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2744 EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES: A PROPOSTA DAS VIVÊNCIAS COM A NATUREZA E A ATUAÇÃO DO PROGRAMA NÚCLEO DE ENSINO DA UNESP, CÂMPUS DE ROSANA/SP Fernando Protti BUENO, UNESP – Universidade Estadual Paulista Eixo 01 - Formação inicial de professores da educação básica Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD), Programa Núcleos de Ensino da UNESP [email protected] 1. Introdução A educação ambiental considerada e assumida, em linhas gerais, enquanto um campo de conhecimento e de práticas pedagógicas, inseridas em um contexto de relações entre a sociedade, a educação e o meio ambiente, tem ao longo do tempo buscado compreender a complexidade dos problemas socioambientais, bem como oferecer condições para fundamentar e subsidiar uma variada gama de intervenções sociais, posicionadas no campo da educação, na tentativa de promover transformações em distintas realidades ante as problemáticas ambientais globais e/ou locais (LIMA, 2011). Nesse sentido, o educador ambiental necessita atuar de maneira intensa sob a relação intrínseca entre ser humano e ambiente, de modo a ter clareza acerca da presença humana enquanto natureza e não apenas enquanto parte da mesma. Esse pensamento e essa visão holística corroboram com a perda de valor da dominação do ser humano sob a natureza, de modo a resultar em atitudes mais harmoniosas e equilibradas do ponto de vista socioambiental (GUIMARÃES, 2001). Com base na Política Nacional de Educação Ambiental, que institucionaliza a educação ambiental e estabelece diretrizes norteadoras a sua prática, a educação ambiental inserida no contexto escolar (educação ambiental no ensino formal), visa promover práticas educativas nos diferentes níveis de ensino (BRASIL, 1999). As escolas, prioritariamente as públicas por concentrarem a maior quantidade de público alvo abrangido, são consideradas enquanto espaços privilegiados para a prática de educação ambiental, dessa forma, se acentua o desafio em criar estratégias pedagógicas e metodológicas para o trabalho com educação ambiental (LIMA, 2011). Contudo, não basta buscar meios para a transmissão de valores ambientalmente adequados dos educadores aos educandos e sim meios que possibilitem aos educandos questionarem de modo crítico os valores pré-estabelecidos nesta sociedade. Portanto, se torna premente permitir aos educandos a construção de conhecimentos que os possibilite

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EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA ESCOLA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES: A

PROPOSTA DAS VIVÊNCIAS COM A NATUREZA E A ATUAÇÃO DO PROGRAMA

NÚCLEO DE ENSINO DA UNESP, CÂMPUS DE ROSANA/SP

Fernando Protti BUENO, UNESP – Universidade Estadual PaulistaEixo 01 - Formação inicial de professores da educação básica

Pró-Reitoria de Graduação (PROGRAD), Programa Núcleos de Ensino da [email protected]

1. Introdução

A educação ambiental considerada e assumida, em linhas gerais, enquanto um

campo de conhecimento e de práticas pedagógicas, inseridas em um contexto de

relações entre a sociedade, a educação e o meio ambiente, tem ao longo do tempo

buscado compreender a complexidade dos problemas socioambientais, bem como

oferecer condições para fundamentar e subsidiar uma variada gama de intervenções

sociais, posicionadas no campo da educação, na tentativa de promover transformações

em distintas realidades ante as problemáticas ambientais globais e/ou locais (LIMA,

2011).

Nesse sentido, o educador ambiental necessita atuar de maneira intensa sob a

relação intrínseca entre ser humano e ambiente, de modo a ter clareza acerca da

presença humana enquanto natureza e não apenas enquanto parte da mesma. Esse

pensamento e essa visão holística corroboram com a perda de valor da dominação do

ser humano sob a natureza, de modo a resultar em atitudes mais harmoniosas e

equilibradas do ponto de vista socioambiental (GUIMARÃES, 2001).

