Linguistica - Introdução ao Estudo do Léxico - Brincando com as Palavras

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Introduo ao estudo do lxicoBRINCANDO COMAS PALAVRAS

Rodolfo Ilari

Introduo ao estudo do lxicoBRINCANDOCOM AS PALAVRAS

Copyright 2002 Rodolfo Ilari Preparao de originais Camila Kintzel Diagramao Fbio Amancio Reviso Vera Quintanilha Projeto de capa Antonio Kehl

Ilari, Rodolfo. Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras / Rodolfo Ilari. So Paulo: Contexto, 2002. Bibliografia. ISBN 85-7244-194-8 1. Lingstica. 2. Portugus Estudo e ensino. 3. Portugus Gramtica 4. Portugus Semntica. I. Ttulo. 01-0818 ndices para catlogo sistemtico: 1. Semntica: Portugus: Lingstica 469.2 CDD-469.2

Proibida a reproduo total ou parcial. Os infratores sero processados na forma da lei.

2002

Todos os direitos desta edio reservados EDITORA CONTEXTO (Editora Pinsky Ltda.). Diretor editorial Jaime Pinsky Rua Acopiara, 199 Alto da Lapa 05083-110 So Paulo SP PABX : (11) 3832 5838 FAX: (11) 3832 1043 [email protected] www.editoracontexto.com.br

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Prefcio

Profundo conhecedor dos segredos da linguagem, pesquisador dos mais lcidos e argutos, lingista atuante em todas as reas desse ramo do conhecimento, visceralmente comprometido com a sua prtica e com as questes de ensino da lngua, Rodolfo Ilari nos oferece agora este novo produto de suas reflexes: Introduo ao estudo do lxico - brincando com as palavras, partindo da mesma convico que o levou escrever Introduo Semntica - brincando com a gramtica (Contexto, 2001): quem quiser compreender como acontece a significao das mensagens lingsticas tem interesse em pensar essas mensagens como construes, nas quais tanto as peas escolhidas como os processos pelos quais as juntamos produzem significao. Se, em Introduo Semntica, tratou mais especificamente da sintaxe (isto , dos procesos que nos permitem juntar as palavras) como construo de sentidos, desta vez o autor centra o foco de ateno nas palavras, essa peas multifacetadas que compem as construes sintticas como ingredientes significativos das mensagens lingsticas. Todavia, o seu brincar com as palavras toca nas questes bsicas da construo dos sentidos nos mais variados gneros textuais. Nas vinte e cinco rubricas que compem a obra, com base em uma coleo de materiais lingsticos dos mais variados e sempre fiel aos seus problemas preferidos, como bem ressalta Geraldi em sue prefcio ao livro Introduo Semntica, intitulado Sagacidade, argcia e lupa, Rodolfo Ilari conduz seus leitores a uma reflexo (epilingstica) sobre a linguagem, procurando levar seu destinatrio privilegiado o futuro professor da lngua materna por meio de diferentes prticas de anlise e exerccios criativos e diversificados, a refletir sobre os recursos lingsticos em seu funcionamento, de forma que com base nessa reflexo, no s capaz de extrair conhecimento sobre a linguagem como tambm tornar-se apto a ensinar seus futuros alunos a pensar de maneira crtica e independente. Assim, Ilari comprova mais uma vez ser um dos lingistas brasileiros que mais se destaca pela profundidade de seus conhecimentos, pela versatilidade com que transita pelos vrios campos da cincia da linguagem, pela necessidade imperiosa que sente em estabelecer a ponte teoria-prtica e pela constante preocupao

com o ensino de lngua e com os professores que nele militam, enfrentando, entre as mil outras dificuldades que todos ns to bem conhecemos, a falta de material didtico apropriado e de orientao sobre como utiliz-lo adequadamente em suas aulas. Este livro um farol que ilumina esse caminho!

Campinas, janeiro de 2002 Ingedore Grunfeld Villaa Koch

Sumrio

11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25.

Ambigidades .................................................................................. Anglicismos ..................................................................................... Antonmia ........................................................................................ Arcasmos ........................................................................................ Campos lexicais ............................................................................... (In-) compatibilidades entre partes de uma sentena ........................... Definies ........................................................................................ Distribuio: os constituintes da orao ............................................. Estrangeirismo ................................................................................. Etimologia ....................................................................................... Flexo nominal ................................................................................ Formao de palavras novas e sentidos novos .................................... Homonmia ...................................................................................... Motivao icnica ............................................................................ Nexos entre oraes .......................................................................... Nmeros .......................................................................................... As palavras-pro ................................................................................ Reconhecimento de formas de um mesmo paradigma flexional........... Polissemia ........................................................................................ Predicados de predicados; predicados de eventos ............................... Sinonmia ........................................................................................ Substantivos contveis e no-contveis .............................................. Sufixos ............................................................................................ Termos genricos e termos especficos .............................................. Variao diastrtica e de registro (nveis de linguagem) ......................

7 17 23 29 37 47 55 63 71 79 85 92 101 108 114 125 133 143 149 157 167 173 179 185 193

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AmbigidadesObjetivo

Alertar para os fatores lingsticos que provocam ambigidade. Mostrar a possibilidade de neutralizar as ambigidades mediante operaes de ordem sinttica ou semntica e pela insero das sentenas em contextos maiores.Caracterizao geral

Ambigidade a caracterstica das sentenas que apresentam mais de um sentido. Um bom teste para saber se uma sentena tem mais de um sentido consiste em propor a ela duas reformulaes, inventando em seguida uma situao em que a primeira reformulao seja verdadeira e a segunda falsa ou inaplicvel. Tomemos como exemplo esta manchete de jornal (FSP, 17.10.1996)Ladres inovam no ataque a mulheres em carros

Primeira reformulao: Os ladres descobrem novas maneiras de atacar mulheres motoristas. Segunda reformulao: Ladres que atacam de carro descobrem novas maneiras de atacar mulheres. Situao-teste: Imagine que essa frase fosse usada em 1940, quando as mulheres no dirigiam. A primeira reformulao no se aplicaria, a segunda poderia ser verdadeira. Pode-se ento concluir que a manchete em questo ambgua.Material lingstico

Os fatores lingsticos da ambigidade so muitos. Eis alguns: A sentena aceita duas anlises sintticas diferentes: Ex. Ambulante vende clandestino no centro (FSP, 2.8.1998) [Ambulante vende clandestinamente... / Clandestino vendido no centro]. Um mesmo pronome aceita dois antecedentes: Ex. Duquesa de York diz que nobreza quer manchar sua imagem (Hoje em Dia BH, 20.1.1996) [[...] manchar a imagem da duquesa / [...] manchar a imagem da nobreza];

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Uma mesma palavra tem dois sentidos diferentes; Um mesmo operador se aplica de duas maneiras diferentes aos contedos da sentena Ex. Palmeiras s empatou com Bahia pelo Brasileiro 1996 (FSP, 11.8.1996) [Jogando contra o Bahia pelo Brasileiro de 1996, o Palmeiras no vai alm do empate / A nica ocasio em que o Palmeiras empatou com o Bahia at hoje foi durante o Campeonato Brasileiro de 1996] Uma mesma seqncia de palavras pode ou no ser interpretada como uma frase feita. Ex: A O Senhor Guimares caiu das nuvens. B Ficou surpreso com alguma coisa? A No, caiu das nuvens mesmo. O avio em que ele voava sofreu uma pane. Alm dos fatores que chamamos aqui de lingsticos, a ambigidade pode derivar de nossa dificuldade em decidir se as palavras foram usadas literalmente ou de maneira indireta (por exemplo: para fazer ironia). Todos ns j passamos pela difcil situao de no saber se determinada frase nos foi dita ironicamente, ou se continha alguma indireta.

Atividade Conte um caso que tenha por fundamento a interpretao equivocada de uma informao ou de uma ordem.

Exerccios

1. As ambigidades sintticas so muito comuns nas manchetes de jornais. Veja estas e compare em seguida com o contedo da matria. Analise: (1) Quais so as interpretaes sugeridas pelas manchetes? (2) Qual dessas interpretaes prevalece na notcia?

Ambiguidades

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Pel critica futebol movido por dinheiroBudapeste (APF) O dinheiro destruiu a beleza, o atrativo e o lado espetacular do futebol, pois os patrocinadores de hoje s exigem eficincia e gols, Pel comentou ontem em Budapeste. Os jogadores de hoje j no jogam por prazer. No tm nada a ver com Puskas, a estrela dos anos 50 que eu considero meu mestre...[A Tarde, Salvador, 6.9.1994]

Time pega Flamengo sem cinco titularesda Reportagem Local

O So Paulo no ter cinco titulares contra o Flamengo, amanh, no Morumbi. Axel, Pedro Lus, Djair e Belletti, suspensos, e Aristizbal, na seleo colombiana. Temos bons reservas, mas o time sentir falta de entrosamento, disse o tcnico Parreira, que ainda no definiu os substitutos.[FSP, 1.0.1996]

Detido acusado de furto de processos A Polcia Civil de So Paulo prendeu funcionrio do Poder Judicirio acusado de liderar esquema de furtos de processos nos tribunais paulistanos.[FSP, 8/7/2000]

AGROTXICOS Plantao de fumo ser investigada

Sade apura causas de suicdios no SulCARLOS ALBERTO DE SOUZA da Agncia Folha em Porto Alegre

Banespianos exigem reajuste salarial e abono da FENABAN[O Conselho, 14/10/1996]

O Ministrio da Sade deve realizar um Inqurito epidemiolgico para apurar as causas das mortes por suicdio na regio do Vale do Rio Pardo (RS). H suspeita de que a contaminao por agrotxicos organofosforados esteja associada a 21 suicdios ocorridos em 95 em Venncio Aires, uma das cidades do Vale, a maioria delas envolvendo agricultores que plantavam fumo [...][Folha de So Paulo, 1/0/96]

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JOS SIMO

A Migalha! Fiz o mnimo possvel, diz FHCBuemba! Buemba! Macaco Simo urgente! O brao armado da gandaia nacional! A melhor piada sobre o salrio mnimo o prprio salrio mnimo! Dessa vez o Don Doca se superou no deboche. Mais um captulo de A migalha. Cento e 51. Boa idia, toma uma 51 e esquece o resto do ms! E adorei esse UM real. Por que ele no deu 150 e Um passe? E o que fazer com esse um real? A Babi, do Programa Livre, acha que a melhor coisa a fazer emoldurar e colocar na parede. Ou ento enrola e manda pro Malanta! E eu que tinha dito que no tava falando muito de rei eleito FHC porque pecado chutar cachorro morto. E a uma leitora disse: pois o cachorro morto acabou de abanar o rabo. Lanou o salrio mnimo. Alis, diz que ele disse: Fiz o mnimo possvel...[FSP, 25.3.2000]

2. Mantendo os mesmos ttulos, escreva uma notcia para cada uma das interpretaes que foram descartadas no exerccio 1. 3. So muitas as piadas que tiram proveito de alguma ambigidade. Quando isso acontece, geralmente rimos da personagem que, contrariando o bom-senso, escolheu a interpretao menos apropriada. Veja as piadas transcritas a seguir e explique quais so as duas interpretaes em jogo.(a) Marido 1 - Como voc ousa dizer palavres na frente da minha esposa? Marido 2 - Por qu? Era a vez dela? (c) Marido - Quando comearem as obras do porto, minha velha, eu hei de te mostrar como sei ainda fazer uma atracao. Mulher - Sim, mas compra primeiro um cabo novo.

