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Historia Da America Portuguesa

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  • 3r:-

    LIVRARIA ACADMICAJ. GUEDES DA SILVA8, R MRTIRES DA LIBERODE, 12

    V. ^ 7* 1PORTO TELEFONE, 25988 ^^LJ^ j~ "V- ^

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    HISTORIA

    AMERICA PORTUGUEZADESDE O ANNO DE MIL E QUINHENTOS DO SEU DESCOBRIMENTO,

    AT O DE MIL E SETECENTOS E VINTE E QUATRO.

  • AMERICA PORTUGUEZADESDE O ANNO DE MIL E QUINHENTOS DO SEU DESCOBRIMENTO

    AT O DE MIL E SETECENTOS E VINTE E QUATRO

    MAGESTADE AUGUSTA DEL-RET D. JOO V, NOSSO SENHORCOMPOSTA POR

    1

    VSEBASTIO DA ROCHA PITTA

    Fidalgo da Casa de Sua Magestade, Cavalleiro professo da Ordem de Christo.Coronel do Regimento da Infanteria da Ordenana da Cidade da Bahia

    e dos Privilegiados d'ellae Acadmico supranumerrio da Academia Real da Historia Portugueza.

    SEGUNDA EDIOReinsta e annotada por J. G. Ges

    Official da Bibliotheca Nacional de Lisboa.

    ORNADA COM SEIS BELLAS GRAVURAS E UM MAPPA

    LISBOAEDITOR FRANCISCO ARTHUR DA SILVA

    Rua dos Douradores, 72

    M. DCCC. LXXX.

  • A QUEM LER

    raridade a que chegou o livro de Sebastio da Ro-

    cha Pitta, difficulta a sua acquisio de dia para dia.

    Ha muito que desappareceu do mercado, e quando porfeliz acaso se encontra algum exemplar, sobe a um preo

    excessivo.

    Entendeu o editor que prestaria um bom servio slettras, se conseguisse apresentar uma edio, que pela

    sua fidelidade substituisse a primeira, com a vantagem

    de formato mais commodo que o seu in-folio, e de umpreo mais accessivel a todos aquelles que sobrando-lhes

    o amor da instruco, no podem, no devem, ou no

    querem pagar livros por preos exorbitantes.

    Encarregado de vigiar a edio, cuidamos em nos es-

    merar quanto nos fosse possiv^el na escrupulosa conferen-

    cia do texto, que foi confrontado palavra por palavra, e

    sempre respeitado. Tommos alguma liberdade unica-mente na orthographia dos nomes prprios estrangeiros,

    que estavam escriptos com menos correco. Ainda as-sim houve o cuidado de mencionar nas notas que vo no

    fim da obra, os nomes que se emendaram, dando por

  • VI

    esta maneira mais uma prova do escrpulo que presidiua este exame.

    Nada se omitliu da primeira edio. Gonservaram-seas licenas, approvaes e pareceres, alguns dos quaes

    so firmados por nomes bem conhecidos nas lettras, epodem servir de documento do apreo que se deu obra.

    Entendemos que no era da nossa competncia envol-vermos-nos em comparaes criticas do nosso autor com

    outros escriptores de historia do Brazil, o que seria equi-

    valente a analysar um grande numero de factos da his-

    toria d'aquella nao. Nas notas que juntmos, como dis-semos, limitamos-nos a breves explanaes, dispensveis e

    escusadas para os sbios, mas talvez agradveis s pes-

    soas menos versadas nos acontecimentos antigos ou mo-

    dernos de outros paizes, a que o autor allude algumas

    vezes.

    Convenincias typographicas obrigaram a eliminar as

    cottas marginaes que se encontram na primeira edio;

    supprimil-as seria infringir a regra que adoptamos de

    nada omittir; reunimol-as portanto no fim do volume,

    com a indicao dos livros e paragraphos a que perten-

    cem, formando por este modo um ndice geral e chro-nologico, de que resulta maior facihdade para a consulta

    da obra.

    Quiz o editor enriquecer esta edio com algumas es-tampas, que teem o mrito de ser fac-simile de gravuras

    antigas de obras de preo e hoje de bastante raridade, ecom um mappa traado por um dos litteratos de quemmais se ufana o Brazil com justo orgulho, do infatigvel

    e nomeado escriptor o fallecido baro de Porto Seguro.As estampas deviam corresponder nitidez do livro;

    confiou-se por esse motivo a sua execuo a bons artis-

  • VII

    tas, desenhando-as o sr. A. Janurio Correia, e gravan-

    do-as D. Jos Severini. O mappa geral do Brazil foi he-liogravado pelo sr. Joseph Leipold, director da officina

    da gravura das notas do Banco de Portugal.

    Nada mais diremos do esmero da edio. Pde cadaum avalial-a por si mesmo.

    Estamos convencidos de que o editor no se engana

    julgando que presta um servio com a vulgarisao d'estelivro estimado e estimvel, no s pela sua forma liltera-

    ria, que tanto encanto oferece, mas pelo grande mere-

    cimento de ser a primeira historia geral do Brazil escri-

    pta por um autor brazileiro.

    Julho de 1880.

    1- ^- ^V

  • NOTICIA BIOGRAPHICA

    SCREVER uma biographia de Sebastio da Ro-cha Pitta, melhor ou mais desenvolvidamenteque o fez a elegante penna do erudito brazi-leiro Pereira da Silva, ser-nos-hia tarefa difficile merecedora de censura.A necessidade de preceder esta edio d'uma

    noticia da vida do autor, aconselha-nos a seguiro referido escriptor, como o guia mais seguro dequem nos podemos valer.

    Os biographos de Rocha Pitta afiSrmam que nas-ceu cm 3 de maio de 1660. Foi natural da Bahia,

    como elle mesmo assevera, quando, descrevendo aquellacidade com a complacncia em que transluz o amor defilho sua terra natal, escreve : Perdoe-se ao autor

    o dilatar-se tanto na pintura da Bahia, por ser ptria sua, eno se offenda o original de ficar to pouco formoso no re-trato. ^

    O cnego Janurio da Cunha Barbosa diz que o nossoautor foi filho do desembargador Joo da Rocha Pitta, naturalda Bahia, e chanceller da Relao d'aquella cidade.

    Ser o prprio Sebastio da Rocha Pitta quem se encarre-gue de destruir esta autoridade. Depois de dizer que o desem-bargador Joo da Rocha Pitta fora natural de Pernambuco, e

    1 Pag. 41, 30, n'este volume.

  • enumerar os cargos e commisses que exerceu, fallecendo emchanceller da Relao da Bahia em 1702, conclue : Estes fo-

    ram os seus despachos ; nas suas virtudes suspeito o autor,

    por ser seu sobrinho e herdeiro da sua casa. ^

    Se porm considerarmos, diz Pereira da Silva, mais valiosoo testemunho do abbade Diogo Barbosa Machado, foram seus

    progenitores Joo Velho Gondim e D. Brites da Rocha Pitta,filha do chanceller Joo da Rocha Pitta.

    Deve certamente reputarse mais valioso o testemunho de

    Barbosa Machado : era contemporneo e poderia at conhecerpessoalmente o historiador de quem tratamos, quando este veiua Portugal ; e se o no conheceu, devia com facilidade obter

    noticia da filiao de quem apparecia no mundo iitterario deum modo brilhante, com uma obra to honrosamente apreciadapela Academia Real da Historia, a que Barbosa Machado pertencia.

    Admittindo a assero do autor da Bibliolheca Lusitana

    quanto aos progenitores de Rocha Pitta, devemos acceitar commuito mais razo o testemunho d'este, quando affirma que seuav fora Sebastio da Rocha Pitta, ^ nome idntico ao do neto.

    Depois do que acabamos de expor, cremos poder concluirque Sebastio da Rocha Pitta, autor da Historia da America, foi

    filho de Joo Velho Gondim e de D. Brites da Rocha Pitta,filha de Sebastio da Rocha Pitta. Pela comparao das datas

    julgamos que o chanceller Joo da Rocha Pitta foi irmo doav materno do nosso autor, e por consequncia tio d'este em

    segundo grau.Apurados, como foi possivel, estes pontos da ascendncia

    de Rocha Pitta, continuemos.At aos 16 annos de idade estudou no collegio dos jesutas

    da Bahia, e d'alli veiu para Portugal a frequentar a Universi-

    dade de Coimbra, d'onde saiu bacharel em cnones.

    Recolhendo-se ptria, teve o posto de coronel do regi-

    mento privilegiado de infanteria das ordenanas da Bahia. Casou

    com D. Brites de Almeida, e partiu para uma fazenda que

    possua perto da cidade da Cachoeira nas margens do Para-

    guass.

    1 Pag. 230, 9.2 Pag. 128, 96.

  • XI

    Entre os cuidados da administrao da sua casa, no perdeuo amor ao estudo ; cultivava a poesia, escreveu um romance

    em castelhano, que no foi bem recebido, e publicou duasobras, uma em 1709, * outra em 1721,^ como tenteando as suasforas para maior emprehendimento. Assim nasceu e se desen-volveu o pensamento de fazer a historia do Brazil. Os escriptosque havia para consultar eram chronicas parciaes ou relaesdispersas e obras estrangeiras, que no bastavam para a com-posio da obra que planeara. Saiu do remanso do lar, exami-nou bibliothecas, consultou archivos pblicos e particulares doBrazil, e passou a Lisboa, onde em 1730 publicou a sua Historiada America Porlugueza.

    A obra foi acolhida com applauso, quasi com enthusiasmo.A Academia Real da Historia examinou-a e approvou-a, en-viando ao autor o diploma de scio supranumerrio.

    El-rei D. Joo v fez-lhe a merc de fidalgo da casa real.Applaudido e considerado voltou o historiador Bahia, e

    d'alli para a sua propriedade, onde falleceu tranquillamenteem 1738.

    O biographo a quem seguimos faz desenvolvidas e sabiasconsideraes sobre os predicados de Rocha Pitta como histo-riador. Se lhe encontra alguma leve mcula, bem depressa av resgatada por grandes bellezas.

    No approvam alguns o seu estylo, que lhes parece dema-siado pomposo. Permitta-se-nos entretanto lembrar que o autorno podia esquivar-se ao gosto, ou defeito, da sua poca. Almd'isso era filho d'um paiz onde as riquezas e bellezas naturaesesto como que desafiando a opulncia da linguagem. Leiam-secom atteno algumas das suas descripes, e veja-se conscien-ciosamente se as galas do estylo so excessivas para o esplen-dor dos objectos descriptos ou para a grandeza dos factos nar-rados.

    Censuram-no outros por ter admittido alguma lenda pie-

    ^ Breve compendio e narrao do fnebre espectculo. . . que na cidadeda Bahia se viu na morte del-rei D. Pedro ii, etc. Lisboa, por Valentim daCosta Deslandes, 1709. 4."

    2 Summario da vida e morte da ex.** sr." D. Leonor .Tosepha de Vilbena,e das exquias que se celebraram sua memoria na cidade da Bahia. Lisboa,por Antnio Pedroso Galro, 1721. i.

  • XII

    dosa, ou alguma tradio menos segura. No cremos que poreste facto se anuiquile o valor da obra. Transportemo-nos aotempo do autor, acceitemos as ideias da sua poca, e conven-cer-nos-hemos que essas lendas e tradies, quando no rece-bidas pela crena dos escriptores, perilhavam-se como ornatos

    da historia, ou convenincia politica. Algumas vezes e n'algunspaizes serviram a incitar os brios, ou a sustentar a corajemdos povos em situaes calamitosos. No queremos com istodizer que a historia adopte a lenda ; desculpe-se em atteno

    s pocas; analyse-se, ou rejeite-se logo, que para isto serve acritica.

