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A História em 40 anos.
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Em 23 de dezembro de 2008, a Eletrosul, subsidiria da Eletrobrs e vinculada ao Ministrio de Minas e Energia, completa 40 anos. Ao longo desse perodo, o
nome da empresa mudou e voltou a mudar, assim como ela prpria em episdios
cujas marcas, tristes ou felizes, ficaram em sua histria e esto retratados nas p-
ginas deste livro. Uma histria que deixou marcas, mas que tambm impulsionou
a empresa a ser o que hoje: slida, rentvel e com um grande futuro pela frente.
Quarenta anos apenas o comeo.
ELETROSUL 40 ANO
S eletrosul 40 years 1968-2008
ELETROSUL 40 ANOSeletrosul 40 years
On December 23, 2008, Eletrosul, a subsidiary of Eletrobrs under the auspices of the Ministry of Mines and Energy, celebrates its fortieth anniversary. Throughout
these years, the companys name has changed and changed again. It has been
through good times and hard times, all of which have marked its history, as the
pages of this book recapture. It is a history that has left its mark, but has also
made the company what it is today: solid, profitable and with a bright future
ahead. Life, as they say, begins at 40.
ELETROSUL 40 ANOSeletrosul 40 years
ELETROSUL CENTRAIS ELTRICAS S.A.
Diretoria executive board
Diretor-Presidente Ceo Eurides Luiz Mescolotto
Diretor de Engenharia Director of Engineering Ronaldo Dos Santos Custdio
Diretor de Operao Director of Operations Antonio Waldir Vituri
Diretor de Gesto Administrativa e Financeira Director of Administration and Finance Paulo Afonso Evangelista Vieira
Conselho de Administrao supervisory board
Valter Luiz Cardeal de Souza Presidente Chairmain
Eurides Luiz Mescolotto
Antonio Machado de Rezende
Cludia Hofmeister
Maurcio Muniz Barreto de Carvalho
Paulo Altaur Pereira Costa
Conselho Fiscal fiscal boarD
Snia Regina Jung
Maria Carmozita Bessa Maia
Odair Luiz Andreani
FOTOGRAFIAS DA CAPA COVER PHOTOS
Vista das obras da usina hidreltrica Passo So Joo. Acervo Eletrosul
Passo So Joo hydroelectric power plant under construction. Eletrosul archive
Vista geral da usina termeltrica Jorge Lacerda. Acervo Eletrosul
View of Jorge Lacerda thermoelectric power plant. Eletrosul archive
Montagem dos condutos forados da usina hidreltrica Salto Santiago, em 1978. Acervo Eletrosul
Assembling the penstocks for Salto Santiago hydropower plant in 1978. Eletrosul archive
Posse do primeiro presidente da Eletrosul, Mario Lannes Cunha ( esq.), em 1968. Acervo Eletrosul
The first Eletrosuls CEO, Mario Lannes Cunha (left), takes office in 1968. Eletrosul archive
Torre da linha de transmisso Biguau-Palhoa. Acervo Eletrosul/Ansio Elias Borges
Pylon for Biguau-Palhoa power line. Eletrosul archive/Ansio Elias Borges
Centro de Operao do Sistema Eletrosul (Cose). Acervo Eletrosul
Eletrosul Operations Center. Eletrosul archive
Subestao Santo ngelo (RS), em 2006. Acervo Eletrosul
Santo ngelo substation (RS) in 2006. Eletrosul archive
Trabalhadores na construo do canal de aduo de Jorge Lacerda I, em 1959. Acervo Eletrosul
Workers building the approach channel for Jorge Lacerda I in 1959. Eletrosul archive
ELETROSUL 40 ANOSeletrosul 40 years
centro da memria da eletricidade no brasil
rio de janeiro, 2008
edio published by centro da meMria da eletricidade no Brasil 2008
Presidente President Mario Penna Bhering
Diretora-Executiva Executive Director Marilza Elizardo Brito
Coordenadoria do Centro de Referncia Reference Center Coordinator Solange Balbi Cerveira Reis
Coordenadoria de Pesquisa Research Coordinator Ligia Maria Martins Cabral
Coordenadoria de Comunicao Communications Coordinator Liliana Neves Cordeiro De Mello
Coordenadoria de Administrao Administration Coordinator Carlos Henrique Da Silva
MEMRIA DA ELETRICIDADE
Coordenao General Coordinator Ligia Maria Martins Cabral
Edio de Texto (Captulos 1 a 4) Copy Editing (Chapters 1 to 4) Eliane Azevedo
Texto Preliminar e Entrevistas Preliminary Copy and Interviews Maria Letcia Correa
Transcrio das Entrevistas Transcription of Interviews Maria Izabel Cruz Bitar
Pesquisa Documental Document Research Suzana Cesa e Maria Letcia Correa
Pesquisa Iconogrfica Picture Research Suzana Cesa
Copidesque Copydesk Magda de Oliveira Carlos Cascardo
Traduo Translation Rebecca Atkinson
Normatizao Bibliogrfica Bibliographical Standardization Leandro Pacheco de Melo
Digitalizao e Tratamento de Imagens Digital Image Processing Leila Lobo de Mendona
Projeto Grfico e Editorao Eletrnica Graphic Design and Desktop Publishing Liliana Neves Cordeiro de Mello
ELETROSUL
Superviso Supervision Adriana Haas
Edio de Texto (Captulos 5 e 6) e Entrevistas Copy Editing (Chapters 5 and 6) and Interviews Adriana Haas
E37
Eletrosul 40 anos : 1968-2008 = Eletrosul 40 years / [coordenao] Ligia Maria Martins Cabral. Rio de Janeiro : Centro da Memria da Eletricidade no Brasil, 2008.192p. : il. ; 28 cm.
ISBN 978-85-85147-78-5 Texto em portugus e ingls.
1. Eletrosul Centrais Eltricas - Histria. 2. Energia eltrica Brasil Histria. I. Cabral, Ligia Maria Martins. II. Centro da Memria da Eletricidade no Brasil.
CDD 338.762131
Em 23 de dezembro de 2008, a Eletrosul Centrais Eltricas S.A., subsidiria da Eletrobrs e vinculada ao Ministrio de Minas e Energia, completa 40 anos. Ao longo desse
perodo, o nome da empresa mudou e voltou a mudar, assim como ela prpria em epis-
dios cujas marcas, tristes ou felizes, ficaram em sua histria e esto retratados nas pginas
deste livro.
A Eletrosul atua como transmissora e geradora de energia eltrica nos estados do Rio Gran-
de do Sul, Santa Catarina, Paran e Mato Grosso do Sul atendendo cerca de 29 milhes
de pessoas em uma regio que representa 18,1% do mercado nacional de energia eltrica
e produz 19% do Produto Interno Bruto (PIB). Recentemente, a empresa expandiu sua rea
de atuao ao vencer, em parceria, o leilo para a concesso da usina hidreltrica Jirau, que
ser construda no rio Madeira, em Rondnia. Com isso, passa a ter 16 empreendimentos
em gerao de energia sendo implantados, entre hidreltricos e elicos.
Alm dos empreendimentos em gerao, a empresa segue investindo no reforo e na ex-
panso do sistema de transmisso, seja em empreendimentos prprios ou em parcerias
(modalidade na qual vem obtendo conquistas tambm na gerao). Esse perodo de cres-
cimento, o mais forte da histria da empresa, est ligado ao que ocorre no pas, que regis-
tra crescimento e investe em obras como as do Programa de Acelerao do Crescimento
(PAC), do qual fazem parte diversos empreendimentos da Eletrosul.
Graas a esse trabalho, a empresa vem obtendo uma srie de prmios (entre eles o de me-
lhor empresa de energia eltrica do pas pelo quarto ano consecutivo, concedido pela revis-
ta Isto Dinheiro) e o reconhecimento de seus clientes, os quais tm manifestado elevados
ndices de satisfao nas pesquisas realizadas nos ltimos anos na mais recente delas, o
ndice de satisfao com a Eletrosul foi de 91,7%.
Muita histria para contar
Mas no apenas com a ampliao de suas instalaes que a Eletrosul est preocupada.
Consolidadas em um Programa de Gesto Ambiental, diversas aes voltadas ao meio
ambiente vm sendo realizadas, tanto internamente, promovendo a conscientizao das
pessoas que tm ligao com a empresa, quanto externamente, minimizando os impactos
ambientais provocados pelos empreendimentos. Da mesma forma, as aes sociais mobi-
lizam tanto o pblico interno (com iniciativas da prpria empresa ou da ONG Transmisso
da Cidadania e do Saber, formada por empregados) quanto as comunidades em que a Ele-
trosul atua.
A histria da Eletrosul, como no poderia deixar de ser, est diretamente ligada histria
do pas. Da decorre a alternncia dos perodos de crescimento e investimentos em gran-
des obras com os de recursos escassos, estagnao, paralisao de empreendimentos e
a privatizao, em 1998, de todo o parque gerador da empresa. Uma histria que deixou
marcas, mas que tambm impulsionou a empresa para ser o que hoje: slida, rentvel e
com um grande futuro pela frente. Quarenta anos apenas o comeo.
A DIRETORIA
sumrio contents
O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) ...............................................................................9Electricity Industry under State Control (1960-1968)
o comeo da empresa (1969-1973) ..............................................................................................27Early Years (1969-1973)
A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980) ...................................................................................... 47Years of Consolidation (1974-1980)
A CRISE DO SETOR: A DCADA PERDIDA (1981-1989) ......................................................................... 73Crisis in the electricity sector: the lost decade (1981-1989)
A privatizao e a sobrevivncia da empresa (1990-2002) ............................................................. 95Privatization and survival (1990-2002)
De volta gerao, uma empresa que brilha (2003-2008) .......................................................... 119A Return to Generation and a Bright Future (2003-2008)
VERSO EM INGLS English translation ........................................................................................... 141
Anexos ANnEXes ........................................................................................................................... 175pRESIDENTES DA ELETROSUL (1968-2008) ELETROSULS CEOS (1968-2008)DIRETORES DA ELETROSUL (1969-2008) BOARD OF DIRECTORS (1968-2008)INSTALAES DA ELETROSUL ELETROSULS INsTALlATIONS
Referncias bibliogrficas bibliographical references ................................................................. 184
8 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
O setor eltrico sob o signo estatal 1960-1968
10 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
O PRESIDENTE JOO GOULART (1961-1964) NA CERIMNIA DE
CRIAO DA ELETROBRS, EM 11 DE JUNHO DE 1962: O SETOR
ELTRICO GANHAVA UMA HOLDING ESTATAL
Nos ltimos quarenta anos, a Eletrosul Centrais Eltricas (Eletrosul) foi pro-tagonista de significativos momentos da histria do setor eltrico no Brasil. Criada, a princ-
pio, para fortalecer a gerao e a transmisso de energia no Sul do pas a partir do comando
estatal, a Eletrosul viveu uma fase de expanso e pujana, experimentou o sabor amargo
da crise econmica dos anos 1980 e tornou-se uma experincia nica de privatizao de
empresa federal do setor, quando teve seu parque gerador vendido.
