7
História do Pensamento Cristão Pseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita 1. INTRODUÇÃO: O nome Dionísio Areopagita vem de At. 17.34 (ARA): 32 Quando ouviram falar de ressurreição de mortos, uns escarneceram, e outros disseram: A respeito disso te ouviremos noutra ocasião. 33 A essa altura, Paulo se retirou do meio deles. 34 Houve, porém, alguns homens que se agregaram a ele e creram; entre eles estava Dionísio, o areopagita, uma mulher chamada Dâmaris e, com eles, outros mais. Este Dionísio foi um dos que se converteram por intermédio do ministério do Apóstolo Paulo. Naturalmente, o Pseudo Dionísio que trataremos aqui 1 não era um crente do século II, mas um teólogo medieval, que é mais conhecido como Pseudo Dionísio por ter usado o pseudônimo do discípulo ateniense de Paulo. Seus escritos circularam por cerca do ano 500 d.C e alguns postulam que ele viveu na Síria ou perto dela no período medieval. Informações a respeito de sua família, e etc. não foram encontradas. Justo Gonzalez afirma que dentro da Idade Média Pseudo Dionísio exerceu grande influência teológica, seja ela negativa ou positiva (na opinião dele mais negativa). Ele diz que: “O mais influente teólogo oriental durante o período entre o quarto e o sexto concílios – ‘CALCEDÔNIA (451), 1 Para esta pesquisa foram utilizadas as seguintes obras: LANE, Tony. Pensamento Cristão (vol.1). São Paulo: Abba Press, 2000, p. 86-88; GONZÁLEZ, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão (vol. 2). São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 90-93; GONZÁLEZ, Justo L. Dionísio Areopagita. Dicionário Ilustrado dos Intérpretes da fé. Santo André: Academia Cristã, 2005, p. 220-222. 1

DIONÍSIO O AREOPAGITA

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: DIONÍSIO O AREOPAGITA

História do Pensamento CristãoPseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita

1. INTRODUÇÃO:

O nome Dionísio Areopagita vem de At. 17.34 (ARA):

32 Quando ouviram falar de ressurreição de mortos, uns escarneceram, e

outros disseram: A respeito disso te ouviremos noutra ocasião. 33 A essa

altura, Paulo se retirou do meio deles. 34 Houve, porém, alguns homens que

se agregaram a ele e creram; entre eles estava Dionísio, o areopagita, uma

mulher chamada Dâmaris e, com eles, outros mais.

Este Dionísio foi um dos que se converteram por intermédio do ministério do

Apóstolo Paulo. Naturalmente, o Pseudo Dionísio que trataremos aqui1 não era um

crente do século II, mas um teólogo medieval, que é mais conhecido como Pseudo

Dionísio por ter usado o pseudônimo do discípulo ateniense de Paulo. Seus escritos

circularam por cerca do ano 500 d.C e alguns postulam que ele viveu na Síria ou

perto dela no período medieval. Informações a respeito de sua família, e etc. não

foram encontradas.

Justo Gonzalez afirma que dentro da Idade Média Pseudo Dionísio exerceu

grande influência teológica, seja ela negativa ou positiva (na opinião dele mais

negativa). Ele diz que: “O mais influente teólogo oriental durante o período entre o

quarto e o sexto concílios – ‘CALCEDÔNIA (451), CONSTANTINPLA II (553),

CONTANTINOPLA III (680-681)’2 –, foi sem dúvida alguma, o que publicou seus

trabalhos sob o pseudônimo Dionísio, o Areopagita”.

Por muitos séculos os pensadores acreditaram que os escritos do falso

Dionísio vinham do próprio discípulo grego do Apóstolo Paulo. Antes do século XV

não foi questionada a sua autoria o que corroborou para sérias implicações

teológicas na Idade Média, duas muito sérias: 1. A autoridade de seus escritos só

era inferior ao próprio Novo Testamento; 2. Como esse autor era Neoplatonista,

seus escritos contribuíram consideravelmente para a influência neoplatônica na

teologia cristã medieval.

