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APRENDER E ENSINAR HISTÓRIA NOS ANOS FINAIS DA ESCOLARIZAÇÃO BÁSICA

Livro - Aprender e Ensinar Historia

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Metodologia do Ensino de História

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  • APRENDER E ENSINAR HISTRIA NOS ANOS FINAIS DA

    ESCOLARIZAO BSICA

  • Conselho editorial Fbio Alves dos Santos Luiz Carlos Fontes Jorge Carvalho do NascimentoJos Afonso do NascimentoJos Rodorval RamalhoJustino Alves Lima

  • ITAMAR FREITAS

    Aracaju-SE2014

    APRENDER E ENSINAR HISTRIA NOS ANOS FINAIS DA

    ESCOLARIZAO BSICA

  • Freitas, ItamarF862a Aprender e ensinar histria nos anos finais da es-

    colarizao bsica/ Itamar Freitas. Aracaju: Criao, 2014.

    200 p. ISBN 978-85-62576-98-0

    1. Conceitos histricos. 2. Contedos histricos. 3. Currculos nacionais. 4. Formao de professores. I. Ttulo.

    CDU 37 (37.01)

    Editorao Eletrnica e capa: Adilma MenezesFoto da Capa: Vecarla/DreamstimeReviso: Christianne Gally

    Ficha catalogrfica elaborada na Fonte

    Proibida a reproduo total ou parcial, por qualquer meio ou processo, com finalidade de co-mercializao ou aproveitamento de lucros ou vantagens, com observncia da Lei de regncia. Poder ser reproduzido texto, entre aspas, desde que haja expressa marcao do nome da autora, ttulo da obra, editora, edio e paginao.A violao dos direitos de autor (Lei n 9.619/98) crime estabelecido pelo artigo 184 do Cdigo penal.

  • 5APRENDER E ENSINAR HISTRIA NOS ANOS FINAIS DA ESCOLARIZAO BSICA

    >> Itamar Freitas

    APRESENTAO

    O que histria?Para que serve a histria?O que significa aprender histria?

    Quem se envolve com a formao de professores de histria depara-se, cotidianamente, com trs questes geradoras de algum desconforto. A primeira sobre o sentido de histria comum na conscincia do graduando, bombardeado, cotidianamente, com meia dzia de definies plantadas pelos professores formadores e justificadas como grande qualidade do saber histrico no sculo XX: a pluralidade de perspectivas. Mas, esse problema de fcil resolu-o, se ele memorizar a ecumnica soluo de Marc Bloch: histria a cincia dos homens, no tempo.

    A segunda sobre a utilidade comum na mente do professor de histria. Essa questo ele tambm resolve fcil. Depois de anos de trabalho com os adolescentes e se no for um doutrinador , conhecer os melhores caminhos para domar a impacincia dos pe-quenos interrogadores: pode, ento, alimentar os propsitos de pais e alunos serve para tirar nota boa no ENEM ou lanar mo da vulgata que j comemorou seus duzentos anos: com a histria, po-demos compreender o presente e at promover a mudana.

    A terceira resposta a do sentido de aprendizagem um pouco mais difcil de ser encontrada entre graduandos e professores. Isso no chega a ser um desastre, pois graduandos e professores, se es-tiverem predispostos, podem complementar sua formao inicial, mediante as estratgias mais criativas. Todavia, quando so os pr-prios professores dos futuros professores de histria que se recusam a refletir sobre esse assunto vejam que no estamos pedindo que respondam questo , temos um problema de grandes propores.

    Excluindo os formadores dos professores da berlinda e voltando nossa ateno ao graduando e ao professor da escolarizao bsica,

  • 6Itamar Freitas >>

    APRESENTAO

    afirmamos que a insuficincia da discusso sobre a aprendizagem preocupante, porque as respostas ensaiadas esto, na maioria das vezes, fundamentadas na mais oportuna frequentemente a mais prxima experincia do sujeito interrogado: o modelo de apren-dizagem depositado em sua ou nossa? lembrana individual. E, podem ter certeza: esse modelo bem mais antigo e cientificamente equivocado que possamos imaginar. Ele nos remete somente para citar um autor cannico disciplina formal de John Locke: apren-der exercitar (a), reter (na) e recuperar os acontecimentos (de) memria. , alm disso, conhecer parmetros pretritos de conduta e aplic-los ipsis litteris.

    Com esse terceiro exemplo, esperamos que seja entendida a razo de esse livro se chamar Aprender e ensinar histria nos anos finais da escolarizao bsica. Ele foi organizado a partir da constatao de que o aprender e demais termos do seu campo semntico o con-ceito de discusso mais urgente, hoje, nos cursos de formao inicial. Nos ambientes que temos frequentado, em vrios estados do Brasil, percebemos que a ignorncia, ou a presuno de domnio sobre a li-teratura que trata de ensino de histria, tem resultado em desenhos curriculares que enfatizam a aquisio de tcnicas, instrumentos, ou como contemporaneamente se costuma dizer linguagens.

    Este livro talvez de forma presunosa, tambm, quem sabe foi editado como estmulo reflexo sobre o impensvel aquilo que j supomos dominar e tambm aquilo sobre o qual raramente ouvimos, ou queremos ouvir falar. Quais so as finalidades da disci-plina escolar histria? possvel aprender histria entre os 11 e os 17 anos? Os conceitos histricos vm das fontes ou do aparato cog-nitivo do historiador? Qual a natureza dos contedos histricos? O que se espera que os alunos dos anos finais aprendam com o nome de histria? O que dizem as prescries curriculares estrangeiras sobre progresso dos contedos? Como pr a avaliao a servio das aprendizagens histricas?

    Pelo inventrio das questes e elas so quintuplicadas adiante , esperamos que esteja explcito, no apenas o tema aprendiza-

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    >> Itamar Freitas

    gem , mas tambm o entrelaamento dos demais conceitos. Aqui a discusso sobre o aprender, seja no ensino fundamental e no ensino mdio, seja na formao inicial de professores de histria, remete aos objetos de aprendizagens que podem ser sintetizados em termos, como conceitos e contedos. Os contedos so apre-sentados, em sua forma corrente, nos instrumentos de prescrio, genericamente conhecidos como currculos e produzidos em v-rios lugares nacionais e estrangeiros.

    Os contedos tambm so abordados em suas possibilidades de distribuio ao longo dos anos, ou seja, como progresso das apren-dizagens. Estas, por fim, podem ser viabilizadas, mediante o emprego de diferentes significados e formas de avaliao.

    Ao abordar o aprender, obviamente, o livro revela as idiossincra-sias da autoria: exageros, digresses, desequilbrios, omisses, radi-calismos e muito passeio livre entre as fronteiras disciplinares. O livro tambm pleno de assimetrias em termo de dimenses e vocabu-lrio e deixa algumas perguntas sem resposta. Esperamos, porm, que essas singularidades no sejam empecilhos ao cumprimento do objetivo principal da publicao, que estimular a reflexo sobre a aprendizagem em histria e, consequentemente, auxiliar a refinar os nossos argumentos em torno da manuteno da disciplina nos curr-culos brasileiros e da permanncia da formao do professor de his-tria nos institutos, faculdades e departamentos de histria.

    Por fim, necessrio registrar que este livro no seria viabiliza-do se no contssemos com o auxlio de colegas engajados nos es-tudos sobre ensino de histria. Eles so muitos e contriburam das mais diferentes formas. Foram revisores, diagramadores, ilustrado-res, leitores e profissionais que encomendaram falas para confern-cias, mesas redondas e grupos de trabalho, enfim, foram parceiros no planejamento e at na escrita de alguns textos. A todos eles, cita-dos ao longo da obra, meu muito obrigado.

  • As finalidades da disciplina escolar histria no Brasil republicano (1900-2011) 11O debate sobre os usos formativos da histria, 12Finalidades da histria em regime discricionrio 21;Finalidades da histria em regime democrtico, 24

    Aprendizagens histricas no Brasil recente:contribuies da Espanha, Inglaterra e Alemanha (1980-2011)33Homem, modernidade e aprendizagem histrica, 34Conhecer e aprender, dentro e fora da histria, 35;Aprender histria na perspectiva dos construtivistasCarretero, Pozo, Asencio, Bruner e Ausubel, 40Aprender histria na perspectiva de Peter Lee 44Aprender histria na perspectiva de Jrn Rsen 50

    Conceitos histricos 61Por que refletir sobre conceitos histricos? 62Conceito, o que isso? 63Conceitos histricos nos ensaios de epistemologia da histria 65Nos manuais de introduo histria 69Ensaios de anlise conceitual 74Dicionrios de conceitos histricos 78Nos trabalhos sobre ensino e aprendizagem histrica 82Discusses sobre contedos conceituais em histria 83Os manuais de fundamentos e metodologias sobre ensino de histria 85Um livro didtico dedicado ao ensino de conceitos histricos 90

    Contedos histricos 101Historiando prticas de definio 102Os contedos histricos em quatro continentes 104

    Currculos nacionais para o ensino de histria (1931-2009) 119Por que estudar currculos? 120A histria na reforma Francisco Campos 121A histria na reforma Gustavo Capanema (1942/1951) 123A histria na reforma Jarbas Passarinho 125A histria na reforma Paulo Renato de Souza 128A histria nas prescries nacionais dos ltimos dez anos 131

    Progresso dos contedos histricos em currculos nacionais de pases da Amrica Europa e sia (1995-2012) 145A experincia da Argentina (1995/2012) 151A experincia do Chile (2000/2012) 154

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    6

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    2

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    SUMRIO

  • A experincia da ndia (2005/2006) 156A experincia da Tailndia (2008) 160A experincia da Inglaterra (2011) 162A experincia da Frana (2008) 166

    Avaliao no ensino de histria a partir dos dispositivos nacionais e estaduais brasileiros (1996-2012) 179Avaliao educacional e a vulgata das teorias da avaliao da aprendizagem 182Avaliao da aprendizagem em histria: entre regulaes nacionais e estaduais (1996/2011) 185Os currculos de histria e prescries sobre avaliao (2007-2012) 190

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  • 1As finalidades da disciplina escolar

    histria no Brasil republicano (1900-2011)1

    Qual o lugar da histria nos processos de formao de adolescentes e jovens?Quem determina as finalidades da disciplina escolar de histria?O que dizem os historiadores brasileiros ao longo do sculo XX?Que interesses nos movem quando pensamos os usos da histria na formao de pessoas?

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    O DEBATE SOBRE OS USOS FORMATIVOS DA HISTRIA 1O valor dos estudos histricos na formao de adolescentes e jo-vens, os critrios de transferncia da historiografia produzida pelos eruditos aos currculos da escolarizao bsica, enfim, a construo de uma histria destinada a processos formativos so temas discu-tidos h, no mnimo, 500 anos. Pensadores, como Lutero, Bossuet, Vives, Comenius, Rousseau, Locke, Hume, Condorcet, Kant, Herbart, Comte, Spencer, Durkheim e Dewey, por exemplo, posicionaram--se a respeito. Eles refletiram sobre as finalidades para a histria e inspiraram os seus usurios na elaborao de projetos educativos. Isso ocorreu na Europa, principalmente no ambiente elitizado da educao preceptorial ou no interior de colgios religiosos que pre-paravam os jovens aspirantes aos estudos universitrios , e nos Es-tados Unidos, de onde extramos a maior parte da nossa experincia escolar e cientfica.Quando os estados modernos assumiram a escolarizao dos cidados por necessidade, direito ou dever, isto , quando foi ins-titucionalizada a educao pblica de massas, esses e outros fil-sofos continuaram inspirando os idelogos dos sistemas, embora dividissem tais funes com os responsveis pelos recentemente institudos campos do conhecimento, como a sociologia, pedago-gia e histria.

