Edson Nunes

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  • 8/18/2019 Edson Nunes

    1/75

    Edson Nunes

    A   G R A M Á T I C A P O L Í T IC A

    D O   B R A S I L

    Clientelismo   e  Insulamento Burocrático

    Prefacio

      de

    Luiz CARLOS BRESSER PEREIRA

    Prefacio

      a

     terceira

     edi?ao

     d e

    RENATO

     LESSA

    terceira

      edifáo

    Jorge Zahar Editor

    Rio de Janeiro

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    2/75

    Copyright © 1997, Edson Nunes

    ([email protected])

    Todos os direitos reservados.

    A reprodu9ao nao autorizada desta

     publicado,

     no todo

    ou

     em parte,

     constituí

     violagao de direitos autorais. (Lei

     9.610/98)

    Copyright ©

     2003

     desta

     ediíao:

    Jorge Zahar Editor Ltda.

    rúa México 31 sobreloja

    20031-144 Rio de Janeiro, RJ

    tel.: (21) 2240-0226/fax: (21) 2262-5123

    e-mail: [email protected]

    site: www.zahar.com.br

    A primeira

     ed¡9ao

     desta obra foi feita em co-edicao com a

    Fundacao Escola Nacional de Administracao Pública — ENAP

    Diretoria

     de Pesquisa e  Difusao

    Ediíoes anteriores: 1997, 1999

    Capa: Sergio Campante

    CIP-Brasil. Catalogacáo-na-fonte

    Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.

    Nu ne s ,  Eds on.

    N972g  A

      g ramát ica p o l í t ica

      no

      B ras i l :

      c l ie n le l ismo  e

      insu -

    3 ed.  lamento

      burocrático

      / Edson  Nunes; prefacio Luiz  Carlos

    Bresser  Pereira. -  3.ed- Rio de  Janeiro: Jorge  Z ahar  Ed.;

    B ra s i l i a ,  DF: E NA P ,  2003.

    A n e x o

    Incluí

      b ib l iog ra f í a

    I S B N :

      85-7110-384-4

    1.   Brasil -  Polí tica  e gover no. 2. Burocracia -  Brasil.

    3.

      Brasil

      —

     Historia.

      I.

      Escola  Nac iona l

      de

      A d m i n i s t r a c ao

    Pú b l ica (B ras i l ) .  I I .  T í tu lo .

    CD D -

    3 20 .981

    03-0641

    CD U  -

      3 2 ( 8 1 )

    O

     máximo

     d e  confusáo

      samado

     ao máximo

    de

      ordem: parece-me u m cálculo

     sublime.

    U M BE RTO  ECO,

     O nome  da rosa

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    S U M A R I O

    N O T A D O A U T O R   7

    PREFACIO   Á TERCEIRA EoigÁo:  A   GRAMÁTICA POLÍTICA  DO   BRASIL ,

    ou UMA  BIOG RAFÍA  D O  BRA SIL REPUBLICANO

    de Renato Lessa  3

    PREFACIO:

     POLÍTICA E

      I N S U L A M E N T O  BUROCRÁTICO

     NO

      BRASIL ,

    de

     Lu iz Carlos

     Bresser

     Pereira  11

    Capítulo

      1 :  i N S T i T U i g ó E S ,

      P O L Í T I C A

      E

     E C O N O M Í A

      7 5

    Capítulo

      2 :

      T I P O S  D E  C A P I T A L I S M O , I N S T I T U I C Ó E S  E

     A g Á o

      S O C I A L

      . . .

      2 7

    Variantes  d e

     capitalismo

     e institui§oes 22

    Troca específica

      e

      troca generalizada

     n o

     capitalismo

      26

    Acumula9ao

     de capital,

      instituÍ95es

     e clientelismo no Brasil  29

    Insulamento burocrático e universalismo de  procedimentos

    como alternativas

     ao

     clientelismo  32

    Corporativismo

     e clientelismo:

      tensoes

      e complementariedades  36

    Variantes de Corporativismo num a perspectiva comparada  37

    Corporativismo e

     clientelismo como quadros analíticos  39

    Conclusao  42

    Capítulo

      3 :

      A   C o N S T R u g Á o D O  I N S U L A M E N T O B U R O C R Á T I C O E D O

    C O R P O R A T IV I S M O E A N A C I O N A L I Z A C Á O D O C L IE N T E L IS M O   4 7

    Paño de

     fundo:

      o

     desafio  a

     modernizacáo

    do

     Estado brasileiro  48

    State building: centraliza£ao política e administrativa 50

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    4/75

    Stíilc huilding'.

     intervenfao

      na economía 55

    State building: o  longo

      impacto

     dos obstáculos internacionais  60

    Capítulo

      4 :

      C A P I T A L I S M O , P A R TI D O S  P O L Í T I C O S

     E

      IN S I I L A M E N T O

    B U R O C R Á T I C O N O  R E G I M E Pós-45  6 7

    Partidos mobilizados internamente

      68

    Implicafoes da mobilizafao de

     dentro:

    a

     institucionaliza9ao

     do clientelismo  77

    Em

      busca

     da

     racionalidade: políticos

     versas

     técnicos

      80

    Capítulo   5 :  M U D A N C A D E N T R O

      D A

     C O N T IN U I D A D E : V E L H A S

    E   N O V A S A R E N A S P O L Í T IC A S

      N O

      PE R ÍO D O P Ó S - G U E R R A

      9 5

    Velhas e

     novas arenas: preparando

     o cenado

     para

     a modernizacao

    liderada

     pelo Estado

      95

    Insulamento

     burocrático:

      a combina?ao de

     velhos

     e

     novos atores

    para a modernizacao liderada pelo Estado

      98

    Urna

     ideología

      instrumental: o nacional-dese nvolvime ntismo 702

    DecisSes

      instrumentáis

     e

     recursos económicos crescentes  10 6

    S incretismo político

     n o

      governo

     J K   10 8

    Conclusao: a

     combinacao

     da s

     gram áticas como

     u m ato de

    malabarismo

      112

    C O N C L U S A O :

      O

      S I S T E M A

      E M

     Q U E S TÁ O : C O N T I N U I D A D E ,

    M U D A N C A   E P E R S P E C T IV A S 7 7 9

    Intera9ao

     entre as gram áticas 720

    Urna

     visao

     da

     ab ertura política

      725

    A N E X O   1 3 1

    B I B L I O G R A F Í A

      755

    L I S T A  D E  Q U A D R O S  &   T A B E L A S

    Q U A D R O   1 —   Propriedade

      vs .

     Controle d os Meios  de Produgáo

    no

     Socialismo,

      Corporativismo,

     S indical ismo

     e

     Cap italismo  ..  39

    F I G U R A

      1 —  Tipos d e

     G ramát icas para

     Relances

    Estado

     vs.

     Sociedade

      42

    Q U A DRO  2 — Industrias e Servidos Pertencentes ao Estado e

    Administrados pela Bu rocracia Estatal, 1942  58

    QUADRO   3 —   Industrias  e

     Servidos

      Pertencentes  ao Estado e

    Nao-Administrados  pela Burocracia Estatal, 1942

      59

    G R Á F I C O  1 —

      Brasil: 1900-1943, Taxa

     de

     Importagáo como

    Porcentagem

      do s

      Rendimentos

      do

     Estado

      60

    TÁ SELA

     1 —

     Filiac.no

     Partidaria de

     Ministros, 1945-1963

      72

    TABELA 2 — Coalizóes

     ñas Eleicóes para G overnadores

      73-4

    TABELA  3 —   UDN, PSD, PTB:

     Tipos

     de

     Partícipacáo

     ñas

    Elcigóes

     para G overnadores,

      1947-1965  75

    TABELA

      4 — Filiagáo

     Part idaria

     de

     G overnadores Elei tos

    cm   1978

      76

    ' A D R O

     4 —

      Partidos Políticos Comparados Segundo

      a

     Base

     Social

    C

     os Tipos de Incentivos

      Partidarios

      78

    ¡ A D R O  5 — Partidos Políticos no Brasil:

     Tipos

     de

    I

     Mobil izagüo

     e

      Orienta

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    \

    Q U A D R O S  6 E 7 —  Ministerios Políticos

      vs .

     M inisterios

    T ecnocrático-Militares Classif icados S egundo a O rigem

    do s M inistros Antes e Depois  de 1964  87

    T A B E L A   7 —   Or igem d os  Ministros  "d a Casa",  1964-1982  88

    T A B E L A  8 —   Estabilidade Ministerial, 1946-1980

      89

    TABELA

     9 — T ecnoburocratas com Experiencia L egislativa  91

    F I G U R A

     2 —   Mudaba na Continuidade: Clientelismo e

    Insulamento Burocrático no Brasil Contemporáneo

      11 4

    Q U A D R O  8 — Brasil: Comp atibilidade das R elagóes entre

    G ramáticas

     na

     Interagáo Estado

     v s.

     Sociedade

      22 6

    N O T A D O A U T O R

    Desejo agradecer

      ao s

     amigos, colegas

     e instituÍ9oes

     que,

     de

     muitas manei-

    ras, ajudaram

     a concretizar o

     presente livro.

     S ua versao

     original constituiu

    tese

      de doutoramento

     em  ciencia política

     n a

     Universidade

      da

     California,

    Berkeley.

      M eu

      comité

      de

      tese

      foi de

      inestimável importancia. Giuseppe

    Di Palma representou  um exemplo intelectual a ser emulado. Linda L ewin

    produziu

     comentarios detalhados  e  impediu-me  de  cometer varios

     erros.

    David

     Collier, orientador, merece urna referencia especial.

      É

     leitor impie-

    doso. Página após página,

      senten£a  po r senten?a,

      ofereceu comentarios

    generosos  e  abundantes. A  estrutura

     deste

     trabalho  foi aperfei§oada  pelo

    seu competente entendimento do que eu estava fazendo e quena fazer. S ua

    insistencia com a precisao,

     elegancia

     e

     p arcimónia

     foi de

     extrema valia.

    Este texto beneficiou-se , em varios estágios, d os comentarios  de A lbert

    Fishlow, Barbara  Geddes,  Be n  Schneider, Emanuel  Adler, Guillermo

    O'Donell,

      José  Brakarz, José Lavareda, Leslie

      Armijo,

      Luiz Roninger,

    M ana Herminia

      Tavares de

     A lmeida, Renato Boschi, Roberto

      Da Matta,

    R u t h Cardóse,  Simón Schwartzman. Marcia Bandeira contribuiu

     de ma-

    neira  única para

      a

      realizaQao

      deste trabalho.

