Upload
others
View
0
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
IMPRES SA S A . Bo nés IMPRE S SOR nos ANNA B S
DAS SC IENG IA S,m s A RTE S E m ! LETRA S .
G EORG IC A S
PORTUGUEZA S,
LUIZ DA S ILVA MOZINHO DE A LBUQUERQUE ,
DE D I C A D A S
A SUA MULHER
E . ANN A MA SCA RENHA S DE ATA IDE.
Fortun atus et i lle Deonqui n ovi t
Virg . G
PARÍS ,
NA orrxcmA DE BOBÉE RUA m. u m.
PROLOGO DOS EDITORES.
O s Redac to res do s Ann aes das Sc ien
c ias,das Artes e das Letras rec e
bêrão d e Portugal 0 Po em a in ti tu lado
G EORG IC A S PORTUG UEZA S c om as No tas,
qu e o ac om panhão ,o qu al seu Autor
lhe s rem ettê ra , d eix ando ao en t end er
d e l l e s a sua publ icação ,s e a tiv ess em
por c on v en ien te . Os R edac tores j ul
gárão não pod er m elhor c o rr espond er á
franqu eza m od esti a e ingenu idad e do
Autor , do que pub l i c ando por m e i o
d o prelo o d i t to Po ema ; no que lhes
pare c e faz er em á Nação hum prezen te ,
zi agricu l tura hum s ervi ço,e ao Autor
“
huma ju stiça ; e esperao que o public o
portuguez , c onfi rm ando a ºpinião dos
Editores,
ache na publ i cação d es ta
Obra m ais hum a prova do m u i to que
elles d esejão an imar,e fazer c onhec er
as produ c ções o riginaes portuguezas
e c on correr , quan to n elles está, para
a gloria e utilidade das Sc ienmas e da
Patria.
ADVERTENCIA DO“
AUTOR.
O MOT IVO , que me fez j ulgar conveniente
j un tar ao tex to as Notas , que dou c om elle,
fo i o lembrar — me,que ellas poderão servir
para ac cla rar alguns termos techn ico s e algu
mas passagens,que n ão es tiverem ao alcanc e
de todo o lei tor,e i gualmente para dar a
razão de algumas l iberdades,que no texto
tomei . Nas Nota s botani cas , cºpiei , quanto,
m e fo i possivel,o nosso illustre compatriota
Fx m x AVELLAR Bnornno,nas suas Noções ele
m en tares d, esta sc ien c ia .
EORG IC A
PORTUGUEZAS.
C ANTO i
A c u sa : accento,oh doce Nize
,escuta
,
Ni ze meu só p razer , am'
ante cara
Futura companheira de meus dias
Ouve os m eus versos'
em que desde es ta bom
Começo a celebrar dos'
lavradores
Quaes sej'
ão o s prazeres e os cuidados ;
Quaes os trabalhos do que arando a terra
.As sementes lhe lança qual das vinhas
0 trato sej a do s diversos gado s
Quantas as pro ducções e que desvelos
Careção a final ter o s pas tores .
G EORG ICAS .
MUSA que outrº ora nas Latinas selvas
Do vate Mantuano pelos labios,
Ruraes preceitos em sublimes versos
Ao lavrador I talico ensinaste,
Hoj e em meu canto hum fogo igual derrama“
,
Que outrem pulsando a maj es tosa lyraDo Meonio cantor
,de Smyrna o s vo tos ,
O incenso appeteça e seus altares ;
Rasgando com hum Vôo impetuoso
A barreira do s seculos os nomes
Dos heroes que cel ebra pronuncie
Á s derradeiras gerações remotas
Ferindo as cordas da sublime lyra
Troe n o s ares qual de Jove a dextra
T race horroroso s bellicos estragos ;
E entre ru ínas e montões de mortos
Al oe tropheo s de sangue salpicados
Que,ao som accorde da -campes tre avena
Eu can to a vida a s ingeleza canto
G ratas aos corações e aos Deoses grates .
CANTO I .
Canto oh N ize os pac ífi c o s asylos
Do activo colono e seus cuidados.
Vós,agrestes Deidades bem fazeía s ,
Sacras Dryades Deo sa s dos verdores
Que os troncos protegeis e os alto s bosques
E vós oh frescas Naiades que ! s urnas
Inclinando beneficas aos campos
Mandais de vossas ag'ilas a frescura ;
Vós c apripedes Faunos e Bacchantes ,
Em torno a m im girai,e
'
o s meus trabalho s
Anime o vosso influx o poderoso .
I A de Rhea e Saturno a aurea i dade
Entre os m ortaes seus dotes n ão espalha
Já n ão crescem nas varzeas não aradas
As abundantes messes,nem das rochas
leite e o vinho em bo rb o tões reben tão
A planta a florescer j á não convida
Sempre sereno e puro bum ceo benigno ;
Do hirsuto inverno regelado sopro
4 G EORG ICAS .
O bafo abrasador do ardente estio
Alt ernativam ente ao homem roubão
De hum clima sempre morno o doce encanto.
Já do Padre Lenêo as ferteis cepas
Não o rnão espontaneas as collinas
Nem de Minerva a arvore pro spera
Sem trato e sem cultura p elos campos .
Asp ero tojo c'
o rastei ro abrolho
O carrasco abundan te em fruc to amargo
A,c icuta homicida e s ilva o feto
Cª
o j unco agudo e m il ingratas plantas
Sufi'
o cão tenros germes que a fraqueza
Bem como a utilidade , em dote houveraq,Vinde pois oh colonos e deixando
chao n io aspr”o fructo , e do A chelo io
,As frígidas torrentes os trabalhos
Da subl ime Thesm opbo ro s , de Evons
De Minerva e de Pan seguindo atten los
Colher o s fructos recompensa grata
Dos suores da industria activa e nobre,
CANTO I . 5
DIVERSAS regiões,diversos climas
Compõem a habitação da prole humana
Huns eminente vêm a Cyn o suri
a ( 1 )
De neves abundante congeladas
Al l i as aguas negão as ribeiras
Bebida aos gados nega o sueco !s plantas ,Carregada de gelo a s teril terra ;
All i o s as tros em c on tínuo s gyro s
Jamais a s ondas buscão do sal gado ;
Por sei s mezes o sol os alumia
E seis mezes occulto espessa noute
Medonhas trevas dissipar não ousa.
Tem huma sorte i gual o s que domina
O australXypb ia s (2 ) no hem i spherio opposto ;
N'
buns e n'outros jamai s do sol o s raios
A cabão de fundir o s altos serro s
De neve tão antiga como a Terra .
Em tan to o s que entre o Cancro furibundo
E o s igno Pan n o Egypto consagrado (5)Morada tem de hum clima sempre ardente
6 GEORG ICAS .
O rigor'
ex p'
rim en t'
ão duas vezes
Em o gyro annual Phebo os vi sita
Já quando de Jason a preza occupa
E j á quando alumia a sacra Themi s . (4)Venturosas oh vós te
'
mp'
radas zonas
Que a torrida c ingi s onde hum ar doce
Entretem a verdura pelos prados
Aonde não pro sperão feras bravas
Tigres Ursos Leões,duros im i go s
Dos tri stes anim ai s m 'enos forçosos
A vós o Ceo em gyro certo env i a
Verao Outono Inverno e Primavera ;Aos vossos habitantes me diri j o ;Ceres me anima e seus trabalhos canto .
Conouo industn'
o so'
,a quem os Numes
De teu u ti l suor em recompensa
Olhão propíc io s antes que a lavoura
Comeces em teus campos busca a ttento
Qual d 'esses campos sej a a natureza .
CANTO I .
Áquem repousa o humus nutri tivo
Sobre a compacta greda alem a greda
Cobre hum calcario assento alem a s teri l
E solta arêa revestindo o s campos,
A apparen c ia lhes dá da praia fria ;
Es tes cobrem vo l can ic o s produc tos
Aquelles producções do mar salgado
Que parecem mostrar que em pris c a idade
Es ten dêra seu sc eptro alli Nep tuno .
Largas varzeas de pas to s abundantes
São a partilha de hum outro ci
o ferro
Rasga hum arido solo pedrego so . x
A lli desponta pela terra a grama
Amiga da frescura,alem floresce
A es teva , a giesta o toj o hirsuto ;N
, outra parte o trovi sco,que na terra
Lança as ra izes a buscar frescura ;Do Libano n o cume o cedro cresce
É qual ím an volvendo ao norte a flecha
Alonga a s braças,ameaçando as ondas ;
8 G EORG ICAS .
Da Suec ia nos montes o pinheiro “
Ostenta o al to tronco e verde copa .
Da terra nas entranhas nª
huma parte
Se forma o ferro duro n'outra o fulvo
Ouro luzente e a prata prec iosa .
A ssim da variada natureza
,A in calculavel força creadora
Deo a cada paiz suas riquezas ,
E quiz que o s homens , mutuamente unidos
;Pelos laços do m t'
res se em mutuas troca s
A massa dos thesouro s repartissem .
S E variada he pois a natureza
Nas“
produc coes do s campos e em seu fundo ;
Se n º
hun s abundão aguas , que o s c on servão
Frios e hum ido s sem pre , e ni
outro s falta
A frescura in ti rior ,e mui ta s vezes
Implo rão chuvas e engrossadas nevoas ,
Que a devorante sede lhes saciem
Não deve ser igual por toda a parte
1 0 G EORG ICAS .
As espigas alli á fouce offi reça
Sem hum trabalho grande ; mas se atte'nto
Se perito cultor com fundas vallas
Corta o terreno,e deposita n'ellas
A agua excessiv a ; se com forte .muro
De terra “dura e vigorosas plantas ,Constrange o rio'
a respei tar seu cam po ;Assim c o
º
a inundaçao“gordo o terreno
Será mais que algum outro productivo .
NÃo de outra sorte o Hollan'
dez cons tante
Combatendo o s fu'rores de Neptuno
Lhe rouba hum Solo'
que“
infhªior às vagas
He da industr ia feli z fertil conquista .
Se o il"rece hum campo tal hum grande fundo,
Das charruas a entrada não moderes ;Nem tampouco em terreno aonde a argi lla
Cobre hum solo ligeiro e arenoso ;Dobra o trabalho e c o' as lavoura s forma
A quaesquer producções util mistura
CANTO I . 1
Menos profundos regos porêm traça
No terreno ligeiro e p ouco fertil
E apenas as sementes cubra a terra
Se acaso consti tue a arêa o campo .
É n tão recea que o ardor de Phebo
Quando do Cancro os raios seus dardej a
Em vapores sub tiz a s i chamando
Da terra os succos a sec cura inteira
O terreno reduza,e d es ta sorte
Faça murcha cahir a espª
ran ça tua .
Ex amm a pesqui za attentamente
Quaes são as producçoes que o solo vestem
Abandonado a s i ; contempla attento
Quaes são do grão da ter ra o s elemento s ,Qual be a ex pomçao d e que maneira
A agua a lava e de que parte o s ventos
A c o stumão bater com m aior força
Dos antigos colonos cuidadoso
As practi cas estuda e os dois extremos
m G ÉORG ÍCAÉ.
No teu m ethodo evi ta o povo rude
De usos velhos escravo,às cegas marcha!
No caminho trilhado e á s vezes erra
Porém erra tambem o que insultando
O rumo antigo na vereda opposta
Temerario s e arroj a en tre huns e outros”
Convem só caminhar,a toda a p arte
“
A todo o instante dirigindo os olhos ;
PORÉM j á toca o fi lho deLatona'
A . c eles te Balan ça (7) a calma ardente
Começa a applacar-se sobre as azas
Dos favon io s Sub tiz grata'
frescurax
Os campos reanima o orb'e intei ro
Igual a negra noute tem ao dia .
Já vapores aeriOs condensados
Em grossas go ttas tem desci do ! terra
Que an c io sa'
n o seio ardente o s sorve
Cuidadoso colono o s bois pesado s
Prende á forte Charrua e ara o s campos .
CANTO I . 3;
Cannr ouâmos oh Nize , do s novilhos
Co' j ugo a frente de teu lado eu vôo
O trabalho me chama . He este o tempo
De revolver co” arado a dura terra
De eXpôr-lhe bem rasgado o fertil se io
A receber o influxo fecundante
Da subti l a tm o sphera he este o tempo
Em que o feno que os largos campo s cobre ,Sob as leivas submerso apodrecendo
Prepare succos,e dê força á s terra s" .
BEM depressa entre nuvens pro c ellosas
O fogoso Orião (8 ) co' braço ingente ,
Conduzirá o horror das tempestades
Em o terreno pobre he pois forçoso
Que ell e encontre nascido o tenro nabo ,O amargo tremoço a fusiforme (g)Raiz do rabão que na primavera
Novamente vol tados c o'a charrua
Hão de formar o adubo precioso ,
1 4 G EORG ICAS .
Decompos tos no seio que os criara .
HE tempo ah corre de escolhidos trigos
Enche o semeador ultimo cort e
à o terreno vou dar , j á preparado
A receber o grao : prendão— se ás grades
Li geira s eguas cabrão — s e as sementes
Dos sen teio s , dos trigos , das cevadas ,Da leve avêa , e em direito s regos
Compassada se lanc e a gro ssa fava
E a redonda ervilha aproveitêmos
O tempo claro em que o terreno leve
Não a cabrunha o grao , ou o germe esmaga .
A ii ! longe o o cio longe a v il pregui ça
Pois que o homem nasceo para o trabalho
E que doce trabalho ! ah ! de meus olhos
A imagem fuj a de infeli zes hºras
Consumidas em tri ste ociosidade .
Com que prazer , oh Ni ze , espero hum d ia,
CANTO I . Ut
Quando cansado eu volte da lavoura
Ver-te correr a mim , e eu ao s teus braços
Sati sfeito voar ! do nosso albergue
Fugi rao a tri s teza , o negro enj ôo
Filho da ociosidade e pa i do s crimes ;A os fi lhos inda tenros ensinando
A aproveitar as forças in fan tin as ,
Com ellas o trabalho ajuda'remos .
Em quanto o lavrador a estev a em p'
tí nha,
Com a vara o fi lhinho o s boi s lhe rege
Outro a loura semente lhe minis tra
Quando o campo sem êa,outro em mil gyros
Passa e repassa no terreno a grade .
OH m il vezes fel iz t odo o que pode
A s ingela s prazeres dedicar-se !
Feliz mil veze s o que ao s pés calcando
Hum a van ambição,e os seus p' res' tigio s
B i do s balanços de que os grandes tremem ;
Que os revezes não teme da fortuna
sõ G EORG ICAS .
Que sempre util aos outros e a si mesmo
Conhece e goza a verdadeira gloria !
Para o mortal feli z que assim cultiva
No rega ço da paz da terra o seio
Novamente a , traçar ruraes preceitos
Com o amparo teu Mus a , começo ,
HUMA lon ga ex pi
rien c ia rec onhe ce
Quanto a o cul tor no civo he desejo
De sempre recolher no mesmo campo
O precioso grão da flava Ceres .
Tu mesmo que retalhas col a charrua
O m ais fecundo chão se não deseja s
Virar em pouco tempo hum solo exhaus to,
Alterna a s pro ducções nas lavras tuas .
O terreno,onde hum anno a fouce curva
Do trigo tem prostrado a espiga loura ,
Orne no anno seguinte,se elle he fresco
I; de aguasºabun dan te , verde m ilho ;
Se leve e sol to es tenda pela terra
l 8 G EORG ICAS .
Tudo tende ao seu fim nada he perdido .
NA t erra nasce a planta da atm o sphera
E do seio que a n utre os sueco s t ira ;Mas c ahin do a final no mesmo seio
Fecundo, 'que a criou com abundancia
Lhe resti tue os dons"
que lhe roubara
E'
s eu despoj o transformado em humus
Abundante,a vigora e lhe d á ' suc c o s
Que nutrem em vez de huma varias plan ta s .
Ass im do bosque antigo que p rostrara
A mão severa do voraz Saturno
As relíquias descendo a o s fundos valles ,Com o lapso do tempo o s torn ao fertei s ;
Assim as aguas, .que no iroso inverno
Descendo do al to monte,a terra alagão ,
Com sigo mortos ramos arrastando
Bai x ão aos campos e hum n ateiro fertil
Sobre as exhaus tas lavras depo s itão .
Não de outra sorte o Nilo,que engrossara
CANTO I .
Na Ethiopia a chuvosa p rimavera,
Por se te vezes c omhorrendo estrondoCab inda despenhado dos r och 'edo' s
Entra no Egypto inunda só cegad'
o
Os cam pos,e do s íncolas ditosos
Forma todo o prazer todá a abund'ancia .
Ma s n em em toda a parte a n atureza
Qui z ella mesma ser quem“ adubas'se ,
Quem vi esse trazer o sueco zi terra
Contente de traçar-n o s o caminho ,
O trilha-lo deixou á º in dus tria nossa .
Assim o agricul tor attento busca
Povoar o terreno que. pre'par-a'
,
De su c culen ta s e ramo sa s planta s ,Que possa submergir c o' forte arado ,
Quando cobertas de vi çosas flores
Com a volta da fresca primavera
Lhe podem fornecer de fertil humus
A maior copia ; aos pés das rezes sua s
'9
ao G EORG ICAS .
Estendendo o palhi ço ou tem a mato,
Lança-os e m covas onde fermentando
Por tempos em adubo se convertem .
sua trabalha ; que a fadiga , o trato
Sã o partilha do agríco la ,e contente
Nas lavras em que assiduo s e esmerara
Vê a final crescer fecunda messe .
Nem desprezar eu devo no meu “canto
Do -colono infeliz de pobres terras
A industri a que lhe faz tornar ' em ci nza s
A esteva ,a giesta ,
o baixo feto,
E dar assim vigor ao seu terreno .
PORÉM nem só das plantas os despojos
Nem só dos an im aes o quen te estrume,
Productivos os campos tornar podem .
São diversos o s solos c omo o s climas .
Sobre a argilla tenaz que nao perm i ttc
Das raizes a entrada a sol ta area
Grande effei to produz bem como a argilla
CANTO I . 2 1
Ligando a s partes de arenosa terra .
A força de lavouras repetidas
Tornão — s e a c ré e o tufo productivos,
E no campo onde seixos importuno s
Da cultu ra o s trabalhos embaraça o
O lavrador se applica a separa— lo s .
