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2 1 Fragmentação, efeito de borda e perda de biodiversidade. 2 Corredores ecológicos, dispersão de fauna e flora e trocas genéticas. 3 Conservação e manejo de populações e de metapopulações in situ e ex situ. 4 Introduções indesejadas de animais exóticos ou alóctones e seus efeitos sobre populações e comunidades em ambientes naturais. 5 Estratégias para conservação da diversidade biológica: hotspots (áreas de alta biodiversidade) e centros de endemismos. 6 Estratégias de conservação de habitats e de espécies. 7 Estrutura de populações e manejo sustentável de fauna na natureza e em semiliberdade. 8 Estatística paramétrica e não paramétrica. 9 Ecologia da paisagem. 10 Biomas e fitofisionomias brasileiros: características e evolução da fauna e flora. 11 Desenvolvimento econômico do país e conservação da biodiversidade amazônica. 12. Política Nacional da Biodiversidade, Decreto nº 4.339/2002. 13 Decreto nº 2.519/1998. 14. Acesso ao patrimônio genético, Medida Provisória nº 2.186-16/2001 e Decreto nº 6.159/2007. 15 Lei nº 5.197/1967. www.klimanaturali.org

Ecologia conservação e manejo da biodiversidade.pdf

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    1 Fragmentao, efeito de borda e perda de biodiversidade. 2 Corredores ecolgicos, disperso de fauna e flora e trocas genticas. 3 Conservao e manejo de populaes e de metapopulaes in situ e ex situ. 4 Introdues indesejadas de animais exticos ou alctones e seus efeitos sobre populaes e comunidades em ambientes naturais. 5 Estratgias para conservao da diversidade biolgica: hotspots (reas de alta biodiversidade) e centros de endemismos. 6 Estratgias de conservao de habitats e de espcies. 7 Estrutura de populaes e manejo sustentvel de fauna na natureza e em semiliberdade. 8 Estatstica paramtrica e no paramtrica. 9 Ecologia da paisagem. 10 Biomas e fitofisionomias brasileiros: caractersticas e evoluo da fauna e flora. 11 Desenvolvimento econmico do pas e conservao da biodiversidade amaznica. 12. Poltica Nacional da Biodiversidade, Decreto n 4.339/2002. 13 Decreto n 2.519/1998. 14. Acesso ao patrimnio gentico, Medida Provisria n 2.186-16/2001 e Decreto n 6.159/2007. 15 Lei n 5.197/1967. www.klimanaturali.org

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    FRAGMENTAO, EFEITO DE BORDA E PERDA DE BIODIVERSIDADE

    O crescente avano do desenvolvimento em direo da Amaznia tem sido responsvel pelo

    acelerado processo de fragmentao das paisagens do bioma da Amaznia. Atividades agrcolas

    (pastagem e cultivo), incndios florestais, construo de barragens, minerao e explorao de

    recursos da fauna e flora resultam na perda da biodiversidade. Para crescer de forma sustentvel

    preciso que as instituies governamentais e no governamentais busquem alternativas para valorizar

    os elementos da biodiversidade. Anseia-se que esses valores sejam considerados nas discusses

    voltadas para o desenvolvimento econmico e nas aplicaes de educao e gesto ambiental.

    Estudos sobre os efeitos da fragmentao florestal sobre a estrutura gentica das espcies so

    importantes para o planejamento e gerenciamento de estratgias de conservao. A fragmentao de

    habitats uma das mais importantes e difundidas conseqncias da atual dinmica de uso da terra pelo

    homem (Brooks et al. 2002). A taxa com que o homem est alterando as paisagens naturais muitas

    vezes maior do que a da dinmica de perturbao natural dos ecossistemas (Goling e Willian 2000).

    A transformao de habitats em pequenos remanescentes impe uma grande ameaa para muitas

    espcies selvagens (Ricklefs 2003, Pattanavibool 2004), devido diminuio da capacidade dos

    organismos em se deslocarem em decorrncia das modificaes ocorridas. A ocupao humana e a

    modificao do uso das terras, esta convertendo paisagens naturais em reas de cultivo, pastagem e

    urbanizao (Brooks et al. 2002; Myers et al 2000; Goling and Willian 2000; Begon et al. 1999). Com

    isso, restam apenas pequenos fragmentos de paisagens naturais, muitas vezes isoladas, tornando-se

    numa rea insular entre as atividades humanas (Brooks et al. 2002). A resposta das espcies existentes

    nesses fragmentos depender da sua capacidade de sobrevivncia dentro desses fragmentos (Laurence

    1991). Algumas espcies conseguem se adaptar, prosperar e circular livremente nas reas

    fragmentadas, ao passo que a maioria, que no consegue, sofre extino local. Portanto, muitas vezes

    os remanescentes naturais so pequenos e(ou) isolados e acarretam a extino local das espcies

    (Goling e Willian 2000).

    A destruio de habitats resulta na fragmentao destes, aumenta a perda de habitat original,

    reduz o tamanho e aumenta o isolamento das manchas de habitat (Scribner et al 2001, Curtis e Taylon

    2004). O perfil dos remanescentes florestais pode diferir na forma, tamanho, microclima, regime de

    luminosidade, solo, grau de isolamento e tipo de propriedade. Conseqentemente, a fragmentao da

    floresta pode influenciar os padres locais e regionais de biodiversidade devido perda de micro-

    habitats nicos, isolamento do habitat, mudanas nos padres de disperso e migrao e eroso do solo

    (Laurence 1991). Adicionalmente, os efeitos de borda, que podem alterar a distribuio,

    comportamento e sobrevivncia de espcies de plantas e animais, sero magnificados em reas de alta

    intensidade de fragmentao florestal.

    As modificaes nas paisagens afetam de forma diferenciada os parmetros demogrficos de

    mortalidade e natalidade de diferentes espcies e, portanto, a estrutura e dinmica dos ecossistemas.

    No caso de espcies arbreas, a alterao na abundncia de polinizadores, dispersores, predadores e

    patgenos afetam as taxas de recrutamento de plntulas. Os incndios e mudanas microclimticas

    atingem de forma mais intensa as bordas dos fragmentos, alterando as taxas de mortalidade de rvores

    (Brooks et al. 2002). As evidncias cientficas sobre esses processos tm crescido nos ltimos anos.

    No Brasil, a explorao antrpica da Amaznia tem ocasionado a perda da sua biodiversidade devido

    substituio das paisagens naturais por campo agrcola, pastagens e urbanizao (Klink 2005). Estima-

    se que j tenha perdido mais de 30 % da sua rea original, e que os cenrios cientficos mostram uma

    tendncia de aumento desse processo. A criao de gado, explorao da madeira, atividades

    relacionadas com minerao e mais recentemente com a possibilidade da expanso agrcola por causa

    do programa de biocombustvel e gerao de energia hidreltrica incentivado pelo governo, esto entre

    as principais ameaas. Assim, o grande desafio dos rgos ambientais evitar que a floresta

    Amaznica tenha o mesmo destino do Cerrado e da Mata Atlntica, sobretudo porque h muitas

    espcies que ainda no foram catalogadas. Alm do mais, a perda da biodiversidade do bioma

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    Amaznico poder trazer consequncias globais.

    O planejamento e manejo de reservas naturais deve necessariamente considerar os efeitos da

    fragmentao da floresta relacionados persistncia das espcies e dos mecanismos ecolgicos. Se a

    rea de uma reserva natural est abaixo do tamanho mnimo necessrio para que seja mantida a

    populao de uma espcie, ento a espcie estar em risco de extino nessa reserva. A fuso rpida do

    conhecimento cientfico com polticas pblicas, relacionadas ao uso e ocupao do solo, urgente para

    evitar uma degradao ambiental intensa e, pr-ativamente, manejar as reas naturais que iro

    enfrentar grande onda de desenvolvimento no futuro. As aes econmicas, social, poltica e ambiental

    decidiro sobre o destino das espcies e dos mecanismos que sustentam a vida. Dessa forma, a

    sociedade dever tomar decises embasadas nos conhecimentos cientficos e tecnolgicos.

    Dore e Webb (2003) analisaram um estudo de caso para determinar o valor da biodiversidade. Foi

    realizada uma prospeco da biodiversidade para procurar compostos qumicos e informao gentica

    produzidos por organismos silvestres e, que pudesse ter algum valor comercial, cujo preo refletisse no

    mercado. O comrcio agrcola, a indstria farmacutica e de cosmticos tm grande interesse nessas

    aplicaes. Esperava-se que a prospeco fosse utilizada para determinar um valor comercial para a

    preservao de reas ricas em biodiversidade. Mas, existem diversos problemas de regulamentao de

    direito a propriedade. Por isso, as companhias farmacuticas freqentemente contratam coletores. De

    fato, seu custo de prospeco est associado s despesas com o coletor, ficando a preservao da rea

    para segundo plano.

    Uma ampla classe de valorao, utilizada por economistas de recursos, tem sido valorar o

    estoque de uma espcie (Perrings et al. 1995 apud Dore e Webb 2003). Essa abordagem engloba

    diversos conceitos de valorao econmica, novos e antigos. A abordagem dos economistas de

    recursos uma forma de valorar passo a passo uma nica espcie, tentando primeiramente calcular sua

    biomassa. Dada a natureza do crescimento biolgico, a equao logstica tem sido muito utilizada para

    estimar a biomassa de uma espcie. A essa biomassa poder ser atribudo um valor de diversas formas:

    pode ser atribudo um valor direto (de consumo) como alimento ou como uma espcie estruturante.

    Valores diretos de existncia e herana tambm podem ser atribudos espcie. Contudo, de uma

    forma geral, os diferentes mtodos podem ser classificados em dois grandes grupos, os mtodos

    diretos e indiretos de valorao econmica da biodiversidade. A economia da natureza interpreta que

    relao ambiente-economia em termos da segunda lei de termodinmica. A segunda lei v a atividade

    econmica como um processo dissipativo. A partir desta perspectiva, a produo de bens econmicos

    e servios invariavelmente requerem o consumo de matria e energia disponveis no ambiente. A

    economia necessariamente se alimenta de recursos de energia/matria de alta qualidade (baixa

    entropia) para crescer e desenvolver. Isso tende a desordenar e homogeneizar a ecosfera. A

    ascendncia da humanidade acompanhada por uma taxa crescente de degradao ambiental, resultando

    na perda da biodiversidade, reduo dos sistemas naturais e poluio da gua, ar e solo. Em suma, o

    paradigma dominante de desenvolvimento econmico baseado no crescimento fundamentalmente

    incompatvel com a sustentabilidade social e ecolgica (Rees 2003).