    Afastado da vida publica, sem tomar parte nos aconteci-mentos, o nosso autor por isso mesmo narra e avalia com

    imparcialidade os factos succedidos no seu tempo. E tam im-parcial e justo que nem aos inimigos regateia o louvor. Paraconfirmar esta verdade basta ler as suas palavras a respeito

    dos Francezes da expedio de Duclerc que ficaram prisioneiros

    no Rio de Janeiro. ^

    Ainda em objectos de interesse secundrio se mostra inves-tigador e bem informado. Notemos como exemplo o que dizdo padre Antnio Vieira : Muitos annos se duvidou da regioem que nasceu. . . mas pela insigne corte de Lisboa se decla-

    rou esta prerogativa. ^ Reviveu em nossos dias esta mesmadiscusso que o sbio commeudador Joo Francisco Lisboa de-cidiu vista de um documento incontroverso, que veiu confir-mar a afiirmativa do nosso autor no trecho aqui transcripto.

    Em summa para aquilatar os mritos do autor e da suaobra, concluiremos com a apreciao do mesmo biographo que

    j por vezes temos citado : A Historia da America PorLugucza deSebastio da Rocha Pitta, no s para aquella poca, ainda

    pobre de obras histricas, seno tambm para a nossa, quepossue maior abundncia de materiaes acerca do Brazil, obra

    muito preciosa e muito necessria para todos os Brazileiros que

    quizerem saber a historia do seu paiz ^

    ' Pag. 290, 92.2 Pag. 244, bb. - -q .. : ., .3 Rev. trim. do Inst. do Brazil, seP,^:2'V'^. ^^qp. 258.

  • ^ENHOR

    America portugueza em toscos, mas brevesrasgos, busca os soberanos ps de Vossa Mages-tade, porque a obrigao e amor a encaminhamao monarcha supremo, de quem reconhece o do-minio e recebe as leis, e a quem com a maiorhumildade consagra os votos, implorando a realproteco de Vossa Magestade, porque ao prncipe

    ^ue lhe rege o imprio, pertence patrocinar-llie a his-Loria. N'ella ver Vossa Magestade em grosseiro riscodelineada a parte do novo mundo, que entre tantasio orbe antigo que compreheude o circulo da sua co-

    roa, a maior da sua monarchia.No offerece a Vossa Magestade grandezas de outras re-

    gies em que domina o seu poderoso sceptro, tendo tan-tas que lhe tributar na do Brazil. Se o quadro parecer pequenopara ida to grande, em cuitos crculos se figuram as immen-sas zonas e espheras celestes ; em estreito mappa se expem as di-latadas pores da terra ; uma s parle basta para representara grandeza de um corpo ; um s simulacro para symbolisar asmonarchias do mundo. Faltar-lhe-ha o pincel de Timantes, paraem um dedo mostrar um gigante ; a intelligencia de Daniel,para em uma estatua explicar muitos imprios ; mas sobra-lhea grandeza de Vossa Magestade, em cuja amplssima superioresphera se esto as suas provindas contemplando como estrel-las

    : s com ella pde desempenhar-se o livro;prender as fo-

  • XIV

    lhas, se Vossa Magestade soltar os raios, que elles alluraiaro(cora reaes vantagens) mais mbitos dos que pretende illustrara penna, existindo estes borres s na forma em que as luzespodem servir as trevas.

    Porm, senhor, como descrevo uma das maiores regies daterra, permitta-me Vossa Magestade que dos resplendores d'essaprpria esphera regia tire uma luz para illuminar as sombrasdos meus escriptos, sem o delicto de Prometheu em roubarum raio ao sol para animar o barro da sua estatua; tanto sedeve pedir a um principe em tal extremo generoso ; e tudo

    pde conceder um monarcha como Vossa Magestade, por todosos attributos grande, e to digno de imprio que nos annospela edade menos robustos, em tempo que vacillante o orbeia caindo, lhe pozeram a natureza e a fortuna aos hombrosno s o peso d'um reino florente , mas a machina de ummundo arruinado.

    Foi Vossa Magestade o verdadeiro Atlante e a fortssimacolumna que, sustentando-o com as foras e com as disposi-es, lhe evitou os estragos, e que ainda hoje o assegura,no s aos seus naturaes dominios, mas a todos os estranhos,

    sendo a refulgente coroa de Vossa Magestade escudo de Paliaspara a defensa, e o seu venerado sceptro raio de Jpiter para

    o respeito . A real pessoa de Vossa Magestade guarde Deusmuitos annos.

    tvaUo Da uvocha tttta.

  • PROLOGO

    s grandezas e excellencias, leitor discreto, da regio doBrazil, to celebre depois de descoberta como anniquilada

    emquanto occulta , exponho ao publico juizo e atteno domundo, onde as suas riquezas teem chegado mais que as suasnoticias, posto que algumas andem por vrios autores intro-duzidas em diversos assumptos differentes do meu, que notem outro objecto. O costume sempre notado nos Portuguezesde conquistarem imprios e no os encarecerem, causa deque tendo creado o Brazil talentos por eminncia grandes,nenhum compozesse a historia d*esta regio, com maior gloriada ptria da que pde lograr nos meus escriptos, tomandoeu com inferiores foras o peso que requeria mais agigantadoshombros

    ;porm o respeitado caracter em que por sua gran-

    deza, e no por merecimento meu, me constituiu a Real Aca-demia, honrando-me com o preclarissimo logar de seu Acad-mico, me dar alentos de Hercules para sustentar pesos deAtlante.

    Com esta expresso offereo este volume : se entenderesque o compuz em applauso e reverencia do clima em quenasci, podes crer que so seguras e fieis as noticias que escre-vo, porque os obsquios no fizeram divorcio com as verda-des. Se em alguns termos o estylo te parecer encarecido , ou

    em algumas matrias demasiado o ornato, reconhece que emmappa dilatado a variedade das figuras carece da viveza dascores e das valentias do pincel ; e que o meu ainda est

  • XVI

    humilde nas imagens que aqui pinto, assim por falta de enge-nho, como por no ter visto todos os originaes, fazendo a

    maior parte das copias por informaes, das quaes me nopde resultar o acerto de Apelles no retrato de Helena pelosversos de Homero ; mas se te no conciliar agrado pelas tin-tas a pintura , no deixem de merecer-te atteno pela gran-deza os objectos ; e se a tua vista fr to melindrosa que nobastem a contental-a, com lhe apartares os olhos a ti teescusas o enfado, e a mim a censura.

  • ADVERTNCIAS

    dverte o autor, que da riqussima America, to dilatada

    que se estende por quasi quatro mil lguas de comprimento,estando ainda por saber as que tem de largo , e jaz debaixode trs diversas zonas , dividindo-se em septentrional e meri-

    dional, da parte septentrional no falia, e s trata na meridio-

    na da grandssima poro que comprehende o Estado do Bra-zil, assumpto d'esta Historia da America Portugueza.

    Que no pe n'ella o cmputo dos tempos em numerosuccessivo de annos, porque desde o de mil e quinhentos, emque foi descoberta a America portugueza, por largo curso, ato de mil e quinhentos e trinta e cinco em que se doaramalgumas provncias e se principiou a fundao d'ellas , noaconteceram outros progressos mais que a vinda do cosmogra-pho Amrico Vespucio

    ,por ordem del-rei D. Manuel, a de-

    marcar esta regio e as suas costas, e depois a de outros geo-grapbos e capites enviados pelo mesmo rei e por seu filho esuccessor el-rei D. Joo iii a tomar posse, metter marcos, obser-var o curso dos mares, sondar os portos, explorar o paiz e levard'elle mais distinctas noticias.

    Que estas operaes se fizeram com intervallos de tempos

    ;

    e desde o anno de mil e quinhentos e quarenta e nove, emque veiu o primeiro governador do Estado, leva a conta d'ellespela successo dos governos e ordem dos factos , mediandoainda alguns largos espaos sem aces para a escriptura, faltaque precisamente interrompe a serie dos annos, mas no altera

  • XVIII

    a verdade da historia nem as noticias do Brazil, que o fimpara que o autor a escreve, e toda a alma e substancia dosescriptos, pois o mais so accidentes.

    Que as matrias e noticias que n'ella trata so colhidas derelaes fidedignas, conferidas com os autores que estas mat-rias tocaram , e com particulares informaes modernas (queelles no tiveram) feitas por pessoas que cursaram as maiorespartes dos continentes do Brazil , e as depozeram fielmentecomo testemunhas de facto, com a sciencia de que o autoras inquiria para compor esta historia, cujo essencial instituto a verdade.

    Que como nos dois primeiros livros descreve o corpo natu-ral e material d'esta regio, as maravilhosas obras que n'ellafez a natureza, as admirveis produces em vrios gneros eespcies, e as sumptuosas fabricas que para o trato civil e poli-tico das suas povoaes foi compondo a arte, no retrato detanta formusura

    ,

    precisada a ser pincel a penna , no temesair dos preceitos da historia quando altera a pureza das suasleis com as idas da pintura

    ,que requer mais valentes phan-

    tasias , tendo por exemplar portentos , em que a mais elevadaphrase potica verdade ainda mal encarecida.

    Que nos outros livros, que conteem matrias politicas, levao estylo histrico com estudo castigado , e no pe nas mar-

    gens os numerosos rios e as varias espcies das producesdo Brazil, porque sendo tanto do instituto d'esta obra, entendeque devem ir no corpo d'eila.

    1. MSki^ mil Kunk i)' 'ww'y)imi^ i

  • LICENAS

    DA ACADEMIA REAL

    ^pprvvaf de c^ntvniv Ilvdrigues da

    i^vda^ dv 'CvnselJ)v de jSua Magestadee dv ieu 'Xrbunal dv VUramar^ ^x:a^

    demkv da ^cademia leal da Mi^^tvria.

    EXCELLENTISSIMOS ^ENHORES

    Em execuo da ordem de Vossas Excellencias vi o livro intituladoHistoria da America Portugueza, composta pelo Coronel Sebastio da Ro-

    cha Pitta ; e ainda que me parece mais elogio, ou panegyrico, que historia,

    no entendo que desmerece o auctor que Vossas Excellencias lhe concedam

    a faculdade que pede, de poder condecorar o seu nome na edio que fizer

    d'esta obra, com o titulo que gosa de Acadmico provincial d'esta Acade-

    mia Real da Historia Portugueza. Vossas Excellencias ordenaro o que fr

    mais justo e acertado. Deus guarde as pessoas de Vossas Excellencias. Casa,

    10 de agosto de 1726.

  • ^pprvvav de @. ^ntvnio i^aetano de

    jSvusa, 'Clrigo regular, ualifkadvr

    dv jSantv-ffidv, 'Cvnsultvr da ^ulla

    da jSanta "Cruzada e ^^ademiev da^eademia H^aZ da ^utria.

    jpXCELLENTISSIAlOS SeNHORES

    Yi a Historia da America Porugueza escripta por Sebastio da Rocha

    Pitta, Fidalgo da Casa de Sua Magestade, Cavalleiro professo da ordem de

    Christo, Coronel do Regimento de infanteria da Ordenana da cidade da Ba-

    hia e dos Privilegiados d'ella, e Acadmico provincial do Estado do Brazil.

    Esta historia, Excelienlissimos Senhores, a nica que temos seguida e

    completa dos dilatados e riqussimos domnios que El-Rei nosso senhor tem

    n'esta grande parte do mundo ; pelo que muito de agradecer a curiosa

    applicao com que seu autor se empregou em escrever esta historia, que

    sendo principalmente poUtica, tem muito da natural, pelo que se faz mais

    agradvel, no s pela noticia dos seus preciosos mineraes, mas pela de

    innumeraveis animaes terrestres, quadrpedes, reptis e volteis, monstros

    horrveis, ainda aquticos, porque aquelles mares produzem cousas de grande

    admirao, como tambm o so os vegetaes, com to extraordinrias pro-

    duces da natureza, que fazem fertilissima aquella grande poro de terra

    comprehendida debaixo do domnio do nosso augusto protector.