Com base na Política Nacional de Educação Ambiental, que institucionaliza a

educação ambiental e estabelece diretrizes norteadoras a sua prática, a educação

ambiental inserida no contexto escolar (educação ambiental no ensino formal), visa

promover práticas educativas nos diferentes níveis de ensino (BRASIL, 1999). As

escolas, prioritariamente as públicas por concentrarem a maior quantidade de público

alvo abrangido, são consideradas enquanto espaços privilegiados para a prática de

educação ambiental, dessa forma, se acentua o desafio em criar estratégias pedagógicas

e metodológicas para o trabalho com educação ambiental (LIMA, 2011).

Contudo, não basta buscar meios para a transmissão de valores ambientalmente

adequados dos educadores aos educandos e sim meios que possibilitem aos educandos

questionarem de modo crítico os valores pré-estabelecidos nesta sociedade. Portanto, se

torna premente permitir aos educandos a construção de conhecimentos que os possibilite

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a analisar, criticar e agir a partir da realidade que os cerca, bem como investir em

processos de formação de professores para que estes tenham meios de possibilitar aos

educandos seus processos de transformação (GUIMARÃES, 2001).

Baseados na pesquisa coordenada por Trajber e Mendonça (2007) sobre a

educação ambiental desenvolvida no ensino fundamental público brasileiro, Loureiro e

Cossío (2007) e Lima (2011) convergem para a expansão quantitativa da educação

ambiental inserida nos espaços escolarizados, bem como pontuam que a criatividade e a

riqueza das experiências desenvolvidas, prioritariamente estão concentradas em projetos

de ação, que objetivam em sua maioria sensibilizar para o convívio com a natureza,

perfazendo, desse modo, o que Cascino (2003) já mencionava sobre âmbito das práticas

pedagógicas na contemporaneidade, a qual tem situado práticas pedagógicas com o

ambiente, na tentativa de promover mudanças na relação homem-natureza, trata-se de

fato de uma reapropriação e reaproximação da natureza pelo homem.

Assim, o trabalho de educação ambiental em atividades extraclasse,

prioritariamente o de contato direto com a natureza, segundo Mendonça e Neiman

(2003), tem o potencial de modificar as formas de sentir e isso desencadeia o processo

de autopercepção, que consequentemente culmina com a ampliação e o conhecimento

de si e do mundo ao seu redor.

A partir desse contexto, buscou-se desenvolver um projeto de educação ambiental

na escola, intitulado ‘Vivências com a Natureza: sentir, pensar e agir’ e desenvolvido

entre os anos de 2013 e 2014 enquanto um dos projetos do Programa Núcleos de Ensino

da UNESP, que basicamente visava desenvolver ações de intervenção educativa e

processos de formação de professores em parceria com as escolas públicas. Nesse

sentido, o projeto foi desenvolvido pelo Curso de Turismo da UNESP, campus de Rosana

em parceria com a Escola Estadual Professora Maria Audenir de Carvalho, localizada no

Distrito de Primavera, município de Rosana/SP e basicamente se utilizou da proposta

das vivências com a natureza, a partir do uso da metodologia do aprendizado sequencial

(CORNELL, 1996; 1997; 2005; 2008), como forma de proporcionar um contato direto com

a natureza, tendo por finalidade contribuir à sensibilização e a ampliação da consciência

ambiental do público envolvido.

Em princípio, o projeto se propôs a realizar a formação inicial dos professores da

escola junto a essa proposta, o que incluía um processo de vivência com a natureza e

somente posteriormente realizar o processo vivencial junto aos discentes, sendo as

turmas participantes do projeto escolhidas perante critério da escola. Todo processo

vivencial seria desenvolvido na Estação Ecológica do Caiuá, unidade de conservação de

proteção integral, localizada no município de Diamante do Norte (PR), divisa com o

município de Rosana (SP).

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Sendo assim, o objetivo desse artigo é descrever a proposta de vivências com a

natureza, bem como discutir alguns dos resultados provenientes da formação inicial de

professores perante essa proposta, tendo como foco específico a realização destas

vivências.

