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Indústria Para-Petrolífera Brasileira
Competitividade, Desafios e Oportunidades
Adilson de Oliveira (coordenador)
2
Equipe
Adilson de Oliveira – Coordenador Geral
Módulo Demanda de Infra-Estrutura
Getúlio Borges da Silveira Filho – Coordenador Luciano Dias Losekann
Luis Otávio de Figueiredo Façanha Wilson Calmon Almeida dos Santos
Módulo Competitividade da Indústria Pára-Petrolífera
Carlos Frederico Leão Rocha – Coordenador Alexis Toríbio Dantas
David Kupfer Esther Dweck
Fábio Neves Perácio de Freitas
Germano Mendes de Paula Jorge Nogueira de Paiva Britto
Luciano Dias Losekann Sálua Bueno
Victor Prochnik
Módulo Pólo-Sul
Adilson de Oliveira - Coordenador
André Furtado Cássio Ribeiro Garcia Soares
Cristina Pessoa João Bosco de Mesquita Machado
Jorge Nogueira de Paiva Britto
Marco Antônio Vargas
Deborah Trigueiro Wanderley – Secretaria Executiva
Felipe Van de Sande de Araújo – Editoração Eletrônica
3
ÍNDICE
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 4
2 INDÚSTRIA BRASILEIRA DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL (IPGN) .......................... 7
2.1 Refinarias ................................................................................................................................................................. 9
2.2 Gasodutos ............................................................................................................................................................... 12
2.3 Plataformas ............................................................................................................................................................ 16
2.4 Navios ...................................................................................................................................................................... 19
3 COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA PARA-PETROLIFERA BRASILEIRA (IPP) ...... 23
3.1 Panorama da Competitividade Setorial ............................................................................................................... 26
3.2 Análise Setorial ...................................................................................................................................................... 34
3.3 Diretrizes Competitivas ......................................................................................................................................... 40
3.4 Estratégias Competitivas ....................................................................................................................................... 44
4 PÓLO SUL: OPORTUNIDADE E DESAFIOS ............................................................... 48
4.1 Pólos Para-petrolíferos .......................................................................................................................................... 50
4.2 Rede Doméstica de Fornecedores ......................................................................................................................... 62
4.3 Redes Regionais de Fornecedores ......................................................................................................................... 71
4.4 Capacitação Inovativa da IPP brasileira ............................................................................................................. 74
4.5 Inserção Internacional da IPP Brasileira ............................................................................................................ 85
4.6 Recomendações ...................................................................................................................................................... 98
4
1 INTRODUÇÃO
A indústria de petróleo e gás (IPGN) brasileira vive momento singular. A descoberta de
vastas jazidas de hidrocarbonetos no pré-sal abre cenário de muitas oportunidades para os
fornecedores de bens e serviços da IPGN1, porém coloca-os diante do desafio de capacitar-se
industrial e tecnologicamente para atender a demanda que virá das operadoras.
É importante notar que a similaridade geológica com a costa ocidental africana abre a
perspectiva de o parque de fornecedores brasileiros virem a ter papel ativo também no
suprimento de bens e serviços das operadoras em atividade nos países daquela região.
Tudo somado, a IPP brasileira receberá forte pressão pelo lado da demanda, porém seu
sucesso dependerá fundamentalmente de sua capacidade de atender essa demanda em
condições adequadas de prazo, qualidade e preço. Vale dizer, a IPP brasileira tem como
grande desafio alcançara níveis internacionais de competitividade.
A indústria do petróleo nasceu no EUA na segunda metade do século XIX, porém só veio a
tomar dimensão no século XX com a expansão do transporte rodoviário. Na sua fase infante,
a produção de petróleo era feita a partir de jazidas identificadas em terra, principalmente em
torno do golfo do México. A demanda de equipamentos e serviços da indústria nessa fase foi
suprida a partir do parque produtivo que foi consolidando em torno do golfo do México.
Na primeira metade do século XX, a indústria do petróleo expandiu-se fortemente fora das
fronteiras da América do Norte, destacando-se a rápida expansão da produção de óleo no
Oriente Médio, onde foram encontrados vastos reservatórios com custos de produção muito
baixos (inferior a US$ 2/barril). Nesse período, o suprimento da demanda de equipamentos e
serviços permaneceu centrado essencialmente nos fornecedores baseados no pólo produtor
estruturado em torno do golfo do México. Ganhos de escala e de capacitação tecnológica
consolidaram a posição dominante desses fornecedores.
Na década de 1970, a crise do petróleo criou um novo cenário para a indústria do petróleo.
As dificuldades geopolíticas de acesso às jazidas do “velho” petróleo, ainda disponível em
quantidades significativas no Oriente Médio em terra, induziram a indústria do petróleo a
mover-se em direção ao “novo” petróleo disponível nas plataformas continentais. O novo
patamar de preço que emergiu após a crise (em torno de US$ 20/barril) criou condições
econômicas favoráveis para um conjunto de inovações na exploração offshore que dava seus
passos iniciais no golfo do México.
No Reino Unido e na Noruega, foram adotadas políticas ativas de incentivo aos fornecedores
locais para dar suporte ao desenvolvimento da produção nessa nova província petrolífera. Os
1 Doravante denominado “Indústria Para-petrolífera (IPP)”
5
sistemas nacionais de inovação desses países foram mobilizados para oferecer capacitação
tecnológica ao sistema produtivo local no caso inglês e ao desenvolvimento de fornecedores
domésticos no caso da Noruega (Hatakenaka e alli, 2006). Em ambos os casos, com o
objetivo de garantir sua competitividade econômica da produção doméstica de
hidrocarbonetos.
Até a década de 1970, o gás era consumido essencialmente na América do Norte, onde uma
rede de gasodutos foi construída para levar aos mercados o gás natural associado dos
campos produtores de petróleo para os centros consumidores. A crise do petróleo criou novo
cenário para esse combustível, em especial na Europa onde foi adotada uma política
agressiva de diversificação das fontes de suprimento de energia. Essa política criou espaço
para a expansão da rede de dutos necessária para a difusão do uso do gás natural disponível
no Mar do Norte, no Norte da África e na antiga União Soviética. No caso japonês, a difusão
do uso do gás natural foi tímida devido às dificuldades impostas pela geografia, porém
permitiu ganhos significativos no campo tecnológico e comercial no que se refere ao
transporte de GNL.
Atualmente, há indicações claras de que a indústria do petróleo entrou em uma nova fase. A
preocupação com o aquecimento global deverá limitar a expansão do consumo de
hidrocarbonetos, porém a transição dos hidrocarbonetos para fontes de energia amigáveis
com o meio ambiente será longa. Vale dizer, a economia mundial continuará a ser movida
com hidrocarbonetos por pelo menos mais três ou quatro décadas.
Para abastecer esse consumo, a IPGN terá que buscar novas áreas produtoras, seja devido
às dificuldades de acesso ao “velho” petróleo impostas pela geopolítica, seja pelo
esgotamento progressivo das jazidas do “novo” petróleo. Nessa nova fase, a indústria do
petróleo deverá operar com novo patamar de preço (provavelmente entre US$50 e US$60
por barril), significativamente superior ao vigente até o final do século XX. Nesse cenário, a
IPGN brasileira situa-se em condições muito favoráveis para sua expansão.
Contudo, para que o Brasil possa tirar plenos benefícios da oportunidade que lhe oferece a
história, é fundamental a estruturação de uma rede doméstica, competitiva, de
fornecedores. A experiência da Noruega é particularmente relevante para o caso brasileiro,
pelo fato de a aquele país ter construído uma rede de fornecedores domésticos competitivos,
partindo praticamente da estaca zero.
Com o objetivo de maximizar a participação da IPP brasileira no suprimento da demanda das
operadoras, em bases competitivas e sustentáveis, o governo federal instituiu o Programa de
6
Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e de Gás Natural (Prominp)2. Entre as diversas
atividades do programa, foi identificada a necessidade de um diagnóstico que identificasse as
condições competitivas atuais da IPP brasileira e permitisse formular uma estratégia para
fortalecer sua capacidade competitiva.
Este relatório apresenta esse diagnóstico e propõe as linhas mestras para a atuação
estratégica do Governo Federal e da Petrobrás no sentido de aumentar a competitividade da
IPP brasileira3. Ele está dividido em cinco grandes capítulos.
No primeiro, procurou-se estimar o comportamento futuro da demanda de equipamentos.
Com base em expectativas quanto ao crescimento da economia brasileira e quanto ao
comportamento do mercado internacional do petróleo formulamos cenários para a expansão
da infra-estrutura necessária para atender a expansão da oferta doméstica de
hidrocarbonetos e de derivados. Esses cenários foram utilizados para estimar trajetórias para
a demanda estilizada de equipamentos da IPGN no horizonte 2025.
No segundo capítulo elaboramos o diagnóstico da competitividade de dezoitos segmentos
industriais selecionados, considerados pelo serviço de engenharia da Petrobras como críticos
para o desempenho competitivo da IPGN. Esse diagnóstico foi elaborado com apoio de
informações disponibilizadas pelo IBGE e de entrevistas realizadas em plantas industriais de
uma amostra qualificada de fornecedores.
O terceiro capítulo explora a possibilidade de vir a se constituir no Brasil um pólo fornecedor
de bens e serviços para a indústria do petróleo para todo o Atlântico Sul. Para tanto,
estudamos a dinâmica dos três pólos estruturados ao longo da história da IPGN, para em
seguida identificar os desafios que a IPP brasileira deve superar para almejar posição
dominante na nossa região. O capítulo se encerra com uma breve análise das políticas de
apoio necessárias para que os desafios sejam superados.
2 Decreto nº 4.925, do dia 19 de dezembro de 2003 3 O estudo foi realizado por uma equipe de professores e pesquisadores coordenada pelo professor Adilson de Oliveira. Ver a composição da equipe de pesquisadores no anexo X
7
2 INDÚSTRIA BRASILEIRA DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL (IPGN)4
A IPGN brasileira vive momento muito favorável. Depois de um longo período de crise e
estagnação, a economia brasileira recuperou condições macroeconômicas para viver um
período de crescimento econômico sustentado a taxas relativamente elevadas. Esse cenário
sugere forte crescimento na demanda de derivados de petróleo e de gás natural pelos
consumidores finais. Por outro lado, a descoberta de vastas jazidas de hidrocarbonetos no
pré-sal em um período de preços elevados para os combustíveis sugere forte expansão da
produção de hidrocarbonetos, não apenas pela Petrobras. Ao ambicioso programa de
investimentos da Petrobras, com projetos no Brasil e no exterior, deverão ser
paulatinamente adicionados os projetos das demais operadoras, cujos esforços exploratórios
apenas começam a mostrar seus resultados. Esse cenário sugere que a demanda de bens e
serviços da IPGN também sofrerá forte expansão.
A previsão da demanda de bens e serviços da IPGN é tarefa complexa. A indústria utiliza
uma gama muito diversa de fornecedores, envolvendo setores de quase todo o aparelho
industrial (metal-mecânico, eletro-eletrônico, serviços de engenharia etc.). Optamos por
articular nossas previsões em torno dos núcleos articuladores do processo produtivo da
IPGN: plataformas, refinarias, gasodutos e frotas de navios. Para tanto, formulamos cenários
para o comportamento da economia brasileira e para o mercado do petróleo que nos
permitiram estimar trajetórias para o consumo de diesel e de gás natural pelos consumidores
finais, por um lado, e estimar a produção de hidrocarbonetos, por outro. Com base nessas
trajetórias identificamos a demanda estilizada de plataformas, refinarias, gasodutos e navios
necessários para dar viabilidade produtiva aos planos de expansão sugeridos nas trajetórias
estimadas
Como os fatores determinantes na oferta primária de hidrocarbonetos são distintos dos que
influenciam a oferta de derivados para os consumidores finais, adotamos enfoques
metodológicos distintos para os dois casos. No upstream, as variáveis determinantes do
comportamento da oferta de hidrocarbonetos são as oportunidades oferecidas pela geologia
e os preços praticados no mercado internacional. Já no downstream, as variáveis chave são a
demografia, a taxa de crescimento econômico e os preços para os consumidores finais. No
caso das refinarias, a expansão da capacidade instalada é fundamentalmente determinada
pela demanda de diesel, dado que as refinarias brasileiras estão estruturadas para maximizar
4 Esta seção foi elaborada tomando como base os relatórios presentes no Anexo, que podem ser acessados através do atalho a seguir: Relatório Demanda de Combustíveis; Relatório Demanda de Infra-Estrutura.
8
a oferta desse combustível, com o objetivo de minimizar a dependência de importações
desse derivado.
A evolução da população não envolve muita incerteza, sendo estimada com grau razoável de
confiança pelo IBGE. As incertezas geológicas foram substancialmente reduzidas com as
descobertas no pré-sal. Restam os comportamentos da economia e dos preços (do petróleo e
de seus derivados) para os quais optamos por adotar cenários, elaborados a partir de
estudos de agências especializadas.
No caso da economia utilizamos três cenários. Um cenário em que a preservação do cenário
macroeconômico permitiria a continuidade na taxa de crescimento atual. Contrastando com
esse cenário, adotamos um cenário otimista e outro pessimista. No otimista, o crescimento
econômico seria mais elevado imaginando-se que as restrições que caracterizaram o
comportamento da economia brasileira nas últimas décadas serão superadas. No cenário
pessimista, o país encontraria dificuldade na superação dessas restrições, situação que
induziria taxa de crescimento relativamente baixa.
Tabela 1
Cenários Econômicos – Taxa de crescimento anual do PIB
Alto Médio Baixo
2007-2008 5,0% 4,5% 4,0%
2009-2025 6,0% 4,5% 3,5%
Fonte: elaboração própria
No caso do preço do petróleo, optamos por dois cenários elaborados pelo Departamento de
Energia dos Estados Unidos, um dito de referência e outro elevado (Figura 1)5. No primeiro, o
preço do petróleo retrocede, se ajusta ao patamar de US$ 50/barril, resultando um preço
médio de US$55/barril no período 2007-2025. No segundo, a trajetória de elevação,
experimentada nos últimos anos, permanece e o preço do petróleo alcança US$ 90/barril no
final do período de análise, gerando um preço médio de US$ 85/barril. É importante notar
que nos dois cenários, apesar de o preço do petróleo nesses cenários ficar substancialmente
abaixo do patamar absurdo alcançado em 2008, ele aumenta significativamente em relação
ao preço praticado até o início da presente década em ambos os casos.
5 Um terceiro cenário, com preços inferiores, não foi considerado em nosso estudo (International Energy Outlook, Department of Energy, USA Administration, 2007).
9
Figura 1
Cenário de Preços do Petróleo (US$/barril)
Fonte: DOE-US, International Energy Outlook 2007
2.1 Refinarias
O óleo diesel constituiu atualmente o gargalo na oferta de derivados do parque de refino
brasileiro. Vale dizer, a produção desse combustível comanda a expansão da capacidade
de refinação doméstica. Essa situação deverá permanecer nas próximas décadas, dado
que a crescente produção de álcool deverá orientar a demanda de derivados de petróleo
para produtos médios. Desta forma, é razoável adotar como elemento determinante na
expansão do parque de refino será a demanda de diesel.
Para cenarizar o consumo futuro de diesel, centramos nossa análise no setor de
transporte, que representa 77% do consumo total do combustível. Depois de analisar
formas diversas de estimação6, optamos por vincular o consumo de diesel à expansão
estimada da frota de veículos movidos a diesel e ao consumo específico de cada
componente da frota (ônibus, caminhões e veículos leves). Como os dados de frota não
são disponibilizados, adotamos uma função de sucateamento e estimamos a frota a partir
do histórico de vendas. O modelo considerou como variáveis explicativas para as vendas a
variação do PIB e a população, tendo sido incorporado, ainda, um mecanismo de correção
de erros.
6 Ver anexo X
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Elevado
Referência
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O consumo total de diesel foi estimado agregando a demanda esperada do setor
agropecuário e o consumo na geração de eletricidade. No caso do setor agropecuário,
adotamos a hipótese de que seu consumo seguirá o mesmo ritmo do setor de transportes.
Na área elétrica, assumimos que o patamar de consumo atual permanecerá ao longo de
todo o período cenarizado, pois expansão significativa da capacidade de geração
alimentada com esse combustível7.
É importante notar que o Brasil tem um programa que pretende promover o uso do diesel
de origem agropecuária, sendo, portanto, necessário deduzir da demanda estimada para o
diesel de petróleo a oferta programada de biodiesel. Em nossos cenários adotamos como
hipótese que as metas governamentais para a produção de biodiesel serão cumpridas,
devendo essa oferta atingir 2%, em 2008, e alcançar 5% do consumo do setor de
transportes em 2008 e 2010.
Nossas estimativas apontam para um arrefecimento no crescimento da demanda de diesel
em todos cenários (Figura 2). A expressiva queda da elasticidade renda do consumo de
diesel é explicada pelo aumento na participação do biodiesel e por ganhos de eficiência no
segmento de transporte.
Figura 2
Demanda Prevista de Diesel – mil barris/dia
Fonte: Elaboração Própria
Como estimamos que a parcela de diesel extraída do óleo processado nas refinarias
brasileiras deverá situar-se em 40% durante todo o período estudado, pudemos estimar a
evolução da carga processada nas refinarias domésticas (Figura 3).
7 Na verdade, a interconexão dos mercados isolados da região norte do Brasil tende a diminuir esse consumo.
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Figura 3
Evolução estimada da Carga Processada – mil barris/dia (2007-2025)
Fonte: Elaboração própria
Adotando como hipóteses adicionais que a utilização da capacidade instalada permanecerá
no patamar histórico (85%) e a taxa de 5% para a reposição de capacidade decorrente da
da depreciação do parque instalado, pudemos estimar a evolução dos investimentos no
downstream da atividade petrolífera.
Essa evolução demandará ampliação significativa da capacidade de refino no horizonte de
previsão (Figura 4). Para responder a essa demanda, nosso cenário sugere a ampliação da
capacidade instalada de seis (6) refinarias existentes (Revamps), agregando capacidade
de refino correspondente a 300 mil barris diários. Além das refinarias de Pernambuco e do
Rio de Janeiro, já programadas, estimamos que teriam que ser construídas quatro novas
refinarias (250 mil barris diários para a capacidade de refino) no cenário de baixo
crescimento econômico, cinco no cenário intermediário e sete no alto. Os investimentos
necessários para atender essa expansão oscilam entre US$ 104,2 bilhões e 149,2 bilhões
no período 2010- 2025.
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Figura 4
Evolução estimada da Capacidade de Refino – mil barris/dia (2007-2025)
Fonte: Elaboração própria
2.2 Gasodutos
A demanda de gás natural (GN) experimenta dinâmica diferenciada nos distintos
segmentos de consumo. No caso do setor industrial, o consumo desse energético enfrenta
a concorrência do óleo combustível; já no setor transportes os energéticos concorrentes
são a gasolina e o álcool, enquanto nos setores residencial e comercial o GLP é o produto
concorrente. Nas termelétricas, o consumo de gás natural é fundamentalmente
determinado pelo comportamento da pluviometria, uma vez que nosso parque gerador
elétrico é de base hidrelétrica8. No entanto, é importante notar que a demanda de infra-
estrutura para atender o mercado termelétrico é ditado não pelo consumo médio das
termelétricas, mas sim pelo seu consumo nos períodos em que operam a plena
capacidade.
No setor industrial, modelamos o comportamento do consumo agregado de GN e óleo
combustível (OC) e buscamos identificar a lógica econômica da substituição entre
combustíveis, com base no comportamento dos preços relativos. Identificamos que o PIB é
a variável relevante para explicar o consumo agregado, tendo se mostrado não significante
estatisticamente o papel dos preços devidamente ponderados. A elasticidade-renda
8 Essa característica faz com que as termelétricas sejam despachadas nos períodos de baixa pluviometria, porém fiquem ociosas nos períodos de pluviometria desfavorável (de Oliveira, 2006)
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estimada de longo prazo foi próxima a 1 e a elasticidade-renda (PIB) de curto prazo foi
estimada em 0,81.
Para estimar a participação do GN nesse agregado, utilizamos modelo que toma como
variável explicativa o preço relativo GN/OC. Incorporamos no modelo a inércia da resposta
da participação em relação aos sinais de preços relativos. A Figura 5 apresenta a demanda
estimada de GN na indústria para os três cenários econômicos adotados. No cenário de
crescimento econômico elevado, a demanda de GN na indústria alcançaria 110 milhões de
m3/dia em 2025. Se a economia voltar a enfrentar restrições, a demanda nesse ano seria
de 72 milhões de m3/dia.
Figura 5
Projeção da Demanda Industrial de Gás Natural
Fonte: Elaboração própria
A previsão da demanda termelétrica resulta da evolução da capacidade instalada de
centrais alimentadas com GN. O Plano Decenal de Expansão de Energia Elétrica antecipa
expansão pouco significativa para as centrais desse tipo, devido à atual situação de
escassez na oferta desse combustível. Esse cenário deverá sofrer progressiva mudança
com a expansão da produção brasileira de petróleo, dado que esta traz consigo uma
parcela significativa de GN associado. A disponibilidade de quantidade crescente de GN
deverá estimular o investimento em centrais alimentadas com esse combustível a partir da
segunda metade da próxima década. No cenário de crescimento econômico elevado, a
capacidade de termelétricas alimentadas com GN alcançaria 37 GW em 2025 e, no cenário
de baixo crescimento, ela alcançaria 27 GW. Essas estimativas sugerem a necessidade de
gasodutos com capacidade para transportar até as centrais elétricas cerca de de 85
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milhões de m3/dia em 2015 e 150 milhões em 2025, no cenário intermediário de
crescimento econômico (Figura 6).
Figura 6
Projeção da Demanda Máxima Termelétrica de GN (Fator de Utilização de 90%)
Fonte: Elaboração própria
A expansão do consumo de GN na indústria e nas termelétricas viabiliza a extensão da
rede de gasodutos para os setores residencial e comercial das zonas urbanas. Estimamos
que o número de domicílios conectado à rede de suprimento de GN cresça à taxa de 12 %
ao ano nos próximos dez anos no sudeste-sul9. No início do período essa taxa se explica
pelo fato de a base inicial ser relativamente baixa; na segunda metade do período, a
justificativa é a redução prevista nos custos das distribuidoras. Já na região nordeste,
onde a renda per capita mais baixa, a difusão do uso do GN nas residências se dará de
forma bem mais lenta. A participação dessa região no consumo residencial brasileiro será
de 7% em 2015 e de 10% em 2025. O consumo médio de gás natural por residência não
deverá sofrer alteração significativa, permanecendo no patamar atual de 0,5 m3/dia. O
crescimento do consumo de GN no setor comercial seguirá ritmo similar ao do setor
residencial. Nesses setores, estimamos que o consumo de GN somará de 1,4 milhão de
m3/dia em 2015 e 5,1 milhões de m3/dia em 2025. No setor veicular, estimamos que a
escassez na oferta de GN deverá estagnar a difusão da frota de veículos alimentados a GN
nos próximos anos, e a retomada na expansão da frota veicular deverá ocorrer apenas
após 2015, ainda assim, lentamente. O consumo de GN nesse setor crescerá a partir de
2015 para somar cerca de 10 milhões de m3/dia, em 2025.
9 Este número foi estimado tendo em conta os planos de expansão da rede de gasodutos dos reguladores estaduais de São Paulo e do Rio de Janeiro.
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Essas estimativas, quando agregadas10, indicam que o volume de GN consumido em 2025
oscilará entre 220 milhões de m3/dia no cenário de crescimento baixo e 292 milhões no
cenário alto (Figura 7).
Figura 7
Cenários para a Demanda de Gás Natural (Milhões de m3/dia)
Fonte: Elaboração própria
Para atender esse ritmo de expansão do consumo, a rede de dutos deverá crescer em ritmo menos acentuado. Isto
ritmo menos acentuado. Isto porque, na medida em que rede de dutos amadurece, economias de escala e o uso
economias de escala e o uso intensivo de estações de compressão permitem expandir a oferta com incrementos
oferta com incrementos menores na rede de dutos. A experiência acumulada na Petrobras sugere que para cada 1%
sugere que para cada 1% de incremento no consumo de gás, há necessidade de 0,4% na expansão da rede de
expansão da rede de gasodutos. Dessa forma, a rede de transporte de GN teria que grosso modo dobrar em sua
modo dobrar em sua extensão até 2025 (
Figura 8).
10 Para compor o total, acrescentamos, além dos segmentos apresentados, a projeção de consumo interno da Petrobras. Essa reflete as projeções divulgadas pela empresa e publicadas no Plano Decenal de Energia.
16
Figura 8
Evolução Estimada da Extensão dos Gasodutos
Fonte: Elaboração própria
2.3 Plataformas
Os cenários de preços influenciam a incorporação de reservas de petróleo. Maior preço
induz maiores investimentos em exploração e, para um mesmo risco geológico, maiores as
descobertas. Desta forma, o custo de descoberta de petróleo é um bom indicador do
resultado esperado, em termos de reservas, para os investimentos em exploração.
Adotamos a relação entre os investimentos em exploração/produção e a incorporação de
reservas como indicador próximo (proxy) do custo de descoberta. Nos últimos anos, esse
valor tem aumentado em função da escalada de preços dos equipamentos, alcançando
US$ 5,50/barril. Assumimos a continuidade da elevação dos custos de descobertas, com o
valor de US$ 7,50/barril no próximo qüinqüênio11.
Esse parâmetro permite estimar a incorporação de reservas a partir de cenários para os
investimentos em exploração e produção. O programa de investimentos no horizonte 2013
11 Nesse período, serão investidos US$ 11 bilhões ao ano nas atividades de E&P.
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17
está disponibilizado no plano estratégico da Petrobras, apresentado em 2007. A partir
dessa data, a estimativa é bem mais complexa, pois ela depende das expectativas quanto
ao preço do petróleo.
Os cenários de preço que adotamos sugerem que as bacias sedimentares brasileiras
deverão permanecer muito atraentes, especialmente após as descobertas no pré-sal.
dessa forma, estimamos que os investimentos orientados para o desenvolvimento da
produção doméstica deverão permanecer em patamar elevado, na verdade crescentes, na
medida em que o desenvolvimento da infra-estrutura de produção nos campos recém
descobertos aumenta a viabilidade econômica de plataforma continental brasileira. Esses
investimentos deverão propiciar reservas apresentadas na Tabela 2.
Tabela 2
Esimativa de Investimentos Anuais e Reservas Incorporadas
Investimentos (US$ bi) Incorporações (mil bbl)
US$ 55/bl US$ 85/bl US$ 55/bl US$ 85/bl
2007-11 11 11 1.450 1.450
2012-16 12 14 1.550 1.900
2017-21 14 17 1.850 2.300
2022-25 16 20 2.150 2.700
Fonte: Elaboração Própria
Pelo ângulo da produção, a política deve ser permanecer sendo ditada por uma lógica de
preservação de horizonte confortável das reservas (15 anos). Porém o ritmo de produção
será distinto nos dois cenários para o preço do petróleo. No cenário de preços mais
elevados, a produção de petróleo alcança 5,3 milhões de barris diários em 2025 e, no
cenário de menores preços, 4,5 milhões de barris/dia.
Figura 9
18
Produção Doméstica de Petróleo (mil barris/dia)
Fonte: Elaboração Própria
É importante ter presente que as atividades internacionais da Petrobras também podem
exercer efeito indutor na demanda doméstica de equipamentos e serviços. Dessa forma, à
produção doméstica de petróleo, é preciso adicionar a produção internacional da
Petrobras. O planejamento estratégico da Petrobras aponta para a intensificação das suas
atividades internacionais. A empresa publicou seus planos para o horizonte 2012, porém
temos poucos elementos para balizar a projeção. Consideramos que preços elevados do
petróleo acarretarão na aceleração da trajetória de internacionalização, pois a companhia
terá mais recursos próprios para investir. Entrevistas realizadas com técnicos da Petrobras
nos permitiram estimar um ritmo relativamente rápido de expansão da produção
internacional da empresa, especialmente na costa ocidental africana. A Figura 10
apresenta nossa estimativa para a produção internacional da Petrobras..
Figura 10
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021 2023 2025
mil
bl/
d
US$ 85/bl
US$ 55/bl
19
Produção Internacional de Petróleo (mil barris/dia)
Fonte: Elaboração Própria
A expansão das produções doméstica e internacional deverá exercer forte pressão na
demanda de plataformas. A Tabela 3 apresenta a necessidade de entrada de novas
plataformas, com capacidade de produção de 150 mil barris diários, para possibilitar
alcançar a produção prevista, levando em conta a queda de produção das plataformas
existentes. No plano doméstico, , seriam colocadas em operação 63 novas plataformas, no
período 2012-2025: preço mais baixo, demandaria a construção de 52 plataformas no
mesmo período. No plano internacional. Seriam construída 16 plataformas, no cenário de
preços elevados do petróleo e 11 plataformas no preços mais baixos.
Tabela 3
Projeção da Entrada em Produção de Novas Plataformas no Brasil - 2012-2025
Brasil Internacional
US$ 55/bl US$ 85/bl US$ 55/bl US$ 85/bl
2012-2016 14 15 3 4
2017-2021 19 23 4 6
2022-2025 19 25 4 6
Total 52 63 11 16
Fonte: Elaboração Própria
0
200
400
600
800
1000
1200
2007 2009 2011 2013 2015 2017 2019 2021 2023 2025
mil
bl/
d
US$ 85/bl
US$ 55/bl
20
2.4 Navios
A projeção da evolução de frotas de navios dedicados à movimentação de óleo e derivados
foi baseada nas estimativas de exportação de petróleo. As últimas derivam da diferença
esperada entre produção e demanda e do volume de petróleo importado na composição da
carga processada. Assumimos que durante o período analisado 20% da carga processada
nas refinarias brasileiras será composta por petróleo importado.
