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Histórico de ocupação e diagnóstico ambiental do Município de Pontal do Paraná: subsídios para o planejamento ambiental Guaita, G. R.; Ferreira, L. B.; Tiepolo, L. M. Universidade Federal do Paraná, Setor Litoral Rua Jaguariaíva, 512 CEP 83.260-000 Caiobá PR, e-mail: [email protected] RESUMO Pontal do Paraná está localizado no litoral paranaense, emancipado do município de Paranaguá em 1996, abrange uma área de 201 km 2 . A partir da década de 1970, com a construção da rodovia PR 412 intensificou-se o processo de ocupação dos atuais limites territoriais de Pontal. A ocupação humana se deu de maneira desordenada não respeitando os limites ambientais. Estes aumentam em proporção à medida que não há planejamento urbano e ambiental agravando os problemas estruturais e ambientais no município. Uma das principais problemáticas locais é o grande fluxo sazonal de população que nos meses de veraneio cresce exponencialmente. O presente trabalho está dividido em duas etapas que objetivam subsidiar o planejamento ambiental de Pontal do Paraná: a primeira propõe-se a realizar o levantamento histórico do povoamento da área em estudo; e a segunda é um diagnóstico territorial. Palavras-chave: Zoneamento ambiental, Pontal do Paraná, impactos ambientais, ocupação histórica. RESUMEN: Histórico de la ocupación y diagnóstico ambiental del municipio de Pontal do Paraná: subsídios para el planeamiento ambiental Pontal do Paraná está ubicado en el litoral paranaense, emancipado del municipio de Paranaguá en 1996, abarca un área de 201 km 2 . A partir de la década de 1970, con la construcción de la carretera PR 412 se intensificó el proceso de ocupación de los actuales límites territoriales de Pontal. La ocupación humana se dio de una manera

Histórico de ocupação e diagnóstico ambiental do Município ... · que Pontal do Paraná foi o que apresentou a ocupação mais tardia. ... acordava de vez em quando e via, à

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Histórico de ocupação e diagnóstico ambiental do Município de Pontal do Paraná: subsídios para o planejamento ambiental

Guaita, G. R.; Ferreira, L. B.; Tiepolo, L. M.

Universidade Federal do Paraná, Setor Litoral

Rua Jaguariaíva, 512 CEP 83.260-000 Caiobá PR, e-mail: [email protected]

RESUMO

Pontal do Paraná está localizado no litoral paranaense, emancipado do município de

Paranaguá em 1996, abrange uma área de 201 km2. A partir da década de 1970, com a

construção da rodovia PR 412 intensificou-se o processo de ocupação dos atuais

limites territoriais de Pontal. A ocupação humana se deu de maneira desordenada não

respeitando os limites ambientais. Estes aumentam em proporção à medida que não há

planejamento urbano e ambiental agravando os problemas estruturais e ambientais no

município. Uma das principais problemáticas locais é o grande fluxo sazonal de

população que nos meses de veraneio cresce exponencialmente. O presente trabalho

está dividido em duas etapas que objetivam subsidiar o planejamento ambiental de

Pontal do Paraná: a primeira propõe-se a realizar o levantamento histórico do

povoamento da área em estudo; e a segunda é um diagnóstico territorial.

Palavras-chave: Zoneamento ambiental, Pontal do Paraná, impactos ambientais,

ocupação histórica.

RESUMEN: Histórico de la ocupación y diagnóstico ambiental del municipio de Pontal

do Paraná: subsídios para el planeamiento ambiental

Pontal do Paraná está ubicado en el litoral paranaense, emancipado del municipio de

Paranaguá en 1996, abarca un área de 201 km2. A partir de la década de 1970, con la

construcción de la carretera PR 412 se intensificó el proceso de ocupación de los

actuales límites territoriales de Pontal. La ocupación humana se dio de una manera

desordenada no respetando los limites ambientales. Estos aumentan en proporción a la

medida que no hay planeamiento urbano y ambiental agravando los problemas

estructurales y ambientales en el municipio. Una de las principales problemáticas

locales es el gran flujo estacional de la población que en los meses de verano crece

exponencialmente. El presente trabajo está dividido en dos etapas que objetivan

subsidiar el planeamiento ambiental de Pontal do Paraná: La primera se propone a

realizar el levantamiento histórico del poblamiento de la área en estudio; y la segunda

es un diagnóstico territorial.

