Nélson Hungria - Comentários Ao Código Penal - Volume IV - Arts. 102 a 120
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SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE TÍTULO VIIDA AÇÃO PENALArt. 102 . A a ç ã o penal é p úbl i ca } salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. § 1.° A aç ã o públi ca é p rom ovid a pe l o Mi nisté r i o Público, dependendo, quando a lei o exi ge, d e repr esen t a ç ã o d o of end i d o ou d e r e- qu i si ção d o m i ni st r o da Ju sti ça. § 2.° A aç ão pr ivad a é promov i da me- diante queixa do ofendido ou de quem tenha qual id ad e par a r e pr esent á l o. § 3.° A aç ão pr ivad a p ode i ntentar se nos c r im es d e ação públ i ca , se o Mi n i st é r i o Públ i co n ã o ofe r ece den úncia no pra zo legal. § 49 No caso de morte do ofendido ou d e t er si do ele dec l ar ad o ausent e p or deci são j u d i c ial, o d i r e i t o de o f er ecer quei x a o u d epr ossegu i r na aç ã o passa a o côn ju ge , ascen- den t e, descend ent e ou i r mã o. d ir eit o an t e r io r. Consolidação das Leis Penais, arts, 274 e 407. direito COMPARADO. Códigos : argentino, arts. 71 e 72; etíope, arts. 216 a 219; grego, art. 118; húngaro, art. 21; italiano, arts. 120 a 12 3, 127, 12 9, í n f i ne, e 130; norueguês, arts. 77 a 79; suíço, art. 28. biblio g rafia. Monte squietj, De 1’Espr i t des Loís,nova edição, Liv. 3.°, cap. V, pág. 23, e Liv. 6.°, cap. IX, pág. 79; F. Manduca, E lProcedi m iento Penal y su De sarr ollo Cientí fico,trad,, prólogo e notas Açãopúblicae açãoprivada
Nélson Hungria - Comentários Ao Código Penal - Volume IV - Arts. 102 a 120
TÍTULO VII
DA AÇÃO PENAL
A r t . 1 0 2 . A ação p ena l épúbl i ca } sa l
vo qua nd o a l ei e xp r es sam en t e a dec l a r a p
r i va t i v a do o fend i d o .
§ 1 .° A ação púb l i ca ép r om ov id a p el o Mi n i
s tér i o Púb l i co , depend end o , qua n do a l ei o
exi ge, d e r epr esen t ação d o of end i d o ou d e r
e-
qu i sição d o m i n i st r o da Ju st i ça.
§ 2 .° A ação p r i v ad a épr om ovi da m e-
d i a n t e q uei x a d o o f en d i d o ou de qu em t en
ha
qua l i d ad e par a r ep r esen t ál o .
§ 3 .° A ação p r i v ad a p ode i n t en t a r se n os
c r i m es d e ação públ i ca , se o Mi n i stér i o
Públ i co não of er ece denún c i a n o pr a zo lega l .
§ 4 9 N o ca so d e m o r t e d o o f en d i d o ou
d e t er s i do e le decl a r ad o au sent e p or deci
são j u d i ci a l , o d i r ei t o d e of er ec
er qu ei x a ou d e pr ossegu i r n a ação passa a o
côn ju ge , ascen- den t e, descen d ent e ou i r mão.
d ir e it o a n t e r io r . Consolidação das Leis Penais, arts,
274
e 407.
direito COMPARADO. Có d i g o s : argentino, arts. 71 e 72;
etíope,
arts. 216 a 219; grego, art. 118; húngaro, art. 21; italiano, arts.
120
a 123, 127, 129, ín f i n e , e 130; norueguês, arts. 77 a
79; suíço, art. 28.
b ib l io g r a f ia . Monte squietj, D e 1’Esp r i t d es Loís
, nova edição,
Liv. 3.°, cap. V, pág. 23, e Liv. 6.°, cap. IX, pág. 79; F.
Manduca, E l
Pr o c ed i m i e n t o P en a l y su D es a r r o l l o C i en t
íf i c o , trad,, prólogo e notas
Ação pública e ação
SAIR K H H _ a j u d a INDICE I | SEGUE
2 A l o y s io dei Ca r v a l h o F il h
o
de A n g e l P i n t o s y P i n t o s ,
Madri, págs. 141 a 160; F. P t j g l i a , P r i n
d p ü F on d a m en t a l i d i D i r i t t o G i u d i z i a r i o
Pen a l e , Milão, Coleção P i c o l l a
Eíb l i o t e c a S c i c n i i f i c c i , vol. '2 .°,
págs. 90 a 127; M a n g i n , T r a i té d e
VA c l i o n P u b l i q u e ei d e 1 'A c t i o n Ci v i l e en M
a t ièr e Cr i m m e l l e , Paris,
1337; M. H. F e r é o l R i v ií ir e , Es q u i s s e H i s
t o r i q u e d e l a Lég i s l a t i o n C r i
m i n e l l e ães Rom a i n s , Paris, 1844, págs. 56, 59 e
72; E. T r é b u t i e n , Cox i r s
s l óm en t a i r e d e D r o i t Cr i m i n e i , t. 2.°,
Paris, 1854, pág. 49; J. B e c o t ,
De I G r g a n i s a t i o n d e l a J u s t i c e Rép r e ss i v e
a u x P r i n c i p a l es Ép o q u e s
H i n t o r i q u a s , Paris, 1860, págs. 9 a 12, 47, 54, 58,
59, 101 a 105, 154 e ^Ol;
F j e r d inand W a l t e k , H i s i o i r e d u D r o
i t C r i m i n e i c h ez l es R om a i n s , tra- dução e
introdução de J. P i c q u e t -D a m e s m e , Grénoble, 1863,
págs, 14
aa introdução e 99 do texto; P. Rossi, T r a i t éde D r o i t Pén
a l , t, 1.°, Paris, 1872, págs. 226 a 239; J. T i s s
o t , L e D r o i t Pén a l Ét u áiéda n s aes
F r i n c i p c s , da?i s s es Usage s e t l e s Lo i s ães D l v
e r s Peup l e s du M on d e ,
edigão, t. 2.°, Paris, 1880, págs. 430 a 453 e 579 a 612; P a u l a
P e s s o a ,
R e f o r m a J u d i c iár i a , Maranhão, 1880; A n t ô n i
o S c e v o l a , Ül s t r u z i o n e
Pr e p a r a t ó r i a ãel P r o c e d i m e n t o Pe n a l e
, Turim, 1886, págs. 118 a 135;
Ad. F k a n c k , P hü o s o p h i e d u D r o i t Pén a l ,
3.a ed., Paris, 1888, págs. 63
a 80; Ch a r l e s M a y n z , Co u r s d e D r o i t R o m a
i n , 5.a ed., vol. 2.°, Bruxelas,
1391, págs. 447 a 450; G a e o f a l o , L a C r i m i n o l o g i
e , 3.a ed., Paris, 1892,
pág. 371; F e r h i, L a S o c i o l c g i e C r i m i n e üe
, trad. do autor, Paris, 1893,
págs. 439 a 444 ;L. L u c c h i n i, E l e m e n t i d i Pr o
c e âu r a P en a l e , Florença,
1895, págs. 78 a 105; B i a g i o B r u g i , I n t r o d u
z i o n e E n c i c l o péd i c a a l i e
S c i en z e G i u r i d i c h e e S oc i a l i , 3,a ed.,
Florença, 1898, págs. 135 a 144;
G e u v á s i o F io r a v a nt i , Da R ei n c i d ên c i a
n o Cód i g o Pe n a l , Recife, 1896;
Jo a q u i m G-u ima r ã e s , Âção Púb l i ca e P r i va d
a , Vitória, 1898; M a r t i ns
Jú n i o r , C om pên d i o d e H i s t ór i a G er a l d o D i r e
i t o , Pernambuco, 1893;
í 'i l o m u s i G t j e i f i , En c i c l o péd i a G i u r
iái c a , Nápoles, 1907, págs. 582 a 675;
A. G r o f p a l i, F i l o s of i a d o D i r e i t o ,
trad. de S o u s a Co s t a , Lisboa, 1910;
Jo ã o M o n t e ir o , P r o g r a m a d o C u r s o d e P
r o c e ss o Ci v i l , vol. I, 3.a ed„
São Paulo, 1912, págs. 89 a 95; V iv e ir o s d e Ca
s t r o , A ação p úbl i ca e
a ação p r i v a d a n o D i r e i t o P en a l , i n A Nov a . E s
co l a P en a l , Rio de Ja-
neiro, 1,913, 2.a ed., págs. 253 a 274; R. Sa l e i l l e s , L a I
nãi v i d u a l i z a c i ó n
d e l a Pe n a , 2.a ed., trad. de Ju a n d e H
in o j o s a , Madri, 1914, págs. 59 a 90; Jo ã o
M e n d e s de A l me i d a Jú n i o r
, O Pr o c e ss o Cr i m i n a l B r a s i l e i r o ,
vols. 1.° e 2.°, Rio de Janeiro, 1920; Cr is ó l it o d e
G u s m ã o , Do s Cr i m e s
Se x u a i s , Rio de Janeiro, 1921, pág. 358; E n r iq u e
A g u il e r a d e P a z ,
Co m e n t ár i o s a l a L e y d e E n j u i d a m i e n t o C r i
m i n a l , t. 1.°, Madri, 1923,
págs. 493 a 547; F. G o y e t , L e M i n i s t èr e Pu b l i c e n
M a t i èr e C i v i l e et
e n M a t i èr e Rép r e s s i v e e t VE x e r c i c e d e VA c t
i o n P u b l i q u e , Paris, 1926, págs. 211 a 223; D
o r a d o M o n t e r o , Na t u r a l e z a y F u n c i ó n
ãel D er e c h o ,
Madri, 1927, págs. 126 a 133; A l o y s i o d e Ca r
v a l h o F il h o , Ação Pen a l ,
Bahia, 1929, págs. 29 a 48; P ê r ic l e s e D e m ó s t e n
e s M a d ur e ir a d e P i n h o ,
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e nt á r io s a o Có d i g o P e n a l
— A r t . 102 .í
rim, 1S32, págs. 180 a 210; N e s t o r D u a r t e , O D i r
e i t o , Noção e No r m a ,
Bahia, 1933, págs. 53 a 88; G iu l i o B a t t a g l i n i ,
S u l l u r i n u n e i a a i d i r i t t o
d i qn e r t l a , i n R i v . I t a l i c m u d i D i r i t t o
Pen a l e , Pádua, ano V, n.° 1,
3ane;rolevereiro, 1933, págs. 75 a 80; O t t o r imo V a n n
i n i , I I Có d i c e
Pe n a l e l íl u s t r a t o A r t i c o l o p e r A r t i c o l o
, direção do Prof. üco C o n t í ,
voi. 1.°, Milão, 1934, págs. 524 a 578; Ja m e s G o l d s c
h m id t , P r o b l e m a s
J u r íd i cos y Po lít i cos ãe i Pr oceso Pen a l ,
Barcelona, 1935, págs. 23 a 42;
M e i.q u í a d e s P i c a n ç o , Quem p o d e d a r q u e
i x a e se r a u x i l i a r d a a c u s ação ,
i n A r q . J u d i c iár i o , Rio de Janeiro, vol. 27,
1936, págs. 77 u 81 do suple-
mento; Sa d i Ca r d o s o d e G u s m ã o , Da
ação p e n a l n o d i r e i t o b r a s i l ei r o ,
i n R e v. d e D i r e i t o P en a l , Rio de Janeiro, vol.
