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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE EUNÁPOLIS
Processo N° 0000878-59.2016.4.01.3310 - 1ª VARA - EUNÁPOLISNº de registro e-CVD 00314.2018.00013310.1.00482/00128
AÇÃO CIVIL PÚBLICA – DANO AMBIENTAL - RESPONSABILIDADE CIVIL AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL LISTISCONSORTE ATIVO: UNIÃORÉUS: MARE BARRACA DE PRAIA LTDA – ME; EDUARDO MAIA OBERLAENDER; MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO e UNIÃO
SENTENÇA
I- RELATÓRIO
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ajuizou a presente Ação Civil Pública
em desfavor de MARE BARRACA DE PRAIA LTDA – ME, EDUARDO MAIA OBERLAENDER, MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO e UNIÃO, todos devidamente
qualificados nos autos, em virtude de suposta irregularidade na instalação de barraca
na Praia de Pitinga, município de Porto Seguro, constituindo obstáculo à livre
circulação da população e à fruição de bem de uso comum do povo, em área tombada,
non aedificandi e de preservação permanente.
Assevera o MPF que os dois primeiros réus ocuparam privativamente área
de praia/terreno de marinha situada na praia de Pitinga, Distrito de Arraial D’Ajuda,
Município de Porto Seguro, ressaltando que o local ocupado compreende área de
preservação permanente, de domínio público, pertencente ao patrimônio da União,
caracterizada também como Zona de Valor Paisagístico.
O autor relata que a União e o Município de Porto Seguro foram omissos no
que se refere ao exercício do poder de polícia inerente à tutela dos interesses públicos
a eles confiados.
Em razão disso, pugna pela condenação dos requeridos na obrigação de
fazer, consistente na retirada da Barraca de Praia da Maré, em definitivo, bem como
de quaisquer outras intervenções construtivas correlacionadas, e recuperação da
________________________________________________________________________________________________________________________Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL ALEX SCHRAMM DE ROCHA em 16/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006.A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 2717363310282.
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Processo N° 0000878-59.2016.4.01.3310 - 1ª VARA - EUNÁPOLISNº de registro e-CVD 00314.2018.00013310.1.00482/00128
área, mediante elaboração de PRAD a ser aprovado pelos órgãos competentes, a fim
de devolver o status quo ante; bem como pela condenação dos réus na obrigação de
pagar indenização por danos materiais extrapatrimoniais coletivos, em patamar não
inferior a R$50.000,00 (cinquenta mil reais) para cada um dos réus, pela degradação
ao meio ambiente.
Requer, ainda, a condenação da União e do Município de Porto Seguro no
pagamento de indenização pelos danos ambientais decorrentes da omissão do poder
de polícia na ocupação irregular da área.
A inicial veio instruída com o procedimento administrativo n.
1.14.010.000155/2016-51 (fls.17/145).
Decisão de fls. 154 designou inspeção judicial na localidade objeto dos
autos.
O MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO apresentou contestação às fls.162/175,
na qual alegou que a área ocupada pelos réus pertence à União, sendo este o ente
responsável por autorizar a sua ocupação. Assevera, ainda, que a fiscalização
compete a todos os entes federativos, inclusive ao IBAMA e ao IPHAN. Defende a
inexistência de responsabilidade do ente municipal.
Auto de inspeção judicial às fls. 185/190.
Manifestação da UNIÃO às fls. 199/212, através da qual alega,
preliminarmente, ilegitimidade passiva ad causam, ao fundamento de que a
atribuição de fiscalização se dá em razão do critério da preponderância do interesse e
que não há imposição legal que atribua à União a fiscalização ambiental única e
exclusivamente considerando a titularidade/dominialidade do bem afetado. Pugna
pela inversão do polo processual para figurar como litisconsorte ativa, vez que
também tem interesse no uso regular do seu patrimônio territorial. No mérito, alegou
que não pode ser responsabilizada por fatos de terceiros, uma vez que não houve
________________________________________________________________________________________________________________________Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL ALEX SCHRAMM DE ROCHA em 16/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006.A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 2717363310282.
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omissão juridicamente relevante de sua parte, de modo a também inexistir nexo
causal para a responsabilidade.
Os requeridos EDUARDO MAIA OBERLAENDER e MARE BARRACA DE
PRAIA LTDA - ME apresentaram contestação às fls. 223/235, alegando que possuem
alvará de funcionamento expedido pela Prefeitura Municipal de Porto Seguro/BA, bem
como que efetuam o recolhimento dos impostos, taxas e licenças devidos perante os
órgãos competentes. Aduz que, ao contrário de outros empreendimentos existentes no
local, a Barraca da Maré está devidamente regularizada perante a SPU, eis que a área
de marinha que pertence à Fazenda Pitinga, cujo “proprietário” é José Carmo Alves,
possui inscrição de RIP n. 2807010002094 e recolhe a respectiva taxa de ocupação.
Audiência de justificação e conciliação realizada em 14.10.2016, conforme
termo de fls. 186/289, na qual as partes se comprometeram a adotar medidas
imediatas para desobstrução da área de praia.
Relatório Técnico de Vistoria da SPU às fls. 307/314.
Manifestação dos réus EDUARDO MAIA e MARÉ BARRACA DE PRAIA às
fls. 320/321.
Nova inspeção judicial realizada em 12.12.2016, conforme auto de fls.
325/326.
Informação Técnica do IPHAN às fls. 363/365.
Audiência de justificação e conciliação realizada em 26.03.2017, na qual foi
concedido prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para que os réus apresentassem PRAD
(fls. 366/369).
Manifestações dos requeridos EDUARDO MAIA e BARRACA MARÉ às fls.
374/376 , fls. 383/384.
Relatório do SPU às fls. 414/439.
Relatório circunstanciado de diligência externa realizada pelo MPF às fls.
442/446.
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Manifestação de EDUARDO MAIA e BARRACA MARÉ, às fls. 451/454, na
qual suscita ilegitimidade passiva, ao fundamento de que a área de marinha ocupada
pertence a terceiro, José Carmo Alves, quem teria legitimidade para apresentar o
PRAD determinado em audiência.
Manifestação do MPF às fls. 473/474 em que requer o não-acolhimento da
preliminar ventilada e pede pela inclusão de José Carmo Alves no polo passivo da
ação.
Manifestação de José Carmo Alves às fls. 476/477.
II – FUNDAMENTAÇÃO
Inicialmente, verifico que José Carmo Alves, em petição de fls. 476/477,
requereu adiamento de audiência supostamente designada para o dia 13/09/2018, ao
fundamento de que, na qualidade de terceiro interessado, deveria também participar da
assentada. Tendo em vista que não houve audiência designada neste feito para aquela
data, e que as audiências realizadas no dia 13/09/2018 dizem respeito a outros
processos, nada a prover em relação à petição de fls. 476/477. Saliento, outrossim, que restou evidente a frustração das tentativas de
conciliação empreendidas entre as partes. Ao contrário, em audiência realizada no dia
26.03.2017, embora não registrado expressamente no respectivo termo, os réus
manifestaram-se pela concordância com a retirada da edificação irregularmente
construída no local objeto do presente litígio, sendo-lhes concedido prazo de 45
(quarenta e cinco) dias para que apresentassem o respectivo PRAD (fls. 366/369).