Palabras-llave: Zonificación ambiental, Pontal do Paraná, impactos ambientales,

ocupación histórica.

INTRODUÇÃO

Em tempos históricos o acesso ao litoral do Paraná era realizado através de

caminhos coloniais (por exemplo, o Caminho Colonial do Itupava e o Caminho Colonial

da Graciosa). Já no período do Império se deu a construção de duas importantes vias

de acesso ao litoral: a estrada da Graciosa, em 1873, e, alguns anos depois, a

construção da ferrovia Curitiba-Paranaguá, em 1885. No início do século XX com a

conclusão do trecho Curitiba-Paranaguá da principal via de transporte ao litoral do

Paraná, a rodovia BR-277, é determinado a malha viária de toda a região e

conseqüentemente orienta o processo de ocupação territorial. No caso de Pontal do

Paraná esta se intensificou recentemente com a construção do trecho que liga Praia de

Leste a Pontal do Sul da rodovia PR-412, entre os anos de 1977 e 1978. Esta rodovia,

por seu desenho, definiu a linearidade da estrutura organizacional do município. Desta

forma houve a concentração, ao longo da rodovia de grande parte dos serviços e, ao

mesmo tempo, a descentralização dos aglomerados populacionais bem como

estruturas públicas.

Entre os sete municípios litorâneos do estado do Paraná há fortes indicativos de

que Pontal do Paraná foi o que apresentou a ocupação mais tardia. De acordo com

FERNANDES (1947) a qualidade da água local foi o fator determinante relativo à

ocupação humana, isso porque as nascentes encontram-se distantes, na Serra da

Prata.

No início da década de 1980, houve a implantação de um pólo industrial no

balneário Pontal do Sul, utilizado por empresas construtoras de plataformas para

exploração petrolífera. Este fato atraiu muitas pessoas em busca de emprego, porém,

logo na conclusão dos trabalhos houve a dispensa dos funcionários, muitos dos quais

permanecendo no município em busca de novas oportunidades de trabalho

(FUNPAR,1999).

Ainda na década de 1980, iniciou-se o desejo separatista em prol da

emancipação de Pontal do Paraná, liderados por autoridades políticas. Nos anos 90, o

movimento ganhou corpo, e líderes locais, políticos e moradores dos balneários então

localizados no município de Paranaguá, insatisfeitos com as condições precárias em

que se encontravam os sistemas de educação e saúde, bem como o descuido com as

vias públicas, intensificaram a busca pela emancipação, uma vez que 51% da

arrecadação de Paranaguá, era proveniente da área que almejava ser emancipada.

Além dos royalties que seriam pagos pela exploração petrolífera. Neste contexto, foi

autorizado pelo Supremo Tribunal Federal, a realização, em dezembro de 1995, do

plebiscito que viria a oficializar a emancipação Pontalense em 20 de dezembro de 1995

através da Lei Estadual No 11.252.

MATERIAL E MÉTODOS

Área de estudo

O presente estudo foi realizado no município de Pontal do Paraná, localizado no

litoral do estado do Paraná e ocupando uma área territorial de 201 km2, apresentando

adensamento populacional recente, atualmente composto por 16.625 mil habitantes

(IBGE, 2007).

A região está inserida na planície costeira com cordões litorâneos (strand plain) e

sedimentos estuarinos (ANGULO, 1992). Quanto à geologia da área, no começo do

Quaternário recente, os sedimentos marinhos começaram a ser recobertos por

processos terrestres, como a formação de entulhos de decomposição (serrapilheira) e a

conseqüente formação dos solos oriundos desta decomposição, dos depósitos de

sedimentos fluviais e da lixiviação pelas águas da chuva (MAACK, 1995). O principal

sistema de drenagem regional é o rio Guaraguaçu, cujas nascentes localizam-se na

Serra da Prata.

Considerando aspectos naturais, Pontal do Paraná faz parte do grande domínio

da Floresta Atlântica costeira, com predomínio de formações florestais (Floresta

Ombrófila Densa de Terras Baixas), restingas (Formações Pioneiras de Influência

Marinha), vegetação de dunas e manguezais (Formações Pioneiras de Influência

Flúvio-marinha).