13, íasc, 1.“, 1936,
págs. 30 a 97; G a l d in o S iq u e i r a , Cu r s o ãe P r
o c e s s o C r i m i n a l , 2,£t ed.,
1937, pags. 65 a 85; F e r n a n d o A u g u s t o d e
M e n d o n ç a , D a ação p r i va d a
n o s d el i t o s c o n t r a a h o n e s t i d a d e d a s f am
íl i a s , i n Ca i >os C r im i n a i s ,
Pernambuco, 1837, pags. 29 a 34; Da ação p en a l e sua p r e em i
n ên c i a
s ob r e a açao c i v i l , i n R ev . Fo r e n s e , 1948,
vol. 118, págs. 11 c 348;
H e r me s L im a , I n t r od u ção à C iên c i a do D
i r e i t o , São Paulo, 1937, págs.
13 a 19 e 241 a 258; Jo a q u i m C a n u t o M e n d
e s d e A l me id a , Ação
P e n a l (An ál i ses e C o n f r o n t o
s ), São Paulo, 1938; A a ção p en a l n o
n o v o Cód i g o Pe n a l , i n O ? i ov o Cód i g o Pe n a l
, vol. 1,°, São Paulo, 1042,
págs. 171 a 182; D i r e t r i z e s ão p r o c e ss o n o Cóãt go
Pen a l , i n O n o v o
Có d i g o P e n a l , vol. 2.°, São Paulo, 1942, págs. 135 a
147; SebastiAn
S o l e r , D er e c h o P en a l A r g en t i n o , t. II,
Córdoba, 1940, págs. 443 a 452;
R a f a e l F o n t e c i l l a R., E l f u i c i o p
e n a l , i n Re v . d e C iên c i a s Pe n a l e s,
Santiago, 1941, vol. 5.°, n.° 1, pág. 13; Ju a n G o n z á l
e z B u s t a m a n t e ,
Pr i n c íp i o s d e D er e c h o Pr o c e sa l P en a l M e x i c
a n o , México, D. F., 1941,
págs. 9 a 13 e 47 a G5; Cé s a r Sa l g a d o , O r eg i m e
d a p r o v a n o C ód i g o
d e Processo P e n a l , caps. Rep r e s en t a
ção ão o f e n d i d o , A s s i s t e n t e , I n t r o-
m i s são d o o f e n d i d o n o p r o c es so , i n R e v . F o r
e n s e, vol. 90, abril a julho,
1942, págs. 346 a 349; M a r ia n o R u iz F u n e s
, E l d er e c h o p en a l d e l a
v en g a n s a , i n R e v . d e l a E s c u el a N a c i o n a l d
e J u r i s p r u d ên c i a , México
D. F., t. IV, ns. 13 e 14, janeiro a junho, 1942, págs. 7 a 24: Jo
s é P e c o ,,
P r o y e c t o d e Có d i g o P e n a l <E x p o s
i c i ó n ãe m o t i v o s ), apresentado á
Câmara dos Deputados da Argentina, La Plata, 1942, págs. 594, 803
e
üü4; R a f a e l G a r c ia V a l d é s , D e r e c h
o Pr o c es a l Cr i m i n a l , 2.a ed., Madri,
1944, págs. 75 a 97; B a s i l e u G a r c ia , Da ação pen
a l , i n Rev . Forense,
vol. 115, fevereiro, 1948, págs. 372 a 378; e I n s t i t u içõe s
d e D i r e i t o
P e n a l , vol. l.D, t. II, São Paulo, 1952, págs. 639 a
657; Jo r g e A l b e r t o
R o m e ir o , D a a ção p en a l , Rio, 1949; V a l e n t im
A l v e s d a S il v a , R e p e r -
t ó r i o d e J u r i s p r u d ên c i a d o Cód i g o Pe n a l
, 2.° vol., São Paulo, 1951,
págs. 581 a 599; H e l e n o Cl á u d io Fr a g o s o
, A r e f o r m a ãa l eg is l ação
p e n a l , i n R e v . B r a s i l e i r a ãe C r i m i n o l o g
i a e D i r e i t o P en a l , 1963; H é l io
SAIR K H H _ a j u d a INDICE I | SEGUE
4 A l o y s i o d z Ca r v a l h o F i l h
o
l o g i a e D i r e i t o P en a l , 1966; J. F r e d er ic o
M a r q u es , P r o p o s i t u r a ãa
ação p en a l , Estado de São Paulo, 1966; E p a m i n o n d
a s P o n t e s , P r e
cl u são, Separata do Re p e r t ór i o E n c i c l o péd i c
o d e D i r e i t o B r a s i l e i r o , 1967.
COMENTÁRIO
SUM ÁRIO : 1. Ação penal: conceito e origem. 2. Objetivo. 3.
Ação
pública e ação privada. 4. Formas de ação penal nas épocas
históricas. 5. No Código brasileiro: ação pública e ação privada.
6. Ação penal popular. 7. Crimes dc ação penal mediante
representação do ofendido ou requisição do ministro da Justiça.
8, Mediante queixa. 9. Sucessão ao ofendido, no caso de morte
ou ausência.
1. O crime revela um indivíduo, senão sempre perigoso, ao menos
inadaptado ao meio social. Apesar de quantas ex- plicações ou
conceitos tenham sido íormuladcs, ao íragor da contenda de
arbitristas e deterministas, — gente irreeon ciliável por definição
mesma,1— é, em verdade, um episódio de inadaptação, implicando nada
mais que um desajusta mento às normas da convivência entre os
homens.
Algumas vezes, é o indivíduo contra o indivíduo, outras, o
indivíduo contra a sociedade, e são as clássicas espécies, hoje
seguramente discernidas, da criminalidade comum e da criminalidade
política. Mas, em qualquer caso, sob qualquer aspecto, desaj
ustamento.
Como tal, rompe o equilíbrio coletivo, desarticula a paz pública,
conturba os espíritos, tanto mais profunda e dura- douramente,
quanto mais intensas e extensas as conseqüên- cias. Atrai sobre si,
por isso mesmo, a reprovação, sem de- mora, do grupo social,
melindrado pelo ato insólito, temen- do que se renove ou repita,
talvez sob formas mais graves ou em maior escala, e reclamando, por
tudo, revide cabal.
Para representar essa perturbação, nenhum confronto melhor,
realmente, que o da pedra lançada na água quieta,
SAIR IL ' i lJ ; l l i ' Jk l AJUDA INDICE I | SEGUE
C o m e n t á r io s a o Có d i g o P e n a l
— A r t . 102 5
livre de influência o espaço líquido. A imagem, não oferece- ria,
atualmente, tão perfeito símile, certo que os progressos
científicos tornam aproximada do ponto em que o crime aconteceu a
mais remota latitude do globo, aonde a reper- cussão chegaria,
dantes, retardada, e sensivelmente diluída, se chegasse, e poderá
ser agora, pelos prodígios da radiodi- fusão ou da televisão,
simultânea ao próprio crime, pressen- tido, sabido, e até
objetivamente visto no instante mesmo.
Como quer que seja, porém, urge à sociedade retomar o equilíbrio
momentaneamente desfeito, restabelecendo no ambiente a paz e nos
espíritos a confiança. É a tarefa do poder público, por meio da
pena.
