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19 CAPÍTULO 1 HISTÓRIA DA UROLOGIA Jayme de Souza Toledo Filho O fato de cálculos vesicais, renais e tumores escrotais terem sido encontrados em diversas mú- mias do antigo Egito, deixa claro que a cirurgia urológica não existia nesta época 15 . Alguns papiros relatam a hematúria, que sabemos, era causada pela Schistosoma haematobium. Hipócrates (469-399 a.C.), foi o primeiro filósofo a separar este ramo da filosofia. Em outras palavras, Hipócrates transforma a medicina em filosofia abstrata, sendo a medicina uma ciência baseada em observação e julgamento”. No “Corpus Hippocraticum”, observamos algumas contribuições ao conhecimento urológico, incluindo os seguintes fatos: – A urina é formada nos rins e flui para a bexiga através dos ureteres. – Hematúria é geralmente causada por doenças renais ou vesicais. – Estrangúria, disúria, e anúria são condições diferentes (figura 1). Figura 1- Hipócrates (460 a 370 a.C.)

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CAPÍTULO 1

HISTÓRIA DA UROLOGIAJayme de Souza Toledo Filho

O fato de cálculos vesicais, renais e tumores escrotais terem sido encontrados em diversas mú-mias do antigo Egito, deixa claro que a cirurgia urológica não existia nesta época15. Alguns papiros relatam a hematúria, que sabemos, era causada pela Schistosoma haematobium.

Hipócrates (469-399 a.C.), foi o primeiro � lósofo a separar este ramo da � loso� a. Em outras palavras, Hipócrates transforma a medicina em � loso� a abstrata, sendo a medicina uma ciência baseada em observação e julgamento”.

No “Corpus Hippocraticum”, observamos algumas contribuições ao conhecimento urológico, incluindo os seguintes fatos:

– A urina é formada nos rins e � ui para a bexiga através dos ureteres.

– Hematúria é geralmente causada por doenças renais ou vesicais.

– Estrangúria, disúria, e anúria são condições diferentes (� gura 1).

Figura 1- Hipócrates (460 a 370 a.C.)

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Estas condições podem ser causadas por ambos os rins, cálculos vesicais ou pelas “carúnculas”, termo esse que se referia às estenoses ureterais, bem como hiperplasia benigna da próstata, câncer de próstata e outras doenças que causavam obstrução do � uxo normal da urina. Além disto Hipócra-tes foi o fundador da uroscopia, que foi fundamental para o diagnóstico das patologias urinárias.(8)

O cálculo vesical mais antigo de que se tem conhecimento, foi obtido no cemitério pré-históri-co de El Amrab, Egito. Ele data de 4.800 a.C., e estava em um jovem de 16 anos.

Este cálculo � cou bem conhecido de todos os urologistas e publicado com fotogra� a na “His-toire de l’Urologie” editado em 1914.

Este cálculo foi presenteado ao Real Colégio de Cirurgiões em Londres pelo Prof. G. Elliott Smi-th, mas destruído por bombardeio aéreo em 1941.

Entre os “Hippocratiuns physicians” nos séculos IV e V a.C., os sintomas dos cálculos vesicais eram bem conhecidos e os especialistas deveriam ter experiência.

Hipócrates disse: Eu nunca trabalharei com cálculos, isto deverá ser tratado somente pelos especialistas. Nascia a Urologia.

No século I, Celsus escreveu sobre litotomia, e até a Idade Média esta cirurgia era conhecida como método Celsiano. Ele apregoava entretanto, que tal procedimento deveria ser realizado em crianças de idade entre nove e quatorze anos.

Apparatus Minor:

O “apparatus minor” ou procedimento simples, consistia em vários dias dedicados à dieta pré--operatória e algumas vezes em jejum. O paciente era submetido a um enema e orientado a andar e pular para que facilitasse a descida do cálculo para o colo vesical. A criança sentava no colo de uma pessoa bem forte. Em paciente adulto uma outra pessoa sentava sobre as suas pernas. O operador � cava sentado sobre o paciente (vítima) e inseria o dedo indicador da mão esquerda no ânus, lubri-� cado com óleo. Com a mão direita aplicava pressão na região suprapúbica empurrando a bexiga e forçando o cálculo com aperto pelo indicador da mão esquerda dentro do reto com o intuito de criar uma protuberância no períneo. Uma pequena incisão era aprofundada em direção ao trígono vesical e o cálculo era expulso através da pressão exercida pelo dedo indicador da mão esquerda presente no ânus do paciente. As vezes era necessário um gancho para deslocar o cálculo14. (� guras 2 e 3)

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Figura 2. Incisão perineal para cistolitotomia.

