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Eliézer de Souza Perruci
Lucas Rangel de Castro Soares
Luiz Carlos dos Santos Júnior
Marcelo Mendes Wey Berti
Rafael Gustavo de Almeida Viana
O DIA DO SENHOR Uma teologia bíblica da perspectiva profética
Monografia apresentada ao Prof.
Carlos Osvaldo Cardoso Pinto em
cumprimento parcial dos requisitos da
matéria Teologia Bíblica do Antigo
Testamento II
CURSO DE BACHAREL EM TEOLOGIA
SEMINÁRIO BÍBLICO PALAVRA DA VIDA
Atibaia
2003
1
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.............................................................................................. 2
2 ORIGEM E CONCEITOS RELACIONADOS À EXPRESSÃO “O DIA
DO SENHOR” ...................................................................................................... 3
3 EXPECTATIVAS DO POVO HEBREU SOBRE O DIA DO SENHOR .... 5
4 A PERSPECTIVA PROFÉTICA SOBRE O DIA DO SENHOR................. 7
4.1 Período Pré-Exílico ....................................................................................................7
4.1.1 Obadias ...............................................................................................................8
4.1.2 Joel....................................................................................................................10
4.1.3 Amós.................................................................................................................12
4.1.4 Oséias ...............................................................................................................16
4.1.5 Isaías .................................................................................................................18
4.2 Período Exílico .........................................................................................................22
4.2.1 Sofonias ............................................................................................................23
4.2.2 Jeremias ............................................................................................................28
4.2.3 Ezequiel ............................................................................................................30
4.3 Período Pós-Exílico ..................................................................................................36
4.3.1 Ageu .................................................................................................................36
4.3.2 Zacarias.............................................................................................................38
4.3.3 Malaquias .........................................................................................................42
2
4.4 Visão Profética Vetero-Testamentária......................................................................44
5 CONCLUSÃO.............................................................................................. 50
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA .................................................................... 51
2
1 INTRODUÇÃO
O Dia do Senhor é um tema pouco explorado na atualidade, pois, dentro de
um mundo influenciado pelo pós-modernismo, este é um tema muito duro e, por muitas vezes,
difícil de ser entendido. A situação torna-se mais complicada por causa de alguns líderes que
não tem a ousadia ou o esforço de estudar tal tema, e de outros que o exploram de maneira
distorcida, passando para o rebanho de Deus uma visão errônea da realidade desse tema.
Constantemente o cristão tende a levar uma vida que, externamente é muito
bonita e cheia de rituais, enquanto internamente, é marcada pela iniqüidade. Isso é agravado
pelo fato dele pensar que o seu viver aqui não influencia em nada no seu relacionamento com
Deus, afinal, ele é filho do Rei e merece toda a sorte de bênçãos que lhe bem desejar.
O povo israelita também pensava da mesma forma. Criam que, pelo fato de
serem o povo que Deus separou para ser o povo de Sua aliança, as bênçãos sempre viriam
independente de sua fidelidade para com Yahweh. Eles também criam que o Dia do Senhor
seria uma espécie de panacéia. Um grande remédio que iria resolver todos os seus problemas.
Todas as nações inimigas seriam punidas por terem se atrevido a tocarem no povo eleito de
Deus.
Porém os profetas, enviados por Deus, vieram a Israel para corrigir essa
visão distorcida sobre o Dia do Senhor. Eles expandiram este conceito, mostrando que este
evento abrange muito mais do que a punição de outras nações, o Dia do Senhor seria um
evento que também envolveria a salvação e a punição do próprio Israel.
O objetivo deste trabalho é, de maneira clara e objetiva, demonstrar qual era
a visão que Israel possuía e o que foi corrigido e expandido pelos profetas a respeito do
evento do Dia do Senhor.
3
2 ORIGEM E CONCEITOS RELACIONADOS À
EXPRESSÃO “O DIA DO SENHOR”
Essa expressão é parte integrante da escatologia bíblica. Os profetas
olhavam para o dia do futuro quando o Deus de Israel, que repetidamente visitou Seu povo na
História, os visitaria finalmente a fim de julgar os ímpios, redimir os justos, e expurgar todo
mal da terra. Existem diversas expressões equivalentes ao termo “Dia do Senhor”, tais como:
“Naquele Dia”, “O Dia”, “Aquele Dia”, “Últimos Dias”. Estas expressões aparecem mais de
75 vezes no Antigo Testamento. Isso evidencia sua importância nas Escrituras proféticas. Tais
textos revelam que a idéia de julgamento é preponderante. Todas estas expressões designam a
divina visitação e salientam a sua qualidade, e não tanto o tempo de sua ocorrência. Por
conseguinte, o Dia do Senhor denota tanto as visitações divinas na história (Am 5.18; Jl 1.15),
com também a visitação escatológica final (Jl 3.14, 18; Sf 3.11, 16; Zc 14.9).
É de suma importância identificar quais são as idéias por trás do termo “dia”
(heb. ���). Este é o mais importante conceito de tempo no Antigo Testamento, pelo qual
pode-se expressar tanto um instante quanto um período de tempo. Pode significar o período de
iluminação natural (em contraste com o período de escuridão); o período de vinte quatro
horas; a idéia geral e indefinida de “tempo”; um instante no tempo; e também um período de
um ano (caso em que a palavra aparece no plural). A expressão Dia do Senhor pode ser usada
de forma escatológica ou não. É um dia de juízo e/ou benção. Existem também expressões
semelhantes que podem referir-se a acontecimentos ordinários e esperados (Is 21.6) ou a
escatológicos , como “naquele dia” ����������; e que podem referir-se a acontecimentos no
futuro em geral (Dt 31.29) tal como “últimos dias” �����������������.
Para uma melhor análise, os usos da expressão Dia do Senhor precisam ser
considerados. Amós 5.18-20, a primeira passagem onde encontramos seu uso no sentido mais
abrangente, demonstra que esta expressão já fora padronizada no vocabulário popular. Para o
4
povo, significa o dia quando Yahweh haveria de intervir, a fim de colocar Israel acima das
demais nações, independente da fidelidade de Israel para com Ele. Acreditavam que nesse dia,
Yahweh se ergueria para desbaratar todos os seus inimigos e salvar Israel de um modo
espetacular. Entretanto, Amós declara que o Dia do Senhor significa juízo também para Israel.
O que Amós acrescentou ao termo não foi a idéia de um julgamento qualquer, mas sim a idéia
de um julgamento moral.
Outros profetas, conscientes dos pecados de outras nações, como também
dos de Israel, declararam que o Dia do Senhor virá contra nações específicas como castigo por
terem subjugado o povo de Deus. Podendo-se destacar: a Babilônia (Is 13.6, 9), o Egito (Jr
46.10), Edom (Ob 15), e muitas nações (Jl 2.31; 3.14; Ob 15).
Em algumas passagens se concebe como iminente o Dia do Senhor, mas
todos o consideram como o tempo da divina irrupção na história, de maneira espetacular. A
extensão do Dia do Senhor tem sido uma questão de debate entre os intérpretes das Escrituras.
Alguns situam o Dia do Senhor apenas como os anos de tribulação enquanto outros o vêem no
período compreendido entre a tribulação até o final do milênio.
O Dia do Senhor é, desta maneira, a ocasião quando Yahweh intervirá
ativamente para punir o pecado, que terá chegado ao seu clímax. Esse castigo poderá ocorre
de diversas maneiras, pois Yahweh não só punirá a Israel por seus pecados, mas também as
nações que permaneceram como inimigos do Senhor.
5
3 EXPECTATIVAS DO POVO HEBREU SOBRE O
DIA DO SENHOR
É de extrema importância para o estudo do dia do Senhor na literatura
profética o fato de haver um contraste entre a visão dos profetas, que será tratada adiante, e a
visão do povo acerca do Dia do Senhor. Este contraste é perceptível na própria literatura
profética nas advertências contra aqueles que ansiavam pelo dia do Senhor.
Devido ao contexto histórico em que Israel viveu durante o período do reino
dividido, a expectativa primordial dos hebreus com relação ao dia do Senhor possuía um
caráter essencialmente político-militar. Visto que os conflitos com as nações vizinhas eram
constantes, os israelitas ansiavam pelo dia em que o Senhor traria a paz absoluta para o seu
povo através da destruição completa das nações inimigas. Neste dia, Israel exerceria o
domínio sobre todas as nações e viveria numa condição de profunda prosperidade.
A tristeza e o medo provocados pela instabilidade social, política e bélica
dariam lugar a um estado de gozo e paz completos. O julgamento de Yahweh cairia somente
sobre as demais nações, sendo Israel o povo que gozaria de uma posição privilegiada que não
seria julgada. Esta visão é decorrência de uma interpretação equivocada das alianças. Deus
realmente estabeleceu pactos incondicionais com Israel, mas o desfrutar das bênçãos da
aliança deuteronômica dependia da obediência exclusiva do povo a Yahweh.
Com o decorrer da história do reino dividido, esta visão foi sofrendo alguns
acréscimos decorrentes de acontecimentos históricos envolvendo Israel e Judá. Durante e
depois do exílio babilônico, além de esperar pela destruição dos seus inimigos, o povo
aguardava a restauração de Israel como um país unificado.
O grande problema das expectativas israelitas concernentes ao Dia do
Senhor era a falta de uma compreensão correta do aspecto espiritual deste evento. O juízo
contra as nações não se dará simplesmente por vingança de guerra, mas como preço justo pelo
6
pecado praticado por tais povos. Conseqüentemente, Israel também seria incluído no juízo
divino, segundo as suas práticas pecaminosas. A própria restauração política de Israel tem um
forte cunho religioso, pois o rei davídico que restaurará a nação também será um sacerdote,
não da casa de Arão, mas da ordem de Melquisedeque.
O ministério profético buscou corrigir as distorções presentes nos anseios
hebreus acerca do Dia do Senhor, porém o povo preferiu a apostasia e, conseqüentemente,
sofreu a disciplina do Senhor.
7
4 A PERSPECTIVA PROFÉTICA SOBRE O DIA DO
SENHOR
Conforme demonstrado anteriormente, a perspectiva de Israel era que o Dia
do Senhor seria uma panacéia de todos os males da sociedade daquela época, mesmo sendo
um conceito desconhecido pela nação1. Porém, Deus usa o ministério dos profetas para
expandir a visão limitada que Israel possuía em relação a esse tema. Sendo assim é necessário
compreender a perspectiva profética sobre o Dia do Senhor.
4.1 Período Pré-Exílico
Sendo o ministério profético basicamente a atuação divina no seu povo,
através de homens específicos, para advertir e conclamar a uma restauração do
relacionamento entre o povo da aliança e Yahweh, e proclamar o juízo decorrente da apostasia
em que a nação vivia, o entendimento da interação dos profetas com o seu contexto se faz de
suma importância para o início do estudo da perspectiva profética sobre o Dia do Senhor.
Tratando-se, especificamente, do período compreendido entre a divisão do reino de Israel sob
um monarca da dinastia davídica e a queda dos dois reinos formados desde então, é necessário
entendermos o caminho percorrido pelos dois reinos até o ponto culminante da sua
incredulidade para com Deus.
Após a morte de Salomão, o trono de Davi sofreu uma crise provocada por
Roboão. Esta crise culminou com a divisão do reino surgindo assim o reino de Judá, que
compreendia as tribos de Judá e Benjamim, e o reino de Israel que compreendia as dez tribos
do norte. O reino de Judá permaneceu sob o governo dos descendentes de Davi, mas isso não
garantiu uma série de bons reinados. Logo com Roboão a idolatria foi fortalecida em Judá,
1 KAISER, Walter C. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1980. p. 202
8
sendo estabelecidos lugares altos, pedras sagradas e postes de Aserá. O próprio rei estava
envolvido com rituais de prostituição idólatra2. Grande parte dos reis que passaram depois de
Roboão mantiveram uma postura apostata, com exceção de alguns poucos que
implementaram reformas religiosas na nação. Mesmo havendo algumas reformas, o coração
do povo se mantinha inclinado para a idolatria, o que fez com que a dedicação de Judá para
com Deus jamais passasse da superficialidade.
Se em Judá a situação espiritual era ruim, em Israel era ainda pior. O mais
perto do culto verdadeiro a Yahweh que foi difundido pelos reis do norte foi o culto sincrético
centralizado em Betel e Dã criado Jeroboão. Nenhum dos reis de Israel durante o reino divido
pode ser considerado bom diante dos olhos do Senhor. O governo do norte foi marcado por
trocas de dinastias causadas por conspirações internas.
A situação internacional também contribui para o nosso estudo. Durante este
período houve o surgimento do império assírio que foi ampliando as suas conquistas se
tornando a grande potencia mundial até a sua queda pelas mãos dos babilônicos. O avanço da
Assíria e as constantes lutas com os arameus, edomitas, filisteus, moabitas, árabes, além do
Egito, tiveram grande influência no curso que os dois reinos tomariam até a queda definitiva.
Todos os profetas viveram em íntimo contato com a situação em que os seus
países viviam, e este contexto influenciou o seu ministério de advertência ao povo de Deus.
Eles sabiam que a apostasia seria punida e que Deus estava agindo na história para disciplinar
o Seu povo.
4.1.1 Obadias
O livro de Obadias é muito peculiar no que diz respeito à reconstrução
histórica que faz ao prenunciar o juízo para Edom. Segundo seus relatos, os descendentes de
Esaú (Gn 36), irmão gêmeo de Jacó, seriam punidos por não fazerem nada enquanto
Jerusalém era invadida, por saquearem Judá e por terem construído barreiras na estrada para
impedir a fuga do povo3 por ocasião da invasão dos filisteus e árabes em 848-841 a.C.
O livro possui uma divisão muito clara o que facilita compreender o termo
2 MERRILL, Eugene H. História de Israel. Rio de Janeiro: CPAD, 2001. p. 345. 3 RYRIE, Charles C. A Bíblia Anotada. São Paulo:Mundo Cristão, 1994. p. 1123.
9
“Dia do Senhor” dentro do seu contexto. O primeiro segmento do livro fala sobre o juízo de
Edom (vv.1-9), seguido da demonstração do seu comportamento para com Judá (vv.10-14) e
fala sobre o julgamento de todas as nações no “Dia do Senhor”, e a “restauração de Judá”.
Essa perspectiva de Obadias sobre o Dia do Senhor parece muito restrita. O
anúncio contra as nações é claro: “Por que o Dia do Senhor está prestes a vir sobre todas as
nações” (v. 15). A restauração de Judá também: “Mas no monte de Sião haverá livramento”
(v. 17). Essa visão demonstra um aspecto punitivo de Deus exclusivo às nações. Israel não
parece ser incluído nessa punição.
O caráter dessa punição pode ser percebido como a Vingança do Deus da
Aliança contra as nações que realizaram qualquer espécie de malefício ao Seu Povo. Essa
observação pode ser compreendida à luz da Aliança Abraâmica, que afirma: “Amaldiçoarei os
que te amaldiçoarem” (Gn.12.2). Obadias sobre isso afirma: “...como tu fizeste, assim se fará
contigo: teu malfeito tornará sobre tua cabeça” (v. 15b).
