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SUMÁRIO SUMÁRIO ............................................................................................................... 1  INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 2  1. AS FILOSOFIAS DA ALTA ANTIGUIDAD E ................................................... 4  1.1 Explanação Geral ............................................................................................ 4  1.2 Em resumo ..................................................................................................... 9  1.3 Questões básicas ........................................................................................... 10  2. A FILOSOFIA QUE NASCE NA GRÉCIA ...................................................... 12  2.1 Considerações Preliminares .......................................................................... 12  2.2 Tentativas de Compreender a Natureza ........................................................ 14  2.3 Principais indagações .................................................................................... 16  2.4 Resumo: Período Cosmológico – Principais Escolas ............ ......................... 23 2.5 Questões Básicas: .......................................................................................... 25  

INTRODUÇÃO

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  • SUMRIO SUMRIO ............................................................................................................... 1 INTRODUO ..................................................................................................... 2 1. AS FILOSOFIAS DA ALTA ANTIGUIDADE ................................................... 4

    1.1 Explanao Geral ............................................................................................ 4 1.2 Em resumo ..................................................................................................... 9 1.3 Questes bsicas ........................................................................................... 10

    2. A FILOSOFIA QUE NASCE NA GRCIA ...................................................... 12 2.1 Consideraes Preliminares .......................................................................... 12 2.2 Tentativas de Compreender a Natureza ........................................................ 14 2.3 Principais indagaes .................................................................................... 16 2.4 Resumo: Perodo Cosmolgico Principais Escolas ..................................... 23 2.5 Questes Bsicas: .......................................................................................... 25

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    INTRODUO

    Oriundo do contedo programtico das disciplinas Histria da Filosofia Antiga e Filosofia l, ministradas, respectivamente, na Universidade Catlica de Pernambuco e no Seminrio Teolgico Batista do Norte do Brasil, o presente trabalho se destina a alunos do curso de graduao, iniciantes no estudo da filosofia. No se trata de um texto denso, condensado, mas expositivo, explicativo, com farta indicao bibliogrfica, tanto de fontes primrias, como secundrias, para quem quiser conhecer mais profundamente o assunto.

    O trabalho est estruturado em quatro tpicos principais, seguidos dos respectivos sub-tpicos, assim definidos: as filosofias da alta antiguidade, as filosofias que nascem na Grcia, a filosofia em ascendncia nas cidades gregas e a filosofia em decadncia no imprio greco-romano.

    Destacamos, no primeiro tpico, filosofias da alta antiguidade, as filosofias desenvolvidas no Egito Antigo, na Mesopotmia, no Ir, na ndia e na China. Nessas filosofias pode-se verificar, no somente a passagem de uma viso sobrenatural para uma viso natural do mundo, caracterizadas pela onipotncia da fala, a influncia dos astros, a divina hostilidade, a negao do mundo visvel e a oposio necessria harmonia.

    No segundo tpico, a filosofia que nasce na Grcia, chamamos a ateno para o fato de que, enquanto na conscincia mtica o homem uma espcie de refm nas mos dos deuses e na conscincia religiosa o homem procura subornar os deuses com palavras lisonjeiras e oferendas, na conscincia filosfica, o homem se torna capaz de discernir para decidir, com o auxlio da razo.

    No terceiro tpico, a filosofia em ascendncia nas cidades gregas, destacamos a filosofia utilitria dos sofistas, a filosofia humanitria de Scrates, a filosofia idealista de Plato e a filosofia realista de Aristteles, reconhecendo que nesse perodo clssico do pensamento antigo, as atenes filosficas se desloca das questes ligadas ao

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    cosmo, para as questes ligadas ao homem, compreendido como a medida de todas as coisas.

    Ao tratarmos da filosofia em decadncia no imprio greco-romano, destacamos a filosofia estoica, que afirma a apatia como fundamento da felicidade, seguida do epicurismo, que no somente destaca a felicidade como o bem supremo do homem, como tambm afirma o prazer como fundamento da felicidade. Os cticos, por sua vez, afirmam a filosofia como busca da verdade, enquanto os eclticos a afirmam como consoladora dos que sofrem. Enquanto isso, os neoplatnicos, orientados especialmente por Plotino, apresentam a filosofia como o caminho para o xtase, que eleva a alma a Deus.

    Finalmente, s nos resta reconhecer a modstia do nosso trabalho, ao mesmo tempo em que agradecemos sua preferncia, desejando que o mesmo possa ajud-lo a encontrar, na filosofia, a luz capaz de iluminar o seu caminho no mundo acadmico.

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    1. AS FILOSOFIAS DA ALTA ANTIGUIDADE

    1.1 Explanao Geral

    Denominam-se filosofias da alta antiguidade, no escopo do presente trabalho, as filosofias desenvolvidas no Antigo Egito, na Mesopotmia, no Ir, na ndia e na China. Nestas, pode-se verificar, no somente a passagem de uma viso sobrenatural para uma viso natural do mundo, como tambm se destaca a viso da onipotncia da fala, caracterizando as filosofias egpcias; a influncia dos astros, caracterizando as filosofias da mesopotmicas; a divina hostilidade, caracterizando as filosofias iranianas; a negao do mundo visvel, caracterizando as filosofias hindustas e a oposio necessria harmonia, como caracterstica das filosofias chinesas.

    Na elaborao do presente tpico, estamos seguindo o roteiro traado por Luis Jacot1, na obra Histria Crtica do Pensamento, em que, partindo do que denomina via da razo, apresenta a passagem do sobrenatural ao natural, da religio filosofia, afirmando que o racional substitui as supersties. Afirma, assim, que:

    Os grandes mistrios da fora, da vida e do pensamento, dos quais os primitivos tiveram a intuio e que lhes fizeram supor a existncia de espritos agitando todas as coisas, incitaram, naturalmente, os pensadores a esclarecer esses mistrios e a emitir consideraes racionais que transformaram as mitologias em verdadeiras religies.2

    1 Autor da obra Histria Crtica do Pensamento, traduzida por Charles Marie Antoine Boury, publicada em So Paulo pela editora Mundo Musical, em 1973, em quatro volumes, nos quais destaca: A Batalha das Idias na Religio, A Batalha das Idias na Filosofia, A Batalha das Idias na Cincia e Nas Asas da Harmonia, como volume final. 2 Luis JACOT. Histria Crtica do Pensamento. Traduo de Charles Marie Antoine Boury, So Paulo: Mundo Musical, 1973. Vol. 2, p, 449.

