P-003 - A Abóboda Energética - K. H. Scheer

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    (P-003)

    A ABBADA ENERGTICA

    Autor

    K. H. SCHEER

    Traduo

    RICHARD PAUL NETO

    Digitalizao

    VITRIO

    Reviso

    ARLINDO_SAN

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    Rhodan, comandante da primeira nave terrena

    tripulada a pousar na Lua, retornou ao nosso planeta.

    Pousou no deserto de Gobi onde, valendo-se da super-

    tcnica da nave exploradora dos arcnidas, uma raa vinda

    da regio central da Via Lctea, instalou uma base que vem

    desafiando os ataques das grandes potncias da Terra.

    Perry Rhodan conseguiu impedir a terceira guerra

    mundial, mas ainda no est satisfeito. Quer promover a

    unio da humanidade.

    Mas a humanidade ainda no est madura para os

    planos de Perry Rhodan. Por isso a luta prossegue em torno

    da Abbada Energtica.

    - - - - - - - - - - Personagens principais: - - - - - - - - - -

    Perry Rhodan Comandante da nave Stardust. o grande benfeitor da humanidadepor ter impedido a terceira guerra mundial, mas considerado o inimigo pbliconmero um.

    Reginald Bell Engenheiro eletrnico da Stardust. o melhor amigo de Perry.

    Dr. Eric Manoli e Dr. Frank M. Haggard nas mos desses homens que repousaa vida de Crest e a sobrevivncia da humanidade.

    Crest Diretor-cientfico da expedio realizada por uma raa estranha. S ele podeconter os impulsos de Thora.

    Thora Comandante de uma nave que dispe de poderio suficiente para destruir aTerra.

    Albrecht Klein, Li Shai-tung e Peter Kosnow Trs agentes secretos que setransformaram em combatentes decididos pelas idias de Perry.

    AllanD.Mercant Chefe do Conselho Internacional de Defesa.

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    I

    ... ocorre uma alterao na potencialidade prtica de determinada situao quando umfato aparentemente improvvel se torna provvel. No faz mais de uma semana que me

    encontrava ao p de uma muralha fictcia, cujos alicerces repousavam nos clculos elaboradosem minha mente.

    Com base no meu raciocnio lgico, cheguei concluso de que seria totalmenteimpossvel enfrentar, sozinho, as trs superpotncias da Terra.

    Minha equao encerrava muitas incgnitas. A interpretao matemtica de uma sriede dados quase sempre correta e infalvel, a no ser que surja, de sbito, uma soluo quetransforme um ou mais dos fatores desconhecidos num dado exato a ser computado nosnossos clculos. Foi exatamente o que aconteceu ou melhor, parece ter acontecido. Hoje, jno penso em abandonar a minha posio para resignar-me a uma tentativa de colocar meusaber disposio das potncias da OTAN.

    O homem esbelto, de rosto fino, colocou o dedo sobre a tecla de parada instantnea dogravador. Imediatamente, os dois carretis deixaram de girar.

    O major Perry Rhodan, ex-piloto de provas da Fora Espacial dos Estados Unidos ecomandante da primeira expedio lunar tripulada, olhou, pensativo, em torno. A cabina decomando da Stardust era muito apertada, e no poderia ser diferente, numa nave espacialdaquele tamanho.

    As portinholas de ao das duas vigias da nave, que permaneceram fechadas durante aviagem pelo espao, estavam abertas. Para alm das grossas lminas de quartzo estendia-se adesolao marrom-amarelada do deserto de Gobi. S direita da nave, pousada maneira deum avio, via-se um pouco de verde. Era a tnue faixa de vegetao que ladeava um riacho

    registrado nos mapas com o nome de Morin-Gol e que desembocava no grande lago salgadode Goshun, poucos quilmetros ao norte. Em certo trecho, sua margem servia de fronteiraentre a China e a Monglia.

    Ao sul da nave, ficava o temido Gobi Central. At poucas semanas atrs, no haviapraticamente nenhum sinal de vida humana por ali, fora algumas pequenas povoaes situadas margem das pouqussimas fontes; e as instalaes militares da Federao Asitica.

    Numa srie de pensamentos soturnos, Perry Rhodan deu-se conta de que, de uma horapara outra, a situao se havia modificado por completo.

    Lanou os olhos semicerrados atravs da vigia de quartzo que dava para o leste. Muitacoisa havia mudado para alm do leito do rio, no lugar em que ficava o pequeno povoado de

    Dashoba. Da noite para o dia, o aerdromo militar, que antes no passava de um miservelcampo de treinamento, parecia transformado numa grande base internacional.

    O contingente de tropas ali estacionado era enorme. Tinha-se a impresso de que asformaes macias das melhores unidades de elite da sia se preparavam para uma invaso.

    Rhodan lanou um olhar para a grande barraca armada perto da Stardust. Ao contempl-la, idia tranqilizadora da prpria segurana tornou-se, simplesmente, ilusria. Pertenceraao equipamento de uma unidade de transporte das Foras Asiticas, chegada h uma semana.Os lbios de Rhodan crisparam-se num ligeiro sorriso. Tirou o dedo da tecla de parada.

    Passou a falar com a voz mais descontrada. Fao esta gravao para o caso de qualquer imprevisto. Repito: aqui fala o major

    Perry Rhodan, comandante da nave espacial americana Stardust e piloto do Comando deExplorao Lunar do espao-porto de Nevada. Fao questo de registrar minhas experinciascom a maior fidelidade.

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    H oito dias o capito Reginald Bell regressou de uma perigosa misso especial. Malacreditei no que meus olhos viram, mas o fato que conseguiu o que parecia impossvel:trouxe o especialista em doenas do sangue cuja vinda o mdico de bordo, Dr. Eric Manoli,

    julgava to importante. Trata-se do Dr. Frank M. Haggard, famoso cientista australiano aoqual o mundo deve o soro antileucmico. Se existe um homem capaz de salvar o ser estranhovindo das profundezas da Via Lctea, esse homem o Dr. Haggard. Face s instalaesmdicas existentes na Starduste atuao desse mdico surgiram probabilidades de salvar avida de Crest. Afinal, dispomos de dois dos vultos mais destacados na medicina. J no vejoas coisas to pretas como ontem e anteontem. No h dvida de que a irrupo de uma guerranuclear aniquiladora, que parecia iminente, foi impedida pelos recursos inconcebveis de quedispem esses personagens estranhos. Para alm da cpula protetora que nos envolveespalham-se os destroos dos enormes msseis nucleares. No chegaram a explodir. Thora, acomandante da gigantesca nave espacial dos arcnidas, interveio a partir da Lua. Uma vez queas armas nucleares de todas as potncias da Terra funcionam com base em reaes de fusoou fisso nuclear, bastou prender os nutrons livres aos ncleos atmicos. Com isso, os

    processos de fisso nuclear baseados nos nutrons tornaram-se impossveis. Nossa posiono m; pelo menos no pior que a que enfrentamos logo aps o pouso no deserto de Gobi.Acredito ter procedido corretamente diante de minha conscincia e do juzo dos homens,quando me recusei a colocar o poderio tcnico-cientfico de uma raa dotada de intelignciamuito superior nossa nas mos de um dos grupos de potncias terrenas. No h nada que

    possa abalar minha f em toda a humanidade. Nada perturbar minha convico de que ofuturo do gnero humano s pode repousar na unio de todos os homens. Ao que parece,encontramo-nos no limiar de uma era de provaes para toda a Terra. Ainda existe muitaincompreenso, desconfiana, dio e malquerena. As grandes figuras de todos os governosrealizaro esforos exaustivos para empregar os conhecimentos fabulosos dos arcnidas naexecuo de seus propsitos. Acontece que tais desejos no correspondem causa do

    progresso da humanidade.Sem a cura de Crest, meu plano grandioso no ter possibilidades de xito. Queroconquist-lo como amigo meu e de toda humanidade. Por isso s posso fazer votos de quemais uma vez o Dr. Haggard d provas do seu extraordinrio saber

    Rhodan desligou o aparelho. Ele o fez de forma um tanto abrupta e teve motivos paraisso. No pertencia classe de homens que, diante de um cerrado bombardeio, sentem-seinclinados a gravar em uma fita suas idias e opinies mais ou menos bem sucedidas.

    Seu rosto, at ento tranqilo, ficou tenso. Num gesto automtico segurou a arma. E,ainda instintivamente, deu um salto para abrigar-se, muito embora o raciocnio logo lhedissesse que tal ato era totalmente ilgico.

    Ergueu-se muito contrariado, amaldioando sua insensatez. No tinha sentido procurarabrigo em uma situao como aquela. Se a cpula energtica dos arcnidas no resistisse, afora concentrada de um exrcito gigantesco desferiria um golpe arrasador.

    Rhodan ps a arma automtica a tiracolo. Saiu da nave pela grande escotilha docompartimento de carga, inteiramente vazio, que ficava logo atrs da cabina destinada tripulao, e desceu pela rampa de metal. No mesmo instante, ouviu-se o radiofone. Uma vozforte e spera disse em tom seco:

    Algum houve por bem interromper o meu sono to merecido. OK! Voc ainda estde p, ou j o agarraram?

    Para seu governo, as comunicaes pelo rdio esto proibidas. Irei at a!

    respondeu Rhodan.Desligou o rdio de pulso. Franzindo a testa, refletiu sobre o grau de aperfeioamentoque teria sido alcanado pelas instalaes de escuta da Federao Asitica.

    O trovejar longnquo cresceu num rugido ensurdecedor. Rhodan ergueu os olhos para

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    contemplar a luminosidade cintilante, quase imperceptvel, que se desenhava no cu. Noponto mais elevado, a cpula energtica atingia dois mil metros de altura. Ao que parecia,desta vez haviam decidido lanar mo de outros meios de ataque.

    Os lbios de Rhodan se estreitaram. A barba de vrios dias contrastava com a pelemorena. Com passos rpidos atingiu a entrada da grande tenda.

    H tempos o capito Reginald Bell despira o uniforme da Fora Espacial. Essavestimenta teria representado um obstculo quase intransponvel na sua arrojada excurso forados limites da cpula.

    Fim do mundo disse com voz gutural. Ainda no se decidiram? Ou ser queinventaram alguma coisa capaz de romper a nossa cpula protetora?

    O olhar que Rhodan lanou para as posies do inimigo, montadas bem ao longe, tinhaalgo de ameaador. Mas logo se descontraiu. Ofereceu um cigarro ao companheiro.

    As intenes deles so boas disse, sorridente. So as melhores possveis.As ltimas palavras morreram em meio ao estrondo provocado pela detonao de

    poderosos projteis. A muralha invisvel, feita de linhas de fora de uma potnciaextraordinria, iluminou-se no brilho intensssimo das exploses. Rhodan fez umaconstatao:

    Desta vez no esto usando a artilharia convencional. Se no me engano, o comandodo Exrcito Asitico dispe de alguns crebros brilhantes. J compreenderam que, numcampo antigravitacional, as armas convencionais so totalmente inteis. O que faria qualquerhomem inteligente ao perceber que, face eliminao da gravidade, j no pode lanar modos potentes canhes, sujeitos ao recuo provocado pelos disparos? Passa a utilizar projteis-foguetes, no ?

