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i
RAQUEL VILLELA LEMES MARQUES
INFLUÊNCIA DA POSIÇÃO DO ARCO NO NÚMERO DE CICLOS ATÉ A
FRATURA POR FADIGA EM INSTRUMENTO ENDODÔNTICO DE NÍQUEL-TITÂNIO
2010
ii
RAQUEL VILLELA LEMES MARQUES
INFLUÊNCIA DA POSIÇÃO DO ARCO NO NÚMERO DE CICLOS ATÉ A FRATURA POR FADIGA EM INSTRUMENTO ENDODÔNTICO DE NÍQUEL-
TITÂNIO
Dissertação apresentada à Faculdade de Odontologia da Universidade Estácio de Sá, visando a obtenção do grau de Mestre em Odontologia (Endodontia).
ORIENTADORES Prof. Dr. Flávio Rodrigues Ferreira Alves
Prof. Dr. Hélio Pereira Lopes
UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ RIO DE JANEIRO
2010
iii
DEDICATÓRIA
Ao meu marido, André Aguiar Marques, por não ter me deixado
desistir, por ter me erguido a cada tombo, por mais que apoio, pela participação
em cada passo desta trajetória. Sem você não teria sido possível. Meu amor e
gratidão eternos por você existir.
À minha família, que foi sempre o meu pilar de sustentação, meu porto
seguro. Mais uma vez vocês estavam certos. Amo vocês demais.
iv
AGRADECIMENTOS
A Deus pela proteção incondicional, por não ter deixado me faltar
saúde, por ter aberto uma janela para cada porta fechada e finalmente por ter
usado como instrumentos de sua infinita bondade pessoas tão especiais as
quais cruzaram meu caminho nos últimos dois anos.
Ao Professor Hélio Pereira Lopes que não precisou aprender a
ensinar, traz esse dom tão especial em sua essência e prima pela ciência em
detrimento da vaidade humana. Ao senhor que me ensinou quase tudo que sei
da minha profissão e nunca deixou de confiar em mim, minha gratidão,
respeito, amizade e principalmente meu muito obrigada.
Aos Professores Wanderson Chiesa, Norbi Rodrigues Correia, Gilberto
Debelian e Kleber de Carvalho que tornaram possível a realização do
experimento deste trabalho e me deram uma lição de profissionalismo.
Ao Professor Flávio Alves que não temeu assumir uma missão já
iniciada, que demonstrou solicitude, competência e paciência em todos os
momentos.
À secretária Angélica Pedrosa por ter ido além de suas funções
administrativas para tornar-se uma amiga da qual não esquecerei.
Às colegas Alessandra Ferreira e Izabelle de Britto por gentilmente
compartilharem seus trabalhos comigo.
Aos meus colegas da turma do primeiro ano do mestrado. Todos
vocês, os de Clínica e os de Endodontia, os que prosseguiram comigo e os que
decidiram por mudar de caminho, vocês são as lembranças mais doces que
levo do curso. Nossas diferenças de experiência de vida, de idade e de metas
v
nunca nos impediram de nos divertir juntos, de aprender um com o outro e de
viver momentos tão especiais que levarei sempre no coração.
Por fim agradeço à Cris e à Mari pela amizade sólida que construímos.
Se nada mais tivesse valido, ainda assim eu seria grata por ter conhecido
vocês.
vi
Se não houver frutos
Valeu a beleza das flores
Se não houver flores
Valeu a sombra das folhas
Se não houver folhas
Valeu a intenção da semente
Maurício Francisco Ceolin
vii
ÍNDICE
Resumo ...............................................................................................................ix
Abstract ...............................................................................................................xi
Lista de Figuras ..................................................................................................xii
Lista de Tabelas .................................................................................................xiii
Lista de Abreviaturas .........................................................................................xiv
Introdução ..........................................................................................................01
Revisão de Literatura .........................................................................................04
Propriedades da liga Níquel-Titânio .....................................................04
Processo de fabricação e acabamento superficial dos instrumentos de
NiTi........................................................................................................07
Fratura dos instrumentos de NiTi..........................................................15
Influência das variáveis relacionadas aos mecanismos de
instrumentação na fratura em flexão rotativa........................................25
Influência das variáveis relacionadas à anatomia dos canais na fratura
em flexão rotativa..................................................................................26
Sistema BioRaCe..................................................................................40
Proposição....................................................................................... ...................43
Materiais e Métodos ...........................................................................................44
Seleção dos instrumentos.....................................................................44
Ensaio de flexão rotativa ......................................................................46
Resultados .........................................................................................................53
Dimensões dos instrumentos BR5C......................................................53
viii
Ensaio de flexão rotativa ......................................................................59
Análise estatística do ensaio de flexão rotativa ....................................60
Discussão ...........................................................................................................61
Considerações gerais............................................................................61
Instrumentos selecionados – BR5C......................................................63
Ensaio de flexão rotativa ......................................................................65
Conclusões.........................................................................................................79
Referências Bibliográficas ..................................................................................80
Anexos................................................................................................................92
ix
RESUMO
O presente estudo avaliou a influência da posição do arco no número
de ciclos necessários para ocorrer a fratura (NCF), através de ensaio de flexão
rotativa de instrumentos de níquel-titânio acionados a motor. Foram
selecionados 20 instrumentos BR5C do sistema BioRaCe. Dois modelos de
canal artificial curvo foram confeccionados em aço inoxidável, ambos com uma
canaleta em forma de U de 20 mm de comprimento, 2 mm de profundidade, 1,5
mm de largura, 10,46 mm de comprimento de arco e 10 mm de raio. A posição
da curva foi confeccionada no segmento médio do canal em um modelo (grupo
I - 10 instrumentos) e na extremidade apical em outro (grupo II – 10
instrumentos). Os instrumentos foram girados dentro das canaletas dos blocos
metálicos à velocidade de 300 rpm até ocorrer a fratura. O tempo foi registrado,
permitindo o cálculo do número de ciclos até a fratura e, o comprimento dos
fragmentos dos instrumentos fraturados foi mensurado através de paquímetro
digital. Os resultados analisados estatisticamente através do teste t-Student
revelaram diferença significativa no tempo necessário até a fratura dos
instrumentos nas duas posições do arco estudadas, assim como nos tamanhos
dos fragmentos remanescentes entre os dois grupos. O número de ciclos para
a fratura diminuiu no grupo onde o arco esteve posicionado no segmento
médio. Na análise no microscópio eletrônico de varredura (MEV), as hélices
dos instrumentos junto ao ponto de fratura não mostraram deformação plástica
e a superfície de fratura dos instrumentos exibiu características morfológicas de
fratura do tipo dúctil.
x
Palavras-chave: instrumentos endodônticos, níquel-titânio, fratura,
flexão rotativa, posição do arco.
xi
ABSTRACT
The current study evaluated the influence of the position of the arc on the
number of cycles to fracture (NCF), through static rotating bending test of
engine-driven nickel-titanium endodontic instruments. Twenty BR5C
instruments from the BioRaCe system were selected. Two models of curved
simulated canal were made in stainless steel, both with a 20 mm lenght, 2 mm
deep, 1,5 mm width, 10,46 mm arc lenght and 10mm ray in U-shaped canal.
The curved portion was made in the middle segment of the canal in a model
(Group I - 10 files) and the apical end in other (Group II - 10 files). These
instruments were rotated inside the canals of the metal blocks at 300 rpm speed
until the fracture happens. The time was recorded allowing the counting of the
number of cycles until the fracture and fragments lenght of the fractured
instruments was measured by digital caliper. The results were statistically
analyzed though the t-Student test which revealed a significant difference in
time to fracture of instruments into two positions of the current arc as well as the
shaped ones from the fragments remain between both groups. The number of
cycles to fracture decreased in the group where the arc was positioned in the
middle segment. On the evaluation by SEM the flutes of the instruments close
to the fracture point did not present plastic deformation and the surface of the
fracture instruments exhibited morphologic characteristics of ductile type of
fracture.
Key words: endodontic instruments, nickel-titanium, fracture, rotating bending,
position of the arc.
xii
LISTA DE FIGURAS
FIG 1. Esquema para usinagem da canaleta em bloco metálico com arco
localizado no segmento médio (grupo experimental 1) .....................................45
FIG 2. Esquema para usinagem da canaleta em bloco metálico com arco
localizado no segmento apical (grupo experimental 2) ......................................46
FIG 3. Equipamento ROMI D 600 TGR® ...........................................................46
FIG 4. Equipamento ROMI D 600 TGR®. Foto aproximada ..............................47
FIG 5. Dispositivo proposto por MOREIRA (2002) para manutenção do conjunto
contra-ângulo e bloco metálico fixo durante o experimento ...............................49
FIG 6. Instrumento BR5C do sistema BioRaCe .................................................53
FIG 7. Ponta do instrumento BR5C (100x) ........................................................53
FIG 8. Haste de corte do instrumento BR5C (150x)...........................................54
FIG 9. Transição da haste de corte para intermediária do instrumento BR5C
(90x)....................................................................................................................54
FIG 10 A. Superfície de fratura de instrumento do grupo experimental 1 –
segmento curvo na porção média do canal (170x).............................................56
FIG 10 B. Superfície de fratura de instrumento do grupo experimental 1 –
segmento curvo na porção média do canal (1000x)...........................................56
FIG 11 A. Superfície de fratura de instrumento do grupo experimental 2 –
segmento curvo apical do canal (200x)..............................................................57
FIG 11 B. Superfície de fratura de instrumento do grupo experimental 2 –
segmento curvo apical do canal (1000x)............................................................57
xiii
LISTA DE TABELAS
TAB 1. Média e desvio-padrão dos comprimentos úteis (mm) dos instrumentos
BR5C antes da fratura........................................................................................52
TAB 2. Média dos diâmetros (mm) e das conicidades (mm/mm) de 10
instrumentos BR5C selecionados aleatoriamente..............................................52
TAB 3. Média e desvio-padrão dos comprimentos (mm) dos segmentos
fraturados dos instrumentos ensaiados..............................................................55
TAB 4. Tempo em segundos até a fratura dos instrumentos: média e desvio-
padrão por grupo ................................................................................................58
TAB 5. Número de ciclos necessários até a fratura do instrumento (NCF): média
e desvio-padrão por grupo..................................................................................58
1
INTRODUÇÃO
A liga níquel-titânio (NiTi) foi desenvolvida na década de sessenta,
inicialmente para fins militares, como circuitos hidráulicos de aeronaves e em
operações subaquáticas devido a sua alta resistência à corrosão e fratura por
torção, além das propriedades de flexibilidade e elasticidade superiores às do
aço. A aplicabilidade da liga na Endodontia foi rapidamente percebida e
amplamente testada por WALIA et al. (1988) e SERENE et al. (1995).
A instrumentação de canais curvos era um problema para Odontologia
devido ao grande número de fraturas decorridas em consequência da anatomia
tortuosa e na maioria das vezes atrésica destes canais (WALIA et al.,1988).
A introdução da presente liga na fabricação dos instrumentos
representou um grande avanço na Endodontia, uma vez que instrumentos
confeccionados em NiTi apresentam elasticidade duas a três vezes maior,
quando flexionados e torcidos, em comparação à instrumentos idênticos
confeccionados em aço inoxidável (TEPEL et al., 1997; YARED, 2004).
Para BAHIA & BUONO (2005), somente os instrumentos de níquel-
titânio possuem as propriedades mecânicas necessárias para se realizar a
instrumentação acionada a motor em um canal radicular que apresenta uma
anatomia complexa.
A redução da pressão nas paredes do canal radicular exercida pelos
instrumentos fabricados com a liga NiTi permitiu a aplicação de movimento de
rotação contínua que permite um preparo cônico progressivo dos canais de
maneira rápida e eficiente, minimizando iatrogenias como a formação de
2
degraus e o transporte do preparo apical (GLOSSON et al., 1995; THOMPSON,
2000; AMERICAN ASSOCIATION OF ENDODONTISTS, 2008)
A maior preocupação no uso de instrumentos endodônticos de NiTi
acionados a motor, independentemente da marca comercial, tem sido a fratura
por fadiga de baixo ciclo quando submetidos à flexão rotativa (LOPES & ELIAS,
2001).
A resistência à fratura por fadiga de baixo ciclo refere-se ao número de
ciclos que o instrumento é capaz de resistir em uma determinada condição de
carregamento (HAIKEL et al., 1999; LOPES & ELIAS, 2001; MOREIRA et al.,
2002).
O número de ciclos é obtido pela multiplicação da velocidade de
rotação pelo tempo decorrido até a fratura em flexão rotativa de um instrumento
endodôntico (NCF) (LOPES et al., 2009).
Durante a rotação em flexão dos instrumentos endodônticos no interior
de canais curvos, são criadas alternadamente, tensões trativas e compressivas
que provocam mudanças microestruturais cumulativas nos instrumentos,
podendo levá-los à fratura após um período de tempo. Sugere-se que a fadiga
clínica seja o mecanismo responsável por 50 a 90 % das fraturas de
instrumentos endodônticos de NiTi (FUCHS & STEPHENS, 1980; LOPES et al.,
2009).
Muitas das características dos instrumentos de níquel-titânio acionados
a motor interferem na fratura por fadiga de baixo ciclo. Exemplos amplamente
discutidos na literatura são: o diâmetro, a conicidade e a seção transversal
(INAN et al., 2007; KITCHENS et al., 2007).
3
NECCHI et al. (2008) afirmaram de forma mais específica que a
intensidade da curvatura e a posição do arco no canal radicular são as
principais características a serem consideradas na avaliação do risco a fadiga
cíclica de um instrumento.
Quanto menor o raio da curvatura e maior o comprimento do arco,
maior será a intensidade das tensões induzidas no instrumento e menor será o
número de ciclos que o instrumento resistirá à fratura por fadiga (LOPES &
ELIAS, 2001).
A interferência da posição do arco na fadiga de baixo ciclo ainda é uma
discussão recente e com pouco embasamento científico. Para tanto, no
presente trabalho, algumas condições de carregamentos clínicos foram
simuladas por meio de um ensaio de flexão rotativa com o objetivo de investigar
se o número de ciclos para a fratura de instrumentos endodônticos de níquel-
titânio acionados a motor é influenciado pela posição do arco da curvatura ao
longo do comprimento de canais artificiais.
4
REVISÃO DE LITERATURA
Propriedades da liga Níquel-Titânio
A principal propriedade mecânica da liga NiTi que permitiu o avanço na
instrumentação endodôntica é a memória de forma, que está associada à
transformação da fase austenítica da liga, mais rígida, para fase martensítica,
mais flexível, durante a deformação e a reversão destas fases durante o
descarregamento. Este retorno à fase austenítica depende de procedimento
termomecânico apropriado. Se a reversão é espontânea durante o
descarregamento esta propriedade manifesta-se como superelasticidade ou
pseudo-elasticidade, e é bastante útil na Endodontia (LOPES & SIQUEIRA,
2004; NECCHI et al., 2008).
A superelasticidade ocorre então devido ao baixo módulo de
elasticidade da liga, por volta de um quarto a um quinto em relação à de aço
inoxidável. É devido a esta característica que os instrumentos endodônticos de
níquel-titânio apresentam alta resistência à deformação plástica e à fratura,
permitindo os acompanhar de forma segura a curvatura do canal radicular,
evitando acidentes como desvios e alterações na sua forma original (LOPES &
SIQUEIRA, 2004).
Quando a transformação martensita-austenita precisa ocorrer por meio
de aquecimento para recuperação da forma inicial, a propriedade manifesta-se
como efeito memória de forma, e possui menor uso na Endodontia (LOPES &
SIQUEIRA, 2004).
