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PontesENTRE O COMÉRCIO E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
1 Crisefinanceiraglobalofuscanegociaçõescomerciais
3 Ocontenciosodoalgodão:aexperiênciapeloolhardosetor Hélio Tollini
4 AsperspectivasparaoBrasilnocasodefracassodaRodadaDoha Danilo Honorio da Silva
6 ObaixocustodaRodadaDohaparaaUniãoEuropéia Liza Sant’Ana Lima
7 Mini-ministerialdeGenebra:umaperspectivaindiana Surupa Gupta
8 Propriedadeintelectualeacessoatecnologiasambientais Vanesa Lowenstein
10 AOMSesuaEstratégiaGlobalparaasaúdepública Ellen ‘t Hoen
12 OBNDEScomoatordaintegraçãonaregiãosul-americana
14 Biocombustíveis:perspectivasdereformasnascondiçõesdetrabalho
16 Oscontenciososcomerciaiseaagendabrasileira Jorge Fontoura
18 Odesafiodacompetitividadeparaasexportaçõesbrasileiras
Outubro2008Vol.4No.5
ISSN:1813-4378
Crise financeira global ofusca negociações comerciaisApesardosavançosnasnegociaçõescomerciaisdaRodadaDoha,nesteano,ocomérciointernacionaltemficadonosúltimosdoismesesemsegundoplanofaceaoclimaeconômicoglobal,cadavezpior.OsgovernosaindadesejamfinalizaraRodada,mas,ultimamente,ofocotemsidodirecionadoparaofortalecimentodossistemasbancáriosefinanceiromundiais,demodoaevitarumaprofundaeduradourarecessão.
Centenasdebilhõesdedólaresjáforaminvesti-dos,nessesúltimosmeses,parasalvarbancosegarantirdepósitos.AlgunsBancosCentraistambémcortaramsuastaxasdejuroscomaesperançadeestimularocomércio;masaverdadeéqueocréditocontinuaescassoeomercadodeaçõesaindaestáextremamentevolátil.
LogoapósocolapsodosetorbancáriodaIslândia,oFundoMonetárioInternacional(FMI)preparou,pelaprimeiraveznahistória,umpacotederes-gateparaumpaísmembrodaOrganizaçãoparaaCooperaçãoeoDesenvolvimentoEconômico(OCDE).AHungria já recebeu empréstimosdoFMIeBielorússia,PaquistãoeUcrâniasãoexemplosdeoutrospaísesqueestãonafilaparareceberajuda.
OsresultadosdaRodadaDoha,entretanto,ficarãomaisprejudicadospeloscrescentestemoresdeumarecessãomundialdoquepelasturbulênciasenfrentadaspelosistemafinanceiro.
Grandes economias temem recessão Entrejulhoesetembro,aeconomiadosEstadosUnidosdaAmérica(EUA)retraiu0,3%,amaiorquedadeseuProdutoInternoBruto(PIB)desde2001.Pelaprimeiravezem16anos,oPIBdoReinoUnidodiminuiu0,5%duranteomesmoperíodo.Apósumadécadaemeiadecrescimento,aeconomiadaEspanharetraiu-se.FrançaeJapãotambémenfrentamumarecessão.
OsprincipaisprodutoresdeautomóveisnosEUAenaEuropaoperamemdéficit,osetorimobiliáriopermanecefraco,evarejistasencontram-seàbeiradafalência.Osgastosdosconsumidorescaemdrasticamentenasmaioreseconomiasmundiaiseoníveldeapreensãoemrelaçãoaodesempregosobe.NosEUA,760.000empregadosforamdes-pedidosduranteosprimeirosnovemesesdoanoe,noReinoUnido,estenúmerofoide164.000entrejunhoeagosto.
ParareceberoPONTESviae-mail,[email protected],informandoseunomee profissão.PONTESestádisponívelon-lineem:www.ictsd.org/news/pontes/ewww.direitogv.com.br
Você sabia?QueosperíodosderecessãonosEstadosUnidosdaAmérica(EUA)coincidemcomperíodosdesignificativasreduçõesdecrescimentonaAméricaLatina…
RecessõesnosEUAecrescimentorealdoPIB(%)
1970 75 80 85 90 95 2000 05-4
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América LatinaEUA
Fonte:Banco Mundial, Indicadores de Desenvolvimento Mundial e cálculos do Fundo Monetário Internacional (FMI)
PontesOutubro2008Vol.4No.5
2 www.ictsd.org/news/pontes/ewww.direitogv.com.br
Afenomenaltaxadecrescimentochinesacaiupelaprimeiravezemdoisanosemeio,eaÍndiatambémenfrentadesaceleração(apesardisso,ambaseconomiascontinuamcres-cendoa9e7,5%aoano,respectivamente).Paraessesgigantes,umaconseqüênciadiretadacontraçãodomercadoéaretraçãodesuasexportações.Oscentrosdetelemarketingindianos,porexemplo,devemcortarumquartodesuaforçadetrabalhoe,naChina,inúmerosexportadoresdebrinquedosjáfaliram.
Lamy pede conclusão da Rodada OsMembrosdaOMCtendem,apartirdeagora,aconsiderarsuasopçõesdeliberalizaçãocomercialcombaseemmedidasdecombateàcrise,afinalospaísesprecisammanterseusempregosesuasreceitas.Seráque,emtemposdeincerteza,ospaísesaindapossuirãocoragempolíticanecessáriaparacortarsubsídiosdeseusagricultoresepescadores,reduzirtarifasprotecionistaseabrirseussetoresdeserviçosàcompetiçãoglobal?
ODiretorGeraldaOMC,PascalLamy,acreditaquesim.EmrecenteconferêncianaUniversidadedeBerkeley,Califórnia,Lamyassegurouque,emtemposruins,ocomércioimpactapositivamentenaestabilizaçãodaeconomiaglobal.
Iniciativas de financiamento comercialApesardopositivismodeLamy,umasériedepaísesemdesenvolvimento(PEDs)jáenfrentadificulda-desparafinanciarsuasexportações.Istosedeve,majoritariamente,àescassezdecréditocomercialparaseguros,garantiaseremessas.Poressarazão,PascalLamyconvocouosmaiores fornecedoresmundiaisdecréditoparaumareuniãonodia12denovembro,parabuscarsoluções.OBrasiltambémjásolicitouaogrupodetrabalhosobrecomércio,dividasefinançasdaOMCqueapresentesoluçõespossíveisaosefeitosdacrisedosbancos(verPontesQuinzenaln.18,13deoutubrode2008).
Emrespostaaestaspreocupações,oBancoMundialaumentou,emoutubropassado,oseuprogramadecomércioefinançasdeUS$1bilhãoparaUS$1,5bilhão.OFMI,porsuavez,criouumprogramadeempréstimosdecurtoprazoparaajudarmercadosemergentesasuperar,temporariamente,osproblemasdeliquidezcausadospelacrisedecréditosefugadeinvestimentos.PaísescomoBrasil,MéxicoeCoréiadoSul,porexemplo,poderãotomaremprestadoatécincovezesovalordesuaquotaanual,semprecisarcumprirasdemandasdeaumentodataxadejurosecortesdosgastospúblicos.
Crise afeta outras áreas OSecretárioGeraldasNaçõesUnidas,BanKi-moon,tambémtemequepaísesdoadoresvenhamacortarseusgastoscomaassistênciaaodesenvolvimento,oqueincluiaconcessãodeUS$16bilhõesprometidosparaocumprimentodosObjetivosdeDesenvolvimentodoMilêniodasNaçõesUnidas.BanKi-moonressaltouqueaconferênciasobreFinanciamentoparaoDesenvolvimento,marcadaparaofinaldomêsdenovembro,emDoha,Qatar,seráumaimportanteoportunidadeparaassegurarqueaatualcrisefinanceiranãoenfraqueçaoscompromissosdeajudainternacional.Aconferênciatambémdevereavaliaropapeldocomércioparaadiminuiçãodapobreza.
Ocombateàsmudançasclimáticasémaisumaáreaquepodeserafetadapelacrisefinan-ceira.Preocupadoscomsuacompetitividade,ospaísesmembrosdaUniãoEuropéia–líderesemreduçãodaemissãodecarbono–nãosabemsedevemounãomanterseusobjetivosdeemissãodegasesdeefeitoestufa.QualquerreduçãounilateraldessesobjetivospoderáterumefeitodesastrososobreaconferênciadoclimaqueocorreemPoznán,Polônia,emdezembropróximo,umavezqueseuobjetivoéanegociaçãodeumacordoquesucedaoProtocolodeQuioto.YvodeBôer,chefedosecretariadodaConvençãodasNaçõesUnidasparaoClima,reconheceessaspossibilidadeseprevêumfuturosombrioparaaproteçãodoclimacasoestasnegociaçõessigamospassosdeinsucessoalardeadosparaaRodadadaDoha.
Tradução e adaptação de artigo originalmente publicado em Bridges Monthly Trade Review Ano 12, n. 5, out-nov. 2008
Espaço aberto
EditorialEstimado(a)leitor(a),
Oartigodeaberturadoquintonúmerodo Pontes Bimestral aborda a relaçãoentreaatualcrisefinanceiramundialeasnegociaçõescomerciaisnaOMC.Oartigoanalisacomoacrisepoderápre-judicar o andamento das negociaçõesdaRodadaDohaedeoutrasquestõesde importânciamundial como asmu-dançasclimáticas.
A conformação dos artigos da seção“OMCemfoco”foipensadacomoob-jetivodeapresentaraoleitorasprinci-paisalternativascomerciaisemdebateapósofracassodasnegociaçõesduranteareuniãomini-ministerial,ocorridaemjulhodesteanoemGenebra.Paratal,convidamos especialistas em comérciointernacionalparaanalisarasperspec-tivascomerciaisdeBrasil,ÍndiaeUniãoEuropéia(UE),cujasposiçõesforamde-terminantesparaosresultadosdamini-ministerial. Na mesma seção, o leitorencontrará um artigo sobre uma pers-pectivadaABRAPAsobreocontenciosodoalgodãoporHélioTolini.
Surupa Gupta e Liza Lima nos trazemelementosdenatureza internaqueex-plicamosposicionamentosadotadosporÍndiaeUEaolongodasnegociações.
Porsuavez,DaniloHonóriotraçaumaanálise dedicada aos interesses de-fendidos pela delegação brasileira nareuniãomini-ministerialedelineiaal-gumas perspectivas nas quais o Brasilpoderábuscarvantagenscomerciais.
EmcomplementaçãoaoartigodeDaniloHonório,aEquipePontesconvidouJorgeFontouraparadebater algumas frentesemqueoBrasilpodebuscarpotenciaispainéis,sobapremissadequeaestra-tégiaquealgunsMembrosdaOMCseráreivindicaremoutrosâmbitosvantagenscomerciaisquenãoobtevenasnegocia-çõesdaRodadaDoha.
Esta edição traz ainda um artigo, deautoriadeVanessaLowenstein,sobrearelaçãoentrebensambientaiseproprie-dadeintelectual;eoutrosobreaimpor-tânciadaestratégiaglobaldaOMSsobrequestõesdesaúdepública.
Nas seções “Análises Regionais” e“Brasil”apresentamosartigos sobreoBNDEScomoinstituiçãodedesenvolvi-mentoregional,umartigoquetratadasquestõestrabalhistasenvolvidasnapro-duçãodeetanol,eoutrosobreacompe-titividadedasexportaçõesbrasileiras.
EsperamosqueoconteúdodestenúmerodapublicaçãoPontes entre o Comércio e o Desenvolvimento Sustentável lhesagrade. Encorajamos nossos leitoresa consultar também nossa publicaçãoquinzenal(PontesQuinzenal).
Atenciosamente,
EquipePontes
Será que, em tempos de
incerteza, os países ainda possuirão coragem política necessária para
cortar subsídios de seus agricultores
e pescadores, reduzir tarifas
protecionistas e abrir seus setores
de serviços à competição global?
Pontes Outubro2008Vol.4No.5
www.ictsd.org/news/pontes/ewww.direitogv.com.br 3
OMC em foco
OcontenciosodoalgodãonaOrganizaçãoMundialdoComércio(OMC)despertouaatençãodemuitospaíses.NoBrasil,ocasorecebeuatençãocrescentedamídiaapósadecisãofavoráveldopaineldaOMC.Emváriosaspectos,ocontenciosofoipioneironahistóriadaOrganizaçãoecrioualgumasfacilidadesparaeventuaisdemandasfuturas.EsteartigodiscuteoseventuaisganhosparaoBrasileparaosetorprodutivocomocon-tenciosodoalgodão,bemcomopontospendentesparaaretaliação.
O contencioso do algodão: a experiência pelo olhar do setorHélioTollini*
OsprodutoresdealgodãodoBrasilcompetemcomoalgodãoestadunidensehádécadas.Oalgodãoestadunidensecontacomsubsídiosdogovernodesde1934.São,portanto,74anosdeestímulosadicionaisedeproteçãoqueoalgodãoestadunidenserecebe.Sabe-sequeédifícilselivrardeumaprática,especial-mentequandoosbeneficiáriospassamasergrandescorporaçõesenvolvidasnoagronegócio.Aliadasaosconseqüentesprejuízosparaosetorbrasileironomercadointernacional,essasforamalgumasdasrazõesparauminíciodeumcontenciosopeloBrasilcontraosEstadosUnidosdaAmérica(EUA),naOMC.
Quandoseiniciaramasconsultasdocasodoalgodão(WT/DS267)naOMC,em2002,poucosacreditavamnavitóriabrasileira.MesmodepoisdadecisãofavorávelaoBrasilpelopainel,confirmadanainstânciadeapelação,simplesmentenãoseacreditavaqueosEUAeliminariamossubsídiosemquestão.Ficaagoraessaquestãoparaomomentodaretaliação,emanálisepeloÓrgãodeSoluçãodeControvérsiasdaOMC(OSC).
Esteartigopretendeapresentaralgunsdetalhesdocontenciosodoalgodão,dopontodevistadosetorenvolvido.Adiscussãoédividida,aseguir,emquatropartesprincipais:(i)pequenohistóricodocontenciosonaOMC;(ii)relevânciadavitóriabra-sileira;(iii)realizaçãodosprognósticosquantoaoprocesso;e(iv)análisedasdificuldadesdaretaliação.
HistóricoUmadasfraquezasdosetoragrícolabrasileiro,emgeral,éafaltadeassociaçõesdevidamentemobilizadasporpartedosprodutores.Comoconseqüência,opoderdebarganhaacabasendobaixofaceàqueledasempresascomasquaisnegociam.Osprodutoresdealgodão,noentanto,sãoumaexceção:organizaram-seemtornodaAssociaçãoBrasileiradosProdutoresdeAlgodão(ABRAPA).E,acontribuiçãodessaassociaçãofoideextremarelevânciaparaosucessodocontenciosodoalgodãonaOMC.