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    Com isso, a conscincia mtica, que mantm o homem como refm dos deuses, d lugar conscincia religiosa, a partir da qual, o homem passa a oferecer suborno aos deuses, na tentativa de alcanar bnos e favores. Esse suborno expresso ora em palavras elogiosas, expresses de louvor, ora em oferendas de valores materiais, seres vivos, s vezes at seres humanos, como no caso de um pai oferecer o filho divindade. Isso d origem ao culto sacrificial, verificado nas bases do Antigo Testamento, que no Cristianismo assume conotao simblica, levando em conta o sacrifcio de Jesus Cristo.

    Ao descobrirem a via do raciocnio, os homens tiveram dificuldades de se deixarem conduzir por ela, uma vez que, quanto mais acrescentavam reflexo reflexo e concluso s concluses, mais problemas suscitavam. Com isso, o raciocnio, no lugar de trazer soluo para os problemas, trouxe mais e mais problemas. Esse encadeamento de problemas produziu no homem primitivo a convico de que o mundo era regido por leis gerais, fundamentadas na relao de causa e efeito. Convictos da existncia dessa relao de causa e efeito, o homem ensaia sua primeira teoria do conhecimento, admitindo que se se conhece os efeitos possvel se conhecer as causas.

    Partindo dessa tentativa de conhecer o mundo, sua composio, sua estrutura, seu mecanismo, sua origem, sua finalidade, como tambm as foras que o dirigem, o homem se sente desafiado a refletir sobre as manifestaes da vida e do pensamento, partindo da para uma reflexo sobre si mesmo, seu prprio eu, suas relaes espirituais com os demais seres, que formam o Todo. Com isso, o ser humano termina alargando sua viso, transformando, assim, o mundo sobrenatural em mundo natural, passando a construir verdadeiras filosofias.

    A ideia de criao pela fala, fundamento do pensamento hebraico, conforme a tradio bblica, tem suas origens na cultura egpcia.

    Para os egpcios, a fala a manifestao do pensamento, que se torna ato. A criao, que consiste numa transformao pelo espirito universal (Ka) da matria (Khet), a qual existe por toda a eternidade, no estado de caos, no pois uma criao ex nihilo,

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    mas uma colocao em ordem do universo feito de matria e de esprito. O mundo vivo, intermedirio, no vivo seno pelo esprito, que se manifesta na matria".3

    Isso significa que, a partir do momento em que o esprito universal penetra a matria, um ser toma a forma, passando a compreender-se como conscincia. Nesse particular, o corpo humano compreende dois seres, um material e outro espiritual, cuja combinao produz o ser vivo. nesse sentido que se admite que o ser humano participa do divino. Com isso, a filosofia egpcia coloca as bases do grande problema das relaes entre a matria e o esprito, que no somente preocupou os filsofos antigos, como at hoje preocupa filsofos contemporneos. Na perspectiva da filosofia egpcia antiga, a fala representa a passagem do espiritual ao material. E por isso que o nome tem uma importncia capital; participando da essncia da pessoa ou da coisa, visto que est em sua origem. Por isso, conhecer o nome de uma pessoa ter acesso a essa pessoa.

    Assim, a ideia de criao pela fala, adotada pelos egpcios desde o incio de sua histria, retomada por Moiss no contexto da libertao do povo de Israel do cativeiro egpcio, sculos mais tarde adotada pelo redator do Evangelho de Joo, ao afirmar que todas as coisas foram criadas pelo Verbo Divino.

    Fundamentada na existncia de um esprito superior e de uma ordem csmica, a filosofia egpcia no conseguiu se livrar completamente da influncia do mito osrico, segundo o qual, o bem e o mal entraram em luta logo em seguida criao do mundo. Com isso, a filosofia definiu tambm seu engajamento na luta moral, com base no princpio tico que define a arte de viver, com base na idia de Justia. Ao admitir que o homem vive e se move no divino, os egpcios terminaram subordinando a filosofia religio.

    As filosofias da Mesopotmia, semelhana das filosofias egpcias, partem de uma viso da matria para uma viso do esprito, do mundo criado para o Deus Criador. Merece destaque o texto que segue, denominado Procura da Criao:

    3 Luiz JACOT. Op. Cit. p. 452.

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    Quando, no alto, o cu no era nomeado, e que em baixo, a terra no tinha nome, do oceano primordial seu pai e da tumultuosa Tiamat, sua me, todas as guas se confundiam ainda.4

    Isso nos leva a entender que, no somente no Egito, como tambm na Mesopotmia, desenvolveu-se a ideia de que a criao se fez pela fala, o que no apareceu de imediato porque o cu e a terra no haviam ainda sido nomeados. Tudo provm da gua, que sob o comando do Espirito Divino, produz tudo o que nela h, inclusive o ser humano. Por isso, os caldeus, convencidos de que Deus interfere na vida dos homens, procuram entrar em contato com ele, procurando influencia-lo. Assim nasceu a magia, que .se desenvolveu especialmente entre os Medos e os Persas.

    Graas sua influncia a astrologia e a magia dominaram toda a filosofia mesopotmica qual as observaes astronmicas, bem precisas, se misturaram s velhas supersties5 Com isso, os povos da Mesopotmia, diante das grandes inundaes, invases estrangeiras e guerras, passaram a desenvolver uma filosofia marcada pelo pessimismo. No entanto, aprenderam a partir desse pessimismo a desenvolver uma vida de submisso aos deuses, em que vieram a encontrar as bases para o otimismo, definido como entusiasmo.

    Assim, a filosofia da Mesopotmia, embora tenha desenvolvido srias observaes cientficas, no chegou a um desenvolvimento semelhante ao verificado na filosofia egpcia, com respeito ao tratamento dado relao entre esprito e matria. Os textos babilnicos, em geral os originais sumerianos, apresentam um interesse particular pelas concepes filosficas sobre a criao do mundo, que, tudo indica, tenham servido de base para a redao do Gnesis, difundindo-se, assim, por todo o ocidente, principalmente atravs do cristianismo.

    Desse modo, as filosofias desenvolvidas na Mesopotmia, mantendo estreitas relaes com a religio, conseguem influenciar o pensamento iraniano, com a 4 DHORME. Escolha de Textos Assrio-Babilncos. Pars: 1910 Apud Luis JACOT, op.cit. p. 458. 5 Lus JACOT. Op. Cit. p. 462.