De volta ao segmento de gerao de eletricidade em 2004, a Eletrosul um caso
exemplar de reafirmao e reconstruo de identidade corporativa uma empresa que ja-
mais deixou de acreditar em sua prpria eficincia, na capacitao do pessoal que formou
ao longo de sua atividade, e em seu papel no mercado de energia eltrica brasileiro.
Para se entender a trajetria da Eletrosul, necessrio remontar a duas dcadas antes
de sua criao, quando o setor eltrico no pas comeou a se modificar em forma e conceito.
At o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o parque gerador eltrico brasileiro
se desenvolveu ancorado, basicamente, na iniciativa privada, especialmente em duas em-
presas de capital estrangeiro: a canadense Light e a norte-americana American and Foreign
Power Company (Amforp).
O quadro comeou a mudar quando, du-
rante o conflito, o governo do Estado Novo
(1937-1945) implementou uma poltica de
substituio de importaes e de apoio
industrializao. O congelamento das tari-
fas de energia eltrica, adotado nos anos
de guerra, e o ambiente pouco acolhedor
para o capital estrangeiro, em um governo
claramente estatizante, no estimulavam
as empresas privadas a crescerem no ritmo
necessrio para o programa governamental
de industrializao do pas.
As primeiras iniciativas do poder p-
blico na gerao de eletricidade tiveram ACE
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ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 11
motivao regional. A primeira delas foi a criao, em 1943, no Rio Grande do Sul, da Co-
misso Estadual de Energia Eltrica (CEEE), com o objetivo de montar um sistema interli-
gado de usinas hidreltricas e termeltricas. A CEEE elaborou, em 1945, o primeiro plano
de eletrificao estadual do pas. Em 1963, foi transformada na Companhia Estadual de
Energia Eltrica, uma sociedade de economia mista.
O governo federal passou a atuar mais decididamente no setor em 1945, quando sur-
giu a Companhia Hidro Eltrica do So Francisco (Chesf). Ao longo da dcada de 1950,
os governos estaduais foram constituindo suas empresas de energia eltrica, enquanto no
plano federal era criada a Central Eltrica de Furnas, em 1957. Essas empresas, porm,
atuavam de forma isolada, sem um planejamento integrado que permitisse mapear e ana-
lisar os recursos hdricos do pas, e operar um sistema que contemplasse as necessidades
nacionais como um todo.
Na dcada seguinte, assistiu-se a uma mudana radical de perfil do setor, que nos qua-
renta anos posteriores floresceria sob o signo estatal. Em 1960, era criado o Ministrio das
Minas e Energia (MME) e, em junho de 1962, instalava-se oficialmente, aps muitos deba-
tes, a Centrais Eltricas Brasileiras (Eletrobrs), a holding federal de energia eltrica.
A nova empresa passou a gerir os recursos do Fundo Federal de Eletrificao (FFE) e
da carteira de aplicaes do governo federal em empreendimentos do setor eltrico, que
at ento tinham estado sob a responsabilidade do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econmico (BNDE). Ainda nos anos 1960, aportes de capital da Eletrobrs permitiram o
reforo da participao da holding nas chamadas empresas associadas dez concession-
rias estaduais , alm de garantir o controle de quatro subsidirias: Chesf, Furnas, a Com-
panhia Hidroeltrica do Vale do Paraba (Chevap) criada pelo governo federal em 1961 e
a Termeltrica de Charqueadas (Termochar), no Rio Grande do Sul.
Em outubro de 1964, um fato importante consolidou a fora da interveno estatal: o
governo federal comprou as dez concessionrias da Amforp que atuavam em cidades im-
portantes dos estados do Sul e do Nordeste e no interior de So Paulo.
Dentro desse esprito de desenvolvimento pautado pela atuao governamental,
o MME determinou, assim que foi criado, a realizao de um amplo levantamento dos
recursos hidrenergticos dos estados da Regio Sudeste, financiado pelo Fundo Espe-
12 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
INTERIOR DA USINA TERMELTRICA DE CHARQUEADAS, NA D-
CADA DE 1960. A CENTRAL FOI CRIADA PARA UTILIZAR O CAR-
VO DO RIO GRANDE DO SUL
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ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 13
cial das Naes Unidas para o Desenvol-
vimento.
Para a elaborao dos estudos, foram
selecionadas, em junho de 1962, as empre-
sas de engenharia canadenses Montreal
Engineering Company e G. E. Crippen and
Associates e a norte-americana Gibbs and
Hill. Essas empresas reuniram-se no con-
srcio Canambra uma sigla formada pelas
iniciais dos pases envolvidos no trabalho: Canad, Estados Unidos (Amrica) e Brasil.
Os trabalhos da Canambra se iniciaram em novembro de 1962 e englobaram os esta-
dos do Sudeste e parte do territrio do estado do Paran, na rea da bacia do rio Paranapa-
nema, no nordeste do estado. O projeto, concludo em 1966, inventariou um potencial esti-
mado em 38 mil megawatts e o relatrio final propunha diretrizes para um vasto programa
de construes de usinas no longo prazo.
Enquanto se realizava o inventrio dos recursos energticos do Sudeste, j havia em
curso dentro do ministrio, desde 1964, uma negociao para se estender os trabalhos da
Canambra para toda a Regio Sul. As atividades comearam em 1966, mas o acordo formal
entre o Brasil, o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) sucessor
do Fundo Especial das Naes Unidas para o Desenvolvimento , e o Banco Mundial foi
assinado em agosto de 1967, estabelecendo o Programa de Desenvolvimento Energtico
para a Regio Sul Plano de Operao (Planop).
A rea total investigada pela Canambra no Paran, Santa Catarina e Rio Grande do
Sul abrangeu 515 mil quilmetros quadrados. Em tempo: foi excluda a rea sob influncia
da empresa pblica estadual Centrais Eltricas de So Paulo (Cesp), no vale do rio Parana-
panema, no Paran, que j havia sido contemplada nos estudos da Regio Sudeste. Foram
examinados ao todo 196 locais de barragens, dos quais 75 se qualificaram para a incluso
no inventrio, no trecho nacional das bacias dos rios Iguau e Uruguai. O levantamento
apontou um potencial energtico de 8.285 megawatts correspondente a trs vezes a de-
manda de carga projetada para toda a Regio Sul at 1980.
TCNICOS DO CONSRCIO CANAMBRA, NOS ANOS 1960, NAS
DEPENDNCIAS DA CEMIG: O MAPEAMENTO DOS RECURSOS
ENERGTICOS DO PAS COMEOU PELO SUDESTE E, EM SEGUI-
DA, O SUL
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14 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
Havia, no entanto, duas caractersticas fundamentais que diferenciavam o trabalho da-
quele realizado no Sudeste. Uma era o fato de o Rio Grande do Sul, nos anos 1960, ainda
operar parcialmente na freqncia de 50 Hertz. O plano de interligar nacionalmente os sis-
temas eltricos do pas tornou imperativa a implementao de um programa de unificao
da freqncia, consolidado com a aprovao da Lei no 4.454, de novembro de 1964, pela
qual se adotou o padro de 60 Hertz, utilizado na maior parte dos estados.
A outra caracterstica regional que balizou os estudos energticos do Sul era a im-
portante produo de carvo e as iniciativas de produo de energia eltrica base de
carvo-vapor na regio, especialmente em Santa Catarina, responsvel, no final dos anos
1950, por 400 mil toneladas anuais do minrio utilizado na fabricao do coque siderrgico.
O beneficiamento do carvo catarinense, incentivado pelo desenvolvimento da indstria
nacional do ao, a partir da criao da Companhia Siderrgica Nacional (CSN), em 1941,
formava estoques de carvo tipo vapor que representavam cerca de um tero do produto
industrializado. Ao longo da dcada, o carvo-vapor foi perdendo espao em seu uso como
combustvel para trens e navios, sendo substitudo pelos derivados de petrleo.
Para ampliar o uso do carvo nacional e incentivar a produo de energia eltrica, o
governo Getlio Vargas (1951-1954) havia lanado, em 1953, o Plano do Carvo Nacional
e instalado a Comisso Executiva do Plano do Carvo Nacional (Cepcan). Segundo a Lei no
1.886, que criou o plano, nos estados nos quais havia jazidas do minrio, seriam construdas
usinas termeltricas prximas s reas de grande consumo de energia possibilitando, as-
sim, a utilizao do carvo-vapor na gerao. Num de seus anexos, a lei previa a construo
de uma central termeltrica na regio carvoeira do Paran e outra em Santa Catarina.
Trs anos depois, o presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961) enviou ao Congresso
Nacional uma mensagem, pedindo autorizao para a Unio constituir a Sociedade Termo-
eltrica de Capivari (Sotelca), com o objetivo de erguer uma usina de 100 megawatts em
Capivari de Baixo, uma localidade no municpio de Tubaro (SC). A trmica seria capaz de
absorver cerca de 300 mil toneladas de carvo-vapor. Essa usina de capital importncia,
pois eliminar a crise de energia que se verifica naquele estado e dar consumo ao carvo-
vapor intermedirio, possibilitando a produo do carvo metalrgico reclamado pela inds-
tria siderrgica do pas, dizia o presidente, na mensagem.
ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 15
MINA DE CARVO NO RIO GRANDE DO SUL, NO FINAL DOS
ANOS 1950: A PRODUO FOI INCENTIVADA PELO GOVERNO
FEDERAL PARA ALIMENTAR O NASCENTE PARQUE SIDERRGI-
CO DO PAS
ACERVO CEEE
16 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
TRABALHADORES NA CONSTRUO DO CANAL DE ADUO DE
JORGE LACERDA I, EM 1959: A SOTELCA FOI UM DOS MARCOS
DO PLANO TERMELTRICO PARA O SUL DO PAS
ACERVO ELETROSUL
ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 17
Na verdade, o local j sediava uma usina a carvo, de 27 megawatts de potncia, cons-
truda pela CSN nos anos 1940. A CSN tinha uma instalao que beneficiava o carvo,
chamada de Lavador de Carvo de Capivari. Essa instalao separava o carvo metalrgico
do rejeito e, para movimentar o lavador, precisava ter energia eltrica. Como no havia, a
empresa construiu uma usina que acabou beneficiando a regio toda, lembra o advogado
aposentado da Eletrosul e ex-diretor da Fundao Eletrosul de Assistncia e Previdncia So-
cial (Elos), Guido Locks.
