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APROVEITAMENTO DE QUEDAS D’ÁGUA PARA GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA COM TURBINAS PELTON DE CERÂMICA EM ATÉ 200 W Mário Kawano 1 Roberto K. Onmori 2 RESUMO Neste trabalho mostra-se um projeto bastante prático, para ajudar as pessoas de pequenas propriedades a terem mais conforto e se afastarem da exclusão social através do uso da energia elétrica gerado no local. Tenta-se transformar o processo de geração de energia elétrica em artesanato, pois se procurou não utilizar máquinas sofisticadas e caras na construção dos elementos do gerador de energia elétrica. Abre-se uma linha de pesquisa em novos materiais para construção de pequenas turbinas. Evita-se qualquer degradação ao meio ambiente. Vários locais como a Mata Atlântica e regiões interioranas possuem pequenas quedas d’água e podem ser aproveitadas para a geração de energia elétrica para baixo consumo como lâmpadas do tipo “PL”, televisão, celular, geladeira e alguns pequenos equipamentos agrícolas. O objetivo do trabalho é mostrar o que tem sido feito na prática para essa finalidade pelos alunos de graduação na construção das turbinas: a) usando barro para construção de pás, b) montagem da roda Pelton, c) montagem final da roda ao gerador (motores DC sucateados), c) canalização da água e geração de energia, d) acumulo da energia gerada em bateria (de carro), e) uso do “nobreak” de computadores para obter a tensão AC de 110V. Palavras chave: Hidrogerador, pico-usinas, energia alternativa, turbinas cerâmicas. 1 Centro Universitário da FEI [email protected], PUC-SP [email protected] 2 Escola Politécnica da USP [email protected]

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APROVEITAMENTO DE QUEDAS D’ÁGUA PARA GERAÇÃO DE ENERGIA

ELÉTRICA COM TURBINAS PELTON DE CERÂMICA EM ATÉ 200 W

Mário Kawano1

Roberto K. Onmori2

RESUMO

Neste trabalho mostra-se um projeto bastante prático, para ajudar as pessoas de pequenas

propriedades a terem mais conforto e se afastarem da exclusão social através do uso da

energia elétrica gerado no local.

Tenta-se transformar o processo de geração de energia elétrica em artesanato, pois se

procurou não utilizar máquinas sofisticadas e caras na construção dos elementos do

gerador de energia elétrica. Abre-se uma linha de pesquisa em novos materiais para

construção de pequenas turbinas. Evita-se qualquer degradação ao meio ambiente.

Vários locais como a Mata Atlântica e regiões interioranas possuem pequenas quedas

d’água e podem ser aproveitadas para a geração de energia elétrica para baixo consumo como

lâmpadas do tipo “PL”, televisão, celular, geladeira e alguns pequenos

equipamentos agrícolas.

O objetivo do trabalho é mostrar o que tem sido feito na prática para essa finalidade pelos

alunos de graduação na construção das turbinas:

a) usando barro para construção de pás, b) montagem da roda Pelton, c) montagem final da

roda ao gerador (motores DC sucateados), c) canalização da água e geração de energia, d)

acumulo da energia gerada em bateria (de carro), e) uso do “nobreak” de computadores para

obter a tensão AC de 110V.

Palavras chave: Hidrogerador, pico-usinas, energia alternativa, turbinas cerâmicas.

1 Centro Universitário da FEI [email protected], PUC-SP [email protected] 2 Escola Politécnica da USP [email protected]

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UP TO 200WATTS ELECTRICAL ENERGY GENERATION BY USING LITTLE

WATER FALLS AND PELTON CERAMIC TURBINES

ABSTRACT

The principal motivation of this work is to develop a practical and low cost project of

electrical energy generation, giving opportunity to people from isolated places, such as little

farms, of having access to electricity; and therefore more comfort.

This method transforms the electrical energy generation into a non-manufactured activity. A

remarkable advantage of the developed system is that no sophisticated machine is required;

and moreover, no damages to the environment are caused. These facts make the necessity of

studying new materials for turbines imperative.

Little falls from many places, such as ‘’Brazilian Mata Atlântica” and country regions, can

be used for electrical energy generation of low consumption. This energy is enough to PL

Lights, televisions, refrigerators, few agriculture equipments and other appliances.