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    asseverao do dualismo tico entre o bem e o mal, opondo os deuses Orsmuzd e Ahriman, deus do bem e deus do mal, cujo dualismo moral veio a influenciar o pensamento iraniano, no somente no masdesmo primitivo, como tambm no zoroastrismo, mitrasmo e maniquesmo. Assim, a filosofia iraniana, em suas origens, aparece numa dependncia total da religio.

    A ideia de um Deus do mal, procedente do pensamento iraniano, retomada em vrias religies, vindo a representar no Gnesis o esprito maligno que teria levado Eva a desobedecer a Deus, experimentando o fruto proibido. Em condies semelhantes, teria tentado seduzir a Jesus, com a inteno de desvi-lo de sua misso entre os homens. Nisso, se configura o que se define como a luta entre o bem e o mal, que de certo modo permeia toda a cultura ocidental, especialmente sob a influncia do cristianismo. Nesse particular, a filosofia vai sentir a necessidade de superar essa personificao do bem e do mal em dois deuses, para entender o verdadeiro problema que se manifesta no antagonismo entre amor e dio, presentes na natureza, inclusive na natureza humana, mas como foras e no como divindades.

    Ao assumir a postura de negao do mundo, a partir de teorias cosmognicas, em que defende a evoluo perptua, a impessoalidade de Deus, a migrao das almas, as filosofias hindustas passam a superar a prpria religio. Enquanto no Egito a filosofia aparece como um captulo da religio, na ndia, a religio aparece como um captulo da filosofia. Desse modo, no budismo a religio depende da filosofia, mas no cristianismo ps-agostiniano, at o alvorecer dos tempos modernos, a filosofia depende da religio, no caso da teologia.

    Ao desenvolver o princpio da negao do mundo visivel, os filsofos hindustas vieram a exercer grande influncia sobre dois destacados filsofos gregos, Pitgoras e Plato. Defenderam que o mundo verdadeiro no o mundo das aparncias, mas o mundo do esprito, pois dele que vem a energia que produz os fenmenos. E essa prioridade ao mundo da energia que impele os Brmanes a negar qualquer realidade ao mundo visvel (...) Ao mesmo tempo que a teoria evolucionista decorre das concepes hindus sobre a matria, inspirou os Jnios, em particular

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    Herclito (...) na defesa da teoria do SER. Foi a partir dessa negao do mundo visvel que Plato passou a considerar a matria como sombra da realidade.

    Entre as filosofias da alta antiguidade, se destaca, tambm, a filosofia chinesa. Embora Confcio no tivesse a inteno de fundar uma religio, suas teses filosficas, mesmo desprovidas de contedo metafisico, terminaram servindo de base para o pensamento religioso, definido posteriormente como Confucionismo. Partindo da ideia da necessidade de harmonia, Confcio termina defendendo a concordncia dos fenmenos de ordem fsica e psquica, dentro do macrocosmo ou do microcosmo, como sendo o elemento fundante da realidade. ideia de concordncia est ligada ideia de oposio, representada nos termos Yin e Yang, oposio destuitiva, necessria existncia, em que o Yin e o Yang se tornam complementares, como o princpio do masculino e do feminino, necessrios origem da vida. Embora principios opostos, se constituem o fundamento da comunho.

    1.2 Em resumo

    1.2.1 As filosofias da alta antiguidade compreendem as filosofias desenvolvidas no Egito, na Mesopotmia, no Ir, na ndia e na China.

    1.2.2 Nessas filosofias antigas, principalmente o Egito, se verifica a passagem do sobrenatural ao natural, da religio filosofia, do mito ao logos, na medida em que o racional substitui o supersticioso.

    1.2.3 Nas filosofias desenvolvidas no Egito, a onipotncia da fala, em que se admite que a ordem csmica suprema, da qual, todos os seres participam, foi criada pela palavra, pois se admite racionalmente, que pela fala, o esprito penetra a matria, permitindo que a fala, expresso do esprito, mova a matria na direo que lhe convier.

    1.2.4 Admite-se que o princpio bblico da criao pela palavra de Deus tenha suas razes na filosofia egpcia antiga. Isso significa que Moiss e

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    Herclito devem ter bebido da fonte egpcia. E provvel que Joo e Orgenes tenham bebido, concomitantemente, na fonte mosaica e heracliana.

    1.2.5 As filosofias mesopotmicas, no somente admitem que antes da palavra produzir a origem csmica, a realidade era caos, como admitem que o Caos era gua. E provvel que no somente o autor do Gnesis, como o prprio Tales de Mileto, tenham sido influenciados pelas filosofias desenvolvidas na Mesopotmia.

    1.2.6 As filosofias que se desenvolvem no Ir, se caracterizam pelo eterno combate entre o bem e o mal. Trata-se de uma filosofia voltada para uma moral positiva, na qual, o bem vence o mal.

    1.2.7 As filosofias desenvolvidas na ndia negaram de tal maneira o mundo visvel, que admitiam que o mundo verdadeiro no o mundo das aparncias, no o aspecto que constitui a realidade, mas a energia, o espirito, que produz os fenmenos, a realidade. Com isso, pode-se admitir que filsofos gregos como: Herclito, Parmnides, Pitgoras e Plato foram influenciados pelo pensamento hinduista.

    1.2.8 As filosofias desenvolvidas na China, partem do principio de que a oposio, no lugar de ser destrutiva, necessria existncia, visto que a harmonia sempre resulta da unio dos contrrios. Admite-se que a interdependncia dos fenmenos necessria, pois sobre ela se fundamenta o sistema de concordncia, que no somente produz o caos, como interfere nele para realizar a harmonia, necessria existncia do Cosmo.

    1.3 Questes bsicas

    1.3.1 At que ponto podemos relacionar a concepo egpcia da onipotncia da fala com a viso bblica da palavra divina na criao do mundo?

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    1.3.2 At que ponto podemos admitir que a viso mesopotmica de que o cosmo vem do caos e que o caos era gua coincide com as narrativas bblicas da criao?

    1.3.3 At que ponto podemos admitir que a negao do mundo visvel, para afirmar o mundo do espirito, tenha influenciado Plato em sua teoria do mundo das ideias, em contraste com o mundo das sombras?

    1.3.4 At que ponto podemos concordar com o pensamento chins antigo, na afirmao de que, a oposio, no lugar de ser prejudicial, benfica existncia?