5
Em ambos os casos, os átomos mudam de posição durante a
transformação austenita-martensita, retornando à posição original, com a
reversão da transformação (LOPES & SIQUEIRA, 2004; NECCHI et al., 2008).
Ainda segundo LOPES & SIQUEIRA (2004), a superelasticidade é um
comportamento elástico atípico em relação a maior parte dos materiais
metálicos, uma vez que estes podem ser deformados elasticamente em até 0,1
ou 0,2% do comprimento inicial. Qualquer deformação acima deste limite será
permanente (lei de Hooke). Contudo, ligas níquel-titânio podem ser deformadas
em até 8%, dependendo da composição e da temperatura, sem manter
nenhuma deformação residual. Nestas ligas, a lei de Hooke a partir de certo
grau de deformação, não é mais observada e a força, ao invés de aumentar na
medida que o material se deforma elasticamente, permanece praticamente
constante, em um comportamento mais parecidos com o de algumas borrachas
do que com os metais.
De acordo com NASSER & GUO (2006), a grande elasticidade da liga
NiTi comparada à das ligas tradicionais é denominada superelasticidade ou
pseudo-elasticidade. Esta característica, mais do que o próprio efeito memória
de forma, é o grande diferencial das ligas níquel-titânio e se refere à
capacidade que certos materiais possuem de recuperar a forma original após
serem deformados muito além do limite elástico quando a tensão é removida.
Essa deformação recuperável pode chegar a 8% no caso das ligas NiTi e
acontece à temperatura constante. Estes autores afirmam também que o
comportamento superelástico das ligas níquel-titânio é mais fortemente
sensível à temperatura do que à taxa de deformação.
6
ZINELIS et al. (2010) realizaram estudo para avaliar a composição,
microestrutura e dureza dos instrumentos endodônticos de NiTi e compreender
a relevância das propriedades mecânicas de memória de forma e
superelasticidade nestes instrumentos. Para tanto 10 tipos de instrumentos de
NiTi com 5 exemplares cada, foram avaliados. Foram eles: EndoSenquence
(ES), Ergoflex K, FlexMaster, Hero 642, HyFlex X-File, K3 Endo, Liberator,
NRT, ProFile e ProTaper. Os instrumentos são compostos de níquel (52,1 a
56,2%) e titânio (43,8 a 47,9%) e foram classificados de acordo com sua
composição: EndoSequence e FlexMaster apresentaram o maior teor de níquel
na composição; ProTaper, Liberator, ProFile e K3 demonstraram maior
presença de níquel que HyFlex X-File mas inferior a Hero 642, NRT e Ergoflex
K. Níquel e titânio foram os dois únicos elementos identificados na composição
de todos os instrumentos testados. Foi aplicado o teste de Vickers para avaliar
a dureza dos instrumentos que após análise estatística foram classificados em
três diferentes grupos: ProFile, Liberator, Hyflex X-File, Hero e Ergoflex
demonstraram valor de dureza intermediário. EndoSequence e ProTaper
apresentaram os maiores valores de dureza, enquanto NRT, FlexMaster e K3
resultaram nos menores valores do teste de dureza. Não foi encontrada
nenhuma correlação entre os parâmetros de dureza e teor de níquel na
composição. Os valores de dureza encontrados nos instrumentos à
temperatura ambiente variaram de 312 a 376 HV. Estes valores são mais que o
dobro dos valores de dureza encontrados na fase martensítica. Todos os
instrumentos na temperatura radicular apresentam-se na fase austenítica. Os
resultados dos testes de composição, microestrutura e dureza realizados
7
mostram que os instrumentos foram manufaturados com a liga NiTi a frio e
nestas condições a liga não apresenta memória de forma e superelasticidade.
Outro fator para reforçar esta afirmativa é que esta liga manufaturada a frio é
mais dura e menos dúctil, o que facilita a transformação do instrumento como
produto final.
Processo de fabricação e acabamento superficial dos instrumentos de
NiTi
Tendo em vista a superelasticidade das ligas NiTi, os instrumentos
endodônticos de níquel-titânio geralmente são fabricados a partir da usinagem
de um fio metálico de NiTi de seção reta transversal circular. A usinagem é o
trabalho de corte realizado por máquinas-ferramentas para a fabricação de
uma peça com determinada forma, dimensão e acabamento. Nesse processo a
haste helicoidal do instrumento é obtida por um processo mecânico de
usinagem denominado roscamento externo e a ponta por torneamento cônico
externo. Roscamento externo é um processo mecânico de usinagem destinado
à obtenção de filetes (arestas laterais de corte) por meio da abertura de um ou
mais canais helicoidais em superfícies cilíndricas ou cônicas. Torneamento é
um processo destinado à obtenção de superfícies de revolução como auxílio de
ferramentas de usinagem mecânica (LOPES & SIQUEIRA, 2004).
A fabricação de instrumentos endodônticos de níquel-titânio, a partir de
fios superelásticos, é mais complexa que aquela dos instrumentos
endodônticos de aço inoxidável, devido à necessidade de usinagem. Uma vez
que a liga tenha sido fabricada, ela sofre vários processos termomecânicos
8
antes do fio ser usinado em um instrumento endodôntico. Essencialmente, o
metal fundido sofre forjamento em uma prensa dentro de uma fôrma cilíndrica
antes de ser enrolado sob pressão, para criar o metal que será usinado. O
metal é então espiralado para modelar o formato cônico com a pressão
constante de uma série de cilindros ajustados ao metal. Durante a fase de
construção, outros processos são realizados na haste metálica incluindo o
enroscamento do metal em um cone, recozendo o metal em seu estado
espiralado, decapando-o e, ainda, enroscando o metal refinado seguido de
recozimento repetido com o metal em configuração reta. Este estágio é seguido
de trefilação da forma atual ou da forma da seção reta transversal do metal,
imprimindo forma circular, quadrada ou mesmo uma forma oblonga antes dos
processos de limpeza e condicionamento. O metal finalizado é armazenado em
carretéis antes da usinagem (THOMPSON, 2000).
O instrumento endodôntico de NiTi acionado a motor fabricado por
usinagem de uma haste metálica cônica de seção reta transversal circular
apresenta pequeno módulo de elasticidade; em conseqüência disso, possui
grande elasticidade, alta resistência à deformação plástica, à fratura e à
corrosão. São oferecidos comercialmente como sistemas constituídos de limas
e alargadores cervicais. Entretanto, os instrumentos endodônticos
denominados de limas são na verdade alargadores helicoidais cônicos, uma
vez que executam o movimento de alargamento e não o movimento de
limagem (LOPES & SIQUEIRA, 2004).
Os instrumentos endodônticos de níquel-titânio acionados a motor
apresentam comprimento de corpo, de parte de trabalho, conicidade e diâmetro
9
em D0 variáveis conforme o sistema comercial. A haste de fixação é metálica e
tem 15 mm de comprimento na maioria dos sistemas, mas em alguns sistemas
apresenta comprimento menor. A ponta de todos os instrumentos endodônticos
de NiTi acionados a motor, independentemente da marca comercial, apresenta
a forma de um cone circular e apresenta curva de transição. A forma elipsóide
da ponta reduz a possibilidade de travamento do instrumento endodôntico no
interior do canal radicular. A extremidade da ponta pode ser aguda,
arredondada ou truncada. A haste helicoidal é cônica e a quantidade de hélices
varia em função do comprimento, diâmetro, conicidade e ângulo da hélice
(LOPES & SIQUEIRA, 2004).
O ângulo de inclinação da hélice geralmente apresenta diferentes
valores ao longo da haste helicoidal. É crescente da ponta em direção ao
intermediário. O sentido da hélice é à esquerda, ou seja, estes instrumentos
endodônticos são empregados com motores com giro à direita. O núcleo pode
apresentar forma cônica com diâmetro maior voltado para o intermediário, ser
cilíndrico ou cônico invertido com o diâmetro menor voltado para o
intermediário. A forma e dimensão do núcleo determinam a profundidade do
canal helicoidal presente na haste. Para núcleos cônicos a profundidade é
constante em toda a haste helicoidal (LOPES & SIQUEIRA, 2004).
Para o núcleo cilíndrico e cônico invertido, a profundidade do canal
helicoidal aumenta em direção ao intermediário. Quanto maior a profundidade
do canal helicoidal, maior a capacidade de transportar resíduos da
instrumentação. Maior também o volume de solução química auxiliar que fluirá
em sentido apical entre a parede dentinária e o instrumento endodôntico. Além
10
disso, quanto menor o diâmetro do núcleo, maior a flexibilidade e a resistência
à fratura por flexão em rotação do instrumento endodôntico. Contudo, menor
será sua resistência à fratura por torção (LOPES & SIQUEIRA, 2004).
As pequenas dimensões e geometria complicada dos instrumentos
endodônticos fazem com que estes sejam difíceis de serem produzidos
(LOPES & SIQUEIRA, 2004).
LOPES & ELIAS (2001) afirmaram que os defeitos do processo de
fabricação dos instrumentos endodônticos podem atuar como concentradores
de tensão. Durante as operações de usinagem, pequenas marcas e
ondulações são introduzidas na superfície dos instrumentos endodônticos pela
ferramenta de corte. Estes defeitos de acabamento superficial atuam como
concentradores de tensões e induzem a fratura do instrumento, durante o uso
clínico, em carregamentos inferiores aos esperados e obtidos em ensaios
mecânicos de apenas um ciclo de carregamento por flexão rotativa. Quanto
maior o número de defeitos menor será a tensão necessária para determinar a
fratura do instrumento.
Os metais e as ligas são submetidos a diferentes ensaios mecânicos e
condições de carregamentos para se determinar suas propriedades mecânicas
e permitir a previsão de seu desempenho. Ainda assim, às vezes, os materiais
podem apresentar fratura com carregamento abaixo do seu limite de
resistência, obtido em ensaios estáticos, isto devido a presença de defeitos nos
materiais (BROEK, 1986).
KUHN et al. (2001) investigaram através de microscopia eletrônica de
varredura, testes de microdureza e difração de raios X o processo de fratura de
11
instrumentos endodônticos de níquel-titânio e observaram que o seu
acabamento superficial é um importante fator no processo de fratura. Os
autores sugeriram que procedimentos de polimentos elétricos poderiam ser
utilizados durante a fabricação para reduzir os defeitos advindos da usinagem
do fio metálico.
Na tentativa de reduzir a chance de fratura dos instrumentos por
defeitos no acabamento superficial, novos métodos e materiais para
manufatura vêm sendo propostos, levando ao surgimento de uma segunda
geração de instrumentos de NiTi com maior flexibilidade, maior resistência à
fadiga e potencial de corte mais apurado (GAMBARINI et al., 2008; JOHNSON
et al., 2008).
Em 2007, uma nova liga de NiTi chamada M-Wire foi desenvolvida
para utilização na manufatura dos instrumentos Profile GT Série X (GTX;
Dentsply Tulsa-Dental Specialities, Tulsa, OK, EUA). O fabricante alega o uso
de um novo processo térmico na liga, que seria o responsável pelo
aprimoramento das propriedades de corte, resistência à fadiga e flexibilidade
dos instrumentos, apesar dos poucos estudos realizados não demonstrarem
nenhuma vantagem significativa em relação à liga tradicional (GAMBARINI et
al., 2008; JOHNSON et al., 2008).
GAMBARINI et al. (2008) compararam instrumentos Twisted File (TF)
com instrumentos K3, ambos com ponta diâmetro 0,25 mm e conicidade 0,06
mm/mm. A resistência à fratura por fadiga dos instrumentos TF foi
significativamente superior. O mesmo estudo também comparou instrumentos
12
K3 e ProFile GT Série X, ambos com ponta diâmetro 0,20 mm e conicidade de
0,06 mm/mm, não houve diferença estatisticamente significante entre eles.
Mais recentemente, um processo de manufatura diferente foi
desenvolvido pela Sybron Endo (Orange, CA, EUA) para utilizar no sistema TF
(Twisted File). O processo de fabricação consiste basicamente na
transformação da fase austenítica da liga em uma fase com estrutura cristalina
diferente, chamada fase- R, alcançada com um processo de
aquecimento/resfriamento que possibilita a torção do metal, e com resultados a
princípio mais promissores que o da liga M-Wire (GAMBARINI et al., 2008;
JOHNSON et al., 2008; LARSEN et al., 2009; TESTARELLI et al., 2009).
Todos os instrumentos TF têm ponta de diâmetro 0,25 mm e
conicidades variáveis em 0,04, 0,06, 0,08, 0,10 e 0,12 mm/mm. De acordo com
o fabricante, o desenho dos instrumentos, a manufatura realizada durante a
fase-R permitindo a torção do metal e o condicionamento da superfície dos
instrumentos são as características responsáveis pelo aprimoramento desta
nova geração de instrumentos de NiTi (GAMBARINI et al., 2008).
LARSEN et al. (2009) realizaram estudo para comparar dois dos
instrumentos de NiTi considerados de segunda geração com dois tipos de
instrumentos fabricados pelo processo de manufatura tradicional. Quinze
exemplares de conicidade 0,04 mm/mm e 0,06 mm/mm de cada um dos
sistemas EndoSequence (ES), Twisted File, ProFile GT Série X e ProFile (PF)
foram testados. Todos os instrumentos apresentam ponta de diâmetro 0,25 mm
à exceção do GTX que possui ponta de diâmetro 0,20 mm. Foi utilizado no
estudo um canal artificial em bloco de aço inox com curvatura de 60° e 3 mm
13
de raio coberto por placa acrílica para permitir visualização do momento da
fratura dos instrumentos durante o ensaio. Todos os instrumentos foram
acionados nas velocidades recomendadas pelos fabricantes, estas depois
foram equiparadas no cálculo do número de ciclos até a fratura. Instrumentos
ES e TF foram acionados a 500 rpm enquanto os GTX e PF foram acionados a
300 rpm. Os instrumentos GTX 20/0,04 apresentaram desempenho
significativamente superior a todos os instrumentos 25/0,04. Entre os
instrumentos 25/0,04, os TF apresentaram-se mais resistentes à fratura que os
ES. A diferença entre os instrumentos TF e PF não foi estatisticamente
significante. Resultados similares foram encontrados nos instrumentos de 0,06
mm/mm.
IQBAL et al. (2010) fizeram estudo comparando o sistema tradicional
dos instrumentos ProFile GT com os instrumentos GTX manufaturados com a
nova liga M-Wire no deslocamento do forame apical. Para tanto, foram
utilizados 40 canais mesio-linguais de molares inferiores. Todos foram
preparados até o instrumento 30/0,04, metade por cada sistema. Após análise
por radiografias digitais sobrepostas de antes e depois da instrumentação
concluiu-se que não há diferença significativa entre as duas gerações do
sistema Profile no que diz respeito ao transporte do forame apical.
Outra alternativa proposta na literatura é o tratamento da superfície
dos instrumentos de NiTi por técnicas variadas, como é o caso da aplicação de
íons nitrogênio por imersão de plasma (PIII) utilizado no sistema ProTaper
(Maillefer SA, Maillefer Instruments, Ballaigues, Suíça). LI et al. (2007)
investigaram a técnica PIII para a modificação da superfície dos instrumentos
14
ProTaper®. Esse método padrão promete o desenvolvimento de uma
modificação na superfície dos instrumentos para melhorar a qualidade e o
resultado clínico. A amostra recebeu íons de nitrogênio ou íons de nitrogênio
mais argônio. Foi feita análise radiográfica de espectroscopia fotoeletrônica
(XPS) na amostra com e sem íons argônio. Em seguida foi feita análise através
de um scanner diferencial de calorimetria (DSC) para investigar o
comportamento de transformação de fase do material. Os resultados
mostraram um grande sucesso na modificação da superfície dos instrumentos
com nitrogênio com a formação de uma fina camada dourada de íons
nitrogênio. A técnica PIII não alterou a característica de superelasticidade da
liga NiTi, pois esta foi mantida em temperatura ambiente. Os autores
concluíram que a técnica é promissora para melhorar as características dos
instrumentos mecanizados de NiTi.
