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1 O PROCESSO CIVILIZADOR E AS FRONTEIRAS: FRONTEIRAS PARA CIVILIZAR OU CIVILIZAR AS FRONTEIRAS? Jones Dari Goettert Adáuto de Oliveira Souza Silvana de Abreu Universidade Federal da Grande Dourados Laboratório de Planejamento Regional Grupo de Pesquisa Linguagens Geográficas 1 [email protected] Resumo O processo civilizador moderno-contemporâneo é um processo de fronteiramento territorial e étnico. As bases de seu desenvolvimento estão assentadas na formação e expansão do Modo de Produção Capitalista e do Estado-nação corresponde à configuração espacial, temporal, política, cultural e identitária hegemônica. A articulação entre essas bases sustenta as relações estabelecidos/outsiders, que envolvem tanto os princípios do Capitalismo (trabalho e acumulação) como os princípios de cada Estado-nação (ordem, progresso, integração, desenvolvimento). No entanto, as fronteiras inter-nacionais são apenas parte dos processos de fronteiramento civilizacional, pois junto a elas são construídas fronteiras civilizacionais trans- nacionais (entre Ocidente e Oriente, por exemplo) e intra-nacionais (entre “brancos” e indígenas no Brasil, por exemplo). Todas as fronteiras, entretanto, como parte do processo civilizador, definem práticas, discursos e representações que emolduram sujeitos, grupos, comunidades e sociedades em espaços divisados entre, sempre, “Nós” e “Eles”. Palavras-chave: Processo Civilizador; Espaço; Fronteiras. THE CIVILIZING PROCESS AND THE BORDERS: BORDERS TO CIVILIZE OR CIVILIZING THE BORDERS? Abstract The modern-contemporary civilizing process is a territorial and ethnic “bordering process. The bases of its development are settled in the formation and expansion of the Capitalist Mode of Production and of the Nation-State, which corresponds to a spatial, temporal, political, cultural and identity hegemonic configuration. The articulation between these bases supports the relationships established/outsiders, involving both the principles of Capitalism (work and accumulation) and the principles of each Nation-State (order, progress, integration, development). However, the inter-national boundaries are just part of the “bordering processof civilization, because they are built along the borders of civilization trans-national (between Western and Orient, for example) and intra-national (between “whitesand indigenous in Brazil, for example). All boundaries, however, as part of the civilizing process, define practices, discourses and representations that frame individuals, groups, communities and societies within envisioned spaces between, always, “We” and “They. Keywords: Civilizing Process; Space; Frontiers. 1 Grupo que integra o Projeto Imagens, Geografias e Educação Processo CNPq 477376/2011-8.

O PROCESSO CIVILIZADOR E AS FRONTEIRAS: … · o processo de globalização em curso coincide com o aumento surpreendente de novas fronteiras políticas inter-nacionais, portanto,

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O PROCESSO CIVILIZADOR E AS FRONTEIRAS:

FRONTEIRAS PARA CIVILIZAR OU CIVILIZAR AS FRONTEIRAS?

Jones Dari Goettert

Adáuto de Oliveira Souza

Silvana de Abreu

Universidade Federal da Grande Dourados

Laboratório de Planejamento Regional

Grupo de Pesquisa Linguagens Geográficas1

[email protected]

Resumo

O processo civilizador moderno-contemporâneo é um processo de fronteiramento territorial e

étnico. As bases de seu desenvolvimento estão assentadas na formação e expansão do Modo de

Produção Capitalista e do Estado-nação – corresponde à configuração espacial, temporal,

política, cultural e identitária hegemônica. A articulação entre essas bases sustenta as relações

estabelecidos/outsiders, que envolvem tanto os princípios do Capitalismo (trabalho e

acumulação) como os princípios de cada Estado-nação (ordem, progresso, integração,

desenvolvimento). No entanto, as fronteiras inter-nacionais são apenas parte dos processos de

fronteiramento civilizacional, pois junto a elas são construídas fronteiras civilizacionais trans-

nacionais (entre Ocidente e Oriente, por exemplo) e intra-nacionais (entre “brancos” e indígenas

no Brasil, por exemplo). Todas as fronteiras, entretanto, como parte do processo civilizador,

definem práticas, discursos e representações que emolduram sujeitos, grupos, comunidades e

sociedades em espaços divisados entre, sempre, “Nós” e “Eles”.

Palavras-chave: Processo Civilizador; Espaço; Fronteiras.

THE CIVILIZING PROCESS AND THE BORDERS: BORDERS TO CIVILIZE OR

CIVILIZING THE BORDERS?

Abstract

The modern-contemporary civilizing process is a territorial and ethnic “bordering process”. The

bases of its development are settled in the formation and expansion of the Capitalist Mode of

Production and of the Nation-State, which corresponds to a spatial, temporal, political, cultural

and identity hegemonic configuration. The articulation between these bases supports the

relationships established/outsiders, involving both the principles of Capitalism (work and

accumulation) and the principles of each Nation-State (order, progress, integration,

development). However, the inter-national boundaries are just part of the “bordering process” of

civilization, because they are built along the borders of civilization trans-national (between

Western and Orient, for example) and intra-national (between “whites” and indigenous in Brazil,

for example). All boundaries, however, as part of the civilizing process, define practices,

discourses and representations that frame individuals, groups, communities and societies within

envisioned spaces between, always, “We” and “They”.

Keywords: Civilizing Process; Space; Frontiers.

1 Grupo que integra o Projeto Imagens, Geografias e Educação – Processo CNPq 477376/2011-8.

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EL PROCESO CIVILIZADOR Y LAS FRONTERAS: ¿FRONTERAS PARA

CIVILIZAR O CIVILIZAR LAS FRONTERAS?

Resumen

El proceso civilizador moderno-contemporáneo es un proceso de fronteramiento territorial y

étnico. Las bases de su desarrollo están asentadas en la formación y expansión do Modo de

Producción Capitalista y del Estado-Nación, que corresponde a la configuración espacial,

temporal, política, cultural y de la identidad hegemónica. La articulación entre esas bases

sustentan las relaciones establecidas/outsiders, que envuelven tanto los principios del

Capitalismo (trabajo y acumulación) como los principios de cada Estado-Nación (orden,

progreso, integración, desarrollo). Sin embargo, las fronteras inter-nacionales son apenas parte

de los procesos de fronteramiento civilizacional, pues junto a ellas son construidas fronteras

civilizacionales trans-nacionales (entre Occidente y Oriente, por ejemplo) e infra-nacionales

(entre “blancos” e indígenas en Brasil, por ejemplo). Todas las fronteras, no obstante, como parte

del proceso civilizador, definen prácticas, discursos y representaciones que encuadran sujetos,

grupos, comunidades y sociedades en espacios divisados entre, siempre, “Nosotros” y “Ellos”.

Palabras clave: Proceso Civilizador; Espacio; Fronteras.

“Ah”, disse o rato, “o mundo torna-se a cada dia mais estreito. A

princípio era tão vasto que me dava medo, eu continuava correndo e me

sentia feliz com o fato de que finalmente via à distância, à direita e à

esquerda, as paredes, mas essas longas paredes convergem tão depressa

uma para a outra que já estou no último quarto e lá no canto fica a

ratoeira para a qual eu corro”. – “Você só precisa mudar de direção”,

disse o gato, e devorou-o.

(Franz Kafka, “Pequena fábula”, in Modesto Carone, 2009)

Introdução

O mundo moderno-contemporâneo está dividido, segundo Michel Foucher (2009, p. 10),

por 248 mil quilômetros de fronteiras políticas terrestres inter-nacionais, divididas em 332

fronteiras entre Estados (por ele definidas de “díades, limites comuns a dois Estados contíguos”).

Nunca, em toda a história humana, pelo que sabemos, construiu-se tantas fronteiras efetivamente

delimitadas e demarcadas – limitada2, portanto – como nos últimos cinco séculos. Poderíamos

objetar aludindo ao recente processo de globalização, tendente, como seus ideólogos têm

proposto, à anulação e até ao fim das fronteiras; no entanto, se em 1945 contava-se com 51

Estados independentes, já eram 159 em 1990 e 193 em 2007 (FOUCHER, 2009, p. 10). Ou seja,

2 Segundo Benedict Anderson (2008, p. 33): “Imagina-se a nação limitada porque mesmo a maior delas, que

agregue, digamos, um bilhão de habitantes, possui fronteiras finitas, ainda que elásticas, para além das quais existem

outras nações. Nenhuma delas imagina ter a mesma extensão da humanidade”. E, para André Roberto Martin (1994,

p. 36 e 38), a partir do século XVII, “[...] a „problemática das fronteiras‟ confunde-se com a questão das

nacionalidades. [...] essa nova forma de institucionalização do poder político – o Estado nacional – é a responsável

pelo estabelecimento de limites rígidos e precisos, tanto quanto possível, entre as sociedades „nacionais‟. [...] desde

então, firmou-se a noção de que a fronteira marca o limite territorial onde o Estado-nação exerce a sua soberania”

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o processo de globalização em curso coincide com o aumento surpreendente de novas fronteiras

políticas inter-nacionais, portanto, de novos Estados-nações.