      A

      estes colegas,

      o meu

    agradecimento.

    Publico este livro

     na

      íntegra, anos após

     s ua

     conclusáo.

      O

     convite para

    publicá-lo veio de  Lu iz Carlos Bresser Pereira,  a quem sou  grato. Contra-

    ditório,  o  ministro Bresser Pereira. Convida-me  a publicar  o trabalho  e,

    em seguida,

      torna-o

     desnecessário. Escreveu prefacio tao conciso

      e

     com-

    petente

     que bem

     poderla dispensar

     a

     leitura

     d o

     livro.

    Nao fosse

      o

     talento

     d e

     L ucia Hipp ólito, esta tradu§ao ainda manteria

      o

    je itao

     d e

      tese. Lucia,

     além de

     brilhante tradutora,

     é

      atenta leitora

      e

     feroz

    crítica. Monica G rin

     foi de

     inestimável ajuda

     na produ£áo do

     texto  final.

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    A  G R A M Á T I CA  POLÍTICA DO ERASE.

    Quando sai do Brasil em  1979 para o doutoramento, provisoes adminis-

    trativas

      e

      políticas vigentes impediam

     a

     concessáo

      de

     bolsa

      e a

      viagem

    daqueles estudiosos

     suspeitos

     de infidelidade ideológica ao regime militar.

    Ja  naquele momento — e isto agravou-se com o passar d os anos — , n ao

    dispunha  de  apreciável taxa  de

      fidelidade

      ideológica nenhuma,

      muito

    menos  ao governo militar. N ao fosse a decidida atua?ao de um

      conjunto

    de

     colegas,

      além

     da bolsa da Funda5áo Ford, eu nao tena saído do

     Brasil.

    Devo esta oportunidade  a Wanderley Guilherme d os Santos, Mario M a-

    chado, Edmundo Campos, César G uimaraes, G ilberto

     Velho,

     R oberto

      D a

    Matta  e  Shepard Forman.  M eu  ingresso  em   Berkeley, após deixar  a

    Universidade

     d e

     Chicago, dependeu

      do

     apoio

     d e

     A lexandre Barros,

      H o-

    ward Becker e David Collier.

    O

     retorno

     a

     minha  instituicao

     de

     origem, Conjunto Universitario Can-

    dido Mendes, após valioso interregno

     no

     exterior

      e em

      postos

      governa-

    mentais, devo  ao  decidido  e  cordial apoio,  a  renovada  confian§a  e ao

    acicate

     profissional e intelectual de Candido A ntonio Mendes de

     Almeida.

    Precisei registrar

     o

     passado nessa nota (Wanderley, Edson L uiz

     e

     Laura

    sao lacos atemperáis). Q uero encerrá-la, contudo, com urna visao otimista,

    esperancosa.

     Dedico este

      livro

     a Eduardo e

     R afael.

      O

      futuro.

    PREFACIO

     Á TERCEIRA

     EDICÁO

    A   G R A M Á T I C A P O L ÍT IC A   D O   B R A S I L ,

    o u U M A

     B I O G R A F Í A

      D O

      B R A S I L

    R E P U B L I C A N O

    Coube

      a

     Lu iz Carlos Bresser Pereira,

      no

     prefacio

     a primeira edicáo deste

    l ivro, a cunhagem

     de

     conciso

     e

     luminoso  u ízo

     a

     respeito

     do

     texto

     de

     Edson

    Nunes:  "E  urna  das  mais instigantes  e  origináis análises  da  política

    brasileira." O

     comentario

     d e

     Bresser,

     ja

     idoso

     de

     seis anos, segué absolu-

    tamente pertinente. Suspeito

      qu e seja

      definitivo.

     Com

     efeito,

      o

     texto

     q ue

    deu

     origem  ao  livro, produzido como tese  de  doutoramento e m  ciencia

    política,

     em

     Berkeley,

     no

     inicio

     da

     década

     de

     oiten ta, mantém

     s ua

     origina-

    lidade  e sua

      capacidade incomum para interpretar

      a

      experiencia ins-

    titucional

     e civilizatória brasileira, a p artir dos anos trinta.

    Mas, antes de qualqu er incursao textual mais detalhada, cabe a pergun-

    ta:

      de__que

     gm ero^afmaJL^se.üaíal  Em

      outros termos,

      a que  tradi?ao

    analítica o exercício de

     Edson

     Nunes

     está,

     de

     algum

      modo, vinculado? A

    pergunta

     por certo nao é

     técnica

     o u

     muito menos inocente.

     O lho ao

     m eu

    redor

     e constato o impressionante

      progresso

     obtido,  ñas décadas recentes,

    no

      campo

      das

      ciencias sociais brasileiras.

      M as esse

      reconhecimento

      é

    como que  travado pela

     percepcao

     de que os avances registrados dizem

    mais respeito a

      investiga9oes

      sobre processos, instituicoes e, em urna

    palavra,

     fenómenos "locáis" e

     espe cíficos

      do que

     tentativas

     de síntese, de

    vis&o  de

      conjunto

     bu  de exercícios  "épicos",

      para usar

      a expressao  de

    SKeldoh  WótrrC™cT ápázes"de*T nstáürar

      novós

     'conjuntos  de fenómenos e

    -

    A s

      visóes

      de  conjunto,

      motivadas

      po r

      grandes

      perguntas_

    ;:

    ^guem

    Somos,

      de**orídevSnos^

      para onde

      vamosTque "futuro

      nos espera, entre

    tantas

     outras —   parecem ter sido

     relegadas

     as antigás artes do

     ensaísmo,

    um

      exercício  infeleHüa¡rfnovi3b  póTapóstas, idiossincrasias e, co*mT?e-"

    qüftncia, desespero. O texto de Edson Nunes, a meu juízo, pertence a um

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    7/75

    A

     GRAMÁTICA POLÍTICA

     DO

     BRASIL

    PREFACIO

      A

     TERCE1RA EDigÁO

    género aparentado

     ap^ensaísmO j

     no que este possui de ambi§ao para tratar

    dfe-gfañdes

     questóes.

     T al

     género pode

      ser

     denominado

     de

     "InterpretaQoes

    do

     Brasil". Em termos

      mais

     diretos,

     A

     gramática política

     do

     Brasil pode

    ser inserida em urna

     tradi^ao  inj;ebsctual maiúscula£^ica,

     no ámbito do

    pensamento

      social

     e político""brasileiro,  voltada

      para

      a

      interpretacáo

     da

    nossa experiencia  civilizatória. A galería de

     precedentes

     é  considerável.

    Para ñcarmos

     nos

     clássicos,

     é o

     caso

     de se

     mencionar Oliveira Viana, José

    Maria

     dos

     Santos,

     Sergio

     Buarque

     de

     Hollanda, Gilberto

     Freyre e

     Raymun-

    dó Faoro.

    Urna

     das interpreta9oes

     possíveis

     do país, o

     livro

     de Edson Nunes pode

    ser lido,

     ainda, como

      urna

     biografía

     do Brasil

     Republicano, com

     enfase

     em

    su a

      fase posterior a 1930, más

     sem

     desconsiderar os legados provenientes

    da

     Primeira República.

      Seu

     momento intelectual deflagrador reside

      na

    insatisfacap

     com formas dualistas de interpretacao da historia do país, ñas

    quais

      todo l̂losso"ségred^O"clvittZatórío parece* depender da

     escolha

     da

    dicotomía

     mais adequada: modernos

     vs.

     atrasados

     ou

     tradicionais;

     ordem

    pública

     vi.

     ordem privada;

      centraliza§áo vs.

     descentraliza9áo;

      sístole vs.

    diástole (para mencionar urna

     das

     mais pobres

     da

     serie), entre tantas.

    Apars

     construens

     dessa insatisfa9§o parece decorrer de urna indagacao

    simples,

     precisa e estrutural na interpreta9áo do autor: é necessário proce-

    der

     dessa forma?

     Ou,

     ainda:

     nao

     seria possível construir urna interpretacáo

    na qual

     todos os aspectos polares dessas

     dicotomías

     possam ser preserva-

    dos, como partes de explica9óes

     plausíveis?

     Essa parece ser a aproximacáo

    decisiva com o problema teórico e histórico básico do texto: como inter-

    pretar o Brasil, supondo-o dotado de urna experiencia sincrética,

     um

     tanto

    assemelhada á antropofagia oswaldiana (para mobiíizarmos outro grande

    intérprete

     do Brasil), na qual tudo se deglute e se incorpora e nada se

    cancela?

    A primeira

     impressao

     do

     texto,

     portante,

     remete

     o leitor a um

     encontró

    com

     o

     complexo

      e

     multivariado

     processo de

     constru9ao

     do

     Brasil

     moder-

    no.

     Neste sentido, urna

     vez

     capturados pelo convite, navegamos

     npjxmtra-

    fluxo do

      minimalismo analítico

      e da  compart imental iza9ao

     disciplinar.

    V ^,...,.,-"

      •""  "'>^.,.'"•-.  '

      r

      '

      T

      .'..

      ""V  ~*í

      ~

    Mas sena

     simplório reduzir

     o

     alcance

     do

     texto

     a urna

     simples

     refuta9ao do

    minimalismo.

      Na verdade, e para isso basta

      consultar

      a

      impressionante

    bibliografía

     respeitosamente utilizada, Edson Nunes

     poe urna

     considerável

    quantidade de investigacóes  ppntuais —

      sobre períodos,

      políticas,

     ins-

    tituÍ9Óes etc.

     — a

     seuservico.

     Portante, as

     potencializa

     e as

     reinscreve

      em

    um

     projeto interpretativo teórica

     e anal í t icamente

     mais ambicioso. Dessa

    forma,

      trata-se

     de um ensaio de interpretacao do

     Brasil, alimentado

      por

    inúmeras contribuÍ9oes

     recentes

     d as

     ciencias

     sociais n o

     país.