Os instrumentos acionados a motor foram projetados para serem
utilizados em movimento de alargamento com rotação contínua, com giro à
direita, empregando-se motores elétricos ou micromotores a ar, possuidores de
dispositivos mecânicos que permitam velocidade de giro e torque baixos. São
acompanhados de ângulos redutores de velocidade (8:1, 16:1, 20:1). A
velocidade de emprego varia de 180 a 350 rpm e o torque entre 0,1 a 10 N.cm
(LOPES et al., 1999; LOPES et al., 2009).
Além dos defeitos no acabamento superficial decorridos da
dificuldade de fabricação dos instrumentos na liga NiTi, a pouca experiência ou
escolha inadequada do profissional em relação aos mais de trinta kits de
intrumentos disponíveis no mercado e a falta de conhecimento das
15
propriedades mecânicas da liga aumentam a possibilidade de fratura.
(AMERICAN ASSOCIATION OF ENDODONTICS, 2008).
MANDEL et al. (1999) avaliaram a incidência de fraturas de
instrumentos NiTi movidos a motor da marca ProFile Série 29, de conicidade
0,04 e 0,06 mm/mm, com relação à experiência do operador. Foram utilizados
um total de 125 canais simulados de resina com a mesma forma geométrica
em termos de ângulo e raio de curvatura e diâmetro do orifício coronal e apical.
Cinco operadores prepararam todas as amostras, onde cada um operou em 25
canais. Os resultados apontaram para um total de 21 (16,8%) instrumentos
fraturados, indicando a necessidade de domínio de técnica para minimizar o
risco deste tipo de ocorrência.
PARASHOS et al. (2006), em seu estudo avaliaram 7159 instrumentos
de níquel-titânio mecanizados de 14 endodontistas em quatro países, e
puderam identificar fatores que podem influenciar na fratura durante o uso
clínico. Foi observado a perda de corte em 12% dos casos e fratura em 5%
(1,5% por torção e 3,5% por flexão). A taxa de defeito variou significantemente
entre os endodontistas. O desenho do instrumento também foi considerado um
fator de influencia durante o processo, porém em menor escala. O fator de
maior influência na fratura analisado foi a habilidade clínica do operador ou a
decisão consciente de usar os instrumentos em determinado número de vezes.
Fratura dos instrumentos de NiTi
O uso de instrumentos endodônticos de níquel-titânio acionados a
motor para a instrumentação de canais radiculares possibilitou aos clínicos
16
realizar um preparo mecânico cônico de modo previsível e consistente
enquanto as complicações do procedimento são minimizadas, especialmente
em canais radiculares curvos (PETERS, 2004).
O principal risco inerente à modelagem com instrumentos
mecanizados de NiTi é a sua susceptibilidade à fratura (PRUETT et al. 1997).
Apesar da grande flexibilidade, a fratura pode ocorrer com os
instrumentos endodônticos de NiTi, especialmente após o uso prolongado
(YARED, 2004). Infelizmente, muitas dessas fraturas ocorrem inesperadamente
sem nenhum sinal visível de deformação permanente. A fratura por fadiga e a
por torção são as causas mais comuns de fratura de instrumentos
endodônticos de NiTi acionados a motor (PRUETT et al., 1997; INAN et al.,
2007; CHEUNG, 2009).
A análise das causas de falhas pode ser feita através da interpretação
e caracterização da superfície de fratura, que se apresenta como um mapa
fotográfico que freqüentemente revela a história dos eventos que precederam a
falha. As fraturas podem ser induzidas pela aplicação de cargas lentas (tração,
flexão, torção), pelo impacto, por carregamentos repetidos (fadiga) ou por
cargas de baixa intensidade atuando durante muito tempo (fluência). Sabendo-
se que não existe material sem defeito, estes são submetidos aos diferentes
ensaios mecânicos para determinação de suas propriedades mecânicas e
previsão de seu desempenho (LOPES & SIQUEIRA, 2010).
A fratura por torção caracteriza-se pelo giro do instrumento ao redor do
longo eixo em uma das extremidades, enquanto a outra extremidade esta fixa
17
em determinada posição (INAN et al., 2007; LARSEN et al., 2009; PLOTINO et
al., 2009).
A fratura estática por torção ocorre pela rotação contínua do
instrumento endodôntico em uma extremidade enquanto a outra pára de girar.
Isto pode facilmente ocorrer se uma parte do instrumento for bloqueada ou
rosqueada em um ponto enquanto a parte conectada ao motor continua a girar.
A fadiga dinâmica por torção resulta da força de atrito gerada pela resistência
da dentina ao corte do instrumento endodôntico (DIETER, 1986).
ROWAN et al. (1997), investigaram a resistência à torção de limas
endodônticas de níquel-titânio e de aço inoxidável. As limas de números 15, 25,
35, 45 e 55 foram submetidas a cargas no sentido à direita e à esquerda. Os
instrumentos foram examinados previamente em um aumento de 10x para
assegurar a uniformidade da superfície de corte livre de defeitos. Os diâmetros
das limas foram medidos em dois pontos da superfície de corte: a 1 mm e a 16
mm da ponta, com um paquímetro digital. Os testes de torção sem carga axial
foram realizados com um aparato adaptado à mesa de uma máquina de ensaio
universal, que imprimiu uma velocidade de rotação de 150 rpm. As limas foram
imobilizadas a 3 mm da ponta por meio de uma garra metálica. A força foi
transformada em torque mediante a expressão: torque = força x raio. Os
valores médios para o torque e ângulo de rotação na fratura foram
comparados. Os resultados demonstraram maiores valores em rotação à direita
do que à esquerda para instrumentos de mesmo número. Segundo os autores,
a rotação à direita tende inicialmente distorcer a hélice do instrumento antes da
falha ocorrer.
18
Ao se classificar a fratura em função do estado de tensão aplicado ao
material, considera-se que as tensões trativas produzem fratura por clivagem,
ao passo que as tensões cisalhantes induzem fratura por cisalhamento. A
fratura dos metais e ligas metálicas sob cargas não-cíclicas pode ocorrer sob
duas formas extremas: fratura frágil e fratura dúctil. A oriunda da aplicação
repetida de tensão (cargas cíclicas) é denominada de fratura por fadiga
(LOPES & SIQUEIRA, 2004).
É sugerido que a fadiga englobe de 50 a 90 % dos mecanismos de
fratura (FUCHS & STEPHENS, 1980). CHEUNG et al. (2005) relataram que a
grande maioria dos instrumentos de NiTi (93 %) parece fraturar por fadiga.
A fratura por fadiga é um fenômeno que ocorre quando são aplicados
carregamentos dinâmicos repetidos ou flutuantes a um material metálico e o
mesmo rompe-se com uma carga muito menor que a equivalente à sua
resistência estática. As tensões necessárias para propagar a trinca são
consideravelmente inferiores à tensão capaz de provocar o crescimento da
trinca sob cargas crescentes e com valores nominais inferiores ao limite de
escoamento do material (LOPES & SIQUEIRA, 2010).
A fratura por flexão rotativa ocorre quando o instrumento de níquel-
titânio acionado a motor gira no interior de um canal curvo. Esse tipo de fratura
é particularmente imprevisível, por acontecer sem que haja qualquer aviso
prévio (LARSEN et al., 2009).
A resistência à fratura por fadiga de baixo ciclo refere-se ao número de
ciclos que o instrumento endodôntico é capaz de resistir em uma determinada
19
condição de carregamento (HAIKEL et al., 1999; LOPES & ELIAS, 2001;
MOREIRA et al., 2002).
As etapas de ruptura de um material sujeito à fadiga são
essencialmente: nucleação da trinca (ocorre na superfície do material, é lenta,
microscópica e depende do acabamento superficial da peça), propagação da
trinca (macroscópica e se dá em incrementos durante cada ciclo de
carregamento pela abertura e fechamento consecutivo da trinca, a qual cresce
na direção do seu eixo longitudinal com certo incremento) e ruptura da peça ou
corpo de prova (comprimento da trinca atinge tamanho crítico tal que a seção
resistente fica relativamente pequena, a porção remanescente não resiste à
carga e a ruptura dá-se repentinamente). Na Odontologia, a fratura por fadiga
de baixo ciclo é a mais observada nos instrumentos endodônticos de NiTi
acionados a motor (LOPES & SIQUEIRA, 2004).
De acordo com estudos feitos por CETLIN et al. (1988), defeitos na
superfície e tensões localizadas reduzem a duração do estágio inicial de fadiga,
que é a nucleação da trinca, diminuindo o número de ciclos para a fratura. Em
geral o problema de fratura está ligado às tensões e deformações aplicadas
sobre o material, quando as mesmas excedem a capacidade de carga que o
elemento suporta. Com o objetivo de caracterizar o mecanismo e o aspecto da
fratura, esta pode ser considerada como dúctil, frágil, e sob fadiga (LOPES et
al., 2009).
Baseados em uma combinação de observações microestruturais e
propriedades macroscópicas de materiais metálicos, GALL et al. (2001)
relataram que a fratura é geralmente classificada como frágil ou dúctil. Do
20
ponto de vista microscópico, a nucleação, crescimento e coalescência de
vazios a partir de partículas de segunda fase ou outras heterogeneidades
levam à ruptura dúctil, e a superfície de fratura é caracterizada pela presença
de microcavidades (dimples). Por outro lado, a fratura frágil é caracterizada
pela quebra seqüencial de ligações atômicas (clivagem) e a superfície de
fratura apresenta planos cristalográficos facetados. Na maioria das situações, a
fratura dúctil ocorre com maior deformação macroscópica comparada à fratura
frágil.
As falhas resultantes da fadiga são particularmente perigosas não
somente por causa de sua ocorrência comum mais também por causa de sua
natureza insidiosa. O fenômeno de fadiga por repetição de carregamentos
alternados ocorridos em canais radiculares curvos pode ser o fator crucial na
fratura do instrumento endodôntico. A fadiga do metal, levando à fratura o
instrumento no interior do canal, pode ocorrer sem aviso prévio, uma vez que
os instrumentos endodônticos de NiTi acionados a motor geralmente fraturam
antes que qualquer deformação plástica das hélices se torne evidente.
SPANAKI-VOREADI et al. (2006) avaliaram o mecanismo de fratura
dos instrumentos endodônticos ProTaper sob condições clínicas de uso. Foi
coletado de vários dentistas um total de 46 instrumentos ProTaper que
apresentaram alguma deformação ou fratura após uso clínico. Os instrumentos
trabalharam em conjunto com irrigação de hipoclorito de sódio a 2,5% e
lubrificação com RCPrep. Os instrumentos foram esterilizados com calor (1
hora a 180°C) ou autoclave (20 minutos a 120°C). O tempo de uso de cada
instrumento não foi registrado. Um sistema novo foi usado como controle (Lote
21
n° 3613400). Todos os instrumentos, após usados clinicamente, foram limpos
em cuba ultra-sônica, imersos em EDTA a 17% e solução aquosa de 3NaOH
por 9 minutos, inspecionados por um estereomicroscópio com aumento de
cinco vezes e classificados em três categorias: (I) plasticamente deformado e
não fraturado, (II) fraturado com deformação plástica e (III) fraturado sem
deformação plástica. Os instrumentos então foram observados no MEV. Dos
instrumentos descartados, 8 apresentaram deformação plástica (grupo A:
17,4%), 4 fraturaram com deformação plástica (grupo B: 8,7%) e a grande
maioria (34) faturou sem deformação plástica microscópica (grupo C: 73,9%). A
análise dos instrumentos no MEV mostrou que alguns instrumentos
deformados clinicamente apresentaram trincas na superfície originadas da área
de corte. Entretanto, a maioria dos instrumentos descartados e todos os
instrumentos do grupo controle não apresentaram trincas. A análise no MEV
mostrou a presença de microcavidades, característica de fratura do tipo dúctil.
Os resultados sugeriram esse tipo de fratura como o mecanismo mais
comumente encontrado nestes instrumentos sobre as condições clínicas de
uso.
SATTAPAN et al. (2000) analisaram os tipos e a freqüência de defeitos
observados em instrumentos endodônticos acionados a motor confeccionados
em NiTi após seu uso clínico. Foram utilizados 368 instrumentos do sistema
Quantec Series 2000 (Sybron Dental Specialties – Kerr, México) descartados
por endodontistas, após o uso clínico por um período de aproximadamente seis
meses. Esses instrumentos foram retirados de uso em função da redução da
eficiência de corte, fratura ou quaisquer defeitos observados ao exame visual.
22
Não foi computado o número de vezes que esses instrumentos foram
utilizados. Previamente à sua inspeção, todos os instrumentos foram limpos
através da imersão em hipoclorito de sódio a 1% por 10 minutos após submetê-
los à limpeza em cuba ultra-sônica e, ao final, esterilizados em autoclave.
Todos os instrumentos foram organizados de acordo com seu número e
comprimento. O comprimento dos instrumentos foi determinado considerando-
se a distância entre a ponta do instrumento até a base do cabo através de um
calibrador digital eletrônico para determinar a localização de qualquer ponto de
fratura. Foram também inspecionados através de um estereomicroscópio com
aumento de 40 vezes com o intuito de visualizar seus defeitos. Foram
produzidos em laboratório testes de torção ou fadiga. Nos testes de fratura por
flexão (fadiga), um tubo de vidro cilíndrico de diâmetro interno de 1 milímetro foi
curvado a 90º, formando uma curvatura de 5 mm de raio. Todos os
instrumentos foram acionados livremente no interior do tubo até a fratura. A
parte superior dos instrumentos fraturados foi inspecionada através de um
estereomicroscópio com aumento de 40x, além de uma avaliação em um
microscópio eletrônico de varredura. Os resultados demonstraram que antes
dos testes de fratura, metade dos instrumentos descartados (49,2%)
apresentou defeitos visíveis. A maioria deles relacionava-se à fratura (20,9%) e
deformações (24,1%). A maior porcentagem de instrumentos fraturados era de
número 2, enquanto a maior freqüência de deformações estava associada ao
instrumento de número 1. Demonstrou-se ainda que todos os instrumentos
fraturados por fadiga apresentaram rompimento brusco sem qualquer defeito
aparente, sendo que o ponto de fratura correspondia ao ponto máximo de
23
curvatura do tubo de vidro. Essas características foram utilizadas para analisar
os tipos de fratura que ocorreram nos instrumentos fraturados clinicamente.
FIFE et al. (2004) avaliaram a fadiga cíclica de instrumentos
endodônticos ProTaper S1, S2, F1, F2 e F3 após múltiplo uso clínico. A
amostra foi composta por 225 instrumentos, divididos em três grupos (15 de
cada tamanho): A = 75 como grupo controle, B = 75 utilizados em 2 molares (6
- 8 canais), C = 75 usados em 4 molares (12 - 16 canais). Radiografias iniciais
foram obtidas através da técnica do paralelismo. Foram incluídos no estudo
apenas dentes permanentes humanos com ápices formados e no mínimo com
uma raiz com curvatura de 10 graus (método de Schneider). Os instrumentos
foram acionados nos canais radiculares previamente alargados no terço
cervical por brocas Gates Glidden, a uma velocidade de rotação de 300 rpm,
durante 1 segundo no comprimento de trabalho (recomendação do fabricante).