A Sotelca, porm, era um projeto bem mais relevante do ponto de vista da gerao. O
capital da nova empresa, de 430 milhes de cruzeiros (6 milhes de dlares), foi subscrito
pelo governo de Santa Catarina, pela Unio, com recursos concedidos Cepcan, e pela CSN,
alm de mineradores particulares. O complexo da Sotelca foi composto inicialmente pela usi-
na termeltrica Capivari, pela termeltrica Jorge Lacerda I, pela linha de transmisso ligando
Capivari de Baixo a Joinville e por quatro subestaes: Jorge Lacerda (em Capivari de Baixo),
Florianpolis (no atual municpio de So Jos), Ilhota e Joinville.
A usina termeltrica Jorge Lacerda I foi inaugurada em 3 de julho de 1965, com potncia
inicial instalada de 50 megawatts. A segunda unidade geradora, tambm de 50 megawatts,
entrou em operao em maro de 1966. A inaugurao da primeira unidade contou com a
presena do presidente da Repblica, Castello Branco (1964-1967), e de integrantes do alto
escalo do governo militar. Na poca, tratava-se da maior usina geradora da Regio Sul do
Brasil.
Em 1967, com a inaugurao da linha
de transmisso de 230 quilovolts entre Join-
ville e Curitiba, foi assegurado o transporte
de energia da usina Jorge Lacerda I para a
capital paranaense, o que permitiu a interco-
nexo dos sistemas eltricos dos estados de
Santa Catarina e Paran.
Eu era garoto e meu pai trabalhava nas
minas de carvo. Lembro bem da importn-
cia do sistema de produo de carvo da re-
gio, que chegou a ter um milho de pessoas
OBRAS DE GEOLOGIA EM JORGE LACERDA I, EM 1958 E, MAIS
ABAIXO, A INAUGURAO DA PRIMEIRA UNIDADE GERADORA
DA USINA, EM 1965: A PRESENA DO PRESIDENTE CASTELLO
BRANCO (AO CENTRO) ASSEGURAVA A IMPORTNCIA DO EM-
PREENDIMENTO PARA O GOVERNO FEDERAL
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18 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
vivendo em funo dele, por conta da Estrada de Ferro Dona Teresa Cristina, do Lavador de
Carvo de Capivari, do Porto de Imbituba e da usina Jorge Lacerda, conta o ex-presidente
da Eletrosul, Milton Mendes de Oliveira.
Poucos meses depois da constituio da Sotelca, como solicitado na mensagem enviada
por Juscelino Kubistchek ao Congresso em 1956, o governo federal criou a Usina Termeltrica
de Figueira (Utelfa), para concluir um empreendimento de 20 megawatts de potncia instala-
da, j iniciado pelo governo paranaense. A usina Figueira entrou em operao em 1963. Atu-
almente localizada no municpio paranaense de mesmo nome (na poca rea pertencente a
Curiva), a usina, desde o incio, foi operada pela Companhia Paranaense de Energia Eltrica
(Copel), empresa do governo do estado instituda em 1954, que a incorporou em 1969.
Outro empreendimento de gerao de eletricidade a carvo financiado pelo governo fe-
deral na Regio Sul foi a central termeltrica Charqueadas, instalada na localidade de mesmo
nome, no municpio de So Jernimo (RS). Neste municpio j funcionava desde 1953 uma
usina a carvo mineral de 20 megawatts, de propriedade da CEEE, a trmica So Jernimo.
Charqueadas foi projetada para utilizao exclusiva do carvo do Rio Grande do Sul, que, ao
contrrio de Santa Catarina, s tinha uso para a produo de vapor. A drstica reduo do
consumo ameaava as minas e boa parte da populao empregada na produo carvoeira.
A usina Charqueadas, alm de significar uma soluo para o mercado de carvo do estado,
tambm reforava o abastecimento da capital, Porto Alegre, ento precrio e sujeito a cortes
e racionamento.
A iniciativa de construo da usina partiu de empresas atuantes no setor de minerao
de So Jernimo, que constituram a Termochar em outubro de 1953. Dois anos depois, a
Unio, via BNDE, ento gestor do FFE, destinou importantes recursos construo da usina
e, na prtica, a realizao desse financiamento levou aquisio do controle acionrio da Ter-
mochar pelo banco. A Termeltrica de Charqueadas entrou em operao em 1962, com uma
capacidade instalada de 54 megawatts, e logo se tornou um importante marco na regio. A
regio era praticamente mato. Pela estrada, se levava seis horas para chegar a Porto Alegre;
de lancha, por via fluvial, quatro horas. Sem mencionar que com a sede da Termochar, no Rio,
tnhamos de pedir a ligao com dois ou trs dias de antecedncia, recorda-se Antonio Pinto
dos Santos Paranhos Neto, que foi chefe da usina na poca. A vila da usina, conta ele, abri-
gava cerca de 1,2 mil pessoas.
ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 19
PRECIPITADORES ELETROSTTICOS DA USINA DE CHARQUE-
ADAS (1999): A CENTRAL TERMELTRICA ERA CRUCIAL PARA
MELHORAR O ABASTECIMENTO DA CAPITAL GACHA, PORTO
ALEGRE
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20 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
Porm, o empreendimento termeltrico
gacho que contou com maior envolvimento
popular na poca foi a usina Oswaldo Ara-
nha, ou usina termeltrica Alegrete. A unida-
de tinha uma histria diferente das demais
da regio, por estar localizada fora da rea
de produo de carvo, na ento quase ins-
pita fronteira oeste do Rio Grande do Sul. Os municpios dali, que viviam do gado e da l,
sonhavam com um processo de industrializao a ser viabilizado apenas se o abastecimento
de energia eltrica fosse regularizado. Mas o governo estadual no via uma demanda local
capaz de sustentar o custo de construo da usina.
Os proprietrios rurais e comerciantes se uniram no Conselho de Desenvolvimento de
Alegrete (CDA) que, com fora poltica, conseguiu a aprovao da obra, iniciada em 1961
pela CEEE. No entanto, por falta de recursos, a construo logo foi paralisada. O CDA elabo-
rou, ento, o Plano Hlice um projeto de arrecadao de fundos entre os 14 municpios da
fronteira oeste, para garantir o transporte de 2 mil toneladas de equipamentos, armazenados
em Rio Grande, Porto Alegre e Canoas. Foi fechado, em 1965, um acordo com a Unio, pelo
qual a empresa Termoeltrica de Alegrete (Termoal) era encampada pela Eletrobrs e trans-
ferida para a gesto da Termochar.
Para o transporte das peas mais pesadas, tornou-se necessrio reforar pontes e traar
uma logstica elaborada para vencer estradas rudimentares. O passo-a-passo da aventura era
transmitido diariamente pela Rdio Alegrete. No dia da chegada da primeira mquina, um es-
tator de 80 toneladas, a populao da cidade se reuniu na ponte do rio Inhandu e comemorou
o feito com banda de msica, danas gachas e desfile a cavalo.
fronteira oeste, no se dava oportunidade de progresso. A obra foi muito ridiculariza-
da e isso contribuiu para que a comunidade tomasse uma posio firme, afirmou, em 1988,
ao Jornal da Eletrosul, um dos integrantes do CDA, Delci Dornelles. Quando a usina a leo
combustvel foi inaugurada, em 1968, com 66 megawatts, houve nova festa popular, que
contou com a presena do presidente da Repblica, Costa e Silva (1967-1969), e diversos
ministros.
A TERMELTRICA DE CHARQUEADAS: A USINA TORNOU-SE UM
IMPORTANTE NCLEO DA VIDA SOCIAL E ECONMICA NA RE-
GIO DE SO JERNIMO, ONDE FOI INSTALADA
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ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 21
CALDEIRAS E CHAMINS DA TERMELTRICA DE ALEGRETE, EM
1999: A CONSTRUO DA USINA FOI RESULTADO DA PRESSO
DE MUNICPIOS DA FRONTEIRA OESTE DO RIO GRANDE DO SUL
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22 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
As especificidades regionais, portanto,
concediam Regio Sul um perfil diferen-
ciado em relao ao restante do pas. Em
novembro de 1966, quando foram inicia-
dos os estudos da Canambra, a gerao
de base termeltrica, utilizando em mais de
50% o carvo-vapor produzido na prpria
regio, somava 437,3 megawatts instalados
superando a base hidreltrica, com 356,2
megawatts. A capacidade instalada de
energia eltrica nos trs estados era, por-
tanto, de 793,5 megawatts. O maior gera-
dor estadual era o Rio Grande do Sul, com
393,4 megawatts de capacidade instalada, enquanto Paran e Santa Catarina dispunham,
respectivamente, de 204,1 megawatts e 196 megawatts.
Alm dos empreendimentos trmicos apoiados pelo governo federal na regio, havia
em operao, durante os anos 1960, vrias usinas de pequeno porte operadas por empresas
estaduais. A CEEE tinha as termeltricas a carvo Candiota, inaugurada em Bag (RS) em
1961, e So Jernimo, j mencionada, ambas de 20 MW. Havia ainda em territrio gacho
a usina trmica a carvo do Gasmetro (27 megawatts), em Porto Alegre, instalada pela
Companhia de Energia Eltrica Rio-Grandense (Ceerg), oriunda do grupo Amforp. Em San-
ta Catarina, alm da usina termeltrica Capivari, mantida pela CSN, funcionavam algumas
unidades a diesel de produo modesta mesmo cenrio do Paran, onde a capital, Curiti-
ba, tinha parte de seu abastecimento suprido por uma usina a diesel de 9 megawatts.
Na verdade, antes do trabalho da Canambra, no era extensivamente conhecido o
potencial hidreltrico da regio. No que j no houvesse esforos para explor-lo. No
Rio Grande do Sul, a CEEE havia implementado desde 1948 um programa de gerao que
inclua a realizao de hidreltricas, algumas de vulto para os padres da poca, como as
usinas Bugres (11,1 megawatts), em So Francisco de Paula, e Canastra (42 megawatts),
em Taquara, que entraram em operao em 1952 e 1956 alm da pioneira hidreltrica
USINA TERMELTRICA DE CANDIOTA (RS), NOS ANOS 1960:
O PARQUE TRMICO DA REGIO SUL INCLUA TAMBM CEN-
TRAIS OPERADAS PELAS EMPRESAS ESTADUAIS
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ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 23
Passo do Inferno (1,4 megawatt), de 1948.
Em 1962, foi concluda a primeira etapa da
hidreltrica Jacu (75 megawatts), em Sal-
to do Jacu, que seria ampliada em 1968,
quando teve duplicada sua capacidade ins-
talada.
Na primeira metade da dcada de
1960, a principal empresa em operao no
Paran era a Companhia Fora e Luz do
Paran (CFLP), da Amforp. Suas maiores
unidades eram as hidreltricas de Gua-
ricana (36 megawatts) e Chamin (18
megawatts), ambas localizadas em So
Jos dos Pinhais e responsveis pelo atendimento a Curitiba e municpios vizinhos. Em
1964, a CFLP foi transferida Eletrobrs, no processo de compra das empresas perten-
centes Amforp.
