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Leitura e Producao de Texto

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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)Núcleo de Educação à Distância - Universidade de Pernambuco - Recife

Luna, Jairo NogueiraLeitura e produção de texto / Jairo Nogueira Luna. -Recife: UPE/NEAD,

2009. 97 p.: il. – (Letras).

ISBN 978-85-7856-014-0

1. Leitura 2. Produção de texto 3. 4. 5. Educação à distância I. Universidade de Pernambuco, Núcleo de Educação a Distância II. Título CDU 82.081

L661l

Impresso no Brasil - Tiragem 150 exemplaresAv. Agamenon Magalhães, s/n - Santo AmaroRecife - Pernambuco - CEP: 50103-010Fone: (81) 3183.3691 - Fax: (81) 3183.3664

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EDIção 2009

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UNIVERSIDADE DE PERNAmbUCo - UPE

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José Alexandro Viana Fonseca

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Adonis DutraAfonso BioneProf. Jáuvaro Carneiro Leão

NEAD - NÚCLEo DE EDUCAção A DISTÂNCIA

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Leitura e Produção de texto

aPresentação

Nos fascículos desta disciplina, pretende-se promover uma reflexão acerca da Leitura, até compreendermos que “ler” é muito mais do que simplesmente de-codificar letras, sílabas, palavras e orações. Buscaremos ligar a habilidade de ler à capacidade de escrever, de modo que um bom escritor seja, antes de tudo, um bom leitor do mundo. Nesse sentido, a disciplina de Leitura e Produção de Texto pretende apresentar conceitos, exercitar práticas e levar o aluno a ler o mundo, de modo que, também, possa paulatinamente construir e reconstruir leituras.

Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna Carga Horária | 15 horas

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Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna Carga Horária | 15 horas

objetivos esPecíficos

Leitura de texto poético e Leitura de texto em prosa; Interpretação e relação intertextual do texto; O paradigma literário: um texto tem sempre “link” para outros textos.

1. a Leitura de texto Poético e a intertextuaLidade Nesta unidade, leremos um texto poético de Carlos Drummond de Andrade, perceberemos como o poema faz referência a outro texto, e, em seguida, buscare-mos compreender por que ocorre essa referência e, por último, em que medida a compreensão dessa referência intertextual modifica a leitura do poema.

Leitura e Produção de texto

Figura 1. Carlos Drummond de Andrade

Fascículo 1

http://www.carlosdrummond.com.br

– existe um vídeo que contém entrevista com o

poeta.

http://www.jornaldepoesia.jor.br/drumm.html

– contém poesias, artigos críticos sobre Drummond.

http://www.jayrus.art.br/Apostilas/LiteraturaBrasilei-

ra/Modernismo30/Poesia_de_30/Carlos_Drummond_

de_Andrade_poesia.htm

– do nosso site, antologia de poesias de Drummond.

textos comPLementares

8 Fascículo 1

texto 1: infância A Abgar Renault

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.Minha mãe ficava sentada cosendo.Meu irmão pequeno dormia.Eu sozinho menino entre mangueiras,lia a história de Robinson Crusoé,comprida história que não acaba mais.

No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeua ninar nos longes da senzala - nunca se esqueceuchamava para o café.Café preto que nem a preta velhacafé gostosocafé bom.

Minha mãe ficava sentada cosendoolhando para mim:- Psiu...Não acorde o menino.Para o berço onde pousou um mosquito.E dava um suspiro...que fundo!

Lá longe meu pai campeavano mato sem fim da fazenda.

E eu não sabia que minha históriaera mais bonita que a de Robinson Crusoé. SAIBA MAIS!

Carlos Drummond de Andrade soube trabalhar

suas reminiscências de infância como parte in-

tegrante de sua poesia. Uma vez morando no

Rio de Janeiro, suas lembranças de Itabira tor-

naram-se um tema que permite discutir aspec-

tos universais do homem, como as lembranças

da infância, saudades da terra natal, saudades

de familiares, aspectos que Drummond tratou

com senso crítico e agudeza, características de

um grande poeta. Nesse sentido, leia outro po-

ema de Drummond acerca do tema, procuran-

do as semelhanças e diferenças entre ambos:

costurando, o irmão pequeno dormindo e ele, po-eta lembrando sua infância, se vê nesse continuum temporal, lendo “a história de Robinson Crusoé”.

O café preparado pela “preta velha”, a mãe que continua cosendo, mas que chama a atenção para que o poeta, ainda criança, não quebre a harmonia do lugar ou sua quietude: “Psiu!”. Longe o pai con-tinua no campo “campeando”.

Então, Drummond conclui, num tom de saudosis-mo, que sua história era mais bonita do que a que estava lendo, a de Robinson Crusoé.

Mas, por que ele chega a essa conclusão?

Não haverá resposta possível, se o leitor não sou-ber qual é a história de Robison Crusoé. Esse é um texto que exige do leitor um conhecimento prévio de outro texto, de modo que então se pos-sa compartilhar da conclusão final do poema, ou refutá-la, se for o caso.

O Poema, no estilo modernista, em versos livres (sem métrica) e sem esquemas de rimas (verso bran-co), traz um conjunto de lembranças da “infância” do poeta, trabalhadas num processo criativo de apreensão da realidade. O modo como o poeta se coloca no espaço familiar (pai, mãe, irmão), cada um deles praticando uma ação eternizada no tem-po pela lembrança: o pai andando a cavalo, a mãe

confidência do itabirano Alguns anos vivi em ItabiraPrincipalmente, nasci em Itabira.Por isso sou triste, orgulhoso: de ferro.Noventa por cento de ferro nas calças.Oitenta por cento de ferro nas almas.E esse alheamento do que na vida é porosidade e comunicação.

A vontade de amar, que me paralisa o trabalho,vem de Itabira, de suas noites brancas, sem mulheres e sem horizontes.E o hábito de sofrer, que tanto me diverte,É doce herança itabirana.

Figura 2. ITABIRA: Rua de Itabira-MG, cidade em que Carlos Drummond de Andrade passou sua infância.

Análise da Estrutura das partes de Claro Enigma (Drum-

mond) e Mensagem (Fernando Pessoa)

Por: Prof. Dr. Jayro Luna – disponível em www.usinade-

letras.com.br

texto comPLementar

9Fascículo 1

intertextuaLidade

Acontece quando há uma referência explícita ou implícita de um texto em outro. Também pode ocorrer com outras formas além do texto, música, pintura, filme, novela etc. Toda vez que uma obra fizer alusão à outra, ocorre a intertextualidade.

Apresenta-se explicitamente, quando o autor infor-ma o objeto de sua citação. Num texto científico, por exemplo, o autor do texto citado é indicado; já na forma implícita, a indicação é oculta. Por isso, é importante para o leitor o conhecimento de mun-do, um saber prévio, para reconhecer e identificar quando há um diálogo entre os textos. A inter-textualidade pode ocorrer, afirmando as mesmas ideias da obra citada ou contestando-as. Há duas formas: a Paráfrase e a Paródia.

Paráfrase

Na paráfrase, as palavras são mudadas, porém a ideia do texto é confirmada pelo novo texto; a alu-são ocorre para atualizar, reafirmar os sentidos ou alguns sentidos do texto citado. É dizer, com ou-tras palavras, o que já foi dito. Temos um exemplo citado por Affonso Romano Sant’Anna em seu livro “Paródia, paráfrase & Cia” (p. 23):

texto originaL

Minha terra tem palmeirasOnde canta o sabiá,As aves que aqui gorjeiamNão gorjeiam como lá.

(Gonçalves Dias, “Canção do exílio”).

Paráfrase

Meus olhos brasileiros se fecham saudososMinha boca procura a ‘Canção do Exílio’.Como era mesmo a ‘Canção do Exílio’?

De Itabira trouxe prendas diversas que ora te ofereço:este São Benedito do velho santeiro Alfredo Duval;este couro de anta, estendido no sofá da sala de visitas;este orgulho, esta cabeça baixa...Tive ouro, tive gado, tive fazendas.Hoje sou funcionário público.Itabira é apenas uma fotografia na parede.Mas como dói!

(Carlos Drummond de Andrade)

atividade crítica/refLexiva | Por que a vida no campo, de uma forma pacata, como a descrita por Drummond em seu poema, pode ser mais bonita que a aventura do náufrago Robinson Crusoé? Qual o sentido de beleza usado por Drummond? Use o FÓRUM TE-MÁTICO para debater essas questões!

2. buscando entender a História de

robinson crusoé a Partir de drummond

Neste tópico, leremos sobre o romance de Da-niel Defoe, em nossa viagem intertextual, como um link literário, em que a partir do poema de Drummond, entramos em outro contexto, outra história. Ao voltarmos para a releitura do texto de Drummond (Infância), teremos condições de dis-cutir se o poeta cria uma relação de paródia ou de paráfrase com a história de Robinson Crusoé.

Figura 3. ROBINSON_CRU-SOÉ IMAGEM: Ilustração de uma das edições do livro de Daniel Defoe, A Vida e as Estra-nhas Aventuras de Robinson Crusoé

http://www.ufrgs.br/proin/versao_1/crusoe/index.html

- contém trechos do livro de Defoe.

http://virtualbooks.terra.com.br/freebook/infantis/robin-

son_crusoe.htm

- existe o livro virtual completo.

textos comPLementares

10 Fascículo 1

Eu tão esquecido de minha terra...Ai terra que tem palmeirasOnde canta o sabiá!

(Carlos Drummond de Andrade, “Europa, França e Bahia”).

Este texto de Gonçalves Dias, “Canção do Exílio”, é muito utilizado como exemplo de paráfrase e de paródia; aqui o poeta Carlos Drummond de An-drade retoma o texto primitivo, conservando suas ideias, não havendo mudança do sentido principal do texto que é a saudade da terra natal. Paródia

A paródia é uma forma de contestar ou ridiculari-zar outros textos; há uma ruptura com as ideologias impostas e, por isso, é objeto de interesse para os estudiosos da língua e das artes. Ocorre, aqui, um choque de interpretação, a voz do texto original é retomada para transformar seu sentido, levando o leitor a uma reflexão crítica de suas verdades in-contestadas anteriormente. Com esse processo, há uma indagação sobre os dogmas estabelecidos e uma busca pela verdade real, concebida através do raciocínio e da crítica. Os programas humorísticos fazem uso contínuo dessa arte.

Frequentemente os discursos de políticos são abor-dados de maneira cômica e contestadora, provo-cando risos e também reflexão a respeito da de-magogia praticada pela classe dominante. Com o mesmo texto utilizado anteriormente, teremos, agora, uma paródia.

texto originaL

Minha terra tem palmeirasOnde canta o sabiá,As aves que aqui gorjeiamNão gorjeiam como lá.

(Gonçalves Dias, “Canção do exílio”).

Paródia

Minha terra tem palmaresonde gorjeia o maros passarinhos daquinão cantam como os de lá.

(Oswald de Andrade, “Canto de regresso à pátria”).

O nome Palmares, escrito com letra minúscu-la, substitui a palavra palmeiras; há um contexto histórico, social e racial neste texto. Palmares é o quilombo liderado por Zumbi, foi dizimado em 1695. Há uma inversão do sentido do texto pri-mitivo que foi substituí-do pela crítica à escravi-dão existente no Brasil.

intertextuaLidade

Por: Ivete Lara Camargos Walty e Maria Zilda Ferrei-ra Cury (disponível em: http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/I/

intertextualidade.htm)

Nesta unidade, tomamos conhecimento das relações de intertextualidade entre textos. Usamos, para isso, a leitura de um poema de Carlos Drummond de An-drade que faz referência ao personagem de Daniel De-foe, Robinson Crusoé. Conhecemos um pouco sobre o poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade e um pouco sobre o romancista inglês do século XVIII, Daniel Defoe. Como se pode notar na constituição da

Figura 4. Intertextualida-de – Bombril: exemplo de paródia é a propaganda que faz referência à obra prima de Leonardo Da Vinci, Mona Lisa.

Figura 4a. Intertextualida-de – Monalisa: Monalisa de Leonardo Da Vinci, célebre obra do Renascimento Ita-liano, ícone de inúmeras recriações na arte contem-porânea e na mídia.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Quilombo_dos_Palmares

- verbete da Wikipédia sobre o Quilombo dos Palmares.

O AUtObIOgRáfICO COmO elemeNtO De

vANgUARDA em pRImeIRO CADeRNO De pO-

esIA De OswAlD De ANDRADe

por: prof. Dr. Jairo Nogueira luna – disponível

em www.usinadeletras.com.br

textos comPLementares

11Fascículo 1

própria palavra, intertextualidade significa relação en-tretextos. Considerando-se texto, num sentido lato, como um recorte significativo feito no processo inin-terrupto de semiose cultural, isto é, na ampla rede de significações dos bens culturais, pode-se afirmar que a intertextualidade é inerente à produção humana. O homem sempre lança mão do que já foi feito em seu processo de produção simbólica. Falar em autonomia de um texto é, a rigor, improcedente, uma vez que ele se caracteriza por ser um “momento” que se privilegia entre um início e um final escolhidos. Assim sendo, o texto, como objeto cultural, tem uma existência física que pode ser apontada e delimitada: um filme, um romance, um anúncio, uma música. Entretanto, esses objetos não estão ainda prontos, pois se destinam ao olhar, à consciência e à recriação dos leitores. Cada texto constitui uma proposta de significação que não está inteiramente construída. A significação ocorre no jogo de olhares entre o texto e seu des-tinatário. Este último é um interlocutor ativo no processo de significação, na medida em que par-ticipa do jogo intertextual tanto quanto o autor. A intertextualidade acontece tanto na produção como na recepção da grande rede cultural, de que todos participam. Filmes que retomam filmes, qua-dros que dialogam com outros, propagandas que se utilizam do discurso artístico, poemas escritos com versos alheios, romances que se apropriam de formas musicais, tudo isso são textos em diálogo com outros textos: intertextualidade.

atividades de Leitura | Agora que você leu os dois textos, pode traçar uma relação en-tre ambos, em busca de melhor compreender porque Drummond conclui que sua infância foi mais bonita do que a história de Robinson Crusoé. Na busca dessa compreensão, é que propomos que resolva as questões a seguir:

SAIBA MAIS!

atividade crítica/refLexiva

Agora discuta, no fÓRUm temátICO, qual

sua opinião acerca da importância das

relações intertextuais para a compreensão

da leitura. De certo modo, parece que a

necessidade de o leitor ir descobrindo as

relações intertextuais também implica um

esforço de leitura que demanda pesquisa e

busca do conhecimento. você concorda?

1. No texto 2, lê–se “Robinson Crusoé herda desta história o mito da solidão”. Neste as-pecto, como foi a infância de Drummond? Havia solidão?

2. Ainda, no texto 2, lê -se “O romance sim-boliza a luta do homem só contra a nature-za, a reconstituição dos primeiros rudimen-tos da civilização humana, testemunhada apenas por uma consciência e dependente de uma energia própria.” Neste aspecto, como era a organização social da família de Drummond? Que elementos do poema fundamentam sua resposta?

3. Sexta-feira, o companheiro nativo que Cru-soé, náufrago, encontrou na ilha era o ele-mento humano que permitia ao herói uma atitude de espelhamento (em que medida sou diferente do outro?) e de dominação (o europeu colonizador sobre o nativo co-lonizado). Nesse aspecto, que elemento familiar de Drummond permite uma com-paração com a questão da dominação e da colonização?

4. No poema de Drummond, a leitura da obra de Daniel Defoe teve um impacto sobre a consciência do leitor? E essa leitura, poste-riormente, permitiu ao poeta compreender a realidade em que ele vivia? Comente.

3. a comPreensão na Leitura Segundo Mary A. Kato, para que uma leitura se efetive como processo de comunicação e de aqui-sição e desenvolvimento de conhecimento, é pre-ciso considerar alguns fatores, como: a) o grau de maturidade do leitor, b) o nível de complexidade do texto, c) o objetivo da leitura, d) o grau de co-nhecimento prévio do assunto trato, e) do estilo individual do leitor. Nesses tópicos, discutiremos esses aspectos com vistas ao entendimento do pro-cesso de leitura.

O processo de Comunicação ocorre quando o emissor (ou codificador) emite uma mensagem (ou sinal) ao receptor (ou decodificador) por meio de de um canal (ou meio). O receptor interpretará a mensagem que pode ter chegado até ele com al-gum tipo de barreira (ruído, bloqueio, filtragem) e,

12 Fascículo 1

Linguagem não-verbal: as pessoas não se comuni-cam apenas por palavras. Os movimentos faciais e corporais, os gestos, os olhares, a entoação são também importantes: são os elementos não-verbais da comunicação.

Os significados de determinados gestos e compor-tamentos variam muito de uma cultura para outra e de época para época.

A comunicação verbal é plenamente voluntária; o comportamento não-verbal pode ser uma reação involuntária ou um ato comunicativo propositado.

Alguns psicólogos (e.g. Armindo Freitas-Maga-lhães, 2007) afirmam que os sinais não-verbais têm as funções específicas de regular e encadear as interações sociais e de expressar emoções e atitudes interpessoais.

• expressão facial: não é fácil avaliar as emoções de alguém apenas a partir da sua expressão fisionômica. Por vezes, os rostos transmitem espontaneamente os sentimentos, mas muitas pessoas tentam inibir a expressão emocional.

• movimento dos olhos: desempenha um pa-pel muito importante na comunicação. Um olhar fixo pode ser entendido como prova de interesse, mas noutro contexto pode significar ameaça, provocação. Desviar os olhos quando o emissor fala é uma atitude que tanto pode transmitir a ideia de submissão como a de desinteresse.

• movimentos da cabeça: tendem a reforçar e sincronizar a emissão de mensagens.

• postura e movimentos do corpo: os movi-mentos corporais podem fornecer pistas mais seguras do que a expressão facial para se de-tectar determinados estados emocionais. Por ex.: inferiores hierárquicos adotam posturas atenciosas e mais rígidas do que os seus supe-riores que tendem a mostrar-se descontraídos.

• comportamentos não-verbais da voz: a entoação (qualidade, velocidade e ritmo da voz) revela-se importante no processo de comunicação. Uma voz calma geralmente transmite mensagens mais claras do que uma voz agitada.

• a aparência: a aparência de uma pessoa reflete

a partir daí, dará o feedback ou resposta, comple-tando o processo de comunicação.

O processo de Comunicação engloba ações e elementos abaixo discriminados.

Elementos da Comunicação:

• Codificar: transformar, num código conheci-do, a intenção da comunicação ou elaborar um sistema de signos;

• Decodificar: decifrar a mensagem, opera-ção que depende do repertório (conjunto estruturado de informação) de cada pessoa;

• Feedback: corresponde à informação que o emissor consegue obter e pela qual sabe se a sua mensagem foi captada pelo receptor.

Linguagem verbal: as dificuldades de comunica-ção ocorrem quando as palavras têm graus distin-tos de abstração e variedade de sentido. O signifi-cado das palavras não está nelas mesmas, mas nas pessoas (no repertório de cada um que lhe permite decifrar e interpretar as palavras);

Figura 5. leitura: observe o personagem de Ziraldo, o Menino Maluquinho, sen-tado numa poltrona de cinema, comen-do pipoca e lendo o livro. O desenho faz, então, uma analogia entre o ato de ler e o de assistir a um filme.

EPSTEIN, Isaac. Teoria da Informação. São Paulo, Ática,

2004.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_da_informacao

- verbete da Wikipédia.

http://www.radames.manosso.nom.br/retorica/teoriain-

formacao.htm

- texto que discute aspectos da teoria da informação.

textos comPLementares

13Fascículo 1

normalmente o tipo de imagem que ela gos-taria de passar. Por meio de do vestuário, penteado, maquilagem, apetrechos pesso-ais, postura, gestos, modo de falar, etc, as pessoas criam uma projeção de como são e de como gostariam de ser tratadas. As re-lações interpessoais serão menos tensas, se a pessoa fornecer aos outros a sua projeção parti-cular e se os outros respeitarem essa projeção.

reLacionamento interPessoaL

• construção da identidade (ERIKSON, 1872). • implica definir quem a pessoa é, quais são seus

valores e qual direção deseja seguir pela vida. (Fonte: Wikipédia).

Obra citada: Freitas -Maga-lhães, A. (2007). A Psicologia das Emoções: O Fascínio do Rosto Huma-no. Porto: Edi-ções Universi-dade Fernando Pessoa.

Este post escrito por João Boavida, Professor da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, e publicado no Diário AS BEIRAS em 20/11/07 vem muito a propósito da recente polêmica sobre o ensino da língua portuguesa do ensino básico, que, em bre-ve, será discutido na Assembleia da República.

síntese

Neste tópico, estudamos como o ato de ler envolve um processo de comunicação, que, por sua vez, se liga à Teoria da Informação e que, ainda, a leitura é um meio pelo qual criamos uma compreensão do mundo. Nesse sentido, a pedagogia, a aprendi-zagem do processo de leitura e a psicologia estão ligadas no estudo e na análise do mesmo ato, apa-rentemente simples para quem está acostumado a ler e é um bom leitor, mas é, em verdade, uma ação extremamente complexa e abstrata da civilização humana, talvez a sua ação mais humana que nos diferencie dos demais animais.

atividade crítica/refLexiva | Você já pen-sou que temos diferentes estilos de leitura, isto é, que cada pessoa tem um modo, ou um hábi-to de ler diferente de outra, alguns gostam de ler ouvindo música, outros no mais absoluto silêncio, uns leem com o marca-texto sempre em mãos, outros ainda leem sem qualquer apa-rato e em qualquer lugar. Discuta acerca das necessidades de lugar e tempo para o ato de ler no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

4. a Leitura através da História

Sempre se leu da mesma forma que o homem contemporâneo lê hoje?

Os egípcios, por exemplo, usavam os hieróglifos. Neste tópico, discutiremos diferentes processos de leitura, ligados diretamente ao modo como a escrita se desenvolveu. Já notou como as línguas orientais têm um processo de escrita e de leitura completamente diferente do nosso, fundamentado nos ideogramas? E alguns povos que leem em sen-

SAIBA MAIS!

A sedutora história da leitura por elias thomé

saliba. Um livro só começa a existir quando

um leitor o abre. – texto em que saliba co-

menta acerca do sentido da leitura através da

história, artigo da revista História viva, dispo-

nível em:

http://www2.uol.com.br/historiaviva/artigos/a_sedutora_histo-

ria_da_leitura.html

Figura 6. Lecture-Renoir: Nes-se quadro de Renoir, notemos como o ato de ler se transforma em texto pictórico para o qua-dro impressionista.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Pedagogia_da_compreen-

são_existencial

- texto da Wikipédia que comenta acerca de uma

pedagogia da compreensão existencial.

http://dererummundi.blogspot.com/2008/01/compre-

enso-na-leitura.html

textos comPLementares

14 Fascículo 1

tido inverso da linha ao nosso. Pois, então, neste tópico, discutiremos esses aspectos.

a evoLução do Livro e da Leitura O livro, como nós conhecemos hoje, surgiu no Ocidente por volta do Século II D.C., fruto de uma revolução que representou a substituição do Vólumen pelo Códex, ou da forma de organizar em rolos para a forma atual composta por cadernos reunidos. Essa mudança não ocorreu de súbito, e as primeiras a aderirem foram as comunidades cristãs ainda no Século II. O mundo greco-romano relutará em assumi-lo. Só por volta do século V é que haverá tanto Códex quanto rolos.

Várias eram as vantagens da nova forma de supor-te: a utilização dos dois lados do suporte, a reunião de um número maior de textos em um único volu-me, absorvendo o conteúdo de diversos rolos, a in-dexação permitida pela paginação, a facilidade de leitura; enquanto que o Vólumen exigia, para ser

desenrolado e lido, a utilização das duas mãos; o Códex depositado em uma mesa pode ser lido sem o auxílio das mãos, liberando-as para o exercício de anotações. As mudanças, como se vê, eram signifi-cativas: tornava-se possível a redução dos custos de fabricação e, ao mesmo tempo em que se facilitava a leitura, concedia-se ao leitor a oportunidade de anotar, comparar e criticar o texto lido.

Com o Códex, criou-se a tipologia formal, abrindo caminho para toda a padronização de formatos as-sociada a gêneros e tipos de livro, normatização da qual são herdeiras as formas atuais de editoração.

Nestes 18 séculos que nos separam da passagem do Vólumen ao Códex, outras transformações significativas ocorreram no âmbito do livro e da leitura. A partir do século XIV, os impressores passaram a se responsabilizar por todas as marcas, títulos, capítulos e cabeças de páginas, eliminando a intervenção direta do corretor ou possuidor do li-vro. A separação entre as palavras, o estabelecimen-to de parágrafos, a numeração de capítulos, dentre outros, são adventos que irão interferir diretamen-te na leitura e que tomarão possível a proliferação de um leitor silencioso, que se vale apenas do olhar para apropriar-se do texto. Todo o aparato da lei-tura que na Antiguidade era predominantemente um ato sonoro e coletivo (voz alta) transforma-se em um ato solitário. O leitor silencioso, em geral, confunde-se com o leitor extensivo, qual seja, aquele que tem, à sua disposição, um número muito grande de títulos para se apropriar, comparar e fundar a partir de seus comentários e novos textos. É o oposto do leitor intensivo, predominante em toda a Idade Média, ou seja, um leitor que dispõe, apenas, de um pequeno número de livros e que faz da leitura desses textos um ato sagrado.

O advento da imprensa de tipos móveis criou condições para que o leitor silencioso proliferasse por toda a Europa; uma verdadeira cultura letrada desenvolveu-se, à medida que os originais se mul-tiplicavam e que a oferta de títulos aumentava ver-tiginosamente. Enquanto a leitura em voz alta per-manecia forte nos meios populares, dedicando-se a um pequeno número de obras, em geral, roman-ces, contos populares e poemas, a leitura com os olhos se dedicava à mais ampla gama de assuntos, em especial os científicos e filosóficos. Era, portan-to, praticada por um seleto grupo de leitores.

Figura 7. Leitura Hieroglífica: observe a es-crita em sentido vertical e a utilização icô-nica (imagens) para compor a escrita nos hieróglifos egípcios antigos.

http://www.joia-e-arte.com.br/ideochineses.htm

- texto que comenta acerca do significado de alguns ide-

ogramas de conceitos abstratos.

http://www.suapesquisa.com/artesliteratura/historiada-

escrita.htm

- breve texto acerca da História da Escrita.

textos comPLementares

15Fascículo 1

No século XXI, proliferaram dezenas de novos mo-delos de suporte para leitura. Desta vez, tinha-se a impressão de que voltaríamos ao passado. Sim, porque o texto estava mais uma vez rolando em algo, desta vez, não através do Vólumen, mas pelo Écran (tela do computador) e com a ajuda da barra de rolagem. O texto eletrônico permite, de alguma forma, que possamos ler num suporte muito próxi-mo ao modelo do caderno, em termos de tamanho e peso, porém como se fosse em rolos. O Vólumen levava os pensamentos ali escritos em uma unida-de. O caderno, tão moderno e tão sofisticado em si, leva folhas presas, grampeadas ou costuradas.

Da evolução do Vólumen ao Écran, passamos pelo Códex e chegamos aos eBooks. Fonte: Revista Editor - trechos do artigo “O Livro Digital”

por José de Mello Jr. ANO 2 - Nº 8 - Fevereiro/Março 2000

No Império Romano, desenvolveu-se uma inci-piente indústria livreira. Os editores repartiam o papiro entre os librarii e os copistas, para os quais o texto era ditado. Depois de corrigidos por revi-sores, os textos eram encadernados. Tornou-se in-tenso o comércio de rolos e códices nas chamadas tabernae librariae.

Cedo, os primeiros mosteiros cristãos acolheram, em sua estrutura, frades encarregados de prepa-rar as tintas e os pergaminhos, enquanto outros, chamados scriptores, copiavam os textos na sala conhecida como scriptorium.

Idade Média. A partir do século VII, passou-se a assinalar o fim do caderno por meio de sinais con-

vencionais, inscritos na parte inferior da última página e repetidos na página seguinte. O termo codex aureus designa um volume com letras dou-radas, gravadas em folhas pigmentadas com um corante púrpura, o murex. Os espécimes existentes datam dos séculos VIII e IX. No século XI, passou-se a marcar a continuidade dos cadernos, escreven-do, no fim da última página, a primeira palavra do caderno seguinte. No século XIII, quase todos os códices eram assinalados dessa forma, e, no século XVI, a prática se generalizou.

A partir do século XII, quando surgiram as univer-sidades, e o pensamento ocidental experimentou uma completa renovação, a demanda de códices se multiplicou extraordinariamente e desenvolveu-se uma nova indústria, que pouco devia à da época romana. As cidades universitárias acolhiam todos os que participavam da fabricação dos livros, desde copistas e encadernadores até comerciantes.

Embora as técnicas empregadas no século XII não diferissem das antigas, os novos artesãos do livro, agora reunidos em grêmios, rivalizavam entre si, na excelência de seus trabalhos e formavam escolas ligadas a alguma universidade ou país. As universi-dades, por sua vez, não permitiam a circulação de cópias de má qualidade e, em seus esforços para proteger a pureza e a exatidão dos textos, obriga-vam os stationarii, ou comerciantes de livros, a te-rem exemplaria ou cópias-mestras autorizadas, das quais não podiam se desfazer.

Nessa época e antes da invenção da imprensa, os leitores podiam prover-se de livros, comprando-os diretamente, nos stationarii ou encomendando-os a um scriptor ou copista. Estes costumavam alugar os cadernos aos livreiros, com preços determina-dos pela universidade. O sistema de cadernos per-mitia que vários copistas trabalhassem na mesma obra, simultaneamente. Às universidades também se reservava o direito de inspecionar as exemplarias em poder dos livreiros.

Além desses livros de texto, que tinham certa difu-são, no fim da Idade Média, as igrejas e os grandes magnatas costumavam encomendar a confecção de luxuosos códices de grande valor artístico. Esses li-vros já não eram realizados por copistas, mas sim, por calígrafos e ilustradores muito especializados.

Foi também frequente a redação de códices sobre pergaminhos anteriormente escritos e depois ras-

Figura 8. escrita cuneiforme: observe a escrita cuneiforme dos assírios e babilô-nios. Era assim chamada por utilizarem cunhas ou estiletes para sulcar as tabui-nhas de argila com que escreviam.

16 Fascículo 1

atividade crítica/refLexiva | Você já ob-servou os Ideogramas japoneses e chineses? Eles aparecem em capas de alguns cadernos, como elemento figurativo, em xícaras, camise-tas, toalhas. Já pensou no efeito plástico, isto é, de figura que esses Ideogramas contêm. Discuta acerca do sentido figurativo, plástico das letras no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

5. como Ler um Poema modernista?

anáLise estruturaL formaLista de aLguns Poemas do modernismo brasiLeiro

O Modernismo brasileiro tem sido considerado um momento de radicalidade em experimentação poética na literatura brasileira, como também tem sido visto como um momento de destruição, de nihilismo em relação aos padrões clássicos e par-nasianos da literatura do século XIX.

pados e apagados, os palimpsestos, que prolifera-ram sobretudo nos séculos VII e VIII, devido à fal-ta de pergaminhos virgens. Entre os palimpsestos mais famosos, destaca-se o da Biblioteca Vaticana que contém o Da Republica, de Cícero.

A invenção da imprensa e o desenvolvimento do papel como suporte para a escrita multiplicaram as possibili-dades da edição de livros e acarretaram a decadência dos códices. Durante o Renascimento, os estudiosos do classicismo puseram, em moda, os códices escritos com a chamada littera antiqua, muito apreciados pelos colecionadores.

Fonte: http://www.ebookcult.com.br/ebookzine/codex.htm

Nova Enciclopédia Barsa Edição 2000 - ©Encyclopaedia Britannica do

Brasil Ltda.

Neste tópico, apresentamos textos acerca das dife-rentes formas de ler e escrever, tanto as formas anti-gas quanto as contemporâneas, isto é, ainda em uso. Mostramos os aspectos definidores do processo de leitura, enquanto técnica ligada à forma de escrita.

SAIBA MAIS!

http://www.ingers.org.br/Paleo1.html

- Interessante texto acerca da importância

da paleografia.

traz também link acerca da evolução das

letras no alfabeto latino.

santo Agostinho foi, ao que se tem notícia,

uma das primeiras pessoas que reconheci-

damente exercia a prática da leitura silen-

ciosa. Durante a Idade média e a Antigui-

dade, a leitura se fazia sempre com a voz,

mesmo estando só. Na leitura silenciosa,

o leitor imagina uma voz interna, mental,

que articula as palavras num sentido abs-

trato, imaginário.

Figura 9. Semana de 22: na foto, o grupo de Moder-nistas que organizou a Semana de Arte Moderna de 1992, em São Paulo. Em primeiro plano, agachado, Oswald de Andrade.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Códice

- verbete da Wikipédia, com link para os diferentes

códices da Paleografia.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Paleografia

- verbete da Wikipédia acerca da Paleografia.

textos comPLementares

http://pt.wikipedia.org/wiki/Niilismo

- verbete da Wikipédia acerca do Nihilismo

http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/N/nihilismo.htm

- Artigo interessante acerca do significado do Nihilismo.

textos comPLementares

17Fascículo 1

Como observa Maria Eugênia Boaventura, essa ex-perimentação radical modernista tinha mais pre-tensões do que a simples provocação aos valores do passado literário:

Que outra intenção teriam os escritores de vanguarda para praticarem esse tipo de experimentação estética, além do efeito imediato de inovação e provocação, já assinalados? De novo, tem-se uma resposta no conjunto da obra de Michel Bu-tor, que demonstrou como a noção de literatura - expressão de propriedade de um indivíduo - vai cedendo lugar à litera-tura feita por todos e para todos. A abolição da fronteira dis-cursiva textual (separação de tipos de discurso, problemas de propriedade, direitos autorais) deve ser o passo inicial para a concretização da verdadeira intertextualidade. E a derrubada de outras barreiras mais amplas que as da literatura está pre-liminarmente implicada, como adverte Leila Perrone-Moisés. (BOAVENTURA: 1985, p. 132-133).

Mário da Silva Brito também comenta acerca da na-tureza desse espírito antagônico dos modernistas aos valores da literatura do século XIX:

Os escritores moços de São Paulo adotam atitudes de antago-nismo ao passado, ao realismo, às escolas romântica, parna-siana e regionalista e debatem, apoiados numa visão paulista da realidade brasileira, o tema da formação racial do país. De permeio à polêmica propriamente dita, cuidam ainda de di-vulgar os valores modernos, quer nacionais quer estrangeiros, oferecendo ao público o conhecimento direto do que seja a nova estética (BRITO: 1978, p. 215).

Do comentário de Mário da Silva Brito ainda pode-mos depreender a questão geográfica cultural de que o Modernismo de 22 está centralizado em São Paulo, a cidade que mais progredia em termos de urbanida-de naquele início de industrialização do país. De sorte que a urbanidade efervescente, requerida pela estética modernista, em razão de suas ligações com o Futu-rismo e o Cubismo, se fazia oferecer em São Paulo. Veja-se a esse respeito a primeira parte do romance Os Condenados (Alma) de Oswald de Andrade ou ainda, o cenário em que se desenvolve a trama de Memórias Sentimentais de João Mi-ramar (ainda Oswald) ou a vinda do personagem herói de, Macunaíma (Mário de Andrade) a São Paulo em busca da mui-raquitã e o seu confronto com o gigante Piaimã que era o industrial Venceslau Pietro Pietra.

A experimentação modernista fundamentava-se também numa proposta de atualização da lite-ratura com as modificações sociais as quais a sociedade estava vivenciando desde o final do império:

O Modernismo ressuscitou o texto com a dicção do povo, abalando uma sintaxe, incorporando e modulando um tipo de expressividade; vale dizer - uma dicção que é a média global da língua geral brasileira. Esta fala-com-portamento, como resultante de um viver nacional em formação, é dinâmica no sentido de estar mais voltada para a mensagem do que para o código. Isto é, no Mo-dernismo, a mensagem pressiona o código no sentido de reatualizá-lo constantemente em função das profundas transformações da vida brasileira (SALLES: 1974, p. 50).

Figura 10. Quadro de Alde-mir Martins, Macunaíma.

SAIBA MAIS!

A semana de Arte moderna de 22, realizada

entre 11 e 18 de fevereiro de 1922, no teatro

municipal de são paulo, contou com a partici-

pação de escritores, artistas plásticos, arquite-

tos e músicos.

seu objetivo era o de renovar o ambiente

artístico e cultural da cidade com “a perfeita

demonstração do que há em nosso meio em

escultura, arquitetura, música e literatura sob

o ponto de vista rigorosamente atual”, como

informava o Correio paulistano a 29 de ja-

neiro de 1922.

A produção de uma arte brasileira, afinada

com as tendências vanguardistas da europa,

sem, contudo, perder o caráter nacional, era

uma das grandes aspirações que a sema-

na tinha em divulgar.

http://t.wikipedia.org/wiki/Cubismo

- verbete da Wikipédia acerca do Cubismo

http://pt.wikipedia.org/wiki/Futurismo

- verbete da Wikipédia acerca do Futurismo.

textos comPLementares

18 Fascículo 1

atividade crítica/refLexiva | A busca constante da originalidade é um dos tópicos comuns da Arte Moderna e da Literatura Mo-derna, porém, tomando por base o que você já aprendeu sobre Intertextualidade, em que medida a originalidade pode estar livre ou im-pregnada de referências aos modelos do pas-sado? Apresente sua opinião no FÓRUM TE-MÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

6. Leitura de Poemas modernistas

Para Haroldo de Campos, a poesia modernista é fruto de uma contradição entre duas classes sociais, que, no início do século XX, disputavam o poder:

(...) constitui-se num primeiro fator de instabilidade que, paulatinamente, através do fenômeno da massifica-ção, desenharia o conflito fundamental ‘entre as massas urbanas, sem estruturação definida e com liderança po-pulista, e a velha estrutura de poder que controla o Es-tado’. Os esforços de atualização da linguagem literária, levados a cabo pelo Modernismo de 22, acusam, como uma placa sensível, o configurar-se dessas contradições (CAMPOS: 1971, p. 12).

Buscamos agora fazer uma breve, aliás brevíssi-ma, análise de alguns poucos poemas modernis-tas, com vistas a demonstrar os elementos estru-turais composicionais que fundamentaram esse processo de atualização da linguagem e, por con-seguinte, de quebra do padrão poético anterior.

Figura 11. Haroldo de Campos em sua bibliocasa (este é mesmo um grande leitor, não?!)

sistematização

aLguns Processos de comPosição Poética modernista A musicalidade em Manuel Bandeira

Já comentamos em outro trabalho a questão da forma aparentemente simples de alguns poemas de Manuel Bandeira, um lirismo calcado em um ritmo moderno de versos livres, lânguidos, que es-conde, ao que nos parece, um pensar e uma práxis das formas poéticas fundadas em complexas rela-ções de ritmo, estrato fônico e figuras.

Manuel Bandeira, cuja poesia se iniciou entre lai-vos de Simbolismo e Parnasianismo, logo se jun-tou à rebeldia dos mais jovens, como Mário de Andrade e Oswald de Andrade. Em Libertinagem (1930), Mário de Andrade aponta em Bandeira a ideia de que o poeta atingiu um estado de cristali-zação do ritmo poético moderno: “Ritmo de todos os ângulos, incisivo, em versos espetados, entradas

bruscas, sentimento em lascas, gestos quadra-dos, nenhuma ondulação” .