Estimamos um forte crescimento das exportações brasileiras de petróleo12
, já que o ritmo de crescimento da
de crescimento da produção é sensivelmente superior ao do consumo de derivados. Caso o cenário de preços do
cenário de preços do petróleo mais elevados ocorra, em 2025, o Brasil exportaria diariamente cerca de 4,9 milhões
diariamente cerca de 4,9 milhões de barris segundo nossas projeções. Com preços mais baixos, as exportações
baixos, as exportações totalizariam 3,2 milhões barris/dia (
Figura 11).
12 O total não corresponde a exportações líquidas já que o Brasil importa petróleo para ajustar a carga processada às características do parque de refino.
21
Figura 11
Exportações Brasileiras de Petróleo (mil barris/dia)
Fonte: Elaboração Própria
Metade da exportação brasileira de petróleo seria direcionada aos Estados Unidos e Caribe.
Viagens para esses destinos têm duração média de quinze dias e seriam utilizados navios
do tipo Suezmax, com capacidade para transportar um milhão de barris. Viagens para a
Europa, que representariam 35% das exportações brasileiras, têm duração de 30 dias e
também utilizam navios Suezmax. O restante das exportações (15%) será destinado a
países asiáticos, utilizando navios superpetroleiros (VLCC), com capacidade de transporte
de 2 milhões de barris, em viagens de quarenta e cinco dias. Consideramos que metade
do óleo será transportada em frota própria e metade, em navios fretados. A taxa de
utilização da frota própria será de 80%.
A frota nacional de petroleiros voltados à exportação seria multiplicada por nove até 2025,
para preços mais elevados, e por cinco, caso o preço do petróleo diminua (Figura 12 e
Figura 13). A ampliação seria concentrada em navios do tipo Suezmax, utilizados em
fretes para Europa e Estados Unidos. A Tabela 4 aponta as necessidades de aquisições de
navios ao longo do período de análise.
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
20
07
20
08
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20
23
20
24
20
25
US$ 85/bl
US$ 55/bl
22
Figura 12
Evolução Estimada Frota de Navios Necessária para Exportações Previstas
Preço do Petróleo US$ 85/bl
Fonte: Elaboração Própria
Figura 13
Evolução Estimada Frota de Navios Necessária para Exportações
Preço do Petróleo US$ 55/bl
Fonte: Elaboração Própria
0
10
20
30
40
50
60
702
00
8
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09
20
10
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11
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21
20
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20
23
20
24
20
25
V L C C
S uez max
0
10
20
30
40
50
60
70
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10
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11
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20
15
20
16
20
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20
18
20
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20
20
20
21
20
22
20
23
20
24
20
25
V L C C
S uez max
23
Tabela 4
Projeção da Necessidade de Aquisição de Navios Voltados à Exportação - 2007-2025
US$85/bl US$55/bl
Suezmax VLCC Suezmax VLCC
2007-2011 5 2 4 2
2012-2016 9 2 5 1
2017-2021 15 3 9 2
2022-2025 18 3 10 2
Total 47 10 28 7
Fonte: Elaboração Própria
Para estimar a frota de navios voltada ao transporte de derivados dentro do Brasil,
consideramos que essa deve acompanhar o crescimento do consumo doméstico. Navios
que têm essa finalidade têm capacidade média de 54 mil metros cúbicos. Como a frota de
navios de grande porte (Suezmax) será fortemente ampliada para atender às
necessidades de exportação, desconsideramos o efeito que o transporte interno possa vir
a ter na aquisição desses navios. Para o transporte de derivados, seria necessária a
aquisição de 28 novos navios com capacidade de 54.000 m3 até 2025, caso a economia
apresente desempenho mais favorável, e 23 navios, caso o cenário de menor crescimento
econômico se confirme.
Tabela 5
Projeção da Necessidade de Aquisição de Navios Voltados ao Transporte Interno – 2007-2025
US$85/bl US$55/bl
2007-2011 3 2
2012-2016 7 6
2017-2021 12 10
2022-2025 6 5
Total 28 23
Fonte: Elaboração Própria
24
3 COMPETITIVIDADE DA INDÚSTRIA PARA-PETROLIFERA BRASILEIRA (IPP)13
O governo brasileiro adotou como política a maximização do suprimento doméstico da
demanda de bens e serviços da IPGN. Essa política atende a necessidade das operadoras do
mercado petrolífero, para as quais a proximidade com os fornecedores é vantajosa para o
sucesso de seus projetos. Dessa forma, o desempenho econômico da IPGN brasileira será
fundamentalmente determinado pela competitividade de sua rede de fornecedores.
Até o final do século passado, o mercado petrolífero brasileiro era relativamente pequeno em
termos globais. Essa situação vem sendo alterada na presente década e tende a rapidamente
evoluir nas próximas, como pudemos identificar no capítulo anterior. Essa perspectiva cria
oportunidade para forte crescimento da IPP doméstica, porém esse crescimento será
fundamentalmente determinado pela capacidade do parque industrial doméstico alcançar
patamar competitivo internacional. Este capítulo busca analisar essa dimensão em dezoito
(18) segmentos produtivos identificados pela equipe do PROMINP como de relevância
econômica e importância estratégica para o desenvolvimento da IPGN no momento atual.
O quadro 1 apresenta o conjunto de segmentos objeto deste estudo. Eles foram estruturados
em cinco grandes grupos, três deles compostos em função da base tecnológica utilizadas
pelas firmas: metalúrgica, mecânica e elétrica. O segmento de navipeças foi singularizado
por ser composto por firmas com base tecnológica nos três grupos anteriores. Os dois
segmentos de engenharia compõem o último grupo.
Cada segmento selecionado foi alvo de estudo específico. A revisão da literatura e a análise
de dados estatísticos permitiram uma primeira aproximação da questão. Contudo, a
percepção apresentada nesses estudos foi fundamentalmente estruturada com base em
entrevistas realizadas na amostra de empresas selecionadas14 pela equipe do Prominp para
visitas técnicas aos sítios fabris.
13 Esta seção foi elaborada tomando como base os relatórios presentes no Anexo, que podem ser acessados através do atalho a seguir: Consolidado; Bombas; Caldeiraria; Compressores; Construção e Montagem; Engenharia; Flanges e Conexões; Geradores e Motores Elétricos; Guindastes e Offshore; Hastes e Unidades de Bombeio; Instrumentação; Motores a Gás e a Diesel; Navipeças; Processo Inovativo; Siderurgia; Subestações e Transformadores; Subsea; Turbinas; Válvulas e City Gate. 14 A seleção das empresas representativas de cada segmento estudado que deveriam ser entrevistadas foi com base em seu cadastro de fornecedores da Petrobras.
25
Quadro 1
Principais Características dos Setores Investigados
Base Tecnológica Segmento do PROMINP
In
dústr
ia d
e T
ransfo
rmação
Tecnologia Metalúrgica
Siderurgia
Tubos, Conexões e flanges
Caldeiraria N
avip
eças
Tecnologia Mecânica
Válvulas
Bombas
Compressores
Motores a gás e a diesel
Hastes e Unidades de Bombeio
Turbinas
Guindastes e Guinchos
Subsea
Tecnologia Elétrica
Geradores e Motores Elétricos
Subestação e Transformadores
Instrumentação
Engenharia
Projeto de Engenharia
Serviços de Engenharia
Construção e Montagem
Fonte: Elaboração própria a partir dos relatórios em anexo
Para orientar as entrevistas foram utilizados questionários, nos quais buscamos obter
informações quantitativas e qualitativas quanto à situação atual e quanto às perspectivas de
expansão de duas dimensões fundamentais para a competitividade da IPGN: capacidade
instalada e capacitação tecnológica. Essas duas dimensões serviram como fundamentos na
elaboração de nossa percepção relativa à competitividade da IPP e o conjunto de estudos nos
permitiu elaborar uma visão geral da competitividade da IPP no momento atual. Com base
nessa visão, formulamos propostas de políticas que, se adotadas, permitirão incrementar a
competitividade da IPP, objetivo central de nosso estudo.
A hipótese que sustenta nosso estudo é que a IPGN está passando por mudança qualitativa,
fruto do incremento de sua escala produtiva. Produtor marginal de petróleo, o Brasil caminha
celeremente para uma posição de destaque no suprimento de hidrocarbonetos não apenas
para o mercado doméstico, onde já alcançamos condições sustentáveis de auto-suficiência. A
situação de exportador líquido de combustíveis deverá ser ampliada nos próximos anos, fruto
da expansão da produção doméstica de hidrocarbonetos nas próximas décadas.
O Brasil conta com vastas bacias sedimentares ainda pouco exploradas, tanto em terra
quanto na plataforma continental. A elevação de preço do barril de petróleo para novo
patamar, superior ao vigente até a década passada (entre US$25 e US$30) abre ampla
26
janela de oportunidades para inovações tecnológicas, especialmente na área do offshore em
que a Petrobras exerce liderança tecnológica. As expectativas otimistas dos analistas quanto
a descobertas de novos campos de hidrocarbonetos no Brasil15 são corroboradas pelo
interesse demonstrado pelos agentes do mercado nas licitações de blocos realizadas pela
ANP nos últimos dois anos (Figura 14).
Por outro lado, a retomada do crescimento sustentado, a taxas relativamente elevadas,
indica que a infra-estrutura de processamento e transporte de hidrocarbonetos, necessária
para atender a demanda de combustíveis da economia, também sofrerá expansão
sustentada. Já foram iniciados os projetos de construção de duas refinarias, e estão em
andamento expansões das existentes. A indústria naval está renascendo e uma rede de
gasodutos interconectando o território nacional, como ocorre no setor elétrico, está em
construção. Nossas estimativas quanto à evolução da demanda de combustíveis no longo
prazo corroboram estimativas realizadas pela EPE16. Para atender a essa demanda será
necessário dar início a novos projetos de infra-estrutura até o final da presente década.
Figura 14
Número de empresas que apresentaram ofertas
e valores arrecadados nas rodadas de licitação da ANP
Fonte: ANP.
A conclusão central de nosso estudo é que o conjunto de segmentos estudados apresenta um
déficit significativo de competitividade, vinculado à atual fragilidade da engenharia nacional e
15 O Departamento de Energia do EUA cenariza 4,4 milhões de b/d para a produção brasileira em 2030. 16 Plano Decenal de Energia, www.epe.org.br
0
5
10
15
20
25
30
35
Rodada 1 Rodada 2 Rodada 3 Rodada 4 Rodada 5 Rodada 6 Rodada 7
Núm
ero
de E
mpre
sas
0
200
400
600
800
1000
1200
R$ m
ilhões
Empresas que apresentaram ofertas Arrecadação (R$ milhões)
27
à limitada capacitação tecnológica para inovar. Porém, não devem ser negligenciadas as
dificuldades identificadas na coordenação da cadeia produtiva, especialmente no que se
refere ao papel das firmas de engenharia, construção e montagem (EPCistas). Esse déficit
distribui-se de forma diferenciada entre os segmentos estudados, pois, se alguns apresentam
condições competitivas para operarem inclusive no mercado global, outros apresentam
lacunas produtivas relevantes que limitam o suprimento adequado do mercado doméstico.
Praticamente todos os segmentos analisados reúnem capacidade produtiva para atender a
maior parte da demanda de equipamentos da IPGN nos próximos anos, sempre que não
ocorram picos acentuados de demanda. Pudemos também verificar que as empresas
entrevistadas estão dispostas a investir na expansão de sua capacidade de produção, caso
venham a identificar um cenário claro de expansão para a demanda de seus equipamentos e
serviços.
No entanto, verificamos a existência de lacunas no suprimento doméstico, algumas delas
dificilmente preenchíveis pelo fato de o mercado brasileiro não oferecer a escala necessária
para a viabilidade de produção doméstica competitiva. Cabe destacar, porém, que a
perspectiva de expansão da demanda doméstica, se acoplada a programas de exportação
para a IPGN do Atlântico Sul, oferece oportunidades para que diversas dessas lacunas
venham a ser preenchidas. Para tanto, é necessária a adoção de políticas específicas que
induzam a produção doméstica desses equipamentos.
3.1 Panorama da Competitividade Setorial17
A competitividade industrial pode ser definida como a capacidade de ofertar produtos ao
mercado a preços competitivos, com qualidade adequada e prazos de entrega
satisfatórios. Ela resulta da capacidade de a firma organizar e gerar métodos eficientes de
produção (Haguenauer 1989, Kupfer 1992), podendo ser medida pela capacidade de
manter e ampliar suas parcelas de mercado. A competitividade é fruto de diversos fatores,
alguns internos à firma, outros ditados pela estrutura do mercado e outros mais pelas
condições sistêmicas em que a firma opera (Coutinho e Ferraz, 1995).
Os fatores estruturais referem-se às características da demanda, à configuração do parque
ofertante e a aspectos institucionais, entre os quais se destacam as normas e
regulamentos determinados pelo governo. No plano sistêmico, são importantes os
aspectos macroeconômicos (taxa de câmbio, taxa de juros, política tributária etc.) e os
17 O anexo contém a ferramenta desenvolvida para analisar os efeitos de mudanças tributárias nos preços de setores industriais participantes da IPP. Esta ferramenta pode ser alcançada através do seguinte atalho: Relatório Ferramenta Alterações.
28
aspectos infra-estruturais, tais como disponibilidade e custo de energia, transportes,
telecomunicações e serviços tecnológicos.
Os fatores internos à firma são compostos pelos ativos que ela mantém acumulados, sua
capacidade de acompanhar a evolução da demanda do mercado e de se transformar para
atender os requisitos ditados pelo mercado. A análise que apresentamos a seguir está
centrada apenas e tão somente em aspectos internos à firma: a escala requerida para sua
operação eficiente e os requisitos de capacitação tecnológica para a oferta de seus
produtos com a qualidade requerida, em prazos adequados e com preços compatíveis com
os praticados no mercado internacional.
Escala Produtiva e Fontes de Inovação
O quadro 2 apresenta as condições de economias de escala vigentes em cada um dos
segmentos estudados. A primeira coluna informa a dimensão da escala requerida
tecnicamente para a operação de uma unidade fabril. A segunda coluna apresenta a
dimensão relativa do mercado nacional com respeito à escala. O mercado é considerado
suficiente se é possível ter unidade fabril das dimensões requeridas tecnicamente e
insuficiente em caso contrário. A terceira coluna informa se existem lacunas relevantes de
fornecimento de produtos e a quarta coluna procura informar a principal razão das lacunas
existentes.
Quadro 2
Economias de Escala e especialização da Unidade Fabril
Fonte: Elaboração própria a partir dos relatórios em anexo.
Legenda: Grande Média Pequena
29
O Quadro 2 indica que o conjunto dos segmentos estudados reúne condições competitivas
do ponto de vista da escala produtiva para o essencial da demanda de equipamentos da
IPGN. Apenas no segmento de instrumentação o problema da escala é relevante. No
entanto, pudemos identificar lacunas na produção de equipamentos específicos, na maioria
dos casos determinadas pela dimensão do mercado doméstico. Não é razoável imaginar
que todas essas lacunas devam ser preenchidas. Contudo, é pertinente explorar em que
medida a mudança de escala por que está passando a IPGN sugere a oportunidade para o
preenchimento de algumas dessas lacunas, particularmente se adotada a estratégia de
exportação desses equipamentos. Voltaremos a esse tema mais adiante neste relatório.
Nosso estudo, a partir de pesquisa do IBGE (PINTEC, 2003), permitiu identificar que os
fornecedores da IPGN desenvolvem atividades inovadoras em ritmo superior à média das
firmas brasileiras. Um terço das empresas da IPP constantes na base de dados da PINTEC
produz inovações de produto que consistem em novidade para o mercado brasileiro,
enquanto 15% dessas empresas introduzem das inovações de processo que são novidade
para sua indústria (na indústria brasileira em geral esses valores são respectivamente 8%
e 3%). Este resultado identificado advém principalmente de atividades de cooperação
entre firmas no desenvolvimento de equipamentos, processos e rotinas. Essa situação
indica que boa parte do esforço de inovação na IPGN deve ser orientada para a interação
tecnológica das firmas atuantes ao longo da cadeia produtiva.
É preciso ressaltar que os gastos em atividades inovativas da IPGN são ainda muito
reduzidos. A razão entre o gasto em P&D e o faturamento dos fornecedores da IPGN situa-
se em 0,65%, patamar muito inferior ao identificado por firmas semelhantes em outras
partes do mundo (ver Acha e Cusmano, 2001 e Hatakenaka et al. 2006). Essa constatação
sugere que os investimentos em atividades de pesquisa e desenvolvimento tecnológico
necessitam ser substancialmente incrementados para que o ritmo de inovação na IPGN
brasileira acompanhe o que ocorre em outros pólos fornecedores. Caso isso não ocorra, o
risco de perda de competitividade da IPGN será crescente.
O Quadro 3 apresenta uma listagem das fontes de conhecimento utilizadas pelas empresas
entrevistadas. Elas foram divididas de acordo com a localização da origem de seu
conhecimento: interna ou externa. Entre as fontes internas à firma são listadas: i)
pesquisa e desenvolvimento (P&D) local; ii) engenharia; iii) aprendizado na atividade
(learning-by-doing); iv) informações tecnológicas oriundas da matriz. As fontes externas
são divididas em dois grupos: fontes intra-industriais, obtidas em clientes e/ou
fornecedores, e aquelas associadas à infra-estrutura tecnológica do país, basicamente
oriundas de universidades, centros de pesquisa, institutos de normatização ou à
transferência de tecnologia de fontes exógenas à empresa.
30
Quadro 3
Fontes de Conhecimento Internas às Firmas Consideradas Importantes
Fonte: Elaboração própria a partir dos relatórios setoriais.
Um dos aspectos mais importantes que emerge desse quadro é a reduzida importância das
atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) como fonte de conhecimento tecnológico
para os fornecedores da IPGN. A principal fonte de conhecimentos tecnológicos dos
fornecedores é o aprendizado na produção dos equipamentos (learning-by-doing),
corroborando os resultados obtidos no nosso estudo a partir da PINTEC.
O fato de o aprendizado na produção (learning-by-doing) aparecer como uma das
principais fontes de conhecimento é de certa forma positivo, pois indica que as firmas
dedicam parte do seu tempo de produção para adquirir informações tecnológicas.
Contudo, é preciso ter presente que, ao negligenciar as atividades de P&D, o
conhecimento tecnológico adquirido fica restrito às atividades correntes da empresa.
Dessa forma, o esforço inovativo fica essencialmente orientado para aprender com o
passado, sendo limitado o conhecimento adquirido orientado para o futuro, necessário no
preenchimento de lacunas produtivas.
Outro aspecto que o Quadro 3 ressalta é a importância do papel coordenador do processo
inovativo exercido atualmente pela Petrobras. A interação com a operadora é fundamental
para a obtenção de informações tecnológicas pelos fornecedores. Atualmente, a Petrobras
31
vem exercendo funções de monitoração das práticas de produção e consolidação de
tecnologia industrial básica em dois segmentos: válvulas e city gates e flanges e conexões.
Ao mesmo tempo, desenvolve novos produtos em conjunto com seus fornecedores, sendo
empresas dos segmentos de turbinas e compressores exemplos desse tipo de qualificação.
Esse resultado indica a necessidade de esta função ser preservada.
Esse aspecto merece especial atenção na medida em que os EPCistas estão adquirindo
crescente importância na coordenação dos projetos da IPGN, sem que a questão da
coordenação do processo inovativo esteja embutida no conjunto de suas atividades, e na
medida em que outras operadoras incrementam sua participação no cenário na IPGN.
O quadro 3 também deixa claro que as articulações dos fornecedores da IPGN com a infra-
estrutura científica e tecnológica nacional são tênues. Esse distanciamento acaba
sobrecarregando a Petrobras, que é obrigada a manter equipes de supervisão da qualidade
dos equipamentos, inclusive com inspeções residentes, para garantir sua competitividade
econômica. A ausência de interação com órgãos de metrologia e normatização é
particularmente preocupante, na medida em que a obediência estrita de normas técnicas,
inclusive com a certificação de procedimentos, é condição sine qua non para a preservação
da competitividade da IPGN. Esse aspecto é fundamental no segmento de navipeças e é
também importante no segmento de flanges e conexões. No entanto, é importante notar,
que o sistema de metrologia doméstico não reúne condições para efetuar determinados
testes, obrigando certos fornecedores a buscar certificação no exterior. Essa solução é
dispendiosa e, em certas circunstâncias, impede o fornecimento doméstico de
equipamentos para a IPGN.
A interação com a infra-estrutura de P&D foi fator fundamental para a montagem de rede
de fornecedores no Mar do Norte. A reduzida cooperação com essa infra-estrutura é,
portanto, preocupante, principalmente em segmentos que a falta de capacitação
tecnológica induz a persistência de lacunas de fornecimento. A intensificação do fluxo de
conhecimento entre os segmentos produtivos e a infra-estrutura de P&D é fundamental
para o sucesso do movimento inovativo da IPGN e, por conseqüência, de sua
competitividade econômica. Essa interação é especialmente necessária com as empresas
de engenharia.
O quadro indica que os fornecedores da IPGN desenvolvem forte interação com agentes no
exterior, com o objetivo de adquirir informações tecnológicas. A interação ocorre tanto
mediante transferência de conhecimento intra-firma, no caso das empresas
multinacionais, quanto por meio de contratos de transferência de conhecimento do
exterior, no caso de empresas nacionais. O primeiro caso é mais comum, fruto da forte
32
participação de empresas multinacionais no conjunto de fornecedores da IPGN. É
importante notar que a aquisição de conhecimento tecnológico no exterior é realizada sem
que, em contrapartida, sejam efetuados gastos domésticos em P&D.
Deve-se ressaltar a limitada experiência no país na elaboração de projeto básico,
conhecimento que está atualmente concentrado na Petrobras. Essa situação é patente no
caso da caldeiraria, onde a falta de profissionais capacitados induz as empresas a fazerem
uso de licenciamentos e contratos de transferência de tecnologia.
Capacidade de Produção
São poucos os segmentos estudados que apresentam capacidade instalada insuficiente
para atendimento da demanda esperada pela IPGN. Em alguns casos, como Subestação/
Transformadores/Sistemas Elétricos e Siderurgia/Tubos, o aquecimento da demanda seja
nacional (no primeiro caso), seja mundial (no segundo caso) pode gerar problemas de
fornecimento associados principalmente à extensão dos prazos de entrega ou ao
incremento dos preços dos produtos.
As empresas entrevistadas demonstraram disposição para investir nos próximos anos para
atender a expansão da demanda, com exceção das firmas dos segmentos de
instrumentação e de engenharia. No caso das empresas de engenharia, a situação atual é
explicada pela escassez de mão-de-obra, fruto da paralisia do setor desde meados da
década de 80 até finais da década de 90. Mais recentemente, o deslocamento da execução
dos projetos para os EPCistas (firmas de engenharia, construção e montagem) veio
agregar dificuldades adicionais para a atuação das firmas tradicionais de engenharia. Já o
segmento de instrumentação é dominado por empresas multinacionais que adotam como
estratégia a importação de produtos de outras empresas do grupo, ficando a filial
brasileira responsável apenas pela conservação, manutenção e vendas dos equipamentos.
Os principais obstáculos à ampliação da capacidade instalada estão associados à incerteza
quanto à demanda futura da IPGN e à disponibilidade de mão-de-obra qualificada. O
problema da incerteza quanto à demanda futura é particularmente relevante no caso das
empresas com maior grau de dependência da IPGN. O problema da qualificação da mão-
de-obra especializada está sendo equacionado pelo PROMINP, por intermédio de um amplo
conjunto de cursos (PNPQ). No entanto, permanece um vácuo significativo na área da
engenharia, onde é particularmente importante o treinamento on the job. Nesse caso, é
fundamental a continuidade da demanda como forma de qualificação.
A instabilidade temporal dos investimentos da IPGN produz vales e picos profundos na
curva de demanda de equipamentos. Esta situação induz os fornecedores a programar sua
capacidade de oferta em patamar significativamente abaixo da demanda média, tornando
33
inevitáveis níveis elevados de importação nos períodos de pico. Como resultado dessa
estratégia, o conteúdo nacional médio dos projetos da IPGN fica abaixo do patamar que
poderia ser alcançado caso a programação dos projetos seja mais bem distribuída no
tempo e os fornecedores nacionais perdem o benefício de ganhos de escala que
aumentariam a sua competitividade.
É importante que esses vales e picos sejam reduzidos. Para tanto, é preciso que as
empresas sejam menos dependentes da demanda do mercado brasileiro, pois as
exportações podem atuar como importante fonte de redução dos efeitos nocivos das
flutuações agudas na curva de demanda doméstica de equipamentos. Nesse sentido, é
preciso criar canais para a entrada dos fornecedores domésticos nos mercados externos,
tarefa que exige das associações empresariais um papel ativo na identificação de
mercados potenciais, inclusive apoiando-se nas unidades de negócio da Petrobras no
exterior. Além disso, é importante que a Petrobras, praticamente a única demandante de
equipamentos da IPGN no Brasil, adote políticas que permitam minimizar os vales e picos
de sua demanda de equipamentos.
Identificamos lacunas no suprimento da demanda de determinados bens, concentrados no
upstream e no transporte marítimo. São poucas as situações em que a indústria doméstica
é incapaz de fornecer equipamentos para o downstream. Essa situação diferenciada pode
ser explicada por dois elementos: i) os processos históricos de desenvolvimento do
upstream e do downstream; ii) as barreiras naturais impostas pela internação dos
equipamentos, no caso do downstream.
Os segmentos fornecedores do downstream foram implantados em um período de forte
proteção do mercado doméstico, com substanciais incentivos à produção local oferecidos
pela Petrobras. Além disso, a maior parte dos equipamentos utilizados no downstream
enfrenta dificuldades naturais e tarifárias para sua importação.
A situação do upstream é radicalmente diferente nesses dois aspectos. O essencial da
produção brasileira de petróleo ocorre offshore e essa produção adquiriu escala somente a
partir da década de 1990. Nessa época a abertura comercial era central na política
econômica e, paralelamente, a indústria do petróleo adotou nova estratégia empresarial,
que repassa para os EPCistas a gestão da montagem e aquisição de bens necessários para
seus projetos de desenvolvimento de campos de petróleo. Além disso, foi adotada no
Brasil uma legislação tributária (REPETRO) que tem como resultado o tratamento
assimétrico (beneficiando a importação) para o suprimento doméstico de equipamentos
para o offshore. Essas condições dificultaram o desenvolvimento de fornecedores
domésticos para o offshore, porém essa situação vem se modificando mais recentemente.
34
Ao contexto histórico diferenciado devem-se somar alguns obstáculos adicionais que
induzem o surgimento de lacunas. Em primeiro lugar, há o problema da escala produtiva.
Esse fator adquire maior relevância no fornecimento de equipamentos de grande porte,
negociados irregularmente. Esse é o caso de motores a gás e a diesel de grande porte,
turbinas de grande potência e turbinas a gás de qualquer dimensão, alguns insumos de
compressores, guindastes e guinchos, instrumentação e diversas navipeças. Nesses
segmentos, são poucas as empresas atuantes no mercado internacional e a escala mínima
eficiente é francamente superior à demanda do mercado nacional. Essa situação torna
difícil a instalação de unidades produtoras no país.18
Em outros segmentos, não existe capacitação tecnológica nas empresas domésticas. Esse
é o caso principalmente de válvulas, em que há dificuldade na produção de determinados
bens (válvulas de tight shut-off e algumas usadas no subsea)19. No caso de engenharia, a
paralisia do setor gerou um quadro de desqualificação técnica que só pode ser superada
mediante política ativa de formação de novos quadros técnicos.
A Questão do REPETRO
O REPETRO é um regime aduaneiro criado para incentivar a pesquisa e lavra de petróleo,
concedendo benefícios fiscais para importação e exportação de bens e serviços destinados
à IPGN.20 Inicialmente elaborado para um conjunto de bens principais utilizados na
atividade de pesquisa e lavra, o REPETRO foi estendido para cobrir também bens
acessórios.
O REPETRO prevê: i) regime especial de admissão temporária aos bens exportados com
saída ficta do território nacional; ii) o regime de drawback, na modalidade de suspensão
do pagamento dos impostos incidentes, de matérias-primas, produtos semi-elaborados e
partes e peças, para a produção de bens a serem exportados nos termos do inciso
anterior; iii) concessão do regime especial de admissão temporária, quando se tratar de
bens estrangeiros ou desnacionalizados que procedam diretamente do exterior.
A dificuldade criada pelo REPETRO é a falta de isonomia entre as empresas domésticas e
as localizadas fora do país. Existem duas questões a serem exploradas. A primeira é a
dificuldade em desonerar toda a cadeia produtiva. Os problemas se iniciam com o fato de
diferentes estados serem envolvidos no fornecimento, o que gera obstáculos de diversas
naturezas para a isenção do ICMS. Negociações são empreendidas no sentido de viabilizar
18 É interessante a comparação do fornecimento desses equipamentos com o caso de transformadores e motores elétricos em que uma empresa nacional aproveitando um momento favorável sob o ponto de vista de fornecimento e de demanda mundial conseguiu adquirir escala de fornecimento para ser competitiva no nível internacional. 19 A estratégia das empresas multinacionais de não direcionamento da produção de válvulas de alto desempenho para o Brasil sugere dificuldades de preenchimento dessa lacuna. 20 Instrução Normativa 4 de 16.1.2001 (http://www.receita.fazenda.gov.br/legislacao/ins/2001/in0042001.htm).
35
isenções, mas são de difícil execução. Deve-se acrescentar que mesmo nas situações em
que a isenção é obtida, o uso dos créditos de ICMS não é assegurado. Ademais, medidas
governamentais recentes restringindo a transferência de créditos dentro de um consórcio
EPCista tornam ainda mais difícil a execução desses procedimentos. É importante notar
que empresas integradas têm maior facilidade de obter o uso de crédito do que empresas
não-integradas. Essa situação pode gerar excessiva integração das empresas na atividade,
o que é ineficiente dada a lógica do sistema turn-key com EPC descrita acima.
