3
Persépolis (Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi, 2007) 08Sexta-feiraJUN 2012 POSTED BY ISABELLA NASCIMENTO PEREIRA IN CINEMA ≈DEIXE UM COMENTÁRIO [Editar] Etiquetas animação, Marjane Satrapi, persepolis “Alá não criou o homem para que ele pudesse se divertir. O objetivo da criação é pôr à prova a humanidade por meio de dureza e oração. Um regime islâmico deve ser sério em todos os aspectos. Não há piadas no islã. Não há humor no islã. Não há diversão no islã. Não pode haver diversão e alegria naquilo que é sério.” O autor desta frase é o Aiatolá Khomeini, o líder religioso que comandou a Revolução Islâmica de 1979 no Irã que foi tão bem retratada neste Persépolis(2007), filme de Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi, baseado na graphic novel autobiográfica da última. Satrapi captura sob um viés bastante pessoal aquele que é considerado por muitos como um dos eventos mais importantes da segunda metade do século XX, transformando o filme em um testemunho vivo das mudanças de seu país e da influência que estes eventos tiveram em sua própria trajetória. Com belos traços arredondados e uma paleta em tons de preto e branco, encontra a maneira ideal de balancear a tristeza inerente à história com a sua atitude e personalidade vibrantes, dando leveza ao filme e suavemente criando laços de empatia com o espectador. Contextualizar uma história dessas é importante, e tudo começa em 1941, quando Xá Reza Pahlevi sucede ao seu pai no trono do Irã, com apoio do Ocidente. É forçado a abdicar em 1954, quando o governo democraticamente eleito do primeiro ministro Mohammad Mussadeq surge com força e dá um golpe de Estado, defendendo uma agenda nacionalista que gera fúria nos EUA e Inglaterra. Estes países então orquestram a Operação Ajax, que derruba Mussadeq e recoloca o Xá Reza Pahlevi no poder, desta vez de uma maneira ditatorial. Com

Persépolis (Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi, 2007)

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Crítica escrita para o blog de cinema arrotos culturais.

Citation preview

Perspolis (Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi,2007)08Sexta-feiraJun 2012PostedbyIsabella Nascimento PereirainCinemaDeixe um Comentrio[Editar]Etiquetasanimao,Marjane Satrapi,persepolisAl no criou o homem para que ele pudesse se divertir. O objetivo da criao pr prova a humanidade por meio de dureza e orao. Um regime islmico deve ser srio em todos os aspectos. No h piadas no isl. No h humor no isl. No h diverso no isl. No pode haver diverso e alegria naquilo que srio.O autor desta frase o Aiatol Khomeini, o lder religioso que comandou a Revoluo Islmica de 1979 no Ir que foi to bem retratada nestePerspolis(2007), filme de Vincent Paronnaud e Marjane Satrapi, baseado na graphic novel autobiogrfica da ltima. Satrapi captura sob um vis bastante pessoal aquele que considerado por muitos como um dos eventos mais importantes da segunda metade do sculo XX, transformando o filme em um testemunho vivo das mudanas de seu pas e da influncia que estes eventos tiveram em sua prpria trajetria. Com belos traos arredondados e uma paleta em tons de preto e branco, encontra a maneira ideal de balancear a tristeza inerente histria com a sua atitude e personalidade vibrantes, dando leveza ao filme e suavemente criando laos de empatia com o espectador.

Contextualizar uma histria dessas importante, e tudo comea em 1941, quando X Reza Pahlevi sucede ao seu pai no trono do Ir, com apoio do Ocidente. forado a abdicar em 1954, quando o governo democraticamente eleito do primeiro ministro Mohammad Mussadeq surge com fora e d um golpe de Estado, defendendo uma agenda nacionalista que gera fria nos EUA e Inglaterra. Estes pases ento orquestram a Operao Ajax, que derruba Mussadeq e recoloca o X Reza Pahlevi no poder, desta vez de uma maneira ditatorial. Com a Revoluo Branca de 1963, comea a modernizar o Ir atravs de reformas civis e militares, tentando implementar uma sociedade aos moldes ocidentais. Estas reformas geram grande descontentamento, por serem malsucedidas e afrontarem os valores de camadas mais religiosas da populao, alm da represso sanguinria do X contra seus opositores e a corrupo de seu governo gerarem repdio. Movimentos de contestao surgem, e diversos grupos se unem pela derrubada do X, sendo fortemente reprimidos pelo governo.E a que se inicia a histria da pequena Marji, menina curiosa, inteligente e viva, filha de pais esquerdistas e ansiosa em entender o que ocorre sua volta. A Revoluo orquestrada do exterior pelo lder religioso xiita Aiatol Khomeini, que prega uma sociedade islmica alternativa aos projetos capitalista e socialista, utilizando de folhetos e mensagens gravadas para propagar seus ideais, e que consolida a queda do regime do X Pahlevi quando retorna do exlio em Paris . A formao de uma Repblica Islmica massivamente apoiada atravs de votao. Em um mundo dividido pela Guerra Fria, o Ir se firma como movimento autnomo, porm essa nova sociedade que emerge no to ensolarada e positiva como se sonhava.Aiatol Khomeini, como se pode perceber na citao inicial, era um homem conservador, e as regras se enrijeceram. O Ocidente foi demonizado, a Sharia (lei islmica) foi adotada, e os outros revolucionrios no islmicos, como os comunistas que pensaram que ali encontrariam espao para propagar sua ideologia, foram considerados inimigos. Logo depois, o Iraque ataca o Ir, aproveitando-se da sua vulnerabilidade e buscando terra e petrleo, contando com o apoio do Ocidente no fornecimento de armas, numa violenta guerra que durou dez anos e no teve vencedor definido, somente destruio e perdas humanas imensurveis.Com uma personalidade naturalmente contestadora, e vivenciando todos esses horrores, Marji acaba sendo enviada ustria, onde descobre um novo mundo cujas liberdades civis andam no mesmo compasso da falta de empatia e de compreenso que encontra ali, alm de ter que lidar com questes prprias da sua idade, como a descoberta da sexualidade, a puberdade e a busca pela prpria identidade. Se o seu pas natal parece brbaro por no suportar aquilo que lhe diferente, a sua estadia na ustria tambm lhe mostra a crueldade passiva do Ocidente, que deixa morrer aqueles que no so do interesse da sociedade, como ela. A sua condio de imigrante naturalmente ambgua, pois ao mesmo tempo em que espera construir uma vida melhor em um novo lugar, ainda que incompreensvel aos seus olhos, Marji se apega esperana de voltar sua terra, pois tais laos so inquebrantveis; porm, ao efetivamente retornar, encontra um Ir que no mais reconhece como seu. Como revela ao seu psiquiatra: eu era uma estrangeira na ustria, e agora sou estrangeira no meu pas.Marji estuda, se casa, se divorcia, se rebela com suas liberdades censuradas. No h mais espao para ela nessa atual sociedade iraniana, e ela intuitivamente sabe que hora de partir. E o sentimento que o filme deixa de uma esperana meio esmaecida, de um futuro que s o melhor possvel porque no h outra opo. Com uma protagonista forte, cercada por personagens to marcantes quanto av e o tio Anouche, Marjane Satrapi conta lindamente sua histria e a do seu pas; sem deixar de exibir os horrores da guerra, permite o humor como via de escape ao espectador, e d ao mundo uma viso tocante e sincera sobre o Ir que ama e conhece, longe das caricaturas xenfobas ocidentais.