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Em busca da sombraSuzana Montoro
Ilustrações Rogério CoelhoTemas Autoconhecimento; Amadurecimento; Amizade
Guia de leitura
para o professor
Complexidade do texto Indicado para crian-
ças a partir de 8 anos. Texto fluente, com
toques de humor e de poesia, desenvolvido
em dez capítulos, nos quais a personagem
revela seu amadurecimento.
Sobre o livro O livro relata, narrado em primeira
pessoa, o processo de amadurecimento da menina
Ana Júlia por meio da procura e das descobertas que
ela faz sobre sua sombra. A busca pela própria sombra
transforma-se num jogo, realizado com a ajuda
inestimável da avó e em companhia da melhor amiga
da garota. Através de diversas brincadeiras, as duas
acabam desenvolvendo uma percepção diferenciada
sobre si mesmas e sobre o mundo.
A história também evoca a vitalidade da brincadeira
como experiência fundamental para uma existência
criativa e prazerosa, como protótipo para a aquisição da
capacidade de pensar por si mesma por parte da criança
e do estabelecimento de vínculos e relacionamentos
proveitosos e confiáveis inerentes à infância e ao
processo de amadurecimento.2008
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Em busca da sombra Suzana Montoro
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por que este livro?
Ao falar da procura da menina Ana Júlia por sua sombra, Em
busca da sombra concebe o ser humano como essencialmen-
te enigmático, surpreendente e desconhecido, inclusive para si
mesmo. E mais: supõe que é a convivência com tal lado obscuro
a companhia mais imprescindível, a maior riqueza, o que temos
de mais íntimo, perene e familiar.
Trata-se de uma concepção abrangente e sofisticada sobre
cada um, que é traduzida com impressionante simplicidade para
as investigações cotidianas do universo infantil.
Ana Júlia, a protagonista da história, é uma criança curiosa
e observadora, que sempre gostou de pensar nas coisas que não
consegue entender sobre si e sobre o mundo que a rodeia, levan-
tando questões como “o que é a alma”.
Sua família acha graça, se diverte com sua maneira de ser e
com seus comentários inusitados, aos olhos do mundo adulto,
mas não leva muito a sério nem dialoga com a genuína investi-
gação da menina sobre tudo que atrai sua atenção e que ela não
dá conta de explicar.
Quem mantém vivo e estimula seu desejo de saber mais é a
encantadora figura da avó. Muito cedo, Ana Júlia percebe que
tem na avó uma interlocutora sempre disposta a compartilhar
seus questionamentos e a legitimar sua curiosidade, acolhendo
com interesse suas dúvidas e nunca a deixando sozinha com
seus enigmas.
O enigma que o livro destaca é a tentativa de Ana Júlia en-
tender quem é sua sombra. De início, ela pensa que a domina,
mas em seguida percebe que a sombra parece ter vida própria,
aparecendo e sumindo quando lhe dá vontade. A garota põe-se,
então, a tentar identificar as semelhanças e as diferenças entre
ela e sua sombra e, especialmente, a buscar uma maneira de se
relacionar com ela. Dessa forma, começa a entender mais sobre a
diversidade que a rodeia.
De início, é a avó de Ana Júlia quem tece as ligações entre dú-
vidas e deduções da neta e é quem vai delicadamente nomeando
a complexa descoberta de si mesma – na procura por sua sombra
– pela qual a menina passa. A avó Ada funciona como uma espé-
cie de “alma” para Ana Júlia, que, conforme a sábia definição que
dá para a pergunta da neta, “é um espaço dentro de nós onde dá
para pôr tudo o que não cabe em nenhum outro lugar”.
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Em busca da sombra Suzana Montoro
o texto literário
O texto transita todo o tempo entre a ótica metafórica do mun-
do infantil e a ótica concreta do mundo adulto. Nesse paradigma,
ilustra a diferença de percepções entre crianças e adultos e os ca-
minhos que a protagonista percorre para apreender e representar
algo tão abstrato e, às vezes, ausente, como a própria sombra.