Chamese a isso reajustar, regenerar, educar, ou, ainda, ao sabor de
remanescentes partidários da velha vindita, cas- tigar; concorram
para isso somente legisladores e juristas, com as construções
teoréticas e princípios abstratos, para aplicação a cada entidade
criminal ou a cada temperamento de delinqüente; ou intervenham os
médicos, com a soma dos conhecimentos da matéria e da alma,
transfigurando o crime em doença, ou imperfeição, ora reduzindo o
criminoso a um fantasma dos seus ancestrais, ora um produto das
suas glân- dulas, ou um derrotado pelas forças desordenadas do
incons- ciente, — o que não há negar é o imperativo do poder pú-
blico de se movimentar, em guarda contra o crime.
Como dito alhures, na sociedade dos homens, agregado dc seres vivos
que é, vibra, exteriorizandose, o mesmo ins- tinto de conservação,
fundamental nas naturezas humanas, e até existente nos
animais.
É o instinto, despertado na hora do perigo, e acionado, que dá à
sociedade a energia indispensável para responder à transgressão das
suas leis.
Esse movimento de defesa é a ação judiciária. Dizse
penal, para distinguir de outra, relativa às violações
de di- reito, que não são crimes, Porque não se compreende direito
sem uma ação correspondente, remédio de que dispõe, para anular, no
momento justo, o ato que o contrariou. Tratase, como no conceito do
nosso Jo ã o M o n t e ir o , de uma “reação
35 2 - 2
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
6 A l o y s i o d e C a r v a l h o Fi l h
o
que a força do direito opõe à ação contrária de terceiro”,
z Pressupõe, portanto, uma relação de direito, e a sua
violação, a ser reparada.
As ações ditas civis pertencem ao particular. O poder
público, através de funcionários especiais, a elas preside, dis-
ciplinandoas, conduzindoas, quiçá govemandoas, dentro das
concepções novas da função estatal. Mas o interesse priva- do, que
continua o dominante, não perde, por isso, a liber- dade de agir, a
qualquer tempo, em qualquer emergência, até o fim. Por maior a
faculdade, hoje reconhecida ao Estado, de interferir na ação
privada, dirigindoa, pelos meios de investigação e esclarecimento,
para a consecução do objetivo de restaurar a relação de direito,
violada, ainda resta ao particular a porção melhor de
arbítrio.
Não é assim com a ação penal, saída das mãos do indi- víduo,
e cada vez mais subtraída à sua iniciativa e arbítrio, para
constituir atributo do Estado, incisiva manifestação da
sua potestas, numa das expressões mais características, o
jus puniendi .
De início, inexistente nos agrupamentos humanos a auto- ridade
supraindividual, ou apenas esboçada em estádios me- nos distantes,
o particular desfrutou da liberdade de fazer recair sobre o
criminoso, em vingança pessoal ou por de veres do sangue, a sua
cólera, que só conhecia termo na con tingência da sua força física.
Quando o entendimento e a experiência começaram a moderar, no
indivíduo, os instintos, e raiou, no grupo, o sentido de
autoridade, fonte do poder público, compreenderam os homens a
inutilidade e a bruta- lidade do castigo, que eternizava entre eles
o ódio, transmi- tido, como um legado, de ascendentes a
descendentes.
A princípio, sem regras preestabelecidas, acaba a vin- gança por se
conter em certos limites, que se proporcionam à gravidade do mal,
ou revestem, por vezes, o aspecto de prestação econômica, que o
ofendido recebe, ou os do seu sangue, em troca do exercício da
represália. Não se trata,
2 Jo ã o M o n t e ir o , P r og r a m a ão Cu r s o ãe P r
o ce s s o Ci v i l , vol. 1.°,
3.a ed., São Paulo, 1912, pág. 89.
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e nt á r io s a o C ó d i g o P e n a l
— A r t . 102 7
ainda que pareça, de um perdão da ofensa. É, antes, uma transação,
rigoroso acerto de contas, que pode não conciliar as partes, mas,
em todo caso, desarma o braço do ofendido, e afasta o sobressalto,
que era permanente, de vindouros re- contros, dando às famílias uma
sensação de desafogo, pro- pícia às realizações pacíficas.
À autoridade incipiente nos grupos entregam os homens a solução dos
seus atritos e desavenças. O conselho do ár- bitro, ou de quem
encarna essa parcela nascente de autori- dade, conselho facultativo
para as partes rivais, assume, afi- nal, caráter coativo, valendo
como norma, e substituindo as desforras irrefletidas e violentas
que as hordas costumavam tomar, em bloco, ao ofensor.3
Essa figura do apaziguador ou juiz de dissídios, — pri- mo rdio de
uma autoridade que se superpõe ao grupo, até impor, soberanamente,
a sua chefia, a sua vontade, a sua lei, numa realidade de poder e
de mando que vem a ser, depois, o Estado, — é, por outro lado, o
mais longínquo in- dício de um procedimento jurídico em face do
crime, con- substanciado, então, na notícia e prova da ofensa, que
os componentes do grupo, considerandose, todos, lesados, tra- zem,
em massa, justificando a imediata repulsa ao ofensor.
Quando o Estado, reforçado o poder disciplinador das relações entre
os homens, avoca o direito de punir, atribui-
se, conseguintemente, a possibilidade de efetivar a repres- são do
delito, em cada caso.
A ação penal significa, pois, o exercício de uma
acusa- ção, que indica o autor de determinado crime,
responsabíli
zandoo, e pedindo, para ele, a punição prevista em lei.
3 Ver F il o m u s i G u e l p i , En c i c l o péd i a G i
u r iãi c a , 5.a ed., Nápoles, 1907, pág. 624, nota 1: o
erime foi, originariamente, infração da paz
pública e da ordem, Quando cometido por membro de grupo
estranho,
ocasionava o rompimento da paz entre os dois grupos, sendo a guerra
a conseqüência. Quando praticado por membro do próprio
grupo,
SAIR K H H _ a j u d a INDICE I | SEGUE
8 A l o y s io d e Ca r v a l h o F i l h
o
Quem afirma essa responsabilidade, e decreta a punição, se couber,
não é, porém, o mesmo que levantou o libelo. Assim foi, durante
largo período, em que, pelo sistema processual dito
inquisitório, de tão aprimorada prática nas jurisdições
eclesiásticas da Idade Média, o acusador e o julgador anda- vam
consorciados numa só pessoa. Mas duas funções que atendem a
diferentes razões e buscam finalidade diversa, como essas, não
podem residir no mesmo indivíduo. Na fun-
ção de acusar, admitase que domine a força da paixão ou do
interesse; na função de decidir, porém, devem predominar,
sobre interesses ou paixões, a serenidade e a imparcialidade,
inapartáveis de qualquer veredicto entre pretensões contrá- rias.
Pelo exposto, ao lado do acusador e do réu, tomase in-
dispensável à ação penal outra personagem, tendo por missão
recolher, das partes litigantes, o alegado, examinar os do-
cumentos, ponderar as provas, e proferir a decisão. Confi- gurase,
assim, o sistema processual misto, vigorante nos tempos
modernos.
2. Uma sentença oriunda de tais elementos, vivamente contrastados,
não há de ser sempre desfavorável ao acusado,
mas de condenação, ou de absolvição, conforme o mereça ele. Não é
exata, portanto, a impressão, às vezes corrente, de que a ação
penal visa a punir o acusado, e pune, cega- mente, graças ao
automatismo do Ministério Público, sem liberdade para opinar, e às
prevenções do juiz, inclinado, pela reiteração no oficio, a ver em
cada inculpado um culpado.
Os antigos, por esse receio, evitaram, quanto possível, os
acusadores profissionais. Os romanos tinham penas severas para os
que acusassem em falso (calumniari ), ou abando- nassem, sem
motivo, a acusação (tergiversari), expondo os alvejados a
constrangimentos desnecessários. Em algumas
jurisdições pretéritas, a temporariedade dos investidos
na
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e n t á r io s a o C ó d i g o P e n a l
— Akt. 102 9
Evidentemente, nem o Ministério Público é máquina de acusar, nem o
juiz criminal distribuidor sistemático de con- denações penais. São
defeituosas todas as noções de ação penai em que se fale de
imposição de pena como o seu fim.
A ação penal, esclarece F l o r i a n , visa ao conhecimento da
verdade sobre um crime, que se diz cometido, e de cuja autoria se
responsabiliza alguém. Por esse desígnio, assim como alcança a
condenação criminal, pode atingir conclusão diametralmente oposta,
como a da absolvição, pela certeza de que o fato não existiu, na
sua condição física, ou que, pelos elementos constitutivos, não é
crime, ou, sendo crime, não o praticou, todavia, o acusado.1
Fixar a culpa ou a inocência, eis o fito, para que nin- guém seja
punido por crime de outrem. Nemo punitur pro alieno
ãelicto. Uma tal função há de estar, naturalmente, à mercê
das circunstâncias de cada crirae, ou verificadas no correr da
ação, sempre que se busque estabelecer a relação entre o preceito
de lei, que define e reprime o delito, e o caso vertente.5
O delito é lesão que tomou aspecto diferenciado das le- sões
comuns, pela sua força específica de perturbação da vida social.