O preparo apical foi alargado manualmente até 0,20 mm antes da
instrumentação mecanizada. Os canais foram irrigados com hipoclorito de
sódio a 5,25% durante a limpeza e modelagem e foi mantida patência a cada
troca de instrumento. Cada instrumento foi examinado em ambiente iluminado,
por meio de uma lupa com aumento de 3,5x, entre as utilizações, para analisar
sinais de deformação plástica ou fratura. Os instrumentos com qualquer sinal
de deformação plástica foram impedidos de continuar no estudo. Os
instrumentos dos grupos B e C foram limpos de quaisquer debris visíveis com
limpeza ultra-sônica e esterilização em autoclave entre os usos. Após
completar os casos clínicos, os três grupos de instrumentos foram submetidos
a ensaios de fadiga, utilizando um aparato específico que permitisse o livre giro
24
dos instrumentos no interior de um canal artificial metálico com curvatura de
90º e 5 mm de raio, a uma rotação de 350 rpm. Os instrumentos foram
resfriados constantemente durante o ensaio com jato de ar para evitar
superaquecimento. Foi registrado o número de rotações para a fratura de cada
instrumento e a média foi calculada. Os dados coletados foram analisados
estatisticamente pelo teste ANOVA (análise de variância). Três instrumentos
S1 e quatro instrumentos S2 exibiram deformação plástica durante a parte
clínica do estudo e foram descartados. Nenhum instrumento de acabamento
(F1, F2 e F3) fraturou ou deformou durante a parte clínica do estudo. Os
resultados mostraram uma diminuição progressiva no número de rotações até
a fratura entre os três grupos para os instrumentos S2, F1, F2 e F3. Entretanto,
os instrumentos S1 não mostraram redução no número de rotações para a
fratura após múltiplos usos. Foi observada diferença estatisticamente
significante (P < 0,05) entre os grupos A (controle), B (2 molares) e C (4
molares) para os instrumento S2 e F2 apenas, mostrando que o múltiplo uso
destes dois instrumentos reduz significativamente a sua resistência à fadiga.
Não foi encontrada diferença estatística no número de rotações para a fratura
com múltiplo uso dos instrumentos S1, F1 e F3. Os resultados mostraram não
haver mudança significativa na média dos comprimentos dos fragmentos
fraturados após múltiplo uso. Os instrumentos S1, S2 e F1 fraturaram próximo
ao ponto de maior curvatura do canal. Os instrumentos F2 e F3 tiveram a
média de comprimento dos fragmentos fraturados de 3,46 mm e 3,81 mm,
respectivamente. O diâmetro dos instrumentos S1, S2 e F1, F2 e F3 na ponta
são, respectivamente, 0,17 mm, 0,20 mm, 0,20 mm, 0,25 mm e 0,30 mm.
25
Portanto, quando o diâmetro aumenta 0,20 mm, a fratura ocorre próxima à
ponta do instrumento. A mudança de conicidade dos instrumentos ProTaper
permite a eles uma maior flexibilidade e maior resistência a fratura por fadiga
no segmento mais próximo da ponta. Isso explica porque, nesse estudo, os
instrumentos S1 pareceram mais resistentes à fratura por fadiga após múltiplo
uso. Os autores concluíram claramente que a reutilização prolongada afeta
fortemente a fadiga dos instrumentos ProTaper.
Na fratura por flexão rotativa, a análise no MEV pode revelar uma
superfície plana, quando a trinca se propaga ao longo de um plano, ou
degraus, quando a propagação se dá pelo avanço simultâneo de várias trincas
em planos paralelos. Nesse caso, não ocorre deformação plástica da haste
helicoidal do instrumento. A morfologia da superfície de fratura dos
instrumentos por torção ou flexão rotativa apresenta características do tipo
dúctil, com microcavidades de formas variadas (LOPES & SIQUEIRA, 2004).
WEI et al. (2007) investigaram o tipo de fratura dos instrumentos
endodônticos ProTaper acionados a motor após uso clínico e compararam
estereomicroscopia com microscopia eletrônica de varredura para determinar
qual é o melhor método para estabelecer o tipo de fratura do material. Em 100
instrumentos fraturados, a análise estereoscópica revelou 88 casos de fratura
por flexão e 12 por torção. Por meio do microscópio eletrônico de varredura,
em 91 casos a fratura foi por flexão, 3 casos por torção e 6 casos mostraram
combinação de tensão (flexão e torção). Concluíram então que o microscópio
eletrônico de varredura é o melhor método para analisar o tipo de fratura dos
instrumentos de NiTi acionados a motor.
26
Influência das variáveis relacionadas aos mecanismos de instrumentação
na fratura em flexão rotativa
Diversas variáveis podem interferir na fratura por fadiga. Algumas
estão relacionadas à anatomia dos canais, principalmente as que englobam as
características da curvatura dos canais como raio, ângulo e comprimento do
arco (MOREIRA, 2006). São estas os principais focos do presente trabalho.
A fratura por fadiga sofre também interferência das variáveis
relacionadas aos dispositivos mecânicos utilizados durante a instrumentação,
tais como velocidade de rotação e características dos instrumentos como
diâmetro, conicidade, seção transversal e flexibilidade. Estas variáveis são
amplamente discutidas por PARASHOS & MESSER (2006).
ULLMAN & PETERS (2005) avaliaram a fratura estática de
instrumentos endodônticos ProTaper sujeitos a vários graus de fadiga em
canais artificiais com curvatura de 90º e 5 mm de raio. Os autores observaram
que a resistência à fadiga diminuiu com o aumento do diâmetro dos
instrumentos. Instrumentos com diâmetros maiores fraturam com mais
facilidade devido a maior intensidade de tensões durante a fadiga no ponto de
flexão. Clinicamente, é importante observar que um instrumento de maior
diâmetro não deve ser considerado como mais resistente ou ter uma maior vida
útil simplesmente por ter um diâmetro maior. Os autores ainda recomendam o
uso cauteloso de instrumentos de maiores diâmetros, ou o descarte dos
mesmos, quando submetidos à fadiga.
27
KITCHENS et al. (2007) compararam o número de rotações para a
fratura de instrumentos endodônticos de níquel-titânio acionados a motor em
velocidades diferentes (350 e 600 rpm) em canais com diferentes ângulos de
curvatura (25, 28 e 33,5 graus). Uma diferença significativa foi encontrada no
número de ciclos para a fratura de acordo com a conicidade do instrumento e o
ângulo da curvatura. Os instrumentos de conicidade maior fraturaram mais
rapidamente independentemente do ângulo e da velocidade empregados.
Quando o ângulo aumentou, os instrumentos fraturaram mais rapidamente.
Instrumentos de conicidades maiores fraturam com menor número de ciclos.
Quanto maior o ângulo do canal, menor o número de ciclos para a fratura; este
não foi relacionado à velocidade de giro.
O diâmetro e a conicidade de instrumentos endodônticos de níquel-
titânio acionados a motor quando submetidos ao ensaio de flexão rotativa têm
influência sobre o NCF (ULLMAN & PETERS, 2005; YAO et al., 2006).
TURPIN et al. (2000) analisaram as seções retas transversais de
instrumentos endodônticos em tríplice U e tríplice hélice, quando submetidos a
tensões. Para os de tríplice hélice, a tensão é progressivamente distribuída
entre o ângulo da hélice e o canal helicoidal do instrumento, onde a tensão é
mais pronunciada. Para os de tríplice U, toda a tensão é concentrada no canal
helicoidal cuja profundidade fica próxima do centro do instrumento. Para os
autores, as tensões são mais bem distribuídas em instrumentos com seção reta
transversal em forma de tríplice hélice.
Ao investigar a influência do desenho dos instrumentos endodônticos
em relação à fratura e à flexão, SCHÄFER & TEPEL (2001) desenvolveram
28
diferentes protótipos caracterizados por cinco seções retas transversais
diferentes (quadrada, triangular, romboidal, formato em “S” e com formato
semelhante a lima Hedströem). Esses instrumentos apresentavam também
diferentes números de hélices, variando entre 16, 24 e 32. Tanto a resistência à
flexão como à fratura foram determinadas de acordo com as normas ISO 3630-
1. Foram utilizados dez instrumentos de cada tipo com diâmetros de ponta
equivalentes a 0,15 mm, 0,25 mm e 0,35 mm. Os resultados demonstraram
que enquanto os instrumentos com seção reta transversal em formato
romboidal apresentaram menor resistência à flexão, os de seção quadrada
demonstraram serem os mais resistentes. De um modo geral, os protótipos em
forma de “S” e semelhantes a lima Hedströem mostraram menor resistência à
fratura, sendo que os de seção triangular e trinta e duas hélices foram mais
resistentes. Os resultados indicaram ainda que há grande influência do
desenho com relação à resistência à fratura e flexão. Entretanto, essas
propriedades podem ser influenciadas pelo número de hélices e pelo processo
de fabricação dos instrumentos endodônticos.
SCHÄFER et al. (2003) analisaram a flexibilidade dos instrumentos
endodônticos de níquel-titânio acionados a motor das marcas RaCe (FKG
Dentaire, Suíça), ProFile (Dentsply Maillefer, Suíça), K3 (SybronEndo, México),
Hero (MicroMega, França) e FlexMaster (VDW, Alemanha), encontrando uma
correlação fortemente significante entre a área da secção transversal e a
flexibilidade desses instrumentos. Esse resultado indica, segundo os autores,
que a configuração da secção transversal é o principal fator que interfere na
29
flexibilidade dos instrumentos endodônticos de níquel-titânio acionados a
motor.
XU & ZHENG (2006) estudaram a influência da seção transversal no
comportamento mecânico de diferentes instrumentos de NiTi através de
modelo finito computadorizado e concluíram com a análise dos resultados que
a seção transversal tem importante influência no comportamento mecânico dos
instrumentos e dentre os modelos de instrumentos estudados aqueles com
seção transversal convexa e de tripla hélice apresentaram maior resistência ao
torque.
YAO et al. (2006) compararam a resistência à fadiga de três
instrumentos endodônticos: ProFile, K3, e RaCe. Cada instrumento girou
livremente dentro de um tubo de aço inoxidável com curvatura de 60º e 5 mm
de raio, a uma velocidade de 300 rpm e amplitude de 3 mm por segundo
(movimento axial contínuo, avanço e retrocesso – “pecking motion”) . Os
instrumentos foram girados até ocorrer a fratura. O tempo decorrido até a
detecção da fratura foi registrado por um cronômetro digital. Os fragmentos
fraturados foram analisados por um microscópio eletrônico. O número de ciclos
para a fratura foi determinado através da conversão do tempo requerido para a
fratura em unidade decimal e da sua multiplicação pela velocidade de rotação.
Os resultados mostraram que a seção reta transversal, diâmetro e conicidade
dos instrumentos contribuem para a vulnerabilidade à fratura por fadiga. A
análise no microscópio eletrônico de varredura revelou que a superfície de
fratura apresentou característica dúctil para todos os instrumentos ensaiados.
O instrumento K3, apesar de ser o instrumento com maior área da seção reta
30
transversal desse estudo, foi o que demonstrou ter maior resistência à fratura
por flexão rotativa. A explicação para esse achado pode estar relacionada ao
desenho do instrumento. Segundo o fabricante, o canal helicoidal do
instrumento K3 passa a ficar mais profundo de D0 a D16. O diâmetro do núcleo
do instrumento K3 não aumenta na mesma proporção que a conicidade e, por
isso, a flexibilidade é aumentada ao longo do comprimento do instrumento. Os
instrumentos RaCe fraturaram entre D5 e D7. Todos os instrumentos ProFile e
K3 0,40/0,06 fraturaram num ponto próximo a D13 e D16. A conicidade do
instrumento Race só aumenta nos 8 mm finais de todo o comprimento da haste
helicoidal, diferente dos 16 mm dos instrumentos ProFile e K3. Essa
característica parece sustentar a hipótese de a área da seção reta transversal
desempenhar um papel chave na fratura cíclica. Entretanto, a área da seção
reta transversal não foi o único fator determinante para a fratura nesse estudo,
uma vez que o ponto de fratura dos instrumentos ProFile e K3 de conicidade
0,04 mm/mm variou de D4 a D15. Esses resultados indicam que a fratura dos
instrumentos com menor conicidade pode ter ocorrido por outros fatores. Os
instrumentos K3 0,25/0,04 foram significativamente os mais resistentes à
fratura quando comparados ao ProFile e RaCe. Na categoria 0,25/0,06, os
instrumentos K3 e ProFile foram significativamente mais resistentes à fratura
do que os instrumentos RaCe. Nas categorias 0,40/0,04 e 0,40/0,06, K3 foram
significativamente mais resistentes à fratura do que ProFile®. No geral, os
resultados desse estudo sugerem que a área da seção reta transversal parece
ser mais um fator importante na contribuição para a fratura por fadiga, assim
como o diâmetro e a conicidade dos instrumentos.
31
Para diversos autores (GABEL et al., 1999; DIETZ et al., 2000;
DAUGHERTY et al., 2001), a probabilidade de ocorrer a fratura de um
instrumento endodôntico de níquel-titânio acionado a motor é menor quando
acionados a velocidades mais baixas. Entretanto, para ZELADA et al. (2002) e
KITCHENS et al. (2007), a velocidade em que os instrumentos endodônticos
são acionados não tem efeito significativo sobre o número de ciclos para
ocorrer a fratura do instrumento. Isso porque o aumento da velocidade diminui
o tempo da fratura.
Para TOBUSHI et al. (1998), em um ensaio de flexão rotativa com
amplitude de deformação constante, a temperatura aumenta proporcionalmente
com a velocidade de rotação, resultando em menor tempo de vida para o
material. Assim, as taxas de variação de temperatura e de deformação afetam
as propriedades superelásticas das ligas níquel-titânio, constituindo-se, desse
modo, em fatores muito importantes para as aplicações práticas.
DIETZ et al. (2000) concluíram que a probabilidade de ocorrer a fratura
de instrumentos endodônticos de níquel-titânio acionados a motor é menor
quando acionados a velocidades mais baixas.
Segundo EGGELER et al. (2004), o efeito da velocidade de rotação na
fratura está relacionado à produção de calor durante a formação da martensita
induzida por deformação. Para formar martensita, a interface austenita-
martensita necessita de um movimento que dissipa energia e produza calor.
Velocidades maiores produzem mais calor que velocidades mais baixas, e com
isso aumentam mais rapidamente a temperatura do instrumento, que leva ao
rápido aumento da tensão superficial, fazendo com que a fratura por fadiga
32
ocorra precocemente. Informaram ainda que durante o carregamento cíclico
das ligas NiTi superelásticas podem ser acumuladas tensões residuais, devido
aos repetidos aparecimentos e desaparecimentos de martensita induzida por
deformação. Este processo influencia a transformação martensítica induzida
por deformação e o mecanismo de deformação, o que altera o comportamento
da liga na fadiga.