Asconsultasdocasoiniciaram-seem2002e,emmarçode2005,oOSCadotouosrelatóriosdopaineledoÓrgãodeApelação.ForamàépocaapresentadosprazosparaqueosEUAeliminassemossubsídiosàexportaçãoeparaaeliminaçãodesubsídiosdeapoiointerno.
ComadecisãonãofoicumpridapelosEUA,nomaisrecentecapítulodestahistória,oBrasilsolicitouformalmenteàOMCadefiniçãodamodalidadeedovalordaretaliação.FoiindicadoovalordeUS$4bilhões:US$3bilhõespelossubsídiosàexportaçãoeUS$1bilhãopelossubsídiosdeapoiointerno.Essevaloréindicativoecertamenteseráoalvodasdiscussõesqueocorrerãonospróximosmeses,atéqueaOSCseposicionearespeito.
Quantoàmodalidade,oBrasilpediuaretaliaçãonasáreasdepro-priedadeintelectualedeserviços.Casoautorizada,estaseráumaretaliação“cruzada”,umavezquenãoocorreránomesmosetordocontenciosoemquestão(bens).AjustificativadoBrasiléqueovalordocomérciocomosEUAnaáreadoalgodãonãoésuficienteparaaretaliaçãodiretadeUS$4bilhões.
Relevância da vitória brasileiraEvidentemente,osprodutoresdealgodãobrasileirosesperamquearetaliaçãotragaalgumbenefícioparaelescomocompensaçãoaosprejuízossuportadosaolongodosanos.Umaexpectativaotimistaporpartedosetoreradeque,apartirdeumadecisãodoOSCfavorávelaoBrasil,osEUAeliminariam,aomenos,ossubsídiosaseusprodutoresdealgodão.Paraosqueassimimaginavam,tem-seaimpressãohojedequeoBrasilnãofoiefetivamentevitorioso.Constatamos,noentanto,quehouvebenefíciosparaosetorcomaaçãonaOMC.
Emprimeirolugar,ocontenciosodoalgodãomostrouquepaísesemdesenvolvimento(PEDs),aexemplodoBrasil,podemdefendercomsucessosuasvantagenscomparativasnocomérciomundial,oquecontribuiparaampliaroempregoegerarrendaparasuaspopulações.Maisdoqueisso,osetorpodeconstatarqueépossí-velumPEDobter,nasaçõeslevadasperanteoOSC,umadecisãofavorávelmesmocontraumpaísdesenvolvido.AindaquenãosejafácilenfrentarumcontenciosonaOMC,nãosepensamaisqueissoéimpossível.
Emsegundolugar,ocontenciosodeuvazãoaumaexpectativaquenãoocorreunaprática.Esperava-seàépocaque,devidoaproblemasorçamentáriosnosEUA,ossubsídiosagrícolasfossemcortados.Descobriu-se,contudo,queos subsídiosagrícolasrepresentamumafraçãomuitopequenadoorçamentodospaísesindustrializados,apontodeapopulaçãonemsentiropesodacontribuiçãoemseubolso.Ocontenciosofoi,então,aformaencontradaparapressionarosEUAparaqueoscortesesperadosocorressem.Hoje,comarecentecrisefinanceira,tem-senova-menteaexpectativadequeapróximaadministraçãodosEUAcortedespesasequeossubsídiosagrícolassejamreduzidos,masnãosetemcertezadisso.Porisso,maisumavez,oprocedimentoderetaliaçãodaOMCpodeseroinstrumentomaiseficazpararecomporoequilíbrionomercado.
Emterceiro lugar,estima-sequeocontenciosodoalgodãotambémtenhafortalecidoaposiçãonegociadoradoBrasilnaRodadaDohadaOMC.Essaconstataçãopodeserobservadainclusivenasmanifestaçõespúblicasdealgumasautoridadesbrasileiras.Ocontenciososerviunãoapenascomoumexemplo,mascomoumelementodepressão.Nestecontexto,diversospaísesassociaram-secomoBrasilparadefenderaaberturadosmercadosagrícolas.
Aliberalizaçãodosmercadosénecessidadebásicadodesenvol-vimentobrasileiroedeoutrosPEDs.NãosetratadebeneficiarosprodutoresdealgodãodoBrasil:elesserãobeneficiadosnamedidaemquepuderemocuparpartedomercadointernacio-nalhojeatendidaporexportaçõesestadunidensessubsidiadas.Abriromercadodealgodão,entretanto,eraocomeçodeumesforçoparaabriromercadodetodososprodutosagrícolas,deformasemelhanteaoqueocorreucomosmercadosdeprodutosindustriais–cujastarifasdeimportaçãocaíram,emmédia,de40%para4%duranteasnegociaçõesdaRodadaUruguai.
PontesOutubro2008Vol.4No.5
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PrognósticosNãosepodenegarqueoganhobrasileironocontenciosodoalgodãoestáconcentradonoreconhecimentodaqualidadedeseuproduto.AproduçãodealgodãonoBrasilfoireconhecidamundialmentecomodealtatecnologiae issofezatémesmocomqueosgrandescompradoresdealgodãovoltassemsuasvistasparaoBrasil.
Outravantagemestánofatodequeagorasereconhecequeépossívelganharaçõescomoadoalgodãoe,emconseqüência,oBrasil,juntamentecomoutrospaíses,jáconsideranovoconten-ciosoparacobriracompetiçãoinjustaemrelaçãoaumconjuntodeprodutosdaagricultura.Outrossetorespodemseguiresseexemplo,poisoscontenciosospermitemquesebusquemmaisoportunidadesparaaagriculturabrasileira.
Finalmente,ocontenciosodoalgodãoabriunovasfronteirasnacooperaçãoentreosetorprivadoeopúblico.AcompetênciadoMinistériodasRelaçõesExterioreseacooperaçãocomaABRAPAfoiarazãodosucessodoBrasilnessaaçãonaOMC.Aotrabalharememconjunto,setorpúblicoesetorprivadoelevaramacapacidadebrasileira internacional,umafórmulaessencialparaseobtersucessoemaçõescomoadoalgodão.
As dificuldades da retaliaçãoÉreconhecidaadificuldadeparaumpaísencontrarumaformaderetaliaçãoquenãoprejudiqueoseuconsumidorinterno.OBrasilenfrentahojeessadificuldade.Fatoéque,tendochegadoatéaquinasdisputasenasnegociações–semocumprimentoadequadodadecisãopelosEUA–,nãotemsentidodeixaraopor-tunidadepassar.OBrasilteráderetaliare,sepossível,encontrarumaformade,dentrodototalaserretaliado,beneficiarosetorprodutivoalgodoeirodopaís.
Certamente,esseéumassuntoquedeveficarrestritoàsdiscus-sõesinternasdogoverno,comopartedaestratégiadopróprioEstado,oquenãosepodeéperderadimensãocríticadosdiversosinteressesenvolvidos.
Comoobservado,omontantedaretaliaçãosugeridapeloBrasilindicaqueseránecessáriofazerusodaretaliaçãocruzada,atin-gindooutrossetoreseconômicos.OpaineldaOMCdevejulgarnestespróximosdiasovalordaretaliaçãosugeridopeloBrasileamodalidadeemqueelasedará.Ossetoresdepropriedadeintelectualeserviços,sugeridospeloBrasil,sãoosmaissensí-veisaosinteressesestadunidensesepodemprejudicarmenosoconsumidorbrasileiro.
Sabe-sequehásempreapossibilidade,deumpaísmaisforte,comoosEUA,revidararetaliaçãoimpostaporumpaísmenosforte.Nessesentido,antecipa-seapossibilidadedeque,paraevitardanosasetoresexportadoresimportanteseàsuaima-geminternacional,osEUAproponhamalgumanegociaçãodecompensação,comomaiorquotaparaalgumoutroprodutodeexportação.Defende-se,noentanto,queoBrasil siganessecontenciosoatéofim.
DeacordocomasregrasdaOMC,opaineldeárbitrostem60dias–atédezembropróximo,portanto–paradefiniramodalidadeeovalordaretaliação.OhistóricodaOMC,contudo,mostraqueesseprazoraramenteécumprido.Aguardemos.
Detodooexposto,umanotafinaldeveficar:deve-sevalorizarcomooBrasilfoiatéagoravencedor,emfunçãodacompetên-ciadogovernoedosetorparaenfrentartodasasdificuldadesencontradasaolongodesseprocesso.
* Hélio Tollini é Ph.D. em economia e consultor nacional einternacional em política agrícola e política de pesquisa edesenvolvimentodesistemas.ÉconsultordaAssociaçãoBrasileiradosProdutoresdeAlgodão–ABRAPA.
OMC em foco
…mesmoqueospaísesafirmem…
praticarum“regio-nalismoaberto”,taldiscriminaçãocontraterceiroséumdosmaioresincentivosàcelebraçãodeacor-
dosregionais.
As perspectivas para o Brasil no caso de fracasso da Rodada Doha DaniloHonoriodaSilva*
QuandoaRodadaDohaparecenaufragaremmeioadivergênciassobreosmétodosemodalidadesquedeterminariamosníveisdeaberturacomercial,sobretudoparabensagrícolasenãoagrícolas,aestratégiadoBrasildeprivilegiarasnegociaçõesmultilateraisemdetrimentodeacordosregionaisebilateraispassaaserquestionada.OobjetivodesteartigoéanalisarasalternativasdoBrasil foradaesferamultilateral.
Aprimeiraquestãoquesecolocaéporqueemdeterminadassituaçõesospaísespreferemnegociaracordosregionaisemdetrimentodaliberalizaçãomultilateral.Nãoháumaexplica-çãoconsensualparaestaquestão,porémosautoresapontamfatoressociológicos,econômicosepolíticosparaapreferênciapelaviadaintegraçãoregional1.
Avertentesociológicadáênfaseaopapeldascrençasedasidentidadesdosagentesparaexplicaraintegraçãoregional.ÉachamadaescolacognitivistadasRelaçõesInternacionais,quedefendeopoderdas idéias edas comunidades epis-temológicas de influenciarem a decisão dos Estados emperseguiraintegração2.
Osestudoseconômicosacercada integração focam,desdeViner,nos incentivoscomerciaisda integração,queresidemnacriaçãodecomércioentreosMembrosenodesviodecomércio,oqualocorrequandoasimportaçõesdepaísesdeforadoblocosãosubs-tituídaspelocomérciointra-bloco3. Segundoessesestudos,mesmoqueospaísesafirmem,retoricamente,prati-carum“regionalismoaberto”, taldiscrimi-naçãocontraterceiroséumdosmaioresincen-tivosàcelebraçãodeacordosregionais. Issomotivaospaísesatentardisciplinaraformaçãodeacordosregionais,desdeoAcordoGeralsobreTarifaseComércio(GATT,siglaeminglês)de19474.
Nocampodaeconomiapolítica,aintegraçãoéanalisadacomoumjogodepoderebarganha.Assim,quandoumpaíshegemônicoutilizaseupoderpolíticoeeconômicoparaforçaroutrospaísesaabriremseusmercadoseaderiremaregrasmaisrestritivas,sãomaioresaschancesdeintegração.Poroutrolado,paísescommenorpoderbuscariamformarblocoseconômicosparafortalecersuaposiçãodebarganhafrenteapaíseseblocosmaisfortes.
Pontes Outubro2008Vol.4No.5
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OMC em foco
Opontocomumatodasestasteoriasencontra-senoníveldeanálisesituadonoplanoexterno.Contudo,tambémháumavertentedasRelações Internacionaisquecolocaênfasenosfatoresinternosdeumpaíscomofontedeincentivoouresistên-ciaàintegração.Paraessavertente,cujoautormaisexpoenteéRobertPutnam,asnegociaçõesocorrememdoisníveis:nonível internacional,comosdemaispaísesenvolvidos,enonívelinterno,emqueaautoridadenegociadoradevenegociarascondiçõesdoacordocomseusconstituintesinternos,sejamelesoCongresso,osagenteseconômicosesuasassociaçõesdeclasse,ossindicatosousuasprópriasburocraciasinternas.
Apósos sucessivos impassesnaRodadaDoha,houvemuitascríticas sobre a ênfase brasileira nasnegociaçõesmultilaterais,comoseofra-cassodosentendimentosparaaformaçãodaÁreadeLivreComérciodasAméricas(ALCA)ouparaoacordoMercosul-UniãoEuropéiafosseresultadodeumaopçãodoBrasilpelaviamultilateral,ouaindaporumaopçãodoBrasilpelaintegraçãodotipoSul-Sul,emdetrimentodeacordoscompaísesdesenvolvidos.
NotocanteàsnegociaçõesdaALCA,estasnãoavançaramporqueosEstadosUnidosdaAmérica (EUA) insistiramemumaagendaambiciosa,queiamuitoalémdeumacordodepreferênciasequeproduziriaumtextodesequilibrado,aotentarextraircompromissosdotipo“OMC-plus”emáreascomoserviços,comprasgovernamentais,investimentosepropriedade intelectual.Alémdisso,osEUAnegavam-seanegociardisciplinasalémdonívelmultilateral(“OMC-minus”)emáreaschaveparaoBrasil,comobarreirastécnicas,antidumpingesubsídiosagrícolas5.
Alémdisso,osEUAsabiamquebilateralmentepoderiamextrairmaisconcessõesdecadapaísdoquepormeiodeumanegocia-çãoentre34países.Assim,osEUArejeitaramaidéiadosdoisníveisdecompromissospropostopeloBrasilepeloMercosulepartiramparaaviabilateral,tendoassinadoacordoscomChile,Colômbia,Peru,PanamáecomaáreadeLivreComérciodaAméricaCentraleRepúblicaDominicana6.
AestratégiadoBrasilemprivilegiaroMercosultambéméalvodecríticasporaquelesquepreferemveropaíslivredasamarrasdoblocoparanegociaracordosbilaterais.Noentanto,aoinvésdeserabandonado,oMercosuldeveriaseraprofundado,pormeiodaeliminaçãodasimperfeiçõesnatarifaexternacomum,doaperfeiçoamentodolivrecomérciodemercadoriasentreospaísesedaaceleraçãodostrabalhospara,dentrodeumprazorazoável,serpossívelchegaraoestágiodemercadocomum,queéoobjetivofinalestabelecidopeloTratadodeAssunção.
CasooBrasilopteporaprofundarsuarededeacordosbilaterais,devefazê-lodemodoconsistentecomaDecisãoCMCN°32/007,aqualexigequeoMercosulnegociesempreembloco.AmedidamaisóbviaseriatentarretomarasnegociaçõescomosEUAecomaUniãoEuropéia(UE).Noentanto,alémdasdificuldadesinerentesàsprópriasnegociações,tantoascondiçõespolíticas(comaperspectivadevitóriademocratanaseleiçõespresi-denciaisestadunidenses)quantoeconômicas (emvirtudedaprovávelrecessãofinanceiramundial),diminuemaschancesdesucessodestasiniciativas.
