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FICHA TÉCNICA
Chanceler
Dom Ângelo Pignoli
Reitor
Manoel Messias de Sousa
Vice-reitor
Renato Moreira de Abrantes
Pró-reitor de Pós-graduação e Pesquisa
Américo Valdanha Netto
Pró-reitor de Graduação e Extensão
Marcos Augusto Ferreira Nobre
Coordenação Editorial
Cândida Maria Farias Câmara
Revisão Técnica
Monique Isabelle de Sousa Nascimento
Revisão Ortográfica
Maciel de Jesus
Diagramação
Manoel Miqueias Maia
Capa e contracapa
Editora Simplíssimo
Organizadoras
Adriana de Albuquerque Pereira
Cândida Maria Farias Câmara
Francisca Aldenisa Peixoto da Silva
Marlene Gomes Guerreiro
HISTÓRIAS DE VIDA Trajetórias estudantis no Sertão Central
Organizadoras
Adriana de Albuquerque Pereira
Cândida Maria Farias Câmara
Francisca Aldenisa Peixoto da Silva
Marlene Gomes Guerreiro
HISTÓRIAS DE VIDA Trajetórias estudantis no Sertão Central
AUTORES
Ana Beatriz Almeida Sampaio
Antônio Wellington de Souza Gomes
Cândida Maria Farias Câmara
Cintia Leslie Pessoa Oliveira
Cosmo Helder Ferreira da Silva
Danilo Pereira Cavalcante
Fabrício Bezerra da Silva
Felipe Fabrício Farias da Silva
Francisca Colares Martins
Francisco Egberto Martins Melo
Francisco Welligton da Silva Lima
Hallison Joabe Rabelo Lemos
Hérick Hebert da Silva Alves
Jânder Carlos Soares Silva
Joélia Ferreira da Silva Pereira
Karleandro Pereira do Nascimento
Kleber Bezerra da Cunha
Lucas Ferreira de Oliveira
Luciano Oliveira Paulo Filho
Luiz Gonzaga de Araújo
Manoel Miqueias Maia
Marcelo Bertonny Alves Freitas
Marcelo Eduardo Pereira dos Santos
Maria Lucieuda Girão Mendes
Maria Mayalle de Almeida Melo
Mariana Lane Freitas dos Santos
Marina Lima Silva
Rosa Maria dos Santos Carvalho
Thairo Fellipe Freitas Oliveira
Thiago Alberto Viana de Sousa
Thiago Costa Alves
COLABORAÇÃO
Professor Renato Moreira de Abrantes
Pereira, Adriana de Albuquerque – Câmara, Cândida Maria Farias – Silva, Francisca Aldenisa Peixoto
da – Guerreiro, Marlene Gomes.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central / Adriana de Albuquerque Pereira;
Cândida Maria Farias Câmara; Francisca Aldenisa Peixoto da Silva; Marlene Gomes Guerreiro;
organizadoras. – 1. ed. – Porto Alegre: Revolução eBook – Simplíssimo, 2007.
Recurso digital: il.
Formato: ePub2
Requisitos do sistema: Adobe Digital Editions
Modo de acesso: World Wide Web
ISBN 9788582455012
1. Educação. 2. História. 3. Estudante. 4. Sertão. I. Título.
CDD: 370
CDU:
Arquivo ePub produzido pela Simplíssimo Livros
SUMÁRIO
Prefácio ..................................................................................................................................... - 9 -
Entre Cronos e Kairós: Histórias na construção do Núcleo de Apoio Psicopedagógico ....... - 11 -
Caminhos e conquistas: uma trajetória acadêmica de perseverança ....................................... - 19 -
O filho de Maria ...................................................................................................................... - 25 -
A faculdade que um dia eu “aparei”, é hoje o centro acadêmico que me ampara ................... - 33 -
A felicidade não está somente na concretização dos objetivos, mas no percurso... ................ - 37 -
A minha trajetória de vida acadêmica ..................................................................................... - 43 -
A trajetória de vida de um jovem do campo até a cidade: a chegada ao ensino superior e as
novas expectativas ................................................................................................................... - 47 -
A trajetória sonhadora de uma estudante apaixonada pela vida .............................................. - 53 -
“Afinal de contas, o que nos trouxe até aqui: medo ou coragem? Talvez nenhum dos dois” . - 59 -
Caminhos e escolhas: o triunfar de um sonho ......................................................................... - 67 -
Da enxada para o sonho do diploma ....................................................................................... - 71 -
De carbono a diamante. Unicatólica: ponte de sabedoria indispensável nessa transformação- 79 -
Do interior do interior do Ceará ao centro do conhecimento .................................................. - 85 -
Do interior do Ceará aos Estados Unidos: uma história de determinação, aprendizado e fé .. - 91 -
Dos campos da roça ao campo da ciência: a trajetória do menino do Sítio Feiticeiro .......... - 97 -
Entrou para a universidade o neto do Zé da Flor .................................................................. - 103 -
“Eu penei, mas aqui cheguei” ............................................................................................... - 109 -
Mobilidade acadêmica internacional: experiências, percepções e aprendizados .................. - 115 -
O que me trouxe até aqui? ..................................................................................................... - 119 -
Perspectiva de vida, história e análise de uma trajetória acadêmica ..................................... - 125 -
Quando tudo começou? Não sei... Só sei que foi assim! (Chicó) ......................................... - 129 -
“Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou” .......................................................................... - 133 -
Registrando gratidão ............................................................................................................. - 139 -
Rompendo o silêncio e conquistando o impossível ............................................................... - 143 -
Se a vida fosse fácil, não teria graça viver ........................................................................... - 147 -
Superando desafios, trilhando sonhos: um relato de um acadêmico com deficiência visual - 151 -
Ter uma direção, uma verdade ............................................................................................. - 157 -
Trajetória acadêmica de um estudante de enfermagem: desafios e conquistas ..................... - 163 -
Um jovem filósofo ................................................................................................................ - 169 -
Um natal diferente ................................................................................................................. - 173 -
Uma vida de superação ......................................................................................................... - 179 -
Prefácio
- 9 -
PREFÁCIO
Histórias de Vida: trajetórias estudantis no Sertão Central não é um livro para
ser lido; é para ser saboreado. Não apenas pela escrita informal, a causar prazer em quem
lê, mas, também, pelos relatos nele contidos que demonstram que é possível, a quem quer,
romper qualquer barreira para construir um sonho.
Qual jovem não deseja entrar para a faculdade e concluir um curso superior?
Quem, nas fases iniciais da vida, já não se perguntou (e respondeu) sobre “o que ser
quando crescer”? O sonho alheio demanda muita responsabilidade tanto em quem sonha
quanto em quem ajuda a concretizá-lo. E aqui nos enquadramos nós, do Centro
Universitário Católica de Quixadá (Unicatólica).
A educação formal é uma das muitas maneiras de fazer com que sonhos se tornem
realidade. Sonhos são projetos de vida em gestação, o futuro trazido para o presente, uma
espécie de “já, mas ainda não”. Por isso, ninguém pode “brincar de educar” ou “brincar
de ser educador”.
Os autores deste livro, a maioria discentes da nossa Unicatólica, nos dão a honra
de conhecê-los mais de perto e nos deixam convictos de que estamos fazendo bem aquilo
a que nos propomos: formar pessoas (e não meros apertadores de parafusos) e transformar
realidades.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 10 -
Quantas pessoas já formadas! Quantas realidades transformadas! As tintas de
todas as páginas estão carregadas de desafios, dificuldades e, também, garra,
determinação e superação. O que se registra neste livro são algumas histórias de alunos
— dentre tantas outras desconhecidas, mas reais —, que “matam mais de um leão por
dia”.
Como professor (e egresso – Cursos de Teologia e Direito) da Unicatólica, sou
testemunha disso: não são poucos os que vêm para as aulas trazendo na mochila não
somente o caderno e a caneta, mas também as preocupações com a vida difícil e o cansaço
do trabalho, por vezes depois de se deslocarem centenas de quilômetros. A estes, costumo
chamá-los de “heróis”, porque de fato o são.
“Há histórias por trás da história”, assim começo a minha dissertação de Mestrado
em Educação e Ensino. Não podemos julgar alguém pela história que vemos,
negligenciando a história que não vemos, aquela oculta na vivência de um cotidiano
sofrido: os ônibus quebrados ou a falta deles, as doenças, a falta de dinheiro, a fome, os
assaltos. Desistir? Ir adiante? Dilema que não pode passar despercebido pelos
professores.
Sinto-me — e creio que também os meus colegas ao lerem este livro — edificado
em saber que as noites insones, preparando aula, ou os finais de semana sacrificados,
corrigindo provas, não foram em vão. Eis aí o resultado: o crescimento humano e
profissional dos nossos alunos.
Desejo que a presente obra nos sirva de inspiração, pois ainda há muito que se
fazer. Professores e funcionários, dediquemos todas as nossas forças à construção dos que
nos são confiados, procuremos meios e estratégias para servir cada vez melhor, tratando
bem os que fora dos nossos muros já são tão maltratados pela vida. Estudantes,
enxerguem o futuro com confiança, motivados pela certeza de que “para Deus nada é
impossível” (Lc 1, 37). Se estamos com Ele, também para nós nada será impossível.
Que Deus nos abençoe a todos. Que a Virgem Santíssima nos acompanhe e nos
conduza a Jesus, seu filho e nosso irmão.
Avante, sempre!
Renato Moreira de Abrantes
Vice-Reitor
UNICATÓLICA
ENTRE CRONOS E KAIRÓS:
HISTÓRIAS NA CONSTRUÇÃO
DO NÚCLEO DE APOIO
PSICOPEDAGÓGICO
Cândida Maria Farias Câmara
Entre Cronos e Kairós: histórias na construção do Núcleo de Apoio Psicopedagógico
- 13 -
tempo é a própria sabedoria do universo traduzida em precisão, finitude e
eternidade. Uma brecha no tempo se abre para a existência e o milagre da vida
acontece: da primeira respiração nasce um novo ser, único e singular, que
viverá até o seu último suspiro. Assim, cada um compõe sua breve história na Terra.
Na mitologia grega, dois deuses regiam o tempo: Cronos e Kairós. O primeiro é
símbolo do tempo cronológico e quantificável, do relógio, dos dias, meses e anos. No
mito, Cronos devora seus próprios filhos, nada pode detê-lo e ele consome tudo que
existe, pois nada pode fugir de sua ação. O segundo, é símbolo da dimensão eterna do
tempo, das oportunidades, do sentido e do vivido e que, portanto, não pode ser medido
nem cronometrado. Retratado como um deus jovem que possuía apenas uma mecha de
cabelo, Kairós corria rapidamente e a única forma de agarrá-lo seria segurando-o pelos
cabelos. Caso contrário, seria impossível uma nova oportunidade.
Assim, é o tempo do momento presente, de viver o instante e abraçar as
oportunidades oferecidas. É dessa forma, entre Cronos e Kairós, que iniciei e que
pretendo contar algumas histórias na minha caminhada no Núcleo de Apoio
Psicopedagógico (NAP) da Unicatólica. Lembro-me quando a coordenadora do curso de
Psicologia, Milena Oliveira, avisa por e-mail que necessitava de uma conversa comigo
em sua sala. O relógio acelerava e a ansiedade aumentava. O que desejava? Havia apenas
um semestre que lecionava na Unicatólica, entrei em janeiro de 2014, era minha primeira
experiência na docência e ainda estava em adaptação com os estudantes e a dinâmica da
instituição.
Na ocasião, ela disse que a direção acadêmica, na época a pessoa da professora
Maria Dias, submetia a responsabilidade pelo NAP ao curso e, como eu era a docente
responsável pela área da Psicologia educacional, seria ideal assumir sua coordenação. Foi
uma surpresa, um convite repentino que mudaria o meu rumo acadêmico. Como diz
Clarice Lispector, tudo no mundo começa com um sim, e essa foi a minha resposta.
O núcleo já funcionava com dois professores de Psicologia que atendiam apenas
os alunos do próprio curso, professor Júlio Ischiara e professor Marcus Kleredis. Os
outros alunos que necessitavam de acompanhamento eram devidamente encaminhados
ao Serviço de Psicologia Aplicada (SPA), mais conhecido como a clínica de psicologia,
sob a coordenação da professora Andréa Vidal. Assim, fomos escrever o projeto do NAP
com todos os envolvidos nessa empreitada, definir objetivos, diretrizes, metas e ações.
No segundo semestre de 2014, ainda em processo de estudo e familiarização com
o serviço, fomos ampliando novas perspectivas ao núcleo e, logo mais, a equipe de
O
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 14 -
psicólogos contaria com a contratação de uma psicopedagoga: a egressa da Unicatólica,
Adriana Albuquerque. O núcleo funcionou inicialmente e provisoriamente em uma sala
no SPA, nela ainda não havia secretária ou computador para o NAP, tudo era
compartilhado com a clínica de psicologia. De horista para tempo parcial, agora tempo
integral, a minha dedicação e da equipe só aumentava e o núcleo foi expandindo-se.
Foram muitas gargalhas nas muitas reuniões e muitos desafios enquanto gestora,
lugar novo para mim. Nesse percurso, perguntei-me sobre a história do núcleo. Como
funcionava antes? Qual a sua história? Os únicos registros do núcleo, de fevereiro a
setembro de 2013, apontam alguns atendimentos dos psicólogos egressos Gilmar Ferreira,
hoje meu amigo pessoal, e Wendel Sousa, da atual pró-reitoria de graduação e extensão.
Em conversas com Júlio Ischiara, ele relata que participou da origem do NAP, um núcleo
institucional e antigo da Unicatólica, no entanto, não temos registros oficiais. Lembro-me
de uma orientação da professora Maria Dias quanto à articulação dos estagiários de
Psicologia nas atividades do núcleo.
Dessa forma, iniciamos primeiramente uma análise diagnóstica dos alunos dos
primeiros e segundos semestres dos cursos, elaboramos folders e cartazes para divulgar o
serviço, implementamos as oficinas de preparação para a vida acadêmica e o questionário
de percepção acadêmica, sempre com a colaboração dos alunos das disciplinas de práticas
integrativas e de estágio profissionalizante em Psicologia. Esses alunos sempre estão
passando para tomar um café, para uma conversa, deixar uma revista da Avon, matar a
saudade e, assim, de maneira tão simplista, criam vínculos que perduram no tempo.
Alguns estagiários que passaram pelo núcleo: Lucas, Bim, Davi, Mayara, Kátia, Matheus
e Edna. Outra estagiária que conquistou seu espaço foi a Marlene Guerreiro, que ao se
formar passou a compor nossa equipe como profissional da Psicologia.
O NAP é um núcleo que preza pelo cuidado com as relações, seja com alunos ou
colaboradores, pelo acompanhamento e compromisso com a jornada de quem o constitui
e para quem ele é o motivo de existir. As decisões e ações são sempre dialogadas e
tomadas no coletivo, cada membro da equipe é peça imprescindível para o melhor
desempenho do trabalho. Alegria e leveza são aspectos importantes na lida diária, acredito
ser possível trabalhar com prazer e amor. Com pouco mais de um ano, em agosto de 2015,
mudamos para nossa nova sede do núcleo, a sala F50. Depois de montar o projeto e das
reformas feitas em uma antiga sala de aula, o NAP passou a funcionar com melhor
estrutura. Também celebramos a chegada de mais duas profissionais: a secretária
administrativa Eryka Soares e a psicóloga Flávia Lima.
Entre Cronos e Kairós: histórias na construção do Núcleo de Apoio Psicopedagógico
- 15 -
Em pouco tempo, uma reestruturação ocorreu, nova sala, a saída do psicólogo
Marcus Kleredis e a entrada de novos integrantes do núcleo. O primeiro planejamento
estratégico desse grupo foi celebrado com muita alegria, com salgadinho e refrigerante
liberados pela vice-reitoria, na pessoa do professor Renato Moreira. Aquele cheiro
delicioso de comida na sala transbordou entusiasmo na equipe, que aproveitou para tirar
fotos e compartilhar nas redes sociais. É gratificante acompanhar as conquistas em nosso
trabalho, podem parecer pequenas, mas grandes em significados, seja uma cadeira nova,
um computador novo, uma pessoa nova. O processo de renovação e mudança é essencial
para alimentar nossa criatividade.
Nesse ponto, o núcleo deu um salto não somente na quantidade de projetos e
atendimentos oferecidos, como também na qualidade. Os grupos temáticos e terapêuticos
foram organizados e iniciamos a implementação de novas ações, pesquisas, participação
em congressos e produções acadêmicas ligadas ao núcleo. Em 2015, foi publicado o
capítulo intitulado “Núcleo de Apoio Psicopedagógico: uma práxis em psicologia escolar
e educacional” para o livro comemorativo dos 10 anos do curso de Psicologia da antiga
Faculdade Católica Rainha do Sertão (FCRS), hoje, Centro Universitário.
Vale mencionar as visitas do Ministério da Educação, no início sempre tensas,
aguardadas com ansiedade, o cuidado para manter todos os dados e relatórios atualizados,
assim como a espera pelo resultado das avaliações. Toda a equipe ficava de prontidão e
lembro na primeira vez, na antiga sala do SPA, os avaliadores nem entraram na sala,
apenas olharam, identificaram o que era e seguiram em frente, foi um misto de alegria,
alívio, surpresa e decepção: “Como assim? É só isso?”. Hoje, estamos mais habituados
com essa rotina, compreendendo esse processo com mais naturalidade e abertos ao
diálogo, como vem acontecendo nas últimas visitas.
Nos congressos sempre compartilhamos as experiências do NAP, lembro do VI
Seminário Cultura de Paz, Educação e Espiritualidade, realizado na Universidade Federal
do Ceará (UFC) em que os ouvintes participaram e perguntaram bastante sobre bullying
e preconceito racial na apresentação intitulada “Oficina de preparação para a vida
acadêmica: dialogicidade e valores de paz no ambiente acadêmico”, dentre muitos outros
eventos que participamos.
Outra produção importante, já em 2016, foi a monografia da especialização em
Educação Biocêntrica pela Universidade Estadual do Ceará (UECE), em que refleti sobre
o processo de adaptação dos estudantes em seu primeiro ano na Unicatólica e as
contribuições possíveis pela ótica da educação biocêntrica. Intitulado “Vivência
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 16 -
pedagógica e adaptação de estudantes ao Ensino Superior: um olhar biocêntrico”, fui
orientada pela querida e sábia educadora Ruth Cavalcante.
O ano de 2016 foi fértil, período para consolidar as ações, divulgar o núcleo e
promover maior aproximação com os estudantes e coordenadores. Cada integrante da
equipe tem sua contribuição no núcleo: a Eryka, em sua alegria e energia jovem, permite
o acolhimento dos estudantes, liga, marca e desmarca atendimentos, sugere melhorias e
questiona também, quando necessário; a Adriana mantém o núcleo sereno, sua presença
acrescenta calma, paciência e muita competência ao grupo; a Flávia, com sua experiência
clínica e no setor financeiro, sabe produzir um relatório no Excel como poucos, além de
proporcionar um tom maternal e acolhedor para a equipe; a Marlene contribui com sua
articulação em diversos setores da Unicatólica, o que facilita muito nosso trabalho, e
acrescenta bastante com visão de docente experiente; o Júlio, que hoje tem seu tempo
muito limitado, mas foi muito importante no desenvolvimento do núcleo, sempre
apresentou muita disponibilidade e agrega pela experiência e história com a instituição.
Em 2017, mais boas mudanças, e vamos para uma nova sala, agora com outras
duas para atendimento. Para o setor permanecer aberto no período noturno, juntou-se à
equipe a colaboradora Aurinete Sales, uma jovem meiga e gentil, que sempre abre o
sorriso quando nos aproximamos. É só aparecer no NAP à noite para confirmar. O
primeiro semestre de 2017 também contou uma conquista importante: a implantação do
Núcleo de Acessibilidade e Inclusão (NAI), com a coordenação da professora Aldenisa
Peixoto, intérprete da língua de sinais e militante na área da inclusão.
O NAI e NAP funcionam juntos, como parceiros que atendem o mesmo público,
mas com diferentes especificidades. Nesse caso, os alunos com deficiência ganharam uma
profissional com olhar especializado para suas demandas, assim como nossa equipe ficou
mais completa e preparada para os desafios impostos no âmbito da inclusão na
Unicatólica. É importante dizer que não somente os alunos ganham com o serviço, mas
toda a sociedade é beneficiada quando um aluno é incluído.
É gratificante acompanhar, por exemplo, uma aluna da Psicologia que reprovou
na minha disciplina e apresentava muita dificuldade no processo de interpretação, de
leitura e escrita. Ao ser encaminhada ao NAP, verificamos o desenvolvimento de um
processo de autonomia e crescimento que desembocou na apresentação da sua
monografia. Como momento máximo de superação, seus agradecimentos também
incluíram a psicopedagoga Adriana, que a acompanhou com mais proximidade, e o
trabalho do núcleo, com direito a lembrancinha deixada na minha mesa, para minha
Entre Cronos e Kairós: histórias na construção do Núcleo de Apoio Psicopedagógico
- 17 -
surpresa. Assim como ela, outros alunos e casos poderiam ser relatados,
cronologicamente foram três anos de experiência, entre erros e acertos, conquistas e
perdas, desafios e alegrias.
No tempo Kairós, internamente, houve muitas situações de aprendizagem e
compreensão mais clara das contribuições da psicologia educacional no Ensino Superior
e das minhas possibilidades e limitações enquanto ser humano e profissional. Acredito
que o núcleo continue a crescer, pois são infinitas as formas de realização de projetos e
ações para os estudantes. Ainda esse ano, vislumbramos isso com a chegada da
coordenadora pedagógica Soraya Gomes, contratada para assessorar o pró-reitor de
graduação e extensão Marcos Nobre. Uma nova percepção que, com certeza, já vem
acrescentando ao núcleo, uma vez que a utilização do projeto orientador de carreira
promete articular coordenações e professores diretamente com o NAP via sistema.
Nesses anos de estudo sobre a educação, sempre acompanhada pelo pensamento
do educador Paulo Freire, é importante lembrar que educar é uma ação que acontece
sempre no plural, não é possível educar na solidão, mas na relação com o outro. Educar
não é um ato solitário, pelo contrário, é solidário e implica educar junto um ao outro.
Educar é amar com humildade, sem deixar de contestar e questionar. É afeto, no sentido
de afetar e ser afetado. É acreditar na construção democrática e participativa, em que o
outro tenha voz e autonomia para participar das decisões de sua própria vida. Com essa
concepção, o NAP, hoje, possui uma dinâmica própria, estrutura física e profissional de
qualidade, um setor que é flexível e aberto às mudanças, que busca seu próprio
aprimoramento. Uma história ainda em construção que só existe em função e na relação
direta com os alunos da Unicatólica.
Nesse sentido, e em lembrança ao dia do estudante, o NAP lançou luz ao
desafiante mundo dos estudantes que constituem a Unicatólica por meio deste livro. Que
seja uma experiência nova a cada página para o leitor, que veja a si mesmo nas
identificações e diferenças diante dos relatos envolventes de superação de pessoas em
busca de um lugar de valor e reconhecimento no mundo. O livro “Histórias de vida:
trajetórias estudantis no Sertão Central” é uma forma de adentrar no universo daqueles
que protagonizam sua própria aprendizagem: os estudantes. Além dos vinte e nove
capítulos dos alunos dos mais variados cursos, convidamos, ainda, os professores
egressos Cosmo Hélder Ferreira da Silva, do curso de Odontologia, e Thiago Alberto
Viana de Sousa, do curso de Administração, que enriquecem essa obra com seus
caminhos já consolidados na docência.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 18 -
É com felicidade e gratidão que convidamos o leitor a mergulhar no mundo das
histórias de vida e aprender com elas, pois como fala Freire, “ninguém ignora tudo.
Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma coisa. Todos nós ignoramos alguma
coisa. Por isso aprendemos sempre.”
CAMINHOS E CONQUISTAS:
UMA TRAJETÓRIA
ACADÊMICA DE
PERSEVERANÇA
Cosmo Helder Ferreira da Silva
Caminhos e conquistas: uma trajetória acadêmica de perseverança
- 21 -
ara muitos pode ser fácil contar sua história de vida. Hoje me desafiei a escrever
algumas palavras sobre minha trajetória até aqui. Nasci em 04 de dezembro de
1988 no município de Itapiúna, região do Maciço de Baturité, a 122 km de
Fortaleza, Capital do Ceará. Filho de Irenilda Ferreira da Silva, dona de casa e agricultora,
e Cosme Temóteo da Silva, pedreiro e agricultor. Tive a alegria de ter dois irmãos e duas
irmãs: Bruna Késia, Ana Kelly, Paulo Henrique e Bruno Erique.
Como muitas crianças do interior do sertão do Ceará, eu poderia não ter tido a
oportunidade que muitos hoje ainda não têm. Porém, eu resolvi fazer diferente. Com 2
anos, minha mãe conseguiu uma vaga para uma organização não governamental de
Itapiúna, o Centro de Apoio à Criança – CEACRI, filiado ao ChildFund Brasil. A
organização atende hoje cerca de 630 famílias em comunidades urbanas e rurais. É uma
organização social que apoia crianças em situação de exclusão, privação e vulnerabilidade
social e mobiliza pessoas para a transformação de vidas. Foi no CEACRI onde eu passei
a maior parte da minha infância e adolescência, onde pude fazer aulas de dança, teatro e
música, além de participar de grupo de jovens e desenvolver atividades voluntárias na
instituição até meus 19 anos.
Nessa instituição pude aprender muito, bem como desenvolver minhas habilidades
de comunicação e participação social. O CEACRI sempre me incentivou nos estudos e
me encorajou junto aos meus familiares ver a educação como uma prioridade e como uma
forma de crescer como pessoa.
Estudei minha vida toda em escolas públicas e tenho muito orgulho disso. Apesar
de todas as dificuldades que as escolas que estudei tinham na época, era naquele espaço
que eu podia desenvolver minhas habilidades para ser um bom aluno e uma pessoa de
bem. Passei pela Escola Recanto da Criança, onde aprendi a ler e escrever. Meu ensino
fundamental cursei na Escola de Ensino Fundamental Demócrito Rocha e o ensino médio,
na Escola de Ensino Fundamental e Médio Franklin Távora, na qual em 2007 eu pude
concluir os estudos básicos, todas na cidade de Itapiúna-CE.
Lembro-me que durante o ensino básico eu sempre fui muito participativo nas
atividades da escola, fazia parte do grêmio estudantil e sempre estava à frente das
atividades culturais. Quando estava no ensino médio, tinha o grande sonho de cursar
Odontologia. Queria ajudar as pessoas, cuidar delas e, ao mesmo tempo, tinha o sonho de
ser professor. O sonho de ser dentista parecia longe para um jovem de família humilde.
Mesmo sabendo que era difícil conseguir realizar esse sonho, corri atrás, e no ano
de 2008 passei no vestibular para cursar Letras-Português na Universidade Estadual do
P
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 22 -
Ceará – UECE, Campus de Quixadá, Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão
Central – FECLESC. Foi uma grande oportunidade na minha vida que eu sempre recordo
com muita alegria, pois naquela época, percebi que realmente tinha aptidão para ser
professor.
Quando estava finalizando o primeiro semestre do curso de Letras-Português
aconteceu uma mudança na minha trajetória acadêmica. No CEACRI, no ano de 2001,
tive a oportunidade de conhecer e ser apadrinhado por dois alemães: Götz Röhl, hoje com
74 anos, engenheiro de tecnologia alimentícia e aposentado, e Erika Röhl, 70 anos,
especialista em economia imobiliária e aposentada. Desde 1978, Erika e Götz ajudam
crianças através do sistema de apadrinhamento no Brasil. Sem nenhum grau de
parentesco, o amor entre eu e meus padrinhos foi sendo construído, baseado numa relação
de respeito e muita gratidão, criei laços e, desde então, passei a tratá-los como uma
segunda família.
Em uma das diversas cartas que trocamos durante muitas vezes ao ano, eu falei
que tinha o grande sonho de cursar Odontologia, porém eu sabia que era um curso com
custos muito altos e que meus pais não tinham condições de arcar com o mesmo. Sabia
que para que eu realizasse aquele sonho eu teria de trabalhar e juntar dinheiro para
futuramente eu poder custear o curso de Odontologia.
No ano de 2008, já cursando Letras-Português, meus padrinhos vieram pela sexta
vez ao Brasil. Em uma dessas visitas eles me agraciaram com a informação que iriam
investir os 30 anos que juntaram de suas economias custeando a faculdade de
Odontologia. Naquele momento eu fiquei muito emocionado! Não sabia o que falar, pois
eu não acreditava que meu sonho estava tão próximo.
No ano de 2009 iniciei meus estudos de Odontologia na Faculdade Católica
Rainha do Sertão (FCRS), hoje, Centro Universitário Católica de Quixadá (Unicatólica).
Meu primeiro dia de aula foi um momento de muita alegria. Parecia não acreditar que
estava iniciando uma grande jornada na minha vida acadêmica. Meu maior desejo era ter
a chance de uma boa educação e poder ajudar a minha família, e foi naquele momento
que eu decidi que sempre iria me esforçar e me dedicar ao máximo para fazer valer todo
o esforço que meus padrinhos estavam fazendo por mim e pela minha educação. A graça
de conhecer e receber a ajuda dos meus padrinhos não foi somente minha, foi também
para toda a minha família.
As dificuldades foram grandes, os desafios imensos, mas durante a graduação eu
pude entender que temos dois caminhos: sermos gratos por tudo que temos ou
Caminhos e conquistas: uma trajetória acadêmica de perseverança
- 23 -
desvalorizarmos as oportunidades que a vida nos proporciona. Eu optei por ser grato e
principalmente saber cultivar cada momento que eu pude ter, seja em sala de aula,
laboratórios, biblioteca, grupos de estudos, clínicas e corredores da faculdade.
Na graduação em Odontologia tive a oportunidade de ser por duas vezes monitor
da disciplina de Saúde Bucal Coletiva I, participei de projetos sociais como o AABB
Comunidade, projeto Superação nas cidades da Região do Sertão Central e Maciço de
Baturité. Fui membro do Centro Acadêmico e pude fazer parte da organização da I
Jornada Odontológica dos Acadêmicos da Católica (JOAC). Sempre gostei de participar
ativamente das atividades que o curso me oferecia, acreditando que naqueles momentos
eu poderia aprender mais. Conquistei muitas amizades quando era aluno de Odontologia,
amizades que até hoje preservo e tenho esmero por elas. A universidade nos proporciona
conhecer pessoas e aprender a conviver com elas.
Em 28 de dezembro de 2012, recebi o título de bacharel em Odontologia. Aquele
momento foi de muita gratidão, alegria e muita comemoração onde pude compartilhar
com amigos e familiares o sonho que até então era distante para aquele jovem sonhador.
Logo após a formatura, ingressei em alguns cursos de especialização atrelados ao
exercício da profissão de cirurgião dentista no meu município de origem, Itapiúna-CE.
Na oportunidade, pude retribuir para minha comunidade tudo o que aprendi durante a
graduação.
Além de trabalhar como dentista, fui, durante os anos de 2013 a 2014, coordenador
de Saúde Bucal e membro do Conselho Municipal de Saúde. Minha experiência de 2
anos, tanto na gestão em saúde como na Atenção Primária em Saúde, foi o suficiente para
compreender o quanto ainda poderia ajudar as pessoas. Foi então que continuei a seguir
o caminho para meu maior objetivo de vida, que era ser professor, mas dessa vez,
professor de Odontologia.
Já com algumas especializações finalizadas, em 2014 fui selecionado para fazer o
curso de Mestrado acadêmico na Universidade da Integração Internacional da Lusofonia
Afro-Brasileira (UNILAB), onde no primeiro ano eu me dediquei somente aos estudos
do Mestrado. No segundo ano do Mestrado, em 2015, tornei-me professor da Unicatólica,
e tenho grande alegria em fazer parte dessa família. Retornar como professor à instituição
que me acolheu como aluno é algo inexplicável. É um sentimento de muita gratidão e
felicidade. Hoje sou professor das disciplinas de Saúde Bucal Coletiva, das quais, na
época de graduação, fui monitor. Além de grupos de estudos e pesquisa, iniciação
científica, dentre outras atividades desenvolvidas na instituição.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 24 -
A alegria de trocar conhecimentos e experiências com os alunos é muito grande.