O movimento de formação do mundo atual (ocidental, sobretudo) foi pensado por

Norbert Elias (1993; 1994) como (um) “Processo Civilizador”. Nele, as relações de

interdependência suscitadas na passagem do Feudalismo para o Capitalismo fizeram-se

concomitantemente a um conjunto de monopólios (da força, da tributação, da economia, da

política, da língua, da identidade) engendrando, de um lado, a própria formação do Modo de

Produção Capitalista e dos Estados-nações, e, de outro, o desenvolvimento de sociogênese e

psicogênese correlatas, em processo profundo de controle e autocontrole das emoções. Mas, se a

formação dos monopólios coincidiu com a formação dos Estados-nações e de um maior controle

sócio-psicogenético, qual foi (e é) o papel da formação das fronteiras nesse processo? Ou, de

outra forma, a formação das fronteiras inter-nacionais foi/é condição para o processo civilizador

moderno-contemporâneo ou foi/é tal processo que produziu um tipo específico de fronteira?

Afinal, como compreender a fragmentação do mundo [a “criação do espaço métrico” (SANTOS,

D., 2002, p. 30) a partir de “uma mensuração sistemática do mundo” (FOUCHER, 2009, p. 10)],

pelo processo civilizador em curso, e qual o seu papel sobre o controle e o autocontrole das

emoções?

Por outro lado, a profunda correlação entre processo civilizador e formação dos Estados-

nações e fronteiras inter-nacionais, ao definir também uma nova forma das pessoas se

perceberem no mundo em comunidades de pertencimento nacionais (com o papel das fronteiras

inter-nacionais como dispositivos identitários, precisando o “meu” e o “teu” país), não aboliu a

constante criação e recriação de fronteiras étnico-espaciais tanto no interior dos Estados-nações

(como os bascos na Espanha) como trans-nacionalmente (os muçulmanos na Europa, por

exemplo). Nesse sentido, outra questão que se coloca na relação entre fronteiras e processo

civilizador é a que se desdobra da criação/recriação da condição estabelecidos/outsiders: por que,

simultaneamente à maior interdependência das relações engendradas pelo processo civilizador

em curso, construídas desde a escala do local à global, condições do tipo estabelecidos/outsiders

têm se mantido e até se aprofundado? Qual a correspondência dessas condições com o processo

civilizador? Seguindo Norbert Elias e John L. Scotson (2000, p. 208-209):

Trata-se da questão de por que a necessidade de se destacar dos outros homens, e com

isso de descobrir neles algo que se possa olhar de cima para baixo, é tão difundida e

enraizada que, entre as diversas sociedades existentes na face da Terra, não se encontra

praticamente nenhuma que não tenha encontrado um meio tradicional de usar uma outra

sociedade como sociedade outsider, como uma espécie de bode expiatório de suas

próprias faltas.

O Processo Civilizador e as Fronteiras

Se, como apontado por Renato Janine Ribeiro (1993, p. 9-10) na apresentação de “O

Processo Civilizador: formação do Estado e civilização” de Norbert Elias, a “civilização [deve

ser] entendida como processo, como verbo que se substantiva, o civilizar dos costumes”, as

fronteiras que lhe dão forma e conteúdo (à civilização) também podem ser entendidas como parte

do processo temporal-espacial de modelação civilizacional, tanto do tempo como do espaço de

cada parte do mundo moderno-contemporâneo . As fronteiras de cada Estado-nação emolduram3

3 Para André Roberto Martin (1994, p. 46), “[...] as fronteiras aparecem como as molduras dos Estados-nações”.

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as formas e os jeitos de pensar e de fazer de cada nacionalidade, assim como as ansiedades e os

medos de cada nova fragmentação no interior dessa configuração ensejam outras fronteiras,

muitas delas mais étnico-culturais que propriamente territoriais.

O processo de formação das fronteiras modernas (entre Estados-nações) é abordado

indiretamente por Norbert Elias (1993) em “O Processo Civilizador”, em especial na “Formação

do Estado e Civilização”. Sua compreensão se desdobra da análise sobre a “Feudalização e

Formação do Estado” e as “Sugestões para uma Teoria de Processos Civilizadores”. Na primeira

parte, sugere que a “configuração4 medieval de poder” se processou em movimentos “cíclicos”

de centralização e descentralização (tendências centrífugas), mas que aos poucos foram

suplantados pela formação de monopólios da força e da tributação (tendências centrípetas). Na

segunda parte, aponta que na formação dos monopólios, mas também na vertiginosa

concentração de população e de atividades nas cidades, concomitante à proliferação de vias e

meios de mobilidade e de comunicação propiciadas pelo aumento das relações comerciais,

processa-se o aprofundamento do controle social (sociogênese) e do autocontrole (psicogênese).

As relações de interdependência sempre maiores e mais profundas impedem a reprodução

“instintiva” das pulsões medievais – no que as relações nas Sociedades de Corte europeias

absolutistas tiveram papel decisivo.

Aqui [nas Sociedades de Corte dos Estados absolutistas] se criaram os modelos de

intercâmbio social mais pacíficos de que, em maior ou menor grau, todas as classes

precisavam, depois da transformação da sociedade europeia ocorrida ao fim da Idade

Média; aqui os hábitos mais rudes, os costumes mais soltos e desinibidos da sociedade

medieval, com sua classe guerreira superior e o corolário de uma vida incerta e

constantemente ameaçada, são “suavizados”, “polidos” e “civilizados”. A pressão da

vida de corte, a disputa pelo favor do príncipe ou do “grande” e depois, em termos mais

gerais, a necessidade de distinguir-se dos outros e de lutar por oportunidades através de

meios relativamente pacíficos (como a intriga e a diplomacia), impuseram uma tutela

dos afetos, uma autodisciplina e um autocontrole, uma racionalidade distintiva de corte,

que, no início, fez que o cortesão parecesse a seu opositor burguês do século XVIII,

acima de tudo na Alemanha mas também na Inglaterra, como o supra-sumo do homem

de razão (ELIAS, 1993, p. 18).

As tendências centrífugas, típicas de relações nas quais os comandos transitavam entre a

nobreza e a Igreja Católica, começam a se dissipar no momento em que a burguesia penetra nos

círculos de poder legitimada pelo papel que desempenha nas relações comerciais que se

desenvolvem. Se até então os movimentos “cíclicos” de centralização e descentralização de

poder se desdobravam de disputas entre “senhores territoriais” – que se enfrentavam

militarmente por controles sobre a terra e sobre senhores territoriais menores, em alternância de

4 “Dizer que os indivíduos existem em configurações significa que o ponto de partida de toda investigação

sociológica é uma pluralidade de indivíduos, os quais, de um modo ou de outro, são interdependentes. Dizer que as

configurações são irredutíveis significa que nem se pode explicá-las em termos que impliquem que elas têm algum

tipo de existência independente dos indivíduos, nem em termos que impliquem que os indivíduos, de algum modo,

existem independentemente delas” (ELIAS; SCOTSON, 2000, p. 184). Ou, para Roger Chartier (2001, p. 13), com

base em “O que é Sociologia”, de Norbert Elias, “[...] uma Figuration é uma formação social, cujas dimensões

podem ser muito variáveis (os jogadores de um carteado, a sociedade de um café, uma classe escolar, uma aldeia,

uma cidade, uma nação), em que os indivíduos estão ligados uns aos outros por um modo específico de

dependências recíprocas e cuja reprodução supõe um equilíbrio móvel de tensões”. (A ideia de “campo” de Pierre

Bourdieu [1998] tem aproximação à de figuração, de Norbert Elias.)

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momentos de tensão, disputa e conflito para momentos de supremacia de um, afrouxamento do

controle territorial e novamente tensão, disputa e conflito –, os séculos XII e XIII delineiam um

conjunto de relações no qual a necessidade dos monopólios da força e da tributação é exigência

de um novo arranjo das relações econômicas, centradas dali em diante menos na terra e mais

sobre o território de atividade e expansão comerciais.

