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FUNDAMENTOS DO MANEJO E DA CONSERVAÇÃO DOS SOLOS NA REGIÃO PRODUTORA DE CACAU DA BAHIA (*) Arlicélio de Queiroz Paiva 1 & Quintino Reis de Araújo 1,2 1 UESC, km 16 Rodovia Ilhéus - Itabuna, Ilhéus, Bahia, Brasil. 45662-000 [email protected] 2 CEPLAC/CEPEC, C. P. 07, Itabuna, Bahia, Brasil. 45600-000. [email protected] INTRODUÇÃO A relação que existe entre solo e planta é de completa dependência um do outro. O solo serve para dar sustentação e funciona como um reservatório de água e dos nutrientes necessários para a vida das plantas. Por outro lado, as plantas promovem a cobertura do solo, protegendo-o e fornecendo matéria orgânica, importante para a formação e conservação do solo. O solo é composto por pequenos espaços vazios, chamados de poros. Os poros de tamanhos maiores são conhecidos como macroporos e os de menor tamanho de microporos. Eles desempenham funções específicas no solo, os microporos servem para armazenar água, enquanto que os macroporos são responsáveis pela sua drenagem, assim como pela entrada e saída de gases e a penetração das raízes. Assim sendo, é de extrema importância que as técnicas adotadas para o cultivo de plantas não promovam a diminuição da porosidade do solo. No entanto, sempre ocorrem mudanças, a mais comum é o aumento da quantidade de microporos e a diminuição de macroporos. Com isso, a velocidade de infiltração da água fica mais lenta e a água passa a acumular-se na superfície, provocando o escoamento conhecido como enxurrada. Esse escoamento superficial é um importante fator gerador de erosão. A erosão é o processo de desgaste acelerado do solo provocado pela utilização de técnicas inadequadas para o cultivo que, com o passar do tempo, ocasiona empobrecimento e perda da capacidade de fornecimento de nutrientes. Além disso, a erosão é responsável por importantes desajustes ambientais. Um deles é o transporte de terra para dentro dos rios que, muitas vezes, causa a sua morte. Outro impacto importante é a poluição dos mananciais. Isto compromete a qualidade da água para consumo humano e animal. CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA O solo é um recurso natural que deve ser utilizado como patrimônio da coletividade, independente do seu uso ou posse. É um dos componentes vitais do meio ambiente e constitui o substrato natural para o desenvolvimento das plantas e, conseqüentemente dos animais que delas se alimentam. A ciência da conservação do solo e da água preconiza um conjunto de medidas objetivando a manutenção ou recuperação das condições físicas, químicas e biológicas do solo, estabelecendo critérios para o uso e manejo das terras, de forma a não comprometer sua capacidade produtiva. Estas medidas visam proteger o solo, prevenindo-o dos efeitos danosos da erosão, aumentando a disponibilidade de água, de nutrientes e da atividade biológica e criando condições adequadas ao desenvolvimento das plantas. Do ponto de vista da conservação do solo, a ocorrência de chuvas fortes em uma determinada região é preocupante, pois essas chuvas têm um alto potencial para o desgaste dos solos. Na região cacaueira da Bahia é muito comum a ocorrência de chuvas intensas, portanto, é uma região onde pode ocorrer erosão, dependendo apenas do tipo de uso do solo. (*) Capítulo de livro publicado em Valle (2012), pp.115-134.

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FUNDAMENTOS DO MANEJO E DA CONSERVAÇÃO DOS SOLOS

NA REGIÃO PRODUTORA DE CACAU DA BAHIA (*)

Arlicélio de Queiroz Paiva1 & Quintino Reis de Araújo1,2

1UESC, km 16 Rodovia Ilhéus - Itabuna, Ilhéus, Bahia, Brasil. 45662-000 [email protected]

2CEPLAC/CEPEC, C. P. 07, Itabuna, Bahia, Brasil. 45600-000. [email protected]

INTRODUÇÃO

A relação que existe entre solo e planta é de completa dependência um do outro. O solo serve para dar

sustentação e funciona como um reservatório de água e dos nutrientes necessários para a vida das plantas.

Por outro lado, as plantas promovem a cobertura do solo, protegendo-o e fornecendo matéria orgânica,

importante para a formação e conservação do solo.

O solo é composto por pequenos espaços vazios, chamados de poros. Os poros de tamanhos maiores são

conhecidos como macroporos e os de menor tamanho de microporos. Eles desempenham funções

específicas no solo, os microporos servem para armazenar água, enquanto que os macroporos são

responsáveis pela sua drenagem, assim como pela entrada e saída de gases e a penetração das raízes.

Assim sendo, é de extrema importância que as técnicas adotadas para o cultivo de plantas não promovam

a diminuição da porosidade do solo.

No entanto, sempre ocorrem mudanças, a mais comum é o aumento da quantidade de microporos e a

diminuição de macroporos. Com isso, a velocidade de infiltração da água fica mais lenta e a água passa a

acumular-se na superfície, provocando o escoamento conhecido como enxurrada. Esse escoamento

superficial é um importante fator gerador de erosão.

A erosão é o processo de desgaste acelerado do solo provocado pela utilização de técnicas inadequadas

para o cultivo que, com o passar do tempo, ocasiona empobrecimento e perda da capacidade de

fornecimento de nutrientes. Além disso, a erosão é responsável por importantes desajustes ambientais.

Um deles é o transporte de terra para dentro dos rios que, muitas vezes, causa a sua morte. Outro impacto

importante é a poluição dos mananciais. Isto compromete a qualidade da água para consumo humano e

animal.

CONSERVAÇÃO DO SOLO E DA ÁGUA

O solo é um recurso natural que deve ser utilizado como patrimônio da coletividade, independente do seu

uso ou posse. É um dos componentes vitais do meio ambiente e constitui o substrato natural para o

desenvolvimento das plantas e, conseqüentemente dos animais que delas se alimentam.

A ciência da conservação do solo e da água preconiza um conjunto de medidas objetivando a manutenção

ou recuperação das condições físicas, químicas e biológicas do solo, estabelecendo critérios para o uso e

manejo das terras, de forma a não comprometer sua capacidade produtiva. Estas medidas visam proteger

o solo, prevenindo-o dos efeitos danosos da erosão, aumentando a disponibilidade de água, de nutrientes e

da atividade biológica e criando condições adequadas ao desenvolvimento das plantas.

