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Departamento de Administração GESTÃO DO CONHECIMENTO E O APRENDIZADO ORGANIZACIONAL: PERCEPÇÕES DO NÍVEL TÁTICO DA MARINHA BRASILEIRA. Aluno: Wellington Pereira Orientador (a): Sandra Regina da Rocha Pinto INTRODUÇÃO O mundo cada vez mais globalizado e integrado exige que as pessoas e organizações estejam sempre prontas para qualquer mudança. Com isso vive-se um momento em que o conhecimento e o aprendizado contínuo estão sendo valorizados. Esse momento é entendido como Era do Conhecimento, sendo assim definido, como o período caracterizado por uma conjunção e sinergia de inovações sociais, institucionais, tecnológicas, organizacionais entre outras, em que a informação e o conhecimento passaram a desempenhar um papel fundamental e estratégico [1]. Sendo assim, as organizações atuais estão inseridas em um ambiente turbulento, caracterizado pela alta competitividade, pela integração dos mercados internacionais e pela redução do ciclo de vida de produtos e serviços [2]. As organizações militares apesar de não estar vivenciando essa alta competitividade, estão inseridas também nesse ambiente repleto de mudanças. O surgimento de novas tecnologias no setor bélico ou até mesmo para uma iminente defesa de interesses do país faz com essa instituições devam estar sempre postas e preparadas. E para isso é fundamental que o conhecimento seja bem utilizado e gerido de maneira eficiente. A importância da gestão do conhecimento é ressaltada pela forma como auxilia as organizações na identificação, seleção, organização e disseminação das informações e experiências [3]. Os primeiros estudos sobre a aprendizagem organizacional surgiram a partir dos anos cinquenta, porém, na década de noventa que esse campo se expandiu na teoria e na prática de gestão [4]. Embora já estabelecida, a área apresenta ainda desafios para sua consolidação, entre eles a dificuldade de constatar empiricamente quando e como um processo de aprendizagem ocorre, desafio que aumenta, quando o sujeito desse processo é a organização [4]. O aprendizado organizacional possui dois importantes componentes os insights e a memória organizacional. O primeiro diz respeito aos conhecimentos e modelos mentais compartilhados e que os decisores devem aprender juntos, para não bloquear a mudança. E o segundo depende dos mecanismos institucionais para reter o conhecimento [4]. As organizações devem aprender com suas experiências, devem registrar as melhores práticas e compartilhar esse conhecimento internamente [5]. O conhecimento essencial deve ser institucionalizado e, com isso, tornar-se propriedade comum, evitando que fique restrito a algumas pessoas-chave e que se perca quando elas deixarem a organização [5]. Com base no exposto, este estudo procurará entender como se dá a gestão do conhecimento e o aprendizado organizacional dentro uma instituição militar, no caso em questão, a Marinha do Brasil, sob a ótica de percepção do nível tático desta organização. O objetivo desta pesquisa é observar como os fuzileiros navais percebem a Gestão do conhecimento e o aprendizado organizacional dentro da Marinha e o que eles acham que a organização faz de melhor e o que deve ser melhorado. Foi utilizada uma pesquisa qualitativa com perguntas iniciadas por como, o que, qual, visando uma melhor compreensão do tópico de estudo. Procurou-se identificar e ilustrar o processo de conversão de conhecimento e enumerar as principais práticas em gestão do conhecimento dentro da organização.

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Departamento de Administração

GESTÃO DO CONHECIMENTO E O APRENDIZADO ORGANIZACIONAL:

PERCEPÇÕES DO NÍVEL TÁTICO DA MARINHA BRASILEIRA.

Aluno: Wellington Pereira

Orientador (a): Sandra Regina da Rocha Pinto

INTRODUÇÃO

O mundo cada vez mais globalizado e integrado exige que as pessoas e

organizações estejam sempre prontas para qualquer mudança. Com isso vive-se um

momento em que o conhecimento e o aprendizado contínuo estão sendo valorizados.

Esse momento é entendido como Era do Conhecimento, sendo assim definido, como o

período caracterizado por uma conjunção e sinergia de inovações sociais, institucionais,

tecnológicas, organizacionais entre outras, em que a informação e o conhecimento

passaram a desempenhar um papel fundamental e estratégico [1].

Sendo assim, as organizações atuais estão inseridas em um ambiente turbulento,

caracterizado pela alta competitividade, pela integração dos mercados internacionais e

pela redução do ciclo de vida de produtos e serviços [2]. As organizações militares

apesar de não estar vivenciando essa alta competitividade, estão inseridas também nesse

ambiente repleto de mudanças. O surgimento de novas tecnologias no setor bélico ou

até mesmo para uma iminente defesa de interesses do país faz com essa instituições

devam estar sempre postas e preparadas. E para isso é fundamental que o conhecimento

seja bem utilizado e gerido de maneira eficiente. A importância da gestão do

conhecimento é ressaltada pela forma como auxilia as organizações na identificação,

seleção, organização e disseminação das informações e experiências [3].

Os primeiros estudos sobre a aprendizagem organizacional surgiram a partir dos

anos cinquenta, porém, na década de noventa que esse campo se expandiu na teoria e na

prática de gestão [4]. Embora já estabelecida, a área apresenta ainda desafios para sua

consolidação, entre eles a dificuldade de constatar empiricamente quando e como um

processo de aprendizagem ocorre, desafio que aumenta, quando o sujeito desse processo

é a organização [4]. O aprendizado organizacional possui dois importantes componentes

os insights e a memória organizacional. O primeiro diz respeito aos conhecimentos e

modelos mentais compartilhados e que os decisores devem aprender juntos, para não

bloquear a mudança. E o segundo depende dos mecanismos institucionais para reter o

conhecimento [4].