    A

     síntese indicada, ou

     bricolage

     teóricamente bem orientada, diz res-

    peito

     ainda

     a urna invulgar familiaridade do autor com

     diferentes

     tradÍ9pes

    disciplinares. No texto estao presentes

     contribuÍ9óes

     nao apenas da ciencia

    política, mas da

      antrojpplogia,

     da historia, da sociología, da economía,

    aliadas a umajjríocur^agaojj^rngarati va

     muito forte.

     O tema da

     coopera9ao

    disciplinar é central para o texto é"2ecorre dó"mo3b pelo qual seus objetos

    de análise sao definidos. Se a experiencia republicana brasileira pode ser

    apresentada como  um processo  sincrético,

      varias abordagens

      e

     perŝ

    pectivas devem estar presentes no esfo^o de elucida9áo. Em particular, ¡

    deve

     ser ressaltada a decisao intelectual de tratar os processos políticos e I

    macrppolíticos como

      configura96es

      envolvidas pela vida social

      e

     pelos

    J

    fluxos  históricos. A influencia de

     Karl Polanyijiess,e

      aspecto é

      notável:f

    nao

      apenas

      os

      mercados estao

      ''ewSeSie^ '̂nas

      relasoes sociais,

      como

    tambérn

     as  instituic,6es e

     práticas políticas ocprrem

     em ternpps e

     lugares

    sufJstañfTváménte   preenchidos

      pela

      experiencia

      histórica.

      Nao  ha,

      pois,

    lugaTjpára um ij^tuj|onajlismo  p _ p r

     vezes^au tista,

     a despeito do fato de o

    livro

      tratar do longo processo

      deTabríca9áo

     institucional na república

    brasileira. Trata-se, enfim, da boa e

     falível

      ciencia da política, atenta as

    **ae

    S

    *>̂~^.t -~* -*-. .,-i-

    ¡

    ^ ^ ..

    ""

    dimensoes da historia, da dinámica social e da cultura.

    O

      foco

      do

      livro incide

      sobre o "processjj de_construcJíQ   institucional",

    desenvolvido  no

     país,

      em meio a

     "profundas

     mudabas

      económicas

      e

    Í

    sociciis

      .

     Ucssíi indic&Ccio

     occorrc 111x12

     intcrprct3.C3o 3 .

     rcspcito cuts

     rci&cocs

    .

      -

      . ^ » J T « ~ j ~ . « * ~ . - -

      . ,   ^ ^ . . í . ' ^ i - . - ^ ' - A u . . „ .

    entre  "sociedade^e  instituÍ95es_rx)líticas Jforrñlus  .

     Esse

      enquadramento

    clássicoTpor^ua

     vez,

     da

     lugar a

     urna

     inova9ao

     analítica de grande monta:

    a  hipótese de que o processo

      de¡^cjanstrucap.

     institucional brasileiro é

    quádruplo,

     ja que  sustentado ppr"quatrp padrpes

     institucionalizados

     de

    reíá9§es ou

      'gramáticas'

     que estruturam os

      Ia9os

     entre  sociedade e ins-

    titür^oes   formáis  no

      Brasil:

      clíeñteTísmb,

     coiporativismo,

      insulamento

    }

      burocrático

      e

     uflíversalismo

     de

     procedimento".

    '

      STéngenhosa

      nÓ9ao

      de

      "gramática",

      co m

      toda

      su a

      carga semántica,

    indica

     a existencia do que poder-se-ia designar como as

     diferentes

     lingua-

    gens em

      uso_np,mundp

     da política. Se linguagens sao formas de*vi3a, as

    "gramáticas"

      indicam  os  priñoDips  que as estruturam. No texto, tais

    priríclpfos"eStaü"|ire

    v

    SéTifes"noánodo peío qual  instifuÍ9oes e

     sistema social

    expectativas

     humanas

     sap,p£oduzidas.

    As

     gramáticas sugeridas podem, em principio, ser representadas como

    se

      fossem carnadas arqueológicas,

      que ao

      longo

      da

      historia vao

      se

    produzindo  e se sobrepondo. Assim, o clientelismo, enquanto modo

    V

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    8/75

    A G R A M Á T I C A P O L Í T IC A D O B R A S I L

    P R E F A C I O A T E R C E I R A  EDigÁO

    dominante

     de

     art icula9áo

     entre sociedade

     e

     sistema político

     e

     como forma

    típica

     de comportamento político e social, apresenta-se como traco dis-

    tintivo

     da República

     Velha,

     a despeito do formalismo liberal

     presente

     da

    letra

     da Constituicao. É de se noíarT rio 'éñtanto já'ñolfnbito  da

     Primeira

    República, a presenca de

      um ,

      digamos, protp-ánürio

      insulador,

     voltado

    para a

     defini§ao

     de arenas e

     agendas

     #

     salvo"3a

     preda§ao^oíigárgiii^a típica.

    "No  gOVerno  Campos

      Salles

      (18981902), porexempío,  certas"defi-

    nicoes cruciais para a agenda do Estado — tais como política económica

    e

     financeira

     —  foram

     insuladas

     em

     torno

     do

     presidente

     e nao

     submetidas

    a  "gramática"

     predomiiwifeTEm

      um  ceño jsehti_d.Q ,  a  conceHtragaojle

    p^3efe.¿n^"mSós^o

    >

    |¡re§iclente

     —

     cujaTneta

     era a insularidade absoluta*

    — teve como contrapartida o reconhecimento do controle estadual exer-

    cido, por sabe-se  la  que  méfSs'̂ peía^olfgarquías  sobre_seu¿_temtorios

    específicos. Gilberto Hochman, emA~Era~3~o"5áneamento, detectou com

    bfilRoinFórmacao  de urna consciéncia sanitarista, em pleno Brasil oligár-

    quico,

     animada por profissionais do sanitarismo, responsáveis principáis

    pela implementacjío

     de

     políticas

     de saúde e^sanearnento, por  todo_o_país,

    expressas ejn

     urna

     Ímguagier^ffisGn^F"grarnática''

     dojclientel^smo.

    '"Mas,

     mesmcTéssas evidencias a respeito da

     presenga

     de um pádráo de

    acao

     social

     e

     política

     com pretensoes

     insuladoras

     nao sao

     suficientes para

    alterar a

     configuracao

     geral

     da

     sociedade

     e de sua interaQ ao com o

     sistema

    político, marcada predominantemente pelas práticas

      e pelos

      valores

      do

    clientelismo.

    Coube aos reformadores de 1930 imaginar urna forma de

     articulajáo

    entre sociedade

      e

     sistema

      políticcTñá

     qual

     as

     práticas

     e

     valores

      dos

      "car-

    comidos" nao

     tivessem

      mais

     lugar.

     Se

     insistirmos

     na

     metáfora arqueológi-

    ca,

     com os anos

     trinta

     a República brasileira produz a sua segunda carnada

    civilizatória,

     caracterizada pela

     "gramática" do corporativismo.

     Esse

     novo

    paradigma

     opera, na vérdade,

     urna

     dupla

     réfutagao:

     a um

     so lempo

     o idea-

    lismo constitucional — para evocar a

     interpretagao

     do Brasil de

     O livéira

    Viana

     —, caracterizado pelas

      ficgoes

     do liberalismo, e a

     cultura.

     predaiória

    docJientelismo

      sjio

     apresentados como fatores de atraso. O que se impoe

    é urna

     novalorma

     de organizagao da sociedade, na qual o atributo trabalho

    *  A  busca da  insularidade absoluta está presente na frase  lapidar de Campos Salles:

    "Quem

      se

     propoe

     a

     consultar

     opinioes alheias  sujeita-se

     naturalmente

     a  modificar  as

    suas, e era isso que eu quería evitar." A  admira§áo

      confessada

     p or Campos Salles, po r

    parte

     de proceres recentes na política brasileira, indica a perenidade da busca

     mencio-

    nada.

    aparecern como base de

     classificagao

     social

    e_cornojeferencja

    a

    gara

      a

     atr ibui^áo

     de

     direitos

     e

     obrigafoes.

    O texto de Edson

      Nunes"

     demonstra de forma inequívoca que as pre-

    tensoes de  profilaxia tiveram sucesso restrito. As expectativas do

     capitao

    Frederico Buys, que exigía a

     canibalizagao

      dos governantes carcomidos

    — "Vamos comé-los. Devenios ser rudes como verdadeiros canibais" —,

    tiveram retorno relativo. O entulho liberal, com certeza, foi

      varrido,

     mas

    I

     a¿^Erarr^cj£^g_cjienteljsmo

     e do

     corporativismo acabaram

     por desco-

    V   brir  formas perenes

      e

      significativas

      de

     coopéracao recíproca. Ñesse

      as -

    *

      ..V7Tpg»»=ETO.-

    J

    .̂ .,-...

    J

    ..a:.-.,;.»»

    >

    ¡£̂ .

      - - -

      •»*•««•»•,«>••«,..*-,>—»

    J  pecto

     reside

     um dos pontos fortes  do hvro, qual seja o dCj^atar a cultura

    do

     clientelismo como

     um  padrao de

     troca

     que nao

     exige

      como* coñdicáo

    rhecesSaná a presenca^pjagrarísmo e do

     atraso oligárquico. Como padrao

    nespecírico  Be

      troca social,

      o^cjientelismo pertence

      a

      niodernidade

      e

    I

      tnajnfjejja^c^omr^tibilidade  co,moutras formas

     de

      configuracao social.

     Daí

    '

      iecorre

     a decisao_do texto de tratar do tema do clientelismo sem mobilizar

    a

     moldura

     oligárquica ejigrária  da

     Primeira República. Como resultado,

    Hemos um

     " trátameñto

      mais sofisticado do tema, sem as inevitáveis

    men5oes ao folclore coronelístico, e com capacidade para iluminar as-

    pectos

     importantes do Brasil urbano e moderno.

    Ainteragao e a

     fertilizagao

     recíproca

     entre

     as gramáticas do clientelismo

    e do

     corporativismo

     ja

     indicam

     que a

     metáfora

     das

     carnadas arqueológicas /

    deve ser reparada. Nao se trata mais de  superposigao, mas de articulajaoj/

    e de

     desenvolvimentq combinado. Edson Nunes mostra, ainda,

     que

     cabera

    4q*g0

    tffv

    t

    jV *~**̂~~™

      '  '* '""•r.ta"*̂

    ,̂-,~«--*

    *

    foprTrneiro  período

     de governo de Getúlio Vargas a

     definicao

     de criterios

    Q̂ y¿«——-̂ .̂  ,̂«̂̂ ^̂ .•.- •̂̂ ..«̂ .̂ ..„„:.••'••"  \

    r

    ,„.„„,.•'.'.-'¿ ;̂íi«.ü.™-*'^-'*^''  .̂ ^̂ ^̂ .̂ .̂ .