Figura 3. Anatomia cirúrgia da cistolitotomia.

Após o ato, curativo e água quente eram utilizados. Por causa da dor e hemorragia a cirurgia era realizada rapidamente. O maior risco desta cirurgia era lesar a artéria pudenda e causar uma lesão es� ncteriana. A mortalidade atingia cerca de 30% devido à infecção. Quanto mais espesso o períneo, pior era o resultado. O “apparatus minor” foi mantido até o século 16 e descrito por outros cirurgiões até a metade do século 18.

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Litotomia Suprapúbica:

O primeiro relato de litotomia suprapúbica, foi de Pierre Franco (1500-1561), nascido na Pro-vence, França. Humilhado pela família, ele tinha baixa escolaridade, e jovem tornou-se aprendiz de barbeiro cirurgião. Como ele era protestante, foi obrigado a fugir da França e praticar em Lausanne, na Suiça. Eventualmente ele retornava a Orange, na França. Foi pioneiro nas cirurgias de hérnias, cirurgias oftálmicas e cirurgia plástica17.

Em 1561, um ano antes de seu falecimento, efetuou uma cirurgia em uma criança de três anos de idade e como o cálculo era do tamanho de um ovo, ele não conseguiu retirar por via perine-al, razão pela qual fez uma incisão suprapúbica.

Posteriormente, o procedimento passou a ser realizado via extraperitoneal, sem os riscos de incontinência, impotência e fístulas, e estabelecido como rotina1.

Acesso transuretral para a bexiga, endoscopia e litotripsia:

Esta inovação cirúrgica surgiu no início do século 19. O excepcional signi� cado desta contri-buição não pode ser subestimado, e constitui importante fase da história do progresso médico. A história da endoscopia começou em 1805. Os outros endoscópicos eram utilizados em astronomia, telescopia e microscópios. Este era para ser introduzido em uma cavidade escura, tinham dois canais :um para a visão e o outro para a introdução da luz (vela). (� gura 4)

Figura 4 - Guillon’s uretroscópio. Paris 1833

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A forte relação entre endoscopia e urologia, contribuiu para a rápida expansão da urologia no diagnóstico de várias patologias.

Nova geração de endoscópios iluminados com lâmpadas elétricas de � lamento de platina in-candescente surgiu em agosto de 1885, por iniciativa de Dittel-Leiter, de Viena.

Figura 5 - Litotriptor por ondas de choque.

Em 1930 iniciou-se a cirurgia urológica endoscópica da próstata (RTU), e aceita pela comuni-dade urológica, com o advento da luz fria, realizando-se também a ressecção de pólipos vesicais, marco importante na história da endoscopia.

História do cateterismo vesical:

O cateterismo está reportado e acompanhado com juncos, palhas e folha de palmas ondula-das. A palavra cateter tem origem no grego, que quer dizer “colocar para dentro”. Os chineses uti-lizavam uma folha de cebola longa e oca. Quando devidamente preparada, eles a laqueavam e a transformavam em excelentes cateteres. O esvaziamento de uma bexiga dolorida era um problema comum e um ato de humanidade para com os anciãos.

Os sumérios, povo que antecedeu aos babilônicos e egípcios, usavam cateteres de ouro. Os in-dianos usavam cateteres laqueados e lubri� cados com manteiga clari� cada, que era muito utilizada

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na cozinha indiana, sem gorduras e impurezas. Os gregos práticos utilizavam cateter curvo (310 a.C.).

Em escavações em Pompeia, cateteres romanos de metal foram descobertos. Na época medie-val os cateteres eram de metal, e prata era o material de escolha.

