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51 72 PÓSIO Humanização da dor e sofrimento humanos no contexto hospitalar Léo Pessini Este artigo procura realçar a importância e a necessidade da dimensão humana no cuidado da dor e sofrimento humanos no âmbito da saúde, especificamente no hospital. Hoje, muito se fala e reclama da desumanização das instituições de saúde. O hospital reflete essa problemática como que um espelho, o que de pior e de melhor acontece na nossa sociedade desumanizada e desumanizante. A humanização desta instituição passa, obrigatoriamente, também pela humanização deste universo maior condicionante da sociedade. No tocante ao cuidado digno da dor e sofrimento humanos, o sistema de saúde brasileiro ainda está numa fase rudimentar. Há muito o que se fazer em termos de operacionalização de políticas públicas relacionadas com a questão, bem como intervir no aparelho formador de profissionais para criar uma nova cultura. Num contexto de crescente tecnologização do cuidado, é urgente o resgate de uma visão antropológica holística, que cuide da dor e sofrimento humanos nas suas várias dimensões, ou seja, física, social, psíquica, emocional e espiritual. Para além da difícil resposta à questão do “porquê” da dor/sofrimento, campo das filosofias e religiões, o cuidado solidário, que alia com- petência técnico-científica e humana, em meio à dor e sofrimento do outro é uma chance pre- ciosa para nos deixarmos tocar em nossa sensibilidade e nos humanizarmos no processo. Unitermos: Bioética – sofrimento humano, humanização hospitalar – ética, dor e sofrimento humanos – ética Léo Pessini Professor doutor em Teologia Moral; pós-graduado em Clinical Pastoral Education and Bioethics pelo St. Luke’s Medical Center, em Milwaukee (EUA); membro da Diretoria da Associação Internacional de Bioética; superintendente da União Social Camiliana e vice-reitor do Centro Universitário São Camilo SIM PÓSIO “O sofrimento somente é intolerável quando ninguém cuida.” Dame Cicely Saunders “Os corpos não sofrem, as pessoas sofrem.” Eric Cassel “Não há riqueza maior que a saúde do corpo, nem contentamento maior que a alegria do coração. É melhor a morte do que uma vida amarga e o descanso eterno, mais que uma doença prolongada.” Eclesiástico 30, 16-17 51 72 Bioética 2002 - vol. 10 - nº 2 Job006 Rev Bioetica N5 final 11/25/02 4:33 PM Page 51

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artigo sobre dor, sofrimento e humanização

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SIMPÓSIO

Humanização da dor e sofrimento humanosno contexto hospitalar

Léo Pessini

Este artigo procura realçar a importância e a necessidade da dimensão humana no cuidado dador e sofrimento humanos no âmbito da saúde, especificamente no hospital. Hoje, muito se falae reclama da desumanização das instituições de saúde. O hospital reflete essa problemáticacomo que um espelho, o que de pior e de melhor acontece na nossa sociedade desumanizada edesumanizante. A humanização desta instituição passa, obrigatoriamente, também pelahumanização deste universo maior condicionante da sociedade. No tocante ao cuidado digno dador e sofrimento humanos, o sistema de saúde brasileiro ainda está numa fase rudimentar. Hámuito o que se fazer em termos de operacionalização de políticas públicas relacionadas com aquestão, bem como intervir no aparelho formador de profissionais para criar uma nova cultura.Num contexto de crescente tecnologização do cuidado, é urgente o resgate de uma visãoantropológica holística, que cuide da dor e sofrimento humanos nas suas várias dimensões, ouseja, física, social, psíquica, emocional e espiritual. Para além da difícil resposta à questão do“porquê” da dor/sofrimento, campo das filosofias e religiões, o cuidado solidário, que alia com-petência técnico-científica e humana, em meio à dor e sofrimento do outro é uma chance pre-ciosa para nos deixarmos tocar em nossa sensibilidade e nos humanizarmos no processo.

Unitermos: Bioética – sofrimento humano, humanizaçãohospitalar – ética, dor e sofrimento humanos – ética

Léo PessiniProfessor doutor em Teologia Moral;pós-graduado em Clinical PastoralEducation and Bioethics pelo St.Luke’s Medical Center, emMilwaukee (EUA); membro daDiretoria da AssociaçãoInternacional de Bioética;superintendente da União SocialCamiliana e vice-reitor do CentroUniversitário São Camilo

SIMPÓSIO

“O sofrimento somente é intolerável quando ninguém cuida.”

Dame Cicely Saunders

“Os corpos não sofrem, as pessoas sofrem.”Eric Cassel

“Não há riqueza maior que a saúde do corpo, nem contentamento maior que a alegria do coração.

É melhor a morte do que uma vida amarga e o descanso eterno, mais que uma doença prolongada.”

Eclesiástico 30, 16-17

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Numa primeira aproximação à questão dahumanização da dor e sofrimento humanos nocontexto hospitalar, constatamos que passa-mos por uma profunda crise de humanismo.Falamos insistentemente de ambientes desu-manizados, tecnicamente perfeitos, mas semalma e ternura humana. A pessoa humana vul-nerabilizada pela doença deixou de ser o centrode atenções e passou a ser instrumentalizadaem função de determinado fim, podendo sertransformada em objeto de aprendizado, o sta-tus do pesquisador, ou ser cobaia de pesquisa,só para citar algumas situações que compro-metem a verdade ética de que as coisas têmpreço e podem ser trocadas, mudadas e comer-cializadas, mas as pessoas têm dignidade quedeve ser respeitada! A manipulação, enfim,sutilmente se faz presente e rouba aquilo que émais precioso à vida humana: sua dignidade.

Acreditamos que frente a este cenário geradorde sofrimento podemos implementar umapolítica de assistência e cuidado que honre adignidade do ser humano doente. Nos limitesde um texto introdutório à problemática emtela, nosso roteiro tem como partida uma aná-lise contextual da realidade hospitalar (1),apresenta alguns dados preocupantes em rela-ção à dor na realidade brasileira (2), segue ana-lisando o fenômeno da tecnologização do cui-dado que transforma a dor e o sofrimentohumano num mero problema técnico (3),aprofunda a problemática no contexto clínico,propondo uma distinção entre dor, que se situamais no âmbito da dor física e do sofrimento

que atinge o todo da pessoa (4). Avança real-çando a necessidade de uma visão antropológi-ca holística que valorize as diversas dimensõesdo fenômeno dor/sofrimento, ou seja, adimensão física, psíquica, social e espiritual(5). Em termos de assistência de saúde, enfa-tiza a necessidade imperiosa de cuidado solidá-rio que une competência técnico-científica ehumanidade, principalmente naquelas situa-ções extremas na fronteira entre a vida e amorte (6).