Na mesma poca, o governo paranaense deslanchou a execuo de um importante
programa de obras, sob a responsabilidade direta da Copel. Entretanto, o primeiro empre-
endimento hidreltrico construdo pela Copel, a usina Foz do Chopim (44 megawatts), em
Dois Vizinhos, s seria inaugurada em 1969.
Tambm em Santa Catarina fortaleceu-se a tendncia centralizao do fornecimento
pela empresa estadual, criada em 1955. Funcionando como holding, a Centrais Eltricas de
Santa Catarina (Celesc) havia incorporado em 1963 o patrimnio de sete empresas sub-
sidirias, entre as quais a Empresa Luz e Fora de Florianpolis (Elfa), que servia capital
estadual e regio litornea vizinha, a Empresa Sul Brasileira de Eletricidade (Empresul) e
a Empresa Fora e Luz Santa Catarina (EFLSC).
No mesmo ano, entraram em funcionamento as duas primeiras usinas hidreltricas
construdas pela Celesc, a de Garcia, em Angelina, e a Governador Celso Ramos, em Faxi-
nal do Guedes, ambas com capacidade inferior a 10 megawatts. Em 1964, foi inaugurada a
hidreltrica Palmeiras (17,6 megawatts), em Cedros.
FINAL DAS OBRAS DA USINA HIDRELTRICA DE GUARICANA,
NO PARAN: COM 36 MEGAWATTS, ERA A MAIOR DO ESTADO,
NUMA POCA EM QUE POUCO SE SABIA SOBRE O POTENCIAL
HDRICO DA REGIO
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24 Eletrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968)
O RIO IGUAU, NO PARAN, EM 1973: EM SUA BACIA E NA DO RIO
URUGUAI, ENTRE RIO GRANDE DO SUL E SANTA CATARINA, O RE-
LATRIO DA CANAMBRA IDENTIFICOU 75 APROVEITAMENTOS
ACERVO ELETROSUL
ELEtrosul 40 anos O setor eltrico sob o signo estatal (1960-1968) 25
O cenrio geral da regio, no entanto, era de dficit de energia eltrica. Em Santa
Catarina, por exemplo, o consumo de energia, em 1960, era de 128,5 quilowatts-hora por
habitante/ano muito abaixo da mdia nacional, de 300 quilowatts-hora por habitante/
ano. Nos trs estados, a precariedade no fornecimento forava as indstrias a lanarem
mo de usinas e geradores prprios, movidos a diesel. Na poca, a Regio Sul j ocupava
uma posio de destaque no contexto econmico nacional, com o crescimento da produo
agropecuria, o aumento da urbanizao e o acelerado processo de industrializao.
O relatrio apresentado pela Canambra, em setembro de 1969, ao MME recomenda-
va a construo de trs usinas hidreltricas e uma termeltrica, em complementao aos
projetos j ento em andamento na regio, conduzidos pelas empresas pblicas estaduais
e federais. O programa de expanso inclua a construo de novas usinas, totalizando mais
de 1,5 mil megawatts, e os sistemas de transmisso correspondentes. No se tratava de
contratar empresas estrangeiras que viessem para c oferecer um relatrio acabado, para
ser usado exclusivamente pelas autoridades decisrias, falou, em depoimento Memria
da Eletricidade, concedido em 2000, o engenheiro Antonio Carlos Tatit Holtz, que participou
dos estudos da Canambra. Foi um processo em que essa equipe, com grande experincia
na rea de produo de eletricidade, teve a oportunidade de trabalhar com tcnicos bra-
sileiros. Foi a consolidao da idia de que o potencial hidreltrico brasileiro no podia ser
desprezado e que valia a pena tomar a deciso de aproveit-lo, com investimento de tempo
e de dinheiro.
Essa viso foi um dos fatores que motivaram a criao de uma empresa federal no
sul do pas, uma idia que foi amadurecendo paralelamente aos trabalhos da Canambra.
A constituio das Centrais Eltricas do Sul do Brasil (Eletrosul), determinada em 23 de
dezembro de 1968 e formalizada pelo Decreto no 64.395, de 23 de abril de 1969, assinalou
o surgimento da terceira subsidiria regional da Eletrobrs, ao lado da Chesf e de Furnas,
obedecendo ao princpio de centralizar na holding federal o planejamento, a operao e o
financiamento dos sistemas eltricos do pas.
ELETROSULPRIMEIRA LOGOMARCA DA ELETROSUL
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26 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
o comeo da empresa1969-1973
28 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
A DIRETORIA DA ELETROSUL E SEU PRIMEIRO PRESIDENTE, MA-
RIO LANNES CUNHA ( ESQ.), TOMAM POSSE, EM 1968: NASCIA
A SUBSIDIRIA DA ELETROBRS PARA O SUL DO PAS
A criao da Centrais Eltricas do Sul do Brasil (Eletrosul), em 23 de de-zembro de 1968, comeou a mudar a forma de atuao federal no setor de energia eltrica
da Regio Sul que, at ento, era composto pelas empresas operadoras de termeltricas a
carvo e pelas antigas subsidirias da American and Foreign Power Company (Amforp), nes-
se momento controladas pela Centrais Eltricas Brasileiras (Eletrobrs). A Eletrosul nascia
embalada pelo projeto de fortalecimento da holding, em seu papel de coordenadora do plane-
jamento, da expanso, da operao e interligao dos sistemas eltricos brasileiros.
Assim como a Companhia Hidro Eltrica do So Francisco (Chesf), no Nordeste, e a
Central Eltrica de Furnas, no Sudeste e, mais tarde, em 1973, a Centrais Eltricas do
Norte do Brasil (Eletronorte) , a Eletrosul
tinha a misso de funcionar como brao re-
gional da Eletrobrs no Sul, com o objetivo
de realizar estudos e projetos, construir e
operar usinas e linhas de transmisso de
energia eltrica e promover a integrao de
seu sistema eltrico ao resto do pas.
A Eletrosul foi constituda sob a forma
de sociedade annima de economia mista,
com sede em Braslia e escritrio central no
Rio de Janeiro. O capital inicial da empresa
era de cerca de 262 mil dlares, correspon-
dentes a um milho de cruzeiros novos, divi-
didos em um milho de aes de um cruzei-
ro novo cada uma. A Eletrobrs subscreveu
899.500 aes e a Companhia Estadual de
Energia Eltrica (CEEE), 100 mil aes; as
500 aes restantes foram subscritas pelo presidente da Eletrobrs, Mario Penna Bhering,
por Manuel Pinto de Aguiar e Amyr Borges Fortes, ento diretores da holding federal, por
Mario Lannes Cunha, que se tornaria o primeiro presidente da Eletrosul, e por Carlos Krebs
Filho, representante do Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS).
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ELEtrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973) 29
De acordo com seu primeiro estatuto, a Eletrosul seria administrada por um presidente
e quatro diretores: de Operao e Planejamento; Financeiro; de Engenharia e Construo;
e Regional, eleitos para mandato de quatro anos pela Assemblia Geral Ordinria, podendo
ser reconduzidos e ficando assegurada ao governo do Rio Grande do Sul a indicao de um
dos membros da diretoria. Houve uma participao forte do Rio Grande do Sul na criao
da Eletrosul, tanto em termos de recursos como de ativos. E isso, em vez de se transformar
em participao acionria, se transformou em participao na direo. O conceito da poca
era o de uma empresa realmente federal. A prerrogativa de o Rio Grande do Sul nomear um
diretor perdurou at 1998, conta o diretor de Engenharia da Eletrosul, Ronaldo dos Santos
Custdio.
A primeira diretoria era composta, alm do engenheiro Mario Lannes Cunha como presi-
dente, pelo Agostinho Pereira Ferreira, diretor de Operao e Planejamento, por Fernando Mar-
condes de Mattos, diretor Financeiro, por Hiram Rolim Lamas, diretor de Engenharia e Constru-
o, e por Walter Jobim Filho, diretor Regional, que tinha seu gabinete em Porto Alegre.
Foi pelas mos de Jobim Filho, oriundo do DNOS, que chegou novssima subsidiria
seu funcionrio de matrcula no 0001, o economista Luiz Fernando Leal Waihrich. Ele tambm
vinha do DNOS e havia participado da comisso montada pelo Ministrio das Minas e Energia
(MME) para organizar a Eletrosul. Waihrich ocupou a funo de secretrio do diretor regional.
Entrei na empresa em 1o de fevereiro de 1969. Nos primeiros tempos, fiquei encarregado de
providenciar a instalao da Diretoria Regional: aluguei o escritrio, comprei mveis. Tambm
fiz o registro da Eletrosul na Junta Comercial de Porto Alegre, lembra ele.
Em maro de 1969, formalizou-se um substancial aumento do capital social da Ele-
trosul do um milho de cruzeiros novos inicial para 50 milhes de cruzeiros novos, cerca
de 12,5 milhes de dlares, basicamente subscritos pela Eletrobrs e relativos aos bens
e investimentos previstos para a construo da usina hidreltrica Passo Fundo (RS). O
empreendimento, iniciado em 1966 pela CEEE, em parceria com o DNOS, e considerado
fundamental para sanar os problemas emergenciais de fornecimento de eletricidade no Rio
Grande do Sul, j estava sob a responsabilidade da Eletrosul em sua gnese: um protocolo
assinado entre a Eletrobrs, CEEE e DNOS, em setembro de 1968, convencionava que a
obra seria concluda pela nova subsidiria a ser criada no Sul dentro de alguns meses.
30 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
A rea de atuao inicial da Eletrosul correspondia aos estados do Paran, Santa Ca-
tarina e Rio Grande do Sul, abrangendo uma superfcie total de 562.071 quilmetros qua-
drados, representando 6,6% do territrio brasileiro. Segundo o Censo de 1970 viviam na
Regio Sul aproximadamente 16,7 milhes de habitantes, correspondendo a 17,9% do total
da populao brasileira. Na mesma data, a participao relativa da regio na potncia ins-
talada total do pas era de 11,6%, com sua produo representando 9,6% e seu consumo
participando com 10,5% do total do Brasil.
Na poca, o perfil econmico da Regio Sul era ainda predominantemente agrope-
curio. O setor primrio empregava mais de 50% da mo-de-obra e gerava 37% da renda,
fornecendo insumos ao setor secundrio, responsveis pela gerao de mais de metade do
produto industrial. O setor secundrio ocupava 14% da populao economicamente ativa e
estava assentado, basicamente, em ramos industriais tradicionais, como alimentos, madei-
ras e tecidos, que demandavam menos energia eltrica, se comparados a outros tipos de
indstrias.
Entretanto, a taxa de crescimento do consumo de energia eltrica regional foi em m-
dia de 10,5% no perodo entre 1970 e 1974, superior mdia nacional, de 9,5%, o que
refletia o bom desempenho da economia do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paran.