A segunda dificuldade apresentada pelo REPETRO é a complexidade da legislação. Os
relatos sobre as engenharias tributárias realizadas e as pendências geradas são originários
de situações bastante complexas. Além disso, interpretações contraditórias da legislação
geram incertezas na obtenção de isenções, além de resultarem em pendências cuja
resolução demanda tempo e imobilização de recursos valiosos para as empresas.
3.2 Análise Setorial
Nesta seção procedemos à análise das condições de competitividade em cada um dos grupos
de segmentos estudados.
Tecnologia Metalúrgica
Não se pode identificar um padrão de competitividade entre os setores que adotam
tecnologias de base metalúrgica. As diferenças são profundas nos processos produtivos:
processo de fluxo contínuo, no caso da siderurgia, montagem de produtos seriados, no
caso de flanges e conexões, e bens de capital sob encomenda, no caso de caldeiraria (ver
Quadro 1). A siderurgia é um setor de base que produz insumos para diversos setores da
economia. A caldeiraria produz bens de capital para o uso em diversas indústrias de fluxo
(papel, açúcar etc). O segmento de tubos tem nas redes de dutos o essencial de sua
demanda enquanto o segmento flanges e conexões é subsidiário das demandas de
tubulações e válvulas.
No caso da siderurgia, a escala de operação e tamanho da unidade fabril (e
conseqüentemente, da firma) é muito superior àquelas dos demais segmentos. A
dimensão de suas unidades produtivas, seu nível de especialização e sua atuação no
mercado internacional tornam sua relação com os segmentos produtivos da IPGN pouco
relevantes para a competitividade setorial. A produção de conhecimento tecnológico nesse
setor é praticamente independente do comportamento da IPGN, e o volume de
exportações do setor siderúrgico brasileiro é a melhor evidência da sua competitividade.
36
No entanto, é importante dar atenção para alguns aspectos relevantes da interação entre
a siderurgia e a IPGN. Atualmente, uma empresa siderúrgica exerce controle da oferta de
aços para a IPGN. Na compra de aços para construção de navios e de plataformas, a
dimensão das empresas envolvidas na negociação não permite a geração de assimetrias
relevantes. Esse, porém, não é o caso da caldeiraria. Neste caso, a negociação com as
empresas siderúrgicas é difícil, sendo adotada como solução a compra do aço de
distribuidores, o que eleva custos.
No caso de tubos de aço, o contrato realizado pela Petrobras já define as condições do
fornecimento, o que a maior parte de seus problemas relativos ao suprimento desse
insumo. As empresas atuantes nesse segmento são competitivas, reunindo condições
adequadas para atender os requisitos de qualidade e para cumprir prazos de entrega. As
empresas produtoras de tubos que atendem a IPGN são empresas multinacionais que
operam no mercado global, aptas para competir no mercado interno e externo. Elas
possuem condições financeiras e tecnológicas para aumentar o volume de investimento,
caso o mercado se mostre atrativo.
No caso de conexões e flanges, a escala necessária para a operação eficiente é pequena. O
mercado é especializado, sendo a IPGN seu maior mercado. Não há problemas de oferta
nesse segmento, porém há problemas sob o ponto de vista da capacitação tecnológica. A
Petrobras mantém um esquema estrito de inspeção, para garantir a adequação dos
produtos às normas de qualidade. A aproximação das empresas desse segmento com a
infra-estrutura de metrologia e normatização é necessária para que o segmento alcance
níveis adequados de competitividade.
A caldeiraria pesada encontra-se em situação mais complexa. A paralisia desse segmento
desde a década de 80 gerou dificuldades para as empresas que não buscaram a
especialização como estratégia empresarial. Ainda que haja casos isolados de
especialização, essa característica não é predominante no segmento que opera com
significativa capacidade ociosa. O segmento ressente-se da falta de profissionais
capacitados, principalmente na área de engenharia e o valor agregado pelas atividades do
segmento está praticamente reduzido ao uso de horas homem de mão de obra
especializada.
O segmento é fortemente dependente da demanda de equipamento da IPGN e, sendo
assim, as flutuações nessa demanda produzem forte impacto na competitividade da
caldeiraria pesada. Os problemas no campo tecnológico são também importantes, mais
precisamente na área de engenharia. Além disso, as empresas que apresentam maior
37
capacidade competitiva são dependentes de licenciamento e autorização externa das
tecnologias que utilizam.
No segmento de caldeiraria, a principal lacuna produtiva decorre da limitação na
calandragem para a produção de equipamentos de grande porte, como reatores HDT. Esse
problema é, entretanto, pouco relevante, pois são poucos os equipamentos que
necessitam de calandras inexistentes no mercado nacional e a demanda desses
equipamentos é esporádica. O preenchimento dessa lacuna só se justifica em um cenário
em que empresas nacionais venham a adquirir capacidade para competir no mercado
internacional, cenário que pressupõe a solução do problema da capacitação na área de
engenharia.
Tecnologia Mecânica
O grupo de base em tecnologia mecânica apresenta, no geral, escala mínima baixa ou
média. As empresas atuantes nesses segmentos têm unidades fabris com escala
adequada, apresentando alto grau de especialização. Os segmentos desse grupo reúnem
condições para o suprimento de bens em termos competitivos. Alguns segmentos são
liderados por empresas multinacionais que fazem uso de conhecimento de suas matrizes
para garantir o suprimento em condições tecnológicas adequadas. O problema de escala
produtiva ocorre apenas no caso de equipamentos de grande porte.
No segmento de bombas, o mercado brasileiro apresenta escala suficiente, para pelo
menos duas a três empresas de porte intermediário. No de compressores, existe problema
na produção do bare compressor, componente estratégico que exige escala mundial para
sua produção competitiva. No segmento de motores a gás e a diesel, a dimensão do
mercado brasileiro comporta a produção de motores industriais para grupos geradores e
motobombas, porém ainda é insuficiente para comportar a produção de motores de maior
porte, demandados em sua maior parte pelas embarcações. Os segmentos de guindaste,
guinchos e turbinas encontram-se em situações similares às dos motores: as turbinas e os
guindastes de maior porte não são produzidos no país. Nesses casos, apesar da presença
no país de empresas fornecedoras, subsistem lacunas que podem ser preenchidas pela
indústria nacional, na medida em que há uma perspectiva concreta de forte ampliação da
escala da IPGN. Sob o ponto de vista tecnológico, o grupo de tecnologia mecânica baseia-
se no aprendizado, na engenharia e na interação com clientes.
O segmento subsea é parte do core business das empresas petrolíferas e, portanto, é
componente estratégico da IPGN. A Petrobras é empresa líder nessas tecnologias, atuando
em estreita colaboração com principais empresas multinacionais com capacitação
tecnológica nesse segmento. A interação constante com a Petrobras, o significativo esforço
38
de P&D realizados nas matrizes e a manutenção de departamentos de engenharia densos
nessas empresas garantem as condições competitivas dos fornecedores desse segmento.
Porém, há um déficit importante de capacitação com base no sistema científico e
tecnológico nacional, situação que pode vir a se configurar uma fragilidade competitiva no
futuro.
Os demais segmentos podem ser divididos em dois grupos: (i) segmento que têm
predominância de empresas de capital multinacional; e (ii) segmentos que têm nas
empresas de capital nacional seus principais representantes. No primeiro grupo, situam-se
bombas, compressores, motores a gás e a diesel, hastes e unidades de bombeio e
guindastes e guinchos. No segundo grupo, estão turbinas e válvulas.
No caso dos grupos multinacionais, o conhecimento flui diretamente da matriz para a
subsidiária brasileira. A localização de atividades tecnológicas no país depende
fundamentalmente da intensidade de interação requerida pelo cliente (ou condições de
adaptação da demanda), da capacitação da infra-estrutura tecnológica (ou condições de
oferta de tecnologia) e da importância do papel da subsidiária na estruturação
internacional da empresa.
Algumas multinacionais, como as atuantes no segmento de bombas, têm unidades fabris
no Brasil de classe mundial. O papel da subsidiária brasileira na estratégia da matriz é
importante, tendo para tanto a interação com a Petrobras. No segmento de compressores,
a unidade de produção foi estruturada para atender a IPGN. No caso de motores, as
empresas fornecedoras de motor de reduzida potência têm boa posição no mercado
nacional e reúnem condições tecnológicas adequadas, ainda que a interação com a IPGN
seja marginal. Porém para a produção de motores de grande porte está sendo realizado
um grande esforço de transferência de tecnologia visando o desenvolvimento de um
montador nacional (que não fabricará as peças fundamentais). Serão necessários esforços
subseqüentes de engenharia e P&D, caso se queira manter um produtor nacional
competitivo.
No caso de empresas de capital nacional, esforços mais intensos devem ser feitos para
atingir competitividade. O segmento de turbinas tem empresas com departamentos de
engenharia relativamente densos e estão inseridas no mercado internacional. Porém, a
interação com Universidades e Centros de Pesquisa é ainda reduzida e será necessário
intensificá-la no sentido do desenvolvimento de produtos com maior potência e conteúdo
tecnológico. O segmento de válvulas passou por recente reestruturação motivada pela
implantação de inspeção residente pela Petrobras. Os resultados parecem ter sido bons.
39
Contudo, os departamentos de engenharia desse segmento ainda têm porte reduzido e
seu adensamento é necessário.
Tecnologia Elétrica
Os setores que adotam tecnologias de base elétrica apresentam requisito de escala,
embora não exijam grande especialização de suas plantas. Nos segmentos que têm o setor
elétrico como principal demandante (geradores, motores elétricos, subestação e
transformadores), as empresas apresentam porte suficiente para atingir níveis eficientes
de escala. Deve-se acrescentar que, nesses segmentos, as exportações são elevadas,
indicando fornecimento competitivo no nível mundial. Além da interação com seus clientes,
esses segmentos têm nas atividades internas de P&D a sua principal fonte de
conhecimento. São, portanto, fornecedores de conhecimento para o setor petróleo.
As maiores dificuldades identificadas estão associadas a obstáculos de inserção em redes
de montagem de sistemas elétricos. A montagem é realizada muitas vezes por empresas
estabelecidas internacionalmente que são fornecedoras de equipamentos complementares,
sem oferta no país. Três situações criam obstáculos ao fornecimento por empresas
nacionais: i) as empresas montadoras localizadas fora do país preferem comprar de suas
subsidiárias; ii) a montagem é realizada fora do país, criando custos adicionais para o
equipamento nacional que deverá realizar viagens de ida e volta; iii) apesar de a
montagem poder ser feita no Brasil, a realização de testes fora do país cria os mesmos
custos do item anterior.
Incentivos à realização de montagem no país e o estabelecimento de empresas que
possam executar os testes necessários estão entre as medidas a serem tomadas para
aumentar a competitividade desses segmentos.
Esses setores apresentaram fortes reclamações quanto ao REPETRO. Segundo eles, a
desvantagem de preço trazida pela obrigação de pagamento do ICMS traria um diferencial
de custo de cerca de 8% para o fornecedor doméstico. Esse problema é particularmente
relevante para o fornecimento de cadeias produtivas com reduzido custo de internalização,
pois o diferencial impositivo retira a competitividade do fornecedor brasileiro.
No segmento de instrumentação, é grande a inserção das empresas multinacionais. Esse
segmento tem papel estratégico na economia e é alvo da política industrial específica.
Contudo, a escala produtiva mínima exigida cria sérios obstáculos para o desenvolvimento
desse segmento no país. Algumas das empresas multinacionais adotaram a especialização
do processo produtivo com baixo conteúdo local. A segmentação do mercado de forma a
permitir a produção ou montagem de alguns equipamentos no Brasil é uma maneira de se
capacitar o setor para posterior ampliação do conteúdo local.
40
Duas formas de capacitação tecnológica são hoje utilizadas pelas empresas. As
multinacionais trazem o conhecimento de suas matrizes, enquanto as empresas de capital
nacional procuram estabelecer laços tecnológicos no exterior, realizando inclusive
atividades de P&D fora do país. A troca de informações com o exterior parece essencial
para esse setor, principalmente dada a limitada capacidade instalada de produção no país.
Projetos de Engenharia
No grupo de engenharia, as empresas de construção e montagem enfrentam enormes
desafios para alcançarem competitividade. O primeiro problema é a constituição de ativos
significativos que possam servir como garantias nos níveis exigidos pela IPGN. Resolvida
essa questão, é necessário identificar instalações com capacidade produtiva para atender
os requisitos e especificações normativas da IPGN. Esse problema é menor no caso do
refino e da instalação de gasodutos, porém é crucial no caso das plataformas e navios, já
que as instalações atualmente existentes são insuficientes. Há, ainda, o problema da
capacitação tecnológica para gerir uma rede extensa de fornecedores relevantes.
Do ponto de vista tecnológico, a coordenação da rede de empresas fornecedoras da IPGN
entre operadoras e EPCistas é um desafio a ser enfrentado, sendo a falta de capacitação
em engenharia o centro das preocupações. A qualificação produtiva e tecnológica dos
EPCistas domésticos necessita ser desenvolvida em três níveis: (i) adequada operação do
canteiro de obras, (ii) competência para gerir e prover requisitos tecnológicos à rede de
fornecedores (iii) capacitação em engenharia básica e de detalhamento.
No caso da operação do canteiro de obras, é preciso atenção para a importância do
processo de aprendizado associado à produção (conforme apresentado no Quadro 3). O
cronograma de investimentos da Petrobras parece ser robusto o suficiente para fornecer a
continuidade de produção necessária para esse aprendizado. Deve-se, contudo, alertar
para dificuldades advindas da excessiva dependência dos investimentos da Petrobras nos
segmentos associados à E&P e à construção de embarcações. A recente prática de
concorrência por lotes reduz o problema, porém a baixa educação formal da mão-de-obra
utilizada no canteiro de obras é obstáculo importante para o aprendizado. O Programa de
Treinamento e Qualificação de Pessoal (PNQP) do PROMINP é relevante para a solução
desse problema.
Na gestão do suprimento, os EPCistas apresentam grande fragilidade tecnológica e elevada
dependência da Petrobras, que vem mantendo a responsabilidade da gestão da rede de
fornecedores. A necessidade de capacitação dos EPCistas é especialmente importante no
upstream, na medida em que a coordenação usualmente realizada pela Petrobras está
sendo mais distante. Nesse caso, é de especial relevância a transferência de parte do
41
progresso técnico da área do petróleo para os segmentos à montante. Em última
instância, a competitividade dos EPCistas brasileiros dependerá de sua capacidade em
gerir essas redes, de forma a promover inovação.
A iniciativa da Petrobras de externalizar a engenharia de projeto básico das plataformas
P55 e P57 coloca os EPCistas diante de um enorme desafio para sua competitividade: a
qualificação da engenharia. De fato, a falta de quadros qualificados é percebida pelas
empresas como seu principal obstáculo a uma atuação competitiva. Essas deficiências
estão concentradas na escassez de profissionais para projeto básico e de engenheiros
experientes, capazes de liderar equipes e conceber projetos. O incentivo ao
estabelecimento de acordos tecnológicos entre empresas de engenharia e Universidade
pode ser um importante reforço à especialização, assim como a formação de quadros no
exterior e a constituição de alianças com empresas internacionais são as principais
propostas para a resolução desses problemas.
3.3 Diretrizes Competitivas
A IPGN encontra-se diante de uma oportunidade e, ao mesmo tempo, de um desafio
histórico. A mudança na sua escala, provocada pela forte expansão da produção e do
consumo domésticos de petróleo e de gás natural bem como pela intensificação das
atividades internacionais da Petrobras, cria condições excepcionais para que o parque de
seus fornecedores domésticos de equipamentos desenvolva-se e se consolide como
supridor competitivo para todo o Atlântico Sul.
Nosso estudo permitiu verificar que o aparelho industrial brasileiro está equipado para
responder a esse desafio, ainda que subsistam lacunas produtivas que necessitem ser
preenchidas. Nosso parque industrial é diversificado e há clara disposição das empresas
para investir na ampliação de capacidade instalada, inclusive visando à eliminação de
lacunas existentes. Identificamos um déficit de competitividade no suprimento que tem
sua origem essencialmente na limitada capacitação doméstica dos fornecedores da IPGN
para inovar, apesar do papel dinamizador do processo de inovação exercido pela
Petrobras.
Essa limitação tem três eixos centrais. Por um lado, a limitação na oferta de mão-de-obra
qualificada, elemento determinante para a fragilidade das firmas de engenharia. Por outro
lado, o esforço ainda incipiente e desarticulado de inovação ao longo da cadeia produtiva
que exige forte interação entre os agentes sob a liderança da Petrobras. Finalmente, a
frágil articulação dos EPCistas com as empresas fornecedoras domésticas.
42
Nossas recomendações procuram oferecer uma resposta competitiva ao desafio acima.
Elas estão estruturadas em três linhas básicas
i) Superação dos obstáculos que limitam o aproveitamento dos ganhos de
escala oferecidos pela expansão da IPGN
A prática descentralizada de compras da Petrobras traz duas conseqüências que podem
afetar o aproveitamento da escala que vem sendo adquirida pela IPGN. A primeira é
referente à existência de picos e vales excessivamente acentuados. A segunda é a
especificação de produtos de maneira idiossincrática.
A coordenação das compras das diversas unidades de negócio da Petrobrás pode ser
adotada como mecanismo de redução desses problemas, sem que necessariamente seja
eliminada autonomia de decisão das unidades de negócio. Para tanto, bastaria introduzir
sinais econômicos para essas unidades, indicando os custos adicionais para a companhia
de prazos e demandas idiossincráticos que inviabilizam o suprimento doméstico. Dessa
forma, as vantagens da redução da concentração temporal da demanda, obtidas por meio
de coordenação de compras, seriam percebidas diretamente pelas unidades de negócio.
A coordenação deveria adotar também níveis mínimos de padronização na especificação
de equipamentos, política que criará oportunidades de ganhos de escala e,
conseqüentemente, menores custos para os fornecedores, em decorrência de redução das
exigências de interação e de especificação do produto.
A prática de compras de sistemas integrados pelas empresas de engenharia e montagem
contribui para a redução do conteúdo local do suprimento da IPGN. As empresas
montadoras de sistema mantêm redes próprias de fornecedores nas quais nem sempre
participam empresas domésticas. Uma solução imediata para aumentar o conteúdo
nacional dos projetos da IPGNN pode ser a extensão da exigência de parcelas mínimas de
compras domésticas por sistema.
ii) Posicionamento estratégico dos EPCistas e empresas de engenharia no
sentido de ganhar capacitação tecnológica para articularem a rede de
fornecedores da IPGN, especialmente no que se refere à articulação das
empresas domésticas com o sistema científico e tecnológico nacional
As políticas aqui devem ser assentadas na intensificação da relação tecnológica entre os
agentes da IPGN e na intensificação da relação entre a IPGN e a infra-estrutura
tecnológica existente no país, especialmente o sistema de normatização e metrologia. O
estreitamento desses laços é fundamental, pois, o desenvolvimento de atividades de
43
pesquisa em Universidades e Centros de Pesquisa sem a contrapartida empresarial, ainda
que reúna méritos, não é suficiente para gerar uma dinâmica de inovações. O terceiro pilar
é a disponibilidade de recursos no CTPETRO e nas verbas da ANP destinadas à inovação.
Esses recursos produzirão resultados mais expressivos se utilizados para estimular o
adensamento da cooperação entre fornecedores e o sistema de P&D. O quarto pilar é a
necessidade de incrementar o esforço tecnológico nas empresas da IPGN.
A Petrobras adota termos de cooperação com os fornecedores como mecanismo de
coordenação e formação de sua rede. Esse procedimento é utilizado em duas situações
principais. Em alguns casos, após identificação de uma necessidade, a Petrobras estimula
a homologação de um fornecedor para preencher essa lacuna. Em outros, a Petrobras
concebe um novo produto e repassa o conhecimento para um fornecedor desenvolver sua
aplicação. Essa prática pode e deve ser ampliada. Para tanto, é fundamental criar
incentivos para a aproximação entre as empresas de engenharia e montagem com os
fornecedores da IPGN. Nesse sentido, é importante que sejam adotados mecanismos que
induzam a destinação de recursos para o desenvolvimento tecnológico dos fornecedores
em cooperação com as empresas de engenharia e montagem. O direcionamento das
verbas da ANP destinadas à inovação é uma forma concreta de estimular essa interação,
reduzindo os custos da associação entre as partes.
A interação da Universidade e de laboratórios de pesquisa com a IPGN deve ser
incentivada em duas direções. A primeira é o desenvolvimento de novos produtos,
destinados a eliminar de lacunas de fornecimento por meio da superação de limites na
capacitação tecnológica. A definição de um projeto e o estabelecimento de acordo com a
Universidade para o seu desenvolvimento em conjunto com fornecedores da IPGN seria
um caminho para solucionar essa lacuna. Uma alternativa a esse caminho seria o
financiamento de incubação de empresas para o desenvolvimento de protótipos
industriais. Nesse caso, a operadora utilizaria verbas da ANP para o desenvolvimento
desse fornecedor.
A segunda forma de interação é mediante a formação de capacitação em termos de
recursos humanos. Nesse caso, o centro da avaliação é a utilização das instituições de
infra-estrutura para a criação dessa capacitação. Dois mecanismos podem ser direcionados
para cobrir essa deficiência. O primeiro é a formação de quadros no Brasil e no exterior. O
segundo é a utilização dos quadros universitários existentes na operação de
departamentos de engenharia e P&D das empresas da IPGN.
Existem três problemas diferenciados que estão associados à rede de metrologia existente
no Brasil. O primeiro é a dificuldade de alguns segmentos da IPGN em seguir normas e
44
padrões de produção. O segundo é a necessidade de homologação de determinados
produtos por rede de certificação reconhecida. O terceiro é a inexistência de certificação de
determinados produtos em território nacional.
No caso do primeiro e do segundo problemas existe a demanda e a oferta do serviço.
Contudo, sua utilização não ocorre. A proposta aqui é a utilização das verbas do CTPETRO
para aproximar centros de metrologia e certificação da IN P&G. No terceiro caso,
identificada uma demanda, sendo do interesse da operadora, as verbas do CTPETRO
devem ser utilizadas para a formação da infra-estrutura necessária à certificação, seja
mediante compra de equipamentos, seja por intermédio da formação de quadros, seja no
envolvimento com instituições internacionais que permitam certificar os laboratórios.
iii) Adoção de medidas que permitam o fortalecimento do desempenho
internacional das empresas domésticas
As relações entre a indústria do petróleo e seus fornecedores são acompanhadas de
atividades criadoras de valor, na medida em que criam ativos específicos. Como
conseqüência dessa característica, os fornecedores tornam-se mais competitivos no
mercado, porém assumem maior importância dentro da rede em que atuam. Assim, o
ingresso como novo fornecedor em uma rede representa um custo adicional tanto para o
fornecedor, quanto para a operadora.
É tradição na indústria do petróleo a utilização pelas operadoras de suas redes
estabelecidas de fornecedores. Parece ser, portanto, um caminho natural para maior
inserção internacional das empresas brasileiras acompanharem a internacionalização da
Petrobras. No entanto, a demanda de produtos muito específicos às condições brasileiras e
a descentralização das decisões de compras são obstáculos à exploração dessa
oportunidade. A customização dos produtos para a Petrobras contribui, por um lado, para
o desenvolvimento da sua engenharia, mas, por outro lado, cria obstáculos na introdução
desses produtos em outros mercados. Esse problema é agravado pelas diferenças nas
exigências dos produtos das diferentes unidades de operação da Petrobras. Tudo isso
resulta na elevação dos custos dos produtos brasileiros, perda do valor obtido com o
desenvolvimento do produto e, principalmente, a dissipação de economias de escala. Em
outras palavras, perda de competitividade da IPGN. A padronização dos produtos para
outros mercados é uma medida relevante para incremento da competitividade das
empresas fornecedoras domésticas.
45
3.4 Estratégias Competitivas
Tecnologia Metalúrgica
O setor siderúrgico não apresenta problemas sob o ponto de vista de capacitação
tecnológica ou produtiva. Existem ganhos a serem obtidos com maior coordenação da
demanda, principalmente no que se refere ao prazo de entrega, em um mercado aquecido
como o siderúrgico. Ademais, na medida em que envolve maior interação entre as partes
permitirá maior especificação do produto.
Contudo, o fornecimento de aço assume grande importância ao longo da cadeia produtiva
da IPGN. Sua relação com segmentos de escala produtiva inferior, como é o caso de
caldeiraria, apresenta problemas graves de coordenação. A reduzida escala traz
dificuldades na relação direta com fornecedores e, assim, grande parte das compras
ocorre por intermédio de distribuidores, o que tem conseqüência sobre o preço do aço e,
por conseguinte, sobre a competitividade do segmento de caldeiraria. Uma alternativa
seria contratar opções de janelas de produção (partidas) com as siderúrgicas nacionais,
compatíveis com os cronogramas das obras da Petrobras. Essas opções seriam repassadas
aos fornecedores que vencerem as licitações, podendo ser exercidas ou não21. Essa
prática também pode ser estendida para aços carbonos que são usualmente produzidos no
Brasil, eliminando a margem dos distribuidores e diminuindo o prazo de entrega dos
fornecedores. Uma segunda questão é a escassez de oferta interna de determinados aços
especiais.
O segmento de tubos apresenta um problema na certificação e homologação de alguns
produtores entrantes. Nesse caso, é importante intensificar o esforço nessa direção
visando a garantir maior nível de concorrência e maior quantidade de fornecimento.
O segmento de Flanges e Conexões tem no adequado atendimento a normas de qualidade
e no cumprimento de prazo suas maiores deficiências. No primeiro caso, é fundamental a
realização da aproximação desse setor com os institutos de metrologia e normas
estabelecidos no Brasil. O direcionamento de recursos do CTPETRO para essa finalidade
permitirá liberar recursos humanos da Petrobras, que vem desempenhando um forte
programa de inspeção com vistas a garantir a qualidade dos produtos do segmento, e
dotará de maior competitividade o segmento.
A caldeiraria apresenta dois problemas centrais. De um lado, a sua relação com o setor de
aço, tratada acima e, de outro, a escassa capacitação em engenharia. O fortalecimento da
engenharia de uma maneira geral será tratado mais adiante, porém, no caso específico de
21 Se os fornecedores não optarem por exercer a opção, ela pode ser repassada para terceiros.
46
caldeiraria, um movimento adicional pode ser o estímulo à permanência de professores e
pesquisadores de Universidades nos departamentos de engenharia de empresas, tirando
proveito das facilidades oferecidas pela lei de inovação. Nesse caso, professores ficariam
por tempo integral nas empresas desenvolvendo projetos especificados previamente.
Tecnologia Mecânica
A indústria de base mecânica no Brasil apresenta um parque industrial bem estabelecido,
com tradição. O seu suprimento de equipamentos para o downstream é quase completo,
com apenas algumas pequenas lacunas. No caso do upstream, ela não apresenta o mesmo
desempenho. A grande exceção são alguns produtos subsea. Nesse caso, a centralidade
da provisão de bens específicos para o negócio do petróleo determinou uma atuação forte
da Petrobras na capacitação de empresas multinacionais22 que realizam parte de suas
atividades de pesquisa no Brasil. Algumas das lacunas encontradas têm origem na falta de
escala para a produção de alguns equipamentos de grande porte. Em alguns segmentos, a
fragilidade do departamento de engenharia dificulta o upgrade e a homologação de
determinados produtos. Nesses segmentos é necessário incrementar a interação com
institutos de metrologia para garantir a capacitação no seguimento de normas e
padronização de produtos.
As propostas aqui alinhadas partem dos seguintes princípios: (i) garantir capacitação
tecnológica nos segmentos em que a escala ainda não foi verificada suficiente; (ii) permitir
acesso das empresas aos recursos de pesquisa do setor petróleo; (iii) incentivar a
formação de núcleos de engenharia nas empresas; e (iv) garantir interação com o sistema
de metrologia.
No primeiro caso, a existência de possibilidade de montagem de motores a diesel para a
propulsão de embarcações de grande porte sugere a necessidade de desenvolvimento de
capacitação para prosseguir no aumento do conteúdo local desses produtos. Para isso,
seria interessante desenvolver protótipos coligando as empresas interessadas com a
Universidade e laboratórios de pesquisa. Procedimentos semelhantes podem ser adotados
na constituição de capacitação para a produção de guindastes de grande porte, turbinas de
grande porte e turbinas a gás e a produção de bare compressor. Deve-se adicionar que a
falta de escala pode ser reduzida mediante procedimentos já adotados na contratação de
embarcações mediante lotes, o que garantiria demanda contínua a ser desenvolvida a
partir das iniciativas tecnológicas.
Os segmentos de bombas e turbinas apresentam empresas com capacitação em
engenharia. Essas empresas podem desenvolver produtos em conjunto com a Petrobras.
22 Algumas se consolidaram após a aquisição de empresas de capital nacional.
47
Alguns termos de cooperação vem sendo assinados e devem ser incentivados. A utilização
de recursos da ANP voltados para a inovação parece ser uma boa forma de estimular esse
tipo de interação. Procedimento semelhante pode ser adotado com o segmento subsea.
Em alguns segmentos como válvulas e city gates existe necessidade de ampliação do
esforço em engenharia. A adoção de programas de residência de pesquisadores, no
formato explicitado para caldeiraria pode ser uma forma de incentivar o adensamento dos
departamentos de engenharia. Ao mesmo tempo, a demanda desses segmentos por
metrologia e normatização deve contar com o apoio de verbas do CTPETRO, nos formatos
sugeridos acima.
Tecnológica Elétrica
Nas tecnologias elétricas, existem dois setores, subestação e motores elétricos que
apresentam bom desempenho e que suas relações com outros segmentos dinâmicos da
indústria garantem sua permanência competitiva. Nesses casos, a única deficiência
identificada foi em determinados procedimentos de metrologia, em que as agências
certificadoras estão ausentes no Brasil. A utilização de verbas do CTPETRO para a
formação de laboratórios que preencham essa lacuna é fundamental para fornecer
competitividade à IPGN nesses produtos.