1. As catedrais contemporâneas da saúdee do sofrimento humano

Façamos inicialmente uma rápida viagem até aIdade Média e entremos numa catedral.“Visível à distância, emblema da cidade, a catedralé na realidade o coração de um vasto conjunto demúltiplas funções: centro religioso, intelectual, eco-nômico, caritativo, artístico, uma cidade sagrada esimbólica dentro da cidade. Lugar dos principaiscentros e nós de organização do espaço urbano edo urbanismo (com sua praça), ela é também umcentro do poder, objeto de conflitos”(1).

A catedral era ao mesmo tempo símbolo, cen-tro e síntese da história da cidade. Em volta edentro deste templo, viviam-se e reviviam-setodos os acontecimentos felizes, tristes e dolo-ridos daquele povo. Diante de suas portas rea-lizam-se os teatros que cantavam a vida dapopulação à luz de seus valores culturais e reli-giosos . Os vitrais, como os outdoors de hoje,

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eram catecismos coloridos de suas crenças.Todas as corporações celebravam dentro dacatedral o dia do seu padroeiro, bem como suasreuniões de rotina. A vida, as festas, as ale-grias, as tristezas, a morte, as esperanças,enfim a vida - do nascer ao morrer - era cele-brada dentro daquele edifício sagrado, a cate-dral, verdadeiro orgulho de todos.

Em nossa civilização contemporânea, a cate-dral da cidade está sendo substituída poroutros tipos de templos sagrados, por novostipos de catedrais. É o caso das catedrais doesporte, que são os grandes estádios; as cate-drais da riqueza, que são os bancos; as catedraisdo lazer, que são os grandes parques de entre-tenimento e diversões; as catedrais do prazer,que são as casas noturnas requintadas e osmotéis luxuosos; as catedrais do trabalho, quesão as fábricas e empresas prestadoras de servi-ços; as catedrais do saber, que são as universi-dades. E no meio de tantos novos templos, eisque surgem as catedrais da saúde, que são oshospitais.

Dentro de um hospital, como nas antigas cate-drais, recapitulam-se todas as fases da vida doser humano. O nascimento, com suas festas eesperanças, as doenças, a restauração da saúde,a cura, as pesquisas na busca de novos medica-mentos, as cruzadas das campanhas preventi-vas, as vigílias nas UTIs – as corporações ou asequipes profissionais combatendo o “inimigo”infecção; as orações e meditações nos oratóriose/ou capelas, sem esquecer do silêncio e dainquietude em momentos de despedida devida.

É importante termos uma visão histórica decomo era esta instituição até muito recente-mente, e que passou por transformações radi-cais ao longo do século XX. A narrativa de M.Foucault é simplesmente contundente: “Antesdo século XVIII, o hospital era essencialmenteuma instituição de assistência aos pobres.Instituição de assistência, como também deseparação e exclusão. O pobre como pobre temnecessidade de assistência e, como doente, porta-dor de doença e de possível contágio, é perigoso.Por estas razões, o hospital deve estar presentetanto para acolhê-lo quanto para proteger osoutros do perigo que ele encarna. O personagemideal do hospital, até o século XVIII, não é odoente que é preciso curar, mas o pobre que estámorrendo. É alguém que deve ser assistido mate-rial e espiritualmente, alguém a quem se deve daros últimos cuidados e o último sacramento. Estaé a função essencial do hospital. Dizia-se corren-temente, nesta época, que o hospital era um mor-redouro, um lugar onde morrer”(2).

Passar de uma instituição onde se vai para mor-rer para uma instituição onde se cuida e seaprimora a saúde exigiu muito tempo e desco-bertas científicas. Entremos no hospital. Estainstituição é um pequeno microcosmo do gran-de macrocosmo (sociedade), isto é, nele encon-tramos em dose concentrada um resumo doque de mais nobre, bonito e incrível encontra-mos na sociedade, bem como o que de maistriste, degradante e violento nela existe. Eleaceita a todos indiscriminadamente. Nele nosdefrontamos com a realidade nua e crua, semdisfarces ou máscaras, que caem por terra sempedir licença. É uma realidade contrastante

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que nos questiona. Nela nos defrontamos como santo e o bandido, o crente e o ateu, a crian-ça que apenas exalou o primeiro vagido de che-gada e que se torna um grito de adeus e o velhi-nho que, no vigor dos seus 90 anos, ainda lutapara viver e de fato vive... - e que alguns diasapós a alta volta ao hospital para agradecer edistribuir um “presentinho” aos que dele cuida-ram. Em situações de emergência, chega nopronto-socorro alguém que fez tudo para tirara própria vida numa tentativa frustrada de sui-cídio, e nós, profissionais da saúde, somos cha-mados a fazer o possível e o impossível para quecontinue a viver. Tantas jovens mulheres que-rendo ser mães, e por problemas de esterilidadenão podem; por outro lado, outras, sendo fér-teis, desperdiçam vidas e em muitas circunstân-cias morrem no processo. Trata-se de uma rea-lidade simplesmente paradoxal.

É um contraste chocante, provocador deindignação ética em muitas instâncias, masque nos convoca a sermos arautos do cuidadoda vida marcada pela dor e sofrimento.Ninguém vai ao hospital por prazer ou paratirar férias, muito menos para passear. Trata-sede uma necessidade de preservação da própriavida. É neste contexto que sempre temos apresença inoportuna da dor e do sofrimentoque nos provocam profundamente como sereshumanos e como profissionais da saúde.

Uma das situações críticas do cuidado da vida équando esta é marcada por dor e sofrimento into-leráveis e sem perspectiva, provocados por deter-minada doença séria de características mortais.Este é um dos motivos pelos quais muitas vezes a

opção pela eutanásia torna-se atrativa, no sentidode abreviar a vida intencionalmente por causa dador e do sofrimento. É muito freqüente ouvir nasUTIs e corredores do hospital pacientes que ver-balizam em alto e bom tom que não temem tantoa morte em si mesma, mas sim a dor e o sofri-mento do processo do morrer. O cuidado da dore do sofrimento é a chave para o resgate da dig-nidade do ser humano neste contexto crítico, e éum dos objetivos da Medicina desde tempos ime-moriais. A problemática da dor e do sofrimentonão é pura e simplesmente uma questão técnica:estamos frente a uma das questões éticas contem-porâneas de primeira grandeza e que precisa servista e enfrentada nas suas dimensões física, psí-quica, social e espiritual. Finalmente, veremosneste capítulo que, no Brasil, estamos aindanuma fase bastante rudimentar em relação aocuidado da dor no sistema de saúde. Existe muitador não aliviada e a esperança está na intervençãonas escolas de formação dos profissionais dasaúde, na reformulação curricular, que contempleesta visão antropológica, para além da formaçãotecnocientífica necessária e na implementação dafilosofia dos cuidados paliativos, em nível institu-cional ou domiciliar, frente aquelas situações emque curar não é mais possível. Falamos aqui nocuidado do sofrimento terminal da vida humana.Vejamos a seguir como a dor é tratada no contex-to de saúde brasileiro.