As organizações devem aprender com suas experiências, devem registrar as

melhores práticas e compartilhar esse conhecimento internamente [5]. O conhecimento

essencial deve ser institucionalizado e, com isso, tornar-se propriedade comum,

evitando que fique restrito a algumas pessoas-chave e que se perca quando elas

deixarem a organização [5].

Com base no exposto, este estudo procurará entender como se dá a gestão do

conhecimento e o aprendizado organizacional dentro uma instituição militar, no caso em

questão, a Marinha do Brasil, sob a ótica de percepção do nível tático desta organização.

O objetivo desta pesquisa é observar como os fuzileiros navais percebem a

Gestão do conhecimento e o aprendizado organizacional dentro da Marinha e o que eles

acham que a organização faz de melhor e o que deve ser melhorado. Foi utilizada uma

pesquisa qualitativa com perguntas iniciadas por como, o que, qual, visando uma

melhor compreensão do tópico de estudo. Procurou-se identificar e ilustrar o processo

de conversão de conhecimento e enumerar as principais práticas em gestão do

conhecimento dentro da organização.

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Departamento de Administração

Ainda que a pesquisa compreenda apenas uma organização e que cada

instituição administre o conhecimento de maneiras diferentes, o estudo torna-se

relevante devido ao fato da Marinha possuir uma representatividade e um grande

número de integrantes. O estudo fica limitado ao nível mais baixo da Marinha e

certamente não pode ser visto como uma realidade nacional de todos os níveis baixos,

mas busca incitar discussões a respeito da gestão do conhecimento e do aprendizado

organizacional em níveis mais subalternos, além de identificar erros e acertos referentes

a esses temas.

REFERENCIAL TEÓRICO

PERCEPÇÃO

A percepção pode ser definida como o processo pelo qual os indivíduos

organizam e interpretam suas impressões sensórias com a finalidade de dar sentido ao

seu ambiente [6]. Porém o que uma pessoa percebe pode ser totalmente diferente da

realidade. A percepção é importante para o estudo do comportamento organizacional

porque o comportamento das pessoas baseia-se em sua percepção da realidade, não na

realidade em si [6]. Alguns fatores influenciam diretamente a percepção. Esses fatores

podem estar no perceptor, no objeto ou alvo ou no contexto da situação em que se dá

(ver figura) [6].

Figura 1[6]:

Fatores no perceptor

Atitudes

Personalidades

Motivações

Interesses

Experiências

Expectativas

Fatores na situação

Momento

Ambiente de trabalho

Ambiente social

Fatores no alvo

Novidade

Movimento

Sons

Tamanho

Cenário

Proximidade

Semelhança

PERCEPÇÃO

Page 3: GESTÃO DO CONHECIMENTO E O APRENDIZADO …

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Ao se observar um alvo na tentativa de interpretar o que esta acontecendo, essa

interpretação é fortemente influenciada pelas características pessoais, tais como

atitudes, personalidade, motivações, interesses, experiências passadas e expectativas [6].

As características do alvo que esta sendo observado também pode afetar a percepção e

como os alvos não são observados isoladamente, sua relação com o cenário influencia a

percepção, assim como gera uma tendência de agrupar coisas próximas ou semelhantes

[6]. O contexto também é importante, o momento em que um objeto é observado pode

influenciar a atenção, bem como outros fatores situacionais [6].

GESTÃO DO CONHECIMENTO

Tradicionalmente, economistas enfatizam a terra e seus recursos naturais

associados, o capital e a mão de obra, como os ingredientes essenciais e primários para

a economia das organizações [13]. Para Barradas (2008, p.17) apud Drücker (1999), na

sociedade atual, o conhecimento é o recurso básico para os indivíduos e a economia

[13]. Os tradicionais fatores de produção (terra, mão de obra e capital) não

desaparecem, mas tornam-se secundários [13].

Barradas (2008, p.17) apud Cavalcanti (2007) ratifica esta afirmação quando cita

que “hoje, segundo a OCDE mais de 60% da riqueza criada no mundo provêm do

conhecimento. A economia é, cada vez mais, digital e intangível”. Afirma ainda que, ao

gerenciar as empresas pelos fatores tradicionais de produção, estão-se gerenciando

somente 30 ou 40% da produção e deixando-se de gerenciar outros 60 ou 70% gerados a

partir dos ativos do conhecimento (informação verbal). “Informação, conhecimento,

criatividade e inovação são, assim, ingredientes básicos para todas as organizações que

atuam nesta nova sociedade, sejam elas públicas ou privadas” [13].

Barradas (2008, p.18,19) apud Toffler e Toffler (2007) relacionam dez

características do conhecimento que influem diretamente neste contexto [13]:

“[...] o conhecimento é inerentemente não-rival [...]”, ou seja,

milhões de pessoas podem usar o conhecimento sem desgastá-lo;

“[...] o conhecimento é um bem intangível [...]” - não podemos tocá-

lo, mas podemos manipulá-lo;

“[...] o conhecimento é não-linear [...]”;

“[...] o conhecimento é um fator relacional – qualquer trecho de

conhecimento adquire significado apenas quando justaposto a outros

trechos que fornecem o contexto [...]”;

“[...] o conhecimento combina com outros conhecimentos [...]”;

“[...] o conhecimento é mais facilmente transferido do que qualquer

outro bem ou produto [...]”;

“[...] o conhecimento pode ser resumido e condensado em símbolos e

abstrações [...]”;

“[...] o conhecimento pode ser armazenado em espaços cada vez

menores [...]”;

“[...] o conhecimento pode ser explícito ou implícito, expresso ou não

expresso, partilhado ou tácito [...]”;

“[...] o conhecimento é difícil de engarrafar, empacotar ou conter

[...]”.