Poder estar em sala de aula e contribuir para a formação de pessoas que transformam a
realidade de muitos municípios do interior e do Estado do Ceará, para mim, é uma forma
de retribuir por todas as oportunidades que a vida me ofereceu. A minha formação no
Centro Universitário Católica de Quixadá foi de grande importância para meu
crescimento profissional e pessoal.
Minha dedicação ao Curso de Odontologia da Unicatólica representa de forma
significativa como eu, egresso e hoje docente, tenho aprendido e valorizado os valores
éticos e cristãos que esta instituição representa para a comunidade em geral. O percurso
continua. Hoje curso Doutorado em Ciências da Saúde na Faculdade de Medicina do
ABC-FMABC, na certeza de que ainda há muitos desafios e caminhos a percorrer. Tenho
certeza de que, apesar de vivermos em uma sociedade repleta de desigualdades sociais,
quando temos sonhos e desejos, mesmo nas camadas mais carentes da sociedade, somos
capazes de fazer e acontecer o SUCESSO!
“Onde quer que haja mulheres e homens, há sempre o que fazer, há sempre o que
ensinar, há sempre o que aprender.”
Paulo Freire.
O FILHO DE MARIA
Thiago Alberto Viana de Sousa
O filho de Maria
- 27 -
ano era 1988, quando um acidente envolvendo um ônibus e um caminhão
ceifou a vida de meu Pai, José, e deixou minha mãe, Maria, deficiente física e
com três filhos para criar. Não me recordo deste momento, afinal eu tinha
aproximadamente 02 anos de idade. Conheci o semblante de meu pai apenas por fotos e,
suas histórias, através de relatos que minha mãe e avó contavam. O pai que conheci e que
me educou, no seu jeito calado, foi o meu avô João Padeiro, que graças a seu gesto de
amor, tomou para si a responsabilidade de me educar, bem como a meus dois irmãos,
dando toda a assistência a nós e à minha mãe. Embora ele nunca tenha me cobrado, eu
tinha uma enorme dívida com ele, dívida de gratidão.
Desde muito cedo comecei a trabalhar, mais precisamente aos 12 anos, em 1997,
no balcão da panificadora de minha família, no contraturno de minhas aulas, porém, acho
que atrapalhava mais do que ajudava, mas faz parte, afinal de contas, ali era meu “lazer”.
Este “lazer” ajudou a formar meu caráter e me ensinou a sempre correr atrás dos meus
objetivos, me ensinando o valor das conquistas, o sabor salgado do suor de meu trabalho.
Digo isso sem arrogância, mas com gratidão ao meu avô, sempre lembrando e praticando
o seu lema: “Sem orgulho, com a graça de Deus”.
Não foi fácil terminar os estudos neste colégio privado, pois uma crise financeira
se instalou no comércio de meu avô e ele teve que suspender o pagamento de meus
estudos, entretanto, entra em cena a minha mãe Maria, que sempre dava um jeito de pagar
os meus estudos. Mesmo com dificuldades de locomoção, todo início de ano ela buscava
a ajuda do padre da Diocese de Quixadá, e conseguiu uma bolsa de estudos que cobria
grande parte da mensalidade, e vendia bolos para ajudar a complementar a mensalidade.
Mas às vezes as mensalidades acumulavam e teve um dia que ela teve que vender um
violão que eu tinha para este mesmo padre, com o objetivo de levantar valores para quitar
os débitos e que eu pudesse continuar os estudos. Graças aos esforços desta batalhadora
MÃE, fui seguindo meus estudos neste colégio.
Os anos foram passando e a possibilidade de acompanhar meus irmãos na rota de
Fortaleza foi aumentando, afinal, em Quixadá eu não tinha opções de continuar os
estudos, pois as poucas opções que se tinha, no início dos anos 2000, não me atraíam,
principalmente por ser apaixonado por informática e na cidade ter apenas alguns poucos
cursos na Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central –
FECLESC/UECE. Me recordo que ainda cheguei a prestar vestibular na Universidade
Federal do Ceará – UFC, em Fortaleza, em um novo curso de Telecomunicações que
acabava de ser lançado, mas sem êxito.
O
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 28 -
Chega o ano de 2003, ano em que terminei o ensino médio e provavelmente iria
seguir a mesma escrita de meus irmãos, João e Marcelo, que foram embora para Fortaleza,
na busca de estudos em 1991 e em 2000, respectivamente, porém, o meu avô paterno me
faz uma pergunta que me fez seguir em Quixadá. Me questionou se eu queria estudar em
uma nova faculdade que estaria chegando na cidade, a Faculdade Católica Rainha do
Sertão (FCRS) e, de imediato, disse que sim, pois sempre possuí laços em Quixadá e não
tinha pretensão de ir embora, deixando família e amigos.
Participei do primeiro vestibular da FCRS, com a primeira opção de curso sendo
para Economia e a segunda, para Administração. Fui aprovado, mas como não abriu
turma para Economia, fui para Administração. Um fato que considero curioso remete
ainda ao período da vida escolar, pois como o colégio que estudei era da Diocese de
Quixadá, eu cheguei a fazer um curso de marcenaria em um dos prédios no qual se
instalaria a FCRS.
Em 2004 a FCRS possuía duas turmas de Administração, ambas com 50 alunos,
sendo uma pela manhã e a outra à noite, eu estudava nesta segunda com amigos do tempo
do colégio e outros que acabara de conhecer e era tudo muito novo e complexo, pois afinal
de contas, não era fácil servir no Tiro de Guerra (Exército), no início da madrugada e da
manhã trabalhar as 8 horas diárias e, à noite, ainda ir para a faculdade. Neste ano também,
comecei a namorar a minha futura esposa, Janaírla, sempre paciente e compreensiva com
tantas atribuições.
Ainda no primeiro semestre de 2004, consegui um trabalho na área administrativa,
numa seguradora de Quixadá, e tive que sair da panificadora de minha família. Os
semestres foram avançando e as dificuldades financeiras foram chegando, mesmo com o
Fundo de Financiamento Estudantil, FIES, que nesta época cobria até 70% da
mensalidade, e meu avô, também com dificuldades de continuar me ajudando
financeiramente, o receio de ter que interromper os estudos me bateu, afinal, eu vinha em
um ritmo tão intenso que esta ruptura iria me abalar. Apesar disso, eu não desisti de
estudar e comecei a trabalhar ainda mais, fazendo trabalhos extras na área de computação,
nos finais de semana, para complementar a minha renda e na busca de custear os meus
estudos, além de contar com a ajuda de amigos e de colegas de trabalho. A essa altura, eu
já tinha um meu novo emprego, numa empresa de Telefonia que tinha em Quixadá —
empresa que entrei como backoffice (uma espécie de “faz tudo”) e terminei como Gerente
Regional, atuando nas cidades de Aracati, Limoeiro do Norte, Quixadá, Quixeramobim e
Russas, passando pelas áreas de Engenharia e Administração.
O filho de Maria
- 29 -
Chega o segundo semestre de 2007 e com ele o meu primeiro título: Bacharel em
Administração. O segundo da família, pois meu irmão João também já era e, futuramente,
a minha prima Paula também seria também formada na FCRS.
Logo após a conclusão da graduação, junto a dois amigos recém-formados, Bruno
e Daniel, tivemos a audácia de abrir uma empresa de Gerenciamento Eletrônico de
Documentos, a “Escanear”. Digo audácia, pois não tínhamos recursos financeiros, mas
muita criatividade e força de vontade. Realizamos o planejamento da empresa e
obtivemos recursos com familiares e através de empréstimos e conseguimos o contato de
um programador, que fez o nosso sistema da forma como havíamos planejado.
A experiência com a “Escanear” foi bastante rica, tanto no âmbito profissional
quanto no pessoal, pois vimos ali os primeiros desafios de se trabalhar com empresa e
como empresa, abdicando muitas vezes de momentos de lazer e colocando até a amizade
em prova, já que era inevitável a diferença de visões nesta e em qualquer empresa que se
trabalha em equipe.
Conseguimos alguns clientes, mas levamos muitos “não” também. Era difícil
convencer os tradicionais proprietários de Quixadá-CE da nossa visão e o quanto eles
iriam ganhar com a nossa ideia. Era mais difícil pela visão fechada que muitos tinham e
não viam nossos serviços como investimento, mas como despesas.
Há alguns anos a empresa está fechada, prefiro dizer em stand by, quem sabe ela
volta um dia. Acredito que o motivo dela estar fechada é pelo fato dela ter surgido “à
frente do seu tempo”, se fosse uma ideia de hoje certamente teria o nome de startup.
Fiquei nesta empresa de telefonia entre 2006 e 2010 e saí após uma solicitação de
meu avô, João Padeiro, para ajudá-lo no dia a dia da panificadora, afinal de contas ela já
estava na casa dos 80 anos de idade e já se encontrava cansado de trabalhar das 05h às
19h, todos os dias.
Iniciei meu maior desafio profissional, em uma empresa familiar, em 2010,
ocasião em que reestruturei a empresa com a ajuda do meu avô e familiares, realizando
um grande sonho dele: o de ver o seu grande amor de cara nova.
O ano é 2010 e saio de um emprego fixo, com crescimento profissional constante,
para entrar de cabeça na ideia de meu avô, que era a de ajudá-lo na panificadora de nossa
família, panificadora esta que deu todo o sustento de uma família por duas gerações.
Não se tinha investimento na estrutura da panificadora, pois sempre houve
investimento na família, por isso ela necessitava de uma urgente reforma. Através de
recursos de terceiros, conseguimos um financiamento e a tão sonhada reforma sairia do
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 30 -
papel. Não foi fácil, pois por ser uma empresa familiar, seriam 10 tipos de reforma para
a mesma empresa, cada um opinava de maneira diferente. Depois de muita conversa,
chegamos a um consenso e iniciamos a reforma.
Foram 02 anos de atuação exclusiva na panificadora, entre 2010 e 2012,
trabalhando das 05h às 20h, de segunda a sábado e mais 05h no domingo. Muito desgaste
físico e psicológico, não é fácil administrar empresa familiar.
Em 2011, conversando com um grande amigo, Bruno, ele me deu a ideia de fazer
uma pós-graduação, ideia esta que acolhi e iniciei os estudos em Fortaleza, aos sábados e
domingos, na busca de melhorar meu currículo e buscar a docência na FCRS. Ainda em
2011, perdi o meu grande inspirador, o meu avô, e fiquei mais um ano à frente de seu
empreendimento, sozinho e com muitos problemas a administrar, principalmente por se
tratar de uma empresa familiar.
Em 2012, um amigo que conheci ainda no colégio e foi meu treinador de
handebol, Cristiano, me questionou se eu teria disponibilidade e interesse de ir ajudá-lo
na coordenação do curso de Educação Física, na FCRS, como secretário de curso, no
turno da tarde e noite. Confesso que fiquei balançado e ao mesmo tempo com receio, pois
eu iria ter um salário menor do que o meu atual e iria trabalhar ainda mais, já que teria
expediente das 05h às 11h na panificadora e das 13h às 22h na FCRS. Após conversa com
minha esposa, sempre compreensiva e querendo o meu melhor, encarei o desafio e fui
participar da seleção, sendo aprovado. A data era 20 de agosto de 2012, e eu retornava à
FCRS, agora como colaborador.
Entre tantas atividades do dia a dia da secretaria e entre planejamento de eventos
e atividades do curso, comecei a ministrar oficinas, como voluntário, para os alunos do
curso, contando com o incentivo do Cristiano e da sua enorme visão a longo prazo e
potencial de planejamento.
Em 2013, mudei de cargo e setor na FCRS, indo com Cristiano para a
Coordenação de Extensão, um novo desafio para ambos. Ainda em 2013, concluí um
MBA Internacional em Gestão e Finanças e fico apto a lecionar.
Em 2014, graças à aposta do então Coordenador de Ciências Contábeis, Danival,
e do Coordenador de Administração, Marcos, começo a realizar minha tão sonhada
atividade como docente, com as disciplinas de Teorias da Administração e Gestão de
Pessoas II. Não foi fácil, mas quem falou que seria? Os primeiros dias de aula foram
angustiantes. Como controlar o tempo? Como seria a minha metodologia? Como fazer o
material das aulas? Mas as semanas foram passando, a angústia diminuindo e o semestre
O filho de Maria
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acabando. Ainda em 2014, o Cristiano volta para o seu grande amor, o Curso de Educação
Física, e a FCRS contrata um novo coordenador.
Em 2015, com a ida do então Coordenador de Extensão, Arnaud, para a
Coordenação da Pós-Graduação, com o apoio do mesmo, recebo o convite do Diretor-
Geral, que foi o meu professor e Coordenador no curso de Administração e é a minha
referência em Administração, Professor Manoel Messias, para assumir a Coordenação de
Extensão. Também não foi fácil, teria que ter uma nova visão e tive novos desafios. Ainda
em 2015, sou agraciado por Deus e recebo o meu maior e mais importante título: pai do
João Pedro. Um lindo bebê, nascido às 06h 25min da manhã de uma quinta-feira, dia 05
de novembro.
Chega 2016 e com ele o credenciamento da FCRS a Centro Universitário,
surgindo assim a Unicatólica e, com ela, novos desafios para toda a família Católica. Com
a atualização do organograma da instituição, sou convidado a Coordenador do Núcleo de
Atividades Articuladas ao Ensino, o NAARTE, com o objetivo de melhorar os processos
deste setor estratégico para a Unicatólica. Ainda em 2016, concluí uma Pós-Graduação
em Docência no Ensino Superior, ofertada para os docentes e alguns funcionários da
Unicatólica. Outra ótima conquista neste ano foi a conclusão de curso do meu irmão
Marcelo, em Medicina. Este daria um ótimo livro também.
Estamos em 2017 e olhando para toda esta história de superação de vida, onde
desde muito cedo fiquei praticamente só, numa cidade do interior, com poucas opções de
trabalho e vida, a não ser no comércio. Tenho a grata felicidade de cruzar com o caminho
da Unicatólica e de pessoas que me ajudaram chegar até aqui e, no mesmo dia que escrevo
este capítulo, recebi a informação de aprovação no Mestrado em Administração da
Universidade de Fortaleza.
O que esta história pode contribuir para este livro ou para você leitor, realmente
não sei, mas espero que ajude na sua busca de superação e concluo com uma frase de
autor desconhecido: “Quando desistir for mais fácil, continue insistindo, pois o difícil
costuma valer muito mais a pena”.
Sucesso!
A FACULDADE QUE UM DIA EU
“APAREI”, É HOJE O CENTRO
ACADÊMICO QUE ME AMPARA
Marcelo Eduardo Pereira dos Santos
A Faculdade que um dia eu “aparei”, é hoje o Centro Acadêmico que me ampara
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ou mineiro, da cidade de Montes Claros-MG. Curso Teologia na Unicatólica
desde 2015, mesmo período da minha admissão como seminarista na Diocese de
Quixadá.
Como membro consagrado da Comunidade Filhos de Maria, fui remanejado para
nossa casa de Missão na Diocese de Quixadá em novembro de 2014. O remanejamento
se deu em função da continuidade dos meus estudos em vista do sacerdócio.
A primeira vez que ouvi o nome da instituição foi em 2005. Naquele ano, estive
em Fortaleza por ocasião do Halleluya, um evento realizado pela Comunidade Católica
Shalom.
A então Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS era uma das instituições
patrocinadoras do evento. De tempo em tempo, os apresentadores divulgavam a marca da
faculdade e lançavam brindes aos participantes.
Em um dos intervalos, quando do arremesso dos brindes, aparei justamente um kit
da FCRS. Ao olhar para aquele kit ainda nas mãos do apresentador, tive uma certeza:
“Esse é meu!”. Dito e feito. Arremessado o kit, no meio de 70 mil pessoas, eu o aparei.
Nem sequer imaginava que aquela faculdade, que eu “aparei”, me ampararia.
Atualizando, em 2014, morando na casa de Missão de Quixadá-CE, fui admitido
no Seminário Diocesano, após a aprovação no vestibular de Teologia, classificado em
primeiro lugar, com o início do curso previsto para janeiro de 2015.
Passados exatos 10 anos, aqui estava eu, no Ceará novamente, agora como
acadêmico da FCRS. A graduação em Teologia será a minha terceira graduação. Sendo a
primeira, licenciatura em Música, pela UNIMONTES, e Filosofia, pela Pontifícia
Antoniana, a segunda. Por ter estudado nestas duas outras instituições, para mim foi
praticamente impossível a tentação da comparação. Mas, com sua particularidade, a
Unicatólica se distingue.
Como acadêmico, tenho podido crescer intelectual e humanamente com tudo o
que o centro acadêmico oferece. Além das disciplinas que são ministradas em sala de
aula, nos são oferecidas atividades de extensão acadêmica, o que em muito contribui para
a nossa formação.
Em 2016 tive a oportunidade de participar de um grupo de estudos sobre a Casa
Comum, coordenado pela Professora Ms. Marlene Guerreiro. Este grupo estudava
assuntos abordados pelo Papa Francisco em sua Encíclica Laudato Si’. Foi uma
experiência ímpar. Pudemos, além de aprofundar o estudo de temas relevantes sobre o
S
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 36 -
cuidado com o meio ambiente, promover o intercâmbio de conhecimentos práticos
relacionados.
Já neste primeiro semestre de 2017, fui indicado e convidado, juntamente com
outros 4 seminaristas do curso de Teologia, para participar do projeto de extensão
universitária UNIDOBEM. É uma oportunidade única de colocar em prática aquilo que
aprendemos. Saímos do espaço acadêmico e adentramos no cotidiano de pessoas e
instituições às quais podemos ajudar na promoção de sua dignidade de pessoa humana.
Agradeço imensamente a Deus a oportunidade de me qualificar intelectualmente
em uma universidade católica e sei que os frutos serão colhidos no futuro que Ele mesmo
me reserva. Sou grato também a todas as pessoas que me ajudaram e ajudam nesse
caminho. Cabe ressaltar aqui, Dom Angelo Pignoli, bispo de Quixadá, que me acolheu
em sua diocese. Agradeço também à Professora Ms. Marlene Guerreiro que, com sua
dedicação e testemunho de leiga engajada e comprometida, sempre nos impulsiona a
irmos além e nos motiva à inserção em realidades que sejam eficientemente
complementares à nossa formação.
Surpreendentemente, todo o profissionalismo e competência que a Unicatólica
oferece é um sinal muito claro de sua missão e dedicação em formar homens e mulheres
capazes de uma resposta aos anseios da sociedade. Digo isso no sentido dos contravalores
atuais e da postura que, bem formados em um ambiente cristão católico, podemos oferecer
como profissionais qualificados e capacitados ao mundo, através de um testemunho
plausível.
Sou feliz por ser Unicatólica e faço parte desta história!
A faculdade que um dia eu “aparei”, é hoje o centro acadêmico que me ampara.
Gratidão.
A FELICIDADE NÃO ESTÁ
SOMENTE NA
CONCRETIZAÇÃO DOS
OBJETIVOS, MAS NO
PERCURSO...
Kleber Bezerra da Cunha
A felicidade não está somente na concretização dos objetivos, mas no percurso...
- 39 -
ó quem sabe os desafios e as dificuldades de cursar o nível superior em outra
cidade é quem não tem condições financeiras suficientes para se manter, ou seja,
comprar os materiais e acessórios necessários, como: apostilas e livros; lanches
diários; mensalidade do curso; eventos; cursos preparatórios, etc. Além de percorrer mais
de 300 km (ida e volta), passando mais de 4 horas diárias de viagem para chegar no Centro
Universitário Católica de Quixadá-CE (Unicatólica), correndo risco de vida por
problemas externos, tais como pneu furado, gasolina esgotada, motor pifado, assaltos
(que foram vários) e ônibus literalmente desconfortável. Chegamos a passar dias sem
estudar devido a não autorização do gestor municipal, que sempre alegava algo do tipo:
feriado, falta de verbas para o combustível ou qualquer outra tentativa de justificativa sem
fundamentação.
Aos 17 anos, em 2012, concluí o ensino médio em uma escola pública. Desde
cedo, minha maior preocupação estava em conseguir uma vaga na universidade pública,
fiz vários vestibulares e Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), sendo aprovado em
alguns: Ciências Contábeis, Letras/Língua Portuguesa, Agronomia, etc., porém, não era
o que eu desejava. Cursei Letras/Língua Portuguesa até o 9º semestre, mas precisava
concretizar o meu sonho, foi então que em 2016, fiz a inscrição do vestibular da
Unicatólica. Esperava ansiosamente o resultado, que logo saiu: fui aprovado! Mas a
questão já não era mais a aprovação, e sim como iria pagar a matrícula se mal eu tinha
dinheiro para pagar a taxa de inscrição do vestibular. Neste mesmo momento, pensei
comigo mesmo e respirei fundo, dizendo: “acalme o seu coração, tudo acontecerá no
momento certo, não da forma que desejo que aconteça, mas na vontade de Deus.”
Eu e a minha família tivemos que pedir emprestado uma parte do dinheiro, a outra
parte conseguimos vendendo produtos e prestando serviços para empresas... paguei. E os
outros meses? Hum... Um milagre aconteceu, mas com esforços e dedicação ao máximo.
Fui selecionado com uma bolsa de estudos em 100%, oferecida pela própria Unicatólica.
E o que dizer da Unicatólica, antes e depois do ingresso?
Nenhuma palavra pode descrever a gratidão que sinto pela devota dedicação
empenhada pelo Unicatólica para nos passar o devido ensinamento. Estrutura
maravilhosa, preocupação com o corpo discente, corpo docente e por todos os
profissionais que contribuem para o desempenho e qualidade no ensino. Aos meus
queridos professores que tanto se dedicaram para o melhor desempenho, ihh... foram
tantos planejamentos, noites mal dormidas e quanta paciência para explicar várias vezes
S
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 40 -
o mesmo conteúdo. Salário algum pode recompensar o bem que executaram em nossas
jornadas, ao trazer conhecimento à nossa existência.
Não são apenas os médicos que salvam vidas. Quem ensinou aos renomados
médicos a base do conhecimento? Quem ensinou aos cientistas a usar o raciocínio lógico?
Sem professores não haveria doutores e nem ciência a ser estudada. Os caminhos que
seguiremos terão traços dos ensinamentos que recebemos em sala de aula. Talvez
esqueceremos dos rostos e nomes mas levaremos no subconsciente as lições aprendidas.
Agradeço a DEUS por tudo que fez em minha vida, só não entendo o porquê de
o meu pai ser tirado de mim tão depressa, de uma forma tão inexplicável, que muitas
vezes pensei que DEUS foi injusto com ele. Questionei por várias vezes, meses ou até
mesmo anos... Como um ser humano igual ao meu pai, tão dedicado a igreja, um bom
pai, esposo e respeitável cidadão, tem uma morte com tanto sofrimento? Procurei por
respostas em muitos lugares, não encontrei tão fácil, com algum tempo busquei uma
explicação na Bíblia Sagrada, foi onde encontrei a tão desejada resposta, que NÃO
precisamos temer a morte, pois lemos: "Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da
morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me
consolam" (SALMO 23:4 BT). A partir de então, comecei a compreender que DEUS sabe
o que faz, e nós não sabemos o que dizemos. Pedi perdão a DEUS e muitas forças para
seguir adiante, com FÉ e segurança.
Sou feliz, entretanto, incompleto. Pois falta um “pedaço” de mim, o meu pai não
se encontra fisicamente ao meu lado, isso causa-me bastante dor. Por mais que eu fale
que não tenho medo, sinto uma insegurança, afinal sou ser humano com muitos defeitos
e imperfeito. Sei que deixou-me muitos ensinamentos que sempre levarei comigo. Apesar
de estar distante fisicamente, ele ainda me transmite energias positivas, tais como:
honestidade, caráter, coragem, fé, humildade e amor ao próximo. O meu pai sempre será
lembrado com muito carinho, hoje eu aprendi a conviver com amor a distância, quem ama
nunca deixará de amar. Amor é para sempre, só se deve dizer a alguém que o ama, quando
verdadeiramente o faz. Palavras demonstram, atitudes comprovam. Ele foi e sempre será
o meu maior exemplo, o maior pai, a minha joia rara, de inestimável valor. Te amo com
todas as letras!
Eu não acredito que a existência humana possa simplesmente acabar como se
nunca tivesse existido. Eu não acredito nisso porque os seres humanos têm alma, têm
sentimentos, têm amor. Somos superiores a quaisquer outros seres porque nós somos
capazes de sentir, seja para o bem ou para o mal, e tudo isso não pode evaporar de uma
A felicidade não está somente na concretização dos objetivos, mas no percurso...
- 41 -
hora para outra. Eu acredito que a morte é, na verdade, uma passagem, e uma passagem
para um mundo melhor. Sim, para um mundo melhor. Por que temos que acreditar que a
morte é um sofrimento e um fim? Por que temos que acreditar que não podemos continuar
existindo depois da morte? Por que inculcaram na nossa cabeça que não podemos ser
felizes com o que temos e somos, na perspectiva de melhorarmos? Eu questiono
fortemente as pessoas pessimistas. Afinal, o que elas fazem para melhorar o mundo? Com
que direito elas tripudiam na dor do outro?
Com o passar dos dias, eu percebi que o meu pai estava dentro de mim. Mas não
em um sentido metafórico, e sim em um sentido real mesmo. Ele está dentro de mim
porque depois que ele morreu, eu finalmente aprendi a ser uma pessoa melhor, eu aprendi
a ser mais solidário, eu aprendi a me importar mais com o sofrimento do outro, eu aprendi
a ser muito mais humilde. Meu pai era motoboy, agricultor e era uma pessoa muito boa e
humilde. Eu melhorei como pessoa depois que ele se foi. Eu conquistei o respeito das
pessoas, eu conquistei autoestima, eu conquistei meus objetivos mais ousados dentro da
universidade. Eu realmente me concentrei mais e provei para o meu pai que o sonho dele
de me ver na universidade e cursando Direito valeria a pena. E, de fato, está valendo.
Se você quer chorar, chore. Chore de verdade. Chore com o máximo de sua dor.
Chore com sua alma. Mas lembre-se de que a morte não existe e de que as pessoas que
amamos sempre serão vivas dentro de nós, em nossas atitudes e em nossa força de vontade
para continuar lutando. Eu tenho certeza que o meu pai quer que eu seja brilhante. Por
isso eu não sonho, eu sou!
Hora de agradecer... minha MÃE (MEU ANJO ETERNO) é tudo, exemplo de
caráter e fidelidade. Como eu a amo! Sei que muitas vezes nos desentendemos com
palavras, atitudes impensadas, ficamos chateados um com o outro, mas tudo é
momentâneo, nada que um pedido de desculpas, um beijo não resolva. Ela é a essência
do meu presente, passado e futuro, sempre quero tê-la por perto. O trecho da música
MÃE, de Marcos Antônio, faz-me lembrar sempre, a importância de uma MÃE, com tão
poucas letras, mas com significado tão grandioso. “Mãe, você não se lembra, mas eu não
esqueci, de joelhos dobrados com rosto molhado choravas por mim…” Obrigado, sem a
SENHORA meus dias seriam vazios... MEU ANJO ETERNO – MÃE!
Os meus irmãos? São fantásticos, entretanto, malucos! Não troco por nada, eles
(as) são companheiros (as), cheios de humor e leais. Irmãos brigam, brincam, se amam.
Irmãos são feitos assim, tão diferentes, mas o amor que corre nas veias é maior que tudo,
nada é mais importante que nossa comunhão, eu preciso e sempre precisarei de vocês.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 42 -
Meus avós? São comediantes exclusivos, os melhores que já vi. Cada qual com
seus “palavreados” e crenças. Minha querida e amável avó é maravilhosa, incrivelmente
cativante. Como eu a amo! Sempre me ajudou, não só financeiramente, mas com
exemplos. Foi uma das pessoas que mais ajudaram na minha graduação, no primeiro
semestre, cheio de dificuldades: financeiras, doenças, adaptações, etc. Ainda lembro
como se fosse hoje das preocupações, dos lanches que faziam para eu levar para a aula...
Sem palavras para descrevê-la.
Enfim, minha família é a estrutura do meu ser, são eles (as) que estimulam e
mostram o “caminho da verdade”, claro que não deixarei de agradecer a DEUS, pois
minha vida pertence ao Senhor. Em Hebreus, 13:5, DEUS disse: de maneira alguma te
deixarei, nunca, jamais te abandonarei.
A MINHA TRAJETÓRIA DE
VIDA ACADÊMICA
Mariana Lane Freitas dos Santos
A minha trajetória de vida acadêmica
- 45 -
o ano de 2013, ingressei no curso de Teologia da Unicatólica. De início, estava
com medo, era um mundo todo novo, cheio de surpresas e eu não imaginava
o quanto eu cresceria em tão pouco tempo. A escolha do curso foi mais uma
indicação, uma grande amiga me indicou o curso, pois me ajudaria no meu futuro. Eu, na
época, em formação para me tornar freira, era aspirante — período inicial de formação e
conhecimento da congregação religiosa.
Depois de alguns dias de aula, eu estava muito contente com todo o curso, feliz
demais por ter chegado até ali, por ter professores bons e estudar tanta coisa nova. Mas,
para grande tristeza minha, tive que trancar o semestre seguinte, pois iria ingressar de vez
na vida religiosa e mudaria de estágio na formação, iria para o postulantado, período de
recolhimento, de formação e adaptação à vida religiosa consagrada.
Então saí do curso, tranquei o semestre e optei pela vontade de Deus naquele
período para mim. Aos poucos fui usando tudo o que havia aprendido na sala de aula com
as irmãs do instituto, principalmente na formação. Mas, com alguns meses na casa de
formação, cheguei a viver um período bem difícil na congregação religiosa, a ponto de
não me encontrar mais feliz com aquela realidade. Outras jovens que estavam comigo no
postulantado acabaram desistindo, o que me entristeceu profundamente. Minha
formadora, a irmã que é responsável pela formação e pelas jovens que entram no
convento, percebeu que eu estava mudada e não estava bem, então decidiu que era melhor
eu voltar para casa.
Quanta sabedoria foi a dela nesse momento! Eu não conseguia entender, mas hoje
reconheço que sim, foi o melhor a se fazer. Voltar para casa foi difícil, assim como foi
para sair de casa e ir para o convento. Quando eu saí, não sabia o que fazer, se continuava
na Igreja, nas pastorais, na paróquia, ou se fugia e ficava em casa. Eu procurei ajuda de
psicólogos, que muito me orientaram e colaboraram para o meu amadurecimento naquele
momento.
Passados alguns meses, eu resolvi retornar ao meu curso de Teologia, agora, era
eu quem optava pelo curso, que decidia e sabia concretamente por que estudar Teologia.
Retornei às atividades na paróquia, junto às pastorais, e reconheço que muito que sei e
faço na Igreja é graças ao meu curso, que além de aprendizado doutrinal, eu pude
aprofundar e fundamentar a minha fé. Aos poucos pude entender a vontade de Deus, Ele
queria que eu estivesse com minha família e na paróquia.
O meu curso tem me ajudado a dar razão a minha fé, tem me dado uma identidade
forte de cristã. Caminhar e amadurecer junto do curso de Teologia foi fundamental para
N
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
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minha vida, tantos foram os testemunhos de professores, de amigos e colegas de sala de
aula que me impulsionaram a continuar e insistir no conhecimento da fé, da Igreja, da
doutrina, do magistério e tantas outras áreas. Muitos ainda me perguntam como posso
ganhar dinheiro estudando Teologia, mas para mim, como minha mãe sempre diz, o que
importa é o conhecimento, esse ninguém pode tirar.
Muito mais do que ganhar dinheiro, eu ganhei muitos amigos, tive a honra de
estudar com pessoas maravilhosas, mestres, doutores, de sabedoria imensurável. Eu
ganhei a experiência de fé mais sólida, mais embasada; eu ganhei prática pastoral; eu
ganhei tantas oportunidades de estudo que meus familiares nem sonham. E tudo o que
ganhei de graça, tenho dado de graça aos meus irmãos, seja em casa, seja na paróquia
onde moro, seja no meu bairro, seja na rua, no ponto de ônibus.
