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Número 3 | Novembro 2015
OS VALORES DA FLORESTA
No dicionário a palavra valor tem diversos significados,
desde o pagamento de algo por meio de bens, serviços
ou dinheiro, passando por valentia, coragem, utilidade e
préstimo, chegando à qualidade que confere a um obje-
to material a natureza de bem econômico.
Há 3 anos, o Imaflora denominou um conjunto de ações
na Amazônia brasileira de Florestas de Valor para des-
tacar as riquezas da sociobiodiversidade que coexistem
nas grandes florestas protegidas do Norte do país, um
país tão grande que mal consegue compreender sua di-
versidade e seu potencial. Era preciso mobilizar, ouvir,
apoiar a organização de comunidades para se planejar
um futuro, um tempo de mais valor para tudo e todos.
Se já sabemos que as florestas têm seu valor, o que ima-
ginar das pessoas que nela vivem e tiram seu sustento,
além de prover com matéria-prima as indústrias e os
mercados. Por isso, o Florestas de Valor se preocupou
em fazer brilhar não apenas o valor do trabalho de extra-
tivistas, quilombolas, indígenas e agricultores, mas suas
qualidades físicas, intelectuais e morais, que fazem
desses homens e mulheres corajosos.
Neste período 3400 pessoas foram envolvidas direta-
mente no projeto em treinamentos em boas práticas de
manejo, ações de agregação de valor aos produtos do
extrativismo, sensibilização sobre consumo consciente
de produtos florestais, geração de renda, sistemas sus-
tentáveis de produção, organização comunitária, entre
outros temas. Cerca de 500 famílias foram beneficia-
das diretamente com aumento de renda e melhorias
na qualidade de vida. O que ajudou a conservar 40 mi-
lhões de hectares de áreas públicas protegidas. O maior
aprendizado do processo foi o exercício do diálogo, que
fomentou parcerias comerciais éticas entre empresas e
produtores, além de colocar do mesmo lado todos os
envolvidos nas cadeias produtivas.
Ao completar duas décadas de existência, o Imaflora fe-
cha o primeiro ciclo do Floresta de Valor comemorando
as conquistas concretas e claras e também as experiên-
cias e o amadurecimento no percurso dos projetos. “Eles
(extrativistas, agricultores e quilombolas) tinham expec-
tativas e trabalhamos para viabilizá-las, foi um amadu-
recimento muito grande para a equipe e ampliação de
sua expertise”, relata Eduardo Trevisan Gonçalves, secre-
tário-executivo-adjunto do Imaflora.
E a missão em prol das florestas, do comércio ético, do
bem-estar e desenvolvimento das comunidades não
acabou como acabam os filmes, com ou sem final feliz.
Ao contrário, cada experiência acumulada confirmou
que o Imaflora está no caminho certo, por isso, também
inspirou os próximos dez anos de seu plano estratégico.
O Imaflora acredita na conciliação entre conservação
da biodiversidade, fornecimento de bens e serviços am-
bientais de forma sustentável com garantias para as po-
pulações locais das áreas protegidas públicas da Ama-
zônia, contribuindo para o desenvolvimento sustentável
dos municípios onde estão localizados. E que tudo isso,
vai ajudar a acabar com a pobreza e a exclusão dos agri-
cultores familiares e extrativistas, fundamentais para a
conservação da Amazônia.
Realização:
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Uma das maiores riquezas brasileiras ainda é ignorada
por parte da população, que desconhece a relevância
de se proteger e conservar as Unidades de Conservação
da Natureza (UCs), como reservas extrativistas, florestas
nacionais e parques. Entre os esforços do Imaflora no
projeto Florestas de Valor está o de conscientizar o bra-
sileiro sobre esse patrimônio natural e cultural.
“Há muitas riquezas no Brasil que passam despercebi-
das pela maior parte da população, como as áreas pro-
tegidas destinadas a conservar nossa biodiversidade e
culturas de povos da floresta. Estamos trabalhando para
que o brasileiro reconheça os parques, reservas e flores-
tas como seu patrimônio e algo a ser protegido, como
são o Cristo Redentor, prédios históricos e os demais
monumentos em todo o país”, diz Roberto Palmieri, ge-
rente de projetos do Imaflora.