Contudo, existe um problema muito sério com respeito ao período da
redação desta “profecia”. Segundo indícios internos do livro, percebe-se que o autor faz
menção de uma destruição feita por Edom (vv. 11-14). D.W.B. Robinson afirma que essas
colocações dizem respeito à destruição de Jerusalém por Nabucodonosor, em 586 a.C4.
Entretanto, Ryrie demonstra a possibilidade de que esse evento narrado por Obadias possa ser
colocado em uma data anterior. Segundo ele houveram quatro invasões significativas de
Jerusalém: a primeira foi realizada por Siraque em 926 a.C (1Re.11.14-25); a segunda pelos
filisteus, entre 848-841 a.C. (2Cr.21.16-17); a terceira pelo rei Joás de Israel, durante o
reinado de Jeorão, em 790 a.C. (2Re.14.13-14); a quarta pela Babilônia entre 606-586 a.C.
(2Re.24-25)5.
Com essa colocação de Ryrie, é notória a possibilidade de que o evento
narrado por Obadias seja inserido na segunda invasão. Mas essa colocação não define a
questão da data do documento. Entretanto, pode-se ressaltar que a conotação da expressão Dia
do Senhor em Obadias, que se refere apenas ao livramento futuro de Israel e a punição das
nações, parece muito restrita para ser datada como posterior a invasão babilônica.
4 ROBINSON, D.W.B. O novo comentário da Bíblia. São Paulo: Vida Nova, 2002. p. 867. 5 RYRIE, Charles C. Op Citp p. 1123.
10
A expressão hebraica �������� para Dia do Senhor vem apenas associada
com a idéia de iminência deste Dia, marcado pela presença do termo �����. Esse conceito,
somado ao fato de que neste documento é apenas demonstrado o juízo das outras nações,
demonstra que estava em pleno acordo com a expectativa judaica desse “Dia”.
Como foi demonstrado, a esperança de Israel era que Yahweh interviria na
história para promover juízo às nações que o afligiam, enquanto lhes promoveria salvação.
Obadias parece cônscio desta idéia, e sua visão profética fundamenta essa perspectiva. Assim,
não existiriam problemas em datar esse documento por volta do ano 841a.C. Então, fica
evidente o caráter positivo dessa profecia, no ponto de vista de Israel. A mensagem, mesmo
sendo marcada pelo juízo de Deus, demonstra a salvação para o povo, que era o momento
mais esperado por eles.
Dessa forma, pouco pode ser extraído sobre a expressão “Dia do Senhor”, a
não ser que este tem um caráter punitivo das nações que se levantarem contra os da “casa de
Jacó”, somado ao livramento destes. Porém, o versículo 21 faz uma menção muito importante
quando afirma: “...o reino será do Senhor”. O povo de Deus não duvidava do Seu controle
Soberano sobre a história, mas sempre aguardou a plena expressão e reconhecimento de Seu
Governo. Essa certeza era a maior glória do povo, que esperava ansiosamente por esse dia.
4.1.2 Joel
A palavra de Deus veio a Joel em um momento de extrema calamidade no
meio do povo. Ele pregou e registrou sua admoestação por meio da figura de uma invasão de
gafanhotos (v. 1.4). Segundo seu relato, essa invasão seria forte e devastadora dando um
clima de punição ao seu livro, embora também existisse um caráter benevolente da ação de
Deus, pois se houvesse um arrependimento genuíno, haveria salvação (vv. 2.18-27).
Assim pode-se perceber o caráter progressivo da literatura de Joel, que se
apresenta punitiva para o povo de Israel (vv. 1.1-2.11), se estende com a conclamação deste
povo ao arrependimento (vv. 2.12-17), demonstra o zelo de Yahweh para a reconstituição do
Seu povo (vv. 2.18-27) e salvação do mesmo (vv. 2.28-32), bem como a punição das outras
nações (vv. 3.1-17).
Dentro dessa estrutura muito bem elaborada, Joel tece alguns aspectos do
Dia do Senhor. Charles C. Ryrie chega a afirma que “o dia do Senhor, tema principal da
11
profecia de Joel, envolve uma intervenção especial de Deus nos acontecimentos da história
humana”6. Embora o Dia do Senhor esteja intimamente ligado a essa intervenção especial de
Deus na história, a partir de Joel, pode-se perceber um aspecto mais abrangente e tenebroso
com respeito a esse dia. Isso pode ser observado pelas palavras que Joel associada à expressão
“Dia do Senhor”.
A palavra integrada ao Dia do Senhor, em Joel 2.11, “Grande” (Heb.
�����), tem conotações importantes no que diz respeito à conceituação do termo. A palavra
hebraica expressa o sentido de grandeza, em termo de magnitude e extensão, número,
intensidade, importância. Dentro do contexto do livro de Joel, a expressão “grande é o Dia do
Senhor”, parece referir-se à sua Intensidade, pois, desde o início do livro, Joel enfatiza o
caráter punitivo deste Dia, demonstrando o levantar de um povo que será grande (Heb. ���,
no sentido quantitativo; Jl.2.2) e poderoso (Heb. �����,que carrega o sentido de poder em
número), como valentes (Jl.2.7) e homens de guerra que executam as ordens do Senhor. Esse
aspecto de intensidade pode ser observado por outra expressão referente a esse Dia, que é
“mui terrível” (Heb.�����������).
A intensidade expressa pela palavra “grande” não diz respeito à amplitude
do evento, mas ao ardor punitivo daquele dia, fato observado nos primeiros momentos do
livro. No capítulo 2, versículo 2, Joel faz uma descrição desse dia como um “dia de
escuridade e densas trevas, dia de nuvens e negridão”.
Ao observar essa frase cunhada por Joel, é complicado concordar com a
perspectiva de Hubbard que afirma como aspecto mais importante do Dia, a compaixão e não
a ira, demonstrando que “Javé estava pronto para mudar”7 e que o papel do profeta era
preparar o povo para isso.
Com certeza Hubbard não atentou para a colocação inicial do profeta sobre
esse dia “Ah! Que dia! Por que o Dia do Senhor está perto, e vem como assolação do Todo-
Poderoso” (v. 1.15). A palavra “assolação” (heb. ����) pode ter o sentido de destruição,
devastação, ruína. Assim, fica evidente o aspecto de intensidade desse “Dia”.
6 RYRIE, Charles Caldwell. A Bíblia Anotada. São Paulo: Mundo Cristão, 1991. p. 1108. 7 HUBBARD, David Allan. Joel e Amós. São Paulo:Vida Nova, 1996. p. 25
12
Contudo, não podemos descartar as considerações que Joel faz sobre a
demonstração do zelo de Deus para com seu povo, pois, após o chamamento para
arrependimento, Joel enfatiza a provisão divina para a terra (vv. 2.18-19). Essa atitude deve
ser encarada como motivo de louvor para toda a terra (v. 2.21). Porém, nesta esfera de
provisão, Deus conclama o Seu povo a alegrar-se, pois Ele vai reconstituir a nação,
devolvendo-lhe o que foi devorado pelos gafanhotos.
Segue-se que, para Joel, o Dia do Senhor tem por cerne a demonstração da
punição de Deus, embora envolva a demonstração de Seu zelo. Mas ainda não está completo
esse conceito, pois no fim do livro pode ser observado um aspecto de paz e prosperidade para
Israel, enquanto seus inimigos foram destruídos (vv. 3.19-21).
Dessa forma percebe-se que para Joel, o Dia do Senhor é um Dia de
punição, julgamento, primeiro de Israel (vv. 1.15-2.11) e depois das nações (vv. 3.1-17), mas
que envolve um aspecto de salvação, livramento para as nações (vv. 2.21) e para Israel (v.
2.23) e de paz e prosperidade a Israel e a Judá (vv. 3.18-20).
4.1.3 Amós
Amós residia em Tecoa (vilarejo que se situava a 16 quilômetros de
Jerusalém), e tinha por ocupação o pastoreio de ovelhas quando recebeu o chamado divino
para exercer o ministério profético. Então viajou para o norte, até Betel, para pregar no que
era um terreno virtualmente estrangeiro. Ele profetizou na época de Uzias, rei de Judá (791-
740 a.C.), que governava uma nação prospera, mas sob a influência direta de Jeroboão II, rei
de Israel (793-753 a.C.). Externamente, seu reinado foi o ápice da monarquia do reino do
Norte, ao passo que, internamente, foi um período marcado pela idolatria e corrupção (2Rs
14.24-25).
A mensagem de Amós destina-se a todos aqueles que ignorando o ensino e
os mandamentos de Yahweh, fizeram aquilo que era bom aos seus próprios olhos e se
deixaram levar pela idolatria e pela luxúria. A sua profecia pode ser dividida de duas formas:
a primeira parte trata-se do julgamento que Deus trará no Seu dia, a todas as nações pagãs.
Primeiramente, Amós relata a benevolência e paciência de Deus para com essas nações,
mostrando que o Senhor suportou os seus numerosos atos de rebelião (Am 1.3,6,9,11,13;
2.1,4). Depois, ele descreve como será o julgamento divino para essas nações.
O primeiro povo a ser julgado é o povo de Damasco, que é julgado pela sua
13
crueldade com os outros povos. Charles Ryrie chega a afirmar que “os siros de Damasco
literalmente ‘trilhavam’ e deformavam os corpos dos seus prisioneiros de guerra com ferros
de arado crivados de pontas agudas”8. Deus então penaliza essa nação de três formas: o
extermínio da descendência de Hazael, rei dos sírios de Damasco (Am 1.4), a destruição de
Damasco e do vale do Áven que, provavelmente, era um centro de culto pagão, e a deportação
desse povo para Quir, que mais tarde foi efetuada pelo rei Tiglate-Pileser III da Assíria.
Os próximos neste julgamento são os filisteus. E desta vez, quatro cidades
são levadas ao banco dos réus: Gaza, uma cidade que ficava próxima ao Egito e era conhecida
pelo tráfico de escravos; Asdode, situada a 33 quilômetros de Gaza; Ascalom e Ecrom. A
transgressão descrita é o tráfico de escravos, que era, provavelmente, uma transação comercial
em que os filisteus atacavam as cidades vizinhas de Judá e Israel e vendiam seus prisioneiros
aos edomitas, os piores inimigos dos israelitas. O anúncio do julgamento, segundo Hubbard, é
ampliado para mostrar o poder devastador de Yahweh. A frase final resume de toda a
calamidade dizendo que o último grupo de sobreviventes, sofre um destino ainda pior do que
os que foram exilados. Hubbard diz que “... nestes discursos somente aqui a fórmula é
ampliada de modo a incluir ������� e também o nome ����, reforçando assim a observação
quanto ao poder e à autoridade divina”9.
Agora, Deus volta os seus olhos para o norte, para a cidade de Tiro. Há
indícios que demonstram que este relato vem logo depois do relato da Filístia, por causa da
semelhança da transgressão de ambas: o comércio de escravos com Edom. Porém, para Tiro
existem dois agravantes: eles negligenciaram uma aliança feita com algum povo que não é
relatado, e, pelo fato de se situarem em uma ilha, seus habitantes eram autoconfiantes e criam
que ninguém poderia derrota-los. Por isso Tiro é julgada com um fogo que comerá (heb.
�������) toda a cidade.
Depois de participar dos dois últimos julgamentos, chega a hora de Edom
ser sentenciado. A sua acusação principal é a guerra impiedosa contra seu irmão, referindo-se
a Esaú e a Jacó, os antepassados dos edomitas e israelitas (Gn 25.19-26). Hubbard afirma, que
a guerra de Edom contra os de Israel é dominada por uma ira cruel que “não cessa de
8 RYRIE, Charles Caldwell. A bíblia Anotada. São Paulo: Mundo Cristão, 1991. p. 1114 9 HUBBARD, David Allan. Joel e Amós. São Paulo: Vida Nova, 1996. p. 150
14
despedaçar suas vítimas”10. As duas cidades edomitas, tanto Temã quanto Bozra, são alvos
adequados para o juízo divino, pois, com certeza, corre através dessas cidades o comércio de
escravo que levou o povo de Edom a tal sentença.
Amós continua sua lista de julgamentos e chega aos amonitas. Este povo é
acusado pela sua crueldade para com as mulheres de Gileade, especificamente para com as
grávidas a quem eles, sem nenhuma piedade, literalmente rasgaram seus ventres com o
propósito de satisfazerem seus desejos depravados. A sua condenação é bastante severa. Deus
mandará fogo que consumirá a nação, aqui representada pela sua principal cidade, Rabá, e
também com a deportação desse povo junto com o seu rei e seus príncipes.
É chegada a hora dos moabitas serem julgados. Este povo é acusado,
principalmente, por dizimar o povo de Edom. É interessante notar o que Deus faz com as
nações pagãs. Primeiramente, Deus utiliza a nação de Moabe para executar a sentença sobre
Edom. Agora Moabe é julgado exatamente por causa de “ser utilizada por Deus” na
dizimação a Edom. A sentença divina é, mais uma vez, fogo que consumirá totalmente as
fortalezas das cidades de Moabe. Haverá também grande tumulto e todos os governantes
dessa nação serão exterminados.
O Senhor agora volta os seus olhos para o seu povo. Independente da sua
divisão política, Deus os pune, principalmente, por causa de sua negligência para com a Sua
Lei. Nesta época a nação de Judá, apesar de ser governada por um rei aparentemente justo
(Uzias), o povo de Judá era extremamente influenciado pelo reinado de Israel (Jeroboão II).
Por causa de toda essa transgressão, Deus os julga com severidade e não poupa nem a cidade
de Jerusalém.
Finalmente, Amós termina o seu discurso de julgamento para as nações com
o relato da nação que era menos esperada pelo povo a quem ele pregou: a nação de Israel. Os
israelitas pensavam que esse julgamento era apenas para as nações vizinhas e que eles
estariam sempre debaixo da benção divina independente da fidelidade do povo para com Ele.
É interessante perceber que Israel, ao contrário das ouras nações, recebe diversas acusações.