LOPES et al. (2009) avaliaram por meio do ensaio de flexão rotativa de
instrumentos endodônticos de NiTi acionados a motor em um canal artificial
curvo, a influência da velocidade de rotação, do diâmetro e da flexibilidade no
número de ciclos necessários para ocorrer a fratura (NCF). Foram empregados
40 instrumentos ProTaper Universal, vinte instrumentos F3 e vinte F4
acionados às velocidades de 300 e 600 rpm. Foi utilizado um canal de aço
inoxidável de 20 mm de comprimento, raio de curvatura de 6 mm e 1,50 mm de
diâmetro interno. O comprimento do segmento curvo apresentava 9,42 mm de
parte curva, correspondendo ao arco de 90º. Os instrumentos foram
introduzidos no canal e girados até ocorrer a fratura. O tempo foi registrado e
convertido em número de ciclos, assim como os comprimentos dos
instrumentos fraturados. Os resultados analisados estatisticamente (teste
Mann-Whitney) revelaram diferença significativa entre as velocidades
estudadas, os diâmetros e as flexibilidades dos instrumentos ensaiados. A
velocidade de rotação exerceu influência no número de ciclos para a fratura
que diminuiu com uma proporção inversa à velocidade. O diâmetro e a
flexibilidade dos instrumentos ProTaper F3 e F4 também exerceram influência
no número de ciclos para a fratura. O número de ciclos para a fratura diminuiu
33
com o aumento do diâmetro e com o aumento da rigidez (menor flexibilidade)
dos instrumentos ensaiados. Na análise pelo MEV, as hélices dos instrumentos
junto ao ponto de fratura não mostraram deformação plástica e a superfície de
fratura dos instrumentos exibiu características morfológicas de fratura do tipo
dúctil.
Para GARCIA et al. (2000), os resultados fornecidos pelo ensaio de
flexão rotativa podem variar com a temperatura, a velocidade da aplicação da
carga, os defeitos superficiais, as características microscópicas e,
principalmente, com a geometria da seção reta transversal da amostra.
Normalmente, aconselha-se um mínimo de seis corpos-de-prova para cada
amostra ensaiada.
Durante o uso clínico, é impossível controlar com segurança o número
de ciclos de carregamento e a intensidade das tensões na região de flexão de
um instrumento endodôntico. Todavia, isso pode ser minimizado: empregando
menor velocidade de giro; não deixando o instrumento permanecer por tempo
prolongado girando em canais radiculares curvos; não flambando o instrumento
no interior do canal radicular – isto ocorre quando se aumenta o carregamento
de tal modo que a velocidade de avanço imposta ao instrumento é maior do
que a sua velocidade de corte na direção apical; reduzindo o tempo de uso do
instrumento e aumentando a distância de avanço e retrocesso do instrumento
no interior de um segmento curvo de canal radicular, mantendo a velocidade de
avanço e giro constantes (LOPES & ELIAS, 2001).
PLOTINO et al. (2007), em seus estudos sobre a influência do
movimento de pincelamento na fadiga de instrumentos endodônticos de níquel-
34
titânio MTwo (Sweden & Martina, Padova, Itália) acionados a motor em canais
radiculares ovais deduziram que a fadiga dos instrumentos de diâmetros
maiores poderia ser reduzida pelo uso de uma pressão lateral ou movimento de
pincelamento. Entretanto, cada instrumento foi utilizado com sucesso sem que
ocorresse a fratura dentro do canal, demonstrando que os instrumentos MTwo
acionados a motor podem ser usados com segurança com uma ação de
pincelamento em condições clínicas simuladas até 10 vezes em canais ovais.
LI et al. (2002) observaram que avanços e retrocessos maiores
promoveram um maior tempo de vida útil do instrumento endodôntico, quando
este era empregado à mesma velocidade de avanço e retrocesso (1 mm/s) em
canais metálicos curvos. Segundo os autores, uma distância de avanço e
retrocesso maior no segmento curvo do canal propiciou ao instrumento
endodôntico um intervalo de tempo maior antes que ele passasse novamente
pela área crítica de maior concentração de tensão. Essa manobra tem como
objetivo evitar a concentração de tensão em uma determinada área do
instrumento.
MOREIRA (2006) avaliou a influência da esterilização e da
temperatura da solução irrigadora na resistência à fratura dos instrumentos
endodônticos de NiTi acionados a motor em flexão rotativa. Foram
confeccionados dois canais com 20 mm de comprimento e raio de curvatura de
6 mm, pela conformação de um tubo de aço inoxidável medindo 1,5 mm de
diâmetro interno. Um dos canais foi feito com 9,5 mm de parte curva,
correspondendo ao arco de 90º e o outro com 14 mm de parte curva relativa ao
arco de 135º. Durante os ensaios os instrumentos foram refrigerados com
35
solução de hipoclorito de sódio a 5,25% nas temperaturas de 10ºC e 25ºC. A
velocidade de rotação foi de 200 rpm. Os instrumentos foram inicialmente
esterilizados em autoclave e divididos em três conjuntos. No primeiro, eles
foram ensaiados até a fratura; no segundo, o ensaio foi interrompido na metade
da vida em fadiga, sendo os instrumentos esterilizados e em seguida girados
até a fratura. No terceiro, o ensaio foi interrompido duas vezes para
esterilizações em 1/3 e 2/3 da vida em fadiga, quando então os instrumentos
voltaram a serem ensaiados até a fratura. Os resultados obtidos permitiram
concluir que o aumento do número de ciclos de esterilização aumenta a
resistência à fratura dos instrumentos independente da marca. Os instrumentos
apresentaram maior resistência à fratura quando os ensaios foram realizados
com a irrigação a 10ºC. A análise por microscopia eletrônica de varredura de
todos os instrumentos não revelou deformações plásticas na haste helicoidal,
nem diferenças na superfície de fratura, que foi caracterizada como do tipo
dúctil. Além disso, foi proposto um modelo estatístico para a previsão da vida
em fadiga dos instrumentos endodônticos de NiTi ensaiados em flexão rotativa.
Durante o uso clínico, é impossível controlar com segurança o número
de ciclos de carregamento e a intensidade das tensões na região de flexão de
um instrumento. Todavia, isso pode ser minimizado: empregando menor
velocidade de giro; não deixando o instrumento permanecer por tempo
prolongado girando em canais curvos; não flambando o instrumento no interior
do canal radicular - isto ocorre quando se aumenta o carregamento de tal modo
que a velocidade de avanço imposta ao instrumento é maior do que a sua
velocidade de corte na direção apical; reduzindo o tempo de uso - quanto
36
menor o tempo de uso do instrumento, menor será o risco de fratura; e
aumentando a distância de avanço e retrocesso do instrumento no interior de
um segmento curvo de canal radicular, mantendo a velocidade de avanço e
giro constantes (LOPES & ELIAS, 2001).
Influência das variáveis relacionadas à anatomia dos canais na fratura em
flexão rotativa
Apesar da grande interferência que as diversas variáveis relacionadas
aos dispositivos mecânicos utilizados na instrumentação demonstraram possuir
na resistência à fadiga, é a curvatura dos canais que parece ser o fator de risco
mais importante na fratura dos instrumentos (PRUETT et al., 1997; ZELADA et
al., 2002; GÜNDAY et al., 2005; CHEUNG, 2009; ZHENG et al., 2009).
NECCHI et al. (2008) e PLOTINO et al. (2010) afirmam de forma mais
específica que a intensidade da curvatura e a posição do arco são as principais
características a serem consideradas na avaliação do risco de fadiga de um
instrumento.
As variações morfológicas do canal radicular têm sido investigadas
através de métodos variados como radiografias, técnicas de contraste, imagem
tridimensional por ressonância magnética, tomografia computadorizada ou até
mesmo microscopia eletrônica (WILLERSHAUSEN et al., 2008; ZHENG et al.,
2009).
O primeiro autor a propor um modelo de medida da intensidade da
curvatura foi SCHNEIDER (1971). A curvatura nesta proposta tem sua medida
37
aferida através do encontro de duas retas desenhadas através da imagem
radiográfica, a primeira é desenhada no longo eixo do canal radicular e a
segunda parte do forame apical e segue até o ponto onde o canal desvia do
longo eixo, no encontro das linhas a curvatura é medida em ângulo. Quanto
maior o ângulo, mais acentuada é a curvatura.
PRUETT et al. (1997) detectaram que dois canais com curvaturas
idênticas, medidas em ângulo pelo método de Schneider, poderiam ter raios e
intensidades diferentes devido ao comprimento do segmento do arco. Foi
proposto então que a curvatura passasse a ser medida não só por ângulo, mas
também por raio, conseguido através de um modelo matemático baseado na
imagem radiográfica.
Atualmente, é comprovado através de geometria, que os valores de
curvaturas de canais radiculares ou artificiais são melhor medidos pelos seus
raios ao invés de seus ângulos, uma vez que o ângulo assim medido pode
variar com o comprimento do segmento do arco da curva, sem, no entanto,
ocorrer a variação do raio da curva. Um exemplo bastante utilizado deste
método foi proposto por LOPES et al. (1998). Chamado de método geométrico,
este determina o valor do raio da curvatura pelo encontro das mediatrizes de
duas cordas da região de maior curvatura do canal e a classifica como suave,
quando o raio é maior ou igual a 20 mm; moderada, quando o valor do raio está
entre 10 e 20 mm; e severa, quando o raio da curvatura é menor que 10 mm.
Quanto maior o raio e menor o ângulo da curvatura, maior a
quantidade de ciclos que o instrumento de NiTi acionado a motor consegue
realizar antes da fratura por fadiga (PRUETT et al., 1997; HÄIKEL et al., 1999;
38
INAN et al., 2007; KITCHENS et al., 2007; NECCHI et al., 2008; PLOTINO et
al., 2010).
Os instrumentos tendem a fraturar no ponto mediano da curvatura
(PRUETT et al., 1997; SATTAPAN et al., 2000; MOREIRA et al., 2002).
Para MOREIRA et al. (2002), o tempo para ocorrer a fratura de
instrumentos endodônticos de NiTi acionados a motor de mesmo diâmetro sob
flexão em rotação é influenciado pelo comprimento do arco de um canal de
mesmo raio de curvatura. Em canais com arco menor, o tempo até a fratura do
instrumento foi significativamente maior do que em canais com arco maior. Isso
ocorreu porque nos canais com arco maior, o ponto máximo de flexão do
instrumento está localizado em sua parte de corte, em uma área de maior
diâmetro. A separação dos instrumentos sempre ocorreu junto ao ponto médio
do segmento curvo do canal.
Da mesma maneira LOPES et al. (2009) avaliaram a influência do
comprimento do segmento curvo dos canais (arco) e do número de ciclos
necessários para a fratura dos instrumentos de NiTi acionados a motor. Foram
utilizados instrumentos ProTaper F3 de 25 mm na velocidade de 250 rpm em
dois canais artificiais de aço inoxidável com 1,04 mm de diâmetro interno, 20
mm de comprimento e raio do arco de 6 mm. O arco do primeiro tubo com 9,4
mm de comprimento e a parte reta com 10,6 mm e o arco do tubo com 14,1
mm de comprimento e 5,9 mm de parte reta. Os resultados indicaram que o
comprimento do arco do canal influencia o número de ciclos necessários para
causar a fratura dos instrumentos. Quanto maior o arco, menores são o tempo
e o número de ciclos necessários para ocasionar a fratura.
39
Apesar do estudo de MALAGNINO et al. (1999) ter destacado a
importância da intensidade da curvatura, somente em 2008 foi citada pela
American Association of Endodontists a influência da posição da curvatura em
relação ao comprimento total do canal (AMERICAN ASSOCIATION OF
ENDODONTISTS, 2008).
NECCHI et al. (2008) realizaram estudo através de um modelo
computadorizado que simula o comportamento mecânico dos instrumentos de
NiTi acionados a motor atuando no canal radicular. Para tanto a geometria do
instrumento e diferentes tipos de canal radicular foram reproduzidos. O modelo
tridimensional do instrumento ProTaper F1 foi criado utilizando o software
Rhinoceros 2.0 (Robert Mc Neel & Associates, Washington, EUA). Três
parâmetros foram considerados para criar sete diferentes tipos de canais
radiculares, são eles: o raio de curvatura (2 mm, 5 mm), o ângulo da curvatura
(30º, 45º) e a posição do arco (segmento apical, segmento médio). Todos os
canais criados através de diferentes combinações dos parâmetros citados
possuem comprimento de 17 mm e diâmetro de 0,02 mm além do diâmetro da
lima. O carregamento sofrido pelo instrumento durante o procedimento clínico
(composto de contínua inserção e remoção do instrumento no canal) foi
estudado para avaliar o efeito da forma do canal nesta condição de fadiga em
flexão rotativa. Os resultados mostraram que a configuração mais crítica do
canal radicular ocorreu na combinação de raio de 2 mm, ângulo de 30º e arco
de curvatura posicionado no segmento cervical. As melhores condições para
utilização do instrumento apresentaram-se no canal com 5 mm de raio, 45º de
curvatura e arco no segmento apical. Os autores concluíram que o raio é a
40
principal característica da curvatura a ser considerada e a posição do arco
pode ser considerada o segundo parâmetro mais influente no nível de tensão
sofrida pelo instrumento durante o procedimento clínico.
Sistema BioRaCe
Para o presente trabalho foram selecionados os instrumentos do
sistema BioRaCe (FKG Dentaire, La Chaux-de-Founds, Suíça). O sistema
apresenta as mesmas características geométricas do sistema RaCe, são elas:
arestas de corte alternadas, ponta inativa, seção reta transversal triangular sem
guias radiais e tratamento eletroquímico da superfície. A diferença entre os dois
sistemas está na conicidade, no tamanho e na sequência dos instrumentos. A
proposta do sistema BioRaCe é alcançar a instrumentação do segmento apical
com ampliação mais adequada e com a nova sequência reduzir a área de
contato de cada instrumento com a parede do canal, aumentando a segurança
do procedimento (DEBELIAN & TROPE, 2008) .
O sistema BioRaCe é composto por dois grupos de instrumentos
comercializados em dois kits distintos: kit básico e kit estendido.
O kit básico apresenta seis instrumentos nominados em ordem de uso
na sequência de BR0 a BR5. O instrumento BR0 apresenta 19 mm de
comprimento útil, ponta com diâmetro de 0,25 mm e conicidade 0,08 mm/mm.
Está indicado pelo protocolo clínico do fabricante para ser utilizado na porção
mais coronária do canal radicular e ter apenas os 4 mm da parte de corte mais
distante da ponta em contato com as paredes do canal. O instrumento BR1
41
assim como todos os outros instrumentos do sistema apresenta 25 mm de
comprimento útil. BR1 apresenta ponta com 0,15 mm de diâmetro, conicidade
de 0,05 mm/mm e está indicado para trabalhar com a porção mediana da parte
de corte em contato com as paredes do canal radicular. O instrumento BR2
possui ponta diâmetro 0,25 mm, conicidade de 0,04 mm/mm e é o primeiro
instrumento indicado pelo fabricante para trabalhar na porção apical do conduto
radicular. Se a anatomia do canal permitir será utilizado depois deste
instrumento o BR3, que possui o mesmo diâmetro 0,25 mm na ponta e uma
conicidade maior com 0,06 mm/mm. Os instrumentos BR2 e BR3 têm por
finalidade ampliar o segmento cervical e médio do canal permitindo que os
instrumentos seguintes da sequência trabalhem livres na porção apical do
conduto. O instrumento BR4 apresenta ponta diâmetro 0,35 mm com
conicidade 0,04 mm/mm e o instrumento BR5 apresenta ponta diâmetro 0,40
mm com a mesma conicidade de 0,04 mm/mm. Ambos apresentam conicidade
menor que a do instrumento BR3 e têm por finalidade a ampliação do
segmento apical do canal (DEBELIAN & TROPE, 2008).