Notemos as qualificações usadas para definir o ritmo de Bandeira: “ângulos, incisivo, espe-tados, quadrados”, é como se Mário quisesse nos chamar a atenção para a concretude do ritmo; ele não fala do ritmo como um senti-mento vago, subjetivo da sonoridade do poe-ma, mas, de algo materializado, presente esta-tística e fisicamente nas palavras dos versos. Se, por exemplo, analisarmos o poema “Não Sei Dançar”, o primeiro de Libertinagem, já podemos perceber de que fala Mário. O rit-mo cristalizado em uma nova solução formal,

que não se fundamenta na tradição versificatória clássica (métrica, acento tônico, etc.) mas, no do-mínio de construções sintáticas originárias de um

http://pt.wikipedia.org/wiki/Cultura_de_massa

- verbete da Wikipédia acerca da Cultura de Massa.

http://br.geocities.com/intertexto/jornalismo/alienacao.

htm

- artigo acerca da televisão como mediadora da cultura

de massa.

textos comPLementares

19Fascículo 1

Na última estrofe, as palavras “Ninguém”, “Nem” e “Não” mantêm o ritmo por meio da articulação de orações e frases que abrem, findando o poema com o mote “Eu tomo alegria”, em que o verbo tomar ressurge com sua força para encerrar o po-ema. Assim “Não sei Dançar” é, de certo modo, a proposição de uma nova dança, um novo ritmo, que surge em oposição às regras versificatórias tra-dicionais, em que o verso livre é mais uma contra-dança do que a dança. A pluralidade de ritmos não é o caos rítmico, mas, a aproximação da linguagem poética à riqueza polifônica do falar da língua portuguesa.

Em “Poema do Beco” (Estrela da Manhã, 1936), a síntese rítmica é conseguida com um choque brus-co, um fim surpreendente num poema de dois ver-sos, de caráter prosódico em que a expressão inter-rogativa “Que importa?”, comum na fala popular, é concluída com um verso iniciado em travessão, que pela concisão e brevidade nos causa estranha-mento: “-O que eu vejo é o beco”. Assim os termos do verso anterior ficam ambiguizados, relativizados entre a denotação e a conotação: “Glória”, “baía”, “paisagem”, “linha do horizonte”. Pode-se ver con-cretamente a linha do horizonte na mancha das

p a l a v r a s do poema no papel, e o beco é a interrup-ção dessa linha no s e g u n d o verso.

falar popular cotidiano que inclui repetições, pa-ralelismos.

O início do poema:

“Uns tomam éter, outros cocaína.Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria.Mas o cálculo das probabilidades é uma pilhéria...Abaixo Amiel!E nunca lerei o diário de Maria Bashkirtseff.”

Os dois primeiros versos nos propõem quatro ora-ções centradas no verbo “tomar” em que os obje-tos (éter, cocaína, tristeza e alegria) criam uma rede significante baseada num ritmo veloz e musical. A oração adversativa do verso seguinte rompe o rit-mo fundado nos versos anteriores; o grito excla-mativo do verso seguinte desordena ainda mais a musicalidade, criando a surpresa e aumentando a vocalização do poema; o verso final da estrofe, ini-ciado com uma conjunção aditiva, retoma o tom do ritmo do terceiro verso.

Henri Fredéric Amiel, poeta e filósofo suíço do século XIX, cuja principal obra é um “Diário Ín-timo”, é o alvo da crítica do modernista Manuel Bandeira; assim também é criticada Maria Bashkirtseff, pintora ucraniana, também do século XIX, cujo diário escandalizou um pouco, em razão de suas confissões íntimas, publicado postumamente.

Na estrofe seguinte, Manuel Bandeira re-sume sua biografia, ou seu “diário íntimo” em dois versos e busca o ritmo como so-lução anarcotizante para a dura realidade: “Sim, já perdi pai, mãe, irmãos. / Perdi a saúde também. / É por isso que sinto como ninguém o ritmo do jazz-band.” O verbo perder substitui a função ritmo do verbo tomar na estrofe anterior, pela sua recorrên-cia, pela organização das orações. A quarta estrofe faz uso do diálogo em tom cotidiano e in-formal para criar uma nova tensão rítmica: “Mis-tura muito excelente de chás... / Esta foi açafata... / - Não foi arrumadeira. / E está dançando com o ex-prefeito municipal: / Tão Brasil!” Em que o verso ser fundamenta o ritmo da estrofe ao lado da homonímia das palavras “esta”/”está”. O final da estrofe (“Tão Brasil!”) servirá ainda para fechar a sétima estrofe, transformando-se num mote dentro do poema, assim como o verso “Uns tomam éter, outros cocaína”.

Fig12 – Manuel Bandeira, poeta, em sua biblioteca

http://pt.wikipedia.org/wiki/Métrica_(poesia): verbete da Wi-

kipédia acerca do conceito de metrificação, contagem rítmica

das sílabas do verso.

texto comPLementar

20 Fascículo 1

trova

A trova tradicional é uma composição poética de qua-tro versos de sete sílabas poéticas cada, em que o 1º verso rima com o 3º, e o 2º verso, rima com o 4º.

Quando você foi emborapensei que eu fosse morrer!Aprendi em boa hora:nem todo amor faz viver! (Kathleen Lessa)

Encontram-se em trovas mais antigas rimas:• do 1° verso com o 4° e do 2º verso com o 3º• do 1º verso com o 2º e do 3º verso com o 4º.

Há ainda trovas em que se faz rima apenas do 1º verso com o 3º, mas isso não é bem visto e nem sempre aceito em concursos.

A trova, para ser bem feita, tem de ter um ACHADO. Achado é algo diferente, uma surpresa, uma con-clusão no último verso.Adelmar Tavares diz : “Nem sempre com quatro versos setissílabos, a gente consegue fazer a trova; faz quatro versos, somente”. Ou seja: não é trova, se não houver o achado.

Nota 1 - Comece a trova sempre com letra mai-úscula. A partir do segundo verso, utilize letra minúscula, ao menos que a pontuação indique o início de nova frase. Nesse caso, use a maiúscula novamente. Aprenda a trovar, fazendo poesia de qualidade.

Nota 2 - “sílaba poética” é diferente de “sílaba gramatical”.As sílabas poéticas são contadas pelo SOM, pela emissão natural da voz.Na contagem dos versos, o número de sílabas poé-ticas é contado somente até a última sílaba tônica. As restantes após a tônica são desprezadas.

Ex: Hora de acender as lâmpadas.

Aqui há 10 sílabas gramaticais:

Ho/ra/ de/ a/cen/der/ as/ lâm/pa/das/

Mas há 7 sílabas poéticas: Ho/ra/ de_a/cen/der/ as/ lâm/padas“lâm” é a última sílaba tônica do verso, e contamos somente até ela.

Ex: Veja o mar de Parati.

Aqui são 8 sílabas gramaticais, mas 7 sílabas poé-ticas.

Ve/ja_o/ mar/ de/ Pa/ra/ti/

“ti” é a última sílaba tônica do verso; contamos até ela.

Ex: Eu/ vi/ mi/nha/ mãe /re/zan/do _________7Aos/ pés/ da / Vir/gem/ Ma/ri/a _________7E/ra_u/ma/ San/ta_es/cu/tan/do __________7O /que_ou/tra /San/ta/ di/zi/a _________7

Nota 3 - Elisão Quando uma palavra termina por vogal átona e

SAIBA MAIS!

trova e trovismo

A trova é uma tradição iniciada por volta do

século XI d.C. em proença, na frança. É duran-

te este período que as poesias passam a ser

acompanhadas de músicas, o que perdurou por

muito tempo, havendo inclusive remanescentes

desta tradição em nossa famosa literatura de

Cordel, muito conhecida no Nordeste brasileiro.

Os repentistas realizam seus trabalhos por meio

de trovas, nem sempre com versos heptassíla-

bos, mas geralmente é esta a medida presente

em seus repentes.

embora a literatura de Cordel e os repentes

apresentem características de trovas, os trova-

dores hoje se constituem em um grupo especí-

fico de poetas, em cujo dia 18 de julho, come-

mora-se o “Dia do poeta trovador”.

Assim, supomos que em Manuel Bandeira, é pos-sível encontrar não só nesses dois exemplos mas em vários poemas, essa tensão entre um ritmo criado da incorporação de construções sintáticas simples, cotidianas, populares a um projeto de atualização do fazer poético. Não é por acaso que seu texto Itinerário de Pasárgada se nos mostra como um dos melhores exemplos de definição do ritmo poético do verso livre, mostrando como o Modernismo construiu um novo conjunto de procedimentos rítmicos.

21Fascículo 1

atividade crítica/refLexiva | Você já experimentou escrever um poema, seja em verso medido ou livre? Escreva um poema e o coloque no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina. Aproveite para fazer um comentário crítico dos poemas dos colegas lá postados.

7. a musicaLidade da Poesia moderna

a musicaLidade de mário de andrade Num belo ensaio, Antônio Manoel já havia nos chamado a atenção para uma teoria musical da po-esia em Mário de Andrade. Seguindo um pouco a trilha construída por Antônio Manoel, acredita-mos que, em vários poemas de Mário de Andrade, existe essa caracterização do ritmo poético, fundado num traba-lho com construções sintáticas, como se elas fossem acordes para uma nova har-monia. Nesse âmbi-to, as reticências e as exclamações têm papel fundamental, uma vez que incor-poram o ritmo e o silêncio como deter-minantes da leitura.

Em um poema como “O Trovador” (Paulicéia Des-vairada, 1922), podemos perceber isso. O poema se abre com uma sequência de palavras em que a extensão (polissílabas) e a escassez de sílabas tôni-cas criam um efeito musical lânguido, reforçado

a seguinte começa por vogal ou ditongo, conta-se uma sílaba só.

Ex.: Ou/ vin/do_a /fa /la /do / ven/to. 7 sílabas poéticas

Que/ro_u/ma /ca/sa/ no/ cam/po. 7 sílabas poéticas

Nota 4 - Ditongos e Hiatos na Métrica

Para atender à métrica, hiatos podem transfor-mar-se em ditongos (Sinérese), e ditongos em hiatos (Diérese).

Ex: Su-a-ve por Sua-ve (3 sílabas viram 2)Sau-da-de por Sa-u-da-de (3 sílabas viram 4)

A Trova é uma composição poética que deve obe-decer às seguintes características:

1. Ser uma quadra. Ter quatro versos.2. Cada verso deve ter sete sílabas poéticas, ser

setessilábico. As sílabas são contadas pelo som. (sílabas poéticas)

3. Ter sentido completo e independente.

O tema desenvolvido deve “caber” dentro dos 4 únicos versos. A Trova difere dos versos da Litera-tura de Cordel, na qual, em quadra ou sextilhas, o autor conta uma história que, no final, soma mais de cem versos.

4. Ter rima. A rima poderá ser do primeiro verso com o terceiro e o segundo com o quarto, no esquema ABAB, ou ainda, somente do segun-do com o quarto, no esquema ABCB.

Segundo o escritor Jorge Amado:

“Todo Trovador é poeta, mas nem todo poeta é trovador. Nem todos poetas sabem metrificar, fazer o verso medido. Poeta para ser Poeta precisa saber metrificação, saber con-tar o verso. “

Fontes:

www.geocities.com/clerioborges (Poeta Trovador Clério José Borges)

www.terradapoesia.cjb.net (Projeto Cultural ABRAVILI )

http://www.geocities.com/congressobrasileirodetrovadores/origem.

html

Kathleen Lessa

Figura 13. retrado de Mário de Andrade, pintado por Lasar Segall. Observe a ge-ometrização do fundo e do rosto, segundo conceitos do Cubismo.

MÚSICA E POESIA

A RELAÇÃO COMPLEXA ENTRE DUAS ARTES DA COMUNI-

CAÇÃO Maria Cristina Aguiar

Assistente do 1º Triênio da ESEV

Arte e Expressões Criativas – Música

Texto em pdf, disponível em: www.ipv.pt/forumedia/6/13.pdf

texto comPLementar

22 Fascículo 1

pelos fonemas nasalisados e pela vogal “e”: “Sen-timentos em mim do asperamente / dos homens das primeiras eras... / As primaveras do sarcasmo / intermitentemente no meu coração arlequinal... / Intermitentemente...” As reticências dão a ideia de continuidade dessa nasalização, que desaparece no ar, até sumir em silêncio. Numa segunda parte do poema que se inicia com um “O” maiúsculo, fechado e redondo (“Outras vezes é um doente, um frio”) cujo verso também termina num “o” contínuo que se fecha em “u”, reforçando a per-cepção sonora desse frio doente. O som redondo é referido no verso seguinte: “na minha alma do-ente como um longo som redondo...” As exclama-ções de “Cantabona! Cantabona!” Tipo de sino, dos quais existe um no mosteiro de São Bento no centro de São Paulo e que quebra a languidez pela surpresa, pelo imprevisto. O longo som redondo agora não é mais o do frio, mas a onomatopeia do sino (“Dlorom”), ressoando conjuntamente à nasalização e ao som redondo.

O poema termina com o verso solitário em que o poeta se apresenta como “um tupi tangendo um alaúde!” Assim o poeta tupi utiliza um instrumen-to que vem do Oriente, a música que sai daí não é uma música oriental, mas, a música de um tupi. É a poesia moderna brasileira buscando seu ritmo, não no aperfeiçoamento ou mesmo na cópia do ritmo incorporado mas também na utilização do instrumento para um ritmo próprio, que se des-cobre na exploração da musicalidade da língua portuguesa. O trovador Mário de Andrade é assim esse tupi (homem das primeiras eras), que observa a musicalidade da nova língua (a portuguesa) e a transforma em poesia.

Em “Máquina de Escrever” (Losango Cáqui, 1926), Mário de Andrade busca a exploração do ritmo poético agora na quebra e no corte contínuo dos versos, desenhando com recuos e enjambements uma poesia que impõe um ritmo já pelo correr dos olhos, pelo espaço da folha de papel, ainda que orientada pela ditadura da line-aridade, mas tensionando essa linearidade ao máximo:

“Escrevendo com a mesma letra...................Igualdade................Liberdade...........Fraternité, point.Unificação de todas as mãos...”

A máquina de escrever é a concretização desse novo fazer poético, não é mais a pena, que dançava em volteios pelo papel, imprimindo na caligrafia de cada um a personalidade grafológica de seu autor; agora é a digitalização, os dedos do poeta, batendo nas teclas, imprimem tipos, letras de forma mecâ-nica, automática. O ritmo é mais veloz, mais baru-lhento, mais urbano: “B D G Z, Remington. / Pra todas as cartas da gente. / Eco mecânico / De sen-timentos rápidos batidos. / Pressa, muita pressa.” Assim como a poesia moderna busca incorporar a “contribuição milionária de todos os erros” (parafra-seando Oswald) do falar cotidiano, da língua viva, também o erro na escrita é incorporado ao poema de forma que tal erro crie o momento de revelação das contradições: “A interjeição saiu com um ponto fora de lugar! / Minha comoção / se esqueceu de bater o retrocesso”. O poeta observa o novo sinal, resultado do erro [|.] e analisa a nova forma: “Ficou um fio / Tal e qual uma lágrima que cai / E o ponto final depois da lágrima”. A seguir, o poeta ironiza o sentimento exposto na nova forma, ao dizer que “não tive lágrimas” e que “a máquina mentiu!”, uma vez que “sabes que sou muito alegre”.

Por fim, o poeta diz fazer sua “assinatura manus-crita” na folha de papel, uma vez que é preciso marcar sua personalidade no poema, uma vez que a máquina de escrever pode reclamar co-autoria. De certo modo, Mário de Andrade colocava, no papel, a discussão que Marshal Mcluhan levou em seu Galáxia de Gutenberg acerca da modificação da percepção humana na passagem da escrita ma-nuscrita para o texto impresso.

Em “III - [Pronomes Pessoais] de Remate de Males (1930), a exploração rítmica do poema atinge, tal-vez, o seu ponto máximo no sentido de que esse ritmo musical se presentifica cada vez mais pela incorporação de aspectos visuais no poema, na quebra da linearidade cursiva pela exploração de novas direções espaciais de leitura.

“Nunca em minuetes! Nunca em furlanas!....................................EU........................ELE....................................TU................................NÓS.............ELES............................... VÓS...Não paro.Não paras.”

Figura 14. Máquina de escrever Re-mington. Você já datilografou numa máquina de escrever? Você sabe o que é datilografia?

23Fascículo 1

Assim, em Mário de Andrade, vemos a busca de um poeta em que a musicalidade moderna exigia a exploração dos limites, não apenas gramaticais mas formais da palavra escrita e impressa. Aos supostos erros gramaticais da fala popular, acrescenta-se a discussão da relação entre manuscrito e texto im-presso, entre espaço da página e sonoridade das notas numa partitura musical. Mário de Andrade, de certa forma, reinventava, no verso moderno brasileiro, a busca mallarmaica da música simbolis-ta, só que agora num outro tom, numa nova escala e com novos instrumentos.

SAIBA MAIS!

http://www.releituras.com/marioandrade_menu.asp

- visite essa página, contém uma crônica de

mário de Andrade acerca da expressão popu-

lar “será o benedito?” leia aqui um trecho:

Nos primeiros dias, benedito fugiu de mim. só

lá pelas horas da tarde, quando eu me deixava

ficar na varanda da casa-grande, gozando essa

tristeza sem motivo das nossas tardes paulis-

tas, o negrinho trepava na cerca do manguei-

rão que defrontava o terraço, uns trinta passos

além, e ficava, só pernas, me olhando sempre,

decorando os meus gestos, às vezes sorrindo

para mim. Uma feita, em que eu me esforça-

va por prender a rédea do meu cavalo numa

das argolas do mangueirão com o laço tra-

dicional, o negrinho saiu não sei de onde, me

olhou nas minhas ignorâncias de praceano e

não se conteve:

— mas será o benedito! Não é assim, moço!

pegou na rédea e deu o laço com uma presteza

serelepe. Depois me olhou irônico e superior.

pedi para ele me ensinar o laço, fabriquei um

desajeitamento muito grande, e assim princi-

piou uma camaradagem que durou meu mês

de férias.

atividade crítica/refLexiva | Você acha que, de fato, o computador veio substituir a máquina de escrever? Você poderia reescrever o poema de Mário de Andrade acerca da má-quina de escrever, adaptando-o para o uso do pc? Discuta ou apresente sua opinião e traba-lho no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

8. o ritmo cinematográfico num

Poema modernista a cinematografia de oswaLd de andrade Oswald de Andrade é o mais radical dos poetas mo-dernistas brasileiros. Suas experimentações com a forma do verso livre, com o ready made, com a paródia e a montagem o aproximam dos vanguar-distas europeus mais radicais do Futurismo, do Cubismo e mes-mo do Dadaísmo. O que nos parece que mais difere o ritmo do poema oswaldiano para o ritmo de Manuel Bandeira e Mário de Andrade é a mudança de foco da relação poesia/música para poe-sia/cinema.

Em Oswald de Andrade, a imagem em movimento é o que determina o ritmo do poema. Haroldo de Campos já observara isso no seu ensaio “Uma Poé-tica da Radicalidade” quando nos fala em “câmera eye” e “visualidade e síntese”.

A paródia é um recurso poético, que já insere uma renovação rítmica, uma vez que existe um original que possui uma forma e um ritmo, e, agora, no texto que o parodia, o ritmo também é objeto des-

Figura 15. Retrato de Oswald de Andrade por Tarsila do Amaral.

www.revista.agulha.nom.br/and.html

- página com poemas e comentários acerca da poesia de

Mário de Andrade

http://www.jayrus.art.br/Apostilas/LiteraturaBrasileira/Mo-

dernismo22/Mario_de_Andrade_poesia.htm

- página de nosso site (Orfeu Spam) com poemas de Mário

de Andrade.

textos comPLementares

http://pt.wikipedia.org/wiki/Ready_made - verbete da wiki-

pedia acerca do conceito de ready made.

texto comPLementar

24 Fascículo 1

o instante mínimo da cena. Assim em “relógio”) “As coisas são / as coisas vêm / As coisas vão / As coisas”, o ritmo do pêndulo se presentifica na construção do poema, e em “Amor” (“humor”) poema de uma só palavra, a simples alteração de fonemas insere o texto, a troca de “a” por “(h)u” já é uma teoria acerca do amor, em tal bre-vidade e síntese que nenhum romântico ousaria pensar, uma vez que o romântico é o antissíntese, é o exagero da expressão subjetiva, e o amor moderno é fotográfi-co, visual, flash.

Assim, para lermos um poema moderno, temos que considerar não apenas o significado das pala-vras - o que aliás não se deve fazer com qualquer poema de qualquer escola - nem tampouco nos atermos ao verso livre ou branco como resultado de uma rebeldia - que até pode parecer gratuita, a alguns - contra a norma e a forma clássica. Para ler um poema modernista, é preciso também ler o que a forma do poema comunica, e o que ela comunica desenforma a informação do poema, tornando-a mais livre e rica, ao passo que aos olhos do poeta modernista, a forma clássica da tradição poética -materializada no Parnasianismo - era uma forma que conformava o poeta à poesia inerte na forma.

sa paródia. A manutenção ou a alteração do ritmo do texto original implica um processo de crítica do poema. Assim em “Meus Oito Anos”, Oswald mantém apenas fragmentos do ritmo original, re-criando-o numa forma mais breve, evidenciando, nessa brevidade, a velocidade da modificação da paisagem do quintal com horizontes para um quin-tal cercado de prédios.

O ready made, recurso vindo do Dadaísmo, permi-te a Oswald recortar trechos da carta de Pero Vaz Caminha, é a simples colocação de um título novo, o poema ressignifica todo o trecho cortado, como em “Meninas da Gare”.

A enumeração como forma de montagem cinema-tográfica poética não tem sido observada, e nisso fincamos nossas presentes palavras. De fato, enu-merações é o elemento de composição de alguns poemas de Oswald (“a Europa curvou-se ante o Brasil”, “Nova Iguaçu”, “Jogo do Bicho”, “Bibliote-ca Nacional”). Mas não é simples enumeração que se nos apresenta. O que Oswald faz é como um flash, um fotograma de um aspecto, de uma cena urbana definida, que ao apresentá-la como poesia, já de imediato se revela toda a contradição ineren-te e potencial da realidade observada. Em “Biblio-teca Nacional”, por exemplo, a enumeração de alguns títulos de livros como se fosse nosso correr de olhos por uma estante de biblioteca, mas uma biblioteca caótica onde os assuntos se misturam, obras de autoajuda, best-seller, religião, jurídica e até um livro para se saber jogar no bicho. Assim, em visualidade e síntese, Oswald nos apresenta um poema que propõe uma leitura acerca do que se lê e de como se lê no Brasil.

Em “Nova Iguaçu”, a enumeração de dizeres de anúncios e placas comerciais compõe um poema em que a “Iguaçu” (nome indígena e personagem de poema épico de Magalhães) agora é reinven-tada pela urbanidade de um Rio de Janeiro que, no poema de Magalhães, é resultado do martírio do índio. A desumanização urbana é um lado do progresso, mas, ao mesmo tempo, é a necessidade veemente da sociedade brasileira a busca da urba-nidade. O pecado é esse “no país sem pecados”. O pecado é civilização que ruiu o paraíso edênico do idealismo indianista romântico. Poema veloz, visu-al, como uma câmera que passeia pela paisagem ur-bana, captando fragmentos, metonímias do Brasil.A síntese como busca cinematográfica na poesia de Oswald leva ao minimalismo plástico. O flash,

Figura 16. cinema: A arte ci-nematográfica faz uma leitura do mundo, em que a câmera é olho, e é por meio desse olho que vemos o mundo que o ci-nema lê.

http://www.releituras.com/oandrade_bio.asp

- texto contendo biografia de Oswald de Andrade.

http://www.jayrus.art.br/Apostilas/LiteraturaBrasileira/Mo-

dernismo22/OSWALD_DE_ANDRADE_poesia.htm

- poemas de Oswald de Andrade em nosso site, Orfeu

Spam.

textos comPLementares

25Fascículo 1

SAIBA MAIS!

O trabalho de montagem cinematográfica é um trabalho de pós-produção, que consiste basicamente

em unir os planos filmados pela equipe de produção, de modo a alcançar o resultado planejado na

pré-produção.

lembrando que a maioria dos filmes, principalmente de longa-metragem, são captados fora de

ordem cronológica, o trabalho do montador será, então, o de compreender todo o roteiro do filme,

ler as planilhas de produção (geralmente feitas pelo assistente de dileção) e, então, em um primeiro

corte, colocar todos os planos em ordem da maneira como prevista pelo roteiro e eliminar planos

errados ou que não devem ir para a versão final do filme. em um segundo corte, ou seja, após o

filme estar em ordem cronológica da trama do roteiro, o montador, o assistente ou assistentes de

montagem e o diretor trabalham no afinamento do produto audiovisual, dando ritmo e outras carac-

terísticas que o diretor considera necessárias.

montadores experientes trabalham em parceria com os diretores, ou seja, não cumprem apenas

ordem e não possui somente conhecimentos técnicos: devem ter embasamento artístico para ajudar

o diretor na escolha de melhores enquadramentos e seleção de sequências que devem ser cortadas

ou adicionadas assim como na duração de planos e cenas. existem muitos livros sobre montagem

cinematográfica. Um dos autores mais famosos nesta área é o cineasta serguei eisenstein, que diri-

giu filmes entre 1923 e 1945.

O trabalho de montagem de um filme é demorado, exige muita paciência, pois, muitas vezes, é na

pós-produção que o assistente de montagem e o montador notam a falta de material ou erros de

continuidade que devem ser resolvidos de alguma forma, na hora da montagem. A equipe de pro-

dução geralmente está desmontada nessa fase, e torna-se, por isso, inviável iniciar novamente a

captação de material durante a pós-produção. O montador, para resolver possíveis problemas, deve

usar os recursos de edição mais o material captado que lhe é disponibilizado. O montador e seu

assistente podem também trabalhar em parceria com o continuísta (anotador (pt)) para solucionar

dúvidas de continuidade.

atividade crítica/refLexiva | Acerca da linguagem do cinema, o que você pensa que ocorre quan-do um romance ou outra obra literária é adaptada para o cinema? Existe perda? Existem vantagens ? Comente no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

glOssáRIO

Códex - O Códex ou Códice surgiu no século I da era cristã, contendo textos escolares, relatos de viagens ou re-gistros contábeis. Seu uso se multiplicou nos séculos II e III em consequência do incremento da demanda de livros e da adoção do pergaminho, que no século IV substituiu o papiro. Nessa época, o códice substituiu definitivamente o rolo e adquiriu a forma característica de livro. Formados por vários cadernos, ou quaderni, os códices constavam de uma quantidade variável de fólios (folhas escritas dos dois lados). A numeração das páginas se fazia por fólios; o anverso era denominado fólio reto; o reverso, fólio verso ou simplesmente reverso.

Compreensão - Compreensão, segundo Piaget, é o segun-do estágio do conhecimento, que ocorre quando o indiví-duo se apropria da informação.

Informação -> Compreensão -> Comprometimento. Segundo English, a melhor maneira de se avaliar a com-preensão de uma pessoa sobre as informações que lhe fo-ram prestadas é perguntando:- o que você entendeu de tudo isso?

A compreensão exige tempo. O pesquisador deve dispor de tempo para informar, explicar e permitir uma real inte-ração com a pessoa que está sendo convidada a participar do projeto de pesquisa. É importante encorajar que esta pessoa pergunte a respeito dos procedimentos e interven-ções que irão ser realizadas. De acordo com o grau de complexidade do projeto, pode ser necessário realizar mais de uma entrevista antes de obter o consentimento propria-mente dito.

English DC. Bioethics: a clinical guide for medical students.

26 Fascículo 1

New York: Norton, 1994:33-5.

Cubismo - é um movimento artístico que ocorreu entre 1907 e 1914, tendo como principais fundadores Pablo Pi-casso e Georges Braque. O Cubismo tratava as formas da natureza por meio de figuras geométricas, representando todas as partes de um objeto no mesmo plano. A represen-tação do mundo passava a não ter nenhum compromisso com a aparência real das coisas.

Futurismo - é um movimento artístico e literário, que surgiu oficialmente em 20 de fevereiro de 1909 com a publicação do Manifesto Futurista, pelo poeta italiano Filippo Marinetti, no jornal francês Le Figaro. Os adeptos do movimento rejeitavam o moralismo e o passado, e suas obras baseavam-se forte-mente na velocidade e nos desenvolvimentos tecnológicos do final do século XIX. Os primeiros futuristas europeus também exaltavam a guerra e a violência. O Futurismo desenvolveu-se em todas as artes e influenciou diversos artistas que depois fundaram outros movimentos modernistas. HierógliFo - é um termo que junta duas palavras gregas: ἱερός (hierós) “sagrado”, e γλύφειν (glýphein) “escrita”. Apenas os sacerdotes, membros da realeza, altos cargos, e escribas conheciam a arte de ler e escrever esses sinais “sagrados”.

A escrita hieroglífica constitui provavelmente o mais antigo sistema organizado de escrita no mundo e era vocaciona-da principalmente para inscrições formais nas paredes de templos e túmulos. Com o tempo, evoluiu para formas mais simplificadas, como o hierático, uma variante mais cursiva, que se podia pintar em papiros ou placas de barro e, ainda mais tarde, com a influência grega crescente no Oriente Próximo, a escrita evoluiu para o demótico, fase em que os hieróglifos iniciais ficaram bastante estilizados, havendo mesmo a inclusão de alguns sinais gregos na escrita.

ideograma - (do grego ιδεω - ideia + γράμμα - ca-racter, letra) é um símbolo gráfico utilizado para repre-sentar uma palavra ou conceito abstrato.

Os sistemas de escrita ideográficos originaram-se na Antiguidade, antes dos alfabetos e dos abjads.

Como exemplos de escritas ideográficas, podemos citar os hieróglifos do antigo Egito, a escrita linear B desde a escrita maia, assim como os caracteres kanji utilizados em chinês e japonês.

intertextualidade - relação entre textos. Um texto citando outro, de modo explícito (autor, obra, parágrafo, epígrafe) ou indiretamente (comentário acerca de...), mas de modo que a compreensão do texto atual só se faz completa, na medida em que se conhece o texto referido. A Paráfrase e a Paródia são exemplos de aplicação intertextual assim como é também a Tradução.

massiFiCação (cultura de massa) - chama-se cultura de massa toda cultura produzida para a população em geral — a despeito de heterogeneidades sociais, étnicas, etárias, sexuais ou psicológicas — e veiculada pelos meios de co-municação de massa. Cultura de massa é toda manifesta-ção cultural produzida para o conjunto das camadas mais numerosas da população; o povo, o grande público.

minimalismo - refere-se a uma série de movimentos ar-tísticos e culturais que percorreram diversos momentos do século XX e que se preocuparam em se exprimir através de seus mais fundamentais elementos, especialmente nas artes visuais, no design e na música. Em outros campos da arte, o termo é usado para descrever as peças de Samuel Beckett, os filmes de Robert Bresson, os contos de Raymond Carver e, até mesmo, os projetos automobilísticos de Colin Chapman, entre outros.

musiCalidade - chamamos de Musicalidade em poesia o ritmo, que pode ser marcado pela alternância de sílabas fortes e fracas, ou pelo andamento da leitura.

niHilismo - é a desvalorização e a morte do sentido, a au-sência de finalidade e de resposta ao “porquê”. Os valores tradicionais se depreciam, e os “princípios e critérios abso-lutos dissolvem-se”. “Tudo é sacudido, posto radicalmente em discussão. A superfície, antes congelada, das verdades e dos valores tradicionais está despedaçada, e torna-se di-fícil prosseguir no caminho, avistar um ancoradouro”.

De maneira bastante original, Pecoraro avalia o niilismo sob duas formas. Pode ser considerado como “um movimento “positivo” – quando através da crítica e do pelo desmasca-ramento nos revela a abissal ausência de cada fundamento, verdade, critério absoluto e universal e, portanto, convoca-nos diante da nossa própria liberdade e responsabilidade, agora não mais garantidas nem sufocadas ou controladas por nada”. Mas também pode ser considerado como “um movimento “negativo” – quando, nesta dinâmica, prevale-cem os traços destruidores e iconoclastas, como os do de-clínio, do ressentimento, da incapacidade de avançar, da paralisia, do “tudo-vale” e do perigoso silogismo: se Deus (a verdade e o princípio) está morto, então tudo é permitido”.

palmares (Quilombo dos) - o Quilombo dos Palmares localizava-se na serra da Barriga, região hoje pertencente ao estado de Alagoas, no Brasil. Foi o mais emblemático dos quilombos formados no período colonial, tendo resis-tido por mais de um século, e o seu mito transformou-se em moderno símbolo brasileiro da resistência do africano à escravatura, ainda que, paradoxalmente, tenha-se conhe-cimento do uso de escravos em muitos quilombos.

paráFrase - consiste em reescrever, com suas palavras, as ideias centrais de um texto. Consiste em um excelente exercício de redação, uma vez que desenvolve o poder de síntese, clareza e precisão vocabular. A paráfrase mantém o sentido do texto original.

Paráfrase representa uma reescritura do texto original com novas palavras sem que o sentido deste seja modificado. Assim, a paráfrase é uma reprodução da ideia do autor com as palavras do discente (aluno), utilizando-se de sinô-nimos, inversões de períodos, etc. Trata-se de reescrever o texto original com as palavras do aluno, mas sem alterar o sentido.

paródia - trata-se de uma imitação, na maioria das ve-zes cômica, de uma composição literária, (também exis-tem paródias de filmes e músicas), sendo, portanto, uma imitação que geralmente possui efeito cômico, utilizando a ironia e o deboche. Ela geralmente é parecida com a obra de origem e quase sempre tem sentidos diferentes.

27Fascículo 1

Na literatura, a paródia é um processo de intertextualiza-ção, com a finalidade de desconstruir um texto.

A paródia surge a partir de uma nova interpretação, da recriação de uma obra já existente e, em geral, consa-grada. Seu objetivo é adaptar a obra original a um novo contexto, passando diferentes versões para um lado mais despojado e aproveitando o sucesso da obra original para passar um pouco de alegria.

ready made - nomeia a principal estratégia de fazer bici cross do artista Marcel Duchamp. Essa estratégia refere-se ao uso de objetos industrializados no âmbito da arte, desprezando noções comuns à arte histórica, como estilo ou manufatura do objeto de arte, e referindo sua produção primariamente à ideia.

Se se considera que a característica essencial do Dadaísmo é a atitude antiarte, Duchamp será o dadaísta por excelên-cia. De fato, por volta de 1915, quando abandona a pintu-ra, assume uma atitude de rompimento com o conceito de arte histórica, que caracteriza como “retiniana”, expressão que remete, por um lado, à imediatez da imagem, e, por outro, ao modelo de visão exteriorizado que caracteriza a filosofia de Descartes, modelo que persiste ao longo dos séculos XV, XVI e mesmo até o XIX com a invenção da Fo-tografia.

robinson Crusoé - personagem do romance de Daniel Defoe, A Vida e as Estranhas Aventuras de Robinson Crusoé (1719).

ruído ( na ComuniCação) - o conceito de ruído surgiu com a teoria da informação e logo se difundiu para outras disciplinas, tais como a Acústica, a Cibernética, a Biologia, a Eletrônica, a Computação e a Comunicação. Em comu-nicação, ruído é todo fenômeno aleatório, que perturba a transmissão correta das mensagens e que geralmente procura-se eliminar ao máximo.

Classificação:

• Ruído exógeno - refere-se às interferências externas ao processo de comunicação, como outra mensagem.

• Ruído endógeno - refere-se às interferências internas do processo de comunicação, como perda de men-sagem durante seu transporte ou má utilização do código.

• Ruído de repertório - refere-se às interferências ocor-ridas diretamente na produção ou interpretação da mensagem, provocadas pelo repertório dos emissores e receptores.

trovador - na lírica medieval, era o artista de origem no-bre do sul da França que, geralmente acompanhado de instrumentos musicais, como o alaúde ou a cistre, compu-nha e entoava cantigas.

Normalmente, os trovadores eram homens, mas houve trovadoras (em provençal ou occitano trobairitz), também nobres. Suas correspondentes nas classes inferiores eram as jogralesas (joglaresses em provençal).

verso livre - não possui restrição métrica nem em rima nem nas estrofes. São versos introduzidos pelo Modernis-

mo e não se baseiam em critérios predefinidos, mas, em decisões que o poeta toma intuitivamente ou em normas por ele criadas.

Como exemplo, tem-se “Na Rua do Sabão” de Manuel Bandeira ou “Um boi vê os homens”, de Carlos Drummond de Andrade.

Versos livres não devem ser confundidos com versos bran-cos, que são aqueles que apenas não fazem uso de rimas.

RefeRêNCIAs

ANDRADE, Carlos Drummond de. Obra Com-pleta. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1986.

ANDRADE, Oswald de. Obras Completas: Po-esias Reunidas. Rio de Janeiro, Civilização Bra-sileira, 1971.

BANDEIRA, Manuel. Poesia Completa e Prosa. Rio de Janeiro, Nova Aguilar, 1983.

BOAVENTURA, Maria Eugênia. A Vanguarda Antropofágica. São Paulo, Ática, col. Ensaios, v. 114, 1985.

BRITO, Mário da Silva. História do Modernismo Brasileiro: 1/Antecedentes da Semana de Arte Moderna. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978.

CANTI, Monica; BENTES, Anna Christina. In-tertextualidade: Diálogos Possíveis. São Paulo, Cortez, 2006.

DEFOE, Daniel. Moll Flanders. São Paulo, Nova Cultural, 2003. - Obra realista inspirada no romance picaresco espanhol, Moll Flanders: recria o mundo pitoresco dos aventureiros e prostitutas do início do século XVIII. Com ini-gualável mestria e riqueza de detalhes, Daniel Defoe conta a história de uma mulher que, ten-do nascido na prisão, termina sua vida rica e respeitada.

DEFOE, Daniel. Diário do Ano da Peste. Porto Alegre, LPM, 1992. - Publicado pela primeira vez em 1722, Defoe já praticava, sob a forma de novela, um jornalismo que somente no sé-culo XX assumirá suas características definitivas, centradas na paixão pelo fato. Ocorrências mais marcantes tanto públicas quanto privadas registradas em Londres, durante a última grande epidemia, em 1665.... praticamente impossível deixar de refletir sobre o que aqueles fatos têm

28 Fascículo 1

a ver com os nossos atuais: a AIDS, a dengue, os surtos de meningite.

KOCH, Ingedore Grunfeld Villaça; CAVALLAJOLO, M. Do mundo da leitura para a leitura do mundo. São Paulo: Ática, 1997.

______; ZILBERMAN, Regina. O Preço da Escri-ta. São Paulo, Ática, 2005.

_________________. A Leitura Rarefeita: Leitura e Livro no Brasil. São Paulo, Ática, 2002.

MANGUEL, Alberto. Uma História da Leitura. São Paulo, Cia. das Letras, 1997.

MARTINS, Maria Helena. A Leitura. São Paulo, Brasiliense, col. Primeiros Passos, 2001.

SALLES, Fritz Teixeira de. Das Razões do Mo-dernismo. Brasília/Rio de Janeiro, ed. Brasí-lia, 1974.

SANT’ANNA, Affonso Romano de. O Gauche no Tempo. São Paulo, Record, 1992.

TELES, Gilberto Mendonça. A Estilística da Re-petição. Rio de Janeiro, José Olympio, 1970.

