9
TESE: O PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO (PJE) E A NECESSÁRIA REFORMULAÇÃO DA CLT QUANTO AO PROCESSAMENTO DOS DISSÍDIOS INDIVIDUAIS AUTOR E RESPONSÁVEL PELA DEFESA: CARLOS ALBERTO PEREIRA DE CASTRO EMENTA: A implantação do PJE-JT é uma realidade já existente para algumas Varas e uma situação iminente para as demais. Tais mudanças devem vir acompanhadas de uma fundamental e urgente modificação da legislação processual trabalhista, com vistas a acompanhar as novidades que o PJE traz, mas principalmente, para que seja privilegiada a atuação do Juiz em suas principais competências funcionais: o conciliar, o instruir e o julgar. Sustenta-se a fixação de um único rito processual para os dissídios individuais, ressalvados os de rito especial, para atender ao princípio da concentração dos atos processuais, conjugado com a preocupação com a qualidade de vida do Magistrado, que não mais teria a tarefa – meramente burocrática – de receber a defesa e documentos que a instruem, permitindo que ocupe seu tempo, cada vez mais exíguo, nas atividades que exigem sua exclusiva atuação. (COMISSÃO 3: RECONFIGURAÇÃO DO PROCESSO DO TRABALHO E VALORIZAÇÃO SISTÊMICA DAS DECISÕES DO JUIZ ORIGINÁRIO

o Processo Judicial Eletrônico (Pje) e a Necessária Reformulação Da Clt

Embed Size (px)

DESCRIPTION

artigo.

Citation preview

Page 1: o Processo Judicial Eletrônico (Pje) e a Necessária Reformulação Da Clt

TESE: O PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO (PJE) E A NECESSÁRIA REFORMULAÇÃO DA CLT QUANTO AO PROCESSAMENTO DOS DISSÍDIOS INDIVIDUAIS

AUTOR E RESPONSÁVEL PELA DEFESA: CARLOS ALBERTO PEREIRA DE CASTRO

EMENTA: A implantação do PJE-JT é uma realidade já existente para algumas Varas e uma situação iminente para as demais. Tais mudanças devem vir acompanhadas de uma fundamental e urgente modificação da legislação processual trabalhista, com vistas a acompanhar as novidades que o PJE traz, mas principalmente, para que seja privilegiada a atuação do Juiz em suas principais competências funcionais: o conciliar, o instruir e o julgar. Sustenta-se a fixação de um único rito processual para os dissídios individuais, ressalvados os de rito especial, para atender ao princípio da concentração dos atos processuais, conjugado com a preocupação com a qualidade de vida do Magistrado, que não mais teria a tarefa – meramente burocrática – de receber a defesa e documentos que a instruem, permitindo que ocupe seu tempo, cada vez mais exíguo, nas atividades que exigem sua exclusiva atuação.

(COMISSÃO 3: RECONFIGURAÇÃO DO PROCESSO DO TRABALHO E VALORIZAÇÃO SISTÊMICA DAS DECISÕES DO JUIZ ORIGINÁRIO

Florianópolis, abril de 2012

Page 2: o Processo Judicial Eletrônico (Pje) e a Necessária Reformulação Da Clt

TESE: O PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO (PJE) E A NECESSÁRIA REFORMULAÇÃO DA CLT QUANTO AO PROCESSAMENTO DOS DISSÍDIOS

INDIVIDUAIS

A implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJE) na Justiça do Trabalho é uma realidade já existente para algumas Varas do Trabalho e uma situação iminente para todas as demais. A meta para 2012 é instalar o sistema em pelo menos 10% das Varas do Trabalho de cada um dos 24 Tribunais Regionais do Trabalho. Além disso, pelo menos 20% dos magistrados e servidores deverão ser capacitados no uso da tecnologia.1

Trata-se de avançar na utilização de recursos tecnológicos para aprimorar o modelo processual existente, visando eliminar processos de trabalho nas Unidades Judiciárias de modo a permitir que servidores das Secretarias das Varas e dos Serviços de Distribuição posssam ser aproveitados em atividades mais ligadas ao trabalho intelectual, permitir maior celeridade no andamento dos feitos, reduzir ou eliminar problemas que antes existiam, como o extravio de autos, a necessidade de “dar carga” aos advogados, de remessa de autos ao Ministério Público, de extração de peças para Cartas Precatórias, entre outras características do processo físico, “de papel”.Porém, a ideia de utilizar meios tecnológicos como instrumentos para a realização dos atos processuais deve ser vista “não apenas como mero meio auxiliar no exercício da jurisdição, mas sim de um modo muito mais profundo, resultando na produção de atos processuais de modo distinto do processo convencional”.2