    Os historiadores, por seu turno, assumiram a discusso sobre as finalidades escolares da histria desde a institucionalizao do seu saber nas universidades, ou seja, no momento em que a histria ganhou foros de licenciatura. Assim, no sculo de ouro da histria, idelogos e compiladores de uma tica para o historiador ocuparam algum tempo de suas vidas com a reflexo e a tomada de posio sobre os usos da histria na formao inicial de cada gerao em seus respectivos pases, naes ou povos, expressando interesses de fundo epistemolgico e poltico-estatal.

    A propedutica universitria da histria, na Alemanha, em 1857, e na Frana, em 1898, por exemplo, deixava claro que o ensino e a

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    >> Itamar Freitas

    aprendizagem histrica tambm justificavam a existncia da hist-ria e do ofcio do historiador. Gustav Droysen (1983) e Langlois e Seignobos (1992) afirmaram que a apresentao dos contedos his-tricos, em ambiente escolar, viabilizava o processo de humaniza-o e concretizava as finalidades do saber erudito: afastar os mitos/mentiras, difundir a alteridade e ajudar a manter a democracia.

    No sculo XX, entretanto, com a institucionalizao da histria nas universidades e, mais adiante, com a criao dos cursos de ps--graduao, experimentamos um progressivo afastamento da erudi-o histrica em relao aos usos formativos que pode ser visualiza-do ainda hoje em, pelo menos, trs perspectivas: entre as matrias propeduticas da formao historiadora e as discusses sobre o ensino de histria escolar; entre os difusores de tendncias histo-riogrficas e os formuladores de polticas pblicas para a disciplina histria; e, entre a pesquisa histrica na ps-graduao e os usos dessa produo.

    Na Alemanha, como anunciou Jrn Rsen (2006), os historia-dores praticamente relegaram as questes de ensino aos profissio-nais da educao. Tal atitude resultou na formao de uma did-tica da histria apartada da teoria da histria e de uma teoria da histria amputada em uma das suas principais funes: a forma-o histrica.

    Nos Estados Unidos, ao contrrio, os historiadores at lutaram para manter o controle sobre as finalidades e os contedos a ensi-nar. Mas a atuao de John Dewey, entre outros fatores, foi decisiva no processo de afastamento da histria de corte objetivista e po-ltico como carro-chefe das Humanidades, substituda, a partir de 1916, pelos Social Studies. (Novic, 1998; Fallace, 2009).

    No Brasil, a admisso dos professores do ensino bsico como membros da Associao Nacional de Histria (ANPUH), duas dca-das aps a sua fundao (1961), um indcio de que tal separao foi, um dia, institucionalizada e, ainda, de que as sensibilidades do ofcio sofreram, na dcada de 1980, alguma alterao. Em outras palavras, um sinal de que a corporao dos historiadores pensou

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    em assumir a articulao passado/presente/futuro como procedi-mento e saber fundamentais formao, independentemente at da colorao ideolgica que tais conscincias viessem a ganhar.

    No entanto, ainda que a reflexo sobre os usos do passado fosse defendida como prerrogativa da seara dos historiadores de ofcio e que esses mesmos historiadores tenham auferido vantagens com o interesse do Estado na articulao de uma memria nacional, re-sultando na manuteno do conhecimento histrico como discipli-na escolar por mais de 170 anos e na criao de, aproximadamen-te, 600 cursos de licenciatura , a discusso sobre as finalidades da histria escolar e a natureza do passado a construir no foi objeto de interesse perene entre historiadores viventes no mesmo perodo (Oliveira, 2011).

    Passada a ameaa da implantao das licenciaturas curtas em estudos sociais, na dcada de 1980 (Martins, 2002), e ampliadas as polticas pblicas que garantiriam a autonomia da histria como disciplina escolar, um velho-novo profissional passou a dominar as questes relativas aos usos da histria na formao de pessoas, in-cluindo, nessas questes, as finalidades da disciplina. Esse profis-sional o pesquisador do ensino de histria sujeito de formao hbrida, que trabalha, dominantemente, em departamentos, facul-dades, institutos ou programas de ps-graduao em educao, e que oscila, politicamente, entre a ANPUH Grupo de Trabalho En-sino de Histria e Educao e a Sociedade Brasileira do Ensino de Histria (SBEH). Junto a esse especialista, cresce um grupo de pro-fissionais que atua nos departamentos de histria e programas de ps-graduao em histria, estimulados por uma nova compreen-so sobre a natureza da teoria da histria, como tambm pela aber-tura estatal para a rea, no que diz respeito, sobretudo, ao Programa de Iniciao Docncia (PIBID) e aos mestrados profissionais em Ensino de Histria. Se quisermos conhecer os discursos sobre os usos da histria na formao de pessoas, deparar-nos-emos, ento, com as seguintes indagaes: a quem cabe definir os fins da disciplina? Quais funes

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    sociais foram estabelecidas ao longo da nossa experincia republi-cana? Onde podemos encontrar os discursos autorizados sobre as finalidades do ensino de histria? Qualquer tentativa de respond--las passar bem prximo das conhecidas e centenrias relaes mantidas entre os historiadores e a poltica ou, na contemporanei-dade, entre as tentativas de encontrar um lugar para a histria no concerto das cincias e os interesses do Estado-nao forjador de conscincias.

    Adiante, aprofundaremos esses temas, abordando teorias da histria e currculos. Por hora, fiquemos com o breve inventrio so-bre o que foi pensado a respeito, seguindo de perto as tendncias mais ou menos centralizadoras e mais ou menos democrticas ao longo do perodo em que a educao escolar da maioria da popula-o brasileira foi pensada e, algumas vezes, assumida como tarefa de Estado. FINALIDADES ANTERIORES PRODUO DE PROGRAMAS ESTATAIS NACIONAIS

    O estabelecimento de um espao para a histria como compo-nente curricular do processo de formao de brasileiros e a conse-quente definio das suas finalidades so frutos de jogos de fora entre vrios atores, a exemplo de historiadores, pais de alunos, pro-fessores, especialistas em pedagogia, lderes sindicais, lderes co-munitrios secretrios de educao, conselheiros de educao nas esferas escolar, municipal, estadual e federal, ministros de Estado, deputados federais e senadores. Dadas as singularidades deste li-vro, acompanharemos as posies dos historiadores por formao inicial ou reconhecimento.

    No so muitos os exemplos de historiadores que teorizam so-bre o tema pouco mais de duas dezenas, apenas, extradas de onze estados da federao, entre os anos 1900 e 2011. Tambm no op-tamos pela representao espacial ou institucional. Colhemos exem-plos que consideramos significativos e diversos.

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    A pluralidade decorre das causas que apontamos h pouco. Os historiadores no se sentiram na obrigao de registrar o seu pensa-mento sobre os usos da histria na formao de pessoas, principal-mente, os que experimentaram a segunda metade do sculo XX. Nesse tempo, mantiveram-se distantes das polticas pblicas para o setor e at enxergaram a prpria natureza formadora das licenciaturas como um entrave evoluo da historiografia Brasileira (Freitas, 2006, p. 11-28). Por isso, grande parte do que aqui apresentado provm das introdues dos livros didticos, de manuais de formao de professor ou de crticas a manuais e programas de ensino.

    As primeiras iniciativas prescritivas do perodo republicano so-bre as finalidades da histria na formao de pessoas foram forjadas dentro do esprito livre que reinava no perodo anterior reforma Francisco Campos (1931). Esse clima permite o anncio dos mais diversos sentidos para a histria escolar. Em outro trabalho (Frei-tas, 2010), j anunciamos que a ausncia de formao especfica a inexistncia de curso de Licenciatura em Histria possibilitava a participao de qualquer interessado bacharel em direito, medicina, engenharia, ou oficial militar. No Congresso Brasileiro de Educao Superior e Secundria, ocorrido no Rio de Janeiro (1922), Bertha Lutz, por exemplo, defendia a histria como nacionalizadora do ensino no Brasil e, sobretudo a Histria da Civilizao como, essencialmente, educadora, no sentido de solidificar a cultura geral e fornecer as diretrizes seguras para a orientao futura (Anais..., 1926, p. 242).

    Dois renomados professores de geografia, Renato Jardim e Fer-nando Raja Gabaglia, respectivamente, de So Paulo e do Rio de Janeiro, defendiam a Histria Contempornea como a que mais se identificava com o estado atual da evoluo da sociedade. No ato da defesa, os mestres ouviram de um congressista que a incompre-enso das causas da Primeira Guerra Mundial se devia, exatamen-te, ao pouco espao reservado Histria Contempornea (Anais..., 1926, p. 304, v. 1; p. 669, v. 2).

    Mas esses no eram, efetivamente, profissionais da histria, diramos hoje, levando ao p da letra o atual projeto de profissio-

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    >> Itamar Freitas

    nalizao do historiador. Vejamos, ento, o pensamento de dois autorizados historiadores do perodo: o sergipano Joo Ribeiro e o paranaense Rocha Pombo, ambos professores de histria do Col-gio Pedro II, membros do Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro (IGHB) e autores de livros didticos de Histria da Amrica, do Bra-sil, Universal e da Civilizao.

    O primeiro, Joo Ribeiro, anunciou o ensino da histria, me-diante generalizaes teis e essenciais como conhecimento fun-damental formao cientfica e literria dos alunos do secund-rio (Ribeiro, 1901, p. 10,12). O segundo, Rocha Pombo, explicitou as funes patriticas e humanitrias da disciplina. Afirmou que a histria forneceria os nomes, os feitos, as obras, as ideias, os sen-timentos, virtudes, a vida das grandes individualidades, alm de ser responsvel pela transmisso das identidades nacional e latino--americana. (Pombo, 1900, p. xxxiv).