Com base nesse exposto tenta-se entender o que é e como se dá a gestão desse

bem tão valioso na atualidade. Gestão do conhecimento, como conceito, ainda traz

controvérsias na definição [14]. Mas pode-se dizer que é como a organização vai

capturar informação, transforma-la em algo útil, conhecimento, e garantir que tanto

conhecimentos explícitos quanto tácitos sejam perpetuados na instituição.

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A gestão do conhecimento não acontece sem a participação ativa dos

funcionários e da própria empresa. Enquanto os primeiros são os atores principais do

processo, cabe à empresa executar algumas ações e tomar iniciativas para garantir todas

as suas etapas [14]. As empresas que dominam o conhecimento dos seus principais

processos organizacionais dão um passo significativo rumo à identificação das bases de

conhecimentos estratégicos. Todas as empresas realizam de alguma forma a gestão do

conhecimento, uma vez que não é possível conceber o trabalho humano sem o uso da

inteligência. As organizações, nos seus processos de trabalho, estão invariavelmente

reutilizando algum tipo de conhecimento para produzir e servir os clientes [15].

De acordo com Scharf e Soriano-sierra (2008, p.6) apud Nonaka e Takeuchi

(1997), a estrutura conceitual básica do conhecimento tem base em duas dimensões –

epistemológica e ontológica [15]. Na ontológica o conhecimento é criado por

indivíduos, ou seja, uma organização não pode criar conhecimento sem indivíduos. A

criação do conhecimento organizacional é um processo que amplia em toda a

organização o conhecimento criado pelos indivíduos, cristalizando-os como parte da

rede de conhecimentos da organização. Já na epistemológica é necessária a

compreensão da diferença entre conhecimentos tácitos e explícitos. O conhecimento

tácito é pessoal, específico ao contexto e difícil de ser formulado e comunicado. O

conhecimento explícito refere-se ao conhecimento possível de ser transmitido em

linguagem formal e sistemática [15]. Sendo complementares e interagindo entre si,

interação esta denominada conversão de conhecimento, processo onde os

conhecimentos tácito e explícito se expandem tanto em qualidade quanto em quantidade

[15]. A partir do pressuposto de que o conhecimento é criado por meio da interação de

conhecimentos, anunciam quatro modos de conversão dele: a socialização, a

externalização, a combinação e a internalização, conhecido por modelo SECI (Sigla

formada pela combinação das letras iniciais) [13]. A socialização é o processo de

compartilhar conhecimento tácito / experiência. Como este é dificilmente formalizado,

sua aquisição ocorre somente através de interação social. Ela ocorre tipicamente na

relação de trabalho entre mestre e aprendiz, na qual o aprendiz aprende determinado

oficio por meio da observação e da prática ao invés de adquiri-lo por meio de manuais e

livros [19]. Externalização é o processo de articular, por meio de metáforas, analogias e

modelos, o conhecimento tácito em explicito, isso acontece quando o individuo é capaz

de comunicar em linguagem formal as bases do seu conhecimento tácito. Assim, o

conhecimento pode se tornar mais facilmente difundido e acessível aos demais [19].

Quando o conhecimento explicito é colhido dentro e fora de uma organização e depois

combinado, editado ou processado para gerar um novo conhecimento mais complexo,

ocorre o processo chamado de combinação, que pode ser facilitado por meio do uso de

redes de comunicação e grandes bases de dados [19]. Já a internalização acontece

quando um novo conhecimento explicito é compartilhado em toda a organização, e

outros empregados passam a absorvê-lo, utilizando-o para ampliar, estender e

reformular seus próprios conhecimentos tácitos [3]. A partir dessa sistematização,

ocorre a espiral da criação do conhecimento, que surge no momento em que a interação

entre conhecimentos tácito e explícito eleva-se dinamicamente de um nível ontológico

inferior até níveis mais altos [19].

Em resumo essa espiral do conhecimento pode ser explicada da seguinte

maneira. O conhecimento tácito que um indivíduo desenvolve interagindo na

organização precisa ser explicitado em uma linguagem que a organização compreenda e

precisa ser comunicado para que outros indivíduos possam experimenta-lo e a partir

dessa vivência possam desenvolver outros conhecimentos tácitos [16].

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Como recomendações estratégicas para o sucesso nesta implementação, Scharf e

Soriano-sierra (2008, p.8) apud Davenport, Delong e Beers (apud, Silva, 2002) sugerem

que não deve ser o projeto de um indivíduo, mas sim da organização; deve haver

definição de conhecimento na empresa e enfatizado o conhecimento como estoque e

fluxo; devem ser criados ambientes para que o mercado do conhecimento floresça; deve

ser dada a mesma importância ao conhecimento em diferentes formatos; o

conhecimento deve ser contextualizado; é preciso incentivar o aprendizado e a

criatividade; o passado/presente deve ser focalizado assim como o futuro; a

experimentação deve ser reconhecida; as interfaces humana e tecnológica devem

possuir a mesma importância e devem ser desenvolvidas formas de avaliação das

iniciativas de conhecimento realizadas, tanto pela mensuração quantitativa como pela

qualitativa [15].