    Sebastio da Rocha Pitta nascido na Bahia ; e no muito que oamor da ptria o obrigue a engrandecer c ornar com especiosas vozes

    aquellas cousas que a ns se nos fazem mais estranhas, ou por serem ra-

  • XX r

    ras vezes vistas, ou somente cridas pelas informaes com que as sabemos.

    sem duvida que aquella parle do mundo contm prodigios, que excedendoas hyperboles, no oTendem a verdade, lei mais essencial para a historia do

    que os outros mais rigorosos preceitos com que ella se deve compor. Este

    autor o faz em eslylo to elegante, que tem muito de potico, em que lhe

    acho companheiros de to grande nota, como algum de eminentssimo ca-

    racter, c este ser o motivo por que concilie na maior parte dos leitores ap-

    plauso e louvor;porque entendo, que no ser menos estimada esta histo-

    ria do que outras que vemos de simiihante estylo na nossa lingua, e na

    dos nossos vizinhos, onde teem bastante reputao.

    Por diTerentes meios conciliam os autores a aura popular cora que os

    seus livros so estimados. Os exemplares da historia romana, cuja lio c

    to recommendavel a um histoilador, vemos quo poucos conseguem o imi-

    tal-os, e por isso so to poucos os que logram o cabal nome de historia-

    dores. Quantas vezes ouvimos criticar aquelles mestres da historia, de quem

    os outros que se seguiram beberam no s o raethodo, mas ainda o mesmo

    estylo? N'esta parle so bem diversos os gostos, porque tamliem alguns,enfastiados da eloquncia, pretendera seja a historia uraa narrao to nua

    de vozes como de reflexes, de sorte que a querem antes insulsa que com

    algum adorno;porm estes discursos so lidos de uns por paradoxos, e de

    outros por affectos da melancholia que os domina, de modo que o nochegara a executar n'esla parte ainda os mais austeros censores.

    Este livro me parece mui digno da licena que seu autor pede, para

    o ornar com o nome de Acadmico da nossa Real Academia; e assim de-

    vem Vossas Excellencias mandar-lhe agradecer o zelo com que es! coope-

    rando para o nosso instituto, no s com os seus estudos, mas ainda com

    a sua prpria despesa na impresso d'este livro : este o meu parecer.

    Vossas Excellencias resolvero o que for mais convenienle honra da nossa

    Academia. Lisboa Occidental, na Casa de Nossa Senhora da Divina Provi'

    dencia, 24 de novembro^ de 1726.

    CU. CLut-uto Lyaetaiio )e out)a.,

    Clrigo regular.

  • XXII

    o Director e Censores d Academia Real da Historia Portugueza dolicena ao Coronel Sebastio da Rocha Pitta para usar do titulo de Acad-mico supranumerrio no livro intitulado Historia da America Portugueza,vistas as approvaes dos dois Acadmicos a quem se commelleu o seu exa-me. Lisboa Occidental, 6 de dezembro de 1726.

    cJCbatcjuex ()e CXieatete.

    UJ. dllbaiitiet. Caetano De oua.

    Gilibatcruc de Vtcicia.

    Qjvvaiciiet Qjmanue Oeiic Da iiva.

    DO SANTO OFFICIO

    ^pprovav dv !(. T. 3Vl. ^r. SVianuel

    uilJ^erme^ ualifwadvr dv jSantv'Offi'-

    Vj ^6xaminadvr da6 trxs Ordens 3\ii^litares.

    Eminentssimo jSenhor

    Vi o livro intitulado Historia da America Portugueza composto por Se-

    bastio da Rocha Pitta, e na brevidade de dez dias em que o li, mostro

    admirei a phrase verdadeiramente portugueza, desafectada, pura, concisa

    e conceituosa. Quer-me parecer que o autor desempenha todas as leis dahistoria, que ouo dizer so muitas e de dificil observncia. Pela princi-

    pal razo de no ter cousa contra a F ou bons costumes, me parece

    merecedora esta obra da licena que pretende. Vossa Eminncia mandar

    o que for servido. S. Domingos de Lisboa Occidental, 20 de dezembro de 1726.

    ^Jt. cillbatiM-ei' Ct/Uiuiit?ettue.

  • XXIII

    ^pprava do ^. T, M. ^r. ^t^a-ventura de jS. iv^ Qualificador do

    jSanto-Cffido,

    Eminentssimo ^enhor

    Sempre o gnio porluguez foi avaro em narrar por escriplo suas hericas

    aces, e ostentar no prelo as suas proezas, no aspirando chegar com a

    penna onde se arrojou a sua espada, nem voar com o discurso onde

    se remontou o seu valor, por se no dispor a reduzir a escriplura o que

    em todo o universo publicou a fama; como excepo, porm, d'esta regra

    se animou Sebastio da Rocha Pitta a apresentar aos olhos do mundo e at-

    teno das gentes a Historia da America Portugueza, que compoz e orde-

    nou em beneficio da ptria e credito da nao, onde resuscita d'entre as

    cinzas, em que ha tantos annos jazia envolta, to admirvel estatua, anti-

    gamente lavrada e primorosamente esculpida com o ferro e armas lusitanas,

    i-etratando-a no breve mappa d'este papel, onde se dar bem a conhecerpela copia o original.

    a ida do escriptor egualmente elevada que o assumpto, e a suapenna proporcionada a to sublime emprego, pois desempenha n'esta obra

    o que premeditou o seu conceito e ajuisou o seu pensamento, e com

    grande brado reputar no theatro do mundo as proezas e faanhas dobrao portuguez, no descobrimento de novas terras, to dilatadas como

    incgnitas. Descreve a bondade do clima, fertilidade da terra, sempre

    fecunda nas suas produces; faz presente o passado, e pe nossa vista

    o que est to longe dos nossos olhos.

    Pontualmente cumpre os preceitos da narrao e as leis da historia;

    porque determina aces, ajusta annos, observa tempos, distingue logares,

    demarca terras, individua successos, reduzindo a abreviados perodos o que

    poder ser matria de copiosos tratados. E denominando-se esta parte do

    orbe Novo Mundo, para ns agora mundo novo, pela noticia que oautor nos communica do que e do que contm to dilatado paiz, expondo

    nossa comprehenso o que at aqui se occultou ao nosso conhecimento.

    Pouco importa descobrir o thesouro, se se no conhece a sua preciosi-

    dade, porque achal-o fortuna, conhccel-o discrio; c mais o logra

    quem o sabe avaliar, que quem o possuo sem o conhecer. O valor do

  • XXIV

    diamante depende da eslimao do lapidado, o valor do oiro do exame

    do contraste, porque um lhe sonda o fundo, outro lhe examina os qui-lates.

    Eslou certo se ha de lr a presente historia com gosto e sem fastio,

    pela boa ordem e admirvel disposio com que est composta, novidadesque refere, particulares que relata, elegncia com que se adorna; porque o

    estylo grave, especioso e agradvel; natural sem artificio e culto sem

    aTectao, e to singular que no tem regra ociosa, orao suprflua; no

    tem periodo que no seja prprio, palavra que no esteja em seu logar,

    no ha termo que se no perceba com clareza, objecto que se no vejacom distinco; egualmente convida a curiosidade e desafia a emulao;

    porque historiar d'esta sorte, felicidade de poucos e inveja de muitos.Tem o Brazil a ventura de achar na eloquncia de um filho o melhor

    instrumento da sua gloria, e o maior manifesto do seu luzimento, pois publica

    com este prego as suas excellencias, e d a conhecer as suas singularidades,

    animando de novo as proezas antigas e os successos passados, que por

    caducos estavam adormecidos, e por esquecidos eram cadavares; e torna

    verdes as palmas que a dilao do tempo tinha murchas, no sendo

    menos teis aos imprios os empregos da penna que as victorias da

    espada, porque nas imagens dos escriplos, como nos mrmores, se con-

    serva a memoria e se eternisa a fama dos triumphos das armas. pois benemrito da maior alteno este precioso livro, e digno de

    lodo o credito o que n'eile se exprime, pela autoridade do escriptor e

    coherencia das noticias, sem o minimo escrpulo de que o affecto de natu-

    ral, e amor da ptria viciasse a historia ou adulterasse a verdade. E

    porque em tudo se conforma com a pureza de nossa santa F Catholica

    e bons costumes, se lhe deve de justia a licena que pede por favor para

    a estampa, sendo merecedor do primeiro logar no prelo. Este o meu pare-

    cer. Vossa Eminncia mandar o que for servido.Lisboa Occidental, no Hospcio do Duque, 10 de fevereiro de 1727.

    ui. tJoc'?enluta De , Lcio.

  • XXV

    Vistas as informaes pode-se imprimir a Historia da America Por-

    tugueza composta por Sebastio da Rocha Pitta, e depois de impressa

    tornar para se conferir, e dar licena que corra, sem a qual no cor-

    rer,

    Lisboa Occidental, 11 de fevereiro de 1727.

    tXt. ux,. CXuucaUe, Cwuwa, Oeta:eita, ii9a, Cae)?.

    DO ORDINRIO

    ^pprcvav de M. H* Tadre ^. ^vsjBai^iosa^ i^lerigv Ilegular^ ^tademkcIleal da histeria Tvrtugueza^ i^l/rv^

    nuta da Btrenuma 'Cam de "JBra^gana^ e examinador das ires -Ordens

    Militares,Tllustrissim.0 ^enhor

    Ordena-me Vossa Illustrissima que veja a Historia da America Portu-gueza, que escreveu o Coronel Sebastio da Rocha Pitta. Esta grande

    poro do mundo, descoberta no anno de mil e quinhentos, esteve at

    agora como incgnita por falta de historiador que desse a conhecer com

    exaco as portentosas maravilhas de que a dotou a natureza. Escreveu

    d'esla regio um brevssimo tratado, com o titulo de Historia da provn-

    cia de Santa Cruz, Pedro Gandavo de iMagalhes, e n'elle, nem a brevi-

    dade, nem o estylo podiam fazer agradvel a sua relao.

    Em maior volume, mas sem exceder de chronista natural d'aquellasdilatadssimas terras, escreveu o padre Simo de Vasconcellos, da Com-

    panhia de Jesus, dois livros de noticias curiosas, que depois foram incor-

  • XXVI

    porailas na Chronica da mesma religio d'aquelle Estado. Em alguns livrosse acham poucas memorias da America que pertenam juntamente aos suc-cessos politicos e militares, porque supposto que temos o Valoroso Luci-

    deno de Fr. Manuel Calado, o Caslrioto Lusitano de Fr, Raphael de Jesus,

    as Memorias dirias da guerra de Pernambuco de Duarte de Albuquer-

    que Coelho, a Nova Lusitnia de Francisco de Brito Freire, e a Guerra

    do Brazil na lingua italiana de Fr. Joo Jos de Santa Thereza, nenhum

    d'estes autores chronista geral de toda a America portugueza, porque a

    maior parte d'estas pennas se occuparam com a historia das guerras que

    introduziram na capitania de Pernambuco as armas hollandezas; e tendo

    algumas d'ellas historiado as nossas desgraas, sempre lhes faltou o tempo

    para darem noticia das nossas victorias.

    Mas, ainda que n'estes livros se veja o brio militar dos Americanos Por-

    tuguezes, tudo o que n'elles se escreve uma pequena parte a respeito

    de to grande lodo. Sabiaraos o valor com que poucos soldados mal arma-

    dos e peor disciplinados, animando-os o zelo da f e o amor da liberdade

    das suas ptrias, souberam vencer e triuraphar de uma gente to valo-

    rosa como a hollandeza, em que no fcil de examinar qual seja n'ella

    maior, se o esforo, se a industria militar. Sabamos em commum os nomes

    dos governadores de muitas capitanias em que se dividiu o agigantado

    corpo d'aquella conquista, mas no lhes sabamos a continuao at os

    nossos tempos, porque estas noticias at agora eram filhas do acaso. Saba-

    mos que em alguns d'aquelles bispados floresceram prelados santssimos,

    que com generoso e apostlico trabalho accrescentaram o rebanho de

    Christo, mas a sua serie era ignorada pelos escriptores. Sabamos os mila-

    gres que pelo espao de tantos sculos escondeu a natureza a todo o

    resto do mundo; e sabamos que aquelles sertes mais eram povoados de

    oiro e de pedraria que de homens; mas tudo isto sabamos com tanta

    confuso, que no seria grande erro aDrmar que era o mesmo que se o

    ignorssemos, porque esta costuma ser a pena do que se sabe em con-

    fuso.