    Ento a valorao da biodiversidade deve ser estudada, utilizada e difundida, sendo uma

    ferramenta aliada e imprescindvel nas polticas econmicas e sociais. Alm disso, a valorao

    essencial dentro da nova viso da economia ecolgica, que prev a internalizao das externalidades

    (positivas ou negativas). Portanto, entre o desafio de atribuir valores aos elementos da biodiversidade,

    reduzir os processos de fragmentao das paisagens naturais e buscar um desenvolvimento de forma

    sustentvel, est a necessidade urgente da aplicao dos instrumentos de gesto ambiental. Inclui-se

    no s o estabelecimento e aplicao das leis, mas a tica em todos os setores - poltico,

    governamental, empresarial e social - para inserir nas discusses econmicas e sociais os valores

    ecolgicos (Ricklefs 2003). Por outro lado, preciso que haja aplicao da educao ambiental nos

    setores da sociedade.

    Por meio da educao ambiental possvel sensibilizar as pessoas e mostrar que os seres

    humanos dependem do ambiente para obteno dos recursos que necessitam para a sua sobrevivncia

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    e, principalmente, que esses recursos so finitos. Ainda, que sejam levadas as informaes dos

    cientistas e pesquisadores a todas as camadas da sociedade, para que a mesma possa refutar os

    acontecimentos. Tais informaes devem ser avaliadas por cada indivduo, pois a sustentabilidade do

    planeta depende primordialmente da ao de todos. Entretanto, a esfera poltica precisa estar bem

    assessorada para tomar decises corretas que contribuam para manuteno dos ecossistemas. Alm

    disso, devemos ter cincia que ns fazemos parte da biodiversidade e, no temos a moral de sentenciar

    uma espcie extino e beneficiar outra porque a consideramos mais valiosa economicamente em

    relao anterior. Para isso, torna-se necessria a mudana dos nossos valores e s assim teremos a

    possibilidade de ter um planeta sustentvel. Dessa forma, a prtica da educao ambiental como

    instrumento de gesto, juntamente com as polticas pblicas eficientes, e governncia so

    imprescindveis para que o Brasil minimize e conserve seus recursos naturais.

    Dentre os vrios temas integrados possveis de investigao na Amaznia, os que esto mais

    relacionados com o processo de gesto territorial da regio so o planejamento e a implementao de

    territrios sustentveis, ou seja, um mosaico de usos de terra complementares gerenciados de forma

    integrada que permitam conservar a biodiversidade e manter tanto a dinmica dos processos

    ecolgicos como a dinmica socioeconmica de um determinado territrio. necessrio o manejo

    florestal sustentvel (Litlle 2003) e a participao social (Nascimento 2003). Para isso, preciso

    integrar e aplicar os conhecimentos cientficos para desenvolver modelos sustentveis de uso do

    territrio na regio.

    Outros mecanismos de resposta conservao ambiental incorporam, tambm, a importncia da

    agricultura familiar, a lgica dos crditos de carbono, a agricultura de floresta, o artesanato e o

    ecoturismo sustentvel para diminuir os impactos dos produtores nessas regies. A sustentabilidade

    depende de modelos alternativos de gesto ambiental. Polticas locais, regionais e federais devem

    convergir na mesma direo. Da prtica coerente de instrumentos de educao e gesto ambiental com

    instrumentos econmicos de desenvolvimento (Bursztyn 2001). Assim, os recursos naturais existentes

    na Amaznia dependem de polticas pblicas eficientes para minimizar o processo de fragmentao

    que ocorre na regio de forma crescente. Portanto, a sociedade brasileira juntamente com as

    comunidades existentes na Amaznia deve atribuir valor aos elementos da biodiversidade e aplicar

    valores morais que possam contribuir para a sustentabilidade do planeta.

    EFEITO DE BORDA

    Efeito de borda uma alterao na estrutura, na composio e/ou na abundncia relativa de

    espcies na parte marginal de um fragmento. Tal efeito seria mais intenso em fragmentos pequenos

    e isolados.

    Esta alterao da estrutura acarreta em uma mudana local, fazendo que plantas que no

    estejam preparadas para a condio de maior estress hdrico, caracterstico das regies de borda,

    acabem perecendo, acarretando em mudanas na base da cadeia alimentar e causando danos

    fauna existente na regio.

    Muitas vezes essa morte dentre os integrantes da flora na regio de borda, acarreta na

    ampliao desta regio, podendo atingir segundo alguns autores, at 500m.

    Na Floresta Atlntica, a maior parte dos remanescentes florestais, especialmente em

    paisagens intensamente cultivadas, encontra-se na forma de pequenos fragmentos, altamente

    perturbados, isolados, pouco conhecidos e pouco protegidos (Viana & Pinheiro, 1998). A

    fragmentao florestal um dos fenmenos mais marcantes e graves do processo de expanso da

    fronteira agrcola no Brasil (Viana et al., 1992), provocando o isolamento de trechos de floresta de

    diferentes tamanhos, em meio a reas perturbadas, ficando a periferia do fragmento mais exposta

    insolao e modificao do regime dos ventos. Essas mudanas provocadas pelos limites

    artificiais da floresta sochamadas efeito de borda e tm enorme impacto sobre os organismos que

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    vivem nesses ambientes fragmentados . Uma forma de se estudar essas mudanas observar o

    padro de agregao das espcies que pode ocorrer em resposta a diferenas locais entre habitat.

    Pelas mudanas provocadas nas condies do local, o efeito de borda afeta o padro de

    distribuio espacial das espcies. A distribuio diamtrica busca permitir a avaliao prvia de

    condies dinmicas da floresta, possibilitando previses futuras quanto ao desenvolvimento da

    comunidade vegetal. E, atravs da avaliao da estrutura vertical em populaes, pode-se

    identificar o comportamento ecolgico e o hbito de cada populao.

    Outro ponto importante no estudo do comportamento das espcies seria com relao ao

    estudo de grupos sucessionais. A separao das espcies arbreas em grupos ecolgicos uma

    maneira de possibilitar o manuseio do grande nmero de espcies da floresta tropical, mediante

    seu agrupamento por funes semelhantes e de acordo com as suas exigncias. Os estudos dos

    grupos sucessionais servem no apenas para que se possa recuperar a vegetao original mas,

    tambm, porque em cada uma de suas fases se encontram potenciali- dades biolgicas de grande

    utilidade para o homem, por exemplo, os grupos de espcies de rpido crescimento, que podem ser

    exploradas comercialmente .

    PERDA DE BIODIVERSIDADE

    Ser que deveramos nos preocupar com a extino das espcies? At pouco

    tempo atrs, a diversidade da vida vem aumentando aos nveis mais elevados de

    que se tem conhecimento na histria da Terra (Chapin et al . , 2000). Contudo, a

    explorao da natureza pelo homem tem tido , e ainda tem, conseqncias

    prejudiciais para a biodiversidade do planeta . Segundo estimativas, cerca de 150

    t ipos nicos de organismos so extintos diariamente (Lamont, 1955). bem

    verdade que muitas espcies de plantas e animais esto desaparecendo e

    continuaro a desaparecer em decorrncia de atividades humanas no passado e

    no presente (Chapin et al . , 1996) , mas ser que essa perda afeta o funcionamento

    dos ecossistemas e inf luenciam o bem-estar da humanidade?

    A cincia conhece quase dois mi lhes de espcies, mas acredita -se que

    existam pelo menos 10 milhes (e talvez at 30 milhes) de espcies (May,

    1990). Com esse grande nmero de espcies, e a vasta diversidade que

    representam, seria realmente to importante se perdssemos algumas, ou mui tas

    que sejam? Afinal, a extino um processo natural mais de 99% de todas as espcies que j exist iram esto hoje extintas (Leakey, 1996). Alm disso, muitas

    espcies so consideradas redundantes (Walker, 1992), o que significa que

    desempenham as mesmas funes dentro de um ecossistema. Sendo assim, a

    perda de todas as espcies que desempenham uma certa funo, com exceo de

    uma, no deveria importar. Ou deveria?

    Em primeiro lugar, qualquer possvel efeito negativo no funcionamento do

    ecossistema deve-se no apenas perda de espcies propriamente ditas, mas

    velocidade com que esto desaparecendo. Hoje em dia, as espcies esto

    desaparecendo de 100 a 1.000 vezes mais rapidamente do que em pocas

    anteriores existncia do homem na terra, e a extino adicional das espcies

    ameaadas pode acelerar substancialmente essa perda (Chapin et al . , 1998).

    Alm disso, para cada 10.000 espcies que se extinguem, somente uma nova

    espcie chega a evoluir (Chapin et al . , 1998) . Portanto, a velocidade de pe rda de

    biodiversidade atual supera largamente a velocidade com que a natureza

    consegue efetuar uma compensao e se adaptar.

    Em segundo lugar, as espcies redundantes conseguem se proteger contra

    as mudanas de funo do ecossistema, no caso de p erda de espcies, somente

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    at certo ponto. Contudo, os organismos classificados por ns como idnticos em

    funo muitas vezes demonstraram diferir o suficiente para adquirir uma

    importncia significativa no funcionamento do ecossistema. Mesmo que algumas

    espcies sejam redundantes em termos da funo que desempenham, elas

    geralmente tm diferentes condies ambientais favorveis ao seu crescimento e

    reproduo, o que uma proteo contra as mudanas no ecossistema se as

    condies ambientais se alterarem (Chapin et al . , 1995). Conseqentemente, a

    perda de espcies pode no s causar efeitos diretos num ecossistema, mas

    tambm afetar sua capacidade de proteo contra futuras mudanas ambientais.

    Portanto, verificamos que as espcies esto desaparecendo mais

    rapidamente do que nunca, que a natureza no consegue acompanhar essa grande

    rapidez de extino e que as espcies ecolgicas equivalentes (se que existem)

    so importantes como proteo contr a futuras mudanas no ambiente. Portanto,

    existem motivos de preocupao. Mas ser que existe alguma prova de que a

    perda de biodiversidade cause efeitos negativos no funcionamento dos

    ecossistemas? Existem pelo menos algumas indicaes e, no texto abaixo, vou

    discorrer brevemente sobre alguns resultados de estudos que investigaram os

    efeitos da perda de biodiversidade.

    Investigaes dos efeitos da perda de biodiversidade

    Embora diversos estudos, part icularmente na cincia agrcola, tenham

    investigado empiricamente a importncia do agrupamento de vrias espcies em

    pocas remotas, foi s no incio da dcada de 90 que os primeiros estudos

    testando especificamente os efeitos da perda de biodiversidade nos processos e

    funcionamento do ecossistema foram publ icados. Desde ento, a pesquisa no

    campo da ecologia chamado Biodiversidade e Funcionamento do Ecossistema

    (BD-EF) aumentou consideravelmente (vide Loreau et al . , 2001, 2002, para

    estudos ) . A despeito de alguns problemas com projetos experimentais,

    estatst icas e extrapolao de resultados para os sistemas naturais, houve

    progresso. A seguir, vou expor e analisar o que considero ser as mais

    importantes realizaes desses estudos.