A proposta desenvolvida se utilizou prioritariamente dos referenciais de Cornell

(1996; 1997; 2005; 2008), tanto em relação a execução das vivências, bem como no

aspecto de suporte teórico e metodológico da pesquisa que se fez presente. A coleta e

análise de dados se fez possível a partir de um processo de pesquisa-ação, que se

utilizou de um roteiro de observação sistematizado (MARCONI; LAKATOS, 2010)

desenvolvido com base nos pressupostos evidenciados no quadro do aprendizado

sequencial (quadro 01) e ordenado a partir de fatores comportamentais, atitudinais,

valorativos, perceptivos e afetivos, sendo este roteiro preenchido ao longo da execução

das atividades. Além deste, também se fez uso do registro fotográfico das atividades

realizadas, como forma de ilustrar as diferentes situações experienciadas pelos

professores e os supostos potenciais atingidos pela sensibilização. A partir da abordagem

qualitativa e do caráter exploratório e descritivo da pesquisa (LUDKE; ANDRÉ, 1986),

buscou-se explorar, analisar e aprofundar sobre as qualidades e as vantagens que o uso

da metodologia do aprendizado sequencial pode despertar no indivíduo durante um

processo de vivência com a natureza, sendo este tratado como uma das formas de se

desenvolver educação ambiental no contexto escolar. A análise dos dados gerados, tanto

pelas anotações realizadas durante as observações e no preenchimento do roteiro,

quanto das descrições dos registros fotográficos, foi realizada por meio de análise

descritiva (MARCONI; LAKATOS, 2010).

2. Educação ambiental na escola e vivências com a natureza

Ao considerar a educação ambiental, a partir dos preceitos da Conferência

Intergovernamental de Tbilisi, como “[...] um processo de reconhecimento de valores e

clarificação de conceitos, objetivando o desenvolvimento das habilidades e modificando

as atitudes em relação ao meio, para entender e apreciar as inter-relações entre os seres

humanos, suas culturas e seus meios biofísicos” (1977 apud SATO, 1999, p. 23-24),

parte-se do pressuposto de que a mera transmissão de informações e de conhecimentos,

tida por muitos como elementos base da educação, dificilmente consiga atingir o que se

preconiza nesta definição.

Ao vislumbrar a educação ambiental brasileira, institucionalizada por meio da

Política Nacional de Educação Ambiental (BRASIL, 1999), como um “componente

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essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma

articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo em caráter formal e

não-formal” e devendo ser desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua

e permanente, tanto para estudantes quanto para professores, verifica-se a oportunidade

de desenvolvimento de diferentes propostas que envolvam processos educativos

voltados à concepção de educação ambiental.

Assim, a partir do desenvolvimento de um projeto de ação, como forma de

inserção da educação ambiental no contexto escolarizado, permeado por atividades

extraclasse, inseridas no espaço não-formal de aprendizagem, se apresenta a proposta

de trabalho de ‘Vivências com a Natureza’ como forma de atuar com ensino e

aprendizagem de modo integral e em conjunto com a escola, a partir das realidades

globais e locais, e refletindo acerca de questões ambientais problematizadoras, porém de

modo lúdico, interativo e a partir do aspecto sensitivo, inserido no corpo, na alma e no

espírito, e ainda centrado no sentimento de amor desenvolvido entre educador e aprendiz

(MENDONÇA; NEIMAN, 2003).

Essa proposta está centrada e é desenvolvida a partir da metodologia do

aprendizado sequencial, desenvolvida por Joseph Cornell e considerada enquanto uma

metodologia original de educação ambiental que visa facilitar o aprofundamento e a

interação que os indivíduos podem ter em contato com a natureza, possibilitando o

aprendizado e o desenvolvimento de sentimentos e valores, necessários para uma

transformação social. Ao desenvolver o aprendizado sequencial (traduzido do inglês flow

learning), Cornell pensou em estabelecer e proporcionar uma melhor relação dos

indivíduos com a natureza, pois ao longo de suas experiências com a natureza percebeu

que havia um fluxo a ser trabalhado para que as atividades fossem mais produtivas, e,

assim, concluiu que as pessoas reagiam favoravelmente a uma determinada sequência,

em função desta se harmonizar aos aspectos da natureza humana (CORNELL, 1997;

2005).