A intermitência de estados de paz entre os momentos de tensões, disputas e conflitos já

não atendia os interesses de uma nova configuração socioespacial que necessitava de um

controle mais efetivo sobre o território, e que fosse um território cada vez mais amplo na medida

em que a atividade comercial se expandia. O comando sobre o território se deu quando se

efetivaram os monopólios da força e da tributação, que possibilitaram também a formação de

monopólios econômicos, políticos, linguísticos, identitários e, fundamental e especialmente,

territoriais. Diferentemente das relações assentadas sobre a terra, nas quais o seu ritmo era dado

pelo tempo predominante da natureza e pelo espaço das trocas simples, as relações comerciais

passaram a depender de um controle extremamente mais efetivo sobre o tempo e sobre o espaço

das trocas para acumulação. O monopólio territorial amplo que possibilitou tal controle foi

correlato à formação dos monopólios da força e da tributação: o primeiro, ao reunir sob um único

comando o poder da força que até então se dispersava entre diversos senhores e domínios

territoriais, impingiu um controle físico-territorial (militar e policial) mais amplo e homogêneo,

neutralizando resistências e impedindo assim a inconstância de relações comerciais e de

interdependências que se expandiam; e a segunda, correlata à primeira, tanto foi primordial para

a sustentação do monopólio da força ao assegurar a formação de um exército militar-policial

permanente, como para empreender esforços na produção de um território cada vez menos

“amarrado” por obstáculos físicos e disputas territoriais, possibilitando maior mobilidade e

comunicação – basilares para o desenvolvimento e expansão do comércio.

À medida que cresciam as oportunidades financeiras abertas à função central, o mesmo

acontecia com seu potencial militar. O homem que tinha à sua disposição os impostos

de todo um país estava em situação de contratar mais guerreiros do que qualquer outro;

pela mesma razão, tornava-se menos dependente dos serviços de guerra que o vassalo

feudal era obrigado a prestar-lhe em troca da terra com a qual fora agraciado. [...] A

supremacia militar que acompanhava a superioridade financeira constituiu, por

conseguinte, o segundo pré-requisito decisivo que permitiu ao poder central de uma

região assumir um caráter “absoluto”. [...] Esse aumento de oportunidades de poder em

mãos da função central constituía assim mais uma condição prévia para a pacificação de

um dado território, maior ou menor, conforme fosse o caso, a partir de um único centro

(ELIAS, 1993, p. 20-21).

Desse modo, a formação dos monopólios da força e da tributação se estabelece

rigorosamente como monopólio territorial, pois a extensão e a profundidade de ambos têm

sentido apenas quando afirmada sobre uma base espacial rígida. Os monopólios (ou os processos

de unificação política e econômica a partir dos séculos XII e XIII, sobretudo) se constituíram

sincrônica mas sobretudo diacronicamente na Europa (mas também em todo o mundo), como os

extremos dados pela formação de Portugal (século XIII em diante) e da Alemanha e Itália

(segunda metade do século XIX). No entanto, todos eles apresentaram um movimento que se

“concluiu” sobre uma base territorial com fronteiras lineares e “fechadas” (o que vale tanto para

as bases nacionais na Europa como para as coloniais fora dela). Os monopólios da força e da

tributação, como monopólios e controles territoriais, necessitam de uma base de atuação

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extremamente delimitada e demarcada, definindo assim tanto o “dentro” como o “fora” como o

“nós” e o “eles”.

Mas se atualmente parece “natural” a existência dos Estados-nações formados a partir dos

monopólios da força e da tributação, e que definem o monopólio territorial (nacional), seu

processo foi marcado por tensões, avanços e recuos e pela constituição de Sociedades de Corte,

que só lentamente foram se distanciando e definindo seus perfis nacionais. Inicialmente, as

sociedades de corte europeias (francesa, inglesa e italiana, especialmente) comunicavam-se mais

entre si que as mesmas com suas áreas de influência, falando a mesma língua (primeiro o italiano

e mais tarde o francês), lendo os mesmos livros, tendo os mesmos gostos, as mesmas maneiras e

o mesmo estilo de vida (cf. ELIAS, 1993, p. 18).

Os monopólios da força e da tributação asseguraram a formação material dos territórios e,

portanto, das fronteiras que os delineavam. No entanto, foi necessário também a formação

“imaterial” dos espaços, isto é, a construção de imagens, imaginações, imaginários e

representações que redefinisse simbolicamente o que se processava materialmente. O mundo

material (da economia, das trocas, do trabalho, do espaço e tempo físicos etc.) tem sua

humanidade calcada sobre uma correlata dimensão simbólica, que no mundo moderno-

contemporâneo se assenta sobre a formação do Estado territorial que tem na Nação seu duo

constitutivo. A formação de uma entidade do “nós” nacional foi processual e teve o monopólio

da língua como um de seus pressupostos.

[Apenas] Mais tarde, de meados do século XVIII em diante, mais cedo em um país e um

pouco depois em outro, mas sempre se conjugando com a ascensão da classe média e o

gradual deslocamento do centro de gravidade política e social da corte para as várias

sociedades burguesas nacionais, os laços entre as sociedades aristocráticas de corte de

diferentes nações são lentamente afrouxados, mesmo que nunca cheguem a se romper

de todo. A língua francesa cede lugar, não sem lutas violentas, às línguas nacionais

burguesas, mesmo na classe alta. A própria sociedade de corte torna-se cada vez mais

diferenciada, da mesma maneira que acontece com as sociedades burguesas, sobretudo

quando a velha sociedade aristocrática perde, de repente e para sempre, seu centro, com

a Revolução Francesa. A forma nacional de integração substitui a que se baseava na

situação social (ELIAS, 1993, p. 18).

Uma pretensa Europa “unificada” pelas Sociedades de Corte, que se comunicavam a

partir da “supremacia” da língua francesa, dá lugar à fragmentação pela “forma nacional”. Toda

língua é também uma forma de dizer, pensar, inventar, imaginar e viver o mundo, e as Nações

moderno-contemporâneas são, mais que inventadas, imaginadas, como condição profunda para

que sejam vividas, “[...] no sentido de que fazem sentido para a „alma‟ e constituem objetos de

desejos e projeções” (de acordo com Lilia Moritz Schwarcs, 2008, p. 10).

Nações são imaginadas, mas não é fácil imaginar. Não se imagina no vazio e com base

em nada. Os símbolos são eficientes quando se afirmam no interior de uma lógica

comunitária afetiva de sentidos e quando fazem da língua e da história dados “naturais e

essenciais”; pouco passíveis de dúvida e de questionamento. O uso do “nós”, presente

nos hinos nacionais, nos dísticos e nas falas oficiais, faz com que o sentimento de

pertença se sobreponha à ideia de individualidade e apague o que existe de “eles” e de

diferença em qualquer sociedade (SCHWARCS, 2008, p. 16).

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A unificação linguística amalgama o que tendia à dispersão, devendo o idioma “nacional”

ser ensinado e aprendido como condição necessária para a construção de um sentimento de

pertencimento também nacional – uma comunidade inventada, imaginada e vivida –, de um lado,

e como relação de poder5 das elites que detêm a forma do bem e do bom falar e escrever.

As pequenas elites podem operar com línguas estrangeiras, mas a língua

nacional se impõe uma vez que o quadro de pessoas instruídas tenha-se tornado

suficientemente grande (como testemunha a luta por um reconhecimento

linguístico nos Estados indianos desde a década de 1940). Daí, o momento em

que livros didáticos e jornais são impressos pela primeira vez em língua

nacional, ou quando essa língua é usada pela primeira vez para algum fim

oficial, marca um passo importantíssimo na evolução nacional (HOBSBAWM,

2010, p. 222-223).

O inventado, o imaginado e o vivido em uma Comunidade Nacional são correlatos à

formação de uma “consciência nacional” que se faz em forma de “irmandade”, emanada sob os

mesmos interesses, origem e destino6. O Processo Civilizador moderno-contemporâneo, calcado

em monopólios basilares da formação do Estado-nação, define uma comunidade na qual e sobre

a qual os sujeitos do território esquadrinhado, limitado e emoldurado por fronteiras rígidas

devem fazer parte. Ou seja, os monopólios sobre o território definem um monopólio

comunitário-identitário sobre os sujeitos, e, incorporado, torna-se lócus de inclusão dos de dentro

mas também de exclusão daqueles que estão fora de seus limites. Assim, é sobre tal configuração

territorial hegemônica que as identidades/comunidades nacionais se estabelecem, em processo

central e dominante de novas relações estabelecidos/outsiders. Mas tais relações devem ser

pensadas sempre como parte do novo Modo de Produção que se constitui, no qual as relações de

mercado, ao encapsularem sob nova lógica a materialidade das relações, também o fazem em

relação à imaterialidade identitária e de pertencimento. Em outras palavras: todo sujeito já nasce

marcado pelos monopólios que fundam e que foram fundados junto ao Estado-nação a que

“pertence”, como marca indelével da vida competitiva à qual, mesmo sem o saber, pertence. O

monopólio identitário-comunitário dado pela condição nacional passa a se constituir como

linguagem de poder, como construção discursiva do Estado-nação.