Metodologia

Para a obtenção de informações históricas foram realizadas pesquisas em

museus e bibliotecas, entre os quais: Biblioteca do Centro de Estudos do Mar e do

Setor Litoral da Universidade Federal do Paraná; Biblioteca do Instituto Histórico e

Geográfico de Paranaguá; Biblioteca Pública do Paraná; Biblioteca do Museu

Paranaense; Secretária de Meio Ambiente do Estado do Paraná. De maneira

complementar foram feitas visitas a Prefeitura Municipal de Pontal do Paraná em busca

de documentos. Uma conversa com o Dr. Arthur Barthelmess, professor aposentado da

Universidade Federal do Paraná, foi realizada para subsidiar o entendimento sobre o

processo de ocupação da região, por se tratar de um profundo conhecedor da história

regional local e seu processo de desenvolvimento.

Para a realização do diagnóstico ambiental do município, foram feitas visitas in

loco nas diferentes unidades de paisagem do município com a intenção de realizar a

caracterização ambiental, levantamento fotográfico, o mapeamento dos problemas

ambientais com seus respectivos pontos georeferenciados. Para tanto o município foi

subdividido em sete unidades ambientais: praia; restinga; mangue; área urbana;

planície de floresta ombrófila densa de terras baixas; rio Guaraguaçu e entorno; e área

rural (colônia Pereira).

RESULTADOS

Histórico de ocupação

Na busca de dados da recente história de Pontal do Paraná é possível encontrar

autores que descrevem o local cada qual à sua maneira, resultando variações quanto

aos topônimos utilizados para uma mesma região como: Barra do Sul, Pontal de

Paranaguá ou somente “O Pontal”.

Analisando o processo de ocupação na área que atualmente corresponde ao

município de Pontal do Paraná, verificamos que em 1765, no dia 5 de dezembro por

ordem direta do governador da capitania de São Paulo, através da publicação nos

púlpitos das Igrejas, ofereceu-se terras pra plantio a 500 casais que participariam da

fundação da nova Vila. Sendo a ocupação repentina uma estratégia de proteção do

território.

Após esta publicação vieram casais que receberam “duzentas braças de testada”

pela praia, preenchendo assim toda a linha da costa de Caiobá até O Pontal,

(BARTHELMESS, 2000). Em virtude da baixa adesão a homologação das escrituras,

pouco se sabe do desenrolar da história destes posseiros na região do atual Pontal do

Paraná.

No século seguinte, no ano de 1820, o naturalista francês Auguste de Saint-

Hilaire em sua viagem entre Paranaguá e Guaratuba teve uma breve passagem pela

localidade que hoje conhecemos como Pontal do Paraná, relatando-a da seguinte

forma: “Depois de deixarmos o rio Paranaguá, entramos num canal que segue mais ou menos na direção do sul da baía e é limitado de um lado pela terra firme e do outro por uma série de ilhas. Em breve perdemos de vista a vila. Ao longo avistávamos a serra coroada de nuvens, que passavam rápidas, ora deixando à mostra os picos, ora ocultando-os. Nossas pirogas avançavam velozmente, deixamos para trás a parte montanhosa da Ilha de Cotinga e fomos costeando a sua extremidade mais próxima do oceano, onde as terras são baixas e cobertas de mangues. Após essa ilha vem a Ilha Rasa, plana, como o seu nome indica. A Ilha do Mel, que vem em seguida, avança até a entrada da baía. É na extremidade dessa ilha que foi construído o forte que defende a barra. À medida que avançávamos, o canal da navegação se alarga. Assim como a Ilha Rasa e a Ilha do Mel, a terra firme é contornada por mangues, mas se vêem nela, de vez em quando, quase à beira da água, pequenos sítios cobertos de telhas, diante dos quais se acham várias pirogas. A ponta da terra sobre a qual já dissemos algumas palavras, que é chamada de Pontal de Paranaguá foi o lugar onde desembarquei. Fui recebido por um cabo de