O trabalho inclui influenciar políticas públicas e divul-
gar a importância socioambiental dessas unidades, que
contribuem para a regulação climática, como o regi-
me pluviométrico, a manutenção do modo de vida dos
povos indígenas e de populações tradicionais e com o
fornecimento de matéria-prima para produção de bens
para toda a sociedade.
Para o Imaflora, a melhor maneira de manter a floresta
em pé e proteger as Unidades de Conservação é utili-
zando seus recursos de forma racional e sustentável. “As
áreas não precisam ficar intocáveis ou improdutivas. É
possível conciliar conservação com o uso sustentável
como já acontece em muitos locais. Se temos popula-
ções manejando de forma sustentável essas florestas,
nós temos pessoas zelando por elas todos os dias”, afir-
ma Palmieri.
UNIDADES DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA SÃO PATRIMÔNIOS DOS BRASILEIROS
Mais de 1 milhão de brasileiros vivem e obtém sua renda
diretamente do manejo das florestas de áreas protegi-
das, que fornece matéria-prima e produtos para a indús-
tria alimentícia, fármacos e cosméticos responsável por
significativo parte dos empregos e PIB (Produto Interno
Bruto) do país.
O Imaflora atua desde 2006 nas Florestas Estaduais do
Trombetas, do Paru e de Faro, Floresta Nacional Saracá-
-Taquera e Reserva Biológica Trombetas localizadas na
Calha Norte paraense e, desde 2010, nas reservas extra-
tivistas Riozinho do Anfrísio, Rio Iriri e Rio Xingu (Terra
do Meio).
Várias dessas áreas são desconhecidas da população de
outros Estados e regiões e, às vezes, do próprio Estado
do Pará, o que não diminui sua importância ecológica
no restante do país, seja como fonte de serviços am-
bientais ou produtos agrícolas e florestais.
Foto: Rafael Salazar
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cário e Rede Pro-UCs - lançou a Coalizão Pró-Unidades
de Conservação.
“A ideia é aliar os esforços de conservação de forma co-
ordenada com governos, comunidades, sociedade civil
e empresas, buscando soluções dialogadas e equilibra-
das para diferentes interesses”, diz Palmieri.
As Unidades de Conservação (UCs) correspondem a
10% do território nacional, mas vivem pressionados pelo
avanço da agricultura e pecuária, grileiros, desmata-
mento ilegal, furtos de madeira e outras ameaças. Pen-
sando em conscientizar o cidadão sobre a necessidade
de proteção, uso, manutenção e recuperação das UCs,
o Imaflora - em parceria com a SOS Mata Atlântica, Se-
meia, WWF, Conservação Internacional, Fundação Boti-
COALIZÃO PRÓ-UNIDADES DE CONSERVAÇÃO
CONGRESSO BRASILEIRO DE UCS
Em setembro, o Imaflora participou do Congresso Bra-
sileiro de Unidades de Conservação (CBUC), principal
evento nacional sobre unidades de conservação (UCs).
Durante o congresso foi lançado o livro “Florestas de Va-
lor: O Uso Sustentável como Estratégia para Áreas Pro-
tegidas” e o “Guia para Comercialização Ética em Áreas
Protegidas”.
O Congresso reuniu mais de 1.200 representantes de
diversos setores envolvidos com o tema, como ONGs,
governos, empresas e universidades. Mais de 1.000 vi-
sitantes passaram pelo estande do Imaflora onde várias
atividades foram promovidas, como nove palestras so-
bre as ações do projeto Florestas de Valor. Os técnicos
do Instituto relataram as experiências de valorização das
populações locais com a promoção do uso sustentável
das unidades de conservação, geração de renda a partir
das atividades econômicas tradicionais, além das práti-
cas da agroecologia. Também teve destaque as certifica-
ções e a verificação de produtos e de carbono, que são
parte da estratégia da instituição. Fotos: Marina Jordão
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O debate teve a presença da diretora do Instituto Pau-
lo Martins, de Belém do Pará, Joanna Martins, além de
Patrícia Cota Gomes, coordenadora de projetos e mer-
cados florestais do Imaflora e das representantes das
comunidades Quilombolas de Oriximiná (PA), Dilena Pi-
nheiro, Suelen Oliveira e Lourdes Oliveira.