(b) Indivduo A - No deixe sua cadela entrar em minha casa. Ela est cheia de pulgas. (d) Indivduo B - Diana, no entre nessa casa. Indivduo A - A primeira coisa que fao Ela est cheia de pulgas. quando acordo de manh tocar a campainha para chamar a criadagem. Indivduo B - Voc tem criados? Indivduo A - No, mas tenho a campainha.

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(e) A mulher entra numa loja de roupas femininas, chama o vendedor e pergunta: - Senhor, posso experimentar este vestido na vitrine? O vendedor responde: - Ser que a senhora no preferiria experimentar no provador? (f) Quando a namorada disse para o rapaz que estava cheia dele, ele perguntou: - E para quando ? (g) - Desculpe, querida, mas eu tenho a impresso de que voc quer casar comigo s porque herdei uma fortuna do meu tio.

- Imagine, meu bem! Eu me casaria com voc mesmo que tivesse herdado a fortuna de outro parente qualquer! (h) - Garo, um chopp! - No servimos menor de idade. - Pode ser um chopp adulto, eu no ligo. (i) Uma moa liga para uma loja de materiais de construo e pergunta: - O senhor tem saco de cimento? - Sim. - Puxa, ento o senhor deve usar cueca de ao.

4. Retorne s piadas do exerccio anterior. Verifique, para cada uma dessas piadas, qual o fator (dentre os listados no Material Lingstico) que causou a ambigidade em questo. 5. Aqui vo mais algumas piadas que tambm se originam de alguma ambigidade. Explique essa ambigidade com suas prprias palavras.Aula de catecismo - Qual dos alunos sabe onde est Deus? perguntou o professor. - No banheiro de casa! - responde o Joozinho, levantando o dedo. - No banheiro de sua casa, Joozinho??? - sim, professor! Todos os dias a mame bate na porta do banheiro e pergunta: - Meu Deus, voc ainda est a? Seu Agenor O pai, a caminho do hospital, dizia para o filhinho que o acompanhava: - Olha aqui, Francisquinho, ns vamos visitar o seu Agenor, mas voc, pelo amor de Deus, no v falar nada do nariz do seu Agenor. O menino balanou a cabea positivamente. Chegaram no hospital e o menino j vai logo olhando pra cara do seu Agenor. Olhou dum lado, olhou do outro, todo confuso, olhou pro pai e disse: - U, papai! No entendi por que o senhor pediu pra eu no falar nada do nariz do seu Agenor!... O seu Agenor no tem nariz!

Bbado valente Dois bbados esto no bar e comeam a perturbar um valento. Um deles leva um soco na cara e cai com tudo no cho. E o outro bbado se di: - Ah, Antnio! Eu...se...eu fosse voc... no agentaria uma porrada dessa no! Nisso o valento mete a mo nele tambm que cai do outro lado da mesa e diz: - E... no te falei, Antnio/ Que eu tambm no agentava?

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Oxignio O oxignio, disse o professor, essencial vida! No pode haver vida sem ele; o oxignio foi descoberto h pouco mais de um sculo. - Puxa! disse Carlinhos; e como que o pessoal se virava antes de sua descoberta? A sogra e o genro A secretria, ao telefone, diz ao patro: - Doutor Marcelo, telefone para o senhor! a sua sogra. Ela est na linha! O senhor fala com ela ou quer que eu a mande esperar? - Manda ela esperar, claro! At o trem passar! Reza antes da refeio A professora pergunta ao Pedrinho: - Pedrinho, l na sua casa vocs rezam sempre antes das refeies? - No, professor, tamos descansados. A me cozinha muito bem.

Tele-esperto - O que voc est fazendo, filho? Colocando a televiso no freezer? - Quero congelar a imagem, mame. Rato Uma mulher entrou, afobada, numa loja. Estava com muita pressa. - Por favor, rpido, uma ratoeira pediu ao balconista. - Uma ratoei...? - Sim, sim, mas rpido, por favor. Tenho de pegar o nibus! - Ah, mas ratoeira desse tamanho ns no temos, minha senhora. Sade de ferro Num lugarejo, comemora-se o aniversrio de um homem de 100 anos. O prefeito, muito orgulhoso, dirige-se ao velhinho e diz: - Vov, meus parabns. No prximo ano espero festejar seus 101 anos. O ancio olha demoradamente para o prefeito e fala: - Por que no? Voc no me parece estar doente.

6. No trecho a seguir (extrado de uma matria da Gazeta de Baro, um jornal de bairro da cidade de Campinas, edio de agosto de 1993) h duas passagens mal redigidas. Aponte essas duas passagens e explique uma delas pelo uso inadequado de um anafrico, que sugere uma interpretao diferente da desejada:O que incomoda a populao [...] o piolho da cabea, que se hospeda geralmente em crianas em idade pr-escolar. No se sabe ao certo o porqu da maior incidncia em crianas, mas se acredita que seja provavelmente pelo contato mais ntimo entre elas. Afinal, s pode ocorrer infestao se a criana entrar em contacto com outra, desmitificando assim que o piolho voa ou que o uso em comum de pentes e escovas pode ser transmitido. Outro mito [...] a transmisso do piolho animal para o ser humano. Isto no existe porque cada espcie tem seu piolho e se o parasita picar outra espcie que no seja a sua, morre.

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7. Veja esta piada:Um pai leva o filho ao mdico: Doutor, meu filho no abre o olho Quem tem de abrir o olho voc: no v que o menino japons?

Seu fundamento lingstico a possibilidade de entender abrir o olho como uma frase feita (significando ficar esperto) ou composicionalmente (abrir + o + olho). Conte mais cinco piadas que tenham por fundamento esse mesmo tipo de ambigidade. 8. Dekassguis O tablide Papo Livre editado em So Paulo e divulga as realizaes de um vereador cujo nome indicaremos apenas pelas iniciais A.N. Em uma edio de julho de 1996, esse jornal trazia, logo abaixo do ttulo, Vereador pede apoio aos dekassguis, a seguinte transcrio de um discurso pronunciado pelo tal vereador:[...] nos ltimos anos em funo de nossas dificuldades econmicas, mais de 150 mil trabalhadores brasileiros, em sua maior parte descendentes de japoneses, esto no Japo, conhecidos como dekassguis, conquistando melhores salrios e cooperando para o desenvolvimento em todos os setores daquele pas amigo, motivo pelo qual peo a todas as autoridades uma ateno especial queles irmos brasileiros que se encontram em sua grande maioria, sem seus amigos e familiares, para que juntos possamos minimizar as suas dificuldades e lutar para que tenham uma vida mais digna e ascenso cada vez maior.

Para quem l a notcia, fica claro o que se quis dizer no ttulo: (1) o pedido do vereador dirigido s autoridades, (2) as autoridades deveriam apoiar os dekassguis [cidados brasileiros de origem japonesa, que vo ao Japo em busca de trabalho]. Mas o ttulo se presta tambm a uma outra interpretao, no desejada. a) Formule com suas palavras essa segunda interpretao do ttulo. b) Esclarea: a quem dirigido o pedido do vereador e quem deveria apoiar quem nessa outra interpretao? c) Escreva uma brevssima notcia que seja coerente com a segunda interpretao do ttulo. d) A dupla interpretao que afeta o ttulo acima resulta do fato de que duas palavras nele empregadas regem a mesma preposio. Quais so as palavras e a preposio em questo? e) Modifique o ttulo de modo a tornar impossvel a interpretao indesejada. f) Que diferena faz para o sentido saber que aos dekassguis complemento de apoio ou de pede?

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9. Dada uma construo Si + conjuno + Sj, em que Si e Sj so duas sentenas completas, a possibilidade de negar aplica-se em princpio a trs lugares distintos: Si, Sj ou ao nexo expresso pela prpria conjuno. Podemos assim prever que diferentes aplicaes da negao sobre S i + conjuno + Sj resultaro em sete esquemas distintos, contendo uma ou mais negaes. Se indicarmos a negao por um trao, as possibilidades so, de incio, as seguintes S i + conjuno + SjSi + conjuno + Sj Si + conjuno + Sj Si + conjuno + S j Si + conjuno + S j Si + conjuno + S j Si + conjuno + S j

Assim, a partir da frase (1) Viajou porque queria ver os pais podemos imaginar uma srie de construes negativas: No viajou porque queria ver os pais, Viajou porque no queria ver os pais, Se no viajou no foi porque no queria ver os pais, No viajou, porque no queria ver os pais etc., que correspondem a uma ou outra daquelas frmulas. (Note que a verbalizao das vrias frmulas pode exigir manobras complicadas, como a clivagem por que ou o uso de um tipo especial de orao condicional): a) Pede-se que voc d exemplos de todas as combinaes possveis a propsito de uma frase de sua escolha em que, como em (1) acima, a conjuno seja porque . b) Depois de responder pergunta anterior, tente substituir porque por pois em seus exemplos e comente os resultados dessa tentativa. 10. Esta bonita propaganda, criada pela agncia Z+G Grey para homenagear os jornalistas, lana mo de alguns nomes de animais que, na linguagem de certas atividades, assumem um sentido especfico:Os tubares do oramento, os elefantes das estatais, os cobras da informtica, as zebras do futebol, as gatas da moda e os dinossauros do rock. Para lidar com todos estes bichos, s comeando como foca.

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A propaganda em questo pode ser explicada, parcialmente, por esta tabela:Coluna 1 tubaro elefante foca etc. Coluna 2 finanas empresas estatais jornalismo Coluna 3 grande capitalista empresa de gesto emperrada reprter iniciante

D um bom ttulo a cada uma das colunas; tente lembrar se voc conhece outros nomes de animais que no esto na propaganda e so utilizados para indicar profisses ou tipos humanos.

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AnglicismosObjetivoExaminar alguns anglicismos que foram incorporados pelo portugus do Brasil, mostrando que sua incorporao acompanhou a assimilao dos artefatos, tecnologias e hbitos que eles nomeiam.

Caracterizao geralEm todas as pocas, o contato de povos que tm culturas e lnguas diferentes resulta numa circulao de hbitos, tecnologias e artefatos que so recebidos com seu respectivo vocabulrio. D-se o nome de anglicismos s palavras e s construes gramaticais que o portugus recebeu do ingls.