This work shows how engineering students have developed the Turbines: a) the

Pelton split buckets made of clay; b) the Pelton Wheel construction; c) piping system and the

use of the DC motors for electrical generators; e) the battery for the energy storage; f) the

110V AC “nobreak” for the installation.

Key words: Hydraulic generator, little waterworks, alternative energy, ceramics turbine.

Objetivo

Produção de energia elétrica com potências inferiores a 200 Watts a partir de um sistema não

poluente, no caso quedas d’água, uso de materiais de baixo custo tornando o sistema

artesanal, melhoria na qualidade de vida, conscientização do beneficiário à

conservação e possível ampliação da vegetação nativa visando manter ou aumentar a

quantidade de água necessária no local, ministrar um curso de manutenção do

sistema gerador e uso racionalizado da energia elétrica.

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1.Introdução

Quando a energia elétrica começou a ser utilizada, a vida humana tem ficado muito mais

confortável. Aproximadamente oito milhões de brasileiros ainda não possuem e nem

usufruem do conforto da energia elétrica. Sem essa energia, é necessário o uso de

compostos químicos normalmente poluentes e descartáveis.

Muitas famílias moram em pequenas propriedades rurais afastadas das redes elétricas

e não têm condições financeiras para arcar com os custos da instalação. Por outro lado uma

parte dessa população vive a beira de serras de onde conseguem água potável e têm

as pequenas quedas d’água, que possa vir a gerar a sua própria energia elétrica.

Muitos aparelhos eletro-eletrônicos necessitam dessa energia como geladeira, telefonia

celular, televisão entre outros. A partir dela, caminhos são iluminados tornando o dia mais

longo e mais produtivo, alimentos são conservados por um período mais longo e as

informações chegam mais rápidas. Um exemplo típico seria a campanha de vacinação.

Para a família onde foi instalado o sistema e usufrui dessa energia gerada, é fornecido um

curso de utilização e manutenção do sistema, conscientização e racionalização no seu uso

para não haver desperdício.

Orienta-se a família ou a população local para conservá-la ou aumentar a vegetação nativa ao

redor dos veios de água para manter a quantidade de água necessária para abastecer a turbina

assim como propagar o conhecimento para os vizinhos que possuem condições para a

instalação do sistema.

O trabalho apresentado é social e sem fins lucrativos.

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2.Metodologia e Resultados

- 2.1 A motivação.

Os alunos de graduação da Pontifica Universidade Catódica de São Paulo (PUC) e da

Faculdade de Engenharia Industrial (FEI) precisam aplicar seus conhecimentos teóricos e

essa é uma oportunidade onde os conceitos adquiridos em mecânica dos fluidos,

instalações elétricas e noções de física são amplamente utilizadas no projeto.

As universidades Católicas normalmente exigem um determinado número de horas de

dedicação em trabalhos comunitários de seus graduandos, que poderão levar muitos

benefícios e alegrias com esse enfoque de trabalho.

- 2.2 A escolha da turbina e seu desenvolvimento.

A turbina Pelton foi escolhida por que se adequou melhor às quedas de água além de

necessitar de pouca vazão. A turbina é quem extrai a energia da água, transferindo o

movimento cinético para um movimento rotacional fazendo o gerador girar. A construção de

turbinas Pelton usando cerâmica não exige nenhum

maquinário especial ou dispendioso. A matéria prima é o barro e pode ser

moldado de maneira simples e artesanal conforme a figura 1 e 2. O primeiro passo foi a

construção do modelo que consistiu em colocar dois ovos de codorna em gesso em

processo de endurecimento, como pode ser visto na figura 1. Observando-se os desenhos

das conchas de uma turbina Pelton, nota-se uma grande semelhança com ovos de aves.