Segundo Benedict Anderson (2008, p. 71 e seguintes), a nação moderno-contemporânea

tem o capitalismo como a sua principal razão de existência. O autor sustenta que o

desenvolvimento da imprensa em seu processo “da reprodutibilidade e da disseminação” foi uma

das “primeiras formas de empreendimento capitalista”. Inicialmente forjado sobre o latim, o

setor editorial foi paulatinamente se tornando uma multiplicidade “monoglota”, isto é, se

5 Segundo Álvaro José de Souza (2001, p. 48), “[...] o idioma tem se mostrado, em múltiplos casos, causa e efeito de

unificação nacional, ora servindo para aglutinar populações, ora sendo imposto em nome da unificação de uma

população em território nacional. Por isso mesmo é que, no processo de formação das nações, seja a do Estado

Moderno europeu, seja o da organização das nacionalidades nos continentes atingidos pela colonização europeias –

Ásia, África, América e Oceania – o idioma adotado é normalmente aquele falado pelos grupos que passam a deter o

poder e a organizar o processo de unificação nacional”. 6 Uma “família”, como apontado por Frantz Fanon (2008, p. 126-127): “A família, na Europa [e certamente não só

ali], representa uma maneira que tem o mundo de se oferecer à criança. A estrutura familiar e a estrutura nacional

mantêm relações estreitas. A militarização e a centralização da autoridade de um país conduzem automaticamente a

uma recrudescência da autoridade paterna. Na Europa, e em todos os países ditos civilizados ou civilizadores, a

família é um pedaço da nação”.

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especializando nas diversas línguas faladas mais que em apenas uma língua lida, o latim (mesmo

com a reação da Contra Reforma que buscou uma retomada das edições nessa língua). Além

disso, Benedict Anderson (2008) salienta três “fatores externos” para o “revolucionário impulso

vernaculizante do capitalismo”: (1) a nova forma pela qual o latim é escrito, agora mais próximo

das “realizações estilísticas dos antigos” (gregos, principalmente); (2) a Reforma protestante, que

com a tradução da Bíblia (especialmente para o alemão) provoca a massificação de leitores e da

leitura – criando uma “aliança entre o protestantismo e o capitalismo editorial”; e (3) “[...] a

difusão lenta, geograficamente irregular, de determinados vernáculos como instrumentos de

centralização administrativa”.

[...] a ascensão desses vernáculos à condição de línguas oficiais, onde elas, em certo

sentido, concorriam com o latim (o francês em Paris, o médio-inglês em Londres),

contribuiu para o declínio da comunidade imaginada da cristandade. [...] O que tornou

possível imaginar as novas comunidades, num sentido positivo, foi uma interação mais

ou menos casual, porém explosiva, entre um modo de produção e de relações de

produção (o capitalismo), uma tecnologia de comunicação (a imprensa) e a fatalidade da

diversidade linguística humana (ANDERSON, 2008, p. 77-78).

Especificamente, as “línguas impressas lançaram as bases para a consciência nacional de

três maneiras diferentes”: (1) “criaram campos unificados de intercâmbio e comunicação abaixo

do latim e acima dos vernáculos falados”; esses campos, formando “companheiros de leitura”,

“constituíram, na sua invisibilidade visível, secular e particular, o embrião da comunidade

nacionalmente imaginada”; (2) “o capitalismo tipográfico conferiu uma nova fixidez à língua, o

que, a longo prazo, ajudou a construir aquela imagem de antiguidade tão essencial à ideia

subjetiva de nação”; e (3) “o capitalismo tipográfico criou línguas oficiais diferentes dos

vernáculos administrativos anteriores”, e, de forma inevitável, “alguns dialetos estavam „mais

próximos‟ da língua impressa e acabaram dominando suas formas finais”. Nesse sentido, “[...] a

convergência do capitalismo e da tecnologia de imprensa sobre a fatal diversidade da linguagem

humana criou a possibilidade de uma nova forma de comunidade imaginada, a qual, em sua

morfologia básica, montou o cenário para a nação moderna” (ANDERSON, 2008, p. 79-82).

A “comunidade imaginada” hegemônica moderno-contemporânea teve sua formação

amarrada em movimentos materiais e imateriais concomitantes. O Capitalismo se fez como

modo de produção material e modo de produção simbólico, no qual processos de objetivação

correspondem a determinados processos de subjetivação7. A Nação é o espaço central de

celebração simbólica do Modo de Produção Capitalista e, como todos os demais (da casa, do

bairro, da cidade, do mercado, do mundo), “[...] exigem uma forma ritual de comportamento, um

modo particular de vestir, maneira de falar, padrão de movimento” (COSGROVE, 2010, p. 129).

Desse modo, a fragmentação do mundo em Estados-nações é correlata, paradoxalmente, à

homogeneização dada pela própria universalização dessa configuração monopolística, da força e

da tributação à cultural-simbólica.

A formação e a consolidação dos Estados Absolutistas na Europa definiram a

constituição de um controle militar (monopólio da força) e de um controle sobre os recursos em

impostos e taxas (monopólio da tributação) praticamente “absoluto” sobre um território, que

7 Para Denis E. Cosgrove (2010, p. 123), “Se toda a produção humana é simbolicamente constituída, podemos

reafirmar os modos de produção como modos de produção simbólica. [...] Na sociedade capitalista, a produção

simbólica ocorre na economia como produtora de mercadorias”.

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também começava a ser monopolizado para esse fim definindo “princípio[s] de política interna”.

Se, de um lado, era necessário lidar com um “equilíbrio instável no território” internamente,

pelas tensões entre nobreza remanescente e burguesia ascendente, por outro lado as formações

socioespaciais novas avançavam com “crescente interdependência de maiores áreas e

populações”, controlando-as e definindo também tensões inter-nacionais, que se constituiam e

que deviam se dar em equilíbrio mínimo, como “balança de poder”, pois “Já não havia espaços

vazios na Europa” (cf. ELIAS, 1992, p. 20-47).

As crescentes relações internas de interdependência, forjadas pelas novas demandas de

uma economia cada vez mais calcada no comércio (e no capitalismo em geral), fez com que,

como no caso da produção de vinho na região de Borgonha (França), “[...] lentamente, os vários

distritos [se tornassem] interligados, as comunicações [fossem] desenvolvidas, expandiram-se a

divisão do trabalho e a integração de áreas maiores e de populações, bem como aumentou

correspondentemente a necessidade de meios de troca e unidade de cálculo que tivessem o

mesmo valor num extenso território, ou seja, a moeda” (ELIAS, 1993, p. 34).

Essas novas condições apontavam para “mudanças na estrutura dos relacionamentos

humanos” (ELIAS, 1993, p. 38). O controle social e o autocontrole se aprofundaram pari passu

às novas estruturas (sociais) de tempo e espaço, redefinindo, nesse sentido, tanto as relações

ensejadas por uma inaugural “tecnoesfera” (um novo modo de produzir: desenvolvimento

comercial, dos transportes e das comunicações, primeiro, e “revolução industrial”, depois),

como, também, por sua “psicoesfera” correspondente (um novo modo de pensar:

interdependência cada vez mais acentuada pela divisão do trabalho, sociedades de corte e

etiqueta etc.) (as ideias de “tecnoesfera” e de “psicoesfera” são de empréstimo de Milton Santos,

2004).

A universalização do “trabalho livre”, em contraponto ao trabalho escravo ou servil,

redefiniu tanto uma nova concepção de trabalho como o aumento das relações de

interdependência, não apenas entre os próprios trabalhadores de um país mas também entre esses

e as classes mais altas e, cada vez mais, entre o conjunto de sujeitos coprodutores de todos os

outros espaços nacionais – em um mundo que passa a ser, por isso, inter-nacional. Da mesma

forma, o trabalho livre redefiniu a relação entre as pessoas e o poder, donde o direito hereditário

e religioso é sobreposto por “formas legais” marcadoras (ideologicamente) da sociedade

comercial primeiro e da sociedade industrial depois.

A cristalização de normas legais gerais por escrito, que é parte integral das relações de

propriedade na sociedade industrial, pressupõe um grau muito alto de integração social e

a formação de instituições centrais capazes de dar à mesma lei validade universal em

toda a área que controla, e suficientemente fortes para exigir o cumprimento de acordos

escritos. [...] o surgimento de novas unidades de integração (e de governo) sempre é

expressão de mudanças estruturais na sociedade, ou seja, nas relações humanas. [...] Em

todos os casos, a rede de dependências que se cruzam no indivíduo tornou-se mais

ampla e mudou de estrutura; em todas as ocasiões, numa correspondência exata com

essa estrutura, a modelação do comportamento e de toda vida emocional, a estrutura da

personalidade, mudou também. O processo “civilizador” visto a partir dos aspectos dos

padrões de conduta e de controle de pulsões é a mesma tendência que, se considerada do

ponto de vista das relações humanas, aparece como um processo de integração em

andamento, um aumento na diferenciação de funções sociais e na interdependência e

como a formação de unidades ainda maiores de integração, de cuja evolução e fortuna o

indivíduo depende, saiba disso ou não (ELIAS, 1993, p. 56, 62 e 83).