Esses estados eram atendidos basicamente pelas trs concessionrias estaduais CEEE,
Companhia Paranaense de Energia Eltrica (Copel) e Centrais Eltricas de Santa Catarina
(Celesc) e por pequenas empresas privadas e cooperativas de eletrificao. A CEEE e a
Copel possuam, em 1970, um importante parque gerador: a capacidade instalada de cada
uma era de 423 e 236 megawatts, respectivamente.
O setor eltrico passava por um processo de acelerada transformao no pas in-
teiro. O final dos anos 1960 ficaram marcados pelo incio do projeto de desenvolvimento
econmico baseado em um Estado forte e centralizador. Entre 1968 e 1973, o Brasil viveu
o perodo batizado como milagre econmico. No auge, em 1973, o crescimento do Pro-
duto Interno Bruto (PIB) foi de 11,4%, um nmero recorde. Entre 1967 e 1974, o cresci-
mento real dos investimentos estatais no setor eltrico, principalmente em hidreltricas,
foi de 15% ao ano, sendo 70% propiciado por recursos prprios (impostos e dotaes
oramentrias).
ELEtrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973) 31
O projeto governamental demandava a centralizao da operao dos sistemas eltri-
cos e, para isso, adotou-se um conjunto de medidas institucionais, entre as quais a cons-
tituio do Comit Coordenador da Operao Interligada (CCOI) da Regio Sudeste, em
julho de 1969, e, dois anos depois, da verso sulista do mesmo rgo. Sob a orientao da
Eletrobrs e do MME, os comits tinham a tarefa de unir as principais concessionrias des-
sas regies na execuo de estudos integrados sistemticos sobre a operao coordenada
de reservatrios e sistemas de transmisso, visando racionalizao do uso dos recursos
energticos.
No era tarefa simples no Sul, onde a cultura do setor era de independncia das em-
presas. Antes da criao da Eletrosul e dos comits, a interligao na regio era muito
precria e a operao do sistema tornava-se muito difcil, falou, em depoimento Memria
da Eletricidade em 2002, o engenheiro Agostinho Pereira Ferreira, que integrou a primeira
diretoria da empresa.
A ao da Eletrosul era importante para viabilizar a operao integrada do sistema na
regio e o primeiro passo seria concluir a usina hidreltrica Passo Fundo, com capacidade de
gerar 220 megawatts, que daria incio ao efetivo processo de interligao dos sistemas ga-
chos com os demais da regio, j que a central iria operar na freqncia de 60 Hertz. A misso
de integrao e de ampliao do parque gerador do Sul do pas, recebida pela Eletrosul, inclua
como passos seguintes a construo da hidreltrica Salto Osrio (PR), com 1.050 megawatts,
a operao da termeltrica Charqueadas, da Termochar, e da usina termeltrica Jorge Lacerda,
ento da Sotelca, e o planejamento e acompanhamento da execuo da mudana do padro de
freqncia do Rio Grande do Sul, na poca predominantemente 50 Hertz.
A usina Passo Fundo, localizada na bacia do rio Uruguai, entre So Valentim e Entre-
Rios, no Rio Grande do Sul, ganhou, em 1970, um aporte de 21 milhes de dlares de um
emprstimo feito pela Eletrobrs com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
A obra compreendia o desvio das guas do rio Passo Fundo para o rio Erechim, aproveitan-
do uma diferena de nvel de 260 metros. O reservatrio da usina possua uma capacidade
total de armazenamento de 1,5 bilho de metros cbicos e demandou uma rea inundada
de 150 quilmetros quadrados. Do total do valor contratado para a obra, 54% foram execu-
tados pela indstria nacional.
BOMBA INJETORA DE CONCRETO NA CONSTRUO DA HIDRE-
LTRICA DE PASSO FUNDO, EM 1967: INAUGURADA SEIS ANOS
DEPOIS, A USINA DA CEEE FOI CONCLUDA PELA ELETROSUL
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32 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
CONSTRUO DA BARRAGEM DE PASSO FUNDO, EM 1968: A
USINA ERA IMPORTANTE PARA A INTERLIGAO DO SISTEMA
ELTRICO DO SUL
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Passo Fundo praticamente uma usina-escola, por ser completa: tem a barragem, o
tnel de desvio, a casa de vlvulas, uma queda de 260 metros, vlvula esfrica, turbina com
dois mancais e o gerador, diz o ex-chefe do Departamento de Iguau da Eletrosul, Edgar
Boaventura Mariot.
A primeira unidade da hidreltrica, de 110 megawatts, entrou em funcionamento em
setembro de 1973 e foi inaugurada em solenidade que contou com a presena do presiden-
te Emlio Garrastazu Mdici (1969-1974). Em seu discurso, o ento presidente da Eletrosul,
Mario Lannes Cunha, ressaltou a importncia da usina para a economia da regio, segundo
registro do Jornal da Eletrosul. A energia eltrica aqui gerada e daqui transmitida haver
de propiciar o surgimento e a implantao de novas unidades industriais que, alm de au-
mentarem a capacidade de absoro de mo-de-obra, ampliaro os horizontes do desen-
volvimento econmico, afirmou.
O projeto do sistema de transmisso de Passo Fundo previa a construo de 780 qui-
lmetros de linhas de transmisso em 230 quilovolts e de trs subestaes abaixadoras e
de interconexo, ligando a usina a Porto Alegre e trmica Charqueadas e garantindo, por
meio da subestao Farroupilha, a conexo
com o sistema de transmisso da usina Jor-
ge Lacerda.
Salto Osrio era um projeto maior e,
apesar de executado pela Copel, foi con-
duzido sob a superviso da Eletrosul, sig-
nificando um importante passo para a ex-
panso da capacidade de gerao da em-
presa. O rio Iguau o principal do Paran
e desce de uma altitude de 870 metros at
75 metros, na foz. Esse desnvel resulta
em vrias quedas e corredeiras e, por esse
motivo, considerado um dos melhores
rios brasileiros para a gerao de energia
eltrica.
TRECHO DO RIO IGUAU, EM 1970: ALI SE INSTALARIA A HIDRE-
LTRICA DE SALTO OSRIO, O PRIMEIRO APROVEITAMENTO DA
MAIS PROMISSORA BACIA DA REGIO
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34 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
INCIO DA CONSTRUO DE SALTO OSRIO, EM 1970: O PRO-
JETO, EXECUTADO PELA COPEL E SUPERVISIONADO PELA ELE-
TROSUL, SIGNIFICAVA UMA IMPORTANTE EXPANSO DO PAR-
QUE GERADOR
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Apesar dessas vantagens, o potencial hidreltrico do rio Iguau encontrava-se ainda pra-
ticamente inexplorado no final dos anos 1960. S haviam sido construdas em sua bacia, at
ento, duas usinas: a primeira em Salto Grande do Iguau (15 megawatts), e a segunda, cha-
mada de Foz do Chopim ou Jlio de Mesquita Filho (44 megawatts), no afluente Chopim, am-
bos empreendimentos da Copel.
O potencial energtico do rio Iguau fora inventariado pelo Comit Coordenador dos Es-
tudos Energticos da Regio Sul (Enersul), que conclura pela possibilidade de aproveitamen-
to, em condies econmicas, de uma potncia de aproximadamente 5 mil megawatts. Esse
potencial se distribuiria em cerca de trinta locais, dos quais dez situados no curso principal do
rio Iguau. Destes, trs foram considerados como mais atrativos e escolhidos para estudos
complementares imediatos: Salto Osrio, Salto Santiago e Salto Segredo.
Salto Osrio, localizado nos municpios paranaenses de Quedas de Iguau e So Jorge
dOeste, compreendia uma srie de cachoeiras, com cerca de 25 metros de altura, concentra-
das em uma distncia de 800 metros e separadas por uma ilha central. A realizao do aprovei-
tamento de Salto Osrio foi determinada por convnio firmado em 28 de janeiro de 1970 entre
a Eletrobrs, a Eletrosul e a Copel. As obras comearam em 1970 e atraram um grande con-
tingente de trabalhadores de todo o pas. O Jornal da Eletrosul, em maro de 1976, lembrava
o caso de Anacleto Sobral, do Piau: ao final da construo de Salto Osrio, ele surpreendeu a
famlia em Teresina, ao voltar para casa ao volante de um Opala comprado com seu salrio.
Uma verdadeira cidade nasceu ao redor do canteiro, que chegou a contabilizar cerca de
18 mil habitantes em meados da dcada de 1970. Era um lugar muito retirado, no tinha nada.
Ns brincvamos dizendo que era mais longe do que o local onde os ndios moravam: a estrada
dava acesso a uma aldeia e era preciso passar dessa entrada para chegar usina. O canteiro,
ento, era completo, tinha tudo. Era muito bonito, em estilo americano, conta Edgar Boaven-
tura Mariot, que foi chefe da obra de Salto Osrio.
A mata existente no local foi preservada ao mximo e o desmatamento, realizado de forma
manual. Apesar de previsto para durar apenas o tempo da construo da usina, o acampamento
contava com rede de gua tratada e esgoto, energia eltrica, ruas pavimentadas, hospital, es-
cola, jardim de infncia, centros de comunicao, igrejas, hotel, supermercado, pequenas lojas,
estao rodoviria e centro de segurana pblica.
36 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
O preo dos aluguis era quase simb-
lico. Os cerca de 200 funcionrios solteiros
moravam em alojamentos especficos para
eles, com restaurante prprio. A piscina
do Grmio Esportivo e Recreativo de Salto
Osrio era o ponto de encontro das famlias,
no vero, e as crianas tinham direito a au-
las gratuitas de natao. Mas a populao
no se unia apenas em torno da diverso.
Um grupo de mulheres de empregados mais
graduados da usina formou um rgo assis-
tencial de voluntrias, que visava ajudar as
famlias menos abastadas de Salto Osrio.
A construo do sistema de transmis-
so associado, interligando a usina Salto
Osrio aos sistemas eltricos em funciona-
mento nos trs estados da regio, teve in-
cio ainda em 1971.
A Eletrosul continuaria a explorar, ain-
da no incio da dcada de 1970, o grande
potencial do rio Iguau: a empresa preparou
o estudo de viabilidade da usina hidreltrica
Salto Santiago. A concesso do empreendimento foi outorgada Eletrosul pelo Decreto
no 70.747, de 22 de junho de 1972. Os primeiros 15 funcionrios da empresa chegaram
rea onde seria construda a usina, entre os municpios paranaenses de Laranjeiras do Sul
e Chopinzinho, em 1973. Segundo relato do engenheiro Nivaldo Almeida Neto, um des-
ses pioneiros, ao Jornal da Eletrosul, em 1976, as condies do local eram mais do que
precrias. O acesso era to difcil que no havia sequer estradas, nem trilhas pelas quais
pudessem passar automveis. Apesar de estar apenas 45 quilmetros a montante de Salto
Osrio, a nova usina seria um desafio em uma rea ainda a ser desbravada.