A metodologia se baseia nos diferentes estágios que auxiliam os indivíduos a

alcançarem uma estrutura mental permitida pelo potencial de uma experiência direta e

profunda. Assim, o aprendizado sequencial tem o poder de auxiliar as pessoas a

esquecerem as suas preocupações, a partir da descontração, da diversão e da

apreciação da natureza, sugerindo que o aprendizado seja por inteiro (corpo e mente),

pois a metodologia é, ao mesmo tempo, pedagógica e terapêutica, sendo que diante do

processo de desenvolvimento dos estágios o indivíduo acalma a mente e realiza melhor

suas atividades, aprendendo a ouvir, a respeitar os outros e a refletir sobre suas

necessidades e seus desejos (CORNELL, 1997; MENDONÇA, 2000; 2006).

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Cornell (1997; 2005), então, considerou o aprendizado sequencial como uma

simples, porém, poderosa estratégia de ensino, que consiste na escolha de atividades

lúdicas adequadas, como dinâmicas e jogos, baseadas em princípios universais de

consciência e de educação vivencial, organizadas e direcionadas perante uma sequência

de 04 estágios – despertar do entusiasmo; concentrar a atenção; experiência direta; e

compartilhar a inspiração – desenvolvidos de forma sutil, gradativa e divertida, com a

intenção de criar um fluxo de energia, que vá de um estado de maior agitação para um

estado de maior concentração da atenção e envolvimento, sendo que esses estágios

fluem de um para o outro de maneira suave e natural, e o indivíduo ao passar pelos

diferentes estágios, alcança as estruturas mentais proporcionadas pelas experiências

diretas e profundas com a natureza (Quadro 01).

Quadro 01 – Qualidades e vantagens dos estágios da metodologia do aprendizado sequencialFonte: adaptado a partir de Cornell (1997, p. 46-47)

Cornell (1997; 2008) explica que o estágio 1 - ‘Despertar o entusiasmo’ - é

marcado pela diversão e pelo desenvolvimento de atividades que geram um intenso fluxo

de energia, no sentido de haver um crescente interesse por aquilo que está sendo feito.

No estágio 2 - ‘Concentrar a atenção’ -, busca-se conduzir o entusiasmo na direção de

uma atenção mais refinada, sendo que somente assim será possível perceber a natureza

e, ao mesmo tempo, dispor de calma, atenção e entusiasmo. No estágio 3 - ‘Experiência

direta’ -, o intuito é levar o indivíduo a experimentar o contato direto com a natureza, abrir

o coração das pessoas e intensificar um ou mais sentidos, para que os participantes

possam descobrir um íntimo e profundo sentimento de pertencimento e compreensão.

Por fim, no estágio 4 - ‘Compartilhar a inspiração’ - é o momento em que os integrantes

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do grupo estão calmos, alegres e sensíveis a ouvir e contar (compartilhar) suas estórias,

seus sentimentos, suas emoções etc.

Mendonça (2007, p. 119) infere ainda que o processo educativo proporcionado

por meio de ‘vivências’ “[...] considera os indivíduos de forma integral, incluindo e

priorizando o aprendizado através do corpo, dos sentidos e da percepção mais sutil de si

mesmos, dos outros, do mundo, da natureza, e dos processos vitais que dão origem e

sustentam a vida [...]”.

Portanto, como fundamentos dessa metodologia há a crença de que o

aprendizado efetivo deva incluir e, por vezes até priorizar, a vivência e a experiência,

sendo que apenas as transmissões de informações, por mais importantes que sejam não

são suficientes para promover o aprofundamento, o enraizamento e o estímulo às

mudanças de comportamentos. Com isso, afirma-se que o contato com a natureza

realizado por meio de um processo educativo que atenda a esse fluxo de energia

possibilita o alcance dos objetivos da educação ambiental – o desenvolvimento da

consciência (processo de sensibilização e conscientização), por meio da clarificação de

novos valores e atitudes (MENDONÇA, 2006; 2007).

3. Resultados e discussões

O processo de formação inicial dos professores na proposta das vivências com a

natureza compreendia a realização de reuniões para apresentação do projeto, da

proposta e promoção de discussões em torno desta, uma palestra junto a Rita Mendonça

(representante da Sharing Nature Brasil), bem como as vivências com a natureza.

Esse processo inicial (apresentação e palestra) procurou detalhar e explicitar a

proposta das vivências com a natureza, bem como envolver os professores, buscando

nisso, um embasamento que culminaria com a realização de vivências com a natureza,

tendo estas a finalidade de levar os professores a sentirem e perceberem as qualidades e

vantagens oriundas dessa proposta.