O segmento de instrumentação apresenta deficiência de fornecimento resultante da
escassez de escala. Nesse caso, é necessária a identificação de nichos de mercado em que
a demanda brasileira possa vir a ser relevante e suficiente para o estabelecimento da
produção doméstica. De outro lado, a articulação com empresas infantes de capital
nacional com centros de pesquisa no Brasil e no exterior pode ser uma alternativa para a
criação de capacitação tecnológica e produtiva.
Engenharia
Os EPCistas têm voltado atenção específica para a sua capacidade de montagem e
construção de instalações industriais, porém pouca atenção tem sido dada à engenharia e
à estruturação de uma rede doméstica de fornecedores. A redução do envolvimento da
Petrobras na formulação de projetos básicos de plataformas tem conseqüências muito
significativas na demanda de capacitação das empresas de engenharia e montagem. Se
esse movimento alarga o mercado para as empresas de engenharia, sinalizando um
ambiente propício ao investimento em capacitação de pessoal, por outro lado, coloca o
desafio de os EPCistas se capacitarem tecnologicamente para a elaboração de projetos.
Esse novo ambiente fortalece o argumento de que as empresas de engenharia e
montagem devem realizar investimentos significativos na sua atualização tecnológica.
48
Sugerimos quatro medidas orientadas para a capacitação do setor, que podem ser
financiadas com recursos dos fundos destinados ao desenvolvimento tecnológico da IPGN:
a indução de currículos de engenharia que envolva maior conteúdo de projeto, que
reforcem os cursos de Engenharia do Petróleo;
o incremento do fluxo de informações para as empresas de engenharia, por meio
de incentivos ao estabelecimento de acordos tecnológicos entre empresas de
engenharia e Universidades.
o estabelecimento de núcleos de engenharia em Universidades, com o objetivo de
incubar empresas que viriam reforçar as competências do setor, além de servir
como uma fonte de quadros com treinamento para empresas de maior porte já
estabelecidas.
dar apoio a iniciativas de colaboração com empresas de engenharia no exterior,
visando a qualificação de engenheiros já atuantes no setor
A limitação tecnológica dos EPCistas no gerenciamento de redes de suprimento é
especialmente danosa no upstream, na medida em que a Petrobras vem reduzindo sua
atividade coordenadora nesse segmento. Para superar duas propostas são elaboradas no
sentido de incrementar a capacitação dos EPCistas. De um lado, a Petrobras deve
incentivar maior envolvimento dessas empresas nos casos em que estiver desenvolvendo
termos de cooperação com fornecedores de equipamentos. De outro lado, é preciso
oferecer a oportunidade de acesso aos recursos legais para P&D disponíveis no CTPETRO
para que essas empresas possam vir a interagir com fornecedores e outros agentes do
sistema de inovação.
49
4 PÓLO SUL: OPORTUNIDADE E DESAFIOS23
Na segunda metade do século XIX, a descoberta do “coronel” Drake, em Titusville, deu
nascimento à IPGN. A partir do segundo quartil do século XX, ela reorientou-se para o
suprimento da demanda do setor automotivo, apoiando-se no ritmo forte de progresso do
conhecimento científico e tecnológico que deu origem à segunda revolução industrial
(Furtado, 1996).Em poucas décadas, o petróleo substituiu o carvão no núcleo do sistema
produtivo das economias industriais. A forte expansão do consumo de derivados de petróleo
induziu forte demanda por equipamentos e serviços necessários para a retirada do óleo do
subsolo, sua transformação em derivados e o transporte desses derivados até os centros de
consumo. Progressivamente, constituiu-se um conjunto diversificado de fornecedores de
equipamentos e serviços especializados para a IPGN.
Até a primeira metade do século XX, a IPGN era essencialmente uma indústria americana24,
estruturada em torno do Golfo do México, onde se localizou o núcleo gerador da IPP25. A
descoberta de vastas jazidas petrolíferas no Oriente Médio abriu nova fronteira para o
desenvolvimento da produção de petróleo, porém os países da região não dispunham de
capacitação industrial e tecnológica suficiente para articular um núcleo produtivo alternativo
ao desenvolvido no Golfo do México. As empresas atuantes no Oriente Médio preservaram
suas parcerias estratégicas com seus fornecedores tradicionais baseados essencialmente no
Golfo do México, consolidando nessa região o conhecimento científico e tecnológico da IPGN.
“A especialização em técnicas desenvolvidas de forma endógena ergueu fronteiras precisas
que, posteriormente, se tornaram uma barreira à entrada na indústria” (Simão, 2001). Dessa
forma, foram estruturadas grandes empresas multinacionais (que, na primeira metade do
século passado, tornaram-se líderes em seus respectivos nichos de mercado (Furtado et alli,
2003).
A crise da década de 1970 abriu nova fronteira geológica para a produção de
hidrocarbonetos. O Reino Unido e a Noruega, onde o essencial do potencial de
hidrocarbonetos do Mar do Norte está localizado, decidiram empreender políticas industriais
visando estruturar um pólo alternativo para o suprimento de equipamentos e serviços
especializados para a IPGN. Nasceu, assim, o segundo grande pólo da IPP. O terceiro pólo da
IPP vem se estruturando mais recentemente em torno de Singapura e da Coréia do Sul, fruto
23 Esta seção foi elaborada tomando como base os relatórios presentes no Anexo, que podem ser acessados através do atalho a seguir: Estudo Comparativo Pólos Tradicionais; Relatório Inserção Internacional Fornecedores; Relatório Pólo Sul; Relatório Sistema Nacional de Inovação Petróleo e Gás. 24 É importante lembrar que os Estados Unidos era um país exportador de petróleo até 1948. 25 De modo geral, a IPP contempla três tipos de empresas: i) fornecedoras de serviços de geologia, geofísica, perfuração, transporte aéreo, manutenção de refinarias etc.; 2º) firmas de engenharia de projetos de plataformas, de unidades de processamento, de refinarias etc.; e 3º) fornecedores de equipamentos para plataformas de perfuração e produção, tubulação, equipamentos subsea, de plantas de refino etc. (Iooty, 2004).
50
de políticas industriais assentadas nas posições estratégicas desses países no comércio intra-
oceânico.
A crise atual no mercado de hidrocarbonetos vem movendo a IPGN em direção a novas
fronteiras geológicas e tecnológicas. A produção em águas profundas, o comércio
intercontinental de gás natural (GNL) e a produção de óleos pesados e não convencionais
ocupam espaço crescente na oferta de hidrocarbonetos, abrindo oportunidades para que
novos pólos de suprimento de equipamentos e serviços especializados para a IPGN venham a
constituir-se.
Até recentemente, o Atlântico Sul respondia por pequena parcela da produção e do consumo
de hidrocarbonetos do mundo. Essa situação deve sofrer radical transformação nas próximas
décadas. Pelo ângulo da demanda, depois de mais de duas décadas de estagnação, o
crescimento econômico voltou ser vigoroso na América do Sul e também na África
Subsaariana. Pelo ângulo da oferta, há forte otimismo quanto às perspectivas de produção
de hidrocarbonetos tanto na costa oriental sul-americana quanto na costa ocidental africana.
O Departamento de Energia Americano estima que a produção de petróleo no Atlântico Sul
atingirá a mesma magnitude da produção no Golfo do México no segundo quartil do presente
século (Figura 15). Esse cenário oferece oportunidade para que seja estruturado um novo
pólo da IPP, centrado na capacidade industrial e tecnológica do Brasil.
Figura 15
Pólos Fornecedores: Produção de Petróleo – Milhões de barris diários
Fonte: US-DOE
51
4.1 Pólos Para-petrolíferos
A dinâmica da IPP é fortemente dependente das atividades da IPGN. A complexidade dos
processos técnicos das operadoras induz a customização da suas demandas, provocando
forte interdependência entre a IPGN e a IPP. Assim, há forte correlação entre os preços
dos hidrocarbonetos, os investimentos realizados pela IPGN e a demanda por
equipamentos, tecnologias e serviços adquiridos junto à IPP. Na década de 1980, o
colapso no preço induziu profunda reestruturação na IPGN. Com o objetivo de maximizar a
recuperação da renda mineral (Pertusier, 2003), as empresas petrolíferas adotaram como
estratégias empresariais a aquisição de e a fusão com concorrentes (Alonso, 2004). Esse
movimento foi acompanhado de esforços visando alcançar maior eficiência no
desenvolvimento dos projetos e obter redução nos custos por meio da terceirização de
funções e serviços, tais como o controle financeiro e a integração produtiva de projetos. O
escopo da subcontratação de operações com empresas fornecedoras de equipamentos e
serviços foi ampliado.
Nesse novo ambiente, as empresas de petróleo procuram estabelecer parcerias
estratégicas, visando compartilhar riscos e benefícios (Zamith, 1999). As empresas
petrolíferas contratam projetos na modalidade turn-key, cabendo à empresa de
Engineering, Procurement and Construction (EPC) coordenar e integrar o suprimento dos
equipamentos e serviços necessários. Uma característica importante desse modelo
contratual é o fato de que a contratante principal acumula as funções de negociação de
preços e de qualidade dos diferentes equipamentos que integram o projeto (ANP/PUC,
1999; Martins, 2003; Furtado et alli, 2003).
As mudanças estruturais na IPGN induziram as empresas da IPP a também deslancharem
mutação estratégica com o objetivo de alcançar utilização mais eficiente de sua
capacidade de produção. A gradual incorporação de atividades e mercados próximos aos
seus nichos originais, por meio de fusões e aquisições, permitiu a empresas da IPP
ganharem capacitação para oferecer soluções técnicas integradas às operadoras (Furtado
et alli, 2003). A Halliburton emergiu como empresa líder nesse processo, focalizando
atividades e consolidando seu portfólio em alguns nichos de mercado. Sua estratégia foi
imitada pela Baker Hughes que reforçou suas atividades de fabricação de bombas
submersíveis, instrumentação e químicos. Estratégia similar foi adotada pela Schlumberger
que reforçou seus sistemas de informação, softwares 3D para as atividades sísmicas,
ferramentas de perfilagem tradicional (wireline logging), atividades de medição durante a
perfuração (Measurements During Drilling) e cimentação (cimenting). Essas companhias
assumiram o perfil de empresas integradas (, aptas a fornecer em tudo o que é necessário
para as atividades de exploração e produção de petróleo (Iooty, 2004). O resultado desse
52
movimento foi a concentração de mais de 50% do mercado para-petrolífero nas mãos do
oligopólio formado pelas três empresas, com o padrão “uma líder - duas seguidoras”.
A estratégia das empresas líderes teve reflexo na IPP como um todo. O crescimento tem
sido a opção estratégica dominante das empresas de perfuração e geofísica26. A segunda
tendência tem sido a ampliação do portfólio de serviços. Contudo, diferentemente do que
ocorreu no caso das líderes, a integração de serviços adotada pelas empresas que
compõem a franja competitiva, raramente rompe com os limites do seu mercado original.
A questão do tamanho crítico provavelmente continuará a ser relevante na IPP. Na
realidade, algumas firmas vão tentar se acomodar entre a franja competitiva e as firmas
líderes, assegurando posições nos mercados nos quais estas estejam relativamente
ausentes.
Tradicionalmente, as operadoras administravam múltiplas subcontratações. Essa prática
mudou na década de 1990, como resultado de esforços para reduzir os custos a partir da
iniciativa Cost Reduction in New Era (CRINE) no Reino Unido e da NORSOK na Noruega.
Neste país, os contratos EPCIs integrados foram introduzidos em 1994 e mudaram a
relação entre as companhias de petróleo e as contratantes principais. Além disso, tendo
em vista a necessidade de remover instalações offshore, as contratantes principais estão
incluindo atualmente em seus serviços a atividade de descomissionamento.
Atualmente, o mercado offshore é dominado por um reduzido número de contratantes
principais capazes de realizar todas as atividades que encerram um contrato do tipo EPCI,
do desenvolvimento conceitual à instalação do projeto, incluindo o acionamento. Na
Noruega, o segmento das empresas contratantes principais passou por um processo de
consolidação na década passada. A fusão das empresas Aker e Kvaerner levou a formação
do maior conglomerado industrial daquele país. No Reino Unido, o segmento das
contratantes principais é dominado por quatro atores: Aker Kvaerner, Wood Group, AMEC
e Vetco Aibel27. Essas companhias têm uma complexa história corporativa de fusões e
aquisições de várias competências locais, tornando difícil resumir, na atualidade, o que
elas representam em termos de interesses locais (Hatakenaka et alli, 2006).
Golfo do México e de Cingapura
O primeiro pólo para-petrolífero estruturou-se em torno do Golfo do México, onde nasceu a
indústria do petróleo. O U.S. Census Bureau (2002) identificou a 469 empresas atuantes
no mercado para-petrolífero, mais da metade delas localizadas no estado do Texas. Esse
26 Uma amostra revela que das 30 empresas analisadas, 83% aumentaram sua capacidade de produção (Barreau, 2002). 27 O Wood Group tem base em Aberdeen, emergindo de uma companhia local de pesca e reparo de barcos. Atualmente a empresa é celebrada como a única companhia local de Aberdeen que se tornou uma companhia global (Cumbers, 2000).
53
conjunto de empresas adiciona cerca de US$ 2,8 bilhões de valor anuais à economia
americana28. No final da década de 1990, as instalações administrativas, de pesquisa e de
produção de 34 das 35 maiores operadoras americanas estavam localizadas na região de
Houston, assim como centenas de companhias petrolíferas de pequeno porte e milhares de
empresas de suporte (Feagin, 1998).
A IPP estadunidense é muito forte tanto doméstica quanto internacionalmente, sobretudo
em áreas que envolvem tecnologias avançadas, e a presença de fornecedores externos no
mercado americano da IPP é pouco relevante29. As empresas líderes possuem mais de
80.000 funcionários em todo o mundo, oferecendo serviços como construção e engenharia
para as empresas de petróleo, bem como a manufatura de equipamentos (U.S.
International Trade Commission, 2007). As firmas de médio porte focam na fabricação de
equipamentos para dois ou três sistemas, tais como equipamentos de controle de pressão
e separadores. As empresas de pequeno porte oferecem componentes especializados,
principalmente tubos, válvulas, equipamentos de pressão e de controle de fluxo e peças
para as plataformas. Muitas dessas empresas também fornecem serviços de
recondicionamento e aluguel de equipamentos (U.S. International Trade Commission,
2007).
A exportação estadunidense de equipamentos voltados à IPGN tem crescido
constantemente desde 2000, quando os preços do petróleo começaram a subir, reagindo à
queda substancial que teve lugar em 1999 (U.S. International Trade Commission, 2007).
Na maioria dos países, os equipamentos e serviços fornecidos pela IPP estadunidenses
representam 1/3 do mercado, chegando a ocupar mais de 50% em alguns casos. O único
país com grande produção petrolífera em que a indústria para-petrolífera dos Estados
Unidos não tem participação destacável é o Irã (U.S. International Trade Commission,
2007).
Embora a IPP estadunidense detenha parcela significativa do mercado mundial, não se
pode desprezar a competição que ela enfrenta dos fabricantes de outros dói pólos. Os
fabricantes europeus são considerados superiores aos seus rivais estadunidenses em
plataformas, componentes hidráulicos, ancoragem e componentes subsea (tubos flexíveis,
linhas de fluxos e sistemas de controle). Há um grande número de pequenos produtores
na Europa, Canadá, Rússia, Ásia e Austrália, com foco em válvulas, tubos/tubulação
(tubing), varetas (rods), brocas (bits) e eletrônicos especializados.
28 É importante notar que nem todas as atividades voltadas ao fornecimento de máquinas e equipamentos para IPGN estão contabilizadas nessa estatística. 29 Apenas US$ 841 milhões de um mercado de quase US$ 10 bilhões em 2005, porém as exportações alcançaram US$ 6,9 bilhões em 2005 (U.S. International Trade Commission, 2007).
54
A economia global sempre desempenhou papel fundamental no desenvolvimento de
Cingapura. Nas décadas de 1960 e 1970, o governo local adotou política de
desenvolvimento pautada na criação de plataformas de exportação intensivas em trabalho
(Yeung, 2006). Nesse período, leis flexibilizaram a contratação de mão-de-obra,
ofereceram incentivos fiscais para investidores estrangeiros e desburocratizaram o
processo de abertura de empresas. Além disso, o Singapore Development Bank criou
linhas especiais de crédito para setores selecionados (Pinto et alli, 2006).
A partir do final da década de 1970, a estratégia pautada no baixo custo da mão-de-obra
foi colocada em cheque pelos países do sudeste asiático. Para recobrar a competitividade
da sua economia, o governo substituiu o foco no custo da mão-de-obra pela promoção dos
setores com alto valor agregado. Em 1979, os salários foram substancialmente majorados
e a política industrial foi orientada à atração de atividades com alta tecnologia. A partir da
década de 1980, corporações multinacionais nas áreas da computação eletrônica e da
química instalaram unidades produtivas no país. Paralelamente, desenvolveu-se a
realocação das atividades intensivas em mão-de-obra, para outros países do sudeste
asiático, especialmente para a Malásia (Yeung, 2006). No entanto, a economia doméstica
ainda era muito dependente do capital global e de seus mercados na América do Norte e
na Europa Ocidental.
Para consolidar a competitividade do país e permitir a expansão do capital doméstico, o
governo iniciou um programa de regionalização por meio do qual as companhias
domésticas eram explicitamente encorajadas a se aventurar no exterior. A construção
dessa economia externa permitiria ao país, de acordo com a visão do governo, aproveitar
as oportunidades colocadas pela economia regional e minorar os efeitos de crises
econômicas enfrentadas pelo país.
A indústria naval foi uma das que mais se beneficiou dessas políticas, com a instalação de
fornecedores de navipeças. A constituição do Grupo Jurong, a partir da joint-venture do
governo com a japonesa Ishikawajima-Harima Heavy Industries (IHI) foi particularmente
importante. Aí foi iniciada a tradição de buscar competitividade por meio da
subcontratação de serviços para a construção naval (Pinto, 2006). O desenvolvimento da
indústria naval cingapurense resulta, em boa medida, da posição geográfica privilegiada
da cidade-estado no Estreito de Málaga, área de grande trânsito de navios30. Além disso,
foi importante a experiência acumulada pela mão-de-obra local, sobretudo no reparo de
navios, decorrente da presença de uma base naval do Reino Unido no país.
30 Cerca de um terço do comércio oceânico mundial passa pelo Estreito.
55
No entanto, a indústria naval cingapurense não constrói navios de grande porte. Operando
com custo elevado de mão-de-obra (Pinto, 2006), a estratégia adotada para o
desenvolvimento desse segmento industrial foi a de operar em nichos, tais como as
atividades de reparo de navios e construção de plataformas petrolíferas. Essa estratégia
permitiu à IPP cingapurense alcançar a liderança mundial na construção de plataformas
para a exploração e a produção de petróleo, com 70% do mercado de conversão de FPSOs
(Floating, Production, Storage and Offloading) e 60% do mercado de plataformas auto-
elevatórias (Jack-up rigs)31. Além disso, o país é o líder asiático em engenharia,
construção e serviços especializados para a IPGN, incluindo poços profundos e
equipamentos de produção.
Duas empresas de Cingapura, a Keppel Offshore & Marine e a Sembcorp Marine, têm
demonstrado seu poder competitivo ao ganharem disputas frente a grandes multinacionais
do setor, fornecendo soluções world-class para alguns projetos-chave em anos recentes. A
IPP de Cingapura faturou cerca de US$ 4 bilhões em 2005, com crescimento de 68% em
relação ao ano anterior (Ministry of Foreign Affairs of Denmark, 2007).As empresas para-
petrolíferas cingapurenses se dedicam tanto à manufatura de equipamentos up-hole
(acima da terra) quanto down-hole (abaixo da terra) para campos petrolíferos. Alguns
exemplos de equipamentos up-hole produzidos pela indústria para-petrolífera de
Cingapura são: cabeça de poço, válvulas, manifolds, equipamentos de cimentação e
equipamentos para controle de pressão. A respeito dos equipamentos down-hole
fabricados pelo setor para-petrolífero cingapurense, pode-se destacar os seguintes:
produtos para filtrar areia e ferramentas de pescaria a cabo de aço - wire-line tools (Wee,
2006).
A IPP de Cingapura conta ainda com pequenas e médias empresas, as quais são
importantes por fornecerem suporte na fabricação de equipamentos e serviços críticos a
empresas de maior porte. Através dos anos, as PMEs cingapurenses construíram
competências para fabricar equipamentos para a IPGN, seguindo as especificações de seus
clientes, ganhando reputação de qualidade, confiabilidade e prazo de entrega. Além disso,
a severidade do marco regulatório do país em termos de propriedade intelectual ajudou a
reforçar a confiança das empresas multinacionais nas PMEs locais (Wee, 2006).
O crescimento na demanda por derivados de petróleo e produtos petroquímicos na Ásia é
percebido como importante oportunidade para a indústria para-petrolífera de Cingapura
diversificar seu portfólio de equipamentos e serviços, passando a atuar de maneira mais
efetiva no fornecimento à etapa midstream do setor petrolífero (Wee, 2006; Ministry of
31 Global players do setor como a Schlumberger, a Halliburton, a Cooper Cameron, a FMC e a Baker Hughes possuem importantes operações de manufatura e serviço em Cingapura.
56
Trade and Industry Singapore, 2006). Contudo, há uma clara percepção de que a
produção em águas profundas será o carro-chefe da IIP cingapurense. O governo está
comprometido com o apoio ao desenvolvimento das novas tecnologias requeridas para
superar as condições extremas de temperatura e pressão presentes nesse novo ambiente
(Ministry of Trade and Industry Singapore, 2006).
O papel do governo de Cingapura no desenvolvimento de sua IPP foi crucial. Primeiro
fornecendo ambiente adequado para investimentos que pudessem explorar oportunidades
para a acumulação de conhecimento em atividades com alguma tradição local. Segundo
incentivando a formação de quadros técnicos e o esforço de inovação tecnológica das
empresas locais (Cheah et alli, 2006). Mais recentemente, esses esforços receberam novo
impulso com a criação do Centro para Pesquisa e Engenharia Offshore (Centre for Offshore
Research and Engineering - CORE).
Localizado na Universidade Nacional de Cingapura, o CORE tem por objetivo alavancar a
capacitação em engenharia offshore (Cheah et alli, 2006). Para tanto, o CORE atuará em
dois pilares: formação de mão-de-obra especializada e pesquisas voltadas para a
engenharia offshore. A Keppel Offshore & Marine liderou a participação da indústria local
no CORE com uma doação de S$ 1,5 milhão para a estruturação da Cadeira Keppel
(Keppel Professorship) no Departamento de Engenharia Civil da universidade. A Agência
para Ciência, Tecnologia e Pesquisa (Agency for Science, Technology and Research
(A*STAR) e a Autoridade Portuária e Marítima de Cingapura (Maritime and Port Authority
of Singapore – MPA) irão repassar ao CORE, cada uma, S$ 5 milhões em bolsas de estudo
ao longo de três anos (NUS, 2007).
Mar do Norte
A descoberta de jazidas importantes de hidrocarbonetos no Mar do Norte modificou
radicalmente o cenário econômico do Reino Unido e da Noruega, Porém, os dois países
reagiram a essa nova realidade de forma distinta.
O Reino Unido já possuía base industrial consolidada, com experiência em atividades de
exploração de petróleo e gás e algum know-how na engenharia offshore. Além disso, o
país domiciliava algumas das maiores companhias petrolíferas do mundo. Os primeiros
anos de desenvolvimento do potencial de hidrocarbonetos foram marcados pela
preocupação com o balanço de pagamento, situação que induziu a adoção de uma política
orientada para a rápida expansão da produção interna de petróleo. A política britânica
buscou atrair operadores internacionais que pudessem mobilizar os recursos tecnológicos e
industriais necessários para a o desenvolvimento acelerado da produção. Com esses
operadores, vieram muitos de seus fornecedores tradicionais de equipamentos e serviços.
57
Assim, na primeira década e meia de exploração no Mar do Norte, o Reino Unido dependeu
largamente das tecnologias offshore desenvolvidas no Golfo do México (Smith, 2007).
No final de 1971, o governo britânico identificou que o apoio à IPP traria substanciais
benefícios econômicos por sua capacidade de ativar segmentos industriais do país, que
estavam em declínio provocando aumento crescente do desemprego. Essa percepção
provocou a criação do Offshore Supplies Office (OSO), instituído com dois objetivos: i)
aumentar para 70% o conteúdo local nos investimentos da IPGN; ii) monitorar o ritmo do
desenvolvimento do setor offshore do país (Smith, 2007). Além do OSO, o governo
britânico criou a British National Oil Corporation (BNOC), empresa estatal que teve papel
importante no fortalecimento da indústria para-petrolífera britânica, tendo em vista as
políticas de “compras seletivas” que adotou até 1979, ano em que foi privatizada (Cook,
1985).
Diferentemente, a base industrial da Noruega era centrada em poucos segmentos, sem
experiência significativa na indústria do petróleo. A política adotada procurou mobilizar o
desenvolvimento da produção de hidrocarbonetos para fomentar o desenvolvimento de
uma indústria nacional de fornecedores (INTSOK, 2001). Contudo, somente com o
aumento do preço do petróleo na década de 1970, o poder de negociação do governo
norueguês cresceu de forma a permitir o uso dos procedimentos de concessão de áreas
para exploração como uma ferramenta para induzir as empresas internacionais de petróleo
a se engajarem em atividades de transferência de tecnologia e elevação das aquisições de
bens e serviços no mercado local (Nordås et alli, 2003). Tendo em vista sua importância
estratégica para a economia norueguesa, a política relacionada ao setor petrolífero tomou
um viés nacionalista (Cook, 1985).
No Reino Unido, a primeira iniciativa do OSO foi fornecer condições às firmas britânicas
para que elas conseguissem se estabelecer na indústria. Para tanto, as empresas de
petróleo foram solicitadas a oferecerem “full and fair opportunity” aos fornecedores
britânicos nas suas aquisições de bens e serviços, sendo dada preferência às empresas
britânicas quando essas apresentassem preço, prazo e qualidade equivalentes aos dos
fornecedores estrangeiros (Martins, 2002). A entrada de novas empresas na IPP foi
estimulada pelo OSO, sobretudo em áreas altamente especializadas, nas quais se tentou
preencher “lacunas de capacidade”. O investimento direto estrangeiro foi estimulado e, ao
longo de toda sua existência, o OSO não adotou políticas discriminatórias em favor das
companhias domésticas. O OSO tinha poderes limitados para influenciar a política de
compras das operadoras, utilizando a ameaça de sanções administrativas no licenciamento
e na aprovação do desenvolvimento dos campos para obter comportamentos desejados.
58
As políticas norueguesas incluíram a criação de uma empresa estatal de petróleo
(Statoil32), o uso ativo de termos de licenciamento na promoção de transferência de
tecnologias e a criação de infra-estrutura de ensino superior e de pesquisa orientada para
a indústria do petróleo (Hatakenaka et alli, 2007). Essas medidas visaram dar apoio ao
desenvolvimento da IPP doméstica, com ênfase para os segmentos de engenharia e de
construção naval, com o objetivo de dotá-la de condições para se tornarem competitivas
internacionalmente. Na exploração dos primeiros campos, foi requerido que as operadoras
estabelecessem acordos de capacitação com parceiros da Noruega e transferência de
tecnologia para a Statoil. Esses acordos apresentavam uma curva de aprendizagem
íngreme para a operadora nacional, que gradualmente se tornaria a operadora de mais da
metade dos campos noruegueses (Heum et alli, 2003). Graças a seu intenso processo de
capacitação tecnológica, a Statoil conseguiu, já em 1976, desenvolver e instalar o primeiro
sistema subsea na costa do país, no campo de Tommeliten33.
A operadora norueguesa buscou capacitar os fornecedores noruegueses para que eles
pudessem competir em pé de igualdade com os fornecedores estrangeiros, estimulando-os
a buscarem conhecimentos tecnológicos fora do país, inclusive formando joint-ventures. O
governo norueguês também induziu as empresas de engenharia multinacionais a
formarem parcerias com empresas norueguesas, para auxiliar na formação da capacidade
de engenharia endógena (Heum et alli, 2003). No entanto, o governo da Noruega nunca
fez exigências específicas a respeito de conteúdo local. Decreto Real (1972) estabeleceu
que as firmas do país deveriam ser escolhidas apenas quando fossem competitivas em
preço, qualidade e tempo de entrega. Dentro do governo norueguês, coube ao Ministério
do Petróleo e Energia da Noruega a tarefa de realizar as licitações para a exploração de
jazidas. O sistema de escolha dos vencedores levava em consideração a contribuição para
a economia da região, além dos critérios financeiros e de competência tecnológica da
empresa.
Com o objetivo de monitorar o conteúdo local, as operadoras foram solicitadas a
reportarem ao Ministério de Petróleo e Energia a outorga de contratos superiores a
aproximadamente US$ 150 mil. As autoridades do Ministério de Petróleo e Energia do país
também exigiam que as operadoras apresentassem sua lista de licitantes antes da
realização de uma aquisição, para que o governo pudesse acrescentar firmas locais na
lista. Desse modo, as firmas norueguesas não eram excluídas por não terem experiência
prévia no fornecimento a companhias de petróleo estrangeiras. Além disso, o Ministério
32 O objetivo da Statoil era administrar os recursos petrolíferos para Estado norueguês e desenvolver a capacidade local nas atividades a montante da cadeia de P&GN (Heum et alli, 2003). 33 Esse pode ser considerado um grande feito, posto que companhias tradicionais que atuavam no Golfo do México não dominavam e operavam essas tecnologias (Ortiz Neto, 2006).
59
deveria ser informado acerca das firmas escolhidas para o contrato, antes de tais
empresas serem notificadas, tendo o direito de alterar a decisão das operadoras quando
lhe parecesse conveniente34.