    Para que tudo se soubesse com distinco, escreveu o Coronel Sebastio

    da Rocha Pitta esta Lisloria da America Portugueza, que comprehende

    duzentos e vinte e quatro annos de tempo, em que se praticaram todos

    aquelles acontecimentos, em que mostra a fortuna a firme variedade da

    sua inconstncia. Com a devida proporo vero os leitores n'esta historiatodos aquelles casos que fizeram famosas a muitas monarchias, porque aqui

    se vero povos mal contentes, e logo satisfeitos; vr-se-ho promessas de

    thesouros, umas vezes mal cumpridas, e outras, descobertos, achar-se o

  • XXVII

    oiro em tanta abundncia como se fora terra ; e uns governadores descui-

    dados da humanidade por culpa da distancia, e outros sempre os mes-

    mos, ainda que to distantes da corte, porque os homens verdadeiramente

    christos adoram cm toda a parte a presena de Deus; de sorte que atten-

    dendo ao que este autor escreveu, entendo que justamente se lhe devedar o titulo de novo Colombo, porque com o seu trabalho c com o seu es-

    tudo nos soube descobrir outro mundo novo no mesmo mundo descoberto.Esta historia est escripta com tanta elegncia, que s tem o defeito

    de no ser mais dilatada, para que os leitores se podessem divertir com

    maior torrente de eloquncia. Todos os successos esto escriplos com to

    artificiosa brevidade, que se percebem sem defeito das noticias necess-

    rias, porque de outra sorte occupariam muitos volumes os negcios po-

    lticos e as aces militares de to grande numero de naes, como so

    as que habitam o dilatadssimo serto da nossa America.

    Parece-me que Vossa Illustrissima lhe deve dar a licena que pede para

    se imprimir esta historia, no s porque no oTende a F, ou bons costu-

    mes, seno tambm para que veja Europa que lhe no cede o Brazil naqualidade dos escriptores. Vossa Illustrissima ordenar o que for servido.

    N'esta Casa de Nossa Senhora da Divina Providencia, 28 de maro

    de 1727.

    iX). Vo Vatvoa,

    Clrigo regular.

    Vista a informao pode-se imprimir o livro de que se trata, e depois

    de impresso tornar para se conferir e dar licena que corra, sem a qual

    no correr.

    Lisboa Occidental, 30 de maro de 1727.

    CU. r. CXtcekdpo De XaceDi^tUOUlO'.

  • XXVIII

    DO DESEMBARGO DO PAGO

    ^pprovamo de 3\arUnJ)v de 3\iendoa de

    Tina e de Troena^ ^tademu da^cademia ^eal da %Lutt)na TcrtU'-gueza

    pENHOR

    Lendo a Historia da America Portugueza, que corapoz Sebastio da

    Rocha Pitta, no achei n'ella cousa por que se deva negar a licena de

    se imprimir; antes me parece que no somente digno de louvor, pormainda de premio o zelo com que seu autor quiz augmentar a gloria da

    ptria. D'elle se v, que a soberana proteco que Vossa Magestade concede

    s artes e sciencias, inspirando os maiores escriptores da Europa, anima

    lambera os das mais distantes partes do mundo; pois as remotas e dila-

    tadas provncias da America lhe tributam mais preciosos thesouros que

    os de suas minas n'este livro, o qual se adorna cora os successos hist-

    ricos que refere, e brilha cora vrios ornatos poticos de largos episdios,

    frequentes figuras, e discretos panegyricos que contm.

    Algura reparo se poder fazer na miudeza com que em historia to suc-

    cinta relata alguns successos, mais dignos de horror e silencio que de

    memoria ; mas no fazer d'elles meno, seria diminuir a gloria dos leaes,encobrindo a infmia dos traidores, contra as severas leis da historia: Nihil

    veri non audeat. Este o meu parecer. Vossa Magestade mandar oque for mais conveniente ao seu real servio.

    Lisboa Occidental, 25 de julho de 1727.

    cJlibaitiafoo De c}ihenboca de stiuct e de ^ iceuccc.

    Que se possa imprimir vistas as licenas do Santo Oficio e Ordinrio,e depois de impresso tornar Mesa, para se conferir e taxar, que sem

    isso no correr.

    Lisboa Occidental, 1 de agosto de 1727.

    GIJb

  • HISTORIADA

    AMERICA PORTUGUEZALIVRO PRIMEIRO

    Introduco da historia Estado em que se achava o Imprio Lusitano Descobrimentodo Brazil Nomes que lhe foram impostos Descripo do corpo natural e material'esta regio Distancia das suas costas, rumos e ventos da sua navegao Movi-mentos dos seus mares Extenso do seu continente Grandeza dos seus mais cele-bres rios Formosura do seu terreno Benignidade do seu clima e dos seus astrosOs seus montes mais famosos Os seus campos, produces e lavouras As suas hrr-vas, flores, arvores e fructas assim naturaes como estrangeiras As feras, brutos e ca-as que tem O que geram e criam os seus mares Os seus pescados, as pescarias doscharos e das baleias, a descripo d'este monstro marinho Os mariscos de vrios g-neros pelas suas praias e rios A barbara vida e costumes dos gentios, seus primei-ros habitadores Vinda de Amrico Vespucio e de outros capites e exploradoresenviados pelos reis D. Manuel e D. Joo III Linha imaginaria e determinao das con-quistas que tocaram aos monarchas portuguezes e castelhanos Successos de Catharinae Diogo Alvares Correia Vinda do glorioso Apostolo S. Thom a ambas as Amricascastelhana e portugueza.

    ,:^O novo mundo, tantos sculos escondido e de tantossbios calumniado, onde no cliegaram Hannon com as

    suas navegaes, Hercules lybico com as suas columnas,

    nem Hercules thebano com as suas eraprezas, a me-

    lhor poro o iJrazil ; vastssima regio, felicssimo ter-'

    reno em cuja superfcie tudo so fructos, em cujo centrotudo so Ihesouros, era cujas montanhas e costas tudo so

    aromas ; tributando os seus campos o mais til alimento, as

    suas minas o mais fino ouro, os seus troncos o mais suave bl-

    samo, e os seus mares o mbar mais selecto ; admirvelpaiz, a todas as luzes rico, onde prodigamente i)rofusa a na-

    tureza se desentranha nas frteis produces, que em opulncia

    f [^'^ da monarchia e beneficio do mundo apuia a arte, brotando assuas canas espremido nctar, e dando as suas fructas sasonada

    ambrsia, de que foram mentida sombra o licor e vianda que aos seus falsos

    deuses atlribuiu a culta gentilidade.

    1

  • AMERICA PORTUGUEZA

    2. Em nenhuma outra regio se mostra o co mais sereno, nem ma-druga mais bella a aurora ; o sol em nenhum outro hemispherio tem os raiosto dourados, nem os reflexos nocturnos to brilhantes ; as estrellas so as

    mais benignas, e se mostram sempre alegres ; os horisontes, ou nasa o

    sol, ou se sepulte, esto sempre claros; as aguas, ou se tomem nas fontes

    pelos campos, ou dentro das povoaes nos aqueductos, so as mais puras

    :

    emfim o Brazil terreal paraiso descoberto, onde teem nascimento e cursoos maiores rios ; domina salulifero clima ; influem benignos astros, e re-spiram auras suavssimas, que o fazem frtil e povoado de innumeraveis

    habitadores, posto que por ficar debaixo da trrida zona o desacreditassem

    e dessem por inhabitavel Aristteles, Plinio e Cicero, e com gentios os pa-

    dres da Egreja Santo Agostinho e Beda, que a terem experincia d'estefeliz orbe, seria famoso assumpto das suas elevadas pennas, aonde a minhareceia voar, posto que o amor da ptria me d as azas, e a sua grandeza

    me dilate a esphera.

    3. Florescia o Imprio Lusitano muitos sculos depois de ser fundado

    por Tubal, ampliado por Luso e por Lysias, e de terem os seus naturaes

    gloriosamente na ptria obrado aces hericas, e concorrido fora d'ella

    para as maiores emprezas, j nos soccorros que deram aos Carthaginezes,conduzidos por Sapho, para domar a Mauritnia, j nos que acompanha-

    ram a Annibal pai-a conquistar a Itlia, j concorrendo com Mithridates

    contra Pompeu, e com Pompeu e seus filhos contra Csar ; e de haverem

    na defensa da prpria liberdade feito admirveis provas de valor com os

    seus capites Viriato e Sertrio contra os Romanos ; e finalmentede depois

    que livres da sujeio dos Suevos, dos Alanos, dos Godos e dos Sarracenos,

    tendo j logrado no seu primeiro rei portuguez o invicto D. Afonso Henri-

    ques, e na sua real |)role, o suave dominio de treze successivos monarchas

    naturaes, se achava na obedincia do felicssimo rei D. Manuel.

    . Mantinha com a Thiara Romana a antiga unio, firme com a nossa

    obedincia e religio ; com Castella estava era paz assegurada pelas nossas

    victorias ; tinha amizade com a Coroa Imperial, com as de Frana, Ingla-

    terra, Esccia, Sucia, Polnia e Dinamarca ; com as republicas e naes

    septentrionaes e italianas, pelos interesses recprocos e communs das mo-

    narchias ; fazia guerra aos Mauritanos, aos Ethiopes e aos Asiticos, para

    lhes introduzir a f catholica ; achava-se dilatado com os descobrimentos das

    ilhas do Porto Santo, da Madeira e dos Aores no Oceano, e por din"erentes

    mares, com muitas pi-aas e provncias em Africa, com grandes povoaes

    e conquistas na Ethiopia ; e comeava a mostrar-lhe os seus maiores domnios

    a sia, quando o Novo Mundo lhe abriu as portas da sua mais vasta regio.

  • LIVRO PRIMEIRO

    5. Tinha j dado o sol cinco mil e quinhentas e cincoenla e duas voltas

    ao zodiaco, pela mais apurada chronologia dos annos, quando no de mil e

    quinhentos da nossa redempo (oito depois que a Chrislovo Colombo levou

    a especulao a demandar as ndias) ti-ouxe a tempestade a Pedi'o Alva-

    res Cabral a descobrir o Brazil. Ia este illustre e famoso capito (o primeiro

    que depois de D. Vasco da Gama passava do Tejo ao Indo e Ganges) go-vernando uma formosa armada de treze poderosas naus, com que partiu aos

    9 de maro, e navegando ao principio com prospera viagem, experimentou

    aos doze dias to contraria fortuna, que arribando um dos baixeis a Lisboa,

    os outros correndo tormenta, perdidos os rumos da navegao, e conduzidos

    da altssima Providencia mais que dos profiados ventos, na altura do polo

    antrctico, dezeseis graus e meio da parte do sul, aos vinte e quatro de

    abril avistou ignorada terra e jamais sulcada costa.6. N'ella surgindo as naus, pagou o general quella ribeira a segurana,

    que achara depois de to evidentes perigos, com lhe chamar Porto Seguro,

    e terra Santa Cruz, pelo estandarte da nossa f que n'ella ai-vorou com

    os mais exemplares jbilos e ao som de todos os instrumentos e arlilhe-

    ria da armada ; fazendo com a mesma militar ostentao e piedade celebrar

    o santo sacrifcio da missa sobre uma ara que levantou entre aquelle in-

    culto arvoredo, que lhe sei'viu de docel e de templo, a cujas catholicas ce-

    remonias estiveram admirados, ms reverentes, todos aquelles brbaros, econformes com o exemplo dos fieis, premissas do aiecto com que depois

    abraaram a nossa religio. Este foi o primeiro descobrimento, este o pri-

    meiro nome d'esta regio, que depois esquecida de titulo to superior, se

    chamou America, por Amrico Vespucio, e ultimamente Brazil pelo pau ver-

    melho, ou cr de brazas, que produz.

