13
ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CARDIOVASCULAR Março de 2016

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CARDIOVASCULAR · Um evento coronário agudo é a primeira manifestação da aterosclerose em, pelo menos, metade dos indivíduos que apresentam doença

Embed Size (px)

Citation preview

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CARDIOVASCULAR

Março de 2016

� SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 3

2. DADOS EPIDEMIOLÓGICOS ........................................................................................................ 3

3. ESTRATIFICAÇÃO INDIVIDUAL DE RISCO CARDIOVASCULAR ..................................................... 4

4. CALCULE O SEU RISCO E DE SEUS PACIENTES ......................................................................... 11

5. RESUMO DO ALGORITMO DA ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO4,5 .................................................. 12

REFERÊNCIAS ............................................................................................................................... 13

3

� 1. INTRODUÇÃO

As doenças cardiovasculares (DCV) são a principal causa de morte nos países desenvolvidos e em

desenvolvimento. Das 57 milhões de mortes que ocorreram no mundo em 2008, 17 milhões (30%)

foram provocadas por doenças cardiovasculares. Cerca de metade desses óbitos resultaram de

doença coronariana (DAC) e, aproximadamente, 20%, de acidentes vasculares encefálicos (AVE).

Além disso, um terço dessas mortes ocorreu em pessoas com idade inferior a 60 anos. Dessa

forma, a prevenção primária e secundária da aterosclerose tem indiscutível importância no âmbito

da saúde pública e na prática diária da medicina.1

A base conceitual de fatores específicos de risco cardiovascular passou a existir formalmente a

partir da década de 1960, com a publicação inicial dos dados do estudo de Framingham.

Do ponto de vista epidemiológico, fator de risco se aplica a um parâmetro que pode predizer o

risco de um evento cardiovascular futuro. A estimativa do risco de doença aterosclerótica resulta

da somatória do risco associado a cada um dos fatores identificados, mais a potenciação causada

pelos sinergismos entre alguns desses fatores. Diante da complexidade dessas interações, diversos

algoritmos têm sido criados, com base em análises de regressão logística de estudos

populacionais, por meio dos quais a identificação do risco cardiovascular é aprimorada.

Desde os dados de Framingham, a prevenção cardiovascular tornou-se uma parte essencial na

assistência à saúde.

� 2. DADOS EPIDEMIOLÓGICOS

As doenças cardiovasculares foram responsáveis por 29,4% de todas as mortes registradas no

Brasil em 2009. Isso significa que mais de 308.000 pessoas faleceram por infarto do miocárdio ou

AVE (Portal Brasil – Ministério da Saúde, setembro 2011). Estudo do Instituto Dante Pazzanese de

Cardiologia (SP) mostrou que 60% dessas vítimas eram homens, com média de idade de 56 anos

(portanto, em plena idade produtiva). Essa alta frequência coloca o Brasil entre os 10 países com

maior índice de mortes por doenças cardiovasculares.3

O custo direto relacionado ao manejo das DCV no Brasil também é elevado, com impacto

significativo no orçamento dos órgãos financiadores da saúde. Como exemplo, em 2007, foram

registradas 1.157.509 internações por DCV no SUS (10,22% do total de pacientes), e a insuficiência

cardíaca foi a principal causa. Em relação aos custos, em novembro de 2009, foram registradas

91.970 internações por DCV, com um custo de R$ 165.461.644,00 segundo o Ministério da Saúde

(Datasus).3

A inexistência de estudos nacionais sobre incidência e prevalência dos fatores de risco

cardiovasculares, somada à elevada estatística de morbimortalidade cardiovascular no Brasil

indicam a necessidade de esforços concentrados dos profissionais de saúde, das sociedades

científicas e das agências governamentais, para se atingirem metas para identificação e controle

dos fatores de risco cardiovasculares. Três abordagens complementares podem ser usadas para

4

reduzir a carga populacional das doenças cardiovasculares: 1) intervenções terapêuticas para

prevenção secundária nos indivíduos com doença cardiovascular manifesta; 2) identificação dos

indivíduos de alto risco, para implementação de metas de prevenção primária; 3) recomendações

gerais de prevenção para toda a população em relação aos hábitos e estilo de vida.