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A sociedade moderno-contemporânea, em sua “unidade fragmentada” dada pelos

diversos Estados-nações, o é em uma integração contínua, “[...] relativamente íntima e uniforme

de pessoas que efetua um maior controle de violência, pelo menos dentro de suas fronteiras” (cf.

ELIAS, 1993, p. 84), monopolisticamente. O “mecanismo monopolista” da força e da tributação

se define sobre um dado território “fechado”, um “Estado em que todas as oportunidades são

controladas por uma única autoridade: um sistema de oportunidades abertas transforma-se num

de oportunidades fechadas”, definindo também um “estado de equilíbrio” tanto interno quanto

externo8. Ao mudarem as relações de poder, criando oportunidades diferentes, mudam também

“[...] a modelagem dos afetos, a estrutura das pulsões e consciência, em suma, toda a estrutura

social da personalidade e as atitudes sociais das pessoas mudam necessariamente com o tempo”

(ELIAS, 1993, p. 97-100).

[...] graças à centralização e à monopolização, oportunidades que antes tinham que ser

conquistadas por indivíduos com emprego de força militar ou econômica tornam-se

passíveis de planejamento. A partir de certo ponto do desenvolvimento, a luta pelos

monopólios não visa mais à sua destruição. É uma luta pelo controle do que eles

produzem, por um plano de acordo com o qual seus ônus e benefícios sejam mais

divididos, numa palavra, pelas chaves para a distribuição. A distribuição em si, a tarefa

do governante monopolista e da administração, passa, assim, de uma função

relativamente privada para pública. [...] Só quando um monopólio centralizado e

público de força existe numa grande área é que a competição pelos meios de consumo e

produção se desenvolve de modo geral sem intervenção da violência física; só então

existem, de fato, o tipo de economia e de luta que estamos acostumados a designar pelos

termos “economia” e “competição” em sentido mais específico (ELIAS, 1993, p. 105 e

132).

A delimitação e a demarcação das fronteiras lineares [sempre tensas porque definidas

politicamente entre grupos em tensão, e, por isso, “manipulada[s] como um instrumento para

comunicar uma ideologia” (cf. RAFFESTIN, 1993, p. 166)], em linhas rígidas e pretensamente

fixas, teve papel central nos processos de centralização, monopolização e planejamento policial-

militar e fiscal-tributário sobre um determinado território (o território nacional), na formação dos

Estados-nações.

Para Nicos Poulantzas (1990, p. 120, 121 e 131):

[o] território é apenas um dos elementos da nação moderna [...] esse espaço-território

serial, descontínuo e segmentado, se implica as fronteiras, levanta também o novo

problema de sua homogeneização e de sua unificação: seria também o papel do Estado

na unidade nacional. [...] O Estado capitalista não se limita a aperfeiçoar a unidade

nacional, ele se constitui quando fundamenta essa unidade, ou seja a nação moderna.

[...] pelo mesmo movimento que o Estado estabelece as fronteiras nacionais e unifica o

interior, é também por esse movimento que ele se volta para o exterior dessas fronteiras

neste espaço irreversível, delimitado embora sem fim, sem horizonte último: extensão

de mercados, do capital, dos territórios. [...] Essas fronteiras só são portanto

estabelecidas como as de um território nacional a partir do momento em que se trata

exatamente (para o capital, para as mercadorias) de franqueá-las. [...] O Estado

8 De acordo com Delgado de Carvalho (1939, p. 104 e 106), em leitura-síntese de “Geografia das fronteiras” de

Jacques Ancel, “[...] A gênese dos Estados atuais resultou num equilíbrio entre as forças internas das nações e a

pressão periférica [externa]. [...] Certos Estados dotados cedo de um espírito nacional, fixaram suas fronteiras em

quadros que não foram mais sensivelmente modificados, tal o equilíbrio interno ao qual tinham chegado”.

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capitalista estabelece as fronteiras ao constituir o que está dentro, o povo nação, quando

homogeneiza o antes e o depois do conteúdo desse enclave. A unidade nacional, a nação

moderna, torna-se assim a historicidade de um território e territorialização de uma

história [...].

É curioso constatar, nessa direção, que concomitantemente à afirmação dos Estados-

nações como unidades básicas da configuração territorial (mas também temporal) do Modo de

Produção Capitalista, desenvolvem-se as teorizações que fundam o “liberalismo econômico”,

especialmente a partir de Adam Smith. Podemos dizer que Adam Smith também admitia a

necessidade de constituição de monopólios da força e da tributação [como em passagens

importantes em que trata da maior importância dos exércitos em comparação com as milícias, e

do comércio com as colônias (SMITH, 1985, p. 63 e 161)], juntamente com importante atuação

do Estado nas funções que lhe eram absolutamente necessárias para o desenvolvimento

econômico. O pensador entendia a necessidade de atuação do Estado com a defesa como “o

primeiro dever do soberano, o de proteger a sociedade contra a violência e a invasão de outros

países independentes”, com exército permanente e não milícias temporárias (SMITH, 1985, p.

151 e seguintes).

Assim como é somente por meio de um exército efetivo bem organizado que uma nação

civilizada consegue defender-se, da mesma forma é somente com tal exército que um

país bárbaro pode ser civilizado com rapidez e de modo razoável. Um exército efetivo

implanta, com força irresistível, a lei do soberano pelas províncias mais longínquas do

império e mantém, até certo ponto, um governo regular em regiões que, caso contrário,

não admitiria lei alguma (SMITH, 1985, p. 162).

Em seguida, Adam Smith aponta a necessidade de “gastos com a Justiça”. Já nos “gastos

com as obras e as instituições públicas”, o autor é explícito em apontar que essas devem ser

destinadas a facilitar o comércio, a educar a juventude e a instruir a todos. Junto aos gastos,

Adam Smith acentua a ordem das receitas do Estado, com tributação sobre a terra, o capital e o

trabalho (cf. SMITH, 1985, p. 163 e seguintes, 173 e seguintes e 247 e seguintes).

Sobretudo, diz o autor:

O comércio e as manufaturas raramente podem florescer por muito tempo em um país

que não tenha uma administração de justiça normal, no qual as pessoas não se sintam

seguras na posse de suas propriedades, no qual a fidelidade nos contratos não seja

garantida por lei e no qual não se possa supor que a autoridade do Estado seja

regularmente empregada para urgir o pagamento das dívidas por parte de todos aqueles

que têm de pagar. Em suma, o comércio e as manufaturas raramente podem florescer

em qualquer país em que não haja um certo grau de confiança na justiça do Governo

(SMITH, 1985, p. 316).

“Segurança, território, população”: para que as relações de troca e intercâmbio

disponibilizassem de um espaço adequado à sua realização, era preciso que as pessoas se

sentissem “seguras” em seu país [a passagem de um “Estado territorial” para um “Estado de

população” foi fundamental, como observado por Georgio Agamben [2010, p. 11] em relação a

análises de Michel Foucault]. A garantia de segurança para pessoas de um determinado território

devia ser “dada” pelo Estado (e a confiança nele como atributo de uma comunidade de

pertencimento em formação e consolidação, a Nação). O controle do território passa a ser um

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controle sobre a população, controlada devidamente por um poder disciplinar correspondente [as

inferências aproximativas entre Adam Smith e Michel Foucault (2008) obviamente são apenas

provocativas, mas ajudam a pensar o quanto para um mundo “liberal” que se formava era crucial

uma ordem da segurança em torno da população e sobre o território, ensejando controles sociais

e autocontroles específicos]. Segundo Georgio Abamben (2010, p. 11), “[...] o desenvolvimento

e o triunfo do capitalismo não teria sido possível [...] sem o controle disciplinar efetuado pelo

novo biopoder, que criou para si, por assim dizer, através de uma série de tecnologias

apropriadas, os „corpos dóceis‟ de que necessitava”.

