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WWW.OBESIDADEEMAGRECIMENTO.BLOGSPOT.COM.BR ¹ Graduando em Psicologia (9° semestre); Estagiando em um núcleo de tratamento clínico e cirúrgico da obesidade. Contato: [email protected] ² Psicóloga especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental e Obesidade e Emagrecimento, atuando no tratamento clínico e cirúrgico da obesidade. Autora do blog: www.obesidadeemagrecimento.blogspot.com.br Contato: [email protected] CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA SISTÊMICA PARA O ESTUDO DA OBESIDADE Por Anderson Cardeal¹ e Psicóloga Daniela Souza² Atualmente, existem diversos estudos que abordam o ambiente familiar de pessoas com transtornos alimentares, porém a literatura aponta uma escassez de estudos que relacionem o funcionamento familiar, obesidade e Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Este tema é muito importante para o tratamento da obesidade ao identificar tanto as causas e manutenções do ganho de peso, como apontar as dificuldades de adesão terapêutica desses indivíduos. Pode-se citar a dissertação de mestrado de Ana Flávia Otto, publicado em 2009, na qual, juntamente com a Doutora Maria Alexina Ribeiro, investigaram a dinâmica familiar de pessoas com obesidade grave a partir do arcabouço teórico da Abordagem Sistêmica. O estudo realizou pesquisa tanto quantitativa como qualitativa, apresentando dois interessantes estudos de caso. Otto & Ribeiro (2009) destacaram diversas pesquisas sobre o tema. Em uma delas, abordou a percepção de crianças obesas em relação aos seus pais: “as mães eram apontadas como dominadoras e os pais como passivos e sem envolvimento”. Em outra citação, afirmaram que em muitas famílias com crianças obesas é dada ênfase à lealdade da criança ao sistema familiar à custa da sua própria autonomia e falou também da dificuldade que essas famílias têm no processo de individuação e em lidar com as diferenças. Em outro estudo, referido pelas autoras, abordaram as percepções de famílias com obesidade infantil e famílias com peso eutrófico: nas famílias de obesos ocorriam mais conflitos e os membros eram menos interessados em atividades sociais e culturais, além de serem mais dependentes e menos suportivos. Pode-se destacar a importância atribuída à dinâmica familiar no estudo da obesidade, atribuindo como uma das causas e manutenção da obesidade a disfunção desse sistema. Na obesidade infantil, esse aspecto citado torna-se mais claro, já que nessa fase do desenvolvimento, a criança ainda depende dos cuidados parentais, com a sua independência ainda em formação, tendendo a lealdade ao seu sistema familiar. Obesidade infantil: Nesse estágio da vida, destacamos as seguintes situações consideradas influentes na obesidade: Mães apontadas como dominadoras e excessivamente protetoras e pais passivos e sem envolvimento no assunto; Ênfase à lealdade da criança ao sistema; Dificuldade no processo de individuação e em lidar com as diferenças, dificultando assim o contato com novos sistemas; Recorrência de conflitos, menos interesse em atividades sociais e culturais; Relação fusionada entre a mãe e os filhos (Otto & Ribeiro, 2009). Já na obesidade adulta, a questão é o quanto esse individuo conseguiu se desenvolver e conquistar a sua independência. É importante investigar, qual a estratégia utilizada para construir a sua individuação e dar continuidade a um novo ciclo de vida, apesar da dinâmica familiar poder se apresentar de forma disfuncional. Isso permitirá um crescimento emocionalmente saudável e próspero. Caso contrário os resultados poderão ter consequências danosas, conforme apresentado no texto em questão. Obesidade adulta: Já nessa fase, observamos nas dinâmicas familiares: Rigidez; superproteção; evitação do conflito, isolamento social, assertividade e raiva inibidas, baixa expressão de sentimentos, triangulação. Como exemplo, pode-se citar o 1° estudo de caso sobre a Família Oliveira: Trata-se da família de Carlos Oliveira, 38 anos, taxista, paciente com obesidade que está se preparando para a cirurgia bariátrica no Hospital Universitário de Brasília. O grupo familiar é composto por: Carlos, sua mãe D. Lila, seus 8 irmãos, 4 cunhadas, 2 cunhados e 15 sobrinhos.