    Importncia da Biodiversidade

    As primeiras contribuies empr icas no campo da BD -EF foram

    publicadas em meados dos anos 90 (Tilman e Downing, 1994, Naeem et al . ,

    1994, 1995). Esses dois estudos concluram que a biodiversidade era importante

    para o funcionamento do ecossistema. O estud o de Naeem et al . (1994, 1995) foi

    realizado no Ecotron, na Inglaterra, em ecossistemas art if iciais consti tudos de

    vrios nveis trficos (i .e. produtores primrios, consumidores e predadores)

    contendo biodiversidade baixa, mdia ou alta. Descobriu -se que a biodiversidade

    afeta substancialmente diversos processos diferentes do ecossistema e que

    alguns processos aumentaram com a biodiversidade, enquanto outros

    diminuram. Tilman e Downing (1994) realizaram seus estudos nos ecossistemas

    de pastagens em Cedar Creek, estado de Minnesota, EUA. Util izaram

    tratamentos experimentais contendo de uma a 24 espcies, e ver ificaram que a

    produtividade e a reteno dos nutrientes do solo aumentaram com a diversidade

    vegetal . Esses estudos receberam muita ateno quando p ublicados; portanto,

    t iveram grande importncia no impulso da pesquisa em BD -EF, aumentando a

    conscientizao das conseqncias da perda de biodiversidade, tanto na

    comunidade cientfica como entre os tomadores de deciso. Propiciaram tambm

    um bom alicerce para futuras pesquisas.

    Importncia do projeto experimental

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    Aps esses primeiros estudos empr icos sobre os efeitos da perda de

    espcies, houve alguma polmica sobre a causa desses resultados (Aarsen, 1997,

    Huston, 1997) . Uma das sugestes era que, em vez da biodiversidade

    propriamente dita, algumas poucas espcies com forte impacto nos processos do

    ecossistema e a crescente probabil idade de essas espcies terem sido includas

    nos agrupamentos de alta diversidade poderiam ser responsveis pelas

    correlaes entre a biodiversidade e o funcionamento do ecossistema. Em outras

    palavras, os resultados poderiam ser fabricados pelo projeto experimental ( i .e.

    efeito de amostragem). Contudo, outros ecologistas argumentaram que a importncia de determinadas espcies e sua maior taxa de ocorrncia em

    agrupamentos com maior nmero de espcies poderiam ser tambm uma

    caracterst ica importante dos sistemas naturais (Tilman et al . , 1997). Essa

    questo foi solucionada de certa forma quando foram apresentadas tc nicas

    estatst icas para separar os efeitos da biodiversidade e determinadas espcies

    (Jonsson e Malmqvist , 2000, Loreau e Hector, 2001). Alm disso, a importncia

    de determinadas espcies e determinadas composies de espcies deveria

    tambm ser objeto de interesse em estudos sobre fatores que afetam o

    funcionamento do ecossistema. De qualquer modo, esse debate foi importante

    pois conduziu a projetos experimentais mais slidos sobre os efeitos da

    biodiversidade.

    Redundncia das espcies

    Alguns estudiosos argumentaram que no a biodiversidade per se, mas

    sim a diversidade funcional do grupo que importante para o funcionamento do

    ecossistema. Esse argumento fundamenta -se na crena de que as espcies

    pertencentes ao mesmo grupo funcional so redun dantes. De acordo com essa

    l inha de raciocnio, as espcies podem se extinguir sem causar nenhum efeito no

    funcionamento do ecossistema, contanto que cada grupo funcional seja

    representado por pelo menos uma espcie.

    No entanto, embora as espcies possam parecer redundantes quanto

    funo que desempenham, elas podem se dist inguir de inmeras outras maneiras ,

    i .e. at ividade no tempo e no espao, preferncias ambientais (climticas),

    escolha especfica da presa, vulnerabil idade a predadores, e a ssim por diante.

    Sustentando a noo de que espcies aparentemente redundantes diferem o

    suficiente para que cada uma seja importante no funcionamento dos

    ecossistemas, existem estudos que investigaram os efeitos da perda de

    biodiversidade dentro de grupos funcionais (ex.: Jonsson e Malmqvist , 2000,

    Jonsson et al . , 2001, Cardinale et al . , 2002, Dangles et al . , 2002, Huryn et al . ,

    2002 Jonsson et al . , 2002, Jonsson e Malmqvist , 2003a,b). Esses estudos

    constataram fortes efeitos de mudana na biodiversidade, embora as espcies

    uti l izadas desempenhassem funes idnticas. Conseqentemente, alm dos

    efeitos definidos no funcionamento do ecossistema quando as lt imas espcies

    de um grupo funcional desaparecem, a perda de espcies dentro de grupos

    funcionais tambm tem grande importncia. Embora alguns desses estudos

    tenham comprovado o aumento do funcionamento do ecossistema com declnio

    da biodiversidade, eles ainda demonstram que a redundncia de espcies, nesse

    sentido, um conceito disfuncional.

    Alm do mais, as espcies redundantes podem, at certo ponto, atuar

    como um seguro biolgico, minimizando o efeito das mudanas no

    funcionamento do ecossistema quando as condies ambientais mudam . Por

    exemplo, imaginemos que duas espcies aparentemente re dundantes (A e B)

    desempenhem uma mesma funo e que a espcie A predomine sobre a espcie B

    em abundncia, j que as condies ambientais existentes favorecem a espcie

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    A. Ento, quando o ambiente se altera de modo que as novas condies passam a

    favorecer a espcie B, causando declnio do desempenho da espcie A, a espcie

    B aumenta em abundncia e desempenho de modo que o funcionamento do

    sistema permanece inalterado. Se a espcie A fosse a nica espcie do sistema

    no momento da mudana ambiental , ocorre ria uma perda no funcionamento do

    ecossistema. Portanto, nesse sentido, a redundncia das espcies um trao

    importante dos sistemas naturais.

    Explicaes mecanicistas para os efeitos da biodiversidade

    Explorar os mecanismos por trs dos efeito s da perda de biodiversidade

    fundamentalmente importante se quisermos compreender as conseqncias da

    rpida perda de biodiversidade atual . A complementaridade de nicho

    freqentemente uti l izada como a explicao mais provvel para os efeitos de

    biodiversidade modificada, principalmente se tanto a diferenciao de nicho como a facil i tao estiverem includas na definio (ex.: Loreau e Hector, 2001). As caracterst icas de uma espcie determinam como, quando e onde ela

    uti l iza os recursos (o nicho). Embora todos os indivduos de uma mesma espcie

    comparti lhem essas caracterst icas, eles geralmente se diferenciam entre

    espcies (diferenciao de nicho). Portanto, a diferenciao de nicho permite

    que as espcies coexistam, evitem uma forte concorrncia e , conseqentemente,

    desempenhem um processo com eficincia (ex.: Volterra, 1926, Lotka, 1932,

    Jonsson e Malmqvist , 2003a). A perda de espcies pode, portanto, reduzir o

    nmero de nichos uti l izados, aumentar a concorrncia e baixar a velocidade do

    processo, afetando negativamente o funcionamento do ecossistema. As

    interaes posit ivas entre espcies, como a facil i tao, por exemplo, so

    potencialmente muito importantes no funcionamento do ecossistema. Embora

    vrios estudos tenham comprovado a facil i tao ent re alguns pares de espcies

    (ex., Soluk e Collins, 1988, Kotler et al . , 1992, Soluk, 1993, Soluk e

    Richardson, 1997, Cardinale et al . 2002, Jonsson e Malmqvist , 2003a), no se

    sabe bem at que ponto tais interaes so comuns ou importantes nos

    ecossistemas naturais. Contudo, tanto a diferenciao de nicho como a

    facil i tao provavelmente so importantes para manter a velocidade do processo

    e o funcionamento do ecossistema. Assim, no caso de perda de espcie, o

    funcionamento do ecossistema poderia ser afeta do negativamente seja pelo

    aumento da competio, pela lacuna de nicho ou pela perda de interaes

    facil i tadoras.

    Investigao da perda de biodiversidade natural ou aleatria

    Para testar realmente os efeitos da biodiversidade, um estudo deve

    uti l izar espcies escolhidas aleatoriamente em um amplo grupo de espcies. A

    maioria dos estudos, contudo, uti l izou determinadas espcies, ou composies de

    espcies aleatrias, colhidas em grupos menores e, portanto, no conseguiu t irar

    concluses sobre os efeitos da biodiversidade propriamente dita. Em vez disso,

    os resultados podem ser relevantes somente para as espcies uti l izadas no

    estudo. Embora possa ser interessante investigar se existe algum efeito geral da

    perda de biodiversidade no funcionamento do ecossistema uti l izando-se espcies

    escolhidas aleatoriamente, a extino de espcies muitas vezes segue padres

    previsveis, dependendo da espcie do sistema e do t ipo de perturbao.

    Portanto, a melhor maneira de estudar os efeitos da perda de biodiversid ade

    seria sujeitar uma comunidade natural a uma perturbao (Petchey et al . , 1999),

    ou uti l izar uma ordem de extino previs vel (Jonsson et al . , 2002). Isso,

    claro, l imita a aplicabil idade geral dos resultados, mas, ao mesmo tempo,

    fornece resultados ma is realistas e um conhecimento especfico dos efeitos da

    perda de espcies no s istema estudado.

  • 10

    Extrapolao dos resultados experimentais para sistemas naturais

    A persistncia dos efeitos da biodiversidade observados em experincias

    controladas e de curta durao foi questionada (e.g. Symstad et al . , 2003) .

    Como, at o momento, a maioria dos estudos foi realizada durante perodos

    relativamente curtos, no se sabe ao certo se os efeitos (iniciais) so transitrios

    ou persistentes e, portanto, se so relevantes quanto aos efeitos da

    biodiversidade nos sis temas naturais. Entretanto, constatou -se num longo estudo

    de pastagens que o efeito inicial da biodiversidade persist iu ao longo do tempo,

    embora os mecanismos subjacentes tenham mudado (Tilman et al . , 2001). Outro

    problema com a maioria dos estudos at agora que, embora os sistemas

    naturais sejam em geral al tamente complexos, as montagens experimentais tm

    uti l izado relativamente poucas espcies e nveis trficos. Os estudos que

    uti l izaram baixa complexidade muitas vezes obtiveram resultados bastante

    diretos, mas os resultados de sistemas experimentais mais complexos tm sido

    difceis de interpretar. Portanto, h uma troca entre a complexidade e a

    interpretabil idade dos resultados e ainda no h b oas solues para esse

    problema, apesar das tentativas para realizar estudos teis sobre os sistemas

    complexos (vide Finke e Denno, 2004, como um exemplo).