A atuação do OSO enfrentou forte hostilidade das operadoras tradicionais (Smith, 2007) e,
também, da Comissão Européia. No entanto, o conteúdo local alcançou o pico de 87,2%
em 1987, ano que marca o término da fase mais intervencionista da política britânica para
o setor para-petrolífero. As estatísticas foram amplamente criticadas, sendo questionada a
forte presença de companhias estrangeiras no Reino Unido. Os críticos das estatísticas
governamentais consideraram esse número otimista, pois se as companhias de capital
estrangeiro fossem eliminadas, o conteúdo local cairia para cerca de 50% (Smith, 2007).
No que concerne a inovações, a política pôs ênfase na pesquisa básica. Somente na
segunda metade da década de 1980, a política de ciência e tecnologia do Reino Unido para
a IPP se tornou mais efetiva. Sob influência do exemplo norueguês, o OSO passou a
avaliar os planos de compra de bens e serviços das operadoras nas rodadas de concessão
de blocos.
Com exceção da adaptação aos padrões industriais dos produtos, o sucesso britânico foi
maior nas atividades localmente determinadas e nas atividades intensivas em trabalho,
sendo pouco efetivo nas atividades intensivas em capital ou tecnologia. A maioria dessas
atividades se mostrou de natureza transitória e gerou poucas oportunidades de
exportação. Os engenheiros britânicos tinham competência técnica para projetar
plataformas destinadas a operar no Mar do Norte, mas tiveram que esperar um longo
período de tempo para colocar tais habilidades em prática. O setor de instalações offshore
e oleoduto ficou sem a presença britânica. Em outros setores, particularmente atividades-
chave de subsolo, tais como perfuração móvel e fluídos de perfuração, as empresas
britânicas conseguiram ocupar algum espaço que não foi sustentado. Nas áreas
promissoras de fornecimento de produtos e serviços atrelados à engenharia submarina, as
companhias de capital nacional fora relegadas a status de coadjuvantes.
Na década de 1980, sobretudo após o contra-choque no preço do petróleo de 1986,
muitas empresas para-petrolíferas britânicas foram compradas por empresas americanas e
noruegueses. No entanto, há exemplos de companhias que sobreviveram, prosperaram e
se internacionalizaram. Se o governo tivesse criado clima de negócios diferenciado que,
entre outras coisas, promovesse acesso a capital de risco e a programas de P&D focados,
o contingente de empresas britânicas sobrevivente teria sido maior (Smith, 2007).
34 Entretanto, apenas uma vez o Ministério considerou que valesse a pena mudar a decisão de uma operadora nesse estágio final. Na maior parte dos casos a influência era mais implícita e ocorria nos primeiros estágios do processo de compra, com vistas a promover o conteúdo local nas aquisições realizadas pelas operadoras lá instaladas (Nordås et alli, 2003).
60
O sucesso das políticas norueguesas de apoio às empresas da IPP permitiu que diversas de
suas firmas ocupem atualmente posições de destaque no cenário internacional, sobretudo
nos segmentos de perfuração, instalação submarina, pesquisa sísmica e sistema de
produção flutuante (INTSOK, 2001). É importante notar que apesar de seu apoio às
empresas locais, a Noruega nunca abdicou da competitividade internacional como pré-
requisito para o apoio governamental. Desde o início sua política foi fomentar fornecedores
domésticos que reunissem condições competitivas no mercado internacional (Nordås et
alli, 2003).A preocupação com oportunidades justas para as empresas locais foi sempre
acompanhada de atenção especial com os esforços de P&D que garantissem
competitividade para as mesmas. Além dos recursos aportados pelas operadoras para
atender os requisitos para concessão de direito para exploração e produção, são alocados
substanciais recursos provenientes de fundos públicos para a inovação tecnológica. Cerca
de 1/3 desses recursos são destinados a programas de pesquisa básica e estratégica de
longo prazo, enquanto os 2/3 restantes são prioritariamente direcionados às demandas
das empresas.
A concepção dos programas, bem como o estabelecimento de metas e prioridades é
incumbência do Norwegian Research Council (NRC), que utiliza de grupos de assessores35
para definir prioridades e programas. Cabe destacar que inclusive as empresas
estrangeiras que atuam na Noruega são chamadas para participar desses grupos de
assessores (Araújo, 2003). É interessante destacar a exigência de que as operadoras
estabeleçam contratos de P&D com firmas e institutos de pesquisa da Noruega. Esta
iniciativa pode ser considerada um marco no que se refere às políticas de apoio ao setor
para-petrolífero e foram emuladas por vários países em suas rodadas de licitação (Cook,
1985).
No que se refere à colocação de produtos e serviços nos mercados externos, as
exportações diretas realizada por companhias para-petrolíferas alcançaram o patamar de €
2,36 bilhões em 2003 no caso do Reino Unido (SCDI, 2004). Além disso, estima-se que
foram geradas receitas de € 2,63 bilhões de em 2003 por negócios baseados no exterior
que, em última análise se reportam à matriz na Escócia. No caso norueguês, estima-se
que as vendas externas somaram € 4,3 bilhões em 2003. Algo em torno de 50% dessas
vendas são exportações diretas (Hatakenaka et alli, 2006).
Lições da Experiência Internacional
A concentração empresarial na IPP ganhou dimensão a partir do movimento de fusões e
aquisições do final do século XX. Esse movimento foi intensificado como resultado da
35 Formados por representantes de empresas de petróleo, de fornecedores de bens e serviços e instituições de C&T.
61
estratégia de terceirização de atividades das empresas de petróleo. Apesar da estrutura
concentrada, observa-se uma importante franja competitiva de empresas médias e
pequenas que ocupam nichos produtivos relevantes na IPP.
A aglomeração das atividades produtivas da IPP em cidades costeiras, localizadas
próximas a grandes bacias produtoras de petróleo e gás natural é uma característica
central dessa indústria. Outra característica importante é a relação entre as grandes
operadoras, os EPCistas e as firmas da franja competitiva. Essas relações não se resumem
apenas a uma estrutura piramidal, já que as PME possuem fortes vínculos diretos com as
operadoras. No entanto, as trajetórias históricas dos pólos estudados sugerem diferenças
têm origem em políticas medulares vinculadas a duas dimensões de desempenho
competitivo: custos e inovação tecnológica.
No caso da Noruega e de Cingapura, a competitividade foi buscada com foco na
capacitação tecnológica (technology oriented competitiveness). No caso inglês e em certa
medida no norte-americano, a eficiência tem sido buscada redução de custos operacionais.
De fato, os dois primeiros países apresentam estrutura de custos superior em relação às
empresas dos últimos, principalmente em razão dos elevados custos trabalhistas
(especialmente na Noruega, onde o mercado de trabalho é altamente regulado36). Há,
contudo, maior propensão a introduzir novas tecnologias na Noruega, do que no Reino
Unido ou nos Estados Unidos (Duncan, 2001)37.
Tanto na Noruega quanto no Reino Unido ou em Cingapura, as políticas governamentais
tiveram papel determinante na constituição e consolidação da IPP doméstica. No Reino
Unido, a política de full and fair opportunity, com o apoio do OSO (Offshore Supplies
Office) e da operadora estatal, foi decisiva para o desenvolvimento da IPP britânica na
década de 1970. Atualmente, empresas localizadas no Reino Unido são líderes mundiais
em diversas áreas do setor para-petrolífero.
Em Cingapura, sem dotação de reservas de petróleo ou de gás natural, o governo
assentou suas políticas na experiência acumulada no setor naval, tirando proveito da
posição estratégica do país no estreito de Málaga. Cingapura dedicou esforços de
capacitação tecnológica para atender as demandas de plataformas FPSOs e Auto-
Elevatórias (Jack-up rigs). O país ostenta a liderança mundial nessas atividades, alicerçada
em grandes grupos nacionais. Porém, a atuação das empresas cingapurenses não fica
restrita à construção naval. O pólo abriga uma importante indústria produtora de
equipamentos subsea que abastece, sobretudo, o mercado regional do Sudeste Asiático.
36 Na Noruega em comparação com o Reino Unido, os custos para operação e manutenção de plataformas, em campos comparáveis, são cerca de 10% mais elevados. 37 É interessante notar que os ingleses têm mais patentes que os noruegueses nessa área.
62
As políticas públicas norueguesas de apoio à IPP doméstica foram muito mais explícitas e
incisivas do que as políticas públicas adotadas pelos governos dos outros pólos. Com o
apoio dessas políticas emergiu no país um cluster produtivo concentrado em torno de
Stavanger, com posição de destaque no plano internacional38. Atualmente o norte da
política governamental de apoio IPP é a competitividade em termos tecnológicos,
preparando as empresas para competirem nos mercados estrangeiros quando da
maturidade dos campos petrolíferos e gasíferos do país esgotar a demanda doméstica por
seus produtos,
A forte presença do capital estrangeiro aproxima o exemplo de Cingapura do britânico.
Porém, é preciso destacar que Cingapura é muito seletiva em sua política de atração de
investimentos, direcionando-os para atividades com alto conteúdo tecnológico, que dão
sustentação às suas vantagens comparativas dinâmicas. Nesse sentido, a competitividade
do setor para-petrolífero cingapurense ganhou um importante estímulo com a criação do
CORE (Centre of Offshore Research & Engineering) em 2004, por entidades
governamentais e privadas.
A dotação de recursos foi elemento muito importante para a Noruega e para o Reino
Unido, mas pouco relevante em Cingapura. A existência de base industrial anterior foi
importante no Reino Unido e em Cingapura, mas pouco relevante na Noruega. As políticas
públicas de apoio à IPP foram importantes nos três casos e continua sendo muito
relevante tanto na Noruega quanto em Cingapura. Nesses dois casos, o foco recente tem
se orientado para o apoio à inovação tecnológica.
Baseando-se nas experiências norueguesa e britânica, Hatakenaka et alli (2006)
estruturaram uma descrição estilizada dos estágios de desenvolvimento de pólos para-
petrolíferos. As primeiras descobertas de petróleo movem operadoras multinacionais para
a região e, com o passar dos anos, algumas dessas companhias criam raízes locais. Essas
companhias levam seu know-how e arrastam empresas para-petrolíferas com as quais têm
relação comercial estabelecidas. Companhias locais passam a procurar oportunidades para
entrar na indústria nascente, sobretudo aquelas cujas competências anteriores podem ser
adaptadas às necessidades das firmas que se instalam na região. Nessa fase, políticas de
apoio à “indústria infante” contribuem para o processo de desenvolvimento da IPP.
A fase seguinte é a de desenvolvimento de conhecimentos especializados. Nela inovações
tecnológicas continuam a fluir para a região, mas as competências da indústria local
começam a se desenvolver. Com o passar do tempo, os produtos e serviços demandados
38 Sobretudo nas seguintes atividades: aquisição de dados sísmicos e gerenciamento de reservas, perfuração offshore, equipamento de perfuração, tecnologias e equipamentos subsea, projeto de plataformas e gestão de projetos, MMO (Manutenção, Modificação e Operação) e fornecimento de serviços offshore.
63
pela IPGN passam a ser desenvolvidos e fabricados na própria região, por subsidiárias de
empresas multinacionais ou por firmas de origem local. Os focos dos esforços iniciais de
desenvolvimento local são produtos e serviços que se encaixam nas demandas específicas
da região. Durante essa fase, universidades locais procuram desenvolver grade curricular
específica para atender às necessidades da indústria local, assim como, fornecer pesquisas
e serviços de testes para firmas nacionais ou multinacionais. Novas firmas, com foco no
fornecimento de produtos ou serviços especializados, podem emergir durante esse
período, sob a forma de spin-offs de empresas multinacionais ou de universidades e
institutos de pesquisa locais.
Seguem-se as fases da internacionalização e diversificação. Nesse estágio, as firmas
locais desenvolvem vantagens competitivas que lhes permitem competir com rivais não-
locais em outros mercados, dando início à atividade de exportação de produtos e serviços
a outras regiões produtoras de hidrocarbonetos. O conhecimento tecnológico e a relação
com as empresas petrolíferas instaladas na região induzem as firmas locais a
diversificarem suas atividades para outros segmentos industriais, movendo-se inclusive
para o dowstreams da IPGN.
A última fase ocorre quando a exaustão dos recursos locais provoca o deslocamento das
firmas locais para outros mercados. As companhias realinham posições, reposicionando
seus funcionários-chave nas regiões mais atrativas. Algumas firmas locais podem
simplesmente sair do negócio, na medida em que a demanda local passe a declinar.
4.2 Rede Doméstica de Fornecedores
Desde sua criação, a Petrobras deu muita importância ao desenvolvimento de uma rede
doméstica de fornecedores que pudesse atender a demanda de seus projetos. Como
resultado da atuação SERMAT39, progressivamente emergiu uma IPP no Brasil,
inicialmente orientada para o suprimento de bens e serviços para o downstream e, após as
descobertas de reservas na plataforma continental, para o upstream.
Entre as políticas adotadas pela Petrobras para o fomento da oferta doméstica de bens e
serviços para a IPGN, cabe destacar a garantia de aquisição de produtos pioneiros, não
ofertados no mercado doméstico, e o apoio ao esforço de capacitação tecnológica de
fornecedores, com base no conhecimento adquirido pelo seu centro de pesquisa (CENPES).
A política de fomento à produção doméstica de bens e serviços da Petrobras teve forte
apoio em políticas ativas governamentais de proteção aos fornecedores domésticos tanto
39 Atualmente EMAT-DMT
64
no plano regulamentar (lei do similar nacional) quanto financeiro (condições de
financiamento oferecidas pelo BNDES).
A política de apoio à IPP doméstica sofreu radical mudança na década de 1990. A política
de abertura da economia brasileira removeu as proteções regulatórias e tarifárias que
apoiavam os fornecedores domésticos. Pelo lado da Petrobrás, a lei 9478 e a mudança na
dinâmica da relação da empresas petrolíferas com seus fornecedores induziram a empresa
a buscar novas formas de relacionamento com seus fornecedores. A contratação dos
serviços e equipamentos passou a ser delegada a um fornecedor principal que subcontrata
atividades específicas de terceiros e o fomento da produção doméstica foi centrado em
Termos de Cooperação (TC) com os fornecedores.
Nos contratos tipo EPC, um agente opera como contratante principal subcontratando
atividades de terceiros, sendo comum que o EPCista estabeleça relações com firmas com
os quais já possua alguma experiência de parceria anterior (Cook, 1985). O papel dos
EPCistas na coordenação dos fornecedores domésticos é ainda incipiente, muito distante
do papel exercido anteriormente pela Petrobras, principalmente no caso do offshore. Essas
empresas são muito dependentes da Petrobras para a confecção dos projetos básicos, o
que limita sua capacidade para estruturar e administrar uma rede inovadora de
fornecedores.
Existem diferenças importantes entre os segmentos de atuação dos EPCistas. A construção
naval exige pesados investimentos em equipamentos de movimentação, máquinas de
corte e solda e instalações físicas. Esse segmento industrial opera com custos fixos
elevados, sendo a alternância entre momentos de forte capacidade ociosa e fases de
utilização plena da capacidade um grave problema para sua vida econômica.
No downstream, as atividades de EPCistas têm menor intensidade de capital, uma vez que
o canteiro de obras não situa-se na empresa. Sua atividade consiste em formular a
engenharia de detalhamento (a Petrobras se responsabiliza pelo projeto básico),
administrar o processo de compras dos equipamentos e montá-los na maneira
especificada. Nesse caso, o produto não é padronizado e a atividade é organizada quase
que totalmente por meio de contratos do tipo turn-key, lump-sum. Nesse tipo de
contratação, as empresas assumem o risco total do processo de construção, sobre os
equipamentos a serem instalados e sobre o prazo de entrega da unidade de produção.
O conjunto de EPCistas atuantes no Brasil reúne capacitações diferenciadas. Algumas
empresas têm na engenharia seu principal ativo e outras são empresas de construção que
têm seu principal ativo no canteiro de obras e na capacidade de montagem. Algumas das
empresas são originárias do segmento de engenharia que aos poucos vão adquirindo
65
maior especialização na atividade EPC. Existem também empresas que são fortemente
estabelecidas no ramo de construção e montagem ou, ainda, no segmento de construção
naval, identificando-se também a entrada de empresas estrangeiras que iniciam suas
operações no Brasil. Existem evidências de que a produtividade dos EPCistas brasileiros é
baixa. Essa realidade é explicada pela menor escala da produção doméstica e pela
necessidade de modernização das instalações fabris. Apesar disso, quando comparado o
custo, a indústria brasileira de construção e montagem mantém alguma vantagem em
relação à norte-americana40.
Quanto à gestão da cadeia de suprimento, observa-se uma tendência das empresas
internacionais prestadoras de serviços para a IPGN assumirem a função adicional de
coordenação de redes de fornecedores, preenchendo espaços antes ocupados pelas
operadoras. Paralelamente, observa-se uma crescente importância da indústria
fornecedora de equipamentos como provedora de tecnologia que é crescentemente gerida
pelas empresas de serviços. Frente a esta tendência, o grande desafio a ser enfrentado
pelos EPCistas refere-se ao fortalecimento da capacitação tecnológica das empresas
nacionais da área de serviços.
Observa-se uma diferença entre os diversos segmentos do mercado de EPC. Os projetos
associados ao downstream têm um nível de conteúdo local (em torno de 90%) muito
maior do que aqueles associados ao offshore e à construção de navios (que pode atingir
entre 60-70%). Em alguns casos, o desenvolvimento de fornecedores nacionais seria
possível, dado que a tecnologia não é tão exigente. Existe, porém, um problema associado
à formação do vendor list pelos EPCistas41. Além disso, identificam-se problemas
relacionados à excessiva especificação de componentes e serviços por parte da Petrobras.
As empresas EPCistas atuantes no Brasil ainda apresentam certa fragilidade tecnológica.
A falta de capacitação é especialmente danosa no upstream, na medida em que o
desenvolvimento de fornecedores próximos traz grandes vantagens para a competitividade
da IPGN. Para superar essa fragilidade, os EPCistas devem ser estimulados a destinarem
recursos para a inovação, mobilizando os recursos do CTPETRO. O fortalecimento da
capacitação inovativa na IPGN requer a coordenação de ações da Petrobras, com as
empresas EPCistas e com seus fornecedores de equipamentos.
40 Disponível em http://www.prominp.com.br/objects/files/2005-02/602_ABAST-02_Relat%C3%B3rio%20Final.pdf 41 Neste caso, eventuais conflitos com compradores dominantes tendem a ser resolvidos através da ameaça potencial de exclusão (exit) do fornecedor do arranjo, em vez de através de mecanismos de negociação (voice) baseados em compromissos mútuos entre as partes participantes. No primeiro caso, o relacionamento baseia-se em contratos pontuais periodicamente renovados (sequencial spot contracts) que tornam possível à firma contratante substituir com facilidade as firmas contratadas, minimizando os custos de turn-over e favorecendo a flexibilidade operativa. No segundo caso, a resposta dos contratantes a problemas com fornecedores está geralmente baseada em mecanismos de negociação, orientados por uma lógica cooperativa de longo prazo, com um maior grau de interação e um fluxo mais denso. Para uma diferenciação entre este dois modelos de coordenação, ver Helper (1993).
66
As exigências da operadora, apesar de terem efeito fundamental na indução da
capacitação tecnológica do setor, têm reflexos também em sentido inverso, na medida em
que podem gerar obstáculos à expansão das escalas produtivas requerida para acelerar o
processo de capacitação. Nesse sentido, a customização dos produtos em função das
necessidades da Petrobras contribui, por um lado, para o desenvolvimento da sua
engenharia, mas, por outro lado, cria obstáculos à introdução desses produtos em outros
mercados, decorrentes da elevação dos custos dos produtos brasileiros, da perda do valor
obtido com o desenvolvimento do produto e, principalmente, da dissipação de economias
de escala. A padronização seria uma medida relevante para incremento da capacitação e
competitividade das empresas fornecedoras domésticas, favorecendo a inserção
internacional dos fornecedores domésticos.
Como tendência geral, nota-se crescente sofisticação estrutural na rede estabelecida entre
a Petrobras e seus fornecedores. No entanto, subsistem fortes diferenças quanto à
capacidade dos fornecedores virem a atuar competitivamente no mercado internacional.
Entre os segmentos que podem almejar um papel relevante nesse mercado cabe destacar
o segmento subsea, dominado por empresas multinacionais que apresentam alto nível de
atualização tecnológica e capacidade competitiva. Devido à necessidade de customizar o
produto às demandas do cliente, a Petrobras exerce papel fundamental na capacitação
desses fornecedores, sendo a celebração de Termos de Cooperação a forma mais comum
de cooperação dos fornecedores com a Petrobras.
A produção de hastes e unidades de bombeio não apresenta grandes desafios técnico-
produtivos, utilizando tecnologias maduras. As empresas atuantes no setor apresentam
importante inserção externa, sobretudo na América do Sul. No entanto, uma gama
importante de produtos, tais como as hastes polidas e as hastes com centralizador com
guia, são atualmente importados.
No segmento de turbinas, as empresas mais importantes são também filiais de empresas
multinacionais. O parque industrial de algumas empresas encontra-se defasado,
mostrando-se insuficiente para atender as especificações ISO. No entanto, observam-se
limites para a atuação das empresas em faixas de potência mais elevadas, a partir de 30
MW ou 40 MW.
No segmento de bombas, as empresas multinacionais parecem estar mais capacitadas
para acompanhar as exigências técnicas da indústria do petróleo do que as empresas de
origem de capital nacional. Nestas, a ausência de esforços de P&D parecem ser
determinantes na origem das dificuldades, sendo recorrente tanto o uso de engenharia
reversa quanto a aquisição de software para o desenvolvimento de produtos. Por outro
67
lado, as empresas multinacionais adotam como estratégia a “tropicalização” da tecnologia
mundial do grupo para atender as especificações técnicas definidas pela Petrobras.
No segmento de Válvulas e City Gates, a Petrobras desempenha papel central na
certificação dos fornecedores. A adequação dos projetos de válvulas e do processo
produtivo às normas do sistema Petrobras eleva substancialmente os custos de produção,
excluindo a possibilidade de atendimento à demanda de outros segmentos da economia. O
segmento enfrenta a concorrência chinesa com produtos de menor valor agregado. Apesar
do esforço de qualificação induzido pela Petrobras, a configuração produtiva ainda se
encontra aquém do que seria adequado para sua atuação no mercado internacional.
No segmento de compressores, há predominância de filiais de empresas multinacionais. As
empresas do setor, em geral, não atribuem maior elevada importância ao investimento em
P&D, uma vez que o aprendizado do setor está mais associado à experiência e ao contato
com o cliente no desenvolvimento de produtos específicos do que à pesquisa. A
capacitação em engenharia é o principal ativo tecnológico desse segmento.
No segmento de motores é possível diferenciar duas grandes formas de atuação das
empresas. Algumas têm seus produtos acoplados a sistemas utilizados na IPGN e outras
se dedicam à produção de motores de grande porte. Neste segundo caso, a dimensão do
mercado é crucial para a viabilidade empresarial. Atualmente, o mercado brasileiro não
comporta plantas dedicadas à produção integrada dos grandes motores. As empresas
tendem a privilegiar a montagem de sistemas, utilizando motores importados das
matrizes. É importante enfatizar que existe um problema de certificação de qualidade
junto às associações classificadoras, principalmente no caso de motobombas e grupos
geradores marítimos.
O segmento de caldeiraria pesada inclui uma série de equipamentos estáticos. A sua
estrutura empresarial é bastante diversificada, com centenas de empresas atuantes. Os
equipamentos são classificados por tamanho, espessura da chapa e pelo tipo de aço
utilizado. Usualmente, os equipamentos são fabricados com aço carbono. Porém, para
resistir a pressões elevadas ou para evitar contaminação, são utilizados aços especiais. O
segmento pode ser agrupado em três tipos de empresas. O primeiro grupo encara a IPGN
como um mercado secundário para sua produção, pois ela responde por menos de 10% de
suas vendas totais. O segundo grupo orienta parte relevante de sua oferta (cerca de 40%)
para a IPGN. Por último, existe outro grupo de empresas que orienta toda sua produção
para o setor de petróleo.
Em termos do processo de capacitação, observa-se que, após a longa crise setorial, as
empresas de caldeiraria brasileiras optaram por uma trajetória de baixa intensidade
68
tecnológica. As empresas dependem de contratos de licenciamento tecnológico e do
desenvolvimento do projeto pelo cliente (Petrobras-Cenpes ou por EPCistas).
Apesar dessas limitações, o índice de conteúdo local dos equipamentos fabricados pelas
empresas de caldeiraria é próximo a 70 %. Os itens críticos para o fornecimento
doméstico são os aços especiais, onde menos de 30% da oferta total é proveniente de
fornecedores domésticos. Observa-se também que um melhor planejamento de aquisições
da IPGN contribuiria para estabilizar a demanda, levando em conta o grau de utilização da
capacidade de produção da indústria, possibilitando às empresas contemplar horizonte
mais longo em suas estratégias empresariais, o que favoreceria os esforços de
capacitação. Uma alternativa possível para reverter essa trajetória seria o
desenvolvimento de empresas de engenharia especializadas em caldeiraria que os
fornecedores poderiam compartilhar, eventualmente mobilizando o Cenpes e as
universidades, as quais poderiam oferecer suporte para essas empresas, agindo como
incubadoras em sua fase inicial.
O segmento de navipeças é fragmentado, heterogêneo e multifacetado em termos das
suas estratégias, padrões de especialização e níveis de capacitação dos agentes
envolvidos. Essa fragmentação dificulta a capacidade de geração de fornecer soluções
completas em termos de sistemas de navipeças. Apesar de o mercado estimado para esta
indústria ser bastante expressivo, a capacitação produtiva e tecnológica dos agentes locais
varia consideravelmente. Avaliações de especialistas indicam que atualmente a indústria
de navipeças está aparelhada, para atender, em média, 70% da demanda do setor de
petróleo. No entanto, somente nas compras feitas diretamente pela Petrobras os
fornecimentos têm alcançado esses valores. Quando as aquisições são feitas através de
empresas de engenharia (EPCistas), o conteúdo nacional é reduzido para algo em torno de
50%. Em alguns segmentos mais sofisticados do mercado de navipeças os fornecedores
nacionais precisam atravessar rapidamente a chamada curva de aprendizado se quiserem
participar da construção de navios de grande porte.
Entre as principais dificuldades relacionadas ao fornecimento de navipeças, destacam-se:
adequação dos produtos para uso marítimo; a certificação de classe a ser obtido por meio
das certificadoras navais; a adequação do prazo de entrega e o domínio de linguagem
computacional para desenvolvimento e intercâmbio de projetos. As estratégias de
capacitação dos agentes apontam em diversas direções. É possível observar uma
tendência dos fornecedores de navipeças com maior grau de sofisticação de estabelecerem
articulações com empresas no exterior (às vezes, por exigência da Petrobras ou
Transpetro), visando à transferência de tecnologia ou a melhoria das condições de
assistência técnica. Um aspecto importante para a capacitação produtiva e tecnológica dos
69
produtores de navipeças refere-se às suas articulações com empresas de projetos navais,
que funcionam como centros aglutinadores e difusores de competências no âmbito do
conjunto da cadeia produtiva naval. Essa articulação se mostra importante na medida em
que empresas de projeto deverão orientar a elaboração das vendors lists para consórcios
vencedores da licitação da Transpetro. Neste sentido, seria particularmente importante a
busca de algum tipo de articulação entre essas empresas e possíveis instâncias de
representação dos fornecedores locais de navipeças para se procurar avançar no processo
de produção doméstica de componentes.
No segmento de guindastes e guinchos, apesar do conteúdo local ainda ser baixo (em
termos de 30% do valor e de 60% do peso dos equipamentos), a instalação de unidades
produtoras no país poderia fazer com que, em um prazo máximo de 10 anos, esses índices
se elevassem para algo em torno de 60%. O principal gargalo em termos do fornecimento
local de componentes refere-se a motores e componentes hidráulicos e eletrônicos mais
sofisticados. Ações coordenadas com a Petrobras, visando uma maior padronização dos
equipamentos utilizados em plataformas, minimizariam incertezas e facilitariam a
articulação de fornecedores locais de componentes com EPCistas. Para empresas de menor
porte, o incremento da produção local encontra-se condicionado não apenas pelo estímulo
proveniente de maior estabilidade da demanda, como também por ações mais ativas que
estimulem a sua capacitação, através, por exemplo, da articulação dos produtores com
empresas de projeto. Destaca-se também a possibilidade de utilizar a capacitação
acumulada para viabilizar a produção de “pacotes” fechados relativos a equipamentos de
movimentação de cargas, oferecendo uma solução “completa” para estaleiros e EPCistas.,
o que tende a estimular o estabelecimento de articulações com empresas sediadas no
exterior visando a transferência de tecnologia.
No segmento de instrumentação e controle de processos, a produção de
equipamentos no Brasil por subsidiárias de empresas transnacionais é bastante restrita e
os planos de expansão desta produção são muito tímidos, apesar de as perspectivas de
crescimento do mercado brasileiro serem positivas. Nesse segmento convivem subsidiárias
de grandes empresas internacionais e empresas de capital nacional, geralmente pequenas.
As últimas costumam operar como fornecedoras locais de produtos, serviços ou como
terceirizadas nas áreas de instrumentação e controle de processos. O segmento possui,
porém, uma expressiva capacidade de inovação, ainda que seus gastos em P&D sejam
bastante limitados.
No tocante à estratégia de automação, a cultura da Petrobras segue uma série de regras,
com as modificações nos sistemas de operação envolvendo um volume muito grande de
consultas internas, gerando um processo demorado que tende a privilegiar os
70
fornecedores de maior porte. No tocante á automação de processos, o sistema de EPCistas
é adequado para a firma cliente, mas dificulta a comunicação entre ele e o fornecedor.