    7. Jaz o opulento imprio do Brazil no hemispherio antarcticto, debaixo

    da zona trrida, correndo do meio d'ella (em que comea) para a parteaustral ao trpico de Capricrnio, d 'onde entra na zona temperada me-

    ridional grandssimo espao. de forma triangular; principia pela bandado norte no immenso Rio das Amazonas, e termina pela do sul no dilata-

    dssimo Rio da Prata;para o levante o banham as aguas do Oceano Atln-

    tico;para o occidente lhe ficam os reinos de Congo e Angola, e tem por

    antpodas os habitadores da urea Chersoneso, onde est o reino de Ma-laca. Na sua longitude grandssima contam os cosmographos mil e cincoenla

    e seis lguas de costa, a mais formosa que cursara os navegantes, pois em

    toda ella e em qualquer tempo esto as suas elevadas montanhas e nltos

    arvoredos cobertos e vestidos de roupas e lajiearias verdes, por onde cor-

    rem innumeraveis caudalosos rios, que em copiosas e diaphanas correntes

  • AMERICA PORTUGUEZA

    precipitam cryslaes nas suas ribeiras, ou levam tributo aos seus mares, em

    que ha grandes enseadas, muitos e continuados portos capacissimos dos

    maiores baixeis e das mais numerosas armadas.

    8. A sua latitude pelo interior da terra largussima : mais de quatro-centas lguas se acham j cultivadas com as nossas povoaes, sendo mui-

    tas as que esto por descobrir. Este famoso continente to digno das sus-

    penses humanas, pelas distancias que comprehende e pelas riquezas que

    contm, como pelas perspectivas que mostra;porque at em algumas par-

    tes, em que por spero parece impenetrvel, aquella mesma rudeza, que

    o representa horrvel, o faz admirvel. A formosa variedade das suas for-

    mas na desconcertada proporo dos montes, na conforme desunio das

    praias, compe uma to egual harmonia de objectos, que no sabem os

    olhos onde melhor possam empregar a vista.

    9. Com inventos notveis saiu a natureza na composio do Brazil, jem altas continuadas serranias, j em successivos dilatados valles ; as

    maiores pores d'elle fez fertilissimas, algumas inteis ; umas de arvore-

    dos nuas, expoz s luzes do sol, outras cobertas de espessas matas, occul-

    tou aos seus raios ; umas creou com disposies em que as influencias dos

    astros acham qualidades proporcionadas composio dos mixtos, outrasdeixou menos capazes do beneficio das estrellas. Formou dilatadssimos

    campos, uns partidos brandamente por arroios pequenos, outros utilmente

    tyrannisados por caudalosos rios. Fez portentosas lagoas, umas doces, e ou-

    tras salgadas, navegveis de embarcaes e abundantes de peixes ; estu-

    pendas grutas, speros domiclios de feras ; densos bosques, confusas con-

    gregaes de caas, sendo tambm d'este gnero abundantssimo este ter-reno, no qual a natureza por varias partes depositou os seus maiores

    Ihesouros de finos metaes e pedras preciosas, e deixou em todo elle o

    retrato mais vivo e o mais constante testemunho d'aquella estupenda e

    agradvel variedade que a faz mais bella.

    10. Os montes famosos d'esta regio, posto que sejam muitos e com-pitam em grandeza, s dos mais celebres pela altura, pela extenso e por

    outras circumstancias memorveis faremos meno. Ao norte o monte Ja-ricoacoara, que estando assentado no continente da terra do Cear, marco

    que muitas lguas ao longe descobrem as embarcaes, quando navegam

    para as capitanias do norte. No districto de Jaguaribe, a famosa serra, cujocume se remata com a forma de Sete-Pes de Assucar. A serra da Borbo-riiia, sita no Porto dos Touros entre o Cunha e a Parahyba, que cor-rendo com o mesmo nome at ribeira do Pinhanc, d'alli at a Iguapava

    (em que mais elevada fenece, escondendo-se entre as nuvens) se chama

  • LIVRO PRIMEIRO

    serra do Araripe. A montanha do Ararob, que nasce no continente da terrado Porto do Calvo, e vai cora a mesma grande altura cortando por muitas

    lguas o interior do serto. O monte das Tabocas em Pernambuco, novelgua? da villa do Recife. As montanhas dos Guararapcs, que principiando

    menos elevadas quatro lguas da mesma villa, vo continuando para o ser-

    to com grandssima altura, e acabam em serranias que penetram os ares

    ;

    estas montanhas e aquelle monte, celebres pelas trs famosas victorias que

    n'elles alcanmos dos llollandezes em Ires sanguinolentas batalhas campaes.

    11. Para o sul a cordilheira dos montes, que comeando na capitania

    dos Ilheos com o nome de Serras dos Aymors, e atravessando as do PortoSeguro e do Espirito Santo, vo por cento e quarenta e trs lguas de

    curso acabar na enseada do Rio de Janeiro, onde lhes chamam Montes dosrgos. No caminho d'aquella cidade para as Minas Geraes, a altssimaserra da Itatiaya. Nos vastos districtos das Minas do Ouro, as inaccessiveis

    serranias, de cujas vertentes (dizem os seus descobridores) nasce o gran-dssimo rio de S. Francisco. Nas prprias Minas do Sul o opulento Serro

    Frio, que tem mais partos de ouro que o Polosi teve de prata. A estu-penda serra de Paran-Piacaba, que tendo assento no continente vizinho s

    villas de Santos e S. Vicente, vai inconstantemente subindo em voltas, umas

    sobre o mar, outras para o interior da terra, e dando por algumas partes

    entrada menos difficil, por outras estreito e fragoso transito para a cidade

    de S. Paulo, que lhe fica pelo serto sete lguas distante.

    12. Apartado quasi duas lguas da dita cidade, o celebre monte Jara-

    guahi, dos primeiros corpos terrenos que n'aquella regio soltaram veias de

    ouro. Junto villa de Sorocaba, o monte Marocoyaba, to robusto, que tem

    de ferro as entranhas. Na villa de Tauba, a grande montanha de Itajuba.

    O alto monte Ayap, fronteiro villa de Parnahyba. Entre ella e a de Ut,a serra de Aputerihib. No caminho das novas Minas do Cuyab, a cordi-

    lheira dos montes de Iboticat, e mais ao sul a do Gochipone. Finalmente

    das elevadssimas montanhas da nossa portugueza America umas parecem

    ler aos hombros o co, outras penetral-o com a cabea. No se jactem sAfrica e Grcia dos seus dois sagrados montes, porque tambm (a menosostentao de cultos) tem Atlantes e Olympos o Brazil.

    13. Toda a maior poro do seu terreno se dilata em grandssimas cam-

    panhas rasas, to estendidas, que caminhando-se muitas lguas successivas,

    sempre parece que vo terminar nos horisontes ; valles to desmedidos, que

    em largussimos dimetros menos difficil abrir-lhes os centros, que com-

    prehender-lhes as distancias no comprimento e largura das suas plancies.

    N'este dilatadssimo Iheatro, em que a natureza com tanlas e to varias

  • AMERICA PORTUGDEZA

    scenas representa a maior extenso da sua grandeza, e apura lodos os alen-

    tos dos seus primores, regando com portentosos rios amplssimas provindas,

    posto que lhes no possamos seguir as correntes, preciso lhes declaremos

    os nomes, primeiro aos mais celebres, e depois a outros tambm famosos,quando a elles fr chegando a historia.

    14. O Rio das Amazonas, ou Gran-Par, que poder ser pae de todosos rios, como o Oceano pae de lodos os mares, tendo principio longus-

    simo no mais interior seio do reino do Peru, com o corpo de estupendo

    vulto e o transito de innumeraveis lguas, por uma boca de oitenta de

    largo se desentranha no mar, to impetuoso, que transformando-lhe as ondas

    sal^jadas em aguas doces, as bebem os navegantes, setenta lguas antes de

    chegarem foz. A este rio, com o grandssimo intervallo de cento e ses-

    senta lguas de costa, por onde desembocam outros (posto que inferiores,

    lambem generosos rios) se segue o Maranho, ([ue com immenso compri-

    mento e largo corpo, por dezesete lguas de capacidade de boca vomita

    as suas aguas no Oceano. Do rio Maranho, em distancia de cento e trinta

    e qualro lguas de costa, corre o Jaguaribe, lambem caudaloso. D'elle se

    contam quarenta lguas ao llio Grande, que leva copioso tributo ao mar.

    Do Rio Grande, correndo a costa por cento e vinte e sete lguas de distan-

    cia, que comprehende os cabos de S. Roque e de Santo Agostinho, ha treze

    rios de grossos cabedaes, sendo entre elles o mais rico e de mais estirado

    nascimento o Parahyba n'esta provncia, e o Beberibe na de Pernam-

    buco.

    13. Distante cincoenta lguas por costa, numeradas desde o cabo de

    Santo Agostinho, est o grandssimo rio de S. Francisco, que com o Gro-

    Par e o da Prata podem fazer um Iriumvirato das aguas dominante so-

    bre todos os rios do mundo. So as suas margens mais povoadas que todas

    as dos outros do Brazil, seguidas as suas ribei-as pelo continente mais de

    quatrocentas lguas ; fecundssimas e medicinaes as suas aguas, naveg-

    veis de embarcaes medianas mais de quarenta lguas pelo serto ; por

    duas abre a boca, querendo tragar o mar quando n'elle entra, e por mui-

    tas o penetra, adoando-lhe as ondas. Enganaram-se alguns escriptores em

    dizer que este rio, no meio do seu curso, por um sumidouro se melte na

    terra, e depois de penelrar-lhe as entranhas pela distancia de doze lguas,

    torna a sair com a mesma copiosa corrente ; sendo o certo, que estreitan-

    do-se entre duas cordilheiras de montes oppostos e dilatados em todo

    aquelle espao, parece que se subterra, emquanlo por esta causa se es-

    conde, affirmando os gentios, que d'aquellas montanhas visto correr pelas

    suas raizes descoberto.

  • LIVRO PRIMEIRO

    16. D'esle portentoso lio se contam at barra da Bahia setenta l-

    guas de costa, em cujo grande espao correm ao mar vinte famosos rios,

    sendo entre elles de maior grandeza os de Sergipe, Rio Real e Ilapicur.

    Da barra da Bahia, correndo as praias sessenta loguas, est o rio Santa

    Cruz no Porto Seguro. N'este intervallo tributam copiosas aguas ao Oceano

    trinta rios, avultando por mais celebres o Taygp, o Camam, o Jaguaripe,o das Contas e o de S. Jorge. Km distancia do rio de Santa Cruz, qua-renta e cinco lguas, fica o Rio Doce, recolhendo as aguas de outros mui-

    tos, com que leva grosso tributo ao mar, sendo um dos feudatarios a este

    rio o das Caravelas, tambm notvel.17. No espao de oitenta lguas, que ha do Rio Doce a Cabo Frio,

    correm vinte e quatro rios caudalosos. Dezoito lguas distante de Cabo Frio

    fica a enseada do Rio de Janeiro, em que desembocam dezesete. No inter-

    vallo de quarenta e duas lguas, que se contam d'ella por costa barra

    de S. Vicente, ha trinta rios de purssimas aguas. Trinta lguas adeante

    est o rio Canana, com grande foz e navegvel a todo o gnero de em-

    barcaes. Em duzentas lguas de costa, que ha do rio da Canana ao daPrata, se acham vinte grandes rios, sendo os maiores o de S. Francisco do

    Sul e o dos Patos.

