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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS PAULO EDUARDO SILVA MALERBA O SINDICALISMO BANCÁRIO NOS GOVERNOS DO PT CAMPINAS 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

PAULO EDUARDO SILVA MALERBA

O SINDICALISMO BANCÁRIO NOS GOVERNOS DO PT

CAMPINAS 2017

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PAULO EDUARDO SILVA MALERBA

O SINDICALISMO BANCÁRIO NOS GOVERNOS DO PT

Tese apresentada ao Instituto de

Filosofia e Ciências Humanas da

Universidade Estadual de Campinas

como parte dos requisitos exigidos

para obtenção do título de Doutor em

Ciência Política.

Profª. Drª. Andréia Galvão (orientadora)

Este exemplar corresponde à versão

final da Tese defendida pelo aluno

Paulo Eduardo Silva Malerba, em

13/12/2017, sob a orientação da Profª

Drª Andréia Galvão.

CAMPINAS

2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS

A Comissão Julgadora dos trabalhos de Defesa de Tese de Doutorado,

composta pelas Professoras Doutoras a seguir descritas, em sessão pública

realizada em 13/12/2017, considerou o candidato Paulo Eduardo Silva

Malerba aprovado.

Titulares

Profª Drª Andréia Galvão – Universidade Estadual de Campinas

Profª Drª Ângela Maria Carneiro Araújo – Universidade Estadual de Campinas

Profª Drª Selma Borghi Venco– Universidade Estadual de Campinas

Profª Drª Patrícia Vieira Trópia –Universidade Federal de Uberlândia

Profª Drª Nise Maria Tavares Jinkings – Universidade Federal de Santa Catarina

A ata de defesa, assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta

no processo de vida acadêmica do aluno.

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AGRADECIMENTOS

A realização desse trabalho contou com a importante ajuda, parceria e

contribuição de muitas pessoas e entidades. Nesse breve momento, quero deixar

registrados.

Agradeço sobremaneira ao apoio desde sempre de meus pais, Paulo e

Celeste, que incentivaram, apoiaram e se empenharam muito para que eu tivesse

acesso ao universo das letras e dos estudos. Assim, eu pude considerar a

trajetória acadêmica como uma possibilidade real – esse direito que, infelizmente,

é reservado à minoria de nosso povo, marcado por profundas desigualdades no

acesso aos bens culturais e educacionais. Um dos propósitos em seguir

estudando e trabalhando é buscar transformar essa realidade. O suporte de minha

família, incluindo minhas irmãs, Paula e Carol, e minha sobrinha, Duda,

propiciaram o acolhimento e o apoio necessários para seguir em frente em todos

os momentos.

Sou muito grato à minha esposa Maria, que durante os anos em que

percorri o mestrado e o doutorado foi fonte de amor, estímulo e paciência, de

mútua admiração e enriquecedoras conversas.

Minha orientadora Andréia Galvão foi figura central nessa pesquisa,

pelo seus aconselhamentos, parceria e generosidade intelectual, que

impulsionaram descobertas e abriram caminhos de novos e significativos

conhecimentos. Desde o mestrado temos trabalhado juntos. Devo a ela, da

mesma forma, agradecimentos pela paciência, pois fui um orientando envolvido

nos trabalhos sindicais e políticos, ora desempenhei mandato parlamentar, ora fui

candidato e, assim, dividi meu tempo em muitas atividades. Persistimos,

acreditamos e, enfim, alcançamos este resultado.

Em minha banca de qualificação tive sugestões valiosas e críticas

bastante construtivas dos professores Armando Boito Junior e José Dari Krein,

indispensáveis para apontar direções e trilhas para realizar o estudo. Deixo

registrada minha gratidão. Assim como à banca de defesa da tese que, por uma

feliz coincidência, foi composta exclusivamente por mulheres, o que não é muito

comum no mundo acadêmico, nem sindical. Agradeço a todas as professoras pela

excelente arguição que realizaram, contribuindo para o aprimoramento de minhas

reflexões e de meu trabalho.

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Aos tantos companheiros e companheiras sindicalistas,

pesquisadores/as e ativistas, que se dispuseram a discutir os temas presentes na

tese, cederam materiais e dialogaram, em muitas conversas. Seria, talvez, injusto

mencionar nomes e cometer o erro de não citar alguém, desse modo, agradeço

aos dirigentes e ex-dirigentes do Sindicato dos Bancários de Jundiaí, pois sempre

contei com o apoio desses importantes companheiros, que me respaldaram e

tiveram a compreensão da dedicação que demanda a realização do doutorado; do

Sindicato dos Bancários de São Paulo, fonte de muitas pesquisas e de

documentos fundamentais da história do sindicalismo e dos trabalhadores

brasileiros; da Fetec/CUT-SP, da Contraf/CUT e da Fenae, que forneceram

subsídios muito necessários para aprofundar a pesquisa.

Aos amigos e amigas, que sempre estiveram ao meu lado nesse

percurso, alguns desde a graduação. A Danielle Tega, que me ajudou na revisão

deste texto e em tantos momentos de minha trajetória, com grande generosidade;

Pedro Nolasco, Lucas Forlevisi, Sérgio Bianchini, de bons e preciosos diálogos. A

Miriam Nutti, que me ajudou e disponibilizou diversos materiais de pesquisa. Os

companheiros de Ciências Sociais e da pós-graduação em Ciência Política da

Unicamp, Marcos Vieira, Felipe Dittrich, Paulo Silvino, Guilherme Aguiar, Arthur

Aquino, Érika Amusquivar, Thiago Trindade, cada um em seu momento,

caminharam comigo e foram importantes fontes de conversas informais e

discussões acadêmicas. As queridas amigas Anabele Silva, Maíra Mansur e

Bianca Calenzo, com as quais mantenho sempre o diálogo sobre o mundo do

trabalho e sobre nossas vidas.

Agradeço aos professores e professoras que fizeram parte de minha

formação, desde o começo aos últimos anos. Sem eles e sem elas não seria

possível explorar o universo do conhecimento e apresentar alguma, ainda que

modesta, contribuição. Aos funcionários do IFCH e da Unicamp, que sempre

foram solícitos, na secretaria, na manutenção, no xerox, no CPD, na DAC, em

todos os espaços indispensáveis para a universidade. Ao povo paulista e aos

defensores da educação pública, minha gratidão, pois é quem sustenta uma

universidade de excelência como a Unicamp, imprescindível no desenvolvimento

intelectual e científico do país, algo que nos deixa a todos orgulhosos e

comprometidos com seu aperfeiçoamento.

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O cofre do banco contém apenas dinheiro;

frustra-se quem pensar que lá encontrará riqueza.

Carlos Drummond de Andrade

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RESUMO

A categoria bancária é uma das mais organizadas do país. Ao longo de sua história constituiu-se como importante referência para a classe trabalhadora em diversos setores. Esta tese tem por objetivo examinar a dinâmica do sindicalismo bancário durante os governos federais do Partido dos Trabalhadores (PT) (2003 a maio de 2016). Para isso, debate interpretações que foram feitas sobre esses governos e de que forma se moldaram as relações políticas com o movimento sindical. Busca-se compreender as continuidades e as mudanças nas dimensões políticas, de organização, reivindicação, negociação e mobilização dos bancários. O período foi permeado por reconfigurações sindicais, inclusive na categoria, que levaram a novos rearranjos políticos. A tese discute as estruturas sindicais, as disputas internas entre diferentes correntes e perspectivas, o perfil do trabalhador e seu engajamento em ações coletivas, as pautas de reivindicações e as atividades políticas construídas pelos sindicatos. Observou-se que o movimento sindical bancário manteve a capacidade de realizar mobilizações e logrou melhorias frente a uma conjuntura política e econômica favorável durante a maior parte do período. Com isso, ampliou conquistas econômicas, cláusulas sociais e na atuação sindical, que podem ser medidas pelo exame da Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) e pela quantidade de greves que foram realizadas. Isso é algo que diferencia este contexto do período anterior. Por outro lado, permaneceram problemas relacionados às condições de trabalho e à flexibilização das relações de trabalho. Dessa forma, a tese analisa as terceirizações; o modelo de gestão realizada pelos bancos, que ocasiona forte pressão sobre os trabalhadores; as desigualdades de remuneração e oportunidades entre os trabalhadores; a estrutura sindical corporativa, que levou à fragmentação do setor financeiro em diversas categorias ao longo das últimas décadas, e, por fim, as medidas adotadas pelo sindicalismo para reverter a fragmentação, mas que ainda se revelam incipientes.

Palavras-chaves: Partido dos Trabalhadores - Brasil, sindicato bancários - Brasil, negociação coletiva do trabalho, participação política - Brasil, relações trabalhistas, greves e lockouts - Brasil

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ABSTRACT

The banking category is one of the most organized in Brazil. Throughout its history it has constituted like important reference for the working class in diverse sectors. This thesis aims to examine the dynamics of banking syndicalism during the federal governments of the Workers' Party (PT). To that end, it debates interpretations that have been made about these governments and how political relations have been shaped by the trade union movement. It seeks to understand the continuities and changes in the political dimensions of organization, demand, negotiation and mobilization of bankers. The period was permeated by union reconfigurations, including in the category, which led to new political rearrangements. The thesis discusses union structures, internal disputes between different currents and perspectives, the profile of the worker and his engagement in collective actions, the patterns of demands and the political activities built by the unions. It was noted that the banking syndical movement maintained the capacity to mobilize and obtain improvements face a favorable political and economic environment during most of the period. As a result, it expanded economic achievements, social clauses and union activities, which can be measured by examining the Collective Labor Convention (CCT) and by the number of strikes that were carried out in the period. This is something that sets this context apart from the previous period. On the other hand, problems related to working conditions and flexibilization remained. Thus, the thesis also analyzes outsourcing; the model of management carried out by the banks, which causes strong pressure on the workers. The inequalities of remuneration and opportunities among workers; the corporate trade union structure, which has led to the fragmentation of the financial sector into several categories over the last decades, and, finally, the measures taken by trade unionism to reverse the fragmentation, but which are still incipient. Keywords: Workers Party – Brazil, Banking trade-union – Brazil, Workers Collective bargaining, Political participation – Brazil, Labor relations, Strikes and lockouts - Brazil

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RÉSUMÉ La catégorie bancaire est l'une des des mieux organisées du pays. Tout au long de son histoire il a constitué comme référence importante pour la classe ouvrière dans divers secteurs. Cette thèse vise à examiner la dynamique du syndicalisme bancaire au cours des gouvernements fédéraux du Parti des Travailleurs (PT). À cette fin, il débat des interprétations qui ont été faites à propos de ces gouvernements et de la façon dont les relations politiques ont été façonnées par le mouvement syndical. Il cherche à comprendre les continuités et les changements dans les dimensions politiques de l'organisation, de la demande, de la négociation et de la mobilisation des banquiers. La période a été imprégnée par les reconfigurations syndicales, y compris dans la catégorie, qui ont conduit à de nouveaux réarrangements politique. La thèse discute sur les structures syndicales, les conflits internes entre les différents courants et perspectives, le profil du travailleur et son engagement dans les actions collectives, les modèles de revendications et les activités politiques construites par les syndicats. Il a été noté que le mouvement syndical bancaire a maintenu sa capacité à se mobiliser et à s'améliorer dans un environnement politique et économique favorable pendant la plus grande partie de la période. En conséquence, il a élargi les réalisations économiques, les clauses sociales et les activités syndicales, ce qui peut être mesuré en examinant la convention collective du travail (CCT) et le nombre de grèves qui ont été menées au cours de cette période. C'est quelque chose qui distingue ce contexte de la période précédente. D'un autre côté, les problèmes liés aux conditions de travail et à la flexibilisation demeurent. Ainsi, la thèse analyse l'externalisation; le modèle de gestion effectué par les banques, ce qui provoque une forte pression sur les travailleurs; les inégalités de rémunération et d'opportunités parmi les travailleurs; la structure syndicale corporative, qui a conduit à la fragmentation du secteur financier en plusieurs catégories au cours des dernières décennies, et, enfin, les mesures prises par le syndicalisme pour l'inverser, mais qui sont encore naissantes. Mots-clés: Parti des travailleurs - Brésil, syndicat bancaire - Brésil, négociation collective, participation politique - Brésil, relations de travail, grèves et lock-out - Brésil

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Índice de gráficos

GRÁFICO 1. INVESTIMENTOS PÚBLICOS NO BRASIL 43 GRÁFICO 2. CARTEIRAS DE CRÉDITO NO BRASIL 44 GRÁFICO 3. RENTABILIDADE DOS BANCOS ATUANTES NO BRASIL 47 GRÁFICO 4. COMPARAÇÃO ENTRE SPREAD E RSPL/ROE DOS BANCOS NO BRASIL 49 GRÁFICO 5. COMPARAÇÃO ENTRE SPREAD E RSPL/ROE DOS BANCOS NO BRASIL E

EM PAÍSES SELECIONADOS 50 GRÁFICO 6. EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E BALANÇA COMERCIAL DE 1995 A 2016

51 GRÁFICO 7. EXPORTAÇÕES E IMPORTAÇÕES DE BENS E SERVIÇOS 52 GRÁFICO 8. PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL NO PIB POR SETOR ECONÔMICO 53 GRÁFICO 9. VARIAÇÃO REAL DOS REAJUSTES SALARIAIS EM RELAÇÃO AO INPC 65 GRÁFICO 10. A EVOLUÇÃO DO EMPREGO BANCÁRIO 1990 - 2016 90 GRÁFICO 11. IDADE DO TRABALHADOR/A BANCÁRIO/A 98 GRÁFICO 12. PARTICIPAÇÃO DE HOMENS E MULHERES NO SETOR BANCÁRIO FONTE:

CENSOS FEBRABAN 2008 E 2014 99 GRÁFICO 13. ESCOLARIDADE DOS TRABALHADORES BANCÁRIOS 100 GRÁFICO 14. REMUNERAÇÃO REAL MÉDIA DOS BANCÁRIOS ENTRE 2004 E 2015 101 GRÁFICO 15. NÚMERO DE PROMOÇÕES DOS BANCÁRIOS 102 GRÁFICO 16. NÚMERO DE AGÊNCIAS BANCÁRIAS E CORRESPONDENTES

BANCÁRIOS (2007-2016) 146 GRÁFICO 17. PARTICIPAÇÃO DAS TRANSAÇÕES POR CANAIS INDIVIDUAIS 149

Índice de tabelas

TABELA 1. ACORDOS SALARIAIS POR ANO 66 TABELA 2. TEMPO DE EMPREGO NO SETOR BANCÁRIO 97 TABELA 3. ENTIDADES SINDICAIS BANCÁRIAS SEGUNDO SEU PORTE 118 TABELA 4 . TRABALHADORES DO RAMO FINANCEIRO 166 TABELA 5. REAJUSTES ENTRE 1995 E 2002: FENABAN (PARA BANCOS PRIVADOS E

ESTADUAIS) 183 TABELA 6. REAJUSTES ENTRE 1995 E 2002: ACORDOS DO BANCO DO BRASIL 184 TABELA 7. REAJUSTES ENTRE 1995 E 2002:ACORDOS DA CAIXA ECONÔMICA

FEDERAL 185 TABELA 8 - PROPORÇÃO DA PLR SOBRE O LUCRO LÍQUIDO DOS BANCOS 194 TABELA 9 - RELAÇÃO ENTRE RECEITAS COM SERVIÇOS E TARIFAS DOS BANCOS E

DESPESAS COM PESSOAL 215

Índice de quadros

QUADRO 1. DIRIGENTES SINDICAIS DA CONTRAF POR SINDICATO (ELEIÇÃO DE 2015) 109

QUADRO 2. DIRIGENTES SINDICAIS DA CONTRAF PELOS BANCOS EM QUE OS DIRIGENTES SÃO EMPREGADOS (2015) 110

QUADRO 3. OS 15 MAIORES SINDICATOS DE BANCÁRIOS DO BRASIL (OUT/16) 116 QUADRO 4- DIAS DE GREVE DE TODA CATEGORIA BANCÁRIA (2004 A 2015) 212 QUADRO 5- REAJUSTES SALARIAIS DOS BANCÁRIOS ENTRE 2003 E 2015 (ACORDOS

COM A FENABAN) 219 QUADRO 6- DIREITOS ADQUIRIDOS PELOS BANCÁRIOS ENTRE 2003 E 2015 220 QUADRO 7- PRINCIPAIS ITENS DA CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO DA

CATEGORIA BANCÁRIA (2015) 225

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Siglas

ACT Acordo Coletivo de Trabalho

ANABB Associação Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil.

APCEF Associação do Pessoal da Caixa Econômica Federal

BANDES Banco de Desenvolvimento do Espírito Santo

BANESE Banco do Estado de Sergipe

BANESTES Banco do Estado do Espírito Santo

BANPARÁ Banco do Estado do Pará

BASA Banco da Amazônia

BB Banco do Brasil

BC/Bacen Banco Central do Brasil

BDMG Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais

BESC Banco do Estado de Santa Catarina

BNB Banco do Nordeste

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BPC Benefício de Prestação Continuada

BRB Banco de Brasília

BRDE Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul

BRICS Bloco de países: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

CAGED Cadastro Geral de Empregados e Desempregados

CAT Central Autônoma dos Trabalhadores

CAT Comunicado de Acidente de Trabalho

CCS Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional

CCT Convenção Coletiva de Trabalho

CDES Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social

CEF Caixa Econômica Federal

CESIT Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho

CGT Central Geral dos Trabalhadores

CLT Consolidação das Leis Trabalhistas

CMN Conselho Monetário Nacional

CNB Confederação Nacional dos Bancários

CNFBB Congresso Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil

CNI Confederação Nacional da Indústria

CONECEF Congresso Nacional dos Empregados da Caixa Econômica Federal

CONTAG Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura

CONTEC Confederação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Crédito

CONTRAF Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro

CSC Corrente Sindical Classista

CSD CUT Socialista e Democrática

CSP Central Sindical e Popular

CTB Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil

CUT Central Única dos Trabalhadores

DEM Partido Democratas

DIEESE Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos

DNB Departamento Nacional dos Bancários

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DS Democracia Socialista

FBP Frente Brasil Popular

FEBRABAN Federação Brasileira de Bancos

FEEB Federação dos Empregados em Estabelecimentos Bancários

FENABAN Federação Nacional dos Bancos - braço sindical patronal

FENAE Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal

FENASEG Federação Nacional de Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e Previdência Complementar Aberta

FES Frente de Esquerda Socialista

FETEC Federação dos Trabalhadores em Empresas de Crédito

FIESP Federação das Indústrias do Estado de São Paulo

FNT Fórum Nacional do Trabalho

FPSM Frente Povo Sem Medo

FST Fórum Sindical dos Trabalhadores

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INPC Índice Nacional de Preço ao Consumidor

INSS Instituto Nacional do Seguro Social

MAIS Movimento por uma Alternativa Independente e Socialista

MAS Movimento Alternativa Socialista

MBA Master in Business Administration

MES Movimento Esquerda Socialista

MNOB Movimento Nacional de Oposição Bancária

MPT Ministério Público do Trabalho

MRT Movimento Revolucionário dos Trabalhadores

MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

MTE Ministério do Trabalho e Emprego

MTL Movimento Terra, Trabalho e Liberdade

MTS Movimento por uma Tendência Socialista

MTST Movimento dos Trabalhadores Sem Teto

NCST Nova Central Sindical dos Trabalhadores

OIT Organização Internacional do Trabalho

PAA Programa de Aposentadoria Antecipada

PAC Programa de Aceleração do Crescimento

PAS Programa de Assistência Social

PCB Partido Comunista Brasileiro

PcD Pessoa com Deficiência

PCdoB Partido Comunista do Brasil

PCO Partido da Causa Operária

PDV Programa de Demissão Voluntária

PEA População Economicamente Ativa

PEB Pesquisa do Emprego Bancário

PIB Produto Interno Bruto

PLR Participação nos Lucros e Resultados

PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PPE Programa Próprio Específico

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PPR Programa Próprio de Resultados

PPS Partido Popular Socialista

PROER Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional

PROFIF Programa de Fortalecimento das Instituições Financeiras Federais

PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

PSDB Partido da Social Democracia Brasileira

PSOL Partido Socialismo e Liberdade

PSTU Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado

PT Partido dos Trabalhadores

RAIS Registro Anual de Informações Sociais

RSPL Retorno Sobre Patrimônio Líquido

SDS Social Democracia Sindical

SEEA Sindicato dos Empregados de Agentes Autônomos do Comércio e em Empresas de Assessoramento, Perícias, informações e pesquisas e de Empresas de Serviços Contábeis no Estado de São Paulo

SEEB Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários

Sindpd Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do Estado de São Paulo

SINTETEL Sindicato dos Trabalhadores em Telecomunicações

SINTRATEL Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing

SIPON Sistema de Ponto Eletrônico

TAC Termo de Ajuste de Conduta

TI Tecnologia da Informação

TST Tribunal Superior do Trabalho

UGT União Geral dos Trabalhadores

UNASUL União de Nações Sul-americanas

UNE União Nacional dos Estudantes

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Sumário

Introdução ..................................................................................................................... 16

Capítulo 1: O impacto da conjuntura política na organização sindical ....... 30

1.1 – O debate sobre a caracterização dos governos petistas ....................... 30

1.2 – Problematizando o debate sobre os governos do PT ............................. 42

1.3 – A relação do movimento sindical com o governo ................................... 56

1.4 – A reorganização do sindicalismo brasileiro .............................................. 59 1.4.1 Rupturas e divergências na CUT .................................................................. 61

2.1 – Trabalhadores de classe média e sindicalismo de classe média ........ 67 2.1.1 O sindicalismo bancário em perspectiva ................................................... 71

2.1.2 O perfil social, político e ideológico do trabalhador nos bancos ........ 76

2.2 – A elevação e a queda do emprego bancário no período ....................... 89

2.3 – Desigualdades internas nos bancos ........................................................... 94

Capítulo 3 – Organização e disputas na categoria ......................................... 106

3.1 – As estruturas e organizações presentes no sindicalismo bancário . 106

3.2 – A estabilidade no número de sindicatos na categoria ......................... 117

3.3 – As centrais e tendências atuantes no sindicalismo bancário ............ 121

3.3.1 A hegemonia da corrente Articulação/CUT ............................................. 128 3.3.2 Legitimidade social do sindicalismo bancário ....................................... 139

3.4 – Desafios à representação sindical ............................................................. 144 3.4.1 Terceirizações, tecnologia e novos desafios nas relações de trabalho ....................................................................................................................................... 144

3.4.2 A representação de trabalhadores do setor financeiro: um processo incipiente ..................................................................................................................... 161

Capítulo 4 - Entre a sustentação política e a crítica: o sindicalismo bancário e os governos do PT ................................................................................................ 172

4.1 – As correntes sindicais bancárias e os governos petistas ................... 175

4.2 – As disputas na formulação e na centralidade das pautas ................. 181 4.2.1 Mesa única de negociação e campanha salarial .................................... 181

4.2.2 PLR e metas ..................................................................................................... 190

4.3 – Retomada e rotinização das greves........................................................... 201

4.4 – O perfil das greves ......................................................................................... 206

4.5 – Ciclo de conquistas e ampliação da CCT................................................. 217

4.6 – O final do ciclo petista e a posição das correntes bancárias ............. 227

Considerações finais ............................................................................................... 234

Referências bibliográficas: .................................................................................... 239

ANEXOS ...................................................................................................................... 250

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16

Introdução

O objetivo desta tese é interpretar a dinâmica do movimento sindical

bancário nos governos do PT. Para isso, procurei observar as mudanças,

permanências e conflitos entre esses governos e os anteriores, considerando

fatores conjunturais e estruturais. O período estudado, entre 2003 e 2015,

representou uma mudança política substancial em relação ao período

imediatamente anterior. Os governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, ambos

do Partido dos Trabalhadores (PT), tinham origem e relação política próximas

ao movimento hegemônico na categoria bancária, o que produziu impactos no

sindicalismo do setor. Assim, a questão que procuramos investigar foi em que

medida governos identificados com o campo popular repercutiram nas

concepções políticas, de organização, mobilização e negociação dos

bancários.

À primeira vista, o movimento sindical bancário manteve a

capacidade mobilizatória e se beneficiou da conjuntura política e econômica

favoráveis, que prevaleceram durante a maior parte do período. Com isso,

obteve conquistas de ordem econômica, social e na ação sindical, que podem

ser medidas pelo exame da Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) e pela

quantidade de mobilizações, em particular greves, que foram realizadas no

período, algo que se diferencia muito dos anos 1990. Por outro lado, no que

tange os aspectos mais estruturais das relações de trabalho, não houve

mudanças substantivas. Por aspectos estruturais refiro-me aos regimes de

contratação, em particular aos contratos atípicos, como a terceirização, e às

condições de trabalho vinculadas ao modelo de gestão realizada pelos bancos,

autoritária e baseada em metas, que ocasionam forte pressão sobre os

trabalhadores, bem como às desigualdades entre homens e mulheres, brancos

e negros. Tais aspectos estendem-se à organização sindical, engessada por

uma conformação que, como veremos ao longo da tese, permitiu a divisão da

categoria em diversas outras, impedindo mobilizações com trabalhadores do

setor financeiro, por exemplo.

Isso não significa que as questões estruturais não estiveram

presentes na discussão do sindicalismo bancário. Ao analisar a pauta, ou

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17

melhor definindo, a minuta de reivindicações ao longo dos anos, todos esses

temas estão presentes. No entanto, não ocuparam lugar central nas lutas da

categoria, na discussão com as bases e no enfrentamento com os bancos.

Apenas o tema da saúde, ligado às condições de trabalho, teve relevância –

embora tenha evoluído pouco na realidade diária do trabalhador. As greves

eram encerradas quando se apresentavam propostas econômicas e

benefícios, deixando em segundo plano essas questões estruturais. A hipótese

com a qual trabalho baseia-se, portanto, no antagonismo entre conjuntura e

estrutura em relação à atuação do sindicalismo bancário de 2003 a 2015: por

um lado, aspectos econômicos e relativos à obtenção de benefícios foram

alterados, especialmente pela via da formalização de conquistas por meio do

instrumento de negociação coletiva anual; por outro lado, problemas

substanciais como a terceirização, as características da gestão dos bancos e a

divisão dos trabalhadores em categorias distintas, por exemplo, foram

mantidos e, em certa medida, foram aprofundados1.

Para analisar a dinâmica do sindicalismo bancário, busquei abordar

as conjunturas política, econômica e social; as relações entre sindicalismo e

governo; o perfil do trabalhador bancário; a organização do trabalho bancário;

a dinâmica interna do movimento sindical; a disputa entre diferentes correntes2

e projetos; a organização da pauta sindical; a retomada das mobilizações e as

conquistas do período. Esse caminho pode iluminar a hipótese acerca do

possível antagonismo entre conjuntura e estrutura. Para percorrê-lo, em vez de

realizar uma leitura estanque, comparando uma dimensão com a outra, optei

por inseri-las no debate mais amplo relativo às transformações verificadas na

1 Tema similar foi discutido por Krein e Teixeira (2014), que avaliaram que o

movimento sindical teve a capacidade de recompor o poder de compra dos salários na

primeira década dos anos 2000, entretanto sem conseguir alterar, substancialmente,

normas e regras que regem a relação de emprego em aspectos mais centrais da

organização do trabalho. Essas dependeriam do arcabouço legal institucional e de

políticas públicas. Dessa forma, a perspectiva de flexibilização do trabalho

permaneceu. 2 Neste trabalho colocamos a expressão “corrente” e “corrente política” como sinônimo

de força política ou tendência. Trata-se dos agrupamentos que realizam o debate e a

disputa política no sindicalismo bancário. Desse modo, mesmo centrais sindicais como

CTB, Intersindical e Conlutas, são referidas como correntes no sentido de serem forças

políticas atuantes na categoria, ainda que organizadas sob a forma de central sindical.

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política e na economia brasileira, em geral, e no movimento sindical bancário,

em particular.

Esta tese constitui um desdobramento de minha pesquisa de

mestrado, na qual abordei as transformações no setor financeiro no Brasil e o

processo de fragmentação dos trabalhadores, tendo como foco as condições

de trabalho e as diferentes formas de contratação e remuneração no setor, que

é controlado, em última instância, pelos grandes bancos atuantes no Brasil.

Sem dúvida, minha experiência pessoal, como funcionário do Banco

do Brasil e militante sindical bancário, guiou-me nesse propósito de entender

melhor o funcionamento do setor financeiro e o impacto sobre a vida de

milhares de trabalhadores no período recente. Quando ingressei no doutorado,

meu objetivo inicial era analisar os processos de trabalho e o perfil do

trabalhador terceirizado e subcontratado para atividades-fim dos bancos.

Aqueles trabalhadores que realizam funções anteriormente desempenhadas

de maneira exclusiva por bancários e que, ao longo de um amplo processo de

terceirização, foram dispersas em diferentes formas de negócios, contratos e

remunerações, as quais retiravam direitos e pioravam as condições de

trabalho, reduzindo os custos das instituições financeiras. Ao longo do curso,

alterei o foco para a análise do sindicalismo bancário no contexto dos governos

petistas, devido tanto aos intensos debates políticos e teóricos sobre a relação

entre sindicalismo e governo, como ao próprio caráter dos governos petistas.

A tese divide-se em quatro capítulos, que resumo a seguir. O passo

inicial para analisar o sindicalismo bancário foi examinar os governos do PT a

partir de quatro abordagens influentes no período, que produziram diferentes

interpretações sobre os governos petistas tendo em vista suas forças

dirigentes, o bloco no poder, os beneficiários de suas políticas e sua base de

sustentação social e eleitoral. Dessa maneira, discuti as hipóteses e

interpretações elaboradas por Boito (2012) em relação à frente

neodesenvolvimentista; Singer (2012) sobre o lulismo, o pacto conservador e o

reformismo fraco; Oliveira (2010) a respeito da hegemonia às avessas; e

Coutinho (2010) sobre a hegemonia da pequena política.

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Após apresentar esse debate, realizo uma problematização das

teses desenvolvidas por esses autores buscando demonstrar, com base em

dados e evidências estatísticas, as transformações e o alcance das medidas

que foram adotadas pelo governo no período. Coloco em cena informações do

campo econômico sobre o papel das classes dirigentes, dos bancos, dos

sindicatos e das relações do governo com os diferentes setores sociais.

Os governos petistas buscaram atender aos interesses de

diferentes setores empresariais e dos trabalhadores, ou melhor definindo, de

diversas frações de classe. Houve, por um lado, a manutenção de diversos

pontos da política econômica anterior, como o chamado tripé econômico

herdado da gestão de Fernando Henrique Cardoso: metas de inflação,

superávit primário e câmbio flutuante, que em diversos momentos se refletiram

em juros altos, sobrevalorização cambial e obstáculos aos investimentos

públicos. Essas medidas eram ligadas à ortodoxia econômica. Por outro lado,

foram implementadas medidas que permitiram melhorias na geração de

emprego, nas condições salariais, no acesso ao crédito e aos bens de

consumo, na formalização de empregos, na maior participação dos

rendimentos do trabalho na renda nacional.

Com essas informações, foi possível apresentar as condições

objetivas em que os trabalhadores realizaram suas mobilizações e

negociações no período; condições essas que, no geral, apresentaram-se

mais positivas comparadas às décadas anteriores, inclusive quanto às próprias

condições políticas para exercer o direito de greve – cujos indicadores

cresceram significativamente se comparados à década precedente (Boito e

Marcelino, 2010), ainda que não tenham desaparecido os constrangimentos

políticos e repressivos, como o corte de salários dos grevistas, intervenções do

judiciário e da polícia, em vários setores.

Além disso, convém ressaltar que os dois governos de Lula da Silva

foram marcados pela reorganização do sindicalismo brasileiro. Em 2004,

forças dissidentes da CUT (Central Única dos Trabalhadores) deram origem à

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Conlutas (atualmente CSP-Conlutas3), bem como em 2006 outros setores da

esquerda cutista fundaram a Intersindical. Ambas realizaram a ruptura em

razão de divergências quanto às políticas do governo e ao papel da CUT. A

interpretação de ambos os grupos era de que o governo Lula da Silva não

avançava nas pautas de interesses dos trabalhadores, pelo contrário,

consolidava a política neoliberal dos governos anteriores e retirava os direitos

dos trabalhadores, particularmente do setor público com a reforma da

previdência (Galvão, Trópia e Marcelino, 2015). Outro aspecto que

desempenhou um papel importante foi a adoção intensa do diálogo social, por

meio de fóruns e espaços tripartites, que foram entendidos como modelo que

priorizava a conciliação de classes em detrimento do enfrentamento dos

interesses do capital. Do mesmo modo, essas correntes compreendiam que a

CUT havia adotado uma política passiva frente ao governo, sem realizar uma

contraposição quando estavam em jogo temas de interesse da classe

trabalhadora, servindo como amortecedora da mobilização popular.

No segundo governo Lula da Silva foi criada a CTB (Central dos

Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), como nova dissidência da CUT

protagonizada pela corrente CSC (Corrente Sindical Classista), ligada

historicamente ao PCdoB (Partido Comunista do Brasil). Nesse caso, a criação

da central não se devia a grandes divergências quanto aos temas ideológicos e

políticos, mas à possibilidade do reconhecimento legal das centrais sindicais

pelo governo. Essa foi a mesma lógica que levou à criação da UGT (União

Geral dos Trabalhadores) a partir da união entre CGT (Confederação Geral

dos Trabalhadores), CAT (Central Autônoma dos Trabalhadores) e SDS

(Social Democracia Sindical), a fim de alcançar os critérios estabelecidos pela

lei das centrais para a obtenção do reconhecimento e, consequentemente, o

repasse de recursos financeiros da contribuição sindical (Galvão, Trópia e

Marcelino, 2015). Outra central, a NCST (Nova Central Sindical de

Trabalhadores) foi criada ainda no primeiro governo Lula da Silva, por ocasião

3 Trata-se da Central Sindical e Popular (CSP) Conlutas. Ao longo da tese irei me

referir apenas como Conlutas, mas indicando a mesma entidade, que reúne entre seus

associados tanto instituições sindicais quanto movimentos sociais e populares.

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da discussão da reforma sindical a partir da filiação de sindicatos, federações e

confederações da estrutura oficial4.

Esses são aspectos importantes de se destacar, pois incidem sobre

o objeto – o sindicalismo bancário – e também demonstram a conjuntura de

disputas e restruturação sindical no período. Na categoria bancária, eram

apenas duas centrais atuantes no início de 2003: CUT e CGT. No término de

2015, eram seis centrais: CUT, UGT, CTB, Conlutas, Intersindical e NCST (os

sindicatos e a federação da NCST permanecem majoritariamente filiadas à

Contec/UGT5). Isso, no entanto, não interferiu substancialmente na correlação

de forças no movimento bancário. A CUT manteve-se hegemônica, tendo

como maior corrente política a Articulação Sindical, representando cerca de

75% das bases de trabalhadores bancários.

Para compreender a dinâmica do movimento sindical bancário, é

necessário analisar o perfil do trabalhador da categoria. Esse é o objetivo do

capítulo 2, no qual foram revisitados debates sobre o perfil do trabalhador da

classe média e do sindicalismo de classe média, na qual compreendo que se

insere o trabalhador bancário. Não somente pelo critério de renda, mas

prioritariamente pela ideologia meritocrática, conforme proposto por Saes

(1985). Essa ideologia, que, a princípio, dificulta a organização e mobilização

coletiva, não impediu a realização de atividades e greves no período. Apesar

do avanço das ações coletivas da categoria, ela conviveu com uma lógica cada

vez mais individualista nos espaços de trabalho, promovida pelos modelos de

4 Refiro-me às entidades oficialmente reconhecidas pelo Estado, conforme os critérios

da estrutura sindical brasileira corporativa, particularmente oriundas do período

anterior à construção democrática no final da ditadura militar e que não passaram por

renovação em suas direções e nos métodos de ação sindical. Esta denominação é

utilizada para se diferenciar do novo sindicalismo, que investiu em estruturas paralelas

de grau superior (Federações e Confederações), a princípio sem reconhecimento

oficial, para aglutinar seus sindicatos e combater a estrutura oficial. 5A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de Crédito (Contec),

filiada à UGT, é uma confederação nacional de trabalhadores bancários, fundada em

1959, pertencente à estrutura sindical oficial. São filiadas a ela sete federações

estaduais e interestaduais de bancários e uma de securitários. Atualmente possui nas

bases sindicais a ela filiadas em torno de 13% da categoria bancária. Essa organização

será mais bem detalhada no capítulo 3.

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gestão organizacional adotados pelos bancos. Esse padrão de gestão da força

de trabalho é baseado em ferramentas de tecnologia e controle, em que o

critério para promoção e remuneração é o cumprimento de metas individuais e

coletivas de vendas de produtos e serviços bancários, que estimulam o

desempenho individual e a competição entre os trabalhadores. Essa lógica é

apresentada ao trabalhador pelos bancos como exigência do mercado e, com

isso, há uma diminuição da autoridade burocrática nos locais de trabalho, e a

presença de uma autoridade mais difusa “exercida diretamente pelo mercado

capitalista” (Jinkings, 2002, Pág. 141) sob a ideologia da meritocracia. A

remuneração variável tornou-se um aspecto cada vez mais valorizado pelos

trabalhadores e com forte presença na pauta sindical.

Com relação a essa questão específica, a hipótese é que o bancário

e a bancária ainda se mobilizam pela natureza de seu emprego, da

manutenção de uma distinção dos salários, benefícios e reconhecimento

social, todas inseridas na lógica do mérito e do dom pessoal. Entretanto, as

possibilidades para exercer essa mobilização variam de acordo com as

condições objetivas, isso é, a situação geral do emprego, da economia e da

política (Boito, 2004).

A retomada do emprego no setor bancário é outro elemento

colocado em discussão, pois inverteu uma tendência iniciada no começo dos

anos 1990, de forte redução de postos de trabalho nos bancos. Algo que

parecia, até então, inexorável, pela grande adoção de tecnologia nos

processos internos dos bancos e na relação com os clientes, bem como pela

ampla terceirização realizada pelas instituições. Ao focalizar apenas aspectos

relativos aos processos de trabalho, não seria possível analisar os motivos

dessa mudança na tendência do emprego. Busquei evidenciar elementos que

poderiam explicar a elevação do emprego, com ritmo mais forte entre 2006 e

2011, seguido pela gradativa redução dos postos de trabalho, iniciada em

2012. Dentre esses elementos, pode-se destacar o incentivo do governo para

a maior inclusão financeira e bancarização, mediante contas simplificadas e

recebimento de benefícios sociais pela rede bancária; ampliação da oferta de

crédito em diferentes modalidades; crescimento dos bancos públicos,

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particularmente para enfrentamento da crise econômica de 2008, em que o

governo utilizou das instituições federais para garantir linhas de crédito e a

execução de programas federais para dinamizar a atividade econômica. A

categoria chegou a ampliar em mais de cem mil postos de trabalho em relação

ao ano de 2002. Porém, mesmo nesse aspecto, houve contradições, devido ao

forte crescimento dos correspondentes bancários. 6 Estimulados pelas

regulamentações do Banco Central, esses estabelecimentos passaram a

poder atuar em todas as cidades do país e a oferecer diversos serviços

bancários, ainda que seus trabalhadores estivessem em condições de

contratação e remuneração mais precárias se comparados à categoria

principal, dos bancários.

A trajetória do emprego bancário demonstra redução a partir de

2012. A saturação do crédito, o maior endividamento das famílias e os novos

mecanismos tecnológicos de atendimento são fatores decisivos para esse

quadro, com destaque para o uso massivo de dispositivos móveis

(Smartphones) com aplicativos de bancos. A utilização da internet associada

ao celular permitiu um salto no número de transações realizadas fora das

agências e com oferecimento cada vez maior de serviços financeiros. O

desafio colocado aos trabalhadores dos bancos é similar ao de outras

categorias: o acesso maior às plataformas de comunicação e à tecnologia

mudou drasticamente a relação de clientes e negócios, do mesmo modo que

interferiu na relação entre os próprios trabalhadores. A conexão entre novos

processos de trabalho, tecnologia e ideologia meritocrática impõe um ambiente

de difícil ação para o sindicalismo.

6 São estabelecimentos comerciais autorizados a realizar transações bancárias e

financeiras. Podem ser mercados, padarias, farmácias, lotéricas, agências dos correios,

dentre outros, que efetivam um convênio com os bancos e são remunerados mediante a

quantidade de transações que efetuam. A resolução 3.110/2003 do Banco Central

representou a grande abertura para ampliação dos negócios por correspondentes.

Atualmente, permite-se a existência de comércios com a única função de servir como

correspondente bancário. As principais transações realizadas são saques e pagamentos

de contas, mas também podem ser feitas abertura de contas, solicitação de

empréstimos, dentre outras. Os funcionários são vinculados ao estabelecimento

comercial e à categoria relacionada a ele.

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O terceiro capítulo trata da dimensão política e organizativa da

categoria bancária, analisando as principais estruturas sindicais e correntes

políticas presentes no movimento que determinam os rumos de organização,

mobilização, negociações e disputas. Para isso, é fundamental identificar,

descrever e analisar quais são elas e qual peso político possuem para

influenciar os rumos da categoria bancária, tanto nas direções quanto nas

bases de trabalhadores.

Há uma notória prevalência da Articulação Sindical, da CUT, como

força política. Presente em todos os estados e no controle dos maiores

sindicatos, não teve sua hegemonia ameaçada durante o período. Busquei

analisar os motivos dessa hegemonia, considerando três eixos principais: 1) o

controle da direção do maior sindicato dos bancários de São Paulo, que é o

maior do Brasil, desde 1979, que permitiu uma estrutura política capaz de

disputar com as demais correntes internas ao movimento, em diversos locais;

2) a capacidade de diálogo e comunicação com a categoria nos anos 1980,

pois encontrou um caminho fértil entre a passividade do sindicalismo oficial, a

excessiva moderação da estratégia do PCB (Partido Comunista Brasileiro) e

do PCdoB e a radicalidade revolucionária da Democracia Socialista7 e da

Convergência Socialista 8 frente a uma categoria de classe média que,

embora propensa a se mobilizar na época, não possuía a mesma tendência

de ruptura social. Sem dúvida, a formação heterogênea da corrente permitiu à

Articulação conectar seu discurso junto às bases com mais efetividade,

vinculando mobilização, reivindicação, proposição e negociação; 3) sua

presença nacional mais sólida, beneficiada pelo crescimento da corrente

dentro de vários segmentos da CUT e com a presença de importantes

7 Corrente interna da Central Única dos Trabalhadores e do Partido dos Trabalhadores.

Atualmente presentes na CSD (CUT Socialista e Democrática), que permanece como

corrente à esquerda na CUT e no grupamento “Mensagem ao Partido”, do PT. Parte de

seus membros deixaram a corrente e são membros fundadores do PSOL e da

Intersindical. 8 Corrente interna da Central Única dos Trabalhadores e do Partido dos Trabalhadores

na época, de orientação trotskista. Em 1994 seus membros fundaram o PSTU e

tornaram-se, desde 2004, os principais integrantes da Conlutas.

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lideranças do “novo sindicalismo9”, dentre os quais o próprio Lula da Silva.

Essa lógica favoreceu a aproximação de outras categorias e contribuiu para

que a Articulação ganhasse espaços em todas as regiões do país.

Ao contrário do ocorrido em outras categorias (Junckes, 2004), a

quantidade de sindicatos bancários teve pouca alteração, não havendo

significativa criação ou divisão de outras entidades. Isso demonstra certa

coesão e estabilidade na estrutura sindical bancária, fortemente atrelada ao

debate nacional. A concentração e centralização do sistema financeiro

(Jinkings, 2002) foram determinantes para as discussões de pautas da

categoria em âmbito nacional, tornando necessário, para além da mobilização

local, um alto nível de organização sindical nacional. Com isso, cria-se um

obstáculo importante para a fundação de novas entidades, na medida em que

dificilmente teriam apoio de forças políticas para se estabelecer, pois poderiam

levar a um conflito de bases em outros locais e ao desarranjo da estrutura

existente (Junckes, 2004) que, no período, manteve-se sem grandes conflitos

estruturais internos.

As novas tecnologias, o avanço da terceirização e os desafios

colocados para os trabalhadores bancários em decorrência da flexibilização

das relações de trabalho são também tema do terceiro capítulo. Neste

processo, destacam-se iniciativas do sindicalismo da CUT para ampliar a

representação dos bancários para outras categorias, dentro da política de

“ramos” da central (conceito presente já no 1° Concut de 198410), como forma

de combater a pulverização de suas bases. A criação da Contraf/CUT 11,

9 Novo sindicalismo é o termo empregado para identificar o movimento sindical que

emergiu no processo de construção democrática do país entre o final dos anos 1970 e

começo dos 1980, em oposição à ditadura militar e à estrutura sindical oficial. Para

mais detalhes, pode-se ler, dentre outras obras, Antunes (1991) e Rodrigues (1997). 10 É possível consultar os documentos de congressos e plenárias da CUT no link:

https://cut.org.br/system/uploads/action_file_version/28db538e2a80e21837316f32130

dc2e0/file/a-construcao-da-estrutura-organizativa-da-cut.pdf. 11A Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf) filiada à

Central Única dos Trabalhadores, é uma entidade de grau superior que reúne oito

federações e 105 sindicatos de bancários do Brasil. É a maior entidade da categoria

bancária. Nas bases das entidades a ela filiadas estão mais de 80% dos trabalhadores

bancários do Brasil. Serão discutidos maiores detalhes sobre a instituição no capítulo 3.

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sucessora da CNB (Confederação Nacional dos Bancários), teve como norte a

construção do ramo financeiro, envolvendo a representação sindical de outros

trabalhadores articulados ao processo de intermediação financeira e de

negócios bancários. Para isso, era necessário abranger trabalhadores de

diversos segmentos, muitos dos quais contratados de empresas coligadas e

de propriedade dos grandes bancos, incluindo-se trabalhadores de callcenter,

agentes de crédito, consultores, terceirizados em retaguarda e tesouraria,

trabalhadores em correspondentes bancários, corretores de seguros, enfim,

diversas funções que, no entendimento da confederação, contribuíssem direta

ou indiretamente para o lucro dos bancos.

Esse processo, porém, foi incipiente e teve pouco efeito prático.

Duas razões contribuíram para a não efetividade da proposta: a primeira, a

estrutura sindical, que assegura a representação sindical por categoria e

mediante autorização do Ministério do Trabalho e, portanto, enfrentá-la seria

uma disputa eminentemente política. Porém, o sindicalismo bancário mostrou

pouco empenho em avançar nesse aspecto, questão que se relacionada à

segunda razão do insucesso da proposta: a tímida ação dos próprios

dirigentes. Desde o início, construiu-se uma linha de cima para baixo, de

definições tomadas pelas cúpulas sindicais, com pouca participação dos

sindicatos menores e das bases de trabalhadores, algo que a análise de

burocratização proposta por Soares (2013) ajuda a explicitar. Assim, apesar do

apelo do tema, não houve forte adesão entre dirigentes sindicais, acostumados

à representação de bancários e mais adaptados à lógica da legislação sindical.

Esses elementos corroboram a hipótese de que as maiores mudanças

ocorridas no sindicalismo bancário foram conjunturais e não estruturais.

Por fim, o quarto capítulo da tese analisa a relação das direções

bancárias com o governo federal. De modo geral, pode-se afirmar que, durante

todo o período, houve apoio da maioria das correntes ao governo federal, ora

mais críticas a determinadas medidas, ora deliberando apoio eleitoral nas

conferências nacionais, porém estiveram na base de sustentação do governo,

enfatizando os avanços obtidos nas CCTs (Convenções Coletivas de

Trabalho) e na valorização dos trabalhadores. Dentre as principais correntes

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políticas que apoiaram o projeto petista pode-se destacar especialmente a

Articulação, a CSD (CUT Socialista e Democrática) e a CTB. De outro lado,

entre as correntes que se destacaram na oposição aos governos petistas

estiveram a Conlutas e a Intersindical, porém com diferenças substanciais em

certos posicionamentos, que serão examinados no capítulo.

O quarto capítulo também discute a mobilização da categoria

bancária a partir da formulação das pautas de reivindicação e seus temas

centrais. No período, houve importantes avanços econômicos e sociais na

CCT. O sindicalismo bancário conseguiu aproveitar o momento de maior

abertura política e de melhoria na economia para obter ganhos no campo

econômico e nos benefícios sociais. Buscou-se inserir cláusulas de proteção

ao assédio moral e a apuração de casos de conflitos no ambiente do trabalho,

mas são mecanismos que pouco conseguiram mudar a realidade dessas

práticas nos bancos. Entre 2003 e 2015, apenas o primeiro ano não repôs, ao

menos, a inflação. Entre 2004 e 2014, os trabalhadores obtiveram aumento

real de salário. Em todos esses anos, com exceção de 200712, houve greve

nacional da categoria. Algo que não acontecia, no período anterior, desde

1993.

Além disso, o capítulo aborda as disputas entre as correntes

internas ao movimento desde a constituição da mesa única de negociação com

a Fenaban, pois até 2003, os bancos públicos negociavam separadamente.

São, ainda, analisados os debates em torno da organização das campanhas

salariais, da negociação da PLR (Participação nos Lucros e Resultados) e da

definição de metas, conteúdos sobre os quais não houve consenso entre as

principais forças políticas, havendo, durante os 14 anos, discussão de mérito e

forma.

Por fim, faço a discussão sobre a retomada das greves na categoria

bancária. Desde o ano 1996 não havia qualquer greve da categoria. Ao

12 Em 2007, a categoria aceitou o reajuste proposto pela Fenaban e os funcionários do

BB aceitaram a proposta específica para outros temas. Apenas a Caixa Econômica

Federal entrou em greve, pela não aceitação da proposta relacionada aos temas

específicos dos empregados da empresa.

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apontar as razões desse retorno, observo que isso se deve, num primeiro

momento, à conjuntura política e, depois, à melhora da economia brasileira no

período, dando maior liberdade para adesões. Faço uma análise do perfil da

participação nas greves e o alcance que elas obtiveram, no sentido de

mobilizar as bases e pressionar os bancos. Foi comum os bancos chamarem a

polícia e acionarem o judiciário com o objetivo de que os trabalhadores

entrassem nos seus locais de trabalho sem serem incomodados pelos

dirigentes sindicais. Sob essa perspectiva, observa-se que as greves

causaram transtornos e prejuízos financeiros e de imagem aos bancos, ao

mesmo tempo em que houve a rotinização dessas greves como mecanismo de

reivindicação, tornando-se, com o tempo, menos ameaçadoras para os

bancos. As greves passaram a ser esperadas e menos surpreendentes aos

bancários e patrões, devido ao seu uso recorrente e aos mecanismos similares

de ação. Além disso, a modernização da informática constitui uma diferença

substancial entre os anos 1980 e 1990 e o período estudado pela tese, na

medida em que o atendimento remoto tornou-se a regra, permitindo que

clientes e funcionários resolvam as demandas de serviços à distância, sem

usar a agência bancária, levando a um tipo novo de greve, com menos

repercussão e mais ajustada à realidade da informatização e das diferentes

formas de atendimento.

A metodologia da pesquisa baseou-se na bibliografia de referência

na área, nos levantamentos de dados e informações estatísticas de fontes

oficiais, como Ministério do Trabalho e Banco Central do Brasil. Consultei as

pesquisas produzidas IBGE, IPEA, Dieese e pela FEBRABAN. Outra fonte

relevante de informações foi a imprensa sindical, as publicações digitais e

físicas elaboradas pela Contraf/CUT e os principais sindicatos de bancários do

país. Realizei entrevistas com dirigentes sindicais da CUT; da Intersindical; da

Contraf; da Federação dos Bancários da CUT/SP; do Sindicato dos Bancários

de São Paulo; da FENAE (Federação Nacional das Associações do pessoal da

Caixa Econômica Federal)13 e da Previ (Fundo de Pensão dos funcionários do

13 A escolha de dirigente da FENAE e do Sindicato dos Bancários de Pernambuco tem

sua importância em buscar captar uma perspectiva do movimento bancário que

estivesse fora do centro-sul do país, além disso, trata-se de uma entidade em que há

presença importante da nova corrente do sindicalismo bancário, chamada “Enfrente”.

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Banco do Brasil. Foram seis entrevistas, com o objetivo de melhor investigar o

objeto.

É importante ressaltar que meu papel de observador participante

traz influências para a pesquisa. De um lado, foi algo positivo, pois a frequente

participação em diversos fóruns, congressos, conferências e espaços de

diálogo, bem como o contato constante com os bancários em seus locais de

trabalho, permitiu-me captar as nuances do sindicalismo bancário, um olhar

mais apurado para determinados temas e debates apresentados. Por outro, o

envolvimento com o objeto fez com que em diversos momentos sentisse

necessidade de cautela e de um olhar mais distanciado para identificar,

descrever e analisar o sindicalismo bancário, que envolve milhares de

trabalhadores e uma dinâmica complexa. Por isso, busquei diversificar as

fontes e olhar para o conjunto das correntes sindicais, a fim de problematizar

as questões colocadas pelas minhas entidades de origem.

Tendo apresentado a estrutura da tese, inicio pela apresentação da

conjuntura política do período analisado.

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Capítulo 1: O impacto da conjuntura política na organização sindical

1.1 – O debate sobre a caracterização dos governos petistas

O capítulo visa discutir aspectos da conjuntura nos governos do PT

e de que modo ela impactou o movimento sindical. Para isso, é feita a

recuperação do debate sobre a caracterização dos governos petistas. O

período foi marcado por ambiguidades nas políticas adotadas, já que muitas

medidas adotadas tiveram direções divergentes que, além de não se

reforçarem, foram contraditórias, atendendo a classes, frações de classes e

grupos distintos. Desse modo, é preciso analisar a formação do governo e

como foi dirigido o Estado brasileiro, quem foram os setores beneficiados e

quem garantiu sua sustentação e continuidade ao longo dos anos.

Realizaremos essa discussão ao longo do primeiro capítulo, como forma de

explicitar o contexto das disputas políticas e sindicais no país e as

interpretações produzidas sobre ele.

A opção analítica é de debater o período por meio do diálogo entre

quatro formulações sobre os governos do PT: as teses de Boito (2012) a

respeito da frente neodesenvolvimentista; a de Singer (2012) sobre o lulismo; a

de Chico Oliveira (2010) da hegemonia às avessas e a de Coutinho (2010)

sobre a hegemonia da pequena política. Tratam-se de discussões influentes

sobre as relações de poder e da composição hegemônica no período.

Do ponto de vista das forças dirigentes, para Boito (2012) formou-se

no Brasil, antes e, principalmente, ao longo dos governos do PT, uma frente

ampla14 e heterogênea que governou o país. Essa frente teve a liderança

14 Boito (2012) faz uma diferenciação entre aliança e frente: “Frente e aliança não são a

mesma coisa. A aliança reúne classes ou frações de classes que agem, cada qual,

organizada de modo independente, com base em um programa político próprio, e que

estabelecem um programa mínimo comum. A frente reúne, de maneira mais informal,

classes e frações de classe, não necessariamente organizadas de modo independente,

em torno de objetivos convergentes, mas cuja convergência nem sempre está clara para

as forças sociais envolvidas na frente. A força social que está envolvida na frente sem o

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partidária do PT, mas foi dirigida pela grande burguesia interna15. Teve a

participação, como base social, do operariado urbano e da classe média baixa,

organizados por meio do Partido dos Trabalhadores e dos sindicatos; da

massa marginal, formada por trabalhadores em condições precárias,

subempregados, desempregados, que poderiam ser divididos em dois grupos:

o primeiro organizado por meio de “movimentos de urgência”, principalmente

os movimentos de moradia, e o segundo grupo, desorganizado. Por fim, faziam

parte os camponeses, especialmente aqueles organizados pelo MST, mas

também outros camponeses e trabalhadores rurais assalariados, cuja relação

política principal se dava pela Confederação dos Trabalhadores na Agricultura

(Contag).

Já para Oliveira (2010), o governo Lula da Silva representou uma

“hegemonia às avessas”, em que a “direção moral” da sociedade pertencia aos

subalternos, com lideranças que emergiram da luta contra a ditadura militar,

porém, com o consentimento da elite econômica. A aparente direção dos

subalternos tornava a exploração capitalista ainda mais forte. Para o autor, o

governo Lula da Silva não teve inimigos de classe e não possuía um projeto e

um objetivo. Sua hipótese é de que o segundo governo Lula da Silva seria

fraco e dependeria de barganhas no congresso, sendo necessário alianças e

cobranças de apoios. Nesse sentido, não haveria importantes mudanças nas

políticas governamentais de Lula da Silva, apenas modificações superficiais e

algumas obras de infraestrutura.

Coutinho (2010), por sua vez discorda, da noção de hegemonia às

avessas e acredita que a melhor expressão seria “hegemonia da pequena

política”. Isso porque os governos petistas estariam inseridos no

saber não pode dirigi-la. Mesmo que radicalize a sua ação, poderá, ao fazê-lo, funcionar

como instrumento da força dirigente” (p. 72). 15 O conceito de burguesia interna inclui industriais brasileiros, da transformação, da construção civil, da mineração; setores da “cúspide do agronegócio”; e, de certa maneira, o capital bancário. Para ficar em alguns exemplos de membros da frente e grandes beneficiários dos governos do PT, são citados BrazilFoods, Friboi, Vale, Gerdau, Votorantim, Odebrecht. Pode-se incluir os banqueiros nacionais como Itaú e Bradesco, no setor privado. Isso indica que mesmo na grande burguesia interna há contradições nas pautas. Boito destaca as diferenças entre o capital bancário e o produtivo em relação à política de juros e à rolagem da dívida pública; entre a indústria de transformação e o agronegócio em relação aos acordos externos.

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neoliberalismo, em que não há uma disputa real de projetos de sociedade. A

expressão é utilizada como oposição à grande política. Para o autor, citando

Gramsci dos Cadernos do Cárcere, a grande política relaciona-se às questões

da fundação de novos Estados, lutas relacionadas “às estruturas orgânicas

econômico-sociais” enquanto a pequena política envolve temas cotidianos, a

política parlamentar, no interior de estruturas estabelecidas. Quem opera a

grande política pode querer levar as disputas para o âmbito da pequena

política, em que não se transformam regimes políticos, instituições ou

estruturas sociais mais amplas. A hegemonia neoliberal se apresenta como

exclusão da grande política, pois não há disputa entre projetos distintos, na

medida em que o individualismo, o privatismo e a naturalização das relações

sociais, tidas como parte da natureza humana, tornam-se dominantes no

senso comum.

Singer (2012), finalmente, defende a noção de pacto conservador,

compreendendo os governos do PT a partir do conceito de lulismo. Esse

modelo de construção do governo é resultado do deslocamento político do

partido, especialmente a partir de 2002, de uma posição de esquerda mais

radical para uma posição conciliadora de classes. Deixou de ter uma visão de

ruptura do modelo social para uma visão de pacto social, de viés conservador,

promovendo reformas fracas, graduais, que consistem em transformações

lentas, representadas na queda vagarosa da desigualdade e na moderada

distribuição de renda. Essas mudanças, sem radicalização ou ruptura,

possibilitaram a aproximação, no campo ideológico e político, dos governos do

PT e do subproletariado. Isso definiu um traço evidente nos governos petistas

que não organizaram e não mobilizaram o conjunto de trabalhadores do

subproletariado.

Os autores aqui apresentados também divergem quanto aos

beneficiários das políticas promovidas pelos governos petistas. Boito (2012)

entende que o PT ocupava a posição de mediador da construção da frente de

governo e representava as classes subalternas, o movimento sindical e

popular – como agentes políticos necessários para a consolidação de

mudanças no interior do capitalismo brasileiro. O autor entende que todos os

grupos que fizeram parte da frente obtiveram ganhos, mas principalmente a

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grande burguesia interna. Os trabalhadores e demais integrantes ganharam,

mas de forma secundária, sendo que o campesinato ocupou a posição mais

desfavorável em razão das contradições entre seus interesses e setores do

agronegócio, também integrante da frente. Em nossa concepção, o

campesinato, apesar do pouco avanço nos assentamentos, foi beneficiado

particularmente pela forte ampliação do crédito para agricultura familiar

(Pronaf) e pelo estímulo às compras públicas da agricultura familiar. Com isso,

a relação do movimento com o governo federal foi menos tensa do que os

números tímidos da reforma agrária poderiam supor. A título de exemplo, o

MST tornou-se o maior produtor de arroz orgânico da América Latina16.

De todo modo, ainda para Boito, haveria uma convergência de

interesses entre diferentes frações de classe, da burguesia e do operariado,

que começou a se desenhar ainda no final dos anos 90. Essa convergência

tinha como fundo a oposição a medidas do governo FHC, como a abertura

comercial, que desinteressava à burguesia industrial e ao movimento dos

trabalhadores, simultaneamente. As medidas adotadas pelo governo tucano

atendiam prioritariamente ao mercado financeiro nacional e internacional e

apenas de forma subsidiária à burguesia interna17. Já os governos petistas

apresentariam uma política estatal de interesse da burguesia interna, como

demonstram os seguintes exemplos: forte financiamento através dos bancos

públicos para a grande indústria, destacadamente recursos alocados pelo

BNDES; política de conteúdo local (Prieto, 2014), especialmente nas parceiras

com a Petrobras; proteção à indústria naval no Brasil; política externa de

ampliação e diversificação do leque de parceiros internacionais como forma de

incentivar as exportações de bens e serviços; investimentos públicos maiores,

como no caso da habitação – que, embora interessem aos movimentos de

moradia, são fontes importantes de lucro das grandes construtoras; expansão

16 Disponível em: bbc.com/portuguese/brasil-39775504, consultado em 08/05/2017. 17 Boito destaca que a burguesia possui suas contradições e que medidas podem atender

algumas frações e não ser interessante para outras. Três aspectos fundamentais das

políticas neoliberais que o autor cita são: 1- redução de direitos sociais e trabalhistas,

com a flexibilização do mercado de trabalho; 2- as privatizações; e 3- a abertura

comercial com desregulamentação das finanças. O primeiro tema costuma ser do

interesse de toda burguesia, enquanto o segundo prejudica os capitalistas menores e o

terceiro é rejeitado pela burguesia interna.

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de políticas sociais que resultaram em maior direcionamento de recursos ao

setor privado, como na educação com o Prouni18 e FIES; importante redução

da taxa SELIC durante o ano de 2012 e 2013; e redução dos custos da energia

elétrica, pauta reivindicada pelo setor industrial.

Na visão de Boito, a frente neodesenvolvimentista enfrentaria, em

busca de hegemonia no Estado brasileiro, a) “a fração burguesa brasileira

perfeitamente integrada e subordinada ao capital financeiro internacional, b)

setores dos grandes proprietários de terra e c) a alta classe média,

principalmente aquela alocada no setor privado, mas, também, no setor

público” (2012, p.4). De mais a mais, o contexto neoliberal impôs ao Brasil,

com êxito, uma especialização regressiva, que em parte explica a retomada da

pauta primária-exportadora, como processamento de produtos agropecuários,

minérios e na indústria de transformação produtos de baixa densidade

tecnológica.

Os trabalhadores desorganizados, por sua vez, conseguiram lograr

melhorias de vida pela ampliação de programas de transferência de renda,

como o Bolsa Família19, benefícios previdenciários e o aumento do consumo

por meio do crédito e de melhores indicadores do mercado de trabalho, com

ampliação da renda. A relação da massa marginal com a frente

neodesenvolvimentista se dá num âmbito populista 20 . Para o autor, essa

18 O Prouni (Programa Universidade para Todos) foi criado em 2004 como mecanismo

de subsidiar o acesso ao ensino superior a alunos de entidades privadas, que cursaram o

ensino médio no sistema público ou como bolsistas no sistema privado e com adoção de

critério de renda per capita familiar de até 3 salários mínimos (critério de 2016). O

programa oferece renúncia fiscal para as faculdades e universidades participantes. Os

alunos podem ter bolsas integrais, que são a maioria, ou parciais. O Prouni atendeu 1,9

milhões de alunos até 2016. Foi responsável pelo forte crescimento dos negócios no

setor de educação superior no Brasil. O número de cursos de graduação oferecidos no

Brasil praticamente dobrou entre 2003 e 2015, ultrapassando 32 mil, com expansão

equivalente na educação superior pública. O número de alunos matriculados no ensino

superior ultrapassou 7,3 milhões em 2013, diante de 3,9 milhões em 2003. O FIES,

Fundo de Financiamento Estudantil, que já existia antes da gestão petista, foi

reestruturado em 2010, desburocratizando o acesso e ampliando seu alcance. Fonte:

Ministério da Educação (2014). 19 O Programa Bolsa Família atendia 13,9 milhões de famílias no início de 2016,

conforme dados do Ministério do Desenvolvimento Social. 20 O autor destaca que o conteúdo populista [e também nacionalista] não possui a

mesma importância no neodesenvolvimentismo quando comparado ao antigo

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camada permaneceu desorganizada politicamente e com pouca mobilização,

sendo chamada apenas para participar das eleições e chancelar a

continuidade do programa da frente neodesenvolvimentista.