Decorrido prazo muito superior ao concedido em assentada, os réus,
contraditoriamente, alegam questões preliminares como suposto óbice ao cumprimento
do compromisso assumido, de maneira a retardar injustificadamente a tramitação do
feito.
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Portanto, ante o manifesto desinteresse da parte em firmar qualquer espécie de acordo com vista à readequação do empreendimento e considerando não haver, no caso, necessidade de produção de prova documental ou pericial, uma vez
que a prova documental e técnica constante dos autos é extensa e suficiente (laudos,
relatórios e pareceres técnicos), não tendo sido impugnada pelas partes, o feito comporta imediato julgamento.
II. 1 DAS PRELIMINARES Da preliminar de ilegitimidade passiva e da desnecessidade de citação
de José Carmo AlvesOs réus Eduardo Maia Oberlaender e Maré Barraca de Praia LTDA suscitam
preliminar de ilegitimidade passiva, ao fundamento de que José Carmo Alves é o titular
da ocupação da área de marinha objeto da demanda perante a SPU, sendo os requeridos
apenas locatários da área.
É assente que a responsabilidade por danos ambientais é solidária entre o
poluidor direto e o indireto, o que permite que a ação civil pública que busque a sua
reparação seja ajuizada contra qualquer um deles, sendo facultativo o litisconsórcio.
Tal conclusão decorre da análise do inciso IV do art. 3º da Lei 6.938/1981, que
considera "poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado,
responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.”
Portanto, a considerar que a responsabilidade pelo dano ambiental é solidária
e objetiva, figura-se legitimada a parte requerida para figurar no polo passivo de
demanda na qual se busca a reparação de dano decorrente da ocupação irregular de
área de praia, independente de quem seja o titular da outorga de ocupação concedida
pela União (SPU). Logo, afasto a preliminar de ilegitimidade passiva aduzida EDUARDO MAIA OBERLAENDER e MARE BARRACA DE PRAIA.
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Outrossim, a considerar que a sentença prolatada não tem o condão de afetar
o direito de ocupação ostentado por José Carmo Alves, eis que gera repercussão apenas
sobre as benfeitorias irregularmente edificadas e mantidas no local. Ademais, o presente
processo encontra-se em avançada tramitação, circunstância que torna, além de desnecessário, inoportuno seu ingresso neste momento processual, ante a evidente possibilidade de retardar o andamento do feito e causar tumulto processual. Portanto, indefiro o pedido de citação de José Carmo Alves requerido pelo MPF.
Da inversão do polo processual da UniãoAnte as peculiaridades da legitimatio ad causam nesse tipo de demanda, e
tendo sido demonstrado o interesse da União quanto ao pedido de desocupação de
áreas de seu domínio, de uso comum do povo, defiro, com fundamento no art. 6º,
§3º, da Lei n. 4.717/1965 c/c arts. 5º, §2º, da Lei n. 7.347/1985 e art. 113, III, do
CPC, o ingresso da União no polo ativo demanda, na qualidade de litisconsorte do MPF, no que tange aos pedidos formulados contra EDUARDO MAIA OBERLAENDER e MARE BARRACA DE PRAIA, devendo permanecer no polo
passivo, concomitantemente, em relação ao pedido de indenização pelo dano
decorrente da omissão do poder de polícia.
Retifique-se o termo de autuação na forma acima especificada.
II.2 DO MÉRITO Do que se extrai da inicial da presente ação civil pública, os dois primeiros réus
teriam ocupado privativamente área de praia/terreno de marinha situada na praia de
Pitinga, Distrito de Arraial D’Ajuda, Município de Porto Seguro, local que compreende
área de preservação permanente, de domínio público, pertencente ao patrimônio da
União, caracterizada também como Zona de Valor Paisagístico. O autor especifica que a
ocupação constitui óbice ao livre acesso da população à praia, bem como à livre fruição
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do bem comum do povo.
Conforme relatório de vistoria do IBAMA , PAR 02519.0000018/2016-72 SEAMB
EUNÁPOLIS/BA/IBAM, o acesso terrestre ao trecho da praia da Pitinga onde localizada
a Barraca Maré é invariavelmente pela Cabana, onde se encontra estacionamento que
serve a toda a praia. O relatório também registra que “dentro da faixa de areia observou-
se a construção de um deck de concreto, recoberto por quiosque de piaçava(…) Foi
observado que o deck de concreto sobre o qual foram erguidas as estruturas da cabana
foram atingidas pelas ondas do mar, observou-se também grande número de sacos de
ráfia dispostos em frente a baraca com a finalidade de conter o avanço da maré e reduzir
os efeitos erosivos causados pelas ondas do mar”. (fls. 24/27).
O quanto exposto no laudo de vistoria do IBAMA que instrui inicial, também foi
constatado em inspeção judicial realizada na localidade em 19.08.2016, conforme se
deduz do auto de inspeção judicial de fls. 185/190, no qual há registro de que “a
localização das Barracas dificulta a circulação de banhistas quando da ocorrência da
maré alta, uma vez que as ondas avançam as construções de alvenaria das barcas”.
Os próprios réus admitem, em contestação, que a barraca foi construída em
área de praia, o que encerra eventual controvérsia sobre tal fato, conforme se extrai de
excerto da peça de defesa abaixo transcrito:
“Verifica-se através do Levantamento planimétrico (doc. 09), de modo
irrefutável que TODAS as barracas, sem exceção, foram construídas na faixa de praia e algumas delas foram erguidas em faixa de marinha pertencente à Fazenda Pitinga ...”.
O relatório técnico de vistoria da SPU de fls. 310/314, registra que “no trecho de
praia, no qual está edificada a MARE BARRACA DE PRAIA está ocorrendo um avanço do
mar, após a supressão da vegetação nativa, dando a entender tratar-se de área de praia,
o que não é verdadeiro, trata-se de área de marinha onde houve supressão de restinga”.
Apesar da aparente incongruência do respectivo relatório técnico, ao afirmar que
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houve o avanço do mar e a supressão da restinga daria erroneamente a entender tratar-
se de área de praia, constata-se, com base na própria informação nela registrada em
cotejo com as demais provas já mencionadas, que o empreendimento encontra-se
efetivamente construído em área de praia não edificável, bem de uso comum do povo.
Isso se deduz da própria informação técnica no sentido de que a barraca está em faixa
de areia onde não há vegetação e sujeita a incidência da maré.
Com efeito, a Lei 7.661/1988, no artigo 10, § 3º, define como praia “a área
coberta e descoberta periodicamente pelas águas, acrescida da faixa subseqüente de
material detrítico, tal como areias, cascalhos, seixos e pedregulhos, até o limite onde se
inicie a vegetação natural, ou, em sua ausência, onde comece um outro ecossistema”.
Ora, se o próprio relatório da SPU afirma que houve supressão da restinga que
havia no local, sem indicar em que momento se deu tal supressão, compreende-se que
as estruturas estão, de fato, sobre a praia, onde não há vestígio de ecossistema diverso.
Portanto, inequívoca a localização da Barraca Maré em área de praia.