milícia que comandava um destacamento acantonado nas imediações. Esse homem recebera ordem de cuidar para que chegassem a tempo as carroças que iriam levar a mim e ao meu pessoal a Caiobá. Minha bagagem chegou na hora. As carroças pertenciam a alguns proprietários das vizinhanças, eram grandes e puxadas por quatro bois e cobertas por um trançado feito de varas de bambu sobre o qual haviam sido colocadas algumas folhas de bananeiras amarradas com cipó. Não havia no Pontal nem casas, nem vegetação; nada mais existia ali a não ser areia pura. Apenas desembarcamos acendemos um fogo para cozinhar o feijão e o arroz que juntamente com água e farinha iriam constituir o nosso jantar. Carregaram a bagagem, e quando partimos o sol já se havia posto fazia muito tempo. É hábito percorrer esta praia à noite, beirando o mar, porque os bois andam ainda muito mais depressa no escuro do que à claridade do dia. Instalei-me com Laurotte em um dos carros de boi, José e Firmino subiram num outro e Manuel acomodou-se no terceiro. Laurotte pusera uma esteira no chão e estenderá sobre ela um cobertor e o meu poncho. Deitei-me, e em breve o marullho das ondas me fez adormecer, mas acordava de vez em quando e via, à luz do luar, que seguíamos por uma praia de areia pura, com as ondas vindo lamber de vez em quando as rodas dos carros.” (SAINT-HILARE, 1995 p. 167-168).

Até meados do século XX, este percurso realizado pelo naturalista francês, era a

melhor alternativa para percorrer a rota Paranaguá – Guaratuba. Segundo

FERNANDES (1947), anteriormente a viagem era feita em sua totalidade pelo mar, em

embarcações à vela. Porém, em virtude de constantes tempestades que impediam o

translado, procurou-se um caminho por terra, já descrito acima no relato do naturalista

Saint-Hilaire.

O trajeto de Paranaguá até Guaratuba tinha duração mínima de dez horas e

freqüentemente era interrompido devido à maré alta que bloqueava a passagem dos

carros de boi. Com isso, a viagem poderia perdurar por mais um ou dois dias. A

existência de algumas casas ao longo do caminho facilitava o pouso dos viajantes, que

dos moradores recebiam agasalhos, além de oferecerem local para a carga ser

abrigada em barracões armados (FERNANDES, 1947).

O aumento da transição de pessoas através da rota terrestre, denominada por

FERNANDES (1947) de “estrada natural”, favoreceu a formação de povoados ao longo

da Praia de Leste (considerada desde Pontal do Sul à Caiobá), dentre eles Pontal,

Matinhos e Caiobá. Nos pontos extremos da rota (Pontal e Caiobá) houve a

necessidade da construção (adaptação) de casas de pescadores, contando com boas

canoas destinadas ao transporte de viajantes e suas respectivas cargas. Nessa época,

já se verificavam canoas com capacidade de transporte de uma tonelada (FERNANDES

1947).

A partir dos dados de recenseamento realizado no ano de 1849, no distrito de

Paranaguá, é possível localizar registros de habitações em três localidades que formam

hoje o município de Pontal. Os Quarteirões 17, 18 e 19; Rio do Guaraguaçu; Rio dos

Maçiéis; Barra do Sul e Pirequê, respectivamente. Sendo a primeira localidade, atual

divisa entre Pontal do Paraná e Paranaguá. De acordo com estes registros não é

possível considerar na íntegra as 86 casas habitadas, 104 fogos1 e 443 almas² como

pertencentes ao que atualmente é Pontal. Já o Rio dos Maçiéis com 46 casas

habitadas, 52 fogos, 253 almas e Barra do Sul/Pirequê com 47 casas habitadas, 55

fogos e 187 almas, correspondem aos limites do município.

Em 1916, novamente o trajeto Paranaguá - Guaratuba tem a rota modificada, e

classificada pelo naturalista por Saint-Hilaire como “maneira incômoda de viajar”. O

percurso agora teria apenas um trecho via mar, realizado pelo interior da baía de

Guaratuba. Nesta época a estrada carroçável das colônias foi melhorada (atual rodovia

Alexandra–Matinhos, PR 508), e o caminho estendido até Porto Parati e,

posteriormente, até Porto Barreiro, onde passaria a ser feita a travessia à Guaratuba

(FERNANDES, 1947). Com estas modificações não haveria mais a necessidade de

passar pela estrada natural, apagando o atual Pontal do trajeto Paranaguá–Guaratuba.

Tal percurso não foi definitivo, a maior dificuldade da viagem chamava-se o morro do “ai

Jesus”, uma rampa com alto nível de inclinação, na estrada da Serra da Prata.