    Reginald Bell fez que sim. Uma forte corrente de ar iluminou seu cigarro num clarovivo. A Stardust, estacionada no centro do campo cinzento protegido pela cpula energtica,transformara-se no alvo de pelo menos mil baterias de foguetes. A julgar pelos impactos,

    deviam ter colocado em ao pelo menos quatro mil lana-foguetes automticos dos maisvariados calibres.O rugido das exploses tornou-se insuportvel. Bell teve de berrar a plenos pulmes

    para tornar sua voz audvel. Esses foguetes no conduzem carga nuclear gritou junto ao ouvido de Rhodan.

    Thora prometeu que interviria imediatamente. A cpula anti-neutrnica cobre toda a Terra.Rhodan sabia que Bell estava berrando com toda a fora. Depois de mais alguns

    segundos, o homem robusto, de ombros largos, compreendeu que seus esforos eram inteis.Cerrou os lbios. Uma contoro nervosa desenhou-se em seu rosto largo.

    As enormes ondas de compresso geradas pelas exploses que se sucediam em rpida

    seqncia no conseguiam atravessar a cpula energtica. Em compensao, esta pareciatransformada num enorme sino.Alguma coisa oscilou.

    Fogo cerrado! constatou Rhodan, lanando um olhar para o crculo que se fechavaem torno da cpula energtica. Ali se achavam estacionadas as unidades de elite da FederaoAsitica, bem protegidas nos excelentes abrigos. Ali estavam montados os lana-foguetes,instalados em abrigos de concreto e abastecidos pelos depsitos de munies situados emabrigos ainda mais slidos.

    No havia por perto nenhum objeto que no estivesse fixado cuidadosamente no solo.Perry Rhodan sabia que os soldados usavam cintos especiais, dotados de fixadores. A

    Federao Asitica lanara mo de pessoas que tinham algum conhecimento de viagensespaciais tripuladas. Outros receberam treinamento intensivo, que os habilitou a enfrentar osefeitos da ausncia da gravidade.

    Com isso, foi eliminado o fator surpresa. A arma formidvel dos arcnidas, o

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    neutralizador da gravidade, funcionava com a mesma perfeio de antes, mas perdera toda autilidade prtica.

    Perry Rhodan deu-se conta de que, embora dispusesse de armas e equipamentosinfinitamente superiores, no devia subestimar o poderio concentrado de um exrcitoaltamente treinado.

    O fogo cerrado das baterias de foguetes pesados e ultrapesados no poderia deixar deproduzir seus efeitos, mesmo que, apesar de todos os esforos, o inimigo no conseguisseromper a cpula energtica.

    Acontece que, naquelas circunstncias, a tenso nervosa resultante das inmerasdetonaes, aliada ao medo causado pela sensao de perigo, bastaria para romper aresistncia psquica dos poucos homens que ali se encontravam.

    De repente, o Dr. Eric Manoli precipitou-se para fora da tenda sem dar a menorexplicao. Antes que Rhodan compreendesse o que estava acontecendo, o mdico haviadesaparecido atravs da escotilha da nave.

    S depois de alguns instantes Rhodan percebeu o motivo da agitao daquele homemfranzino. Ele e Bell comearam, tambm, a correr. Rhodan lembrou-se de que seusmovimentos poderiam ser detectados atravs de um dispositivo de localizao tica. O campode defesa energtica formado pelos arcnidas tornava impossvel a captao eletrnica daimagem, mas a muralha invisvel podia ser atravessada pelo olhar. Se percebessem que, logoaps o incio do bombardeio, os homens se precipitavam para a nave, isso s poderiaconcorrer para piorar a situao.

    Rhodan estava apavorado.No devemos deixar qualquer brecha por onde possamos ser atacados, pensou. Pelo

    amor de Deus! No podemos mostrar nenhum ponto fraco.Encontraram-se com o Dr. Manoli na grande escotilha de carga da nave. Trazia sobre a

    cabea os enormes abafadores de som usados como proteo contra o rudo por ocasio da

    partida da nave.Manoli sorriu. Moveu os lbios. Apontou para o pino do cabo de ligao.Assim que Rhodan colocou o pesado dispositivo, o fragor infernal transformou-se num

    murmrio distante. Colocou no pescoo o grampo com o microfone de laringe e ligou oscontatos do equipamento de telefonia que trazia no peito.

    J estava na hora soou a voz calma vinda dos minsculos alto-falantes embutidosnos abafadores. Estou admirado de no lhes ter ocorrido antes a idia de nos submeter aum fogo cerrado. O pessoal da Faculdade de Psicologia deve estar metido nisso.

    Um ligeiro sorriso esboou-se no rosto do Dr. Manoli. No entanto, os lbios trmulosdesmentiam a tranqilidade que procurou aparentar.

    Obrigado. Foi uma tima idia respondeu Rhodan. Devia ter-me lembradodisso antes. bom que ele tambm faa alguma coisa ouviu-se a voz de Bell. Ser que

    tambm deu para ter boas idias? S sei que estou com um medo terrvel respondeu Rhodan com voz aptica.

    Estou com medo desta cpula energtica, cujo funcionamento no conheo e cujo limite deresistncia constitui uma incgnita para mim. Mas, deixemos isso de lado. Eles testaro nossaresistncia com um fogo cerrado de vrias horas. As armas nucleares no funcionaro mais,

    por isso, recorrero aos explosivos qumicos. Se estes no produzirem efeito, atacaro comgases. Caso os mesmos falhem, convocaro os especialistas em guerra bacteriolgica. O fato

    que ainda existem possibilidades com que nosso amigo Crest nem chega a sonhar. O homem dotado de uma tremenda capacidade inventiva e, com o surgimento da nossa terceira potncia,criamos uma situao tal que a esta altura j mobilizou toda a cincia humana.

    Obrigamo-los a este tipo de unio observou Manoli. As superarmas terrenas

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    tornaram-se ineficazes. As reaes nucleares j no so possveis, uma vez que no podem serdesencadeadas sem nutrons livres, e atualmente os homens no conseguem desligar estas

    partculas do ncleo atmico.De repente, Rhodan lanou um olhar fulminante sobre Bell. Este empalideceu. Passou a

    ponta da lngua pelos lbios. O que houve? perguntou com voz gutural.Desde que voltou a ficar submetido s ordens de Rhodan, Bell perdera a petulncia

    juvenil. A alegria enorme que lhe provocavam as estupendas armas defensivas dos arcnidasdesvaneceu-se com a mesma rapidez com que surgira durante sua expedio Austrlia.

    Rhodan no respondeu. Correu para a tenda, onde entregou um par de abafadores ao Dr.Haggard, que parecia muito assustado. Bell compreendeu imediatamente. Sem dizer uma

    palavra, desapareceu no interior da armao de plstico inflado.Os outros seguiram-no devagar. O excelente isolamento acstico fez com que os rudos

    chegassem ainda mais abafados. Com isso, fora eliminado, tambm, o risco de esgotamentonervoso.

    Passaram perto do reator em forma de tambor de leo, que emitia um zumbido agudo.Desde o pouso da nave esse aparelho fornecia a energia para a cpula protetora. Rhodan

    parou, pensativo. Mais uma vez procurou atravessar o dispositivo cilndrico com aimaginao, de forma a compreender como ele funcionava. Ele era astronauta e fsico nuclear.Podia gabar-se de ter compreendido todos os detalhes mesmo os mais afastados de seucampo de conhecimentos do mecanismo propulsor qumico-nuclear da Stardust. Mas,diante dessa tecnologia infinitamente superior, seus conhecimentos no passavam do zero.Sabia, apenas, que no setor quente do reator dos arcnidas era liberada uma energiaequivalente de um pequeno sol. Por certo, ali se desenvolvia um processo de fusoextremamente complicado que devia basear-se no ciclo do carbono. Seria um processoestupendo de ignio cataltica a frio, que se distanciava do das fisses nucleares da Terra

    tanto quanto o machado de pedra das pistolas automticas.Pelo que dissera Crest, seria faclimo fornecer energia para toda a indstria terrena comaquele aparelho cuja altura no ultrapassava a de um homem. Rhodan sentia vertigens quandofazia clculos baseados nesses dados. Tambm desta vez desistiu do intento de compreenderesse aparelho criado por uma raa superior. Por enquanto, tinha de contentar-se em aceitar amaneira pela qual funcionava.

    Vrios cabos da grossura de um brao subiam at a antena esfrica que possibilitava acriao da cpula energtica de quatro quilmetros de dimetro e dois de altura.

    Cerca de seis semanas haviam-se passado desde o encontro da gigantesca nave espacialesfrica na superfcie da Lua. Cerca de seis semanas seriam suficientes para que os cientistas

    da Terra compreendessem algumas verdades perigosas. Talvez, a esta altura, a fbula deRhodan, segundo a qual haviam sido descobertos na Lua alguns vestgios abandonados deuma estranha cultura repousasse sobre ps de barro. No estavam lidando com idiotas; nohavia a menor dvida. Os homens que ocupavam os postos de comando militares e cientficosdas trs superpotncias sabiam raciocinar. Se, alm de tudo, ainda conseguissem se unir, asituao acabaria por se tornar insustentvel.

    Perry Rhodan sentiu os olhares perscrutadores dos trs homens. Por trs da cortina queseparava a parte dos fundos via-se a sombra do Dr. Haggard. Ao que parecia, havia colocadoabafadores no ser que estava sob seus cuidados.

    O rosto de Perry tornou-se mais srio. H alguns anos andava ligeiramente curvado, o

    que fazia com que seu corpo, alto e magro, parecesse um pouco menor. Bell observou-o, cadavez mais preocupado. Se o comandante perdesse a tranqilidade, tudo estaria perdido. Elemesmo, Reginald Bell, no seria capaz de levar avante de maneira coerente o plano cujaexecuo fora iniciada. Era muito impulsivo.

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    O Dr. Eric Manoli nem de longe estaria em condies de prosseguir naquela empresaarriscada. Era, antes de tudo, mdico; e como tal no saberia emitir ordens que tivessem de sercumpridas incondicionalmente.

    O capito Clark G. Fletcher estava desaparecido havia uma semana. Rhodan tinhacerteza de que ele devia enfrentar grandes dificuldades se que ainda estivesse vivo. Tinhacometido um grande erro ao permitir que retornasse ao lar. No poderia dar certo.

    Os lbios de Rhodan estreitaram-se. Como no tivesse ligado o dispositivo de telefonia,Bell absteve-se de fazer qualquer pergunta. Em vez disso, ps inconscientemente a mo no

    basto prateado que, segundo sabia, encerrava foras inacreditveis.Era o chamado irradiador psquico dos arcnidas, atravs do qual se podia eliminar a

    vontade consciente de qualquer pessoa, obrigando-a atravs de um processo de obstruosugestiva a praticar atos que contrariavam seus prprios desejos.

    Era um instrumento relativamente inofensivo. No causava o menor dano psquico e amente da pessoa submetida aos seus efeitos no era afetada. Todavia, tambm o irradiador

    psquico perdera o fator surpresa. Do outro lado, j haviam descoberto que o alcance doaparelho no ultrapassava dois quilmetros.

    Com isso, a terceira potncia via-se obrigada a assumir a defensiva.Rhodan passou junto ao laboratrio mvel do Dr. Haggard, trazido na semana anterior.

    Ao perceber o olhar irnico de Rhodan, Bell deu de ombros. Ele sabia que a essa altura, noconseguiria repetir a faanha de poucos dias atrs. De qualquer maneira, o Dr. Haggard estavano acampamento e, o que era mais importante, trouxera aquilo de que Crest tanto precisava.