29Fascículo 2

objetivos esPecíficos

Expandir o conceito de Leitura; Ler figuras de linguagem em Imagens; Compreender aspectos da comunicação visual.

1. ProbLematização Nesta unidade, veremos figuras de car-tazes, propagandas, em que se utilizam figuras de linguagem (metáfora, meto-nímia, hipérbole, etc...) e buscaremos entender como se processa a comuni-cação visual com elementos de sentido figurado. Observaremos como a leitura das imagens é hoje uma necessidade para a compreensão de inúmeras men-sagens, muitas vezes, com aspectos su-bliminares e ambíguos.

• Tomas em consideração a trave no teu próprio olho? (Mateus 7:1-3)

• Rios te correrão dos olhos, se chorares! (Olavo Bilac)

• Um quarteirão de perucas para Clodovil Pereira.

(José Cândido Carvalho)

figura 17. hipérbole

Leitura e Produção de texto

Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna Carga Horária | 15 horas

30 Fascículo 2

Exemplos:

• Então, por que olhas para o argueiro no olho do teu irmão, mas não tomas em consideração a trave no teu próprio olho? (Mateus 7:1-3)

• Rios te correrão dos olhos, se chorares! (Olavo Bilac)

• Um quarteirão de perucas para Clodovil Perei-ra. (José Cândido Carvalho)

• Na chuva de cores Da tarde que explode A lagoa brilha (Carlos Drummond de Andrade)

(fonte: Wikipédia)

sistematização A leitura de imagens (fotografias, cartazes, propagandas)

O sentido de Leitura mais amplo permite que com-preendamos as mensagens transmitidas por fontes não verbais como formas de ler. Assim, cinema, televisão, outdoor, obra de arte plástica, símbolos, música são meios de comunicação que podem se utilizar de elementos não verbais para sua comu-nicação: imagem, nota musical, formas plásticas, impulsos elétricos, luz.

Observemos algumas figuras a seguir. São cartazes de propaganda e atentemos como eles comuni-cam, utilizando-se de figuras de linguagem visuais.

Veja as mãos que seguram a bola de basquete (fig.16). Anatomicamente são mãos de uma criança pequena ou de um bebê. Como pode ele alcançar a cesta de basquete? Difícil já seria para ele segurar a bola, que é grande! O slogan do cartaz “Com Nestlé Crescimento, o seu bebê vai marcar pon-tos...”, e a frase ao final do cartaz, sob a marca do produto “Nestlé Crescimento ajuda os miúdos a ficarem graúdos”, promete um crescimento visível além do normal para quem utilizar o produto. Nes-te sentido, o que temos aqui é um exagero, figura conhecida como Hipérbole.

síntese

A função da mensagem publicitária é a de criar um mundo ideologicamente favorável e perfeito com a contribuição do produto a ser vendido. Devido a isso, essa mensagem trata a base informativa de for-ma manipulada, objetivando transformar a consci-ência do possível comprador.

Em todos os casos, o possível comprador é o re-ceptor virtual da mensagem, e o responsável pelo produto, o emissor.

Para convencer o consumidor a realizar uma ação pré-determinada (a ação de consumir o produto), o out-door (segundo Carvalho, 2000, p. 16) utiliza formas simples, com elementos justapostos (men-sagem escrita, foto do produto, slogan e/ou marca) para possibilitar a fácil compreensão da massa de consumidores. Esta seria, em tese, a forma como se apresenta o discurso de publicidade em out-door.

Entretanto, a busca cada vez mais acirrada pelo mercado consumidor e o fato de este mercado estar se tornando cada vez mais crítico e exigente fazem com que estas mensagens utilizem, cada vez

Figura 18. Hipérbole 2: Observe a fi-gura 18 e responda que elementos da imagem podem ser caracterizados como Hipérbole.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Figura_de_linguagem

- verbete da Wikipédia com link para várias figuras de

linguagem.

texto comPLementar

http://pt.wikipedia.org/wiki/Publicidade

- verbete da Wikipédia acerca do slogan.

http://webserver.4me.com.br/wwwroot/abap - site da ABAP

– Agência Brasileira de Agências de Publicidade.

textos comPLementares

31Fascículo 2

mais, recursos linguísticos e visuais como recursos auxiliares ao discurso publicitário. Se antes bastava apenas chamar atenção através da imagem e con-vencer através da mensagem escrita, hoje é necessá-rio cifrar mensagens embutidas em discursos apa-rentemente ingênuos (em publicidade, nenhum discurso é ingênuo).

Não se contesta aqui a utilização da forma imagem + mensagem + slogan/marca, que, via de regra, também é utilizada nos out-doors selecionados para nossa análise. O que demonstraremos é que o discurso de publicidade em out-door tem mostra-do uma sofisticação linguística na sua busca por captar a confiança e a credibilidade do mercado consumidor.

(Adaptado de: http://www.filologia.org.br/vcnlf/anais%20v/civ8_08.

htm - texto de Letícia Queiroz de Moraes (FEUDUC/UERJ)

SAIBA MAIS!

Hipérbole é exagero com propósito expressivo.

tHaís nicoLeti de camar-go*esPeciaL Para a foLHa de s. PauLo

O desejo de exprimir emoções

por meio de palavras leva, por

vezes, à elaboração de ima-

gens que beiram o excesso. O

exagero com propósito expres-

sivo é o que chamamos de hi-

pérbole.

“profundissimamente hipocon-

dríaco,/ este ambiente me cau-

sa repugnância.../ sobe-me à

boca uma ânsia análoga à

ânsia/ Que escapa da boca de

um cardíaco.” Nesses conheci-

dos versos, Augusto dos Anjos

abusou do recurso, lançando

mão não só de um inusitado

advérbio derivado do super-

lativo do adjetivo “profundo”

como de uma comparação

algo extravagante.

O superlativo indica que um

ser possui em alto grau certa

característica. Comum no estilo

grandiloquente de Castro Al-

ves, para quem a poesia é uma

“musa libérrima”, e associado

à fala ilustrada, o superlativo

erudito raramente é ouvido no

dia-a-dia. foi alvo da ironia de

machado de Assis, que caracte-

rizou José Dias, personagem de

“D. Casmurro”, pelo seu hábi-

to de usá-lo: “José Dias amava

os superlativos. era um modo

de dar feição monumental às

ideias; não as havendo, servir a

prolongar as frases”.

manipulando grande variedade

de recursos de ênfase, os fa-

lantes tendem a descartar “mi-

nutíssimo” ou “sapientíssimo”,

dando lugar a “miudinho” ou

a “sabidão”, quando não a ad-

jetivos seguidos de “pra burro”

ou “pra cachorro”. Certa perso-

nagem de C. lispector é descrita

como uma “velha sequinha”. O

sufixo -inho preso a um adjetivo

não só o intensifica mas ainda

lhe empresta um tom afetivo.

Alterando o corpo da palavra,

fazem-se “arquiinimigo”, “su-

perfino” ou “megacomício”, por

exemplo. A repetição (mar azul,

azul) também produz ênfase.

No curioso repertório de guima-

rães Rosa, registram-se formas

as mais inventivas. em “Cerca-

vam-nos anjos-da-guarda, aos

infinilhões”, o neologismo suge-

re a ideia de grande quantidade.

De uso cotidiano ou literário, a

hipérbole é uma das figuras de

linguagem mais expressivas da

língua. veja o belo efeito alcan-

çado por vinícius de moraes no

seu “soneto do Amor total”: “e

de amar assim, muito e amiúde/

É que um dia em teu corpo de

repente/ Hei de morrer de amar

mais do que pude”.

*thaís Nicoleti de Camargo é

consultora de língua portuguesa

da folha

(fonte: http://vestibular.uol.com.br/ultnot/

resumos/ult2772u28.jhtm)

atividade crítica/refLexiva | Você, por certo, já deve ter prestado atenção em alguma propaganda ou comercial de televisão que lhe tenha chamado a atenção pela criatividade. Você poderia comentar acerca de um caso des-ses no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

2. metonímia e o eixo Paradigmático

eixo sintagmático/eixo Paradigmático

Na linguística de F. de Saussure, as relações sintag-máticas opõem-se às relações associativas (Saussure não fala em relações paradigmáticas). Os linguistas estruturalistas propuseram a distinção entre eixo sintagmático (eixo horizontal de relações de senti-do entre as unidades da cadeia falada, que se dão em presença) e eixo paradigmático (eixo vertical das relações virtuais entre as unidades comutá-veis, que se dão em ausência). No primeiro eixo, abrem-se as relações que pertencem ao domínio da fala, por exemplo, os elementos que constituem o

32 Fascículo 2

enunciado Estou a ler estão numa relação sintag-mática; a segunda pertence ao domínio da língua, por exemplo, leitura está em relação paradigmática com livro, leitor, ler, livraria, biblioteca, mas apenas um destes elementos pode ser válido no enuncia-do produzido. Neste caso, todas as palavras podem ser comutáveis, dependendo do contexto e da na-tureza do enunciado. Assim, no enunciado Estou a ler, podemos comutar os elementos estou a por quero, detesto, vou, sei, etc., e o elemento ler pode ser comutado por comer, escrever, correr, saltar, condu-zir, etc. Diz-se que todos estes elementos substituí-veis estão em relação paradigmática. Estas relações sintagmáticas e paradigmáticas não se limitam ao nível lexical ou gramatical do signo, mas abrangem também o nível fonológico.

Bib.: Ferdinand de Saussure: Curso de Linguística Geral (Lisboa, 1971);

L. Hjelmslev: Prolégomènes à une théorie du langage (Paris, 1968); R.

Jakobson: Essais de linguistique générale (1963).

Paradigma (do grego Parádeigma) literalmente modelo, é a representação de um padrão a ser se-guido. É um pressuposto filosófico, matriz, ou seja, uma teoria, um conhecimento que origina o estu-do de um campo científico; uma realização cien-tífica com métodos e valores que são concebidos como modelo; uma referência inicial como base de modelo para estudos e pesquisas.

estendendo o conceito

Thomas Kuhn, (1922 - 1996) físico americano, cé-lebre por suas contribuições à história e filosofia da ciência, em especial do processo (revoluções) que leva à evolução do desenvolvimento científico, designou como paradigmáticas as realizações cien-tíficas que geram modelos que, por período mais ou menos longo e de modo mais ou menos explíci-to, orientam o desenvolvimento posterior das pes-quisas exclusivamente na busca da solução para os problemas por elas suscitados.

Em seu livro “A estrutura das Revoluções Cientí-ficas”, apresenta a concepção de que “um paradig-ma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade cien-tífica consiste em homens que partilham um para-digma”, p. 219 e define “o estudo dos paradigmas como o que prepara basicamente o estudante para ser membro da comunidade científica na qual atu-ará mais tarde”, p. 31.

Hoisel, autor de um interessante ensaio ficcional, que aborda como a ciência de 1998 haveria de se encontrar em 2008, chama a atenção para o aspec-to relativo da definição de paradigma, observando que uma constelação de pressupostos e crenças, escalas de valores, técnicas e conceitos comparti-lhados pelos membros de uma determinada co-munidade científica num determinado momento histórico é simultaneamente um conjunto dos procedimentos consagrados, capazes de condenar e excluir indivíduos de suas comunidades de pares. Mostra-nos como este paradigma pode ser compre-endido como um conjunto de vícios de pensamen-to e bloqueios lógico-metafísicos que obrigam os cientistas de uma determinada época a permanece-rem confinados ao âmbito do que definiram como seu universo de estudo e seu respectivo espectro de conclusões admitidas como plausíveis.

Na comunicação 3, de seu livro “Anais de um sim-pósio imaginário”, Hoisel destaca ainda que uma outra consequência da adoção irrestrita de um paradigma é o estabelecimento de formas especí-ficas de questionar a natureza, limitando e condi-cionando previamente as respostas que esta nos fornecerá. Um alerta já nos foi dado pelo físico Heisenberg quando mostrou que nos experimen-tos científicos o que vemos não é a natureza em si, mas, a natureza submetida ao nosso modo peculiar de interrogá-la.

Figua 19. Metonímia: Na imagem a seguir, você até poderia pensar na figura do exagero, a Hipérbole, pela grandiosidade do cenário e pela quantidade de pessoas, mas o que temos de recurso na foto é a Metonímia, pois vendo parte da tor-cida numa parte do estádio, supomos naturalmente que se trata de uma partida de futebol.

http://www2.fcsh.unl.pt/edtl/verbetes/C/conceito.htm

- texto que analisa o conceito de Conceito.

texto comPLementar

33Fascículo 2

Figura 20. Observe as três imagens: nelas existe o recurso da Metonímia.

síntese

Existem vários casos de uso da Metonímia; dentre entre eles, destacamos:

Formas de usos

• Efeito pela causa: Sócrates tomou a morte. (O efeito é a morte, a causa é o veneno.)

• Causa pelo efeito: Por favor, não fume dentro de casa: sou alér-gica a cigarro. (O cigarro é a causa: a fumaça, o efeito. Podemos ser alérgicos à fumaça, mas não, ao cigarro)

• Marca pelo produto: O meu irmãozinho adora danone.(Danone é a marca de um iogurte; o menino gosta de iogurte)

• Autor pela obra: Lemos Machado de Assis por interesse. (Nin-guém, na verdade, lê o autor, mas, as obras dele em geral.)

• Continente pelo conteúdo: Bebeu o cálice da salvação. (Ninguém engole um cálice, mas, sim, a bebida que está nele.)

• Possuidor pelo possuído: Ir ao barbeiro. (O barbeiro trabalha na bar-bearia, onde se vai de fato, ninguém vai a uma pessoa, mas ao local onde ela está)

• Matéria pelo objeto:

Quem com ferro fere... (ferro subs-titui, aqui, espada) •O lugar pela coisa: Uma garrafa de Porto. (Porto é o nome da cidade conotada com a be-bida - mas não é a cidade que fica na garrafa, mas sim a bebida.) •O instrumento pela causa ativa: Sou um bom garfo. (em substituição de “alguém que come bastante”). •A coisa pela sua representação = sinal pela coisa significada):

És a minha âncora. (em substituição de “segu-rança”).

• Parte pelo todo: A mão empurrou o carrinho do bebê. (na ver-dade, quem empurra o carrinho é a pessoa e não só a mão)

atividade crítica/refLexiva | Discuta so-bre a importância do uso de figuras para efeito expressivo e estético do texto no FÓRUM TE-MÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

3. a ironia

Ironia é a afirmação de algo diferente do que se deseja comunicar, geralmente o contrário, na qual o emissor deixa transparecer a contrariedade por meio do contexto do discurso, ou através de algu-ma diferenciação editorial, ou entoativa ou gestu-al. O que diferencia a ironia do enunciado falso simples é a sinalização da contrariedade, geralmen-te sutil, através do contexto, edição, entoação ou gesto ou de outro sinal. A função da ironia geral-mente é crítica e impressionista.

SAIBA MAIS!

A sinédoque é um caso especial de metonímia,

em que se troca a palavra que indica o todo de um

ser por outra que indica apenas uma parte dele.

• exemplo:

O rebanho tinha mil cabeças. (cabeça [parte]

-> animal [todo])

Ou o singular pelo plural:

• exemplo:

O homem, que é mortal, imortaliza-se por

meio de suas conquistas.

• A choupana não suportou quatro invernos.

http://users.hotlink.com.br/lucidio/fdl/metonimia.htm

- verbete sobre a Metonímia com exemplos.

http://www.filologia.org.br/viiifelin/32.htm

- texto de Afrânio da Silva Garcia (UERJ), Metonímia: Am-

plitude e Precisão, que faz uma interessante análise dos

usos da Metonímia.

textos comPLementares

34 Fascículo 2

Na figura 21, o pobre homem segura uma vasilha onde os doadores jogam seus trocados. Perceba que a vasilha velha tem o logotipo do cartão de uma conhecida marca de cartão de crédito. Poderíamos entender que o pedinte aceita, inclusive, cartão de crédito! Ora, sabemos que um mendigo não teria condições de ter um equipamento para desconto em cartão de crédito nem a empresa do cartão se prestaria a oferecer ao pedinte condições para tal. Logo o que temos aqui é uma Ironia. A Ironia é uma das figuras mais fortes para mostrar as contra-dições da realidade, uma vez que ele mostra o con-trário ou o avesso do que efetivamente se poderia dizer. Assim, o mendigo com sua pobreza jamais poderá ter um cartão de crédito, mas aceita doa-ções em cartão de crédito! Por outro lado, o poder econômico seria tal que a própria pobreza se trans-forma num ne-gócio rentável. Apenas para observação, a fi-gura acima não é uma propa-ganda oficial do cartão de crédi-to, mas, um tra-balho criativo com a intenção de desmistificar a propaganda.

síntese

tiPos de ironia A maior parte das teorias de retórica distingue três tipos de ironia: oral, dramática e de situação.

• A ironia oral é a disparidade entre a expres-são e a intenção: quando um locutor diz uma coisa mas pretende dizer outra coisa, ou então quando um significado literal é contrário para atingir o efeito desejado.

• A ironia dramática (ou sátira) é a disparidade entre a expressão e a compreensão/cognição: quando uma palavra ou uma ação põe uma questão em jogo, e a plateia entende o signifi-cado da situação, mas a personagem não.

• A ironia de situação é a disparidade existente entre a intenção e o resultado: quando o re-sultado de uma ação é contrário ao desejo ou efeito esperado. Da mesma maneira, a ironia infinita (cosmic irony) é a disparidade entre o desejo humano e as duras realidades do mun-do externo. Certas doutrinas afirmam que a ironia de situação e a ironia infinita não são ironias de todo. Exemplos: Moça linda, bem tratada, três séculos de família, burra como uma porta: um amor! (Mário

de Andrade)

É também um estilo de lin-guagem caracterizado por subverter o símbolo que, a princípio, representa. A ironia utiliza-se como uma forma de linguagem pré-es-tabelecida para, a partir e de dentro dela, contestá-la.

Foi utilizada por Sócrates, na Grécia Antiga, como ferramenta para fazer os seus interlocutores entra-rem em contradição, no seu método Socrático.

Figura 21. Ironia: Note o pedinte, na miséria, o logotipo do cartão de crédito na sua vasilha.

Figura 22. Observando a figura, o que ele apresenta em termos de Ironia?

http://www.radames.manosso.nom.br/retorica/ironia.htm

- texto sobre a Ironia do ponto de vista da Retórica.

texto comPLementar

http://pt.wikipedia.org/wiki/Propaganda

- verbete da Wikipédia sobre a Propaganda.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Propaganda

- texto que analisa as relações entre a Ironia e a escola

do Romantismo.

textos comPLementares

35Fascículo 2

SAIBA MAIS!

o sarcasmo e a ironia

sarcasmo (do grego antigo σαρκασμός

“sarkasmos” ou “sarkázein”; sarx=“carne”

Asmo= queimar “queimar a carne”) designa

um escárnio ou uma zombaria, intimamente

ligado à ironia com um intuito mordaz qua-

se cruel, muitas vezes ferindo a sensibilidade

da pessoa que o recebe. A origem da pala-

vra está ligada ao fato de muitas vezes mor-

dermos os lábios quando alguém se dirige a

nós com um sarcasmo mordaz. O sarcasmo é

uma figura de estilo muito utilizada nas artes

orais e escritas, designadamente na literatu-

ra e na oratória. fyodor Dostoyevsky foi um

dos grandes representantes do uso deste re-

curso estilístico, definindo-o como “o último

modesto e puro refúgio das pessoas quando

o entrosamento e a vulgaridade invadem a

privacidade das suas almas”.

Considera-se algo irônico ao comentário

escrito ou oral feito por uma pessoa, desig-

nando exatamente o oposto daquilo que re-

almente se pretendia dizer. O sarcasmo e a

ironia estão estreitamente ligados, podendo

ambos ser usados como figuras de estilo na

retórica ou na literatura e não correspondem

àquilo que supostamente se pretenderia afir-

mar. A diferença entre estes conceitos está no

fato de que o sarcasmo é sempre mais pican-

te e mais provocador, enquanto que a ironia

é uma simples contradição voluntária, com

intuito menos áspero e feroz.

atividade crítica/refLexiva | De certo, em algum momento de sua vida, você presen-ciou alguma atitude irônica. Poderia comentar acerca dele no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina?

4. o eufemismo e a mensagem eufemismo Figura de retórica que procede à substituição de uma expressão rude ou desagradável por uma ou-tra que amenize o discurso, embora sem alterar o sentido, por exemplo, “ir para outro mundo” ou “Tirar Inês ao mundo determina” (Camões, Os Lusíadas, III, 123) em vez de “morrer” ou “pessoa

de poucos recursos financeiros” por “pobre”. O ter-mo é de origem grega (euphemismos, “bem dizer”) e desde sempre foi utilizado para designar as formas de dissimulação de sentimentos desagradáveis, de pensamentos cruéis ou de palavras tabu, que se evi-tam pelo recurso a uma linguagem mais amaviosa, sem se perder o sentido original de vista. De algu-ma forma, todas as literaturas de vanguarda ten-dem a rejeitar o recurso ao eufemismo, pelo fato de o considerarem uma forma puritana de expres-são que quer fugir da representação fiel da realida-de em todas as suas acentuações, sejam elas cruéis ou agradáveis. Isso não significa que o seu oposto, o disfemismo, seja a forma preferida. Trata-se de um recurso de atenuação da expressão que pode ser conseguido, combinando-se com outras figu-ras: uma metáfora ou uma metonímia servem, por exemplo, muitas vezes, para amenizar uma ideia repugnante ou cruel (diz-se Televisão de pobre é buraco de fechadura. em vez de Os pobres não têm televisão). A dupla negativa amplamente utili-zada em português ou a simples expressão de uma coisa negativa pelo seu lado positivo (litotes) são exemplos dos efeitos antitéticos que o eufemismo também privilegia, por vezes, como nas expressões “não ignoro que”, “não nego que”, “não esqueci” (por “lembrei-me”), etc., fórmulas que entram em qualquer discurso com intenção diplomática, para evitar ferir a susceptibilidade de quem se apresenta como interlocutor. Os puristas da língua tenderão a rejeitar essas redundâncias da linguagem.

Figura 23. Observe o cartaz acerca de um concurso mundial para modelos 2007. Aqui podemos encontrar elementos característicos do Eufemismo.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Eufemismo

- verbete da Wikipédia sobre Eufemismo

texto comPLementar

36 Fascículo 2

Na figura 23, três jovens de corpo esguio, conforme o modelo padrão de beleza contemporâneo, dan-çam alegremente de costas para o leitor. Trata-se de uma chamada para o concurso de beleza realizado por uma marca de lingerie. O slogan da propagan-da (“Show me your Sloggi – Mostre-me seu slog-gi”); é uma mensagem que atenua, ou pelo menos, tenta a visão dos corpos das moças. Mostre-me seu sloggi, indica também que todas as moças usam essa marca de lingerie, mas, ao mostrar a lingerie, roupa íntima, está também mostran-do sua intimidade em público. Isso é Eufemismo, quan-do se tenta atenuar a força expressiva da mensagem. No caso, uma forma de utilizar o sex appeal das modelos como elemento de valori-zação da marca de lingerie.

Todos nós já nos deparamos, havendo até pessoas que incrivelmente dele se aperceberam, com um elaborado, por vezes rebuscado ou até forçado, Eu-femismo. E o que é o Eufemismo? - perguntam os leitores a quem a cultura pior precaveu. À falta de uma caneta no bolso da camisa e de um guarda-napo retirado de um qualquer café ou pastelaria, torna-se mais difícil elucidar o que quer que seja, ainda assim, tentemos.

Na vida acadêmica, o Eufemismo nasce por vol-ta do 9º ano de escolaridade. Através da sátira de Gil Vicente , encontramos o Arrais do Inferno que mais não é que o Diabo, ele mesmo. As próprias “figuras de estilo”, grupo no qual se integra o Eu-femismo, mais não são para qualquer adolescente que um Eufemismo, sendo com uma definição tão agradável que se escondem Hipérboles e Metá-foras, nomes tão difíceis para qualquer Bernardo, Rodrigo ou Mariazinha.

Na infância, talvez o Eufemismo surja pela primei-ra vez na história da cegonha que terá vindo de Pa-ris e prossiga com a história da semente do pai no jardim da mãe. Tradução: O bebê veio da barriga da mãe. O pai fez amor com a mãe. Simples!

E agora que se percebe que o Eufemismo é uma atenuação da realidade, isto é, dizer o mesmo por palavras mais suaves, já percebo: a sopa está ape-titosa/ a sopa está danada salgada; a sopa assim é que faz bem/ está tão insossa que nem um balde cheio de sal salvava isto.

Percebamos, então, qual será, na frase “este mi-crorganismo pode provocar infecções em zonas pú-blicas, nomeadamente no interior e em redor do orgão genital feminino”, o eufemismo...

Figura 24. Observe a figura da caixa de fósforos. Que elementos presentes nessa figura podemos considerar como característicos do Eufemismo?

SAIBA MAIS!

Na nossa comunicação diária, podemos gerar

problemas através do uso de expressões inade-

quadas. sem querer, ofendemos o interlocutor,

criamos um clima desagradável no trabalho e,

quem sabe, um inimigo para a vida toda.

Com um pouco de cuidado , podemos contribuir

para o inverso. sabemos que a palavra é uma

energia poderosa que pode destruir pessoas,

mas também pode construir amizades eternas.

A substituição de palavras mais agradáveis e

polidas para suavizar a expressão de uma ideia

pesada é tão importante que até existe um ter-

mo para isso em português: eufemismo.

Assim podemos dizer que alguém é “fofo” ou

“forte”, em vez de dizer que é gordo e que é

“elegante” ou é “esguio”, quando é magro.

Nessa troca, o tímido vira “pessoa observadora”

ou “bom ouvinte”, e o medroso vira “cuidadoso”.

Outros exemplos:

NeRvOsO - Cuidadoso

lOUCO - Criativo, excêntrico

INDeCIsO - Curioso, avaliador

eXplOsIvO - Realizador

AfemINADO - Delicado

bOAteIRO - Comunicativo

Um exercício interessante é cada um criar a sua

própria lista de eufemismos. O que não se pode

fazer é usar o eufemismo de forma irônica, porque

daí se perde o efeito positivo.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Eufemismo

- verbete da Wikipédia sobre Eufemismo

texto comPLementar

37Fascículo 2

atividade crítica/refLexiva | Comente alguma situação em sua vida que você já sentiu necessidade de substituir palavras ou expres-sões mais fortes por outras mais suaves, seja para não machucar ou incomodar alguém, seja por algum outro motivo no FÓRUM TEMÁ-TICO da Sala Virtual da Disciplina.

5. os sentidos da PercePção e a sinestesia

Em psicologia, neurociência e ciências cognitivas, percepção é a função cerebral que atribui signifi-cado a estímulos sensoriais a partir de histórico de vivências passadas. Através da percepção, um indivíduo organiza e interpreta as suas impressões sensoriais para atribuir significado ao seu meio. Consiste na aquisição, interpretação, seleção e or-ganização das informações obtidas pelos sentidos. A percepção pode ser estudada do ponto de vista estritamente biológico ou fisiológico, envolvendo estímulos elétricos evocados pelos estímulos nos órgãos dos sentidos. Do ponto de vista psicológi-co ou cognitivo, a percepção envolve, também, os processos mentais, a memória e outros aspectos que podem influenciar na interpretação dos dados percebidos.

Oestudo da percepção é um dos campos mais antigos da pesquisa psicológica, e existem muitas teorias quantitativas e qualitativas sobre os pro-cessos fisiológicos e cognitivos envolvidos. Os pri-meiros a estudar com profundidade a percepção foram Hermann von Helmholtz, Gustav Theodor Fechner e Ernst Heinrich Weber, A Lei de Weber-Fechner é uma das mais antigas relações quanti-tativas da psicologia experimental e quantifica a relação entre a magnitude do estímulo físico

Na figura 25, o ícone que indica a saída de som de um alto-falante ou amplificador está ao lado de um série de barras coloridas, partindo das cores mais frias para as mais quentes. Desse modo, o sentido da visão (cores) está associado ao sentido da audi-ção (sons), isto é Sinestesia, ou seja uma relação de troca de sentidos da percepção. Leia o artigo a seguir:

cientistas britânicos reLacionam auras a fenômeno da sinestesia

A visão de halos ou auras em volta dos corpos humanos, relacionada muitas vezes ao misticismo, pode

ser causada por um simples fenômeno da sinestesia ou mistura dos sentidos.

A hipótese foi levantada por uma equipe de pesquisadores do University College de londres, dirigida

pelo doutor Jamie ward. O estudo foi publicado na revista britânica Cognitive Neuropsychology e noti-

ciado nesta quarta-feira pelo jornal the Daily telegraph.

tradicionalmente, a capacidade de ver irradiações luminosas foi associada a poderes “extrasensoriais”

que certas pessoas afirmam possuir. Agora, os cientistas acham que há algo de verdade nisso. esse

fenômeno não tem a ver com “campos de energia” nem com o mundo dos espíritos, mas pode estar

relacionado a uma confusão dos sentidos humanos, fazendo com que algumas pessoas “vejam” sons,

“escutem” cores ou “saboreiem” formas.

(mensurável por instrumentos) e o seu efeito per-cebido (relatado). Mais adiante,Wilhelm Wundt fundou o primeiro laboratório de psicologia expe-rimental em Leipzig, em 1875.

Na filosofia, a percepção e seu efeito no conhe-cimento e aquisição de informações do mundo é objeto de estudo da filosofia do conhecimento ou epistemologia. Em geral, a percepção visual foi base para diversas te-orias científicas ou filosóficas. Newton e Goethe estudaram a percepção de cores e algumas escolas, como a Gestalt, sur-gida no Século XIX e escolas mais recentes, como a fenomenolo-gia e o existencialis-mo baseiam toda a sua teoria na percep-ção do mundo.

Figura 25. Sinestesia: Observe a relação entre cores e a ideia de sons no desenho.

http://www.pmr.poli.usp.br/lpa/index.asp

- página do Laboratório de Percepção Avançada da USP que

faz experimentos em robótica para desenvolvimento de

máquinas robóticas mais sensíveis ao mundo.

texto comPLementar

38 Fascículo 2

Figura 26. Observe o teclado na figura; é uma maneira didática de ensinar a localização das notas musicais no teclado, por meio de um artifício visual.

síntese

Embora já seja aceita como uma condição real e não apenas imaginação exagerada, a causa da sines-tesia é desconhecida. Algumas hipóteses já foram levantadas e compõem parte do campo de estudos do assunto:

1. Supõe-se que todos os sentidos são interpre-tados de forma separada e protegida em regi-ões distintas do cérebro. Na sinestesia, haveria uma queda de uma ou mais destas barreiras, fazendo com que os sinais dos órgãos senso-riais chegassem a mais de uma área interpreta-tiva, gerando respostas fora do comum.

2. Todos nasceríamos com essa condição, desta forma o cérebro infantil seria sinestésico por definição, mas nos primeiros meses ou anos

As pessoas sinestésicas podem enxergar cores em pessoas que conhecem ou como reação a palavras

como “amor” ou “ódio”. essas cores não refletem energias ocultas emitidas pelas pessoas, mas são

criadas inteiramente no cérebro da pessoa que vê a aura, segundo a conclusão dos cientistas britânicos.

em seu estudo, ward descreve o caso de uma jovem, identificada apenas pelas iniciais g.w., que via

cores como azul e violeta quando encontrava pessoas conhecidas, a ponto de bastar ouvir os nomes

delas para ter essa sensação. Os nomes provocavam a aparição de uma cor que cobria todo o campo

de visão de g.w., e as tais pessoas pareciam emanar uma aura colorida.

por exemplo, a palavra “Jamie” era imediatamente associada à cor rosa, “thomas” ao preto, e “Han-

nah”, ao azul. Quando a jovem ia a uma festa e se divertia, todo o cenário se coloria de vermelho,

afirmam os cientistas. segundo a pesquisa, certas palavras carregadas emocionalmente como “medo”

e “ódio” também desencadeavam reações cromáticas.

As palavras normalmente associadas a emoções positivas faziam aparecer cores, como rosa, laranja e

verde. Já as que evocavam algo negativo provocavam cores, como preto, marrom e cinza.

segundo Jamie ward, embora g.w. não acredite ter poderes místicos e nunca tenha se interessado por

esoterismo, é facilmente imaginável que em outro tipo de cultura, esse fenômeno poderia ter esta in-

terpretação. Os artistas sempre pintaram os santos com uma auréola em volta da cabeça, e isso é algo

que diz muito sobre o fenômeno criativo.

O escritor russo-americano vladimir Nabokov escreveu certa ocasião que percebia as letras em cores.

também é famoso o poema sobre as cores do alfabeto escrito pelo francês Arthur Rimbaud, sinestésico

por excelência.

De acordo com pesquisas anteriores, uma em cada duas mil pessoas é sinestésica. mas outros estudos

indicam uma proliferação muito maior desse fenômeno.

O cientista britânico convidou simples pedestres para participarem de um teste destinado a determinar

se são ou não sinestésicos sem saber. trata-se de certificar se as pessoas com essa condição associam

sempre as mesmas cores às mesmas letras ou aos mesmos números, enquanto outras pessoas fariam

isto por adivinhação.

Outros cientistas , como vilayanur Ramachandran, da Universidade da Califórnia em san Diego, acham

que a sinestesia está relacionada diretamente à criatividade, seja na poesia, nas artes plásticas ou

na literatura. para ele, nossa habilidade para relacionar sons e objetos pode estar ainda na base da

linguagem humana. A relação entre os sentidos do ouvido e da visão pode ter constituído um passo

importante para a criação verbal. EFE

Agência EFE - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização escrita da Agência EFE S/A.

http://www.zootropole.com.br/2008/08/sinestesia-saiba-se-voc-

sinestsico.html

- apresenta um breve teste para saber o grau de sinestesia em

seus sentidos.

http://neuronioshiperativos.blogspot.com/2008/03/sinestesia-o-

sabor-das-palavras-o.html

- site com informações acerca da Sinestesia.

http://sinestesico.blogspot.com/

- blog dedicado à Sinestesia.

textos comPLementares

39Fascículo 2

6. a metáfora e a comunicação ProbLematização

Metáforas são muito antigas e muito comuns. Es-tamos cercados de metáforas. A metáfora é consti-tuinte da própria linguagem, e poderíamos dizer que todo signo é metáfora, quando transfere o sig-nificado indizível do incognóscível para um objeto representativo. Notemos que as metáforas funcio-nam como substitutos para termos mais próprios, óbvios ou costumeiros em dado contexto. Esse “funcionamento” da metáfora repete o mecanis-mo da semiose em geral. Ou ainda, se o signo é uma coisa que representa outra, estando no lugar de outra, o mesmo se dá na metáfora. Podemos distinguir semiose lato sensu de metáfora, analisan-do os caminhos do entendimento. Na metáfora, o entendimento é determinado, principalmente, por meio de associações idiossincráticas, evocativas, in-ferenciais, lógico-relacionais ou, como sugere Um-berto Eco, por ratio dificilis (raciocínio complexo). Na semiose metafórica, o modo simbólico de sig-nificação assume um importante papel mediador entre inferências e associações. Todo termo meta-

de vida passaria por um processo de especiali-zação que levaria à conformação convencional que conhecemos, os sinestésicos adultos conti-nuariam com as funções sensoriais mescladas em algum nível.

3. Os sinais sensoriais chegam a várias áreas do cérebro, mas algum tipo de “máscara” faz com que apenas alguns sejam filtrados e interpre-tados por determinados setores cerebrais. A sinestesia seria originada pela queda dessa “máscara”.

Esta última hipótese tem base nos sintomas de quem é usuário de alucinógenos, como LSD e mescalina, cujos sintomas são semelhantes ao da sinestesia, só que muito mais fortes e descontrolados.

atividade crítica/refLexiva | Já aconte-ceu com você de alguma vez se enganar sobre algo que estivesse olhando? Algo que lhe pa-receu diferente do que realmente depois você verificou que era? Comente no FÓRUM TE-MÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

SAIBA MAIS!

inferência inconsciente

Hermann von Helmholtz é frequentemente citado como o fundador do estudo científico da percep-

ção visual. Helmholtz sustentava que a visão é uma forma de inferência inconsciente: visão é uma

questão de derivar uma interpretação provável a partir de dados incompletos.

Inferência requer assunções prévias sobre o mundo: dois fatos que sabidamente são assumidos no

processamento de informações visuais é que a luz vem de cima e que objetos são vistos de cima e

não, de baixo. O estudo de ilusões de óptica (casos em que o processo de inferência falha) lançaram

muita luz sobre que tipo de informações são presumidas pelo sistema visual.

A hipótese da inferência inconsciente foi recentemente retomada nos chamados “estudos bayesianos”

de percepção visual. proponentes dessa abordagem consideram que o sistema visual executa algu-

ma forma de inferência bayesiana, para derivar uma percepção do estímulo sensorial. modelos base-

ados nesta ideia têm sido usados para descrever vários subsistemas visuais, tais como a percepção

de movimento e de profundidade. Uma introdução pode ser encontrada em mamassian, landy &

maloney (2002).

teoria da gestaLt A psicologia da gestalt em trabalhos das décadas de 1930 e 1940 levantou muitas das hipóteses

que são estudadas pelos cientistas da visão atualmente.

As leis de organização da gestalt têm guiado os estudos sobre como as pessoas percebem componentes

visuais como padrões organizados ou conjuntos, ao invés de suas partes componentes. gestalt é

uma palavra alemã que significa “configuração” ou “padrão”. De acordo com essa teoria, há seis

fatores principais que determinam como nós agrupamos coisas de acordo com a percepção visual.

40 Fascículo 2

uma sutil hipérbole, ao se dizer que em uma bolsa de mulher, cabem tantas coisas quanto em uma geladeira. Notemos que a palavra “refriggerador” com dois “gg” em vermelho indica tamanho extra grande, e a frase “cabe tanta coisa que você nem acredita” logo abaixo da foto da bolsa reforça tanto

o sentido metafórico quanto o hiperbólico.

síntese A mais famosa figura de lin-guagem, a metáfora é, assim como a metonímia, uma figu-ra de palavras - isto é, o efeito se dá pelo jogo de palavras que se faz na frase.

A metáfora consiste em retirar uma palavra de seu contexto

convencional (denotativo) e trans-portá-la para um novo campo de sig-nificação (conotativa), por meio de uma comparação implícita, de uma similaridade existente entre as duas:

• Buscava o coração do Brasil. Ora, o Brasil não possui o órgão biológico em questão. Portanto, coração significa aí o centro vital, a essência, o âmago do país.

• Achamos a chave do problema. O problema não é nenhuma fechadura, mas para resolvê-lo (ou abri-lo), o elemento que se diz ter achado é tão necessário quanto uma chave para abrir uma porta.

catacrese

É uma variedade de metáfora natural da língua, de emprego corrente, que serve para suprir a inexistência de um nome específico para determinada coisa.