Foram tantos os desafios, como o período de avaliações parciais, de trabalhos,
apresentações de seminários, pegar ônibus até debaixo de chuva, ajudar colegas a
entender o conteúdo, fazer vídeo e perder o arquivo valendo nota, e todos estes momentos
me ajudaram e ajudam ainda a superar mais e mais as minhas dificuldades pessoais.
A Teologia contribuiu muito na minha vida, na minha formação como pessoa
madura, com valores e aptidões profissionais, além da formação da doutrina católica que
recebi ao longo do curso.
A minha trajetória de vida acadêmica foi mais ou menos essa. Com felicidade,
hoje estou quase chegando ao fim nesta instituição e posso acrescentar que minha fé me
permite ainda sonhar em fazer um mestrado na área de Direito Canônico, em vista de
auxiliar nas necessidades da minha diocese, que tanto contribuiu para a minha formação
profissional, desde o primeiro dia de aula até os dias de hoje. Eu sou Mariana Lane Freitas
dos Santos, tenho 24 anos, moro em Quixeramobim, graduanda do 7º semestre do curso
de Teologia do Centro Universitário Unicatólica de Quixadá.
A TRAJETÓRIA DE VIDA DE UM
JOVEM DO CAMPO ATÉ A
CIDADE: A CHEGADA AO
ENSINO SUPERIOR E AS NOVAS
EXPECTATIVAS
Antônio Wellington de Souza Gomes
A trajetória de vida de um jovem do campo até a cidade: a chegada ao Ensino Superior e as novas expectativas
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eu nome é Antônio Wellington de Souza Gomes, tenho 24 anos, estou
cursando na Unicatólica o 7º semestre de Teologia. Moro na zona rural,
distrito de Juá em Quixadá-CE, tenho que me deslocar diariamente para a
cidade estudar. Ingressei na escola com a idade de três anos em 1996, concluí o ensino
básico na minha própria comunidade. Era muito inquieto e as minhas professoras não
entendiam meu comportamento e me ofendiam com palavras que humilhavam,
negligenciando o fato que eu era só uma criança. Chamavam-me de “doido”, por não
compreenderem o meu comportamento e não conseguir aprender, deixando registrados
de forma negativa na minha memória afetiva esses episódios que fizeram parte do meu
histórico escolar.
A partir dos meus seis anos de idade, eu não conseguia mais dormir à noite e me
faltava o ar, sentia como se o meu coração estivesse na minha cabeça pulsando: tuntum,
tuntum... Eu dormia respirando pela boca, minha mãe, vendo aquele fato, procurou ajuda
médica. Na ocasião, me encaminharam para o CAPS (Centro de Atenção Psicossocial) e
fiquei tendo acompanhamento com o Dr. Carlos Magnos (psiquiatra) que me receitou
remédio controlado e o Dr. Júlio (psicólogo), mas continuava tendo os mesmos problemas
de não conseguir dormir à noite, como também no âmbito escolar não conseguia aprender
o conteúdo. Eu fazia as provas e era reprovado, no entanto, pela idade eu passava porque
eu não tinha a idade para estar naquela turma.
Quando completei nove anos, minha mãe vendo a minha situação de não conseguir
dormir à noite pediu ao Dr. Júlio uma tomografia da minha cabeça. Fiz essa tomografia e
só recebi o resultado com onze anos de idade, já estava cursando a 5ª série do Ensino
Fundamental I, hoje 6º ano, foi aí que minha mãe e eu fomos driblados, marcaram uma
consulta para mim no H.G.F (Hospital Geral da Fortaleza), minha mãe teve que antecipar
o seu parto alguns dias para poder me acompanhar na consulta.
Assim, quando minha irmã completou 3 meses, fomos para a consulta, chegando
ao consultório do neurocirurgião Dr. Firmo descobrimos que eu estava diagnosticado com
hidrocefalia (que reduzia minha coordenação motora, visão, e o cognitivo), não conseguia
assimilar e processar as informações como as outras pessoas e isso me prejudicava nos
estudos. Portanto, não era uma consulta, era para fazer uma cirurgia, pois o estágio da
hidrocefalia já estava tão avançado que se não fizesse essa cirurgia logo eu ficaria cego
ou paraplégico. Minha mãe Eliete quase ficou louca, pois só tínhamos ido com a roupa
do corpo, não estávamos preparados para ficar.
M
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 50 -
Fomos encaminhados para o Hospital Batista, para fazer a cirurgia, logo, o Dr.
Carlos ligou para minha mãe. Depois que chegamos ao hospital, ele explicou que não
poderia dar essa notícia a ela, pois a mesma ainda estava grávida e a emoção poderia ser
muito forte e prejudicar a minha irmã. Fiz a cirurgia e foi colocada uma válvula na minha
cabeça, retornei para casa, mas com um mês e quinze dias retornei ao hospital e relatei
para o médico que no canto da cirurgia tinha se formado uma bolha d'água. Ele mandou
tirar um raio X, e foi constato que a válvula tinha enrolado na minha barriga, o mesmo
disse que tinha que operar novamente, por esse motivo, perdi o ano letivo e tive que
repetir a 5ª série.
A partir daí minha vida escolar mudou, conseguia armazenar conhecimento e
aprender, pois, até a 5ª série eu não desenvolvia intelectualmente, no entanto, os prejuízos
ficaram, até hoje tenho dificuldades com a matemática e o português, pensei naquele
momento voltar no tempo e recuperar o conteúdo perdido, não podia, então só tinha uma
opção e meta, que era seguir em frente nos estudos. O gordinho que sofria bullying pelo
seu peso e por ser considerado o menos inteligente se tornou o "Albert Einstein" da turma.
De repente, colegas que antes achavam que eu era o menos inteligente, começaram
a se aproximar de mim, mas percebia que eles só se aproximavam para se aproveitar do
meu conhecimento e não para fazer amizade, era apenas para eles passarem de ano. Eu
consegui me destacar com esforço próprio e dedicação aos estudos, terminei o
Fundamental I e II, logo, entrei na escola de Ensino Médio Gonzaga Mota, nesse ambiente
tive três professores que me ajudaram muito.
O primeiro, Adriano Borges, professor de matemática, com ele eu realmente
conseguia entender matemática e realizava os cálculos que eram muito complexos para
mim; o segundo, Henrique, professor de português, que me incentivava nos estudos e em
sua disciplina; e o terceiro, Renato Bruno, professor de física, não considero ele como
professor, mas como irmão, quando precisava de um local para ficar para fazer a prova
do Enem, por exemplo, ele ofereceu a sua casa.
Inscrevi-me no Enem em 2012, ano que concluí o meu Ensino Médio, não
consegui a pontuação exigida, então conversei com a coordenadora do polo do Juá do
Gonzaga Mota, dizendo que queria repetir o 3º ano como aluno ouvinte para me preparar
melhor. Continuei estudando, quando em um dia participando da missa do Padre Luciano,
meu pároco, falando sobre a Teologia em sua pregação, despertou meu interesse por fazer
Teologia.
A trajetória de vida de um jovem do campo até a cidade: a chegada ao Ensino Superior e as novas expectativas
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Nesse mesmo período, estava acontecendo o festejo de São José em minha
comunidade, então, vieram dois seminaristas, um deles o Léo, quando conversando com
ele e falei do meu interesse em fazer Teologia, o mesmo falou que também iria fazer o
vestibular da Unicatólica para Teologia, sendo ele quem mais me incentivou para fazer o
vestibular, então decidi fazer o vestibular e passei, ingressando na universidade.
Começaram então a surgir uma série de dificuldades, tentei uma bolsa social na
instituição, que foi o primeiro desafio ultrapassado com sucesso, pois sem bolsa não teria
condições financeiras para seguir o curso, pago o valor equivalente a R$ 107 por mês.
Outras dificuldades vieram, como o transporte escolar, batemos em muitas portas para
conseguir o passe para chegar na Unicatólica, pois o distrito que moro não tinha rota
escolar para Quixadá. Minha mãe e eu fomos à Secretaria de Educação de Itapiúna,
Capistrano e Quixadá, recebemos muitas negativas, humilhações, nenhuma secretaria se
responsabilizava, todas afirmavam que não era da competência do município o ensino
superior. Entre várias angústias e tensões, felizmente consegui, então, nesse percurso
acabei me prejudicando, perdendo disciplina do primeiro semestre, porque tinha que sair
mais cedo para pegar transporte na praça da catedral para ir para casa, no entanto, isso
não me desanimou: eu tinha um propósito, que era fazer o nível superior.
No segundo semestre, tive uma boa notícia: o motorista que não queria me levar
se aposentou e entrou outro motorista, que foi sensível a situação e se propôs me trazer
para a instituição. Na universidade conheci pessoas que me ajudaram muito, como o Padre
Marcos Chagas, que me ajudou na adaptação acadêmica, ele percebeu que eu tinha
dificuldades emocionais e acadêmicas e recomendou procurar o NAP (Núcleo de Apoio
Psicopedagógico) da Unicatólica.
A chegada à instituição me abriu possibilidades e descobertas, ainda não tinha
domínio do uso das mídias, não fazia parte da minha vivência escolar, pois não tinha
contato com o computador, quando cheguei tudo era novo, fui aprender para realizar as
pesquisas e trabalhos acadêmicos.
No NAP, conheci a Adriana (psicopedagoga), que tem me ajudado a enfrentar os
desafios, que são muitos no percurso acadêmico, como também os meus colegas de sala:
irmão Marcio, esse foi meu braço direito dentro da universidade; irmão Rafael, meu
conselheiro pessoal nos problemas da vida; Carlinhos, meu amigo, que ajudou nos
trabalhos de algumas disciplinas; Carlos Alberto, Severino, João Paulo e Marcelo, que
me ajudaram nas correções no português e norma culta em alguns trabalhos. Também
tenho a contribuição de conhecimento e de experiência de vida de meus professores que
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
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enriqueceram a minha caminhada: Padre Luciano, Renato, Padre Erasmo (meu orientador
de TCC 2) — que emprestou alguns de seus livros para atualizar a bibliografia do meu
TCC — Padre Helton, Padre Marcos, Irmã Lurdes, Padre Eronildo, Dom Adélio, Padre
José Nogueira, Padre Nilson, Padre Savio, Aldenisa Peixoto, Auxiliadora e a minha outra
psicóloga Tunísia (que me lembra de tulipas), com quem desabafo sobre os problemas
pessoais e às vezes acadêmicos.
Estou perto de concluir o curso, fazendo o TCC 2, que tem exigido muito, pois
estou ficando na universidade por causa dos livros, e só retorno para casa à noite. Aliás,
esse problema já me persegue faz algum tempo, pois não tinha condição financeira de
comprar os livros que alguns professores indicavam. Enquanto que meus colegas
conseguiam comprar online, sofria com a falta dos mesmos na biblioteca, então o jeito
era pegar o conteúdo pela explicação do professor nas aulas. Quanto a minha alimentação,
graça a Deus, estou conseguindo almoçar na Congregação Jesus Missionários dos Pobres,
com a ajuda do Padre Francisco, que permitiu.
Eu espero, quando terminar esse curso, fazer a diferença na sociedade, no meu
distrito e por onde passar. Uma das reflexões que trago para minha vida sobre os estudos,
eu retiro da música dos MCs e rappers Os Racionais “A vida é desafio”, essa música me
motivou a seguir em frente nos estudos e superar as barreiras e as dificuldade que a vida
me impõe, especificamente destaco esse trecho: “Geralmente quando os problemas
aparecem a gente tá desprevenido, né não? Errado é você que perdeu o controle da
situação, perdeu a capacidade de controlar os desafios, principalmente quando a gente
foge das lições que a vida coloca na nossa frente, tá ligado? Você se acha sempre incapaz
de resolver, se acovarda, morô? O pensamento é a força criadora, o amanhã é ilusório
porque ainda não existe. O hoje é real. É a realidade que você pode interferir. As
oportunidades de mudança tá no presente. Não espere o futuro mudar sua vida. Porque
o futuro será a consequência do presente. Parasita hoje, um coitado amanhã. Corrida
hoje, vitória amanhã, nunca esqueça disso, irmão.”
Assim, finalizo o texto, ressaltando que esse momento da minha vida tem
possibilitado fazer voos antes jamais imaginados. Acredito que o conhecimento e a
experiência que tenho adquirido na Unicatólica me avançam para um amanhã com mais
esperança de vitórias, para que o ciclo não se repita, e eu consiga ter um futuro diferente
dos meus pais.
A TRAJETÓRIA SONHADORA
DE UMA ESTUDANTE
APAIXONADA PELA VIDA
Francisca Colares Martins
A trajetória sonhadora de uma estudante apaixonada pela vida
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eu nome é Francisca Colares Martins, porém, sou conhecida como
Aureliana e estou no 8° semestre do curso de Fisioterapia. Tudo começou
aos quatro anos de idade, minha mãe me colocou para estudar, na época
não tinha creche e tínhamos que estudar em uma fábrica de vassouras abandonada, tudo
era complicado, mas estava dando certo, e aos cinco anos já sabia ler. Aos seis anos tive
que me mudar, meus pais se separaram e tive que morar em um sítio, essa época foi a
mais incrível, a infância em um sítio era um sonho, porém a escola ficava a cinco
quilômetros e como a estrada se desfazia com a chuva no decorrer do inverno, tínhamos
que ir a pé. Posso até imaginar ao fechar os olhos, lembro de dezenas de crianças subindo
a serra, cheias de lama por causa da chuva com os livros guardados em uma sacola,
chegando ao escurecer em casa, todo dia.
No ensino fundamental nosso colégio passou por uma reforma, tínhamos que
estudar em casas alugadas, era engraçado estudar em casas, a minha sala de aula ficava
em um antigo mercado que não tinha banheiro, alguns tinham aulas na igreja.
Posteriormente, isso não deu certo e fomos estudar na quadra do colégio, fizeram umas
paredes provisórias e foi assim até o colégio ser entregue.
O colégio novo era muito bonito, era uma grande estrutura para uma comunidade
que sequer tinha mil habitantes na época. O novo colégio tinha dois andares, biblioteca,
auditório, laboratório de informática, pátio, enfim era muito bonito. O ensino era de
qualidade, realizávamos feiras de ciências incríveis, uma até virou capa do jornal Diário
do Nordeste: “Estudantes do município de Aratuba dispõem de uma infraestrutura que
contribui para um ensino nota 10”, sendo chamada de modelo inédito no Ceará. O jornal
também destacou uma pesquisa de mestrado em que o objeto de estudo era as escolas do
município.
No ensino médio, tenho recordações maravilhosas, pois estudava bastante,
tínhamos aulas em laboratórios de ciências, íamos a museus tanto regionais como em
outras cidades. Uma delas foi maravilhosa, tive a oportunidade de criar um equipamento
para transformar água salobra em água potável, juntamente com um colega. A professora
então nos levou a uma feira regional para representar o município, foi muito legal,
fizemos um protótipo e levamos um banner para apresentar, e a experiência foi exitosa.
Me imaginava sendo bióloga marinha e morando em Fernando de Noronha. Meu sonho
era trabalhar na natureza e, como a maioria dos jovens, queria mudar o mundo.
Fiz amizades com meus professores, como a professora de biologia Marcyara,
ela era muito jovem, uns dois anos mais velha que a gente, além de professora, é até hoje,
M
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 56 -
uma amiga bem especial. Meu professor de matemática (bom, o que falar dele?), um
amigo, me emprestava livros, presenteava colocando dedicatória, ele era simplesmente
maravilhoso para todos, nos incentivava com sua história de vida. Ele me fez ver que eu
poderia ir longe, me elogiava bastante, não por ser boa em matemática (porque eu não era
mesmo), mas sobre eu ser ótima em biologia e química, disse que eu tinha um arsenal de
conhecimento que iria me levar longe. Ele foi muito importante para mim.
E no último dia de aula, cada professor falou um pouco sobre cada aluno, para
mim foi triste, chorei bastante, nos abraçamos e nos despedimos. Foi uma vida
compartilhada com os meus colegas, crescemos juntos, ríamos juntos, éramos uma
família.
Fiquei em casa uns seis meses sem fazer nada, algumas amigas já estavam na
faculdade e eu não sabia direito o que queria, eram tantas opções. Tinha um livro na minha
casa que continha diversas profissões e tinha um teste de vocação. Marquei algumas
profissões que eu queria fazer, marquei quase todas da área da saúde, menos Fisioterapia.
Gostei muito da parte do livro que descrevia sobre a Biomedicina, tanto é que nesse dia
fui dormir com meus pensamentos voltados para a mesma.
No mês de junho do ano de 2013, abriram vagas para o vestibular da Faculdade
Católica Rainha do Sertão – FCRS em Quixadá, e olhem só, tinha Biomedicina, me
animei bastante e me inscrevi.
Os dias passaram e uma noite anterior ao vestibular fiquei muito nervosa, não
conseguia dormir, só pensava no vestibular. Cheguei em Quixadá para fazer a prova, ao
entrar no estacionamento fomos muito bem recebidos, teve uma abertura com oração e
música, nos entregaram um cartão com um versículo bíblico, me senti acolhida. Ao entrar
na sala, fiz amizade com uma menina muito simpática de nome Laiane, pedi a ela para a
gente dar uma voltinha pela faculdade, pois ela já a conhecia. Ela aceitou e saímos da
sala. Eu me impressionei com a estrutura e pensei: “meu Deus, quero muito estudar aqui”.
Após o vestibular, voltei para casa e fiquei esperando o resultado. Em uma noite
estava conversando com uma prima por celular, no qual informou que o resultado já havia
saído, então pedi para ela olhar se meu nome havia saído na lista de classificados, e ela
disse que não, fiquei triste, mas perguntei se ela tinha certeza, vindo logo em seguida um
“sim”. O problema é que essa minha amiga procurou pelo nome que sou conhecida, ou
seja, “Aureliana”, mas no resultado constava meu nome de acordo com o RG, então falei
para ela procurar por Francisca Colares Martins, e logo em seguida vieram as melhores
palavras, informando que tinha passado em quarto lugar para Biomedicina.
A trajetória sonhadora de uma estudante apaixonada pela vida
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Nessa hora fiquei muito feliz, pulei de alegria! Porém, me ligaram da faculdade
dizendo que não ia abrir turma para Biomedicina, que eu podia me matricular em outros
cursos da saúde. Fui a minha antiga escola pegar meus certificados, e encontrei meu
professor de matemática, que me incentivou a fazer Fisioterapia, pois não sabia o que
queria.
No dia seguinte, a faculdade me ligou novamente para confirmar qual o curso
que queria fazer, fiquei na dúvida entre Enfermagem e Fisioterapia, e disse Fisioterapia
por puro impulso. Me matriculei, e fui para o primeiro dia de aula, onde amei tudo, pois
não houve aula e sim uma missa. Refleti muito sobre como estava feliz de estar nessa
instituição, que superava minhas expectativas, uma instituição que se preocupa com
questões sociais, ambientais e é católica, não conseguia acreditar que eu tinha conseguido.
Com o início das aulas comecei a me encantar pelo curso. Um momento
marcante foi quando a professora Danielle Santiago passou um vídeo bem emocionante
sobre uma fisioterapeuta que havia sofrido um acidente e ficou tetraplégica, chorei
quando a vi entrando em seu casamento, me emocionei muito, vi que era isso que eu
procurava, era isso que eu queria e não sabia. Me apaixonei pelo curso, e com o tempo,
essa paixão virou amor.
No ano de 2014.1, fui chamada pelo presidente do Centro Acadêmico para fazer
parte de uma chapa, que foi a vencedora e que permaneceu até 2016.1. Tive momentos
incríveis, de muito aprendizado, pelos quais sou grata. Realizamos vários eventos, era
cansativo, nos privamos de várias coisas, mas valeu muito a pena cada sacrifício.
Também participei do “Overdose da alegria”, grupo que me proporcionou
experiências as quais vou lembrar pelo resto da minha vida. Nos vestíamos de palhaços e
íamos alegrar a vida das pessoas, fosse na faculdade, no hospital ou em qualquer lugar.
Em 2016.1, me inscrevi para o programa Pet-GraduaSUS. Saliento que esse
programa do governo só beneficiou três faculdades no Estado e, com muito orgulho, a
Unicatólica conseguiu esse programa. Fui aprovada como bolsista, e estou tendo
experiências grandiosas até os dias atuais. Esse programa nos possibilita ter contato com
a comunidade. Sendo multidisciplinar, aprendemos a importância de cada curso para o
cuidado integral do paciente, possibilitando conhecimentos e experiências primorosas.
Em 2017.1, atual semestre, participo da Liga Acadêmica de Fisioterapia
Neurológica da Unicatólica, na qual estou imensamente feliz de participar. Estou
produzindo dois artigos com meus colegas e uma professora, que é a mesma que me
orienta no TCC I.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
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O tempo passou rápido, em 2018.1 estarei me formando, tendo a certeza de que
a Unicatólica me fez conhecer mundos que não conhecia. Aprendi muito, me tornei mais
madura, hoje vejo que os alunos da Unicatólica são diferenciados, preocupados com
questões sociais, ambientais e, acima de tudo, preparados para transformar realidades.
Tenho orgulho de estudar aqui, a cada conquista da instituição vibro e torço para
mais conquistas. Aqui encontrei uma família bem numerosa, pessoas qualificadas,
transformadoras e posso dizer com veracidade que a instituição transformou minha vida.
Nossa clínica é bem moderna e equipada com aparelhos diversos, em que
prestamos atendimento à população e em breve estaremos com um espaço para
equoterapia, que é a terapia com cavalos. Poucas pessoas têm a chance de ter um ensino
de qualidade como o nosso e valorizo muito isso.
O curso de Fisioterapia, bem diferente do que eu pensava, se preocupa com a
prevenção de doenças, promoção da saúde, atuando em todos os campos da saúde, na
Pesquisa, no Esporte, na Estética, Pediatria, Geriatria, Gestantes, na Atenção Básica, na
Neurologia, Ortopedia, Reumatologia, Traumatologia, Neonatologia, Cardiologia,
Ergonomia, Massoterapia, Acupuntura, Equoterapia, Oftalmologia, Fisioterapia Jurídica
e em tantas outras áreas transformando realidades.
Sou apaixonada pela Fisioterapia, acredito que todos temos uma missão na vida,
e sinto que estou no caminho certo. Você deve estar se perguntando como sei disso, sei
porque ela me faz chorar de emoção, me arrepia, me torna uma pessoa melhor, me inspira,
me encoraja, me faz ficar sem palavras.
Como afirma o filósofo Immanuel Kant: “O ser humano é aquilo que a educação
faz dele”. A Unicatólica fez de mim uma pessoa que se preocupa com o mundo ao meu
redor, sendo transformadora de realidades, formadora de opiniões, preocupada com as
questões sociais, uma pessoa mais reflexiva e empoderada e com uma bagagem de
conhecimentos diferenciados que me ajudarão a me destacar no mercado de trabalho.
Nesses oito semestres na Unicatólica passei por muitas situações, chorei (de
alegria e de tristeza), me desesperei, sorri, me alegrei, conquistei, perdi, aprendi, fiz e
refiz muitas coisas, alcancei metas, conquistei e criei sonhos, me enganei, mudei de
opinião diversas vezes, perdi o sono e a paciência, ganhei experiências, gargalhadas,
conhecimento e maturidade. E se fosse possível voltar atrás faria tudo de novo, porque
tudo valeu e está valendo a pena. Obrigada, Unicatólica!
“AFINAL DE CONTAS O QUE
NOS TROUXE ATÉ AQUI,
MEDO OU CORAGEM?
TALVEZ NENHUM DOS DOIS”
Marina Lima Silva
“Afinal de contas o que nos trouxe até aqui, medo ou coragem? Talvez nenhum dos dois”
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que me trouxe até aqui foi o amor pelo Direito, amor este que achava que já
conhecia... Que nada! Mal sabia que esse amor me faria passar por tantas
provações, e já lhes adianto, está valendo a pena cada uma delas.
Quando conheci (entenda-se conhecendo) não tive dúvidas que seria um amor para
a vida toda, afinal de contas, desde criança não queria ser outra coisa ou ter outra profissão
— a não ser aquela fase que todo mundo quer ser médico veterinário, por ter tanto amor
aos animais. A profissão nunca foi minha dúvida, queria ser juíza e militar sobre os
direitos das crianças, sobretudo, na área de pensão alimentícia, sem ao menos entender
muito do que se tratava esse direito ou ter vivenciado experiência próxima, a questão
então seria onde morar ou em qual faculdade estudar.
Foi quando chegou o vestibular e essa questão também logo foi superada, afinal,
naquela época de se inscrever em todas as faculdades possíveis e impossíveis, eu acabei
fazendo só o Enem e me inscrevendo apenas para a Faculdade Católica Rainha do Sertão
– FCRS como faculdade particular, passando em Direito somente para a FCRS,
atualmente Unicatólica, sem nunca ter vindo a Quixadá ou cidade vizinha. Para não dizer
que não conhecia ninguém que estivesse estudado na Unicatólica, conhecia apenas duas
ou três pessoas, mas que também não eram quixadaenses e já não moravam mais em
Quixadá, ou seja, estaria morando em uma cidade desconhecida, com pessoas
desconhecidas, a quase 200 (duzentos) quilômetros longe de casa, com apenas 17 anos,
sem saber cozinhar, passar ou lavar, enfim, para minha mãe então parecia o fim do mundo.
Quando vim pela primeira vez foi para prestar o vestibular, eu, uma amiga e o pai
dela. Um sufoco! Muita gente quase não achava a sala que ia fazer a prova, tive que
encontrar a minha e a da minha amiga. Quando terminamos a prova fomos visitar o centro
e de lá retornamos para a nossa cidade.
O mais engraçado dessa época de pré-vestibular era que quando discutia com meus
colegas do colégio sobre o que iríamos fazer e onde iríamos estudar, nunca tinha me
passado pela cabeça vir estudar e morar em Quixadá, muito menos na Católica, até porque
dizia que se fosse para fazer uma faculdade particular iria pra Capital, onde estariam as
melhores.
Engano meu, ao chegar a Quixadá me deparei com a faculdade ideal para mim,
posso dizer isso com certeza, afinal, já são quase quatro anos de curso e de muito
aprendizado, desde os momentos em sala de aula até os corredores e estacionamento.
Digo isso porque depois das aulas esses lugares se tornaram ambientes de discussões
O
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 62 -
sobre temas relevantes e outros nem tanto, mas, enfim, sempre aprendemos algo novo e
é isso que importa na vida acadêmica.
Voltando ao período que antecedeu o meu ingresso na faculdade, teve o resultado
do vestibular que, diga-se de passagem, foi uma decepção, e apesar de ouvir muito que o
resultado do vestibular em nada tem a ver com o potencial do aluno, aquele resultado me
deixou ainda mais ansiosa, indecisa, desacreditada, um mister de emoções.
Fiquei no 132º (centésimo trigésimo segundo) lugar, ou seja, nos classificáveis, o
vestibular para Direito só acontece uma vez por ano na Unicatólica, já tinha perdido as
esperanças que fosse começar a tão esperada faculdade de Direito no ano seguinte. A
inexperiência nessa hora foi quase que decisiva, já que nem eu e nem meus pais sabíamos
como funcionava a chamada dos classificáveis. Foi quando, por incentivo de alguns
amigos e familiares que disseram que eu seria chamada e que levasse logo toda a
documentação necessária e o dinheiro para a matrícula, viajamos novamente para
Quixadá.
Quando chegamos, me deparei novamente com aquela multidão de pessoas, só
não maior do que a do vestibular, e sem entender muito bem como era o procedimento
começamos a indagar as pessoas, esperamos algumas horas. Foi sendo chamado curso a
curso, até que começaram a chamar os classificáveis do Direito. A tensão só aumentava,
temia que quando fosse a minha vez já não estivesse mais vagas a serem preenchidas, fui
acompanhando um a um, até que o meu nome foi chamado, e aquele mister de emoções
veio à tona novamente, agora não só em mim, mas também no meu pai que me
acompanhava, na minha amiga e no pai dela e até em pessoas que tínhamos conhecido
ali. Um alívio!
Desse dia só consigo lembrar-me de um dos meus colegas de sala, que atualmente
estuda comigo e desde o início da faculdade nos tornamos amigos, que inclusive me deu
muitas caronas e me ajudou na conquista do primeiro estágio. Mal sabia eu que aquele
rapaz que quando teve seu nome chamado pulava e gritava de tanta alegria (até hoje ele
é assim) seria meu amigo não só de faculdade, mas da vida.
Matriculada, porém não instalada, faltava agora um local para morar, que fosse
próximo à faculdade, seguro, com preço acessível e espaçoso. Sim! Espaçoso, porque
meus pais, a princípio, diziam que queriam viver aqui, só que Jaguaruana não é tão perto
assim, não é mesmo, são quase 200 km de distância, como havia falado anteriormente.
Na saga de procurar um apartamento, encontramos um, aparentemente ótimo,
próximo à faculdade, espaçoso, preço acessível e ainda tinha a vantagem de ser
“Afinal de contas o que nos trouxe até aqui, medo ou coragem? Talvez nenhum dos dois”
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mobiliado. Já estávamos quase fechando o contrato, foi quando em uma viagem para
Fortaleza para uma consulta com o otorrino, o médico me pergunta sobre a faculdade, e
o digo que estou indo morar em Quixadá e ele surpreso me diz que, por coincidência, sua
mãe mora em Quixadá, inclusive, possui apartamentos para alugar na avenida da
faculdade. Logo me interessei e já pedi o contato dela, já marcando de conhecer os
apartamentos.
Foi de fato uma coincidência muito boa, primeiro porque os apartamentos eram
os melhores que conheci, segundo e mais importante, me livrei de morar em um
apartamento que aparentemente era ótimo, mas que nesses anos morando aqui descobri
que no período de chuvas a avenida vira um verdadeiro rio (sem exageros), e os alunos
que moram nessa avenida já tiveram de usar até barcos/canoas para conseguirem sair de
suas casas.
Um alívio para os meus pais saber que eu estava morando em um lugar bom, pois
não foi fácil para mim nem para eles ter que morar fora para estudar, longe de seus olhos
cuidadosos e de todo aquele mimo. Muitas coisas começariam a mudar, principalmente,
no que diz respeito às responsabilidades, estas agora seriam maiores.
Matriculada, instalada, agora era só esperar para começar a tão esperada faculdade
de Direito. Início das aulas, dia 31 de julho de 2013, aquele friozinho na barriga, no
primeiro dia missa de recepção dos alunos na quadra lotada de calouros. Após a missa,
dividiram os grupos por curso, aquele primeiro reconhecimento dos colegas de sala, as
primeiras amizades, as primeiras impressões, de lá fomos para a sala (famosa B29), onde
passamos vários semestres devido ao grande número de alunos que minha sala tinha
(cerca de 60 alunos).
Já em sala, nos apresentamos: “Nome? De onde vem? Por que escolheu esse
curso? E qual carreira quer seguir?”, passamos a semana respondendo essas perguntas, a
cada dia para um professor diferente. Essa última pergunta é a que me faço até hoje, isso
porque naquela época, quando entrei na faculdade, não imaginava que a cada semestre
iria viver uma experiência nova ou conheceria uma nova carreira. Iniciei com o
pensamento que estudaria para concurso público, no caso para ser juíza de Direito.
Mas os semestres foram passando, fui conhecendo outras vertentes do curso, uma
delas a docência. Jamais passou pela minha cabeça ser atraída pela carreira acadêmica,
até que conheci o PROMAC - (Programa de Monitoria Acadêmica) da faculdade e resolvi
me inscrever para ver no que dava, encarei mais como um desafio e não ainda como uma
possível carreira. Na primeira vez não passei, reconheci que não tinha estudado e resolvi
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 64 -
tentar novamente, foi quando veio a aprovação para ser monitora da disciplina de Teoria
Geral do Processo – TGP, ministrada “apenas” pelo coordenador adjunto do curso, razão
para me dedicar ainda mais a esse desafio. Fui monitora durante o ano de 2016.