Do ponto de vista da conservação do solo, a ocorrência de chuvas fortes em uma determinada região é

preocupante, pois essas chuvas têm um alto potencial para o desgaste dos solos. Na região cacaueira da

Bahia é muito comum a ocorrência de chuvas intensas, portanto, é uma região onde pode ocorrer erosão,

dependendo apenas do tipo de uso do solo.

(*) Capítulo de livro publicado em Valle (2012), pp.115-134.

O impacto das gotas de chuvas fortes sobre a superfície de um solo, sem cobertura vegetal (Fig. 1),

provoca a separação das partículas de argila, silte e areia. As partículas individualizadas que são

transportadas pela água para dentro do solo, estacionam no interior dos macroporos e provocam

entupimento. Como os macroporos são responsáveis pela infiltração da água, começa a ocorrer acúmulo

na superfície, resultando em enxurrada e conseqüentemente erosão. Portanto, as aparentemente

inofensivas gotas de chuva são as principais responsáveis pelo desgaste dos solos sem cobertura vegetal.

Figura 1. Choque da gota de chuva contra o solo provocando desprendimento de partículas.

Diante disso, o agricultor deve se empenhar ao máximo para manter a cobertura vegetal, uma vez que ela

amortece o choque das gotas de chuva contra a superfície do solo, diminuindo os riscos de ocorrência de

erosão. Essa cobertura pode ser feita por intermédio da preservação das florestas, pelas culturas agrícolas,

pelas plantas de cobertura e/ou pela adição de restos de plantações.

Outro componente importante na ocorrência de erosão é a topografia do terreno. Em locais muito

declivosos, a possibilidade de ocorrência da erosão é muito maior do que em locais mais planos. Na

região cacaueira da Bahia existem extensas áreas declivosas, as quais são susceptíveis à erosão. O declive

acentuado favorece uma maior velocidade das águas de escoamento e conseqüente aumento da

capacidade de transporte de terras para as partes mais baixas do relevo.

Nesse contexto, pode-se afirmar que, por apresentar a maior parte das terras ocupadas por sistemas

agrossilviculturais, nos quais o cacau é a cultura de interesse econômico principal, a região cacaueira da

Bahia possui uma excelente estratégia para evitar a erosão, uma vez que as plantas que compõem o agro-

ecossistema funcionam como amortecedores do choque das gotas de chuva sobre o solo. No entanto, isso

não significa que o cacauicultor pode ficar despreocupado com a erosão. Em visitas freqüentes feitas a

diversas fazendas de cacau da região, especialistas que trabalham com manejo e conservação do solo têm

observado a ocorrência de erosão laminar em áreas declivosas. Nessas áreas, a cobertura do solo,

proporcionada pelo cacau, juntamente com outras plantas que compõem os sistemas agroflorestais, não é

suficiente para evitar a erosão. Desse modo, o cacauicultor deverá introduzir alguma prática de

conservação para aumentar a resistência do solo contra a erosão, evitando assim o seu empobrecimento.

Portanto, é necessário conhecer e adotar técnicas conservacionistas que são eficientes para o controle da

erosão.

Nos últimos tempos, a região sul da Bahia passou por uma mudança muito importante no uso de seus

solos, em decorrência da crise estabelecida na lavoura cacaueira ocasionada, principalmente, pela doença

vassoura-de-bruxa do cacaueiro. A alteração mais significativa foi a substituição do cacau cabruca por

áreas de pastagem, de fruteiras e de café entre outros. Essas modificações no uso da terra têm gerado

preocupações com relação à conservação do solo, pois, até então, os agricultores não viam necessidade de

adotar técnicas conservacionistas, uma vez que a proteção do solo promovida pelo sistema cabruca era

mais eficiente do que os outros tipos de usos que surgiram.

As pastagens bem manejadas, nas quais se utilizam sistemas de rotação de pastos, associações com

leguminosas calagem e adubação contribuem para a conservação dos solos, pois promovem a sua

cobertura e fornecem matéria orgânica. No entanto, em boa parte das terras ocupadas por pastagens na

região cacaueira, o que se observa é o pastoreio excessivo, no qual, os animais cortam o capim rente à

superfície do solo, causando uma completa degradação dos pastos e deixando o solo exposto à erosão.

Para piorar a situação, a técnica mais utilizada no manejo de pastagens degradadas é o uso indiscriminado

do fogo.

Com a diversificação dos cultivos ocorrida na região, houve um aumento das áreas ocupadas por fruteiras

e café. Como essas plantações promovem naturalmente uma menor cobertura do solo quando comparadas

com o sistema cabruca, existem probabilidades altas do aumento das perdas de solo por erosão (Fig. 2).

Entretanto, essas perdas podem ser minimizadas com a adoção de técnicas eficientes para o seu controle.

Figura 2. Erosão em área com café no sul da Bahia, plantada no sentido morro abaixo. (Foto: José

Olímpio de Souza Jr, 2000).

PRÁTICAS AGRÍCOLAS E QUALIDADE DO SOLO

A manutenção, e até a recuperação da qualidade do solo, está diretamente relacionada com os sistemas de

cultivos e os tipos de manejos que são adotados. Cultivos e manejos que evitam a erosão, favorecem a

cobertura vegetal e aumentam o teor de matéria orgânica do solo são considerados como

conservacionistas, pois melhoram as características físicas, químicas e biológicas do solo. Em outras

palavras, melhoram a qualidade do solo, criando boas condições para o crescimento e o desenvolvimento

das plantas. Por outro lado, cultivos e manejos que favorecem a erosão, reduzem a cobertura vegetal e o

teor de matéria orgânica, comprometem a qualidade do solo e, com isso, tornam o ambiente desfavorável

para o plantio. Alguns exemplos são dados a seguir.

Desmatamento e degradação do solo

No período entre o desmatamento e a degradação do solo, existem conseqüências, fenômenos e processos

desencadeados sobre os agentes ambientais, além da própria flora, que são inúmeros e complexos. Assim,

nesta trajetória de repercussões ecológicas, o desmatamento e as práticas associadas afetam direta ou

indiretamente a fauna, o ar, a água, o solo e o homem. Portanto, um enfoque mais eclético deve incluir, a

partir deste ponto de vista, os efeitos do desmatamento sobre todos estes componentes e não apenas sobre

o solo.