A trama, construída a partir dos depoimentos da protagonista,
acompanha o raciocínio e as percepções típicas de uma criança:
com uma linguagem simples, próxima e direta, vai desenrolando
com a personagem os caminhos do seu autoconhecimento – que
acaba imprimindo no leitor a vontade de seguir o mesmo processo.
Ante a curiosidade sem fim de Ana Júlia, sua mãe vive lhe
dizendo que ela “procura pêlo em ovo” e que “vive com a cabeça
cheia de minhocas”. E seu pai, para definir a imensa amizade en-
tre a protagonista e sua amiga Fê, afirma que as duas “são farinha
do mesmo saco”.
A diferença entre o universo infantil e adulto, exposta na forma
de narrar e na interpretação que a protagonista faz daquilo que lhe
é dito aparece, por exemplo, quando Ana Júlia não consegue en-
tender uma frase da mãe, em resposta a suas perguntas: “nós não
precisamos entender as coisas que nós não entendemos”.
Outro aspecto importante a destacar no texto é que ele retrata
a seriedade com que as crianças brincam e o compromisso com
que se dedicam a suas investigações. Ao mesmo tempo, descreve
o caráter mágico e prazeroso que têm as descobertas infantis.
Por meio de sua lúdica participação na busca que a neta co-
meça, a avó a convida a aceitar o estranhamento da dúvida e do
incompreensível, a se comprometer com o próprio desejo, a ter
esperança de que encontrará o que procura e, especialmente, a ter
paciência nesse processo. Enfim, ensina-lhe a ser hospitaleira e a
brincar com o desconhecido que há nela, nos outros e no mundo.
Ao procurar sua sombra, Ana Júlia encontra a si mesma,
transformando a curiosidade em brincadeira, em pensamentos,
em comunicação e em laços de convivência. Através da busca da
sombra, que se desdobra em jogos divertidos realizados por ela e
por sua melhor amiga, Fê – tentam desenhar a sombra, fotogra-
fá-la, prendê-la no quarto, batizá-la –, as meninas se conhecem
melhor, admitem seus pontos fracos, tornam-se mais amadure-
cidas e prontas para lidar com a diferença.
Podem-se usar essas expressões meta-
fóricas para conversar com os alunos
sobre que idéia fazem delas: seu signi-
ficado é claro? Depois dessa pequena
pesquisa, perguntar e conversar sobre
que outras expressões desse tipo eles
conhecem e sobre o que acham que
querem dizer.
A partir da situação vivida por Ana
Júlia, a conversa com os alunos pode
indagar como eles traduziriam a frase
da mãe da personagem e o que fariam
se estivessem no lugar da menina. Em
seguida pode-se perguntar a quem eles
costumam recorrer quando têm uma
dúvida importante, para a qual não
encontram resposta sozinhos.
dicas
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Em busca da sombra Suzana Montoro
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A avó de Ana Júlia participa ativamente do jogo de encontrar a
sombra, sugerindo várias estratégias lúdicas que vão se deslocando
da concretude do desenho para a representação da palavra, pro-
pondo que a neta dê um nome para sua sombra, acompanhando-a
até que ela chegue à compreensão do conceito e à interiorização da
experiência: “se a sombra não aparece é porque está escondidinha
dentro de nós”. E tudo isso com o auxílio de um anjo da guarda,
que “é como uma sombra, só que nunca o vemos”.
A história também mostra como Ana Júlia passa a criar brin-
cadeiras com sua amiga, na saga da procura, passando uma a
fazer de conta que é a sombra da outra, depois criando códigos
secretos de comunicação entre elas até que aprendem a conversar
sobre tudo e sobre elas mesmas e a se conhecer muito melhor.
Além de “fazer de conta”, o brincar abre espaço para o fazer real,
para o tomar iniciativas. E constitui-se numa conquista determi-
nante para o desenvolvimento emocional de toda criança.
A vontade de saber está presente desde muito cedo nas crian-
ças. Refere-se originariamente às indagações cruciais sobre sua
origem, sobre como nascem os bebês e sobre as diferenças físicas,
mas estende-se a tudo que as rodeia e torna-se alvo de sua aten-
ção incansável e de seu desejo de apreender o mundo em que
vivem. Autorizar essa curiosidade e dialogar com ela é o princi-
pal combustível para favorecer o desenvolvimento e a autono-
mia das crianças. A desatenção da família de Ana Júlia sobre a
importância, para ela, de suas investigações faz com que a garota
conclua que sua sombra não aparece em sua casa provavelmente
porque “se sente intimidada”.
