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LETRAS LIBRAS|165 LITERATURA VISUAL

Literatura Visual

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Literatura Visual

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  • LETRAS LIBRAS|165

    LITERATURA

    VISUAL

  • LETRAS LIBRAS|166

  • LETRAS LIBRAS|167

    LITERATURA VISUAL

    Shirley Porto

    Janana Peixoto

    INTRODUO

    Pensar em literatura visual pensar em uma modalidade de produo literria que utiliza a

    viso como principal fonte de captao da informao. Nesta disciplina trabalharemos com a

    literatura visual como rea de conhecimento que nos possibilitar conhecer um pouco mais as

    possibilidades de apropriao, produo e fruio do texto literrio sinalizado.

    Para refletir sobre literatura visual preciso que pensemos que esta modalidade de texto

    surgiu no momento em que as pessoas surdas se apropriaram do saber sobre o poder de

    produo imagtica de sua lngua.

    De acordo com Sutton-Spencer (2005) se nos reportarmos histria da literatura e a

    histria das pessoas surdas poderemos ver que at o sculo XVIII no existiam comunidades

    surdas como as que conhecemos hoje.

    As formaes das comunidades surdas so fruto do movimento cientfico, social,

    educacional e cultural da Modernidade7. O movimento cientfico possvel de ser exemplificado

    por pesquisas ocorridas entre os sculos XIV e XV, realizadas por Rodolpho Agrcola e Girolamo

    Cardano sobre a no relao entre o sistema fonatrio e a possibilidade de acessar informao do

    crebro. Agrcola, a partir da realizao de pesquisas com um Surdo8 mostrou que este era capaz

    de aprender a falar, ler e escrever. (SKLIAR, 1996 e 1997)

    7 Para este trabalho localizaremos, de modo simples, a Modernidade no perodo histrico aps a Idade Mdia, surgido com uma ordem mundial de pensamento do homem sobre si mesmo como centro do universo, pelo inicio da economia liberal, possibilitada pelo capital da burguesia como classe em ascenso, pelas grandes navegaes, por uma viso de que a produo do conhecimento cientfico acontece, por analogia, como o conhecimento das engrenagens e movimentao de um relgio. 8 O uso da letra S maiscula delimita uma viso poltica sobre a surdez, compreendendo o Surdo como sujeito de direitos lingsticos, sociais, educacionais, culturais diferente dos ouvintes.

  • LETRAS LIBRAS|168

    O surgimento das comunidades surdas possibilitou a produo literria sinalizada, mesmo

    que esta tenha se perdido devido ao amordaamento lingustico e cultural vivido pelos Surdos a

    partir da hegemonia oralista.

    Como qualquer atividade humana, as produes literrias, enquanto construes coletivas,

    contribuem com a organizao de nossa viso sobre o mundo e esto aliceradas em uma cultura

    que influencia a lgica da lngua, significando e dando sentido ao modo como desenvolvemos

    nossas relaes com o outro.

    Em meados do sculo XVIII e at a penltima dcada do sculo XIX os movimentos sociais

    dos Surdos e a formao das comunidades surdas possibilitaram que estes tambm exercitassem

    de modo literrio sua lngua.

    No entanto, com o advento do oralismo em 1880 e consequentemente com o

    esfacelamento das comunidades surdas, grande parte deste acervo se perdeu, pois, como a lngua

    de sinais ainda no tinha registro escrito, toda a sua produo existia apenas nas mentes dos

    participantes das comunidades e eram passadas de pessoa para pessoa.

    Se a aproximao dos Surdos que possibilita o surgimento da literatura visual responda as

    seguintes questes:

    1) De que modo o oralismo interferiu nas possibilidades de desenvolvimento da lngua de sinais.

    2) Quais so os momentos, no movimento histrico, vividos pelos Surdos que possibilitam seu

    agrupamento e consequentemente o desenvolvimento da lngua de sinais.

    3) Voc j sabia que os Surdos tambm produzem literatura ou que, mesmo sem produzir eles

    podem ter acesso a esse bem cultural por meio de tradues para a lngua de sinais?

    Na atualidade podemos considerar trs tipos de produes literrias visuais. A primeira

    est relacionada a traduo para a lngua de sinais dos textos literrios escritos; a segunda fruto

    de adaptaes dos textos clssicos a realidade dos Surdos e por fim, o tipo que realmente

  • LETRAS LIBRAS|169

    representa o resgate da literatura Surda que a produo de textos em prosa ou verso feitos por

    Surdos.

    Nesta disciplina nos deteremos ao estudo do conto como gnero literrio traduzido e a

    produo de textos por Surdos. Os contos por ns abordados sero um texto de Machado de

    Assis, renomado contista brasileiro e um conto clssico infantil. Os textos produzidos por Surdos

    sero as piadas de Surdos e poemas sinalizados.

  • LETRAS LIBRAS|170

    UNIDADE I

    O CONTO TRADUZIDO PARA A LIBRAS

    Nesta unidade, primeiro vamos discutir o conto como gnero literrio e construir uma

    definio acerca do que vem a ser o conto, a partir da forma que o caracteriza.

    De modo bem simples, o conto uma narrativa mais curta que o romance. Uma narrativa

    um relato com aes interligadas por um nexo lgico, podendo ser baseado em fatos reais ou

    imaginrios. Sua estrutura basicamente composta dos seguintes elementos estruturais: as

    personagens, o fato acontecido, a descrio de como ocorre o episdio, o lugar/lugares, os

    momentos nos quais os fatos acontecem, a causa. (SALLES, 2004)

    Agora vamos ver como podemos encontrar os elementos estruturais colocados acima no

    conto O caso da vara, de Machado de Assis.

    SOBRE MACHADO DE ASSIS

    Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contista, dramaturgo, jornalista,

    poeta, novelista, romancista, crtico e ensasta, nasceu na cidade do Rio de

    Janeiro em 21 de junho de 1839. Filho de um operrio mestio de negro e

    portugus, Francisco Jos de Assis, e de D. Maria Leopoldina Machado de

    Assis, aquele que viria a tornar-se o maior escritor do pas e um mestre da

    lngua, perde a me muito cedo e criado pela madrasta, Maria Ins,

    tambm mulata, que se dedica ao menino e o matricula na escola pblica,

    nica que frequentar o autodidata Machado de Assis.