      .̂.̂ •.̂ •̂ -

      * - •• :  •

    pira a

      foífnagaó

      de um novo sistema de servido público — via

      DAS P

     —

    COm   características  gramaticais próprias, bascadas  em

      urna

      Cultura  de

    Universalismo

     de procedimentos. Nova gramática,

     portante,

     que vem ao

    _̂(l̂ *̂

    1

      ' • . ' , .

     .iJ îw-"

    7

    'V-"*í„,,. * • * * < i™

    1

      ~*- * - - - * \ .   'V**»

    IHDndo

     envolvida

     p or

      linguagens'que

     n ao I he  sao

     próprias,

      em  fun§ao  do

    OOntexto mais ampio noqual o clientelismo redivivo e nacionalizado e o

    Corporativismo  estáo implantados e ativos.

    »

      A

     análise contida

     n os

     capítulos

     4 e 5 é

     magistral. Ela demonstra como,

    pós-45,

     a arquitetura institucional do Brasil moderno se constituiu.

    i-se do momento mais complexo e rico do sincretismo, no qual urna

    im

     moderna, politicamente aberta e atravessada por forte crescimento

    imico  estabelece suas ratinas e formas próprias de organizacao.

    s

     dois capítulos,

     a

     experiencia

     da Repúblicade

     1946

     é

     dissecada

     e o

    o

     político

     de

     Getúlio Vargas

     eJúsíelino

      Kúbitschek

     é

     posto

     em

    ,

     na

      arte_d^cornbirláf"as

     gramáticas do~clientelismo,

     do

     corporati-

    , do universalismo de procedimentos  e do insulamento. Este último

    lisrhtTScabou por ser decisivo para a constituicao da grande capaci-

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    9/75

    A

     GRAMÁTICA

     POLÍTICA

     DO BRASIL

    dade

      estratégica,

      que o

      Estado brasileiro manteve

      até o fim dos

      anos

    oitenta. As  principáis

     agencias públjcasjjue

     sustentaram a modernidade

    no país

      decorreram

     d e arránjos

     pelos

     quais  se

     pjetendeu

      evitar a^gptuia

    pplítica, corporativista ¿"clientelística.   ~ ~ ~ '

    "A

      análise

      dé Édsorf

     Nuríes

      é  fundamental

      para

      o

      entendimento

      da

    dinámica do primeiro experimento democrático brasileiro, o da R epública

    de   1946.  O   desempenho eleitoral  e político  dos  dois principáis partidos

    daquele regime — o PS D e o P T B — nao pode ser adequadamente avaliado

    sem

     o

     jo^¿ojitaditóri^̂ pjripjemejTíar_das  gramáticas

      do

     clientelismo,

    do corporativismo e do universalismo. Q uanto a U D N , vale a

     percep§ao

     do

    trajeto  que vai da defesa asséptica do universalismo a aberta escolha da

    subversao da

      ordem,

      sem que a auto-imagem d e  vestal tenha impedido,

    em

     muitos aquis

     e

     alis,

     o uso de

     gramáticas abjetas.

    Por fim, a

      indaga§áo

      de

      Bresser Pereira,

      em seu

      belo prefacio,

      é

    incontornável:

     "Qual é a

     relevancia

     dessa

     análise para

     o

     tempo p resente?"

    Concordo com Bresser em sua avaliac.ao do estado atual do corporativis-

    mo: nos lempos que

     correm

      ele

     assume fisionomía  marcadamente social.

    Trata-se de organizar e

     definir

      injgresses corporativos

     basTd

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    10/75

    PREFACIO

    P O L Í T I C A   E  I N S U L A M E N T O

    B U R O C R Á T I C O N O

      B R A S I L

    Multas

     sao as teses de doutorado apresentadas por estudantes brasileiros

    no   exterior. A grande m aioria, embora revele esfor§o imp ortante de

    pesquisa ou de formaliza5ao, morre ña s bibliotecas das respectivas uni-

    versidades dado  o  caráter pontual  e  freqüentemente irrelevante  do  tema

    que tratam. A

     tese

     dejdoutorado de Edspn

     Nunes,

     apresentada em

     1984

     na

    Un i versidade da Califo rnia, Berkeley, eslava ameac. ada de ter também esse

    destino. Um destino, entretanto, que neste caso seria  injusto para o autor

    e para o Brasil, ja q ue este trabalho é

     urna

     da s

     mais

     instigantes e origináis

    análises

     d a

     política brasileira.

     Em boa

     hora, Jorge Zahar Editor

     e a

     Escola

    Nacional de Adm inistra9ao Pública resolveram o problema publicando-a

    13

     anos depois.

    O autor parte de um modelo básico: existem quatro

      padróes ins-

    titucionalizados

      de

      relagpes

      ou "quatro gramáticas" que estruturam os

    lacos

      entre  sociedade

      e

      Estado

      no

      Brasil.

      Sao elas: o

      clientelismo,

      o

    _•  ,̂*-

    ^  .

    . . . , • >

      \ ~  - -w

      w

    *̂ ^

    c

    *~̂ ™**"̂ *«

      '

    COrgprativismo, o  insulamento burocrático e o universalismo d e procedi-

    iffintosTp

     clientelismo

     f az

     p arte da tradi§ao

     secular

     brasileiraeseus

     outros

    bis

      nomes sao patrimonialismo e

     fisiologismo;

     ja

     a s outras tres institui-

    emergemnos anos

     30, sob o

     governo

     deG etú l io

     Vargas.

     A

     partir desse

    irnento

     as quatro g ramáticas passam a conviver e a se inter-relacionar.

    esse compromisso,  do

      qual

     G etúlio Vargas e   Juscelino Kubitschek

    os

     mestres,

      que irá viabilizar a

     constru9áo

     de um

     Estado nacional

     e

    ncia

     de um

      poderoso processo

      de industrializado n o

     Brasil.

    ,sas_quatro

     institui^oes políticas dividem o trabalho^^lientelisrnp^e

    irati.yisrrio_sao  instrumentos de

     Iqgitimidade

     polftiga^o  insuíamento

    Ífi,0t,a forma através

     da qual as "entes modernizantes

     tecnoburocrá-

    e  empresariais promovem  o  desenvolvimento;  o  universalismo  de

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    11/75

    \

    12

    A G R A M Á T I CA   POLÍTICA DO  B R A S I L

    PREFACIO 13

    procedirnentos,

     a afirmacao

     lenta dejum regime

     burocrático

     racional-legal

    ejíventualménte democrático. Digo eventualmente democrátór/pbrqúe

     o

    autor

     na o

     identifica

     o

     universalismo

     de

     procedirnentos co m

     a

     democracia.

    A instaura9áo do universalismo de procedirnentos ocorreu no Brasil, no

    período analisado

     (1930-60),

      principalmente através

      de

     tentativas  de_re-

    forma

      do

      servico público

      e da implanta§áo

      de

      um

      sistema

      de

      mérito.

    Embora

      as

     élites

      se

     julgassem portadoras  legítimas

     d e

     valores modernos

    e

     universalistas,

     nao estavam entáo particu larmente interessadas na demo-

    cracia. Até os  anos  60,  elas  estavam  multo  mais  preocupadas com o

    desenvolvimento que entao se

     identificava

     com a

     industrializacao.

    .

    ...̂ __

    . . .  1̂  -~̂ . .  ',._

    ;>

    ,-......,.,

     V_,̂-

     - ̂ 

    Acombina§ao das quatro gramáticas

     ocorre

     de maneira

     vanada,

     depen-

    dendo do momento. Vareas faz uso principalmente do

      corporativismo,

     

    '  

    i

    1

    —'

     - O

    -__

      _.*rf

    t

    v-w--

    através do qual organiza as rela§oes do

     Estado

     com a

     sociedade,

     e  dWyjjaj-

    telismo, qu e

     Ih e

     permite manter as velhas oligarqu ías políticas sob contro-

    leTÜlnsulamento burocrático  e o universalismo de procedimentoŝ entre-

    tantóCjá estad

     presentes em seu primeiro governo. Em seu segundo

     governo

    e"h€rg8Vé"rño  Kübítschek, será o insulamento burpcrátî qííe"3arara"toríica.

    O

     clíelítBismó'sefá'Sóminjntenogoverno

      GouJaj-t^Ños

     governos

     militares,

    tf rmül^élito'blarwraticQ^yolta â ser dominante, acomp anhado pelo cor-

    p5rStívlsmcC

     éniquanto

     o

     clientelismo

     é

     colocado

     e m

     segundo plano.

    * O

     clientelismo existirá

     em

     todos

     os

     momentos como urna forma

     delidar

    com os políticos, que no flrasil da época

      estudada

      sa o  intrínsecamente

    populistas,

      tendo

      seu comportamento  reforcado

      peTo  fato

      dg_que  é um

    comportamento esperado

     e

     desejado

     p or

     parte

     do s

     eleitores.

     O  |psularQen,ta

    burocrático  é

      q

      p . s t r a f p . g i a  pr.r  p . x r v . l f i n i M í i  H n s  pu fes  piíra  Hrihl^r  fl iW

    13

    controlada  pelosjjartidns  políticos. A competencia técnica da burocracia

    e o

      universalismo

      de

      procedirnentos

     eram  os  meios

      para conter

      a ir-

    racionalidade populista considerada entao inerente aos políticos. O  corpo-

    rativismo,

     através do qual o Estado interm ediav a os

     interesses

     de empre-

    sarios  e  trabalhadores, completava  a estrategia de

      moderniza§ao. Nesse

    quadro,

      o clientelismo era ao

      mesmo

      tempo o

      instrumento

     p olítico por

    excelencia  para garantir  a implementa§ao de  políticas modernas,  o seu

    maior

     adversario.