O kit estendido apresenta quatro instrumentos, dois deles indicados
para instrumentar canais com curvaturas severas, são eles: BR4C e BR5C. Os
outros dois instrumentos comercializados no kit têm por finalidade
complementar a instrumentação de canais radiculares com grande diâmetro e
são apresentados no sistema como BR6 e BR7 (DEBELIAN & TROPE, 2008).
Os instrumentos BR4C e BR5C são necessários quando o instrumento
BR3 do kit básico tem dificuldade de alcançar o comprimento de trabalho em
um canal com curvatura acentuada. Estes dois instrumentos do kit estendido
42
apresentam conicidade de 0,02 mm/mm. O instrumento BR4C apresenta ponta
diâmetro 0,35 mm enquanto o BR5C apresenta ponta diâmetro 0,40 mm
(DEBELIAN & TROPE, 2008).
Os instrumentos BR6 e BR7 são necessários quando o instrumento
BR5 do kit básico possui diâmetro suficiente para a limpeza das paredes do
canal. O instrumento BR6 apresenta ponta diâmetro 0,50 mm e conicidade 0,04
mm/mm enquanto o BR7 apresenta ponta diâmetro 0,60 mm com conicidade
de 0,02 mm/mm (DEBELIAN & TROPE, 2008).
Para o experimento realizado neste trabalho foram selecionados os
instrumentos do tipo BR5C.
43
PROPOSIÇÃO
Este trabalho, empregando instrumentos de níquel-titânio acionados a
motor BR5C do sistema BioRaCe (FKG Dentaire, La Chaux-de-Fonds, Suíça),
teve como objetivos:
1- Avaliar a influência da posição do arco em canais artificiais, no
número de ciclos até a fratura por fadiga.
2- Analisar, por meio de microscopia eletrônica de varredura a
superfície de fratura e a configuração das hélices das hastes de
corte dos instrumentos.
44
MATERIAIS E MÉTODOS
Seleção dos instrumentos
Para este estudo foram utilizados 20 instrumentos endodônticos de NiTi
do tipo BR5C do sistema BioRaCe (FKG Dentaire, La Chaux-de-Fonds, Suíça).
Este instrumento apresenta valores nominais com diâmetro D0 ISO 0,40 mm,
conicidade de 0,02 mm/mm e comprimento útil de 25 mm. A amostra foi dividida
em dois grupos, cada qual com 10 elementos, escolhidos aleatoriamente. Para
a confirmação do comprimento dos instrumentos, todos foram previamente
medidos com o objetivo de comparar os comprimentos dos segmentos
fraturados a partir da extremidade da ponta destes instrumentos. Os
comprimentos totais e das hastes de fixação foram medidos com o auxílio de
um paquímetro digital com resolução de 0,01 mm (Mitutoyo Sul-Americana Ltda,
Suzano, SP). A tolerância padrão ISO para variação no comprimento de um
instrumento é de 0,5 mm (LOPES & SIQUEIRA, 2004). Todas as medidas foram
aferidas duas vezes.
As medidas referentes aos comprimentos dos instrumentos foram
realizadas por meio das faces de medição externas do paquímetro. Os
comprimentos considerados de cada instrumento foram as médias aritméticas
dos valores obtidos (Anexo 1).
O comprimento útil (L), em milímetros dos instrumentos foi obtido por
meio da equação: L = comprimento total – comprimento da haste de fixação.
Com o objetivo de padronização das dimensões em relação ao
diâmetro e conicidade dos instrumentos, 10 elementos da amostra,
aleatoriamente escolhidos, tiveram seus diâmetros em D0 e conicidades
45
determinados (Anexo 2). A medição foi realizada com o mesmo paquímetro
digital com resolução de 0,01 mm (Mitutoyo Sul-Americana Ltda, Suzano, SP).
A conicidade foi determinada medindo-se os diâmetros da haste
helicoidal cônica de corte em D3 e D13 uma vez que STENMAN & SPANGBERG
(1993) afirmam que a conicidade de um instrumento endodôntico é obtida por
meio da diferença entre o diâmetro final e inicial de sua parte de corte dividido
pelo comprimento desta. Todavia, devido às dificuldades na definição do
diâmetro final e inicial da parte ativa, determina-se dois pontos nas
extremidades opostas da haste helicoidal do instrumento, neste caso a 3 mm e
13 mm da ponta. Nestes pontos, por causa da melhor definição da haste
helicoidal, o processo de medição é mais confiável (LOPES & SIQUEIRA,
2004). Inicialmente, a partir desses pontos são traçadas duas retas tangentes
aos vértices das hélices da parte superior e inferior da haste helicoidal. Essas
linhas são convergentes e os diâmetros são obtidos traçando-se uma
perpendicular ao eixo do instrumento nos pontos determinados na haste
helicoidal.
O diâmetro D0 de um instrumento endodôntico é definido como o
diâmetro projetado da conicidade da haste helicoidal na ponta do instrumento,
sendo, portanto virtual. Este diâmetro é obtido por meio da equação: D0 = D3 – C
x 3.
46
Ensaio de flexão rotativa
O número de ciclos suportados pelos instrumentos até a fratura foi
avaliado por meio de ensaio em flexão rotativa estático (Anexo 3). Todos o
instrumentos foram acionados na velocidade de 300 rpm.
O ensaio de flexão rotativa de instrumentos endodônticos consiste em
um instrumento girar no interior de um canal artificial curvo, acompanhando a
sua trajetória dentro do limite elástico do material. O canal artificial deve possuir
diâmetro maior do que o do instrumento a ser ensaiado (LOPES et al., 2009).
No presente estudo foram utilizadas duas canaletas metálicas (Figuras
1 e 2), usinadas a partir de dois blocos de aço inoxidável. A usinagem das
canaletas metálicas foi realizada em ferramentaria especializada, utilizando-se a
técnica de usinagem assistida por computador, com auxílio do equipamento
ROMI D 600 TGR® (Romi S.A, São Paulo, Brasil) (Figuras 3 e 4).
Figuras 1: Esquema para usinagem da canaleta em
bloco metálico com arco localizado no segmento médio
(grupo experimental 1).
47
Figuras 2: Esquema para usinagem da canaleta em
bloco metálico com arco localizado no segmento apical
(grupo experimental 2)
Figuras 3: Equipamento ROMI D 600 TGR®.
48
As canaletas foram confeccionadas em forma de U, com 2 mm de
profundidade e 1,5 mm de largura. O comprimento total das canaletas foi de 20
mm. Em ambas, a curvatura foi confeccionada com raio de 10 mm e
comprimento de arco de 10,46 mm, sendo variada a localização deste arco em
cada uma das canaletas. A usinagem foi programada de forma que a amplitude
da deformação máxima trativa e compressiva estivesse relacionada ao ponto
médio do segmento curvo da canaleta.
Na canaleta utilizada no grupo experimental 1, o arco estava localizado
no meio da canaleta, tendo os segmentos retos inicial e final 4,77 mm de
comprimento cada um. Na canaleta utilizada no grupo experimental 2, o arco
Figuras 4: Equipamento ROMI D 600 TGR®. Foto aproximada.
49
estava localizado na região apical da canaleta, tendo o segmento reto inicial
9,54 mm de comprimento e o final 10,46 mm.
A manutenção dos blocos metálicos em posição fixa durante o
experimento estático foi garantida pelo dispositivo proposto por MOREIRA
(2002), que permitiu a realização do experimento sem a influência do operador.
O dispositivo é composto de uma base quadrada de alumínio com 1 cm de
espessura e 20 cm de lado. Nesta base foram instalados 4 pilares de borracha
para evitar a vibração durante o acionamento do motor. Esta base recebeu dois
sulcos paralelos a fim de permitir que fosse acoplada uma morsa número 2 para
apreensão dos blocos metálicos. A morsa pode ser movimentada nestes dois
sulcos paralelos, e fixada com um parafuso de aperto manual, para permitir a
coincidência de eixos entre o instrumento e o canal artificial.
Perpendicularmente à base, foi fixado um prisma de náilon de 8 cm de altura e
base de 3,5 cm por 5 cm, sendo torneada a face superior do prisma, a fim de
neste ponto ser fixado o conjunto micromotor e contra- ângulo, por intermédio
de quatro parafusos. Estes parafusos constituíram um mecanismo regulável que
permitiu o movimento do conjunto facilitando a inserção do instrumento na
canaleta artificial, com o objetivo de que a trajetória vertical do instrumento
instalado na peça de mão coincidisse com o eixo longitudinal da parte reta do
canal artificial (Figura 5).
Em frente a cada canaleta, uma placa acrílica transparente de 2 mm de
espessura foi parafusada, permitindo a visualização enquanto cada instrumento
estivesse girando no interior das canaletas.
50
Durante o ensaio, a canaleta de aço inoxidável foi preenchida com
glicerina líquida através de uma agulha acoplada a uma seringa de 10 cc com o
objetivo de reduzir o atrito do instrumento com a parede do canal e a liberação
de calor. Cada instrumento foi posicionado em um contra-ângulo com redução
6:1 (Sirona, Chicago, Estados Unidos da América) e introduzido no canal a
partir do segmento reto maior até a ponta tocar em um anteparo posicionado na
extremidade do canal. Este anteparo era a seguir removido e tinha como
objetivo apenas padronizar a distância de penetração do instrumento no interior
do canal.
Figura 5: Dispositivo proposto por MOREIRA (2002) para
manutenção do conjunto contra-ângulo e bloco metálico
fixo durante o experimento.
51
A seguir, os instrumentos foram acionados com rotação à direita na
velocidade nominal de 300 rpm por meio de um motor elétrico VDW Silver
(VDW, Munique, Alemanha), até ocorrer a fratura dos instrumentos.
Durante o acionamento dos instrumentos nas canaletas artificiais, o
trabalho dos mesmos foi gravado em vídeo sob magnificação, empregando-se
uma câmera de vídeo Sony® acoplada ao divisor de luz de um microscópio
clínico CEMAPO (CEMAPO, São Paulo, Brasil), utilizando-se aumentos de 6 a
10x no equipamento.
Esta providência permitiu obter o exato momento da fratura do
instrumento, podendo-se registrar precisamente quanto tempo ocorreu até que
houvesse a sua fratura pelo cronômetro disponível no visor da câmera (Anexo
4). A seguir, os segmentos fraturados foram medidos com o paquímetro para
determinar a distância do topo da haste de fixação até o traço de fratura (Anexo
5). As distâncias da extremidade apical do instrumento ao ponto onde ocorre a
fratura foram obtidas por subtração.
O número de ciclos foi obtido pela multiplicação da velocidade de
rotação pelo tempo decorrido, em segundos, até a fratura em flexão rotativa de
cada instrumento.
Os valores obtidos quanto ao número de ciclos até a fratura dos
instrumentos foram submetidos à análise estatística por meio de teste
paramétrico t-Student.
Após a fratura, os segmentos maiores dos instrumentos foram
acondicionados em frascos contendo acetona, aguardando o momento
oportuno para análise por meio do MEV.
52
Três segmentos fraturados de cada grupo, selecionados
aleatoriamente, foram submetidos à limpeza em unidade ultra-sônica. A
amostra selecionada foi acondicionada em frascos de Becker contendo
acetona e em seguida depositada no cesto da unidade ultra-sônica contendo
água, operando em 40khz a um tempo de ação de 12 minutos.
A seguir os instrumentos de cada grupo foram fixados em um porta-
amostra e observados no MEV (JEOL, modelo ISM 5800IV, Tóquio, Japão) por
meio da análise da superfície de fratura e a configuração das hastes de corte
helicoidais adjacentes ao ponto de imobilização (fratura).
Os instrumentos foram fotomicrografados e as imagens gravadas para
posterior análise. Durante a obtenção das fotomicrografias adotou-se aumentos
diferenciados para a observação da superfície de fratura e da configuração as
hastes de corte helicoidais junto ao ponto de fratura.
53
RESULTADOS
Dimensões dos instrumentos BR5C
As médias das dimensões dos instrumentos endodônticos de níquel-
titânio acionados a motor, denominados BR5C do sistema BioRaCe, avaliados,
estão representados nas Tabelas 1, 2 e 3.
Tabela 1 - Média e desvio-padrão dos comprimentos úteis (mm) dos
instrumentos BR5C antes da fratura.
Tabela 2 - Média dos diâmetros (mm) e das conicidades (mm/mm) de
10 instrumentos BR5C selecionados aleatoriamente.
Instrumentos Comprimento útil (mm)
Grupo experimental Número de
elementos Nominal Obtido
Desvio-
padrão
Grupo 1
Arco segmento médio 10 25 24,68 0,1476
Grupo 2
Arco segmento apical 10 25 24,75 0,1179
Instrumentos Diâmetro (mm) e Conicidade (mm/mm)
Número de instrumentos D0 D3 D13 Conicidade
10 0,40 0,46 0,66 0,02
54
Todos os instrumentos aferidos ficaram dentro dos limites de
padronização ISO 3630-1/1992 que determina tolerância de +/- 0,5 mm para
comprimento e tolerância de +/- 0,02 mm para D0 do instrumento. Destes
instrumentos, três foram selecionados para análise por microscopia eletrônica
de varredura. Os instrumentos apresentaram ponta cônica circular com vértice
arredondado e transição elipsóide da base da ponta para a aresta de corte
(Figura 6 e 7), alternância do fio de corte e superfície polida que reduz defeitos
no acabamento superficial apesar de não eliminá-los por completo (Figuras 8 e
9).
Figura 6: Instrumento BR5C do sistema BioRaCe.
Figura 7: Ponta do instrumento BR5C (100x).
55
Figura 8: Haste de corte do instrumento BR5C (150x).
Figura 9: Transição da haste de corte para
intermediária do instrumento BR5C (90x).
56
Tabela 3 - Média e desvio-padrão dos comprimentos (mm) dos segmentos
fraturados dos instrumentos ensaiados
Durante a análise no MEV, não se observou deformação plástica na
haste helicoidal dos instrumentos fraturados.
A morfologia da superfície de fratura apresentou característica do tipo
dúctil (Figuras 10 e 11). A morfologia da superfície de fratura foi plana, quando
a trinca se propagou ao longo de um plano ou apresentou degraus, quando a
trinca se propagou simultaneamente em planos diferentes devido a múltiplos
locais de origem. A haste de corte helicoidal apresentou ranhuras com
diferentes profundidades advindas do processo de usinagem. Junto à superfície
de fratura observaram-se inúmeras trincas localizadas na profundidade
(depressão) das ranhuras presentes na superfície da haste de corte helicoidal.
Instrumentos Comprimento (mm)
Grupo experimental Número de
elementos Média (mm) Desvio-padrão
Grupo 1
Arco segmento médio 10 12,07 1,5840
Grupo 2
Arco segmento apical 10 6,71 1,0806
57
A
B
Figuras 10 A (170x) e B (1000x): Superfície de fratura
de instrumento do grupo experimental 1 – segmento
curvo na porção média do canal.
58
Figuras 11 A (200x) e B (1000x): Superfície de fratura
de instrumento do grupo experimental 2 – segmento
curvo apical do canal.
A
B
59
Ensaio de flexão rotativa
Os dados relativos ao ensaio de flexão rotativa utilizando os
instrumentos BR5C são apresentados nas Tabelas 4 e 5.
Tabela 4 – Tempo em segundos até a fratura dos instrumentos: média
e desvio-padrão por grupo
O número de ciclos até a fratura dos instrumentos foi obtido pela
multiplicação da velocidade de rotação pelo tempo decorrido, em segundos, até
a fratura em flexão rotativa de cada instrumento.