Por fim não é quantidade de informação e conhecimento que determina a gestão

do conhecimento e sim o que se realiza com esse conhecimento, baseado na criação de

valor, para a sobrevivência e crescimento no mercado [15].

APRENDIZADO ORGANIZACIONAL

Ainda há uma carência de uma teoria geral de aprendizado Organizacional [17].

Entretanto Scharf e Soriano-sierra (2008, p.9) apud Vasconcelos e Mascarenhas (2007)

argumentam que a aprendizagem pode ser entendida como um processo de mudança de

comportamento a partir da aquisição de conhecimentos sobre si e o meio [15]. E

complementam afirmando que relaciona-se, também, à identidade dos indivíduos, que a

desenvolvem a partir da interação entre seus valores e comportamentos existentes e os

novos estímulos e experiências adquiridos no cotidiano.

Com isso é necessário reconhecer a importância crescente do aprendizado eficaz

como fator crítico para o sucesso dentro das organizações e enfatizar o papel crescente

da abordagem da “organização que aprende” [12]. Organizações que aprendem, são

aquelas que dispõem de habilidades para criar, adquirir e transferir conhecimentos, e são

capazes de modificar seu comportamento, de modo a refletir os novos conhecimentos e

ideias [15]. O aprendizado deixou de ser uma atividade em separado, que ocorre, antes

da pessoa ingressar no local de trabalho ou em distantes ambientes de sala de aula (...) o

aprendizado é o coração da atividade produtiva [12]. Neste contexto, onde o

aprendizado é fator chave do sucesso organizacional, o conceito de aprendizado está

sintetizado no conceito de competência e não mais no conceito de qualificação [15]. A

nova realidade organizacional é como um contínuo processo de transformação e

inovação e ressaltam a importância de desenvolver a cultura da aprendizagem [15].

A aprendizagem deve ser despertada nas pessoas como forma de diferenciá-las

entre si e criar capacidades em áreas distintas [15]. Scharf e Soriano-sierra (2008, p.9)

apud Bessant (1999) propõe que o aprendizado seja entendido como um processo que

envolve uma combinação de experiência, reflexão, formação de conceitos e

experimentação [15]. De acordo com o autor, três são os componentes envolvidos no

processo: o primeiro é a acumulação e desenvolvimento de competências centrais, que

diferencia as empresas ou pessoas entre si, com oferta ou não de possíveis vantagens

competitivas [15]. O segundo é a dimensão temporal: o aprendizado envolve um

processo de longo prazo [15]. O terceiro componente do aprendizado é sua

idiossincrasia: os processos de aprendizado são próprios das organizações e seus

ambientes e, dificilmente, replicáveis por outras [15].

Com isso o autor propõe algumas características do aprendizado [15]:

Que o mesmo não é automático: é necessário investimento

explícito para aprender;

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O aprendizado pode envolver o domínio e a mudança

desde tarefas corriqueiras até processos mais intensivos em

conhecimento e grandes transformações;

Aprender a aprender é prioritário e envolve componentes

formais e componentes tácitos.

O aprendizado organizacional possui dois importantes componentes os insights e

a memória organizacional. O primeiro diz respeito aos conhecimentos e modelos

mentais compartilhados e que os decisores devem aprender juntos, para não bloquear a

mudança. E o segundo depende dos mecanismos institucionais para reter o

conhecimento. Conhecimentos, crenças e metas precisam ser compartilhados na

construção da memória organizacional, para que a organização aprenda. Esse

aprendizado não envolve simplesmente a aquisição de conhecimento, mas também o

papel social que a construção dessa aprendizagem organizacional tem na formação da

organização em si [4].

Resumidamente aprendizagem é um fenômeno social que vem da experiência

cotidiana [18], e esse aprendizado dentro da organização pode ser entendido de duas

maneiras: o que o individuo faz para aprender sobre a organização e o esforço que essa

organização faz para permitir que esse indivíduo aprenda e consiga ter os

conhecimentos necessários.

METODOLOGIA

A pesquisa nas organizações engloba relações de caráter social e humano e vem

se desenvolvendo e destacando, de maneira significativa, por estudos que valorizam o

emprego de métodos quantitativos para descrever e explicar fenômenos [11]. Porém,

mais recentemente, a abordagem qualitativa surge, nesta área, como promissora

possibilidade de investigação [11].

As pesquisas, conforme as abordagens metodológicas que englobam, são

classificadas em dois grupos distintos – o quantitativo e o qualitativo, esses que não

necessariamente são excludentes [11]. Esse estudo será realizado com base na

abordagem qualitativa. Neste tipo de abordagem, o pesquisador procura aprofundar-se

na compreensão dos fenômenos que estuda – ações dos indivíduos, grupos ou

organizações em seu ambiente e contexto social – interpretando-os segundo a

perspectiva dos participantes da situação enfocada, sem se preocupar com

representatividade numérica, generalizações estatísticas e relações lineares de causa e

efeito [11]. A pesquisa qualitativa também poderia ser chamada de “pesquisa textual”,

uma vez que a mesma se baseia em interpretações e/ou descrições [12]. A esse respeito,

tem-se que a Sociologia, a Psicologia e a Antropologia são algumas das disciplinas

amplamente reconhecidas por usar a pesquisa qualitativa. Ademais, sabe-se que existe

um amplo conjunto de métodos de pesquisa que podem ser classificados como

qualitativos [12].