Mais um desafio concluído com sucesso, porém não era o suficiente, tinha pegado
gosto pela coisa e então resolvi me inscrever novamente e passei agora para monitora de
Processo Civil I, uma continuação da disciplina de TGP, e outro desafio pela frente. Foi
aí que percebi que além dos concursos públicos (estabilidade) ou da advocacia (vocação),
o Direito poderia me proporcionar algo que gosto muito de fazer, compartilhar o que sei
e oferecer ajuda. A monitoria está sendo uma realização, inspirada nos meus professores,
sobretudo, nas minhas professoras, mulheres fortes e inteligentes, e quem sabe a vida
acadêmica e a docência não se tornam minha profissão também, podendo um dia até me
tornar professora da casa.
Falando em profissão, não posso deixar de falar dos estágios. Comecei a estagiar
bem antes do que imaginava, ainda no segundo semestre. Aquela dificuldade para acordar
cedo, se adequar aos horários e responsabilidades. Estagiei e ainda estagio no setor
público, passei o primeiro ano na Justiça Comum Estadual, no ano seguinte no Juizado
Especial, mais perto de casa e, atualmente, depois de pouco mais de dois anos estagiando
apenas com uma bolsa paga pela prefeitura, defasada, diga-se de passagem, passei na
seleção de estágio do Tribunal de Justiça, considerado pelos alunos do Direito um dos
melhores e mais bem remunerados, dinheiro do qual precisava e chegou no momento
certo.
Esses estágios foram fundamentais na minha formação profissional e pessoal, me
levaram a enxergar as pessoas com um olhar menos julgador e mais humano. Vivenciando
muitas situações, desde questões entre os colegas de trabalho (parceria, concorrência,
desavenças, etc.) até ser reconhecida e parada na rua pelas pessoas que atendi para falar
sobre processos (quem trabalha no setor público sabe do que estou falando), enfim,
experiências que fazem e ainda farão muita diferença na futura profissional que eu quero
ser.
Outra coisa que não posso deixar de falar é sobre o FIES (Fundo de Financiamento
Estudantil), o bendito FIES, digo isso com certo tom de ironia porque ao mesmo tempo
que sem ele seria mais difícil ou até impossível cursar Direito na Unicatólica — que,
como sabemos, é um curso caro, sem falar nas despesas que meus pais têm para me
manterem morando fora de casa com aluguel, alimentação, etc — ele também é uma
novela mexicana, não foi difícil conseguir, difícil está sendo manter. Na época que fiz foi
“Afinal de contas o que nos trouxe até aqui, medo ou coragem? Talvez nenhum dos dois”
- 65 -
o último semestre que precisou de fiador, nos anos seguintes o aluno poderia ser seu
próprio fiador e é aí que está, no decorrer do curso o valor das mensalidades foi
aumentando, só um fiador não bastava, tive que arranjar outro e quem precisa sabe como
é difícil arranjar um, imagina dois.
A crise no País foi aumentando, as burocracias também, o que significa muita dor
de cabeça e até choro, todo semestre aditamento não-simplificado, idas ao banco,
documentos, papéis e mais papéis e aquele medo de por qualquer coisa perder o
financiamento e ter que trancar o curso, mas enfim, não posso reclamar, são os contras
que qualquer coisa boa tem.
De obstáculos em obstáculos superados, vou me encontrando no curso e na
faculdade que escolhi e ao final do primeiro semestre do ano que vem (2018.1), estarei
me formando e comemorando com a minha família e amigos essa conquista, ou como
dizia Belchior, comemorando “um diploma de sofrer e outra universidade” e então todas
aquelas noites mal dormidas, a saudade de casa e da família, os perrengues, enfim, todos
os esforços serão recompensados.
CAMINHOS E ESCOLHAS: O
TRIUNFAR DE UM SONHO
Marcelo Bertonny Alves Freitas
Caminhos e escolhas: o triunfar de um sonho
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ada um de nós constrói a própria história e está carregada de diferentes
sentimentos. Alegrias, descobertas, tristezas, conquistas, desejos, perdas.
Sentimentos que fizeram parte do passado e que nos visitam no presente. Assim
sendo, ingressar no Ensino Superior foi um divisor de águas em minha vida.
No ano de 2012, fui aprovado no vestibular do Centro Universitário Católica de
Quixadá (Unicatólica) para o curso de Biomedicina, momento de grande alegria e
satisfação pessoal e de familiares. No ato da matrícula recebi a triste notícia de que não
havia número suficiente de matrículas para formar turma. Um turbilhão de sentimentos
me visitou neste momento, expectativas iam-se embora e a tristeza, árdua e vívida, se fez
presente.
Ainda surpreso com a notícia, fui informado nas dependências da instituição que
havia cursos disponíveis para matrícula, foi então que caí de paraquedas na Fisioterapia.
Esperançoso e determinado fiz da minha escolha casa de bons sentimentos. Seriam cinco
anos de desafios, de abdicações, decisões e crescimento. Desde então, cada dificuldade
era um incentivo para não desistir, tinha que me superar. Concordo com Spurgeon quando
diz que: “Muitas pessoas devem a grandeza de suas vidas aos problemas e obstáculos que
tiveram para vencer.” De fato, é através destes obstáculos que aprendemos, que nos
superamos e que valorizamos nossas conquistas.
Com um conteúdo desafiador e estimulante, o curso de Fisioterapia da Unicatólica
atendeu todas as minhas expectativas. Sinto-me honrado em fazer parte desta instituição
de ensino que nasce encarando a educação como uma necessidade social, estimulando o
aluno a responsabilizar-se com o seu papel de cidadão consciente a partir do momento
em que une a preparação profissional e acadêmica a uma sólida formação humana. A
seriedade, o respeito e o tratamento humano que a instituição dispensa a seus alunos e
colaboradores são visivelmente atestados pelo seu sucesso como entidade de ensino.
Afirmo que o conjunto de experiências acadêmicas e pessoais vividas por mim contribuiu
de forma significativa no meu processo de formação profissional.
A cada dia tentamos melhorar, aprender, evoluir, dar sentido à nossa existência.
O que pensamos hoje, certamente é diferente do que pensávamos no passado, visto que
concepções mudam conforme o tempo passa. A verdade não é única, absoluta, ela está
sempre a transformar-se, acompanhando novas pesquisas, novas ciências. Assim acontece
conosco, não podemos ficar parados no tempo, senão ele certamente nos deixará para trás.
Com este discurso, ponho-me em reflexão e analiso o que construí na graduação,
vejo que conceitos foram ultrapassados e o quanto de novo tenho aprendido nesta
C
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 70 -
caminhada. Estudei, pesquisei, participei de programas acadêmicos, escrevi trabalhos,
cantei, chorei, sorri e fui feliz. Hoje, ao tentar escrever sobre minha trajetória acadêmica,
vejo que através das vivências do cotidiano, das transformações sociais e das relações
construídas na graduação, tenho adquirido conhecimentos que fazem de mim um homem
de grandes valores, vejo o quanto cresci como pessoa e percebo que o eu profissional
cresce a cada dia. Assim é a vida, um eterno processo aberto a mudanças e a inovações.
Hoje, concluo meu grau de Bacharel em Fisioterapia com a certeza de que sou
realizado pela escolha que fiz e pelos caminhos que passei. Olhar para trás, para o que
fui, para o que fiz e para o que sacrifiquei. Poder constatar por experiência própria que
boas ações e boas escolhas podem repercutir positivamente em nossas vidas. Saber que
agora desfruto da sensação de alegria e dever cumprido, porque em dias anteriores não
me permiti desistir ou desanimar quando tudo pareceu difícil ou interminável. Um belo
passado construído que culminou em um célebre presente, literalmente uma dádiva dos
céus.
No momento em que fui nomeado acadêmico de Fisioterapia, assumi um
compromisso, um compromisso comigo mesmo, que foi testemunhado pelo desejo de
plantar nesse mundo mais um profissional humanizado, com raízes fortes na
determinação à espera de boas conquistas. Ao longo desse trajeto fiz grandes amigos,
grandes parceiros. E assim estamos quase no fim ou no começo, deixo a interpretação em
aberto.
Externo meus votos de agradecimento a todos que construíram comigo essa
trajetória e que fazem parte destas linhas, sou grato a Unicatólica pela acolhida e sinto-
me feliz em fazer parte dessa história.
DA ENXADA PARA O SONHO DO
DIPLOMA
Luiz Gonzaga de Araújo
Da enxada para o sonho do diploma
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o dia 21 de junho de 1952, no sítio Areias (Faz. Tabuleiro), no município de
Senador Pompeu, no Estado do Ceará, em um dia ensolarado, com um belo
céu azul. Minha mãe é Antônia Pinheiro de Araújo, vinda do município de
Cedro-CE, de origem indígena, deu à luz ao seu segundo filho Luiz Gonzaga de Araújo,
de uma família de 9 irmãos. A minha amada mãe, sempre muito fervorosa e devota, tinha
o costume de dar o nome aos seus filhos de acordo com o santo do dia, por isso meu nome
é Luiz Gonzaga. Meu pai chamava-se Antônio Bezerra de Araújo, vindo do município de
Lavras da Mangabeira-CE, de origem europeia.
Passei minha infância no sítio Areias, zona rural, convivendo com as dificuldades
decorrentes do nosso clima seco e quente, com longos períodos de estiagem, mas criado
com muito amor e dedicação, sempre baseado nos princípios religiosos, não faltando às
novenas e celebrações realizadas pela própria comunidade, muitas vezes por coordenação
da minha mãezinha. Para ajudar meus pais no sustento da casa, devido à constante
dificuldade financeira, tive que iniciar os trabalhos como agricultor aos 7 (sete) anos, e
assim, ajudar a criar os meus 8 irmãos. Mesmo com o cansaço decorrente dos trabalhos
da roça, passando o dia sob o sol quente e levantando a enxada e a foice, eu era assíduo
nas peladas de futebol com bolas de meia e brincadeiras rurais.
Ainda sobre a minha infância, considero importante lembrar que apanhei de corda
e cipó dos meus pais, quando desobedecia aos seus ensinamentos, sendo este o método
de educar os filhos na época. No entanto, não guardo qualquer mágoa deles, mas sim
agradeço por tudo que me ensinaram.
Mesmo muito novo, já percebia que não queria aquela vida de trabalho árduo sem
retorno financeiro para mim. Um certo dia, durante as novenas e celebrações, me veio o
encantamento ao ver a nossa vizinha Antoniêta ler a Bíblia, sentindo uma vontade muito
forte de fazer o mesmo. Logo, disse a minha mãe que queria aprender a ler. No entanto,
não havia escola na comunidade, havendo apenas algumas pessoas que compartilhavam
o pouco conhecimento que tinham, ensinando as crianças a ler e escrever.
Aos 10 anos passei a frequentar a escola multisseriada, com claras lembranças de
alguns “professores”, sendo eles: Antoniêta Batista, João Izidoro, Didi, Ananias, Maria
Vidal e Filenita. Em alguns períodos, tive que estudar à noite para continuar a trabalhar
na roça durante o dia, pois para o meu pai “filho homem” não estudava, tinha que trabalhar
na roça e conquistar as coisas por meio da enxada e não por meio da caneta.
N
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 74 -
De alguma forma, via que era por meio dos estudos que eu poderia mudar de vida,
por isso sempre fui estudioso, não precisando levar “bolos” com palmatória, por ter
deixado de cumprir qualquer tarefa e/ou normas da escola.
Os conhecimentos oferecidos no sítio Areias não iam além da 4ª série, logo, para
prosseguir os estudos, teria que ir para o povoado de Betânia, no município de
Solonópole, hoje Dep. Irapuan Pinheiro. Em 1970, já com 18 anos, ainda sonhando com
o diploma, não poderia parar de estudar. Por isso, fui cursar o Admissão, seleção para
fazer o ginásio, com a professora Maria Vanilda. Fui aprovado e, assim, iniciei o ginásio.
Durante os primeiros 6 (seis) meses, andava 9 (nove) quilômetros, diariamente, entre o
sítio Areias e Betânia para assistir às aulas. Após o referido período, a minha irmã mais
velha, a Francisca, uma das apoiadoras dos meus sonhos, decidiu também estudar na
Betânia. Para isso, uma amiga da família disponibilizou uma casa para passarmos a
semana, por isso, passamos a andar os 9 (nove) quilômetros apenas no início e fim da
semana.
No período das férias, por consequência da severa seca em 1970, meu pai, meus
irmãos e eu trabalhávamos como “cassaco”, na rodagem que passava no sítio Marêta
(Solonópole). Para conhecimento, “cassaco” era uma figura sertaneja a qual auxiliava na
construção de estradas tendo como pagamento a comida, mais especificamente, farinha e
rapadura. Nos horários das refeições, fazíamos uma fila, sob o sol quente, e recebíamos
o punhado de farinha em uma mão e rapadura na outra.
Em 1971, buscando melhores estudos, mudei-me para a cidade de Senador
Pompeu para concluir o ginásio. Como na época ainda não havia o pau de arara, meio de
transporte rural, entre Senador Pompeu e o sítio Areias, andava 30 (trinta) quilômetros a
pé todas as sextas-feiras com destino ao sítio Areias, onde morava a minha família. Nas
segundas-feiras, retornava para Senador Pompeu com os mantimentos plantados e
colhidos por minha família. Além de andar os 30 (trinta) quilômetros, tinha que passar o
Rio Banabuiú de canoa. No ano de 1974, devido às intensas chuvas, a correnteza do rio
não permitia o transporte por canoas, não sendo possível eu e minha irmã irmos para
Areias buscar comida e nem a minha mãe vir até Senador Pompeu trazer os mantimentos.
Como não tínhamos dinheiro, por muitas vezes passamos fome e os vizinhos que nos
ajudavam quando percebiam que não tínhamos comida.
De 1971 a 1974 estudei no Colégio Cristo Redentor e Escola Estadual de Senador
Pompeu, dedicando-me aos estudos, leituras e pesquisas, sempre buscando
Da enxada para o sonho do diploma
- 75 -
conhecimento, pois nos estudos, a cada dia mais, estavam depositados todos os meus
sonhos e desejos, bem como as expectativas da minha mãe de eu ter um futuro melhor.
Sempre que possível, quando tinha eventos gratuitos, gostava de ir para as
“tertúlias” e festas de forró para dançar; sempre gostei de dançar e dizem que danço bem.
Gostava também de jogos de futebol, assistir teatro, dramas; participar de gincanas,
quermesses, eventos da igreja, entre outras diversões, sempre de uma maneira que não
atrapalhasse os meus estudos, os quais eram prioridade em minha vida. Também
participei e fiz parte de movimentos estudantis e sindicalistas, implantei e coordenei o
Projeto de Educação de Jovens e Adultos nas Delegacias do Sindicato dos Trabalhadores
Rurais de Senador Pompeu-CE, ajudei a criar a Associação dos Professores Municipais
do Interior do Ceará (APROMICE) e engajei-me desde a idade de 15 anos nas pastorais
da Igreja Católica: grupos de jovens, catequese, liturgia, casamento, família, ECC e
palestrantes.
No período das férias, ao retornar para a comunidade de Areias, lecionava na
mesma sala na qual comecei a estudar, dando aula de modo multisseriado (1ª a 4ª série)
numa mesma sala, para as crianças e jovens que não tinham chance de estudar em escolas.
Esse momento era muito gratificante para mim, no qual meu coração transbordava do
sentimento de gratidão por tudo que havia ocorrido até então e poder fazer parte das vidas
das crianças que por algum motivo despertaram-se para o “saber”, iniciando ali a jornada
da busca pelos sonhos, buscando mudar a realidade da enxada para o sonho do diploma,
assim como eu.
Não existindo escola pública de 2º grau em Senador Pompeu, de 1975 a 1977 tive
que estudar na Escola Técnica de Comércio Clóvis Salgado, a qual era privada, com muito
sacrifício da minha mãe, a qual se virava em mil para pagar, pois eu não tinha emprego
na época, a não ser pequenos “bicos” que fazia dando aula de reforço escolar. Com muita
dedicação da minha mãe e esforço da minha parte, consegui concluir o Ensino de 2º Grau
com habilitação no Magistério pela SEDUC/CE, bem como o Curso de Administração,
em 1986.
Com essa formação, consegui iniciar minha carreira de professor, lecionando as
disciplinas de Educação Moral e Cívica e a de Estudos Sociais, nas séries de 1º Grau (5ª
a 8ª série), na Escola Estadual de Senador Pompeu. Em uma das turmas que lecionei,
conheci a Helena Siqueira Teixeira, com a qual, em 1982, casei-me, com muita alegria e
amor. Com ela tive três filhos: Hérbert Luiz, Leila Hérica e Laiz Hérida. Helena e eu,
juntos, defendemos um projeto de vida e de educação dos nossos filhos, baseado na
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 76 -
premissa de que a educação moral, ética e afetiva é de responsabilidade dos pais, bem
como a instrução escolar.
A cada dia mais apaixonado pela educação e docência e com o forte apoio da
minha esposa, dei início à jornada de estudos para tentar o vestibular. Diante deste projeto,
sabia que teria que me dedicar muito para superar as minhas limitações de conhecimento
até então, tendo que estudar, por exemplo, física, química e matemática — matérias que
não dominava muito até então. Buscando uma real imersão na busca pelo diploma, fui
passar alguns meses no sítio Areias, estudando muitas vezes embaixo de um pé de
mangueira e, à noite, sob a luz de lamparina, pois na época não havia energia elétrica na
zona rural, consequentemente, no sítio Areias.
O grande momento chegou e em 1985 fiz o vestibular pela UECE/Quixadá,
tirando o 1º lugar, dando início, portanto, ao meu mundo acadêmico. De acordo com as
experiências e os conhecimentos que ia adquirindo, fui optando pelos cursos que podia
realmente cursar diante das possibilidades financeiras e de tempo, já que havia uma
família e não poderia mais pensar só em mim. Logo, de 1985 até os dias atuais já consegui
concretizar 6 (seis) cursos, entre graduações e especializações, sendo eles: Licenciatura
Plena em Pedagogia, de 1985 a 1988, pela Universidade Estadual do Ceará-
UECE/Quixadá – Ceará; Especialização em Psicopedagogia, 1991, pela Faculdade
Associadas Ipiranga/São Paulo-SP; Bacharel em Teologia, de 1999 a 2002, pela
Faculdade Evangélica do Piauí – FAEP/Teresina-PI; Curso Livre de Psicanálise, de 2000
a 2002, pela Soc. Psicanalítica Ortodoxo do Brasil-SPOB/Niterói-RJ; Especialização em
Didática, em 2002, pela Soc. Psicanalítica Ortodoxo do Brasil-SPOB/Niterói-RJ e
Especialização em Gestão Escolar, em 2004, pela Universidade do Estado de Santa
Catarina/Florianópolis-SC.
Iniciei-me na experiência profissional como monitor de férias e coordenador do
Mobral, considerado estágio, e galguei alguns cargos e algumas funções, sendo elas:
Agente Administrativo, 1975 – EMATER/Senador Pompeu-CE; Professor Municipal,
1976 a 1977 – Depart. de Educação/Senador Pompeu-CE; Professor Estadual, 1978 a
1988-EEF. de Sen. Pompeu e EEM Cel. Adauto Bezerra/ Senador Pompeu-CE; Chefe do
Serviço de Educação, 1988 a 1990-14º CREDE – Senador Pompeu-CE; Professor
Estadual, 1991 a 1992 – EEM Cel. Adauto Bezerra/Senador Pompeu-CE; Secretário de
Educação, Cultura e Desporto, 1993 a 1996/Senador Pompeu-CE; Professor Estadual,
1997 a 1998 – EEM Cel. Adauto Bezerra/Senador Pompeu-CE; Diretor Geral, 1999 a
2001 – EEM Cel. Adauto Bezerra/Senador Pompeu-CE; Diretor Geral, 2002 a 2004 –
Da enxada para o sonho do diploma
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EEF Martins Rodrigues/Senador Pompeu-CE; Diretor Geral, 2005 a 2013 – Liceu de
Senador Pompeu/Senador Pompeu-CE e Orientador da Célula de Gestão de Pessoas, 2013
a 2014-SEFOR-Fortaleza-CE.
No entanto, devido à longa carreira no âmbito da Educação e Gestão Escolar, não
havia conseguido realizar o meu grande sonho no ramo acadêmico que era me formar em
Direito. Com a minha aposentadoria em abril de 2014, após ter trabalhado 4 décadas e
com muita alegria e realização, superando as dificuldades e os desafios da realidade,
conseguimos formar os nossos filhos: Hérbert Luiz (Técnico em Informática e Teólogo),
Leila Hérica (Pedagoga e Especialista em Educação Infantil) e Laiz Hérida (Técnica em
Química, Técnica em Meio Ambiente, Química, Especialista em Gestão Ambiental,
mestra e doutoranda em Engenharia Civil); e desejando realizar um sonho que não foi
possível na vida adulta procurei algumas faculdades para concretizar este sonho, não
sendo bem acolhido em várias delas em Fortaleza. Em 2016, visitei a Unicatólica de
Quixadá-CE, onde fui bem acolhido e decidi fazer a inscrição em Bacharel em Direito,
entrando como graduado.
Hoje, aos meus 63 anos, retornei ao mundo acadêmico, vivendo esse momento
com muita intensidade, me dedicando na busca de conhecimentos e almejando novos
horizontes e tendo a plena certeza que tudo valeu a pena, todos os momentos de
dificuldades e as escolhas feitas trouxeram boas consequências para a minha família e eu.
Sou muito grato ao Meu Deus, à minha família e a Unicatólica de Quixadá-CE, por estar
me proporcionando, também, a busca pela realização desse sonho: a conquista do diploma
de Bacharel em Direito.
DE CARBONO A DIAMANTE.
UNICATÓLICA: PONTE DE
SABEDORIA INDISPENSÁVEL
NESSA TRANSFORMAÇÃO
Cintia Leslie Pessoa Oliveira
De carbono a diamante. Unicatólica: ponte de sabedoria indispensável nessa transformação
- 81 -
sonho de alcançar a faculdade é de fato um desejo pertinente a muitos
estudantes, contudo nem sempre é possível chegar lá, os empecilhos
certamente atingem em massa aqueles alunos que residem bem distante da
instituição de ensino onde as condições geográficas e financeiras assolam esse sonho!
Mas como já dizia Einstein: “No meio da dificuldade encontra-se a oportunidade”. Esse
cenário passa a ser visto com outros olhos, olhos de superação e vontade de vencer na
vida, de trilhar uma trajetória de lutas e conquistas.
Filha de Tauá, uma cidade interiorana fincada em uma das áreas que mais sofrem
com a estiagem do nosso Estado, as oportunidades de cursar uma graduação fora do
município também acabam se tornando escassas, porém, sempre tive em mente o seguinte
pensamento: “Quando há uma tempestade os passarinhos se escondem, mas as águias
voam mais alto” — Mahatma Gandhi. Fiz como a águia: não só sobrevoei as dificuldades,
mas venci a cada dia um novo obstáculo polindo a minha força de vencer a luta!
Desde muito cedo sempre tive a convicção de que o sucesso só viria com o estudo
e que para isso era preciso “ralar” muito! Aluna de escola pública, filha de professora,
dotada de uma força enorme de seguir em frente com os meus estudos, fiz desse desejo
uma meta para a minha vida. Os esforços não foram em vão e logo vieram as conquistas
ainda no ensino fundamental: 1º lugar no concurso de redação “Sobrevivência do
semiárido” (concurso realizado pela prefeitura municipal de Tauá para evidenciar as
potencialidades do semiárido nordestino) – 2008; 7º lugar – concurso do CEARÁ TEM
DISSO SIM (concurso promovido pelo jornal o povo – publicação no livro Autoestima
Cearense) – 2009; 1º lugar no concurso Jovem Cientista com o projeto “Materiais que
influenciam para a degradação do meio ambiente” (concurso promovido pela prefeitura
municipal de Tauá, onde jovens do ensino fundamental e médio deveriam produzir um
trabalho de cunho científico de acordo com o tema proposto e apresentá-lo) – 2009; 1º
lugar no concurso de paródia contra exploração sexual de crianças e adolescentes
(campanha realizada pela prefeitura municipal de Tauá no combate à exploração sexual
de crianças e adolescentes) – 2010; 1º lugar no Estado do Ceará no Concurso
Internacional Cartaz da Paz – LIONS INTERNACIONAL (concurso realizado pelo Lions
internacional a fim de promover a paz entre as nações) – 2009.
Durante a conclusão do ensino médio sempre há uma grande preocupação sobre o
que fazer depois: Cursar uma faculdade? Trabalhar? Parar por aqui? Foi aqui que decidi
retirar da gaveta os planos e ir cada vez mais alto em busca dos meus objetivos, realizei
o Enem e através deste exame obtive uma média que me possibilitou as seguintes
O
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 82 -
escolhas: Farmácia Unicatólica – 2013; Serviço Social UNOPAR – 2013; Pedagogia
UECE – 2013; Nutrição UFMG – 2013; Odontologia Unicatólica – 2014.
Há quase quatro anos fiz uma das mais sábias escolhas da vida: cursar
Odontologia. Nela, vi uma oportunidade de mais uma vez me realizar, preservando e
restaurando o movimento mais lindo e espontâneo do ser humano, o sorriso. Em seguida
a escolha Unicatólica foi preponderante, pois seria o local onde colocaria em prática tudo
aquilo que sempre almejei.
Fazer parte da história de uma instituição que visa a equidade é extremamente
gratificante, mais emocionante ainda é poder vivenciar de perto uma visão assistencial
nas áreas em que a população quixadaense e regiões circunvizinhas são menos assistidas
pelas políticas públicas (saúde e direito). O Projeto Cafundó é o exemplo vivo dessa
assistência, o símbolo de responsabilidade social dessa instituição. Alunos dos cursos da
Unicatólica, orientados por seus professores, vão a essa comunidade prestar serviços
básicos de cidadania a famílias que lá vivem desprovidas de praticamente todos os direitos
humanos. Ainda como graduanda principiante, pude viver essa experiência modificando
o dia daquela comunidade tão sofrida, oferecendo instruções de saúde bucal para aqueles
que, em sua maioria, nem conheciam uma escova dental. Ver a expressão de
agradecimento no rosto sofrido daqueles que procuram a Unicatólica como solução para
suas necessidades é um ensinamento que levarei para toda a vida, pois não há nada que
pague um olhar de gratidão!
A educação é uma ferramenta transformadora capaz de mudar de maneira sólida
e permanente o ser humano. Creio que todos que por aqui já passaram levaram na
bagagem grandes experiências e um forte sentimento de agradecimento pela sua
formação. Os grandes personagens dessa caminhada foram meus pais, o Sr. José Iran e
Aurineide Pessoa, meus progenitores, os grandes responsáveis pela minha trajetória
marcada por conquistas onde sempre os tive como base, e nunca me permitiram fraquejar
e desistir dos meus sonhos que também são deles — a melhor herança que podia ter.
Confesso que muitas vezes DESISTIR era o que me vinha à mente quando me
deparava com as dificuldades da vida acadêmica, mas os meus guardiões sempre me
diziam que dificuldades sempre surgem, e é nosso dever superá-las e transformá-las em
uma nova etapa de vida, como uma lagarta que em seu processo de metamorfose rompe
o seu casulo para se transformar em borboleta. Assim, fiz dos desafios forças e hoje, além
de estar em momentos conclusivos do meu curso de Odontologia, também estou cursando
Administração e Gestão Pública pela UFC (Universidade Federal do Ceará).
De carbono a diamante. Unicatólica: ponte de sabedoria indispensável nessa transformação
- 83 -
Que sejamos inspiração de esforço e superação para todos aqueles que pretendem
seguir avante na busca pelos seus sonhos, e assim como eu, construir a sua história de
vida. Em momento algum me arrependi da escolha Unicatólica, pelo contrário, não só por
ser um dos maiores polos de ensino superior do Ceará, mas pela garantia de excelência
de ensino que além de teórico e prático, proporciona a todos os discentes o confronto da
aprendizagem teórica com a prática num ambiente realista, onde podemos prestar
assistência, auxiliar comunidades necessitadas, colocando em xeque nossos
conhecimentos adquiridos e visualizando as possibilidades de crescimento dentro de
nossa profissão escolhida. Tenho orgulho de ser Unicatólica!
DO INTERIOR DO INTERIOR DO
CEARÁ AO CENTRO DO
CONHECIMENTO
Hallison Joabe Rabelo Lemos
Do interior do interior do Ceará ao Centro do conhecimento
- 87 -
ou Hallison Joabe Rabelo Lemos, minha história se iniciou no dia 03 de maio de
1998, sou o primeiro filho de uma prole de dois. Meu pai chama-se José Nilson
Lemos, uma figura que me proporciona força e entusiasmo nas lutas diárias, que
sempre me ajudou e me mostrou o quanto um pai pode batalhar pela sua família. Desde
muito cedo, o auxiliava nos seus afazeres, principalmente na roça, no cuidado dos
animais, no capinar os legumes e entre outras tantas atividades.
Assim, mesmo com muitas tarefas, sempre separei meu tempo para estudar, e o
tal conhecimento surgiu a mim de uma fonte inspiradora em minha vida. Minha mãe Sueli
Rabelo Lemos, mulher guerreira, que sempre me incentivou a lutar pelos meus sonhos e
objetivos independente das dificuldades, sempre acreditou no poder que a educação
exerce na vida de um ser humano, e que através da busca pelo mesmo, eu conseguiria
meu espaço neste mundo infinito do saber.
Ao longo das nossas vidas encontramos muitas barreiras e adversidades, no
entanto, também nos deparamos com pessoas maravilhosas, e uma dessas pessoas foi
Silvana Coelho, professora de matemática no Colégio de Ensino Básico José Eduardo
Filho, na localidade de Lagoa das Carnaúbas, interior de Morada Nova, onde estudei todo
o meu Ensino Fundamental. Ela, com seu jeito alegre de ser, facilitou a transformação da
matemática de um aluno que na 5ª série sequer sabia dividir, em um aluno que chegou à
terceira fase da OBMEP (Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas).
O sucesso é uma questão de esforço, de perseverança, mas também de confiança
e automotivação. As pessoas buscam sua motivação externamente, mas a verdadeira
motivação é criada no seu interior, só assim você pode se tornar singular, único e
inspirador.
Ao terminar minha jornada no ensino fundamental, entrei em uma nova fase, um
novo caminho: o ensino médio. Ainda com antecedência, apareceram os empecilhos, a
distância, o medo de um novo ambiente e novas realidades, mal sabia que ali era o lugar
onde me tornaria melhor. Meu colégio em todo o ensino médio foi a Escola Estadual
Maria Edilce Dias Fernandes, uma casa que proporciona ao município de Ibicuitinga o
reconhecimento do potencial de seus alunos. Foram três anos onde consegui desenvolver
o meu caráter, como estudante e como pessoa. Ali conheci seres humanos maravilhosos,
como a minha ex-professora de geografia do segundo ano do Ensino Médio, Maria José,
ela me trouxe a esperança de que existem pessoas que ainda se preocupam com o seu
próximo.
S
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 88 -
Depois do término do ensino médio vieram as perguntas, as dúvidas, tais como “e
agora qual caminho seguir?” E foi exatamente nesse período que surgiu a Unicatólica,
instituição que significa para mim não só uma entidade educacional, mas, sobretudo, uma
construtora de sonhos. Nesse meio-tempo em que terminei o ensino médio e comecei a
estudar no Centro Universitário Católica de Quixadá, passei por um momento muito
difícil em minha vida, uma fase de provação e dificuldade emocional. Com certeza em
nossas vidas todos nós já passamos por um lugar chamado deserto, onde há escassez de
alegria, força e motivação, mas sempre devemos tornar esse deserto uma fonte, um
manancial de entusiasmo e confiança de que sobre todos os obstáculos lá estará o seu
pódio.