Es te calcina em fornos pelo campo
O tenaz barro aquel le com pequenas
Valla s enxuga hum brej o em quanto est'outro ,
Fazendo rebentar c om fogo as penha s ,
Vai hum cam inho abrir as frescas aguas,
Que depois murmurando em can aes varios ,A refrescar conduz as plantas suas .
MA S tu agora,oh fi rme scrutadora
Do s thesouro s da fertil natureza
Musa,ao Agricultor
,da marga ( 1 2 ) o uso
Canta e ensina . Aquella que s e esfolha ,
Que absorve a agua e n”ella se dissolve
He propri a p ara o fraco esteril solo ,
22 G EORG ICAS .
Que por con tínuo s fruc tos esgotado
Carece de conforto e de socorros ;Aquella em que a alumina he dominante
,
C om van ta j em se applica á nimiamente,
Ou areen ta,ou desli gada terra ;
A calcaria porêm leva a abundancia
Ao terren o tenaz , ao encharcado
Bem como á quelle em que domina a aréa
Vi triíi cavel , magra solta e esteri l .
QUANDO n” hum solo ingrato o cul to r sabio
Tem descoberto a marga , nova e3pi
rança
Luz a o s seus olhos elle a arranca a ferro
Do seio que a contêm em varios montes
A os r igores a expõe do fri o inverno
E quando a primavera vem cobrindo
De flores as campinas ri j o malho
Desfaz a pedra c o' a s geadas branda
E em dose moderada pelo campo
O fecundante p ó então se espalha
CANTO 232
Enterra — se á charrua,e quinze dias
Depoi s ara de novo a relha o solo
Sobre tudo se de aguas abundante
Lançou o ceo chuveiros sobre a terra .
TA BS sao , oh Nize para ,os que no campo
Detem o lavrador empregos varios
Porém quando das nuvens pro c ello sas
Cabe a c ruel saraiva , a chuva grossa
Quando zunindo os ventos indomados
Pelos b osques os ramos despedação
He n o simples abrigo das cabanas
Que se oc cupa o culto r ; hum entrelaça
O brando vime e d'elle o s cestos tece,
Outro afi a o m achado e falca o s troncos
Seccos e fortes ; este. faz reparos
Na pesada charrua aquel le aprompta
Cangas e j ugos,em quanto outro fende
Com a serra mordaz madeira em pranchas.
az, GEORG ICAS .
HOUVE temp o em que errantes entrº
a s sei t/as ,,
Dos fruc tos que spontanea a terra dava
Os selvagens humanos se nutr i ao .
Oh bem haj a o mortal que ousou primeiro
Forçar o touro a subm etter-se ao j ugo !
Oh bem haj a -o primei ro ; que dobrando
A forç a de calor o duro fe rro
Fez aos humano s conhecer,seu Uso
Desde o primeiro s imples instrumento
Destinado a rasgar da terra o seio
Seu invento nascer v i o cada idade ,
E a arte,mais e mais ganhando luzes
,
Melhoro u pouco a pouco o rude arado
Do primeiro cultor ; j á adaptando
A relha ao ligneo primitivo dente,
Já a sega cortante á aguda re ib a
Já a ambas unindo a rij a a iveca ;Te
'
que varias especi es de charruas,
Prºprias a varias terras varios usos,
A escolha do cultor s e apresentarão .
20 C ÉonC ICAs.
Pedregoso e exposto ao so l nascente
O carvalho frondoso e o que envolve
Porosa casca tronco da sobrei ra
Nas m ão s do Cºn struc tor não sã o inuteis,
Nem' inda o ri j o pão de antigos fre ix o s .
De hum aço puro de Vulcano o alumno
Sobre a rij a bigorna a relha forma
Alli forj a tambem segas cortantes .
Humas vezes ! relha,quando a a iveca
Passa de hum lado ao outro , a fô rma imprime
Da mortifera lança de Mavorte
Outra s para a charrua , que constante
A leiva volve sempre ao mesmo lado
Só d esse a relha form a gume agudo .
Destinada a lançar no aberto rego
Do novo rego a terra , a enterrar n, elle
A s arrancadas semi — murchas plantas
Em form a curva deve ser a a iveca ,
E na parte ex tl rio r polida e liza .
CANTO I . 27
QUAL empunhando o leme o nauta ousado
Na derrota ao navio fi ta proa ,
Assim o lavrador,em quanto canta
Após os tardos boi s,co
' a curta esteva
A Charrua dirige a bra ça curva
D'hum lenho fort e a construi — la he propria .
O apego he da cha rrua exacto guia
D' elle depende o fun do em que entra o dente,
D' elle a ordem dos sulc os e a grandeza ;
Busca,oh arti s ta o t ro nco hum tanto curva
Da faia,freixo ou til ia e d' elle o forma ;
Leves madeiras e de lga do s ferros ,
Combinados e un i do s com destr eza
Devem c om pôr o s c írculo s , que gyrao
Levemente no e ixo ass im : ao . ti ro
O enfado evitarás de m ór'
esforço .
PAR A romper de novo antigos prado s ,A charrua sem dente he vantaj osa
,
E a fim de dividi r quebrar a terra
2 8 GEORG ICAS .
São as p esadas grades necessarias ;Com as ligeiras cobrem — se as sementes :
De for tes carros de carretas leves
Ha mister a final toda a cul tura .
ATÉ agora cantei da terra o trato
As lavouras tendentes,a apromp tá -la
Aos benignos influxos da atm osphera ;
Mostrei a arte de adubar os c ampos
A fim de lhes pres tar fecundos succos
Trato agora dos regos que a charrua
Deve dar ao terren o , antes que 6116
A semente se lanc e ; agora digo
O tempo,o modo d, espalha r nas terras
Os preciosos grao s uteis legumes,
As raizes e plantas nutrientes .
Tu Deosa do cultor , oh flava Ceres ,Tu me reforça a voz
,e accende a mente !
ANTE S de dar qualquer semente ao campo ,He preciso primeiro que lavrado
CANTO I , 99
Sej a este muitas vezes não recêes
O trabalho oh cultor ; que sem trabalho
Não produzem as lavra s abundancia .
Cruze hum rego outro rego com seus dentes
Quebre e divida a grade a c ogulada
Terra junta em torrões de novo passe
No terreno a charrua e entao nelle ,Segundo a qualidade e a natureza ,
A semente se espalhe productiva.
S s. em terreno fecundo fofo e leve
Pertendes semear branda batata
Em varia s partes a rai z divide,
Cada huma das quaes contenha hum germe,
E ao longo d o s regos da charrua
A iguacs espaços cuidadoso a olança ,
Distribuindo em torno hum proprio adubo
Se faz o louro milho a esp, rança tua,
Assaz fundo c o, grade o grão enterra ,
Traçando logo no terreno li zo
30 G EORG ICAS .
A s regadeira s que no ardente esti o
Al l i devem gti iar as frescas aguas .
De hum modo semelhante o feij ão tenro,
O grao,a ervilha no terreno lança
E no outono o tremoço amargo en terra
Bem como a fava em alinhados sulcos .
Mas se o linho te o ccupa tenra planta
Que toma fórm as mil nas m ãos da arte
Ou sej a para o rna to e cobertura,
Ou sej a para as cordas vigorosas,
Trabalha mais que nunca o teu terreno,
Mais que nunca o aduba e tão s ómente
Hum tal cuidado emprega em solo fresco,
Bom,solto e leve
,e de aguas nao escasso .
PA RA formar os p ermanentes prados
Da luzerna do trevo e de outras planta s,
Erro p,
rigo so fôra ao fertil solo
Roubar lavoura s e poupar trabalhos .
Venturoso o colono que habitando
CANTO I .
Ferti l paiz de braços abundante,
Após o s gyros da pesada grade
A m alho faz esto rroar a terra
A neve,que durante a estaçao dura
,
Fórça co' peso a encurvar os ramos
Das arvores e arbustos,he temível
Para o milho inda tenro e damn ifica
O nascido feij ao ; esse o motivo
Por que para o s lançar ao solo aguarda
Da primavera a vol ta o cultor habil .
Nascidas estas plantas,duas vezes
G ozão da sacha o provei to so trato,
Já para destruir noc ivas plantas
Já para as desbastar,ch egar-lhes terra .
Ao menos huma vez i gual trabalho
Faz praticar em derredor da ervi lha
Do amarello grão da parda fava :
E da batata as hasteas productiva s
Por varias vezes sob a terra e stende .
52 G EORG ICAS .
PORÉM tu , dos m ortaes ri cco thesouro,
Tu Precioso dom'da flava Ceres
,
Agora sê obj ec to do meu canto .
Ouvi-me oh lavradores , es cutaí-m e
He tempo de lançar o trigo aos campos .
JAMA IS produzi r pode a m á semente'
Ao cultor hum nutrido e l impo fructo
Jám a i s o trigo secco ,o en rugada ,
Ou roi do grêlado , ou c om m i s tura
D' estranhos grãos produz formosas m esses í
O primeiro em s i mesmo traz a origem
Da fraqueza e d o s vícios ; o outro abriga
Inimigos fataes,que a suffo c á — lo
No s rego s hão de vi r . Habil colono
Passa n o crivo n a j oeira p assa
O trigo que a o terreno teu confias . x
CULTORE S ha que ao seu in tl resse a tten to s
Em barrela alcalina'
o s grãos mergulhão
34 G EORG ICAS .
Despem as folhas,que o verão cres tara
E Arachne pela terra as tramas urde
Estendendo no rego argenteo fi o
Quadra em que o sol de nós desvía'
o s raios
E vai da Libra ao furibun do Scorp io ( 1 3 )Cantella então cultores , chega o tempo
Do m omento esp iar da sementei ra.
N'HUM d ia claro e secco,e quando a terra
Bem m ovida e quebrada,humida esteja
Em proporçao tão j usta , que nem vôe
Em pó subti l nem c'
o trabalho unida
E compacta s e torne, avançar deve
Dextro s emeador , e com mão certa
_Espalhar pelas lavras a semente .
He após os seus passos,que tra tan do
,
Conduzindo traz s i ligei ra grade,
Ocyroe ( 1 4) cobre os grãos co, a terra sol ta .
Di toso o lavrado r se no seu campo
N㺠fica hum só torrao que o germe esmague.
CANTO t. 35
A esta çao,o tempo
,a na tureza
Do solo que se arou ,e a experiencia
De versados cultores tão s ómente
Devem determinar a quantidade
Dos grãos que á mao convem lançar na terra ;
LA onde as frias aguas demoradas
Fazem apodrecer íi o hum ído inverno
Os tenros germes , as semen tes cobre
Em vez da grade,huma charrua propria
,
Que levantando a terra a hum lado e ao outro,
Deixa no me io hum fosso aberto ais aguas
E o grao desponta em al ternadas cintas .
He assim que o s cul tores,implorando
A clemencia do s ceos , a sua esp” rança
No seio de Cybele depo s i tão .
A terra desce o invern o , as grossas chuvas ,Os rij os furacões
,a branca neve
Molhão, batem , alvejão p elo campo .
36 G EORG ICAS .
Os mortos ramos com torcidos bracos ,As espinhosas bal sas s empre verdes
Interrompem a alvura das campinas
Que branquej ão coº
c respç c a ram elm
Fumão ao longe as rus ticas choupanas,
Aonde o lavrador sentado a o fogo
Os membros seus requenta agasalhado ;Em quanto o ca çador p ela s encostas
O veado l igeiro a cerva esquiva,
O j aval i c erdoso acer ta e mata ;
Ou cº o s galgos p ersegue na c arreira
Tímida lebre,que ligeira s al ta .
Este espera nas turva s alagôas
O pato gra snador,altiva garça ;
Aquelle a saborosa gall ínho la .
Assim de bellas Nymphas rodeada
Cingido o seio de grossei ras p elles,
Com a al j ava n o hombro,o arco em punho
A soberba Diana lá da Carí a
No s altos montes e brenhosos bosques
CANTO L 37
Acossa,vence , e em terra as feras lança .
EM tanto a natureza desenvolve
Os preciosos germes ; j á despon tão
As tenras folhas e de hum verde alegre
Esm al tão a s campinas ; o s cul tores
Vem cheios de p razer correr o s campos,
Rogando ao ceo que aj ude o s seus t rabalhos ,E o s recompense c o' a abundante espiga .
Ca s c a a fresca , a vi çosa primavera
Reverdescem o s bosques bro tão flores
Os fructos p romettendo ; o so l derrete
As cry stall in a s neves que fundidas
Vem engrossar as rapi das ribeiras ;As implum adas aves amorosas
Dº entre a n ova verdura alegres cantao ;
Zephyro bei j a as rosas , e convida
Os Satyros saltantes e o s ga lhudo s
Caprinos Faunos a seguir as Nymphas
3 3 GEORG ICAS .
Por entre o s verdes troncos . Vem,oh Nize
,
Juntos os ledo s campos percorrendo,
Das novas flores,que do s ramos pendem
Odorantes capellas teceremos ;Vem do lindo lila z da purpurina
Fragrante rosa e cand ida açucena
A frente coroar . Vinde,oh prazeres
,
Companheiro s fi ei s da tenra Flora,
Suaves risos alegrai os campos .
A S redeas sacudindo á s niveas pombas ,
Venus no carro de ouro desce ! t erra .
Vem ap'
ós ella c o ' a s douradas tranças
Nos c o llo s de alabastro ao vento sol ta s
Tecendo as Graças m i l gen tíz chore'as
E em leves gyro s voltej ando Amores .
Prazer doce o s trabalhos acompanha
Do agricol a feli z , e de continuo
Amorosas canço es Echo repete .
ÁQUEM trigo tremez cantando lança
CANTO L 59
O.lavrador ! terra e (1, esta sorte
Assegura prudente o seu sustento ;
Cresce aqu i a cevada , que n ascêra
No precedente outono ; al li ! terra
He lançada a que he prºpria á primavera .
M ilho fei jão de especi es variadas
Alem recebe o solo grãos lentilhas .
Aquem,curvando ao j ugo a larga frente ,
Os novilhos co'as leiva s v ao cobrindo
O verde ornato do s fecundos campos ;E entre o s vi çosos trigos j á nascidos
Em bandos a s alegres campon eza s ,Com festivaes a c cen to s o ar ferindo
,
Cuidadosas separao a s más planta s,
E lhes arrancão a raiz nociva .
Qm: segredos , oh Nize que belleza s
Das flores a estação n os apresenta !
Segunda c reação do vasto mundo
Novos entes ser nella recebem ,
/,o G EORG ICAS .
Sej a entre os an imaes,sej a entre as plantas :
De Co lcho s m anda o si gno m i l amores
Reinar n o s ares vol tej ar na terra ,E o s humanos alegra p
'
romettendo
0 com o precioso de Amalthea .
Mar s onos electricos var iao
O es tado da atmo sphera ,e a c c elerao
Ora e o ra retardão a carreira
Do s succos n as entranhas j á das plantas
E j á do s an im aes,de Apollo o raio
O ra as nuvens encobrem , e o ra brilha ;
Ora sôão trovões sobre as montanhas;
Ora desce huma chuva fecundante
Derramando a frescura pelos vall es .
MA S j a na quarta divisão celeste
Aonde curva o'
Can c ro ingentes braços ,
Entra o luminar do Orbe ; o quente esti o
Succede á temperada primavera .
42 G EORG ICAS .
Continue a Olhá-los c om piedade
Té ao ul timo instante das colhei tas .
Mo STRA-SE na extensao dos far tei s campos
Não só a esp'
rança do cul tor , mas nelles
Se vê de huma naçã o todo o thesouro .
Afasta , oh Ceo'
piedoso,o horrido estrago
Da saraiva cruel que em hum momento,
Companheira do raio furibundo
Extingue todo o bem com tanto esforço
E tanto suor ganho ; afasta as Chuvas ,
Que ás vezes alagando as louras messes ,Das ribeiras engro s são as correntes
E arrastao entre as ondas pro c ello sas ,Entre as ruínas com enorme estrago
A vital nutr i çã o de hum povo inteiro .
Flagel lo s horrorosos que a vingança
Dos Numes i rritados muitas vezes
A terra manda ; após o s quaes levan tao
A mofi na in dígencía a magra fom e
CANTO 1 . 43
A pobreza a miseria as mãos mirradas,
E empun ha entre ellas imp ia fo uce a morte .
Mas ouve o Ceo as preces do s cultores
E justo recompensa o s seus trabalhos .
Li no campo as espigas ondeando
Figurão hum mar de ouro a branda palha
Amarella se mostra,o grão condensa
O lac teo succo ; he tempo de cortá— lo
Antes que mui to secco o ri j o Eolo
E a mão do c eifado r po r terra entornem
O fructo rô ta a espiga . Oh fl ava Ceres,
Vem tu m esm a'
guia r os c ei fadores ,Empunha a curva fouce e pros tra a plan ta .
CAMPONEZE S , correi , atai o s molhos ,Erguei-o s em pavêas que d íríjão
As espigas ao c e'
o,util can tell a
Em todo o tempo,e necessaria quando
A chuva tem molhado ou molha os trigos ;
44 GEORG ICAS .
E tu ,oh guardador
,prende á s carretas
Os forçosos novilhos que he j á t empo
De transportar o s paes ; porêm evi ta
A força do calor para o transporte,
Pois larga então mai s grãos a sec ca espiga.
MA S j á do fertil campo o s louros molhos
O lavrador t irou Ceres o corre
Gostosa de lhe achar curta resteva
I gual po r tod a a parte e fornecida .
Vamos agora,oh Nize
,ver as eiras
Onde o trigo e cevada estão em medas"
E aonde o lavrador contente esp era
O premio e recompensa do s trabalhos .
Sobre o cume de hum monte percorrido
Com cyl in dro pesado ou malho forte,
"
Unido e duro , se debulha O tri go .
EU não descreverei ora,oh cultores
,
Machinas proprias a empregar nas eiras,
CANTO I . 45
Ou seja para o grao CleSPl I' das valvulas
,
Ou para o separar de estranhos corpos .
Novos trabalhos minha Musa esPerão
E de outras producções eu passo oh Nize,
A narrar— t e as van taj en s e a cultura .
CA NTO II .
ão são o s al tos muros das cidades
As arcada s os porti cos,os templos
,
Os palaci o s dos grandes que pintar- t e
Vai,oh Nize adorada a Musa minha .
Altos colossos de tropheo s ornados ,
Erguidos obeliscos,de que inda hoj e
S e glo reia o Egypto , do meu canto
O assum pto nao serão . Pinta r-t e eu quero
Do singelo cul tor modesto a sylo
Qual elle deve ser,simples
,alegre
E proprio ao util fim de seus trabalhos .