� 3. ESTRATIFICAÇÃO INDIVIDUAL DE RISCO CARDIOVASCULAR

Um evento coronário agudo é a primeira manifestação da aterosclerose em, pelo menos, metade

dos indivíduos que apresentam doença arterial coronariana. Dessa forma, a identificação dos

indivíduos assintomáticos que estão mais predispostos à doença é crucial para a prevenção

efetiva, com a correta definição das metas terapêuticas individuais. Um passo fundamental para o

estabelecimento de estratégias preventivas individuais ou populacionais envolve a avaliação do

risco de desenvolvimento de eventos clinicamente relevantes, uma vez que o custo-eficácia de

qualquer intervenção varia de acordo com o risco global, em um determinado indivíduo ou em

uma população.

Existem, atualmente, vários algoritmos para estratificação de risco. Vejamos os mais utilizados:

a) O Escore de Risco de Framingham estima a probabilidade de ocorrer infarto do miocárdio ou

morte por doença coronariana no período de 10 anos, em indivíduos sem diagnóstico prévio

de aterosclerose clínica, identificando, razoavelmente, indivíduos de alto e baixo riscos.

b) O Escore de Risco de Reynolds estima a probabilidade de infarto do miocárdio, acidente

vascular encefálico (AVE), morte e revascularização miocárdica em 10 anos.

c) O Escore de Risco Global estima o risco de infarto não fatal, morte por doença arterial

coronária, AVE fatal e não fatal, insuficiência vascular periférica ou insuficiência cardíaca em

10 anos, sendo utilizado a partir dos 40 anos.

d) O Escore de Risco pelo Tempo de Vida (ERTV) se aplica a indivíduos entre 20 e 59 anos e avalia

a probabilidade de um indivíduo de risco baixo a moderado, em 10 anos, apresentar um

evento isquêmico, numa projeção para 30 anos. O cálculo do Escore de Risco pelo Tempo de

Vida considera que o indivíduo deve pertencer exclusivamente a uma das seguintes

categorias: a) sem nenhum fator de risco; b) um ou mais fatores de risco em controle não

ótimo; c) um ou mais fatores de risco elevados; d) um fator maior de risco elevado; e) dois ou

mais fatores maiores de risco elevados.

São considerados fatores maiores de risco pelo ERTV: colesterol total > 240 mg/dL, pressão

sistólica > 160 mmHg, pressão diastólica > 100 mmHg ou HAS tratada, diabetes mellitus ou

tabagismo atual.

As diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e do American College of Cardiology/

American Heart Association (ACC\AHA) recomendam, a partir de 2013, a combinação de um

escore de curto prazo com outro de longo prazo, para melhor estimativa de risco. Essa abordagem

5

justifica-se pelo seguinte fato: grande parte das mulheres e dos homens adultos jovens se

encontra na categoria de baixo risco em 10 anos, mas, no longo prazo, parte deles poderá ser

reclassificada como de alto risco predito ao longo da vida.

Assim, a abordagem combinada deve ser usada para melhorar a motivação de indivíduos com

baixo risco no curto prazo, mas alto em longo prazo, a intensificarem mudanças de estilo de vida e

controlar os fatores de risco.

As diretrizes da SBC e da ACC/AHA recomendam que a estratificação de risco seja feita em três

etapas:

1. determinação da presença de doença aterosclerótica significativa ou de seus equivalentes;

2. utilização dos escores de predição do risco;

3. reclassificação do risco pela presença dos fatores agravantes do risco.

Etapa 1: Determinação da presença de doença aterosclerótica significativa ou de seus

equivalentes

O indicador mais claro de risco é a manifestação prévia da doença aterosclerótica (coronária,

cerebrovascular ou periférica). Portanto, o primeiro passo é a identificação de manifestações

clínicas da aterosclerose ou de seus equivalentes como diabetes mellitus tipo 1 ou 2, doença renal

crônica e aterosclerose subclínica. Aproximadamente, 80% dos indivíduos com doença

cardiovascular conhecida morrerão de causas cardiovasculares, com mais de 20% de probabilidade

de eventos graves em 10 anos. Esses pacientes não necessitam de outras etapas para a

estratificação de risco, sendo considerados, automaticamente, de alto risco.

QUADRO 1. Critérios de identificação de pacientes com alto risco de eventos coronarianos (fase 1)

Doença aterosclerótica arterial coronária, cerebrovascular ou obstrutiva periférica, com

manifestações clínicas (eventos CV)

Aterosclerose na forma subclínica, significativa, documentada por metodologia diagnóstica

Procedimentos de revascularização arterial

Diabetes mellitus tipo 1 ou 2

Doença renal crônica

Hipercolesterolemia familiar

Fonte: V Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção de Aterosclerose. Arq. Bras. Cardiol. 2013; 101(4): supl. 1.