Nos termos da supracitada Lei, “as praias são bens públicos de uso comum do
povo, sendo assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer
direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de segurança
nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação específica “(artigo 10, caput, Lei
7.661/88) não sendo permitida a urbanização ou qualquer forma de utilização do solo na
Zona Costeira que impeça ou dificulte o acesso então assegurado (artigo 10, § 2º, da Lei
Lei 7.661/88).
Ressalte-se que praia (bem de uso comum do povo) não se confunde com terreno
de marinha (bem dominial da União), de modo que nem todo terreno de marinha estará
localizado na praia, e nem toda praia terá sua extensão limitada à faixa de marinha, eis
que os critérios legais para determinação geográfica de uma e de outra são distintos.
Logo, eventual autorização de ocupação de terreno de marinha outorgado à parte ré não
lhe confere o direito de construir em área de praia, obstruindo o livre acesso e fruição,
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como é o caso dos autos.
Além de o empreendimento ter sido construído em área de praia, verifica-se que
também está localizado em área tombada pela União, considerada como Zona de Valor
Paisagístico, sendo esta também outra causa de pedir constante da inicial.
A Constituição Federal, em seu art. 216, inc. V, definiu, como patrimônio cultural
brasileiro, os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
Nesse sentido, já dispunha o Decreto-lei nº 25/37:
Art. 1º Constitui o patrimônio histórico e artístico nacional o conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país e cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico.[...]§ 2º Equiparam-se aos bens a que se refere o presente artigo e são também sujeitos a tombamento os monumentos naturais, bem como os sítios e paisagens que importe conservar e proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou agenciados pela indústria humana.
Como um dos instrumentos previstos pela Constituição Federal, para a
promoção e proteção do patrimônio cultural brasileiro, se encontra o tombamento, forma
de intervenção do Estado na propriedade, que impõe ao proprietário uma série de
obrigações e restrições, com vistas à conservação do bem em seu valor histórico,
paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico ou científico.
Em última instância, o tombamento assegura que seja observada a função
social da propriedade, adequando o domínio privado às necessidades do interesse
público.
Nesse sentido, observa-se que a inscrição lançada no Livro do Tombo em 1968
descreve, como objetos de tombamento, no Município de Porto Seguro, “o marco do
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Descobrimento; o Paço Municipal; as ruínas do Fortim, Reduto ou Bateria da Costa,
juntamente com as duas velhas peças de artilharia ali existentes e o antigo canhão que az
perto da praia; as ruínas da Igreja da Glória; e as Igrejas pertencentes à Diocese de
Ilhéus; de Nossa Senhora da Pena; da Misericórdia e cemitério anexo; dos Jesuítas; e de
Nossa Senhora da Ajuda”.
Todavia, a extensão dessa especial proteção foi ampliada por força do Decreto
nº 72.107, de 18 de Abril de 1973, que assim dispôs:
Art. 1º. Fica erigido Monumento Nacional o Município de Porto Seguro, Estado da Bahia, cuja área urbana, sítio da antiga Capitania, e lugares históricos adjacentes, em especial o Monte Pascoal, serão inscritos nos Livros do Tombo do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.Art. 2º. Na área do Monumento Nacional de Porto Seguro aplicar-se-á regime especial de proteção, nos termos do tombamento determinado no artigo 1º deste Decreto.
Do teor do dispositivo transcrito, infere-se que o Decreto tombou todo o
Município de Porto Seguro, não mais se limitando ao centro histórico, sendo forçoso
concluir que a referida praia está inserida nessa restrição administrativa.
O tombamento geral se impõe, como forma de proteger o patrimônio histórico
e paisagístico, ainda que isso implique uma limitação do direito de propriedade de bens
individualmente considerados, sem que seja oportunizada aos proprietários a prévia
manifestação. Nesse conflito entre interesse público e interesse privado, o primeiro se
sobreleva, pois o direito de propriedade não é absoluto e deve atender sua função social,
conforme preconizado pela Constituição Federal.
Nesse diapasão, importante frisar que a inexistência de homologação do
Ministério da Cultura no prazo de 05 anos do tombamento, exigida pela Lei n. 6.292/75,
não retira a validade da restrição administrativa, porquanto trata-se de exigência criada
a posteriori (o tombamento geral do município se deu em 1973 e a Lei é de 1975), tendo
em vista a proteção do ato jurídico perfeito outorgada pela Constituição Federal.________________________________________________________________________________________________________________________Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL ALEX SCHRAMM DE ROCHA em 16/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006.A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 2717363310282.
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Ademais, o TRF1 já se manifestou acerca da validade do tombamento geral do
município de Porto Seguro, conforme se observa dos seguintes precedentes:
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. CONJUNTO ARQUITETÔNICO E PAISAGÍSTICO DO MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO/BA. DISTRITO DE TRANCOSO. TOMBAMENTO EM PROTEÇÃO AO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL. CONSTRUÇÃO. AUSÊNCIA DE PRÉVIA AUTORIZAÇÃO JUNTO AO IPHAN. I - Tombado, em defesa do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Conjunto Arquitetônico e Paisagístico do Município de Porto Seguro/BA encontra-se amparado por regime especial de proteção, submetendo-se à legislação de regência qualquer alteração nas suas características originárias, condicionando-se a alteração de qualquer imóvel, público ou particular, que o integra, à apresentação e aprovação de projeto arquitetônico junto ao IPHAN. II - Demonstrado o caráter agressor da obra realizada sem a devida autorização do órgão competente, impõe-se ao requerido a obrigação de restabelecer as características originais do imóvel, nos termos dos art. 17 e 18, do Decreto-Lei nº 25/37. III - Além do caráter punitivo, a multa coercitiva tem por finalidade desestimular o seu destinatário quanto ao eventual descumprimento do julgado. No caso concreto, a fixação do valor da astreinte em R$ 500,00 (quinhentos reais), por dia de atraso no cumprimento da ordem mandamental constante do decisum impugnado, afigura-se compatível com tais objetivos, não se vislumbrando, na espécie, a alegada exorbitância desse valor. IV - Apelação desprovida. (AC 2006.33.10.002175-1, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, TRF1 - QUINTA TURMA, e-DJF1 DATA:19/03/2015 PAGINA:887.)
ADMINISTRATIVO. EMBARGO EXTRAJUDICIAL. DISTRITO DE TRANCOSO/BA. CONJUNTO ARQUITETÔNICO E PAISAGÍSTICO DO MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO/BA. LAGOA DO RIO DA BARRA. IMÓVEL TOMBADO. CONSTRUÇÃO DE CASA RESIDENCIAL. AUTORIZAÇÃO. NECESSIDADE. DECRETO-LEI N. 25/37. 1. Trata-se de imóvel de propriedade do impetrante que se localiza em área sujeita à fiscalização do IPHAN, dado o tombamento do Município de Porto Seguro por meio do Decreto 72.107/73, re-ratificado pela Portaria nº 140/2000, do Ministério da Cultura. 2. Dispõe o art. 18 do Decreto-lei n. 25/37 que, "sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa
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tombada, fazer construção que lhe impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto, impondo-se neste caso a multa de cinquenta por cento do valor do mesmo objeto". 3. Condiciona-se a alteração de bens tombados à prévia autorização, assim como se determinam critérios e condições de intervenção nas áreas do entorno, a fim de, com isso, garantir a harmonia e preservar a ambiência da localidade onde está o imóvel ou conjunto protegido. 4. Correta, portanto, a sentença que indeferiu segurança objetivando que o IPHAN se abstivesse de paralisar as obras de construção de casa residencial do Impetrante. 5. Apelação a que se nega provimento. (AC 2004.33.00.022080-9, JUIZ FEDERAL JAMIL ROSA DE JESUS (CONV.), TRF1 - QUINTA TURMA, e-DJF1 DATA:23/04/2010 PAGINA:205.)
