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Mecˆ anica e Ondas fasc´ ıculo 16 Copyright c 2008 Mario J. Pinheiro All rights reserved April 23, 2013 Contents 17 Lei da Gravita¸c˜ ao Universal 394 17.1 Lei da Gravidade de Newton .................... 395 17.2 Energia potencial gravitacional ................... 398 17.3 Princ´ ıpio da sobreposi¸ ao ...................... 401 17.4 Energia potencial de uma calote esf´ erica e de uma part´ ıcula . . . 402 17.5Descri¸c˜ ao da experiˆ encia de Cavendish ............... 404 17.6 An´ alise elementar da ´ orbita translunar ............... 406 17.7 Energia potencial do sistema esfera-part´ ıcula ........... 409 17.8 For¸ ca gravitacional exercida entre objectos com simetria esf´ erica 411 17.9 For¸ cas gravitacionais sobre objectos extensos ........... 413 17.10For¸ ca de mar´ es (ou for¸ ca tidal) ................... 413 17.11Peso e for¸ca gravitacional ...................... 415 18 Movimento planet´ ario 416 18.1 Velocidade de escape ......................... 420 18.2 Movimento Planet´ ario Geral ..................... 421 18.3 Propriedades Gerais do Movimento Planet´ ario geral ....... 424 18.4 Movimento planet´ ario-sistema de 2 part´ ıculas ........... 425 18.5 ´ Orbitas caracter´ ısticas ........................ 436 18.6 ´ Orbitas circulares ........................... 439 18.7 ´ Orbitas el´ ıpticas ........................... 441 18.8 Leis de Kepler revisitadas ...................... 444 19 F´ ısica no sistema de coordenadas em rota¸c˜ ao 449 Mario J. Pinheiro Departamento de F´ ısica e Instituto de Plasmas e Fus˜ ao Nuclear Instituto Superior T´ ecnico email: [email protected] 393

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Mecanica e Ondas

fascıculo 16

Copyright c© 2008 Mario J. PinheiroAll rights reserved

April 23, 2013

Contents

17 Lei da Gravitacao Universal 39417.1 Lei da Gravidade de Newton . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39517.2 Energia potencial gravitacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39817.3 Princıpio da sobreposicao . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40117.4 Energia potencial de uma calote esferica e de uma partıcula . . . 40217.5 Descricao da experiencia de Cavendish . . . . . . . . . . . . . . . 40417.6 Analise elementar da orbita translunar . . . . . . . . . . . . . . . 40617.7 Energia potencial do sistema esfera-partıcula . . . . . . . . . . . 40917.8 Forca gravitacional exercida entre objectos com simetria esferica 41117.9 Forcas gravitacionais sobre objectos extensos . . . . . . . . . . . 41317.10Forca de mares (ou forca tidal) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41317.11Peso e forca gravitacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 415

18 Movimento planetario 41618.1 Velocidade de escape . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42018.2 Movimento Planetario Geral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42118.3 Propriedades Gerais do Movimento Planetario geral . . . . . . . 42418.4 Movimento planetario-sistema de 2 partıculas . . . . . . . . . . . 42518.5 Orbitas caracterısticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43618.6 Orbitas circulares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43918.7 Orbitas elıpticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44118.8 Leis de Kepler revisitadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 444

19 Fısica no sistema de coordenadas em rotacao 449

Mario J. PinheiroDepartamento de Fısica e Instituto de Plasmas e Fusao NuclearInstituto Superior Tecnicoemail: [email protected]

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“Wise is he who enjoys the show offered by the world.”

- Fernando Pessoa

“The Future is indeed within us and is woven by ourselves. Notbeing fixed, like the Past, it can be transformed by our own efforts.The Reparable of the present soon becomes the Irreparable of thefuture. The action of Chance, that is to say, of unknown causes, isconsiderable in the march of events, but it has never yet stopped anation from deciding its own fate.”

- Gustave Le Bon, in “The World Unbalanced”.

17 Lei da Gravitacao Universal

Em 1687 Sir Isaac Newton publicou a lei da gravitacao universal na sua obraPrincipia Mathematica. Nela era dito que:

cada partıcula do universo atrai outra partıcula com uma forca quee proporcional ao produto das suas massas e inversamente propor-cional ao quadrado da distancia entre elas.

Na simplicidade desta lei, Newton condensou todas as observacoes astronomicasacumuladas ao longo dos seculos. Numerosos astronomos tentaram explicar aordem aparente do movimento do Sol e dos planetas no ceu, em particular osseus aspectos recorrentes:

• ciclo do dia e da noite;

• progressao anual dos planetas;

• retorno periodico dos planetas.

Em 150 A.C., Claudius Ptolomeu 1 generalizou os trabalhos realizados pelosGregos. A Terra constituıa o centro do sistema cosmologico. Inventou-se os epi-ciclos, cırculos no interior do grande cırculo tracado por cada planeta, chamadoo deferente 2. Em particular, admitiu que os centros dos epiciclos de Mercurioe Venus alinhavam-se numa linha recta que ligava a Terra ao Sol. Este modeloexplicava a variacao do brilho dos planetas e podia predizer as futuras posicoesdos planetas. Tudo isto esta ilustrado na Fig. 1.

1Claudius Ptolomeus foi um notavel astronomo de Alexandria, autor de obras importantes:Tetrabiblos (Astrologia), Geografia e Harmonia Musical. O modelo de Ptolomeu constitui umaperfeicoamento do Sistema Deferente-Epiciclo, imaginado por dois astronomos e matematicosgregos Apolonio e Hiparco.

2Deferente significa literalmente aquele que arrasta.

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Figure 1: Sistema cosmologico de Ptolomeu.

Com o sistema epiciclos-deferente podia-se explicar qualquer movimento planetario,mas a custa de uma excessiva complicacao.

Nicolau Copernico (1473-1543) propos uma teoria radicalmente nova sobre osistema solar, colocando o Sol no centro e a Terra e os outros planetas revolvendoem redor do Sol em cırculos, porem mantendo os epiciclos de modo a mantero movimento circular uniforme que era suposto os planetas manterem. Estavaassim criada a teoria heliocentrica do sistema solar. Este modelo explicava omovimento retrogrado observado.

Kepler (1571-1630) introduziu as orbitas elıpticas e quantificou com grande pre-cisao os dados recolhidos por Tycho Brahe (1546-1601).

Leis de Kepler:

• Primeira Lei de Kepler: “O planeta em orbita em torno do Sol descreveuma elipse em que o Sol ocupa um dos focos”.

• Segunda Lei de Kepler: “A linha que liga o planeta ao Sol varre areasiguais em tempos iguais”.

• Terceira Lei de Kepler: “Os quadrados dos perıodos de revolucao dosplanetas sao proporcionais aos cubos dos eixos maximos de suas orbitas”.

17.1 Lei da Gravidade de Newton

Sir Isaac Newton conseguiu explicar as Leis de Kepler com apenas algumasleis simples que constituem a Mecanica Newtoniana. Em particular, Newtondescobriu que alguns princıpios gerais unificavam o Ceu e a Terra, mostrandoque todos os fenomenos na Natureza, aqui na Terra como nos Ceus 3, estavamsujeitos as mesmas leis do movimento e da gravitacao.

3“Venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na Terra como no Ceu” - excerto doEvangelho Segundo Sao Mateus, Cap. VI.

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Figure 2: O movimento retrogrado dos planetas na perspectiva do modelo he-liocentrico de Copernico.

Figure 3: Dados planetarios.

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Newton mostrou que se duas partıculas tem massas m1 e m2 e estao separadaspela distancia r, o modulo da forca gravitacional que as atrai e dado por:

F =Gm1m2

r2, (17.1)

onde G = 6.672 × 10−11 N.m2/kg2 e a constante da Gravitacao Universal, quee usualmente medida por experencias do tipo de Cavendish 4.

As suas caracterıstica sao as seguintes:

• lei do quadrado inverso;

• forca atractiva;

• aplica-se a todo o objecto com massa;

• os seus efeitos estendem-se ao infinito.

Na forma vectorial esta lei escreve-se:

−→F 12 = −Gm1m2

r221

−→u r, (17.2)

onde−→F 12 e a forca que m1 exerce sobre m2. De acordo com a lei da accao-

reaccao para forcas centrais, verifica-se sempre−→F 12 = −

−→F 21. (17.3)

No nucleo galactico, a formacao das estrelas ocorre no seio das nuvens molec-ulares. Os astronomos acreditam actualmente que uma nuvem de gaz isola-se,afundando-se sobre ela mesma devido ao seu peso (a forca da gravidade). Apressao no nucleo aumenta, aquecendo-o, e assim favorecendo a ocurrencia dereaccoes nucleares, na origem da emissao de luz. A nossa Galaxia forma o equiv-alente a tres vezes a massa solar por ano, o que representa muito pouco emrelacao ao que seria expectavel, dada a profusao de gas interestelar. E porque?Porque ha uma fonte de perturbacao, as nuvens onde se formam as estrelas saoalvo de turbulencia que provoca a dispersao desse gss, provocada pela activi-dade das estrelas mais proximas que explodem, criando uma onda de choque. Adimensao das estrelas depende dessa turbulencia e, no seu nascimento, a maio-ria das estrelas tem a massa aproximadamente de 0.3 massas solares. Algumasdelas atravessam regioes do espaco ricas em materia, aumentando a sua massapor acrecao de gas. Por exemplo, a nebulosa RCW 49, e uma das mais prolıficasprodutoras de estrelas na nossa Galaxia.

4O valor oficial CODATA atribuıdo a G em 1986 foi G = (6, 67259 ± 0.00085) × 10−11

m3Kg−1s−2 e foi baseado nas medidas feitas por Luther e Towler em 1982. Contudo, ovalor de G foi posto em questao devido a novas medidas feitas por grupos na Alemanha,Nova Zelandia e Russia. Por exemplo, em 1996, um grupo alemao do “German Instituteof Standards” liderado por W. Michaelis obteve um valor para G que e 0.6 % superior aovalor aceite. Outro grupo da University of Wuppertal, Alemanha, liderado por Hinrich Meyerencontrou um valor que e 0.06 % inferior. O grupo russo encontrou uma variacao curiosa notempo e no espaco que vai ate +0.7 %. Daqui resulta uma controversia, e uma procura pararealizar experiencias mais precisas, mas tem sido impossıvel ate agora...

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Figure 4: Forca gravitacional de m1 sobre m2.