As quilombolas de Oriximiná ministraram uma oficina
de culinária com preparação de peixe ao leite de casta-
nha e doce de castanha, no dia 22 de outubro. No dia 23,
a oficina ficou a cargo de Lorena Mangabeira, analista
de qualidade do Imaflora e paraense, que apresentou os
segredos do arroz paraense.
A região amazônica é tradicional pela culinária que usa
castanha-do-Brasil, peixes e caças diversas, cupuaçu,
cacau, açaí e mandioca, entre outros. A riqueza da flo-
resta é base da alimentação local, que vem sendo pre-
servada ao longo das gerações.
Exposição
A Exposição “Amazônia Está Aqui”, que ficou na praça
da área externa do Sesc, reuniu informações sobre a
Amazônia, a importância das cadeias de produtos da
sociobiodiversidade para a conservação da floresta e
geração de renda para as populações locais. A exposi-
ção demonstrou a relação entre o fortalecimento dessas
cadeias e a conservação da Amazônia e, ainda, destacou
como escolhas conscientes de consumo das populações
do Sudeste – mesmo ocorrendo tão longe da floresta -
podem interferir nessa dinâmica. Mais de 1.200 pessoas
visitaram a exposição durante o período do evento.
Não é só a água das chuvas que a Amazônia brasileira
fornece para outras regiões do país. Muitos dos produ-
tos consumidos no Sudeste têm matéria-prima vinda do
outro extremo do país. Ao estilo tão longe-tão perto, a
primeira edição do evento A Amazônia está aqui – re-
alizado pelo Projeto Florestas de Valor do Imaflora em
parceria com o Sesc Piracicaba, de 18 a 31 de outubro –
desenvolveu uma série de atividades culturais e culiná-
rias para demonstrar que a floresta Amazônica está bem
mais perto do que as comunidades urbanas imaginam,
em especial Piracicaba e região.
Para o Imaflora, aproximar a Amazônia e o Sudeste é o
caminho para a conservação da biodiversidade, a pro-
teção do modo de vida das populações tradicionais
amazônicas e dos povos indígenas. A programação foi
desenvolvida para sensibilizar os participantes sobre
consumo consciente de produtos de origem florestal e
também trazer luz à presença da Amazônia no dia a dia
do cidadão do sudeste.
Uma apresentação de carimbó - manifestação de dan-
ça e música paraense – abriu a programação no dia 18,
reunindo Chico Malta e o Grupo Cobra Grande de Alter
do Chão, distrito de Santarém. A programação também
incluiu uma oficina sobre o carimbó, abordando aspec-
tos históricos, rítmicos e de dança dessa manifestação.
A culinária nortista foi destaque durante todo o perío-
do seja pelo debate Culinária e Amazônia: uma mistura
sustentável, que ocorreu no dia 21, ou pelos pratos pro-
duzidos pela comedoria do Sesc, que colocou em seu
cardápio vatapá, bolinho de piracuí, mousse de cupuaçu
com calda de cacau, bolo de macaxeira e outras delícias
da Amazônia.
A AMAZÔNIA ESTÁ AQUI - EDIÇÃO SESC PIRACICABA
Foto
: Mar
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Mo
rosi
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mentação escolar sejam destinados à compra de produ-
tos locais.
O cardápio atual inclui produtos processados como sal-
sicha e almôndegas enlatadas, que não fazem parte da
cultura alimentar da região. Desde 2011, as comunida-
des discutem formas de adequar o cardápio das escolas
à tradição gastronômica local uma herança quilombola
- e também de fornecer alimentos mais saudáveis para
as crianças.
As futuras localizações das unidades foram definidas
no primeiro semestre deste ano. Para serem usadas por
muitas comunidades, as UBAs ficarão em locais estraté-
gicos com fácil acesso e próximas às escolas com mais
alunos.
“Sem mercado, os extrativistas perdem os produtos na
roça ou precisam viajar horas de barco para tentar ven-
dê-los, o que também é uma ação incerta. Beneficiar lo-
calmente e fornecer às escolas irá valorizar a produção
local, aumentar a geração de renda para os agricultores
e possibilitar um cardápio mais nutritivo e adaptado à
realidade local para os estudantes”, diz o coordenador de
projetos do Imaflora.