Provocando, em. virtude disso, muito maior abalo na coletividade,
desperta a iniciativa repressora do Estado, no seu papel tutelar do
direito. Aquela capacidade de agir ex teriorizase em atividade
própria, adequada a ur.i fim neces- sário e justo, qual o da
restauração da norma jurídica, in- fringida ou ameaçada. É a ação
penal, no sentido objetivo, para fim determinado, a punição do
crime. Mas ao Estado, quando assim se defende, a si mesmo, e às
unidades sociais,
4 E. F l o r i a n , P r i n c i p i i d i D i r i t t o P r o c e
s s u a l e P e n a l e , 2.a ed .;
Turim, 1932, pág. 181.
5 Como assinala L u c c h i n i , a ação penal realiza função
coorde-
nadora entre a lei, em abstrato, e o fato, em concreto. A lei
repres
sora, incriminando o fato, estabelece a relação ideal entre o crime
e a
pena; a ação penal, dirigida pela lei de processo, estabelece a
relação
real entre a incriminação legal e a punição do culpado { E l e m e
n t i
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
10 A l o y s io d e Ca r v a l h o Fi l h
o
defendendo, em suma, o direito, como de sua obrigação, não seria
lícito, nem político, corrigir o ato individual de rebeldia,
praticando ação injusta, ou iníqua. A injustiça e a iniqüida- de,
longe de estimularem o respeito às regras de conduta co- letiva,
incitam à desobediência, que, por muito repetida, en- gendra
divergências e choques de toda espécie, pródromos de outras
desinteligências ainda mais gerais e irresistíveis, com a
profundeza, a amplitude e o ímpeto de convulsão social. Na causai
da grande transformação política do século XVIII teve parte
saliente a justiça penal do tempo, com o seu cor- tejo de incríveis
arbitrariedades e crueldades.
É que o grupo transferiu ao Estado a função penal, por feliz
compreensão, mesmo, da necessidade de uma proteção uniforme e
superior contra as ofensas individuais, mas não deixa de sentir
como feita ao todo a lesão endereçada dire- tamente a uma das
partes. Desse ponto de vista, ocorre, nas sociedades civilizadas,
algo semelhante ao que sabemos do fato criminal nos agrupamentos
primevos. Sucedeu que a responsabilidade penal se dissocializou,
isto é, evoluiu de res- ponsabilidade de todos, ou de muitos, para
responsabilidade pessoal, com o corolário da pena rigorosamente
individuali- zada, e tanto mais individualizada quanto menos
elementa- res ou facciosas as concepções do crime e da pena, quanto
menos empírico o aparelhamento jurídicopenal da sociedade.
Essa limitação da culpa não exprime, porém, uma mes- ma limitação
do malestar pela ofensa recebida. O sofrimen- to, que o delito cria
para a vítima, projetase em desas sossego e clamores de punição em
todo o grupo, que reage, de pronto, pela hostilidade ao criminoso,
ou pelo temor do seu convívio, na previsão de novas infrações. Essa
reprovação geral lembra o primitivo sentimento coletivo do dano do
cri- me, e é mais ou menos acentuada ou persistente, conforme
o alcance da lesão, ou condição de parentesco, companhei-
rismo, amizade, para com o ofendido, como outrora, quando
a voz do sangue ditava a solidariedade na vingança.
A pena é satisfação a essa exigência de punição, um pro-
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
C o m e n t á r io s a o C ó d i g o P e n a l
— A r t . 102 i i
intimide aos que não delinqüiram, coibindoos, como na fan- tasia da
doutrina clássica. Mas a esses oferece a certeza de que o poder a
quem compete reprimir e punir o crime está vigilante, na proteção e
defesa de todos.6
A ação penal é o meio por que essa proteção se concre- tiza,
oportunamente. O que houver de deficiência, ou de ex- cesso, nessa
defesa, é motivo para intranqüilidade e insatis- fação, ainda
maiores, às vezes, do que as que o próprio crime suscitou. A ação
penal não seria, pois, um meio útil de de- fesa social, não fora
empresa de inteligência, de raciocínio, de humanidade, capaz de
negar a culpa, onde faltar, e de afirmála, quando existente, até
distinguindoa, qualifican-
doa, graduandoa, para a efetivação do poder punitivo em termos e
condições razoáveis.
3. Distinguese a ação penal em pública e
privada : ação pública, pertencente ao poder público,
ação privada, pertencente ao indivíduo. Se os dois termos devessem
expri- mir noções antagônicas, a impropriedade seria flagrante,
pelo menos nos nossos dias. Erigida a função de punir em
atri-
buto do Estado, e sendo a ação penal o instrumento da sua
realização, não se compreenderia, a rigor, ação privada. Toda ação
é pública, posto que ao indivíduo caiba, excepcional-
mente, a iniciativa do seu exercício. A queixa da parte ofen- dida,
essencial na ação privada, não é senão uma condição para o
exercício da ação penal, esclarece F l o r i a n . Não lhe
altera a estrutura, nem contraria o seu caráter de ação pú- blica.
7é o que já se chamou ação intrinsecamente de ordem pública e
extrinsecamente de natureza privada.
6 Do crime — expõe Brug i — , resultam um dano i m e d i a t o
e uni dano mc . d i a t o , representado
este pelas apreensões gerais de que
o fato se reproduza, perturbando a sociedade. A pena é o modo
de
reparação do dano mediato, reforçando na sociedade a convicção
da
tutela permanente do direito pelo Estado (I n t r oãu z i o n e Enc
i c l o p éd i c a
a i l e Sc i en z e G i u r i d i c h e e S oc i a l i , de B
ia g io B r u g i , 3.a ed., Florença, .1898, pág.
135) .
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
12 A l o y s io d e Ca r v a l h o F il h
o
Na categoria de ação pública costumam os autores in- cluir a ação
popular (actio popularis) , exercitável por qual- quer pessoa,
como um atributo cívico. Cuique de populo licet
accusare, diziam os romanos, e com isso significavam que o
acusador, podia sair, e saía, de dentro do povo. Para agitar a ação
penal, não é preciso ser o ofendido, ou ter, com este, qualquer
relação de parentesco, de dependência ou de inte- resse. Nisso
consiste a ação penal popular.
Da ação privada destacase a ação dependente de ins- tância
privada. Há de comum nas duas o poder de disponi- bilidade do
particular ofendido. Mas, enquanto na primeira, que diríamos,
então, propriamente privada, ou exclusivamen- te privada, o
indivíduo decide, por sua vontade, da punição do crime, ao ponto de
não intentar ou não continuar a ação, na de instância privada
cumpre, simplesmente, ao particular iniciar o procedimento, isto é,
apresentar a sua queixa con- tra o ofensor.
O poder público conduz a ação, como se fora sua, e nesse sentido a
desenvolve até final, sem mais intrometimento do ofendido que possa
colidir com o interesse público da repres- são, insuscetível de
transigência. Esse tipo de ação penal participa, portanto, muito
mais de ação pública do que de ação privada. Como ressalta So l e r
, é ação pública, em que a instância da parte ofendida
constitui requisito de ordem processual. s Nela, o poder
dispositivo do indivíduo é limi- tado à iniciativa da ação, ao
passo que na ação exclusiva- mente privada abrange o
início e o prosseguimento. " Essa
circunstância, comum às duas ações, marca, ao mesmo tem- po, a sua
linha divisória. 10
s Se b a s t i á n S o l e h , D er e c h o P en a l A r g
en t i n o , t. II, Córdoba,
1940, pág. 448.
Ver Jo a q u i m Ca n u t o M e n d e s d e
A l me id a , A Ação Pen a l n o N ov o
Cód i g o Pe n a l , i n O N o v o Cód i g o Pe n a l , vol.
1.°, São Paulo, 1942, pág. 180.
io É tão clara a diferença que, na hipótese de ação
dependente
de instância privada, acontecendo que a acusação tenha escolhido
apenas um, dentre os vários participantes do crime, o Ministério
SAIR AJUDA INDICE I | SEGUE
Co m e n t á r io s a o C ó d i g o P e n a l
— A r t . 102 13
O discrime da ação penal em pública e
'privada corres- pondia, entre os romanos, à bipartição
dos delitos em públi- cos e
particulares, aqueles denominados, preferentemente, de
crimes (crimina publica), e os outros de delitos
(delicia privata ) . 11
O delito privado dava origem à ação do ofendido, reque- rendo,
quase sempre pela via civil, a indenização do dano, isto é, a
imposição de uma pena pecuniária ao culpado. O crime público era
passível de acusação popular, e o seu jul- gamento competia ao
povo, nas assembléias, Era a socieda- de a exigir o direito de
condenar o criminoso, pelo que a sua falta traduzia lesão aos
interesses gerais. Assim demarcadas as duas espécies de prejuízo,
estavam conseqüentemente tra- çados os dois tipos de
procedimento.
Já hoje o conceito de crime não autoriza pensarse na ofensa
ao interesse individual, com exclusão do interesse pú- blico, ou
supremacia. Se o crime é a ruptura do equilíbrio coletivo, e o fim
da ação penal é recompor esse equilíbrio, todos os delitos — não
obstante pareçam, alguns, à primeira vista, lesivos do interesse
particular, — causam distúrbio social, que é necessário desfazer, e
por isso contra todos igualmente se justifica a ação coerciva do
Estado.
Com efeito, há infrações de natureza privada, no sentido de que
ofendem o indivíduo diretamente e indiretamente o Estado. Ofendem
mais um particular do que a sociedade, advertia M o n t e s q u i e
u , Outras, como os delitos políticos, atacam o Estado, e
reflexamente o indivíduo. Mas, ainda
11 Ver H. F e r é o l , R iv iè r e , Esqu i s s e H i s t o r i q
u e de l a Lég i s l a t x n n
C r i m i n e l l e ães R om a i n s , Paris, 1844, pág. 71,
nota 1.