Quatro delas são citadas como motivo de julgamento: vender os pobres como escravos (Am
2.6), perverter a justiça dos oprimidos (Am 2.7), relações sexuais ilícitas (Am 2.7) e tirar
10 HUBBARD, David Allan. Joel e Amós. São Paulo: Vida Nova, 1996. p. 152
15
vantagens financeiras dos pobres (Am 2.8). Um fato interessante nesta quatro acusações é que
elas têm algo em comum: todas são fruto de abuso de poder. Sobre essas acusações, Hubbard
afirma:
Os credores, fazendo uso de propinas, perseguições financeiras ou provas fraudulentas, vendiam pessoas inocentes... Isso, no mínimo, viola as leis que exigem um tratamento humano para os escravos, violação essa que tornava o crime de Israel pior que o de Gaza... Pais, aproveitando da obediência filial e da incapacidade da mulher para defender seus direitos, alegavam autoridade patriarcal para manterem relações sexuais com suas noras, apesar das leis de Israel, que proibiam claramente tal confusão de relações sexuais. Parece que não se tem em vista a escrava nem a prostituta, pois Amós emprega a palavra ������� , mulher jovem moça, para descreve-la.11 (grifo pessoal)
Se parasse neste ponto, as acusações que se tem em mão já seriam
suficientes para condenar Israel. Porém, Amós ainda não acabou o seu discurso. Agora ele dá
uma verdadeira aula sobre a história israelita, relembrando-os de tudo que Deus realizou pelos
seus antepassados e por eles (Am 1.9-11). O castigo para Israel é mais severo do que para as
outras nações, principalmente, por causa da sua negligência (Am 1.12) para com a revelação
dada somente a eles através de profetas e nazireus (Am 1.11). Deus então desfere a sentença
para Israel dizendo que não restará nenhum sobrevivente e que até os mais valentes e mais
treinados para a guerra sairão correndo de medo naquele dia. Deus, mais uma vez, relembra o
povo de Israel que tudo tem uma conseqüência lógica (Am 3.2-7), ou seja, que todas as
conseqüências que Israel sofrerá são devido às suas ações para com Deus. Essa passagem traz
uma lembrança da aliança deuteronômica, onde se Israel obedecesse, seria abençoado, porém,
se desobedecesse, as maldições prescritas viriam.
A partir do capítulo 5, Amós começa a dar descrições de como será,
realmente o dia do Senhor. Como foi dito acima, o povo israelita mantinha a tradição de que o
dia do Senhor seria de julgamento apenas para as outras nações e que eles estariam sempre
debaixo da benção de Deus não importando o modo de como eles agiam para com Ele. Amós,
então mostra a realidade do dia do Senhor para o Seu povo. Deste ponto em diante, Amós
expõe que dia do Senhor será terrível para todo aquele que despreza os seus mandamentos e
faz o que Ele reprova, incluindo da nação de Israel.
Amós continua a atacar verbalmente os dois maiores males de Israel: uma
adoração sem uma preocupação com a justiça (vv. 5.18-27) e a preguiça e calmaria sem a
11 HUBBARD, David Allan. Joel e Amós. São Paulo: Vida Nova, 1996. p. 160
16
consciência da iminente calamidade (v. 6.14). E agora ele volta-se para aqueles que desejam o
Dia do Senhor. Feinberg diz que alguns afirmam que nesse grupo havia escarnecedores que se
atreviam a desafiar o Senhor a fazer o pior que pudesse. Apesar de ter uma possível
explicação, é preferível ver que neste texto o profeta se refere a pessoas que falam
piedosamente e, simultaneamente, praticam ações perversas12. Estas pessoas são hipócritas e
enganam-se a si mesmas. E, no meio de todo este pecado, eles desejavam o Dia do Senhor
pois achavam que seria um dia de glória e livramento para todo o Israel.
Amós explica-lhes que o dia do Senhor é dia de trevas para o ímpio. A
palavra utilizada por ele para qualificar a expressão “Dia do Senhor” é ����� que significa
escuridão ou obscuridade. É interessante analisar como essa palavra é utilizada em outros
textos. Essa palavra aparece 51 vezes em todo o Antigo Testamento e, na maioria das vezes
em que ocorre, ela traz consigo o sentido de morte, escuridão extraordinária e pode até ser
vista como uma espécie de sinônimo de ����� (����).
Então, através disso, pode-se perceber claramente que o Dia do Senhor ao
qual Amós estava se remetendo era, na realidade, um grande e terrível dia de julgamento para
os que viviam uma vida hipócrita diante de Deus. A história, contada por Amós, sobre o
homem que foge do leão e do urso para ser picado por uma cobra em sua própria casa,
enfatiza mais ainda o caráter abrangente e punitivo desse dia. Em outras palavras, ninguém,
incluindo os israelitas, que vivesse uma vida hipócrita escaparia de tamanho castigo.
4.1.4 Oséias
O profeta Oséias exerceu o seu ministério durante os anos dos reis Uzias
(792-740 a.C.), Jotão (750-731 a.C.), Acaz (735-715 a.C.) e Ezequias (729-686 a.C.), de Judá;
e de Jeroboão II (793-753 a.C.) de Israel. O fato de Oséias não ter citado os reis que reinaram
no reino do Norte durante o período compreendido entre o fim do reinado de Jeroboão II e o
fim do seu ministério pode significar uma mudança de residência (ou de interesse) de Israel
para Judá durante o curso do seu ministério. Devido ao fato de Jeroboão II ter sido o último
rei da dinastia de Jeú13 e o último reinado que gozou de alguma estabilidade em Israel, a
proposta de que Oséias não tinha interesse profético no reinado dos reis posteriores a 753 a.C.
12 FEINBERG, Charles L. Os profetas menores. São Paulo: Vida, 1996. p. 104 13 Zacarias, filho de Jeroboão II foi assassinado no seu sexto mês de reinado.
17
parece explicar a ausência de citações referentes aos governantes do reino do Norte deste
período.
A situação religiosa de Israel, testemunhada pelo profeta, durante o reinado
de Jeroboão II era de total apostasia. Apesar das conquistas territoriais e da liderança política
total do monarca, cada vez mais a nação se afastava de Deus e se afundava na idolatria,
atribuindo a deuses pagãos a paz que havia em Israel naqueles dias. Este afastamento de Israel
para com Yahweh é ilustrado pelo próprio casamento do profeta com Gômer.
Um fator que contribuiu para a insistência de Israel na apostasia foi a
situação pacífica gozada pelo reino durante o reinado de Jeroboão II. Os ataques dos reis
assírios, tão freqüentes no século nono, foram interrompidos devido a outros conflitos e a
nação pôde prosperar. Durante a trégua assíria, Israel ampliou os seus domínios chegando a
conquistar Damasco.
Neste contexto, Oséias adverte Israel sobre as conseqüências do seu
“adultério” contra Yahweh e, quase sem esperanças de ser ouvido, chama a nação ao
arrependimento. Oséias fala do juízo divino de Israel pela sua apostasia e mostra que a pior
conseqüência deste afastamento é o seu abandono temporário por parte de Deus o que
causaria grandes sofrimentos para todo o povo. Porém, o profeta é consciente do caráter
incondicional da aliança e traz a promessa de restauração ao povo de Deus.
O conceito do Dia do Senhor no livro de Oséias está inserido no contexto da
restauração definitiva da esposa traidora de Yahweh (Israel) na sua posição de povo separado
para ser o receptor das bênçãos contidas nas alianças. Oséias garante que aquilo que o Senhor
havia dito a Abraão não foi nem será revogado, mas tem o seu pleno cumprimento preparado
para o Dia do Senhor. Dentro da mensagem profética de Oséias, o conceito do Dia do Senhor
está presente, sempre se referindo à época de restauração nacional de Israel e à época em que
Deus fará que a sua aliança seja cumprida.
A expressão “Dia do Senhor” não ocorre no livro de Oséias. Entretanto,
pode-se identificar este conceito em pelo menos dois trechos do livro. O primeiro deles se
encontra logo no primeiro capítulo, quando o profeta fala do dia de Jezreel. O lugar onde Jeú
matou Jorão e todo o restante da casa de Acabe chamava-se Jezreel. Deus ordenou que Oséias
pusesse este nome no seu filho mais velho como alusão a este ocorrido, mas também ao fim
da dinastia de Jeú que ocorreria futuramente. Porém, no fim do primeiro capítulo (v. 2.2 no
18
TM), Oséias tira a carga negativa do nome e afirma que a restauração de Israel se dará no dia
de Jezreel, que não mais denota morte, mas agora é uma alusão à benção futura quando
Yahweh irá reabilitar o seu povo para que desfrutem das bênçãos das alianças. Esta
reabilitação se dará sob o governo de um líder único para todo o povo (v. 1.10) que será
novamente completamente reunido.
Pode-se identificar claramente o Dia do Senhor em mais um trecho
relacionado à restauração futura de Israel. A partir do versículo 14 do segundo capítulo do
livro de Oséias, o profeta fala da promessa divina de reatar os laços com a sua esposa
adúltera. Isto acontecerá exclusivamente por iniciativa de Yahweh, pois ele continua fiel à sua
aliança, ainda que o seu povo o abandone. Naquele dia, o Senhor irá purificar definitivamente
o seu povo da idolatria (v. 2.17) e irá estabelecer Israel na terra prometida para sempre (v.
2.23). Será um tempo de grande prosperidade para Israel, pois a mão do Senhor novamente
estará sobre eles. O Senhor será sensível aos pedidos de Israel e, novamente, o povo
desfrutará de um relacionamento privilegiado com Deus.
O profeta Oséias continua o seu livro falando do juízo de Deus para com o
seu povo, mas a fidelidade de Deus para com a sua aliança continua presente no discurso do
profeta, o mantendo consciente de que, por maior que fosse a apostasia de Israel, Yahweh
jamais abandonaria o povo da aliança, pois não pode negar a Si mesmo.
4.1.5 Isaías
Isaías foi, sem a menor dúvida, o maior de todos os profetas do Antigo
Testamento, pois seu pensamento e doutrina cobriam uma gama tão variada de assuntos
quanto seu ministério foi de longa duração. Embora seus escritos possam ser divididos em
duas partes: os capítulos 1-39, vinculados ao julgamento, e os capítulos 40-66, enfatizando o
consolo prioritariamente; o livro forma uma unidade devido aos seus próprios aspectos de
continuidade, tal como a expressão “Santo de Israel” que ocorre doze vezes na primeira parte
e quatorze vezes na segunda parte14.
Pode-se dividir as profecias de Isaías em dois grupos. Ao primeiro
pertencem as que têm seu ponto de partida nos acontecimentos de sua época, embora se
14 KAISER, Walter C. Jr. Teologia do Antigo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 1984. p. 212
19
concentrem em um futuro distante. Um segundo grupo inclui profecias que não apenas
predizem o futuro, mas também tem seu ponto de partida numa época posterior à de Isaías;
isto é, especialmente na época do cativeiro babilônico. Estas profecias mencionadas em
último lugar, que muitos estudiosos alegam não serem de Isaías, encontram-se principalmente
nos capítulos 40-66.
O contexto em que Isaías viveu é de grande importância para o
entendimento da visão do profeta a respeito do Dia do Senhor. Ele exerceu seu ministério nos
dias de Uzias, Jotão, Acaz e Ezequias, todos reis de Judá. O seu ministério foi direcionado ao
reino do Sul, mas ele pôde testemunhar a queda de Israel em 722 a.C., o que é um fator
relevante no pano de fundo do profeta. É neste contexto histórico que o profeta Isaías prediz
acerca dos eventos que acontecerão “naquele dia”, e isto certamente influenciou suas
palavras. Isto posto, é importante salientar algumas ocorrências no livro, quando Isaías
discorre a respeito do Dia do Senhor.
Em seu livro, ele revela que o propósito de Yahweh abrangia todas as
nações da terra. Estas se levantariam e cairiam de acordo com o Seu plano (vv. 14.24-27).
Quando o orgulho nacional destas nações se exaltou, como resultado do sucesso das ações
imperialistas contra outros povos, elas foram advertidas a não mais se orgulharem da sua
ascensão sobre outros países, pois cada uma destas nações foi usada como instrumento nas
mãos de Yahweh para disciplinar Israel. Mesmo sendo instrumentos estabelecidos por Deus a
sua atuação não era livre, se ultrapassassem os limites de Yahweh seriam punidos na mesma
moeda, pois Deus levantaria outra nação para aplicar a disciplina contra o seu povo.
No entanto, há um aspecto futuro na idéia de Isaías do “Dia do Senhor”.
“Naquele dia” Judá aterrorizaria o Egito segundo o plano do Senhor dos Exércitos (vv. 19.16-
17), e um soberano severo oprimiria seus próprios súditos egípcios (vv. 19.20). Yahweh, no
entanto, libertaria o Egito de modo milagroso de tal maneira que este país faria uma terceira
parte da adoração ao Senhor, juntamente com Israel e Assíria, tendo uma herança do Senhor
junto com estas duas nações (vv. 19.24-25). Assim, embora o Senhor tivesse de ferir o Egito,
Ele o sararia ao enviar um juiz e “salvador”, assim como fizera em favor de Israel no tempo
dos juízes. Então o Egito adoraria ao Deus vivo juntamente com Israel (vv. 19.18-19, 21-22).
O Senhor agora volta Sua atenção para Seu povo. Israel não está seguindo
os caminhos do Senhor. Devido aos seus costumes pagãos e pensamentos mundanos, o povo
perdeu o favor do Senhor. O comércio que havia florescido durante o reinado de Uzias e
20
Jotão, fora uma das razões pelas quais Judá, em seu mundanismo, se havia esquecido da sua
vocação como povo do Senhor. Portanto, o profeta considera com aversão os tesouros de
prata e ouro que se haviam ajuntado em Judá (como em Israel durante o reinado de Jeroboão
II). Semelhantemente, Isaías condena os pensamentos mundanos que motivavam o acúmulo
desses tesouros, e que se demonstra especialmente pela arrogância a que ele havia levado (vv.
2.11ss).
Em Isaías 2.8 identifica-se outra razão para a ira do profeta: a terra está
cheia de ídolos. O povo havia condescendido à loucura dos pagãos e se ajoelhara diante da
criação de seus próprios dedos (vv. 44.10). Desta forma, os arrogantes se degradaram, quer
pertencessem à plebe, quer às classes mais altas. Por causa deste pecado o Senhor traria
julgamento (vv. 2.10-22). A descrição do julgamento aqui não é de um julgamento em
particular (e.g. destruição através dos seus inimigos; cap. 3), mas de um juízo em seu caráter
abrangente, o “Dia do Senhor”.
O Senhor virá para julgar, quem será capaz de manter-se em pé? Há razão
para entrar nas cavernas e se esconder em buracos no chão (cf. v.2.19). Todos pecaram, tanto
os grandes como os pequenos. Todos ansiaram por coisas elevadas, e serão rebaixados. A sua
autodegradação espiritual será apropriadamente castigada pela degradação externa. Só o
Exaltado, o Senhor, permanece (vv. 2.11, 17).
Por esta razão o dia do juízo é chamado de dia em que o Senhor Todo-
poderoso reservou para todos os orgulhosos e soberbos. Este é o Dia do Senhor (vv. 2.11, 12,
17; 13.6, 9). Nos profetas este é o dia em que o Senhor se revela em majestade para derrubar
os Seus inimigos (e também para salvar o Seu povo – mas esta idéia está em segundo plano
aqui cf. vv. 4.2-6). Esta é a descrição do juízo final no Antigo Testamento, e, no espaço de
tempo entre a profecia e este evento escatológico, houve julgamentos específicos que o
prefiguraram.