6

Etapa 2: A utilização dos escores de predição do risco

O Escore de Risco Global deve ser utilizado na avaliação inicial entre os indivíduos que não foram

enquadrados nas condições de alto risco.

TABELA I. Atribuição de pontos de acordo com o risco cardiovascular global para mulheres.

Pontos Idade

(Anos) HDL-C CT

PAS (não

tratada)

PAS

(Tratada) Fumo Diabetes

-3 < 120

-2 60+

-1 50 - 59

0 30 - 34 45 - 49 < 160 120 -129 Não Não

1 35 - 44 160 - 199 130 -139

2 35 - 39 < 35 140 -149 120 -129

3 200 - 239 130 -139 Sim

4 40 - 44 240 - 279 150 -159 Sim

5 45 – 49 280 + 160 + 140 -149

6 150 -159

7 50 - 54 160 +

8 55 - 59

9 60 - 64

10 65 - 69

11 70 - 74

12 75 +

Pontos Total

Fonte: V Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção de Aterosclerose. Arq. Bras. Cardiol. 2013; 101(4): supl. 1.

7

TABELA II. Risco cardiovascular global em 10 anos para mulheres

Pontos Risco (%) Pontos Risco (%)

< - 2 < 1 13 10,0

- 1 1,0 14 11,7

0 1,2 15 13,7

1 1,5 16 15,9

2 1,7 17 18,5

3 2,0 18 21,6

4 2,4 19 24,8

5 2,8 20 28,5

6 3,3 21 + < 30

7 3,9

8 4,5

9 5,3

10 6,3

11 7,3

12 8,6

Fonte: V Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção de Aterosclerose. Arq. Bras. Cardiol. Vol. 101 no 4 supl. 1

São Paulo out. 2013.

8

TABELA III. Atribuição de pontos de acordo com o risco cardiovascular global para homens

Pontos Idade

(Anos) HDL-C CT

PAS (não

tratada)

PAS

(Tratada) Fumo Diabetes

- 2 60+ < 120

- 1 50 - 59

0 30 - 34 45- 49 < 160 120 - 129 < 120 Não Não

1 35- 44 160 - 169 130 - 139

2 35 - 39 < 35 200 - 239 140 - 159 120 - 129

3 240 - 279 160 + 130 - 139 Sim

4 280 + 140 - 159 Sim

5 40 - 44 160 +

6 45 - 49

7

8 50 - 54

9

10 55 - 59

11 60 - 64

12 65 - 69

13

14 70 - 74

15 75 +

Pontos Total

Fonte: V Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção de Aterosclerose. Arq. Bras. Cardiol. Vol. 101 no 4 supl. 1

São Paulo out. 2013.

9

TABELA IV. Risco cardiovascular global em 10 anos para homens

Pontos Risco (%) Pontos Risco (%)

< - 3 ou menos < 1 13 15,6

- 2 1,1 14 18,4

- 1 1,4 15 21,6

0 1,6 16 25,3

1 1,9 17 29,4

2 2,3 18 + >30

3 2,8

4 3,3

5 3,9

6 4,7

7 5,6

8 6,7

9 7,9

10 9,4

11 11,2

12 13,2

Fonte: V Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção de Aterosclerose. Arq. Bras. Cardiol. Vol. 101 no 4 supl. 1

São Paulo out. 2013.

São considerados indivíduos de baixo risco aqueles com probabilidade menor que 5% de

apresentar os principais eventos cardiovasculares: doença arterial coronária, acidente vascular

cerebral, doença arterial periférica obstrutiva e insuficiência cardíaca, em 10 anos. Os pacientes

classificados nessa categoria, mas que tenham história familiar de doença cardiovascular

prematura (familiares de primeiro grau < 55 anos masculinos e < 65 anos feminino) serão

reclassificados para risco intermediário.

10

São considerados de risco intermediário os homens com risco > 5% e < 20% em 10 anos e as

mulheres com risco > 5% e < 10% em 10 anos.

Homens com risco > 20% em 10 anos e mulheres com risco > 10% em 10 anos são considerados

pacientes de alto risco.

Etapa 3 – A reclassificação do risco pela presença de fatores agravantes do risco

Nos indivíduos de risco intermediário, devem ser avaliados os fatores agravantes de risco, que, quando

presentes (um ou mais fatores), reclassificam o paciente para condição de alto risco. São eles:

� História familiar de doença arterial coronária prematura (parente de primeiro grau

masculino < 55 anos e feminino < 65 anos).