Na visão que se pretende sustentar nesta tese, tais mudanças devem vir acompanhadas de uma fundamental e urgente modificação da legislação processual trabalhista, com vistas a acompanhar as novidades que o PJE traz, mas principalmente, para que seja privilegiada a atuação do Juiz de primeiro grau em suas principais competências funcionais: o conciliar, o instruir e o julgar.O próprio Tribunal Superior do Trabalho, ao publicar seu Plano Estratégico para o período 2010-2014, identificou como um dos pontos negativos da atuação daquele Pretório (e da Justiça do Trabalho como um todo, por certo) a existência de uma “legislação processual ineficiente, levando à morosidade do julgamento do processo judicial trabalhista”.3

O presente trabalho não visa esgotar as situações concretas em que tal mudança se mostra importante, mas apenas propor alterações em dispositivos da CLT que tratam dos ritos processuais dos dissídios individuais trabalhistas, sem prejuízo de outros tópicos em que alterações legislativas sejam consideradas apropriadas.A IDEIA DE RITO PROCESSUAL ÚNICO PARA OS DISSÍDIOS INDIVIDUAISSustenta-se, em síntese, a fixação de um único rito processual para os dissídios individuais na Justiça do Trabalho, ressalvados os procedimentos de rito especial, como as ações de consignação em pagamento, habeas corpus, mandados de segurança e as previstas em outros regramentos específicos.Para tanto, busca-se a fundamentação nos princípios processuais da concentração dos atos processuais e da duração razoável do processo.4

1 BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA PRIMEIRA REGIÃO. Definido o cronograma de implantação do PJE-JT no primeiro semestre. Disponível em http://trt-01.jusbrasil.com.br/noticias/3028992/definido-o-cronograma-de-implantacao-do-pje-jt-no-1-semestre. Acesso em 15.abr.2012.2 BENUCCI, apud BRANDÃO, Cláudio Mascarenhas. Processo Eletrônico na Justiça do Trabalho. In: CHAVES, Luciano Athayde (org.). Curso de Processo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2009, p. 668.3 BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Resolução Administrativa nª 1.463, de 1.jul.2011. Disponível em http://www.tst.jus.br/documents/10157/7e60d7c4-a469-43ed-9aa0-dd3bcff138a9. Acesso em 15.4.2012.4 “A concentração dos atos processuais é medida que se destina, essencialmente, a atender a necessidade de rápida solução do conflito de interesses – anseio que jamais seria atingido se muitos dos atos

Page 3: o Processo Judicial Eletrônico (Pje) e a Necessária Reformulação Da Clt

A inovação trazida pela Lei 9.957/2000, estabelecendo um rito processual que se presumia mais célere (denominado “sumaríssimo”), não gerou o resultado esperado pelo legislador, por diversos fatores, entre os quais se pode destacar o fato de que, diferentemente do que aconteceu em outros ramos do Judiciário (Justiça Federal e Justiças Estaduais) em que se inspirou a medida (a Lei dos Juizados Especiais), a implementação de um rito “sumaríssimo” na Justiça do Trabalho não veio acompanhada da criação de novas Unidades Judiciárias (como os Juizados Especiais, criados nos ramos antes citados), é dizer, impondo aos Juízes de primeiro grau, tão somente, prazos mais curtos de solução dos litígios, sem lhes conferir qualquer melhoria da estrutura organizacional ou aumento do número de Magistrados capaz de dar cobro à previsão legal de decisão do feito em apenas 15 dias!Os advogados das partes, inicialmente talvez até acreditando na novidade processual, ajuizaram ações trabalhistas sob tal rito em quantidade considerável, nos primeiros anos de sua vigência. No entanto, com o passar dos anos, notou-se que:- em algumas Unidades Judiciárias praticamente não há ações ajuizadas sob o rito sumaríssimo, visto que os prazos para marcação de audiências iniciais e de instrução no rito ordinário praticamente se aproximam dos prazos previstos para aquele rito, tornando o procedimento pouco útil;- em outras Unidades, os advogados relutam em ajuizar demandas sob tal rito, visto que a sistemática processual nem sempre lhes permite atuar do modo que consideram adequado (um dos exemplos mais citados é a necessidade de manifestação sobre a defesa e documentos trazidos pelo(s) réu(s) na própria audiência) e pela dificuldade em se saber qual será a necessidade de produção de prova testemunhal;- por outra vertente, a principal medida originalmente prevista na Lei, que limitava a demanda a dois graus de jurisdição, foi modificada durante o processo legislativo de aprovação do texto, passando a permitir o recurso ao TST;- a própria Lei, ou a interpretação a ela conferida, faz com que os advogados exerçam uma “opção” pelo rito ordinário, bastando que incluam, na inicial, um pedido que seja “inestimável”, como danos morais, para elevar o valor da causa para mais de 40 salários mínimos.Todas essas observações não envolvem, ainda, o chamado PJE.Trazido o problema para a implantação do referido modelo, tem-se novos questionamentos ou enfrentamentos. Nos procedimentos vigentes (tanto ordinário como sumaríssimo), a parte demandada leva a defesa e os documentos em arquivos no formato PDF, fazendo uso de uma mídia física (pen drive ou similar), para juntar em audiência, caso não haja acordo; o assistente de audiência então realiza a inclusão de tais arquivos no PJE. Excluída a proposta conciliatória, a juntada de defesa e documentos é um ato de mero expediente, que poderia ser feito fora da audiência, antes dela, via peticionamento eletrônico. Entretanto, como ocorre em audiência, é possível que:- os arquivos estejam corrompidos;- os arquivos estejam com vírus; ou - haja alguma incompatibilidade entre a mídia e o terminal de computador da Vara.Tais problemas inviabilizam a juntada e, consequentemente, a realização da audiência, caso o rito seja o sumaríssimo, gerando mais morosidade pelo adiamento do feito – ou, caso se adote outra interpretação, haveria preclusão da produção de prova documental pelo réu, que teria de se defender oralmente, com sérios prejuízos ao direito de defesa e possível alegação de cerceamento.