48 G EORG ICAS .
Traçar-t e vou o s c omm odo s aprisco s ,Os sadios curraes
j,o s bons celleiro s
,
A adega onde de Ba c cho o s succbs fervem
Os lagares aonde espuma o mosto,
E os que a azei tona c om esforço espremem
E ao agradavel mi sturando o util,
Farei que flores mil em torno c resçao ,
Fructos de alto valor , fresca verdura ,Que do colono o a sylo aform o seem .
QUANDO o s homens errantes,como as feras ,
Do s fructos do c arvalho se nutrí ao ;Quando de hum arco e setta s sempre armados
,
Vív íão de segu i r p elas montanhas
As ín dom i tas feras , ou coº as redes
A s aves em ciladas apanhavão'
,
As grutas , a s cavernas contra a s Chuvas
Contra o s ventos c rueís e contra as neves
Erao o seu abrigo ; sem cui dado
Sobre o futuro,á n utr içao de hum d ia
50 G EORG ICA'
S .
A chuva , o vento o tempo in ex oravel
A fraca hab i ta çao lançou por terra .
DE SD E entao os humanos trabalbãrao
Em c imentar com massas p egaj o sas
As duras p edras,em formar paredes
E mais firmes a sylo s ; finalmente
Em as obras c ompôr de a rchite ctura ,
Aos trabalhos ruraes in dispensaveís .
TRA C EMOS,Musa minha pois que o tempo
Já ao s homens mostrou de que maneira
Deve o asylo seu ser fabricado ,
Tracemo s da morada do s cultore s
Quaes devão s er a ei qi os íção e as partes .
DE risonha collina em branda encos ta ,
De Naiades saudaveis refrescada ,
Vizinha a hum solo grato aos pomareíros
E grato ao s hortelões , onde Pom ona
CANTO I I . 5 1
E Vertumno floresção c om van taj em
Ditoso te c on tem plaíse pode'res
Da tua habitação lançar a s bases ;
Longe da , v ízínhança das lagôas
Fó co s de c orrupçao , que o ar v i c xao
_
Longe ,dos valles hum i do s e frios
,
Onde hum ar nebuloso pouco a pouco
Da vida diminue o lume escasso,
E o saudavel vigor aos membros l ira
Lugares onde o s tri s tes habitantes
Sobre o pallido rosto impresso trazem
De hum clima ingra to o desastroso cunho
Onde o s fraco s m or taes langu ídos sempre
Não lhes he dado em torno á frugal mesa
Ver a ssen tarrse a prol e n umerosa ,Honra das cans
,e da velhic e amparo .
! oj e tambem de hum si tio aonde as fontes
De lympha escassas,no calor do estio
Recusao ao s rebanhos a bebida ,E às hortas e pomares a frescura,
_
52 G EORC ICAS
EXPOSIçOES se encontrão desabridas ,
,Que se devem fugi r dª onde lutando
Em viva guerra os indomados ventos
Parecem des terrar a prole humana .
Allí a s tempes tades furiosas
Gi os troncos m ais robusto s inves tindo
Os derribão p or terra allí no inverno
Aqu ílão regelado que assobia
Fere,opprime o cul tor
,offende as rezes
E aí morte certa o seu rebanho entrega .
HUMA vez escolhido o lugar p roprio
Com m ethodo começa o s teus trabalhos .
De hum pequeno cultor o pobre a sylo
Não i guala d o s riccos a morada .
Aquel le que pequeno s campos ara ,Menor curral precisa e menor tec to
Menos tendo a cobrir ; porém a ordem ,
Boa'dísp05 1çao util limpeza
,
A singela elegancia,necessarias
CANTO I I . 55
São tanto á humilde choça do s pastores
Como á morada do colono ricco .
Ca da hum proporciona na grandeza
Os edifí cios seus aos seus trabalhos,
Bem como às pro ducções das” t erras suas
,
E hum plano regular dirige o todo .
V i“
: com que ordem a abelha indus triosa
De branda cera as cellas organisa
Com que ordem junto !s l ímpidas correntes
O castor seus asylo s edifica ,
Com que cuidado a s aves amorosa s
Para os filhinhos tecem fofo ninho
Entre os ramos das arvores copadas ,
E no seio da terra a s prov iden tes
Formigas o sustento depo si tao
Em ordenadas covas resguardado .
QUANTO folgo de ver o s louro s trigos ,Producto da cul tura cuidadosa
54 G EORG ICAS
Em hum limpo c el leiro recolhidos ;
Pelo ar conserva da ao grão de Ceres
Sec cura e fresquidão ,c om que elle folga ;
Bem construído s , branqueados muros
Ao rato roubador ímpen etraveis
Onde fendas não ha em que se abriguem
Os maligno s insectos roedores
De finas redes de tec ido arame
As pequenas j anellas guarnecidas ,Com caixilho in ti rior de rala tea
Que vedar possa á borboleta a'
en trada .
Se allí po r vario s tubos , t é ao meio
Do grão amontoado, o ar circula ,Em perfei ção guardados largos an no s
Os tri gos podem ser,sem que o s ataquem
Funestos males que lhes poupa a industria
A industria m ãí fecunda das riquezas .
QeANTA S vezes colheitas abundantes
De trigos e cevadas,que ao s cul tores
CANTO II . 55
Dera hum terreno grato e generoso
Quantas , tenros legumes precio sos
Producto de fadigas e trabalho s,
São a preza do rato m alfazej o
Chega o a corromper— se ou devorados
N'hum momento se v êmpo r mil insec tos
Do incauto colono penas j ustas !
Oh quanto irri ta o Ceo descuido
Que entrega á c orrupç ue perder deixa
Bens ao sus tento o s !
Oh quantas vida s da m i seria garras
Poderíão roubar s ómente as perdas,
Que a van pregui ç a causa aos lavrador es !
Do teu suor o premio o dom dos Num es
Não exponhas po r tanto a aniquilar-se
Mas segundo os teus meios ergue ao lado ,
Do tecto aonde hab íta s,hum c elleiro
Em que segura tenhas a abundancia .
Do s palheiros all i tamb em levanta
56 G EORG ICAS .
O reparado abrigo,aonde aquelle
Que attent'
amente cuida de seus gados,
Provisão guardará de palha e fenos ,
Sustento necessario,e mais que todos
,
Ao b o i,
'como ao cavallo provei toso .
D'alli tambem defende com cuidado
A entrada ao rato que de hum cheiro impuro
Infecta as prov que não consome,
E aos malignos que m a culão
Det'
rí orao stento .
Circule o ar por entre os feno s,
Para queferm en tan do não se ac cendão
Ou perca o o sabor á s rezes grato .
PAR A ev i ta r fadigas e transportes
Sob os palheiros os curraes c ollo cão
O S próv ído s agrícolas ,'
e á s grades
Fazem por alçap ões baixar os fen o s ;Mas para conservar aos uteis gados
A robustez ,, vigor , sa! de e força
58 GEORG ICAS .E
Nos diversos empregos e trabalhos
Em quanto p arte,vo li tando ao longe
,
Ex trahe o sueco das cheirosas flores
Parte prepara o mel e a cera branda
Humas da nova prole a ttentas c uidão,
Ou mor tos corpos do corti ço lanção
E o res to contra os zangão s conspirado ,Da colonia extermina hum fardo inutil :
Tal,digo o lavrador do s seus cercado ,
Providente o s trabalhos di s tribue
Banindo o ocio da industr ia im i go .
Alem faz conduzir o mato ás covas,
E á s rezes estender hum novo leito ;Aquí faz padej ar de hum lado ao outro
O trigo no c elleiro amontoado ;Humas vezes percorre os seus palhei ro s ,E reparar o s faz das fria s aguas ;O utras
,manda abrigar do tempo iroso
Os utei s instrumentos , que descausão .
CANTO I I .
Poa êm can to,dos vario s edificios
Em isolar c ogita as varias partes
A fim de prevenir do incendio o estrago .
Un e da natureza a simples graça
Com as obras da arte . Oh quanto he doce
A o s olhos,descansar sobre a verdura
Das a rvores v i çosas,que interrompem
Aqui e alli o s muros branqueados !
Quanto agradavel a frescura e sombra
Das verdes cºpa s n o calor do estio
Quando de hum puro ga z os aros enchem ,
E huma aura impura 6) próvídas embebem
Na primavera m i l fragran tes flores
Ver pender em fes tões ; no outono o s fruc tos ,Gratos ao paladar
,colher nos ramos ;
A ttrahido s das arvores c o' a sombra
Os mimoso s cantores das fl orestas
Vem alli fabricar o s brandos ninhos
E mi l concerto s variados so l tão
Em torno a cas a , que o culto r hab ita .
60 G EORGICAS .
Por i s so he que elle esplan a contra os muros
Dos edificio s s eus diversos troncos,
Com o junco e ci
o vime subjugados ;Ou sej a o deli cado pecegueiro
Ou sej a .o dam asqueiro ou a gingeira ,
A pereira no inverno preciosa
O limoeiro a l imeira que se adorna
De sabo rosos Odorantes fructos,
A vide de que pendem doces cachos .
HE ni
hum asylo tal , oh Nize amada
Que vê na dóce paz correr seus dias
O que i sento do ocio e van cubíça ,
Faz do trato,rural o seu estudo .
O s primeiros humanos imitando ,
Cul tíva cuidadoso a terra grata ;Se lhe lembra dei tar— se á fresca sombra
De frondoso carvalho sobre a relva
Os rio s brandamente murmurando
As aves descan tando nas florestas
CANTO I I . . 6 :
Tudo o convida a so c egado s somnos .
Se não queima a seus p és a dependencia
Da lisonj a o incenso se 0 n ao c erca o
As pompas e as grandezas ao seu lado
Habita a doce paz vive a abundancia .
Do diurn o trabalho fatigado
Folga de ver ao descahí . da tard e
O pastor que tocando a doce avena
As ovelhas c onduz ; no Cheio tarro
Aquel le lhe apresenta o branco leite,
E a esposa os n íveo s queij os e a coalhada .
Mai s tarde O S l entos bois trazendo assom ao
Reclinada a charrua ao j ugo presa ;Mugindo alem as v ac cas criadoras ,Dos novilhos segu idas apparecem ,
Que ex pi
rim en tan do as inda tenues forças ,IIun s c
'
o s outros em luta j á se en saíão ;Os rafeiro s c i o gado
,que p reservão
Do lobo roubador,no pateo entrando
. ,
6
62 GEORG ICAS .
Lhe vem as maos lamber , e em torno
HUM recrei o innocente finda e c, roa
As ho ra s dest inadas ao trabalho ;Depois de recolher as mansas rezes
,
O guardador ao som das tesas c ordas,
Cantando dansa em gyros co ' as pas torãs .
Em tanto a par da esposa rodeado
Dos tenros filhos,lavrador ditoso
Ensinando-lhes vai c o ' proprio exemplo,
Linguagem expressiva a limitarem
Os desej o s a gozos innocentes,
A despre zar o orgulho a ambição louca
Oppos to s s empre á solida ventura .
NA O de outra sorte quando ao som sublime
Das lyras de ouro os transportados vates
Da pri sca i dade a dita des crevêrão ,
Os quadros seus ornou de vivas côres
O p incel eloquente da verdade.
CANTO I I . 63
HUM tempo houve feliz em que as augustas
M ãos do s Monarcas empunhando a es teva,
Em doce paz o proprio campo ará rão ;
Sem ma i s guarda que a estima de seus povos ,
Sem mais bens que a virtude e o seu trabalho,
Era o publico bem o bem da patria,
A dita s ó a gloria a que asp i ravao .
MA S de todo m udou da terra a fa ce
Mal que a soberba c om maligno influxo,
Aos del íc to s no mundo abrio entrada .
Desde então,buns do s outros inimigos
,
Os apim aes a terra en sanguen tárão ;
Roubou o lobo as míseras ovelhas
O aço r empolgou a rola fraca ;Contra o aço r a aguia a garra aduncaDe improvi so lançou
,e o leão fero
No s outros an im aes cabio faminto .
Sílvá rão pelo campo horriveis serpes
Destillando mortíferos venenos .
64 G EORG ICAS .
Desde entao se fechou da terra o seio ,
E em vez de frhc to s pro duzío abrolhos .
Os r io s das barreiras triumpbando
As misera s campinas a lagá rão
Envolveo-se de luto o fi rmamento ;Rebram á rão trovões ; ardentes raio s
Fulm ín á rão o s tronco s e tremendo
Chammas de s i lançou a prºpria terra .
Fonçºso fo i entao que os mesmos hºm ens
Com armas huns dos ou tro s se guardassem ;Fo i forço so cingir de espinhos duros
As proprias posse ss ões ; em toda a parte
Se leo o meu e o teu,e em toda a parte
Do meu e teu perversos inim igos
Surgi rão á porfi a ; a dura força
Da Jus ti ç a na m ao tomou a espada .
VOLVEO do tem po a lutuosa roda
Mai s e mais as desgraças se augmen tárão .
se C EORC ICAS .
"
Vi a fom e cruel . m as que horrores
Te pinto ob Nize be tempo em que d eixando
Tri s tes scenas,que o Ceo pun in do
'
c rim es
Ao m undo apresentou , retome a avena
E voltando ao a ssump to que dei x á ra ,Os c elleiro s de Bac chº te descreva .
DE Phebo 9 ardente olhar , que os lõuro s cacho s
A s sucarado s torna e precioso s
Quando ainda pendentes da videira
De pampanos vi çosos s e co ro ao ,
He a o li cor das uvas esp remido
De hum effei to fatal ; m ilhões de vezes
Hunr v inho que sem pej o s e off'rec êra
Do div inal Olympo a par d o nectar ,Em bum lugar exposto á calma ardente
,
Em azedo vinagre s e converte .
D i: Nax o nasmontanhas , que povôãoPo r toda a par te verdej antes cepas
CANTO n . 67
Huma gruta s e vê de toscas p enhas ;
De bum lado e outro crys tall in as fontes
Brandamente sab ín do de entre as lapas
Sussurrão c om doçura ; as lentas vides
De Apollo ao s raios c om viçosas folhas
A entrada impedem e subindo ao cume
Do s alamos frondosos que a guarnecem,
Pendem em mil festões por toda a parte .
Huma relva mimosa e sempre verde
De varias lindas flores esmaltada
Lhe forma o pavimento alli da calma
Jám ai s penetra a força hum ar suave
De contínuo tempi
rado se respira
Entre as beras que a par das negras bagas
Mo s trão lustrosas folha s sempre-verdes .
No mai s p rofundo dºes te fresco asylo
Guarda o ebrio Sileno o doce mosto,
Seu amor,seu desvelo e seu cuidado .
Esculpidas es tão na penedia
A s insignes v i c torias do Thebano
68 G EORG ICAS.
Quando tirado por malhados tigres ;Entre o bando das fervidas Bacchantes
,
A Asia suj eitou,e emvez de lança
Na dextra maneava hum verde thyrso .
Vão após o seu carro foliando
Os Satyros galhudos e os caprinos
Faunos de verdes heras enramado's .
Cem amphoras que ainda aroma ex halão
Cem torneados vasos e cem pelles
Pela gruta esparzidas se dev i são .
Imitemos Sil eno em seus cuidados ;Sej a o seio da terra quem resguarde
O S succos , que nutrira a superficie .
HUMA adega na terra sepultada
Conserva em todo o tempo util frescura .
As melhores madeira s alli formem
Pelas cintas deferro subj ugadas
Capazes vasos que o licor con tenbão .
Alli a s celha s,dornas quarto s
,pipas
CANTO II . 69
Devem sempre abundar , e fí nalm ente
Será perfeita adega,em que sabín do
O mosto de hum lagar mai s al to que ella
Por c an aes aos ton eís he conduzido .
So s a pressão de fortes parafusos,
Da uva escorra o sumo a ssuc arado,
E fermente nas cubas sempre l im pa s
O rubído li cor de roxos cachos .
Da cava no mais fundo em transparentes
Bo telhas sej a posto com cuidado
O bacchico licor que a rolha fecha
E c o? lapso do tempo se melhora .
A s sm para apurar o s dons de Evon s
Forme O habil cultºr as ofli c ín as
Junto do tecto seu ; assim eleve
Solici to alm azen s , em que recolha
Da arvore de Pallas a colhei ta .
Mas nas m argens de hum rio ,ou de hum regato
70 G EORG ICAS .
Aproveitando da agua util esforço,
Forme o lagar , aonde as fortes gal gas
Esmaguem a azei tona,e onde a imprensa
O oleo prec ioso d'ella tire .
Porém empregue aqui todo o cuidado
E sem pºupar trabalho s nem fadigas,
Huma Offi cina tal limpa conserve .
Mas he j á tempo ,oh Nize
,que deixemos
Do agríc o la a morada ,e sobre as aza s
Da minha Musa que incessante v ôa
.Vem o terreno ver que em torno a cerca .
ALL I verás primei rº em c an aes v arios
A lympha em tor to s regos serpej ando ,Os lago s procurar , onde p intada
A abobada cel este se devi sa,
D' onde de Phebo o s reflec tidos raios
A cem partes di vagão inconstantes ,E dº allí sabiamente repartida
Levar pºr toda a parte util frescura,
CANTO II . 7
Matando a sede á s sequiosas plantas .
VERA S nao longe as esplanadas arvore s
Com symm etrícos ramos revestindo
Os muros d'e sta sor te embelezado s .
N'outra parte,deixados á natura
Verás os trºnco s de sombrios bosques,
A u
Que,el evando — se as nuvens alard eao
A natural belleza e liberdade .
Alli terás na fresc a p rimavera
Das flores variadas a fragran c ía ,
Sombra e fres cura no calmoso estio
E no outono no vime entrelaçado
O s fruc tos colherás de m il sabores.
ALL! a triumpban te m ão da arte
Fará criar no marmeleiro a cerbo
A pera saborosa ; a amendo ei ra
Nutrirá c om seu succo os grossos pomo sX
Do pecegue iro e as rosadas flores
72 G EORG ICAS .
Pºndo de parte o abrunheiro agreste
A selvagem fereza , presta o s succos
A branca,ou rubra ame ixa del icada
E conservando a r'obuste z anti ga,
Doc il às mãos da arte ufano brilha
Dos adoptivos fruc tos carregado .