Inicialmente uma reflexão deve ser feita acerca do próprio conceito de degradação ambiental e

degradação do solo. É necessário saber quais são os indicadores que sinalizam e podem ser consideradas

como efetivas alterações nas propriedades de agente ambiental e que trazem prejuízos às suas

potencialidades. Quanto ao solo, necessariamente a análise mais ponderada deve adotar um conceito mais

completo e atual em relação a sua fertilidade, que se traduz por condições edáficas apropriadas para

satisfazer as potencialidades ambientais e produtivas frente às necessidades humanas, contemplando

adequados atributos físicos, biológicos e químicos do solo, de forma indissociável.

O ato do desmatamento se constitui, em si mesmo, um processo de grandes alterações para o solo e para o

ambiente, modificando as relações entre inúmeras espécies correlacionadas, que conviviam em equilíbrio

e com base em reciclagens naturais. O desmatamento desordenado ocorrido na região sul da Bahia para

implantação da lavoura cacaueira, onde existem apenas 5% de remanescentes da Mata Atlântica original,

provocou uma série de agressões ambientais. A começar pela perda irreversível da biodiversidade.

Diversas espécies vegetais, como também, aves, insetos, microrganismos e outros animais, deixaram de

existir sem se saber ao certo do valor da sua existência. Outra importante agressão ao meio ambiente foi a

diminuição da quantidade e da qualidade da água (Fig. 3). Muitos cursos de água secaram ou

simplesmente deixaram de existir, outros foram poluídos, não podendo mais ser usufruídos pelas

populações.

Ademais, o desmatamento deixa o solo descoberto e, com isso, mais susceptível à erosão que, além de

empobrecer o solo contribui para a poluição dos cursos d´água. Desse modo, percebe-se que os prejuízos

oriundos do desmatamento são muito mais do que a degradação do solo, que por si só já causaria reflexos

indesejáveis na qualidade de vida das pessoas que dele dependem.

Os efeitos negativos do desmatamento e práticas posteriores sobre o solo, podem ser indicados a partir de

diversos fenômenos que, ao mesmo tempo em que representam prejuízos efetivos para o sistema edáfico,

repercutem nos demais membros do ambiente. Assim o solo pode apresentar: erosão, compactação,

lixiviação, perda microbiana, diminuição da infiltração e armazenamento de água, degradação da matéria

orgânica e poluição, dentre outras.

Apesar da legislação relacionada ao desmatamento, são insignificantes as ações e a consciência, prática e

generalizada, em torno de um manejo sustentável das florestas e/ou de áreas que deveriam ser reservas. A

exploração é desordenada e inconseqüente, afetando seriamente a biodiversidade dos ecossistemas e

revelando o imediatismo e a visão fragmentária dos “homens” que como seres pensantes da natureza,

ainda desconhecem as aplicações e potencialidades dos componentes vivos e recursos naturais que eles

estão degradando. Isto, apesar de estudos e proposições de profissionais e cidadãos ligados à ecologia que

ressaltam, de forma significativa e coerente, a posição do homem como centro e principal componente do

meio ambiente.

Figura 3. Encontro de dois cursos de água em Itajú do Colônia: um de águas com coloração clara, vindo

de microbacia sob mata e cacau, e outro com coloração barrenta, oriundo da erosão de áreas sob

pastagem mal manejadas. (Foto: Quintino Araujo, 2002).

Por obrigação legal, no mínimo 20% da cobertura vegetal, representativa de cada propriedade rural, deve

ser preservada. A devastação ocorrida na região cacaueira, além de desrespeitar essa exigência legal,

avançou também sobre outras áreas que deveriam permanecer sob florestas, como os topos dos morros, os

entornos das nascentes, as margens dos cursos d´água e as áreas com inclinação superior a 100% de

declividade (45º).

Embora o cultivo do cacau em cabruca, adotado em boa parte da região cacaueira da Bahia seja de menor

impacto ambiental em relação a outros tipos de sistemas de cultivo, é extremamente necessário se

preocupar com uma maior proteção ambiental. Para isso, além da recomposição das áreas de proteção

permanente, outra possível forma de reverter ou minimizar essas agressões seria a adoção de Reserva

Particular do Patrimônio Natural (RPPN), na qual o proprietário destina uma parte do seu imóvel para

reserva florestal.

Pero Vaz de Caminha, em 1º de maio de 1500 afirmou que “... águas são muitas infinda. E em tal maneira

graciosa que, querendo a aproveitar, dar-se á nela tudo por bem das águas que tem”. A vazão dos cursos

de água, sua profundidade, o fornecimento d'água das suas nascentes, tem diminuído muito nas últimas

décadas. Além das influências das vegetações sobre aspectos climáticos, localizados ou não, a litosfera

representa um “reservatório” de água para nossos recursos hídricos. Questiona-se, no entanto, se o manejo

adotado nas áreas desmatadas tem aumentado ou diminuído a capacidade de armazenamento d'água nos

solos.

A queimada e o solo

Existe uma ilusão de que a terra fica mais fértil depois de queimada. O que ocorre na realidade é que os

nutrientes que seriam adicionados ao solo pouco a pouco, pela decomposição da matéria orgânica, passam

a ficar disponíveis de uma só vez nas cinzas. Com isso, esses nutrientes são carregados pelas chuvas e o

resultado é um solo muito mais pobre do que antes de ser queimado. Além disso, existem diversas

recomendações que devem ser seguidas, com o objetivo de se fazer uma queimada controlada. Para isso,

os agricultores devem procurar informações nos órgãos especializados.

A natureza demonstra que os ambientes, nos quais a queimada ocorre como um fenômeno natural

(provocado por descarga elétrica, por fricção entre corpos), apresentam-se, de modo geral, com solos

empobrecidos, com conseqüentes deficiências nutricionais, pH inadequado, altos teores de elementos

tóxicos. Dentre as conseqüências negativas advindas da queimada estão: a destruição dos organismos do

solo, a queima da matéria orgânica com liberação de CO2 para a atmosfera, volatilização de alguns

nutrientes, principalmente nitrogênio, diminuição da infiltração e retenção de água, aumento da

susceptibilidade do solo à erosão, redução da capacidade produtiva dos terrenos e desequilíbrios no meio

ambiente. Os efeitos do fogo têm sido mais desastrosos, quando decorrentes de queimadas mal

conduzidas e aplicadas continuamente. Tem-se verificado que em áreas prejudicadas pelo fogo, como

parte de um manejo deficiente, as culturas produzem menos e os pastos diminuem sua capacidade de

suporte. Os prejuízos ambientais decorrentes do fogo têm sido mais intensos, destacadamente, em áreas

de relevo acidentado e muito inclinado.