AlémdoPartidoDemocrataconstantementedefenderainclusãodecláusulastrabalhistaseambientaisnosacordoscomerciais,aprópriarecessãoqueseavizinhanosEUAtornaoambientepoucopropícioaolivrecomércio,jáqueossetoreseconômicos
…pode-seconcluirqueoBrasilpodeedeveperseguir
acordosbilateraisoubi-regionais
paraaumentaroacessoamercados
paraprodutos brasileiros…
etambémos trabalhadores tendemapedirmaiorproteçãocontraacompetiçãoexterna.NaEuropa,amesmadificuldadeseráverificadacasoarecessãosejatãograveapontodeafetaraagricultura, jáqueademandaporsubsídiosaumentariaedificultariaatémesmoumacordodequotascomoMercosul.
Nãoobstante,oBrasildispõedealternativasparaabrirmer-cados,principalmenteaquelesemergentes,justamenteondeasexportaçõesbrasileirasmaistêmcrescidonosúltimosanos.Umpossívelcaminhoparaconseguir talaberturaemoutrospaísesemdesenvolvimento(PEDs)éa“RodadadeSãoPaulo”doAcordodo SistemaGlobal de PreferênciasComerciais(SGPC),noâmbitodaConferênciadasNaçõesUnidasparao
ComércioeoDesenvolvimento(UNCTAD,siglaeminglês).OSGPCéumacordodepreferênciasentrePEDs,entreosquaisdestacam-seÍndia,CoréiadoSul,MalásiaeIndonésia,alémdemuitospaísesafricanosedomundoárabe.ValelembrarquenoAcordodoSGPCoMercosuljáfoiadmitidocomoMembroe,portanto,podenegociarcomobloco.
Todasestasestratégiaspodemserper-seguidasparalelamenteàRodadaDoha,mas demodo algumdevem ser vistascomosubstitutasaosistemamultilateraldecomércio.MesmoqueaRodadaDohafracasse,aOMCcontinuaráadesempe-nharumimportantepapelnasupervisãodaspráticas comerciaisdospaíses,namanutençãodaestabilidadederegrase
naresoluçãodeconflitoscomerciaisentreosEstados.
AsrecentesvitóriasdoBrasilcontraossubsídioseuropeuseestadunidenses,nospainéisdoaçúcar(UE),doalgodão(EUA)edoProgramadeCréditoedeGarantiasdosEUAsãoexemplosdecomoosistemamultilateralpodefuncionaremfavordeumcomérciomaisjusto,mesmosemoavançodaRodadaDoha.ObviamentequemaisdoqueasvitóriasnoÓrgãodeSoluçãodeControvérsiasdaOMC,aoBrasilinteressaprincipalmenteareformadasregrasatuaisdoAcordosobreAgricultura.Contudo,issosóserápossívelnoâmbitodaOMC,conformejádeixaramclaroosprópriosEUAeasComunidadesEuropéias.
Destaforma,pode-seconcluirqueoBrasilpodeedeveperse-guiracordosbilateraisoubi-regionaisparaaumentaroacessoamercadosparaprodutosbrasileiros,masas verdadeirasprioridadesencontram-senoaprofundamentodoMercosulenapreservaçãoeaperfeiçoamentoda regrase instituiçõesmultilateraisdecomércio.
*MestreemRelaçõesInternacionaispelaUnB,ProfessoremCursosdePósGraduaçãoeAnalistadeComércioExteriordoMinistériodoDesenvolvimento,IndústriaeComércioExterior.
1 MANSFIELD,Edward;MILNER,HelenV.Thepoliticaleconomyofregionalism.ColumbiaUniversityPress:1997.
2 HASENCLEVER, Andreas; MAYER, Peter; RITTBERGER,Volker. Theories ofinternationalregimes.CambridgeUniversityPress:2001.
3 VINER,J.Thecustomsunionissue:Carnegieendowmentforinternationalpeace.NewYork:1950.
4 OGATT1947regulavaaformaçãodeacordosregionaispormeiodeseuart.XXIV,quefoiincorporadoaoGATT1994,mascontinuaineficienteparadarcontadacomplexidadedosacordosregionaismodernos.
5 SILVA,DaniloHonorio.AformaçãodaÁreadeLivreComérciodasAméricaseosimpactosnapolíticaexternabrasileira.TesedeMestrado.UnB:2003.
6 OsAcordoscomColômbiaePanamáaguardamaprovaçãodoCongressodosEUA,aopassoemqueoacordocomPeruestápendentedeimplementação,segundodadosdoUSTR.Osdemaisacordosestãoemvigor.
7 Disponívelem:www.mercosur.int
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6 www.ictsd.org/news/pontes/ewww.direitogv.com.br
O baixo custo da Rodada Doha para a União EuropéiaLizaSant’AnaLima*
Naúltimareuniãomini-ministerialdaRodadaDohadaOrganizaçãoMundialdoComércio(OMC),emjulhode2008,maisumavezaagriculturaconstituiuopontosensíveldasnegociações.Parasurpresageral,nãoforamossubsídiosamericanosnemastarifaseuropéiasacausamortisdasdiscussões,massimodesacordoinsuperávelentreChina,ÍndiaeEstadosUnidosdaAmérica(EUA)sobreummecanismodesalvaguardaespe-cialquedeveriapermitiraospaísesemdesenvolvimento(PEDs)protegerseusmercadosemcasodesurtodeimportações1.AUniãoEuropéia(UE),quedestaveznãofoiresponsabilizadapelofracassodasnegociações,lamentou-oprofundamente,jáqueocustodaRodadaparaobloconuncafoitãobaixo.
ODiretorGeraldaOMC,PascalLamy,prometeunãodesistirapósofracassodaRodada.Issoporqueapossibilidadedeumacordonuncafoitãoreal:aconvergênciadeposiçõesfoiobtidaem18dos20temasrelativosaacessoamercadosdebensagrícolaseindustriais,85%dotrabalhoquedeveriaserfeito.Apartirdisso,asnegociaçõescontinuamemGenebranoseiodoscomitêse,emumfuturopróximo,LamyalmejaconvocarumanovaMinisterial2.
Considerando-sequeaUEtemtodointeressenaconclusãodaRodadaDoha,cumprerecordarosprincipaisaspectosdaposiçãoeuropéiaaolongodasnegociaçõeseanalisardequemaneirataiscustospodemcontribuiraseudesfechoouimpedi-lo.Paratanto,faz-senecessárioesclareceraimportânciadaagriculturaparaoblocoeuropeu,quasesempremalcompreendida.
A “exceção agrícola” européia EnquantonosPEDsosprodutosagrícolasrepresentam,emmédia,40%doProdutoNacionalBruto(PIB),35%dasexportaçõese70%dosempregos3,naUniãoEuropéiaaatividadeagrícolarepresenta2%doPIB,envolve3%dapopulaçãoeconsome,paradoxalmente,quase40%doorçamentocomunitário4.AUEinsiste,noentanto,emprotegerseusetoragrícola.Porquê?
ApreocupaçãodaEuropacomsuaagriculturaremontaàpró-priaconstruçãodaComunidadeEconômicaEuropéia(CEE),quepriorizouanecessidadedeospaíseseuropeusgarantiremsuasegurançaalimentarapósaSegundaGuerraMundial.APolíticaAgrícolaComum(PAC),implantadaapartirde1962,foiaprimeira,eduranteváriosanosaúnica,políticarealmenteintegradadaCEE.Pormeiodesubsídiosàproduçãoedaproteçãodomercadoeuropeuàs importações,aPACatingiuseuobjetivoprincipalnosanos1980e,nessemesmoperíodo,começouaproduzirexcedentesdosprincipaisprodutosagrícolasquasequeperma-nentemente.Entreeles,algunseramexportadosdemaneirasubsidiada,aopassoqueoutroseramestocadosouvendidosnoprópriomercadoeuropeu.
Taismedidas,alémdeonerosas,distorciamosmercadosagrícolasinternacionaisetornaram-sebastanteimpopularesnointeriordoblocoecriticadaspelosprincipaisexportadoresagrícolasmun-diais.Assim,restriçõesàproduçãodecertosprodutospassaramaserimpostasaofinaldosanos1980enoiníciodosanos1990,umamudançadeorientaçãoquecontinuoucomareformadaPACde1999.APACintroduziuumapolíticadedesenvolvimentoruralcomvistasaestimularosagricultoresareestruturaremaexploração,diversificaremaproduçãoemelhoraremacomerciali-zaçãodeseusprodutos.Em2003,umanovareformaestabeleceuqueamaiorpartedossubsídiosaagricultoresseriaoutorgadaindependentementedovolumedaproduçãoecondicionadaàobservânciadecertasnormasambientais,segurançaalimentarebem-estardosanimais.
OMC em foco
AssucessivasreformasdaPACmostramumaclaraorientaçãoemdireçãoàsregrasdemercado,masnãoalteramaposiçãodoblocoeuropeunasnegociaçõescomerciaismultilaterais.ParaaUE,aagriculturanãoéumsetoreconômicoqualquer.Seéver-dadequeestaéumaatividadeeconômicaqueproduzriquezasegeraempregos,devendo,portanto,sujeitar-seàsregrasdemercado,éprecisoteremmentequeaagriculturasofrefortesinfluênciasdascondiçõesclimáticasegeográficas,encontra-seintimamenteassociadaàocupaçãodoterritórioedevesatisfazerconsumidorescadavezmaispreocupadoscomaqualidadedosalimentoseasegurançasanitária,consumidoresquedesejam,sobretudo,queaproduçãoagrícolarespeiteomeioambienteeobem-estardosanimais5.
Tais razõesexplicamarecusadoseuropeusemsubmeteraagriculturaintegralmenteàleidasvantagenscomparativaseosconseqüentesesforçosdaUEparamantera“exceçãoagrícola”nasnegociaçõesdaRodadaDoha.
As preocupações da União Européia Nasnegociaçõescomerciaisagrícolasmultilaterais,aUEtemumatriplapreocupação:
preservarasingularidadedeseumodelodedesenvolvimento1.rural,fulcradonacombinaçãodaproduçãocompreocupaçõessociais,sanitárias,ambientaisedebem-estardosanimais,oquejustificamqueoblocopermaneçaàmargemdasregrasdemercado;
levarosEstadosUnidosafazeremesforçoscomparáveisaos2.doseuropeusnotocanteàreformadapolíticaagrícola;e
privilegiaroacessodosPEDsaomercadoagrícolaeuropeu,3.desdequeestesrespeitemsuasnormasambientaisedesegurançaalimentar6.
Àluzdetaislinhasdiretivas,aomenosemdoisaspectosaUEparecegozardeumaposiçãobastanteconfortávelnaRodadaDoha.Primeiramente,graçasàreformadaPACde2003,ossub-sídiosinternosdaUEpassaramaterefeitosmínimosnadistorçãodocomércio,saindo,assim,doalvodascríticasdosEUAedosprincipaisPEDsexportadoresdeprodutosagrícolas.Emsegundolugar,naVIConferênciaMinisterialdaOMCde2005,oblocoeuropeu,sobfortepressão,aceitou,demaneiracondicionaleapesardaameaçadevetodaFrança,oanode2013comoprazofinalparaaeliminaçãodossubsídiosàsexportações.Aindaqueaeliminaçãodetaissubsídiosjáestivesseestabelecidanoorça-mentocomunitário,ogestoeuropeufoirecebidocomoprovadeflexibilidadepelosdemaisMembrosdaOMC.
AgrandedificuldadedaUEhojeresidenasconcessõesatinentesaograudeaberturadeseumercadoagrícola.AolongodasnegociaçõesdaRodadaDoha,aUE,pressionadaprincipalmentepelaFrança,insistiuempropostasconsideradas“tímidas”paraovorazapetite
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OMC em foco
Demodogeral,admite-sequeasnegociaçõesfracassaramemfunçãodotema“mecanismosespeciaisdesalvaguardaparaPEDs”,cujoescopoépermitirquetaispaísesaumentemtarifasparagerenciaraumentosrepentinosdeimportaçõesereduçõesdepreços.Sobumaperspectivaindiana,édifícilsustentarqueaequipenegociadorateriadesistidodelutarpor,nomínimo,amanutençãodestaflexi-bilidade.Paraentenderoporquê,énecessárioexaminaralógicaquemotivaaposiçãodefensivaadotadapelaÍndiaemrelaçãoàagriculturaeaosrecentesfatorespolítico-econômicos,globaisedomésticosqueinfluenciaramaformaçãodaposiçãodaÍndianasnegociaçõesmultilateraisdaOMCemGenebra.
As limitações político-econômicas indianas e as negociações comerciais agrícolasApesardaÍndiateracompanhadooBrasileoG-20emsuaambiçãodederrubarossubsídiosagrícolasdaUniãoEuropéia(UE)edosEUA,suaposiçãonoquetangeacessoamercadosagrícolasfoiessencialmentedefensiva.TalposturaéconseqüênciadiretadetrêsgrandeslimitaçõescomasquaisaÍndiasedepara:(i)acomposiçãodeseusetoragrícola;(ii)anecessidadedequesuaeconomiaesuaforçadetrabalhosejamsubmetidosatransformaçõesestruturaisassociadasàtransiçãodeumaeconomiaagrícolaparaumaecono-miaindustrial;e(iii)anecessidadedequeogovernoimplementepolíticasdomésticasdereformadosetoragrícola.
Aolongodasúltimasdécadas,conformeaeconomiaindianafoicrescendoediversificando-se,aparticipaçãodosetoragrícolanoprodutointernobruto(PIB)dopaísfoisendocontinuamentereduzidaemrelaçãoaosetorindustrialedeserviços.Talredu-ção,contudo,nãofoiacompanhadadeumdeclínioproporcionaldaporcentagemdapopulaçãoquedependedaagriculturaparasuasubsistência:osetorcontinuaaempregar115,5milhõesdefamílias.Destemodo,quase60%daforçadetrabalhoindianaestáempregadanosetoragrícola,quecontribuicomapenas18,5%doPIBdopaís.Umdosprincipaisdesafiosenfrentadospelogovernoindianoéexatamenteimplementarumatransformaçãoestruturalquepermitaaabsorçãodeumnúmeromaiordetrabalhadoresemoutrossetoresdaeconomia,aomesmotempoemquemantémasegurançaalimentardesuapopulação.
Taltransformaçãojáocorreuemtodosospaísesindustrializados.Aopromovê-la,entretanto,ospaísesocidentaiscontaramcomoauxíliodesetoresagrícolasprotegidosduranteamaiorpartedoSéculoXX.OsgovernosdestesEstadospuderamsuavizartaltrans-formaçãopormeiodeinstrumentospolíticos,comotarifas,quotas
Mini-ministerial de Genebra: uma perspectiva indiana SurupaGupta*
Quandoareuniãomini-ministerialdaOMCfracassou,emjulhodesteano,2008,aimprensaocidentalapon-touaChinaeaÍndiacomoosinequívocosculpados.AimprensaindianasustentouqueosresultadosforamconseqüênciatantodasdivergênciasentreaÍndiaeoutrospaísesemdesenvolvimento(PEDs),quantodesuadivergênciacomosEstadosUnidosdaAmérica(EUA).Independentementedequemsejaconsideradoculpado,oexamedostemaseinteressescomosquequaisaÍndiaestáenvolvidaénecessárioparaqueasestratégiasfuturassejamprevistas.
exportadordeEUA,BrasileArgentina.AUEexigiu,então,queumcertonúmerodeprodutos“sensíveis”fossemexcluídosdasreduçõestarifáriasousofressemreduçõesmenoresqueamédiapropostaparaosdemaisprodutosagrícolas.ApesardaameaçadevetodoPresidentefrancês,NicolasSarkozy,namini-ministerialdeGenebradejulhode2008,oComissárioeuropeudecomércio,PeterMandelson,sinalizouaceitarqueocortetarifáriomédioparaosprodutosagrícolasfossede54%,sobacondiçãodequeareduçãotarifáriamédiareferenteaosbensindustriaisaseroperadapelosPEDstambémfossede54%.