Assim, torna-se forçoso concluir que a área em que se encontra a Barraca Maré,
por ser considerada área de singular importância paisagística histórica e cultural, que
deve ser preservada por estar inserida no perímetro do Município de Porto Seguro, não
pode sofrer qualquer tipo de alteração, mediante construção ou reforma sem autorização
circunstanciada do IPHAN.
Contudo, no caso dos autos, a Informação Técnica do IPHAN n. 03/17-ETPS
PS/SBA (fls. 363/365) dispõe que o empreendimento não tem anuência por parte do
IPHAN para sua implantação na área. A informação técnica especifica acerca do “caráter
negativo da atual implantação dos empreendimentos de natureza comercial na área
analisada que com a construção de volumes edificados sem anuência deste Instituto em
faixa de praia próxima às falésias causam relevante impacto negativo na leitura da
paisagem tombada.”
Cumpre afastar a tese de defesa comumente alegada em litígios desta natureza
consistente na alegação de que alvarás emitidos pela Prefeitura Municipal de Porto
Seguro-BA seriam suficientes para permitir as referidas construções.
Conforme acima delineado, os imóveis situados na área urbana de Porto
Seguro-BA, conforme definido no Decreto n. 72.107/73, submetem-se ao regime especial
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do tombamento estabelecido pelo Decreto-lei n. 25/37, particularmente ao disposto nos
seus arts. 17 e 18, in verbis:
Art. 17. As coisas tombadas não poderão, em caso nenhum ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ser reparadas, pintadas ou restauradas, sob pena de multa de cinquenta por cento do dano causado.Parágrafo único. Tratando-se de bens pertencentes à União, aos Estados ou aos municípios, a autoridade responsável pela infração do presente artigo incorrerá pessoalmente na multa.
Art. 18. Sem prévia autorização do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, fazer construção que lhe impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto, impondo-se neste caso a multa de cinquenta por cento do valor do mesmo objeto.
Condiciona-se, portanto, a alteração de bens tombados à prévia autorização
do IPHAN, sem que eventual manifestação favorável de administração municipal consiga
suplantar essa exigência legal, porquanto o imóvel localiza-se em área sujeita à especial
proteção federal.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TOMBAMENTO. REFORMA QUE ALTERAM CARACTERÍSTICAS ORIGINAIS DE IMÓVEL TOMBADO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DO IPHAN. VIOLAÇÃO AO ART. 17 DO DECRETO LEI 25/1937. DESFAZIMENTO. PRECEDENTE. (...) 2. Inexistência de dúvidas quanto ao tombamento pelo IPHAN do imóvel em questão, vez que está inserido na Poligonal de Entorno de Bens Tombados, Área 1 - Santo Antônio e São José, consoante documento de fls. 32/33, bem como que houve reforma no citado bem que alterou as suas características originais, fato, aliás, reconhecido pelo próprio demandante. 3. As reformas realizadas no imóvel provocaram a descaracterização do bem, alterando tanto a sua volumetria quanto a sua fachada, pois, não
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foram observados os parâmetros urbanísticos para a zona. (...) 5. Comprovação de que o imóvel tombado foi objeto de modificação, sem autorização da autoridade administrativa competente, restando violado o comando previsto no artigo 17 do Decreto-Lei 25/37. (...)(AC 200583000086093, Desembargador Federal Manoel Erhardt, TRF5 - Primeira Turma, DJE - Data::10/05/2012 - Página::116.)
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DANOS AO MEIO AMBIENTE - DEVER DE INDENIZAR E RESTAURAR - ABSTENÇÃO DE CONSTRUÇÃO EM ZONA DE AMORTECIMENTO E AREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - CONSTRUÇÃO DE LOTEAMENTO SEM PRÉVIA LICENÇA AMBIENTAL DO ÓRGÃO COMPETENTE. (...) 3) O fato de a ré ter obtido licenças ou autorizações perante a Prefeitura Municipal de Paraty para lá construir - Alvará de Construção e Laudo de Vistoria - não a exime de obter a licença ambiental pelo órgão competente. (...).6) Apelação desprovida. Sentença mantida. AC 200351110007917. Desembargadora Federal CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA. E-DJF2R - Data::08/05/2012 - Página::341. TRF2.
Diante das provas coligidas ao feito, restou, assim, plenamente configurada a
existência de construção danosa ao patrimônio histórico, artístico e paisagístico
nacional, sem a devida autorização do órgão competente, qual seja, o IPHAN.
Também não consta dos autos prova de que os réus tenham obtido a devida
licença ambiental para construção e funcionamento da Barraca de Praia.
Ora, há que se considerar que a construção erigida em faixa de praia pode
provocar dano ambiental em razão da supressão e descaracterização da vegetação de
restinga típica dessa área, a qual tem papel fundamental na fixação do substrato
arenoso, evitando, assim, a formação de processos erosivos. A supressão da vegetação
para inserção da Barraca obviamente descaracteriza o ecossistema típico da faixa de
praia. No caso dos autos, conforme mencionado alhures, o relatório do SPU registra que
a área onde localizada a barraca da Maré trata-se de “área de marinha onde houve
supressão da restinga” (fls. 310).
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Nesse particular, a despeito de a Lei 12.651/2012 ter revogado o regime de
proteção das restingas que tinha como base a Resolução CONAMA n. 303/2002, em
especial as áreas de restingas localizadas em faixa mínima de 300 metros, medidos a
partir da linha de preamar máxima; entendo que as áreas de restinga,
independentemente de terem a função de estabilizar mangue ou fixar dunas, são áreas
de preservação permanente em face da previsão constante no art. 215, IV, da
Constituição Estadual da Bahia e art. 89, inciso IV e paragrafo único da Lei Estadual n.
10.431/2006 que dispõe sobre a Política de Meio Ambiente e de Proteção à
Biodiversidade do Estado da Bahia.
Assim, tendo por premissa a regra da máxima eficácia dos direitos
fundamentais, sempre deve prevalecer a norma mais protetiva ao meio ambiente, e, na
eventual hipótese de contradições entre normas editadas por dois ou mais entes da
federação, deverá predominar a norma que se apresentar mais benéfica à preservação do
meio ambiente.
Portanto, concluo que as áreas de restinga no Estado da Bahia possuem
regime protetivo próprio e generalizado, que não se vincula às restingas com a função de
estabilizar mangue ou fixar dunas – nos termos do disposto no art. 215, IV, da
Constituição Estadual da Bahia combinado com o art. 89, IV e paragrafo único, da Lei
Estadual nº 10.431/2006 –; de modo que, mesmo após a revogação do regime de
proteção generalizado dado às restingas (qualquer restinga existente na faixa de 300
metros contados da preamar máxima, pela Resolução CONAMA n° 303/2002), as
disposições constantes na Constituição e legislação infraconstitucional do Estado do
Bahia permitem manter incólume a proteção das áreas de restinga aqui existentes,
independentemente da localização e da função que desempenhem.