Tratos culturais

Muitas vezes as condições naturais do solo não permitem que ele expresse o seu potencial produtivo.

Nesse caso, torna-se necessário a adoção de técnicas para corrigir as adversidades que comprometem as

condições necessárias ao bom desenvolvimento das plantas. Algumas dessas técnicas serão destacadas a

seguir, sobretudo aquelas mais utilizadas na região cacaueira da Bahia.

Calagem e adubação. Tanto o calcário quanto os adubos devem ser adicionados ao solo na medida certa.

Para isso, é indispensável a análise do solo em laboratório antes da aplicação desses corretivos. Sem a

análise do solo, o agricultor corre dois riscos: o primeiro é adicionar menos do que o solo ou as plantas

necessita. Nesse caso, a produtividade deverá ser menor do que a esperada.

O segundo risco é adicionar a mais. Nessa situação, o agricultor gasta dinheiro desnecessariamente e não

terá aumento compensatório de produtividade. Ao contrário, os adubos em excesso podem diminuir a

produtividade ou, em casos mais extremos, matar as plantas. Além disso, o excesso carregado pelas águas

das chuvas pode provocar a contaminação dos cursos d'água.

Capina. Antes de se adotar essa técnica, o agricultor deve analisar o tipo de vegetação espontânea

existente na área. Essa análise é necessária para decidir se o material capinado deve ser deixado como

coberta ou se deve ser retirado da área. A depender do manejo adotado na capina, ela pode melhorar ou

afetar a qualidade do solo. Quando o agricultor deixa a vegetação capinada sobre o solo, esse material

promoverá a sua cobertura, evitando a erosão e adicionado matéria orgânica. Caso contrário, o solo fica

exposto às intempéries e pode sofrer erosão.

Defensivos agrícolas. O desequilíbrio ambiental contribui para o agravamento do ataque de pragas e a

disseminação de plantas invasoras indesejadas nas lavouras. Com isso, vários agricultores seguem a via

dos defensivos agrícolas para o seu controle. Contudo, o manuseio inadequado desses produtos pode

causar danos à saúde humana e animal, como também, problemas ambientais.

O uso irracional desses produtos, quando aplicados nas plantas ou no solo, pode ocasionar o seu acúmulo

afetando as propriedades físico-químicas do solo. Também, estes produtos podem ser transportados pela

chuva para cursos d'água contaminando animais aquáticos que, ao serem consumidos pelo homem afetam

sua saúde. A infiltração de agrotóxicos no perfil do solo é um sério fator de contaminação deste e do

lençol freático e, conseqüentemente, de plantas e de cursos d´água.

CAUSAS E TIPOS DE EROSÃO

A erosão é o desgaste acelerado do solo que ocorre em função do manejo inadequado. As principais

causas da erosão são a falta de cobertura vegetal, a utilização abusiva de máquinas agrícolas, o pisoteio

constante de animais e o pastoreio excessivo com o corte do capim rente à superfície do solo. Essas

práticas promovem a individualização de partículas do solo que entopem os poros, causando efeitos

indesejáveis. Dentre eles se destacam a diminuição da velocidade da infiltração da água que passa a

escoar superficialmente (enxurrada) e causa erosão, redução do armazenamento e disponibilidade de

água, impedimento das trocas gasosas e dificuldade de penetração das raízes no solo.

A cobertura vegetal do solo seja ela feita por floresta, culturas agrícolas, restos de cultivos ou plantas

cultivadas especialmente para esse fim, servem como proteção contra os impactos das gotas de chuva que

são responsáveis pela desagregação e transporte de partículas em solo descoberto (Fig. 4). Além disso, as

plantas fornecem matéria orgânica ao solo, com melhoria das suas propriedades físicas e químicas.

Existem diversos tipos de erosão. No entanto, serão apresentados a seguir os mais importantes do ponto

de vista agrícola.

Erosão por salpicamento é provocada pelo choque das gotas de chuva contra a superfície do solo

descoberto. Com o choque, as partículas do solo ficam separadas umas das outras e entopem os poros,

com isso, a água passa a formar enxurrada que provoca a erosão. Nas áreas mais declivosas ocorre uma

maior quantidade de terra transportada.

Erosão laminar é o mais importante e perigoso tipo de erosão existente. Na maioria das vezes, o

agricultor não percebe a sua ocorrência e, quando ela é notada, os estragos já foram feitos. Esse tipo de

erosão se caracteriza por retirar finas camadas ou lâminas de solo, daí o nome laminar. O agricultor deve

ficar atento ao surgimento de certos sinais de ocorrência dessa erosão, como o aparecimento de raízes e

pedras na superfície de solos cultivados com culturas permanentes, como cacau, café e certas fruteiras.

Figura 4. Exemplo de erosão diferencial em área localizada na margem da rodovia Ilhéus - Uruçuca

(Foto: Quintino Araujo, 2002).

Erosão em sulco é o tipo de erosão que mais chama atenção do homem. Porém, provoca menos

desgaste do que a erosão laminar. Locais declivosos e com solo descoberto são favoráveis à ocorrência

desse tipo de erosão.

Erosão em voçoroca é o tipo de erosão que provoca um grande impacto visual (Fig. 5). A sua origem

é a erosão em sulco não controlada. É muito cara e de difícil controle. Em áreas de ocorrência de

voçorocas, o uso de máquinas e equipamentos agrícolas fica impossibilitado.

APTIDÃO VERSUS EROSÃO DAS TERRAS

Em geral, nas regiões tropicais, a interferência do homem sobre o ambiente tem gerado conseqüências

desastrosas. São raros os casos em que se observa a utilização de um ecossistema dentro de sua aptidão

(Curi et al., 1992). A medida que esta adequação é realizada, o processo de depauperação é nulo ou muito

menor e lento, de modo que a área consegue manter as suas principais características menos alteradas.

Isto se traduz em uma ação sustentável, possibilitando um uso constante do ecossistema sem redução do

seu padrão de produtividade.

Figura 5. Erosão em voçoroca na margem da rodovia Ilhéus - Olivença (Foto Quintino Araujo, 2001).