Material lingstico

A tendncia das palavras recebidas de outras lnguas serem reconhecidas, num primeiro momento, como palavras estrangeiras, porque soam diferentes e se escrevem segundo a grafia da lngua de origem. Aos poucos, acontece uma adaptao tanto da pronncia como da grafia; com isso, as palavras importadas acabam por confundir-se com as palavras mais antigas da lngua whiskey > wiski > usque As palavras estrangeiras so mais facilmente aceitas quando se aplicam a objetos, tcnicas ou modos de viver que so em algum sentido novos; assim, a assimilao de palavras estrangeiras acontece na maioria das vezes como parte de um processo de assimilao que no apenas lingstico, mas cultural. O portugus do Brasil recebeu muitas palavras do ingls, sobretudo nos sculos XIX e XX; trata-se de palavras ligadas ao vesturio, comrcio, esporte, cinema e tecnologia. Um ramo da tecnologia responsvel hoje pela transferncia ao portugus do Brasil de uma grande quantidade de anglicismos a informtica.Atividades Quando o futebol comeou a se popularizar no Brasil, os brasileiros viram-se s voltas com palavras inglesas que identificavam, por exemplo, as posies ocupadas pelos diferentes jogadores no campo e as principais jogadas. Muito

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desse vocabulrio acabou sendo substitudo ou adaptado ao longo do tempo. Veja como um cronista que viveu na primeira parte do sculo XX relembra aqueles jogos; em seguida, imagine-se no papel de locutor de rdio ou reprter de campo daqueles tempos e transmita alguns minutos de jogo.Naquele tempo, toda a terminologia futebolstica era em lngua inglesa, pois a prtica do association football (abreviadamente soccer) era regida pelas regras introduzidas no Brasil por um grupo de ingleses a cuja frente se encontrava, se no me engano, um tal de Charles Miller. Assim, os jornais, ao descrever uma partida em todos os seus detalhes, vinham repletos de termos empregados na grafia original, pois a nacionalizao das expresses futebolstizcas ainda no tinha sido empreendida. A disposio dos players (jogadores) no ground (campo) para o kickoff (pontap inicial) era publicada no jornal em forma de pirmide, em cujo vrtice se colocava o goalkeeper, num esquema que seria o sequinte: 1-2-3-5. Estes nmeros correspondiam, alm do goleiro, aos dois backs direito e esquerdo: aos trs halves e aos cinco forwards. Quem jogava na direita ou na esquerda mantinha-se em sua posio, enquanto que o center-half e o center-forward podiam movimentar-se de um lado para outro do campo. Tirada a toss e escolhido o campo, o referee trilava o apito iniciando-se com o shoot do centro-avante a partida. As infraes como os hands, os falts, os offsides e os penalties assim como o recurso do corner eram comentados pela crnica esportiva, que descrevia lance por lance a peleja. Com o aportuguesamento da palavra futebol (alguns gramticos defenderam ludopdio ou bolipede) e demais termos ingleses o goal-keeper passou a ser guardio, guarda-vala, guarda-meta ou goleiro. O back passou a ser zagueiro. O half hoje mdio e o forward avante, assim como o referee o rbitro. Surgiram, ento, escanteio, impedimento e toque de mo para designar corner, off-side e o hand. A terminologia da crianada era em ingls deturpado, entretanto. Tomando conhecimento de oitiva dessa terminologia, nossa gente mida a aplicava estropiando a pronncia, adotando a prosdia condizente com a sua cultura, alis de acordo com o esprito de nossa lngua: Half e hand (desconhecia-se o ag aspirado da lngua inglesa) eram simplesmente alfo e ende. As vrias categorias da equipe eram assim designadas gortipa, beque, alfo e linha. O beque central era centeralfo. O tranco e outras safadezas constituam fau, sendo permitida a marreta. No havia filigranas como agora, nem passos de minueto. O violento esporte breto era jogo para maches, dele s participando quem entrasse em campo sem amor pele... (Os ludopedistas do violento esporte breto, em Oito bananas por um tosto: crnicas campineiras. Campinas, Secretaria Municipal de Cultura, Esportes e Turismo, 1955).

Pesquise com algum mais velho o que vinha a ser a prtica do footing. Explique o que isso tem a ver com o sentido da palavra inglesa foot (p).

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Exerccios

1. Na lista de palavras a seguir, separe aquelas que, de acordo com sua opinio so de origem inglesa daquelas que foram formadas dentro da lngua portuguesa. Confira em seguida as respostas na p. 22. clube lder dopar futebol flertar bingo (office) boy biquini super-mercado lanche xerife linchar reportagem f sanduche best seller xerox jeans gangue bonde clip iate treinar 2. Os anglicismos listados a seguir dizem respeito atividade poltica. Explique sua significao: apartheid establishment impeachment lobby boicote 3. Os anglicismos listados a seguir dizem respeito ao esporte, e alguns, mais especificamente, ao futebol. Explique o que significam e, se possvel, encontre um equivalente em portugus. anti-doping hooligan recorde cockpit pnalti (penalty) crner (corner) off side beque (back) cruzar a bola (cross) drible (dribling) 4. Procure equivalente que no seja de origem inglesa aos anglicismos: smoking, pulver, suter, top.

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5. Os anglicis mos listados a seguir referem-se atividade de produo ou s rela-

es humanas que se estabelecem na produo. Explique o que significa: canibalizar reengenharia trainee reciclar 6. Tente explicar a diferena entre um trainee e um aprendiz, entre um top e uma blusa, entre locaute e greve, entre um biquini e uma tanga. 7. Os anglicismos listados a seguir referem-se a formas de comercializao ou propaganda de produtos: escolha dois deles e d um exemplo da situao que eles descrevem. Pea a seu professor que explique as demais: dumping franchising leasing shopping center merchandising 8. Gangster, gentleman, playboy, esnobe, caubi: procure entre as personagens da histria, literatura ou cinema um exemplo de cada um desses tipos humanos. Diga por que ele mereceu o ttulo. Tente ento uma traduo aproximada para as cinco palavras. 9. Faa, em conjunto com seus colegas, um levantamento de palavras que se referem ao uso de computadores. Separe, em seguida, as que so de origem inglesa. Confira em seguida a resposta na pgina 22 . 10. s vezes, o nome estrangeiro mais conhecido do que o nome portugus. Voc sabe o que vem a ser: uma toranja? [um grapefruit] o jogo do ludopdio (ou balipdio)? [o futebol] um co rateiro [um fox-terrier] um co de gua [poodle] um triceto [hamster] 11. Dos inmeros anglicismos que entraram para o portugus nos ltimos 150 anos,

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alguns eram inicialmente siglas. Os exemplos mais famosos so, provavelmente, Dedet DDT por Difenil dimetil tricloroetano, o nome do mais famoso inseticida de todos os tempos. Esse--esse SOS Save Our Souls, era a mensagem transmitida para pedir socorro em situaes extremas, tais como os naufrgios e outras grandes catstrofes. Literalmente, significa salvem nossas almas. Pec PC, por personal computer ou computador pessoal Os primeiros pecs foram criados para substituir os computadores de grande porte, que geralmente pertenciam a grandes firmas ou corporaes e eram usados de maneira no pessoal, mas compartilhada. Aids AIDS, por Acquired Immunological Deficiency Syndrome, ou Sndrome da Imunodeficincia Adquirida; a aids instala-se pela ao de um vrus, o HIV, que destri o sistema imunolgico dos pacientes. Pesquise num dicionrio a origem das seguintes palavras ou siglas:HIV

modemVIP W.O. UFO

yuppie laser 12. Ache na lista de palavras de origem inglesa a seguir: Dois nomes de gneros musicais Dois nomes de tipos de veculos Dois nomes de espetculos Dois tipos de filme Dois tipos de tecido camping, cartoon, check-up, cult, flash, folclore, ghost writer, happening, iate, insight, jazz, jersey, massmedia, mdia, look, overnight, paging, performance, pick-up (picape), piquenique, show, skate, slogan, estoque, strip-tease, suspense, triler, joint-venture, truste, country, disk-jockey, soul, copidescagem, briefing, best-seller, release, coquetel, fast food, videoclipe, zapping, chinz. 13. Muitas das palavras inglesas que o portugus recebeu tm uma histria curiosa em ingls. Veja estas:

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

sanduche : no sculo XVIII, John Montagu, conde Eduardo de Sandwich(1718-1792) sentia-se to bem mesa do jogo que nem mesmo para tomar as refeies dela se afastava. Teve, ento, a idia de mandar preparar fatias de po com carne ou queijo, saboreando-as enquanto jogava. linchar: derivado do nome prprio ingls Lynch, e da expresso Lynchs law [lei de Lynch]. Entre o sculo XV e o sculo XIX, vrios juzes com o mesmo nome, na Irlanda e na Amrica, condenaram criminosos sem processo legal. Linchar significa executar sumariamente, segundo a lei chamada de Lynch; aplicao da lei de Lynch; execuo sumria por uma populaa. boicote: ingl. boycott, do nome do capito ingls James ou Charles Cunningham Boycott (1832-97), administrador das fazendas de Lord Erne, no distrito de Comemara, Irlanda. Boycott provocou, por volta de 1880, em conseqncia de suas exigncias excessivas e severidades exageradas, uma recusa geral de trabalhar s suas ordens. Boicote significa forma de coero ou represlia que consiste em impedir ou romper qualquer relao social ou comercial. slogan: ingl. slogan, grito de guerra dos antigos montanheses da Esccia. Breve frmula para fins e propaganda, apelo, lembrana, sugesto em poucas palavras, divisa, lema.[Fonte: Jrgen Schmidt-Radefeldt e Dorothea Suring Dicionrio dos Anglicismos e Germanismos da Lngua Portuguesa, Frankfurt am Main, Ferrer de Mesquita, 1997]

Resposta do exerccio 1: Todas essas palavras so de origem inglesa. Resposta do exerccio 9: Personal computer, software, hardware, disquete, programa, salvar, deletar .

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AntonmiaObjetivo

Explorar palavras e frases que podem ser colocadas em oposio, como um recurso para o enriquecimento da reflexo e da expresso.Caracterizao geral

Informalmente, as pessoas costumam chamar de antnimas quaisquer palavras ou expresses que podem ser colocadas em oposio: nascer vs. morrer, ir vs. vir, grande vs. pequeno etc. Os antnimos costumam ser comparados aos pares e entre dois antnimos que formam par h sempre uma propriedade em comum. Assim, grande e pequeno indicam tamanho; ir e vir indicam deslocamento; nascer e morrer so os dois extremos do mesmo processo de viver etc.Material lingstico

Os antnimos formam pares que se referem a realidades opostas: Aes: perdi o lpis, mas em compensao achei uma nota de 10 reais. Qualidades: a sopa estava quente, mas o caf estava frio. Relaes: o gato estava embaixo da mesa; a gaiola do canrio estava sobre a mesa. A oposio existente entre dois antnimos pode ter fundamentos diferentes: diferentes posies numa mesma escala. Ex. quente e frio representam duas posies na escala da temperatura. incio e fim de um mesmo processo: florescer e murchar. diferentes papis numa mesma ao: bater e apanhar. Encontramos antnimos entre: substantivos: bondade versus maldade adjetivos: duro versus mole verbos: dar versus receber advrbios: l versus c preposies: sobre versus sob etc.

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

Costuma-se pensar na antonmia como uma relao de oposio que diz respeito s palavras, no sistema da lngua. Mas os textos podem construir oposies entre palavras e expresses que, normalmente, no consideraramos como antnimas.

Atividade O Maniquesmo foi uma doutrina religiosa da Idade Mdia segundo a qual o mundo dominado por dois seres de qualidades opostas: Deus ou o bem absoluto, e o Diabo ou o mal absoluto. Tudo aquilo que acontece no mundo teria de ser explicado pela ao de um ou outro desses dois seres. Hoje em dia, o termo maniquesta usado para descrever a atitude das pessoas que avaliam as situaes e as pessoas ou como inteiramente boas ou inteiramente ms, sem possibilidade de meio-termo. Nos jornais fcil encontrar editoriais, artigos e cartas de leitores que se manifestam totalmente a favor ou totalmente contra uma determinada idia ou iniciativa. Localize um desses textos e explique por que ele merece ser qualificado como maniquesta.