    1.3.5 Faa uma sntese das principais ideias, desenvolvidas nas filosofias da alta antiguidade, que nos ajudam a compreender melhor a mensagem bblica sobre a criao do mundo.

    1.3.6 Faa uma reflexo em torno da concepo de tica, desenvolvida nas filosofias da alta antiguidade, especialmente no Egito.

    1.3.7 Faa uma sntese das principais ideias religiosas desenvolvidas nas filosofias da alta antiguidade, principalmente na mesopotmia.

    1.3.8 Faa uma sntese das principais ideias sobre Deus, desenvolvidas nas filosofias da alta antiguidade, destacando a viso chinesa.

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    2. A FILOSOFIA QUE NASCE NA GRCIA

    2.1 Consideraes Preliminares

    Discordando dos que pretendem encontrar uma pretensa origem ocidental para a filosofia grega, Abbagnano6 afirma que os primrdios da filosofia grega devem ser procurados na prpria Grcia, especialmente nos primeiros sinais em que a filosofia assume a conotao de pesquisa, rompendo-se com as cosmologias mticas. Embora elementos filosficos possam ser encontrados nas cosmologias dos poetas, nas doutrinas mistricas e nos apoftegmas dos sbios, a filosofia propriamente dita comea com as indagaes que geram o esprito de pesquisa, resultando na ruptura entre o mito e o logos. Assim, a passagem do discurso mtico ao discurso lgico deixa atrs o conhecimento fruto da assimilao, abrindo espao para o conhecimento fruto da descoberta. O mito, como discurso que impacta, gera assimilao, enquanto o logos, enquanto discurso que esclarece, gera descoberta.

    Trs importantes obras mitolgicas antigas merecem destaque no nascedouro da filosofia grega: A Teogonia, de Hesodo, A Ilada e A Odissia, de Homero. Ao procurar apresentar a origem dos deuses, em sua Teogonia, Hesodo7 afirma que antes de tudo foi o Caos, depois a Terra e em seguida o Amor que nasce entre os deuses imortais. Aparecem trs deuses principais: Ctonos, que era a Terra, Cronos, que era o Tempo e Zeus, que era o Cu. Zeus, transformado em Amor, procede Criao do Mundo. Na Ilada8, Homero, narra o episdio da guerra de Tria, em que Aquiles, aps uma guerela com Agamenon, retira-se para sua tenda, voltando em

    6 Nicola ABBAGNANO. Histria da Filosofia. Vol I. Traduo de Antnio Borges Coelho et al, Lisboa: Presena, 1981, p.21. 7 Hesodo. Teogonia: A Origem dos Deuses. Traduo de Jaa Torrano, So Paulo: Ilumionuras, 1991, p. 105. 8 O texto A Ilada pode ser encontrado em vrias edies em portugus, dentre elas a publicao de Martin Claret, na srie Ouro, n 18.

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    seguida para vingar a morte de seu amigo Ptroclo, morto por Heitor. Aps matar Heitor, Aquiles arrasta seu cadver em torno do tmulo de Ptroclo, entregando-o, em seguida, a Priamo, pai do morto. Trata-se de um poema de guerra de considervel beleza literria. Seu teor filosfico pode ser vislumbrado na amostra da natureza humana. Na Odissia9, Homero procura mostrar que, enquanto Telmaco vai procura de seu pai Ulisses, que havia sado para a guerra, o mesmo recolhido por Alcino, rei dos feceos, aps um naufrgio. Destaca as aventuras de Ulisses desde que saiu de taca at chegar em Tria. Nessa aventura, Ulisses passou do pas dos Lotfagos ao dos Ciclones, tendo permanecido algum tempo na ilha de Circe, sendo retido por Calipso. De volta a taca, Ulisses orientado por Atena, deusa da sabedoria, a empregar certa astcia para no ser derrotado pelos pretendentes, que cortejavam sua mulher Penlope, com a inteno de se apropriar de seu reino.

    Concomitante com o nascimento da filosofia na Grcia, verifica-se, tambm, o nascimento da religio, especialmente a religio baseada no culto de Dionsio, que vinha da Trcia; o culto de Demter, que vinha de Eleusis; expressos no orfismo, dedicado, especialmente, a Dionsio. O Orfismo era uma religio baseada numa revelao, atribuida a Orfeu, filho de Egro, rei da Trcia, e da musa Calope. Exmio tocador de lira, Orfeu teria descido ao Hades para buscar sua esposa Eurdice, que teria morrido picada por uma serpente, ao tentar fugir do assdio de Aristeu. Orfeu conseguiu encantar as divindades infernais com o som de sua lira, tirando sua esposa de l. Vindo Terra, Orfeu pde revelar aos homens o que h depois da morte. Com isso, o orfismo adotou o conceito de cincia como a atividade do pensamento, enquanto guia do homem no caminho da vida, ou seja, a pesquisa que conduz o homem ao verdadeiro caminho da vida.

    Alm dos primeiro sinais da filosofia na Cosmologia do mito e dos mistrios, fortes elementos filosficos podem ser verificados na lenda dos sete sbios, cujos nomes preservados so: Tales, Bias, Ptaco, Solon, Clebulo, Mison e Chilon, a quem so atribudos gnomas, frases que expressam sabedoria com teor tico. Digenes

    9 Igualmente, o texto A Ilada pode ser encontrado em vrias edies em portugus, dentre elas a publicao de Martin Claret, na srie Ouro, n 18.

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    Lartios 10 atribui a cada um desses sbios as seguintes frases: "Conhece-te a ti mesmo(Tales); O cargo revela o homem (Bias); "sabe aproveitar a oportunidade (Ptaco); "Toma a peita as coisas importantes" (Slon); "A medida coisa tima (Clebulo); indaga as palavras a partir das coisas e no as coisas a partir das palavras" (Mison); "No desejes o impossvel" (Chilon). Como se percebe, essas frases so todas de natureza prtica, mas com forte contedo filosfico, isto , contm um forte apelo ao amor sabedoria. isso significa que a filosofia nascente na Grcia assume como meta principal a investigao sobre a vida do homem no mundo, no mais como um ser refm dos deuses e da natureza, mas como algum capaz de interpelar criticamente, no somente os deuses, como tambm o mundo natural.