    O Futuro

    At hoje, os estudos tm demonstrado que a biodiversidade importante

    para a velocidade dos processos do ecossistema e para o funcionamento do

    ecossistema pelo menos em escalas espaciais relativamente pequenas e por curtos perodos de tempo. Alm do mais , foram encontradas evidncias de

    mecanismos por trs dos efeitos da biodivers idade. Assim, o desafio para os

    estudos no futuro ser expandir em espao, tempo e complexidade, de forma que

    os resultados obtidos sejam mais relevantes para os sistemas naturais. A

    pergunta se e como a biodiversidade importante para o funcionamento dos

    ecossistemas uma das questes mais importantes da ecologia hoje. Uma vez

    que a atual perda de biodiversidade ameaa seriamente os servios que um bom

    funcionamento dos ecossistemas presta humanidade (Luck et al . , 2003),

    preservar a biodiversidade tambm pode nos ajudar a preservar a humanidade.

    CORREDORES ECOLGICOS

    Como instrumento de gesto territorial, os Corredores Ecolgicos atuam com o objetivo

    especfico de promover a conectividade entre fragmentos de reas naturais. Eles so definidos no

    SNUC como pores de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservao,

    que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a disperso de

    espcies e a recolonizao de reas degradadas, bem como a manuteno de populaes que

    demandam para sua sobrevivncia reas com extenso maior do que aquelas das unidades

    individuais.

    Os Corredores Ecolgicos visam mitigar os efeitos da fragmentao dos ecossistemas

    promovendo a ligao entre diferentes reas, com o objetivo de proporcionar o deslocamento de

    animais, a disperso de sementes, aumento da cobertura vegetal. So institudos com base em

    informaes como estudos sobre o deslocamentos de espcies, sua rea de vida (rea necessria

    para o suprimento de suas necessidades vitais e reprodutivas) e a distribuio de suas populaes.

    A partir destas informaes so estabelecidas as regras de utilizao destas reas, com vistas a

    possibilitar a manuteno do fluxo de espcies entre fragmentos naturais e, com isso, a

    conservao dos recursos naturais e da biodiversidade. So, portanto, uma estratgia para amenizar

    os impactos das atividades humanas sob o meio ambiente e uma busca ao ordenamento da

    ocupao humana para a manuteno das funes ecolgicas no mesmo territrio.

  • 11

    As regras de utilizao e ocupao dos corredores e seu planejamento so determinadas no

    plano de manejo da Unidade de Conservao qual estiver associado, incluindo medidas com o

    fim de promover sua integrao vida econmica e social das comunidades vizinhas.

    Os Corredores Ecolgicos so criados por ato do Ministrio do Meio Ambiente. At o

    momento foram reconhecidos dois corredores ecolgicos:

    Corredor Capivara-Confuses

    Corredor Caatinga

    DISPERSO DE FAUNA E FLORA

    Muitos animais vivem em comunidade, formando grupos sociais, compostos por elementos

    da mesma espcie: bandos, alcateias, cardumes, etc. H tambm animais que vivem isolados. Mas

    at estes tm necessidade de se juntar para se reproduzirem, nem que seja apenas no acto do

    acasalamento. Alm disso, mes e crias formam grupos, mais ou menos temporrios, conforme as

    espcies. A fmea de Urso-pardo passa cerca de trs anos com a cria. Por outro lado, algumas

    espcies de aves so nidfugas, isto , assim que nascem abandonam o ninho, o que no quer dizer

    que os pais, ou pelo menos um deles, no acompanhem a prole. No fundo, todos os animais tm a

    necessidade de, pelo menos em algum momento, partilhar o espao com outros animais da mesma

    espcie.

    Qualquer grupo obedece a regras internas, normalmente definidoras de hierarquia social,

    mantendo assim o equilbrio dos laos existentes. So inmeros os comportamentos sociais das

    diversas espcies que os etlogos tentam registar e compreender. O facto de os animais poderem

    viver isolados ou em comunidade, poder estar ligado a factores derivados da presso competitiva:

    em grupo aumenta a presso por alimento, por parceiro sexual ou pelo local de reproduo. O risco

    de contgio por doena aumenta tambm, alm de que vrios animais juntos so mais facilmente

    detectveis pelos predadores, do que quando se encontram isolados. Mas viver em comunidade

    tambm aumenta o nmero de olhos, narizes e orelhas alerta para o perigo. Entre os predadores, a

    cooperao conjunta torna mais fcil a caada, alm de poder proporcionar a captura de presas

    muito maiores do que seria possvel obter isoladamente. Existem tambm casos de cooperao na

    criao da prole, com as evidentes vantagens de tal facto.

    Os jovens adultos, dependendo de vrios factores, podem ficar no grupo familiar ou partir

    para formarem a sua prpria famlia ou para viverem isoladamente. O habitat, a distribuio de

    alimento, o sistema de acasalamento e os riscos de endogamia, parecem determinar, em grande

    medida, o nvel de disperso dos jovens animais em relao ao seu local de nascimento.

    Dependendo da espcie, os factores que mais influenciam a disperso variam, e dentro de cada

    espcie, pode tambm haver diferentes formas de disperso.

    Quando os jovens ficam na sua rea natal, partilhando o territrio com os progenitores,

    falamos em filopatria natal. Esta estratgia tem vantagens e custos. O grau de parentesco entre os

    elementos do grupo aumento o risco de endogamia, com a consequente reduo de variabilidade

    gentica, o que uma evidente desvantagem evolutiva. No entanto, a consanguinidade pode

    favorecer a seleco de genes que determinem uma boa adaptao a um determinado habitat.

    Entre outros custos da vida em grupo, podemos referir o aumento da densidade populacional,

    que far subir a competio por recursos e parceiros sexuais, bem como por abrigos ou locais de

    reproduo.

    Segundo algumas teorias sociobiolgicas, porm, a vida em sociedade leva reduo da

    agressividade entre os membros e ao aumento dos comportamentos altrustas. Outra vantagem da

    vida social dos animais a de um melhor conhecimento do local onde o grupo habita.

  • 12

    A disperso tem, tambm, custos e benefcios. Se, por um lado, evitam assim a

    consanguinidade, por outro, dispendem muita energia deambulando procura de novos territrios,

    alm de que no conhecem as novas reas para onde se deslocam. Podem ainda encontrar muita

    resistncia e agressividade por parte de indivduos que habitem territrios por onde passem ou para

    onde se desloquem.

    Portanto, a disperso e a filopatria tm, cada qual, os seus custos e benefcios. Uma

    soluo de compromisso, que adoptasse comportamentos de disperso e de filopatria poderia ser

    uma boa estratgia. Foi o que fizeram muitas espcies, especialmente entre as aves e os mamferos.

    Em geral, d-se uma diferenciao por sexos: enquanto os elementos de um dos sexos ficam no

    local de nascimento, os do outro sexo partem. Assim, evitam os problemas de endogamia, e os

    membros que permancem, desfrutam das vantagens da filopatria.

    Curiosamente, parece haver uma tendncia para que, nas aves, se dispersem as fmeas,

    enquanto nos mamferos so os machos que maioritariamente se dispersam. Alguns etlogos tm

    tentado explicar esta tendncia que, reafirme-se, uma tendncia, com excepes.

    Um dos etlogos que se debruou sobre o assunto, Paul Greenwood, publicou um artigo em

    1980, onde explana duas hipteses para explicar o comportamento de aves e mamferos quanto

    disperso. Comeando por admitir que uma separao comportamental entre sexos, um deles

    ficando no local onde nasceu o outro partindo para novas paragens, traria evidentes vantagens para

    a espcie, e acrescenta uma explicao para as diferenas entre aves e mamferos. Essa diferena,

    segundo Greenwood, baseia-se no modo diverso como os machos de aves e de mamferos

    competem por parceiras. Os mamferos so maioritariamente polignicos, isto , cada macho

    defende um grupo de fmeas, competindo com outros machos pelas parceiras. Os machos jovens e

    os subordinados, impedidos de chegar s fmeas, aumentam as suas possibilidades de

    acasalamento quando se dispersam. As fmeas, normalmente, vivem em grupos matralineares

    (compostos por mes, filhas e netas), beneficiando das vantagens da decorrentes. Assim, os

    machos so forados a dispersarem-se para evitar os problemas de uma elevada taxa de consanguinidade.

    Por outro lado, as aves so maioritariamente monogmicas. Os machos, em vez de

    competirem directamente pelas fmeas, competem por locais com bons recursos (em alimentao e

    em locais de nidificao), locais esses que atrairo as potenciais companheiras. O conhecimento do

    local ser, ento, mais importante para os machos do que para as fmeas. Estas, dispersando-se

    evitam os problemas genticos da endogamia e escolhem os territrios com melhores recursos.

    Mas estas hipteses, funcionando bem na generalidade, tm muitas excepes, como no caso dos

    mamferos territoriais, em que seria de esperar que se verificasse a hiptese dos machos teritoriais

    das aves, e que ocorresse a disperso das fmeas. Tal no acontece na maioria dos casos. Surgiram

    ento mais hipteses para explicar as diferenas entre sexos na disperso. Primeiro, em 1989, em

    relao aos mamferos, por Clutton-Brock, e depois expandido s aves, por Wolff e Plissner, em

    1998. Em ambos os casos, os autores partem do princpio de que a filopatria preferencial

    disperso. E que o primeiro sexo a ter oportunidade de se reproduzir ser o que escolher ficar no

    territrio, enquanto o outro sexo ir dispersar-se. Uma vez que as fmeas dos mamferos

    amamentam e cuidam das suas crias, os machos, geralmente, no apresentam cuidados parentais.

    Daqui resulta que os machos esto livres para vaguear para longe. Quando a sua descendncia

    feminina alcana a idade de reproduo, muito provavelmente, o pai no estar presente,

    permitindo s filhas no terem de se ausentar para evitar a consanguinidade. Se o macho

    reprodutor estiver presente quando as suas filhas atingem a idade reprodutora, so estas que se

    dispersam.

    Uma outra hiptese, sustentada por Stephen Dobson em 1982, afirma que nos mamferos

    polignicos, a competio por parceiros sexuais maior nos machos do que nas fmeas, da serem

    os machos a dispersarem-se. Por outro lado, nos mamferos monogmicos, os nveis de competio

    por parceiros sexuais sero mais equivalentes, pelo que a disperso entre sexos tender a efectuar-

  • 13

    se em propores equivalentes. Os dados parecem corroborar esta hiptese. Mas tambm aqui

    existem lacunas: como explicar, ento, por exemplo, o comportamento das fmeas nas espcies de

    aves monogmicas, em que, maioritariamente, so estas a dispersar-se?