    FINALIDADES CONTEMPORNEAS AOS INTERESSES DO ESTADO CENTRALIZADOR

    Ribeiro, Pombo, Gabaglia, Jardim e Berta Lutz externaram po-sies em um tempo em que no havia teoria formal publicizada, nem prescrio nacional para o ensino da histria no Brasil. Na d-cada de 1930, esse cenrio modificou-se, mas os autores continu-aram a divergir sobre as finalidades da histria escolar, a exemplo dos cariocas Jonathas Serrano e Balthazar da Silveira e do paulista Cesarino Jnior. Serrano foi professor de Histria do Colgio Pedro II, scio do Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro (IHGB) e au-tor de livros didticos de Histria do Brasil e da Civilizao. Silveira, tambm autor de livro didtico de Histria, era formador de profes-sores no Instituto de Educao da Universidade do Distrito Federal (UDF), e Cesarino Jnior, professor de histria do Ginsio da capital paulista e autor de livro didtico de Histria da Civilizao. Serrano segue o mesmo caminho de Rocha Pombo. Prescreve a formao da nacionalidade, mediante exemplos de intenes e

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    aes, ressaltando a necessidade de participao dos alunos no fu-turo do Brasil e acrescentando um fim ecumnico: a interiorizao do sentido de continuidade histrica da humanidade (Serrano, s.d, p. 16; 1931, p. 15). Silveira, discriminando tambm os fins do ensino das histrias do Brasil e da civilizao, enfatiza o carter exemplar e pedaggico da histria, afirmando que a mesma teria importncia decisiva no avigoramento moral de uma raa e no fortalecimento dos vnculos que unem uma nacionalidade (Sil-veira, 1934, p. 258, 260).

    Cesarino, entretanto, afastando-se dos dois colegas, aprofundou a generalidade do sergipano Joo Ribeiro, enfatizando um princ-pio difundido entre a Europa e as Amricas na passagem do sculo XIX para o sculo XX: a histria deve ser ensinada como uma ci-ncia e como uma cincia deve ser aprendida. Dessa forma, dizia o mestre, se a histria se ocupa das transformaes das instituies no tempo, o seu estudo na escola secundria deve mostrar-nos o como e o porqu dessas transformaes e explicar-nos por que as instituies so hoje o que so, e como chegaram a s-lo (Cesarino Jnior, 1936, p. 52).

    Nas trs dcadas em que vigoraram as reformas Francisco Cam-pos e Gustavo Capanema, alguns especialistas apresentaram verses mais distantes dos programas oficiais. Foram os casos de Guy de Hollanda, especialista em ensino de histria do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais (CBPE) e professor da Faculdade Nacional de Filosofia (FNFi); Lydina Bessadas Gasman, autora de Guia meto-dolgico (1971), para o ensino de histria, e Documentos histricos bra-sileiros (1975); Delgado de Carvalho, professor de Histria Moderna e contempornea na FNFi, de Histria Diplomtica no Instituto Rio Branco, e autor de livros didticos de Histria; Amlia Domingues de Castro, Eduardo dOliveira Frana e Emlia Viotti da Costa, pro-fessores do curso de histria ofertado pela Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras (FFCL) da Universidade de So Paulo (USP).

    Guy de Hollanda conhecido crtico dos programas e manuais e da poltica centralizadora do Ministrio da Educao. Em meados da

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    dcada de 1950, pregou para a histria uma funo historicista cls-sica, renovada por apelos pacifistas difundidos pela Organizao das Naes Unidas (ONU): fornecer elementos da crtica histrica que possibilitassem ao aluno compreender o presente e formar atitu-des de respeito ao outro, poca, anunciadas como predisposies nefastas compreenso entre os homens (Hollanda, 1957, p. 7, 9-10). Essa tambm foi a posio de Lydinia Gasman: desenvolver o senso de compreenso e tolerncia, com o emprego significativo da sentena, hoje, bastante conhecida: torn-los cidados dentro de um cenrio internacional (Gasman, 1959, p. 92).Delgado de Carvalho esteve entre os mais ativos defensores da histria como componente dos estudos sociais. Talvez, por isso, te-nha entendido a histria ensinada genericamente e, diremos hoje, na longa durao como uma coleta de fatos, mais ou menos com-provados, porm aceitos por um grupo social e transmitida por he-rana de gerao em gerao (Carvalho, 1957, p. 20). Para ele, o que importava, efetivamente, era que a histria pudesse auxiliar, via estudos sociais, a levar os educandos a estruturar atitudes de respeito s instituies vigentes, de compreenso e de tolerncia cultural, de ponderao e reflexo crtica na leitura do mundo, de aceitao esclarecida das mudanas culturais valiosas e de cola-borao nas atividades construtivas (Carvalho, 1957, p. 73-4).

    , sobretudo, uma finalidade socializadora no sentido estadu-nidense de mudana de comportamentos que prope Delgado de Carvalho. Curioso que o perodo, dcada de 1950, abrigue tantas e to diversas noes sobre os usos escolares da histria e dentro da mesma instituio. Flagramos isso entre os professores Hollanda e Carvalho, da Universidade do Brasil, e veremos tambm com Amlia Domingues de Castro, Eduardo dOliveira Frana e Emlia Viotti da Costa, da FFCL/USP.

    Amlia Domingues de Castro afirmou que a histria deveria simplesmente nos ensinar a viver. Assim, o ensino de histria, no secundrio, teria a finalidade de formar o cidado do mundo e de um dado pas, orientar o seu julgamento tico e poltico, [...] ape-

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    trechar para uma vida pessoal mais rica, eficiente e cheia de signi-ficado (Domingues, 1955, p. 262). Esses atributos configuravam, curiosamente, nas palavras da professora, a ideia de histria ma-gistra vitae. Traduzindo melhor essa funo radicada no to cri-ticado, hoje, regime de historicidade, a histria seria responsvel pela transmisso de capacidades e conhecimentos relacionados erudio e compreenso, aos valores cvico-polticos, com-preenso internacional e formao moral (Domingues, 1955, p. 258-261).

    Ensinar a viver tambm era o ofcio que a histria queria mi-nistrar, segundo Emlia Viotti da Costa. Entretanto, para a autora, tais prticas requereriam a compreenso do passado em diferen-tes dimenses do humano no somente o militar e o poltico, por exemplo e a formao do brasileiro consciente dos seus proble-mas (Costa, 1955, p. 71).

    Publicado em 1955, o pensamento de Viotti da Costa referenda as finalidades da reforma Francisco Campos, que j contabilizava mais de duas dcadas, mas, ao que nos parece, plenamente atual, no que diz respeito formao humana e formao poltica, que leva o adolescente a assumir atitude crtica e a adotar uma nor-ma de ao quanto aos problemas nacionais e internacionais. (Cos-ta, 1955, p. 75. Grifos da autora). Seis anos depois, as posies da professora so referendadas, sem as bases da reforma de Francisco Campos: a histria seria, assim, a principal formadora da consci-ncia cvica e do aluno, dos homens de amanh o cidado da democracia , do desenvolvimento integral da personalidade e da conscincia do sentido de civilizao, colaboradora, por fim, da formao do cidado (Costa, 1960, p. 102).

    O terceiro professor da FFCL/USP, Eduardo dOliveira Frana, posicionou-se no I Simpsio de Professores de Histria do Ensino Superior (1961) que deu origem ANPUH. Esse ambiente, contu-do, no marcou inflexo alguma com relao s finalidades do ensi-no de histria, quando observamos os seus registros e os compara-mos ao que vimos at o momento:

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    >> Itamar Freitas

    [...] Que pretendemos com o ensino de histria?I compreenso do homem, auto-conhecimento;II conhecimento da condio humana;III busca do crescimento da liberdade de esprito;IV busca da condio do homem no presente;V unidade fundamental da humanidade; procurar viso da Histria Universal;VI conscincia da realidade que somos como unidade na-cional no conjunto das unidades do mundo cada vez mais interdependentes (Frana, 1962, p. 105).

    Vemos, ento, que Frana apresenta finalidades gerais e, no vo-cabulrio da poca, desinteressadas, isto , atributos que caberiam em qualquer pas ou povo em regime democrtico: liberdade de pensamento, compreenso do presente, formao da humanidade e da nacionalidade. Como seriam, ento, os objetivos da disciplina escolar histria em momentos de exceo?FINALIDADES DA HISTRIA EM REGIME DISCRICIONRIO

    O primeiro exemplo ns extramos de uma ao coletiva que bus-cava inovar a abordagem da histria nos livros didticos. Na verdade, a coleo Histria Nova no Brasil foi produzida em regime democrti-co e at estimulada pelo Estado. Contudo, foi por esse mesmo Estado cassada, ainda no ano de lanamento, 1964. Seus autores Nelson Werneck Sodr, Joel Rufino, Pedro Celso, Cludio Giordano, Maur-cio Martins de Mello e Pedro Celso Uchoa Cavalcante Neto punham diferentes instituies no mesmo empreendimento: o Ministrio da Educao, atravs da Campanha de Assistncia ao Estudante (Cases), o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) e a FNFi, onde, com exceo de Sodr, cursavam a licenciatura em histria (Loureno, 2008, p. 391). Para eles, histria ensinada caberia, ento, explicar o presente e, dessa forma, possibilitar a participao consciente de to-dos na resoluo dos problemas do nosso tempo (Santos, 1964, p. 9).

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    No perodo da tutela militar, duas outras publicaes anuncia-ram finalidades, ainda que no tenham apresentado a radicalidade do projeto anterior. A primeira foi produzido por Ella Grinsztein Dottore, professora do ensino secundrio e da Faculdade de Educa-o da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ilmar Rohloff de Mattos e Jos Luiz Werneck da Silva, professores do Departamen-to de Histria da Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). A segunda, tambm difundida em livro didtico, teve Luis Koshiba como responsvel que depois seria professor de Histria Moderna e Contempornea na Faculdade de Cincias e Letras (FCL) da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e livre docente com tese sobre ensino de histria (1995) (http://www.editorasaraiva.com.br/autor/luiz-koshiba/.)

    Para Mattos, Dottore e Silva, o ensino de histria facultaria ao aluno o conhecimento sobre suas origens, compreender o seu pre-sente e preparar um futuro melhor. O ensino de histria tambm ajudaria a responder como o mundo em que vivemos chegou a ser desta maneira? Qual o meu lugar neste mundo? Como poder ser o mundo de amanh? Que poderei fazer para melhorar o mundo? (Mattos et. al, 1972, p. 4). Em resumo, os autores propunham um ensino de histria que auxiliasse na construo das identidades pes-soal e coletiva espcie humana , no desenvolvimento da noo de historicidade e do potencial protagonismo na vida cotidiana.

    O texto de Koshiba, por outro lado, centrava foras na funo construtora do pensamento crtico. Condenando os fins e prticas do seu tempo, no ensino de histria, ele afirmou que a capacidade de pensar conta mais que a capacidade de memorizar, sendo o ensi-no de histria o responsvel por explicitar a estrutura mais ampla que permite ao aluno compreender os eventos ou fatos. (Koshiba, 1984, p. iii-iv).

    Para encerrarmos este tpico, apresentamos finalidades inser-tas em duas obras publicadas sob a rubrica de estudos sociais. O primeiro teve como autores: Srgio Buarque de Hollanda, Carla de Queiroz, Sylvia Barboza Ferraz, Virglio Noya Pinto e Laima Mesgra-

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    vis, todos professores da USP, respectivamente, nas reas de histria, literatura italiana, literatura alem e comunicao e artes (Msculo, 2008). Escrito em 1971 e coordenado por um historiador renoma-do, o livro, assim, justificava o estudo da histria: Vocs conhecem o Brasil de hoje? S podemos conhecer o Brasil atual estudando o que ele foi, para depois compar-lo com o que hoje. A nfase dos auto-res era, portanto, no conhecimento das diferenas entre as pocas, resultante das mudanas nos hbitos e costumes, nas maneiras de governar, no desenvolvimento tcnico e econmico do pas para o melhor conhecimento do processo de formao e do estado atual do Brasil (Hollanda, 1971, p. 3).