O desenvolvimento do projeto somente teve início em junho de 2013, após sua

aprovação no órgão da instituição e assim levou a uma reorganização de sua forma de

execução junto a escola. Nesta, em acordo junto aos Coordenadores dos ensinos

fundamental e médio, e Diretores da escola, definiu-se que a apresentação oficial do

projeto aos professores ocorria em duas reuniões de ATPC (manhã e tarde) a serem

realizadas no mês de agosto, as quais participaram 26 professores (de um todo de cerca

de 60 professores).

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Nestas reuniões de apresentação do projeto, evidenciou-se a pretensão do projeto

realizar um processo formativo vivencial, o qual pretendia ser desenvolvido com três dias

de duração (supostamente em um final de semana) e em local isolado, e imerso a

natureza, utilizando-se para isso da Estação Ecológica do Caiuá. Contudo, em virtude da

dificuldade de interesse e disponibilidade dos mesmos, se interessaram de modo mais

acalorado e se disponibilizaram a participar desse processo vivencial apenas 09

professores.

Além disso, como forma de envolver os professores e conectá-los ainda mais a

proposta das Vivências com a Natureza, em setembro de 2013 realizou-se uma palestra

virtual (em função da distância e custo no deslocamento), nos dois horários da ATPC

(manhã e tarde), com Rita Mendonça, que é educadora e representante da Sharing

Nature no Brasil (organização com sede nos EUA que atua e difunde a metodologia do

Aprendizado Sequencial de Joseph Cornell), contando com a participação de 26

professores.

Devido a uma série de empecilhos, dentre estes a disponibilidade dos

professores, bem como a necessidade de buscar envolver o maior quantitativo possível

junto ao projeto, as vivências com a natureza junto ao grupo de professores da escola,

foram realizadas somente no ano de 2014, tanto no período da manhã quanto no

período da tarde, e o qual se utilizou exclusivamente do horário de ATPC (cerca de 02

horas, que compreendeu desde o trajeto em ônibus de ida e retorno a escola até o

período de vivência em si), de modo a conseguir envolver uma amostra de 33

professores (sendo que destes, alguns poucos não haviam participado das reuniões

iniciais, bem como da palestra) de um universo de cerca de 60 professores. Esta vivência

se utilizou de uma área natural localizada em meio ao ambiente urbano da cidade

(distante cerca de 01 quilômetro da escola), muito procurada para diferentes usos, que

compreendia um espaço formado por uma extensa área gramada com árvores, tendo ao

seu lado um grande bosque de eucaliptos. Trata-se de uma área de fácil acesso, uso

múltiplo e com grande interferência urbana, mas, que ainda sim mantém a possibilidade

de um contato intenso e profundo com a natureza.

Em relação às vivências realizadas, sem distinção ao grupo de professores

participantes (manhã e tarde), buscou-se basicamente realizar as mesmas atividades

dentre um rol de atividades disponíveis e possíveis para cada estágio do aprendizado

sequencial de Cornell (1996; 1997; 2005; 2008), de modo que assim, seria possível

proceder a uma análise sobre as qualidades e as vantagens de cada atividade ou do

estágio como um todo a cada um dos grupos. Esse suposto roteiro de atividades (tabela

01), passível de ser alterado mediante uma série de fatores, mas também pelo fato do

educador achar mais conveniente perante ao estado de espírito do grupo participante, foi

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idealizado levando-se em conta alguns elementos como: prioritariamente os potencias

descritos por Cornell (2005; 2008), e, posteriormente o espaço físico a ser utilizado, o

tempo disponível, a quantidade de público participante, entre alguns outros.