    Em 1985, surge uma terceira hiptese, desenvolvida por Olof Liberg e Torbjrn von Schantz,

    apelidada de Hiptese de dipo. Aqui, os autores colocam a enfase nos reprodutores e no nos

    jovens adultos, como o fizeram os anteriores autores. Segundo esta nova hiptese, so os pais que

    expulsam os jovens do territrio, forando-os a dispersarem-se, e no estes que tomam a iniciativa

    de o fazerem. Para Liberg e von Schantz as diferenas na disperso entre sexos, tanto nas aves

    como nos mamferos, reduz a competio em termos reprodutivos entre pais e filhos. Assumem

    que para a descendncia, na maioria dos casos, seria prefervel ficar. Mas os pais ocupam uma

    posio hierrquica superior, e so estes que decidem da partida ou no dos filhos, e de qual dos sexos. E se os progenitores beneficiarem com a permanncia dos filhos, mas no houver recursos

    suficientes para tamanha prole, podero determinar a expulso de alguns membros, at que o

    nmero de efectivos se encaixe nos recursos existentes.

    Assim, o sistema reprodutivo de aves e mamferos est intimamente ligado com o tipo de

    competio entre os progenitores e as descendncias masculina e feminina. Genericamente, nas

    espcies com um sistema de reproduo poligmico ou promscuo, a descendncia masculina, se

    ficar em casa, tender a competir com o pai por fmeas, enquanto a descendncia feminina no

    uma ameaa para nenhum dos progenitores. J nos sistemas monogmicos, seria de esperar que

    nem filhos nem filhas competissem com qualquer dos pais, precisamente porque estes so

    monogmicos. Mas, como j vimos, as fmeas das aves tm tendncia disperso, o quer dizer:

    so expulsas pelos pais, enquanto as fmeas dos mamferos so toleradas. Porqu? Pelos seus

    diferentes modos de reproduo: postura versus gestao e nascimento. Nas aves, uma filha a

    quem seja permitida a permanencia junto dos pais, poder enganar os pais colocando ovos no

    ninho da famlia, deixando assim os custos da nidificao para aqueles. Quanto s filhas dos

    mamferos, estas no tm como esconder a gravidez e o nascimento aos pais, pelo que no os

    podero enganar e, ento, os pais nada tm a temer, em termos de competio reprodutiva com as

    filhas.

    Deste modo, segundo a Hiptese de dipo temos quatro possibilidades: (1) nas aves

    monogmicas, os progenitores expulsam as filhas, porque estas, apesar de no enganarem os pais

    quanto a cpulas, porque estes so monogmicos, podem, no entanto, pr os seus prprios ovos no

    ninho familiar, enganando ambos os pais. Os filhos, como no podem enganar os pais, so

    tolerados. (2) Nas aves polignicas ou promscuas, ambos os sexos da descendncia so forados a

    abandonar a rea natal, porque ambos podem trair os progenitores. (3) Nos mamferos

    monogmicos, nem machos nem fmeas descendentes podem enganar os progenitores, pelo que

    ambos os sexos tendem a ser tolerados no territrio dos pais. (4) Nos mamferos poligmicos ou

    promscuos, a descendncia masculina expulsa porque podero enganar o pai, acasalando com

    uma das fmeas. As filhas, como no podem enganar os progenitores tendem a ficar em casa. A

    Hiptese de dipo explica muitas contradies das outras hipteses; no entanto, tambm tem a sua

    falha: no explica o facto de alguns descendentes abandonarem de livre vontade a rea natal, o que se poder ficar a dever procura de melhores recursos ou para evitar a endogamia.

    Como sempre, a Natureza equilibrada mas complexa. Nenhuma hiptese explica, por si

    s, todas as situaes que podemos encontrar quando procuramos entender as diferenas entre

    sexos, em aves e mamferos, quanto disperso ou filopatria. Portanto, tendo em conta o papel

    que jogam tanto progenitores como descendncia, e as variaes que podero ocorrer de acordo

    com a espcie, o sexo ou o indivduo, devemos atender a que os animais, aves e mamferos, se

    tendero a dispersar, ou no, de acordo com a satisfao de trs factores bsicos: a reduo da

    competio por recursos, a reduo da endogmia e a reduo da conflitualidade entre progenitores

    e descendncia.

    TROCAS GENTICAS

  • 14

    As trocas genticas ocorrem com as mudanas ocasionais entres espcies, ou seja, o

    procedimento pelo qual um gene sofre uma mudana estrutural. As trocas envolvem a adio,

    eliminao ou substituio de um ou poucos nucleotdeos da fita de DNA.

    A mutao proporciona o aparecimento de novas formas de um gene e, consequentemente,

    responsvel pela variabilidade gnica. Quando ocorre por adio ou subtrao (mutaes

    deletrias) de bases, altera o cdigo gentico, definindo uma nova sequncia de bases, que

    consequentemente poder alterar o tipo de aminocido includo na cadeia proteica, tendo a

    protena outra funo ou mesmo inativao da expresso fenotpica.

    Por substituio, ocorre em razo da troca de uma base nitrogenada purina (adenina e

    guanina) por outra purina, ou de uma pirimidina (citosina e timina) por outra pirimidina, sendo

    esse processo denominado de transio e a substituio de uma purina por uma pirimidina, ou

    vice-versa, denominada de transverso.

    Elementos Genticos Transponveis

    Elementos genticos transponveis so segmentos de DNA que tm a capacidade de mover

    de um local para outro (i.e. genes que saltam).

    Propriedades dos Elementos Genticos Transponveis

    Movimento aleatrio Elementos genticos transponveis podem mover de uma molcula de DNA para qualquer

    outra molcula de DNA ou mesmo para outro local na mesma molcula. O movimento no

    totalmente aleatrio; h stios preferenciais na molcula do DNA nos quais um elemento gentico

    transponvel ir se inserir.

    No so capazes de auto-replicao Os elementos genticos transponveis no existem autonomamente (exceo alguns fagos transponveis) e assim, para serem replicados eles precisam ser parte de um outro rplicon.

    Transposio mediada por recombinao stio-especfica A transposio requer pouca ou nenhuma homologia entre a localizao atual e o novo stio. O

    evento de transposio mediado por uma transposase codificada pelo elemento gentico

    transponvel. A recombinao que no requer homologia entre as molculas recombinantes

    chamada de recombinao stio-especfica ou ilegtima ou recombinao no homloga.

    Transposio pode ser acompanhada de duplicao Em muitos casos a transposio do elemento gentico transponvel resulta na remoo do

    elemento do stio original e insero em um novo stio. Entretanto, em alguns casos o evento de

    transposio acompanhado pela duplicao do elemento gentico transponvel. Uma cpia

    permanece no stio original e a outra transportada para o stio novo.

    CONSERVAO E MANEJO DE POPULAES E DE METAPOPULAES IN SITU E

    EX SITU

    Preocupados com as altas taxas de eroso de recursos genticos e com a perda de

    componentes da biodiversidade e, mais ainda, interessados no incremento de esforos voltados

    conservao dos recursos biolgicos em todo o planeta, pases, independentemente da sua

    condio episdica de usurio ou provedor de material gentico, promoveram negociaes, no

    mbito do Programa das Naes Unidas sobre Meio Ambiente (PNUMA), que resultou na adoo

    da Conveno sobre Diversidade Biolgica. Recentemente, convencidos da natureza especial dos

    recursos fito-genticos para a alimentao e a agricultura, conscientes de que esses recursos so

    motivo de preocupao comum da humanidade, cientes de sua responsabilidade para com as

  • 15

    geraes presentes e futuras e, finalmente, considerando a interdependncia dos pases em relao

    a esses recursos, os pases aprovaram, no mbito da Organizao das Naes Unidas para a

    Alimentao e a Agricultura (FAO), o Tratado Internacional sobre Recursos Fito-genticos para a

    Alimentao e a Agricultura, do qual o Brasil um dos seus membros.

    Diversidade biolgica ou biodiversidade so expresses que se referem variedade da vida

    no planeta, ou propriedade dos sistemas vivos de serem distintos. Engloba as plantas, os animais,

    os microrganismos, os ecossistemas e os processos ecolgicos em uma unidade funcional. Inclui,

    portanto, a totalidade dos recursos vivos, ou biolgicos, e, em especial, dos recursos genticos e

    seus componentes, propriedade fundamental da natureza e fonte de imenso potencial de uso

    econmico. tambm o alicerce das atividades agrcolas, pecurias, pesqueiras,extrativistas e

    florestais e a base para a estratgica indstria da biotecnologia.

    A conservao global da biodiversidade significa maior segurana para os programas

    relacionados produo agrcola e conservao biolgica, bem como para a segurana alimentar,

    constituindo-se em um componente essencial para o desenvolvimento sustentvel e para a prpria

    manuteno da diversidade gentica das espcies com importncia scio-econmica atual e

    potencial.

    O Brasil, por sua prpria natureza, ocupa posio de destaque dentre os pases

    megabiodiversos. Conta com a mais diversa flora do mundo, nmero superior a 55 mil espcies

    descritas (24% do total mundial). Possui alguns dos biomas mais ricos do planeta em nmero de

    espcies vegetais - a Amaznia, a Mata Atlntica e o Cerrado. A Floresta Amaznica brasileira,

    com aproximadamente 30 mil espcies vegetais, compreende cerca de 26% das florestas tropicais

    remanescentes no planeta.

    O Pas conta ainda com a maior riqueza de espcies da fauna mundial e, tambm, com a

    mais alta taxa de endemismo. Dois de seus principais biomas, a Mata Atlntica e o Cerrado, esto

    relacionados na lista dos 25 hotspots da Terra, sendo que a Mata Atlntica encontra-se entre os

    cinco mais ameaados. Uma em cada onze espcies de mamferos existentes no mundo so

    encontrados no Brasil (522 espcies), juntamente com uma em cada seis espcies de aves (1677),

    uma em cada quinze espcies de rpteis (613), e uma em cada oito espcies de anfbios (630) e

    mais de 3 mil espcies de peixes, trs vezes mais do que qualquer outro pas. Muitas dessas so

    exclusivas para o Brasil, com 68 espcies endmicas de mamferos, 191 espcies endmicas de

    aves, 172 espcies endmicas de rpteis e 294 espcies endmicas de anfbios. Esta riqueza de

    espcies corresponde a pelo menos 10% dos anfbios e mamferos, e 17% das aves descritos em

    todo o planeta.

    A composio total da biodiversidade brasileira no conhecida e talvez nunca venha a ser na

    sua plenitude, tal a sua magnitude e complexidade. Nesse sentido, e considerando-se que o nmero

    de espcies existentes no territrio nacional, particularmente na plataforma continental e nas guas

    jurisdicionais brasileiras, - em grande parte ainda desconhecida, elevado, fcil inferir que o

    nmero de espcies, tanto terrestres quanto marinhas, ainda no identificadas, no Brasil, pode

    alcanar valores da ordem de dezena de milhes. Apesar dessas estimativas, a realidade que o

    nmero de espcies conhecidas atualmente, em todo o planeta, est em torno de 1,7 milhes, valor

    que atesta o alto grau de desconhecimento da biodiversidade, especialmente nas regies tropicais.