O cateterismo com metal era extremamente difícil; somente em 1674, J.C.Petit, inventou o cateter com ponta curva para permitir melhor passagem na uretra posterior.

O domínio da vulcanização da borracha ocorreu em 1839, quando a GoodYear inventou tal processo. No Hôpital St. Louis, em Paris, August Nelaton usou a tecnologia da GoodYear para aplica-ção de cateter com orifício lateral, que é o cateter de Nelaton.

Os cateteres de Nelaton tinham uma pequena luz e não eram usados por longo tempo, porque eram friáveis. Os cateteres de borracha foram aperfeiçoados e patenteados para uso comercial por James Jacques, diretor de uma fábrica de borracha na Inglaterra11.

Em 1892, Malecot, residente de Felix Guyon, descreveu um cateter de � xação e demora. Nu-merosos médicos descreveram o mesmo cateter com pequenas modi� cações, porém prevaleceu o conhecido, até hoje, como cateter de Malecot.

Em 1907, Charles Russel Bard fundou a primeira fábrica de cateteres nos Estados Unidos. Na França, o fabricante J. Eynauld fundou a Porgés, e na Alemanha, Rusch. Todos vieram a ser os maio-res fabricantes mundiais de cateteres vesicais.

Em 1933 o cateter idealizado pelo Dr. F. E. B. Foley, de Minnesota, começou a ser industriali-zado e distribuído pela Bard. Como não se fazia prostatectomia, o cateter era denominado “Cateter da Vida”.

Em 1911, Morton sugere que pacientes com fratura de coluna necessitavam esvaziar a bexiga por instrumento asséptico. Em 1913, Eisberg escreveu um dos primeiros livros texto de neurocirur-gia, reconhecendo disfunção vesical após laminectomia. Ele preconizava o programa de cateterismo intermitente com os mais rígidos princípios de higiene.

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O nascimento da Urologia como especialidade:

Felix Guyon o pai da Urologia

Jean Casimir Felix Guyon foi o primeiro cirurgião do mundo a ter a carreira conhecida como o pai da Urologia; nasceu em 21 de julho de 1831, na ilha de Bourbon, na Bretanha. Seu pai era cirurgião de navios, e sua mãe, ceroula. Aos cinco anos a família se mudou para Nantes, na França. Ele iniciou seus estudos em Nantes e terminou em Paris. Em 1863, defendeu sua tese de residência intitulada Anomalias Uretrais.

Ele examinava, classi� cava e identi� cava sintomas clínicos. Em conjunto com Claude Bernard, introduziu os princípio � siológicos da medicina.

Em 1881 publicou “Leçons Cliniques de Maladies des Voies Urinaires” trabalho fundamental para a urologia moderna. Em 1886 publicou “Atlas de Maladies Urinaire”, uma maravilhosa referên-cia, editada com 159 ilustrações anatômicas de casos clínicos.

Dez anos após, fundou a “Association Française d’Urologie”, em 1907, e fundou a “Association Internationale d’Urologie” em 19085.

Foi Chefe de Clínica Urológica do Hôpital Necker, sendo seu sucessor Joaquim Albarran. Transformou o Hôpital Necker em um templo da urologia, sendo o primeiro departamento de urolo-gia do mundo. Enquanto estabelecia a fundação da moderna urologia, Felix Guyon seguia seus gran-des princípios: Trabalho – Pesquisa – Não há progresso sem pesquisa. A passagem de conhecimen-tos é essencial. A união com outros especialistas é primordial e deve ser compartilhada e discutida.

Anestesia: o nascimento da cirurgia e urologia.

O uso de anestesia para cirurgia é um dos grandes avanços da história humana. Antes da anes-tesia e dos antissépticos, a cirurgia era uma heroica demonstração de dores e horrores.

A introdução da anestesia foi com o óxido nitroso em 1841, éter em 1846 e clorofórmio em 1847, e a antissepsia idealizada por Pasteur e Liester em 1870.

Isto mudou totalmente a face cruel das cirurgias de membros e abdome. Em 1846, a novidade foi a cirurgia sem dor, com instrumento feito por Charriére para cirurgia inalatória com éter. Cloro-formio e éter foram utilizados em diferentes combinações, e em muitas delas, começavam a indução

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com clorofórmio e continuavam com éter12.