    Perry Rhodan, que ainda envergava o uniforme da Fora Espacial, ps a mo no ombroesquerdo, numa atitude pensativa. Suas divisas no estavam mais ali; ele mesmo as retirara. Omajor Perry Rhodan havia deixado de existir, pois fora avisado por uma mensagemradiofnica de que havia sido privado de sua patente. Transformara-se no inimigo pbliconmero um.

    Com todo cuidado, puxou a cortina. O Dr. Manoli aproximou-se. Num movimentorpido, estabeleceu a ligao atravs do cabo. No fique nervoso! soou a voz tranqilizadora do mdico nos alto-falantes dos

    abafadores. Nosso paciente est com febre, mas j contvamos com isso. Sabamosperfeitamente que um ser de constituio biolgica diferente da nossa no poderia reagir aosnossos medicamentos da mesma forma como reage um ser humano normal. Mas o espectrosanguneo bastante animador. A proliferao doentia dos glbulos brancos regrediu com a

    primeira injeo do soro anti-leucmico do Dr. Haggard. Pelo menos, conseguimos deter oavano da molstia. As inchaes das glndulas e a hemorragia cutnea esto regredindo.Apenas no sabemos qual a causa dos efeitos colaterais. Num ser humano no surgiriam

    sintomas desse tipo. A esta altura, porm, j sabemos muito sobre o organismo de Crest.Seu metabolismo idntico ao nosso. Tal qual os seres humanos, respira oxignio eseus pulmes transportam esse gs vital ao organismo atravs do sangue. Haggard damesma opinio. Realizamos exames minuciosos antes de injetar o soro. Dentro de uma horaaplicaremos a segunda dose.

    Apesar dos graves efeitos colaterais? Apesar desses efeitos confirmou Manoli com um ligeiro movimento de cabea.

    Seu rosto assumiu uma expresso sria. No podemos fugir aos riscos. Haggard umespecialista muito competente, mas no um mgico. Os sintomas esto sob controle. No de se esperar que o paciente entre em colapso. A circulao mantm-se numa estabilidade

    notvel. Seu corpo dotado de um rgo que o homem no possui. Poder-se-ia dizer que setrata de um regulador de presso muito aperfeioado, situado acima do corao. As medidasregistradas pelo nosso instrumental mdico automtico revelam que os princpios de colapso eos espasmos vasculares so imediatamente compensados. um organismo admirvel, que

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    ningum suportaria numa raa degenerada como esta. De qualquer forma, vemo-nos diante desuperinteligncias que no conseguem reunir a fora de vontade que seria necessria paraconverter suas potencialidades espirituais infinitamente superiores em qualquer tipo deatuao prtica. a que est o problema, comandante.

    J no sou comandante. Para mim, nunca deixar de ser. Para resumir, temos motivos para crer que no s

    conseguiremos pr Crest de p, mas tambm alcanaremos a cura completa e o totalrestabelecimento.

    Rhodan lanou mais um olhar sobre aquele rosto incrivelmente juvenil, coberto degotculas reluzentes de suor. Embora no tivesse nascido em nosso planeta, Crest suava. Peloque dizia Manoli, era um bom sinal.

    Rhodan voltou-se. O fogo cerrado de artilharia continuava. O solo trepidava sob a forados impactos. Parecia que cargas explosivas muito potentes estavam sendo detonadas junto face externa da cpula energtica.

    No estou gostando disso cochichou Bell. Ouvia-se perfeitamente que engolia emseco. As intenes deles no so boas. At parece que todo esse fogo de artifcio no passade uma manobra para prender nossa ateno.

    Quem dera que pudssemos perguntar a Crest se a cpula continuar a resistir aobombardeio disse Rhodan. Eric, ser que voc poderia despertar Crest por um instante?

    Nem pense nisso! recusou-se o mdico. impossvel! Seria o maior erro quepoderamos cometer.

    Infelizmente voc tem razo confirmou Rhodan. Um sorriso esboou-se no seurosto.

    Bell estremeceu. Conhecia a meiguice tristemente clebre de Rhodan, que acabarianuma irrupo fulminante.

    Se no conseguirmos restabelecer Crest, o inferno desabar sobre nossas cabeas

    observou o comandante com uma tranqilidade surpreendente. Sim, senhores: o inferno!Contrariei as ordens que recebemos, pousando a Stardustaqui no deserto de Gobi. Recusei-me a entregar Crest. Declarei centenas de vezes que seus conhecimentos cientficos etecnolgicos no seriam entregues a nenhuma potncia da Terra. Sufocamos uma guerranuclear no nascedouro e, com nossas armas defensivas muito superiores, zombamos de toda ahumanidade. E ela nunca esquecer isso. Os trs grandes blocos das potncias da Terrauniram-se contra ns. L na Lua, a extica comandante de uma gigantesca nave espacial decombate espera o restabelecimento de Crest, o cientista que se afastou do seu mundo para

    procurar em nossas regies galcticas algum planeta em que j tivesse sido desvendado omistrio da conservao biolgica das clulas. Para Crest, isso significaria a vida eterna. Seu

    crebro genial h de ser conservado para sempre.Thora, a comandante, tambm se conservou espiritualmente ativa, como tantasmulheres da sua raa. Despreza a humanidade por causa de suas condies primitivas dedesenvolvimento. Se no conseguirmos curar seu irmo de raa, ficaremos expostos da noite

    para o dia, sozinhos e indefesos, s divises de combate de uma humanidade enfurecida. Aterceira potncia ter chegado ao fim. Falei claro?

    Bell respondeu: Muito claro, amigo! Se Thora der para trs, passaremos pelos interrogatrios dos

    Servios Secretos; depois disso enfrentaremos uma corte internacional. Nossas intenesforam boas demais, no foram?

    Na minha opinio, no cometemos nenhum crime; nem sequer praticamos qualquererro afirmou o mdico com a voz tranqila. Quem age no interesse de toda ahumanidade nunca pode estar errado. E no estamos fazendo outra coisa. Pelo contrrio: coma nossa demonstrao de fora, conseguimos aproximar, de um momento para outro, at

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    mesmo os governos separados por divergncias ideolgicas profundas. Ser que isso no valenada?

    S conseguimos isso graas ao poder de Thora ressalvou Rhodan. Se Crestmorrer, ela se separar de ns. verdade que no poder decolar sem o nosso auxlio, masisso no a deixar preocupada. O fatalismo tomou conta de sua raa. Ela se fechar numenorme campo energtico e recusar-se- terminantemente a manter contato com os homens.Temos de fazer alguma coisa.

    O qu?A pergunta foi formulada em tom penetrante. O nervosismo de Bell havia atingido o

    ponto crtico. Devemos convenc-la de que o homem um ser dotado de uma enorme criatividade.

    Dentro de pouco tempo as potncias terrenas disporo de armas nucleares que podero serutilizadas apesar dos campos anti-neutrnicos.

    O Dr. Manoli empalideceu. Acabara de compreender. Rhodan concluiu com toda atranqilidade:

    Estvamos realizando pesquisas secretas para uma fuso nuclear a frio. Se essaspesquisas forem bem sucedidas, no haver mais necessidade do detonador trmico paradesencadear a fuso nuclear. Com isso, o campo anti-neutrnico no passar de uma

    brincadeira. Quando esse dia chegar, no quero estar embaixo desta cpula energtica.Olhou para o alto. Muito alm da cobertura da tenda, a cpula resistia aos projteis,

    como se estes no passassem de bombas juninas. A situao poderia mudar, talvez, muitodepressa.

    Ligue-me com Thora disse Rhodan em tom pensativo. Quero falar-lhe comurgncia, na qualidade de representante de uma humanidade que quer formular umasexigncias em seu prprio benefcio.

    Exigncias? disse Bell, com um sorriso de escrnio. Ser que ouvi bem? Ela

    saltar no meu rosto de dentro do tubo de imagens. Para ela, no passamos de macacos comum pouquinho de inteligncia. Seu cdigo continua a proibir qualquer tipo de contatoconosco. Este negcio de Crest no passou de um acordo em que ela mal e mal se dignouentrar.

    Rhodan, com o p, puxou a banqueta para junto de si. A mesma j pertencera aoequipamento de uma unidade asitica de transporte.

    Se ela possuir aquilo que entre ns se costuma chamar de instinto de conservaoacabar cedendo. Vamos logo! Estabelea a ligao. Afinal, voc ou no nosso tcnico decomunicaes?

    Bell deu de ombros. Murmurando uma praga, tirou o pino da tomada de seu abafador e

    desapareceu atrs da cortina. O estranho videofone dos arcnidas havia sido instalado junto aoleito de Crest. A grande tenda oferecia mais espao que a pequena cabina da Stardust.Pretende coagi-la? perguntou o Dr. Manoli, preocupado. Isso mesmo! respondeu Rhodan. Acho que ela se encontra numa dependncia

    to forte de Crest como jamais sonhamos. Notei perfeitamente que ele lhe dava ordens. Paramim, a brincadeira j passa da conta. O que ser de ns se a cada pequeno incidente tivermosde solicitar seu auxlio? Para meu gosto, a Lua fica muito longe. Quando chegar o momentocrtico, perderemos minutos ou segundos que podero tornar-se decisivos. Precisamos de umequipamento muito mais potente, inclusive de algumas armas ofensivas. Por favor, noformule mais perguntas. Se acontecer aquilo de que desconfio no recanto mais profundo do

    meu crebro, Thora despertar de qualquer maneira. Subestima os homens. Acha que nosomos capazes de coisa alguma. No meu entender, est cometendo um engano fatal. No compreendo gaguejou Eric Manoli. Procure raciocinar disse Rhodan com um sorriso irnico. O que faria voc,

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    como mdico, se um paciente se queixasse de fortes dores? Procuraria resolver tudo cominjees de morfina, ou tentaria descobrir a causa das dores para aplicar o tratamentoadequado?

    claro que procuraria arrancar o mal pela raiz. Pois isso disse Rhodan com um sorriso forado. isso mesmo. Os servios

    secretos das potncias terrestres tambm procuraro as razes que, no nosso caso, ficam naLua. No venha me dizer que acredita que ainda esto engolindo a nossa histria!

    Bell fez um sinal com a mo. Do seu rosto zombeteiro s se podia concluir que acomunicao havia sido estabelecida.

    Rhodan levantou-se sem a menor pressa. Dirigiu-se pea que ficava na parte dosfundos da tenda e colocou-se diante da tela oval do instrumento dos arcnidas.

    A nave estranha estava estacionada do outro lado da Lua. Ningum conseguiria alcan-la com as ondas ultracurtas comuns. Indagado a este respeito, Crest limitara-se a declarar queesse problema havia sido resolvido h muito pelos arcnidas, atravs da radiotelegrafia develocidade superior da luz.

    Para um engenheiro terreno, era mais que difcil aceitar uma explicao desse tipo semque surgisse uma srie imensa de perguntas. A montanha de problemas que tal fato faziasurgir prenderia o tcnico por toda a sua vida.

    O rosto de Thora reluziu na tela. Era uma imagem tridimensional colorida de raraexpressividade. Thora era bela, de uma beleza cativante, mas parecia terrivelmentedespersonalizada na sua tranqila frieza. Rhodan lanou um olhar fascinado para os cabelosmuito claros, que formavam um contraste marcante com os olhos vermelho-dourados, umadas caractersticas dos arcnidas.

    H pouco, Rhodan estivera disposto a usar palavras moderadas, procurando explicar oseu procedimento atravs da educao que recebera. Mas, subitamente, resolveu mudar deatitude.