O ponto central do julgamento é o homem. Por esta razão ele é mencionado
tanto no início como no fim do “dia do Senhor”. Ninguém que esteja separado do Senhor,
permanece grande, inclusive os ídolos diante dos quais o povo tanto se curvava. “Naquele
Dia”, O povo (vv. 2.20) reconhecerá a desvalia dos ídolos que fizeram com tanto cuidado. Em
seu desespero, eles os jogarão fora. Ninguém se lembrará mais deles, a não ser os ratos e
morcegos. O quadro será de desolação completa.
21
“Naquele dia” em Isaías 4.2 refere-se à era messiânica de salvação que
irrompe depois do julgamento. Israel não seria totalmente destruído. A promessa da
preservação de um remanescente ocorre repetidamente em Isaías (vv. 6.13; 7.3). Para eles um
novo período de glória nascerá. “Naquele Dia”, um adorno muito superior aos falsos enfeites
dos dias da sua vaidade os espera (v. 3.18). As suas vestimentas, os seus ornamentos e a sua
glória serão chamados “o Renovo do Senhor” e o “fruto da terra”.
Finalmente, a salvação que o Messias traz é retratada de outra maneira, a
saber: a figura da volta de Israel do exílio, que foi profetizado por Isaías (vv. 5.13; 6.12) e de
fato iniciado com a invasão assíria em 722 a.C e as três ocupações babilônicas (605, 597 e
586 a.C.). Na era messiânica que virá, o Senhor Todo-poderoso (v. 6.1) estenderá pela
segunda vez a Sua mão (como por ocasião do êxodo do Egito c.f. v. 11.16), isto é, Ele
demonstrará o Seu poder para remir e libertar os israelitas que vivem no exílio. Eles serão
chamados de remanescente (vv. 7.3; 10.20), separados das nações gentílicas. Eles voltarão
como remanescente que sobreviveu ao julgamento e escapou à opressão. Assim, “naquele
dia” de todos as partes do mundo Ele trará os que pertencem ao Seu povo de volta a Canaã.
“Naqueles dias”, quando Israel experimentar a libertação dada pelo seu
Deus, os cânticos da sua juventude serão renovados e o povo cantará novamente como nos
dias antigos. O cântico de louvor que se segue agradece ao Senhor porque depois de um
período de ira o Seu furor foi amenizado e a abundância de consolação foi concedida a Israel.
Isaías proclama profecias não só para Israel e Judá, mas também às nações
gentílicas. Sendo a Babilônia a primeira nação contra quem Isaías proclamou. Devemos notar
que mais do qualquer outro reino, a Babilônia representa nas Escrituras o poderio mundial que
é hostil a Deus. Foi na Babilônia que o orgulho humano desafiou o governo de Deus, desde a
época em que foi construída a torre de Babel (vv. 13.11, 13ss). Portanto, a predição da queda
da Babilônia encabeça apropriadamente a série de profecias contra nações gentias, e tem um
âmbito muito mais abrangente. Um exército vem de longe para destruir a Babilônia bem como
toda a terra. O profeta tem em vista o vasto Império Babilônico que abrangia, quase que
inteiramente, o mundo conhecido na época. Este tempo Isaías denomina “Dia do Senhor”. Isto
revela que, para o profeta, o juízo de Babilônia será junto com o juízo final sobre todas as
nações. O cumprimento propriamente dito mostrará que os dois juízos estão separados por
muitos séculos, mas essencialmente eles são um, sendo o primeiro um tipo do segundo.
O profeta ainda proclama o juízo de Deus “naquele dia” contra Damasco,
22
Efraim (vv. 17.1-9), Egito (v. 19.16), apesar de, no mesmo capítulo, profetizar que o Egito
será abençoado “naquele dia” (vv. 19.18-24); contra a Etiópia (v. 20.6), contra Jerusalém (vv.
22.8, 12) e contra Sebna, administrador do palácio (v. 22.20). No capítulo 24, são
mencionados os “reis da terra” (v. 24.21). Isto não acontece porque o profeta procura pelo mal
apenas nos grandes da terra – o julgamento se abate sobre todos (vv. 24.1-3) – mas porque
eles são os representantes da humanidade pecaminosa, particularmente da luta da humanidade
para se exaltar contra Deus. O juízo vem sobre todo o orgulho da criatura (v.2.12) e em duas
partes: primeiro os reis são tangidos para masmorras, em seguida são “visitados” depois de
muitos dias com uma perspectiva de serem levados diante de um juiz.
Isaías 27.1 diz: “Naquele dia, o Senhor, com sua espada severa, longa e
forte, castigará o Leviatã, serpente veloz, o Leviatã, serpente tortuosa; matará no mar a
serpente aquática” (NVI). Charles C. Ryrie afirma que o Leviatã e a serpente são símbolos
dos inimigos de Deus, que serão feridos pelo Seu juízo. Possivelmente os dois Leviatãs
representam a Assíria e a Babilônia. A serpente aquática ocorre repetidamente como um
símbolo do Egito (vv. 51.9; Sl 74.13). A conseqüência desta vitória lê-se nos versos 12 e 13
do mesmo capítulo.
Com a costumeira peça de ligação, “naquele dia”, Isaías traz agora no
capítulo 28 verso 5, uma sentença de restauração. Do castigo se salvará um remanescente que
terá o Senhor como coroa única. Por estas razões o profeta descreve em Isaías 52.6, “Naquele
dia”, isto é, no grande dia da redenção, Israel aprenderá por experiência que coisas
maravilhosas e esplêndidas estão ligados a este nome. Que o Senhor diz que, a despeito de
todos os inimigos, Ele se levantará em Sua grandeza, graça e fidelidade.
4.2 Período Exílico
O período exílico é marcado pelas atividades proféticas de Sofonias,
Jeremias e Ezequiel no que tange ao “Dia do Senhor”. Estes escreveram para o povo com o
objetivo de ressaltar o perigo que ainda estava por vir, descrevendo de maneira particular o
evento. Entretanto, a particularidade no estilo literário de cada autor enriquece a conceituação
do Dia do Senhor como um evento. Assim é necessário compreender essas particularidades
observando cada autor.
A compreensão acerca do Dia do Senhor dos profetas do exílio com certeza
foi influenciada pelo fato deles terem presenciado o castigo de Deus vindo sobre o povo da
23
Aliança. Com certeza foram dias de escuridão com respeito a forma como Yahweh agiria com
o seu povo. Muitos rejeitaram o caráter incondicional das alianças, pensando que Deus havia
definitivamente abandonado o seu povo.
Com a queda do reino do Norte em 722 a.C., surgiu um problema teológico
envolvendo o caráter das alianças. O Senhor não mais suportara a rebeldia de Israel, por isso
enviou os assírios para disciplinar a nação, desintegrando-a totalmente e dispersando a sua
população por várias regiões do império. Judá observou este acontecimento com apreensão,
pois a disciplina de Deus para com Israel envolvia fatores que, aparentemente, iam de
encontro com as estipulações das alianças, tais como a saída do povo da terra prometida.
Tanto o povo quanto os profetas de Judá tinham consciência do verdadeiro motivo pelo qual
Israel havia sofrido a disciplina divina – a apostasia. Porém, a compreensão desta realidade
não era interpretada de forma semelhante pelos profetas e pelo povo. Judá não queria buscar o
arrependimento, antes julgava ser a nação intocável. Os profetas viam que o destino de Judá
seria o mesmo de Israel, se permanecesse da impiedade.
Com as três invasões de Jerusalém em 605, 597 e 586 (esta última
culminando com a destruição do templo), ficou provado que as advertências dos profetas
eram fundadas e que a ira do Senhor se lançaria contra Judá. Por ocasião destas três invasões,
Nabucodonosor levou grande parte da população de Judá para o cativeiro em Babilônia.
Assim como Israel, Judá fora tirado da sua terra.
Apesar de não estarem na sua terra natal, os judeus foram tratados de forma
razoável durante o exílio. Muitos deles começaram negócios e prosperaram, alguns chegaram
a ocupar altos postos no governo e, de forma geral, se adaptaram bem ao estilo de vida da
Babilônia. Aparentemente, este era o fim de Judá como nação unida e habitando na terra
prometida.
Neste contexto, os profetas tiveram um papel fundamental na reafirmação
da aliança com Yahweh. Eles compreendiam que Deus estava disciplinando o seu povo, mas
que também operaria uma restauração completa do povo de Israel no Dia do Senhor.
4.2.1 Sofonias
O livro de Sofonias é o nono na coleção profética da literatura dos hebreus,
sendo considerado mais um dos profetas menores. Porém, as declarações feitas e os juízos
propostos não soam menores em nada em relação a outros profetas. Muito pelo contrário, são
24
abrangentes às nações enquanto específica na afirmação dos detalhes envolvidos na execução
desse juízo, no qual está incluso o próprio povo de Judá e Jerusalém (v. 1.4).
A Palavra do Senhor veio a Sofonias nos dias de Josias, pouco antes do
grande reavivamento em Judá em 621 a.C. e, segundo Carson, a composição desse livro pode
ser datada em cerca de 627 a.C.15
Sofonias marca o início de uma nova linha de profetas que deveria incluir
Jeremias, Habacuque e Ezequiel, todos os que procuraram salvar Judá da sorte que já tinha
envolvido o reino do Norte. Sua visão dos adventos futuros é muito clara, porém negativa.
Suas colocações não deixam espaço para dúvidas, pois são precisas e completas,
demonstrando um “lado negro” das profecias. Dentro desse aspecto tenebroso, Sofonias
escreve de maneira muito sistemática. O profeta inicia com a demonstração do juízo contra
Judá e Jerusalém (vv. 1.2-18), anexado a um convite ao arrependimento (vv. 2.1-3) e, por fim,
somado a uma declaração de juízo contra outras nações (vv. 2.4-15) e às profecias de bênção
para as nações (vv. 3.9-10) e para Israel (vv. 3.11-20).
O início do livro não é nada simpático, pois começa com a seguinte
declaração de Deus: “De fato consumirei todas as cousas sobre a face da terra” (v. 1.2). E
ainda “consumirei os homens e os animais, consumirei as aves do céu, os peixes do mar, e as
ofensas com os perversos, e exterminarei os homens de sobre a face da terra”.
Por esta razão, diz-se que Sofonias demonstra o lado negro das profecias.
Sua mensagem é centrada no juízo a ser executado por Deus, e que este não será brando. Ele
começa afiançando este sobre Judá e Israel quando diz “estenderei a minha mão contra Judá, e
contra todos os habitantes de Jerusalém”. Em 1.7, este castigo � mostrado sob uma
perspectiva terrível: Judá é um sacrifício aos olhos de todos (�����, fala de sacrifícios
comunitários, e o radical fala de matança violenta), e os convidados s�o os da babilônia. O
fato do Senhor usar uma nação mais ímpia do que Judá como instrumento do castigo que não
pouparia nenhuma parte de Jerusalém (vv.1.10-13), atingindo todos os nobres e os que
gozavam de algum prestígio (vv. 1.8-9), soou para o povo como algo terrível.
Esse pronunciamento divino pela boca de Sofonias tem por motivo a
apostasia do povo que importou para si os ídolos de outros povos (v. 1.4), bem como seus
15 CARSON, J.T. Sofonias introdução e comentário. São Paulo: Vida Nova, 2002.
25
sacerdotes enquanto buscava uma adoração que não tem como alvo o Senhor (v. 1.5).
Contudo a declaração não está completa, pois nesse ponto Deus adverte o povo dizendo que O
Dia do Senhor está Perto (cf. 2Re.22.16-20).
A partir deste ponto as afirmações tornam-se mais claras. Pois nesse Dia, o
juízo virá sobre os oficiais, filhos do rei, todos que usam roupas estrangeiras, os que sobem o
pedestal dos ídolos e aos apegados ao vinho que dizem que o Senhor não faz nem bem nem
mal (vv. 1.8-12). Todas essas especificações de juízo demonstram a postura apóstata do povo
de Deus, incluindo a menção aos filhos do rei. Estes, segundo Carson, eram devassos e em
parte responsáveis pela situação do povo por denegrirem o estado moral e religioso das
estipulações de Deus ao reedificar altares associados à adoração de Baal16, introduzindo um
sincretismo religioso no povo.
Assim, o pronunciamento do juízo de Deus, como de costume nas profecias,
vem em acordo com a agressão feita pelo povo sentenciado. São notáveis as especificações
feitas no v.13: “Por isso serão saqueados os seus bens, e assoladas as suas casas, e edificarão
casas, mas não habitarão nelas, plantarão vinhas, porém, não lhes beberão o vinho”. Como se
não bastasse anunciar um momento de devastação do povo, Deus demonstra um período em
que o povo não experimentaria prosperidade.
Dentro desse quadro tenebroso encontra-se o Dia do Senhor associado a um
predicativo do sujeito que qualifica e expande a expressão. A palavra “amargo” (Heb. ���) é
comumente aplicada à comida, ou até mesmo à água. Outras vezes diz respeito a dores físicas
e sentimentos humanos. Neste caso, a expressão está ligada ao conceito que está presente no
campo semântico da palavra hebraica: prejudicial, danoso. Assim podemos perceber que este
Dia é também a execução do juízo através de atos prejudiciais e danosos. Tal juízo é fruto da
apostasia do povo.
Essas especificações são bem ampliadas pelo versículo 15 que atribui
diversos adjetivos a esse dia: “Aquele dia é dia de indignação, dia de angústia, dia de alvoroço
e desolação, dia de escuridade e negrume, dia de nuvens e densas trevas”. A palavra referente
a indignação é �������, que traz o sentido de fúria, raiva transbordante. Essa expressão está
ligada à punição intensa, aplicado a Judá, que será executada em um futuro próximo.
16 CARSON, J.T. Op Cit
26
Referente à angústia tem-se a palavra hebraica �����. Essa palavra denota dilema, aflição,
amargura, desgosto. Assim, essa expressão demonstra o conceito de amargura desse dia, que
será de aborrecimento para o povo de Deus. Alvoroço e desolação são correspondentes a
������e �������, ambas denotando ruína, devastação. A intensidade desses sinônimos juntos
proporcionam uma perspectiva tenebrosa desse dia que trará juízo e destruição, mostrando o
que foi dito nos versículos 1.2-3. Assim nota-se claramente que o Dia do Senhor não é dia de
festa e de libertação para o povo, mas um dia de punição pelas afrontas feitas ao Senhor da
Aliança, que é fiel aos Seus decretos e Pactos (Dt. 28) e os anuncia ao Seu povo.
Porém, Sofonias oferece ao povo um convite ao arrependimento. Um pedido
para que o povo se concentre e se examine, pois eles se encontravam numa situação
deplorável. Mas o arrependimento deve ser rápido, “antes que saia o decreto, pois o dia vai
como a palha; antes que venha sobre ti o furor da ira do Senhor, sim, antes que venha sobre ti
o Dia da Ira do Senhor” (v. 2.2). Esse versículo demonstra a iminência desse dia e o
caracteriza como a manifestação da Ira de Deus para aqueles que estão em desacordo com o
Seu plano. Por isso, o profeta diz: “buscai o Senhor, vós todos os mansos da terra, que
cumpris o seu juízo; buscai a justiça, buscai a mansidão; porventura lograreis esconder-vos no
dia da ira do Senhor” (v. 2.3). Assim, é clara a demonstração da punição ao povo de Deus
nessa manifestação do dia da ira do Senhor.