2. Alguns dados sobre dor na realidadebrasileira

O contexto da assistência médica em nossopaís é ainda caracterizado, em muitos seg-

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mentos populares, por uma cultura que cheirao conformismo dolorista (“é assim mesmo”)da sociedade enquanto tal. Num ethos socialmarcado por desigualdade e exclusão, herançade nosso período de escravidão, “o pobre temque sofrer”, e o crente não menos, para“ganhar o céu”. Felizmente, este manto dolo-rista, que acaba sacralizando a desigualdadesociopolítica e cultural, vai desaparecendo aospoucos.

Alguns sinais positivos já começam a surgir nocontexto clínico brasileiro. Foi criado em1997, no âmbito do Ministério da Saúde, umPrograma Nacional de Educação Continuadaem Dor e Cuidados Paliativos para osProfissionais da Saúde (3).

O que entender por dor? A palavra “dor” ori-gina-se do latim dolore. Os dicionários costu-mam defini-la como impressão desagradávelou penosa, decorrente de alguma lesão ou con-tusão, ou de um estado anormal do organismoou de parte dele.

O tema dor é geralmente negligenciado pelosprofissionais e educadores do setor saúde queelaboram os currículos de formação dos futu-ros profissionais da área. Segundo especialis-tas, existem basicamente dois tipos de dor: asagudas e as crônicas. A dor aguda geralmenteestá associada a algum tipo de lesão corporal etende a desaparecer logo que esta melhora. Ador crônica é aquela que perdura por mais deseis meses. É aquela que persiste além dotempo razoável e esperado para a cura de umalesão, ou que está associada a doenças crôni-

cas, causadoras de dor contínua, ou que retor-na em intervalos de meses ou anos.

Estudos epidemiológicos sobre a ocorrência eetiologia dos quadros álgicos são poucos, e oconhecimento sobre o tema ainda é bastanteprimário no Brasil. Sabe-se, porém, que a doré a razão principal pela qual 75%-80% daspessoas procuram o sistema primário de saúde.A dor crônica acomete parcela significativa dapopulação brasileira e é apontada como sendoa principal causa de falta ao trabalho, licençasmédicas, aposentadorias por doença, indeniza-ções trabalhistas e baixa produtividade. NoBrasil, 6 dos 11 medicamentos campeões devenda no ano de 1998 foram analgésicos e/ouantiinflamatórios (5).

As dores oncológicas representam 5% dasdores crônicas. Estima-se que 18 milhões depessoas no mundo apresentem câncer diagnos-ticado atualmente, e a dor é um problemacomum nesses pacientes. Os estudos têmapontado que a dor oncológica não tem sidoadequadamente controlada, não por falta derecursos terapêuticos, mas por avaliaçãoimprecisa do quadro de dor e utilização inade-quada do arsenal antiálgico disponível.

Estudos realizados nas unidades de cuidadospaliativos e câncer da Organização Mundial daSaúde (OMS) mostram que 4,5 milhões depacientes em países em desenvolvimento edesenvolvidos morrem anualmente sem recebertratamento da dor e sem que lhes sejam conside-rados outros sintomas tão prevalecentes quantoa dor e que também causam sofrimento.

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Em suma, a dor ainda não recebe a atençãodevida na assistência à saúde em nosso país.Necessitamos de programas de educação emrelação a essa problemática para doentes, fami-liares, médicos, farmacêuticos, enfermeiros,psicólogos, assistentes sociais e outros profis-sionais. O desafio para a comunidade científi-ca, para os profissionais da saúde e para toda asociedade é a elaboração de um programa espe-cial sobre essa questão nos currículos de for-mação desses profissionais. O tema dor deveser discutido e esclarecido para que hajamelhor compreensão e prevenção de sua pre-sença, bem como de seu controle (6,7).

Estes programas de educação devem funda-mentar-se em alguns princípios fundamentais,que assinalamos a seguir:

1) Visão da dor nas suas diferentes dimensões.A dor é uma experiência em que aspectos bio-lógicos, emocionais e culturais estão ligados demodo indivisível e no seu ensino deve-se pro-ver informação para que estes aspectos possamser adequadamente considerados, investigadose abordados. As intervenções terapêuticasdevem sempre que possível atuar na causa dador, sendo desejáveis as terapias que interfirampouco na fisiologia e no comportamento nor-mal do indivíduo, que sejam pouco complexas,menos dispendiosas e com mínimo potencialde complicações e efeitos adversos;

2) Valores éticos e a importância da qualidadede vida. A valorização da qualidade de vida dapessoa frágil pela dor e sofrimento e que talvezesteja enfrentando o adeus à vida; o respeito

pela dignidade do ser humano, bem como sen-sibilidade no processo de tomada de decisõesterapêuticas, devem permear toda a atividadede ensino, pesquisa e assistência;

3) Presença de equipe multidisciplinar. Aexperiência assistencial representa a possibili-dade de integração dos conceitos que envolvemo estudo da dor e seu manejo. O treinamentodeve incluir o atendimento aos doentes comdor, realizado por todos os profissionais desaúde, de forma integrada. Entre os princípiosque devem alicerçar os programas educacionaisda área da saúde em dor, devem ser acrescen-tados os conceitos da filosofia de cuidadospaliativos que visam cuidar da dor e sofrimen-to dos pacientes fora de possibilidades terapêu-ticas.

As escolas médicas, em geral, têm a graduaçãobaseada no famoso relatório Flexner, datadode 1912, que fundamenta o ensino daMedicina com uma visão biocêntrica/tecno-cêntrica. O corpo humano é estudado por par-tes e a doença é vista como sendo o mau fun-cionamento dos mecanismos biológicos, estu-dados sob o ponto de vista da biologia molecu-lar e celular. O objetivo da ação médica é inter-vir física ou quimicamente para normalizar ofuncionamento da unidade esfacelada. A fina-lidade da escola médica era formar estudiososem doenças, especialmente especialistas queatuassem em hospitais, e não capacitar os pro-fissionais para cuidar de doentes. Tal modeloresulta numa visão reducionista da pessoacomo um todo. A preocupação atual da relaçãoentre as condições psicossocioculturais na

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expressão e na solução de questões de saúdeimplicou a inclusão de um conceito sociocên-trico na educação básica. Esta deve desenvol-ver-se na organização de currículos com fun-damentação antropocêntrica, ou seja, compe-tentes para formar profissionais capazes decontribuir para o bem-estar físico, psíquico esocial dos doentes (7,8). Passamos a seguir aconsiderar a questão que fundamentalmentetem um componente ético, mas que a ideolo-gia a torna mero problema técnico.