    O segundo exemplo de finalidades da histria dentro dos estu-dos sociais trazia o nome da matria no ttulo: Estudos sociais: o pro-cesso de ocupao do espao brasileiro. O livro foi escrito por Elza Nadai, Suria Abucarma e Joana Neves, respectivamente, professora de prtica de ensino de histria na Faculdade de Educao da USP, gegrafa e professora do ensino bsico paulista e professora do cur-so de licenciatura em histria da Universidade Federal da Paraba (UFPB). Nele tributada ao ensino de histria a funo de analisar as relaes existentes em uma determinada poca e as suas poss-veis vinculaes com o presente [...] para que o aluno possa ver e sentir o estilo de vida, as contradies, os problemas e as solues encontradas em outras pocas e perceba que s no conjunto das aes humanas se forja de fato uma cultura (Nadai; Neves; Abucar-ma, 1978).

    Dezessete anos depois, Neves e Nadai produziram outro livro, anunciando a necessidade de o ensino de histria enfatizar as transformaes sociais ao longo dos tempos, a mudana, o apren-dizado da reflexo e do pensamento e o protagonismo dos grupos sociais. (Nadai; Neves, 1995). Mas a j estamos em tempos de plena autonomia para a disciplina escolar histria.

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    FINALIDADES DA HISTRIA EM REGIME DEMOCRTICO

    O ltimo grupo de historiadores aqui reunidos produziu em re-gime de ampla liberdade e difuso dos estudos histricos superio-res em todo o pas. Isso significou tambm maior diversidade em termos de finalidades para a histria escolar quando comparadas s dcadas anteriores. Nos anos 1990, por exemplo, o paulista Marcos Antnio da Silva, docente da FFLCH/USP, inovou ao compreender os professores e alunos de histria, em diferentes graus, como histo-riadores e ao difundir a ideia de que o ensino de histria poderia concretizar um direito: partilhar do prazer que produzir histrias (Silva, 1995, p. 81, 84). Antonio Paulo Rezende e Maria Thereza Di-dier, ambos professores do curso de histria da Universidade Fede-ral de Pernambuco (UFPE), alertaram para a funo de preparar o jovem para enfrentar os dilemas que [afligiam] a humanidade [na-quele] final de milnio (Rezende; Didier, 1996, p. v).

    Na dcada seguinte, Astor Antnio Diehl, gacho e professor da Universidade de Passo Fundo (UPF), propagou a ideia de que o en-sino de histria deveria produzir e intermediar capacidades e tra-dies do pensar histrico disciplinado, mediante a reconstituio de liberdades do passado [regras de pesquisa], conhecimentos e convencimentos [contedos] e orientaes racionais, sob a pers-pectiva das aes individuais e coletivas. (Diehl, 2003, p. 85-6). No mesmo ano, Margarida Oliveira, professora do Centro Universitrio de Joo Pessoa (UNIP), encerrava sua tese, defendendo o ensino de histria como um canal de acesso a um direito: o direito ao pas-sado. Boa histria escolar seria, ento, aquela que viabilizasse a compreenso, interpretao e atuao do aluno em seu mundo, isto , a histria formadora do cidado (Oliveira, 2003). Um ano mais tarde, Francisco Rgis Lopes Ramos, professor do departamento de Histria da Universidade Federal do Cear (UFCE), afirmou que o ensino de histria no deveria centrar-se no saber o que aconte-ceu. Sua grande funo seria ampliar o conhecimento sobre a nos-sa prpria historicidade. Saber que o ser humano um sendo, cam-

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    po de possibilidades historicamente condicionado e aberto para mudanas (Ramos, 2004, p. 24. Grifos do autor).

    Nos ltimos seis anos, vrios foram os apelos por uma histria renovada, partindo de muitos outros cantos do Brasil. Destacaria, porm, dados os limites deste texto, representantes dos estados de Minas Gerais, Rio de janeiro, Paran e do Distrito Federal.

    Em Minas, Caio Boschi, professor da Pontifcia Universidade Catlica (PUC-MG), dedicou um livro inteiro ao valor dos estudos histricos, retomando antigas e recentes funes. A histria escolar serviria, ento, ao processo de autoconhecimento, de produo da identidade social, em suas dimenses locais e universais. O ensino de histria contribuiria tambm para a aquisio da conscincia de direitos e deveres [...] fator de formao para a cidadania (Boschi, 2007, p. 56). Marieta de Morais Ferreira e Renato Franco, respec-tivamente, professores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Fundao Getlio Vargas (FGV), retiraram da disciplina o exclusivismo da formao para a cidadania. Contudo, alertaram para a impossibilidade de construir cidadania sem as noes de histori-cidade, de construo do saber sobre o vivido e sobre o tempo, ele-mentos que somente o conhecimento histrico poderia oferecer. Assim, para ambos, teria a histria escolar a funo de ensinar a refletir e a ler o mundo, de capacitar os alunos a selecionar e criti-car as informaes do seu dia a dia (Ferreira; Franco, 2009, p. 104).

    Nosso inventrio encerra-se com as posies de Fernando Cer-ri, professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) e Estevo de Rezende Martins, professor da Universidade de Bras-lia (UnB). Ambos pem acento na ideia de conscincia histrica. Para Cerri, o ensino de histria deve desenvolver atividades que permitam ao educando conhecer histria [...] ao mesmo tempo em que conhece diferentes formas pelas quais se lhe atribui significa-do (Cerri, 2011, p. 131). No entendimento de Martins, os objeti-vos do ensino de histria seriam tanto formar a conscincia e o pensamento histricos como orientar o aprendizado informativo dos eventos do passado (Martins, 2011, p. 85). Somente assim, o

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    ensino contribuiria para a consolidao de uma nova conscincia histrica, simultaneamente pertinente cultura histrica disponvel na sociedade a que se pertence e criticamente independente dela, de modo a que se possa conformar a cultura histrica (individual e comum) da sociedade do dia seguinte (idem, p. 88).

    CONCLUSES

    Neste breve inventrio, vimos que histria escolar foram atri-budas as mais diversas finalidades. Os historiadores brasileiros pensaram-na como formadora do homem culto, sobretudo em suas dimenses sensveis e cognitivas, explorando seus potenciais liter-rio e cientfico, o homem exemplo moral da raa, o homem livre, o patriota brasileiro, o latino-americano, o cidado, o cidado do mundo e, por fim, o protagonista.

    A fim de realizar esses ideais, o ensino de histria foi chama-do a capacitar os alunos para o conhecimento da histria, das di-ferenas entre pocas e das mudanas institucionais, para a com-preenso da ideia de continuidade histrica da humanidade e posterior abertura mudana, para a compreenso do presente, do processo de formao do Brasil atual, do mundo, da historici-dade dos homens e das instituies, das estruturas que explicam os acontecimentos.

    O ensino de histria tambm foi responsabilizado por capaci-tar os alunos a pensar historicamente e de modo disciplinado, a efetuar a crtica histrica reflexo e leitura do mundo, ao uso crtico da informao, construo de identidades, participao poltica, formao da conscincia e do pensamento histricos, tomada de decises futuras, ao julgamento tico-poltico, ao crtica relativa aos problemas nacionais e internacionais e por re-lacionar passado/presente, perceber contradies e solues. Por fim, a histria escolar tambm foi convidada a contribuir com o desenvolvimento de atitudes de tolerncia e a enfrentar os dilemas humanos do final do milnio.

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    >> Itamar FreitasA diversidade desse inventrio esconde (ou revela) a marca de filsofos e cientistas de vrios matizes, ainda que os historiadores do sculo XX tenham se esforado bastante para expuls-los de grande parte dos seus programas. Gente famosa, como ilustrados Kant e Condorcet, os evolucionistas/positivistas/historicistas/pragmatis-tas, como Marx, Darwin, Spencer, Durkheim, Dewey e tambm gente desconhecida, como Hannequin, Haeckel, Villoro.

    A pluralidade tambm revela as apropriaes em termos de epistemologia histrica, nos ltimos 100 anos no Brasil: os histo-riadores da Escola Metdica francesa e norte-americana (Langlois e Seignobos, Johnson), os crticos dos Annales (Ferro, Charbonell), os marxistas (Schaft e Novais), pensadores da educao (Freire), os l-deres de tendncias na prpria escola dos Annales (Febvre, Braudel, Duby) e da nova histria social alem (Rsen).

    A pluralidade de posies, contudo, revela um problema de complexa soluo: qual dessas categorias responde melhor s nos-sas necessidades? O que temos considerado como nossas entre as diferentes necessidades sugeridas por este inventrio?

    Espero que a leitura deste primeiro captulo possa estimul-lo a pensar que a opo por uma ou outra finalidade para a histria ultrapassa a determinao da ltima teoria da histria em vigor nos cursos de formao e excede pobreza cognitiva expressa nas di-cotomias tradicional/moderno, conservador/revolucionrio, posi-tivista/analista, pedagogo/historiador etc. Ela foi e ser, suponho, sempre relativa aos nossos interesses e posies na sociedade.

    Imagine-se como pai de aluno: que funes deveriam cumprir a disciplina, viabilizar a construo da identidade nacional e fornecer competncia literria e cientfica o suficiente para a aprovao do seu filho no Exame Nacional do Ensino Mdio (ENEM)? Imagine-se professor de histria dos anos finais da escolarizao bsica: ser que a identidade nacional e o sucesso no ENEM lhe bastariam? Cla-ro que no. Certamente, voc optaria pela apresentao de conheci-mentos sobre 20 sculos de humanidade e a expanso das capacida-des crticas do seu aluno, pensando-o, no futuro, como cidado do

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    mundo. Imagine-se agora como professor de um curso de licenciatura em histria. Voc concordaria com os fins desejados pelo mestre do ensino fundamental? Outra vez, no! Possivelmente, diminuiria a nfase concedida aos acontecimentos e detalharia as funes crti-cas capacitar os alunos a compreenderem o passado, mediante no-es sofisticadas, como imaginao, evidncia e historicidade e re-presentao, quem sabe at, sintetizaria essa e outras finalidades no conhecido pensar historicamente. E sendo gestor de escola, ficaria satisfeito com a nfase nas capacidades meta-histricas defendidas pelo professor universitrio? No pensaria tambm nas dificuldades de gerir um sistema to plural em termos de finalidades e interes-ses? No pensaria em conciliar vontades dos pais, dos alunos, dos professores e do Estado, de unificar programas e livros didticos na finalidade genrica de formar para a cidadania? Se fosse um depu-tado federal de esquerda, apoiado por instituies que lutam pela ampliao e defesa dos direitos da mulher, no proporia que, entre os fins do ensino de histria, estivesse a transformao de um direi-to humano em valor, como a ideia de igualdade dos sexos perante a lei? Se atuasse como ministro de Estado da Educao, no pensaria em pr em prtica um ensino de histria voltado ao cumprimento das demandas sociais e de organismos internacionais, referendadas pelo parlamento, focando, por exemplo, a ideia de tolerncia em re-lao aos diferentes grupos, como imigrantes, homossexuais e na in-formao sobre a contribuio da experincia indgena e negra para a vida nacional? E se fosse Presidente de Repblica? No pensaria em acentuar conhecimentos, habilidades e valores homogneos que possibilitassem a formao de pessoas capacitadas para gerir um projeto de nao, 6 potncia, em um mundo cada vez mais rpido e globalizado?