    No proferiu nenhum cumprimento. Em vez disso, falou com voz spera: No me venha explicar que ainda no est na hora do contato dirio. Oua bem eprocure lembrar-se de que j no sou uma simples figura no seu tabuleiro. Se no capaz dereparar as pequenas avarias do mecanismo propulsor de sua supernave espacial para coloc-laem condies de decolar, tambm no se julgue capaz de impressionar um cientista da Terra eum soldado de elite com suas palhaadas. Os homens de minha raa tm mais coragem edeterminao na ponta dos dedos do que os idiotas da sua tripulao carregam nas cabeasocas. Se interromper a comunicao desligo a cpula energtica. Queria dizer alguma coisa?

    Ela o encarou com os olhos arregalados. Ningum, nunca, usara uma linguagem dessapara com a comandante.

    No desligou. Quando Rhodan prosseguiu, os cantos de sua boca desceram. E agora, madame, preste muita ateno ao que vou dizer! Eu...Bell estava convencido de que seu ex-comandante enlouquecera. Assumiu uma pose de

    quem se julga o chefe do enorme imprio espacial, que Crest designara como o GrandeImprio. Ao que parecia, estava esquecido de que, em meio Via Lctea, o planeta Terra norepresentava mais que um grozinho de areia no deserto de Gobi; talvez at menos.

    Bell tinha certeza de que alguma coisa no daria certo.

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    II

    Uma sociedade ou uma aliana defensiva nada mais que uma autntica relao demtua confiana entre os participantes.

    Sempre que, no mbito de uma unio mundial, seja estabelecido um sistema secreto de

    defesa especfica, tudo indica que o quartel-general ser instalado num lugar de acesso fcil eseguro pelos participantes.

    No caso do CID Conselho Internacional de Defesa fora escolhida a ilha daGroenlndia, por ser o local que oferecia posio geogrfica mais favorvel. A gigantescacentral defensiva da OTAN fora montada muito abaixo do solo.

    Allan D. Mercant, o chefe onipotente do CID, s prestava contas de seus atos perante oplenrio da Comunidade de Defesa. Aquele homem delicado, de aspecto despretensioso, derosto moreno e testa alta, era uma criatura muito pacfica quando se tratava de animais.Poderia, mesmo, ser confundido com o diretor de alguma sociedade protetora dos animais; e a

    pessoa a quem declarasse que ocupava essa posio acreditaria piamente na sua palavra se o

    visse nas densas florestas do Canad, com a cmera fotogrfica equipada com teleobjetivadiante dos olhos que reluziam num brilho entusistico.

    Mercant no apreciava a caa com arma de fogo, que no se harmonizava com osprincpios que adotara.

    Justamente por isso, a atividade profissional a que se dedicava devia causar surpresa. Asms-lnguas diziam que, para o chefe do CID, a sade de um pobre animal era maisimportante que a vida de um dos seus numerosos agentes. claro que no havia em talafirmativa um pingo de verdade. Por isso, a nica resposta de Mercant diante de observaesmordazes como esta consistia num brilho irnico dos olhos.

    Naquele instante, ele estava parado diante de uma tela gigantesca. O smbolo luminoso

    que aparecia no ngulo superior direito indicava que a cmera de TV se encontrava num pontodistante da sia.

    Isso era mais que estranho; h cerca de um ms tal fato teria causado a maior sensao.A essa hora, porm, nem mesmo a presena de oficiais e agentes secretos do bloco oriental

    parecia impressionar os presentes.Trinta dias antes teria sido totalmente inconcebvel permitir a entrada de um

    representante da Federao Asitica, quanto mais do Bloco Oriental, no quartel-general doConselho Internacional de Defesa.

    Para levar a surpresa ao mximo, Allan D. Mercant chegara a expedir convites pessoais.Foi assim que s primeiras horas da manh daquele dia, dois bombardeiros Delta, da

    Federao Asitica e do Bloco Oriental, pousaram no enorme aeroporto do quartel-general.Os visitantes foram recebidos e cumprimentados por Mercant em pessoa. No entanto, ele

    tivera o cuidado de levar os recm-chegados em um trem fechado por uma das insondveisgalerias de gelo do quartel-general. De tal forma que eles j no saberiam indicar com

    preciso o lugar em que se encontravam. Viram-se num enorme salo, bem iluminado, ondereinava uma temperatura agradvel. Ningum diria que, por cima deles, havia uma camada degelo e rocha de quase trs quilmetros de espessura.

    Era a central de Mercant, o lugar para onde convergiam os laos que cimentavam aimponente unio defensiva do Ocidente.

    Verdadeiras tempestades de som pareciam irromper dos grandes amplificadores

    embutidos. O trabalho de transmisso do pessoal da televiso chinesa era excelente, talvez,at, um pouco demais.

    Teleobjetivas de grande potncia captavam toda a rea em que se situava o alvo. Os

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    olhos dos espectadores eram atormentados ininterruptamente por raios ofuscantes. O rugidoinfernal da detonao dos projteis misturava-se ao som grave dos pesados msseisteleguiados terra-terra, que eram disparados numa seqncia incrivelmente rpida das carretasrebocadas por veculos especiais.

    O espetculo j durava quinze minutos e o fim ainda no estava vista. Qualquerdilogo entre os presentes seria impossvel. A transmisso do bombardeio prendia todas asatenes, at que Mercant desligou abruptamente o receptor.

    Os tubos de imagem relampejaram. A imagem cintilou ligeiramente antes de apagar-sepor completo. O silncio passou a reinar no salo.

    Mercant passou a palma da mo pela calva reluzente. Parecia exibir tamanhaingenuidade que o marechal Petronskij no pde reprimir uma sensao desagradvel. Ochefe da Fora Aeroespacial do Oriente lanou um olhar suplicante para o homem esbelto, derosto impassvel que se encontrava a seu lado.

    Ivan Kosselov, chefe do Servio Secreto do Bloco Oriental, no movera um msculo daface durante a apresentao do espetculo. Por certo, achara conveniente conservar a mscarahabitual. Kosselov e Mercant j haviam travado muitas lutas silenciosas das quais o grande

    pblico nem chegava a suspeitar.Havia mais dois homens que chamavam a ateno. Eram Lao Lin-to, comandante

    supremo da Fora Aeroespacial da Federao Asitica, e Mao Tsen, um chins do Sul,enorme e de ossos salientes que, segundo se sabia, desempenhava as funes de chefe doServio Secreto da Federao Asitica.

    Dessa forma, as personalidades mais importantes e influentes dos trs grandes blocos depotncias estavam reunidas no abrigo central do QG do CID. Era um fato estranho; naverdade, mais que estranho.

    Os homens olharam-se. Os agentes e assessores, que se conservavam distncia, nosfundos do salo, mantiveram-se num silncio sepulcral. Ali, s os grandes estavam com a

    palavra.Mercant convidou os cavalheiros a entrarem na sala de conferncias. Os guardasretiraram-se. O recinto foi isolado hermeticamente do mundo exterior.

    O pigarro de Mercant parecia encerrar uma revelao, talvez uma advertncia. Ascabeas voltaram-se, os dedos comearam a brincar com os lpis e as canetas, os crebrosvigilantes tornaram-se mais alertas. O que desejaria Mercant?

    Falou no tom de quem sabe dissimular muito bem quaisquer preocupaes queporventura pudessem surgir entre suas palavras.

    Admiro a capacidade de resistncia do exrcito vermelho principiou em tomamvel. Cavalheiros. Apesar de todos os esforos da Federao Asitica, um ligeiro exame

    da tela ns d a impresso de que realmente estamos lidando com um poder infinitamentesuperior. Os dados assustadores, colhidos no curso dos acontecimentos das ltimas semanas, bastam para provar que nem os pases da OTAN, nem os do Oriente tm qualquer participao no que est ocorrendo. Fao questo de salientar este fato. Peo-lhesencarecidamente que confirmem que daqui por diante, de uma vez por todas, a nave espacialStardustdeixar de ser considerada uma base do Ocidente plantada para fins de provocaoem territrio submetido soberania da Federao Asitica. Por pouco, o equvoco no nosarrasta a uma catstrofe nuclear. Volto a assegurar-lhes que os cientistas do Ocidente noconhecem qualquer meio ou instrumento capaz de produzir fenmenos estranhos como os quese esto verificando. A Stardustpousou no deserto de Gobi contra a nossa vontade. Qual a

    sua opinio, Sr. Mao Tsen?O enorme chins voltou o rosto sombrio. Seus olhos escuros brilhavam numa expressoirnica.

    Ora, Mercant! soou a voz grave. Vim para terminar de vez este jogo de

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    esconde-esconde. claro que os senhores no seriam capazes de desenvolver armas dessetipo. Lamento que a desconfiana mtua nos tenha feito perder um tempo precioso. A nicacoisa que me interessa saber como o major Rhodan encontrou essas coisas. Pelo que medisseram, os fatos esto diretamente ligados ao primeiro pouso lunar.

    Ao segundo! soou uma voz fria.O sorriso de Mercant enrijeceu. O tom da voz do chefe da defesa do Oriente era

    inconfundvel. Um sorriso sombrio aflorou aos lbios do marechal Petronskij. Com o segundo pouso lunar tripulado insistiu Kosselov em tom inexpressivo.

    Fui autorizado a inform-lo a esse respeito. Nossa nave tripulada partiu trs meses antes daStardust. Como no costumamos divulgar nossos fracassos, a queda da nave, que para nscontinua sendo um mistrio inexplicvel, nunca foi dada ao conhecimento pblico.

    Poderia fazer o favor de nos fornecer informaes mais detalhadas? interveio ogeneral Pounder, chefe da Fora Espacial dos Estados Unidos. Em seguida, voltou o rosto

    plido e perturbado em direo a Mercant: Por que o Servio Secreto do Ocidente nuncachegou a saber disso?

    Pois no disse Kosselov. Acho que j no podemos dispensar um intercmbiosincero. Nossa nave caiu sobre a superfcie lunar. Sofremos uma perda total; no obtivemosqualquer comunicado, e no temos a mais leve indicao do que aconteceu. Sabemos, generalPounder, que a Stardustenfrentou problemas semelhantes, mas h uma diferena: depois do

    pouso forado, a tripulao voltou a entrar em contato com os senhores. Da se conclui, comtoda a segurana, que, pouco antes do pouso, a nave foi arrancada da rbita em virtude de umafalha do equipamento de teledireo. Foi exatamente o que aconteceu com a nossa nave. Face semelhana dos casos, resolvemos solicitar o seu auxlio. Temos motivo para acreditar quealgo de misterioso deve existir no nosso satlite. A interpretao dos dados disponveis leva,ainda, concluso de que o major Rhodan demonstrou mais habilidade que nossos homens. Ofato que foi mais feliz, pois conseguiu sobreviver ao pouso forado. No temos a menor

    explicao para o que aconteceu depois. H um fato bsico que assume a maior importncia:tanto a nave do Oriente como a do Ocidente enfrentaram situaes de grave emergncia emvirtude de defeitos no sistema direcional, surgidos sem causa aparente. impossvelresponsabilizar os blocos de potncias rivais pelo que aconteceu. Os fatos so estes.