    Texto retirado de

    http://www.releituras.com/machadodeassis_bio.asp

    Outras fontes para informao sobre Machado de Assis

    http://www.machadodeassis.org.br/

    SCHWARZ, Roberto. Um mestre na periferia do capitalismo: Machado de Assis. So Paulo: Duas Cidades. Ed. 34, 2000.

    Outras fontes de pesquisa

    http://www.machadodeassis.org.br/

    http://www.releituras.com/machadodeassis_bio.asp

  • LETRAS LIBRAS|171

    AGORA RESPONDA EM LIBRAS E REGISTRE EM VDEO:

    Quem so as personagens da histria?

    Qual o fato acontecido?

    Como se desenvolve o episdio?

    Quando se passa o evento?

    O que gera o evento?

    possvel com a leitura de O caso da vara fazer um paralelo entre as relaes de poder entre

    brancos e negros no sculo XIX e as relaes de poder entre ouvintes e Surdos no mesmo perodo?

    Vamos agora estudar um conto clssico infantil Pinquio. Este texto de Carlo Collodi de

    1883.

    Assista ao conto O caso da vara, traduzido numa perspectiva de traduo

    cultural para a Libras por Heloise Gripp Diniz e Roberto Gomes de Lima. O

    texto a ser lido est no volume 7 (sete) da Coleo Clssicos da Literatura em

    Libras/portugus, produzido pela Editora Arara azul com o apoio do

    MEC/SEESP e do FNDE.

    Assi

    Agora com voc

    Carlo Collodi, pseudnimo de Carlo Lorenzini, (Florena, 24 de

    novembro 1826 26 de outubro 1890) foi um jornalista e escritor

    italiano do sculo XIX, famoso por haver criado o Pinquio.

    Pinquio , sem dvida, a criatura que engoliu o criador: o mais

    famoso personagem da literatura infantil, conhecido em todo o

    planeta, poucos so os que efetivamente apontam reconhecer em

    Collodi o seu criador

    Lorenzini morreu repentinamente em 1890, na sua cidade natal,

    onde foi sepultado.

    Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Carlo_Collodi

  • LETRAS LIBRAS|172

    AGORA RESPONDA EM LIBRAS E REGISTRE EM VDEO:

    1) Quem so as personagens da histria?

    2) Qual o fato acontecido?

    3) Como se desenvolve o episdio?

    4) Quando se passa o evento?

    5) O que gera o evento?

    6) possvel utilizar o texto Pinquio para falar das relaes entre as pessoas?

    Assista o texto Pinquio, traduzido numa perspectiva de traduo cultural para a

    Libras por Heloise Gripp Diniz e Roberto Gomes de Lima. O texto a ser lido est no

    volume 3 (trs) da Coleo Clssicos da Literatura em Libras/portugus, produzido

    pela Editora Arara azul com o apoio do MEC/SEESP e do FNDE.

    Assi

    Agora com voc

  • LETRAS LIBRAS|173

    UNIDADE II

    AS PIADAS DE SURDOS

    No h nos textos tericos lidos por ns informaes acerca das piadas como elemento

    literrio, mas possvel agregar a piada ao exerccio de produo de imagens das lnguas.

    Todas as lnguas podem produzir piadas, a diferena est em como cada cultura e cada

    povo elege os elementos a serem ressaltados na construo das piadas.

    No caso dos Surdos as piadas em Libras so contadas e recontadas em rodas de conversas

    e tm a surdez, a lngua de sinais e a relao surdos/ouvintes como as possibilidades mais

    recorrentes.

    Pesquisar sobre a temtica mais recorrente nas piadas produzidas pelos

    Surdos em sua cidade ou na internet. Pesquisar, pelo menos, trs piadas.

    Fazer entrevista com Surdos que gostam de contar piadas e buscar apreender

    informaes sobre os elementos da lngua realados para a construo das

    piadas.

    Pe

    Agora com voc

  • LETRAS LIBRAS|174

    UNIDADE III

    A POESIA SURDA

    Todas as expresses culturais esto impregnadas das concepes de homem, mundo e

    sociedade de seus autores. Com relao aos Surdos no diferente e, particularmente para esta

    pesquisa, a poesia em lngua de sinais dos Surdos poetas-sinalizadores, culturalmente se

    constituem diferentes da dos ouvintes.

    De acordo com Sutton-Spence (2005), de um modo geral, no h evidncias da existncia

    de poemas em lngua de sinais antes de 1960. Por outro lado, registros apresentados em Fischer e

    Lane (1993) nos informam que existiam poetas Surdos nos sculos XVIII e XIX. Provavelmente, a

    no especificao de que esses poetas, alm de produes escritas tinham, tambm, poemas em

    lngua de sinais, se deva pela impossibilidade de registro do poema sinalizado naquele momento,

    o que levou, aps todo o perodo de negao da lngua de sinais no oralismo, perda cultural

    dessa possibilidade de produo e expresso literria.

    Atualmente, Ormsby (1995) citado por Sutton-Spence (2005, p.17) sugere que [...] a

    poesia em lngua de sinais no tem sua raiz na comunidade surda e que construes do tipo a

    tradio potica das lnguas de sinais ou a poesia da comunidade surda levam a grandes

    equvocos conceituais.

    De acordo com o j citado autor e outros autores americanos (KLIMA e BELUGI, 1979; ROSE

    1992; VALI, 1993) utilizados como referncia por Sutton-Spence (2005), apesar de a poesia em

  • LETRAS LIBRAS|175

    lngua de sinais no ser uma tradio cultural da comunidade surda, vrios so os valores de sua

    produo: credibilidade e avano da lngua de sinais estabelecidos pelos estudos feitos s poesias

    sinalizadas; diverso proporcionada pela poesia, uma vez que os humanos so naturalmente

    animais brincalhes e que brincam com a linguagem pelo simples prazer que isto proporciona

    (p.18); contribuio na construo de uma identidade surda positiva, pois os poemas podem ter a

    surdez como temas possveis, mas seu foco est na diferena entre Surdos e ouvintes e no na

    deficincia, entre outros aspectos explicitamente colocados quando a autora relaciona os valores

    da poesia de Doroth Miles (1931 1993), considerada como a figura chave da poesia em lngua de

    sinais, tanto nos Estados Unidos, quanto na Inglaterra.