Vejamos que Singer também leva em consideração os

trabalhadores desorganizados em sua análise, mas os define de modo

diferente (subproletariado) e caracteriza sua relação com os governos petistas

a partir do conceito de “bonapartismo”21. Singer (2012) defende a ideia de

realinhamento eleitoral, que teria se consolidado no ano de 2006. Isso implicou

uma mudança de base social do presidente Lula da Silva, que passou a se

sustentar política e eleitoralmente nesse subproletariado, um segmento que

representa uma parcela significativa da sociedade brasileira, capaz de definir

os resultados das disputas eleitorais para presidente. O subproletariado, para

o autor, seria a população mais empobrecida, com renda até dois salários

mínimos e que aderiu ao projeto lulista durante o primeiro mandato de Lula da

Silva através de ganhos objetivos com as políticas sociais do governo. De

outro lado, a classe média, que constituía um importante suporte ao PT,

afastou-se, em parte, da base eleitoral petista devido ao escândalo do

“Mensalão”. O conceito de subproletariado serve para indicar uma diferença

entre a estrutura social brasileira e a de países europeus, referindo-se a uma

camada proletária abaixo do operariado tradicional que é mais bem

remunerado. A divisão é realizada pela renda e pela integração desta camada

à produção capitalista. O subproletariado, pela sua condição estrutural, não

teria condições de participar da luta de classes, pois as relações de emprego,

renda e garantia de direitos sociais são frágeis, de modo que se trata de uma

camada vulnerável22. Esse subproletariado seria composto por trabalhadores

desenvolvimentismo, embora guardem semelhanças. Para o autor: “Na relação política

populista, os trabalhadores obtêm ganhos reais – e isso, ao contrário do que afirmam os

observadores liberais para quem o populismo seria mera “demagogia”; porém, esses

ganhos são muito limitados e justamente porque os seus beneficiários se mantêm

política e ideologicamente dependentes das iniciativas do governo”. 21 Conceito que Boito (2013) descarta por considerar que os governos petistas não são

árbitros entre as classes fundamentais. De todo modo, é possível discutir se há um

possível parentesco entre os conceitos de bonapartismo e populismo. 22 Braga (2012) apresenta interessante debate a respeito do conceito de subproletariado,

diferenciando sua visão da utilizada por Singer (2012) e do conceito de batalhadores de

Souza (2010).

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fragilmente integrados ao modo de produção, estando ou não na formalidade,

como vendedores ambulantes, trabalhadoras domésticas, empregados

precários, que sofrem com as condições de trabalho e com a grande

rotatividade e menor remuneração de suas ocupações, ou ainda com o

desemprego.

Esse segmento possui caráter marcadamente conservador no

campo social e moral. Em 1989, o candidato Lula da Silva, representante da

classe trabalhadora no espectro político, teve o voto essencialmente da classe

média e dos trabalhadores urbanos, enquanto Collor, que era ligado às elites

econômicas, angariou os votos dos mais pobres. O afastamento dos mais

pobres de pautas de luta mais revolucionárias ou de reformas mais profundas

é um traço histórico observado por Singer, que o atribui principalmente à

vulnerabilidade social. Embora queiram mudar a realidade econômica e social

na qual estão inseridos, costumam afastar-se de transformações radicais, pois

estas os colocariam em uma situação de instabilidade. Nesse sentido, o pacto

conservador e as reformas lentas e graduais de Lula da Silva teriam

encontrado importante compatibilidade com a forma de ver e vivenciar o

mundo do subproletariado.

Se de um lado as políticas sociais do governo Lula da Silva, entre

elas o Bolsa Família e a valorização do salário mínimo, aproximaram o

subproletariado, por outro, provocaram distanciamento e descontentamento da

classe média, pois significou perda de posição relativa para os mais pobres

(Singer, 2012; Souza, 2010). Por exemplo, o acesso a lugares antes

“exclusivos” da classe média e alta, como aeroportos, restaurantes, aquisição

de bens de consumo como carro, dentre outros, tornarem-se mais populares,

diante do aumento da renda dos mais pobres, enquanto os bens de consumo

de luxo permaneceram restritos ao seleto grupo dos mais ricos.

Oliveira (2010) discorda da tese do realinhamento eleitoral

formulada por Singer. Segundo ele, a divisão entre pobres, representados pela

candidatura Lula da Silva e ricos, simbolizada por Geraldo Alckmin, do PSDB,

não ajudaria a explicar a alta taxa de votação em Alckmin no primeiro turno de

2006, quando obteve em torno de 40% dos votos válidos. Certamente esses

votos não seriam todos provenientes de setores ricos. Ademais, destaca

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Oliveira, não há consistência no campo partidário para realizar uma divisão

nítida, já que figuras importantes da elite, como Blairo Maggi, maior produtor de

soja do mundo, apoiava Lula da Silva em detrimento de seu partido, o PPS,

que apoiava Alckmin. Para o autor de "A crítica da razão dualista", o

capitalismo contemporâneo promove a irrelevância da política partidária, como

pode ser notado com a política centrada cada vez mais em lideranças,

personalidades e menos nos partidos políticos, e isso se acentua nos países

periféricos. Nesse sentido, a análise não colide com os apontamentos de

Singer, que atribui ao lulismo um forte caráter personalista. No entanto, a

“hegemonia às avessas” não seria expressão do populismo, aspecto em que

diverge das análises de Boito e de Singer. Para Oliveira, o populismo foi uma

forma de dominação autoritária, num contexto de transição de uma economia

agrária para industrial. Foi um processo sui generis de incorporação da classe

operária e que causou alterações na estrutura de poder, deslocando

“fortemente os latifundiários da base de dominação” (2010, p. X). Nada disso

estaria presente no contexto de governos do PT que, na visão do autor,

funcionalizava a pobreza por meio da manutenção – e ampliação – do Bolsa

família e da continuidade do conservadorismo na política econômica.

A ênfase de Oliveira no programa de transferência de renda

parece-nos exagerada, pois, ainda que se considere sua importância, o Bolsa

Família não foi a principal medida dos governos petistas em relação ao

combate à miséria. Evidente que criticar esse aspecto do trabalho de Oliveira

pode parecer anacrônico, pois tivemos dez anos para verificar os resultados

das políticas de Lula da Silva e Dilma Rousseff. Entretanto, já se destacava, no

período em que o autor formulou suas críticas (2003 a 2006), o acordo

realizado entre governo e centrais sindicais para valorização do salário

mínimo23. Essa medida foi a mais importante do ponto de vista da ampliação da

participação dos salários na renda nacional, melhora dos salários e da redução

da pobreza, somada à ampliação da cobertura previdenciária, à formalização e

dinamização do mercado de trabalho, embalada, dentre outros fatores, pelo

23 Desde 2005, ficou acordada a valorização do salário mínimo mediante a reposição da

inflação, medida através do IPCA, somada à média da variação do PIB nos dois anos

anteriores.

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mercado doméstico e pela expansão do crédito (Baltar, 2015), possibilitou a

redução da pobreza de forma mais inequívoca que o bolsa família.

Outro aspecto destacado por Oliveira em sua crítica aos governos

petistas é que a vitória de Lula da Silva, como se deu, anulava a esquerda. Lula

da Silva teria sequestrado os movimentos sociais e as organizações da

sociedade civil, ao nomear importantes dirigentes sindicais da CUT em

ministérios, além de sindicalistas terem assumido poderosos fundos de

pensão. Com pequena nuance, o PT havia retornado o velho argumento

leninista-stalinista de que “sindicatos não teriam função num sistema

controlado pela classe operária” (2010, p. 25). Oliveira já havia abordado a

questão dos fundos de pensão em seu trabalho “O Ornitorrinco” ainda no início

do governo Lula da Silva, segundo o qual os gestores dos fundos de pensão

oriundos do movimento sindical seriam uma nova classe social, articulada aos

interesses do capital financeiro. Eles geriam um elemento fundamental do

capital-dinheiro. Enquanto Boito considera que o sindicalismo desempenhou

um papel ativo na frente neodesenvolvimentista, articulando os trabalhadores

organizados com os propósitos do governo, Oliveira advoga a tese da

cooptação.

Valendo-se do conceito gramsciano de “transformismo”24, Bianchi e

Braga (2011) reforçam esse argumento de cooptação do movimento social

organizado pelo governo Lula da Silva. Segundo os autores, os sindicatos

cutistas se alinharam à administração de Lula da Silva, agindo como

amortecedores do conflito social. O sindicato dos bancários de São Paulo, em

particular, tornou-se porta-voz do governo na categoria, transformando-se em

“sindicato chapa branca”. Mais que simples adesismo, o sindicalismo bancário

teria pavimentado o caminho da burocracia sindical petista rumo ao capital

financeiro. O “cimento” dessa pavimentação seriam os gestores de fundos de

pensão. A contradição com os interesses dos trabalhadores seria grave: os

recursos dos trabalhadores geridos nos fundos de pensão seriam usados para

financiar, mediante a administração de burocratas sindicais, a exploração do

24 O transformismo seria a cooptação de classe ou fração de classe dominada pela

classe dominante. Os primeiros passariam a defender os interesses dos dominadores em

troca de pequenos ganhos, algo que derrotaria a organização popular.

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trabalho e do meio-ambiente. Porém, ao contrário de Oliveira, não se trata, de

uma nova classe social, mas da “financeirização da burocracia sindical”.

Contudo, o argumento acerca de cooptação do movimento sindical

cutista e do movimento social não explica adequadamente a conjuntura. As

lideranças da CUT, em sua maioria, faziam parte do mesmo projeto político

que venceu em 2002. Assim como Lula da Silva, grande parte dos expoentes

cutistas é fundadora da central e do PT, bem como são membros da mesma

corrente política, a Articulação – e, portanto, compartilhavam ideias, militância

e propósitos. É bastante razoável supor que, ao ser eleito presidente da

república, Lula da Silva convidaria membros oriundos de seu partido e de sua

corrente política para trabalhar no âmbito da administração federal. É também

razoável presumir que boa parte dos convidados aceitaria, pois se tratava da

concretização de um projeto político em construção há duas décadas. Como

consequência desse processo, muitos petistas e cutistas passaram a ocupar

cargos de confiança no governo, algo apontado no artigo de Bianchi e Braga.

O governo federal, como controlador das empresas patrocinadoras

dos fundos de pensão, possui a incumbência de nomear parte de seus

gestores e escolher aqueles que se alinham aos seus objetivos. Nesse sentido,

a administração federal depende, em partes, dos fundos de pensão para

financiar projetos maiores. É fato notório que os fundos de pensão ocupam

lugar importante no capitalismo e são estruturas com grande capacidade de

alocação de recursos, porém de essência tipicamente capitalista. Para Bianchi

e Braga, os argumentos dos dirigentes sindicalistas nos fundos de pensão, que

alegavam selecionar melhor os investimentos e agir segundo preocupação

socioambiental, eram frágeis e enganosos. Mas, no geral, observa-se, nos

debates entre gestores e participantes bancários dos fundos de pensão, o

objetivo de garantir a solvência dos recursos, pois os trabalhadores estão

interessados em suas aposentadorias e pensões. Os gestores buscam atender

a essa expectativa, bem como responder aos interesses do governo federal

por investimentos em seus projetos. Observa-se que a participação de

dirigentes sindicais nos fundos de pensão se inicia nos anos 1990 (em

posições eletivas), como forma de se estabelecer mais um espaço de

representação política e diálogo entre dirigentes e trabalhadores,

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principalmente num contexto de poucos avanços na pauta sindical. Além das

nomeações que podem ser realizadas pelo patrocinador, no caso os bancos

públicos e, por consequência, o governo federal, parte dos dirigentes dos

fundos são eleitos pelos funcionários dos bancos. Nestes espaços, o

sindicalismo bancário conseguiu eleger e reeleger diversos de seus dirigentes

tanto em diretorias quanto nos conselhos deliberativo e fiscal.

José Ricardo Sasseron, ex-dirigente do Sindicato dos Bancários de

São Paulo, foi também diretor de seguridade da Previ, eleito pelos funcionários

do Banco do Brasil, entre 2006 e 2012, para ele o interesse dos sindicatos para

a participação dos sindicalistas nos fundos de pensão tem a seguinte

abordagem:

O interesse é com a boa gestão do patrimônio dos participantes e com a defesa de seus direitos e interesses. O movimento sindical sempre defendeu a ampliação do espaço democrático e a presença dos representantes dos trabalhadores em seus fundos de pensão com base na lógica de que, se o participante contribui para a formação de sua poupança previdenciária e se a reserva dos fundos se destina a pagar aposentadorias e pertence ao trabalhador, nada mais justo que a participação de seus representantes para gerir este patrimônio coletivo. Não podemos deixar o controle dos nossos recursos nas mãos de terceiros, sem a nossa

interferência [...] É importante ressaltar que não há uma preocupação generalizada, entre os sindicalistas, com as questões relativas aos fundos de pensão de sua categoria profissional25

Se os investimentos forem viáveis, do ponto de vista do retorno

financeiro, os diretores não costumam encontrar objeções dos trabalhadores

que participam dos fundos. De todo modo, não seria possível mudar a natureza

de um instrumento capitalista para outra coisa, pois é da natureza da

constituição dos fundos de pensão a busca de valorização.

A hipótese de que o sindicalismo pavimentou a relação entre

governo e mercado financeiro parece-nos menos factível. A ligação entre

governo e mercado financeiro remonta à “carta ao povo brasileiro” em 2002, na

qual Lula da Silva assume o compromisso de manter contratos com

investidores brasileiros e estrangeiros, e se concretiza com a nomeação de

Henrique Meirelles para o Banco Central. Ou seja, essa ligação já existia e

25 Entrevista realizada pelo autor em 14/11/2016.

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havia canais muito mais eficazes para pavimentar tais relações.

Evidentemente que não se trata de diminuir a importância dos fundos de

pensão, mas também não é possível projetá-los como mais importantes do

que, de fato, eram; bem como supor que os sindicalistas gestores tivessem

uma autonomia plena para transformar a lógica financeira que guia a atuação

dos fundos. Assim, a crítica parece ter um objetivo mais moral, de não se

admitir sindicalistas administrando fundos no mercado financeiro, tarefa que,

segundo essa visão, poderia ser reservada apenas aos técnicos e aos

banqueiros.

Desenvolvendo também sua crítica a partir de conceitos

gramscianos, Coutinho defende que, na lógica dos governos petistas, a política

passa a ser vista como administração do existente e a apatia da sociedade é

“teorizada como um fator positivo para a conservação da ‘democracia’” (2010,

p. 32). Assim, as eleições não colocam nada de substantivo em questão, mas

apenas temas administrativos, produzindo um consenso passivo, por meio da

aceitação e não da auto-organização, que seria um consenso ativo. Porém, o

autor entende que o conceito de revolução passiva não é o mais preciso para

analisar a época da “servidão financeira”, como ele prefere chamar a “era

neoliberal”, incluindo o governo Lula da Silva.

A crítica de Coutinho refere-se ao fato da revolução passiva

conceitualmente pressupor a convivência entre restaurações e renovações,

isso é, manutenção de um modelo social capitalista, porém permeado por

mudanças, com concessões às camadas populares. Trata-se de uma

transformação que impede mudanças políticas mais profundas, reais e

radicais, mas que satisfaz demandas populares “pelo alto”, sem participação

do povo nas definições. As mudanças são tidas como concessões e não

realizações oriundas do papel ativo do povo. O presente modelo não teria

essas características, sendo muito mais clara a manutenção da ordem social e

econômica. A expressão utilizada pelo autor é contrarreforma, emprestada

também do pensador sardo. O neoliberalismo apenas mantém o velho,

podendo até admitir algumas novidades, porém de forma residual, que não se

configuram no que se poderia chamar de renovações. Para ele, o governo Lula

da Silva, em vez de “minar a hegemonia neoliberal”, serviu para consolidá-la

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de forma estável no país; a disputa política no Brasil foi reduzida a um

bipartidarismo efetivo, entre dois blocos – PT e PSDB –, que aplicam as

mesmas políticas e utilizam-se dos mesmos métodos, sem recuar diante de

“formas mais ou menos graves de corrupção sistêmica” (2010, p. 42), que, de

forma não fortuita, reduzem a economia a um tema técnico e não político,

compromisso que reforça a pequena política. A saída seria recolocar a grande

política na ordem do dia, sendo essa uma função da esquerda para voltar a ter

uma palavra a dizer e uma função a desempenhar na sociedade.

Para o autor, não há diferenças substanciais entre os governos Lula

e FHC. Entendemos que essa análise subestima algumas nuances que devem

ser consideradas na comparação entre ambos os governos. As mudanças em

diversas políticas, como na questão social e no próprio papel do Estado, ainda

que não promovam uma ruptura com o modelo anterior, sem dúvida colocam

ingredientes novos, impõem renovações e alteram determinados sentidos.

Vejamos alguns indicadores que expressam essas mudanças a fim de

problematizar o debate aqui apresentado.

1.2 – Problematizando o debate sobre os governos do PT

A partir das interpretações apresentadas pelos autores, nesse item

busca-se apresentar dados e informações que possam contribuir com o debate

sobre os governos do PT e mostrar as mudanças na conjuntura política.

No final do primeiro mandato, com especial ênfase no segundo

mandato de Lula da Silva e no primeiro de Dilma Rousseff, nota-se a retomada

de investimentos estatais mais amplos, intervenção para incentivar a economia

nacional, utilização ativa dos bancos públicos para concessão de crédito e

redução das taxas de juros, valorização real do salário mínimo (Baltar, 2014),

realização de diversos concursos públicos e fortalecimento de carreiras

públicas (Araújo e Véras de Oliveira, 2014), dentre outras medidas, que

indicam diferenças não apenas superficiais em relação ao neoliberalismo26

dos governos Collor e FHC.

26 Esta obra não pretende analisar a fundo as características do modo de produção

capitalista em termos mundiais, desse modo, quando se utiliza o termo neoliberalismo

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Gráfico 1. Investimentos públicos no Brasil

Fonte: Gráfico elaborado e publicado por Orair, R. (2016)

O gráfico 1 retrata o comportamento do investimento público entre

1947 e 2015. O pico havia sido de mais de 10% do PIB no ano de 1977, por

se refere a um conjunto de ações ideológicas, políticas e econômicas, de alcance

mundial, principalmente a partir dos anos 1970, que modificou o modo de produção

capitalista. Essas transformações foram lideradas pelas potencias capitalistas

ocidentais, com destacado papel de Estados Unidos e Inglaterra. Esse movimento se

apresentou como uma alternativa inevitável para superar a crise do modelo capitalista

de Estado de bem-estar social dominante na Europa no pós segunda guerra mundial e

das políticas de intervenção do Estado na economia. Trata-se de uma reação de

orientação liberal em novo contexto histórico. Suas principais bases são a defesa da

reorientação do papel do Estado, em particular a desregulamentação da economia, a

privatização de amplos setores públicos, flexibilização do mercado de trabalho,

liberalização do comércio, redução do gasto público e, sobretudo, a liberdade de

circulação de capitais, com fortalecimento do mercado financeiro – do mesmo modo

com pouca regulamentação. Os organismos multilaterais como Banco Mundial e Fundo

Monetário Internacional (FMI) passaram a ser porta-vozes dos interesses neoliberais e

condicionaram qualquer forma de auxílio e apoio financeiro e econômico aos países em

dificuldade à adoção de medidas de viés neoliberal. Os países latino-americanos

tiveram diferentes experiências de adesão e imposição à agenda neoliberal, sendo o

primeiro deles o Chile, a partir da ditadura de Augusto Pinochet (1973), que contou

com forte participação de professores e pesquisadores oriundos da Universidade de

Chicago, nos Estados Unidos, escola se tornou um centro de referência para

disseminação das ideias neoliberais e contribuiu com a formação de diversos

think-tanks ao redor do mundo. O Brasil adotou medidas neoliberais de forma mais

nítida e articulada a partir do governo Collor (1990-1992) e, especialmente, nas gestões

de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).

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ocasião do II PND – Plano Nacional de Desenvolvimento (Carneiro, 2008) –,

tendo, desde então e até 2007, apresentado tendência de queda, chegando ao

ano 2000 em patamar menor que 3% do PIB. É possível verificar que a partir

de 2007 houve a retomada do investimento público com a criação do PAC,

tendo seu maior volume em 2011, com cerca de 4,5% do PIB. Se essa

retomada está longe de ser comparada ao período do desenvolvimentismo, ela

criou uma inflexão no longo processo de redução dos recursos públicos na

economia. Abaixo, observamos a participação do sistema bancário no crédito

brasileiro, na qual fica evidente a participação do Estado no incentivo à

economia através de suas instituições.

Gráfico 2. CARTEIRAS DE CRÉDITO NO BRASIL

Fonte: Banco Central do Brasil. S Gerenciador de Séries Temporais - v2. BCB-DSTAT. Indicadores de crédito, Saldos por controle de capital. Elaboração do autor.

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Assim, não é pequena a mudança entre os mandatos de Lula da

Silva e Dilma Rousseff e seus antecessores. Nota-se também a importante

diferença entre os dois mandatos de Lula da Silva. Do primeiro, voltado

principalmente ao mercado financeiro, porém com introdução de políticas

sociais mais amplas; para o segundo, em que o foco busca o desenvolvimento

da economia com maior intervenção do Estado, principalmente para suprir a

demanda de crédito e orientar projetos em infraestrutura. Os bancos públicos

passaram a exercer um papel de incentivar e promover o crédito a juros

menores. O saldo total cresceu 3,7 vezes acima da inflação medida pelo IPCA.

Em 2010, a carteira de crédito dos bancos públicos volta a se tornar maior que

a dos bancos privados nacionais, posição que havia sido perdida em 2005 e,

em 2013, os bancos públicos superam a soma das carteiras de crédito dos

bancos privados nacionais e estrangeiros, oferecendo, assim, mais de 50% do

crédito no país. O BNDES agiu de forma decisiva ao fornecer crédito para o

setor produtivo em diversas áreas. Houve opção do governo em promover

indústrias nacionais, inclusive para vender no exterior, utilizando-se de

recursos do BNDES para capitalizá-las, ampliando a exportação de produtos e

serviços nacionais para países estrangeiros. Dentre as empresas mais

beneficiadas, destacam-se aquelas apontadas por Boito (2012), tanto no setor

de construção quanto de alimentação.

A Petrobras, maior empresa do Brasil e estatal, teve papel

fundamental no impulso econômico brasileiro e na ampliação dos

investimentos públicos demonstrados no gráfico 1. A empresa investiu na

construção de refinarias, plataformas e desenvolvimento de tecnologias e

pesquisas que permitiram descobrir novas reservas e explorá-las, alimentando

uma ampla cadeia produtiva, sobretudo privada e nacional. São evidências de

que as políticas dos governos do PT reforçaram setores da burguesia, que

absorveram esses negócios, promovendo também ganhos para o movimento

popular e sindical em termos de salário e emprego. A hegemonia, como

acertadamente aponta Boito, foi da grande burguesia interna, particularmente

no segundo mandato de Lula da Silva e no primeiro de Dilma Rousseff.

No primeiro mandato de Lula da Silva, adotando o conceito de Boito

(2012), entendemos que a composição dessa ampla e heterogênea frente

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neodesenvolvimentista não havia se consolidado, embora houvesse a

convergência de interesses da burguesia interna com setores dos movimentos

sindical e popular em alguns temas, especialmente quanto às taxas de juros,

acesso ao crédito e incentivo à indústria. Essa noção de frente

neodesenvolvimentista torna-se mais clara a partir do PAC (Programa de

Aceleração do Crescimento), em 2007, mediante a ampliação do investimento

público. No entanto, as medidas neoliberais que beneficiaram os negócios

financeiros não ficaram em segundo plano na maior parte do tempo. Os

investidores nacionais e estrangeiros do mercado financeiro obtiveram ganhos

significativos. Os principais momentos de redução no ganho foram durante a

crise financeira internacional, cujo auge no Brasil foi em 2008 e 2009 e durante

o governo Dilma Rousseff, com redução na taxa básica de juros da economia,

conforme será apresentado. A bolsa de valores de São Paulo, que tinha 12 mil

pontos em 2003, atingiu 70 mil pontos em 2010 e em 2016 estava acima de 50

mil pontos (Ibovespa).

Vejamos mais de perto como ficou a situação dos bancos, setor que

nos interessa diretamente dado nosso objeto de estudo. Os principais bancos

atuantes no Brasil mantiveram-se muito rentáveis. É um acerto dizer, desse

modo, que não houve ruptura com os banqueiros e que a política

macroeconômica de Lula da Silva e Dilma Rousseff beneficiou o capital

bancário nacional. Os bancos estrangeiros no Brasil, diferentemente de outros

países em desenvolvimento, como o México, não conseguiram ampliar sua

participação no mercado durante os governos do PT. As maiores operações,

seja em ativos, lucros, carteiras de crédito, ficaram com Itaú e Bradesco, de

capital privado, e Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, de controle

público. O banco Santander foi o principal banco estrangeiro no período. O

HSBC no Brasil foi vendido ao Bradesco em 2015, sem ter expandido sua

participação no mercado.

No gráfico 3, nota-se que a rentabilidade média dos bancos,

constatada pela divisão entre lucro líquido pelo patrimônio líquido, foi bastante

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significativa no período. Ao comparar com a taxa Selic real27, com a inflação

medida pelo IPCA e com o crescimento do PIB, o RSPL (Retorno Sobre

Patrimônio Líquido) dos bancos seguiu em patamares elevados. A utilização

do RSPL costuma ser mais realística para determinar o resultado e a

capacidade das empresas em produzir lucro. A comparação com a taxa Selic

serve como parâmetro para saber se o negócio é mais viável que o

investimento de recursos em títulos da dívida pública ou papéis do mercado de

capitais.

Gráfico 3. Rentabilidade dos bancos atuantes no Brasil

Fontes: IBGE, Diretoria de Pesquisas Coordenação de Contas Nacionais BANCO CENTRAL DO BRASIL/SISTEMA GERENCIADOR DE SÉRIES TEMPORAIS, V2.1.

Meta Selic definida pelo Copom.

27 Taxa de juros fixada pelo COPOM (Comitê de Política Monetária) do Banco Central

do Brasil para remuneração de títulos públicos federais e empréstimos interbancários.

Serve como taxa básica de juros e parâmetro para a economia.

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Retorno sobre patrimônio líquido dos cinco maiores bancos brasileiros, dados obtidos nos Relatórios Anuais dos bancos. Elaboração própria. Dados da Caixa Econômica Federal de 2000 a 2008 fornecidos pelo Dieese. PIB - preços de mercado - var. real anual - ref. 2000 - (% a.a.) - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de Contas Nacionais Referência 2000 (IBGE/SCN 2000 Anual). IPCA medido pelo IBGE. Selic calculada a partir da média das taxas diárias informadas pelo Banco Central. RELATÓRIO ANUAL DOS BANCOS: BANCO DO BRASIL, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, BRADESCO, ITAÚ E SANTANDER, ENTRE 2000 E 2016. ELABORAÇÃO PRÓPRIA.

Destaque-se que, entre 2008 e 2013, Banco do Brasil e Caixa

Econômica Federal foram os bancos mais rentáveis do país, resultado da

estratégia das instituições, definidas no âmbito do governo federal, em praticar

uma política anticíclica. Num primeiro momento, essa política visava combater

os efeitos da crise internacional, quando os bancos privados recuaram na

concessão de crédito; no segundo momento, já no governo Dilma Rousseff, a

política assumiu um duplo papel: manter o nível de atividade econômica e

emprego e forçar uma redução no spread28 cobrado pelos bancos privados.

No gráfico 4, produzido para esta pesquisa, mostramos como a

queda do spread bancário acontece de forma drástica entre 2012 e 2013,

tendo impacto na rentabilidade dos bancos brasileiros, criando, assim, uma

oposição maior e sistemática do setor bancário ao governo Dilma Rousseff,

diferente do que aconteceu com Lula da Silva. Os dados foram obtidos no

Banco Mundial, de forma que permitirá, mais a frente, comparar os dados

brasileiros com os internacionais. Observa-se, ainda, que os anos de 2010 e

2013 foram os únicos nos últimos 21 anos em que o crescimento do PIB foi

maior que a taxa de juros real.

28 É a diferença de taxas de juros com a qual o banco ou outro intermediário financeiro remunera a captação de recursos (investidores) e a taxa de juros cobradas de tomadores de recursos, por meio, por exemplo, de empréstimos concedidos.

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GRÁFICO 4. COMPARAÇÃO ENTRE SPREAD E RSPL/ROE DOS BANCOS NO BRASIL

DADOS BANCO MUNDIAL, DATA BANK, Global Financial Development. RENTABILIDADE SOBRE PATRIMÔNIO LÍQUIDO DEPOIS DE IMPOSTOS. ELABORAÇÃO DO

AUTOR

Verifica-se, no gráfico 4, a redução do spread em 13,3 pontos

percentuais no período de dois anos, a maior num período curto de tempo. Ao

compararmos com outros países do mundo, como Estados Unidos, China,

Rússia e países da Zona do Euro, veremos que os negócios financeiros dos

bancos atuantes no Brasil permaneceram com rendimento superior à média do

segmento (gráfico 5). Entre 2002 e 2008, com exceção de 2005, os bancos

brasileiros foram os mais rentáveis do mundo, ocupando essa posição

novamente em 2011. Entre 2012 e 2015, os bancos chineses conseguiram

superar a rentabilidade dos bancos que atuam no Brasil, que ficaram na

segunda posição.

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Gráfico 5. Comparação entre Spread e RSPL/ROE dos bancos no Brasil e

em países selecionados

DADOS BANCO MUNDIAL, DATA BANK, Global Financial Development.

Desse modo, entendemos que o mercado financeiro no Brasil e o

mercado de capitais no país, de modo geral, foi beneficiado pelos governos do

PT. A economia internacional favorável, principalmente antes da crise de 2008,

aliada à reorientação parcial do papel do Estado, foi decisiva para a obtenção

de melhores taxas de crescimento, geração de empregos, distribuição de

renda e redução da pobreza, permitindo um mercado interno maior e mais

dinâmico no país no período de governo de Lula da Silva, além da ampliação

das reservas internacionais. O enfrentamento da crise internacional de 2008

obteve relativo êxito devido ao fortalecimento do mercado interno e à

distribuição de renda, seja através da ampliação do salário mínimo (Krein e

Teixeira, 2014), como através de programas sociais. Isso se sustenta a partir

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de dados de queda da desigualdade de renda e da importante melhoria na

participação da renda do trabalho em relação ao PIB (Pochmann, 2012).

O gráfico 6 indica que o período de mais forte expansão da balança

comercial aconteceu entre 2002 e 2007, quando começa a decrescer em razão

da crise internacional. Nesse período, o Brasil obteve grande entrada de

divisas, decorrente da valorização das commodities no mercado externo. A

balança manteve-se superavitária até 2013, tendo queda no ano de 2013 e

2014, e se recuperando em 2015, com a valorização do real. Para Baltar

(2014), um aspecto problemático no Brasil é o câmbio que, devido a aplicação

da política monetária e fiscal, apresenta tendência de se apreciar em

conjunturas externas favoráveis, diminuindo a capacidade de ganhos e

investimentos no Brasil, e de se depreciar quando o mercado internacional se

esfria. Sem dúvida, setores da mineração e da agropecuária foram grandes

beneficiárias nesse período.

GRÁFICO 6. EXPORTAÇÕES, IMPORTAÇÕES E BALANÇA COMERCIAL DE 1995 A 2016

FONTE: BANCO CENTRAL DO BRASIL. Sistema Gerenciador de Séries Temporais - v2.1, Balança Comercial e Serviços. ELABORAÇÃO PRÓPRIA.

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Por outro lado, na média, a exportação e importação de bens e

serviços foram desfavoráveis ao Brasil, com maior entrada de produtos

processados de maior tecnologia do exterior e menor exportação de produtos

brasileiros, em termos de valores. Essa é uma implicação da divisão

internacional neoliberal, em que o Brasil ocupa um papel periférico, o que deixa

o país numa “especialização regressiva” (Boito, 2012). Trata-se não apenas de

uma imposição externa, mas de opção do Estado e da classe dominante

brasileira, com todas as suas contradições. Desde 1995, o único período em

que o país conseguiu inverter esse quadro foi de 2002 a 2007, com vantagem

cambial competitiva.

GRÁFICO 7. EXPORTAÇÕES E IMPORTAÇÕES DE BENS E SERVIÇOS

Exportações/Importações - bens e serviços - ref. 2000 - (% PIB) - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Sistema de Contas Nacionais Referência 2000 (IBGE/SCN 2000 Anual)

Para os setores industriais, os ganhos foram possíveis devido à

dinamização do mercado interno, com a adoção de medidas sociais voltadas à

população trabalhadora, já mencionadas neste capítulo. Entretanto, o país não

logrou êxito em alterar a estrutura produtiva do Brasil. Nem do ponto de vista

das reformas, como a tributária, que se manteve estruturalmente regressiva,

incidindo sobre o consumo, o que penaliza os mais pobres (Pochmann, 2015),

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nem a agrária, uma vez que a concentração de terras permaneceu elevada. A

desindustrialização do país não foi revertida, embora tenha havido durante

alguns anos uma ampliação da participação da indústria no PIB, como

demonstra o gráfico 8.

GRÁFICO 8. PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL NO PIB POR SETOR ECONÔMICO

FONTE: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Contas Nacionais. PARTICIPAÇÃO NO PIB POR SETOR DA ECONOMIA. ELABORAÇÃO PRÓPRIA.

A indústria participava com cerca de 26% do PIB em 2000; essa

participação cresceu e se aproximou de 30% em 2005, tendo seu melhor

período situado entre 2004 e 2007, logo começa a recuar gradativamente, com

pequena retomada entre 2010 e 2011 e, por fim, termina com participação

inferior a 25% no ano de 2014 e depois em 2015. Assim como a agropecuária

manteve-se em média com 5% do PIB, tendo sido ampliado entre 2003 e 2004,

no auge do valor das commodities. Quem amplia a participação nesse contexto

é o setor de serviços, realidade observada em diversos países do mundo

(Pochmann, 2015), que ultrapassou os 70% de participação no PIB no ano de

2014. Esse foi o segmento que mais gerou empregos no Brasil no período dos

governos do PT, sendo especialmente beneficiado pelo aumento de consumo

e da renda do brasileiro.

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A partir dos dados apresentados nos gráficos, parece-me que a

concepção de frente neodesenvolvimentista tem capacidade de explicar

diversas dimensões da correlação de forças entre classes e frações de classes

no período. Entendo que houve convergência de interesses entre classes

distintas, motivada por uma melhora na conjuntura econômica, ampliando a

capacidade de apropriação de ganhos econômicos e políticos pelos diferentes

agentes. O Estado atendeu de forma seletiva as demandas das diferentes

classes: burguesia interna, operariado urbano, campesinato e trabalhadores

desorganizados. Sem dúvida, a maior parte da renda foi apropriada pela

burguesia e a sua fração interna ganhou força no período. Entretanto, a fração

mais vinculada ao mercado financeiro e ao fluxo de capitais internacionais

também foi atendida com preferência. Não é possível vislumbrar de maneira

nítida a delimitação de interesses atendidos – pelo menos na maior parte do

período – entre as frações da grande burguesia interna e aquela subordinada e

integrada ao capital financeiro internacional.

Essa separação torna-se mais clara a partir de 2012 com o

enfrentamento levado a cabo, pelo governo Dilma Rousseff, na redução da

taxa de juros da Selic, e, portanto, na remuneração dos detentores de título da

dívida e dos rentistas de maneira geral, que passam a elevar a desconfiança e

rejeição à “nova matriz econômica”29. Dilma Rousseff ampliou a política de

concessão de crédito pelos bancos públicos, forçando a redução do spread,

bem como elevou a proteção à indústria nacional. As medidas adotadas por

Lula da Silva no combate à crise internacional foram intensificadas por Dilma

Rousseff, como a concessão de amplas desonerações fiscais em diversos

setores30, com forte impacto no orçamento público. Os maiores beneficiados

foram os grandes empresários brasileiros, que absorveram as desonerações

aumentando suas margens de lucro, de modo que essa política não surtiu o

efeito positivo esperado na economia, com reinvestimentos. Com objetivo

declarado de reduzir custos do setor produtivo e estimular o investimento

produtivo, no início de 2013, Dilma Rousseff anunciou a redução nas contas de

29 Política de Dilma para promover o desenvolvimento produtivo da economia nacional, com liberação de mais crédito, desonerações fiscais e incentivo à política de conteúdo local (MDIC, 2016). 30 Estimativas do IBRE/FGV consideram que o governo Dilma deixou de arrecadar mais de R$ 400 bilhões em tributos relacionados às desonerações fiscais (2015).

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energia elétrica, mediante nova rodada de incentivos fiscais e prorrogação das

concessões do setor elétrico. Tais medidas estavam alinhadas com o interesse

das grandes indústrias, lideradas por CNI e Fiesp (Singer, 2015). Esses casos

indicaram objetivamente, a partir do início de 2012, uma política em que as

escolhas seletivas do Estado tornaram-se bastante favoráveis às demandas

da indústria em detrimento do mercado financeiro, inclusive dos grandes

bancos privados nacionais, embora isso não tenha se refletido no aumento

relativo da participação da indústria no produto nacional.

A política de governo de Lula da Silva foi mais conciliatória nesse

sentido, conseguindo absorver, com cenário favorável, diferentes demandas

da burguesia, dos trabalhadores organizados e desorganizados e, como já

apontado por Boito (2012), em menor grau dos trabalhadores na agricultura. O

que explicaria a resistência de setores da burguesia aos governos do PT, ainda

no primeiro mandato de Lula da Silva, se os interesses desta classe vinham

sendo atendidos, em maior ou menor grau, pelo governo petista? Isso se

relaciona com a importante diminuição de medidas neoliberais mais

“ortodoxas”, como as reformas orientadas para o mercado, corte de direitos

sociais e a privatização de empresas públicas. Pelo contrário, houve

incremento e investimento no setor público, como no caso do Banco do Brasil,

Caixa Econômica Federal, BNDES e Petrobras e, como já mencionado,

ampliação dos gastos sociais31. Ademais, setores descontentes da burguesia

podem ter calculado que obteriam ganhos maiores caso o governo não tivesse

feito algumas opções redistributivas ou mesmo se não tivesse mantido o

câmbio desvalorizado.

É importante frisar que, nos governos Collor e FHC, a intervenção

estatal foi orientada, fundamentalmente, para a reprodução do modelo

neoliberal mais ortodoxo, seja pela abertura comercial, por reformas para o

mercado32, com implementação de programas para beneficiar o setor bancário

31 Alguns indicadores dessa elevação podem ser consultadas em nexojornal.com.br/grafico/2017/01/13/Os-gastos-sociais-do-governo-federal-de-2002-a-2015, consulta em 12/02/2017. 32 Destacam-se a reforma administrativa conduzida por Collor de Melo no início de seu governo e as abrangentes reformas trabalhista e previdenciária executadas por FHC. No governo Lula da Silva foi realizada, ainda em 2003, a reforma da previdência

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nacional e estrangeiro33, ou pelas privatizações e concessões amplas34. Já nos

governos Lula da Silva e Dilma Rousseff, o neoliberalismo conviveu com um

modelo de reorientação na intervenção estatal com objetivo social.

1.3 A relação do movimento sindical com o governo

Os governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, com suas nuances,

mantiveram algumas políticas de viés neoliberal, como, por exemplo, o tripé

herdado de FHC - superávit primário, câmbio flutuante e metas de inflação,

com o oneroso pagamento de serviços da dívida interna, baseado em altas

taxas de juros. Por outro lado, reorientaram a atuação do Estado nas políticas

sociais, ampliando programas voltados à população mais empobrecida, como

o Bolsa Família, bem como buscando a valorização real do salário mínimo e a

ampliação da formalização do trabalho, ambas ações com importante impacto

na previdência social, instrumento fundamental para a política redistributiva

(Calixtre e Fagnani, 2017).

Os governos do PT ampliaram os gastos sociais, tomando como

referência o PIB. Na área de educação, além dos já mencionados Prouni e

Fies, houve a ampliação da rede federal de ensino, como novos campi, e das

escolas técnicas. Na habitação, o “Minha Casa, Minha Vida”, significou a

retomada do investimento federal na área; na saúde houve a criação de

diversos programas, como as Farmácias Populares, Mais Médicos; na

voltada aos servidores públicos. Para mais detalhes desse importante debate, cf. Krein, Santos, Nunes (2011). 33 Conforme Braga e Prates (1999) o governo FHC buscou facilitar a entrada de competidores internacionais no setor bancário nacional, com vistas, conforme a justificativa do governo, a promover a concorrência no segmento. Em seu governo, duas grandes instituições estrangeiras passaram a atuar no Brasil de forma considerável, o inglês HSBC, por meio da aquisição do Bamerindus, e o espanhol Santander, pela aquisição do Banespa. 34 Os governos do PT não interrompem de forma definitiva a privatização e a concessão de empresas e serviços públicos. Todavia, elas foram substancialmente reduzidas, ocupando lugar secundário. Os casos mais notórios no governo FHC foram as privatizações das empresas de telefonia; da Companhia Vale do Rio Doce; dos bancos públicos estaduais, entre eles Banespa e Banerj e da Companhia Siderúrgica Nacional; nos governos do PT os casos mais emblemáticos foram a concessão das rodovias federais, levadas a cabo por Lula da Silva e por Dilma Rousseff, e dos aeroportos, conduzidas na gestão da segunda.

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previdência, o crescimento significativo dos Benefícios de Prestação

Continuada (BPC) e de outros gastos oriundos da maior formalização do

trabalho no período. Verificou-se, também, a ampliação do crédito, que saiu de

cerca de 25% para mais de 55% do PIB, voltado para pessoas jurídicas e

física, com participação decisiva das instituições públicas federais (Banco

Central, conforme gráfico 2).

O cenário externo foi favorável para a economia brasileira,

principalmente no período de 2003 a 2008 (Baltar, 2014), com valorização

expressiva no preço das commodities, conhecido como boom das

commodities, relacionado ao forte crescimento da economia da China, com

grande demanda de insumos brasileiros. O Brasil promoveu ampliação do

leque de parceiros comerciais realizados pela política externa, com olhar mais

atento ao eixo-Sul (Milani e Carvalho, 2013). Esse cenário internacional

permitiu o acúmulo de reservas cambiais, minimizou a volatilidade da

economia brasileira, possibilitou o aumento da arrecadação federal e a

consolidação de políticas sociais mais amplas. O crescimento econômico,

embora em ritmos muito menores do que o registrado durante a

industrialização do país, aliado ao maior volume de crédito, propiciou a

geração de novos empregos e renda, fomentando o mercado interno. A reação

do mercado de trabalho foi bastante favorável, revertendo a trajetória de

desemprego observada até 2003 (Baltar e Krein, 2013).

Esses elementos fizeram com que as maiores centrais sindicais

brasileiras apoiassem os governos durante a maior parte do período35. Com o

mercado de trabalho apresentando melhorias, a geração de postos de trabalho

e aumento real dos salários ampliaram a capacidade de mobilização dos

sindicatos. O reconhecimento das centrais sindicais no ano de 2008, por meio

de uma lei que passou a destinar 10% da arrecadação da contribuição sindical

para as centrais consideradas representativas, foi outra forma de estabelecer

uma relação maior com essas entidades. Apesar das diferenças entre as

centrais do ponto de vista ideológico, como veremos adiante, aconteceram

mobilizações conjuntas em prol da redução da jornada de trabalho de 44 horas

para 40 horas semanais, contra a emenda 3, contra o projeto de lei da

35A Força Sindical adere mais claramente no segundo mandato de Lula da Silva.

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terceirização. Também houve a apresentação de uma pauta conjunta,

envolvendo CUT, Força, CTB, UGT, CGTB e NCST, para a candidatura Dilma

Rousseff nas eleições de 2010. Mas, antes de caracterizar a relação entre o

movimento sindical e os governos petistas, é importante indicar as diferenças

em relação ao contexto anterior.

O movimento sindical brasileiro passou por um processo

defensivo nos anos de 1990. Esta defensiva, principalmente depois de 1992,

refletiu-se no número de greves, na queda de filiações aos sindicatos, na pauta

apresentada – objetivando manter direitos e não os ampliar –, na redução de

conquistas salariais, entre outros (Boito e Marcelino, 2010). O avanço do

neoliberalismo foi o principal motivo para esta posição de defesa e de refluxo

na organização sindical.

Por outro lado, a pauta neoliberal não promoveu mudanças na

estrutura sindical brasileira. Não houve ataques sistemáticos quanto à forma

de organização das entidades, como acontecera na Inglaterra, com a

implementação das medidas de caráter neoliberal por Margareth Thatcher nos

anos 1980. A estrutura de sindicatos atrelada ao Estado permaneceu (Boito,

2002)36. Houve também apoio de setores sindicais, como a Força Sindical, à

pauta neoliberal, conforme é apontado por Trópia (2009). No entanto, nos anos

1990 verificou-se um processo de flexibilização de direitos trabalhistas e maior

dificuldade de organização sindical, num cenário de alto desemprego e baixo

crescimento econômico (Krein, 2007).

A eleição de Lula da Silva propiciou importantes mudanças na ação

sindical. A pauta passou, gradativamente, da defensiva para posições mais

ofensivas, em busca de novos direitos e de ampliação de salários,

utilizando-se em quantidade cada vez maior das greves para alcançar seus

objetivos (Boito e Marcelino, 2010). A greve também foi utilizada como

instrumento de luta sindical para mobilização da categoria e disputa entre

direções sindicais e oposições. Dois fatores favoreceram esta mudança na

pauta sindical. O primeiro deles é político. A ascensão do PT levou à

36 A lei sindical, oriunda do corporativismo de Estado varguista, determina a unicidade sindical, em que apenas um sindicato de trabalhadores representa uma categoria profissional por base geográfica. Ela também estabelece contribuições compulsórias, como o imposto sindical,

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participação de pessoas oriundas do movimento sindical em altos cargos do

governo federal (Galvão, 2012; Bianchi e Braga, 2011), mudou a forma do

Executivo federal se relacionar como os movimentos sociais, permitindo um

ambiente político mais favorável para organização dos trabalhadores, mais

democrático e menos repressivo, embora não tenham sido eliminados

elementos repressivos e constrangimentos às mobilizações. Outro fator

fundamental foi econômico. Como vimos, desde 2004 o Brasil passou por um

processo de crescimento econômico mais acelerado que nos anos anteriores,

aliado a políticas que permitiram o aumento do emprego, da renda e do

consumo (Baltar, 2014), cenário no qual a organização sindical foi favorecida.

Os governos petistas não interromperam o processo de

flexibilização de direitos trabalhistas (Galvão, 2012), tendo adotado medidas

tanto no sentido de ampliar direitos como de flexibilizá-los e limitá-los, podendo

considerar o período de avanços e contradições (Krein, Santos, Nunes, 2011).

Em que pese o fato de os governos petistas não terem revertido a flexibilização

realizada nos anos 1990, bastante combatidas pelo PT e pelo sindicalismo

cutista à época, e de terem introduzido medidas que trouxeram prejuízos à

classe trabalhadora, entendemos que o sentido geral das mudanças na

legislação foi mais favorável à proteção social do que à flexibilização. Galvão

(2007 e 2012), analisando o governo Lula da Silva, considera que a reforma

trabalhista não foi suspensa, mas foi realizada de forma sutil e mitigada, sem

debate, e em ritmo menor do que aquele adotado no governo FHC. Essa visão

é complementar à noção de ações contraditórias, pois, de um lado, mantém-se

mudanças desfavoráveis e aprovam-se outras medidas para flexibilização, de

outro, avança-se em temas de proteção social e garantias de direitos. Desse

modo, a depender da categoria ou do setor a ser analisado, pode-se inferir

maior benefício ou prejuízo aos trabalhadores. Contudo, o conjunto das

medidas permite concluir que a proteção social e os direitos trabalhistas foram

mais fortalecidos que enfraquecidos.

1.4- A reorganização do sindicalismo brasileiro

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As medidas contraditórias adotadas pelos governos petistas e as

diferentes posições das correntes sindicais frente a elas levaram a mudanças

organizativas importantes. A criação de novas centrais sindicais e as disputas

político-ideológicas inserem-se tanto no contexto de mudanças na previdência

e nas leis trabalhistas quanto no melhor ambiente político e econômico para a

ação sindical. Outro aspecto fundamental foi o reconhecimento das centrais

sindicais e a garantia de seu financiamento por meio da lei 11648/200837,

construída pelo diálogo entre o governo e as centrais, que tiveram assegurado

10% da arrecadação com a contribuição sindical. Foram dois movimentos,

portanto, relacionados ao sindicalismo no período: o primeiro deles de cisão,

particularmente na CUT, com divergências políticas e ideológicas que deram

origem à Conlutas e à Intersindical e, posteriormente, a criação da CTB (antiga

CSC), já no bojo da nova lei sobre centrais; o segundo de fusão de centrais,

com objetivo alcançar os critérios de representatividade da lei de

reconhecimento (Galvão, Marcelino e Trópia, 2015).

A fusão que deu origem à UGT (União Geral dos Trabalhadores)

visou assegurar as condições para alcançar os critérios de representatividade

previstos na lei de reconhecimento das centrais. Assim, somaram-se CGT,

CAT e SDS, dando origem a essa central. Ela alcançou o reconhecimento do

Ministério do Trabalho e tem acesso aos recursos da contribuição sindical,

enquanto ainda existir essa contribuição38. Galvão, Marcelino e Trópia (2015)

destacam que a aliança entre as três centrais que formaram a UGT não foi

aleatória: suas razões são encontradas nas dissidências do movimento

37 Conforme o art. 2° da lei 11648/2008: 2o Para o exercício das atribuições e prerrogativas a que se refere o inciso II do caput do art. 1o desta Lei, a central sindical deverá cumprir os seguintes requisitos: I - filiação de, no mínimo, 100 (cem) sindicatos distribuídos nas 5 (cinco) regiões do País; II - filiação em pelo menos 3 (três) regiões do País de, no mínimo, 20 (vinte) sindicatos em cada uma; III - filiação de sindicatos em, no mínimo, 5 (cinco) setores de atividade econômica; e IV - filiação de sindicatos que representem, no mínimo, 7% (sete por cento) do total de empregados sindicalizados em âmbito nacional. 38 A aprovação da reforma trabalhista no governo Michel Temer extinguiu a obrigatoriedade da contribuição sindical, todavia não é possível saber se haverá alguma compensação do governo federal para assegurar recursos aos sindicatos de trabalhadores e patronais. Notícias veiculadas na imprensa mencionam que haveria um acordo entre a presidência da república e setores sindicais mais próximos à Força Sindical para apresentar um projeto que assegure outra fonte de financiamento às entidades afetadas pelo fim da obrigatoriedade da contribuição sindical.

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sindical, em parte originado pela aproximação entre CUT e Força, o que teria

trazido discordâncias tanto na esquerda cutista quanto entre os conservadores

da Força, os quais viram possibilidade de criar uma outra força política. De

acordo com as autoras, a UGT reforça alguns argumentos outrora utilizados

pela Força: a aplicação de práticas gerenciais modernas e inovações, bem

como uma postura ativa na disputa do “mercado sindical”. Do ponto de vista

partidário, as forças predominantes no interior da UGT são o PPS e o PSB.

A partir dessa conformação, temos, em 2016, seis centrais sindicais

reconhecidas oficialmente no país pelos critérios de representatividade

estabelecidos pela lei: CUT, UGT, CTB, Força Sindical, NCST e CSB. A CGTB

perdeu a condição em 2015, enquanto duas centrais que surgiram de cisões

da CUT, Conlutas e Intersindical, não alcançaram os indicadores para serem

reconhecidas.

1.4.1 Rupturas e divergências na CUT

A ênfase à CUT nessa análise deve-se ao fato notório do

sindicalismo bancário ser amplamente hegemonizado por sindicatos cutistas,

historicamente identificados com o novo sindicalismo. Desse modo, as

transformações vivenciadas pela CUT e as suas relações políticas tornam-se

fundamentais para compreender a dinâmica do segmento.

A moderação do governo Lula da Silva pode ser vista como análoga

– guardada as devidas proporções – à moderação por que passaram seu

próprio partido e a CUT. A CUT defendeu as medidas que possibilitaram

melhores salários aos trabalhadores, como o já mencionado do acordo de

valorização do Salário Mínimo, como algo central nos ganhos salariais dos

trabalhadores, aquecimento do mercado de trabalho, programas sociais,

fortalecimento do papel do Estado, dentre outros. Ao mesmo tempo, teve

dificuldades em definir claramente sua posição frente à administração federal,

inclusive na crítica à política econômica, especialmente do primeiro mandato

de Lula da Silva e no segundo de Dilma Rousseff. Nesse sentido, a central e

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seus sindicatos passaram a absorver politicamente tanto o reconhecimento

positivo das políticas do governo junto aos trabalhadores em suas bases

quanto os resultados negativos e as crises. A relação entre governo e central

vai além, portanto, de simples cooptação, pois é um processo de imbricação,

com histórias e interesses comuns e, evidentemente, contradições. Fontes e

Macedo (2014) discutem essa relação ambígua no âmbito dos bancários, entre

a sustentação e a crítica e mobilização.

Se, nos anos 1990, conforme apontado por Galvão (2004), a CUT já

tinha uma posição de sindicalismo de negociação em detrimento do projeto de

confronto dos anos 1980, nos anos 2000 esse papel de negociação avançou

para um cenário ainda mais complexo com a chegada do PT ao governo:

realizar as críticas, representar os trabalhadores e, simultaneamente, defender

o projeto político do qual suas lideranças fizeram parte e defenderam. Nesse

contexto, o sindicalismo cutista passou a cumprir um papel diferente do que

vinha fazendo. Deixou de ser porta-voz da crítica, da oposição às medidas do

governo FHC e passou a ocupar um papel ambíguo, de representação dos

trabalhadores e de ter parte de seus quadros ocupando funções de comando

no Estado.

A CUT foi a principal central aliada aos governos do PT, o que

provocou rupturas no sindicalismo cutista. Saíram correntes como o MTS

(Movimento por uma Tendência Socialista), FES (Frente de Esquerda

Socialista), e CSC (Corrente Sindical Classista), dentre outras, que

constituíram a Conlutas, a Intersindical e a CTB. As duas primeiras deixaram a

central, respectivamente, em 2004 e 2006, num processo de críticas políticas e

ideológicas à CUT e sua corrente majoritária, a Articulação, em razão do apoio

dado ao governo Lula da Silva. A Conlutas e Intersindical consideravam a

corrente Articulação e a CUT cooptadas pelo governo. O fato de o PT ampliar o

leque de alianças com partidos da direita, cedendo espaço no governo federal

para figuras políticas as quais anteriormente se opunham e adotar um

programa e discurso mais conciliador, dentre outros temas, são aspectos que

devem ser considerados como relevantes no afastamento dessas correntes

tanto do PT quanto da CUT (Galvão, Marcelino, Trópia, 2015).

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A Conlutas (desde 2010, Central Sindical e Popular – CSP –

Conlutas) é hegemonizada partidariamente pelo PSTU. A central adota uma

postura contrária ao governo, assume um discurso de confrontação à estrutura

sindical e busca integração com diferentes movimentos sociais em defesa de

transformações profundas na sociedade, de viés socialista. A criação da

Intersindical, em 2006, tem conexões com a criação do PSOL em 2004 –

partido hegemônico na central e que surgiu a partir de setores da esquerda do

PT descontentes com a reforma da previdência, que reduzia direitos dos

trabalhadores do setor público, grupo social que durante as últimas décadas

manteve-se fortemente mobilizado e organizado junto à CUT e sendo

importante polo de resistência às medidas neoliberais adotadas pelos

governos nos anos 90 (Junckes, 2004). O PSOL foi reforçado com a adesão de

novas correntes em 2005, nos eventos que sucederam o escândalo do

“Mensalão”. A Intersindical constituiu-se em princípio sem o objetivo de criar

formalmente uma nova central, mas de criar um polo que agregasse forças

políticas de esquerda no sindicalismo. Por conta disso, “desde 2008 [é] dividida

em duas: Intersindical – instrumento de luta e organização da classe

trabalhadora e Intersindical – instrumento de luta, unidade de classe e

construção de uma nova central” (Galvão, Marcelino, Trópia, 2015, p.30).

A CTB foi formada em 2007, num contexto de menor divergência

política e mais voltado à consolidação de um novo projeto político em razão

das possibilidades (e dos recursos econômicos) inauguradas pelo

reconhecimento das centrais pelo governo federal (Galvão, Marcelino, Trópia,

2015). A medida permitiria a obtenção de espaço político dominante à

corrente, que é hegemonizada por membros do PCdoB. Na CUT, a CSC era a

segunda força.

A CTB apoiou os governos do PT, entretanto tem uma diferença de

fundo com o sindicalismo cutista, desde os anos 1980: o apoio à estrutura

sindical. Para a CTB, é fundamental a manutenção da unicidade sindical, para

defender os direitos dos trabalhadores. A central entende que a proposta de

pluralismo sindical beneficia os patrões, na medida em que eles podem criar

sindicatos fantoches, sob controle patronal, e incentivar a filiação e

reconhecimento dos trabalhadores nessas entidades feitas para dividir e

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enfraquecer o movimento sindical. A CTB, que antes de ser central e corrente

dentro da CUT esteve vinculada à antiga CGT (Confederação Geral dos

Trabalhadores), possui influência dentro do movimento sindical brasileiro, com

cerca de 10% dos trabalhadores brasileiros ligados às entidades filiadas à

central (dados do Ministério do Trabalho, 2017).

A Articulação, na condição de tendência majoritária, com grande

influência em praticamente todos os estados do Brasil, definiu os principais

rumos da CUT nas mobilizações, organizações e discussões políticas no

período. Foi alvo das principais críticas das demais correntes, em especial das

que romperam com a CUT, por ter adotado um discurso e ação política

considerada mais moderada e passiva perante o governo, mesmo diante da

reforma da previdência realizada em 2003. A continuidade, pelo governo, de

medidas iniciadas com FHC e a falta de reformas estruturais e de rupturas

levou ao desgaste da CUT e do PT junto à esquerda partidária e setores

sindicais. Galvão (2014) destaca alguns aspectos da postura da CUT, por

consequência de sua principal corrente.

A afinidade político-ideológica da CUT com o governo petista facilita o movimento de aproximação com o Estado e a prioridade à ação institucional. A pressão sobre o Estado é exercida por meio da apresentação de propostas, desconectada da mobilização necessária à conquista da hegemonia no plano da sociedade civil. Assim, a disputa de hegemonia resume-se a ter um projeto, mesmo que o referencial de classe desse projeto seja esvaziado ou diluído numa política de compromisso. (Galvão, 2014, p.110)

A Articulação, no interior da CUT, foi a corrente que mais próxima

esteve do núcleo do governo Lula da Silva, tanto em postos no governo quanto

em fundos de pensão das estatais. Nos mecanismos tripartites criados por Lula

da Silva, como CDES (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social), no

qual se buscava criar um espaço de entendimento e diálogo social, envolvendo

governo, empresários, sindicalistas, professores e diversos profissionais com

finalidade de discutir temas de interesse nacional e assessorar diretamente o

presidente da república, e no FNT (Fórum Nacional do Trabalho), iniciativa do

governo Lula da Silva para debater as reformas trabalhista e sindical,

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representantes cutistas participaram, inclusive do sindicalismo bancário, como

Luiz Cláudio Marcolino, na época secretário-geral e depois presidente do

sindicato dos bancários de São Paulo. Essa postura sinalizava tanto a

disposição para compor espaços de diálogo quanto a ênfase na

institucionalidade.

De acordo com Galvão, Trópia e Marcelino (2015), a participação

nos fóruns e espaços tripartites e a postura da CUT perante as medidas do

governo Lula da Silva foram decisivas para a ruptura e criação da Conlutas e

da Intersindical. Essas forças políticas tinham a expectativa de transformações

sociais mais profundas, que se chocaram com um governo conciliador e com a

lógica do diálogo social. A direção majoritária da CUT foi criticada por essas

correntes pela moderação política e o apoio ao governo, bem como por

participar de espaços de diálogo e conciliação (Galvão, 2009). Ambas as

correntes cobravam mobilização e oposição da central frente às medidas

macroeconômicas e à reforma da previdência em 2003. Por outro lado, é

importante destacar que as greves no Brasil tiveram importante ampliação

(Dieese, 2016), sendo que muitas delas foram dirigidas politicamente pela

CUT, inclusive em empresas estatais e públicas. Dentre as razões para a

retomada notória de mobilizações, pode-se apontar o contexto econômico, em

que houve melhoria em diversos indicadores (Krein e Teixeira, 2014), e

também o cenário político. As categorias conseguiram reajustes acima da

inflação na maior parte do período, conforme aponta o Dieese (2017):

GRÁFICO 9. VARIAÇÃO REAL DOS REAJUSTES SALARIAIS EM RELAÇÃO AO INPC

Fonte: Dieese (2017)

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TABELA 1. ACORDOS SALARIAIS POR ANO

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Acordos 316 369 495 480 548 658 640 655 715 816 815 804 807 802 784 780 753 714

Acima do INPC

35,1 51,5 43,2 25,8 18,8 54,9 71,7 86,3 87,7 76,6 79,5 87,7 87 93,6 86 90,4 50,7 18,9

Igual ao INPC 14,6 15,2 19,6 27,7 23 26,1 16,3 10,7 8,3 11,9 11,7 7,8 7,1 4,9 7,7 7,3 30,5 44,4

Abaixo do INPC

50,3 33,3 37,2 46,5 58,2 19 12 3,1 4,1 11,5 8,8 4,5 5,9 1,5 6,4 2,3 18,7 36,7

Variação real média

-0,45 0,3 -0,01 -0,72 -2,08 0,61 0,78 1,52 1,22 0,86 0,9 1,66 1,33 1,9 1,21 1,35 0,2 -0,52

Dieese (2017). Acima, igual ou abaixo do INPC referem-se ao percentual dos acordos analisados que ficaram, respectivamente, em cada uma destas condições. Variação real média refere-se aos salários compreendidos pelos acordos comparados à inflação medida pelo INPC/IBGE.

A variação real média negativa dos salários, durante os governos

Lula da Silva e Dilma Rousseff, aconteceu apenas em 2003, -2,08%, e em

2016, quando ficou em -0,52%. Durante o período compreendido entre 2004 e

2015, as médias de reajustes acima da inflação eram predominantes. No geral,

86% dos acordos analisados ficaram nessas condições. Nesse sentido, do

ponto de vista dos reajustes salariais, o período de governos petistas

mostrou-se favorável ao conjunto dos trabalhadores.

Porém, em relação a outros aspectos, há impactos negativos. As

nuances e ambiguidades relativas aos governos petistas repercutiram na

categoria bancária e em seu sindicalismo, o que discutiremos nos próximos

capítulos.

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Capítulo 2: A categoria bancária como expressão de

um sindicalismo de classe média

Para identificar e discutir a categoria bancária em relação às suas

práticas sociais, às manifestações políticas, o nível de mobilização e

organização, é fundamental levar em conta o debate sobre classes sociais. A

inserção do bancário na estrutura social influencia o modo como os

trabalhadores se enxergam e percebem a luta social e política, podendo ou

não se engajar em formas de ação coletiva, como o sindicato. O caráter de

classe também repercute sobre o tipo de sindicalismo que é praticado por esse

segmento. A seguir, são discutidos os caminhos teóricos da discussão, os

quais buscaremos relacionar com a realidade da categoria bancária no período

pesquisado.

2.1 – Trabalhadores de classe média e sindicalismo de classe média

Entendemos que a categoria bancária é parte da classe média.