ALOJAMENTO DE SOLTEIROS EM SALTO OSRIO (AO ALTO), EM
1971, E LOCAL ONDE SERIA ERGUIDO O CENTRO URBANO DE
SALTO SANTIAGO (1975): AS OBRAS DESBRAVARAM A REGIO
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Ao mesmo tempo em que investia na ampliao da gerao hidreltrica, a Eletrosul
tinha a tarefa de aproveitar a vocao termeltrica da Regio Sul. A Termochar foi incorpo-
rada nova empresa do sistema Eletrobrs em janeiro de 1971. No ano anterior, a potncia
da usina Charqueadas havia sido aumentada para 72 megawatts, com a instalao da quar-
ta unidade geradora, de 18 megawatts. Em fevereiro de 1972, foi a vez da usina termel-
trica Alegrete, a Termoal, que passaria a operar como unidade de reserva e de equilbrio do
sistema de transmisso. O subsistema de transmisso associado a Alegrete foi transferido
para a CEEE. No mesmo ms, foi incorporada tambm a Sociedade Termeltrica de Capi-
vari (Sotelca), responsvel pela usina Jorge Lacerda (100 megawatts).
Em dezembro de 1972, a Eletrosul assumiu, em carter provisrio, a administrao de
duas usinas da Companhia Pelotense de Eletricidade, subsidiria da Eletrobrs e antiga The
Riograndense Light and Power Syndicate, do grupo Amforp: a usina termeltrica do Porto,
com 12,5 megavolts amperes, e a usina Diesel, com 9,4 megavolts amperes, ambas locali-
zadas em Pelotas (RS). Nenhuma das duas foi incorporada ao parque gerador da Eletrosul,
mas seus grupos geradores foram transferidos para usinas da empresa, onde foram insta-
lados como geradores de emergncia e de partida das usinas (black start). Essas usinas
tiveram um papel importante na formao da cultura tcnica da Eletrosul, pois criaram uma
relao forte da empresa com a Escola Tcnica Federal de Pelotas, que se tornou a principal
fonte de tcnicos da Eletrosul at o final da dcada de 1980.
Essa poltica de incorporaes obedecia ao conceito de centralizao ento vigente no
setor eltrico estatal e permitia, com a reduo do nmero de empresas federais na regio,
eliminar custos administrativos e melhorar a coordenao operacional.
A Sotelca tinha planos de construir uma segunda etapa de Jorge Lacerda e a execu-
o da obra foi transferida para a Eletrosul. Seriam instaladas duas novas unidades de 66
megawatts cada, compondo a usina termeltrica Jorge Lacerda II. A montagem da nova
central termeltrica havia sido iniciada em setembro de 1971. A primeira dessas unidades
entrou em operao em 1973, ampliando a capacidade total da usina Jorge Lacerda para
166 megawatts. O sistema de transmisso vinculado segunda etapa de Jorge Lacerda
incluiu uma linha de 230 quilovolts entre a usina e Joinville (SC), e a ampliao das quatro
subestaes existentes: Siderpolis, Florianpolis, Ilhota e Joinville, todas em Santa Ca-
38 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
CONSTRUO DA TERCEIRA E QUARTA UNIDADES DE JORGE
LACERDA, EM 1972: A VOCAO TERMELTRICA DA REGIO SE
MANTINHA
ACERVO ELETROSUL
ELEtrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973) 39
tarina. Finalmente, em dezembro de 1973, a empresa passou a operar a usina termeltrica
Capivari (27 megawatts), da Companhia Siderrgica Nacional (CSN), que tinha sido en-
campada pelo governo federal em maro do mesmo ano.
Com as incorporaes, a ampliao de Jorge Lacerda e a entrada em operao da
usina hidreltrica Passo Fundo, a capacidade geradora instalada da Eletrosul passou de 72
megawatts em 1970, quando a empresa operava somente a usina Charqueadas, para 542
megawatts, em 1973. A capacidade total da Eletrosul representava, em 1973, 29% do total
de 1.886 megawatts instalados na Regio Sul. A CEEE, com 547 megawatts, respondia por
29%; a Copel, com 419 megawatts, por 22%; e a Celesc, com 85 megawatts, por 5%. Os
demais 271 megawatts, ou 14%, estavam sob a responsabilidade das demais concession-
rias.
O sistema de transmisso da subsidiria regional comeou a operar regularmente em
1971, com a energizao, em 230 quilovolts, da linha de transmisso Passo Fundo-Farroupi-
lha, com 242 quilmetros de extenso. No ano seguinte, a Eletrosul passou a operar 1.640
quilmetros de linhas de transmisso, em vrias tenses, sendo 985 quilmetros originrios
dos sistemas da Termoal e 655 quilmetros, da Sotelca. A Eletrosul comprou da Companhia
Fora e Luz do Paran (CFLP), ento subsidiria da Eletrobrs, a linha de transmisso Join-
ville-Curitiba, em 230 quilovolts, que passou a integrar o sistema da empresa regional.
Ao longo de 1973, foram energizados 528 quilmetros de linhas associadas usina
Passo Fundo e, por meio da subestao Farroupilha, estabeleceu-se a conexo com o siste-
ma de transmisso da termeltrica Jorge Lacerda. No final do ano, a Eletrosul contava com
2.410 quilmetros de extenso total de linhas de transmisso, o que consolidou a posio
da empresa como fornecedora em grosso das trs concessionrias estaduais.
O sistema de transformao da Eletrosul disps inicialmente de um nmero conside-
rvel de subestaes, a maioria proveniente das empresas encampadas. No momento da
incorporao, a Termochar, a Termoal e a Sotelca somavam 23 subestaes.
A ampliao da capacidade de gerao e do sistema de transmisso acontecia em
paralelo ao necessrio programa de unificao da freqncia na regio, coordenado pelo
Departamento de Converso de Freqncia (Decofre), um rgo criado em 1969 por um
convnio firmado entre a Eletrobrs, Eletrosul, CEEE e Secretaria de Energia, Minas e
40 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
Comunicaes do Rio Grande do Sul. O Decofre, diretamente subordinado presidncia
da CEEE, com a coordenao tcnico-financeira da Eletrosul, tinha ainda a incumbncia de
orientar e prestar assistncia aos consumidores na adaptao de suas instalaes.
As atividades do Decofre tiveram incio em 1o de agosto de 1969 e ficou estabelecido
um cronograma para a mudana de freqncia das diferentes reas de consumo no Rio
Grande do Sul. As primeiras etapas do programa de converso foram executadas em 1971
e, em 1973, 366.456 consumidores em 135 municpios, ou 58% do total, j eram atendidos
na nova freqncia no estado. Em Porto Alegre, no mesmo ano, o programa chegou a trs
quartos dos consumidores do maior centro populacional do Rio Grande do Sul. Os consu-
midores no nos deixaram em paz todo o dia. Perguntavam se poderiam ligar o chuveiro, o
ferro eltrico e tudo o mais. As duas linhas de telefone estavam sempre ocupadas, contou
o chefe do setor de Projetos do Decofre, Rodiney Escobar Resing, em entrevista publicada
pela Folha da Manh em 16 de julho de 1973. O primeiro dia da converso na capital re-
gistrou cerca de 500 telefonemas e 400 visitas de moradores da cidade sede do Decofre.
Mas, fora pequenas interrupes de energia, o processo transcorreu sem tropeos.
Em setembro de 1971, como conseqncia das incorporaes das usinas e empresas
termeltricas de propriedade do governo federal, a Eletrosul ganhou uma diretoria adminis-
trativa, para a qual foi nomeado Lrio Brigo. A empresa viveu, portanto, um processo rpi-
do de estruturao e crescimento. Ao total de 543 empregados em 1970 seriam somados
783 em 1971, oriundos das empresas incorporadas. Conduzi o processo de entrevistas dos
funcionrios da Termoal e da Termochar, para saber de sua inteno de serem admitidos
pela Eletrosul. Calculo que, em ambas, 99% foram para a subsidiria, afirma o economista
Luiz Fernando Leal Waihrich. Em 1973, a Eletrosul tinha um total de 2.103 empregados.
Com apenas cinco anos de existncia, a Eletrosul j entrava no ranking das 500 maio-
res empresas do pas elaborado pelo Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundao
Getlio Vargas (FGV). Os financiamentos concedidos pelo Banco Mundial, pelo BID e pelo
Lloyds Bank chegavam, na poca, a 100 milhes de dlares, o que atestava a confiana do
mercado financeiro internacional nos investimentos da Eletrosul.
Em julho de 1973, foi organizada a Fundao Eletrosul de Previdncia e Assistncia
Social (Elos), com o objetivo de proporcionar plano de suplementao salarial aos em-
ELEtrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973) 41
PORTO ALEGRE, NOS ANOS 1950: VINTE ANOS DEPOIS, A CA-
PITAL GACHA ESTAVA INTEGRADA FREQNCIA NACIONAL
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pregados desligados por aposentadoria. No
mesmo ano, a Eletrosul deu incio a um im-
portante programa de valorizao de recur-
sos humanos, com nfase nas atividades de
treinamento: os cursos e estgios promovi-
dos pela empresa contaram com a partici-
pao de 820 empregados, seis dos quais
treinados no exterior.
Por conta do expressivo e rpido au-
mento do nmero de funcionrios, surgiu a
necessidade de se propiciarem oportunida-
des para que as pessoas se conhecessem
e criassem o esprito de equipe. Uma delas
foi a I Mini Olimpada da Eletrosul, em abril,
que reuniu em Tubaro (SC) cerca de 100
empregados da empresa vindos do Rio de Janeiro, Paran e Rio Grande do Sul, alm da
representao local. Foram disputados torneios de xadrez, damas, bolo e futebol de salo.
Outro instrumento de integrao entre os funcionrios foi criado ainda em 1973: o Jornal da
Eletrosul, informativo interno distribudo a toda a empresa e que ainda est em circulao.
Em pleno processo de implantao, a Eletrosul foi chamada a assumir de maneira
formal o papel de coordenao e execuo do planejamento energtico da Regio Sul,
com nfase na interligao regional do sistema misso j prevista, mas que a Lei no
5.899, a chamada Lei de Itaipu, de 5 de julho de 1973, consagrou, ao ratificar a diviso
do pas em quatro regies eltricas, repartidas pelas quatro subsidirias regionais da
Eletrobrs.
A lei atendia ao projeto do governo federal de organizar o planejamento e a ope-
rao do setor eltrico brasileiro, em especial, por conta da construo da usina hi-
dreltrica Itaipu, no rio Paran, na fronteira com o Paraguai e em parceria com o pas
vizinho. Seria a maior usina do mundo, at ento, com 12 mil megawatts de capacidade
geradora.