• Nariz do avião, pé da mesa, boca da noite, dente de alho, embarcar no trem, etc.

fórico tem um caráter simbólico, ainda que sutil, oculto ou indireto. A peculiaridade da significação por metaforização reside na eficácia desse recurso quando o objetivo é de enfatizar certos aspectos de uma realidade, sintetizar, enaltecer, ou mesmo, or-namentar, simplesmente, um discurso, poetizar si-tuações, seduzir pela palavra. O efeito se opera pela evocação de relações não vulga-res entre o metafori-zante e o metaforiza-do. Com tal virtude de eficácia, a metáfo-ra está em toda parte: na língua do povo, na gênese de gírias, ne-ologismos e ironias, nos filmes e slogans e imagens da publicida-de, nas manchetes do dia- a- dia, nas artes em geral. Encontra-mo-la em todas as linguagens: escrita, falada, audiovisual.

sistematização

Na figura 27, temos a propaganda de uma geladei-ra que promete muito espaço, capaz de guardar muitas coisas, mas que por fora não é tão grande que possa incomodar. Antes da imagem da gela-deira, vemos uma bolsa de mulher. A mensagem, por-tanto, é que a geladeira em questão cabe tanta coisa quanto uma bolsa de mu-lher e ocupa tanto espaço quanto ela. Temos aqui uma Metáfora, uma vez que entre a bolsa de mu-lher e a geladeira se estabe-lece uma comparação de suas qualidades. Por outro lado, existe também aqui,

Figura 27. Metáfora - 1

Figura 28. metáfora2: Observe os chinelos e os pincéis coloca-dos de forma a sugerir por me-taforização os dedos dos pés

http://pt.wikipedia.org/wiki/Semiótica - verbete da Wikipédia

acerca da Semiótica, ciência dos signos.

texto comPLementar

http://pt.wikipedia.org/wiki/Metáfora

- verbete da Wikipédia acerca da

Metáfora.

texto comPLementar

41Fascículo 2

SAIBA MAIS!

metáfora e matemática

As metáforas podem ser explicadas e entendidas de acordo com um raciocínio matemático. Certos

pensadores gostam muito dessas analogias, porque emprestam um certo ar de exatidão às cha-

madas ciências humanas. logicamente, nesses casos, tal exatidão é apenas relativa. O linguista

dinamarquês Hjelmslev tentou desenvolver essa ideia. para ele, a língua podia ser investigada em

termos algébricos, distinguindo, nas palavras e proposições, aspectos ou gRANDeZAs constantes e

variáveis, tal como nos sistemas de equações.

Já Umberto eco, em semiótica e filosofia da linguagem, refere-se às metáforas como sistema de

relações entre dois ou três termos - que pode ser representado com notações semelhantes às que

servem aos problemas matemáticos de relações e proporções. para entender metáforas através de

um raciocínio ordenado matematicamente, partimos do seguinte fato: metáforas expressam signi-

ficados ou funcionam quando destacam equivalências, pertinências, proximidades, contingências,

enfim associações entre termos costumeiramente não associados. essas associações podem ser óbvias

ou insuspeitadas. podem exigir do entendimento tanto um raciocínio simples quanto complexo ou

mesmo refinado (ratio simples e ratio dificilis, segundo eco).

tais relações se estabelecem em fUNÇÃO de afinidades “descobertas”, desnudadas, realçadas,

evidenciadas, enfatizadas pela construção metafórica. tanto para construir quanto para entender

metáforas, é necessário conhecer o universo semântico dos termos e o contexto de ocorrência da

proposição. valores simbólicos, que se equivalem em dado contexto, tornam possível a relação me-

tafórica entre termos de linguagem. Observe a analogia com a representação matemática, baseada

na lógica das razões e proporções: em matemática

a:b::c:d

leNDO: a está para b assim como c esta para d, significando que o produto dos extremos (a x d)

é IgUAl ao produto dos meios (c x d). em eXemplO NÚmeRICO:

4 2:3::12:18 estA É UmA RelAÇÃO De RAZÃO e pROpORÇÃO. sÃO vAlORes DesIgUAIs, pORÉm

em estADO De RelAÇÃO semelHANte em NAtUReZA (RAZÃO) e pROpORÇÃO. De fAtO:

2 x 18 = 3 x 12 = 36

na metáfora

teRmO 1 : teRmO 2 :: teRmO 3 : teRmO 4

Na frase: No deserto, o ouro negro jorrava em torrentes

O exemplo mostra uma clara transferência de significados, posto que a semântica dicionarial (o

significado costumeiro) informa que ouro: 1º não é negro; 2º sendo sólido, não jorra, propriedade

de líquido. percebe-se, então, que OURO NegRO é uma expressão que, no exemplo, está substi-

tuindo o substantivo concreto que constitui o sujeito. Considerando a qualidade usualmente mais

associada ao ouro, temos:

OURO : vAlOR eCONÔmICO ou RIQUeZA em mAtÉRIA sÓlIDA

:: QUAlIDADe “NegRO”: RIQUeZA QUe “JORRA”, lÍQUIDA

Como numa adivinhação, brincadeira de crianças, a me-

táfora sugere a questão: o termo metaforizado é uma

matéria líquida e negra que possui a mesma qualida-

de de riqueza econômica que o ouro, ou seja, petróleo.

Ouro equivale a petróleo, se considerado o aspecto do

valor pecuniário das duas substâncias.

qualidade riquezaSÓLIDOOURO

termo metaforizante

qualidade negrotermo metaforizadoqualidade riqueza

líquido

Figura 29. metáfora_matemática

42 Fascículo 2

atividade crítica/refLexiva | Indique aqui uma atividade para os alunos realizarem no contexto social, PROVOCANDO o aluno a co-laborar com o debate do tópico no FÓRUM TE-MÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.] Preencha os quadrinhos das cruzadinhas a seguir:

Cruzadinhas

Horizontais: 1. Figura do exagero; 2. Figura da substituição (parte pelo todo,

conteúdo pelo continente, etc...) 3. Troca de sentidos, integração de sentidos

da percepção; 4. Por vezes, utilizada como sinônimo de

Idioma; 5. Figura da atenuação da força expressiva de

uma mensagem; 6. Quando se diz o contrário do que realmen-

te se pretende dizer; 7. Estudo das normas e regras do “bem falar”; 8. Tipo especial de Metonímia; 9. Figura baseada num processo de comparação.

Vertical: 1. Sistema organizado de sinais, código, todo sis-

tema de signos que serve para comunicação.

7. a Leitura da aLegoria ProbLematização

Sucessão de metáforas e/ou comparações através das quais realidades abstratas são concretizadas. Por meio desta figura, uma realidade abstrata, e, por isso, de mais difícil apreensão, é substituída por ou comparada com uma realidade mais con-creta e, portanto, mais compreensível.

Por esse motivo, a alegoria é uma figura de estilo

com uma dimensão textual invulgarmente extensa; por vezes, abrange a totalidade de uma obra lite-rária: é o que acontece, por exemplo, no Auto da Barca do Inferno, de Gil Vicente.

Nesse auto vicentino, a passagem da vida terrena à vida depois da morte é alegoricamente represen-tada pela passagem de um rio, para a qual estão disponíveis duas barcas, a barca do paraíso e a barca do inferno. As almas são metaforicamente representadas por passageiros; o interrogatório a que são submetidas representa o julgamento das almas subsequente à morte; o destino de cada uma das barcas prefigura a salvação ou a condenação eternas. Embarcar numa ou noutra depende do comportamento das almas na vida terrena, e esse comportamento determina, portanto, o destino das almas depois da morte.

Releia agora a alegoria da árvore utilizada pelo P. Antônio Vieira num dos seus sermões.

(...) Uma árvore tem raízes, tem troncos, tem ramos, tem folhas, tem varas, tem flores, tem frutos. Assim há-de ser o sermão; há-de ter raízes fortes e sólidas, porque há-de ser fundado no Evangelho; há-de ter um tronco, porque há-de ter um só assunto e tratar uma só matéria; deste tronco hão-de nascer diversos ramos, que são diversos discursos, mas nascidos da mesma matéria e continuados nela; estes ramos não hão-de ser secos, senão cobertos de folhas, por-que os discursos hão-de ser vestidos e ornados de palavras. Há-de ter esta árvore varas, que são a repressão dos vícios; há-de ter flores, que são as sentenças; e por remate de tudo isto, há-de ter frutos, que é o fruto e o fim a que se há-de ordenar o sermão (...). P. Antônio Vieira

Este excerto é bem elucidativo da natureza da alegoria. Para mostrar, de forma mais expressiva, como deve ser o sermão, o autor compara-o, nos seus diversos elementos, com uma árvore e suas partes constituintes.

Começa por estabelecer uma comparação genéri-ca entre o sermão e a árvore: “Uma árvore tem raízes, tem troncos, tem ramos, tem folhas, tem varas, tem flores, tem frutos. Assim há-de ser o sermão (...)”. Um confronto do tipo “O sermão é como uma árvore” não alcançaria a expressividade que Vieira pretende. E, ao desdobrar a árvore nos seus constituintes (raízes, troncos, ramos...), abre o caminho à alegoria, estabelecendo o paralelo entre cada deles e os elementos do sermão: [o sermão] “há-de ter raízes (...); há-de ter um tronco (...); des-te tronco hão-de nascer diversos ramos (...)”.

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43Fascículo 2

O valor expressivo da alegoria resulta, principal-mente, do fato de tornar mais perceptíveis certas características das realidades abstractas, relacionan-do-as com outras, concretas. Neste caso, a natureza do discurso oratório (sermão) torna-se mais visível pela comparação com uma realidade concreta de todos conhecida, a árvore.

No centro da composição, surge a Pátria, coroada por um anjo e entronizada (sem esboceto conhe-cido e apenas identificada pelos atributos); abaixo desta, a Agricultura (com esboceto); à esquerda, a Pintura e a Arquitetura (sem esboceto conhecido, mas identificáveis pelos atributos: paleta e compas-so); em baixo, à esquerda, a Indústria (com esbo-ceto); em baixo, à direita, a História de Portugal (com esboceto - por vezes, por desconhecimento da existência do estudo, tem sido identificada como a alegoria às Letras, por carregar um livro).

sistematização

Alegoria Aquilo que representa uma coisa para dar a ideia de outra através de uma ilação moral. Um bom exemplo em português é-nos apresentado pelo Pa-dre Antônio Vieira: “Notai uma alegoria própria

Figura 30. Alegoria da Pátria: Alegoria à Pátria, às Artes, à Indústria, à Agricultura e à História de Portugal da autoria de Acácio Lino.

da nossa língua. O trigo do semeador, ainda que caiu quatro vezes, só de três nasceu; para o sermão vir nascendo, há-de ter três modos do cair: há-de cair com queda, há-de cair com cadência, há-de cair com caso. A queda é para as coisas, a cadência para as palavras, o caso para a disposição. A queda é para as coisas, porque hão-de vir bem trazidas e, em seu lugar, hão-de ter queda; a cadência é para as palavras, porque não hão-de ser escabrosas, nem dissonantes, hão-de ter cadência; o caso é para a disposição, porque há-de ser tão natural e tão de-safectado que pareça caso e não estudo: Cecidit, cecidit, cecidit.” (Sermão da Sexagésima, V, Obras Escolhidas,

vol.XI, Sá da Costa, Lisboa, 1954, p.222).

Etimologicamente, o grego allegoría significa “di-zer o outro”, “dizer alguma coisa diferente do sen-tido literal” e veio substituir, ao tempo de Plutarco (c.46-120 d.C.), um termo mais antigo: hypónoia, que queria dizer “significação oculta” e que era utilizado para interpretar, por exemplo, os mitos de Homero como personificações de princípios morais ou forças sobrenaturais, método que teve como foi especialista Aristarco de Samotrácia (c.215-143 a.C.). A alegoria distingue-se do símbo-lo pelo seu carácter moral e por tomar a realidade representada elemento a elemento e não, no seu conjunto. Muitas vezes definida como uma me-táfora ampliada, ou, como dizia Quintiliano, no Institutio oratoria, uma “metáfora continuada que mostra uma coisa pelas palavras e outra pelo sen-tido”, a alegoria é um dos recursos retóricos mais discutidos teoricamente ao longo dos tempos. A mesma correlação é estabelecida por Cícero no De Oratore, em que a alegoria é vista como um siste-ma de metáforas. Uma forma de distinguir metáfo-ra e alegoria é a proposta pelos retóricos antigos: a primeira considera apenas termos isolados; a segunda amplia-se a expressões ou textos inteiros.

Na tradição grega mais antiga, uma aplicação pos-sível da proto-ideia de alegoria é o ensino dos pita-góricos, cujo sistema filosófico, apoiado em rela-ções numéricas simbólicas, contém associações de natureza alegórica. Tal acontece, por exemplo, na doutrina do dualismo essencial entre limite e ili-mitado, que se funda na composição de dez pares de opostos, alguns alegóricos como Luz/Trevas e Bom/Mau.

Regra geral, a alegoria reporta-se a uma história ou a uma situação que joga com sentidos duplos e fi-gurados, sem limites textuais (pode ocorrer num

http://pt.wikipedia.org/wiki/Alegoria

- verbete da Wikipédia.

texto comPLementar

44 Fascículo 2

A distinção fundamental entre a alegoria e o sím-bolo foi estabelecida durante o Romantismo, em Coleridge no Statesman’s Manual (1816 ) e em es-pecial com Goethe e Schlegel. Ao princípio de Sch-legel, que defendia que toda a obra de arte devia ser uma alegoria, começou Hegel por contrapor: “Isso só será assim, se significar que toda a obra de arte deve representar uma ideia geral e implicar uma significação verdadeira. Ora, pelo contrário, o que nós aqui designamos com o nome de alegoria é um modo de representação secundária tanto no conteúdo como na forma e só de um modo imper-feito corresponde ao conceito de arte.” (Estética, trad. de Álvaro Ribeiro e Orlando Vitorino, Gui-marães Eds., Lisboa, 1993, p. 226).

A discussão sobre as diferenças entre símbolo e alegoria continua no século XX, salientando-se as reflexões de Walter Benjamin, Martin Heidegger, Hans-Georg Gadamer e Paul de Man. Todos ten-tam, de uma forma ou de outra, estabelecer a con-ciliação de ambos os conceitos, que está negada pelos românticos.

Walter Benjamin, em Ursprung des deutschen Trauerspiels (Origens do Drama Trágico Alemão, 1928), traz a alegoria para o campo exclusivo da es-tética. Partindo do sentido etimológico do termo, Benjamin viu a alegoria como a revelação de uma verdade oculta. Uma alegoria não representa as coi-sas tal como elas são, mas pretende antes dar-nos uma versão de como foram ou podem ser, por isso Benjamin se distancia da retórica clássica e assegu-ra que a alegoria se encontra “entre as ideias como as ruínas estão entre as coisas”. O filósofo alemão distinguiu dois tipos de alegoria: a “cristã”, que se atesta no drama barroco e que nos dá a visão da finitude do homem na absurdidade do mundo, e a “moderna”, atestada na obra de Baudelaire, coloca-da ao serviço da representação da degenerescência e da alienação humanas. É importante a distinção que Benjamin faz entre alegoria e símbolo, recupe-rando a oposição romântica: a primeira, enquanto revelação de uma verdade oculta - ou “uma verdade escondida sob bela mentira”, na célebre definição de Dante, no Convívio -, é temporal e aparece como um fragmento arrancado à totalidade do contexto social; o símbolo é essencialmente orgânico. O exa-me da relação entre o simbólico e o alegórico no Romantismo alemão será continuado por Lukács, na sua Estética, em diálogo distanciado com Benja-min, investigando o conceito de alegoria à luz de um dos paradigmas marxistas: a ideologia.

simples poema como num romance inteiro), pelo que também tem afinidades com a parábola e a fábula. Seja o exemplo seguinte de uma fábula de Esopo: “O leão e a rã”: Certa vez, um leão, ao passar perto de um pântano, ouviu uma rã coaxar muito alto e com muita força. Dirigiu-se então na direção do som, supondo que ia encontrar um animal grande e possante, correspondente ao ba-rulho que fazia. Por isso, ao avançar, nem repa-rou na pequena rã e pôs-lhe a pata em cima. “Vê lá onde pões os pés!”, gritou a rã. O leão olhou, admirado, e disse: “Se és assim tão pequena, por-que é que fazes tanto barulho?” Se substituirmos a rã por “o Orgulho” e o leão por “o Poder”, trans-formamos a fábula numa alegoria; se em vez da rã colocássemos “o Ministro Sem Pasta” e em vez do leão “o Pai Severo”, teríamos uma parábola, que esconde personagens reais por detrás de uma más-cara alegórica. De notar que é usual, na alegoria o recurso a personificações ou prosopopeias, em es-pecial de noções abstratas, prática muito comum, sobretudo na literatura medieval.

A decifração de uma alegoria depende sempre de uma leitura intertextual, que permita identificar num sentido abstrato um sentido mais profundo, sempre de caráter moral. Dizer que a alegoria é um desenvolvimento de uma fábula pode não ser sufi-ciente. Vejamos, por exemplo, o enigma da Esfinge no mito de Édipo. A questão central é esta: «Qual é o ser que, tendo uma única voz, ora caminha com dois pés, ora com três, ou ainda com quatro, e que é tanto mais fraco quantos mais pés tiver?» Quan-do Édipo chega a Tebas, resolve o enigma, respon-dendo: «É o homem que engatinha a quatro patas enquanto é criança, caminha ereto nas suas duas pernas quando é jovem e se encosta a uma benga-la na velhice.», a Esfinge, derrotada, suicida-se. O desenvolvimento da fábula da Esfinge grega depen-de de duas condições essenciais para se constituir como alegoria: não estar limitada a um fim didático, como todas as fábulas (sem a conclusão do enigma, a tragédia de Sófocles não poderia progredir); não jogar com a significação metafórica, isto é, não pro-duzir mais do que uma leitura do sentido abstraído, porque é próprio da alegoria não fazer uso da am-biguidade ou da plurissignificação, sob pena de se perder a ilação moral procurada.

Até à Idade Média, inclusive, a alegoria serviu de instrumento de defesa de teólogos que recorreram às interpretações alegóricas da Bíblia para supera-rem todas as dúvidas heréticas.

45Fascículo 2

Heidegger estudou a natureza da obra de arte como sendo constitutiva de uma realidade alegó-rico-simbólica indivisível: “A obra de arte é, com efeito, uma coisa, uma coisa fabricada, mas ela diz ainda algo de diferente do que a simples coisa é, ‘allo agoreuei’. A obra dá publicamente a conhecer outra coisa, revela-nos outra coisa: ela é alegoria. À coisa fabricada reúne-se ainda, na obra de arte, algo de outro. Reunir-se diz-se em grego symbal-lein. A obra é símbolo.” (A Origem da Obra de Arte, Edições 70, Lisboa, 1992, p.13). Na sua mag-num opus, Wahreit und Methode (1960), Hans-Georg Gadamer estabelece as semelhanças entre alegoria e símbolo: ambos se referem a algo cujo sentido não consiste na respectiva aparência exter-na ou imagem acústica, mas numa significação que os supera; em ambos, uma coisa quer dizer outra. E conclui que a principal diferença reside no fato de o símbolo se opor à alegoria da mesma forma que a arte se opõe à não-arte.

Paul de Man reapreciou também o debate romântico sobre a alegoria e o símbolo e, em Allegories of Reading (1979), apresentou as suas próprias leitu-ras como alegorias, observando que o exemplo de Rousseau pode contrariar o senso comum que vê o Romantismo como a afirmação do símbolo em de-trimento da alegoria. Paul de Man expõe a diferen-ça entre ambos os termos desta forma: “Enquanto o símbolo postula a possibilidade de uma identi-dade ou identificação, a alegoria designa, acima de tudo, uma distância em relação à sua própria origem, e, renunciando à nostalgia e ao desejo de coincidência, fixa a sua linguagem no vazio desta diferença temporal.” (“The Rhetoric of Tempora-lity”, in Blindness and Insight, 2 ed., Routledge, Londres, 1989, p. 207).

O próprio exercício da teoria e da crítica literária se tem servido de processos alegóricos: Ruskin es-creveu o tratado clássico Queen of the Air (1869), em que define o mito como uma história alegórica; as obras de Freud e Jung fizeram escola na interpre-tação alegórica de sonhos e mitos; os doze volumes do estudo comparado de religiões Golden Bough (1911-15), de James Frazer, fornece interpretações alegóricas de mitos primitivos que se tornaram re-ferências fundamentais no género; Walter Benja-min, no ensaio “O narrador” (in Illuminationen, 1969), distingue alegoricamente dois tipos ideais de narrador: o marujo que nos permite aproximar de lugares distantes e exóticos, e o velho camponês que conta histórias antigas; Cleanth Brooks, em

The Well Wrought Urn (1947), alegorizou todos os poemas que leu, de forma a transformá-los em parábolas para a própria natureza da poesia; a cha-mada crítica arquetípica defende, como o faz Nor-throp Frye em The Anatomy of Criticism (1957), que toda a análise literária deve ser alegórica.

síntese

Uma alegoria é uma representação tal que transmi-te um outro siginificado em adição ao significado literal do texto. Em outras palavras, é uma coisa

Figura 31. Alegoria da Justiça: Beccafumi Domenico (c. 1486-1551), il Mecarino. Alegoria da Justiça (1,610 x 1,510 m). Pintura a óleo sobre tela, localizada em Lille, Palais des Beaux-Arts

Figura 32. Carro Alegórico: Observe o sentido alegórico do carro.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Estética

- verbete da Wikipédia sobre Estética

http://www.radames.manosso.nom.br/retorica/alegoria.htm

- página acerca da Alegoria.

textos comPLementares

46 Fascículo 2

que é dita para dar a noção de outra, normalmente por meio d’alguma ilação moral.

É bastante fácil confundir a alegoria com a metáfo-ra, pois elas têm muitos pontos em comum. Para melhor entender o que seja uma alegoria, podemos citar alguns exemplos.

O mais conhecido exemplo de alegoria é provável que seja O Mito da Caverna, de Platão. O autor referia-se aos mitos e superstições de seus contem-porâneos, comportamento que ficou representado pela alegoria da caverna em que as pessoas ficariam presas e imóveis, sem jamais poder contemplar diretamente o que acontecia fora dali.

A Bíblia está repleta de alegorias, o próprio Cris-to ensinava por meio delas. Mas, antes mesmo do Novo Testamento, encontramos muitas alegorias, e muitos talvez considerem uma das mais belas a que faz a comparação da história de Israel com o crescimento de uma vinha no Salmo 80.

Os ditados populares são alegorias contextualizadas:

• “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura.”

• “Mais vale um pássaro na mão que dois voando.” • “Casa de ferreiro, espeto de pau.”

Etimologicamente, o grego allegoría significa “di-zer o outro”, “dizer alguma coisa diferente do sen-tido literal” (allos, “outro”, e agoreuein, “falar em público”).

atividade crítica/refLexiva | A alegoria da Justiça, enquanto estátua da Justiça é representa-da de olhos vendados e segurando uma balança e uma espada. Você sabe por quê? Comente no FÓ-RUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

8. Leitura do mundo ProbLematização

Paulo Freire aponta leitura de mundo como um desvela-mento da realida-de, na qual se retira o véu que cobre os nossos olhos e não nos deixa ver as coi-sas, com o objetivo de poder conhecê-las. Ele acrescenta que não basta apenas desvelar a realidade, é necessário realizar um desvelamento crítico, ou seja, uma ação que homens e mulheres devem exercer para retirar o véu (o que oculta) que não os deixa ver e analisar a veracidade das coisas, chegar ao profundo das coisas, conhecê-las, encon-trar o que há em seu interior, operar sobre o que se conhece para transformá-lo. Sendo assim, para Freire um conhecimento crítico (desvelamento crítico) exige a ação transformadora. A realidade “não é só dado objetivo, o fato concreto, senão, também, a percepção que o homem tem dela”.

A realidade objetiva é a forma como as coisas são sem véus nem superficia-lidades.

SAIBA MAIS!

carro aLegórico As alegorias são os carros que vão contando o enredo com destaques sobre

elas. Quanto mais enfeitado for o carro, mais o público fica mais alegre. Nos

carros alegóricos, também, tem a ver os elementos do enredo, pois nada vai

valer se colocar carros bonitos, se não estiver de acordo com o enredo.

Nenhum carro pode ser movido à tração animal ou motorizado. As alegorias

não podem ultrapassar oito metros e cinquenta centímetros de largura e

nove metros e oitenta centímetros de altura. Um carro alegórico é um tipo de

alegoria carnavalesca, em que normalmente as pessoas vão em cima, desfi-

lando. O primeiro carro alegórico do desfile é chamado de Carro Abre-Alas

e é ele que leva o nome da escola de samba. Os carros alegóricos podem

ser de diversos tamanhos e, geralmente são utilizados muitos enfeites, como

plumas e brilho. Os maiores carros chegam a atingir até 13 metros de altura

e 60 metros de comprimento, o que ocasionalmente prejudica a sua entrada

no local de desfile. esses carros geralmente são empurrados por pessoas

que ficam embaixo ou atrás da alegoria.

Figura 33. Paulo Freire

http://pt.wikipedia.org/wiki/

Realidade

- verbete da Wikipédia acerca

da Realidade.

texto comPLementar

47Fascículo 2

sistematização

Leitura de Mundo Frei Betto

“Ivo viu a uva”, ensinavam os manuais de alfabe-tização. Mas o professor Paulo Freire, com o seu método de alfabetizar conscientizando, fez adultos e crianças, no Brasil e na Guiné-Bissau, na Índia e na Nicarágua, descobrirem que Ivo não viu apenas com os olhos. Viu também com a mente e se per-guntou se uva é natureza ou cultura.

Ivo viu que a fruta não resulta do trabalho huma-no. É Criação, é natureza. Paulo Freire ensinou a Ivo que semear uva é ação humana na e sobre a natureza. É a mão, multiferramenta, despertando as potencialidades do fruto. Assim como o próprio ser humano foi semeado pela natureza em anos e anos de evolução do Cosmo.

Colher a uva, esmagá-la e transformá-la em vinho é cultura, assinalou Paulo Freire. O trabalho hu-maniza a natureza e, ao realizá-lo, o homem e a mulher se humanizam. Trabalho que instaura o nó de relações, a vida social. Graças ao professor, que iniciou sua pedagogia revolucionária com trabalha-dores do Sesi de Pernambuco, Ivo viu também que a uva é colhida por bóia-frias, que ganham pouco comercializada por atravessadores, que ganham melhor.

Ivo aprendeu com Paulo que, mesmo sem ainda saber ler, ele não é uma pessoa ignorante. Antes de aprender as letras, Ivo sabia erguer uma casa, tijolo a tijolo. O médico, o advogado ou o dentis-ta, com todo o seu estudo, não era capaz de cons-truir como Ivo. Paulo Freire ensinou a Ivo que não existe ninguém mais culto do que o outro, existem culturas paralelas, distintas, que se complementam na vida social.

Ivo viu a uva, e Paulo Freire mostrou-lhe os cachos, a parreira, a plantação inteira. Ensinou a Ivo que a leitura de um texto é tanto melhor compreendida quanto mais se insere o texto no contexto do autor e do leitor. É dessa relação dialógica entre texto e contexto que o autor e do leitor se compreendem. É dessa relação dialógica entre texto e contexto que Ivo extrai o pretexto para agir. No início e no fim do aprendizado, é a práxis de Ivo que importa. Práxis-teoria-práxis, num processo indutivo que torna o

educando sujeito histórico. Ivo viu a uva e não viu a ave que, de cima, enxerga a parreira e não vê a uva. O que Ivo vê é diferente do que vê a ave. Assim, Paulo Freire ensinou a Ivo um princípio fundamen-tal da epistemologia: a cabeça pensa onde os pés pisam. O mundo desigual pode ser lido pela ótica do opressor ou pela ótica do oprimido. Resulta em uma leitura tão diferente uma da outra como entre a visão Ptolomeu, ao observar o sistema solar com os pés na Terra, e a de Copérnico, ao imaginar-se com os pés no Sol.

Agora Ivo vê a uva, a parreira e todas as relações sociais que fazem do fruto festa no cálice de vinho, mas já não vê Paulo Freire, que mergulhou no Amor, na manhã de 2 de maio de 1997. Deixou-nos uma obra inestimável e um testemunho admi-rável de competência e coerência.

Paulo deveria estar em Cuba, onde receberia o tí-tulo de Doutor Honoris Causa, da Universidade de Havana. Ao sentir dolorido seu coração que

tanto amou, pe-diu que eu fosse representá-lo. De passagem mar-cada para Israel, não me foi pos-sível atendê-lo. Contudo, antes de embarcar fui rezar com Nita, sua mulher, e os filhos em torno de seu semblante tranquilo: Paulo via Deus.

Figura 34. alunos lendo na sala de leitura da escola.

www.filologia.org.br/ixcnlf/9/10.htm

- bom artigo acerca da leitura de mundo.

http://www.paulofreire.org.br/pdf/comunicacoes_orais/

LEITURA%20DE%20MUNDO%20E%20MULTICULTU-

RALISMO%20NA%20ESCOLA%20SOBRE%20A%20

%C3%93TICA%20FREIRIANA.pdf

– artigo em pdf, sobre a questão da leitura de mundo.

[Digite aqui a SÍNTESE (resumo). Apresente as principais

ideias e conceitos abordados, auxiliando na realização das

atividades de aprendizagem no final do capítulo.]

textos comPLementares

48 Fascículo 2

atividade crítica/refLexiva | Após essas nossas leituras, exercícios, comentários, você modificou ou aprendeu alguma coisa que somou ao seu modo de entender o significado das palavras “Leitura” e “Realidade”? Comente no FÓRUM TEMÁTICO da Sala Virtual da Disciplina.

SAIBA MAIS!

a imPortância do ato de Ler Por PauLo freire

A leitura do mundo precede a leitura da palavra, daí que a posterior leitura desta não possa pres-

cindir da continuidade da leitura daquele. linguagem e realidade se prendem dinamicamente. A

compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica implica a percepção das relações entre

o texto e o contexto. Ao ensaiar escrever sobre a importância do ato de ler, em me sentir levado — e

até gostosamente — a “reler” momentos fundamentais de minha prática, guardados na memória,

desde as experiências mais remotas de minha infância, de minha adolescência, de minha mocidade,

em que a compreensão crítica da importância do ato de ler se veio em mim constituindo.

Ao ir escrevendo este texto, ia “tomando distância” dos diferentes momentos em que o ato de ler se

veio dando na minha experiência existencial. primeiro, a “leitura” do mundo, do pequeno mundo em

que me movia; depois, a leitura da palavra que nem sempre, ao longo de minha escolarização, foi a

leitura da “palavramundo”.

Os “textos”, as “palavras”, as “letras” daquele contexto se encarnavam no canto dos pássaros — o do

sanhaçu, o do olha-pro-caminho-quem-vem, o do bem-te-vi, o do sabiá; na dança das copas das ár-

vores sopradas por fortes ventanias que anunciavam tempestades, trovões, relâmpagos; as águas da

chuva brincando de geografia, inventando lagoas, ilhas, rios, riachos. Os “textos”, as “palavras”, as

“letras” daquele contexto se encarnavam também no assobio do vento, nas nuvens do céu, nas suas

cores, nos seus movimentos; na cor das folhagens, na forma das folhas, no cheiro das flores — das

rosas, dos jasmins —, no corpo das árvores, na casca dos frutos. Na tonalidade diferente de cores de

um mesmo fruto em momentos distintos: o verde da manga-espada verde, o verde da manga-espada

inchada; o amarelo-esverdeado da mesma manga amadurecendo, as pintas negras da manga mais

além de madura. A relação entre estas cores, o desenvolvimento do fruto, a sua resistência à nossa

manipulação e o seu gosto. foi nesse tempo, possivelmente, que eu, fazendo e vendo fazer, aprendi

a significação da ação de amolegar.

gLossário

enunCiado - O conceito de enunciado já evocou grande po-lêmica no decorrer do último século. Alguns estudiosos, como Saussure (1974), tomaram a decisão de não abarcá-lo em toda a sua complexidade, focando suas atenções nos aspec-tos formais da língua. Outros (Bakhtin, 1974, por exemplo) aceitaram o desafio e promoveram um conceito de enunciado que valoriza suas características composicionais e a extensão do seu volume – o discurso. A construção de uma disciplina com foco no enunciado permitiu, portanto, o aparecimento de visões críticas e polêmicas sobre o tema. Diferentes perspec-tivas foram concebidas e, como consequência, abordagens contrastivas para o seu estudo foram desenvolvidas.

esboCeto - substantivo masculino - esboço de pequeno tamanho.

estétiCa - (do grego αισθητική ou aisthésis: percepção, sensação) é um ramo da filosofia que tem por objeto o estudo da natureza do belo e dos fundamentos da arte. Ela estuda o julgamento e a percepção do que é considerado belo, a produção das emoções pelos fenômenos estéticos bem como as diferentes formas de arte e do trabalho artís-tico; a ideia de obra de arte e de criação; a relação entre matérias e formas nas artes. Por outro lado, a estética tam-bém pode ocupar-se da privação da beleza, ou seja, o que pode ser considerado feio, ou até mesmo, ridículo.

euFemismo - é a atenuação ou suavização de ideias conside-radas desagradáveis, cruéis, imorais, obscenas ou ofensivas. Exemplos:

• Ele entregou a alma a Deus. (Em lugar de: Ele morreu)

49Fascículo 2

• Nos fizeram varrer calçadas, limpar o que faz todo o cão... (Em lugar de fezes)

• Ela é minha ajudante (Em lugar de empregada do-méstica)

• “...Trata-se de um usurpador do bem alheio...” (Em lugar de ladrão)

existenCialismo - é uma corrente filosófica e literária que surgiu nos séculos XIX e XX. O existencialismo tem por base a afirmação dos ideais de liberdade, responsabilidade e subjetividade do ser humano, o qual, segundo o pensa-mento filosófico, tem livre-arbítrio e deve utilizar a razão para fazer as melhores escolhas.

A essência do existencialismo procura analisar o homem como indivíduo, sendo que este faz sua própria existência. Percebe-se ,assim, a preocupação em explicar o sentido das vidas humanas de uma forma subjetiva, ao invés de se preocupar com verdades científicas relativas ao universo, que fora o centro de outras correntes filosóficas.

O existencialismo foi inspirado nas obras de Arthur Scho-penhauer, Søren Kierkegaard, Fiódor Dostoievski, Friedrich Nietzsche, Edmund Husserl e Martin Heidegger, difundido principalmente através das obras de Jean-Paul Sartre e Si-mone de Beauvoir.

Tal corrente de pensamento teve influências da religião, uma vez que muitos filósofos eram cristãos. Pascal e Kierkegaard eram cristãos dedicados. Nietzsche também acreditava, de certa forma, na existência de um Criador. O existencialismo pautado na religião afirmava que a fé defende o indivíduo e guia as decisões com um conjunto rigoroso de regras.

Para os filósofos existencialistas contemporâneos, a existência humana é vista como algo muito rico e complexo, por isso é impossível ser enquadrada em sistematizações abstratas.

Fenomenologia - nascida na segunda metade do século XIX, a partir das análises de Franz Brentano sobre a inten-cionalidade da consciência humana, trata de descrever, compreender e interpretar os fenômenos que se apresen-tam à percepção. Propõe a extinção da separação entre “sujeito” e “objeto” (opondo-se ao pensamento positivista do século XIX) e examina a realidade a partir da perspectiva de primeira pessoa.

gestalt - a Psicologia da forma, Psicologia da Gestalt, Gestaltismo ou simplesmente Gestalt é uma teoria da psi-cologia, que considera os fenômenos psicológicos como um conjunto autônomo, indivisível e articulado na sua configuração, organização e lei interna. A teoria foi criada pelos psicólogos alemães Max Wertheimer (1880-1943), Wolfgang Köhler (1887-1967) e Kurt Koffka (1886-1940), nos princípios do século XX. Funda-se na ideia de que o todo é mais do que a simples soma de suas partes.

Hipérbole - em retórica, ocorre hipérbole quando há exa-gero numa ideia expressa, de modo a acentuar, de for-ma dramática, aquilo que se quer dizer, transmitindo uma imagem inesquecível. É frequente na linguagem corrente, como quando dizemos: “Já te avisei mais de mil vezes para não voltares a falar-me alto!”.

Honoris Causa - abreviado como h.c. (em português: causa nobre), é um título honorífico concedido a uma per-sonalidade que tenha contribuído com os preceitos de uma instituição oficial de ensino , não pertencente a seu quadro funcional.

ironia - é um instrumento de literatura ou de retórica que consiste em dizer o contrário daquilo que se pensa, dei-xando entender uma distância intencional entre aquilo que dizemos e aquilo que realmente pensamos. Na Literatura, a ironia é a arte de gozar com alguém ou de alguma coi-sa, com vistas a obter uma reação do leitor, ouvinte ou interlocutor.

Ela pode ser utilizada, entre outras formas, com o objetivo de denunciar, de criticar ou de censurar algo. Para tal, o locutor descreve a realidade com termos aparentemente valorizantes, mas com a finalidade de desvalorizar. A ironia convida o leitor ou o ouvinte a ser ativo durante a leitura, para refletir sobre o tema e escolher uma determinada po-sição. O termo Ironia Socrática, levantado por Aristóteles, refere-se ao método socrático. Nesse caso, não se trata de ironia no sentido moderno da palavra.

metáFora - é a figura de palavra em que um termo substitui outro em vista de uma relação de semelhança entre os elementos que esses termos designam. Essa semelhança é resultado da imaginação, da subjetivida-de de quem cria a metáfora. A metáfora também pode ser entendida como uma comparação abreviada, em que o conectivo comparativo não está expresso, mas, subentendido.

Na comparação metafórica (ou símile), um elemento A é comparado a um elemento B por meio de um conectivo comparativo (como, assim como, que nem, qual, feito etc.).

Muitas vezes a comparação metafórica traz expressa, no próprio enunciado, a qualidade comum aos dois elementos: Esta criança é forte como um touro.

Elemento A Qualidade comum ao conectivo elemento B.Já na metáfora, a qualidade comum e o conectivo com-parativo não são expressos, e a semelhança entre os elementos A e B passa a ser puramente mental.

Do ponto de vista lógico, a criança é uma criança, e um touro é um touro. Uma criança jamais será um touro. Mas a criança teria a sua força comparada à de um touro.

Veja o exemplo: “O tempo é uma cadeira ao sol, e nada mais”. (Carlos Drummond de Andrade)

A associação do tempo a uma cadeira ao sol é puramente subjetiva. Cabe ao leitor completar o sentido de tal asso-ciação a partir da sua sensibilidade, da sua experiência. Essa metáfora, portanto, pode ser compreendida das mais diferentes formas. Isso não quer dizer que ela possa ser in-terpretada de qualquer jeito, mas que a compreensão dela é flexível, ampla.

Observe a transformação de comparações metafóricas (ou símiles) em metáforas:

50 Fascículo 2

• O Sr. Vivaldo é esperto como uma raposa. (compara-ção metafórica)

• O Sr. Vivaldo é uma raposa. (metáfora)• A vida é fugaz como chuva de verão. (comparação

metafórica) • A vida é chuva de verão. (metáfora)

Nesse último exemplo, o elemento A (as mangueiras estão sendo comparadas ao elemento B (intermináveis serpen-tes), pois há uma semelhança no modo como ambos se põem em relação ao chão. Os galhos da mangueira, por serem baixos e tortuosos, lembram intermináveis serpentes.