De todo modo, os réus não demonstram e, sequer, alegam que possuem
licenças ambientais emitidas por órgão ambiental seja municipal, estadual ou federal.
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Portanto, independentemente da discussão acerca da natureza da área na qual se
instalaram, deveria ter sido precedida de autorização do órgão ambiental competente.
Veja-se que, como não há nos autos prova de que, quando da instalação da
barraca, ainda havia restinga, pode-se concluir que ou houve dano ambiental pela sua
supressão, ou ilegalidade pela edificação em área de praia. Em ambas as hipóteses, a
conduta dos réus é irregular, merecendo a demolição das estrutura e recuperação da
área.
Da responsabilidade dos requeridos pelos danos causadosAs questões relativas ao meio ambiente estão disciplinadas no artigo 225 e
seguintes da Constituição Federal de 1988 como direito de todos, e isso confere à
matéria a natureza de bem de uso comum do povo e essencial à qualidade de vida,
impondo ao poder público e à própria coletividade o dever de protegê-lo e preservá-lo.
Além disso, a Constituição impõe condutas preservacionistas a quantos possam direta
ou indiretamente gerar danos ao meio ambiente.
A matéria vem veiculada no art. 225 da Constituição Federal, que assim
estabelece:
“Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações."
A efetividade das normas constitucionais encontra-se aparelhada por normas
infralegais, como a Lei n.º 6.938/81, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente e a
Lei n.º 9.605/98, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de
condutas e atividades lesivas ao meio- ambiente.
Em se tratando da natureza difusa do interesse de preservação ambiental, a
responsabilidade é objetiva, conforme se verifica da redação da Lei nº 6.938/81, ao
dispor em seu art. 14, § 1º:________________________________________________________________________________________________________________________Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL ALEX SCHRAMM DE ROCHA em 16/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006.A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 2717363310282.
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Art. 14 ...
§1o Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o
poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar
ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados
por sua atividade.
Do artigo acima mencionado, extrai-se que a responsabilidade para os
causadores de danos ambientais é a objetiva e integral. A lei também consagra a
responsabilidade solidária entre o causador direto e o indireto da atividade que enseja a
degradação ambiental (art. 3º, IV, da Lei nº 6.938/81), revelando-se pertinente a
condenação daquele que contribuiu diretamente, bem como daquele que deixou de
fiscalizar efetivamente os danos ambientais ocorridos.
É importante destacar que o “princípio da obrigatoriedade da intervenção
estatal”, que impõe a intervenção do Poder Público na tutela ambiental, tem fundamento
não apenas na Constituição Federal (art. 225, caput e § 1º) e na Lei nº 6.938/81, mas
também na Declaração de Estocolmo/72 (item 7).
Decorre do princípio da obrigatoriedade da intervenção estatal, em
consonância com os princípios da precaução e da prevenção, que atuam como pilares do
sistema protetivo do meio ambiente e compõem a essência do Direito Ambiental, o
encargo do Poder Público (natureza compulsória) de adotar todas as medidas necessárias
para evitar a degradação ou potencial lesão ao ambiente. É o que se denomina de Poder
de Polícia Ambiental.
Insta salientar, ainda, que a responsabilidade estatal, in casu, é de natureza
objetiva, prescindindo da discussão acerca da culpa, o que exsurge da conjugação dos
seguintes dispositivos legais: art. 37, § 6º e art. 225, § 3º da CF; art. 3º, IV e art. 14, § 1º
da Lei 6.938/81; e arts. 43 e 927 do Código Civil.
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No caso dos autos, a ocupação da região deveria ter sido precedida de licença
da Secretaria de Patrimônio da União (artigo 1º da Lei nº 9.636/88). De outro lado, não
poderia o Município de Porto Seguro, ignorando as regras sobre licenciamento ambiental,
sem participação das autoridades competentes, conceder autorização para construções
em suas praias.
Com efeito, ao órgão ambiental municipal falta competência para, de maneira
unilateral, exercer uma prerrogativa - universal e absoluta – de licenciamento ambiental
no litoral, uma vez que o Decreto Federal 5.300/2004, que regulamenta a Lei
7.661/1988, adota como "princípios fundamentais da gestão da Zona Costeira" a
"cooperação entre as esferas de governo", bem como a "precaução" (art. 5°, incisos XI e X,
respectivamente). Essa postura precautória, porém, acaba esvaziada, sem dúvida,
quando, após o decurso de décadas, nada mais resta que o fato consumado da
degradação ambiental, justamente por carência de colaboração entre os órgãos
ambientais e pela visão monopolista e territorialista da competência de licenciamento.
Além do mais, evidente que o Município, pelo fato de atuar no âmbito da
autorização para construir, não se despe do seu dever de proteger o meio ambiente,
direito de toda coletividade e dever imposto ao Poder Público, conforme se infere do art.
225 da Constituição Federal.
Configurada está, igualmente, responsabilidade da União pela reparação dos
danos ambientais, uma vez que, estando as construções em áreas de praia e de terreno
de marinha, compete ao ente federal aferir a regularidade na utilização dos imóveis de
sua propriedade (art. 20, IV e VII, da CF), bem como adotar mecanismos de fiscalização,
controle e recuperação de eventuais danos ambientais resultantes dos empreendimentos,
segundo preconizam as Leis ns. 6.938/81 e 9.636/98.
Sendo assim, na forma do art. 11 da Lei n.º 9.636/98, cabe à União Federal
a necessária fiscalização sobre área de sua propriedade, assegurando sua integridade em
face de eventuais danos ambientais.
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“Art. 11 - Caberá à SPU a incumbência de fiscalizar e zelar para que sejam mantidas a destinação e o interesse público, o uso e a integridade física dos imóveis pertencentes ao patrimônio da União, podendo, para tanto, por intermédio de seus técnicos credenciados, embargar serviços e obras, aplicar multas e demais sanções previstas em lei e, ainda, requisitar força policial federal e solicitar o necessário auxílio de força pública estadual.”