    A

      política

      de

      mo^e^Tiizac^p_e_de^er^)Kqrnento

      ficava  a cargo da

    instituicao do insulamento burocrático. A través  déla  os tecnoburocratas

    estatais se protegiam da influencia política em agencias de governo como

    o

      D A S P ,

      onde pontificou a burocracia clássica, como  a  S U M O C , dominada

    por urna tecnoburocracia nacionalista (Cleanto de P aiva L eite , G lycon de

    Paiva, Rómu lo de A lmeida, Jesús Soares Pereira, Ignacio R angel). Nao se

    imagine, entretanto, que estes homens eram apenas técnicos. Eram técni-

    eos

     políticos, que se envolv iam permane ntemente em estrategias políticas

    para garantir sua autonomía sempre precaria.

    Embora concentrando

     su a

     análise

     no

     período

      de

      1930

      a

      1960, Edson

    Nunes

     prossegue p elo regime militar, mostrando,

     co m

     dados

     muito

     claros,

    como foijenorme o aumento dj j  insulame nto burocrático,

     nesse

      período.

    Deixa,

     éntretantoTde'dar a

     importancia necessária

     ao

     Decreto-lei

     200,

     d e

    1967, através do qual os m ilitares tentam realizar

     uma^féfjórma  adminis-

    tíaü~vlfpT5TieTrlCdl;^^^

    \

    B

    _

    H

    «jia»M¡B*>=5ra¡**

    A   pergunta  qu e  cabe agora  é: qual  a  relevancia dessa análise para  o

    tempo presente?Trés mudanzas fundamentáis ocorreramdepo is da análise

    contida neste

     livro:

     a

     sQciedade

     civil ampliou-se, modernizou-se e

     tornou-

    . se mais, democrática. A  democra^a^fcTféstarjelecrda  em'T985 e, dez anos

    jdepois, em  1995^ o  governo

      Fernando Henrique

     Cardoso propós  urna

    /reforma

      administrativa centrada

      na idéia da  transÍQap  de urna adminis-

    t̂rSĝ ^̂ icaburocrática  rjara urna administracao pública

     gerencial.

    Com o retorno d a democracia,

      refor§a-se

      o  universalismo de  procedi-

    rnentos,

     agora entendido

     de

     forma plena.

     Com sua

     contrapartida,

      o

     clien-

    reaparece como prática, embora cada

      vez iríais

    r. O corporativismo^por

     sua,yez,

     perdelarga,

    deixando

     de ser

     urna forma

     de organiza^ao da

     sociedade intermediada pelo

    Estado, para se transformar em mera e strategia d e defesa.

     ¿e iriteresses

     po r

    determinados grupos sociais.

     E o

     insulamento burocrático

     é

     colocado

      em

    cheque como

      antidemocráticorÑesTé"quadro,

      a tecnoburocraicia

      estatalc—,

    peTae" poder  na medida  em que nao consegue mais  legitimidade para  se

    insular

      na

      política. Perde poder,

      além dissorporquéá

      queda

      do regime

    7

    militar está relacionada

      a  urna profunda

      crise

      do

     Estado

     nacionál-desen-

    volvimentista, que fora sua p rincipal obra.

    S ua

     reacáo

     diante

     da

     crise

     e da

     perda

     de

     poder

     é

     perversa:

      ela, que se

    propunha ser o

     principio

     de

     racionalidade

     na

     arena p olítica brasileira, p arte

    para  a defesa irracional  e logra, na ConstituÍ9ao de  1988, eliminar todos

    os avanzos que

     haviam

     sido

     alcanzados desde

     o

     D ecreto-lei

      200 na direcáo

    dé~ümá'ádmínistrac.ao  política gerencial mais  moderna

      e

      voltada para

    confióle de

     resultados,

     a o

     invés

     do

     controle rígido

     do s

     processos.

     O

     retro-

    cesso burocrático,  entao ocorrido,  cria  priyilégjos_para  a burocracia  na

    forma  de

      estabilidade plena

      e

      aposeñtádoria^ integral, engessa toda

      a

    affiuni?tfa5ab   pública  tornando-a dramáticamente centralizada  e  inéfi-

    fiiente, e'eoríoi álmágem  da'altáltmrocracia

      pública"que

      tantos  servidos

    prestara  ao país.

    No plano político, por sua vez, ocorre um grande avanco democrático.

    O clientelismo cont inua presente nos partidos políticos, mas a crítica da

    ,

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    12/75

    14

    A

     ( ¡R A M Á T I C A

      P O L Í T I C A

      IX )

     B R A S I L

    sociedade a

     esse

      tipo de comportamento é cada vez  mais forte,  abrindo

    . >*-_™>_fc  ,U**̂¿, „«__ ..V^V—-v i--A *'

    1

    '--  ' a  t—̂ **-*-_

    u

    -

    dc

     ~* »««-• '*

    éspafcf

      para

      o

      aparecimento

      de

      políticos modernos,  situados  tanto

      na

    esquerda qu anto na direita do espectro p olítico-ideológ ico. Será com

     base

    em   urna  sociedade  civil  ampliada e democratizada e na  lideranca  de

    /   pólít icósmo3ernüs apoiados

     ñovamenté"nos

     melhores setores

     da

     tecnobu-

    rocracia qu e, a partir de meados dos anos 80,

     inicia-se

     amp io processo de

    \ J L j

      rrignoj^emBora mais

     .rígido politicam ente, de

     forma

     a

     ganhar

     governabili-

    *

    /

    "

      I.

      dade. E na dire§áo de um

     Esjado

     mais  fptte^financeijamente e dotado d e

    i  instituicoes  e

      estrategias

      administrativas

      gerenciais,

      qu e  Ihe

      permitem

    1

      aumentar

      seu

     grau

     d e  governanca.

    Dentro

      desse

      quadro, será ainda necessário manter

      a

      estrategia

      de

    compromisso que caracterizou o período analisado neste livro, principal-

    mente os anos 50? Compromissos,

      acordes

     e  concessoes mutuas sempre

    serao necessários.

      Af inal , a  política  é a  arte  do  compromisso.  Mas os

    compromissos

     e as

     permutas

      (trade-offs)

      serao outros. A través

     das "agen-

    cias

      autónomas"

     e das "organizaQóes

      sociais"

      o

     Estado b rasileiro

      póHérá

    contar

      co m

      instituicoes

     muito mais

     nexiveis,

     eficigntes

      e

     yolj^da^para

    resultados.  Instituigoes, entretanto, que nao serao caracterizadas princip al-

    mente pelo insulamento bmocráüco, mas pelo controle de urna alta buro-

    K

      cracia,

     situada

      no

      núcleo  estiatégico

      do

      Estado,

      a

      qual responderá

      ao s

    políticos  éleitos.

     Á  eficiéncia^somar-se-á,

      assim,

      a

     demanda

      de_resp,Q,nsa-

    ^

    biliza?áo (^cco untaSüity^T'or

      outro lado, o controle

      daTa^Io

     das agencias

    autonórnas

     elías^órgíffízagoes  sociais

      nao  ocorrerá

      apenas através

      de

    contratos de gestao firmados com os políticos e burócratas situados no

    núcleo estratégico, mas, de forma crescente, através de mecanismos de

    o {   pjrti^ipaslosocial,  em que os cidadaos controlem os servicos prestados

    pelo Estado.

    Na conclusáo do livro, Edson Nunes afirma que as élites reformistas,

    preocupadas  com a governabilidade,  deverao  ter  sempre  em  mente  as

    gramáticas que relacionam Estado e sociedade. Nao ha dúvida. Nesse

    sentido, sua contribui§áo intelectual — ao explicar essas gram áticas ou

    instituicoes

      integradoras

      e

      organizadoras

      da  sociedade

      brasileira

      — é

    fundamental. A s instituifoes  integradoras e,coordenadoias boje relevantes,

    entretanto, nao sao

     rnajs^SJa^smas.  Á"defini§áo

      de quais sejam elasjios

    anos

     90 Fc5rfio~sé~íriter-relacionarn  é  urna tarefa a ser

     realizada, para

     a

    qual esse

     livro servirá de poderosa inspira§ao.

    Lurz  CARL OS BRESSER PEREIRA

    Mato de

     1996

    CAPÍTULO 1

    iNSTiTuigóES,

      P O L Í T IC A

     E

      E C O N O M Í A

    O

     Brasil pertence

     ao

     grupo

     d e

     países

     q ue

      adotaram,

     no s

     últimos

     50

     anos,

    urna economía

      capitalista moderna

     e

      internacionalizada. Países

      qu e

     pro-

    curam

      implantar  urna

      ordem

      capitalista moderna  tém de  criar novas

    instituic.óes. A operac,áo de um

     sistema capitalista modern o exige com por-

    tamentos  individuáis

     e

     institucionais  compatíveis

     com a

     lógica

      da

     produ-

    gáo económica.

    A   moderna ordem económica capitalista penetra todas  as esferas  da

    vida

     social

     e

     estende-se

     a

     outras

     instituic,óes; a

     lógica

     do mercado

     torna-se

    a

      regra predominante para

      a

     organizado

     da vicia política e social, e os

    cómparTárñentósIndividuáis também sao

     embutidos

     na

     lógica

     da

     produgáó

    ec^nornicar"""""

      ~~-~~

    Observando  o  impacto  da produgáo  capitalista na  sociedade,  M ax

    Weber

      chamou

      a atenc,áo

      para

      a

      mesma ordem

      de

      problemas

      que se-

    riam  mais tarde brilhantemente reunidos pela

     antropología

     económica

      de

    Polanyi:

    A

      economia

      capital ista

      do s

      dias

      de

      hoje

      é um

      ¡menso

      cosmo

      dent ro

      do

      qual

      o

    i ndiv iduo nasce e que se

     aprésenla

     a e le , ao menos enquan to individuo, como urna

    inalterável  ordem de coisas  dentro da

      qual

      ele deve viver. Porga o individuo, na

    medida

     em que

     este  está envolvido

     no

      sistema

      de

     relajees

     d e

     mercado, ajuLaptar-se

    a

      normas_cap¡talistas  de

      aguo.

      O

      empresar io

      que a

      longo prazo

      ag e

      contra  essas

    normas será inevitaveímente el iminado d o cenado  económico, da mesma manei ra

    que o t rabalhador que nao

     possa,

     ou se recuse a ada ptar-se a elas será  at irado á r úa

    sem

      trabalho.