Essa discussão não pode ser feita apenas considerando o salário, a renda.

Para isso, é fundamental analisar o trabalhador bancário levando em conta

aspectos como ideologia, identidade profissional, componentes simbólicos e

culturais. O aspecto econômico deve ser ponderado, pois tem relevância,

desde que associado à análise ideológica, essa sim, definidora

substancialmente da visão de mundo e das formas de como interpretar e agir

na sociedade. Em nossa análise, os conteúdos do trabalho bancário, ainda nos

dias atuais (2017), permitem inseri-lo nos referenciais de classe média, em

particular na forma como esse trabalhador se percebe, ou como ele possui sua

autoimagem. Dentre esses referenciais, pode-se mencionar o viés do trabalho

intelectual, que se opõe à lógica do trabalho manual ou braçal; os símbolos do

ambiente de trabalho, em prédios relativamente sofisticados, com uso de

equipamentos tele informacionais modernos; frente a uma mesa cercada de

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símbolos do trabalho intelectual; na relação de confiança e credibilidade que

deve estabelecer com os clientes; na forma de se vestir e se portar, que exige

um cuidado maior em razão das atribuições de suas funções. Por outro lado,

ainda que se identifique nas funções desempenhadas diariamente um caráter

intelectual, por ser realizado mediante computadores e sistemas, inserindo e

organizando cadastros, informações e documentos, realizando análises de

dados, visitando e recebendo clientes, o trabalho bancário é, em grande

medida, repetitivo e controlado. A elaboração e o planejamento das atividades

de trabalho são, geralmente, pensados pelas direções, cabendo à grande

maioria dos trabalhadores nas dependências, sejam agências ou

departamentos internos, executar processos cada vez mais automatizados e

simplificados, em que um software realiza análises de dados e riscos para

efetivar determinadas transações e procedimentos. De todo modo, ainda

prevalecem na autoimagem do funcionário e na sua relação interpessoal, na

relação com os clientes e com os espaços de trabalho uma realidade de classe

média, vinculada a um conteúdo ideológico meritocrático, a ser melhor

debatido a seguir.

Boito (2004) e Trópia (2007) destacam que Mills (1979) e Lockwood

(1962), assim como Poulantzas (1974) e Saes (1985), colocaram em debate

importantes análises sobre a prática e as orientações dos assalariados de

classe média. O debate teórico sobre classes sociais é fundamental e, para os

autores, não se pode desconsiderar a importância dessa polêmica sobre a

inclusão dos trabalhadores não manuais na estrutura de classes, pois seria

uma forma de ocultar o debate sobre a realidade social. Trópia (2007)

considera que, para dar conta desse debate, é preciso refletir sobre os

constructos simbólicos, rituais e culturais da classe média.

Lockwood (1962) e Mills (1979) trabalham na perspectiva de pensar

a classe social para além da questão salarial, considerando a situação de

trabalho. Para o primeiro, alguns critérios como salários e condições de

trabalho melhores, a proximidade no trabalho com o patrão, a maior

possibilidade de ascensão profissional, são aspectos que diferenciam o

trabalho de classe média do operariado. Mills (1979) defende a concepção da

luta pelo status social como algo que singulariza a classe média, na medida em

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que a distribuição do prestígio social é desigual na sociedade. Como destaca

Trópia (2007), outros elementos destacados por Mills explicam a percepção da

classe média sobre suas diferenças em relação ao trabalhador manual, tais

como a imagem social, o poder econômico, a maior sofisticação do local em

que trabalham, o empréstimo de status dos seus clientes. Isso criaria uma

percepção característica na pessoa da classe média.

Poulantzas (1974) compreendia que os salários não eram condição

suficiente para buscar uma clareza quanto aos trabalhadores de classe média.

Seria necessário avaliar as dimensões ideológicas, políticas e econômicas

para compreender a classe média, pois as associações desses elementos

produzem efeitos diferenciados nas classes sociais. Como consequência

desses efeitos na classe média, o autor cita o individualismo, a meritocracia, a

expectativa de ascensão social e uma forma específica de conceber o papel do

Estado, como protetor. Por isso, os trabalhadores de classe média formariam

um segmento diferente do operariado tradicional. Para o autor, a estrutura

social não pode ser entendida separadamente do processo que a constrói.

Desenvolvendo a perspectiva de Poulantzas, Saes (1985)

considera que o elemento central da distinção entre a classe média e as

demais classes é a “ideologia meritocrática”. Esse é o fator comum, que unifica

e é compartilhado pelos trabalhadores de classe média. A ideologia

meritocrática dos trabalhadores da classe média (não manuais39) seria a visão

de mundo baseada nos méritos pessoais como condição para inclusão,

adequação e ascensão na sociedade. Essa ideologia não permite que os

trabalhadores de classe média percebam as contradições do modo de

produção capitalista e das relações sociais desiguais como algo estrutural. A

oposição entre capital e trabalho estaria mais aparente no cotidiano do

trabalhador proletário (manual), pois os trabalhadores de classe média tendem

a conceber as relações de trabalho como se ocorressem entre pessoas ou

grupos profissionais, devido ao efeito da ideologia. Para o autor, as

desigualdades sociais derivariam, no entendimento da classe média, das

39 Saes se refere aos trabalhadores de classe média como “não manuais”, uma forma de conceituar que, segundo ele, seria mais específica e precisa que “trabalhador intelectual” ou “trabalhador improdutivo”, no sentido marxista. Dessa forma, o operariado é compreendido como trabalhadores manuais.

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diferenças de capacidade, oportunidades, talento, dons, vontades e

diversidades individuais. Essa noção meritocrática estaria permeada pelo

sentimento de superioridade, o que traduz um preconceito e possibilita a

segregação em relação aos trabalhadores manuais. Os trabalhadores de

classe média recusam-se à igualdade social e esse seria um limite para

atuação política coletiva.

Apesar disso, o sindicalismo de classe média é uma realidade. Boito

(2004) argumenta, citando Mouriaux, que a ampliação do sindicalismo de

classe média aconteceu num cenário de declínio das taxas de sindicalização e

da luta sindical dos setores operários mais tradicionais, em diversos países

centrais no capitalismo, bem como na América Latina. Isso significa que

enquanto houve redução do sindicalismo nas indústrias, ele cresceu na classe

média – em especial no setor público –, mobilizando por meio de greves,

manifestações e negociação de Convenções Coletivas de Trabalho (CCT).

Para o autor, é fundamental considerar que esses trabalhadores são movidos

por interesses, valores e concepções diferenciados do operariado,

constituindo, portanto, uma classe social diferente. A realidade do sindicalismo

de classe média, em que pese o crescimento na segunda metade do século

XX, é marcada pela dificuldade em sindicalizar, em razão do individualismo

que é a base da visão meritocrática, dos dons e méritos individuais como forma

de assegurar o espaço na sociedade. Para Boito, a ideologia meritocrática cria

uma hierarquia das profissões e do lugar de cada um na sociedade, levando à

estigmatização do trabalho manual e ocultando a verdadeira origem das

desigualdades sociais. Em suas palavras, o trabalhador de classe média:

“(...) poderá, seja pela percepção social do trabalho que realiza, cercado de objetos e de cercado de objetos e de símbolos típicos do trabalho intelectual, seja pela correlação de forças políticas e pela conjuntura ideológica, conceber a si próprio como um trabalhador não manual que merece, enquanto tal, um tratamento social diferenciado, isto é, poderá professar a ideologia meritocrática e, nessa medida, integrar a classe média” (BOITO, 2004, p. 222).

Nesse sentido, a meritocracia é “funcional para a classe média e

disfuncional para a classe operária” (idem, p. 220).

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2.1.1 O sindicalismo bancário em perspectiva

Os elementos anteriores nos ajudam a analisar a categoria bancária

e o sindicalismo que pratica. Girardi Jr (1995) destaca elementos

condicionantes estruturais que fundamentam a visão de mundo dos

trabalhadores nos bancos. No início do trabalho bancário no país, as

instituições exigiam padrões morais e sociais elevados, porém com salários

baixos; o trabalho era monótono e repetitivo para relativa alta escolaridade,

que, embora não fosse necessária, pois o trabalho demandava um

conhecimento prático, aprendido com a rotina, era obrigatória por parte dos

bancos. Isso gerava um radicalismo reivindicatório, porém de viés

meritocrático, para garantir tanto ganhos salariais quanto “ a existência de uma

hierarquia salarial” (1995, p.9). Os trabalhadores de classe média, à vista

disso, teriam barreiras ideológicas que os separaram dos trabalhadores

manuais. Portanto, cobrava-se uma forma de premiar de diferentes maneiras

os dons e méritos de cada um, constituindo a necessidade de se criar uma

“complexa estratificação de dignidade da profissão e justa posição social”.

Assim, os trabalhadores bancários foram levados a se organizar para uma

competição com os operários em busca de conquistas e para que pudessem

controlar sua situação de trabalho (1995).

Ainda para Girardi Jr (1995), as lideranças dos bancários tinham

uma visão sobre a categoria que variava conforme a conjuntura,

aproximando-se ou afastando-se dos operários. Essas lideranças não

assumiam uma perspectiva classista, isso é, não defendiam uma ideologia de

enfrentamento de classes, mas sim uma lógica de interesse de canalização

das demandas para dentro do Estado (sindicalismo corporativo) para favorecer

interesses corporativos. Assim como Ana Lúcia Oliveira (1990), o autor

enfatiza a adesão ao populismo (no período varguista) como momento em que

houve a maior integração da categoria bancária em organizações coletivas na

época40.

40 Para Oliveira, há uma relação entre a instituição da legislação previdenciária, com o Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários (IAPB) e a estruturação do sindicalismo bancário corporativo de Estado. O IAPB foi um centro de disputa política

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Segundo Girardi Jr (1995), mesclava-se a ideologia meritocrática

com benefícios da luta coletiva. Assim, a adesão ao corporativismo sindical

varguista tinha como objetivo não a luta de classes, mas a luta para a

valorização da categoria. A estrutura sindical varguista seria funcional à lógica

do sindicalismo de classe média, pois propiciava a divisão dos trabalhadores e

de suas pautas. Como explica Boito (2004), a ideologia meritocrática não é um

obstáculo instransponível para a luta coletiva e diferentes situações de

trabalho podem se articular de formas distintas para a organização coletiva. Há

uma gradação, determinada pela conjuntura, situação econômica e contexto

histórico, para o apego à ideologia meritocrática. Por exemplo, o servidor

público com estabilidade de vínculo empregatício possui maior propensão a se

organizar em relação ao trabalhador comerciário que atua em espaços

menores e mais fragmentados, cujas relações pessoais com o patrão

dificultam a sindicalização e a mobilização. Portanto, embora em gradações

diferentes, “é possível praticar um sindicalismo dentro dos marcos da ideologia

e interesses da classe média, que repercute nas concepções, no conteúdo das

reivindicações e nas formas de organização e nos métodos de luta” (Boito,

2004, p. 225).

Já Girardi Jr (1995) destaca que a greve é utilizada pelos bancários

desde os anos 30 como forma de combater a exploração e criar resistência

frente aos banqueiros. O autor considera que os trabalhadores não manuais

não são um bloco homogêneo e que se dividem em função da situação de

trabalho em determinadas situações. Essa a razão pela qual faremos a

distinção, mais a frente, da categoria no século XXI em três grupos principais,

pois possuem unidade na ideologia meritocrática, entretanto, divergências

quanto a conjunturas e situações de trabalho específicas. Para o autor, no

e de fonte de poder de lideranças sindicais bancárias. O instituto permitiu, da mesma maneira, canalizar a disputa entre o Partido Comunista – que detinha a hegemonia na categoria – com outros segmentos da categoria. “A construção do IAPB teve forte relação com as razões que levaram os bancários a adequarem-se à lei de sindicalização de 1931: a falta de proteção social. E expressou junto com a construção do sindicalismo corporativo praticado pelos bancários, a consolidação de uma categoria profissional singular em relação aos demais trabalhadores, fortemente baseada na autoimagem de trabalhador mais qualificado, de quem era exigido um determinado padrão social e cultural” (Oliveira, 1999, p. 150)

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contexto do trabalho bancário entre os anos 1923 a 1944, as exigências de

acesso ao trabalho bancário, vinculadas ao perfil, imagem, estilo de vida,

criavam um “mercado de personalidades”, em que a situação de trabalho

exigida atingia a vida privada do trabalhador, estabelecendo um tipo particular

de sociabilidade. Não existia um mercado de trabalho propriamente bancário,

isso é, o bancário lidava com grande volume de trabalho, cujo aprendizado se

dava na prática; no entanto, sem um conhecimento específico, sem uma

técnica singular, o que dificultava a inserção do trabalhador demitido dos

bancos no mercado de trabalho. Essa realidade, de certa forma, ainda existe.

Embora tenham sido realizados significativos avanços na tecnologia aplicada

ao trabalho no setor, bem como exigências aos trabalhadores quanto a

conhecimentos e certificações do mercado financeiro e de capitais, o

aprendizado prático continua sendo prioritário. A relação com o cliente, com os

sistemas, produtos e serviços bancários, acontece com a experiência e a

rotina, na lógica de "aprender fazendo”.

Por outro lado, como analisado por Segnini (1999) em relação aos

anos 1990, a qualificação do trabalhador bancário aumentou

consideravelmente, por meio da cobrança realizada pelas instituições de

diplomas de nível superior e de pós-graduação. Segnini considera isso o

“fetiche da qualificação mais elevada dos bancários”, em que se observa “que

a importância do diploma, em termos de conteúdo (qualidade), é relativizada,

adquirindo muito mais um caráter legitimador do posto de trabalho ocupado do

que mobilizador de conhecimentos” (1999, p. 198). Trata-se de exigência

formal dos bancos, da necessidade de o trabalhador apresentar certificados e

diplomas, independentemente de sua qualidade, estimulando o aprendizado à

distância e cursos de graduação rápidos, como forma de mostrar aderência às

exigências de qualificação, sem, contudo, representar ganhos qualitativos ou

que propiciem a utilização desses conhecimentos na rotina diária. Outro

elemento apontado por Girardi Jr (1995) sobre demandas sindicais daquela

época, mas que permanecem ainda nos dias atuais, referem-se à

reivindicação de regras claras e objetivas para promoção e ascensão

profissional, isso é, a pauta da valorização meritocrática, sem que

componentes subjetivos ou relações de apadrinhamento determinem as

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ascensões profissionais. Embora, como em todo empreendimento capitalista,

as práticas de apadrinhamento e de priorização das relações pessoais

(chamadas modernamente de networking) continuem sendo importantes

mecanismos de promoção e valorização profissional nos bancos.

Ao observar a trajetória do sindicalismo bancário, nota-se, conforme

os trabalhos de Oliveira (1990) e Girardi Jr (1995), que a categoria soube se

aproveitar da estrutura sindical corporativa criada por Vargas para canalizar

suas demandas para dentro do Estado. Com isso, conseguiu avanços

coletivos, como a jornada de seis horas, a criação do IAPB, o fim do trabalho

aos sábados, dentre outras, mantendo, ainda assim, uma ideologia de classe

média, com viés meritocrático.

O movimento bancário viveu uma experiência fundamental no

processo de construção democrática após a ditadura militar, na qual trazia

lideranças e militantes sociais contra a ditadura militar. Em particular,

destacavam-se ativistas oriundos dos bancos públicos, como Banco do Brasil,

Banespa, Banrisul, Banerj, dentre outros, além de universitários, militantes de

partidos e movimentos sociais, dirigentes combativos já na estrutura de

sindicatos (Fontes e Macedo, 2014). Isso permitiu uma retomada bastante

politizada da mobilização bancária. Naquele contexto, a radicalidade das

novas lideranças sindicais encontrava apoio e eco na categoria bancária,

assim como em outros setores. A demanda era salarial, mas certamente ia

além, incluindo na pauta a discussão contra o autoritarismo. A criação da CUT,

da qual os bancários tiveram importante participação, no contexto do novo

sindicalismo, representava uma fina sintonia com a retomada da democracia,

reivindicando a liberdade sindical, a organização nos locais de trabalho, a

defesa de um sindicalismo combativo e transformações estruturais na

sociedade brasileira. O confronto com os sindicatos oficiais, com os

sindicalistas do PCB e com o Estado autoritário possibilitou o avanço de uma

nova forma de se organizar. Diversos autores (Antunes, 1988 e 2011;

Rodrigues, 1990; Boito, 1999) apresentam esse movimento como algo novo no

sindicalismo brasileiro.

Essa digressão é necessária para compreender de que forma um

segmento de classe média, como os bancários, que havia aderido ao

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sindicalismo corporativo de Estado nos anos 1930 – com viés meritocrático e

voltado ao interesse da categoria –, com importante de mobilização até os

anos 1960, conseguiu uma significativa retomada de organização no processo

de construção democrática do país após a ditadura militar. De acordo com a

análise proposta por Boito (2004), há gradações diferentes de apego à

ideologia meritocrática conforme a conjuntura, podendo os trabalhadores de

classe média ora se aproximarem ora se afastarem da organização coletiva,

inclusive de alianças com o operariado. Assim, naquele contexto,

particularmente no final dos anos 1970 e início dos anos 1980, houve uma

convergência de interesses políticos e ideológicos da categoria bancária com

os demais segmentos populares em relação ao cenário político do país.

Ademais, evidencia-se que havia elementos que impulsionavam os

trabalhadores para a organização sindical, dentre eles, como mencionado por

Saes (1985) e Boito (2004), a burocratização do trabalho, a concentração em

grandes unidades de serviço e a degradação salarial. Apesar desses

elementos, a meritocracia não desapareceu. Isso nos permite entender

determinados movimentos da categoria, tanto nos anos 90 quanto nos anos

2000, que reforçam o viés meritocrático e pessoal, num contexto de

arrefecimento do movimento sindical e popular diante de uma forte ofensiva

das ideias e políticas neoliberais que atingiram o Brasil.

Um exemplo a ser mencionado foi o plebiscito sobre o fim do

anuênio, realizado em novembro de 2000. Naquela ocasião, os bancos

forçaram a realização de plebiscito – que acabou se realizando –, no qual todo

bancário poderia votar. As opções eram duas: 1) manutenção de um anuênio,

que era um valor monetário incorporado ao salário a cada ano, em valor médio

de 1% do salário básico; 2) congelar o pagamento de anuênios, cancelando o

direito a novas incorporações, em troca de uma indenização de R$ 1100,00

para cada trabalhador que assim optasse. A escolha majoritária decidiria sobre

o benefício para futuros trabalhadores. Apesar da campanha dos sindicatos

contrários à medida, por entender que ela retirava direitos e prejudicaria,

inclusive, quem começasse a trabalhar nos bancos posteriormente, a escolha

da maioria, pelo voto individual, foi o fim do direito e o recebimento da

indenização. A lógica dos bancários foi bastante pessoal, objetiva e imediata:

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sem saber quanto tempo permaneceriam no emprego, ou mesmo calculando o

rendimento daquele valor, era melhor receber de imediato a indenização,

expressiva na época, em vez de valorizar uma conquista, mesmo que viesse a

causar prejuízos a futuros trabalhadores.

São relevantes as observações de Boito (2004) com relação à

percepção dos trabalhadores de classe média sobre o sindicato, nas quais fica

evidente a oposição conceitual entre a ideologia meritocrática e a organização

coletiva. As concepções do mérito pessoal ou do mérito da profissão41 colidem

com a organização coletiva, que constituiu o fundamento dos sindicatos,

sobretudo quando estes possuem orientação classista, como no caso dos

sindicatos oriundos do novo sindicalismo. O trabalhador apegado ao mérito

pessoal resiste em agregar-se à luta coletiva e unificar-se num coletivo de luta,

pois seria, de certo modo, admitir uma incapacidade pessoal e um

rebaixamento social ao ser identificado com o trabalhador manual que, sem

mérito e dons pessoais, precisa recorrer à mobilização coletiva (Saes, 1985;

Boito, 2004). Para Boito, essa é uma atitude “que estigmatiza o movimento

sindical, que é concebido como uma espécie de movimento dos

incompetentes” (2004, p. 225).

2.1.2 O perfil social, político e ideológico do trabalhador nos bancos

Analisando a categoria bancária, observa-se que ela inclui

trabalhadores de instituições públicas, de economia mista, privadas nacionais

e privadas estrangeiras. São trabalhadores com níveis de atuação e locais de

trabalho diferentes. Buscamos realizar três divisões que permitam melhor

compreender a diversidade dessa categoria.

A primeira delas é a mais basilar de todas: a escala hierárquica. Há

os trabalhadores em carreiras iniciais, como escriturários, técnicos bancários,

41Para Boito (2004), em dadas situações pode-se prolongar e completar a ideologia do mérito pessoal para o mérito da profissão, como forma de se preservar a diferenciação relativa deste grupo, de classe média, na sociedade. Essa lógica aprofunda a noção de salário relacional, ou seja, a ideia de que é fundamental manter uma valorização salarial em relação às demais categorias e classes sociais.

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agentes de atendimento, auxiliares de atendimento, caixas, dentre outros

cargos, com nomes diferentes, mas que se referem aos primeiros cargos da

hierarquia na carreira administrativa dos bancos. Hoje são minoritários,

representam menos de 40% do total dos trabalhadores das instituições

(Dieese, 2017) e, geralmente, são os cargos em que é respeitada a jornada de

seis horas, conforme previsto no artigo 224 da CLT. De outro lado, existem os

trabalhadores com “funções de confiança” ou cargos mais elevados, como

assistentes, gerentes de relacionamento e de contas, administradores de

unidades, analistas de processos42, analistas de sistemas, gerentes de área,

gerentes de divisão, dentre outros cargos de maior poder e direção.

Geralmente, trabalham oito horas diárias, quarenta horas semanais, sem

computar eventuais horas extras, e possuem um vínculo maior com as

políticas de metas e remuneração variável dos bancos. Como há muito é

discutido (Larangeira, 1997; Jinkings, 2002; Segnini, 1998 e 1999), os bancos

adotaram mecanismos de gestão que reduziram as escalas hierárquicas,

desde as agências bancárias até as direções.

A segunda divisão possível é diferenciar os trabalhadores que

atuam nas agências e centrais de atendimento, em contato direto com o

público, seja recebendo-os no espaço bancário, visitando-os nas empresas ou

realizando contato por telefone; daqueles que trabalham em “áreas-meio”,

setores administrativos em que não há contato diretamente com o público. Há

uma interação – por instrumentos de informática ou telefonia – entre os

trabalhadores nas redes de agências e centrais com os trabalhadores lotados

em prédios administrativos internos. As agências são voltadas prioritariamente

à realização de negócios, venda de produtos e serviços bancários e

financeiros, além de alguns serviços operacionais – que, embora tenham se

reduzido, são demandados nas agências. Os empregados em áreas internas

dos bancos trabalham com a teleinformática nas funções de planejamento,

processamento, análise, controle, desenvolvimento, gerenciamento de

negócios, no entanto, sem lidar diretamente com a clientela.

42 Para compreender melhor a especificidade de algumas funções, cf. Sanches (2016), em particular o capítulo 2, no qual são especificados os novos processos de trabalho de profissionais vinculados à tecnologia e a implementação de novos formatos organizacionais e de relacionamento com o cliente.

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A terceira distinção é entre os funcionários que trabalham nas

instituições cujo controle acionário é público, daqueles que são empregados

em instituições inteiramente privadas, sejam elas nacionais ou estrangeiras.

No primeiro caso, o acesso aos postos de trabalhos é realizado mediante

concurso público. As instituições sob controle público atuantes no Brasil são:

Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal, Banrisul, Banco do Nordeste

(BNB), Banco da Amazônia (BASA), Banco do Estado do Espírito Santo

(Banestes); Banco de Brasília (BRB); Banco do Estado de Sergipe (Banese);

Banco do Estado do Pará (BanPará), todos bancos múltiplos com carteira

comercial. Ainda há os bancos de desenvolvimento, ativos junto ao Banco

Central, que são o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG);

Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) e Banco de

Desenvolvimento do Espírito Santo (Bandes). Os trabalhadores de todos

esses bancos são representados pelos sindicatos de bancários, já o Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), possui

representação sindical própria.

Ainda que trabalhem numa mesma categoria, as realidades em

termos de vínculo de trabalho e remuneração, local de trabalho, a forma de

socialização das atividades e as características da realização do trabalho são

bastante distintas e interferem objetivamente e subjetivamente no perfil do

trabalhador. Assim sendo, é pertinente mostrar que há grande convergência no

perfil político, ideológico e social do “trabalhador bancário”, mas há diferenças

que devem ser destacadas e que influenciam na forma de ação da categoria.

No caso dos bancários, a carreira inicial de escriturário, que

representava a maioria dos trabalhadores nos anos 1980 e início dos anos

1990, hoje é 32% do total (Dieese, 2017). Os gerentes são 39% dos bancários.

Os demais trabalhadores são assistentes, analistas, técnicos, dentre outros.

Nesse sentido, houve um processo deliberado, por parte das novas políticas

gerenciais dos bancos, de aumentar a quantidade de cargos mais elevados –

mesmo com salários apenas um pouco maiores – com o objetivo de ampliar o

compromisso dos trabalhadores com os negócios dos bancos.

A ascensão profissional nos bancos está atrelada a um ideal

construído pelas instituições no espaço de trabalho de “comprometimento”,

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“confiança”. Um funcionário de cargo gerencial está mais inserido na lógica

defendida pelo banco – seja ele público ou privado –, ou seja, o trabalhador

torna-se propenso a atender aos direcionamentos da empresa, em detrimento

da organização dos trabalhadores, seja no local de trabalho ou junto aos

sindicatos. O empregado em cargos mais altos, evidentemente, passa a ter um

salário fixo melhor – às vezes apenas um pouco mais – e direito à maior

participação nos programas de participação sobre lucros e resultados. A

remuneração variável compõe, como demonstraremos no terceiro capítulo,

uma importante parcela da remuneração anual do trabalhador. Os funcionários

recebem, em termos absolutos, bem como em termos proporcionais, valores

maiores conforme os cargos que ocupam, aumentando os ganhos variáveis de

acordo com as posições mais elevadas. Bancos como Itaú e Santander

possuem programas próprios de remuneração, além daquele acordado com o

sindicato, cuja definição é unilateral pela empresa e são pagos de acordo com

o cumprimento de metas individuais ou coletivas e a valoração do lucro. O

Banco do Brasil possui um módulo de remuneração variável, além do acordo

sindical – definido, portanto, apenas pela empresa –, em que adiciona ao

pagamento de PLR valores baseados na obtenção de resultados pelo

trabalhador e pela unidade em que atua.

Esses mecanismos de ascensão profissional e de remuneração

variável exercem grande influência na disposição do trabalhador aderir às

atividades coletivas. A participação sindical é mais ativa dos trabalhadores em

carreiras iniciais, com redução gradativa conforme os trabalhadores assumem

cargos mais altos, como nas gerências de contas. O mérito individual é

fortalecido com a percepção de que se ganhará mais e terá maior

reconhecimento quanto mais alinhado se estiver com os ideais do banco. A

ascensão profissional e salarial depende do maior alinhamento do funcionário

às propostas de trabalho definidas pelas instituições financeiras e, como

consequência, de menor engajamento reivindicatório, que estaria em

contradição com o que é defendido pela empresa. O trabalhador passa a

pensar na concepção que foi chamada por Jinkings (2002) de “capital

personificado”, isso é, uma internalização pelos funcionários da racionalidade

empresarial, reforçada cotidianamente pela forte política de comunicação dos

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bancos e pelo apelo patronal às virtudes do mercado, como regulador da vida

em sociedade.

Todos os trabalhadores nos bancos estão imersos neste mesmo

conjunto de situações, entretanto, esse contexto atinge de forma diferenciada

cada segmento e consegue maior adesão à lógica empresarial e à ideologia

meritocrática conforme os trabalhadores ascendem profissionalmente e

passam a desempenhar funções com mais prestígio interno, melhores salários

e mais remunerações variáveis. Se nos cargos básicos existem funcionários

com expectativas de promoção funcional, no caso de gerentes ela já é

realidade e sempre é oferecida pelos bancos a possibilidade de crescimento

na hierarquia. Além disso, o apelo às “funções de confiança” é algo que

acentua esse processo, tanto em bancos públicos quanto privados. Os bancos

sustentam que aquele funcionário conta com o apoio da empresa possui a

confiança do patrão e, desse modo, é adequado que essa confiança,

representada por salários e prestígios maiores, seja recíproca. Aderir

espontaneamente às manifestações e reivindicações seria visto como “traição”

ou “irresponsabilidade” e que, possivelmente, teria consequências, como

perda de cargo ou demissão. Esse conjunto de informações é passado de

forma cotidiana, implícita, difusa, constituindo uma ideologia dominante.

Entretanto, ainda que o trabalhador não tenha uma aderência ideológica ao

defendido pelo banco, pelo menos terá uma aderência pelo medo de ter

perdas. Não menos importante é a assimilação por muitos trabalhadores de

que a greve, por exemplo, é uma atividade a ser desempenhada pelos

dirigentes sindicais, com participação voluntária dos trabalhadores de baixo

nível hierárquico, portanto, menos expostos à perda de salário ou menos

dispostos a ascensão profissional. Assim, a greve deve ser realizada pelo

sindicato e por aqueles funcionários que não teriam muito a perder.

Apesar disso, a categoria bancária mantém bons números de

sindicalizados, com cerca de 40% dos bancários brasileiros ativos. A título de

comparação, a última pesquisa do IBGE disponível, com base no PNAD

(2015), indica que a média de sindicalizados no Brasil, em todos os setores, é

de 19,5%.

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A tendência é de um número proporcionalmente maior de

sindicalizados em entidades menores, possivelmente pela maior facilidade de

contato entre o dirigente sindical e o bancário em seu local de trabalho. Em

cidades e regiões muito grandes, com alto número de trabalhadores e

dispersão em milhares de locais de trabalho, o contato do sindicalizado é

realizado por jornais impressos – distribuídos por dirigentes e funcionários da

entidade sindical –, sites; mensagens de celular; e-mails. Entretanto, apesar

dos sindicatos maiores terem mais recursos econômicos e políticos, o contato

pessoal dos dirigentes com cada trabalhador é menor, bem como a

rotatividade de funcionários e a mobilidade entre os inúmeros locais de

trabalho é significativa.

O movimento sindical bancário possui, via de regra, boa inserção

nos locais de trabalho, possui jornais e informativos entregues nos locais de

trabalho e capacidade de comunicação por meio eletrônico, assim como os

trabalhadores conhecem quem são os dirigentes e os meios para ter contato

com os sindicatos. Normalmente, há dirigentes que mantém suas atividades

laborais normais, em unidades dos bancos, e outros que possuem liberação

remunerada para atividade sindical, conhecida por frequência livre, mediante

acordo coletivo firmado entre sindicatos e bancos. São os dirigentes com

frequência livre que conduzem a rotina cotidiana dos sindicatos nos principais

cargos executivos das entidades. Os bancos privados estabelecem limites

para liberação de dirigentes em aditivos da Convenção Coletiva de Trabalho

(CCT), geralmente mais favoráveis que nos bancos públicos, como BB e CEF,

que estipulam limites baseados no número de bancários representados por

cada base sindical. No caso do BB esse número é de um dirigente liberado por

550 funcionários. O Acordo Coletivo dos sindicatos com a CEF prevê a

liberação de 172 dirigentes, número não definido em proporção com os

bancários na base, entretanto, representa praticamente a mesma relação de

550 para um.

O número de associados aos sindicatos indica que há trabalhadores

sindicalizados tanto de bancos públicos quanto de bancos privados. Isso é

possível de se demonstrar por ocasião de eleições sindicais, em que há

participação de todos os segmentos. Há sindicalizados em cargos hierárquicos

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com funções de confiança, como gerentes, assistentes, analistas, dentre

outros. Embora tal afirmação pareça contraditória em relação aos aspectos

mencionados anteriormente, convém ressaltar que há questões relevantes que

fazem com que o trabalhador de classe média opte pela sindicalização. Além

da questão salarial, negociada pelos sindicatos, seja em salário direto ou

indireto (auxílios alimentação, refeição, creche) ou remuneração variável

(PLR), existem aspectos importantes no tocante à participação sindical na vida

do trabalhador, principalmente relacionados à proteção contra assédio moral,

acompanhamento para afastamentos de saúde, resistência quanto à perda de

cargos e mesmo quanto à demissão. Todavia, e esse é o fundamento das

considerações feitas há pouco, é notória a maior mobilização de trabalhadores

em cargos iniciais, como escriturários e caixas, independentemente do tempo

de banco, em atividades sindicais, assembleias e, principalmente, em período

de greves. Ou seja, o fato de trabalhadores em cargos hierárquicos superiores

estarem “sindicalizados” não significa, necessariamente, que estejam

“mobilizados”.

Nos bancos públicos não é incomum encontrar trabalhadores mais

antigos em postos de trabalho iniciais, como escriturários. Isso decorre, em

alguns casos, de bons salários caso o funcionário seja antigo, inclusive,

maiores que o de gerentes que entraram na carreira posteriormente43, ou da

opção por não se submeter à lógica anteriormente mencionada, na qual a

ascensão na carreira representa maior cobrança por metas e resultados, a fim

de se justificar maiores salários e o acesso às funções de confiança.

Não há indicativo de que o número de trabalhadores sindicalizados

em bancos públicos seja maior, proporcionalmente, que em bancos privados.

Em 2016, no Brasil, cerca de 230 mil trabalhadores bancários eram

empregados em instituições de controle público, enquanto 240 mil trabalhavam

em empresas privadas, já contabilizadas as demissões do ano. A virtual

estabilidade dos trabalhadores de bancos públicos, cujo acesso é feito por

43 No caso do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal há importantes diferenças salariais e de direitos entre funcionários admitidos antes e depois de 1996, quando foi feita uma profunda reestruturação no plano de cargos e salários das empresas, sob a lógica do governo de FHC, de enxugamento nos gastos da esfera pública.

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concurso público, permite maior propensão à adesão a atividades sindicais,

inclusive greves – principalmente nos níveis hierárquicos iniciais. Por outro

lado, como a relação de vínculo com o banco é vista como mais segura, muitos

trabalhadores entendem que sua relação com o sindicato é menor, isso é,

dependem menos do sindicato.

Estamos diante dessa contradição: de um lado os trabalhadores em

bancos públicos possuem maior propensão à mobilização e participação no

sindicato, garantida pela estabilidade do concurso público – a qual chamamos

de virtual, pois os vínculos de todos trabalhadores em bancos públicos ou de

economia mista são regidos pela CLT –, enquanto nesse mesmo contexto são

detectadas resistências ao sindicato entre segmentos de funcionários dos

bancos públicos. Importantes lideranças sindicais são oriundas dos bancos

públicos, tanto nas direções quanto nas oposições. Formar uma oposição

sindical é sempre um risco, ainda mais quando há determinação estatutária da

presença de proporção de trabalhadores entre bancos públicos e bancos

privados na composição das chapas. Sabe-se que em caso da chapa não se

eleja, há enorme possibilidade de os membros oriundos de bancos privados

serem demitidos, pois se inscreveram numa chapa sindical e concorreram em

eleições, apresentando desta maneira predisposição à luta sindical e

reivindicatória. Uma das grandes dificuldades em se renovar direções sindicais

decorre desse fator. Os dirigentes sindicais funcionários de bancos públicos

podem concluir mandatos e retomar, não sem dificuldades44, suas funções no

banco. Por outro lado, um dirigente sindical de banco privado, em caso de

conclusão do mandato, ou de não eleição, ao retornar ao banco tem ameaça

muito clara de perder o emprego. Desse modo, costumam perpetuar direções

com as mesmas pessoas em diversas entidades sindicais, alternando as

funções que desempenham dentro da entidade ou em outras entidades que

possuem relação política.

44 A estigmatização do dirigente sindical ocorre de forma parecida com aquela descrita por Boito (2004), e há, do mesmo modo, um receio por parte do empregador, dos chefes de setores, de que esse bancário crie mobilizações ou faça denúncias por problemas no ambiente de trabalho, enfim, que aja como um militante sindical em seu setor. Isso é um empecilho para possíveis ascensões profissionais.

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A falta de renovação mais intensa não é um problema que se limita

a esse aspecto, embora seja relevante. A escolha pela participação no

movimento sindical restringe ou praticamente elimina as perspectivas de

carreira profissional nos bancos. Ao participar do movimento sindical, o

trabalhador decide por se abster de uma trajetória profissional e salarial,

mantendo a mesma remuneração do cargo de quando foi eleito pela primeira

vez45. Se participar da direção do sindicato, por um lado, concede estabilidade

no emprego46 por meio da legislação, entendendo-a como um benefício – e

evidente, uma garantia ao direito de militar sindicalmente –, por outro é uma

opção de estagnação do ponto de vista salarial e profissional. Essa dicotomia

afasta muitos trabalhadores engajados de assumirem posições no sindicato.

Mesmo nos bancos públicos, em que há possibilidade de se participar como

delegado sindical47, a procura nem sempre é grande.

Os bancos públicos, pela virtual estabilidade no emprego, são os

locais em que há maior presença e atividade de militantes de esquerda e

oposição sindical. Essa possibilidade praticamente não existe nos bancos

privados. Em eleições realizadas nos maiores sindicatos, é comum as chapas

construídas por tendências de esquerda terem grande participação de

bancários de entidades públicas. Também é notório que as chapas de

oposição geralmente conseguem maior proporção de votos nos bancos

públicos, tanto pela relação mais próxima com os componentes da chapa

quanto pelo caráter mais radical presente em algumas unidades de bancos

45 À exceção de entidades que possuem acordos aditivos com os bancos que preveem gratificação pecuniária aos dirigentes sindicais com frequência livre depois de 10 anos. O tema é controverso e os principais sindicatos ligados à CUT não aceitam acordos nesse sentido, pois consideram que a gratificação a um dirigente sindical poderia significar a existência de uma “carreira” de dirigente sindical, algo que não condiz com a concepção sindical que deveria ser pautada pela militância e não pela burocratização e premiação da função de dirigente. Essa modalidade de acordo é bastante comum nos sindicatos ligados à Contec/UGT, mas também existe em sindicatos cutistas. 46 Esse aspecto ainda é envolto de dúvida e apreensão, pois algumas empresas entendem que a estabilidade não é garantida a todos os dirigentes de uma entidade, mas apenas aos que participam das posições na comissão executiva. Por ora, os bancos não têm entrado em conflito em relação a esse aspecto, mas é uma perspectiva que não é descartada. 47 É previsto no acordo sindical entre BB e CEF e as entidades sindicais a eleição de delegados sindicais nos locais de trabalho, entretanto, em muitos sindicatos não são realizadas essas eleições devido à baixa ou nenhuma procura.

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públicos, particularmente naquelas em que há grande concentração de

trabalhadores e, assim, mais socialização48. Essas áreas são departamentos

internos, prédios administrativos, setores de retaguarda e processamento.

Esse é um aspecto que diferencia os trabalhadores que atuam nas agências,

em contato com o cliente, daqueles que atuam nas áreas internas onde há

maior convivência entre grupos de trabalhadores.

Do prisma das bases sociais, um elemento importante pode ser

observado. Os sindicatos das regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste

possuem forte presença proporcional de empregados em bancos públicos, já

que as instituições privadas se concentram mais nas regiões mais ricas,

Sudeste e Sul. A maior presença de direções sindicais não alinhadas com a

tendência majoritária, a Articulação/CUT, ou com o sindicalismo oficial, da

Contec/UGT, acontece em regiões e locais em que os bancos públicos ainda

são presentes em maior proporção. Pode-se citar como exemplos os

sindicatos de bancários de Porto Alegre e Pará, que são filiados à CUT, porém

com hegemonia da CSD/CUT – no caso da capital gaúcha, com forte presença

do Banrisul em sua base; já no caso do estado do norte do Brasil, com maioria

dos bancários ligados ao BB, CEF, Banpará e BASA. Outro caso são dois

sindicatos em que a hegemonia é da Conlutas, como no Rio Grande do Norte e

no Maranhão, nos quais a parcela dominante é de bancários de instituições

públicas, sobretudo BB, CEF e BNB. No caso dos bancários do Espírito Santo,

cujo sindicato tem domínio em sua direção membros da Intersindical, pode-se

observar a base trabalhadora do Banestes, com 2500 empregados, que

corresponde à terça parte do total de trabalhadores representados pelo

sindicato. Outra entidade com forte presença pública é Brasília, cidade em que

estão as sedes de BB, CEF e BRB. Ainda assim, o sindicato da capital federal

segue com a maior parte de seus dirigentes como membros da

Articulação/CUT, embora seja um dos sindicatos em que importantes

lideranças fazem parte de uma nova força política, com características de nova

corrente, chamada “EnFrente/CUT”, surgida de uma ruptura no âmbito da

48 Por “mais radical” compreendemos discursos e ações diretas mais enfáticas, com mais enfrentamento com os bancos e com os trabalhadores que furam greve, maior adesão espontânea de funcionários às paralisações e presença de maior conflito nos locais de trabalho por ocasião das mobilizações.

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Contraf/CUT a partir de 2015, formada por dirigentes sindicais. Esse cenário

da nova corrente será melhor detalhado no próximo capítulo.

Os bancos públicos favorecem a atuação de correntes mais à

esquerda e menos alinhadas ao movimento hegemônico49 . Dessa forma,

permitem compor chapas de oposição, criando disputas mais competitivas

pelas direções dos sindicatos, o que tende a dinamizar o papel dos dirigentes

que já estão na direção, obrigando-os a ter uma militância mais atuante para

evitar o crescimento das forças oposicionistas. Os trabalhadores de bancos

públicos possuem muitas características comuns com os trabalhadores de

bancos privados. A questão debatida sobre o perfil do trabalhador de classe

média, em que a ideologia meritocrática é fator partilhado pelos seus

membros, sem dúvida permeia a categoria bancária no geral. Esse aspecto,

contudo, é mais forte nos bancos públicos, devido ao acesso ser mediante

concurso público. Dessa maneira, além da ideologia meritocrática, típica dos

símbolos, da cultura e da ideologia dos trabalhadores bancários, no caso das

entidades públicas – ou de economia mista – ganham esse novo fator, o

mecanismo de admissão. Pode parecer contraditório ser mais meritocrático e

mais radical ao mesmo tempo. Trata-se de uma radicalidade corporativa, ou,

nos termos de Boito (2004), referência de uma “identidade restrita”, que agrega

maior ideologia meritocrática com maior radicalidade para defender sua

posição relativa ou o “mérito da profissão” na empresa pública.

O concurso público é, por essência, algo valorizado pela classe

média, por se constituir um dispositivo supostamente justo – em que as

oportunidades são iguais para todos –, em que as pessoas podem ingressar no

serviço público por seus méritos e habilidades. Nessa visão, não dependeriam

de ninguém, mas sim de seus dons, capacidades e qualidades, conquistadas

por dádiva da natureza e esforço pessoal. Isso impediria, nessa concepção, o

49 Os bancários de instituições públicas tiveram um papel fundamental no processo de reorganização no final da ditadura militar. Como exemplo, a primeira direção, após a anistia, do sindicato dos bancários de São Paulo, o maior do Brasil, era fortemente composta por funcionários do Banespa e Banco do Brasil (Fontes e Macedo, 2014). O primeiro presidente oriundo de banco privado foi eleito apenas em 2004. Ainda assim, é inegável que a participação e influência de bancários de instituições privadas cresceu fortemente nas entidades sindicais bancárias, geralmente em composições de chapas de situação.

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compadrio e a indicação, comuns no setor privado. O efeito da ideologia

meritocrática é reforçada, pois não importa quem é o governo ou o chefe, o

trabalhador adquiriu por ele próprio seu trabalho. Este não decorreria da luta

sindical por ampliação de concursos, por regras estabelecidas em CCT que

obrigaram os bancos a realizar mais concursos, nem de uma série de lutas

políticas que culminam na valorização do emprego no setor público, pois,

segundo essa ideologia, o mérito, em última instância, é de quem foi aprovado

no concurso.

O trabalhador bancário em instituições públicas, assim, é um

“bancário ideologicamente híbrido”, com fortes características similares ao de

bancário do setor privado, mas também com importantes elementos

característicos de servidor público. Por mais que os bancos realizem sua

competição no mesmo mercado e os bancos públicos adotem metas e

mecanismos de remuneração e promoção similares aos do setor privado,

ainda há, como item constitutivo, uma lógica de mérito ligada à admissão por

concurso e segurança no emprego, ambas proporcionadas pelo concurso

público e sua presumida estabilidade. Esses fatores interligados de forma

complexa na ideologia meritocrática do bancário no setor público cria um tipo

específico de cultura, que não é somente pública, nem somente privada, mas

sim um perfil híbrido, com elementos dos dois. Em dado momento pode

sobressair um deles, em outros momentos pode ser outro, a depender da

conjuntura e dos interesses em disputa. Essa virtual estabilidade e segurança

no vínculo de emprego permite que, na defesa da posição relativa, inclusive

em comparação aos bancos privados, sobressaia, em algumas situações, um

discurso e ação de maior radicalidade, porém delimitados pela lógica

meritocrática, isso é, em defesa do mérito da profissão nos bancos públicos.

Não se trata, em geral, de uma radicalidade revolucionária, mas sim de uma

defesa mais extrema de seu prestígio salarial e simbólico.

A ofensiva neoliberal no Brasil nos anos 1990 e 2000 teve um papel

importante na consolidação do perfil do bancário, pois ela reforça algumas

características da ideologia meritocrática, como o individualismo e, como

apontado por Coutinho (2010), a naturalização das relações sociais e de

poder, como algo derivado da natureza humana e não construída pela ação

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dos homens e mulheres ao longo do tempo. A questão do privatismo é

ambígua. A concepção ganhou espaço na ideologia dos bancários,

particularmente entre trabalhadores do setor privado, enquanto os

trabalhadores dos bancos públicos – no contexto híbrido de nossa hipótese –

em sua maioria defendiam as instituições bancárias públicas pela relevância

de seu papel social. De forma implícita, o discurso de defesa do banco público,

inclui, para muitos trabalhadores, prioritariamente a defesa dos empregos e

direitos.

As pautas sindicais muitas vezes buscam dialogar com esse espírito

meritocrático presente na categoria. Um desses exemplos foi a demanda pela

isenção de imposto de renda sobre a PLR50, uma forma de atender uma

demanda típica de classe média por menos impostos e um ganho direto,

relacionado à sua capacidade. Em vez de reivindicar um fundo público, numa

lógica coletiva, optou-se por defender uma pauta focalizada para uma

determinada forma de remuneração, que atendia ao interesse de um público

específico, principalmente os trabalhadores mais bem remunerados – como os

bancários, metalúrgicos de grandes companhias – que recebem PLR e se

enquadravam nas faixas de cobrança do imposto de renda. Krein (ANO) havia

apontado essa tendência do sindicalismo brasileiro nos anos 2000 de pautas

de caráter mais corporativo em detrimento de pautas mais amplas e classistas,

como, por exemplo, a redução das jornadas de trabalho.

A categoria mantém uma visão de classe média, em que os valores

individuais, a valorização do mérito e dos dons pessoais é muito presente. Tais

valores são reforçados no contexto neoliberal. No entanto, ao longo de sua

história, a categoria assimilou a importância da organização coletiva e sindical

para proteção e defesa de seus direitos – dentro de uma visão meritocrática,

essa ideologia não se coloca como obstáculo intransponível para a

organização sindical (Boito, 2004). A categoria teve forte impulso na

redemocratização dos anos 1980, na qual as lideranças e importantes

segmentos do movimento sindical inseriram-se no debate mais amplo da

50 A lei 12832/2013 foi sancionada pela presidente Dilma Rousseff, alterando a lei 10101/2000, e passou a isentar a cobrança de imposto de renda sobre os pagamentos de PLR até R$ 6 mil. Os valores que ultrapassam esse limite, passam a ser tributados conforme uma tabela progressiva.

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sociedade brasileira, estabelecendo diálogo com a categoria e a classe

trabalhadora, como protagonistas do novo sindicalismo. A crise da ditadura

militar e a ofensiva neoliberal contra direitos trabalhistas e sociais permitiram

uma atuação e mobilização mais próximas dos bancários e do movimento

operário, embora esse entendimento classista seja, na maior parte das vezes,

uma postura de parte das direções sindicais e não necessariamente do

conjunto de trabalhadores da categoria.

2.2 – A elevação e a queda do emprego bancário no período

A partir do final dos anos 1980, o emprego bancário iniciou uma

trajetória de redução. Em 1990, eram 732 mil bancários em todo o país,

passando a 483 mil bancários em 1995 e atingindo o menor patamar em 1999

e 2001, com 393 mil bancários (Dieese, 2017). Para uma categoria que chegou

a ter mais de um milhão de pessoas, a redução foi significativa. Diversos

trabalhos analisam as razões dessa redução (Jinkings, 2002; Segnini, 1999;

Larangeira, 1997), sendo os elementos centrais a convergência entre novas

tecnologias inseridas no mundo do trabalho bancário, a utilização de novos

modelos organizacionais, terceirização, privatização com diminuição dos

bancos públicos e baixo crescimento econômico.

Entretanto, a partir de 2002, o emprego bancário apresentou uma

retomada, em especial no período de 2006 a 2012, ultrapassando, novamente,

os 500 mil trabalhadores, número que não era alcançado desde 1996.

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GRÁFICO 10. A EVOLUÇÃO DO EMPREGO BANCÁRIO 1990 - 2016

DADOS: CAGED, COMPILAÇÃO DO DIEESE. ELABORAÇÃO PRÓPRIA.

Até 2014 o emprego nos bancos privados cresceu 17% e nos

bancos públicos 39%. Porém, foi a partir de 2013 que a trajetória do emprego

se inverteu, iniciando uma nova série de reduções no emprego bancário, que

desde então apresentou o fechamento de quase 45 mil postos de trabalho, até

meados de 2017 (Caged, 2017). Conforme será analisado no próximo item,

essa tendência pode se acentuar no próximo período, com a continuidade do

processo de demissões diante da prolongada crise econômica e política

observada desde 201551 e da adoção de novas tecnologias.

O aumento no emprego no período destacado foi de mais de 100 mil

trabalhadores diretos. Tendo como referência o ano de 1990, em 2012

atingiu-se o maior valor relativo, com 70% comparado àquele ano. Dentre as

principais razões para o incremento na contratação de trabalhadores no

período, destacamos a decisiva participação da política do governo federal no

sentido de estimular a inclusão financeira, a ampliação do crédito, inclusive

microcrédito, o aumento na renda média da população e a forte contratação de

51 Embora não seja objetivo desta tese discutir o governo Michel Temer, destaque-se que BB, CEF e Bradesco realizaram programas de incentivo ao desligamento de funcionários, em especial para os aposentados, entre o final de 2016 e 2017. Com adesão de quase dez mil trabalhadores no BB, nove mil na CEF e mais de sete mil no Bradesco, cujo foco principal foram os funcionários oriundos do HSBC, instituição que teve as operações adquiridas no Brasil pelo banco privado nacional. Sendo assim, a participação dos bancos públicos primeiro na elevação e depois na redução do emprego bancário é significativa.

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pessoal nos bancos públicos, que tiveram sua função reorientada para maior

participação no mercado e, principalmente após a crise internacional de 2008,

para oferta de crédito e a redução das taxas de juros.

O governo federal estimulou a bancarização por meio da criação

das contas simplificadas e o do estímulo à abertura de contas dos beneficiários

do INSS e do bolsa-família. Em 2012, eram 12,8 milhões de contas dessa

modalidade, sendo que 8,3 milhões estavam ativas, ou seja, eram

movimentadas (Bacen, 2015). Levantamento do Banco Central, através do

cadastro de clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), indica que o

número de pessoas com relacionamento bancário passou de 60,8% em 2005

para 80% da população adulta em 2012 e no final de 2014 esse número

avançou para 84,5%. Dados do Banco Mundial (2017) indicavam que em 2014,

68% da população brasileira com mais de 15 anos tinha relacionamento ativo

com o sistema bancário.

A ampliação do crédito no Brasil, conforme demonstrado no

primeiro capítulo, teve relevância no incremento de negócios no sistema

financeiro e, por consequência, na contratação de trabalhadores. O crédito

consignado, estabelecido pela lei 10.820/2003, no final do primeiro ano de

governo Lula da Silva, abriu a possibilidade para empréstimos com descontos

na folha de pagamento – em princípio com desconto de até 30% de parcela no

total do salário, sendo ampliando, em 2015, para 35% –, facilitando o acesso

ao crédito para amplos segmentos da população, com prevalência do crédito

aos aposentados e pensionistas, além de servidores públicos das três esferas

de governo.

Houve um avanço significativo do crédito em todas as regiões do

país, com crescimento de recursos destinados ao microcrédito produtivo

(Bacen, 2010) e também ao Programa Nacional de Favorecimento à

Agricultura Familiar (Pronaf), embora, segundo o Banco Central, ainda

concentrado nas regiões mais ricas. Estudo de Gazolla e Schneider (2013)

demonstra o impacto do financiamento à agricultura familiar no Rio Grande do

Sul, do ponto de vista de incremento da produção e da diversificação agrícola

promovida por pequenos produtores. Esse crédito é mediado pelo sistema

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financeiro, em particular pelo Banco do Brasil, ampliando, assim, a inclusão

financeira e, por consequência, a demanda de trabalho nas agências.

Foram expandidos os financiamentos para compras de bens de

consumo duráveis, com particular atenção à aquisição de carros e de motos.

Esse mercado teve amplo crescimento no Brasil entre 2004 e 2014. A frota de

carros no Brasil que era de 24,5 milhões em 2001 saltou para 56,9 milhões de

veículos em 2014, ou seja, mais que dobrou (Observatório das metrópoles,

2015). Outro aspecto que contribuiu para maior integração no sistema

financeiro e, portanto, para a demanda de serviços é o crédito imobiliário, que

se tornou um nicho atrativo de mercado para o sistema financeiro, inclusive

com adesão do Banco do Brasil de bancos privados à modalidade, que

continua com a maior participação da Caixa Econômica Federal.

Já em 2012, embora ainda numa conjuntura de oferta de crédito e

de inclusão financeira, inicia-se uma trajetória de redução no emprego

bancário52, a princípio liderada pelos bancos privados atuantes no Brasil,

seguida pelos bancos públicos. A Caixa Econômica Federal postergou o início

da redução de seu quadro, que teve ampliação até 2014 e depois redução,

tendo como ponto de maior aceleração da trajetória de queda o final de 2016 e

início de 2017, já no governo Michel Temer.

Roberto von der Osten, da Contraf, entende que as novas

tecnologias são o principal fator de demissões nesse período: “em cada novo

avanço tecnológico acontece um boom de demissões”53.

O Itaú atingiu o número de 104.542 trabalhadores no ano de 2011, a

maior quantidade no período, sendo que a partir de 2012 houve redução de

7.565 postos de trabalho e rotatividade de 13,85%, iniciando uma trajetória

decrescente no emprego. Em 2015, o número de trabalhadores no Itaú foi de

90.320, perda de mais de 14 mil postos de trabalho apenas nesta instituição.

No Bradesco, segundo maior banco privado em ativos, eram 104.412

funcionários em 2011, em 2015 o relatório anual do banco apontava uma

52Os dados sobre emprego bancário apresentados a seguir foram obtidos em consulta ao Caged Estabelecimentos, do Ministério do Trabalho, e dos relatórios anuais produzidos, entre 2003 e 2016, pelos bancos: Banco do Brasil, Itaú, Bradesco, Caixa Econômica Federal e Santander. 53 Entrevista realizada pelo autor em 24/10/2016.

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redução do quadro para 92.861 funcionários, 11.551 trabalhadores a menos.

No Santander, o número em 2011 era de 54.564, passando por reduções

anuais, com pequeno incremento em 2015, entretanto, o saldo no final do

período foi de 50.024 funcionários, ou seja, menos 4540 pessoas.

Nos bancos públicos, o impacto foi levemente diferente, entretanto,

seguiu, ao final do período, a trajetória de redução dos quadros. O Banco do

Brasil tinha 113.810 funcionários diretos em 2011, ampliou para 114.182 em

2012 e, a partir de 2013, iniciou uma trajetória de corte de postos de trabalho.

Ao final de 2015, eram 109.191 funcionários, ou seja, redução de 4.991

funcionários. Em 2016, após o final do ciclo de governos petistas, foram

lançadas medidas para reduzir o quadro, em particular, o plano especial de

aposentadoria incentivada, que alcançou cerca de 10 mil funcionários. O

relatório do BB, em 2016, indicava que o banco fechou o ano com o quadro em

100.622 funcionários. No período, foram cortados 13.560 empregos.

No caso da Caixa Econômica Federal, houve significativo avanço no

emprego nos governos do PT por meio de concursos públicos. O banco estatal

buscou ampliar sua presença em diversas localidades pela abertura de novas

agências, que ultrapassaram quatro mil unidades, ante pouco mais de duas mil

em 2003, ou seja, mais que dobrou. O número de empregados na CEF era

menos de 60 mil em 2003, atingiu 68.257 em 2005 e chegou ao máximo de

102.067, em 2014 – aumento de 70% no quadro de funcionários diretos. A

partir de 2015 iniciou-se a redução, passando para 97.493 empregados

naquele ano e, em 2016, para 94.978. O incremento de empregados na CEF

deveu-se à ampliação de sua atuação como banco público, mediador de

programas centrais do governo federal, como bolsa-família; habitação; Minha

casa, Minha vida; FGTS; PIS, todos com ampliação substancial no período.

Além disso, em 2008, firmou com o Ministério Público do Trabalho (MPT) um

termo de ajuste de conduta (TAC), de número 4.446, com o objetivo de

substituir trabalhadores terceirizados por concursados nas atividades-fim.

Segundo o MPT:

De acordo com o cronograma fixado no TAC, 4.446 postos de serviço atualmente terceirizados serão extintos em três etapas distintas, em frações iguais ou aproximadas, quando necessário, em outubro, novembro e dezembro de 2008,

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respectivamente. O mesmo ocorrerá no próximo ano, quando a CEF extinguirá 4.783 postos de serviço terceirizados remanescentes, também em três etapas, nos meses de abril, maio e junho de 2009, respectivamente.54

Sendo assim, pode-se definir o ano de 2012 como o ponto de

inflexão no emprego bancário no setor privado, no caso do BB, em 2013 e, na

CEF, em 2015, encerrando o ciclo de expansão do emprego iniciado em 2003

em todos os segmentos do setor financeiro nacional. Esses motivos podem ser

compreendidos pelo esgotamento da política de inclusão pelo crédito e

consumo do governo federal e pela adequação da estrutura dos bancos ao

atendimento, em especial com a incorporação de novas tecnologias, dentre

elas o crescimento do mobile banking, ou seja, utilização do telefone celular

com internet para realização das transações financeiras. Sendo assim, os

bancos passaram a buscar alternativas ao atendimento presencial e para

promover a redução de custos de suas operações.

2.3 – Desigualdades internas nos bancos

As desigualdades de renda, ascensão profissional e

reconhecimento permanecem nos bancos. Segnini (1999) e Jinkings (2002)

apontaram diversos fatores que levaram a diferenças entre homens e

mulheres; brancos e negros nos ambientes de trabalho bancário com relação à

garantia de igual tratamento. Quanto às mulheres, a entrada mais tardia no

mercado de trabalho, a partir dos anos 1960 (mesmo os concursos públicos

eram limitados a homens até então) e a dificuldade em obter promoções na

época foram fatores importantes na origem das desigualdades; no entanto, a

internalização de estereótipos de gêneros é a causa fundamental para

compreender a distinção de salários e funções. Por exemplo, a onda de

demissões que atingiu a categoria, ao longo dos anos 1990, atingiu os cargos

iniciais, menos qualificados, mais normatizados e operacionais, ocupados

54 Texto extraído de: mpt.jusbrasil.com.br/noticias/19948/caixa-economica-federal-compromete-se-perante-mpt-a-extinguir-terceirizacao-em-atividade-fim, consulta em 16/12/2016.

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principalmente por mulheres (Segnini, 1999; Jinkings, 2002) que, portanto,

sofreram mais com as demissões no período. A visão socialmente atribuída à

mulher, tida como mais “sensível”, “paciente”, “dedicada” é reforçada nos

bancos mediante sua designação para funções, ainda que gerenciais, voltadas

ao atendimento de pessoas físicas e de pequenos valores, enquanto

prioritariamente os homens assumem cargos de decisão estratégica, que

demandam maiores riscos (Segnini, 1999).

A Febraban (Federação Brasileira de Bancos) havia realizado o

Censo da Diversidade em 2008, no qual ela própria atestou as desigualdades

de gênero e raça. Embora tenha criticado, na época, a falta de acesso aos

dados brutos do levantamento, a Contraf/CUT apoiou sua realização. Na

campanha nacional dos bancários de 2012, uma das conquistas presentes na

CCT foi a realização de novo censo da diversidade, a ser realizado entre 2013

e 2014. Esse censo seguiu basicamente os critérios daquele realizado em

2008, no qual os bancários poderiam voluntariamente responder à pesquisa

pela internet, mediante questões elaboradas pela Febraban e a empresa de

pesquisa contratada. Na primeira, em 2008, não houve amostragem científica,

o que não validou os dados cientificamente, embora tenha sido respondido por

quase 50% da categoria e tenha oferecido um bom parâmetro de pesquisa; já

no segundo censo adotou-se amostragem científica, o que permitiu

classificá-lo como “censo” de fato, com pertinência científica. Esta seção

baseia-se nos levantamentos realizados na RAIS (Relação Anual de

Informações Sociais) e nos dois censos da diversidade, pois ambos os

mecanismos contribuem para apresentar um perfil dos trabalhadores com

base na renda média, bem como em diferenças substanciais entre os grupos

sociais.

A categoria é composta por uma leve maioria de homens, 51,7%

diante de 48,3% mulheres, número que não se alterou ao longo dos últimos

anos. Conforme os dados levantados pela Febraban, houve incremento na

presença de trabalhadores e trabalhadoras negros e negras (pretos e pardos)

na categoria bancária. Em 2008, representavam 19% e passaram, em 2014, a

24,7% do total. Contudo, o número é bastante inferior ao representado na PEA

(População Economicamente Ativa), na qual os negros são 43% (IBGE, 2012).

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Há menos negros trabalhando em bancos que a média existente na sociedade.

No período, o quantitativo de brancos decresceu de 77,4% para 71,4%. Isso

revela que os critérios de seleção priorizam trabalhadores homens e mulheres

brancos, em detrimento de negros. Os dados divulgados pela Febraban (2008

e 2014) reforçam as análises propostas por Segnini (1999), em que o critério

de acesso às funções determina as diferenças.

Em 2008, 59% dos trabalhadores haviam tomado conhecimento das

vagas por meio de indicação, seja de amigos ou de funcionários dos bancos.

Esse número decresceu para 51,6% na pesquisa de 2014, enquanto o

conhecimento das vagas por editais de concurso cresceu de 17,8% para

21,2%, acompanhando a tendência de ampliação de vagas nos bancos

públicos. Desse modo, nota-se que nas instituições privadas, a indicação

continua a ser, com larga vantagem, o principal critério de conhecimento das

vagas, à frente da internet, jornais e agências de recrutamento. Desse modo,

há forte tendência das pessoas que já trabalham no meio ou que possuem

conhecidos, indiquem outras pessoas de seu círculo de convivência. Se, na

maioria, já são historicamente brancos, a tendência de se manter essa

diferença permanece, pois, nos círculos sociais, costumam prevalecer

pessoas de mesma classe social e etnia. Além disso, identifica-se a maior

seleção de brancos durante a escolha. Ademais, nos bancos públicos, em que

o acesso acontece por concurso, repete-se a realidade da desigualdade social

e racial vigente na sociedade brasileira, em que a maioria dos concursos e dos

vestibulares garantem as vagas aos brancos que, em média, possuem mais

acesso ao ensino de qualidade e à preparação para provas. As cotas raciais –

ou reserva de vagas para Pessoas Pretas e Pardas – em concursos é

realidade mais recente, particularmente após a lei 12.990/2014, que nos

bancos não produziu resultados sensíveis nos dados da pesquisa, porém, sem

qualquer dúvida, é um evento importante e que deverá trazer efeitos em caso

de novas seleções55.

Embora ainda seja prematuro afirmar, o aumento de 5,7% de

trabalhadores negros no setor pode indicar, que as manifestações contrárias à

55O Banco do Brasil realizou apenas uma seleção após a publicação da lei. A CEF não realizou novo concurso depois da lei.