    DOROTH MILES

    Dorothy Miles, tambm conhecida como Dot (1931-1993), foi uma das

    pioneiras da poesia em ASL (lngua de sinais americana)/BSL (lngua de sinais

    britnica), ela tambm era uma poeta em Ingls. Ela foi contepornea dos

    poetas em ASL Clayton Valli e Ella Lentz.

    Nascido em Gwernaffield, Pas de Gales do Norte em 1931, a sua lngua

    materna era o Ingls. Como ela se tornou surda aos oito anos, ela mais tarde

    freqentou escolas para surdos, na Inglaterra, onde a British Sign Language

    (BSL) foi utilizado. Frequentou Gallaudet University, em 1957, onde comeou a

    aprender ASL. Ela recebeu um BA, com distino, Universidade Gallaudet em

    1961 e, finalmente, estabeleceu-se em os EUA

    Nos EUA, ela foi inspirada pelo uso da linguagem gestual no Teatro Nacional de

    Surdos (DTN), e comeou a perseguir na traduo em linguagem gestual e

    poesia, em que ela fez contribuies para a ASL poesia e literatura. Depois de

    20 anos em os EUA, ela retornou Inglaterra em 1977, onde continuou suas

    influncias e trabalha em BSL e poesia Ingls. Para o resto de sua vida, ela

    continuou a compor a poesia em Ingls e em BSL, em que ela estava confortvel

    com ambas as lnguas.

    Referncias

    Sutton-Spece, Rachel. Sutton Spece, Rachel. "Dorothy Miles". "Miles Dorothy".

    European Cultural Heritage Online (ECHO), December 2003. Online Patrimnio

    Cultural Europeu (ECHO), dezembro de 2003.

    FONTE: http://www.handspeak.com/byte/m/index.php?byte=milesdot

  • LETRAS LIBRAS|176

    Ainda segundo Sutton-Spencer (2005), a importncia da poesia de Doroth Miles est no

    otimismo mostrado pela possibilidade de controle da comunidade surda de seu prprio destino,

    na explicitao da necessidade de fortalecimento da identidade dos Surdos, como uma forma de

    luta contra a opresso sofrida vinda dos ouvintes. Por fim, para a referida autora, seus poemas

    mostram indignao, mas freqentemente tm um tom brincalho, contendo e mostrando a fora

    psicolgica, a vontade de luta e a capacidade de revolta que os Surdos tm que ter no mundo dos

    ouvintes.

    O valor literrio do poema existe para alm da emprica percepo potica vislumbrada,

    em portugus, pela estrutura do texto em versos, ou em Libras, por uma ao performtica do

    poeta.

    Acerca dessa questo, para Bosi (1996) a qualidade da obra potica est na sua essncia

    que, maximizada pela habilidade do poeta na utilizao e emprego da mtrica e da organizao do

    texto, constri uma nova possibilidade de elocuo, capaz de abrir portas para um novo

    conhecimento. Neste sentido, acreditamos que a produo de Nelson Pimenta apresenta essa

    possibilidade, visto que para Jauss (1994), h uma natureza eminentemente libertadora na arte e

    na literatura, pois ambas tm a capacidade de transgredir e comunicar simultaneamente atravs

    da experincia esttica. Experincia que permite ao leitor, ao identificar-se com uma obra seja por

    aproximao ou estranhamento, questionar-se, refletir sobre seu entorno social, poltico,

    econmico, ampliando atravs de reconstruo psicolgica, o que ele chama de horizonte de

    expectativa.

    NELSON PIMENTA

    Nasceu em Braslia em 1963. Primeiro ator surdo a se profissionalizar no Brasil,

    estudou no NTD (National Theatre of the Deaf), de Nova York. pesquisador

    de Lngua de Sinais e j atuou como instrutor de Teatro e de Lngua de Sinais

    Brasileira em diversas instituies de ensino, entre elas o Ines (Instituto

    Nacional de Educao de Surdos) e a Feneis (Federao Nacional de Educao

    e Integrao de Surdos). Atualmente, faz curso de graduao em Cinema na

    Universidade Estcio de S, coordena as aes de teatro e expresso corporal

    da Arpef (Associao de Reabilitao e Pesquisa Fonoaudiolgica), preside o

    ILSB (Instituto de Lngua de Sinais Brasileira) e professor de Teatro no Centro

    Educacional Pilar Velazquez.

    FONTE: http://www.paulinas.org.br/loja/DetalheAutor.aspx?idAutor=13278

  • LETRAS LIBRAS|177

    O ESTUDO DO POEMA LNGUA FALADA E LNGUA SINALIZADA, DE NELSON PIMENTA9

    O poema que vamos estudar uma produo da LSB vdeo, empresa especializada em

    materiais educativos para Surdos.

    O poema a seguir trata da relao entre surdos e ouvintes. Em muito retrata a

    autobiografia do seu autor, que aprendeu muito sobre como lutar pelos direitos dos surdos aps

    viagem aos Estados Unidos, onde tambm conheceu a poesia em lngua de sinais.

    1 DESENVOLVER RVORE 5 BASE IGUAL DESENVOLVER RVORE

    2 DESENVOLVER RVORE 6 DESENVOLVER RVORE

    3 DESENVOLVER RVORE 7 DESENVOLVER RVORE

    4

    articulao labial de abrir e fechar lbios

    FALAR FALAR FALAR (mos em forma genuna semi-aberta, com dedos curvos unidos paralelos ao polegar, movimento de abrir e fechar)

    8 articulao labial OI, OI, OI

    OI OI OI LNGUA-DE-SINAIS,

    LNGUA-DE-SINAIS, LNGUA-DE- [SINAIS

    9 FALANTE+ 2pOLHAR1p SINALIZADOR+ 2pOLHAR2p

    10

    ....expresso facial de desprezo... exp. f. "autoritria"

    2pOLHAR1p 2pOLHAR2p 2pOLHAR1p

    2pMANDAR1p CALAR CALAR

    11

    exp. f. "autoritria"

    CALAR VOC

    12

    negativa com balanar de cabea

    NO

    13

    exp. f. "autoritria"

    CALAR VOC

    14

    negativa com balanar de cabea

    NO

    9 Este texto de anlise do poema lngua falada e lngua sinalizada,de Nelson Pimenta foi retirado da minha dissertao de mestrado.