Existe grande heterogeneidade entre os EPCistas, havendo firmas deste segmento que são
mais integradas verticalmente, capazes de especificar mais detalhadamente os itens a
serem adquiridos. Identifica-se também um problema de escala, pois o mercado brasileiro
não é suficientemente grande para a instalação de fábricas de produtos de ICP, apesar de
a escala mínima de fabricação variar consideravelmente segundo o tipo de produto.
Algumas firmas do setor fazem montagem SKD ou CKD, o que lhes permite trabalhar com
escalas menores. As grandes empresas multinacionais atuantes no setor organizam sua
atividade de P&D em centros de excelência internacionais. Para estas firmas, a execução
dessa atividade está relacionada à possibilidade de atração de um centro de excelência
para o Brasil, o que é uma possibilidade concreta para algumas empresas. As firmas
nacionais enfatizam a absorção de tecnologias já desenvolvidas e a adaptação dessas
tecnologias nos seus produtos. Porém, algumas firmas nacionais também desenvolvem
projetos mais ousados, como, por exemplo, o controlador lógico programável da ALTUS,
usado pela Petrobras, que foi desenvolvido em conjunto com a Universidade do Vale do
Rio dos Sinos e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com apoio da Petrobras e da
Finep.
Os sistemas elétricos incluem uma ampla família de produtos que se articula em torno dos
transformadores, que são os componentes mais relevantes. Nesse caso, a indústria está
organizada pela tensão dos equipamentos e em função da forma de refrigeração, a óleo ou
a seco. No passado, as concessionárias de eletricidade realizavam os projetos de
subestações e adquiriam os transformadores diretamente dos fornecedores. Nesse setor,
empresas multinacionais de grande porte convivem com outras de capital nacional, sendo
que algumas delas são de propriedade familiar. Com a liberalização do setor elétrico, as
concessionárias focalizaram suas atividades e passaram a demandar soluções fechadas
dos fornecedores, estimulando a diversificação da oferta. Os sistemas elétricos são
desenhados conforme a necessidade do cliente e o serviço pós-venda é muito importante
para o sucesso empresarial.
Os fabricantes domésticos sofrem pouca concorrência de importações que são
significativas apenas no caso de equipamentos padronizados. O segmento conta com
tecnologia madura, sendo incrementais os seus progressos tecnológicos. A tecnologia
básica dos transformadores tem como principais componentes o núcleo de aço e as
bobinas de cobre. Os desafios tecnológicos do segmento estão orientados à utilização dos
equipamentos em condições extremas de uso, como transformadores submarinos, com
maior segurança e menor impacto no meio ambiente. Esses desafios se traduzem no
71
desenvolvimento de transformadores de maior potência (a seco), que não utilizam óleo
mineral como material isolante. Apesar da maturidade tecnológica, a indústria conta com
fluxos tecnológicos significativos, em função de seus produtos terem elevado conteúdo de
engenharia. Os contratos de transferência tecnológica não são, em geral, uma fonte
significativa de conhecimento para os fornecedores. Os departamentos de engenharia das
empresas estão bem estruturados, sendo a mão de obra qualificada considerada como
fonte significativa de conhecimento. As empresas realizam parcerias com universidades,
enquanto os gastos com P&D totalizam de 1% a 2% do faturamento. Essas percentagens
alcançam valores mais expressivos nas empresas maiores.
No caso de Motores e Geradores Elétricos, cerca de 40% da produção brasileira é
orientada para o mercado externo, com a indústria de petróleo e gás sendo responsável
por menos que 5% da produção total. A tecnologia é madura, identificando-se uma
trajetória tecnológica ditada pela redução de peso e tamanho, implicando o
desenvolvimento de materiais isolantes mais resistentes, que diminuem a necessidade de
ventilação. Além disso, ganhos de eficiência são gerados por uma série de inovações que
envolvem chapas magnéticas de melhor qualidade, maior volume de cobre, enrolamentos
especiais, núcleos do rotor e do estator tratados termicamente, desenho das ranhuras,
maiores barras e anéis de curto-circuito, melhor desenho da ventilação, melhor projeto do
rotor.
O Brasil detém elevado nível de capacitação tecnológica nesse segmento. A principal fonte
de conhecimento é interna, baseada em investimentos expressivos em P&D e na
realização de parcerias com universidades brasileiras e estrangeiras, com apoio de
recursos da FINEP. Os clientes também têm papel importante no processo de capacitação,
principalmente ao exigirem uma melhora contínua de desempenho, como é o caso da
IPGN. A interação com fornecedores é importante, apesar de a empresa líder internalizar
grande parte das atividades. Uma fonte de vulnerabilidade é a importação por EPCistas de
grupos/sistemas que incluem motores e geradores.
O segmento de Flanges e Conexões caracteriza-se por uma estrutura de mercado
fragmentada, na qual predominam empresas de pequeno e médio porte, com controle
familiar, com exceção das conexões premium, que são produzidas principalmente por
fabricantes de tubos de aço. Freqüentemente a produção é sob encomenda, realizada com
nível de atualização tecnológica intermediário, persistindo problemas relativos aos prazos
de entrega. Nesse setor, as empresas mais importantes são, em geral, de capital nacional,
com pessoal empregado oscilando entre 100 e 150 funcionários. As empresas procuram
focalizar sua atuação em produtos em produtos não-padronizados, atendendo demandas
em a concorrência internacional (em particular, de produtos asiáticos, de um modo geral,
72
e chinês, de um modo particular) é baixa. O mercado da IPGN é, em geral, secundário
para essas empresas. O setor de flanges e conexões está sujeito a inspeção por parte da
Petrobras, com a presença de um inspetor residente. As exigências para um melhor
controle de qualidade acabam gerando custos, o que dificulta a competitividade das
mesmas em produtos mais padronizados e de menor margem de rentabilidade.
Por fim, é possível mencionar a importância da capacitação em alguns ramos de insumos
básicos integrados às redes de fornecimento do setor de óleo e gás. No caso de Insumos
Siderúrgicos, as evidências demonstram que o setor possui plenas condições de atender à
demanda atual e futura. Tanto as companhias siderúrgicas, quanto as produtoras de
tubos, que atendem à indústria de petróleo e gás natural, são controladas por empresas
com escala de operação global. As empresas são bastante competitivas, principalmente
em relação à qualidade e ao prazo de entrega, estando aptas a concorrer com
competidores estrangeiros no mercado interno e a exportar. Verifica-se importante
articulação da cadeia produtiva como conseqüência da relevância atribuída aos clientes e
fornecedores como fonte de conhecimentos. Uma importante mudança em termos de
estrutura é o fato de que cada vez mais as empresas produtoras de tubos passaram a
prestar serviços, aumentando as barreiras à entrada no setor.
4.3 Redes Regionais de Fornecedores
O conceito de Arranjo Produtivo e Sistema Inovativo Local (APSIL) adota elementos
institucionais e históricos que integram os sistemas produtivos territoriais como parte
relevante desses arranjos (Cassiolato e Szapiro, 2002, Vargas, 2002). Assume-se que a
interdependência entre atores fomenta a competitividade local, induzindo a especialização
a formas específicas de troca de conhecimentos (Lastres e Cassiolato, 2003).
Nessa perspectiva metodológica, a dimensão territorial constitui um recorte específico de
análise dos processos produtivos e inovativos A proximidade geográfica leva ao
compartilhamento de visões e valores econômicos, sociais e culturais, constituindo-se em
fonte de dinamismo, bem como de diversidade e de vantagens competitivas em relação a
outras regiões. Em outras palavras, a proximidade geográfica desenvolve ativos
específicos, gerando spillovers42 com externalidades positivas.
A Petrobras tem atuação em todo o território nacional. A territorialização dos esforços de
capacitação comandados pela empresa tem sido acompanhada por Núcleos Regionais.
42 Spillovers relacionam-se com o “efeito vazamento”, no qual, pela proximidade geográfica, certos conhecimentos “vazam” de uma empresa para outra.
73
Esses núcleos têm por objetivo capacitar pequenas empresas para atuarem
competitivamente na cadeia produtiva local de suprimento da IPGN. Em outubro de 2004,
foi assinado um convênio entre o Sebrae Nacional e a Petrobras para inserção competitiva
e sustentável de micro e pequenas empresas na cadeia produtiva da IPGN43.
O desenvolvimento da produção de petróleo da bacia de Campos estimulou a expansão de
investimentos dos fornecedores de diversas partes do Brasil e também do exterior na
região. Esse movimento acirrou a competição, induzindo os fornecedores locais a unirem
esforços, como alternativa para a garantia da sobrevivência no mercado.
Em 2001, o sistema Sebrae, em parceria com a ONIP e o Ministério da Ciência e
Tecnologia, lançou o programa “Competitividade é a Nossa Plataforma” com o objetivo
principal de desenvolver ações integradas que fortalecessem a cadeia produtiva do
petróleo na região. Um diagnóstico serviu de base para o projeto do SEBRAE voltado para
a formação de um arranjo produtivo local de petróleo e gás, com base em Macaé. Ao final
de 2003 foi lançada REDEPETRO-BC, com o objetivo estruturar uma rede de pequenas e
médias empresas nos municípios da Bacia de Campos. Em 2005, 144 empresas estavam
integradas à rede, destacando-se um Grupo Executivo composto por 16 empresas e um
Grupo de Apoio formado por 12 instituições tecnológicas e empresariais. A Secretaria
Executiva ficou com a função de executar todas as atividades operacionais que garantem o
fluxo de informação entre os membros da rede. A promoção da articulação produtiva em
busca da competitividade.
As atividades operacionais da Rede foram organizadas por projetos, estruturados a partir
das necessidades ou oportunidades identificadas pela Secretaria Executiva junto às
empresas. Entretanto, o Grupo Executivo começou a identificar que o desenho gerencial
adotado possuía fragilidades, como, por exemplo: falta de direcionamento estratégico,
ingerência externa na tomada de decisão, baixo comprometimento das empresas
participantes da rede, assimetria de informações, entre outros fatores que desgastavam as
relações e ameaçavam a própria coesão do grupo. Novo cadastramento de associados
permitiu constar que a rede contabilizava 80 (oitenta) empresas e 14 (quatorze)
organizações de diversos segmentos. Um novo modelo de gestão fortaleceu a atuação
tanto da Secretaria Executiva quanto do Grupo Executivo.
43 Esse convênio definiu com principais focos estratégicos os seguintes temas: a capacitação de micro e pequenas empresas; a formação e a consolidação de redes de cooperação competitiva de empresas petrolíferas e fornecedores locais; a realização de diagnóstico da capacitação de fornecedores; a elaboração e implementação de plano de desenvolvimento participativo para a cadeia produtiva; a sensibilização e mobilização de grandes fornecedores para o engajamento das micro e pequenas empresas como fornecedoras locais; e a interação com outras redes de cooperação competitiva para a troca de experiências e promoção de negócios.
74
A Redepetro-RS foi criada em 1999, antes mesmo da Rede Petro-BC, a partir da
articulação da Secretaria da Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, com universidades
e empresas. Ela adotou como objetivo fortalecer a base tecnológica local dos fornecedores
da IPGN, de energia e de minerais, dando início em um programa de capacitação de
fornecedores para 35 pequenas empresas. Nos primeiros meses de 2003, duas empresas
gaúchas assumiram alguns dos contratos de prestação dos serviços de montagem
industrial da obra de ampliação da Refap.
Esse resultado induziu grandes empresas regionais a apoiarem o desenvolvimento da
oferta local para suas necessidades de bens e serviços. No final de 2004, 80 empresas
locais se apresentaram como fornecedoras potenciais da Refap. Outro grupo de empresas
foi formado com 20 companhias da região de Rio Grande e Pelotas, a partir de novembro
de 2005, com foco no suprimento do dique seco e na construção e manutenção de
plataformas de produção de petróleo. Outro subgrupo iniciou-se em maio de 2006 com 45
empresas escolhidas entre os fornecedores das âncoras Copesul, Petroquímica Triunfo e
Innova, do Pólo Petroquímico de Triunfo (RS).
A Rede PETRO-RS vem crescendo por meio da adesão de diferentes atores. Quando do seu
lançamento em 1999, ingressaram na Rede 36 empresas, 4 agentes financeiros, 10
laboratórios ligados a Universidades e Centros de Pesquisa, além de organizações de apoio
institucional e a Petrobras. No início de 2005, estavam credenciadas na Rede, além da
Petrobras e dos agentes financeiros, 189 empresas e mais de 90 laboratórios de pesquisa.
Nesse período foram efetuados mais de 40 projetos de desenvolvimento tecnológico,
induzidos pelas demandas da Petrobras. A consolidação dessas ações resultou na
estruturação do Projeto Estruturante do Petróleo e Gás.
A Rede de Cooperação da Cadeia Produtiva do Petróleo e Gás em Sergipe começou a se
estruturar em 2003, coordenada pelo Sebrae/SE. Desde sua criação, a Rede foi se
integrando a outras redes no Estado e no Brasil, tendo contribuído com a criação da Rede
Sergipe de Tecnologia, Rede de Metrologia de Sergipe e liderado inicialmente as ações da
Rede Brasil de Tecnologia no Estado. Em 2003, o projeto integrou-se ao Prominp. Uma
primeira avaliação das atividades da rede indicou que 86% das empresas participantes
fizeram mudanças na estrutura organizacional e 100% obtiveram novos contratos. A
média do incremento no faturamento foi de 154,2%, chegando ao em um caso a 676%.
Em 2002, foi realizado em Maceió (AL) um seminário sobre o uso do poder de compra,
com o objetivo de cumprir um decreto estadual que criou o Fórum de Competitividade
para as Cadeias Produtivas Prioritárias de Alagoas e o programa de compras
governamentais. A cadeia produtiva da IPGN foi uma das três cadeias produtivas
75
selecionadas para serem desenvolvidas, com o amparo do acordo assinado em junho de
2000 entre Sebrae, ONIP e ministérios. Em 2002, a partir da liderança da Algás, foram
desenvolvidas visitas a empresas de pequeno porte, incentivando a formação de uma rede
de contatos com potencial para participação no projeto. No segundo semestre de 2003, a
primeira turma de cinco empresas deu início no trabalho de qualificação e, em 2004, foi
iniciada o programa de gestão da qualidade em micro e pequenas empresas (MPE), com
base na norma internacional ISO 9001. Um convênio entre Algás, Sebrae/AL e o Senai,
permitiu a implementação do selo de qualidade do gás natural em outras cinco pequenas
empresas instaladoras de gás em Alagoas.
Em 2003, foi criada a Rede Petro/MG, com a função de articular as pequenas empresas
mineiras e aproximá-las dos organismos de fomento e pesquisa do Estado. O objetivo era
identificar oportunidades de negócios geradas por grandes empresas e criar canais de
comercialização. Foram realizados diagnósticos para identificar gargalos que restringiam a
competitividade das empresas e foram preparados módulos de capacitação com trabalho
de instrutores e consultoria. Após 12 meses, teve início foi feito um segundo diagnóstico
para medir a evolução obtida. Das 41 empresas iniciais, somente 22 atenderam às
demandas de suas empresas-âncoras e foram recomendadas para o cadastro da ONIP.
Após a etapa de capacitação de fornecedores, foi feito o cadastramento na Petrobras e
ONIP. Foram também identificadas e divulgadas formas de acesso das micro e pequenas
empresas ao crédito.
Na Bahia, os trabalhos de estruturação da rede de empresas foram iniciados em 2005. As
empresas associadas realizaram o Programa de Capacitação que contempla o
aperfeiçoamento nas áreas de gestão, abrangendo planejamento estratégico, gestão de
processos, gestão de pessoas, gestão de clientes, gestão da informação, gestão da
responsabilidade social, gestão do SMS e gestão de resultados. Paralelamente a essas
ações, foram implantados procedimentos para a realização de compras conjuntas,
objetivando reduzir custos de matéria-prima, material de escritório e segurança. Em 2006,
havia 18 empresas cadastradas na ONIP e Petrobras.
4.4 Capacitação Inovativa da IPP brasileira
A inovação é um processo social que se dá fundamentalmente por meio do aprendizado
interativo de empresas, universidades e instituições de pesquisa, podendo a base de
conhecimento relevante para o processo inovativo ser informal e não codificada. Existe um
amplo reconhecimento na moderna teoria da inovação de que as firmas atuantes em
76
determinado mercado operam com parâmetros científicos e tecnológicos comuns. O
conceito de paradigma tecnológico, proposto por Dosi (1988), enfatiza que esses
parâmetros apresentam-se estruturados e tendem a evoluir ao longo de trajetórias
particulares. No entanto, a base de conhecimento é desenvolvida, mantida e disseminada
por instituições de vários tipos. O conjunto de instituições que contribui para o
desenvolvimento e difusão de tecnologias é definido como sistema de inovação (Lundvall,
1992).
Dados da National Science Foundation (2005) indicam que a IPGN americana apresenta
participação relativamente modesta nos fundos privados investidos em P&D (cerca de
0,6%), estando sua dinâmica tecnológica fortemente articulada com a de seus
fornecedores de equipamentos e serviços44. A coordenação das várias pontas do processo
inovativo é crucial para o sucesso da atividade das operadoras (Dantas, 1999), sendo
indispensável a participação das empresas fornecedoras nesse processo. A coordenação
garante à operadora: (a) relações estáveis com os agentes do seu arranjo produtivo; (b)
garantia da qualidade dos bens e serviços produzidos; (c) redução de custo e de tempo
para implementação de novos bens e serviços aos requerimentos produtivos; (d) aumento
de spillovers do arranjo.
A Petrobras destaca-se como uma das empresas petrolíferas que mais investe em P&D,
seja em termos absolutos, seja como proporção de seu faturamento. A empresa tem como
meta investir 1,4% do seu faturamento em P&D, tendo sido destinados mais de R$ 1200
milhões aos esforços de P&D em 2006 A empresa mapeia anualmente cerca de 600
tecnologias identificadas como gargalos tecnológicos para a execução do seu plano
estratégico, cabendo ao CENPES buscar soluções para os problemas identificados. Esse
conjunto não contempla conhecimento tecnológico incremental que é do âmbito dos
fornecedores de bens e serviços45. Nestes casos, o desenvolvimento não cabe ao CENPES,
mas ao setor de materiais que tem como uma de suas tarefas o desenvolvimento de
fornecedores capacitados para o atendimento competitivo da Petrobras. Atualmente, a
estratégia de desenvolvimento tecnológico da Petrobras aponta quatro prioridades:
aumento da capacitação tecnológica para a produção em águas profundas e
ultraprofundas; aumento da recuperação de petróleo nas jazidas já descobertas; novas
tecnologias de refino para adequar a produção de derivados tanto aos petróleos
44 A cadeia de suprimentos do setor petróleo incorpora empresas que são classificadas em vários setores de atividades (metal-mecânica, eletrônica, química, serviços de engenharia, etc.) com estruturas industriais, dinâmicas inovativas e padrões de concorrência bastante diferenciados. 45 Em uma das entrevistas realizadas foi citado o exemplo de uma chave de grifo com problemas, que foi enviada ao CENPES para análise. O custo para o CENPES proceder com a análise e identificação de um problema relativo a este tipo de ferramenta é muito elevado. Nesses casos, o setor de materiais está mais bem posicionado para equacionar o problema tecnológico.
77
disponíveis no país quanto às características de seu consumo; e tecnologias de novas
fontes de energia.
O processo de inovação tem início nas áreas de negócio da empresa, identificadas como
clientes do sistema de inovação. Elas definem diretrizes e prioridades para a carteira de
projetos de pesquisa da empresa. Definidos os desafios tecnológicos das áreas de negócio,
passa-se à elaboração dos Programas Tecnológicos, em estruturas matriciais com uma
visão multidisciplinar. A preocupação com a mobilização de competências complementares
por meio de projetos cooperativos faz parte da estratégia de gestão tecnológica da
Petrobras.
Desde 2005, a Petrobras adotou novo modelo de gestão do processo de inovação, baseado
na estruturação de Redes Temáticas. Nesse novo modelo, cabe ao CENPES (ou a uma área
de negócio) a gestão da Rede, tendo o assessoramento de um Comitê Técnico-Científico.
Os Núcleos de Competência associados às Redes Temáticas estruturam-se a partir de
quatro áreas que se desdobram numa série de temas vinculados a tecnologias
estratégicas. O CENPES acompanha com atenção o desenvolvimento de fornecedores:
subsea, tubos e navipeças. No caso do subsea, onde grau de complexidade tecnológica é
elevado, o CENPES participa de redes de conhecimento que envolvem parcerias com
universidades, centros tecnológicos, fornecedores ou mesmo concorrentes (no caso do
desenvolvimento de tecnologias em estágios pré-competitivos). A interação do CENPES
com os fornecedores no desenvolvimento tecnológico nestas áreas estratégicas não se
baseia em um modelo único, ainda que tais articulações sejam operacionalizadas através
de Termo de Cooperação (TC).
O TC foi estruturado como instrumento para o desenvolvimento de um novo produto,
desde o projeto conceitual até testes de campo com protótipos, com aderência tecnológica
aos projetos da empresa. “A adoção dos Termos de Cooperação é decorrência decisiva da
prática de formação de parcerias pela Petrobras, formalizando um relacionamento mais
estreito e cooperativo da empresa com fornecedores de bens e serviços críticos ao
processo produtivo. Nestes contratos, em geral associados ao desenvolvimento e testes de
protótipos, há explicitamente a garantia de participação de técnicos da Petrobras na
consecução dos projetos, cumprindo um papel de supervisão e de troca de informações –
estas necessariamente passadas à contratante, desde que associadas ao objeto
contratado” (Dantas, 1999).
Formatados inicialmente para permitir a viabilização de projetos na fronteira do
conhecimento, como a exploração e produção de óleo e gás em águas profundas, os TCs
procuraram estimular a associação dos fornecedores com universidades para garantir
78
suporte acadêmico para o esforço de inovação tecnológica. Eles tornaram-se
particularmente relevantes para as empresas brasileiras de médio e pequeno porte, nas
quais é limitada a capacidade de investimento em capacitação tecnológica. Por meio dos
TCs, a Petrobras assume a responsabilidade de financiar os custos associados à fabricação
e testes do protótipo, rateando os custos associados à engenharia e à realização de testes
laboratoriais com o fornecedor.
O TC é instrumento flexível para contratação de projetos. Nos casos mais simples, o TC
envolve somente atividades de homologação de materiais/equipamentos já produzidos por
fornecedores da cadeia. Nos casos mais complexos, o termo de cooperação pode envolver
diferentes etapas, desde a concepção e engenharia básica de um determinado
equipamento até a sua fabricação e homologação. Em todos os tipos de TCs, a empresa
adota critérios de aceitação que pressupõem o sucesso nos testes de campo, o que explica
uma taxa de sucesso de mais de 95% nos TCs estabelecidos pela empresa.
Após uma relativa desmobilização dos programas de capacitação de fornecedores no fim
da década de 90, os TCs voltaram com força após a criação do Programa de Mobilização
da Indústria Nacional do Petróleo e Gás (PROMINP), em 2003. Criado com o objetivo de
maximizar a participação da indústria nacional de bens e serviços, em bases competitivas
e sustentáveis, o PROMINP procura integrar ações vinculadas com outros programas de
capacitação, especialmente a qualificação da mão de obra, dentro de uma lógica geral de
incremento de índices de conteúdo nacional no suprimento de bens e serviços.
Com o advento do Prominp, o foco dos TC voltou-se para a identificação de nichos para
substituição da importação. O mapeamento dos itens produzidos nacionalmente e
importados permite agrupar os bens e serviços adquiridos pela companhia em quatro
zonas de atendimento (figura X). A zona de importação corresponde aos materiais e
serviços que não serão nacionalizados, seja por motivos econômicos, seja por dificuldade
tecnológica. Na zona de atendimento atual, as ações da Petrobras limitam-se ao
acompanhamento do comportamento tecnológico dos fornecedores domésticos.
A ação da Petrobras centra-se nas zonas em que o Prominp identifica potencial para a
substituição da importação por fornecedores domésticos. A zona de conforto é composta
pela parcela da demanda de bens e serviços não atendida domesticamente que oferece
condições favoráveis para a inserção competitiva de fornecedores domésticos. A zona de
sobre-preço caracteriza-se pela necessidade de incentivos temporários para que seja
desenvolvida a capacidade para a oferta doméstica. A zona de importação contempla os
equipamentos que não são considerados passíveis de produção doméstica em condições
competitivas.
79
Figura 16
Zonas de Atendimento
Fonte: Petrobras
Em alguns casos o fornecedor participa do desenvolvimento desde o início do projeto. Em
outros, o fornecedor entra somente na etapa de desenvolvimento de protótipos. Na
maioria dos casos, o fornecedor recebe o projeto pronto para fabricação do equipamento.
Da mesma forma, o timing dos projetos varia consideravelmente. No caso da bomba
multifásica, por exemplo, o projeto já dura cerca de 20 anos e tem previsão de conclusão
em 2009. Para outros equipamentos, o tempo de desenvolvimento é muito menor. O
maior problema dos programas de capacitação de fornecedores, segundo avaliação dos
profissionais entrevistados no CENPES, reside nos vínculos de dependência que se criam
entre esses fornecedores e a Petrobras. Na avaliação do CENPES, faltam profissionais nas
empresas com capacitação para interagir em redes tecnológicas e, por outro lado, a
universidade não está estruturada para a oferta de capacitação tecnológica ao parque
produtivo.
Um dos traços marcantes da estratégia empresarial da Petrobras tem sido a cooperação
com instituições de pesquisa para dar suporte ao seu esforço inovativo. Esse traço
acentuou-se, no que se refere às instituições de pesquisa, após as mudanças institucionais
na regulação do setorial provocadas pela abertura do mercado brasileiro de
hidrocarbonetos. O Fundo do Petróleo, alimentado com parcela dos royalties obtidos com a
produção de hidrocarbonetos, foi criado para fomentar o Plano Nacional de Ciência e
Tecnologia para o Desenvolvimento do Setor de Petróleo e Gás (CTPETRO). Além disso, as
80
operadoras receberam a obrigação de destinar um por cento (1%) das receitas obtidas nos
campos com elevada rentabilidade às atividades de P&D. A Petrobras, como maior
produtora de petróleo, é a grande usuária desses recursos.
Os recursos oriundos dos royalties do petróleo são repassados pela ANP ao Ministério da
Ciência e Tecnologia (MCT), sendo transferidos ao Fundo Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (FNDCT). Esses recursos são administrados pela Financiadora de
Estudos e Projetos (FINEP), com o apoio técnico da ANP. A aplicação dos recursos se
operacionaliza, preferencialmente, na forma de editais para financiamento de programas e
projetos selecionados, sendo contratados mediante convênios com universidades e centros
de pesquisa do país. No mínimo 40% dos recursos devem ser aplicados em programas
liderados por instituições das regiões Norte e Nordeste do País. As empresas devem
submeter projetos associados com universidades ou centros de pesquisa (MCT, 1999).
Os editais do CT-Petro têm procurado consolidar do sistema setorial de inovação, através
da indução da articulação entre empresas da cadeia produtiva da IPGN e institutos de
pesquisa. Eles têm adotado quatro orientações básicas: i) ampliação da capacitação
técnica das universidades e centros de P&D do N/NE, ii) reforço da formação de recursos
humanos para a IPGN; iii) direcionamento e ampliação da atuação das empresas na
definição da agenda de P&D para a IPGN; iv) fomento de incubadoras de empresas
setoriais. Entretanto, o envolvimento do setor produtivo permanece muito aquém do
necessário para o estabelecimento de elos sustentáveis entre as empresas e instituições
de pesquisa (Freitas, 2002)
Apesar dos esforços empreendidos, persistem importantes limitações nas ações do CT-
Petro. A principal delas refere-se ao crescente descolamento entre o volume de recursos
previstos pelo mecanismo institucional e a sua execução efetiva em termos do volume de
recursos liberados para contratação de projetos. O montante de recursos liberados para
contratação de projetos representa atualmente menos de 10% da arrecadação total. A
maior parte dos recursos tem sido destinada ao incremento do superávit fiscal do governo
(Tavares, 2005a). Uma segunda limitação do CT-Petro diz respeito à pulverização dos
esforços de pesquisa e um viés direcionado para o fomento de atividades de pesquisa de
interesse da comunidade científica (Furtado, 2003), apesar de ser orientação do fundo a
promoção de projetos cooperativos envolvendo relações universidade-empresa.
Em média, os projetos cooperativos entre universidade ou institutos de pesquisa e
empresas envolveram pouco mais de 50% dos recursos disponibilizados. Os dados
apontam também a participação de um número ainda restrito de empresas nos projetos.
Esses números sugerem certo descolamento entre os interesses das empresas e o foco
81
das instituições de pesquisa. Em síntese, o fundo setorial é um mecanismo de fomento
com grande potencial para ampliar as atividades de C&T da IPGN, envolvendo
fornecedores e instituições de pesquisa em projetos cooperativos. Entretanto, seu papel
tem sido muito limitado como instância de organização e coordenação dos esforços de
pesquisa do sistema setorial de inovação da IPP. Por outro lado, a obrigação regulamentar
de aplicar parcela da receita em projetos cooperativos com instituições de pesquisa
credenciadas pela ANP induziu a Petrobras a investir mais de R$ 350 milhões em projetos
de P&D, em 2006.
O censo realizado em 2004 pelo CNPq indica que a Petrobras posicionava-se como a
segundo agente com mais relacionamentos com grupos de pesquisa no Brasil. No total, 72
grupos de pesquisa pertencentes a 32 diferentes instituições relataram 156 interações com
unidades de negócio ligadas à Petrobras. Essas interações estão concentradas (81,4%) em
atividades relacionadas com as engenharias, computação, ciências exatas e da terra. No
tocante aos fluxos de informação e conhecimento provenientes da Petrobras para os
grupos de pesquisa, cabe destacar que sete (4,5% do total) dos relacionamentos
reportados encontram-se associados ao fornecimento de insumos materiais para
atividades de pesquisa. Apenas três relacionamentos (1,9% do total) encontram-se
associados respectivamente à transferência de tecnologia desenvolvida pela Petrobras
para os grupos e ao treinamento de pesquisadores dos grupos na empresa.