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discriminação, que tem sido pauta do movimento sindical, podem ter produzido

algum reflexo na contratação do setor e na ampliação da diversidade, bem

como a realização do censo em 2008 pode ter reforçado as premissas

defendidas pelos sindicatos. Ainda assim, o avanço é lento e não tem

garantido um equilíbrio nas relações de gênero e raça. No caso das pessoas

com deficiência, nota-se que dobrou o número de contratações, relativamente

ao total, entre os dois censos, de 1,8% para 3,6%. Algo que indica maior

atenção para a questão, mas ainda tímida, inclusive perante a exigência legal

da contratação de 5% de trabalhadores com deficiência em relação ao total.

Na categoria bancária, a maior faixa dos trabalhadores possui até

10 anos de emprego na categoria, representando 61,3% dos funcionários de

acordo com o censo da Febraban de 2014, número próximo ao contabilizado

pelo Dieese (2015) com dados da RAIS. Dentro da referida faixa, a maioria

concentra-se em até cinco anos, representando 60% do total, enquanto os

demais estão na faixa entre 5 e 10 anos. Vejamos os dados na tabela abaixo.

TABELA 2. TEMPO DE EMPREGO NO SETOR BANCÁRIO

Notemos que houve algumas alterações em relação ao ano de

2008. Naquela ocasião, havia uma proporção mais próxima entre os

trabalhadores com menos de 10 anos de tempo de vínculo, 54,9%, e com

tempo superior a 10 anos, 45,1%, enquanto em 2014 a diferença aumentou,

perfazendo 61,3% (até 10 anos) e 38,7% (mais de 10 anos). Houve uma

ampliação do número de trabalhadores com menos tempo no setor, o que

revela o desligamento de funcionários mais antigos, notadamente na faixa

entre 15 e 20 anos de vínculo, que se reduziu de 16,6% do total para apenas

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2,5%. Outro aspecto a se destacar são os funcionários com mais tempo de

emprego. Há predominância masculina entre quem possui mais de 10 anos no

emprego. Do total masculino, 41,3% estavam nesta faixa em 2014, diante de

36,2% das mulheres, o que sugere a maior permanência de homens.

Com relação à faixa etária, pode-se observar no gráfico 10 abaixo

que, nos dois censos, a maioria se encontra na faixa entre 25 e 34 anos e, no

gráfico 11, a distribuição entre homens e mulheres por faixa etária:

GRÁFICO 11. IDADE DO TRABALHADOR/A BANCÁRIO/A

FONTE: FEBRABAN, CENSOS DE 2008 E 2014

Os trabalhadores e trabalhadoras jovens (até 34 anos) representam

quase 45% do total, com um encolhimento próximo a 3% em relação a 2008. A

faixa até 25 anos teve redução na participação total em mais de 7%. As demais

faixas tiveram aumento na quantidade de trabalhadores, o que demonstra um

pequeno envelhecimento da categoria. Trata-se, portanto, de um equilíbrio

entre trabalhadores mais jovens e mais velhos. As mulheres representam a

maioria dos jovens, sendo que 48,4% delas possuem até 34 anos e 46,7%

estão na faixa de 35 até 54 anos. Entre os homens, 42,3% são jovens,

enquanto 48,9% possuem entre 35 e 54 anos.

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GRÁFICO 12. PARTICIPAÇÃO DE HOMENS E MULHERES NO SETOR BANCÁRIO

Fonte: Censos Febraban 2008 e 2014

Em relação à escolaridade dos trabalhadores, mantém-se a

tendência de ampliação dos anos de estudo e de maior formação, algo que já

havia sido apontado nos estudos dos anos 1990, como Segnini (1999). Isso se

baseia, principalmente, no aumento de formação em nível de pós-graduação,

particularmente especializações e MBA (Master of Business Administration,

pós-graduação latu sensu em administração). Tal aumento decorre, de um

lado, do estímulo constante dos bancos, mediante oferta de cursos, e de outro,

da pressão para maior qualificação sob risco de perda de cargo de confiança

ou demissão pela falta de atualização aos propósitos da empresa. As mulheres

continuam com nível de escolaridade médio superior ao dos homens, outra

tendência já apontada nos estudos de Segnini (1999) e confirmadas pelos

dados mais recentes. Do total de mulheres, 82,5% possuem no mínimo nível

superior, contra 76,9% dos homens. Os trabalhadores do sexo masculino

possuem mais formação de pós-graduação (38%) em relação às mulheres

(34,6%). Os brancos possuem 81,3% dos trabalhadores com, no mínimo, nível

superior completo, enquanto os negros possuem 74,5%.

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GRÁFICO 13. ESCOLARIDADE DOS TRABALHADORES BANCÁRIOS

FONTE: CENSOS FEBRABAN 2008 E 2014.

Os dados dos censos indicam que a maioria dos bancários tinham

experiência prévia ao setor, ou seja, 57,7% haviam trabalhado em outro setor

antes de ingressarem na carreira nos bancos (2014). Trata-se de pessoas,

dessa forma, com relações com outras categorias e sindicatos.

Em relação à remuneração dos bancários, podemos observar, pelos

dados da RAIS e compilados pelo Dieese, o aumento real da renda a partir de

2004 até 2015.

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GRÁFICO 14. REMUNERAÇÃO REAL MÉDIA DOS BANCÁRIOS ENTRE 2004 E 2015

FONTE: DIEESE, COM BASE NO RAIS. ATUALIZAÇÃO INFLACIONÁRIA DO AUTOR PARA OS

ANOS DE 2004 A 2014.

Observa-se que a remuneração média dos bancários passa a ter

um crescimento consistente a partir de 2009. Até então, variou entre altas e

baixas, tendo perdas de valor real, a despeito dos reajustes assegurados pela

CCT. Isso se deve à estratégia de rotatividade dos bancos, ou seja, as

instituições demitem funcionários com maiores salários e contratam

trabalhadores com salários menores. Esse quadro aconteceu principalmente

nos bancos privados, embora tenha ocorrido também no Banco do Brasil – que

afetou a remuneração média dos bancos público – entre os anos de 2007 e

2008 em razão de um Programa de Antecipação de Aposentadoria (PAA) que

incentivou a aposentadoria de cerca de sete mil funcionários mais antigos e

com salários maiores. No setor privado, as pesquisas de emprego bancário

(PEB) publicadas pelo Dieese captaram que os novos funcionários entram

recebendo cerca de 70% a 75% do salário dos trabalhadores desligados no

mesmo ano. Os salários nos bancos públicos continuam maiores que nos

bancos privados, entre 9% a mais no início do período e ultrapassando 20%

em valores médios. Após 2012, ampliou-se a diferença entre a remuneração

média dos bancos públicos em relação aos bancos privados, devido ao

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aumento das demissões nestes, geralmente de funcionários de salários

maiores.

A pesquisa demonstra outra variável bastante comum atualmente

nos bancos, que são as promoções. É uma estratégia dos bancos em

promover para cargos de confiança os funcionários, sem que, no entanto, isso

necessariamente represente aumentos substanciais de salários, mas

garantem uma maior adesão do trabalhador à lógica empresarial, bem como

uma ampliação da jornada de trabalho de seis para oito horas diárias. Os

dados indicam que mais de um quarto dos trabalhadores passam por quatro ou

mais promoções.

GRÁFICO 15. NÚMERO DE PROMOÇÕES DOS BANCÁRIOS

FONTE: FEBRABAN CENSOS DE 2008 E 2014.

Note-se que apenas 19,7% dos trabalhadores não passaram por

nenhuma promoção. O mais comum são quatro ou mais promoções, enquanto

há trabalhadores que passam por entre uma e três vezes. Os homens são mais

vezes promovidos que as mulheres, como demonstram os levantamentos de

2008 e 2014. Enquanto 19,9% das mulheres tem quatro ou mais promoções,

esse número sobe para 31,7% entre os homens. O constante número de

promoções não impede demissões, pois, se ao avançar na estrutura

hierárquica, mesmo que até o nível gerencial, o funcionário não atingir os

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resultados das metas, poderá ser demitido, no caso dos bancos privados, ou

perder o cargo de confiança, nos bancos públicos.

Em relação à diferença de remuneração entre os gêneros, a

pesquisa do censo da diversidade da Febraban, tanto de 2008 quanto de 2014,

identificou a permanência na desigualdade de salários entre homens e

mulheres e entre brancos e negros, sendo que a maior desigualdade acontece

entre homens brancos e mulheres negras. As mulheres recebiam, em 2008,

em média, 76,4% dos salários dos homens e, em 2014, esse valor aumentou

relativamente para 77,9%. A pequena redução da desigualdade não indica, no

entanto, qualquer mudança nas opções dos bancos nas formas de contratação

e remuneração. No caso de raça, os negros recebiam em média 84,1% da

remuneração dos trabalhadores brancos, esse valor avançou para 87,3% no

ano de 2014, indicando uma melhora 3,2%. Isso indicaria uma melhora relativa

de cerca de 0,5% por ano. Nesse ritmo, caso mantido, seriam necessários

outros 24 anos para igualar as remunerações. A maior desigualdade acontece

na região Sudeste, na qual a proporção de remuneração média dos negros em

relação aos brancos bancários variou no mesmo período de 78,7% para

81,2%. No caso de mulheres bancárias negras, a diferença é ainda mais

significativa: em 2008, essas mulheres recebiam 64,5% da remuneração

média de um homem branco, tendo a proporção melhorado para 68,2% em

2014. O maior fosso encontra-se também na região Sudeste, em que as

mesmas médias caem para 59,4% e 62% no mesmo período.

As mulheres continuam exercendo principalmente as funções mais

baixas na escala do trabalho bancário, chamadas de operacionais,

particularmente escriturárias, técnicas-bancárias, caixas, dentre outras. Do

universo de mulheres, são 44,7% em funções operacionais e administrativas;

já do total de homens são 36,1%. No caso de cargos de gerência, 14,5% são

ocupados por mulheres e 21,5% por homens. A classificação adotada pela

Febraban não é adequada, pois não diferencia os tipos de gerência, se são

gerências gerais de agências, gerências de setores e divisões ou gerentes de

contas, cuja remuneração, poder e prestígio são notavelmente diferentes. As

mulheres ocupam cargos menores e com menor remuneração. Como os

dados brutos não são disponibilizados pela Febraban, isso prejudica a análise

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de dados, para saber quais as características dos cargos. Nos cargos de

direção e superintendência, os mais altos nos bancos, 1% dos homens estão

presentes, contra 0,3% de mulheres. Pode-se inferir, baseado no número total

de bancários e no número relativo de homens e mulheres, que são em torno de

20% de trabalhadoras nessas funções. Essa proporção seria parecida com

aquela que encontramos em 2008 apenas nas direções (Malerba, 2011),

quando a apresentação era mais explícita nesse sentido.

Nas direções e superintendências, os dados divulgados pela

Febraban indicam que 0,5% dos trabalhadores negros atuam nestes níveis,

representando algo como 17% dos cargos disponíveis nas instâncias mais

altas. Seria um avanço em relação aos 4% apurados em 2008, entretanto, a

metodologia, naquele caso, divulgava o percentual apenas das direções.

Como não há disponibilidade dos dados brutos, fica difícil inferir uma melhora

nesse sentido, que tampouco é destacada pela própria Febraban. Esse

número seria relativamente menor que o total de trabalhadores na categoria,

situado em 24,7%. Assim como as mulheres que são 48,3% do total, aparecem

em apenas 20% nestes níveis mais elevados.

O sindicalismo bancário reconheceu essas desigualdades ainda

nos anos 1990, quando passou a estruturar a discussão sobre elas. A

Comissão Nacional de Gênero e Raça e Orientação Sexual foi criada em 1997.

Em 2000, a realização da pesquisa “O rosto dos bancários – Mapa de Gênero

e Raça do Setor Bancário Brasileiro” impulsionou a discussão e a sua

colocação como pauta de reivindicação dos bancários. Nesse ano, passa a

integrar a CCT da categoria o item “igualdade de oportunidades”, item que se

manteve e se ampliou no debate da categoria. Algumas novas cláusulas foram

incluídas durante os governos petistas, dentre elas a própria realização do

censo da diversidade 2014. Outras foram a ampliação da licença maternidade,

a extensão de vantagens para cônjuges em relações homoafetivas e cláusula

para valorização da diversidade. Essas cláusulas são parte de um conjunto de

conquistas no âmbito das convenções dos bancários no período analisado.

Pode-se afirmar que todas essas conquistas tiveram impactos positivos na

vida dos trabalhadores. As mulheres utilizam as licenças estendidas, até onde

se acompanha na imprensa bancária, sem retaliações; o censo 2014 mostra

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que cerca de 40% dos bancários que declaram relações homoafetivas

incluíram seus conjunges nos planos de saúde ou outras vantagens.

As cláusulas para valorização da diversidade, entretanto, ainda não

conseguiram reduzir as desigualdades de acesso aos cargos e remuneração.

A pesquisa encomendada e realizada pela Febraban em 2014 serviu como

mais um instrumento de cobrança por melhorias e igualdades. O sindicalismo

bancário também se juntou a outros movimentos, particularmente os

movimentos feministas, para que o governo ratificasse a convenção 156 da

OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre a igualdade de

oportunidades, embora isso ainda não tenha se tornado realidade.

A existência de pesquisas e estudos realizados por sindicatos e

bancos, além daqueles produzidos pela academia, propiciaram condições para

avançar nas temáticas. O primeiro passo era tornar evidente a desigualdade,

que já era de conhecimento empírico dos trabalhadores e trabalhadoras.

Depois tornou-se pauta frequente do movimento. Isso se deve

fundamentalmente ao papel das mulheres na organização e na mobilização

dessas pautas. Esses debates foram incorporados pela maioria das direções

sindicais e bem recebido pelas bases. Essa pauta, embora não seja central do

movimento, aparece como tema relevante de cobranças e conquistas. No

entanto, em que pese mudanças e avanços, as condições estruturais da

desigualdade não conseguiram ser transformadas.

Um elemento que merece atenção e está em processo de

construção é a maior presença de mulheres nas direções dos sindicatos. No

caso da CUT, essa era uma determinação estatutária, a partir de cotas,

inicialmente de 30%. Mas é notório que as mulheres têm alcançado cargos

mais altos, como presidência, secretária-geral e tesouraria, as funções mais

importantes numa entidade. Não se trata, desse modo, de mera adequação às

cotas. Como exemplo desses casos, temos o sindicato dos bancários de São

Paulo, o principal do Brasil, em que, pelo terceiro mandato consecutivo, as

mulheres dirigem a entidade. Mais que isso: pelo terceiro mandato, os três

principais cargos são desempenhados por mulheres. No sindicato dos

bancários do Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Pernambuco, dentre outros, são

mulheres a presidir a entidade nos últimos anos. São sintomas de um período

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em que as mulheres assumiram importantes funções dentro do sindicalismo

bancário e da coordenação da categoria. Ainda é precoce afirmar uma maior

feminização na cúpula sindical bancária, mas há indícios importantes de

mudanças a serem melhor explorados em novos estudos.

Capítulo 3 – Organização e disputas na categoria

Este capítulo apresenta a configuração do sindicalismo bancário e

indica as principais razões de disputas entre as diferentes organizações do

setor. O Brasil possui 212 sindicatos de bancários em todo o país. Estão

divididos em sete centrais sindicais, duas confederações e quinze federações.

Representam mais de 494 mil bancários em todo o território nacional (dados do

Caged, de outubro de 2016). Há, ainda, sete principais tendências sindicais,

que, com intensidades diferentes, influenciam nas pautas e disputas no interior

da categoria. São elas: Articulação Sindical/CUT; CSD/CUT; Unidade

Sindical/CUT; CTB; UGT (estrutura oficial); Intersindical e Conlutas. Há outras

tendências menores, presentes principalmente nos bancos públicos, como

Unidade Classista, ligada ao atual PCB; MRT (Movimento Revolucionário dos

Trabalhadores), antiga LER-QI e os militantes do PCO (Partido da Causa

Operária) e Unidade Sindical, ligada ao PPS, que tem a hegemonia do

sindicato dos bancários de Campinas.

3.1 – As estruturas e organizações presentes no sindicalismo bancário

A maior organização de grau superior da categoria, a Confederação

Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (CONTRAF), sucessora da

Confederação Nacional dos Bancários (CNB) e do Departamento Nacional dos

Bancários (DNB), é filiada à CUT. Ela possui 105 sindicatos associados e 8

federações estaduais ou interestaduais, que representam cerca de 400 mil

bancários na base, ou mais de 80% da categoria em todo país. Atualmente é

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quem conduz, junto ao Comando Nacional dos Bancários 56, as principais

negociações da categoria bancária.

A Contraf foi fundada em 2006, ampliando a proposta de

representação sindical da CNB, que organizava formalmente apenas os

bancários e financiários, para todo o ramo financeiro. Para isso, além da

mudança do nome que incluiu “trabalhadores do ramo financeiro”, houve

alteração estatutária com essa finalidade. Essa mudança formal foi

acompanhada por diversos sindicatos e federações no Brasil, que passaram a

buscar a representação de outros segmentos de trabalhadores do setor

financeiro, como trabalhadores em callcenter, correspondentes bancários,

terceirizados do setor bancário ou financeiro, entre outros. Trata-se de uma

estratégia política do movimento bancário da CUT no período, de ampliar a

representação sindical para todos os trabalhadores envolvidos nos processos

financeiros, porém essa estratégia não avançou significativamente e a

Confederação se manteve como representante de bancários, financiários e,

em alguns locais, dos trabalhadores das cooperativas de crédito, como no

estado de São Paulo57.

A Contraf é oriunda do antigo DNB (Departamento Nacional dos

Bancários), fundado em 1985, vinculado à CUT58. O departamento foi criado

com o objetivo político de organizar a categoria nacionalmente, por meio da

relação entre os principais sindicatos dos bancários alinhados ao novo

sindicalismo e das oposições bancárias em diversos estados brasileiros

(Junckes, 2004). A criação do DNB insere-se no contexto de organização da

56O Comando Nacional é formado pelas sete federações filiadas à Contraf/CUT e pela Federação de Bancários de São Paulo e Mato Grosso do Sul, que é filiada à Contec/UGT, e pelos sindicatos do país: São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Florianópolis, Campinas, ABC, Campo Grande, Mato Grosso, Espírito Santo, Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Ceará, Piauí, Pará, Acre, Amapá, Rondônia e Roraima. A coordenação da Comissão Nacional cabe à presidência do Sindicato dos Bancários de São Paulo e da Contraf-CUT. 57 A Contraf chegou a ter em sua direção durante os dois primeiros mandatos um

trabalhador oriundo de empresa de callcenter, a Fidelity. Durante esse período, notadamente entre 2008 e 2010, a entidade buscou articular mais ações concretas com vistas a representar trabalhadores de terceirizadas. 58 A criação de departamentos internos à CUT foi uma deliberação da plenária nacional da entidade, realizada em dezembro de 1985, na cidade de São Bernardo do Campo.

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CUT, quando se iniciou a construção dos “Ramos de atividade” na central,

como forma de coordenar as entidades envolvidas no mesmo setor

econômico. Portanto, é uma confederação que surgiu como orgânica da

CUT59. A liderança na DNB coube ao maior sindicato, São Paulo, que elegeu o

primeiro presidente, em 1989, sendo que tinha papel de preponderância desde

a primeira coordenação em 1986. No período da DNB, houve importante

avanço na organização da categoria, no sentido de estruturar a minuta de

reivindicações unificada e a estratégia das campanhas salariais, com o

objetivo de alcançar uma convenção coletiva de trabalho nacional. À época

existia apenas a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de

Crédito (Contec/hoje filiada à UGT), herdeira da estrutura sindical oficial e que,

portanto, do ponto de vista formal, representava a categoria bancária – e

recebia os recursos compulsórios da estrutura sindical brasileira –, embora a

grande maioria dos sindicatos de bancários já fosse alinhada ao sindicalismo

cutista.

Nota-se desde o início da confederação cutista o papel central

desempenhado pelo sindicato dos bancários de São Paulo, que elegeu cinco

de seus sete presidentes. A confederação é hegemonizada pela

Articulação/CUT e desse modo tem trabalhado de forma próxima à central e,

de maneira geral, apoia os governos do PT.

A Contraf possui três características fundamentais: organicidade na

CUT, hegemonia da Articulação/CUT e predomínio dos sindicatos de

bancários São Paulo e Rio de Janeiro, que indicam a maior parte dos

dirigentes em cargos de executiva, ou seja, aqueles cargos que realizam as

atividades cotidianas da confederação, com poder administrativo. Na tabela

abaixo destacamos a origem sindical de todos os dirigentes da Confederação,

dividindo aqueles que participam da direção executiva.

59 Isso significa que é parte da estrutura da central, integrada organicamente ao trabalho realizado pela CUT.

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QUADRO 1. DIRIGENTES SINDICAIS DA CONTRAF POR SINDICATO (ELEIÇÃO DE

2015)

Sindicato Dirigentes Executiva Corrente Majoritária

São Paulo/SP 18 6 Articulação

Rio de Janeiro/RJ 6 2 Articulação

Porto Alegre/RS 6 1 CSD

Belo Horizonte/MG 5 1 Articulação

Brasília/DF 4 1 Articulação

Niterói 2 1 Articulação

Mato Grosso 2 0 Articulação

Alagoas 2 0 Articulação

Rondônia 2 0 Articulação

Curitiba/PR 1 1 Articulação

Pará 1 1 CSD

Ceará 1 1 Articulação

Campinas 1 1 UnidadeSindical

Jundiaí 1 1 Articulação

Sul Fluminense 1 0 Fórum do interior

Roraima 1 0 Articulação

Oposição RN60 1 0 Articulação

ABC 1 0 Articulação

Pernambuco 1 0 Articulação

Oposição BA 1 0 Articulação

Oposição MA 1 0 Articulação

Paraíba 1 0 Articulação

Juiz de Fora 1 0 Articulação

Ribeirão Preto 1 0 Sindicalismo oficial

60 No segmento bancário, a CUT opta por inserir representantes de oposições em suas estruturas, nas federações e na confederação. É uma forma de organizar e fortalecer lideranças e grupos políticos para futuras disputas. No caso da direção da Contraf, há representantes da oposição na Bahia, cujo sindicato é hegemonizado pela CTB e realizou disputas contra chapas da CUT, bem como do Maranhão e Rio Grande do Norte, hegemonizados pela Conlutas.

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110

Campos/RJ 1 0 Articulação

Extremo Sul da BA 1 0 Articulação

Londrina 1 0 Articulação

Campo Grande 1 0 Articulação

Total 66 17

FONTE: FORMULAÇÃO PRÓPRIA A PARTIR DE DADOS DO MTE E DA CONTRAF

QUADRO 2. DIRIGENTES SINDICAIS DA CONTRAF PELOS BANCOS EM

QUE OS DIRIGENTES SÃO EMPREGADOS (2015)

Banco Dirigentes Secretarias Executivas

Itaú 13 2

Bradesco 15 7

Santander 7 2

BB 8 4

CEF 8 2

HSBC (Bradesco) 10 0

Banrisul 2 0

Mercantil 1 0

Bic Banco 1 0

Rural 1 0

Total 66 17

FONTE: FORMULAÇÃO PRÓPRIA COM BASE EM INFORMAÇÕES DO SITE E PUBLICAÇÕES DA

CONTRAF

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Observa-se na tabela 4 que a Contraf não logrou êxito, até o

presente momento, em incluir trabalhadores de outras categorias em sua

estrutura e continua sendo uma Confederação de representação sindical

praticamente de bancários. Embora haja acordo coletivo para os financiários e,

em alguns estados, com cooperativas, isso não implica em representação

desses trabalhadores pela entidade. O predomínio de funcionários de grandes

bancos verifica-se na composição da direção, e dificilmente seria diferente, na

medida em que as grandes instituições financeiras compraram ou se fundiram

com diversas outras, sejam estaduais ou bancos privados, o que levou à

concentração de bancos, bancários e de dirigentes nos maiores grupos

(Minella, 2007; Jinkings, 2002).

No ano de 2015, pela primeira vez, houve inscrição de duas chapas

durante o Congresso da entidade para a escolha da direção. A chapa liderada

pela Articulação, encabeçada por Roberto von der Osten, venceu com 75%

dos votos e com apoio dos principais sindicatos e dirigentes. A outra chapa foi

liderada por Miguel Pereira, oriundo do sindicato dos bancários Sul

Fluminense, até então secretário de Organização do Ramo Financeiro e que já

havia sido secretário de finanças da Contraf e coordenador de diversas

campanhas eleitorais de chapas cutistas. O sistema de escolha dos dirigentes

é de composição proporcional aos votos, portanto, quem vence não escolhe

todos os dirigentes. Pereira liderou uma chapa de dissidentes da Articulação

Sindical Bancária, que vieram a criar um novo agrupamento político, chamado

de “EnFrente/CUT61”, com crítica em especial ao papel desempenhado pelo

Sindicato dos Bancários de São Paulo e do Rio de Janeiro na condução da

política da categoria, papel este considerado como pouco democrática, de

decisões de cúpulas, e sem aceitação de divergências.

Anabele Silva, dirigente da FENAE e do Sindicato dos Bancários de

Pernambuco, militante da Enfrente, sintetiza os motivos que levaram esse

grupo de dirigentes a constituir uma nova força política: “A divisão aconteceu

em razão da forma como o movimento majoritário lidava com as discussões,

61 É uma nova força política do segmento bancário, que se mantém vinculada à CUT e seus membros são majoritariamente filiados ao PT.

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centralizada e sem democracia, isso começou a ganhar força entre um grupo

de pessoas que não concordava com isso”62.

Pereira contou com apoio do então presidente da Contraf por dois

mandatos, Carlos Cordeiro, dirigente do sindicato dos bancários de São Paulo.

O movimento reuniu membros de outros estados, mas não conseguiu ocupar

nenhum cargo executivo, por decisão da chapa vencedora, que embora tenha

dividido os cargos de direção proporcionalmente, não o fez em funções

executivas63, o que levou a protestos e, inclusive, ajuizamento do processo

eleitoral. A corrente “EnFrente/CUT” é formada principalmente por dirigentes

sindicais e não possui hegemonia em nenhum sindicato, embora possua

membros de importantes direções em sua composição, particularmente no

Distrito Federal, Pernambuco e Rio Grande do Sul. As principais correntes

representadas na direção da Contraf são a Articulação Sindical, amplamente

majoritária, e a CSD/CUT (Corrente Socialista e Democrática).

Observam-se algumas contradições em relação à confederação

orgânica da CUT, de aceitar a filiação de sindicatos que não possuem filiação

em federações cutistas, ou mesmo de entidades que fazem parte de estruturas

que se contrapõem às organizações da CUT em certas regiões. São exemplos

disso os sindicatos ligados à Federação dos Bancários de São Paulo (FEEB

SP/MS), como os de Campinas, Ribeirão Preto e Piracicaba, que possuem

filiação direta à Contraf – embora a Feeb SP/MS seja filiada à Contec/UGT.

Assim como Santos, filiado à Feeb SP/MS e também à Intersindical. Essas

filiações possuem um caráter pragmático, inserem-se num contexto de disputa

por filiações e numa estratégia de não permitir que as entidades possam

fortalecer outra confederação ou criar estruturas paralelas.

A Contraf chegou a ter em sua direção durante os dois primeiros

mandatos um trabalhador oriundo de empresa de callcenter, a Fidelity. Durante

62 Entrevista realizada pelo autor em 13/05/2017. 63 A chamada executiva é a parte da direção que detém o controle de secretarias. Há membros que são diretores, no entanto, não possuem função executiva em alguma secretaria ou pasta, ou seja, aquelas que realizam as atividades cotidianas da entidade. As funções executivas na Contraf/CUT são 17, sendo as principais na condução da Confederação: presidência, secretaria geral, secretaria de finanças, comunicação, assuntos jurídicos, formação, de políticas sindicais e saúde do trabalhador.

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esse período, notadamente entre 2008 e 2010, a entidade buscou articular

mais ações concretas com vistas a representar trabalhadores de terceirizadas.

A Contraf organiza, anualmente, a Conferência Nacional dos

Bancários e os congressos do BB e CEF64. A conferência é a última instância

para finalizar a minuta de reivindicações a ser entregue aos bancos e definir as

estratégias da campanha nacional dos bancários. Antes de ser realizada, a

conferência nacional é precedida pelas conferências estaduais, organizadas

pelas federações estaduais ou interestaduais, com o objetivo de aglutinar e

debater propostas e estratégias oriundas de conferências regionais – quando é

realizada por um grupo de sindicatos de uma mesma região – ou encontros

locais organizados pelos sindicatos com sua diretoria e, em tese, com a base65,

que debatem o tema e elegem seus representantes à cada etapa de

conferência.

Contec/UGT

A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de

Crédito (Contec/UGT) é a mais antiga confederação do sindicalismo bancário.

Fundada em 1958 e reconhecida em 195966, foi durante três décadas a única

entidade de âmbito nacional oficialmente representante dos bancários. Sua

fundação foi um passo importante para os bancários se organizarem

formalmente em âmbito nacional, com a participação dos mais importantes

64 Para organizar e debater temas específicos de bancos, a Contraf criou e é assessorada pelas chamadas “Comissões de Organização dos Empregados” (COE) ou “Comissão de Empresa” ou “Comissão Executiva dos Empregados” (CEE), que são as representações sindicais, compostas por bancários de cada Instituição Financeira, geralmente dirigentes dos sindicatos, que discutem os temas específicos e participam das mesas permanentes de negociação com as instituições. Na campanha nacional, a Contraf lidera a negociação com assessoramento das comissões. Em 2016, existiam as COEs do Itaú, Bradesco/HSBC e Santander e as CEEs do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Essas comissões reúnem-se de forma regular e extraordinária para tratar de assuntos pertinentes a cada uma das instituições bancárias. O objetivo é agregar informações dos sindicatos e bancários para negociar com os bancos temas de interesse da categoria. 65 A Contraf costuma realizar também a consulta nacional aos bancários. Trata-se de um formulário com questões sobre temas que os bancários considerem relevantes serem debatidos e qual posicionamento sobre índice de reajuste e prioridades na campanha nacional. A consulta não tem caráter científico e é realizada pelos sindicatos como forma de balizar os debates nas conferências. 66 Consulta ao site da entidade contec.org.br em 12/04/2016.

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sindicatos do Brasil (Canêdo, 1986). Entretanto, como herdeira do sindicalismo

oficial, baseou sua atuação, durante a ditadura militar, no caráter recreativo e

com direções colaboracionistas com o regime, sem enfrentamentos políticos

com o governo e os banqueiros. Durante o processo de construção

democrática no final da ditadura militar e as constantes vitórias das oposições

sindicais entre o final dos anos de 1970 e meados de 1980, ligadas ao novo

sindicalismo, nos mais significativos sindicatos brasileiros, tornou-se uma

entidade reconhecida pelas antigas figuras da estrutura sindical oficial do

período da ditadura. A confederação se assenta no sindicalismo de cúpula e na

defesa da estrutura sindical caracterizando-se pela manutenção de

concepções conservadoras. Compreende um espectro que vai desde

direções totalmente passivas até aquelas que apresentam reivindicações

moderadas e localizadas, combatem as correntes reformistas mais avançadas

e as revolucionárias (Boito, 1996). A filiação partidária, quando existe, é

dispersa em vários partidos.

A Contec manteve-se, entre 2003 e 2016, como força minoritária

dentro do movimento bancário, com representação de menos de 13% da

categoria no país, tendo neste período perdido a exclusividade jurídica que

mantinha na relação com os bancos, especialmente os públicos, que

passaram a reconhecer a Contraf/CUT como parte legítima nas negociações.

Manteve também uma postura conservadora na prática sindical, voltada

especialmente para o caráter assistencialista e acompanhando praticamente

as negociações encabeçadas pelo comando nacional, liderado pelos cutistas.

A representação sindical estatutária da Confederação é dos

“trabalhadores em empresas de crédito” (MTE, 2016). Em 2015, a Contec

possuía 86 sindicatos associados. São também associadas à Contec sete

federações estaduais ou interestaduais de bancários e uma federação de

securitários. A principal federação é a Feeb SP/MS, que tem em suas bases

em torno de 40 mil bancários. No entanto, quatro de seus principais sindicatos

são filiados diretamente à Contraf: Campinas, Santos, Ribeirão Preto e

Piracicaba. Além disso, a Federação faz parte do comando nacional dos

bancários, com coordenação da Contraf/CUT. Do ponto de vista jurídico, é

possível às entidades de base se filiarem a entidades de grau superior de

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diferentes orientações políticas e ideológicas, mesmo que opostas entre si e

filiadas a diferentes centrais. Em nossa interpretação, esses sindicatos,

inclusive Santos – filiado à Intersindical –, realizam esse movimento

contraditório para ocupar espaços políticos dentro dessas estruturas que lhes

conferem poder político e condições de ampliar sua força. É um cálculo político

para ocupar espaços de maior influência em uma ou outra federação ou

confederação, bem como em centrais distintas. A disputa de bases, quando

acontece, é no âmbito dos sindicatos, que disputam o espaço geográfico de

representação determinado pela estrutura sindical corporativa. Por exemplo,

no caso das duas federações paulistas, a Feeb/SP-MS/UGT e a

Fetec/CUT-SP houve um entendimento político67 nos anos 1990 em que cada

uma receberia sua parte nas contribuições sindicais de acordo com as

entidades que eram a elas afiliadas. A Contec é filiada à UGT (União Geral dos

Trabalhadores), sendo que já era integrante da CGT desde sua fundação.

O presidente da Contec/UGT, Lourenço Ferreira do Prado, é

dirigente da entidade desde meados dos anos 1970 – na época chegou a ser

vice-presidente do Sindicato dos Bancários de Brasília –, e é presidente da

Contec desde o período da ditadura. Muitos diretores da Contec são antigos

em suas funções, remanescentes do período da ditadura militar.

Na direção executiva da entidade, há um vice-presidente

securitário, presidente do sindicato de securitários do Distrito Federal e da

federação nacional dos securitários. A Federação Nacional dos Securitários,

filiada à Contec, assina a convenção coletiva de trabalho com a Federação

Nacional de Empresas de Seguros Privados, de Capitalização e Previdência

Complementar Aberta (Fenaseg), para locais onde as empresas estão

inorganizadas em sindicatos patronais. Nos locais onde há sindicatos

patronais, estes assinam junto aos sindicatos estaduais de securitários, como

acontece em São Paulo. Nesse sentido, a Contec possui um diálogo com outra

categoria do setor financeiro, composta por corretores e securitários que, no

cenário de grandes conglomerados formados pelos bancos atuantes no país,

67 Informação fornecida por meio de entrevista com o dirigente sindical Roberto Rodrigues, da Fetec-CUT/SP, em 15/03/2017.

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muitas vezes trabalham – em última instância – para bancos proprietários de

seguradoras por meio de holdings.

A base sindical da Contec é muito menor e dispersa no território

nacional, principalmente no interior dos estados de São Paulo, Minas Gerais,

Santa Catarina, Paraná e sindicatos estaduais de Goiás e Amazonas. O

presidente da Contec também é o coordenador do chamado FST (Fórum

Sindical dos Trabalhadores), espaço voltado ao debate e para reforçar a

defesa da unicidade sindical. O FST surgiu em 2003 como contraponto ao

FNT, com críticas ao governo Lula da Silva e representantes da CUT, que

naquela ocasião defendiam, dentro do FNT, posições em favor da liberdade

sindical com o fim da contribuição sindical obrigatória e da unicidade sindical.

Na tabela abaixo é possível ter a dimensão dos principais

sindicatos de bancários do país por número de trabalhadores em

suas bases, bem como a qual confederação e corrente política

pertencem. Nota-se que, entre as quinze maiores entidades, doze

são filiadas à Contraf/CUT, duas não possuem filiação e uma é

filiada à Contec/UGT. Das quinze, oito são hegemonizadas pela

Articulação, com destaque aos cinco maiores sindicatos do Brasil

que, somados, possuem quase metade dos trabalhadores do país

em suas bases. Dentre os demais, há um filiado à CTB, um à UGT,

um à Intersindical e um à Conlutas.

QUADRO 3. OS 15 MAIORES SINDICATOS DE BANCÁRIOS DO BRASIL (OUT/16)

Sindicato Confed. Central Base Corrente

majoritária

Sind. Banc. de São Paulo CONTRAF CUT 137791 Articulação

Sind Banc de Brasília CONTRAF CUT 29962 Articulação

Sindicato Banc Munic do Rio

de Janeiro CONTRAF CUT 26434 Articulação

Sind Banc de Curitiba CONTRAF CUT 18719 Articulação

Sind B. Belo Horizonte CONTRAF CUT 17539 Articulação

Sind Banc da Bahia Não tem CTB 13625 CTB

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Sind B de Porto Alegre CONTRAF CUT 12515 CSD

Sind Ban do Ceará CONTRAF CUT 11972 Articulação

Sind B de Pernambuco CONTRAF CUT 9583 Articulação

Sind Banc do Pará CONTRAF CUT 9523 CSD

Sind Banc no Estado de Goiás

CONTEC UGT 8809 UGT

Sind Banc do ABC CONTRAF CUT 8372 Articulação

Sind Banc de Campinas CONTRAF CUT 7952 Unidade Sindical

Sind Banc do Espírito Santos CONTRAF Intersindical 7502 Intersindical

Sind Banc do Maranhão Não tem Conlutas 4963 Conlutas FONTE: CAGED ESTABELECIMENTOS E CNES/MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2016, ELABORAÇÃO

PRÓPRIA.

3.2- A estabilidade no número de sindicatos na categoria

As pesquisas sindicais realizadas pelo IBGE até 2001 foram

subsídios importantes para analisar as categorias de trabalhadores e seus

sindicatos no período. Tais dados foram usados, por exemplo, na tese de

Junckes (2004), trabalho no qual fica demonstrando que entre 1991 e 2001

houve pequeno aumento no número de sindicatos atuantes no setor bancário,

passando de 191 para 205. O tamanho das bases de cada sindicato teria sido

reduzido, segundo o autor, em razão da diminuição dos trabalhadores

bancários em todo o país durante os anos 1990.

Vejamos na tabela abaixo a sistematização desses dados, para a

qual utilizamos tanto as informações extraídas de Junckes (2004) sobre o

período de 1991 a 2001, como uma atualização nossa, feita a partir do

levantamento de entidades e das bases contabilizadas pelo Caged

Estabelecimentos (2016). Seguimos a mesma nomenclatura e divisões

estabelecidas por aquele autor como forma de facilitar a visualização das

possíveis alterações.

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TABELA 3. ENTIDADES SINDICAIS BANCÁRIAS SEGUNDO SEU PORTE

Grupo de sindicatos por

base sindical

Número de

sindicatos por

grupo 1991

Número de

sindicatos por

grupo 2001

Número de

sindicatos por

grupo 2016

Mega (+34000) 06 01 01

Grandes (10000-33999) 13 09 07

Médios (5000 – 9999) 11 10 06

Pequenos (1000-4999) 75 41 54

Micro (até 1000) 86 144 144

Total de sindicatos 191 205 212

Fonte: Junckes (2004), dados da CAGED Estabelecimentos e CNES/Ministério do Trabalho. Elaboração própria.

Dando sequência a esses dados, pudemos analisar a evolução no

número e tamanho dos sindicatos a partir de 2001 até 2016, o que abrange

todo o período de governos petistas e um ano de governo FHC. Com isso,

temos que o número total de sindicatos avançou de 205 para 212, ou seja,

elevação de 3,4%. Houve alteração, também, no que se refere ao número de

bancários em cada base sindical. De 2001 a 2016, apenas dois segmentos de

sindicatos mantiveram números estáveis: aqueles com menos de mil bancários

na base, em quantidade total de 144 sindicatos nos dois casos, e do mesmo

modo apenas um sindicato continuou com mais de 34 mil bancários na base.

Na faixa que Junckes (2004, p. 179) considerou como “grandes”, isso é, entre

10 mil e 33.999 bancários na base, houve redução de 09 para 07 sindicatos,

assim como sindicatos com base entre 5 mil até 9.999 bancários, cuja redução

foi de 10 para 06 entidades. A elevação aconteceu no número de sindicatos

com base “pequena”, que tinham de mil até 4.999 bancários: em 2001 eram 41

sindicatos nesta faixa, passando para 54 sindicatos no ano de 2016.

Para Junckes (2004), isso indicava uma certa coesão entre as

forças políticas que, ao contrário do que aconteceu no contexto mais amplo,

em que o número de entidades no país saltou de 7612 em 1992 para 11354 em

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2001 68 , conseguiram impedir a multiplicação de sindicatos bancários. A

posição político-ideológica ajuda a entender essa "coesão": a Contec sempre

defendeu a estrutura sindical e, nas vezes em que tentou fundar outros

sindicatos em bases cutistas, teve a iniciativa impedida por estes. De outro

lado, a CUT fez opção de ganhar os sindicatos “por dentro”, isso é, disputando

eleições em entidades já existentes e não criando novas. Por já ser majoritária,

a central não tomou medidas para criar novos sindicatos em bases da Contec.

A criação de sindicatos de trabalhadores no Brasil não teve

expansão significativa no período de 2001 a 2016: ao comparar os dados do

IBGE (2002) com as informações divulgadas pelo Ministério do Trabalho

(2017), existiam no Brasil 11529 sindicatos de trabalhadores no ano de 2016.

Sendo assim, entre 2001 e 2016, houve acréscimo de 175 entidades sindicais,

aumento de cerca de 1,5% do total.

No segmento bancário nota-se a expansão de entidades pequenas,

que cresceram mais de 30% no período, resultado da queda de algumas

entidades que tinham mais de cinco mil bancários, conjugada com o aumento

de bancários na base de entidades que eram consideradas “micro”, ou seja,

com menos de mil bancários. Cerca de sete entidades tiveram aumento de

suas bases e atingiram o patamar de pelo menos mil trabalhadores, mantendo

estável o segmento de baixo, “micro”, enquanto houve redução no segmento

logo acima, de “médios”.

Dentre os grandes sindicatos, nota-se que dois deles desceram o

degrau, passando a se situar entre os médios. Como não houve divulgação do

nome das entidades por Junckes (2004), supõe-se tratar de dois sindicatos

com mais de nove mil bancários, o de Pernambuco, em que surgiram

pequenos sindicatos ligados à Contec em sua base, e o Sindicato dos

Bancários do Pará, que dividiu sua base com o sindicato do Amapá no período.

Esse conjunto de fatores leva a maior concentração de poder nos

grandes sindicatos e no mega sindicato de São Paulo – entidades que, juntas,

têm em suas bases 2/3 dos bancários de todo país, sendo que o Sindicato de

São Paulo já possuía, em 2016, algo em torno de 28% desses trabalhadores. 68 O autor atribuiu essa ampliação à combinação de imposto sindical e liberação no registro de frações das elites sindicais junto ao Ministério do Trabalho.

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As 144 entidades consideradas “micro”, do ponto de vista do tamanho de suas

bases, tinham 11% dos bancários em suas áreas de atuação.

Ainda que não se possa considerar apenas o tamanho da base

como forma de situar a relevância sindical, trata-se de um indicador nos revela

algumas questões interessantes. No contexto bancário, as disputas entre

diferentes forças políticas acontecem, principalmente, nos maiores sindicatos.

Nas bases sindicais menores, as disputas mostram-se reduzidas, seja do

ponto de vista eleitoral, em que, via de regra, inscreve-se apenas uma chapa,

ou mesmo em outras formas de debate, na qual, apresenta-se apenas uma

corrente69.

Assim, retomando o argumento de Junckes (2004), nas demais

entidades, as menores, há certa coesão entre as forças políticas, em que não

se criou praticamente novos sindicatos e a competição entre elas foi pequena.

Nos maiores sindicatos, a disputa deslocou-se da oposição entre Contec e

CUT, que vigorou nos anos 1980 e 1990, para disputas entre CUT e

dissidências da própria CUT, no caso Conlutas, Intersindical e críticos

independentes ou grupos de pequena expressão70. No início dos anos 1990,

chegaram a acontecer disputas entre chapas da própria CUT, prática que a

central, por meio de resolução, impediu, estabelecendo que poderia haver

apenas uma chapa cutista nas eleições.

A CUT continua como majoritária, agregando em torno de 76% dos

bancários do país, que estão em bases de sindicatos filiados à Contraf e/ou à

central. É seguida pelo sindicalismo oficial, que consideramos a soma de todos

filiados à Contec e/ou à NCST e UGT, com cerca de 13% dos bancários; CTB

com 4,8%; Conlutas e Intersindical, com 2,3% cada e Unidade Sindical

(Campinas) com 1,6%. No caso de sindicatos filiados a uma confederação e

central diferente, como por exemplo, os bancários de Ribeirão Preto e de

Naviraí, ambos filiados à Contraf e à UGT, estamos considerando a central em

69 Outros enfrentamentos realizados pelos sindicatos de bancários se referem a algumas disputas com outras categorias pela representatividade de trabalhadores terceirizados ou subcontratados pelos bancos e que executam trabalhos de natureza bancária. Esse tema será melhor abordado no próximo capítulo. 70 Entendimento reforçado pela entrevista com Roberto von der Osten, presidente da Contraf/CUT, em 24/10/2016.

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121

nosso cálculo (UGT), pelo perfil ideológico mais próximo dos sindicatos com

esta central.

Em termos econômicos, para termos uma percepção melhor sobre

o porte de cada entidade, a Contraf recebeu, no ano de 2016, R$ 5.406.323,56

de valores relativos à contribuição sindical71, enquanto a Contec recebeu R$

2.141.144,23. O Sindicato dos Bancários de São Paulo, que é a maior entidade

da categoria, foi o sindicato brasileiro que mais recebeu recursos da

contribuição sindical: R$ 17.995.634,59, sendo que o sindicato costuma

devolver aos seus associados os valores relativos à contribuição sindical. O

segundo maior sindicato, de Brasília, recebeu R$ 5.978.075,49, portanto,

ambas as entidades receberam mais recursos que a confederação nacional e

que todas as federações.

A manutenção do número de sindicatos com pouca variação,

deve-se, assim, à consolidação das forças políticas nas entidades, bem como

na relação entre elas, em que se evita criar sindicatos e abrir disputas por

bases. A competição, quando acontece, tem sido notada nas entidades

sindicais maiores, em suas eleições.

3.3 – As centrais e tendências atuantes no sindicalismo bancário

Apesar da divisão verificada nos governos petistas, a CUT

mantém-se como a maior central sindical do país, representando 30,40% dos

trabalhadores sindicalizados do Brasil (MTE, 2016). Foi a principal central

aliada aos governos do PT. Criada no contexto do novo sindicalismo e da

retomada da democracia, surgiu como resultado político da organização dos

trabalhadores do início dos anos 1980, em confrontação ao sindicalismo oficial

e ao estado antidemocrático. Naquele cenário, ganhou força a defesa da

liberdade sindical, da organização nos locais de trabalho, de um sindicalismo

combativo e por transformações estruturais na sociedade brasileira

(Rodrigues, 1997).

71 Os dados são públicos e disponíveis em:acesso.mte.gov.br/cont_sindical/ arrecadacao-da-contribuicao-sindical-2.htm

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Ainda que não tenha realizado uma ruptura, a CUT posicionava-se

oficialmente contra a estrutura sindical. Além disso, levou novos elementos ao

sindicalismo, canalizando vigor político para o movimento e apoiando

convenção 87 da OIT, da pluralidade sindical. Entretanto, é notório que essa

pauta deixou de ser prioritária desde os anos 1990 e, de certa maneira, a

central se conformou à estrutura. No campo discursivo, rejeita a estrutura

sindical, mas a ação concreta para enfrentá-la é muito tímida, até porque a

estrutura sindical não se limita à contribuição obrigatória. Pontos

fundamentais, como a falta de liberdade sindical para organização por setores

econômicos ou de outras formas que os trabalhadores julguem pertinentes,

não têm recebido a relevância que merecem. A central tem feito movimentos

para adesão de novos sindicatos “por cima”, ou seja, participado da

competição para filiar novas entidades – processo acelerado depois da lei de

reconhecimento das centrais. Ora, a intervenção do Estado, por meio da

concessão de cartas sindicais, da unicidade sindical e da garantia de

contribuições compulsórias, favorece a proliferação de entidades sindicais

pouco representativas junto aos trabalhadores (Boito, 2002). A direção da CUT

passou a discutir a filiação de sindicatos cujos dirigentes não possuíam

qualquer identidade ideológica e política com a central. Isso pode ajudar a

entender porque, ao lançar uma campanha e abaixo-assinado contra o

imposto sindical em 2011, foram módicos o debate e a adesão nas suas

próprias fileiras. Todavia, o principal sindicato dos bancários, o de São Paulo,

devolve sua parte da contribuição sindical, ou “imposto sindical”. A entidade

havia interrompido a cobrança do “imposto sindical” por meio de uma liminar

movida por ela, em 1996, impedindo o desconto dos salários dos trabalhadores

em sua base. Com a revogação da liminar em 2005, o sindicato passou a

realizar, a partir do ano seguinte, um processo de devolução dos valores

mediante solicitação dos trabalhadores.

Como já observamos, o movimento sindical bancário é

hegemonizado pela CUT desde a década de 80. Os anos 1980 foram

marcados pela ascensão dos movimentos de massa, sendo o ano de 1985 um

marco, quando houve a primeira greve nacional desde os anos 1960. Antes da

retomada, as últimas greves gerais da categoria haviam sido em 1946, 1951 e

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1961, as quais fortaleceram a visão da unidade nacional da categoria (Fontes e

Macedo, 2014). Essa hegemonia acontece, em particular, pela sua corrente

majoritária, a Articulação, sobre a qual falaremos no próximo item.

Diferentemente das correntes que romperam com a CUT nos

governos petistas, a CSD, que no PT é majoritariamente ligada à chamada

Democracia Socialista, manteve-se na CUT e adquiriu mais relevância no

cenário interno. Fazia parte, nos anos 80, do movimento “CUT pela base”.

Continua à esquerda e elabora criticamente as posições adotadas pela

Articulação e pelos governos do PT, embora realize composições políticas e

siga como uma força política que pode ser compreendida como apoiadora

crítica da Articulação no campo nacional durante os governos petistas. Seus

membros no PT agregaram-se a outros grupos e passaram a ser parte da

tendência “Mensagem ao partido”

A CSD é uma corrente que tem influência dentro do movimento

nacional, com militantes em diversos sindicatos. Possui hegemonia em

sindicatos importantes como Porto Alegre, Florianópolis e Pará e teve

destacado papel na retomada do sindicalismo bancário a partir do Rio Grande

do Sul. É uma corrente que defende no espaço de ação sindical o fim da

estrutura sindical, avançando para a organização com liberdade sindical.

Portanto, é uma corrente crítica ao corporativismo, aos sindicatos oficiais, à

unicidade e às contribuições compulsórias, que dividem e pulverizam o

sindicalismo brasileiro. Mas, como vimos, essa crítica tem pouca incidência na

prática.

A criação de pequenos sindicatos sem representatividade é

consequência da estrutura sindical. A corrente CSD identifica a resistência dos

sindicatos pelegos; do judiciário, da mídia e dentro da própria CUT que

impedem a ruptura com o modelo sindical corporativo. Entretanto, não há

ações concretas que possibilitem avançar na liberdade sindical, e sim a defesa

dessa posição nos espaços institucionais. A CSD defende em seus

posicionamentos formais pautas e ações unificadas com movimentos sociais e

solidariedade de classe.

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Uma de suas dirigentes reconhece os desafios internos para colocar

em prática as posições defendidas pela corrente:

Mas existe um obstáculo que é interno à nossa Central. Diz respeito à cultura política que se tornou hegemônica do conjunto da nossa militância, que se acomodou à estrutura oficial, como forma de sobreviver a ela. Utilizar as regras do jogo, já que não conseguiam alterá-las. Para superar essa cultura política, será necessário um grande esforço político e pedagógico72.

A CSC, que formou CTB em 2007, uma nova central sindical com

acesso a recursos da contribuição sindical obrigatória, manteve aliança com a

CUT durante os governos petistas, embora tenha adotado em algumas

circunstâncias também pontuais posturas críticas a aspectos da política

majoritária do movimento. Como já mencionado, em nosso entendimento, o

fator determinante para criação da CTB foi a aprovação do reconhecimento

das centrais, pelo governo Lula da Silva, em 2008. A medida permitia a

obtenção de espaço político hegemônico, pois a CSC era a segunda força na

CUT, e uma sustentação econômica da nova central, servindo também aos

interesses do partido que a hegemoniza, o PCdoB. A saída da CSC ampliou

significativamente o espaço proporcional da Articulação na CUT, assim como a

entrada dessa corrente em 1990 (na mesma época que o PCB) havia reduzido

relativamente o tamanho da corrente majoritária no interior da CUT, levando a

um processo de disputa, negociação e composição constantes entre as

correntes para alcançar a hegemonia cutista (Rodrigues, 1997).

A CTB tem influência dentro do movimento sindical bancário,

estando presente em importantes entidades – possui a hegemonia na Bahia e

Sergipe e militantes em diversos sindicatos do país, como em São Paulo, Rio

de Janeiro e Brasília.

Já a criação da Conlutas e da Intersindical é resultado do processo

político de chegada de um partido popular ao poder, em que a expectativa por

72 Consultado em: csd.org.br/csd/noticias/item?item_id=487206,textodeRosaneSilva,SecretáriaNacional sobreaMulherTrabalhadoradaCUT. Consulta realizada em 18/11/2016.

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transformações sociais mais profundas chocou-se com um governo conciliador

e com a lógica do diálogo social, debate apresentado no primeiro capítulo. A

direção majoritária da CUT foi criticada pelas correntes que deram origem a

essas organizações pela moderação política e pelo apoio ao governo, bem

como por participar de espaços de diálogo e conciliação (Galvão, Trópia e

Marcelino, 2015). Conlutas e Intersindical partilhavam o entendimento de que

os governos do PT deram continuidade às medidas iniciadas por FHC e que

faltariam rupturas e reformas estruturais necessárias para um processo de

avanço social mais robusto capaz de transformar o quadro de desigualdade da

sociedade brasileira. Nesse sentido, incitavam a CUT a pressionar o governo

ou a promover o enfrentamento às reformas voltadas ao mercado, como a

reforma da previdência em 2003.

Com fortes ligações com o PSTU, a Conlutas foi criada em 2004

principalmente a partir da corrente sindical MTS (Movimento por uma

tendência socialista), herdeira política da antiga Convergência Socialista.

Outras correntes, que já compunham o PSOL, também contribuíram para a

formação da Conlutas, como o MES (Movimento de Esquerda Socialista), além

de forças como o MAS (movimento de ação sindical) e o MTL (Movimento

Terra, Trabalho e Liberdade) (Galvão, Marcelino e Trópia, 2015). Uma

importante liderança da Conlutas foi o dirigente Dirceu Travesso, de São

Paulo, falecido em 2014, que teve importante atuação sindical e também na

Convergência Socialista, ocupando cargos de direção no sindicato dos

bancários de São Paulo e no PSTU, partido pelo qual disputou diversas

eleições, inclusive para governador. Foi um dos principais nomes a organizar a

oposição à direção hegemônica cutista paulistana.

A posição da Conlutas é contrária e de confrontação à legislação da

estrutura sindical, assim como busca integração com diferentes movimentos

sociais, em defesa de transformações estruturais na sociedade, de viés

socialista. A Conlutas aceita filiação de entidades sindicais e não sindicais,

como movimentos estudantis, de moradia, comunitários, dentre outros. Não é

reconhecida como uma central sindical nos termos da legislação aprovada em

2008, pois não possui os critérios mínimos de representatividade

estabelecidos em lei.

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A Conlutas, que também criou o MNOB (Movimento Nacional de

Oposição Bancária) em 2004, organizou durante alguns anos seu próprio

encontro nacional de bancários para debater os temas e construir uma pauta

de reivindicações da categoria, reunindo os sindicatos de bancários filiados a

ela: Maranhão, Rio Grande do Norte e Bauru, além de oposições sindicais de

outras cidades e regiões. Desse modo, entregou, algumas vezes, minutas de

reivindicações em separado para a Fenaban, BB e CEF, pois seus integrantes

deixaram de participar da conferência nacional dos bancários por um período.

No entanto, continuaram a participar do Congresso Nacional de Funcionários

do Banco do Brasil e do Congresso Nacional de Empregados da Caixa

Econômica Federal, onde apresentaram suas teses. Em 2014, a Conlutas

retomou a participação em fóruns organizados pela Contraf, como a

Conferência Nacional dos Bancários, mas não integra seu comando nacional –

havia sido convidada a participar em 2009, mas não aceitou.

O retorno do MNOB para participar das conferências gerou conflito

dentro da Conlutas, entre os favoráveis e os contrários a essa política.

Membros do movimento criticam os militantes do PSTU por quererem

hegemonizar e definir os rumos da central. Em Bauru, por exemplo, isso levou

a um importante racha na diretoria. O próprio PSTU passou por racha em julho

de 2016, com a criação do MAIS (Movimento por uma Alternativa

Independente e Socialista), formado por militantes com divergências táticas

em relação ao partido73.

Atualmente, a Conlutas tem influência nos locais onde possui o

controle das direções sindicais – Maranhão, Rio Grande do Norte e Bauru –,

reunindo em torno de 10 mil bancários, e em bases nas quais disputa eleições

e organiza oposições. Já teve atuação mais presente em São Paulo, Rio de

Janeiro, Belo Horizonte, e, nos dias atuais, está mais organizada e competitiva

73 O fator central da divisão foi o “Fora Todos” adotado pelo partido no momento em que havia ascensão de movimentos de direita e manifestações nas ruas contra o governo Dilma Rousseff e a esquerda, de forma mais geral e difusa. Embora os membros do MAIS fossem de oposição ao governo do PT – ao mesmo tempo em que eram contrários aos movimentos conservadores –, entendiam que não era adequado apoiar o impeachment, pelo contrário, ele deveria ser denunciado como golpe. Essa posição, contudo, era diferente do PSTU, que analisou a conjuntura como um rearranjo parlamentar da burguesia. Apesar da desfiliação do PSTU e posterior filiação de diversos membros ao PSOL, o MAIS continua a integrar a Conlutas.

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em Brasília, de predominância de bancos públicos. Como discutimos no

capítulo 2, os bancários de instituições financeiras públicas ou de economia

mista, embora sejam celetistas, possuem o que chamamos de virtual

estabilidade no emprego e uma ideologia meritocrática “híbrida” sobre

aspectos da carreira. De modo que é mais fácil encontrar e construir lideranças

em bancos públicos, pois o risco de demissão é menor e o vínculo e

estabilidade no emprego é maior, mesmo quando da composição de chapas

para disputa de eleições. Em todo o Brasil a maioria dos votos obtidos por

chapas lideradas por membros da Conlutas é oriunda de bancos públicos. Em

Brasília, soma-se o fato de ter a alta cúpula e a maioria dos funcionários com

maiores salários de BB e CEF, segmentos que estavam bastante descontentes

com os governos petistas e, consequentemente, com a relação política entre o

sindicato dos bancários de Brasília e o PT.

Em relação à Intersindical, destacamos as conexões de seu

surgimento com a criação do PSOL em 2004, uma ruptura em relação ao

próprio PT, partido com hegemonia na CUT. Foi fundada em 2006 por

entender que a CUT havia perdido sua capacidade de representar os

trabalhadores na perspectiva de um projeto de mudança para o Brasil, pois

estava atrelada ao governo e à defesa das medidas adotadas por ele. A

entidade combate a estrutura sindical e busca articulação junto a movimentos

sociais, entendendo o sindicalismo como parte de um projeto de classe e de

transformação social (Galvão, Marcelino, Trópia, 2015). Ainda assim, a

Intersindical participou de alianças com a Articulação em diversas entidades

sindicais, como destacamos, por exemplo, no sindicato dos bancários de São

Paulo. Sua hegemonia é presente no sindicato dos bancários do Espírito Santo

e no tradicional sindicato dos bancários de Santos.

Quanto aos espaços políticos ocupados por outras forças, temos a

Unidade Sindical de Campinas, que permanece na CUT. No campo partidário,

tal qual o partido que hegemoniza – o PPS –, afastou-se do PT desde o

primeiro mandato de Lula da Silva, adotando um tom mais crítico e assumindo

alianças em projetos liderados pelos conservadores e pelo PSDB, como no

caso do governo estadual em São Paulo. Nos anos 1990 e começo de 2000,

foram comuns disputas entre Articulação e Unidade Sindical, em Campinas,

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bem como em bases da Feeb SP-MS (Federação dos Empregados em

Estabelecimentos Bancários de São Paulo e Mato Grosso do Sul). Entretanto,

a Unidade Sindical se manteve na direção do sindicato e da federação. Depois

desse período, passou a existir uma política que pode ser chamada de

coexistência, um aparente acordo informal no qual as correntes não

disputaram mais nas federações de São Paulo e respeitam mutuamente suas

bases. A Articulação e a Unidade sindical fizeram algumas alianças táticas,

entre elas no interior da CUT, bem como no âmbito da categoria bancária. A

liderança maior desta corrente é David Zaia, que foi presidente dos bancários

de Campinas em três ocasiões e desde os anos 1990 preside a Feeb SP/MS,

na qual seu grupo político possui hegemonia. Além disso, David Zaia é um dos

vice-presidentes da UGT e presidente estadual do PPS. Por contraditório que

pareça, o sindicato de Campinas segue filiado à CUT, embora importantes

lideranças sejam vinculadas à UGT e ao PPS que, de forma geral, é crítico ao

campo político do qual a CUT faz parte. A permanência do único sindicato de

bancários da corrente na CUT pode-se explicar pela tentativa de ocupar

espaços políticos em diferentes posições, desde a UGT e a estrutura oficial até

a CUT, bem como é exemplificativo do enraizamento de dirigentes sindicais

bancários nas estruturas de poder desde entidades oficiais até em espaços do

novo sindicalismo.

3.3.1- A hegemonia da corrente Articulação/CUT

O sindicalismo bancário de São Paulo ocupou lugar relevante no

novo sindicalismo brasileiro, tendo, juntamente com o sindicato dos

metalúrgicos do ABC, liderado diversas ações na construção da CUT. Os

bancários de São Paulo ingressaram no movimento pró-CUT em 1981 e

seguiram a linha de levar ao limite a legislação da estrutura sindical,

confrontando o então sindicalismo oficial liderado pela Contec. Dentre outros

pontos, o sindicalismo de contestação ou confronto, cujo discurso e atuação

política defendia a liberdade sindical, a democracia, as manifestações

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contestatórias contra o governo e os patrões, a organização dos trabalhadores

nos locais de trabalho (Antunes, 1988), algo que não acontecia na categoria

bancária. Muitas das lideranças bancárias das oposições vitoriosas do novo

sindicalismo emergiram de seus locais de trabalho, organizando os

trabalhadores em defesa de direitos e na mobilização nas campanhas salariais

e manifestações, particularmente no Banespa e no Banco do Brasil, inclusive

liderando campanhas salariais quando as direções oficiais se negavam a

encaminhar as lutas e os anseios da categoria, defendendo posições de

colaboração com o Estado e os bancos (Fontes e Macedo, 2014).

O surgimento dessa força política – o Novo Sindicalismo – nos

bancários – ia além do questionamento e enfrentamento de temas relativos à

categoria: era também um movimento de contestação social e de confronto ao

autoritarismo político da ditadura militar, no qual se buscava influenciar

politicamente os rumos da sociedade. Portanto, era um movimento politizado.

Seus militantes, oriundos de movimentos da esquerda, em diversas vertentes,

tinham como objetivo questionar a ordem vigente e o sistema político:

O Sindicato tinha uma diferença em relação aos demais. Era um grupo de pessoas com formação política ou que se destacaram na greve de 1978. Assim, nossas palavras de ordem para disputar as eleições na entidade eram: abaixo à ditadura e pelas liberdades democráticas. Não eram palavras do ambiente sindical, mas que faziam parte do contexto político nacional e que ganhou adesão de vários setores que não eram bancários, mas viam em nós um movimento contrário à ditadura militar. ” (Entrevista de Luiz Gushiken, Folha Bancária especial 3, abril de 2013)

As principais lideranças de São Paulo vincularam-se à Articulação

Sindical. As origens da corrente remontam ao Manifesto dos 11374, realizado

em 1983, no âmbito do Partido dos Trabalhadores75, que definiu a atuação

partidária, ainda bastante fragmentada em que diferentes grupos e correntes

políticas de esquerda que participavam do PT, com visões distintas sobre seu

funcionamento. A ideia principal do documento era fortalecer o PT como

74 A integra do manifesto está nos anexos desta tese. 75 Sobre o período de formação do PT pode-se consultar os trabalhos de Meneguello (1989) e também de Secco (2015).