  • LETRAS LIBRAS|178

    15 pessoa cabea para baixoDESCER

    16 kPESQUISARk'para baixo kPESQUISARk'para baixo kPESQUISARk'para baixo

    17

    ...expresso facial "uso de fora"...

    ambiente 1 1iEU-SAIR3k ambiente 2

    18 PEIXE PEIXE

    19 pessoa cabea para cimaSUBIR GUA-PASSAR-ROSTO FICAR-OMBROS

    20 PESSOA PESSOA

    21 CONHECER-NO CONHECER-NO NADA LNGUA-DE-SINAIS

    22

    exp.f "desinteresse"

    LIGAR-NO

    23

    .................................................exclamativo.............................................................

    FLOR ABRIR BRILHAR// FLOR ABRIR BRILHAR// FLOR ABRIR BRILHAR

    24

    ...i....

    O-QU // NADAR NADAR NADAR EU-APROXIMAR

    25

    mos em d ...i...

    PESSOAS-EM-P APROXIMAR-EU//SINAL O-QU

    26

    mos em d

    SINAL IGUAL LNGUA-DE-SINAIS//

    27

    mos em d ...int...

    SINAL IGUAL LNGUA-DE-SINAIS

    28

    exp.f "agrado"

    BONITO

    29 EU-GOSTAR

    30 FALANTE+ 3POLHAR2P

    31 3POLHAR3P 3PMANDAR2P

  • LETRAS LIBRAS|179

    32

    exp.f."autoritria"

    CALAR

    33

    exp.f."autoritria"

    CALAR

    34

    negativa com balanar de cabea

    NO

    35

    exp.f "desprezo" e "dar de ombros"

    SINALIZAD@ SINAL^CONTINUAR

    36 iCONVIDARk APRENDER

    37 APRENDER APRENDER APRENDER

    38 AMOR

    39 FLOR 2sjCORTAR RAIZ R-A-I-Z 2sjDAR1si

    40

    exp. f "prazer contido"

    desenho em formato de corao CORAO GUARDAR.

    41

    exp. f "felicidade"

    SALTAR

    42 exp. f "felicidade"

    SALTAR

    43

    exp. f "felicidade"

    SALTAR coisa-plana (mo em b)VOAR

    44

    articulao labial

    TCHAU coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    45 OBRIGAD@ 1pAJUDAR1s

    46 OBRIGAD@ 1pAJUDAR1s

    articulao labial

  • LETRAS LIBRAS|180

    47 BYE coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    48 articulao labial

    BYE coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    49 coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    50 coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    51 coisa-plana (mo em b) kVOAR-SOBRE-NUVENSi

    52 coisa-plana (mo em b) kATERRISSAR-SOBRE-CHOk'

    53

    muito

    GRUPO TODOS FALAR

    54 1SOLHAR3P GRUPO-FALAR

    55 1SOLHAR3P GRUPO-SINALIZAR

    56

    exp. f "felicidade", "enlevo" muito

    CORAO ABRIR TIRAR LNGUA-DE- SINAIS COMEAR SINALIZAR

    57

    exp.f "desagrado"

    3pkOLHAR1di SINALIZADOR+

    58

    exp.f "desagrado"

    3pkOLHAR3di

    59 3pkMANDAR3di PARAR SINALIZAR

    60 1s2ESPERAR VOC-GRUPO

    61 CORAO ABRIR TIRAR LNGUA-DE-SINAIS COMEAR

    62

    muito

    SINALIZAR

  • LETRAS LIBRAS|181

    63

    muito

    SINALIZAR

    64

    muito

    SINALIZAR

    65 exp. f "sorriso"

    UNIO

    Uma possvel traduo

    Lngua sinalizada e Lngua falada

    A lngua falada uma rvore que

    se desenvolve, desenvolve, desenvolve

    E os falantes, falam, falam, falam.

    Da mesma forma a lngua sinalizada

    uma rvore que

    se desenvolve, desenvolve, desenvolve

    Oi, Oi, Oi, sinalizao, sinalizao, sinalizao

    At que os falantes nos olham.

    entreolham se...

    Olham-nos...

    e mandam-nos: - cale-se! cale-se!

    - Cale-se!

    - No!

    - Cale-se!

    - No!

    Submergi.

    Procurei nas profundezas

    Sa para outras guas

    Peixes passam na minha frente

    Emergi

    E vi pessoas

  • LETRAS LIBRAS|182

    No conheo nada dessa lngua de sinais

    No me interesso.

    Ao largo vejo flores que brilham e brilham e brilham...

    O que aquilo? Nado, nado, nado, nado ao seu encontro.

    Quando me aproximo eles sinalizam diferente,

    de um jeito que no entendo.

    - Essa sinalizao faz parte da lngua de sinais.

    - Essa sinalizao faz parte da lngua de sinais?

    Que bonito!

    Gostei!

    C esto os ouvintes que olham os sinalizadores

    Entreolham-se...

    e mandam

    - Cale-se!

    - Cale-se!

    - No!

    Os sinalizadores continuam sinalizando

    Sou convidado a aprender

    E eu aprendo, aprendo, aprendo...

    Amo!!!

    Da flor, sua raiz me dada.

    E a guardo no corao...

    Felicidade.

    Felicidade.

    Felicidade ...

    - Tchau...

    - Obrigado pela ajuda!

    - Obrigado pela ajuda!

    - Bye!

    - Bye!

    Vo...

    Vo ...

    Vo de volta

  • LETRAS LIBRAS|183

    Aterrissagem, os sinalizadores esto todos calados.

    Vejo o grupo dos falantes todos falam, falam, falam

    Olho para os falantes.

    Olho para os sinalizadores.

    Abro meu corao e dou aos sinalizadores, sinalizao,

    sinalizao, sinalizao...

    Os falantes nos olham.

    Entreolham-se e no se agradam.

    - Parem!

    - Esperem vocs!