Exerccios

1. A poltica um terreno frtil para o surgimento de antnimos, que s vezes nomeiam partidos em luta entre si, s vezes indicam posies conflitantes diante de um determinado conjunto de problemas. A seguir, voc encontra vrios pares de palavras que surgiram num contexto poltico determinado, e que fazem lembrar momentos diferentes da histria brasileira. Procure estabelecer o que significam as palavras em questo e a que momentos da histria se referem. constitucionalistas x legalistas maragatos x ximangos nacionalistas x entreguistas monarquistas x republicanos parlamentaristas x presidencialistas direitistas x esquerdistas emboabas x paulistas 2. A freqncia com que se recorre a certas oposies de palavras marca, em alguma medida, as preocupaes e inovaes prprias de uma poca. Procure contextualizar os pares que seguem, pensando nas escolhas e nos valores a que fazem referncia:

Antonmia

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relgio de pulso mecnico x relgio de pulso movido pilha controle manual x controle remoto (de um aparelho de televiso, por exemplo) telefonia fixa x telefonia celular caf de mquina x caf de coador acar x adoante carro nacional x carro importado nibus regular x nibus executivo ovo comum x ovo caipira coalhada x iogurte fotocpia x xerox embalagem retornvel x embalagem descartvel direo mecnica x direo hidrulica etc. 3. Quando algum pergunta se o poo raso ou fundo, est perguntando pela fundura do poo (no por sua rasura). Qual a propriedade que se quer determinar com estar perguntas? A porta alta ou baixa? A parede branca ou colorida? O elefante leve ou pesado? O avio veloz ou lento? O rio largo ou estreito? A muralha da China comprida ou curta? A lista telefnica grossa ou fina? etc. 4. Nem sempre a negao nos faz passar de um adjetivo a seu oposto: h coisas, por exemplo, que no so feias e nem por isso so bonitas; conte um caso, ilustrando uma situao em que se possa dizer que a ausncia de uma determinada propriedade no leva necessariamente propriedade contrria.

5. H antnimos que admitem meio termo (por exemplo: o caf da garrafa trmica pode estar quente ou frio, mas pode tambm estar morno). Na lista a seguir, escolha um par de antnimos e descreva uma situao que representa o meio-termo: nacional importado brega chique encadernado brochado

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

moderno antigo leve pesado mamfero peixe criana velho rico pobre 6. Imaginar que um certo objeto possa ter as propriedades contrrias (que se expressam por um par de antnimos) contrrio ao bom-senso. Mas os provrbios, com sua antiga sabedoria, lembram-nos que essas situaes paradoxais podem acontecer. Escolha um desses provrbios e conte uma histria a que ele se aplica: O barato sai caro. O timo inimigo do bom. H males que vm para bem. Mais vale um mau acordo do que uma boa demanda.7. O volume 12 da Enciclopdia popular de Pdua (um folheto distribudo gratuitamente nos bairros de Campinas, SP) trazia a seguinte seo: ORGANIZE-SE Voc abriu, feche Acendeu, apague. Ligou, desligue. Desarrumou, arrume. Sujou, limpe. Est usando algo, trate-o com carinho. Quebrou, conserte. No sabe consertar, chame quem o faa. Para usar o que no lhe pertence, pea licena. Pediu emprestado, devolva. No sabe como funciona, no mexa. de graa, no desperdice. No sabe fazer melhor, no critique. No veio ajudar, no atrapalhe. Prometeu, cumpra. Ofendeu, desculpe-se. Falou, assuma. Seguindo estes preceitos, viver melhor.

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Alguns dos preceitos foram formulados utilizando pares de antnimos. Quais? [Depois de responder, confronte seus resultados com os dos seus colegas.] 8. Muitas das duplas que povoam o cinema/seriados da televiso/histrias em quadrinhos e outras formas de fico so formadas por personagens com caractersticas (fsicas, psicolgicas, sociais, raciais etc. contraditrias). Lembre de uma dessas duplas e explique o que distingue as duas personagens. 9. O adjetivo integral assume sentidos parcialmente diferentes em expresses como po integral, leite integral, edio integral de uma obra, arroz integral, aposentadoria integral etc. Como voc chamaria um po que no integral? E um leite que no integral? E uma edio de obra que no integral? E uma aposentadoria que no integral? Voc seria capaz de lembrar outras palavras cujos diferentes sentidos correspondem a antnimos tambm diferentes? 10. O Dicionrio analgico da lngua portuguesa do Pe. Spitzer utiliza a antonmia como um recurso para distribuir as palavras dentro de uma grande grade classificatria. Veja como ele trata o vocabulrio referente riqueza e pobreza. Feita a leitura desse trecho, responda s perguntas:560. Riqueza (v.559,447) - S. riqueza, dinheiro, fortuna, abastana, bens (de fortuna), prosperidade, boas finanas, condies de solvncia, independncia, recursos, ganho, receita, po, opulncia, abundncia, cpia, dinheiro a valer, ufa, boa soma, bolso recheado, mammon, remdio, tesouro, ndia, Eldorado, Peru, Potosi, Califrnia, milhes, maquia, Creso, milionrio, ricao, homem abastado, arranjado, remediado, capitalista, financeiro, aristocrata do dinheiro, haute finance, argirocrata, plutocrata, sobejido, fartura, arca, tesouro, queijo, melgueira, chuchadeira, pechincha (economias), bolada, bolo, vazabarris, chapa, mina de ouro, ricao, recheio, corda de enforcado (talism), lavrador, grosso. V. fazer dinheirama, dinheiro a rodo, ter de seu, ter o seu arranjo, ter chorume, ter chelpa, pesa ouro ou monta ouro, nadar em grande gua, estar cheio como um ovo, tirar a algum o p do lodo, ter para dar e vender. A. rico, abastado, remediado, solvente, solvel, opulento, a rodo, ufa, endinheirado, cherudo, apatacado, podre de rico. 561. Pobreza (v.448) - S. pobreza, indigncia, necessidade, misria, apertura, penria, mendicidade, proletariado, empobrecimento, pauperismo, asilo de mendigos, mealheiro, esmola, po dos pobres (de Sto. Antnio), hospital de pobres, um pobre, mendigo, indigente, necessitado, lzaro; pobre diabo, proletrio, pobre, envergonhado, mendicante; alforje dos pobres, mngua, mendigaria, lazeira, peregrino, piolharia, limpeza de bolsa, fraca-roupa, pobreto, maltrapilho, escatima. V. ser pobre, empobrecer, viver da mo para a boca, mendigar, pedir, viver de esmolas, reduzir pobreza, recolher esmolas, esmolar, ver-se em apertos, na indigncia, pedinhar, depauperar, viver mngua, no ter nem cheta, andar ao lambisco, na espinha, no espinhao, no ter onde cair morto, andar pingando ou pingar misria, no ter nem para a cova de um dente, no ter nem eira nem beira nem ramo de figueira, limpar algum, ficar a pedir chuva, andar aos tombos, andar aos paus, deitar remendos sua vida, tirar a camisa a, ficar sem camisa, tomar a mulher em camisa, viver aos dias, dia por dia; deixar algum em branco, abunhar, tomar o po a algum, ser um pobre de Cristo, comer o po que o diabo amassou, estar na pindaba. A. insolvente, reduzido indigncia, pedicho, uma esmola, por amor de Deus, para o pobre cego, mngua, mngua de pinga, baldo, ao naipe, escorrido, sem real, maltrapilho.

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

1. 2. 3. 4.

Que outras palavras referentes riqueza e pobreza voc conhece? A que mitos remetem as palavras ndia, Eldorado, Peru e Califrnia? Quem foi Creso e o que ele tinha a ver com riqueza? Qual das expresses da segunda coluna (Pobreza) descreve a situao em que a moa se casa sem levar dote?

11. Veja esta letra de Caetano Veloso: ela tira proveito de algumas antonmias bem estabelecidas na lngua e cria algumas outras. Aponte as que voc achar mais interessantes e tente explic-las.

Os quereresOnde queres revlver sou coqueiro Onde queres dinheiro sou paixo Onde queres descanso sou desejo E onde sou s desejo queres no E onde no queres nada, nada falta E onde voas bem alto eu sou o cho E onde pisas o cho minhalma salta E ganha liberdade na amplido. Onde queres famlia sou maluco E onde queres romntico, burgus Onde queres Leblon sou Pernambuco E onde queres eunuco, garanho Onde queres o sim e o no, talvez E onde vs, eu no vislumbro razo Onde queres o lobo eu sou irmo E onde queres caubi, eu sou chins. Ah bruta flor do querer Ah bruta flor, bruta flor [...]

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ArcasmosObjetivo

Explorar os efeitos que pode produzir, num texto, o uso de expresses que so reconhecidas como antigas ou desusadas.Caracterizao geral

Chamamos de arcasmos as expresses que, tendo j sido de uso corrente na lngua, caram em desuso; quando usadas, refletem um estado de lngua mais antigo. Os arcasmos so pouco comuns na fala corrente; aparecem mais freqentemente na literatura, em especial naqueles gneros em que as obras do passado continuam servindo de referncia produo dos autores contemporneos e em autores que fazem do arcasmo um recurso de estilo.Material lingstico

possvel encontrar arcasmos em todos os domnios da lngua: vocabulrio, morfologia, sintaxe... Constituem arcasmo: No lxico, o uso de certas palavras, por exemplo, coita por angstia, mil-ris ou contos de ris por reais etc. Na morfologia: formas antigas, com o artigo definido el: el rei e certos particpios passados que sobrevivem apenas em frases feitas (ex. teda e manteda). Na sintaxe: a anteposio do pronome tono palavra que o atrai, como na frmula Esta So Paulo onde eu me criei, recorrente nos discursos de campanha do ento candidato a governador Jnio Quadros. Com freqncia, o arcasmo consiste em usar uma palavra com um sentido que ela j teve, mas que hoje no corrente: se algum usar, hoje em dia, a palavra formidvel com o sentido de assustador, estar falando como os escritores do sculo XVI. Com freqncia,, as falas mais tipicamente regionais continuam usando formas e expresses que, do ponto de vista da lngua brasileira comum seriam arcaicas. As razes por que as palavras e construes se tornam arcaicas so vrias: Os objetos, tcnicas e hbitos correspondentes caram em desuso; A palavra perdeu a ligao com outras que tinham origem comum.