    Alm disso, interessante registrar que a maior parte dos conhecimentos sobre a biodiversidade no

    nvel especfico se refere a organismos de grande porte. O nosso conhecimento sobre outros

    organismos, a exemplo dos insetos, liquens, fungos e algas ainda muito incipiente. A parcela da

    biodiversidade menos conhecida est localizada na copa das rvores, no solo e nas profundezas

    marinhas.

    Em relao aos recursos fitogenticos, estimativas da FAO indicam a existncia, em mbito

    mundial, de cerca de 6,5 milhes de acessos de interesse agrcola mantidos em condio ex situ.

    Desse total, 50% so conservados em pases desenvolvidos, 38% em pases em desenvolvimento e

    12% distribudos nos Centros Internacionais de Pesquisa (IARCs), do Grupo Consultivo

  • 16

    Internacional de Pesquisa Agrcola (CGIAR).

    Os recursos genticos so mantidos em condies in situ, on farm, e ex situ. A conservao

    in situ de recursos genticos realizada, basicamente, em reservas genticas, reservas extrativistas

    e reservas de desenvolvimento sustentvel. Naturalmente, a conservao in situ de recursos

    genticos pode ser organizada tambm em reas protegidas, seja de mbito federal, estadual ou

    municipal. As reservas genticas, por exemplo, so implantadas e mantidas em reas prioritrias,

    de acordo com a diversidade gentica de uma ou mais espcies de reconhecida importncia

    cientfica ou scio-econmica. Teoricamente, essas reservas podem existir dentro de uma rea

    protegida, de uma reserva indgena, de uma reserva extrativista e de uma propriedade privada,

    entre outras.

    Nos termos da Conveno sobre Diversidade Biolgica, conservao in situ definida

    como sendo a conservao dos ecossistemas e dos habitats naturais e a manuteno e a

    reconstituio de populaes viveis de espcies nos seus ambientes naturais e, no caso de

    espcies domesticadas e cultivadas, nos ambientes onde desenvolveram seus caracteres distintos.

    A conservao in situ apresenta algumas vantagens, tais como: (i) permitir que as espcies

    continuem seus processos evolutivos; (ii) favorecer a proteo e a manuteno da vida silvestre;

    (iii) apresentar melhores condies para a conservao de espcies silvestres, especialmente

    vegetais e animais; (iv) oferecer maior segurana na conservao de espcies com sementes

    recalcitrantes e (v) conservar os polinizadores e dispersores de sementes das espcies vegetais.

    Deve-se considerar, entretanto, que este mtodo oneroso, visto depender de eficiente e constante

    manejo e monitoramento, pode exigir grandes reas, o que nem sempre possvel, alm do que a

    conservao de uma espcie em um ou poucos locais de ocorrncia no significa, necessariamente,

    a conservao de toda a sua variabilidade gentica.

    A conservao on farm pode ser considerada uma estratgia complementar conservao

    in situ, j que esse processo tambm permite que as espcies continuem o seu processo evolutivo.

    uma das formas de conservao gentica da agrobiodiversidade, um termo utilizado para se

    referir diversidade de seres vivos, de ambientes terrestres ou aquticos, cultivados em diferentes

    estados de domesticao. A conservao on farm apresenta como particularidade o fato de

    envolver recursos genticos, especialmente variedades crioulas - cultivadas por agricultores,

    especialmente pelos pequenos agricultores, alm das comunidades locais, tradicionais ou no e

    populaes indgenas, detentoras de grande diversidade de recursos fito-genticos e de um amplo

    conhecimento sobre eles. Esta diversidade de recursos essencial para a segurana alimentar das

    comunidades. Dentre os principais recursos fito-genticos mantidos a campo pelos pequenos

    agricultores brasileiros esto a mandioca, o milho e o feijo. Contudo, muitos recursos genticos

    de menor importncia para a sociedade "moderna" so tambm mantidos, podendo-se citar como

    exemplos uma srie de espcies de razes e tubrculos, plantas medicinais e aromticas, alm de

    raas locais de animais domesticados (sunos, caprinos e aves, entre outros). A manuteno desses

    materiais on farm, com nfase para as variedades crioulas, envolve recursos nativos e exticos

    adaptados s condies locais. Outra particularidade que estas variedades crioulas, mesmo

    deslocadas de suas condies naturais, continuam evoluindo na natureza, j que esto

    permanentemente submetidas diferentes condies edafoclimticas.

    A conservao ex situ, por sua vez, envolve a manuteno, fora do habitat natural, de uma

    representatividade da biodiversidade, de importncia cientfica ou econmico-social, inclusive

    para o desenvolvimento de programas de pesquisa, particularmente aqueles relacionados ao

    melhoramento gentico. Trata da manuteno de recursos genticos em cmaras de conservao de

    sementes (-20 C), cultura de tecidos (conservao in vitro), criogenia - para o caso de sementes

    recalcitrantes, (-196 C), laboratrios - para o caso de microorganismos, a campo (conservao in

    vivo), bancos de germoplasma - para o caso de espcies vegetais, ou em ncleos de conservao,

    para o caso de espcies animais. A conservao ex situ implica, portanto, a manuteno das

    espcies fora de seu habitat natural e tem como principal caracterstica: (i) preservar genes por

    sculos; (ii) permitir que em apenas um local seja reunido material gentico de muitas

    procedncias, facilitando o trabalho do melhoramento gentico; (iii) garantir melhor proteo

  • 17

    diversidade intraespecfica, especialmente de espcies de ampla distribuio geogrfica. Este

    mtodo implica, entretanto, na paralisao dos processos evolutivos, alm de depender de aes

    permanentes do homem, visto concentrar grandes quantidades de material gentico em um mesmo

    local, o que torna a coleo bastante vulnervel.

    As trs formas de conservao, in situ, on farm e ex situ, so complementares e formam,

    estrategicamente, a base para a implementao dos trs grandes objetivos da Conveno sobre

    Diversidade Biolgica: i) conservao da diversidade biolgica; ii) uso sustentvel dos seus

    componentes e iii) repartio dos benefcios derivados do uso dos recursos genticos. A

    conservao on farm vem recebendo crescente ateno nos diversos fruns internacionais

    relacionados temtica da conservao dos recursos genticos. Nesse contexto, a Conveno sobre

    Diversidade Biolgica, por meio das suas Conferncias das Partes, tem dado especial ateno a

    essa questo, considerando que: i) o campo da agricultura oferece oportunidade nica para o

    estabelecimento de ligao entre a conservao da diversidade biolgica e a repartio de

    benefcios decorrentes do uso desses recursos; ii) existe uma relao prxima entre diversidade

    biolgica, agronmica e cultural; iii) a diversidade biolgica na agricultura estratgica,

    considerando os contextos scio-econmicos nos quais ela praticada e as perspectivas de reduo

    dos impactos negativos sobre a diversidade biolgica, permitindo a conciliao de esforos de

    conservao com ganhos sociais e econmicos; iv) as comunidades de agricultores tradicionais e

    suas prticas agrcolas tm uma significativa contribuio para a conservao, para o aumento da

    biodiversidade e para o desenvolvimento de sistemas produtivos agrcolas mais favorveis ao meio

    ambiente; v) o uso inapropriado e a dependncia excessiva de agro-qumicos tm produzido efeitos

    significativos sobre os ecossistemas, com impactos negativos sobre a biodiversidade; e,

    finalmente, os direitos soberanos dos Estados sobre seus recursos biolgicos, incluindo os recursos

    genticos para alimentao e agricultura. Esse posicionamento dos pases nas Conferncias das

    Partes tem permitido, alm do estabelecimento de um programa de longo prazo voltado

    especificamente s atividades sobre agrobiodiversidade, um crescente avano na discusso e

    implementao de aes relacionadas conservao e promoo do uso dos recursos da

    biodiversidade agrcola.

    Nos ltimos anos ocorreram, em mbito mundial, importantes avanos relacionados

    conservao e promoo do uso dos recursos genticos. Em junho de 1996, a Conferncia

    Tcnica Internacional sobre Recursos Fitogenticos, realizada em Leipzig, Alemanha, no mbito

    da Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e a Alimentao FAO, aprovou o Plano Global de Ao para a Conservao e a Utilizao Sustentvel dos Recursos Genticos para a

    Agricultura e a Alimentao que tem, basicamente, como prioridades: (i) a Conservao in situ e o

    Desenvolvimento; (ii) a Conservao ex situ; (iii) a Utilizao dos Recursos Fitogenticos; e (iv) a

    Capacitao das Instituies

    Em novembro de 2001, foi aprovado, no mbito da FAO, o Tratado Internacional de

    Recursos Fitogenticos para a Alimentao e a Agricultura que prev, entre os seus objetivos, a

    conservao e o uso sustentvel dos recursos fitogenticos para a alimentao e a agricultura e a

    repartio justa e eqitativa dos benefcios derivados de seu uso, em harmonia com a Conveno

    sobre Diversidade Biolgica, para a sustentabilidade da agricultura e a segurana alimentar.

    No Brasil, o despertar da conscincia conservacionista conta com mais de meio sculo de

    decises polticas, influenciadas pela cincia e pela sociedade preocupadas com as condies do

    meio ambiente e, especialmente, com a conservao da flora e da fauna. Nas ultimas duas dcadas

    tem havido um crescente envolvimento do Governo Federal, bem como uma maior

    conscientizao da sociedade civil nos assuntos relativos conservao da biodiversidade.

    Nas ltimas dcadas, as atividades ligadas conservao dos recursos genticos no Pas

    tiveram um considervel impulso, assegurando posio de destaque entre os pases tropicais. Os

    avanos conduzidos por alguns rgos de pesquisa, a exemplo da Empresa Brasileira de pesquisa

    Agropecuria EMBRAPA, particularmente por meio da EMBRAPA Recursos Genticos e Biotecnologia, esto sendo fundamentais para o avano do Pas na conservao e utilizao dos

  • 18

    seus recursos genticos. Paralelamente, o Brasil experimentou avanos significativos na

    implantao de Unidades de Conservao, ampliando fortemente a conservao in situ da

    biodiversidade e a promoo da utilizao sustentvel dos recursos genticos nativos. A

    conservao on farm, apesar de ser um dos mtodos mais tradicionais de conservao, ainda

    bastante fragmentada no pas, apesar dos recentes avanos experimentados nos ltimos anos. H

    de se reconhecer que a sociedade civil organizada exerce, atualmente, uma forte liderana na

    conservao on farm de recursos genticos, promovendo no apenas o uso sustentvel, mas

    tambm o intercmbio de recursos genticos entre os agricultores, dentro e entre comunidades.