CONSTRUO DE ITAIPU, NO INCIO DA DCADA DE 1970: O
MAIOR PROJETO HIDRELTRICO DO MUNDO, AT ENTO, MU-
DARIA A FEIO DO SETOR ELTRICO BRASILEIRO
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As concessionrias estaduais, de acordo com a nova legislao, poderiam continuar ge-
rando energia, embora apenas para seu prprio mercado, e se fosse preciso, competiria s
subsidirias regionais prover um suprimento adicional. Foram reforadas pela lei, ainda, as
funes de coordenao do planejamento e da operao dos sistemas eltricos brasileiros,
com a instituio dos Grupos Coordenadores para Operao Interligada (GCOI), destinados
a assumir o papel dos antigos CCOIs, que funcionariam como rgos colegiados, com partici-
pao das concessionrias de mbito regional e estadual, sob a direo da Eletrobrs.
Mas o ponto fundamental no qual a Lei no 5.899 afetava a atuao da Eletrosul era a
obrigatoriedade de a empresa adquirir a energia de Itaipu destinada Regio Sul Furnas
faria o mesmo em relao ao Sudeste. Um convnio assinado entre a Eletrosul, a CEEE, a
Celesc e a Copel, em 1973, estimava em 12% do total colocado disposio do Brasil por
Itaipu, a parcela a ser revendida pela Eletrosul s concessionrias estaduais.
Alm da construo da hidreltrica Itaipu, o planejamento da expanso dos sistemas
eltricos para a Regio Sul passaria a levar em conta a tendncia de crescimento do consu-
mo a taxas superiores s previstas no estudo da Canambra. Em julho de 1973, a Eletrobrs,
a Eletrosul, a CEEE, a Celesc e a Copel reavaliaram essas estimativas, prevendo, alm do
crescimento proposto pela Canambra, a adio de 700 megawatts, a serem proporcionados
com a ampliao da usina Candiota, da CEEE, pelas duas novas unidades na usina Jorge
Lacerda e pela incluso de Foz do Areia, da Copel.
Como resultado, foi firmado entre a Eletrosul, CEEE, Celesc e Copel um contrato
de fornecimento por meio do qual essas concessionrias compravam praticamente toda a
energia gerada pela Eletrosul entre 1974 e 1982. Assim, fechava-se o crculo que visava
integrar a operao regional, levando-se em conta o enorme potencial de Itaipu e a neces-
sidade de viabilizar o mercado para o uso da energia gerada pela mega-usina.
A Lei de Itaipu tambm promoveu uma importante mudana na forma de tratamento
do recorrente problema de sustentao da demanda para o carvo-vapor. At ento, como
herana do Plano do Carvo Nacional, a Eletrosul, assumindo o papel da Sotelca, era obri-
gada a comprar toda a produo do carvo-vapor da Regio Sul, independentemente das
necessidades de consumo da empresa. Como o preo do combustvel era alto, essa obriga-
o estava cada vez mais pesada para a estrutura financeira da empresa.
44 Eletrosul 40 anos o comeo da empresa (1969-1973)
A USINA DE JORGE LACERDA NOS ANOS 1960: NAS MOS DA
ELETROSUL, O COMPLEXO TERMELTRICO SE TORNARIA O
MAIOR DA AMRICA LATINA
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A nova lei desobrigou a Eletrosul da compra compulsria do carvo-vapor. E o Decreto
no 73.102, de 7 de novembro de 1973, criou a Conta de Consumo de Combustveis (CCC),
formada pela contribuio mensal das empresas participantes dos dois GCOIs (Sudeste
e Sul) e administrada pela Eletrobrs. A CCC rateava o custo do carvo e derivados de
petrleo entre as diversas concessionrias responsveis pelo atendimento do mercado con-
sumidor, de forma proporcional fatia de cada uma.
As mudanas no quadro institucional do setor eltrico consolidaram um cenrio no qual
a Eletrosul exercia um papel relevante na gerao e na interligao dos sistemas eltricos
da regio. A partir da implantao da empresa do Sul, boa parte dos empreendimentos
previstos para a regio, tanto de expanso da capacidade geradora como de ampliao do
sistema de transmisso, passaria a ser realizado diretamente ou sob a superviso da nova
empresa. A Eletrosul estava consolidada.
46 Eletrosul 40 anos A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980)
A CONSOLIDAO DA EMPRESA1974-1980
48 Eletrosul 40 anos A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980)
A segunda metade da dcada de 1970 teve especial significado na histria da Centrais Eltricas do Sul do Brasil (Eletrosul). Para atender ao acentuado aumento do con-
sumo de energia eltrica no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paran superior mdia
nacional e responder, de modo efetivo, aos efeitos da crise do petrleo, a empresa, nesse
perodo, realizou grandes investimentos em gerao e implantou tambm extensa malha de
transmisso, inaugurando linhas de 525 quilovolts.
Aconteceu ainda uma importante mudana no perfil do parque gerador da empresa:
a Eletrosul baseou a ampliao de sua capacidade instalada na fonte hidreltrica. Se, at
1974, o sistema de gerao da empresa era predominantemente trmico (55%, contra 45%
hidrulico), em 1975, com a entrada em operao das primeiras unidades de Salto Osrio,
as hidreltricas passaram a representar 59% do total.
Dessa forma, a Eletrosul se alinhava orientao do governo federal para o setor
eltrico brasileiro, de aproveitamento da hidreletricidade uma opo baseada na existn-
cia no pas de amplas bacias hidrogrficas.
Segundo os levantamentos realizados at
o incio dos anos 1970, o Brasil tinha um
potencial hidreltrico da ordem de 60 mil
megawatts. A essa altura, as hidreltricas
geravam 78% da energia eltrica consumida
no pas, e 80% delas pertenciam a empresas
pblicas.
Em apenas alguns anos, a importn-
cia da Eletrosul na gerao de energia para
os trs estados do Sul passou a ser vital.
Em nmeros: em 1974, a capacidade ins-
talada da empresa era de 485 megawatts
que representavam 30% do total de 1.636
megawatts disponveis na regio. Naquele
ano, essa capacidade dividia-se entre a usina
hidreltrica Passo Fundo (220 megawatts)
MONTAGEM DE PARTES DA TURBINA DA USINA HIDRELTRICA
SALTO OSRIO, EM 1978: A INAUGURAO DAS PRIMEIRAS UNI-
DADES, DOIS ANOS ANTES, MARCARA O INGRESSO DA ELETRO-
SUL NA ERA DOS GRANDES PROJETOS
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e as usinas trmicas Charqueadas (72 megawatts), Alegrete (66 megawatts), Capivari (27
megawatts) e Jorge Lacerda (100 megawatts).
No ano seguinte, aps a entrada em operao de duas unidades geradoras da primeira
etapa da usina Salto Osrio (350 megawatts) e da segunda etapa da usina Jorge Lacerda
(132 megawatts), a participao da Eletrosul saltou para 967 megawatts, ou seja, 46% do
total regional de 2.118 megawatts. A subsidiria da Centrais Eltricas Brasileiras (Eletro-
brs) no Sul tornou-se a maior fornecedora de energia da regio, superando a liderana re-
gional, antes nas mos da gacha Companhia Estadual de Energia Eltrica (CEEE). No final
da dcada, a potncia instalada da Eletrosul somava 2.066 megawatts, que correspondiam
a 47% dos 4.432 megawatts instalados na rea de atuao da empresa.
A gerao prpria da Eletrosul mais do que triplicou nesse perodo, passando de
2.092.936 megawatts-hora em 1974 para 6.732.902 megawatts-hora em 1980. O cres-
cimento da capacidade geradora da empresa foi acompanhado pelo aumento de sua rea
de atuao, em 1980. O Decreto no 84.589, de 24 de maro de 1980, incluiu nessa rea o
recm-criado estado do Mato Grosso do Sul, at ento atendido por Furnas Centrais Eltri-
cas. Entre os empregados, a medida compensou, de certa forma, o sentimento de frustra-
o pelo fato de a empresa no ter participado da implantao e operao das linhas que
conectam a usina Itaipu ao sistema eltrico (em 750 quilovolts, corrente alternada, e 600
quilovolts, corrente contnua) trabalho que foi delegado a Furnas.
Com isso, a rea de atuao da empresa passou a somar 932.787 quilmetros quadra-
dos de extenso territorial total. Ainda em maro de 1980, Eletrosul, Furnas e a Empresa
de Energia Eltrica do Mato Grosso do Sul (Enersul) comearam a planejar o sistema de
transmisso de energia eltrica no estado, a ser expandido por meio da construo de uma
segunda linha de transmisso, em 138 quilovolts, no trecho Jupi- Mimoso-Campo Grande,
e da linha no trecho Guara-Dourados-Campo Grande. A linha Jupi-Mimoso, encampada
pela Unio juntamente com outros bens e instalaes da Companhia Energtica de So
Paulo (Cesp), teve sua posse e administrao cedida Eletrobrs em 1974. A empresa
tambm prestou servios tcnicos de apoio Enersul para a implantao de pequenas hi-
dreltricas, particularmente as de So Miguel, Costa Rica e Mimoso. No entanto, o efetivo
atendimento ao Mato Grosso do Sul pela Eletrosul seria iniciado somente em 1982.
50 Eletrosul 40 anos A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980)
INAUGURAO DAS UNIDADES 3 E 4 DE JORGE LACERDA II:
COM A ENTRADA EM OPERAO DA SEGUNDA ETAPA DA TER-
MELTRICA, A ELETROSUL ASSUMIU O PAPEL DE MAIOR FORNE-
CEDORA DE ELETRICIDADE NA REGIO SUL
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A economia da Regio Sul tambm vivia um tempo de transformaes. A empresa
fornecia energia em grosso s trs concessionrias estaduais Companhia Paranaense de
Energia Eltrica (Copel), Centrais Eltricas de Santa Catarina (Celesc) e CEEE e atendia,
no final de 1974, a um mercado de cerca de 19 milhes de habitantes, 18% da populao
total do Brasil. Naquele momento, ainda predominavam no Sul as atividades agropecurias.
O setor primrio empregava em torno de 50% da mo-de-obra e gerava 37% da renda, for-
necendo insumos ao setor secundrio e, assim, permitindo a realizao de mais da metade
do produto industrial. O setor secundrio ocupava 14% da populao economicamente ativa
e respondia por 16% do produto regional.
Quando chegou a dcada de 1980, as indstrias j eram, com larga margem, as maio-
res consumidoras de energia: demandavam 47% do total fornecido. As residncias respon-
diam por 21%. Isso porque, ao longo do perodo, alm da retomada do crescimento fabril da
regio, houve ainda alteraes na prpria estrutura industrial, que passou a registrar uma
maior expanso da indstria de base principalmente, o plo petroqumico do Rio Grande
do Sul e o parque metal-mecnico de Santa Catarina , mais intensiva em termos de gasto
de energia que os segmentos tradicionais. O consumo residencial tambm cresceu de forma
expressiva, em funo do aumento da populao urbana e da ampliao dos servios de
energia eltrica para atender a essa nova demanda.