    Enfim, com esse inventrio de posies e de interrogaes, qui-semos to somente afirmar que o campo das finalidades foi e conti-nuar a ser um ambiente de disputas e quanto mais democrtica for a sociedade e por isso que lutamos h dcadas , mais distante estaremos de um suposto consenso. Os usos da histria, na forma-

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    >> Itamar Freitas

    o de pessoas, devem variar, porque pessoas que formam pessoas tm vontades e so diferentes, e essas vontades e diferenas modifi-cam-se ao longo do tempo o mesmo valendo para as pessoas sub-metidas formao. O desejvel torna-se, ento, o certo, academi-camente correto, politicamente correto, apenas, na arena poltica. Vence o melhor argumento, ou a mais forte presso.

    Contudo, independentemente dos nossos interesses e das posi-es que ocupamos em sociedade, ser sempre importante retomar velhas questes a respeito das ideias de homem, sociedade, Estado, funes sociais da cincia da histria e acompanhar os seus desdo-bramentos na pesquisa sobre a teoria da histria, aprendizagem e o ensino de histria. o que faremos a seguir, enfatizando algumas das principais polmicas experimentadas no tempo presente, no Brasil.

    REFERNCIAS

    BOSCHI, Caio Csar. Por que estudar histria? Para que serve a histria? O que faz o historiador? Por que importante aprender histria? So Paulo: tica, 2007.

    CARVALHO, Delgado. Introduo metodolgica aos estudos sociais. Rio de Janeiro: Agir, 1957.

    CASTRO, Amlia Domingues de. A histria no curso secundrio brasileiro: estudo evolutivo. Revista de Pedagogia, So Paulo, v. 1, n. 1, p. 59-79, jan./jun., 1955.

    ______. Alguns problemas no ensino da histria. Revista de Histria, So Pau-lo, v. 11, n. 24, p. 257-266, 1955.

    CERRI, Luis Fernando. Ensino de histria e conscincia histrica: implica-es didticas de uma discusso contempornea. Rio de Janeiro: Editora da FGV, 2011.

    CESARINO JNIOR, A. F. Como ensinamos histria. Revista de Educao. So Paulo, v. 13-14, p. 52-60, mar./jun. 1936.

    COSTA, Emilia Viotti. Sugestes para a melhoria do ensino da histria no curso secundrio. Revista de Pedagogia, So Paulo, v. 6/7, n. 11-12, p. 91-104, jan. jun. 1960.

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    DIEHL, Astor Antnio. Histria como reflexo didtica. In: DIEHL, Astor An-tnio; MACHADO, Ironita P. Apontamentos para uma didtica da histria. Passo Fundo: Clio, 2003. p. 79-89.

    DROYSEN, Johann Gustav. Historica: lecciones sobre la Enciclopedia y meto-dologia de la historia. Barcelona: Alfa, 1983.

    FALLACE, Thomas. John Deweys on the origins of the Social Studies: an analysis of the historiography and new interpretation. Review of Educatio-nal Research, v. 79, n. 2, pp. 601-624, jun. 2009.

    FERREIRA, Marieta de Moraes; FRANCO, Renato. Aprendendo histria: re-flexo e ensino. So Paulo: Editora do Brasil, 2009.

    FRANA, Eduardo DOliveira. Resumo do Relatrio do Prof. Eduardo DOliveira Frana. In: FACULDADE DE FILOSOFIA CINCIAS E LETRAS DE MARLIA. I Simpsio de Professores de Histria do Ensino Superior (15 a 20 de outubro de 1961). Marlia: FFCL, 1962. p. 103-118.

    FREITAS, Itamar. A pedagogia histrica de Jonathas Serrano: uma te-oria do ensino de histria para a escola secundria brasileira (1913-1935). So Cristvo: Editora da UFS; Aracaju: Fundao Ovido Tei-xeira, 2008.

    ______. A histria ensinada e a histria por se ensinar a partir das confe-rncias e congressos sobre o ensino secundrio brasileiro (1922-1034). In: Histrias do ensino de histria no Brasil. So Cristvo: Editora da UFS, 2010. v. 2. p. 67-107.GASMAN, Lydna Bessadas. Para o ensino de histria na Escola Nova. Escola Secundria, Rio de Janeiro, n. 8, p. 91-93, jan./mar. 1958.

    HOLLANDA, Guy. Os objetivos e o contedo do ensino da histria no curso secundrio. In: Um quarto de sculo de programas e compndios de hist-ria para o ensino secundrio brasileiro (1931-1956). Rio de Janeiro: INEP/CBPE/MEC, 1957. p. 1-10.

    HOLLANDA, Srgio Buarque de et. al. Histria do Brasil: estudos sociais (das origens Independncia). So Paulo: Companhia Editora Nacional, 1971.

    KOSHIBA, Luiz; PEREIRA, Denise Manzi Frayze. Histria do Brasil. 4 ed. So Paulo: Atual, 1984.

    LANGLOIS, Charles Victor e SEIGNOBOS, Charles. Introduction aux tudes historiques. Paris: Kim, 1992.

    LOURENO, Elaine. Histria Nova do Brasil: revisitando uma obra polmica. Revista Brasileira de Histria. So Paulo, v. 28, n. 56, p. 385-406, 2008.

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    >> Itamar Freitas

    MARTINS, Estevo C. de Rezende. A exemplaridade da histria: prtica e vivncia do ensino. In: FONSECA, Selva Guimares; GATTI JNIOR, Dcio (orgs.). Perspectivas do ensino de histria: ensino, cidadania e conscincia histrica. Uberlndia: Editora da UFU, 2011. p. 83-111.

    MARTINS, Maria do Carmo. Disciplina e Matria: a verso oficial. In: A Histria prescrita e disciplinada nos currculos escolares: quem legitima esses saberes? Bragana Paulista: Editora da Universidade So Francisco, 2002. p. 108-116.

    MSCULO, Jos Cssio. A coleo Srgio Buarque de Hollanda: livros did-ticos e ensino de histria. So Paulo, 2008. Tese (Doutorado em Educao) Programa de Ps-Graduao em Educao: Histria, Poltica, Sociedade Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo.

    MATTOS, Ilmar Rohloff de; DOTTORI, Ella Grinsztein; SILVA, Jos Luiz Wer-neck da. Brasil, uma histria dinmica (1 Volume Do Descobrimento Independncia). So Paulo: Companhia Editora Nacional, 1972.

    NADAI, Elza e NEVES, Joana. Histria do Brasil (2 Grau). 17 ed. So Paulo: Saraiva, 1995.

    NADAI, Elza; NEVES, Joana; ABUCARMA, Suria. Estudos Sociais: o processo de ocupao do espao brasileiro (Manual do professor 5 srie, 1 grau). So Paulo: Saraiva, 1978.

    NOVICK, Peter. Thet noble dream: the objectiviy question and the ameri-can historical profession. Cambridge: Cambridge University, 1998.

    OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de. O direito ao passado: uma discusso necessria formao do profissional de histria. So Cristvo: Editora da UFS, 2011. [Texto original da tese defendida em 2004].

    RAMOS, Francisco Rgis Lopes. A danao do objeto: o museu no ensino de histria. Chapec: Argos, 2004.

    REZENDE, Antonio Paulo; REZENDE, Maria Thereza Didier. Rumos da his-tria: a construo da modernidade o Brasil colnia e o mundo moderno. So Paulo: Atual, 1996. v. 2.

    RIBEIRO, Joo. Memria histrica apresentada congregao do Gymnasio Nacional (Anno de 1901). Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1902.

    RSEN, Jrn. Didtica da Histria: passado, presente e perspectivas a partir do caso alemo. Prxis Educativa. Ponta Grossa, v. 1, n. 2, p. 7-16, jul./dez. 2006.SILVEIRA, Alfredo Balthazar da. Ligeiras observaes sobre o ensino da his-tria da civilizao. Revista Brasileira de Pedagogia. Rio de Janeiro, v. 2, n. 14, p. 258-275, mai. 1935.

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    AS FINALIDADES DA DISCIPLINA ESCOLAR HISTRIA NO BRASIL REPUBLICANO (1900-2011)

    Suria Abucarma. http://altinocorreia.blogspot.com.br/2012/10/morre--prof-suria-abucarmauma-das.html. Capturado em 21 nov. 2013.

    VILLA, Marco Antonio e FURTADO, Joaci Pereira. Brasil: das comunidades primitivas s vsperas da Independncia. So Paulo: tica, 2005.

    NOTAS

    1 Texto originalmente produzido como conferncia de abertura da X Se-mana de Histria e o I Encontro do Grupo de Trabalho sobre Ensino de Histria da Associao Nacional de Histria, ncleo do Cear, proferida na Faculdade de Filosofia Aureliano Matos/Universidade Estadual do Cea-r, Campus de Limoeiro-CE, em 4 de novembro de 2013, a convite dos professores Francisco Autnio da Silva (UECE/FAFIDAM), Joo Rameres Regis (UECE/FAFIDAM) e Fracisco Egberto de Melo (URCA/ANPUH-CE).

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    >> Itamar Freitas

    2Aprendizagens histricas no Brasil recente:

    contribuies da Espanha, Inglaterra e Alemanha (1980-2011)1

    possvel aprender histria entre os 11 e os 17 anos? Se a resposta for positiva, em que consistir tal aprendizagem? Qual a diferena entre aprender histria e pensar historicamente? Quem melhor explica a aprendizagem na disciplina escolar histria: a psicologia, a filosofia, a epistemologia ou a metodologia da histria?

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    Itamar Freitas >>

    APRENDIZAGENS HISTRICAS NO BRASIL RECENTE

    HOMEM, MODERNIDADE E APRENDIZAGEM HISTRICA 1

    Este captulo trata dos majoritrios sentidos de aprendizagem histrica correntes no campo da pesquisa sobre ensino de histria no Brasil e est orientado por uma atitude moderna, isto , selecio-na e discute autores e questes que entendem as noes de Estado, identidades nacionais, a cultura dos direitos humanos, a elaborao de parmetros curriculares etc. como instrumentos relevantes para a manuteno das sociedades.

    Anunciada a filiao principal, fica fcil compreender que a dis-cusso sobre aprendizagem remete positividade da ideia de ho-mem espcie e, consequentemente, necessidade de esse homem vir a ser formado em determinado momento o tempo escolar. Para ns, est claro: quem pensa a subjetividade e a socializao dos indivduos, no raro, pensa em capacitar a gerao seguinte a viver. Viver, por sua vez, significa conhecer, aprender e aplicar padres culturais mantidos pela gerao madura. Tal capacitao resume-se, em grande parte, no desenvolvimento de habilidades e na apresen-tao de conhecimentos sobre essa mesma sociedade, elementos que vm a ser, exatamente, o objeto nuclear da aprendizagem.