EXTRATIVISTAS E AGRICULTORES DA CALHA NORTE SE PREPARAM PARA FORNECER SUA PRODUÇÃO PARA AS ESCOLAS LOCAIS
O beneficiamento de produtos da sociobiodiversidade
é uma das estratégias de comunidades quilombolas da
região da Calha Norte (PA) para conquistar o acesso ao
mercado da alimentação escolar. Para isso virar realida-
de, iniciou-se a construção de quatro Unidades de Be-
neficiamento de Alimentos (UBAs) com apoio técnico
do Imaflora, além da parceria do ICMBio (Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade) e o envolvi-
mento da prefeitura de Oriximixá.
Após período de instalação e adequação, as UBAs serão
gerenciadas pelas comunidades, por meio de suas insti-
tuições de base. Para a construção, instalação de máqui-
nas e equipamentos, treinamentos de pessoal e capaci-
tações voltadas à administração do empreendimento, a
iniciativa contou com recursos do Fundo Amazônia e
com o patrocínio da Petrobras, por meio do Programa
Petrobras Socioambiental.
Léo Ferreira, coordenador de projetos do Imaflora na
região da Calha Norte, explica que para poder forne-
cer produtos para a alimentação escolar os extrativistas
precisam atender às legislações específicas. As UBAs
poderão processar alimentos de origem animal e vege-
tal, como peixe, galinha caipira e polpas de frutas (açaí,
cupuaçu, acerola e taperebá) e produzir doces, assados,
bolos, polpas para sucos e uso culinário, entre outros
itens processados.
“A articulação para o fornecimento de alimento para as
escolas começou há quatro anos e reuniu comunidades,
prefeituras, ICMBio e outros órgãos, mas havia necessi-
dade de processar o alimento de acordo com a legisla-
ção sanitária”, diz Ferreira.
A proposta de inserir os produtos dos agricultores e ex-
trativistas locais na alimentação escolar está respaldada
pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE),
que determina que no mínimo 30% dos recursos da ali- Foto
: Raf
ael S
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SEMANA DO EXTRATIVISMO: MOMENTO DE BALANÇO E PLANEJAMENTO DA PRODUÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO NA TERRA DO MEIO
A 2ª Semana do Extrativismo - realizada em maio - foi
um momento de reflexão sobre a produção extrativista,
avaliação das metas alcançadas e sugestão de propostas
para alavancar o arranjo produtivo local e a comerciali-
zação conjunta da produção dos extrativistas e das po-
pulações indígenas vizinhas à região.
Realizado na localidade Roberto, dentro da Reserva Ex-
trativista do Rio Iriri (Resex Iriri) na região da Terra do
Meio (PA), o encontro reuniu extrativistas, empresas,
governos e organizações não governamentais, como o
Imaflora, na busca de melhorias e inovações que pro-
movam uma relação diferenciada entre os povos da flo-
resta, o Estado e as empresas que utilizam os produtos
da sociobiodiversidade.
A região possui grande potencial de produção de borra-
cha, castanha-do-brasil, óleo de copaíba, farinha e óleo
de babaçu, por isso, o foco do Florestas de Valor é forta-
lecer as cadeias de produtos com parcerias comerciais
diferenciadas, que valorizem as populações locais e seus
produtos.
“A expectativa das populações extrativistas e indígenas
que vivem na região é atrair empresas que estejam dis-
postas a construir modelos de negócio que respeitem
o modo de vida tradicional e que valorizem a produ-
ção extrativista. Estes novos arranjos entre empresas e
comunidades têm grande potencial de atrair o interesse
dos jovens por estas atividades e permitir que o merca-
do consiga reconhecer os serviços socioambientais, via
comercialização diferenciada”, diz Patricia Cota Gomes,
coordenadora de projeto no Imaflora.
Para Helga Yamaki, também coordenadora de projeto do
Imaflora, a grande mudança na região é o fortalecimen-
to do arranjo produtivo local, que permita a organização
de extrativistas e indígenas para comercialização con-
junta da produção, o que viabiliza maiores volumes, algo
essencial para os acordos comerciais.
Durante o evento, os participantes se reuniram com as
diversas empresas para avaliar as parcerias já estabele-
cidas e discutir novas. Eles também redigiram uma carta
endereçada à Conab (Companhia Nacional de Abasteci-
mento). O objetivo do grupo é buscar apoio para o for-
talecimento da cadeia produtiva local, além de apontar
alguns entraves que têm dificultado o acesso das popu-
lações às politicas da Conab.