1 Para esta pesquisa foram utilizadas as seguintes obras: LANE, Tony. Pensamento Cristão (vol.1). São Paulo: Abba Press, 2000, p. 86-88; GONZÁLEZ, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão (vol. 2). São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 90-93; GONZÁLEZ, Justo L. Dionísio Areopagita. Dicionário Ilustrado dos Intérpretes da fé. Santo André: Academia Cristã, 2005, p. 220-222.2 BETTENSON, Henry (Ed.) Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: ASTE, 1967, p. 438

1

Page 2: DIONÍSIO O AREOPAGITA

História do Pensamento CristãoPseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita

Seu pensamento foi tão forte que muitos teólogos chegaram a pensar que o

neoplatonismo era parte da filosofia própria das Escrituras, o que, naturalmente

invalidava outras correntes filosóficas como o aristotelismo, que foi reintroduzido na

Europa ocidental nos sécs. XII e XIII.

2. O PENSAMENTO DO PSEUDO DIONÍSIO.

Neoplatonismo. Já dissemos que o seu pensamento estava mergulhado no

Neoplatonismo e uma teologia profundamente mística, isso significa a aceitação da

natureza incorpórea, mística e transcendente de Deus que não tem contato com o

mundo e a alma como a realidade última do mesmo em contraste com o seu corpo

explicando a existência do mal. Para o Pseudo Dionísio Deus é totalmente

impossível de ser conhecido. Deus transcende totalmente toda categoria do

pensamento humano.

Obras Principais.

1. Nomes Divinos , discute os nomes bíblicos para Deus e a sua natureza

transcendente;

2. Teologia Mística , discursa sobre a união mística da alma humana com Deus;

3. Hierarquia Celestial , debate a natureza dos anjos, que são divididos em uma

hierarquia de nove coros, três a três (como a Trindade): Serafins, Querubins e

Tronos; Domínios, Virtudes e Poderes; Principados, Arcanjos e Anjos;

4. Hierarquia Eclesiástica , apresenta a igreja como a imagem do mundo celestial

e como ele, como uma hierarquia. Nesta obra Dionísio diz que há três ordens de

ministros: bispo, sacerdote e diácono; e três ordens de níveis mais baixos: monge,

leigo e catecúmeno. Também há três sacramentos: batismo, eucaristia e

confirmação (Crisma); e três estágios para Deus: purificação, iluminação, união.

“Os Três Caminhos”. É importante ressaltar uma doutrina que o Pseudo

Dionísio formulou chamada de três estágios ou três caminhos. Esta doutrina tinha

como objetivo a aproximação da alma com a transcendência Divina, segue os

estágios:

a) Purificação. A alma é livre de sua impureza.

2

Page 3: DIONÍSIO O AREOPAGITA

História do Pensamento CristãoPseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita

b) Iluminador. A alma recebe a luz divina.

c) Unificador. A alma é unida a Deus em uma visão estática

(contemplação e abismada) – uma visão que, por causa da absoluta transcendência

de Deus, não é “abrangente”, mas, ao invés, “intuitiva”.

A alma quando passa por estes três estágios é socorrida pelas várias

hierarquias. Elas fazem isso por meio dos sacramentos. Gonzalez afirma de maneira

satírica que: “se esta fosse a totalidade do pensamento do Pseudo Dionísio, seria

difícil chamá-lo de cristão”3.

Humanidade de Cristo. Dionísio também tem uma interpretação

Neoplatonista e muito controvertida a respeito da humanidade de Cristo. Tem-se a

impressão de que ele pensava que a humanidade foi absorvida pela divindade, de

tal forma que, depois da encarnação, não se pode mais falar de uma natureza

humana no salvador.

Por essas e outras razões, Dionísio foi acusado de monofisismo, o que

significa negar totalmente a existência de uma natureza humana em Cristo. Embora

ele mesmo não declare isso, dizer que sua cristologia é muito parecida com essa

idéia tem muito fundamento.

Abordagem Apofática. Outro aspecto da teologia do Pseudo Dionísio é a

sua abordagem apofática à teologia. Em seu livro Nomes Divinos ele faz a seguinte

declaração:

Deus é maior que toda razão e todo conhecimento e tem sua firme habitação completamente além da Mente e do Ser... e não pode ser alcançado por nenhuma percepção, imaginação, conjectura, nome, discurso, apresentação ou compreensão... É impossível descrever ou conceber em sua natureza última... Os místicos sendo deificados e unidos, através do cessar de suas atividades naturais, à Luz que ultrapassa a Deidade, não pode encontrar mais nenhum método adequado para celebrar seu louvor do que negá-lo de toda sorte de atributo.4

3 ; GONZÁLEZ, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão (vol. 2). São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 92.4 LANE, Tony. Pensamento Cristão (vol.1). São Paulo: Abba Press, 2000, p. 88.