Não desisti, fiz o vestibular e consegui a aprovação em 12° (décimo segundo)
lugar no curso de Administração. Com isso, percebo que a oportunidade é algo que muitas
vezes pode ser a única, e busco segurá-la e aproveitá-la de forma íntegra. Comecei em
2015.1, ainda um pouco abatido pelas dificuldades pessoais, mas dei início a uma jornada
de quatro anos. Com poucas condições financeiras consegui o Fundo de Financiamento
Estudantil (FIES) e travei essa batalha individual comigo mesmo. Independentemente do
seu problema, nós nunca conseguiremos nada sozinhos, e se hoje estou de pé é porque até
agora Deus esteve comigo.
Agradeço a Deus, a minha família em primeiro lugar, e ao Centro Universitário
Católica de Quixadá, que foi quem impulsionou minha vida e ajudou a realizar os meus
sonhos, se tornando um dos meus incentivos. Venho contemplando a cada dia mais
bênçãos do Senhor. Ao iniciar o quinto semestre consegui mais uma de minhas metas:
me tornei bolsista do ProUni (Programa Universidade Para Todos). Sei que isso pode
parecer trivial, no entanto, depois de tanto esforço e dedicação é importante ter noção das
nossas próprias limitações e perceber que muitas vezes elas são criadas por nós mesmos.
Outro fator que torna a Unicatólica essa entidade renomada e reconhecida na
sociedade são as pessoas que a compõem, posso dizer isso com convicção. Uma das
melhores experiências vividas no meu curso foi poder conhecer a professora Auxiliadora
Bezerra. Quero salientar a importância que a sua disciplina me trouxe, um exemplo de
ser humano e profissional. Também não posso deixar de ressaltar a passagem pela
disciplina Teoria Geral da Administração, que foi ministrada pelo professor e
coordenador do curso Marcos James, aprendi bastante sobre a vida de um administrador
e entendi que nós temos o poder de nos superar, basta escolher, e como ele mesmo diz:
“O céu é o limite.” Portanto, não podemos ficar nos questionando pelas vezes que
Do interior do interior do Ceará ao Centro do conhecimento
- 89 -
erramos, mas sim tentar repará-las. E a principal mensagem que deixo a vocês é: “Sonhar
é bom, mas conquistar é bem melhor”.
DO INTERIOR DO CEARÁ AOS
ESTADOS UNIDOS: UMA
HISTÓRIA DE DETERMINAÇÃO,
APRENDIZADO E FÉ
Felipe Fabrício Farias da Silva
Do interior do Ceará aos Estados Unidos: uma história de determinação, aprendizado e fé
- 93 -
u fui criado em uma família católica e durante toda minha vida escolar
frequentei um colégio católico, assim, a religião sempre se fez presente na
minha história. Desde a infância eu sempre gostei de ajudar aos outros, logo,
cheguei à conclusão de que deveria escolher uma profissão na área da saúde, tendo optado
pelo curso de Odontologia. Por ser natural de Quixeramobim, a escolha de estudar na
Unicatólica parecia ser a melhor opção para mim por conta da localização. Além disso, o
fato de ser uma instituição católica só me fez ter a certeza.
Iniciei a vida acadêmica muito cedo, aos 16 anos, cheio de dúvidas, incertezas e
expectativas. Desde o 1o semestre sempre me senti bem acolhido por todos os
funcionários e professores da instituição. A Unicatólica nos proporciona uma formação
integral, que vai além da matriz curricular básica de cada curso. Disciplinas como tópicos
teológicos, responsabilidade social e psicologia nos preparam a ser, além de bons
profissionais, bons cidadãos.
Ao iniciar os atendimentos clínicos tive a certeza de ter escolhido o curso ideal
para mim. Restaurar o sorriso de inúmeras pessoas e fazer passar a “dor” dos pacientes,
não têm preço. Percebi como os serviços ofertados pela Unicatólica são importantes para
a população quixadaense. Sempre vejo a gratidão dos pacientes pela oportunidade de
terem um atendimento odontológico de qualidade e gratuito. Frases como “muito
obrigado, doutor”, “não sei o que seria da gente sem a Católica” e “vocês são tão bons”
fazem todo o esforço valer a pena.
Cheguei ao 6o semestre e tudo estava indo super bem, aprendendo bastante,
atendendo meus pacientes, me relacionando bem com colegas e professores. Porém, o
auge da minha vida acadêmica ainda estava por vir. Em agosto de 2013 me inscrevi no
processo seletivo do programa Ciências Sem Fronteiras para tentar realizar uma
“graduação-sanduíche”, que consiste em uma graduação iniciada no Brasil, com um
período sanduíche em outro país e retorna-se para concluir no seu país de origem. Durante
um longo processo seletivo, de 8 meses no total, meus professores e minha coordenadora
na época foram essenciais. Eles me incentivaram a todo momento a seguir esse sonho e
sempre acreditaram no meu potencial. Eu fui selecionado e em agosto de 2014 eu parti
para o meu intercâmbio nos Estados Unidos.
No total, foi 1 ano e meio (3 semestres) de muito aprendizado nos Estados Unidos.
Primeiramente, eu fiz um semestre de curso de inglês para me aprofundar na língua. Esta
foi uma das melhores experiências da minha vida. Ter a oportunidade de aprender uma
segunda língua com professores nativos e em um país onde todos falam inglês, não tem
E
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 94 -
preço. Foram 4 meses de muito estudo, dedicação e satisfação pessoal. Tive a
oportunidade de ter colegas de classe do mundo todo e aprender mais sobre diferentes
culturas.
Dando continuidade ao intercâmbio, ingressei na vida acadêmica propriamente
dita. Tive a oportunidade de aprender mais sobre o meu curso, Odontologia, em uma
universidade americana com professores incríveis. De cara me identifiquei com o estilo
de vida de lá e com os métodos de ensino. O inglês deixou de ser um desafio e passou a
ser parte da minha rotina. Além das disciplinas na área da saúde, tive a oportunidade de
estudar francês, fundamentos de como falar em público e comunicação e atividades de
liderança e empreendedorismo. Foram 2 semestres, 10 disciplinas, muito aprendizado e
uma superação incrível. Eu me dediquei ao máximo e no final desse período apareci como
aluno destaque na lista de melhores alunos.
Mais uma vez a religião teve papel importante na minha vida. Logo me engajei na
igreja, que era localizada dentro do campus da universidade, e encontrei um local para ser
acolhido. Durante meu tempo de intercâmbio eu cresci bastante na minha fé e crenças
religiosas. Participei de missas, festejos, grupo de jovens, retiros, congressos e fiz
inúmeras amizades.
Nas férias de verão eles nos incentivam a buscar um estágio extracurricular. Na
oportunidade, enviei meu currículo para algumas universidades e consegui um estágio de
pesquisa na área de Microbiologia e Implantodontia. A emoção não cabia dentro de mim,
pois seria minha primeira experiência com pesquisas laboratoriais. Além disso, sou grato
por ter tido essa oportunidade em um país de primeiro mundo e com tecnologia de ponta.
Aprendi técnicas laboratoriais, a manusear diversos instrumentos, a colonizar bactérias,
testar diferentes produtos odontológicos, a cortar dentes para pesquisas e tive hands-on
com implantes. Identifiquei-me com esse mundo da pesquisa e tive a certeza de que
deveria seguir na área da docência.
Ao retornar ao Brasil, eu trouxe comigo um amadurecimento profissional e
pessoal incrível, contatos profissionais com professores e universidades, amigos do
mundo inteiro e a sensação de dever cumprido. Trouxe uma bagagem indescritível, mas
também fiz questão de deixar um pouco do Felipe do Brasil em cada pessoa que tive
contato.
Retornei no 8o semestre aqui na Unicatólica e cheguei na época de mudanças. Vi
nossa amada faculdade se tornar Centro Universitário, presenciei o incentivo à pesquisa
e grupos de extensão. Fui monitor de 3 diferentes disciplinas, além de participar de 3
Do interior do Ceará aos Estados Unidos: uma história de determinação, aprendizado e fé
- 95 -
grupos de estudo e de ingressar em um estágio extracurricular no CEO – Centro de
Especialidades Odontológicas Regional de Quixeramobim.
Como tudo na vida, não aconteceram só coisas boas. Durante minha vida
acadêmica aprendi o significado da palavra resiliência. Tive diversos problemas
familiares, como dificuldades financeiras e problemas de saúde enfrentados pelos meus
pais. Em diversos momentos pensei que não iria conseguir, mas com o apoio de Deus e
da minha família tudo foi possível. Nunca me deixei abalar e nem transparecer as
dificuldades enfrentadas. Sempre cheguei nas clínicas com um sorriso no rosto e
preparado para atender meus pacientes.
Após retornar do intercâmbio, aproveitei todas as oportunidades que surgiram. Os
professores da Odontologia nos incentivam muito a ir além, a voar alto. Todos acreditam
no meu potencial e dizem que tenho tudo para seguir na vida acadêmica, só basta eu correr
atrás. Agradeço cada orientação na apresentação de trabalhos, oportunidades de escrever
artigos e os ensinamentos diários nas clínicas. A Unicatólica está no caminho para tornar-
se referência no Ceará. Eu tenho orgulho de estudar aqui e de poder contribuir nesse
crescimento.
Recentemente, eu me inscrevi na seleção para participar de um curso de inverno
na Universidade de São Paulo – USP, onde foram mais de 110 inscritos concorrendo a 12
vagas e eu fui selecionado. Será um curso na área de Cirurgia Buco-Maxilo-Facial,
Periodontia e Biologia Oral, onde os participantes irão se familiarizar com as atividades
de pesquisa de mestrado e doutorado desse departamento. Mais uma conquista que só foi
possível com o apoio de professores, familiares e amigos. Esse resultado demonstra que
a Unicatólica e os professores da Odontologia nos preparam para sermos profissionais
excelentes, estando no mesmo nível das grandes universidades brasileiras.
Meu nome é Felipe, acadêmico do curso de Odontologia da Unicatólica, natural
de Quixeramobim-CE, realizei o sonho de fazer um intercâmbio nos Estados Unidos,
sempre estive envolvido em atividades de pesquisa, monitoria e extensão, pretendo seguir
na área da docência e posso afirmar que tudo é possível quando se tem determinação,
humildade e fé.
DOS CAMPOS DA ROÇA
AO CAMPO DA CIÊNCIA:
A TRAJETÓRIA DO MENINO DO
SÍTIO FEITICEIRO
Francisco Welligton da Silva Lima
Dos campos da roça ao campo da ciência: a trajetória do menino do Sítio Feiticeiro
- 99 -
eu nome é Francisco Wellington da Silva Lima, aluno do 5º semestre do
curso de Licenciatura em Educação Física do Centro Universitário Católica
de Quixadá (Unicatólica) e tenho 22 anos.
Sou de uma família humilde, que vive no Sítio Feiticeiro, no interior do município
de Morada Nova, ficando a uma distância de 40 km da região urbana. Meus pais, João
Batista e Ivone da Silva Lima, são agricultores de baixa renda e têm seis filhos. Destes,
somente eu estou cursando o Ensino Superior e outros dois finalizaram o Ensino Médio,
pois, infelizmente, grande parte da minha família — e das famílias que vivem no interior
— têm a visão de que só porque somos humildes não podemos alcançar algo melhor. O
pensamento predominante é o de que “eu não tenho condições. Tenho que entrar em uma
fábrica, arrumar um emprego logo”, eles veem dessa forma.
A minha infância, apesar de muito difícil, devido à falta de recursos para manter
o nosso sustento, foi muito feliz e tenho boas recordações dela. Me lembro de, quando
criança, brincar muito com um primo meu. Não tínhamos condições de comprar
brinquedos, mas nem por isso deixávamos de nos divertir. Nosso principal meio de
entretenimento era os talos de Carnaúba que, de talos, se transformavam em cavalos,
dando asas a nossa imaginação. Eu sempre gostei muito de brincar e o faço até hoje,
quando posso, ao encontrar o meu irmão mais novo.
Contudo, apesar de gostar muito de brincar, parte do meu tempo tinha que ser
dedicado ao trabalho ajudando o meu pai na roça. Comecei a ajudá-lo na agricultura aos
cinco anos — idade em que, aproximadamente, comecei a falar — e assim o faço até os
dias de hoje. Aos cinco anos não trabalhava efetivamente, mas já o acompanhava ao arado
para ir aprendendo o ofício.
Devido a este meu atraso para começar a falar, a minha entrada no ambiente
escolar também sofreu certo atraso. Sendo assim, aos nove anos, aproximadamente, dei
início a minha vida escolar entrando na Educação Infantil. Porém, por já ser um pouco
mais velho do que as outras crianças, eu não gostava das aulas, porque todas elas eram
baseadas em cantigas e não possuíam, a meu ver, nenhum conteúdo significativo.
Me recordo de um fato marcante e que, de certa forma, foi decisivo naquele
momento em que eu me encontrava: certo dia, depois que minha mãe me deixou na escola,
resolvi não assistir às aulas e acabei voltando para casa. Quando cheguei em casa minha
mãe não perguntou nada e, como de costume, fui brincar um pouco. Quando meu pai
chegou em casa e me viu ali, perguntou para minha mãe por que eu não estava na escola,
mas ela não soube responder. Então, ele me deu uma surra e questionou o que eu estava
M
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 100 -
fazendo ali. Eu não menti e contei para ele que não gostava das aulas, que queria um lugar
em que aprendesse mais conteúdo, pois, por eu já ter nove anos, eu já tinha maior
conhecimento sobre algumas questões. Desse modo, meus pais foram conversar com a
diretora da escola que concordou em me colocar na antiga 1ª série do Ensino
Fundamental. A partir daí passei a me focar nos estudos e a gostar de ir para as aulas.
Entretanto, apesar de gostar muito de estudar, não foi um período fácil para mim.
Como já disse, minha família é de origem muito humilde e a agricultura não nos fornece
condições para suprir nossas necessidades básicas, sendo que essa realidade se estende
até os dias de hoje. Por esse motivo, muitas vezes, antes de irmos para escola, o que
tínhamos para merendar era café preto misturado com cuscuz ou café preto misturado
com farinha e, quando não tínhamos nenhuma dessas opções, íamos para escola sem
comer nada. Na escola tinha merenda, contudo, as condições de higiene da mesma e o
modo como os utensílios de cozinha (panelas, pratos, copos, entre outros) eram
armazenados, eram muito inadequados. Assim, era comum encontrar sapos, e outros
animais indesejados, passeando pelo espaço em que a refeição era servida, o que me fazia
perder totalmente o apetite.
Quando passei para o Ensino Médio a situação melhorou um pouco, porque as
aulas ocorriam no período da tarde na região urbana de Morada Nova. Desse modo,
quando estava no segundo ano deste nível de ensino passei a morar com um tio meu,
Francisco de Assis, que me acolheu e me acolhe até os dias de hoje, dividindo tudo o que
ele tem comigo, sem me cobrar absolutamente nada. Hoje o considero como um grande
amigo.
Após finalizar o Ensino Médio eu resolvi prestar o vestibular da Unicatólica para
o curso de Licenciatura em Educação Física. A minha escolha por esse curso se deu por
eu gostar muito de jogar futsal. O conceito que eu tinha a respeito de Educação Física
advinha da minha vivência das aulas de Educação Física do Ensino Fundamental e do
Ensino Médio que se resumiam, na maioria das vezes, em aulas teóricas. Quando ocorria
alguma aula prática era somente para se jogar futsal livremente. Porém, quando entrei na
faculdade pude perceber que a Educação Física escolar, em si, ia muito além da visão que
eu tinha e isso fez com que meus horizontes, a esse respeito, fossem expandidos.
Entretanto, apesar de, finalmente, ter a oportunidade de realizar o sonho de cursar
o Ensino Superior, nem tudo foi fácil, por alguns motivos: primeiro, devido às minhas
restrições financeiras. E, segundo, porque eu achei que fosse ser um curso fácil —
Dos campos da roça ao campo da ciência: a trajetória do menino do Sítio Feiticeiro
- 101 -
acredito que isso se deva à concepção que eu tinha a respeito da Educação Física enquanto
área de conhecimento.
O aspecto da restrição financeira, em muitos momentos, me fez pensar em desistir
do curso. No primeiro semestre eu não tinha bolsa de estudos e, ao final do mesmo, pensei
seriamente em abandonar a faculdade. Porém, a perseverança de minha avó, Marinete, e
de minha mãe não permitiu que eu fizesse isso. No segundo semestre minha mãe e minha
avó uniram forças para pagar a minha matrícula e eu dei entrada na Bolsa Social que a
Unicatólica oferece, sendo contemplado com uma bolsa de estudos integral. Me recordo
de duas situações em especial, em que minha avó e minha mãe me incentivaram: antes
mesmo de eu iniciar o curso, me lembro de minha avó dizendo que enquanto ela estivesse
viva ela iria me ajudar, que não era para eu desistir; e, quando ao final do primeiro
semestre eu pensei em desistir, vendo como alternativa ingressar no Exército Brasileiro,
minha mãe com lágrimas dizer que daria um jeito para que eu continuasse os meus estudos
e assim aconteceu.
Sou muito grato a Unicatólica por ser contemplado com a Bolsa Social, pois, por
meio dessa, tenho certeza que o sonho de concluir o meu curso de Licenciatura em
Educação Física se tornará realidade. Me sinto como se a Unicatólica estivesse fazendo
um grande investimento em mim e a forma como eu procuro retribuir a este investimento
é me dedicando aos estudos, procurando aproveitar ao máximo o que cada disciplina,
cada docente, oferece, e usufruindo de toda infraestrutura e corpo de conhecimento que
ela me disponibiliza, procurando participar de cada evento, palestra e cursos de extensão
que ela proporciona, sempre que possível. A partir dos estudos realizados durante o curso
e das demais oportunidades oferecidas, atualmente, sou atleta de rendimento de provas
de longa distância de atletismo.
Ao finalizar o curso de Licenciatura em Educação Física tenho como propósito
tentar mudar um pouco a realidade, a visão que as pessoas têm, principalmente do interior
do Estado, a respeito da Educação Física escolar. Grande parte delas pensa que a
Educação Física é simplesmente chutar uma bola de qualquer jeito, mas não é. Tem todo
um processo, todo um corpo de conhecimento, seja para qualquer modalidade esportiva
envolvida. Tenho como propósito, também, cursar pós-graduação: fazer mestrado e
doutorado. Sei que não será um caminho fácil, mas eu quero chegar lá, não irei desistir
enquanto não ver este sonho realizado.
ENTROU PARA A
UNIVERSIDADE O NETO DO
ZÉ DA FLOR
Manoel Miqueias Maia
Entrou para a Universidade o Neto do Zé da Flor
- 105 -
uebrar um paradigma você deve saber que não é nada fácil, e acredite: não foi
fácil esta história chegar até você. Vou te explicar o porquê...
Sou filho do segundo casamento de uma supermãe chamada Lúcia. Digo isso por
ela ser um exemplo de coragem e dedicação enquanto enfrenta lavagens de roupas todos
os dias para sustentar a casa e oferecer um teto para os dois filhos que ainda moram com
ela — Yasmin e eu. Minha mãe não pôde estudar por falta de oportunidades, e por isso
deixou o ensino fundamental pela metade, tendo de cuidar dos irmãos mais novos e ainda
trabalhar como doméstica no ápice de sua adolescência.
Meu pai também não teve escolaridade. Acho que ele não sabe assinar o próprio
nome. Digo que “acho” porque por um infortúnio causado por diversos vícios, ele nos
deixou precocemente para seguir sua vida por um caminho diferente. Filho do interior de
Capistrano, no Maciço de Baturité, ele e mais outros 4 vieram ao mundo por meio da
Dona Marcelina e do Seu João, um casal de “sangue no olho” que trabalhou na roça para
pôr o feijão na mesa.
E por falar em roça, na minha família sempre reinou essa cultura de vida no sertão,
tanto paternalmente como maternalmente. Para você ter uma ideia, tente imaginar um
peão baixinho cabra da peste, vestindo gibão de couro com a faca na bainha, correndo
atrás do gado no cavalo arrendado no meio das malícias da Caatinga do Ceará. Se
conseguir imaginar, você tem aí em mente uma imagem aproximada da aparência do meu
avô materno, o famoso Zé da Flor, um nordestino caricato, que junto com a minha avó, a
Dona Maria Capoeira, agregaram em suas imagens a personificação dos costumes da
família.
Não poderia nem conseguiria dar um vislumbre da minha trajetória estudantil até
aqui sem fazer este resgate cultural familiar. Cultura está marcada pela presença da vida
no campo, dos arrendamentos de terra das regiões da Serra de Baturité, do Vale do
Jaguaribe e do Sertão Central em busca da sobrevivência, com ausência de residência e
de renda fixa, além da pouca escolaridade dos membros da família.
Sou do início da segunda metade da década de 90, mas ainda presenciei o êxodo
rural nordestino iniciado na época da construção das grandes metrópoles do sudeste do
Brasil. Quem não queria sofrer com o sol que castiga o sertão “socado dentro do mato,
de apragata currelepe, pisando inriba do estrepe, brocando a unha-de-gato” — como
diz Patativa do Assaré —, tinha mais era que partir e deixar sua família para trás. Nunca
encontrei nada escrito, mas isto parecia um lema familiar: se você é homem e “engrossou
Q
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 106 -
o pescoço”, se prepara porque está na hora de ir atrás de emprego e conseguir dinheiro e
ajudar a sustentar a família que ficou aqui no Ceará.
Foi assim que eu vi muita gente ir embora. Tios, primos e — infelizmente — meu
irmão Adriano. Quase todo mundo foi para Minas Gerais trabalhar no mascate, levando
consigo a maior parte das coisas que eu gostava de fazer: andar de bicicleta, ir buscar
água no açude nas ancas do jumento, brincar com terra fazendo barragem na beirinha da
lagoa do meu avô... Foram e deixaram só a saudade aqui para gente aprender a lidar.
Durante minha primeira infância vivi em uma casa de taipa no interior de Itapiúna,
e se até lá eu tivesse a consciência que tenho hoje, muitas das coisas básicas que possuo
em casa como água na torneira, energia elétrica e até mesmo um banheiro, seriam para
mim privilégios de gente rica. Isso era coisa que só o dono de uma fazenda que meu pai
trabalhava possuía.
Sempre fui muito sonhador e até hoje isso me causa certa impaciência e muita
ansiedade, mas jamais imaginei que um dia eu poderia colocar minhas mãos em um
celular, por exemplo, que naquela época era um Motorola que o patrão tinha o prazer de
puxar a antena e ligar para a família na Capital. E aqui estou eu, usando ferramentas de
comunicação e gestão de projetos para presidir o Centro Acadêmico de Sistemas de
Informação da Unicatólica através de um dispositivo móvel.
Falar disso tudo que você já leu é emocionante. Mas sabe o que é mais
emocionante ainda? É que apesar de não ter sido o primeiro a concluir o ensino básico —
minha irmã Adriana terminou primeiro —, não fui apenas o primeiro membro de uma
família tradicional da roça a pôr os pés em uma universidade, mas sim ser o primeiro
aprovado e poder escolher 5 universidades para estudar sem custos. Custos estes que
minha família com certeza não poderia pagar. Desconheço qualquer familiar que teve
tantas possibilidades. Foram elas: UFRS, UECE, IFCE, CISNE e Unicatólica — onde
aqui estou cursando Sistemas de Informação.
Muita gente pode alegar facilidade para ingressar hoje no ensino superior, mas
quer mesmo saber a real? Não é fácil, não. Para chegar aqui, literalmente percorri muitos
quilômetros. Em Itapiúna meus irmãos e eu encarávamos 6 km a pé para chegar a nossa
escola. Nos últimos anos do meu ensino médio, eram mais 4 km. Hoje são 86 km diários
entre Ibicuitinga e Quixadá, esperando carona embaixo do sol que queima a pele sem dó
ou andando em ônibus superlotado. E tudo isso por esforço, por necessidade e vontade de
mudança pessoal e da vida da minha família.
Entrou para a Universidade o Neto do Zé da Flor
- 107 -
Se hoje estou em uma instituição de ensino superior que me realiza em diversos
sentidos, que me valoriza, aprimora minhas habilidades, me conduz a ser um ser humano
e um profissional de princípios e com visão de futuro, agradeço a todas as pessoas
nomeadas até aqui, que de modo positivo ou negativo me ensinaram a enxergar as coisas
de valor que a vida pode nos ofertar.
Uma vez um professor chamado Pachecão me disse que só 3 coisas mudariam a
minha vida: ler um livro, fazer uma viagem e conhecer pessoas. Ele estava quase certo.
A Unicatólica também muda a vida das pessoas. Aprendi aqui a superar medos, como o
de falar em público; a desenvolver o pensamento crítico, criativo e inovador; a
desenvolver empatia e propor soluções para os problemas sociais envolvendo minhas
áreas de estudo, integrando vivências a outras áreas do conhecimento; a liderar; e a
construir duas coisas de grande valor: network e grandes amizades.
Se hoje aqui permaneço é porque encontrei um ambiente acolhedor, fraternal e
amigável, que une profissionais tão carismáticos e transformadores de vidas: professores,
secretárias, monitoras de laboratório, etc. Não que eu queira deixar tantos outros de fora,
mas aqui encontrei professores que posso chamar de pais e mães — mesmo sem eles
saberem: Prof. Me. Júlio Cavalcante, Profa. Dra. Luciana Magalhães, Prof. Me. Renato
Furtado, Prof. Me. Alandson Mendonça, Prof. Me. Leonardo Rocha, Profa. Ana Maria
Roncolato, Profa. Auxiliadora Bezerra... Todos (as) e muitos outros (as), sem exceção,
tem emprestado a mim e a muitos outros alunos experiências de vida fantásticas, além de
serem propulsores de encorajamento de estilos de vida com o qual os discentes se
identificam, os fazem sonhar e desenvolver protagonismo com visão de mundo
valiosíssimos.
Os agradecimentos que tenho a Unicatólica, meus professores, orientadores de
carreira e monitoria, a você que leu esta história, e, principalmente o meu seio familiar,
são imensuráveis.
Obrigado por tornarem a minha vida a melhor possível.
“EU PENEI, MAS AQUI
CHEGUEI”1
Thiago Costa Alves
1 O tema se refere a um trecho da música cantada por Luiz Gonzaga intitulada “Pau de Arara”, que retrata
a saída de um sertanejo nordestino de suas terras em busca dos seus sonhos. Uso esse trecho em referência
à minha ida a São Paulo em busca de juntar dinheiro para concretizar o meu sonho, e, também, o uso como
alusão à dificuldade que foi para ingressar no curso de Psicologia na Unicatólica.
“Eu penei, mas aqui cheguei”
- 111 -
hamo-me Thiago Costa Alves, atualmente tenho 30 anos, e sou natural da
cidade de Quixadá, Ceará. Curso Psicologia no Centro Universitário Católica
de Quixadá. Mas para chegar ao curso dos meus sonhos (Psicologia) não foi
uma trajetória tão curta e nem tão fácil! E essa história venho aqui compartilhar.
Nos meus primeiros anos de estudo fui colocado em escolinhas particulares do
bairro, no entanto, a partir do ensino fundamental, passei a frequentar escolas públicas.
Foi então que o sistema público de políticas públicas de ensino começou a entrar na minha
vida. Após o ensino médio pude fazer a escolha sobre o que eu gostaria de seguir
profissionalmente, porém, pela imaturidade e incerteza, optei por caminhos que não me
fizeram sentir-me completo, mas que serviram para o meu aprendizado. Tentei cursar
outras faculdades, cursos que não me faziam feliz! Todavia, sou grato ao Enem (Exame
Nacional do Ensino Médio), como política pública de inserção ao ensino superior, que
me proporcionou ter uma experiência na UFC (Universidade Federal do Ceará), no curso
de Redes de Computadores. Então, desde cedo as políticas educacionais sempre estiveram
presentes em minha vida.
O primeiro desejo de cursar Psicologia surgiu no ano de 2009, quando naquele
ano eu era seminarista franciscano e cursava Filosofia no IESMA (Instituto de Ensino
Superior do Maranhão). No entanto você pode estar a se perguntar: o que tem a ver a
psicologia com o ser seminarista e cursar Filosofia? Pois bem, aqui vos respondo: foi na
filosofia que eu “descobri” a psicologia e por ela me encantei. No mesmo ano de 2009
larguei o seminário e a filosofia com a certeza de que um dia iria cursar Psicologia e ser
um bom psicólogo, porém, para tal, não sabia como conseguiria realizar esse sonho, só
sabia que era isso que eu queria como meta de vida.
Após a minha saída do seminário retornei a Quixadá com um intuito: convencer o
meu pai a me colocar para cursar Psicologia, naquela época na FCRS (Faculdade Católica
Rainha do Sertão). No entanto, a tentativa foi em vão, porque o mesmo acreditava que tal
curso não teria retorno financeiro no futuro, e ele tratou de me fazer desistir deste para
tentar Direito. Assim, me inscrevi no vestibular para Direito, mas não obtive êxito (Deus
sabe o que faz!). Aquele sonho de cursar Psicologia não ficou esquecido, apenas tinha
que procurar outra maneira de ingressar no curso, já que eu não tinha o apoio do meu pai.
Nesse tempo, sempre que possível procurava conversar com pessoas próximas, e uma
delas, o Padre Marcos Chagas (da Comunidade Católica Shalom de Quixadá), me
aconselhava falando as seguintes palavras: “Se é isso que você quer tanto, procure então
uma forma para conseguir!”. Fiquei a imaginar mil maneiras para conseguir, entretanto
C
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 112 -
as dificuldades — desemprego, falta de apoio familiar, etc. — me faziam desanimar e
pensar em desistir.
Durante um período de tempo, cerca de três anos mais ou menos, o sonho de cursar
Psicologia na Unicatólica ficou suspenso. Isso por não enxergar saída alguma para a sua
concretização. Até que no final do ano de 2013, um tio meu que mora em Americana,
interior de São Paulo, veio a Quixadá com sua família passar férias. Ele lança mais uma
vez o convite de ir morar em São Paulo — o mesmo já havia me chamado várias vezes
para ir morar com ele, mas, pelo medo de enfrentar o novo, nunca tinha aceitado, foi então
que vi uma nova oportunidade de ir em busca do sonho de entrar na faculdade.
De início o medo foi grande, mas pelo fato do desconhecido, de estar cometendo
um erro, entretanto, mesmo com todas as contingências contrárias, pois a maioria dos
meus familiares residentes no Ceará achava essa ideia “uma loucura”. Resolvi traçar
planos e metas, um deles era ir para São Paulo com o objetivo de juntar dinheiro para
cursar Psicologia, e isso podia demorar o tempo que fosse, poderia ser difícil como fosse,
mas não iria desistir.
Foi então que, em fevereiro do ano de 2014, fui morar em São Paulo. Levei apenas
uma mala com poucas roupas, na carteira alguns trocados doados por parentes, e no
coração saudades e fatos da minha vida em Quixadá que passavam na janela do ônibus
rumo a Fortaleza, e depois em meio às nuvens que eu via pelo vidro do lado da asa do
avião. Eu era mais um filho do Nordeste que partia em busca do seu sonho em terras do
Sudeste brasileiro.
No primeiro momento foi muito difícil a adaptação, pois eram pessoas, costumes
e cultura diferentes, me via como um estrangeiro em terras estranhas, e foram muitas as
noites de tristeza e choro. Todavia, mesmo em meio à saudade de casa e à solidão,
comecei a buscar emprego e ir atrás de alcançar o objetivo para que lá fui. Graças a Deus,
logo nas primeiras semanas consegui empregos, digo “empregos” porque foram vários
que surgiram, e eu pude escolher qual o melhor para mim e para o meu objetivo.
Além do emprego consegui fazer várias e boas amizades, uma delas aqui se
destaca, uma moça chamada Erica Adriele, ela que sempre me dava forças e alento nas
saudades de casa. Trabalhando comecei a juntar dinheiro, todo mês deixava a maior parte
do salário na conta para o meu objetivo, e assim foi feito durante um ano até a empresa
que eu trabalhava fechar. Consegui juntar um bom dinheiro, foi então que resolvi voltar
para Quixadá e dar continuidade aos planos de cursar Psicologia. Mas antes de voltar,
estando ainda lá em São Paulo, fiz a minha inscrição no vestibular da Unicatólica,
“Eu penei, mas aqui cheguei”
- 113 -
concorrendo a uma vaga no modelo simplificado de seleção pela nota do Enem (Exame
Nacional do Ensino Médio). A decisão de voltar, porém, não foi fácil, pois eu já estava
acostumado com a vida em São Paulo, e deixar os amigos que tinha feito naquela cidade
ia ser muito doloroso, no entanto assim o fiz.