Após a Segunda Grande Guerra mundial, a tecnologia e a indústria farmacêutica avançaram com o uso de respiradores arti� ciais nas cirurgias torácicas, com o uso de tubo endotraqueal. Intu-bação, relaxante muscular e analgesia intravenosa com barbitúricos e mais recentemente propofol e benzodiazepínicos.

A nova anestesia à gás, com halotano e � uorane, contribuíram para a nova anestesia.

Para anestesia tópica e in� ltrativa, a cocaína foi de grande valia, muito utilizada em cirurgias oftálmicas inicialmente. A administração de cocaína em punção lombar, foi realizada pela primeira vez em 1898, porém efeitos colaterais de cefaleia e alto índice de mortalidade causada pela coca-ína e infecção levaram ao abandono de seu uso durante um longo tempo. Novos fármacos foram surgindo com menor toxicidade e bons resultados, como a novocaína, procaína e outros em 1920, e melhora na qualidade das agulhas13.

Imagem em Urologia:

Antes do advento do raio-X, o diagnóstico médico e urológico era muito complicado. Quando o paciente chegava ao médico com dor ou fratura, o exame físico e o bom senso da palpação eram os elementos investigatórios.

Após a descoberta do raio-X, em 1895, por Wilhelm Conrad Roentgen, professor e diretor do Instituto de Física de Wuernzburg, começou o uso hospitalar, porém com baixa potência, per-manecia di� culdades para avaliação abdominal. No início havia grande di� culdade para avaliar e distinguir cálculos urinários, linfonodos e � ebolitos. Com a ajuda da cistoscopia, era possível usar um cateter ureteral e efetuar uma radiogra� a de abdome. O primeiro relato independente foi de Louis Ernest Schmidt, em 1899. Outro destaque nesta área foi Geza von Illges, de Budapeste, que fez uma instilação de bismuto pelo cateter ureteral, o que tornava o cateter mais � exível e radiopaco16. (� gura 6)

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Figura 6 - Primordio da radiologia.

A primeira cistogra� a foi relatada em 1903, por Wittek, que preenchia a bexiga com ar e de-monstrava o cálculo vesical.

A técnica de Friedrich Voelker, em 1906, produziu o primeiro esboço completo da pelve renal. Ele utilizou solução a 2% de prata coloidal, porém havia com esta técnica di� culdade de introdução de contraste, e a toxicidade do agente utilizado.

Na Clinica Mayo, em 1915, injetava-se solução de nitrato de prata a 5%, porém este composto de prata era tóxico e causava necrose renal. O término do uso dos compostos de prata ocorreu em 1918, quando Cameron introduziu o iodeto de sódio para a pielogra� a retrógrada.

Em 1923, um grupo de pesquisadores da Clinica Mayo em Rochester, liderado por Earl D. Os-borne (Si� ologista e fundador da Academia Americana de Dermatologia e Si� liologia), descreve o uso intravenoso e oral de iodeto de sódio para visualizar o trato urinário. Foi o início da urogra� a excretora, espinha dorsal da urologia.

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Ultrassonogra� a:

A ultrassonogra� a é o segundo método mais utilizado para diagnóstico em urologia. A origem da ultrassonogra� a baseou-se na orientação dos morcegos que utilizam ondas sonoras para medir a distância.

No subaquático, o sistema foi utilizado pelos submarinos na I Guerra Mundial, e, em particular, após o afundamento do Titanic, em 1912.

Em 1940, H.Gohr , da Universidade de Colonia, Alemanha, efetua o primeiro relato médico da utilização de ultrassonogra� a na área médica.

Desde o início dos anos 70, as grandes universidades desenvolveram treinamento e pesquisa nesta área e foi extremamente produtivos. Mas somente no início dos anos 80 novos mecanismos de rotação e oscilação foram empregados e os transdutores eram melhores. A boa qualidade de imagem e resolução se iniciou em 1990, com sistema e monitores digitais. O sucesso do diagnóstico na ultrassonogra� a, depende do operador e informações fornecidas durante o exame.