Estágio 1 Estágio 2 Estágio 3 Estágio 4Que animal sou eu? Duplicação Trilha cega Poema dobrado

Encontre alguém que... Trilha de surpresas Encontre a árvore Meditação com a naturezaArca de Noé Senhor dorminhoco Personificar uma árvore

Corvos e corujas Passeio da lagarta Máquina fotográficaMorcego e mariposas Caminhar descalço Caçada imóvelJogo da identificação

EncadeamentoTabela 1 – Atividades propostas para o roteiro de vivências com a natureza

Fonte: própria

Nos dois grupos de professores, foi possível notar certa facilidade em se atingir os

resultados almejados pela proposta das vivências com a natureza, contudo, ainda sim

também foi possível notar que alguns fatores externos à proposta, de certo modo,

puderam interferir no planejamento, execução ou no próprio resultado das atividades,

ainda que não fosse possível mensurar seu grau de intervenção. Destes, pode-se citar,

por exemplo, o fato de alguns professores terem participado da vivência somente devido

a insistência da coordenação da escola, o que o colocava em uma situação de

desconforto e/ou desinteresse; a demonstração de apatia e certa vergonha em participar

das ou de algumas atividades, principalmente as que exigiam maior expressão corporal,

apesar de se visualizar em alguns certa facilidade nas expressões gestuais e corporais;

em específico, um dos grupos abusou da realização de brincadeiras de duplo sentido ao

longo das atividades desenvolvidas; a apresentação de maior dificuldade de

concentração, supostamente devido as preocupações com os afazeres cotidianos

(acadêmicos, profissionais e pessoais); e certa dificuldade em proporcionar silêncio em

alguns momentos, já que alguns indivíduos aparentavam ter a necessidade de falar e

assim poder chamar a atenção dos demais membros do grupo.

Sem distinção aos grupos, alguns dos principais pontos a serem destacados são:

a forma como alguns indivíduos e/ou grupos encaravam algumas das brincadeiras, de

modo a extrapolar estas ao nível de uma acirrada competição (mesmo que estas não

tivessem este intuito); a questão da limitação e/ou restrição ao sentido da visão, a qual o

uso de vendas em algumas atividades causava extremo desagrado, bem como certa

aflição, assim como proporcionava ainda as diferentes formas de ver e de se relacionar

com a natureza, como, por exemplo, a trilha ou o caminho sendo percorrido com e sem a

venda; e as distintas formas de demonstração de afeto, carinho, cuidado, respeito,

atenção, compaixão e solidariedade para consigo, com o outro e com a natureza.

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Em específico, nas atividades do estágio 01 e dentre estas, principalmente em

‘Arca de Noé’, foi possível observar que os professores se sentiram levemente

desconfortáveis em precisar imitar gestos de animais para que pudessem encontrar seus

pares. O mesmo não foi possível de se observar em ‘Que animal sou eu?’, no qual

também precisavam interagir entre si, contudo, a partir da fala e da observação sobre a

figura de um animal fixada em suas costas. Já na atividade ‘Morcego e mariposa’ se

atingiu o ápice do envolvimento, bem como do entusiasmo, já que mesmo os indivíduos

que participavam vendados e, com isso, demonstravam algum receio quanto ao

deslocamento no espaço proposto, ainda sim, mantiveram um elevado grau de interação

e divertimento, configurando os elementos necessários ao avançar para o próximo

estágio.

No estágio 02, as atividades ‘Duplicação’ e ‘Senhor Dorminhoco’, apesar de

diferentes entre si e realizadas uma com cada grupo, possibilitaram aos presentes

concentrar o foco de atenção aos elementos propostos, de modo a acalmar o entusiasmo

anteriormente gerado. Isso os estimulou a participação na atividade ‘Passeio da lagarta’,

a qual por ser realizada com todos participantes vendados, possibilitou aos presentes a

geração de certo desconforto, medo e insegurança. Por outro lado, por serem guiados

pelo educador, bem como estarem todos conectados entre si pelo apoio dos braços

também estimulou os laços de confiança e de atenção/preocupação com o ambiente ao

seu redor.

Já no estágio 03, na continuidade da atividade ‘Passeio da lagarta’, foi realizada a

‘Trilha cega’, que consistia em percorrer sozinho e vendado uma trilha, sendo apenas

guiado por um barbante. Nesta, pode-se observar a elevação do desconforto, do medo e

da insegurança, principalmente por agora caminharem sozinhos. Por outro lado, estes

sentimentos permitiram aos professores se estimularem a partir do tato e da audição, na

tentativa de descobrirem e reconhecerem o espaço percorrido, bem como a composição

do ambiente ao seu redor, promovendo assim parte da experiência em contato direto com

a natureza. Nesse sentido, a atividade ‘Encontre a árvore’ trouxe um aprofundamento do

sentimento de pertencimento e compreensão, especificamente no momento em que se

tem o contato direto com a árvore, bem como no momento de retorno e reconhecimento

da árvore, a qual se desvela em uma relação íntima e profunda.