Este tipo de pesquisa envolve a análise e coleta de uma ampla variedade de

materiais empíricos - tais como estudos de caso, experiências pessoais, histórias de vida,

entrevistas, observações, dentre outros – que descrevem a rotina e/ou problemas da vida

dos indivíduos [12]. Ela é complexa, envolve pesquisa de campo, coleta de dados,

análise indutiva das informações, ao mesmo tempo em que, foca nas experiências dos

participantes e escreve sobre esse processo de uma forma expressiva e persuasiva a fim

de envolver os leitores [12].

Existem algumas abordagens de pesquisa qualitativa, mas as principais são a

narrativa, a fenomenologia, a etnografia, o estudo de caso e grounded theory, no entanto

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podem ser usadas outras metodologias, essas que se diferem no que diz respeito à

análise dos dados [12].

Uma vez que o presente estudo busca realizar um levantamento das percepções

dos indivíduos entrevistados, valorizando suas interpretações e compreensões a respeito

da gestão do conhecimento e o aprendizado organizacional dentro do nível tático da

Marinha Brasileira, o método de pesquisa mais adequado é de fato a pesquisa qualitativa

de caráter exploratório. A pesquisa exploratória foca na maior familiaridade com o

problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a facilitar a construção de hipóteses.

Esse tipo de pesquisa tem como principal objetivo o aprimoramento de ideias ou a

descoberta de intuições, novas ideias [11]. A pesquisa exploratória é extremamente

flexível, de modo que quaisquer aspectos relativos ao fato estudado têm importância

[11]. Optou-se por utilizar o método fenomenográfico, um dos tipos de pesquisa

classificado como qualitativa [12].

A fenomenografia surgiu no início da década de 80 na Universidade de

Gotemburgo, na Suécia e foi introduzida por um psicólogo sueco chamado Ference

Marton. Ela é o método que estuda as relações humanas e investiga de uma maneira

qualitativa as diferentes formas que as pessoas experimentam, interpretam ou pensam a

respeito de diferentes fenômenos (ou do mesmo fenômeno) [12].

Diferente da psicologia tradicional, que está interessada em estudar como as

pessoas percebem e contextualizam o mundo, a fenomenografia se interessa mais pelo

conteúdo do pensamento. Em outras palavras, ela se interessa em como as pessoas

descrevem a percepção e os pensamentos a respeito do fenômeno. Assim sendo, nesse

método de pesquisa, o pesquisador nunca é separado do objeto de percepção e/ou do

conteúdo do pensamento [12].

É importante enfatizar que a fenomenografia difere da fenomenologia,

abordagem qualitativa mais conhecida. Embora ambas tenham a experiência humana

como seu objeto de pesquisa, o interesse da fenomenologia é a “essência da

experiência” e não a experimentação e vivência do fenômeno que trata a

fenomenografia.

Nesse sentido, a fenomenografia atende às necessidades desse estudo, uma vez,

que o interesse é obter a partir da percepção dos entrevistados

(experimentação/vivência), como a gestão do conhecimento e aprendizado

organizacional funcionam no nível mais baixo da Marinha do Brasil.

Foram realizadas entrevistas com seis fuzileiros navais do nível tático da

Marinha a fim de apurar a percepção deles sobre os determinados temas.

Entrevistaram-se sargentos de diferentes patentes para obter uma visão mais ampla

dentro do nível tático. Com isso, foram indagados um 1º sargento, dois 2º sargento e

três 3º sargento. As entrevistas foram realizadas no próprio ambiente militar no período

de Maio a Junho de 2012.

Optou-se por realizar as entrevistas dentro dos batalhões em que os sargentos

estavam inseridos para que os respondentes se sentissem mais a vontade. Por isso foram

visitados seis batalhões diferentes: Batalhão de Logística, Batalhão de Engenharia,

Unidade Médica, Batalhão de Viaturas Anfíbias, 1º Batalhão de Infantaria e 3º Batalhão

de Infantaria.

MARINHA DO BRASIL

Em 20 de janeiro de 1567, sob o comando de Mem de Sá foi travada uma

batalha decisiva no Rio de Janeiro. Era os portugueses reconquistando um pedaço de

suas terras que tinham sido tomadas por franceses (França Antártica), esse fato histórico

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conhecido, é o nascedouro da Marinha do Brasil porque toda ação se deu no mar ou a

partir dele. Depois em 28 de julho de 1736, foi criado pelo rei D. João VI o Ministério

da Marinha e de domínios ultramarinos, sendo o Conde de Anádia o primeiro ministro

da Marinha [7]. Hoje, a Marinha do Brasil é uma instituição baseada na hierarquia e

disciplina que desempenha o papel importante e reservado do Poder Naval em tempo de

paz, respaldando a ação política do governo no campo das relações internacionais e

mantendo-se atualizada, pronta a se expandir quando necessário [7].

Conforme sua página na internet sua missão é: preparar e empregar o Poder

Naval, a fim de contribuir para a defesa da Pátria; estar pronta para atuar na garantia dos

poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem; atuar em

ações sob a égide de organismos internacionais e em apoio à política externa do País; e

ainda cumprir as atribuições subsidiárias previstas em lei, com ênfase naquelas

relacionadas à autoridade marítima, a fim de contribuir para a salvaguarda dos

interesses nacionais [8].