Tomogra� a Computadorizada:

Também conhecida como CAT-scanning (Computed Axial Tomography). Foi idealizada em 1972 pelo engenheiro britânico Godfrey Houns� eld, tendo ganho em 1976 o Premio Nobel de Fi-siologia e Medicina. Hoje existem mais de 30.000 máquinas no mundo. Nestes 25 anos de história da tomogra� a computadorizada, ela melhorou em muito as imagens, velocidade e conforto para os pacientes.

Ressonância Nuclear Magnética:

‘As primeiras pesquisas datam de 2003 pelos ganhadores do Prêmio Nobel de Fisiologia e Me-dicina Paul C. Lauterburg e Sir Peter Manos� eld, da Inglaterra. A ressonância nuclear magnética é hoje um método de rotina e mais de 60 milhões de trabalhos são relatados por ano. É superior aos outros métodos de imagem e substitui vários métodos invasivos, reduzindo o risco e desconforto dos pacientes.

Hiperplasia Benigna da Próstata:

A palavra “próstata” vem do Grego e signi� ca próximo (à bexiga). Herophilus, anatomista de

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Alexandria, foi o primeiro a descrever a existência da glândula.

Como a função da próstata era desconhecida, a ênfase da retenção urinária no império roma-no, era atribuída a cálculos9. Mais tarde, estudos de Galeno, atribuíram o conceito de hiperplasia com referência a carúnculas e carnosidades, como causa de retenção. Em 1649, Jean Rolam fez a primeira de� nição da relação entre hiperplasia prostática causando obstrução do colo vesical, por tumor da glândula prostática10.

Prostatectomia perineal:

O início desta cirurgia de rotina, foi em 1885, com Sir William Fergusson. Ele recomendava que os cirurgiões realizassem a prostatectomia em pacientes que tinham sintomas de obstrução uriná-ria. A desvantagem desta técnica era o sangramento e o acesso via perineal limitado.

Prostatectomia suprapúbica:

Somente em 1880, Leopold Ritter von Dittel se comprometeu a realizar a primeira prostatec-tomia suprapúbica. Ela era realizada em duas etapas: a primeira consistia na enucleação da próstata e em seguida hemostasia compressiva com compressas e cistostomia. Alguns dias mais tarde (em média 15 a 20 dias), a retirada das compressas eram realizadas e realizado o fechamento da cistosto-mia. Uma variante desta técnica foi descrita por Harris Hryntschack, que consistia na sutura trigonal e cavidade prostática.

Prostatectomia retropúbica:

Dutch, em 1908, foi o primeiro a realizar a técnica retropúbica, mas cirurgiões da época prefe-riam a técnica transvesical, buscando menor infecção. Em 1940, com o advento das sulfas, o irlandês Terence Millin idealizou a cirurgia retropúbica contendo sete estágios. Este procedimento trouxe uma série de vantagens para os pacientes, mantendo a bexiga intacta e e� ciente fechamento da cápsula prostática com maior conforto e menor período de convalescença12.

Ressecção endoscópica da próstata (RTU):

Os ressectoscópios iniciais eram de� cientes em coagulação, razão pela qual o sangramento era abundante. A persistência de T. M. Davis de Greenville, experiente em eletricidade, desenvolveu um sistema utilizando dupla corrente: uma para corte e outra para coagulação, e aumentou o tamanho

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da alça, permitindo ressecar fragmentos maiores de tecidos. Este excelente resultado fez reviver a RTUp. Inspirado em Davis, Joseph F. McCarthy aperfeiçoou o ressectoscópio em 1932, sendo seu sistema utilizado até hoje, e a ressecção endoscópica passou a ser o método dominante para trata-mento da hiperplasia prostática14.

O avanço neste sistema endoscópico foi realizado na década de 70 por Harold Hopkins, da In-glaterra. Ele inventou a � bra óptica � exível e o novo sistema de lentes que é utilizado até hoje como “padrão ouro”.