Os ovos de codorna eram os que se aproximavam mais das medidas dessas conchas, isso

levando em consideração a contração da cerâmica após a queima. Após a cura do gesso, os

ovos foram retirados e o restante da concha foi desbastado. O modelo foi tornado

perfeitamente liso e assim foi possível fazer o molde com massa plástica. Foi usado o barro

da própria região, facilmente encontrado, para a construção das conchas e, para cada concha

moldada, o molde era encerado com cera desmoldante. A figura 2 mostra alunos do

quarto ano de engenharia elétrica construindo voluntariamente conchas para turbinas. As

conchas ficaram no Sol por uma semana a fim de ficarem o mais seca possível. A primeira

queima foi feita a 1000 graus Celsius. Após chegarem a temperatura ambiente, as conchas

são pintadas com tinta para cerâmica e finalmente recozidas pela última vez a 980 graus

Celsius. Uma vez definido o diâmetro da turbina, parafusam-se as conchas em um

disco, que pode ser uma roda plástica de carrinho ou de bicicleta. O rendimento destas

turbinas é superior a 70%.

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- 2.3 Obtenção e uso da energia elétrica.

O gerador de energia elétrica utilizado é um simples motor de corrente continua

(D.C.), encontrado em grande quantidade nas casa de sucatas eletrônicas de São Paulo. A

energia fornecida pelo gerador é condicionada (regulador de voltagem) e armazenada em

uma bateria de carro de 12V.

Figura 1 Construção do modelo em gesso com ovos de codorna. Figure 1 Model construction

in gypsum using tinamou eggs.

Figura 2 Alunos moldando conchas

Figure 2 The students shaping the splic buckets.

Um “nobreak” transforma a tensão DC de 12V em AC 110 ou 220V. O “nobreak” pode ser

um obsoleto, também encontrado em casas de sucatas, pois as empresas normalmente

substituem esses equipamentos por outros mais modernos. Para a

iluminação, usam-se lâmpadas do tipo compactas e eletrônicas (PL) de baixo consumo (6

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a 9 W) e de grande eficiência luminosa. Em locais onde a comunidade é grande e se faz

necessário o uso de refrigeradores, coloca-se um “nobreaks” de maior potência (700W), mas

infelizmente ainda não são encontrados facilmente em casa de sucatas, necessitando a sua

compra.

- 2.4 Teoria e equacionamento.

A equação do comportamento do gerador pode ser escrita pela equação de Pouillet:

U = E - rI (1.0)

onde U é a tensão de saída do gerador, E é a tensão gerada, r é a resistência interna do

gerador e I a corrente fornecida. Multiplicando (1.0) por I chega-se a

UI = �EI - rI2 (1.1)

onde UI é a potência de saída do gerador, r*I² é a potência perdida na resistência interna do

gerador, E*I é a potência recebida da turbina e � é o rendimento da turbina. Devido a queda

de tensão no diodo e na fiação, que está ao redor de 1 V, esse valor deve ser

acrescido a tensão mínima da bateria e com isso chega-se a U = 11 V.

Figura 3 Levantamento das características do gerador em vazio (curva superior) e com uma

carga de 3 Ohms (curva Inferior).

Figure 3 No load generator characteristics is shown in the upper straight line and with a 3

Ohms load is the lower straight line.

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A equação (1,1) fica:

11I = 0,6 * 125 – 1,3 I2 (1.2)

e resolvendo (1.2) tem-se I = 4,5 A. Como nos interessa a tensão E, basta dividir a

potência recebida por esta corrente e chega-se a E = 16,8 V. Com esse valor no gráfico da

figura 3 chega-se a N = 550 RPM. Pode-se calcular a velocidade do jato d’água em função

do diâmetro D da roda Pelton dada por (1.3):

V = (D * � * N) / (60 * 0,455) (1.3)

Para D = 0,29 metros, a velocidade deve ser de V = 18,35 m/s

Para calcular a altura da queda d’água tem-se:

H = V2 / (2 * 9,8) (1.4)

resultando em uma altura de H = 16,8 m.

O diâmetro de roda de uma bicicleta infantil é de 0,25 metros, sendo que as pás aumentam

mais quatro cm no diâmetro total da turbina (MACINTYRE,1983). A altura de queda

necessária para essa roda é de H =16,8m, mas nestas instalações é muito comum quedas

com 25m ou mais em 100m de mangueiras. A viagem ao local de instalação

normalmente é muito trabalhosa, principalmente para levar os apetrechos a serem

utilizados, como pode ser visto pela figura 4.