As pressões de uso exercidas pelas mais diversas interferências antrópicas sobre o sistema solo tendem a

diminuir sua potencialidade e, em níveis avançados de alterações e perturbações provocar a degradação

das terras. A seqüência do processo de degradação pode ser exemplificada com base em dados de

Mielniczuk & Schneider (1983) citados por Bianco (1998), conforme ilustrado na Figura 6.

Na etapa 1, inicia-se um processo no qual as características originais do solo são destruídas

gradativamente e não são percebidas, devido talvez à pouca intensidade dos cultivos e pela manutenção

da produtividade às custas de corretivos e fertilizantes (Fig. 6).

Na etapa 2, com o manejo adotado incluindo excessivas mobilizações do solo, há perdas acentuadas da

matéria orgânica, com forte comprometimento da estrutura.

Ocorre compactação superficial, impedindo a infiltração da água e a penetração das raízes, bem como

selamentos superficiais. A erosão acentua-se e as culturas respondem menos eficientemente à aplicação

de corretivos e fertilizantes.

Na etapa 3, o solo está intensamente comprometido, com colapso violento do espaço poroso. A erosão é

acelerada e a produtividade cai a níveis mínimos. Deve-se enfatizar que o uso atual de determinada área

muitas vezes não é compatível com sua real Aptidão Agrícola, determinada por um conjunto de fatores

físicos, químicos e bióticos que interagem refletindo nos níveis de fertilidade, disponibilidade de água e

ar, risco de erosão, impedimentos à mecanização e outros (Curi et al., 1992). Marques (1950) comenta

que se a gleba de terra for submetida a uma forma de uso mais intensiva ou menos protegida do que

aquela de que é normalmente capaz fatalmente acarretará sérios problemas econômicos e ambientais.

Figura 6. Etapas da degradação de um solo sob uso inadequado.

REFLEXOS DA EROSÃO

O declínio da capacidade produtiva dos solos, ao longo dos anos, tem sido uma das principais causas do

abandono das lavouras em muitas regiões do Brasil. A erosão, a lixiviação, a oxidação da matéria

orgânica e a acidificação dos solos pelos fertilizantes nitrogenados são os fatores que mais contribuem

para a acelerada degradação da fertilidade natural do solo (Pavan & Chaves, 1996).

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Anos de Cultivo

%ProdutividadeRelativaErosão Relativa

O uso da terra de acordo com a sua vocação agrícola e a adoção de medidas contra erosão representam os

primeiros passos na direção do cultivo adequado das terras (Marques, 1950; Bahia et al., 1992). Os danos

da erosão atingem não apenas o agricultor, mas toda a comunidade e a nação. Assim, a responsabilidade

pelo seu controle deve ser de todos, instâncias governamentais e não-governamentais.

É importante saber qual a interpretação que os técnicos e produtores rurais têm para o questionamento: O

que provoca maior diminuição da fertilidade do solo: a exportação de nutrientes (retirada pela produção

das culturas) ou a erosão? Uma reflexão mais completa acerca disto pode ser feita ao responder outras

duas questões: O que se entende por fertilidade do solo? E, o que significa erosão do solo?

Até pouco tempo, a fertilidade do solo era predominantemente associada às condições químicas, mais

diretamente relacionadas ao pH do solo e à disponibilidade de nutrientes exigida pelas plantas. Com os

recentes avanços científicos e aprofundamento dos conhecimentos sobre os solos, difunde-se uma

conceituação mais sistêmica da fertilidade do solo, que deve ser entendida como a capacidade em

fornecer ao vegetal água, oxigênio, calor e nutrientes. Assim, Araujo (2007) recomenda que a fertilidade

do solo deve considerar conjuntamente suas condições físicas, químicas e biológicas.

A erosão representa um dos principais fenômenos de degradação dos solos, especialmente em áreas

desprotegidas, mal cultivadas, expostas à ação das chuvas, dos ventos e do sol. Caracteriza-se pelo

desprendimento e arraste acelerado das partículas do solo, causado pela água e pelo vento. O principal

tipo, a erosão hídrica, começa quando as gotas de chuva que atingem a superfície do solo e destroem os

agregados ocorrendo, na seqüência, as três etapas seguintes (Bertoni & Lombardi Neto, 1990): 1) as

partículas do solo se soltam pelo impacto das gotas, 2) o material desprendido sofre salpicamento e é

transportado e, 3) esse material é depositado nas partes mais baixas do relevo. A erosão provoca o

carreamento e a perda da camada fértil do solo, das sementes, da matéria orgânica, dos corretivos, adubos,

defensivos e outros insumos. A quantidade total de elementos retirados do solo pelas colheitas do café,

por exemplo, assume proporções mínimas quando comparada com aquela perdida pela erosão (Marques,

1950). Ao lado dos sérios reflexos sobre a produção e o meio ambiente, a erosão causa a perda, também,

da própria água que, ao invés de infiltrar-se no corpo do solo, perde-se nas enxurradas. Marques (1950) e

Bahia et al. (1992), são unânimes em citar os seguintes fatores como principais determinantes da erosão

no solo: chuva e vento, cobertura e manejo do solo, topografia e propriedades do solo.

Chuvas e ventos. Chuvas mais intensas causam mais erosão do que as menos intensas (mesmo que

prolongadas). A água de chuva menos intensa pode encontrar melhores condições para infiltrar-se no

solo. Chuvas intensas saturam rapidamente as camadas superficiais e geram as enxurradas, com o

escoamento crescendo morro abaixo. Na precipitação pluviométrica, são importantes o tamanho e a

velocidade das gotas, além da quantidade, intensidade e distribuição das chuvas. As propriedades dos

solos determinam distintos graus de susceptibilidade à erosão. Solos profundos, com boa permeabilidade

e bem estruturados (e coerentes) estão, em geral, menos sujeitos à erosão hídrica; enquanto que, solos

rasos com camadas compactadas ou adensadas, acentuadas diferenças texturais entre camadas e muito

arenosos, podem sofrer mais erosão.

O vento é um forte agente de deslocamento do solo que, ao contrário da erosão hídrica, exerce maior

influência sobre solos mais planos. Os efeitos da erosão eólica podem ser danosos para a região de onde o

material é deslocado, assim como para aquele onde o material é depositado. O movimento das ondas pode

causar desmoronamentos, às vezes de grande porte. Este tipo de erosão não é significativo na região

cacaueira do sul da Bahia.

Cobertura e manejo do solo. A cobertura do solo é a forma mais eficiente de prevenir a erosão.