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partido de massas, instrumento estratégico da luta dos trabalhadores e capaz

de mobilizar e aglutinar as diversas propostas contempladas no lema “terra,

trabalho e liberdade”. O documento combate a tentativa de conciliação e

trégua da ditadura militar, do mesmo modo que a tentativa de pacto social por

setores da oposição que, na visão do manifesto, acabaria por isolar e submeter

os trabalhadores novamente a pagar os custos da dívida econômica e social.

Parece-nos, neste aspecto, que a crítica à trégua e à conciliação, inclusive de

setores oposicionistas ao regime, direcionava-se ao PCB, que no período de

crise da ditadura militar, assumiu uma estratégia diferente, mais moderada,

defensiva e conciliatória, que lhe custou perda de espaços substanciais e

importância entre os trabalhadores (Antunes, 2011). O manifesto apresentava

contraponto a três diferentes vertentes: 1) do PT como frente de oposição

liberal, nos moldes do PMDB, em que o foco era a ação

parlamentar-institucional; 2) o modelo de socialismo sem trabalhadores, como

o PDT; 3) a proposta de um partido vanguardista tradicional, que se proclama

representante da classe trabalhadora. No último caso a crítica era direcionada

a amplos setores trotskistas no partido, pois o documento critica a política de

seguir orientações externas ao PT e, em vez de divulgar as ideias do partido,

priorizavam a divulgação de suas próprias posições.

Um dos eixos de atuação destacado na criação da Articulação do

PT e que é bastante importante para compreensão da atuação sindical na CUT

era a intensa participação nas mobilizações populares, em seus diversos

segmentos, contribuindo para construção de “propostas concretas para suas

lutas, respeitada a sua autonomia” (Tese dos 113, anexo). Em 1987, o primeiro

Encontro Nacional da Articulação Sindical, que a constituiu formalmente,

reuniu as lideranças sindicais consideradas independentes – que eram maioria

– no interior da CUT, ou seja, aqueles que não tinham vinculação com algumas

das correntes que já estavam organizadas, como Convergência, DS

(Democracia Socialista), Força Socialista, entre outras. A maioria dos

independentes que fundaram a Articulação Sindical era militante da

Articulação do PT, de forma que as concepções ideológicas e políticas que

sustentavam a tendência eram compartilhadas e comuns e, ao longo da

história, se transpassaram mutuamente. Segundo os documentos publicados

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pela Articulação Sindical 76 esses dirigentes se “identificavam com a

concepção sindical de construção e fortalecimento da CUT como central

sindical que mobiliza, organiza e dirige as lutas dos trabalhadores, e não

apenas enquanto ‘movimento’” (ver nota 71). O lema era o “sindicalismo de

massa, classista, democrático, autônomo e unitário”.

A Articulação passaria desde então a exercer crescente hegemonia

no âmbito da central e no sindicalismo bancário. Na época, a disputa entre os

bancários se dava principalmente contra o sindicalismo oficial. No caso das

correntes cutistas, foram diversas as composições e rupturas com a

Democracia Socialista e a Convergência Socialista, que eram membros da

CUT, e também com os militantes do PCB e do PCdoB (que viriam a compor a

CSC). Neste período, a disputa entre as correntes em eleições sindicais era

mais comum, bem como rupturas e rearranjos. Ao longo do tempo, é evidente

o declínio do sindicalismo do PCB, que acabou isolado e, atualmente, tem

como último espaço de hegemonia o sindicato dos bancários de Campinas, por

meio da corrente Unidade Sindical. As demais correntes seguem presentes no

debate nacional dos bancários, com formatações diferentes, após três

décadas de dinâmica sindical. A Conlutas é, em grande medida, herdeira da

Convergência Socialista; a Democracia Socialista majoritariamente está

representada na CSD; outras frações da Democracia Socialista e de grupos

menores da esquerda cutista formaram a Intersindical e a CTB sucedeu a

CSC, ligada ao PCdoB.

A Articulação mantém a hegemonia no sindicalismo bancário, com

ampla maioria no âmbito nacional, e está presente em praticamente todos

estados, tendo o controle dos principais sindicatos no Brasil. Desse fato deriva

que as principais decisões da categoria, definições estratégicas e negociações

são politicamente dirigidas pela corrente. Isso não implica em subestimar a

influência de outras tendências dentro das estruturas nacionais da categoria.

As tendências como CSD e CTB, mais próximas politicamente da Articulação;

assim como Intersindical e Conlutas – incluindo o MAIS recentemente –, com

maior viés de oposição à corrente majoritária, conseguem apresentar suas

76 Ver articulacaosindical.com.br/nossa-historia/historia-da-artsind/, consultado em 22/10/2016 e manifesto dos 113, nos anexos desta tese.

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posições e pautas nos espaços de debate e discussão e, diversas vezes,

influenciar nos debates. É possível notar que as posições da Articulação

buscam dialogar com essas outras forças políticas e levar em conta suas

ponderações. Ou seja, as possíveis propostas, divergências ou críticas abrem

processos de diálogo, que podem ou não prosperar. Embora em última

instância, via de regra, a Articulação tenha condição de vencer pelo voto de

delegados, a lógica do “consenso progressivo” que permeia a constituição da

corrente preconiza o caminho do consenso mediante o esgotamento dos

debates e das negociações com as demais propostas antes de uma matéria

ser levada à apreciação do plenário nas conferências e congressos da

categoria. Desse modo, deliberações e resoluções finais, ainda que atendam

aos objetivos iniciais da Articulação, são fruto de negociação e da busca de

conciliação com as demais correntes, em particular aquelas mais propensas à

negociação, como CSD, CTB e Intersindical. É possível verificar essas

negociações durante a realização de congressos e conferências, em que as

votações de propostas, seguidas de destaques e propostas divergentes,

passam sempre por tentativas públicas de conciliação, de forma que possam

atender aos diferentes grupos que divergem.

É possível apontar três elementos centrais que permitiram a

hegemonia da Articulação no sindicalismo bancário brasileiro: sua hegemonia

no sindicato dos bancários de São Paulo; a política e diálogo com as bases e a

representatividade nacional dentro da CUT.

A hegemonia no sindicato dos bancários de São Paulo foi

fundamental por ser o maior do país, exercendo, portanto, um papel

imprescindível na condução dos debates nacionais da categoria. O sindicato

dos bancários de São Paulo é uma entidade robusta e com grande capacidade

e recursos para apoiar chapas de seu campo em disputas locais e regionais,

seja no interior do estado ou em outros estados do país. Sua relevância no

enfrentamento aos bancos se deve também à presença de sedes de

importantes instituições financeiras na capital e região metropolitana de São

Paulo, como Itaú, Bradesco, Banespa (Santander), Unibanco.

O controle da maior entidade sindical bancária brasileira garantiu

vantagem à Articulação Sindical no embate com as outras correntes, inclusive

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na composição de estruturas de caráter nacional, como a criação do DNB, em

que os paulistas sempre tiveram hegemonia. A Articulação cresceu entre

outros setores da CUT e as principais lideranças do novo sindicalismo,

anteriormente independentes, tornaram-se ligadas a ela, dentre as quais o

próprio Lula da Silva. Isso permitiu alavancar a atuação da corrente para todo o

país, ganhando gradativamente mais espaço e reduzindo o peso das outras

correntes.

Mas a forma como construiu suas propostas e como dialogou com a

base de bancários é outro fator que contribuiu para a tendência ampliar

gradativamente sua presença nas direções sindicais. Sua formação mais

heterogênea permitiu-lhe envolver lideranças de diferentes origens políticas de

esquerda, algo que possibilitou ajustar suas estratégias de forma menos

engessada ideologicamente. A nosso ver, tanto a postura passiva dos

sindicatos oficiais quanto as atitudes excessivamente moderadas do PCB e

PCdoB frente ao espaço aberto pela redemocratização e, por outro lado, o

radicalismo de Democracia Socialista e Convergência Socialista, que

defendiam a CUT como movimento e mais ampla que uma instituição “central

sindical” (Rodrigues, 1997), abriram espaço para a Articulação construir um

caminho de diálogo com a base de bancários. Embora a Convergência e a DS

tenham alcançado importante presença nas bases, tinham discursos e

apontavam para práticas mais disruptivas, o que gerava certa rejeição por

parte de uma categoria de perfil de classe média, mais propensa ao

comedimento.

Assim, a adoção de uma postura favorável à negociação e, ao

mesmo tempo, a mobilização nos locais de trabalho, possibilitou à Articulação

aproximar-se da base de bancários, promovendo lutas salariais e políticas sem

associá-las a uma perspectiva de vanguarda revolucionária. A tese defendida

no 3º Concut (Congresso Nacional da CUT) "A defesa de um sindicalismo de

classe" 77 , sinaliza nessa direção. Esse congresso também ampliou a

77 Trata-se de tese apresentada pela Articulação no 3° Congresso Nacional da CUT, em 1988, realizado na cidade de Belo Horizonte, em que a tendência apresenta um programa mais claro de atuação que baliza suas ações. A tese afirma a CUT como instrumento de classe, de massa, democrático e formado pelas bases. Reafirma uma linha de maior caráter de negociação, dentro dos marcos do capitalismo, porém com

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importância das direções em relação às bases, o que é considerado um fator

de burocratização da corrente e da CUT, tornando suas decisões menos

participativas e mais centradas no papel das cúpulas. Essas deliberações

passaram a priorizar o caráter propositivo da central, reduzindo o confronto

(Galvão, 2004). A participação em espaços de diálogo, como o “Entendimento

Nacional” chamado pelo governo Collor, e as câmaras setoriais, eram a

expressão desse modelo de sindicalismo (idem). Essas decisões, no entanto,

não foram pacíficas, tendo sido duramente criticadas e combatidas no interior

da central por outras tendências. As disputas no interior da CUT tornam-se

mais acentuadas, tendo como evidência o 4° Concut realizado em 1991,

marcado por fortes discussões de posições e vitória apertada da chapa da

Articulação frente às demais forças, cujo principal grupo era a “CUT pela base”.

O congresso marcou a entrada na central de membros do PCdoB (pela

corrente CSC) e do PCB, que não participaram da fundação da central oito

anos antes. A entrada dessas novas forças políticas favoreceu a Articulação,

que constituiu novas alianças com esses setores, permitindo-lhe reequilibrar a

disputa com outras forças cutistas e consolidar sua posição hegemônica.

Essas novas alianças interferem no sindicalismo bancário, passando a existir

acordos para evitar algumas disputas entre a Articulação e as correntes

ligadas ao PCdoB e PCB.

Nos anos 1990, essa perspectiva propositiva se consolidou,

favorecendo a concepção de sindicato cidadão78, que amplia a atuação do

objetivo de construção do socialismo mediante a mobilização e organização dos trabalhadores em seus sindicatos. 78 A perspectiva defendida neste trabalho é de que a concepção de sindicato cidadão não possui uma visão classista no sentido de enfrentamento da ordem social, porém tampouco é restrita ao assistencialismo e ao oferecimento de serviços. Ele reforça as instituições mediadoras do conflito social, pois incorpora nas ações sindicais um forte viés institucional, de participação nas esferas públicas e no aparelho estatal por meio da negociação e da proposição. A preocupação do sindicato cidadão é mais abrangente do que apenas a categoria profissional. Essa concepção, no entanto, possui dificuldades em articular duas frentes: uma mais ampla, buscando o diálogo na sociedade, e outra voltada às reivindicações trabalhistas. Portanto, ora ele se propõe a se legitimar na sociedade como ator no processo de debate social, porém sem conseguir mobilizar suas bases, ora ele fica restrito aos temas da categoria durante as campanhas salariais, sem conseguir apoio da sociedade e sem conseguir efetivamente transmitir a importância de as duas dimensões caminharem juntas. Isso se nota no sindicalismo bancário, em que muitas das ações e das articulações com o movimento social e popular não são acompanhadas pelo apoio da categoria; assim

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sindicato, com viés de negociação e proposição, para além dos interesses

corporativos, dialogando com outros temas sociais, que causam problemas

para a vida do trabalhador como economia, política, emprego, transporte,

saúde, entre outros. Desse modo, o sindicato torna-se, cada vez mais, um

espaço de discussão política e cidadã (Rodrigues, 1997), reforçando uma

prática mais integrada com diferentes movimentos sociais. Essa concepção

ainda é predominante nos anos 2000, como expressa a presidenta do

Sindicato dos Bancários de São Paulo Juvândia Moreira:

O que mais incomoda o trabalhador na cidade de São Paulo? O tempo que gasta para se deslocar de casa para o trabalho, os temas relacionados à saúde, educação, segurança, a coleta e tratamento do lixo? Questões que impactam na qualidade de vida dos trabalhadores são abordadas (...) São questões que afetam a qualidade de vida dos bancários e de seus familiares e que são tratadas como prioridade pelo Sindicato Cidadão, que se preocupa com o trabalhador como um todo. (spbancarios.com.br/Pagina.aspx?id=307, consulta em 04/11/16)

Essa visão de sindicato cidadão é criticada por alguns autores, para

os quais o sindicato passaria a assumir atribuições caberiam ao Estado,

esvaziando, desse modo, a perspectiva de defesa de direitos, numa

concepção de cidadania sem críticas aos seus limites, vista como simples

status de direito. Um dos exemplos mais reforçados são os cursos oferecidos

pelos sindicatos a seus associados e à sociedade, como forma de prestação

de serviços. Com a crescente demanda por maior formação dos bancários, os

sindicatos passaram a ofertar, dentre seus atrativos, cursos para diversos

temas e certificações exigidos pelos bancos. Para Galvão e Varela, o alcance

dos serviços é ainda maior:

Ambas as centrais [refere-se à Força e CUT] convergiram na defesa de um ‘sindicalismo cidadão’, passando a atuar como agências de emprego e a oferecer qualificação profissional aos desempregados, mas também outros ‘serviços’, como seguros de vida, cartões de crédito, empréstimos bancários a taxas de juros inferiores às praticadas pelo ‘mercado’ e fundos de pensão. (Galvão e Varela, 2011, p.253)

como muitas lutas em defesa do interesse da categoria não ganham apoio popular, às vezes até atraem a rejeição, como nas greves, embora se busque construir laços por meio do descontentamento partilhado em relação aos bancos. O primeiro documento oficial da CUT que utiliza a expressão “cidadania” é o das resoluções da 5ª plenária nacional da CUT, de julho de 1992.

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Essa visão pode ser corroborada, por exemplo, pela criação, por

parte do sindicato dos bancários de São Paulo, da Bancredi (cooperativa de

crédito dos bancários) e pela Bancoop (cooperativa habitacional dos

bancários).

Entretanto, não nos parece que, ao assumir essas tarefas, o

sindicato se limita a desempenhar um papel de agência de empregos e

serviços. O sindicato cidadão tem uma concepção política mais abrangente,

com o propósito de interferir nas políticas públicas e nos debates políticos da

sociedade. Para isso, costuma mobilizar sua estrutura para participar de

conselhos municipais, comissões de emprego, dar suporte a manifestações e

mobilizações populares e debater com a categoria programas eleitorais, assim

como os diretores costumam apoiar candidatos em eleições proporcionais e

majoritárias. Mantém, outrossim, boa relação com movimentos sociais e

populares, como de moradia, comunitário, catadores de recicláveis, moradores

de rua. Os projetos mantidos pela entidade como Projeto Travessia, CineB,

dentre outros (Colombi, 2014) expressam uma perspectiva de integração e

diálogo bem mais politizada, que extrapola o mero oferecimento de serviços.

Embora, de fato, não se proponha a uma crítica mais complexa ou refletida

quanto aos limites da noção de cidadania. Retomaremos essa discussão no

capítulo 4.

São notórios os esforços de sindicatos da Articulação para difundir

suas pautas políticas para a sociedade e a categoria. Para tanto, lançou mão

de recursos na criação do canal de televisão TVT, em parceria com o sindicato

dos metalúrgicos do ABC, da Rede Brasil Atual e de seus informativos de

comunicação para defender a visão de sociedade daquilo que é denominado

“campo democrático e popular”. Os informativos usualmente debatem temas

de política e economia do cenário nacional e a defesa de seu projeto político.

Por outro lado, há uma política de aproximar-se da categoria através de

diversos tipos de cursos, atendimentos, assistências e convênios com

empresas, faculdades, que permitem descontos na aquisição de serviços e

produtos para quem for associado. Em nosso entendimento, trata-se de uma

forma de atingir uma fatia maior de trabalhadores que, embora não

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convencidos da importância do sindicato pelo viés da luta e organização

coletiva, pode aproximar-se pelo oferecimento de benefícios, para, a partir daí,

se engajar politicamente. Não deixa de ser uma implicação da lógica pessoal e

individual na ação sindical, pois busca adequar o sindicato a certo tipo de

demanda da categoria, sendo uma opção utilitarista para contemplar aquele

trabalhador que está mais preocupado com suas questões individuais do que

com a luta coletiva. Isso é feito como uma tentativa de aproximar-se do

trabalhador e buscar, com o tempo e a formação política, convencê-lo da

importância da entidade e do engajamento coletivo. Quando não há

politização, essas filiações podem limitar a atuação sindical, como de fato

acontece. Não é raro, entre os bancários, uma visão comercial do sindicato,

visto como prestador de serviços, inclusive de serviços de mobilização quando

necessárias.

De todo modo, nos anos 1990, em que já havia se consolidado

como maior força política, a Articulação passa a ter uma atuação mais

moderada (Araújo e Véras de Oliveira, 2014), através da ampliação da noção

de proposição e de negociação. A essa altura, o sindicalismo da Articulação

também havia obtido espaços sociais significativos, com representantes na

vida parlamentar e política de cidades, Estados e no Congresso Nacional.

Citemos, no caso dos bancários, a presença de Luiz Gushiken; bem como do

próprio ex-presidente da CUT, Vicentinho, oriundo do sindicato dos

metalúrgicos do ABC – ambos representantes na Câmara dos Deputados.

Questionamos os dirigentes sindicais entrevistados sobre a

hegemonia da Articulação, buscando obter uma avaliação de quem militava

desde os anos 1980 e vivenciou o processo de construção da hegemonia

dessa corrente. Dois dirigentes, Gilmar Carneiro 79 e Edson Silva (Índio),

apresentaram, dentre outros motivos, uma explicação que pode ter afetado as

forças políticas mais à esquerda: a privatização de bancos públicos estaduais.

Como mencionado anteriormente, é notória a presença mais robusta de

militantes das correntes minoritárias de esquerda em bancos públicos. Essa

realidade já acontecia nos anos 90 e, portanto, o processo de privatização e

demissão de trabalhadores dos bancos públicos estaduais atingiu mais

79 Entrevista realizada pelo autor em 10/11/2015.

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fortemente essas forças, o que, de certo modo, favoreceu a hegemonia da

Articulação.

Edson Silva (Índio), militante da Intersindical, considera que as

forças de esquerda cometeram seus erros: “Por outro lado, esses setores

também se fragmentaram mais politicamente”80.

Com a vitória de Lula da Silva nas eleições presidenciais de 2002,

diversos dirigentes sindicais da Articulação Bancária foram nomeados em

cargos no governo federal, do primeiro e segundo escalões. É o caso de

Ricardo Berzoini, que havia sido presidente do sindicato dos bancários de São

Paulo (1993-1998) e deputado federal (1999-2014), e foi nomeado como

ministro da Previdência (2003-2004) e, posteriormente, do Trabalho (2004 e

2005), além de ter sido ministro das Relações Institucionais (2014), das

Comunicações (2015) e da secretaria de Governo (2015 e 2016) já nos

governos Dilma Rousseff. É também o caso do já citado Luiz Gushiken, que se

tornou ministro da Comunicação Social (2003 a 2005). A relação política entre

a corrente e o governo federal foi bastante próxima, implicando na referida

ambiguidade na dinâmica interna da tendência e da própria CUT (Fontes e

Macedo, 2014) e despertando as críticas e rupturas que mencionamos no

primeiro capítulo.

As críticas à atuação da CUT envolvem ainda um outro aspecto: a

burocratização. Soares (2016) considera fundamental analisar as políticas

adotadas pela Articulação e pelo sindicalismo bancário, em particular, sob

esse prisma. Cada vez mais o poder passou a ser centralizado na cúpula e

houve uma concentração de poder nos dirigentes sindicais da Articulação que

passaram a determinar os rumos da categoria. A menor participação de

militantes de bases nos congressos, desde o 4° congresso, privilegiava uma

noção de sindicalismo cujas decisões foram tomadas de forma constante pelas

cúpulas sindicais. A Articulação passou a desempenhar um sindicalismo

pragmático, voltado a ganhos graduais por meio da negociação. Segundo o

autor, trata-se da mesma lógica que se “acomodou ao governo por considerar

a disputa pela gestão do Estado a melhor estratégia política disponível”

80 Entrevista realizada pelo autor em 09/11/2016.

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(Soares, 2016, p. 513). Essa é, de certa forma, a crítica feita pela corrente

“EnFrente/CUT” que recentemente rompeu com a Articulação no sindicalismo

bancário: a ideia de que a Articulação dominada especialmente pelos

bancários de São Paulo levou o movimento para um processo de

burocratização em que as decisões são tomadas por poucos. Trataremos mais

de perto da questão da relação com o governo a seguir.

3.3.2 – Legitimidade social do sindicalismo bancário

A legitimidade, pensada em termos políticos, geralmente diz

respeito à relação entre Estado e a população. Para que se torne legítimo aos

olhos da população e, portanto, para ser justificável, tanto do ponto de vista de

sua existência quanto do exercício do poder, o Estado precisa obter um

consenso social. Esse consenso garante seu reconhecimento e,

especialmente, a obediência, sem a necessidade do uso recorrente da

violência, mas que deve se transformar em adesão para consolidar a

legitimidade das ações e decisões estatais (Bobbio et.al. 2000).

A busca pela legitimidade também perpassa a atuação de outras

entidades, como as sindicais, que dependem de mobilização e de força

política, isso é, de condições concretas para realizar suas atividades e

disputar, com os patrões, temas de seu interesse na sociedade. Junckes

(2004) aponta que o sindicalismo bancário buscou reconhecimento nas

esferas de governo, entre os capitalistas e na sociedade como forma de

compensar o “esgotamento do reconhecimento interno e do poder de atuação

obtidos através da ação direta ou da ameaça de promover mobilizações contra

as posturas patronais” (Pág. 261). Mas essa análise não consegue explicar

que as iniciativas adotadas pelo sindicalismo bancário em busca do diálogo

com a sociedade são anteriores ao seu enfraquecimento interno, no cenário de

transformações e demissões dos anos 1990.

Nos anos 1980, a oposição dos sindicatos era mais direcionada ao

governo autoritário. Com o processo de construção democrática, o foco

continuou no governo, mas ao mesmo tempo os bancários passaram a

trabalhar publicizar suas críticas aos bancos. A categoria bancária lida com

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atendimento direto ao público, com contato permanente com a população e

com um tema sempre em competição, que é a mercadoria-dinheiro. Além

disso, a imagem social dos bancos historicamente não é boa, ligada aos lucros

excessivos e, sobretudo no Brasil, à alta cobrança de juros e taxas de seus

clientes. Trata-se de uma relação contínua entre trabalhadores bancários,

população e bancos. As possibilidades de ação direta tornaram-se mais

restritas nos anos 1990, devido ao avanço da tecnologia e aos canais de

atendimento alternativos, à crise econômica e ao desemprego, de modo que a

estratégia de desgastar a imagem dos bancos foi reforçada. A crítica ao

governo FHC era também a crítica aos banqueiros, maiores beneficiários de

programas com recursos públicos, como o PROER.

O sindicalismo bancário manteve a postura de buscar legitimidade

social ao apontar para problemas e reclamações dos clientes, como as altas

taxas de juros cobrados pelas instituições financeiras, altas tarifas de

prestação de serviço, a qualidade do atendimento e o papel social que os

bancos não cumprem. Assim, o objetivo é situar politicamente, sindicato e

sociedade (inclusive empresários) em um mesmo lado, em oposição ao

poderio dos bancos, do outro lado, beneficiados pelas políticas estatais. Essa

é uma tática que continua presente no movimento bancário, ou seja, atingir a

imagem dos bancos. Isso fica mais evidente num contexto de novas

tecnologias, em que as greves deixam de paralisar todas as atividades dos

bancos, como vimos anteriormente. Dessa forma, ataca-se a imagem dos

bancos, buscando legitimidade junto à sociedade pela crítica comum ao papel

considerado parasitário desempenhado pelo sistema financeiro.

A partir da imagem negativa que os bancos possuem perante a

sociedade, geralmente vistos como usurários, o debate incentiva o apoio da

sociedade às lutas sindicais e às reivindicações dos trabalhadores,

prejudicados pela mesma lógica. Sob essa ótica, a sociedade e os

trabalhadores bancários são vítimas da política de lucros das empresas, que

tanto exploram trabalhadores quanto prejudicam a sociedade, inclusive para

influenciar as decisões na esfera pública.

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Nos anos 1980, o sindicalismo bancário recebeu forte apoio social,

pois conseguiu conectar-se, assim como o novo sindicalismo, aos valores,

ideias e concepções presentes em grande parte dos trabalhadores brasileiros,

que tinham a expectativa da abertura política da sociedade brasileira, da

consolidação de direitos sociais, de melhorias na qualidade de vida e no

combate à crise econômica e à dependência brasileira do exterior. Desse

modo, sem dúvida, há uma mudança no sindicalismo brasileiro, em particular

referindo-se aos bancários, ao longo dos anos 1990, no enfrentamento de forte

inflexão no emprego e nos direitos trabalhistas. Mas essa mudança se situa

num conjunto de transformações da sociedade brasileira e mundial.

Harvey (2006) havia destacado o individualismo competitivo como

valor central, ambientado na economia de acumulação flexível e na cultura de

empreendedorismo, que permeia não apenas a economia, mas também outras

dimensões da vida. Thébaud-Mony e Druck (2007) destacam a flexibilização, a

volatilidade, a imprevisibilidade, os riscos e outros aspectos da lógica

financeira que atravessa a sociedade, inclusive – e principalmente – o

trabalho. Portanto, do mesmo modo que faz em outros países, o

neoliberalismo chega ao Brasil a partir do início da década de 1990 operando

mudanças na economia, na ideologia, na cultura, e em esferas da vida pública

e da concepção privada. Nota-se o caráter de “inevitável” (Galvão, 2003;

Dedecca, 2003) que essas medidas neoliberais alcançam, tidas pelos seus

defensores como opções únicas e imprescindíveis para combater a

desigualdade e a pobreza de países como o Brasil, ao integrá-lo à globalização

do capitalismo mundial. As desregulamentações monetária e financeira

ganham espaços substanciais tanto na disputa ideológica na sociedade – com

sua defesa pela mídia e em centros universitários e de produção do

pensamento, quanto na realidade concreta, por meio de medidas

governamentais para reorientar o papel do Estado e o funcionamento da

economia (Chesnais, 1998).

Isso posto, a legitimidade social construída pelo sindicalismo

bancário, que canaliza valores e expectativas da sociedade brasileira nos anos

1980, muda de maneira significativa para obter mais capacidade de luta e

apoio social. Nesse sentido, busca formas diferentes de resistir ao forte avanço

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de um conjunto formado por governo, empresas e bancos para, assim, garantir

sua existência. Os valores dominantes, num cenário de refluxo das lutas

sociais dos anos 1980, atingem também a categoria bancária, acuada pelo

forte desemprego e ideologicamente influenciada pelas novas políticas de

contratação e remuneração dos bancos. Tratava-se de um desafio interno,

para os sindicatos mobilizarem a categoria, e um desafio externo, de obter

força e apoio social no enfrentamento aos bancos e às diversas flexibilizações

de direitos sociais e trabalhistas. Desafios similares aos enfrentados por

diversas categorias, com suas particularidades de bases sociais. Entendemos

que na classe média essas noções neoliberais tiveram impacto mais

significativo, pelo próprio perfil de formação social desses trabalhadores,

fundamentalmente o individualismo.

Nesse sentido, a busca por legitimidade social, que já existia, é

inserida num cenário novo nos anos 1990, com sérias dificuldades políticas,

econômicas e ideológicas, resultantes da forte ofensiva neoliberal. Como

apontado anteriormente, a CUT, hegemonizada pela Articulação, passa, nesse

período, por um processo de moderação política, por uma perspectiva de

negociação e pela adoção de um sindicalismo com menor confrontação em

relação à década anterior (Galvão, 2003). Esse processo é mediado

internamente pela concepção da corrente majoritária e condicionado pela

conjuntura a ser enfrentada, em que a capacidade de mobilização e ação

direta dos movimentos populares no Brasil e no mundo estavam em declínio.

Tanto a CUT quanto o sindicalismo bancário buscaram, em nossa concepção,

associar-se ao movimento social, em particular ao MST e a movimentos de

moradia, e realizar atividades de enfrentamento, direcionados ao governo,

bancos e latifundiários. Sem dúvida, num contexto em que o apoio social era

bastante reduzido em relação ao período anterior.

A legitimidade social, capacidade de organização e mobilização dos

bancários mantiveram-se como referência de luta para as demais categorias

de trabalhadores, embora estabelecidos em outro patamar. A partir dos anos

2000, com a chegada de Lula da Silva ao governo central, os bancários

ampliaram as possibilidades de articulação política. Muitas lideranças sindicais

e bancárias assumiram funções no governo federal e elegeram-se em

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diferentes níveis. Entendemos que os bancários mantiveram uma postura de

disputa de espaços na sociedade – fortalecida na concepção de sindicato

cidadão –, sejam eles em conselhos municipais, cargos legislativos ou

executivos, incluindo-se as disputas corporativas, para representantes eleitos

pelos trabalhadores nas direções das empresas públicas, nos cargos de

direção e conselho eleitos nos fundos de pensão e nas caixas de assistência

de saúde dos bancos públicos. Fazia e faz parte de uma postura dos bancários

cutistas a disputa por espaços e fortalecimento do poder sindical da categoria,

mas ressaltemos que muito vinculados à esfera institucional e gradativamente

mais desconectados de mobilizações populares. Destaca-se esse caráter de

disputa de espaço na própria tendência majoritária, inclusive no interior da

CUT. Nas eleições de 1997 para o comando da central os bancários,

particularmente de São Paulo, até o último momento enfrentaram os

metalúrgicos, que na época conseguiram reeleger Vicentinho, ex-presidente

do Sindicato dos metalúrgicos do ABC.

O acesso a espaços de poder serve tanto para representar

demandas da categoria em outros espaços quanto para fortalecer a

legitimidade social de uma categoria organizada e que deseja se mostrar em

condições de realizar lutas em diferentes arenas políticas, propondo regras e

influências que levam a relação capital e trabalho para outros locais. Nesse

sentido, a legitimidade da categoria, aos olhos das mídias, governos e

sociedade, como capaz de se articular em diferentes frentes, permanece. O

sindicalismo bancário continua sendo visto como um dos mais significativos do

país e esse esforço tende a se manter, dentro da CUT, do PT, com os

movimentos sociais, nos espaços de poder, com uma prática mais propositiva,

conformada à estrutura sindical e aos limites políticos do neoliberalismo.

O sindicalismo bancário, em nova conjuntura política nos anos

2000, conseguiu mostrar poder de ação direta contra a exploração do trabalho,

com realização de diversas atividades e greves, que asseguraram a

manutenção da CCT da categoria entre as melhores do Brasil. Por outro lado,

os bancários, mesmo com a mudança no ambiente político do país, com a

chegada de Lula da Silva e a melhora na situação econômica, mantiveram uma

postura de menos confrontos, mais corporativista e voltada aos temas da

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categoria, com forte ação institucional. Portanto, menos propensa a propor

rupturas da ordem vigente e das regras políticas.

3.4 – Desafios à representação sindical

A categoria bancária passou, principalmente nos anos 1990, por

forte redução no número de trabalhadores contratados diretamente pelos

bancos. O processo pode ser entendido por dois movimentos que

aconteceram de forma concomitante: a adoção de novas tecnologias – através

da informática e do uso das telecomunicações nos sistemas – e a introdução

de novas técnicas de gerenciamento, contratação e remuneração, com

medidas para alterar a forma de atuação dos trabalhadores e um novo

processo de organização da força de trabalho, que incluiu a terceirização

(Jinkings, 2002).

Com a ampliação das formas atípicas de contratação no mercado

de trabalho e, particularmente no setor bancário, cresceu a percepção, nas

direções sindicais, da importância de o sindicato representar todos os

trabalhadores envolvidos no processo de intermediação financeira e de

rentabilização das instituições financeiras. A terceirização tornou-se o principal

mecanismo dos bancos reduzirem custos e isentarem-se de responsabilidades

legais quanto ao pagamento de direitos trabalhistas (Thébaud-Mony e Druck,

2007). Assim, diversas empresas passaram a trabalhar para os bancos,

empregando trabalhadores com remuneração e direitos inferiores aos dos

trabalhadores bancários, contratados diretamente pelas instituições e com

cobertura pela CCT da categoria.

Isso trouxe desafios para a organização e representação sindical

dos bancários, como veremos a seguir.

3.4.1 - Terceirizações, tecnologia e novos desafios nas relações de trabalho

Os correspondentes bancários são uma aposta importante dos

bancos para ampliar a presença de serviços bancários e financeiros em

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diversos municípios do país. O número de correspondentes superou

largamente o de agências durante o período. Seu marco regulatório atual é a

resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) 3.954/2011, que englobou a

legislação sobre o tema. Essa resolução foi parcialmente alterada por outras

sete resoluções, todas ampliando as possibilidades de serviços e as condições

de funcionamento, além de regular a remuneração por serviços prestados e

captação de negócios. Desde a criação dos correspondentes como

prestadores de serviços às instituições financeiras, pela resolução 2.166/1995,

houve diversas alterações, principalmente a resolução 3.110/2003, sempre no

sentido de facilitar a contratação e a expansão da prestação de serviços

(Malerba, 2011).

Entre 2007 e 2016, o número de correspondentes passou por

expansão até atingir o auge em 2013, com quase 230 mil estabelecimentos

prestando serviços aos bancos. São supermercados, farmácias, padarias e,

principalmente, os Correios, com contrato com o Banco do Brasil – chamado

de banco postal81 – e as casas lotéricas, contratadas pela Caixa Econômica

Federal, que realizam transações financeiras online, conectadas ao sistema

bancário. Torna-se evidente a política do governo federal e dos bancos, na era

PT, em expandir a lógica dos correspondentes e as instituições públicas

federais serem duas das principais contratantes. No gráfico abaixo é possível

notar o avanço tanto no número de correspondentes até 2013 quanto no de

agências, até 2014, regredindo no biênio 2015 e 2016. Segundo o Banco

Central do Brasil (2016), a redução verificada entre 2013 e 2014, no caso dos

correspondentes, deve-se, ao processo de recadastramento dos prestadores

de serviços.

81 Até 2012, o contrato de prestação de serviços da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBC), como correspondente bancário era com o Bradesco. O Banco do Brasil venceu a licitação e passou a explorar esse serviço desde então, tendo renovado o contrato.

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GRÁFICO 16. NÚMERO DE AGÊNCIAS BANCÁRIAS E

CORRESPONDENTES BANCÁRIOS (2007-2016)

FONTE: BANCO CENTRAL DO BRASIL (2016) BCB.GOV.BR SGS - SISTEMA GERENCIADOR

DE SÉRIES TEMPORAIS - V2.1

No que concerne ao número de transações financeiras, os

correspondentes tinham 125 milhões no ano de 2003, o que representava

0,6% do total realizado no Sistema Financeiro Nacional. Em 2007, já eram

4,7% do total de transações, avançando para 5,2% em 2010, reduzindo para

cerca de 4% entre os anos de 2011 e 2012, retrocedendo para 3,2% em 2013,

até inverter a trajetória em 2014 com 4,7%, 2015 com 5,7% e 2016 com 7,8%.

Esse último é o maior percentual já registrado na história, representando 5,1

bilhões de transações realizadas. Não deixa de ser uma contradição intrigante

o papel desempenhado pelos bancos públicos e pelo governo federal, que

ampliaram a contratação de trabalhadores nas agências e, ao mesmo tempo,

contribuíram com a expansão dos correspondentes bancários, que se utilizam

de trabalhadores em condições e direitos rebaixados em relação aos

bancários.

Ao ser questionado sobre a importância e o impacto dos

correspondentes bancários, Roberto von der Osten, presidente da Contraf,

entende que eles estão em queda, não sendo em 2016 um grande desafio aos

trabalhadores bancários. Para ele “os proprietários [comerciantes] não querem

mais prestar serviços como correspondentes, não compensa

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financeiramente” 82 . No entanto, nesse aspecto, parece-nos que os

correspondentes se mantêm como opção viável e bastante utilizada ainda

pelos bancos, sendo difícil o prognóstico sobre sua obsolência no futuro

próximo.

Outro elemento importante a ser considerado é o papel da

tecnologia, que não foi integrada à rotina do trabalhador bancário subitamente.

Desde os anos 1970, equipamentos eletrônicos e mecânicos começaram a

fazer parte do cotidiano nos bancos, com o objetivo de automatizar processos

anteriormente manuais. Nesse sentido, não apenas a relação de trabalho do

empregado passou a ser mediada, progressivamente, pelas máquinas, como a

relação entre cliente e banco tornou-se integrada pela tecnologia no

processamento de dados e informações (Jinkings, 2002). Uma das primeiras

alterações mais perceptíveis aos clientes e usuários do serviço bancário foi a

colocação de ATMs (terminais de caixas eletrônicos, da sigla em inglês).

Atividades conhecidas por operacionais, como atendimento de

caixas, tesouraria, retaguarda e compensação nas agências bancárias, bem

como nas áreas intermediárias, em que não há atendimento diretamente ao

público, foram as primeiras atingidas pelo processo de inclusão da tecnologia.

Procedimentos foram simplificados e permitiram economia de recursos aos

bancos num processo constante de diminuição de gastos com pessoal e

elevação dos investimentos voltados à informatização e segurança da

informação. De acordo com relatório da Febraban, os bancos investiram R$

18,6 bilhões apenas no ano de 2016 em tecnologia. Desse montante, 45%

foram utilizados em softwares, 35% em equipamentos (hardwares) e 19% em

telecomunicações. Segundo a entidade, os bancos representaram 13% do

total investido em tecnologia no país em 2015 e 14% em 2016, atrás apenas do

governo83.

O processo foi e continua acelerado por meio da popularização da

internet, microcomputadores e notebooks e, mais recentemente, pela

utilização massiva de celulares smartphones. Os bancos seguem investindo

cifras expressivas em novos procedimentos tecnológicos:

82 Entrevista realizada pelo autor em 24/10/2016. 83 Disponível em: goo.gl/hp98z6, consultado em 13/01/2017.

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Esse crescimento de utilização só é possível porque um longo caminho – envolto em segurança e com foco no desenvolvimento dos sistemas mais inovadores – ganhou corpo nos últimos anos. Os 17 bancos representados neste estudo demonstraram ter consciência da necessidade da evolução e criação de padrões disruptivos, questões que o setor endereça e avança dia a dia com novas soluções e serviços. (Febraban, 2017)84

Os bancos continuam a investir em pesquisa e desenvolvimento na

área de tecnologia da informação como forma de tornar mais amplo o acesso

aos seus produtos e serviços com custos cada vez menores. No gráfico

abaixo, produzido pela Febraban (2017) em sua pesquisa anual, podemos ver

o percentual de cada tipo de canal nas transações financeiras. Houve avanço

significativo nos serviços financeiros dos bancos realizados pelo mobile

banking (pelo celular), que se tornou, em 2016, o meio mais utilizado, saindo

de 100 milhões de transações em 2011 para 21,9 bilhões em 2016. Em termos

percentuais, representou 34% das transações, seguido pela internet e caixas

eletrônicos.

84 Os chamados “padrões disruptivos” são utilizados pelos profissionais de Tecnologia da Informação (TI) e pelos bancos como sinônimos de padrões revolucionários. São inovações que superam os padrões vigentes por meio de ruptura, não de evolução de uma mesma lógica de processamento. São novas técnicas que promovem uma alteração no padrão de tecnologia, colocando novas plataformas no lugar. Um caso bastante mencionado, como exemplo, são as máquinas fotográficas digitais, que criaram uma revolução perante o modelo anterior das máquinas de filmes, ocupando o lugar destas no mercado. Evidente que no atual estágio das sociedades capitalistas não há inovação que prescinda de todo o conhecimento acumulado por outras tecnologias e desenvolvimentos, que se tornam referências e podem vir a ser superados.

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GRÁFICO 17. PARTICIPAÇÃO DAS TRANSAÇÕES POR CANAIS INDIVIDUAIS

FONTE: PESQUISA FEBRABAN DE TECNOLOGIA BANCÁRIA 2017

Nota-se que mesmo os caixas eletrônicos têm reduzido sua

participação relativa, saindo de 26% em 2011 para 15% em 2016, assim como

a internet banking (pelo computador) diminuiu de 38% para 23%, no período.

Esses dados servem para evidenciar que o setor continua em transformação,

buscando mecanismos de atendimento remoto ao consumidor, em que os

custos para os bancos são menores comparados ao atendimento pessoal.

Conforme levantamento realizado pelo Dieese (2017), uma transação

realizada pelo celular, como uma transferência, por exemplo, tem o custo de

3% de uma mesma transação realizada na agência, com atendimento pessoal.

Ademais, os bancos providenciam seus servidores e sistemas e os

consumidores utilizam seus próprios equipamentos para realizar o trabalho.

Portanto, muitos dos custos do banco são passados ao consumidor: elimina-se

o atendente pessoal, o cliente faz a utilização de seu próprio computador,

celular, plano de internet, energia elétrica, dentre outros. Para os correntistas,

a vantagem reside no fato de não precisar se dirigir à agência, nem esperar em

filas e poder realizar as transações em horários mais amplos, embora para

muitos haja o constrangimento para entrar na agência bancária, pois os

funcionários são orientados a direcionar os clientes aos caixas eletrônicos, aos

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correspondentes bancários e aos canais alternativos, algo que levou o Banco

Central a emitir, dentro da resolução 3694/2009, proibição ao impedimento de

acesso de clientes aos meios tradicionais de atendimento85.

A utilização dos correspondentes não é desprezível e tem sido

mantida, nos últimos cinco anos, em patamares próximos aos das transações

das agências bancárias. As principais atividades realizadas pelos

correspondentes continuam sendo transações mais simples, como pagamento

de contas e saques de valores. Ainda assim, conforme o Banco Central (2016,

p. 56), eram 71,3% dos correspondentes autorizados a recepcionar operações

de crédito em 2014, porém apenas 38,9% estavam credenciados para abertura

de contas. A maior expansão entre 2010 e 2014 aconteceu nas cidades com

menos de 10 mil habitantes, enquanto, nos municípios maiores, esse

movimento foi amplamente consolidado entre 2005 e 2010.

Pelos dados acima, podemos observar algumas tendências do setor

bancário no Brasil: a) uma maior inserção da tecnologia para os clientes e

funcionários, em especial a utilização do mobile banking que, somado à

internet, já representam quase 60% das transações financeiras; b) o relevante

papel do correspondente bancário, especialmente em pequenos municípios e

para a clientela que não utiliza, por alguma razão, as plataformas digitais. Essa

parcela é substancialmente formada por pessoas com menor rentabilidade aos

negócios dos bancos, idosos e pessoas de baixa renda, que costumeiramente

são orientadas a buscar esses canais alternativos. Os caixas eletrônicos e os

POS (do termo em inglês point of sale – ponto de venda –, são as máquinas de

cartões utilizadas no comércio) que, em 2011, realizavam 42% das transações

financeiras, tiveram seu papel reduzido para 25%. Isso se deve, no caso dos

caixas eletrônicos, a menor circulação de dinheiro em espécie, dada as

possibilidades de se utilizar outros mecanismos de pagamento. No caso das

máquinas de cartão, comuns em lojas e nos comércios, a interpretação

possível é de que a queda relativa no número de transações se deve à crise

econômica, especialmente do biênio 2015 e 2016, em que as vendas

85 Art. 3º É vedado às instituições referidas no art. 1º recusar ou dificultar, aos clientes e usuários de seus produtos e serviços, o acesso aos canais de atendimento convencionais, inclusive guichês de caixa, mesmo na hipótese de oferecer atendimento alternativo ou eletrônico.

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diminuíram no comércio de forma mais ampla. Outro aspecto a se observar é a

ampliação do comércio eletrônico, por meio da internet, em que o pagamento

prescinde do equipamento POS. Portanto, há tendência de as máquinas de

pagamento manterem espaço no comércio físico, presencial, mas continuarem

relativamente menos utilizadas que em anos anteriores, mesmo com a

retomada do crescimento econômico.

Apesar de todas essas tendências apontadas, convém ressaltar que

as agências continuam a ser estratégicas para os bancos. O esforço que o

setor bancário tem feito é para retirar de seus maiores custos a realização de

tarefas operacionais, quais sejam: pagamento de contas, transferências de

dinheiro, compensação de cheques, serviços de retaguarda e BackOffice,

enfim, atividades necessárias, mas que não ampliam diretamente a

rentabilidade das instituições.

Num primeiro momento, houve a centralização dos serviços de

compensação e retaguarda, posteriormente passando por maciça

automatização (Sanches, 2016). Nos últimos anos, o interesse maior dos

bancos foi de automatizar e terceirizar a maioria das transações operacionais.

Assim, estimularam-se alternativas à agência tradicional, em que o custo

operacional para os bancos é maior, pois envolvem aluguel de prédio,

segurança, limpeza, energia elétrica, impostos, salários, e demais custos fixos.

As atividades que demandam a estrutura física do banco correspondem a 25%

das transações, sendo deste universo: 15% em caixas eletrônicos, 8% em

agências e 2% em callcenters, dos quais parte significativa das estruturas,

tanto as ativas quanto as reativas86, é terceirizada pelos bancos (Malerba,

2011; Venco, 2003).

Isso não implica o fim das agências, mas o encerramento de parte

delas, com evidente prejuízo aos trabalhadores. Desde 2015, com o

esgotamento do ciclo econômico, diminuição da demanda por crédito e do

aumento do desemprego, os bancos têm fechado agências. Essa ação

articula-se com o curto prazo e o médio prazo. A crise econômica acelera o

86 Denomina-se “ativa” a central de atendimento telefônica que liga para os clientes principalmente para ofertar produtos e serviços e “reativa” aquela em que as centrais são preparadas para receber demandas dos clientes: informações, alterações, contratações e cancelamentos de produtos e serviços.

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processo de reorganização dos bancos e as demissões, que começaram em

2012, apontavam exatamente para essa tendência, e têm sido aceleradas a

partir de 2013, mantendo-se até o presente momento, em 2017. Convergem,

assim, a crise econômica e a nova política de organização dos bancos. Os

investimentos em agências digitais e nas chamadas “tecnologias disruptivas”

tornaram-se centrais nos maiores bancos brasileiros. Certamente, se

houvesse demanda crescente por novos negócios, essa estratégia seria

igualmente implantada, mas de maneira mais lenta.

As agências tornam-se, nessa visão empresarial dos bancos, um

espaço de negócios e não de operações. Seriam como lojas para comercializar

produtos e serviços bancários, mas não para realizá-lo operacionalmente: isso

deve ser realizado pelo próprio cliente em seus equipamentos eletrônicos ou,

na melhor das hipóteses, nas centrais de atendimento por telefone e

correspondentes. Assim, a circulação de valores seria muito reduzida nas

agências.

A pesquisa de tecnologia bancária produzida pela Fenaban (2017)

com as atividades dos bancos em 2016, aponta o sentido das mudanças:

A tendência, direcionada pela quarta revolução industrial, é que a função dos bancários seja readequada, mais focada em auxiliar consumidores na gestão de negócios, nas funcionalidades disponíveis e na melhor alocação de recursos, além de trabalhar na construção de processos internos mais fluidos e inteligentes. (p.11)

O movimento, portanto, tem dois aspectos claros: incorporar novas

tecnologias e terceirizar o trabalho. Ambas se complementam com o objetivo

de reduzir custos e ter controle sobre o trabalho, criando situações de

contratação e remuneração flexíveis e que dificultam a ação sindical. Enquanto

diminui significativamente os empregados com vínculo direto com o banco, o

número de trabalhadores que, em alguma parte do processo, contribuem com

o lucro dos bancos diminui em ritmo mais lento.

A utilização da internet associada ao celular permitiu um salto no

número de transações realizadas fora das agências e com oferecimento cada

vez maior de serviços financeiros. As plataformas, chamadas digitais, têm sido

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utilizadas de forma considerável pelos bancos, com a liderança do Itaú, que

investe em agências totalmente digitais e remotas para atendimento ao cliente,

portanto, sem contato pessoal. É possível realizar abertura de contas,

financiamento de carros, remessa de dinheiro, tudo por meio do celular. Assim,

um número crescente de pessoas possui contas em agências virtuais, sem

terem um prédio físico ao qual estejam vinculadas. A agência digital, com

atendimento apenas pelo telefone e internet, com uso de chats, consegue

atender uma quantidade expressivamente maior de clientes por unidade e

funcionário. Em último caso, se o cliente precisar de atendimento pessoal, irá

buscá-lo nos correspondentes bancários ou nas agências “fluxos”,

“operacionais”, em que são realizados serviços financeiros. O Banco do Brasil

tem investido nas agências digitais, particularmente em 2017, com a ampliação

do número de contas para cada funcionário (divisão do total de contas

correntes pelo número de funcionários).

Estima-se que uma agência tradicional possui, na média, 2,5 mil

clientes, contra 45 mil de uma agência digital87. A plataforma digital dos bancos

aproxima-se do “modelo Uber aplicado às agências bancárias”88, devido ao

processo flexível e rápido de interação e contratação de serviços pelos

clientes. A esse tipo de serviço somam-se outras plataformas controladas

pelos bancos brasileiros e estrangeiros atuantes no país, como Youse, da

Caixa Seguradora, que facilita a simulação e contratação de seguros pela rede

mundial de computadores e tem sido alvo de críticas e reclamações de

corretores de seguro89.

O desafio colocado aos trabalhadores dos bancos é similar ao de

outras categorias: o acesso maior às plataformas de comunicação e à

tecnologia mudou drasticamente a relação de clientes, negócios,

trabalhadores e sindicatos, como no já mencionado Uber (aplicativo para

contratação de serviço particular de transporte), além de Airbnb (aplicativo em

que pessoas alugam imóveis de outras pessoas físicas para se hospedar em

87 Fonte: Valor Econômico valor.com.br/financas/5019144/fechamento-de-agencias- bancarias-cresce-no-ano, consulta em 29/06/2017. 88 Fala do presidente da Contraf/CUT, Roberto von der Osten, durante a Conferência Nacional dos Bancários, 2016. 89 fenacor.org.br/noticias/fenacor-e-sincor-sp-denunciam-seguradora-online, consulta em 31/05/2016

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viagens), Netflix (serviço de streaming para filmes, via internet), dentre outros,

no qual é possível realizar transações, contratar serviços e pagamentos

utilizando-se de dispositivos móveis e em redes, sem a necessidade de

conversar pessoalmente ou por telefone com qualquer pessoa. O

desenvolvimento desses aplicativos e canais tem se tornado prioridade de

investimento para as grandes empresas, inclusive no setor bancário.

Em estudo produzido pelo Dieese (2017) sobre as principais tecnologias que

as instituições financeiras desenvolvem ou buscam adquirir para seus

negócios no futuro, constatou-se que os bancos se consideram inseridos na

quarta revolução industrial, dos sistemas ciberfísicos, isto é, sistemas que

interligam a esfera virtual com o mundo físico e biológico. Assim, os bancos se

integram a essas novas facetas da tecnologia, chamadas de 4.0. Os bancos

reforçam a premissa de que se transformarão em plataformas financeiras, mas

manteriam importância no que se refere à regulação do sistema financeiro

(Dieese, 2017). As instituições financeiras integrarão, progressivamente,

formas de tecnologia aos produtos financeiros, investindo em fintechs90 e

consolidando os novos modelos de relacionamento (idem).

Isso implica a redução do número de pontos fixos de atendimento,

ou seja, as agências tradicionais e, como consequência, exige-se novas e

diferentes atribuições do trabalhador. Conforme pesquisa de Tecnologia da

Febraban (2017), do sistema financeiro brasileiro, 47% dos bancos investem

em analytics91, 24% em computação cognitiva e 65% em blockchains92. Essas

90 Refere-se à atuação de empresas voltadas à tecnologia, normalmente iniciantes, chamadas de startups, que, com recursos de investidores já consolidados, buscam o desenvolvimento de produtos e serviços financeiros, apresentando novos modelos de relacionamento entre finanças e tecnologia. 91 Refere-se a softwares com alto desempenho que coletam, processam e analisam um volume muito elevado de dados de diversas fontes e origens, promovendo cruzamento de informações e oferecendo interpretações e tendências para subsidiar decisões sobre diversos temas. Empresas utilizam, por exemplo, para analisar tendências e potencial de consumo de pessoas que navegam pela internet e fazem isso por meio da análise do tipo de informações que elas acessam. 92 Os blockchains (cadeia de blocos, do inglês) são um sistema descentralizado de contabilidade e registro de transações. Possui um sofisticado modo de validar registros criptografados e torna-se seguro pois os registros são distribuídos e acessíveis em todos locais onde se utiliza o software. É a tecnologia utilizada pelas moedas digitais, como o bitcoin. As transações feitas por duas partes são altamente confiáveis pelo sistema criptográfico, sem necessidade da intervenção de terceiros.

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são as tendências de investimentos tecnológicos das instituições financeiras. A

comunicação com os clientes mantém foco no mobile e na internet banking,

buscando garantir a “virtualização”, maior acesso, integração entre

plataformas tecnológicas distintas e a experiência mais individual possível para

cada cliente, o que chamam de customização.

Os grandes bancos e as grandes empresas foram as principais

articuladoras da reforma trabalhista93, apresentada no dia 23 de dezembro de

2016, sob o número de PL 6.787/2016. Um dos sócios majoritários do Itaú, de

forma direta, criticou as leis trabalhistas e defendeu a reforma94. O projeto foi

aprovado na Câmara dos Deputados em 26 de abril de 2017, com a redação

final apresentada pelo relator do projeto, que ampliou substancialmente o

projeto original. O Senado Federal aprovou, em 11 de julho de 2017, sem

alterações, a proposta oriunda da Câmara dos Deputados. A reforma tornou lei

13467, promulgada em 13 de julho de 2017, contendo diversas das demandas

das entidades patronais ao longo dos anos, com o objetivo de flexibilizar a

contratação, remuneração e as condições de trabalho.

O objetivo desta tese não era discutir alterações na legislação que

fossem além dos governos petistas; entretanto, torna-se forçoso apresentar,

Para os bancos isso pode significar uma redução importante de custos na validação e segurança na troca de documentos e transações realizadas. 93 São fartas as referências na imprensa e nos próprios meios de comunicação das entidades patronais em apoio ao projeto, desde o seu anúncio pela presidência, às vésperas do Natal de 2016, até sua aprovação no Senado. Representantes das entidades patronais também participaram de audiências no Congresso em apoio às medidas apresentadas na reforma trabalhista. Ver, como exemplo, a agência Brasil do governo federal:agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2017-03/entidades-patronais-defendem-modernizacao-das-relacoes-de-trabalho-no-pais, consultada em 04/04/2017. 94 Da Reuters, disponível em: www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/06/1895760-setubal-defende-aprovacao-da-reforma-trabalhista.shtml, consulta em 01/07/2017. Segundo a agência de notícias Intercept Brasil, lobistas de bancos, indústrias e transportes estão por trás das emendas apresentadas na Câmara dos Deputados. Não apenas isso, de acordo com o site: “Dessas propostas de “aperfeiçoamento”, 292 (34,3%) foram integralmente redigidas em computadores de representantes da Confederação Nacional do Transporte (CNT), da Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC & Logística), disponível em theintercept.com/2017/04/26/ lobistas-de-bancos-industrias-e-transportes-quem-esta-por-tras-das-emendas-da-reforma- trabalhista/, consulta em 04/05/2017.

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mesmo que de maneira breve, essa discussão, haja vista que o setor bancário

sofrerá efeitos importantes a partir dessas medidas.

Há uma convergência, evidentemente não casual, entre os

interesses dos grandes bancos brasileiros e a reforma na legislação

trabalhista, que permitirá adequar o uso da força de trabalho aos interesses

dos empregadores. As condições de trabalho nas instituições financeiras, que

há anos tornaram-se alvo de críticas do movimento sindical e dos

trabalhadores, em especial pelo excesso de metas, controles, sobrecarga,

intensidade, pressão e assédio moral, tendem a se degradar ainda mais com

as mudanças introduzidas.

No trabalho bancário, algumas das normas devem ter maior efeito

do que outras. Dentre elas, há perspectiva de ampliação da terceirização, que

já acontece (Sanches, 2006; Malerba, 2011). A permissão da terceirização

irrestrita pela lei 13.429/2017, aprovada em março de 2017, após manobra do

presidente da Câmara dos Deputados, que desarquivou o projeto de lei

4.302/1998, enviado à época por FHC, foi confirmada pela própria reforma

trabalhista, que em seu conteúdo também retira a responsabilidade das

empresas contratantes quanto à fiscalização das condições de trabalho em

empresas terceirizadas.

A CEF, tão logo a reforma trabalhista foi aprovada, e a pretexto de

atualizar as suas normas internas, criou a previsão do “bancário temporário”,

contratado por tempo determinado para atividades de bancário no interior de

suas dependências, conforme a demanda de serviço aumentar. Os bancos

têm comunicado, internamente, aos seus funcionários que a reforma

trabalhista é positiva e criará condições para o desenvolvimento econômico e

uma melhor relação entre trabalhadores e empresários95.

A ampliação da terceirização e a postura adotada pela Caixa

Econômica Federal podem indicar uma possível redução no número de

concursos e a utilização em maior escala do trabalhador terceirizado em suas

atividades. Como há exigência legal do concurso público para entidades

95 Além da Caixa Econômica Federal que alterou seu regulamento chamado RH037, trazido a público pelo movimento sindical, o Banco Itaú defendeu a reforma trabalhista junto aos seus empregados.

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públicas ou de economia mista, eles devem permanecer, mas ficam flexíveis e

permissivas as condições de se contratar terceiros para desempenhar

atividades de bancários. A expansão do período de contratação do trabalho

temporário e a própria ampliação da jornada na contratação por tempo parcial

podem servir aos interesses de bancos públicos e privados para atender

demandas específicas em determinadas épocas do ano ou de campanhas

promocionais que venham a realizar. O banco Santander, por exemplo,

costuma ter aumento de trabalho no período de matrículas em cursos

educacionais de nível superior, pois o banco explora bastante o segmento de

contas universitárias. Torna-se, portanto, uma possibilidade contratar

bancários temporários ou de tempo parcial96 para atender essa demanda

específica, inclusive com visitas às instituições de ensino.

Krein (2007) já havia demonstrado que as reformas com viés

liberalizante nas leis do trabalho não geram empregos. Assim, as reformas na

legislação no governo de FHC, na segunda metade dos anos 1990, não

mostraram impactos positivos na criação de novos postos de trabalho. Do

mesmo modo, novamente a reforma é realizada num contexto de crise, com

alto desemprego e busca criar a expectativa, principalmente nos

desempregados, de que haverá maiores oportunidades com a aprovação das

medidas. Mas, conforme Krein, a geração de emprego depende do

crescimento econômico, do aumento da demanda. Ao reduzir o custo da força

de trabalho, “baratear a oferta”, apenas ampliará a margem de lucro do

empregador, mas não o fará contratar mais pessoas.

Outro ponto a ser considerado é a prevalência do negociado sobre o

legislado, que pode pressionar os bancários. Embora seja uma categoria

organizada e que possui uma CCT (Convenção Coletiva de Trabalho) mais

abrangente e segura que a maioria das categorias, conforme apresentaremos

no último capítulo, ainda assim, abre-se espaço para flexibilizar determinadas

regras, permitindo a negociação em termos mais frágeis. A vigência da CCT e

o calendário de negociações deve ser tema de embate entre empregados e

96 O contrato parcial pode ser de até 30 horas semanais e também menor que 26 horas, com pagamento proporcional. Segundo Krein (2007) essa modalidade não teve boa adesão quando inserida nos anos 90 devido a controvérsias em sua utilização e pagamento.

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empregadores, na medida em que a reforma suspende os efeitos das

convenções e acordos coletivos até sua renovação.

Deve ser avaliada, também, a possibilidade de trabalhadores com

salários maiores que duas vezes o teto da previdência social negociarem

individualmente as condições de seu contrato de trabalho. No setor bancário,

os trabalhadores com maiores remunerações são os de nível gerencial em

diante na escala remuneratória. Se esses trabalhadores já tinham uma

participação da remuneração variável relativamente maior que os demais

bancários, com essa perspectiva abre-se espaço para negociar outros

formatos de remuneração e condições de trabalho. Em tese, levando a regra

ao seu limite, os trabalhadores com renda atualmente superior a R$ 11 mil

podem não ser garantidos pela contratação coletiva.

A permissão da contratação de autônomos em condição de

exclusividade e continuidade abre também um caminho amplo para não

registrar trabalhadores no regime CLT. Bancos menores, em especial voltados

a investimentos, ou aqueles com plataforma predominantemente digital, já têm

feito contratos com consultores autônomos para captação e prospecção de

negócios. Isso pode acontecer tanto na situação de pessoa física ou jurídica,

por meio da abertura de PJ e contrato comercial. A remuneração nesses casos

é negociada por produtividade e comissionamento sobre operações. Não há

segurança no vínculo empregatício, tampouco garantia de remuneração fixa.

Há, ainda, prejuízos em verbas trabalhistas e previdenciárias, sem

recolhimento de FGTS, INSS, pagamento de férias, licenças saúde, dentre

outras. Por ocasião da expansão do crédito no Brasil, em especial entre 2007 e

2012, foi comum a figura dos chamados “pastinhas”, trabalhadores

contratados por financeiras e correspondentes bancários para conquistar

clientes, principalmente aposentados, pensionistas ou servidores públicos, a

fim de realizarem crédito consignado. Esse formato de vínculo tende a se

ampliar.

A contratação de teletrabalho, ou home office como chamado na

linguagem das empresas, é outro caminho em que os bancos investem. As

empresas, como já mencionadas, têm alocado recursos em plataformas de

tecnologia e estimulado a utilização de softwares em notebooks e mobiles para

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os funcionários. Assim, eles podem realizar trabalho à distância, seja em

visitas aos clientes empresariais, prática muito reforçada pelos bancos aos

seus funcionários, particularmente gerentes, ou mesmo para trabalho a partir

de casa (Sanches, 2016). A ideia dos bancos é permitir que o trabalhador se

conecte à rede da empresa a partir de casa por meio da VPN (Rede Privada

Virtual, sigla em inglês). Os bancos treinam e capacitam os funcionários para

atuar de fora das dependências das instituições, em visitas e nas suas casas,

mantendo contato por meio digital, com e-mails, chats, videoconferências e

telefones, principalmente celulares.

Em análise empreendida pelo Cesit (2017), o problema da reforma

trabalhista está na exclusão dos trabalhadores das regras da CLT no que se

refere à jornada de trabalho, colocando a possibilidade de não ter limites de

horas para o trabalho, comprometendo a divisão entre trabalho e vida privada

no espaço doméstico. Algo que particularmente deve incidir sobre as mulheres

de forma mais grave, pois atinge diretamente a esfera reprodutiva no ambiente

domiciliar. As relações de gênero são, portanto, modificadas com esta medida.