    Embora tendo nascido do mito e dos gnomas, a filosofia grega floresce em tom de poesia. Embora alguns admitam o nascimento da filosofia como ruptura com o mito, queremos destacar que a filosofia no se rompe com o mito. Ora, se o mito o discurso que procura impactar e o logos o discusso que procura explicar, a poesia o discurso que procura embelezar, por isso, mito, logos e poesia esto juntos na filosofia, causando a admirao necessria ao filosofar. Desse modo, o tema primordial da filosofia grega, a justia, tem suas razes na mitologia, em que Hesodo personifica a lei em Dik, filha de Zeus, que tem assento junto ao Pai e recebe a incumbncia de vigiar os homens, para que sejam punidos os que praticarem a injustia. A noo de justia est atrelada obedincia s leis. Nesse caso, as leis criadas pelo homem para nortear a vida em sociedade, so espalhadas nas leis que esto inscritas na natureza. Assim, a filosofia nasce de uma preocupao com as leis humanas, como elemento norteador da vida em sociedade.

    2.2 Tentativas de Compreender a Natureza

    O termo natureza, no contexto da filosofia que nasce na Grcia, a traduo do termo fysis, que diz respeito natureza, entendida como cosmo, mundo natural, 10 Digenes LARTIOS. Vida e Doutrina dos Filsofos Ilustres. Traduo de Mrio da Gama Kury, 2 ed, Braslia: UNB, 1977, p.23.

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    constitudo de matria. O termo fysik pressupe uma investigao em torno da natureza. O estudo da fsica pr-socrtica, de acordo com Reale11, constitui-se uma verdadeira ontologia, incluindo uma teologia natural. A fsica platnica constitui-se uma espcie de metafsica do sensvel, enquanto a fsica aristotlica, uma espcie de ontologia do sensvel, que desemboca tematicamente na teologia, em que constata a teoria da substncia em movimento. Na era helenstica, porm, a fsica vem a assumir a conotao de ontologia, na medida em que se apresenta como explicao ltima do real. No neoplatonismo, especialmente em Plotino, a fsica retorna ao significado platnico, na medida em que o mundo natural apresentado como emanao do divino.

    Assim, a filosofia, desde os pr-socrticos at os sofistas, fundamentada na preocupao com o problema da natureza. O homem no excludo das investigaes filosficas, porm, e visto apenas como um elemento integrante da natureza, uma vez que a constituio do mundo fsico explica a constituio do homem. Por isso, os filsofos desse perodo investem na investigao que tem como objetivo leva-los descoberta da unidade que faz da prpria natureza um mundo, procurando descobrir assim, a nica substncia que constitui a essncia do mundo e a nica lei que regula seu devir, isto , as mudanas que ocorrem no mundo. A substncia, na viso dos pr-socrticos, a matria de que todas as coisas so constitudas, que em si mesma conduz fora que garante sua composio, nascimento, morte e recomposio. A matria, assim, se constitui o princpio que no somente explica a origem do mundo, como tambm sua funcionalidade. Com isso, o termo hilozoismo, indica que a substncia corprea primordial conduzia consigo a fora que a fazia morrer e viver. Em contraste com o hilozoismo est o espiritualismo, que admite a existncia de uma fora externa, que pe a matria em movimento. Essa fora externa, em Herclito, definida como o Logos, entendido como palavra que expressa o Nous divino e ordena, pe em ordem, tira o cosmo do caos. Assim, os gregos mantiveram em sua filosofia uma espcie de dualismo ontolgico, que parte dos pr-socrticos, com a ideia de que a matria era constituda dos elementos gua,

    11 Giovanni REALE. Histria da Filosofia Antiga. Traduo de Henrique de Lima Vaz. So Paulo: Loyola. 1995. Vol. V, p. 114-1 t5.

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    ar, terra e fogo, integrantes da natureza. Ainda nos pr-socrticos, especialmente em Pitgoras, esse elemento que pe a matria em movimento recebe a designao de alma; em Plato, se define como ideia; em Aristteles, como o indeterminado, que move sem ser movido; e nos estoicos, denomina-se esprito. Nesse caso, a filosofia se encontra com a religio hebraica, que explicava o movimento do mundo pelo sopro divino. No pensamento cristo, alma e espirito se tornam sinnimos, indicando a natureza imaterial do ser humano. A partir de Descartes, o esprito passa a ser entendido como o princpio do pensamento. O esprito se ope ao corpo, matria, extenso, na medida em que indispensvel e totalizante. Na metafsica hegeliana, o esprito considerado como absolutamente primeiro na verdade da natureza. a ideia que chegou ao ser-para-si, diferente do ser-fora-de-si, que a natureza. Em Hegel, o esprito se desenvolve do esprito subjetivo, que compreende a alma, ,a conscincia e os fatos psquicos, ao espirito objetivo que, por sua vez, compreende o direito, os costumes e a moralidade e, da ao esprito absoluto, atravs da arte e da religio. Alm disso, o termo esprito, no pensamento ocidental, especialmente na teologia, designa entidades no corpreas, como os anjos e Deus.

    2.3 Principais indagaes

    A primeira questo levantada pelos filsofos pr-socrticos, integrantes da escola jnica, diz respeito ao arqu, princpio que no somente explica a origem do universo, como tambm sua constituio e funcionalidade. Com isso, os filsofos pr-socrticos, pela primeira vez, lanaram mos do princpio que vem a se constituir a base da cincia, reduo do todo parte. No caso dos pr-socrticos, a reduo da natureza objetividade.

    Assim, Tales de Mileto (624-546), fundador da Escola Jnica, ao interrogar sobre o princpio originrio do universo, o elemento primitivo do qual tudo deriva, afirma que a gua esse princpio. Argumenta que a terra est apoiada sobre as guas, que constituem seu princpio sustentador. Argumenta ainda que tudo deriva da gua, pois a vida tem sua origem no mido. Admitia a existncia de uma fora, ligada

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    gua, ativa, vivificadora e transformadora, tendo como base a afirmao de que tudo est pleno de Deus12.

    Anaximandro (610-547), em sua obra Acerca da Natureza, desenvolve uma especulao cosmolgica, na qual vem a identificar o aperon, infinito, que indica a quantidade infinita da matria, da qual, tudo deriva e qual, tudo retorna, depois de ter cumprido o ciclo da existncia, cumprindo uma lei necessria. Este principio engloba e governa tudo, pois, em si mesmo, imortal, indestrutvel e divino13. Assim, o aperon constitui, no somente a substncia, mas tambm a lei que pe o mundo em movimento.