O que acontecia no setor eltrico na Regio Sul no estava descolado do cenrio polti-
co-econmico do pas na segunda metade dos anos 1970. Em 1974, o governo Ernesto Gei-
sel (1974-1978) lanou o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND), que reafirmava
as empresas estatais como pilares do processo de substituio de importaes de insumos
e bens de capital e da ambiciosa meta de manter taxas de crescimento do Produto Interno
Bruto (PIB) na ordem de 10% ao ano.
O choque do petrleo, em 1973, havia indicado a vulnerabilidade energtica brasileira
e os desequilbrios comerciais do pas com o exterior, desencadeando fortes presses infla-
cionrias. Isso levou o governo a reforar os investimentos em hidreletricidade para diminuir
o consumo de combustveis fsseis. Entre 1970 e 1980, a taxa de crescimento anual de
gerao de energia eltrica, em grande parte hidreltrica, ficou acima de 10%.
52 Eletrosul 40 anos A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980)
A HIDRELTRICA SALTO OSRIO EM CONSTRUO: A USINA
SIGNIFICAVA UM EXPRESSIVO AUMENTO NA CAPACIDADE DE
GERAO DA EMPRESA, ATENDENDO CRESCENTE DEMANDA
CRIADA PELA MAIOR INDUSTRIALIZAO DA REGIO
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O plano governamental previa a equalizao das tarifas de energia eltrica, at ento
diferenciadas de acordo com a rea de concesso. O Decreto no 1.383, de 26 de dezembro
de 1974, determinou a introduo de preos nicos dos servios de energia eltrica ao con-
sumidor final em todo o territrio nacional. Um dos objetivos dessa equalizao era tentar
diminuir a concentrao industrial em determinadas partes do pas e, assim, minimizar as
desigualdades regionais. Para sua operacionalizao, foi instituda a Reserva Global de Ga-
rantia (RGG), formada pela contribuio de todas as concessionrias, com cotas de at 2%
sobre o seu ativo imobilizado.
No final de 1974, atendendo s determinaes da Lei de Itaipu, a Eletrobrs elaborou um
estudo sobre a expanso dos sistemas eltricos das regies Sul e Sudeste, considerando a
entrada em operao da usina hidreltrica Itaipu. O Plano de atendimento aos requisitos de
energia das regies Sudeste e Sul at 1990, conhecido como Plano 90 que acabou abran-
gendo ainda parte do Centro-Oeste props
um esforo de ampliao da capacidade ge-
radora das trs regies, de acordo com as
metas do II PND, prevendo o crescimento do
mercado de energia eltrica no pas na faixa
de 11% ao ano entre 1974 e 1979, prximo
ao que acabou ocorrendo. A partir dessas
projees, foi elaborado um vasto programa
de construo de usinas de grande porte, a
ser desenvolvido em paralelo ao programa
nuclear brasileiro, com destaque, na Regio
Sul, para os aproveitamentos hidreltricos
nos rios Paran e Iguau.
A inaugurao da usina hidreltrica
Salto Osrio, em 19 de maro de 1976 o
primeiro aproveitamento importante do rio
Iguau marcou o princpio da participao
da jovem empresa na era dos grandes proje-
A INAUGURAO DE SALTO OSRIO, EM 1976: PARA O ENTO
PRESIDENTE DA ELETROSUL, TELMO THOMPSON FLORES (NA
PRIMEIRA FILA, AO LADO DA ESPOSA), O RIO DAS CATARATAS
PASSAVA A SER, TAMBM, O RIO DAS HIDRELTRICAS
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54 Eletrosul 40 anos A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980)
tos. Iniciada pela Copel, a usina levou menos
de seis anos para ser construda, com custo
de cerca de 340 milhes de dlares, finan-
ciados pela Eletrobrs, pelo Banco Mundial
e pelo Banco Interamericano de Desenvolvi-
mento (BID). Na verdade, as duas primeiras
unidades j haviam comeado a operar em
17 de outubro e 11 de dezembro de 1975,
com 125 megawatts cada. A primeira etapa
completou-se em 14 de fevereiro e 4 de junho
de 1976, quando entraram em funcionamen-
to mais duas unidades, somando a potncia
instalada de 700 megawatts.
As obras de ampliao da usina Salto
Osrio foram iniciadas ainda em 1975, com
a previso, na segunda etapa do aproveita-
mento, da instalao das unidades 5 e 6, de
175 megawatts cada que entrariam em
operao comercial em 30 de dezembro de
1980 e junho de 1981, respectivamente ,
completando a potncia instalada final da
usina, de 1.050 megawatts.
Na entrada em operao da usina, o presidente da Eletrosul na poca, Telmo Thomp-
son Flores, definia com exatido o que significava o aproveitamento do Iguau: O rio das
cataratas passa a ser, agora, tambm, o rio das hidreltricas. Thompson acompanhou o
desenvolvimento dos aproveitamentos do Iguau e da prpria empresa, tendo sido o presi-
dente que mais tempo permaneceu no cargo (nove anos).
Ao mesmo tempo em que encerrava a obra da hidreltrica Salto Osrio, a Eletrosul
iniciava a construo da usina hidreltrica Salto Santiago, tambm no rio Iguau um pro-
jeto de monta, previsto para gerar 2 mil megawatts. As obras comearam em 1975, com
ESCAVAO DE ROCHAS PARA O DESVIO DO RIO IGUAU NA
CONSTRUO DE SALTO SANTIAGO: O PROJETO INICIAL DA
USINA PREVIA UMA CAPACIDADE DE 2 MIL MEGAWATTS E UM
ORAMENTO DE 200 MILHES DE DLARES
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ELEtrosul 40 anos A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980) 55
O ACAMPAMENTO DE SALTO SANTIAGO, EM 1976, NO INCIO
DAS OBRAS: FOI NECESSRIO, ANTES DE TUDO, CONSTRUIR
UMA ESTRADA DE 42 QUILMETROS PARA LIGAR A REA, EN-
TO ISOLADA, S RODOVIAS PARANAENSES
VILA RESIDENCIAL DOS FUNCIONRIOS DE SALTO SANTIAGO,
EM 1975: NO AUGE DAS OBRAS, A POPULAO DO ACAMPA-
MENTO CHEGOU A 16 MIL PESSOAS E HAVIA CENTRO COMER-
CIAL, ESCOLAS, HOSPITAL, HOTIS E CLUBES
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56 Eletrosul 40 anos A CONSOLIDAO DA EMPRESA (1974-1980)
a construo da estrada de acesso de 42 quilmetros ligando o canteiro BR-277 e do
aeroporto. O acampamento foi instalado no ano seguinte, e, em 1979, no auge das obras, a
populao total era de 16 mil habitantes. Havia sido construdo um centro comercial com 44
lojas, um ginsio com 28 salas de aula atendendo a um total aproximado de 1,8 mil alunos,
com 77 professores , e um hospital com 97 leitos e uma equipe de 15 mdicos, alm de um
cinema, dois clubes, dois hotis e uma igreja.
Ento orada em 200 milhes de dlares, Salto Santiago contava com recursos do
BID, Eletrobrs, Agncia Especial de Financiamento (Finame), Financiadora de Estudos
e Projetos (Finep) e do Export and Import Bank of America (Eximbank). O desvio do rio
Iguau foi planejado para ser realizado em duas etapas. Na primeira, concluda em 1976,
foram construdas ensecadeiras na margem esquerda, envolvendo uma rea de fundao da
barragem principal. Durante essa primeira etapa, o rio Iguau continuou passando em seu
leito natural, embora confinado na margem direita.
A segunda etapa do desvio foi realizada com a abertura de quatro tneis subterrne-
os, para permitir o fechamento total do leito natural do rio Iguau, o que foi feito em 17 de
maro de 1978, em solenidade que contou
com a presena do presidente Geisel. Em
1979, concluda a construo da barragem,
as comportas foram fechadas, tendo incio,
com uma antecipao de cinco meses em
relao ao cronograma original, o enchi-
mento do reservatrio com 208 quilmetros
quadrados de rea e 6,75 bilhes de metros
cbicos de capacidade de armazenamen-
to. A primeira unidade geradora, com 333
megawatts, entrou em operao comercial
em 31 de dezembro de 1980.
A nacionalizao dos equipamentos na
gerao hidreltrica colocou a Eletrosul, em
pouco tempo, como uma referncia no se-
O PRESIDENTE ERNESTO GEISEL CUMPRIMENTA UM FUNCIO-
NRIO DA ELETROSUL, DURANTE A CERIMNIA DE DESVIO DO
RIO IGUAU, PARA A CONSTRUO DE SALTO SANTIAGO (1978):
AS OBRAS ESTAVAM CINCO MESES ADIANTADAS EM RELAO
AO CRONOGRAMA ORIGINAL
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tor. Na poca, a empresa constituiu vrios grupos de trabalho para estudar as possibilida-
des de fabricao nacional dos equipamentos componentes das usinas, conta o diretor de
Operao da Eletrosul, Antonio Vituri, que coordenava um desses grupos poca. Essas
obras eram muito importantes para o setor como um todo. Ns dependamos muito dos
fornecedores internacionais de equipamentos, e, na fase de montagem, vinham equipes de
supervisores estrangeiros, japoneses, americanos, e eram os reis aqui. Todo mundo no pas
estava aprendendo. Mas a participao nacional foi subindo a cada empreendimento, e,
hoje, somos auto-suficientes, avalia o ex-chefe de obras de Salto Santiago e Ilha Grande,
Paulo Lorencini.
Com a hidreltrica Salto Santiago, consolidava-se a excelncia da qualificao do cor-
po tcnico da Eletrosul. Uma das empreiteiras que participava da obra achou que estava
se gastando muito cimento e chamou um consultor americano, considerado um dos melho-
res especialistas em concreto do mundo, da Universidade da Califrnia. Ele passou um ms
na obra e, ao final, se reuniu com a diretoria e disse que o nosso engenheiro era excelente,
tanto que o estava levando para fazer um estgio com ele na universidade; o engenheiro e
a famlia, tudo pago por um ano!, conta Edgar Boaventura Mariot, ex-chefe do Departa-
mento de Iguau da Eletrosul.
Um importante trabalho foi conduzido durante a construo da usina Salto Santiago:
o salvamento arqueolgico da rea a ser atingida pelo reservatrio. Em um convnio com o
Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (Iphan) e em parceria com a Universi-
dade Federal do Paran (UFPR), a Eletrosul comeou em 1979 as pesquisas de prospeco
e escavao dos stios arqueolgicos e o estudo e a divulgao das peas recolhidas. Mais
adiante, o material levantado foi tratado no laboratrio de arqueologia do Departamento de
Antropologia da UFPR.
O reservatrio encobriu parte dos municpios paranaenses de Laranjeiras do Sul, Gua-
rapuava, Chopinzinho e Mangueirinha. O estudo de reconhecimento de impacto ambiental
da implantao da usina fora elaborado em 1975, logo aps a definio do projeto do apro-
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