    18. Ultimamente se segue o estupendo Rio da Prata, maior que todos,

    e s inferior ao Gran-Par, ou das Amazonas : traz o seu nascimento da

    mesma me, e posto que irmo menor, tem o curso quasi egualmente di-

    latado, mas por diTerente rumo, correndo o das Amazonas para o norte,

    e o da Prata para o meio-dia. Era largura de cincoenla lguas de foz en-

    tra pelo Oceano, e outras tantas, antes de o aportarem, vo os navegantes

    bebendo doces as suas aguas. Os escriptores impropriamente lhe chamamtambm Paraguay, sendo este o nome de outro rio, que recolhendo maisdois no seu regao, vai com elles a entranhar-se no da Prata, no no prin-

    cipio do seu nascimento, mas j no progresso do seu curso.19. No bojo de um e na boca de outro se vem dois archipelagos de

    ilhas, sendo menos as que se acham na distancia martima (^ue ha de um

    a outro, onde as mais celebres so, a de Itamarac, a de Santo Aleixo, a

    de S. Sebastio, a Ilha Grande e a de Santa Catharina ; e por esta causa

    so os mares de toda esta costa to limpos e navegveis, pois no acham

    os mareantes outros baixos celebres e dignos de at teno para a cautela

    do perigo, mais que o de S. Roque, o de Vasa-Barris em Sergipe, o de

    Santo Antnio na barra da Bahia, e os Abrolhos.

    20. Os rumos da navegao pelas costas da nossa America portugueza

    de norte a sul, e os ventos com que se fazem as viagens para as suas ai-

  • AMERICA PORTUGUKZA

    turas e para os seus portos, exporemos, declarando, que de um grau aus-

    tral, saindo do Gran-Par para o sul, nenhuma embarcao redonda pde

    navegar as costas das seis provncias Maranho, Cear, Rio Grande, Para-

    hyba, Itamarac e Pernambuco, por correrem violentas as aguas pela costa

    abaixo ao oeste, e cursarem por elia impetuosos os ventos suestes e

    les-suestes, causa pela qual do Gran-Par se vo os navios fazendo na volta

    do norte at altura de dezoito e vinte graus de latitude pelo sudoeste e

    oeste, para dobrarem o cabo de Santo Agostinho, e proseguirem a viagem

    para as outras provncias do Brazil ; mas do referido cabo para o Gran-Par

    perpetua a mono, navegveis os mares, e os ventos de servir sempra

    favorveis.

    21. No cabo de Santo Agostinho, que est era oito graus e um lero,

    corre a costa pelo noroeste. D'elle ao rio de S. Francisco, que fica cm dez

    graus e meio, corre a costa nornordeste susudoeste. Do rio de S. Francisco

    ao Rio Real, que est em onze graus e um quarto, o rumo nordeste su-

    doeste. Do Rio Real ponta de Itapuan, que est em treze graus, corre

    nordeste sudoeste. Da ponta de Itapuan de Santo Antnio da barra da

    Bahia, que fica na mesma altura, corre a costa leste oeste. Da ponta de

    Santo Antnio ao Morro, que fica em treze graus e dois teros, corre a

    costa nornordeste susudoeste. Do Morro aos Ilheos, que esto em quinze

    graus escassos, corre norte sul. Dos Ilheos ao Porto Seguro, que est em

    dezeseis graus e meio, corre a costa o mesmo rumo. Do Porto Seguro aos

    Abrolhos, que esto em altura de dezoito graus, e lanam ao mar cincoenta

    e cinco lguas, corre a costa norte e sul. Dos Abrolhos ao Espirito Santo,

    que est era altura de vinte graus, corre do norte quarta de nordeste ao

    sul quarta de sudueste.

    22. Do Espirito Santo ao Cabo Frio, que est em vinte e trs graus,

    vai correndo a costa at ponta do cabo de S. Thom pelo sul quartado sudoeste, e d'esta at o Cabo Frio pelo sudoeste. Do Cabo Frio at o

    Rio de Janeiro, que fica na mesma altura de vinte e trs graus, corre a

    costa leste oeste. Do Rio de Janeiro ao Porto de Santos, que est em vinte

    e quatro graus, corre a costa a oes-sudoeste. De Santos ao rio de S. Fran-

    cisco do Sul, que est era altura de vinte e seis graus e dois teros, vai

    correndo a costa pelo sudoeste quarta do sul. D'elle ilha de Santa Catha-

    rina, cuja altura so vinte e oito graus e meio, corre ao sudoeste quarta

    do sul. Da dita ilha ao rio da Lagoa, que est em altura de trinta e dois

    graus, corre a costa pelo sudoeste, guinando para o sul. D'alli ao cabo de

    Santa Maria, que fica em altura de trinta e cinco graus, corre-se a costa

    ao sudoeste.

  • LIVRO PRIMEIRO

    23. Tem o Oceano n'estas costas diverso movimento e curso no circulodo anno, porque do cabo de Santo Agostinho correra as aguas para o sul

    desde vinte de outubro ale vinte de janeiro ; de vinte de janeiro at vintede abril esto indiTcrentcs no curso; do vinte de abril at vinie de julhocorrem para o norte ; e de vinte de julho at vinte de outubro se mostramoutra vez como indeclinveis : porm do cabo de Santo Agostinho at o Rio(las Amazonas tem sempre uma mesma arrebatada corrente por toda aquella

    costa para oeste at o Gran-Par. A razo natural d'esta variedade ,porque como o sol fere com perpendiculares raios os mares da trrida zona,

    e o seu calor consome grande poro das aguas do Oceano Atlntico e

    Ethiopico, convertendo umas em nuvens, e attenuando outras em ar, dis-

    poz a prvida natureza, que o Oceano Boreal transforme com o seu hmidotemperamento em si o ar vizinho, e conceba um continuo augmento de

    aguas, que cori-endo para o sul (como as que o Oceano Austral participada zona frigida, correm para o norte) se conformem ambos para a conser-vao do todo, supprindo um e outro Oceano com as suas aguas as que

    na zona trrida se consomem.

    24. Vista j, posto que em sombras, a pintura do corpo natural d'esta

    regio, a benevolncia do seu clima, a formosura dos seus astros, a dis-

    tancia das suas costas, o curso da sua navegao, o movimento dos seusmares, objectos que mereciam mais vivos e dilatados rascunhos, mostrare-mos tambm em brutesco breve as suas produces, fructos, plantas, la-vouras e manufacturas, com que os Portuguezes foram fazendo grandes os

    interesses do seu commercio e as delicias das suas povoaes, e outrasarvores, flores e fructas estrangeiras, que com o tempo lhes introduziram,

    recebendo-as a tei-ra para as produzii- to copiosamente, que bem mostraque s onde no cultivada, deixa de ser profusa: exporemos o mimodos seus mariscos, o regalo dos seus pescados e a riqueza das suas pes-

    carias ; de tudo daremos breve, mas distincta noticia.

    2o. A cana (planta comraum a toda a America portuguezaj se cultivaem sitios prprios para a sua produco, (|ue se chamam massaps, unsem terra firme, outros em ilhas. Estendida se mette na terra, e d'clla vo

    brotando olhos, que crescendo entre as suas folhas, parecem vista sea-

    ras de trigo. Quando esto sasonadas, e pelo conhecimento dos lavradoresperfeitas, de dezoito mezes nos continentes, e de um anno nas ilhas, secortam e levam para os engenhos, onde espremidas em instrumentos quechamam moendas, umas que movem correntes de aguas, outras giros de ca-vallos, se derretem em docssimo sueco, que caindo liquido, vai correndo

    por aqueductos do pau a uma grande tacha, chamada parol, o metlida na

  • iO AMERICA PORTUGUEZA

    lerra, d'onde em taas pequenas de cobre, presas por cadeias de feno,

    o sobem para o botar nas caldeiras em que se coze ; em fervendo, lhe lan-

    am uma agua de certa qualidade de cinza, que nomeiam decoada, e postono ponto necessrio, o passam a vasilhas de barro pyramidaes, que cha-

    mam formas, e cobei'tas de barro as suas circulares bocas, depois de qua-

    renta dias que n'ellas se est purificando o assucar, se pe um dia ao

    sol, e se mette em caixas.

    26. O peso do assucar, assim branco, como mascavado, que se tira decada uma d'eslas formas, sendo todas feitas quasi por uma medida nas suas

    oTicinas, diverso nos engenhos;porque as canas que se moem pr-

    prias, ou obrigadas, e se cultivam em terras de massap mais legitimo,

    ou se plantam de novo era outras menos canadas e mais distantes das

    praias (causa por que lhe chamam propriedades do mato, por dilTerena dasoutras, que se dizem da beira-mar) so maiores no comprimento, grossura

    e distancia dos ns, e teem mais sueco que as outras que nascem em terre-

    nos j de muitos annos cultivados, como so todas as fazendas que ficam perto

    dos rios, e pela sua vizinhana e commodidade dos seus portos foram as

    primeiras que se fabricaram, e j por antigas so hoje menos rendosas,

    carecendo as canas de mais trabalho para crescerem, pela muita herva que

    n'aquelles logares as suffoca, como a zizania ao trigo, se no ha continuo

    cuidado em as alimpar, no sendo s novas fazendas do mato necessrias

    tantas limpas ; e lambem consiste o rendimento e bondade do assucar nos

    mestres d'elle, que assistem s caldeiras, os quaes devem ter grandes ex-

    perincias, para o cozer e pr no ponto da maior perfeio.

    27. Nos engenhos em que concorrem as referidas qualidades, circums-

    tancias e beneicios, d cada forma trs arrobas, e trs e meia de branco,

    uma ou meia de mascavado; havendo engenhos que fazem trs mil, trs

    mil e quinhentos, e quatro mil pes dos declarados pesos, e moradores

    que teem dois, trs e quatro engenhos moenles, para cujas fabricas fazem

    grossas despezas, principalmente no tempo presente, em que pelo desco-

    brimento e lavra das minas, que levam muitos escravos, tem crescido o

    valor d'elles a excessivo preo, e a este respeito os outros gneros neces-

    srios para a cultura do assucar; e a no haver este desconto, seriam os

    senhores dos engenhos os vassallos de maiores rendas e os mais opulen-

    tos de toda a coroa portugueza.

    28. So copiosos os meles que as formas botam, quando depois de

    congelado o assucar, lhes tiram pelo fundo, em que teem um furo, as folhas

    com que as tapam, quando lho lanam liquido ; e no tempo em que se est

    purificando, distilla os referidos meles, os quaes se os senhores dos enge-

  • LIVRO PRIMEIRO H

    nhos OS querem cozer, teem outras oflicinas para este fira, e com novo be-

    neficio e arte fazem outra qualidade de assucar, que chamara batido, as-

    sim branco como mascavado, na cr e apparencia como o outro, mas na

    doura e substancia diverso, porque duas arrobas de branco balido no

    fazem o eTeilo de uma de branco lno, e a mesma diUerena ha entre um

    e outro mascavado.

    29. Tambm este gnero de assucar distilia outra espcie de mel,que chamam remei, do qual se fazem outras manufacturas; quando os se-nhores dos engenhos no querem usar d'estes inferiores gneros de assu-

    car, vendem os raeles aos fabricadores das aguas ardentes, que era pipas

    e toneis os levam para as suas officinas, onde tendo-os algum tempo em certa

    infuso, os pera o cozer em lambiques, cuja distillao agua ardente,

    de que consta a maior parte da carga das embarcaes que navegam para

    a costa de Africa a buscar escravos, e se gasta por elles e pela plebe do

    Brazil em logar das do reino.