    Mercant confirmou com a cabea. Cavalheiros, j lhes transmiti com todos os detalhes as notcias e explicaes

    recebidas do major Perry Rhodan. Nosso ex-piloto espacial comunicou simplesmente queencontrou na Lua vestgios de uma estranha civilizao dotada de inteligncia superior e umavano tecnolgico fantstico. de l que provm as armas e equipamentos infinitamentemais potentes que os nossos. Contrariando ordens que lhe demos, Rhodan pousou no deserto

    de Gobi. Da em diante, vem recusando qualquer contato conosco, limitando-se a dizer querepresenta a chamada terceira potncia. No momento, no estamos interessados na definiodesse termo. O que importa so os fatos, que, em ltima anlise, encontram seu remate numacpula energtica impenetrvel que representa o maior mistrio de todos os tempos.Acabamos de ver, com os nossos olhos, que de nada adianta um bombardeio com armasconvencionais.

    Pois dem-nos armas mais eficientes! disse o chins em tom amargurado. Faam alguma coisa para endireitar as conseqncias catastrficas da traio cometida pelo

    piloto dos senhores. A esta altura j devamos estar de acordo em um ponto: Perry Rhodaninveste contra todo o mundo. Transformou-se no inimigo pblico nmero um. Se no

    conseguirmos eliminar aquele misterioso campo de fora e reduzir a tripulao da Stardustimpotncia... ...nesse caso, poderamos ser forados a unir-nos interrompeu Mercant, num tom

    ligeiramente irnico.

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    Kosselov pigarreou. Lanou um olhar pensativo sobre os homens que se encontravamreunidos.

    Somos da opinio que, ao usar os meiosde que dispunha para impedir uma guerranuclear, Rhodan no praticou nenhum ato de alta traio. Pelo contrrio disse o marechalPetronskij. Os senhores mesmos, dominados pelo pnico, comprimiram os tais botes.Acontece que os msseis nucleares no explodiram. Portanto, se hoje podemos realizar estaconferncia, devemos isso a Perry Rhodan. este o lado positivo dos acontecimentos, e queno deve ser ignorado.

    Ningum est ignorando este aspecto observou Mercant com a voz tranqila. Todavia, cabe lembrar que dificilmente teria havido o to falado aperto de botes se Rhodanno tivesse pousado no territrio da Federao Asitica. Emitimos numerosas notas nas quaisasseguramos que esse pouso no correspondia aos nossos desejos. Apesar disso, Pequim

    preferiu acreditar que se tratava de uma base ocidental para fins de provocao. Mas,deixemos isso de lado! A esta altura s nos interessa saber de que forma poderemos chegar aum acordo.

    Alguma coisa deve ser feita disse Mao Tsen, enfatizando as palavras. Estamosdecididos a no tolerar a terceira potncia em territrio da Federao Asitica. O ato deRhodan constitui um crime contra a ordem mundial. Ele se ope a uma potncia soberana donosso planeta.

    O senhor devia considerar o ponto de vista de Rhodan disse o general Pounder emtom ressentido. Acho que nesta conferncia devemos usar de toda a franqueza. E, parafalar francamente, permita que lhe diga que, a meu ver, corresponde plenamente aos objetivosda paz mundial, que uma fora neutra exera certo controle sobre nossos atos. No necessrio ressaltar que, antes, reinava uma tenso horrvel no plano internacional. O pousode

    Rhodan no Gobi no foi o fator decisivo que fez com que os botes que acionam as

    armas nucleares fossem comprimidos no Oriente e no Ocidente. Talvez fosse a fagulha queprovocou a exploso, depois de termos acumulado quantidades enormes de explosivos numaguerra fria que j durava alguns decnios.

    O chefe do Servio Secreto do Bloco Oriental parecia nervoso. General Pounder disse com a voz apagada. At parece que o senhor continua a

    ver em Perry Rhodan a criana mimada do seu programa espacial. Permita que lhe diga quetambm ns no podemos concordar com essa potncia que surje de uma hora para outra. Semfalar na situao jurdica, completamente insustentvel, no h como nos rebaixarmos a tal

    ponto que nossos governos fiquem sujeitos s ordens de quem quer que seja! Quem nosgarante que Rhodan no se transformar em um imperador mundial? Por enquanto, seu reino

    pequeno; est reduzido imobilidade, j que se acha preso no interior daquela misteriosacapa protetora. Acho que j tempo de engajarmos o potencial industrial, e cientfico de todasas potncias na luta contra Rhodan. E, antes de mais nada, devemos descobrir quem est portrs dele. No acreditamos nas informaes do CID.

    Um sorriso forado esboou-se no rosto de Mercant. Ele se levantou. Estava pensativo. Eu os convidei a comparecerem ao quartel-general do CID para inform-los sobre os

    dados mais recentes colhidos por nossa organizao. Todos os fatos conhecidos foramprocessados pelo maior e mais potente dos computadores eletrnicos da Terra. Para nodificultar a obteno de um resultado final vlido, preferimos no formular questes sobre osaspectos favorveis ou desfavorveis de uma tecnologia avanada nas mos de um homem

    nascido em nosso planeta. Dessa forma, continua em aberto a indagao sobre se Rhodantenciona desempenhar o papel de guardio pacfico da humanidade, visando aodesenvolvimento e ao progresso, ou se pretende usar os instrumentos infinitamente superioresde que dispe para entregar-se a uma nova forma de imperialismo.

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    isso o que ele vai fazer! disse Kosselov, em tom exaltado. Que motivopoderia ter para no proceder dessa forma?

    Um momento disse Mercant, com uma cortesia glida. Aprecio a oportunidadedesse encontro, e todo homem inteligente e amante da paz devia fazer a mesma coisa. Nem

    por isso, porm, deixo de condenar a conduta ilegal de um homem que partiu como major daFora Espacial e retornou ao nosso planeta como ditador. Pouco importa que Rhodan tenha,ou no, feito um favor humanidade torturada por tantos pesadelos. O certo que impediuuma guerra nuclear. Nesse ponto, no posso deixar de concordar com o general Pounder.Todas as reaes nucleares conhecidas tornaram-se impraticveis. Estabelecemos uma unioforada que, a meu ver, forma os laos suaves que conduziro a uma coligao entre asgrandes potncias. Estamos todos unidos contra um homem. So estes os nicos fatosrelevantes a serem considerados nesta oportunidade. Gastamos semanas em indagaes sobreos acontecimentos misteriosos que, certamente, se desenrolaram na Lua. Os dados fornecidos

    por Rhodan j so do seu conhecimento. Seus servios de escuta captaram as mensagensradiofnicas trocadas entre o Comando Espacial dos Estados Unidos e o major Rhodan. Porelas se percebe que o major Rhodan insiste na afirmativa de ter encontrado na Lua as criaesde uma raa infinitamente superior, e que delas se apoderou em benefcio da humanidade.Recusa-se a entregar os produtos de sua descoberta a qualquer governo da Terra. claro que,sob o ngulo estritamente jurdico, cometeu os crimes de desero, alta traio e indisciplina,entre outros. Mas no devemos confundir causas com efeitos.

    Aqui, no podemos aplicar os padres jurdicos habituais, ainda mais que Perry Rhodanrenunciou sua patente e cidadania americana. Tornou-se, pois, um aptrida. Diz ser umcidado do mundo e no se submete autoridade dos juizes terrenos.

    uma posio juridicamente insustentvel! interrompeu Kosselov, em tomexaltado.

    Sem dvida confirmou Mercant. mais do que isso. A situao totalmente

    confusa. Mas ser prefervel deixarmos o nosso juzo a este respeito para quando tivermoscondies de adotar medidas prticas contra Rhodan. No momento, tudo no passa depalavras, e estas so totalmente infrutferas na situao em que nos encontramos. Devemosnos ocupar exclusivamente com fatos.

    Mercant sentou. Fez um ligeiro gesto com a mo. Uma enorme tela iluminou-se. Apartida da nave tripulada Stardustfoi apresentada.

    As imagens da nave foram surgindo. Finalmente, viram os preparativos para o pouso naLua, fotografados pelos instrumentos de bordo. As fotografias da estao tripuladaFreedom-Iforam apagadas. Eram excelentes filmes e registros em fita obtidos atravs de ondasinfravermelhas. Ouviu-se a ltima mensagem radiofnica de Rhodan. Logo aps soou o apito

    estridente do alarma eletrnico e o chiado agudo do pedido de socorro codificado QQRXQ. Oequipamento direcional automtico da Stardustdeu sinal da cessao do funcionamento dateledireo de Terra. As ltimas fotografias mostraram a nave se precipitando, em ngulo reto,sobre a superfcie da Lua, numa queda aparentemente descontrolada. Por fim, desapareceuatrs da curvatura do plo lunar.

    Mercant mandou desligar o aparelho. Acabamos de assistir aos preparativos da decolagem e a queda disse. At aqui,

    tudo foi claro. Acreditamos que tenha havido alguma falha ou acidente. Houve quem falasseem sabotagem. O que sabemos que, subitamente, a nave deixou de reagir aos impulsos dateledireo, embora seus receptores estivessem em perfeitas condies. O retorno Terra

    prova isso. So estes os resultados finais e incontestveis a que chegou o computadoreletrnico. Agora, os senhores vero o relatrio de tcnicos que analisaram os resultadosfornecidos aps a anlise dos ltimos dados. Dele se conclui, sem sombra de dvida, quePerry Rhodan no est sozinho. Atrs dele existe alguma coisa desconhecida, apavorante. Os

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    senhores ho de compreender que, por enquanto, intil realizar qualquer jogo deestratagemas jurdicos. O que importa saber quem detm o poder. Se for Rhodan, noteremos outra alternativa seno lembrar, com um sorriso amarelo, o velho ditado, segundo oqual o mais forte sempre tem razo. Concordam comigo?

    Kosselov j havia chegado mesma concluso. Os representantes da Federao Asiticaprotestaram em termos veementes. Mercant s pde dar de ombros.

    Sr. Mao Tsen, partilhamos irrestritamente da sua indignao. Acontece que noestamos em condies de tomar qualquer medida efetiva contra a invaso do seu territrio,

    praticada por Rhodan. Os senhores lanaram mo de suas divises de elite e as armas maisavanadas de que dispem. Qual foi o resultado? Dispararam projteis que valem milhescontra a indestrutvel muralha energtica. Rhodan no mexe um dedo. Segundo os princpiosda lgica conclui-se que o homem se sente invulnervel. Recomendo-lhes que desistam e secontentem com um bloqueio total da rea. Provarei que o verdadeiro mal est localizado naLua. Ao que parece, Rhodan no passa de uma figura subalterna de um grande jogo.

    Com estas palavras, Mercant exprimiu de forma indireta aquilo que um homem que seencontrava longe dali havia dito numa clarividncia notvel. Prosseguiu em tom firme:

    Para exterminar o mal pela raiz, teremos de pousar na Lua. Pousar ou atacar, tantofaz. Ouamos o relatrio sucinto de nosso computador.

    Voltando-se para os tcnicos, Mercant ordenou: Podem ligar.Ouviu-se um ligeiro estalido nos amplificadores, depois...

    Pressupe-se que os dados fundamentais sobre a decolagem e o pouso da nave sejamconhecidos. O retorno Terra foi levado a efeito sob controle eletrnico remoto. A penetraona atmosfera terrestre transcorreu normalmente. O acontecimento mais importante que levou constatao precisa desses fatos consiste no ato de rebeldia cometido pelo major Rhodan ao

    pousar no Gobi Central, em territrio asitico. O plano de construo e a planta de

    equipamentos da Stardustprovam que, antes da decolagem, seus tripulantes no tinham amenor condio de utilizar armas e instrumentos mais aperfeioados. A interpretao dosdados disponveis permite concluir com absoluta segurana que o comandante da Stardustencontrou, na Lua, produtos de uma indstria extraterrena.