O que restou para a RodadaSeéverdadequeas“concessões”daUEforambemrecebidaspelosprincipaisexportadoresagrícolas,agrandequestão,quecertamenteprovocaráprofundosdesacordosnasnegociaçõesemcurso,ésaberquaisequantosprodutosserãoconsiderados“sensíveis”eficarão,portanto, isentosdareduçãotarifáriamédiaproposta.Nopassado,aUEpropunhaqueestacategoriacobrisseaomenos8%desuas linhastarifárias,enquantoospaísesdoG-20,porexemplo,insistiamparaquetalcoberturaatingisseapenas1%delas.OtextodeLamysugeriuqueospro-dutos“sensíveis”dospaísesdesenvolvidosficassemlimitadosa4%oua6%daslinhastarifárias7.QualquerumadasduascifrasseriaextremamentesatisfatóriaparaaUEnumfuturoacordo,namedidaemquelhepermitiriacontinuaraprotegerseusprodutosmaissensíveis,taiscomocarnebovina,frangoeaçúcar,setoresnosquaispaísescomoBrasileArgentinapossuemimportantepotencialexportador.Ademais,emrazãodoenfraquecimentodoG-20apósasdivergênciasentreBrasil,Argentina,ChinaeÍndianamini-ministerialdeGenebra,aposiçãoeuropéiaquantoàproteçãodeseusprodutosagrícolas“sensíveis”deveráencontrarmenorresistênciadaquelesexportadores.
Considerando-seafortecompetitividadedaindústriaeuropéiaeque77%doPIBedeseusempregosprovêmdosetordeserviços8,oblocovênaRodadaumaoportunidadeimperdívelparaabrirosmercadosindustriaisedeserviçosdosPEDs,aindaprotegidos.Comumacordopróximodaspropostassobreamesanamini-ministerialdeGenebra,aUEsairiaduplamentevencedora:elaexpandiriaseusmercadosindustriaisedeserviçose,maisimportante,manteriaseussubsídiosagrícolasnostermosdareformadaPACde2003aomesmotempoemquecontinuariaaprotegerseussetoressensíveis(talqualoagrícola)dacon-corrênciainternacional.Semdúvida,ocustodaRodadaDohaparaaUEtornou-serelativamentebaixoeobloconãodeverámediresforçosnempressõesparaobterdospaísesemergentesaaberturadosmercadosondeécompetitiva.
* Liza Sant’Ana Lima é doutora em Direito Internacional pelaUniversitéParisII(Panthéon-Assas).
1 SobreofracassodasnegociaçõesdeGenebra,verICTSD,“Mini-ministerialdaOMCterminaemfracasso”,30dejulhode2008.Disponívelem:http://ictsd.net/i/wto/portugueseupdates/15629/.
2 WTO,“LamyreadytocallMinistersbacktoGeneva”,16September2008.Disponível em: http://www.wto.org/english/news_e/sppl_e/sppl100_e.htm.
3 M.MILLET,P.GARCIA-DURAN,«LaPACfaceauxdéfisducycledeDoha»,RevueduMarchécommunetdel’Unioneuropéenne,n°494,janvier2006,p.16.
4 Commission européenne, Les Européens, l’agriculture et la politiqueagricolecommuneen2006,Résumé,mars2007,pp.4et17.
5 P. LAMY, “Le modèle agricole européen au défi des négociationscommercialesinternationales?”,Économierurale,n°279,janvier-février2004,p.66.
6 P.DEFRAIGNE,“EntreCancún2003etHongKong2005,lesperspectivesduDohaRound”,Cahiersdedroiteuropéen,n°1-2,2004,p.10.
7 WTO,RevisedDraftModalitiesforAgriculture,TN/AG/W/4/Rev.3,10July2008,paragraph71,p.14.
8 OMC,Examendespolitiquescommerciales–Communautéseuropéennes,RapportduSecrétariat,WT/TPR/S/177,22janvier2007,p.i.
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8 www.ictsd.org/news/pontes/ewww.direitogv.com.br
esubsídios.Porqueogovernoindianoatariasuasmãoselimitariaoespaçodepolíticaspúblicascomvistasaforçartaltransiçãoemumpaísdemocráticodemaisdeumbilhãodepessoas?
Asituaçãotorna-seaindamaiscomplexapelanaturezaecomposiçãodosetoragrícolaindiano:maisde80%dosagricultoresindianostra-balhamempropriedadescommenosdedoishectares(destas,61%sãomenoresqueumhectare).Quandoogovernofalaem“segurançadesubsistência”,elelevaosinteressesdestesagricultores,prima-riamente,emconsideração.Apenas1,2%dosagricultoresindianostrabalhamempropriedadesmaioresde10hectares.
Importadestacarquedesde1991,a Índiatemadotadoumaorientaçãorelativamenteliberalemsuaspolíticaseconômicas.Oprocessodeliberalizaçãodosanos90,contudo,ignorouquasequecompletamenteosetoragrícola,comalgumasnotáveisexceções.Aindaquesereconheçaque,comaspolíticascorretasecomainfusãodecapitaleinfra-estrutura,parcelasdosetoragrícolaindianopodemtornar-secompetitivasglobalmente,issolevarátempo–eosgovernantesindianosnãodesejamabriraeconomiadopaísaimportaçõesagrícolasemlargaescalaantesquetaisreformassejamimplementadas.
Fatores políticos determinantesAproeminênciapolíticadosetoragrícoladependedonúmerodeeleitoresqueseidentificamcomseusinteresses.Noprocessopolítico, tal identificaçãoocorrepormeiodoMinistériodeAgricultura,quecontacomumministrodegabinetecujopoderrelativoemanadofatodesereleumaparteimportantedeumacoalizãogovernamentalfrágil.Nonívelnacional,asnegociaçõessãoobtidascombasenacoordenaçãointer-burocráticapelaqualoMinistériodoComércioéresponsável,masdiversosoutrosatoresdevemserconsultados,comooMinistériodaAgricultura.
Ademais,adisputapolíticaassociadaàtransformaçãosetorialmencionadagera,pordiversasvezes,umaltograudeconflitoeviolência.Emumcasorecente,umaconhecidafirmaindianafoiobrigadaaabandonarseusplanosdeconstruirumafábricadeautomóveisnoestadodeBengalaOcidentalemfacedaextremaoposiçãodoscamponesescujasterrasestavamsendoocupadaspeloprojeto–aindaquecomcompensações.EmalgumaspartesruraisdaÍndia,gruposMaoístasganharammuitosseguidoresesuasaçõestêmprovocadoconflitosviolentos.
Porfim,nonívelinternacional,doisfatoresdeterminaramaposiçãoindiana.OprimeiroestárelacionadoàextremaresistênciadosEUAàdemandadeChina,ÍndiaeoutrosPEDsporflexibilidadeempolíticaspúblicasesalvaguardasespeciais,vinculadaàextremaatençãoconferidaporestesPEDsaotemadareduçãodossubsídiosporpartedosEUAedaUE.Osegundofator,maisimediato,dizrespeitoàrecentecrisealimentarglobal,quetornouaindamaissensívelotemadassalvaguardasespeciais(durantecrise,PEDspuderamempregarosinstrumentospolíticosdeseuagrado).
Éimportantenotarque,nasúltimaseleiçõesparlamentares,opartidopolíticoemgestão,adespeitodasaltastaxasdecresci-mentoeconômico,sofreuumaderrotaeleitoralsurpreendente–foiconsiderado“anti-agricultura”peloseleitores.Damesmaforma,nãoéprovávelqueaatualgestãosejaconvencidaafazerconcessõesquantoamecanismosdesalvaguarda,oquetambémseriavistocomo“anti-agricultura”.Nosúltimosmeses,contudo,a ÍndiatemmostradoestaresperançosaquantoàconclusãobemsucedidadaRodadaDoha.Assegurarconcessõesparaseusetordeserviçoscontinuasendoumatarefaimportanteparaascâmarasdecomércioeparaogoverno.AÍndiatambémsemostrousatisfeitacomadireçãoeoconteúdodosdocumentosdasnegociaçõesdeDohaemacessoamercadosdebensnão-agrícolas(NAMA,siglaeminglês)eagricultura.Tem-secertonaÍndiaque,paraserbemsucedido,umacordoconclusivodaRodadaDohadeveria,nomínimo,sersensívelàs realidadespolíticasdosetoragrícolaindiano.
* Especialista em Economia Política Internacional e ProfessoraAssistentenaUniversity of MaryWashington
OdebateoraemvoganoComitêdeComércioeMeio-Ambiente(CCMA)daOrganizaçãoMundialdoComércio(OMC)sobreoparágrafo32.iiidoMandatodeDohadeveriaconsideraroimpactodapropriedadeintelectualsobreoacessoeadifusãodastecnologiasambientais,umavezqueousodetaistecnologiasreduziriaamplamenteaemissãodegasesdeefeitoestufa.Oalcancedosistemadepatenteseasdis-tintasmodalidadesdeacessoamercadosqueestãosendonegociadasnomarcodesseComitêpodem,contudo,levaraumcenárioquedificulteaindamaisoacessoeadifusãodetecnologias“limpas”porpartedospaísesemdesenvolvimento(PEDs).Esteartigoapresentaalternativasdemodalidadesquepodemserutilizadasnessanegociação.
Outros temas multi laterais
Propriedade intelectual e acesso a tecnologias ambientaisVanesaLowenstein*
Propriedade intelectual, meio-ambiente e acesso a mercadosAregulaçãodemeioambienteepropriedadeintelectualresultaempadrõesdeproteçãoeacessoamercados.Osdireitosdepropriedadeintelectual(DPIs)–particularmenteaspatentes–criamparaseutitularumdireitoexclusivodeexploraçãosobreo invento(produtoouprocesso)emdeterminadoterritórioeduranteumperíododetempolimitado.Dessaforma,somenteodetentordotítulopodeofertaroprodutonessemercado.Diantedaausênciadeconcorrência,ospreçossão,obrigatoriamente,maiselevados.Ospadrõesambientais,porsuavez,tambémcriamcondiçõesdeacessoamercadosepodemtrazerbenefí-cios(fiscaisetarifários,porexemplo)àquelesqueproduzemoucomercializamessetipodebemouserviço.
Aprincipaldiferençaentreessesdoispadrõesresidenaquantidadedeprodutoresquesebeneficiamdomaioracessoamercados.Nocasodaspatentes,outorga-seexclusividadeaotitularquantoaoacessooufabricaçãodedeterminadoprodutoouserviço.Nocasodosbensambientais,poroutrolado,éoferecidapreferênciadeacessooufabricaçãodeserviçosàquelequeatendeascondiçõesnessamatéria.Énaacumulaçãodessespadrões–ambientaledepropriedadeintelectual–quesemaximizamosbenefíciosdeacessoparacertosatoresequesedificultaouimpedeoacessoaoutros.
Modalidades de redução tarifária e não-tarifáriaAtéomomento,odebatenoâmbitodoCCMAtevetrêsprincipaisenfoques:(i)adefiniçãode“benseserviçosecológicos”ou“benseserviçosambientais”;(ii)aelaboraçãodelistasnacionaisoumultilateraisdebenseserviçossuscetíveisdeincorporaçãoatalcategoria;e(iii)acriaçãodeumprojetointegradorconstituídoporprojetosnacionaisouambientais.Paraalémdoenfoquepredominante,oresultadodanegociaçãoserá limitadopelasmodalidadesdefinidascomocritérioparaareduçãoouelimina-
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çãodebarreirastarifáriasenão-tarifáriasaosbenseserviçosambientais.Ograudeacessoaomercadoserácondicionadopelasseguintesmodalidades:
Modalidades para barreiras tarifárias:(i)listavivaversuslistamorta,ouseja,umalistadinâmicaquepermitaa incorporaçãoeeliminaçãodebenseserviços(viva),eoutrafixa(morta);(ii)númeromáximodeprodutos;(iii)limitedeterminadoemvalor;(iv)eliminaçãodetarifasdiferenciadassegundoograudedesenvolvimento;e(v)eliminaçãogradualdetarifas,situaçãonaqualprazospoderiamserconcedidosparaeliminaçãogradual(produtoaprodutoepaísapaís).
Modalidades para barreiras não-tarifárias.Diversasoutrasbarreirasnão-tarifáriastambémpoderiamserobjetodenegociação,masnãoserãoanalisadasnopresenteartigo.Entreestas,encontram-seossubsídios,asbarreirastécnicaseoestabelecimentodediversospadrõesdesegurança,sanitários,trabalhistaseatéambientais,aplicadospelospaísescomocondiçãoparaacessoaseusmercados.
Propriedade IntelectualNoatualcontextocompetitivo,écomumqueatecnologiamaisavançadaparaajusteadeterminadanormatécnicasejapaten-teada.Seessatecnologiaéincorporadaemumanormasemoconsentimentodotitulardapatente,cabesomenteaesteocumprimentodamesma.
Apartirdessecenário,surgemalgunsquestionamentos.Atec-nologiaprotegidapelosDPIsdeveserincorporadaaumanormatécnicaouàlistadebens?AsempresasquedesejamadotarumanormadevemobterumalicençadotitulardosDPIs?Nessecaso,dequeformadevemfazê-lo?Asempresasenvolvidasnoprocessodeestabelecimentodenormastêmaobrigaçãodedivulgarinformaçõessobresuaspatentes(oupedidosdepatente)aosdemaismembrosdoComitêencarregadodoestabelecimentodasnormas?Oqueocorreseotitulardapatentesenegaraconcederlicençasparaousodatecnologiapatenteada?
Evidentemente,a reduçãooueliminaçãonão-tarifáriaparadeterminadoprodutonãoseráprodutivaseotitulardosDPIstiveraprerrogativadebloquearsuaaplicação,aonegaraconcessãodeumalicençaouexigirbenefíciostãoelevadosquetornemimpossíveloacesso,adifusãoeautilizaçãodoinvento.Essasituaçãoensejaosurgimentodosseguintescenários:
Nocasodaconcessãodeumareduçãooueliminação,esta1.podeestarcondicionadaànão proteção por patentedessebemnoterritórioquereduzatarifa.Dessaforma,osbenefí-ciosdeacessonãoseriamcumulativos,jáque,seoaumentotarifáriofossesomadoàexclusividadecomercialdosDPIs,oacessoseriaprivilegiadoeosimportadoresnãoteriamnenhumbenefício.Ademais,seoobjetivodareduçãotarifáriaéomaioracessoeomenorcustodobemambiental,apatenteanulariataisbenefíciosaoinibiraconcorrência.