    30. O tabaco, planta que sendo por muitas qualidades chamada hervasanta, o luxo dos homens lhe faz degenerar em vicios as virtudes, to

    melindrosa, que na sua creao qualquer accidente a destroe, assim como

    no seu uso qualquer sopro a desvanece. Cultiva-se s nas capitanias do

    norte ; semeia-se em maio, e nascida, a transplantam ; o muito sol a queima,

    e a deraasiada chuva a apodrece ; cresce cega, porque lhe tirara os olhos

    ;

    sujeita cora excesso lagarta e ao raosquito ; no lera ramos, s lana

    folhas, raas era cada p no passam de doze ; a sua colheita de agosto

    at fevereiro;quando est sasonada, se lhe fazem amarellas as folhas ; as

    que vo declinando, se vo colhendo e guardando era casas de palha, fei-

    tas em proporo grandeza do sitio era que a semeiara ; tira-se-lhe o talo,

    e no seu beneficio, desde que a comeam a torcer at a sua ultima

    perfeio, passa pelas mos doze vezes, e no peso conveniente se

    fazem os rolos, que cobrem de couro em cabello, para se embarca-

    rem.

    31. Esta planta d duas folhas, segunda chamam soca. A sua bon-dade e perfeio procede no s da qualidade do terreno era que a culti-

    vara, da proporo ou compostura com que o tempo (vario nas mesmas

    naturaes estaes do clima) se diTerena e mostra desegual;porm, do be-

    neficio que se lhe applica, da arte cora que se cocha e torce, algura mo,

    outro com engenhos, (d'onde c menos o trabalho e sae mais perfeita a

    obra) algumas vezes de mil ps se colhem nove ou dez arrobas, sendo esta

    a maior grandeza a que chega a sua liberalidade : raas a produco cora-

    mum de cada mil ps sete at oito arrobas, entrando n'este nuraero a

  • i2 AMERICA PORTUGIJEZA

    primeira foliia, e a segunda da soca : esta se colhe em dois mezes, e acon-

    tece s vezes ser melhor e mais abundante.

    32. Os seus lavradores necessariamente teem curraes de gado, para lhes

    fecundarem as terras d'esta cultura cora o mesmo que ho mister as hor-

    tas para produzirem as plantas : ha d'esles agricultores alguns, que teem

    tantos sitios d'esta lavoura, taes fabricas de escravos, e officinas, que re-

    colhem cada anno trs mil e quinhentas ou quatro mil arrobas, quando os

    accidentes do tempo ou falta do cuidado e beneficio lhe no diminuem o

    seu costumado rendimento.

    33. As capitanias do norte carecem de farinha de trigo, de que abun-

    dam algumas do sul, mas a commum e geral em todas a da mandioca.Esta se planta com uns ramos, ou garfos, que em qualquer tempo (excepto

    nos mezes de abril, maio e junho, que so os do mais rigoroso inverno noBrazil) se mettem na terra, chamados manabas, os quaes lanam grossas

    raizes, que aos doze at aos dezeseis mezes (conforme os sitios em que se

    cultivam, de mais ou menos sympalhia com esta planta) as arrancam, e

    ralam em uma forma de engenho, que chamara bolandeira, e espremem

    em instrumentos de palha, que nomeam tapits, e logo a cozera em algui-

    dares de barro ou de cobre, e fazem farinha dos gneros e nomes que di-

    remos, e umas delgadas e tnues fatias, (jue supprem o po, com o nome

    de beijs.

    34. Das mesmas raizes lanadas de molho se faz a mandioca-puba, e

    postas ao sol, a carim, ambas subslancialissimas e com virtudes para re-

    mdio de muitas enfermidades. Da agua que sae dos tapits, coada e posta

    ao sol, se faz a farinha a que chamam de tapioca, e gomma selecta, a me-lhor matria para os polvilhos das cabelleiras. Da mandioca, que depois de

    posta em molho chamara puba, feitos uns bolos cozidos e depois ralados,

    se fazem farinhas, que sovadas e amassadas era forma de pes e de fatias

    de biscoito, e cozidos em fornos, saem cora adrairavel gosto, o mesmo

    feitio e perfeio que os do trigo.

    33. Esta farinha se faz de vrios modos : fresca, que dura s dois dias,

    e de maior regalo ; fina, de que se usa nas mesas com diversos nomes,

    uma de pitanga, outra de tapioca, e a que chamara de guerra, que o po

    de munio dos soldados, sustento da gente vulgar. Todas, excepto a pri-

    meira, saindo do fogo bem cozidas e guardadas em partes seccas, duramum anno com o prprio gosto, e seis mezes os beijs, que sempre se fa-

    zem de farinha fina. Das villas do Cayr, Gamam, Boipeba e Rio das Con-tas, vem em compridos fardos de palha chamados sirios, e lanam seis

    quartas e meia e sele quartas cada um.

  • LIVRO PRIMEIRO 13

    36. A mais que se lavra em diferentes parles, se conduz em saccos,ou solla nas embarcaes. As circumslancias mais notveis d'estas raizes

    so duas: a primeira, estarem dois e trs annos mettidas na terra, sem

    apodrecerem, quando aos seus agricultores parece que em as dilatar po-

    dem conseguir maiores inleiesses ; a segunda, serem refinado veneno antesde lanadas de molho, e uilissimo sustento depois de beneficiadas. Ha la-

    vradores to poderosos, que dos sirios fazem cada anno dois mil e qui-

    nhentos, e da que se vende solta mais de Ires mil alqueires.

    37. Outras raizes ha do mesmo gnero e feitio, mas de diversa quali-

    dade, que se chamam aipis, de quatro espcies, ass, branco, preto e pox:de todas se fazem poi' vrios modos agradveis guisados ; assadas teem

    o mesmo sabor que as castanhas de Portugal, e nas olhas se assemelham

    aos nabos. tradio entre os gentios, que todas as referidas raizes, aforma da sua cultura e do seu uso, lhes deixara aquelle varo cuja dou-trina no quizeram receber, e a quem fizeram ausentar de todo o Brazil,

    que foi o glorioso Apostolo S. Thom, como logo mostraremos.38. immensa no Brazil a produco do arroz, egual na bondade ao

    de Hespanha, ao de Itlia, e melhor que o da sia, e poder servir de

    po, como na ndia, se em o nosso clima se no accommodaram os corposmais farinha de mandioca, que melhor os nutre

    ;porm continuamente

    se usa d'elle por regalo, assim guisado em muitas viandas, como em ou-

    tros vrios compostos. Na provncia da Bahia os alqueires que se colhem,

    no teem numero ; so tantos nas dos Ilheos e do Porto Seguro, que sae

    para varias partes em sirios, como a farinha. Este gro tem circumstancia

    maravilhosa na do Par, porque, peneirados aquelles sertes, se experimen-

    tou que os seus naturaes o colhem sem o semearem, produzindo-o natural-

    mente a terra em dilatadssimos brejaes, com abundncia e sem cultura

    ;

    mas no s para a parte do norte se acha esta singularidade, porque pela

    do sul, muito alm de S. Paulo nas novas Minas do Cuyab, se viu o arroz

    produzido na mesma forma, e o gro maior que lodos os d'esle gnero.

    39. De outros gros e legumes produz a nossa America em quanti-

    dade trigo, f(!jo, milho, favas, algumas ervilhas do reino, ands, como

    ellas na forma c melhores no gosto, mangalls, mendobs, gergelim, gen-

    gibre, do qual se faz ulil conserva, e sorve de simples em vrios mixtos de

    doces e de guisados ; balatas, inhames, gerems, cars brancos, roxos e

    de outras cores e castas, mangais, mangaritos, lamataranas, remdio insi-

    gne para os enfermos de estillicidio e asma. Dos incultos d em abundncia

    pinhes, sapucaias, castanhas de caju, que estando maduras se comem as-

    sadas, e se confeilam como as amndoas, das quaes teem o gosto, e sup-

  • 14 AMERICA PORTUGUEZA

    prem a falta em varias espcies de doces, saborosos por extremo, e quando

    eslo verdes se cliaraam muturs, e d'elles se fazem excellenles guisados,

    e compostos regalados.

    40. Das hervas naturaes comestveis so principaes os quiabos, os gi-

    ls e os machixeres, as largas layobas, a peitoral manioba, que se guisa

    das folhas da mandioca, as cheirosas pimentas de muitas espcies e co-

    res, que servem ao gosto, ao olfato e vista. Das hortalias da Europa

    ha no Brazil alfaces, couves de varias castas, repolhos, nabos, rbos, ce-

    nouras, pepinos, espinafres, abboras d'agua, cebolas, alhos, cardos, bre-

    dos, mostarda, tomates e beldroegas ; das hervas cheirosas, hortel, segu-

    relha, poejo, coentro, funcho, salsa, mangerona, endro, raangerico, ale-

    crim, arruda e losna ; das medicinaes, canatistula, tamarindos, jalpa, salsa

    parrilha, filipodio, pau da China, malvas, tanchgem, sene, a que os natu-

    raes chamam tacumbur.41. As outras hervas naturaes so innumeraveis, e to activa a virtude

    de algumas, que se alcanaram a noticia e experincia d'ellas Diosco-

    rides e Plinio, seriam o maior emprego das suas pennas e observaes.

    O conhecimento dos seus eflfeitos nos occultaram sempre os gentios, tena-zes do segredo e avaros dos bens que lhes concedeu a natureza

    ;porm

    de alguns mais domsticos, e da experincia que a falta de outros rem-

    dios deu aos penetradores dos sertes, onde no havia boticas, nem me-

    dicinas, se veiu a conhecer a sua fora, e a exercer a sua pratica.

    42. As mais celebres so a sambambaia, que solda todas as quebra-

    duras; a capba, que desfaz todos os apostemas; a herva de leite, que

    alimpa de todas as belidas e nvoas aos olhos ; o mata-pasto, que tira as

    febres; a caroba, que tira as boubas; o ananaz, que expulsa a pedra ; o co-

    roat, que arroja as lombrigas; a btua, que conforta os estmagos, e ex-

    pelle as dores de cabea ; o mil-homens para mil enfermidades, e outras

    para varias queixas, ou tomadas em polagens, ou postas como remdios t-

    picos : ha tambm herva de rato para matar, e tanharon para attrahir

    ;

    outras libidinosas, que provocam a lascivia, das quaes mais conveniente

    occultar a noticia, e callar os nomes.

    43. Duas portentosas hervas ha, que merecem particular narrao

    :

    uma a que chamam sensvel, porque parece ter no s a natureza vege-tativa das plantas, mas tambm a sensitiva dos anmaes

    ;porque no pr-

    prio instante em que a tocam, murcha todas as suas folhas, e no as torna

    a abrir, at que se no ausenta a pessoa, que pondo-lhe a mo aofendeu,ou a violou ; tem em si mesma (como a vibora) a peonha e a triaga, nafolha o veneno, e o antdoto na raiz.

  • LIVRO PRIMEIRO 15

    44. A outra, com elTeito diverso, lambera nolavel ; o nome se ignora,e a virtude se viu na aldeia da Naluba, quarenta lguas distante da

    cidade da Bahia, e a no ser to autorisada e fidedigna a pessoa que como

    testemunha de vista o depoz, o no escrevramos. Achou a ura gentio jdomestico e christo fazendo cerlo instrumento de ferro, que pela elicacia

    de uma herva que lhe applicara, o fez to brando que o cortava como a

    qualquer fructa ; e oTerecendo prmios ao ndio, para que lhe mostrasse a fo-

    lha, os reputou em menos que o segredo, no lho querendo i-evelar ; e seria

    provvel que teria outra folha de contraria virtude para o solidar, pois na

    brandura em que eslava, lhe no servia para o instrumento que dispunha.