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

A lngua sofreu um processo de regularizao que fez desaparecer formas parcialmente diferenciadas. Em uma fase muito antiga da lngua portuguesa, o feminino de senhor era senhor (isso mesmo: os trovadores medievais qualificavam sua amada de fremosa mia senhor) e os adjetivos terminados em -s formavam o feminino em -s (isso mesmo: uma princesa leons) essas formas modificaram-se mais tarde para receber a terminao -a, que hoje a terminao generalizada dos femininos: formosa senhora, princesa leonesa.Atividade O texto a seguir adaptao de uma carta do sculo XVIII, escrita por um padre da Cria de So Paulo a um oficial do imprio que servia na regio das Minas, ento em pleno ciclo da minerao. Como voc poder observar, trata-se de duas pessoas ligadas por laos de parentesco, amizade e interesses comuns. A grafia e a pontuao foram adaptadas. Nessa carta h algumas passagens que hoje no seriam escritas da mesma maneira. Aponte essas passagens e discuta-as em seguida com seu professor, tentando estabelecer se constituem arcasmos.Meu Primo e [...] Irmo. J escrevi a Vossa Merc por um correio da Cria que levou cartas para Bicudo Bueno e outras vrias para moradores dessas minas que, pelo tempo em que partiu, estar a chegar nesse lugar. Dizia a Vossa Merc ser eu chegado com vida, e lhe pedia me fizesse diligencia por remeter todas as cousas inteis que pudesse haver, como cristais e outras pedras de nenhum valor, penas de pssaros e tudo o mais que fosse de galantaria para um curioso de bom gosto em Lisboa. J sei que Vossa Merc ter nesta minha petio alguma molstia, e que antes me poderia Vossa Merc servir com ouro ou diamantes pelo valor que os homens lhe deram e que, j que ocupo a Vossa Merc em cousas to vis e de nenhum preo, pr a grande pessoa de Vossa Merc em nenhuma estimao. Confesso que em outros haveria razo de reparo quando das minas s se espera ouro ou cousa semelhante; mas como sei que Vossa Merc tem que acudir a tantos, no quero eu ser instrumento por que Vossa Merc desvie os acrescentamentos de sua casa; e s quero para mim a ateno de Vossa Merc e que no me despreze quando chegar sua porta. A casa de Vossa Merc est em paz, e eu com a mesma paz comigo vivo. Remeto a Vossa Merc 206 medidas tocadas na milagrosa Imagem do Senhor Jesus da freguesia de So Mamede da Cidade de Lisboa em uma boceta encapada para Vossa Merc nos fazer merc de repartir pelos fiis cristos pelos preos que em um papel incluso na mesma boceta vo declarados; advertindo a Vossa Merc que no podendo dar sada pelos preos apontados, ser por aqueles que o zelo e devoo de Vossa Merc puder conseguir. [...] A petio do Senhor JESUS a Vossa merc e no digo mais. Ao Capito Incio Diaz Paes tambm remeto outra boceta com 105 e lhe peo o mesmo favor. Vossa Merc aplicar aos enfermos e tendo f viva experimentaro efeitos milagrosos. Eu vou vivendo como quem no tem dinheiro e, como Vossa Merc no me convida para as suas lavras, no ponho em execuo esta jornada.

Arcasmos

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Tambm pedia a Vossa Merc em primeiro lugar alguma casca de cabriva da muito cheirosa, que o Capito-Mor Bicudo Bueno diria a Vossa Merc o lugar onde se acha, ainda que dssemos algumas patacas ao sujeito da diligncia que Vossa Merc arbitrar, conforme a sua distncia. Fico obedincia de Vossa Merc com aquela antiga vontade, pedindo a Deus aumente a Vossa Merc na alma e no corpo, e que o guarde como muito muito muito desejo. S. Paulo 24 de Mayo de 1734 Senhor Capito-Mor Diego de Toledo Lara Saudoso primo e muito seu negrinho de Vossa Merc Joz de Almeyda Lara[Esta carta foi publicada no Tomo XVI da Revista do Instituto Historico e Geogrfico de S Paulo. Prof.a Mirta Groppi F. a estudou no contexto do Projeto de Estudo da Histria do Portugus Brasileiro].

Exerccios

1. Os ditados e os provrbios contm, s vezes, palavras que j no se usam na linguagem corrente. Considere os provrbios que seguem. Usando a pequena explicao das palavras que mantm neles um sentido antigo, explique o que significam: Quem usa, cuida (usa faz lembrar de usos e costumes, useiro e vezeiro) A co fraco acodem as moscas (acudir usado aqui no sentido antigo de aproximar-se, chegar perto) No se pescam trutas a bragas enxutas (braga era um tipo de calo, geralmente curto e largo, que se usava outrora) Mais vale uma m arrumao que uma boa questo (arrumao e questo j no se usam hoje com o sentido jurdico que tm no provrbio) Vinho bom no precisa de ramo (o ramo, no caso, era o emblema que distinguia as casas de pasto, em que o vinho podia ser encontrado). 2. Da mesma forma que as palavras e construes que ele emprega, a ortografia original de um texto denuncia sua antiguidade. Veja como foi escrito, originalmen-

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

te, este famoso soneto de Olavo Bilac (Via Lctea, XIII) e tente l-lo em voz alta, sem cometer erros. Transcreva-o em seguida para a ortographia (desculpe, ortografia) actual:XIII Ora (direis) ouvir estrellas! Certo Perdeste o senso! - E eu vos direi, no emtanto, Que, para ouvil-as, muita vez desperto E abro as janellas, pallido de espanto... E conversamos toda a noite, emquanto A via lctea, como um pallio aberto, Scintilla. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo co deserto. Direis agora : - Tresloucado amigo! Que conversas com ellas? Que sentido Tem o que dizem, quando esto comtigo? E eu vos direi : - amae para entendel-as! Pois s quem ama pde ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrellas.

3. Na linguagem da burocracia, conservam-se com um sentido antigo algumas pa-

lavras que perderam esse mesmo sentido na linguagem corrente. Procure esclarecer o que acontece quando um funcionrio pblico dispensado do servio por motivo de gala ou nojo. 4. Na histria da lngua portuguesa, comum o caso de palavras que caram em desuso e foram substitudas por outras, formadas com a mesma raiz. s vezes, no entanto, o caso de pensar se a palavra que se perdeu no era melhor, do que a que ficou, para expressar a idia correspondente. Compare: formas arcaicas soffrena perdoana mentideiro conhecena vizindade semelhvel falsura dulcido longura formas atuais sofrimento perdo mentiroso conhecimento vizinhana semelhante falsidade doura comprimento

Arcasmos

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triganabeio 5.

pressalbio

Os anncios que voc ler a seguir foram retirados da revista O Careta, publicada no comeo do sculo XX, no Rio de Janeiro, e que teve como ponto alto o humor poltico. Como voc pode notar, o estilo da propaganda mudou muito ao longo dos ltimos 100 anos. Tente explicar o que mudou, na lngua e na concepo de propaganda.

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

6. Nos bons colgios do sculo XIX, os alunos tratavam-se por o senhor, talvez como parte de uma pedagogia que os imaginava adultos, interagindo com outros adultos. Tente se colocar nessa situao e escreva uma carta a um colega, sobre um assunto que esteja na ordem do dia, usando aquela forma de tratamento. Reflita no efeito de usar a expresso o senhor no sculo XIX e hoje. 7. O trecho que segue foi extrado do livro A linguagem usual e a composio, de Jlio Nogueira e faz parte de uma orientao sobre como fazer uma boa redao sobre o tema O Carnaval. Escrito na primeira metade do sculo XIX, o texto descreve uma realidade diferente da atual e s vezes usa palavras diferentes para descrever coisas que no mudaram muito. Assinale as passagens em que se descrevem realidades antigas ou se usam expresses que caram em desuso.Poderemos limitar-nos ao carnaval do bairro onde moramos, ou ao grande carnaval do centro. No primeiro caso aludiremos aos preparativos, como a armao do coreto para a msica; a decorao festiva que tomam certas casas comerciais vendedoras de artigos de carnaval: mscaras, roupas de fantasia, lana-perfumes, confetti, serpentinas etc. Mencionaremos o rudo ensurdecedor dos bombos, pandeiros, gaitas, apitos, etc., com que os caixeiros procuram atrair a freguesia. Na hora da batalha de confetti, h uma verdadeira multido no local e dela poderemos destacar alguns tipos curiosos pela extravagncia de sua vestimenta ou pelas suas maneiras, cnticos, esgares. No esqueamos a passagem dos blocos ou cordes, cuja riqueza, originalidade ou falta de gosto descreveremos. Dessa descrio constar tambm a ordem em que se apresenta o rancho, vindo frente a porta-estandarte, em requebros e meneios que ela procura tornar graciosos; de justia mencionar o homem do leque, cuja funo fazer evolues com ela; descreveremos os anjos, meninas que por vezes ostentam fantasias caras e fazem passos de dana sobre o asfalto por todo o trajeto, revelando uma resistncia surpreendente; teremos algumas palavras para o carro alegrico, explicando-lhe o assunto ou enredo, como dizem os jornais; em seguida as pastoras, que constituem o coro de cnticos; depois a banda de msica ou o simples choro, isto , pequeno grupo de msicos, conforme a riqueza e importncia do rancho; no esqueceremos os fogos de bengala, o fumo que deitam e os aplausos dos entusiastas. [...] Se preferirmos o grande carnaval, descreveremos o que ocorre na Avenida. A teremos a multido, o atropelo, os agrupamentos nos passeios e escadarias de edifcios pblicos cheios de gente. Descreveremos a espera impaciente do pblico, os ditos de esprito, as discusses sobre qual ser o prstito vitorioso; os vendedores ambulantes de refrescos, doces e artigos de carnaval; os alugadores de cadeiras e bancos improvisados; a agitao que se opera na massa popular quando se ouve o clarim da primeira sociedade que entra na

Arcasmos

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avenida; indivduos que se erguem na ponta dos ps; outros que sobem para seus bancos e cadeiras; os garotos que se instalam nas rvores. O prstito aproxima-se. J chegam polcias e inspetores de veculos montados em motocicletas, ante os quais o povo que invadira o leito da avenida vai abrindo caminho. Se j noite, cabe aludir iluminao do prstito: fogos de bengala e lmpadas eltricas. No esqueceremos os homens que, com grandes varas, afastam os galhos das rvores ou suspendem os fios para desembaraar a passagem dos carros altos. Diremos agora como so organizados os prstitos: a guarda de honra bem montada, composta de diretores do clube, cujo papel cumprimentar o pblico e sorrir-lhe, agradecendo os aplausos; depois vem o carro-chefe, em geral uma alegoria de assunto histrico, ou com figuras lendrias: centauros, drages, pgasos, gigantes etc.; colocadas em vrios pontos se vem pessoas vestidas a carter, sobretudo mulheres que atiram beijos multido. Esses carros tm movimentos engenhosos para diversos efeitos. Alm do carro-chefe, h outros tambm alegricos ou de crtica, e os em que seguem outros diretores do clube. Descrever o entusiasmo da multido quando passam esses prstitos, as aclamaes, as discusses em voz alta entre os partidrios das diferentes sociedades etc. Uma ateno especial nos deve merecer a volta dos assistentes s suas residncias, com o costumeiro assalto aos bondes e nibus, sobretudo se o tempo se mostra ameaador.

8. A Botica ao Veado de Ouro foi, no passado, uma das mais famosas farmcias de So Paulo. Hoje o nome indica uma rede de farmcias de manipulao. Botica, boticrio so os nomes que se usavam, antigamente para designar o que hoje se chama mais comumente de farmcia e farmacutico. Tente descobrir, em sua cidade, algum estabelecimento comercial antigo e verifique se ele j foi conhecido por algum nome que hoje j no seja muito comum (armazm, emprio, casa de secos e molhados, leiteria). 9. Escritos antes de 1970 como crnicas, o texto Antigamente e Antigamente II, do poeta Carlos Drumond de Andrade, recupera muitas frases feitas que no eram de uso corrente. Localize-os no livro Caminhos de Joo Brando, ou em uma antologia, leia-os e pea ao seu professor que explique as frases que para voc hoje so incompreensveis. Comente em seguida a representao que o poeta faz nas duas crnicas da vida que as pessoas viviam, antigamente. 10. Os textos transcritos a seguir so anncios extrados de jornais brasileiros do sculo XIX, e foram recolhidos (com outras centenas de anncios) no livro de Marymrcia Guedes e Rosana Berlinck E os preos eram commodos. Como seria de esperar, contm palavras que j no se usam, ou que, quando usadas, soam arcaicas. Comente, a esse propsito, as palavras destacadas.