Seobemcontinuaragozardeproteçãoconcedidapelos2.DPIs,serápossívelexigiralicençaparaaproduçãodobemambientalnoterritóriodedestinoemtrocadedeterminadaregalia1.Essaopçãoapresentaavantagemdedifundiretornarefetivaatransferênciadetecnologiasambientais.
Casoareduçãooueliminaçãodafabricaçãodoproduto3.seja condicionada ao território nacional, o benefícioseráanulado.
Transferência de tecnologiaOutramodalidadedebarreiranão-tarifáriaquepoderiaconsti-tuirobjetodanegociaçãoéocondicionamentodareduçãooueliminaçãodebarreirasàtransferênciaefetivadetecnologia.
Aestratégiapoderiagiraremtornodacriaçãodecapacidadesendógenasparaquetaisprodutospudessemserproduzidosemterritórionacional.
AlgunsPEDsdestacamanecessidadedequeosvínculosecologicamenteracionaisentre comércio debens ambientais etransferênciadetecnologiassejammelhoresclarecidos.Questõesrelativasàtransfe-rênciadetecnologiapodemserinterpre-tadasconjuntamentecomos incentivosestabelecidosnosartigos66(parágrafo2)e67doAcordosobreAspectosdeDireitosdePropriedadeIntelectualRelacionadosaoComércio(TRIPS,siglaeminglês).Nessesentido,asdisposiçõessobretransferênciadetecnologia–cujaaplicaçãoserestringeaogrupodepaísesdemenordesenvolvimentorelativo–seriamestendidasaPEDs.OGrupodeTrabalhosobreComércioeTransferência
deTecnologiadaOMCpoderiaexaminararelaçãoentrecomérciodebensambientaisetransferênciadetecnologias“limpas”.
Finalmente,emterritórionosquaisastarifassãoreduzidas,seriapossíveltrabalharparaqueaimplementaçãodelicençasobrigatóriasdetecnologiasambientaiscondicionasseaconcessãodosDPIsaoexercíciodessesbenefícios.
Emambos os casos, asmodalidadesdevemconsiderar osseguintesprincípios:
Não-reciprocidade plena• .Àluzdasdiferençasestruturaisentrepaísesdesenvolvidos (PDs)ePEDs,busca-seevitarqueareduçãotarifária resulteemumforte incrementonasexportaçõesdebensambientaisporpartedePDsaPEDs,massimleveaumincrementodasexportaçõesnosentidoinverso.
Tratamento especial e diferenciado• .Buscaconsiderarasdisparidadesexistentesentreospaíses,demodoapos-sibilitaraoutorgadetratamentoespecialaPEDs (e.g.,reduzindoemmaiormedidaastarifasde importaçãodebensambientais).
Reciprocidade cruzada• .Arealizaçãodeconcessõescruzadasbuscaprotegersetoresmaissensíveisemdeterminadopaíseconcederreduçõestarifáriasabensquepossuemmaiorparti-cipaçãonocomérciomundial.Nessesentido,seriainteressanteconsideraraproteçãodosbensagrícolasouagroindustriaisdealtoconsumointerno,paraqueareduçãotarifárianãogereincrementosubstancialdas importaçõese,portanto,umapossíveldestruiçãodaproduçãonacional.
Rodada DohaAcaracterísticaquedistingueaRodadaDohaéocompromissoassumidopelosMembrosdaOMCdefazercomqueasnormascomerciaismultilateraisealiberalizaçãodocomércioapóiemoprocessodedesenvolvimento.OseixossobreosquaissesustentaoMandatodeDohaconstituemumaoportunidadeúnicaparaconjugartemascomerciaiscomambienteedesenvolvimento.PrivilegiarsomenteumdostrêseixosemdetrimentodeoutrosomentecontribuiparaoaumentodaslacunasquedividemPDsePEDs,contrariandooobjetivoprincipaldaRodada.
Paraqueoprocesso sejacompletoe integradorepermitaampliaroacessoàstecnologiaslimpas,éprecisoconsiderar,
Outros temas multi laterais
AlgunsPEDsdesta-camanecessidadedequeosvínculosecologicamenteracionaisentre
comérciodebensambientaisetrans-ferênciadetecno-logiassejammelhor
esclarecidos.
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particularmente,oefeitoqueosDPIsprojetamsobreaapli-cação,difusãoecomercializaçãode inovaçõesambientais.Modalidadescomo licenças – sejamestasvoluntárias,com-pulsóriasourequisitosparabenefíciospré-estabelecidos–sãoelementosquedevemserconsideradosemcasosnosquaisareduçãooueliminaçãodebarreirascomerciaisincidesobreprodutosouprocessospatenteados.
Há,ainda,doiselementosaseremconsideradosparaagestãodoacessoamercadossobreprodutosambientaisprotegidosporpatente.Umdeleséafabricaçãolocaldoproduto.Seamodalidadeacumularbenefícios(obtendoumgraumaiordeacessodevidoàexclusividadedecomercializaçãosomadaaomelhoracesso
porsetratardeumbemambiental),seriapossívelocondicionamentodesseacúmulodebenefíciosàfabricaçãonacionaldopro-duto.Dessaforma,afabri-caçãoemterritórionacionalleva,indiretamente,aumfluxodetransferênciadetecnologia,criandoknow how,capacidadeprodutivaemão-de-obraqualificada.Osegundoéonão-acúmulodebenefíciosambientaisedeDPIssobreummesmoproduto.
Oparágrafo32daDeclaraçãodeDoharecomendaqueosMembroslevememconsideração:“(i)oefeitodasmedidasrelacionadasaomeio-ambientenoacessoamercados,especialmenteemrelaçãoaospaísesemdesenvolvimento,(…)eaquelassituaçõesnasquaisaeliminaçãooureduçãodasrestriçõesedistorçõesdocomérciopossabeneficiarocomércio,omeio-ambienteeodesenvolvimento;(ii)asdisposiçõespertinentesaoAcordodeTRIPS…”.Écombasenessadisposição,somadaaoparágrafo31,queasmodalidadespropostassobrepropriedadeintelectualetransferênciadetecnologiaadquiremespecialrelevâncianotratamentodetemasambientais.Oobjetivoésocializaroscustosebenefíciosdeumanegociaçãocujoseixossãoocomércio,omeio-ambienteeodesenvolvimento,aomesmotempoemquesepropiciaaimplementaçãodasflexibilidadesdoAcordoTRIPS.
Como implementar?Apropostapoderiaserimplementadapormeiodeumadecla-raçãoquedeixeclaroovínculoentrepropriedadeintelectualeacessoatecnologiasambientaisequeexpressequeasmedidaspropostassãoconsistentescomoAcordoTRIPS.
Paralelamente,omesmotemadeveriaseragregadoàConvenção-QuadrodasNaçõesUnidassobreMudançasClimáticascomoumdospontosdoPlanodeAçãodeBali.Esteforodeuinícioaodebatesobreovínculoentrepropriedadeintelectualetecnologiasambientais.Encontramo-nos,assim,diantedeoportunidadeúnicadefortalecerainteraçãoentreambasasnegociaçõesaopropi-ciarautilizaçãodasflexibilidadesdosistemadepatentesparaoacessoedesenvolvimentolocaldetecnologias“limpas”.
* Advogada,pesquisadoradoCentrodeEstudosInterdisciplinaresdeDireitoIndustrialeEconômicodaUniversidadedeBuenosAires. Tradução e adaptação de artigo originalmente publicado em Puentes entre el Comercio y el Desarrollo Sostenible v. 9, n. 4, jul. 2008
1 JohnBartonpropõeoestabelecimentoumsistemadelicençasobrigatóriasparaeliminarasbarreirasdeacesso.VerBiores Trade and Environment Review,Ano1,No.2,dez.2007,disponívelem:<http://www.ictsd.org>.
A OMS e sua Estratégia Global para a saúde públicaEllen‘tHoen*
UmdosprincipaisparticipantesdasnegociaçõesquelevaramàelaboraçãodarecémadotadaEstratégiaGlobaldaOrganizaçãoMundialdaSaúde(OMS)sobresaúdepública,inovaçãoepropriedadeintelectual,disse-merecentementequeseusserviçosnãoseriammaisnecessáriosporqueotrabalhojáestavatermi-nado.Podemosconcordarcomestadeclaração?
Outros temas multi laterais
Oobjetivoé socializaroscustos ebenefíciosde umanegociaçãocujoseixossãoocomércio,omeio-
ambienteeo desenvolvimento…
Semdúvida,não.ÉverdadequeosnegociadoresdoGrupodeTrabalho IntergovernamentalemSaúdePública, InovaçãoePropriedadeIntelectual(IGWG,siglaeminglês)conseguiramfinalizaraEstratégiaGlobal,apresentadapormeiodepontosdeaçãoque,juntos,podemtransformarfundamentalmenteomodocomoapesquisaeodesenvolvimento(P&D)emsaúdesãoconduzidos.IstoporqueaEstratégiapriorizaassegurarqueasefetivasnecessidadeshumanassejamatendidaseporqueofinanciamentodeP&Défeitoparaqueosprodutosdesenvolvidossejamacessíveisàquelesquedelesmaisnecessitem.
Porsisó,estejáéumprogressoconsiderávele,porquenão,histórico.Masotrabalhoaindaestálongedeestarterminado.Averdadeiramudança,quefariadosucessodoIGWGumverda-deiromarco,irádependerdaefetividadecomqueaOMSeseusEstadosMembrosirãotraduziraEstratégiaemações.
ÉimportanteressaltarqueotrabalhodoIGWGfoidesenvolvidoapartirdetrabalhosanteriores.Aanálisedoatualambientedepropriedadeintelectual(PI)e inovaçãomédica,desenvol-vidapelaComissãosobreDireitosdePropriedadeIntelectual,InovaçãoeSaúdePública(CIPIH,siglaeminglês),demonstrouqueháalgofundamentalmenteerradonomodopeloqualnovosprodutosmédicossãodesenvolvidosecomercializados.Comsuas60recomendações–asprimeirastratandodosproblemasdeacessocausadospeloatualambientedePIepelafaltadeinovação,emespecialparadoençasqueafetamospaísesemdesenvolvimento(PED)–,acomissãoconstruiuumabasefirmesobreaqualfoidesenvolvidootrabalhodoIGWG.
PartedaefetividadedotrabalhodaCIPIH,entretanto,perdeu-seemsuatransposiçãoparaaEstratégiaGlobal,umavezqueaaçãopropostapelogrupodetrabalhorefleteoscompromis-sosnecessáriosparamantertodosàmesadenegociações.AEstratégiaafirma,porexemplo,queemalgunspaísesosdireitosdepropriedadeintelectualsãoumimportanteincentivoparaodesenvolvimentodenovosprodutosmédicos.Noentanto,osestudosdaCIPIHnãoencontraram,naprática,qualquerevidênciadequeaimplementaçãodoAcordosobreAspectosdosDireitosdePropriedadeIntelectualRelacionadosaoComércio(TRIPS,siglaeminglês)nosPEDstenhaimpulsionadosignificativamenteaP&Ddeprodutosfarmacêuticos.ParaaComissão,aprincipalrazãoparataléainsuficiênciadeincentivoscomerciais.
Mesmoassim,aatéentãoincontestávelteoriadequeosmaisseverosníveisdeproteçãoparaPIsãooúnicomeiodegarantir
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inovaçãopareceestarcomosdiascontados.Nessesentido,aEstratégiaGlobaltemsidoumefetivoapelopormudanças.Alternativamente,a iniciativapropõeacriaçãodegruposdepatentes(patent pools)detecnologiasup e downstream,comvistasaaumentaroacessoeainovação.Alémdisso,procuraincentivarousodelicençascompulsóriascomoestímuloàcon-corrêncianomercadodemedicamentosgenéricos,rejeitaaincorporaçãodedispositivosTRIPS-plusemacordoscomerciaisbilateraiseregionaiseencorajaodesenvolvimentodenovosmecanismosdeincentivo(comoprêmiosemaiorparticipaçãogovernamentalemP&D).
Ambiciosa,aEstratégiaGlobalabrecaminhoparamudançasfunda-mentaisemduasáreas-chave,conformeapresentadoaseguir.
Relação entre custo de P&D e preços finaisEmprimeiro lugar,paradarseqüênciaàResolução60.30daAssembléiaMundialdeSaúde,principalórgãodecisóriodaOMS,aEstratégiapedeodesenvolvimentodepropostasemP&DvoltadasàsnecessidadesdesaúdepúblicaequetragammedidasquedesvinculemoscustosdeP&Ddospreçosdosprodutosmédicos.
EssadesvinculaçãopoderiaquebrarocicloviciosoquefazcomqueosinvestimentosemP&Dsejamcompensadospelacomer-cialização demedicamentos a preçoselevados.EnquantoosavançosemP&Ddependeremdacobrançadealtospreços,atenderàs reaisnecessidadesdesaúdepúblicacontinuarásendoumautopia.
Ummododedesvincularcustosdepreçossãoos fundosdeincentivo1.BarbadoseBolíviapropuseramaoIGWGacriaçãodeincentivosàinovação,sugerindoprêmiosmúltiplospara:
odesenvolvimentodetestesdediagnósticorápidodetuber-•culoseabaixocusto;
adescobertadenovos tratamentoscontraadoençade•Chagas;
odesenvolvimentodemedicamentosevacinascontrao•câncer,especialmenteemPEDs;e
osdoadoresdelicençasvoluntárias• 2.
AEstratégiaGlobal incentivaosMembrosdaOMSabuscarempropostascomoessas.
Fatocrucialéque,nessesassuntos,aEstratégiaprovavelmenteiráagircomoumcatalisadordemudançasporumasériedeatoresdiferentes.OplanodeaçãodetalhadosobrecomoaEstratégiaGlobalseráimplementadaaindanãoestáfinalizado.Noentanto,suaprópriaexistênciadeveservirdeimpulsoouinspiraçãoparaqueoutrosatorespassemaenfrentarospro-blemasmaisespinhososdePIeacessoamedicamentos.
ExemplodissoéainiciativadaFacilidadeInternacionalparaaCompradeMedicamentos(UNITAID,siglaeminglês)3:esta-belecerumpooldepatentesqueviabilizeoacessoanovosmedicamentosanti-retrovirais(ARVs)destinadosaotratamentodaAIDSemPEDs,bemcomoodesenvolvimentodecombinaçõesdedosefixasefórmulaspediátricasdotratamentoARVtriplo.Essapropostacobremesmooscasosemqueaspatentesdasdrogasindividualmenteconsideradassãodetidasporentidadesouempresasdiferentes.