17.2 Energia potencial gravitacional

Mostramos em Seccao anterior que a variacao da energia potencial entre doisestados i e f e dada por

∆U = Uf − Ui = −∫ r2

r1

−→F (r) · d−→r . (17.4)

No caso de uma partıcula m situada acima da superfıcie terrestre, obtem-se:

−→F = −GMTm

r2−→u r

Uf − Ui = GMTm∫ r2r1

drr2 = GMTm[− 1

r ]r2r1

Uf − Ui = −GMTm(

1rf− 1

ri

) (17.5)

A escolha do ponto de referencia e arbitrario. Seja Ui = 0 quando ri = ∞, talque F (∞) = 0:

∴ U(r) = −GMTmr , r > RT . (17.6)

Para duas partıculas quaisquer m1 e m2:

U(r) = −GMTm

r. (17.7)

Exemplo 1: A Eq. 17.19 explica um fenomeno de grande importancia em As-tronomia: o colapso gravitacional, que consiste na queda sobre si proprio deum corpo massivo sob a accao da gravidade. Este fenomeno esta na origem daformacao de estruturas no Universo. A partir de uma distribuicao inicial demateria, o colapso gravitacional conduz a formacao de uma hierarquia de es-truturas, tais como agrupamento de galaxias, grupos estelares, estrelas e plane-tas. Estime o tempo caracterıstico do colapso gravitacional. Aplique a formulaobtida para estimar o tempo de colapso gravitational do Sistema Solar.

Seja uma massa m de gas em queda livre desde a superfıcie de um corpo esfericode massa M e raio R, atraıda pela sua forca gravıtica. Da conservacao da energia

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FasesdaLua

Eclipses da Lua

Marés causadas pela atracção do Sol e da Lua

Maré de Quadratura Maré de Sizígia

Figure 5: Mares tal como aparecem num velho Almanaque publicado em Lon-dres por James Reynolds em 1801. Quando a mare esta no seu maximo chama-semare alta, mare cheia ou preamar; quando atinge o seu nıvel mınimo chama-semare baixa ou baixa-mar. Podemos dizer que, em media, as mares tem umperıodo de 12 horas e 24 minutos. As doze horas devem-se a rotacao da Terrae os 24 minutos sao devidos a orbita lunar. Quando as forcas gravitacionais doSol e da Lua estao alinhadas, na ocasiao da lua nova e lua cheia, produzem-semares mais altas, sao as mares de sizıgia (do Grego, sysygos). Pelo contrario,nas luas minguante e crescente as forcas gravitacionais do Sol e da Lua estao emquadratura, resultando no enfraquecimento da forca resultante e produzindo-semares mais baixas: sao as chamadas mares de quadratura.

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Figure 6: Energia potencial gravıtica.

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Figure 7: Diagrama de tres partıculas em interacao.

mecanica total obtem-se:

Ki + Ui = Kf + Uf−GMm

Ri= 1

2mv2 − GMm

R

⇒ v =√

2GMR ,

admitindo que Ri R. Tal significa que a massa m tem a velocidade v asuperfıcie do corpo massivo. O tempo que decorre ate que m atinja o centro docorpo esferico, admitindo que a aceleracao e uniforme, e:

t =R

v=

√R3

2GM=

√3

1√Gρ

, (17.8)

tendo nos inserido a relacao M = ρ 43πR

3. O sistema solar possui a massa totalM = 2× 1033 g, e o raio medio e de R = 7.5× 1014 cm. A Eq. 17.8 permite-nosestimar o tempo de colapso do sistema solar em tc ≈ 1.8× 109 s.

Exemplo 2: O nascimento das estrelas resulta do gradual colapso gravitacionalde uma nuvem de gas interestelar.

17.3 Princıpio da sobreposicao

A energia potencial total associada a um conjunto de partıculas e dada pelasoma sobre todos os pares (Fig. 7). Por exemplo, para um sistema de trespartıculas tem-se:

Utot = U12 + U13 + U23

= −G(m1m2

r12+ m1m3

r12+ m2m3

r23

).

(17.9)

Generalizando a expressao da energia potencial de N corpos passa-se a escrever:

U = −1

2

N∑i=j;(i 6=j)

N∑j=1

GMiMj

rij. (17.10)

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Exemplo 3: Qual e a energia gravitacional da galaxia? Considere que ha nelaN estrelas de massa M .

Repare que temos N termos do tipo∑Ni=1 e (N − 1) termos do tipo

∑Nj=1.

Daqui resulta

U ≈ −1

2GN(N − 1)

M

R. (17.11)

Se N ≈ 1.6 × 1011 estrelas e R ∼= 1021 m (distancia media entre estrelas),M ≈ 2× 1030 kg, estima-se entao que

U ≈ −4× 1051J.

Exemplo 4: Energia gravitacional de uma esfera uniforme.

Podemos comecar por considerar a energia de interaccao entre um nucleo esfericopleno de raio r e uma camada esferica de espessura dr que a rodeia. Logo, amassa da esfera e 4πρr3/3 e a massa da camada e 4πr2drρ. Usando o princıpioda sobreposicao, podemos escrever

dU = −G(

4π3 r

3ρ)

(4πr2ρ)

r= −1

3G(4πρ)r4dr. (17.12)

Integrando sobre todas as camadas, imaginando-as como constituindo uma ce-bola, obtemos sucessivamente:

US =∫dU = −

∫ Rr=0

13G(4πρ)r4dr = −G(4πρ)2

3R5

5

US = − 35G(

4πρ3 R3

)2 1R = − 3

5GM2

R .(17.13)

No caso do Sol, obtem-se:

US ∼= −3(7× 10−11)(2× 1030)2

5(7× 108)∼= −2× 1041J.

17.4 Energia potencial de uma calote esferica e de umapartıcula

Considere uma partıcula pontual de massa m e uma calote esferica de massaM , espessura t e raio R. A separacao entre o centro da calote e a partıcula e r(Fig. 8).

A partıcula esta em P . Considere um anel de material com densidade ρ tendotodos as partes a igual distancia s de P .

A largura do anel e Rdθ, a espessura t e o raio R sin θ.

A massa dM do anel e dada por

dM = (Rdθ).2πR sin θ.t.ρdM = 2πR2tρ sin θdθ.

(17.14)

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Figure 8: Geometria dos calculos da energia potencial de uma calote esferica euma partıcula. A espessura da calote e t.

A energia potencial criada pelo anel no ponto do espaco onde se encontra apartıcula m e

dU = −GmdMs

= −2πGmR2tρ sin θdθ

s(17.15)

A fim de obter a energia potencial total da calote esferica temos que integrarsobre todo a calote. Mas e mais simples integrar sobre s em lugar de θ e paratal e conveniente fazer uma mudanca de variavel:

s2 = r2 +R2 − 2rR cos θ2s dsdθ = 2rR sin θ

sin θs dθ = ds

rR

∴ dU = − 2πGmRtρr ds

(17.16)

Ha dois casos a considerar:

Caso I: r > R: (m esta fora do escudo)

θ = 0 s = r −Rθ = π s = r +R

(17.17)

U(r > R) =∫dU = − 2πGmRtρ

r

∫ r+Rr−R ds

U = −Gmr (4πR2tρ).(17.18)

Mas M = V ρ = (4πR2t)ρ:

∴ U = −GmMr

. (17.19)

Concluımos assim que o potencial criado por uma calote esferica de massa Mcom raio R e exactamente igual ao potencial criado por uma partıcula pontualde massa M localizada no centro (no caso de pontos fora da calote).

−→F (−→r ) = −dU

dr−→u r = −GMm

r2−→u r. (17.20)

Caso II: r < R: (m esta dentro da calote esferica)

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Figure 9: (a) - Potencial gravıtico; (b) - forca gravitacional.

Consideremos agora o caso em que a partıcula encontra-se dentro da caloteesferica:

θ = 0 s = R− rθ = π s = R+ r

(17.21)

O integral a perfazer e o seguinte:

U(r < R) = − 2πGmtρRr

∫ R+r

R−r ds = − 2πGmRtρr [(R+ r)− (R− r)]

= −GmR (4πR2tρ) = −GmMR .(17.22)

Conclui-se assim que o potencial e constante no interior do escudo. A forcaexercida na partıcula m e entao nula:

−→F (−→r ) = −dU

dr−→u r = 0 (17.23)

A forca exercida sobre m no interior da esfera anula-se porque por simetriatodas as partes anulam-se par a par. A Fig. 9 mostra as curvas de potencialgravıtico e a forca gravitacional que dela deriva.

17.5 Descricao da experiencia de Cavendish

A experiencia de Cavendish consiste basicamente num par de esferas, cada parformando um halter que tem um eixo comum em torno do qual pode rodar(Fig. 10). Um dos halteres esta suspenso por uma fibra de quartzo e e livrede rodar torcendo a fibra. A torsao e medida pela posicao de um raio de luzreflectido por um espelho colado a fibra. O segundo halter pode girar sobre umeixo de tal modo que cada uma das suas esferas fica muito proxima de uma dasesferas do outro halter. A atracao gravitacional exercida entre os dois paresde esferas produz uma torsao da fibra, e e a magnitude da torsao que permitecalcular a forca gravitacional.

A forca exercida sobre as massas M e m distantes de r uma da outra e:

F =GMm

r2. (17.24)

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Figure 10: Experiencia de Henry Cavendish.

O torque em relacao ao eixo de suspensao devido ao binario das forcas gravita-cionais por sua vez e

−→τ = [−→L ×

−→F ], (17.25)

tendo como modulo

τ =lGmM

r2(17.26)

Mas o fio torcido resiste ao binario criando um torque oposto que segue a lei deHook para os fios de torsao:

τ = −kφ (17.27)

Mostra-se que o perıodo das oscilacoes de um pendulo de torsao e dado por

T = 2π

√I

k, (17.28)

onde o momento de inercia das massas na haste e I = ml2/2 e o angulo dereflexao do feixe de luz no espelho e dado por θ = 2φ.

Obtem-se as seguintes equacoes:

−kφ = lGmMr2

φ = lGmMkr2

φ′ = 2lGmMkr2

θ2 = 2lGmM

kr2

(17.29)

O angulo φ′ corresponde ao angulo total de deflexao.

405

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Suponhamos que os resultados de uma experiencia sao os seguintes:

r = 4.65cmM = 1.5kgm = 0.015kgl = 10cmL = 5.7m

k = 8.5× 10−9N.m/rad∆s = LθT ∼ 10 min

∆s = 4lLGmMkr2

= 4×0.10L×6.672×10−11×0.15×1.508.5×10−9×(0.0465)2

∆s = 0.0327L(m)

(17.30)

Para uma distancia do espelho a parede L = 5.7 m, obtem-se um erro experi-mental de 2.6 %.