    Sobre a natureza desse homem, ao longo dos ltimos quatro sculos tempo de constituio do pensamento moderno , foram produzidas vrias ideias, mas os poderes do homem, estabeleci-dos pelos sistemas de pensamento, so finitos. Quando comparadas, entre si, as filosofias da histria, teleologias, vises de mundo, teorias sociais etc., no encontramos mais que uma dzia de habilidades a desenvolver, passveis de serem agrupadas em modelos ainda mais sintticos, como aquele que divide as potencialidades humanas em conhecer, agir e sentir. Essa constatao possibilita-nos afirmar, inicialmente, que aprender fazer algo com, ou seja, adquirir ou desenvolver determinada habilidade, mobilizando particulares conhecimentos que auxiliem na moldagem dessas capacidades humanas, condizentes com um padro cultural estabelecido por determinada sociedade.

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    >> Itamar Freitas

    Mediante o emprego dessas limitadas habilidades memorizar, reconhecer, criticar, por exemplo , consideradas por grande parte das teorias da aprendizagem, podemos classificar as aprendizagens histricas e selecionar aquelas que tm grande apelo no Brasil, en-tre os pesquisadores do ensino de histria, sobretudo: a(s) teoria(s) construtivista(s) da aprendizagem, fundada(s) em pressupostos de Jean Piaget, Lev. S. Vigotsky, Jerome Bruner e David Ausubel, a edu-cao histrica de Peter Lee e a didtica da histria de Jrn Rsen.

    So essas as abordagens respectivamente, russo/genebrina/estadunidense (codificada, principalmente, pelos espanhis), ingle-sa e alem que sintetizaremos adiante, esperando que possam ser-vir de instrumento para a reflexo sobre a prtica docente. Com elas tentaremos responder s seguintes questes: possvel aprender histria entre os 11 e os 17 anos? Se a resposta for positiva, em que consistir tal aprendizagem? Qual a diferena entre aprender hist-ria e pensar historicamente? Quem melhor explica a aprendizagem na disciplina escolar histria: a psicologia, a filosofia, a epistemolo-gia ou a metodologia da histria?

    Antes, porm, vejamos como foi possvel chegar at esses trs grupos de ideias sobre aprendizagem histrica.

    CONHECER E APRENDER, DENTRO E FORA DA HISTRIA

    No novidade afirmar que historiadores por formao inicial e profissionais da educao experimentam conflitos velados sobre quem deveria ditar as regras no campo da aprendizagem histrica. Mas, quando e por que o debate foi estabelecido? A pesquisa sobre essa questo no existe no Brasil, razo pela qual arrisco algumas hipteses. Em primeiro lugar, importante lembrar que a discusso sobre aprender est, umbilicalmente, ligada questo do conhecer. Embora o aprender, classicamente, incorpore o conhecer no sen-tido de ser apresentado a... e reter como uma das habilidades necessrias, ambos se confundem quando a discusso retroage ao sculo XIX e aos seus antecedentes.

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    Sabemos que quem pensou a formao do homem, no raro, lanou hipteses sobre as capacidades e as limitaes humanas em termos de conhecimento do mundo. Esse movimento est pre-sente no pensamento teolgico de Joo Ams Comenius, no empi-ricismo de John Locke e no positivismo de mile Durkheim, entre outros autores. A frmula demais conhecida: 1. instituio das faculdades mentais e corporais do homem; 2. estabelecimento das funes e limitaes de cada faculdade; 3. explicao sobre forma-o de ideias do trabalho dos sentidos tarefa da razo. A partir da, foram elaboradas e prescritas as estratgias de ensinar de desenvolver habilidades necessrias ao conhecer e/ou de transfe-rir o conhecimento.

    Outros fatos que merecem ser lembrados so o domnio dos fil-sofos sobre o tema da aprendizagem mesmo quando a psicologia e, depois, a pedagogia ganharam status de saber universitrio e o relativo desprezo que a maioria dos historiadores tambm eman-cipados, da filosofia da histria, por exemplo , relegaram s ques-tes do ensino ao longo do sculo XX.

    Claro que tivemos tericos da histria preocupados com as questes do ensino. Quando o assunto foi a defesa da cientificida-de da histria na Universidade, a mais conhecida dupla francesa, Charles-Victor Langlois e Charles Seignobos autores da Introduc-tion aux tudes historiques (1898) , tambm props um antdoto ao ensino, baseado nas habilidades de escutar, copiar e narrar por escrito, memorizar e repetir.

    Para que o ensino se torne eficaz, necessrio reduzir es-tes processos passivos no sendo possvel elimin-los de todo fazendo-o substituir gradativamente por exerccios que ponham o aluno em atividade. Alguns j foram experi-mentados e muitos outros podem ser tentados. O professor pode fazer que o aluno analise gravuras, narraes, descri-es, etc., para delas extrair a essncia dos fatos; esta pe-quena exposio, escrita ou oral, ser uma garantia de que

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    o estudante viu e compreendeu o que lhe foi proposto, ao mesmo tempo que far nascer nele o hbito de s empregar termos precisos. Pode ainda o professor pedir ao aluno um desenho, um croquis geogrfico, ou um quadro sincrnico. Pode faz-lo elaborar um quadro comparativo entre socie-dades diferentes ou um quadro de encadeamento de fatos (Langlois; Seignobos, 1946, p. 231).

    Esse antdoto, como pudemos acompanhar, era, justamente, o emprego do mtodo que fez da histria uma cincia diferenciada da filosofia e das cincias naturais: o mtodo crtico heurstica, anli-se e sntese. Aprender, portanto, entre os metdicos, alm de conhe-cer e memorizar fatos histricos, significava desenvolver e pr em uso as habilidades cotidianas do historiador profissional: analisar, compreender, representar, sincronizar, comparar e encadear fatos histricos (Langlois; Seignobos, 1992, p. 269).

    A iniciativa dos franceses, embora conhecida em outros pases, no foi internacionalizada com a mesma intensidade dos trabalhos de John Dewey e Jean Piaget. O pensamento desses homens foi lar-gamente difundido em grande parte das naes ocidentais, inclusive no Brasil. Marcas do seu pensamento esto impressas nos modelos de formao de professor e no planejamento dos currculos para a escolarizao bsica, ao longo dos ltimos 70 anos.

    O estadunidense John Dewey pensou a aprendizagem de manei-ra geral como os filsofos j exemplificados. Sua base, ao contrrio dos citados historiadores metdicos, era, literalmente, o mtodo das cincias naturais ou mtodo experimental. Ele tambm denunciou a nfase concedida ao desenvolvimento da memria e a suposio de que determinados conhecimentos escolares ativariam especficas e correspondentes capacidades humanas e alertou:

    O nico caminho direto para o aperfeioamento duradouro dos mtodos de ensinar e aprender consiste em centraliz-los nas condies que estimulam, promovem e pem em prova a

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    reflexo e o pensamento. Pensar o mtodo de se aprender inteligentemente, de aprender aquilo que utiliza e recom-pensa o esprito (Dewey, 1979, p. 166. Grifos do autor).

    Quando detalha o ato de pensar, ele explicita as etapas desse mtodo, indicando, consequentemente, todas as habilidades envol-vidas na aprendizagem de algum conhecimento escolar: o ato de pensar implica todos estes atos a conscincia de um problema, a observao das condies, a formao e a elaborao racional de uma concluso hipottica e o ato de a pr experimentalmente pro-va (Dewey, 1979, p. 165).O caso de Jean Piaget o mais conhecido. Teorizando sobre as formas de conhecer, o suo formatou uma teoria do desenvolvimen-to que logo foi empregada como explicao sobre as limitaes e potencialidades do aprender humano. Tal teoria do crescimen-to mental ou desenvolvimento dos comportamentos, incluindo a conscincia (Piaget, 1990, p. 7) expressa os seus dbitos com o pensamento lgico-matemtico. Isso est claro na exposio das caractersticas do pr-adolescente, ou seja, nas potencialidades e limitaes da aprendizagem dos humanos na faixa etria que se ini-cia aos 11 ou 12 anos de idade, em mdia.

    Para ele, sob o ponto de vista cognitivo, o sujeito capaz de combinar ideias, ou hipteses, em forma de afirmaes e negaes, e utilizar operaes proposicionais: implicao (se...ento), disjun-o (ou...ou...ou os dois), excluso (ou...ou), incompatibilidade (ou...ou...ou nem um nem outro), implicao recproca entre outras. Sob o ponto de vista afetivo, potencializam-se os valores ideais ou su-praindividuais. As ideias de ptria e justia social, por exemplo, no assumem valor afetivo adequado seno no nvel dos 12 anos para cima. (Piaget, 1990, p. 111-128).

    Piaget e Dewey na verdade, mais Dewey que Piaget escreve-ram sobre o ensino de histria. Ambos apresentaram objees, im-possibilidades de ordem vria que, infelizmente, no poderemos comentar neste espao (Dewey, 1913; 1936; Piaget, 1998). Seus lei-

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    tores, entretanto, sobretudo no Brasil, no foram capazes de singu-larizar as aprendizagens histricas, ou seja, permaneceram tmidos na crtica ao centralismo ocupado pelo mtodo das cincias experi-mentais ou do raciocnio lgico-matemtico.

    Em relao s ideias de Langlois e Seignobos, as apropriaes foram tambm reduzidas. Apesar de incorporarem a tese de que a cientificidade da histria estaria no mtodo crtico j interna-cionalizado no ocidente , os historiadores, em sua maioria, dei-xaram a reflexo sobre as potencialidades e limitaes do conhe-cer/aprender humano, sob a tutela dos profissionais da psicologia e da pedagogia, optando pelo controle da produo e seleo dos acontecimentos e processos histricos que constituiriam os curr-culos do ensino bsico, e somente destinado aos adolescentes. Em outras palavras, ocuparam-se de questes, como: os alunos devem aprender mais histria poltica ou econmica? Devem conhecer a experincia individual ou coletiva? Devem reter os acontecimentos e perodos-chave da histria nacional, ou das histrias nacional e mundial de forma integrada?

    Nos ltimos 20 anos, quando a pesquisa sistemtica sobre o ensino de histria ganhou espao nas universidades, ambas as perspectivas foram recuperadas. Temos, assim, dois grupos no ho-mogneos isso entre os pesquisadores, porque os professores da escolarizao bsica, em sua maioria, no levam em considerao a problemtica discutida neste texto. O primeiro reflete sobre apren-dizagem histrica, partindo das conquistas da psicologia de Piaget, por exemplo, ainda que para neg-las ou reform-las. O segundo minimiza, omite ou exclui essa contribuio e fundamenta a apren-dizagem histrica na cientificidade da histria ainda que, no haja consenso sobre a mesma. Conheamos alguns exemplares do pri-meiro grupo e a primeira grande ideia de aprendizagem vigorante2.