    Neste contexto, deve-se destacar a relevncia dos movimentos sociais (Movimento dos Pequenos

    Agricultores, Movimento das Mulheres Trabalhadoras Rurais, Movimento dos Trabalhadores Sem

    Terra e das ONGs, principalmente daquelas organizadas em redes, caso da Rede Ecovida e Rede

    Cerrado, por exemplo), que so considerados importantes atores na organizao e articulao

    poltica e social das comunidades.

    Contudo, apesar desses avanos, deve-se reconhecer que a conservao dos recursos

    genticos no Pas, um dos principais pases de megadiversidade, est longe da condio ideal.

    Faltam inventrios relativos s instituies (governamentais, no-governamentais e movimentos

    sociais) envolvidas na conservao in situ, on farm e ex situ de recursos genticos (fauna, flora e

    microrganismos); representatividade, tanto em termos regionais quanto nos biomas; infraestrutura

    existente em cada coleo; nvel de uso e intercmbio de recursos genticos, bem como

    informaes sobre as necessidades e as medidas necessrias para a conservao desses materiais a

    curto, mdio e longo prazos.

    INTRODUES INDESEJADAS DE ANIMAIS EXTICOS OU ALCTONES

    As espcies exticas invasoras tm um significativo impacto na vida e no modo de vida

    das pessoas. O impacto sobre a biodiversidade to relevante que essas espcies esto,

    atualmente, sendo consideradas a segunda maior ameaa perda de biodiversidade, aps a

    destruio dos habitats, afetando diretamente as comunidades biolgicas, a economia e a sade

    humana. As espcies exticas invasoras assumem no Brasil grande significado como ameaa

    real biodiversidade, aos recursos genticos e sade humana. Vrias delas esto se

    disseminando e dominando, de forma perigosa, diferentes ecossistemas, ameaando a

    integridade e o equilbrio dessas reas, e causando mudanas, inclusive, nas caractersticas

    naturais das paisagens.

    De acordo com a Conveno sobre Diversidade Biolgica - CDB, espcies exticas

    invasoras so organismos que, introduzidos fora da sua rea de distribuio natural, ameaam

    ecossistemas, habitats ou outras espcies. Possuem elevado potencial de disperso, de

    colonizao e de dominao dos ambientes invadidos, criando, em conseqncia desse

    processo, presso sobre as espcies nativas e, por vezes, a sua prpria excluso.

    A crescente globalizao, a ampliao das vias de transporte, o incremento do

    comrcio e do turismo internacional, aliado s mudanas no uso da terra, das guas e s mudanas

    climticas decorrentes do efeito estufa, tendem a ampliar significativamente as oportunidades e os

    processos de introduo e de expanso de espcies exticas invasoras nos diversos ecossistemas

    da terra.

    A disseminao de espcies exticas leva a homogeneizao dos ambientes, com a

    destruio de caractersticas peculiares que a biodiversidade local proporciona e a alterao nas

    propriedades ecolgicas essenciais. Tais alteraes so exemplificadas pelas modificaes dos

    ciclos hdricos e de nutrientes, da produtividade, da cadeia trfica, da estrutura da comunidade

    vegetal, da distribuio de biomassa, do

  • 19

    acmulo de serrapilheira, das taxas de decomposio, dos processos evolutivos e das relaes

    entre plantas e polinizadores, alm da disperso de sementes. As espcies exticas podem, ainda,

    gerar hbridos com espcies nativas, colocando-as sob ameaa de extino.

    Em ecossistemas pobres em nutrientes, a presena de espcies invasoras cria, muitas

    vezes, condies favorveis para o estabelecimento de outras espcies invasoras, que

    normalmente no se estabeleceriam. As plantas invasoras, em seu processo de ocupao,

    aumentam sua rea de ocorrncia e dominam e eliminam a flora nativa por competio direta. Os

    animais so eliminados ou obrigados a sair do local procura de alimentos, antes abundantes pela

    diversidade de espcies existentes. Assim, lentamente as invases biolgicas vo promovendo a

    substituio de comunidades com elevada diversidade por comunidades monoespecficas,

    compostas por espcies invasoras, ou com diversidade reduzida.

    Outros efeitos resultantes da ocorrncia de plantas invasoras podem passar pela

    alterao de ciclos ecolgicos, como regime de fogo; quantidade de gua disponvel; alterao da

    composio e disponibilidade de nutrientes; remoo ou introduo de elementos nas cadeias

    alimentares; alterao dos processos geomorfolgicos; e mesmo pela extino de espcies.

    As invases biolgicas podem se originar de introdues intencionais ou no intencionais,

    e causam danos ecolgicos, econmicos, culturais e sociais. Ao longo dos ltimos sculos

    muitas espcies foram intencionalmente introduzidas pelo homem a novos ambientes. As

    introdues so realizadas sempre com boas intenes. Em muitos casos elas so benficas, a

    exemplo da maioria das espcies cultivadas, de muitas plantas ornamentais e de alguns

    organismos para controle biolgico. Muitas espcies, entretanto, se tornam invasoras, cujos

    impactos negativos se sobressaem a eventuais benefcios.

    Por meio de estudos realizados nos Estados Unidos da Amrica, Reino Unido, Austrlia,

    ndia, frica do Sul e Brasil, concluiu-se que os custos decorrentes da presena de espcies

    exticas invasoras nas culturas agrcolas, em pastagens e nas reas de florestas atingem cifras

    anuais da ordem de US$ 250 bilhes. Adicionalmente, os custos ambientais nesses mesmos

    pases chegam a US$ 100 bilhes anuais. Uma projeo mundial dessas cifras indica que as

    perdas globais anuais decorrentes do impacto dessas espcies ultrapassa US$ 1,4 trilhes,

    aproximadamente 5% do PIB mundial.

    Considerando-se esses valores, estima-se que no Brasil esse custo pode ultrapassar os US$

    100 bilhes anuais. Esse montante pode ainda sofrer aumento significativo, especialmente, se

    incluirmos os custos relacionados s espcies que afetam a sade humana. Nos Estados

    Unidos da Amrica, as estimativas de custo, considerando apenas os prejuzos e os gastos

    com o controle de espcies exticas invasoras, so da ordem de US$ 137 bilhes ao ano.

    Se valores monetrios pudessem ser atribudos extino de espcies, perda de

    biodiversidade e aos servios proporcionados pelos ecossistemas, o custo decorrente dos

    impactos negativos gerados pela presena das espcies exticas invasoras seria muitas vezes

    maior.

  • 20

    Dados indicam que mais de 120 mil espcies exticas de plantas, animais e

    microorganismos j foram introduzidas nos seis pases acima mencionados. Com base nesses

    nmeros, estima-se que um total aproximado de 480 mil espcies exticas j foram introduzidas

    nos diversos ecossistemas da Terra. Considera-se que mais de 70% dessas introdues ocorreram

    como resultado de aes humanas. Se imaginarmos que 20 a 30% dessas espcies introduzidas

    so consideradas pragas e que estas so as responsveis pelos grandes problemas ambientais

    enfrentados pelo homem, fcil imaginar o tamanho do desafio que, forosamente, temos de

    enfrentar para o controle, monitoramento, mitigao e, eventualmente, a erradicao dessas

    espcies de ambientes naturais. Desde o ano de 1600, as espcies exticas invasoras j

    contriburam com 39% das extines de animais cujas causas so conhecidas.

    No caso das plantas, por exemplo, alguns autores, na dcada de 1970, quantificaram que

    os prejuzos econmicos na produo agrcola, decorrentes da ao de espcies invasoras eram

    da ordem de 11,5% em regies temperadas. J em regies tropicais, a reduo da produo se

    situava entre os 30 e 40%. Outros autores, na dcada de 1980, estimaram que essas perdas eram

    da ordem de 10% da produo agrcola mundial.

    Os prejuzos causados por espcies exticas invasoras s culturas, pastagens e reas de

    florestas na Amrica do Sul excedem a muitos bilhes de dlares ao ano. Na Argentina, por

    exemplo, o gasto relacionado ao controle da mosca das frutas ultrapassa os US$ 10 milhes de

    dlares anuais, alm da perda adicional anual de 15 a 20% da produo de frutas. Essas perdas

    equivalem a US$ 90 milhes de dlares ao ano, sem contabilizar os impactos econmicos e

    sociais indiretos gerados com a reduo da produo e a perda de mercados de exportao. Na

    Nova Zelndia, por outro lado, onde todos os materiais postais so examinados visando prevenir a

    entrada de material biolgico, conseguiu-se reduzir a tal ponto os prejuzos decorrentes da

    mosquinha-das- frutas que o saldo positivo da produo agrcola paga todo o sistema de inspeo.

    No Rio Grande do Sul, a espcie Eragrostis plana (capim-annoni) ameaa os

    sistemas seculares de produo bovina em funo da perda da cobertura vegetal nativa, composta

    por diversas espcies de gramneas, leguminosas e outras famlias importantes na composio dos

    campos naturais. Estima-se que dos 15 milhes de hectares de campos naturais presentes no

    estado do Rio Grande do Sul, cerca de trs milhes j estejam invadidos por essa gramnea

    africana, com prejuzos de mais de US$ 75 milhes anuais pecuria do Estado. Atualmente essa

    espcie j est presente nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paran e vem se

    disseminando para outras regies.

    Ainda na Regio Sul do Brasil, as espcies Tecoma stans (amarelinho) e a Houvenia dulcis

    (uva do japo), entre outras, vem desenvolvendo, no estado do Rio Grande do Sul, um

    crescente processo de invaso. No estado do Paran, a planta Tecoma stans encontra-se

    disseminada em mais de 170 dos 393 municpios do Estado, estando j registrada como invasora

    em 85 deles, com seu cultivo e uso proibidos no Estado. Sua presena est confirmada em cerca

    de 50 mil hectares de pastagens, dos quais 15 mil j esto totalmente improdutivos.

    Ao considerar a fauna invasora, vale registrar a crescente disseminao da Achatina

    fulica (caracol gigante africano), atualmente presente no Distrito Federal e

  • 21

    em mais 23 estados brasileiros. Outros exemplos que esto trazendo srias

    preocupaes aos governos estaduais se referem s espcies Sus scrofa (javali), Aedes aegypti

    (mosquito da dengue) e Callithrix jacchus (sagi).

    Nos ambientes aquticos, destacam-se as macrfitas exticas que causam inmeros

    problemas para os diversos usos da gua em diferentes regies do pas. Os problemas envolvem

    desde o acumulo de lixo e outros sedimentos at a proliferao de vetores patognicos, alm das

    dificuldades relacionadas navegao, gerao de energia, distribuio de gua

    populaes humanas, irrigao, recreao e pesca, com prejuzos ao turismo regional, bem

    como perda de receita e empobrecimento dos municpios.