Agora, o tema do Dia do Senhor é aplicado às outras nações a partir do
versículo 2.8. Filisteus, moabitas, amonitas, ass�rios e etíopes n�o escapar�o do juízo do
Senhor. É Interessante notar que nos versículos 3.1-7, o castigo sobre as nações serve de
advertência a Judá. Aqui segue o mesmo modelo de entrega de profecias outrora utilizado por
Am�s: primeiro o anúncio de castigo �s nações vizinhas, depois ao próprio povo de Judá. De
fato, em N�meros e Jeremias, a expressão "ira do Senhor" sempre � utilizada em rela��o ao
povo da aliança.
Existe outro aspecto que pode ser observado no que diz respeito ao dia do
Senhor. Ao pronunciar o juízo divino a Moabe e a Amom (vv. 2.8-11), nota-se um aspecto
positivo para o povo de Deus, onde se lê: “o restante do meu povo os saqueará, e os
sobreviventes da minha nação os possuirão” (v. 9b). Essa colocação parece prenunciar o que
seria dito com mais clareza no momento das profecias de bênçãos para o povo de Deus (vv.
3.11-20): “Os restantes de Israel não cometerão iniqüidade, nem, proferirão mentira, e na sua
boca não se achará língua enganosa; por que serão apascentados, deitar-se-ão, e não haverá
27
quem os espante”.
A expressão “remanescente de Israel” corresponde ao termo hebraico
������������������, que aparece oito vezes no Antigo Testamento. Al�m de Sofonias, tr�s
profetas mencionaram este remanescente: Ezequiel, Jeremias, e Miquéias (Jr 6.9; 31.7; Ez 9.8;
11.13; Mq 2.12). Para todos eles, este remanescente estava em perigo devido aos pecados do
Judá infiel. A ora��o sempre � que o remanescente seja poupado.
Os profetas que fazem qualquer menção sobre esse remanescente,
expandindo esse tema, são posteriores a Sofonias. Assim vale notar o que Sofonias fala sobre
o assunto. Ele qualifica esse remanescente no versículo 3.12 como oprimido e pobre
(�����������). A primeira palavra, embora traduzida como "humilde” (ARA), fala de
opressão, aflição. É um povo que sofre as amarguras de um sistema social injusto, um sistema
de quase escravidão. É um povo que espera por uma nova salva��o, s� que agora dentro de
sua própria terra.
Assim, encontramos ecos da prega��o de Am�s (Am 2.7; 4.1; 5.11). A
injustiça social n�o pode passar desapercebida no dia do Senhor, e Sofonias concorda com
isto, pois o profeta via em seu tempo uma grande necessidade de uma reforma social, apesar
de Judá estar sendo governada por um rei piedoso. Josias foi posto no trono pela intervenção
do povo da terra ����������� (cf. 2Rs 21.24), que representava a camada da população mais
humilde (Gn 42.6; Ex 5.5), e promoveu uma das maiores reformas religiosas e sociais de
todos os tempos em Judá. Portanto, a ascensão desse rei pelas m�os do povo pobre,
possivelmente os camponeses, revela uma verdadeira revolução em Judá. Eles se tornaram
parte do cumprimento do Dia do Senhor.
Por isso, Sofonias prossegue em 3.13 mostrando o que se espera desse
remanescente de Israel. Será um povo puro, que não cometer iniqüidade. A palavra
iniqüidade nesta passagem � uma tradução de �������. A raiz tem o sentido básico de
"desviar-se" e, trazendo para o campo moral, desviar-se do caminho reto e bom. Este desviar-
se provoca atos violentos e at� homicídios. Assim como faziam os opressores de Judá.
Da mesma forma, o remanescente não proferirá mentira. O termo hebraico
usado para mentira nesta passagem é �����, que define a mentira consciente. Se o mundo
mente, o remanescente n�o deve assim proceder. Afinal, o que profere mentiras n�o escapar
(Pv 19.5), antes perecer (Pv 19.9). Na sua boca n�o se achará língua enganosa. Ou seja, uma
28
língua que engane pela astúcia (��������). Jeremias reclama do profeta que engana para
disto tirar beneficio (Jr 14.14; 23.26). O que o Senhor mandar dizer, isso falar o
remanescente.
Para Sofonias, o remanescente adquire claros tons escatológicos.
Promoverão uma revolução muito mais intensa do que a do "povo da terra". Ser um período
áureo, no qual o Senhor em pessoa estar no meio deles – em Jerusalém, a cidade santa. Por
isso o versículo 3.17 afirma: "O SENHOR, teu Deus, está no meio de ti, poderoso para te
salvar; ele se deleitar em ti com alegria; calar-se- por seu amor, regozijar-se- em ti com
júbilo".
4.2.2 Jeremias
Jeremias viveu os últimos dias do reino de Judá, antes do exílio. Ele
começou o seu ministério durante o reinado do rei Josias (640-609 a.C.), com quem mantinha
relações bastante cordiais, pois, Josias era um rei bom que temia a Deus. Porém, após a sua
morte, Jeremias passou a sofrer grandes perseguições. O maior motivo de sua perseguição foi
a denúncia por ele feita contra o espírito rebelde do povo e contra os atos dos sucessores de
Josias. Por causa disso, ele foi ameaçado, preso e humilhado. Contudo, mesmo que algumas
vezes tenha reclamado, Jeremias continuou firme alertando sobre o julgamento que viria.
Israel, mais uma vez, não deu ouvidos à palavra do Senhor e, como
conseqüência, o juízo divino veio sobre eles. Porém, dentro do cativeiro, o Senhor continuou
a falar por meio de Jeremias e, desta vez, as palavras de Jeremias foram de ânimo para a
nação de Israel. O juízo divino agora cairia sobre as nações que subjugaram o Seu povo. Deus
faria com que todas as nações que se opuseram a Israel sofressem um duro castigo. E para
Israel, Deus estaria preparando uma nova aliança.
Ás profecias, por Jeremias proferidas, dizem que Deus acabaria atingido
seu objetivo para com Israel, mas somente após um período de julgamento purificador e de
exílio. Deus não toleraria qualquer infidelidade no meio de seu povo. O julgamento
exterminaria os que faziam pouco caso da Aliança e abriria caminho para o estabelecimento
de uma nova aliança.
Como conseqüência da constatação da apostasia de Judá, o profeta Jeremias
emitiu várias declarações de Juízo para o povo. Ele percebia que a destruição do reino do sul
29
era iminente, e que a ira de Deus iria se revelar contra o seu próprio povo como conseqüência
do seu afastamento da aliança de Yahweh. As declarações do profeta têm uma profunda
ligação com esta realidade, mas a sua consciência do caráter incondicional da aliança sempre
está presente, mesmo durante as ocupações dos babilônios, testemunhadas por ele.
O conceito do “Dia do Senhor” é usado em referência ao juízo e castigo que
Yahweh aplicará tanto no seu próprio povo quanto nas nações que foram hostis a ele. No que
diz respeito a Israel, o Dia do Senhor também será o tempo em que Deus restaurará
definitivamente o seu povo como nação independente na terra prometida e sob um monarca
davídico. Esta restauração ainda não ocorreu, porém muitos dos castigos específicos às nações
vizinhas de Judá, profetizados por Jeremias, já foram executados, e, muitos deles, o próprio
profeta pôde testemunhar nos seus dias.
Quanto às declarações a Judá, Jeremias destaca o caráter da justiça de Deus
contra todos aqueles que não temem ao Senhor, e isso não exclui o povo da Aliança. A ira de
Deus se faria presente em todas as nações devido à sua impiedade e a destruição será
completa (vv. 25.30-38). Esta declaração, embora dirigida aos líderes das nações, se refere ao
grande dia futuro em que o Senhor destruirá todos os que não o buscam, inclusive os da casa
de Israel.
Este dia está relacionado ao juízo de Israel, mas também à restauração final
e completa do Povo da Aliança (vv. 30.5-9). Esta restauração está intimamente ligada ao juízo
das nações, pois, antes da instauração do reino davídico em Israel, Yahweh destruirá as
nações iníquas. Israel será finalmente um povo livre do jugo das nações que por tanto tempo o
escravizou. Nestes versículos o Dia do Senhor pode ser visto de duas perspectivas distintas. A
primeira está relacionada ao grande sofrimento que Judá passará (vv. 5-7). A segunda
perspectiva é a da restauração definitiva de Israel como povo santo de Yahweh e em quem Ele
cumprirá a Sua aliança.
Os últimos sete capítulos do livro de Jeremias apresentam o juízo de
Yahweh para com as nações que oprimiram Israel. O primeiro juízo emitido por Jeremias foi
direcionado ao Egito. A profecia previa a destruição das forças egípcias pelos babilônicos
(povo do Norte). Isto aconteceu com a campanha de Nabucodonosor em Carquemis em xx
a.C e com o avanço dos babilônicos sobre o Egito que cumlminou com a ocupação de Mênfis
e Tebas, que ocorreu em cerca de 567 a.C. O segundo juízo foi direcionado aos filisteus. Estes
tiveram a sua terra invadida pelo faraó Neco II em 609 a.C., mas a profecia de Jeremias se
30
refere à invasão vinda do Norte – uma referência aos babilônicos – que invadiram a Filistia
em 604 a.C. Moabe, Amom e Edom também tiveram o seu juízo profetizado por Jeremias.
Todos estes povos caíram sob o domínio babilônico. O mesmo aconteceu com Damasco. O
instrumento de Yahweh para executar o seu juízo a todas estas nações também seria punido
no seu devido momento, nem mesmo a poderosa Babilônia escaparia da ira do Senhor. Os
capítulos 50 e 51 prevêem o castigo divino para o Império caldeu. Babilônia foi dominada por
Ciro em 539 a.C.
A exemplo dos outros profetas, Jeremias também expande o conceito do
“Dia do Senhor” que Israel mantinha por tradição. Ele mostra ao povo judeu que as nações
serão julgadas por terem subjugado o povo de Yahweh, como todo o Israel esperava. Porém a
palavra de Jeremias também é dirigida para o povo judeu, mostrando assim que o “Dia do
Senhor” é dia de punição para todo aquele, incluindo o Seu povo, que ignora os seus
mandamentos. O julgamento divino sobre o Seu povo tinha por propósito purifica-lo afim de
torna-lo apto para o cumprimento da aliança que Yahweh preparou para Ele.
4.2.3 Ezequiel
Ezequiel foi levado para a Babilônia após a segunda incursão de
Nabucodonosor a Jerusalém em 597 a.C. Viveu grande parte de sua vida no exílio, onde foi
comissionado por Deus e exerceu o ministério profético. Durante o período em que Ezequiel
profetizou, Judá vivia a condenação prometida por Yahweh. Esta condenação se deu devido
ao povo ter se afastado de Deus. Este afastamento foi causado pela idolatria da nação em
oposição a uma vida de santidade diante do Deus que havia escolhido Israel entre todas as
demais nações. Deus entregou Judá nas mãos dos seus inimigos visando disciplinar o Seu
povo, o que ocorreu através do exílio na Babilônia, a maior potência da época.
Pode-se identificar no livro de Ezequiel o conceito do Dia do Senhor sendo
utilizado pelo profeta com dois sentidos aparentemente distintos, mas ligados ao propósito
futuro de Deus de restaurar definitivamente a Israel como nação separada e completamente
purificada. O primeiro uso que o profeta faz da expressão está relacionada ao aspecto
histórico do juízo de Israel e das nações. O dia do Senhor é o dia em que Deus julga
severamente àqueles que são rebeldes aos seus mandamentos. Para Israel, esta condenação
não envolve a destruição completa do povo, pois Yahweh tem com eles uma aliança eterna e
31
irrevogável. Como decorrência disto, o juízo para Israel é acompanhado com a promessa da
restauração futura do povo da Aliança.
Com relação às demais nações, o julgamento será baseado no mal feito
contra Israel. Este juízo é uma decorrência da Aliança Abraâmica, que prescrevia maldição
divina para àqueles que amaldiçoassem Israel. Os juízos contra as nações, assim como o juízo
contra Israel, foram executados num determinado momento da história antiga. Estes juízos
foram executados no Dia do Senhor, ou seja, momentos onde Deus interviu para julgar as
nações a fim de cumprir o seu propósito para com a nação do Pacto. Porém, é importante
destacar que estas ocasiões passadas apontam para o grande Dia final, quando o Senhor
trouxer o juízo (para as nações pagãs) e a restauração (para Israel) definitivos ao mundo.
O profeta também fala sobre este grande dia final. O Senhor tem um plano
para Israel que não pode ser frustrado. Israel será recolocado na sua posição de povo separado
por Deus para revelar a Sua glória no mundo. Naquele dia, Deus irá eliminar o mal
definitivamente e fará o seu povo subir novamente a sua terra, o templo será reconstruído e a
glória do Senhor virá novamente habitar o templo.
No capítulo 7, o profeta aborda o tema do dia do Senhor, ele proclama a
toda à terra prometida a vinda do juízo de Deus. Os versículos 2-13 consistem em três
oráculos curtos, todos de teor semelhante, ligados pela frase comum: “o fim vem”, “vem a tua
sentença”, “vem o tempo”. O fato de que a mensagem precisava de tanta reiteração pode ser
compreendido somente dentro do fundo histórico da crença popular na inviolabilidade de
Jerusalém. A destruição dela era inconcebível à mente israelita. O povo apesar de continuar
apóstata, depositava sua confiança na profecia de Isaías, que afirmava que o Templo de Deus
e a cidade de Deus ficariam de pé. No entanto, a situação nos dias de Ezequiel era diferente.
Depois de cerca de 150 anos, a mensagem de Isaías já não poderia mais ser uma justificativa
para a crescente apostasia do povo. A ira de Yahweh sobre o povo era inevitável. O povo
vivia o passado, mas Deus estava julgando o presente.
Para Ezequiel, a destruição de Jerusalém era um ato de intensidade quase
apocalíptica. Este fato foi o ponto culminante de séculos de pecado e de longanimidade
divina. O padrão não poderia se repetir para sempre: Deus deveria agir frente a tamanha
rebeldia. O Senhor já havia agido inúmeras vezes piedosamente poupando o seu povo, mas
agora finalmente diz: “Os meus olhos não te pouparão, nem terei piedade”.