EXULTA º pom areiro que m ettendo
Em hum tronco selvagem, qi1e rachá ra
De hum cultivado ramo hum a vergon tea ,
A casca unindo á casca o lenho ao lenbo ,Ou na fendida p elle introduzindo
A fechada borbulha,ou finalmente
C'
o habi to ex frior de bum fertil ramo
Outro ramo vestindo agreste e forte,
S ó,com sua arte , u tei s prodígi o s cria .
T anto pode ampliar-.os p roprios gozos
A industria do s mo rtaes quando a ex pi
rienc ia
Mes tra das artes fielmente os guia !
74 G EORG ICAS .
Taes quaes a ma l c ommum propíc i a o s cria
Para que á sombra delles nossos netos
A mão b em dígao , que formar-lhes soube
Es tes docéis copados de verdura,
Es tes fo cos de fructos sabo rosos .
PLANTEMOS indano terreno proprio
Com ordem cada arvore ; de bum lado
As mai s fracas s e vej ao de outro as fortes ;
De hum as que a folha largão ,de outro aquellas
Que possuíndo eterna mºcidade ,
Huma viçosa folha sempre adorna .
Tu vem primeiro,lá da Armenia fructo
,
Damasco saboroso fino e bello
E nas tuas especi es variado
Occuper hum terreno nutri ente,
Leve e fino ; j áma is cortante ferro
As braças te mutíle em liberdade
Estende em torno a ti fecundos ramos .
CANTO I I . 75
P s mz º q ue enxertando ligneo tronco ,No lugar mesmo em que a semente o dera ,
Nesse mesmo lugar seus fruc to s colhe
Os seus vind ouro s bem'
d í rao seu n ºme.,
E o tronco prezarão que assim criara .
Nªum igual solo ob Nize plantaremo s
Com desvelo o mimoso p ecegueiro
Podado a ttentamente , e contra os muros
Preso com arte em regular figura ;O tronco das vermelhas a zaro las
Dará na primavera as l indas fl ores
Em cachos agradavei s , e n o outono
Virão orná- l a o s agrodo ces fruc tos .
Da gingeíra o estio os dons sazona
Como o s da cerej e ira e colheremos
As avelan s que dobre casca envolve .
A cerej eira ama º calcarío assen to, ,
Assim como a gingeira , e, pelo enxerto
Mais que pela semen te prompta cresce ,
76 G EORG ICAS .
A aveleira em'
terren o fresco e solto,
Das sementes nascida dará fructos,
E às melhores ameixas , ao s abrunhos
Daremos no vergel lugar distin c to .
PROVEND O á estaçao fria em que cerrados
Os thesouros fecundos de Pomona ,Nem se quer a verdura o s vergeís orna ,A maceira de especies va riadas
Que se c'roa de doces e agros pomos
Plantaremos nos altos com van ta j em .
A S diversas p ereira s que a l im en tão
Fructos em toda a quadra preciosos
E de duração lon ga , sobre o tronc o
Da sua esp eci e de s emente vindo
Ou sobre o marmeleirº enxertaremos ;Arvore do c i l que obedece á fórma ,
Que ao pomareiro agrada 6 Ora reveste
S eus murºs de verdura o ra se eleva
Livremente no ar e até em leque
CANTO I I .
Forma paredes de agradavei s ruas.
A fi gueira creadora de frescura ,
O marmeleiro,que fornece o s pomos
A arte d o copeiro,e o s bellos tronco s
As enx er tias ; a arvore a que outró ra
De Pyram o tingi o o sangue o fr,ucto ;A uva espim o pirl iteiro a çarça
Emulas brilharão no pomar nosso .
Mas na parte dos ventos abrigada
Ostentará a par das verd es'
fo lhas
Os aureo s pomos e fragran tes flores
A laranj eira ; do s suc co so s fructos
Se 'ornará a limeira preciosa,
A par do limoeiro azedo e doce .
Poa entre o s varios trºncos repartida
Murmurará
i
a lympha branda e clara
Necessaria fr escura derramando .
Nº outono,sabia mao
,de inuteis braças
7 8 GEORG ICAS .
Despo j arz'
i as arvores e attenta
Na doce primavera os curtos garfos
Nas fendas m etterá dos novos troncos,
Ou nas abertas cascas as borbulhas
E com o prºprio unguento ( 1 7) humedecido
As chagas cobri rá das plantas sua s .
TAMBEM as frescas aguas , que diman ao
Da risonha collina indi car devem
A horta onde as mimosas hortali ças
Cobrem a terra , e onde a industria e a arte
Se prezao de nutrir succosas plantas
Da natura os esforços ajudando.
Allí do hortelão mao cuidadosa
Para as aguas reger cantei ro s forma
T i rados ao cordão p equenas rua s
Para o transporte dos adubos deixa ,
E servi ço das plantas . Allí cre sce
Repolho tenro cºuve deli cada ,
A branca alface , o nabo turbinado , ( 1 8)
CANTO I I . 79
Rábão picant e , b etarraba dºce ;Enroscando-s e alli p elas la tadas
O feij ão,
tem pendente a branda vagem ;
Cresce o espinafre,a varia ervilha cresce ;
O alho,a cebo la sob a terra engro ssao ;
A verde sal sa o manj ericao verde,
O coentro , a tufada p impinella ,
Melancia s aquosas,e fragran tes
Meloes assucarado s,os pepino s
AS abobº
ras de esp ecies differentes
Beringelas c eno íras rabanetes
Os espargos,m astruço s , alcachofras
Abun dão nos canteiros espalhados .
NUN C A alli fal tão variadas planta s
Que sustento , ou regalo ao cultor prestem ;
A que teme o calor,continuamente
He pelas frias aguas refrescada,
E aquella a quem a neve e o frio assusta
O hortelão cuidadoso a n torno a abriga .
80 G EORG ICAS .
A toda a parte leva o gratº adubb
Do pequeno carrinho a leve ca ixa ;O sacb o sem descanso nao perdoa
As más hervas, queemtorno !s plantas nascem .
O cultor. que be de meios abundante
Para o seu gozo allí a s ruas orna
Dos verdes buxos e de murta verde
A tesoura cortados dá cheirosa
Baixa alfazema , ou teixo á v i sta'
gra to ,
Do nardo , ou dos arbusto s que ma is ama.
O morango es to lho so ( 1 9) allí floresc e ;
A rep tante.
(20) bo rtelan a ségurelha ,A“
m anj erona a azeda a bergamota ,
A chicorian o fertil solo crescem ;
O tomateiro , 0 pimentão v erdejão
Vaidoso s com os fruc tos purpurinOs
N A O cantarei , oh Nize , os dons de Flora ,o o
/
O trato dos jardins nem o suave
82 G EORG ICAS .
A cºr oa que de myrtos me formaste ,Nas verde s balsas por tua mao colhidos.
NA O deixarei p orêm n º esquecimento
As tenra s aves que o cultor sustenta
E que a habita ção sua embelezando
Seu pequeno cuidado rec ompen sao .
Companhei ras do agri cola o meu canto ,
V inde agora es cutar , vós a quem cabem
Os trabalhos domestico s em sºrte .
Attentas vigiai dos brancos ovos
A lenta incubação , e aos tenro s p intos
Distribui a varia alímpadura
Que no crivo passou ou o quebrado
Grao do milho á s gallinbas , e aos nadantes
Alvos pato s as bervas , e maos fructos
Cozidos p_
reparai,como aos vaidoso s
Gordos perus , na infancia deli cados ;
O vizinho pombal de Cypria as aves
Co, a tenra prole sem cessar povoem
CANTO I I . 83
Gozem todas no abrigo co, a limpeza
De bum trato regular,de huma aura pura .
T ENHO-TE,oh Nize m inha
,desenhadº
O asylo do chltor . He tempo agora,
Que bum momento de par te os pinceis pondo,
Interrompa o trabalho e deixe avena ;Hum vas to campo inda a correr me resta ,
Mas se hum só olhar teu me recompensa,
N㺠temas Nize,de correr que eu cause.
C A NTO III.
Dmx muo s , m inha Niz e , o ledo asylo
Do ditoso colono , abandonemos
As planta s annuaes e os seus trabalhos
Deixemos as lavouras repetida s
De que o trigo carece ; poi s ferindo
Palla s a terra,de seu seio el eva
Os pacífi cos ramos a oliveira .
Oh arvore infeli z , ricco thesouro
Do ingrato lavrador dos Lusos campos,
Já começo a cantar te,e em teu soccorro
Vou chamar a razao e levantá-la
Sobre as azas da simples harmon ia .
86 G EORG ICAS .
TU,Deo sa das s c ien c ías e das artes
,
Ora a cantar me aj uda o teu triumpho,
O troncº que ven ceo com seus thesouro s ,O soberbo animal
,que o Deos das ondas
Qual hum raio sahir fez do oceano
Solta s ao ar as o ndeadas Cli n as ,
E rguido o collo e Chammas resp irando .
OUV I-ME ob lavrador deponde os erros
Que a antiga usança sem cessar consagra ;A mão calosa do severo tempo
Eríge em leis o s m ais crueis abusos ,
E o vul go resp eito so abate a fro nt e
Perante os erros d a remota idade .
Li nos incul tos soli tari os campos,
Onde não en tra da charrua o ferro,
Filho da naturez a e d'ella al umno,
Se reproduz o forte zambu j e iro ;Nascid o da semente derramada
CANTO l l l .
Em hum terreno proprio té ás bordas
Do neg ro abysmo a longa raí z lança
Vertical e robusta d'esta sabem
Forçosos ramos que o terreno ao longe
Rompendo abraçao , adornados sempre
De nutri entes capíllares (2 1 ) tenues
Tardo em crescer , na duração parece
Rival da eternidade alçand o a fronte
Zomba do vento,ri das tempes tades ,
E de fºlhas se cobre verdej ante s .
A profunda rai z, que em terra desce ,
O sustenta e vigora ; quando a cul ta
Oliveira provinda j á dos ramos
Já das raízes,be m ais fraca e debíl
,
Teme o rij o aquil㺠,teme as procella s
E do tempo não zomba tão vaidosa .
TU pois,a quem propicia amiga sorte
Deo de taes troncos em partilha a cºpi a ,Cºm mao imp i a a terra nao despoj es
88 GEORG ICAS .
Bi es te thesºuro ; mas cortando o s ramos ,O caule (2 2) poupa e inserindo n'elle
Novas vergon teas , bum olival preza
De todos o melhor e o mai s robusto .
On ! quanto fo lgarí ao nossos netos ,Se em alinhados ren ques , pelas terras ,Para seu bem lançassem o s prudentes
Di
azeítona o s caroços ! Se imitando
Das aves a li ç㺠(23 ) em largas dornas
C'
o pingue adubo e c o º
a'
aren o sa terraAccelerando a força germinante
Venc esse a arte a tarda natureza ;E c o
' a cultura hum olival surgisse
De robustez , d e duração eterna !
PORÉM ,depois que a industria e que os cuidados
Do s próv ído s m o rtaes aos campos cultos ,
Aos terrenos movidos e adubados
Troux erão a oliveira,es ta apresenta
90 G EORG ICAS .
Por indivíduos de huma mesma espec ie !
Seria então igual'em tudo o t
.rato
,
A flores cenci a igual i gual colheita
E o fructo a hum mesmo tempo amadurando,
Por igual fornecêra hum puro azei te .
SEM a ttenção j áma ís prosp erar pode
Trabalho humano ; da .razão dotado
Estuda,oh lavrador
,observa e pensa .
Porêm envolta em 'condensadas nuvens,
E cercada ' de horrenda escurídade
Triste ignorancia habita em nossos campºs .
Jazem na indo len c ía sepul tados
Entregues ou ao ocio ou aos prazeres
No luxo consumindo o s opulentos
Os bens , que o lavrador com suor ganha .
De telas de ouro os aposentºs cºbre
O habitante inutil das c idades
E hum tris te colmo m al do tempo abrigaDo pobre lavrador a humilde choça
,
CANTO I I I . 9 !
Nada desperta nada anima a industria.
Na miseria e desprezo abandon ado
O lavrador prosegue na ignorancia,
E movido s ómente pela força
De hum tri ste necessario sem desvelo,
Como o pai cul t ivou,cul tiva o filho .
FUNr sro s erros !Deperece em tanto
A oliveira tarda em cresc imento ;Cobre o inato o s terr enos mais fecundos ;No ferti l valle o j unco esteri l cresce ;Despovoão
-se as miseras aldêas
E ex haurida na çã o,vê sem recurso
"
Faltar-lhe a força , e qual o corpo enfermo
A quem fata l moles tia en to rpec êra
Cal l e sem vigor e apenas com trabalho
Sobre a terra se arrasta : assim privada
Do espi ri to vi tal da agri cultura
A sociedade languida perdida
A, energia e a força , off'
rece o collo.
92 G EORG ICAS .
Ao j ugo alheio que evitar n ao soube
Ou compra com torrentes de seu sangue
Aquella independencia que p odera
Com pacifi ca industria ter guardado .
X
rDo s humanos a'sol ida riqueza
Não j az do Potosi no metal ful vo ,
Nem na perola india ou mexicana
Nem no diamante de que abunda o Gan ges ;Mas venturoso be sim aquel le Estado
Ricco de braços de prowsoes ricco,
Aonde a fouce nas seara s cansa,
E que dos bens reaes que nutre e cria
Ao longe va i levar a extrema cop ia .
Porem té onde oh'Musa o vôo el '
evas ?
Ah ! deixa o campo azul,que al tiva fendes
,
A mais expertos vates volve ao s bosques
Faze outra vez ouvir do fertil tronco
De Minerva qual sej a o p roprio trato .
94 G EORG ICAS .
Contra o dén te do gado as tenras hastes
Que bro tão da raiz l igada ao tronco .
“PORÉM,fi lhas da arte
,he só com arte
Que podem pro sperar aquellas planta s .
E se a grande oliveira teme o sopro
Do aquilo gelador com maior causa
O teme a j oven arvore , que apenas
Tem lançado raiz . Hum tronco herba ceo
He ao principi o o seu : fraca e delgada
Preci sa de attençoes e de desvelos .
Hum terreno fecundo , solto e leve ,
Que mantem o calor co'a area fulva,
E aonde po ssao crys tallinas aguas
A frescura levar de quando em quando,
Ao viveiro c onvem . A ll i“
plan tado s
Os novos ramos a crescer c om eção
Do colono as futuras esperanças .
Vos oh Dryade s tenras,que ligadas
CANTO I I I .
Aos novos troncos receai s seu dano ,
Ab protegei-os contra as neves fri as !
Inspirai ao cultor que abrigue as plantas,
Que o terren o lhes mova que apertárao
As torrentes das nuvens desp edidas .
Benign a Pallas tu , do lugar onde
Se educa o tronco que adop taste outróra
Para bem dos m ortaes benigna afasta
0 dente roedor do voraz gado ;Faze cingir de balsas espinhosas
O viveiro p recioso , e lá do O lympo
Pro tege dos c olonos o s trabalhos.
E tu grato dos num es aos favores,
Assídua s a ttenções , colono emprega
Se da raiz plantada,j un tamente
Bro tão diversos ramos,pouco a pouco
Cuidadoso o s supprime olhando attento
Que o numero excessivo jamais roube
A seve ao que al gum dia i rá dos campos
96 G EORG ICAS .
Povoar a extensão e ao mesmo tempo
Alguns conserva que tolhendo o excesso
Dos succos no maior , o mal lhe'
poupem
De hum prematuro augm en to até que o tempo
Lhe dê a firme e lignea c ons istencia .
Não tenhas poi s desej o p erigoso
De ver em breve os troncos elevados,
Mas espera pac ífi co ,e retira
Os baixos reben tões,quando o m ais al to
De todo a mão te encher c om que o abraças .
QUANDO a planta a final , houver chegado
A huma grossura propria então desponta
A guia verti cal para que a seve
Aos lados volva , e vá formar o s ramos .
Supprime então de todo a s mais v ergon teas ,
Roubadoras de suec o s ; bem depressa
Ramo s e tronco á proporça o chegados ,A infancia terminou da arvore tua
Hc tempo que ella passe aos l argos campos ,
98 G EORG ICAS .
Em hum lugar tempº
rado , em solo l eve ,Nem hum ido em excesso
,nem ventoso .
Vó s,oh campo s
,que regao m ansamente
Do patrio Tej o as agua s abundantes,
Quão prodiga vos fo i de seus thesouro s
A benefi ca Pallas mas a incuria,
A fatal ignorancia , o abandono
Da cultura das arvores chamando
A colera do s ceos v estio de luto
Os ramos n'outro tempo productivos .
Semelhantes aos bosques do Co cy to
De verden egro s ho rrido s cypres tes'
,
To rn ao — se o s oliva es,e os lavradores ,
Perdida a esp,
ranga da colheita ri cca ,
Do ceo se quei x ao e á n a tura imputão
Hum mal,de que sao causa em grande parte .
TU poi s , que tens a espºrança em teu s vive iro s
Segura a torna consultando a arte ,
CANTO II I . 99
Quando a arvore nova em terra plantas .
Mal que do campo as mess es prec i ºsas
Das eira s recolheres,dês que a terra
Hum ida as saz não res i s tir qual pedra
Ao ferro que a penetra , as covas abre
Que devem receber as novas plantas .
Po r l ongo tempo abertas as conserva
Antes da plantacao ,para que os raio s
De Phebo a parte interna lhes melhorem ,
E a s i chamando a terra os elementos
Espalhados no ar e aerifo rm es,
Combinada com“
elles,productiva
,
Nutriente se torn e em vez de esteri l.
No d iaphan o manto que ro dêa
Do globo a superfi ci e , vari os gazes
Distin c tos vagao ,que hum composto formao ,
Alli exis te o o x ygen eo puro (25)Que alenta a combustão , e a vida alenta
All i o n itrogeneo azo te (26) impuro
1 00 G EORG ICAS .
Inimigo da luz e auto r da morte ;Producto das mater ias decompostas
O carbonico ar (27) nocivo habi ta
E o ligeiro hydrogen eo (2 8) ao al to sobe .
Alli se estende a luz em rectos raios,
De côres os obj ecto s adornando
E o calorico , agente da natura
Igualmente circula na a tm osphera .
ENVOLTA em hum ve'o tal exi s te a terra
De varios element os combinada,
Que a s i appropri ando ares diversos
Roubados á a tmo sphera ,que ella toca
,
Vario s compos to s forma,e de m il m odo s
A bem dos vegetaes seªm odifi ca .