3. A dor e o sofrimento como problematécnico

Vivemos numa sociedade dominada pela anal-gesia, em que fugir da dor é o caminho racio-nal e normal. À medida que a dor e a mortesão absorvidas pelas instituições de saúde, ascapacidades de enfrentar a dor, de inseri-la noser e de vivê-la são retiradas da pessoa. Ao sertratada por drogas, a dor é vista medicamentecomo um barulho de disfuncionamento noscircuitos fisiológicos, sendo despojada de suadimensão existencial subjetiva. Claro que estamentalidade retira do sofrimento seu significa-do íntimo e pessoal e transforma a dor em pro-blema técnico. Diz-se que hoje temos a cha-mada trindade farmacológica da felicidade, nonível físico-corporal, psíquico e sexual, queestá disponível a conta-gotas nas prateleirasdas farmácias, a um custo razoável. O xenical– para o emagrecimento e busca da felicidadedo corpo escultural; o prozac – para livrar-sedos incômodos da depressão e da busca dobem-estar psíquico, e o viagra, que liberta a

pessoa do fracasso e da vergonha da disfunçãoeréctil (impotência), proporcionando o prazere a felicidade sexual. Atualmente, não maispossuímos os místicos de outrora, que atri-buíam à dor um sentido e ao sofrimento umarazão de ser. Estamos numa sociedade secula-rizada em que o sofrer não tem sentido, e porisso somos incapazes de perceber o sentido dosofrimento. As culturas tradicionais tornam ohomem responsável por seu comportamentosob o impacto da dor, sendo que hoje é a socie-dade industrial que responde diante da pessoaque sofre, para livrá-la deste incômodo.

Em meio medicalizado, a dor perturba e des-norteia a vítima, obrigando-a a entregar-se aotratamento. Ela transforma em virtudes obso-letas a compaixão e a solidariedade, fonte dereconforto. Nenhuma intervenção pessoalpode mais aliviar o sofrimento. Só quando afaculdade de sofrer e de aceitar a dor foi enfra-quecida é que a intervenção analgésica temefeito previsto. Nesse sentido, a gerência dador pressupõe a medicalização do sofrimento.

Segundo Illich, o médico e seu cliente, por vive-rem numa sociedade que valoriza a anestesia,aprendem a “abafar a interrogação inerente atoda a dor”. Numa sociedade analgésica, parecerazoável se libertar dos incômodos impostospela dor, mesmo que isto custe a perda da inde-pendência. À medida que a analgesia domina, ocomportamento e o consumo fazem declinartoda a capacidade de enfrentar a dor, índice dacapacidade de viver. Ao mesmo tempo, diminuia faculdade de desfrutar prazeres simples e esti-mulantes fracos. Serão necessários estimulan-

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tes cada vez mais poderosos para dar às pessoasa impressão de que estão plenamente vivas.Fala-se aqui de esquizoalgia, significando o sin-toma de supermedicalização, destruição iatrogê-nica do poder de sofrer. Gestão técnica da dor,que enfraquece e expropria (9).

A medicalização penetra fundo em nossasvidas e constitui um dos domínios em que opoder da técnica foi mais bem acolhido emenos contestado. Cada pessoa torna-se umhóspede potencial dos hospitais, um pacientequase certo de determinadas cirurgias, um fre-qüentador assíduo de consultórios e ambulató-rios. Se antes freqüentar um hospital era sinalde pobreza (local de concentração de indigen-tes), hoje os hospitais e clínicas são indicado-res de desenvolvimento econômico e social,lugares que as pessoas têm obrigação quasemoral de freqüentar (10).

Sob tal ótica, a dor foi transformada em pro-blema de economia política. A pessoa torna-seconsumidora de anestesias e se lança à procu-ra de tratamentos que determinam insensibili-dade, inconsciência, abulia e apatia provocadasartificialmente. Toda dor é vista como resulta-do de tecnologia faltosa, de legislação injustaou ausência de medicina analgésica. A hetero-nomia da dor transforma-a em demanda agudade medicamentos, hospitais, serviços de saúdemental e outros cuidados profissionais.

Por este caminho da medicalização da vida bio-lógica e psíquica, os problemas cruciais sãodespojados de suas dimensões sociais, são des-politizados, e apresentam-se como questões

particulares e individuais, que uma visita a umespecialista renomado, um bom calmante, umpasseio ou um regime alimentar na base dos“diets”’ e “lights” podem resolver. Isto é muitoimportante de ser levado em conta principal-mente numa realidade de América Latina, emque temos “dor e sofrimento sociais” provoca-dos por um sistema socioeconômico excluden-te em plena era de globalização econômica (8).Considerando-se este contexto “macro”, volte-mo-nos agora ao contexto “micro”, ou seja, àrealidade clínica, fazendo uma distinção entrea dor e o sofrimento humano causado pelasenfermidades (11).

4. A dor e o sofrimento humano no con-texto clínico

A cura da doença e o alívio do sofrimento,desde o nascedouro da medicina hipocrática,são aceitos como sendo os objetivos daMedicina. A doença destrói a integridade docorpo, e a dor e o sofrimento podem ser fato-res de desintegração da unidade da pessoa.Enquanto hoje a medicina está até que bemaparelhada para combater a dor, no que tangeao lidar com o sofrimento encontra-se aindanum estágio bastante rudimentar (12).

Ganha sempre mais importância e até umacerta popularidade nos meios científicos quelidam com pacientes terminais a distinçãoentre dor e sofrimento. Disso resulta a neces-sidade de, ao tratarmos da problemática, esta-belecermos claramente as definições e distin-ções necessárias.

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Cassel afirma que “o sofrimento ocorre quandoexiste a possibilidade de uma destruição imi-nente da pessoa, continua até que a ameaça dedesintegração passa ou até que a integridade dapessoa é restaurada novamente de outra manei-ra”. Aponta que o“sentido e a transcendência”oferecem duas pistas de como o sofrimentoassociado com a destruição de uma parte dapersonalidade pode ser diminuído. Dar um sig-nificado à condição sofrida freqüentementereduz ou mesmo elimina o sofrimento a elaassociado... A transcendência é provavelmentea forma mais poderosa na qual alguém pode tersua integridade restaurada, após ter sofrido adesintegração da personalidade (13).