(∆s)teo = 18.6cm(∆s)exp = 19.1cm

(17.31)

17.6 Analise elementar da orbita translunar

Considere o problema de uma nave com massa m movendo-se com a velocidadev no campo gravitacional da Terra de massa MT e da Lua ML. Assumindo quea nave nao perturba o movimento da Lua que orbita a Terra num cırculo deraio D, a energia potencial da nave e dada por

U = −GMTm

r− GMLm

r′(17.32)

onde r e r′ sao as distancias desde a Terra e da Lua ate a nave, respectivamente.A sua energia total mecanica e

Em =1

2mv2 − U(r, r′). (17.33)

Ao longo da linha que une a Terra a Lua, r′ = D − r (e, neste caso, U(r, r′) =U(r) pois D e fixo). Podemos verificar que existe um ponto B onde a forca queage sobre m se anula, isto e,

dU

dr|r=B= 0. (17.34)

Da Eq. 17.32 obtemos logo

B =D

1 + ε(17.35)

e

U(B) = − (1 + ε)GmMT

B(17.36)

406

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onde

ε =

(ML

MT

)1/2

(17.37)

Substituindo as massas da Terra e da Lua na Eq. 17.37 verifica-se que ε = 1/9,ou seja, B = 0.90D, a fronteira entre o campo gravıtico da Terra e da Luaencontram-se a cerca de 90 % da distancia Terra-Lua.

Refira-se que a velocidade com que a nave Apollo-8 chegou ao ponto B era devB ≈ 3380 km/h.

Assumindo que a orbita do satelite e elıptica, a sua energia e 5

E = −GMTm

2a(17.38)

onde 2a e o eixo-maior da elipse.

Exemplo 5: Supondo que a nave foi colocada numa orbita elıptica de eixo-maior 2a, qual e a velocidade orbital lunar vM (isto e, a velocidade com que anave chega a Lua)?

A energia mecanica total e dada por

Em = −GMTm

2a=

1

2mv2

B + U(B). (17.39)

Obtem-seE = 1

2mv2 − GMTm

r

E = −GMTm2a

∴ v =√GMT ( 2

r −1a )

(17.40)

onde a ultima expressao da a velocidade da nave em qualquer posicao r da suaorbita. Pondo r = a = D, tem-se

vM =

√GMT

D(17.41)

Mostra-se que se pode reescever a Eq. 17.39 na forma

−D2a

=u2

2− (1 + ε)D

B(17.42)

onde pusemos u ≡ vB/vM . Obtemos entao

vM = 3670km/h.u = 0.92

DB = 1 + ε = 1.11∴ 2a = 1.23D.

(17.43)

5Veja o Cap. 16.

407

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Table 1: Dados para o Sistema Solar.Distancia Terra-Lua D 384398.3 km

Raio da Terra RT 6377.8 kmRaio da Lua RL 1738 km

ε2 ML/MT 0.01228Massa da Terra MT 5.983× 1024 kg

Constante Gravitacao Universal G 6.67× 10−11 N m2 kg−2

Concluımos que o eixo-maior da elipse descrita pela orbita da nave e um poucomaior que o mınimo necessario para atingir a Lua, isto e, um pouco mais doque 0.9D.

Exemplo 6: Suponha que a nave e injectada a partir de uma orbita circularbaixa a distancia r0 do centro da Terra, por exemplo, a 160 km de altitude, our0 = 6539 km. Calcule a velocidade que devera ser comunicada ao satelite demodo a que a nave atinja a Lua. Se escolhermos a orbita elıptica 2a = 1.23D,obtemos v0 = 3949.3 km/h. Usando a Eq. 17.41, podemos construir a seguintetabela:

2a = 1.23D v0 = 3949.3 km/h2a = 0.9D v0 = 3939.7 km/h

2a =∞ v0 = 3976.7km/h velocidade de escape2a = 2r0 v0 = 2811.5km/h orbita circular

(17.44)

Os resultados apresentados em 17.44 mostram que a velocidade adicional que enecessaria para atingir a Lua e apenas ligeiramente superior a que e necessariapara escapar ao campo gravıtico do sistema Terra-Lua. Note-se tambem quetodas as velocidades tem a mesma ordem de grandeza, concluindo-se que o“custo” do voo nao e o unico criterio a ter em conta para selecionar a orbita,pois que em todos os casos tratam-se de missoes extremamente dispendiosas.

Exemplo 7: Sabendo que o perıodo da orbita e dado pela expressao (despreza-se a influencia da Lua):

T = 2π

√a3

GMT(17.45)

determine o tempo que leva a viagem a Lua 6. Admita que se escolheu a orbitaelıptica, tal que 2a = D.

T = 2π√

(1.92×108)3

6.67×10−11×5.983×1024

T = 8.37× 105sT ≈ 10 dias.

(17.46)

6Na verdade este exemplo ilustra uma orbita muito semelhante a que foi descrita pela sondaSovietica Luna-3 lancada a 4 de Outubro de 1959 e que sobrevoou a face oculta da Luaa 7 deOutubro. Em lugar de uma orbita heliocentrica, a Luna-3 era de facto um satelite da Terracom uma orbita muito excentrica com o raio no apogeu ra = 469000 km e um perıodo de 16.2dias.

408

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A viagem a Lua decorre em cerca de 10 dias (ida e volta) no caso de usarmos aorbita elıptica. As naves Apollo levaram cerca de tres dias percorrendo orbitasdiferentes (Fig. 11).

17.7 Energia potencial do sistema esfera-partıcula

Considere uma partıcula de massa m a distancia r do centro de uma esferasolida homogenea de massa M e raio R.

Caso I: r ≥ R:

Pode-se imaginar que a esfera solida e constituıda por um grande numero decamadas desde o nucleo ate a superfıcie de raio R.

Como ja foi abordado na Seccao anterior, a forca e a energia potencial criada pelacamada dependem somente da sua massa e da distancia r a que uma partıculam se encontra : −→

F = −GmMr2−→u r , (r ≥ R)

U = −GmMr , (r ≥ R).(17.47)

No interior da esfera o caso difere.

Caso II: r ≤ R:

A partir do resultado obtido quando tivemos em conta as camadas esfericas,a forca exercida numa partıcula e devida inteiramente a toda a massa contidaentre r = 0 e r = r:

∴ F = GmM(r)r2 , (r ≤ R). (17.48)

Estes dois casos distintos encontram-se sumariados no grafico da Fig. 12.

M(r) e a quantidade de massa no interior de uma esfera de raio r e M e amassa total da esfera de raio R. Como a esfera e homogenea, ρ, a sua densidadevolumica e constante:

ρ = MV = 3M

4πR3 = 3M(r)4πr3

∴M(r) = M(rR

)3∴−→F = −GmMr

R3−→u r

(17.49)

A energia potencial na regiao r ≤ R e obtida a partir da definicao:

U(P2)− U(P1) = −∫ P2

P1

(−→F · d−→r ). (17.50)

QuadroNegro 1

409

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Figure 11: Orbita Terra-Lua descrita pelo Apollo-8.

410

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Figure 12: A forca exercida sobre uma partıcula no exterior da esfera solidahomogenea e dada por GmM/r2 e esta dirigida para o centro. A forca qua actuasobre a partıcula quando ela esta na regiao interna da esfera e proporcional a re tende para zero no centro.

A Fig. 13 mostra os graficos da energia potencial e da forca gravitacional criadapor uma esfera solida homogenea.

17.8 Forca gravitacional exercida entre objectos com sime-tria esferica

Sejam dois objectos esfericos em atraccao mutua exercendo um sobre o outro aforca:

−→F AB =

GmAmB

r2(17.51)

onde r e a distancia entre eles (Fig. 14).

Cada massa elementar do objecto B actua sobre o CM do objecto A, de modosemelhante ao sistema calote esferica + massa pontual. Somando sobre todosos elementos dm de B a forca resultante actua sobre o CM de A. Usandoargumentos de simetria podemos concluir que a forca recıproca actua tambemsobre o CM de B. Pela Terceira Lei de Newton as forcas sao iguais em moduloe opostas em direcao.

Se o objecto B nao possui simetria esferica, a forca sobre A continua a actuarsobre o CM de A. Porem, a diferenca agora e que a forca sobre B nao actuasobre o CM de B.

411

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Figure 13: Energia potencial e forca de atracao gravitacional exercida sobreuma partıcula de massa m por uma esfera solida homogenea.

Figure 14: A forca gravitacional exercida sobre uma esfera A devido a umaesfera B actua sobre o CM de A.

412

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Este resultado vai permitir-nos abordar o caso mais geral de forcas gravitacionaisexercidas sobre objectos extensos 7.

17.9 Forcas gravitacionais sobre objectos extensos

Sabemos que a forca gravitacional exercida pela Terra sobre uma partıcula demassa mi e −→

f i = mi−→g (17.52)

onde −→g e a aceleracao da gravidade. Considerando relativamente pequenosobjectos onde se pode assumir−→g constante sobre a extensao do objecto, obtemos

−→F =

∑i

−→f i =

∑i

mi−→g = (

∑i

−→mi)−→g = M−→g , (17.53)

onde M e a massa total do objecto. A questao que agora nos colocamos e aseguinte: em que ponto do objecto actua esta forca efectiva?

Calculemos o torque em torno do CM do objecto resultando da accao de todas

as forcas−→f i:

−→τ c = [∑i

−→r i ×−→f i] =

∑i

−→r i ×mi−→g = (

∑i

mi−→r i)×−→g . (17.54)

Ora por definicao,∑imi−→r i = M

−→R c e como estamos aqui a medir distancias

em relacao ao CM, de modo que podemos por−→R c = 0. Logo, obtemos assim

−→τ c = 0. (17.55)

Em conclusao, a forca total−→F nao pode produzir torques em torno do CM. Isto

e,−→F actua exactamente no CM do objecto. Este ponto tambem e chamado de

centro de gravidade do objecto.

Se o objecto for de tal forma extenso que −→g varia em toda a sua extensao, ocentro de gravidade nao pode ser facilmente identificado, excepto para objectosesfericos.

17.10 Forca de mares (ou forca tidal)

As mares sao as elevacoes e depressoes da superfıcie oceanica devido a accaodas forcas de mare com origem na Lua e no Sol.

As mares afectam a profundidade das aguas dos estuarios e marinas e produzemcorrentes oscilantes. As previsoes das mares sao feitas com as leis de Newton, e

7Repare bem que nos referimos a objectos que tem volume e forma, nao se trata mais aquide estudar objectos pontuais.