Por i sso do terreno a,
in f'rior parte
,
Em quanto o s raios nao tocou do dia,
Nem a massa,d iaphana dos ares ,
Jám ais as plantas nutre,antes ingrata
QS principios da vida aos troncos nega
x 02 G EORG ICAS .
O olival correrás quando dos ramos
Te off'recer a oliveira curva ao peso
Os grossos feitos bagos abun dantes .
TU,oh sabia Minerva
,agora di ze
Em que estação convenha ser mudada
Do viveiro a oliveira para os campos
Tu,dize o tempo
,tu ensina o modo .
A Pallas escutai ora , oh cul tores .
BEM que plantada a arvore vegete
Em qualquer estação do frio inverno
sopro gelador,nem os ardores
Devorantes do estio a favorecem .
De huma vida inda debil nos começos
Carecendo criar rai z e ramos
He do tempo o rigor nocivo á planta .
QUANDO o sol chega á Libra e manda a terra
Do do ce outono os temperados dias
CANTO III . 1 03
Quando Ba ceho do s ramos da videira
Faz os cachos pender de c ôre s varias,
E Pomona os vergeís de fructos c, roa
Ou quando Flora espalha pelos campos
Do candido regaço as frescas flores
E a verde prisão sua abrindo a rosa
Pud ibun da convida o sopro grato
Dos incons tantes Zephyros lascivos
Quando as Nymphas dos bosques e as das aguas ,
Deixando as grutas vem tecer no campo
Mil choreas c 'o s Faunos am orosos
Então oh lavrador , então ao solo
Do teu novo olival confia a esp,
rança .
Bone e fundo da cova onde c oº a terra
Combine a enxada hum bem cortido adubo
Se acaso a greda alli em copia existe
Retendo as aguas,de miudos seixos
No mais baixo colloca huma cam ada .
Sobre o fofo terreno attentamente
foz, G EORG ICAS .
Distribue as raízes que poupad'as]Devem ser p ela mao
,que do viveiro
As arvores arranca . Sempre estranhas .
Ao contac to do ar,como a seccura ,
Pouco tempo da terra separadas
As raizes conserva,e busca attento
Ao cobrir d , ellas,evitar os vacuos
Por onde os proprios succos se evapo ra o ,
E nos quaes vão formar o seu retiro
Insectos mil,que as c ap íllares tenras
A tacao roem'
da mudada planta .
EU quizera que acima das raízes
Depois de huma camada de terreno
Outra de palhas frescas s e lançasse,
Para melhor d o s sueco s nutri tivos
A sabida vedar,ligar a terra
,
Conservando á s raizes a frescura .
MUSA s ingela,Musa , que ao meu lado
1 06 G EORG ICAS .
A NT IGOS torreoes , capiteis fustes
A fronte como outró ra não lh e adorn ão ;
Huma c ,roa de flores e de fructos
De m il ten ras'
fo lhagen s que tecerão
As Graças ledas,sobre os seus cabello s
Ao vento soltos , hoj e se devisa ;
Mollemente na relva reclinada ,
Meio apartado O tino véo que a cobre
Deixa aos olhos mirar seu l indo seio ;
Seio fecundo,que alimenta o s entes !
Que lindas côres,graças
,que figuras
,
Que producçoes aos olhos nao descobre
O seio desnudado de Cybele !
Vêde mil an imaes,que em torno a cercao
Cada qual se desvela em ameigá-la
,
Ella a todosx
surri e a todo s lan ça
Carinhosa e Shave o Olhar m aterno .
Mas c om '
que extremo , com que expressao doce
A vós a ma: commum o s Olhos lança ,
A vó s cultores , seus dilectos filhos !
CANTO I I I . 1 07
OnNA r cada ve z mais , ornai meu seio ,Ella v o s clama
,que aos cuidados grata
Eu juro sempre ser ; para instigar-vo s
Á industria e ao cuidado fui eu mesma
Quem o meu seio revest i de abrolhos
Hoj e pois a vó s toca , oh fi lhos caros,
De m ais bellos adornos r evestir-me .
Ah deixai, deixai erro s e phantasmas ;
Deixai o luxo, que do orgulho li lho
Me ultraj a e me as sa ssin a ; vac s thesouros
Cessai de procurar e de arri scar-:v o s
A o s p'
r igo s e ao s trabalho s por colhe-lo s ;
Em m im em mim terei s c om pouco esforço ,
Da riqueza real,do s b ens a pos se .
No regaço da paz e da abundancia
Eu vos farei viver grata ao s desvel os
Que pra ti ca rdes sem cessar comigo .
S IM cultores,Cybele assim vo s hrada .
Avante,avante que eu ] :t vej o ao longe
t 08 GEORG ICAS .
A charrua virando em torno aos troncos
Da oliveira O terreno e dªeste modo
Dobrando a producção . Alem unidas
Ceres e Pallas hum te'
rreno hab i tao ;
E em quan tO'
aquella a esp iga amadurece ,Esta ri sonha va i l impando as flores .
LONG E dos olivaes,sim longe fuj a
A casta Pro tec tora das floresta s,
Que se ap raz nos terrenos sem cul tura .
Nao ache no olival movido sempre
Hum refugio o coelho,que entre 0 m ato
Pode o tiro evi tar dos caçadores ;Nem a lebre
,que a traz os vôos deixa
Do alip ede galgo , aqui se esconda .
EM torno á s covas onde a planta cres ce,
Cuidadosa s lançai no outono o adubo,
A fim de que do inverno as frias aguas
Dº
c lle im pregnem a terra,e cubiço sas
1 1 o GEORG ICASa
De deco tar o s ramos ; i gnorante
Rusti co sem pi edade sobe ao tronco
Vibra O ri j o podão e prostra as braças
Da arvore infeliz. Em pouco tempo
Cobrem O chao os ramos,largas chagas ,
Tyrannas in c i soes do tronco as veias
Ás inj urias expõem do iroso vento .
De voz privada a m iseravel planta
Lamentar— se não sabe ; mas sem forças
Dilacerada rota e esvaída
Languida cahi r deixa as murchas folhas
E em vez da producção em que abundava
Em conservar- se contra hum trato duro
E em reparar-se os succos empregando ,
Recusa O ric co fructo e curta vida
Que mais longa esperava,infeliz conta .
PE LA S ex cavações da rota casca
Pela s fendas do s estalados ramos
A seve se corrompe e se extravasa ;
CANTO II I . 1 I I
Penetra a chuva , a neve se insinua ;Succede a corrupção as fibras sec cão
,
Os delgados c an aes que a natureza
Para c irculaçao dos v i taes suecos
Por toda a partehavia semeado
An iquilão-se ; alo jão -se no lenho
Roedores insec to s,suj os vermes .
Mil parasi tas (3 1 )' vão roubando
'
as braca s ;To rnão — se em fim o s troncos cavernosos .
Nas corruptas profundas cavidades
Da arvore infeliz ao d ia fogem
O tris te n outibó , o mocho tris te
A coru j a s evera e taciturna ,O alado mamal filho da noute ;
Alli se alo jão m il rep tiz impuros .
Sem base,sem sustento ei s sopra Eolo
E a arvore quebrada cahe po r terra .
ATÉ quando até quando Oh patria minha"Te verei na indolencia sepultada
1 1 3 G EORG ICAS .
Até quando huma rus ti ca ignoranc ia ,Nas mãos tomando da cultura O tra to
,
Pobres nos tornará e desditosos ?
DE IXA ! Oh— V! S que da s s c ien c ías uteis
O dia i llum in ou , deixai o s muro s
Das c idades e a luz trazei aos campos .
A idade renovai, feliz idade
Em que O agriculto r ganhava al tares ;
A idade em que pascendo o s seus rebanhos
Em doces versos,em can çoes sublimes
Espalhavão as luzes os pastores ;
Em que o s heroes de louro coroados
Arando O proprio campo , descan savão .
ENTRE tanto a ti só , ao s nossos filhos ,
Se as doçuras de pai O Ceo me guarda
Oh Nize m inha votarei meu canto .
S im po r vós filhos meus , verei hum d ia
Estes ruraes preceitos p raticados ;
GEORG ICAS'
.
Que O seio maternal sem fruc to esgo tao
Pros tre o ferro igualmente os mortos ramos
Procurando com tudo que entre as braças
Regular equilibrio se conserve .
Para limpar assim as Ol ive iras
Deve evitar -s e o regelado inverno ;
Mas logo que modera os seus rigores
E antes que a prim avera a seve mova,
O tempd he proprio a semelhante emprego .
O practi co vu lgar corta sem tino
Oblíqua horizontal verti calmente
Deixa pontas e covas ; despedaça
Mui tas vezes a casca,e racha O lenho .
Cautello so ao contrario o experto agricola
Na d irecçao do tronco alinha o golpe ,
C'
O ferro O pule , de unguento o cobre
A natureza grata ao s seus cuidados
Produz a casca,e dentro em pouco espaço
A pensada ferida cicatriza .
CANTO I I I . 1 1 5
Se acaso em algum ram o produc tivo .
Da podridão se mostrão o s começos,
O ferro logo a parte enferma escava
E da massa benefica a pene tra .
OH bem haja o colono venturoso
Que aos traba lhos ruraes assim se applica
Com que doce prazer recolhe os fructos
Das arvores,que a propria m ão plantara ?
Com que prazer no ardor do quente esti o
Das sombras goza , que el le mesmo erguêra ?
A os amigos c om gos to apresentando
Do seu trabalho o fructo de algum modo,
Creador de outros entes,se remonta
Sobre o ser de mortal . Porém he tempo
He tempo,oh Nize
,de colher o fruc to
Da arvore de Palla s . Oh colonos ,
Deixa i do varej ão O brutal uso
Que a pregu i ça consagra ; com seus golpes
O fructo tenro esmaga fere os ramos
5 G EORG ICAS .
Os pimpolho s destroe , que promettião
A futura colheita ; sobre a terra
Dispersa as folhas , nutri ção e amparo
De novos reben tões que a natureza
Para fructos , ou braças só des tina .
Erguei plantai,activos lavradores
Leves escadas contra O tronco forte
Subi,colhei com mão s uave os fructos
E em vez de derrotar a fertil planta ,
Poupai o s novos bens,que ell a vos guarda .
LANçA Oh Musa por terra a tulha immunda ,
Triste invenção da i gnorancia crassa
Onde barbaras m ãos amontoando'A azei tona co, apanho macerada
Nella se atea cOm ingente força
Viva fermenta ção , que sem remedio
O oleo,inda nas drupas (52) contamina .
Ou vós,que das sc ien c ías e d as artes
CA NTO IV.
A d' echo em echo m il concertos voão ,
Soando alegres hymn os pelos valles
Agudos s istro s , gai tas sibilantes ,
Adufes e pande iros acompanhão
Do s coros foliões a s ledas vozes .
Sobre o carro que tol dão coª a ramagem
As tenras vides e as torcidas heras,
O Deos de Nysa recostado assoma ;Sobre a frente galhuda e prazen teira
De parras lhe tremula huma grinalda
Nas maos movendo alegremente hum thyrso
m o G EORG ICAS .
Olha de quando em quando a linda Ariadna
Que no carro a par delle recostada
De hera e vinha tambem c ingida a testaCom hum meigo surriso lhe responde .
Quatro ti gres,perdida a feridade
,
Ao jugo preso s o seu carro ti'
rão
Pelos caprinos Faunos conduzidos .
PRE C E D ENDO o cortejo O bom Sileno
Mostra r isonho o rub icundo rosto ;C0
' a sinis tra empunhando a rara cl ina
Do tardio animal que alegre monta .
A O lado d'elle O c ôro das Bacchantes
Em mosqueadas p elles envolvidas
Nus o s braços , as comas des trançadas ,
E nas formosas mãos thyrsos vibrando,
AO ar se elevão em con tínuos sal tos .
Pouco depoi s dos Sa tyros caprinos
Segue cabriolando a vaga turba
Huns fazendo soar torcidos buzi os
I 22 G EORG ICAS .
Vó s oh rochedos, que de rude marmore
Os banco s ostenta is no seio vosso
Já de Vulcano se introduz O raio
Fulmina o ni tro ei s de improviso estala
A calva frente da robusta p enha ;
Rólão penhascos desde o cume á falda ,
E a mão da industria de Len êo as plantas
Faz suc ceder ao s musgos que ves t i ao
Os ari do s penedos descarnados
Rei do s m etaes a fronte das montanhas
O ferro em m il sentidos rompe e abre .
Penetra o sol o aspero terreno
E em breve fertil para Raccho o torna
L x onde O polo arc ti c o s e eleva
A v in te ,e c inco grá o s , até ao clima
Em que distancia igual a Cynosura
Conserva do zenith e do horizonte, (33)
Espontanea rebenta,vinga e Cresce
Com ingente vi gor a fertil cepa ;
CANTO IV.
Alli rival das arvores frondosas
Sobe da terra em v igoroso tronco ,
Com vaidade elevando — se n o s ares
Ostenta as folhas'
,e por toda a parte
Aos olhos deixa ver os roxos cachos ;
Porém fóra d, alli ou des t inada
O vinho-a fornecer carece a vide
De longas attençoes e decuidados
Hum abrigo requer mais leda folga
No s montes , que ao nascente expostos fic ao ,
Ou que ao m eio dia a fronte alegres volvem
Nas encostas porêm que O nort e açouta
Privada do calor , e combatida
Na estaçã o fria , do s gelados ventos
Do s aqu i loes soberbos e fero zes
Jamais o doce cacho amadurece
E em v ez de dar a uva hum succo forte,
Só produz hum li cor aquoso e fraco .
Igualmente nos vall es abundantes
Onde Baccho Q terreno usurpa CereS ,
1mí G EORG ICAS .
Jamai s a industri a colherá bom vinho .
Car sçx o fecundas messes nas campinas ,
Nas bordas que os ribeiros humedecem ;Nos levantados cumes das montanhas
Elevem — se risonha s as florestas ;E tu
,oh vinha vem ornar a s brandas
As suaves encos tas das collinas .
O n tu,que a terra confi ar pretendes
Em propria exposi ção de Raccho as plantas ,
Em primeiro lugar prepara o solo ;Pois nunca em hum terreno incul to e duro
Algum a plantaçã o prosperar pode .
Cum oa s s sabios ha que despoj ando
DO importuno mato a branda encosta
Em montões as raízes sec car deix ão
Com O ardor do so l ; depoi s no outono
As en tregão á s Chammas devorantes
1 26 GEORG ICAS .
Quasi a dos fructos disputar se atreve.
VEM, Nize huma aura fresca nos convida
Pelo campo a gyrar , !eia corramos
Essa collina que hum cultor peri to
Ao Deos de Nax o consagrar p retende .
Eu j á vej o o terreno preparado
Com' precedentes op tim as culturas ;Em d iff
'
ren tes sec ções vej o os bacello s
Que O podador cortou , depois'que O outono
Da vide o fertil páo deixou maduro ;Os que produzem moscatel fragrante
Cobrem de hum lado a terra de outro aquelles
Que devem fornecer. a malvasia ;
De hum lado os que produzem roxos cachos
Proprios a dar a côr ao mosto puro
Do outro os da uva branca deli cada
Todos cortados em robustas plantas ,
Que fecundas , bons fruc tos tenhão dado .
CANTO IV . 1 27
De tosca pedra vê os baixos muro s'
Que em socal cos cortando a longa encosta
So s tem c om arte as adubadas terras ;
As longas ruas ao cordão abertas
Parecem convidar os uteis carros
Que aindahum dia da cultura em premio
A vindima ao lagar conduzir'
devem .
Contempla toda a encosta,que movida
Até ao fundo , promover parece
Da delgada rai z O crescimento .
LA no cume , que o sol no ex tremo occaso
Doura c , o derradeiro de seus raios ,
Vê a parte da terra destinada
As cepas a nutri r de cachos brancos
Mais do que as outras c epas vigorosas,
E que sempre mais tarde amadurecem
Na falda da collina,que m ai s fertil
To rnão as aguas do chuvo so inverno ,Já marcado ao cordão devisa O solo
I G EORG ICAS .
Destinado a nutrir os roxos cachos
As espec ies mimosas e as que excedem
Todas as mais em saborosos suec os .
A divisão geral presi de a ordem!
A ordem mar do gozo e da belleza
E foco princip al da u ti l idade .
Aqui dos bosques a nociva sombra
De Bac cho às plan ta s O calor nao veda
Nem dos rio s e charcos o s vapores
A del icada fl oresc enc ia attacao .
Parai Oh ven tos respei tei o s tenros
Delicados p impolhos , e vó s neves ,Ah não cre stei s do agrícola a esp
”
rança !
Benigno Olhar do facho do universo
Luz fecundante amor da natureza
Propício a hum solo tal teus raios manda
Já tem findado o ardor do quente es ti o
Já de Latona O fi lho o carro avança
GEORGICAS .
Em espaçada s covas logo as planta,
Com hum numero grande de bacello s
A ferti l terra p rovidente o ccupa
A fim de moderar-lhes o sustento
Deixa ao con trario entre estes grande espaço
Quando hum terreno magro e pouco fertil
Com escassez a s eve lhes m ini s tra .
"
Se acaso a cepa remontando ao s ares
Deve desenvolver ex ten so s ram o s
Carece então de mó r profundidade,
Para que,a proporçao sempre conservem
As raí zes no chão , no ar co'as braças .
Desu maneira o agricul tor experto
De Bac cho as plantas ao terreno entrega ;Desta arte lhe c on fi a a s tenras vides
Cujos cachos mais tarde fermentando
A origem são do nectar espumoso ,
Do ardente alcohol que p or activo
De _
sp'
ri to usurp a impropriamente o nome ;
.CANTO IV .
Nectar , que da razao as luzes frouxas
De todo apaga,e do s signees de vida
E do v igo r os fortes membros priva,
Se do uso delle o homem n ão modera
Vergonhoso appetite . Autor funesto
De desordens,de crimes
,que exci tando
A colera e furor,em feras torna '
Os míseros mortaes , a quem provoca
Mas se a prudencia o' torpe abuso impede,
Do velho curvo c, o s pesado s ann o s
No s frios m embros o calor renovaAnima O braço que volvendo a terra
Já de suor banhado desfalece,
E reluzindo n as douradastaças
No s límpidos crystaes puro brilhan do
Doce alegria e hum prazer honesto
Nos alegres banquetes insinua .
D'ell e escudado o viajante affronta
Da Zembla os gelos ou a s c ndas turva s
Do procelloso reino Neptun ino .