    Do corao, meu corao novamente dou a sinalizao

    Sinalizao

    Sinalizao

    Sinalizao

    Todos, surdos e falantes, unidos.

    Para situar os leitores que desconhecem a Libras, optamos por iniciar nossos comentrios

    fazendo algumas reflexes e esclarecimentos sobre a formulao deste poema.

    Como a lngua de sinais uma lngua de construo espacial-visual, dois grupos so

    colocados lado-a-lado espacialmente, o grupo dos sinalizadores usurios da lngua sinalizada, e o

    dos falantes usurios da lngua oral. Por todo o texto esses espaos se mantm, havendo uma

    regularidade de uso das duas mos, sem predomnio da mo esquerda ou direita. Podemos, assim,

    visualizar claramente a construo de dois grupos que so semanticamente marcados por duas

    imagens. Inicialmente, de desenvolvimento similar de suas lnguas. Um pouco mais adiante, de

    confronto.

    No incio, os versos 1, 2, 3 e 4 apresentam o desenvolvimento da lngua falada. Do mesmo

    modo, os versos 5, 6, 7 e 8 apresentam o desenvolvimento da lngua sinalizada:

    1 DESENVOLVER RVORE 5 BASE IGUAL DESENVOLVER RVORE

    2 DESENVOLVER RVORE 6 DESENVOLVER RVORE

    3 DESENVOLVER RVORE 7 DESENVOLVER RVORE

  • LETRAS LIBRAS|184

    A partir dos versos 9 a 14 simetricamente o texto marcado pela dominncia da mo que

    representa os falantes, mas a mo que representa os sinalizadores, apesar de ser colocada em

    atitude mais passiva no deixa o espao de sinalizao desse grupo vazio. Estes, podemos

    considerar como sendo um dos exemplos desse cuidado simtrico:

    9 FALANTE+ 2pOLHAR1p SINALIZADOR+ 2pOLHAR2p

    10

    ....expresso facial de desprezo... exp. f. "autoritria"

    2pOLHAR1p 2pOLHAR2p 2pOLHAR1p

    2pMANDAR1p CALAR CALAR

    11

    exp. f. "autoritria"

    CALAR VOC

    12

    negativa com balanar de cabea

    NO

    13

    exp. f. "autoritria"

    CALAR VOC

    14

    negativa com balanar de cabea

    NO

    Acerca dessa regularidade e do cuidado esttico do no predomnio de uma ou outra mo

    Sutton-Spence (2005, p. 60)10, acrescenta:

    10 Para conferir com o original: On top of this careful symmetry, there is further retention of both hands so that, even when a one-handed sign is articulated on the dominant hand, the non-dominant hand is still maintained in some way.

    4 articulao labial de abrir e fechar lbios

    FALAR FALAR FALAR (mos em forma genuna semi-aberta, com dedos curvos unidos paralelos ao polegar, movimento de abrir e fechar)

    8 articulao labial OI, OI, OI

    OI OI OI LNGUA-DE-SINAIS,

    LNGUA-DE-SINAIS, LNGUA-DE- [SINAIS

  • LETRAS LIBRAS|185

    Alm dessa cuidadosa simetria, h uma reteno adicional de ambas as mos a fim de que,

    mesmo quando um sinal realizado com uma mo articulado com a mo dominante a mo no

    dominante seja ainda mantida de certa forma.

    Essa simetria influencia diretamente o contedo do poema, pois o que primeiro chama a

    ateno a imagem das diferenas de comportamento entre falantes e sinalizadores. Apesar de

    colocar o desenvolvimento das duas lnguas em patamares semelhantes, dado aos falantes,

    atravs da expresso facial e dos olhos, poder sobre os sinalizadores.

    Neste poema, a figura humana o componente principal e desempenha diferentes papis.

    Um grupo, constitudo por falantes, exerce o papel de ordenadores das atitudes dos segundo

    grupo, o dos sinalizadores que se configuram como "obedecedores" dessa ordem. Um dos

    sinalizadores, no entanto, no se deixa subjugar, se nega a acatar a ordem dada, viajando e

    voltando com um conhecimento que lhe permite uma igualdade discursiva que propicia uma

    mudana de atitude no grupo de sinalizadores do qual inicialmente ele fazia parte. Assim, ele

    deixa de ser indivduo discordante, mas sem voz, para se configurar como modelo de no

    aceitao da ordem de parar de sinalizar11.

    Podemos associar duas perspectivas de viagem feita pelo eu lrico. Uma interna de

    descobrimento de si e a outra fsica, de ida a um outro local. As duas, no texto, se fundem na

    possibilidade de auto-conhecimento e, assim, de mudana de atitude.

    Nos versos 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 15 o ritmo, que no princpio, contnuo tem sua

    mobilidade alterada: a velocidade a mesma, mas o sinal carregado de fora, mostrando que a

    atitude de introspeco difcil, como tambm, a procura por um novo espao.

    11 Por todo o poema falantes e sinalizadores so, respectivamente, sinnimos para ouvintes e surdos.

    9 FALANTE+ 2pOLHAR1p SINALIZADOR+ 2pOLHAR2p

    10

    ....expresso facial de desprezo... exp. f. "autoritria"

    2pOLHAR1p 2pOLHAR2p 2pOLHAR1p 2pMANDAR1p CALAR CALAR

    11 exp. f. "autoritria" negativa com balanar de cabea

    CALAR VOC NO

  • LETRAS LIBRAS|186

    O verso, FALANTE+ 2pOLHAR1p SINALIZADOR+ 2pOLHAR2p traz toda a carga de viso da

    relao de desigualdade do ser ouvinte superior e do ser surdo inferior, atravs do modo superior

    do olhar dos falantes, marcado na expresso facial autoritria que no permite que sua ordem

    seja descumprida. As figuras de repetio e gradao, constantes nos versos de 9 a 15, so

    sugestivas da alternncia rtmica do poema.

    No verso seguinte, a expresso facial ainda mais forte, aliando-se ao carter autoritrio

    um olhar com um qu de desprezo. O ritmo alterado, havendo uma fora na realizao dos

    sinais:

    ....expresso facial de desprezo...