413

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Figure 15: As partıculas individuais mi que fazem parte de um objecto saoactuadas por forcas gravitacionais mi g. A soma de todas essas forcas indiciduaise equivalente a uma unica forca que actua em C, o CM do objecto.

Figure 16: (a) num campo gravitacional uniforme um objecto experimenta amesma aceleracao; (b) Quando o campo nao e uniforme, a gravidade actua difer-entemente nas diferentes partes do objecto. O resultado e uma forca diferencialque tende a alongar um objecto ao longo das linhas de campo ou a comprimi-loao longo da direccao perpendicular as linhas de campo.

o problema foi resolvido sobretudo por Pierre-Simon Laplace, sendo de grandeimportancia a sua previsao para a navegacao costeira.

Quando um campo gravitacional e uniforme todas as partes de um corpo emqueda livre experimentam a mesma aceleracao. Pelo contrario, se o campo e naounforme a aceleracao varia de ponto para ponto e daqui resultando uma forcadiferencial, provocando um alongamento ou compressao do objecto (Fig. 16).

Forcas diferenciais sao forcas de mares, tambem chamadas forcas tidais.

Considere dois objectos de massa m separados de uma distancia 2a localizadosa distancia r da massa M (Fig. 18). A forca de mare (ou forca tidal) exercidasobre o objecto iguala a diferenca entre a forca gravitacional em cada um dosextremos:

FT =GMm

(r − a)2− GMm

(r + a)2= GMm

(r + a)2 − (r − a)2

(r − a)2(r + a)2. (17.56)

414

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Figure 17: As mares resultam em primeiro lugar da forca diferencial criada pelalua. A forca gravitacional exercida sobre a massa dos oceanos no lado proximoda lua e maior, sendo menor no lado mais distante. Desta situacao resulta quea massa oceanica do lado voltado para a lua e para aı atraıda desenvolvendo-seduas pretuberancias de mare e fazendo que um dado lugar possa experimentarduas mares altas por dia a medida que a Terra roda. A forca da gravidade naoe mostrada por ser menor, mas desempenha um papel tambem importante.

Daqui resulta a forca tidal (ou de mare)

FT =4GMma

r3(17.57)

valida para distancia r a. Repare que trata-se de uma forca que decairapidamente como 1/r3, donde a influencia da Lua ser mais importante da quee exercida pelo Sol (Fig. 17).

17.11 Peso e forca gravitacional

Perto da superfıcie terrestre o peso de um corpo de massa m e

w = mg. (17.58)

Se a igualarmos a forca que actua sobre um corpo em queda livre, obtemos aconstante de aceleracao da gravidade:

mg = GMTmR2T

∴ g ≡ GMT

R2T

(17.59)

Suponha agora que um objecto de massa m esta a altura h acima da superfıcieterrestre, ou seja, esta a distancia r do seu centro:

r = RT + h. (17.60)

Se o corpo esta em queda livre, a sua aceleracao e, digamos, g′:

mg′ = GMTmr2 = GMTm

(RT+h)2

∴ g′ = GMT

r2 = GMT

(RT+h)2(17.61)

415

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Figure 18: A forca tidal actuando sobre um objecto resulta da diferenca emmagnitude da forca gravitacional atraves do objecto.

g′ decresce com o incremento de altitude, atingindo no caso limite g′ =limh→∞ 0. No espaco intersideral os corpos nao tem peso (apenas massa).

Considere a energia potencial de uma partıcula a distancia r do centro:

U(r) = −GMTm

r, (17.62)

sendo que a sua energia potencial a superfıcie da Terra (r = RT ),e dada por

U(RT ) = −GMTm

RT. (17.63)

A variacao da energia potencial e a sua diferenca:

∆U = U(r)− U(RT ) = −GMTm

[1

r− 1

RT

]= GMTm

(r −RTrRT

)(17.64)

Seja z = r −RT e rRT ≈ R2T , valido se z RT . Obtemos assim

∆U = GMTmR2T

z

∆U = mgz.(17.65)

∆U = mgz representa a variacao da energia potencial de uma partıcula queocorre quando se eleva a uma altura z acima da superfıcie terrestre.

18 Movimento planetario

Os primeiros registos historicos de observacao astronomica datam da Babilonia,feitas no ano 2234 a.C. Em 721 a.C. foi observado o primeiro eclipse. Os mapas,globos (600 a.C.) e o Zodıaco (547 a.C.) foram inventados por Anaximandro 8.

8Anaximandro de Mileto (609-610 a.C. - c. 546 a.C.) foi um filosofo pre-Socratico ediscıpulo de Tales. Foi um geografo, matematico, astronomo e polıtico. Anaximandro de-fendia a ideia de que o princıpio de tudo reside numa substancia primordial chamada “ape-iron”, infinita e indeterminada.

416

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Figure 19: Um corpo de massa m move-se em orbita circular em torno de umcorpo de massa M .

Iremos agora apresentar as Leis de Kepler, obtidas pelo grande sabio alemao aofim de penosos e laboriosos calculos realizados ao longo de 18 anos e usando osdados astronomicos obtidos pelo astronomo dinamarques Tycho-Brahe.

Caso I: orbitas circulares

Um corpo de massa m move-se numa trajectoria circular de raio ro em tornode um objecto massivo com massa M (Sol).

A forca actuando no planeta e

F =GMm

r2o

. (18.66)

Se a rapidez do planeta e v, entao a sua aceleracao centrıpeta e

ac = v2

ro

∴ GMmr2o

= mv2

ro

(18.67)

ou seja

v2 =GM

ro(18.68)

o raio da orbita fixa a rapidez. O perıodo de uma revolucao e:

T = circunferencia/rapidezT = 2πro

v .(18.69)

417

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∴GM

ro=

(2πroT

)2

(18.70)

donde se obtem a

Terceira Lei de Kepler:

T 2 =4π2

GMr3o. (18.71)

Na realidade as orbitas dos planetas sao aproximadamente circulares e estaanalise simples e bastante boa.

orbitas circulares

QuadroNegro 2

Caso II: orbitas elıpticas

Primeira Lei de Kepler: As orbitas dos planetas sao elipses estando o solnum dos seus pontos focais.

• Sol ⇔ planetas;

• Terra ⇔ satelites.

418

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• M ⇔ m

• mM .

Considere um planeta localizado num dos seus pontos de retorno: rp ou ra.

QuadroNegro 3

Portanto o afelio e o perielio correspondem as distancias:

ra = rmax = −GMm2E +

√(GMm

E )2 + L2

2ME

rp = rmin = −GMm2E +

√(GMm

E )2 − L2

2ME

(18.72)

Verifica-se tambem que o eixo maior

A = ra + rp = −GMm

E(18.73)

tem um comprimento independente de L. Todas as orbitas com o mesmo eixomaior tem a mesma energia total. Pode-se mostrar que

ε =

√1 +

2EL2

m(GMm)2. (18.74)

419

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Figure 20: Um objecto de massa m e lancado para cima da superfıcie terrestrecom uma velocidade inicial vi e atinge a altitude maxima h (MT > m).

Exemplo 8: Um objecto e projectado verticalmente para cima com velocidadeinicial vi (Fig. 20). Qual e a altitude alcancada pelo objecto? Assuma que aTerra esta em repouso.

A energia e conservada:Ki + Ui = Kf + Uf . (18.75)

18.1 Velocidade de escape

Considere um objecto de massa m no campo gravıtico de um corpo de grandemassa M . A sua energia total e

E = K + U= 1

2mv2 − GMm

r

(18.76)

Assumindo que o objecto e lancado da superfıcie de M com raio R com a veloci-dade v, tendo no final energia cinetica zero em r → ∞, obtem-se rapidamente

420

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a velocidade de escape:

Ei = Ef12mv

2 − GMmr = 0 + 0

∴ v =√

2GMR

(18.77)

Aplicacao numerica:

M = MR = R

v = 618km/s(18.78)

M = MT

R = RTvT = 11.2km/s.

(18.79)

18.2 Movimento Planetario Geral

Os satelites artificias tem uma importancia crescente na gestao futura do plan-eta. As observacoes espaciais, complementadas pelas observacoes no solo, saoum instrumento inultrapassavel no futuro, permitindo saber, por exemplo, ondese encontra agua potavel para irrigacao e exploracao agrıcola, mapear terrasaraveis e prever a sua productividade, prever erupcoes vulcanicas e prospeccaode recursos minerais.

O movimento planetario e, em geral, o problema do movimento central tem umpapel de grande importancia em diferentes topicos de varia areas da fısica, porexemplo, na difusao de partıculas, estrutura atomica e navegacao no espaco.Este problema e referido por problema de Kepler ou ainda, o problema dosdois-corpos.

Comecaremos por estudar os aspectos mais importantes do movimento de duaspartıculas sob a accao de um campo central, f(r)−→u r, onde f(r) e qualquerfuncao da distancia entre as partıculas e −→u r e o versor dirigido ao longo daslinhas que passam pelos seus centros.

Nesta seccao iremos comecar por efectuar uma transformacao de coordenadasapropriada para depois, usando as leis da conservacao da energia e do momentoangular, obtermos uma equacao do movimento de facil resolucao. Finalmente,aplicando ao caso particular do movimento planetario com f(r) ∝ 1/r2, iremosreencontrar as leis de Kepler.

Consideremos assim o problema fundamental a 2-corpos, onde somente 2partıculas interagem uma com a outra.

Duas partıculas de massa m1 e m2 tem os vectores posicoes −→r 1 e −→r 2 num dadoreferencial de inercia. Uma forca central actua sobre ambas, denotando-se por−→F 12 a forca de m1 sobre m2.

421

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Figure 21: Par de partıculas em interaccao mutua.

−→F 12 = m1

d2−→r 1

dt2−→F 21 = m2

d2−→r 2

dt2

(18.80)

Este problema tem uma resolucao mais facil se substituirmos −→r 1 e −→r 2 por−→r = −→r 2−−→r 1 e passando para as coordenadas do CM das 2 partıculas (Fig. 21).

Sejam:

•−→R : o vector posicao do CM do sistema relativamente a uma origem O.

• −→r : o vector coordenada relativa das duas partıculas.

−→R = m1

−→r 1+m2−→r 2

m1+m2−→r = −→r 2 −−→r 1

(18.81)

Podemos reescreve-las sob a forma

−→r 1 =−→R − m2

M−→r

−→r 2 =−→R + m1

M−→r

(18.82)

onde M = m1 +m2 e−→F 12 = −

−→F 21, de acordo com a lei da accao-reaccao.