processuais não pudessem, por exemplo, ser aglutinados numa só audiência” (TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Manual da Audiência na Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr, 2010, p. 61).

Page 4: o Processo Judicial Eletrônico (Pje) e a Necessária Reformulação Da Clt

O advogado da parte autora, por seu turno, que já tem dificuldade em analisar a defesa no processo dito físico, pode ter ainda mais dificuldades com o meio eletrônico, como por exemplo, o escaneamento ilegível de documentos, ou os problemas relacionados com a veracidade da assinatura aposta pelo trabalhador nestes.Quanto ao rito ordinário, o atual ordenamento exige que se realize uma tentativa conciliatória no início da audiência, antes da apresentação da defesa. Daí, se atribui prazo ao autor para manifestação e marca-se nova audiência, para a instrução do feito (e julgamento). Ocorre que os mesmos problemas já salientados quanto à juntada de arquivos em PDF se verificam no rito ordinário, com geração de incidentes processuais desnecessários, caso se estabelecesse outro ritual.Não se questiona a importância de se buscar a solução pacífica dos conflitos trabalhistas. Porém, a realidade dos números registra que a audiência inicial não tem se prestado a esse tão almejado fim, acarretando tão somente maior número de audiências realizadas, porém sem nenhum efeito prático para os prefalados princípios processuais. Como bem frisado pela ilustre colega Olga Fortes, Juíza Substituta do quadro do TRT da 2a

Região, tentamos adotar o modelo de gestão de processos de trabalho para otimizar nosso tempo, mas a verdade é que “sofremos da ausência de tempo para nos reorganizarmos segundo o novo modelo” o que resulta, dentre outros fatores, da quantidade de audiências realizadas em média pelos Juízes do Trabalho em primeiro grau.5

Vista a questão sob o ponto de vista do jurisdicionado, a audiência conciliatória do rito ordinário, quando não ocorre o acordo, constitui demanda de tempo (e gasto financeiro) desnecessário, sendo mesmo difícil para o trabalhador (e para o tomador de serviços) compreender a razão da obrigatoriedade de comparecimento a uma audiência que dura, em média, cerca de dez minutos, em que apenas (1) são registradas as presenças, (2) se é indagado sobre a possibilidade de conciliação – sendo que os próprios advogados das partes, na maioria das vezes, não estudaram o processo sequer para fazer uma proposta – e (3) se recebe a defesa e os documentos, marcando-se nova audiência para a instrução.Deve-se lembrar, também sob tal ótica, que muitas vezes o trabalhador, em tal audiência “inicial”: (1) se encontra desempregado, sem renda portanto, e se vê obrigado a comparecer à sede do Juízo, com dispêndio de recursos que podem lhe fazer falta; ou (2) pode estar em um novo emprego, do qual precisará pedir dois dias de dispensa do ponto – um para a audiência inicial, outro para a de instrução – sendo que a primeira não lhe traz qualquer proveito prático.Visto pelo ponto de vista do Magistrado (e o que se discute neste Conamat, entre outros pontos, é justamente a preocupação com a qualidade de vida do Juiz), geralmente assoberbado por uma pauta que lhe consome grande parte do tempo – com prejuízo, portanto, das demais atividades jurisdicionais, da realização da carga horária exigida em formação continuada perante as Escolas Judiciais ou, pior que isso, com o sacrifício do tempo de descanso e desfrute do convívio familiar e social – a supressão da audiência meramente conciliatória do rito ordinário acarretaria uma otimização do tempo em que o Juiz está envolvido com o seu trabalho, deixando este de ser um mero recebedor de defesas e documentos. Não haveria supressão da tentativa de conciliação: ela apenas seria postergada para após a produção da defesa e a juntada dos documentos pelo tomador dos serviços demandado, em audiência única, quando as partes já estão cientes de que, não havendo acordo, a instrução se daria na mesma oportunidade. Num exercício meramente empírico, considerando que se tenha, por dia, seis audiências iniciais de rito ordinário, cada uma com a duração média de dez minutos, esse “ganho” de tempo equivaleria a uma hora diária de