Ao examinar o art. 75-A, que altera o dispositivo sobre o teletrabalho, o estudo

expõe que tampouco há “registro ou controle dos horários de trabalho” (CESIT,

2017, p. 56). Já em relação à saúde e segurança do trabalho, o documento

produzido pelo Cesit destaca que a única obrigação do empregador é orientar

seus empregados, de maneira expressa e ostensiva, sobre os cuidados a

serem tomados. E conclui:

De forma indireta, ao liberar, por exemplo, a terceirização para quaisquer atividades, ampliar o uso dos contratos temporário e em tempo parcial, dispor sobre o tempo de trabalho, legitimar a contratação intermitente, retirar o teletrabalho do campo de aplicação da jornada, legalizar formas de contratação sob regime de outra natureza que não o da CLT, como é o caso dos autônomos, entre outras situações extremamente prejudiciais aos trabalhadores e à própria dinamização da economia. (p. 56)

Outra alteração que pode ocasionar impactos sobre o trabalho no

setor bancário é a possibilidade da redução no intervalo de almoço, que poderá

ser de 30 minutos, em vez de habitual uma hora, para trabalhadores com

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jornada de oito horas diárias. Os bancos já criam dificuldade para muitos

trabalhadores almoçarem de forma tranquila, impondo horários que não são

adequados fisiologicamente ou para o descanso, ou seja, a exigência de

cumprimento do horário de almoço muito próximo do horário de entrada ou

muito tarde, bem como os mantém interligados com o banco durante esse

horário por meio do telefone celular. A realidade nos bancos é que hoje a maior

parte dos trabalhadores possuem jornadas de oito horas. As instituições

financeiras utilizam-se de subterfúgio dos chamados cargos de confiança para

burlar a CLT em seu art. 224, que estabeleceu, ainda em 1934, a jornada de

seis horas. Na maioria dos casos, os trabalhadores de oito horas não são

cargo de confiança, ou seja, não possuem nível de tomada de decisão ou de

representação que configure confiança, apenas possuem mais atribuições e

responsabilidades que os funcionários em carreiras iniciais. Entretanto, do

mesmo modo, trata-se de um trabalho bastante ligado à execução de

atividades definidas pelas direções e, desse modo, regulado e controlado,

cujas possibilidades e limites são estabelecidos pelos sistemas informatizados

com os quais interagem durante toda a jornada (Blass, 1992; Jinkings, 2001;

Segnini, 1999).

O sindicalismo enfrenta e enfrentará um ambiente bastante difícil

nesse contexto, em que convergem mudanças tecnológicas – em particular no

setor de serviços, com as chamadas tecnologias 4.0 –, gerenciais e

organizativas, além da legislação trabalhista, que sofreu profundas e

estruturais alterações a partir da reforma trabalhista (Cesit, 2017). Evidente

que é uma convergência articulada e controlada pelos grandes grupos

econômicos, dentre eles os bancos, nos marcos da ideologia neoliberal. O

sentido é o de flexibilizar e dar condições de utilizar a força de trabalho de

forma mais longa e intensa, com menor regulação protetiva do trabalho,

desequilibrando a função social do trabalho e colocando empregadores e

empregados em posição simétrica. Reforça-se a lógica das relações e das

contratações em âmbito privado. Inclusive retirou-se dos sindicatos a

incumbência de realizar as homologações por demissão – momento em que os

dirigentes sindicais tinham oportunidade de dialogar e auxiliar o trabalhador na

ocasião de sua saída –, que a partir da reforma passarão a ser realizadas no

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âmbito das empresas, podendo ou não ter a participação do sindicato, caso

seja demandado pelo trabalhador.

Nesse cenário que valoriza cada vez mais as iniciativas

individuais, com espaços de trabalho fragmentados e ideologia fortemente

meritocrática, inclusive na contratação e na remuneração (Krein, 2007), os

limites para atuações sindicais tornam-se mais estreitos. Reitera-se uma

relação de emprego baseada na incerteza, no medo, causando ansiedade e

adoecimento para muitos trabalhadores. O fim da contribuição sindical, no

âmbito da reforma trabalhista, poderia ser entendido como positivo, contudo

veio isolado de um processo de diálogo e reformulação sindical mais

abrangente, que pudesse dinamizar as relações entre sindicatos e

trabalhadores.

Sendo assim, a medida não caminha no sentido de ampliar a

liberdade sindical, a pluralidade e a organização dos trabalhadores em outros

formatos que não aquele da estrutura sindical varguista. Fica evidente que

intenção da emenda na Câmara dos Deputados foi buscar retirar uma fonte de

financiamento das entidades, como forma de reduzir seu potencial de

fortalecimento e enfrentamento. Não impedirá, dessa maneira, a existência de

sindicatos sem atuação na base, cuja única participação é na arrecadação de

recursos financeiros – obrigatórios ou não – e o controle de máquinas

sindicais, ainda que com menor capacidade arrecadatória, caso seja mantida a

reforma trabalhista sem alterações – que entrou em vigor em 11 de novembro

de 2017.

3.4.2 - A representação de trabalhadores do setor financeiro: um processo incipiente

Os bancários discutiram diversas alternativas para fazer frente aos

desafios trazidos pela tecnologia e novas formas de contratação,

especialmente o avanço da terceirização. A mesa temática de negociação,

estabelecida na convenção coletiva de 1992, sinaliza a importância que esses

temas passam a ocupar na discussão política dos bancários, diante do risco de

ampliação do desemprego.

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A organização dos trabalhadores por ramos constitui uma política

concebida pela CUT desde os anos 1980. O objetivo seria, num cenário de

pluralidade sindical, permitir que trabalhadores num mesmo ramo de atividade,

como por exemplo, o setor financeiro, pudessem ser organizados de forma

conjunta, unificando e fortalecendo as lutas coletivas. A estrutura sindical,

porém, impede a organização dos trabalhadores de forma livre, por meio de

livre associação em sindicatos que organizem ramos profissionais. Como

vimos, uma parte importante do sindicalismo brasileiro defende essa estrutura,

o que dificulta sua superação.

A unicidade e a divisão dos trabalhadores em categorias

profissionais distintas impedem que trabalhadores terceirizados, por exemplo,

sejam representados pelo sindicato dos bancários, ainda que atuem dentro do

mesmo espaço e em atividade análoga. Esse elemento constitui um grande

entrave à luta sindical contra a terceirização (Krein, 2007) na medida em que a

estrutura fragmenta os trabalhadores em diferentes categorias e, portanto, cria

obstáculos de organização, mobilização e solidariedade.

As datas-bases são diferentes em cada categoria, assim como os

sindicatos que a organizam possuem concepções diferentes e não

necessariamente interpretam a realidade de enfrentamento da mesma

maneira. A estrutura sindical varguista prospera, inclusive, pelo interesse de

amplos setores sindicais, que entendem como conveniente essa lógica de

organização, pois permite manterem bases sindicais, com recebimento de

recursos obrigatórios, como a contribuição sindical97, sem uma competição

pelas bases. O maior risco é outro sindicato ser criado e buscar uma divisão

geográfica da base ou mesmo da categoria, por meio de subdivisão do

segmento a ser representado. Por exemplo, o sindicato dos trabalhadores

97 Em tese, a contribuição sindical deixa de ser obrigatória aos trabalhadores, a partir da vigência da lei 13467/2017, da reforma trabalhista. Entretanto, não se sabe o alcance da reforma, se a contribuição será substituída por outra, e em que medida o caráter facultativo do recolhimento afetará o montante arrecadado com a contribuição. É possível fazer uma analogia com as taxas assistenciais e confederativas: embora exista o direito de oposição, na prática assembleias sindicais pouco participativas definem o percentual a ser descontado e muitas entidades dão pouca publicidade ou dificultam o direito de o trabalhador exercer a oposição ao desconto. Conforme decisão do STF, (ARE 1018459, de 2017), o desconto assistencial poderá ser realizado apenas de trabalhadores sindicalizados.

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rodoviários vir a ser dividido com a criação de um sindicato dos trabalhadores

rodoviários do transporte de cargas. Isso é algo relativamente comum de

acontecer e, em boa medida, explica a grande quantidade de sindicatos

criados no Brasil nas últimas décadas. A pretexto de impedir uma pulverização

de sindicatos, a estrutura sindical promove exatamente o contrário, facilitando

a divisão sindical – mediante autorização do Ministério do Trabalho – por meio

de dirigentes em busca de espaços de poder político e econômico. Essas

divisões passam ao largo do conhecimento da maioria dos trabalhadores, que,

em geral, não são mobilizados nesses debates, que se realizam no âmbito das

direções sindicais. Além desses fatores, com o advento da lei de

reconhecimento das centrais sindicais, tornou-se comum a disputa das

centrais pela filiação das entidades sindicais com o objetivo de reforçar a

representatividade formal e essas centrais receberem repasses maiores de

recursos da contribuição sindical.

Outro aspecto a ser ponderado é que quem define a categoria

profissional em que os trabalhadores serão inseridos são as empresas. Isto é,

cabe ao empresário realizar o enquadramento profissional que determinará,

em última instância, o sindicato que organizará aqueles trabalhadores. Esse

aspecto colide com a liberdade dos trabalhadores escolherem a entidade que

melhor possui capacidade e condições de lhe representar. Trata-se de uma

grave distorção, do empregador poder decidir a qual sindicato o trabalhador

poderá se filiar e com qual sindicato o empregador deverá negociar.

Geralmente, quem defende a unicidade da estrutura sindical utiliza, como

justificativa, o argumento que ela permite melhores condições de defesa dos

interesses dos trabalhadores, ao passo que o pluralismo sindical beneficiaria

os patrões. O pluralismo facilitaria a criação de sindicatos por meio de pessoas

que seriam “testas de ferro” dos interesses do patrão na direção de sindicatos

de trabalhadores. Isso ampliaria a divisão e o controle patronal sobre o

movimento sindical. Essa visão, por exemplo, é defendida pela CTB, bem

como pelas entidades herdeiras do sindicalismo oficial, como a UGT, NCST e

pela Força Sindical, que em sua criação já tinha papel definido de balancear,

por meio do “sindicalismo de resultados”, o sindicalismo de confronto adotado

na época pela CUT (Galvão, 2003).

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Esse cenário indica uma série de dificuldades para que os

bancários pudessem e possam organizar e mobilizar os trabalhadores de

outras categorias do setor financeiro. Em nossa dissertação de mestrado

(Malerba, 2011), demonstramos quais são as principais categorias do setor

financeiro e de que forma esses trabalhadores estão divididos entre diferentes

bases de sindicatos, todos com condições de contratação e remuneração

piores em relação aos bancários. O sindicalismo bancário, além de representar

os empregados em bancos múltiplos, bancos comerciais, bancos de

investimento e caixas econômicas, representa os trabalhadores em

financeiras, muitas das quais com controle direto ou indireto dos próprios

bancos, principalmente por intermédio de holdings. Com a expansão dos

correspondentes bancários, a partir de 2003, novas categorias passaram a

atuar no setor financeiro, representando legalmente trabalhadores que

realizam atividades típicas de bancários, como processamento de documentos

financeiros, abertura de contas, realização de empréstimos bancários, dentre

outros. Essas categorias são os comerciários, segmento majoritariamente

dominado pela UGT e Força – a CUT possui cerca de 26% de participação no

setor (Trópia, 2014), e os agentes autônomos, cujos sindicatos de São Paulo

estão entre os maiores do Brasil em termos de base sindical. O sindicato dos

agentes autônomos98 de São Paulo não é filiado a nenhuma confederação

nem central, enquanto nos demais sindicatos há uma prevalência da Força

Sindical.

Com o forte crescimento dos callcenter também se nota a atuação

de trabalhadores dentro de empresas que prestam serviço de forma direta ou

indireta para os bancos, com contato, principalmente telefônico, com clientes,

em cadastros fornecidos pelas próprias instituições financeiras. O conteúdo do

trabalho é também bancário, com realização de atividades anteriormente

desenvolvidas pessoalmente nas agências e espaços dos bancos. Neste caso,

a representação sindical em São Paulo é feita pelo Sindicato de empregados

98 Sindicato dos Empregados de Agentes Autônomos do Comércio e em Empresas de Assessoramento, Perícias, informações e pesquisas e de Empresas de Serviços Contábeis no Estado de São Paulo.

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em empresas de processamento de dados (Sindpd99) filiado à CSB; Sindicato

dos trabalhadores em telecomunicações (Sintetel), filiado à Força Sindical; e

Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing (Sintratel) filiado à UGT. O

Sindpd ainda representa diversos trabalhadores em empresas como Tecban,

Fidelity, Cobra, todas controladas por bancos na área de Tecnologia da

Informação (TI). Trata-se de um dos maiores sindicatos brasileiros em número

de trabalhadores na base.

Além desses, os trabalhadores bancários convivem diariamente

com corretores de seguro e securitários, muitos dos quais trabalham dentro

das agências bancárias negociando produtos e serviços de seguridade dos

próprios bancos, porém de forma terceirizada. Nesse segmento há o sindicato

dos securitários, que no estado de São Paulo é filiado à UGT; bem como o

sindicato dos corretores de seguros quando são autônomos. O sindicato dos

securitários é filiado à Contec/UGT, que possui representantes da categoria

em sua diretoria, portanto, pode-se entender como uma categoria em que há

participação dos bancários em seus debates.

No Estado de São Paulo os bancários, ligados à CUT, assinam

acordo coletivo em nome dos trabalhadores em cooperativas de crédito no

Estado, assim como em Brasília e algumas outras cidades. A Federação

Centro-Norte possui diretor do setor de cooperativa e representação formal

dessa categoria. Em Rondônia, o sindicato dos bancários representa

formalmente os trabalhadores em lotéricas. São algumas das experiências que

incluem categorias além de bancários. Estima-se que o setor financeiro

empregasse 865.950 trabalhadores em suas diversas categorias no ano de

2014, conforme a tabela abaixo, produzidas com dados do Ministério do

Trabalho (RAIS, 2014). Isso representa 70% a mais de trabalhadores para

além dos bancários.

99 Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do Estado de São Paulo.

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TABELA 4 . TRABALHADORES DO RAMO FINANCEIRO Emprego no Ramo Financeiro no Brasil - 2010 / 2014

CNAE 2010 2014

Variação (%)

Bancários 483.097 512.186 6,0%

Planos de Saúde 62613 85454 36,5%

Outros 29315 34458 17,5%

Crédito cooperativo 34967 51196 46,4%

Corretores e agentes de seguros, planos de previdência complementar e de saúde

30571 43145 41,1%

Seguros não-vida 28743 37529 30,6%

Atividades auxiliares dos serviços financeiros não especificadas anteriormente

28557 14874 -47,9%

Administração de consórcios para aquisição de bens e direitos

10868 12245 12,7%

Atividades de intermediários em transações de títulos, valores mobiliários e mercadorias

10963 11528 5,2%

Seguros de vida 7506 9976 32,9%

Previdência complementar fechada 9173 8331 -9,2%

Sociedades de crédito, financiamento e investimento - financeiras

11406 7772 -31,9%

Administração de cartões de crédito 4344 7753 78,5%

Atividades auxiliares dos seguros, da previdência complementar e dos planos de saúde não especificadas anteriormente

8329 6760 -18,8%

Sociedades de fomento mercantil - factoring 7217 6462 -10,5%

Atividades de administração de fundos por contrato ou comissão

4907 6224 26,8%

Seguros-saúde 5649 5705 1,0%

Outras atividades de serviços financeiros não especificadas anteriormente

6942 4352 -37,3%

Total 785.167 865.950 10,3%

Fonte: Dieese (2015) com base em dados da RAIS-MTE.

O processo de organização do ramo é, porém, bastante incipiente.

Como já referido anteriormente, a mudança da CNB para Contraf/CUT trazia

em seus objetivos ampliar a representação dos trabalhadores no setor

financeiro. Essa alteração, acompanhada de mudança no estatuto da

confederação e de diversos sindicatos a ela filiados, foi um passo formal para

representação sindical do segmento. Durante os anos de 2005 a 2010, o

sindicalismo bancário concentrou debates e esforços no sentido de construir o

“ramo financeiro”, isso é, abrir diálogo e buscar a organização, junto às

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entidades sindicais bancárias, dos trabalhadores nas demais categorias que

atuam no setor.

Em nossa perspectiva, a iniciativa não alcançou êxito por dois

fatores fundamentais. O primeiro deles, os limites da própria estrutura sindical,

aspecto que já abordamos. A utilização de argumentos jurídicos para limitar o

alcance dos bancários nas demais categorias também esteve presente. Esses

argumentos eram tanto internos, ou seja, justificados pela preocupação de

dirigentes bancários em se sobrepor às demais categorias, sem respaldo na

lei, quanto externos, das outras categorias ao reagir, inclusive com amparo do

judiciário, ao assédio de bancários em suas bases. Como exemplo, pode-se

mencionar a situação das empresas de callcenter, em que bancários

enfrentaram a resistência de empregadores e de outros sindicatos para

mobilizar os trabalhadores100. Além disso, de forma indireta, esse raciocínio

leva à análise da conjuntura, de que a ofensiva sobre outras bases pode

representar a abertura para que outros sindicatos façam o mesmo, avançando

sobre as bases bancárias.

O outro fator determinante, que se articula ao primeiro fator, é de

viés político. O sindicalismo bancário ao longo da década de 1990 e no

decorrer dos anos 2000 voltou-se para as próprias demandas da categoria,

com olhar mais limitado a pautas corporativas e específicas. Esse aspecto já

100 Um exemplo foi a ação judicial de interdito proibitório movida pela empresa Fidelity em face da Contraf/CUT, do Sindicato dos Bancários de São Paulo e do Sindicato dos Bancários de Jundiaí, no qual se solicitou liminar e a fim de impedir que essas entidades realizassem “turbações” diante da empresa, dificultando seu funcionamento normal. Em suma, uma das alegações era de que a Fidelity tinha “total desvinculação da categoria bancária” e para isso juntou “cópia de comprovantes de recolhimentos de contribuições sindicais feitos para entidade representativa da categoria dos trabalhadores em processamento de dados”. Logo se nota que a empresa se opunha à presença de sindicatos de bancários em mobilizações, não apenas quanto à forma, alegando causar constrangimento e ameaça aos trabalhadores e clientes, como quanto ao conteúdo e à legitimidade legal da parte. O judiciário acolheu os argumentos da empresa nos seguintes termos: “Logo, defiro a liminar requerida, para determinar que os requeridos abstenham-se de praticar atos que causem embaraços ao exercício de direitos fundamentais de terceiros e de molestar a posse mansa e pacífica do autor sobre as suas instalações e/ou seus maquinários, obstar seu normal funcionamento e a livre locomoção de clientes e/ou empregados, autorizando, desde já, o uso de força policial para cumprimento do mandado, com imposição de multa pecuniária de R$ 50.000,00 por dia, para o caso de descumprimento da ordem judicial”. O número do processo é 0165800-57.2008.5.15.0002, tendo sido mantida a decisão em instâncias superiores da justiça do trabalho.

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havia sido observado por Junckes (2004) e Krein (2007): de forma gradativa,

adotam-se pautas mais particularistas na relação com os trabalhadores e

menos abrangentes ou classistas. Galvão (2003) destaca o papel de

moderação na atuação política da CUT nos anos 1990, que, a nosso ver, leva

novamente a uma visão social mais corporativa das categorias, voltada aos

problemas e desafios de forma segmentada – cuja solução passa primeiro pela

negociação e, quando esgotada, para ação direta – um viés que reduz, em

certa medida, a disputa classista. A postura defensiva na conjuntura dos anos

1990, com menos apoio dos bancários e da sociedade, acabou por influenciar

a concepção de enfrentamento da central. Essa postura é, de certa maneira,

contraditória com os propósitos do “sindicato cidadão”, que tem por objetivo

uma relação mais ampla com a sociedade e as diversas dimensões da vida do

trabalhador, ultrapassando as questões específicas da categoria. Contudo,

essa visão é complementar à forma como as entidades sindicais passam a

lidar com a noção de “sindicato cidadão”, em que se prioriza a via institucional

de disputa política, menos dada a ações diretas e, de forma concomitante,

mais direcionada ao Estado e suas mediações, como os conselhos, por

exemplo, buscando canalizar suas demandas para o poder público de forma

institucional. Enquanto isso, as mobilizações e greves, isso é, a ação direta e o

enfrentamento, quando esgotadas as vias negociais, ficaram restritas às

questões corporativas. Portanto, nos anos 2000, nota-se que as greves

estiveram ligadas a questões de relações de trabalho e não a temas sociais

mais amplos. A utilização do instrumento da greve geral, dialogando com o

conjunto da sociedade, voltou a acontecer apenas em 2017 em relação às

reformas do governo Michel Temer. Houve, assim, uma dificuldade de

articulação das duas dimensões, uma social e ampla e outra trabalhista e mais

restrita.

Dessa forma, há uma profunda concepção ideológica que impediu a

mesma ousadia de outros momentos: por exemplo, as disputas dos anos 1980

contra os sindicatos oficiais, a criação do DNB e CNB, a própria criação da

CUT num cenário em que não havia respaldo legal. Os mesmos limites legais

de outrora estavam dados, mas em uma nova conjuntura. O objetivo era

ampliar a organização com outros setores, notadamente mais prejudicados na

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relação com os bancos. Entretanto, o sindicalismo cutista e bancário já haviam

passado por um processo progressivo de acomodação à estrutura sindical e

por um olhar mais particular para a categoria e, logo, menos classista.

Somam-se às dificuldades concretas da luta sindical num ambiente de pouca

liberdade para os trabalhadores se organizarem de outras maneiras, mais

efetivas e coordenadas, ao perfil ideológico do sindicalismo bancário.

Certamente podem-se destacar mobilizações de caráter abrangente dos

trabalhadores bancários nos anos 1990, como as ocorridas contra as medidas

de corte neoliberal, a exemplo das privatizações, das reformas orientadas para

o mercado (trabalhista, previdência) e dos cortes de gastos nas áreas sociais

com prioridade ao pagamento de elevados juros aos credores da dívida. Nos

anos 2000, pode-se sublinhar a adesão ao FNT (Fórum Nacional do Trabalho),

para debater e, eventualmente, avançar em medidas para reforma sindical e

trabalhista, embora tenha sido fortemente criticada de vários lugares, desde o

sindicalismo oficial, defensor da estrutura sindical, até as correntes à

esquerda, contrárias ao diálogo social e à conciliação de classes. Outras

medidas foram a luta pela jornada de 40 horas semanais, que teve relevo entre

os anos de 2006 a 2008, na qual se somaram as centrais sindicais como CUT,

Força Sindical, CTB, UGT e NCST, com vistas a pressionar o congresso pela

aprovação da redução de jornada sem redução de salários, e as

manifestações em defesa do veto da emenda três101, que contou com apoio

dessas centrais. Outras manifestações abrangentes nas quais os sindicatos de

bancários tiveram papel relevante foram os protestos contra o projeto de lei

4330/2004, do então deputado Sandro Mabel, que expandia a possibilidade de

terceirização nas empresas, inclusive nas atividades-fim, que eram vedadas

pela súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). O sindicalismo

bancário também se envolveu em muitas eleições gerais, desde a

101 Foi uma emenda inserida pelo congresso nacional no projeto de lei de criação da Super-Receita (Lei Nº 11.457, de 16 de março de 2007) no governo Lula da Silva. A emenda retirava a possibilidade de fiscalização dos auditores fiscais da Receita Federal em relação aos contratos firmados entre pessoas jurídicas (PJ), quando os fiscais constatassem existir, em vez de relação comercial, um vínculo empregatício disfarçado, fraudando a legislação trabalhista. Seriam casos em que a empresa forçaria um trabalhador a abrir uma PJ individual, sem empregados, em que ele seria remunerado na condição de prestador de serviços e não de trabalhador com registro em carteira. O presidente Lula da Silva vetou a emenda, e o veto foi mantido pelo Congresso Nacional.

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apresentação de pautas até a deliberação de apoio durante as campanhas por

parte de seus diretores. Em muitas dessas eleições, principalmente

majoritárias, houve coesão dos bancários com outras categorias da CUT e

demais centrais. No entanto, essas pautas se davam, geralmente, no escopo

de um sindicalismo de negociação e realizado por dirigentes, dentro das

margens consideradas legais de se reivindicar direitos específicos e pouco

conectadas a mobilizações populares mais amplas.

A luta contra a estrutura sindical não significa uma ruptura

econômica ou social. Ela permanece nos marcos do capitalismo e das lutas

pela garantia e ampliação de direitos. Ainda assim, para muitos dirigentes,

essa luta pode ser vista como algo demasiado radical num cenário em que as

entidades e instituições já se acostumaram e equilibraram suas relações com

no âmbito dessa estrutura. Isso levou a uma moderação nesse enfrentamento,

que contribuiu para que a “construção do ramo financeiro” se tornasse uma

medida incipiente, com pouca ação direta e efetiva para torná-la real ou, pelo

menos, colocá-la em disputa na sociedade102.

Assim, nos anos 2000, o sindicalismo bancário permanece mais

amoldado ao corporativismo da estrutura sindical. A relação próxima com os

governos do PT, em especial pela sua corrente majoritária, fortalece os

vínculos com instâncias do Estado. Há uma conexão política construída entre

movimento sindical e governo, como mencionado anteriormente, até mesmo

com muitos sindicalistas em cargos do governo federal. Isso permite que parte

dos conflitos sejam canalizados para o Estado em busca de soluções,

prescindindo – em diversos momentos – de um sindicalismo mobilizador, que

politizasse e fortalecesse vínculos com as bases ou mesmo que entendesse

102 Uma experiência que pode ser um parâmetro de como lidar com as novas realidades, particularmente no setor de serviços, foi a criação da Ver.di na Alemanha, entidade que reuniu, desde 2001, sindicatos de várias categorias do segmento de serviços. São inseridos: servidores públicos, bancários, comerciários, gráficos, trabalhadores nos correios, jornalistas, rodoviários, dentre outros. Evidente que se deve levar em conta as importantes diferenças entre ambos os países, em relação ao tamanho territorial e da população, da estruturação do mercado de trabalho, da legislação trabalhista e da legislação sindical; entretanto, pode ser uma forma de entender experiências em que a articulação de categorias em uma mesma entidade é uma forma de coordenar melhor a organização política e a utilização de recursos econômicos.

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como necessário a ruptura com o modelo sindical vigente. Mostraremos no

último capítulo como, inclusive no segmento bancário, o papel do Estado é

importante como mediador de disputas com os bancos, em que o acesso a

canais de diálogos nos bancos públicos e, por conseguinte, à mesa da

Fenaban, cria possibilidades novas institucionais de pressão.

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Capítulo 4 - Entre a sustentação política e a crítica: o sindicalismo bancário e os governos do PT

Como demonstrado anteriormente, o sindicalismo bancário não é

um todo homogêneo. Podem ser identificadas diferenças regionais, diferenças

no perfil dos bancários em cada base, com maior ou menor presença de

bancos públicos e privados, bem como a presença de diferentes correntes

sindicais, com posicionamentos diversos. Por isso, a relação com o governo

não pode ser estabelecida em apenas uma direção. Embora tenha havido um

movimento majoritário, liderado pela Articulação, que determinou o apoio aos

governos petistas, houve uma dinâmica de sustentação e crítica a alguns

aspectos.

Referimo-nos a apoios ou críticas levando em consideração as

direções sindicais e as disputas em torno delas. Não necessariamente os

movimentos realizados pelas forças dirigentes ou oposicionistas nos sindicatos

coincidem com as concepções das bases sociais. Entendemos que na maior

parte do período, até 2013103, as bases de trabalhadores mantiveram uma

percepção de que os governos do PT foram positivos, no sentido de garantir

melhores remunerações e direitos, ou seja, questões mais específicas da

categoria e não necessariamente questões sociais mais amplas. O ano de

2005, com a crise do Mensalão, criou certo distanciamento das bases de

classe média com o petismo e mesmo com o sindicalismo bancário,

compreendido, de uma maneira geral, como apoiador do governo. Portanto, o

posicionamento de Singer (2012) já destacado ao longo deste trabalho, possui

pertinência quando se analisa categoria bancária: o escândalo de corrupção

atingiu a sustentação do governo numa categoria de classe média, que se

tornou refratária ao partido e aos sindicatos de bancários devido à relação

entre ambas as organizações.

103 Não entraremos numa discussão aprofundada a respeito das manifestações de 2013, porém compreendemos que elas foram um ponto de inflexão importante na política brasileira. Retomaremos isso no final deste item.

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Contudo, apesar de uma certa distância dos bancários em relação

ao governo e ao sindicalismo, no geral, a categoria na base tendeu ao apoio,

ou ao “consentimento passivo”, mediante um cenário de melhores condições

econômicas e negociações favoráveis, com a compreensão de que,

comparada aos anos anteriores, havia avançado e o sindicato cumpria seu

papel, realizando mobilizações e greves. Há nisso certo cálculo individual e

“identificação coletiva restrita”, nas palavras de Boito (2004, p. 229), quanto às

condições de vida e suas possibilidades, ou seja, predominava entre os

trabalhadores a perspectiva de se mobilizar pelo merecimento e pelo

sentimento de justiça que deveria existir em relação à sua profissão, percebida

como diferenciada em relação a outros trabalhos. É uma mobilização de

caráter corporativo, que envolve os interesses restritos da categoria, da

profissão e a sua valorização é vinculada ao reconhecimento do desempenho

profissional.

As tendências políticas presentes no movimento sindical bancário

elaboraram numerosas análises de conjuntura, diagnósticos, previsões e

debates quanto aos governos do PT e a relação da categoria com o governo.

Isso pode ser verificado por meio dos informativos produzidos pelas entidades

e também pela análise dos cadernos de teses apresentadas no contexto de

conferências e congressos em vários níveis que foram realizados pelos

trabalhadores104. Baseado nessas informações, buscaremos compreender de

que forma o sindicalismo expressou-se e agiu politicamente em relação aos

governos do PT, considerando a análise das tendências e o nível de influência

104 Baseamo-nos nos seguintes documentos: cadernos de teses das conferências estaduais de São Paulo, e nacionais dos bancários, realizadas entre 2003 e 2016, bem como dos congressos de funcionários do Banco do Brasil e de empregados da Caixa Econômica Federal. No geral, os congressos de bancos públicos tendem a ser mais radicalizados pela maior presença de correntes minoritárias. Esses materiais, infelizmente, não se encontram disponíveis de forma digital. As entidades sindicais, em especial as maiores, disponibilizam seus informativos nos sites, que podem ser consultados nas referências bibliográficas. Um dos principais mecanismos de informação, seja pela longevidade ou pela intensa periodicidade da publicação é a Folha Bancária do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e região, disponível em www.spbancarios.com.br/folha-bancaria, que permite analisar a forma como a entidade se posicionou e divulgou as informações ao longo de muitas décadas. O mesmo sindicato dispõe de um centro de documentação bastante vasta, em que muitas informações estão disponíveis para consulta via internet: www.spbancarios.com.br/cedoc.

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que cada uma possui no âmbito nacional da categoria. Especial atenção

dedicamos aos documentos apresentados pela Articulação, CSD, CTB,

Intersindical e Conlutas, dada sua importância dentro do movimento, sua

capacidade de influenciá-lo e pela regularidade com que realizaram e

publicaram suas análises. As tendências da UGT e da Unidade Sindical/CUT

também apresentaram ideias e conceitos, mas nem sempre foram regulares e

abrangentes nas análises, muitas das quais salientaram, na maior parte,

questões internas da categoria.

Pode-se afirmar que as correntes Articulação, CSD/CUT e CTB,

mantiveram apoio frequente aos governos do PT. Isso não significa que não

houvesse críticas. Entretanto, o sentido geral, bastante claro, foi de apoio,

conforme apresentaremos mais adiante.

A Articulação, amplamente majoritária, foi a maior apoiadora do

governo e buscou justificar diversas das ações dos governos Lula da Silva e

Dilma Rousseff a partir da noção das possibilidades reais do governo. Nesse

sentido, destacou a necessidade de promover um equilíbrio entre a realização

de transformações e a relação com um sistema político e econômico difícil,

formado por forças, seja no legislativo e no judiciário ou na sociedade, que

possuíam visões e objetivos diferentes do governo. A CSD/CUT encaminhou

seus debates de forma favorável ao governo durante o período, porém de

forma mais incisiva e constante, colocava em debate posições críticas a

determinadas ideias e ações do governo, conforme veremos abaixo. Do

mesmo modo, a CTB, apoiou os governos do PT, porém com maior presença

de posições críticas sobre temas das políticas petistas, também detalhadas a

seguir.

A Intersindical e a Conlutas, ou anteriormente as forças políticas

que representavam dentro da CUT, realizaram, desde o primeiro ano dos

governos petistas, uma oposição pela esquerda destacando, em especial,

problemas na política econômica. Porém, embora bastante crítica ao governo,

principalmente no primeiro mandato de Lula da Silva, a Intersindical adotou

uma postura de maior diálogo, fazendo ponderações em que se reconheciam

avanços em determinadas políticas governamentais, por exemplo no

enfrentamento da crise econômica mundial. Do mesmo modo, durante a crise

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que culminou no fim do período petista no governo, a Intersindical estabeleceu

relações mais próximas com a CUT, como parte da Frente Povo Sem Medo,

em que contestou, com argumentos similares aos cutistas e petistas, as

mobilizações da direita e a tentativa – e posterior consumação – do

impeachment de Dilma Rousseff. Por seu turno, a Conlutas adotou uma

postura crítica, não apresentando praticamente nenhum argumento favorável

ao governo, realizando uma oposição sistemática e expressiva no campo da

argumentação e do discurso, quer dizer, bastante adjetivado e de forma mais

ostensiva.

4.1 – As correntes sindicais bancárias e os governos petistas

As posturas diante do governo e as disputas entre as tendências

acontecem bastante no campo discursivo e não parecem se refletir em modos

de ação e mobilização diferenciados nas bases sindicais da categoria. As

teses apresentadas em debates tendem a abarcar todos os temas, mas nem

sempre a maioria deles é central para a organização e mobilização dos

trabalhadores bancários. Geralmente, os temas mais particulares da categoria

acabavam prevalecendo como pautas mobilizadoras, enquanto as relações

com o governo eram apreciadas em “análises de conjunturas” que destacavam

a interpretação e a posição de cada corrente, de modo similar àquelas

apresentadas pelas correntes em diferentes categorias, porém nem sempre

esses debates eram apropriados ou discutidos pelas bases.

As correntes tiveram convergências em muitos temas que

constaram em boa parte dos documentos produzidos em congressos e

conferências. Nem sempre a intensidade foi a mesma, no entanto, pode-se

notar as críticas frequentes às altas taxas de juros, ao papel do Banco Central,

aos superávits primários. Esses foram fundamentalmente presentes no

primeiro mandato de Lula da Silva. Por um lado, a Articulação Sindical

defendia paciência para a retomada do desenvolvimento econômico e social,

que teriam sido prejudicados, inicialmente, pelo legado das crises econômicas

e sociais do governo Cardoso. As correntes Intersindical e Conlutas foram

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criadas neste contexto, pois suas críticas eram bem mais contundentes do que

as das demais forças políticas e entendiam que não havia mais espaços para

mudanças dentro da CUT. A Intersindical não foi criada, de início, como uma

nova central sindical, mas como espaço para aglutinação de militantes e

grupos que não concordavam com a política majoritária da central e do

governo. Mas, naquele momento, para a Intersindical ainda era possível

disputar por dentro o projeto da esquerda liderada por Lula.

A CSD realizou críticas ao governo e mesmo ao sindicalismo mais

próximo a ele, entretanto, esses elementos ocupavam lugar menos central em

sua orientação política. As críticas à política econômica, à influência do capital

financeiro e às privatizações foram presentes em seus discursos, embora

equilibradas com o reconhecimento de avanços.

Se é verdade que avançamos em alguns pontos, muito temos ainda a conquistar. Nossos congressos e encontros nacionais e regionais acumulam a cada ano centenas de reivindicações que sequer são analisadas pelos banqueiros e os governos. (Tese da CSD, Contraf, 2006) A política econômica realizada pelo Governo Lula prioriza a transferência de renda aos ricos (volumosos recursos públicos destinados ao pagamento de juros), mesmo que exista um incontestável crescimento de política de distribuição de renda (salário mínimo, Bolsa-família etc.). Ao manter a obsessão por altos superávits fiscais primários e juros estratosféricos, o Governo Lula limita as possibilidades de aumento da liderança do Estado no provimento de políticas públicas universalizantes. Para satisfazer a ânsia financista, apresenta projetos que se chocam diretamente com os interesses da classe trabalhadora (Tese da CSD, Contraf, 2008)

Do mesmo modo, pode-se notar nos textos e teses apresentadas

pela CSC/CTB reconhecimentos e críticas ao governo federal.

Reconhecimento por avanços em áreas sociais importantes, nas relações mais

democráticas com a sociedade, valorização dos salários; as críticas se dirigiam

ao Banco Central, em razão da política ortodoxa e dos juros elevados, bem

como à necessidade de se realizar reformas estruturais na sociedade brasileira

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que não haviam sido promovidas pelo governo federal. Vejamos dois

exemplos, nos fragmentos abaixo:

O governo de Lula tem como marca importante sua postura democrática, de diálogo e consulta permanente e variada com os movimentos sociais. [...] Destacadamente o Banco Central do Brasil tem se notabilizado por uma gestão ortodoxa e contracionista. [...] As mudanças nesse padrão constituem-se em grandes desafios e lutas a serem desencadeados para a concretização do projeto de desenvolvimento. (Tese da CSC, Contraf, 2006) [...] Diante desse quadro, urge reformas de bases estruturantes e imprescindíveis, como a reforma agrária, que dê terra a quem nela produz, reforma tributária que desonere setores produtivos, e os mais pobres, reforma educacional, tornando o saber e a cultura, universal, acessível a todos, [...] (Tese da CTB, Conecef, 2014)

A Articulação destacava, com frequência, a participação popular,

com maior abertura para o diálogo e espaços para mediação, algo justamente

criticado pelas correntes que romperam com a CUT, por entenderem que o

diálogo social era expressão da conciliação de classes que o governo buscava

fazer.

Para a Intersindical e para a Conlutas, o movimento sindical

bancário errava, pois, em vez de trabalhar pelo fortalecimento das

organizações populares e em prol de mudanças estruturais, aceitava a lógica

do governo baseada no diálogo, algo que os enfraquecia, ao levar os temas

para as mesas de negociação tripartite, como o CDES e o FNT, bem como

tentativas de conciliar com os setores empresariais. Segundo a Intersindical,

isso quebrava a unidade do campo democrático, ao aliar-se com inimigos

históricos da classe trabalhadora. A Conlutas reforçava essa crítica, no

entanto, parece-nos com um viés mais moral, com críticas aos acordos

políticos e, em diversas ocasiões, aos aparatos estatais, sindicais e dos

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movimentos sociais, que criaram uma “camada de privilegiados” 105 nas

cúpulas, que amorteciam as lutas populares.

A política internacional dos governos petistas foi defendida pela

Articulação, CSD e CTB, pois compreendiam que se criavam novos polos de

relações, voltadas ao modelo sul-sul, bem como favorecia a integração do

cone sul na América Latina, invertendo a lógica anterior, de prioridade nas

relações com EUA e Europa. A Intersindical definia que o Brasil se inseria no

cenário internacional, mesmo nos momentos de maior intervenção do Estado,

como um modelo “neodesenvolvimentista dependente”106 que encontrou seus

limites no governo Dilma Rousseff e levou à crise econômica a partir de 2014

em virtude das saídas adotadas pelo governo. A Conlutas, por sua vez,

entendia que o Brasil continuava se inserindo de forma subordinada no

mercado internacional, como vendedor de produtos primários e sem conseguir

desenvolver uma pauta mais ampla de produtos.

Outros elementos que geraram certa convergência entre as

correntes políticas presentes no sindicalismo bancário se davam em razão da

crítica à falta de reformas estruturais que pudessem corrigir problemas

históricos do país, especialmente a desigualdade. Todas as correntes

apontavam a importância de reformas tributária, política, urbana e agrária. Era

consenso, do mesmo modo, o problema da terceirização como grande desafio

aos trabalhadores. Para a Conlutas, um dos problemas dessas reformas não

andarem era o fato da CUT buscar “esconder” o governo para poupá-lo de

críticas. A Articulação entendia que era importante a pressão popular, na

medida em que o governo não tinha maioria para aprovar medidas mais

incisivas, pois dependia de um congresso conservador e mesmo de um

judiciário que dificultava avanços. A relação política entre Executivo e

Legislativo precisaria sempre pactuar e repactuar a fim de que alguns avanços

fossem possíveis, por essa razão defendia a importância da institucionalidade,

dos trabalhadores se organizarem e participarem das eleições, bem como de

votarem em trabalhadores para os cargos de poder.

105 O conteúdo da crítica pode ser localizado na tese do MNOB no Congresso Nacional dos Funcionários do Banco do Brasil – CNFBB – em 2010, p. 3). 106 Pode ser localizado na tese da Intersindical no CONECEF 2014, p. 26.

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Nesse sentido, com apoio da CSD e da CTB, a corrente majoritária

conseguiu aprovar, nas três eleições subsequentes, o apoio à candidatura de

Lula da Silva e Dilma Rousseff para a presidência. Essa aprovação se repetiu

na Conferência Nacional dos Bancários (2006, 2010 e 2014), apesar das

críticas e votos contrários de Intersindical e Conlutas, que compreendiam não

ser adequado deliberar apoio a alguma candidatura, mas sim apresentar uma

pauta de reivindicações da categoria ao governo, sendo que este era um dos

principais empregadores de bancários.

As ações adotadas pelo governo para enfrentar a crise financeira

internacional foi outro aspecto no geral bem aceito entre as correntes, pois se

considerou adequadas as medidas de incentivo ao crédito, ampliação da

participação dos bancos públicos, incentivos tributários específicos e o fato de

tais políticas terem assegurado o nível de emprego e a ampliação da renda. Do

mesmo modo, o aumento real do salário mínimo, baseado nas regras firmadas

entre o governo e as centrais sindicais, em boa medida foi bem aceito pelo

sindicalismo da categoria. A Conlutas foi a mais crítica em relação aos dois

temas: no que se refere às políticas anticíclicas, considerou que elas teriam

beneficiado os grandes empresários sem garantias para os trabalhadores; em

relação ao salário mínimo, entendia que o avanço era tímido diante das

necessidades dos mais pobres e do compromisso do governo com os

banqueiros. Por sinal, as críticas ao pagamento dos juros da dívida pública

foram presentes em todas as análises de correntes.

Por fim, de um lado Articulação, CSD e CTB entenderam que o

governo conseguiu avançar em áreas importantes: na geração de emprego e

renda; diminuição da pobreza; reorientação do papel do Estado, tornando mais

ativo no desenvolvimento social e econômico do Brasil. Ainda assim, situações

problemáticas permaneceram como a falta de reformas estruturais, o excesso

de gastos com a dívida pública, a rotatividade e a baixa qualidade dos

empregos, a terceirização, a falta de ratificação de convenções da OIT

importantes, como a 158 e 156107, o processo de privatizações e concessões,

107 A convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) impede a demissão imotivada, ou seja, a empresa não tem ampla liberdade de dispensar o trabalhador, devendo justificar o desligamento de empregados. A convenção 156 da OIT estabelece a igualdade de oportunidades e tratamento entre homens e mulheres,

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particularmente no governo Dilma Rousseff108. Essas correntes advogaram a

tese do enfrentamento entre dois projetos distintos, um encabeçado pelo PT,

que representava a maior possibilidade de desenvolvimento do país, com

maior soberania e participação do Estado no enfrentamento às desigualdades;

a criação do emprego e renda, beneficiando aos mais pobres; o maior acesso

às políticas públicas de educação, saúde, moradia, saneamento, energia

elétrica, crédito para agricultura familiar, programas de transferência de renda;

valorização do salário mínimo; realização de concursos públicos, dentre

outros. De outro lado, o projeto liderado pelo PSDB representava o

neoliberalismo e os desejos das elites, principalmente do mercado financeiro, a

volta das privatizações, das reformas antipopulares, da retirada de direitos, o

retorno do desemprego e da pobreza, aspectos que marcaram os anos 90, nos

governos Cardoso.

As correntes que romperam com a CUT deram mais ênfase aos

aspectos negativos dos governos petistas, que estariam inseridos no

neoliberalismo. No entanto, para a Intersindical não era correto afirmar que os

governos do PT e do PSDB eram iguais, enquanto para a Conlutas as

diferenças eram muito pontuais. Para ambas as correntes, os grandes

problemas foram a continuidade de grande parte das políticas neoliberais, com

enormes ganhos ao sistema financeiro, os gastos excessivos com a dívida

pública, a reforma da previdência, a pequena redução da desigualdade, a

geração de empregos precários e com baixa remuneração, os benefícios às

grandes empresas, como as construtoras, o agronegócio, dentre outras, que

lucraram com a política desmedida de incentivos fiscais do governo (que para

a Intersindical começaram adequados, mas se excederam) e de financiamento

dispondo sobre a proibição de qualquer discriminação em razão da trabalhadora ou do trabalhador ter responsabilidade familiar. 108 O governo Dilma Rousseff sofreu as maiores críticas pela privatização e concessão de portos, aeroportos, rodovias, bacias para exploração de petróleo, dentre outras. O governo Lula da Silva foi criticado pela concessão de rodovias, mas foi majoritariamente elogiado pela compra de bancos públicos através do Banco do Brasil, que poderiam ter ido para a iniciativa privada. Os dois casos mais significativos são do BESC (Banco do Estado de Santa Catarina) e do BNC (Banco Nossa Caixa), este adquirido junto ao governo do Estado de São Paulo. O processo de transição na aquisição do BNC teve forte participação do movimento sindical, que garantiu o emprego e a maior parte dos direitos dos trabalhadores, embora haja críticas quanto alguns direitos que não foram respeitados, como os anuênios.

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público para as grandes corporações, sem contrapartidas adequadas, como

garantia de emprego e condições de trabalho. O governo não avançou em

reformas estruturais, nem nas causas indígenas e agrárias. Outro aspecto que

recebeu destaque foi a permanência da violência estatal. Por outro lado, a

Intersindical reconheceu avanços nas áreas sociais, nos investimentos

públicos, na valorização do salário mínimo, no enfrentamento à crise

internacional, na maior participação do Estado no desenvolvimento econômico

e social do país. Como afirmamos, a Conlutas em suas teses geralmente não

apontava aspectos positivos, embora chegasse a reconhecer avanços em

questões dos bancos públicos, como as contratações, porém frequentemente

frisava mais as críticas.

4.2 – As disputas na formulação e na centralidade das pautas

Durante o período, pudemos observar que muitos temas presentes

nas pautas de reivindicações da categoria tiveram largo consenso entre as

diferentes forças políticas do movimento bancário. Por outro lado, algumas

pautas foram pontos de disputas durante praticamente todo o período, em que

diferentes correntes políticas disputaram o conteúdo e a forma de propostas e

mesmo a centralidade que eles deveriam ocupar nas negociações e

mobilizações dos bancários. São esses temas e projetos que buscamos

debater nesse item, trazendo aqueles aspectos que consideramos mais

relevantes nas divergências e disputas entre as correntes109.

4.2.1 – Mesa única de negociação e campanha salarial

Um dos temas de disputas entre as correntes nas campanhas

nacionais é a organização da campanha em mesa única e a pauta econômica,

em particular a reivindicação do reajuste salarial da categoria, bem como a 109 A minuta de reivindicações dos bancários possuía, em 2015, 129 cláusulas e 68 páginas, sendo inviável reproduzi-la integralmente. Ela pode ser consultada em sua totalidade no link: bancariosce.org.br/arquivos/files/Minutas_Especificas_2015/Minuta-da-Pauta-de-Reivindicacoes-dos-Bancarios-2015-2016.pdf

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reposição das perdas salariais do plano Real. Durante os anos 1990,

especialmente após a implantação do Plano Real, os bancários tiveram

reajustes abaixo da inflação. No caso dos bancos particulares, cuja

negociação era realizada entre os sindicatos e a Fenaban, liderados pela CNB,

o prejuízo foi menor. Segundo levantamento do Dieese, para uma inflação

acumulada de 76,65% (INPC) entre 1995 e 2002, as campanhas asseguraram

reajuste de 72% no período – somados os oito anos –, ou seja, a perda real de

valor dos salários foi de 4,6%. No caso de Banco do Brasil e Caixa Econômica

Federal, a situação foi muito mais séria. As direções dos bancos públicos

reconheciam apenas a Contec como parte legítima de representação dos

funcionários e os canais de negociação eram extremamente limitados.

Em alguns anos, a campanha salarial foi definida em dissídio. Os

bancos públicos passavam pelo processo de reestruturação segundo a lógica

do governo FHC, bem definida no livro “metáforas do Brasil” (Rodrigues, 2004).

O BB passou por PDV (Programa de Demissões Voluntárias), no ano de 1995,

para enxugar o quadro de funcionários, processo relatado como de grande

pressão e assédio sobre os funcionários. Em 1986, havia sido extinta a

conta-movimento, que permitia ao BB utilizar recursos do tesouro. Desde a

gestão Collor, o banco passava por reestruturações para torná-lo mais próximo

aos padrões das instituições privadas, com constantes ameaças aos

trabalhadores. Em 1995 e 1996, o banco apresentou prejuízos – sob critérios

bastante discutidos e polêmicos, em que a instituição lançou como provisão de

devedores duvidosos diversos empréstimos com pouco ou nenhum atraso.

No período situado entre 1995 e 2002, os bancários do BB tiveram

reajustes de 33,70%, diante de uma inflação de 76,65% medida pelo INPC. Na

prática, resultou numa perda real de salário de 41,74%. Na Caixa Econômica

Federal, a situação foi pior, com reajustes de 26,94% e perdas de salários

acumuladas em 48,27%. No BB foram quatro anos com reajustes zero, na CEF

foram cinco anos sem qualquer correção nos salários. Em todos os anos, os

salários foram corrigidos abaixo da inflação. Em 1995, ano que chegou mais

próximo do INPC, a correção foi feita por determinação judicial, em dissídio.

Contudo, outros dissídios posteriores mantiveram a política de arrocho. A

suposta compensação era feita por meio de abonos; no caso do BB variaram

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entre R$ 1 mil e R$ 3 mil, com exceção aos anos de 1995 e 1999, em que não

houve abono. Na CEF os abonos variaram entre R$ 550,00 e R$ 4500,00, e

houve pagamento em todo período. Vejamos nas tabelas abaixo os reajustes.

TABELA 5. REAJUSTES ENTRE 1995 E 2002: FENABAN (PARA BANCOS PRIVADOS E

ESTADUAIS)

Ano Reajuste

salarial INPC (IBGE) Aumento Real PLR Abono

1995 30% 25,80% 3,34% 72% + R$ 200

1996¹

10,80%

14,28%

-3,05%

60% + R$ 270

45%

1997 5,00% 4,30% 0,67% 80% + R$ 300

1998

1,20%

3,59%

-2,31%

80% + R$ 300

R$ 700

1999 5,50% 5,25% 0,24% 80% + R$ 400

2000 7,20% 6,96% 0,22% 80% + R$ 450

2001 5,50% 7,31% -1,69% 80% + R$ 500 R$ 1.100

2002 7% 9,16% -1,98% 80% + R$ 550 R$ 1.200

Total 72% 76,65% -4,65%

ELABORAÇÃO: DIEESE - SUBSEÇÃO SESE/SEEB-SP. (1) NO ACORDO COLETIVO DE TRABALHO DE 1996/1997, O VALOR DO ABONO FICOU EM

45% DO SALÁRIO REAJUSTADO, LIMITADO ENTRE R$ 315 (NO MÍNIMO) E R$ 1.125

(MÁXIMO).

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TABELA 6. REAJUSTES ENTRE 1995 E 2002: ACORDOS DO BANCO DO BRASIL

Ano Reajuste

salarial INPC (IBGE) Aumento Real PLR Abono2

1995 25% 25,80% -0,64%

1996

0%

14,28%

-14,28%

R$ 1.100 a

R$ 1.600

1997

0%

4,30%

-4,30%

R$ 1.800 a

R$ 3.000

1998

0%

3,59%

-3,59%

R$ 1.000 a

R$ 2.000

1999 0% 5,25% -5,25%

2000 1,70% 6,96% -4,92% R$ 2.500

2001 2% 7,31% -4,95% R$ 1.000

2002 5% 9,16% -3,81% R$ 1.200

Total 33,70% 76,65% -41,74%

ELABORAÇÃO: DIEESE - SUBSEÇÃO SESE/SEEB-SP (2) PARA OS ANOS DE 1996 A 1998, FORAM CONCEDIDOS ABONOS NOS VALORES

INFERIORES PARA AS CARREIRAS DE SERVIÇOS AUXILIARES E SUPERIORES PARA AS

ADMINISTRATIVAS E TÉCNICAS.

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TABELA 7. REAJUSTES ENTRE 1995 E 2002: ACORDOS DA CAIXA ECONÔMICA

FEDERAL

Ano Reajuste

salarial INPC (IBGE)

Aumento

Real PLR Abono

1995 20,94% 25,80% -3,86% R$ 550

19963

0%

14,28%

-14,28%

R$ 1.000

1997 0% 4,30% -4,30% R$ 4.500

1998 1% 3,59% -2,50% R$ 1.000

1999 0% 5,25% -5,25% R$ 2.500

2000 0% 6,96% -6,96% R$ 1.200

2001 0% 7,31% -7,31% R$ 900

2002 5% 9,16% -3,81% R$ 1.200

Total 26,94% 76,65% -48,27%

ELABORAÇÃO: DIEESE - SUBSEÇÃO SESE/SEEB-SP O ACORDO FOI ASSINADO PELA CONTEC EM 09/10/97, RETIRANDO O DISSÍDIO 1996 DO

TST, E POSTERIORMENTE FOI ASSINADO PELA COMISSÃO DE EMPRESA. O REAJUSTE

DEFINIDO PARA SET/96E SET/97 FOI DE 0% E FOI CONCEDIDO UM ABONO PARA OS DOIS

PERÍODOS NO VALOR DE R$ 5.500. PARA OS ANOS DE 2001 E 2002, FICOU GARANTIDO O

PAGAMENTO MÍNIMO.

Como os bancários das instituições públicas federais não

participavam da CCT da categoria com a Fenaban e os bancos estaduais,

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tiveram prejuízos com a defasagem salarial, perderam direitos, seus planos de

cargos, carreiras e salários foram desestruturados, ficaram sem acesso aos

direitos da CCT da categoria – como cesta alimentação, que passaram a

receber muito depois e em valores inferiores. Não havia previsão de PLR em

acordos coletivos e, quando este existia, era pago conforme as regras criadas

pelos próprios bancos e muitos funcionários não recebiam.

A política sindical estava bastante prejudicada no BB e na CEF

devido à forma dura como o governo se relacionava com os sindicatos. A

retirada de direitos acentuava o temor e o assédio moral dentro das empresas

e dificultava a mobilização dos funcionários nas pautas coletivas. A CEF

instituiu a política de demissão imotivada, através do normativo interno RH008.

As mobilizações e paralisações da categoria foram feitas essencialmente pelos

bancos privados e estaduais, como o Banespa na luta contra a privatização. A

CCT da categoria era algo desejável para as instituições públicas, que ano

após ano perdiam salário e direitos. Portanto, instituir uma mesa única de

negociações, na qual estivessem todos os bancos de um lado e os sindicatos

de outro, era a situação vista como ideal para unificar as conquistas de todos

os bancários.

Quando se inicia o governo Lula da Silva em 2003, a demanda do

sindicalismo bancário, em sua ampla maioria, era que BB e CEF assinassem a

convenção coletiva da categoria, assegurando os mesmos direitos e

unificando o processo de negociação. Em abril daquele ano, a CEF revogou a

RH008 e abriu negociação para reaver as demissões ocorridas na vigência da

norma. Em 2003, pela primeira vez em mais de uma década, os bancários de

BB e CEF entram em greve para garantir que o acordo assinado pela Fenaban

fosse cumprido nos bancos públicos. O BB assinara um acordo reconhecendo

a CNB como parte legítima para representar os trabalhadores em suas bases.

Em 2003, pela primeira vez, os salários, PLR, abono, foram os mesmos para

bancos privados e públicos.

No ano de 2004, tanto BB quanto CEF assinaram documento se

comprometendo a cumprir o acordo nos termos negociados com a Fenaban e,

a partir de 2005, participariam na mesa única de negociação, mantendo

também reuniões à parte para debater as questões específicas das instituições

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federais. Em 2004, houve uma greve unificada da categoria que durou 30 dias,

no entanto, a Contec ajuizou dissídio coletivo no TST para os funcionários do

BB e da CEF. A assinatura em 2004 se deu com intermediação do Tribunal

para os bancos públicos – embora não tenha alterado muito da proposta

acertada com a Fenaban. A primeira CCT assinada por todos os bancos e

dentro do processo da mesa única foi a de 2005.

A mesa única, portanto, é uma realidade da categoria bancária, cuja

reivindicação foi encaminhada pelos principais sindicatos do Brasil. Mas é

ponto de polêmica para a corrente Conlutas. Esse debate surgiu já no

congresso da Fetec-SP em 2003. O MTS – que formou a Conlutas – defendia

mesas de negociação em separado (Fenaban, CEF e BB), com mobilização

conjunta de toda a categoria para repor as perdas salariais do plano real,

desde julho de 1994.

A Articulação exaltava a campanha e a CCT unificada, com

garantias a todos trabalhadores bancários do país. A corrente criticava a

postura de grupamentos na categoria cujo discurso era aproveitar o novo

governo para repor as perdas e diferenças salariais, em detrimento da unidade

da categoria. A crítica se direcionava ao MTS, que considerava a mesa única

uma forma de esconder e proteger o governo, dispensando-lhe de repor as

perdas salariais e os direitos dos trabalhadores dos bancos públicos.

O documento da Articulação no congresso 2003 devolvia a crítica

ao MTS dizendo que este, capitaneado por parte do movimento sindical

cutista, algumas entidades de representação interna (ANABB), juntamente

com a direita do movimento sindical (Contec) e a direita que ocupa cargos de

carreira nessas empresas públicas, ganha alguns adeptos nos bancos

públicos, mas era meramente economicista, não levando em consideração

uma política estratégica de fortalecer a unidade da categoria e o futuro da

organização. Diz:

(...) tendo uma CCT única, todos os bancos deverão segui-la, coisa jamais realizada na história do movimento sindical bancário. Essa é a oportunidade de fazer acontecer, aproveitando a fase nova de um governo democrático e popular. [...] Quem apostou em Campanhas Salariais separadas apostou contra o futuro e contra a organização e

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mobilização da categoria bancária” (Tese da Articulação, Fetec, 2003).

Essa mesma crítica à mesa única (ou mesa unificada, para

esclarecer que há negociações nas mesas específicas), na qual bancos

públicos e privados assinariam a mesma CCT em todo país, permeou muitos

debates subsequentes na categoria. Tinha de um lado a posição da Conlutas e

de outro da Articulação, apoiada pela Intersindical, CTB, CSD, que

acreditavam ser a melhor alternativa uma única convenção, de forma a unificar

os trabalhadores bancários nas lutas. Para uma política classista, não poderia

haver divisões e sim unidades para somar nas mobilizações e nas conquistas.

Em nossa interpretação, essa postura da Conlutas tem a ver com sua base

sindical, majoritariamente formada por bancos públicos, local no qual suas

oposições conseguem os melhores resultados, bem como uma estratégia de

desgaste do governo Lula da Silva naquele momento, como forma de

demarcar politicamente sua área de atuação e oposição política, ressaltando

diferenças com relação ao campo majoritário e setores da esquerda.

A despeito da CCT única, o Comando Nacional continuou

entregando pautas de reivindicações específicas para o BB e CEF,

apresentando demandas atinentes apenas a estas instituições, do mesmo

modo que manteve a assinatura de acordos específicos com esses bancos. A

CSD atribui a estratégia de ter a mesa com a Fenaban envolvendo todos os

bancos (mesa unificada) e mesas concomitantes para discutir as questões

específicas de cada banco, um modelo que permitiria contemplar as demandas

de cada corporação, em vez de um único espaço de negociação (Tese da

CSD, Conecef, 2014). Em diversas ocasiões, os bancos públicos

apresentaram correções nos pisos salariais, com efeito em todos os salários,

maiores que os índices previstos na CCT da categoria, do mesmo modo que

tanto BB quanto CEF possuem regras adicionais acordadas em aditivos, e são

mais favoráveis que a convenção, por exemplo, no que se refere à PLR.

Ao analisar a dinâmica das negociações, o que unifica correntes

como Conlutas, Intersindical, CTB e CSD é a reivindicação de reposição de

todas as perdas salariais ocorridas no governo FHC, período no qual

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funcionários de BB e CEF tiveram seus salários praticamente congelados.

Como mencionado, o governo FHC tinha por objetivo equiparar os

vencimentos de funcionários de BB e CEF com os demais bancários do setor

privado. Os empregados em bancos públicos tinham historicamente salários

maiores. Ainda hoje ganham um pouco mais, porém a diferença é muito

menor. As reposições salariais necessárias são calculadas entre 70% e 93%

para que os bancários de BB e CEF atinjam o mesmo patamar remuneratório

anterior às perdas salariais. Do outro lado, a Articulação defende que a luta

seja por aumento real de salário e correção no piso que garantiria o aumento

do poder de compra do salário e a valorização da categoria.

Na prática, Intersindical, CSD e CTB, embora defendam o modelo

de negociação do comando nacional, com a “mesa única”, somam-se à

Conlutas na pauta da reposição, pois acreditam que deve haver maior pressão

do movimento para reposição das perdas salariais. Essa discussão, na

avaliação dessas correntes, tem passado sem a devida importância nas

discussões com os bancos públicos, embora já tenha sido aprovada em

congressos de funcionários do BB e da CEF.

Outro tema de disputa entre as correntes refere-se ao reajuste

demandado pela categoria junto à Fenaban na pauta de reivindicações. A

Articulação tem defendido que seja a inflação e mais um aumento real, que foi

em torno de 5%, entre 2007 e 2015, e piso da categoria igual ao salário mínimo

do Dieese. A Articulação defende sua posição baseando-se também na

“consulta aos bancários”, que são formulários levados pelos sindicatos às suas

bases para questionar aspectos da campanha salarial: quais devem ser as

prioridades e qual índice a ser reivindicado. Segundo a corrente, a proposta de

aumento real de 5% encontra-se em consonância com a maior parte das

respostas dos bancários. Já a CTB, CSD, Intersindical e Conlutas entendiam

que a demanda deveria ser maior. Há a compreensão de que, se o pedido de

reajuste for maior, melhora a capacidade de mobilizar a categoria, que se

sente mais motivada em entrar numa campanha salarial e em greve para

reivindicar reajuste de 20%, 30% do que pouco mais de 10% como aconteceu

na maioria das campanhas salariais entre 2003 e 2015. Além disso, é justo e

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compatível com o aumento da rentabilidade dos bancos, portanto, seriam

valores a título de reposição da inflação e produtividade.

As correntes possuem acordo em relação ao piso salarial tendo

como referência o salário mínimo do Dieese. Nas últimas campanhas, as

correntes minoritárias apresentaram propostas de reajustes, na Conferência

Nacional dos Bancários, superiores ao que foi defendido pela Articulação. A

proposta era de inflação mais 10%. Entretanto, saiu vitoriosa a proposta da

Articulação, com maioria no plenário, tendo apoio da Unidade Sindical.

Outra divergência entre a corrente majoritária e a Conlutas e

Intersindical refere-se ao formato de construção da comissão de empresa nos

bancos públicos. Atualmente elas são construídas nas federações de

sindicatos, que indicam os nomes para compor a comissão, proposta

defendida pela Articulação, enquanto as outras duas correntes entendem que

ela deveria ser eleita proporcionalmente nos congressos dos funcionários do

Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Na prática, o atual modelo

beneficia a Articulação, já que as federações possuem forte hegemonia da

corrente, que possui também o controle das comissões de empresa. Outra

divergência é sobre o número de delegados para cada base: enquanto a regra

atual assegura um delegado para cada 300 funcionários, a Intersindical propôs

um para 200 e a Conlutas chegou a apresentar um para cada 100 funcionários.

Tem sido mantida a regra de 1 para 300.

4.2.2 – PLR e metas

A Participação de Lucros e Resultados consta na CCT da categoria

bancária desde 1995, ano em que entrou em vigência a MP 794 – e suas

seguidas reedições –, que previu a aplicabilidade do mecanismo como forma

de integração entre capital e trabalho e incentivo à produtividade. A

participação de lucros havia sido prevista nas constituições de 1946, de 1967 e

1969, tornando a aparecer no art. 7° da CF/1988. A PLR consta como

“desvinculada da remuneração”. Embora já houvesse alguns programas de

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participação nos bancos privados, eles não eram previstos em contratação

coletiva.