Da mesma forma, e desde muito antes de poder formular
questões, o brincar é uma experiência indispensável para que a
criança interaja com o mundo que a rodeia. A brincadeira cria
uma área intermediária de experimentação entre o mundo inter-
no e a realidade externa, constituindo um espaço potencial para
a expressão mais espontânea e criativa do ser humano. Constitui,
portanto, o melhor caminho para a descoberta de si mesmo.
Mas, para poder brincar, a criança precisa ter, necessariamen-
te, uma relação de confiança com o outro. Ou, dito de outra for-
ma, a criança precisa perceber que o outro com quem convive
tem interesse e consideração verdadeiros por ela.
Sobre esse ponto do texto, pode-se
explorar com as crianças de quais
brincadeiras mais gostam, com quem
brincam e quem na família brinca com
elas. A partir da história do livro, tam-
bém é possível verificar quais das brin-
cadeiras descritas gostariam de fazer
ou que outras inventariam para buscar
um contato com a própria sombra.
dicas
em tempo
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Em busca da sombra Suzana Montoro
O livro aponta para a importância da presença de adultos
disponíveis para o contato com a criança, nessa aventura in-
terminável de conhecer a si mesma e o mundo. Adultos que
dêem crédito a ela e que não tenham perdido a força e a plasti-
cidade de sua própria curiosidade infantil. Adultos que sintam,
com relação ao que fazem, o mesmo prazer que observamos
nas crianças ao brincar. Como Dudu, o fotógrafo irmão de Fê,
que apresenta a mágica de revelar fotografias para as meninas e
que leva suas sombras a sério. Ou como a avó Ada, que brinca
de verdade com sua neta.
O empenho que Ana Júlia e sua amiga Fê colocam em encon-
trar e desenhar suas sombras, em escolher um nome para elas
que represente sua essência e a dedicação com que as procuram
e se preocupam quando somem dão a dimensão de como, para a
criança, brincadeira é coisa séria.
A exemplo de Ana Júlia, os alunos
podem relatar para os colegas como
desvendaram algum enigma e quem os
ajudou nessa tarefa. Ou podem trazer
para a classe alguma pergunta que
tenham e para a qual ainda não encon-
traram resposta.
dicas
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Em busca da sombra Suzana Montoro
para o aluno
livros• Gustavo e os medos. Ricardo Alcântara. Edições SM, 2004.
Quando os pais de Gustavo viajam, ele fica aos cuidados da
tia Maria. Os dois se dão bem, exceto na hora das refeições. A
tia, cansada de insistir para que ele coma, resolve “chamar os
medos”. A partir desse momento, Gustavo fica cada vez mais
assustado e cheio de medos empoleirados nos ombros. Até
que resolve enfrentá-los de vez.
• Valentim é a cara de.... Graciela Montes. Edições SM, 2005.
Desde que nasceu, Valentim é comparado a todo mundo. Até que
ele bola um plano para ser identificado com ele mesmo. Leve e
divertida, a narrativa discute a importância de ser reconhecido
pelas qualidades pessoais e da busca de um lugar no mundo.
• Gambito. Menalton Braff. Edições SM, 2005.
A relação entre irmãos é o fio condutor dessa narrativa. Gam-
bito é o nome de um filhote de saracura capturado no leito de
um rio onde Carlinhos vai pescar com seu irmão mais velho.
A breve experiência de ver o bichinho sofrer faz o menino
tomar consciência sobre o significado de ser adulto e fazer
escolhas responsáveis.
• A bolsa amarela. Lygia Bojunga. Casa Lygia Bojunga, 2004.
Raquel tem três grandes vontades, que esconde dentro de uma
bolsa amarela: a vontade de crescer, de ser garoto e de se tor-
nar escritora. Ao tentar lidar com as vontades, que teimam em
crescer, e descobrir seu processo de amadurecimento, a menina
conta seu cotidiano e mistura o mundo real ao fantástico, que
ela inventa, cheio de amigos e aventuras imaginárias.