    Anaxmenes (585-525), discpulo de Anaximandro, reconhece como princpio do universo uma matria definida, que o ar. Atribui, porm, ao ar a infinidade e o movimento constante. Via ainda no ar a fora que anima o mundo. O ar o princpio do movimento e de todas as mudanas. Pelo processo da rarefao e da condensao, o ar determina a transformao de todas as coisas. Rarefazendo-se, o ar se torna fogo; condensando-se, o ar se torna vento, nuvem, gua, terra, pedra. Sua tese: como a nossa alma, que ar, nos sustem, assim o sopro e o ar circulam o mundo inteiro. 14

    Xenfanes (580 - 460), natural de Clofon, afirma a terra como sendo o elemento primordial. Relacione a terra com a gua, mas afirma que todas as coisas, inclusive o homem, tm sua origem na terra. Assim, a partir da terra, desenvolve sua Cosmologia. Porm, Xenfanes se tornou famoso a partir de sua teologia, na qual, combate a concepo antropolgica dos deuses, afirmando a existncia de um Deus nico, distinto do homem, no-gerado, eterno, imvel, puro pensamento, e que age atravs de seu pensamento.15

    12 Gerd BORNHEIM (Org). Os Filsofos pr-socrticos. So Paulo: Cultrix, 1993, p. 23. Doxografias 4 e 7. 13 BORNHEIM, op.Cit p. 25 Fragmentos 1-3. 14 Ibid, p.28 Fragmento 1. 15 Ibid, p. 30 Cf. Fragmentos 27, 29, 33.

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    Herclito (536 - 475), recusou-se a participar do governo da cidade, chamaram-no velho orgulhoso. Em sua filosofia, afirma a unidade fundamental de todas as coisas; todas as coisas esto em movimento constante; no universo tudo muda, nada permanece como sempre foi; o movimento se processa atravs dos contrrios; o fogo o elemento gerador do processo csmico; o logos compreendido como inteligncia, que governa o real; a sabedoria humana est ligada ao logos; o conhecimento sensvel enganador, por isso, deve logo ser substitudo pela razo; da luta entre os contrrios nasce a mais bela harmonia; o fogo transforma todas as coisas e todas as coisas se transformam em fogo; no se pode entrar duas vezes no mesmo rio; o senhor, cujo orculo est em Delfos, no fala, nem esconde, apenas indica; para Deus, tudo bom, belo e justo, os homens que julgam umas coisas justas e outras injustas.16

    Pitgoras (571 - 497), natural de Samos, desenvolveu uma linha de pensamento em que mistura filosofia com religio, tendo como fundamento o princpio da metempsicose, transmigrao das almas, provavelmente de origem oriental. Defende, em sua filosofia, trs ideias bsicas: o nmero o primeiro princpio; da harmonia dos nmeros, em suas relaes, resultam os elementos de todas as coisas; o estudo dos nmeros reflete, tambm, o comportamento humano. Pitgoras se apresentava como depositrio de uma sabedoria que lhe fora transmitida por uma divindade. Essa sabedoria no comportava nenhuma modificao. Os discpulos deviam apenas assimilar o que ouviam do mestre. O acesso escola era atravs de um ritual de iniciao. Grande parte da doutrina pitagrica aparece na literatura platnica.17

    Alcmeo (sc. V), natural de Crton, um dos mais destacados discpulos da escola pitagrica, cuja doutrina bsica pode ser assim resumida: das coisas insensveis e das coisas mortais, s os deuses tm um conhecimento certo; aos homens s conjecturar permitido. Os homens morrem porque no podem unir o princpio ao fim. O homem se distingue dos demais seres, por ser o nico que compreende, pois

    16 Ibid, p.35 - Cf. Fragmentos 8 ,10 , 12, 32, 36, 45, 50, 76, 90, 91, 93, 102, 116. 17 Ibid, p. 47

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    todos os outros apenas percebem, mas no compreendem. mais fcil proteger-se de um homem inimigo do que de um amigo. A alma e imortal e, semelhana dos seres divinos: sol, lua, estrelas e todo o cu; esta em constante movimento.18

    Parmnides (sc. V), natural de Elia, um dos mais destacados filsofos da Escola Eletica, que contestou o princpio da dinmica, defendido por Herclito, afirmando, em substituio, o princpio da esttica. tese de que tudo muda, nada permanece como foi, os eleatas contrastam com a afirmao de que nada muda, tudo permanece como sempre foi; pois a mudana apenas iluso de nossa mente. Parmnides escreveu um poema dividido em trs partes: o prlogo, o caminho da verdade e o caminho da opinio. No prlogo, o filsofo conduzido presena da deusa, que lhe promete a revelao da verdade. No caminho da verdade, o filsofo distingue dois meios de investigao, o do ser e o do no-ser, sendo que o primeiro o caminho da certeza e o segundo o caminho do pensar. A terceira parte do poema compreende o caminho da opinio, no qual, Parmnides desenvolve sua Cosmologia, afirmando a necessidade de se conhecer a opinio dos mortais, a fim de que, participe da ordem aparente do mu sem se deixar vencer por nenhum mortal.19 Parmnides foi o primeiro a demonstrar a esfericidade da terra e sua posio no centro do mundo. S existem dois elementos: o fogo e a terra. Os homens nascem da terra. O fogo traz consigo o calor e a terra o frio. O esprito e a alma so uma mesma coisa. S h duas filosofias: uma da verdade e outra da opinio.

    Zeno (Sc. V), natural de Elia, discpulo de Parmnides, se tornou famoso por seus argumentos na tentativa negar o movimento. Defende a tese de que impossvel haver movimento dentro de um tempo finito e de um espao infinito. Isso significa que uma coisa destituda de grandeza, de espessura e de massa, no poderia existir. A respeito do lugar, Zeno afirma que todo ser ocupa um lugar, mas evidente que haver um lugar do lugar e assim ao infinito. Com referncia ao movimento, Zeno apresenta quatro argumentos, conhecidos como: o imvel conduzido, a corrida entre Aquiles e a tartaruga, o voo da flecha e a corrida no

    18 Ibid, p. 51. 19 Ibid, p. 53. Cf. Fragmento 1, 2, 8 e 16.

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    estdio. Conclui cada um demonstrando a impossibilidade do movimento. No mundo nada se move, tudo permanece como sempre foi: o movimento no passa de iluso de nossa mente.20