Ao retornar ao Ceará tive que reorganizar-me emocionalmente e me readaptar ao
lugar novamente. No primeiro instante veio a vontade de voltar, mas pensei em meu
objetivo e me propus: se eu passar no vestibular para Psicologia fico, caso contrário
retorno para São Paulo. Aconteceu que eu passei, e o misto de sentimentos foi grande!
Como eu já tinha o dinheiro guardado cuidei em fazer a matrícula, e assim garantir a
minha vaga já para o primeiro semestre de 2015.
Lembro-me que o primeiro dia de aula foi um momento de muita alegria e emoção,
porque era algo que eu tanto almejava há anos e que naquele momento estava dando início
a concretização de um sonho. Contudo, o dinheiro que eu tinha ia dar para me manter um
semestre na faculdade, então tive que correr atrás de alternativas para me manter no curso.
A partir de então fui me informar sobre o FIES (Fundo de Financiamento Estudantil) do
Governo Federal; não foi fácil, porém consegui 75% de financiamento, e já naquelas
alturas meu pai percebeu o meu interesse pela psicologia e se propôs a me ajudar quando
o dinheiro que eu possuía acabar, e assim foi feito.
Desde o primeiro semestre busco me dedicar com muito afinco ao curso. Fui líder
de turma durante três semestres, membro do Centro Acadêmico de Psicologia, monitor
da disciplina de Práticas Integrativas I, e atualmente estou como monitor de Práticas
Integrativas II. Sempre que possível estou engajado nos eventos proporcionados pelo
curso de Psicologia. Tudo isso está me ajudando no meu progresso como aluno e como
futuro profissional. A cada dia, em cada disciplina, em cada amizade que eu construí
dentro da faculdade, também ajudo como monitor outros alunos a se desenvolverem, e
isso me faz feliz. Colegas já deixaram a faculdade e estão atuando, outros continuam os
estudos fazendo mestrado, residência, etc.; esses são exemplo e inspiração para mim.
Nestes mais de dois anos que estou no curso de Psicologia vi a faculdade também
evoluir, passar a ser Centro Universitário Católica de Quixadá. Contudo já passei
momentos de muitas alegrias, bem como de tristezas superadas com o apoio dos colegas.
A Unicatólica me proporciona a oportunidade de cursar a Psicologia que eu tanto
queria, com qualidade no ensino, os melhores professores e estrutura, tudo isso na minha
própria cidade. Isso é uma vantagem para mim, pois vejo a maioria dos meus colegas de
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 114 -
sala enfrentando horas de viagem (os quais eu muito admiro por todo esforço que fazem
para estudar) para chegar à faculdade.
E assim vou seguindo, com alegria e disposição, algumas vezes entre lágrimas e
dificuldades, mas que são superadas pela vontade de alcançar o objetivo, pelo
companheirismo dos colegas de curso e instituição e pelo incentivo dos professores.
Tenho certeza que sairei da Unicatólica com uma boa formação, bem preparado para o
mercado de trabalho.
MOBILIDADE ACADÊMICA
INTERNACIONAL:
EXPERIÊNCIAS, PERCEPÇÕES E
APRENDIZADOS
Fabrício Bezerra da Silva
Mobilidade acadêmica internacional: experiências, percepções e aprendizados
- 117 -
e chamo Fabrício Bezerra da Silva, tenho 21 anos, minha história na
Unicatólica inicia-se no ano de 2012 quando, através do Exame Nacional
do Ensino Médio (ENEM) e do Programa Universidade Para Todos
(ProUni), dei começo a minha graduação no curso de Odontologia. No mesmo período
também havia passado em outros processos seletivos de universidades públicas aqui do
estado do Ceará, porém decidi que deveria ficar em Quixadá e cursar Odontologia por
duas principais razões, a primeira pelo fato de poder morar perto de casa e da minha
família e a segunda por causa da instituição, corpo docente da Unicatólica e pela
qualidade dos laboratórios e clínicas do curso.
Hoje, após quase 6 anos tenho certeza que fiz a escolha certa. Naquela época não
compreendia o quão importante para a formação do odontólogo é a estrutura física capaz
de dar suporte a todas as atividades laboratoriais e clínicas tão necessárias em minha
futura profissão. Ainda em 2012 tive a chance de participar do processo eleitoral para o
Centro Acadêmico, do qual me tornaria presidente na eleição consecutiva em 2015.
Em 2013 soube a respeito do Programa Ciências Sem Fronteiras, e fiquei muito
entusiasmado em participar. Fui fazer minha inscrição no site, porém a então FCRS –
Faculdade Católica Rainha do Sertão, não havia firmado um termo de compromisso junto
a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), foi aí que
procurei a direção da instituição e tive o apoio dos professores Maria Dias Cavalcante e
Renato Moreira, que providenciaram todo o processo de credenciamento da Católica
junto a CAPES.
Todo o processo seletivo durou 9 meses, foi então que em abril de 2014 até julho
de 2015 participei do período sanduíche nos programas de Graduação da University of
Kentucky e University of Texas Health Science Center at San Antonio nos Estados
Unidos da América (EUA). Conhecer pessoas: este foi o grande aprendizado nesses 18
meses que morei nos EUA. Ainda me lembro da sensação de saber que conheceria o prof.
Jeffrey Okeson, autor de diversos livros em Odontologia ou do prazer de estagiar durante
o verão com o prof. Ralph Rawls, importante pesquisador e co-autor do livro de Materiais
Dentários.
Sempre fiquei pensando que conheci a diversidade do Brasil quando estava fora
de suas fronteiras, digo isto pois conheci brasileiros de todas as partes do Brasil que
também estavam no mesmo programa de mobilidade acadêmica que eu. E sinto-me
privilegiado por ter conhecido tantas pessoas, e cada uma delas ter me mudado de alguma
forma.
M
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 118 -
Quando retornei ao Brasil em 2015 percebi que muita coisa havia mudado na
instituição, alguns dos meus amigos já haviam colado grau, novos professores e novos
alunos haviam chegado e dei conta do dinamismo da vida acadêmica e de como somos
capazes de mudar e crescer. Talvez aqueles que continuaram no dia a dia aqui na
instituição não tenham se dado conta do quão diferente as coisas podem se tornar em
apenas 18 meses.
Nesse período de readaptação, contei com o apoio do professor Jorge Fiamengui.
Tive um maior contato com ele pois fui eleito presidente do Centro Acadêmico de
Odontologia no segundo semestre de 2015, o prof. Jorge foi meu mentor, e muitas vezes
me percebi recebendo seus conselhos, orientações e puxões de orelha. Acredito que esse
relacionamento saudável entre professores e alunos também é uma marca da nossa
instituição, e isso contribui grandemente para nosso crescimento pessoal, acadêmico e
profissional.
Novas perspectivas e desafios me são colados a frente ao chegar mais perto do
sonho da colação de grau, mas apesar das incertezas que cercam este período, como por
exemplo a inserção no mercado de trabalho, posso afirmar com certeza que a Unicatólica
contribuiu muito positivamente para me preparar como pessoa humana e profissional, não
apenas na perspectiva de emprego, mas também nas habilidades de liderança, resiliência
e empreendedorismo trabalhadas durante esses quase 6 anos como aluno da Unicatólica.
Bem como, de certa forma, dei minha contribuição, juntamente com os milhares de
alunos, professores e colaboradores que juntos formam uma pequena metrópole em pleno
coração do semiárido brasileiro, chamada Unicatólica.
O QUE ME TROUXE ATÉ AQUI?
Maria Mayalle de Almeida Melo
O que me trouxe até aqui?
- 121 -
que me trouxe aqui? Quando ainda criança sonhamos ou idealizamos um
futuro e dentro desse futuro traçamos metas, projetos e objetivos para serem
alcançados ao longo dos anos, surgindo, dentro desta perspectiva, as primeiras
dúvidas, perguntas e questionamentos, além do temido clichê “O que você vai ser quando
crescer?”. Não são todos que sabem desde a infância qual carreira seguir, que profissão
abraçar ou o que ser quando crescer, bom, eu era uma dessas pessoas.
Quando perguntadas, a maioria das crianças responde a essa pergunta com frases
do tipo “vou ser astronauta”, “piloto de fórmula 1” ou os mais comuns “quero ser doutor
(a)” ou “vou ser professor (a)”, mas os anos passam, as prioridades mudam, os desejos e
sonhos aumentam e a realidade enfim bate à porta, chega o Ensino Médio, vestibular e lá
está aquela perguntinha novamente, e agora você tem que saber respondê-la, pelo menos
é o que se espera, porém você não sabe responder, normal, sempre te ajudaram a decidir,
mas por algum motivo que ninguém explica, geralmente você tem que tomar essa decisão
sozinho, então você escolhe, faz sentido quando criança querer ser médica e escolher
fazer Arquitetura e Urbanismo?
Na verdade nada na vida faz muito sentido, nem tudo se encaixa da maneira como
deveria ou como achamos que deveria. Como eu disse, as circunstâncias mudam. Você
fez o vestibular, passou. Parabéns, pois você começa a trilhar novos e maravilhosos
passos rumo a um brilhante e promissor futuro profissional como farmacêutica.
Só um momento: mas você não prestou vestibular para a Arquitetura e
Urbanismo? Sim. E agora você faz Farmácia? Sim. Novamente, repito, as circunstâncias
e prioridades mudam, e geralmente você precisa mudar com elas, faz parte da essência
humana, e como disse John Kennedy: “A mudança é a lei da vida”. Então mudamos,
buscando sempre o melhor. Escolher é uma das etapas principais. Qual curso? Eu sempre
quis algo relacionado à área das ciências da saúde, mas escolhi Arquitetura porque sempre
gostei de desenhar e talvez por influência daqueles sonhos abstratos de infância, porém,
há momentos em que sua vontade não coincide com a de seus pais ou com suas
necessidades.
Então, por obra do destino ou como queiram chamar, novamente as coisas mudam
e lá estou eu, fazendo Farmácia na Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS, agora
Unicatólica, talvez o mundo tenha balançado um pouco e mudado meu destino ou foi obra
de Alguém especial, não sei, mas não me arrependo de estar onde estou.
Aqui vai mais um ponto: a Unicatólica é em Quixadá, porém eu não moro nessa
cidade. Como vou fazer? Bom, alguns se mudam e acolhem o novo desafio de viver
O
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 122 -
sozinho em uma cidade diferente, estranha, longe da família, amigos e daqueles que ama,
outros escolhem ir e vir de sua cidade até Quixadá, todos os dias, durante 4 ou 5 anos.
Mesmo sendo difícil sentir-se acolhido em todos os lugares e por todas as pessoas, na
Unicatólica sempre me sinto em casa, principalmente para os discentes que como eu
passam o dia inteiro no campus e só retornam para suas cidades no fim da tarde ou, por
tantas vezes, já no cair da noite.
Quando tive que escolher qual curso e qual instituição, a única certeza que tinha
era de que teria que ser algo nesta instituição que me encontro. Por quê? Bom, sempre me
deram e mostraram boas referências da mesma, como a melhor do interior do Estado, e
seria uma excelente alternativa para quem quer ingressar no Ensino Superior sem deixar
de estar perto da família.
A Unicatólica é um exemplo de que não é necessário deslocar-se até a Capital do
Estado ou ir muito longe para ter a oportunidade e o privilégio de cursar excelentes cursos,
com excelentes professores. Ainda assim, depois de todas as escolhas e mudanças existem
também as dificuldades, os problemas que por diversas vezes parecem não ter solução e
que acabam desgastando o humor e até mesmo o desempenho no ambiente acadêmico.
Um dos maiores seria viver longe da família, como já mencionei anteriormente, ainda
assim, alguns encontram apoio em outros familiares e parentes, como eu, meus pais vivem
no interior de Quixeramobim.
Atualmente moro com minha tia Ludmila na sede da cidade, logo, o apoio familiar
sempre vai ser importante e mostrar-se de profunda relevância no crescimento pessoal de
todos nós, nossa família é nosso maior exemplo, e por que não dizer que possuímos outras
famílias além da de laços sanguíneos?
No decorrer da graduação encontramos pessoas maravilhosas e que nos dão força
e nos acompanham durante nossa longa jornada, como no caso de alguns professores,
alguns com carinho e admiração especial como o Professor Dr. Roberto Albuquerque, a
Professora Ms. Karla Bruna e a Professora Dra. Regilane Matos, além do Professor Dr.
Márcio Batista, os três últimos são farmacêuticos nos quais me espelho e sempre levarei
como referência, não só durante o período da graduação, mas também, futuramente, no
ambiente profissional. Quanto ao Professor Roberto, este se mostrou um dos meus
maiores incentivadores dentro do ambiente acadêmico da Unicatólica, o tipo que diz ao
aluno: “Nunca desista, porque sei que você é capaz” — uma frase que te incentiva a ir
sempre mais longe e não desistir diante de qualquer dificuldade.
O que me trouxe até aqui?
- 123 -
Quanto ao ensino, a cada dia é mais gratificante, as oportunidades a nós
disponibilizadas dentro do campus deste Centro Universitário nos preparam para um
futuro promissor e de excelência, desde o quesito experiência com a aliança de práticas
que trazem em conjunto a questão do ensino/aprendizado e a aplicação deste dentro e/ou
fora do ambiente da Unicatólica, além do incentivo cada vez maior à pesquisa, com o
desenvolvimento dos mais variados projetos e trabalhos de caráter científico.
Enfim, cabe ainda relatar o quão é importante nunca deixar de sonhar/planejar ou
idealizar um futuro apesar das dificuldades. Aprendi durante estes 3 anos que todos os
dias alguém vai estar lá para estender a mão e te acolher e em outros teremos que ser tão
autossuficientes quanto a vida nos permite ser, que apesar de tudo, sempre terá algo ou
alguém que te motive a buscar o que quer que seja, cada vez mais longe. No meu caso,
todos os dias sou grata pelo amor, incentivo, confiança e apoio de meus pais (Júlia e
Marcelo) e da minha avó materna, dona Maria Júlia (in memorian), aos amigos, a nossa
outra família que conquistamos ao longo da vida e que são, por diversas vezes, a nossa
base, principalmente em um ambiente muitas vezes hostil, como o da graduação, estes
merecem nossa eterna gratidão.
E por fim, o que me trouxe aqui? Provavelmente aqueles sonhos de infância que
nos moldam e nos fazem quem somos, o desejo de ser reconhecida por algo, a satisfação
de encontrar algo que se ame fazer, a necessidade de pertencer a alguma profissão,
suponho que tudo isso me trouxe até aqui, mas o maior motivo talvez tenha sido o
“SONHAR”, porque de nada adianta sonhar e não acordar. Levantar e realizar o sonho
de cursar algo que você goste é lindo, porém o realizar, o tornar-se aquilo que você sonhou
é ainda mais gratificante, desta forma, deixo dito: nunca deixe de sonhar, mesmo que seu
sonho mude, nunca permita-se parar de sonhar, levante-se, orgulhe-se e busque até que
você viva na realidade aquilo que tanto sonhou!
E você, o que te trouxe até aqui?
PERSPECTIVA DE VIDA,
HISTÓRIA E ANÁLISE DE UMA
TRAJETÓRIA ACADÊMICA
Hérick Hebert da Silva Alves
Perspectiva de vida, história e análise de uma trajetória acadêmica
- 127 -
e chamo Hérick Hebert, tenho 22 anos de idade e sempre morei com os
meus pais e irmã. Durante toda a minha vida, procurei dar ênfase às
atividades realmente relevantes para minha trajetória, sempre busquei me
interessar nos estudos, para garantir um futuro de qualidade a minha família, pois os meus
pais nunca tiveram essa oportunidade que estou tendo hoje.
No meu último ano do ensino médio, eu ainda não tinha decidido que carreira
seguir, muito menos para qual faculdade ou universidade ir. Fiz vários testes vocacionais
para descobrir em que perfil eu me enquadrava, pois este era o momento que poderia
decidir o rumo de minha vida profissional.
A todo momento procurei me espelhar em meus professores e demais familiares,
visto que sempre os admirei e reconhecia todos os esforços que fizeram para chegar onde
estão hoje. Quando enfim consegui realmente escolher o que queria cursar no ensino
superior, ainda assim surgiram várias dúvidas se eu realmente estava no caminho certo.
Optei por fazer o vestibular do Centro Universitário Católica de Quixadá, devido a curta
distância da minha cidade natal, Baturité.
Na época escolhi cursar Odontologia e Farmácia, pois eram as áreas que eu mais
me identificava. Meus pais sempre me apoiaram em minhas decisões, e quando recebi a
notícia que tinha sido classificado para o curso de Farmácia, não acreditei, pois foi o meu
primeiro vestibular realizado e, por ser aluno de escola pública, muitos não acreditavam
na minha capacidade. Devido às condições financeiras da época, foi muito difícil realizar
a minha matrícula em uma instituição privada e logo quando iniciei os estudos foi um
momento bastante complicado. Eu não sabia até então se os meus pais teriam condições
para me sustentar em uma outra cidade e, mesmo passando por essas dificuldades, me
considero muito privilegiado por ter a oportunidade que muitos desejam, que é poder
cursar um nível de ensino superior de qualidade.
O curso de Farmácia está sendo uma experiência maravilhosa, pois a Unicatólica
conta com excelentes professores, sejam eles especialistas, mestres e doutores, que
buscam sempre passar todo o conteúdo que de fato contribua em nossa formação
acadêmica. Dentre as diversas oportunidades que estou tendo durante a graduação, estão
as experiências vivenciadas com todos. Em meu primeiro semestre sempre admirei os
outros que estavam em semestres mais avançados, pois eles dominavam certos
conhecimentos em relação ao curso que os tornavam diferenciados.
Logo no segundo semestre, me inscrevi no Programa de Reforço Acadêmico do
curso de Farmácia, criado por nosso antigo coordenador Gláucio Barros Saldanha, no
M
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 128 -
qual eu poderia estar repassando os meus conhecimentos com diversas disciplinas que eu
já tinha passado para os demais alunos, de forma a contribuir para a aprendizagem e
formação deles. Até então eu já tinha sido monitor de Embriologia e Histologia Humana,
Química Orgânica, Bioquímica Básica e Clínica e Parasitologia Clínica.
Diante dos diversos projetos que a Unicatólica oferece, eu sempre gostei dos
sociais, pois são aqueles que nos mostram a real dificuldade das pessoas, principalmente
as de baixo poder aquisitivo — isso estimula a capacidade de ajudar ao próximo. O
projeto Serviço de Atendimento Farmacêutico ao Idoso vem contribuindo bastante na
minha formação, pois o trabalho que realizamos com os idosos da Casa de Acolhida
Remanso da Paz é engrandecedor devido ser uma parte da população que merece um
cuidado especial, demonstrando bastante dificuldade com relação às terapias e
medicamentos utilizados. Desse modo, juntamente com os professores da instituição,
procuramos medidas para ajudá-los a melhorar na sua qualidade de vida.
Diante disso, me vejo com um olhar mais humanizado, tudo que absorvi nesta
trajetória foram momentos especiais para mim mesmo. Fiz grandes amizades, uma delas
é com a Sandna Larissa Freitas dos Santos, formada em Farmácia pela Unicatólica, ela
me mostrou diversos conhecimentos que contribuíram para minha aprendizagem.
Agradeço imensamente por todos os professores que participam da minha
construção e vivência acadêmica, incluindo o meu orientador de Trabalho de Conclusão
de Curso I, professor Me. Edmir Geraldo de Siqueira Fraga, que sempre mostrou total
apoio durante a realização do nosso projeto, contribuindo com conhecimentos de grande
valia para a execução do mesmo e com sabedoria soube dirigir-me os passos e os
pensamentos nessa nova etapa. Portanto, se cheguei até aqui foi porque eu acreditei em
mim mesmo e em Deus, e isso só foi possível porque eu não desisti de atingir os meus
objetivos.
QUANDO TUDO COMEÇOU?
NÃO SEI... SÓ SEI QUE FOI
ASSIM! (CHICÓ)
Joélia Ferreira da Silva Pereira
Como tudo começou? Não sei... Só sei que foi assim! (Chicó)
- 131 -
epois de duas tentativas frustradas de ingressar no ensino superior, em outras
instituições, eu decidi só iniciar um curso o qual estivesse determinada a
concluir. Afinal, de que me adiantaria fazer um curso com o qual não me
identificasse? Foi assim nos outros dois. Comecei a fazer e não concluí, sequer, o primeiro
semestre. Então, resolvi estudar para o Enem, com o objetivo de conseguir uma bolsa (o
curso de Direito, que sempre quis fazer, não estava ao meu alcance pois não conseguiria
pagar as mensalidades e minhas despesas com aluguel, alimentação, transporte, entre
outros).
A ideia era conseguir uma bolsa pelo ProUni (Programa Universidade Para
Todos). Foram várias tentativas, muitas delas frustradas, por conta da impossibilidade de
conseguir a bolsa, já que a concorrência era grande e a minha nota estava numa
classificação muito baixa em relação à quantidade de vagas disponíveis. Não desisti.
Continuei tentando… Um dia vi a possibilidade de um quase. Classificada em 8° lugar,
mas só eram 3 bolsas. Apesar de não ter conseguido dessa vez, eu fiquei animada.
Na próxima prova do Enem eu vou me garantir… Pensei! No entanto, na chamada
do meio do ano me inscrevi novamente, mas não tinha expectativa de que seria agora,
mesmo assim me inscrevi. Na lista de espera havia 4 bolsas, eu estava em 5° lugar. Deu
um frio na barriga, um aperto no peito, senti disparar o coração. Nunca tinha me sentido
assim, tão perto de conseguir. Me acalmei, relaxei e deixei os dias passarem.
Numa sexta-feira por volta das 16h, recebi uma ligação para me apresentar na
faculdade trazendo uma declaração registrada em cartório. De novo, deu um frio na
barriga, um aperto no peito, senti disparar o coração. Agora eu consegui! Constatei. Senti
um misto de alegria e nervosismo, impossível de conter, que dirá de explicar. Tudo em
mim tremia. Na segunda-feira seguinte fui à faculdade deixar meus documentos,
conforme solicitado. Fiz a matrícula e as aulas iniciavam no mesmo dia, à noite. Espantei-
me! Já?! Não pude ir à noite, visto que já havia acertado com uma colega de trabalho a
mudança de turno para aquele dia, ou seja, trabalharia no período noturno. Tive de
renegociar os horários no trabalho para que a noite ficasse livre para as aulas.
Ao iniciar as aulas, aquela sensação estranha de não saber onde está, de não
conhecer ninguém, de ingressar em terrenos nunca antes percorridos. A dúvida me
apareceu diariamente nos dias seguintes… Como será possível conciliar trabalho e
estudos? Será que posso carregar este fardo? Mesmo sem respostas segui adiante. Não foi
fácil, mas superei a primeira guerra (leia-se, primeiro semestre) e suas inúmeras batalhas
diárias (leia-se, trabalho). Estou no segundo semestre agora e, tal como o primeiro, é
D
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 132 -
sempre um leão por dia, aquela briga interior continua aqui, mas a vontade de prosseguir
prevalece.
O sentimento que resume minha trajetória é o de perseverança. Mesmo que
inúmeras forças queiram que eu caia, ainda continuo de pé. O que eu posso dizer para
uma pessoa em situação semelhante é o mesmo que digo diariamente a mim mesma:
Quem acredita sempre alcança. Não desista de você! Confie em si mesmo! Ainda tem
muito chão pela frente, mas tenho nas mãos um mapa, no coração uma vontade, na mente
um objetivo.
“QUANTO FUI, QUANTO NÃO
FUI, TUDO ISSO SOU”
Jânder Carlos Soares Silva
“Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou”
- 135 -
que nos impulsiona? Até onde queremos ir? O que estamos fazendo para
alcançar nossos sonhos? A minha história não começou hoje e, para chegar até
aqui, muitas coisas aconteceram: novos lugares, novas pessoas, novos
desafios, pequenas conquistas, grandes frustrações, sim, não e talvez. Eu vivi de
momentos, e contarei um pouco deles nas próximas linhas.
Para que saibam quem vos fala, gentilmente me apresento: rapaz nordestino,
negro, de família humilde. Teimoso, de sorriso fácil e coração livre. Procuro acreditar
que, no fundo, todas as pessoas podem ir longe, toda meta pode ser atingida, todo simples
pode ser grande. Não sou bom quanto queria e poderia ser, mas sigo numa constante luta
para alcançar essa dádiva.
Durante muito tempo ouvi que algumas pessoas haviam nascido para
contentarem-se e que eu fazia parte desse grupo, mas neguei assumir isso como verdade.
Ouvi que faculdade era uma realização distante e que era melhor evitar a dor de sonhar
com algo que nunca chegaria, mas eu preferi tapar meus ouvidos.
Morei desde o primeiro ano de vida numa cidade do interior de São Paulo chamada
Juquiá. Muito cedo, perceberam em mim interesse pelo estudo, pelo conhecimento, pelas
descobertas de como as coisas funcionavam. Algumas poucas pessoas ousaram dizer:
“Esse menino vai longe!” E essa era a energia que precisava para acreditar mais, mesmo
num contexto social onde era costumeiro parar de estudar tão cedo.
Aos doze anos de idade minha família inteira retorna ao Ceará para cuidar de um
avô que havia adoecido, necessitando de atenção constante. O pequeno município de
Irapuan Pinheiro, terra onde nasci, me acolheu novamente. Continuei estudando e
galgando degraus mais altos: a sensação era a de que eu não cabia ali, não era ali que eu
deveria parar. Concluí o ensino fundamental na escola pública do município e ingressei
no ensino médio estadual também na pequena cidade.
Antes mesmo de concluir o primeiro ano, me submeti a um processo de seleção
para uma escola técnica interna na cidade de Iguatu no centro-sul cearense e fui aprovado.
Por tal motivo, repeti o primeiro ano do ensino médio, no que viria a ser o Instituto Federal
de Educação. Paralelo ao ensino médio, me formei técnico em agroindústria. Ali cresci
muito: me preparei o máximo para que pudesse continuar alçando voos mais distantes.
E no ano de 2012 pousei na antiga Faculdade Católica Rainha do Sertão, hoje
Centro Universitário Católica de Quixadá, no curso de Psicologia. Estar nesse lugar
simbolizava que minhas lutas até então não haviam sido improfícuas e decidi aproveitar
o máximo de todas as coisas novas e boas que a instituição pudesse me oferecer.
O
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 136 -
Desde o primeiro semestre comecei a frequentar grupos de estudo, porque
entendia que uma graduação ia muito além da sala de aula. Foi no GEFIS (Grupo de
Estudo Família, Indivíduo e Sociedade) que tive a oportunidade de elaborar um primeiro
trabalho que seria apresentado num evento institucional.
Quando cursava o terceiro semestre fui selecionado para compor o grupo de
estudantes que fariam parte do PET–Saúde (Programa de Educação pelo Trabalho),
projeto federal interdisciplinar que me possibilitou contato com outras disciplinas da
saúde e com profissionais da rede pública do Município de Quixadá. Foram dois anos de
muito aprendizado, agregando conhecimentos, compartilhando experiências que nos
aproximavam da realidade profissional que encararíamos num futuro breve.
Dentro desse programa apresentei trabalhos em congressos estaduais, dentro da
própria faculdade e ainda em eventos da rede de saúde do município, como as Jornadas
de Saúde Mental promovidas pelo CAPS (Centro de atenção Psicossocial), um dos meus
locais de atuação dentro do PET e que despertou interesse por pesquisa que resultou no
meu Trabalho de Conclusão de Curso.
Paralelo a este programa, também fiz parte do GEPAC (Grupo de Estudo e
Pesquisa em Análise do Comportamento) que enriqueceu meus conhecimentos na
abordagem psicológica então já assumida como perspectiva de trabalho. Nesse grupo
desenvolvi estudos, participei de organizações de eventos na Unicatólica e também em
eventos estaduais da área e desenvolvi trabalhos científicos.
No sexto semestre da graduação fui aprovado como monitor da disciplina de
Técnicas Psicométricas, condição na qual permaneci dois anos. Essa experiência me
permitiu conhecer e me apaixonar pela área da Avaliação Psicológica e também me abriu
outras portas; fui convidado a fazer parte do seleto grupo de extensão NEAPSI (Núcleo
de Estudos em Avaliação Psicológica), iniciando minhas atividades clínicas ainda no
sétimo semestre da graduação. E foi talvez aqui que eu me apropriei da carreira
profissional que ainda construo. Foi com a prática que me sobreveio a responsabilidade
que temos em nossas mãos para com o outro.
No sétimo semestre, um projeto construído em parceria com amigos com fins de
aprovação na disciplina de Exames Psicológicos e Orientação Profissional foi escolhido
pela direção de uma escola de ensino médio de Banabuiú-CE para ser aplicado às turmas
de terceiro ano. Foi mais uma oportunidade única de conhecer o campo da orientação
profissional, de trabalhar com jovens estudantes na perspectiva de facilitar o
conhecimento de si e de suas habilidades e potencialidades, e também de fazer um
“Quanto fui, quanto não fui, tudo isso sou”
- 137 -
trabalho de cunho social, espelhando fora da universidade o que vem sendo construído na
academia.
Apaixonado pela arte, foi no Coral Vozes do Sertão que encontrei alívio nos dias
difíceis. A música faz parte de mim, e em meio ao caos que muitas vezes nos sobrevém
no mundo acadêmico, vi ali uma oportunidade de relaxar e de contribuir. Fizemos
apresentações revigorantes: fosse em abertura de eventos, confraternizações,
comemorações festivas, estávamos lá, em coro, espalhando amor e paz em cada nota, tom
e afinação.
Além da necessária vivência acadêmica, construí dentro do curso de Psicologia
uma carreira política; em 2015 compus a chapa vencedora das eleições para o Centro
Acadêmico Honestino Guimarães, atuando no cargo de diretor de comunicação.
Desenvolvemos projetos no intuito de fazer com que o curso figurasse entre os mais
importantes da instituição, fortalecendo o vínculo intra-alunos e entre estes e os docentes,
entendendo que o coletivo sempre é mais forte e que juntos podemos vencer obstáculos
ainda maiores. Cabe lembrar que desenvolvemos também ações sociais que se
propuseram, em alguma instância, a beneficiar a população menos favorecida do
Município de Quixadá e circunvizinhos.
Acreditando que havia realizado um bom trabalho, em 2016 me candidatei
novamente ao Centro Acadêmico, assumindo o cargo de presidente durante este ano.
Contando com um grupo forte, continuamos e intensificamos as ações da gestão passada,
mas também criamos novos e exitosos projetos, que nos fizeram ser reconhecidos por boa
parte dos alunos e docentes como um C.A atuante e participativo.
Fui membro da Comissão de Organização da Mostra de Psicologia durante quatro
edições. Com o objetivo de divulgar o que de grandioso nosso curso estava
desenvolvendo na Unicatólica e apresentá-lo a outros públicos, criei o Programa TV
Mostra, no qual atuei como apresentador e repórter: o programa era veiculado no canal
da instituição no YouTube. Aliás, se você nunca assistiu, recomendo; viva comigo um
pouco das boas coisas e experiências nessas mostras.
Foi também no ano de 2016 que participei do Pré-Congresso Regional de
Psicologia e fui eleito delegado estudantil para representar a Unicatólica no 9° COREP
(Congresso Regional de Psicologia) que aconteceu em Fortaleza-CE. Era a oportunidade
que eu tinha para conhecer ainda mais o campo político de nossa categoria, participar das
discussões que fomentavam construções que envolvem nosso fazer no Estado. Eu mal
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 138 -
podia acreditar que estava vivendo esse momento tão rico, até que coisa maior me
aconteceu.