    De fato, espcies exticas invasoras geram graves conseqncias em ambientes aquticos

    continentais em todo o mundo, com destaque para: a invaso da Perca do Nilo (Lates niloticus),

    no Lago Victoria, na frica, que, junto com a tilpia- do-Nilo (Oreochromis niloticus), causou

    a extino de centenas de espcies nativas de peixes; do Mexilho Zebra (Dreissena polymorpha)

    e da Lampria (Petromyzon marinus), nos Grandes Lagos da Amrica do Norte, que resultou no

    colapso da pesca comercial nessa regio. Alguns estudos quantificaram as perdas econmicas

    associadas introduo de 13 espcies exticas invasoras no Canad e obtiveram uma estimativa

    anual da ordem de 187 milhes de Dlares Canadenses. Em ambientes aquticos, a invaso de

    moluscos e da lampria marinha provocam perdas anuais de 32,3 milhes de Dlares Canadenses.

    importante considerar que o custo de controle e manejo de espcies exticas invasoras

    em um novo ambiente elevado. Portanto, investimentos em aes de preveno de futuras

    introdues podem evitar a perda de bilhes de dlares agricultura, floresta e a ecossistemas

    naturais e manejados e sade humana.

    Ao contrrio de muitos problemas ambientais que se amenizam com o passar do

    tempo, a contaminao biolgica tende a se multiplicar e se espalhar, causando problemas

    de longo prazo que se agravam e no permitem a recomposio natural dos ecossistemas

    afetados. Essas degradaes ambientais colocam em risco atividades extrativistas e outras

    atividades econmicas ligadas ao uso dos recursos naturais.

    Reconhecendo a importncia do problema das invases biolgicas, o Brasil, por

    meio do Ministrio do Meio Ambiente - MMA, e em estreita articulao com os diferentes

    setores da sociedade, vem desenvolvendo, desde 2001, uma srie de aes relacionadas

    preveno de novas introdues; deteco precoce; erradicao; controle/manejo; e

    monitoramento de espcies exticas invasoras que podem afetar ecossistemas, habitas e

    espcies nativas. Estas aes dizem respeito reviso e ao desenvolvimento de normativas

    relacionadas matria, realizao de inventrios das espcies exticas ocorrentes nos diversos

    ecossistemas brasileiros, inclusive no mbito de bacias hidrogrficas, discusso sobre a

    elaborao de lista oficial de espcies exticas invasoras em mbito nacional e estmulo

    abertura de linhas de financiamento para aes de controle, bem como atividades de pesquisa.

    Certos ambientes parecem ser mais suscetveis que outros invaso, especialmente

    quando degradados. Alm da maior suscetibilidade de alguns ambientes,

  • 22

    existem espcies cujas caractersticas facilitam o seu estabelecimento em novas reas. A

    ecologia das espcies invasoras um tema complexo, que envolve desde os mecanismos de

    entrada e disperso destas espcies, passando pelas caractersticas biolgicas que as tornam

    invasoras, relao entre as atividades humanas e sua disseminao, impactos scio-econmicos

    (positivos ou negativos) que causam, at os aspectos legais e tcnicas de manejo.

    Em razo da complexidade dessa temtica, as espcies exticas invasoras envolvem uma

    agenda bastante ampla, com aes interinstitucionais e multidisciplinares. Aes de

    preveno, erradicao, controle e monitoramento so fundamentais e exigem o envolvimento e a

    convergncia de esforos dos diferentes rgos dos governos federal, estadual e municipal

    envolvidos no tema, alm do setor empresarial e das organizaes no-governamentais. A

    implementao da presente Estratgia Nacional dever contribuir decisivamente para a preveno

    de novas introdues, bem como para a mitigao dos impactos decorrentes da presena de

    espcies exticas invasoras aos diferentes biomas do pas ou s suas diferentes bacias

    hidrogrficas.

    A Estratgia Nacional se constitui no primeiro documento aprovado no mbito do

    Governo Federal que pode orientar as diferentes esferas do governo no trato das questes

    relativas s espcies exticas invasoras. Obviamente, legislaes especficas sero

    necessrias para prevenir ou diminuir a introduo e a translocao de exticas invasoras no pas.

    A Estratgia Nacional representa, ainda, um importante instrumento para a

    internalizao e implementao no pas do artigo 8(h) da Conveno sobre Diversidade

    Biolgica. Da mesma forma, a Estratgia se traduz em uma efetiva ferramenta que o pas dispe

    para a consecuo das determinaes das Decises V/8, VI/23 e IX/4, das Conferncias das

    Partes, da CDB, quando foram tratadas, em profundidade, as complexas questes relacionadas s

    espcies exticas invasoras.

    Prevenir e mitigar os impactos negativos de espcies exticas invasoras sobre a populao

    humana, os setores produtivos, o meio ambiente e a biodiversidade, por meio do planejamento e

    execuo de aes de preveno, erradicao, conteno ou controle de espcies exticas

    invasoras com a articulao entre os rgos dos Governos Federal, Estadual e Municipal e a

    sociedade civil, incluindo a cooperao internacional.

    Para os propsitos desta Estratgia Nacional sobre Espcies Exticas Invasoras, entende-se

    por:

    Espcie Extica ou Alctone - espcie ou txon inferior e hbrido

    interespecfico introduzido fora de sua rea de distribuio natural, passada ou presente, incluindo

    indivduos em qualquer fase de desenvolvimento ou parte destes que possa levar reproduo.

  • 23

    Espcie Extica Invasora ou Alctone Invasora - espcie extica ou alctone cuja

    introduo, reintroduo ou disperso representa risco ou impacta negativamente a sociedade, a

    economia ou o ambiente (ecossistemas, habitats, espcies ou populaes).

    Introduo movimento de espcie extica por ao humana, intencional ou no

    intencional, para fora da sua distribuio natural. Esse movimento pode realizar-se dentro de um

    pas, entre pases, ou fora da zona de jurisdio nacional.

    Introduo Intencional - movimento ou liberao deliberada de uma espcie extica fora

    da sua distribuio natural por ao humana.

    Introduo No-Intencional todas as outras formas de introduo por ao humana que

    no as intencionais.

    Estabelecimento processo de reproduo com xito de uma espcie extica com

    probabilidade de contnua sobrevivncia em um novo habitat.

    Anlise de Risco (i) avaliao das conseqncias da introduo, da probabilidade de

    estabelecimento de uma espcie extica, com base em informao cientfica e (ii) identificao

    de medidas que podem ser implementadas para reduzir ou gerir os riscos, levando em conta os

    aspectos ambientais, scio-econmicos e culturais.

    Introduo de Espcies

    Introduo Intencional

    No deveria haver primeira introduo intencional ou introdues posteriores de uma

    espcie extica considerada invasora ou potencialmente invasora em um pas sem que

    houvesse autorizao prvia de uma autoridade competente do estado receptor. Uma anlise

    de risco apropriada, que poderia incluir uma avaliao do impacto no meio ambiente, deveria ser

    conduzida como parte do processo de avaliao antes de uma deciso conclusiva sobre autorizar

    ou no a introduo proposta ao pas ou s novas

  • 24

    zonas ecolgicas, dentro de um pas. Os estados deveriam conduzir todos os esforos necessrios

    para permitir somente a introduo de espcies cuja ameaa diversidade biolgica seja

    improvvel. O nus da prova de que uma introduo proposta no ameace a diversidade

    biolgica deveria corresponder ao proponente da introduo, ou ser atribuda, conforme

    apropriado, ao estado receptor. A autorizao de uma introduo pode, quando apropriado, ir

    acompanhada de condies (por exemplo, preparao de um plano de mitigao,

    procedimentos de monitoramento, pagamento pela avaliao e manejo ou, ainda, requisitos de

    conteno).

    As decises relativas introdues intencionais deveriam ser baseadas no abordagem

    precautria, incluindo as anlises de riscos, estabelecida no Princpio 15 da Declarao do

    Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento e no prembulo da Conveno sobre

    Diversidade Biolgica. Onde existir ameaa de reduo ou perda de diversidade biolgica,

    a falta de certeza cientfica e conhecimento sobre uma espcie extica no deveria impedir que

    uma autoridade competente adotasse uma deciso a respeito da introduo intencional de tal

    espcie extica, de modo a evitar a disseminao e os impactos negativos da espcie extica

    invasora.

    Introduo No-Intencional

    Todos os estados deveriam ter disposies que abordassem introdues no

    intencionais (ou introdues intencionais que tenham se estabelecido e se tornado invasoras).

    Estas disposies poderiam incluir medidas estatutrias e regulatrias, bem como o

    estabelecimento e o fortalecimento de instituies e rgos com responsabilidades apropriadas.

    Recursos operativos deveriam ser suficientes para permitir ao rpida e efetiva.

    Deve-se identificar rotas comuns que conduzam a introdues intencionais, assim como

    disposies deveriam ser disponibilizadas para minimizar tais introdues. Atividades

    setoriais, tais como pesca, agricultura, silvicultura, horticultura, transporte martimo

    (incluindo a descarga de guas de lastro), transporte de superfcie e areo, projetos de

    construo, paisagismo, aqicultura, incluindo a aqicultura de espcies de uso ornamental,

    turismo, indstria de animais de estimao e reservas de caa so vias de introdues no

    intencionais. Avaliao de impacto ambiental dessas atividades deveria incorporar o risco de

    introduo no intencional de espcies exticas invasoras. Quando apropriado, anlise de risco

    de introduo no intencional de espcies exticas invasoras deveria ser conduzida para essas

    rotas.

    Mitigao de impactos

    Mitigao de Impactos interna e externa

    Uma vez detectado o estabelecimento de uma espcie extica invasora, os estados,

    individual e cooperativamente, deveriam adotar etapas apropriadas, tais como erradicao,

    conteno e controle, para mitigar os efeitos adversos. As tcnicas utilizadas para a

    erradicao, conteno ou controle devem ser seguras para os seres humanos, para o meio

    ambiente e para a agricultura e, tambm, aceitveis eticamente pelos interessados nas reas

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    afetadas pelas espcies exticas invasoras. Medidas de mitigao deveriam, com base na

    abordagem precautria, ser adotadas nos primeiros estgios da invaso. Em consonncia com a

    poltica ou legislao nacional, uma pessoa ou entidade responsvel pela introduo de espcie

    extica invasora deveria assumir os custos das medidas de controle e da restaurao da

    diversidade biolgica, sempre que comprovada a falha no cumprimento das leis e regulamentos

    nacionais. Portanto, importante a deteco precoce de novas introdues de espcies exticas

    potencialmente invasoras ou invasoras conhecidas, e precisam ser combinadas com a

    capacidade de tomada de ao rpida.

    Erradica