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

ATTENO !! AO NOVO ARMAZEM DE MOLHADOS Participa-se ao respeitavel publico desta capital, que acaba de abrir se um completo e variado sortimento de molhados, bem como ferragens, drogas, loua e miudezas de armarinho, calados e muitos outros objectos que se vendero por commodos preos no largo do Chafariz n o 4, esquina da rua Fechada; esta casa estar aberta desde as 7 horas da manha at as 9 da noite. (O 19 de dezembro, 12.8.1854) ANTIGA LOJA DO QUEIMA Lino de Sousa Ferreira, chegado ultimamente do Rio de Janeiro com um dos melhores sortimentos e ultima moda, sendo ricos cortes de cala de casimira, manteletes, toucados, colletes, mangas, e camisinhas bordadas, calado, e todo mais pertencente ao seo estabelecimento que vender por todo preo; assim mais transferiu seu estabelecimento do largo da matriz n 42 para a rua das Flores no 12. (O 19 de dezembro, 12.8.1854) MANOEL Ferreira dos Santos, com loja de fazendas na rua do Commercio no 12, casa de Joaquim de Souza Ferreira, faz sciente ao respeitavel publico, que por liquidao pretende vender por atacado e retalhos as fazendas a seu cargo, pelo custo da crte, constando o sortimento de todos aquelles artigos que um grande estabelecimento pode ter em fazendas de luxo e de lei, tanto para homens como para senhoras, e se obriga a mostrar as facturas querendo os compradores conferenciar seus custos. (O 19 de dezembro, 26.8.1854)

Respostas do Exerccio 1: Quem tem um certo hbito ruim, desconfia das pessoas que tm o mesmo hbito / Quem no sabe se defender vira vtima dos outros / Nada que valha a pena se consegue sem esforo / Mais vale um mau acordo que uma boa demanda / O que bom no precisa de propaganda.

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Campos lexicaisObjetivo

Ampliar os recursos para a anlise dos aspectos nocionais do significado das palavras.Caracterizao geral

Constituem um campo lexical as palavras que nomeiam um conjunto de experincias em algum sentido anlogas. Os nomes das cores, por exemplo, que se referem a um tipo particular de experincia visual ou os nomes dos animais, que organizam parte de nossa experincia dos seres vivos, constituem campos lexicais.Material lingstico

Para organizar um campo lexical, dispomos de pelo menos dois recursos: a chamada anlise componencial e a anlise por prottipos. A anlise componencial parte do princpio de que a significao das palavras pode ser quebrada em unidades menores (geralmente chamadas de componentes ou traos semnticos) e que as unidades encontradas na anlise de uma determinada palavra reaparecero em outras palavras. Seria possvel, assim, verificar que duas ou mais palavras tm em comum, realizando operaes que lembram a fatorao da aritmtica. Por exemplo: quadrado = [+ figura geomtrica] [+ plana] [+ cncava] [+ com quatro lados] [+ lados iguais] [+ ngulos iguais]

Alguns desses traos so igualmente necessrios na caracterizao de um tringulo, losango, retngulo, pentgono etc. Na anlise por prottipos, identificamos indivduos que representam melhor toda uma categoria e procuramos entender os demais elementos da categoria a partir da nossa experincia (no traduzida em traos) daqueles indivduos. Para

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

organizar a categoria dos pssaros, por exemplo, podemos tomar como referncia o pardal e perguntar-nos quais so os animais que mantm com ele uma semelhana incontestvel: feito esse teste, provavelmente diremos que o sabi um pssaro, mas o peru no .Atividade Uma forma de prototipicidade muito prpria das sociedades industrializadas consiste em associar determinados produtos manufaturados a determinados fabricantes, que supostamente ofereceriam a melhor verso do produto. Com seus colegas de classe, monte uma lista de 20 produtos correntes (tais como: refrigerante de guaran, mquina de lavar roupa, tnis, vela de ignio de automvel, pilha de lanterna, lmpada, tinta vinlica para paredes, canos e conexes para a instalao domstica de gua etc.). A respeito desses mesmos produtos, voc far junto a uma classe vizinha a seguinte pesquisa de opinio: Que marca imediatamente lembrada quando se menciona o nome do produto? Em seguida, discuta com seus colegas de classe a seguinte questo: por que antigas marcas so s vezes preservadas, depois de consumada a unificao de duas grandes firmas concorrentes? (Um exemplo: a firma que resultou da unificao dos fabricantes Brasilit e Eternit produz uma nica srie de produtos, que continuam sendo comercializadas pelos nomes Eternit e Brasilit).

Exerccios

1. Na tabela a seguir, o sinal (+) indica a presena de um determinado trao, e o sinal () indica sua ausncia. Considerando que um conjunto de traos define uma palavra, escreva na coluna da direita as palavras que correpondem a cada linha. Em ordem alfabtica, so elas: automvel bicicleta bonde a cavalo caminho carriola carroa charrete motocicleta riquix trator tren de neve

Campos lexicais

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A gasolina ou vapor

Propulso humana

Para uso agr cola

Trao animal

Sobre e strada

Quatro rodas

Sobre Trilhos

Duas rodas

Para carga

Veculo

+ + + + + + + + + + + +

+ + + + + -

+ + + + + -

+ + + + + + +

+ + + + + + -

+ + + + +

+ + -

+ + + + + + + + + -

+ + + -

+

Bicicleta

2. Mediante um clculo simples, possvel mostrar que trs traos binrios bas-

tam em condies ideais para distinguir at oito palavras. Pense cada uma das linhas da ltima coluna como o final de um percurso que comea em mvel para sentar e passa pelas trs escolhas indicadas. Decida em que linhas voc colocaria as palavras cadeira, banquinho, sof, banco, pufe, poltrona.para uma pessoa mvel para sentar para mais de uma pessoa com encosto sem encosto com encosto sem encosto com estofamento sem estofamento com estofamento sem estofamento com estofamento sem estofamento com estofamento sem estofamento

3. Assim como possvel escrever propores aritmticas, possvel escreverpropores lingsticas. Diga quais, dentre as seguintes esto corretas:Rei rainha prncipe princesa Veado cora bode cabra Cavalo potro gua potranca vaca bezerra

=

=

=

=

=

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

Banquinho poltrona --------------------- = -----------------= banco sof

=

Brasileiro japons --------------------------- = ----------------sul-americano asitico cocker gato siams =

gato -----------gata

=

borboleta --------------------larva

sabi sabioca = lagarto lagartixa

co gato

4. Junte as peas da direita e da esquerda, de modo a construir frmulas intuitivamente verdadeiras: gaveta puxador barbante corda porta casa leme barco sapato civil rosto gente motorista carro titica galinha = = = = = = = bosta vaca focinho bicho guido bicicleta = minhoca cobra xcara asa abertura gruta coturno militar piloto avio

5. Suponha que voc quisesse fornecer a um selvagem um bom exemplo do que um carro uma caneta esferogrfica um sanduche um funcionrio pblico um telefone celular um chinelo um iogurte uma cerveja que exemplos voc usaria? Procure ser bastante especfico. No caso da cerveja, por exemplo, cerveja branca ou preta? Embalagem de 666 ml ou latinha de 350 ml? Brahma, Antrctica ou Schincariol? etc. 6. O grfico a seguir foi extrado sem modificaes do verbete Gentica da Enciclopdia Mirador (onde utilizado para explicar como a transmisso do chamado Fator Rh negativo afeta as pessoas conforme a hereditariedade e o sexo). Aqui, utilizaremos esse grfico para pesquisar os nomes de parentesco em uma rvore genealgica fictcia. D um nome de pessoa aos quadrados (homens) e s bolinhas (mulheres). Em seguida, localize-se no indivduo identificado pela seta e diga qual a relao de parentesco que tm com ele as demais pessoas do grfico.

Campos lexicais

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7. Entre as palavras dispostas a seguir, h uma relao hierrquica que pode ser

intuitivamente recuperada, mesmo sem grandes conhecimentos de zoologia. Mostre essa relao hierrquica organizando todas essas palavras por meio de um quadro sintico: vertebrado mamfero felino gato roedor rato candeo raposa co pitbull doberman bovdeo rena boi rptil cobra cascavel

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

8.

Exclua , em cada conjunto, a figura que no cabe. Explique em seguida o que motivou a excluso.

9. Os lingistas utilizam, s vezes, o nome de campo lexical para indicar o conjunto das palavras que designam as partes de um objeto ou o conjunto dos termos que dizem respeito a uma mesma tcnica, a um mesmo ramo de atividades. Para os no-especialistas, normalmente difcil enumerar todas as palavras de um desses campos lexicais; em geral, eles lembram algumas, compreendem algumas outras quando as ouvem e desconhecem as restantes. Tente lembrar os nomes de todas as peas que compem uma bicicleta de passeio. Compare em seguida a lista a que voc ter chegado com a lista das legendas da figura. Separe aquelas legendas em trs conjuntos, conforme constituem para voc (a) um vocabulrio ativo, (b) um vocabulrio passivo, (c) um vocabulrio desconhecido.cano do selim bomba pneumtica freio traseiro bagageiro pra-lama selim quadro alavanca de mudana de marchas guido

cabo do freio alavanca do freio pra-lama freio dianteiro garfo dianteiro

olho-de-gato (catadiptrico) pneu com cmara de ar

cmbio traseiro corrente pedal cala-p

porta-cantil

Campos lexicais

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10. O trecho a seguir transcrio parcial de uma entrevista do Projeto de Estudo da Norma Urbana Lingstica Culta (Nurc), realizada em 1971 entre um Doc(umentador) e um Inf(ormante) ento um advogado de 31 anos que descreve as operaes por que passava o caf, na fazenda que ele conheceu na infncia, desde a colheita at a venda. Leia a entrevista, e elabore a partir dela um grfico do tratamento dado ao caf. Discrimine todas as operaes, inclusive os locais em que se realizam e os implementos utilizados; no ponto conveniente do grfico, anote as palavras que as pessoas da cidade provavelmente desconheceriam.Doc. e com que se colhe... o caf por exemplo o senhor se lembra? Inf. bom... o:: era colhido tudo manualmente... mas nessa poca ento:: de:: colheita... at as mulheres passavam a:: ajudar... porque a colheita teria que ser feita dentro de uma certa poca... ento preciso mais gente pra colher...::... ... costumava-se colocar em baixo do p de caf uma espcie de:: lona... uma esteira... e a:... e depois vai-se pa?...passando a mo no galho... e caindo os gros... depois colhe-se tudo Doc. sabe como que se chama esse ato de passar a a mo no galho? Inf. esse no e... tem uma palavra especial, viu?...:... (en)derrear no derrear... uma coisa assim mas no me lembro bem... derrear o caf eu acho Doc. e depois que se... ahn que se...esse vai esse gro vai pro...vai pro pano ou no o pano s pra:: ahn:: Inf. ... vai pro pano... vai pro pano e depois vai pra um saco e naturalmente ainda o gro est muito misturado com::...pedrinhas... terra... e depois precisa:: ento limpar aquilo Doc. e como que se limpa? Inf. a limpa a::... bom inclusive o gro de caf precisa ser secado...ento precisa colocar no terreiro... e deixar secar no sol... hoje tem secador tambm:: ( ) mecnico... mas o:: o normal e at hoje:: que se faz bastante ::... jogar o caf no terreiro... e deixar alguns dias l no sol Doc. como o terreiro? Inf. o terreiro uma:: uma poro de..de terra.... ah... calada... com::... lajota...bom ou s vezes cimentada mas em geral com lajota... e fica ali::.. :: um ( ) como se poderia chamar? um cho... ou s vezes at:: cho:: batido batido mas... normalmente tem lajota no terreiro Doc. e .. gro :: Inf. e:: espalhado ali Doc. e tem algum cuidado especial durante essa secagem ou no? Inf. :: deve-se revolver um pouco o gro... s vezes at com:: com burro... e uma::... e uma espcie de::... no seria de um arado mas enfim u::ma uma coisa de madeira que se colocava... que o burro puxava... arrastava... ento j se ia revolvendo... o caf... pra no ficar sempre com o mesmo gro em cima Doc. e manualmente se fazia isso tambm no? Inf. tambm... poderia se fazer Doc. com algum:: instrumento especial?