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    APRENDER HISTRIA NA PERSPECTIVA DOS CONSTRUTIVISTAS: CARRETERO, POZO, ASENCIO, BRUNER E AUSUBEL

    A definio operacional de aprendizagem, como anunciada na introduo, incorpora a ideia de que aprender fazer algo com al-guma coisa, ou seja, envolve o desenvolvimento de habilidades e a manipulao de conhecimentos. Os critrios de seleo e uso desses conhecimentos e habilidades, durante o sculo XX, foram ditados por psiclogos do desenvolvimento, da aprendizagem ou do ensino nos quais os pedagogos buscam auxlio. Assim, para o caso brasi-leiro, desde os anos 1930, quando se iniciaram os cursos de licencia-tura, a ao chamada aprender vem sendo traduzida com os mais diferentes sentidos que depem sobre a diversidade de psicologias em conflito: reter informao, modificar o comportamento, expe-rimentar e descobrir, e relacionar novo conhecimento ao conheci-mento adquirido fora da escola, por exemplo.

    Na Europa, notadamente na Espanha, de onde os brasileiros tm extrado muitos dos seus referenciais sobre a escolarizao bsica, es-ses traos marcam a trajetria de autores, como Mario Carretero, Juan Ignacio Pozo e Mikel Asensio. Suas pesquisas partiam dos mesmos problemas enfrentados por ingleses, estadunidenses e brasileiros. Elas refutavam e ainda refutam a aprendizagem memorstica e no significativa, comumente detectada entre os alunos adolescentes.

    Em termos tericos, da mesma forma, Carretero, Pozo e Ascen-sio criticaram as pesquisas sobre o ensino de histria, orientadas pelas hipteses de Jean Piaget, demasiadamente centradas na busca dos sentidos e usos de conceitos vrios das cincias naturais cau-sa, consequncia, previso e inferncia a partir de hipteses , para dar respostas incompreenso dos alunos acerca do passado.

    Apesar das crticas, os referidos autores mantiveram a ideia genebrina de que o aprender em cincias sociais significava assi-milar. Obviamente, tratava-se do assimilar de Piaget, com toda a dinmica da ao conhecida h dcadas: equilibrao, desequilibra-o, assimilao, acomodao e equilibrao. Os autores, entretan-

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    to, incorporaram a crtica e os complementos teoria do desenvol-vimento do terico de Genebra e anunciaram a aprendizagem em cincias sociais, inclusa a histria, como um processo cognitivo interno que recebe ajudas externas , dependente do nvel de de-senvolvimento do indivduo estimulado pelas oportunidades de aprender , dependente do emprego de conflitos cognitivos con-tradio entre os saberes prvios e os saberes cientficos e depen-dente da interao social considerados tambm o efeito dos re-foros e da imitao. Em sntese, aprender em histria, segundo os citados pesquisadores espanhis, era um processo que resultava em assimilao. Essa a explicao, portanto, de um construtivismo fundado em Piaget, Vigotsky, Bruner e Ausubel, mas que no des-preza a contribuio de comportamentalistas como F. B. Skinner (Carretero; Pozo; Asensio, 1989, p. 15-29).

    Quando abordaram, especificamente a aprendizagem histrica, os autores pareceram eleger outro vilo, alm das aprendizagens memorsticas: a pedagogia dos objetivos e/ou a pedagogia do dom-nio. Para os autores, essas novas abordagens, na verdade, operavam uma radical mudana de orientao, migrando da nfase nos conhe-cimentos para a nfase nas habilidades (Carretero; Pozo; Asensio, 1989, p. 13-14, 16-7).

    Anos adiante, apesar de no explicitar a ideia de aprendizagem, Carretero ampliou o papel da epistemologia histrica e conservou, para o ensino de histria, as caractersticas do pensamento formal, anunciadas por Piaget (Carretero, 1997).

    Como nenhuma crtica se esgota em si mesma, os autores, evi-dentemente, propuseram duas possibilidades de tratamento con-junto das habilidades e conceitos que se distanciassem da exclusiva memorizao dos acontecimentos e/ou do exclusivo treino de ha-bilidades mentais: a aprendizagem como inveno e descoberta e a aprendizagem verbal significativa.

    No comentrio original, os autores hierarquizaram as duas abor-dagens, afirmando que o aprender como descoberta era frgil e de-veria ser corrigido pelo aprender como apreenso significativa por

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    parte do aluno. Neste texto, porm, no temos a inteno de indicar a aprendizagem ideal. Por isso, apresentamos as duas noes em disputa, a partir das formulaes dos prprios autores, Jerome Bru-ner e David Ausubel.

    Para o estadunidense Jerome Bruner, ensinar apresentar a es-trutura da matria. criar situaes nas quais o aluno possa apren-der como as coisas se relacionam. Aprender, consequentemente, captar a estrutura da matria em estudo compreend-la de modo que permita relacionar, de maneira significativa, muitas outras coi-sas com ela (Bruner, 1969, p. 7). Nessas frases, est implcita a ideia de que a histria, por exemplo, estruturada por uma rede de con-ceitos e princpios hierarquizados que devem ser dominados pelo professor, para que o aluno avance na compreenso dos mesmos dos mais simples aos mais complexos.

    Alm dos princpios, ideias gerais, generalizaes alm da es-trutura da matria , Bruner tece consideraes sobre um contedo especfico requisitado como importante para alguns estudiosos da dcada de 1950: o estilo de pensamento de uma disciplina, as ati-tudes ou os expedientes heursticos, em outras palavras, os modos de fazer com os quais e pelos quais os cientistas operam para des-cobrir algo nas suas respectivas reas. Em histria, tais contedos seriam, por exemplo, as operaes processuais da pesquisa: achar e organizar fontes histricas, ler, criticar e sintetizar informaes ex-tradas de fontes histricas. Vem da a ideia de que aprender captar a estrutura da matria, descobrindo como interagem suas partes. Em O processo da educao ttulo que empregamos nesta sn-tese, Bruner no toma posio sobre a necessidade de incluir os procedimentos os fazeres do ofcio como contedos estruturais. Essa orientao, por outro lado, foi aplicada nas experincias com o ensino de histria na Inglaterra, na dcada de 1970, onde, ao invs de aprender histria diretamente, os alunos foram estimulados a fa-zer histria. Aprender histria significaria, ento e tambm des-cobrir como o conhecimento histrico fora produzido (Carretero; Pozo; Asensio, 1989, p. 220-1).

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    Passemos agora segunda alternativa ao aprendizado histrico como exclusiva reteno de conhecimentos por memria, ou exclu-sivo desenvolvimento de habilidades: a teoria da aprendizagem ver-bal significativa de David Ausubel. Para este autor e tambm para os seus colaboradores e continuadores Joseph Novak e Helen Ha-nesian que publicaram Psicologia educacional (1980), o aluno no aprende, exclusivamente, diante do professor. Mesmo estando em sala de aula, sob o ponto de vista dos processos decisivos que atra-vessam os vrios tipos de aprendizagem, o aluno pode receber ou descobrir os contedos. Em outras palavras, a aprendizagem escolar pode ser realizada por recepo ou por descoberta.

    Na aprendizagem receptiva [...] todo o contedo daquilo que vai ser aprendido apresentado ao aluno sob a forma final [...]. Do aluno exige-se somente internalizar ou incorporar o material (uma lista de slabas sem sentido ou adjetivos em-parelhados; um poema ou um teorema geomtrico) que apresentado de forma a tornar-se acessvel ou reproduzvel em alguma ocasio futura [...].[Na] aprendizagem por descoberta [...], o contedo prin-cipal daquilo que vai ser aprendido no dado, mas deve ser descoberto pelo aluno antes que possa ser significativa-mente incorporado sua estrutura cognitiva. A tarefa prio-ritria desse tipo de aprendizagem, em outras palavras, descobrir algo qual das duas passagens do labirinto leva ao objetivo, a natureza precisa das relaes entre duas va-riveis, os atributos comuns de diferentes objetos, e assim por diante (Ausubel; Novak; Hanesian, 1980, p. 20).

    A aprendizagem por descoberta predominante na resoluo de problemas no dia a dia, e a aprendizagem por recepo a mais empregada na aquisio de conhecimentos acadmicos (Ausubel; Novak; Hanesian, 1980, p. 21). Em alguns momentos, os dois tipos so superpostos, dentro ou fora da escola. Ambos, em suma, so im-

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    portantes para a vida e devem ser cultivados. No entanto, seja por descoberta, seja por recepo, importante que o aluno adquira significados e de forma significativa. Vem da a expresso aprendi-zagem significativa.

    Para Ausubel, adquirir significado quer dizer associar men-talmente uma palavra ao seu referente. Assim, somente ocorre a aprendizagem significativa quando as novas ideias so relaciona-das a algum aspecto relevante existente na estrutura cognitiva do aluno, como por exemplo, uma imagem, um smbolo, um conceito ou uma proposio. Mas, para que ela ocorra, necessrio que o alu-no manifeste uma disposio para a aprendizagem significativa e, ainda, que o material aprendido seja potencialmente significativo (Ausubel; Novak; Hanesian, 1980, p. 34).

    Quando essas condies no so satisfeitas, ou quando se pratica o extremo oposto, a aprendizagem recebe o nome de automtica. Ob-serve essa proposio: O movimento a favor da Repblica iniciou-se no Brasil em 1870, na cidade do Rio de Janeiro, com a publicao do Manifesto Republicano (Berutti; Marques, 2005, p. 132). Sendo obri-gado a l-la e rel-la, provvel que o aluno a retenha por algum tem-po, mas tal proposio no far sentido algum, se ele desconhecer o significado de Repblica, manifesto e de sculo XIX, isto , se tais conceitos no lhe forem familiares, ou no estiverem relacionados aos seus respectivos referentes concretos. Neste caso, provvel que o aluno se interrogue: quem ou o que essa tal de Repblica!!?

    APRENDER HISTRIA NA PERSPECTIVA DE PETER LEE3

    Durante a exposio das ideias de aprendizagem histrica re-novadas, Carretero, Pozo e Asensio citam as pesquisas inglesas das dcadas de 70 e 80 do sculo passado como modelo, apresentan-do a experincia de fazer histria ao invs de aprender histria, como exemplo da contribuio construtivista principalmente de Bruner que resultou em nova explicao intitulada aprendizagem por descoberta.

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    Os ingleses incluindo-se Peter Lee, de quem vamos tratar agora , no explicitam essa filiao pedaggica. Eles parecem reivindicar muito mais a participao da histria na resoluo de problemas de aprendi-zagem do ensino de histria, empregando princpios histricos extra-dos de historiadores cannicos na Inglaterra, a exemplo de Robin Geor-ge Collingwood (1889-1943) The Idea of History (1946; 1993) e The Principles of History and Other Writings in Philosophy of History (2001) e Michael Joseph Oakeshott (1901-1990) Rationalism in Politics and Other Essays (1962) e On History and Other Essays (1983).

    Assim, independentemente da origem, os ingleses empregam o centenrio princpio citado por historiadores, como Charles-Victor Langlois, na Frana; Rafael Altamira, na Espanha; Henry Johnson, nos Estados Unidos; e, Jonathas Serrano, no Brasil: se a histria cincia fundada no mtodo crtico , o ensino de histria deve tam-bm ser cientfico, ou seja, as operaes processuais do historiador devem ganhar centralidade no currculo da educao bsica.