Práticas de manejo com base em curvas de nível são fundamentais para aumentar a infiltração d'água no

perfil do solo, reduzir a enxurrada e minimizar a erosão. Culturas mais densas e de sistema radicular

abundante, em geral previnem mais a erosão.

Topografia. Em áreas em que o comprimento e declividade da rampa são elevados e a velocidade da

água alcança níveis de enxurrada, a melhor prática é a manutenção de cultivos de cobertura, manejo em

curvas de nível ou terraços e barreiras espaçadas. Esta práticas deverão estar de acordo com o

comprimento da rampa, que quebrem a velocidade da água.

Propriedades do solo. Propriedades do solo como textura, estrutura, porosidade, permeabilidade, teor

de matéria orgânica, tipo de argila e profundidades, entre outros, são importantes para a determinar uma

maior ou menor erosão. Por exemplo, a manutenção ou o incremento da matéria orgânica assume um

papel fundamental para a redução dos processos de erosão. Ela melhora as condições físicas, químicas e

biológicas do solo aumentando, por exemplo, a porosidade, o arejamento, a infiltração e o

armazenamento d'água, a penetração de raízes, o desenvolvimento de microorganismos e da meso e

macro faunas do solo, além de adicionar nutrientes. As funções da matéria orgânica nos solos tropicais

assumem maiores significados em função do alto grau de intemperismo de grande parte destes; assim

devido as suas propriedades ela é responsável por grande parte da fertilidade de muitos solos. Portanto,

uma detalhada caracterização da matéria orgânica pode ser uma valiosa alternativa para avaliar o estado

geral dos solos, incluindo sua erosão.

PLANEJAMENTO CONSERVACIONISTA

A solução dos problemas decorrentes da erosão não depende apenas da ação isolada de um produtor. A

erosão produz efeitos negativos para o conjunto dos produtores rurais e para as comunidades urbanas.

Planos de uso, manejo e conservação do solo e da água devem contar com o envolvimento efetivo de

produtores, técnicos, comunidades e autoridades governamentais. Dentre os princípios fundamentais do

planejamento de uso das terras, destaca-se um maior aproveitamento das águas das chuvas, evitando-se

perdas excessivas por escoamento superficial. Podem-se criar condições para que a água pluvial se infiltre

no solo. Isto, além de garantir o suprimento de água para as culturas, criações e comunidades, previne a

erosão, evita inundações e assoreamento dos rios, assim como, abastece os lençóis freáticos que

realimentam os cursos de água. Uma cobertura vegetal adequada assume importância fundamental para a

diminuição do impacto das gotas de chuva. Há redução da velocidade das águas que escoam sobre o

terreno, possibilitando a sua maior infiltração e diminuindo o carreamento das partículas do solo.

O manejo do solo requer a consideração de todas as operações agrícolas e tratamentos aplicados ao solo

para a produção de plantas (Cogo & Levien, 2000). A conservação do solo determina o seu uso dentro

dos limites de praticabilidade econômica, de acordo com sua capacidade e necessidade, para mantê-lo

permanentemente produtivo. O objetivo da conservação do solo deve ser a manutenção do seu potencial

produtivo em níveis o mais próximo possível do estágio original. Relaciona-se o planejamento

conservacionista com a qualidade de vida, pois esta contempla várias dimensões (ambiental, social,

econômica, política, cultural) para o atendimento das necessidades humanas, satisfazendo,

essencialmente, o crescimento econômico, a equidade, a sustentabilidade e a participação dos homens

como sujeitos da história (Araujo, 2007). A conservação do solo e a conservação da água são inter-

relacionadas e, em geral, praticadas concomitantemente (Baruqui & Fernandes, 1985). A grande maioria

das técnicas para conservar o solo, também o é para a água e vice-versa. A proteção recomendada para as

áreas agrícolas possibilita a manutenção de condições adequadas para as plantas, e para o ambiente como

um todo, evitando, por exemplo, que o solo sofra constantes ciclos de umedecimento e secagem, de

oscilações de temperaturas de grandes amplitudes, de incidência direta e permanente dos ventos, etc.

Na atualidade, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento brasileiro estabelece um programa

de conservação que reconhece que a degradação do solo tem atingido níveis críticos, impondo custos à

sociedade, pela grande perda de terras agricultáveis através da erosão, o que causa redução da sua

capacidade produtiva, assoreamento de cursos d'água e represas e, conseqüentemente, o empobrecimento

do produtor rural, com reflexos negativos para a economia nacional (MAPA, 2001).

O programa tem como um dos critérios norteadores, as ações desenvolvidas com base em microbacias

hidrográficas, que representam unidades naturais onde os fatores ambientais, econômicos e sociais

encontram-se em condições homogêneas e por isso, mais apropriadas para o estabelecimento de planos de

manejo e uso, monitoramento e avaliação das interferências humanas no meio ambiente. Elas representam

unidades sistêmicas que permitem a identificação e o reconhecimento das inter-relações dos fluxos de

energia e dos demais fatores envolvidos no processo produtivo, com vistas a compatibilizar as atividades

humanas com a preservação ambiental. Em muitas situações, os proprietários rurais implantam lavouras

em áreas que, em realidade, serviriam mais para uma pastagem manejada ou reflorestamento (Bianco,

1998). Isto é um exemplo de como o espaço agrícola está sendo utilizado fora de sua aptidão natural. Os

principais sistemas que identificam a vocação das terras tomam por base a declividade do terreno, a

profundidade do solo, a susceptibilidade à erosão, a drenagem, a presença de pedras, entre outros.

O planejamento conservacionista assume papel essencial, com o objetivo de racionalizar o uso das terras,

dentro dos enfoques de produção e ambiental. Inicialmente, as classes de capacidade de uso das terras

indicam as possibilidades máximas de cultivo de certa área, com a adoção de um mínimo de medidas

protetoras do solo, assegurando a produção adequada, sem o perigo de depauperamento. O sistema de

classificação da capacidade de uso da terra, de mais simples elaboração e apresentação, mas indicando

satisfatoriamente a base do planejamento originou-se nos Estados Unidos e foi difundido por diversos

trabalhos (Marques, 1971; Lepsch et al., 1983; Resende et al., 1997). Por este sistema as terras são

classificadas em oito classes, dentro de três grupos:

A. Terras cultiváveis.

Classe I Podem ser cultivadas com segurança e economia, sem práticas especiais de melhoramento

ou proteção (aparentemente sem problemas especiais de conservação).