12 M o n t e s q u i e u , D e VEs pr i t ães Loi s , nova
edição, Paris, Liv. 3.° cap, 5, pág. 23.
A reserva da lei, quando toma de instância privada, em certos
crimes,
a ação penal, concerne somente ao fato em si, quer dizer, à
ofensa.
Desde que esta foi divulgada, com o comparecimento espontâneo do
ofendido a juízo, não haverá razões para que se não proceda
como
na ação pública, por natureza indivisível. Ver Se b a s t i á n
S o l e r , ob.,.
vol. e ed. cits., pãg. 447,
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
14 A l o y s io d e Ca r v a l h o F i l h
o
que de natureza privada, o crime viola a lei, que é pública, e
sancionada no interesse geral. 13 Nesse pressuposto, que nenhuma
razão abala, a reprimenda dos crimes, de todos os crimes, é função
imanente do Estado, e nela tem interesse a sociedade inteira, sem
distinção de ofendidos ou nãoofen didos. 11
Apesar disso, e embora diminuto o número de prosélitos da
iniciativa privada, não perde atualidade a controvérsia sobre a
legitimidade e vantagem da intromissão do parti- cular na ação
penal.
As alternativas oferecidas à preferência das legislações podem ser
assim relacionadas: ação penal do ofendido, in- dependentemente do
Ministério Público; ação privativa do Ministério Público, com
exclusão do ofendido, e temos os dois tipos extremos e puros da
ação privada e da ação pú- blica; ação popular, convergindo com a
do Ministério Público, ou dela subsidiária; ação penal do ofendido,
nos mesmos termos.
A questão fundamental, portanto, é a de saber se ao particular
assiste o direito de ação penal. Firmado que sim, iestaria fixar o
modo e extensão do seu exercício, se isolado, concorrente ou
suplementar.
Pela forma singular de participação, age o ofendido por conta
própria, à revelia do Ministério Público, de cuja co- operação
prescinde. Pela participação concorrente, Ministé- rio Público e
particular dispõem, por igual, da faculdade de agir, sem que a
atuação de um esteja condicionada à do outro. Pela participação
subsidiária, ao ofendido somente se permite a ação penal quando da
omissão ou negligência do
is I n A n t o n i o S c e v o l a , V l s t r u
z i o n e Pr e p a r a t ór i a ãel P r o c ed i -
m en t o Pen a l e , Turim, 1386, pág. 18.
14 Para P r in s , o binômio crime públicocrime privado é da
tra-
dição histórica; teve grande alcance no direito antigo, e se
readquire,
no nosso tempo, alguma importância prática, é mais do ponto
de
vista econômico, quer dizer, da prestação à vítima do delito,
quando
diretamente ferido o interesse privado (C iên c i a P en a l e D i
r e i t o P o s i-
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e nt á r io s a o Có d i g o P e n a l
— Art. 102 15
Tvlirusiério Público. É uma atividade, esta última, mera-
mente supletiva, sem razão de ser se levada a termo a ação pública.
1S
Os apologistas da ação privada enxergam na sua prática ama garantia
individual em geral, e especialmente contra os criminosos
poderosos, ou com amizades de influência nos altos círculos do
Estado. A Fe r r i também impressionou a circunstância, tanto
que, adversário da ação penal privada, 18 admitiu a iniciativa
particular associandose, não substituin- do, à ação pública, a fim
de prevenir possíveis contemplações dos órgãos do Ministério
Público para com os titulares do Governo, dos quais independem
quanto ao cumprimento das suas atribuições, mas aos quais,
naturalmente, rendem defe- rência, pelas eventualidades de melhoria
na carreira, mercê da munificência oficial nas promoções,
estipêndios etc. 17
lj Ao ver dc alguns, a participação subsidiária encontra
a
melhor justificativa, no vultoso número de feitos penais que
sc
arrastam nos cartórios, por desídia funcional, virtualmente
arquiva-
das, ou destinados a arquivamento certo, graças à prescrição, sobre
que o acusado vela nos bastidores da justiça, para o momento
azado.
A escola positiva cerrou fileiras no combate à ação penal
privada. G a r o f a l o repeliu a divisão de púb l i c a
c p r i v a d a , acusandoa
de atender à natureza objetiva do crime e algumas vezes à
natureza
da pena, sem nenhuma consideração pelo grau de perversidade
do agente. Conferese ao ofendido o poder de decidir da sorte
do delin-
qüente, e não se cogita de saber se esse delinqüente é temível, se
é
primário, reincidente etc. ( L a C r i m i n o l o g i e ,
3.a ed., Paris, 1892, pág. 371). No apreciado livro em que
divulgou no Brasil os postulados
e teorias fundam enta is do positivismo penal, V iv e ir o s
d e Ca s t r o ,
adepto da nova escola, manifestouse também contrário à ação pri
vaàa, sustentando que a dicotomia da ação penal “não se conforma
com o fundamento racional do direito de punir, não
atende à classi- ficação científica dos criminosos, não passa,
enfim, de uma longínqua
reminiscéncia de idéia da vingança, que foi nos tempos
primitivos o conceito justificativo da pena” (A N o v a E s
co l a P en a l , 2,a ed., Rio
ds Janeiro, 1913, cap, A a ção púb l i c a e a a ção p r i va d a n
o d i r e i t o
p e n a l , pág. 259).
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
16 A l o y s i o d e C a r v a l h o F i l h
o
Não são menores, entretanto, os inconvenientes da ins- tância
privada. Em tese, o ofendido é o menos apto para encaminhar um
procedimento que, se no princípio é ato de incriminação, deve
revestir, no seu curso, e no epílogo, com a mais completa
imparcialidade, a mais perfeita serenidade. Dessa isenção,
exatamente, não é capaz a vítima do crime, pelas paixões e
malquerenças que lhe insuflam a acusação, animando o propósito de
conseguir, acima de tudo, uma con- clusão condenatória. É difícil,
senão impossível, surpreender, no particular que iniciou a ação
criminal, um intuito supe- rior de justiça. O ofendido — observa M
a n d u c a — dirigese por impulso antisocial, como o ódio, a
vingança. O senti- mento que o impele é egoísta, jamais altruísta.
Enquanto isso, a ação penal pública dá ao perseguido garantias de
neutralidade e de justiça. Os funcionários que a exercem são
insensíveis a paixões ou malquerenças, proverbiais no
ofendido.
Acresce que a renúncia e o perdão, conseqüências prá- ticas da
intervenção soberana do indivíduo, criam, em larga escala, a
impunidade. É um espetáculo deponente o das de- sistências da ação
penal, algumas vezes sinceras, quantas outras sem nenhuma
motivação, fruto de conluios ou de ex- torsões, em que a dignidade
do ofendido se compromete, e não raro são envolvidos parentes e
amigos do ofendido e do ofensor. E a essa verdadeira consagração da
impunidade pre- side, impotente, o Ministério Público!
Assim, um sentimento mesquinho de vingança inspira a queixa
particular (o nosso C r i s ó l i t o d e G u s m ã o conside- rava
a ação penal privada “uma revivescência da vindita 'pri-
vada, adornada com os princípios do classicismo penal” 19) ,
e quando o temor ou o interesse sobrevêm, ditando a parali- sação
do processo, mascarase, habilmente, a transação com um gesto de
piedade, como se o perdão, no caso, fora dádiva
is M a n d u c a , E l Pr o c e d i m i e n t o P en a l y su d es
a r r o l l o ci e n t i f i c o .
trad. de á n g e l P i n t o s y P i n t o s ,
Madri, pág. 144.
19 Cr is ó l it o de G t j s m ã o , D o s C r
i m e s S e x u a i s , Rio de Janeiro.
1921, pág. 358.
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e nt á r io s a o Có d i g o P e n a l
— A r t . 102 17
espontânea e generosa. Entretanto, nem a vingança pode servir de
móvel, nem a piedade de desfecho à punição dos criminosos.
Isto posto, se o poder público consente, em algumas hipóteses, e
por motivos excepcionais, que o ofendido movi- mente, a seu
talante, a ação penal, não terá com isso procla- mado o seu
nãointeresse na punição do delinqüente. Não há, por conseguinte, um
direito privado de ação penal, como não subsistem razões de ordem
jurídica em favor da querela individual, de tão constante prática
em outros tempos.
As razões são simplesmente de conveniência, de eqüidade, de
oportunidade prática, como se exprime V a n n i n i
. Determinadas circunstâncias, peculiares a algumas
infrações, aconselham condicionarse a ação, nesses casos, à
manifes- tação da vontade do ofendido. A querela individual é o
pre- enchimento de uma formalidade, estatuída no interesse da
tranqüilidade das famílias (é a hipótese de crimes como o adultério
e o rapto), ou em vista do interesse particular do- minante na
punição (é a hipótese de crimes como a injúria e a difamação).