    O fato de os pesquisadores lanarem mo desse princpio no quer dizer que eles apenas repetem os tericos da histria e do en-sino do final do sculo passado. A novidade de Peter Lee e do seu grupo est, principalmente, na realizao de pesquisa bsica com alunos de histria da escola elementar e da escola secundria na Inglaterra. Alm disso, Lee reafirma a necessidade de os profissio-nais da rea considerarem as especificidades de cada saber escolar nos trabalhos de investigao sobre ensino e aprendizagem, afas-tando-se, consequentemente, dos clssicos objetos de ensino o conhecimento factual e hipteses como a diviso por estgios e as caractersticas psicolgicas universais dos alunos empregados por Piaget e seus seguidores. Vejamos, ento, as singularidades do pensamento da educao histrica em seu nascedouro4, iniciando com a reflexo proposta na introduo deste texto: as relaes entre homem, formao e ensino de histria.

    Lee e seus parceiros da educao histrica no costumam teo-rizar sobre o homem, ou sobre os objetivos do ensino de histria para formar esse homem. As raras referncias que encontramos nos

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    textos analisados indicam uma compreenso do homem como ser constitudo por pensamento, sentimento e vontade. Isso o que su-gerem as citaes relacionadas definio de compreenso hist-rica. Para ele, compreender o outro no significa partilhar dos seus sentimentos e motivaes a exemplo de comemorar, ou chorar com os homens do passado , uma vez que os sentimentos dependem dos valores e os valores dos alunos so diferentes dos valores dos homens do passado. Compreenso ao contrrio de isolada sensibi-lizao uma realizao e uma disposio (Lee, 2003, p. 20-1).

    Como realizao, algo que acontece quando sabemos o que o agente histrico pensou, quais os seus objetivos, como entenderam aquela situao e se conectamos tudo isto com o que aqueles agen-tes fizeram (Lee, 2003, p. 20). Alm de realizao, fruto de ope-rao racional do aluno, a compreenso somente possvel como disposio. Ela ocorre apenas se os alunos estiverem dispostos a considerar o homem do passado como um ser humano respeitvel, como ns (Lee, 2003, p. 21), ou seja, quando os alunos aceitarem a ideia de que as pessoas no passado tinham as mesmas capacidades para pensar e sentir que ns, mas no viam o mundo como ns o vemos hoje (Lee, 2003, p. 27).

    Como possvel, ento, essa realizao? Ele e os seus parcei-ros respondem reiteradas vezes: substituindo as ideias do senso co-mum que os alunos mantm sobre a histria e o passado por ideias professadas pela epistemologia histrica de corte metdico.

    Os alunos, tal como os historiadores, precisam de compreen-der por que motivo as pessoas actuaram no passado de uma determinada forma e o que pensavam sobre a forma como o fizeram, mesmo que no entendam isto to bem quanto os historiadores. A consequncia directa de os alunos no com-preenderem o passado que este se torna uma espcie de casa de gente desconhecida a fazer coisas ininteligveis, ou ento uma casa com pessoas exactamente como ns, mas ab-surdamente tontas (Lee, 2003, p. 19).

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    >> Itamar Freitas

    Para Peter Lee, as crianas chegam escola com duas ideias fr-geis: o presente como ponto de partida para o que normal e o progresso, no sentido de avano tecnolgico. Aplicadas leitura do passado, tais ideias induzem as crianas a pensarem o passado como obrigatoriamente deficitrio e as aes das pessoas do pas-sado como fora do normal (Lee, 2003, p. 22, 24).

    Para modificar essa tpica viso do senso comum, os adeptos da educao histrica sugerem que o professor elabore estratgias que promovam o desenvolvimento dos conceitos e procedimentos metahistricos. Assim, desde as investigaes e publicaes de De-nis Shemilt (1980)5 e Peter Rogers (1978)6, alm do prprio Lee e demais autores aqui citados, ganha nfase, na Inglaterra, a ideia de que os alunos de histria no devem aprender apenas os conte-dos substantivos retidos e verbalizados como tal. Lee e Ashby rea-firmam, assim, a necessidade de os alunos tambm dominarem os conceitos e procedimentos dos historiadores.

    Os mesmos autores, porm, alertam que a ideia no formar historiadores mirins. A meta fazer com que os alunos pensem ra-cionalmente sobre o passado e o presente em oposio ao senso comum. E pensar racionalmente s possvel com a aquisio de co-nhecimentos e habilidades historiadoras (Ashby, Lee, 2000, p. 200).

    Como deve, ento, proceder o professor? Que tipo de aprendi-zagem histrica deve ser planejada? Na prtica, aprender histria fazer questionamento s fontes, validar seus argumentos e evitar anacronismos, operaes possveis com a aquisio de conceitos e os procedimentos relacionados aos termos tempo, mudana, com-preenso, causa, evidncia e relato (Lee, 2005, p. 32, 41). Com o sis-temtico emprego desses princpios, da avaliao diagnstica e de modelos de progresso extrados da pesquisa bsica, os professores podero acompanhar o desenvolvimento das ideias poderosas, ou ideias de segunda ordem conceitos e procedimentos histricos no curso da escolarizao dos alunos (Ashby, Lee, 2000, p. 200). Em sntese, os pesquisadores da educao histrica sugerem que a investigao histrica transforme-se no centro do currculo de

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    histria e seja reconhecida como um empreendimento srio nas aulas de histria (Ashby, 2006, p. 153).

    Contudo, habilitar os alunos a compreenderem o passado ao modo do historiador no basta para que a histria funcione como ferramenta de orientao do aluno no tempo (Lee, 2006, p. 145). necessrio lhe oferecer algum contedo acontecimental. Qual con-tedo seria esse? Estariam, ento, sugerindo que continussemos a lanar mo dos programas enciclopdicos e das cannicas nar-rativas dos livros didticos como a histria nacional e a histria do mundo?

    No bem isso o proposto. Para Lee, e tambm para Jonathan Howson, com quem escrever depois, apresentar narrativas clssi-cas ou listas de perodos no habilita o aluno a transformar o pas-sado em ferramenta de orientao no tempo. O ideal oferecer um ponto de vista geral de padres de mudanas de longo prazo (Lee, 2006, p. 145). Estudantes devem assimilar determinados padres de mudana, expressos por quadros sinpticos temticos as Fra-meworks knowledge7 [estruturas de conhecimento] que percor-ram longas duraes, como no excerto que se segue.

    Quadro 1 Excerto da estrutura de conhecimento Modos de produo

    H anos atrs Como voc gasta seu tempo? O que voc come? Quanto tempo voc vive?60.000aC. Predador: voc olha

    para as razes e frutas, pequenos animais, crustceos, moluscos e larvas...

    Tudo que achar e poder ser digervel. s vezes come pouco...

    Voc pode morrer ao nascer. Se no, provvel que morra antes dos 5 anos de idade e no vive mais que 30 anos... 7.000aC. Agricultor: voc cuida

    do rebanho, semeia, combate ervas dani-nhas, faz po, toma cerveja...

    Quando tem sorte, voc come carne e bebe leite. Todos os dias voc come po, feijo e mingau. Pode armazenar comida para sobreviver nos momentos difceis...

    Vive de 30 a 40 anos. Voc pode se recuperar de leses e doenas, mas mais propenso a ficar doente ou morrer na guerra ou em incndios domsticos...

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    >> Itamar Freitas

    H anos atrs Como voc gasta seu tempo? O que voc come? Quanto tempo voc vive?150 Operrio industrial:

    voc vai ao trabalho na fbrica ou na mina (mulher e homem, meninos e meninas). Voc reserva algumas horas por semana para o lazer...

    Voc come carne, po, fru-tas e legumes frescos. Voc bebe ch e come alimentos de outros pases. Se voc puder trabalhar e ganhar dinheiro, pode sempre tomar cerveja...

    Vive uns quarenta anos, mas a doena grande assassina, especialmente das crianas menores de 5 anos. Se voc fica velho ou doente e tem famlia capaz de cuidar de voc, improvvel que viva muito tempo...

    Hoje Trabalhador do setor de servios: voc vai trabalhar em uma loja ou restaurante. Voc ensina, enfermeira, resolve problemas de matemtica ou usa computadores. Alguns contam piadas ou prati-cam esportes...

    Voc come sanduche, aquece congelados. Voc tambm come (e bebe) demais. Raramente sente fome e est mais propenso a ter excesso de peso do que passar fome ...

    Voc pode esperar viver 70 ou 80 anos ... a menos que falte comida, pois recebemos quase todos os nossos alimentos do exterior e a populao mundial est crescendo rapidamente...

    Adaptado de Howson e Shemilt (2011).

    Observem que um quadro bem simples, semelhante ao que vimos nos livros didticos ao longo do sculo XX. Mas, isso s apa-rncia. Vejam que o ponto de vista o do aluno, que as perguntas so bsicas sobre a vida e, por isso mesmo, significativas. Veja tambm que no h um referente espacial, ou povo especfico. Tudo que se disponibiliza para a reteno dos alunos so padres de mudana em tempos bem distantes uns dos outros.

    Assimiladas as informaes do quadro, os professores podem induzir os alunos a fazerem generalizaes sobre o que aconteceu entre um tempo e outro Entre 60.000 aC. e hoje, as pessoas passa-ram cada vez menos tempo produzindo alimentos e gastando mais tempo fazendo outras coisas!. Tambm pode estimul-los a elabo-rar questes: Por que os agricultores envolveram-se em mais lutas e guerras que os outros povos? (Shemilt, 2009, p. 163-4).

    Partindo dessas e outras questes e generalizaes, os professo-res e os alunos podem ampliar o nmero de divises temporais (li-

    Continuao

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    Itamar Freitas >>

    APRENDIZAGENS HISTRICAS NO BRASIL RECENTE

    nhas), ampliar o nmero de questes (colunas) tornando o quadro ainda mais sofisticado (Howson; Shemilt, 2011). Podem at mesmo retom-lo em formato mais complexo no semestre ou ano seguinte. O fundamental que esse quadro sirva como acelerador da aprendi-zagem histrica, na medida em que oferece uma espcie de suporte provisrio no qual as narrativas podem ser construdas (Lee; How-son, 2009, p. 241; Howson; Shemilt, 2011, p. 77)8.

    Com esses exemplos, portanto, podemos afirmar que, para Peter Lee, a aprendizagem histrica dos alunos tanto um processo de aqui-sio da compreenso sobre o trabalho do historiador, quanto o de ma-nipulao de uma estrutura temporria de conhecimento histrico.

    APRENDER HISTRIA NA PERSPECTIVA DE JRN RSEN

    Nos trabalhos do terico da histria alemo Jrn Rsen, a dis-cusso sobre aprendizagem histrica atribuda ao campo da did-tica da histria9. A didtica tem como objeto a conscincia histrica que estruturada por processos de pensamento que determinam o comportamento das pessoas. Aprendizagem histrica so esses mesmos atos de pensamento em operao constante (Rsen, 2010, p. 42). Ela um processo de desenvolvimento da conscincia his-trica no qual se deve adquirir competncias da memria histrica (Rsen, 2010, p. 113).

    Essas ideias de didtica e de aprendizagem so mais int