Helga explicou que uma das questões enfrentadas pelos
extrativistas é o impacto do ICMS (Imposto sobre Circu-
lação de Mercadorias de Serviços) sobre os produtos, o
que diminui a competitividade da produção extrativista
quando comparada a outras cadeias da região.
Foto: Helga de Oliveira Yamaki
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WICKBOLD É PARCEIRA DAS COMUNIDADES DA TERRA DO MEIO
Líder nacional na produção de pães especiais, a Wi-
ckbold inaugurou uma nova fase nas parcerias comer-
ciais com as associações do Xingu, que beneficiou os
extrativistas de castanha-do-brasil da região da Terra do
Meio com preços 25% superiores aos que vinham sendo
praticados na comercialização do produto.
A negociação, que teve o apoio técnico do Imaflora e
Instituto Socioambiental (ISA), incluiu visita da empresa
às comunidades, onde seus representantes conheceram
o modo de vida tradicional e sua contribuição na ma-
nutenção da floresta em pé e, consequentemente, na
produção de castanhas.
“A expectativa é que esta parceria com a Wickbold traga
visibilidade e estimule a vinda de outros parceiros para a
região, fortalecendo a cadeia de valor do extrativismo a
partir de relações comerciais mais éticas com as popu-
lações extrativistas”, diz Patrícia.
A empresa se comprometeu, em acordo de longo prazo,
a comprar toda a produção da região. “O importante é o
ganho de escala que isso pode significar mais adiante,
com impacto direto a um número significativo de famí-
lias na região, além dos benefícios de se promover um
produto como a castanha que está entre os cinco pro-
dutos de maior importância econômica e social para a
região Norte”, afirma Patrícia.
O Brasil é o segundo maior produtor dessa castanha e
responde por 36% da produção mundial. Como mos-
tram dados do IBGE, o Brasil produziu em 2013, aproxi-
madamente 38 toneladas de castanhas, dos quais 55%
foram consumidas no mercado interno, mostrando que
o mercado nacional deste produto está aquecido.
A maior parte da comercialização da castanha era feita
por intermediários, o que exclui os castanheiros da ne-
gociação do preço do produto ou da remuneração de
seu trabalho. Com a parceria, os castanheiros ganharam
espaço para diálogo e peso no processo.
“Era importante que a empresa entendesse a forma de
viver das comunidades e respeitasse isso no processo
de negociação, uma vez que estas populações também
se dedicam ao manejo de outros produtos da floresta e
trabalham em suas roças tradicionais para diversificar a
renda e garantir a própria segurança alimentar”, explicou
Helga.
Foto: Helga de Oliveira Yamaki
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SELO ORIGENS BRASIL®
O Imaflora prepara para 2016 o lançamento do Selo Ori-
gens Brasil®, que visa valorizar cadeias de produtos da
sociobiodiversidade e dar transparência à cadeia produ-
tiva, permitindo ao consumidor o rastreamento de toda
história do produto e do produtor.
O Origens Brasil® é um sistema de garantia que assegu-
ra a rastreabilidade da produção e relações comerciais
mais éticas, por meio de uma plataforma tecnológica
de gestão da informação, que permite controle interati-
vo das informações das cadeias produtivas do território
(produção, comercialização e indicadores de impacto).
O Origens Brasil® disponibilizará para cada perfil de usu-
ário (comunidades, empresas e instituições de apoio)
um painel de gestão (dashboard) que permitirá o acesso
às informações consolidadas do produto, produtor, ter-
ritório de origem e suas cadeias produtivas. Os dados
poderão ser visualizados em mapas georreferenciados,
auxiliando a gestão dos negócios e dos riscos associa-
dos à cadeia.
As empresas e comunidades que aderirem à iniciativa
terão um mecanismo, por meio do uso da logomarca
que é o próprio código QR, que permite informar ao
consumidor a história por trás de cada produto, asso-
ciando-os às populações que vivem nas regiões, bem
como sua contribuição para os territórios (abrangidos)
do Origens Brasil®.
Foto
: Raf
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9
IMPACTO NAS COMUNIDADES
A atuação do Imaflora em comunidades extrativistas é
positiva, negativa ou neutra? Com essa dúvida o institu-
to em 2012 iniciou o desenvolvimento de um sistema
de indicadores que orientasse seu trabalho e avaliasse
os resultados de forma científica.