    45. As flores estrangeiras que ha n'esta regio em abundncia grande,

    so rosas de Alexandria e de Portugal, que do em todo o curso do

    anno, e de uma se faz j assucar rosado maravilhoso ; cravos de Arro-

    chella, mesclados, alrairantes e vermelhos;

    jasmins de Itlia e gallegosem copia excessiva ; mosqueias, tulipas, anglicas, aucenas, maravilhas,

    posto que adulteradas, macellas, girasoes, lirios, caracoes e esponjas, que

    chamara corona-christi ; suspiros, maiores que as perpetuas, porm seme-lhantes a ellas na igura, na folha e na durao ; a cor entre roxo e car-

    mesim, com umas midas respiraes brancas no diaraeti"o da sua breve cir-

    cumferencia ; trouxeram-se da ndia oriental, e no seu nome bera mostram

    serem de longe ; mogarins fragrantissiraos, claros como eslrellas, lambera

    da sia; rausarabis, que nascera s nos fins dos raraos que a sua arvore

    lana, formando pyramides compostas de flores tostadas, amarellas e bran-

    cas; so oriundas de Cabo Verde.

    46. Das naturaes ha muitas admirveis, sendo a primeira a do mara-

    cuj, raysterioso parlo da natureza, que das raesraas partes de que cora-

    pz a flor, lhe formou os instrumentos da sagrada paixo, fazendo-lhe nas

    folhas cumuladas ao p o calvrio, em outras peas a columna, os Irescravos, a coroa de espinhos, e pendentes era cinco braos, que cora egual

    proporo se abrera da colurana para a circuraferencia, as cinco chagas

    ;

    de cada Ires, com alleno, se forma a cruz, e no ramo em que se prende

    o p, se v a lana.

    47. Outra a melamorphose das flores, seno na substancia, nos acci-

    dentes, rosa maior que a de xVlexandria, que trajando na raanh de branco,se vae corando e dispondo ao raeio dia para vestir purpura de larde,

    nascendo neve, e acabando ncar ; produzida de uma arvore pequena de

    grande copa e folhas largas. Outras ha, que se chamara flores de S. Joo,

    por comearem um raez antes do seu dia, das quaes se matizara as suas

    capellas ; nascera de uraa arvore de mediana estatura e copa, cujos ramos

  • 16 AMERICA PORTUGUEZA

    rematam em tal profuso de gemadas flores, que parecem cachos de ouro

    em folhagens de esmeralda ; da prpria cor dourada outras rosas peque-

    nas, que parecem maravilhas, de innuraeraveis e crespas folhas.

    48. O vulgo immenso de boninas de muitas caslas, roxas e brancas,que dormem de dia e despertam noilc, com to melindroso ser, como d-bil suavidade. As flores da quaresma, por virem n'aquelle tempo, azues

    e em forma de pyramides, com as quaes se ornam os altares. Os jasminsmidos e vermelhos, mas em tal copia produzidos por entre as estreitas

    folhas das brandas varas em que nascem, que enredando-se por qualquer

    tronco ou edifcio, o fazem uma confuso verde, ou um encarnado laby-

    rintho. As aucenas, que imitam no tronco e na folha s de Europa, umas

    brancas com cheiro, outras sem fragrncia nacaradas ; os bredos namorados,

    de muitas castas, com folhas de varias cores. As flores da courana midas

    e suaves.

    49. Das fructas estrangeiras logra o Brazil pecegos, peros, marmelos, pe-

    ras, e aafro nas capitanias do sul ; porm em todas se do figos de duascastas, excellentes ambas, roms admirveis, perfeitas uvas moscatis de

    Jesus, ferraes e bastardos, cujas cepas e vides produzem duas e trs vezes

    no anno ; melancias selectas, regalados meles ; e em summo grau formo-

    sas e deleitveis todas as fructas, que se chamam de espinho, excedendos que d'este gnero ha em Europa. Mangas da sia em grande numero eperfeio, de que j se fazem preciosos doces.

    30. Das naturaes cultas ha infinitas, sendo primeira oananaz, que como

    a rei de todas a coroou a natureza com diadema das suas mesmas folhas,

    as quaes em circulo lhe cingem a cabea, e o rodeou de espinhos, que como

    archeiros o guardam. As outras so as fragrantes pitombas, como pe-

    quenas gemmas de ovos ; as pitangas d mesmo tamanho, mas golpeadas

    em gomos, umas roxas, outras vermelhas, todas frescas e refrigerantes dos

    calores da febre ; os maracujs cordealissimos de cinco espcies, mas deuma s qualidade, de cujo sueco se fazem dehciosos sorvetes, e da casca

    perfeitas conservas ; os aras, tambm de cinco caslas, dos quaes osperinhos e merins se do aos enfermos, e de todos se fazem prosados do-

    ces com o nome de marmeladas, to finas e selectas como as do reino, to-

    das mui brancas, e s as das goiabas carmesins, cr da sua massa.

    51. Ha cocos de outros tantos gneros, cuja agua suave e fresca; da

    frucla se fazem saborosos doces e mimosos guisados ; fructas do conde gran-

    des e deliciosas ; bananas de dois gneros que servem de regalo, e por

    muitos modos de mantimento, na falta da farinha, e assadas so melhores

    que as mas camoezas : pelo seu regalo, cheiro e formosura, se pde

  • LIVRO PRIMEIRO i7

    presumir foi o pomo com que a serpente tentou no paraso a nossos pri-meiros pes, podendo lambem o comprimento e largura das suas folhaspersuadir foram as de que elles se cobriram, das quaes podiam cortargrandes roupas.

    52. As fruclas silvestres so muitas, e entre ellas as de melhor sabor e

    mais nome as mangabas, que sasonadas excedera a muitas, e em conserva

    nenhuma as eguala, suaves no cheiro e agradveis vista, de uma partevermelhas, amarellas de outra ; os mocujs, como ellas na massa, no gostoe na forma, porm diferenles na cr, entre verde e pardo ; corta-se-lhes aarvore para se colherem ; os aretics-aps, os mames, os morics, os ca-

    jus, que teem outro fructo de diFerente qualidade na castanha, de que j fal-

    tmos, aquelles frescos, e estas quentes ; os cajs e os jenipapos, excel-lentesconforlativospara o estmago; d'estas duas ultimas se fazem tambmexcellentes doces, e os gentios tiram d'ellas os seus mais generosos vinhos.

    De outras agradveis, posto que de inferior estimao, se acham cobertas

    as brenhas e matos do Brazil, tendo n'esla multido muito logar a jaboti-

    caba e o umbu, o qual no serto suppre com a copia do sueco a falta da agua.

    53. Das plantas e arvores preciosas logra a nossa America o cravo

    ;

    nasce de uma arvore, em que se acham cravo, pimenta e canella : cravo

    na flor, pimenta no fructo, e canella na casca;porm estas Ires produces

    teem a mesma acrimonia, sabor e cheiro s do cravo da ndia, de que to-

    das tomam o nome. A canella em sua prpria espcie, que veiu da siaao Brazil por ordem real ha poucos annos, se colhe de uma arvore na al-

    tura grande, formosa na copa, estendida nos ramos, de folhas compridas

    ;

    d'ellas ha j no Brazil to grande numero, que abunda d'esta especiaria,

    a qual suppre dignamente de Ceylo por todos estes paizes, e se envia

    muita a Portugal.

    54. O cacau, cujo fructo no tem flor, arvore de mediana altura, deramos mui apartados do tronco ; nasce o pomo todas as luas, sendo mais

    perfeitos os do vero ; tem a forma de um pequeno melo, a cramarella,

    suave o cheiro, e dentro umas poucas pevides menores que as amndoas,

    mas do mesmo feitio, que so o que propriamente chamara cacau, e do o

    nome arvore e ao pomo ; a polpa d'este, desfeita em licor suave, serve

    de regalado vinho aos naluraes ; as amndoas ou pevides seccas ao sol

    a matei-ia principal do chocolate : produzem em terras hmidas e alaga-

    dias ; semeiam-se os gros frescos, porque seccos no nascem, e os tron-

    cos se vo dispondo em forma de bem ordenados pomares : o beneficio mais fcil aos que cultivara as arvores, que o resguardo dos fructos, sem-

    pre combatidos e peneirados dos pssaros.

  • 18 AMERICA PORTUGUEZA

    55. A baunilha nasce em umas delgadas varas, a que no idioma dos

    naturaes chamara cips, compridas, sempre verdes e cheias de apartados

    ns, com s duas folhas em cada um ; brotam umas bainhas do comprimento

    e grossura de paus de lacre ; estando sasonadas, ficam negras ; o miolo

    cheio de uns gros mui pequenos, com sueco que parece leo, e cheiro

    fragrantissimo, sendo o primeiro ingrediente do chocolate . O anil, pobrede tronco, de humilde folha mui mida, nasce pelas brenhas. Do algodo

    ha infinita copia, que se fabrica em muitos teares, dos quaes saem innu-

    meraveis peas de panno, que tem uso para varias cousas, e da mesma

    matria se fazem grossas, mas vistosas obras; porm nas redes para as

    serpentinas se apuram os seus fabricadores, lavrando-as com primorosas

    pinturas de muitas cores, agradavelmente matizadas. O uruc nasce dearvores pequenas, o fructo do tamanho e feitio de uma lima mais pyrami-

    dal, tem uns gros negros engastados em uma massa de escarlata, admi-

    rvel tinta nacarada, que se compra em Europa por muito preo. A tara-juba raiz de um incorruptvel tronco ; tiraram d'ella os Hollandezes gran-des interesses com a preciosa tinta amarella que faz, e do pau brazil

    Iodas as naes do norte para muitas de tantas cores, como as suas en-

    genhosas artes sabem fazer d'elle.

    56. O blsamo distillao fragrante de robustas arvores, que pormuitos espaos de distancia respiram suavidades ; so cinzentas, e teem a

    folha semelhante s do myrto, mui altas, copadas, e tantas, que formando

    densas matas d'este aroma, occupara successivas lguas de terreno,

    sendo em uns togares melhor o seu licor que em outros, e no seu gnero

    o mais perfeito do mundo;provocado de qualquer golpe, que pelas luas

    lhes do nos troncos, corre em tanta copia, que em nenhuma parte daPalestina se colhe em mais abundncia; fazem d'elle, com outros ingre-

    dientes, admirveis obras de contas, caixas e peas maravilhosas, to agra-

    dveis vista como ao olfato ; medicinal para muitas enfermidades, pro-

    digioso na cura das fendas, tem sympathia com o crebro e com o ventre,

    e muitas outras virtudes.

    57. Ha outro gnero d'estas arvores da mesma cor e grandeza, mas

    differentes na qualidade, e brotam dos troncos leo menos suave, mas tam-

    bm cheiroso, que chamam copahuba, egualmente proveitoso para muitosachaques, dores e feridas, preservando-as de espasmos, e curando-as mais

    brevemente que os unguentos da cirurgia, e para as pinturas tem o mesmoeffeito que o de linhaa. As bicubas so arvores tambm grandes, cujosfructos parecem nozes como as muscadas ; o seu miolo pisado distilla umleo finssimo, que se applica s dores e curas gallicas com maravilhoso

  • LIVRO PRIMEIRO 19

    eTeito. Ha outra casta de arvores de menos altura e ramos, que brotam

    perfeita almecega, gomma activa para emplastos nos peitos, partes rendidase carnes quebradas, com outras virtudes para remdios de muitos males.

    58. As madeiras pela formosura, pi'eo, grandeza e incorruplibilidade,

    so as melhores do mundo. Seja a primeira aquelle pau que deu o nome

    a esta opulenta regio, e concorreu para o seu commercio e grandeza desde

    o seu descobrimento, sendo appetecido e solicitado de tantas naes.

    Logo o jacarand, egual na estimao e luzimenlo ao bano, com a vanta-gem das ondas pardas, que o fazem mais vistoso. O sassafraz, que alm dolustre e suave cheiro, leni virtude para curar muitas enfermidades, causa

    porque se lavram d'elle muit