3 :
1 32 G EORG ICAS .
Riqueza do que habita hum solo improprio
Ás colheitas de Ceres c omm utada
Em farinhosos graos traz a abundancia
A hum pai z sem seus dons inhabitavel.
OH sabio creador da natureza,
Entre mi l pi oducçoes ,huma sómente
Inu til se nao vê nas obras tuas
E se o vic i o fatal de tudo abusa,
Sej ão ao vício o s damno s imputados !
TU po i s que tens plantado as brandas vides
Vem os modos ouvir de cul tiva— las .
Va rião como os sítios a s 'm an eira s
De amanhar de Len êo as fertei s plantas .
N'
hun s pe i zes levanta-s e a videira
Á s arvores unida, j á c ingindo
Co 'as pampin osas braças alto o lm c íro,
Já o tremulo chopo a amendo eira
Já a amoreira de sanguíneos fruc tos .
154 G EORG ICAS .
HA paizes.
tambem,onde da cepa
Mais elevada o s alongado s ramos
Susten tao mortos pá o s entrela çados ;
Outros aonde a planta vigorosa :
Cada anno floresce em muita s varas ;Outros em fim — aon de j unto a terrai
Hum ilde pelo chao quasr s e arrastra .
Feli z o Vinhateiro ,“ que in s truído
Dos princip io s da arte'
em que se emprega,
Sabe experto escolher ao seu terreno
Que espéci e de Cultura mai s convenha
MUSA,tu que me ligas com cadees
De rosas e de flores a o trabalho ,
Tu me apresenta as l ei s que a natureza
Na formação do fruc to da videira
Constante segue . Ouvi-me agricultores ,
E do que a Musa m inha expor pretende
Fazei a appl icação às plantas vossas .
CANTO IV.
“
1 35
O raio que de Phebo luní inoso
Sobre O terreno cahe,trazendo a elle
A luz com O calor , pelo terreno
Para a planta que nutre,he reflectido ;
E do calor reflexo a força excede
A do raio que vem direi to á planta ;
Por i sso quanto m ais prox ima a terra
Sem a o s ares sub ir s eus fructos nutre ,
Tanto mais em seu fructo o calor obra .
DA Lybia n o s desertos arenosos
Onde ruge O Leão onde exercita
O tigre a tyrannie sanguinosa ,
Do alvo. chão , que hum sol ardente exhaure,
Reflec tido, o calor c om força ingente
Das arvores abra sa as verdes folhas
Tornando tudo em cinza , e tudo em fogo .
Em toda a pa rte a provida na tura ,
Mal o s entes creon,proveo -o s de orgão s
Por onde a v ida e os succos lhes minis tra.
i 36 GEORG ICAS .
A planta,que adherente exis te a terra
Pelos poros da casca , pelas folhas ,
Como pelas rai zes s e alimenta ;
E tanto mais frondosa ella s e estende
Tanto mais succos distribue aos fructos
Que pendem de seus ramos vigorosos .
AQUELLE que recolhe poi s o s cachos
Em clima frio ou em terreno fertil
Onde ou falta O calor,ou cresce a seve
,
Deve sempre ao terreno quanto possa
Das suas cepas a ttrahir os ramos .
Ao contrario o que planta em hum terreno
Magro e pobre ou em que hum sol ardente
Da sua planta as verdes folhas cresta
Deve a vinha al tear , e até aos troncos
Perm íttír-lhe que eleve ousada a s vides .
S r: quizermo s a vinha ver vingada
Do bacello plantado com desvelo
t 38 G EORG ICAS .
De outra maneira exhausta em poucos anuos
Decrepita infeliz em justa pena
Hade negar-lhe para sempre os fructos ;
Nem lhe esqueça j áma i s deixar em baixo
Com prudencia o fiel,que em qualquer caso
Pode a cepa supprir , que desfalece .
O fluído,que nu tre as varias partes
Do todo O vegetal,a lac tea seve
Quanto mais em seu curso he demorada ,
Tanto mais s e prepara e s e elabora ;Tendendo sem pre a so c correr o s cumes
Apressada da base á s pontas sobe
E all i rebentar faz espessas folhas
Que mais e mais a marcha lhe promovem
Para 9 fim de dete- la e dirigi-la
Os cachos a n utrir,o V inhateiro
Da cepa que podou,as braças curva .
O junco dos terrenos pantanosos
O brando vime,que elle retorcêra
CANTO IV . 1 39
Lhe fornece as prisões ; ora curvando
A só vara que exi ste,amesma cepa
Quasi em círcul o a liga ora a retorce
Na lança , que entrar vai depoi s na terra
Mas se a cada videira tem deixado
Duas varas fruc tíferas,enlaça
A hum só esteio as de dobradas plantas,
E a vinh a inteira d, esta sorte ordena
Em alinhados renques igualmente
G rato s á vis ta, e prºprios a cultura .
MAS baldado he podar,empar as cepas ,
Os golpes alizar,despir os ramos
Das parasi tas que a substancia roubão
Se do terreno onde as raízes m o rão
Incautos desprezamos a cultura ,
No s pa izes ditosos , que povoão
Colonos m il que do trabalho e industria
T írão conten tes próvida abundancia ,
Tres vezes de Leneo em torno !s plantas
140 G EORG ICAS .
He no gyro annual bulida a terra
Nunca depois das chuvas copiosas
Antes que a humidade s e evapore ;Nem quando o Ceo das nuvens denegridas
Soltar promette rapidas torrentes
Que do cul tor i n allogrem o s trabalhos .
DA encosta nao convem na in f'ríor parte
A cava'
c om eçar ,com ella a queda
Das terras pouco a pouco se p romove ;
Cumpre porêm puxar transversalmente
O terren o cortado pela enxada ;Cumpre se acaso o solo se acha exhaust o
Distribuir — lhe avaro hum proprio adubo
Em terra vegetal j á transformado .
As folhas , que arrendara o cri tocephalo
O u as em que se aloj a o rinom acer,
Quanto he util colher para queima-las
Fóra da vinha ; quanto amontoando
1 42 G EORG ICAS .
Ou cortantes navalhas ; j a surrindoO Outono de pomos coroado
Vem trazendo o s trabalhos da vindima .
Buscai,vindimadores , que sereno ,
Livre de nuvens se apresente O d ia
E sem os offender , entre os m ais cachos
Atten tos escolhei os bem maduros ,
FEL IZ O agricultor , que tem lagares
Á vinha unidos,e que pode a elles
A uva transportar in tac ta'
e lim pa;Mas se a distancia Obriga a usar do
Seja o transporte fei to com cuidado ;Evite- se o pizar , calcar as uvas
E sobre tudo o m is turar o s bagos
Podres e mal maduros na vindima .
JA vej o d, entre gs muros das C idades
Surgirem os inertes habi tantes
Que os trabalhos do campo ao campo chamão
Onde alegri a festival preside .
Vem minha Nize vem guarnece a negra
Madeixa de grinaldas pampino sa s ,
Que eu tambem de hera a m inha frente euramo
Entremos nestes coros,que festivos
A O som das gaitas do s pastores ledo s
Cantão do padre Emonio al tos l ouvores ;
Porém que vivo a rdor me assalta a men te ?
He elle,he elle
,o Thyon êo sagrado
Que ensina as suas lei s ao s lavradores !
Oh como nas encostas das collinas
Aos echos voão mil festivos can tos
Mil hymn o s de prazer v ao repetindo
De valle em valle as grutas son o ro sas !
Que operação sublime me encarregas
De pintar oh Lenêb? Antes de rota
Do bago a pelle,começar n ao pode
O succo a fermentar ; por i sso a uva
Deve ser comprimida,e d esta sorte
o o N
A v inifi caçã o cºnvem d ispô — la.
“
1 44 GEORG ICASZ
LEMBRA — Ma agora , Oh Musa os resul tados
D'este processo e como as partes todas
Em geral movimento a hum fim c on sp i rao
A sahida do gaz forte e assassino, (56)
A form ação do al c ,ol leve e ardente
A do líquido roxo e colorante ,Que na pelle reside (37 ) O calor forte , (58)Que livre sahe da cuba , e d este modo
Deixa ver ao cultor como lhe he faci l
Reprimir,exci tar
,e ao seu intento
Conduzir toda a massa fermentante .
CALC AD A e dividida a massa toda,
Começa a n atureza o seu trabalho
t fín idade as l ei s obedecendo (39)Da vinifi cação entra o processo .
Começa o gaz carbon ico a apartar— se
DO l íquido ,que espuma e que se turva ;
O calor l ivre faz sentir a força
O tartaro da cuba nas paredes
1 46 G EORG ICAS .
A fermentaçã o lenta convem de agua
Juntar-lhe huma porçao que o torne l iquido
COM taes cautela s s ó , c om tães trabalho s
Os licores de Emonio se '
preparão .
Porém se he teu inten to que ao abri — lo
Te salte o forte vinho em branca espuma,
Antes que o gaz carbonico se exhale ,
Do contac to do ar ligei ro o priva ,
E em toneis b em tapa'dos o encarcera ;Mas para es te fim prudente escolhe
O mosto que fermenta c om lenta ra,
E que de alcoho l e gazes não abunda:
Sr. cub i ças hum vinho l icoroso ,
Na doçura rival do mel do Hymetto ,
Antes de o fermentar , o louro c achº“
,
O u torcendo — lhe o pe' preso a videi ra
Ou em pranchas expondo-O , ao 561 O passa .
E se no licor teu prezas e buscas
CANTO IV. 1 47A intensidade em côr e hum sabor forte ,Só da cuba O retira quando cesse
Toda a fermentação tumultuosa ,
SOB a potente vigorosa imprensa
T á a ul tima gotta ex trahe o succo
Purpur in o da pelle delicada .
Ha cultores,que o s bagos , sepa rados
Do engaço , á cuba lan ção ,e a ssim deve"
Obrar O que prepara hum vinho doce ;Porém o que o destina ao alambique
,
E aquelle que perten de ço rn o sueco
A c erl »o do s engaço s de al gum m odo
Modific a r a insipidez do mosto,
Desengaça r as uva s j á m a ís deve .
MAS j a n o s bons tonei s sendo,encerrado
,
Se apura o vinho com trabalho lento,
E huma fermentação tranquilla e longa .
Depois he que Ocultor separar deve
1 48 G EORG ICAS .
Da l ia immunda o suec o l impo e puro
Priv a r este do ar , do calor forte ,E em f o lhada garrafa em fim fecha— lo .
ASSAZ tem os cantado Musa,he tempo
De terminar de Emonio o longo t rato ;
Agora empunha a ri cca taça de ouro,
E enchendo-a de vinho,alegre a líba
Em honra do cultor industrioso
Para quem desvelada sãos precei tos
Das flores tas a sombra tens cantado,
Das floresta s,que outr'ora em brandos verso s
Doces hym n o s a Amor de ti ouvirão .
1 50 GEORG ICAS .
CANTADO temos com que lei com que ordemA terra da atmosphere altrehe os succos
Como embebe em si mesma o gordo adubo
A s aguas,os orvalhos
,e os tran sm itte
Aplanta,que n os orgãos os prepara
,
E na seve os converte que a sustenta .
Temos vis to tambem por que maneira
A lei geral da morte Obedecendo,
O vegetal na terra decomposto
Para outros nutrir habíl a torna .
Mas não bastava!s ó que a verde planta
Di
outra planta a existencia preparasse ;Não bas tava da luz que expos ta aos raios
Fonte devida para novos entes
De ar v ital derramasse na a tm o sphera
Hum benefico o rvalho a s í chamando
Do s m ephi ti co s gazes o veneno ;
Era preciso ainda Oh Mãi sublime
Para c, roar tua Obra i n im itavel
Que o sueco vegetal na mesma planta ,
CANTO V . i 5 i
Tornando-se concreto produzi sse
Caules,raizes
,flores folha e fruc tos ;
Que aos an imaes servindo de sustento
Por ell es novamente commutado s
A bem tornassem da nascente planta ;E que outros inda a enriquecer ten dessem
Dos m ineraes o reino inanimado .
Era p reciso encadearos en tes
De tal maneira que as ruín as d'este
A vida e o vigor fossem d'
aquelle
E que a materia sempre decomposta
E novamente sempre se compondo
Vivifi casse a face do universo
As aguas semelhante que n o immenso
Lago d o oceano c'
o cal or tornadas
Em vapor leve,sobre o s al tos montes ,
Condensadas do ar se precipi tão
E dalli em torrentes,em ribei ros
,
Em fontes de crys tal e arroios mansos
Novam en te ao geral tanque se arro j ão .
i 52 GEORGICAS .
MU SA,de huma tal mestra grata alumna
Agora ao s teus iguaes ao s lavrado res
Vem cantar o . cuidado das m anadas,
E a o pas tor,que modula a branda frauta
Qual o trato prec iso aos seus rebanhos .
0 3 tu,Nume do Pindo !oh tu
,que outr ,ora
Guiast e a idade de ouro entre o s pas tores,
Lá do alto agora da el evada esphera ,
Onde reges o carro adamantino,
Na mente hum vivo rai o me dai-dej a .
Presta-me Oh sacro Pan,a branda frauta ;
Vós,Nymphas
,que do Zezere as correntes
Benignas protegei s,e as margens frias
Onde encontrei hum termo ao s m eus desej os ,
De hum amigo fiel pelos desvelos,
S e vós m e grangea stes tal thesouro
Huma v oz me prestai que fazer possa
Eterno o nome seu,e o vosso nome .
1 54 G EORG ICAS .
SURG I da moll e in curia , agricultores ,Sarj a i esses terrenos pantanosos
,
Onde o ra crescem juncos e espadan a s
O trevo lhes lançai,lançai — lhes gram as
,
Que apenas cul tivais em curto espaço ;Cobri cobri o s a t idos outeiro s
Do onobrychis c'
o germe productivo,
E os terrenos m a is frescos c o' a luzerna ;Então
,e então s ómente
,em vosso aprisco
O gado abundará então sómente
No s curraes entrarão gordos novilhos
Após as fortes mãis ledo s brincando ;Sóm en te então as crinas sacudindo ,Leves cevallos rin charão n os campos
Sóm en te entao em vez da magra fome
Offl
rec erão d i tos as a s aldeas
A face do prazer e da abundancia .
Só produz o terreno cultivado
He sem gado impossível a cultura ,
E O gado nutrir só prados podem .
CANTO v. 35
Tu poís que O nob're emprego tens emsorte
De cultivar a terra,attento cuida
Pastagens em formar . Duas especies
Ha de .p rado s n'
hun s d estes a n atura
Per s i mesma produz a s verdes plan tas ;Porém se a arte a aj uda se n o s baixos
E quasi pantanosos,vallas abre
Se terra alli conduz para elevá- lo s
Se o s grãos,que do s palhei ros s e retirad
Cuidadosa allí lança ; oh que v an taj em
Produzíra trabalho tão pequeno !
São c om tudo estes prados inf'rio res
A o s al to s e elevados onde as hervas
Menos aquosas são m ai s nutri en tes,
E sempre para o s gados mai s saudaveis .
Muito melhor,se a indus tria formar soube
Nos si tio s elevados providente
Beserva to rio s de agua , que n o es tio
Matem a sede á s abrasadas plantas ;
Alli tambem convem de quando em quando
Éô G EORG ICAS .
Do s bons fenos lançar os grãos fecundos' Distribuir de quando emquando adubos ;As moutas arrancar e toda a planta
Que ou com os ramos seus suffo ca as hervas ,Ou c om a sombra espessa as dam n ifi ca ;
No contorno formar vallados fortes,
Que prohibão a entrada do s rebanhos
Nas epo cas não proprias ; sej a quando
Hervas que para feno se des t inão
Na sua flores cenc ia sao cortadas ;Sej a depoi s das chuvas
i
c opio sas ,
Quando c om as pi sadas,O chão molle
Se tornar desigua l com taes desvelo s
Os prados n aturac s bom pasto críão .
Dr: prados taes das suas he i-vas fi nas
Criadas pela s terras que descan são,
Ligeiros poldro s bellos s e a l im en tão ;
São ellas as que mais convem a ovelha,
E c om pastagens taes o s fortes touros
i ss GEORG Í CAS.
Em quem da escravidão nao pode O j ugo
Des trui r o valor,manchar a audacia .
Aqui cheio de pó e branca espuma,
Salpi cado de sangue hórrido estrago
Debalde te rodea arremessando
O peito ao s p'
rígo s , O clarim da gloria ,O retin n ir das erinas mais te “
an imão
Intrep ido a aff'
ronter a morte v ôa s
Com teu senhor o s louros repartindo .
A qui por entre a s lanças te arremessas
All i ouves zunir de Marte O raio ;
Mas no centro do horror submisso e do c íl ,
Da m a o,que te conduz a le i procuras .
Erguido O collo as ondeadas olinas
S ól tas vaidoso ao ar O freio mordes
Com orgulhosa audacia e O chão que pisas
Com a ligei ra planta apenas to ca s,
Quando da paz serena n o regaço
Em nobres j ogo s teu senhor 'conduzes .
Alem,ao peitoral lan çando o peito
CANTO ! .
Com ligeireza e brio ufano arras tras
Das bel lãs Nymphas o s dourados carros .
Mais baixa a frente,menos leve o passo ,
Preso á charrua traças ao colono
O productivo rego ou com a grade
Cobres o grão fecundo ou po r mil modos
Ao lavrador uteis servi ços fazes .
Companheiro do heroe em seus combat es,
Servo do cidadão n o s seus prazeres,
D ' al ta pompa do s grandes lustre e ornato,
Alívio d o cultor em seus trabalhos
A toda a parte teu serv iço estendes
Do homem para O bem viver só sabes ;Ao homem pois reconhecer- te importa
,
Se perfeito desej a possu ir— te .
VAR IOS climas fornecem raças varia s,
Que produzem cruzadas bello effeí to
Huma de outra o s defei to s corrigindo .
Tu,oh Arabe errante
, tu possues
i 60 GEORGICAS .
De bons“
cavallos a mai s bella especie ;Só tu do c ruzamento não careces ;Maiores são o s teus
, são mais nervosos
Mais leves mais ardentes . Tu ,Marrocos
,
Apresentas vaidosa o s mais p res tantes
Cavallo s que produz a Barbar ia ,Que as hervas nutrem do nevoso Atlante
Com os quaes fez de Dido outr'ora a gente
D'Aguia Romana atraz volver o s vôos .