Classe II Cultiváveis com práticas simples de conservação

Classe III Cultiváveis com práticas complexas de conservação (requerem cuidados intensivos)

Classe IV Cultiváveis apenas ocasionalmente ou em extensão limitada, com sérios problemas de

conservação.

B. Terras de pastagens ou silvicultura, cultiváveis apenas em casos especiais (culturas permanentes e

adaptadas).

Classe V Terras cultiváveis apenas em casos especiais com algumas culturas permanentes e

adaptadas, sendo indicada para pastagens ou reflorestamento, sem necessidade de práticas

especiais de conservação.

Classe VI Para pastagens ou reflorestamento, mas com problemas especiais de conservação

(restrição moderada de uso).

Classe VII Para pastagens ou reflorestamento, com problemas complexos de conservação (severas

restrições).

C. Terras impróprias para vegetação produtiva, indicada para abrigo da flora e fauna silvestres, para

recreação ou armazenamento d’água.

Classe VIII Terras impróprias para cultivo, pastagens ou reflorestamento, podendo ser destinada à

preservação da flora e da fauna silvestres ou para fins de recreação, turismo ecológico ou

armazenamento d’água.

A conservação do solo e da água é uma área de estudos e de operações que preconiza um conjunto de

medidas, práticas e procedimentos, que devem ser adotados, dentro das especificidades de cada realidade,

para a manutenção da capacidade produtiva das terras e do meio ambiente. As medidas devem ser

implantadas, em geral, de forma conjunta, integrando, para uma mesma área e cultura, mais de uma

prática de prevenção à erosão.

PRINCIPAIS TÉCNICAS DE CONSERVAÇÃO DO SOLO

As técnicas são classificadas como vegetativas (uso de plantas), edáficas (relativas ao solo) e mecânicas

(utilização de máquinas e equipamentos).

Técnicas Vegetativas Técnicas Edáficas Técnicas Mecânicas

Florestamento e reflorestamento

Plantas de cobertura

Cobertura morta

Rotação de culturas

Formação e manejo de pastagem

Cultura em faixa

Faixa de bordadura

Quebra vento e bosque sombreador

Cordão vegetativo permanente

Manejo do mato e alternância de

capinas

Capinas alternadas

Consórcios / Sistemas

agroflorestais

Enriquecimento com madeiras

Proteção de nascentes

Manejo fitossanitário integrado

Manejo de resíduos culturais

Quebra ventos

Cultivo de acordo com a

capacidade de uso da terra

Controle do fogo

Calagem

Adubação verde

Adubação orgânica

Adubação química

Culturas em faixas

Controle do fogo

Preparo do solo e plantio

em nível

Distribuição adequada dos

caminhos

Sulcos e camalhões em

pastagens

Enleiramento em contorno

Terraceamento

Subsolagem

Irrigação e drenagem

Cultivo em contorno

Banquetas individuais

Controle do movimento da

água na lavoura

Divisão adequada das áreas

de suporte com pastos

Enleiramento permanente

A seguir, comentários a respeito de algumas dessas técnicas que podem ser utilizadas na região cacaueira

com sucesso.

Cultivo de acordo com a capacidade de uso. As terras devem ser utilizadas em função da sua

aptidão agrícola. Isto pressupõe a disposição adequada de florestas/reservas, cultivos perenes, cultivos

anuais, pastagens, etc, racionalizando o aproveitamento do potencial das áreas e sua conservação.

Plantio em contorno. É conhecido também como plantio em curva de nível. Neste método todas as

operações de preparo do terreno, balizamento, semeadura e outras, são realizadas em curva de nível. No

cultivo em nível ou contorno criam-se obstáculos à descida da enxurrada, diminuindo a velocidade de

arraste e aumentando a infiltração d'água no solo. Este pode ser considerado um dos princípios básicos,

constituindo-se em uma das medidas mais eficientes na conservação do solo e da água. Essa técnica não

pode ser usada isoladamente, principalmente em locais de topografia acidentada e regiões de chuvas

intensas, devendo vir junto com outras técnicas para a maior eficiência conservacionista.

A escolha dos métodos/práticas de prevenção à erosão é feita em função dos aspectos ambientais e sócio-

econômicos de cada propriedade e região. Cada prática, aplicada isoladamente, previne o problema de

maneira parcial. Para uma prevenção adequada da erosão, faz-se necessária a adoção simultânea de um

conjunto de práticas.

Adubação verde e plantas de cobertura. A adubação verde consiste na incorporação de plantas ao

solo. Essas plantas são especialmente cultivadas para esse fim e são cortadas na época da floração para

serem incorporadas ao solo. Nessa época é onde ocorre o maior armazenamento de nutrientes nas plantas.

As plantas de cobertura são cultivadas com o objetivo de proteger o solo contra a erosão (Fig. 7). Elas não

são cortadas, nem incorporadas ao solo, permanecem durante todo o seu ciclo cobrindo-o. As espécies

mais comuns são: feijão-de-porco, mucuna, crotalária, cudzu, amendoim forrageiro, guandu, feijão-de-

corda, calopogônio e leucena, entre outras.

Figura 7. Amendoim forrageiro cobrindo o solo em plantação de cacau no sul da Bahia. (Foto: Arlicélio

Paiva, 2003).

Tanto a adubação verde quanto as plantas de cobertura são importantes para a melhoria das propriedades

do solo. Os solos ficam mais ricos em nutrientes, especialmente em nitrogênio. Esse enriquecimento

ocorre por intermédio da adição de resíduos orgânicos ou pela associação com microorganismos. Com o

tempo, o teor de matéria orgânica aumenta nos solos cultivados com essas plantas e melhoram as

propriedades físicas, com maior infiltração e armazenamento de água, entrada e saída de gases e

penetração das raízes. Além disso, essas plantas podem controlar as invasoras e alguns tipos de pragas e

doenças. Antes de adotar essas técnicas, o agricultor deve se informar para saber quais as espécies mais

indicadas para a região, a disponibilidade de sementes e o hábito de crescimento dessas plantas.

Cordão de vegetação permanente. São plantas cultivadas em fileira (cordão), dispostas em curva

de nível, com uma largura aproximada de um a dois metros. É uma técnica eficiente no controle de erosão

em áreas declivosas. As plantas utilizadas no cordão devem ter um retorno econômico para o agricultor.