Em relação à dor, constata-se que grande partedos profissionais de saúde não sabem o quesignifica “dor” quando falam nela. A dor temduas características importantes: a primeira éque estamos diante de um fenômeno dual: deum lado, a percepção da sensação; de outro, aresposta emocional do paciente a ela. A segun-da característica é que a dor pode ser sentidacomo aguda, e portanto passageira, ou crôni-ca, e conseqüentemente persistente.

A dor aguda tem um momento definido de iní-cio, sinais físicos objetivos e subjetivos e ativi-dade exagerada do sistema nervoso. A dor crô-nica, em contraste, continua além de umperíodo de seis meses, com o sistema nervosose adaptando a ela. Nos pacientes com dor crô-nica, nem sempre existem sinais objetivos,mesmo quando eles apresentam mudançasvisíveis em sua personalidade, estilo de vida ehabilidade funcional. Esse tipo de dor exige

uma abordagem que contemple não somente otratamento de suas causas, mas também desuas conseqüências psicológicas e sociais.

Existem pelo menos mais duas definições dedor que valem a pena lembrar. Em 1979, aAssociação Internacional para o Estudo daDor assim a definiu:

“uma experiência emocional e sensorial desa-gradável, associada com dano potencial ouatual de tecidos, descrita em termos de taisdanos”. Em 1986, reformulou esse conceitopara “uma experiência sensorial e emocionaldesagradável, associada a lesões reais ou poten-ciais, ou descrita em termos de tais lesões” (4).

Dame Cicely Saunders, a fundadora domoderno hospice, tomando esta descriçãocomo base cunhou a expressão “dor total”, queinclui além da dor física a dor mental, social eespiritual. Falhar em considerar esta aprecia-ção mais abrangente de dor é uma das princi-pais causas pelas quais os pacientes não rece-bem alívio adequado dos sintomas dolorosos.

Por vezes, existe um momento na doença crí-tica em que os sentimentos de desesperança eimpotência se tornam mais intoleráveis que aprópria dor. Neste ponto, a diferença entre dore sofrimento torna-se evidente. Nem semprequem está sentindo dor está sofrendo. O sofri-mento é uma questão subjetiva e está maisligado aos valores da pessoa. Por exemplo, duaspessoas podem ter a mesma condição física,mas somente uma delas pode estar sofrendocom isso. A palavra dor deve ser usada para a

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percepção de um estímulo doloroso na perife-ria ou no sistema nervoso central associada auma resposta efetiva. Nem toda dor leva aosofrimento (a dor de um atleta vencedor deuma maratona leva ao prazer), e nem todosofrimento requer a presença de dor física (aangústia de saber que um ente querido temmal de Alzheimer, por exemplo).

Daniel Callahan (14) definiu sofrimento comosendo a experiência de impotência com o pros-pecto de dor não aliviada, situação de doençaque leva a interpretar a vida vazia de sentido.Portanto, o sofrimento é mais global que a dore, fundamentalmente, sinônimo de qualidadede vida diminuída (15) - situações como as dedoenças sérias e prolongadas que causam rup-turas sociais na vida do paciente, juntamentecom a crise familiar, preocupações financeiras,premonições de morte e preocupações que sur-gem da manifestação de novos sintomas e seuspossíveis significados.

A dor pode ser definida como uma perturba-ção, sensação no corpo, como já dito anterior-mente. O sofrimento, por outro lado, é umconceito mais abrangente e complexo. Pode serdefinido, no caso de doença, como um senti-mento de angústia, vulnerabilidade, perda decontrole e ameaça à integridade do eu. Podeexistir dor sem sofrimento e sofrimento semdor. Em cada caso, somente nós podemossenti-lo, bem como aliviá-lo. Certamente,algum nível de dor e sofrimento pode ser tole-rado, e seria na verdade utópico dizer que o alí-vio de toda dor e sofrimento seria um objetivoapropriado para o sistema de saúde. A vulnera-

bilidade provocada pela doença exige uma res-posta, chamada “cuidado” (16).

Um dos principais perigos em negligenciar adistinção entre dor e sofrimento no contextoclínico é a tendência dos tratamentos se con-centrarem somente nos sintomas físicos, comose apenas fossem a única fonte de angústiaspara o paciente. Isto resulta, freqüentemente,na situação de pacientes que estão fisicamentemais confortáveis por causa da terapia da dor,mas cujo sofrimento continua presente.

A distinção entre dor e sofrimento tem umsignificado todo particular e urgente quando setrata de cuidar da dor dos pacientes terminais.Diante da impotência que define o sofrimento,Callahan (17) acredita que “a medicina quesomente procura prolongar a vida, estendendo,mas não aliviando o sofrimento, chegou no fim deseus recursos e objetivos”. Não fazer a distinçãoentre dor e sofrimento nos permite continuaragressivamente a prescrever tratamentos médi-cos fúteis, na crença de que enquanto prote-gem os pacientes da dor física também os pro-tegem de todos os outros aspectos. Em outraspalavras, a distinção nos obriga a perceber quea disponibilidade de tratamento da dor em sinão justifica a continuação de cuidados médi-cos fúteis. A continuação de tais cuidadospode simplesmente impor mais sofrimentospara o paciente terminal.

Ouvimos, com freqüência, confidências depacientes terminais que não têm tanto medo demorrer, mas temem o sofrimento relacionadocom o processo do morrer. Isto ocorre especial-

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mente quando esta experiência é marcada peladependência mutilante, a dor e o sofrimentonão cuidados que tão freqüentemente acompa-nham a doença terminal, ameaçando a integri-dade pessoal e a perspectiva de um futuro.

Um dos primeiros objetivos da medicina aocuidar dos pacientes terminais deveria ser oaliviar a dor e o sofrimento causados peladoença. Embora a dor física seja a fonte maiscomum de sofrimento, a dor no processo domorrer vai além do físico, tendo conotaçõesculturais, subjetivas, sociais, psíquicas e éticas.Portanto, lidar efetivamente com a dor emtodas as suas formas é algo crítico e de sumaimportância para um cuidado digno dos queestão morrendo.

Podemos dizer que a dor é fisiológica, enquan-to o sofrimento é psicológico. O sofrimento émuito mais vasto, mais global, isto é, existen-cial. Ele inclui as dimensões psíquicas, psico-lógicas, sociais e espirituais. A dor é uma expe-riência somatopsíquica. A dor e o sofrimentose reforçam mutuamente: uma dor muitoforte e persistente pode influir em todas asdimensões do sofrimento, e, inversamente, aansiedade, a depressão, a solidão ou o senti-mento do não-sentido da vida podem acentuara dor (18,19). Passemos a algumas considera-ções a respeito das dimensões do sofrimento.