Na linguagem cotidiana, deparamo-nos com inúmeras ex-pressões, como:

• cheque-borracha• cheque-caubói• voto-camarão• manga-espada• manga-coração-de-boi

Nos exemplos já vistos, fica bastante claro o porquê da existência de metáforas. Diante de fatos e coisas novas, que não fazem parte da sua experiência, o homem tem a ten-dência de associar esses fatos e essas coisas a outros fatos e coisas que ele já conhece. Em vez de criar um novo nome para o peixe, ele o associa a um objeto da sua experiência (espada) e passa a denominá-lo peixe-espada. O mesmo acontece com peixe-boi, peixe-zebra, peixe-pedra, etc. (Se quiser fazer uma experiência, abra o dicionário na palavra “peixe” e verá quantas expressões são formadas a partir desse processo).

Muitos verbos também são utilizados no sentido metafó-rico. Quando dizemos que determinada pessoa “é difícil de engolir”, não estamos cogitando a possibilidade de colocar essa pessoa estômago adentro. Associamos o ato de engolir (ingerir algo, colocar algo para dentro) ao ato de aceitar, suportar, aguentar, em suma, conviver. Alguns outros exemplos:

• A vergonha queimava-lhe o rosto.• As suas palavras cortaram o silêncio.• O relógio pingava as horas, uma a uma, vagarosa-

mente.• Ela se levantou e fuzilou-me com o olhar.• Meu coração ruminava o ódio.

Até agora, vimos apenas casos de palavras que assumiam um sentido metafórico. No entanto, existem expressões inteiras (e até textos inteiros) que têm sentido metafórico, como:

• ter o rei na barriga: ser orgulhoso, metido• saltar de banda: cair fora, omitir-se• pôr minhocas na cabeça: pensar em bobagens, pen-

sar em tolices• dar um sorriso amarelo: sorrir sem graça • tudo azul: tudo bem• ir para o olho da rua: ser despedido, ser mandado

embora

Como se pode perceber, a metáfora afasta-se do raciocínio lógico, objetivo. A associação depende da subjetividade de

quem cria a metáfora, estabelecendo uma outra lógica, a lógica da sensibilidade.

metonímia - chama-se de metonímia ou transnominação uma figura de linguagem que consiste no emprego de um termo por outro, dada a relação de semelhança ou a pos-sibilidade de associação entre eles.

propaganda - é um modo específico de se apresentar uma informação, com o objetivo de servir a uma agen-da. Mesmo que a mensagem traga informação verdadeira, é possível que esta seja partidária, não apresentando um quadro completo e balanceado do objeto em questão. Seu uso primário advém de contexto político, referindo-se ge-ralmente aos esforços patrocinados por governos e partidos políticos. Uma manipulação semelhante de informações é bem conhecida, a publicidade, mas normalmente não é chamada de propaganda, ao menos, no sentido mencio-nado acima.

O CENP, Conselho Executivo de Normas Padrão, um dos órgãos que normatiza a atividade publicitária no Brasil, considera publicidade como sinônimo de propaganda. Esta confusão entre os termos propaganda e publicidade no Brasil ocorre por um problema de tradução dos originais de outros idiomas, especificamente os da língua inglesa. As traduções dentro da área de negócios, administração e marketing utilizam propaganda para o termo em inglês ad-vertising e publicidade, para o termo em inglês publicity. As traduções dentro da área de comunicação social utilizam propaganda para o termo em inglês publicity e publicidade para o termo em inglês advertising. No caso do CENP, a distinção entre os vocábulos é irrelevante, pois a entidade cuida tão-somente das relações comerciais entre anuncian-tes, agências e veículos. Assim definido o âmbito de sua atuação, torna-se óbvio que ela trata da propaganda co-mercial e emprega a locução como sinônimo de publicida-de (“advertising”). O termo propaganda é usado quando a veiculação na mídia é paga,; já publicidade refere-se à veiculação espontânea.

realidade - (do latim realitas isto é, “coisa”) significa em uso comum “tudo o que existe”. Em seu sentido mais livre, o termo inclui tudo o que é, seja ou não perceptível, aces-sível ou entendido pela ciência, filosofia ou qualquer outro sistema de análise.

Realidade significa a propriedade do que é real. Aquilo que é, que existe. O atributo do existente.

O real é tido como aquilo que existe fora da mente ou dentro dela também. A ilusão, a imaginação, embora não esteja expressa na realidade tangível extra-mentis, existe ontologicamente, onticamente* (relativa ao ente - vide Heidegger in “Ser e tempo”)*, ou seja: intramentis. E é portanto real, embora possa ser ou não ilusória. A ilusão quando existente é real e verdadeira em si mesma. Ela não nega sua natureza. Ela diz, sim, a si mesma. A realidade interna ao ser, seu mundo das ideias, embora na qualidade de ens fictionis intra mentis (ipsis literis, in “Proslogion” de Anselmo de Aosta - argumento ontológi-co), ou seja, enquanto ente fictício, imaginário, idealiza-do no sentido de tornar-se ideia, e ser ideia, pode - ou não - ser existente e real também no mundo externo. O que não nega a realidade da sua existência enquanto

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ente imaginário, idealizado.

Quanto ao externo - o fato de poder ser percebido só pela mente - torna-se sinônimo de interpretação da realidade, de uma aproximação com a verdade. A relação íntima en-tre realidade e verdade, o modo como a mente interpreta a realidade, é uma polêmica antiga. O problema, na cultura ocidental, surge com as teorias de Platão e Aristóteles sobre a natureza do real (o idealismo e o realismo). No cerne do problema, está presente a questão da imagem (a represen-tação sensível do objeto) e a da ideia (o sentido do objeto, a sua interpretação mental).

Em senso comum, realidade significa o ajuste que fazemos entre a imagem e a ideia da coisa, entre verdade e veros-similhança. O problema da realidade é matéria presente em todas as ciências e, com particular importância, nas ciências que têm como objeto de estudo o próprio homem: a antropologia cultural e todas as que nela estão implicadas : a filosofia, a psicologia, a semiologia e muitas outras, além das técnicas e das artes visuais.

Na interpretação ou representação do real, (verdade sub-jetiva ou crença), a realidade está sujeita ao campo das escolhas, isto é, determinamos parte do que consideramos ser um fato, ato ou uma possibilidade, algo adquirido a partir dos sentidos e do conhecimento adquirido. Dessa forma, a construção das coisas e as nossas relações de-pendem de um intrincado contexto, que, ao longo da existência, cria a lente entre a aprendizagem e o desejo: o que vamos aceitar como real?

A verdade (subjetiva) pode, às vezes, estar próxima da reali-dade, mas depende das situações, contextos, das premissas de pensamento, tendo de criar dúvidas reflexivas. Às vezes, aquilo que observamos está preso a escolhas que são mais um conjunto de normas ou e sim, do que evidências.

semiose - dentro da ciência dos signos (Semiologia; Semi-ótica), semiose foi o termo introduzido por Charles Sanders Peirce para designar o processo de significação, a produ-ção de significados.

Peirce e Saussure estavam interessados em linguística, a qual examina a estrutura e o processo da linguagem. Reco-nhecendo, entretanto, que a linguagem é diferente ou mais abrangente que a fala, desenvolveram a ideia de semioses para relacionar linguagem com outros sistemas de signos, sejam estes de natureza humana ou não.

Hoje, não há acordo doutrinário quanto à direção da relação de causa e efeito. Uma escola de pensamento considera a linguagem o protótipo da semiótica, e seu estudo iluminaria princípios aplicáveis a outros sistemas de signos. A escola oposta defende a existência de um sistema meta-signo, sendo a linguagem simplesmente um dos vários códigos para significação comunicante, citando como exemplo os meios pelos quais as crianças aprendem sobre seu ambiente mesmo antes de domina-rem uma linguagem. Qualquer que seja o ponto de vista, uma preliminar de-finição da semiose é qualquer ação ou influência para sentido comunicante pelo estabelecimento de relações entre signos que podem ser interpretados por qualquer audiência.

sex appeal - Apelo sexual refere-se à técnica utilizada muitas vezes em publicidade de valorizar o corpo, seja feminino, seja masculino, da (do) modelo, para relacioná-lo com algum produto ou marca. Ultimamente tem sido muito comum nas propagandas de cerveja, em que se associa a bebida com uma moça loira, linda e de roupas bem sensuais. O Sex appeal é um forma de sedução.

sinestesia - (do grego συναισθησία, συν- (syn-) “união” ou “junção” e -αισθησία (-esthesia) “sensação”) é a rela-ção de planos sensoriais diferentes: Por exemplo, o gosto com o cheiro ou a visão com o olfato. O termo é usado para descrever uma figura de linguagem e uma série de fenômenos provocados por uma condição neurológica.

Figura de linguagem

Sinestesia é uma figura de estilo ou semântica, que rela-ciona planos sensoriais diferentes. Tal como a metáfora ou a comparação por símile, são relacionadas entidades de universos distintos.

Exemplos de sinestesias:

• Indefiníveis músicas (audição), supremas harmonias de cor (visão) e de perfume (olfato).

• Horas do ocaso, trêmulas, extremas, requiem do Sol que a dor da luz resume.

• “Os carinhos (tato) de Godofredo não tinham mais o gosto (paladar) dos primeiros tempos.” (Autran Dourado)

• “O brilho macio do cetim.” (visão + tato) • “O doce afago materno.” (paladar + tato) • “Verde azedo.” (visão + paladar) • “Aroma gritante.” (olfato + audição) • “O delicioso aroma do amor” (paladar + olfato) • “Beleza áspera” (visão + tato)

slogan - um slogan ou frase de efeito é uma frase de fácil memorização utilizada em contexto político, religioso ou comercial como uma expressão repetitiva de uma ideia ou propósito.

Um slogan político geralmente expressa um objetivo ou alvo (“Trabalhadores do mundo, uni-vos!”), enquanto um slogan publicitário é mais frequentemente usado como uma identificação de fácil memorização, agregando um valor único à empresa, produto ou serviço, sendo esse va-lor concreto ou não (“A número 1”).

Slogans variam do escrito ao visual, do cantado ao vulgar. Quase sempre sua natureza simples e retórica deixa pouco espaço para detalhes e, como tal, servem talvez mais a uma expressão social de propósito unificado do que uma projeção para uma pretendida audiência.

Slogans são atrativos, particularmente na era moderna, de bombardeios informacionais de numerosas fontes da mídia. “Slogan” vem de sluagh-ghairm (se pronuncia slogorm), do gaélico-escocês para “grito de guerra” , como no filme co-nhecido Coração Valente.

52 Fascículo 2

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55Fascículo 3

objetivos esPecíficos

Tipologia Textual: Narração e Descrição Ler figuras de linguagem em Imagens; Tipologia Textual: Dissertação e a Dissertação acadêmica; O Diálogo e a Injunção.

1. tiPoLogia textuaL Tudo o que se escreve recebe o nome genérico de redação ou composição textual. Basicamente, existem três tipos de redação: narração (base em fatos), descrição (base em caracterização) e dissertação (base em argumentação). Mas considere-mos, ainda, a existência do Diálogo, da Entrevista e da Injunção. Cada um desses tipos redacionais mantém suas peculiaridades e características. descrição Tipo de texto em que se faz um retrato por escrito de um lugar, uma pessoa, um animal ou um objeto. A classe de palavras mais utilizada nessa produção é o adjetivo devido a sua função caracterizadora. Numa abordagem mais abstrata, pode-se até descrever sensações ou sentimentos. Não há relação de anterioridade e posterioridade.

Leitura e Produção de texto

Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna Carga Horária | 15 horas

56 Fascículo 3

narração Modalidade textual em que se conta um fato, fictí-cio ou não, que ocorreu num determinado tempo e lugar, envolvendo certos personagens. Refere-se a objetos do mundo real. Há uma relação de anterio-ridade e posterioridade. O tempo verbal predomi-nante é o passado. Estamos cercados de narrações desde as que nos contam histórias infantis, como o Chapeuzinho Vermelho ou a Bela Adormecida, até as picantes piadas do cotidiano. dissertação Estilo de texto com posicionamentos pessoais e ex-posição de ideias. Tem por base a argumentação, apresentada de forma lógica e coerente, a fim de defender um ponto de vista.

estrutura básica:

1. apresentação da ideia principal; 2. argumentos; 3. conclusão.

Utiliza verbos na 1ª e na 3ª pessoa do presente do indicativo. É a modalidade mais exigida nos con-cursos em geral, por promover uma espécie de “raio-X” do candidato no que toca às suas opini-ões. Nesse sentido, exige dos candidatos mais cui-dado em relação às colocações, pois também revela um pouco do seu temperamento, uma espécie de psicotécnico. Tipologia Argumentativa. exPosição Apresenta informações sobre assuntos, expõe ideias; explica, avalia, reflete.

estrutura básica:

1. ideia principal; 2. desenvolvimento; 3. conclusão.

Faz uso de linguagem clara, objetiva e impessoal. A maioria dos verbos está no presente do indicativo. injunção Indica como realizar uma ação; aconselha. É tam-bém utilizado para predizer acontecimentos e com-

portamentos. Utiliza linguagem objetiva e simples. Os verbos são, na sua maioria, empregados no modo imperativo. Há também o uso do futuro do presente. diáLogo Materializa o intercâmbio entre personagens. Pode conter marcas da linguagem oral, como pausas e retomadas.

entrevista É um colóquio entre pessoas em local combinado, para obtenção de esclarecimentos, avaliações, opi-niões etc.

• No jornalismo é a coleta de declarações toma-das por jornalista(s) para divulgação através dos meios de comunicação Derivação: por metonímia - as declarações as-sim coligidas.

Neste tópico, vimos que a Tipologia textual busca com-preender as caracte-rísticas que definem os principais tipos de texto, a saber: Narração, descri-ção, dissertação, injunção, diálogo e entrevista. Agora es-tudaremos cada um dos tipos com suas características.

Figura 35. Tipologia Textual

http://pt.wikipedia.org/wiki/Tipologia_textual

- verbete da wikipédia acerca da tipologia textual.

http://textuariosocial.blogspot.com/2008/04/tipologia-textual.html

- blog criado para discussão e análise da tipologia textual e das

características dos textos.

http://www.phpbbserver.com/letsspeakenglis/viewtopic.php?t=35&

view=previous&sid=561a3ef3880646f8ac35dfdf701e030d&mforu

m=letsspeakenglis

– interessante artigo acerca das diferenças conceituais entre tipolo-

gia e gênero textual e suas aplicações no ensino escolar.

textos comPLementares

57Fascículo 3

SAIBA MAIS!

para marcuschi, tipologia textual é um termo que deve ser usado para designar uma espécie de

sequência teoricamente definida pela natureza linguística de sua composição. em geral, os tipos tex-

tuais abrangem as categorias narração, argumentação, exposição, descrição e injunção (swales, 1990;

Adam, 1990; bronckart, 1999). segundo ele, o termo tipologia textual é usado para designar uma

espécie de sequência teoricamente definida pela natureza linguística de sua composição (aspectos

lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas) (p. 22).

gênero textual é definido pelo autor como uma noção vaga para os textos materializados encontrados

no dia-a-dia e que apresentam características sócio-comunicativas definidas pelos conteúdos, pro-

priedades funcionais, estilo e composição característica.

travaglia define tipologia textual como aquilo que pode instaurar um modo de interação, uma ma-

neira de interlocução, segundo perspectivas que podem variar. essas perspectivas podem, segundo o

autor, estar ligadas ao produtor do texto em relação ao objeto do dizer quanto ao fazer/acontecer, ou

conhecer/saber, e quanto à inserção destes no tempo e/ou no espaço. pode ser possível a perspectiva

do produtor do texto dada pela imagem que o mesmo faz do receptor como alguém que concorda

ou não com o que ele diz. surge, assim, o discurso da transformação, quando o produtor vê o receptor

como alguém que não concorda com ele. se o produtor vir o receptor como alguém que concorda

com ele, surge o discurso da cumplicidade. tem-se ainda, na opinião de travaglia, uma perspectiva

em que o produtor do texto faz uma antecipação no dizer. Da mesma forma, é possível encontrar a

perspectiva dada pela atitude comunicativa de comprometimento ou não. Resumindo, cada uma das

perspectivas apresentadas pelo autor gerará um tipo de texto. Assim, a primeira perspectiva faz surgir

os tipos descrição, dissertação, injunção e narração. A segunda perspectiva faz com que surja o tipo

argumentativo stricto sensu. A perspectiva da antecipação faz surgir o tipo preditivo. A do compro-

metimento dá origem a textos do mundo comentado (comprometimento) e do mundo narrado (não

comprometimento) (weirinch, 1968). Os textos do mundo narrado seriam enquadrados, de maneira

geral, no tipo narração. Já os do mundo comentado ficariam no tipo dissertação.

travaglia diz que o gênero textual se caracteriza por exercer uma função social específica. para ele,

estas funções sociais são pressentidas e vivenciadas pelos usuários. Isso equivale dizer que, intuiti-

vamente, sabemos que gênero usar em momentos específicos de interação, de acordo com a função

social dele. Quando vamos escrever um e-mail, sabemos que ele pode apresentar características que

farão com que ele “funcione” de maneira diferente. Assim, escrever um e-mail para um amigo não é

o mesmo que escrever um e-mail para uma universidade, pedindo informações sobre um concurso

público, por exemplo.

Observamos que travaglia dá ao gênero uma função social. parece que ele diferencia tipologia textu-

al de gênero textual a partir dessa “qualidade” que o gênero possui. mas todo texto, independente

de seu gênero ou tipo, não exerce uma função social qualquer?

marcuschi apresenta alguns exemplos de gêneros, mas não ressalta sua função social. Os exemplos que

ele traz são telefonema, sermão, romance, poesia, bilhete, aula expositiva, reunião de condomínio,

etc.

Já travaglia não só traz alguns exemplos de gêneros como mostra o que, na sua opinião, seria a função

social básica comum a cada um: aviso, comunicado, edital, informação, informe, citação (todos com a

função social de dar conhecimento de algo a alguém). Certamente a carta e o e-mail entrariam nessa

lista, levando em consideração que o aviso pode ser dado sob a forma de uma carta, e-mail ou ofício.

ele continua exemplificando apresentando a petição, o memorial, o requerimento, o abaixo assinado

(com a função social de pedir, solicitar).

58 Fascículo 3

atividade/fórum | Você já deve ter feito muitas redações na sua vida escolar e escrito muitas cartas e outros textos. Comente acerca daquele tipo de texto em que você mais se sente à vontade e sobre aquele que você mais tem di-ficuldades no Fórum Temático da Disciplina.

2. a narração Neste tópico, estudaremos as características da Narração. O Contar histórias é uma das atividades mais antigas do uso da palavra. Literatura e religião têm seus principais textos fundamentados nesse tipo de texto.

A narração consiste em arranjar uma sequência de fatos, na qual os personagens se movimentam num determinado espaço, à medida que o tempo passa.

O texto narrativo é baseado na ação que envolve personagens, tempo, espaço e conflito. Seus ele-mentos são: narrador, enredo, personagens, espa-ço e tempo.

Dessa forma, o texto narrativo apresenta uma de-terminada estrutura: Esquematizando temos:

• Apresentação; • Complicação ou desenvolvimento; • Clímax;• Desfecho.

Protagonistas e antagonistas A narrativa é centrada num conflito vivido pelos personagens. Diante disso, a importância dos per-sonagens na construção do texto é evidente.

Podemos dizer que existe um protagonista (perso-nagem principal) e um antagonista (personagem que atua contra o protagonista, impedindo-o de alcançar seus objetivos). Há também os adjuvantes ou coadjuvantes; esses são personagens secundá-rios que também exercem papéis fundamentais na história.

narração e narratividade Em nosso cotidiano, encontramos textos narra-tivos; contamos e/ou ouvimos histórias o tempo

todo. Mas os textos que não pertencem ao campo da ficção não são considerados narração, pois esta não tem como objetivo envolver o leitor pela tra-ma, pelo conflito.

Podemos dizer que, nesses relatos, há narrativida-de, que quer dizer, o modo de ser da narração.

os eLementos da narrativa Os elementos que compõem a narrativa são: • Foco narrativo (1a e 3a pessoa);• Personagens (protagonista, antagonista e coad-

juvante);• Narrador (narrador-personagem, narrador-

observador).• Tempo (cronológico e psicológico);• Espaço.

Leitura de texto narrativo

Conto de Natal Stanislaw Ponte Preta

(Sérgio Porto)

Era um Papai-Noel mais subdesenvolvido do que - di-gamos - o Piauí. Uma barba mixuruquíssima, rala, encardida, que ele acabou por puxar para debaixo do queixo, na esperança de diminuir o calor.

Sim, porque fazia calor.

A calçada refletia por debaixo das calças dos transeun-tes o seu bafo quente, o que ocorria também por de-baixo das saias das passantes, mas esta imagem é mais refrescante e talvez não dê ao leitor a ideia do calor que fazia. A turba ignara, ia e vinha carregada de embru-lhos, vítima da desonestidade dos comerciantes, mas, ávida de comprar presentinhos.

Figura 36. A leitura é uma atividade, que resiste às mais duras condições assim como a Narração.

59Fascículo 3

atividade/fórum | Uma das ações mais prazerosas entre amigos é contar piadas. De fato, toda piada é uma breve narração, cuja fi-nalidade é a de provocar o riso, daí seu estilo ser cômico. Conte alguma piada que você ache boa na página do fórum temático. Observe que sua piada não deve conter palavrões nem ter conotação preconceituosa!

E o Papai Noel avacalhado ali na esquina, badalando. Era um sininho de som fino, que ele badalava meio sem jeito, como se estivesse disfarçando alguma coisa sem aquela dignidade de badalar de sino dos verdadei-ros Papais-Noéis.

Também a roupa era mixa! A blusa não tinha aque-la vermelhidão dos Papais-Noéis de capa de revistas. Nunquinha Madalena. Era cor-de-rosa, daquele cor-de-rosa das camisas que usam componentes de blocos de sujo, no Carnaval carioca. Isto, inclusive, talvez fos-se verdade: aquele Papai-Noel era tão vagabundo que era bem possível que tivesse aproveitado o uniforme do Carnaval anterior para o Natal.

Tia Zulmira, protegida pela sombra de uma marquise, aguardava condução e observava o Papai Noel. Obser-vava, por exemplo, que o Papai-Noel usava tênis (bossa nova natalina), observava que o Papai-Noel não fazia anúncio de coisa nenhuma, ao contrário de seus co-leguinhas de outras esquinas, que traziam, às costas grandes, cartazes coloridos com os nomes das lojas da cidade.

A velha, num lampejo, percebeu tudo. Viu logo que, naquele Papai-Noel, tinha truque. E, apenas para con-firmar a sua teoria, abriu a bolsa, retirou um pedaço de papel e escreveu:

— 500 cruzeiros no grupo do gato — 1.675 pelos sete lados... NCr$ 200,00 — centena 463 (invertido) . . . NCr$ 150,00.

Enrolou o papelzinho no dinheiro correspondente e, saindo de debaixo da marquise, passou disfarçadamen-te pelo Papai-Noel e espalmou, na sua mão, a fezinha. Papai Noel apanhou tudo e disse baixinho:

— Obrigado, minha senhora. Um bom Natal para a senhora também.

Texto extraído do livro “Dez em Humor”,

Editora Expressão e Cultura - Rio de Janeiro, 1968, pág. 50.

SAIBA MAIS!

A narrativa literária costuma se apresentar em

forma de prosa, mas pode ser também em ver-

sos (epopéia, Romanceiros). se tivermos de de-

finir o texto narrativo de forma sucinta, citando

Carlos Reis, diremos que o texto narrativo é um

processo de exteriorização, uma atitude objeti-

va e baseada na sucessividade.

No século XX, a partir do estruturalismo, sur-

girá uma espécie de teoria semiótica da nar-

rativa (ou narratologia), que propõe estudar

a narratividade em geral (romances, contos,

filmes, espetáculos, mitos, anedotas, canções,

músicas, vídeos). encabeçados por Roland

barthes, esses estudos pretendem encontrar

uma “gramática” da narrativa, mais ou me-

nos como saussure encontrara para a fala. É

a partir daí que surgem as fichas de leitura e

os estudos sobre o narrador, os actantes, as

estratégias narrativas de determinada escola,

entre outros.

Roland barthes, mestre no estudo da narrativa,

afirma que “a narrativa está presente em to-

dos os tempos, em todos os lugares, em todas

as sociedades, começa com a própria história

da humanidade. (...) é fruto do gênio do nar-

rador ou possui em comum com outras narrati-

vas, uma estrutura acessível à análise”.

http://www.algosobre.com.br/redacao/narracao-com-

exemplos.html

- página com informações sobre a Narração.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Narração

- verbete da Wikipédia acerca do Modo Narrativo em

Literatura.

textos comPLementares

60 Fascículo 3

No terreno objetivo, temos as informações (dados do conhecimento do autor do texto: livro compra-do em Lisboa), as caracterizações (dados que estão no objeto de descrição: livro vermelho). Já no sub-jetivo, estão as qualificações (impressões subjetivas sobre o ser ou objeto: livro interessante). O ideal é que uma descrição possa fundir a objetividade, ne-cessária para a “pintura” ser a mais verídica possí-vel, e a subjetividade, que torna o texto bem mais interessante e agradável. Sendo assim, a descrição deve ir além do simples “retrato”, deve apresentar também uma interpretação do autor a respeito da-quilo que descreve.

3. a descrição A ação descritiva é fundamental para o pensamen-to humano; se, muitas vezes, se diz que uma ima-gem vale mais que mil palavras, também é fato que uma palavra comporta mil imagens. O pensador alemão Lessing escreveu acerca das diferenças en-tre a imagem nas artes plásticas e a palavra na poe-sia. Neste tópico, estudaremos as características do texto descritivo.

Uma descrição consiste em uma enumeração de parâmetros quantitativos e qualitativos os quais buscam fornecer uma definição de alguma coisa. Uma descrição completa inclui distinções sutis, úteis para distinguir uma coisa de outra.

Descrição - caracteriza-se por ser um “retrato ver-bal” de pessoas, objetos, animais, sentimentos, cenas ou ambientes. Entretanto, uma descrição não se resume à enumeração pura e simples. O essencial é saber captar o traço distintivo, particu-lar, o que diferencia aquele elemento descrito de todos os demais de sua espécie. Os elementos mais importantes no processo de caracterização são os adjetivos e as locuções adjetivas. Dessa maneira, é possível construir a caracterização tanto no sentido denotativo quanto no conotativo, como forma de enriquecimento do texto. Enquanto uma narração faz progredir uma história, a descrição consiste justamente em interrompê-la, detendo-se em um personagem, um objeto, um lugar, etc.

A qualificação constitui a parte principal de uma descrição. Qualificar o elemento descrito é dar-lhe características, apresentar um julgamento sobre ele. A qualificação pode estar no campo objetivo ou no subjetivo. Uma forma muito comum de qua-lificação é a analogia, isto é, a aproximação pelo pensamento de dois elementos que pertencem a domínios distintos. Pode ser feita por meio de comparações ou metáforas. descrição subjetiva x descrição objetiva • Objetiva - quando o objeto ou ser são narrados

ou apresentados como realmente são fisica-mente na realidade.

• Subjetiva - quando há interferência da emo-ção, ou seja, quando o objeto ou ser são trans-figurados pela emoção do autor.

Figura 37. Você pode descrever a imagem?

http://www.algosobre.com.br/redacao/descricao.html

- página com tópicos acerca da descrição

http://www.algosobre.com.br/redacao/descricao-com-exem-

plos.html

- do mesmo site acima, complementa as informações da pági-

na anterior com exemplos.

textos comPLementares

61Fascículo 3

SAIBA MAIS!

o Ponto de vista

O ponto de vista é a posição que escolhemos para melhor observar o ser ou o objeto que vamos

descrever. No entanto, nas descrições, além da posição física, é fundamental a atitude, ou seja,

a predisposição psicológica que temos com relação àquilo que vamos descrever. O ponto de

vista (físico e psicológico) que adotarmos acabará determinando os recursos expressivos (voca-

bulário, figuras, tipo de frase) que utilizaremos na descrição.

O ponto de vista físico vai determinar a ordem da apresentação dos detalhes, que devem ser

apresentados progressivamente. Observe o que diz Othon m. garcia, em sua obra Comunica-

ção em prosa moderna p. 217:

Nunca é, por exemplo, boa norma apresentar todos os detalhes acumulados em um só período.

Deve-se, ao contrário, oferecê-los ao leitor pouco a pouco, verificando as partes focalizadas e

associando-as ou interligando-as.

Na descrição de uma pessoa, por exemplo, podemos, inicialmente, passar uma visão geral e

depois, aproximando-se dela, a visão dos detalhes: como são seus olhos, seu nariz, sua boca,

seu sorriso, o que esse sorriso revela (inquietação, ironia, desprezo, desespero...), etc.

Na descrição de objetos, é importante que, além da imagem visual, sejam transmitidas ao leitor

outras referências sensoriais, como as táteis (o objeto é liso ou áspero?), as auditivas (o som

que ele emite é grave ou agudo?), as olfativas (o objeto exala algum cheiro?).

A descrição de paisagens (uma planície, uma praia, por exemplo) ou de ambientes (como uma

sala, um escritório) -- as cenas -- também não devem se limitar a uma visão geral. É preciso

ressaltar seus detalhes, e isso não é percebido, apenas, pela visão. Certamente, numa paisa-

gem ou ambiente, haverá ruídos, sensações térmicas, cheiros, que deverão ser transmitidos ao

leitor, evitando que a descrição se transforme numa fria e pouco expressiva fotografia. também

poderão integrar a cena pessoas, vultos, animais ou coisas que lhe dão vida. É, portanto, fun-

damental destacar esses elementos.

Leitura de texto narrativo Comunicação

(Luís Fernando Veríssimo)

É importante saber o nome das coisas. Ou, pelo me-nos, saber comunicar o que você quer. Imagine-se en-trando numa loja para comprar um... um... como é mesmo o nome?“Posso ajudá-lo, cavalheiro?”“Pode. Eu quero um daqueles, daqueles...”“Pois não?”“Um... como é mesmo o nome?”“Sim?”“Pomba! Um... um... Que cabeça a minha. A palavra me escapou por completo. É uma coisa simples, conhe-cidíssima.”“Sim senhor.”“O senhor vai dar risada quando souber.”“Sim senhor.”

“Olha, é pontuda, certo?”“O quê, cavalheiro?”“Isso que eu quero. Tem uma ponta assim, entende? Depois vem assim, assim, faz uma volta, aí vem reto de novo, e na outra ponta tem uma espécie de encai-xe, entende? Na ponta tem outra volta, só que esta é mais fechada. E tem um, um... Uma espécie de, como é que se diz? De sulco. Um sulco onde encaixa a outra ponta, a pontuda, de sorte que o negócio, entende, fica fechado. É isso. Uma coisa pontuda que fecha. Entende?”“Infelizmente, cavalheiro...”“Ora, você sabe do que eu estou falando.”“Estou me esforçando, mas...”“Escuta. Acho que não podia ser mais claro. Pontudo numa ponta, certo?”“Se o senhor diz, cavalheiro.”“Como, se eu digo? Isso já é má vontade. Eu sei que é pontudo numa ponta. Posso não saber o nome da coisa, isso é um detalhe. Mas sei exatamente o que eu quero.”

62 Fascículo 3

“Sim senhor. Pontudo numa ponta.”“Isso. Eu sabia que você compreenderia. Tem?”“Bom, eu preciso saber mais sobre o, a, essa coisa. Ten-te descrevê-la outra vez. Quem sabe o senhor desenha para nós?”“Não. Eu não sei desenhar nem casinha com fumaça saindo da chaminé. Sou uma negação em desenho.”“Sinto muito.”“Não precisa sentir. Sou técnico em contabilidade, estou muito bem de vida. Não sou um débil mental. Não sei desenhar, só isso. E hoje, por acaso, me es-queci do nome desse raio. Mas fora isso, tudo bem. O desenho não me faz falta. Lido com números. Tenho algum problema com os números mais complicados, claro. O oito, por exemplo. Tenho que fazer um rascu-nho antes. Mas não sou um débil mental, como você está pensando.”“Eu não estou pensando nada, cavalheiro.”“Chame o gerente.”“Não será preciso, cavalheiro. Tenho certeza de que chegaremos a um acordo. Essa coisa que o senhor quer, é feito do quê?”“É de, sei lá. De metal.”“Muito bem. De metal. Ela se move?”“Bem... É mais ou menos assim. Presta atenção nas minhas mãos. É assim, assim, dobra aqui e encaixa na ponta, assim.”“Tem mais de uma peça? Já vem montado?”“É inteiriço. Tenho quase certeza de que é inteiriço.”“Francamente...”“Mas é simples! Uma coisa simples. Olha: assim, as-sim, uma volta aqui, vem vindo, vem vindo, outra vol-ta e clique, encaixa.”“Ah, tem clique. É elétrico.”“Não! Clique, que eu digo, é o barulho de encaixar.”“Já sei!”“Ótimo!”“O senhor quer uma antena externa de televisão.”“Não! Escuta aqui. Vamos tentar de novo...”“Tentemos por outro lado. Para o que serve?”“Serve assim para prender. Entende? Uma coisa pon-tuda que prende. Você enfia a ponta pontuda por aqui, encaixa a ponta no sulco e prende as duas partes de uma coisa.”“Certo. Esse instrumento que o senhor procura fun-ciona mais ou menos como um gigantesco alfinete de segurança e...”“Mas é isso! É isso! Um alfinete de segurança!”“Mas do jeito que o senhor descrevia parecia uma coi-sa enorme, cavalheiro!”“É que eu sou meio expansivo. Me vê aí um... um... Como é mesmo o nome?” ...

(Fonte: VERÍSSIMO, Luís Fernando. Comunicação. In: PARA gostar de

ler, v.7. 3.ed. São Paulo: Ática, 1982. p. 35-37.) )

atividade/fórum | Na página do fórum temático, tente fazer a descrição da figura abai-xo. Observe também as descrições feitas pelos demais participantes do fórum, compare com a sua, observe as diferenças de opinião e os diferentes modos e estilos assim como os dife-rentes pontos de vista:

4. a dissertação A Dissertação é o tipo de texto que possui uma aparente complexidade maior em razão do grau de abstração e de articulação do pensamento que é preciso fazer, uma vez que ele dá origem à for-mulação de conceitos, ideias, relações de causa e consequência. Neste tópico, estudaremos as carac-terísticas da Dissertação. É um estudo teórico de natureza reflexiva, que consiste na ordenação de ideias sobre um deter-minado tema. A característica básica da disserta-ção é o cunho reflexivo-teórico. Dissertar é deba-ter, discutir, questionar, expressar ponto de vista, qualquer que seja. É desenvolver um raciocínio, desenvolver argumentos que fundamentem posi-ções. É polemizar, inclusive, com opiniões e com argumentos contrários aos nossos. É estabelecer relações de causa e consequência, é dar exemplos, é tirar conclusões, é apresentar um texto com orga-nização lógica das ideias.

A dissertação, geralmente, é feita em final de curso de pós-graduação, stricto sensu em nível de mestra-do, com a finalidade de treinar os estudantes no domínio do assunto abordado e como forma de

Figura 38. Salvador Dali, Dream Provoked by the Flight of a Bumble Bee

63Fascículo 3

iniciação à pesquisa mais ampla.

Na monografia (dissertação), para a obtenção do grau de mestre, além da revisão da literatura, é preci-so dominar o conhecimento do método de pesqui-sa e informar a metodologia utilizada na pesquisa.

Dissertação científica, ou simplesmente exercita-ção, é o trabalho feito nos moldes da tese, com a peculiaridade de ser ainda uma tese inicial ou em miniatura.

A dissertação tem ainda finalidade didática, uma vez que constitui o grande treinamento para a tese propriamente dita.

Chama-se memória a dissertação sobre assunto científico, literário ou artísti-co, destinada a ser apresentada ao go-verno, a uma corpo-ração ou academia.

A dissertação con-siste na explanação ou discussão de conceitos ou ideias. Ela pode ser expositiva ou argumentativa. Na dissertação expositiva, o autor apresenta uma ideia, uma doutrina e expõe o que ele ou outros pensam sobre o tema ou assunto. Geralmente faz a amplificação da ideia central, demonstrando sua natureza, antecedentes, causas próximas ou remo-tas, consequências ou exemplos.

Na dissertação argumentativa, o autor quer pro-var a veracidade ou falsidade de ideias; pretende convencer o leitor ou ouvinte, dirige-se à sua inteli-gência através de argumentos, de provas evidentes, de testemunhas.

Se a dissertação é objetiva, o tratamento dado ao texto é impessoal, com argumentação lógica, par-tindo de elementos gerais e indo para os particula-res. Na dissertação subjetiva, o autor dirige-se não só à inteligência, mas também, de modo pessoal, aos sentimentos de quem ele pretende convencer. Além da emoção, às vezes, há ironia, sarcasmo, ridículo. São partes importantes da dissertação: a introdu-ção, o desenvolvimento e a conclusão.

Leitura de texto dissertativo O que é a filosofia? A filosofia surge na Grécia Antiga como uma ativi-dade especial do homem sábio, o amigo do saber (filo + sophia = amor à sabedoria). Desde então, inú-meras foram as tentativas de definir exatamente o que procura e o que faz um filósofo. Todos reco-nhecem a sua importância e a imensa utilidade, são porém imprecisos e divergem em relação a de-terminar qual a sua verdadeira ciência. Aristóteles, discípulo de Platão e fundador do Liceu, uma es-cola voltada para o saber e a ciência que ele insta-lou em Atenas no século IV a.C., fez uma das mais claras exposições sobre as qualidades da filosofia.

A principal característica que Aristóteles vê num filósofo é que ele não é um especialista. O sophós, o sábio, é um conhecedor de todas as coisas, sem possuir uma ciência específica. O seu olhar derra-ma-se pelo mundo, sua curiosidade insaciável o faz investigar tanto os mistérios do cosmo e da physis, a natureza, como as que dizem respeito ao homem e à sociedade. No fundo, o filósofo é um desvela-dor, alguém que afasta o véu daquilo que está a encobrir os nossos olhos e procura mostrar os ob-jetos na sua forma e posição original, agindo como alguém que encontra uma estátua jogada no fundo do mar coberta de musgo e algas, e gradativamen-te, afastando-as uma a uma, vem a revelar-nos a sua bela forma e esplendor (a verdade entre os gregos está associada ao belo).

O que distingue o sábio é que ele tem o conhe-cimento das coisas mais difíceis. Entender que o fogo queima ou que a chuva molha é algo comum a qualquer um, pois sentir, ter sensações é algo uni-versal entre os homens, mas possuir as noções mais exatas das causas últimas e ser capaz de dar conta delas, transmitindo-as pelo ensino, é um apanágio, uma virtude do homem sábio. Ele também se dis-tingue do teólogo, na medida em que o seu objeti-vo é o de atingir a verdade e não forjar um dogma (algo que não se pode discutir ou questionar).

Em seguida, em decorrência lógica do que foi dito, a filosofia para Aristóteles é, por assim dizer, a mãe de todas as ciências, porque ninguém impõe critérios a ela. Ao contrário, se existem regras, se existem parâmetros para chegar a algo específico é a filosofia quem os estabelece, pois é do dedutivo, do geral, que partem as linhas orientadoras que guiam a mente do homem em direção a um deter-minado conhecimento.

Fonte: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/cultura/filosofia.htm

Figura 39. Escrever uma dis-sertação envolve alto grau de pensamento abstrativo

64 Fascículo 3

atividade/fórum | Na página do fórum te-mático da disciplina, apresente sua argumenta-ção acerca da seguinte pergunta: - Qual a importância da pesquisa para o desen-volvimento de uma boa dissertação?