Procedimentos de invasão mínima para tratamento da hiperplasia prostática:

Criocirurgia:

Técnica desenvolvida por Gonder e Soares na metade dos anos 60. O congelamento da próstata era realizado por via uretral. O líquido usado era o nitrogênio líquido liberado por sonda. O procedimento pode ser realizado com anestesia regional ou sedação. A eliminação dos tecidos ne-cróticos através do cateter ou pela eliminação expontânea. Hoje novos aparelhos estão em voga, ba-seando-se no mesmos princípios, porém com auxílio de computadores e ultrassonogra� a transretal.

Hipertermia por microondas:

A moderna hipertermia, consiste em atingir a região prostática com uma temperatura de 41 a 45 graus Celsius, ocasionando danos ao tecido prostático e necrose tecidual.

Mola prostática:

A mola ou “stent” prostático, foi inicialmente descrito por Fabian em 1980, como alternativa para pacientes sem condições cirúrgicas. Vários tipos foram desenvolvidos: intrauretral e intrapros-tático, geralmente confeccionados de titânio. Os resultados não alcançaram as expectativas e inú-meras complicações � zeram com que caísse em desuso.

Litíase urinária: da cirurgia à litotripsia extra-corpórea

Nas ultimas quatro décadas, grandes mudanças ocorreram no tratamento da litíase urinária. Inovações revolucionaram as opções e escolhas de tratamento, trocando as cirurgias maiores com signi� cante morbidade por cirurgias minimamente invasivas, ou procedimentos não cirúrgicos.

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Cirurgia do cálculo renal:

O primeiros relato de cirurgia para cálculo renal, provavelmente incidental, foi a incisão, em 1635, de abcesso em � anco de Mr. Hobson, Consul Britânico em Veneza, pelo físico italiano Dome-nicus de Marchetti, quando pela incisão vários cálculos renais foram eliminados e desenvolveu uma � stulo para o resto da vida13.

Inicialmente, a cirurgia renal era restrita à nefrectomia. A primeira foi realizada em 1869 por Gustav Simon de Heidelberg, Alemanha, em um paciente com persistente fístula ureterocutânea.

Ingalls, em 1872, realizou a primeira nefrectomia por cálculos, e Heineken, em 1879, a primei-ra pielolitotomia para cálculos.

A terapia microbiana começou com as sulfonamidas em 1933 e a penicilina em 1940, o que era insu� ciente para debelar as infecções no pós-operatório. O índice de mortalidade por nefrecto-mia nesta época variava de trinta a cinquenta porcento. A cirurgia renal para grandes e recorrentes cálculos, constituiu a maior parte da prática urológica até o início dos anos oitenta, quando novas tecnologias revolucionaram o tratamento dos cálculos.

Litotripsia percutânea:

Simon, em 1869, realizou a primeira nefrostomia para hidronefrose, e mais tarde a pielogra� a anterógrada por Wickbom em 1954.

Vinte anos após, J. Fernstrom usou técnica de dilatação percutânea que permitia a extração de cálculos por cestas ou por pinças

A ideia tomou pulso quando Peter Alken da Alemanha e Michael Marberg da Áustria, desen-volveram não só a rotina de dilatação via percutânea, mas o nefroscópio percutâneo. O ultrassom foi utilizado para quebrar os fragmentos e retirar os fragmentos através da camisa. A retirada de cálcu-los ureterais teve seu avanço com a utilização de extratores por Enrico Dormia, em 1936. Estes ex-tratores tornaram-se muito populares na Europa, porém com grande incidência de lesões ureterais.

Victor Marschall efetuou os primeiros relatos com ureteroscópicos � exíveis em 1966. Busch, em 1966, criou o primeiro uretroscópio ACMI 7 F. A melhora destes aparelhos se deram com o novo sistema de lentes desenvolvido por H. Hopkins em Londres.

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Litotripsia Extracorpórea:

Novo método de destruição de cálculos com explosão de energia. Em 1970, no laboratório da Dornier, em Munique, Chaussy, Eisenberger e Fossman iniciaram pesquisa de destruição de cálculos por ondas de choque diretas dentro da água. Em 1977 eles publicaram seus achados de demolição de cálculos. Três anos mais tarde, a primeira aparelhagem foi produzida pela Dornier HMI. Este equi-pamento sofreu várias modi� cações e é utilizado até a atualidade6. (� gura 7)

Figura 7. Princípios da extracorpórea.