422

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Combinando as equacoes anteriores obtem-se

Md2−→Rdt2

= 0, (18.83)

donde obtemosd−→R

dt=−→V c = Const. (18.84)

Na ausencia de forcas externas, o movimento do CM descrito por−→R (t) e uni-

forme e e independente do tipo de interacao entre as partıculas, tendo como

simples solucao−→R =

−→R o+

−→V t. As constantes

−→R o e

−→V dependem das condicoes

iniciais e da escolha do sistema de coordenadas. Esta e uma primeira vantagemda transformacao feita.

Podemos ainda obter

m1m2d2−→rdt2

= M−→F 21. (18.85)

Definindo a massa reduzida µ = m1m2

m1+m2do sistema de 2-partıculas, podemos

escrever a Eq. 18.85 na forma abreviada

µd2−→rdt2

=−→F 21. (18.86)

Vemos assim que o problema a dois corpos ficou reduzido ao problema bem maissimples do problema a um corpo! Podemos fazer a seguinte interpretacao daEq. 18.86: a coordenada relativa −→r (t) do sistema de 2-partıculas comporta-secomo se se tratasse da coordenada de uma so partıcula de massa µ em movimento

no campo de forcas−→F 12(−→r ) que representa a forca mutua exercida entre o par

de partıculas.

A energia cinetica total no referencial de inercia O pode ser expresso em termos

de−→V = d

−→R/dt (velocidade do CM), e −→v = d−→r /dt (velocidade relativa das duas

partıculas).

K =1

2m1v

21 +

1

2m2v

22 (18.87)

e

v21 = d−→r 1

dtd−→r 1

dt v22 = d−→r 2

dtd−→r 2

dt . (18.88)

Usando as Eqs. 18.82 para −→r 1 e −→r 2, obtemos

K = 12M(d

−→Rdt ) · (d

−→Rdt ) + 1

2µ(d−→rdt ) · (d

−→rdt )

K = 12MV 2 + 1

2µv2

(18.89)

A energia cinetica total no referencial O e a soma da energia cinetica de umapartıcula hipotetica de massa M = m1 + m2 movendo-se com velocidade Vcmais a energia cinetica de uma partıcula de massa µ movendo-se com velocidaderelativa v.

423

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O momento linear no referencial O e−→P = −→p 1 +−→p 2 = M

−→V . (18.90)

e, por sua vez, o momento linear “relativo” do par de partıculas e

µ−→v = m1m2

M (−→v 2 −−→v 1)= 1

M (m1−→p 2 −m2

−→p 1)(18.91)

Se o sistema de 2 partıculas estiver isolado (sem que haja forcas externas actu-antes), entao conclui-se que

−→P = Const. (18.92)

e, em particular, no referencial do CM, o momento total e nulo,−→P = 0.

18.3 Propriedades Gerais do Movimento Planetario geral

18.3.1 Momento angular

Consideremos duas partıculas pontuais m1 e m2, sujeitas a forcas do tipo centrale suponhamos que nao existem torques actuando sobre elas. O momento angular

de m1 e m2 em torno do seu CM,−→L c, e dado por:

−→L c =

−→l 1 +

−→l 2 = m1[−→r ′1 ×−→v ′1] +m2[−→r ′2 ×−→v ′2] = Const.

= µ[−→r ×−→v ],(18.93)

onde −→v ′1 = d−→r ′1/dt e −→v ′2 = d−→r ′2/dt. Usando o vector posicao de m1 e m2

relativos ao referencial do CM, temos:

−→r ′1 = m2

m1+m2

−→r−→r ′2 = − m1

m1+m2

−→r . (18.94)

Obtem-se entao sucessivamente−→L c = m1m2

m1+m2[−→r ×−→v ′1]− m1m2

m1+m2[−→r ×−→v ′2]

= µ−→r × (−→v ′1 −−→v ′2)= µ[−→r ×−→v ]

|−→L c |= µr2ω = const.

(18.95)

Este resultado significa que o modulo do momento angular do par de partıculasreferido ao CM e equivalente ao de uma partıcula de massa µ.

18.3.2 Energia total

Assumindo que a forca de interaccao−→F exercida entre as duas partıculas e do

tipo central e igual ao gradiente de uma funcao potencial U(r), a energia totaldo sistema e uma constante do movimento:

Ec =1

2MV 2 +

1

2µv2 + U(r) = const. (18.96)

424

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Figure 22: Momento angular de duas partıculas no referencial do CM.

18.4 Movimento planetario-sistema de 2 partıculas

O estudo do movimento planetario ou dum sistema de duas partıculas e tipica-mente o problema relativo aos seguintes sistemas:

• Sol + planeta;

• Planeta + Lua;

• Terra + satelite artificial.

Podemos escolher o referencial do CM adequadamente, da tal forma que:

−→R = 0⇒

−→V = 0. (18.97)

Podemos comecar por escrever as seguintes equacoes:

M = m1 +m2;µ = m1m2

M ;−→r = −→r 2 −−→r 1;−→r 1 = − µ

m1

−→r ;−→r 2 = µ

m2

−→r .

(18.98)

425

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Figure 23: (a) Duas partıculas orbitam em torno do seu CM comum localizadono ponto O; (b) A situacao em (a) e descrita em termos de uma partıculahipotetica de massa µ. O vector r e a coordenada relativa das partıculas.

A energia total do sistema de 2 partıculas no referencial do CM e dada por

E = K + U (a)= 1

2µv2 + U(r) (b).

(18.99)

Nas Eqs. 18.99(a)-(b) considerou-se que o CM do sistema tem velocidade nula,

isto e,−→V = 0, uma escolha apropriada a fim de simplificar a algebra.

Agora repare: a velocidade tem componentes radiais e azimutais, a saber

−→v = vr−→u r + vφ

−→u φ. (18.100)

vφ = vt = rω = r(dφdt

);

L = µr2ω = µr2(dφdt

).

(18.101)

Em consequencia, a energia apresenta uma dependencia das duas coordenadas,r e θ, facto que torna a visualizacao do movimento difıcil. Porem, se tivermosem conta que:

1

2µ(rφ)2 =

L2

2µr2, (18.102)

podemos reescrever a equacao da energia na forma:

E = 12µ(v2

r + v2φ) + U(r) (a)

∴ E = 12µv

2r + L2

2µr2 −Gm1m2

r (b).(18.103)

Na Eq. 18.103-(b), o primeiro termo representa a energia devido ao movimentoradial no referencial do CM; o segundo termo representa a energia cineticarotacional em torno do CM; o ultimo termo e a energia potencial gravitacional.

426

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Figure 24: A energia potencial efectiva Vef (r) no caso do movimento planetario.A energia potencial comum e U(r) = −GµM/r = −k/r.

Como se depreende da Eq. 18.99, e util definirmos uma funcao a que chamaremosenergia potencial efectiva:

Vef (r) ≡ L2

2µr2− Gm1m2

r. (18.104)

Seja k ≡ Gm1m2 = GµM = Gµ(m1 +m2). Esta pequena mudanca de variavelpermite-nos reescrever de novo a energia potencial efectiva numa forma maiscompacta:

Vef (r) =L2

2µr2− k

r. (18.105)

A energia mecanica total pode-se agora escrever numa forma simplificada, in-volvendo unicamente o movimento radial:

E =1

2µv2

r + Vef (r). (18.106)

Em consequencia desta apropriada transformacao podemos agora representa-lagraficamente usando a tecnica dos diagramas de energia 9. A Fig. 24 mostra osgraficos de ambas as curvas.

18.4.1 Solucoes da equacao do movimento

A descricao que acabamos de fazer do problema a 2-corpos nao e totalmenteexacta porque se os corpos sao esferas homogeneas eles interagem uns com os

9Desenvolvida num fascıculo anterior

427

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outros como se fossem partıculas ideais. Porem, a maioria dos corpos no sistemasolar nem sao perfeitamente homogeneos, nem sao perfeitamente esfericos. ALua, por exemplo, possui concentracoes massicas anomalas 10. Em particular,debaixo dos Mare Imbrium, Serenitatis, Crisium e Orientale estao presentesmassas anomalas que alteram a gravidade local, tornando instaveis numa escalade tempo de meses ou anos as orbitas dos satelites artificiais a baixas altitudesem redor da Lua. As orbitas sucessivas ficam distorcidas levando ao impactodo satelite na superfıcie lunar. Sabemos tambem que Mercurio e perturbadoligeiramente por uma pretuberancia equatorial do Sol. Em ultima instancia,a verdade e que o sistema solar e um sistema de varios corpos cuja resolucaomatematica encontra-se em aberto. Felizmente, como a massa do Sol e muito su-perior a de qualquer outro planeta, as perturbacoes introduzidas nas trajectoriasdos corpos celestes por outros planetas sao muito pequenas, fazendo com que aaproximacao dos dois corpos seja razoavel.

Satelite artificial: um satelite e um corpo que se move em queda livre emtorno da Terra. Vd. Fig. 25.

Se lancarmos horizontalmente um corpo de uma elevacao V , dependendo davelocidade inicial, ele caira em D, E, F , G, ou, se a velocidade inicial forsuficientemente elevada, ele prosseguira num movimento de queda circular emtorno da Terra. E o que acontece a qualquer satelite (incluindo a Lua).

A rotacao da Terra provoca um achatamento dos polos e a deformacao dassuperfıcies equipotenciais que deixam se ser paralelas, como mostra a Fig. 26.

A determinacao do campo gravıtico e util para a determinacao das altitudes dasmontanhas, elevacoes, em geofısica em geral, e na determinacao das correntesoceanicas, fundamental para a previsao do tempo.

Para estudar o campo gravıtico terrestre os satelites tem que descrever orbitasde baixa altitude para que os aparelhos de bordo consigam determinar comexactidao as inhomogeneidades. Com o aumento da altitude, essas inhomo-geneidades dissipam-se, e a Terra comporta-se a altitudes elevadas (acima dos20000 km) como se fosse um geoide com um campo gravıtico de simetria esferica(desvanecendo-se os detalhes), como mostra a Fig. 27.

O “geoide” e um modelo fısico da forma da Terra. O grande matematico e fısicoalemao Carl Friedrich Gauss definiu o geoide como a “figura fısica da Terra”,isto e, uma superfıcie equipotencial que, em media, coincide com o valor donıvel medio das aguas do mar. Ve-se na Fig. 27 que a superfıcie do geoide emais irregular do que o elipsoide de revolucao com que poderıamos aproximar aforma do planeta (tendo em conta o achatamento dos polos). Porem, o geoidee uma superfıcie mais suave do que a propria superfıcie terrestre. Por exemplo,a superfıcie terrestre varia entre os +8,850 m (Monte Evereste) e os -11,000 m(Fossa das Marianas), enquanto que o geoide varia apenas cerca de ±100 malem da superfıcie do elipsoide de referencia.