Por fim, o estágio 04 foi marcado pela realização de apenas uma atividade, a

‘Meditação com a natureza’, na qual cada um dos professores escolheu aleatoriamente

uma frase, que os remetia a relação entre sociedade, ser humano e natureza, e, a partir

disso, buscaram um espaço específico e por lá estiveram pensando por cerca de 10

minutos sobre o significado daquela frase para cada um deles ou para a realidade que os

cercava. Ao final da meditação, no momento de compartilhar a inspiração, cada um dos

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professores fez questão de ler suas frases e explicar seu entendimento e seu

posicionamento diante daquilo. Em geral, seus posicionamentos os remetiam a uma

relação mais equilibrada e harmônica com a natureza.

Em geral, dentre os grupos dos professores foi possível notar além de uma maior

participação e envolvimento, um maior engajamento junto as atividades dos estágios de

experiência direta e de compartilhar a inspiração, respectivamente os estágios 3 e 4 da

proposta de vivências com a natureza. Os professores pareciam mais confortáveis com

algumas situações, dentre estas a externalização, principalmente via oralidade, dos

sentidos, dos sentimentos e dos pensamentos que os permeavam aquele momento.

4. Considerações

Diante do exposto, considera-se que as vivências com a natureza realizadas a

partir da metodologia do aprendizado sequencial, neste caso em específico junto ao

Projeto Núcleo de Ensino da UNESP, tem se mostrado para além de uma simples

estratégia pedagógica, podendo ser considerada enquanto um recurso metodológico

flexível e adaptável a diferentes contextos, escolarizados ou não escolares, que por meio

de práticas realizadas no espaço não-formal tem possibilitado a sensibilização e a

ampliação da consciência ambiental, passível, então, de ser vislumbrada como uma

forma de educação ambiental a ser inserida na escola, bem como no processo de

formação inicial ou continuada dos professores, na tentativa de buscar o envolvimento e

a solução de problemáticas socioambientais que se apresentam, especificamente a partir

da interação e do aprofundamento em relação ao contato com a natureza, tanto física

quanto humana de cada indivíduo abrangido.

Sendo assim, pelas vivências com a natureza serem consideradas como uma

forma de interação e de contato direto e profundo com a natureza, por meio da qual se dá

o aprendizado a partir de um aspecto sensitivo, inserido no corpo e na mente dos

indivíduos que vivenciam os aspectos relativos à natureza (física e humana) e, com isso,

podem apreender sobre si, sobre os outros e sobre a sua relação com o ambiente, de

modo a produzir conhecimento, no campo da educação ambiental, esta consiste, então,

em uma proposta de experimentação de conceitos de observação das emoções, dos

sentimentos e dos pensamentos, com o objetivo de contribuir para com as relações dos

indivíduos consigo, com o outro e para com o meio ambiente, bem como com a

ampliação da consciência ambiental, algo considerado enquanto essencial, inclusive na

formação de professores, para o trabalho com a educação ambiental na escola.

2754

Em geral, é possível considerar que as vivências, independente dos grupos

trabalhados, realmente tem potencial de imergir os indivíduos com a natureza e isso se

deve prioritariamente aos estágios e as brincadeiras idealizadas por Cornell, as quais

atreladas a escolha, a sequência e a forma de condução, bem como ao local de natureza

conservada e o interesse e envolvimento dos participantes, possibilitam uma real

sensibilização e o início de um processo de ampliação da consciência humana e

ambiental.

Nesse sentido, considerou-se que a experiência de vivências com a natureza

realizada junto aos professores da escola, enquanto um processo de formação inicial,

proporcionou aos mesmos uma possibilidade de imersão e (re)integração com a natureza

de modo a contribuir com a formação pessoal e profissional, prioritariamente em relação

as mudanças de valores, comportamentos e atitudes.

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