Nesse evento, fui eleito delegado estudantil para representar todos os estudantes
de Psicologia do Estado do Ceará no 9° Congresso Nacional de Psicologia – CNP,
ocorrido em Brasília. O CNP é a instância máxima de deliberação do Sistema Conselhos
de Psicologia, nele são definidas as diretrizes e ações políticas que devem ser priorizadas
para o triênio subsequente, ou seja, para a próxima gestão dos Conselhos Regionais e
Federal. Incomensurável foi essa experiência. Entendi que muito precisava ser feito por
nossa categoria, e esse comprometimento político aumentou ainda mais minha vontade
de contribuir com a psicologia brasileira.
Agora estou perto de realizar um dos meus sonhos: concluir uma graduação. Eu
não consigo resumir isso em outra palavra que não seja agradecimento. A Deus, aos meus
pais e heróis que sempre acreditaram em mim e fizeram muito mais do que podiam para
me permitir viver essa realização, aos meus professores que foram exemplo, que me
acolheram, que disponibilizaram tempo para me ensinar como fariam com seus filhos;
permitam-me citar a docente Mércia Capistrano, que de forma tão particular e carinhosa
investiu em minha carreira acadêmica, me incentivou, me abriu portas e confiou em mim.
Eu sei que todas essas maravilhosas experiências que vivi em minha graduação
contribuíram e contribuirão de modo inigualável para a minha formação profissional e
humana. Estou certo de que aproveitei cada segundo, cada oportunidade. Certo de que
olhar para trás sempre será motivo para nostalgia, saudade e, por que não dizer, orgulho.
Mas é preciso vencer novos desafios. A graduação não limita minhas asas; apenas
aprimoram ainda mais o meu voo. E eu vou seguir, porque parar não está nos meus planos,
não cabe no meu sonho.
No fim, deixo-vos um trecho de Shakespeare que carrego sempre comigo:
“Portanto, plante seu jardim e decore sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga
flores. E você aprende que realmente pode suportar. Que realmente é forte, e que pode ir
muito mais longe depois de pensar que não se pode mais”. Que possamos sempre seguir
na realização dos sonhos, e que sempre tenhamos terreno fértil para tal.
REGISTRANDO GRATIDÃO
Ana Beatriz Almeida Sampaio
Registrando gratidão
- 141 -
ou Ana Beatriz Almeida Sampaio, nasci em Quixeramobim em maio de 1997,
sou a primeira de três filhas do casal Gustavo e Aninha Sampaio, e atualmente
curso Psicologia na Unicatólica de Quixadá. Mas a minha vida acadêmica
começou aos dois anos de idade no Colégio Nossa Senhora do Rosário – CNSR e posso
afirmar com segurança que a partir do que eu vivi lá que me tornei a discente que sou
hoje.
Então, venho por meio desse relato externar e deixar registrado o meu grande
sentimento de gratidão por todo meu trajeto até chegar aqui. Para começar a história devo
dizer que meus pais são os diretores da escola, meu pai é o gestor geral, podemos dizer
assim, mas a minha mãe sempre está ao seu lado, lhe ajudando no que consegue e lhe
dando todo o apoio que ele precisa. Sempre fui conhecida por todos como “a Bia filha do
diretor”. Ah, como eu me sinto honrada por essa oportunidade! Nunca me senti melhor
do que ninguém por isso, pelo contrário, meus pais faziam questão de que todos
percebessem que eu não ganhava privilégios com isso, sempre pedia para que os
professores não agissem diferente comigo e se tivessem de agir que fosse para cobrar
mais de mim.
Mas me sinto honrada porque ser filha do diretor fez com que o colégio fosse a
minha casa, os funcionários eram realmente meus tios e tias que me educaram não só pelo
fato de ajudarem na minha construção cognitiva, mas me transmitirem valores e
princípios que carregarei comigo sempre. Seus filhos eram como se fossem primos e
todos os alunos que por ali passavam se tornaram meus irmãos, e ver meu pai, junto com
minha mãe, se doar para contribuir com a educação de cada um desses, ver meu pai perder
várias noites de sono por causa da escola, fez com que o meu desejo por me dedicar aos
estudos crescesse sempre mais. Era como se eu quisesse mostrar a eles que suas renúncias,
o seu ato de doar-se, valia a pena.
Vou tentar resumir um pouco do que vivenciei a cada nível de ensino.
Primeiramente na educação infantil as tias Elieuda, Divinha, Beth e Edvâne (professoras
da educação infantil) me introduziram no fantástico universo da leitura e escrita. Uma
educação infantil onde vínculos começaram a se formar e construir amizades que
perduram até hoje. Depois no fundamental 1 as tias Tassiane e Ronalda tiveram bastante
trabalho para nos colocar nos eixos. Uma fase marcada pelos momentos de recreação, as
belíssimas feiras de arte e ciência que foram cruciais no desenvolvimento da minha
autonomia.
S
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 142 -
Passou-se o tempo e de repente estava no ensino fundamental 2. Literalmente,
subimos degraus. Estávamos esperando ansiosamente para estudar no andar de cima. Foi
uma época de metamorfose para nós, mas a tia Adriana, tia Cirlândia e Fatinha
(coordenadoras), nos ajudaram a superar cada mudança. Passamos por vários problemas,
alegrias, tristezas, decepções e todas as crises complexas da adolescência. Assim, nossos
laços também se fortaleceram.
Até que é chegada a reta final: o ensino médio. O Hugo e a Lili (coordenadores)
me acolheram de uma forma inexplicavelmente especial. Foram três anos cheios de
cálculos, fórmulas, redações, muitos, mas muitos, inúmeros simulados e um
companheirismo sem tamanho. Nesses momentos finais meus pensamentos se encheram
de lembranças que justificam tamanho sentimento de gratidão misturado com saudade.
Podem se passar dez, vinte, trinta anos e nunca esqueceremos de nossas excursões, do
passeio a praia de Iparana, do teatro da bonequinha de pano...
O colégio, os professores e todos os funcionários desde a portaria e serviços gerais
até o meu pai, me ensinaram muito mais que matemática, ciências, inglês... Me ensinou
a viver e agir sempre pensando não só em mim, mas em todos com quem eu convivo e
com a sociedade em geral. Me sinto muito feliz ao poder afirmar que fiz parte da nação
CNSR e que viveria tudo outra vez.
Sair de uma realidade onde todos se preocupam com todos e entrar em outra em
que se vive cada um por si, foi bem difícil, ou melhor ainda é. Mas tive a graça de encarar
essa nova fase dentro da Unicatólica de Quixadá. Por ser católica, acredito que Nossa
Senhora que me carregou no colo durante toda a minha educação básica, não queria que
fosse diferente com a minha formação no Ensino Superior — sair dos braços de Nossa
Senhora do Rosário para vir para os da Rainha do Sertão para mim foi indiscutivelmente
essencial para que eu me sentisse segura.
O primeiro e segundo semestres foram difíceis em relação a esse processo de
adaptação, mas poder estar perto de meus pais tornaram as mudanças bem mais
suportáveis. As vivências feitas pelos estagiários do NAP (Núcleo de Apoio
Psicopedagógico) fizeram com que eu notasse que não era só eu que tinha problemas
nesse novo ritmo de vida, mas que meus colegas estavam na mesma situação que eu, e
então começamos a criar vínculos também nesse sentido: compartilhar não só os
problemas, mas também as soluções. Desde então, temos desfrutado, junto aos nossos
professores que já se tornaram amigos, da grande e inacabável descoberta que são as
Psicologias.
ROMPENDO O SILÊNCIO E
CONQUISTANDO O IMPOSSÍVEL
Lucas Ferreira de Oliveira
Rompendo barreiras e conquistando o impossível
- 145 -
uando eu era criança, tive momentos difíceis, vivia em um silêncio absoluto...
Não havia ninguém que soubesse se comunicar comigo. Tentava apontar, usar
mímica para estabelecer uma mínima comunicação com meus poucos amigos.
Estudava na creche do meu bairro e as poucas lembranças que tenho é uma pseudo-
inclusão, um ambiente em completo silêncio para mim. Eu sabia que minha mãe ficava
triste com minha situação, estava em uma sala de aula onde não entendia nada do que era
repassado.
Em 2003, passei uma situação muito difícil e minha mãe decidiu procurar um lugar
para romper meu silêncio, uma escola que ensinasse Libras e que tivesse pessoas iguais
a mim. Foi quando, finalmente, ela encontrou a Escola José Jucá — a conquista da minha
liberdade (sair do mundo do silêncio). Lá, minha mãe fez a matrícula, um lugar que tinha
meus pares, muitos surdos, e cada um usa as mãos de modo a emanar uma sinfonia de
movimentos. Percebia que eles conseguiam entender-se, interagir com qualidade, sorrir,
e o outro sabia o motivo do sorriso, eu amava aquele lugar! A representação de
movimentos que tirava de mim o silêncio insuportável era a Língua Brasileira de Sinais,
a parte mais importante da minha vida, foram anos felizes, finalmente!
Quando finalizei o Ensino Fundamental na Escola José Jucá, comecei meu Ensino
Médio na Escola Gonzaga Mota, lá voltei aos meus dias de "creche", uma situação muito
difícil, vivenciei um espaço sem a presença dos meus pares (surdos) e sem o intérprete,
profissional com o qual já havia me acostumado com a presença fundamental. Esperei
que a escola conseguisse essa pessoa importante para mediar a comunicação na língua de
sinais, sem sucesso. Fui paciente e na realidade digo: Fui atrevido e corajoso. Desistir
parecia um ato de covardia comigo, a escola era a representação da realização dos meus
sonhos.
Na escola de Ensino Médio, nunca fui reprovado e até conseguia tirar notas boas,
mas, em algumas matérias, ficava de recuperação e precisava me desdobrar em casa para
tentar compreender os conteúdos, foram anos difíceis... Professores sem formação
específica para lidar com um aluno diferente, sim, sou um aluno diferente e não deficiente
como muitos deles pensavam. Com muito esforço consegui mais uma vitória, o tão
sonhado primeiro emprego antes de terminar o Ensino Médio, passei na entrevista, era
bom o suficiente para conseguir um trabalho. Foi gratificante essa conquista...
O ano foi passando e o Enem foi se aproximando, esse processo seletivo foi muito
complexo, a primeira vez que fui fazer não sabia se haveria intérprete e na realidade não
estava preparado, as aulas de preparação para o exame na minha escola foram uma
Q
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 146 -
interrogação para mim. Sem a preparação adequada não consegui boa pontuação. Fiquei
decepcionado com as oportunidades sendo roubadas novamente de mim. Nesse processo
de tristeza, meu irmão foi fundamental, ele percebeu a minha tristeza e resolveu pesquisar
simulados do Enem para que eu pudesse praticar.
Meu segundo exame foi mais tranquilo, fiz na Unicatólica com toda acessibilidade
que eu tinha direito e minha nota foi bem melhor. Com esse resultado consegui entrar no
IFCE (Instituto Federal do Ceará) de Quixadá-CE, um resultado que me deixou muito
feliz, era a minha chance de conquistar o impossível... Mas, a pseudo-inclusão não
deixava, solicitei a contratação do profissional intérprete de Libras e a explicação emitida
no parecer era que eu não teria o direito a esse serviço.
A pseudo-inclusão derrubou mais um sonho. Tranquei minha matrícula, não podia
aceitar viver novamente naquele silêncio. Meu sonho do ensino técnico foi frustrado,
passei dois anos sem estudar e confesso que estava ciente que não passaria do Ensino
Médio. Silêncio, sonhos rompidos, tudo me acompanhava naquela época. Estava quase
sem esperança, quando resolvi prestar o vestibular na Unicatólica, foi uma experiência
nova, ansioso e desacostumado com a acessibilidade da presença do intérprete, não
solicitei a interpretação de algumas questões e, dado meu ensino médio deficitário, o
resultado não foi positivo: meu sonho foi adiado.
No ano seguinte, ciente da qualidade da instituição resolvi mais uma vez prestar
vestibular, dessa vez, mais experiente e com a esperança renovada fui realizar a prova.
Utilizei todos os recursos de acessibilidade disponibilizados pela Unicatólica, entendi que
naquele espaço tinha a realização dos meus sonhos nas suas paredes. Consegui passar e,
finalmente, conquistar o impossível: ser um acadêmico do Curso de Licenciatura em
Educação Física e romper o silêncio imposto pela pseudo-inclusão. Foi o que a
Unicatólica me proporcionou, tenho acessibilidade, posso falar a minha língua e ser
escutado, entendo o que os professores falam e agora minhas dúvidas não são pelo motivo
da falta de comunicação, mas pela base do Ensino Médio que foi ruim.
Tenho esperança no futuro, perspectiva de contribuir na formação de outros
surdos, ter uma carreira, ser um profissional de excelência. Meu sentimento em relação a
todos da Unicatólica é de gratidão, tenho um FUTURO de sucesso a trilhar e, graças a
Unicatólica, sei que serei um profissional que vai fazer a diferença. Sou Lucas Ferreira
de Oliveira, sou surdo, acadêmico do curso de Educação Física e sou Unicatólica com
muito orgulho!
SE A VIDA FOSSE FÁCIL,
NÃO TERIA GRAÇA VIVER
Francisco Egberto Martins Melo
Se a vida fosse fácil, não teria graça viver
- 149 -
uando terminei meu Ensino Médio em 2007 numa escola de Baturité, a
aproximadamente 33 km de Itapiúna (cidade onde moro), meu único pensamento
era cursar Administração de Empresas em uma universidade pública. Fiz a
inscrição para os vestibulares das universidades públicas de Fortaleza, e o final do período
escolar foi o início da caminhada acadêmica. Mas não aconteceu como planejei. Fiz o
vestibular da primeira, e ao conferir o gabarito vi que tinha zerado uma disciplina, o que
automaticamente me desclassificava do concurso. E entre um vestibular e outro, uma forte
crise de apendicite me impediu de fazer a segunda prova. Passei horas na mesa de cirurgia,
sabendo depois que o que eu achava ter sido um simples procedimento na verdade se
tratava de algo tão complicado, pois o problema estava em um estado avançado.
Em 2008, surgiram duas chances: Vestibulares em Fortaleza em Quixadá. Aqui
inicia minha vida acadêmica na cidade de Quixadá, terra da nossa Unicatólica, quando
passei para o curso de Sistemas de Informação. Como morava em outra cidade, tive que
me adaptar à locomoção diária no início da jornada. Com o passar do tempo, consegui
alugar um apartamento em Quixadá junto com outras pessoas, e me estabilizei, voltando
para Itapiúna apenas nos finais de semana. No meio tempo que cursei Sistemas de
Informação na universidade pública, conquistei bolsas, participei ativamente da vida
acadêmica sendo representante dos alunos no conselho do curso, comprei alguns embates
para a melhoria das condições de estudo dos alunos, mas ao mesmo tempo percebia que
esse curso não era o que eu queria. Meu sonho sempre foi estudar Administração.
Assim, em 2012, ano em que eu deveria colar grau, acabei não colando. Problemas
pessoais prejudicaram meu rendimento no curso, e minhas notas agora, de fato,
mostravam o que eu já sabia: aquele curso não era para mim. Em 2013 abandonei faltando
apenas o TCC 2 (Trabalho de Conclusão de Curso) para me formar, e resolvi voltar a
morar em Itapiúna. Consegui meu primeiro emprego com carteira assinada em uma ONG
e passei a focar somente no trabalho e em cursos avulsos proporcionados por ela. Até que,
em 2014, surgiu a chance de fazer uma faculdade. A então Faculdade Católica Rainha do
Sertão (FCRS) tornava pública a chamada para o Vestibular 2014.2, com vagas para
vários cursos, inclusive Administração.
Pensei então: Preciso fazer! Há tempos não estudava nada para fazer um
vestibular, mas mesmo assim fui, com coragem e esperança de que eu pudesse obter
sucesso na prova. Fiz minha inscrição e passei! No dia 4 de agosto, depositava minhas
esperanças e apostava alto no curso dos meus sonhos. Dizia comigo mesmo: Se eu não
Q
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 150 -
me formar nesse curso, não me formo em mais nenhum! E com esse pensamento, iniciava
novamente minha vida acadêmica, agora como estudante da FCRS.
Então minha rotina era: trabalhar o dia inteiro, e ao final de cada tarde correr para
me organizar e ir para as aulas à noite, de segunda a sexta, percorrendo 58 km de ida e 58
km de volta para minha cidade.
Essa rotina perdurou apenas um semestre. Em fevereiro de 2015, minha família
sofreu um golpe em forma de “quase infarto”. Minha tia-avó, de 75 anos, que cuidava da
panificadora da família (principal fonte de renda), adoeceu seriamente, nos preocupando.
Tivemos que cuidar de sua saúde, e a panificadora ficou muitos dias fechada. Até que,
nesse momento, tive que tomar uma das decisões mais importantes da minha vida, e assim
foi feito: Larguei meu emprego na ONG, e passei a dedicar meus esforços e conhecimento
na panificadora da família.
Dessa forma, minha rotina sofreu mais uma alteração, ficando assim: todos os
dias, acordar às 4 da manhã para cuidar da panificadora, trabalhar a manhã toda, monitorar
o movimento à tarde e ir todas as noites para as aulas, chegando em casa quase sempre
depois das 10 da noite.
Me adaptei a essa rotina que sigo até hoje, e seguirá assim até o dia da minha
formatura, prevista para 2018.1. Difícil, pois manter um bom rendimento acadêmico
nesse contexto exige muita dedicação. E administrar panificadora, já inserido na área de
Administração de Empresas, é uma oportunidade para colocar em prática tudo o que
aprendo na faculdade. Essa é minha história!
SUPERANDO DESAFIOS,
TRILHANDO SONHOS: UM
RELATO DE UM ACADÊMICO
COM DEFICIÊNCIA VISUAL
Danilo Pereira Cavalcante
Superando desafios, trilhando sonhos: um relato de um acadêmico com deficiência visual
- 153 -
ara abordar minha trajetória acadêmica, é necessário, primeiro, iniciar com um
relato do meu maior desafio de vida, que se iniciou aos seis anos: não conseguia
realizar uma leitura contínua, lia muito próximo do livro e esbarrava nas coisas.
A professora, diante de minhas dificuldades, juntamente com minha mãe, conversou para
tentar solucionar o problema, e elas decidiram procurar a orientação de um
oftalmologista.
Foi constatada a necessidade dos óculos, no entanto não resolveu o problema e
ficaram algumas indagações. — É preguiça? Ou outro problema? Minha mãe me levou a
um neurologista e não foi detectada nenhuma patologia. Meus pais procuraram a opinião
de outros profissionais da saúde, passando por uns oito oftalmologistas, até que um destes
identificou uma anomalia genética e me encaminhou para um especialista. Fui
diagnosticado com uma doença degenerativa da retina (Doença de Stargardt), em que os
óculos não poderiam corrigir o déficit visual e que a tendência seria ficar cego.
Meus pais ficaram desesperados e começaram uma busca incansável pelo melhor
tratamento, indo a outros oftalmologistas. Uma doutora tranquilizou-os dizendo que eu
poderia ter uma vida próxima da normalidade e apresentou algumas estratégias.
A fase de adaptação consistiu em estimulação visual para aprender a utilizar o
resquício de visão e terapia ocupacional para manipular instrumentos que me auxiliariam,
tais como réguas, lupas e textos ampliados. Estas foram as adaptações iniciais.
Comecei a ser visto como diferente, estudava em escolas regulares e sempre tinha
amigos que me ajudavam, pois não conseguia copiar do quadro, um colega ditava e eu
copiava em um caderno com uma pauta mais escura e com caneta porosa. Estava ficando
difícil ler, ficava com dor de cabeça e náuseas, que se intensificavam com a piora da visão
e tudo se complicou ainda mais.
Buscávamos novas alternativas. Uma pessoa começou a ler minhas provas,
comecei a estudar por áudio e adquiri uma telelupa (uns óculos com duas lentes para ver
mais longe). Sentia-me constrangido pelo olhar das pessoas.
Na adolescência a parte psicológica piorou, pois meus amigos iam sozinhos ao
shopping e eu não podia, precisava sempre estar acompanhado por uma pessoa. Isso foi
apenas uma das barreiras. Surgiram os apelidos como cego, fundo de garrafa, dentre
outros.
No Ensino Médio me sentia envergonhado e inferior aos demais alunos. Teria que
enfrentar maiores desafios: passar no vestibular e trabalhar. Devido minhas limitações
deixei meu sonho de lado, que era cursar Direito.
P
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 154 -
Decidi concorrer no vestibular para Educação Física em universidades públicas,
porém não fui aprovado. Consegui uma bolsa em um cursinho e fui tentar outros
vestibulares. Neste percurso, algumas das instituições não aceitaram que eu fizesse a
prova com ledor ou que transcrevesse a redação nas segundas fases, até tempo adicional
era complicado e recorri ao Ministério Público para realizar as provas. Meu pai, triste,
afirmava que seria difícil.
Refletindo o que iria fazer da minha vida, revoltado e tratando as pessoas mal, por
muito tempo passei por um acompanhamento psicológico. Comecei a me conhecer,
identificando minhas capacidades e limitações. Decidi fazer vestibular para uma
universidade privada de pequeno porte que meu pai poderia custear. Foi necessário mais
uma vez a intervenção do Ministério Público. Surgiram questionamentos de como poderia
exercer a função de Professor de Educação Física e afirmei que seria apenas para
conhecimento pessoal.
Durante a graduação também fiz um curso de informática, em que poderia
escanear os textos no computador, fornecendo maior autonomia para os meus estudos. As
provas eram realizadas com o ledor e o mesmo transcrevia as respostas.
Paralelo à faculdade comecei a frequentar a Associação de Cegos do Ceará, fiz
um curso de auxiliar administrativo e um de deficiência visual e braille. Com isso, os
obstáculos foram sendo amenizados, uma vez que fui me capacitando e adaptando às
necessidades. Neste momento me assumi como pessoa com deficiência visual, passando
a utilizar bengala, que foi de fundamental importância para minha autonomia. Com mais
independência, comecei a treinar natação e musculação.
Surpreendentemente fui de sedentário e coitadinho a único estudante de Educação
Física do Estado do Ceará com deficiência e, na época, cogitava-se até a nível nacional,
pois não se tinha conhecimento de outros casos. As pessoas começaram a me olhar agora
como herói, pois era também atleta de destaque, o primeiro cearense a ganhar os Jogos
Paralímpicos Universitários Brasileiros e configurar entre os duzentos melhores
nadadores com deficiência do País.
Acabei me desviando do foco, pois fui convocado por uma seleção para Agente
de Saúde. Assumi o cargo como forma de manter a faculdade. No início tinha
flexibilidade nos horários para treinar, pois a coordenadora era muito compreensiva,
porém, com a sobrecarga, abandonei o curso de inglês e espanhol. Foi necessário reduzir
os horários dos treinos e, desmotivado, abandonei mais um sonho: o de ser campeão
paralímpico.
Superando desafios, trilhando sonhos: um relato de um acadêmico com deficiência visual
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Estudei para concursos na área da Educação Física e, fazendo jus ao apelido
recebido na universidade de “ministério público”, recorri a ele mais algumas vezes para
conseguir realizar as provas, pois esbarrei nos mesmos problemas do vestibular. Fui
aprovado em dois concursos, um estadual e outro municipal. Optando pela vaga
disponível do concurso municipal de Quixadá, fui obrigado a abandonar minha família.
A nova realidade longe de minha família foi amenizada graças a uma prima de
minha mãe, que residia em Quixadá. Ela me ajudou com o reconhecimento espacial da
cidade e me apresentou muitas pessoas, que contribuíram para o processo de adaptação.
A falta de acessibilidade foi sendo superada com a sensibilidade de moradores do
município, os quais ajudaram na travessia de rua, orientando quanto a barreiras
arquitetônicas. Morar sozinho não foi tão difícil, pois minha mãe me ensinou muitas
atividades diárias como: lavar roupa, cozinhar e limpar a casa. Senti muita falta da comida
da minha avó, carinho da mãe, ajuda incondicional de meu pai e da amizade de minhas
irmãs.
Com o passar do tempo, fiz várias especializações: em Educação Inclusiva, em
Lutas e em Gestão escolar. Neste período fui reconvocado pelo concurso estadual,
assumindo mais cem horas na cidade de Quixadá.
Não alcançando meu sonho de atuar na área de educação inclusiva na CREDE 12
(Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação) ou na Secretaria de
Educação do Município de Quixadá, redimensionei mais uma vez minha vida fazendo um
novo concurso para voltar ao berço familiar em Fortaleza.
Com a aprovação em quinto lugar geral, estava decidido a voltar para Fortaleza.
Entretanto, no mesmo período obtive aprovação no vestibular de Direito da Unicatólica.
Dessa vez, não sendo necessária a intervenção do Ministério Público. Mais uma vez o
destino me colocou numa indecisão: abandonar o concurso de Fortaleza e a família ou a
estabilidade de dois concursos públicos e a aprovação no curso de Direito da Unicatólica.
Surgiu a esperança de realizar um sonho abandonado: uma graduação em Direito.
Então fiquei trabalhando para concretizá-lo.
O início do curso de Direito foi desafiador. A Unicatólica dispunha de
funcionários dedicados, atenciosos, uma coordenação sensível que criou estratégias para
a inclusão como: tempo adicional em provas e entregas de trabalho, prova com ledor,
sendo substituída por provas em sala de aula realizadas em meu notebook. Os professores
traziam a prova no pen drive e depois eu poderia responder sem depender de outras
pessoas.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 156 -
Surgiram novos desafios: os materiais sugeridos para estudo que o meu leitor de
tela do computador não reconhecia. Minha jornada de trabalho é sessenta horas semanais,
e ainda tenho que disponibilizar tempo para estudar e organizar o apartamento, barreira
que está me levando a um desgaste físico e mental, o que também afeta meu rendimento
acadêmico.
Não posso deixar de destacar que amigos de sala me ajudam gravando notas de
aula e encaminhando materiais para meu e-mail, gerando motivação e ótimos resultados.
Esses anjos são importantes para a conquista do meu sonho.
Fiquei muito animado com a criação do NAI – Núcleo de Acessibilidade e
Inclusão na Unicatólica, mais uma ferramenta que poderá desenvolver ações de melhoria
do meu aprendizado e que contribuirá para a inclusão de pessoas com deficiência no
curso.
É evidente que na atual realidade da sociedade e de muitas universidades, não há
um atendimento adequado às necessidades das pessoas com deficiência. Isso é ressaltado
na ocorrência constante de discriminações, como também, por não ser posta em prática a
legislação destinada à inclusão deste segmento. É perceptível a falta de acessibilidade e a
escassez de profissionais com formação para alcançar os ideais inclusivistas, os quais
ainda estão longe de serem efetivados em sua plenitude.
Dentre as perspectivas para o futuro, gostaria de voltar a militar e ajudar nessa
transformação social. Os desafios diários não são motivos para eu desistir. Cada
superação me motiva a seguir nas trilhas do meu sonho. Peço que Deus me dê força e me
guie rumo à vitória.
TER UMA DIREÇÃO,
UMA VERDADE
Karleandro Pereira do Nascimento
Ter uma direção, uma verdade
- 159 -
quele que conquista o pódio é porque não olha nem para buracos, nem para
obstáculos, nem para contratempos, nem para nada. A travessia não é nada
fácil. Tinha tudo para dar errado, ou não. Decidi encorajar-me contra os
paradigmas de um garoto pobre, do sertão, sem perspectivas de um futuro promissor.
Educado com o pouco que meus pais tinham e em meio à escassez do básico, consegui
driblar a pobreza e reescrever minha narrativa de superação.
Tudo começou na Fazenda Guaribas, no interior de Quixeramobim-CE, chamo-
me Karleandro Pereira do Nascimento, sou o segundo filho de um casal de agricultores
— Antonia Prudente Pereira e Carlos Alberto dos Santos — e irmão de Karlyane Pereira.
Comecei a ajudar meus pais aos cinco anos de idade nas tarefas domésticas, no
cuidado ao rebanho de ovelhas e na agricultura, mas sempre conciliando com os horários
de minhas aulas. Estas, iniciados na escolinha de educação infantil Maria Madalena
Pereira. A primeira e a segunda série foram na Escola Francisco Manoel do Nascimento.
A terceira série foi na Escola Manoel Pereira do Nascimento, que ficava a 02 km de minha
casa, percorridos todos os dias a pé no período vespertino. Já da quarta a oitava série
pegava caminhão todos os dias para ir até a localidade vizinha estudar na Escola Alfredo
Almeida Machado, onde fiquei até a conclusão do ensino fundamental.
No final deste período surgiu a oportunidade de cursar o ensino médio no distrito
de Manituba, distante cerca de 10 km de minha casa, sendo uma extensão da Escola de
Ensino Médio Humberto Bezerra. Meus pais hesitaram no primeiro momento, e então
percebi que na opinião deles seria melhor parar ali, no ensino básico, ajudá-los na
agricultura seria melhor. Como meu pai foi educado numa cultura machista e num sistema
hierárquico de gênero, tinha comportamento bastante autoritário e na visão dele o
importante seria que o filho trabalhasse na roça e o ajudasse no sustento da casa. Devido
a este comportamento característico de meu pai e em virtude do seu antigo vício em
álcool, possuía dívidas com a justiça.
Vários colegas meus de colégio, também de família pobre, terminavam o ensino
fundamental e ficavam por ali, optavam pela agricultura ou emprego em mercantis. Eu
não queria aquilo para mim, queria algo mais.
Chegava o dia da matrícula do ensino médio e para minha surpresa meus pais
decidiram que eu deveria continuar na academia. Durante todo o ensino secundário fui
vítima de bullying e agressões verbais, nunca revidei aqueles insultos, ficava paralisado
sem reação. Com isso, me auto excluí do contato com a sala e, por consequência disso,
tive poucos amigos no ensino médio.
A
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
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Todo o meu ensino médio foi cursado no período vespertino e, no contraturno de
minhas aulas, auxiliava meu pai na agricultura e alimentação do gado. Contribuía também
na igreja de minha comunidade, sempre fui muito devoto de Nossa Senhora das Graças,
considero-a minha madrinha.
Recordo que iniciei no ensino médio no ano de 2008 e, logo em março, surgiu a
oportunidade de ir dois sábados ao mês à sede da escola em Quixeramobim, fazer um
cursinho de informática, uma espécie de projeto de inclusão digital da escola. Lembro-
me que o inverno era severo naquele ano, mesmo assim eu evitava faltar. Em algumas
ocasiões meus pais davam-me R$ 6,00 para o lanche. Em meio às dificuldades, concluí o
cursinho.
No terceiro ano do ensino médio me sentia totalmente perdido, como eu morava
no interior (sertão) não tínhamos acesso à internet, poucos professores nos estimularam a
prestar vestibular. Então a professora Hylmar me falou que havia cursos de licenciatura
na Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central –FECLESC campus da
UECE em Quixadá, que eram totalmente gratuitos, com exceção da inscrição, logo, fiquei
imensamente feliz. Na verdade, sempre tive a ideia de que o ensino superior fosse
exclusivamente pago, portanto, reservado a classe média e alta, tamanha era minha falta
de acesso à informação.
Finalmente concluí o ensino médio no ano 2010 e concomitante a isto estavam
abertas as inscrições do vestibular da FECLESC – UECE. Lembro-me que eu tinha um
cofre de moedas que totalizava R$ 73,00, mas a taxa de inscrição consistia em pouco mais
de R$ 80,00. Sem dinheiro para custear todo o valor e sem o consenso de meus pais,
abstive-me de meu sonho.
No ano seguinte, em 2011, minha rotina limitou-se apenas em auxiliar meus pais
nas tarefas de casa. Considero o pior ano de minha vida, pois percebi que o mundo
acadêmico havia sido abruptamente retirado de mim e devido minha falta de atitude e
encorajamento deixei que isto acontecesse. Não via mais sentido em minha vida, já que
meus colegas de sala haviam se mudado para São Paulo, outros para Quixeramobim,
alguns fazendo curso técnico, mas eu continuava ali estagnado, sentia uma tristeza
imensa, meu sonho ficava cada vez mais distante. Neste mesmo ano, sofri uma injúria e
difamação de familiares e isso me deixou ainda mais deprimido e descontente.