5. a dissertação acadêmica Neste tópico, abordamos as características da Dis-sertação Acadêmica, ou seja, dos trabalhos mo-nográficos, dissertações e teses produzidas nas Universidades e Faculdades como resultados de pesquisa, sendo elas indispensáveis para a obten-ção dos graus de mestre e doutor, e, em muitos casos, também são exigências para a obtenção dos graus de bacharel, licenciado ou especialista.

A Dissertação acadêmica é um trabalho escrito de considerável extensão sobre um tema pré-definido, normalmente para fins acadêmicos. Originalmen-te, a dissertação (do lat. dissertatione(m) dizia respei-to a uma discussão, debate ou tratado sobre um determinado tema. É ainda a partir desta tradição que alguns escritores portugueses até ao Romantis-mo escreveram dissertações. O árcade Correia Gar-ção, por exemplo, legou-nos três textos de reflexão que receberam o nome de “dissertação”, sendo a “Dissertação Terceira” a mais conhecida («Sobre ser o principal preceito para formar um bom poeta procurar e seguir somente a imitação dos melhores autores da Antiguidade», 1757). Hoje, aceita-se que qualquer trabalho escolar executado segundo prin-cípios científicos de rigor de investigação e de reda-ção pode constituir uma dissertação, trabalho que persegue sempre o objetivo de aprofundar uma ideia precisa de que se partiu. O termo confunde-se com outros familiares como tese e monografia. Atualmente se distingue entre dissertação de mes-trado e tese de doutoramento, porém sem escla-recer a terminologia. (Deve-se notar que a mesma distinção é feita nas universidades anglófonas, mas no sentido contrário, reservando-se o termo disser-tação para os trabalhos de maior fôlego como o trabalho escrito para obtenção do grau de PhD.) Fica subentendido que a distinção entre disserta-ção e tese reside sobretudo na extensão física e na profundidade da investigação do texto a escrever: a dissertação de mestrado é, norma geral, mais curta (cerca de 150 páginas, em média) e não pretende tratar o assunto até à exaustão; a tese é, norma ge-ral, de grande extensão (pelo menos mais de 250

SAIBA MAIS!

escrever não significa, apenas, preencher o pa-

pel com frases mas também não se constitui num

martírio. Um texto pressupõe simples operações

anteriores, entre as quais está o planejamento.

Assim que se recebe uma proposta de reda-

ção, uma série de ideias sobre o assunto vêm à

cabeça. Deve-se registrar todos os pensamentos

no papel. fatos, informações, opiniões, um caso

que aconteceu na sua rua, tudo deve ser anotado

em forma de esquema. Não deve ser preocupação,

nessa fase, a ordenação dessas ideias.

essa primeira fase, denominada fluxo de ideias,

é fundamental para a execução da redação.

muitas ideias anotadas talvez nem sejam utili-

zadas depois, enquanto outras ideias podem

surgir adiante.

É claro que as ideias não vão aparecer do nada.

elas fazem parte de um repertório de opiniões,

fatos, informações a que se está exposto todos

os dias.

partindo desse conjunto desordenado de ideias,

pode-se perceber a possibilidade de agrupá-las

segundo certas semelhanças. Uma divisão pos-

sível seria em causas, consequências e soluções.

Dica para captação de ideias: relacionar o tema

proposto com a sociedade brasileira atual e

fazer a pergunta “por quê” a cada argumento

levantado, a fim de promover uma reflexão

mais profunda sobre o assunto.

lembrar que, ao redigir, não se deve esquecer de:

• anotar todas as ideias, frases, palavras,

sensações que surgirem sobre o tema;

• fazer uma seleção das ideias que surgiram;

• pensar num plano para o texto, estruturando-o

em introdução, desenvolvimento e conclusão;

• revisar no rascunho, ao final, a grafia das

palavras, a pontuação das frases e a eufonia

das palavras usadas, assim como a adequação

vocabular ao contexto.

http://www.algosobre.com.br/redacao/dissertacao.html

- página acerca do significado do verbo “dissertar”.

http://www.infoescola.com/redacao/dissertacao

- página acerca da dissertação.

http://www.mundovestibular.com.br/articles/1396/1/DICAS-PA-

RA-UMA-OTIMA-REDACAO-DISSERTATIVA/Paacutegina1.html

- página que pretende dar dicas para vestibulandos, esclarecen-

do os principais tópicos de uma redação dissertativa.

textos comPLementares

65Fascículo 3

páginas, em média) e procura tratar um assunto de forma quase exaustiva. Contudo, podemos natu-ralmente falar de dissertação para trabalhos de re-duzidas dimensões, desde um comentário de texto a um trabalho de licenciatura (normalmente den-tro do limite de algumas dezenas de páginas). A monografia tornou-se sinônima de tese e de disser-tação no sentido acadêmico dos trabalhos univer-sitários, embora a sua semântica aponte também para outros caminhos.

Uma dissertação acadêmica obedece a regras espe-cíficas, existindo hoje uma imensa literatura de re-ferência para ajudar a redação e composição formal da dissertação. Certas instituições impõem regras especiais de acordo com os princípios e os objeti-vos aí definidos. Uma dissertação acadêmica pu-blicada deve ser tratada como um livro em termos de referência bibliográfica, destacando o título em itálico, por exemplo, Carlos Silva: Guerra Junqueiro: A Gênese de um Poeta, Faculdade de Letras, Uni-versidade de Portugal, 1999. Caso a dissertação ou a tese não sejam publicadas, a referência apenas utiliza as aspas: Carlos Silva: «Guerra Junqueiro: A Gênese de um Poeta», Faculdade de Letras, Uni-versidade de Portugal, 1999. Normalmente, e em particular nas teses de doutoramento, o autor de uma tese acadêmica deve produzir um abstract (cerca de 300 palavras), que acompanha a disser-tação e é enviado para uma instituição (UMI) que edita regularmente o Dissertation Abstracts Inter-national (1ªed., 1987). Esta base de dados multidis-ciplinar inclui mais de um milhão de títulos desde 1861 até hoje e está disponível on line. É atualizada mensalmente.

Podemos sintetizar as regras de composição de uma dissertação da seguinte forma: 1. O título. A escolha do título de uma disserta-

ção ou tese, tal como a escolha de um título de um livro, não deve ser menosprezada, pois pode contribuir para a correta compreensão da obra em questão ou para o êxito do trabalho. Ao nível da pesquisa bibliográfica, durante uma pesquisa específica, podemos ver a impor-tância que um título tem para a compreensão de uma dada obra. Analise, por exemplo, um título como Os Lusíadas ou Auto da Barca do Inferno. Num fichário de biblioteca, é possível não só encontrar um livro pelo seu índice de títulos mas também pelo índice de autores e pelo índice de assuntos.

2. O prefácio. Uma dissertação ou tese acadêmi-ca é composta por várias partes, umas obriga-tórias (como o índice), outras facultativas. O prefácio é uma das partes facultativas. Pode en-cerrar a história e as incidências da elaboração da dissertação/tese, a motivação do autor para a investigação realizada, as condições em que tal investigação foi desenvolvida e as etapas mais relevantes para a sua consecução.

3. O preâmbulo. É uma parte facultativa da res-ponsabilidade do autor da dissertação ou tese. Se coexistir com a introdução, reserva-se para uma apresentação sumária dos objetivos da obra e sua fundamentação.

4. O corpo principal. Trata-se do desenvolvimen-to da investigação e da reflexão crítica sobre o tema a que o autor se propõe tratar.

5. A conclusão. Todo trabalho de natureza cien-tífica inclui as principais conclusões da inves-tigação realizada. Nelas se incluem não só as observações críticas finais julgadas pertinen-tes como também uma eventual orientação do leitor para a possibilidade de ulteriores investigações.

6. O posfácio. É uma parte facultativa pós-textu-al que pode servir para acrescentar um dado novo na investigação realizada, quando e só quando as circunstâncias não permitiram a sua inclusão no corpo principal do texto.

7. As notas. São complementos do texto princi-pal. Podem constituir-se em comentário, escla-recimento ou simples citação em pé de página (preferencialmente) ou no final de um texto (prática habitual, sobretudo em livros de ex-pressão inglesa). Como comentário, introdu-zem ou complementam criticamente um aspec-to particular relevado no texto, cuja discussão é aí deixada em aberto. Como esclarecimento, limitam-se a dar uma breve ex-plicação sobre a natureza do tex-to ou autor cita-do, informações úteis para uma pesquisa paralela ou posterior, ou correções de por-menor. Como citação, referem à obra ou obras que serviram de fonte ao autor. São, portanto, partes facultativas, mas muitas vezes de leitu-ra indispensável para a total compreensão de uma dissertação ou tese.

Figura 40. Exemplares de teses.

66 Fascículo 3

8. As citações. Tanto quanto possível, não se deve evitar sobrecarregar um texto com cita-ções marginais. Como princípio geral, acon-selha-se a trabalhar sempre os textos em pri-meira mão, recusando a citação em segunda ou terceira mãos. Escolher uma boa citação, saber quando é que é adequado inseri-la e que extensão deve ter pode ser mais difícil do que parece à primeira vista. As citações em inglês, francês, espanhol ou italiano ocorrem muitas vezes (e tal é aceitável) na língua original, em-bora se possa optar por traduzi-las em nota. Parte-se do princípio universal que quer o seu autor quer todos os potenciais leitores de um livro científico têm a obrigação de ler qual-quer texto nessas línguas. É importante não deixar nunca uma citação incompleta (sem autor, sem fonte, sem página, etc.). Todas as afirmações diretas devem ser documentadas, remetendo para as fontes. Em nenhum caso, admite-se que o estudante omita as fontes que utilizou, incorrendo, se o fizer, em fraude. So-brecarregar o texto com citações alheias pode vir a dar num texto incaracterístico. Um bom texto de análise literária, por exemplo, não se mede pelo número de citações mas pela opor-tunidade e importância das referências.

9. A bibliografia. Uma dissertação, uma tese universitária, um livro técnico contêm (ou devem conter) sempre uma bibliografia, isto é, o conjunto de textos e/ou livros que efe-tivamente contribuíram para a investigação que foi necessário realizar para produzir uma obra. Uma bibliografia é uma lista de obras ordenadas alfabeticamente pelos apelidos dos autores ou então ordenadas cronologicamente por ano de edição (mais raro). Uma referência bibliográfica é apenas um registro isolado de uma obra. Quando fazemos um trabalho de investigação, quando estudamos a obra de um autor, quando fazemos um comentário literá-rio, consultamos livros de dois tipos: àqueles sobre os quais trabalhamos diretamente, sobre os quais estamos a emitir uma opinião críti-ca e que são a base do nosso estudo damos o nome de bibliografia ativa; àquelas obras que nos ajudaram a fazer o nosso trabalho damos o nome de bibliografia passiva (geralmen-te de maior extensão em relação à anterior). Existem duas formas universais de apresentar uma bibliografia: ou arrumamos os títulos por ordem cronológica, desde o mais antigo até o mais recente, ou por ordem alfabética do ape-

lido dos autores. Em bibliografias extensas, é costume fazer-se uma divisão temática, de acor-do com a especificidade do trabalho científico desenvolvido.

10. O estilo. Quando procuramos educar o nosso próprio estilo de escrita, a melhor solução não passa pelo armazenamento de palavras novas e/ou difíceis. Geralmente, a procura de um es-tilo de grande erudição conduz a um trabalho só legível pelo seu próprio autor. Pelo contrá-rio, a excessiva vulgarização e padronização do discurso pode levar a um texto impessoal, inca-racterístico e inaceitável para um estudante de Letras. O uso de terminologia específica deve ser ponderado com rigor, adequado às circuns-tâncias e devidamente justificado.

11. A expressão escrita. A correção do texto cien-tífico passa também pelo estilo adotado e tam-bém pela correção ortográfica.

atividade/fórum | Discuta, na página do fórum temático da disciplina, quais suas preten-sões em termos de carreira acadêmica.

SAIBA MAIS!

o Que é Pós-graduação?

No brasil, a pós-graduação funciona com dois

tipos de ensino: lato sensu e stricto sensu.

O lato sensu capacita o profissional para melhor

executar sua atividade, pois possibilita atuali-

zar e aprofundar seus conhecimentos em de-

terminada área da sua profissão. se quiser

atuar no ensino superior, o aluno realiza um

complemento e produz um trabalho final, a mo-

nografia. Já na pós-graduação stricto sensu,

o profissional que pretende seguir carreira

universitária ou trabalhar com pesquisa pode

optar pelo mestrado e, na sequência, Doutorado.

esse nível de curso forma o profissional para

atuar no ensino superior e iniciar a atividade

de cientista-pesquisador. Como trabalho final,

o aluno realiza uma dissertação no mestrado

ou uma tese no Doutorado.

http://www.teses.usp.br

– banco de dados de teses e dissertações da USP.

www.dpi.inpe.br/cursos/ser212/aula3-como_fazer_tese.ppt

- apresentação em powerpoint, disponível nesse endereço

acerca de instruções básicas de como fazer uma tese.

textos comPLementares

67Fascículo 3

6 . o diáLogo Neste tópico, falaremos acerca do conceito de Di-álogo enquanto tipo de texto escrito, diferindo em termos de meio e algumas características do diálogo

enquanto texto oralizado (con-versa). Acredi-tamos que você compreenderá mais a fundo o sentido do “diá-logo” para o de-senvolvimento da dialética e do pensamento.

O Diálogo é, em literatura, um gênero textual, e não propriamente um tipo de texto. Porém, o de-senvolvimento da Narratologia, do romance e dos textos dramáticos, deu ao diálogo outra extensão, uma vez que sendo parte importante das narrati-vas, também pode ser utilizado como texto para exposição de conceitos (dissertação).

Com efeito, Platão considerava o diálogo o gênero literário ideal superando a poesia, tendo em vista a sua preocupação e o seu conceito de verdade. O Diálogo é assim, tanto um tipo de texto quanto um gênero. Se falamos de uma obra como Diálo-gos de Platão, ou Diálogo acerca da conversão do gentio, do Padre Manuel da Nóbrega, falamos de gênero, porém, se queremos nos referir aos diálo-gos entre personagens numa obra, esse diálogo é um tipo de texto. O texto de uma peça de teatro é dominado pelas características do diálogo, uma vez que se destacam as conversas entre as personagens, ficando as ações e descrições situadas no âmbito das rubricas. Platão escreveu somente diálogos (exceto a Sétima Carta, talvez a única autêntica). Ele nunca fala nos diálogos em seu próprio nome e se refere a si mes-mo só três vezes (na Apologia e no Fédon). Platão poderia, no entanto, ter escrito tratados filosóficos. Os Diálogos de Platão se desenrolam em situações dramáticas muito precisas, e o cenário é absoluta-mente indispensável para a compreensão do que acontece em cada diálogo. Um diálogo, como uma peça de teatro, avança, passo a passo e deve ser lido sequencialmente, na ordem em que ele se desenro-la a nossa frente. Como num drama, a situação se

desenvolve, os elementos mudam muito ou pouco, e o sentido de uma frase pronunciada por alguém no começo do diálogo pode ser ou não ser o mes-mo para ele (ou para seu interlocutor) após umas quantas páginas de conversação. É por isso que Platão tem suas ressalvas à lógica formal. A lógica formal se baseia sobre a suposição que proposições podem ser destacadas de seu contexto pragmático, conjugadas umas com outras, comparadas entre si e assim produzirem novas proposições. Mas num diálogo, como na vida real, palavras não mantêm seu sentido de um sujeito a outro, e o mesmo sujei-to, em tempos diversos, pode usar a mesma palavra de modo ligeiramente – ou mesmo totalmente – diverso. Nesse sentido, importa ressaltar que não temos nos diálogos um porta-voz de Platão, mes-mo Sócrates, não é, de maneira unívoca, Platão. Assim, também nos diálogos médios e tardios, a discussão é sempre contextual, e tem de ser lida de tal modo: tudo que é dito deve ser tomado como pronunciamentos em seus contextos, inseparáveis de quem os pronuncia.

Será, então, que tudo é incerto nos diálogos de Platão?

Não haverá nenhuma doutrina, nenhum pro-nunciamento, nenhuma posição que possamos

tomar como sendo em toda seriedade de Platão ou de Sócrates?

Não teremos pé em lugar nenhum, nenhum ponto de partida, nada em que nos possamos fiar, que não sejamos forçados, mais tarde, a

revisar, sob a pressão desse movimento?

Pergunte a qualquer escritor. Ele certamente dirá que o diálogo é a alma do texto de ficção. Da mesma forma que as conversas é que dão vida às relações entre as pessoas, no cotidiano. Claro, os personagens agem, e essas ações podem ser narra-das ou descritas. Mas, com os diálogos, as ações e, por extensão, as tramas em que estão envolvidos ganham brilho, agilidade e uma camada de infor-mações suplementares sobre ele e a situação que está sendo narrada.

Pode até se dizer que não há conto ou romance sem alguma forma de diálogo. Como os escritores consagrados podem confirmar, o bom diálogo é uma das ferramentas literárias mais fáceis de domi-nar. Afinal, todo mundo fala e se comunica, basta caprichar. Mas é preciso cuidado ao usá-lo. Se um bom diálogo até salva um mau texto de ficção do desastre completo, um diálogo medíocre pode arrui-

Figura 41. Um diálogo...

68 Fascículo 3

nar uma boa história.

Os manuais mostram que há duas formas de ex-pressar a fala dos personagens. Uma é o discurso direto, quando o escritor exibe os personagens dialogando, reproduzindo suas conversas. Outra é o discurso indireto, quando o narrador dá a co-nhecer, com suas palavras, o que os personagens conversam ou ponderam intimamente.

Aqui um exemplo de discurso direto, de uma crô-nica de Luís Fernando Veríssimo:

“— Tente relaxar...— Desculpe. É que tem uma parte de mim que, enten-de? Fica de fora, distanciada, assistindo a tudo. Uma parte que não consegue se entregar...— Eu entendo.— É como se fosse uma terceira pessoa na cama.— Certo. É o seu superego. O meu também está aqui.— O seu também?— Claro. Todo mundo tem um. O negócio é aprender a conviver com ele.— Se ele ao menos fechasse os olhos!”

Que, em discurso indireto, seria algo mais ou me-nos assim:

Ele sugeriu que ela tentasse relaxar. Ao que ouviu em res-posta que havia uma parte dela que ficava de fora, distan-ciada, assistindo a tudo. E acrescentou, ainda, que era uma parte que não conseguia se entregar...

o uso de travessões e asPas Luís Fernando Veríssimo usa travessões para in-dicar ao leitor que se trata de um diálogo. Há es-critores que preferem indicar o diálogo abrindo e fechando aspas. Outros colocam as frases dos personagens no meio do texto, sem alertar o lei-tor que se trata de diálogo. Veríssimo evita isso, sobretudo porque no seu texto, não há possibi-lidade de confundir-se quem está falando — são só dois os interlocutores, um falando a cada vez, e há o uso de penduricalhos que costumam vir coladinhos aos diálogos, especialmente quando há vários personagens falando. Eles são verbos, como “dizer”, “afirmar”, “ponderar”, “concor-dar”, “acrescentar”, entre outros.

“O Jorge falou que vai para Santos”, disse ela. Ou “O Carlos também está indo”, acrescentamos, numa só voz.

O mais comum é o escritor usar o verbo dizer, com

pronome pessoal ou não.

“O Jorge vai para Santos”, disse.

Trata-se de uma ajudazinha do escritor para o leitor. E qualquer leitor mediano já está condi-cionado a passar por esse recurso sem tropeçar nele. O cérebro registra o que o personagem dis-se, mas praticamente não “vê” o tal do penduri-calho. É preciso tomar cuidado para não abusar, pois, se muito repetido em trechos próximos do texto, ele perde a invisibilidade e começa a ficar mais importante que o resto.

Há umas convenções quanto a isso. Por exemplo: “Faça isso”, mandou, “pode ser o certo.” (Depois do verbo-penduricalho, você continua a frase com letra minúscula. A não ser que haja um substanti-vo ou nome próprio: “Faça isso”, mandou, “João acha que é o certo.” Se você, entretanto, quiser destacar a segunda frase, ela começa com maiúscu-la, graças ao ponto final na primeira: “Faça isso”, mandou. “Pode ser o certo”.

a verossimiLHança

Para ser eficiente, o diálogo tem de ser verossímil tanto quanto os personagens. Isso quer dizer que, como na vida real, cada pessoa tem um modo de falar. A não ser que seja um personagem disfarça-do, um lixeiro não convencerá falando como um físico nuclear. Como um dos papéis do diálogo é proporcionar informações sobre o personagem ou a ação, ele tem de ser adequado. Os personagens também não podem errar o tom. Há situações em que as conversas têm de ser formais e outras em que a informalidade é obrigatória. Da mesma for-ma, usar gíria exige personagens ou situações que sejam adequados a isso.

Os escritores usam recursos para insinuar o que não está sendo dito, sobretudo para reforçar as emoções dos personagens. Assim, um sujeito rai-voso fecha os punhos, aperta os olhos; um nervoso fica andando sem parar, coça-se; o mentiroso não encara os outros etc. São recursos, mas devem ser apreciados com moderação. No setor das emoções, é comum ver que, quando o personagem está es-tressado, em crise, as frases são mais curtas, cheias de verbos vigorosos, parágrafos rápidos e diálogos ágeis. O leitor fareja a tensão e a urgência até lê mais depressa. Nos momentos de calma e ternura, os personagens falam bastante, discutem consigo

69Fascículo 3

mesmos. O texto reduz o ritmo da tensão.

a informação do diáLogo É preciso ter cuidado ao embutir informações nos diálogos. O recurso tem de ser usado em doses pe-quenas. Nada mais chato do que ler meia página de informações que vêm da boca de um persona-gem, narrando fatos do passado ou explicando alguma coisa.

Uma situação clichê dessas é a do vilão que, depois de amarrar o herói, explica minuciosamente o seu plano de conquistar o mundo, até que o mocinho consiga livrar-se. Lembre-se de James Bond preso pelo Dr. No Goldfinger.

Na leitura dos livros de 007, isso sempre atra-palha a ação, dá aquela tentação de pular para a frente no livro. É uma coisa que só vale para quadrinhos ou paródias.

Basta pensar um pouco no cotidiano, em que essas informações são brevemente mencionadas, já que elas fazem parte do repertório de quem conversa, ou nem são referidas, a não ser que se trate de uma aula ou palestra.

a audição do diáLogo escrito Para ajudar um bom diálogo, é interessante ouvir pessoas de várias origens e modos de vida diferen-tes, para usar como base. Ler para ver como bons autores trataram dos diálogos é recomendável, mas cuidado.

Grandes mestres da literatura, por melhores que sejam, muitas vezes ficaram fora de moda ou data-dos no jeito que construíram seus diálogos.

Machado de Assis, por exemplo, um mestre do di-álogo nos seus livros, hoje é um veneno para imi-tadores. Não tem nada a ver com o jeito de falar atual, a não ser que seu livro aconteça em tempos machadianos. E, mesmo assim, corre o risco de vi-rar paródia.

Os diálogos não devem ser uma cópia exata das conversas da realidade. O escritor pode usar a vida real como essência, mas terá de filtrar o que se-ria uma conversa, para obter um diálogo. Usará só o fundamental para o diálogo ser ágil, eficiente

e provocar uma empatia do leitor com tal ou tal personagem. No diálogo, em geral, não há espaço para se ficar dizendo abobrinhas ou jogando con-versa fora, sob pena de o leitor jogar o livro fora. É sempre bom lembrar que uma função do diálogo é levar a ação adiante, acrescentar um conflito, mos-trar algo de novo sobre um personagem.

www.fflch.usp.br/dlm/ingles/graduacao/ROTEIRO_

ANALISE.pdf

- arquivo em pdf que apresenta as características bási-

cas de um texto dramático (peça de teatro), explicando

como colocar os diálogos, as rubricas, etc.

www.fflch.usp.br/dlm/ingles/graduacao/ROTEIRO_

ANALISE.pdf

- arquivo em pdf que comenta acerca das características

do texto de telenovela (roteiro).

textos comPLementares

70 Fascículo 3

atividade/fórum | O diálogo é fundamen-tal para o desenvolvimento do pensamento humano, uma vez que existe a possibilidade da troca de ideias entre os atuantes do diálogo. Nesse sentido, é que se usa o termo dialética, emprestado da filosofia. O dicionário traz a se-guinte definição de dialética: substantivo feminino

1. Rubrica: filosofia. Em sentido bastante genérico, oposição, conflito originado pela contradição entre princípios teóricos ou fenômenos empíricos.

• Rubrica: filosofia. No platonismo, processo de diálogo, de-bate entre interlocutores comprometidos profundamente com a busca da verdade, por meio do qual a alma se eleva gradati-vamente das aparências sensíveis às realida-des inteligíveis ou ideias.

• Rubrica: filosofia. No aristotelismo, raciocínio lógico que, embora coerente em seu encadeamento in-terno, está fundamentado em ideias apenas prováveis, e por esta razão traz sempre, em seu âmago, a possibilidade de sofrer uma refutação.

• Rubrica: filosofia. No kantismo, raciocínio fundado em uma ilusão natural e inevitável da razão, que por isso permanece no pensamento, mesmo quando envolvido em contradições ou sub-metido à refutação. Obs.: cf. dialética transcendental

• Rubrica: filosofia. No hegelianismo, lei que caracteriza a re-alidade como um movimento incessante e contraditório, condensável em três mo-mentos sucessivos (tese, antítese e síntese) que se manifestam simultaneamente em to-

SAIBA MAIS!

discurso direto e indireto As falas de um personagem

em uma narrativa, o narrador pode apresentar a fala das personagens por meio do discurso direto ou do

discurso indireto.

No discurso direto, conhecemos a personagem por meio de suas próprias palavras. para construir o discurso

direto, usamos o travessão e certos verbos especiais, que chamamos de verbos “de dizer” ou verbos dicendi.

são exemplos de verbos dicendi os verbos falar, dizer, responder, retrucar, indagar, declarar, exclamar e

assim por diante.

Na seguinte passagem do romance “vidas secas”, de graciliano Ramos, ficamos sabendo do sofrimento e

da rudeza de fabiano, o protagonista, por meio da forma como ele se dirige ao filho.

“Os juazeiros aproximaram-se, recuaram, sumiram-se. O menino mais velho pôs-se a chorar, sentou-se

no chão.- Anda, condenado do diabo, gritou-lhe o pai.”

No discurso indireto, o narrador “conta” o que a personagem disse. Conhecemos suas palavras indireta-

mente. A passagem mencionada acima ficaria assim:

“O pai gritou-lhe que andasse, chamando-o de condenado do diabo.”

Há, ainda, uma terceira forma de conhecer o que as personagens dizem. É o discurso indireto livre. Nesse

caso, o narrador passa do discurso indireto para o direto, sem usar nenhum verbo dicendi ou travessão.

por exemplo, numa outra passagem de vidas secas, o narrador usa o discurso indireto livre para caracterizar

a personagem de seu tomé:

“seu tomé da bolandeira falava bem, estragava os olhos em cima de jornais e livros, mas não sabia mandar:

pedia. esquisitice de um homem remediado por ser cortês. Até o povo censurava aquelas maneiras. mas

todos obedeciam a ele. Ah! Quem disse que não obedeciam?”

podemos observar que a última reflexão não é do narrador, e, sim , da personagem, pensando sobre a questão.

71Fascículo 3

dos os pensamentos humanos e em todos os fenômenos do mundo material.

• Rubrica: filosofia. No marxismo, versão materialista da dialé-tica hegeliana aplicada ao movimento e às contradições de origem econômica na his-tória da humanidade.

2. Derivação: sentido figurado (da acp. 1.1). Uso: pejorativo. Na arte, modo de discutir por meio de ra-ciocínios especiosos e vazios.

Com base no que foi aqui exposto sobre o di-álogo e com a definição de dicionário do que é dialética, comente qual a importância da dia-lética para o desenvolvimento do pensamento.

7. a entrevista e a injunção Neste tópico, comentaremos acerca das caracterís-ticas da entrevista e da injunção. Por sua caracte-rística própria, a entrevista tem muito de diálogo; quanto à injunção, ela parece mais próxima da linguagem dos editais, decretos, leis e normas, por-tanto, da linguagem jurídica.

a entrevista

Na entrevista, é de suma importância saber ouvir. Com alguma preparação, uma estrutura de entre-vista bem definida e com os objetivos delineados, qualquer membro de uma equipe de trabalho pode realizar a tarefa de entrevistar alguém de forma cor-reta e com bons resultados. Ainda assim, deve ser dada preferência a membros da equipe com mais aptidões de interação social e com vontade para

manter uma conversa com os entrevistados num ambiente agradável. Aqui ficam algumas dicas para uma entrevista de sucesso:

• Prepare uma entrevista no contexto apropria-do, e tome nota para que isso sirva como re-ferência no decorrer da entrevista. Faça uma revisão nas questões e coloque nos momentos que antecedem a entrevista.

• Antes da entrevista, faça uma pesquisa acer-ca da pessoa a ser entrevistada, seu currículo, seus trabalhos. Não mace a pessoa a ser entre-vistada com perguntas que poderia facilmente saber a resposta a priori. Ainda assim, pode confirmar brevemente essas respostas, dando a mostrar o seu interesse e conhecimento da pessoa em questão.

• Anote as respostas no seu bloco de notas durante a entrevista. (Não tente capturar a informação de forma eletrônica nesta fase!)

• Consulte as notas da estrutura da entrevista no decorrer desta. Assim, terá a certeza de que está a fazer as perguntas corretas e que não se está a desviar dos objetivos definidos.

• Discuta os problemas com o entrevistado. Esclareça situações que possa observar no ambiente. Faça sugestões e observações basea-das em conhecimento teórico e familiarização com outros sistemas.

O sentido da entrevista não deve ser demasiado restritivo. Depois de estabelecida uma ligação po-sitiva com o entrevistado, é normal que a entrevis-ta acabe por entrar numa dinâmica própria. Por vezes, o entrevistado pode começar a entrar em grande detalhe acerca das inúmeras dificuldades e problemas da situação em que se encontra. Isto é exatamente o comportamento que procura. Se tal acontecer, não interrompa o fio de diálogo ao interpor uma nova questão. Em vez disso, tome nota rapidamente do máximo que conseguir, dei-xando o entrevistado dizer tudo o que pretende. Faça perguntas relacionadas com a informação que acabou de obter, tentando aprofundar o tema, pois esta é uma forma de ir de encontro aos aspectos mais inovadores e originais da entrevista. Quando o tema se extinguir, então sim, deve voltar à sequ-ência definida para a entrevista. Não há qualquer problema em desviar-se um pouco do contexto

Figura 42. Jô Soares entrevistando um convidado

72 Fascículo 3

da entrevista, desde que mantenha, em mente, os objetivos que traçou para a entrevista. Após algu-mas entrevistas (bastam até duas ou três para tal ser notado), o entrevistador vai concluir que ob-teve valioso conhecimento acerca do domínio do problema e vai ter uma melhor compreensão do problema a ser trabalhado e das opiniões do en-trevistado acerca do conhecimento que ele possui. Para além disso, o entrevistador consegue fazer um apanhado das necessidades chave da entrevista. O entrevistador deve ter sempre em mente que este método deve basear-se numa troca de informação mútua entre entrevistador e entrevistado.

a injunção texto injuntivo O texto injuntivo incita ao cumprimento escrupuloso de diferentes etapas, cronologicamente ordenadas, de execu-ção de uma ação. 1. parte: descrição dos materiais e circunstâncias

que presidem ao ponto de partida da realiza-ção da ação.

2. parte: enumeração de procedimentos ( podem ser indicados os limites temporais a ter em conta no desenvolvimento de algum procedi-mento).

A Conjugação verbal na Injunção:

• 3ª pessoa do conjuntivo (forma supletiva do Modo Imperativo): “Coloque a tampa e, a seguir, pressione.”

• Presente do Indicativo com sujeito indeter-

minado: “Coloca-se a tampa e, a seguir, pressiona-se.”

• Infinitivo:

“Colocar a tampa e, a seguir, pressionar.”

estudos de cor e forma de KandinsKy, da bauHaus Contudo, a influência do formato americano e da estética futurista tridimensional de Hans Donner foram mais fortes, e o Jô Soares Onze e Meia aca-bou incorporando elementos de ambos. Em 1997, graças à computação gráfica, a abertura ganhou uma simulação de viagem aérea noturna sobre uma cidade virtual extremamente iluminada, com inser-ções das imagens do apresentador em luminosos e na televisão dentro dos apartamentos. A assinatura recebeu também uma repaginada, ganhando um brilho metalizado e movimentos mais rápidos que exploravam, ainda mais, as três dimensões. Além disso, o cenário recebeu mais cores, acompanhan-do a identidade da marca, além de uma cidade es-tilizada ao fundo, construído apenas com formas brancas sobre o fundo azul, agora mais escuro.

Em 1999, assim como toda a programação do SBT, a abertura recebeu elementos mais icônicos e efei-tos visuais mais rebuscados, como luzes e brilhos, tornando-a, ainda, mais popular. O relógio ganhou peças de corda, e o fundo recebeu nuvens. Além

SAIBA MAIS!

a evoLução do design dos Programas de

entrevista de jô soares.

publicado Agosto 11, 2008

em 1988, estreava, no sbt, o Jô soares Onze e meia,

baseado quase que integralmente nos famo sos talk

shows americanos de fim de noite como o “late show

with David letterman” ou o “the tonight show with

Jay leno“. Inicialmente uma das principais diferen-

ças em relação ao formato original estava no âmbito

visual. enquanto que David entrevistava seus convi-

dados em fundos com imagens noturnas da cidade

de manhattan, a produção de Jô soares optou por

empregar uma linguagem visual mais minimalista.

Os cenários eram compostos majoritariamente por

um fundo azul, claro com algumas nuances de luz.

O mesmo conceito era aplicado na vinheta que ini-

ciava e fechava cada bloco. Um despertador estili-

zado era construído em sua maioria com formas e

cores básicas que faziam uma associação aos famo-

sos estudos funcionalistas de wassily Kandinsky, da

bauhaus. O lettering Jô soares se integrava a esse

objeto, enquanto que a frase “Onze e meia” não

existia. ela era representada pelos ponteiros locali-

zados sobre a letra “O”.

essas referências menos populares obviamente mos-

travam a busca da emissora por um público mais eli-

tizado e diferenciado, o que acabou em parte acon-

tecendo.

www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es/eSSe3/2007

- eSSe3.C.MEN.pdf - arquivo em pdf que discute do

ponto de vista da semiótica as características dos textos

injuntivos.

http://noticias.uol.com.br/empregos/dicas/entrevista.jhtm

- matéria acerca de como se preparar para uma entrevista

de emprego.

http://arquivoetc.blogspot.com/2007/11/veja-entrevista-

j-soares.html - revista Veja entrevista o humorista Jô Soares

textos comPLementares

73Fascículo 3

disso, devido ao grande destaque musical dado ao programa, os instrumentos musicais do Quinte-to apareciam sobrevoando a cidade e ajudando a compor a trilha sonora.

Nesse momento, outra novidade aparecia nos en-cerramentos e aberturas de cada bloco. Juntamente com a marca, era apresentada uma imagem de algu-ma cidade brasileira durante a noite. Diferente do Late Show que costuma focar seu programa na cida-de de Manhattam, fica demonstrado o interesse do programa nacional em não restringir uma eventual associação somente com a vida noturna paulistana.

Depois de mais de 10 anos no Sistema Brasileiro de Televisão, Jô Soares e boa parte de sua equipe pas-saram, no ano 2000, a fazer parte da programação da Rede Globo. Mesmo contanto com um melhor aparato técnico, o “Programa do Jô”, como passou a ser chamado, não mostrou mudanças profundas. As cidades continuaram sendo apresentadas na en-trada e saída dos intervalos comerciais. Até os mes-mos elementos da última vinheta do SBT foram mantidos, mas com algumas diferenças.

O programa, aliás, se aproximou ainda mais do mo-delo americano. O cenário, ao contrário do mini-malismo do final década de 80, contou com painéis com fotos noturnas da cidade de São Paulo.

Ao invés do vermelho, azul e amarelo, as cores em-pregadas desta vez foram predominantemente o pre-to e o dourado, trazendo um pouca mais de sofistica-ção. A nova assinatura, agora dourada, contou com uma lua real e um fundo de um céu estrelado. Os elementos virtuais, como a cidade e os instrumentos musicais flutuantes, foram substituídos por cenas reais, embalados por um novo jazz, como trilha sonora. Tudo isso sob uma lente de aumento com o formato do símbolo da Rede Globo que ampliava os detalhes por onde ela passava (que foi aplicado nas vinhetas institucio-nais e por um curto período nas aber-turas das principais atrações da casa).

evoLução dos cenários Em 2005, vinheta e cenários foram levemente atu-alizados. A marca ficou mais brilhosa, e via-se uma cidade refletida nela. Já o formato do símbolo da emissora na lente da abertura foi trocado pelo da marca do programa.

Três anos depois, juntamente com a nova progra-mação, as mudanças na identidade visual da Rede Globo e a inauguração da televisão digital, o talk show apresentou uma nova vinheta. Mesmo seme-lhante à anterior, ela deu mais destaque à Lua com seu tamanho agigantado, ao Sexteto e à torre colo-rida de transmissão da tevê digital, projetada por Hans Donner, que também está presente no cená-rio. Já a assinatura perdeu um pouco dos reflexos e brilhos, conferindo um pouco mais de limpeza visual, acompanhando, assim, a nova estética do próprio canal.

Fonte: http://televisual.wordpress.com/2008/08/11/a-evolucao-do-

design-dos-programas-de-entrevistas-de-jo-soares/

8. redação Neste tópico, discutiremos a redação, enquanto texto a ser produzido pelo aluno, as circunstâncias e o contexto para produção de uma redação em sala de aula. Bem como as questões relativas à lei-tura e à avaliação da redação.

Quem nunca recebeu uma redação (escolar ou não) vazia de significado e que, ao terminar a leitura, não foi capaz de entender o que

o autor quis dizer?

Você, que presumiu que os alunos soubessem se expressar por texto, agora tomou esse susto. Recebeu um monte de palavras no papel.

Como fazer o estudan-te recuperar/adquirir a capacidade de discursar pela escrita?

Vamos pensar nos grandes escritores. Camões pediu às ninfas do rio Tejo (as Figura 43. Cenários do Jô

74 Fascículo 3

Tágides) que elas o ajudassem na empreitada de cantar as glórias de seu povo. “Cantando espalha-rei por toda parte/Se a tanto me ajudar o engenho e arte”, dis-se o poeta no Canto I de Os Lusíadas. Arte não é todos que po-dem, mas engenho é pra quem quer. Escrever é um traba-lho duro de revisão, reescrita, reestrutura-ção de texto. É incrí-vel como ainda tem gente que pensa que escrever é APENAS sentar-se diante de uma folha de papel e “deixar a imagina-ção solta”.

Hoje, o principal problema apresentado em reda-ções escolares pode ser resumido assim: o aluno não sabe pensar o texto como uma conversa. E o erro está no modo que a redação foi um dia intro-duzida em sua vida.

Quem nunca ouviu a professora orientar a divi-são da redação “Introdução/Desenvolvimento/

Conclusão”?

Sem explicar o porquê da famosa fórmula, as re-gras tornaram-se engessadoras da produtividade. Seria mais fácil mostrar ao aluno que a redação é discurso, conversa, é necessário apresentar uma ideia e debatê-la com o leitor. E para isso, é preciso reescrever, muitas vezes, um texto, ter [algum] co-nhecimento no assunto debatido, lê-lo em voz alta, apresentar para que outra pessoa o leia e aponte o que não ficou claro. No final das contas, ensinar o aluno a argumentar é o mesmo que ensiná-lo a PENSAR!