O trabalho ganhou impulso com a parceria com o Labo-
ratório de Silvicultura da Esalq/USP (Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Pau-
lo) e com o Instituto Socioambiental (ISA). Os parceiros
desenvolveram e aplicaram um método de avaliação de
impactos baseado na abordagem Meios de Vida Susten-
táveis.
A intenção era de avaliar como essas ações impactam
em diferentes dimensões da vida dos extrativistas. São
23 indicadores avaliados, divididos em cinco capitais:
social, humano, financeiro, físico e natural.
O primeiro levantamento foi realizado este ano, com
comunitários de três Reservas Extrativistas da Terra do
Meio (PA), nas quais se verificou os impactos das ações
do Imaflora e do ISA nos contratos diferenciados entre
empresas compradoras de produtos da sociobiodiversi-
dade e extrativistas e também a organização do sistema
de comercialização local, as chamadas cantinas.
Para a avaliação foram realizadas entrevistas com 22
extrativistas. As análises iniciais já apontam resultados
interessantes, com impactos positivos na maioria dos
indicadores avaliados, além de pontos de melhoria para
a continuidade das ações do Imaflora e parceiros na re-
gião.
Foto
: Raf
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10
O CACAU AGROFLORESTAL DE SÃO FÉLIX DO XINGU
SISTEMAS SILVOPASTORIS (SSP)
O projeto Florestas de Valor fomenta a harmonia entre
floresta, pecuária e agricultura, além de investir e incen-
tivar agricultores familiares da região de São Félix do
Xingu (PA) a utilizar práticas agroecológicas. Trata-se de
uma região onde o cacau é produzido em sistema agro-
florestal, ou seja, a cultura do cacau é consorciada com
outras espécies de árvores.
Coordenador de projetos do Imaflora, Marcos Froes Na-
chtergaele explica que a proposta de sistema agroflores-
tal permite que a produção local mantenha-se equilibra-
da ao longo do tempo, como esperam os agricultores do
grupo de trabalho da região.
“Esses agricultores já se destacam pelo plantio diversifi-
Outra ação do (projeto) Florestas de Valor é a implan-
tação de sistemas silvopastoris (SSP), que começou em
setembro desse ano com seis agricultores. Os pastos se-
rão divididos com cerca dupla, que permita formar cor-
redores de árvores. A proposta inicial é de implantar 300
árvores por hectare.
A pastagem será usada em rotação e o gado ficará de
três a quatro dias em cada pasto. Depois, passará para
outro, enquanto o primeiro se regenera. As árvores dão
sombra e frutas para o gado, massa verde para adubar o
solo, entre outros ganhos. “Com isso, se consegue colo-
car de 4 a 5 cabeças de gado por hectare, enquanto no
sistema convencional temos uma cabeça por hectare”,
diz Nachtergaele.
cado de árvores em suas roças”, diz o coordenador.
No Sistema Agroflorestal (SAF) o cacau é plantado com
outras espécies, que podem ser árvores companheiras
de futuro ou de serviço. O cacau é uma planta que pre-
cisa de sombra para desenvolver, por isso o sistema é
mais que adequado.
As árvores de futuro são espécies que em alguns anos
poderão fornecer madeira ou frutas, como o ipê ou cajá
ou algum outro produto florestal, que será agregado à
renda do agricultor. Já as de serviço, como o ingazei-
ro, são utilizadas para fixar nitrogênio no solo e evitar a
aplicação de ureia ou criar um ambiente favorecendo o
cacau. Além disso, a poda dessa leguminosa misturada
ao solo vira adubo.
Foto: Rafael Salazar
11
PESQUISA
O estudo de mestrado de Daniel Braga constatou o potencial dos sistemas agroflorestais na recuperação de áreas
degradadas por pastos ou desmatamento, o que também ajudou na definição das espécies para recuperação. Coorde-
nado pelo professor Flávio Gandara da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz/USP), o trabalho mapeou
a região de SAF-Cacau de São Félix do Xingu sob diversos aspectos: estrutura florestal, florística, qualidade do solo,
micronutrientes, mapas geomorfológicos entre outras informações. Depois, o pesquisador comparou os dados com as
áreas de pastagens e de florestas nativas. O estudo indicou mais de 100 espécies que podem ser utilizadas nos SAFs.