    Que sabedoria! resmungou Mao Tsen, com ironia. At a j sabamos. s?A voz montona do aparelho voltou a soar. A tela mostrou o foguete na rea de pouso.

    Com base nas declaraes confusas do piloto Clark G. Fletcher, capito da ForaEspacial, verifica-se que o major Rhodan forou os membros da tripulao a tolerarem o

    pouso proibido. O capito Fletcher foi preso pelos servios australianos de segurana. Otratamento leviano a que foi submetido durante o interrogatrio produziu um derrame

    cerebral. Pelo que se depreende das gravaes em fita e dos relatrios mdicos, o sistema dememria de Fletcher foi inutilizado por um bloqueio hipntico parapsicolgico. Assimmesmo, conseguiu-se apurar sem sombra de dvidas que Fletcher foi obrigado a obedecer sordens de seu comandante. Os funcionrios que causaram a morte de Fletcher esto sendo

    processados. Que habilidade! ironizou o chins.O relatrio prosseguiu com uma apresentao detalhada dos resultados das

    investigaes. Fez uma reconstituio da conduta dos outros tripulantes, o Dr. Manoli e ocapito Reginald Bell, baseado nas escassas informaes fornecidas pelos agentes dosservios secretos do Ocidente e do Extremo Oriente.

    A exposio terminou com estas palavras: O desaparecimento misterioso do Dr. Frank Haggard, especialista em doenas dosangue, deve ser encarado como um aspecto importante. E a interpretao dos atos deRhodan, com base em cerca de onze milhes de possibilidades, d a explicao desse fato.

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    Admite-se, com 99% de probabilidades de acerto, que o major Rhodan trouxe Terra um servivo no-humano, que sofre de uma doena do sangue. O exame dos preparativos tomados

    pelo Dr. Haggard permite a concluso segura de que se trata de leucemia. Apurou-se quaisforam os aparelhos e medicamentos que levou consigo. A probabilidade de acerto de 100%.

    Desta vez, Mercant esperou, em vo, por qualquer objeo do chefe do Servio Secretoda Federao Asitica. Mao Tsen parecia estarrecido na sua poltrona.

    Incrvel! murmurou Kosselov.Mercant continuou a observar os presentes. O general Pounder estava mergulhado em

    profunda meditao. O relatrio foi concludo com uma observao lacnica: A declarao de Rhodan, de ter encontrado na Lua a herana abandonada de uma

    raa no-humana, e de ter conseguido utiliz-la pela forma j conhecida, rejeitada comabsoluta segurana, por no corresponder verdade. O exame cuidadoso dos dados tcnicos ecientficos leva concluso de que nenhum homem seria capaz de compreender, em poucosdias, o funcionamento de armas e aparelhos totalmente desconhecidos. A utilizao dachamada cpula energtica exige conhecimentos to estranhos espcie humana, que deles,nenhum engenheiro terreno dispe. Considerados todos os fatos, calculou-se com uma

    probabilidade de 100% que s o conhecimento aproximado da mecnica da cpula energticaexigiria trs ou quatro anos de trabalho de uma equipe de pesquisas altamente qualificada.Para o domnio completo do instrumental seriam necessrios outros trs ou quatro anos.Conhecemos o quociente intelectual dos quatro pilotos. Nunca seriam capazes de, numtrabalho conjunto, compreender a aparelhagem e, muito menos, p-la a funcionar. Eliminadosos dados irrelevantes e calculadas cuidadosamente sessenta e quatro milhes de

    possibilidades, chega-se com segurana absoluta ao fato de que, contrariamente sdeclaraes de Rhodan, este encontrou na Lua seres estranhos de inteligncia extraordinria. falta de dados bsicos no possvel apurar os objetivos especficos de Rhodan. Parecerecomendvel atacar com meios adequados a base dos seres desconhecidos, situada na Lua,

    ou tentar estabelecer relaes diplomticas.Com estas palavras, terminou o relato dos fatos interpretados pelo maior computador daTerra.

    Mercant levou duas horas para dar respostas s inmeras perguntas dos presentes.Clculos detalhados foram solicitados e fornecidos prontamente pela mquina. O computadordesenvolveu uma lgica perfeita e cristalina. Finalmente, Kosselov tocou no ponto crtico.

    No temos dvidas de que os dados fornecidos so corretos. O computadorrecomenda um ataque com meios adequados. Os senhores dispem desses meios? No necessrio ressaltar que nossas armas nucleares no tero qualquer efeito. No conseguimosnem romper a cpula protetora da Stardust! O que me diz, Sr. Mercant?

    Este lanou um olhar pensativo aos presentes. No trazia nos lbios o sorriso habitual. Em que condies esto suas naves espaciais, Kosselov? Nossa nave est pronta para decolar h uma semana. Com uma tripulao de seis

    homens e carga til de 92 toneladas.O general Pounder fungou. O que acabara de ouvir era um golpe. Seis homens, mais

    noventa e duas toneladas! O Bloco Oriental continuava um passo frente. O que nos diz, marechal Lao Lin-to? Podemos decolar a qualquer momento respondeu o comandante supremo da Fora

    Aeroespacial da Federao Asitica. Tripulao, quatro homens; carga til, 58 toneladas.Os defeitos que causaram a exploso de nossa primeira nave lunar foram removidos.

    Mercant pigarreou antes de falar. Amanh, a nave do Ocidente estar em condies de decolar. a Stardust-II. Atripulao continua a ser de quatro homens e a carga til de 64 toneladas. Peo-lhes que

    providenciem quanto antes um encontro dos tcnicos em naves espaciais. Todas as naves

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    devem partir da Terra ao mesmo tempo. Se houver diferenas sensveis no tempo previsto para o percurso, estas devem ser compensadas de tal forma que as trs naves entremsimultaneamente na mesma rbita lunar. Ser que conseguiro isso?

    Para qu? perguntou Kosselov, asperamente. Que tolice essa? Quer atacarcom qu? Se l em cima existe uma base ocupada por inteligncias superiores, nossos pilotostero uma surpresa bastante desagradvel. Afinal, quais so suas intenes?

    Mercant respondeu em tom delicado. Antes de mais nada, ser necessrio tomar providncias para que o comando das

    naves seja manual. Temos instrues para que lhes sejam fornecidos dados exatos sobre osinstrumentos de localizao que se tornam necessrios. A base desconhecida s pode estarlocalizada numa rea bem delimitada junto ao plo sul lunar.

    Mais tarde, forneceremos as coordenadas exatas. Sabemos perfeitamente em que pontonossa nave realizou o pouso forado. Os seres estranhos s podem estar em local prximo aeste ponto, circunstncia que confirmada pela interpretao dos dados realizada pelocomputador. Obtivemos dados muito mais abundantes do que se poderia imaginar. Estodispostos a trabalhar de mos dadas com o Ocidente?

    Depois de mais duas horas este ponto foi esclarecido e fixado por escrito num protocoloespecial de coalizo. S depois disso, Mercant apresentou seu grande trunfo.

    O senhor perguntou como atacaremos. Por favor, preste ateno!Desta vez foi um oficial do Ministrio da Defesa quem ligou a tela.Uma ilha minscula surgiu. Ao que parecia estava deserta. O caos teve incio com uma

    esfera de gases incandescentes. O rugido que saa pelos amplificadores no parecia dessemundo. As energias primitivas desencadeadas formavam uma coluna que subiuvertiginosamente ao cu azul. Vagas enormes, um calor terrvel, uma atmosfera dilacerante.

    Trata-se de nossa experincia mais recente declarou Mercant. uma bomba defuso de cem megatons. H trs meses conseguimos aplicar o princpio da fuso nuclear a

    frio, j estabelecido no campo terico. Isso significa que a nova bomba no depende de umdispositivo trmico para desencadear a fisso nuclear. A bomba cataltica funciona com baseem tomos de msio. Basta utilizar um dispositivo qumico de ignio que funciona a umatemperatura de apenas 3.865 graus centgrados para que a reao nuclear tenha incio. Notemos necessidade de nutrons livres. Dentro de quinze dias, a nova bomba cataltica estarem condies de ser transportada e, portanto, utilizada. Um grupo de transporte americanofar a entrega, de acordo com o protocolo que acaba de ser firmado. Por enquanto, preferimosno utilizar a nova bomba contra Perry Rhodan. Se destruirmos sua base na Lua, ele serender. Mais alguma pergunta?

    Muitas perguntas foram feitas. Todas elas conduziram a um fato incontestvel: nunca

    antes as grandes potncias tinham mostrado suas cartas mais secretas pela forma como oestavam fazendo naqueles dias.Um homem alto e louro, de gestos delicados, cujo rosto revelava bastante autocontrole,

    observava atentamente as reaes do chefe do Servio Secreto, um personagem quaseonipotente. E uma vez terminada a sesso, breve mas importante, pediu dispensa das funesde observador especial e oficial de ligao do Conselho Internacional de Defesa e solicitou

    permisso para atuar na China.Mercant atendeu ao pedido. Ao retirar-se, o homem alto teve a impresso de sentir o

    olhar do chefe pousado na sua nuca. Costumava-se dizer que o crebro de Mercant era dotadode qualidades excepcionais. De qualquer maneira, atendera ao desejo razoavelmente

    fundamentado de seu melhor agente. Mas no deveria ter sorrido de forma to estranha.L fora, ouviam-se os rugidos dos pesados bombardeiros Delta dos visitantes quedeslizavam sobre a pista. O QG do CID voltou rotina. Allan D. Mercant estava satisfeito,tanto quanto isso era possvel em meio aos acontecimentos.

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    No entanto, dizia-se que seu crebro possua uma elevada capacidade parapsicolgica. Equase todos os visitantes que naquele dia compareceram ao QG haviam menosprezado essefato. S um homem estava meditando a respeito. Para ele, a idia constitua um foco de

    permanente inquietao. Deixemos que os dados rolem murmurou Mercant.

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    III

    Duas horas da madrugada. Num gesto brusco, o homem magro que ostentava as divisasde tenente-general baixou a mo.

    No mesmo instante, irromperam as frias do inferno. As bocas de cerca de seis mil

    canhes e lana-foguetes comearam a cuspir fogo.Em toda a histria militar da humanidade jamais houvera um fogo cerrado como este.

    Nunca antes, mil e quinhentas baterias, quase todas compostas dos calibres mais pesados,concentraram seu fogo sobre um alvo que no era maior que um jardim.

    O cerco continuava, com a nica diferena que novas divises haviam sido mobilizadasnos ltimos trinta dias. Desde alguns dias antes, o territrio delimitado pela cpula energtica

    passara a ser bloqueado por um cordo quntuplo de tropas.Pouco depois da abertura do fogo, seis mil projteis de calibres variados golpearam a

    cpula protetora. A pontaria foi concentrada numa rea de cinqenta metros quadrados,situada a vinte metros acima do solo.

    Foi ali, e somente ali que detonaram cargas explosivas. Era a ltima tentativa de rompera muralha energtica, aps uma srie de ataques infrutferos.

    O QG ficava numa elevao, a treze quilmetros da linha divisria do territrio ocupadopor Rhodan.