    Melisso (sc. V), natural de Samos. De seu poema sobre o ser foram conservados alguns fragmentos, a partir dos quais, pode-se resumir suas ideias. O eterno ilimitado, uno e homogneo. No poderia perecer, nem tornar-se maior, nem transformar-se, nem sofrer dor ou pena. Se sofresse algumas dessas coisas, j no seria mais um. No h vazio, pois o vazio nada e o que nada no pode ser. Se a terra, a gua, o ar, o fogo, o ferro, o ouro, uns vivos, outros mortos, e o preto e o branco e as demais coisas que os homens dizem que existem verdadeiramente, se estas coisas so, e ns as vemos e ouvimos corretamente, necessrio que cada coisa seja tal como nos aparecem pela primeira vez, sem mudar, nem transformar-se, que sejam sempre tal como . Essa, porm, no a realidade, percebemos as coisas, no pelo que elas so, mas pelo que parecem ser.21

    Empdocles (sc. V), natural de Agrigento, escreveu dois poemas: Sobre a Natureza e Purificaes, dos quais, foram conservados alguns fragmentos, que nos permitem entender suas ideias bsicas. Afirma a existncia de quatro elementos originais, a partir dos quais, se deu a formao de todos os seres. Esses elementos so: fogo, terra, gua e ar. Estes elementos e todo o processo do real so determinados pela fora do amor e do dio, que regem ciclicamente o cosmo. A partir da unio desses elementos, se da o nascimento de todas as coisas e a partir da desunio, se d a morte. O amor a fora que une todas as coisas, enquanto o dio gera a discrdia e desune, desintegra todas as coisas. Esses elementos tanto podem ser verificados na natureza, enquanto mundo natural, como tambm na natureza humana. O amor envolvente, o dio repugnante. O amor une, o dio separa.22

    20 Ibid, p. 60. 21 Ibid, p. 64. 22 Ibid, p. 67 Cf. Fragmentos 6, 8, 9, 11, 12, 13, 14, 17, 26, 62, 96, 98 16, 20, 21, 22, 30, 35, 59.

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    Filolau (sc. V), natural de Crton, seguidor da filosofia pitagrica, que veio a influenciar o pensamento de Plato. Partindo do princpio da harmonia, explica a origem de todas as coisas. A harmonia a unidade do misturado e a concordncia das discordncias. Os corpos, elementos integrantes da esfera do mundo, so cinco: fogo, gua, terra, ar e o quinto, a harmonia, se constitui o princpio, o envolvedor dos quatro. H quatro princpios nos seres dotados de razo: crebro, corao, umbigo e rgos geradores. A cabea o princpio do entendimento, O corao o principio da sensibilidade. O umbigo o princpio do enraizamento e do crescimento do embrio. Os rgos geradores se constituem o principio da seminao e da criao. O crebro indica o princpio do homem. O corao, princpio dos animais. O umbigo, princpio das plantas. Os rgos geradores, princpio de todos os seres vivos.23

    Arquitas (sc. lV), natural de Tarento, no sul da Itlia. Filiado doutrina pitagrica, Arquitas foi um poltico, dedicado s cincias da matemtica, da mecnica e da msica. Escreveu sobre todas essas reas do conhecimento, mas restaram apenas alguns fragmentos, a partir dos quais, tentamos demonstrar suas principais ideias. Afirma a existncia de trs proposies na msica: a aritmtica, a geomtrica e a contraposta, que se denomina harmonia. O homem deve chegar ao conhecimento daquilo que ignora, aprendendo de um outro ou por conta prpria. Quanto mais se usa a razo, mais se aumenta a Concrdia e se evita a discrdia, fazendo cessar a rebelio.24

    Anaxgoras (500 - 428), natural de Clazomena, seguidor da doutrina pitagrica, defensor do princpio da multiplicidade. Procura explicar a natureza do mltiplo afirmando que em cada coisa h uma poro de cada coisa. A exceo do Esprito, que ilimitado e autnomo. Ao contrrio das coisas, o Esprito puro, no misturado com nada. O Esprito tem poder sobre todas as coisas que tm alma, tanto as maiores, quanto as menores. O Espirito ordenou todas as coisas como

    23 Ibid, p. 85 _ Cf. Fragmentos 8, 9, 10, 12, 13. 24 Ibid, p, 89 - Cf. Fragmentos 1, 2, 3.

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    deveriam ser e como so agora e as que sero depois destas. O Esprito eterno. O Esprito habita tanto os seres vivos, quanto a natureza.25

    Leucipo (490 - 430), natural de Abdera, influenciado por Zeno de Elia, provavelmente criador da teoria dos tomos, desenvolvida posteriormente por Demcrito. Escreveu um livro intitulado A Grande Ordem do Mundo, do qual, se conservou o fragmento referente a um Captulo, que trata da questo do Esprito. Sua tese principal: Nada deriva do acaso, mas tudo de uma razo e Sob a necessidade. Todas as coisas so ilimitadas e se transformaram umas nas outras. Os corpos so formados a partir da aglomerao dos tomos, que vo caindo no vazio. O sol o crculo mais externo e a lua o mais vizinho da terra, sendo os astros os intermedirios.26

    Demcrito (460 - 370), natural de Abdera, considerado o mais viajado de todos os filsofos pr-socrticos, tendo visitado a Babilnia, o Egito, a ndia, a Etipia e Atenas. Como discpulo de Leucipo, desenvolveu a teoria dos tomos, a partir da qual, afirma que a realidade e constituda de tomos e de vazio. A combinao dos tomos, que so infinitos, em nmero e imperceptivelmente pequenos, explica a formao de todos os fenmenos. Demcrito escreveu vrios livros, divididos em reas especficas, como: Escritos ticos, nos quais trata da vida aps a morte e a vida tranquila; Escritos Fsicos, nos quais, trata do pequeno cosmos, da diversidade de forma dos tomos e das normas do pensamento; Escritos Filolgicos, nos quais, trata do rito e da harmonia da poesia. De todos os escritos de Demcrito, tem-se conservado em torno de trezentos fragmentos.

    Grandes filsofos posteriores se inspiraram no pensamento de Demcrito, a exemplo de Aristteles, Epicuro e modernamente Karl Marx. A filosofia de Demcrito prende-se, precisamente, a trs problemas bsicos; tica, Poltica e Educao, os quais parecem anda no resolvidos at hoje. No campo da tica, criou o que denominou Tritigenia, que significa prudncia como a inteligncia que nos leva ao: bem pensar, bem falar e bem cumprir o dever. A respeito da poltica, afirma que 25 Ibid, p. 99 - Cf. Fragmentos 5, 6, 7, 8. 26 Ibid, p. 103 Cf. Fragmento 1 e Doxografias 1, 2, 3.