AoclamarpelaexploraçãodenovosealternativosincentivosparaP&Demsaúde,aEstratégiatambémestimulaodebate
entreacadêmicose indústria.A idéiadaconcessãodeprê-mios,aoinvésdemonopólios,vemganhandoforçacadavezmaior4.Outroexemplo,foiorecentedebatedeespecialistasorganizadopelaorganizaçãonão-governamentalMédicosSemFronteiras(MSF),compesquisadores,economistaseativistasquedemonstraramgrandeinteressenacriaçãodeumfundodeincentivoparaodesenvolvimentodeumexamemaissimplesparaodiagnósticodatuberculose.
Emsíntese,aidéiadeescapardosmonopólioscomoúnicoincen-tivoàinovaçãoestáganhandoespaço.EstadesvinculaçãodoscustosdeP&Ddospreçosdosprodutosjáépraticadaporinsti-tuiçõessemfinslucrativos,comoaDrugs for Neglected Deseases Initiative,quepagaadiantadopelapesquisaedesenvolvimentoepossuiumapolíticadenãocobrarpelaspatentesdosprodutosresultantesdessapesquisa.Issofazcomqueosmedicamentosfiquemdisponíveiscomoprodutosgenéricosdesdeoprimeirodiaemquesãocomercializados.
OutroexemploéodaNovartis,quesepropôsacriarumfundoglobalparaP&Demdoençasnegligenciadas,parafinanciarainovaçãosemfinslucrativos.Apropostaincluiumportfóliocentralizadoegeren-ciamentodePI.Dosbeneficiáriosdofundoseriaexigidoquelicenciassemseusdireitosdepropriedadeintelectualexclusivamenteparaoórgãodofundoparadoençasnegli-genciadas,masresguardando-seodireitodeexploraroprodutoemmercadosmaisricos,desdequeosroyaltiesfossemdestinadosaofundo.E,nocasodeonovocompostopoderserutilizadoparaotratamentode
umadoençacommaiorvalorcomercial,oinventorouempresadeverácompensarofundo5.
ApesardapropostadaNovartisestarfocadasomenteemdoençasnegligenciadasesugerirmudançaslimitadasnosistemaglobaldeP&D,elaéumclaroreconhecimentodosproblemasdeacessocriadospelosdireitosdePI.Estetemsidoumnovoposicionamentonaindústriafarmacêutica.
TRIPS?AsegundamudançafundamentalàqualaEstratégiapoderiaconduziréoaumentodosdebatesintergovernamentaissobreacriaçãodeumtratadosobresaúdeessencialebiomedicina,comvistasamudarasregrasdeP&Dnaáreamédica.
Atualmente,otratadoglobaldeP&Dpredominante,oAcordoTRIPSdaOMC, fundamenta-senaconcessãodemonopólioscomooprincipal incentivopara inovação.Ademais, seusdispositivossobretransferênciadetecnologiasãolimitados.QuandooAcordoTRIPSfoinegociado,odebatepúblicoeramuitorestrito,aescaladaAIDSemPEDseraaindadesconhe-cidaeoentendimentodosdetalhestécnicoselegaisentreosgruposligadosatemasdesaúdeeravirtualmenteinexistente.Emcontraposição,osinteressesindustriaiseramfortementerepresentadosetiveramumpapelcríticonaelaboraçãodotextodoAcordo,bemcomoemsuaaprovação.
LoveeHubbardpropõemumnovopanoramacomercial,noqualoincentivoaP&Docorraporoutrosmeiosquenãoexclusiva-menteaconcessãodedireitosmonopolistas6.Comoresultado,novosprodutosseriammaisacessíveisenãoestariampresosapatentesde20anos.Haveria,assim,ummercadoparaP&Deummercadocompetitivoàparteparaproduçãoevendas,noqualtodososprodutosseriamgenéricos.Tambémexistiriaumanormainternacionalpararegulamentarumacontribuiçãoem
Outros temas multi laterais
Emsíntese,aidéia deescapardos
monopólioscomoúnicoincentivoàinovaçãoestága-nhandoespaço.
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P&Dparaasseguraradisponibilidadederecursosfinanceiros,desatrelando-osdalógicadealtospreçosereduçãodeoferta.
TransferirodebatedePIparaP&Dtambémafetaadinâmicadospaísesnanegociaçãodetratadoscomerciais.QuandoasdiscussõesdeixamdeestarcentradasempadrõescadavezmaisseverosdeproteçãoparaPIepassamaversarsobrecomocadapaíspodecontribuirparaa inovaçãoemsaúdepúblicaparabenefíciodetodos,atônicadodebatemuda.
OMS: qual o próximo passo?DepoisdaDeclaraçãodeDohade2001sobreoAcordoTRIPSeSaúdePública,aEstratégiaGlobaléatentativamultilateralmaisimportantedealteraraspolíticasdepropriedadeintelectualparaquerespondammelhoràsreaisnecessidadesdesaúdepública.Destavez,sãoautoridadesdaáreadasaúdequeconduzemas
negociações,queocorremnoâmbitodaOMS,enãodaOMC.Osucessodaestratégiadependerá,portanto,daefetividadeedeterminaçãodaOrganização.
Noentanto,opapeldaOMSaindapermanecealtamentecontroverso.Issosedáemespecial porque os seusmembrosaindanãoche-garamaumacordoquantoàdefiniçãodaquelesqueserãoresponsáveispela imple-mentaçãodosdiferentesinstrumentosdoplanodeaçãodaEstratégia.
TambémnãotemsidoumbomsinalofatodeaOMSaindanãoterreconhecido,traduzidonemmesmopubli-cadoaspropostasdeBolívia
eBarbadosparaacriaçãodefundosdeincentivo,apesardeteremsidoapresentadasemrespostadiretaaumaResoluçãode2007daAssembléiaMundialdaSaúde.Damesmaforma,oforteembateduranteasnegociaçõessobreomandatodaOMSnaáreadePItambémnãoévistocomoumbompresságio.
AEstratégiaGlobaléatitude.AOMS,naqualidadedeagênciamaisimportanteemsaúdepúblicanomundo,deveassumirumpapeldeliderança.Semumaimplementaçãoefetiva,aEstratégiaseránadamaisdoqueumadeclaraçãodeboasintenções.Edessas,omundojáviuobastante.
* Ellen‘tHoenédiretoradepolíticasdaCampanhadeAcessoaMedicamentosEssenciaisdaONGMédicosSemFronteiras(MSF). Tradução e adaptação de artigo originalmente publicado em Bridges Monthly Trade Review Ano 12, n. 4, ago. 2008
1 Stiglitz, Joseph.Prizes,NotPatents,2007.Disponívelem:http://www.project-syndicate.org/commentary/stiglitz81.
2 ProgramadetrabalhoapresentadoporBarbadoseBolívia,17abril2008.Disponívelem:http://www.keionline.org/.
3 AUNITAIDfoiestabelecidaem2006porBrasil,França,Chile,NoruegaeReuinoUnidoscomoobjetivodereduzirospreçosdosmedicamentosparacombateroHIV/Sida,amaláriaeatuberculose,semqueaqualidadesejapostaemcausa.
4 Vernota1.5 Paul Herrling, R&D and Sustainable, Predictable Financing of R&D for
NeglectedDiseases, nota apresentadano FórumGlobal dePesquisa emSaúdedoKEIeMSF,realizadoem28mar.2007,emGenebra.
6 Hubbard,T.eLove,J.ANewTradeFrameworkforGlobalHealthcareR&D.PLoSBiol.2004;2:E52.
O BNDES como ator da integração na região sul-americanaNosúltimosanos,oBancoNacionaldeDesenvolvimentoEconômicoeSocial(BNDES)tem-seconsolidadocomoummecanismoativodapolíticaexternadogovernobrasileiro.Esteartigobuscaidentificarsuasprinci-paislinhasdeaçãovoltadasaodesenvolvimentodaintegraçãonaAméricadoSul.
Análises regionais
…opapeldaOMSain-dapermanecealta-mentecontroverso…membrosaindanãochegaramaumacor-doquantoàdefini-çãodaquelesqueserãoresponsáveispelaimplementaçãodosdiferentesinstru-mentosdoplanodeaçãodaEstratégia.
NareuniãodoFundoMonetárioInternacional(FMI)edoBancoMundialde2007,opresidentedoBNDES,LucianoCoutinho,propôsacriaçãodeumfundointernacionalparaofinanciamentodaintegraçãosul-americana.Talpropostainsere-senocontextodeprojeçãoregionaldoBNDEScomoinstrumentodapolíticaexternadogovernobrasileiro,principalmentenoquedizrespeitoàinte-graçãoregional.Jáem2005,GuidoMantega,entãopresidentedoBNDES,afirmavaque“oGovernoLulaestabeleceucomoumadesuasprioridadesalterarageopolítica,construindoumanovacorrelaçãodeforçasfavorávelaospaísesemergentes”.
ParafinanciaraintegraçãonaAméricadoSul,ogovernofederalbrasileirodispõedetrêsmecanismosprincipais:
a Iniciativaparaa Integraçãoda Infra-estruturaRegional1.Sul-americana(IIRSA)1,criadaem2000;
oProgramadeCréditoàExportação(PROEX)2. 2;e
oBNDES.3.
Desde2005,oBNDEStemcriado linhasdeapoioaempresasbrasileiras,sejapormeiodecréditosàexportaçãodebenseserviços,sejapelacriaçãodemarcosregulatóriosfavoráveisàexportaçãodeinvestimentosestrangeirosdiretos(apoioàinter-nacionalizaçãodasempresas).Ofatodetalestratégiatercomofocoasempresasbrasileirasquecomercializamcompaísessul-americanoséfreqüentementeevocadopelasliderançasdoBNDEScomooaspectodefinidordasintoniadoBancocomoprogramadeprojeçãoregionaldefinidopeloatualgovernofederal.
Apoio à exportação: principal frente de atuação do BNDES na regiãoOBNDESéhojeomaiorbancodedesenvolvimentodaAméricaLatinaeosegundomaiordomundo(atrásapenasdoBancoMundial)3.Nosúltimostrêsanos,oBNDEStemtidocomofocoodesenvolvimentoeamultiplicaçãode linhasdecréditoàexportaçãodebenseserviçospraticadaporempresasbrasileiras,desempenhandoumpapelcadavezmaisativono“desenvolvimentosustentávelecompetitivodaeconomiabrasileira”,conformedeclaraçõesdopróprioBanco.
Sãoduasassuasprincipaislinhasdeapoioàexportação.Nofinan-ciamentoàprodução,aempresaobtém,juntoaoBNDES,recursosparaproduzirobemouserviçoaserexportado.Jánalinhadefinanciamentoàcomercialização,oimportadoréfinanciadoeoexportador(brasileiro)recebeosrecursosantecipadamente.Aqui,cabedestacaraparceriarecentementefirmadaentreosgovernosdoBrasiledaArgentina,deacordocomaqualoBNDESfinanciaráemUS$200milhõesasimportaçõesdeprodutosbra-sileirosporempresasargentinas.
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SegundodadosdoBNDES,68%daslinhasdecréditodesembolsa-dasem2005(US$3,86bilhões)correspondemabensdecapital,sendoasempresasqueproduzemequipamentosdetransportesasmaisbeneficiadas.Osserviços,porsuavez,responderamporapenas5%dessevalor(US$252,2milhões).
Aindaqueosnúmerosrepresentem28%deaumentoemrelaçãoa2004,oBNDESpassouainvestirnaformulaçãodeestratégiasdeexpansãodaparticipaçãodosetordeserviçosemsuaslinhasdefinanciamento.ParaalémdeumapreocupaçãocomvistasaoequilíbriodaplataformadeempresasbeneficiáriasdaslinhasdecréditodoBNDES,asaltasliderançasdoBancodefendemque“oapoioàsexportaçõesdeserviçoséfundamentalparaagregaçãodevalornastransaçõescomerciaisbrasileiraseparamelhorarosaldodeserviços”4.Oprincipalpontodeatençãoincidesobreosserviçosdeconstrução,umavezquesetratadeumsetornoqualopaís“possuivantagenscomparativas”.
Infra-estrutura: ponto sensível para a integração regionalOtemarelativoainfra-estruturavemocupandoumespaçocadavezmaioremfórunsnacionaiseregionais.NoBrasil,temsidoobjetodeintensosdebatesnomeioempresarialepolítico5e,naregião,foramtaisdiálogosquederamorigemàjámencionadaIIRSAeaoFundoparaaConvergênciaEstrutural(FOCEM,siglaemespanhol),noâmbitodoMercadoComumdoSul(Mercosul).Independentementedofórum,odiagnósticoéomesmo:aassi-metriaentreospaísessul-americanosnotocanteàinfra-estruturaconstituiumdosprincipaisdesafiosàintegraçãodessespaíses.
CaberessaltaraexperiênciadoFOCEM,fundoregionalcriadopeloConselhodoMercadoComum(DecisãoCMCN.45/04)comquatroáreasdeatuaçãoprincipais:promoveraconvergênciaestrutural,odesenvolvimentodacompetitividade,acoesãosocialeofortalecimentodaestruturainstitucionaldoMercosul.ConformeoPrimeiroOrçamentodoFundo(MERCOSUL/CMC/DEC.N.28/06),relativoaoperíodo2006-2007,ofocodostrabalhosfoidefinidoemtornodainfra-estrutura,principalmentenoParaguaieUruguai,incluindoasseguintesatividades:
construção,modernizaçãoerecuperaçãodeviasdetrans-•portemodalemultimodalqueotimizemomovimentodaproduçãoepromovamaintegraçãofísicaentreosEstadosparteesuassub-regiões;
exploração,geração,transporteedistribuiçãodecombustíveis•fósseis,biocombustíveiseenergiaelétrica;e
implementaçãodeobrasde infra-estruturahídricapara•contençãoeconduçãodeáguabruta,saneamentoambientalemacro-drenagem.
As iniciativasacimaapresentadasforamcriadassobacrençadequeaharmonizaçãodainfra-estruturaconstituipeça-chaveparaaviabilizaçãoda integraçãoedodesenvolvimentodospaísessul-americanos.Comefeito,nosúltimosanos,odiscursopolíticofavorávelàintegraçãoevoluiumaisrapidamentequeosmecanismoscapazesefetivaraintegraçãosul-americana.Assim,oFOCEM,aIIRSAeoBNDESinserem-seemumcontextonoqualaatençãodasliderançaspolíticasdaAméricadoSulvoltou-separaodesenvolvimentodeferramentascapazesdesuperaraslacunasentreospaísesdaregião.
Dessaforma,ajámencionadapreocupaçãodoBNDESemaumentaraexportaçãodeserviçosfoiadaptadaaoideáriodasliderançaspolíticassul-americanaseoBancopassouaatuarcomoórgãofinanciadordaintegraçãosul-americana,comfocoemserviçosdeinfra-estrutura6.