    As posies de artilharia ficavam mais ao norte. As baterias pesadas foram instaladas atrinta quilmetros do alvo. Os canhes convencionais voltaram a ser utilizados, pois ao quetudo indicava o pequeno grupo que ocupava o territrio bloqueado fora reduzido imobilidade.

    J no se notava o menor indcio de um estado de ausncia de gravidade. Por isso, ogeneral Tai-tiang ordenara o novo ataque.

    Os oficiais de seu estado-maior olhavam fixamente para o alvo. Entre eles haviacientistas, inclusive peritos em armamentos. A fora de impacto dos projteis que atingiam oalvo ao mesmo tempo chegava a vrios milhes de toneladas. As ondas de presso que sesucediam sem cessar teriam sido suficientes para aplainar uma cadeia de montanhas. Ficaramobservando o espetculo durante quinze minutos, sem trocar uma nica palavra. A essadistncia, a rea atingida parecia uma mancha incandescente de dez centmetros, queconstante-mente expelia raios fulgentes.

    A cpula energtica, normalmente invisvel, emitia um brilho esverdeado. Junto ao localdos impactos assumia uma tonalidade violeta. Nada mais aconteceu. A cpula reluzente

    parecia um smbolo brilhante em meio noite impregnada de uma luminosidade vermelha.

    Este bombardeio arrasaria as fortalezas mais resistentes do mundo disse Tai-tiang,em tom ressentido. De que tipo de mquinas dispor essa gente? Como ser possvelresistir a um fogo cerrado destes com a mesma facilidade de quem se abriga de bolinhas degude atiradas contra uma parede de ao? O que est acontecendo?

    O chins voltou a cabea num gesto repentino. Seus olhos pareciam chispar fogo. Tai-tiang sabia perfeitamente que estava prestes a atirar outro bilho do patrimnio do povo contrauma parede misteriosa.

    Os ilustres cientistas envolvem-se num silncio desnorteante resmungou. Muito bem! Ser que seus colegas do Ocidente tm alguma coisa a dizer?

    As equipes de observao de americanos e europeus haviam chegado quinze dias atrs.

    A delegao do Bloco Oriental presenciara o fracasso catastrfico do Exrcito Asitico desdeo incio. Os conselhos e as recomendaes tornavam-se cada vez mais raros. E agora, oscolegas do Ocidente viram-se brindados com olhares irnicos.

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    Um dos maiores fsicos nucleares dos Estados Unidos procurou fazer-se ouvir por cimado trovejar dos canhes distantes. S com grande esforo, aos gritos, conseguiu ser entendido.

    Cavalheiros, deixamos perfeitamente claro aos senhores e aos seus governos que nemmesmo ns dispomos do elixir da sabedoria. Aqui nossos conhecimentos cientficos e aexperincia dos nossos tcnicos esbarram numa muralha intransponvel. Recomendoencarecidamente que voltem a consultar as equipes mdicas e psicolgicas. Se algo puder serfeito, isso s possvel atravs da prostrao nervosa dos inimigos que se encontramcercados.

    Tentaremos no devido tempo disse o comandante em tom nervoso. - Acha que foipor nada que tivemos o trabalho infernal de instalar estas baterias? Lanamos mo de quasetoda a frota de avies de transporte da Federao Asitica para garantir o abastecimento demunies. No compreendo que os senhores no estejam em condies de fornecer qualquerclculo aceitvel. Deve haver uma maneira de destruir esse complexo. Se para isso

    precisarmos de mais mil e quinhentas baterias, s avisar.A discusso tornou-se mais acalorada. A apenas treze quilmetros dali, um verdadeiro

    inferno foi desencadeado num espao bastante restrito. Eu ficaria louco se estivesse ali disse um civil de estatura baixa e lbios

    ressequidos. Seus olhos procuraram a figura alta em meio penumbra do abrigo deobservao.

    O homem aproximou-se. Apesar da elasticidade dos seus passos, parecia arrastar os ps.Quando surgiu na luz dbil das lmpadas semi-apagadas, seu rosto exprimia umatranqilidade surpreendente.

    Sem dizer uma palavra, dirigiu o potente binculo para oeste. Logo aps, lanou umolhar sobre o relgio.

    Perto dele, a luminosidade verde de um isqueiro rompeu a escurido. O tenente PeterKosnow, agente especial dos Servios Secretos do Oriente, fumava em baforadas rpidas e

    nervosas.Este, sentia-se tomado de sentimentos caticos. No era fcil ficar parado em meioquele ajuntamento de oficiais de alta patente. Em condies normais, Kosnow no teria dadoa menor importncia aos militares. At ento, os poderes extraordinrios de que se achavainvestido haviam bastado para manter um relacionamento satisfatrio tambm com esse tipode gente. Na maioria das vezes, tinham de submeter-se s ordens dele, que no passava de umsimples tenente do Servio Secreto. A situao no sofrera qualquer modificao, pelo menosnas aparncias. Enquanto no se conseguisse enxergar atrs da testa daquele homem robusto,ele continuaria a ser considerado o representante de uma organizao superpoderosa.

    Ele mesmo, porm, acreditava que todos notariam a inquietao de que se achava

    possudo. Tornou-se inseguro e insatisfeito consigo mesmo. Lutou para manter o autocontrolee esforou-se para no despertar a menor desconfiana.Pensou no cigarro que mal comeara a fumar. O brilho apagou-se. S o rosto estreito do

    homem que se encontrava diante dele destacou-se na luminosidade dos televisores.No ntimo, Kosnow comeava a duvidar de seu novo amigo. Nem por um segundo

    chegou a pensar na possibilidade de que o capito Albrecht Klein, agente especial doConselho Internacional de Defesa pudesse cometer uma tolice. O que no o impedia de acharque a audcia do colega constitua uma rematada loucura.

    Kosnow reprimiu um pigarro. A discusso travada em altas vozes entre os oficiais ecientistas veio bem a propsito pois fornecia uma verdadeira cortina sonora que encobria a

    conversa dos dois homens.Albrecht Klein, promovido havia apenas trs semanas pelo prprio Allan D. Mercant, aoposto de capito do CID, descansou o binculo num gesto vagaroso. Lanou um olharperscrutador para os homens que gesticulavam nervosamente. Permitiu-se um repuxo irnico

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    dos cantos da boca. So exatamente dez horas e dezoito minutos disse em voz baixa. O que houve,

    meu camarada? Seu rosto parece ter sido tirado de um museu de cera!Kosnow soltou um palavro. Sua voz tinha um tom gutural. Klein continuou:

    H seis horas que o grupo de transportes pousou na Sibria. A esta hora, a nave lunarde vocs j deve ter a bordo a nossa nova bomba. E eu no gosto de nada disso.

    Depois, em silncio, examinou o seu colega do Oriente com um olhar atento. Os olhosde Kosnow estavam fixados na cpula energtica que se desenhava nitidamente em meio noite.

    So formidveis cochichou ao ouvido de Klein. Se tivessem praticado o menorato que pudesse ser considerado um atentado aos direitos humanos eu seria o maior inimigodeles e tambm de voc. Mas como as coisas esto, no posso; e isso me deixa doente.Voc compreende, amigo?

    Klein deu uma risada. A quem vai dizer isso! S sei que impediram a guerra nuclear que estava para ser

    iniciada. Tambm sei que Rhodan no pretende favorecer qualquer das partes. Tenho ummedo terrvel de que amanh ou depois as coisas mudem. A desconfiana e o medo quereinavam entre os homens cederam porque um novo inimigo surgiu. Como se sentem diantede uma ameaa comum, adotam um procedimento comum. E isso vale muito. Ningum teriaalcanado a to desejada paz mundial de forma mais bela, rpida e eficiente. EnquantoRhodan desempenhar as funes de terceira potncia, ns formaremos uma unidade coesa.Quanto mais durar, tanto mais intensamente a idia do seu poderio inacreditvel penetrar namente dos homens e mais fortemente solidificaremos nossa unio. Se a situao perdurar pormais alguns anos ou dcadas, teremos uma Terra unida. Nestas condies, no vejo por quelanar mo de todos os recursos para eliminar Rhodan. Quando ele estiver liquidado, a guerrafria irromper de novo. Sejamos honestos quanto a isso!

    uma concluso clara e absolutamente lgica Kosnow esboou um sorriso triste. Mas h um seno. Ningum sabe que rumo tomar a personalidade de Rhodan. Ele nopassa de um homem, mesmo que estejamos entusiasmados por ele.

    Sou o nico homem que manteve contato pessoal com ele depois que pousou naTerra. Tambm sou o nico que viu o tal Crest. A esta altura, nossos ilustres chefes jchegaram concluso de que um ser extraterreno se encontra em companhia de Rhodan. Issorevela um poder de observao genial. Acontece que no viram Crest. Estou convencido deque Rhodan predestinado a cuidar de toda a Terra. Decida logo, Peter! Veja o nossoexemplo. Quando nos encontramos h cerca de dois meses, pegamos instintivamente nasarmas.

    Rotina. E reflexo condicionado retificou Kosnow. Pode ser. Tanto pior, se tivermos de nos exprimir por essa forma. A esta altura, achoque no mais que nosso dever fazer alguma coisa pelo mundo que vivemos. Para mim aguerra nuclear frustrada graas interveno de Rhodan representou o golpe final. Que diabo!At onde chegamos! Vivamos todas as horas do dia num medo constante do amanh. Noquero que isso se repita. Uma tentativa malograda basta! Bem, no tenho mais nada a dizer. Jo informei sobre o resultado da conferncia da Groenlndia. A bomba ainda um assuntorigorosamente confidencial. Nenhum dos homens que aqui se encontram sabe coisa alguma arespeito. At mesmo o general Tai-tiang um homem to sem importncia que no mereceser informado sobre a nova arma nuclear. Segundo a vontade dos grandes chefes, o

    bombardeio da cpula no passa de uma manobra planejada e executada de forma a mant-loocupado e para desviar a ateno que poderia ser atrada pelo lanamento de naves tripuladas.Depois que a base na Lua tiver sido destruda, os chineses evacuaro a rea e um bombardeiroocidental soltar uma nica bomba sobre a regio.

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    O capito Klein voltou a olhar para o relgio. Seus trajes escuros mal se destacavam daescurido que reinava no fundo do abrigo. Kosnow permaneceu calado. Seus dentes vigorososmorderam o lbio inferior. Ainda hesitava.

    Minha misso comear dentro de oito minutos. Voc participar dela. Decida logo!Aqui ainda podemos falar vontade.

    A figura de Klein submergiu na escurido. Alguns segundos depois, fez continncia aalguns oficiais uniformizados dos Servios Secretos das trs potncias que participavam daoperao.

    O representante do Servio de Defesa da Federao Asitica era o major Butaan; o doServio Secreto do Bloco Oriental, o coronel Kalingin; e o do CID, o coronel Cretcher.

    Haviam elaborado um projeto conjunto cujo valor prtico seria testado por um comandocomposto de agentes especiais do Ocidente e do Oriente.

    Peter Kosnow tambm surgiu na luz abafada. Gestos rpidos, palavras ditas em voz alta.O general Tai-tiang juntou-se aos homens que aguardavam. Seu aperto de mo foi

    cordial, mas seus olhos negros emitiam um brilho frio. Agirei conforme o combinado. Procurem executar os planos dos servios de defesa.

    Se conseguirem podero contar com a nossa gratido. Quando pretendem penetrar na reabloqueada?

    s trs em ponto, senhor respondeu o capito Klein. Pedimos-lheencarecidamente que volte a transmitir instrues precisas aos comandantes das respectivasunidades. No gostaramos que nossa gente nos matasse por engano.