E olha que tem gente que perde tempo pensando que o “miguxês*” é o maior problema das nossas redações. (*miguxês - linguagem usada para co-municação informal em chats, orkut, bilhetinhos; escrita que utiliza sons da língua portuguesa. ex. “miguxo amu todos vo6! beijaum! s2″.)

atividade/fórum | Comente, no fórum te-mático da disciplina, como foi para você a ativi-dade de escrever uma redação na sua vida escolar.

SAIBA MAIS!

leia essa redação escolar, escrita por Ca-

zuza em 1971. embora, Cazuza tenha sido

um grande letrista e compositor, é fato que

a redação do menino Cazuza apresenta

ainda uma visão ingênua acerca do mundo

musical e dos shows business americanos,

notadamente no que tange à participação

dos empresários.

A música rock veio mudar as tradicionais músicas

dos homens de negócios para uma música mais livre

e sem preconceitos. A música rock reflete um com-

portamento erótico, para alguns destrutivo, mas na

minha opinião é apenas um meio de desabar as es-

truturas. A música americana popular até mais ou

menos 1960 estava presa aos empresários, homens

de negócios que comandavam toda a publicidade da

TV, que mandavam e desmandavam nos artistas, e

isso não dava liberdade artística para os compositores.

A música rock trouxe uma nova concepção de som

e música.

Figura 44. Escrevendo uma redação

rle.ucpel.tche.br/php/edicoes/v3n2/H_Conceicao.pdf

– arquivo em pdf que discute aspectos pedagógicos e didáticos

da redação na escola.

http://www.filologia.org.br/anais/anais III CNLF2029.html

– excelente artigo de Marísia Carneiro (UERJ) acerca da argu-

mentação em textos de redação escolar.

textos comPLementares

75Fascículo 3

glOssáRIO

argumentação - substantivo feminino 1. arte, ato ou efeito de argumentar 2. Derivação: por extensão de sentido.

troca de palavras em controvérsia, disputa; discussão 3. Rubrica: termo jurídico.

conjunto de ideias, fatos que constituem os argumen-tos que levam ao convencimento ou conclusão de (algo ou alguém)

4. Rubrica: literatura, estilística. no desenvolvimento do discurso, corresponde aos re-cursos lógicos, como silogismos, paradoxos etc. ger. acompanhados de exemplos, que induzem à aceita-ção de uma tese e à conclusão geral e final.

inFormação - substantivo femininoato ou efeito de informar(-se) 1. comunicação ou recepção de um conhecimento ou

juízo 2. o conhecimento obtido por meio de investigação ou

instrução; esclarecimento, explicação, indicação, co-municação, informe

3. acontecimento ou fato de interesse geral tornado do conhecimento público ao ser divulgado pelos meios de comunicação; notícia

4. em âmbito burocrático, esclarecimento processual dado geralmente por funcionário de apoio à autori-dade competente na solução ou despacho de requeri-mento, comunicação etc.

5. informe escrito; relatório 6. conjunto de atividades que têm por objetivo a coleta,

o tratamento e a difusão de notícias junto ao público. Ex.: liberdade de i.

7. conjunto de conhecimentos reunidos sobre determina-do assunto.

Ex.: a informação existente sobre a nova doença é in-suficiente.

8. elemento ou sistema capaz de ser transmitido por um sinal ou combinação de sinais pertencentes a um re-pertório finito

9. Rubrica: comércio. opinião ou parecer que contém dados sobre uma pes-soa física ou sobre a evolução de uma pessoa jurí-dica. Ex.: revelaram-se boas as informações sobre o fornecedor

10. Rubrica: comunicação. quantidade numérica que mede a incerteza do resul-tado de um experimento a realizar-se; medida quanti-tativa do conteúdo da informação

11. Rubrica: informática. mensagem suscetível de ser tratada pelos meios infor-máticos; conteúdo dessa mensagem

12. Rubrica: informática. interpretação ou significado dos dados

13. Rubrica: informática. produto do processamento de dados

14. Rubrica: termo militar. Regionalismo: Brasil. conjunto de informes (documentos ou observações) já analisados, integrados e interpretados, que habilita um comandante a tomar decisões seguras relativas a uma linha de ação e à conduta da manobra (mais

us. no pl.) 15. Rubrica: direito falimentar.

fase inicial do processo falimentar onde são apurados os bens, direitos e obrigações do falido

16. Rubrica: direito administrativo. ato através do qual um órgão da administração pública faz esclarecimentos sobre o processo administrativo

17. Rubrica: direito processual. conjunto de dados fornecidos pela autoridade impetra-da no habeas corpus sobre o fato que se quer qualificar como abusivo

18. Rubrica: termo de garimpo. sinal de possível existência de diamantes nas ad-jacências, dado pela presença de satélites (‘minerais’)

memórias - chama-se memórias ao gênero de literatura em que o narrador conta fatos da sua vida. É tipicamente um gênero do modo narrativo, assim como a novela e o conto, porém essa classificação é predominantemente atribuída a histórias verídicas ou baseadas em fatos reais. Diferencia-se da biografia, pois não se prende a contar a vida de alguém em particular, mas, sim, narrar as suas lembranças.

personagem - substantivo de dois gêneros 1. pessoa que é objeto de atenção por suas qualidades,

posição social ou por circunstâncias; 2. papel representado por um ator ou atriz a partir de

figura humana fictícia criada por um autor; 3. Derivação: por extensão de sentido: figura humana

imaginada pelos autores de obras de ficção. • Derivação:porextensãodesentido.

Figura humana representada em várias formas de arte. Ex.: o principal personagem do quadro é um pastor de longas barbas

4. Derivação: por extensão de sentido O homem definido por seu papel social ou comporta-mento.

subjetividade - substantivo feminino 1. característica do que é subjetivo 2. domínio do que é subjetivo 3. rubrica: filosofia.

realidade psíquica, emocional e cognitiva do ser hu-mano, passível de manifestar-se simultaneamente nos âmbitos individual e coletivo e comprometida com a apropriação intelectual dos objetos externos. Obs.: p.opos. a objetividade

tese - Documento que representa o resultado de um tra-balho experimental ou exposição de um estudo científico de tema único e bem delimitado, essencial para a obtenção do grau de doutor, livre-docente ou professor titular. Deve revelar a capacidade de seu autor em incrementar a área de estudo que foi alvo de suas investigações, constituindo-se em real contribuição para a especialidade em questão. Seus itens basilares são: revisão de literatura, metodolo-gia utilizada, rigor na argumentação e apresentação de provas, profundidade de ideias e avanço dos estudos na área. Um fator que caracteriza a tese é a originalidade. É elaborada sob a coordenação de um orientador.

76 Fascículo 3

A tese deve revelar a capacidade do pesquisador em sis-tematizar o conhecimento, revelando a capacidade do doutorando em fornecer uma contribuição para a ciência, primando pela originalidade. verossimilHança - substantivo feminino 1. qualidade do que é verossímil ou verossimilhante 2. Rubrica: literatura.

ligação, nexo ou harmonia entre fatos, ideias etc. numa obra literária, ainda que os elementos imagi-nosos ou fantásticos sejam determinantes no texto; coerência.

refeRêNCIAs

ADAM, J. M. (1990). Élements de linguistique textuelle. Theorie et pratique de l’analyse. Liè-ge, Mardaga.

AUROUX, S. A escrita. In: _____ . A filosofia da linguagem. Campinas: Unicamp, 1998.

BAKHTIN, Mikhail. Questões de literatura e de estética. São Paulo: Unesp, 1993.

BARTHES, Roland. O prazer do texto. Lisboa: Edições 70, 1974.

BRONCKART, J.-P. (1999). Atividades de lingua-gem, textos e discursos. Por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: Editora da PUC/SP.

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FREIRE, P. A importância do ato de ler. São Pau-lo: Cortez, 1997.

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KRAMER, Sonia. Por entre as pedras: arma e sonho na escola. São Paulo: Ática, 1993.

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WALTHER-BENSE, Elisabeth. Teoria Geral dos Signos. São Paulo, Perspectiva, 2000.

77Fascículo 4

objetivos esPecíficos

O Conhecimento Linguístico; Referenciação e progressão referencial; Sequenciação textual

1. o conHecimento Linguístico no Processo de Leitura: coesão e coerência

O conhecimento linguístico abrange o conhecimento gramatical e o lexical. Ba-seados nesse tipo de conhecimento, podemos compreender: a organização do material linguístico na superfície textual; o uso de meios coesivos para efetuar a remissão ou sequenciação textual; a seleção textual adequada ao tema ou aos modelos ativados. Na construção de um texto, assim como na fala, usamos mecanismos para garan-tir ao interlocutor a compreensão do que se lê/diz. Esses mecanismos linguísticos que estabelecem a conectividade e a retomada do que foi escrito/dito são os referentes textuais e buscam garantir a coesão textual para que haja coerência, não só entre os elementos que compõem a oração mas também entre a sequência de orações dentro do texto.

Essa coesão também pode, muitas vezes, ocorrer de modo implícito, baseado em conhecimentos anteriores que os participantes do processo têm com o tema.

Leitura e Produção de texto

Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna Carga Horária | 15 horas

78 Fascículo 4

Por exemplo, o uso de uma determinada sigla, que para o público a quem se dirige deveria ser de co-nhecimento geral, evita que se lance mão de repe-tições inúteis.

Numa linguagem figurada, a coesão é uma linha imaginária - composta de termos e expressões - que une os diversos elementos do texto e busca estabe-lecer relações de sentido entre eles.

Dessa forma, com o emprego de diferentes proce-dimentos, sejam lexicais (repetição, substituição, associação), sejam gramaticais (emprego de prono-mes, conjunções, numerais, elipses), constroem-se frases, orações, períodos, que irão apresentar o contexto – decorre, daí, a coerência textual.

Um texto incoerente é o que carece de sentido ou o apresenta de forma contraditória. Muitas vezes, essa incoerência é resultado do mau uso daqueles elementos de coesão textual. Na organização de pe-ríodos e de parágrafos, um erro no emprego dos mecanismos gramaticais e lexicais prejudica o en-tendimento do texto. Construído com os elemen-tos corretos, confere-se a ele uma unidade formal.

Nas palavras do mestre Evanildo Bechara (1), “o enunciado não se constrói com um amontoado de palavras e orações. Elas se organizam segundo princípios gerais de dependência e independência sintática e semântica, recobertos por unidades me-lódicas e rítmicas que sedimentam estes princípios”.

Desta lição, extrai-se que não se deve escrever fra-ses ou textos desconexos – é imprescindível que

haja uma unidade, ou seja, que essas frases estejam coesas e coerentes, formando o texto.

Além disso, relembre-se de que, por coesão, enten-de-se ligação, relação, nexo entre os elementos que compõem a estrutura textual. Há diversas formas de se garantir a coesão entre os elementos de uma frase ou de um texto: 1. Substituição de palavras com o emprego de si-

nônimos ou de palavras ou expressões de mes-mo campo associativo.

2. Nominalização – emprego alternativo entre um verbo, o substantivo ou o adjetivo corres-pondente (desgastar/desgaste/desgastante).

3. Repetição na ligação semântica dos termos, empregada como recurso estilístico de inten-ção articulatória e não, uma redundância - re-sultado da pobreza de vocabulário. Por exem-plo, “Grande no pensamento, grande na ação, grande na glória, grande no infortúnio, ele morreu desconhecido e só.” (Rocha Lima)

4. Uso de hipônimos – relação que se estabelece com base na maior especificidade do significa-do de um deles. Por exemplo, mesa (mais espe-cífico) e móvel (mais genérico).

5. Emprego de hiperônimos - relações de um ter-mo de sentido mais amplo com outros de sen-tido mais específico. Por exemplo, felino está numa relação de hiperonímia com gato.

6. Substitutos universais, como os verbos vicá-rios (ex.: Necessito viajar, porém só o farei no ano vindouro). A coesão apoiada na gramáti-ca ocorre no uso de conectivos, como certos pronomes, certos advérbios e certas expressões adverbiais, conjunções, elipses, entre outros.

A elipse se justifica quando, ao remeter a um enun-ciado anterior, a palavra elidida é facilmente iden-tificável (Ex.: O jovem recolheu-se cedo. ... Sabia que ia necessitar de todas as suas forças. O termo o jovem deixa de ser repetido e, assim, se estabelece a relação entre as duas orações.).

Dêiticos são elementos linguísticos que têm a pro-priedade de fazer referência ao contexto situacional ou ao próprio discurso. Exercem, por excelência, essa função de progressão textual, dada sua carac-terística: são elementos que não significam, apenas indicam, remetem aos componentes da situação comunicativa. Já os componentes concentram em si a significação.

Figura 45. A coesão dá sentido ao texto.

79Fascículo 4

Elisa Guimarães (2) nos ensina a esse respeito:

Os pronomes pessoais e as desinências verbais indicam os participantes do ato do discurso. Os pronomes demonstra-tivos, certas locuções prepositivas e adverbiais bem como os advérbios de tempo referenciam o momento da enun-ciação, podendo indicar simultaneidade, anterioridade ou posterioridade.

Assim: este, agora, hoje, neste momento (presente); ulti-mamente, recentemente, ontem, há alguns dias, antes de (pretérito); de agora em diante, no próximo ano, depois de (futuro).

Esse conceito será de grande valia quando tratar-mos do uso dos pronomes demonstrativos.Somente a coesão, contudo, não é suficiente para que haja sentido no texto; esse é o papel da co-erência, e coerência se relaciona intimamente a contexto.

Como nosso intuito nesta página é o de apresentar conceitos, sem aprofundá-los em demasia, bastam-nos essas informações. Vejamos como o examinador tem abordado o assunto. Prova aftn/rn 2005 Assinale a opção em que a estrutura sugerida para preenchimento da lacuna correspondente provoca defeito de coesão e incoerência nos sentidos do texto.

A violência no país há muito ultrapassou todos os limites. ___1___ dados recentes mostram o Brasil como um dos países mais violentos do mundo, le-vando-se em conta o risco de morte por homicídio.

Em 1980, tínhamos uma média de, aproximada-mente, doze homicídios por cem mil habitantes. ___2___, nas duas décadas seguintes, o grau de violência intencional aumentou, chegando a mais do que o dobro do índice verificado em 1980 – 121,6% –, ___3___, ao final dos anos 90 foi su-perado o patamar de 25 homicídios por cem mil habitantes. ___4___, o PIB por pessoa em idade de trabalho decresceu 26,4%, isto é, em média, a cada queda de 1% do PIB, a violência crescia mais do que 5% entre os anos 1980 e 1990.

Estudos do Banco Interamericano de Desenvolvi-mento mostram que os custos da violência consu-miram, apenas no setor saúde, 1,9% do PIB entre 1996 e 1997. ___5___ a vitimização letal se distri-

bui de forma desigual: são, sobretudo, os jovens pobres e negros, do sexo masculino, entre 15 e 24 anos, que têm pago com a própria vida o preço da escalada da violência no Brasil.

(Adaptado de http:// www.brasil.gov.br/acoes.htm)

a) 1 – Tanto é assim que b) 2 – Lamentavelmente c) 3 – ou seja d) 4 – Simultaneamente e) 5 – Se bem que

comentário

As lacunas no texto ocultam palavras e expressões que atuam como conectores – ligam orações esta-belecendo relações semânticas entre os períodos. A banca sugere algumas opções de preenchimento.

Dessas, a única que não atende ao solicitado é a de número 5, uma vez que a expressão “Se bem que” deveria introduzir uma oração de valor concessi-vo, estabelecendo, assim, ideia contrária à que foi apresentada, até então, pelo texto.

Verifica-se, contudo, que o que se segue ratifica as informações anteriores ao fornecer dados comple-mentares às estatísticas sobre homicídios. Sendo aceita a sugestão da banca, a coerência textual seria prejudicada. Por isso, o gabarito é a opção E.

http://www.brasilescola.com/redacao/coesao.htm

- página que traz lista de palavras coesivas ou de tran-

sição.

http://www.coladaweb.com/porredacao/coesao.htm

- página que contém boas informações acerca da coesão

textual.

textos comPLementares

80 Fascículo 4

SAIBA MAIS!

PéroLas das Provas de vestibuLar

Trechos das provas do vestibular de faculdades federais do Rio de Janeiro e de São Paulo, colhidos em 2001 e

2002.

“lavoisier foi guilhotinado por ter inventado o oxigênio.”

“O nervo ótico transmite ideias luminosas ao cérebro.”

“O vento é uma imensa quantidade de ar.”

“O terremoto é um pequeno movimento de terras não cultivadas.”

“Os egípcios antigos desenvolveram a arte funerária para que os mortos pudessem viver melhor.”

“péricles foi o principal ditador da democracia grega.”

“O problema fundamental do terceiro mundo é a superabundância de necessidades.”

“O petróleo apareceu há muitos séculos, numa época em que os peixes se afogavam dentro d’água.”

“A principal função da raiz é se enterrar.”

“A igreja ultimamente vem perdendo muita clientela.”

“O sol nos dá luz, calor e turistas.”

“As aves têm na boca um dente chamado bico.”

“A unidade de força é do Newton, que significa a força que se tem que realizar em um metro da unidade de

tempo, no sentido contrário.”

“lenda é toda narração em prosa de um tema confuso.”

“A harpa é uma asa que toca.”

“A febre amarela foi trazida da China por marco polo.”

“Os ruminantes se distinguem dos outros animais porque o que comem, comem por duas vezes.”

“O coração é o único órgão que não deixa de funcionar 24 horas por dia.”

“Quando um animal irracional não tem água para beber, só sobrevive se for empalhado.”

“A insônia consiste em dormir ao contrário.”

“A arquitetura gótica se notabilizou por fazer edifícios verticais.”

“A diferença entre o Romantismo e o Realismo é que os românticos escrevem romances e os realistas nos

mostram como está a situação do país.”

“O Chile é um país muito alto e magro.”

“O batismo é uma espécie de detergente do pecado original.”

“Na grécia a democracia funcionava muito bem porque os que não estavam de acordo se envenenavam.”

“A prosopopéia é o começo de uma epopéia.”

“Os crustáceos fora d’água respiram como podem.”

“As plantas se distinguem dos animais por só respirarem a noite.”

“Os hermafroditas humanos nascem unidos pelo corpo.”

“As glândulas salivares só trabalham quando a gente tem vontade de cuspir.”

“A fé é uma graça através da qual podemos ver o que não vemos.”

“Os estuários e os deltas foram os primitivos habitantes da mesopotamia.”

“O objetivo da sociedade Anônima é ter muitas fábricas desconhecidas.”

“A previdência social assegura o direito à enfermidade coletiva.”

“O Ateísmo é uma religião anônima.”

“A respiração anaeróbia é a respiração sem ar que não deve passar de três minutos.”

“O calor é a quantidade de calorias armazenadas numa unidade de tempo.”

“Antes de ser criada a Justiça, todo mundo era injusto.”

“Caracter sexual secundário são as modificações morfológicas sofridas por um indivíduo após manter rela-

ções sexuais.”

“tiradentes, depois de morto, foi decapitulado.”

Resposta a uma pergunta: “Não cei”.

“entres os índios de América, destacam-se os aztecas, os incas, os pirineus etc.”

“A História se divide em 4: Antiga, média, moderna e momentânea (esta, a dos nossos dias).”

“em esparta as crianças que nasciam mortas eram sacrificadas.”

Resposta à pergunta “Que entende por helenização?”: “Não entendo nada”.

“No começo os índios eram muito atrazados mas com o tempo foram se sifilizando.”

“entre os povos orientais os casamentos eram feitos ‘no escuro’ e os noivos só se conheciam na hora h.”

“então o governo precisou contratar oficiais para fortalecer o exército da marinha.”

“em homenagem a gutenberg, fizeram na Alemanha uma estátua, tirando uma folha do prelo, com os di-

zeres: ‘e a luz foi iluminada’.”

“No tempo colonial o brasil só dependia do café e de outros produtos extremamente vegetarianos.”

“A capital de portugal é luiz boa.”

“O principal rio nos estados Unidos é o mininici.”

“A geografia Humana estuda o homem em que vivemos.”

81Fascículo 4

atividade/fórum | Comente, no fórum te-mático, quais seriam as causas das redações de vestibulares servirem, muitas vezes, de fonte para demonstração de exemplos de falta de coesão, coerência e de conhecimento, uma vez que os vestibulandos devem ser jovens que concluíram o ensino fundamental e médio e, portanto, supõe-se que tenham condições de escrever razoavelmente bem.

2. coerência Neste tópico, demonstraremos a importância da coerência, que, ao lado da coesão, são elementos fundamentais para a estruturação significativa e semântica do texto.

Um texto pode ser incoerente em ou para determi-nada situação, se seu autor não consegue inferir um sentido ou uma ideia por meio da articulação de suas frases e parágrafos e por meio de recursos linguísticos (pontuação, vocabulário, etc.).

A coerência textual é a relação lógica entre as ideias, pois essas devem se complementar; é o resultado da não-contradição entre as partes do texto.

A coerência de um texto inclui fatores, como o conhecimento que o produtor e o receptor têm do assunto abordado no texto, conheci-mento de mundo, o conhecimento que esses têm da língua que usam e a intertextualidade entre o texto e os textos anteriores que tratam do mesmo assunto.

Pode-se concluir que texto coerente é aquele no qual é possível estabelecer sentido, é enten-dido como um princípio de interpretabilidade.

Veja o exemplo: “As crianças estão morrendo de fome por causa da riqueza do país.”“Adoro sanduíche porque engorda.”

As frases acima são contraditórias, não apresentam informações claras, portanto são incoerentes.

A construção textual deve ser a construção de um todo compreensível aos olhos do leitor. A coerên-cia textual é o instrumento que o autor vai usar para conseguir encaixar as “peças” do texto e dar um sentido completo a ele.

Cada palavra tem seu sentido individual; quando elas se relacionam, elas montam um outro sentido. O mesmo raciocínio vale para as frases, os parágra-fos e até os textos. Cada um desses elementos tem um sentido individual e um tipo de relacionamen-to com os demais. Caso estas relações sejam feitas da maneira correta, obteremos uma mensagem, um conteúdo semântico compreensível.

O texto é escrito com uma intencionalidade, de modo que ele tem uma repercussão sobre o leitor, muitas vezes proposital.

“O brasil é um país muito aguado pela chuva.”

“Na América do Norte tem mais de 100.000 Km de estradas de ferro cimentadas.”

“Oceano é onde nasce o sol; onde ele nasce é o nascente e onde desce decente.”

“Na América Central há países como a República do minicana.”

“A terra é um dos planetas mais conhecidos no mundo.”

“As constelações servem para esclarecer a noite.”

“As principais cidades da América do Norte são Argentina e estados Unidos.”

“expansivas são as pessoas tangarelas.”

“O clima de são paulo é assim: quando faz frio é inverno; quando faz calor é verão; quando tem flores é pri-

mavera; quando tem frutas é outono e quando chove é inundação.”

“Os plantetas são 9: mercúrio, venus, terra, marte. Os outros 5 eu sabia mas como esqueci agora e está na

hora de entregar a prova, o sr. não vai esperar eu lembrar, vai? (e espero que não vai abaixar a nota por causa

disso).”

Figura 46. A falta de coerência compromete o texto

82 Fascículo 4

Em uma redação, para que a coerência ocorra, as ideias devem se completar. Uma deve ser a conti-nuação da outra. Caso não ocorra uma concate-nação de ideias entre as frases, elas acabarão por se contradizer ou por quebrar uma linha de racio-cínio. Quando isso acontece, dizemos que houve uma quebra de coerência textual. A coerência é um resultado da não contradição en-tre as partes do texto e do texto com relação ao mun-do. Ela é também auxiliada pela coesão textual, isto é, a compreensão de um texto é melhor capturada com o auxílio de conectivos, preposições, etc. Vejamos alguns exemplos de falta de coerência textual. “No verão passado, quando estivemos na capital do Cea-rá Fortaleza, não pudemos aproveitar a praia, pois o frio era tanto que chegou a nevar”

“Estão derrubando muitas árvores e por isso a floresta consegue sobreviver.”

“Todo mundo viu o mico-leão, mas eu não ouvi o sabiá cantar”

“Todo mundo destrói a natureza menos todo mundo”

“Podemos notar claramente que a falta de recursos para a escola pública é um problema no país. O governo pro-meteu e cumpriu: trouxe várias melhorias na educação e fez com que os alunos que estavam fora da escola vol-tassem a frequentá-la. Isso trouxe várias melhoras para o país.”

A falta de coerência em um texto é facilmente de-tectada por um falante da língua, mas não é tão simples notá-la quando é você quem escreve. A coe-rência é a correspondência entre as ideias do texto de forma lógica.

Quando o entendimento de determinado texto é comprometido, imediatamente alguém pode afir-mar que ele está incoerente. Na maioria das vezes, esta pessoa está certa ao fazer esta afirmação, mas não podemos achar que as dificuldades de organi-zação das ideias se resumem à coerência ou à co-esão. É certo que elas facilitam bastante esse pro-cesso, mas não são suficientes para resolver todos os problemas. O que nos resta é nos atualizarmos constantemente para podermos ter um maior do-mínio do processo de produção textual.

atividade/fórum | Observe o quadrinho abaixo, comente acerca do efeito cômico, cau-sado pela falta de entendimento das duas ve-lhinhas acerca do processo automático da má-quina de caixa eletrônico; por outro lado, essa falta de entendimento também foi causada por uma ambiguidade.

SAIBA MAIS!

Observe atentamente as duas figuras; o que

elas apresentam de cômico é justamente uma

questão de falta de coerência. você pode expli-

car qual é essa falta de coerência em cada uma

das figuras?

Figura 47. Existe aqui falta de coerência?

http://pt.wikipedia.org/wiki/Coerência_e_Coesão

- verbete da Wikipédia sobre coesão e coerência.

texto comPLementar

83Fascículo 4

3. referenciação Neste tópico, abordaremos a referenciação textual, demonstrando sua importância para a boa estrutu-ração do texto. Você sabe o que é referenciação?

A referência não pode ser vista apenas como um produto da língua; na verdade, ela faz parte do complexo processo de interação entre sujeitos en-volvidos nas atividades enunciativas. Tal processo interacional é sempre seguramente controlado pe-los participantes, que conduzem a construção de uma referência em comum entre eles, para isso sendo fundamental fatores, como a cognição e a contextualização, entre outros.

Tal referência se apresenta como um “objeto de discurso” e não precisa ser necessariamente corres-pondente a um “objeto do mundo” já existente. Não é função da referência ser um “espelho do mundo”, uma imagem perfeita de algo já existente, pois está mais relacionada à intenção dos falantes que a constroem do que aos elementos da língua utilizados para isso.

Ver a referência unicamente como um item lexical, ou seja, como uma “convenção linguística” estáti-ca, invariável é descartar todos os fatores que, na realidade, a tornam possível para a criação de uma significação comum entre os sujeitos envolvidos na situação de comunicação, como, por exemplo, o contexto e a interação.

Esta visão de língua(gem) desconsidera toda e qual-quer influência que o contexto possa exercer no ato da comunicação, limitando a língua a um ins-trumento formal, autônomo e independente, ten-do por base, apenas, os conhecimentos estruturais e gerativistas da língua estudada.

O uso da língua é ação conjunta e coordenada, na qual os sujeitos envolvidos se dispõem a colaborar mutuamente, para a construção do sentido deseja-do. Os enunciados produzidos sempre estarão defi-nidos e determinados pelos contextos de produção em que estão inseridos.

Em “língua como espelho”, trata-se de entendê-la como representação exata do mundo, um reflexo tal e qual e, portanto, ligado à visão de “produto” pronto e imutável já mencionado acima, enquan-to em “língua como lâmpada”, tem-se a ação da luz sobre o mundo, não estática e variante, depen-

dendo da posição tanto da luz quanto do objeto iluminado, assim como a língua depende de vários fatores sócio-histórico-culturais.

Conhecer todos os elementos formais da língua não garante o sucesso do processo de referencia-ção. Um mesmo enunciado produzido com os mesmos elementos formais pode ter inúmeras e diferenciadas interpretações, tomando por base, apenas, o contexto enunciativo de cada um deles.

Para que esses diferentes enunciados possam ser corretamente interpretados em seus contextos enunciativos, muitos outros conhecimentos de-vem ser compartilhados pelos interlocutores, e todos os envolvidos devem pressupor ou fornecer tais conhecimentos.

A “interpretação correta” como equivalente de “interpretação pretendida pelo enunciador” só poderá ser garantida, se ambos os interlocutores compartilharem previamente uma gama de conhe-cimentos ou se estes forem construídos colaborati-vamente durante o processo de interação.

A referência nunca pode ser tratada como algo ex-terno ou desconectado à interação e ao contexto situacional, pois são esses fatores, entre outros, que delimitam e determinam a construção de seus refe-rentes e sentidos.

Para que a interação pela língua aconteça, os in-terlocutores precisam ter muito mais do que ape-nas os elementos formais da língua em comum. É preciso ter a interação no âmbito da cultura, determinadas crenças, valores e, principalmente, o contexto situacional e alguns conhecimentos pré-vios. Todos são essenciais para a construção mútua dos referentes e sentidos.

Além de terem es-ses fatores em co-mum, é necessário também que todos os participantes pressuponham a posse de tais co-nhecimentos pelos outros interlocuto-res, para que não haja explicações

desnecessárias na tentativa de construir um refe-rente que já existe para ambos.

Figura 48. A referenciação permite a recorrência para a memória.

84 Fascículo 4

A língua é necessária para a interação/comunica-ção, mas não é suficientemente autônoma para garantir isso, assim como os outros fatores, se con-siderados isoladamente, também não o são. É o conjunto desses vários fatores que importa, pois apenas conhecimento da língua, contexto e conhe-cimentos prévios não realizam o processo sozinhos. Não sendo a língua suficiente para garantir o su-cesso da interação/comunicação, assim ela tam-bém não é suficiente para o processo de referen-ciação. É preciso, além de conhecer a língua, saber utilizá-la no processo de interação/comunicação, associando-a aos conhecimentos social, situacional e de mundo, etc.

É esse amálgama de conhecimentos e fatores que torna possível, por exemplo, a compreensão de metáforas, metonímias, analogias, associações e outras figuras que não se esgotam na língua.

Não há como garantir com total certeza que uma mensagem seja perfeitamente compreendida (de acordo com a intenção do enunciador), pois são muitas as variantes do que estamos chamando de “conhecimento compartilhado” que tanto afetam e determinam o “jogo da linguagem”.

A única maneira de evitar o “paradoxo do conhe-cimento comum”, ou seja, o problema de saber se o seu interlocutor tem todos os referentes necessá-rios para compreender o sentido do seu enuncia-do, é conduzir esse processo por diversos caminhos que levem o participante a obter ou relacionar os conhecimentos prévios necessários.

Os conhecimentos comuns ou compartilhados por si sós também não dão conta do processo de refe-renciação; eles são fatores que participam da cons-trução de sentidos dos novos referentes, dentro de um quadro muito mais amplo de variantes.

Todos os fatores envolvidos no processo de inte-ração/comunicação só funcionam dentro do con-junto, e nenhum deles pode ser estudado isolada-mente como sendo o único ou principal.

O que importa não é a quantidade de conheci-mentos que os sujeitos envolvidos no processo de interação compartilham, mas sim, a maneira como fazem isso, selecionando e combinando tais co-nhecimentos dentro de estratégias definidas para atingir o objetivo de construir o sentido esperado.

Portanto, “referir” é muito mais do que simples-mente indicar objetos do mundo, tal e qual eles são aos nossos olhos. A linguagem não é uma imi-tação da realidade nem tem a intenção de ser.

SAIBA MAIS!

Anáfora pode ser vista de duas maneiras. A pri-

meira é uma visão tradicional, enquanto que a

outra é uma visão mais recente.

pela visão tradicional, a retomada de um termo

já está introduzida no discurso, mantendo, as-

sim, uma identidade referencial com o mesmo

referente. por exemplo, na frase: “Um veado

escondeu-se numa cerrada moita”, as palavras

que poderiam retomar “um veado” são: o veado

ou ele.

pela visão mais recente, o referente pode reto-

mar, ampliar, recategorizar ou avaliar uma pa-

lavra.

A anáfora vem sendo estudada como um fenô-

meno de natureza inferencial e não como um

simples processo de clonagem referencial (mar-

cuschi, 2000 a, p.3). Ou seja, ela não é um sim-

ples fenômeno de correferencialidade.

por exemplo:

ele jogou seu cigarro no jardim e acendeu um

outro.

A expressão “um outro” constrói um referente di-

ferente daquele do grupo nominal anterior. Há

somente entre ambos uma relação lexical.

Assim, anáfora é a expressão que, no texto, se

reporta a outras expressões, enunciados, conteú-

dos ou contextos, não necessariamente manten-

do a identidade referencial, que não só contri-

bui para a continuidade tópica e referencial mas

também promove a recategorização dos objetos

dos discursos, indica pontos de vista do locutor e

orienta argumentativamente o discurso.

PronominaLização

O emprego de pronomes evita que haja repeti-

ções num texto. eles também contribuem para a

estruturação de um texto.

A correferenciação retoma um referente já citado

no texto.

www.fi losofia.uchile.cl/Editorial/l ibros/discurso_

cambio/14Franci.pdf

- arquivo em pdf que analisa e exemplifica aspectos da

referenciação textual.

texto comPLementar

85Fascículo 4

atividade/fórum | A Anáfora é também uma figura utilizada com relativa constância na poesia. Encontre exemplos de utilização de anáfora na poesia e comente na página do fó-rum temático da disciplina.

4. nominaLização Neste tópico, falaremos da Nominalização, proces-so através do qual podemos usar um substantivo, fazendo referência a um verbo anteriormente ex-presso no texto. Vamos ver como isso funciona? A nominalização é um recurso coesivo dos mais usados entre as estratégias de remissão e progres-são textual. Seja o exemplo:

• Dois menores invadiram ontem à tarde uma casa em Cariacica, onde se realizava uma festa de aniversário e roubaram vários pertences das pessoas presentes. A invasão provocou tanto tumulto que ninguém teve a iniciativa de cha-mar a polícia para investigar o roubo.

Veja-se que a invasão retoma a proposição centrada no verbo invadir, e o roubo retoma a proposição centrada no verbo roubar. Nesse contexto, cada uma das formas nominais anafóricas, retomando uma informação já explicitada, constitui um novo tópico, sobre o qual se assenta a progressão textu-al. Este uso é corrente nos discursos jornalísticos, tanto nas notícias quanto nos editoriais e artigos

A não correferenciação implanta um novo

referente. As formas referenciais nominais (anáfora nomi-

nal/lexical) categorizam, recategorizam, orien-

tam a argumentação.

As escolhas dependem do gênero do discurso.

De acordo com este, fazem-se as escolhas lexi-

cais, e são apontados os tipos de comportamento

linguístico. Det+ nome (modificadores)

Quando o texto for uma notícia, não ocorre a

adjetivação. O adjetivo possui uma marca sub-

jetiva.forcaut – formação discursiva: o que pode e o

que deve ser dito.

a catáfora

É um fenômeno pouquíssimo estudado. ela ocor-

re quando o sujeito explícito aparece em segunda

posição, não obedecendo à ordem normalmente

utilizada, em que primeiro aparece o tema e de-

pois os seus referentes.

ex: Quando a vi, márcia estava com pressa.

anáfora Por sinonímia

Implica utilizar um novo termo/expressão o qual

é considerado como dado, por ser recuperado

como sinônimo de um termo/expressão. O que

dará a condição de sinônimo é a propriedade

de simetria existente entre os pares utilizados,

devendo haver reciprocidade de propriedades

semânticas. Há graus de sinonímias que vão

desde a absoluta(inquestionável)até uma quase-

sinonímia (inquestionável).

por exemplo:

enxuguei a louça.

sequei a louça.

anáfora Por HiPonímia

Os pares utilizados exercem entre si relação de

hierarquia, quando um termo é menor ou maior

do que o outro, quando se inclui numa classe

maior, e apenas o termo subordinado herda ca-

racterísticas do superordenado. x: UNIsINOs é

uma Universidade. termos subordinado - hipô-

nimo - UNIsINOs.

termo superordenado - hiperônimo - Universi-

dade. A hiponímia é a relação lexical correspondente à

inclusão de uma classe em outra.

anáfora Por meronímia

Caso particular de anáfora nominal baseada

em uma relação entre todo (holônimo) e parte

(merônimo).

ex: A disciplina é parte do currículo.

anáfora resumidora

Quando o termo utilizado condensa uma ex-

tensão do discurso, não retoma um grupo no-

minal ou um segmento anterior particular, mas

condensa e resume o conteúdo de uma frase, de

um parágrafo ou de todo um fragmento de texto

anterior. ex: Nossa gata foi atropelada por um

carro. esse acidente deixou-lhe traços.

A anáfora: para trás do texto.

Catáfora: para frente do texto.

exófora: para fora do texto.

A endófora não se usa mais. ela aponta para de-

terminadas realidades.

Nominar processos é um caráter da anáfora e da

catáfora. Inexiste uma classe de palavras funcionalmente

definida como anafórica.

86 Fascículo 4

de opinião. Entretanto, mais do que um instru-mento de progressão referencial, a nominalização é uma estratégia de referenciação e de textualiza-ção ancorada na memória discursiva, esta pressu-postamente partilhada pelos interlocutores. Como estratégia de textualização, retoma e trabalha ou-tros discursos, criando, com isso, a imagem de um continuum discursivo.

E não foi difícil encontrar, tanto nos editoriais quanto nos artigos de opinião examinados, “en-cabeçamentos” definidos, que apontam para um discurso anterior, pressuposto:

• Repercuteintensamentea visita que o presi-dente Luiz Inácio Lula da Silva fez na quin-ta-feira ao Espírito Santo. (26-02-2005)

• O aumento da carga tributária brasileira,

que o Governo tantas vezes negou, agora é reconhecido oficialmente. (14-03-2005)

• O falecimento de João Paulo II significa

para a humanidade a perda de um de seus maiores líderes, em todos os tempos. (03-04-2005)

• A escolha do novo papa é uma resposta a

problemas enfrentados pela Igreja Católica na Europa, disse ontem o Arcebispo de Vitó-ria, dom Luis Mancilha Vilela. (20-04-2005)

Do ponto de vista semântico, a nominalização vei-cula um conteúdo pressuposto, subjacente (e “exte-rior”) ao que é dito no evento enunciativo. Assim, a morte do papa pressupõe que o papa morreu; a queda do dólar pressupõe que o dólar caiu ou está caindo; a denúncia de corrupção pressupõe que alguém denunciou a existência de corrupção; a reação do presidente pressupõe que o presidente reagiu de algum modo. Pressupor, no sentido aqui defendido, é apontar para um discurso anterior, que se inscreve no evento enunciativo como um preconstruído (Henry, 1992). A ilusão de objetivi-dade referencial, advinda dessa estratégia, decorre exatamente do fato de que os referentes (resultan-tes do processo de nominalização) foram construí-dos fora, em um discurso anterior, de responsabi-lidade pública.