5 FORTES, Olga Vishnevsky. Conciliação. Disponível em http://ww1.anamatra.org.br/artigos. Acesso em 15.abr.2012.

Page 5: o Processo Judicial Eletrônico (Pje) e a Necessária Reformulação Da Clt

trabalho, suficiente para a produção de atos processuais ou tarefas realmente indelegáveis do Juiz (conciliar, instruir, julgar, despachar, etc.).Desta forma, vislumbra-se como razoável a alteração do momento processual em que se tenta a conciliação para após a produção da defesa, que seria juntada por peticionamento eletrônico, em prazo assinado por lei, antes da realização da audiência.Em linhas gerais, a ideia envolve:1) a modificação dos artigos 847 e 848 da CLT, de modo a estabelecer que a defesa do réu

será apresentada mediante petição, acompanhada dos documentos que a instruem, no prazo de 15 dias contados do recebimento da citação, mantendo-se a audiência para fins de conciliação, instrução e julgamento; e

2) a adoção de um único rito processual trabalhista, que já seria mais célere, pela desnecessidade de se estabelecer a audiência inicial do atual rito ordinário.

À GUISA DE ENCAMINHAMENTOAnte o exposto, sugere-se que a ANAMATRA defenda a modificação dos ritos processuais previstos na CLT e na Lei 5.584/70, criando-se um único rito de modo a tornar novamente a existir uma só audiência para fins de conciliação, instrução e julgamento, rito este em que todos os demais atos processuais relativos à defesa do réu, juntada de documentos e réplica da parte autora ocorreriam antes de tal audiência.Com isso, estariam atendidas duas finalidades: a primeira, de melhoria da prestação jurisdicional e do acesso à Justiça, visto que o jurisdicionado teria simplificado o seu comparecimento à Unidade Judiciária, com a realização de uma só audiência e com efeitos concretos sobre a duração da fase de conhecimento, que poderia ser reduzida ante a redução de processos em pauta; e a segunda, de melhoria das condições de trabalho do próprio Juiz de primeiro grau, que não teria de ocupar seu tempo com audiências iniciais em que raramente se obtém a conciliação, concentrando seus esforços na solução dos litígios, seja pela conciliação seja pelo ato de julgar, apenas modificando-se o rito processual para atender ao princípio da concentração dos atos processuais, conjugado com a preocupação com a qualidade de vida do Magistrado, que não mais teria a tarefa – meramente burocrática – de receber a defesa e documentos que a instruem, permtindo que ocupe seu tempo, cada vez mais exíguo, nas atividades que exigem sua exclusiva atuação.Florianópolis, 15 de abril de 2012.

REF. BIBLIOGRÁFICAS

- BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA PRIMEIRA REGIÃO. Definido o cronograma de implantação do PJE-JT no primeiro semestre. Disponível em http://trt-01.jusbrasil.com.br/noticias/3028992/definido-o-cronograma-de-implantacao-do-pje-jt-no-1-semestre. Acesso em 15.abr.2012.

- BRASIL. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Resolução Administrativa nª 1.463, de 1.jul.2011. Disponível em http://www.tst.jus.br/documents/10157/7e60d7c4-a469-43ed-9aa0-dd3bcff138a9. Acesso em 15.4.2012.

- CHAVES, Luciano Athayde (org.). Curso de Processo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2009.- FORTES, Olga Vishnevsky. Conciliação. Disponível em http://ww1.anamatra.org.br/artigos. Acesso em

15.abr.2012.- TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Manual da Audiência na Justiça do Trabalho. São Paulo: LTr,

2010.

AUTOR DA TESE E RESPONSÁVEL PELA DEFESA:CARLOS ALBERTO PEREIRA DE CASTRO – Juiz titular, associado da AMATRA 12.

EMAIL: [email protected]