Usando manômetro e um bocal de teste, faz-se o levantamento da queda e perda de carga do

sistema, para o acerto ideal da energia que chega a turbina Pelton. Enquanto um grupo de

alunos (do quarto ano da PUC/2005) acerta toda instalação hidráulica, um outro grupo de

alunos (primeiro ano da PUC/2005) faz a instalação elétrica. Terminado todo o trabalho, os

beneficiários da residência e outros das proximidades assistem um curso de manutenção do

sistema e recebem orientações de como manter a vegetação nativa ao redor dos veios de

água para manter a quantidade de água necessária para abastecer a turbina. Também são

orientados para a , manutenção periódica do gerador como engraxar os eixos, verificação do

nível de água da bateria, da rede elétrica, medida de consumo, racionalizar a energia sem

desperdícios e, principalmente, propagar o conhecimento para os vizinhos que possuem

condições para a instalação do sistema.

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Figura 4 Difícil subida até o local da instalação. Figure 4 Difficult climb up before work

place.

A figura 5 e 6 mostram respectivamente uma equipe fazendo a instalação elétrica e

a instalação hidráulica enquanto que a figura 7 mostra o resultado do trabalho.

Figura 5 Aluno fazendo a parte elétrica. Figura 6 Aluno testando a parte hidráulica.

Figure 5 The students making Figure 6 the student devise hydraulic parts electrical

installation parts .

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Figura 7 - Resultado do esforço. Da esquerda para direita temos: Luiz Fernando, Rafael

Silvestre, Mario Kawano, Igor Alexandre, Pittelkow, Moacyr Buch, Ednaldo Mareco,

Esposa do beneficiário, O beneficiário José, Alexandre Reis ,João Batista e o

fotografo Leandro Pottes.

Figure 7 The effort result. From left to hight Luiz Fernando, Rafael Silvestre, Mario

Kawano, Igor Alexandre, Pittelkow, Moacyr Buch, Ednaldo Mareco beneficiary wife,

beneficiary, Alexandre Reis , João Batista and photographer Leandro Pottes.

3.Resultados e discussão

Apesar de parecer uma energia muito pequena, ela consegue mudar completamente a vida de

uma família. Com se um sistema fornecendo apenas 50W tem-se 36Kwh em um mês, que é

o consumo de muitas famílias de baixa renda.

As turbinas de cerâmica devem ser melhor estudadas, pois transformam uma

tecnologia sofisticada em artesanato simples.

O chuveiro elétrico não pode ser acionado pelo sistema porque exigiria uma potência

muito elevada do sistema ou do “nobreak”, mas normalmente essas pessoas têm aquecedor

de água acoplada nos fogões de lenha e também podem usar um aquecedor solar

social (Kawano,2004).

Este trabalho deve e pode ser aproveitado por outras universidades, como no caso das

Católicas cujos alunos são obrigados a terem um determinado número de hora de

trabalho social.

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As aulas teóricas e praticas sobre o sistema e meio ambiente devem ser lecionadas de

maneira simples, palavras de fácil compreensão por que a comunidade tem grau de

instrução muitas vezes básico.

Atenção aos cuidados com seguranças para não tomar choques elétricos e melhor uso e

racionamento da energia gerada e acumulada.

Também disponibilizamos e incentivamos a propagação da tecnologia para outras famílias.

O sistema é viável e mostrou-se de baixo custo e as famílias ficaram com melhor qualidade

de vida.

4. Agradecimentos

- Aos Alunos do primeiro e do quarto ano da PUC (2005), que participaram do projeto em

especial aos alunos Leandro Pottes e Pablo Rodrigues, que apesar de já terem

participado da criação do projeto, continuam orientando seus colegas.

- Ao Centro Universitário da Fei nos forneceu o Laboratório de Mecânica dos Fluidos.

- A Pontifícia Universidade Católica nos cedeu os fornos para as queimas da cerâmica.

- A Kanaflex pela doação das mangueiras.

5. Bibliografias

[1] MACINTYRE, A.J. Máquinas motrizes hidráulicas. Rio de janeiro: Guanabara Dois;

1983.

[2] Kawano, Mário; Aquecedor Solar Social; I Simpósio Internacional de Ciências

Integradas da Unaerp Campus do Guarujá; 2004; S.P.