No ano 2000, a PLR tornou-se lei, com número 10.101, proposta

pelo governo federal. A norma permite que as empresas abatam os valores

pagos à título de PLR do lucro real, reduzindo a cobrança do imposto de renda

de pessoa jurídica devido pelas empresas. Os sindicatos ou uma comissão de

funcionários devem participar das negociações, através de convenções e

acordos. As empresas podem deduzir seus programas próprios de

remuneração daqueles firmados em acordos, ou seja, se o banco já tem uma

política de remuneração variável baseado na produtividade, na rentabilidade,

ele pode utilizar os valores pagos nessa política para descontar de seu

funcionário aquele acordado por meio de convenção ou acordo coletivo.

A PLR vem ocupando espaço crescente de importância dentro das

convenções e acordos firmados pelos bancários, em bancos públicos ou

privados. O tema desperta polêmica, em conjunto com a ampliação das metas

cobradas pelas instituições de seus funcionários; metas estabelecidas pelas

direções e divididas pelas empresas entre todas as suas unidades.

Pelo seu caráter de remuneração variável, a PLR não possui

incidência de encargos sociais, tampouco reflexos salariais para os

funcionários que a recebem. Entretanto, trata-se de um valor que pode

representar algumas vezes o salário mensal do empregado. Segundo o Dieese

(2016), por exemplo, na média, um caixa de banco recebeu em 2015 uma PLR

de R$ 9916,37, porém o salário base da função é de R$ 2669,45, isto é, o

montante da PLR equivale a quase quatro salários brutos.

Nota-se a ampliação dos valores recebidos individualmente por

meio da PLR: levando em conta as cláusulas da CCT de 1995 e 2015, tendo

como referência o cargo de caixa de banco, a PLR aumentou 324% acima da

inflação. Por outro lado, o lucro dos bancos cresceu em torno 1100% em

termos reais (Dieese, 2016b) nesse período. Se de um lado, para o

funcionário, tornou-se um valor com o qual ele conta pelo seu aspecto

imediato, para os bancos isso não tem ampliado seu gasto com folha de

pagamento, na medida em que não é um valor fixo e não possui reflexos em

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outras despesas com pessoal, havendo inclusive possibilidade de abatimento

fiscal. Portanto, é preferível aos bancos investir em programas de

remuneração variável e colocá-los num lugar central da discussão econômica

com a categoria do que discutir aumentos de salários, que trazem benefícios

aos funcionários aparentemente menores no imediato, mas de longo prazo, em

termos de garantias e incorporação de rendimentos de forma fixa e definitiva. É

o reforço da lógica da flexibilização do trabalho: remuneração variável tomando

mais espaço dos rendimentos do trabalhador e o pagamento mediante

produtividade, transferindo ao trabalhador as responsabilidades e os riscos

para o aumento da lucratividade – num processo gradativo de privilegiar a

renda variável em detrimento da fixa.

Além disso, como há muito se verifica, a remuneração variável e os

programas próprios vinculam o funcionário às demandas do banco, tornando-o

responsável pela sua própria remuneração, o que amplia o individualismo.

Alcançar os resultados cada vez maiores cobrados pelos bancos é uma

necessidade para assegurar o emprego ou o cargo e para garantir ascensão

profissional e uma remuneração melhor. De forma que a remuneração variável

se tornou uma demanda de parcela importante da categoria, que passa a

entendê-la como a justa valorização do empenho pessoal. Esse esforço

pessoal e da equipe de trabalho na unidade é visto na perspectiva do mérito, o

que dilui laços de solidariedade e de ação coletiva. Não é raro, assim,

funcionários irem contra a greve e tentarem entrar nos locais de trabalho por

terem metas a cumprir. A chamada entrega do resultado tornou-se a grande

máxima nos locais de trabalho bancário.

Por mais que exista o entendimento da própria categoria de que as

metas são exageradas, exigem demais dos funcionários e prejudicam as

condições de trabalho, a lógica se retroalimenta. O funcionário sente-se

obrigado a atingir os resultados para se manter empregado e alcançar

melhores rendimentos, compatíveis com o seu esforço. A agência bancária,

para ser viável e receber o reconhecimento do banco, precisa assegurar o

cumprimento das metas da unidade e dos seus funcionários.

Dentre os grandes bancos atuantes no Brasil, apenas o Bradesco e

a Caixa Econômica Federal (CEF) não possuem programas próprios de

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remuneração baseados nos resultados e lucros, somente o acordado na CCT

e ACTs. A CEF diferencia-se do Bradesco pois paga comissão sobre a venda

de produtos e serviços bancários.

O Banco do Brasil, Itaú e Santander pagam programas próprios, sob

regras distintas, mas nenhuma é negociada com o sindicato, são critérios

unilaterais das empresas. O Banco do Brasil chama de módulo bônus, atrelado

ao cumprimento de resultados em suas unidades e carteiras, e passou a

remunerar os funcionários sobre a venda de produtos por um sistema de

pontuação e troca por produtos da empresa Livelo. O módulo bônus soma-se

ao estabelecido no acordo sindical. O Itaú possui diversos programas próprios,

sendo o principal o Agir, que se baseia em resultados individuais e das

unidades. O Agir desconta do valor estabelecido na convenção. Para os

cargos de confiança mais altos, o programa próprio costuma pagar mais que o

acordo firmado junto aos sindicatos. No Santander, é chamado de PPE

(Programa Próprio Específico). Há também o Programa Próprio de

Remuneração Santander, cuja contratação é feita pelos sindicatos e tanto os

valores desse programa quanto do PPE não descontam da PLR estabelecida

na CCT.

Na minuta de reivindicações entregue pela Contraf à Fenaban, a

PLR aparece no artigo 34. Nele, a reivindicação é de três salários mais verbas

de natureza salarial, reajustadas na CCT mais uma parcela fixa, que na minuta

de 2015/2016, foi de R$ 7.246,82 (sete mil, duzentos e quarenta e seis reais e

oitenta e dois centavos). Em caso de prejuízo, o valor reivindicado aos bancos

é de um salário mínimo calculador pelo Dieese. A minuta ainda demanda que

não haja descontos dos programas próprios na PLR, devendo-se somar os

dois. Esse é o modelo que se consolidou de PLR a partir de 2007. Em 2005, a

categoria reivindicava PLR de um salário, mais valor de R$ 788,00 e 5% do

lucro distribuído de forma linear, essa mesma proposta repetiu-se em 2006,

com atualização do valor. No entanto, naquele ano, a conquista de uma

parcela adicional condicionada ao lucro do banco tornou-se uma armadilha

para a categoria, que receberia valores adicionais desde que o banco lucrasse

mais. Em 2007, a reivindicação já incluía dois salários e R$ 3500,00 de valor

fixo.

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Na CCT assinada e válida em todo país em 2015, a regra

conquistada foi de 90% do salário base mais as verbas de natureza salarial, o

valor fixo de R$ 2021,79, limitado ao teto individual de R$ 10.845,92. Essa

regra não pode ser menor que 5% e nem maior que 12,8% do lucro líquido da

instituição financeira. Caso fique menor que o percentual mínimo, o valor

individual deve ser majorado até o máximo de 2,2 salários por funcionário ou

5% do lucro, o que acontecer primeiro, e se for maior que 12,8% haverá uma

redução no valor individual. Além desse, é somado o valor resultante da

divisão linear de 2,2% do lucro líquido pelo número de funcionários aptos a

receber, até o limite de R$ 4043,58. Sobre a primeira parte, a chamada regra

básica da Fenaban, pode haver compensação de programas próprios – o que

não ocorre sobre a segunda, que se refere à parcela adicional.

De acordo com o Dieese (2016b), o total do lucro líquido dos bancos

utilizados para pagamento da PLR tem se comportado da seguinte forma:

TABELA 8 - PROPORÇÃO DA PLR SOBRE O LUCRO LÍQUIDO DOS BANCOS

Banco 2010 2015

Bradesco 6,9% 6,6%

Itaú 6,2% 5,2%

Santander 6,6% 7,2%

CEF 18,4% 17,5%

BB* 9,2% 9,0%

FONTE: DIEESE (2016B) *NO CASO DO BB NÃO CONSIDERA O MÓDULO BÔNUS. NO CASO

DA CEF, O ACORDO ADITIVO DE PLR PERMITE QUE OS VALORES DISTRIBUÍDOS

ULTRAPASSEM 12,8% DO LUCRO LÍQUIDO.

Nota-se que a quantidade de recursos proporcionais utilizados

pelos bancos em relação ao seu lucro decresceu no período de 2010 a 2015

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em todas instituições, com exceção do Santander. O mesmo estudo aponta

que esse índice era de 14% tanto no Bradesco quanto no Itaú no ano de 1995.

Isso significa que, apesar da importância da PLR ter aumentado nos salários e

nas discussões da categoria – com diversas alterações na regra ao longo do

período –, seu valor perante os lucros foi reduzido. O estudo do Dieese mostra

essa contradição: redução do percentual distribuído conforme o lucro dos

bancos aumenta. Quanto maior é o banco, menor é o percentual distribuído.

Na Caixa, a proporção é significativamente maior em função da conquista da

PLR social, em 2010, com a distribuição de 4% do lucro de forma linear. A

conquista foi justificada como forma de compensar o trabalho social realizado

pelos empregados da instituição, na intermediação de interesses do governo e

da sociedade, por meio de políticas públicas. Não se baseia nos parâmetros de

atingimento de metas comerciais. Na Caixa, portanto, além da regra básica da

Fenaban, os funcionários recebem 6% dos lucros distribuídos linearmente.

Com a importância da PLR cada vez maior, passou a ser frequente

nas pautas dos sindicatos a discussão sobre o assunto, o que suscita debates

e divergências entre as diferentes correntes do sindicalismo. Nenhuma delas

propõe deixar de debater ou retirar a PLR da pauta, porém, seu formato é

discutido. A Articulação e a CSD têm feito prevalecer sua posição sobre o

tema, que é a reivindicação apresentada na campanha salarial, na qual se

multiplicam três salários e mais um valor fixo, que em 2015 foi R$ 7246,82.

Com esse modelo, quem ganha salários maiores, recebe maior valor de PLR.

De acordo com a visão da corrente, é uma forma de valorizar e dialogar com

todos os segmentos de funcionários, que receberiam uma mesma proporção

de participação, vinculada ao salário recebido e um valor fixo, esse linear.

Desse modo, os sindicatos estariam representando os diversos segmentos de

cargos dentro dos bancos, com suas diferenças de atribuições. Para as

correntes minoritárias, como a Intersindical, Conlutas e CTB, essa posição não

é adequada. Primeiro, porque o valor que os bancos pagam relativos aos

lucros, são pequenos. Segundo, porque a distribuição não é justa se feita

baseada em salários. O correto seria a divisão linear do lucro para todos os

funcionários. Nos documentos mais recentes, defendem o formato de 25%

distribuídos igualmente. Assim, a diferença salarial existente já compensaria

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as diferentes atribuições e responsabilidades dos cargos, não tendo razão

para manter uma PLR desigual entre os funcionários.

Outro embate frequente é em relação às metas. Novamente divide a

Articulação e CSD e as posições de Intersindical, Conlutas e CTB. Enquanto a

Articulação entende que a pauta deve ser contra as metas abusivas – que hoje

permeariam todas instituições –, as demais correntes citadas entendem que a

posição deve ser contra as metas de modo geral, pois elas já acarretariam

prejuízo aos trabalhadores bancários de serem cobrados por objetivos criados

pelos bancos, que causam estresse, pressão, adoecimento e competição entre

os trabalhadores. A Articulação defende que metas são inerentes às atividades

econômicas, e mesmo em organizações sindicais e sociais estão presentes,

seria algo que por si só não teria problema. O problema estaria embutido nas

metas abusivas, no excesso de pressão, no assédio moral e na

individualização das metas e exposição de resultados, que é a política mais

comum nas instituições bancárias. Embora as correntes reconheçam os

problemas enfrentados pelos trabalhadores diariamente em sua rotina de

trabalho, sua origem é controversa: de um lado encontram-se aqueles que os

atribuem à presença de metas abusivas, de outro os que concebem de que a

existência de metas por si só já seriam o problema.

Ao analisarmos o posicionamento da Intersindical entre 2003 e

2015, podemos encontrar essa defesa da PLR no formato de distribuição de

25% do lucro linear, sem que esteja vinculado ao cumprimento de qualquer

meta. Em 2003, a crítica foi feita em relação à participação de sindicatos nos

debates internos dos bancos quanto ao PPR (Programa Próprio de

Resultados). Na visão da corrente, os sindicatos não deveriam participar

desses espaços, pois legitimariam a imposição de metas e cobrança sobre os

funcionários. Além disso, essa política dos bancos intensifica o trabalho e

individualiza a relação trabalhista, pressionando e levando os bancários ao

adoecimento. Como consequência, isso despolitiza a categoria e os sindicatos

ao tomarem parte dessa discussão dos bancos. O caminho seria unificar e se

posicionar com a categoria contra os problemas e as consequências dessa

exploração do trabalho, posicionando-se da seguinte forma:

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(…) nós não podemos assinar nenhum acordo com que condicione a PLR às metas” (Contraf, 2006) (...) (...) e “fim do assédio moral e da cobrança por metas! Esse modelo de gestão imposto pelos bancos destrói a saúde física, psicológica e emocional dos trabalhadores! ” (Fetec, 2009), “é urgente termos uma PLR linear para toda a categoria bancária, ou algo como já tem nos bancos públicos: onde um percentual do lucro já é distribuído linearmente a todos os bancários” (Fetec, 2012) (...) A PLR serve de paliativo para o resto do ano, onde as bancárias e os bancários continuarão sobrevivendo com baixos salários e grandes pressões. Vale ressaltar que a PLR é um mecanismo importante para distribuir os resultados com quem, de fato, os produziu. No entanto, é preciso estar atentos/as para que a mesma não o utilize como forma de naturalizar os índices rebaixados de reajuste salariais”. (Tese da Intersindical, Conecef, Contraf, 2014)

No congresso interestadual da categoria dos estados do Rio de

Janeiro e Espírito Santo (este último liderado pela Intersindical), foi aprovada a

minuta de reivindicações para ser levada à conferência nacional. Nela, é

reiterada a posição da corrente em relação ao índice salarial a ser reivindicado

e quanto a PLR. Assim como na conferência estadual de São Paulo, a corrente

apresentou novamente a proposta de PLR linear de 25% do lucro dos bancos.

A Intersindical em suas posições políticas destaca que a PLR é

importante e serve de “paliativo para uma categoria endividada”, entretanto

destaca que se deve ter cuidado para que não seja usada a fim de naturalizar

índices salariais menores. Da mesma forma, é reiterada a posição de não

permitir que a distribuição de lucros e resultados esteja vinculada ao

atingimento de metas, que a corrente se posiciona contra.

Do mesmo modo, a Conlutas vem se posicionamento a respeito da

PLR e das metas, como se pode notar nos documentos assumidos pela

corrente sindical: “PLR linear de 25 % do lucro sem vínculo de metas” é uma

pauta recorrente neste período por parte da central. Além disso, a Conlutas

critica o papel que a PLR vem ocupando: em vez de reajustes salariais, sobre

os quais incidem direitos trabalhistas, tem havido a priorização da PLR.

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Entretanto, como podemos notar nas pautas de reivindicação da Conlutas, a

PLR tem sido uma constante, sob o formato de distribuição linear:

A questão da PLR Nós discordamos da política implementada pelo BB com o apoio da CONTRAF/CUT, que prioriza o pagamento da PLR em detrimento dos salários. Na verba de PLR não incide FGTS ou INSS, o que significa que estes valores não serão levados em conta no cálculo da aposentadoria do bancário. Com certeza isso interessa ao banco, que acaba gastando muito menos. Além disso, o valor da PLR depende do lucro do banco. A crise econômica, somada ao custo das aquisições dos bancos realizadas pelo BB devem derrubar seu lucro no próximo período. Isto significará uma redução substancial na PLR paga aos bancários do BB. [...] Propomos Que a PLR seja distribuída de forma linear ao conjunto dos empregados (Tese MNOB, CNFBB, Contraf, 2010). [...] Fim das metas e do assédio moral/sexual que estão adoecendo os bancários! Punição para os assediadores! Custeio total dos gastos com saúde por parte das caixas de assistência dos bancos. (Tese MNOB, Conecef, Contraf, 2014)

Apesar da crítica, o texto não apresenta alternativa a esse modelo,

tão somente propõe melhorar a distribuição e torná-la mais justa com quem

ganha os menores salários, desvinculado de metas. O problema de ser uma

remuneração variável permanece, bem como a dependência do bancário a

esse valor adicional ao salário recebido duas vezes ao ano (uma vez por

semestre). Porém, não se trabalha com medidas objetivas para que a

negociação da PLR não influencie a luta por reajustes salariais, tanto na

organização do movimento quanto na expectativa das bases.

Do mesmo modo, a CTB vem realizando essa discussão quanto à

linearidade da PLR, defendendo nos últimos anos o mínimo 25% do lucro

líquido. A posição contra as metas também foi firmada na última década. Ainda

em 2006, na conferência nacional, a tese da corrente, à época CSC, defendia o

“fim das metas abusivas”, porém essa postura mudou para o fim das metas:

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Desta forma propomos que a Conferencia Nacional aprove uma Minuta Mínima Unificada de Reivindicações, destacando a Valorização do Trabalhado (reposição da inflação, aumento real, produtividade, ampliação da cesta alimentação e da participação nos lucros), Isonomia de Tratamento e Fim das Metas Abusivas. Os Congressos dos BB, CEF, BNB e BASA devem aprovar as Minutas Complementares. (Tese da CTB, Contraf, 2006) Campanha Salarial - Elevação do piso salarial, tendo como referência o salário mínimo do DIEESE; Reposição das perdas salariais (recomposição do poder de compra) a partir dos anos 90; - PLR linear para todos os empregados, com distribuição mínima de 25% do lucro (Tese da CTB, Conecef, Contraf, 2014).

A CSD defende visão parecida com a Articulação no que se refere

às metas:

Considerando que as metas ocorrem em todas atividades humanas, todavia não pode ser um instrumento de gestão opressor. Não pode, portanto, significar pressão, assédio, doenças. Nesse sentido defendemos a democratização na definição das metas – metas coletivas com a participação dos trabalhadores na sua definição” (CSD Bancária)110.

Quanto à PLR, tem defendido que não se permita a individualização

dos resultados, e concorda com a proposição da Articulação, de três salários e

valor fixo. Desde 2006, na pauta de reivindicações da categoria bancária

consta o artigo que pretende contratar a remuneração variável,

Com o objetivo de oferecer resistência, interferir na lógica da gestão individual para coletiva e exigir o fim das metas abusivas, fica convencionado que os bancos pagarão mensalmente a título de remuneração complementar 10% (dez por cento) sobre o total das vendas de produtos financeiros realizadas nas unidades e 5% (cinco por cento) da receita de prestação de serviços, apurada trimestralmente e distribuída de forma linear. [...]

110csdbancaria.org/2015/12/10/definicoes-aprovadas-na-conferencia-estadual-da-csd-bancari

ars. Consulta em 09/11/2016.

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Durante a vigência desta convenção coletiva de trabalho, os reajustes e outras formas de remuneração serão previamente negociados entre as partes signatárias do presente instrumento. (Minuta de reivindicações da categoria bancária, 2015)

A defesa da proposta pela Contraf argumenta que as negociações

salariais abrangem o salário fixo, salários indiretos e PLR, porém a

remuneração variável é organizada totalmente a critério do banco. O objetivo

da cláusula, portanto, é que nenhum banco utilize dessa política para

remuneração sem que a discuta com o sindicato. Avalia-se que esse tipo de

programa traz inúmeros problemas, como maior assédio e pressão sobre o

funcionário, por individualizar o resultado, promover a competição entre

colegas de trabalho; maior rotatividade baseada no perfil de venda; além de

doenças de trabalho decorrentes da cobrança. Apesar da aprovação, a

proposta recebeu críticas de outras correntes minoritárias. Uma das mais

destacadas pela Intersindical:

(...) contratar remuneração variável é uma forma de legitimar a pressão por metas e, consequentemente, o assédio moral. Isso pode gerar um achatamento maior dos salários, deixando os bancários reféns da venda de produtos. Temos que lutar por um reajuste salarial digno e pela valorização do piso. É uma contradição tentarmos acabar com as metas e com o assédio e, ao mesmo tempo, ganhar em cima da venda de produtos”, explica Carlão, coordenador geral do Sindicato/ES111.

Esse dilema entre se opor ao modelo de gestão dos bancos, que

cada vez mais transforma o trabalhador prioritariamente em vendedor de

produtos e serviços financeiros, e ao mesmo tempo buscar inserir a prática da

remuneração variável numa contratação coletiva na qual os sindicatos possam

interferir é uma realidade da categoria. A lógica financeira da economia

neoliberal aprofundou a diversificação de produtos e serviços (Chesnais, 1998)

e mesmo com a resistência dos trabalhadores quanto às diversas

flexibilizações no setor, elas têm acontecido: terceirizações, demissões,

privatizações, entre outras. Assim, pode parecer tentador buscar a negociação

111

Disponível em migre.me/w10Oy, consulta em 09/11/2016.

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dentro desse contexto, já que parece inevitável a forma como ele se consolida.

Entretanto, ao aceitar a remuneração variável como regra e reivindicar apenas

a contratação coletiva, o modelo de remuneração torna-se cada vez mais

paradigmático e não muda sua característica variável e flexível. Continuará

sendo uma verba sobre a qual não incidem encargos sociais e sem direitos

embutidos. Sem dúvida, contratar coletivamente é melhor do que a definição

unilateral da PLR, que fortalece o individualismo, mas buscar essa mediação

pode ter efeito danoso, pela capitulação que essa forma de remuneração

representa diante da defesa do salário.

4.3 – Retomada e rotinização das greves

O período estudado caracterizou-se pela retomada de mobilizações

da categoria bancária, com protestos e greves praticamente em todos os anos.

A partir de 2003, a categoria bancária passa novamente a realizar greves

durante as campanhas nacionais. Depois de mais de uma década em

defensiva com relação às mobilizações, emprego em declínio no setor e

dificuldades de organização dos trabalhadores, os sindicatos conseguem

novamente assumir papel de liderança e movimentar politicamente a

categoria.

Diversos autores debateram do ponto de vista teórico as condições

para ampliação das greves (Edwards e Hyman, 1994; Shalev, 1992 e 1993;

Rehfeldt, 1995). Segundo Rehfeldt (1995), o estudo clássico das greves

relaciona os ciclos econômicos, particularmente o nível de emprego, às

condições para os trabalhadores se engajarem em greves. Quando o

desemprego diminui, as greves aumentam em frequência, pois há melhores

condições objetivas dos trabalhadores se organizarem, sem serem

pressionados pelo desemprego, já que há maior oferta de trabalho e

possibilidades dos empregados se realocarem no mercado; situação que se

inverte em casos de elevado índice de desempregados. Mas há outras

abordagens sobre o tema, que associam o aumento e a diminuição das greves

não com os ciclos econômicos e sim com os políticos.

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Dentre essas abordagens, duas nos parecem pertinentes ao caso

brasileiro, e à categoria bancária em particular: as teorias do

neocorporativismo e dos recursos de poder que enfatizam o caráter

neocorporativo na relação dos sindicatos com um governo de origem popular e

as condições favoráveis às negociações, tanto no setor público quanto no setor

privado, asseguradas por um partido socialdemocrata no poder.

O sindicalismo bancário manteve uma notável capacidade política,

a despeito da conjuntura desfavorável dos anos 1990, em que as políticas

neoliberais passaram a ser implementadas com forte vigor no Brasil. Dentre as

medidas que tiveram maior impacto no setor bancário, pode-se mencionar a

reorganização do sistema financeiro nacional, a partir do plano real, com

direcionamento do governo federal para a concentração e internacionalização

do setor (Minella, 2007; Jinkings, 2002; Malerba, 2011); as privatizações de

instituições públicas estaduais, que sempre foram forte polo de resistência dos

trabalhadores bancários; as políticas de mudança no perfil das instituições

públicas federais, como o Profif (Programa de Fortalecimento das Instituições

Financeiras Públicas Federais); as flexibilizações na legislação trabalhista e o

conjunto de políticas austeras que ampliaram o desemprego. Portanto, havia

um sentido de transformações financeiras e econômicas orientadas pelo e

para o mercado, através do governo federal, ao mesmo tempo em que os

bancos inseriam novas plataformas tecnológicas, de controle e de organização

do trabalho bancário (Segnini, 1998 e 1999).

Podemos afirmar que os bancários mantiveram importante

capacidade política devido ao papel que exerceram na resistência às políticas

neoliberais no seio da classe trabalhadora. Suas entidades foram importantes

articuladoras de diferentes movimentos, assim como incentivaram e

promoveram diversas mobilizações populares (Junckes, 2004). Entretanto,

não tiveram condições de realizar grandes greves ou mobilizações na

categoria, em função do cenário político e econômico adverso, inclusive de

perseguição a dirigentes sindicais nas instituições públicas (Rodrigues, 2004).

Contudo, são conhecidas algumas das estratégias utilizadas nos anos 1990

para conseguir, de alguma forma, atingir aos banqueiros e reivindicar os

direitos. As mobilizações chamadas kinder, em que os dirigentes paravam

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prédios administrativos e espaços de negócios dos bancos, de forma surpresa,

foi um dos repertórios mais comuns para contestar e buscar negociações com

os bancos. A categoria, em seu conjunto, estava preocupada com seu destino,

em virtude da redução de mais da metade dos postos de trabalho entre o início

e o final da década.

Nesse sentido, a eleição de Lula da Silva em 2002, simbolizava

tanto para dirigentes quanto trabalhadores, nos locais de trabalho, a

possibilidade de retomada de espaços para reivindicar e direitos a

reconquistar, sem que houvesse perseguição e criação de dificuldades no

exercício das mobilizações. Dessa forma, entendemos que antes de qualquer

elemento econômico concreto, a retomada de mobilizações bancárias a partir

de 2003 se deve, sobretudo, à mudança no cenário político. A percepção de

um cenário político favorável advém tanto da trajetória dos principais membros

do governo Lula da Silva e da nomeação de diversos sindicalistas em altos

cargos, quanto do apoio emprestado pelo Partido dos Trabalhadores a

inúmeras mobilizações populares nas décadas que antecederam sua

ascensão ao governo federal.

Mas esse elemento do contexto político, embora fundamental, não

conseguiria isoladamente explicar a recuperação das mobilizações na

categoria bancária de forma vigorosa no início do novo governo. Os acessos

aos meios institucionais não garantem, por si só, a organização política e

reivindicatória de trabalhadores do setor público e privado. Como mencionou

Rehfeldt (1995), os sindicatos fortalecem-se ou enfraquecem conforme o

cenário econômico. As crises atingem de forma diferenciada os sindicatos,

sendo mais resistentes aqueles que possuem mais sindicalizações e mais

organização. A importância do contexto econômico no caso brasileiro é

fundamental, contudo deve-se destacar que o sindicalismo bancário

atravessou os períodos mais difíceis de crise nos anos 1990 com boa

capacidade de organização e sindicalização, o que certamente propiciou

melhores condições para se beneficiar quando houve a melhora no cenário

econômico do país. No primeiro ano de mandato de Lula da Silva houve

greve nos bancos públicos federais e, em 2004, aconteceu a primeira greve

nacional da categoria, após mais de uma década. A greve de 2004 não

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contava, a princípio, com o apoio das principais direções sindicais do Brasil,

nem da CNB, que entendiam que a proposta da Fenaban chegara a um bom

nível e contemplava reivindicações da categoria, algo que dificilmente seria

ampliada com greve. A proposta dos bancos era, na ocasião, de 8,5% de

reajuste salarial, com mais R$ 30,00 para salários menores de R$ 1500,00, o

que elevaria o reajuste dos menores salários para até 12,77%, frente a uma

inflação de 6,64%. Apesar da tentativa de as direções convencerem as bases a

aceitar o acordo, as oposições bancárias conseguiram derrotar a proposta nas

assembleias, refletindo nos discursos um sentimento favorável à greve por

parte dos trabalhadores. Ademais, os militantes de oposição, ligados

principalmente ao PSTU, estimulavam o discurso de que as direções cutistas

adotaram postura moderada na luta para defender o governo, que seria

associado aos banqueiros. A Articulação, principal força nas direções,

defendeu a proposta por concebê-la como bastante positiva, ao garantir entre

cerca de 2% e 6% de aumento real nos salários. Em São Paulo, a proposta

também foi rejeitada, com forte atuação das correntes minoritárias para isso,

particularmente da Conlutas e das que viriam a criar a Intersindical. O

resultado das assembleias levou a categoria a enfrentar uma greve nacional de

30 dias, sem que os banqueiros oferecessem qualquer outra proposta.

O dirigente Edson Silva (Índio), da Intersindical, entende que o início

do governo Lula da Silva e a forma como as direções se colocaram quanto à

greve teve importância no que se refere às rupturas na categoria:

“Principalmente no início do governo Lula, em particular em 2004, faltou

ousadia por parte da direção do movimento, o que gerou desconfianças numa

parcela da categoria [da independência do movimento]. Isso acabou por abrir

caminho para sectarismos e divisão”112.

Após mais de vinte e cinco dias de greve, a Contec (na época, filiada

à CGT) ajuizou dissídio coletivo no TST para os bancos públicos, BB e CEF,

alegando que o governo federal estaria criando dificuldades nas negociações e

na tentativa de encontrar uma solução negociada. A oposição bancária apoiou

o ajuizamento em todo o país, sendo duramente criticada pelas correntes

cutistas por se associar ao sindicalismo oficial em defesa da saída judicial, que

112 Entrevista realizada pelo autor em 09/11/2016.

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representou, ao longo dos anos 1990, inúmeras derrotas para o movimento

sindical bancário113.

Em nossa análise, a greve de 2004 tornou-se emblemática dos

desdobramentos de negociações e greves da categoria nos anos

subsequentes. Ela inaugurou um ciclo de greves nacionais na categoria114, que

se repetiria anualmente até 2016. A única exceção foi no ano de 2007, em que

a proposta apresentada pela Fenaban contemplava aumento real, ampliação

da PLR e criação da 13ª cesta-alimentação, conforme será detalhado no

próximo item. A proposta da Fenaban e as específicas do aditivo do BB foram

aceitas pela maioria da categoria – houve greves em algumas bases sindicais,

mas que não prosperaram em razão do quadro geral do país –, enquanto a

proposta aditiva da Caixa Econômica Federal foi rejeitada em todo o Brasil,

levando a uma greve somente neste banco público federal. Essa foi uma

estratégia utilizada durante todo o período: negociar em mesa única as

propostas da Fenaban, válidas para toda categoria, ao mesmo tempo em que

se realizavam negociações paralelas com os bancos públicos para temas

específicos. Isso levava à decretação da greve conjunta, mas com votação

separada para adesão e encerramento da greve, com três assembleias

realizadas simultaneamente, em que eram feitas as votações da proposta da

Fenaban, do BB e da CEF. Portanto, em algumas ocasiões, a proposta da

Fenaban era aceita, resultando no encerramento de greve nos bancos

privados, enquanto no BB e CEF as propostas poderiam ser rejeitadas,

mantendo greves localizadas nestes bancos, ou se iniciar greve apenas em

bancos públicos. A não aceitação da proposta da Fenaban levava à

paralisação de toda a categoria, pois ela era a referência de todas as

negociações.

113 Um relato dos impasses sobre o ajuizamento do dissídio no TST pode ser conferido em matéria do jornal o Estado de São Paulo de 08/10/2004 por meio do link: economia.estadao.com.br/noticias/geral,pedido-de-dissidio-divide-bancarios-no-pais,20041008p22995. Nem todos os sindicatos brasileiros realizaram a greve, em particular os pequenos, nos quais a greve havia sido rejeitada em assembleias. 114 A utilização do termo greve nacional na categoria significa que a greve teve adesão dos bancários de todos os bancos do setor. É importante realizar essa distinção pois podem existir greves apenas no Banco do Brasil, na Caixa Econômica Federal ou nos bancos privados. A greve realizada em 2003 aconteceu apenas no BB e na CEF.

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A tendência de negociação entre a Fenaban e o Comando Nacional

passou a ter uma característica constante: os bancos apresentavam uma

proposta, esta era rejeitada na mesa de negociação; uma nova proposta, mais

elevada que a primeira, era apresentada na continuidade das negociações; a

proposta era rejeitada pelas direções e bases sindicais nas assembleias, ou já

havia a decisão coletiva pela greve. Após um período de realização de

protestos e paralisações, os bancos voltavam a negociar. A Fenaban – bem

como os bancos públicos nas mesas de negociação específicas – apresentava

uma nova proposta, finalmente defendida pelas direções sindicais e aprovada

nas assembleias.

4.4 – O perfil das greves

A greve assumiu um caráter importante para a organização da

categoria bancária em diversas localidades do país, particularmente nas

instituições públicas. Em nossa concepção, os bancos evitavam apresentar

propostas mais elevadas ainda no início, mesmo que passíveis de serem

aceitas, pois havia o risco de rejeição nas bases sindicais, como acontecera

em 2004. Isso porque a greve tornou-se, gradativamente, uma necessidade de

a categoria exteriorizar sua oposição aos bancos. Essa exteriorização tinha

como base real as propostas apresentadas nas mesas de negociação – da

Fenaban e as específicas –, mas cumpria também a função de denunciar

socialmente, além de questões econômicas e benefícios sociais, as condições

de trabalho, a realidade diária de pressão e metas vivenciada pelos bancários,

tanto do setor público quanto privado. Algo similar ao destacado por Soares

(2013)

O uso de expressões como “desrespeito”, “dignidade”, “honra” e “reconhecimento” revelam a existência de uma dimensão moral no ato de “entrar em greve”. O que se pode deduzir a partir dos discursos e das práticas dos bancários é que eles entram em greve por conta de um acúmulo de insatisfações ou, em outras palavras, devido a um conjunto de sentimentos de injustiça compartilhados coletivamente, de noções de direito não satisfeitas, sendo as reivindicações econômicas a principal delas, mas não a única. (Pág. 251)

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Embora essas questões não econômicas constassem nas pautas

de reivindicações e na imprensa sindical, a conjuntura política e econômica,

esta principalmente a partir de 2005, garantiram espaço para essa expressão

pública acontecer através de greves. De modo que as greves passaram a ser

aguardadas pelos trabalhadores dos bancos, particularmente nos públicos,

como algo necessário e rotineiro no processo de negociação nacional. Para

Roberto von der Osten, presidente da Contraf/CUT, um aspecto a ser

considerado em relação às greves é que houve um processo de menos

engajamento dos trabalhadores nas ações coletivas, inserido na ideia de

individualismo e meritocracia. Para ele, isso condiz com a lógica do

neoliberalismo. “Muitos bancários se acostumaram a esperar que alguém

realize o movimento por ele, se tornaram menos participantes”115. Isso reforça

o argumento também apresentado por Soares (2013), de que a greve se

tornou mais um movimento de “fora para dentro” do que de organização nos

locais de trabalho, isso é, são greves levadas pelo sindicato para o local de

trabalho.

a greve é organizada mais “de fora pra dentro”, ou seja, ela é construída mais por iniciativas das organizações sindicais do que de trabalhadores da base [...] Ela não surge como um movimento relativamente repentino e inesperado ou a partir de uma espécie de situação gatilho que inicia uma reação articulada contra determinados problemas. Ao contrário, a organização da greve bancária segue um rito consolidado ao longo de décadas. Isso não quer dizer que tudo esteja previamente definido ou que inexistam debates e disputas internas quanto à melhor maneira de proceder na greve. Porém, na medida em que desde 2003 vêm ocorrendo greves em todos os anos, os bancários já se sentem acostumados com elas. (Soares, 2013, Pág. 254)

A realização da greve como expressão de uma série de conflitos

e de insatisfações nos locais de trabalho – publicizando-os para a sociedade –,

passou a ser instrumento de poder dos sindicatos. Isso é, a capacidade de

organizar uma greve, de defendê-la publicamente e realizá-la, cumpria um

papel de fortalecimento e coesão política para as direções sindicais com as

bases, particularmente nos grandes sindicatos, e servia para combater os

115 Entrevista realizada pelo autor em 24/10/2016.

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discursos e ações das oposições sindicais. Defender a aceitação de acordo

salarial sem realizar uma greve poderia ser visto, especialmente após 2004,

como moderação política e ser explorado pela oposição sindical em

campanhas eleitorais. Esse fenômeno acontecia, particularmente, nos bancos

públicos, embora produzisse efeitos nos bancos privados. O trabalhador no

banco privado concordava com a greve, tanto que geralmente a aprovava nas

assembleias, entretanto, as condições para exercer seu direito eram muito

mais difíceis. O medo da perda do emprego devido à participação no

movimento grevista afastou adesões espontâneas, mesmo entre os

trabalhadores nos cargos de início na carreira116. Nos bancos públicos, a

situação era diferente, como já mencionado, devido à virtual estabilidade no

emprego e à presença mais significativa de militantes políticos nestes locais.

As adesões não eram maiores nos bancos públicos porque as condições de

trabalho e remuneração eram piores do que aquelas dos bancos privados, pois

geralmente acontecia o inverso, ou pelo menos eram similares. O que

diferenciava era que os trabalhadores dos bancos públicos tinham mais

possibilidades concretas de exprimir, pelo menos em parte, sua insatisfação.

O contexto político e o papel central adquirido pelas instituições

públicas nas políticas governamentais, que levaram à expansão do emprego

bancário – com realização de vários concursos públicos – encorajou, ainda

mais, a adesão de funcionários às greves, principalmente de trabalhadores nos

cargos menores na hierarquia.

Nos bancos privados, a adesão à greve, em todo período, foi

realizada mediante piquetes de dirigentes e assessores sindicais. Esses

piquetes, ainda que envergonhados, como afirmava Boito (2004), em razão da

ideologia burguesa que o apresenta como interdição ao direito de ir e vir, eram

necessários para assegurar greves mais amplas. Como a lógica empresarial

opõe a luta pela efetivação do direito coletivo – a greve –, em que é forçoso o

respeito à decisão coletiva de paralisação, ao direito individual da pessoa que

116 Considera-se adesão espontânea como aquela em que o trabalhador adere sem a necessidade de piquetes, mesmo que a greve aconteça a partir da convocação oficial da greve. Não há informações de movimentos paredistas no setor bancário sem a convocação de sindicatos.

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queira trabalhar, em diversas ocasiões os bancos acionaram a polícia militar e

mesmo as guardas municipais para forçarem a abertura de seus espaços para

os trabalhadores entrarem.

Outro instrumento fartamente utilizado pelos bancos durante

alguns anos foi o interdito proibitório, inclusive nos bancos públicos –

mostrando o potencial conflitivo e contraditório também existente na relação

entre governo e sindicatos. Esse mecanismo jurídico, de acordo com a lei,

serve para garantir a posse de propriedade quando colocada em risco. No

caso dos bancos, visava garantir, com ordem judicial e aparato policial, que os

dirigentes sindicais e trabalhadores em greve não pudessem ficar em frente

aos locais de trabalho e, tampouco, intervir para impedir a entrada de outros

trabalhadores que quisessem retornar ao trabalho. Enquanto esse instrumento

era analisado pela justiça cível, o resultado judicial para os bancos era mais

favorável, porém, ao ser colocado sob jurisdição da justiça do trabalho,

especializada em analisar conflitos nas relações de trabalho, o resultado se

inverteu, tornando o interdito proibitório menos efetivo, o que levou ao seu

desuso117.

A frequência anual das greves levou, de certa maneira, à

rotinização de sua realização. Assim, a greve tornou-se, no imaginário do

trabalhador, cada vez menos um instrumento forte de contestação,

transformando-se numa rotina de negociação e pressão na relação com os

bancos. Para setores da oposição, como a Conlutas, a greve passou a ser um

processo banalizado; ou mesmo um processo de “teatralização”, em que cada

passo de uma das partes era de conhecimento prévio da outra, havendo certo

entendimento quanto aos rumos e destinos do movimento. Contudo, esses

conceitos têm mais viés político que analítico. O processo de greve tornou-se,

de fato, rotineiro, porém pelas razões mencionadas anteriormente, quais

117 As ações de Interdito proibitório baseiam-se no código civil de 2002, art. 1210. No novo Código de Processo Civil (CPC) de 2015 localiza-se nos artigos 567 e 568. No antigo CPC, de 1973, era previsto nos art. 932 e 933. A súmula vinculante 23 do STF definiu, em 2009: “A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada”. Evidente que o instrumento não serve para mediar conflitos trabalhistas, pois em momento algum a posse dos imóveis dos bancos foi colocada em risco, o que havia era a mediação dos dirigentes, a tentativa de convencimento dos trabalhadores para adesão ao movimento grevista.

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sejam: a) a conjuntura política e econômica favorável; b) a oportunidade de

reforçar politicamente as direções sindicais e suas relações com as bases; c) a

disputa entre direções e oposições; d) o sentimento de exteriorização dos

trabalhadores sobre suas condições de trabalho. O processo de greve

transcendia as questões econômicas, alcançando um sentido de justa

manifestação e oposição aos bancos pelas condições, metas e pressões nos

ambientes de trabalho. Esse sentimento coletivo era compartilhado não

apenas por quem realizava a greve – ausentando-se do local de trabalho –,

que não era a maioria da categoria, mas por diversos trabalhadores que,

mesmo não participando das greves, compareciam às assembleias e votavam

de forma amplamente favorável, indicando apoiar ideologicamente a

mobilização. Nos bancos privados, esse sentimento alcançava também a

contestação à gestão autoritária e às demissões imotivadas de colegas.

Ressalta-se que a resolução dos problemas relacionados ao assédio moral, à

pressão e ao autoritarismo gerencial não avançou de forma substancial na

categoria bancária, apesar da formalização de medidas para o enfrentamento

desses temas na convenção coletiva, como criação de grupo de trabalho para

prevenção de conflitos no ambiente de trabalho, em 2006; depois a criação de

protocolo para acompanhar e apurar casos de conflito no ambiente de

trabalho, em 2010; proibição de exposição de rankings de vendas entre os

funcionários, em 2011; comissão bipartite para analisar afastamentos do

trabalho por saúde, em 2013; proibição de envio de metas e cobranças no

telefone particular do trabalho. Soares (2013) e Ostronoff (2015) apontaram a

dificuldade em melhorar e solucionar os problemas nos locais de trabalho

relacionados às metas e à pressão, que afetam a saúde do trabalhador. A

categoria bancária está entre as que mais possuem afastamento do trabalho

por doenças ocupacionais (Dieese, 2016a)118, dentre elas as principais são

doenças mentais e psicológicas.

A quantidade de trabalhadores paralisados nas greves é sempre

118Conforme o anuário de saúde do trabalhador, publicado pelo Dieese em 2016, os

bancários ocupam a primeira posição na “Classificação das 20 atividades econômicas com maiores incidências de doenças ocupacionais - Brasil, 2013” com 8,51 por mil vínculos.

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uma medida difícil de obter, na medida em que se trata de um movimento

nacional, em que os perfis da categoria variam de região para região e

interesses distintos motivam a contagem do movimento sindical, que

geralmente é feita a partir do número de agências e unidades fechadas, e a

dos bancos, que querem minimizar publicamente os impactos das greves.

É notório que as greves trazem problemas aos bancos, mesmo

num cenário em que há disponibilidade de equipamentos eletrônicos; canais

alternativos para transações e terceirizados, pois, é no atendimento pessoal

dos bancários que muitos negócios maiores são realizados. Seria, portanto,

ingênuo acreditar que as unidades fechadas ao atendimento público não

causem qualquer transtorno aos bancos, tanto que instrumentos jurídicos e

repressivos foram utilizados para combater diversas greves no período.

Apesar do aumento de transações por canais ofertados pelos bancos, que

buscam valorizar progressivamente a tecnologia, conforme mencionamos no

capítulo 3, esses dados devem ser relativizados quando analisados do ponto

de vista qualitativo. Os indicadores quantitativos de transações não refletem a

qualidade dos negócios e a importância da negociação efetuada via

atendimento pessoal. A relação entre funcionários e clientes ainda é

fundamental para se concretizar operações de crédito, venda de produtos e

serviços bancários, orientação quanto a investimentos financeiros, etc., pois

inspira confiança.

De outro lado, torna-se evidente que as greves dos anos 2000 são

diferentes daquelas realizadas nos anos 1980. Tanto pela mudança no perfil

da gestão de trabalho, mencionada no capítulo 2, quanto pela adoção de

novas tecnologias. A efetividade é bastante diferente, pois há 30 anos os

clientes não possuíam alternativas para sacar dinheiro, depositar, realizar

transferências, empréstimos, dentre outras. Assim, deve-se destacar que as

greves tinham consequências maiores para os clientes e para os bancos. As

greves atuais precisariam interromper o setor de tecnologia da informação,

algo, no entanto, improvável, devido ao esquema de funcionamento dessas

unidades, fortemente monitoradas, e à descentralização e coordenação da

tecnologia, que não depende de um único local. Isso para não falar no risco de

exposição dos trabalhadores do setor em caso de adesão à greve. Além disso,

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os próprios sindicatos preferiram, ao longo do tempo, não se confrontar com a

paralisação completa dos bancos, optando pelo funcionamento de

equipamentos que permitem aos clientes realizarem transações básicas, para

não atrair contra o movimento a antipatia maior da população.

A Contraf/CUT informa em seus comunicados a adesão às greves

por meio do fechamento de agências e centros administrativos em todo país.

Por exemplo, no ano de 2013, segundo a entidade, a greve chegou a fechar

12.140 agências e centros administrativos. Em 2014, foram 10.335 unidades

fechadas e, em 2015, 13.089. Esses números representam, respectivamente,

57%, 44% e 57% do total de agências. Quanto mais tempo dura a greve, maior

torna-se a adesão ao longo dos dias, o que explica o motivo de terem sido

fechadas menos agências em 2014, quando a greve durou sete dias.

QUADRO 4- DIAS DE GREVE DE TODA CATEGORIA BANCÁRIA (2004 A 2015)

Ano Dias de paralisação

2004 30

2005 06

2006 06

2008 15

2009 15

2010 15

2011 21

2012 09

2013 23

2014 07

2015 21

FONTE: INFORMATIVOS SINDICAIS CONTRAF-CUT E FOLHA

BANCÁRIA/SEEB SP, JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO. CONSIDERA-SE APENAS O PERÍODO EM QUE OS

BANCÁRIOS, DE TODOS OS BANCOS, ESTIVERAM EM GREVE

DECLARADA.

Levando-se em conta o número proporcional de agências e

centros administrativos fechados, poderia se concluir uma adesão média

superior a 50% da categoria. Contudo, nem todos os funcionários que

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trabalham em certo espaço aderem à greve, bem como há sistemas de

contingenciamento, ou seja, um número mínimo de funcionários que trabalham

para manter as atividades tidas como essenciais. Como destacado

anteriormente, inclusive nos bancos públicos, a maior adesão acontece dentre

os funcionários com cargos mais baixos na escala hierárquica: escriturários,

técnicos-bancários, caixas-executivos, entre outros, que hoje não são

majoritários na categoria. Isso significa dizer que há agências e unidades

fechadas para o público, porém com funcionários na parte interna. Do mesmo

modo, há funcionários que continuam trabalhando remotamente, podendo

realizar visitas a clientes, por exemplo. Assim, a proporção de participação nas

greves é menor que os dados de agências fechadas podem indicar, pois nos

locais fechados há funcionários trabalhando. Isso leva a algumas críticas ao

modelo de greve, chamado por alguns dirigentes de “greve de prédios”, pois

nem sempre o fechamento do local de trabalho ao público implica em

paralisação de todos trabalhadores. Também é criticado o fato dos

funcionários que seguem trabalhando durante a greve, especialmente os que

ocupam cargos gerenciais, atenderem prioritariamente os clientes mais

rentáveis aos bancos, ou seja, os mais ricos. Esse atendimento pode ser

mantido por telefone, internet ou visitas. Isso significa que a greve atinge, de

forma mais contundente, os mais pobres. Os bancos não costumam divulgar

seus próprios levantamentos em relação ao impacto das greves sobre o

funcionamento das unidades.

Em relação à duração, nota-se que as greves não foram curtas

nesse período, sendo a mais longa a realizada em 2004 e as duas mais curtas

as de 2005 e 2006, que duraram seis dias. Nos governos Lula da Silva, apenas

uma greve superou vinte dias, enquanto nos cinco anos de governo Dilma

Rousseff foram três anos com períodos superiores a vinte dias (2011, 2013,

2015). O ano de 2007 foi o único no período em que não houve greve nacional,

apenas na Caixa Econômica Federal. Em alguns dos anos, os bancários de

instituições privadas saíram em greve e aceitaram a proposta antes dos

bancos públicos, em particular da CEF, que manteve greves por períodos mais

longos como em 2009. Em outras ocasiões, houve bases sindicais em que as

propostas da Caixa ou do BB foram rejeitadas, estendendo a greve por mais

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algum período, entretanto, sem ser um movimento nacional, mas apenas de

algumas regiões. Quando isso acontece, os bancários acabam por retornar ao

trabalho sem novas propostas, seguindo o resultado majoritário no país. A

Conlutas costuma estimular essa estratégia como forma de se contrapor e

criticar a aceitação das propostas pelas bases cutistas, embora esse gesto

seja mais político, não trazendo alterações no quadro de negociações.

Apesar das dificuldades das greves, no que se refere à capacidade

de mobilização, bem como à redução de seu impacto devido à utilização da

tecnologia como alternativa para o atendimento aos clientes, a greve traz

prejuízos aos negócios dos bancos. Há o prejuízo para a imagem, um recurso

bastante utilizado pelo movimento sindical ao denunciar as altas taxas de

juros, tarifas e a falta de compromisso social das instituições financeiras.

Junckes (2004) entrevistou gestores de bancos que reclamavam,

precisamente, da forma agressiva como os dirigentes sindicais referiam-se aos

bancos em seus informativos. Ao consultar a Folha Bancária, principal meio de

comunicação do Sindicato dos Bancários de São Paulo, é possível notar esse

tom mais forte em relação aos bancos em diversas de suas edições119. Na

campanha nacional de 2015, por exemplo, o mote utilizado pelos bancários foi

“exploração não tem perdão”, denunciando o adoecimento de trabalhadores

pela exploração dos bancos. A tese de Ostronoff (2015) utiliza-se em seu título

de uma campanha realizada pelos bancários em 2010: “Menos metas, mais

saúde”, em que se destacava os problemas de saúde decorrentes do assédio

moral e a pressão por metas nos locais de trabalho, amplamente divulgado aos

clientes e usuários dos bancos.

Os bancos realizam controles intensos sobre suas receitas e

despesas. Por essa razão, seria improvável que a mudança na rotina de

agências e centros administrativos não produzisse alterações na lógica de

funcionamento das instituições e prejuízos econômicos. A ampliação da

cobrança de tarifas de prestação de serviços, em razão da redução de ganhos

financeiros com a inflação, com os quais os bancos estavam acostumados até

119 A Folha Bancária pode ser consultada pelo endereço eletrônico spbancarios.com.br/folha-bancaria. O Centro de Documentação do Sindicato dos Bancários de São Paulo realizou a digitalização das edições do informativo desde 1930.

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o plano real (Gouvêa, 1998), fez com que as instituições, gradativamente,

passassem a buscar o pagamento de toda folha de trabalhadores apenas com

a cobrança de tarifas. Esse objetivo foi praticamente alcançado pelas

principais entidades, conforme demonstra a tabela abaixo.

TABELA 9 - RELAÇÃO ENTRE RECEITAS COM SERVIÇOS E TARIFAS DOS BANCOS E

DESPESAS COM PESSOAL

Bancos Receitas de prestação de serviços e tarifas (milhões

R$)

Despesas de pessoal pagas com receitas de prestação

de serviços e tarifas*

2014 2015 2014 2015

Itaú 27740 30815 168,7% 164,7%

Banco do Brasil 22186 22361 113,4% 99%

Bradesco 17934 19301 128,8% 134,7%

Caixa Federal 18404 20715 96,5% 98,5%

Santander 11058 11867 149,7% 146,9%

FONTE: DIEESE – REDE BANCÁRIOS – DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS DOS BANCOS * RESULTADO OBTIDO PELA DIVISÃO DAS RECEITAS COBRADAS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS E

TARIFAS PELO VALOR TOTAL DAS DESPESAS COM PESSOAL (INCLUI-SE SALÁRIOS, ENCARGOS E

BENEFÍCIOS). EXEMPLO: O ITAÚ ARRECADOU EM TARIFAS EM 2015 O SUFICIENTE PARA PAGAR

1,64 VEZES SUAS DESPESAS DE PESSOAL.

O prejuízo das instituições financeiras decorre da dificuldade de

acesso dos clientes aos serviços bancários. A greve retira as unidades de seu

funcionamento habitual, cria tensionamentos para gestores, funcionários,

sindicalistas, clientes e usuários. Para instituições que precisam de

credibilidade e do atendimento pessoal para fechar vendas maiores e

negociações mais complexas, sem dúvida, a paralisação e o tumulto na frente

das agências causam transtornos, pois clientes reprogramam a utilização dos

serviços bancários e a redução no contato entre funcionários e clientes dificulta

as vendas e o atingimento de metas.

No período analisado, a retomada da greve aconteceu de forma

bastante consistente, convertendo-se em prática cada vez mais rotineira, que

passou a integrar os calendários anuais de funcionários, dirigentes sindicais e

da população, geralmente entre setembro e outubro. Cresceu no movimento

sindical, em particular na corrente majoritária, o interesse em se discutir

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convenções e acordos com validade de dois anos. Essa visão foi apoiada

pelos sindicatos com bases mais heterogêneas, isso é, com distribuição mais

equilibrada entre bancários de instituições privadas e públicas. Nas entidades

com prevalência de instituições públicas, como no Nordeste, a concepção da

convenção anual era mais forte, devido ao reforço da ideia da greve como

necessária para a coesão de direções e bases, do enfrentamento a possíveis

oposições sindicais e da radicalidade maior nos bancos públicos. Em 2016, já

na gestão Michel Temer, pela primeira vez a CCT foi assinada com duração de

dois anos.

Sobre o caráter neocorporativista mencionado pela literatura

(Korpi e Shalev, 1980 citados por Rehfeldt, 1995), destaque-se o papel do

governo federal na resolução dos conflitos entre bancos e bancários, e na

canalização, em alguns momentos, dos conflitos para o Estado. A Fenaban é

uma entidade em que há predominância de instituições privadas. A partir de

2005, com a formalização da participação dos bancos públicos na mesa única

de negociação com os trabalhadores, as instituições públicas passaram a

exercer influência nas negociações gerais da categoria, bem como o governo

manteve relação próxima, – em especial até 2012, quando inicia um

enfrentamento maior–, com os banqueiros. Quando as negociações

encontravam fortes obstáculos, os sindicatos tinham canais de reivindicação

dentro do governo para cobrar resolução dos impasses na mesa única, por

meio da participação das instituições públicas e da relação do governo com os

bancos. Essa foi uma novidade do período, pois antes dos governos Lula da

Silva e Dilma Rousseff, os trabalhadores não possuíam alternativas

significativas de mediação além da mesa de negociação. Junckes (2004)

destaca a cobrança pública realizada pelos sindicatos dos bancários às

instituições financeiras, valendo-se para isso da relação dos dirigentes com o

ministro do trabalho.

Dessa forma, pode-se inferir que a relação entre o sindicalismo da

CUT e o governo federal tornou-se um mecanismo para buscar conciliação e

soluções nas mesas de negociação entre bancos e trabalhadores. O processo

de inserção dos bancos públicos na mesa única da Fenaban tornou esse

mecanismo de mediação ainda mais importante, influenciando, desse modo,

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toda a categoria e os bancos, inclusive os privados.

4.5 – Ciclo de conquistas e ampliação da CCT

A Convenção Coletiva de Trabalho da categoria bancária teve

importantes incrementos em aspectos econômicos, direitos sociais e garantias

sindicais. Isso aconteceu nos bancos privados e nos bancos públicos que,

desde 2003, passaram a convergir com as decisões tomadas na mesa de

negociação dos sindicatos com a Fenaban e, em 2005, a subscrição tornou-se

formal. Desse modo, bancários de todo o Brasil, de instituições públicas e

privadas, passaram a compartilhar uma CCT comum, algo inédito no Brasil. A

primeira CCT assinada pela categoria bancária foi em 1992120, de modo que

apenas em 2005 tornou-se um instrumento comum de todos os trabalhadores

em bancos.

A reivindicação de um acordo nacional único remonta aos anos

1980 e ao longo processo de organização, mobilização e reivindicação

verificado nesse período (Soares, 2013). A lógica do sindicalismo bancário foi

de ampliar as conquistas através da unidade dos trabalhadores, em âmbito

nacional e entre trabalhadores de diferentes instituições e naturezas jurídicas.

Dessa forma, é um resultado considerável alcançar a construção de um

documento que possa balizar quase 500 mil trabalhadores em todo Brasil.

Outro fator que favoreceu essa conquista foi a lógica de organização do

sistema financeiro nacional, particularmente a partir dos anos 1990, quando

houve um processo de concentração e centralização das instituições

financeiras (Jinkings, 2002). Concentração em menos instituições, sendo que

atualmente as cinco maiores detêm 70% dos ativos de todo setor financeiro

nacional (Bacen, 2017) e centralização na região centro-sul do país,

particularmente no Sudeste. Isso implica que, com mais trabalhadores

120 Antes da CCT nacional havia acordos regionais realizados entre as entidades sindicais e os bancos.

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agrupados em menos grupos econômicos, a mesa de negociação conjunta

torna-se mais factível e possível, ao contrário de setores mais pulverizados,

em que prevalecem pequenos negócios, como os comerciários.

A CCT assinada entre a Contraf e a Fenaban abrange

praticamente 85% dos bancários no Brasil; outras duas convenções, uma com

a Feeb SP/MS e outra com a Contec/UGT completam o conjunto de

trabalhadores. O paradigma é a negociação liderada pela Contraf, que baliza o

processo de assinatura das outras duas convenções e os acordos aditivos

firmados pelos bancos públicos, em especial BB e CEF. Os acordos aditivos

desses dois bancos estabeleceram termos específicos e mais vantajosos em

relação à CCT Fenaban. Os funcionários de BB e CEF, que estavam fora do

acordo geral da categoria até 2003, tiveram inúmeros prejuízos ao longo dos

anos 1990, que, em grande medida, nivelou os salários e direitos.

Gradualmente, alguns direitos e benefícios foram reconquistados no período,

conforme veremos, porém ainda bastante distantes da realidade anterior a ele.

A Convenção assinada pela Contraf em 2003 possuía 53 cláusulas

e em 2015 esse número saltou para 68 cláusulas, numa média de cerca de

uma nova cláusula por ano, que, de maneira geral, adicionaram novos direitos.

Os reajustes salariais, com exceção de 2003, quando houve perda real de

4,91% nos salários, foram superiores à inflação. Em outras três ocasiões, os

reajustes foram diferenciados em função da renda. Em 2004, quem estava no

piso chegou a receber 6,82% acima da inflação, pois o reajuste previa um

abono fixo de R$30,00 incorporados no salário de quem recebia até R$

1500,00 por mês. Em 2008, foram criadas duas faixas de reajustes, a primeira

de 10% para salários menores de R$ 2500,00 e outra de 8,15% para salários

maiores, frente a uma inflação de 7,04% medida pelo INPC/IBGE. Por fim, em

2010, novamente o aumento salarial foi diferenciado, quem recebia até R$

5250,00 teve aplicado o índice de 7,5% sobre os salários e quem recebia

acima deste valor teve uma importância fixa de R$ 393,75, assegurando no

mínimo 4,29%. Nesse caso, baseando-se nos dados atualizados da inflação

medida pelo INPC/IBGE, os reajustes variaram entre -0,39% para salários

acima de R$ 9178,32 e +2,82% para salários abaixo de R$ 5250,00, que era a

remuneração média da categoria na época.

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QUADRO 5- REAJUSTES SALARIAIS DOS BANCÁRIOS ENTRE 2003 E 2015

(ACORDOS COM A FENABAN)

Ano Reajuste INPC/IBGE Variação real Abonos

pecuniários

2003 12,60% 17,51% - (4,91%) R$ 1500,00

2004 8,5% a 12,77% 5,95% 2,55% a 6,82% R$ 700,00

2005 6% 4,99% 1,01% R$ 1700,00

2006 3,5% 2,86% 0,64%

2007 6% 4,92% 1,08%

2008 8,15% a 10% 7,04% 1,11% a 2,96%

2009 6% 4,45% 1,55%

2010 4,29% a 7,5% 4,68% (- 0,39%) a 2,82%

2011 9% 7,3% 1,7%

2012 7,5% 5,58% 1,92%

2013 8% 5,69% 2,31%

2014 8,5% 6,59% 1,91%

2015 10% 9,9% 0,1%

Totais 98,04% a 107,37% 87,46% 10,58% a 19,91%

FONTE: CCT BANCÁRIOS DE 2002 A 2015, ÍNDICE INPC DIVULGADO PELO IBGE, CALCULADO DE SETEMBRO A SETEMBRO (DATA-BASE 01/09). OS TOTAIS REFEREM-SE A

SOMAS SIMPLES, PARA FINS DE COMPARAÇÃO. APLICANDO-SE A CORREÇÃO COMPOSTA

(JUROS SOBRE JUROS), OS ÍNDICES DE REAJUSTES REPRESENTAM ENTRE 10,79% E

20,72% ACIMA DA INFLAÇÃO.

Os ganhos reais de salário ao término do período variaram entre

10,58% e 19,91%, beneficiando, principalmente, os salários mais baixos. O

salário após 90 dias de admissão, que em janeiro de 2003 era de R$ 624,03,

chegou em dezembro de 2015 a R$ 1976,10, uma valorização de 43% acima

da inflação acumulada no período. Portanto, além dos reajustes salariais, o

piso foi gradualmente sendo ampliado. Note-se que a política de abonos

pecuniários, desvinculados de reflexos salariais, muito comuns nos anos 90,

persistiu por um período, mas logo deixou de ser comum121. Em relação aos

auxílios alimentação e refeição na categoria, houve valorização acima dos

reajustes salariais no período. Em janeiro de 2003 os valores dos auxílios para

refeição eram de R$ 10,36, com direito a 22 tíquetes, perfazendo R$ 227,92 e

o auxílio-alimentação mensal era de R$ 163,72. Em 2015, o valor do

auxílio-refeição subiu para R$ 29,64 por dia, com total mensal de R$ 652,08; e

121 Em 2016, já depois da saída de Dilma Rousseff, o reajuste salarial foi 1% abaixo da inflação, com abono de R$ 3.500,00. Em 2017, mediante acordo realizado em 2016 com validade de dois anos, o reajuste salarial foi 1% acima da inflação e não houve abono.

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220

o auxílio-alimentação passou para R$ 491,52. Nesse sentido, os ganhos acima

da inflação foram próximos a 30%, com base no INPC/IBGE.

Na tabela abaixo, destacamos os principais acréscimos que

aconteceram, por ano, na convenção coletiva dos bancários.

QUADRO 6- DIREITOS ADQUIRIDOS PELOS BANCÁRIOS ENTRE 2003 E 2015 Ano Principais novos direitos

2006 • Criação de grupo de trabalho para prevenção coletiva de conflitos no ambiente de trabalho (combate ao assédio moral), com participação dos sindicatos e dos bancos.

2007 • Inclusão de 13ª cesta alimentação

2009 • Ampliação da licença maternidade, fundamentada na lei 11770/2008;

• Extensão de vantagens aplicáveis aos cônjuges para relações homoafetivas

2010 • Cláusula de valorização da diversidade;

• Protocolo para prevenção de conflitos no ambiente de trabalho, com adesão voluntária por meio de aditivo de cada banco, com objetivo de enfrentar o assédio moral

2011 • Não exposição de rankings individuais no monitoramento de resultados dos bancos, como forma de evitar assédio moral

2012 • Realização do censo da diversidade para o ano de 2013

2013 • Direito a uma folga anual (folga assiduidade);

• Adiantamento emergencial em períodos transitórios de afastamento por doença (quando o INSS não autorizou pagamento de auxílio e o processo está em recurso);

• Comissão bipartite para analisar afastamentos no trabalho;

• Adesão ao vale-cultura, conforme lei 12.761/2012;

• Vedação de envio de cobrança de metas por SMS no telefone particular do funcionário

FONTE: CCT ASSINADA PELA CONTRAF/CUT E FENABAN. ELABORAÇÃO própria. Foram incluídos os anos em que apurou-se haver acréscimo de novos direitos. Os anos de 2004, 2005, 2008, 2014 e 2015 tiveram avanços em cláusulas econômicas, como já mencionado, e renovação das demais cláusulas, mas não houve novidades substanciais nos demais aspectos.