VISITA DA IBC DISCUTE NOVOS RUMOS PARA COMERCIALIZAÇÃO DO CACAU COM DIRETORIA DA CAMPPAX E SEUS COOPERADOS
Os esforços dos agricultores começaram a render frutos,
seja pela qualidade do cacau ou ainda pela valorização
de parcerias comerciais. Em março deste ano, represen-
tantes da Indústria Brasileira de Cacau-IBC, moageira de
Rio das Pedras-SP, estiveram em São Félix do Xingu para
avaliar a safra 2015 com os agricultores familiares coo-
perados.
Em reunião com os cooperados, o Diretor Comercial do
IBC Mauricio Dati Pinho abordou a possibilidade de re-
munerar melhor a parceria se o cacau tiver o certificado
orgânico. “Existe uma demanda crescente por cacau or-
gânico e estamos apostando na possibilidade de apoiar
a certificação de um grupo de agricultores e oferecer
esse cacau para IBC”, declara Nachtergaele.
O cacau é atualmente a principal fonte de renda dos
agricultores familiares cooperados, seguida do gado de
leite e produção de polpas de frutas. Entre 2014 e 2015,
a Camppax comercializou com o IBC aproximadamente
400 toneladas de cacau.
“A gente acredita que a agricultura familiar é compatí-
vel com a conservação de recursos naturais estratégicos
para as Unidades de Conservação”, diz Nachtergaele.
Foto
: Raf
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12
Ao final do ciclo, as maiores conquistas ressaltadas
foram o protagonismo dos agricultores familiares na
condução da oficina e a construção coletiva do co-
nhecimento por meio da troca de saberes. Além dis-
so, foi desmistificada a ideia de que a produção de
cacau de qualidade requer práticas e técnicas mui-
to complexas, que exigem elevado grau de insumos
e tempo. Também foi possível desvendar o passo a
passo das etapas do beneficiamento.
Os três agricultores facilitadores: Pedro Ribeiro Aguiar,
Natal Pereira da Silva, Raimundo Freires dos Santos,
transmitiram o que aprenderam nos cursos do Ima-
flora e usaram as informações em suas práticas no
campo. A soma dos novos aprendizados com as ex-
periências que já possuíam foi exemplo de diálogo e
valorização do conhecimento local entre agricultores
e agricultoras, mostrando que é possível fazer dife-
rente.
Esta experiência foi um marco em São Félix do Xingu
para o Imaflora no que se refere a espaços de forma-
ção e construção do conhecimento no meio rural. A
metodologia potencializa a difusão dos conhecimen-
tos e inovação, colocando o agricultor familiar como
centralizador do conhecimento e o técnico como um
facilitador do diálogo entre os agricultores.
AGRICULTORES TÉCNICOS
Uma nova forma de socialização e difusão de conhe-
cimento no meio rural vem sendo incentivado pelo
Imaflora, Adafax (Associação para o Desenvolvimento
da Agricultura Familiar do Alto Xingu) e Camppax (Co-
operativa Alternativa Mista Dos Pequenos Produtores
do Alto Xingu) em São Félix do Xingu. Tendo em vista
a necessidade de criar meios diferenciados para for-
talecer a socialização de técnicas agroecológicas para
cultura do cacau, uma nova estratégia de formação foi
utilizada, tendo o agricultor como protagonista do co-
nhecimento. A proposta visa incentivar a discussão de
práticas agrícolas entre os agricultores, a valorização e
construção conjunta do conhecimento adquirido lo-
calmente. Para tanto, as oficinas têm sido conduzidas
não por técnicos agrícolas especialistas, mas sim por
agricultores familiares, que estão no projeto desde o
início e que se destacaram nas práticas.
“Vimos neste método uma grande oportunidade de in-
centivar a troca de ideias e experiências entre os agri-
cultores da região que lidam com as mesmas condi-
ções climáticas, políticas e sociais”, diz Andressa Neves.
A metodologia foi utilizada no período de 4 a 8 de maio
de 2015 em três oficinas de beneficiamento de cacau,
que abordaram temas como colheita e separação dos
frutos, fermentação e estrutura ideal dos cochos.
Patrocínio:Realização: Apoio:
Foto
: Raf
ael S
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