Laser:

Light Ampli� cation by Stimulated Emisson of Radiation (LASER), foi postulado por Albert Eins-tein, em 1917. Demorou mais de meio século para que fosse utilizado na medicina. Em 1968, expe-rimentos de W. P. Mulvaney, dos Estados Unidos, mostraram que a fusão e evaporação de cálculos urinários com o laser de CO2 e laser de rubi atingiam altas temperaturas (mais de 1.000 graus Celsius) e lesão tecidual. Os cientistas H. D. Fair e I. Fensel utilizaram posteriormente o Nd:YAG. O laser pul-sado, desenvolvido em 1983 por G. M. Watson e J. E. A. Wickhan dos Estados Unidos, fragmentavam os cálculos de forma segura e sem lesão tecidual, ocasionando menos de 2% de estenose ureteral.

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Cinco anos mais tarde, Wickhan e J. Segura, tornam possível a destruição dos cálculos através dos ureteroscópicos. Vários tratamentos no campo urológico tem mudado drasticamente o aporte da litíase urinária: nefrolitotomia, ureterolitotomia, e reoperações , estão fadadas a não serem vistas pelos novos urologistas.

Câncer de Próstata:

As alterações obstrutivas prostáticas eram incluídas no rol da hiperplasia. Dois casos de câncer de próstata foram descritos por Benjamim Brodie em 1832.

Em 1891, lesões osteoblásticas metastáticas típicas em osso, foram descritas por Von Recklin-ghausen em cinco pacientes. Diagnóstico: Inicialmente, somente o exame clínico era o meio diag-nóstico. Mais tarde, a biópsia perineal foi introduzida para os casos suspeitos. O marco milenário para o diagnóstico do câncer de próstata foi a utilização das agulhas de Silverman, e a biópsia guiada por ultrassonogra� a transretal hoje. Os graus histológicos no tecido maligno são expressos pela es-cala de Gleason.

Os marcadores sanguíneos iniciais foram as fosfatases ácida e alcalina, mas o primeiro real marcador foi o antígeno prostático especí� co (PSA), descoberto por Richard Ablin e colaboradores nos Estados Unidos, com a publicação de trabalhos em 1970.

O antígeno prostático especí� co foi medido no sangue quantitativamente por Papsidero, em 1980, foi quando Stamey passou a utilizar nos trabalhos iniciais como o marcador mais importante. Hoje, grande potencial é observado no teste de gene de câncer prostático 3 (PCA3), mais especí� co para o câncer de próstata e não in� uenciado pelo volume prostático associado com hiperplasia be-nigna e prostatite.

Tratamento cirúrgico:

O primeiro relato cirúrgico de prostatectomia perineal foi em 1867 por Theodor Billroth, e o paciente veio a falecer 14 meses após.

Antes de 1980 a anatomia da próstata era pobremente conhecida. As técnicas não eram pa-dronizadas, o índice de sangramento, incontinência e impotência eram muito altos

Em 1974, Reiner e Walsh descreveram a anatomia do plexo venoso dorsal e seu controle cirúr-gico. Em 1982, Walsh e Donker, descreveram a localização anatômica do plexo pélvico e a inervação

Page 16: HISTÓRIA DA UROLOGIA · Foi Chefe de Clínica Urológica do Hôpital Necker, sendo seu sucessor Joaquim Albarran. Transformou o Hôpital Necker em um templo da urologia, sendo o

HISTÓRIA DA UROLOGIA

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dos corpos cavernosos, Esta pioneira observação de Patrick Walsh e sua descrição, foi a base anatô-mica para a prostatectomia radical17.

Em 1998, Hollabaugh e colaboradores, descreveram de maneira elegante a inervação do es-fíncter externo, ramos da hipogástrica inferior e o ramo intrapélvico do nervo pudendo.

Com recente incorporação das técnicas laparoscópicas e robóticas, tornou-se mais rápido a recuperação, quando comparada ao acesso retropúbico.

Referências

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