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - RECURSO ESPECIAL - MEIO-AMBIENTE - TERRENO DE MARINHA E ÁREA DE PROTEÇÃO PERMANENTE - VEGETAÇÃO DE RESTINGA - OMISSÃO FISCALIZATÓRIA DA UNIÃO - LOCALIZAÇÃO NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA - SÚMULA 7/STJ - PERMISSIVO "C" - SÚMULA 83/STJ. 1. Reconhecida, nas instâncias ordinárias, a omissão da pessoa jurídica de direito público na fiscalização de atos lesivos ao meio-ambiente é de ser admitida sua colocação no pólo passivo de lide civil pública movida pelo Ministério Público Federal. Litisconsórcio passivo entre a União e o Município por leniência no dever de adotar medidas administrativas contra a edificação irregular de prédios em área non aedificandi, caracterizada por ser terreno de marinha e de proteção permanente, com vegetação de restinga, fixadora de dunas. 2. Conclusões soberanas das instâncias ordinárias quanto à omissão da União e de seus órgãos. Impossibilidade de reexame. Matéria de fato. Súmula 7/STJ. 3. Dissídio jurisprudencial superado. Súmula 83/STJ. Recurso especial conhecido em parte e improvido. (RESP 200300670099 RESP - RECURSO ESPECIAL – 529027 Relator(a) HUMBERTO MARTINS Sigla do órgão STJ Órgão julgador SEGUNDA TURMA Fonte DJE DATA:04/05/2009)
ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. I - O MPF ajuizou a presente Ação Civil Pública em face do MUNICÍPIO DE GUARAPARI, da UNIÃO FEDERAL e de REAL EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA, objetivando, em síntese, a
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declaração de nulidade do Alvará de Licença nº 0021/2006, concedido para a construção do edifício mencionado em sua peça inicial; que a União Federal não permita a realização de obra pela 3ª Ré, procedendo à devida fiscalização; que a 3ª Ré proceda à demolição da obra já realizada, bem como repare os danos ambientais causados. II - Inicialmente, cumpre rejeitar arguição de ilegitimidade passiva ad causam da União Federal. E isto porque a área objeto da presente demanda, na qualidade de terreno de marinha, pertence à União, na forma do art. 20, VII, da CRFB/88. Em sendo assim, na forma do art. 11 da Lei n.º 9.636/98, cabe à mesma a necessária fiscalização sobre área de sua propriedade, assegurando sua integridade em face de eventuais danos ambientais. (...) VIII - Apelação da União Federal improvida. (AC 200750010026061 AC - APELAÇÃO CIVEL – 544553 Relator(a) Desembargador Federal REIS FRIEDE Sigla do órgão TRF2 Órgão julgador SÉTIMA TURMA ESPECIALIZADA Fonte E-DJF2R - Data::09/05/2012 - Página::221)
A responsabilidade da União, conforme salientado nos autos, é inconteste.
Por outro lado, para o fim de apuração do nexo de causalidade no dano
ambiental e de eventual solidariedade passiva, equiparam-se quem faz e quem não faz
quando deveria fazer.
Consoante entendimento de PAULO AFONSO LEME MACHADO, o Poder de
Polícia Ambiental é a “atividade da Administração Pública, que limita ou disciplina direito,
interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou a abstenção de fato em razão de
interesse público concernente à saúde da população, à conservação dos ecossistemas, à
disciplina da produção e do mercado, ao exercício das atividades econômicas ou de outras
atividades dependentes de concessão, autorização, permissão ou licença do Poder Público
de cujas atividades possam decorrer poluição ou agressão à natureza”.
No caso sub judice, impõe concluir que o Poder de Polícia Ambiental pertence,
solidariamente, ao Município de Porto Seguro e à União, que não se desincumbiram de
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seu ônus, concorrendo, com sua omissão fiscalizatória, para a degradação ambiental na
área em comento.
A União, portanto, é solidária, objetiva e ilimitadamente responsável, nos termos
da Lei 6.938/1981, por danos ambientais decorrentes da omissão do seu dever de
controlar e fiscalizar, na medida em que contribua, direta ou indiretamente, tanto para a
degradação ambiental em si mesma, como para o seu agravamento, consolidação ou
perpetuação.
Com relação à responsabilização de Eduardo Maia Oberlaender e Maré
Barraca de Praia Ltda a prova dos autos é uníssona no sentido de que estes
contribuíram diretamente para ocupação irregular em faixa de praia e prática do dano
ambiental e paisagístico, conforme constatado nos mencionados laudos do IBAMA,
IPHAN e SPU constantes dos autos, bem como nas inspeções judiciais realizadas.
Ademais, o dever de reparação do dano ambiental é imposto inclusive ao
causador indireto, uma “vez que a responsabilidade civil pelos danos ambientais é
objetiva e integral, sendo solidária entre o causador direto e o indireto quanto à reparação
da degradação ambiental em decorrência do caráter propter rem (AC
00064599420114058200, Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho, TRF5 - Segunda
Turma, DJE - Data::30/11/2015)”.
Nesse sentido, recente precedente:
AMBIENTAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. DESMATAMENTO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. FALTA DE LICENÇA. DANO AMBIENTAL COMPROVADO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. TEORIA DO RISCO INTEGRAL. APLICABILIDADE. CONDENAÇÃO EM MULTA E RECUPERAÇÃO DOS DANOS AMBIENTAIS. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. 1. (...). 4. O dever de recuperar a vegetação nativa incumbe ao proprietário/possuidor (obrigação "propter rem"), ainda que não tenha sido ele o causador direto do dano ambiental. 5. (...). (APELREEX 00056591220104058100, Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto, TRF5 - Terceira Turma, DJE - Data::09/01/2014 - Página::208.)
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Em face dessa narrativa, os réus devem ser considerados responsáveis pelos
danos causados ao bem tombado, em virtude da realização de intervenções não
autorizadas pelos órgãos competentes.
Impacto no turismo regional Convém enfrentar questão trazida pelo Município de Porto Seguro no sentido
de que os empreendimentos das praias do município são de grande importância para a
economia local e imprescindíveis para o desenvolvimento turístico da região. Cuida-se de
argumento falacioso, pois subverte a ordem real dos fatores. O grande apelo turístico da
região são justamente os valores culturais e históricos que seus empreendimentos
acabam por prejudicar.
O maior fator distintivo do Município de Porto Seguro é o de se tratar do berço
de nosso País, o local do descobrimento. Esse sim é o verdadeiro elemento que atrai
turistas dos mais distintos pontos do Brasil e do mundo. São, portanto, os empresários
do setor que se beneficiam dos valores culturais da região, e não o contrário, como
querem fazer crer.
Não devem ser esquecidos os esforços governamentais no sentido de enaltecer
os valores históricos do nosso povo, com investimentos vultosos, a exemplo da
comemoração dos 500 anos do Brasil, no ano de 2000. Cultivar o patrimônio histórico é
um dos meios de reverenciar nossos antepassados, suas lutas, suas conquistas e
sofrimentos.
A preservação de ambientes naturais segundo as condições que nossos
ancestrais viveram ajuda a compreender a história, as reais dificuldades que
enfrentaram. Também é importante lembrar que o conhecimento da história de um povo
constitui elemento indispensável para a formação de sua identidade, com reflexos em
cada indivíduo, contribuindo para o fortalecimento de sua autoestima.
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Essa é a grande importância da preservação do Município de Porto Seguro,
como patrimônio histórico. Ao contrário de tantos outros municípios desse país, não
pode ficar a mercê de interesses econômicos incompatíveis com sua natureza.
Não que seja impossível conciliar a preservação do meio ambiente natural e
histórico-cultural com a geração de riquezas. Absolutamente. Entretanto, para isso, é
preciso criatividade e, sobretudo, opção por alternativas sustentáveis, que explorem
esses valores culturais sem destruir seus monumentos, naturais ou construídos pelo
homem.
No âmbito normativo, vale pontuar, a atividade econômica está subordinada,
dentre outros princípios gerais, à "defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que
traduz conceito amplo e abrangente das noções de ambiente natural, de meio ambiente
cultural, de meio ambiente artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral.