10Denominadas em ingles “mascoons”.

428

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Figure 25: Um satelite e um corpo em queda livre em torno da Terra.

429

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(a)

(b)

Figure 26: Devido a rotacao do planeta Terra ocorre uma deformacao das su-perfıcies equipotenciais.

430

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Figure 27: Campo gravıtico a diversas altitudes. Com a altitude perde-se osdetalhes, aparecendo o campo gravıtico como perfeitamente homogeneo.

431

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O facto do planeta apresentar grandes inhomogeneidades do campo gravıtico(assim como qualquer outro corpo cosmico), a orbita de um satelite nao seraperfeitamente Kepleriana (do tipo (a), na Fig. 29), como seria de esperar (tendoem conta os calculos desenvolvidos anteriormente), mas antes sera uma orbitado tipo (c).

Se porventura quisessemos efectivamente descrever a orbita de um satelite comgrande precisao, poderıamos recorrer ao modelo EGM96 11 que nos da uma ex-pressao matematica do potencial gravıtico terrestre em qualquer ponto (r, λ, φ)recorrendo a um conjunto de parametros que vai ate a 360o ordem. A expressaodo potencial no modelo EGM96 tem a forma:

U(r, λ, φ) =GMT

r

(1 +

360∑n=2

(ar

) n∑m=0

Pn,m(sinφ)[Cn,m cosmλ+ Sn,m sinmλ]

),

(18.107)onde r e o raio geocentrico (isto e, a distancia ao centro da Terra), φ e λ saoa latitude e longitude geocentricas, respectivamente, tal como sao mostradasna Fig. 28; Pn,m sao as chamadas funcoes de Legendre normalizadas de grau ne ordem m 12; Cn,m e Sn,m sao os coeficientes (valores numericos) do modeloEGM96 13. Por exemplo: (C20 = −0.484165371736× 10−3, S20 = 0.0); (C21 =−0.186987635955× 10−9, S21 = 0.119528012031× 10−8),...

Iremos em seguida resolver o problema do movimento planetario, isto e, iremosobter as solucoes das equacoes definidas anteriormente e verificar quais as orbitaspossıveis que daı resultam. Antes de prosseguirmos, repare que as solucoes desteproblema devem ser do tipo:

• r = f(t);

• φ = g(t);

• r = h(φ)⇒-trajectoria da orbita.

Portanto, temos que resolver o seguinte sistema de equacoes:

vr = drdt =

√2µ (E − Vef (r)) (a)

dφdt = L

µr2 (b)

∴ dφdr = L

µr21√

2µ (E−Vef (r))

(c)

(18.108)

Para comecar, repare que podemos integrar de imediato a Eq. 18.108-(a), ob-tendo

t− to =

∫ r

ro

dr√2µ (E − Vef (r))

. (18.109)

11Earth Gravity Model 1996.12Sao funcoes tabuladas. Por exemplo: P0,0(x) = 1; P1,−1(x) = −P1,1(x)/2; P1,0 = x,...,

onde neste caso x = sinφ.13Detalhes deste modelo e os seus coeficientes podem ser obtidos no sıtio da NASA:

http://cddis.gsfc.nasa.gov/926/egm96/egm96.html

432

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r

O

Figure 28: Coordenadas geograficas da esfera.

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(a) (b) (c)

Figure 29: Devido a inhomogeneidade do campo gravıtico terrestre, a orbita deum satelite nao e rigorosamente do tipo Kepleriano (a), mas sim do tipo (c). Ocaso (b) seria um caso intermedio, devido a perturbacao criada pela rotacao daTerra.

434

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Da Eq. 18.108-(b), obtemos facilmente a dependencia angular:

φ− φo =

∫ t

to

L

µr2dt. (18.110)

Dividindo a Eq. 18.108-(b) pela Eq. 18.108-(a), obtem-se

dr=

L

µr2

1√2µ (E − Vef (r))

. (18.111)

Chama-se a r(φ) a orbita da partıcula.

Considerando o potencial gravıtico U(r) = −k/r, a Eq. 18.108-(c) converte-seem

φ− φo = L

∫dr

r√

2µEr2 + 2µkr − L2, (18.112)

onde φo e uma constante de integracao. Consultando uma Tabela de Integrais 14

verifica-se que a solucao e a seguinte:

φ− φo = arcsin

(µkr − L2

r√µ2k2 + 2µEL2

). (18.113)

Isto e,

µkr − L2 = r√µ2k2 + 2µEL2 sin(φ− φo). (18.114)

Resolvendo agora em ordem a r obtem-se finalmente

r =

L2

µk

1−√

1 + ( 2EL2

µk2 ) sin(φ− φo). (18.115)

Por convencao, toma-se φo = −π/2 e introduz-se os parametros:

ro ≡ L2

µk (a)

ε ≡√

1 + 2EL2

µk2 (b).(18.116)

ro representa fisicamente o raio da orbita circular correspondente a um dadovalor de L, µ e k. ε e um parametro sem dimensoes chamado excentricidade,e que caracteriza a forma da curva. A Eq. 18.116 pode ser escrita na forma daequacao de uma conica:

r =ro

1− ε cosφ, (18.117)

ou ainda,ror

= 1− ε cosφ =εp

r, (18.118)

14Por exemplo, Gradshteyn and Ryzhik, Table of Integrals, Series, and Products, Ed. AlanJeffrey, Fifth edition (January 1994) ISBN number: 0-12-294755-X.

435

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que representa uma equacao de uma seccao conica; p e o paramtero focal; ro eo semi-latus rectum. Como ja referimos, ε denota a excentricidade:

ε = e =

√1 +

2EL2

µk2. (18.119)

Pode-se agora inverter a Eq. 18.119 expressando-a em funcao da energia:

E = −µG2M2m2

2L2(1− e2). (18.120)

E conveniente aqui referir a seguinte relacao:

e =rmax − rminrmax + rmin

. (18.121)

Da analise dos resultados obtidos podemos concluir:

• Quando Vef < E < 0, o movimento tem lugar entre dois pontos de retornormax e rmin. A orbita e uma elipse tendo ro como ponto focal;

• Quando E → 0, rmax →∞, e a excentricidade e = rmax−rminrmax+rmin

→ 1, isto e,a trajectoria descreve uma parabola;

• Quando E > 0, e = rmax−rminrmax+rmin

> 1 e a trajectoria e uma hiperbole, ondermin e a distancia mınima de aproximacao.

18.5 Orbitas caracterısticas

Em resumo, consoante o valor da excentricidade obtemos diferentes tipos detrajectorias:

• ε = 0: orbita circular, E = Emin

• ε > 1: orbita hiperbolica, E > 0.

• ε = 1: orbita parabolica, E = 0

• 0 < ε < 1: orbita elıptica, E < 0.

Recapitulando o que foi explanado anteriormente, temos

E =1

2µv2

r + Vef (r), (18.122)

onde

Vef (r) =L2

2µr2− Gm1m2

r. (18.123)

436

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Figure 30: Trajectorias possıveis de um satelite: (a) parabola; (b) elipse; (c)hiperbole.

437

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Figure 31: Grafico da funcao energia potencial efectiva no caso do movimentoplanetario, mostrando diferentes valores dos raios para duas energias que corre-spondem a orbita circular e elıptica.

Da soma de ambos os termos resulta um mınimo:

limr→∞

Vef (r) = 0. (18.124)

Quando−→L 6= 0, o potencial centrıfugo repulsivo L2/2µr2 e o termo dominante

para pequenos valores de r, enquanto que para grandes valores de r e o potencialgravıtico Gm1m2/r que domina.

A energia cinetica associada ao movimento radial e:

K = E − Vef (r). (18.125)

O movimento fica restringido as regioes onde K > 0 e a natureza do movimentodepende de E (Fig. 31).

E > 0: Hiperbole r nao tem limites para valores elevados, mas deve exceder

um certo valor mınimo se−→L 6= 0. As partıculas estao separadas por uma

barreira centrıfuga. (e > 1)

E = 0: Parabola orbita que fica no limite entre curva fechada e aberta. (e =1).

E < 0: Elipse O movimento e confinado para grandes e pequenos valores der. Duas partıculas formam um sistema fechado. (0 < e < 1).

E = Emin: Cırculo r tem um unico valor exacto e as partıculas orbitam emredor uma da outra a uma distancia constante. (e = 0).

438

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Figure 32: Trajectorias orbitais diferentes correspondendo ao mesmo valor domomento angular.

18.6 Orbitas circulares

E tem um valor mınimo quando vr = 0 e dVef/dr = 0.

Vef (r) = L2

2µr2 −kr (a)

dVdr = − L2

µr3 + kr2 = 0 (b).

(18.126)

Obtem-se daqui o raio da trajectoria circular:

ro =L2

µk, (18.127)

ao qual corresponde a energia mecanica total mınima:

Emin = Vef (ro) = −µk2

2L2 (a)

U(ro) = −µk2

L2 (b).(18.128)

A energia minıma iguala o valor de Vef (ro), quando r = 0 e r = ro. A energiatotal e negativa e e exactamente metade da energia potencial gravıtica:

Emin = −1

2U(ro) = −GMm

ro, (18.129)

e o movimento e circular.

Exemplo 9: Qual e a velocidade inicial perpendicular a linha que une o centroda Terra ao satelite, e que e necessaria transmitir ao satelite de modo a forca-loa descrever uma orbita circular?

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Desprezando o atrito o satelite esta unicamente sujeito ao campo gravıtico ter-restre, de modo que a aceleracao esta dirigida para o centro da Terra (acel.centrıpeta):

mg = mv2

r∴ v =

√gr

(18.130)

sendo r a distancia do satelite ao centro da Terra e v a velocidade do sateliteperpendicular a linha que une o centro da Terra ao satelite.

Como a forca gravitacional decresce com o quadrado da distancia, tambem severifica:

g = g0R2T

r2(18.131)

donde se obtem

v = RT

√g0

r. (18.132)

A superfıcie da Terra v ≈ 8 km/s (enquanto que a velocidade de escape e 11.27km/s).