    2pOLHAR1p 2pOLHAR2p 2pOLHAR1p 2pMANDAR1p CALAR,

    A repetio do verbo OLHAR de um grupo ao outro, do grupo de falantes entre si e

    novamente dos falantes para os sinalizadores reforam a sugesto de no admisso de

    questionamento do poder, da ordem estabelecida. Acerca da repetio de sinais individuais

    Sutton-Spence (2005, p. 46)12 coloca:

    A repetio de palavras pode parecer paradoxal em uma forma artstica da lngua onde a maioria

    dos possveis significados podem ser extrados em um menor nmero de palavras. No entanto,

    palavras repetidas na poesia adiciona significado extra ao significado que as palavras por si s

    carregam. O efeito da repetio de palavras para trazer ao ambiente os sons ou parmetros

    12 No original: Repeating words migth seem paradoxal in a language art-form where as much meaning as possible is squeezed into as few words as possible. However, repeating words in poetry adds extra significance to the meaning carried in the words alone. The effect of repeating the word is to bring into the foreground the sounds or parameters that make the words as well as the meaning of the words. Repetition is also an important part of building up rhythm in a poema.

    12

    exp. f. "autoritria"

    CALAR VOC

    13 negativa com balanar de cabea

    NO

    14 pessoa cabea para baixoDESCER

    15 kPESQUISARk'para baixo kPESQUISARk'para baixo kPESQUISARk'para baixo

  • LETRAS LIBRAS|187

    que fazem as palavras ou tambm os significados das palavras. Repetio tambm uma parte

    importante da construo do ritmo do poema.

    A negao do direito dos sinalizadores de uso de sua prpria lngua um bloco informativo

    composto pelos sinais em si, pela modulao rtmica e pela expresso facial de desprezo.

    Essa uma problemtica que marca os surdos profundamente, em suas histrias de vida,

    todos tm exemplos de momentos em que lhes foi negado o direito de serem eles mesmos.

    Desse modo, o eu lrico se apresenta como indivduo que vai procura de espao para ser

    um sinalizador livre, vido por aprender mais sobre as possibilidades de sua prpria lngua, mas,

    tambm, se apresenta como coletivo, quando retrata a experincia, que vivida por todos os

    surdos, de negao da lngua de sinais e obrigao de oralizao.

    No incio, o eu lrico est individualizado, por conseguinte, introspectivo, angustiado,

    solitrio. Isso se apresenta nos versos 14, 15 e 16 nos quais o eu, no poema, ao se negar a

    obedecer aos falantes, submerge.

    14 pessoa cabea para baixoDESCER

    15 kPESQUISARk'para baixo kPESQUISARk'para baixo kPESQUISARk'para baixo

    16

    ...expresso facial "uso de fora"...

    ambiente 1 1iEU-SAIR3k ambiente 2

    A gua um meio impossvel para o ser humano sobreviver e se relacionar, respirar, se

    comunicar, se alimentar, etc. Por isso, possvel remeter a angstia sentida pela falta de ter com

    quem dialogar. No encarte que acompanha a fita, o poeta fala sobre isso:

    H um tempo atrs, aqui no Brasil, descobri umas coisas muito interessantes atravs de

    pesquisas em Lngua de Sinais, mas algumas pessoas ouvintes me desencorajaram dizendo que

    tais coisas no tinham valor algum. Eu fui perdendo o entusiasmo e me sentia desapontado at

    que fui aos Estados Unidos, onde me deram a possibilidade de me aprofundar em aspectos da

    cultura surda.

    No Dicionrio de Smbolos, Chevalier e Gheerbrant (1998, p.15), ao apresentarem as

    significaes simblicas da gua, dizem: "As guas, massa indiferenciada, representando a

  • LETRAS LIBRAS|188

    infinidade dos possveis, contm todo o virtual, todo o informal, o germe dos germes, todas as

    promessas de desenvolvimento", mas tambm de todas as ameaas de reabsoro. Mergulhar nas

    guas, para delas sair sem se dissolver totalmente, salvo por uma morte simblica, retornar s

    origens, carregar-se, de novo, num imenso reservatrio de energia e nele beber uma fora nova.

    Desse modo, a forma como o verso foi construdo possibilita-nos considerar que a fuga do eu lrico

    pela gua pode simbolicamente significar a necessidade de reconstruo de si mesmo e de sua

    realidade.

    Segundo Sutton-Spence, uma aluso feita quando se fala de uma coisa, mas se quer falar

    de outra. A compreenso de uma aluso vai depender do resgate de outras leituras feitas pelos

    expectadores, leitores. De acordo com a referida autora13:

    A construo da aluso pode ser sutil e a inteno do poeta para insinuao no sempre

    nenhuma nova criao, pois a audincia poderia no reconhecer a insinuao. Porm, mesmo

    que no poema no haja uma completa compreenso no reconhecimento da insinuao, esta no

    nenhuma grande perda. Tambm possvel os leitores acharem um pouco de ressonncia em

    uma linha que os faa lembrar de outro texto, at mesmo quando o poema no pretendeu isto.

    (SUTTON-SPENCE, 2005, p, 123)

    Assim, o sinal usado no verso 15 PESQUISAR, mas no poema, alusivamente, podemos

    atribuir o sentido de reflexo e busca interior de respostas para a angstia vivida pelo eu-lrico.

    No verso 18, temos a sada do eu lrico de seu contexto aqutico de origem para um novo

    ambiente. A sada, no entanto, no tranqila, uma vez que a expresso facial e corporal, alm do

    ritmo lentificado, imprimem a percepo do uso da fora para a sada de um contexto aqutico

    para outro:

    ...expresso facial de uso da fora..

    ambiente 1 1iEU-SAIR3k ambiente 2

    A respeito da construo rtmica na poesia em lngua de sinais Sutton-Spence (2005) coloca

    que esta se realiza pela durao dos sinais, ou seja, pelo movimento de produo do sinal e pela

    sua repetio. 13 No ingls: Allusiveness can be subtle and the poets intention for allusion is not always highlighted, so the audience might not recognise the allusion. However, so long as the poem does not entirely rely on the recognition of the allusion, this is no great loss.