3

Page 4: DIONÍSIO O AREOPAGITA

História do Pensamento CristãoPseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita

O que ele quer dizer nesta declaração é que só se pode falar de Deus

apofaticamente, ou seja, em sentido negativo, dizendo o que Deus não é. Quando

você exclui Deus da imanência, de sua relação com o mundo criado sua alma torna-

se una com Deus. Isso pode ser feito através do silêncio da oração que é um

mistério onde a Luz se revela.

3. PSEUDO DIONÍSIO PARA OS DIAS DE HOJE

Para concluirmos quero expor como algumas ideias do Pseudo Dionísio que

julgo serem erradas (aspectos negativos) e em segunda estância seus pontos que

podem ser reaplicáveis aos nossos dias (aspectos positivos).

NEGATIVOS:

1. Sua Cristologia tende dar importância à humanidade de Cristo em

detrimento de sua divindade. Isso pode se aplicar aos testemunhas de Jeová nos

dias de hoje.

2. Sua proposta de relacionamento com Deus por meio da alma é

completamente neoplatônica e nada tem a ver com a espiritualidade judaico-cristã

que pensa o ser humano integralmente tributado (mente, emoções, corpo, alma,

relacionamentos, vontade) a Deus. Toda teologia que considera o ser humano

apenas como alma, ou desconsidera a ressurreição escatológica do corpo concorda

com esta visão dualista do ser humano.

3. Seu pessimismo em relação aos atributos de Deus tem mais a ver com

o Mundo Das Idéias (Platão) do que com as Escrituras. A idéia de um Deus

incognoscível é um contra-senso na própria revelação de Deus. A história da fé

mostra o Deus que se revela e se encarna na história.

POSITIVOS:

1. Sua visão transcendente é importante, mas deve manter-se

equilibrada. É saudável uma teologia que diferencia o “ser” do homem em relação ao

“Ser” de Deus. Vivemos dias em que Deus se tornou um ídolo, algo feito por mãos

humanas. Na prática, falar sobre Deus tornou-se algo corriqueiro. E na própria

teologia lemos, vemos e ouvimos sobre “um deus” que vive para responder aos

4

Page 5: DIONÍSIO O AREOPAGITA

História do Pensamento CristãoPseudo-Dionísio ou Dionísio, o Areopagita

meus caprichos; lemos também o deus di Teísmo Aberto que abandonou sua

Soberania para ser um deus puramente existencial (ou humano). Em relação a isso

ele está certo: Deus é Deus, nós somos homens. Entretanto, Deus é relacional e

não apenas um Ser plenamente “intocável”.

2. Sua visão de Hierarquia Eclesiástica implica em uma mentoria

espiritual, onde a santidade é vista não como uma busca pessoal-particular, mas

como um anseio coletivo. Porém faço algumas ressalvas:

I. No processo de santificação Deus provê uma hierarquia de pessoas

para nos conduzir a um relacionamento mais profundo com Deus, mas isso não

deve abrir espaço para níveis de superioridade ou inferioridade.

II. Utilização dos sacramentos para o crescimento espiritual dos crentes

com a ressalva do 3° sacramento da confirmação ou Crisma.

Sejam quais forem os demais aspectos positivos ou negativos do Pseudo

Dionísio, o fato é que ele teve uma ampla influência para a idade Média e foi um dos

resgatadores da filosofia neoplatonista. Na história da Igreja ele foi considerado um

fiel intérprete da mensagem paulina.

Referências Bibliográficas:

BETTENSON, Henry (Ed.) Documentos da Igreja Cristã. São Paulo: ASTE, 1967.

GONZÁLEZ, Justo L. Uma História do Pensamento Cristão (vol. 2). São Paulo:

Cultura Cristã, 2004.

GONZÁLEZ, Justo L. (Ed.) Dionísio Areopagita. Dicionário Ilustrado dos

Intérpretes da fé. Santo André: Academia Cristã, 2005.

LANE, Tony. Pensamento Cristão (vol.1). São Paulo: Abba Press, 2000.

5