1
Deixando ao indivíduo, por exceção, a liberdade de inten- tar a
ação penal, e, em conseqüência, conformandose com o seu silêncio,
revela o Estado, em suma, compreender que,
20 Ottor ino Vannini, I I C o d i c e Pen a l e I l l u s t r
a t o A r t i c o l o p er
A r t i c o l o , direção de Ugo Costti, vol. 1.°, Milão,
1934, pág. 525. Relacio-
nando os crimes de ação privada polo Código italiano,
considera
VAN«irri que o legislador, assim dispondo, atendeu a três
critérios: o da simultaneida.de de lesão ao interesse público
e ao particular, o
da incerta violação do interesse público e o critério combinado. Do
primeiro ponto de vista, são de ação privada o crime de
violência
carnal (art. 519), o de ato libidinoso violento (art. 521), o de
rapto
para íim de matrimônio ou fim libidinoso Carts. 522 e 523)
etc. Pelo segundo critério, o de exercício arbitrário das
próprias razões
com violência sobre as coisas (art. 392), ou sobre as pessoas (art,
393),
o de ofensas corporais (art . 581) etc. Finalmente, pelo critério
con-
jugado, os crimes de in jú ria e de difam ação (arts. 594 e
595) etc.
21 Razões ainda de ordem política induzem o poder público,
em
outras circunstâncias, a decretar a isenção de procedimento penal
ou
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
18 A l o y s io d e Ca r v a l h o F il h
o
por vezes, ao interesse e necessidade da punição supera o inte-
resse do olvido sobre o crime, evitando situações ainda mais
delicadas, e proporcionando à vítixna ou aos seus parentes
compensação melhor do que seria a pena, fato público, dc profunda e
larga repercussão.
4. A ação penal popular tem precedência no tempo. É a primeira
forma de procedimento contra o delito,
quando a comunidade nos grupos impunha, como vimos, a solidariedade
dos seus componentes. Solidariedade passiva e ativa. A
diferenciação e a especialização que se processam na atividade do
homem, pela crescente complexidade, a par da consolidação da
autoridade estatal, originam critérios coletivos diferentes sobre a
natureza e extensão do interesse ferido pelo crime. Decorrem daí,
também, sucessiva ou perio- dicamente, modos diversos de agir
contra o mesmo crime. A ação privada, a princípio, e depois a
ação pública acabam substituindo, parcial ou
totalmente, a ação popular.
Considerada e louvada como dos mais expressivos direitos do
cidadão, a ação penal popular primou na democracia ateniense e na
república romana, para declinar ou morrer no império romano, na
jurisdição dos povos bárbaros, no regime feudal, nas monarquias
absolutas, enfim, onde cer- ceadas ou banidas as liberdades
individuais. Forque o sistema constitucional de cada povo é que lhe
dá viço, ou caducidade. Atributo de soberania, como é, não pode o
direito de acusar entrar em desarmonia com a Magna Carta nacional,
obser- vava Mang iw . 22 Bem entendido, o processo
penal, desde o termo de início, a acusação, até o último termo, a
sentença, se o não quisermos estender à execução da condenação,
quan
22 mangin, T r a i tê d e VA c t i o n P u b l i q u e e t d e VA c
t i o n C i v i l e en
Ma t l èr e C r i m i n e l l e , Paris, 1837, vol. 1.°, pág.
3.
penal em certas modalidades do furto entre parentes (art. 181
do
nosso Código), e a não punição do participante de conspiração que
abandona, a tempo, os companheiros, e os denuncia. Naquele
caso.
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Co m e n t á r io s a o C ó d i g o P e n a l
— A r t . 102 19-
do imposta, acompanha as mutações ou oscilações na vida do país, de
cuja estrutura política não é senão um “segmen- to” , como o faz
ver G olds ch m idt . 23
Assim, no curso da história, a ação penai popular vinga nos climas
temperados de liberdade e fenece ncs escaldos de autoritarismo.
Teve, por isso, na vida grega o relevo de um dos mais ilustres
misteres, que era honra cumprir, e de que era opróbrio desertar.
Não a desestimaram, por seu lado, os romanos, tão ciosos do apreço
à ordem jurídica.
Ao entendimento de gregos e romanos, acusar os crimes era uma das
maneiras de participar da vida pública, como fazer as leis e
cumprir as funções de julgador. Recorda P icqtj e t -Da m e s
m e , 4 que homens da estatura de Ca t ã o e de Cí c e h o
se desvaneceram de exercitar esse direito de acusação c deram
à sua prática brilhos ainda memorados. 5
Mas se foram tantas as excelências, não há esconder o reverso,
especialmente na mesma vida pública romana, con- soante os mais
severos e tristes testemunhos. Com o admi- rável senso das coisas,
buscaram os romanos antecipar o re- médio, prevenindo o mal, ou,
quando menos, reduzindoo. E é assim que já na fase republicana,
visando, naturalmente, a evitar o descrédito da instituição,
opunham ao exercício da
acusação popular numerosas proibições, de caráter eminen
23 G o u j s c h m id t , P r o b l em a s J u ríd i c o s y P o
lít i c o s d e i Pr a c e sa
P e n a l , Barcelona, 1935, pág. 67.
24 J. P i c q u e t -D a m e s m e , pág. 14 da introdução à
tradução do
livro H i s t o i r e áu D r o i t C r i m i n e i c h e z l es R
om a i n s , de F e r d i na n d -
W a l t e r , Grénoble, 1863.
25 Entre quantos críminavam V e r r e s , foi Cíc e r o o
preferido para
sustentar a acusação, de acordo com a norma de ser confiado o alto
encargo a um acusador, quando muitos se apresentavam, para
deter-
minado crime. Ver J. B e c o t , D e VOr g a n i s a t i o n d e l
a J u s t i c e Rép r e s si v e
a u x PH n c i p a l e s E p o q u e s H i s t o r i q u e s,
Paris, 1860, pág. 59.
a circunstância de poder a ação penal ser exercida contra o
estranho
que participa do crime {art. 183, n.° II, do nosso Código). Quanto
ao
segundo exemplo, o princípio sobre que assenta a isenção penal
é
SAIR K H H _ a j u d a INDICE I | SEGUE
20 A l o y s io d e C a r v a l h o F il h
o
temente pessoal, fundadas, ora no critério de capacidade, ora no
critério de idoneidade. 2e
Não valeram, contudo, tais cautelas, porquanto o abuso das
delações atingiu, proporções inacreditáveis, tomandose
a função de acusar uma profissão, e das mais rendosas, em parte
licitamente, pela quota advinda à pecúnia do acusador, tirada do
patrimônio do acusado, mas em grande parte tam- bém pelos negócios
de toda sorte e vulto que facilitava, pro- porcionando pingues
propinas a delatores e testemunhas, em compensação das mais torpes
falsidades. 27
“Quem tivesse vícios e talentos, uma alma baixa e espí- r i t o
ambicioso” , — comentava, séculos depois, M o n t e s q u ie u
,
reportandose às delações daquele tempo, — “saía em pro- cura de um
criminoso cuja condenação pudesse agradar ao governante e por esse
meio conquistava dignidades e for- t u n a ” . s
Assim pervertida, na intenção e nos fins, a ação popular desaparece
com a civilização clássica, para somente renascer ncs tempos
modernos, embora sem um mínimo, que seja, do antigo
esplendor.
Condições de ambiente e peculiaridade políticas sãolhc
desfavoráveis, por completo, na jurisdição dos povos bárbaros e na
justiça dos senhores feudais.
O nomadismo das primeiras tribos germânicas, e, depois de fixadas
ao solo, o caráter profundamente autonômico de
, 2® As mulheres, os menores, os magistrados, os venais, os
calu-
niadores mercenários etc., não podiam acusar, em Roma, salvo
quando
fossem os ofendidos. Dig., Liv. 48, tít. II, ns. 8 a 11. Ver Garcia
d e l
Co r r a l , C u e r p o ãe D e r e c h o C i v i l R om a n o
, Barcelona, 1897, vol. 3.°,
pág. 725.
27 Como mostra B e c o t {ob. e ed. cits., pág. 104),
ficaram tão
desacreditados os delatores pagos e tão raros os gratuitos que, por
evitar a impunidade dos crimes, os imperadores romanos foram
obrigados a nomear acusadores de função contínua. Nessa prática,
descobrem muitos autores o germe da instituição do
Ministério
Público, nascida na França no século XIV, com a criação
dos
p r o c u r a d o r es d o r e i .
28 Montesqtjieu, ob. e ed. cits., pág. 78. .
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e n t á r io s a o Có d i g o P e n a l
— Art. 102 21
sua vida, eis circunstâncias decisivas para um período áureo da
ação penal privada. A organização interna dos núcleos liumanos
dispersos repousa sobre o espírito e o sentimento de família, e
esse cunho familial imprime à punição dos crimes c velho aspecto de
compromisso do sangue, tanto do lado da vítima, como do lado do
culpado. A ação particular é a única forma então possível de
procedimento contra o crime, com as conseqüências extremas da
renúncia e do perdão. Nem a ordem imperial, posteriormente, alcança
diminuir o discricio narismo privado, no exercício da acusação
penal, O conflito entre ofensor e ofendido continua um caso de
família, e, como tal, passível de ajuste doméstico, sem outra lei
que a vontade
das partes, em pessoa, ou por seus parentes. A autoridade pública
só intervém, quando falha a composição. É uma interferência de
simples adjutório, que lhe não dá prestígio, quanto mais primazia,
como órgão de justiça.
Não é outro o panorama, pelo feudalismo. A prcemi nência do
individual sobre o social, nota marcante da época, constitui
impedimento inelutável a uma justiça penal ds expressão coletiva,
firmada num direito ou dever cívico de acusação. Os homens,
acastelados num círculo impenetrável
a toda comunhão de idéias ou de interesses, não conhecem entre si
os laços naturais da dependência, mas os convencio-
nais do mando e sujeição, numa hierarquia de posições por si mesma
negativa de qualquer coesão, inclusive no sofri- mento ou na
responsabilidade pelo crime.