� Critérios de síndrome metabólica: obesidade abdominal, hipertensão arterial, baixo HDL-C,

hipertrigliceridemia e intolerância à glicose.

� Microalbuminúria (30 – 300 mcg/min) ou macroalbuminúria (> 300 mcg/min).

� Hipertrofia ventricular esquerda.

� Proteína C de alta sensibilidade > 2 mg/dl (na ausência de outras causas inflamatórias).

� Espessura íntima-média de carótidas > 1,0 (estudo doppler).

� Escore de cálcio coronário > 100 (moderado) ou > percentil 75 para idade ou sexo

(angiotomografia coronária).

Observando-se essas etapas, chega-se a um risco absoluto final, conforme apresentado na tabela VI.

TABELA V. Risco absoluto final

Risco absoluto em 10 anos Percentagem (%)

Baixo risco < 5 em homens e mulheres

Risco intermediário >5 e < 10 nas mulheres

>5 e < 20 nos homens

Alto Risco >10 nas mulheres

>20 nos homens

Fonte: V Diretriz Brasileira de Dislipidemia e Prevenção de Aterosclerose. Arq. Bras. Cardiol. Vol. 101 no 4 supl. 1

São Paulo out. 2013.

11

Com o objetivo de reduzir a carga de doença cardiovascular, enfatiza-se o cálculo de risco global

em 10 anos. Entretanto, grande parte dos indivíduos que são considerados de baixo risco em 10

anos, na verdade, apresentam alto risco ao longo da vida. A estimativa do risco de doença

cardiovascular pelo tempo de vida permite estratificar, de forma mais abrangente, a carga de

doença cardiovascular futura, pois leva em conta o risco de doença cardiovascular enquanto o

indivíduo envelhece. A Diretriz da Sociedade Brasileira de Cardiologia recomenda o uso do Escore

de Risco pelo Tempo de Vida em indivíduos de riscos baixo e intermediário a partir dos 45 anos.

A diretriz americana (ACC/AHA) recomenda utilizá-lo em todas as pessoas entre 20 e 39 anos e

naquelas entre 40 e 59 anos definidas como de baixo risco pelo Escore Global em 10 anos.

O risco predito pelo Escore de Risco pelo Tempo de Vida > 39% em homens ou > 20% em mulheres

caracteriza condição de alto risco ao longo da vida.

� 4. CALCULE O SEU RISCO E DE SEUS PACIENTES

Uma calculadora para estimativa dos riscos global e pelo tempo de vida está disponível na web,

nos seguintes endereços:

� http://my.americanheart.org/cvriskcalculator

� http://www.cardiosource.org/en/Science-And-Quality/Practice-Guidelines-And-Quality-

Standards/2013-Prevention-Guideline-Tools.aspx.

A UNIMED-BH recomenda que você calcule o seu e de seus pacientes, considerando a faixa

etária e a história clínica.

12

� 5. ALGORITMO DA ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO4,5

ERG < 5% em homens e mulheres

Baixo Risco

ERG>5%e<10% em

mulheres e>5%

e<20% em homens

ou

ERG<5% em

homens e mulheres

+ HF de DAC

prematura

Risco Intermediário

Condição de

alto risco

ou

ERG >10% em

mulheres e >20%

em homens

ou

ERG>5% e<10% em

mulheres e>5% e<20%

em homens e pelo

menos um fator

agravante

Alto Risco

13

� REFERÊNCIAS

1. Andrade JP, Piva e Matos LA, Carvalho AC, Machado CA, Oliveira GM. Programa nacional de

qualificação de médicos na prevenção e atenção integral às doenças cardiovasculares. Arq.

Bras. Cardiol. 2013; 100(3): 203-211.

2. Braunwald E. A textbook of cardiovascular medicine.7th Ed. Elsevier Saunders, 2005.

3. Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS. Informações de saúde. [Acesso em 23 dez. 2015].

Disponível em: www.datasus.gov.br

4. Sociedade Brasileira de Cardiologia. Departamento de Aterosclerose. V Diretriz Brasileira

de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose. Arq. Bras.Cardiol. 2013; 101(4): supl 1.

5. Guideline on the Assessment of Cardiovascular Risk. A Report of the American College of

Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines. J. Am Coll

Cardiol. 2014; 63(25).