5. As dimensões da dor/sofrimento

A contribuição da medicina psicossomática e aentrada da psicologia no contexto da saúde,

notadamente no âmbito hospitalar (UTIs eemergências), inicialmente, foram de extremaimportância nestes últimos anos para resgataro ser humano para além de sua dimensão físi-co-biológica e situá-lo num contexto maior desentido e significado, nas suas dimensões psí-quica, social e espiritual (20,21).

Dimensão física

É a facilmente observada quando presente.Surge de um ferimento, de uma doença ouda deterioração progressiva do corpo, noidoso e no doente terminal, impedindo ofuncionamento físico e o relacionamentocom os outros. No nível físico, a dor funcio-na como um alarme de que algo está erradono funcionamento do corpo. Contudo, comoa dor física afeta a pessoa na sua globalidadede ser, ela pode facilmente ir além de suafunção como um sinal de alarme. A dor seve-ra pode levar a pessoa, por vezes, a pedir aprópria morte.

Dimensão psíquica

É a dimensão do sofrimento que pode ter múl-tiplos fatores causais num capítulo de altacomplexidade na área da saúde mental. Entreinúmeras situações críticas que podem desen-cadear sofrimento psíquico, lembramos oenfrentamento da própria morte. Brotam sen-timentos caracterizados por mudança dehumor, sentimentos de perda do controle sobreo processo de morrer, perda de esperanças esonhos ou necessidade de redefinir-se peranteo mundo.

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Dimensão social

É a dimensão do sofrimento marcada pelo iso-lamento, criado justamente pela dificuldade decomunicação sentida no processo do morrer. Apresença solidária é fundamental. A perda dopapel social familiar é também muito cruel.Por exemplo, um pai doente torna-se depen-dente dos filhos e aceita ser cuidado por eles.

Dimensão espiritual

Surge da perda de significado, sentido e espe-rança. Apesar da aparente indiferença dasociedade em relação ao “mundo além deste”,a dor espiritual está aí. É quando o doenteconfidencia ao seu conselheiro espiritual: “dóia alma”. Necessitamos de um sentido e deuma razão para viver e para morrer. Em recen-tes pesquisas nos Estados Unidos, ficou evi-denciado que o aconselhamento em questõesespirituais situa-se entre as três necessidadesmais solicitadas pelos que estão morrendo eseus familiares (22, 23, 24, 25, 26).

Essas dimensões do sofrimento inter-relacio-nam-se e nem sempre é fácil distinguir umasdas outras. Se os esforços para lidar com a dorenfocam somente um aspecto e negligenciam osdemais, o paciente não experimentará alívio dador e sofrerá mais. A dor não aliviada, comodissemos, pode causar não somente depressão,mas até levar a pessoa a pedir para morrer.Como diz a Declaração sobre a Eutanásia, daSagrada Congregação da Fé (5 de maio de1980): “A dor física é certamente um elementoinevitável da condição humana; no plano bioló-

gico, é como que advertência de utilidade incon-testável; mas, repercutindo também na vida psi-cológica do homem, muitas vezes torna-se des-proporcionada à sua utilidade biológica, e podeassumir dimensões tais que gerem o desejo deeliminar a própria vida custe o que custar”.

“As súplicas dos doentes muito graves que, porvezes, pedem a morte não devem ser compreen-didas como expressão de uma verdadeira vonta-de de eutanásia; nestes casos são quase semprepedidos angustiados para aliviar a dor, por umcuidado médico melhor, por amor” (27).

Nesta mesma direção, uma força-tarefa (taskforce) do Estado de Nova York sobre a Vida ea Lei elaborou em 1994 um documento inti-tulado Quando a morte é procurada: suicídioassistido e eutanásia no contexto médico e reto-mou e atualizou a questão num Suplemento,em 1997, cuja conclusão vale a pena registraripsis litteris:

“O grande interesse público sobre o suicídiomedicamente assistido representa um sintomade um problema muito maior: nossa falhacoletiva em responder adequadamente ao sofri-mento que os pacientes freqüentemente expe-rimentam no final da vida. Aperfeiçoar os cui-dados paliativos, e responder às necessidadespsíquicas, espirituais e sociais dos pacientesque estão morrendo, deve ser uma prioridadenacional crítica. Se o suicídio assistido seráfinalmente legalizado ou não, esperamos quetodos os que estão envolvidos no debate sobrea legalização unirão as forças para ajudar aatingir este importante objetivo” (28).

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Vale relembrar, novamente, a dra. CicelySaunders, quando afirma: “o sofrimento somen-te é intolerável quando ninguém cuida” (29). Éna filosofia do hospice, viabilização da medicinapaliativa, que vemos a integralidade do ser huma-no no cuidado da dor e do sofrimento (30).

6. O cuidado da dor e do sofrimento

A dor física é geralmente a mais fácil de secontrolar. Embora os textos médicos descre-vam abordagens farmacológicas e não-farma-cológicas para controlar a dor, existe muita dorfísica não aliviada. Peritos estimam que 75%dos pacientes com dor são tratados inadequa-damente, e que de 60% a 90% dos que estãona fase terminal sentem dor de severa a mode-rada, suficiente para prejudicar as funções físi-cas, o humor e a interação social. Quase 25%dos pacientes de câncer morrem com dor seve-ra e não aliviada (31).

Na perspectiva do paciente, a dor pode aumen-tar a partir do medo, isolamento, insônia oudepressão. As respostas dos pacientes para ostratamentos de dor também podem variar. Umdos grandes problemas que os pacientes têm éencontrar uma linguagem adequada para expres-sar sua dor, de modo a que seja adequadamenteidentificada e cuidada. Muitos relutam em falarda dor, porque sentem que os outros os julga-riam como fracos e que só sabem reclamar.Outro problema em cuidar da dor dos doentes éque alguns não cooperam com o programa tera-pêutico, talvez para evitar efeitos colaterais dotratamento que os impediriam de resolver ques-

tões pendentes, ou simplesmente como formade garantir algum controle em face da perda daautodeterminação. Outros, negam a dor paramanter o sentimento de que ainda estão no con-trole, apesar de evidências em contrário.Outros, usam sua dor para proteger-se de ques-tões mais difíceis. Outros, numa perspectiva defé, abraçam a dor, acreditando que tem um valorredentor que podem oferecer a Deus (32, 33).