Compreendese, assim, o exclusivismo da ação privada num sistema
jurídico em que o indivíduo afinal, mais do
que árbitro da acusação, representa, tantas vezes, por si ou per
outrem, a própria justiça penal, resumida a um duelo, —
suficiente como prova, como processo, como sentença,
como tudo, na punição do crime. Por si, por sua linhagem, por seu
senhor, é a fórmula consagradora dessa privatividade
de acusação penal. Ninguém mais, nada mais.
Depois, a colisão entre a autoridade dos senhores feudais e o
crescente poder real prepara o ocaso da ação privada.
351 - 3
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
22 A l o y s io d e Ca r v a l h o F i l h
o
O longo e árduo processo de condensação dos poderes políticos na
realeza implica, também, a progressiva absor vência da justiça
feudal, inclusive no conjunto das atribui- ções penais.
Empenhados, seriamente, em colocar debaixo da autori- dade própria
os mais amplos domínios, os soberanos se arro gam, com
exclusividade, o dever de assistência aos interesses da segurança
coletiva, e por conseguinte o direito de sua pro- teção penal,
exeqüível no poder repressor aos atos infringentes dessa ordem de
interesses.
Do nosso ponto de vista, é a mais importante das reivin- dicações
reais. Faz reviver, por certo prisma, a idéia de crime público e de
crime particular, um dos elementos atuantes nessa sensível
transição que a justiça penal sofre durante alguns séculos,
paralelamente às transformações políticas.
Assim, onde a realeza conclui a sua tarefa, a ação pública
reconquista a prioridade. Verdade ê que sob aspecto diverso do
tradicional, e por muito tempo ao nível, quase, da inicia- tiva
privada, até lhe anular as últimas resistências.
Na França, então, profundas inovações de forma, como, para
exemplificar, o segredismo nos trâmites processuais, sucedendo ao
sistema de larga publicidade, determinam o advento do Ministério
Público, que vai ser, por toda parte, exatamente, o fulcro da ação
penal pública, assegurandolhe um primado sem mais alternativa, até
aos nossos dias.
5. Como o último termo da evolução da ação penal, a ação pública
aparece modernamente no primeiro plano, na generalidade dos
Códigos. A ação privada e a ação popular constituem exceção.
Alguns Códigos, ao lado da ação particular e da ação pública,
mencionam a ação dependente de instância privada, como se lhe
reconhecessem vida autônoma, vale dizer, como se consagrassem uma
divisão tripartida da ação penal.
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Co m e nt á r io s a o C ó d i g o P e n a l
— A r t . 102 23
conseqüências, praticamente, são sempre as mesmas, quanto à
disponibilidade da ação, por parte do ofendido, no seu início, e
indisponibilidade, uma vez oferecida a representação. Haja vista os
efeitos assinalados pelo mesmo Código argen- tino à renúncia e ao
perdão do ofendido, restritos às ações privadas (arts. 59, n.° 4, e
69).
Também pelo Código brasileiro, a ação pública é a regra, a
ação privada, a exceção. A ação pública compete ao Minis- tério
Público, mediante denúncia, a ação privada, ao ofendido, mediante
queixa. Queixa e denúncia são, portanto, os modos de início da
ação, quando privativa do ofendido, ou privativa do poder
público.
Exercitando a ação pública, nem sempre o Ministério Público age por
iniciativa própria, mas, algumas vezes,
somente depois de provocado, por via de representação do ofendido,
ou de requisição do ministro da Justiça (art. 102, § 1.°, do Cód.
Penal). Ali, a ação tipicamente pública; aqui, a ação pública
dependente de instância, privada ou oficial.
Nos crimes cuja ação penal é subordinada ao preenchimento desse
requisito, é evidente que se não formará a culpa ao
criminoso, faltando a representação, ou a requisição.
Instituindo a ação pública como regra, o legislador não desamparou,
todavia, o ofendido, em face da negligência do
Ministério Público, É assim que admitiu a ação privada sub-
sidiária, nos crimes de ação pública, quando o Ministério
Público não tenha oferecido denúncia, no prazo legal (art. 102, §
3.°, do Cód. Penal). Mas a atuação do particular, nessa emergência,
conserva o caráter de subsidiária, até final, porquanto, suprida,
com a queixa, a omissão do Ministério
Público, a este competirá seguir a ação, aditando a queixa ou
repudiandoa, substituindoa pela denúncia, fornecendo
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
24 A l o y s io d e Ca r v a l h o F i l h
o
mas de assistente singular, senhor dos mais largos poderes,
livremente exercitáveis. '
A disposição do Código não tem alcançado, todavia, entendimento
pacífico. Se a atividade súbsidária do ofendido é autorizada para o
caso de não haver denúncia no prazo legal, o que faz presumir
omissão de dever, o Cód. de Processo Penal admite que o Ministério
Público, ao invés de apresentar a denúncia, requeira o arquivamento
do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação (art.
28).
Assim, cumpre indagar se ainda nessa hipótese, que não significa
desídia funcional, justificase o particular agir,
supletivamente. Procede a dúvida sobretudo porque a lei processual,
insistindo naquela norma substantiva, usa, para
confirmála, expressões diversas, como as de não ser a
ação pública intentada no prazo legal
(Cód. de Processo Penal, art. 29). Ora, um dos modos de se não
intentar a ação penal
pública é, por certo, o arquivamento, o qual, — argumenta se,
—eqüivale a não ter havido denúncia.
A ausência de denúncia, que é o pressuposi.o do
Código
Penal para que se legitime a interferência posterior do ofen- dido
na ação pública, caracterizase, em suma, pela falta dessa peça
inicial, ou pelo arquivamento do inquérito. Ocor-
rendo, portanto, que o prazo se esgote, sem a denúncia e sem o
pedido de arquivamento, é claro que cabe a ação privada. Caberá, é
óbvio, na hipótese de, consumado o arquivamento, surgirem novos
elementos de prova. Inexistindc, porám, esses elementos, a solução
não será tão simples, porque levaríamos, então, o interesse privado
a predominar soberanamente, so- brepondose, ou, melhor, antepondose
ao interesse público,
que o órgão da Promotoria encarna, e de que não se afastou,
Como se vê, são diversas e complexas as .situações que têm
provocado a manifestação dos tribunais. Diante de ação
penai intentada por queixa do ofendido antes de escoado o lapso
para a denúncia do Ministério Público, consideroil o
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e n t á r io s a o C ó d i g o P e n a l
— A r t . 102 2ã
variadas espécies foram conhecidas pelo Tribunal de Justiça de São
Paulo, como, em 1949, a de o Ministério Público não se haver
pronunciado, dentro do prazo legal, nem com a denúncia nem com o
pedido de arquivamento, e a de, consu- mado este, novos elementos
de prova terem sido apurados. Nos dois feitos, o egrégio colegiado
paulista reconheceu legí- tima a ação privada subsidiária, como
igualmente, de outra vez, em que o arquivamento íora solicitado e
deferido dentro do prazo. Esta última conclusão distanciavase,
substancial- mente, da que o mesmo Tribunal adotara, poucos anos
antes, acompanhando a maioria do Supremo Tribunal Federal, pela
inaceitabilidade da intervenção do ofendido ou seu represen- tante
legal na eventualidade de arquivamento do inquérito policial pelo
Ministério Público. Conhecemos do Tribunal de Justiça da
Guanabara decisão plenária em habeas corpus T
assenündo em que a ação privada é totalmente incabível quando o
Ministério Público promove o arquivamento, por- quanto dessa
hipótese não cogita a lei penal processual, a qual só se refere ao
não oferecimento da denúncia no prazo
legal.
: Seria impraticável arrolarmos aqui todos os julgados, num e
noutro sentido. As divergências subsistem, realmente, em se
tratando de arquivamento. Não seria razoável que ocorressem em
relação à “ ausência” de denú.icia, sobre que não deixa dúvida o
art. 29 do diploma adjetivo. Fm todo caso, “a controvérsia que, em
certa época, agitou a jurisprudência
dos tribunais, inclusive do Supremo, que, por muiín tempo esteve
vacilante, está hoje inteiramente superada1’, assim acentua o
comentário com que na Rev. Brasileira de Crimi nologia
e Direito Penal foi registrada e louvada a
decisão
— e notese que unânime — da l.a Turma do Supremo, de-
sautorizando a ação privada subsidiária quando o Ministério Público
obtém o arquivamento. Desse acórdão foi relator o
Ministro E v a n d r o L i n s e S i l v a , que assinalou a sua
passagem
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
26 A l o y s i o b e C a r v a l h o F i l h
o
Mas não se esgota em tais critérios o momentoso tema. Atendendo
consulta sobre a possibilidade da iniciativa priva- da supletiva,
sanando demora despropositada do Ministério Público em oferecer a
denúncia, ou seja, protelandoa com sucessivos pedidos de diligência
e de esclarecimentos, respon- deu o Professor H é l io T q r n ag h
i pela afirmativa, ensinando que a lei põe limites ao poder
punitivo do Estado, “marcando lhe, inclusive, prazo fatal e
peremptório (Cód. de Processo Penal, art. 798) findo o qual o
ofendido é livre de retomar o seu direito” . 2!í É uma hipótese que
não se confunde nem com a falta ocasional de denúncia nem com o
voluntário ar- quivamento das peças de instrução criminal.