No ano de 1926 é aberta a Estrada do Mar (PR 412), que como o próprio nome

diz, liga as demais regiões do litoral à orla Atlântica, dando início, a atividade

econômica predominante dos municípios costeiros do litoral paranaense, o turismo.

Como relata Loureiro Fernandes, “a estrada tornou-se um agente civilizador da região

favorecendo o trânsito de veículos automotivos”. Sendo a viagem até Guaratuba mais

freqüente, acontece o incremento das atividades de pesca e posteriormente o

desenvolvimento de vilas como Caiobá e Matinhos.

Com o crescimento destas vilas balneárias, tentou-se a fundação de mais duas:

a vila Balneária e o Pontal. Porém, em razão de estarem situadas longe da Serra, ao

contrário de Caiobá e Matinhos, não dispunham de água potável. Sendo assim, a

1 Fogos: Entenda – as por moradias, não necessariamente habitadas. 2 Almas: Habitantes.

presença humana em termos turísticos na região de Pontal do Paraná, limitou-se a

escassos banhistas (FERNANDES, 1947).

Com base em levantamentos aerofotográficos realizados nos anos de 1952,

1960, 1980 e 1997, podemos acompanhar a evolução da ocupação urbana no

município de Pontal do Paraná (FUNPAR, 1999) (Tabela 1).

Tabela 1: Evolução da ocupação urbana (%) em Pontal do Paraná.

(FUNPAR, 1999).

Ano Praia de Leste Ipanema/Grajaú Shangri-lá/Atami Pontal do Sul

1952 5 0 0 5

1960 20 30 3 5

1980 50 50 20 30

1997 90 80 50 55

De acordo com dados do Censo Demográfico do IBGE (1991), na região

balneária de Paranaguá, em 90% dos imóveis o abastecimento de água era feito

através de poços e canalização interna, as demais residências não possuíam

canalização interna de água. Somente em meados da década de 90, a Companhia de

Saneamento do Paraná (SANEPAR) disponibiliza o serviço de água tratada a parte do

município, atendendo cerca de 52,1% dos imóveis urbanos (FUNPAR, 1999).

Este fato contribuiu para a realidade atual de dois dos sete municípios do litoral

do Paraná. O município vizinho de Matinhos iniciou o processo de urbanização décadas

antes de Pontal do Paraná, e em pouco tempo já exercia ampla pressão ao ambiente

natural. Em Pontal do Paraná, ainda é possível encontrar locais com baixa densidade

de edificações, porém o crescimento é rápido e realizado praticamente sem

planejamento.

Um agravante é a ausência no município de Unidades de Conservação,

especialmente de proteção integral, uma vez que estas podem limitar o avanço urbano

sobre a planície litorânea do município e suas formações vegetacionais.

Pontal do Paraná caracteriza-se como um município linear, não existindo um

núcleo definido. Podemos apontar os balneários de Praia de Leste, sede da Prefeitura

Municipal, Ipanema e Shangri-lá com as maiores redes de serviços. Pontal do Sul,

onde encontra-se a Câmara Municipal, o Centro de Estudos do Mar da Universidade

Federal do Paraná e o posto industrial da Ponta do Poço, no momento desativado, são

os principais aglomerados urbanos.

Como a Tabela 1 aponta, os primeiros sinais de ocupação provêm de Praia de

Leste, balneário cortado pela Estrada do Mar e Pontal do Sul, de onde são oriundos a

maioria dos registros históricos dos séculos anteriores.

Segundo o diagnóstico da FUNPAR (1999) referente ao município de Pontal do

Paraná, no ano de 1951 o Governo Estadual doou a Paranaguá uma área de

43.382.000 m², que foi repassada à Empresa Balneária Pontal do Sul no mesmo ano.

Na época, foi realizado um planejamento geral da área, delimitando quadras e ruas,

mas que foi pouco efetivado. Ruas do projeto foram transformadas em canais de

drenagem e navegação, o rio Perequê foi modificado. Não se respeitou o projeto inicial,

resultando em um crescimento desordenado. Ainda em 1951, foi aberto o primeiro

loteamento em Pontal do Sul, com área de 55.895.100 m². Com a eventual valorização

da área, moradores locais (nativos e não nativos) foram afastando-se da praia, sendo

os lotes ocupados, a partir de então, por proprietários de segunda residência. A Figura

1 dá a dimensão do processo de ocupação da região em 1953.