32
Sua sentença (vv. 7, 10) nos apresenta um problema não solucionado. A
palavra hebraica ���������ocorre, fora destes versículos somente em Isaías 28:5, onde
significa “diadema” ou “grinalda”. Uma palavra semelhante em aramaico significa “’manhã”,
mas isto normalmente sugeriria benção e não calamidade. Outros pensam numa “reviravolta
dos eventos” e, portanto, no “infortúnio”, e assim veio a ser usada a palavra sentença. Não
pode, no entanto, ser descrita como sendo qualquer coisa mais do que uma boa conjectura que
se encaixa no contexto. A descrição de Deus assim: eu, o SENHOR, é que firo (v. 9) clama
por alguma emenda por aqueles que deixam de ver a ironia que existe em grande parte dos
escritos proféticos. Para os ouvintes e os leitores que estavam acostumados a nomes de Deus
tais como “Jeová-Jire” e “Jeová-Nissi” (Gn 22.14; Ex 17.15), deve ter sido tremendamente
impressionante vê-Lo descrito como “Jeová-Makkeh”. O Senhor que provera e protegera
estava a postos para ferir.
De 14-22, embora o povo se prepare para resistir à desgraça iminente (v.
14), a defesa é inútil. Diante daquilo que está vindo, os joelhos ficarão fracos como água (v.
17). A única coisa que os defensores poderão fazer é vestir-se de pano de saco (v. 18) e jogar
seu dinheiro fora das ruas (v. 19), a sua prata e o seu ouro será impotente, desta vez, para lhes
fazer bem algum. Nenhuma soma de dinheiro poderá comprar alimento quando o alimento
não está disponível. Deste modo, as próprias coisas que os israelitas desviados tinham
prezado, e que tinham sido o motivo da queda deles, ficariam sendo como sujeira no dia da ira
de Deus (vv. 19, 20). Esta palavra, �����, pertence à linguagem da impureza feminina, e
expressa o nojo que será sentido não somente das suas riquezas, como também das suas
preciosas jóias (v. 20), que tinham usado para enfeitar de modo dispendioso os seus ídolos17.
Muito mais horripilante ainda será que o recesso (v. 22; Lit. “lugar de estima”) sofrerá
profanação pelos estrangeiros. Esta é uma referência clara ao Templo, que é descrito em
termos igualmente carinhosos em 24:21, 25. As palavras emotivas aqui empregadas são uma
lembrança sadia ao leitor de que, quando Deus age em julgamento, Ele mesmo sofre dor e
mágoa bem como aqueles aos quais Sua santidade condenou.
Nos versículos 23-27, o profeta exclama: “faze a cadeia para levar os
exilados para o cativeiro”. O hebraico, porém é difícil, e LXX junta as palavras com o
versículo anterior, trazendo o sentido de “e farão desolação”. Como isso ocorre
17 Taylor, John B., Ezequiel. Mundo Cristão, 1984. pp.87.
33
freqüentemente o que podemos ver é o olhar de desespero do tradutor, desespero que tem seu
paralelo naquela dos israelitas aflitos que, no meio do seu sofrimento, buscarão paz (v. 25),
mas será tarde demais, pois os canais reconhecidos da atuação divina (os profetas) já terão
sido bloqueados. Os profetas, sacerdotes e anciãos nada terão para dizer (v. 26): o rei, o
príncipe, e o povo ficarão incapacitados no seu desespero (v. 27).
O profeta agora volta-se para o aspecto do Dia do Senhor contra os povos
que colaboram na destruição de Jerusalém. Diversos oráculos no capítulo 25 condenam a
atitude de Amon (vv. 25.1-7), Moabe (vv. 25.8-11), Edom (vv. 25.12-14) e os filisteus (vv.
25.15-17), a estes poderíamos acrescentar o oráculo contra Tiro em 26.1-6, e também os
contra o Egito no capítulo 32.
Deus traz o seu juízo sobre os povos estrangeiros mediante o mal que elas
causaram a Israel, porém este juízo não culmina somente em julgar estes povos e condená-los,
mas acima de tudo cumprir os seus propósitos para com a nação escolhida, visando a futura
restauração definitiva da mesma.
Todavia o que é mais importante é o que ele deve comunicar aos exilados,
com a visão de um provérbio antigo muito repetido naquela época podemos saber como eles
pensavam: “Os pais comeram uvas verdes e os dentes dos filhos ficaram embotados” (v.
18.2). É justificação do passado; ao mesmo tempo, protesto de inocência e censura velada a
Deus. É justo o que se passou? Existe motivo para que paguem justos por pecadores?
Ezequiel não se deixa enganar, para ele, se torna evidente que todos, pais e filhos, comeram
uvas verdes, que todos se tornaram escória (vv. 22.18-22). De qualquer maneira, como
princípio válido com respeito ao futuro, ele anuncia que doravante Deus julgará a cada um de
acordo com o seu comportamento. Esta superação de mentalidade coletivista, cedendo lugar à
responsabilidade individual, constitui-se num dos grandes progressos na história teológica de
Israel (ver caps. 18 e 33.12-20).18
Ao mesmo tempo, após a queda, Ezequiel denuncia com maior clareza os
responsáveis pela mesma. Em 22.25-31 aparecem cinco grandes grupos principais (príncipes,
sacerdotes, nobres, profetas, latifundiários) os quais acumulavam crimes em Jerusalém. O
capítulo 34 responsabiliza pela injustiça os pastores (reis) e os poderosos, mas justamente é
18 Schökel, Alonso L., Diaz J.L. Sicre, Profetas II. São Paulo: Paulinas, 1991.p.696.
34
este capítulo que nos abre caminho para uma visão nova. Depois de acusar os responsáveis
pelo rebanho e os membros mais fortes, Deus anuncia que ele próprio apascentará as suas
ovelhas, que procuraram seguindo o seu rasto (vv. 34.11-16).
É a partir daí que se começa a ver que não há como se prender unicamente
ao aspecto destruidor e terrível do dia do Senhor, mas também devemos entender o aspecto
restaurador do dia do Senhor para com o seu povo e para com o mundo num geral também.
O capítulo 36 fala da renovação da natureza, diz que os próprios montes
sobre os quais a espada desceu e também a destruição (cap. 6) ouvem agora uma palavra de
consolo: “vós, montes de Israel, lançareis ramos e produzireis frutos..., sereis lavrados e
semeados”. Todo o território recupera sua vida anterior: “serão repovoadas as cidades as
cidades e as ruínas reconstruídas, multiplicarei sobre vós os homens e o gado e farei que sejais
habitados como antes”. Mas o aspecto mais importante é a mudança interior do homem:
“Borrifarei água sobre vós e ficareis puros... Dar-vos-ei coração novo, porei no vosso íntimo
espírito novo, tirarei de vosso coração de pedra e vos darei coração de carne” (vv. 36.25-28).
Porém o povo ainda não está em condições de ouvir estas promessas, eles só
pensam em: “os nossos ossos estão secos, a nossa esperança esta desfeita” (v.37.11). Por
outro lado, este povo que se julga morto, sem futuro, ouve conjuro que os faz retornar à vida
(vv. 37.1-14). Nesta nova existência ficarão superadas as antigas tentações regionalistas;
conforme o indica a ação simbólica das duas achas de lenha (vv. 37.15-24), “já não
constituirão duas nações, nem tornarão a dividir-se em dois reinos”. Há, porém, algo mais
importante, Deus concluirá então a nova aliança e habitará permanentemente com o seu povo
(vv. 37.26,27). Enquanto ocorre o oferecimento da nova aliança (v. 36) e restabelecimento
espiritual da nação (v. 37), há a invasão de Israel por inimigos (v. 38). Logo após então ocorre
o livramento sobrenatural de Israel (v. 39) e o derramamento geral do Espírito (vv. 39.25-27).
Ezequiel 40 – 48 são o desenvolvimento particular de 37.27-28, “quando o
meu santuário estiver para sempre no meio deles”.
Chega-se com isto ao ponto culminante. O castigo mais duro que Deus
podia infligir a Israel era a destruição do templo e o desaparecimento de sua Glória. Assim
disse a visão de 8-11. Agora, porém, quando tudo mudou, novo templo vai ser construído
(caps. 40-42), para o qual voltará a Glória do Senhor (vv. 43.1-5).
A descrição deste templo é a descrição de um dos templos históricos do
35
povo de Israel. Um templo simbólico que retrata alguma realidade espiritual, um templo
futuro que há de ser construído e utilizado por Israel.
Ao falar que era como um dos templos históricos podemos perguntar, seria
o templo de Salomão? Provavelmente não, pois a descrição das dimensões são diferentes
(côvado diferente, provavelmente um côvado e um palmo), os portões são diferentes, as
edificações, utensílios e adornos diferentes e santidade diferente19. Logo podemos chegar a
conclusão que Ezequiel 40 - 48 não descreve o templo de Salomão.
Alguns acham que poderia se referir ao templo de Zorobabel, mas as
dimensões também são diferentes, o sistema de culto é diferente, pois o templo pós-exílico
seguia o modelo adotado anteriormente por Israel e este não. O ritual que era feito no templo
de Zorobabel seguia as prescrições mosaicas, não houve manifestação (registrada) da vinda da
glória de Deus nos termos descritos por Ezequiel. A ausência de tal registro, caso tivesse ele
acontecido, é algo impossível. Sendo assim podemos concluir que o templo de Ezequiel 40 –
48, não descreve o templo pós-exílico.
Alguns ainda falam que a descrição seria simbólica. O templo indicaria a
glória futura de Israel (Hoelema20, Taylor), que ele significa novos céus e nova terra
(Marshal), outros falam que é a igreja (Philip Hughes), Cristo e a sua ��������� (Keil). Mas a
conclusão que se chega é que a sua natureza pouco determina o significado do símbolo em
relação à realidade tencionada e a multiplicidade de detalhes tornam esta hipótese muito
problemática.
Outros falam que ele é descrito como uma realidade do futuro. Idéia de que
o templo revela a glória futura de Israel, mas situa esta glória nos limites do mistério e da
geografia, concorda com as expectativas menos detalhadas, mas não menos futuristas de
personagens como Isaías 2.2-4, Ageu 29 e Jeremias 2. Reflete-se nas expectativas dos
essênios.
Alguns problemas que se vêm em relação a esta posição são: a igreja é o
templo atual e na nova Jerusalém de apocalipse não haverá templo (amilenistas), os sacrifícios
19 Ao pé da colina onde o Templo de Salomão se situava, existiam os sepulcros dos reis; mas no caso deste templo descrito em Ezequiel, toda a colina será santificada; cf. 2Re 21.18, 26.
20 Hoekema entende que acontecerá na nova terra.
36
descritos por Ezequiel são simbólicos, pois Jesus o sacrifício perfeito já foi oferecido
(amilenistas e alguns Pré-milenistas). Se os sacrifícios são simbólicos, por que o templo
precisa ser literal? Ezequiel afirma que os sacrifícios são expiatórios, são essas algumas
questões que geram problemas com a posição descritiva como uma realidade futura.
Ezequiel proclama o conceito do Dia do Senhor, abordando aspectos
históricos que apontam para o grande Dia final, quando o Senhor irá trazer o juízo final (para
as nações pagãs) e a restauração definitiva (para Israel) ao mundo.
4.3 Período Pós-Exílico
O Império Babilônico caiu pelas mãos dos Persas. Este povo foi ganhando
destaque no cenário internacional com as suas conquistas territoriais chegando a prevalecer
sobre a cidade de Babilônia em 539. O imperador persa Ciro II, implantou uma política de
benevolência para com os povos vassalos, além de permitir que todos os exilados do período
babilônico voltassem para as suas terras de origem.
O povo judeu exilado se beneficiou desta permissão, porém nem todos
decidiram voltar para a Palestina devido à prosperidade de que gozavam na Babilônia.
Zorobabel e Neemias promoveram dois retornos em massa para a terra prometida,
conseguindo inclusive autorização do império Persa para reconstruir Jerusalém, inclusive o
templo de Yahweh.
O retorno de judeus para Jerusalém não significa a restauração da nação,
pois os judeus ainda eram vassalos do império Persa. Neste ambiente de reconstrução e
restauração do sistema religioso israelita, os profetas Ageu, Zacarias e Malaquias exerceram o
seu ministério cônscios de que a verdadeira e definitiva restauração de Israel se dará no Dia
do Senhor.
4.3.1 Ageu
Ageu, o primeiro dos profetas da restauração, não tem história registrada
sobre sua pessoa. Ele era o embaixador do Senhor (v. 1.13) e seus testemunhos estão
seguramente entesourados com o seu divino Empregador.
Por falta de dados históricos sobre a pessoa de Ageu, não é possível
determinar com precisão o período coberto por sua vida. Alguns dizem que Ageu, pertenceu
37
ao período pré-exílico, por causa da suposição de que este conhecera o Templo de Salomão
(v. 2.3). Mas para sustentar essa opinião, teríamos que dizer que Ageu, ao transmitir sua
mensagem, tinha por volta dos 80 anos. Não é impossível, mas é pouco provável, pois
contextualmente nota-se que a afirmação feita por Deus por meio do profeta (vv. 2.1-2). O
texto que Ageu fala com pessoas que estiveram presentes no período de Salomão (“Quem há
entre vós...”). É mais razoável acreditar que Ageu tenha nascido no período do exílio, embora
sua idade não possa ser datada com clareza.
Sua missão é clara, estimular o povo à construção do Templo do Senhor,
demonstrando a reprovação divina para o povo (vv. 1.3-12), a reação do povo à repreensão
(vv. 1.12-15) e o estímulo a Zorobabel e Josué (vv. 2.1-9), o chamamento para purificação
(vv. 2.10-19) e confiança no porvir (vv. 2.20-23). O período de Ageu é muito peculiar e por
isso suas advertências são particulares. Nota-se que o livro gira em torno da reconstrução do
templo, quer reprovando o povo ou encorajando seus líderes. Desta forma, o caráter profético
de sua obra é pouco perceptível. A mensagem do livro de Ageu, embora esteja muito ligada
ao fator material do Templo, não degradou o caráter vital da “religião” israelita. Todo esse
prisma pode ser observado pela preocupação com a reconstrução do templo, pois isto
significava o retorno à adoração a Yahweh.
Assim, dentro dessa perspectiva peculiar que tem Ageu, pouco se percebe
sobre o Dia do Senhor. Ageu cita essa expressão quando conclama o povo à confiança no
futuro: “Farei abalar o céu e a terra; derrubarei o trono dos reinos e destruirei o carro e os que
andam nele; os cavalos e os seus cavaleiros cairão, um pela espada do outro. Naquele dia, diz
o Senhor dos Exércitos, tornar-te-ei, ó Zorobabel (...) servo meu (...) diz o Senhor, e te farei
um anel de selar; por que te escolhi, diz o Senhor dos Exércitos” (2.21-23).
É notório que este “anel de selar” é um objeto de prestígio. Porém parece
também estar ligado às atividades de um rei que, para validar um documento ou decreto,
selava-o com cera quente e pressionava sobre a cera o seu anel. Assim, Deus dará a Zorobabel
uma postura de autoridade. Segundo J. McIlmoyle essa identificação de autoridade a
Zorobabel está ligada com a sua restauração prometida ao trono como descendente de Davi21
e a rejeição de Jeconias (Jr.22.24). Dessa forma fica implícito o caráter de preservação deste e
21 MCILMOYLE, J. Ageu. São Paulo: Vida Nova, 2002.
38
de preferência por este, pois Deus o escolheu (2.23b).