    1

    É

     evidente

     que a

     idéia

     de que a

     realidade social

      é

     organizada

     em

     torno

    i

      de um

      complexo

      entrelac,amento  de  forjas

      mais "modernas"

      e

      menos

    "modernas" de

     comportamento

     ja foi

     amplamente debatida. Entretanto

     o

    15

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    13/75

    16

    A G R A M Á T I CA

     P O L Í T I CA

     D O

     B R A S I L

    estudo das relagóes entre características do mercado e  da

      auséncia_de

    mercado, entre modernidade e

     tradigao,

     continua a ser um ponto básico de

    referencia  ñas  ciencias sociais. Ño contexto dos

      éstudos

     brasileiros, as

    interpretagóes do Brasil contemporáneo  tém  sido prolíficas n a produgáo de

    dicotomias, todas representando variagóes

     em

     torno

     do

     tem a clássico

      dos

    "dois

     Brasis":

     desenvolvimento

     versus

     subdesenvolvimento, Brasil urba-

    no   versus Brasil  rural,  industrializagáo versus oligarquía  rural, poder p ú -

    blico versus ordem privada, centralizado versus pode r local, sístole versus

    diástole,  representado

      versus

      cooptagáo, tradigáo

      versus

      modernidade,

    Brasil versus India. A h istoria do país tem sido freqüentemente  explicada

    em termos da tensáo constante entre dois polos que se alternam em ciclos

    iRtermináveis,  ou e ntre dois polos em p ermanente contradicáo mutu a.

    Dessa  forma,  Néstor Duarte ,  OHyeira  Viana

      e Víctor

      Nunes Leal

    enfatizaram  a rrmMIiáQ PÍ9_d& íP,de|,prpado como urna barreira a  cons-

    trugáo d e  urna  ordem pública. De O liveira Viana e Francisco Cam pos a

    Raimundo Faoro e Simón S chwartzman, os estudiosos investigaran o uso

    do

     poder público

     na

     criacáo de umajprdem estatal.

     De

     M aria Isaura Pereira

    de

      Q ueirós

      a G olbery do Couto e Silva,  enfatizaram  a importancia de

    sucessivos momentos

      de centralizagáo e

      descentralizagáo,

      de

      sístole

      e

    diástole, na formagáo da sociedade e do Estado brasileiro. A B e l ín d ia d e

    Edmar Bacha,

     p or

      exemplo,

     é a

     mais recente manifestagáo, desde

      a

     ótica

    dá~desigualdade, deste "olhar". Nao é exag ero dizer que a idéia dos dois

    Brasis  tem exercido  um   permanente fascínio,  em suas  variadas formas,

    sobre a vida intelectual brasileira.

    A s dicotomias se

      mostraram

      úteis na produgáo de  mu í

     tas

     jmájises

    perspicaze s sobre a política e a

     economía

     brasileiras. Entretanto o sistema

    institucional évoluiu pa ra

      urna forma

      que transcende a nogáo dos "dois

    Brasis".

      A o

      mesriio tempo

      que tém

      surgido críticas

      á

     tese

      da

      sociedade

    dualista,

     ja é tempo de a literatura avang ar além das observagóes g erais

     de

    qu e elementos  de tradigáo e modernidade interagem d e  formas elaboradas,

    ~e part ir

     para

     a

     análise sistemática dessa

      interagáo e

     para

     a

     construgáo

     de

    um

      arcabougo

     analítico que capture as varias dimensóes de sua interagáo.

    .

      "Em geral, grande parte

     da

     crítica

      ao

      paradigma

     da

     sociedade dualista

    origina-se

     de

     urna

     perspectiva

     neomarxista,

     qu e

     focaliza

     as

     complexidades

      «̂— îi- "̂̂ —̂—

      ^

     , «

    w

    -~_^-~-~

    t

    ->^»__-'<

    envolvidas na articulagáo de modos de produgáo. Freqüentem ente, a critica

    abordou o problema a

     partir

     de urna ótica económica e internacional. Agora

    é  oportuno

      degagjegaj;.,Q  enfoque

      da

     sociedade

     dualista, partindo  de urna

    perspe ctiva que combine a preocupag áo com a economía e um foco sólido

    najnteraglQ .entrevárias^djmensóes   instUucionais, dentro da

     esfera

     política

    de um caso nacional.

    I N S T I T U i g O E S , P O L Í T I C A E E C O N O M Í A

    í

      17

    No

     contexto deste foco político interpretativo, é importante demonstrar

    como emergiram noyosjjpos de organizacóes políticas A sociáis, como se

    tornaram   institucionalizadas e qué'ímpacto causaram em grupos, resolu-

    980 de conflítos, padroes de intermediagáo de

     interesses

     e  governabilidade.

    Defendendo a relevancia do estudo das

      instituiqóes

      políticas,  Arthur

    Stinchcombe sugere que, ao responder á questáo sobre como as relagóes

    de  classe s ao

      agregadas

     n a

      sociedade, nao podemos olhar

      simplesmente

    para

     a

     esfera económica.

     A resposta

     "depende

      de

     como

     o

     sistema político,

    e nao a

     economía,

     as

     agrega".

    2

    A s

     instituigóes

     políticas desem penharam u m papel crucial na formagáo

    /de relagpes dg glasse e de padroes  de

     acumulagáo

     de capital, no processo

    ;  diTímplantagáo  de  urna  moderna ordem económica industrial no Brasil.

    Desempenharam tambera

      um

     papeljrucial  na

      manutengáo  e

      integragáo

    dentro de um marco  naciori5i7~de~muitas  relacóes  que nao  refletem  a

    *̂~~1~

    -•-,

    -•••̂

    1

     ... . ̂_ .̂̂ .̂ .~-.._^ ^ ^  *

    existencia de um m oderno modo de produg áo capitalista no país.

    No

     processo de

     adogáo

     do  capitalismo moderno,  o Brasil teve de criar

    muitas instituigóes novas em período de tempo relativam ente curto. Con-

    tradizendo os  diagnósticos  de  Weber  e  Polanyi, entretanto,

      nenj

      todas

    foram

     penetradas pela lógica

      impessoal

     das modernas

      relagóes

     de rnerca-

    déf. 'Esté processo de construgáo institucionaí, em meio a profun das

    mudangas económicas  e  sociais, constituí  o  foco deste  livro.  Proponho,

    aquí, um arcaboug o interpretativo para comp reender as relagóes entre

    sociedade e

     instituigóes políticas formáis

     no

     Brasil contemporáneo.

    A

     análise inicia-se

     c om

     urna discussáo

      das

     características

      do

     capitalis-

    mo em sociedades industriáis avangadas, em contraste com sociedades

    camponesas  e sociedades cap italistas periféricas e nao-industrializadas. O

    objetivo, obviamente,

     nao é

      rejficar  estes contrastes,

     mas tomá-los

      como

    ponto de partida para distinguir diferentes conjuntos de relagóes pos-

    sív^fs  é f i t T e  mt>dó  de  produgáo, padroes  de  agáo social  e  instituigóes

    políticas

      formáis,  e  ainda propor que existem quatro padroes  institucio-

    nalizados de relagóes ou "gramáticas" que

      estruturam

      os lagos entre

    sociedade e instituigóes formáis

      no

      Brasil: clientelismo,

      corporativis-

    mó,  insulamento burocrático e universalismo de procedimentos. Dos qua-

    ÍÍO,  apenas o último reflete claramente a lógica do moderno mercado

    capitalista.

    Vi»ifc"n

      i'"

    J

    '

    Após expor a estrutura teórica, realizo urna análise histórica dos fatores

    qu e contribuirán para a existencia desse quádruplo

     sistema institucional

    brasileiro.  No s  tres capítulos subseqüentes, mostró como  o corporativis-

    mo,

     o

     insulamento burocrático

     e o

     universalismo

     de

     procedimentos incor-

    poram-se ao clientelismo ja existente.

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    14/75

    18

    A

     G R A M Á T I CA

     P O L Í T I C A D O B R A S I L

    Me u argum ento é o de que a institucionalizagáo das quatro gramáticas

    progrediu

     d^

     maneira desig ual através

     do

     tempo,

      tomando-se

     como ponto

    de   partida  o prmteiro  governo

      Vargas

      (1930-45).  Na

      década

      de 30, a

    legislac_áo

      corgora_tivista

      surgiu como um esforzó para sejyiar  uma.soli-

    dariedade  social  e relagóes  pacíficas entre grupos  e  classes, onde nao

    tetiam

      lugar"

     a

     tradicional

     divisad  entre

     partidos

     políticos nem os erros da

    ordem  ecdñomicajiberal.

    Em

      1933

      o

     Brasil elegeu urna Assembléia Constituinte permeada pela

    representagáo

      corporativista. O reg ime de 1934 foi substituido por urna

    ditadura, e m

     1937,

      mas os

     dispositivos corporativistas estáo em vigor

      até

    hoje:

      náojcriaram

      a

     solidariedadjs^pcial

     entáo desejada, mas funcionaran

    como

      poderoso  instrumento de  controle  e  atrelamento  do  trabalho  ao

    Estado.

    No  período

     pós-30,

     um

     processo

     de centralizacáo eolítica desenvolveu-

    »V~

    .-.-- ~>_. S^ ..

    J

    í̂ *̂**

    H

    >*a*̂~*̂ ^ --aro

    se paral clámente

     a

     instaurado dos regulamentos corporativistas, retirando

    detestados

     e municipios quase todos os meios para o exercício dapojítica

    clientelísta

      e

      transformando

      o

      governo federal

      no

      mais poderoso ator

    pórtico

     da

     período.

    D e

      1937

      em

      diante, quando

      se  consolidou  a

      ditadura,

      as

      normas

    CQjpqrativistas  intensificaram-se,

      e fortaleceu-se  a centralizado. No en-

    tanto,

     centralizado

     e corporativismo nao conseguirán

    destruir

     o

      cliente-

    lismo.

      A o  contrario, geraram novos recursos para  su a  prática, recursos

    agora administrados pelo'govérnWfederal.  ""

    O  Estado Novo (1937-45) procurou também  alterar  as bases tradicio-

    nais  do  Estado brasileiro através  de  urna  r e f o r mad o j ie r v ico p ú b l i co

    baseada

     n o

     universalismo

      de

     procedimentos.

      O

     novo regime criou, ainda,

    um

      corpg_Jécnicp,

      isolado

      das

      disputas políticas, para

      assessorá-lo  na

    formulagáo

      de

     políticas.