Se nas Sociedades de Corte (cf. ELIAS, 2001) o controle social e o autocontrole se

constituíam como elementos basilares para o progressivo aumento da “espiação” sobre o outro (e

sobre si), em olhares, modos de cumprimento, de falar, de ajustar o corpo, de se portar à mesa,

embalados por manuais de bons costumes e de etiqueta, nos territórios nacionais que se

formavam a fronteira passa a marcar o ponto até onde podia se manifestar o controle tanto sobre

a terra e seus recursos (monopólio da tributação – cartorial, fiscal, fundiário etc.) como sobre as

gentes (monopólio da força – exército, polícia, prisões, manicômios, hospitais, escolas etc.)9. No

primeiro caso, a terra e tudo o que está sob e sobre ela vira recurso e “meio de produção”; e, no

segundo, todas as gentes viram recurso e “força de trabalho”, racionalizadas e manipuladas

através da “invenção da população”. Na mesma medida em que o espaço e o tempo são

linearizados, esquadrinhados e mensurados, o são também as relações socioespaciais e suas

gentes, enquadradas no processo de “contabilização” moderno-contemporâneo. A lógica

Capital/Trabalho encontra na formação dos Estados-nações o seu correlato, como fórmula

“perfeita” entre economia e política.

Para Hervé Le Bras (2000, p. 24):

[Sobre a necessidade de contabilização da população] É mais fácil representar o

conjunto de habitantes de uma ilha como um todo [referência à Inglaterra], do que o de

um país como a França com fronteiras ainda flutuantes e mal definidas [no contexto da

formação dos dois Estados-nações; a ênfase contábil da população impõe-se

definitivamente na Inglaterra no final do século XVII, enquanto na França se consolida

apenas mais de um século depois].

Para Claude Raffestin (1993, p. 67-68):

[Pelos recenseamentos a população] é uma representação abstrata e resumida, mas já

satisfatória para permitir uma intervenção que busca a eficácia. O recenseamento

permite conhecer a extensão de um recurso (que implica também um custo), no caso a

população. Nessa relação que é o recenseamento, por meio da imagem do número o

Estado ou qualquer tipo de organização procura aumentar sua informação sobre um

grupo e, por consequência, seu domínio sobre ele. [...] os primeiros recenseamentos

modernos frequentemente coincidem com o fortalecimento do Estado ou com a

formação de um novo Estado [o Estado-nação].

9 Para Roger Chartier (2001, p. 18 e 19): “O monopólio fiscal, o monopólio militar e a etiqueta de corte são portanto

os três instrumentos de dominação que, conjuntamente, definem essa forma social original que é a sociedade de

corte. [...] No Ocidente, entre os séculos XII e XVIII, as sensibilidades e os comportamentos efetivamente se

modificaram profundamente por dois fatos fundamentais: a monopolização, pelo Estado, da violência que obriga ao

controle das pulsões e assim pacifica o espaço social; e o estreitamento das relações interindividuais, que implica

necessariamente um controle mais severo das emoções e dos afetos”.

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Para Benedict Anderson (2008, p. 233):

A verdadeira inovação dos recenseamentos dos anos 1870, portanto, não constitui na

construção de classificações etno-raciais, e sim na sua quantificação sistemática [o

autor perscruta o contexto da penetração inglesa no Sudeste Asiático a partir do século

XIX]. Os dirigentes pré-coloniais no mundo malaio-javanês já tinham tentado efetuar

uma série de estimativas dos povos sob o seu controle, mas por meio de relações de

impostos e listas de recrutamento. Os objetivos eram concretos e específicos: manter um

rastreamento daqueles que realmente poderiam ser tributados e recrutados para o

exército – pois esses dirigentes estavam interessados apenas em lucros e potenciais

soldados.

E para Norbert Elias (1993, p. 106, 108 e 118):

Sem a organização monopolista da violência física e da tributação, limitada no presente

às fronteiras nacionais [“monopólio dentro dos limites de um território” proporcionando

“estabilidade às fronteiras” ou “as fronteiras do monopólio”], a restrição dessa luta

[“lutas econômicas de nossos dias”] por vantagens “econômicas” ao emprego do poder

“econômico”, bem como a observância de suas regras básicas, seriam impossíveis em

qualquer época, mesmo em Estados isolados.

A “organização monopolística” controla territórios e populações, e conhecer a sua

“exatidão” se constitui como instrumento eficaz e eficiente de poder10

. Formação dos Estados-

nações e consolidação do Modo de Produção Capitalista compõem, assim, o duo central da

armação espaço-temporal moderno-contemporânea. A interdependência cada vez mais acentuada

entre as partes do mundo a partir da arquitetônica capitalista, fazem refluir para um mesmo

enlace as relações internas e externas dentro e entre os Estados-nações e o mercado inter-

nacional – ele mesmo cada vez mais global mas extremamente arrumado pela configuração de

mercados nacionais11

.

De acordo com Norbert Elias (1993, p. 144, 146 e 147):

Na realidade histórica, esses dois processos – mudanças de poder entre classes dentro de

uma mesma unidade, e deslocamentos no sistema e tensões entre unidades diferentes –

constantemente se entrelaçam. [...] [Todo Estado-nação] Pode conquistar possessões

coloniais, proceder à revisão de fronteiras, obter mercados de exportação e vantagens

econômicas ou militares, em suma, pode promover o aumento geral de seu poder. Mas,

exatamente porque nas lutas de sociedades bastante complexas cada rival e adversário é,

ao mesmo tempo, um parceiro na linha de produção da mesma maquinaria, toda

mudança súbita e radical num setor dessa rede inevitavelmente provoca perturbação e

10

O “Estado territorial” é transformado em “Estado de população”, segundo Michel Foucault (1988, p. 131): “As

disciplinas do corpo e as regulações da população constituem os dois pólos em torno dos quais se desenvolveu a

organização do poder sobre a vida. [...] A velha potência da morte que simbolizava o poder soberano é agora,

cuidadosamente, recoberta pela administração dos corpos e pela gestão calculista da vida. [...] Abre-se, assim, a era

do bio-poder”. 11

Vejamos o que aponta Michel Foucault (2008, p. 390 a 392): “[...] a pluralidade [moderno-contemporânea] de

Estados é a própria necessidade de uma história agora inteiramente aberta e que não é temporalmente polarizada

para uma unidade última. Um tempo aberto, uma espacialidade múltipla [...] É nessa que se articula o princípio de

que se está num tempo que é [politicamente] aberto e num espaço que é estatalmente múltiplo. [...] essas unidades se

afirmam [...] num espaço que é agora o dos intercâmbios econômicos ao mesmo tempo multiplicados, ampliados e

intensificados [espaço da concorrência]. [...] fio condutor da razão de Estado”.

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mudanças em outro. Para sermos exatos, não deixa de operar, por essa razão, o

mecanismo da competição e do monopólio. Mas os conflitos inevitáveis tornam-se cada

vez mais arriscados para o precário sistema de nações. [...] Da mesma maneira, as

relações entre diferentes classes sociais dentro de um domínio tornam-se, com o avanço

da divisão das funções, cada vez mais ambivalentes.

A acentuada interdependência concomitante à aceleração das trocas (produção,

circulação, distribuição e consumo) definiram a “alocação exata do tempo” aliada ao “espírito de

previsão” (ELIAS, 1993, p. 208), o que correspondeu também à alocação exata do espaço, no

sentido de formação de “mesmos padrões de conduta” e de emoções e de seu devido controle

(ELIAS, 1993, p. 212).

Como modo de produção global, o Capitalismo definiu o modelo Estado-nação como a

configuração temporal-espacial hegemônica no mundo, não impedindo, no entanto, que “[...] de

acordo com a estrutura da história de cada país, variedades muito diferentes de controle das

emoções emergem no contexto da conduta civilizada” (ELIAS, 1993, p. 214). Assim, cada povo

e também cada indivíduo, pertencente a um país, conduz a sua conduta de acordo com princípios

nacionais próprios: mitos de origem e de destino, projetos, representações de passado e de futuro,

artes, esportes etc.

Nesse sentido, podemos afirmar, sempre em aproximação a Norbert Elias (1993, p. 234),

que o Estado-Nação é parte de um “processo histórico de racionalização”. O “abrandamento das

pulsões” se dá por um processo de “psicologização e racionalização” em cada país e no Ocidente

em geral:

A reflexão contínua, a capacidade de previsão, o cálculo, o autocontrole, a regulação

precisa e organizada das próprias emoções, o conhecimento do terreno, humano e não-

humano, onde agia o indivíduo, tornaram-se precondições cada vez mais indispensáveis

para o sucesso social. [...] O que mudou foi a maneira como as pessoas se ligavam umas

às outras. [...] a racionalidade e os padrões de sentimentos, a auto-imagem e a economia

pulsional dos alemães, ingleses, franceses e italianos se diferenciam, de acordo com

suas diferentes histórias de interdependência, e a modelação social da pessoa no

Ocidente, como um todo, difere da dos orientais (ELIAS, 1993, p. 225, 226, 230, 231-

232).

Tanto nas relações próximas (inter-pessoais) como nas relações distantes (inter-

nacionais), a racionalização moderno-contemporânea fez com que “as pessoas passa[sse]m a se

observar mais” (ELIAS, 1993, p. 246).