As espécies mais utilizadas são cana-de-açúcar, capim elefante, capim santo e capim colonião, entre

outras. A depender do grau e do comprimento do declive, o agricultor pode plantar mais de um cordão na

sua área.

Cobertura morta. São restos de vegetais utilizados para cobrir o solo e evitar a ocorrência de erosão.

Essa técnica evita a perda excessiva de água do solo mediante a evaporação. O exemplo mais conhecido

na região é o do cacau bate-folha. Outro bom exemplo de cobertura morta é o das folhas cortadas das

bananeiras.

DECÁLOGO CONSERVACIONISTA

Em homenagem ao Dia Nacional da Conservação do Solo, comemorado em 15 de abril, Silva (1998)

divulgou um folheto de grande valor didático e orientador, cujo texto é reproduzido a seguir:

“O solo se constitui no recurso mais importante da agricultura, uma verdadeira dádiva da natureza,

significando dizer que deve ser bem cuidado, para passar de pai para filho, como um legado usufruto,

beneficiando as gerações subseqüentes. Para tanto, há de se atentar para os cuidados e técnicas de

manejo que possibilitem tirar o máximo da terra sem lhe causar maiores danos, conforme o decálogo, a

seguir, resumidamente, discriminado:

I. Evitar as queimadas, uma vez que elas provocam a morte dos microrganismos do solo e, mais

ainda, destroem a matéria orgânica, rompendo as unidades estruturais, ocasionando o arraste

da capa superficial pela ação erosiva das gotas de chuvas, empobrecendo rapidamente a terra.

Processa-se a erosão laminar, criam-se crostas duras na superfície do solo e os nutrientes

retidos na capa orgânica se perdem nas enxurradas.

II. Não se deve deixar o solo desprotegido, ou seja, nu, inclusive nos intervalos dos cultivos, a fim

de evitar o desgaste da capa organo-mineral, agravado ainda com a invasão das ervas daninhas

que consomem os nutrientes do terreno.

III. Não cultivar o solo em relevos muito fortes, escarpados a não ser o seu terço inferior, porém

mantendo a vegetação intacta no seu topo. E, quando o fizer, jamais plantar morro abaixo, mas

no sentido das curvas de níveis, de modo a evitar a erosão do solo. A vegetação deixada nas

partes altas funciona como pára-choque, quebrando a força dos ventos e, sobretudo, das chuvas,

evitando as enxurradas que danificam o solo. Adicionalmente, intercalar entre as faixas dos

cultivos, linhas contínuas de leguminosas (plantadas bem juntas), de modo a formar anteparos,

impedindo o arraste do solo e a ação desidratante dos ventos, ademais dos benefícios que

proporcionam ao solo com a matéria orgânica rica produzida.

IV. Não realizar tráfegos constantes na área, sobretudo com máquinas pesada e práticas de aração e

gradagem com o solo úmido, evitando-se a compactação do terreno, fator do mau

desenvolvimento do sistema radicular das plantas, seja pela ação física ou pela má drenagem

que provoca.

V. De tempo em tempo, variar o tipo de cultivo na mesma área, ou fazer seqüências de culturas,

com a finalidade de quebrar os ciclos dos inimigos naturais (pragas e doenças) e se dispor de

resíduos orgânicos mais ricos ou diversificados no solo.

VI. No caso de plantios em cova, sobretudo em solos pobres, fazê-los em buracos profundos (0,4 x

0,4 x 0,4 m), adicionando à massa do solo retirada entre 3 a 5 kg de esterco de curral, ou outra

fonte orgânica, com a finalidade de propiciar melhores condições de desenvolvimento para as

plantas, em razão dos benefícios advindos dessa incorporação tanto no que diz respeito à

estruturação do solo, quanto ao aumento da capacidade de fornecimento e retenção de nutrientes

e de umidade, resultando num maior volume e aprofundamento do sistema radicular,

fundamental ao desenvolvimento dos cultivos.

VII. Implantar leguminosas - consorciadas ou não - anuais, semiperenes ou perenes, sobretudo as de

alta capacidade de produção de nitrogênio natural e biomassa (folhas, galhos, etc),

possibilitando melhorias físico-hídricas e químicas consubstanciadas na maior retenção de água

e nutrientes, agregação do solo e aporte de nitrogênio.

VIII. Ao capinar, sobretudo no sistema de “coroamento”, só fazê-lo no sentido de fora para dentro, ou

seja, da periferia para o pé da planta, e não ao contrário, como comumente se procede. Essa

prática simples evita a perda de solos, o desperdício da matéria orgânica oriunda das ervas

daninhas e a formação de verdadeiras “bacias” que prejudicam o cultivo com a acumulação de

água nos períodos chuvosos, bem como expõe as raízes finas alimentícias ao sol, prejudicando-

as.

IX. Nos cultivos perenes, é recomendável fazer consórcios com espécies anuais, plantadas entre as

linhas, com a finalidade de cobrir o solo, aumentar o teor de matéria orgânica e possibilitar uma

renda adicional. Da mesma forma, utilizar sistema agrossilviculturais com plantas perenes ou

semiperenes, selecionando espécies que se interagem na produção de biomassa, na exploração

do solo em camadas distintas e na tolerância à fertilidade do solo. Ademais, pode-se utilizar

sistemas de alamedas (linhas duplas de leguminosas) espaçadas de 5 em 5 metros, com cultivos

anuais entre elas, enriquecendo o solo com as podas constantes, cujo material orgânico recobre

o solo, evitando as ervas daninhas, aumentando o teor de matéria orgânica e reduzindo o uso de

fertilizantes com o tempo de cultivo.

X. Manter as matas ciliares (árvores que margeiam os rios), a vegetação das nascentes e dos topos

das vertentes, com a finalidade de conservar o solo e preservar o manancial hídrico, mantendo

regularizados os cursos de água”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A história da humanidade está intimamente ligada à história de uso da terra. A conservação do solo e da

água mantém a riqueza (capacidade produtiva) das terras, melhora o rendimento das culturas e garante um

ambiente equilibrado, para a atual e as futuras gerações. Os agricultores, como protagonistas desta

história, têm um papel fundamental na construção de uma vida saudável. Mas, a compreensão e a

responsabilidade acerca da conservação do solo e da água devem, ao máximo, ser compromissos de todos

os cidadãos que, assim, de forma consciente, participam da construção de uma vida com mais qualidade.

LITERATURA CITADA

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