Nos últimos anos, têm sido realizadas negociações da Petrobras com as universidades para
formular uma política de contratos adequada à viabilização de projetos cooperativos de
P&D. Nesse sentido, há indícios de certo desconforto das instituições de pesquisa com
relação à forma pela qual a empresa lida com questões como titularidade de patentes,
publicação de artigos científicos, sigilo das informações e remuneração pelo uso das
tecnologias desenvolvidas em parceria. As dificuldades começaram em fins dos anos 1990,
com as mudanças nos termos dos contratos de concessão para exploração,
desenvolvimento e produção de petróleo e gás, que removeram o monopólio da Petrobras
e ampliaram o volume de recursos para P&D no setor.
O ponto mais complicado e complexo é a propriedade intelectual, sendo possível
caracterizar três situações distintas: quando o interesse em patentear é exclusivo da
universidade, quando é da empresa ou quando é de ambos. Outros aspectos importantes
referem-se à definição de quem deve arcar com os custos de pedido e manutenção do
depósito de patente; bem como às condições de participação nos lucros, no caso de
licenciamento. Existem também controvérsias sobre os direitos de uso, associado a
situações nas quais a empresa se compromete a pagar à universidade parceira uma
porcentagem do lucro que venha a obter com o uso da tecnologia, seja produto ou
82
processo, mesmo que a empresa tenha investido apenas recursos próprios naquele
desenvolvimento e não conte com dinheiro público.
A política da Petrobras determina que a empresa detenha 100% da titularidade nos
projetos apoiados por ela. Há uma adequação, caso a caso, quando os projetos contam
com recursos vindos de agências públicas de fomento à pesquisa, como a Financiadora de
Estudos e Projetos (Finep) e as fundações de amparo à pesquisa. A empresa não paga às
universidades royalties pelos benefícios que o uso da tecnologia possa gerar, optando por
uma estratégia defensiva no patenteamento. As inovações são geralmente adotadas nos
processos produção, sendo a patente solicitada nos países onde a empresa opera46.
É importante notar que o contexto institucional no qual se dá a interação universidade-
indústria está se modificando, em função dos impactos da recente Lei de Inovação. Essa
lei determina que instituições de pesquisa participem dos resultados dos projetos,
disciplinando o registro de propriedade intelectual e as condições de licenciamento das
tecnologias47. Apesar de essa lei ter criado ambiente institucional mais robusto, ela
dificultou a relação universidade-empresa criar conflitos potenciais sobre o direito de uso
do conhecimento que pode resultar em novo produto ou processo, pela empresa.
Estudo realizado pelo INPI (2006) indica que a Petrobras foi o segundo maior depositante
de pedidos de patentes no Brasil, no período 1999-2003. A grande maioria dessas
patentes é constituída por inovações incrementais em processos, porém há também
inovações protegias sob a forma de segredo industrial, com destaque para a formulação
de novos combustíveis e lubrificantes. No período mais recente (2004-2006), observa-se
uma aceleração dos pedidos de depósitos de patentes pela Petrobras. A Petrobras destaca-
se também como a principal depositante brasileira no escritório norte-americano de
patentes (USPTO). A empresa havia solicitado 46 patentes naquele órgão entre 2001 e
2005, o que a coloca como a maior solicitante brasileira.
Nosso estudo da competitividade de dezoito (18) segmentos do parque produtivo brasileiro
indicou que a escala produtiva não representa desafio competitivo para a maior parte dos
equipamentos demandados pela IPGN, ainda que subsistam lacunas produtivas vinculadas
a limitações de escala. O grande desafio enfrentado pela IPP doméstica encontra-se na
46 Trata-se de uma estratégia bem diferente da estratégia ofensiva de proteção intelectual, na qual a tecnologia é embarcada no produto final, a patente assegura proteção do mercado (e não do uso) e os pedidos são feitos nos países onde o produto é vendido. 47 A Lei de Inovação prevê duas possibilidades principais de articulação Universidade-Empresa. Na “Prestação de Serviços Tecnológicos”, a instituição de C&T estabelece uma “remuneração”, sem que haja prestação de contas das despesas. Neste caso, a titularidade e as despesas com registro são de responsabilidade da empresa, enquanto o licenciamento e participação nos resultados são definidos como direitos exclusivos da empresa, sendo garantida a nomeação dos inventores (desde que não seja segredo industrial). Na “Parceria Tecnológica”, desenvolvem-se atividades conjuntas, tendo como instrumento contratual um convênio. Nesse caso, está previsto o ressarcimento de custos mediante prestação de contas, a titularidade, o licenciamento, as despesas com registro e a participação nos resultados compartilhados, sendo também garantida a nomeação dos inventores (desde que o objeto não envolva segredo industrial).
83
sua limitada capacitação tecnológica para tender a demanda de inovações da IPGN. Essa
limitação é fruto de três fatores centrais: i) os investimentos em P&D da IPP doméstica
são muito baixos; ii) os laços de cooperação da IPP doméstica com o sistema nacional de
ciência e tecnológica são tênues e não estruturados; iii) a engenharia doméstica, tanto dos
fornecedores quanto das empresas que prestam serviços de engenharia para a IPP,
encontra-se muito fragilizada.
A interação com a Petrobras é a principal fonte de conhecimento tecnológico da IPP
brasileira, essencialmente pelo aprendizado obtido nas operações da Petrobras (learning
by doing). Ainda que esse mecanismo seja relevante para incrementos na capacitação
tecnológica, ele é claramente insuficiente para dotar os fornecedores domésticos da
dinâmica competitiva necessária para operar no mercado global. Como pudemos verificar
nos três pólos para-petrolíferos analisados na seção anterior, a dinâmica inovativa dos
fornecedores locais é essencial para a competitividade da rede de fornecedores atuantes
nesses pólos.
Atualmente, o essencial do esforço de capacitação tecnológica da IPP brasileira vem sendo
realizado nas matrizes das filiais de empresas multinacionais estabelecidas no país. Para
tanto, será indispensável investimentos significativos dos fornecedores da IPP na sua
capacitação tecnológica que devem ser apoiados por políticas governamentais ativas que
visem estreitar a cooperação dos fornecedores com o sistema nacional de ciência e
tecnologia.
É verdade que atividade inovadora dos fornecedores do petróleo superior à média da
indústria brasileira48. Também é verdade que se observa maior intensidade da cooperação
com o sistema nacional de inovação, comparativamente à média da indústria49. Contudo, o
gasto em P&D representa apenas 0,65% faturamento dos fornecedores e, quando
controlado por tamanho, a intensidade do gasto em P&D dos fornecedores só é maior do
que a da indústria em geral nas empresas com menos de 100 empregados. É importante
notar que os dados da PINTEC indicam que o gasto em P&D dos fornecedores apresenta
melhor retorno que o obtido pelos investimentos em P&D das demais empresas. Esse
dado sugere que os investimentos em P&D, associados ao processo de aprendizado
viabilizado pela cooperação com a Petrobras, produz bons resultados para a IPP.
A evidência internacional parece confirmar essa percepção. Acha e Cusmano (2001)
identificaram que a interação entre operadoras e fornecedores é a força motora do
48 Um terço das inovações de produto, e pouco menos de 15%, das inovações de processo introduzidas pelos fornecedores representam novidade para o mercado brasileiro ou mundial, contra, respectivamente, 8% e 3% para a indústria brasileira em geral. 49 Pouco mais de 25% da IPP mantém laços de cooperação enquanto na indústria em geral esse indicador atinge apenas 4%.
84
processo de inovação setorial. É importante destacar, contudo, que esse estudo indica que
os gastos na capacidade de inovação dos fornecedores, especialmente das firmas de
engenharia e de montagem atuam como epicentro inovador do setor. Na ausência de
significativos investimentos em P&D, desses agentes a IPP brasileira tende a perder
paulatinamente sua capacidade competitiva. Essa é a maior fragilidade da IPP brasileira.
O processo inovativo da IPP brasileira encontra-se fortemente condicionado pelas
estratégias da Petrobras, seja em termos da identificação de oportunidades, seja na
montagem de arranjos institucionais capazes de explorá-las, seja ainda no tocante à
mobilização dos recursos (humanos, materiais, informacionais, gerenciais e financeiros)
necessários á exploração das mesmas. A empresa desempenha papel central na
coordenação e organização do nesse processo, por meio do gerenciamento de um sistema
Programas Tecnológicos, Redes Temáticas e Núcleos Regionais com forte impacto sobre a
infra-estrutura de C&T. O sistema de gestão tecnológica da empresa foi ampliado e
sofisticado nos últimos anos, com a estruturação de Comitês Tecnológicos Estratégicos
(CTEs) e de Comitês Tecnológicos Operacionais (CTOs). O papel das novas operadoras no
processo inovativo é ainda marginal, fruto da recente de desregulamentação do setor.
Porém, esse papel deverá ser crescente com a expansão da produção dessas empresas. A
incorporação das novas operadoras no sistema de inovação da IPP é um desafio a ser
enfrentado.
A mudança no modo de gestão dos projetos na indústria do petróleo abriu espaço para a
atuação das empresas de engenharia e montagem como EPCistas. No entanto, o papel
dessas empresas na coordenação dos fornecedores domésticos da IPGN ainda é incipiente.
Essas empresas são infantes nas atividades petrolíferas, sendo fundamentalmente
dependentes dos projetos básicos fornecidos pela Petrobras. A capacidade de elas
estruturarem e administrarem uma rede inovadora de fornecedores é baixa. Nesse
contexto, a coordenação de redes de suprimento e inovação pelos EPCistas acabou
resultando em uma de “externalização truncada”, sendo essa tarefa de coordenação
assumida, em diferentes graus, pela própria Petrobras. Esse problema é agravado pela
capacitação também limitada de alguns segmentos do parque fornecedor.
O desenvolvimento de fornecedores de bens e serviços próximos traz grandes vantagens
para as empresas EPCistas, na medida em que possibilita a formação de uma rede de
empresas inovadoras que definirão, em última instância, a competitividade internacional
dessas empresas. Para que a interação com estes agentes seja possível, no entanto, as
empresas EPCistas devem destinar recursos para o desenvolvimento tecnológico,
particularmente através da instalação de laboratórios de P&D e da formulação de projetos
que envolvam fornecedores. Uma questão fundamental refere-se à estruturação de redes
85
inovativas integrando empresas EPCistas e fornecedores especializados dotados de
competências complementares.
No tocante aos mecanismos de fomento, verifica-se um papel ainda restrito do CT-Petro
na orientação do esforço tecnológico na IPGN e na indução das articulações de empresas
do setor com a infra-estrutura de C&T. O CT-Petro representa um importante mecanismo
de fomento voltado para a ampliação das atividades de C&T no setor de petróleo e gás,
particularmente pelo foco no envolvimento de empresas e instituições de pesquisa em
projetos cooperativos. Entretanto, verifica-se que o CT-Petro ainda apresenta limitações
que se refletem tanto no crescente descolamento entre o volume de recursos previstos
pelo mecanismo institucional e a sua execução efetiva em termos do volume de recursos
liberados para contratação de projetos, como também em relação ao envolvimento do
setor produtivo na definição das prioridades de pesquisa para o setor e na execução de
projetos. No tocante ao volume de recursos destinados ao fundo, ainda que a arrecadação
gerada tenha mais do que triplicado entre 2000 e 2006, os valores empenhados têm
representado um percentual sistematicamente menor da arrecadação. Com relação à sua
capacidade de articular os fluxos de conhecimento para inovação na IPGN, verifica-se a
que a participação de empresas em projetos cooperativos ainda é bastante restrita, tendo
em vista o universo de empresas na cadeia de petróleo e gás e a própria importância
econômica deste setor no país.
A limitada capacidade de alavancagem dos recursos do CTPetro no sentido de gerar o
funding necessário para induzir esforços de capacitação na IPGN sugere que ser
interessante buscar-se formas alternativas e complementares de financiamento daqueles
esforços. A mobilização desses instrumentos alternativos poderia envolver tanto uma
melhor formatação de “soluções financeiras” (venture-capital, por exemplo) adequadas às
necessidades da IPGN, como uma maior coordenação entre as agências de financiamento
(Finep, Banco do Brasil, BNDES) responsáveis pela análise e aprovação das solicitações de
financiamento dos diversos tipos de agentes. Por outro lado, seria interessante que a
Petrobras assumisse uma postura menos conservadora no tocante ao financiamento dos
esforços de capacitação do conjunto de agentes integrados à IPGN.
A capacidade de interação de competências e de coordenação de esforços inovativos a
partir das Redes Regionais de capacitação de fornecedores ainda é muito restrita. Tais
redes operam principalmente como canal de acesso de fornecedores às compras da
Petrobras. No caso brasileiro, o esforço de regionalização do sistema de inovação no
âmbito da IPGN assume particular importância em função do caráter continental do país e
das particularidades das bacias e frentes de exploração e produção. No caso da Petrobrás,
que possui uma atuação descentralizada em todo o território nacional, a questão relativa à
86
territorialização dos esforços de capacitação de fornecedores tem sido contemplada
através dos Núcleos Regionais de capacitação. Entretanto, apesar da importância dos
esforços já realizados, percebe-se que as redes regionais operam mais como um canal de
acesso de fornecedores ao poder de compra da Petrobras do que como sistemas locais de
inovação.
Neste aspecto, é importante análise detalhada da configuração e dinâmica inovativa dos
diversos sistemas locais de inovação que operam a partir das Redes Regionais de
capacitação de fornecedores. Ao contrário de outras experiências de rápida expansão da
IPGN em espaços relativamente concentrados, a configuração territorial dessa indústria no
Brasil é complexa. A Petrobras, através de suas diversas unidades operacionais, pode
desempenhar um papel crucial na estruturação e fortalecimento de sistemas locais de
inovação, os quais, por sua vez, podem contribuir para a redução das desigualdades
regionais do país. Para que isso ocorra, torna-se também necessária uma mudança de
postura da Petrobras em relação ao papel que as pequenas empresas podem desempenhar
no fortalecimento de sistemas locais de inovação..
Um último aspecto positivo refere-se ao impacto potencial de novas descobertas realizadas
na Bacia de Santos, que apontam para uma grande expansão das reservas e da
capacidade de produção de petróleo no Brasil. Em função dessas descobertas, é possível
que o país venha a se converter numa importante fronteira de expansão da IPGN ao nível
internacional. Isto implica em novos desafios no sentido de acelerar o processo de
capacitação dos agentes que se articulam interior do sistema de inovação da indústria, em
particular a Petrobras, EPCistas, empresas fornecedoras e agentes do sistema de C&T.
Face à dimensão dos investimentos previstos, se esta capacitação não for acelerada no
timing adequado, é provável que a boa parcela desses investimentos venha ser
direcionada para o exterior na forma da contratação de serviços, insumos e equipamentos,
inclusive em razão da possibilidade de uma atuação mais agressiva de outras operadoras e
de empresas para-petrolíferas estimuladas pelo mercado em expansão. Nesse contexto,
uma maior coordenação das ações e integração de competências entre os diversos
agentes inseridos no sistema de inovação da IPGN mostra-se fundamental.
4.5 Inserção Internacional da IPP Brasileira
A inserção internacional dos fornecedores de bens e serviços para a IPGN depende de
diversos fatores. Nosso estudo permitiu classificar os segmentos industriais estudados em
três grandes grupos, segundo o potencial para exportação. Os segmentos com elevado
87
potencial50 apresentam estrutura concentrada e são controlados por empresas com escala
de operação global, todas multinacionais. A exceção é o segmento de motores e geradores
elétricos, que conta com uma global player de origem nacional. Em termos tecnológicos,
as empresas desse segmento apresentam elevado nível de atualização e mostram-se
competitivas em termos de qualidade, preço e prazo de entrega.
A dimensão e a perspectiva de crescimento do mercado brasileiro induzem o
credenciamento das filiais brasileiras de multinacionais como produtoras de classe
mundial, com base em processos de transferência de tecnologia das matrizes. As firmas
brasileiras, por sua vez, procuram manter um fluxo intenso de conhecimentos com
fornecedores de tecnologias produtivas desenvolvidas no exterior. Em geral, a necessidade
de customização de produtos aos requisitos da operadora exige que pelo menos parte do
processo de capacitação tecnológica tenha que ser desenvolvida no país, por meio da
realização de esforços constantes de engenharia de produto e de processo, em parceria
com a Petrobras. A forma mais comum de cooperação nesse sentido ocorre mediante a
celebração de Termos de Cooperação.
Diversas firmas desse segmento projetam expansão relevante da capacidade de produção
entre 2010 e 2015, como estratégia voltada para a diversificação das atividades de
fornecimento para setores não associados diretamente à IPGN. Com relação ao conteúdo
local da produção, constata-se que existe uma grande variação entre os segmentos. Essa
proporção varia entre 25% e 95% do custo de produção dos equipamentos. A importação
de insumos depende da existência de escala para a produção doméstica de forma
eficiente, sendo importante notar que os produtores locais de determinados insumos
praticam preços pelo menos 20% superiores aos encontrados no mercado internacional, o
que favorece a importação.
No caso dos segmentos com médio potencial51, observa-se que a IPP é responsável por
cerca de 80% da demanda doméstica de compressores. No caso dos compressores
empregados no refino, as empresas domésticas mostram-se competitivas e existe apenas
um pequeno número de empresas internacionais capazes de concorrer com elas. Já no
caso dos compressores utilizados no offshore, existe um número maior de empresas
capazes de concorrer com as empresas domésticas que enfrentam dificuldades
competitivas no mercado internacional. Os motores estacionários a diesel, que são usados
como motobombas e como grupos geradores na IPGN não se enquadram na linha de
50 Nesse grupo estão inseridos os fabricantes dos seguintes equipamentos: motores e geradores elétricos,
turbinas a vapor de baixa potência, produtos siderúrgicos e tubos de aço, subsea (árvore de natal molhada, umbilicais e linhas submarinas flexíveis), hastes, unidades de bombeio, transformadores e bombas.
51 Nesse grupo estão inseridos os fabricantes de compressores (à exceção de “bare compressors”), de motores a gás ou a diesel e os prestadores de serviços de Engenharia de detalhamento de projetos.
88
produtores dos fornecedores nacionais, voltados em especial para a indústria
automobilística e de tratores. Existe, portanto, um hiato entre a produção nacional de
motores e a demanda da IPGN, que resulta em um atendimento apenas parcial de sua
demanda. Nesses segmentos, as firmas se valem fundamentalmente da transferência de
conhecimento da matriz para adquirir capacitação tecnológica, mas os fabricantes de
mantêm Termos de Cooperação com a Petrobras para a adequação e o desenvolvimento
de novos produtos, no caso de compressores, sobretudo na área de downstream. No caso
dos serviços de detalhamento de engenharia, as empresas acreditam que se encontram
capacitadas para atender a demanda da Petrobras, na medida em que as especificidades
de funcionamento da operadora são seu principal diferencial em relação às empresas
estrangeiras. Porém, elas não conseguem acompanhar a Petrobras em outros países,
devido ao desconhecimento do mercado local,
Entre os segmentos com Baixo Potencial52 destaca-se a caldeiraria pesada, que tem na
IPGN o seu principal mercado. A estagnação da demanda durante a década de 1980
prejudicou substancialmente o setor. Houve saída de empresas, transferência de
propriedade e desmobilização da capacidade tecnológica. No presente, as empresas
apresentam uma trajetória de baixa intensidade tecnológica, tendo a maioria se
especializado na fabricação de equipamentos e não desenvolve engenharia de projeto.
No segmento de flanges e conexões, o mercado brasileiro apresenta estrutura
fragmentada, na qual predominam empresas de pequeno e médio porte. Muitas operam
com ociosidade, devido a intensa concorrência de fabricantes de outros países,
especialmente chineses. Em termos tecnológicos, o segmento encontra-se em posição
intermediária, o que levou à especialização na fabricação de produtos menos sofisticados.
No segmento de válvulas e city gates, os fornecedoras da IPGN concentram sua atuação
na produção seriada de alguns itens. Apesar de as empresas situadas no País terem
envidado esforços para diversificar suas linhas de produto, problemas de fornecimento
nacional para uma série de válvulas permanecem, especialmente no segmento subsea.
Também não existem fabricantes nacionais de válvulas de alta e média pressão de
fechamento para o segmento de refino e de gás natural.
No segmento de guindastes navais e offshore constata-se que, apesar de o parque
brasileiro de guindastes operar a plena capacidade, a relação cambial favorável às
importações tem feito com que boa parte do impulso dinâmico associado ao crescimento
do setor seja convertido em aumento de importações. Assim, a atividade de ore ainda não
52Nesse grupo estão inseridos os segmentos de caldeiraria pesada, flanges e conexões, válvulas e city gates,
guindastes navais e offshore, navipeças, instrumentação e controle de processo, turbinas a gás ou a vapor de alta potência e motores a gás ou a diesel de grande porte. No segmento de serviços estão contemplados os de construção e montagem e os de Engenharia associados ao desenvolvimento de projeto básico.
89
logrou se estruturar plenamente no Brasil, sendo a demanda interna suprida em grande
medida por importações. No segmento de navipeças, cujo crescimento nos últimos anos
tem estado fortemente atrelado à demanda de navios de apoio para operações offshore,
permanece uma forte dependência de importações em relação a sistemas que encerram
sofisticação tecnológica (propulsão, governo, automação, navegação e comunicação).
Esse fato, que representa uma barreira de difícil transposição, aliado à prática comum de
aquisição de pacotes fechados com alto conteúdo importado na indústria nacional de
construção naval, reduz o efeito spill-over na produção doméstica de navipeças.
No segmento de instrumentação e controle de processo (ICP) predominam multinacionais
que se organizam em uma rede mundial de atividades integradas de P&D, produção e
logística, que lhes permite atender com eficiência dezenas de países. Esse arranjo
produtivo faz com que a produção de equipamentos de ICP no Brasil pelas filiais seja
limitada, alcançando no máximo 40%. Em geral, somente peças de baixo valor agregado
são fabricadas localmente. Os planos de expansão dessas empresas são tímidos, apesar de
operarem à plena capacidade. Algumas, inclusive, concentram a sua atuação nas áreas de
venda, engenharia de adaptação e serviços de implantação no País. Essas empresas
investem em P&D no Brasil, uma vez que, no segmento de eletrônica, o mercado brasileiro
ainda não oferece escala mínima. Nos segmentos de turbinas a gás ou a vapor de alta
potência e no de motores a gás ou a diesel de grande porte, o mercado brasileiro também
ainda não apresenta escala suficiente para comportar unidades operando em bases
competitivas.
Em relação aos serviços de construção e montagem, se observa que desde o lançamento
do Prominp esse segmento ganhou novo impulso no País, graças à decisão de privilegiar a
realização de investimentos dessa natureza no Brasil em detrimento do exterior. Tal
medida possibilitou o retorno ao País da indústria de construção e montagem, em voltada
para navios e plataformas, e mais recentemente, para refinarias. Todavia, o que se
observa é que, no caso da construção de navios, a produtividade internacional ainda se
mantém bem superior à brasileira. O segmento apresenta problemas sérios de
obsolescência das instalações fabris, o que resulta em custos e prazos de entrega na
construção de navios consideravelmente superiores aos vigentes no mercado externo. As
construções voltadas para o abastecimento e o offshore tampouco apresentam estimativas
de produtividade adequadas em razão de uma série de fatores, que abrangem desde
problemas de equipamentos à escassez de mão-de-obra qualificada, passando por uma
organização institucional ineficiente. Cabe destacar, ainda, que as grandes empresas
EPCistas internacionais a estão assumido a coordenação de redes de fornecedores,
preenchendo espaços antes ocupados pela Petrobras. No entanto, essas empresas não
90
estruturaram até o momento arranjos produtivos que lhes permitam ocupar papel
relevante no processo de inovação da IPGN. Por fim, no que se refere aos serviços de
engenharia associados a projeto básico, que têm na IPGN o seu principal demandante no
país, nenhuma firma brasileira se considera adequadamente capacitada para enfrentar os
desafios apresentados por essa indústria.
Nosso estudo sugere que a IPP brasileira ainda não se encontra adequadamente
estruturada para competir no mercado global, embora avanços significativos tenham sido
observados ao longo dos últimos anos. Por um lado, existem segmentos em que as
empresas apresentam elevado nível de atualização tecnológica e mostram-se competitivas
em termos de qualidade, preço e prazo de entrega. Por outro, encontramos segmentos
nos quais as empresas apresentam trajetória de baixa intensidade tecnológica, contam
amiúde com departamentos de engenharia reduzidos e uma estrutura muito fragmentada,
na qual predominam empresas de pequeno e médio porte, que se mostram incapazes de
enfrentar a concorrência intensa de fabricantes de outros países.
Adicionalmente, apesar de empresas de diversos segmentos terem envidado esforços para
caminhar na curva de produtos, constata-se que persiste o desafio de incorporar produtos
mais sofisticados à linha de produção nacional. Nos casos em que não existe impedimento
tecnológico por parte dos fabricantes, esse objetivo tende a ser obstaculizado pela falta de
uma demanda segura que justifique o investimento. Esse cenário indica que a
configuração produtiva da IPP doméstica encontra-se apenas parcialmente adequada para
possibilitar uma maior inserção internacional. Essa afirmação é corroborada pelo fato de
diversos setores apresentarem déficits comerciais persistentes e, em determinados casos,
crescentes nos últimos anos.
É preciso adensar a cadeia nacional de fornecedores, elevar o grau de modernização
tecnológica das empresas e avançar na produção doméstica, em bases eficientes, de
equipamentos mais sofisticados. Para tanto, o volume e os requerimentos de compra da
Petrobras são instrumentais, visto que essa empresa constitui o único agente doméstico
com suficiente leverage para pressionar nessa direção.
Petrobras como Instrumento de Inserção Internacional da IPP
A mudança na escala da IPGN, se associada a uma maior previsibilidade de sua demanda
de bens e serviços, cria condições muito favoráveis para o adensamento da IPP doméstica,
abrindo ampla janela de oportunidades para a inserção internacional de fornecedores
domésticos. O Plano Estratégico da Petrobras prevê dispêndios de US$ 112,4 bilhões, dos
quais US$ 97,4 bilhões (86,7%) no Brasil e US$ 15,0 bilhões (13,3%) no exterior (Quadro
4). O objetivo da Petrobras é que a participação do conteúdo nacional alcance 64,8%, o
91
que corresponde a encomendas de bens e serviços no montante de US$ 63,1 bilhões. Esse
volume é equivalente a uma média anual de US$ 12,6 bilhões e representa um incremento
de quase 30% em relação ao contemplado no Plano Estratégico anterior.
Quadro 4
Petrobras: Distribuição por Mercado dos Investimentos
Previstos no Plano Estratégico de Negócio 2008-2012
Etapa
Mercado Colocação no Brasil Conteúdo
Nacional (%) Brasil
(US$ bi) Exterior (US$
bi) US$ bi %
Exploração e Produção 54,6 10,5 29,5 46,8 54,0
Abastecimento 31,4 4,0 24,3 38,5 77,4
Gás e Energia 6,6 0,1 5,0 7,9 75,8
Distribuição 2,5 0,1 2,4 3,8 96,0
Corporativo 2,3 0,3 1,9 3,0 82,6
Total 97,4 15,0 63,1 100,0 64,8
Fonte: Petrobras, 2008.
Com as descobertas do pré-sal, a Petrobras estima que a demanda de equipamentos
deverá dobrar em relação às previsões constantes do atual Plano. Para fazer frente a esse
desafio, a empresa delineou as linhas mestras de um plano de incentivo à IPP. A idéia
central consiste em concentrar os investimentos e antecipar a contratação de grandes
pacotes de equipamentos. Com isso, a Petrobras espera criar escala suficiente tanto para
atrair novos fornecedores estrangeiros para o mercado doméstico, como também viabilizar
planos de expansão da indústria nacional. O objetivo é criar capacidade no mercado
doméstico e manter no Brasil o maior volume possível de encomendas para criar uma IPP
forte e competitiva em escala global. Há uma expectativa no mercado de que ocorrerá
uma mudança no modelo de contratação de bens e serviços da Petrobras. Em vez de
licitações divididas por projetos específicos, se aposta em encomendas de grandes pacotes
de equipamentos. Essa forma de atuação possibilitaria à Petrobras juntar vários projetos
em uma mesma licitação, garantindo escala que justifique investimentos na ampliação da
capacidade instalada dos seus fornecedores. Um primeiro movimento nesse sentido,
inclusive, já foi dado. Em setembro, a Petrobrás anunciou a encomenda de oito conveses
para as plataformas do pré-sal junto ao Estaleiro Rio Grande, localizado no Rio Grande do
Sul. Com essa demanda, a Petrobras pretende transformá-lo em um grande produtor em
série de embarcações.
Diante do potencial representado pelo pré-sal, o BNDES também decidiu elaborar uma
radiografia da cadeia produtiva do petróleo, a fim de subsidiar a política industrial para
esse segmento, com o intuito de criar as condições para garantir o fornecimento de
equipamentos e matérias-primas necessários à exploração dessa nova fronteira geológica.