É necessário relevar que esta consagração será feita “naquele dia”. Como
demonstrado pelo versículo 22, será em um tempo em que os tronos dos reinos e suas forças
seriam derrubados, e seus exércitos destruídos. Nota-se um caráter profético nesta afirmação,
onde se pode relaciona-la ao conceito do Dia do Senhor, que será um dia em que haverá a
manifestação de alguém com poder e prestígio de Deus, escolhido por ele, para ter a posição
de servo dEle.
As afirmações de Ageu não são muito claras, mas assemelham-se
diretamente com as descrições de Is.9.2-7, 11.1-3, Mq 5.2-4 e Jr.23.5 que apontam para um
libertador davídico, o Ungido, que teria essa postura em um futuro almejado pelo povo. Nota-
se que, embora pouco se afirme sobre o Dia do Senhor neste livro, ele concorda com os
profetas anteriores no que diz respeito a um caráter messiânico daquele dia. Sem contar que
esta mensagem serviria como estímulo à sua platéia que estava completamente desanimada
com o retorno do exílio.
Então, chega-se a conclusão que Ageu tem um papel importante na
conceituação do tema dia do Senhor reafirmando esse caráter messiânico incluso neste, e que
seu livro, muito estimulou seu público alvo a servirem primeiramente a Deus, e depois a
preocuparem-se com seus supostos problemas.
4.3.2 Zacarias
Zacarias é mencionado em Esdras 5.1; 6.14, junto com Ageu, como um dos
principais artífices da reconstrução do templo. As datas do seu livro coincidem com esta
indicação. É necessário identificar o profeta Zacarias com o “Zacarias, filho de Ado”, do qual
fala Neemias 12.16. Muitos autores assim fazem, e deduzem deste dado a origem sacerdotal
do profeta. Outros negam que tal identificação seja válida.
No tocante à época, é valido o que se disse sobre Ageu. Dois grandes temas
ocupavam os judeus daquele tempo: a reconstrução do templo e a restauração escatológica. Se
Ageu tinha dado mais importância ao primeiro e apenas breve apêndice ao segundo, Zacarias
faz o contrário. Sem esquecer o tema do templo, ele fixou a sua atenção em descobrir a era
39
escatológica que previu estar próxima.22
Pode-se dizer que o livro de Zacarias é dividido em duas partes, 1-8 e 9-14,
isso porque alguns comentaristas dizem que somente os primeiros oito capítulos seriam de
autoria do profeta e os outros seriam um possível acréscimo. A apresentação do profeta se dá
diante do primeiro oráculo (vv. 1.1-6), que trata de uma exortação à conversão, a fim de que
não aconteça aos seus contemporâneos o mesmo que aconteceu com os seus antepassados.
Os seis primeiros capítulos são divididos em oito visões com uma série de
pequenos oráculos inseridos entre eles, porém alguns comentaristas falam que o número
original de visões seriam sete. Talvez a descrição pudesse ser representada da seguinte
maneira:
1a visão: os cavalos de cores; punição das nações e bênção de Jerusalém (1.8-16)
2a visão: os quatro chifres e os quatro ferreiros; punição dos gentios (2.1-4)
3a visão: o homem com o cordel, glória de Jerusalém (2.5-9)
4a visão: o candelabro de ouro, as sete lâmpadas e as duas oliveiras; exaltação de Zorobabel e de Josué, governador e sumo sacerdote, respectivamente (4.6, 10b-14)
5a visão: o rolo voando; punição dos ímpios (5.1-4)
6a visão: a mulher no recipiente; a iniqüidade habita em Babilônia, onde ela é bem acolhida
7a visão: os quatro carros; punição do norte (6.1-8)23
Da abordagem literária do livro podemos dizer que as visões seguem um
esquema trimembre: descrição do visto-pergunta do profeta-resposta do anjo intérprete.24 O
mais interessante é notar a relação entre as visões. As duas primeiras e as duas últimas têm
por objeto os países estrangeiros que maltrataram Judá. As três centrais preocupam-se pela
restauração judaica. E tudo isso converge na quarta visão, a qual fala dos dois grandes
dirigentes, político e religioso, do novo povo de Deus. Todas as ilusões que os judeus
alimentaram desde que partiram para o exílio encontram-se aqui concretizadas: Deus torna-se
benigno para com o seu povo, castiga seus adversários, enche de glória Jerusalém e concede a
Jerusalém governantes dignos da nova situação.
Alguns acréscimos foram feitos a essa estrutura (provavelmente o próprio
22 Schökel, Alonso L., Diaz J.L. Sicre, Profetas II. São Paulo: Paulinas, 1991.p.1176. 23 Schökel, Alonso L., Diaz J.L. Sicre, Profetas II. São Paulo: Paulinas, 1991.p.1177 24 Idem, Ibid.
40
Zacarias os tenham feito). Mas essas inserções posteriores não modificaram o conteúdo dos
capítulos, já que as idéias fundamentais (punição dos inimigos, glória de Judá, governo de
Josué e de Zorobabel), ficaram reforçadas, mesmo que a estrutura inicial fique mais obscura e
mais confusa.
Os capítulos 7 e 8 são formados por uma série de oráculos em aparente
desordem. O capítulo 7 começa com uma consulta ao sacerdote para saber se é necessário
continuar lamentando e jejuando. A resposta de Zacarias vem nos versículos 8. 18 e 19,
dizendo que não só o jejum do quinto mês, mas também os outros irão se transformar em
gozo, alegria e festa. Atualmente entre a pergunta (vv. 7.1-3) até a resposta (vv. 8.18,19)
encontram-se textos com um caráter diverso, mas sem que haja uma unanimidade entre os
estudiosos. No que diz a desordem, ela tem certa explicação. A consulta do jejum (vv. 7.1-3),
ocasionou a inserção da crítica do mesmo (vv. 7.8-14). Ao mesmo tempo, o castigo de
Jerusalém trouxe como conseqüência o anúncio da sua restauração nos versículos 8. 1-17.
É interessante lembrar que o profeta faz referência à reconstrução do templo
(v. 1.16) e promete a Zorobabel que terminaria a obra “não pela força, nem com riquezas, mas
sim com a ajuda do espírito de Deus” (cf. 4.6b-10a). Esta reconstrução abre caminho para um
era de prosperidade e de bênção.
No entanto é perceptível que, o que mais interessa a Zacarias é esse novo
mundo futuro. É este o tema fundamental das suas visões. A punição dos inimigos como
medida prévia, seguida da restauração gloriosa de Jerusalém governada por Josué e
Zorobabel. A glória, porém, advém principalmente da presença de Yahweh, a qual o profeta
se refere com freqüência (vv. 2.9b, 14-16; 8.3, 23). Com isso a cidade ficará aberta não só aos
judeus, como também a todos os povos que desejarem adorar Yahweh.
Portanto pode-se dizer que a mensagem de Zacarias inspira-se na de
Ezequiel como também desenvolve mais plenamente a de Ageu. Zacarias, no entanto, não se
preocupa só com o futuro, para ele o presente possui grande valor e a sua tarefa no momento
histórico não consiste somente em colocar pedra sobre pedra, é converter-se (vv. 1.1-6). O
culto por si só não é suficiente (vv. 7.4-7).
Percebe-se então que o conteúdo da mensagem de Zacarias é constituído de
diferentes linhas proféticas. Por vezes ele nos lembra a geração de Amós, de Isaías ou de
Miquéias, aos quais ele alude sem os mencionar expressamente, com o seu marcado acento
41
social. Outras vezes ele remete-se ao conteúdo profético de Ezequiel, com o seu ideal de
restauração política e cultural.
Quanto a segunda parte dos escritos de Zacarias, a primeira parte é
constituída por três grandes blocos. O primeiro desenvolvendo temas típicos do hino ao Deus
guerreiro, as suas conquistas (vv. 1-7), a chegada ao templo (v. 8), entronização (vv. 9-10),
libertação dos cativos (vv. 11-14), banquete final e prosperidade (vv. 15-17). A passagem de
10.1 e 2 pode ser considerada fora de contexto a princípio, porém pela sua referência à chuva,
talvez ela se adapte perfeitamente com o final do anterior (v. 9.17), revelando o Deus que na
história aparece também como Senhor da natureza e garante não só o êxito político-militar,
mas também a prosperidade material.
O segundo bloco repete temas já abordados como, a batalha (vv. 10.3-7), o
retorno dos exilados em uma série de novo êxodo (vv. 10.8-11a), a derrota dos inimigos (v.
11b) e o louvor final ao Deus salvador (v. 12). O fragmento 11.1-3 desnorteia no início.
Porém, considerando que as imagens do cedro e do leão aplicavam-se às potencias
estrangeiras, percebe-se que estes versículos servem para salientar a derrota dos inimigos.
A seguir vem a alegoria dos dois pastores. Existem diversas discussões
sobre o assunto, mas o que deve-se salientar é que em qualquer das hipóteses, a alegoria
descreve uma situação muito difícil do povo/rebanho, que se torna cada vez mais dura por
culpa dele mesmo. No entanto, a atividade do mal pastor e a dispersão irão transformar-se em
prova purificadora e então, no final, haverá um resto que invoque a Yahweh e se reestabeleça
uma aliança com Ele.
Em resumo esses dois blocos do trecho de 9-11 falam da superação da
prova, do Deus guerreiro que derrota os seus inimigos e liberta os exilados. Porém o primeiro
concede importância ao tema messiânico (vv. 9.9-10) e o segundo não. Aqui, o mal não se
acha fora do povo, mas dentro dele. O que importa não é derrotar os inimigos, e sim purificar
o povo.
Analisando o capítulo 12, encontra-se um novo título. A partir daqui até o
final do livro, este pode ser dividido em sete seções, que começavam todas com a mesma
frase: �������� �����������ou “acontecerá naquele dia” (vv. 12.3,9; 13.2,4; 14.6,8,13).
Entretanto, é difícil acreditar ser esta a fórmula que estrutura os capítulos e sim o conteúdo
dos oráculos. Em 12.1-13, o profeta fala do combate escatológico entre Jerusalém e todas as
42
nações (vv. 1-8), mas ainda assim, a derrota dos inimigos não abre caminho para o grande
cântico de vitória, mas para gigantesca lamentação (vv. 12.9 - 13.1). A purificação do coração
segue a purificação do país, expulsando dele os ídolos e os falsos profetas (vv. 13.2-6).
O capítulo final mistura temas já conhecidos dos capítulos anteriores com
outros novos. Inicia-se falando do combate escatológico e da teofania (vv. 1-5), e abre
caminho para a época paradisíaca (vv. 6-11). Nos versículos 12 a 15, volta a ressoar o tema da
batalha. Os sobreviventes dele irão até Jerusalém para celebrar a realeza de Yahweh na festa
dos Tabernáculos (v. 16), e aquele que não o fizer será punido (vv. 17-19). O capítulo conclui
com um apêndice que fala da exorbitante santidade de tudo quanto houver em Jerusalém e do
desvanecimento dos mercadores do templo (vv. 20-21). Talvez o maior valor destes oráculos
tão diferentes seja a insistência na realeza de Yahweh (vv. 14.9,16,17).
4.3.3 Malaquias
Apesar de ter um livro com conteúdo profético fantástico com seu nome,
nada se sabe sobre Malaquias e a sua auto-apresentação em 1.1. Não existem citações vétero-
testamentárias que indiquem ou sugiram algo sobre sua pessoa, caráter, pais, cidade natal,
cargo ou data de seu ministério. Conseqüentemente nasce um problema no que diz respeito à
data deste documento, tornando o último de seis livros proféticos não datados.
Apesar disso, pode-se levantar algumas afirmações no livro que indiquem o
período histórico em que está inserido o profeta e sua profecia. A primeira indicação interna é
o fato de que os edomitas tinham sido levados do monte Seir, mas não tinham voltado (vv.
1.3-4). Isso implica em dizer que a data da redação deve ser posterior a 585 a.C. Outra
indicação pode ser vista na colocação de que os exilados tinham voltado, reconstruído o
templo e caído no comodismo e na formalidade (vv. 1.6ss). Isso implica em que existe um
bom tempo entre o regresso e este prenuncio de apostasia do povo. Outro indicativo relevante
é que o povo está subordinado a uma autoridade persa que aceita suborno (v. 1.8). Há ainda
mais um indício, pois os problemas de caráter moral encontrados nesse livro são semelhantes
aos encontrados em Esdras e Neemias (cf. materialismo, casamento misto). Segue-se que a
data pode ser aproximada à 430 a.C., após o retorno de Neemias para a Pérsia em 432 a.C.
Sobre isso, Ellisen diz:
Malaquias foi a voz profética final, contemporâneo de Esdras, sacerdote e historiador que escreveu antes e depois dele. Foi o último mensageiro divino para o
43
povo da aliança do Antigo Testamento, ministrando cerca de 1000 anos depois de Moisés, o primeiro profeta e primeiro escritor bíblico25.
À luz desse comentário, pode-se notar que o período de Malaquias é
complicado, pois, embora o templo estivesse terminado, o sistema religioso restaurado e o
muro já estar de pé, o povo não correspondia a esses fatos. O estado espiritual do povo não
estava nada correto, e é sobre essas inadequações que vêm as advertências de Deus.
Ao ter em mente as advertências de Deus, é notório o esquadro em que é
redigido o livro. Logo de início existe duas declaração de contrastes, onde a primeira expressa
o contraste entre o amor de Deus e a infidelidade do povo (v. 1.2) e a segunda relaciona o
aborrecimento para com Esaú e sua descendência com a Grandeza do Senhor (1.3-5).
Existe, nesse contraste demonstrado, especificamente no v.5 uma afirmação
que pode ter um sentido ambíguo. Segundo alguns liberais a colocação “fora dos termos de
Israel” implica em algum tipo de reconhecimento de Yahweh e de Sua Salvação expresso fora
das estipulações da Lei de Deus. Esse tipo de pensamento pode ser definido com Inclusivismo
soteriológico, que não tem o menor respaldo bíblico.
A fim de sanar qualquer dúvida sobre a expressão é necessário compreender
o significado de “termo” no texto. A palavra hebraica referente a esta é ������, e denota um
sentido de limite, território e borda no sentido territorial, e tem qualquer conceito de
legislação. Assim é notório que a expressão refere-se à manifestação divina fora da região de
Israel, e não fora das estipulações determinadas por Ele.
Ainda assim outros definem que essa manifestação fora de Israel é para
salvação em outras nações, como se a frase fosse dita pelas outras nações. Contudo o contexto
não é favorável a esse tipo de conclusão irrisória. O contexto está sobre a manifestação da
IRA de Deus sobre a Nação de Edom, “povo contra quem o Senhor está irado para sempre”.
E diante dessa afirmação, Israel reconheceria a grandeza de Deus, como é percebido na frase
“os vossos olhos o verão, e vós direis...”. Fica então óbvio que a conclusão Inclusivista é
infundada.