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

Inf. no uma pessoa quase que faz fazendo o papel do burro ... ((risos)) de puxar o:: a madeira, n? Doc. uhn uhn... e essa pea de madeira? Inf. depois no final do dia se recolhe todo o caf... se faz um :: um monte... e se cobre com uma lona Doc. uhn uhn... e depois desse caf fei/h seco o que se faz? Inf. a se recolhe num::... num lugar que costuma se chamar de tulha... a a tulha :: uma:: vamos dizer um barraco... fechado... onde o caf fica armazenado Doc. e:: ele j est nessa fase j para... para industrializao ou ele ainda tem que passar por outro processo? Inf. no depois ele tem que ser::... depois de seco ele ainda tem que ser::... como que se diz?... tem que ser descascado... pra... pra o que tem:: mquinas especiais tambm. Doc. e a fazenda geralmente tem tudo isso ou manda pra fora? Inf. ho/hoje costuma-se mandar pra fora mas ahn:: antigamente tinha pelo menos esse de::... de descascar o caf j havia nas fazendas... era tudo feito assim::... com roda dgua... ou de animais .......................................................................................................................... Doc. mas... e me diga uma coisa esse caf descascado... ele j est pronto pro consumo? Inf. no.. depois... a ele est pronto pra ser vendido pelo fazendeiro... e vai ser vendido ento pra se::... modo ou exportado... agora:: o:: o caf j descascado ele pode ser exportado assim... Doc. ah sim Inf. quer dizer no ... ahn:: o caf que vai ser utilizado pela dona de casa... mas ele j exportado em saco descascado

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(In-) compatibilidades entre partes de uma sentenaObjetivo

Mostrar que a possibilidade de combinar palavras para construir frases sofre restries cuja transgresso resulta em enunciados anmalos.Caracterizao geral

H duas fontes possveis de incompatibilidade: lingstica e prtica. Sabemos que certas propriedades so incompatveis na prtica, um mesmo objeto por exemplo no pode ser simultaneamente redondo e quadrado. Por outro lado, no uso corrente da linguagem, certas combinaes de palavras ficam excludas; por exemplo, causa estranheza atribuir propriedades fsicas a entidades abstratas, como em idia gorda, velocidade pontuda.Material lingsticoPara explicar o fato de que certas palavras no combinam em condies nor-

mais, os lingistas formularam a hiptese de que as palavras se selecionam reciprocamente, ou, dito de outra maneira, que h entre elas restries de seleo. H restries de seleo entre o substantivo e o adjetivo, entre o substantivo e verbo, entre o verbo e o advrbio. Dormir profundamente vs.[???] dormir exatamente Discurso demorado, casa envidraada vs. [???] discurso envidraado, casa demorada A pergunta incomoda vs.[ ???] a pergunta torce para o Corinthians A combinao de palavras em princpio incompatveis resulta, s vezes, em um efeito de sentido. O adjetivo indigesto, por exemplo, deveria aplicar-se, em princpio, apenas a comidas. Mas um livro indigesto pode ser um livro de leitura difcil ou chata. E, s vezes, a gente fica horas seguidas ruminando uma idia... Entre os enunciados anmalos, a tradio distingue os que so absurdos (isto , os que no tm chance de ser verdadeiros em nenhuma circunstncia) dos

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

que so paradoxais (isto , contrrios opinio corrente). s vezes, um enunciado paradoxal resulta ser verdadeiro.

Atividades Uma histria mentirosa pode ser, simplesmente, uma histria que no corresponde aos fatos. Mas h histrias que falam, de propsito, de situaes francamente impossveis ou absurdas. Aponte os absurdos da histria mentirosa que segue. Se possvel, continue a histria ou conte outra, com muitos absurdos. No esquea de comparar a histria que ter inventado com a de seus colegas.O heri desta histria no tem nome. Ele se chama Cisco Kid. Cisco Kid era um bandoleiro que viajava pelas montanhas do Mxico num transatlntico. Certo dia, chegando a uma cidade do interior que ficava bem no litoral, Cisco Kid resolveu conhecer o bar da praa central, que ficava num bairro fora de mo. No bar, que estava ento movimentadssimo, no havia ningum. Quando Cisco entrou no bar, uma pessoa que estava do outro lado da praa o empurrou, e ele estatelou-se no cho. Abaixando-se um pouco mais, conseguiu alcanar o teto. As lmpadas do lustre, todas apagadas, iluminavam um velho analfabeto, que lia o jornal da cidade, onde, claro, no havia jornal. Cisco piscou com uma das orelhas, que fez um barulho parecido com um bocejo. Nesse momento, as lmpadas, que estavam apagadas, apagaram-se ainda mais, e assim, finalmente, foi possvel enxergar. Cisco e a pessoa que o tinha empurrado comearam a brigar de socos, apesar de que nenhum dos dois tinha braos. A confuso s terminou quando Cisco apartou a briga entre ele mesmo e o desconhecido, atirando para o ar com o revlver apontado para um buraco do soalho, que era feito de terra batida...

Jogo do pssaro voa: A pessoa que manda no jogo vai dizendo, sucessivamente frases do tipo Pssaro voa, borboleta voa, avio voa, cavalo voa etc. Enquanto fala, ergue a mo. Os outros jogadores devem erguer a mo apenas quando o objeto nomeado efetivamente voa. Quem erra, cai fora. Vence o ltimo que ficar.

Exerccios

1. Sujeitos e predicados so normalmente escolhidos de modo a fazer sentido juntos. Com base nesse critrio, a) Descubra o predicado correto, nas chaves abaixo:Meu gato Gregrio {relincha para pedir leite, mia para pedir leite, late de madrugada}.

(In-) compatibilidade entre partes de uma sentena

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O Joo { falou pelo telefone com sua viva, trabalha na fbrica de chocolate, nasceu maior de idade}. O papa {lanou mais uma encclica, abriu oficialmente a temporada de caa, suspendeu por indisciplina o atacante do Corinthians}. O avio {cometeu seu segundo erro de lgica, saiu da rota, concentrou-se em suas tarefas domsticas}.

b) Pelo mesmo critrio do exerccio anterior, aponte o sujeito corretoA {o mudo, o recm-nascido, o homem que todos apontavam como culpado} falou: assim no d. {A porta, A enxada, A pgina central} est rangendo por falta de leo nas dobradias. {O dente, O piano de cauda, O vidro de comprimidos}teve que ser submetido a tratamento de canal. {O papel mata-borro, O mico-leo dourado, O atual diretor do meu instituto} est em extino. 2. Escolha os objetos apropriados para os verbos, nas duas listas abaixo:

debulhar podar britar acender desentupir ligar descascar cabular desassorear

rvores frutas cereais canos, esgotos aparelhos eletrodomsticos aulas pedras rios, crregos fogo

3. As restries de seleo nos proporcionam um dos tantos mecanismos textuais de resoluo da ambigidade. Pense nos diferentes sentidos que um bom dicionrio apresentaria para cada uma das palavras grifadas; em seguida, explique o raciocnio por meio do qual escolhemos para elas o sentido que prevalece na frase. O sargento no d mais aperto porque est com a rosca espanada. O namorado no fresco, porque suas guelras esto esverdeadas. No deixe os brigadeiros no sol, que eles ficam com gosto de sabo. O cavalo perdeu um pra-lama no acidente. O macaco agenta at 3000 quilos, desde que o cho seja firme e ele esteja bem calado. Batida com acar deixa qualquer um etilizado.

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

As projees do governo baseiam-se em dados viciados Essa preguia nasceu em cativeiro.4. Os termos integrantes de uma orao so sempre escolhidos de modo a dar

certo com o verbo. Por isso, conhecendo o verbo de uma sentena, podemos s vezes prever, dentro de certos limites, quais sero os termos integrantes. Teste essa previsibilidade completando os espaos vazios no texto que segue. Escolha, para cada espao, um dos nomes propostos como opes.

Ingredientes: 1 kg de batata 2 gemas 100g de farinha de trigo 1 colher de manteiga a escumadeira, as batatas o espremedor de batatas, a manteiga gemas, pedacinhos pequenos Modo de preparo Cozinhe _________________________e esprema-as ainda quentes. Acrescente ____________________, misture bem e deixe esfriar. Quando estiver frio, junte as gemas e _____________________________. Amasse bem e corte em ______________________. Coloque __________________ para ferver. Quando os gnocchi, duas pedras estievr fervendo, jogue ______________________ e espere que subam na panela. Retire com uma escumadeira e coloque em ____________________ de servir. Cubra com o molho de sua preferncia. um recipiente, uma escumadeira a gua, a farinha as batatas, a manteiga

(In-) compatibilidade entre partes de uma sentena

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5. Frases como a orelha do urso rasgou ou a mo do santo esfarelou no so boas se o urso for um bicho e o santo for uma pessoa; mas essas mesmas frases tornam-se perfeitamente possveis se o urso for de pano e se o santo for uma esttua de gesso. Invente uma histria em que uma das frases abaixo possa ser interpretada O rabo do cavalo quebrou A gua da lagoa furou A fumaa do trem caiu O azul do cu manchou etc. 6. Explique o que h de estranho com estes dois dilogos, cujas personagens so um juiz de instruo e um perito designado pelo tribunal: Juiz - O que significa a presena de esperma? Perito - Indica que houve relao sexual. Juiz - Esperma masculino? Juiz - Doutor, quantas autpsias o senhor j realizou em cadveres? Perito - Todas as autpsias que realizei foram em cadveres. 7. Uma lio que no faltava nunca nas gramticas de outros tempos era a dos coletivos. Neste exerccio, vamos fazer a voc a mesma pergunta que as gramticas normalmente faziam, mas lembrando que a relao entre nome comum e coletivo sempre envolve restries de seleo. Na matriz que segue, coloque um x na(s) casa(s) que indica(m) a(s) correspondncia(s) correta(s) entre as linhas e as colunas.