Os médicos também falham em aliviar a dordos pacientes. Alguns ignoram a natureza dador. Outros não diagnosticam acuradamente asua origem, ou falham em avaliar o pacienteem intervalos regulares para detectar novosprocessos causadores de dor e que exigemnovas terapias. Alguns simplesmente não acre-ditam na descrição da dor do paciente. Outros,ainda, não tentam alternativas para a terapiamedicamentosa, tais como estimulação elétri-ca dos nervos, massagem ou terapias orientais,como a acupuntura, por exemplo (34, 35, 36,37, 38, 39, 40, 41, 42).

Os que utilizam terapias medicamentosas sãopor demais tímidos em prescrever narcóticos,pelas seguintes razões: a) ignorância básica damagnitude de doses necessárias para combatera dor aguda; b) medo exagerado de causar umaparada respiratória; c) ansiedade em relação aoperigo de adicção; d) medo irracional de serprocessado civil ou criminalmente; e) estimati-va exagerada dos efeitos colaterais de algunsanalgésicos, tais como adicção potencial.

Recentes estatísticas estimam que mais de 90%da dor pode ser aliviada, e geralmente por meio

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de drogas. O desafio, para os médicos, é iden-tificar acuradamente a necessidade de cuidar dador e usar as técnicas para seu controle.

Na verdade, há muito a ser feito nesta área docontrole, administração e alívio da dor. Osofrimento sentido na fase terminal da doen-ça é muito mais que físico. Ele afeta nãosomente o conceito de si próprio, mas tam-bém o senso global de sentir-se conectado comos outros e com o mundo. Este sofrimentopsicossocioespiritual pode ser sentido comouma ameaça para o paciente em relação aosentido de vida, perda de controle, enfraqueci-mento da relação com os outros, uma vez queo processo do morrer intensifica o isolamentoe interrompe as formas ordinárias de contatocom os demais. Os pacientes em estado termi-nal freqüentemente têm sentimentos deimpotência, desesperança e isolamento.Assim, um plano adequado para lidar comeste sofrimento psicossocioespiritual deveenfrentar esta realidade.

“Talvez o remédio mais eficaz em termos decura seja a qualidade do relacionamento man-tido entre o paciente e seus cuidadores, e entreo paciente e sua família. A qualidade curadorada relação terapêutica pode facilmente serenfraquecida ou ameaçada quando reaçõesemocionais (negação, raiva, culpa e medo) sen-tidas pelos pacientes, famílias ou cuidadoresnão são adequadamente trabalhadas. É claroque está no coração da relação terapêuticaentre paciente e cuidadores o cuidado dasnecessidades de relação e sentido, bem como deuma comunicação honesta e verdadeira” (43).

Em suma, no contexto clínico, um cuidadoadequado dos que estão morrendo procura res-peitar a integridade do doente como pessoa,visando garantir que o paciente: a) será manti-do livre da dor tanto quanto possível, de formaque o momento final seja marcado pela digni-dade; b) receberá cuidados continuados e nãoserá abandonado ou perderá sua identidadepessoal; c) terá tanto controle quanto possívelem relação a decisões relacionadas com seutratamento, e permissão de recusar as inter-venções terapêuticas que apenas prolongam oprocesso do morrer; d) será ouvido como pes-soa nos seus medos, pensamentos, sentimen-tos, valores e esperanças; e) terá a opção demorrer aonde desejar.

A força-tarefa do Estado de Nova York sobrea Vida e a Lei conclui o documento Quando amorte é procurada: suicídio assistido e eutanásiano contexto médico com as seguintes palavras:“O cuidado efetivo da dor exige um programacompreensível, como é exemplificado na filo-sofia dos cuidados de hospice. Os profissionaisda saúde têm o dever de oferecer efetivo alívioda dor e paliação para os sintomas dos pacien-tes quando necessário, de acordo com um jul-gamento médico apropriado e as abordagensmais avançadas disponíveis. O alívio da dor edos sintomas da doença é uma contribuiçãopoderosa para a qualidade de vida do paciente.Ele pode também apressar a recuperação e pro-ver outros benefícios médicos. Os médicos e asenfermeiras têm uma responsabilidade ética eprofissional para oferecer um cuidado efetivoda dor e dos seus sintomas. Esta responsabili-dade deve ser entendida como central na arte

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da medicina e dos cuidados médicos. O cuida-do dos sintomas dolorosos sentidos pelopaciente não deve se restringir ao final da vida,nem deve ser um sinal de que os esforços cura-tivos foram abandonados. Os cuidados paliati-vos devem ser compreendidos para incluir ocontrole dos sintomas em todos os estágios dadoença”(44).

Vale a pena lembrar um dos principais lemasda medicina: Sedare dolorem opus divinum est,que traduzido para o português significa:“Aliviar a dor é uma obra divina”. Nesta mis-são de “aliviar a dor”, quer como profissionaisou simplesmente como seres humanos, vale apena lembrar o livro da Bíblia, chamado Livrode Jó, considerado um dos clássicos da literatu-ra universal. Seu personagem, Jó, sofre umasérie de perdas, entre outras a saúde, os bensmateriais e a própria família. Em meio a tan-tas perdas, ousa perguntar: “ Por que Deus fazisto comigo?”

Na visão do rabino Harold Kushner, as pala-vras de Jó nem de longe contêm uma indagaçãode ordem teológica, elas são um grito de dor.(...) O que Jó queria de seus amigos – o que eleestava de fato pedindo com a pergunta “Por queDeus faz isto comigo?” – não era teologia, masempatia. Não desejava que lhe explicassemDeus, tampouco estava querendo mostrar-lhesque sua teologia era falha. Ele queria somentedizer-lhes que era realmente um ser bom e queas coisas que estavam acontecendo eram terri-velmente trágicas e injustas. Mas seus amigosempenharam-se tanto em ser advogados deDeus que quase simplesmente esqueceram de

Jó, a não ser para observar, em forma de acusa-ção e julgamento, que ele devia ter feito algu-ma coisa de muito ruim para merecer aqueledestino nas mãos de um Deus justo. Sob oimpacto de tantas perdas causadoras de sofri-mento, Jó tentava desesperadamente mantersua auto-estima, a certeza de que era umhomem bom e digno. A última coisa que dese-java ouvir era que não vinha agindo bem (45).

Extrapolando a explicação cientificamenteperfeita e o arrazoado teológico, a solidarieda-de marcada pela competência técnico-científi-ca e humana é a chave do cuidado e sentido do“mistério” do sofrimento humano.