Logo, é notório que as declarações de Yahweh, no que tange o Dia do
25 ELLISEN, Stanley A. Conheça Melhor o Antigo Testamento. São Paulo: Vida, 1991. p. 342
44
Senhor, estão primariamente situadas sobre Israel. Contudo, a manifestação da Ira de Deus
inclui seu povo, pois, a partir do versículo 6, Deus faz alegações diretas ao povo falando sobre
sua desonestidade (vv. 1.6-14), sua infidelidade pactual (vv. 2.1-9), sua devassidão moral
incluindo casamentos mistos (vv. 2.10-12) e divórcios (vv. 2.13-16), impiedade (v. 2.17),
furto (v. 3.7-12) e arrogância (vv. 3.13-15). Nesse contexto de perversidade do povo de Deus,
existem alguns que são considerados como “os que temiam ao Senhor”. Esses serão poupados
no Dia do Senhor pois são considerados como tesouro particular para Ele. Essa atitude visa
demonstrar a diferença entre o que serve a Deus e o que não serve, o justo e o perverso. (vv.
3.16-18)
A expressão Dia do Senhor acontece apenas uma vez no livro (v. 4.5)
associado a características singulares, como “grande” e “terrível”. A palavra grande já foi
comentada anteriormente, mas sobre terrível (���) nada foi declarado. Esta palavra está
intimamente ligada ao medo, temor diante a uma demonstração devastadora. Assim fica
notório o caráter deste dia, como demonstrado em outros profetas, de destruição, sendo este
ainda enfatizado no versículo 4.1, quando diz que será este dia como uma fornalha, onde
todos os soberbos e todos os que comentarem perversidade queimados, abrasados por Deus a
ponto de não terem nem raiz nem ramo.
Entretanto, não parece ser essa a única marca deste dia descrito por
Malaquias, pois no seguinte versículo diz: “ele converterá o coração dos pais e filhos, e o
coração dos filhos aos pais, para que eu não venha e fira a terra com maldição”. Esse
versículo demonstra um aspecto pouco claro sobre esse dia, pois se refere a Elias mencionado
no versículo 5, que parece ser aludido no versículo 3.1, onde Deus se refere ao Seu
mensageiro que vai à Sua frente preparando Seu caminho como marca antes do Grande e
Terrível Dia do Senhor. Embora seja complexo definir quem possa ser esse, fica claro que
com sua manifestação existe a possibilidade de libertação desse juízo preanunciado.
4.4 Visão Profética Vetero-Testamentária
“Israel acreditava que, se houvesse um breve período de inocência e ventura
no limiar da história, o clímax verdadeiro e o coroamento da história se reservavam para o
45
futuro. Tinha a firme convicção de que o melhor estava por vir26”. J.M.P Smith afirma que “o
desenvolvimento da idéia do dia de Yahweh na história israelita foi marcado, não tanto pela
adição, de tempos a tempos, de novas características, quanto pela expansão e aprofundamento
de elementos já presentes27”.
Como demonstrado, a frase “Dia de Yahweh” funcionava como a expressão
da esperança israelita no momento histórico em que Deus ergueria a Israel a ponto de ser
triunfante perante seus inimigos de um modo espetacular, observado em Obadias. Contudo
Amós transforma a frase “no símbolo iminente do julgamento de Israel28”.
Amós 5.8, diz: “Ai de vós que desejais o Dia do SENHOR! Para que
desejais vós o Dia do SENHOR? É dia de trevas e não de luz. Como se um homem fugisse de
diante do leão, e se encontrasse com ele o urso; ou como se, entrando em casa, encostando a
mão à parede, fosse mordido de uma cobra”. Esses versos parecem demonstrar uma
expectativa do povo de Israel com respeito ao Dia do Senhor, como se isso fosse algo
positivo. O relato de Amós expressa mais que um conceito de julgamento, mas de terrível
sofrimento.
Sofonias apresenta uma declaração mais abrangente desse conceito, pois
inclui no Dia do Senhor o julgamento de outras nações. “Está perto o grande Dia do
SENHOR; está perto e muito se apressa. Atenção! O Dia do SENHOR é amargo, e nele clama
até o homem poderoso. Aquele dia é “dia de indignação, dia de angústia e dia de alvoroço e
desolação, dia de escuridade e negrume, dia de nuvens e densas trevas, dia de trombeta e de
rebate contra as cidades fortes e contra as torres altas” (Sf 1.14-16). O aspecto de julgamento
é parte da expressão Dia do Senhor, mas o que é expandido é a idéia do julgamento moral
contra todo e qualquer homem, dentro ou fora de Israel, como parece sugerir Joel 2.2: “dia de
escuridade e densas trevas, dia de nuvens e negridão! Como a alva por sobre os montes, assim
se difunde um povo grande e poderoso, qual desde o tempo antigo nunca houve, nem depois
dele haverá pelos anos adiante, de geração em geração”.
Contudo Joel demonstra que o “Dia do Senhor” não é meramente um
26 ROWLEY, H.H., A fé em Israel. São Paulo: Paulinas. 1977. pg.191 27 SMITH, J.M.P, American Journal of Theology, V, 1901, p.53 28 ROWLEY, H.H. Op Cit. pg.191
46
momento punitivo, mas um evento, que envolve punição e salvação. Pois, Joel fala que
“acontecerá, depois, que derramarei o meu Espírito sobre toda a carne; vossos filhos e vossas
filhas profetizarão, vossos velhos sonharão, e vossos jovens terão visões; até sobre os servos e
sobre as servas derramarei o meu Espírito naqueles dias.Mostrarei prodígios no céu e na terra:
sangue, fogo e colunas de fumaça. O sol se converterá em trevas, e a lua, em sangue, antes
que venha o grande e terrível Dia do SENHOR. E acontecerá que todo aquele que invocar o
nome do SENHOR será salvo; porque, no monte Sião e em Jerusalém, estarão os que forem
salvos, como o SENHOR prometeu; e, entre os sobreviventes, aqueles que o SENHOR
chamar”.
Obviamente não é possível a todos esse salvamento, mas é para aqueles que,
entre os sobreviventes, o SENHOR chamar. Assim nota-se um prisma maior no que se refere
ao Dia do Senhor, pois esta está além do Juízo de Israel e das Nações. Essa visão é
demonstrada também por Isaías, no momento em que seus escritos denotam mais uma nuance
apocalíptica. Em Isaías 24.20s lê-se: “A terra cambaleará como um bêbado e balanceará como
rede de dormir; a sua transgressão pesa sobre ela, ela cairá e jamais se levantará. Naquele dia,
o SENHOR castigará, no céu, as hostes celestes, e os reis da terra, na terra. Serão ajuntados
como presos em masmorra, e encerrados num cárcere, e castigados depois de muitos dias”.
Esse trecho demonstra o aspecto punitivo do Dia do Senhor, mas pouco depois, em Isaías 25.9
está escrito que “Naquele dia, se dirá: Eis que este é o nosso Deus, em quem esperávamos, e
ele nos salvará; este é o SENHOR, a quem aguardávamos; na sua salvação exultaremos e nos
alegraremos”.
Dessa forma percebemos que o Dia do Senhor é muito mais que um
momento de Juízo ou Julgamento, mas um evento que envolve esses aspectos somados ainda
com o Livramento do povo.
Outro ponto que merece atenção é o fato de que as profecias incluem
aspecto universalista, fato que é pouco observado em todo o Velho Testamento, embora esteja
fortemente presente. Segundo Rowley, “a fé dos israelitas não é exclusivamente deles, mas
pode ser compartilhada por homens de outras nações e raças, que se reunirão ao Senhor e ao
Seu povo29”. A idéia presente nesse aspecto não diz respeito a salvação de todos, sob qualquer
29 Idem. pg.201
47
forma de manifestação de crença, mas no conceito de que “a religião do Yahwismo estava
aberta a todos os homens30”. Isso é evidente na história de Raabe, Rute, Jonas, entre outros
exemplos expresso no Velho Testamento.
Uma conclusão, ainda obscura, que se pode retirar do conceito do Dia do
Senhor é que está aberto a outras nações, não só o Juízo, mas a possibilidade de Salvação. É o
que parece sugerir Zacarias, em 2.11: “Naquele dia, muitas nações se ajuntarão ao SENHOR e
serão o meu povo; habitarei no meio de ti”. H.G. Michel observa que isso significa a
aceitação do convite de Isaías 45.22: “Olhai para mim e sede salvos, vós, todos os limites da
terra; porque eu sou Deus, e não há outro”, somado a idéia da ilimitada extensão da Aliança
Abraâmica31 (“...em ti serão benditas todas as famílias da terra“).
Isaías indica ainda de forma mais aberta e específica a situação desses, que
são considerados como prosélitos quando afirma: “Aos estrangeiros que se chegam ao
SENHOR, para o servirem e para amarem o nome do SENHOR, sendo deste modo servos
seus, sim, todos os que guardam o sábado, não o profanando, e abraçam a minha aliança,
também os levarei ao meu santo monte e os alegrarei na minha Casa de Oração; os seus
holocaustos e os seus sacrifícios serão aceitos no meu altar, porque a minha casa será
chamada Casa de Oração para todos os povos”.
Ao observar esses textos pode-se concluir que o Dia do Senhor tem um
caráter internacional, no que diz respeito a Julgamento e Livramento, embora ambas tenham
suas condicionais.
Todas as passagens do Antigo Testamento que apresentam de maneiras
várias a visão da Idade Áurea ou do Dia do Senhor, são comumente denominadas
messiânicas. Embora essa afirmação tenha suas conotações perigosas, tais como a imposição
do cumprimento total na vida do Senhor Jesus Cristo, expressa um aspecto muito relevante
para a conceituação do terno, em termos de Velho Testamento.
Em algumas das passagens que apresentam a esperança vétero-
testamentária, encontra-se com um líder davídico, representante divino no governo universal.
Em Isaías 9.2-7, é possível observar esse aspecto: “O povo que andava em trevas viu grande
30 Idem. pg.200 31 MICHEL, H.G, The International Critical Commentary Haggai and Zacariah, 1912, p.144
48
luz, e aos que viviam na região da sombra da morte, resplandeceu-lhes a luz. Tens
multiplicado este povo, a alegria lhe aumentaste; alegram-se eles diante de ti, como se
alegram na ceifa e como exultam quando repartem os despojos. Porque tu quebraste o jugo
que pesava sobre eles, a vara que lhes feria os ombros e o cetro do seu opressor, como no dia
dos midianitas; porque toda bota com que anda o guerreiro no tumulto da batalha e toda veste
revolvida em sangue serão queimadas, servirão de pasto ao fogo. Porque um menino nos
nasceu, um filho se nos deu; o governo está sobre os seus ombros; e o seu nome será:
Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz; para que se
aumente o seu governo, e venha paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu reino, para o
estabelecer e o firmar mediante o juízo e a justiça, desde agora e para sempre. O zelo do
SENHOR dos Exércitos fará isto”.
Fato semelhante é observado em Isaías 11.1-3: “Do tronco de Jessé sairá um
rebento, e das suas raízes, um renovo. Repousará sobre ele o Espírito do SENHOR, o Espírito
de sabedoria e de entendimento, o Espírito de conselho e de fortaleza, o Espírito de
conhecimento e de temor do SENHOR. Deleitar-se-á no temor do SENHOR; não julgará
segundo a vista dos seus olhos, nem repreenderá segundo o ouvir dos seus ouvidos; mas
julgará com justiça os pobres e decidirá com eqüidade a favor dos mansos da terra; ferirá a
terra com a vara de sua boca e com o sopro dos seus lábios matará o perverso”.
Em analogia a passagem de Isaías 9, encontra-se a passagem de Miquéias
5.2-4: “E tu, Belém-Efrata, pequena demais para figurar como grupo de milhares de Judá, de
ti me sairá o que há de reinar em Israel, e cujas origens são desde os tempos antigos, desde os
dias da eternidade. Portanto, o SENHOR os entregará até ao tempo em que a que está em
dores tiver dado à luz; então, o restante de seus irmãos voltará aos filhos de Israel. Ele se
manterá firme e apascentará o povo na força do SENHOR, na majestade do nome do
SENHOR, seu Deus; e eles habitarão seguros, porque, agora, será ele engrandecido até aos
confins da terra”. Está passagem demonstra o governo sobre toda a terra, no nome e no
exercício da força de Senhor.
Ao observar esse conceito, é fácil relembrar da passagem da bênção de Jacó
em Gênesis 49 que diz que o cetro de Judá e o bastão de comando se afastarão dentre os pés
dAquele a quem os povos devem obediência.
Semelhantemente, Jeremias afirma que o Senhor suscitará um rebento novo
a Davi (Jr 23.5), um renovo de justiça, “o qual reinará verdadeiramente e com sucesso, e
49
administrará a justiça e o direito neste país”. Aqui, no entanto, nada se diz com respeito à
universalidade desse governo, o que não implica em diversidade alguma de concepção, já que
não seria razoável exigir que um escritor exprimisse todo o seu pensamento sobre
determinado assunto toda vez que sobre ele se pronunciasse. Mas o fato mais incrível é a
descrição do caráter desse governo, que será executado em justiça, como demonstram todos
os outros oráculos que dizem respeito a essa universalidade, dentro desse aspecto messiânico.
Assim é notável a existência uma íntima ligação entre o Dia do Senhor e a
manifestação do Messias prometido, e que o resultado é absolutamente positivo, conforme
demonstra Habacuque: “Pois a terra se encherá do conhecimento da glória do SENHOR,
como as águas cobrem o mar” (Hb 2.14).
50
5 CONCLUSÃO
Infelizmente o Dia do Senhor continua a ser mal interpretado pela igreja
brasileira. Prova disso é a atitude de muitos crentes para com Deus e para com o próximo.
Este erro também se reflete na literatura cristã e até na sua hinódia, onde, por vezes, canta-se
com alegria e júbilo a chegada do dia do Senhor.
O Dia do Senhor é dia de alegria somente para aqueles que estão preparados
para ele. Para aqueles que vivem uma vida hipócrita, ou seja, uma vida que é coberta de
rituais e cerimônias religiosas e transmite uma aparência de santidade, mas na realidade é uma
pessoa totalmente longe de Deus em seus atos e pensamentos, este dia será terrível. Isto
deveria causar na igreja, além da alegria, uma santa preocupação. Em outras palavras, cada
crente deveria constantemente perguntar-se se está preparado para o Dia do Senhor.
Os pastores e líderes têm por dever pregar e ensinar de uma perspectiva
bíblica e saudável a respeito deste tema. Cai sobre seus ombros a responsabilidade de criar no
rebanho que Deus lhes concedeu para que cuidassem, este santo temor a respeito do Dia do
Senhor.
Este dia será um Dia de intervenção, em que o próprio Deus irá agir, sem
intermediários, para purificar o seu povo e cumprir o seu propósito nele. Por isso urge a
necessidade de que cada crente faça uma auto-avaliação diária sobre sua vida diante de Deus,
para que ele, estando preparado, receba com alegria este grande e tremendo dia.
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