O Poder Naval é descrito como a parcela militar do Poder Marítimo, e dele se

origina, para sua própria proteção e segurança, de modo a garantir os meios necessários

para utilização do potencial de suas águas. Portanto, à Marinha compete, com suas

forças, bases navais, arsenais e estabelecimentos, garantir a capacidade de uso do mar,

sejam quais forem às condições e ocasiões [9]. Já o Poder Marítimo de um país é mais

amplo, pois se constitui da capacidade de administrar e de dar apoio às atividades

ligadas ao mar [9].

Ainda conforme o site eletrônico da MB, a Força tem como visão de futuro ser

moderna, equilibrada e balanceada, dispondo de meios navais, aeronavais e de fuzileiros

navais compatíveis com a inserção político-estratégica do nosso país no cenário

internacional e, em sintonia com os anseios da sociedade brasileira, devendo estar

permanentemente pronta para atuar no mar e em águas interiores, de forma singular ou

combinada, de modo a atender aos propósitos estatuídos na sua missão [8].

É uma instituição complexa, com um efetivo aproximado de setenta mil pessoas,

que tem em sua estrutura uma grande variedade de tipos de organizações (mais de

trezentas), de maneira que cada uma apresenta características distintas, marcadas por

culturas específicas, influenciadas pela região onde se localizam, pelo porte da

organização e também pela tarefa que executam [9]. Possui em seu efetivo tanto homens

como mulheres, categorizados em Oficiais e Praças, das mais diversas áreas de atuação

exercendo atividades que contribuem para a atividade fim da Marinha [9]. Estruturada

em três níveis hierárquicos: estratégico, operacional e tático [10]. Diferente de outras

organizações ocorre uma inversão de níveis na Marinha, o operacional vem antes do

tático, sendo esse a base da organização.

A cultura de uma organização é definida como o conjunto de comportamentos,

normas, hábitos, valores e padrões partilhados por todos os membros de uma empresa,

tornando-a, assim, única [6]. Independentemente do tipo de organização, o ambiente é

uma força poderosa com impacto no sucesso ou insucesso das organizações e cabe aos

administradores monitorar e analisar o ambiente organizacional [9]. Deduz-se que

sendo uma organização militar a MB possui como principais valores a subordinação da

vontade individual à vontade do grupo, o corporativismo, a unidade, a tradição, a

cooperação, a organização, a disciplina e a constante preparação para a guerra [9]. Outro

aspecto cultural militar é a formação dos jovens em Academias Militares, o que

representou uma tendência internacional consolidada na primeira metade do século

XIX, de profissionalização e burocratização da careira militar [9]. Destaca-se a

importância do companheirismo na cultura militar, uma vez que os conceitos de honra e

espírito marcial estão fundamentados em rituais de companheirismo [9]. O militar

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enfatiza a importância do grupo contra o indivíduo, pois o sucesso em qualquer

atividade exige a subordinação da vontade individual à vontade do grupo. Assim,

tradição, espírito de corpo, unidade, comunidade têm alta conotação no sistema militar

de valor [9].

RESULTADOS DA PESQUISA

Constatou-se através da pesquisa que a parte operacional da marinha não

percebe uma boa gestão do conhecimento e um aprendizado organizacional por parte da

instituição. O que poderia ser pensado é que como os entrevistados não conhecem os

conceitos eles não saberiam avaliar se esses dois termos são empregados de maneira

satisfatória na marinha. Porém apesar de quase todos não conhecerem os conceitos de

gestão do conhecimento e aprendizado organizacional, quando explicados a eles de que

se tratava souberam mostrar como esses dois termos atuam dentro da organização. E

através dessa explicação foi possível levantar alguns pontos de sucesso e deficiência por

parte da Marinha.

No que diz respeito à gestão do conhecimento foi observado que os

conhecimentos tácitos e explícitos são explorados de diferentes formas pela

organização. Os conhecimentos explícitos são demonstrados através de cursos, manuais

e palestras. Esses conhecimentos explícitos são muito bem avaliados pelos fuzileiros,

como se pode reparar nesse trecho:

E1: (...) os cursos são muito, muito bem elaborados, a gente vê muita coisa (...)

Eu precisei cursar um curso abaixo que era de auxiliar, mas muito bem elaborado,

muito bem conduzido e o de Sargento também, tanto de formação que é a parte geral

que todo mundo pega uma que é a parte de fuzileiro e quanto o de aperfeiçoamento

também é muito bom.

Como acrescenta esse outro sargento:

E2: (...) o conhecimento explicito é bem feito, bem planejado e ele é passado de

uma forma clara (...) o conhecimento explicito é muito rico, a gente tem muitos

manuais, manual de segurança, manual de execução, cada atividade que a gente faz no

dia a dia desde a atividade administrativa de carreira até as nas atividade diária de

manobra, todas elas tão previstas e prescritas em algum documento.

No que diz respeito ao aprendizado organizacional e os conhecimentos explícitos

observa-se que a Marinha disponibiliza meios para que seus fuzileiros possam se aperfeiçoar e

trabalhar de maneira mais eficiente disseminando conhecimentos explícitos por toda a

organização, como relata esse sargento:

E2: (...) então eu acho que a marinha trabalha exatamente em cima disso,

buscando nos cursos de carreira que todos tenham o mesmo aprendizado , que todos

passem pelas mesmas disciplinas e ela busca o que verificar se aquilo ali tem efeito né

que seriam os estagio de aplicação então é interessante o sistema da marinha nesse

sentido, ela consegue fazer com que todos os militares que galguem subir a carreira

eles tem que passar por esses curso, isso faz com que todos passem pelo mesmo sistema

, pelo mesmo curso, em anos diferentes(...)