Ora, dentro da concepção Bakthiniana de dialo-gismo, todo enunciado é uma resposta a um já-dito, com o qual entra em relação na cadeia infi-

nita dos discursos. Admitindo essa dialogia, vários estudiosos têm associado esse já-dito à noção de pressuposição, de interdiscurso, ou de memória discursiva. Segundo Ducrot, para tratar adequa-damente a argumentação, é preciso admitir que o sujeito da enunciação fala sempre a partir de um “lugar comum” argumentativo (de um topos), onde um sistema comum de crenças é partilhado. É a partir desse “lugar comum” que se constroem os discursos. Passar um conteúdo sob a forma de pressuposição é, portanto, uma estratégia eficaz na formação de opinião.

Para fazer um contraponto, vamos tomar o primei-ro enunciado do editorial de A Gazeta, de 21 de outubro de 2004: O Brasil fracassa em combater a corrupção. Esse modo de veicular o conteúdo dá à forma verbal fracassa o estatuto de informação da opinião defendida pelo jornal no evento da produ-ção do editorial. Diferente seria, se a formulação tivesse sido: É evidente o fracasso do Brasil em combater a corrupção. Nessa recontextualização, a forma nominal o fracasso do Brasil já pressupõe que o Brasil fracassa, tomando essa imagem de fra-casso como já conhecida, veiculada publicamente. O modalizador é evidente, marca o engajamento do jornal na existência dessa imagem, o seu grau de crença nesse discurso de fracasso, de conheci-mento público, que vem de outro lugar.

Na perspectiva textual-discursiva, que assumimos aqui, nominalizar um predicado é, numa retoma-da anafórica, pressupô-lo como conhecido do in-terlocutor e, a partir desse pressuposto, acrescentar uma informação nova. É o que explica a diferença de estruturação entre A e B, a seguir:

A. O coordenador da campanha distribuiu mesadas aos parlamentares da base aliada, e isso foi altamen-te criticado pelos membros da CPMI.

B. A distribuição de mesadas pelo coordenador da campanha aos parlamentares da base aliada foi altamente criticada pelos membros da CPMI.

Em A, temos duas unidades de comunicação, pos-tas em sequência. Primeiramente, o ato de distri-buir mesadas é informado ao locutor; a seguir, é acrescentada uma informação nova (um comentá-rio) sobre esse primeiro ato. Em B, temos apenas uma unidade de comunicação. Nesse caso, a distri-buição de mesadas ... é um conteúdo pressupos-to que já faz parte da memória textual do leitor; a

87Fascículo 4

informação nova é o comentário de que tal ação foi altamente criticada pelos membros da CPMI. Essa mesma análise proposta para B pode ser apli-cada a C, logo abaixo:

C. A queda no índice de aprovação ao de-sempenho do presidente da República reflete equívocos do Governo na condução insatisfató-ria de problemas. (20-04-2005, p. 3).

O conteúdo presente na construção no-minal destacada é, aqui também, toma-do como conhecido, como pressuposto; a informação nova é encadeada a esse pres-suposto, esse “já–dito em outro lugar”. Nes-se caso, o enuncia-do, encabeçado pela construção nominal

definida, é, todo ele, caracterizado como comen-tário, tendo, na sua estruturação, a combinação de conteúdos de status informacional diferente: um conteúdo comentado (de conhecimento público) e o comentário feito, de teor avaliativo (informa-ção nova), numa dialogia entre o já-dito e um dizer, ou melhor, numa relação entre o interdiscurso e o intradiscurso, dentro de um processo discursivo virtualmente infinito. Tal conclusão pode ser de-preendida, sem dificuldade, dos enunciados que acabamos de comentar. Detalhando melhor essa direção de análise, vamos tomar ainda um enun-ciado que, nos últimos tempos, tem rondado a memória discursiva da maioria dos brasileiros: “A existência de corrupção no congresso prejudica a imagem do país”. • Informação de conhecimento público: existe

corrupção no congresso.

• Informação nova: prejudica a imagem do país. Essa estratégia de nominalizar um evento (colo-cando-o na posição de nome com função remissi-va) faz dele o objeto de um olhar a partir de uma perspectiva pessoal (ou sócio-ideológica) do enun-ciador, que quer engajar o leitor no seu ponto de vista (ou no ponto de vista de um grupo) a respeito de uma verdade pública, já sabida e admitida pelos interlocutores.

SAIBA MAIS!

sumarização de documentos

sumarização de documentos é tarefa que trata da

redução da massa textual, a fim de se obterem

ganhos significativos em desempenho, quando

da busca por informação útil. também conhecida

por criação automática de resumos, esta tarefa

impõe como desafio a necessidade de se elimi-

narem dados tanto quanto possível, entretanto,

mantendo os significados-chave do texto.

A sumarização de documentos pode ser classifi-

cada quanto à natureza do processo de criação,

conforme descrito abaixo:

• sumarização por Abstração - é a criação au-

tomática de resumos realizada de forma simi-

lar àquela feita pelo homem. Dado um texto,

o resumo é criado a partir do entendimento

do leitor, possivelmente com a inclusão de

nova informação, ou seja, novas palavras,

sentenças e estilos. Devido à complexidade,

a sumarização por abstração foi preterida em

favor de outros métodos.

• sumarização por extração - esta técnica con-

centra-se na criação de resumos por meio da

seleção de sentenças e parágrafos principais

e importantes, copiados inteiramente do texto

original. baseia-se na medida de importância

das palavras de um texto por meio da identi-

ficação por alguma medida. em média, ape-

nas 20% de um texto são aproveitados para a

criação do resumo com esta técnica. para que

o resumo possa ter o efeito necessário, ou-

tras heurísticas podem ser adicionadas, como

a identificação da sentença dentro de um do-

cumento ou parágrafo, reconhecimento de

palavras conclusivas (“portanto”, “definiti-

vamente”, “resumindo”) ou, até mesmo, de

construções conclusivas (“minha dissertação

de mestrado é sobre”). Outra classificação

para os resumos diz respeito à finalidade e

ao uso dos resumos criados. Os resumos po-

dem ser, basicamente, de dois tipos:

• Resumos Indicativos - caracterizam-se pela

formação do resumo com o mínimo de infor

Figura 49. Nominalização

http://www.filologia.org.br/soletras/12/07.htm

- Bom artigo acerca da Nominalização, de Hilda de Oliveira

Olímpio (UFES)

http://www.faccar.com.br/desletras/hist/2006_g/textos/002.htm

- artigo acerca da Nominalização na Publicidade, de Paula Tatia-

na da SILVA (UEL/PIBIC/CNPq), Cecília Contani BARALDO (UEL/

IC) e Esther Gomes de OLIVEIRA (Orientadora)

textos comPLementares

88 Fascículo 4

atividade/fórum | Discuta, na sala do fó-rum temático da disciplina, se o uso da nomi-nalização é importante e em qual contexto ele se faz mais útil.

5. nominaLização – Parte ii Neste tópico, aprofundaremos nosso estudo acerca da Nominalização como recurso de estruturação textual.

Para situar nossas colocações, vamos lembrar que o propósito do editorial não é o de informar fatos, eventos ou propriedades (à maneira de uma narrati-va); é, antes, refletir, fazendo julgamentos de valor, sobre esses fatos, eventos e propriedades (na maioria das vezes, já veiculados no próprio jornal), expres-sando um ponto de vista, favorável ou desfavorável.

Daí o conteúdo comentado recuar para a posição de nome, deixando livre a posição de predicado para ser preenchida por um verbo de opinião ou de argumentação do tipo: provar, confirmar, sig-nificar, implicar, convir, surpreender, interessar, merecer, ser útil, ser justo, ser fácil, ser difícil, ser possível, ser provável, ser lamentável, ser válido, ser estranho ....

O editorial jornalístico é (por sua natureza efême-ra e circunstancial) um gênero discursivo, que se presta muito bem ao uso da estratégia de nominali-zação e, particularmente, desses “encabeçamentos” anafóricos. Ora, por sua própria função, o edito-rial comenta fatos já veiculados e, em geral, muito recentes, de modo que o redator (representante do jornal) os pressupõe conhecidos do leitor. Aliás, parece ser aceitável a hipótese de que é a memória discursiva do leitor que encaminha o editorialista na escolha de sua estratégia. Se este entende que vai passar ao leitor uma informação nova, ainda não situada na sua memória discursiva, natural-mente não a veiculará sob a forma de informação dada. Primeiro, ela será introduzida como infor-mação nova e só depois poderá ser comentada. É o que podemos constatar nos exemplos que se seguem, em que as formas destacadas introduzem um referente novo:

Um choque ocorrido, na Av. Beira Mar, on-tem de tarde, tumultuou o trânsito por mais de duas horas.

Uma manifestação de estudantes, na entrada da UFES, ontem de manhã, provocou uma rea-ção violenta da polícia.

Uma decisão pessoal do presidente da República, tomada na reunião da coordenação política do Go-verno, impediu que a educação fosse castigada pelo rigor da política fiscal. (04-05-2005)

Se, ao contrário, o redator supõe que os fatos a serem comentados estão na memória do leitor, es-tes são tomados como pressupostos e comentados diretamente. Daí, o uso de construções nominais definidas (veiculando informações pressupostas) ser, como já salientamos, uma estratégia bastante frequente no “encabeçamento” de editoriais.

Se aplicarmos aos referidos enunciados (em foco na seção anterior) os testes de interrogação, negação e encadeamento, propostos por Ducrot (1984), o pressuposto permanece; só a informação nova será atingida nessa recontextualização. Retomemos, para isso, um dos exemplos já focali-zados:

A escolha do novo papa é uma resposta a pro-blemas enfrentados pela Igreja Católica na Eu-ropa, disse ontem o Arcebispo de Vitória, dom

mação necessária, para que, ao lê-lo, o leitor

decida por também ler ou não o texto original

por completo.

exemplos são manchetes de jornal, resenhas

de livros e sinopses de filmes.

• Resumos Informativos - em contrapartida,

neste tipo de resumo, o leitor não tem a in-

tenção de ler o documento original completo,

limitando-se a obter toda informação neces-

sária a partir do próprio resumo.

A tarefa de sumarização, normalmente, se utiliza

de outras duas tarefas para cumprir seu objetivo:

classificação e clusterização. O problema de de-

cidir se determinada sentença ou parágrafo será

incluído no resumo pode ser reinterpretado a

partir da classificação de sentenças. Outra abor-

dagem é a identificação de grupos de sentenças

e parágrafos, realizada em conjunto à cluste-

rização, que consiste em agrupar sinônimos de

palavras do texto com vistas a definir os campos

semânticos utilizados.

finalmente, cabe salientar que em um sistema

de mineração de textos, a criação de resumos de

textos é sempre desejada, de forma a ajustar o

tamanho da massa textual trabalhada. Isto ace-

lera várias etapas, como a Indexação.

89Fascículo 4

Luis Mancilha Vilela. (20-04-2005)

Aplicando aí o teste da interrogação: “A escolha do novo papa é uma resposta a problemas enfren-tados pela Igreja Católica na Europa?...”

Aplicando agora o teste da negação: “A escolha do novo papa não é uma resposta a problemas enfren-tados pela Igreja Católica na Europa, ...” Nos dois contextos (interrogativo e negativo), a es-colha do novo papa é um conteúdo que se man-tém verdadeiro, pressuposto. Quanto ao teste de encadeamento, o próprio texto (de onde o referido enunciado foi destacado) mostra que o sequencia-mento do conteúdo na progressão textual ocorre sobre a informação nova. O pressuposto é apenas um quadro de referência, que faz parte de um acor-do enunciativo.

A escolha do novo papa é uma resposta à Euro-pa, disse ontem o Arcebispo de Vitória, dom Luis Mancilha Vilela. Ele afirma que o cardeal alemão Joseph Ratzinger, eleito ontem papa Bento XVI, terá que dar respostas firmes a críticas à Igreja, de-correntes do crescente contato de europeus com outras crenças... (20-04-05) Vale salientar que os conteúdos pressupostos não se referem obrigatoriamente a fatos ou eventos efe-tivamente realizados, mas, a fatos ou eventos textu-alizados, informados, enunciados (no sentido de inscritos na história). Mas não é de tempo crono-lógico que se trata. Trata-se de um tempo interno à própria enunciação, de uma enunciação presente

com vestígios de uma enunciação anterior, em ter-mos de linguagem, e não de mundo. É isso que se evidencia no enunciado seguinte, em que a cons-trução nominal (a reunião de governadores,...), embora se refira a uma ação a ser realizada no futu-ro, já foi veiculada na mídia.

A reunião de governadores, marcada para ter-ça-feira próxima, na residência oficial da Praia da Costa, será importante para o Espírito Santo (04-10-96).

O predicado nominalizado, tomado como de co-nhecimento geral, não precisa ser justificado. Não é sobre ele que se dá o encadeamento sequencial do texto, a sua continuidade argumentativa. Ali-ás, ele não está em discussão, sendo, na verdade, o ponto de partida sobre o qual recai o comen-tário. Segundo Ducrot, pressupor um conteúdo é apresentá-lo como devendo ser mantido em todo o discurso subsequente, que deve ser encadeado sobre o posto e não, sobre o pressuposto. Se o posto é a informação nova; se o subentendido é o que o interlocutor pode concluir; o pressuposto é um conteúdo partilhado, tomado como já sabido, que cria uma espécie de cumplicidade entre os in-terlocutores. É nesse sentido que a nominalização é uma estratégia argumentativa, um jogo sobre a imagem do referente, tomada como uma infor-mação partilhada, aceita como evidente, uma vez que pertence a um “já-dito”, não sendo de respon-sabilidade exclusiva do interlocutor. Aliás, pode ocorrer de o editorialista, por meio de aspas (ou de outro expediente), explicitar seu afastamento dessa enunciação anterior.

6. exPressões nominais referenciais

Neste tópico, buscaremos exemplos e contextuali-zações acerca do uso da referenciação e da nomi-nalização.

formas referenciais nominais (revendo aLguns conceitos) Anáfora - é a repetição de uma palavra a espaços regulares durante o texto, ou seja, é o termo que re-toma um termo ou expressão anterior, mantendo a identidade referencial.

Nos dias de hoje, já se sabe que a anáfora pode

Figura 50. O redator

90 Fascículo 4

A anáfora associativa pode funcionar, porque se pressupõe que o leitor tenha, em sua memória, a representação da imagem de ‘casa’ que possui como componentes (teto, paredes, janelas, ve-nezianas) bem como uma representação do que é ‘comprar uma casa’ o que justifica expressões como ‘o antigo proprietário’. Tais representações misturam estreitamente as competências lexical e enciclopédica, isto é, a associação entre esses grupos nominais repousa sobre os conhecimen-tos semânticos armazenados no léxico ou sobre conhecimentos de mundo compartilhados pela comunidade linguística.

Rotulação ou anáfora resumidora: são retomadas referenciais dadas pelo encapsulamento de uma extensão do discurso. Esse tipo de anáfora não re-toma um grupo nominal ou um segmento anterior particular, mas condensa e resume o conteúdo de uma frase, de um parágrafo ou de todo um frag-mento do texto anterior.

A anáfora resumidora empacota uma extensão do discurso, e, embora não seja uma repetição ou um sinônimo de nenhum precedente, apresenta-se como um equivalente.

Ela toma frequentemente a forma de nominaliza-ção. O grupo nominal anafórico pode conter um nome formado a partir de um verbo ou de um ad-jetivo, que não figuram necessariamente no con-texto anterior. Esse tipo de anáfora tem uma clara função de mudar ou de promover alteração dentro de um tópico, colocando uma informação nova dentro de um esquema dado.

acrescentar um sentido (que pode resumir um pro-cesso). As anáforas podem acontecer por:

• Sinonímia - é a relação que se estabelece entre duas palavras ou mais que apresentam signifi-cados iguais ou semelhantes, são os sinônimos. Embora na língua geral, o fenômeno da sino-nímia total não ocorra, na área técnica, ele é mais frequente do que se imagina. A identifica-ção dos sinônimos acontece durante a análise e sistematização dos conceitos. É mais correto identificá-los como termos equivalentes. Exem-plo: Antídoto e Contraveneno. Antídoto use Contraveneno. Contraveneno Use Antídoto.

O que não podemos deixar de lembrar é que, mui-tas vezes, um termo vai ser sinônimo de outro so-mente dentro de um determinado contexto, fora dele não o será.

• Hiponímia - relação semântica de inclusão no sentido parte/todo. Assim, o significado de “laranja” está em relação de inclusão com o de “cítrico”, que, por sua vez, está em relação de inclusão com o de “fruta”. Por isso, o signifi-cado de “laranja” é hipônimo do de “cítrico”, que é hipônimo do de “fruta”. “Boca” é hipô-nimo de “cabeça”, que é hipônimo de “cor-po”. “Rosa” é hipônimo de “vermelho”, que é hipônimo de “cor”. Em resumo, hiponímia é a relação de inclusão de uma unidade signi-ficativa em outra. Em termos lógicos, pode-se dizer que essa relação é “assimétrica”, pois ela só funciona num sentido, o da parte em di-reção ao todo. É por isso que é verdadeira a afirmativa de que “toda laranja é fruta”, mas não a de que “toda fruta é laranja”.

O oposto de hiponímia é a hiperonímia, que tam-bém é uma relação de inclusão de significados, mas no sentido todo/parte. Assim, o significado de “fruta” é hiperônimo do de “cítrico”, que é hi-perônimo do de “laranja”. • Meronímia ou metonímia (anáfora associati-

va) - é a substituição de um nome por outro em virtude de haver entre eles algum relaciona-mento. Ela é a relação contrária e nem sempre é transitiva. Transitividade neste caso é a pro-priedade que uma relação tem de, quando há três termos relacionados (A, B e C), o elemento C está contido em A como parte essencial.

Figura 51. Quadro de Norman Rockwell

91Fascículo 4

Este é o método pelo qual o locutor impõe indi-retamente algumas avaliações particulares, fazendo com que o leitor chegue à conclusão por ele visada.

atividade/fórum | Analise a imagem dos cartazes ao lado, comentando, no fórum te-mático da disciplina, as relações de nomina-lização, referenciação e encapsulamento que ocorreram.

7. seQuenciação textuaL Neste tópico, discutiremos a questão da sequencia-ção textual para a estrutura do texto.

Chamam-se sequenciação textual os diversos tipos de atividades realizadas pelo produtor para fazer o texto progredir, mantendo o fio discursivo. Uma das atividades mais recorrentes é o uso do parale-lismo sintático.

Denomina-se paralelismo sintático um encadea-mento de funções sintáticas idênticas ou um enca-deamento de orações de valores sintáticos iguais. Orações que se apresentam com a mesma estrutu-ra sintática externa, ao ligarem-se umas às outras em processo no qual não se permite estabelecer maior relevância de uma sobre a outra, criam um processo de ligação por coordenação. Diz-se que estão formando um paralelismo sintático.

ParaLeLismos freQuentes • e, nem

Ele conseguiu transformar-se no Ministro das Re-lações Exteriores e no homem forte do governo.Não adianta invadir a Bolívia nem romper o contrato do gás.

SAIBA MAIS!

Hiperônimo - é uma palavra que apre-

senta um significado mais abrangente do

que o do seu hipônimo (vocabulário de

sentido mais específico).

É o que acontece com as palavras doença

e gripe – doença é hiperônimo de gripe,

porque em seu significado contém o sig-

nificado de gripe e o significado de mais

uma série de palavras, como dengue, ma-

lária, câncer. então se conclui que gripe é

hipônimo de doença. A relação existente

entre hiperônimo e hipônimo é funda-

mental para a coesão textual.

ex: grupos de refugiados chegam dia-

riamente do sertão castigado pela seca.

são pessoas famintas, maltrapilhas, des-

truídas. Note que a palavra “pessoas” é um hipe-

rônimo da palavra “refugiados”, uma vez

que “pessoas” apresenta um significado

mais abrangente que seu hipônimo “re-

fugiados”.

Figura 52. Observe os cartazes e veja a proposta do fórum temático.

http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/fale/

article/viewFile/2420/1894

- artigo de Telisa Furlanetto Graeff acerca do encapsu-

lamento textual.

texto comPLementar

92 Fascículo 4

• não só... mas também O projeto não só será aprovado, mas também posto em prática imediatamente.

• mas

Não estou descontente com seu desempenho, mas com sua arrogância.

• ou

O governo ou se torna racional ou se destrói de vez. “ Maria Rita, ou ‘seja amiga dos alunos ou’ perca o emprego.”

• tanto... quanto

Estávamos questionando tanto seu modo de ver os problemas quanto sua forma de solucioná-los. [thiago muniz]

• isto é, ou seja

Você deveria estar preocupado com seu futu-ro, isto é, com sua sobrevivência.

A mãe pediu para a menina ir ao supermercado e que, na volta, passasse na farmácia.

Se você prestou atenção à frase, percebeu que existe um problema na sua construção. Por quê?

Vamos analisá-la.

A oração para a menina ir ao supermercado é re-duzida de infinitivo; a oração que, na volta, passas-se na farmácia é uma oração desenvolvida.

Tal estrutura apresenta incorreção, pois orações co-ordenadas entre si devem apresentar a mesma es-trutura gramatical, ou seja, deve haver paralelismo.

Veja como fica a frase, respeitando-se o paralelismo:

• A mãe pediu para a menina ir ao supermerca-do e, à volta, passar na farmácia.

Segundo as regras da norma culta, não se pode co-ordenar frases que não comportem constituintes do mesmo tipo.

O paralelismo dá clareza à frase ao apresentar es-truturas idênticas, pois para ideias similares devem corresponder formas verbais similares.

ParaLeLismo nas construções

1. Ricardo estava aborrecido por ter perdido a hora do teste e porque seu pai não o esperou. Correção: Ricardo estava aborrecido por ter perdido a hora do teste e por seu pai não tê-lo esperado. Ricardo estava aborrecido porque perdeu a hora do teste e porque seu pai não o esperou.

2. Manda-me notícias de minha prima Isoldina e se meu pai resolveu aquele problema que o atormentava. Correção: Manda-me notícias de minha prima Isoldina e descobre se meu pai resolveu aquele problema que o atormentava.

ParaLeLismo semântico

1. Meu pai pratica tênis e faz um ótimo churrasco. Correção: Meu pai tem duas paixões: praticar tênis e fazer churrasco.

2. Ela possui lindos cabelos loiros, um corpo fantástico e muita simpatia. Correção: Ela possui lindos cabelos loiros, um corpo fantástico e é muito simpática.

Fiigura 53. O Paralelismo é um conceito também geométrico e arquitetônico.

http://www.espacoacademico.com.br/024/24res_koch.

htm - resenha do livro Desvendando os Segredos do Texto,

de Ingedore V. Koch, resenha feita por Cleusa Maria Alves

de Matos.

http://www.cezar.azevedo.nom.br/texto.

php?tipo=miscelania&id=452

- texto de Karin E. Rees de Azevedo.

textos comPLementares

93Fascículo 4

atividade/fórum | Comente em que medi-da o uso de paralelismos pode ajudar na com-preensão do texto. Sugerimos ler o Sermão da Sexagésima do Padre Antônio Vieira e atentar para o uso de paralelismos que ali se faz.

8. teoria da informação Neste tópico, apresentaremos sinteticamente a TI (Teoria da Informação) e como ela permite compreender melhor os aspectos relativos à or-ganização textual.

teoria da informação

A Teoria da informação ou Teoria matemática da comunicação é um ramo da teoria da proba-bilidade e da matemática estatística, que lida com sistemas de comunicação, transmissão de dados, criptografia, codificação, teoria do ruído, correção de erros, compressão de dados, etc. Ela não deve ser confundida com tecnologia da informação e biblioteconomia.

Claude E. Shannon (1916-2001) é conhecido como “o pai da teoria da informação”. Sua teoria foi a primeira a considerar comunicação como um problema matemático rigorosamente embasado na estatística e deu aos engenheiros da comunicação um modo de determinar a capacidade de um canal de comunicação em termos de ocorrência de bits. A teoria não se preocupa com a semântica dos da-dos, mas pode envolver aspectos relacionados com a perda de informação na compressão e na trans-missão de mensagens com ruído no canal.

É geralmente aceito que a moderna disciplina da teoria da informação começou com duas publica-ções: a do artigo científico de Shannon, intitulado Teoria Matemática da Comunicação (“A Mathe-matical Theory of Communication”), no Bell System Technical Journal, em julho e outubro de 1948; e do livro de Shannon em co-autoria com o também engenheiro estadunidense Warren We-aver (1894-1978), intitulado Teoria Matemática da Comunicação (The Mathematical Theory of Communication), contendo reimpressões do arti-go científico anterior de forma acessível também a não-especialistas - isto popularizou os conceitos.

entroPia da informação

No processo de desenvolvimento de uma teoria da comunicação que pudesse ser aplicada por enge-nheiros eletricistas para projetar sistemas de teleco-municação melhores, Shannon definiu uma medi-da chamada de entropia, representada por:

onde log é o logaritmo na base 2, que determina o grau de caoticidade da distribuição de probabili-dade pi e pode ser usada para determinar a capa-cidade do canal necessária para transmitir a infor-mação.

A medida de entropia de Shannon passou a ser considerada como uma medida da informação contida numa mensagem, em oposição à parte da mensagem que é estritamente determinada (por-tanto previsível) por estruturas inerentes, como, por exemplo, a redundância da estrutura das lin-guagens ou das propriedades estatísticas de uma linguagem, relacionadas às frequências de ocor-rência de diferentes letras (monemas) ou de pares, trios, (fonemas) etc., de palavras.

A entropia como definida por Shannon está in-timamente relacionada à entropia definida por físicos. Boltzmann e Gibbs fizeram um trabalho considerável sobre termodinâmica estatística. Este trabalho foi a inspiração para se adotar o termo en-tropia em teoria da informação. Há uma profunda relação entre entropia nos sentidos termodinâmi-co e informacional. Por exemplo, o demônio de Maxwell necessita de informações para reverter a entropia termodinâmica, e a obtenção dessas in-formações equilibra exatamente o ganho termodi-nâmico que o demônio alcançaria de outro modo.

Outras medidas de informação úteis incluem in-formação mútua, que é uma medida da correlação entre dois conjuntos de eventos.

Informação mútua está relacionada de forma mui-to próxima, com testes estatísticos, como o teste de razão logarítmica e o teste Chi-square.

A teoria da informação de Shannon é apropriada para medir incerteza sobre um espaço desorde-nado. Uma medida alternativa de informação foi

94 Fascículo 4

criada por Fisher para medir incerteza sobre um espaço ordenado. Por exemplo, a informação de Shannon é usada sobre um espaço de letras do alfabeto, já que letras não têm ‘distâncias’ entre elas. Para informação sobre valores de parâmetros contínuos, como as alturas de pessoas, a informação de Fisher é usada, já que tamanhos estimados têm uma distância bem definida.

Diferenças na informação de Shannon correspondem a um caso especial da distância de Kullback-Leibler da estatística Bayesiana, uma medida de distância entre distribuições de probabilidade a priori e a poste-riori.

Andrei Nikolaevich Kolmogorov introduziu uma medida de informação que é baseada no menor algorit-mo que pode computá-la.

SAIBA MAIS!

teoria da Informação foi desenvolvida num ambiente de engenharia e serve para solucionar

problemas técnicos de telecomunicação relativos à transmissão de informação. sua maior pre-

ocupação é transmitir informação o mais economicamente possível. em princípio, isto interessa

à Retórica. então a pergunta: como a teoria da Informação pode contribuir para o desenvolvi-

mento da Retórica? talvez possamos responder, analisando o que aconteceu em outras áreas

do conhecimento.

Desde que foi criada, houve inúmeras tentativas de transplantar as conclusões da teoria da

Informação para outras áreas do conhecimento, para as quais não havia sido concebida. A

maioria dos transplantes, porém, resultou em rejeição pelo paciente, pois foi o resultado de

uma assimilação mal digerida dos conceitos que a teoria da Informação utiliza. surgiram

afirmações absurdas e cômicas que ganharam status de ciência, simplesmente porque eram

citadas como resultados da teoria da Informação. Alguns exemplos:

• Quanto mais raro um termo, mais informativo.

• As línguas naturais são redundantes.

• se uma língua natural tem redundância de 55%, pode-se excluir, ao acaso, 55% de suas

unidades significativas sem perda do conteúdo.

• Uma mensagem previsível não traz informação nenhuma.

• Informação é a organização do caos. É o caminho inverso da tendência natural para a de

sorganização, que é o princípio da entropia.

• Informação é a redução da previsibilidade, é a redução das probabilidades de escolha.

• Quanto maior a taxa de novidade de uma mensagem, maior seu valor informativo.

Absurdos, como os enumerados acima, são oriundos do desconhecimento do sentido espe-

cífico que os conceitos informação, redundância e ruído têm na teoria da Informação, que

divergem consideravelmente do significado comum desses termos.

Analisemos a seguir esses sentidos específicos.

1. informação Para a teoria da informação

Informação, nessa teoria, é vista como a quantidade de significante após a tradução para um

código otimizado. A teoria da Informação quer quantificar o significante consumido em cada

mensagem. A teoria da Informação considera que as mensagens não são transmitidas na sua

forma original. Antes disso, são traduzidas para uma linguagem artificial otimizada, na qual

cada signo do código original é associado a um número binário. Nessa tradução, aos signos

originais mais comuns se atribui um número binário de menos dígitos. Aos signos mais raros

atribuem-se os números binários com mais dígitos. Isso é natural para se economizar tempo

de transmissão, pois os signos mais comuns são mais frequentes no discurso. se forem repre-

sentados por números binários de menos dígitos, gastarão menos tempo de transmissão. Já

http://www.infoescola.com/comunicacao/teoria-da-informacao

- texto explicativo acerca da TI.

texto comPLementar

95Fascículo 4

atividade/fórum | Discuta em que medida aspectos relativos à coesão, à coerência, aos processos de sinonímia, de anáfora podem se transformar em elementos facilitadores ou dificultadores da compreensão de um texto.

os raros, que são representados por números binários mais extensos, por ocorrerem pouco,

não prejudicam a economia da transmissão.

em síntese, informação para a teoria de Informação, grosso modo, é o número de dígitos

binários de que uma mensagem precisa para ser transmitida, traduzida para uma linguagem

binária otimizada.

Na teoria da Informação, quando se diz que signos raros são mais informativos, quer-se di-

zer que na linguagem artificial de transmissão, eles são representados por números binários

mais extensos e consomem mais informação, mais bits, para serem transmitidos. Isto não tem

absolutamente nada a ver com a eficiência dos signos raros na comunicação humana. Não

quer dizer que eles sejam mais informativos, quando se entende informação como significado.

2. redundância Para a teoria da informação

A teoria da Informação compara os códigos reais com um código ideal, que teria as carac-

terísticas perfeitas para a economia de transmissão. No código real, cada signo tem uma

probabilidade diferente dos demais de aparecer no discurso. No código ideal, suposto pela

teoria da Informação, os signos são equiprováveis, quer dizer, numa estatística do discurso,

todos ocorrem o mesmo número de vezes. O conceito de redundância é uma comparação

entre o código real e o código ideal no que diz respeito à economia de meios de transmissão.

O código ideal é de economia máxima. O código real terá uma eficiência avaliada por um

percentual em relação ao código ideal. A diferença de eficiência entre o código real e o ideal

é o que chamamos de redundância do código.

Quando se afirma que um código tem redundância de 55%, segundo a teoria da Informação,

significa que seu desempenho no tocante à economia de transmissão é de apenas 45% do

máximo teórico, que só se alcança com um código ideal.

partindo dos conceitos que utilizamos neste site, pode-se dizer que um código com redundân-

cia de 55% é abundante, possui mais elementos que os necessários à realização econômica

dos discursos. Não se pode afirmar, porém, que é possível eliminar 55% de seus signos sem

comprometer o sentido, pois abundância não é redundância.

3. ruído Para a teoria da informação

Na teoria da Informação, ruído é a diferença entre a quantidade de informação emitida e

a recebida. Isto corresponde a uma quantificação do que entendemos por ruído supressivo

neste site.

96 Fascículo 4

glOssáRIO

algoritmo - substantivo masculino1. Rubrica: aritmética. Diacronismo: obsoleto.

sistema de numeração decimal assimilado dos árabes2. (c1894)Rubrica: matemática.

sequência finita de regras, raciocínios ou operações que, aplicada a um número finito de dados, permite solucionar classes semelhantes de problemas (p.ex.: algoritmo para a extração de uma raiz cúbica) 2.1 processo de cálculo; encadeamento das ações necessárias ao cumprimento de uma tarefa; processo efetivo, que produz uma solução para um problema num número finito de etapas Ex.: o a. que permite obter o seno de x com uma certa precisão

3. Derivação: por extensão de sentido. Rubrica: gramáti-ca generativa, matemática. mecanismo que utiliza representações análogas para resolver problemas ou atingir um fim, noutros campos do raciocínio e da lógica Ex.: pode-se considerar a gramática como um a., na construção das frases

4. Rubrica: informática. conjunto das regras e procedimentos lógicos perfeita-mente definidos que levam à solução de um problema em um número finito de etapas.

bits - medida de informação que corresponde a uma res-posta sim ou não, ou ao sinal aceso ou apagado, ou em informática, ao 1 ou ao zero.

Coordenação - substantivo feminino 1. ato ou efeito de coordenar(-se) 2. ato de conjugar, concatenar um conjunto de elemen-

tos, de atividades etc. Ex.: a c. entre os diversos setores de uma empresa

3. estado daquilo que está coordenado Ex.: esforços infrutíferos por falta de c.

4. gerência de determinado projeto, setor etc. 5. atividade do sistema nervoso central que regula o sin-

cronismo da contração e do relaxamento muscular nos movimentos complexos

6. Rubrica: gramática. processo ou construção em que unidades linguísti-cas (palavras, sintagmas, frases, períodos) de função equivalente são ligadas numa sequência; os termos coordenados podem ser justapostos e, na escrita, se-parados por vírgula (p.ex.: sala ampla, confortável) ou ligados por conjunção coordenativa (p. ex.: sala am-pla e confortável)

7. Rubrica: linguística estrutural. relação entre os componentes de uma construção en-docêntrica que apresentam as mesmas propriedades sintáticas; assim, na frase o rapaz e a moça chegaram, tem-se um sintagma nominal endocêntrico por coor-denação, uma vez que seus componentes, o rapaz, a moça, podem aparecer separadamente no mesmo tipo de construção.

dialogismo - substantivo masculino 1. arte de dialogar 2. Rubrica: estilística, retórica. Diacronismo: antigo.

Figura que consiste em construir uma reflexão sob a forma de diálogo, com perguntas a que o próprio au-tor responde, ou em reproduzir em diálogo as ideias e os sentimentos dos personagens

elipse - substantivo feminino 1. Rubrica: geometria.

Lugar geométrico dos pontos de um plano, cujas distâncias a dois pontos fixos desse plano têm soma constante; interseção de um cone circular reto e um plano que corta todas as suas geratrizes.

2. Rubrica: gramática, linguística. Em um enunciado, supressão de um termo que pode ser facilmente subentendido pelo contexto linguístico ou pela situação (p.ex.: meu livro não está aqui, [ele] sumiu!) Obs.: cf. zeugma

enCapsulamento - esta é uma função própria particular-mente das nominalizações que, conforme abordado, su-marizam as informações contidas em segmentos preceden-tes de texto (informações – suporte), encapsulando-as sob a forma de uma expressão nominal, isto é, transformando-as em objetos-de-discurso.

etimologia - do antr. ár. al-Khuwarizmi (matemático ár. do sIX) formou-se o ár. al-Khuwarizmi ‘numeração decimal em arábicos’ que passou ao lat. medieval algorismus com infl. do gr. arithmós ‘número’; ver algarismo; f.hist. 1871 algo-rithmo.

interação - substantivo feminino 1. influência mútua de órgãos ou organismos inter-rela-

cionados Ex.: <i. do coração e dos pulmões> <i. do indivíduo com a sociedade a que pertence>

2. ação recíproca de dois ou mais corpos 3. atividade ou trabalho compartilhado, em que existem

trocas e influências recíprocas 4. comunicação entre pessoas que convivem; diálogo,

trato, contato 5. intervenção e controle, feitos pelo usuário, do curso

das atividades num programa de computador, num CD-ROM etc.

6. Rubrica: estatística. medida de quanto o efeito de uma certa variável so-bre outra é determinado pelos valores de uma ou mais variáveis diferentes [Este fenômeno faz com que a res-posta à aplicação de dois tratamentos não seja a mera soma das respostas a cada tratamento.]

7. Rubrica: física. qualquer processo em que o estado de uma partícula sofre alteração por efeito da ação de outra partícula ou de um campo

8. Rubrica: sociologia. conjunto das ações e relações entre os membros de um grupo ou entre grupos de uma comunidade

lógiCa - substantivo feminino 1. Rubrica: filosofia.

Parte da filosofia que trata das formas do pensamento

97Fascículo 4

em geral (dedução, indução, hipótese, inferência etc.) e das operações intelectuais que visam à determina-ção do que é verdadeiro ou não

2. Derivação: por metonímia. Tratado, compêndio de lógica

3. Derivação: por metonímia. Qualquer exemplar de um desses tratados

4. Derivação: por extensão de sentido (da acp. 1). Maneira rigorosa de raciocinar Ex.: l. implacável

5. Derivação: por extensão de sentido. Forma por meio da qual costuma raciocinar uma pes-soa ou um grupo de pessoas ligadas por um fato de ordem social, psíquica, geográfica etc. Ex.: <a l. da criança> <a l. do louco> <a l. do por-tuguês>

6. Derivação: por extensão de sentido. Maneira por que necessariamente se encadeiam os acontecimentos, as coisas ou os elementos de natureza efetiva. Ex.: <a l. desse mundo> <a l. das paixões>

7. Coerência, fundamento Ex.: falta de l. 7.1 Derivação: por extensão de sentido. Encadeamento coerente de alguma coisa que obedece a certas convenções ou regras Ex.: <a l. do discurso musical> <a l. do contra-ponto>

8. Rubrica: informática. Organização e planejamento das instruções, asserti-vas etc. em um algoritmo, a fim de viabilizar a implan-tação de um programa

semântiCa - substantivo feminino 1. Rubrica: linguística.

Ramo da linguística que se ocupa do estudo da signi-ficação como parte dos sistemas das línguas naturais; pode ser abordado sincrônica ou diacronicamente.

2. Rubrica: linguística. Num sistema linguístico, o componente do sentido das palavras e da interpretação das sentenças e dos enunciados.

3. Rubrica: linguística. O significado das palavras, por oposição à sua forma.

4. Rubrica: filosofia, lógica. Teoria abstrata da significação ou da relação entre os signos e seus referentes (em oposição à sintaxe e à pragmática), constituindo com estas uma semiótica.

5. Rubrica: filologia. Ciência que estuda a evolução do significado das palavras e de outros símbolos que servem à comuni-cação humana; semiologia.

RefeRêNCIAs

EPSTEIN, Isaac. Teoria da Informação. São Pau-lo, Ática, 2000.

FREIRE, P. A importância do ato de ler. São Pau-lo: Cortez, 1997.

GNERRE, M. Linguagem, escrita e poder. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

KOCH, I.;TRAVAGLIA, L.C. Texto e coerência. 4 ed. São Paulo: Cortez, 1995.

KOCH, I.V.; ELIAS, V.M. Ler e Compreender os Sentidos do Texto. São Paulo: Contexto, 2006.

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SOARES, Angélica. Gêneros Literários. São Paulo: Ática, 1993.

WALTHER-BENSE, Elisabeth. Teoria Geral dos Signos. São Paulo: Perspectiva, 2000.