Rebanho

Manada

Alcatia

Colnia

Enxame

Matilha

Nuvem

Cfila

Tropa

Burros Camelos Carneiros Elefantes Formigas Abelhas Ces de caa Lobos Porcos Gafanhotos

Vara

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

8. Nos anncios imobilirios que voc ler a seguir, os nomes dos imveis no aparecem, mas algumas de suas caractersticas so apresentadas com grande destaque. Tomando por base essas caractersticas, procure descobrir se esses anncios promovem uma casa, um apartamento, uma chcara etc.Campo dos Amarais. Pequena entrada e prestaes. 1000 metros quadrados, sem benfeitorias. Excelente negcio para valorizao futura. Ligar para 239-1501. Cobertura. Bairro dos Alecrins. 350 m2 de puro luxo. Mais informaes pelo telefone 239-1501. Recm-construdo. Centro. Vendo todo carpetado. Ed. Cruzeiro do Sul, sala ampla, 3 quartos com AE, banheiro privativo, banheiro social, dependncias completas para empregadas, cozinha, rea de servio, garagem privativa coberta. Dois por andar, acesso direto pelo elevador. Chaves com o Zelador. Pr-fabricada. Madeira tratada segundo mtodo americano. Para negcio rpido. Tratar pelo telefone 239.1501 com Lus. Jardim Chapado prximo a finas residncias. Cercado com 5 fios de arame farpado. 370-0000. Jardim Flamboyant 700 mil Novinha. Fachada colonial. 4 quartos com armrios embutidos, sala de jantar, cozinha, banheiro social com teto solar. Fora: quarto para empregada enorme, WC, lavanderia e bom quintal. Chaves Rua Camargo Pimentel, 272.

9. O revisor do jornal embaralhou os ttulos desses anncios. Ajude-o a recoloclos no lugar apropriado. Hotel em Itatiaia com motor novo 1300, pneus novos, freio a disco em timo estado geral. Tratar Rua Frei Manuel 25. Lampies e fogareiros precisa-se para caminho, servio na cidade. Papis Amlia Ltda. Fone 666-6666. Moas a gs e querosene completo estoque de peas nas Lojas Aladim, Rua Costa Aguiar, 377, Leme. Dlmata com 30 apartamentos inteiramente mobiliados, vendo. Tratar com o proprietrio do Cinema Ideal no horrio de projeo. Motorista macho de boa linhagem, desmamado e vermifugado, compro. Tratar Rua Duque de Caxias, 77 com Telmo. Wolks Sedan 13 a 16 anos. Boa aparncia. Precisa-se para servio externo. Tratar com a indstria de cosmticos Clava rua Carolina Florence, 114. [Fonte: Correio Popular, Campinas]

(In-) compatibilidade entre partes de uma sentena

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10. O texto de Lus Fernando Verssimo que voc vai ler a seguir mostra duas personagens falando as mesmas coisas de duas realidades muito diferentes. O equvoco dura at o final. Explique o que isso tem a ver com restries de seleo.Parole, parole, parole De uns tempos para c eu s penso naquilo Eu penso naquilo desde os meus, sei l. Onze anos. . E o tempo todo. No. Eu, antigamente, pensava pouco naquilo. Era uma coisa que no me preocupava. Claro que a gente convivia com aquilo desde cedo. Via acontecer nossa volta, no podia ignorar. Mas no era, assim, uma preocupao constante. Como agora. Pra mim sempre foi, alis eu no penso em outra coisa. Desde criana? De dia e de noite. E como que voc conseguia viver com isso desde criana? Mas uma coisa natural. Acho que todo mundo assim. Voc que anormal, se s comeou a pensar naquilo nessa idade. Antes eu pensava, mas hoje uma obsesso. Fico imaginando como ser. O que que vou sentir. Como ser o depois. Voc se preocupa demais. Precisa relaxar. A coisa tem que acontecer naturalmente. Se voc fica ansioso pior. A sim, a coisa se torna uma angstia, em vez de um prazer. Um prazer? Aquilo? Bom, na sua idade no sei. Pra mim o maior prazer que um homem pode ter. quando o homem chega no paraso. Bom, se voc acredita nisso, ento pode pensar naquilo como um prazer. Pra mim o fim. Voc precisa de ajuda, rapaz. Ajuda religiosa? Perdi a f h muito tempo. Da ltima vez que falei com um padre a respeito, s o que ele me disse foi que eu devia rezar. Rezar muito, para poder enfrentar aquilo sem medo. Mas voc foi procurar logo um padre? Precisa de ajuda psiquitrica. Talvez clnica, no sei. Ter pavor daquilo no saudvel. E eu no sei? Eu queria ser como voc. Viver com a expectativa daquilo naturalmente, at alegremente. Ir para aquilo assoviando. Ah vou. Assoviando e dando pulinho. Olhe, j sei o que eu vou fazer. Vou apresentar voc a uma amiga minha. Ela vai tirar todo o seu medo. J sei, uma dessas transcendentalistas. No, daqui mesmo. Codinome Biba. Com ela tiro e queda. Figurativamente falando, claro.

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

Hein? O qu? Do que ns estamos falando? Do que voc est falando? Daquilo, da morte. Ah. E voc? Esquece.

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DefiniesObjetivo

Mostrar como se podem formular definies claras e corretas, apontando os defeitos mais comuns desse tipo de texto.Caracterizao geral

Uma definio um pequeno texto em que se formula o significado de uma palavra. Em geral, ao definir uma palavra, identificamos a classe maior qual pertencem os objetos que ela nomeia e, em seguida, apontamos as propriedades que distinguem esses objetos no interior dessa classe maior, como nestes exemplos:[Monarquia] [uma forma de governo] [em que o poder supremo exercido por uma s pessoa]expresso que recorta uma subclasse, dentro da classe maior.

palavra que se quer definir

expresso que delimita uma classe maior

[Tringulo]

[um polgono]

[de trs lados].

Material lingstico

Os verbos que mais aparecem nas definies so: ser, significar, consistir, constituir... As razes para definir podem ser vrias: Aumentar o vocabulrio diante de palavras desconhecidas, pode ser interessante definir para melhor compreenso do que foi dito. Eliminar ambigidades quando uma palavra ambgua em um contexto, isto , quando no est claro em qual de seus sentidos est sendo usada, convm definir (1) para evitar que se tirem concluses falsas; (2) para evitar discusses meramente verbais. Tornar exatos os limites de aplicao de palavras conhecidas, mas vagas. Por exemplo: Neste texto, entenderemos por montanha toda elevao do terreno com mais de 500 metros acima do nvel do mar. Neste contrato, produto significa o inseticida PHD, objeto da presente transao comercial O que uma boa definio no deve ser:

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Introduo ao estudo do lxico brincando com as palavras

Uma mera enumerao de exemplos: Arranha-cus so, por exemplo, os edifcios tal e tal (se, por acaso, os dois edifcios ficam na rua principal da cidade, algum poderia entender que todo prdio da rua principal da cidade um arranha-cu). Circular: azul a cor do que azul ou Confiana a qualidade de quem confia. Obscura uma definio obscura quando usa termos mais difceis do que a palavra que pretende definir, possivelmente desconhecidos da pessoa a quem se destina etc. Quimioterapia uma forma de tratamento oncolgico [...] (possivelmente as pessoas que no sabem o que quimioterapia, sabem menos ainda o que significa oncolgico). Demasiado ampla: Sapato uma coisa que se pe nos ps (as meias tambm cobrem os ps). nibus um veculo motorizado que transporta passageiros (essa definio serve tambm para txi etc.) Demasiado estreita: Bonde o veculo que circula no Parque Taquaral, em Campinas (no mundo, existem outros bondes, alm do que circula aos domingos na Lagoa do Taquaral em Campinas) Figurada: A arquitetura msica congelada, Uma rvore um cabide de folhas, Um pente um coador de piolhos Negativa quando pode ser positiva: Um div no uma cama nem uma cadeira (a av do presidente do Senado tambm no uma cama nem uma cadeira)Atividade Leia este texto, extrado das memrias do psiclogo e filsofo americano William James (1842-1910) e, em seguida, discuta a afirmao de que uma definio pode evitar uma discusso meramente verbal.H alguns anos, quando participava de um grupo de camping, nas montanhas, voltei de um passeio solitrio encontrando todos, no acampamento, empenhados numa feroz discusso metafsica. O objeto da discusso era um esquilo um esquilo vivo que se supunha estar trepado de um lado de um grosso tronco de rvore, enquanto que, prximo, no lado oposto da rvore, imaginava-se que um homem estivesse parado. Este homem experimentava ver o esquilo e, para consegui-lo, corria ao redor da rvore mas, por mais depressa que se deslocasse, o esquilo movia-se com velocidade igual na direo oposta, mantendo sempre a rvore entre ambos, de modo que o homem jamais conseguia ver o animal. O problema metafsico resultante o seguinte: o homem movese ou no ao redor do esquilo? Ele move-se ao redor da rvore, sem dvida, e o esquilo est na rvore. Mover-se-, ento, o homem, tambm ao redor do esquilo? No cio ilimitado da vastido dos campos, a discusso chegara ao fim. Todos haviam tomado partido e cada um obstinava-se em sua posio. O nmero de adeptos de cada parte era igual. Por isso, quando reapareci, as partes apelaram para mim, a fim de lhes pro-

Definies

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porcionar a maioria. Lembrei-me do adgio escolstico, segundo o qual, sempre que nos deparamos com uma incoerncia, conveniente fazer uma distino: imediatamente procurei e encontrei uma, que era a seguinte: Decidir qual das partes tem razo, disse eu, depende do que cada uma quer dizer, praticamente, quando fala de andar ao redor do esquilo. Se o que entendem por isso que se passa de norte do esquilo para leste, depois ao sul, depois ao oeste e, depois, novamente ao norte, obviamente o homem desloca-se ao redor do esquilo visto que ocupa essas posies sucessivas. Mas se, pelo contrrio, o que se quer dizer estar primeiro em frente dele, depois sua direita, logo detrs e depois sua esquerda, para voltar a estar diante do esquilo, totalmente bvio que o homem no anda volta dele, dado que, em virtude dos movimentos compensatrios feitos pelo pequeno animal, este conserva o seu ventre sempre voltado para o homem e o lombo sempre do lado mais distante. Faam tal distino e cessar o motivo para qualquer disputa. Ambas as partes esto certas e ambas erradas, segundo o que entendem pela expresso andar de volta, seja de uma maneira prtica ou de outra. Embora um ou dois dos contendores mais acalorados qualificassem a minha fala de evasiva e artificiosa, dizendo que no eram argcias ou sutilezas escolsticas o que queriam, mas simplesmente o que em bom ingls queria dizer em volta de, a maioria pareceu admitir que a distino resolvera a disputa. Irving Copi, Introduo Lgica de S.Paulo, Mestre Jou.

Exerccios

1. Decida se estas definies so boas: (a) uma substncia branca, leve, utilizada para construir geladeiras portteis e bias de piscina. (isopor) (b) um instrumento que serve para apertar (alicate) (c) um animal sem penas que voa (morcego) (d) um padre que usa batina, sandlias e um cordo (franciscano) (e) uma bebida obtida pela destilao de cereais (vodca) (f) um programa de televiso feito ao vivo (programa de auditrio) (g) um barco movido a vela, t