O encurvado collo a fina orelha ,
A agulha levantada a fronte bella,
A chata espadoa , a vigorosa p erna
A rapida carreira , o genio dc c il ,São dotes que a natura em grande copia
Sobre elles derramou . A nobre Hespanha
O cavallo Andaluz soberba mostra ;
Nº
elle o guerreiro sati sfei to encontra
A intrepidez O o rgulho a l igei reza
O olhar fogoso ; a nenhum outro cede
0 cavallo Andaluz , belleza e graça
1 62 G EORG ICAS .
Tu Islan diº a final p equeno e feio
Afei to aº clima durº que n º invernº
De espessº,lºngº pel lº t e reves tes ;
N㺠sereis,esquecidºs n º meu canto .
Proprio s aºs vºssºs climas e terrenºs
A vºssa imperfei çaº tá certo pºntº
O cruzamentº emenda ; pºrêm nunca
Os paizes de friº e de humidade
Vºs prºduzem iguaes aºs dºs paizes
Mais quentes,i n aquºsºs e elevadºs .
TU pºis,ºh lavradºr que em abundancia ,
Pradºs pºssues e fecundos campºs
Fºrma de bºas eguas as manadas ,E cºm prºpriºs cavallºs as fecunda .
De emproada cabeça,cºllo a iroso
De largps peitº s , tendº aº m enºs vis to .
Tres gyros annuaes dº sºl luzente ,
A procrear,as eguas s㺠dispºstas ,
E aºs sei s anuos m ui prºpriº h e o cavallo .
CANTO V ._
1 63
Pºrém a escºlha d'este he mais que tudº
A perfeição das raças necessaria ;
Hum cºrpº grande v igºrº sº e forte,
A queixada pequena , º ºlhar vivo
Convexa a frºnte hum poucº a ºrelha fina
Maciº pellº ,avantaj adº pei tº
,
Garupa larga levantada agulha
A canella delgada a junta mºvel,
A quartella n aº lºnga,º ca scº unido
Lucido e negrº chamm ej an tes ºlhº s
Mºbilidade , graça , geniº dºc il ,
S㺠para a bºa escºlha ºs caracteres .
Pºa t㺠perfei tº s pa ís sendº cobertas ,Podem as eguas dar perfei tºs fi lhºs .
Porém da egua gravida desvia
Os p,
rigºs e ºs trabalhºs ; separada
Deve andar dº s cevallos e d , aquella s
Que a lim en tão º s fi lhºs , ºu que livres
Fºlgão de exerci tar — se em leves saltºs
i 64 G EORG ICAS .
Ma s aº poldro nascido a l iberdade
Mais que tudº cºnvem ; convem — lhe em tºrnº
Da ma i brincar p elºs vi çosos campºs,
E depºis de seis mezes quandº º tempº
Chega de º desmamar,a branda sêmea
,
O sºro as farinacées muc ilagen s
A herva tenra alimenta— lo devem .
A cºbertº nº invernº em curral prºpr io
Deve as n ºutes passa r ; mas sem cadêa s,
E a par dºs seus iguacs em l iberdade ;
Para que em fim,chegadº aº quartº annº
,
Ou aº quintº , cºmece ºs seus trabalhºs .
NÃO menºs a tten ç㺠empregar deve
Na educaçaº dº bºi cºmº n a escºlha
Dºs tºurºs para pais o que pºssue
Das vac cas as manadas , que em m il mºdºs
Os trabalho s,que exigem gra tifi c㺠.
Eu n㺠descrevº aquella raça in dºc il
Imagen í d º furºr terrºr dºs campºs ,
l 66 G EORG ICAS .
Pisa r ºs campºs,l evantandº airoso
Hum cºllº grº ssº huma cabeça breve
De negras curtas armas adºrnada
Sºbre ºs j ºelhºs seus p ender dev isº
Sºlta papada dº iiºbustº pei tº ;
Entre á sªarnudas pernas vigºrºsas
Lhe des ize aº aº sºlº a lºnga cauda,
E em quantº c'
º mugido º s ares fere,
Dºs negros olhºs flamm as lhe chamm ejão .
De ºutrº rival'
a vis ta lhe embaraça,
Se n㺠queres n º campº atroz pelej a .
DE ciume incendido ,quantas vezes
O soberbº animal O im igº busca ,Olha — º de lºnge
,e cºm a m㺠pºtente .
Em to rb ílhões da terra O p ó levanta ;
Muge ameaça e qual º ardente raio
Ferº prº cura a singular p elej a
Já as frontes corn igeras se encontrã o ;
J á a pºnta O contrariº dilacera ;
CANTO V . 1
Urros de dºr , mug idos de vingan ça
Já temerosºs echos mil repetem
Em bºrbºtões na terra º sangue cºrre ;Raiva c ciume ºs an im aes resp ir㺠.
Mas º vencidº,em pó e emsangue envºl tº ;
Perdida a fº rça,ex tin c ta quasi a vi da
,
A o cºntrariº a final cede a vic toria :
E em quantº cºm º collº l evantadº
Este sºberbo .a recºmpensa busca,
'
C0' a frºnte baixa , cºm º ºlhar em fogO,
O vencidº dºs campºs triste fºge
E só,entre ºs rem o tºs fundºs valles
Occul ta o opprobrio ,e a vingança estuda .
Vingança sanguinosa,em que embebidº
O animal se nutre,cºntra º s trºncos
Já a ensaiar começa º cºrno agudº,
E parte em lascas º feridº lenhº .
As fo rças e o vigºr em fim res taura,
Ren ºva-se— lhe a raiva e j á bramindo
Cºrre á s plan i C i es , e o rival prºcura .
1 68 G EORG ICAS .
T A B S dº prazer º ín stin c tº,e seus effeitºs
S㺠entre ºs an im aes ; e se desej as
Prevenir º s desastres separadºs
Traze º s de sexº variº . As eguas pastem
N ,hum sitiº,as vac cas d ºutrº , aquem ºs tºurºs
Os cevallo s alem ; pºis de ºutra sºrt e
Na estação dº s am ºres O ciume
Estrago li a — de fazer , e fracºs fi lhºs
A m ai p rºduzirá,que fecun dá ra
Hum vencedº r nº prºprio sangue tintº .
MA s j a contêm no ventre a vac ca prenhe
Dº criadºr a esp'
rança e a riqueza ,Que deve º obj ec tº ser de seus cuidadºs .
Defende-a das inj urias da atmosphere,
Dºs grandes friºs ; dº calºr ardente
Das copiosas chuvas ; seu t rabalhº
Mºdera pºr extremº e d'ella aparta
Quan tº pºssa feri — la e incommoda— la ;Ma i s que nunca bºns fen ºs lhe minis tra
,
GEORG Í CAS.
Para in an sº º tºrn ar jamais te esqueça .
Manear- lhe ºs ainda curtºs cornºs,
E ºs p és para 0 i r fºrmandº a ferra .
Trata-lo com dureza em fim evi ta
Que a dºçura he só ganha cºm doçura.
DE BALDE modº brando em pregarias
C º tourº , que natura fez in dºc il
Atrevido e sºberbº e se domá- lõ
Aº trabalhº he pºssível,e dobrar-lhe
Aº j ugº a cervi z dura,jam ais ni elle
O soffrimento e a mansid㺠se en cºn traºt
Mal .trinta mezes cºn ta,ent㺠pr ivadº
De prºcrear , º tourº tºm a o nºme,
E º caracter de bºi ; então esquece
O soberbº animal o antigº org'
ulh'o ,Esquece a indep endencia ; e humilde es c rat'º
He d ,aquel l'
e,que '
º rege e de quem firme
O servi çº suppºrta ; e soffre º jugº .
CANTO V . 1 3 1
POR ÉM nunca aº trabalho rigºrºso,
Aquelle que de bºi as forças preza ,
O suj ei ta antes que dº lei te os dentes
Por novº s den tes '
ren ovadºs sej 㺠;
O que aºs tres ann ºs faz a natureza .
Os aneis,que nºs cºrnºs se ºri gi n aº ,
A idade dº animal marcão de sorte,
Que a m㺠al em de tres , n ºs cºrno s cºnta.
Pelos aneis º numerº dºs anuºs .
Deve reger prudencia xc au telo sa
O trabalhº dº bºi deve evi tar-lhe
Duras fadigas pela ardente calma ;
Nº es tiº aproveitandº a m adrugada, ,
E prendendo-º de nºvº ! tarde aº j ugº .
O que habita hum terrenº p edregºsº
O que destina º bºi para ºs transpºrtes ,
Cºm van taj em de ferro os pés lhe fºrra
POR fins º bºi , em tºda a vida escrava ,
Sente º s effei tºs da cruel velhi ce ;
1 72 G EORG ICAS .
Di to sº s e cansadº das fadigas
De huma vida de penas de trabalhºs
E sp'
ran dº em paz a tarda m 㺠da idade,
Seus dias acabasse a natureza !
Mas dº hºmem escravo em quan tº vivo ,
Alimento lhe presta alem da mºrte .
MAL gyro s dºze o sºl tem c ºmpletado
Muda -se a sºr te ; subi to cºmeça
Hum tratº favºravel m as presagio
Dº destinadº gºlp e derradeirº .
He levadº a abundantes gºrdºs pradºs ;
Já n㺠lhe opprime º cºllº º fºrte j ugº ;
A sêmea ,o s gra os ,o s nabos , as raí zes
Dº ten rº rábão a batata branda ,
.Cº
o sal,que o
'
appetite lhe desperta
S e lhe prºdigal iz㺠mas em breve
Tºma º animal carne , e a rij os'golpes
Pºr terra cahe às mãºs d”
aquelle mesmº
Para quem só t ivera fºrça e vida .
1 74 G EORG ICAS .
Cº ” a sºbriedade d º vigºr,c'
º geitº
Cºm que ºs mao s passºs vence , cºª a dureza ,
Que lhe faz afrºn tar º sºl e as neves
Assaz º indemni zou . Cºmº seu dºnº
Cºn dem n adº á penur ia e aº trabalhº,
O toj o hirsuto º cardº as dura s folhas
As v ergºn teas das arvºres , a relva ,
Tºda a especi e de grao tºdº º legume
Lhe serve de alimento ; lºnga vida
Inda a pezar de hum tratº asp ero e durº
Chega º tri ste a cºntar . Oh vós cultores,
Que pºs suis manadas , s e quizerdes
Mulos apasc entar em vºssºs campº s ,
Po r c ampanheirº º burrº dai á s eguas
Porém que sej a fºrte de ºlhºs vivº s ,
De fixa ºrelha ,de luzente pello ,
De mais de tres e menºs de dez anuos .
N A O mais,n aº mais de agri cºla s man ada s ;
Adeºs pºr huma vez tenazes leivas ;
CANTO V . 1 75
Adeºs fºrte charrua , bravºs tºuros ,
Á gei s c avallºs,vigºrºsºs mulos ;
Adeºs em fim amados lavradºres .
Nas margens de hum regato humilde cºrto
Flexíveis canas,cºm que brinca o vento
Pºr entre ellas ligei ro volitando ;
Cº' a branda cera o s variºs c an aes un o ;
De Pan á imitaçãº,cºrrendo ºs labiºs
Cº , a dºce fran ta , agºra ante mim chamº
Das rus tica s malhadas ºs pastºres .
V INDE oh m ansº s rebanhºs , aº meu ladº
Saltem sºbre a verdura ºs cºrdeirinhºs
De pedra em pedra ºs cabritinhºs saltem .
Balai em tornº, a m im mansas ºvelhas,
Trincai ºs ramºs cabras roedoras ;E em quantº º Deºs caprip ede me guia
Os a c cen tºs e a vºz nº humilde metrº
Ah !vem j untº de mim,oh Nize amada
Acºmpanhar c º º teu meu dºce cantº .
1 "6 G EORG ICAS .
ESCUTA I-ME ºh pastºres que nºs campºs
Guiais gadº lanigero ; 㺠terreno
A cºmm ºda i as raças ; pºis que º sºlº
Que nutre a esp eci e menºs encºrpada
Nutri ç㺠amaior recusar pode .
Porêm qualquer que fºr das vossas rezes
A grandeza,da lan cuidai atten to s ;
D, ella tece º pastºr a humilde manta,
E a purpura dºs rei s s e tece d” ella .
Preza o a lvo carneiro , que n o vel lº
Finº e sem mancha a neve pura imita .
Dá — lhe pº r cºmpanheira a branca ºvelha
E nunca nº rebanhº teu cºnsente
Das cºres vari adas a mistura .
Nunca perm i tte nelle a ºvelha annosa
Nem a que tem sym ptºma s de m olestia
Mórm en te se fºr mal cºntagiº sº .
OH qu㺠habil cºnvem que º pastºr sej a
Na practi ca c n º tratº de seu gadº !
QUANDO ºs ven tºs dº sul,que as aguas trazem
Tºld㺠º ar de nuvens procellºsas
Quandº ºeeo,de tºrrentes abundante
,
I nun da'
ºs campºs .e submerge os pradºs ;Ou sºbre a terra as neves am ºn tôa
, .
Cres tando as fºlhas das ra steiras plantas
Do gelador nºrdeste º bafº i roso ,
Aº pastº ºs teus rebanhºs n 㺠c ºn duzas ;
Pºrém de brandºs fenºs resguardadºs
No abri go dºs curraes a ºvelha nutre .
Jamais no ºutºnº , invernº ºu primavera
Pelo campº o rvalhado a ºvelha pas te
Só cºrrer as campinas lhe perm i tte
Depºi s que o sºl em ondeado fumº
Da fresca aurºra d issip á ra o pranto, .
J A MA i s pelas pastagens pantanosas
Os lan igerºs gadºs pascer devem :
Jám ai s nºs val l es humidºs e friºs ,
Ou á sombra dó bºsque ºnde nao en traº
CANTO V . 1'7
Do sºl ºs raiºs que em vapºr diss ipãº
A humidade ex cesswa do terrenº .
Huma herva fina e enx uta qual se encºntra
Nas fecundas plan íc ies elevadas ,Ou nas brandas encºs tas das collinas
,
Mais que tudº c'onvem a taes rebanhos .
MA s se no invernº Os regelados ventº s,
As neves e º s o rvalhos s㺠nºcivos
A mansa Ovelha mai s nºcivº h'
e inda
O bafº abrazadºr dº quente es tiº
Quandº raiºs de fºgº dardejando
D”entre º s braçºs dº cancrº furibundo
O sºl ardente º cerebrº lhe fere,
Fracº em ex tremº , tenro e deli cadº .
Pºr is so , ent㺠prudente O pastºr eauto
De manhan para o occaso , e p ela tarde
Para º nascente º gadº seu dirige ;Mas do d ia nº meio frescas sºmbras
Sºb ºs copados trºncºs lhe p rºcura .
1 80 GEORG ICAS .
OH pastºr vigilante,teus cuidadº s
Redobra quandº lá nº fresc º outºnº
A terra descem as prim eiras aguas,
Para que em turvas pºdres a lagôas
Hum venenº mºrtal n㺠beba O gadº
De tempº em tempo então sómente º leva
Aºs cºrrentes e límpidos ribe irºs
Oucrystall ine s fontes ºnde a ºvelha
Pºssa sem ris cº al gum matar a"
sede .
S ó prºvidencia s taes,s ó taes desvelos
Fa zem vingar lan igero s rebanhºs .
PORÉM s e º pastºr quer que as mansa s rezes
Recompensem dº tratº ºs seus cuidadºs,
Cumpre que ºs indivíduºs mais p erfei to s
Para a raça fºrmar attento escºlha .
Hum carneirº de lan alva e sem mancha
V igºrºso sadio de ºlhºs vivºs
De la rga frºnte , de fºcinhº rombo ,
Es treitas curta s ventas,grande ventre ,
i 82 GEORG ICAS .
Aº carneirº de nºvº a ºvelha entrega
E esta , o fructo n º ven tre conservando
Cincº mezes,no ºutºn º luz 0 mos tra.
O nascidº animal pºr ºutº días,
Aº menºs , n º .curral guarda e cºnserva
Mórin en te se n a sc eº em tempº friº .
DA prenhe ºvelha attentamente cuida ;Do restº do rebanhº á parte a encerra
,
Durante fria n ºute ; quantº pºssas
Dº feroz lºbº º uivº c arn ic eirº
Aº timido animal ºuvir evi ta ;D
,
ºutra m aneira , º sus tº muitas vezes
Desorganiza º fructo nas en tranhas
Cºm a sua da mãi l evando a vida .
BE N IGNO acºlhe Pan O pastºr habil ,O qual
,s e a º velha Ot fi lhº seu n㺠lambe ,
A fim de º enchn gar ,de sa l º cºbre ,
Para que dº app etite c onvidada
CANTO V. 1 83
O auxi li º m aternal lhe n ao recuse ;S e ella º lei te lhe nega
,aº c ºrdeirinhº
,
Inda a pezar da mãí , a teta entrega ;Se lei te assaz n㺠tem ,
lhe augmenta a c ºpia,
Ministrando-lhe a sêmea, ou a cevada ,
O nabº,ºs rábãºs nu trien tes hervas
,
O fenº da luzerna , da hera as fºlhas
Temperadas c ºº sal que a ovelha preza .
QUE direi eu agora em teu abºno
Pastor,que dº cºrdeirº que pá dec e
Minoras º penar,examinandº
Dºnde p rº em o mal, pa ra
'
evi tar-lho
Aº que o friº ºffendeº , em quentes panos
Envolves carinhosº e j untº aº fºgº
O alentº vi tal lhe reanimas ;X
Ao que findos dois mezes , s e desmama ,
Da mãí não só apartas m as lhe impedes
Ouvir della o s balidos saudºsºs
A bºns pas tº s e guias , brandas sêmeas
34 GEORG ICAS .
Ao principiº lhe dás e º s graos cºzidºs
Ou na agua , ou n º leite sabºrºso .
E que direi d'aquelle que ºs cº rdeirº s
Aºs quinze d ias cas tra , excep tº ºs pºucºs ,Que para raça escºlhe ; que as borregas
Priva de conceber,para que dêem ,
Cºmº os carneirºs,lan e carne bºa
Castrando-as i gualmente às sei s semanas
Depºis que ellas tem vis tº a luz dº d ia
Que nº curral suspende º sal em p edra s
Para que o gadº livremente a s lamba
E º sadiº vigº r ass im cºnserve ;
Que para tºsquiá -lo em fim aguarda
Que na fresca risonha primavera ,
Afastando a lan velha , j á da nova
Venh㺠sabín dº a s pºn tas n aº frizadas ;l
Que se acasº ferio n º cºrte as rezes ,
Afim de prevenir a sarna e rºnha,
As,cura sem tardança ? Oh vós pas tºres, ,
i 86 GEORG ICAS .