Agora observando o outro lado da gestão do conhecimento que seria o conhecimento

tácito, ou seja, a experiência que advém com o dia a dia, foi relatado por parte dos entrevistados

que essa passagem de conhecimento é deficitária. Conforme o trecho abaixo:

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Departamento de Administração

E3: Vou te dizer que ele prepara 100 % porque tem a parte teórica e a parte

prática, a parte pratica infelizmente durante o curso ela é um pouco desprovida, vamos

dizer assim, vou nem dizer que ela é precária, deficiente, ela é desprovida, tendeu?!

Ou como ainda afirma esse outro sargento:

E4: (...) aqui no batalhão de engenharia nós executamos tarefas que elas

exigem um conhecimento técnico muito apurado e esse conhecimento técnico você não

ganha simplesmente fazendo um curso de 6 meses, é um conhecimento que a gente tem

quer ter de de experiência mesmo(...)

Foi possível ainda observar os motivos que podem estar gerando essa passagem

deficiente de conhecimento, tais como, desinteresse por parte fuzileiros em adquirir novos

conhecimentos, medo de perder o poder advindo do conhecimento, falta de material e falta de

estímulo por parte da organização para que essa passagem seja bem feita.

Analisando o primeiro motivo percebe-se que o desinteresse por parte dos fuzileiros em

buscar conhecimentos tácitos com aqueles que os detém pode estar sendo gerado por um

excesso de tarefas que ele tem tido. Excesso de tarefas que provém de uma falta de pessoal. E

também por falta de valorização desses militares, uma vez que o cara desmotivado aprende

menos e passa menos conhecimento.

Observando o fragmento abaixo se pode constatar isso:

E5: (...) o militar que é bom ele é muito empregado e o militar que assim , não,

o militar que é o enganador por exemplo, que não quer nada, pensa assim não vou

mandar esse militar fazer nada porque ele não quer nada , o militar que quer ta sempre

ali, sempre sendo empregado , sempre sendo fuxicado, só que só ele, só ele , só ele , e o

militar que é bom sempre vai ser bom e o militar que ruim sempre vai ser ruim.

(...)marinha fronteira quer o que eficiência, quer eficiência a todo tempo ai acaba

sobrecarregando o militar que é bom, aconteceu comigo isso, eu fui um dos primeiros

colocados da minha turma e como eu era sempre empregado, empregado , ai mudei

meu conceito , hoje em dia não sou mais primeiro em nada ...

Com relação ao segundo motivo, entendeu-se que a passagem de conhecimento tácito é

muitas vezes dificultava por que certas pessoas não passam o conhecimento adiante por medo

de perder uma posição confortável. Uma vez que detendo tal conhecimento elas ficam menos

sujeitas a mudanças, como mudanças de local, por exemplo. Como confirma esse relato de um

sargento:

E3: A gente vê muito no dia a dia acontecer esse, vamos botar como esse erro,

de a pessoa ir embora e levar o conhecimento com ela, existe a pratica já

fundamentada nas forças armadas que é do ser humano que é passar o conhecimento,

mas infelizmente existem pessoas que não sei porque motivos, não sei se é medo de

perder uma posição que se encontra confortável ou algo do tipo , que é guardar o

conhecimento, que é uma coisa triste ao meu ver, não são todos mais existe, isso existe.

O terceiro motivo é a falta de material, recursos e até mesmo de pessoal. A marinha

brasileira sofre com uma falta de meios necessários para exercer os adestramentos e com a falta

de pessoal muitos militares tem sido empregados nas áreas administrativas e com isso deixado

de exercer funções operacionais, como adestramento de tropas. Como relata o fuzileiro abaixo:

E3: (...) tem adestramentos que são necessários e por meios que a marinha não

tem disponível no momento não ocorre, por exemplo, navios, nós somos uma tropa que

saímos do mar para terra então a gente precisa de navios então a marinha não tem

navios, terão exercícios que não serão feitos, ai já é uma deficiência da administração

naval foge da alçada de batalhão ou de qualquer coisa do tipo, então existem coisas

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que deveriam ser feitas e não são por falta de material equipamento, qualquer coisa do

tipo, que vem de cima... que envolve o governo até.

Como confirma esse outro também:

E1: (...) eu costumo de dizer que não sou enfermeiro porque eu vi enfermagem

na escola, quando você sai da escola e você vai pra um quartel, eles jogam .. nós temos

cabos recém formados agora, eles jogam cabos recém formados num quartel e falam

assim ‘’Faz sua manobra’’ mas você acabou de sair da escola e você só vê enfermagem

ali. Então o que que o enfermeiro normalmente faz num quartel ? Você faz uma injeção,

um curativo, faxina. Então eu sempre trabalhei na parte administrativa, inspeção de

saúde e hoje trabalho na inteligência.

Por fim, o último motivo constatado foi à falta de estímulo da organização para que o

conhecimento tácito seja disseminado. Se o fuzileiro não tiver interesse em buscar e passar esse

conhecimento essa disseminação não ocorrerá. Ou seja, o conhecimento tácito fica vulnerável

podendo se perder.

Por exemplo, quando um militar é transferido para outra função, ele deveria receber a

função de alguém que a fizesse antes, deveria haver um período ou um processo padrão para

que essa função fosse passada e para que o conhecimento do dia a dia fosse passado de maneira

adequada para a nova pessoa que vai exercê-la. Mas não existe um procedimento padrão. A

passagem de função vai depender da pessoa que esta deixando o cargo, se o indivíduo que irá

receber essa nova função tiver „sorte‟ a pessoa que exercia antes passa as tarefas, os segredos e a

experiência.