    O general chins franziu a testa. Depois sorriu. Ao que parecia, a expresso nossagente soara um pouco estranha aos seus ouvidos.

    No se preocupem. No haver nenhum engano da nossa parte. O helicptero estesperando.

    Est na hora insistiu o coronel Cretcher.

    necessrio que nossos homens estabeleam contato antes do nascer do sol interveio o coronel Kalingin. Se Rhodan reagir conforme desejamos, podero suspender ofogo s oito da manh.

    Tomara que isso acontea murmurou Tai-tiang. Soltem o demnio em tempo etenham cuidado para no contaminar os nossos soldados. De que se trata?

    O coronel Cretcher no satisfez a curiosidade do chins. Trata-se de uma descoberta dos cientistas ocidentais limitou-se a dizer. O

    senhor h de permitir que nos retiremos.Klein e Kosnow desceram em companhia dos oficiais. Numa das salas do abrigo fora

    instalada a central de comando dos Servios Secretos. Um mdico aplicou as ltimas injees.

    Isso foi feito com uma seringa hipodrmica especialmente esterilizada e guardada, que injetouo medicamento diretamente na corrente sangunea. Alguma reao? perguntou o mdico. Tonturas, perturbaes do equilbrio,

    sensao de calor? Nada, doutor informou Klein. Tomara que isso faa efeito. No estou disposto

    a aparecer aos homens na forma de um monstro inchado. O senhor nem teria tempo para isso observou um dos radiobacteriologistas.

    Sob as condies qumicas aqui reinantes, os germes cultivados esto em condies de viver emultiplicar-se. A nica coisa que tm a fazer abrir s escondidas as vlvulas das pequenasgarrafas de presso. Um ligeiro chiado ser inevitvel. Tenham cuidado. No se esqueam de

    que, apesar das vacinas de alta eficcia, no ser conveniente que o jato de plasma entre emcontato com o rosto. O lquido est cheio de microorganismos dos tipos mais perigosos. Noposso revelar mais nada.

    Toda a rea situada no interior da cpula energtica ser contaminada? perguntou

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    Kosnow. O que mais voc quer? respondeu o coronel Kalingin, asperamente. Se

    conseguirmos introduzir esta substncia radiobiolgica na rea cercada pelo anteparo deradiao energtica, dentro de poucas horas toda e qualquer forma de vida estar extinta nointerior da cpula. Dessa forma, poderamos levantar acampamento. Nem mesmo o Dr.Haggard conhece qualquer remdio contra esses germes.

    Ao receber a garrafa de ao, que no tinha mais de quinze centmetros, o capito Kleinsentiu a garganta ressequida. Parecia um bujo de oxignio de um aparelho para respirao. Anica diferena que, ao contrrio daquele, sua carga era a mistura mais infernal jamais

    produzida nos laboratrios secretos dedicados guerra bacteriolgica.Ao que parecia, o coronel Cretcher estava percebendo a repugnncia de seu agente.

    Klein, quem lhe confiou esta misso foram os representantes oficiais de toda ahumanidade disse em tom apaziguador. Voc parece ter captado uma certa admiraode Perry Rhodan. H poucas semanas, este lhe permitiu que penetrasse na cpula energtica,onde mantiveram ligeira palestra. Tente entrar de novo. Diga que conseguiu passar sescondidas e contra a nossa vontade pelos cordes de tropas que isolam a rea, a fim deconferenciar com Rhodan a pedido de um grupo revolucionrio. Voc leva uma vantagemenorme: j o conhece. Uma vez l dentro, abra a vlvula da garrafa de presso sem que eledesconfie. Uma carga suficiente. Invente qualquer coisa para fazer com que Rhodan acreditena sua misso revolucionria. s.

    Klein engoliu em seco. Parecia ter os olhos em fogo no rosto plido. Sim, senhor disse com a voz pesada. Estou acostumado a fazer servios

    desagradveis, mas este negcio me parece muito sujo. O trabalho dos servios secretos nunca foi muito nobre resmungou Kalingin.

    Francamente, capito Klein, no compreendo os seus escrpulos. Nosso pessoal no costumaser assim.

    O coronel Cretcher lanou-lhe um olhar de advertncia. O rosto de Peter Kosnowcontinuava impassvel. Pois isso! observou o major Butaan. No disse mais nada, mas Klein teve a

    impresso de que o asitico seria um inimigo perigoso. O radiobilogo americano, cujo rostoestava um pouco plido, explicou:

    Capito, apesar das ordens que tenho quanto ao sigilo, compreendo seus escrpulos.Asseguro-lhe que essa arma no a mais diablica que temos em nosso arsenal. Os germesque se encontram nessas garrafas produzem uma infeco imediata, seguida de uma inchaodos tecidos do corpo. Mas se o antdoto for ministrado dentro de oito horas aps acontaminao, o restabelecimento absolutamente seguro. claro que dispomos desse

    antdoto. Portanto, tudo depender de Perry Rhodan, exclusivamente dele, que poder seguiras instrues que transmitiremos pelo rdio e pelos alto-falantes, abandonando o territriobloqueado dentro de oito horas. Acho que uma soluo humana.

    Klein preferiu no responder. No apenas seria intil, como tambm perigoso. O majorda Federao Asitica observava-o com uma expresso de desconfiana nos olhosentreabertos. Antes que os dois agentes se retirassem, Butaan disse, em tom enftico:

    O tenente Li Shai-tung, representante dos Servios Secretos da Federao Asitica,est esperando no helicptero. Fazemos questo de que ele tenha uma participao bastanteativa na misso especial. Entendido, capito Klein?

    O homem louro baixou os olhos para o malaio franzino.

    Perfeitamente, senhor! soou a resposta, proferida em tom frio. No vejonenhum motivo para que Li Shai-tung no participe.Klein lembrou-se das ordens que recebera. J se encontrava na sia o tempo suficiente

    para saber que ali no se costumava respeitar os melindres alheios. Isso aplicava-se

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    especialmente ao Servio Secreto da Federao Asitica. Se necessrio, dever sacrificar-se no interesse da causa comum foram as

    instrues. Klein sentiu um gosto amargo na boca.Pouco depois, os agentes se retiraram.Ao sarem do abrigo de grande profundidade, foram recebidos pelo rugido infernal das

    peas de artilharia. Ao norte, as bocas dos canhes expeliam sem cessar os seus lampejos parao cu. Parecia uma fita rubra feita de chamas.

    Diante do abrigo, o helicptero estava espera. O tenente Li encontrava-se no comando.J tinha recebido as ltimas injees. De acordo com o plano, aproximar-se-iam da cpulanum ponto situado alm da rea alvejada pela artilharia e ali procurariam entrar em contatocom Rhodan atravs do equipamento porttil de radiofonia.

    A mquina potente dos servios de defesa entrara em funcionamento. Nenhum detalhefora esquecido. Ningum cometera o menor engano.

    Havia, porm, uma circunstncia da qual ningum suspeitava. Nenhum dos oficiais tinhaa mais leve idia a respeito de como os trs se entendiam e no se tinha a mais levedesconfiana de que eles tambm estavam empenhados em preservar a paz para ahumanidade.

    E assim, um americano de descendncia alem, um russo e um chins subiram para ocu entrecortado de projteis. Depois de terem contornado a rea alvejada e quando seaproximavam da cpula energtica, Li Shai-tung perguntou, aps um ligeiro pigarro:

    Tudo em ordem por a? J esto cientes de que arriscamos nossas cabeas, no esto?Kosnow sorriu, mas no respondeu. Em vez disso, dirigiu-se a Klein num tom estranho:

    Agora, sejamos sinceros, camarada! Que tal seu chefe todo-poderoso? Por que vocficou preocupado com o sorriso que ele deu quando voc solicitou autorizao para estamisso especial? A idia da introduo dos germes na rea da cpula foi sua, no foi?

    Klein fez que sim. Empalidecera. Seus olhos claros exprimiam uma grande inquietao.

    Falando com a voz abafada, disse: Mercant um sujeito formidvel, mas nunca se sabe o que ele traz na cabea. Comele, at os melhores psiclogos falham. No h como interpretar seus atos. Dizem que dotado de faculdades espirituais extraordinrias.

    O que no estranho num mundo como o nosso. Sem dvida. Mas pela idade de Mercant, os genes de seus progenitores no podem

    ter sofrido qualquer dano. Quando ele nasceu, ningum ao menos desconfiava de reatoresatmicos ou bombas nucleares. Se o homem extraordinrio, as causas devem ser outras.Dizem que em todas as pocas houve casos de mutao espontnea.

    Por que isso o preocupa? Ele no o autorizou a realizar a misso?

    Autorizou disse Klein. Atendeu ao meu pedido de transferncia e atprovidenciou a arma biolgica. Apenas, ao despedir-me dele, tive a impresso de ter sidopenetrado at as profundezas mais recnditas dos meus pensamentos. Comportou-se como umadulto que percebe a travessura do filho, mas faz de conta que no sabe de nada. umasensao desagradvel.

    Os dois homens ficaram calados. Kosnow apagou o cigarro. Depois, comeou a falar,expondo com preciso suas idias.

    Existem duas possibilidades. Se adivinhou suas intenes, no tem objeo a quevoc d uma dica a Rhodan. Da se concluiria que est de acordo com as medidas tomadas porele. Talvez compreenda que sua atuao constitui a melhor garantia para a paz mundial. Seria

    mesmo de admirar se um homem com suas qualidades ainda no tivesse chegado a essaconcluso. Se no adivinhou, voc est vendo fantasmas. Mude de rumo, Li. D o sinalluminoso s tropas estacionadas em terra, seno poderemos receber uma rajada bem no meiodo peito.

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    Foi esse o comeo da misso daqueles trs homens que sabiam, no ntimo, o quanto seuschefes estavam totalmente enganados.

    O capito Klein segurou a garrafinha de presso. Antes que o helicptero iniciasse asmanobras de aterrissagem, disse em tom grave:

    Vejam s! Fabricamos esta coisa maldita para, eventualmente, atir-la na cabea devocs. Muito interessante, no ?

    No se preocupe ironizou Kosnow. Temos coisas parecidas. Tambm acreditoque j est na hora de destruirmos brinquedos deste tipo. Mas, oportunamente, teremos quetrocar algumas palavras sobre nossas concepes ideolgicas.

    Ainda bem que isso no interfere no seu desejo de paz disse Klein em tom irnico. No estava nas intenes do Criador que uns palhaos coloridos de ideologia andem sedespedaando apenas por no lhes convir a opinio dos outros homens, que tambm socriaturas de Deus.

    Voc fala que nem minha me murmurou Kosnow. Est certo. No falemosmais nisso. Estou ardendo de curiosidade para ver Perry Rhodan.

  • 8/2/2019 P-003 - A Abboda Energtica - K. H. Scheer

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    IV

    Os homens resolveram resguardar-se com os grossos abafadores, como se o simples fatode estarem protegidos das violentas ondas de som fosse a mais eficiente panacia contra o

    poderio dos atacantes.

    Com um gemido abafado e medo nos olhos, haviam colocado os capacetes poucossegundos aps um novo ataque de artilharia. S mais tarde ligaram os contatos dos aparelhosde comunicao.

    Perry Rhodan j chegara concluso de que as coisas no poderiam continuar comoestavam. Os acontecimentos pareciam evoluir inexoravelmente em direo a uma catstrofe.