• Corda bamba. Lygia Bojunga. Casa Lygia Bojunga, 2004.
Maria nasceu no circo e anda na corda bamba. Quando seus
pais morrem, ela precisa ir morar com a avó. Para entender e
aceitar seu novo cotidiano, a menina inventa uma corda ima-
ginária, que a leva a lugares diferentes de um mundo inventa-
do, que ajuda a reconstruir o verdadeiro.
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Em busca da sombra Suzana Montoro
filmes• A viagem de Chihiro. Hayao Miyazaki. Japão, 2001.
Perdidos na estrada durante uma viagem de mudança, Chihi-
ro e seus pais acabam descobrindo uma misteriosa passagem
que os leva até um mundo mágico. É lá que a jovem Chihiro
enfrentará várias aventuras para salvar os pais, transformados
em porcos.
• As crônicas de Nárnia: o leão, a feiticeira e o guarda-roupa.
Andrew Adamsom. EUA, 2005.
Na Inglaterra da Segunda Guerra Mundial, quatro irmãos vão
morar no interior do país, onde ficam hospedados na casa
de um professor aposentado. Lá, uma brincadeira de escon-
de-esconde revela um guarda-roupa encantado. As crianças
também descobrem que, se forem para o fundo do armário,
podem deslocar-se para um universo paralelo, de animais fa-
lantes e criaturas fantásticas.
refletindo com os alunos
Destacar os aspectos lúdicos e prazerosos que acompanham
a busca e as descobertas de Ana Júlia, assim como as amizades e
as convivências significativas que ela vai construindo, talvez seja
o recurso mais rico que o livro propicia, para ser experimentado
em sala de aula.
As crianças de 8 a 10 anos em geral estão tentando assumir e
mostrar sua independência em todos os aspectos que lhes seja
possível. E, por isso mesmo, é comum que evitem pedir ajuda e
resistam em aceitá-la mesmo quando necessitam dela. Pela mes-
ma razão, apreciam especialmente quando suas opiniões e pecu-
liaridades são tratadas com consideração e respeito.
A professora ou professor costuma ser, nessa idade, um dos
adultos mais importantes para a criança, depois dos próprios
pais. Muitas vezes a criança procura neles aquilo que acha difícil
conseguir com os pais ou outros parentes próximos. Propiciar
atividades e experiências nas quais todos possam exercitar uma
convivência espontânea e divertida em torno de assuntos do in-
teresse das crianças fortalece vínculos de confiança com outros
adultos aos quais elas podem recorrer quando necessitarem.
A própria capacidade de estar só, aquisição tão importante
seja para brincar, estudar ou se concentrar em qualquer ativida-
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Em busca da sombra Suzana Montoro
Elaboração do guia Maria aparecida BarBirato psicanalista pelo instituto sedes sapientiae PrEParação Malu rangel rEvisão carla Mello Moreira e gislaine Maria da silva
de que desperte seu interesse, decorre necessariamente do esta-
belecimento anterior desses vínculos de confiança que a criança
tenha podido experimentar com adultos com os quais convive.
É também nessa idade que as crianças começam a ter mais
consciência e a perceber com maior clareza as variações existen-
tes nos valores, códigos de conduta e maneiras de viver e se re-
lacionar adotadas pelas diferentes famílias e pessoas com quem
convivem. Podem, portanto, se enriquecer com a diversidade que
experimentam no contato e na amizade com seus colegas e pro-
fessores em sala de aula.
Qualquer uma das dicas apontadas ao longo deste guia ou
quaisquer outras formas que o professor encontre de usar a his-
tória de Ana Júlia como inspiração para brincar com as crian-
ças podem funcionar como estímulo e autorização para o prazer
contido na aprendizagem, mostrando que ela é produto compar-
tilhado de uma convivência espontânea e criativa.
A leitura de outros livros, como os sugeridos na página 6, que
falem da descoberta pela criança do seu universo e da criação
de um mundo lúdico que favoreça o autoconhecimento também
pode ser uma boa maneira de provocar o mesmo processo nos
alunos, além de incentivar o gosto pela leitura.