Figura 1: Foto área de Pontal do Sul na região da desembocadura da baía de Paranaguá. Fonte: ITCF.

De acordo com a Tabela 1 o aumento populacional intensifica-se a partir da

década de 80, que pode ser visualizado na Figura 2.

Figura 2: Foto área de Pontal do Sul/ Desembocadura da baía de Paranaguá. Fonte: ITCF.

O fator que motivou este crescimento foi a construção da rodovia PR 412

ligando o balneário de Praia de Leste a Pontal do Sul nos anos de 1977 e 1978

permitindo o acesso a todos os balneários de Paranaguá. Do mesmo modo, como

ocorreu com Caiobá e Matinhos 50 anos antes através da Estrada do Mar.

Em meados dos anos 80 iniciou-se a implantação do pólo industrial, na área da

Ponta do Poço, balneário de Pontal do Sul. Formado por três empresas construtoras de

plataformas para exploração petrolífera (Techinte, Tenenge e Fem). O canteiro

industrial atraiu muitos operários provenientes do interior do Paraná e outros estados,

atingindo cerca de três mil trabalhadores (FUNPAR, 1999). Com o fim das atividades no

local, perderam-se os postos de trabalho e os operários deixaram o município ou

acabaram procuraram novas fontes de renda.

Figura 3: Antigas instalações da Empresa Fem, Ponta do Poço. Foto: Gerson Guaita

No balneário de Pontal do Sul, em março de 1982, foi inaugurada a sede do

Centro e Estudos do Mar (antigo Centro de Biologia Marinha CBM), da Universidade

Federal do Paraná.

Figura 4: Centro de Estudo do Mar (CEM – UFPR), Pontal do Sul. Foto: Gerson Guaita.

A presença deste Centro de estudos na região é importante para o conhecimento

das dinâmicas marinhas do nosso litoral. Além de fortalecer a preservação dos

ambientes praieiros, como a restinga, ecossistema muito alterado nos municípios da

orla.

A articulação política pela emancipação de Pontal do Paraná ocorre desde a

década de 80, a partir de reuniões de políticos estaduais com líderes locais

arquitetando o desmembramento de Paranaguá. Em 1987 é apresentado um projeto à

Assembléia Legislativa propondo que, no município de Paranaguá seja criado o distrito

administrativo de Pontal do Paraná. Este ato corresponde a um dos primeiros passos à

emancipação, fato que ocorreria em dezembro de 1995. Alegando o descuido da

Prefeitura Municipal de Paranaguá com os balneários, principalmente as condições das

vias públicas, saneamento básico e precariedade dos setores da saúde e educacionais.

Líderes locais, moradores, veranistas e políticos mobilizaram-se em manifestação

organizada pelo Conselho de Associações das Praias do Paraná, ocorrida em fevereiro

de 1995. O vice-presidente desta Associação, o médico pediatra Helio Gaissler de

Queiroz, viria a ser o primeiro prefeito de Pontal do Paraná, eleito no ano seguinte.

Entre as razões pela disputa do território, estão os tributos pagos, uma vez que

cerca de 51% do IPTU arrecadado por Paranaguá era originário dos balneários. Assim

como os royalties pagos pela exploração de petróleo na costa marítima (ROCHA,

1997).

A partir de então, iniciou-se uma batalha jurídica para a realização do

plebiscito que colocaria em pauta a emancipação de Pontal do Paraná. Por diversas

vezes, a Prefeitura de Paranaguá conseguiu na justiça a suspensão da votação. Até

que, por decisão do Supremo Tribunal Federal a favor dos manifestantes, é realizado

em 10 de dezembro de 1995 o plebiscito que por 1450 votos a favor contra 159,

emancipa o mais novo município do litoral paranaense. Após dez dias a Lei Estadual Nº

11.252 de 20 de dezembro, oficialmente reconhece Pontal do Paraná como município.