Com a inclusão dos dados referentes ao pré-sal, a expectativa é de que ocorrerão
mudanças nas atuais regras de financiamento do setor. Além de conteúdo nacional,
92
deverão ser criadas medidas de desoneração tributária e linhas de financiamento em
condições compatíveis com as oferecidas no mercado internacional. O governo estuda
instituir a obrigatoriedade de compra de navios e plataformas no país e de uso de
equipamentos mais sofisticados para perfuração em profundidade, além das sondas que
encerram um valor unitário extremamente elevado (entre US$ 700 milhões e US$ 1
bilhão), fabricados com um mínimo de componentes brasileiros.53 Contempla-se, ainda,
incluir a sonda no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infra-
estrutura (Reidi), que isenta de PIS e Cofins os investimentos em bens de capital nas
áreas de energia e transportes. Essas medidas, associadas à sustentabilidade da demanda
deverão permitir maior adensamento da cadeia nacional de fornecedores, especialmente
no que se refere à produção de equipamentos mais sofisticados
Estudos realizados no âmbito do Prominp indicam que diversas empresas fornecedoras da
IPGN já estão exportando, para acomodar as oscilações da demanda doméstica. No setor
de bombas, por exemplo, as duas principais empresas mantêm unidades fabris
atualizadas, pois há interesse das respectivas matrizes de caracterizar suas filiais
brasileiras como produtoras de classe mundial, dado que o mercado doméstico representa
uma peça importante na sua estratégia global. No segmento de unidades de bombeio, o
baixo dinamismo do mercado local foi citado pela empresa líder como a razão pela qual ela
tem aumentado suas exportações de forma substancial, principalmente para a Argentina e
a Colômbia. Nesse caso, o desempenho exportador está estreitamente ligado à demanda
dos empreendimentos da Petrobras no exterior. Por sua vez, os principais fabricantes de
tubos de aço sem costura privilegiam o mercado interno e que as exportações são
utilizadas basicamente para reduzir o grau de ociosidade de suas plantas.
Assim, na medida em que diminuam os picos e vales de demanda no país, é possível que
aquelas empresas que utilizam as exportações basicamente para escoar o excesso de
produção deixem de fazê-lo, em um primeiro momento. Porém, com o passar do tempo, a
ampliação da capacidade doméstica de produção de equipamentos em bases competitivas
internacionalmente, poderá favorecer as exportações.
Uma questão crucial para a maior inserção internacional da IPP é a estratégia das
matrizes, uma vez que diversos segmentos da IPP são controlados por empresas
multinacionais. As estratégias definidas pelas matrizes podem configurar um importante
elemento limitador das exportações, na medida em que a lógica de atuação dessas
empresas tende a subordinar-se às determinações de suas respectivas matrizes. É possível
53 A preferência a fabricantes nacionais, todavia, só será possível se, a partir de 2012, a indústria brasileira estiver devidamente preparada. Por enquanto, a Petrobras encomendou 12 sondas para serem montadas em Cingapura e na China.
93
que as filiais brasileiras ainda que competitivas e atualizadas em termos tecnológicos não
possam acompanhar o movimento de internacionalização da Petrobras, em virtude tão
somente da delimitação pela matriz dos mercados destinados a suas subsidiárias.
Depoimentos colhidos junto a diversas empresas que participaram sugerem essa
possibilidade.
No segmento de compressores, a América Latina foi apontada como o mercado alvo das
filiais aqui localizadas por duas razões. Em primeiro lugar, porque as matrizes delimitam a
área de atuação de suas filiais segundo um critério de proximidade. Em segundo lugar,
devido às especificidades associadas à demanda da região. Nesse caso, atender a partir do
Brasil a demanda de subsidiárias da Petrobras na América Latina apresenta-se como a
melhor estratégia empresarial. Já a empresa líder do setor de linhas flexíveis considera
que uma ação mais abrangente de exportação seria inviabilizada pela estratégia
corporativa de sua matriz, que pratica uma segmentação de mercado. A tendência é que
necessidades da Petrobras na África, por exemplo, sejam atendidas por outra subsidiária
da companhia.
Nesse contexto, o mais provável é que, em se tratando de filiais de multinacionais,
o poder de alavancagem de fornecedores instalados no Brasil pela Petrobras fique limitado
à América Latina. A demanda por equipamentos e serviços gerada por investimentos na
Costa Ocidental africana, em muitos casos, deverá ser atendida pela própria matriz. Por
fim, cabe ressaltar que a própria Petrobras pratica uma política de descentralização tanto
das compras como das contratações de suas subsidiárias no exterior. Estas empresas têm
autonomia de decisão e, em geral, tendem a privilegiar os respectivos mercados, seja para
se adequar às legislações específicas de cada país, seja por força dos contratos celebrados
com seus sócios locais ou, ainda, por contar ou querer fomentar uma base local de
fornecedores competitivos, à semelhança do que a própria matriz busca no Brasil. Nesse
sentido, o fato de a Petrobras contar com diversas subsidiárias no exterior não cria, a
priori, um canal privilegiado para a inserção de fornecedores locais em países onde ela
está presente. Esse efeito de arrasto, se ocorrer, deverá ser função principalmente das
especificidades da demanda da Petrobras, o que poderá favorecer determinados
fornecedores que já a atendem de forma competitiva no mercado doméstico.
No mercado latino-americano, a Petrobras vem trabalhando para ampliar as compras de
suas subsidiárias a partir do Brasil. Tanto é assim que, entre 2004 e 2007, o total de
produtos e serviços adquiridos no Brasil multiplicou-se por quase 14 vezes (Quadro 5).
Trata-se, no entanto, de um volume pouco expressivo quando comparado ao total
comprado e é preciso notar que a IPP brasileira já ocupou praticamente toda a parcela que
as subsidiárias da Petrobras demandam do exterior. Com efeito, essa participação que foi
94
de 88,3% em 2005 saltou para 97,9% no ano seguinte54. Logo, o desafio em relação à
América Latina consiste, sobretudo, em utilizar o efeito demonstração para conquistar a
demanda de outras operadoras ativas na região.
Quadro 5
Evolução das Compras da Petrobras na América Latina a Partir do Brasil: 2004-2007
Ano
Total de Produtos
Comprados
(US$ milhão)
Produtos
Comprados no
Brasil
(US$ milhão)
Participação
(%)
2004 1.000 11 1,1
2005 1.509 93 6,2
2006 1.390 118 8,5
2007 2.053 162 7,9
Média 1.450 106 7,0
Fonte: Prominp, Programa Mercosul de Desenvolvimento de Fornecedores para o
Setor de P&G, março de 2008.
A África é o terceiro principal mercado de destino dos investimentos da Petrobras no exterior, atrás do norte-
americano situado no Golfo do México e do mercado da Argentina. A Nigéria concentra a
maior parte dos investimentos da Petrobras no continente, seguida por Angola. Ao longo
do período 2008-2012 deverão ser investidos US$ 1,4 bilhão na Nigéria e US$ 900 milhões
em Angola.
Na Nigéria, a Petrobras atua nos campos gigantes de Agbami e Akpo, em parceria com a
Total e a Chevron-Texaco. A expectativa da empresa é tornar a Nigéria uma das maiores
produtoras do Sistema Petrobras, fora do Brasil. As reservas desses campos estão
estimadas em 1,6 bilhões de barris de petróleo e o objetivo é produzir cerca de 400 mil
barris de óleo por dia, dos quais 65 mil caberão a Petrobras. A empresa detém
participação, como operadora, em outros dois blocos offshore, que estão em fase de
exploração. Em Angola, são desenvolvidas atividades em seis blocos offshore. No Bloco 2, a
Petrobras atua em parceria com a Chevron e a Sonangol com participação de 27,5%, que
lhe garante uma produção de petróleo de 2,8 mil barris/dia. Nos outros blocos, a Petrobras
atua como operadora, sendo sua participação, respectivamente, de 40%, 30% e 80%. A
empresa objetiva alcançar produção na faixa dos 100 mil barris de petróleo/dia. Desde
que iniciou suas atividades em Angola, a empresa já investiu cerca de US$ 560 milhões,
porém em torno de US$ 500 milhões foram gastos com o pagamento de bônus ao
governo.
Como a Costa Ocidental Africana, apresenta geologia semelhante à brasileira, existe a
expectativa de que serão realizadas descobertas importantes de hidrocarbonetos na
54 Prominp, Programa Mercosul de Desenvolvimento de Fornecedores para o Setor de P&G, março de 2008
95
camada pré-sal dessa região. As inovações desenvolvidas para o mercado brasileiro
poderão ser lá replicadas, sugerindo vantagens competitivas para a IPP brasileira nesse
mercado. Com isso, algumas matrizes de empresas multinacionais podem ser levadas a
rever suas estratégias, no sentido de privilegiar as filiais brasileiras no atendimento desse
mercado.
Política Industrial e Inserção Internacional da IPP
Durante o primeiro governo Lula, a política industrial passou a ocupar papel de maior
relevância na agenda econômica. Em 2002, a idéia de câmaras setoriais foi retomada,
com a denominação Fóruns de Competitividade – Diálogo para o Desenvolvimento. Em
março de 2004 foi lançada a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior
(PITCE), com “o objetivo de ampliar a eficiência e a competitividade das empresas
nacionais e inseri-las internacionalmente, a fim de favorecer a criação de empregos e
propiciar a elevação da renda. Para tanto, ela contemplou um conjunto amplo de medidas
que visaram o estímulo ao investimento produtivo, a formação de poupança de longo
prazo, a superação de gargalos de infra-estrutura, a modernização e a capacitação do
parque industrial e o estímulo à inovação de produto, processo e gestão” (Presidência da
República do Brasil, 2004). Sua execução esteve a cargo da Agência Brasileira de
Desenvolvimento Industrial (ABDI), subordinada ao Conselho Nacional de
Desenvolvimento Industrial (CNDI). Este último é comandado pela Presidente da
República e integrado por ministros de Estado e por representantes da indústria e dos
sindicatos.
As diretrizes contidas na PITCE deixaram claro que se pretendia criar ambiente favorável
ao desenvolvimento industrial e facilitar a iniciativa empreendedora. Para tanto, buscou-
se equacionar o desenvolvimento de atividades-chave, de modo a gerar capacitações que
permitam ao Brasil aumentar sua competitividade no cenário internacional (Dieese, 2005,
p. 4). Suas linhas mestras foram focadas em: i) estruturar o Sistema Nacional de
Inovação; ii) promover a expansão sustentada das exportações com a incorporação de
novos produtos, empresas e negócios; iii) promover a modernização produtiva da
indústria, privilegiando arranjos produtivos locais, programas setoriais e programas
concentrados espacialmente; iv) ampliar a capacidade e a escala de produção de setores
produtores de bens de capital intermediários que se encontram próximos do limite de sua
capacidade instalada, a fim de que eles possam conciliar o atendimento tanto do mercado
interno como do externo; v) concentrar esforços no desenvolvimento de áreas intensivas
em conhecimento (Semicondutores; Software; Fármacos e Medicamentos; Bens de
Capital).
96
Em maio de 2008, o Governo Federal lançou a segunda fase da PITCE, denominada
Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP). Ela está estruturada em torno de quatro
macrometas e alicerçada em uma série de medidas de desoneração e financiamento
voltadas para 25 setores da economia, entre os quais está incluído o de petróleo e gás
natural55. A primeira meta consiste em elevar a participação do investimento fixo no
Produto Interno Bruto (PIB) para 21% em 2010, o que pressupõe um crescimento médio
anual de 11,3% da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), para um crescimento projetado
do PIB de 5% ao ano. Segundo o MDIC, o valor do investimento deverá alcançar R$ 620
bilhões em 2010.
A segunda meta busca estimular as atividades de inovação. Para isso, foi estabelecida a
meta de elevar para 0,65% do PIB o dispêndio privado em pesquisa e desenvolvimento
(P&D) em 2010, o equivalente a R$ 18,2 bilhões. Em 2006, os gastos com P&D
alcançaram R$ 11,9 bilhões, correspondentes a 0,51% do PIB. Portanto, o incremento
médio anual almejado nos investimentos privados em P&D é de 9,8%. Também segundo
o MDIC, a idéia consiste em captar os investimentos das empresas em atividades
sistemáticas, destinadas a ampliar o estoque de conhecimentos e seu uso em novas
aplicações.
A terceira meta está voltada para a ampliação da inserção internacional das empresas
brasileiras por duas vias: a das exportações e a dos investimentos diretos para instalação
de representações comerciais ou unidades produtivas no exterior. De acordo com o MDIC,
o objetivo para 2010 consiste em ampliar a participação do país nas exportações mundiais
para 1,25% em valor e alcançar a cifra de US$ 208,8 bilhões exportados. Para tanto, será
necessário um crescimento médio anual das vendas externas brasileiras de 9,1% ao ano
até 2010. A quarta meta prevê um conjunto de medidas para aumentar em 10%, até
2010, o número de micro e pequenas empresas (MPEs) brasileiras que exportam. Em
2006, 11,8 mil MPEs exportaram. Portanto, a meta do governo consiste em aumentar
esse número para 13,0 mil empresas.
Para viabilizar este conjunto de ações, estão previstos investimentos equivalentes a R$
251,9 bilhões até 2010. Desse total, R$ 210,4 bilhões serão provenientes do MDIC e
operacionalizados via BNDES; e R$ 41 bilhões terão origem no Plano de Ação Ciência,
Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Nacional, a cargo do Ministério da Ciência
55 Os 25 setores beneficiados pela PDP são: (1) indústria têxtil e confecções; (2) papel e celulose; (3) mineração e siderurgia; (4) carnes; (5) bens de capital seriados; (6) bens de capital sob encomenda; (7) complexo de serviços; (8) complexo automotivo; (9) indústria naval e cabotagem; (10) couro, calçados e artefatos; (11) indústria aeronáutica; (12) madeira e móveis; (13) higiene pessoal, perfumaria e cosméticos; (14) plásticos; (15) construção civil; (16) sistema agroindustrial; (17) tecnologias da informação e comunicação; (18) complexo de defesa; (19) nanotecnologia; (20) biotecnologia; (21) petróleo, gás natural e petroquímica; (22) biodiesel; (23) energia nuclear; (24) bioetanol e (25) complexo da saúde.
97
e Tecnologia.56 Adicionalmente, estão previstas medidas de facilitação do crédito e de
desoneração, a cargo do Ministério da Fazenda, que deverão fazer com que o governo
deixe de arrecadar cerca de R$ 21,4 bilhões até 2011.
As medidas contemplaram ampliação do crédito, facilitação do crédito, desoneração fiscal
e estímulos às exportações. Entre elas, destacam-se: i) a criação de nova linha de crédito
com juros especiais de 4,5% ao ano para empresas que invistam em P&D; ii) a criação da
linha Capital Inovador, com recursos de R$ 6 bilhões, voltada para empresas que invistam
em capacitação, engenharia e ativos intangíveis; iii) a criação de fundo soberano para
financiar atividades de empresas brasileiras no exterior; iv) a redução do spread de 1,4%
para 1,1%, ao ano, no conjunto das linhas de financiamento do BNDES e de 1,5% para
0,9%, ao ano, do spread para as linhas de compra e venda de bens de capital (máquinas e
equipamentos); v) a duplicação para dez anos do prazo das linhas do Financiamento de
Máquinas e Equipamentos (Finame) para a indústria; vi) a ampliação da lista dos bens de
capital que não terão de pagar Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e PIS/Cofins;
vii) a prorrogação, até 2010, da lei que permite a depreciação acelerada de máquinas e
equipamentos usados para aumentar a capacidade de produção, o que deverá reduzir a
incidência da CSLL; viii) a ampliação do Programa de Financiamento às Exportações
(Proex) de R$ 500 milhões para R$ 1,3 bilhão.
Especificamente para a IPGN, a Política de Desenvolvimento Produtivo estabelece dois
objetivos principais: (i) garantir a auto-suficiência em petróleo e (ii) revitalizar e ampliar a
participação da indústria nacional, em bases competitivas e sustentáveis, na implantação
de projetos de óleo e gás no Brasil e no exterior. Ela adotou como metas aumentar a
produção de óleo para 2,4 milhões barris/dia e a de gás natural para 637 mil barris/dia
equivalentes, em 2012, e manter o conteúdo local nos projetos em 75% em 2010.
Para atingir essas metas pressupõe a superação de quatro desafios: (i) fomentar a
liderança tecnológica, (ii) aumentar a capacidade produtiva, (iii) adensar a cadeia
produtiva e promover a capacitação industrial, e (iv) aprimorar a qualificação técnica e
profissional. Para cada um foi definido um conjunto de instrumentos, apresentados no
Quadro 6.
A Petrobras tem papel determinante em quatro dos 25 setores alvo da política industrial:
biodiesel, bietanol, indústria naval e cabotagem, além obviamente do complexo de
petróleo, gás natural e petroquímico. A empresa será responsável pelo mais expressivo
volume de compras de bens e serviços no mercado interno durante os próximos anos. O
56 Como os financiamentos do BNDES para o setor de infra-estrutura, não contemplado na Política Industrial, estão
previstos em R$ 110 bilhões até 2010, se depreende que os desembolsos totais do BNDES deverão alcançar cerca de R$ 320 bilhões até 2010.
98
presidente Lula deixou claro, em diversas ocasiões, que não vê a Petrobras apenas como
uma grande produtora de petróleo, mas também como um motor para o desenvolvimento
do país. Para ele, não basta à operadora estar entre as maiores companhias de capital
aberto do mundo, ela deve também atuar como alavancadora do desenvolvimento
nacional e geradora de oportunidade para outros setores da sociedade.
Quadro 6
Desafios e Instrumentos da Política de Desenvolvimento Produtivo para o Setor de P&G Desafios Instrumentos
Aumentar a capacidade produtiva
BNDES: Finem, Finame e BNDES-
Exim MF: Repetro
INPI: licenciamento e transferência de
tecnologia
Petrobras: plano de negócios 2008-
2012
ANP: regulação setorial
Adensar a cadeia
produtiva e capacitação industrial
MME Prominp: FIDCs
Petrobras SEBRAE:
inserção de MPEs na cadeia
INMETRO IBP: certificação
SEBRAE: capacitação de fornecedores
ANP: regulação setorial
Petrobras: plano de negócios 08-12
BNDES: Finem Finame
MME Prominp cartilha de
conteúdo local
MME Prominp: fóruns regionais
Petrobras: Programa de Garantia de
Qualidade de Materiais e Serviços
Associados (PGQMSA)
Qualificação técnica e
profissional
MME/Prominp: Plano Nacional de
Qualificação Profissional
(PNQP)
Projeto Corporativo de qualificação em
SMS
Senai ABEMI: qualificação profissional
Senai CEFET: centros de exame
de qualificação
Petrobras: Plano de Negócios
2008-2012
CNPq / CAPES
Liderança tecnológica
Petrobras CENPES: pesquisa
BNDES FINEP CNPq/CAPES
MME Prominp: centros de excelência
Fonte: MDIC, “Política de Desenvolvimento Produtivo”, 2008.
O Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp)
constituiu o primeiro grande passo no sentido de possibilitar a ampliação da participação
da IPP, em bases competitivas e sustentáveis, nos projetos da IPGN. Em relação a outros
segmentos, a exemplo da construção naval, a atuação da Petrobras também tem sido
fundamental. Durante o lançamento da Política de Desenvolvimento Produtivo, a empresa
anunciou um programa de compras no mercado interno de 146 embarcações de apoio
para as operações offshore, das quais 24 encomendadas imediatamente. Segundo ele, um
dos objetivos desse programa consiste em facilitar a capacidade de estruturação do setor
naval brasileiro.
Instrumentos de Política Industrial e Inserção Internacional da IPP
A atual política industrial objetiva dotar o parque industrial doméstico de maior solidez,
removendo restrições ao seu crescimento em bases competitivas Ele propõe um conjunto
99
abrangente de ações que visa atrair investimentos domésticos e estrangeiros voltados
para a ampliação da base de exportações e para a substituição competitiva de
importações. No âmbito dos investimentos, o Programa de Desenvolvimento Produtivo
prevê não apenas um conjunto de desonerações, como também uma expressiva ampliação
do crédito pra os setores da indústria e serviços. Em 2007, por exemplo, os desembolsos
do BNDES para a indústria somaram R$ 25,6 bilhões e para o setor de serviços o
montante foi de R$ 7,8 bilhões, totalizando R$ 33,4 bilhões. A ser concretizado o objetivo
da atual política, o financiamento médio anual do Banco deverá alcançar R$ 70,1 bilhões,
ou seja, irá mais do que dobrar.
As medidas de apoio e de incentivo à inovação prevista pelo PDP também são arrojadas no
campo do financiamento e, em termos de incentivo fiscal, é oferecido o benefício da
depreciação acelerada. A nova linha do BNDES que contempla investimentos em ativos
intangíveis é uma novidade positiva, “pois amplia o conceito de inovação para além da
fronteira tecnológica, que, sem dúvida, é um dos principais promotores do processo de
inovação, senão o principal, mas não o único” (Almeida, 2008). No tocante à promoção
das exportações, também foram feitas ampliações e melhorias importantes nos
mecanismos de incentivo. Todavia, se deve ter em mente que a eficácia desses
instrumentos está diretamente relacionada com a taxa de câmbio, uma questão que foge a
alçada da política industrial, na medida em que a apreciação da taxa de câmbio produz um
impacto negativo sobre as exportações e vice-versa. Adicionalmente, a questão da
retenção do ICMS dos exportadores, que pelo lado fiscal é o que mais encarece a atividade
exportadora no momento, não pôde ser tratada no âmbito do Programa de
Desenvolvimento Produtivo, uma vez que esse assunto diz respeito apenas à esfera
estadual.
Apesar de ainda não ser possível avaliar o impacto na nova política sobre os
fornecedores de bens e equipamentos para a IPGN, ela deverá contribuir para o
adensamento dessa cadeia e para que as empresas possam avançar ainda mais na curva
de produtos. No tocante aos segmentos que já se mostram competitivos
internacionalmente em termos de prazo de entrega e qualidade, ela poderá favorecer as
exportações, por disponibilizar maiores volumes de crédito e prazos de financiamento,
desde que o câmbio se mostre favorável.
4.6 Recomendações
O Brasil reúne condições muito favoráveis para a estruturação de um novo pólo da IPP. Já
tendo superado a fase infante da indústria, a empresa líder no mercado doméstico tem
100
crescente inserção internacional. A descoberta de substanciais recursos petrolíferos no
pré-sal abre ampla janela de oportunidades para, com o apoio de uma política industrial
adequada, projetar a IPP brasileira no mercado internacional.
A década de 1990 foi particularmente desfavorável à IPP brasileira. A Petrobras
acompanhou a política de abertura da economia brasileira, o que induziu a contratação no
exterior de grande parte dos seus empreendimentos. Essa política começou a ser
progressivamente abandonada após a forte desvalorização do real no final da década
passada. Foram então adotadas políticas de promoção da produção doméstica, como a
exigência de índices de nacionalização nos projetos da indústria do petróleo.
A principal fragilidade das empresas brasileiras reside na menor capacidade tecnológica.
Em geral, elas são licenciadoras de tecnologias de empresas líderes internacionais, quando
não se trata de uma filial de empresa multinacional. As empresas domésticas ocupam os
segmentos de menor complexidade tecnológica, sendo a parte restante importada de
fornecedores internacionais. Em geral, a engenharia básica é deixada para as grandes
empresas internacionais. As políticas nacionais não foram capazes de ultrapassar o âmbito
da substituição de importações. No entanto, a experiência internacional demonstra que
mesmo quando há predomínio de filiais de empresas multinacionais, o país pode contar
com uma IPP competitiva. Esse é claramente o caso de Cingapura, onde a competitividade
está associada à existência de uma rede densa de fornecedores de bens e serviços
especializados, apoiada por instituições que promovem a inovação. No caso brasileiro,
embora existam filiais que apresentam condições favoráveis de competitividade, ainda é
limitado o uso do país como base para exportação.
Na década de 1980, a Petrobras buscou capacitar os fornecedores nacionais do ponto de
vista tecnológico. Essa política enfrentou sérias limitações devido à elevada propensão da
empresa de internalizar a maior parte das atividades tecnológicas da IPGN. Os
fornecedores nacionais ficaram quase sempre em uma postura passiva, dedicando-se a
receber e aplicar conceitos desenvolvidos na Petrobras. Dessa forma, a IPP doméstica
adquiriu capacitação tecnológica limitada, tornando-se pouco competitiva e dependente de
um mercado doméstico protegido. Quando houve abertura, muitos dos ativos tecnológicos
adquiridos a duras penas foram perdidos.
O desafio central da política industrial setorial consiste em superar o âmbito do modelo de
substituição de importações, que até o momento não se mostrou capaz de formar uma IPP
verdadeiramente competitiva, apoiada em vantagens competitivas dinâmicas. As políticas
promovidas no final da década de 1990, como as de conteúdo nacional retomam, em larga
medida, as políticas do passado. A principal tentativa de mudança consistiu na criação do
101
CTPetro, fundo destinado à promoção da inovação na IPGN. Porém, as regras que regem o
uso dos recursos tornaram-se um limitante para a concretização de uma efetiva política
científica e tecnológica setorial. Os casos internacionais estudados ilustram claramente
quais são os caminhos a serem trilhados para dotar os atores locais de capacidade de
inovação. Esses caminhos se situam na convergência de sólidas políticas industriais com
políticas complementares de capacitação tecnológica.
No caso brasileiro, ainda não existe uma clara convergência entre a política industrial e a
política tecnológica, porque ambas possuem focos mal definidos e não convergentes. A
política de compras da Petrobras está ainda demasiadamente pautada pelo paradigma da
substituição de importações e da ocupação do mercado interno a partir da fabricação local.
Essa política não prioriza especializações produtivas apoiadas em vantagens competitivas.
Ela não associa conteúdo local, com desenvolvimento tecnológico endógeno. As relações
entre a Petrobras e os fornecedores nacionais se limitam às exigências de satisfazer os
índices de nacionalização, mas não almejam o desenvolvimento de vantagens
competitivas. A ausência de uma vocação definida para a IPP brasileira representa o
principal obstáculo para a definição de uma política setorial que transcenda o modelo de
substituição e esteja voltada para a competitividade.
A parte tecnologicamente mais dinâmica da IPP doméstica é constituída,
predominantemente, por filiais de empresas multinacionais que se instalaram no país, no
contexto de uma estratégia de ocupação do mercado interno. É fundamental que se
estruture uma política industrial capaz de aproveitar a inserção dessas empresas em
circuitos internacionais para ter acesso a mercados externos. Na atualidade, grande parte
da indústria de construção naval e de grandes equipamentos subsea está em mãos de
grupos estrangeiros. Neste último segmento, as filiais brasileiras detêm vantagens
competitivas bem estabelecidas que poderiam ser melhor aproveitadas se existissem
políticas setoriais mais efetivas de promoção de exportações. Essas políticas teriam que
oferecer condições tributárias favoráveis para as empresas exportadoras.
Em outros segmentos podem surgir vocações sobre as quais se assente a competitividade
da indústria brasileira. O importante é que a política pública seja capaz de identificar as
potencialidades de mercado e dar condições para que as empresas prosperem destinando
parcela crescente da produção para o mercado externo. A política tecnológica deveria ser
constituída para dar maior fôlego às vantagens dinâmicas criadas pela indústria. Os casos
da Noruega e de Cingapura são ilustrativos de políticas tecnológicas complementares
voltadas ao adensamento tecnológico.
102
A constituição de um centro de pesquisa orientado para a IPP pode ser um importante
instrumento para que as firmas para-petrolíferas empreendam esforços mais consistentes
de desenvolvimento tecnológico. A constituição do IFP (Instituto Francês do Petróleo) foi o
primeiro passo no sentido da criação de empresas para-petrolíferas francesa. Em
Cingapura mais recentemente presencia-se à criação de um centro de pesquisa
diretamente voltado aos interesses da IPP, com a clara finalidade de aumentar a
densidade tecnológica do aglomerado industrial. Na política tecnológica, o caso Norueguês
é sem dúvida o mais eficaz. O fundo setorial constituído e administrado pelo NRC (National
Research Council) é distribuído em 1/3 para a pesquisa básica e 2/3 para programas
prioritários, onde o estabelecimento de metas é feito por comitês assessores constituído
por representantes de empresas de PG&N e para-petrolíferas, inclusive de filiais de
multinacionais.
Até o momento, a incerteza com relação à demanda futura da IPGN no Brasil, decorrente
das grandes flutuações nos seus níveis de encomendas dado a tendência de concentração
temporal das aquisições das operadoras, constituiu a principal barreira para a
concretização de planos de investimento das empresas da IPP. Esse quadro, todavia, vem
mudando desde que o programa de investimentos da IPGN brasileira, tanto no
downstream quanto no upstream, ganhou momento. Com o desenvolvimento do pré-sal, a
Petrobras estima que a necessidade de bens e serviços da IPP deverá mais do que dobrar
em relação às previsões constantes do atual Plano Estratégico, já bastante ambicioso. Esse
fato, associado à decisão já anunciada de que a empresa pretende concentrar o maior
volume possível de investimentos no mercado interno e antecipar a contratação de
grandes pacotes de equipamentos, deverá equacionar o problema de oscilação da
demanda local. Com isso, serão cridas condições de escala, tanto para atrair novos
fornecedores estrangeiros ao país, como também viabilizar os planos de expansão dos
fornecedores locais de bens e serviços, possibilitando a criação de uma IPP forte e
competitiva em escala global.
Quanto mais orientada para o mercado internacional for a configuração produtiva da IPP
doméstica, maiores serão os seus ganhos de competitividade. Nesse sentido, a existência
de uma política de incentivo às exportações, que assegure a existência de linhas de
financiamento com prazos, custos e condições gerais adequadas, constitui um fator
fundamental para manter a competitividade internacional da empresas nacionais e, por
conseguinte, alavancar exportações. O Governo deve atuar como observador atento do
processo competitivo global na IPGN, especialmente em termos dos instrumentos de
política de comércio exterior oferecidos por outros países. Cabe a ele “calibrar” a oferta
interna de instrumentos de promoção às exportações de modo a garantir a não permitir a
103
deterioração da competitividade exportadora da IPP doméstica. A Petrobras tem no seu
poder de compra instrumento poderoso para alavancar a oferta doméstica de bens e
serviços para a IPGN, com amplos benefícios para a competitividade de seus projetos. No
entanto, apenas o engajamento ativo do empresariado na tarefa de dotar suas plantas
produtivas de condições competitivas, em especial no plano das inovações tecnológicas,
garantirá à IPP doméstica papel relevante no mercado global da IPGN.