DentreasoperaçõesfinanciadaspeloBNDES,destacam-se:
aampliaçãodacapacidadedegasodutosnaArgentina,1.obraoperadapelaOdebrechteConfab,queenvolveua
concessãodeaproximadamenteUS$237milhõesdefinan-ciamentosdoBNDES;
aconstruçãodoAeroportodeTenanaAmazôniaEquatoriana,2.tambémoperadapelaOdebrecht,quecontoucomUS$50,4milhõesdoBNDES;e
a construção das linhas 3 e 4 dometrô de Caracas.3.Nestaúltima,o financiamentodecercadeUS$107,4milhões entre 2001 e 2005 envolveu a exportaçãodebens(tubulaçõesparaar,águaeeletricidade,açoparaconstrução,guindastes,pontesrolantesecaminhonetes)eserviços(gerenciamentodeobrascivis,levantamentostopográficos,sismológicosegeológicos,administraçãodemateriaiseequipamentos).
AsempresasmaisbeneficiadaspeloapoiodoBNDESàexportaçãodeserviçoseminfra-estruturatêmsidoaquelasjáconsolidadasnomercadonacionaledotadasdeprojeção internacional.OexemplomaisemblemáticoéaOdebrecht7,envolvidaemquasetodasasprincipaisoperaçõesfinanciadaspeloBanconaAméricadoSul.Aconstrutorabrasileira,queocupaa16ªposiçãoentreasmaioresempresasdaAméricaLatina8,atuaemtrezepaíses,doMéxicoàArgentina,emaisde80%(R$6bilhões)dareceitadesuareceitaéprovenientedoexterior.
Considerações finaisAcombinaçãode instrumentosnacionaise regionaiscomoobjetivodepromover a integração sul-americana tem-sereveladoumapráticacomumdogovernobrasileiro,principal-menteapartirde2000.Paraalémdeumideal,amultiplicaçãodetabuleirosemqueoBrasilatuatemtrazidobonsfrutosàeconomiadopaísnosúltimosanos.Defato,aintegraçãoregional impulsionouacompetitividadedasempresasbra-sileiraseabriumercadospara investimentos,entreoutrosbenefícios.Ferramentadegrandeimportânciaparaapromoçãodaintegraçãosul-americana,oBNDEStemcontribuídoparaoaumentodadiversidadedossetoresapoiados,bemcomodospaísescomosquaisoBrasilfechouacordos,oquesetraduzemaumentodemercadosconsumidores.
Noquedizrespeitoespecificamenteàinfra-estrutura,oFOCEMeoBNDESparecemcons-tituir osmecanismosdeperfilregionalprioritáriosaogovernobrasileiro.Noentanto, o volume dosfinanciamentosdoBNDESultrapassaemmuitoaquelesdoFOCEM:parafinsilustra-tivos,somenteastrêsobrasdestacadasnaseçãoante-rior(Argentina,EquadoreVenezuela)totalizaramUS$394,8milhõesemfinancia-mentosdoBNDES,maisdoqueodobrodosrecursosprevistosnoorçamentodoprimeirobiêniodoFOCEM(US$125milhões).Alémdisso,osprojetosaprovadosnoprimeiro semestrede2007noâmbitodoFOCEM(6noParaguaie6noUruguai)depara-ram-secomobstáculosburocráticosparasuaimplementação.
CaberessaltarqueoFOCEMprivilegiaasempresasnacionaisdospaísesemqueaobraseráexecutadaparaaconcessãodofinancia-mento,aoinvésdegigantesmaiscompetitivoscomoaOdebrecht.Nessesentido,torna-seprevisívelaposiçãodoPresidenteLuizInácioLuladaSilvaedoMinistrodasRelaçõesExteriores,CelsoAmorim,dedestacaroBNDESnosfórunsinternacionaiscomo
Análises regionais
Acombinaçãodeinstrumentosnacio-naiseregionaiscomoobjetivodepro-moveraintegraçãosul-americanatem-sereveladoumapráticacomumdogovernobrasileiro…
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umaferramentaqueofereceeficiênciaecredibilidadeparaofinanciamentodeobrasdeinfra-estruturanaAméricadoSul.ExemplodissoéarecenteviagemdopresidentedoBanco,LucianoCoutinho,aTóquioparaexplorarapossibilidadedeempréstimode
bancosjaponesesaoBNDES.“Osbancosjaponesespodemdesenvolver, juntocomoBNDES, fundos de apoioa investimentoseminfra-estrutura, ehá tambémgrandeinteresseeminstru-mentosfinanceirosrelacio-nadosaomeio-ambiente,comooFundoAmazônia”,disseCoutinho9.
Trata-sedamaturaçãodeumapropostaquefoiapre-sentaporCoutinhoemoutu-brodoanopassado,duranteareuniãoanualdoFMIedoBancoMundial.Acriaçãodeumfundointernacional
paraofinanciamentodaintegraçãosul-americanaénecessáriaparaacontinuidadedasatividadesdoBNDES,cujademandaporrecursoséelevada(oestoquedeprojetosdeinvestimentosapro-vadospelobancohojegiraemtornodeUS$90bilhões)etendeacrescer.EssecenáriodevepressionarasfontesderecursosdoBanco,emespecialsetambémconsideradooatualcontextodacriseeconômicamundial.
1 Os Presidentes da América do Sul decidiram, em reunião realizadaem agosto de 2000, em Brasília, criar a IIRSA, uma vez reconhecida acarênciademecanismosdeaçãoconjuntaparaimpulsionaroprocessodeintegraçãopolítica,socialeeconômica,fundamentalmentepormeiodamodernizaçãodainfra-estrutura.NoBrasil,éaUniãoqueoperaaIRRSA,comrecursosorçamentáriosparaprojetosespecíficos.Ver:<http://www.iirsa.org>.Acessoem:17out.2008.
2 Ver:<http://www.fazenda.gov.br/sain/temas/proex.asp>.Acessoem:17out.2008.
3Ver:COSTA,KarenFernandez.AtransformaçãodoBNDESesuainfluênciana política de Estado do Brasil na década de 90. In:28EncontroAnualda Anpocs, 2004, Caxambu. 28 Encontro Anual da Anpocs, 2004. http://www.encontroanpocs.org.br/2004/lista_sessoes_prog.asp? atvId=116
4 Palavras proferidas por Guido Mantega em 2005, quando ainda erapresidentedoBNDES.Apresentaçãodisponívelem:<http://www.bndes.gov.br/empresa/download/apresentacoes/mantega_importancia_das_%20exportacoes.pdf>.Acessoem:17out.2008.
5 Vereditorialintitulado“Odesafiodacompetitividadeparaasexportaçõesbrasileiras”,nestenúmerodoPontes Bimestral.
6 Dignodenota,oBNDESnãofinanciaobrasnoexterior,massimexportaçõesdebenseserviçosproduzidosnoBrasil.
7 Recentemente, a empresa foi objeto de um quadro de tensão juntoao governo equatoriano, que acusava a Odebrecht, participante doconsórcio responsável pela execução do projeto da usina hidrelétricade San Francisco, de ter utilizadomateriais de qualidade inferior, como objetivo de acelerar o ritmo da obra – entregue 9 meses antes doprazo, adiantamento que garantiu à Odebrecht o recebimento de umbônuscontratualdeUS$13milhões.Paramaisinformações,ver:PontesQuinzenal,Vol. 3,No.18.RelaçõesBrasil-Equador seestremecemapóscasoOdebrecht.(13/10/2008).Disponívelem:<http://ictsd.net/i/news/pontesquinzenal/31036/>.Acessoem:17out.2008.
8 Ver BBC. Brasil domina ranking das 500 maiores empresas da América Latina. (28/07/2008). Disponível em: <http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/07/080728_brasilempresasranking.shtml>.Acessoem:17out.2008.
9 Ver Agência Brasil. BNDES vai propor fundo internacional para financiar integração sul-americana. (17/10/2007). Disponívelem: <http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2007/10/17/materia.2007-10-17.6337367433/view>. Acesso em: 21 out. 2008. Vertambém: BNDES. BNDES busca ampliar relacionamento com instituiçõesinternacionais.(17/10/2008).Disponívelem:<http://www.bndes.gov.br/noticias/2008/not187_08.asp>.Acessoem:21out.2008.
Biocombustíveis: perspectivas de reformas nas condições de trabalhoOaumentonademandaporbiocombustíveis–nota-damente,oetanol–produziu,naindústriasucro-alcooleirabrasileira,crescimentoemodernização.Osetor,entretanto,aindaapresentacondiçõesprecáriasdetrabalho.Opresenteartigobuscaidentificarasmedidasadotadaspelosprincipaisatoresenvolvidosnaproduçãodebiocombustíveisparasolucionarquestõesrelativasaosdireitostrabalhistasnestesetor.
Brasil
Acriaçãode umfundo
internacionalparaofinanciamentodaintegraçãosul-ame-ricanaénecessáriaparaacontinuidade
dasatividades doBNDES…
Oaumentonademandaporbiocombustíveis–notadamente,oetanol –produziu,na indústriasucro-alcooleirabrasileira,crescimentoemodernização.Osetor,entretanto,aindaapre-sentacondiçõesprecáriasdetrabalho.Opresenteartigobuscaidentificarasmedidasadotadaspelosprincipaisatoresenvolvi-dosnaproduçãodebiocombustíveisparasolucionarquestõesrelativasaosdireitostrabalhistasnestesetor.
OBrasiléo segundomaiorprodutormundialdeetanol.Ademandapelobiocombustívelnomercadointernacionalcons-tituiuaforça-motrizdosaltosníveisdeprodução:em2006,aproduçãomundialdeetanolfoide,aproximadamente,51bilhõesdelitros.AindaqueaUniãoEuropéia(UE)eosEstadosUnidosdaAmérica(EUA)tambémproduzambiodieseleetanolemlargaescala,oBrasiltemexportadobiocombustíveisparaessesmercados,umavezqueapresentamenorescustosdeprodução.Comefeito,“[n]oBrasil,oscustosdeproduçãoeasvantagensambientais –balançofavoráveldopontodevistadasemissõesdegasesdeefeitoestufa (GEE) –estãoassociadosàproduçãoatual,comgrandeconcentraçãoemSãoPaulo,ondeascondiçõessãobastantefavoráveis(solo,clima,tecnologiaetc)”1.
Referênciamundialemdiversospaíses,oprogramadecres-cimentodaindústriadebiocombustíveisdoBrasilapresenta,entretanto,algunspontos sensíveis. Emmeadosde2005,representantesdaUEedosEUA,porexemplo,condicionaramalgumasexigênciasdepadrões relativosà sustentabilidadesocialeambientaldaproduçãodebiocombustíveisnoBrasilànegociaçãoporumvolumemaiordeexportação2.
Cenário trabalhista na indústria sucro-alcooleiraAperspectivadecrescimentonademandaporbiocombustí-veisnospróximosanosnãotardouaprojetarefeitossobreomercadodetrabalhonosetor.DeacordocomdadosdaUniãodaIndústriadaCana-de-açúcar(UNICA),nasafrade2006,oestadodeSãoPaulorecebeumaisde70.000trabalhadoresparatrabalhonoscanaviais.
Essesnúmeros,contudo,nãocarregamconsigoapenasoti-mismo.Amodernizaçãoobservadanaindústriadacananãoalcançoudeformauniformetodosospontosdacadeiaprodu-
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tiva.Talvezoexemplomaisnotóriodissosejamascondiçõesdetrabalhonoscanaviais.Depoimentosdoprocurador-chefedoMinistério Público doTrabalho (MPT), Cícero Rufino,desafiamos números otimistas apresentadospelaUNICA,soboargumentodequeasusinascanavieirasprotagonizamsistemáticasviolaçõesaosdireitostrabalhistas.
Hádoistiposdecortedecananoscanaviais:omecanizadoeomanual.Oprimeirodelesenvolveacontrataçãodeprofissionaisqualificados(agrônomos,técnicosagrícolas,engenheirosquímicos,contadoreseengenheirosdeprodução).“[E]stestrabalhadoressãocontratadosdiretamentepelausinaatravésdocontratode trabalhopor tempo indeterminado,queassegura,alémdosdireitostrabalhistasbásicos,oseguro-desempregoquandohouverdemissão”3.
Em contraste, o cortemanual envolve um contrato portempodeterminado(conhecidocomocontrato“safrista”),o qual não estabelece obrigatoriedadedepagamentodeseguro-desempregoaotrabalhador.Oscritériosdeseleçãocorrespondemàforça,habilidadeeresistênciafísica,fatorescondicionantesdaprodutividadedotrabalhadornocanavial.O pontomais sensível hoje da indústria sucro-alcooleiraéqueo saláriopagoestádiretamente relacionadocomaprodutividadedotrabalhadoreissolevaasituaçõesgravesdeexposiçãodotrabalhador.ConformeapontaNovaes:“[P]araseremselecionadospelausina,oscandidatosterãoquecortarnomínimo10toneladasdecana/dia.(…)Aproduti-vidadedotrabalhonocortemanualdobrouemrelaçãohá20anos,quandosecortavade4a6toneladasdecana/dia,semquehouvessemudançassubstanciaisnaformadecorteenosinstrumentosdetrabalho”4.
Ocenário trabalhistadaproduçãodebiodieselébastantesimilar.NoPiauí,porexemplo,estadoemqueocultivodemamonacomomatéria-primadobiodieseltemcrescidonosúltimosanos,os trabalhadores tambémsão submetidosaosistemade remuneraçãoemfunçãodaprodutividade.Maisdoqueisso:aempresareduzosalárioquandoametadetrêstoneladasanuais,fixadaemcontrato,nãoéalcançada.
Outropontosensíveldestaindústriaéoregimealimentardostrabalhadores,incapazdereporosnutrientesgastoscomacargaexcessivadetrabalho.Emdecorrênciadisso,muitoscortadoresdecanaadquiremproblemasdesaúde,osquaispodemlevaràmorte.Atualmente,oMinistérioPúblicoinves-tigaarelaçãoentreinfartosdetrabalhadoresdecanaviaiseascondiçõesdetrabalhonointeriorpaulista.
Éimportantedestacarque,emborahajamovimentosfavorá-veisàcolheitamecanizadadacanadentrodosetorusineiro,ocortemanualaindaéomaisutilizadonoBrasil5.NoestadodeSãoPaulo,maiorprodutordecana-de-açúcardopaís6,ocortemecanizadoocorreem40,7%dos3,8milhõesdehectarescultivados,segundodadosdoInstitutodeEconomiaAgrícola(IEA).Essaporcentagem,que tendeaaumentar, insere-senocontextodainiciativadaSecretariadoMeio-AmbientedoestadodeSãoPaulo,quecriou,em2007,umseloambientalparapromoveramecanizaçãodascolheitasdecanaeestimularasusinasdoestadoacumprircomametademecanizaçãode70%daáreacultivadaaté2010.