Nenhuma sociedade pode sobreviver sem canalizar as pulsões e emoções do indivíduo,

sem um controle muito específico de seu comportamento. Nenhum controle desse tipo é

possível sem que as pessoas anteponham limitações umas às outras, e todas as

limitações são convertidas, na pessoa a quem são impostas, em medo de um ou outro

tipo. [...] As tensões entre Estados, criadas pela dinâmica irresistível de suas lutas pela

supremacia sobre domínios cada vez maiores, encontram expressão na constituição

psicológica da pessoa, em frustrações e restrições específicas. Impõem a esses

indivíduos uma pressão de trabalho e uma insegurança profunda que nunca cessam.

Tudo isso, as frustrações, a inquietação, a pressão do trabalho, não menos que a ameaça

que nunca termina à vida inerente às tensões entre Estados, gera ansiedades e medos. O

mesmo se aplica às tensões dentro de cada sociedade e Estado (ELIAS, 1993, p. 270).

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Mas, então, como saber o dentro e o fora de “cada sociedade e Estado”? Toda intenção

de controle, segurança e disciplina (e racionalidade correspondente) deve se ajustar a um espaço

conhecido, delimitado e demarcado. A marcação das fronteiras definiu esse saber, constituindo-

se na armadura territorial sobre a qual o poder pode e deve se impor, assegurando a segurança e

impondo a disciplina12

. Os monopólios e os poderes moderno-contemporâneos articulam-se

definindo a “exatidão” do território e da população. De modo semelhante, as relações entre

populações, comunidades, grupos e pessoas tendem a se desenvolver também a partir de uma

racionalidade “exata” (“nós somos isto e eles são aquilo”), na qual as práticas discursivas

hegemônicas são impostas como relações de normalidade – automaticamente criando o seu

Outro, o anormal, a anomia. Nessa exatidão, inevitavelmente, relações estabelecidos/outsiders se

propagam, se criam, de recriam e se desfazem, marcando fronteiras em um processo civilizador

que é ele mesmo estruturado em lógicas fronteiriças. Seja para classificar espaços e gentes, para

produzir comunidade de pertencimento ou seja para a imposição de controles do espaço, as

fronteiras territoriais ou étnicas (cf. BARTH, 1998) definem suas territorialidades13

e delas

emergem relações estabelecidos/outsiders correspondentes.

O Processo Civilizador como Processo de Fronteiramento

Civilizar não pode ser compreendido como o processo de tornar melhor, melhorar. Antes,

deve ser compreendido como movimento modelador de uma dada formatação de condutas,

ajustada no que definimos hodiernamente por relações moderno-contemporâneas. Tais relações

definem um jeito de pensar e praticar o mundo, ou seja, uma forma de viver. Essa forma de viver

é definida por um processo civilizador que articula e é articulado por duas linhas centrais

básicas: politicamente, pela fragmentação do mundo em Estados-nações; e, economicamente,

pela homogeneização do Modo de Produção Capitalista. Uma e outra, no entanto, articulam-se

em “processos de fronteiramento”14

inevitáveis, a partir de competitividades materiais e

12

“Modernamente foi o príncipe que sentiu a necessidade de materializar os limites de sua contestada autoridade.

Foi o Renascimento que lhe forneceu os meios de chegar a isso: o mapa, a exploração topográfica, o interesse

estratégico. As primeiras fronteiras traçadas no mapa são as da autoridade do soberano, da monarquia

administrativa. O que ainda está impreciso e indeterminado na realidade, aparece exato na carta geográfica”

(CARVALHO, 1939, p. 109). 13

“Sean cuales sean sus orígenes específicos, sin embargo, la territorialidad por lo general se pone en práctica en

varias formas diferentes aunque a menudo complementarias: (1) mediante la aceptación popular de las

clasificaciones de espacio (e.g. “nuestro” frente a “tuyo”); (2) a través de la comunicación de un sentido de lugar

(donde las señales y fronteras territoriales evocan significados); y (3) mediante la imposición del control sobre el

espacio (mediante la construcción de barreras, la interceptación, la vigilancia, la disposición de cuerpos de policía, la

guerra, y la revisión judicial)” (AGNEW; OSLENDER, 2010, p. 196). 14

Tomamos a ideia de “processo de fronteiramento” de empréstimo de Thiago Rodrigues Carvalho (2010, p. 85-86),

para quem “A fronteira como construção em permanente desenvolvimento deveria ser uma palavra conjugada no

gerúndio: fronteirando. O movimento que atribui sucessivas significações às fronteiras constituem processos de

fronteiramentos. São significados atribuídos ao fenômeno/conceito, a fim de fazer valer uma acepção motivadora, da

relação de quem julga a manifestação, inteligível e total em sua relação com ele. São construções que também

participam da trama de constante re-construção/identificação do fenômeno/conceito, não o esgotando, apenas elenca

alguns de seus dispositivos e os usa em suas estratégias de consumação territorial. [...] Os processos de

fronteiramento na formação, consolidação e constituição do fenômeno territorial fronteira são estratégias políticas

de apropriação dos poderes espacializados nas frentes do fenômeno fronteira. Frentes manifestas de forças que

tencionam diversas formas de encontros, desencontros, dispersão e expansão ou fechamento e choques, disputas e

transgressões, ou até mesmo, conexões integradoras (legais e ilegais), contiguidades e permeabilidades, que estão

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simbólicas que lhes são inerentes: para as primeiras, a ênfase na acumulação; paras as segundas,

a ênfase no status.

A fórmula é “simples”: dividir para multiplicar. A constituição dos monopólios da força e

da tributação define o monopólio territorial sobre os recursos materiais e humanos. A sustentação

dos monopólios se afirma com a soberania do Estado-nação, desenvolvendo uma comunicação

que propõe (e impõe) a unificação linguística, da narrativa temporal única e da integração

territorial, de um sentimento identitário e de pertencimento hegemônico em uma “comunidade”

nacional inventada, imaginada e vivida. Passamos a ser, então, primeiro e sobretudo, brasileiros,

colombianos, argentinos, peruanos, equatorianos, venezuelanos, paraguaios, espanhóis, russos,

angolanos... Para cada nacionalidade, as suas fronteiras; para cada fronteira, os de dentro e os de

fora, os estabelecidos e os outsiders [ora, uma das “características essenciais da biopolítica

moderna (...) é a sua necessidade de redefinir continuamente, na vida, o limiar que articula e

separa aquilo que está dentro daquilo que está fora” (AGAMBEN, 2010, p. 127)].

“Ordem e Progresso” riscam o centro da bandeira nacional brasileira. Tributários da

filosofia positivista emanada no século XIX, a ordem e o progresso se firmam como ideologia da

nação, definindo, imediatamente, a repulsão: fora e abaixo a desordem, fora e abaixo o atraso. A

ordem geométrica da bandeira é a ordem nacional: o verde da natureza exuberante; o amarelo

das riquezas espalhadas pelo solo; e o azul límpido da paz. A ordem (a paz) levará ao progresso.

Toda desordem e todo atraso devem ser rechaçados, banidos... Na bandeira nacional colombiana

mudam as cores e seus significados, mas o espírito da nação nela se reproduz: a riqueza do solo,

o mar e o território e o sangue do heroísmo... Na bandeira nacional argentina a paz na imensidão

brilha em sol se irradiando sobre o branco e o azul-celeste... Ordem, progresso, tradição e futuro:

de uma ou de outra forma, todo arquétipo nacional se imiscui à lógica da acumulação, em uma

interpenetração aviltante entre sentidos de ser e estar (pertencer) e de ter e acumular (des-

envolver). Os sentidos de todo Estado-nação são os sentidos do Modo de Produção Capitalista. A

acumulação se funda em processos avassaladores de competitividade e de ameaça em que

sociogêneses e psicogêneses são retroalimentadas, formando-se relações estabelecidos/outsiders

entre comunidades nacionais mas também transnacionais (a relação entre Ocidente e Oriente,

conforme Edward W. Said, 2007) e intra-nacionais (os preconceitos contra a origem geográfica e

de lugar no Brasil, conforme Durval Muniz de Albuquerque Jr., 2007).