Todavia, inconscientemente, o destino já estava traçado, mas muitas etapas ainda
precisavam ser superadas. Em outubro de 2011, através do rádio fiquei sabendo do
vestibular da FECLESC, desta vez eu tinha o dinheiro da inscrição, coincidência ou não,
Ter uma direção, uma verdade
- 161 -
meu cofre de moedas tinha apenas a quantia da taxa do vestibular. De imediato fui a
Quixeramobim realizar minha inscrição, quem a fez foi meu antigo professor de química,
inscreveu-me no curso de Letras-Português. Notei que boa parte da minha família achava
bobagem perpetuar os estudos, com isso só recebi apoio e assistência de meus avós, mãe
e uma tia, o restante acreditava que seria perda de tempo e de dinheiro. Como venho de
uma família de professoras, optei também pela licenciatura, entretanto, meu grande sonho
seria cursar Enfermagem.
O vestibular ocorreu no dia 27 de novembro de 2011, data que a igreja comemora
a festa de Nossa Senhora das Graças, minha madrinha. Passei nas duas fases da prova,
dando início aos estudos no dia 28 de fevereiro de 2012 e logo tive que vir morar em
Quixeramobim com minha tia.
O curso de Letras era matutino, todos os dias de segunda a sexta eu estava em
Quixadá. Como meus pais são bastante humildes, me ajudavam com o que podiam. Ainda
no primeiro semestre de faculdade meu pai foi chamado ao fórum para pagar o restante
de sua dívida com a justiça, sua pena consistiu em ficar recluso nos fins de semana, isso
diminuiu ainda mais a renda de minha família, deixando-os impossibilitados de me
ajudarem financeiramente. Passei muita fome do primeiro ao terceiro semestre de
faculdade.
No quinto semestre de Letras o desejo de cursar Enfermagem aumentava cada vez
mais. No sexto semestre um professor doutor do curso de Letras convidou-me para
participar de um projeto de Iniciação Científica onde iria ser agraciado no período de 01
ano com um auxílio de R$ 440,00 — considero este meu primeiro ‘emprego’. Durante os
estágios nas escolas tive a certeza de que não queria ser professor da educação básica,
ressalvo que acho uma profissão nobre, todavia eu não me identificava. A partir deste
auxílio economizei ao máximo para prestar vestibular na Unicatólica, lembro-me que era
pouco mais de R$ 1.000,00 a matrícula.
Aguardava o resultado ansioso, e lá estava meu nome na décima sétima posição
de trinta vagas ofertadas para o curso de Enfermagem da turma de 2015.1. Continuei o
curso de Letras conciliando com o de Enfermagem. Minha bolsa de Iniciação Científica
na FECLESC foi renovada por mais um ano pelo mesmo professor doutor do curso de
Letras, que ainda seria meu orientador em um segundo projeto de sua autoria. Já em
fevereiro de 2016 fui aprovado no Programa de Monitoria Acadêmica da Unicatólica
(PROMAC), onde fui monitor de Anatomia Humana do curso de Enfermagem durante
todo o ano de 2016, recebendo auxílio da instituição de R$ 150,00 mensais.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 162 -
Todo o custeio do meu curso de Enfermagem é financiado pelo Fundo de
Financiamento Estudantil (FIES) tendo 100% da mensalidade pagos pela Caixa. Em
junho de 2016 a partir da nota do Enem consegui uma vaga no Programa Universidade
para Todos (ProUni) com 100% do custeio da mensalidade, apesar disso não pude aderir
à bolsa devido a uma denúncia apresentada à instituição, correspondente à minha
matrícula ativa numa universidade pública. Desta forma, permaneci com FIES e concluí
o curso de Letras.
Minha formatura no curso de Letras ocorreu em 2017 no mês de janeiro, com
enorme afinco e gratidão despeço-me da minha primeira casa, minha amada FECLESC,
onde tudo começou. Hoje sou formado em Letras-Português pela Universidade Estadual
do Ceará, sou integrante e precursor juntamente com mais três acadêmicas do Projeto
‘Parasitologia na Escola: Educação em Saúde’, sou membro do Centro Acadêmico de
Enfermagem da Unicatólica, aluno do Grupo de Estudos e Pesquisa sobre Sistematização
da Assistência de Enfermagem (GEPSAE) e bolsista principal de Iniciação Científica no
Projeto “Doenças crônicas não transmissíveis em Quixadá-CE: estratégias educativas
pautadas na sistematização da assistência de enfermagem” do curso de Enfermagem da
Unicatólica.
Não imaginava que uma pessoa nascida na pobreza assim como eu e com apenas
23 anos iria alcançar tamanho feito. A fé em Deus, o todo-poderoso, e em minha
madrinha, Nossa Senhora das Graças, foi e é essencial em minha caminhada. Por ter vindo
de uma família simples, minha pretensão é fazer muito pelos indivíduos neste contexto,
principalmente pelas pessoas carentes assim como eu. Acredito que para ser um bom
enfermeiro/professor devo enxergar o que está por trás do processo, não lidar apenas com
os procedimentos ou técnicas, mas ver que ali tem uma vida, que assim como a minha,
poder ter uma travessia bem mais difícil e uma verdade bem mais desoladora.
TRAJETÓRIA ACADÊMICA DE
UM ESTUDANTE DE
ENFERMAGEM: DESAFIOS E
CONQUISTAS
Thairo Fellipe Freitas Oliveira
Trajetória acadêmica de um estudante de enfermagem: desafios e conquistas
- 165 -
uito tempo se passou desde a minha escolha pela graduação em
Enfermagem. Nasci em uma cidade pequena no interior do Estado do
Maranhão chamada Zé Doca, não havendo oportunidades, em 2013 fui
morar com minha tia na Capital São Luís. Na busca de conseguir estudar em uma
faculdade, consegui entrar em uma instituição particular para cursar Enfermagem, fiquei
feliz por ter conseguido, pois foi o curso que sempre pensei em fazer, daí por diante tudo
estava estabilizado até que o esposo da minha tia começou a apresentar transtornos
mentais e agir de forma violenta. Não havendo mais condições de continuar o casamento,
se separaram, e então tive que trancar a faculdade e voltar para casa.
Meses depois, minha vó convidou-me a vir para o Ceará na busca de continuar
meus estudos, passei dias pesquisando uma nova oportunidade até conhecer a então
Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS. Logo que possível fui até a faculdade para
conhecê-la e ver a possibilidade de transferência. Em seguida, já estava tudo pronto,
aguardava apenas o início das aulas.
Assim que se iniciaram as aulas tive bastante dificuldade de adaptação, pois o
nível pedagógico e a carga horária da faculdade eram muito superiores aos das instituições
que antes estudava no Maranhão, exemplo disso foi a minha reposição em quase todas as
provas assim que comecei. Pensei então que não conseguiria por ser estudante de escola
pública e de um Estado que ocupa as piores posições no ensino do País, passando a me
dedicar mais às aulas e também a estudar em casa para conseguir um conceito satisfatório
nas disciplinas.
O tempo foi passando e percebi que a faculdade oferecia espaço para que o aluno
desenvolvesse atividades além da instituição, o que foi muito gratificante, pois encontrei
aqui o que outros locais não ofereciam, desde então procurei a coordenação de
Enfermagem e recebi total apoio para juntos desenvolvermos projetos e ações que
beneficiassem a instituição e a comunidade, formando assim um elo de extensão e
pesquisa.
Foi a partir desse auxílio que a faculdade ofereceu que começamos a trabalhar
com o projeto Novos Horizontes, que é uma comunidade filantrópica de acolhimento que
atende jovens e adultos provenientes do abuso de álcool e outras drogas na cidade de
Quixadá-CE. O espaço oferecido pela comunidade e o apoio da Unicatólica foram
fundamentais para aplicarmos na prática o que aprendemos em sala de aula, passando a
ser uma atividade de extensão e um campo de aprendizagem para acadêmicos.
M
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 166 -
Durante o segundo semestre de 2016 realizamos várias atividades educativas com
roda de conversas aos moradores dos Novos Horizontes, projeto que demonstrou grande
eficácia, pois todos os integrantes participaram de forma ativa debatendo e esclarecendo
suas dúvidas. Posteriormente fizemos o que ficou conhecido como “manhã saudável”, na
qual foi feita a avaliação de saúde dos moradores, através de medições como índice de
glicemia, peso, altura, pressão arterial, testes rápidos e vários outros, logo em seguida foi
realizado um lanche natural com frutas e sucos, além de recomendações de educação em
saúde.
Sem dúvidas o fato mais importante e desafiador encontrado durante a avaliação
dos acolhidos foi que a sua necessidade assistencial não se limitava apenas a questões
físicas, estava além do que podíamos mensurar com qualquer material. Grandes histórias
de vida vivenciadas por pessoas em sua maioria jovens, que possuem famílias — filhos,
esposas — desestruturadas pelo uso de drogas, pessoas que antes trabalhavam e tinham
um bom relacionamento familiar, agora à mercê de substâncias químicas capazes de
destruir sonhos e vidas.
Assim, o curso de Enfermagem buscou individualmente prestar os cuidados
básicos a todos os moradores referentes à higiene corporal, alimentação, ingesta hídrica
e atividades físicas e, principalmente, ensiná-los a cuidarem de si mesmos. O que no início
se mostrou um grande desafio, no decorrer das atividades conseguimos realizar o nosso
objetivo e proporcionar às pessoas que precisam assistência à saúde de forma integral e
igualitária.
Não poderia deixar de citar aqui, os grandes que contribuíram e continuam a
contribuir de forma direta ou indireta para minha formação acadêmica, primeiramente a
Deus em quem tenho posto minha fé, e quem tem me sustentado de forma equilibrada em
seguir para os meus objetivos em meio a vários empecilhos, como saudades da família,
dos amigos e da cidade natal, dificuldades financeiras, moradia...
Minha mãe Francisca Vilanir, que sempre acreditou no meu potencial e estimulou-
me a seguir em frente durante toda a minha trajetória, minha avó Maria da Conceição,
que é quem mora comigo desde a minha chegada ao Ceará e minha entrada na
Unicatólica, a todos os meus familiares; meus grandes mestres da Enfermagem profa.
Eudênia Oliveira, prof. Paulo Jorge, profa. Samia Jardelle e Regina Kelly, a quem devo
minha gratidão pelos ensinamentos, e quem servem de “espelho” profissional e humano
do que é ser enfermeiro. Sinto-me feliz e realizado por saber que a cada dia que passa
Trajetória acadêmica de um estudante de enfermagem: desafios e conquistas
- 167 -
mais perto fica de tornar-me enfermeiro e voltar para minha terra para cuidar do meu
povo carente.
UM JOVEM FILÓSOFO
Luciano Oliveira Paulo Filho
Um jovem filósofo
- 171 -
ou Luciano, tenho 20 anos, sou natural de Fortaleza e hoje moro em Quixadá,
atualmente sou estudante, estou cursando Filosofia (Bacharelado) pelo Centro
Universitário Católica de Quixadá – Unicatólica e também trabalho num projeto
do governo como cuidador em uma escola municipal de Quixadá. Minha história de vida
é marcada por dois grandes momentos, o primeiro, quando morava em Fortaleza. Fui
criado em um bairro pobre da Capital chamado Álvaro Weyne, e consequentemente,
minha família também o era.
Quando criança estudei em escolas públicas, minha educação básica foi
prejudicada pela precariedade ali presente, porém, mesmo inserido nestas condições
contrárias — pobreza, falta de estrutura física e até familiar — consegui avançar na minha
educação primária, embora tenha me causado atraso intelectual.
Todavia, no ensino fundamental algo me atraiu muito, a alegria da minha
professora de história era contagiante e ela tinha um domínio do conteúdo diferente dos
outros professores, era notável a alegria dela com a docência. Hoje me espelho nela,
também quero ser professor e contagiar meus futuros alunos assim como um dia fui
contagiado.
Esse primeiro momento da minha vida é marcado por situações humanamente
adversas, pois aos 9 anos de idade acontece a morte do meu pai, que de uma forma direta
mexeu absurdamente comigo e minha família. Com tudo isso, minha guerreira mãe dona
Marinete decide se mudar para Quixadá, terra de minha avó dona Rosália, e daí em diante
ocorre uma revolução interna na minha cabeça e uma descrença com a vida.
O segundo momento importante da minha vida, foi quando eu e minha família
fomos morar em Quixadá, cidade nova, povo novo, mas o mesmo desejo de lecionar
continuava. Mesmo morando em Quixadá, as condições não eram adequadas para uma
educação digna, primeiro porque não me interessava pelos estudos, na verdade, era
considerado na sala de aula um “aluno sem futuro” e até eu mesmo me classificava assim.
Contudo, o tempo foi passando e eu fui crescendo e vendo que poderia ser
diferente. Quando estava cursando o ensino médio, me encantei pela filosofia, ela passou
a ser não apenas uma disciplina como as outras, mas um estilo de vida, não faltava uma
aula de filosofia, fazia questão de sentar na primeira fila, para não perder nenhuma
informação. Dois amores cresciam na minha vida: aquele sonho de criança de lecionar,
ser professor, e a filosofia, que cada vez mais ocupa um lugar de destaque em minha vida.
Com o término do ensino médio, surgiu em minha casa, principalmente por parte
da minha mãe, dona Marinete, aquela famosa pergunta: O que você vai fazer da vida? No
S
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 172 -
meu coração já tinha a absoluta certeza do que queria para o futuro: ser professor de
filosofia, unir uma vontade de criança a um amor presente. Porém, antes de fazer o
vestibular para Filosofia, que era a minha vontade, influenciado diretamente pela minha
mãe, fui fazer vestibular para História, fui aprovado e comecei a estudar. Ser historiador
não me seduzia, até gostei das disciplinas e tudo, mas faltava algo, ainda cursei um
semestre de História e resolvi trancar o curso.
Contudo, a filosofia era o meu real objetivo, já não podia esperar mais, tinha que
fazer o vestibular para Filosofia. Foi quando abriram as inscrições do vestibular 2016.1
da Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS, hoje Unicatólica, estudei bastante e fui
aprovado no curso que eu tanto sonhava. Os primeiros dias de aula foram estranhos,
colegas de sala que eu não conhecia, mas com o passar do tempo, fomos criando laços de
amizades. Cada aula era uma experiência nova, fiquei surpreso de como a filosofia
dialoga com outras áreas: Direito, Psicologia, Sociologia, História, dentre outras.
Em nenhum momento pensei em desistir do curso, porque me sentia e me sinto
satisfeito com a filosofia, os professores incríveis, a própria instituição de alta qualidade
e que ajuda na minha fé, pois participo dos eventos da pastoral universitária, das
formações e, principalmente, das missas que diariamente frequento. Portanto, a
Unicatólica é o lugar que além de ter o curso que sempre quis, o curso de Filosofia, tem
uma ótima estrutura física e cristã, a qualidade dos professores é notável, me proporciona
a vivência do evangelho.
Hoje, estou no terceiro semestre, muito feliz e satisfeito, espero me formar e assim
que terminar a graduação pretendo fazer uma pós-graduação ou ingressar no mestrado em
Filosofia, para que um dia eu possa ser professor de filosofia. Meu grande sonho é
trabalhar na Unicatólica, para contagiar as pessoas com o brilho desse campo de saber.
Antes eu não tinha perspectiva de futuro ou trabalho, qualquer coisa estava de bom
agrado, por muito tempo fui alguém sem sonhos, porque pensava pequeno e achava
confortável viver assim. Hoje, sou diferente, penso grande, sei os caminhos que devo
seguir, sou um jovem filósofo autêntico cheio de sonhos e tudo isso ocorreu com a
filosofia em minha vida e de uma forma direta é a Unicatólica que me proporciona alçar
gigantescos voos.
UM NATAL DIFERENTE
Rosa Maria dos Santos Carvalho
Um Natal diferente
- 175 -
hegou, enfim, mais um dezembro, data que nos convida a pensar em como foi
o ano que passou. Com base nesta ideia, somos induzidos por um sentimento
reflexivo sobre como aproveitamos essas 365 oportunidades que nos foram
concedidas. Todo ano as minhas reflexões eram meio que repetitivas, se limitavam a
analisar como tinha sido como estudante, e quais seriam os possíveis métodos de
aperfeiçoamento para melhorar minha performance.
Logo, no último ano ao me colocar diante deste propósito, fiz uma viagem interior
mais longa, indo a lugares um pouco mais longes, sendo que estes não ficavam somente
no contexto do ciclo temporal que chegava ao fim, era uma reflexão sobre os passos dados
em toda uma vida. Estava de férias, algumas coisas se repetiam como sempre, arrumar a
mala com destino a casa da vó, na cabeça já havia todo o roteiro das atividades as quais
eu poderia desenvolver naquele ambiente.
Uma lista mental elaborada sobre quais filmes, livros e séries iam ocupar meu
tempo. Porém, ao pensar sobre como tinha sido o meu 2016, percebia que estava diante
de um universo bem maior, onde havia os planos de aperfeiçoamento, como também uma
autocobrança para não repetir os mesmos equívocos, só que agora estava diante de um
contexto diferenciado. Fazia poucos dias que havia acabado de concluir o primeiro
semestre da minha tão sonhada Psicologia. Confesso que era a primeira vez que parava
para pensar sobre esse assunto. Mentalmente, pensei: “YES, eu consegui, eu cheguei onde
eu sempre quis, eu não parei no meio do caminho, finalmente, sou uma universitária!”
Demorou para que tomasse posse desse pensamento e da veracidade do mesmo,
e, finalmente quando me convenci de tal certeza, me aprofundei ainda mais ao refletir não
somente o fato de ter chegado onde sempre desejei, mas também, me pus a indagar sobre
o longo caminho que percorri para chegar até aqui. Não podia esquecer o fato de que o
tempo nunca foi muito meu amigo, por questão de minutos, a minha vida foi
completamente “modificada”, eu não soube esperar o suficiente, a minha pressa
ocasionou um problema no parto aos 06 meses de gravidez. Veio então o diagnóstico:
paralisia cerebral neonatal — esta perduraria a vida inteira.
A falta de um atendimento rápido e eficaz realizado em plena Capital onde todos
julgavam que teriam um maior suporte a oferecer, me marcaria para sempre, os
comprometimentos da lesão foram relativamente sérios, principalmente nos primeiros
anos. Mas, apesar de toda aparente fragilidade, foi feita uma ressalva no terceiro ano de
vida, sendo que tal afirmação médica viria a ser decisiva para o meu desenvolvimento.
C
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 176 -
Foi atestado que as lesões motoras eram praticamente irreversíveis, porém as
minhas funções cognitivas foram preservadas, com isso ficou estabelecido: Ela pode
estudar. Tudo isso se passou longe de casa e já estava na hora de deixarmos a Capital e
voltar para a nossa serra cearense.
Retornavam para casa aquelas que até hoje são inseparáveis: uma mãe com uma
filha e suas diferenças. No entanto, algo mais foi depositado na bagagem daquela criança,
que era uma indicação médica para que a menina estudasse, e, para quem olhava para
aparência dela, pouco falante e nem o pescoço segurava, não era difícil duvidar da sua
capacidade intelectual. Porém, o importante é que a pessoa mais importante não duvidou.
Chegava janeiro, eu tinha quase três anos quando minha mãe me matriculou em uma
escola regular.
Mais uma vez vieram as ressalvas, a menina iria precisar da companhia materna
durante a aula, já houve quem achou que isso não daria em nada, mas graças a Deus minha
mãe não desistiu e logo vieram os pequenos avanços, os quais se tornaram constantes,
passaram a ser comemorados. Minha fala desenvolvia, com pouco tempo depois já
conseguia ficar sozinha na escola.
Aprendi a ler no tempo certo junto com a turma, na formatura do ABC fui uma
das oradoras, a escrita nunca foi lá essas coisas, mas prestava muita atenção, afinal, não
aceitava uma nota senão um 10, competia no grupo de amigos para ver quem tirava nota
maior. A turma cresceu junta, um ou outro saiu ou entrou, e a gente continuava a criar
disputas para ver as melhores notas, devo muito aos meus amigos que faziam trabalho
comigo e me auxiliavam em tudo, de maneira muito natural. A escola era o meu paraíso,
amava estar lá, queria ir até fim de semana.
Quando fui para o fundamental II a dinâmica de cara me assustou um pouco,
muitos professores, mais conteúdo. Naquela época, embora não tivesse medo eu ficava
insegura, já que carregava o título de uma das melhores da turma. Logo, já estava
habituada a esse novo desafio, docentes e todo núcleo escolar sempre fizeram de tudo
para que fosse capaz de evolução, desde adaptações físicas para que pudesse ter acesso a
todos os espaços da escola até mesmo atenção para as avaliações de maneira justa e
adequada.
Eu não posso deixar de citar o episódio onde a escola resolveu estimular a leitura
dos alunos. Eu, como não podia ir pela manhã fazer o resumo, dobrava o número de livros
e, no outro dia, no recreio, oralmente fazia os resumos. Ganhei como o melhor resumo e
fiquei entre os primeiros que leram mais livros, eu sempre gostei de fazer um pouco mais
Um Natal diferente
- 177 -
do que o imposto. E se aproximava a tão sonhada festa de formatura, estava muito feliz,
a felicidade não cabia dentro de mim, porém, quando realmente vi que sairia dali, então
veio o choque de realidade, eu estava saindo da minha segunda casa, eu ia mudar de
escola, os amigos também, como eu viveria longe dos pátios das Duas Irmãs, sem meus
amigos, sem os professores, sem as gincanas?
Eu sentia uma mistura de medo e saudade. Mas logo comecei a perceber que eu
tinha a missão de honrar o empenho da minha mãe, dos meus professores, dos meus
amigos e até mesmo do meu fiel moto táxi que me levava para escola. Isso me fez perceber
que era necessário alçar voo em busca de novas conquistas.
Comecei a pensar para onde iria, uma escola regular de meio período, ou a nova
escola profissionalizante que acabara de abrir na cidade. A faculdade era um sonho,
porém eu mesma achava um pouco distante da minha realidade. Afinal, eu queria estar
inserida dentro do seu espaço físico, e talvez Quixadá não daria certo, portanto concluí
que deveria ir para a escola técnica já que de lá sairia pelo menos com um curso.
Não que tivesse ou tenha alguma rejeição ao ensino a distância, mas eu sonhava
em viver a experiência dentro de um campus, e até o presente momento via isto como
algo impossível. A escola profissionalizante era bem maior, na turma houve dificuldade
no começo, porém eu sempre achava um jeito de resolver, eu não quis de jeito nenhum
sair de lá.
O curso não tinha muito a ver comigo, mas como era de minha vontade
permanecer, me formei, sou técnica em agronegócio. Lá, minha visão se estendia, e agora
conseguia almejar de maneira mais real a minha graduação. O tempo foi tendo o seu
curso, a segunda formatura ocorreu e até adentrar às dependências da Unicatólica pela
primeira vez foi necessário aguardar um ano e meio. Nesse período me fiz inúmeros
questionamentos, já que perdi dois vestibulares por conta da dificuldade de transporte,
gerando inúmeros pensamentos de por que tanta demora.
Para passar o tempo, após ver uma reportagem e sem nada para fazer, decidi
prestar concurso para o INSS (Instituto Nacional de Seguro Social). Comecei sozinha, de
forma um tanto equivocada, comprando a primeira apostila na primeira banca que
encontrei. A minha vontade era “devorar” o conteúdo, mas aquele livro mais parecia uma
pedra, a sua extensão me cansava fácil. Foi aí que recebi a informação de um cursinho
em Quixadá, me matriculei, e passei a ir no ônibus da faculdade. O cursinho veio me dar
a certeza de que apesar de ser 120 km de casa até Quixadá, era cansativo, contudo dava
para encarar.
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 178 -
Quando o ônibus parava em frente a faculdade e todos desciam, ficava sonhando
como devia ser a faculdade por dentro. Minha reflexão natalina me trouxe a certeza de
que tudo valeu a pena, de que eu posso me aprimorar cada vez mais para ser uma boa
universitária, que é só o começo, tenho muitos desafios e medos para enfrentar, mas o
meu sonho é maior, e como diz Renato Russo: “Nunca deixem que lhe digam que não
vale a pena lutar pelo sonho que se tem”.
UMA VIDA DE SUPERAÇÃO
Maria Lucieuda Girão Mendes
Uma vida de superação
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eu nome é Maria Lucieuda Girão Mendes, tenho 40 anos, acadêmica em
Psicologia, atualmente estou no 6° semestre desse curso na Unicatólica.
Através da minha trajetória acadêmica quero descrever as minhas
dificuldades e superações no decorrer do curso.
O meu sonho era cursar faculdade de Enfermagem, mas devido ao pensamento de
que não era mais o meu tempo, fui me acomodando e deixando o tempo passar. Tinha
concluído o ensino médio no EJA (Educação de Jovens e Adultos), fazendo três anos em
um ano e meio, e isso me trouxe prejuízo, pois avancei várias etapas do meu estudo. Se
estivesse feito ano por ano seria mais proveitoso, teria um aproveitamento melhor e
desenvolvido de melhor forma a aprendizagem. Porém, passaram 14 anos para que
pudesse ingressar em uma instituição. Houve um grande incentivo do meu esposo, que
sempre me dizia que nunca era tarde, e que o nível superior faria muita diferença na minha
vida profissional e pessoal. Mas, mesmo com o apoio do meu esposo, me deparava com
certa fragilidade em conciliar família, casa, trabalho e vida pessoal, porém, diante das
minhas responsabilidades, sabia da necessidade de cuidar de mim.
Psicologicamente, me sentia muitas vezes sufocada, querendo dar conta de todos
os afazeres, mas sempre na busca de melhorar como mãe, esposa e no trabalho, onde
exercia o cargo de técnica de Enfermagem, telefonista e auxiliar em departamento
pessoal, lidando com pessoas que exigiam cautela em seu atendimento. Era necessário
saber ouvi-las e tomar cuidado para que elas pudessem exercer suas funções. Foi a partir
do escutar, da troca que fazíamos nas conversas, que muitos desafogavam seus
sofrimentos.
Diante dessas experiências, partindo na busca de uma auto compreensão, busquei
olhar para a minha história e de pessoas que passavam por mim, e descobri que a
enfermagem cuida do outro, mas a psicologia estava sempre em mim, pois a mesma busca
compreender a subjetividade da pessoa, lidando com o sofrimento psíquico, a busca de
compreender a si mesmo para depois compreender o outro, e a partir dessa descoberta
tomei a decisão de prestar vestibular para o curso de Psicologia.
Quando passei pela primeira etapa, ser aprovada para mim foi uma grande vitória.
Depois de seis meses, comecei o curso sem ter a noção de como ia me adaptar a essa nova
etapa da minha vida. Se antes eu achava difícil tomar a decisão de realizar esse sonho,
difícil foi dar segmento a cada dia, pois me deparei com um novo ritmo exigido na
faculdade, e devido a essas carências não tinha uma desenvoltura apropriada, pois era
preciso participar, e só assim eu iria expressar as minhas dificuldades. Quando me
deparava com os colegas expondo suas opiniões as quais eu não compreendia, isso era
M
Histórias de vida: trajetórias estudantis no Sertão Central
- 182 -
torturante, pois vinha um sentimento de incapacidade que, por muitas vezes, quis me fazer
desistir, principalmente quando chegaram as primeiras avaliações, em que minhas notas
não foram boas. Precisava me dedicar e estudar mais, mas não estava conseguindo
conciliar o tempo, pois saía do trabalho direto para a faculdade e, ao retornar, tinha as
tarefas do lar, era muito difícil, pensei que não conseguiria concluir o primeiro semestre.
A partir do terceiro semestre ouvi muito a professora Cândida falar sobre a
importância da terapia, foi aí que coloquei como esperança a solução desses problemas
no processo terapêutico. Hoje, posso dizer que foi realmente de extrema importância dar
início a esse procedimento, pois foi na terapia que consegui vencer os medos que me
impediam de seguir.
Olho para minha história, principalmente a infância, e vejo que do seio da família
veio minha formação como pessoa. O mais extraordinário que descobri na terapia foi que
o ambiente em que me encontrava quando criança não foi o fator determinante da minha
formação, tive autonomia, mesmo sem compreender, fiz minhas escolhas e assim pude
superar uma infância traumática que hoje posso relatar com um sorriso que expressa
vitória.
Pude compreender que por estar inserida em uma faculdade renomada, o sonho de
muitos, precisava dar o meu melhor, ser grata por essa conquista e usufruir da mesma,
meu foco precisava ser a faculdade e concluir o curso pretendido.
Toda essa trajetória não seria possível se nosso Senhor Jesus Cristo não estivesse
comigo, pois foi ele, em primeiro lugar, que me permitiu lutar e vencer, colocando
suportes ao meu alcance para que eu pudesse prosseguir, sendo essas bases compostas
por amigos, em especial Tamara e Jozirene, que por diversas vezes me ouviram, me deram
um pouco do seu tempo para chorar quando eu não suportava o sofrimento psíquico
devido às sobrecargas. A elas o meu agradecimento pela dedicação e companheirismo.
Através das dificuldades fui melhorando e vencendo os obstáculos, mas tendo
certeza que ainda tenho muito a aprender. A escolha do curso foi de suma importância,
pois a cada disciplina era um desafio que eu conseguia ver como primordial para a nossa
vida acadêmica, e aos poucos fui me alicerçando e fortificando-me quanto a minha
escolha.
Às vezes, me sentia diferente de muitos, ao ouvir os comentários das abordagens
que os demais se identificavam. E quanto a mim, não tinha uma preferência, pois gosto
de todas as linhas de estudo da Psicologia, com suas diferentes complexidades. Agora, no
sexto semestre e cursando a disciplina de psicopatologia, que é ministrada pela professora
Milena, a qual me norteou e proporcionou-me descobrir que não existe apenas um
Uma vida de superação
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segmento, decidi que serei psicóloga, e irei trabalhar com pessoas em suas diversas
particularidades, cada abordagem terá a sua importância, uma complementando a outra.
Diante de tantos desafios, tenho a certeza que fiz a escolha certa, pois ser psicóloga é
saber lidar com o outro a partir de si mesmo.
ORGANIZADORAS
ADRIANA DE ALBUQUERQUE PEREIRA
É mestra em Educação pela Florida Christian University – FCU. Possui graduação em Psicologia através do Centro Universitário
Católica de Quixadá – Unicatólica e graduação em Licenciatura
em História pela Universidade Estadual do Ceará – UECE.
Especialista nas áreas de Educação Global, Educação Especial e
em Psicopedagogia. É professora da Prefeitura Municipal de
Quixadá/CE e Psicopedagoga do Núcleo de Apoio
Psicopedagógico – NAP do Centro Universitário Católica de
Quixadá – Unicatólica.
CÂNDIDA MARIA FARIAS CÂMARA
Possui mestrado em Psicologia pela Universidade Federal do
Ceará – UFC com estudo na Linha de Pesquisa – Processos de
Mediação: trabalho, atividade e interação social. Graduou-se em
Psicologia pela UFC. É psicóloga comunitária e escolar e ex-
integrante do Núcleo de Psicologia Comunitária – NUCOM.
Atualmente integra o corpo docente da Unicatólica, coordena o
Núcleo de Apoio Psicopedagógico – NAP e o Grupo de Estudo,
pesquisa em Psicologia, Arte e Educação – GEPAE.
FRANCISCA ALDENISA PEIXOTO DA SILVA
É mestranda em Educação pela Florida Christian University –
FCU. Graduanda em Letras/Libras pela Universidade Federal de
Santa Catarina – UFSC e Letras/Português pela Universidade
Estadual do Vale do Acaraú – UVA. Especialista em Libras,
Educação Inclusiva, Educação Global, Inteligências Humanas e
Construção da Cidadania. É professora e intérprete de Libras no
Centro Universitário Católica de Quixadá – Unicatólica e tutora
presencial da Universidade Federal do Ceará – UFC.
MARLENE GOMES GUERREIRO
É mestra em Doutrina Social da Igreja pela Pontifícia
Universidade Lateranense, bacharel em teologia e psicologia
pela Faculdade Católica Rainha do Sertão – FCRS, sendo, ainda,
especialista em Psicopedagogia pela Faculdade INTA e em
Docência no Ensino Superior pela Faculdade Católica Rainha do
Sertão – FCRS. Tem experiência na área de Teologia, com ênfase
em Doutrina social da Igreja e em Psicologia.