Tabela 5 – Número de ciclos necessários até a fratura do instrumento
(NCF): média e desvio-padrão por grupo
Instrumentos Tempo(s)
Grupo experimental Número de
elementos Média (s) Desvio-padrão
Grupo 1
Arco segmento médio 10 137,5 22,1272
Grupo 2
Arco segmento apical 10 485,5 85,7325
Instrumentos NCF
Grupo experimental Número de
elementos Média Desvio-padrão
Grupo 1
Arco segmento médio 10 687,5 110,6358
Grupo 2
Arco segmento apical 10 2427,5 428,6623
60
Análise estatística do ensaio de flexão rotativa
O teste t-student com significância de 1% foi aplicado através do
programa BioEstat 5.0 para comparação do NCF dos grupos 1 e 2. Houve
diferença estatisticamente significante (p<0,0001) nos resultados.
Os resultados obtidos mostraram que os instrumentos BR5C quando
acionados em canal com arco no segmento apical fraturaram com valor médio
de ciclos maior do que quando foram acionados em canal com arco em
segmento médio.
61
DISCUSSÃO
Considerações gerais
Este estudo buscou avaliar a influência da posição do arco para
ocorrer a fratura dos instrumentos BR5C do sistema BioRaCe em canal artificial
curvo submetido à ensaio de flexão rotativa estático. Também analisou por
meio de microscopia eletrônica de varredura as superfícies de fraturas
ocorridas nos ensaios de flexão rotativa, assim como a configuração das
hastes de corte helicoidais dos instrumentos fraturados.
SERENE et al. (1995), LOPES & ELIAS (2001) e PLOTINO et al.
(2009) relataram que o principal questionamento quanto à utilização de
instrumentos endodônticos de NiTi acionados a motor está relacionado à
fratura. A fratura do instrumento endodôntico de níquel-titânio acionado a motor
ocorre por um carregamento em torção, por um carregamento em flexão
rotativa ou pela combinação destes. Estes autores acrescentaram que a fratura
por torção acontece quando, durante o avanço do instrumento no interior do
canal radicular, sua ponta fica imobilizada total ou parcialmente e na outra
extremidade é aplicado um torque superior ao limite de resistência à fratura do
material. A fratura por flexão rotativa ocorre quando o instrumento no interior de
um canal radicular curvo fica submetido à uma deformação elástica devido às
forças de resistência das paredes do canal e, com o giro do instrumento, na
área flexionada surgem tensões alternadas de tração e compressão. PRUETT
et al. (1997) acrescentaram que a fratura por fadiga pode ocorrer abaixo do seu
limite elástico, sem quaisquer sinais visíveis de deformação plástica prévia em
instrumentos usados.
62
De acordo com SATTAPAN et al. (2000), durante o uso clínico dos
instrumentos endodônticos de NiTi acionados a motor no preparo de canais
radiculares curvos, a fratura por torção ocorreu em 55,7% dos instrumentos e
por flexão rotativa em 44,3%. Entretanto, WEI et al. (2007) observaram em um
estudo clínico que a fratura de instrumentos endodônticos de NiTi acionados a
motor por fadiga ocorreu em 91% dos casos, por torção em apenas 3% e por
combinação de tensões (torção e flexão) em 6% dos casos. CHEUNG et al.
(2005) relataram que 93 % das fraturas dos instrumentos parecem ocorrer em
fadiga por flexão rotativa.
Segundo LOPES et al. (2000), a resistência à fratura dos metais e
ligas metálicas é proporcional às forças de coesão entre seus átomos. Apesar
de ser possível calcular-se a resistência mecânica teórica com base nas forças
de ligações interatômicas, esse valor tem pouca aplicação prática, uma vez que
a resistência real é da ordem de 100 a 10.000 vezes inferior à teórica
calculada. A razão dessa diferença está associada à presença de defeitos nos
materiais. BROEK (1986) acrescenta ainda que não existe material sem
defeito.
LOPES et al. (2000) e LOPES & ELIAS (2001) relataram que os
instrumentos endodônticos, por apresentarem geometrias complicadas com
variações bruscas de dimensões, são difíceis de serem produzidos. Assim
sendo, possuem um grande número de defeitos superficiais advindos das
ferramentas de usinagem que funcionam como pontos concentradores de
tensão. Além disso, durante a instrumentação de um canal radicular, os
instrumentos endodônticos são submetidos a um severo estado de tensão e de
63
deformação que varia com a anatomia do canal e com o conhecimento e
habilidade do profissional. Nessa fase, os instrumentos sofrem carregamentos
extremamente adversos que modificam continuamente sua resistência à torção
e à flexão. Portanto, devemos buscar o máximo de uniformização em relação à
geometria (forma e dimensões) das amostras quando do uso de instrumentos
endodônticos em ensaios mecânicos. GALL et al. (2001) mencionam que a
fratura pode ocorrer após uma deformação relativamente pequena em
materiais com geometrias complicadas onde ocorre severa concentração de
tensão. LOPES et al. (2000), analisando por meio da microscopia eletrônica de
varredura a superfície de instrumentos endodônticos, observaram a presença
de marcas de usinagem, rebarbas e regiões com redução abrupta de diâmetros
e outros defeitos que funcionam como pontos concentradores de tensão
induzindo a falha destes instrumentos com níveis de tensão abaixo do
esperado. KUHN et al. (2001) citaram que o acabamento superficial dos
instrumentos endodônticos é um importante fator na fratura dos instrumentos.
Aconselharam ainda que o polimento eletrolítico poderia reduzir os defeitos
advindos do processo de fabricação e melhorar o comportamento mecânico
dos instrumentos, quando submetidos a carregamentos durante o uso clínico.
Instrumentos selecionados – BR5C
Os instrumentos endodônticos de níquel-titânio mecanizados
selecionados para este trabalho foram os alargadores (limas endodônticas)
BR5C de valores nominais de 25 mm de comprimento útil, de 0,40 mm de
diâmetro em D0 e conicidade de 0,02 mm/mm.
64
A proposta de utilização do Sistema BioRaCe parece não ter
antecedentes na literatura no que diz respeito a estudos sobre fratura por
fadiga. O instrumento BR5C deste sistema é indicado para trabalhar em canais
com curvatura acentuada, razão esta que justificou a escolha deste instrumento
para o presente estudo.
Os instrumentos endodônticos empregados nesse estudo não foram
previamente analisados por microscopia eletrônica de varredura quanto à
presença de possíveis defeitos acentuados nas partes de trabalho (ponta e
haste helicoidal), oriundos do processo de fabricação (usinagem), porque,
segundo LOPES et al. (2000) e KUHN et al. (2001), sabe-se que os
instrumentos endodônticos apresentam complexidade de forma e acabamento
superficial com grande número de defeitos que atuam como pontos
concentradores de tensão.
As dimensões dos instrumentos endodônticos foram obtidas com o
emprego de um paquímetro digital com resolução de 0,01 mm. A norma ISO
3630-1/1992 determina um limite de tolerância centesimal para medida das
dimensões do instrumento endodôntico. Uma vez que não é exigida tolerância
milesimal para esta medição, o paquímetro torna-se opção viável de
instrumento de aferição, com já citado em LOPES et al. (2009).
Avaliando as dimensões dos instrumentos endodônticos estudados, foi
possível observar que todos apresentaram valores dentro da especificação
com tolerância de +/- 0,5 mm para comprimento e +/- 0,02 mm para D0 (ISO
3630-1, 1992). A mesma norma cita que o comprimento mínimo do segmento
cônico da haste metálica de um instrumento endodôntico são 16 mm sem um
65
valor máximo especificado. Os resultados deste estudo mostraram que todos
os instrumentos endodônticos selecionados apresentaram valores dentro da
especificação. Os instrumentos que apresentaram medidas discrepantes das
especificadas pela norma, com relação à tolerância, foram substituídos. Este
procedimento permitiu o emprego de instrumentos com maior homogeneidade,
fato esse que se torna relevante a partir do momento em que a discrepância
entre as dimensões de instrumentos de uma mesma numeração e de um
mesmo fabricante pode interferir diretamente nos resultados obtidos nos
ensaios mecânicos (LOPES & SIQUEIRA, 2010).
Segundo GARCIA et al. (2000) e ELIAS & LOPES (2007), o número de
elementos da amostra aconselhável quando se usa corpos-de-prova
padronizados são no mínimo seis. Mesmo tendo os instrumentos endodônticos
selecionados valores dimensionais dentro da especificação, isso se justifica,
pelo fato das normas vigentes na Odontologia permitirem limites de tolerância
elevados, além disso, os instrumentos endodônticos apresentam acabamento
superficial com grande número de defeitos oriundos do processo de fabricação
(usinagem) que atuam como pontos concentradores de tensão, os quais
podem influenciar os resultados obtidos, de acordo com LOPES et al. (2000) e
KUHN et al. (2001). Diante disso é utilizada uma amostragem maior, de um
mínimo de dez espécimes.
Ensaio de flexão rotativa
Na realização de ensaios mecânicos, principalmente quando do
emprego de instrumentos ou produtos acabados, torna-se necessário o uso de
66
dispositivos específicos para a realização do ensaio proposto. É importante
ressaltar que esses dispositivos não devem incorporar variáveis durante a
realização do ensaio que possam influenciar a interpretação dos resultados
obtidos.
Os ensaios mecânicos de laboratório não retratam os carregamentos
reais dos instrumentos endodônticos durante a instrumentação de canais
radiculares de dentes humanos, entretanto, são empregados nos ensaios por
flexão rotativa para avaliação do número de ciclos suportado pelo instrumento
endodôntico até a fratura. Estes valores são fundamentais no estudo
comparativo das propriedades mecânicas e da resistência à fratura entre os
diversos instrumentos, na seleção da liga metálica usada na fabricação do
instrumento e para o ajuste de motores elétricos quanto ao torque e a
velocidade de giro. Além disso, podemos afirmar que os ensaios mecânicos de
laboratório fornecem valores de comparações entre os instrumentos
endodônticos avaliados que podem ser aplicados durante a instrumentação de
canais radiculares, uma vez que em laboratório é possível padronizar as
condições de trabalho dos instrumentos, o que é impossível em condições
clínicas.
PLOTINO et al. (2009) revisaram os principais métodos de ensaio
mecânico para testar fadiga propostos nas duas últimas décadas e concluíram
que as diferenças na metodologia afetam o comportamento em fadiga.
Propõem que uma padronização internacional para o ensaio de fadiga cíclica
dos instrumentos de NiTi acionados a motor com a finalidade de uniformizar a
metodologia e comparar resultados.
67
O ensaio de flexão rotativa pode ser considerado estático ou dinâmico.
É considerado estático quando um instrumento endodôntico gira no interior de
um canal artificial curvo permanecendo numa mesma distância, ou seja, sem
deslocamento longitudinal de avanço e retrocesso (PRUETT et al., 1997;
HAIKEL et al., 1999; LOPES et al., 2007). Quando o instrumento endodôntico,
durante o ensaio, é movimentado longitudinalmente, é considerado dinâmico
(LI et al., 2002; YAO et al., 2006).
A escolha do ensaio de flexão rotativa estático teve por finalidade
eliminar variáveis (avanço e retrocesso do instrumento) de difíceis
padronizações advindas do ensaio mecânico dinâmico que poderiam interferir
nos resultados.
O ensaio de flexão rotativa estático consistiu em submeter os
instrumentos endodônticos a girar no interior de um canal artificial curvo até a
fratura, sendo assim considerado um ensaio estático destrutivo. Vários fatores
têm influência na fratura dos instrumentos endodônticos submetidos à flexão
rotativa, dentre os quais podemos destacar a capacidade e o conhecimento do
operador; o desenho, o diâmetro, a conicidade e o comprimento do
instrumento, a velocidade de giro e tempo aplicados, a anatomia do canal
radicular - levando-se em consideração o raio de curvatura, o comprimento e a
localização do arco e a interação mecânica do instrumento com as paredes do
canal que podem induzir tensões de torção no instrumento endodôntico
(LOPES et al., 2009). Assim sendo, planejamos a realização do ensaio de
flexão rotativa estático de modo a eliminar a interferência do operador, manter
constante as velocidades de rotação, padronizar a geometria do canal artificial
68
quanto ao comprimento total do canal, comprimento do raio de curvatura e
comprimento do arco e também utilizar instrumentos endodônticos com
dimensões padronizadas.
O dispositivo de fixação no ensaio de flexão rotativa estático foi o
descrito por MOREIRA et al. (2002). Este dispositivo teve como objetivo
principal eliminar a interferência do operador na indução de tensões sobre os
instrumentos endodônticos durante a execução do ensaio. Esta preocupação
foi demonstrada também por outros autores, tais como: PRUETT et al. (1997),
HAIKEL et al. (1999), GABEL et al. (1999), DIETZ et al. (2000), LI et al. (2002),
BAHIA (2004) e KITCHENS et al. (2007).
De acordo com TOBUSHI et al. (1998), o ensaio de flexão rotativa é
um método eficaz para determinar o comportamento em fadiga dos
instrumentos endodônticos de níquel-titânio.
Para PLOTINO et al. (2009) o ensaio mecânico para avaliação da
fadiga apesar de eficiente deve sofrer uma padronização internacional quanto a
metodologia para que seja possível comparar resultados entre estudos
distintos, uma vez que as variáveis de diferentes metodologias afetam os
resultados.
Com o emprego de canais artificiais é possível padronizar o
comprimento do canal, o comprimento do raio e a localização e o comprimento
do arco. Esta padronização do canal artificial eliminou variáveis que poderiam
interferir nos resultados referentes aos objetivos propostos neste trabalho.
O canal artificial de aço inoxidável tinha canaleta com diâmetro interno
de 1,5 mm que permitiu ao instrumento endodôntico girar com liberdade no
69
interior do tubo, eliminando assim o carregamento por torção. O raio de 10 mm
selecionado para os dois canais artificiais do presente estudo foi anteriormente
utilizado em estudo de PRUETT et al. (1997). Na seqüência dos ensaios, o
canal era preenchido com uma solução química lubrificante, glicerina líquida. A
glicerina, por ser hidrossolúvel, foi a solução química de escolha, com a
finalidade de lubrificar o canal artificial para amenizar o atrito e a geração de
calor. O uso de soluções químicas com atividade solvente e antimicrobiana não
foi indicado pelo fato de termos trabalhado em um canal artificial de aço
inoxidável.
GABEL et al. (1999), SATTAPAN et al. (2000), DAUGHERTY et al.
(2001) e WEI et al. (2007) com a finalidade de estudar a fratura de
instrumentos endodônticos acionados a motor, utilizaram dentes naturais
humanos e não canais artificiais, na tentativa de aproximação das condições
clínicas de uso dos instrumentos.
Segundo PEREIRA et al. (2004), ao utilizarmos canais radiculares de
dentes humanos verifica-se a enorme diversidade de forma, extensão, volume
e direção dos mesmos, o que dificulta o controle das variáveis, podendo
influenciar os resultados.
Para LOPES & SIQUEIRA (2004), em canais radiculares de dentes
humanos é impossível controlar com segurança a intensidade das tensões na
região de flexão rotativa do instrumento. Além do mais, haverá sempre a
combinação de tensões por flexão rotativa e por torção.