Se quisermos colocar o satelite numa orbita geoestacionaria a sua inclinacaorelativa ao plano do equador e nula e devera ser escolhido um r de tal formaque o satelite permaneca sempre sobre o mesmo ponto da superfıcie terrestre,isto e, o satelite devera ter o mesmo perıodo que a Terra:

v =√gr

ωr =√gr

∴ r =3

√g0R2

TT2

4π2 ≈ 4.22× 107m.

(18.133)

Usamos para RT o valor medio do raio da Terra, pois que o nosso planeta Terratem a forma de um geoide ou esferoide oblato.

Portanto compreendemos agora que os satelites geoestacionarios parecem estarfixos sobre um ponto sobre o equador. As antenas de emissao e recepcao po-dem estar fixos no solo e sao mais economicas. Estes satelites sao de grandeimportancia nas comunicacoes globais, televisao, previsao do tempo e em comu-nicacoes militares. Uma desvantagem destes satelites reside na altitude elevadaa que sao forcados a estar, levando o sinal electromagnetico aproximadamente0.25 segundos a fazer ida e volta provocando um atraso significativo do sinal.Outra desvantagem significativa esta na dificuldade da recepcao do sinal emlatitudes superiores a 60o. Recorre-se entao a satelites com orbitas elıpticas.

Quando o satelite tem uma orbita geosıncrona em torno da Terra quer dizerque ele volta a um ponto fixo na Terra exactamente no mesmo dia e instante aesse ponto fixo.

Exemplo 10: Mostre que na verdade um satelite em torno da Terra esta emqueda para a Terra.

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Table 2: DefinicoesPlanetas Terra

rmin = rp perihelio perigeurmax = ra afelio apogeu

Considere a situacao da fig. 33. No instante t = 0 o satelite esta na posicaoP1 em orbita circular a velocidade v. No instante posterior t2 esta em P2. Naausencia de qualquer aceleracao o satelite prosseguiria ao longo da tangencialde P1 e cairia como se fosse um projectil disparado por um canhao. Em P2 teracaıdo de

(RT − s)2 + v2t2 = R2T (18.134)

ouv2t2 = 2Rts− s2 (18.135)

Desprezando o ultimo termo, obtemos

s ≈ 1

2

(GMT

R2T

)t2, (18.136)

o que representa a distancia percorrida pelo satelite na sua queda com aceleracaog = GMT /R

2T .

18.7 Orbitas elıpticas

As orbitas elıpticas correspondem a E < 0, 0 ≤ ε < 1,

r =ro

1− ε cosφ. (18.137)

Podemos usar a Eq. 18.137 para determinar o valor maximo de r que ocorrepara φ = 0, rmax e o valor mınimo de r que ocorre para φ = π, rmin. Esses saoos pontos de retorno do movimento e correspondem as seguintes expressoes:

rmax = ro1−ε , (φ = 0) (a)

rmin = ro1+ε , (φ = π) (b).

(18.138)

O comprimento do eixo maior e dado por

A = rmin + rmax = 2a

= ro

[1

1+ε + 11−ε

]A = 2ro

1−ε2 .

(18.139)

Note quermaxrmin

= 1+ε1−ε

ε = rmax−rminrmax+rmin

.(18.140)

441

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P1

P2

svt

RT

Figure 33: Satelite em queda.

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Figure 34: (a) Elipse; (b) Geometria para obter as equacao geral da conica; (c)Movimento elıptico de m1 e m2 em torno do sue CM em O. O ponto O e ofocus do lado direito da elipse menor e o focus esquerdo da elipse maior; (d) Omovimento correspondente da partıcula hipotetica µ em torno de O′.

443

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Table 3: Dados planetarios dos planetas do sistema solar.Planeta Diametro (Terra=1) Massa (Terra=1) Semieixo maior (U.A.) Perıodo sideral (Anos) Excentricidade da orbita

Mercurio 0.3824 0.0553 0.3871 0.24084 0.2056Venus 0.9489 0.8150 0.7233 0.61515 0.0068Terra 1 1 1 1.00004 0.0167Marte 0.5326 0.1074 1.5237 1.8808 0.0934Jupiter 11.194 317.89 5.2028 11.862 0.0483Saturno 9.41 95.17 9.5388 29.456 0.0560Urano 4.4 14.56 19.1914 84.07 0.0461

Neptuno 3.8 17.24 30.0611 164.81 0.0100Plutao 1 0.4 0.02 39.5294 248.53 0.2484

A = 2ro1−ε2 =

2L2

µk

1−(1+ 2EL2

µk2).

A = k(−E) .

(18.141)

Estes coeficientes aplicam-se as orbitas elıpticas e verifica-se que o comprimentodo eixo maior e independente de L. As orbitas com o mesmo eixo maior tem amesma energia. A excentricidade e dada pela seguinte expressao:

ε =

√1 +

2EL2

µk2. (18.142)

Apresenta-se na Tabela 3 alguns dados planetarios relevantes.

18.8 Leis de Kepler revisitadas

As leis de Kepler sao leis aproximadas. Recordemos as duas primeiras leis:

1 O planeta move-se numa trajectoria elıptica com o foco na posicao do CM dosistema planeta-Sol (O CM deste sistema esta a 450 km do Sol).

2 O vector posicao do planeta (medido a partir do CM do sistema planeta-Sol)varre areas iguais em intervalos de tempo iguais (dA/dt =constante, vd.Fig. 35).

O momento angular conserva-se quando o movimento e sujeito a forcas centrais,como e o caso da forca gravitacional.

Considere um trajecto PP ′. Durante o intervalo de tempo ∆t, o vector posicao−→r (t) varre a area ∆A:

∆A = 12r

2∆φ

lim∆t→0∆A∆t = 1

2r2 lim∆t→0

∆φ∆t

dAdt = 1

2r2ω = L

2µ = const.(18.143)

444

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Figure 35: (a) Representacao geometrica da Segunda Lei de Kepler; (b) Ilus-tracao da Segunda Lei de Kepler.

445

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A Segunda Lei de Kepler e valida para qualquer tipo de forca central.

3 O racio do quadrado do perıodo (T 2) pelo cubo do semi-eixo maior (a3) eaproximadamente o mesmo para todos os planetas.

dt = 2µL dA∫

dt = 2µL

∫dA

(18.144)

Para uma revolucao completa temos o perıodo dado por:

T =2µ

LA =

Lπab. (18.145)

Numa orbita elıptica verifica-se em particular

b = a√

1− ε2, (18.146)

e

a(1− ε2) =L2

µk. (18.147)

Pode-se assim obter a Terceira Lei de Kepler:

T 2 = 4µ2

L2 π2a2b2 = 4µ2

L2 π2a2a2(1− ε2)

= 4µ2

L2 π2a3 L2

µk = 4µ2π2a3

GMm = 4π2a3

GMmmMm+M

T 2 = 4π2a3

G(m+M) .

(18.148)

Exemplo 11: Orbita de um satelite 15.

Um satelite descreve uma orbita elıptica em redor da Terra. Sabe-se que mM ⇒ µ ≈ m. Suponha que os dados numericos sao os seguintes:

• RT = 6400 km;

• m = 2000 kg;

• rp = perigeu= 1100 km

• ra = apogeu = 4100 km

a) Calcule o valor do eixo-maior da elipse A.

A = (rp + ra + 2RT ) kma = 1.8× 107 km

(18.149)

15Kleppner and Kolenkow, “An introduction to mechanics”, (McGraw-Hill, New York,1973), p. .

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b) Calcule a energia inicial do satelite antes da descolagem.

Ei = −GMTm

RT= −mgRT = −12.5× 1010 J (18.150)

c) Calcule a energia do satelite em orbita.

A = k(−E) = GµMT

(−E) = GMTm(−E) =

(mg)R2T

(−E)

∴ E = −mgR2T

A = − 2×103×9.8×(6.4×106)2

1.8×107 = −4.5× 1010 J.(18.151)

d) Calcule a energia (ou o trabalho) requerida para colocar o satelite em orbita,desprezando o efeito do atrito da atmosfera.

W = ∆EW = E − Ei = 8× 1010 J.

(18.152)

e) Calcule o momento angular do satelite na sua orbita.

rmin = r01+ε

rmax = r01−ε

∴ ε = rmax−rminrmax+rmin

ε = rmax−rminA = 3×103

1.8×104 = 16

ε2 = 1 + 2EL2

mk2 ⇒ L = 1.2× 1014kg.m2/s

(18.153)

f) Calcule a velocidade do satelite no perigeu.

E = 12mv

2 − kr

rp = (1100 + 6400)km = 7.5× 106 km∴ vp = 7900m/s.

(18.154)

g) O momento angular conserva-se. Porque? Calcule a velocidade no afelio, va.

La = Lpµrpvp = µrava

va =rpvpra

= 5600m/s.(18.155)

Exemplo 12: O satelite russo Sputnik I, foi lancado pela USSR a 4 de Out-ubro de 1957 emitindo sinal durante tres semanas 16 e descrevendo uma orbitaelıptica, tinha um perıodo de rotacao em torno da Terra de T = 96 mn 12s e uma altitude maxima de H = 939 km. Este feito tornou a Russia numapotencia espacial e constitui um marco historico na conquista do espaco. Use a

16Era esferico com 84 kg de massa e 58 cm de diametro. A altitude no apogeu era ha = 947km, inclinacao i = 65.128o, perıodo T = 96.17 min.

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Figure 36: Elementos da orbita elıptica de um satelite artificial da Terra. Ocentro da Terra O e um dos focos da elipse, Pe e o perigeu, (ponto mais proximoda Terra), Ap e o apogeu (ponto mais distante), M e o centro geometrico daelipse, e a e o semi-eixo maior. H e h sao as alitudes em Ap e Pe.

Terceira Lei de Kepler para determinar a altura de ejeccao do satelite (Fig. 36).Determine tambem a velocidade no perigeu, que corresponde a velocidade deejeccao.

Sabe-se que:

a = 3

√GM4π2 T 2

∴ a = 6949.85km(18.156)

onde usamos G = 6.674× 10−11 m3.kg−1.s−2 e MT = 5.96× 1024 kg.

Como vemos na Fig. 36, temos a seguinte relacao geometrica simples de grandeutilidade:

h+H = 2a− 2RT∴ h = 205km

(18.157)

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Na realidade foi a 215 km da superfıcie, mas este exemplo mostra como as leisdo movimento planetario levam-nos a conclusoes imutaveis.

A velocidade de ejeccao calcula-se por meio da seguinte equacao:

vp =√

GMa

RT+HRT+h

∴ vp = 7970m/s.(18.158)

19 Fısica no sistema de coordenadas em rotacao

O movimento rotacional e um movimento acelerado. Um referencial em rotacaoe um referencial acelerado onde surgem forcas fictıcias.