  • LETRAS LIBRAS|189

    No poema em questo, a sugesto de dificuldade na mudana do ambiente est na

    alterao no padro de durao do movimento do sinal que influencia na construo do ritmo. No

    caso de ambiente11iEU-SAIR3k ambiente 2 o tempo do sinal alongado no ambiente 1 e agilizado

    quando o eu-lrico transpassa o ambiente 2.

    Como os sinais no so holsticos, mas composicionais o complemento da informao se d

    pela expresso no-manual, composta no primeiro momento pela expresso facial pelo juntar das

    sobrancelhas, fechamento parcial dos olhos, aperto dos lbios e pelo movimento do corpo que

    lentamente se inclina para frente, como isso demandasse o uso de muita fora e no segundo

    momento pela movimentao inversa, levantamento das sobrancelhas, abertura dos olhos e dos

    lbios e aumento da velocidade do movimento de nadar.

    Transposta a barreira os versos de 22 a 28 so todos de descobertas sobre as

    possibilidades poticas da lngua sinalizada:

    22

    ...exclamativo...

    FLOR ABRIR BRILHAR// FLOR ABRIR BRILHAR// FLOR ABRIR BRILHAR

    23

    ...i....

    O-QU // NADAR NADAR NADAR EU-APROXIMAR

    24 mos em d ...i...

    PESSOAS-EM-P APROXIMAR-EU// SINAL O-QU

    25

    mos em d

    SINAL IGUAL LNGUA-DE-SINAIS//

    26

    mos em d ...int...

    SINAL IGUAL LNGUA-DE-SINAIS

    27

    exp.f "agrado"

    BONITO

    28 EU-GOSTAR

  • LETRAS LIBRAS|190

    Nestes versos, o ritmo da descoberta o mesmo, gil e carregado de leveza. Aliada ao

    ritmo, para transmitir o prazer das descobertas feitas, est a expresso facial de agrado.

    Na estrofe seguinte, os significados, que se nos apresentam, falam sobre a auto-afirmao

    de ser sinalizador pela negao em obedecer ao falante:

    29 FALANTE+ 3POLHAR2P

    30 3POLHAR3P 3PMANDAR2P

    31 exp.f."autoritria"

    CALAR

    32 exp.f."autoritria"

    CALAR

    33 negativa com balanar de cabea

    NO

    34 exp.f "desprezo" e "dar de ombros"

    SINALIZAD@ SINAL^CONTINUAR

    O ritmo desses versos constante e imprime a ideia de atuao, movimento,

    desenvolvimento. A carga informativa se localiza na expresso facial. Os olhares dos falantes,

    nesse contexto onde o eu lrico estrangeiro porque vem de outro meio, e sua expresso

    autoritria nos informa que as posturas dos falantes no so muito diferentes da dos falantes de

    origem do eu do poema. No entanto, a dos sinalizadores sim, pois esses se negam a obedecer. A

    expresso facial e o comportamento de dar de ombros e continuar sinalizando esto carregados

    de uma postura completamente diferente da dos sinalizadores de origem do eu lrico.

    No verso 38 est a segunda metfora, a flor da qual lhe dada a raiz.

    38 FLOR 2sjCORTAR RAIZ R-A-I-Z 2sjDAR1si

  • LETRAS LIBRAS|191

    Nesse verso, no a flor que dada ao eu lrico, mas sua raiz. Essa raiz sugere que

    possvel replantar e fazer brotar a flor da sinalizao onde quer que ele esteja, tornando-o um

    possvel "plantador" e "repassador" das novas "flores", ou seja, possibilitado ao eu lrico a

    mudana dos comportamentos pelo sinalizadores que ele conheceu em terra estranha.

    A metfora feita entre a raiz da flor e a lngua de sinais nos sugere o estabelecimento da

    segurana e do desenvolvimento da identidade surda, pela possibilidade de fincamento da raiz e a

    partir da o desenvolvimento e disseminao da lngua de sinais e pelo uso desta e das relaes

    surdo-surdo

    No verso seguinte, o eu lrico guarda a raiz que lhe foi dada no corao. O corao que,

    segundo Chevalier e Gheerbrant (1998), a sede dos sentimentos, simboliza o amor, afeto e

    proteo das coisas queridas. No entanto, segundo os mesmos autores, as civilizaes tradicionais

    localizam no corao "a inteligncia e a intuio". Neste sentido, tem-se a possibilidade de o eu

    lrico apreender a experincia do aprendizado como um conhecimento que, intuitivamente, no

    deve ser apenas seu, mas passado para o grupo oprimido do qual ele saiu, como possvel forma de

    libertao.

    desenho em formato de corao

    39 CORAO coisa-pequena-perto-do-peito GUARDAR.

    Nos versos seguintes o eu lrico alegre, agradece e se despede:

    46 articulao labial

    BYE coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    47 articulao labial

    BYE coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    48 coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

    49 coisa-plana (mo em b)VOAR-SOBRE-NUVENS

  • LETRAS LIBRAS|192

    50 coisa-plana (mo em b) kVOAR-SOBRE-NUVENSi

    51 coisa-plana (mo em b) kATERRISSAR-SOBRE-CHOk'

    52 muito

    GRUPO TODOS FALAR

    53 1SOLHAR3P GRUPO-FALAR

    H uma diferena de ambientes nos quais o eu lrico se coloca para as viagens. No

    princpio, pela gua meio de regenerescncia. Agora, depois das descobertas feitas, seu retorno

    pelo ar, uma sugesto de liberdade e de expanso Chevalier e Gheerbrant (1998, p. 68 - 9)

    Dos versos 46 ao 53, a percepo de estruturas Lingusticas por repeties confere

    densidade s palavras em jogo, posto que refora o impacto das imagens de libertao, ao mesmo

    tempo em que aumentam a expectativa. Com muita propriedade, a respeito da repetio, Bosi

    (1997, p. 33) afirma que:

    [...] a repetio potica no pode fazer o milagre de me dar o todo, agora. Ao contrrio da viso

    fulmnea, ao contrrio da posse, ela me d o sentimento de expectativa. Linguagem, agonia. A

    repetio me preme a conhecer o signo que no volta: as diferenas, as partes mveis, a

    surpresa do discurso.

    Em relao a esse aspecto podemos, novamente, dialogar com Sutton-Spence (2005), que

    trata da repetio de configuraes de mo abertas como elemento de criao de imagens

    positivas, sendo que nos versos 46 a 51 todos os sinais so realizados com configuraes de mo

    abertas.