Quando não é possível a presença física a pessoa deixa para ele uma espécie de manual,

confeccionado por quem exercia a função antes e que eles denominam de „bizuário‟. Mas a

ressalva é que esse procedimento é uma iniciativa que parte da pessoa, não é um procedimento

padrão e nem é algo incentivado pela marinha. Tanto que foi relatada que diversas vezes houve

passagens de função onde a pessoa que recebeu a nova tarefa, não recebeu nada, teve que

aprender tudo sozinho. Conforme relato abaixo:

E4: (...) até hoje não tive problemas com questão a essas passagens não , tanto

no lado operativo quanto aqui no lado administrativo tudo me foi passado assim mais

claro possível, quem me passou eu tive a sorte de receber de pessoas organizadas que

me diziam olha segue isso, isso, aqui que ...

(...) eu já presencie de militares que foram movimentados assim ó ‘estalo de

dedos’ do nada e a função ficou lá, ela tinha que ser exercida por alguém , ai alguém

chegou lá e pegou aquele mundo todo e tentou desvendar o mistério e como é que ele

ocorria e assim foi ...

Outro exemplo de que esse conhecimento tácito depende do interesse do fuzileiro e não

possui um estímulo por parte da marinha é observado no fragmento abaixo:

E1: (...) quando eu fui fazer o curso de enfermagem eu vi tudo isso de novo só

que quando você vai pra um batalhão, se você não procurar ter um contato maior com

a enfermagem, ele te separa, porque você vai pro batalhão e você tem uma enfermaria,

ali você tem um paciente com dor de cabeça, você tem um paciente que teve uma crise

renal, que tem uma crise de coluna, que você vai ministrar uma injeção nele e ponto.

Esse relato de um fuzileiro naval que é enfermeiro mostra claramente que se ele não

procurar buscar um contato maior com o tácito ele provavelmente ficará despreparado porque

não existem meios que o façam ficar em contato com esse tipo de conhecimento.

A conclusão deste estudo é que a marinha brasileira, aqui representada pelo nível tático

do corpo de fuzileiros navais, obtém sucesso em alguns procedimentos que diz respeito à gestão

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do conhecimento e o aprendizado organizacional. Porém alguns pontos ainda carecem de

melhorias para que tais assuntos sejam exercidos de forma eficiente pela organização.

A gestão dos conhecimentos explícitos é muito bem feita e a organização dispõe de

meios para que seus militares aprendam sobre ela e sobre suas funções. Entretanto os

conhecimentos tácitos ainda precisam ser difundidos de melhores formas dentro da instituição

para que ela alcance um nível maior de eficiência dentro do assunto. Uma vez que o

aprendizado organizacional é composto por duas vertentes: o que a organização faz para que o

indivíduo aprenda e o que o indivíduo faz para aprender na organização. Com relação aos

conhecimentos tácitos foi constatado que só esta existindo a segunda parte da definição.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa esta formulada em cima de dois temas que atualmente têm

ganhado destaque no meio acadêmico, na área de administração, mas precisamente na

área de organizações. E além do objetivo proposto pelo estudo, observar como o nível

tático da marinha percebe o aprendizado organizacional e a gestão do conhecimento, foi

possível refletir como esses temas são de grande importância para a administração, uma

vez que tais assuntos são de grande relevância na atual era do conhecimento em que se

vive.

Observa-se ainda que na literatura analisada e levantada existe a presença de

grandes nomes da administração, como por exemplo, Drucker e Nonaka. O que de certa

forma reforça a importância desses assuntos. Espera-se também que após a conclusão

do estudo a pesquisa venha estimular mais indagações dentro dos temas em questão.

O presente estudo consistiu em um levantamento de natureza qualitativa que

objetivou descrever percepções a partir da experiência de seis fuzileiros navais da

Marinha brasileira, sendo eles uma amostra do nível tático desta instituição, ou seja, o

nível mais subalterno. Lembrando que na Marinha ocorre uma inversão de níveis, o

tático é subordinado ao operacional, diferente das outras organizações onde o tático é

superior ao operacional.

O objetivo da pesquisa foi alcançado. Foram levantados os pontos fortes e fracos

da gestão do conhecimento e do aprendizado organizacional tendo como base a

literatura do assunto e a visão dos entrevistados. A ressalva que deve ser feita é que a

pesquisa foi realizada com base em um único nível da organização e por isso pode não

representar a realidade de outros níveis. Por isso, sugere-se que outros estudos sejam

feitos abrangendo os outros níveis ou a organização como um todo.

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Departamento de Administração

APÊNDICE

Roteiro da entrevista:

Para tentar evitar que as respostas sejam influenciadas pelas perguntas buscou-se

elaborar perguntas neutras, e que serão repetidas em todas as entrevistas.

Perguntas Iniciais:

Você poderia me contar sobre a sua carreira até o dia de hoje?

Você poderia me dizer um pouco mais sobre seu trabalho na corporação?

Perguntas principais:

O que é gestão do conhecimento para você?

O que o curso de fuzileiros navais faz para gerir conhecimento?

O que é aprendizado organizacional?

O que você acha que os fuzileiros fazem para garantir seu conhecimento?

Perguntas Finais

O que você acha que o fuzileiro faz bem feito?

O que você acha que o fuzileiro faz mais ou menos e pode ser

melhorado?

O que você acha que o fuzileiro faz mal?