Pode-se mostrar que num referencial em rotacao verifica-se a seguinte relacaoentre a taxa de variacao temporal do vector posicao −→r :(

d

dt−→r)in

=

(d

dt−→r)rot

+ [−→Ω ×−→r ], (19.159)

onde o sımbolo × denota o produto externo e onde se assume que −→r possuio mesmo valor em ambos os referenciais num dado instante. A Eq. 19.159 17

pode reescrever-se assim:

−→v in = −→v rot + [−→Ω ×−→r ]. (19.160)

A Eq. 19.159 e totalmente geral e, em particular, pode ser generalizada para

qualquer vector−→B (por ex., o vector inducao magnetica):(

d

dt

−→B

)in

=

(d

dt

−→B

)rot

+ [−→Ω ×

−→B ]. (19.161)

A aceleracao e dada por:

−→a in =(d−→v indt

)in

=(d−→v indt

)rot

+ [−→Ω ×−→v in]

−→a in = [ ddt (−→v rot + [

−→Ω ×−→r ])]rot + [

−→Ω ×−→v rot] + [

−→Ω × [

−→Ω ×−→r ]]

∴ −→a in = −→a rot + [Ω×−→r ] + 2[−→Ω ×−→v rot] + [

−→Ω [−→Ω ×−→r ]]

(19.162)

Da Eq. 19.162 concluımos que a forca aparente−→F rot num sistema de coorde-

nadas em rotacao e dada por

−→a rot = −→a in − [Ω×−→r ]− 2[−→Ω ×−→v rot]− [

−→Ω × [

−→Ω ×−→r ]]

−→F rot = m−→a rot = m−→a in −m([Ω×−→r ] + 2[

−→Ω ×−→v rot] + [

−→Ω × [

−→Ω ×−→r ]])

−→F rot =

−→F +

−→F fict−→

F fict = −2m[−→Ω ×−→v rot]−m[

−→Ω × [

−→Ω ×−→r ]]−m[Ω×−→r ].

(19.163)

17(Repare que o intervalo de tempo e o mesmo em ambos os referenciais, nao e supostoocorrer efeitos relativistas.

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O primeiro termo a direita da forca fictıcia e chamado forca de Coriolis, osegundo termo, apontando para fora do eixo de rotacao e chamado de forcacentrıfuga. Finalmente, o ultimo termo e chamado forca de Euler.

Essas forcas sao em geral consideradas fictıcias porque nao resultam de ver-dadeiras interaccoes fısicas 18, sao o resultado de relacoes puramente cinematicas.

Exemplo 13: Uma pequena esfera desliza sem atrito numa haste rıgida emrotacao em torno de um eixo com momento angular constante ω.

a) Determine a forca exercida pela haste na esfera (Fig. 37).

Repare que a forca de Coriolis resulta do produto extermo [−→Ω × −→v rot], onde

−→v rot e a velocidade da esfera no referencial em rotacao. A forca de Coriolis,embora fictıcia, realiza trabalho no referencial em rotacao (portanto, aceler-ado), agindo perpendicularmente a haste, donde resulta o aparecimento de uma

“pressao de contacto”−→N , com a direccao oposta a

−→F Cor. Repare tambem que

na vertical estao aplicadas o peso da esfera e a respectiva normal, mas comoa resultante e nula, nao nos interessa neste problema. A forca centrıfuga eexercida radialmente para fora do eixo de rotacao.

Temos assimmar = mr = FcentN − FCor = 0Fcent = mω2r

∴ mr −mω2r = 0

(19.164)

A ultima Eq. 19.164 e a equacao do oscilador harmonico, cuja solucao e

r = Aeωt +Beωt. (19.165)

A e B sao constantes de integracao que podem ser determinadas com ascondicoes iniciais r(t = 0) = r0 e v(t = 0) = v0.

b) Calcule a expressao da forca de Coriolis.

N = FCor = 2mωrFCor = 2mω2(Aeωt −Beωt). (19.166)

Como r(t = 0) = r0 = A+B e r(t = 0) = ω(A−B), obtem-se

A = 12 (r0 + v0

ω )B = 1

2 (r0 − v0ω )

(19.167)

Exemplo 14: Deflecao de massas em queda livre. Calcule a deflecao a que estasubmetida uma massa m quando cai de uma torre de 50 metros de altura noequador. Veja a Fig. 37-(b).

18A forca centrıfuga aumenta com a distancia do eixo de rotacao enquanto que as forcas deinteraccao decrescem com a distancia.

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ω

r

FCor

Fcent

N

r

ω

Visto por cima

Visto na vertical

ω

Ω Este

Oeste

Norte r

m

ur

uθ m

(a)

(b)

Figure 37: (a) - Forca de Coriolis num referencial em rotacao; (b) - queda deuma massa m de uma torre de altura h = 50 m situada no equador.

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a) Calcule as componentes da velocidade e da forca no referencial da Terra (emrotacao em relacao as estrelas).

As forcas da gravitacao e centrıfuga sao radiais, e a forca de Coriolis assenta noplano equatorial, como se depreende aplicando a regra-da-mao-direita. Podemosusar a expressao

−→v rot = r−→u r + rθ−→u θ (19.168)

para representar a velocidade da massa m no referencial em rotacao da Terra.Em seguida, obtem-se as componentes fr e Fθ e a equacao do movimento radial:

QuadroNegro 4

O movimento de queda de m faz-se a superfıcie da Terra e, portanto r ≈ RT .A equacao do movimento reduz-se a:

r = −g + Ω2RT= −g′

g′ ≡ g − Ω2RT

(19.169)

onde designa-se por g′ a constante “efectiva” de aceleracao da gravidade 19.

QuadroNegro 5

19O lancamento de foguetoes e mais vantajoso no equador, aproveitando a velocidade rota-cional de Terra que tem o valor maximo de 460 m/s (no equador), devendo ser feita para Este.Os Estados Unidos escolheram Cape Canaveral (28o de latitude Norte), e a Europa lanca oAriane desde a Guiana Francesa (5o de latitude Norte).

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Exemplo 15: O Pendulo de Foucault.

Uma celebre experiencia de pensamento de Newton mostra o efeito absoluto daforca centrıfuga. Se fizermos rodar um balde com agua em torno do seu eixo, asuperfıcie livre do lıquido adquire uma forma parabolode. O que aconteceria seo balde estivesse parado e em seu lugar rodassem todos os astros do universo?Newton concluiu que nada aconteceria a superfıcie livre do lıquido, mostrandoassim o caracter absoluto da forca centrıfuga.

Em 1852, Leon Foucault suspendeu um pendulo no tecto do Panteao em Parisdando uma dramatica prova da rotacao da Terra.

Para um observador sobre a superfıcie terrestre existem duas forcas fictıcias ater em conta: a forca centrıfuga e a forca de Coriolis. Num plano horizontal dolugar, a forca de Coriolis e dada por 2mvΩ sinλ (procure ver porque), onde λ ea latitude do lugar, e Ω sinλ e a componente vertical da velocidade angular daTerra.

a) Obtenha as equacoes do movimento da massa m suspensa num fio de com-primento l.

Designemos o deslocamento em relacao a vertical por r. A forca restauradora emgr/l. As componentes da velocidade de m, radial e transversa, sao r e rθ. Assuas aceleracoes sao: ar = r − rθ2 e aθ = rθ + 2rθ. Daqui podemos escrever deimediato as eqs. do movimento:

m(r − rθ2) = −mg rlm(rθ + 2rθ) = −2mrΩ sinλ

(19.170)

b) Considere que θ + Ω sinλ = 0. Determine o perıodo T das oscilacoes dopendulo.

Inserindo esta condicao na Eq. 19.170-(b), obtem-se θ = 0. Substituindo-a naEq. 19.170-(a) resulta em

r + ω2r = 0ω2 = g

l + Ω2 sin2 λ.(19.171)

Esta equacao e a equacao do oscilador harmonico. O perıodo das oscilacoes e

T =2π√

gl + Ω2 sin2 λ

(19.172)

c) Admita que as condicoes iniciais sao: r(t = 0) = 0, θ(t = 0) = θ0 e θ(t =0) = 0. Calcule r e θ(t).

A solucao geral do oscilador harmonico e do tipo r(t) = A cos(ωt + φ), ondephi e a chamada fase inicial. Atendendo a r(t = 0) = 0 (normalmente nas

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experiencias com o pendulo, a massa parte sem velocidade inicial).

r(t) = A cos√

gl + Ω2 sin2 λ

θ = Const = −Ω sinλθ(t) = θ(t = 0) + Ctθ(t) = θ0 − Ω sin(λ)t

(19.173)

Concluımos que o pendulo de Foucault ira rodar ao longo do tempo em tornoda vertical do lugar, devido a rotacao da Terra. Em particular, vemos que noequador, λ = 90o e θ(t) = θ(t = 0): o pendulo nao roda.

Exemplo 16: O limite de Roche, ou raio de Roche 20, e a distancia a queum objecto cosmico, ligado pela sua propria forca gravitacional, se desintegraradevido a accao da forca tidal exercida por um segundo corpo e excedendo a forcade auto-atraccao do primeiro corpo. No interior do limite de Roche, os materiaiseventualmente dispersos tendem a formar aneis, enquanto que no exterior dolimite de Roche, os materiais tendem a coalescer em partıculas muito pequenas,em poeira cosmica.

Assim, consideremos uma massa m′ pertencendo a um primeiro corpo cosmico(satelite natural ou artificial) de massa m (sendo por hipotese m′ m) comraio r e densidade massica ρs. Seja um segundo corpo com massa M , raio R edensidade ρM situado a distancia d do primeiro:

Fg = FTGm′mr2 = 2GMm′r

d3

∴ d = r 3

√2Mm

M = ρM4πR3

3

m = ρm4πr3

3

d = R 3

√2ρMρm .

(19.174)

Um satelite natural ou artificial que esteja ligado por forcas mais fortes do quea gravitacao naturalmente que pode orbitar dentro do limite de Roche. E ocaso de Metis, lua de Jupiter, e Pan, lua de Saturno, pois sao solidos ligadospor forcas de tensao fortes. Um cometa poderia quebrar-se no limite de Roche,no caso de as ligacoes entre as suas partes forem fracas 21.

20Edouard Roche, astronomo frances, foi o primeiro a calcular este limite em 1848.21Nao parece ser o caso de Apofis, o asteroide que pora eventualmente a vida em perigo no

nosso planeta em 13 de Abril de 2036.

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