     Um de meus

      objetivos nesse  livro

     é

     examinar

     o

    legado

     d a

     década

     de 30, no

      qual

     o

     corporativismo  constituí,

     s em

     dúvida,

    urna de suas parcelas mais importantes. A s tentativ as de  implantado tanto

    do universalismo de

     .procedimentos

      quanto do insulamento burocrático

    na o  foram

     t áo

      bem-sucedidas nem tiveram tanto apoio quanto os regula-

    mentos corporativistas.

    O

     regime democrático

     d e

     1946 emergiu quando

     urna da s

     novas gramá-

    ticas,

     o corporativismo, ja se encontrava e m pleno funcionamento  ao lado

    da antiga,

      o

      clientelismo.

      O s

      npvos  partidos políticos, criados  com

      a

    redemocratizagáo,

      fizeram  largo u so

     d o

     ciientelisrjl

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    15/75

    20

    A

     G R A M Á T I C A P O L Í T IC A D O B R A S I L

    Neste

     sentido, analiso o problema da articulaqao desta sociedade que se

    industrializa,   do ponto  de vista  de suas estruturas

     políticas

     e m  interac_áo

    com  a sua  transformacjáo  económica.

    N O T A S

    1.  Ma x  Weber, Th e  Protestant Ethic  and Spirit

      of   Capitalism;

      ver também  Karl

    Polanyi,

     Th e Great  Transformation;  e G eo rge Dalton, "Primitive, Arc ha ic an d Modern

    Economies:  Karl  Polanyi ' s  Contribution to Economic Anthropology and  Comparat ive

    Economies",

      Essays

      in

      Economic Anthropology, Dedicated

      to the

      Memory  of  Karl

    Polanyi.

    1.

     A r t h ur S t inchc omb e ,

     Economic So ciology ,

     p.247.

    CAPITULO 2

    T I P O S D E C A P I T A L I S M O , I N S T I T U I C Ó E S

    E

     AgÁo  S O C I A L

    Quatro principáis gramáticas definem as relajees Estado versus sociedade

    no  Brasil: clientelismo, corporativismo, insulamento bu rocrático e univer-

    salismo  de

      procedimentos.

      As institaicpesformaispodem operar Jjuma

    variedade; de

      modos,  segundo_uma_oujnais_gramáticas.

      G rupos sociais

    podem,

     igualmentejbasearsuas

     aqóes em consonancia com

     urna

     ou mais

    gramáticas.

    Para

     colocar a discussáo na perspectiva apropriada, este capítulo desen-

    volve-se em tres etapas. Primeiro, revé conceitos que tém sido utilizados

    na  discussáo das

     diferencias

     e similaridades entre as instituigóes formáis e

    O S  padroes de intermediagáo de interesses ñas modernas formagóes capi-

    ta¿istas fndustrializadás  e num á periférica  e semi-industrializada como  o

    Brasil. T ambém salienta

     o

     papeFcrucial desernpenhado pelo timing erñt|ue

    elementos  universais similares podem

      combinar-se

      para

      a gera^áo de

    diferentes resultados  sociais

     e políticos na

     perife ria nao-industrializada,

    *m

     comparagáo com o centro industrial. A pesar de as categorías de centro

    e periferia serem altamente agregadas  e  conterem, obviamente, enormes

    variaQÓes

     no seu

     interior,

     elas sao

     úteis como

     uní

     ponto

     de

     referencia

     inicial

    para introduzir os conceitos utilizados neste capítulo.

    ¡i

    Em segundo lugar,

      introduz

     o tema do clientelismo como um  compo-

    r

     I  nente distintivo

     de

     certas sociedades capitalistas. O clientelismo é contras-

    tadcTcom  o universalismo de procedimentos"9as sociedades capitalistas

    Industrializadas, através de urna

     distinc^áo

     entre "troca específica" e

     "troca

    generalizada"

      ña s

     sociedades  de mercado.  ~ ^

    1

      Finalmente, estabelece  um contraste entre o  corporativismo —   como

    Urna d as principáis característica1T9¥TóTmá~9é govemoTírasileira — e o

    clientelismo.  A   conclusáo  é a de que a  noció  do  clientelismo pode

    21

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    16/75

    22

    A

     G R A M Á T I C A P O L Í T I C A

     DO

     B R A S I L

    T I PO S D E C A P I T A L I S M O , IN S T I T U i g ÓE S E A C Á O S O C I A L

    23

    complementar com sucesso os esforgos dos estudiosos do corporativismo,

    preenchendo  varias lacunas aínda na o cobertas pelos  analistas.

    V A R I A N T E S  D E   C A P I T A L I S M O   E INST IT UYES

    O

      capitalismo

      é

      geralmente entendido como  um   modo

      de

     produgáo

      em

    que ajprogriedade

      e o

     controle

     dos meios de proíugáo  esfáó na máo da

    burguesía. Este

      mocfó

     de produgáo

     requeFaíxistenciá

     de um mercado de

    traBaího  íivre. Os p roprietários dos meios de  produgáo  compram no

    mercado a quantidade de trabalho necessário a producto de bens. Esta é a

    base de um conjunto de relagóes de classe em que capital e trabalho

    constituem dois polos necessários.

    1

    No  capitalismo moderno  a extraqáo de mais-valia é feita indiretamente.

    Nao

      existe o

     conflito

      armado da colheita nem a taxagáo direta do que é

    produz ido pelos trabalhadores. O cap italismo moderno

      na o

      faz uso de

    meios

      extra-económicos

      para

     a extragáo da

      parcela destinada

     a s

      fragóes

    dominantes, embora possa utilizá-los para reforqá-la.

    Di

    estra

    multiplicidade de grupos de  interesses.

    2

     No capitalismo moderno a ac,áo

    "concertada" de grup os de individuos depe nde de varios fatores, tais como

    posicáo

      do grupo na matriz da

      estratificacáo

      social, acesso ao uso de

    reoirsjDsjiolíticos,

      grau de

      satisfagáojias^necessidades^económicas,

      ar-

    ranjos dominantes para

     a

     agregagacTe interméTiíágaode interesses,

     e

      assim

    po r

     diante. A  situacjío de classe

      na o

      constitui base suficiente para a

     a§áo

    coletiva

      e para" o

     conflito político.

    3

      "'

    '""Üo

     ponto

     de

     vista

     político,

     alguns autores partem

     da

     hip ó tese

     de quej)

    liberalismo é o

     pompanheirojjplítico

     apropriado ao capitalismo moderno

    porque classe  e cidadaniá'sáo entidades  antagónicas  que o  liberalismo

    procura reconciliar através do "dominio público".  Sufrágioj;  cidadama sao

    os equ ivalentes políticos

      do

     mercado económico. Ja

     foi dito que a

     cidaoÉT

    niá constitui a principal revolugáo de nossa era. O "dominio pú blico", onde

    individuos funcionan como eleitores, como checks

     an d

     balancés'dó poder

    do Estado, como cidadáos,

      tem

      sido visto como

      urna

     conseqüéljcia  do

    funcionamento d o mercado económico livre . O  dominio público é o espago

    abstrato  onde

      as

     contradigóes  entre

      a

     lógica

      da

     producto  capitalista

     e as

    demandas

     d a

     sociedade

      sao

      reconciliadas.

    '~

      O  Estado moderno se transformou no p rimeiro detentor da  forc,a como

    um atributo de sua autoridade. A cons trugáo de  urna au toridade racional e

    territorialmente

      universal foi um fator-chave no desenvolvimento dos

    Estados capitalistas contemporáneos.

    4

      Esta autoridade foi desenvolvida

    através  de  varios tipos  de dominagáo que  marcaram progressivamente  a

    separado

     entre Estado e  sociedade. Históricamente houve concentrado

    de autoridade ñas  máos  do Estado, mas parcela razoável de autoridade

    permaneceu ñas máos das élites locáis. A industrializagáo e a mobilizagáo

    social erodiram a autoridad e local e ge raram um

     dominio

     publico nacional,

    onde

      os  individuos se relacionan

    un s

     c ornro

     outros'lfrom'TrEstado

      de

    maneira  impessoal

     e

     mais  individualizada.

    O

     dominio

     pú blico é regulado por

      normaste

      insjjtuie.óes

      bascadas

     n o

    universalismo

      de

     proced imen tos ,

     isto

      é,

     n orma s "que  podem

      ser

      formal-

    melitejiTiIIzadas por

      todos

     o s

     individuos

      dapolity,  ou a

     eles aplicadas,

      ao

    elegeremR epresentantes,  prótegefém-se cbní|a_abusos de poder pelo  Es -

    tado,

     testaren

    o poder  das  instituigóes formáis  e  fazerem  demandas  ao

    Estado.

      "Liberdade

      de

      exp_ressáo,

      liberdade de reuniáo e liberdade de

    impjensa_sáo   aspectos básicos da representagáo"  procedural' .  Quando

    essas  garantías de procedimento sao suprimidas, é extraordinariamente

    difícil para o povo form ular e exprimir seus interesses." O universalismo

    de procedimentos por si so nao garante a existencia da democracia, mas é

    umjde

     seus

     componentes cruciais.

    5

    D

      longo processo histórico d o desenvolvimento d a moderna sociedade

    capitalista

     na o

      somente representou urna

     revolugáo

     económica mas tam-

    bém  marcou  a

     redefinigáp

      do s padróes d e  relagóes sociais  e  políticas  no

    interior

     d os Estados-na$áo.  SignificoÜ  a

      reformulagáo

     das

     relacjóes

     entre

    individuos,  redefiníu instituic.óes básicas como a Igreja, a

      familia

      e a

    propriedade, reformulou o conceito de liberdade.

    6

    *•"  Esta "grande

      transformacáo",

      nao obstante, teve lugar apenas mima

    parte muito peq ueña do globo, aquela constituida pelas

     nagóes

     do noroeste

    da Europa  e dos  Estados  Unidos.

    7

      O s  termos "capitalismo moderno",

    "sociedades  democráticas"  e "civilizacáo ocidental"  estáo estreitamente

    relacionados   a essas nagóes. A s sociedades capitalistas do A tlántico Norte

    8§0 o

      produto

      de

      urna

      combinagáo de

      múltiplos fatores

      históricos

      e

    circunstancias

      conj

     un turáis  que, digamos assim, ajudaram a "congelar"

    um  conjunto

     de

     elementos cruciais para

     a

     criagáo

     d as

      sociedades demo-

    cráticas ocidentais.