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    nem o corpo, nem o dinheiro faz o homem feliz, mas a retido do carter. A respeito da educao, afirma que ela e a natureza :so semelhantes: a educao transforma o homem, mas atravs dessa transformao, o homem cria uma natureza.27

    2.4 Resumo: Perodo Cosmolgico Principais Escolas

    O perodo Cosmolgico na histria da filosofia antiga est dividido em quatro escolas, conhecidas como: Escola Jnica, Escola Pitagrica, Escola Eletica e Escola Atomista. Alguns autores consideram o pensamento de Herclito como uma escola parte, que denominam Escola de feso, como tambm costumam dividir a Escola Atomista em atomistas anteriores e atomistas posteriores.

    A designao Perodo Cosmolgico indica a preocupao bsica com o conhecimento da natureza, especialmente, a questo da matria primordial, a questo do caos e as leis que fizeram o cosmo sair do caos. No se ignora a existncia do homem, porm, ele pensado como uma fagulha girando em torno do universo.

    Assim, a escola jnica se caracteriza pela busca do princpio material do universo. Tales de Mileto teria empregado o termo ark, principio, para designar a gua como o elemento originrio do universo e do incio da vida. Significa que antes da ordem, o caos era gua. Anaximandro, tambm de Mileto, considerou o aperon, substncia sem forma determinada, infinita, imensa e inextrincvel, mais flexvel do que a gua, origem e fim da vida sensvel, como o elemento originrio da realidade csmica. Anaxmanes, tambm de Mileto, apresenta o ar, ar, como a substncia originria, a verdadeira origem de tudo, visto que, alm de ser verdadeiramente malevel, sem ele a vida impossvel. Herclito, natural de Efeso, apresenta o Pyr, fogo, como o smbolo mais adequado do devir, que significa mudana e equilbrio entre os contrrios. O logos a expresso do Deus nico, que pe em ordem todas as coisas.

    27 Ibid, p.106 - Cf. Fragmentos 2, 3, 33, 40, 57, 180, 181, 189, 191, 235.

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    A escola pitagrica se caracteriza pela busca do princpio vital do universo, que Pitgoras e seus discpulos julgaram t-lo encontrado no principio da metempsicose e na divinizao dos nmeros. Assim, os pitagricos afirmaram que a mnada a origem de tudo e dela procede a dada, que o substrato material da prpria mnada. Da mnada e da dada, que so indeterminadas, nascem os nmeros, dos quais, nascem os pontos e as linhas, das quais, procedem as figuras planas. Das figuras planas nascem as figuras slidas e destas os corpos sensveis, cujos elementos essenciais so: o fogo, a gua, a terra e o ar. Esses elementos, na medida em que mudam e se transformam, dotam o universo de alma, de razo, de forma esfrica, cujo ponto central a terra.

    A escola eletica se caracteriza pela busca da origem da natureza e das leis que a regem. Em princpio, os eleatas assumem uma posio contrria ao pensamento de Herclito, pois, enquanto este defendia o movimento e a mudana como leis que regem o universo, os eleatas aceitam a imutabilidade como princpio fundante do ser. Enquanto Herclito afirmava a dinmica, os eleatas afirmavam a esttica. Assim, Parmnides afirmava a nous, razo, como o nico instrumento de conhecimento verdadeiro, que nos revela, no somente a imutabilidade do ser, como tambm a impossibilidade do vir-a-ser. Zeno, atravs de suas aporias, falcias, procura provar a impossibilidade do movimento. Xenfanes afirmava a unidade e a imutabilidade do ser, destacando que as mudanas no passam de iluso mental. Defendia que a substncia primeira e fundante de tudo a terra, pois tudo sai da terra e volta terra.

    Para os integrantes da escola atomista, tambm denominados fisicos posteriores, a realidade est dividida em partculas indivisiveis, denominadas tomos, que, literalmente, significa no divisvel. Assim, Empdocles, apresenta os quatro elementos: terra, ar, fogo e gua como o princpio de todas as coisas. Apresenta o amor como o principio que aproxima os elementos no seio do ser imutvel e o dio como o princpio que afasta os elementos no seio do ser imutvel, admitindo o poros, como abertura, que permite a passagem de um elemento para outro, permitindo a mudana, geradora do novo. Anaxgoras, por sua vez, define a realidade como sendo composta de homeomerias, que significa parte qualitativamente semelhante e quantitativamente diferente, garantido o devir, responsvel pela diversidade dos seres.

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    As homomerias partem do Nous, mente suprema e se constituem o principio gerador e ordenador de todas as coisas. Demcrito, figura mais destacada dos atomistas, afirma que toda a realidade constituda de tomos. A alma humana formada de tomos leves e sutis, semelhantes ao fogo. Os deuses so constitudos de tomos mais perfeitos; e mais duradouros. A terra constituda de tomos mais volumosos. Os corpos se formam na medida que os tomos caem no vazio, onde no h tomos. Leucipo defende que os corpos so formados pelo movimento dos tomos no vazio. Utiliza o princpio da mecnica para explicar as obras da natureza, como se fossem obras realizadas por mquinas. Afirma que o movimento dos tomos, fundamento de tudo, provocado pelo vazio.

    2.5 Questes Bsicas:

    2.5.1 At que ponto a preocupao que levou os pr-socrticos a filosofar, a saber, a preocupao com a natureza, deve tambm nos levar a filosofar?

    2.5.2 Que relao deve existir entre a preocupao dos filsofos pr-socrticos com a questo da gua, do ar, da terra e do fogo, com os discursos que hoje se faz em nome da ecologia?

    2.5.3 Faa uma sntese das principais idias de Herclito, justificando o devir, contrastando-as com as idias de Parmnides, na medida que afirma a realidade da imutabilidade e da imobilidade do ser.

    2.5.4 Faa uma sntese das principais idias, desenvolvidas pelo pitagricos para afirmar o princpio vital do universal, mostrando que o nmero se constitui a realidade originria de todas as coisas.

    2.4.5 Faa uma reflexo sobre a afirmao de Empdocles de que todas as coisas resultam do amor e do dio, enquanto duas foras que unem e separam, destacando as repercusses possveis desse princpio na vida humana.

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