Diante das greves que marcaram o período, as convenções

coletivas passaram a tratar também da reposição dos dias de paralisação. Em

todas elas, foram inseridas cláusulas com o período no qual os funcionários

deveriam repor as horas de greve, sem que houvesse desconto salarial dos

dias de paralisação. Na prática os acordos estabeleceram uma data limite para

reposição, que não permitiam repor todas as horas não trabalhadas. Por

exemplo, no ano de 2015, a CCT foi assinada em 03/11 e estabelecia

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reposição dos dias não trabalhados até o dia 15 de dezembro de 2015, sendo

que os funcionários não poderiam perfazer mais de uma hora extraordinária

por dia com essa finalidade. Considerando que havia 29 dias úteis entre a data

de assinatura da CCT e o prazo final para reposição, no máximo os

funcionários poderiam repor 29 horas. A greve levou 21 dias (sendo 14 dias

úteis), portanto, para quem realiza jornada de seis horas, foram 84 horas não

trabalhadas. A reposição, quando realizada, significaria cerca de 35% do total.

Essa é uma disputa sempre colocada: de um lado, os bancários, que

entendem que a greve é um direito e a paralisação não pode trazer prejuízos

financeiros aos funcionários e, de outro, os bancos, que pretendem a

reposição dos dias não trabalhados e remunerados. No final, a convenção

chega a uma opção intermediária, já que mantém a cláusula de interesse dos

bancos, enquanto os bancários entendem como positivo repor menos da

metade do período em que houve paralisação.

No caso de Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, houve

avanços mais significativos nos pisos salariais. Cláusulas garantiram o retorno

das faltas abonadas, que haviam sido suprimidas no governo FHC. Outros

direitos incluem a ampliação de liberações para dirigentes sindicais em maior

quantidade que o aumento relativo de funcionários; eleição de delegados

sindicais; mesas de negociação permanente; dispensa para funcionários

dirigentes ou delegados sindicais participarem de negociações e reuniões

sindicais; aumento de bolsas de graduação para estimular a formação de

funcionários; ampliação das ausências permitidas; previsão de contratação de

milhares de funcionários. O processo de ampliação do número de funcionários

também teve reforço pela cobrança sindical, constante em CCT aditiva tanto

do BB quanto da CEF. No caso específico do BB, alguns direitos foram

conquistados, como acesso a um programa de assistência social (PAS) para

adiantamentos e auxílios em tratamentos médicos, odontológicos, entre

outros, que antes eram disponíveis apenas para funcionários que ingressaram

no banco antes de 1998; licenças para acompanhar familiares enfermos;

garantia de três ciclos avaliatórios para descomissionamento122; vinculação da

122 No Banco do Brasil, como na maioria dos bancos, são realizadas avaliações semestrais sobre o desempenho do funcionário. No caso do BB chama-se GDP

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promoção de gestores à ausência der reclamações comprovadas na ouvidoria

interna (mecanismo no qual podem ser realizadas reclamações sobre

superiores ou referente a problemas no ambiente de trabalho, que são

investigadas por profissionais indicados pelo banco); fim do banco de horas.

Na CEF, particularmente, os principais direitos conquistados são: melhor

controle do ponto eletrônico (Sipon) para evitar jornadas de trabalho

irregulares; vale-cultura para funcionários com salário de até oito

salários-mínimos, além do previsto na lei e no conjunto da categoria bancária;

liberação sindical para funcionários que participem da comissão de empresa.

Observa-se na análise das CCT da categoria bancária a crescente

preocupação com o tema do assédio moral e da pressão pelas metas,

resultando em medidas acordadas sobre os temas. No ano de 2006, a criação

de uma comissão para prevenção de conflitos no ambiente de trabalho foi

considerada como um aspecto positivo pelos sindicatos, pois atendia, em

partes, as reivindicações da categoria. Porém, a cláusula ficou ainda distante

dos interesses dos sindicatos, pois tratava os problemas de assédio moral,

pressão e cobrança por metas de maneira eufêmica, como “prevenção de

conflitos no ambiente de trabalho”. Em 2010 foi criado o protocolo, de adesão

voluntária, para tratar de conflitos no trabalho. Os maiores bancos assinaram

acordos aditivos com essas cláusulas, que se referem aos procedimentos a

serem adotados pelas empresas a partir de uma denúncia relacionada ao

conflito. Nesse documento os bancos concordam com a condenação de

qualquer forma de assédio e a busca por um ambiente de trabalho saudável,

com respeito à diversidade. O documento estabelece a criação de um

instrumento específico para denúncias, reclamações, sugestões e pedidos de

esclarecimento dos empregados. Os sindicatos podem receber e apresentar

denúncias pelo protocolo, desde que elas não sejam anônimas e, tanto bancos

quanto sindicatos preservem a identidade do denunciante e do denunciado. Os

empregados podem realizar denúncias anônimas nos dispositivos de denúncia

(Gestão de Desempenho Profissional), na qual os superiores, pares e subordinados podem avaliar o funcionário. Essas avaliações são referências utilizadas, com outros mecanismos, para promoções e repreensões aos trabalhadores. A cláusula de três ciclos avaliatórios garante maior segurança ao funcionário ao exigir mais tempo para se retirar o cargo em caso de más avaliações, algo que pode impedir perseguições e permitir possíveis correções em problemas apontados nas avaliações.

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oferecido pelos empregadores. Os bancos devem apurar e responder aos

denunciantes.

Outra cláusula que busca combater a pressão por metas foi

inserida em 2011 e aprimorada em 2013 e se refere ao impedimento de

divulgação de rankings individuais de funcionários. Essa prática era comum

nos bancos para evidenciar os funcionários que mais realizaram vendas e

negócios, bem como aqueles que estavam mal colocados no ranking. Desse

modo, os rankings foram considerados pelos sindicatos como instrumentos de

perseguição e reforçavam o assédio moral. Em 2013, impediu-se a cobrança

de metas por SMS no telefone particular do funcionário. No mesmo ano, a CCT

convencionou a criação de uma comissão de trabalho bipartite para analisar os

afastamentos do trabalho o que, segundo a imprensa sindical123, é algo comum

na categoria e relaciona-se a problemas mentais, mais que afastamento por

problemas de lesões por esforço repetitivo e osteomusculares

O transtorno mental é uma das principais causas de afastamentos do trabalho no setor bancário, superando os casos de LER/Dort, segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), com base em informações do INSS. (...) A proporção dos casos de transtornos mentais entre os bancários é muito maior do que entre trabalhadores de outros setores no Brasil, devido à pressão e o assédio moral que sofrem pelo cumprimento de metas. Muitas vezes, os bancários somente conseguem afastamento após recorrer à Justiça para comprovar que o quadro tinha ligação com o trabalho124.

São avanços sobre uma pauta comum em todos os bancos, a

pressão por metas, que leva muitas vezes ao assédio moral e ao adoecimento

de trabalhadores. Entretanto, apesar da formalização ser significativa, ainda

não representam mudanças substanciais nas condições de trabalho dos

funcionários. Isso por duas razões: a primeira delas pelo caráter formal do

instrumento, em que os bancos se propõem a apurar e investigar, contudo,

123 contrafcut.org.br/noticias/crise-amplia-casos-de-afastamento-do-trabalho-por-ansiedade-67eb, consultado em 27/06/2017. 124 contrafcut.org.br/noticias/crise-amplia-casos-de-afastamento-do-trabalho-por-ansiedade-67eb, consultado em 27/06/2017.

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sem realizar alterações em sua estrutura de funcionamento. As práticas de

gestão por meio da cobrança de metas e resultados e mecanismos

sofisticados de controle são centrais nos problemas de saúde dos

trabalhadores. O instrumento de apuração lida com as consequências, sem

interferir na causa dos problemas, ligada à intensificação e pressão do trabalho

nos bancos. O segundo aspecto é que os funcionários ainda possuem medo

de relatar problemas no ambiente de trabalho e de algum modo se expor a

possíveis retaliações. A lógica dos bancos procura inserir ideologicamente que

o ambiente capitalista de competição funciona dessa forma, com metas,

cobranças e pressão – o que não deixa de ter coerência com a realidade,

todavia, também é verdade que essas práticas levam a problemas cada vez

mais frequentes de saúde e transtornos de todos os tipos, basta observar os

materiais produzidos pela Previdência Social relacionados ao afastamento por

doenças ou acidentes no trabalho125 . As denúncias anônimas devem ser

analisadas, respondidas e esclarecidas pelos bancos em reuniões com o

movimento sindical sobre o tema, porém, isso não tem facilitado as denúncias

de funcionários, que receiam a perda de emprego ou prejuízos em sua

carreira.

A ampliação da CCT da categoria bancária verifica-se tanto nas

cláusulas sociais quanto nas sindicais. Ela demonstra que a categoria

conseguiu aproveitar o contexto político e econômico do Brasil no período

analisado para avançar em discussões internas da categoria. Por outro lado,

isso não representou mudanças substanciais nas condições de trabalho.

Embora cláusulas em defesa da saúde e de proteção contra as cobranças dos

bancos estejam presentes na CCT, não lograram mudar a forma de ação dos

bancos, fundada em forte gestão de metas e pressão por resultados. Não seria

uma tarefa das mais simples, em razão de ser um instrumento largamente

utilizado por um modelo produtivo apoiado nas novas tecnologias e modelos

gerenciais que tem na intensidade do trabalho e no forte controle sobre o

trabalhador, por resultados, seus aspectos centrais. Abaixo, destacamos os

principais aspectos da CCT da categoria bancária, divididos por eixos: direitos

125 Cf. os dados da Secretaria de Previdência divulgados em: www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/06/1895999-crise-amplia-casos-de-afastamento-do-trabalho-por-ansiedade.shtml, consultado em 27/06/2017.

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econômicos, sociais e sindicais. A base é a convenção assinada em 2015.

QUADRO 7- PRINCIPAIS ITENS DA CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO DA

CATEGORIA BANCÁRIA (2015) Direitos econômicos

Piso salarial do pessoal de escritório após 90 dias

R$ 1976,10

Piso salarial de caixas após 90 dias R$ 2669,45

Adicional noturno 35% / CLT prevê no mínimo 20%

Gratificação de função Mínimo de 55% acima do piso

Auxílio-refeição R$ 652,08 mensais

Auxílio-alimentação R$ 491,52 mensais + 13°

Auxílio-creche R$ 394,70 (até 71 meses)

Auxílio filhos com deficiência R$ 394,70 sem limite de idade

Auxílio funeral R$ 905,60

Direitos Sociais

Vale-transporte Desconto de 4% na folha de pagamento, na CLT são 6%

Ausências legais

Prazos maiores para ausências em caso de falecimento de parentes (4 dias úteis); casamento (5 dias úteis); internação hospitalar de parentes (1 dia); levar filhos menores de 14 anos ao médico (2 dias)

Folga assiduidade 1 dia por ano

Licença maternidade Até 180 dias mediante solicitação

Estabilidade provisória no emprego

Até 24 meses durante pré-aposentadoria; pais por até 60 dias após nascimento; gestantes por 60 dias após a licença maternidade

Complementação de auxílio-doença Garante o mesmo salário da ativa por até 24 meses

Indenização por morte ou incapacidade devido a assaltos

R$ 135.047,22

Monitoramento de resultados Proibição de exposição de rankings e de envio de SMS com cobrança de metas em telefone particular do trabalhador

Assistência médica e hospitalar ao funcionário dispensado

Mantém atendimento para funcionários despedidos, conforme o tempo de vínculo. Entre 60 e 270 dias

Programa de reabilitação profissional Manutenção ou reinserção do funcionário no trabalho em caso de patologia

Acidentes de Trabalho Envio mensal ao sindicato das Comunicações de Acidentes de Trabalho (CATs)

Relação homoafetiva Extensão das vantagens aplicáveis aos cônjuges

Aviso prévio proporcional indenizado De 30 a 90 dias de remuneração conforme tempo de vínculo

Conflitos no ambiente de trabalho Protocolo para prevenção. Canal de denúncia e apuração

Requalificação profissional O funcionário demitido tem direito a

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despesas para cursos de qualificação ou requalificação até R$ 1349,70

Adiantamento salarial nos períodos transitórios especiais de afastamento por doença

Em caso de cessão de benefício pelo INSS, o banco adiantará pelo prazo de 120 dias os valores relativos ao auxílio doença, mediante alguns critérios

Comissões bipartite entre trabalhadores e bancos para temas de interesse da categoria

Comissões de segurança; saúde do trabalho; terceirização; funcionamento das agências em horários especiais; jornadas especiais; compensação de horas extras; 7ª e 8ª horas; auxílio educacional; gratificação semestral; estratégias de geração de emprego; estabilidade de dirigentes sindicais; igualdade de oportunidades e política sobre AIDS (é vedado ao banco exigência de exames médicos para diagnóstico da doença).

Vale-Cultura Adesão ao programa vale-cultura para funcionários com renda até cinco salários mínimos.

Direitos Sindicais

Frequência livre de dirigentes sindicais

Garantia de liberação remunerada de dirigentes sindicais. Conforme demanda nos bancos privados; *180 funcionários no BB; *172 funcionários na CEF.

Quadro de avisos Sindicato tem prerrogativa de utilizar o quadro de avisos nos locais de trabalho

Sindicalização Garantia de facilitação para campanhas de sindicalização nos locais de trabalho a cada 12 meses

CIPA Os bancos encaminham aos sindicatos o ato convocatório

FONTE: CCT ASSINADA ENTRE CONTRAF/CUT E FENABAN. ELABORAÇÃO PRÓPRIA

Em termos de direitos sindicais, a CCT praticamente manteve os

mesmos direitos que adquiridos nos anos 1990. Na prática, a frequência livre

para dirigentes de bancos privados costuma ser muito mais flexível em relação

aos bancos públicos. Normalmente, os dirigentes em cargos executivos nos

sindicatos, federações e confederação conseguem liberação mediante

demanda aos bancos. No caso de Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal

há limite de vagas, firmado no Acordo Coletivo de Trabalho (ACT). Como já

mencionado, esse limite foi ampliado significativamente no período de 2003 a

2015. No BB, a proporção é de um funcionário liberado para cada 550

trabalhadores na base, no ACT de 2002 eram 60 no total, o que representava

um liberado para quase 1200 funcionários na base. Na CEF são 172

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funcionários liberados, o que representa proporção similar ao BB. No ACT de

2002, eram 45 no total. Os dirigentes egressos de bancos incorporados ao BB,

como Banco Nossa Caixa e BESC, permaneceram com suas liberações,

superando a cota estabelecida no acordo coletivo. O sindicalismo bancário, via

de regra, não possui dificuldade para acesso aos locais de trabalho, realizando

a entrega de materiais para cada funcionário dentro das unidades, ocasião em

que se realizam, de forma constante, as sindicalizações. Esse direito foi

conquistado na prática, pela presença constante nas bases e por ter se

desenvolvido nas últimas décadas com lideranças surgidas em seus próprios

locais de trabalho.

4.6 – O final do ciclo petista e a posição das correntes bancárias

A partir de 2013, houve alteração nas correlações de forças

políticas, a própria política institucional e partidária passou por um amplo

processo de desconfiança por parte da opinião pública e a avaliação de

governos teve significativa piora. Ainda que no plano federal o governo Dilma

Rousseff tenha conseguido reverter parcialmente a rejeição para as eleições

de 2014, em que se saiu vitoriosa, as manifestações de junho de 2013

abalaram as bases da política brasileira. Em que pese a ausência de análises

conclusivas sobre esse fenômeno, parecer ser possível afirmar que a partir de

então a direita se fortaleceu, obtendo maior presença e capacidade de

organização de forças conservadoras e antipetistas na sociedade. Somados

ao julgamento do “mensalão” em 2012 e às ações da chamada operação lava

jato a partir do início de 2014, tanto o PT quanto seu campo político e, mais

difusamente, a esquerda, passaram por um forte período de ataques.

Nesse contexto, a segunda gestão de Dilma Rousseff teve início

na defensiva. A base parlamentar do governo estava desorganizada e o apoio

popular era frágil, em razão do aumento do desemprego em rápida velocidade,

com queda da renda e recessão econômica (Pochmann, 2015). A condenação

judicial de integrantes do PT e a cobertura intensa da mídia em pautas

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negativas contra o governo culminaram com as manifestações de 2015 pelo

afastamento de Dilma Rousseff, que acabou se concretizando em 2016126.

Como contraponto, os movimentos sociais buscaram unidade em

defesa da democracia e crítica à política de austeridade adotada pelo governo

federal. Conforme Galvão (2016, p. XX):

(...) uma parte da oposição de esquerda se reaproximou dos movimentos mais próximos do PT em nome da defesa da democracia. Em setembro e outubro de 2015, duas iniciativas foram criadas: a Frente Brasil Popular, integrada por CUT, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), MST, entre outros, e a Frente Povo Sem Medo, composta por CUT, CTB, Intersindical, MTST.

Dentro do movimento sindical bancário grande parte das correntes

sindicais, portanto, compôs as frentes em defesa da democracia e

reconheceram o processo de impeachment como golpe: Articulação, CSD,

CTB, Intersindical; não participaram a Conlutas, que defendeu o “fora todos”,

as forças ligadas à Contec/UGT e a Unidade Sindical.

A Frente Brasil Popular reunia os setores mais identificados como

governistas, que haviam apoiado os governos petistas e prestado apoio desde

o primeiro turno à candidatura de Dilma Rousseff; a Frente Povo Sem Medo foi

formada por movimentos que apoiavam o governo e outros mais à esquerda,

que vinham sendo críticos aos governos liderados pelo PT e à sua política de

conciliação de classes – embora mantivessem abertos espaços de diálogo

com o governo. Em ambas as frentes, a crítica ao modelo de austeridade do

governo Dilma Rousseff se fez presente. Segundo Galvão (2016) a FBP

minimizava a responsabilidade do governo Dilma Rousseff perante a crise,

alegando o sequestro da agenda do governo pelos derrotados nas eleições,

enquanto a FPSM responsabilizava o governo diretamente pelas políticas de

austeridade. Em nossa visão, as duas frentes faziam a denúncia ao governo

pela adoção da política econômica dos derrotados na arena eleitoral do ano

anterior, porém a FBP destacava de forma enfática a responsabilidade do

126 Esses elementos sucintamente colocados tiveram efeitos negativos da avaliação da base sobre o sindicalismo bancário, fortemente identificado com o PT e o governo federal. A nosso ver, o perfil de classe média dos bancários ajudou a construir o cenário.

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ministro da fazenda, Joaquim Levy, ou o chamado “plano Levy”, sem destacar

o nome da presidente.

A análise feita pela Conlutas em 2015, durante o congresso de

funcionários da CEF, demonstra que a central não acreditava na possibilidade

de afastamento de Dilma Rousseff e entendia que a burguesia estava unida ao

governo, com apoio do imperialismo; tampouco acreditava que uma onda

conservadora estivesse crescendo em todo o país.

Ainda que numerosos dirigentes do PSDB e de outros setores da oposição de direita agitem o impeachment deste mandato, a política do imperialismo e da burguesia brasileira não é a derrubada de Dilma Rousseff, mas sim chantagear o governo para que ele aplique todo o ajuste fiscal, favorecendo a continuidade do desgaste do PT, em preparação ao retorno do PSDB ao governo central em 2018. [...] Nesse sentido, inexiste no país tanto o crescimento de uma onda conservadora, quanto uma ameaça de golpe ou de retrocesso na situação política. O que existe é uma unidade da burguesia e do governo, com o apoio do Imperialismo, para se aplicar no país um profundo ajuste fiscal, um grande plano de austeridade, que se refletirá no rebaixamento das condições de vida e no aumento dos patamares de exploração da classe trabalhadora. (Tese da Conlutas, Conecef, Contraf, 2015).

Torna-se evidente uma leitura que acreditava não haver risco de

rupturas, mesmo diante das expressivas manifestações da classe média nas

ruas e das fortes ofensivas do empresariado, do sistema financeiro e da mídia

contra o governo federal.

Em 2016, a Conlutas acabou por reconhecer que havia uma disputa

entre dois polos, porém ambos os polos da burguesia em disputa pelo poder:

um ligado ao PT e outro ao PSDB, DEM e PMDB. Reafirma de que não houve

golpe, mas um enfrentamento parlamentar, em que o governo Dilma Rousseff

utilizou-se de métodos de luta institucionais, como entrega de cargos,

ministérios e troca de favores, e que a proposta das entidades governistas

(CUT, MST, CTB, UNE, etc.) era apenas o “fica Dilma Rousseff”.

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Contudo, a prova definitiva de que não existia nenhum golpe, e sim um enfrentamento parlamentar, foi a política do governo para os supostos golpistas. Caso conseguisse evitar o impeachment na Câmara, Dilma Rousseff propôs simplesmente a unidade nacional com os mesmos setores, mostrando que não havia nenhuma barreira intransponível entre um setor que defende a democracia e um setor golpista, mas sim uma disputa pelo poder. (Tese do MNOB, Conecef, Contraf, 2016)

A posição da Intersindical, outra corrente que se opôs, pela

esquerda, aos governos petistas, foi de reconhecer o processo de

afastamento como golpe institucional, engajando-se na luta contra o

impeachment em nome da democracia e não em defesa do governo federal.

Assim, criticou a política econômica do governo, bem os apoios que recebeu:

O Brasil vive tempos sombrios. A curta democracia do país está em risco após golpe institucional que afastou por pelo menos 180 dias a presidente da república, Dilma Rousseff. Neste momento, a defesa da democracia não se confunde com defesa de governo. O golpe é decorrente de um processo ilegítimo de deposição presidencial, que ocorreu sem comprovação de crime de responsabilidade e conduzido por um Congresso de maioria corrupta, com o objetivo principal de aprofundar impiedosamente as políticas neoliberais no Brasil. 2. É verdade que a crise política não se deve apenas ao processo de impedimento em curso. É fruto também da perda de legitimidade do governo do PT, que abriu mão de seu programa originário construindo, em nome da governabilidade, alianças com partidos reacionários, clientelistas e representantes dos interesses do capital estrangeiro e nacional. (Tese da Intersindical, Conecef, Contraf, 2016)

As demais correntes (Articulação, CSD, CTB) que já integravam a

base de apoio ao governo federal desde 2003, mantiveram sua posição,

buscando combater o afastamento de Dilma Rousseff e a ascensão do

governo Michel Temer. Todas elas estiveram articuladas e atuaram ativamente

nas frentes constituídas para a defesa da democracia.

A Articulação posicionou-se de forma a evidenciar um conjunto de

fatores e conexões de interesses internacionais e nacionais que explicariam o

afastamento de Dilma Rousseff, dentre os quais destaca-se a riqueza do

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pré-sal e o papel de protagonista que o país adotou nas relações

internacionais, tendo criado espaços e fóruns próprios para debates, como a

UNASUL (União de Nações Sul-Americanas) e o bloco do BRICS (Brasil,

Rússia, Índia, China e África do Sul), não se colocando de forma alinhada aos

interesses dos Estados Unidos. O impeachment se basearia nas relações

dessas elites, pois havia se tornado claro o esgotamento da conciliação

construída por Lula e que, portanto, não seria desejável aos ricos manter um

Estado que estivesse utilizando muitos recursos para gastos sociais, sendo

dessa forma necessário derrubar o governo para se estabelecer políticas

neoliberais mais austeras, nos moldes que já estavam sendo realizados em

outros países, como na Argentina e em diversas nações na Europa. Os grupos

empresariais de comunicação, industriais, banqueiros e de agronegócios

mostraram-se coesos para impedir que políticas distributivas continuassem,

embora os avanços dos governos do PT tenham se situado aquém do

necessário. Segundo a corrente, isso já teria sido condição suficiente para a

“plutocracia” encontrar suas alternativas:

A derrubada do governo Dilma dá definitiva mostra de que a política de conciliação, mote de governança a partir da primeira gestão Lula, foi tolerada pela plutocracia até o limite de seu interesse. A derrubada se efetivou na madrugada de 12 de maio, seja a presidenta reconduzida ao cargo ou não em alguns meses. O segundo governo Dilma, que se iniciara em 2015 com política econômica contrária a seu próprio programa, colheu em pouco tempo retração econômica, crescimento do desemprego, redução na renda média do trabalhador. Dar ao mercado financeiro a área econômica, afagar mídia historicamente plutocrata e golpista, desprezar diálogo com movimentos sociais para não desagradar à direita não foram suficientes para que as urnas fossem respeitadas. (Tese da Articulação, Conecef, 2016, p. 10)

A CSD apresentou discussão próxima à que foi feita pela

Articulação sobre o contexto de afastamento da presidente. Compreende que

os governos petistas, particularmente de Lula da Silva, com grande

capacidade eleitoral, conseguiram realizar importantes feitos sociais,

principalmente a maior distribuição de renda já realizada no Brasil, que

permitiu a retirada de milhões de pessoas da miséria e da fome. Inclusive

setores neoliberais, patrocinados pelo capital financeiro, aprovaram a política

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econômica adotada, pois o modelo que melhorou no geral a vida do povo não

rompeu com o modelo neoliberal. Assim, o antigo núcleo da direita neoliberal

conseguiu ganhar forças dentro do sistema político. Apesar do acerto dos

governos em diversas questões econômicas, como no enfrentamento à crise

internacional, faltaram medidas regulatórias do mercado financeiro, bem como

a atuação no campo monetário foi tímida e a taxa de investimentos vinha em

redução. A elite rentista que existe no Brasil resiste à redução de ganhos

financeiros, do mesmo modo que o setor produtivo não aceita diminuir suas

margens de lucro, que segundo a corrente são as maiores do mundo.

A proximidade da crise econômica, somada à grande repercussão

da mídia sobre a operação lava jato, favoreceu a ofensiva liberal-conservadora

e desorientou a política econômica de Dilma Rousseff após as eleições de

2014. Em vez de continuar as mudanças, o governo optou pela agenda

derrotada nas urnas. Segundo a corrente, a partir desse e de outros

elementos, ampliou-se a crise política que permitiu o golpe institucional. Esse

golpe representou uma grande recomposição da direita “patrocinada por um

conluio jurídico-midiático com estreitos laços com o imperialismo norte

americano e coesão programática em torno a uma política ultraliberal”127. Por

fim, a corrente defende a experiência construída pelas “Frentes”, como esforço

para unidade e resistência. Aponta para a necessidade de ampliar iniciativas

como essas e buscar mobilizar a população, seja de trabalhadores

sindicalizados, bem como aquelas milhões de pessoas que foram beneficiados

pelas políticas governamentais nos últimos anos. Destaca o papel da CUT, que

nasceu da luta da classe trabalhadora e tem as características para ser o

instrumento de luta e avanços, para além de temas sindicais, mas em questões

sociais abrangentes “ que torne a sociedade brasileira mais justa e socialista”

(idem).

A CTB aponta a gravidade da crise política, mais séria que a crise econômica e do projeto do governo Michel Temer contemplar políticas que levem ao desmonte do Estado, à recessão econômica e ao entreguismo, ou seja, a venda do patrimônio público. Critica os cortes nas áreas e políticas sociais realizados pelo governo Michel Temer, assim como as mudanças vislumbradas na

127 Conteúdo presente tese da CSD, Conecef, 2016, p. 52

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previdência e nas leis trabalhistas, a retomada da privatização e o desmonte de áreas e empresas estratégicas. Do mesmo modo, denuncia as mudanças na política externa, com redução das relações com países em desenvolvimento e reforço da subordinação aos Estados Unidos. Nesse contexto é essencial continuarmos a denunciar o golpe, agregando cada vez mais os descontentes com as medidas do governo. Em meio às ameaças à democracia e aos direitos dos trabalhadores, acreditamos que o povo deve ser consultado sobre os destinos do país. Não podemos referendar o governo ilegítimo do Michel Temer, que apresenta em seu programa uma série de ameaças às conquistas sociais (tese da CTB, Conecef, 2016, p. 73)

Nota-se que as preocupações são comuns às manifestadas pela

Articulação, CSD e Intersindical. Em todas elas há críticas mais ou menos

contundentes ao início do segundo mandato de Dilma Rousseff e à

continuidade de determinadas ações ligadas ao neoliberalismo e à

predominância da burguesia. A crítica mais direta ao governo Dilma é realizada

pela Intersindical. Do mesmo modo que as demais, a CTB aponta a

participação da mídia no processo de crise que culminou com o afastamento

da presidente.

No início do mandato de Michel Temer, ainda em 2016, o governo

apresentou diversas medidas de caráter neoliberal, como a PEC do teto de

gastos, o fim da participação da Petrobras no pré-sal, a reforma da

previdência, a reforma trabalhista, dentre outras. Essas pautas têm unificado

as correntes do movimento sindical bancário em defesa dos direitos, num

contexto defensivo, com desemprego alto e recessão, e com os sindicatos

ainda apresentando baixa capacidade de mobilizar a sociedade. A reforma

trabalhista é outro tema que encontra a resistência de todas as correntes do

segmento bancário. A ofensiva governamental tendeu a reduzir as disputas

nas análises de conjuntura e nos espaços de discussão da categoria bancária,

possibilitando uma convergência de avaliações e perspectivas de ações, como

as greves gerais que foram realizadas em 2017, nos dias 28/04 e 30/06, sendo

que a primeira alcançou resultados expressivos de unidade e mobilização.

Ao término do período de governos petistas, as conferências e

congressos passaram a indicar uma postura de maior convergência entre as

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correntes em razão de análises e problemas em comum identificados pelas

forças políticas na conjuntura. Isso, evidentemente, não impede as disputas e

os discursos tanto favoráveis quanto críticos serem retomados em relação ao

balanço dos governos de Lula da Silva e de Dilma Rousseff.

Considerações finais

A conjuntura política nos governos Lula da Silva e Dilma Rousseff

teve impacto sobre a organização sindical brasileira. Observa-se tanto a

dissidência de forças políticas, quanto a criação e fusão de novas entidades

sindicais. Essa realidade incidiu sobre o sindicalismo bancário, diversificando

as centrais sindicais atuantes no segmento, sem que houvesse, contudo,

alterado a hegemonia cutista e da Articulação. No início de 2003, a categoria

dividia-se em duas centrais e passou a ser composta, no final do período, por

seis diferentes centrais sindicais, embora isso não tenha implicado numa

diversidade maior de posicionamentos políticos. Os membros de Conlutas e

Intersindical, quando no interior da CUT, defendiam posições geralmente

contrárias ao grupo hegemônico. Isso se tornou mais evidente em razão do

apoio da CUT aos governos petistas enquanto as duas centrais dissidentes

tinham uma postura de oposição e crítica, seja ao governo federal e suas

políticas bem como à CUT, pela adoção de uma linha de atuação considerada

menos combativa, ou mesmo cooptada. As outras centrais, como UGT e CTB

surgiram numa perspectiva de reorganização decorrente da lei de

reconhecimento das centrais sindicais. Embora também seja uma dissidência

da CUT, a CTB não representou, nos fundamentos, mudanças de orientação

política em relação àquela.

Buscamos demonstrar que no período estudado (2003 a maio de

2016) as condições objetivas em que se realizaram as campanhas nacionais

foram mais favoráveis que aquelas dos anos 1990. Os dados relativos ao

mercado de trabalho, com o crescimento do emprego, da formalização do

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trabalho, da ampliação da renda média, entre outros, propiciaram mais espaço

para reivindicações e mobilizações em diversas categorias. Nesse sentido, o

sindicalismo bancário também conseguiu ampliar sua atuação, inclusive

devido ao importante incremento no emprego bancário, principalmente pelo

papel exercido pelos bancos públicos, que chegaram a acordar em

instrumentos de convenção coletiva a contratação de mais funcionários. Mas

os resultados positivos não se devem apenas às melhores condições

econômicas. As condições políticas contribuíram para as mobilizações sociais

e reivindicativas, dada a origem social do governo e sua influência nas

negociações da categoria, que passaram a ser realizadas na mesa única

envolvendo a Fenaban e as instituições financeiras públicas. Os bancos

públicos tiveram uma reorientação de suas funções, assumindo importância

estratégica para as políticas econômicas e sociais do governo federal, com

Lula da Silva e Dilma Rousseff. Nesse cenário, o sindicalismo bancário

conseguiu realizar um projeto de mais de uma década, que era a construção

de um instrumento de CCT único, incluindo bancos públicos e privados em

todo país.

O sindicalismo bancário obteve conquistas e avanços no período

dos governos petistas, pois os dados relativos às convenções e acordos

coletivos revelam ganhos econômicos e cláusulas sociais mais abrangentes.

No caso dos bancos públicos, houve a recuperação do emprego e de parte dos

direitos que haviam sido retirados no período anterior. A categoria retomou

uma agenda ofensiva, na direção de novos direitos, em sentido oposto ao

processo defensivo dos anos 1990. Nas treze negociações coletivas

realizadas no período, em doze delas os bancários conseguiram aumento real

de salário, bem como uma ampla valorização do piso da categoria e nos

benefícios sociais, em particular nos auxílios. A PLR passou a distribuir

maiores valores aos trabalhadores, embora, com o crescimento da

lucratividade das instituições financeiras, isso tenha representado

relativamente menos dispêndio aos bancos. Observamos onze novos direitos

que foram incluídos para os trabalhadores bancários, com especial acréscimo

no período compreendido entre 2006 e 2013.

Por outro lado, o perfil do trabalhador bancário aprofundou uma

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concepção de ideologia meritocrática e baseada na individualidade, lógica

reforçada diariamente pelas empresas, que atrelam seus programas de

ascensão profissional e remuneração, ou mesmo garantia do emprego, ao

cumprimento de metas e resultados, sob intenso controle da teleinformática.

Essa realidade, já presente nos anos 1990, tornou-se o modelo de todos os

bancos do setor, o que incentiva uma disputa maior entre trabalhadores para

alcançar cargos e remunerações melhores. Buscamos evidenciar que estudos

anteriores já sinalizavam a natureza de classe média do trabalho bancário,

imerso na ideologia meritocrática e que essa tendência, portanto, foi

acentuada. Isso se mostrou um elemento de dificuldade para a organização

coletiva, entretanto não impediu que os trabalhadores apoiassem ou

participassem de manifestações e greves. As concepções que levam à ação

coletiva dos bancários estão nos marcos do mérito, seja ele individual ou o

“mérito da profissão”, aspecto proporcionalmente mais relevante nos

trabalhadores de bancos públicos, em razão do concurso público. Essa lógica

meritocrática, de certa maneira, influencia as direções sindicais, mesmo as

declaradamente mais classistas que, em busca do diálogo com as bases,

fortalecem pautas meritocráticas e tentam pautar temas de interesse de

segmentos da categoria: critérios para ascensão na carreira e participação nos

lucros e resultados, inclusive, com a luta bem-sucedida pela isenção de

cobrança de imposto de renda sobre parte importante da PLR.

Em relação às formas de luta, a categoria retomou greves gerais no

setor, que não aconteciam desde 1993. O sindicalismo bancário manteve-se

como referência positiva aos demais setores, pela capacidade de reivindicação

e organização nacional, negociação e mobilização, que asseguram uma das

mais completas convenções coletivas do país. Não foi apenas a mudança na

conjuntura que permitiu aos bancários iniciar o período com greve nos bancos

públicos e seguidas greves gerais, mas também a capacidade de organização

e mobilização, que resistiu aos anos 1990, quando houve aprofundamento das

medidas neoliberais e a diminuição da categoria, conseguindo manter uma

coesão importante entre as entidades e a categoria.

Todavia, aspectos relacionados à estruturação do trabalho

permaneceram com tendência negativa entre 2003 e 2015. O sindicalismo

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bancário não conseguiu mudar as condições de trabalho, que cotidianamente

se deterioram mediante a permanente cobrança por metas, de maneira

unilateral e autoritária, a intensificação do trabalho e a remuneração baseada

em resultados. O tema também ocupou os debates da categoria, entretanto,

ainda que medidas tenham sido formalizadas na CCT, não se alterou a

realidade objetiva dos trabalhadores.

Outro que definimos como de ordem estrutural, as modalidades de

contratação e remuneração, mantiveram a tendência de flexibilização. O

período registrou o aprofundamento nas possiblidades de terceirização, em

particular através da contratação de correspondentes bancários. Em 2003,

esses espaços conveniados aos bancos multiplicaram por 40 vezes a

quantidade de transações financeiras que realizavam e foram expandidas as

redes de estabelecimentos que realizam esses procedimentos. Diversas

etapas do trabalho de retaguarda e compensação foram terceirizadas. Isso é,

do ponto de vista da relação de trabalho, a realidade mostrou uma

continuidade nas formas de contratação precária e fora das normas vigentes

aos bancários.

Esse também foi um tema que os trabalhadores bancários e as

organizações sindicais identificaram como um desafio. A mesa permanente de

negociação sobre terceirização remonta à CCT de 1992. Não se trata, pois, de

um problema recente para os trabalhadores do setor. Assim, o período é

marcado pela tentativa da principal confederação da categoria, a CNB, ao

transformar-se em Contraf, buscar a representação do conjunto de

trabalhadores do setor financeiro. Com uma abordagem mais ampla, a

concepção da confederação cutista foi de construir o que a CUT denomina

como “ramo financeiro”, composto por cerca de 866 mil trabalhadores (com

base na RAIS de 2014), mas que estão fragmentados em inúmeras categorias,

sob formas de contratação e remuneração diferenciadas, sempre piores que a

categoria principal, a os bancários. Buscamos mostrar, contudo, que essas

medidas se mostraram incipientes, não tendo avanços significativos. Os

sindicatos de bancários seguem representando de fato e de direito os

bancários, financiários e, em boa medida, os trabalhadores em cooperativas

de crédito. Esta categoria pode ser compreendida como uma das poucas nas

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quais houve relativo sucesso em incluí-la na representação sindical.

Esse segundo aspecto nos leva ao próximo elemento de

permanência que é a estrutura sindical. Uma das grandes dificuldades em

conseguir mobilizar e agregar a luta dos trabalhadores de outras categorias

são os limites impostos pela estrutura sindical corporativa, que prevê a

unicidade sindical, em que a divisão representativa se dá no nível das

categorias. No limite, ao enfrentar essa lógica, outro elemento se destaca: a

intervenção do judiciário na atividade sindical. Se no início do governo Lula da

Silva havia uma expectativa de romper a lógica da estrutura sindical, inclusive

por meio da criação do Fórum Nacional do Trabalho, que resultou, até mesmo,

na apresentação de um projeto de lei com a previsão da pluralidade sindical, a

dificuldade em construir consenso no campo sindical, a falta de força política

do agrupamento favorável à autonomia sindical e as crises do governo

impediram que se avançasse. No fim, buscamos mostrar que houve mais uma

convivência pacífica e modulada pela estrutura sindical do que um

enfrentamento constante, que poderia resultar em outras formas de se

organizar.

Alguns temas mais amplos anteriormente reivindicados, como as

reformas estruturais e a regulamentação do sistema financeiro nacional,

tornaram-se secundários. A questão do emprego diminuiu de importância ao

longo dos anos 2000, porém retornou mais forte desde 2012, com o início de

nova onda de demissões. A perspectiva mais corporativa, particularista, dos

bancários e de seus sindicatos é uma questão manifesta. Pautas como a

contratação e controle de toda remuneração variável e o combate a metas

abusivas tiveram amplo espaço na pauta sindical, sem, contudo, representar

avanços substanciais.

Enfrentar as condições estruturais do mundo do trabalho, das

relações sindicais e das formas de representação, inclusive no setor bancário,

passa a ser cada vez mais fundamental para garantir a continuidade da

organização sindical e a própria existência da categoria. Ao longo dos

governos petistas é possível identificar avanços, permanências e retrocessos,

dado o antagonismo entre uma conjuntura favorável e uma estrutura

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limitadora da ação sindical. Com a deterioração da conjuntura, os avanços

ficam em risco, sem que os limites estruturais sejam superados.

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bancariosjundiai.com.br

bancariosma.org.br/

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bancariosrjes.org.br/

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bb.com.br

bcb.gov.br

bradesco.com.br

caged.maisemprego.mte.gov.br

caixa.gov.br

callcenter.inf.br

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contec.org.br

contrafcut.org.br

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securitariossp.org.br

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sincor.com.br

sindbancarios.org.br

sindeepres.org.br

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valor.com.br

www.worldbank.org

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Entrevistas:

Gilmar Carneiro, ex-presidente do Sindicato dos Bancários de São Paulo, em

10/11/2015

José Ricardo Sasseron, ex-dirigente do Sindicato dos Bancários de São Paulo,

ex-diretor de seguridade da Previ, em 14/11/2016.

Roberto von der Osten, diretor do sindicato dos bancários de Curitiba,

presidente da Contraf/CUT, em 24/10/2016

Edson Silva (Índio), dirigente do Sindicato dos Bancários de São Paulo e

secretário-geral da Intersindical, em 09/11/2016

Roberto Rodrigues, diretor do Sindicato dos Bancários de Jundiaí, secretário

de finanças da Fetec/CUT-SP, em 15/03/2017

Anabele Silva, diretora do Sindicato dos Bancários de Pernambuco e diretora

da Federação Nacional das Apcefs (FENAE), em 13/05/2017

ANEXOS

Anexo I

“MANIFESTO DOS 113” São Paulo, 02 de julho de 1983.

Companheiros do PT, Estamos convencidos que o PT vive, hoje, um momento muito difícil, mas não aquela crise que os seus inimigos apregoam. Diante disso, resolvemos nos articular para uma intervenção coletiva na vida do nosso partido. Estamos, nesse momento, diante da importante tarefa da renovação das direções

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partidárias. Reconhecemos as dificuldades que vivem, decorrentes 1º dos desacertos das nossas direções na aplicação da linha de construção partidária, e 2º da ofensiva externa, daqueles que são contra, e interna, daqueles que não acreditam que os trabalhadores são capazes de se organizarem como força política autônoma em nosso país. No entanto, reafirmamos, nesse momento, a vigorosa vontade de milhares de militantes que, apoiados no reconhecimento da necessidade histórica do PT, querem fazer do Partido um dos instrumentos dos trabalhadores construírem uma sociedade socialista, onde não haja explorados nem exploradores. Defendemos, assim, o PT como partido de massas, de lutas e democrático. Combatemos, por isso, as posições que, por um lado, tentam diluí-lo numa frente oposicionista liberal, como o PMBD, de ação predominantemente parlamentar-institucional; ou que se deixam seduzir por uma proposta “socialista” sem trabalhadores, como o PDT. Também combatemos aqueles que, incapazes de traduzir nosso papel em termos de uma efetiva política de organização e acumulação de forças, se encerram numa proposta de partido vanguardista tradicional, que se auto-nomeia representante da classe trabalhadora. Por outras palavras, somos contra tanto o comportamento individualista daqueles que acreditam não ser necessário ouvir o Partido e que, por conta própria, avançam propostas conciliadoras, como aqueles que, também não se submetendo a democracia interna do PT, subordinam-se a comandos paralelos e priorizam a divulgação das suas posições políticas, em detrimento daquelas do próprio Partido. Ao contrário desses “iluminados”, não temos respostas para todos os problemas do PT. Nem temos a receita infalível para superar a crise econômica do país, para vencer a ditadura e para chegar ao poder. O que pretendemos, ao detonar o amplo processo do debate democrático - que subsidiaremos com alguns documentos de produção coletiva a serem amplamente distribuídos - é contribuir para que os próprios militantes, filiados e simpatizantes do PT possam elaborar coletivamente diretrizes claras, capazes não apenas de orientar a nossa prática cotidiana e a da direção renovada, mas, sobretudo, de auxiliarem o avanço e a unificação política dos movimentos dos trabalhadores. Entendemos assim, que cabe ao PT nesse momento:

1. Lutar contra a tentativa do regime de estabelecer uma política de trégua e de conciliação, assim como lutar contra o estabelecimento, por forças que se dizem de oposição, de um pacto social que visa ao isolamento dos trabalhadores. Entendemos que tais propostas buscam, tão somente, fazer novamente a classe trabalhadora apagar os custos da crise econômica e social;

1. Responder a esta conciliação e a este pacto com a mobilização de todas aquelas forças sociais exploradas que estão dispostas a lutar pelas numerosas reivindicações abrigadas pelo lema TRABALHO, TERRA E LIBERDADE;

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1. Cumprir concretamente nosso papel como partido de massa: 1. Militando intensamente nos movimentos populares,

sindicais, raciais, culturais e das chamadas minorias, contribuindo com propostas concretas para a condução de suas lutas, respeitada a sua autonomia;

2. Aplicando nossas propostas de filiação e nucleação intensivas, a fim de que as mais amplas camadas de explorados possam participar da construção do PT e da aplicação da sua política; e.

3. Executando uma política ativa de formação política e cultural dos militantes;

4. Para levar à prática as propostas acima, achamos que também são necessários alguns passos relacionados com a estrutura e a democracia interna do Partido:

D.1 - Revalorizar o papel dos núcleos como instância de reflexão e deliberação; D.2 - Imprimir-lhes uma dinâmica, sobretudo, direcionada para a atuação dos movimentos sociais e não apenas para a vida interna do partido; D.3 - Estabelecer critérios políticos claros para a escolha das direções partidárias e dos parlamentares; D.4 - Estabelecer, também, critérios claros para a participação das bases nas decisões partidárias; D.5 - Descentralizar a estrutura organizacional e financeira do partido, alcançando todas as nossas bases, seja na capital, seja no interior do Estado; D.6 - Criar uma imprensa partidária ágil e amplo fluxo de informações, que atinja o conjunto do Partido; enfim, abrir todos os canais possíveis para consolidação da democracia interna do Partido dos Trabalhadores. Comprometidos, portanto, com esses princípios, nós, abaixo-assinados, militantes de diversas regiões, setores e instâncias do PT, convocamos a todos os companheiros que concordam com essas posições a apoiarem e a participarem deste projeto que se inspira nas idéias originárias do nosso Partido Articulação dos 113

Anexo II

Sindicato dos bancários do Brasil (em dezembro de 2016)

SINDICATO UF CONFEDERAÇÃO CENTRAL Base

estimada128

128 As estimativas baseiam-se no cruzamento das informações dos dois cadastros (CNES – Cadastro Nacional de Entidades Sindicais, do Ministério do Trabalho – e Caged Estabelecimentos, presentes nas fontes consultadas) e das informações disponibilizadas sobre eleições sindicais na imprensa sindical. Trata-se de estimativa, devido ao cruzamento de informações e a divulgação nem sempre exata dos dados, portanto podem existir variações.

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Sindicato dos Bancários do Estado do Acre AC CONTRAF CUT 950

Sindicato dos Bancários de Alagoas AL CONTRAF CUT 3021

Sindicato dos Bancários do Amazonas AM CONTEC UGT 3334

Sindicato dos Bancários de Tabatinga AM CONTEC UGT 50

Sindicato dos Bancários de Carauari AM CONTEC UGT 30

Sind. Trab do Ramo Financ Estado do Amapá AP CONTRAF CUT 708

Sindicato dos Bancários de Jequié BA CONTEC CTB 400

Sindicato dos Bancários de Juazeiro BA CONTEC CTB 387

Sindicato dos Bancários de Feira de Santana BA CONTRAF CTB 985

Sindicato dos Bancários de Itabuna BA CONTRAF CTB 484

Sindicato dos Bancários de Jacobina BA CONTRAF CUT 281

Sindicato dos Bancários da Bahia BA sem confederação CTB 15022

Sindicato dos Bancários, IF e de crédito de Vitória da Conquista

BA sem confederação CTB 1002

Sindicato dos Bancários de Irecê BA sem confederação CTB 412

Sind dos Banc e Financiários de Camaçari BA sem confederação CTB 366

Sindicato dos Bancários de Ilhéus BA sem confederação CTB 239

Sindicato dos Bancários e trab. Sist. Fin. do Extremo Sul Bahia

BA CONTRAF CUT 710

Sindicato dos Bancários de Sobral CE CONTEC UGT 226

Sindicato dos Bancários de Iguatu CE CONTEC UGT 184

Sindicato dos Bancários do Ceará CE CONTRAF CUT 11972

Sindicato dos Bancários de Cariri CE sem confederação CUT 525

Sindicato dos Bancários de Brasília DF CONTRAF CUT 29962

Sind dos Bancários no Est do Espírito Santos ES CONTRAF INTERSINDICAL 7502

Sindicato dos Bancários de Catalão GO CONTEC UGT 224

Sindicato dos Bancários no Estado de Goiás GO CONTEC UGT 6949

Sindicato dos Bancários de Anápolis GO CONTEC UGT 672

Sindicato dos Bancários de Itumbiara GO CONTEC UGT 120

Sindicato dos Bancários de Jataí GO CONTEC UGT 500

Sindicato dos Bancários de Rio Verde GO CONTEC UGT 341

Sindicato dos Bancários do Maranhão MA sem confederação CONLUTAS 4963

Sindicato dos Bancários de Uberlândia MG CONTEC UGT 2417

Sindicato dos Bancários de Varginha MG CONTEC NCST 1723

Sindicato dos Bancários de Montes Claros MG CONTEC NCST 1604

Sindicato dos Bancários de Itajubá MG CONTEC NCST 1100

Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Financeiro de Poços de Caldas

MG CONTEC NCST 1100

Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Financeiro de Governador Valadares

MG CONTEC NCST 703

Sindicato dos Bancários de Muriaé MG CONTEC NCST 539

Sindicato dos Bancários de Curvelo MG CONTEC NCST 458

Sindicato dos Bancários de Barbacena MG CONTEC NCST 296

Sindicato dos Bancários de Ponte Nova MG CONTEC NCST 211

Sindicato dos Bancários de Araguari MG CONTEC NCST 198

Sindicato dos Bancários de Araxá MG CONTEC NCST 124

Sindicato dos Bancários de Manhuaçu MG CONTEC NCST 114

Sindicato dos Bancários de Ituiutaba MG CONTEC NCST 465

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Sindicato dos Bancários de Caratinga MG CONTEC NCST 300

Sindicato dos Bancários de Santos Dumont MG CONTEC NCST 110

Sindicato dos Bancários de Belo Horizonte MG CONTRAF CUT 17539

Sindicato dos Trab. do Ramo Financeiro da Zona da Mata e Sul de Minas

MG CONTRAF CUT 1730

Sindicato dos Bancários de Divinópolis MG CONTRAF CUT 1300

Sindicato dos Bancários de Ipatinga MG CONTRAF CUT 789

Sindicato dos Bancários de Uberaba MG CONTRAF CUT 778

Sindicato dos Bancários de Cataguases MG CONTRAF CUT 474

Sindicato dos Bancários de Patos de Minas MG CONTRAF CUT 446

Sindicato dos Bancários de Teófilo Otoni MG CONTRAF CUT 292

Sindicato dos Bancários de Ponta Porã MS CONTEC UGT 160

Sindicato dos Bancários de Três Lagoas MS CONTEC UGT 344

Sindicato dos Bancários de Naviraí MS CONTRAF UGT 225

Sindicato dos Bancários de Corumbá MS sem confederação UGT 168

Sindicato dos Bancários de Dourados MS CONTRAF CUT 2582

Sindicato dos Bancários de Campo Grande e região MS

MS CONTRAF CUT 2556

Sindicato dos Bancários Rondonópolis e Região Sul de Mato Grosso

MT CONTRAF CUT 639

Sindicato dos Bancários de Barra dos Garças (Médio Araguaia)

MT CONTRAF CUT 359

Sindicato dos Bancários no Estado de Mato Grosso

MT CONTRAF CUT 4805

Sindicato dos Bancários do Pará PA CONTRAF CUT 9523

Sindicato dos Bancários de Patos e Região PB CONTEC UGT 112

Sindicato dos Bancários de Sousa PB CONTEC UGT 100

Sindicato dos Bancários de Conceição PB CONTEC UGT 90

Sindicato dos Bancários de Catolé do Rocha PB CONTEC UGT 60

Sindicato dos Bancários de Cajazeiras e Região

PB CONTEC UGT 58

Sindicato dos Bancários de Mamanguape e Região

PB CONTEC UGT 58

Sindicato dos Bancários de Itabaiana e Região

PB CONTEC UGT 40

Sindicato dos Bancários da Paraíba - ok PB CONTRAF CUT 3466

Sindicato dos Bancários de Campina Grande PB CONTRAF CUT 653

Sindicato dos Bancários de Caruaru PE CONTEC UGT 635

Sindicato dos Bancários de Petrolina PE CONTEC UGT 361

Sindicato dos Bancários de Garanhuns PE CONTEC UGT 347

Sindicato dos Bancários de São Bento do Una PE CONTEC UGT 217

Sindicato dos Bancários de Goiana PE CONTEC UGT 118

Sindicato dos Bancários de Palmares PE CONTEC UGT 120

Sindicato dos Bancários de Pernambuco - ok PE CONTRAF CUT 9583

Sindicato dos Bancários e Financiários do Piauí

PI CONTRAF CUT 2902

Sindicato dos Bancários de Maringá PR CONTEC UGT 1690

Sindicato dos Bancários de Ponta Grossa PR CONTEC sem central 917

Sindicato dos Bancários do Sudoeste do Paraná

PR CONTEC UGT 671

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Sindicato dos Bancários de Paranaguá PR CONTEC UGT 406

Sindicato dos Bancários de Cianorte PR CONTEC UGT 187

Sindicato dos Bancários de Telêmaco Borba PR CONTEC UGT 100

Sindicato dos Bancários de Goioerê PR CONTEC UGT 90

Sindicato dos Bancários de Cascavel PR CONTEC UGT 1047

Sindicato dos Bancários de Foz do Iguaçu PR CONTEC UGT 572

Sindicato dos Bancários de União da Vitória PR CONTEC FORÇA 144

Sindicato dos Bancários de Londrina PR CONTRAF CUT 1784

Sindicato dos Bancários de Umuarama/Assis Chateaubriand

PR CONTRAF CUT 600

Sindicato dos Bancários de Apucarana PR CONTRAF CUT 515

Sindicato dos Bancários de Guarapuava PR CONTRAF CUT 410

Sindicato dos Bancários de Campo Mourão PR CONTRAF CUT 340

Sindicato dos Bancários de Arapoti PR CONTRAF CUT 312

Sindicato dos Bancários de Paranavaí PR CONTRAF CUT 395

Sindicato dos Bancários de Toledo PR CONTRAF CUT 369

Sindicato dos Bancários em Cornélio Procópio

PR CONTRAF CUT 260

Sindicato dos Bancários de Curitiba PR CONTRAF CUT 18719

Sindicato dos Bancários do município do Rio de Janeiro

RJ CONTRAF CUT 26434

Sindicato dos Bancários de Niterói RJ CONTRAF CUT 3844

Sindicato dos Bancários da Baixada Fluminense

RJ CONTRAF CUT 3360

Sindicato dos Bancários do Sul Fluminense RJ CONTRAF CUT 2265

Sindicato dos Bancários de Campos dos Goytacazes

RJ CONTRAF CUT 1096

Sindicato dos Bancários de Nova Friburgo RJ CONTRAF CUT 757

Sindicato dos Bancários e Ramo Fin. Petrópolis/SJ V Rio Preto

RJ CONTRAF CUT 636

Sindicato dos Bancários de Angra dos Reis RJ CONTRAF CUT 590

Sindicato dos Bancários de Macaé RJ CONTRAF CUT 565

Sindicato dos Bancários de Itaperuna RJ CONTRAF sem central 551

Sindicato dos Bancários de Três Rios RJ CONTRAF CUT 300

Sindicato dos Bancários de Teresópolis RJ CONTRAF CUT 285

Sindicato dos Bancários de Mossoró RN CONTEC UGT 366

Sindicato dos Bancários do Rio Grande do Norte

RN sem confederação CONLUTAS 3804

Sindicato dos Bancários do Estado de Rondônia

RO CONTRAF CUT 2151

Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Financeiro de Roraima

RR CONTRAF CUT 571

Sindicato dos Bancários de Bento Gonçalves RS CONTEC UGT 365

Sindicato dos Bancários de Uruguaiana RS CONTEC UGT 300

Sindicato dos Bancários de Cachoeira do Sul RS CONTEC UGT 248

Sindicato dos Bancários de Nova Prata RS CONTEC UGT 160

Sindicato dos Bancários de Lajeado RS CONTEC UGT 300

Sindicato dos Bancários de Porto Alegre RS CONTRAF CUT 12515

Sindicato dos Bancários de Caxias do Sul RS CONTRAF CUT 2196

Sindicato dos Bancários de Novo Hamburgo RS CONTRAF CUT 1275

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Sindicato dos Bancários de Santa Maria RS CONTRAF CUT 1132

Sindicato dos Bancários de Pelotas RS CONTRAF CUT 1054

Sindicato dos Bancários e Financiários do Vale do Caí

RS CONTRAF CUT 666

Sindicato dos Bancários do Litoral Norte - RS RS CONTRAF CUT 654

Sindicato dos Bancários de Santa Cruz do Sul RS CONTRAF CUT 621

Sindicato dos Bancários de Rio Grande RS CONTRAF CUT 458

Sindicato dos Bancários de Carazinho RS CONTRAF CUT 414

Sindicato dos Bancários de Bagé RS CONTRAF CUT 363

Sindicato dos Bancários de Frederico Westphalen

RS CONTRAF sem central 350

Sindicato dos Bancários do Vale do Paranhana

RS CONTRAF CUT 344

Sindicato dos Bancários de Santo Ângelo RS CONTRAF CUT 321

Sindicato dos Bancários de Cruz Alta RS CONTRAF CUT 309

Sindicato dos Bancários de Horizontina RS CONTRAF CUT 296

Sindicato dos Bancários de Alegrete RS CONTRAF CUT 250

Sindicato dos Bancários de Santana do Livramento

RS CONTRAF sem central 220

Sindicato dos Bancários de Camaquã RS CONTRAF CUT 217

Sindicato dos Bancários de Rosário do Sul RS CONTRAF sem central 198

Sindicato dos Bancários de Guaporé RS CONTRAF sem central 161

Sindicato dos Bancários de Passo Fundo RS CONTRAF CUT 1061

Sindicato dos Bancários de Santa Rosa RS CONTRAF CUT 329

Sindicato dos Bancários de São Borja RS CONTRAF CUT 230

Sindicato dos Bancários de Erechim RS sem confederação sem central 527

Sindicato dos Bancários de São Leopoldo RS sem confederação sem central 429

Sindicato dos Bancários de Ijuí RS sem confederação sem central 411

Sindicato dos Bancários de Rio Pardo RS sem confederação UGT 280

Sindicato dos Bancários de São Luiz Gonzaga RS sem confederação sem central 270

Sindicato dos Bancários de Vacaria RS sem confederação sem central 258

Sindicato dos Bancários de Soledade RS sem confederação UGT 246

Sindicato dos Bancários de Santiago RS sem confederação sem central 190

Sindicato dos Bancários de São Gabriel RS sem confederação sem central 148

Sindicato dos Bancários de Brusque SC CONTEC UGT 348

Sindicato dos Bancários de Joinville SC CONTEC UGT 1764

Sindicato dos Bancários de Itajaí SC CONTEC UGT 700

Sindicato dos Bancários de Tubarão SC CONTEC UGT 607

Sindicato dos Bancários de Rio do Sul SC CONTEC UGT 344

Sindicato dos Bancários de Balneário Camboriú

SC CONTEC UGT 340

Sindicato dos Bancários de Laguna SC CONTEC UGT 322

Sindicato dos Bancários de Porto União SC CONTEC UGT 172

Sindicato dos Bancários de Canoinhas SC CONTEC UGT 150

Sindicato dos Bancários de Mafra SC CONTEC UGT 92

Sindicato dos Bancários de Lages SC CONTEC UGT 438

Sindicato dos Bancários de Florianópolis SC CONTRAF CUT 3731

Sindicato dos Bancários de Blumenau SC CONTRAF CUT 1632

Sindicato dos Bancários de Chapecó, Xanxerê SC CONTRAF CTB 1162

Sindicato dos Bancários e Financiários de SC CONTRAF CUT 876

Page 257: PAULO EDUARDO SILVA MALERBA O …repositorio.unicamp.br/.../1/Malerba_PauloEduardoSilva_D.pdfPaulo Eduardo Silva Malerba, em 13/12/2017, sob a orientação da Profª Drª Andréia

257

Criciúma

Sindicato dos Bancários de Joaçaba SC CONTRAF CUT 607

Sindicato dos Bancários e Cooperativas de Crédito de São Miguel do Oeste

SC CONTRAF CUT 300

Sindicato dos Bancários de Concórdia SC CONTRAF CUT 250

Sindicato dos Bancários de Videira SC CONTRAF CUT 100

Sindicato dos Bancários de Caçador SC sem confederação UGT 100

Sindicato dos Bancários de Alto Vale do Araranguá

SC CONTRAF CUT 150

Sindicato dos Bancários no Estado de Sergipe SE CONTRAF CTB 3286

Sindicato dos Bancários de Sorocaba SP CONTEC UGT 3883

Sindicato dos Bancários de São José dos Campos

SP CONTEC UGT 3462

Sindicato dos Bancários de São José do Rio Preto

SP CONTEC UGT 1918

Sindicato dos Bancários de Araçatuba SP CONTEC UGT 1575

Sindicato dos Bancários de Rio Claro SP CONTEC UGT 1330

Sindicato dos Bancários de São Carlos SP CONTEC UGT 1200

Sindicato dos Bancários de Jaú SP CONTEC UGT 1162

Sindicato dos Bancários de Franca SP CONTEC UGT 951

Sindicato dos Bancários de Tupã SP CONTEC UGT 791

Sindicato dos Bancários de Guaratinguetá SP CONTEC UGT 739

Sindicato dos Bancários de Votuporanga SP CONTEC UGT 550

Sindicato dos Bancários de Lins SP CONTEC UGT 450

Sindicato dos Bancários de Andradina SP CONTEC UGT 338

Sindicato dos Bancários de Presidente Venceslau

SP CONTEC UGT 230

Sindicato dos Bancários de Campinas SP CONTRAF CUT 7952

Sindicato dos Bancários de Ribeirão Preto SP CONTRAF UGT 4400

Sindicato dos Bancários e Financiários de Santos

SP CONTRAF Intersindical 3802

Sindicato do Bancários de Piracicaba SP CONTRAF CUT 2003

Sindicato dos Bancários de Marília SP sem confederação UGT 1373

Sindicato dos Bancários e Financiários de São Paulo

SP CONTRAF CUT 137791

Sindicato dos Bancários do ABC SP CONTRAF CUT 8372

Sindicato dos Bancários e Financiários de Guarulhos

SP CONTRAF CUT 2922

Sindicato dos Bancários de Jundiaí SP CONTRAF CUT 2020

Sindicato dos Bancários de Mogi das Cruzes SP CONTRAF CUT 1497

Sindicato dos Bancários de Taubaté SP CONTRAF CUT 1475

Sindicato dos Bancários de Presidente Prudente

SP CONTRAF CUT 1323

Sindicato dos Bancários de Catanduva e Região/SP

SP CONTRAF CUT 1021

Sindicato dos Trabalhadores do Ramo Financeiro de Barretos

SP CONTRAF CUT 800

Sindicato dos Bancários de Bragança Paulista SP CONTRAF CUT 786

Sindicato dos Bancários de Limeira SP CONTRAF CUT 600

Sindicato dos Bancários de Araraquara SP CONTRAF CUT 597

Page 258: PAULO EDUARDO SILVA MALERBA O …repositorio.unicamp.br/.../1/Malerba_PauloEduardoSilva_D.pdfPaulo Eduardo Silva Malerba, em 13/12/2017, sob a orientação da Profª Drª Andréia

258

Sindicato dos Bancários de Assis SP CONTRAF CUT 520

Sindicato dos Bancários do Vale do Ribeira SP CONTRAF CUT 364

Sindicato dos Bancários e Financiários de Bauru

SP sem confederação CONLUTAS 2573

Sindicato dos Trab. em Empresas de Crédito de Tocantins

TO CONTEC UGT 1942

Fontes: Cadastro Nacional de Entidades Sindicais/Ministério do Trabalho e Caged Estabelecimentos.