Diagnóstico dos problemas ambientais

Unidade praia:

(1) Acúmulo de resíduos sólidos: a concentração de lixo nas praias tem como

uma das causas à presença humana no ambiente, especialmente nos meses de

temporada, quando o fluxo de veranistas é maior. A instalação de lixeiras no calçadão

ou ruas beira-mar, além da distribuição de sacos plásticos por programas

governamentais, não tem resolvido o problema. Os fluxos de maré contribuem para o

acúmulo de resíduos na faixa de areia. Neste caso, são provenientes de outros

balneários, barcos de pesca, recreação e navios que atracam nos portos da baía de

Paranaguá. Além de poluir visualmente a praia, os resíduos podem afetar diretamente a

biota marinha e costeira, podendo contaminar e provocar danos aos organismos destes

ambientes.

(2) Tráfego de veículos: observa-se o grande número de veículos que transitam

nas areias das praias do município, motivados pela ausência de fiscalização dos órgãos

competentes e a ausência de barreiras para impedir o acesso à praia. A circulação

torna-se perigosa em virtude da presença de pessoas no local e o ambiente e seus

componentes bióticos acabam sofrendo diversos tipos de impactados.

(3) Baixos índices de balneabilidade: em decorrência do baixo percentual da rede

coletora de esgoto no município (cerca de 18%), a qualidade da água nas praias tende

a ser baixa. Os problemas afetam diretamente a saúde humana e do ambiente, além de

enfraquecer a atividade econômica predominante na região, o turismo.

Unidade restinga

(4) Ocupação humana: ocorre de diferente formas, desde a instalação de

camping e estacionamentos para veículos (Pontal do Sul) e casas de pescadores, bem

como seus comércios de pescados (Pontal do Sul, Ipanema, Canoas). Para a

instalação desses empreendimentos é feita a “limpeza” da área, desmatando áreas de

restinga. Em conseqüência, diversas espécies têm seus habitats naturais destruídos, e

as funções ecológicas do ambiente são drasticamente afetadas, como a contenção de

marés.

(5) Degradação para fins recreativos e comerciais: em diversos pontos da orla,

encontram-se canchas esportivas, playground e quiosques. São comuns em balneários

densamente freqüentados nos meses de verão, tornando-se um atrativo a mais aos

veranistas. Em contrapartida, ocorre a degradação da restinga para a instalação destes

equipamentos recreativos.

(6) Substituição da vegetação de restinga: comum na frente dos condomínios.

São introduzidas no ambiente espécies vegetais com potencial estético e paisagístico,

porém não pertencentes ao ecossistema. Já as espécies típicas da restinga, são

retiradas do local descaracterizando o ambiente e comprometendo suas funções.

(7) Desinformação a respeito do ambiente: muitos dos freqüentadores da praia,

não têm conhecimento sobre a fragilidade dos ambientes de restinga e suas funções no

ambiente. Ele passa a ser considerado apenas como uma faixa de transição inóspita. A

transformação do ambiente seja para fins recreativos, comerciais, paisagísticos ou

utilitários é geralmente bem vista pelos freqüentadores.

Unidade mangue

(8) Aterramento para ocupação: os mangues são ecossistemas de grande

fragilidade e sensíveis a interferências antrópicas, fundamentais para diversas espécies

que dele obtém alimento e o utilizam como local de procriação. Por serem situados

próximos de rios, praias e baías, é grande a pressão sobre esses ambientes para fins

de ocupação humana, comerciais, industriais e portuários. No município de Pontal do

Paraná, muitas áreas de mangue foram aterradas para construção de moradias, e

atualmente existe a pressão política para a instalação de um porto no município.

Unidade urbana

(9) Esgoto: a disponibilidade de rede coletora de esgoto em Pontal do Paraná

está abaixo do necessário para que se tenha um ambiente saudável. A destinação mais

comum dos resíduos domésticos são as fossas sépticas, que contaminam o lençol

freático, situado, no litoral, há poucos metros da superfície. Existem também inúmeras

ligações clandestinas de esgoto em rios e valas, contaminando diretamente o ambiente.

Ambas as destinações refletem a contaminação do solo, águas de rios e posteriormente

do mar. Oferecendo riscos a saúde humana, principalmente na população residente

próxima aos rios e valas, além é claro, dos freqüentadores da praia.

(10) Poluição visual ao longo da rodovia PR-412: esta rodovia interliga os

balneários de Praia de Leste a Pontal do Sul. Grande parte dos serviços oferecidos no

município concentra-se nas margens desta via. A quantidade de placas e letreiros é

grande sem obedecer qualquer padrão e ordenamento, mostrando grande diversidade

de cores, modelos e tamanhos, caracterizando poluição visual. Até mesmo os marcos

públicos indicando os balneários, agridem visualmente.