    Ainda dialogando com esta autora acerca das imagens positivas temos, tambm, a simetria

    horizontal como elemento constituinte da formao dessas imagens, uma vez que nesse grupo de

    versos todos os sinais so realizados desde a altura do trax at o alto da cabea.

    No nvel semntico, buscando informaes sobre o significado do Vo como smbolo

    Chevalier e Gheerbrant (1998, p. 964), o vem como a expresso de [...] um desejo de

    sublimao, de busca de uma harmonia interior, de uma ultrapassagem de conflitos". Essa

  • LETRAS LIBRAS|193

    simbologia nos possibilita refletir sobre todas as mudanas ocorridas com o eu lrico: de

    conhecimentos sobre as possibilidades poticas de sua lngua, de comportamentos, de encontro

    consigo e at possveis atitudes de auto-afirmao a serem tomadas.

    O ritmo nos versos de 42 a 51, volta a ser leve, o vo tranqilo. Aliada ao ritmo, a

    expresso facial nos informa que o eu lrico est em paz consigo, um retorno feliz.

    Ao retornar, distribui o bem que lhe foi dado e estava guardado em seu corao com os

    sinalizadores que estavam todos calados. Isso demonstra, tambm, que houve uma mudana de

    atitude do eu lrico frente ao problema da opresso. No incio, ele se nega a obedecer e submerge,

    solitrio. Ao retornar, sua atitude de juntar foras com seus pares, dividir com eles o bem que

    a raiz da sinalizao. No verso 55, o ritmo lento e leve nos faz sentir como essa doao est

    carregada da necessidade de unio para se fortalecer contra o opressor.

    Por fim, os ltimos versos nos falam sobre a coragem de argumentar e mostrar que

    preciso aos falantes entender e respeitar os sinalizadores para que todos vivam em harmonia.

    No h um sinal que especifique os surdos e os ouvintes, mas o contexto de sinalizao nos

    possibilita essa traduo, uma vez que o poeta, ao fazer o sinal UNIO, engloba todo o espao

    sua frente, fazendo um crculo.

    55 exp. f "felicidade", "enlevo" muito

    CORAO ABRIR TIRAR LNGUA-DE-SINAIS COMEAR SINALIZAR

    56 exp.f "desagrado"

    3pkOLHAR1di SINALIZADOR+

    57 exp.f "desagrado"

    3pkOLHAR3di

    58 3pkMANDAR3di PARAR SINALIZAR

    59 1s2ESPERAR VOC-GRUPO

    60 CORAO ABRIR TIRAR LNGUA-DE-SINAIS COMEAR

  • LETRAS LIBRAS|194

    61

    muito

    SINALIZAR

    62

    muito

    SINALIZAR

    63

    muito

    SINALIZAR

    64

    exp. f "sorriso"

    UNIO

    Assim, pode-se dizer que o tema do poema a opresso sofrida na relao dos

    sinalizadores com os falantes. O eu lrico tem uma percepo inicial de que os sujeitos se

    comunicam de forma diferente, mas as "rvores" das quais as lnguas brotam esto plantadas

    sobre o mesmo cho, o que, em princpio, significa que tm o mesmo valor.

    A ao, no poema, fica por conta da necessidade de novos contatos, que levam o eu lrico a

    uma viagem para se fortalecer e retornar defendendo a sinalizao. a busca pela identidade

    Lingustica e, conseqentemente, cultural, encontrada e dividida com seus pares sinalizadores,

    mas no apenas com estes, tambm com os falantes. Para o eu lrico no basta informar e mudar

    as atitudes dos sinalizadores preciso ensinar aos falantes uma nova maneira de se relacionar

    com os sinalizadores, pois para que estes mudem de atitude, precisam re-significar sua forma de

    ver os sinalizadores e isto acontecer, entre outros aspectos, mediante a mudana de postura do

    prprio sinalizador com relao a sua lngua e suas possibilidades de expresso.

    A recorrncia da temtica sobre o surdo seja para apresentar um smbolo nacional ou para

    discutir a relao entre surdos e ouvintes e, nessa discusso, celebrar a lngua de sinais como

    lngua da comunidade surda, pode ser considerada como expresso da necessidade que o poeta

    tem de, via arte, fazer com que sua audincia reflita sobre essas questes.

    nesse sentido lembramos das consideraes de Sacks (1998, p. 157) para quem Os

    surdos consideram a lngua de sinais uma parte imensamente ntima, indissocivel de seu ser, algo

  • LETRAS LIBRAS|195

    de que eles dependem, e tambm, assustadoramente, algo que lhes pode ser tirado a qualquer

    momento (como foi, de certo modo, pela Conferncia de Milo em 1880).

    Essa preocupao perfeitamente compreensvel porque, aps anos de opresso

    Lingustica e cultural, h nos surdos uma sensao de que preciso construir, entre os prprios

    surdos, uma conscincia do valor que a lngua de sinais tem para eles, de modo que, ela no corra

    o risco de ser usurpada novamente.

    Discutir no frum as imagens presentes no poema lngua falada

    e lngua sinalizada, de Nelson Pimenta

    Agora com voc

  • LETRAS LIBRAS|196

    REFERNCIAS

    BOSI, Alfredo (org). Leitura de poesia. So Paulo: tica, 1996.

    CHEVALIER, Jean & GHEERBRANT, Alain. Dicionrio de smbolos. Rio de Janeiro: Jos Olympio, 1998.

    JAUSS, Hans R. A histria da literatura como provocao teoria literria. Trad. Srgio Tellaroli. So Paulo:

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    PORTO, Shirley B. das Neves. De poesia, muitas vozes, alguns sinais: vivncias e descobertas na apreciao

    e Leitura de poemas por surdos. Dissertao de mestrado/ Programa de Ps-Graduao em Linguagem e

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    SKLIAR, Carlos B. Historia de la sordera y de ls personas sordas. (S/D mimeo).

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    Eleny Gianini)

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Carlo_Collodi

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    http://www.handspeak.com/byte/m/index.php?byte=milesdot

    http://www.paulinas.org.br/loja/DetalheAutor.aspx?idAutor=13278