Obesidade e sistêmica

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¹ Graduando em Psicologia (9° semestre); Estagiando em um núcleo de tratamento clínico e cirúrgico da obesidade.Contato: [email protected]² Psicóloga especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental e Obesidade e Emagrecimento, atuando no tratamento clínico e cirúrgico da obesidade.Autora do blog: www.obesidadeemagrecimento.blogspot.com.brContato: [email protected]

CONTRIBUIÇÕES DA TEORIA SISTÊMICA PARA O ESTUDO DA OBESIDADE

Por Anderson Cardeal¹ e Psicóloga Daniela Souza²

Atualmente, existem diversos estudos que abordam o ambiente familiar de pessoas com transtornos alimentares, porém a literatura aponta uma escassez de estudos que relacionem o funcionamento familiar, obesidade e Transtorno de Compulsão Alimentar Periódica (TCAP). Este tema é muito importante para o tratamento da obesidade ao identificar tanto as causas e manutenções do ganho de peso, como apontar as dificuldades de adesão terapêutica desses indivíduos. Pode-se citar a dissertação de mestrado de Ana Flávia Otto, publicado em 2009, na qual, juntamente com a Doutora Maria Alexina Ribeiro, investigaram a dinâmica familiar de pessoas com obesidade grave a partir do arcabouço teórico da Abordagem Sistêmica. O estudo realizou pesquisa tanto quantitativa como qualitativa, apresentando dois interessantes estudos de caso.

Otto & Ribeiro (2009) destacaram diversas pesquisas sobre o tema. Em uma delas, abordou a percepção de crianças obesas em relação aos seus pais: “as mães eram apontadas como dominadoras e os pais como passivos e sem envolvimento”. Em outra citação, afirmaram que em muitas famílias com crianças obesas é dada ênfase à lealdade da criança ao sistema familiar à custa da sua própria autonomia e falou também da dificuldade que essas famílias têm no processo de individuação e em lidar com as diferenças. Em outro estudo, referido pelas autoras, abordaram as percepções de famílias com obesidade infantil e famílias com peso eutrófico: nas famílias de obesos ocorriam mais conflitos e os membros eram menos interessados em atividades sociais e culturais, além de serem mais dependentes e menos suportivos.

Pode-se destacar a importância atribuída à dinâmica familiar no estudo da obesidade, atribuindo como uma das causas e manutenção da obesidade a disfunção desse sistema. Na obesidade infantil, esse aspecto citado torna-se mais claro, já que nessa fase do desenvolvimento, a criança ainda depende dos cuidados parentais, com a sua independência ainda em formação, tendendo a lealdade ao seu sistema familiar. Obesidade infantil: Nesse estágio da vida, destacamos as seguintes situações consideradas influentes na obesidade: Mães apontadas como dominadoras e excessivamente protetoras e pais passivos e sem envolvimento no assunto; Ênfase à lealdade da criança ao sistema; Dificuldade no processo de individuação e em lidar com as diferenças, dificultando assim o contato com novos sistemas; Recorrência de conflitos, menos interesse em atividades sociais e culturais; Relação fusionada entre a mãe e os filhos (Otto & Ribeiro, 2009).

Já na obesidade adulta, a questão é o quanto esse individuo conseguiu se desenvolver e conquistar a sua independência. É importante investigar, qual a estratégia utilizada para construir a sua individuação e dar continuidade a um novo ciclo de vida, apesar da dinâmica familiar poder se apresentar de forma disfuncional. Isso permitirá um crescimento emocionalmente saudável e próspero. Caso contrário os resultados poderão ter consequências danosas, conforme apresentado no texto em questão.Obesidade adulta: Já nessa fase, observamos nas dinâmicas familiares: Rigidez; superproteção; evitação do conflito, isolamento social, assertividade e raiva inibidas, baixa expressão de sentimentos, triangulação.