Mas impede que º dente seu nºcivº
Tºque a planta que es timas , cuj a mºrte
As mais das vezes,s egue hum tal in sul tº .
Para t irar — lhe ºr
lei te , a cabra ºrdenha
A,
noute,e sºbre a fresca madrugada ;
Porém nunca de sºrte,que aº cabritº
DO precisº alimentº a cop ia fal te .
SE hum rebanho escºlhido ter p ertendes,
Bºas cabras p rºcura e fortes bºdes .
De tres anuos té sete ª nde corp º,
Cabeça leve,grº s sº fºr te cºllo
Pendent e orelha , cºxa refçrçada ,
A marcha firme,a barba espessa e lºnga
O bode deve ter ; hum fi n? pello
Huma garupa larga,hum corpo fºrte ,
De leite as lºngas tetas abundantes,
"
Vi gºr e agilidade a cabra tºrn aº
Para a prºpagaçaº mais bella e prºpria
E se d'esta ºs filhinhos vigiares
CANTO V . t 87
Verás multipl icar os teus rebanhos ,
E terás nomeada entre os pas tores .
ºu tu que volves com o arado a terra
Tu que as arvores tens a teu cuidado ,Tu v inhateiro ,
e V! S emfim pastores ,Adeos por huma vez . He tempo agora
,
Que no seio da paz e do socego
A minha Musa e o estro meu descansem .
Em quanto assim can tava ao som da fran ta,
Doce amizade esforços mil fazia
Po r lançar —me nos braços do repouso
Po r ella em fim,completo s o s meus votos
,
Con segui acabar sin gellas rimas
Ao lado do só bem por que anhelava .
Tu pois, que me guiaste a tal ventura
Tu,prezado Tudella se rompendo
A barreira dos seculos , chegarem
Meus versos ao s ouvidos dos v indouros ;
1 88 GEORGICAS .
Se a inda hum d ia a Musa venturosa
Me poder franquear da Fama o templo
Dentro delle gravar minha mão grata,
Sobre as aras da Deo sa,i rá t eu Nome
Junto ao Nome de Nize quaes no peito
A amizade e o amor m ”
os tem gravado .
F IM.
190 NOTAS .
zonte de taes paizes ,não variao em al tura ;
o sol porêm será alli visivel m etade do annoe a outra metad e occulto ; conforme o c cupar
a parte bo real, ou austral da eclíp tica ,
não,
a ttendendo ao effeito da refrac ção .
O aus tral Xyphias ( 2) n o hem i spheri o Opposto ;
pag . 5 .
Xyphias ou Dourada,nom e de hum a das
con s tellações vizinhas ao pólo austral descrip tas po r Bayer ,
serve aqui de designaro mesmo pólo ,
E o s igno a Pan no Egyp to consagrado (3)
pag . 5 .
O Capricornio signo consa grado pelos
Egypc io s ao Deos Pan , cujo symbo lo era humbode . Aqui
,tanto o Cancro , como o Capri
cornio,são tomados pelos tropico s do m esmq
nome que termmao a zona torrida .
NOTAS . 1 9 :
E j á quando alum ia a sacra Them is . (4)
pag . 6 .
Os habitantes do equador tem a esPhera per
pen dic ular ,e po r conseguinte , o so l n o zeni th
nos do i s pon tos equi n o x iac s de An es ,e da
Libra . Os Gregos fabulá rão ser o Aries celesteo d o to zão de ouro do s Argon autas e a
Libra,a Balança da virgem da j usti ça Them i s .
E qual íman vol vendo ao n orte a flecha , (5)
Pª g ' 7 '
As arvores in c lm ão a flecha para 0 nasbente , por ser o pon to de donde primeiros e lhes apresenta a luz ,
agente essencial davegetação aeria . O cedro do Líb
an o
,arvore
'
m a les to sa que es tende ho rizontalmente assuas vigorosas e longas braças , he daquellalei geral a unica excepção conhecida poi sque a sua flecha se d irige Sempre para o norte ;phenom eno
,cuj a causa a analyse ehym íca ,
eas ex pen en c zas da phys ica vegetal na o poderao ainda descobrir .
1 92 NOTAS.
Das Hyades chorosas (6) que'
da frente
pág. 9.
Hyade'
s nome de huma pequena coh
stellação que forma a cabeça do Taurustodos sabem 'que o s poetas fabulãrão , que
Es tas filhas de Atlas e de Etheri a forão transform adas em astros pelos
'
Deo ses,condoídos
do s prantos que ellas derram avão continuam ente pela morte de seu irmão Hyas ; Horaciodi
'
sse ei tr is tes Hy a des
A celeste Balança a calma 'arden te
pãg . 1 2 .
Chega o so l á Balança ou Libra,";º si gno
'
da eclíp ti ca,ein 2 3 de sep tembro ; começa
b ou tono com o equ in o x ío .
O fogoso Ou ao (8) c'obraço ingen te ;
pag . 1 3.
Orl ao ou Uríon,grande con stel lação meri*
:94 NOTAS"
.
c ezes ; hedy sa rum on obry chís do s bo tan ic o s
he entre as plantas da familia leguminosa adoptadas para p rados artifi c iaes
,a que parecem ai s
u ti l,e de mais extensa a ppl icação para este
fim nas differentes prov ín c ia s de Portugal .:º
. Porque sendo indigena na Europameridiona l
,e nell a ºriginaria das m ontanha s
calcarias,facilmente pode prosperar c om a
cultura n o clima (Pes te reino .
20 . Porque exigindo as plantas de prado artific ial , taes como a luzern a , o trevo , et
/
c .,terren o
plano,profundo pouco compacto e fresco
o onobrychis pro spera nas terras m ai s sec c a s ,el evadas p edregosas e até nas areentasp rincipalmente se na composição dellas entrasubstancia calca ria a qual se encontra quasigeralmente n os terrenos de Portugal .3 0 . Porque
,o onobrychis , tanto na semen
teira como n os am anho s para a s suas colheitasan nuaes exige menos trabalho e meno s adubodo que as d ittas plantas ; he c om tudo mui utils emeá-lo em terra profundamente lavradae a inda m elhor s e nella tem precedido culturas taes como a do milho da batata e tc .
cuj os amanhos dividem a terra e extinguem
NOTAS . 1 93
n ella as hervas n ocivas huma e '
outra cousahe conveniente para que ,
no primeiro e segundo anno
,ganhem vigor as rai zes desta
planta as qu aes,em tal caso
, p rofundão
perpendicularmente até dez palmos e mais ,de que provém o vingar o onobrychis n o s
t errenos ingratos e arido s poi s que pode ,p elas
,suas raizes
,procurar em grande pro
fund idade o s sueco s n ec essario s á v egetaçao .
40 . Porque,ainda que a luzerna ou o
trevo produzem maior quantidade de herva ,
a do onobrychis,que fornece n o s pa izes
m erid ion aes tres ou quatro abundantes cortesem cada anno
,ou sej a da da em verde ou em
feno , he mai s sub s tancial , e conserva os gadosm a i s v igorosos e menos expostos a molestias .50 . Porque
,o onobrychis
,que dura em
prado de 1 0 até 1 5 anuos,pela dec om po
s i ção das suas abun dantes raizes , melhoraconsideravelmente o terreno para nelle sepraticar a cultura das c ereaes .
Tanto o s In glezes , como o s Fran cezes temconhecido as van ta j en s da cultura destaplanta
,e por i sso huns e outros , ha ann o s
esta parte tem multiplicado muito o s prados
1 96 NOTAS .
d ella . He digno de se notar , e de servirde exemplo o que tem acontecido na parteda Champ agne denominada , pela esterilidadedo seu terreno
,Champagn e pouílleuse esta
porção daquella provinci a era , ha menos dequarenta anno s
,o d i stri c to mais m iseravel de
França os seus gados poucos e enfezados ,a s suas arvores raras e mesquinhas e as colhei ta s das c ereaes nunca supprião ao sustentoannual dos seus entao infeli zes habi tantes
,
o s quaes com a in troducção dos prados doonobrychis
,tem feito desapparec er o aspecto
indigente daquel le pai z,aonde c om es te
meio,nelle actualmente mui generali zado ,
as terras p roduzem abundan tes colhei ta s dec ereaes cr iao arvores perfei tas e sus tentão
gado s vigorosos .
Musa ao agricultor da marga ( 12) o uso
pag. 2 1 .
A marga he hum composto de carbonatede cal e de alumina ou argila pura ; porêmFt propo rção dos dois princ ípios , que a c on
1 98 NOTAS .
Ocyroe ( 14) cobre o s grãos co'a terra solta .
pag. 34.
Ocyroe,fi lha do centauro Chi ron ,
e deCherillo pretendendo conhecer o futuro , fo iconvertida em Lª goa .
Já o es tame ( 1 5) ao pistillo fecundado
pag . 41 .
Os orgao s sex uaes das plantas dividem — s eem estames , e pi s ti llo s a fun cção do s es tamesou orgãos masculinos he fecundar com o póque contêm nas chamadas an thera s , o s or
gão s femininos , ou p i s tillo s ; findo isto ,está
completo o fim da fl orescencia o s es tamese a corolla i sto he , o tegumento do s orgãossex uaes immediatamente co n tíguo a el lesm urchão e deperecem .
E huma aura impura ( 16) próvi das embebem ;pag . 59.
Os vegetaes tem a propridade de exhala r
NOTAS . 1 gg
d e s i quando estão expostos ! luz, o o x y
genco ou ar vital e p elo contrario a dedecompor o gaz acido carbon i co
,gaz im
proprio a combustão e respira ção .
'
E com o p roprio unguen to ( 1 7) humedecido
Pag . 7 8 .
O unguento a que o s Fran cezes chamaode S .F ia c re
,patrono do s pom areíro s he hum
composto de argi la e bosta de b o i , e c o s-v
tumao misturar — lhe palha miuda para o to rnarmenos facil em fender- se ; c om ell e cobremas ferida s feita s n o s troncos
,e ramos a té
que as tenha coberto a producçao da casca .
A branca alface o n abo turbinado ( 18)
pag . 7 8.
Diz — se a raiz turbinada quando he conicav erticalmente ou se assemelha a hum piãobailando .
NOTAS .
0 morango esto lho so ( 19) alli floresce ;
pag . 80 .
Chama-se tronco estolho so ,aquelle que
sab ín do da primeira raiz,lan ça em mais
ou menos di stancia,n ova s i raizes na terra ,
e neste lugar brota dois“
,ou mais es tolhos ,
i s to he,troncos herbaceos
,quasi nus de
folha s,e sem j untas .
A reptan te (20) bortelan a segurelha
paº
. 80.
Diz — se a rai z rep tante ou serp ejantequando he horizontal
,e se es tende
,lançando,
radiculas em'
varias dis tancias .
De nutrientes capí l lares (2 1 ) tenues
pag . 87 .
Da-se aqui o nome de capíllares á s radª
culas mais finas que lanção de s i os ramºs,da princ ipal raiz .
202 NOTAS .
s i gao della ; ambas estas c ircum stan c ias
ob stão á facil in tro ducção do calor e dahumidade
,que devem concorrer no inte
rior da semente,como agentes i nd ispen
saveis daquel la Operação da natureza .A experienc ia tem mostrado constante
mente 10 qu e nos si tios abundantes de
caroços de azeitona ,por exemplo
,na pro
x im idade dos lagares de azeite,e até n o s
ol ivaes cult ivados,não se vêem nascer zam
buj eiro s ; aº que n o s mato s frequentados
por an im aes costumados a comer a zei
tonas,e prrnmpalm en te pertencendo a
classe dos* ruminantes,por exemplo
,as
cabras,e n o s si ti os e vallados
,em que as
aves que s e nutrem com azei tona,c o s tum a o
pousar,s e encontrão frequentes zambu
j eiros . Em con sequencia,o s an im aes e as
aves sao os unicos semeadores des ta arvore ,os quaes
,tendo pelo c alor e humidade d o s
seus intes tinos diminuído o s'
obs ta cul o s
acima referidos lanção a semente d is
posta para entrar em germinação . Im i
tando o que acontece nas aves e n os an i
maes podemos conseguir hum facil nas
NOTAS . 203
cimento de zambuj eiro s e formar viveirosregulares desta preciosa arvore .
Para apoio do que fi ca transcripto acresc en ta re i que percorrendo e observandoem diversas es tações vario s sitios de mato se de val lados silvestres n o termo de San
tarem e nas vizinhanças do Zezere,tenho
nelles encontrado muitos zambuj eiro s n ovose algun s rec em — nascidos ,
ao mesmo tempoque não descobri em taes si tios zambu
j eiros c om fructo ,ou semente e em al guns
do s mesmos sitios n ão vi hum só zambuj eiroque segundo a tardia fruc tifi caçãO
º destaarvore estivesse em idade de produzi rsem entes ; ou porque o s cultivadores aprov ei tão louvav ehn en te o s zambuj eiro s para en
x ertia e plantação , logo que chegão á grandeza conveniente para s emelhante destino
,
s egundo as c i rcum stan c ia s da nossa a c tualagri cultura ; ou porque o s povos o s c o rtao
,
c om damno da m a i s vantajo sa cultura daoliveira e o s des tinão para lenha
,e para
outros usos ainda m ai s reprehen s iveis , qual'
he o do s cajados da gente do campo .
Po r tudo o que fi ca transcrip to e expos to ,
204 NOTAS .
parece-me. que os passaros e os an imaes são os
uni cos semeadores dos zambuj eiro s que seen con trao nos matos e vallados .
Tem lançado rai z . Hum tronco herbaceo (a í )pag . 94.
Herbac eo he propriamente o tronco de c on
,s isten c ia não lenhosa , e que perece annualm en te ; porêm aqui se applica o termoherbaceo á consi s tencia tenra da nova olive ira .
Alli exi ste o o x ygeneo puro (25)
Pª gº 99
O o x ygen eo he o ar resp iravel , e proprioa combustão e que
,unido ao azote na pro
porção de 2 1 para 79 ,forma o ar a tmos-ª
pherico em que vivemos .
A lli o n i trogeneo azote (26) impuro
Pª gº 99º
6 J
O n i trogen eo ou azote,he hum gaz Unª
proprio a combustão e resp iração .
206 NOTAS.
s er o calor,ou calor ico hum fluido ão qual
,
alem de mui tos outros phenomenós , se deveo estado fluido e gazoso das diversas subs tan c ias , e a volatil i za ção e d i lataçã o detodas ; razao pela qual aqu i s e chama agenteda n atureza .
Calyces (30) e coro llas de 1111! côres ,
pag . 1 05 .
O calyx na maior par te das flores,he õ
tegumento ex terno dos orgãos sex uaes , decôr verde
,ou menos corado que a corolla .
Mi l parasitas (3 1 ) vão roubando as braças ;
pag . I I I .
Plantas parasi ta s são aquellas , cuj a raiz estáapegada ao tronco
,ou pernadas , de outro ve
geta l , e que tirão delle o s suec o s , c om o s
quaes vegetão e po r i sso são n oci v as á splantas a que se unem ou em que nascem .
NOTAS . 207
O oleo , ai nda nas drupas (32) con tam ina.
pag . 1 1 6 .
O fructo ( botanicamente fallando ) he hum a
, ou mais sementes fecundadas ,e nu
t ridas sobre o seu receptaculo ,ate' p erfei to
estado de madureza . O tegumento d'estashe o que o s bo tan ic o s chamao p ericarpo ; adrupa he huma especie de peri carpo semvalvulas , nem suturas
,carnudo
,de casca
coriacea,e contêm no centro huma n oz
,
ou carôço.
Conserva do zen i th e do horizonte , (33)
pag . 1 2 2,
Novamente se toma aqui a Cynosura pelo
p ólo ,e como a al tura d ª es te Sobre o hori
zonte de hum lugar he igual á lat itude domesmo lugar
, v em o s u ltimos versosdesignar o s pa i zes c om prehen dido s entre oparallelo do 250 ,
e o do 450 latitude mediaentre zero e noventa .
NOTAS .
Sobre os longos sarm entos (3 1) j á dispostos .
pag . 1 29.
Sarmentos são varas nodosas as quaes toc ando na terra ou em corpos vizinhos n'ellesse arra igão pelas sua s j untas ; e n'es te lugars ign ifi cão propriamente as varas da videira .
Do ardente alcohol (35) que por activo
pag . 1 30 .
A distillaçao da agua ardente p or humc alor brando
,produz huma substancia muito
in flamm avel e muito volatil,que se chama
espirito de vinho,ou alc ohol ; a formaçao
des te he devida ! decomposi ção do principioa ssucarado contido n o mosto
,e t anto mais
abundante,quanto o he es te prin c ípio .
A sabi da do gaz forte e assassino , (36)
pag . 144.
O gaz acido carbonico he hum dos pro
2 1 o NOTAS .
cuj o contac to he indispen savel á fermen
tação .
D'affi nidade !s leis obedecendo , (39)
pag. 1 44.
Chama-se affi n idade aquella força , que
seni cessar , tende a reunir os principios separ ados ; e c ohesão ,
a que tende a conservar noestado de combina ção ou união os quese a chão combinados , ou unidos .
E no fundo tenaz se prec 1p1 ta ; (40)
pag . 145 .
O tartaro he hum sal,que se precipi ta
p ela fermentação v inosa , nas paredes efundo das cubas e toneis . Varias ex pe
r ien c ias tem mostrado que o tartaro exis teformado n a uva ,
e em outra s subs tanciasv egetaes ,
e parece obrar como fermenton a fermentação
,onde a sua presença he
essencial, v i s to que o mosto
,inteiramen te
despoj ado do tartaro,nao fermenta .
NOTAS . 9 1
R esinoso , que a côr do vinho encerra . (4 1 )
pag . 1 45 .
A côr do s vinhos , como la s e disse hedevida a dissolução no al cohol do p rm mp i ocolorante e resinoso
,c ontido na pelle do
bago .
Tu prezado Tudella se rompendo
pag . 1 87 .
O Sn l'
. Fernando Tudella de Castilho , P idalgo da Ca sa Real residente n a villa doFundão e meu p rezado amigo e bemfei tor .
FIM DAS NOTA S .