    A s

     modernas sociedades cap italistas industriáis sao constituidas por:

     a)

    padráo distinto de

      autOTidaderacional

      baseada no universalismo de

    ¡edimentos;

     b) um

     p adráo dominante

     d e

     acáo social baseada

     n o

     ipdi-

    Blismo

     e no

     irnpersonalismo

     d e

     procedimentosrque repousa

     e m

     urna

    iiplicidade d e

     fragóes

      de

     classe, grupos

     d e status,

     pa rtidos políticos

      e

    ladania; c) urna economia de mercado baseada na transferencia impes-

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    17/75

    24

    A

     G R A M Á T I CA

     P O L Í T I C A  DO

     B R A S I L

    soal

     de recursos económicos, onde as trocas que ocorrem  independen da s

    características pessoais dos individuos envolvidos. Em  poucas palavras, o

    que chamamos de capitalismo

     moderno

     é um composto, urn a combinacjáo

    interconectados.

    Seria

      problemático utilizar

     a

     historia

     das

     sociedades

     capitalistas indus-

    triáis como um paradigma para prever o futuro das sociedades capitalistas

    periféricas,  náo-industriais ou semidesenvolvidas, porque o centro percor-

    reu

      estágios

      e

      patamares específicos

      a sua

     próp ria historia.

     A s

      combi-

    nac_óes,  isto  é, os  conjuntos  de  relagóes  entre  condi§óes económicas,

    estrulura social

      e

      arranjos  políticos

      qu e  ali

      ocorreram

      — e q u e

      sao

    résponsáveis pela  heterogerieidade no interior do

      próprio

      centro — nao

    seráo encontrados em outro lugar.

    Po r

     simples

     razóes

     probabilísticas, nenhuma perspectiva

     evolucionaría

    linear

     q ue

     tomasse

      o

     centro como paradigma

     poderla s er

     capaz

      de

     prever

    os desdobramentos

      históricos

      dos países nao-centrais:

      nestes, diversos

    fatores internos teriam que se repetir  da mesma maneira que no

     centro,

     e

    varios outros fatores internacionais, que

     constituirán

    o cenário para o

    desenvolvimento dos países centráis, teriam que estar novamente pre-

    sentes. Para complicar mais

     as

     coisas,

      o

     timing

     da

     combinagáo

     dos

     eventos

    deveria

     ser o

     mesmo.

    8

    Além  disso teria que existir urna

     condicjáo final

      impossível: os países

    centráis deveriam estar ausentes do mundo  atual  porque sua simples

    existencia n ao apenas altera

     o espado no qual os

     países periféricos devem

    subsistir, mas também  fixa  parámetros, incentivos e limites para

     esses

    países. Mesmo na porqáo do mundo a que me refiro, de modo simplificado,

    como  o "centro",  os que se

     industrializaran

    mais cedo determinaran a

    agenda para os que chegaram mais tarde. Comparando  a Inglaterra com as

    nagóes continentais por volta de 1848, William L anger concluiu "que todo

    o  continente,  co m a possível  excegáo da  Bélgica,  eslava

      urna

      geracjáo

    inteira atrás da Inglaterra".

     9

     Como afirma Bendix:

    A  historia  moderna tem  sido caracterizada  por  consecutivas

      revolucóes

      ou  res-

    tauragóes, e

      cada urna

     d estas transforma^óes

      inf luenciou

      a

      scguintc (.. .) Cada urna

    destas revolucpes

     ou

     restaurares

     fo¡

     u rna resposta

     co le t iva u

     condigóes

     in ternas e

    est ímulos externos. Cada urna teve

     repercussóes

     a lém d as  frontuiras d o país em que

    ocorreu. Após

     cada

     t ransfo rmagáo , o m u n d o m u d o u no sentido

     de

      Herácli to, de que

    nao

      é  possível

      banhar-se duas

      vfczes  ña s

      mesmas

      í iguas  de um

      rio.

      A

      par t i r

      do

    momento

      em que o r ei

      ing lés

      fo i

     destronado

      c o

      P a r l a m e n t o  declarado  supremo,

    outras

      m o n a r q u í a s  se

      to rnaram inseguras ,

      e a  idé ia  do  govcrno

      p a r l am e n t ar

      fo i

    lanzada.

      A

      par t i r

      do

      momento

      em que a

      industrializacfio

      fo i

      iniciada,

      outras

    economías se

      tornaram atrasadas.

      A  pa r t i r do momento em que a

      idéia

     d e

      igualdade

    TIPOS

     D E

     C A P IT A L I S M O ,

     INSTITUigÓES E AgÁO

     S O C I A L

    25

    Ibi

      proclamada peran te

     o

     mundo ,

      a

     desigualdade

     s e

     tornou

      um

      fardo  pesado  demais

    para  se

     carregar.

    1

    "

    Quando  o capitalismo  é  entendido como  um   pacote  de condigóes e

    relaqóes entre variáveis no contexto da producáo capitalista, torna-se

    possível

      falar

      de "variantes de capitalismo", que podem partilhar tragos

    similares, enquanto

     sao,

     ao

     mesmo lempo,

      profundamente diferentes

      urna

    da outra. " T ome-se, por exemplo,  as sociedades capitalistas náo-indus-

    triais ou semi-industrializadas. O que as separa do capitalismo moderno

    nlo  é  apenas  urna  defasagem  no

      lempo,

      ou  urnas poucas elapas

      numa

    hipolética escala

      de  modernizatjáo.

    O capitalismo industrial moderno e o capitalismo periférico podem ser

    t-íubstantivamente

      similares no que diz respeito a estrutura capitalista

    sica

      e, ao

     mesmo

      lempo,

      diferentes

     no que diz

     respeito:

     a) aos

      desdo-

    |i>ram"enlbs   históricos

      qu e

      produziram

      o

     cap ilalismo

      na

     pe riferia, como

    Sseqüéncia  de sua  exisléncia  no  cenlro;  b) aos  desdobramenlos his-

    (Nóricos

     — e o

     timing

     — d os

     conflilos

     e

     qqntradicpes existen

     tes na

     periferia

      tóíño  fungáo d a importancia relativa  de cada ator

     político principal;

     c) aos

    1

      ÍíÍTBíjos""polñicos

      que  foram estabelecidos para adminislrar  a  ordem

    CSpitálísfá,

      e os padróes de separaqáo, ou de integracáo, entre Estado e

    lOCiedade; d) aos padróes de

      agáo

     social e de orientacáo normativa dos

    hldivíduos

     como mem bros de diferentes classes, grupos ou

     facgóes;

     e) as

    distintas "passagens" que

     tiyeram lugar

     em

     cada sqciedade periférica

     e que

    ^wárárr?a*

    tl

    coñgeraT

    :

    '

    r

    ou recriar importantes aspectos daquela sociedade

    determinada;

      f)

      as características do processo de acumulado de capital.

    O entendimento do capitalismo como um pacote de

     condiqóes

      e re-

    lacpes deve incluir as característigasjio sistema  de propriedade e conlrole

    dos

     meios

     de

     producto, padróes^dejgao^social,  tipojde_a¡itQridade pública

    6 padróes de intermediagáo

     deinteresses. Este

     procedimento nao deixará

    Cspágo

      para

      a  díscussáo  do

      capitalismo periférico como  urna transigáo

    entre o tradicionalismo e o capitalismo moderno; dirigirá, ao contrario, o

    foco

      da análise para a

      combina§áo

      distinta e durável de elementos que

    firacterizam   urna sociedade específica em comparagáo com outras.

    12

    Á  nogáo  de

      combinado

      (e o  timing  desta

      combinado)

      é  crucial.

    Desdobrámentos  históricos  sao  lanío produlo

      daacmnuJ¿icjígJe_faíQ4:es

    íruturais

      como

      o

      sao

      de

      escolhas

     yirluais

      ou de

      "oportunidades  de,

    Ida".

    13

     CondÍ9Óes e slruturais forriecem

     o cenário, a "janela", para esco-

    5,

     coalizóes e

      resolugóés

     3e

     conflitos.

      Islo quer dizer que as condÍ5Óes

    aturáis similares, se exislem, podem produz ir diferentes resullados em

    ""Mes"distintas,  depenHendo  do padráo das  escoTRás  feitas  pelos

    cipais atores políticos. Urna

      "oporlunidade"

      estruturalmente  criada

  • 8/18/2019 Edson Nunes

    18/75

    26

    A  G R A M Á T I CA

     P O L Í T I C A

     DO

     B R A S I L

    nao

      garante nada. Oportunidades, para

      serem

      aproveitadas,

      devem_ser

    Semp re que ocorre

    urna transfOT rna^áojrnportante, urn a passagem

     —

     como

     a

     industrializaqao

    ou

     urna revolugáo pol í t ica— , ela exclui varias alternativas e abre inúmeras

    outras.

    15

      '

    Pensemos  na

     industrializado.

     E la  cria novas oportunidades para co -

    alizóes políticas assim como novos tipos

     d e

     conflitos, oferece novas bases

    para  a

     compe^áo política,

      mina  o  poder  das élites  fundiárias e  torna

    impossível pa ra elas governar de forma  oligárquica. A lém disso,

     promove

    a emergencia

      de

      novos atores coletivos.  Isto  significa que,

      ao mesmo

    tempo, a industrializagáo cria novas oportunidades  e evita a ocorréncia  de

    varias outras alternativas. Em qualq uer caso, os resultados políticos exis-

    tentes serio sempre

     o

     produto

     da combinado de

     varios f atores importan tes

    em dada

     seqüéncia

     temporal.

    No cascado

     Brasil,

     a

      industrializacjío

      leve

     lugar

     nu m

     contexto

     em que

    os grupos oligárquicos ja estavam

     enfraquecidos

     p or

     confrontos

     políticos,

    pélsraSpfesiáo" mundial no  final da década  de 20,  pela prejenc_ajÍ£jirna

    .ejSergstatal

     crescentemente forte e peía existencia de grupos comp etitivos.

      A

     emergencia

     de

     urna

     nova ordem

     na

     década

     de 30, e

     aínda

     mais nítidamen-

    te na década de 50, aconteceu na ausencia de

     urna

     faccjáo  Dominante,.he-

    gemónica. O