Como exemplo, pode-se citar o 1° estudo de caso sobre a Família Oliveira: Trata-se da família de Carlos Oliveira, 38 anos, taxista, paciente com obesidade que está se preparando para a cirurgia bariátrica no Hospital Universitário de Brasília. O grupo familiar é composto por: Carlos, sua mãe D. Lila, seus 8 irmãos, 4 cunhadas, 2 cunhados e 15 sobrinhos.

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¹ Graduando em Psicologia (9° semestre); Estagiando em um núcleo de tratamento clínico e cirúrgico da obesidade.Contato: [email protected]² Psicóloga especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental e Obesidade e Emagrecimento, atuando no tratamento clínico e cirúrgico da obesidade.Autora do blog: www.obesidadeemagrecimento.blogspot.com.brContato: [email protected]

Essa família apresenta um histórico de doenças relacionadas à obesidade. Nas quatro gerações ocorre obesidade, hipertensão arterial, diabetes, hipotireoidismo cardiopatia. A história da obesidade na família nos revela uma característica transgeracional desse sintoma. Familiares tanto da mãe quanto do pai de Carlos são obesos e apresentam doenças associadas. Esse sintoma na família (obesidade), tem o papel de manter a estabilidade emocional da família através das gerações.

Na família todos os filhos obesos desenvolveram o sintoma após os 20 anos. Nos homens relacionados ao sedentarismo e na mulher ligação com a gestação. A família tem dificuldade de adaptação ao ciclo de vida, pois, estando no estágio “tardio de vida”, não conseguiram concluir a fase anterior “lançando os filhos e seguindo em frente”. Essa dificuldade com os ciclos de vida interferem na busca do individuo da sua autonomia e diferenciação da família de origem.

A família de Carlos organiza-se de forma a dificultar a saída de seus filhos de casa. A mãe D. Lila, mantém todo o sistema sob o seu domínio. Três filhos adultos permanecem morando com a mãe, o que demonstra a dificuldade de se afastar da família de origem e assumir uma vida mais autônoma.

A maior característica do sistema de relações da família Oliveira é a aglutinação, na qual suas fronteiras internas são difusas e as fronteiras externas são rígidas. Sua comunicação é abundante e confusa, com todos falando ao mesmo tempo, sem respeitar o espaço do outro. Os membros começam a engordar quando iniciam as suas vidas laborais, após os casamentos, além dos filhos (agravante para as mulheres), existindo também a ampliação dos sistemas de convivência. Essa família encontra-se no “estado tardio davida”, na qual a matriarca é centralizadora, cuidadora e superprotetora. A família não consegue se adaptar ao estágio do ciclo da vida “lançando os filhos e seguindo em frente”. É necessário estabelecer contornos nas relações para que essas sejam saudáveis e duradouras e que as interferências sejam mínimas, ou seja, as fronteiras devem ser nítidas e não difusas ou rígidas.

Otto & Ribeiro (2009) nos convida a pensar na obesidade de forma diferente, sem desconsiderar o que já foi aprendido até hoje pela medicina e demais áreas da saúde. As autoras abordam a importância multiprofissional no tratamento à pacientes obesos, com um foco novo paradigmático, indicando a importância do estudo das relações familiares e as repercussões em cada membro desse sistema.

O texto esclarece a necessidade de observar os indivíduos nos seus sistemas diversos, e, a partir disso, construir mudanças que preferencialmente permitirá a cada membro um processo saudável de individuação. Processo esse que a psicologia sistêmica considera extremamente importante para o desenvolvimento do indivíduo.

Texto base para produção:OTTO, A. F. N. ; RIBEIRO, M. A. . Obesidade e Transtorno da Compulsão Alimentar (TCAP): um estudo sobre a dinâmica familiar do paciente 2009 (Artigo publicado no Repositório da Biblioteca da Universidade Católica de Brasília).