O princípio do desenvolvimento sustentável, além de impregnado de caráter
eminentemente constitucional, encontra suporte legitimador em compromissos
internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa fator de obtenção do justo
equilíbrio entre as exigências da economia e as do ambiente histórico e cultural.
Subordina-se, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente
situação de conflito entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável,
cuja observância não comprometa, nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais
significativos direitos fundamentais: o direito à preservação do meio ambiente, que
traduz bem de uso comum da generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das
presentes e futuras gerações.
Dos danos materiais e morais coletivosO MPF requereu a condenação dos requeridos, MARÉ BARRACA DE PRAIA
LTDA, EDUARDO MAIA ABERLAENDER, UNIÃO e MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO no
pagamento de indenização por danos materiais e morais coletivos causados ao meio
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ambiente e a condenação do MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO e da UNIÃO no
pagamento de indenização pelos danos ambientais causados em decorrência de suas
condutas omissivas.
Ora, o dano ambiental pode ser compreendido como qualquer lesão aos
recursos ambientais que cause degradação e desequilíbrio ecológico. Assim, não apenas
a degradação da natureza deve ser objeto de reparação, mas também a privação do
equilíbrio ecológico, do bem-estar e da qualidade de vida imposta à coletividade e, no
caso específico, o livre acesso e fruição da praia, bem de uso comum do povo.
Como o dano em geral, o dano ambiental tanto pode ser de ordem material,
quanto moral.
É considerado dano ambiental material ou patrimonial, quando existe a
obrigação de uma reparação a um bem ambiental lesado, que pertence a toda a
sociedade, o qual deve ser integralmente recuperado, mediante obrigações de fazer e não
fazer. Somente quando este dano for irreversível, quando o ambiente não puder ser
recuperado e voltar ao estado anterior ao indigitado evento é que será possível a
indenização em dinheiro. Mas, a prioridade da tutela ambiental é retornar o ambiente ao
statu quo ante.
Em relação aos alegados danos materiais e ao pedido indenizatório, verifico
que, no caso em apreço, é possível a restituição ao status quo ante, impondo-se, assim,
além de demolição das obras irregularmente construídas, a adoção de medidas
restauradoras da área degradada, bem assim, a inibição da prática de ações antrópicas
outras, desprovidas de regular autorização dos órgãos competentes.
Tal obrigação, além de imputada aos referidos requeridos deve ser suportada
também ao Poder Público, pela falta do poder de polícia ambiental e pelo comportamento
omissivo ao longo dos anos.
No que pertine ao pedido de condenação pelos danos morais coletivos, é
importante ressaltar que a possibilidade de indenização por dano moral está prevista na
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Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso V. Outrossim, o texto constitucional não
restringe a violação à esfera individual, e mudanças históricas e legislativas têm levado a
doutrina e a jurisprudência a entender que, quando são atingidos valores e interesses
fundamentais de um grupo, não há como negar a essa coletividade a defesa do seu
patrimônio imaterial.
Alguns juristas não admitem o dano moral coletivo, por se prenderem ao
ultrapassado conceito de dano moral, como a dor e o sofrimento infligidos a um
indivíduo por uma conduta ilícita. Todavia, o direito civil contemporâneo tem se afastado
desse critério, para entender o dano moral como aquele decorrente da violação de
direitos da personalidade, enquanto expressão do princípio da dignidade da pessoa
humana, sendo despicienda a demonstração de que a vítima passou por um sofrimento
ou vexame.
Cuida-se, portanto, de um dano in re ipsa, que decorre inexoravelmente da
violação do direito da personalidade. Por este motivo é que muitos civilistas preferem o
emprego da expressão dano extrapatrimonial a dano moral, pois este último remonta a
um conceito subjetivo, ao passo que a primeira é mais precisa, por se referir
simplesmente ao que não pode ser quantificado em pecúnia.
Ora, tais valores insuscetíveis de aferição patrimonial, decorrentes de direitos
fundamentais, também podem ser inerentes a uma coletividade e, em tal condição,
sofrer um dano. Assim, o dano extrapatrimonial coletivo verifica-se quando ocorre uma
lesão injusta e intolerável a um interesse de natureza transindividual, não havendo que
se perquirir sobre eventual abalo coletivo.
Nesse sentido pronunciou-se a Ministra Eliana Calmon, em voto proferido no
REsp 1.057.274: “as relações jurídicas caminham para uma massificação, e a lesão aos
interesses de massa não pode ficar sem reparação, sob pena de criar-se litigiosidade
contida que levará ao fracasso do direito como forma de prevenir e reparar os conflitos
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sociais”. Ainda em suas eminentes palavras: “o dano extrapatrimonial coletivo
prescindiria da prova da dor, sentimento ou abalo psicológico sofridos pelos indivíduos”.
Por tudo quanto exposto, entendo que a conduta dos requeridos acarretou
dano extrapatrimonial de caráter transindividual, tendo em vista a interferência negativa
no perfil visual do bem tutelado e nos valores fundamentais da comunidade local, que se
viu prejudicada na utilização sustentável do meio ambiente local por vários anos, vez que
a área tornou-se equipamento comercial que limitou sobremaneira o livre acesso e a
fruição da área de praia.
Nestes termos, entendo que a indenização pelo dano moral coletivo deve ser
fixada em R$50.000,00 (cinquenta mil reais), valor proporcional à gravidade do dano e
que atende às finalidades de ordem compensatória e punitiva que o dano moral deve
ostentar.
Embora, em princípio, a condenação seja solidária, na presente hipótese,
entendo que apenas os réus particulares, excluindo-se a UNIÃO e o Município de Porto
Seguro, devem arcar com tal indenização, uma vez que eles foram os únicos beneficiados
pelas edificações ao longo dos anos em que permaneceram no local.
Da Antecipação dos Efeitos da TutelaNos termos do art. 300 do novo CPC, a “tutela de urgência será concedida
quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou
o risco ao resultado útil do processo”.
Em que pese a modificação da redação, para a concessão da antecipação dos
efeitos da tutela continua se fazendo necessária a ocorrência simultânea da prova
inequívoca que convença o Juiz da verossimilhança das alegações e o fundado receio de
dano irreparável ou de difícil reparação.
O juízo de verossimilhança foi sobejamente demonstrado no discorrer da
presente sentença.
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Pelo que se pode demonstrar, os réus realizaram construção em área de praia,
obstruindo o livre acesso da população e a fruição do bem de uso comum do povo. A
construção também foi erigida sem autorização do IPHAN e do órgão ambiental
competente.
Saliento que a presente ação foi proposta no ano de 2016 e em audiência
realizada no início do ano seguinte, os réus foram categóricos no sentido de que não
tinham interesse de manter o empreendimento no local, estando dispostos a retira as
construções ali erigidas. Se comprometeram a apresentar PRAD, tendo sido paralisado o
regular andamento do feito, ante a indicação de que providenciariam a retirada
espontânea do equipamento construtivo. Contudo, conforme já asseverado antes, os
requeridos passaram a se comportar de maneira contraditória, obstando a entrega do
PRAD objeto do compromisso firmado em assentada, o que indica a intenção protelatória
com o fim de persistir na ilegalidade.