Diante das dificuldades de se obter e padronizar dentes extraídos com
configurações semelhantes para um estudo comparativo optou-se pelo
70
emprego de canais artificiais. Com estes canais, durante os ensaios de
laboratório, podemos submeter os instrumentos endodônticos a um único tipo
de carregamento, eliminando a combinação de tensões que ocorrem com o
emprego de canais radiculares de dentes humanos. Todavia, os resultados
obtidos de ensaios de laboratório devem ser criteriosamente interpretados, e
sua extrapolação para o emprego clínico deve ser cautelosa.
Para PLOTINO et al. (2009) o modelo ideal de metodologia para
ensaio mecânico de fadiga seria com a instrumentação de canais curvos em
dentes naturais. Entretanto, neste tipo de ensaio, o dente somente pode ser
utilizado uma vez, já que a forma do canal radicular muda durante a
instrumentação, tornando impossível a padronização das condições
experimentais.
Para PLOTINO et al. (2010) pequenas variações nos parâmetros
geométricos do canal artificial têm influência nos resultados dos ensaios
mecânicos de fadiga, uma vez que o estudo realizado com canais artificiais de
configurações diferentes, apesar de apresentarem os mesmos valores de
curvatura, suas dimensões influenciaram a trajetória dos instrumentos de
maneiras distintas, levando à diferenças nos resultados.
A conclusão de que a configuração do canal, principalmente o
diâmetro, interfere na trajetória do instrumento foi previamente relatada por
CAMPOS (2004). O autor confeccionou um canal artificial em um bloco de vidro
com 20 mm de comprimento, 1 mm de diâmetro, segmento curvo na porção
apical com raio de 5 mm e comprimento do arco de 10 mm. Após confecção do
71
canal foi introduzido instrumento endodôntico de NiTi e foi realizada radiografia.
Observou-se que o raio de curvatura do instrumento passou a 6,5 mm.
A resistência à fratura de um instrumento endodôntico de NiTi
acionado a motor, quando submetido a um carregamento por flexão rotativa,
tem sido quantificada pelo tempo decorrido até a falha (HAIKEL et al., 1999).
Para outros autores, o tempo decorrido até a falha está relacionado à
velocidade de rotação imposta no instrumento, sendo que a probabilidade de
ocorrer a fratura é menor quando os instrumentos endodônticos são acionados
à velocidades mais baixas (GABEL et al., 1999; DIETZ et al., 2000;
DAUGHERTY et al., 2001; YARED et al., 2001).
Entretanto, a resistência à fratura por fadiga é quantificada pelo
número de ciclos que um instrumento endodôntico é capaz de resistir em uma
determinada condição de carregamento. O número de ciclos é obtido pela
multiplicação do tempo para ocorrer a fratura pela velocidade de rotação
empregada no ensaio (FIFE et al., 2004; YAO et al., 2006; HANI et al., 2007). O
número de ciclos é cumulativo e está relacionado à intensidade das tensões
trativas e compressivas impostas na região de flexão de um instrumento. A
intensidade das tensões é um parâmetro específico e está relacionado ao raio
de curvatura do canal radicular, ao comprimento do arco e ao diâmetro do
instrumento empregado (PRUET et al., 1999; ELIAS & LOPES, 2007).
Para ensaios realizados dentro de uma mesma condição de
carregamento, a velocidade de rotação não tem influência significativa sobre o
número de ciclos para a fratura do instrumento endodôntico. Isto porque
velocidades maiores reduzem o tempo requerido para alcançar o número de
72
ciclos até a fratura (CETLIN et al., 1988; COURTNEY et al., 1990; PRUETT et
al., 1997; ZELADA et al., 2002; PARASHOS & MESSER, 2006; KITCHENS et
al., 2007).
LOPES et al. (2009) demonstraram que o aumento da velocidade de
rotação diminui o número de ciclos para a fratura do instrumento de NiTi
acionado a motor.
Para EGGELER et al. (2004), o efeito da velocidade de rotação na
fratura de um corpo-de-prova de níquel-titânio está relacionado à produção de
calor durante a formação da martensita induzida por tensão. Para formar
martensita, a interface austenita-martensita precisa de um movimento que
dissipa energia e produz calor. Velocidades maiores produzem mais calor que
velocidades mais baixas e com isso aumentam mais rapidamente a
temperatura do corpo-de-prova, que leva ao rápido aumento de tensão na
superfície fazendo com que a fratura por fadiga ocorra precocemente.
Para NASSER & GUO (2006), a movimentação da interface austenita-
martensita é de fundamental importância para a nucleação e o crescimento da
trinca (fratura) por fadiga.
Apesar da importância das variáveis relacionadas aos mecanismos de
instrumentação são as variações morfológicas do canal radicular que
demonstram possuir maior interferência na resistência à fadiga (PRUETT et al.
,1997; ZELADA et al. ,2002; GÜNDAY et al. ,2005; ZHENG et al. ,2009;
CHEUNG, 2009).
73
NECCHI et al. (2008) e PLOTINO et al. (2010) afirmam que o raio de
curvatura e a posição do arco são as principais características a serem
consideradas na avaliação do risco de fadiga de um instrumento endodôntico.
PLOTINO et al. (2010) afirmam que a configuração do canal artificial
influencia a trajetória do instrumento afetando os resultados dos testes de
resistência à fadiga.
As conclusões de interferência da localização da curvatura alcançadas
no trabalho de NECCHI et al. (2008) foram calcadas em experimento utilizando
modelo de computador. O modelo tridimensional do instrumento ProTaper F1
foi criado utilizando-se o software Rinoceros 2.0 e sua utilização foi simulada
em modelos computadorizados de canais radiculares com 17 mm de
comprimento e diâmetro de 0,02 mm além do diâmetro do instrumento, em sete
combinações diferentes dos parâmetros de raio (2 mm e 5 mm), ângulo de
curvatura (30º e 45º) e posição do arco (segmento médio, segmento apical). Os
autores afirmam que a principal vantagem do modelo computadorizado é a
possibilidade de avaliar alguns aspectos do comportamento mecânico dos
instrumentos, principalmente a distribuição dos carregamentos sofridos no
interior dos canais radiculares. Estes carregamentos possuem grande
influência na fratura por fadiga, mas são difíceis de serem analisados em
laboratório ou em testes in vivo. Os próprios autores admitem a necessidade de
complementação das conclusões alcançadas através desta metodologia com
estudos que reproduzam as condições clínicas de uso do instrumento.
A necessidade de verificar a influência da posição de um arco de
mesmo comprimento e raio o número de ciclos até a fratura de um instrumento
74
endodôntico de NiTi, propósito do presente estudo, também foi mencionada por
alguns autores (NECCHI et al.,2008; PLOTINO et al., 2010). Diversos trabalhos
têm avaliado o efeito do raio de curvatura (PRUETT et al., 1997; INAN et al.,
2007; CHEUNG, 2009), do comprimento do arco (LOPES et al., 2007; LOPES
et al., 2009) e da forma e diâmetro do canal artificial (PLOTINO et al., 2009;
PLOTINO et al., 2010). Portanto, os resultados do nosso estudo preenchem,
em grande parte a lacuna a respeito da interferência da posição do arco na
fratura em flexão rotativa.
Com relação ao número de ciclos até ocorrer a fratura do instrumento
verificamos que foi menor quando o arco estava deslocado para o segmento
médio do canal em comparação a ao arco situado no segmento apical do
canal. Devido ao fato de terem sido eliminadas diversas variáveis neste
trabalho, principalmente o raio e o comprimento do arco, podemos afirmar que
estas diferenças em relação ao número de ciclos até ocorrer a fratura do
instrumento BR5C devem-se à posição do arco.
Todavia, é preciso ressaltar que o número de ciclos até a fratura
também é influenciado pela geometria (forma e dimensões) do canal artificial.
Enfatiza-se ainda, conforme já mencionado por alguns autores (MOREIRA et
al., 2002; CAMPOS, 2004; PLOTINO et al., 2009) que o comprimento do arco e
o valor do raio de um instrumento endodôntico no interior de um canal artificial
cilíndrico não são os mesmos do canal artificial. A diferença entre a geometria
do canal e a do instrumento é mais acentuada quanto maior for o diâmetro do
canal artificial em relação ao diâmetro do instrumento.
75
Reconhecendo esta afirmativa, PLOTINO et al., ( 2007) e PLOTINO et
al., (2009) têm proposto que o diâmetro interno do canal artificial seja 0,2 mm
maior do que o do instrumento a ser testado, o que parece minimizar estas
variáveis decorrentes da relação entre o diâmetro do instrumento / diâmetro do
canal.
A diferença estatística observada entre o número de ciclos até a
fratura dos instrumentos quando acionados em canais artificiais tendo o arco
posicionado no segmento médio ou apical pode ser explicada pelo fato do
ponto de maior concentração de tensão trativa e compressiva do instrumento
ao girar no interior de um canal com um segmento curvo varia em função da
posição do arco.
Assim, empregando-se instrumentos endodônticos de mesmo diâmetro
nominal, nos canais com arco posicionado para o segmento médio (grupo
experimental 1), o ponto crítico de concentração de tensão ficará situado em
uma região de maior diâmetro da haste de corte helicoidal cônica do
instrumento do que nos canais onde o arco está posicionado para apical.
Consequentemente, quanto maior o diâmetro no ponto crítico de concentração
de tensão trativa e compressiva menor será o número de ciclos até a fratura
por fadiga do instrumento (PRUETT et al., 1997; MOREIRA et al., 2002;
LOPES et al., 2007; LOPES et al., 2009).
Calculando-se os diâmetros dos segmentos fraturados a partir da
extremidade dos instrumentos temos para o arco posicionado no segmento
médio (grupo experimental 1) o diâmetro no meio do arco de curvatura de 0,64
mm e para o arco posicionado no segmento apical (grupo experimental 2) o
76
diâmetro de 0,53 mm. Assim, estes valores justificam os resultados obtidos
neste estudo e são consonantes com os resultados do estudo de NECCHI et
al., (2008).
O diâmetro em D0 e a conicidade interferem no número de ciclos até a
fratura por fadiga do instrumento (PRUETT et al., 1997; PLOTINO et al., 2010).
Neste trabalho utilizou-se instrumentos de mesmo diâmetro em D0 e mesma
conicidade. Porém como a haste de corte helicoidal é cônica, o diâmetro do
instrumento em relação ao ponto crítico (meio do arco) varia em função da
posição do arco ao longo do canal.
Na análise por microscopia eletrônica de varredura não se observou
deformação plástica macroscópica nas hastes de corte helicoidais em qualquer
dos instrumentos ensaiados. Isto pode ser atribuído à superelasticidade da liga
NiTi, ao diâmetro do canal artificial e ao uso de uma solução lubrificante
(glicerina). A superelasticidade da liga de níquel-titânio aumenta o grau de
deformação elástica do instrumento endodôntico, enquanto o maior diâmetro
do canal e o uso da solução lubrificante reduzem a resistência ao giro do
instrumento no interior do canal metálico durante o ensaio de flexão rotativa.
Por meio da análise por microscopia eletrônica de varredura verificou-
se que na fratura por flexão rotativa, quando ela foi oriunda da propagação de
uma única trinca, a superfície da fratura com pequenos aumentos foi plana e
perpendicular ao eixo do instrumento. Quando oriunda da propagação de mais
de uma trinca, a superfície da fratura apresentou degraus (vários planos).
Nestes casos, as linhas de propagação das trincas seguiram sentidos opostos
e foram separadas por pequenas distâncias. As trincas estavam presentes na
77
superfície das hastes de corte helicoidais dos instrumentos junto ao ponto de
fratura que correspondeu ao ponto de maior concentração de tensão durante o
ensaio de flexão rotativa.
Conforme relatado por CETLIN et al. (1988), LOPES et al. (2000) e
YAO et al. (2006), as trincas sempre têm início nas depressões das ranhuras
advindas do processo de usinagem por roscamento das hastes de corte
helicoidais dos instrumentos ensaiados.
A análise da superfície de fratura de todos os instrumentos
endodônticos ensaiados não revelou diferenças quanto às características
morfológicas. As superfícies de fratura apresentaram características
morfológicas de fratura tipo dúctil. Nela, identificou-se a presença de
microcavidades (dimples) geralmente arredondadas que indicam ruptura
causada por tensão trativa. Durante o ensaio mecânico por flexão rotativa, na
superfície externa da região flexionada do instrumento são induzidas tensões
trativas e na superfície interna são induzidas tensões compressivas. A
repetição cíclica destas tensões alternadas, mesmo estando elas abaixo do
limite de escoamento do material (NiTi), induz a nucleação de trincas que
crescem, coalescem e se propagam até ocorrer a fratura do instrumento por
fadiga de baixo ciclo. Esta fratura se caracteriza pela aplicação de uma tensão
elevada para um número baixo de ciclos, de acordo com HÄIKEL et al. (1999),
LOPES & ELIAS (2001), PARASHOS & MESSER (2006) e LOPES et al.
(2007).
Para a redução do número de fraturas dos instrumentos endodônticos
é necessário que haja maior informação por parte dos fabricantes sobre a
78
geometria e as propriedades mecânicas desses seus produtos além de um
melhor acabamento superficial, dos instrumentos classificados como acionados
a motor.
79
CONCLUSÕES
A partir dos resultados obtidos no presente experimento foi possível
concluir que:
1- A posição do arco do canal artificial influenciou significativamente no
número de ciclos até a fratura por fadiga do instrumento BR5C de NiTi. A
fratura ocorreu com um menor número de ciclos com o arco posicionado no
segmento médio do canal e com um maior o número de ciclos para o segmento
apical.
2- Não ocorreu deformação plástica visível nas hastes de corte
helicoidais dos instrumentos endodônticos fraturados. As superfícies de fratura
dos instrumentos apresentatarm características morfológicas do tipo dúctil.
80
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92
ANEXOS
Anexo 1. Comprimentos úteis (mm) dos instrumentos BR5C antes da fratura
Comprimento útil (mm)
Grupo experimental 1 Grupo experimental 2
1 24,7 24,5
2 24,9 24,7
3 24,9 24,8
4 24,8 24,8
5 24,7 24,9
6 24,6 24,7
7 24,5 24,7
8 24,6 24,8
9 24,6 24,9
10 24,5 24,7
Média 24,68 24,75
Desvio-padrão 0,1476 0,1179
93
Anexo 2. Diâmetro e conicidade dos instrumentos escolhidos aleatoriamente para balizar a amostra
Diâmetro (mm) e Conicidade (mm/mm)
D0 D3 D13 Conicidade
1 0,40 0,46 0,67 0,020
2 0,40 0,46 0,66 0,020
3 0,40 0,47 0,68 0,020
4 0,39 0,45 0,67 0,020
5 0,42 0,48 0,66 0,018
6 0,40 0,46 0,67 0,020
7 0,41 0,47 0,68 0,020
8 0,40 0,46 0,64 0,018
9 0,42 0,47 0,65 0,018
10 0,38 0,44 0,64 0,020
Média 0,40 0,46 0,66 0,020
94
Anexo 3. Número de ciclos necessários até a fratura do instrumento (NCF)
NCF
Grupo experimental 1 Grupo experimental 2
1 840 2155
2 685 2930
3 575 2795
4 710 2600
5 515 2215
6 735 2760
7 610 2945
8 725 2065
9 860 1730
10 620 2080
Média 687,5 2427,5
Desvio-padrão 110,6358 428,6623
95
Anexo 4. Tempo (s) até a fratura dos instrumentos BR5C
Tempo (s)
Grupo experimental 1 Grupo experimental 2
1 168 431
2 137 586
3 115 559
4 142 520
5 103 443
6 147 552
7 122 589
8 145 413
9 172 346
10 124 416
Média 137,5 485,5
Desvio-padrão 22,1272 85,7325