É possível, contudo, que a controvérsia desapareça, em breve, com o
advento de novo código, mantida que seja a norma do anteprojeto H u
n g r i a repelindo, de todo, a ação pri- vada supletiva, acoimada,
em nota explicativa, de desatender, quase sempre, ao interesse da
Justiça, “ para somente servir a sentimentos de vindita, quando não
a objetivo de chan- tagem” (sic).
6. Quanto à ação penal popular, não a acolheu o
novo
legislador, ainda que da velha tradição do nosso direito essa forma
de procedimento contra o crime.
A Constituição imperial de 1824 instituiua, para os delitos de
suborno, peita, peculato e concussão, contanto que intentada a ação
dentro de ano e dia do crime. Afora tal
28 ver as decisões do Supremo Tribunal, em D i r e i t o ,
1953, volu-
mes 82 a 84, pág. 267, e D i ár i o da Ju s t i ça , de
761954, J u r i s p r u dênc i a .
pág. 1.811 e R e v . B r a s i l e i r a d e Cr i m i n o l o g i a
e D i r e i t o Pen a l , n.° 12,
19G6, pág. 145; a decisão da Guanabara figura na mesma revista n.°
4, 1964, p. 178; do tribunal alagoano, i n R ev i s t a F o r
en s e , vol. 130, pág.
450; e as do tribunal paulista, i n R e v i s t a F o r en s e
, vol. 139, pág. 405;
Revista dos Tribunais, São Paulo, vol. 182, pág. 73; R ev i t s a F
o
s en se , ' vol. 126, pág. 543, e vol, 151, J u r i s p
r u dên c i a Cr i m i n a i R e-
s u m i d a , pág. 445. A Conferência de Desembargadores
(1943) assen- tou que nos crimes de ação pública, arquivados os
autos a requeri-
mento do Ministério Público, não pode a ação penal ser iniciada
mediante queixa do ofendido. (Conclusão XII, pág. 174.Í Em
sentido
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
Co m e nt á r io s a o Có d i g o P e n a l
— A r t . 102 :ít
prerrogativa, restrita como se vê, a crimes funcionais, a mesma
Constituição concedia, em geral, aos cidadãos, como uma das
garantias constitucionais, a faculdade de apresentar aos Poderes
Legislativo e Executivo reclamações, queixas ou petições, e até
expor qualquer infração da Constituição, requerendo perante a
competente autoridade a efetiva res- ponsabilidade dos
infratores.
O Cód. de Proc. Criminal de 1832 adotou a ação penal popular,
mediante denúncia de qualquer pessoa do povo, não somente para
aqueles crimes, mas também para numerosas outras infrações,
especificadas. Ainda atribuía a todo cidadão a faculdade de
denunciar crimes de responsabilidade dos empregados públicos,
constituindo a sua acusação peça sufi- ciente para a autoridade
pública competente proceder contra o indigitado. so
Apesar das intenções e tendências ostensivamente limi tativas do
liberalismo, dito excessivo, desse Código, a lei n.° 261, de 3 de
dezembro de 1841, não modificou o sistema. Somente com o advento do
Cód. Penal republicano (1890), dispondo sobre o procedimento ex
officio, a denúncia do Ministério Público e a queixa da parte
ofendida (art. 407), e silenciando sobre a queixa ou denúncia de
qualquer pessoa do povo, é que avultou o pensamento de estar
repelida a ação penal popular no direito brasileiro. Assim opinou J
o ã o M e n -
des. Em sentido contrário, G a l d i n o S i q u e i r a argumentou
que7 omisso embora o Código de 1890, a Constituição repu- blicana,
que lhe é posterior, e, sobretudo, lhe é preeminente, como lei das
leis, consentia a quem quer que fosse "represen- tar, mediante
petição, aos poderes públicos, denunciar abusos
30 Constituição, arts. 157 e 179, n.° 30; Cód. de Proc.
Criminal, arts. 74 e 150.
Estado em São Paulo: “o fato de haver o Ministério Público
requerido
o arquivamento do inquérito policial não constitui obstáculo ao
início
da acão penal por meio de queixa da parte ofendida” < J u st i
ça , Porto
Alegre, 1949, vol. 31, pág. 194). De H élio Toenaghi, na Re v . B r
a s i l e i r a
de Cr i m i n o l c g i a e D i r e i t o P en a l , n.° 14,
pág. 145: Ação p r i v a d a su b-
s i d iár i a (parecer) .
SAIR IMPRIMIR AJUDA ÍNDICE VOLTA SEGUE
28 A l o y s io d e Ca r v a l h o F i l h
o
das autoridades, e promover a responsabilidade dos
culpados” (art. 72, n.° 9), o que implicava, — bem
claro, até pela parte íinal do inciso constitucional, — o direito
de acusação penal, ainda que limitado aos crimes de
responsabilidade, 31
Assim, presentemente, o direito de acusar é privativo do ofendido,
por si ou seu representante legal. Pessoa estranha ao delito, sem
interesse pessoal lesado, sem título legítimo de representação aos
atingidos pela ofensa, não disporá senão da faculdade de
noticiar à autoridade o crime de que teve conhecimento,
quando couber a ação pública. É uma facul- dade de simples aviso,
que a lei, todavia, cerca de formali- dades e cautelas, buscando
conciliar o interesse público da repressão dos crimes com a
necessidade de garantia aos par- ticulares contra as acusações
temerárias. 32
Embora repelida do Código, para a generalidade dos crimes, a ação
penal popular subsistirá, entretanto, para casos especiais, em
maior ou menor extensão, tal como na vigência do velho Código. 3Í!
É assim que, reservada para legislação própria a disciplina dos
delitos de falência, conti
31 G a l d i n o Siq u e i r a , Cu r s o d e Pr o c e ss o
Cr i m i n a l , 2.a ed., 1937,
São Paulo, pág. 73; Jo ã o M e n d e s , O Processo C r i v
i i n a l B r a s i l e i r o ,
Rio, 1920, vol. 2.°, pág. 205.
32 ver o Cód. de Proc. Penal, art. 27: “Qualquer pessoa do
povo
poderá provocar a iniciativa do Ministério Público, nos casos cm
que caiba a ação pública, fornecendolhe, por escrito,
informações sobre o íato e a autoria e indicando o tempo, o
lugar e os elsmcntos
de convicção” .
33 O Cód. Eleitoral de 1950 (le i n.° 1.164, de 24 de ju lho)
optou
pelo sistema da simples participação do fato punível à autori- dade
competente. Declarando, com efeito, que são de ação pública
as infrações eleitorais (art. 176), facultou a “todo cidadão”
comunicar a infração de que houver conhecimento ao juiz
eleitoral da zona onde
a mesma se verificou (art. 177). O decreto de 1932 (n.° 21.076, de
24 tít: fevereiro), primeiro, em ordem cronológica, dos
códigos que vigora-
ram após a modificação do processo eleitoral no país, entregava a
iniciativa da ação penal aos procuradores eleitorais, bem como
a q u a l q u e r e l ei t o r (art. 110). O
preceito foi mantido na reforma de 1535
(lei n. ° 48, de 4 de m aio ), onde, por outro lado, já apareciam
com
esta faculdade os “delegados de partidos”. As leis seguintes
(dec.Iei
Com entários ao Código Pe n al — Art , 102 23
nuará a ação pública em tais crimes a ser intentada pelo Ministério
Público, mediante denúncia, ou pelo síndico, ou qualquer credor,
mediante queixa. 34
Em projeto de lei que formulou no Senado em 1951, ado- tando a ação
penal popular para os crimes de responsabili- dade, o
Senador O l a v o O l i v e i r a alegou, na justificação, que a
Constituição então vigente, no capítulo dos direitos e ga- rantias
individuais, consagrava, no § 38 do art. 141, a ação
cível popular, e no parágrafo anterior a ação penal
popular, não havendo razão para considerarse simplesmente
previsto neste último inciso o “direito de petição” aos poderes pú-
blicos. 85
Pela lei de falência de 1929 (dec, n.° 5.746, de 9 de
dezembro)
a ação pública podia ser intentada por denúncia do Ministério
Público,
ou por queixa do llquidatário ou de qualquer credor (art, 174) .
Suprimida, na nova legislação ídsc.lei n.° 7.631, de 21 de jun lio
de
1945) a figu ra do liquidatário, com. ampliação do papel do
síndico, passou a este a faculdade de dar queixa, mantida,
também, para
qualquer credor (art. 194). Ainda o síndico ou qualquer credor
poderá
oferecer queixa, se o Ministério Público não apresentar
denúncia, no prazo legal (art. 108, parág. único) .
35 Projeto de lei n.° 2551, i n D i ár i o ão Con g r e s so Na c i
o n a l , de
6 de junho de 1951. Sustenta, ainda, a justificação que a ação
penal
popular contra os crimes funcionais, “além de tutelar a
liberdade
1946)' omitiram qualquer referência a e le i t o r . ,
enquanto conservavam
aos partidos a citada prerrogativa, de que fariam uso através
dos
seus “representantes legais”, ou ‘'delegados", ou até, como na lei
de
1946, “fiscais” , Releva notar, entretanto, que os atos
legislativos men-
cionados, desde o de 1932, consideraram ação p i íb l i c
a a ação penal
pylas infrações eleitorais. A lei eleitoral atual (n,° 4.737, de 15
de
ju lho d