Considerações finais

Em suma, a questão da dor e do sofrimentohumanos, numa perspectiva ética filosófico-teológica para além da dimensão “mistérica”portadora de difíceis interrogações existenciaisnão raramente sem respostas ao porquê, sem-pre exigem um cuidado que alie competênciatécnico-científica e humanismo. Um dos obje-tivos fundamentais da medicina, desde os tem-pos hipocráticos, é justamente minorar o sofri-mento humano causado pelas doenças. Com ofantástico progresso da medicina high tech,chegou-se à ilusão de pensar que a gestão téc-nica da dor seria a solução, mas, independentede serem um problema de ordem técnica, a dore o sofrimento situam-se na esfera ética edevem ser considerados nas suas várias interfa-ces, de ordem física, psíquica, social e espiri-tual. O desenvolvimento e implementação da

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filosofia dos cuidados paliativos, que se consti-tui num clamor unânime de todas as partesenvolvidas nesta discussão, é uma grande espe-rança para a real efetivação de um cuidadodigno das pessoas que têm dor e sofrimentoatrozes causados por doenças.

A dor e o sofrimento humanos foram vistos nonível fenomenológico enquanto sintomasdolorosos, que exigem uma intervenção urgen-te e por vezes emergente de cuidados médicose de toda a equipe de saúde. Não foi nossoobjetivo trabalhar a teologia ou antropologiado sofrimento humano (46), chave preciosapara alcançar um horizonte de sentido numaperspectiva de ética. Lembramos, ao finalizaresta reflexão, uma preciosa afirmação antropo-lógica da exortação apostólica Salvifici Doloris,ao afirmar que: “O sofrimento humano susci-ta compaixão, inspira também respeito e, aseu modo, intimida. Nele, efetivamente, estácontida a grandeza de um mistério específico”(47).

Reflitamos conclusivamente sobre o sentidodesta afirmação. O sofrimento suscita compai-xão, isto é, empatia traduzida em ação solidá-ria e não somente uma exclamação anestesia-dora de consciência: “que pena”, “que dó”. Aindiferença, simplesmente, é um fator desu-manizante que aumenta ainda mais a dor e osofrimento. O sofrimento suscita respeitotambém. Em quem muito sofre acabamos porcriar uma auréola de sacralidade. Uma criançaque nasce com seríssimos problemas genéticos,por exemplo, os que a cuidam não se intimi-dam em dizer “é um(a) santinho(a)”. O sofri-

mento igualmente nos infunde temor, medo,porque vemos como que num espelho nossafragilidade, vulnerabilidade e mortalidade,dimensões de nossa existência humana quenem sempre gostamos de que sejam lembradas.

É procurando traduzir em gestos concretos ovalor da pessoa humana em termos de autocui-dado que estaremos melhor preparados paracuidar da vida, com humanismo e competênciatécnico-científica. Quem cuida do cuidador?Considerar a pessoa não simplesmente comoum corpo, não reduzindo-a à biologia, pura esimplesmente, é um grande desafio. Uma visãoholística, multi, inter e transdisciplinar, éimperiosa. O ser humano é um todo uno, umnó de relações. Ser gente é possuir corpo, é terum psiquismo e coração, é conviver com osoutros, cultivar uma esperança e crescer naperspectiva da fé em valores humanos.

É zelando, promovendo e cuidando desta uni-dade vulnerável pela dor e sofrimento que esta-remos sendo instrumentos propiciadores devida digna. Quem cuida e se deixa tocar pelosofrimento humano do outro torna-se umradar de alta sensibilidade, se humaniza noprocesso e, para além do conhecimento cientí-fico, tem a preciosa chance e o privilégio decrescer em sabedoria. Esta sabedoria nos colo-ca na rota da valorização e descoberta de que avida não é um bem a ser privatizado, muitomenos um problema a ser resolvido nos circui-tos digitais e eletrônicos da informática, masum bem fundamental, um “mistério” e dom, aser vivido prazerosamente e solidariamentepartilhado com os outros.

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RESUMENHumanización del dolor y sufrimiento humano en el contexto hospitalario

Este artículo busca realzar la importancia y la necesidad de la dimensión humana en elcuidado del dolor y sufrimiento humano en el ámbito de la salud, específicamente en elhospital. Hoy, se habla mucho y se reclama de la deshumanización de las instituciones dela salud. El hospital refleja esa problemática como un espejo, lo que de peor y mejorsucede en nuestra sociedad deshumanizada y deshumanizante. La humanización de estainstitución pasa, obligatoriamente, también por la humanización de este universo mayorcondicionante de la sociedad. En lo referente al cuidado digno del dolor y sufrimientohumano, el sistema de salud brasileño todavía está en una fase rudimentaria. Hay muchopor hacer en términos de operacionalización de políticas públicas relacionadas con eltema, como intervenir en el aparato formador de profesionales para crear una nueva cul-tura. En un contexto de creciente tecnificación del cuidado, es urgente el rescate de unavisión antropológica holística, que cuide del dolor y del sufrimiento humano en sus variasdimensiones, o sea, física, social, psíquica, emocional y espiritual. Más allá de la difícilrespuesta a la cuestión del “por qué” del dolor y sufrimiento, campo de las filosofías yreligiones, el cuidado solidario, que coliga competencia técnico-científica y humana, enmedio del dolor y sufrimiento del otro, es una oportunidad preciosa para dejar tocar nues-tra sensibilidad y humanizarnos en el proceso Unitermos: Bioética – sufrimiento humano, humanización hospitalaria – ética, dolor y sufrimien-to humano – ética

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ABSTRACTA human approach to human pain and suffering in a hospital setting

This paper addresses the importance of a badly needed approach to the human dimen-sion of efforts to alleviate the pain and suffering experienced in the context of healthca-re in general and hospitals in particular. Many complaints and references are made thesedays to the dis-humanization of healthcare institutions. Nowhere else are these problemsmore clearly mirrored than at hospitals, revealing the best and the worst facets of ourinhuman and dis-humanizing societies. Thus, the humanization of hospitals necessarilyrequires the humanization of society at large. With regard to a dignifying approach tohuman pain and suffering, the Brazilian health system is still at a very rudimentary stage.Much needs to be done to stimulate public policies on the issue, as well as to effect chan-ges in the professional education apparatus intent on creating a new culture. In a contextmarked by the increasing technologization of medical care, it is imperative to restore aholistic anthropologic view of human pain and suffering, be it physical, social, psycholo-gical, emotional, or spiritual. In addition to answering the question of “why” peopleexperience pain and suffering, a territory better covered by philosophy and religion, theone-to-one provision of care, mixing technical and scientific knowledge with human vir-tues in view of the pain and suffering of others, presents us with a precious opportunityto develop sympathy and become more human in the process. Uniterms: Bioethics – human suffering, hospital humanization – ethics, human pain and suffering – ethics.

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