„Nós, ocidentais, somos completamente diferentes dos outros‟, este é o grito de vitória

ou a longa queixa dos modernos. A Grande Divisão entre Nós, os ocidentais, e Eles,

todos os outros, dos mares da China até o Yucatán, dos inuit aos aborígenes da

Tansmânia sempre nos perseguiu. Não importa o que façam, os ocidentais carregam a

história nos cascos de suas caravelas e canhoneiras, nos cilindros de seus telescópios e

nos êmbolos de suas seringas de injeção. Algumas vezes carregam este fardo do homem

branco como uma missão gloriosa, outras vezes como uma tragédia, mas sempre como

um destino. Jamais pensam que apenas diferem dos outros como os sioux dos

algonquins, ou os baoulés dos lapões; pensam sempre que diferem radicalmente,

absolutamente, a ponto de podermos colocar, de um lado, o ocidental, e de outro, todas

as outras culturas, uma vez que estas têm em comum o fato de serem apenas algumas

culturas em meio a tantas outras. O Ocidente, e somente ele, não seria uma cultural, não

apenas uma cultura (LATOUR, 1994, p. 96).

em constante estado de manifestação, pelo território que se adensa em incomensuráveis territorialidades de produção

e reprodução de relações de poder”.

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Os processos de fronteiramento moderno-contemporâneos são a articulação “natural” da

contradição heterogeneidade-fragmentação/homogeneidade-unidade do mundo. A civilização

projetada nos últimos séculos, mais que nos tornar bons e melhores, é um processo de

configuração socioespacial inter-nacional/capitalista (sociogenético) interiorizado como

“subjetividade capitalística” (em empréstimo de Félix Guattari e Suely Rolnik, 2010)

(psicogenético) [ou, para Giorgio Agamben (2010, p. 13), “o processo de subjetivação que leva o

indivíduo a vincular-se à própria identidade e à própria consciência e, conjuntamente, a um poder

de controle externo”]. Se em um primeiro momento a formação capitalista em um mundo em

expansão “fronteirizou” os civilizados e os incivilizados, a civilização e a barbárie, dizimando ou

escravizando outsiders (povos indígenas da América e povos africanos e asiáticos), em seguida a

própria ordem do Capital definiu sua “ética e espírito” com base no trabalho e na acumulação,

“dignificadores” da condição humana moderna. Progresso, des-envolvimento, acumulação e

trabalho migram para a formação dos Estados-nações, e nele e a partir dele toda “desordem”,

“atraso”, reprodução simples e “preguiça” devem desaparecer.

Como processo de fronteiramento, o processo civilizador define um jeito de viver pelos

controles e autocontroles dos impulsos e das emoções (o outro será sempre, por isso, um

“descontrolado”, “instintivo”, “animal”, “selvagem”). A exacerbação das relações de

interdependência requer que todos e cada um sejam controlados e se controlem. Define-se a

condição normal, que será o parâmetro para a condição anormal, constituindo-se como a base das

relações estabelecidos/outsiders. O normal e a normalidade são normatizadas (em aproximação a

Michel Foucault, 1996 e 2001). A normatividade é dada pelos pressupostos “éticos e espirituais”

do Capitalismo: controle para o trabalho (ordem) e trabalho para a acumulação (progresso). As

fronteiras inter-nacionais emolduram a ordem interna (nacional) que por sua vez é emoldurada

pela ordem global (capitalista). O encontro entre as duas ordens define um sujeito normal (aquele

que trabalha) e uma comunidade ajustada (aquela que progride).

Nesse sentido, não é estranho que no Brasil tem se produzido, por exemplo, um “leve”

desdém e até estigma (com base em Erving Goffman, 1988) em relação aos paraguaios, podendo

ser constatado mais facilmente em espaços fronteiriços com o Paraguai. “Os paraguaios

trabalham pouco e o que vem de lá é tudo falsificado, é um país atrasado”. Em outra escala, a

interna, outro estigma é produzido em relação, por exemplo, aos povos indígenas. No momento

em que processos de identificação e de demarcação de terras indígenas se intensificam, buscando

cumprir a Constituição de 1988, é comum em espaços de conflito ouvir que “os índios não

precisam de mais terra porque não trabalham” (em outros contextos, ainda poder-se-ia aludir aos

estigmas em relação aos caboclos, nordestinos, baianos etc.). Enquanto isso, com a agudização

da crise mundial, “bem longe dali”, na Europa, os movimentos de extrema direita se fortalecem e

uma das bandeiras é a ofensiva contra os imigrantes, os estrangeiros... Em todas as situações a

produção da distinção, pois como observou Boaventura de Sousa Santos (2010, p. 33 e 39), “O

pensamento abissal moderno salienta-se pela sua capacidade de produzir e radicalizar

distinções”, em um mundo no qual “A humanidade moderna não se concebe sem uma

subhumanidade moderna”.

O Modo de Produção Capitalista produz sua materialidade e imaterialidade e ambas se

incrustam nos fundamentos de cada Estado-nação. Como participantes concomitante e

indissoluvelmente desse Modo de Produção e de suas nacionalidades, cada sujeito, grupo,

comunidade ou mesmo sociedade – em suas hegemonias – procuram se estabelecer sociogenética

e psicogeneticamente sob tais materialidade e imaterialidade (“ética e espírito” capitalistas).

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Coesos internamente, controlamo-nos como “iguais” pois injetamos no outro nossas repulsas e

aversões. Fronteiras territoriais lineares e “fechadas” (nacionais) se fundam e se desdobram em

um conjunto de outras fronteiras étnicas (territoriais e não territoriais), em nome dos

fundamentos da nação e da acumulação e em constante confronto com sujeitos, grupos,

comunidades e sociedades concorrentes ou “incômodas” à nação e à acumulação. Assim, não

parece ser aleatório que algumas das imagens mais emblemáticas desses conflitos e tensões

venham justamente do centro germinal do processo civilizador.

(“Partido do Povo Suíço” – www.google.com.br – acessado em 26/01/2012)

O processo civilizador como processo de fronteiramento define o “Nós” e o “Eles”. As

fronteiras inter-nacionais são a materialidade definidora de quem pode ficar dentro e de quem

deve permanecer fora. Indesejáveis, desajustáveis, incivilizados, desordeiros e incômodos, como

“ovelhas negras”, podem e devem ser expulsos, mancham a ordem e o progresso, ou, caso

contrário, deverão, quando for possível, tornarem-se “brancos”, ordeiros e trabalhadores. Mas em

um mundo marcado pela competitividade e acumulação, os fronteiramentos cada vez mais

excludentes são a regra, pois os espaços de acumulação e apropriação são também cada vez mais

seletivos [como diz Zygmunt Bauman (2005, p. 24), “No carro do progresso, o número de

assentos e de lugares em pé não é, em regra, suficiente para acomodar todos os passageiros

potenciais, e a admissão sempre foi seletiva”]. Nem todos podem se “naturalizar” como sujeitos,

grupos, comunidades ou sociedades “dignas” do mundo do trabalho, da acumulação e do

progresso, fazendo desse mesmo mundo um espaço de tal maneira “fronteirizado” que já não há

mais para onde escapar [como aponta o mesmo Zygmunt Bauman (2005, p. 87) em diálogo com

Ulf Hedetoft: ao mesmo tempo em os “espaços vazios” já não mais existem, “as fronteiras entre

Nós e Eles estão sendo retraçadas de modo mais rígido” que nunca, e tais fronteiras, também

segundo Andreas e Snyder, transformaram-se em “membranas assimétricas” permitindo a saída,

mas protegendo “contra o ingresso indesejado de unidades provenientes do outro lado”].

O processo civilizador constrói fronteiras. As fronteiras, dialeticamente, civilizam os

sujeitos, os grupos, as comunidades e as sociedades, os tempos e os espaços moderno-

contemporâneos. O processo de fragmentação e divisão do mundo capitalista é a forma de

civilizar os espaços a partir de controles e monopólios materiais (da força, da tributação, da

economia) e simbólicos (imaginários, sentidos de pertencimento, identitários, de coesão e de

projetos comuns). Articuladas tanto pelos imperativos do Modo de Produção Capitalista como

pelos do Estado-nação, as fronteiras civilizam comportamentos, condutas e emoções, ao mesmo

tempo em que comportamentos, condutas e emoções hegemônicas civilizam fronteiras,

marcando, delimitando, demarcando e definindo os de dentro e os de fora. E atualmente o

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processo é de tal jeito avassalador que não parecem restar mais espaços de indistinção, estando e

sendo todos marcados pelas lógicas da competitividade e pertencimento dominantes.

Seria, então, essa a expressão real da “Pequena fábula” de Franz Kafka, apontada no

início do texto? Talvez. Há vastidão, caminhos, paredes, partes, cantos e mais cantos. Corremos

para um lado e logo em seguida corremos para outro. Paramos em silêncio. Olhamos de novo e

avançamos mais um pouco. Agora sim, uma saída? Ainda não... A fronteira se fecha mais uma

vez, outras vezes, todas as vezes. Se na fábula o gato devora o rato, talvez seja preciso recuar e

insistir, outra vez e cada vez mais, que o processo civilizador que engendramos deve ser

drasticamente repensado, para que o “fim” nem seja “The Wall”, como cantou Pink Floyd, nem a

boca do gato, como escreveu Franz Kafka.

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