Conforme exposto, o dano ao ambiente histórico e cultural vem se perpetrando
e acumulando durante anos, engendrado pela atuação ilegal dos demandados, e que, se
não for imediatamente suspenso, resultará em prejuízo irreversível à sociedade, advindo
disso o fundado receio de dano de difícil reparação, conforme se infere da inteligência do
seguinte precedente:
DIREITO ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. TUTELA ANTECIPADA. DEMOLIÇÃO DE BARRACA CONSTRUÍDA EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA PRECAUÇÃO. APLICABILIDADE. 1. (...) 2. É certo que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é bem comum de uso do povo, cabendo ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo, nos termos do art. 225 da CF/88. 3. A precaução é um dos princípios norteadores do Direito Ambiental, segundo o qual se exige uma atuação antecipada do Poder Público diante do risco ou do perigo de dano ao meio ambiente. 4. Logo, não há como se negar prevalência ao interesse público, de preservação do meio ambiente, e ao princípio da precaução, diante da evidência de que o
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empreendimento pretendido pelo Agravante (barraca) está localizado em área de preservação permanente. 5. A obra em questão, destinada a fins comerciais, foi construída sem licenciamento prévio, portanto está submetida às conseqüências previstas na Lei nº. 7.661/88, quais sejam: interdição, embargo ou demolição, independente da existência de dano efetivo ao meio ambiente (...). Não bastasse tudo isso, o local é também ponto de desova de espécies de tartarugas marinhas. 6. Agravo de instrumento improvido. (AG 200705000357786, Desembargador Federal Francisco Barros Dias, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data: 26/11/2009 - Página::386.)
Não desconhece este Juízo que o art. 300 do CPC estabelece que “A tutela de
urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de
irreversibilidade dos efeitos da decisão”. Ocorre que a situação de difícil reversibilidade
foi criada pelos próprios requeridos ao descumprirem sistematicamente o comando
exarado pelo Poder Público.
Desse modo, o único meio de atingir o quanto postulado na inicial é com a
demolição integral do quanto construído nos últimos anos.
Contudo, tendo em vista a nítida intenção dos réus de não promoverem a
desobstrução da área de praia que ocupam e, considerando a responsabilidade solidária
do Município de Porto Seguro aqui reconhecida, imponho a este ente municipal o dever
de promover, no prazo de 30 (trinta) dias corridos (prazo material), a demolição de todas
as construções realizadas em área de praia e sem autorização do IPHAN na objeto dos
autos, sob pena de imposição de multa diária de R$1.000,00 (mil reais).
Nesse mesmo prazo os requeridos Maré Barraca de Praia e deverão apresentar
PRAD (Plano de Recuperação de Áreas Degradadas) para a área ocupada, a ser aprovado
pelo IPHAN e pelo órgão ambiental local, sob pena de multa autônoma de igual valor.
Por outro lado, segundo dispõe o art. 536, caput e § 1°, do CPC:
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a
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obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.
§ 1o Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.
Assim, ante a recalcitrância dos réus em descumprirem o embargo
extrajudicial e legislação regente, afigura-se adequado o imediato impedimento de
atividade na localidade, a fim de que o Município adote, dentro do prazo assinado, as
medias para demolição acima determinadas.
Por isso que o prazo de 30 (trinta) dias, acima assinalado, para demolição, não
é de início da demolição, mas de sua conclusão. Os trabalhos de demolição devem iniciar
no menor espaço de tempo possível, respeitados apenas os preparativos (contratação de
máquinas e pessoas) para derrubada das construções e retirada dos materiais.
A necessidade de paralisação de qualquer atividade na localidade também se
justifica pelo fato de se tratar de atividade desenvolvida em local inapropriado, já que,
como fartamente demonstrado, erigido sem licença do IPHAN.
III – DISPOSITIVOAnte o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, para CONDENAR o
Requeridos, EDUARDO MAIA OBERLAENDER, MARÉ BARRACA DE PRAIA e MUNICÍPIO DE PORTO SEGURO, solidariamente, na obrigação de fazer consistente na demolição de todas as construções sem autorização do IPHAN, da SPU e do órgão ambiental competente na área praia e tombada como patrimônio da União,
bem como na remoção dos entulhos decorrentes da demolição. Condeno, ainda, os Requeridos, EDUARDO MAIA OBERLAENDER e MARÉ
BARRACA DE PRAIA, solidariamente, na obrigação de fazer consistente na
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recuperação de toda a área degradada, as suas expensas, na forma de PRAD a ser
readequado e aprovado pelo IPHAN e do órgão ambiental competente.
Nos termos da fundamentação supra, determino a imediata paralisação das atividades realizadas no empreendimento objeto da ação fixo prazo de 30 dias corridos - contados da intimação da presente – para a conclusão dos trabalhos de demolição das construções não autorizadas, limpeza da área e readequação de Plano de Recuperação de Área Degradada, sob pena de incidência multa diária de R$1.000,00 (mil reais) para o caso de descumprimento da ordem, quantia esta a ser
revertida para o fundo previsto no art. 13 da Lei n. 7.437/85.
A multa ora cominada para o caso de descumprimento das presentes
determinações não afasta eventual responsabilização criminal (arts. 329 e 330 do Código
Penal).
Autorizo o IPHAN, o MPF e a UNIÃO a promoverem a demolição e recuperação
da área por conta própria, se o Município Réu e réus particulares não o fizerem no prazo
supra. Para tanto deverão apresentar projeto e orçamento a ser aprovado pelo Juízo.
Nessa hipótese, ficam os requeridos obrigados a reembolsar os valores gastos pelo autor
na recuperação da área, sem prejuízo do pagamento das multas fixadas acima.
JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, ainda, para CONDENAR
apenas os requeridos EDUARDO MAIA OBERLAENDER e MARÉ BARRACA DE PRAIA LTDA, na obrigação, solidária, de pagar indenização no valor R$50.000,00 (vinte mil reais), pelos danos morais coletivos, quantia esta a ser revertida para o fundo previsto
no art. 13 da Lei nº 7.437/85.
Retifique-se o termo de autuação para incluir a União no polo ativo dos
autos, na qualidade de litisconsorte assistencial do MPF.
Processos sem custas, ante a natureza da ação.
Deixo de condenar os réus em honorários advocatícios, pois, “dentro de critério
de absoluta simetria, se o Ministério Público não paga os honorários, também não deve
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PODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA PRIMEIRA REGIÃO
SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE EUNÁPOLIS
Processo N° 0000878-59.2016.4.01.3310 - 1ª VARA - EUNÁPOLISNº de registro e-CVD 00314.2018.00013310.1.00482/00128
recebê-los.” (Precedente: REsp 1099573/RJ, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma,
julgado em 27/04/2010, DJe 19/05/2010).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Eunápolis/BA, 16 de setembro de 2018.
Juiz Federal ALEX SCHRAMM DE ROCHA
________________________________________________________________________________________________________________________Documento assinado digitalmente pelo(a) JUIZ FEDERAL ALEX SCHRAMM DE ROCHA em 16/09/2018, com base na Lei 11.419 de 19/12/2006.A autenticidade deste poderá ser verificada em http://www.trf1.jus.br/autenticidade, mediante código 2717363310282.
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