(11) Parque urbano: o município tem apenas um parque municipal, o do rio

Perequê, pouco conhecido da população, é aberto à visitação, porém, a estrutura não é

atrativa aos visitantes. Falta iniciativa pública para a criação de parques municipais, que

atuariam como local de lazer e sensibilização ambiental da população. As áreas de

interesse para a criação desses parques deveriam ser demarcadas, mesmo que a

criação não seja imediata.

Unidade planície de terras baixas

(12) Ocupações irregulares: em diversos balneários do município é possível

observar ocupações irregulares, que rapidamente avançam sobre a planície de

restinga, ameaçando ambientes íntegros desprovidos de amparo legal de proteção. O

crescimento populacional dos municípios litorâneos é alto, oriundo principalmente de

pessoas do interior do estado, atraídas por empregos temporários nos meses de verão.

As ocupações ilegais têm como conseqüência o desmatamento das florestas de terras

baixas, transformando estas áreas em periferias com baixa condição de

desenvolvimento humano.

(13) Pressões futuras: a construção da estrada que ligará a rodovia PR-407 ao

futuro porto terá grande influência na ocupação da área ainda preservada. A ausência

do poder público expresso na fiscalização ambiental agrava a situação da região, uma

vez que a aplicação das leis ambientais não é exercida. Desta forma é esperada a

ocupação humana nas margens desta nova estrada, afetando gravemente as poucas

áreas de florestas de terras baixas existentes no município.

(14) Áreas sem amparo legal de proteção: Pontal do Paraná ainda possui áreas

relativamente preservadas. Entretanto, há necessidade de uma intervenção séria por

parte dos órgãos ambientais responsáveis, uma vez que grande parte dos

remanescentes florestais destes ambientes estão ameaçados de desaparecer para

ceder lugar a aterros e loteamentos.

CONCLUSÃO

A partir dos levantamentos sobre a história dos municípios do litoral do Paraná,

especialmente Pontal do Paraná, é possível perceber, como afirma Fernandes (1947),

que um dos fatores decisivos para o processo de ocupação é a abertura de rodovias,

tornando-se agentes civilizadoras, e modeladoras do ordenamento territorial. Entretanto

Outros fatores assumem papel de destaque em relação a ocupação humana em

determinadas localidades. No município avaliado, por exemplo, as causas sociais

apresentam-se como instrumentos de manipulação política e de interesses por parte

dos governantes.

A maioria dos problemas ambientais levantados no município são de simples

solução, a considerar a aplicação da legislação ambiental e territorial. Entretanto

assumem grandes proporções devido a flutuação populacional nos meses de verão

(alta temporada). Independente desta característica os esforços conjuntos dos poderes

públicos e privados, além da participação da sociedade são de extrema relevância.

Em decorrência da existência de grandes áreas naturais preservadas no

município de Pontal do Paraná, ainda há possibilidades de orientar um ordenamento

através do planejamento ambiental. Entre as opções destacam-se a criação de parques

municipais destinados à comunidade, que atuariam como sensibilizadores em relação a

questão ambiental, bem como áreas de recreação e lazer, atualmente restritas a praia.

Da mesma forma a implantação de Unidades de Conservação de proteção integral

possibilita a conservação dos remanescentes da floresta atlântica e seus ecossistemas

associados e limita a expansão desordenada sobre estes recursos, situados em locais

estratégicos, como por exemplo no entorno do rio Guaraguaçu.

Nesse contexto o planejamento ambiental, é ferramenta indispensável para o

crescimento urbano ordenado, com vistas à preservação ambiental e desenvolvimento

social.

AGRADECIMENTOS Agradecemos o acesso a todas as instituições visitadas. Agradecemos especialmente ao

Dr. Arthur Barthelmess pelas informações complementares e a Luiz Fernando De Carli

Lautert pelo apoio e sugestões. À Tatiana de Medeiros Canziani pela tradução do resumo

em espanhol e a Edson Cezar Perle pela colaboração na revisão do trabalho.

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emphasis on the curves from Paranaguá and Cananéia regions. Marine Geology, n. 140, p.

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