Propostas em debate: como melhorar as condições de trabalho nos canaviais?Aprecariedadedascondiçõesdetrabalhonoscanaviaisconstitui,atualmente,objetodepreocupaçãoeanálisedeorganizaçõesdedireitoshumanoscomoaAnistiaInternacionaleaOrganizaçãoInternacionaldeDireitosHumanos(FIAN,siglaeminglês)7.Asuspeitadequetaiscondiçõespudessemsercaracterizadascomotrabalhoescravooudegradantefoiumadasprincipaismotivaçõesparaoenvio,emabrilde2008,deumamissãointernacionala
trêsestadosbrasileiros:MatoGrossodoSul,PiauíeSãoPaulo.Aofinaldavisita,amissãoapresentouasseguintesrecomendaçõesaogovernobrasileiroeàindústriadacana:
avançarnasnegociaçõesetrâmiteslegaiscomvistasasolu-1.cionaroproblemadaviolaçãodosdireitostrabalhistas;e
buscaralternativasaosistemaderemuneraçãocombase2.naprodutividade.
A crescente visibilidade do tema pressionou o principalrepresentanteda indústria canavieiranoBrasil, aUNICA,aformularumapropostacomvistasamitigarosproblemasapontados.OpresidentedaUnião,MarcosJank,destacou,eminúmerosfóruns,algunspontoscríticos,sobreosquaisémaisurgenteoavançodosdebates:contratosdetrabalho,remuneração,saúdeesegurançadostrabalhadores,trans-porte,alojamentoeatendimentoamigrantescontratadosemoutrasregiõesdopaís.
Em2001,aUNICAcriouonúcleofixodeResponsabilidadeSócio-ambientaleSustentabilidadeparacompor suaestru-tura,oqualelaboraestudoserealizasemináriosperiódicosnasregiõesdasusinasassociadas.Em2006,aUNICAassinouumprotocolodeintençõescomaFederaçãodosEmpregadosRuraisAssalariadosdoEstadodeSãoPaulo (Feraesp) comoobjetivodeaperfeiçoarascondiçõesdetrabalhoereco-mendaraadoçãodemelhorespráticas.Odocumentotratadanecessidadedeeliminargradualmenteaterceirizaçãodocortemanualdacana-de-açúcar,demelhorarascondiçõesdetransporteoferecidasaostrabalhadoresruraiseaumentaratransparêncianopagamentoporprodução.Foramcriados,ainda,gruposdetrabalhoparaanalisarasituaçãodoquadrotrabalhistanoscanaviais9.
Noque tangeaogoverno,oPresidenteLuis InácioLuladaSilva reuniuosprincipais representantesdosempresários(UNICA)e trabalhadores (FERAESPeConfederaçãoNacionaldosTrabalhadoresnaAgricultura–CONTAG)emBrasília,comoobjetivodeapresentarumapropostaconjuntaaosproblemastrabalhistasobservadosnaproduçãodebiocombustíveis10.NaprimeirareuniãodaMesadeDiálogoparaAperfeiçoarasCondiçõesdeTrabalhonaCana-de-Açúcar,ocorridaemjulhode2008,foramdebatidosdoismodelos,osquaispassaramapautarodebatenacionalapartirdeentão11.
Oprimeirodelescorrespondeaumcontratocoletivonacional,queestabeleceriapadrõesmínimoscomuns.Adúvidaemtornodessapropostaestárelacionadaapoucosavançosapartirdabuscaporummínimodenominadorcomumemumsetorqueapresentaumagrandeheterogeneidade – sãomaisde400indústriase70.000 fornecedoresdecana,dispersosem20estados.Inspiradonaexperiênciapaulista,osegundomodeloenvolveaformulaçãodeumprotocolodemelhorespráticastrabalhistasno setor,cujaadesãoseriavoluntária.Paraasempresassignatárias,oprotocolocorresponderiaaumaespé-ciedecertificado,queasdiferenciariadasdemais,inclusiveperanteomercadointernacional.
NareuniãodaMesadeDiálogo,tornou-seevidentequeasusinasrepresentadaspelaUNICAsãopartidáriasdosegundomodelo, pois o considerammais exeqüível e inovador.Acreditamqueomodeloestáemmaior sintoniacompro-cessosemandamentonomundo,quetêmbuscadoavançosno setor trabalhista emprocessosmais descentralizados.AUNICAsustenta,ainda,queaadoçãodosegundomodelonãoexcluioprimeiro:auniformizaçãogradualdaspráticaslaboraisdoprotocolodeadesãovoluntáriapodeconstituir,futuramente,umcontratonacional,oqualteriacaracterís-ticasmaislegítimas,essencialmenteporterpartidodabaseemdireçãoaotopo(bottom-up).
Paralelamenteaodebatefundamentadonessesdoismodelos,oprocurador-chefedoMPT,CíceroRufino,sugereaincorporação
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daJustiçadoTrabalhonoprocessodeavaliaçãodohistóricodasempresasquesolicitamfinanciamentoaogoverno.OBNDES–quesomenteem2006concedeufinanciamentosnovalordeR$1,5bilhãoparaaconstruçãodedestilarias–podeconstituiruminteressantepontodepartida.OBanco,queatualmentevinculaaliberaçãodecréditoaocumprimentodalegislaçãoambiental,poderiaconsiderartambémasnormastrabalhistascomocritérioparaaprovaçãodelinhasdecrédito.
Comentários finaisOprocessodeformulaçãodepolíticasdeincentivoàprodu-çãodebiocombustíveisnoBrasilnãoocorreuderepente;aocontrário,resultoudeexperiênciasquedatamde,nomínimo,trêsdécadas.Nosúltimoscincoanos,entretanto,odebateemtornodepossíveismedidasparaamelhoriadascondiçõestrabalhistasnosetordosbiocombustíveispareceestartrazendoventosmaisotimistas.
Detodomodo,aspropostasdefendidaspelosrepresentantesdaindústriadecana-de-açúcarnãosãopautadasemmodificaçõesestruturais:desconsideram,porexemplo,aextinçãodosistemaderemuneraçãoemfunçãodaprodutividade,quepossuiimplicaçõesnocivasàsaúdedostrabalhadores,eaincorporaçãodegarantiasdetratamentomédicoadequadoaoscortadoresdecana.Dessaforma,équestionávelograudeambiçãodeumprojetocomooprotocolodeadesãovoluntária,quedeixaadecisãosobtotalresponsabilidadedasusinas.
UmaformadeoEstadobrasileiroadotarumaposiçãomaispró-ativa nesse processo podepartir da incorporaçãodeexigências trabalhistasparaa concessãode financiamen-tosàproduçãodebiocombustíveis, conforme sugestãodoprocurador-chefedoMPT.
1 Paraumaanálisemaisdetalhadasobreomercadointernacionaldeetanol,verartigodeArnaldoWalter,publicadoemPontesBimestral,Vol.3,No.5.Disponívelem:<http://ictsd.net/i/news/4428/>.Acessoem:20out.2008.
2 O “Selo Combustível Social” insere-se nesse contexto. Ver InstruçãoNormativa No. 01, de 05 de julho de 2005 e artigo publicado emPontes Bimestral, Vol. 4, No. 1. Disponível em: <http://ictsd.net/i/news/10607/>.
3 VerNOVAES,JoséRobertoPereira.Campeõesdeprodutividade:doresefebresnoscanaviais.EstudosAvançados,v.21,p.167-178,2007.
4 VerNOVAES,Idem.5 Ver:<http://www.revistarural.com.br/Edicoes/2005/artigos/rev92_cana.
htm>.Acessoem:23out.2008.6 Nasafra2005/2006,oestadodeSãoPauloproduziu263.870.142toneladas
decana-de-açúcar,maisdoqueametadedoqueopaísproduziunessamesmasafra(425.535.761toneladas)(ÚNICA,2008).
7 AvisitadamissãofoirealizadaemparceriacomentidadesrepresentativasdeAlemanha,Holanda,SuíçaeCanadá.Paramaisinformações,ver:AgênciaBrasil.Missãoapontaimpactosdaproduçãodebiocombustívelsobredireitoàalimentação.(10/04/2008).Disponívelem:<http://www.agenciabrasil.gov.br/noticias/2008/04/10/materia.2008-04-10.5198135052/view>.Acessoem:20out.2008.
8 OsprincipaisprojetoscoordenadospelonúcleodeResponsabilidadeSócio-ambientaledeSustentabilidadesão:ParceriacomInstitutoBancoMundial(WorldBankInstitute);ProjetoTear-Tecendoredesresponsáveis;ParceriacomoInstitutoEthos;ProgramadeelaboraçãodoBalançoSocial;Programade elaboração do relatório de sustentabilidade GRI (Global ReportingInitiatives). Para mais informações sobre cada um desses programas,ver: <http://www.unica.com.br/content/show.asp?cntCode={7CEAA4F5-C3D3-4638-BC8F-AC8E88AFE9C6}#Programa%20de%20elaboração%20do%20Balanço%20Social>.Acessoem:20out.2008.
9 Odocumentoestádisponívelem:<http://www.unica.com.br/multimedia/documentos/>.Acessoem20out.2008.
10 AMesaécoordenadapeloMinistrodaSecretaria-GeraldaPresidência,LuizDulci,tambémcontacomaparticipaçãoderepresentantesdosseguintesMinistérios:CasaCivil;MinistériodoTrabalhoeEmprego;daAgricultura,PecuáriaeAbastecimento;edoDesenvolvimentoAgrário.
11 Ver:MarcosS.JankeElioNeves.Cana-de-açúcar,entreovelhoeonovo.(27/08/2008).Disponívelem:<http://www.feraesp.org.br/>.Acessoem:17out.2008.
Os contenciosos comerciais e a agenda brasileiraJorgeFontoura*
A litigiosidadecomercial internacionaldoBrasilreveladesdelogoparticularismodeposiçãoinco-mum:nãoobstanteainsignificanteparticipaçãodopaísnovolumedocomércioglobal,somosconten-doresrecorrentestantonoSistemadeSoluçãodeControvérsiasdaOrganizaçãoMundialdoComércio(OMC),comonocontenciosoarbitraldoMercosul.Senesseúltimoespectroaposiçãoécompreen-sível,hajavistaopesoespecíficodaeconomiabrasileiravis-à-visosdemaissignatáriosdoTratadodeAssunção(1991),nocontextodosistemamulti-lateraldecomércioaposiçãobrasileirademandaconsideraçõesmultifacetadas.
Brasil
NaOMC,comodemandantesoudemandadosnosprocedimentosdesoluçãodecontrovérsias,somosoquartomaiorusuárioemnúmerosabsolutosdecasos,aoladodaÍndiaeatrásapenasdeEstadosUnidosdaAmérica(EUA),daComunidadesEuropéias(CE)1edoCanadá.Partícipesemtrintaesetecasos,estamosaoladodaÍndia,porémsomosmaispró-ativos,jáqueatuamoscomoautoresemumnúmeromaiordedemandas.ConformeinformaçõesatualizadasdaCoordenaçãoGeraldeContenciososdoMinistériodeRelaçõesExteriores(MRE),oBrasilapareceucomodemandanteoudemandadoem37casosiniciadosnaOMC,sendooprimeiroentreospaísesemdesenvolvimento2.Comodemandante,oBrasilatuouem23disputasefoidemandadoem14.Setambémconsiderarmososcasosemquefoiterceiraparte(50),oBrasiltotaliza87casosdeumtotalde380noti-ficadosàOMCdesde1995.
Emboradignadecuriosidade,talposiçãonãodevesertomadacomoparadoxal,consideradasascaracterísticasdaeconomiabrasileiradeexportação,e,logo,depotencialconflitooudelitigiosidadelatente.Diversificadaemvariadolequedecate-gorias,desdeasmaisprevisíveiscommoditiesatéprodutosindustriaisdealtovaloragregado,apautabrasileiradecomér-cioexteriorvailiteralmentedoaçoàsaeronaves.Outrofatorcausadordapeculiarposiçãodiriarespeitoàcompetitividadedasexportações,malgradoosfatorestidoscomoempecilhosamelhor inserção internacionaleacessoanovosmercados,comoainsegurançajurídicaeadecantadaineficiênciaestatallatina,geradoradeformidáveisobstáculosfísicoseentravesburocráticosaolivrecomércio.
NãohácomodeixardeconsiderarqueobrevepercursohistóricoquepermiteafirmarseroBrasilumpaísvencedornacenadocontenciosocomercialinternacionaldeve-semaisaoesforçoisoladodeinstituiçõesefuncionáriosdoqueàconcertaçãoestatalmetódicaeordenada,comqualidadeeeficiência.Tampoucoàorganizaçãosetorialdosagenteseconômicosdiretamenteenvolvidosnoscontenciosos,tantonaOMCquantonoMercosul.Aatuaçãopontualdesetores,provendomeioshábeisadarsustentaçãoàs ingentesnecessidadesdasatuaçõestécnicasemcontenciosos,aindaqueverificadasemalgunscasos,nãopodesertomadacomoregra.
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Amais importantedisputaqueseverificahojedizrespeitoàarbitragempeloartigo22.6doEntendimentoRelativoàsRegraseProcedimentosparaSoluçãodeControvérsiasdaOMC(ESC)no“casodoalgodão”,solicitadapelosEUAapósoBrasil terpedidoqueoÓrgãodeSoluçãodeControvérsiasdaOMC(OSC)autorizasseasuspensãodeconcessõesoudispusessedeoutrasliberalidadescompensatórias.Defato,oBrasilsolicitouautori-zaçãopara“retaliar”osEUAemUS$1.037bilhãoemsubsídiosacionáveis(Marketing Loan e counter-cyclical payments)eUS$3bilhõesnocasodossubsídiosproibidos,naformadegarantiasdecréditoàexportação.OsnúmerosindicadospeloBrasilem2005sãomeramenteestimativoseascifrasvindouraspoderãoserdiferentes,inclusivein pejus.ComoosEUAobjetaramessepedido,umpaineldearbitragemfoicompostocomvistasadefinirovalordascontramedidasaseremautorizadas.
Deverãotambémserdefinidasnestaarbitragemasmodalida-desdeeventuaiscontramedidasaseremimplementadas.Taiscontramedidasdão-segeralmentenomesmosetordebens,emboraoBrasiljátenhasinalizadonopedidode2005que,nocasodoalgodão,nãoconsiderapráticooueficazretaliarapenasdestaforma.PleiteiaoBrasilaautorizaçãopararetaliarempropriedadeintelectual(TRIPS,siglaeminglês)eserviços,oqueredundariaemresultadosbemmaissignificativos.ApósasautorizaçõesconcedidaspelosárbitrosparaocasoBananas (Equadorvs.CE)enocasoJogosdeAzar(AntiguaeBarbudavs.EUA)retaliaremnosetordeproprie-dadeintelectual–autorizaçõesque,naprática,nuncachegaramaseraplicadas–cabeagoraaoBrasil,provavelmentesobcritériosmaisestritosaseremimpostospelosárbitros,advogarpermissãoparaefetuar“retaliaçãocruzada”.
Iniciadocomconsultas,emsetembrode2002,oemblemáticocasoalgodão,aproxima-seagora,seisanosdepois,desuafasederradeira,quandoseverificará,finalmente,seoslongosecustososanosdecomplexolitígio,conduzidocombri-lhantismopeloItamaraty,redundarãoembenefícioconcretoaopaíseaosetorcotonicultorafetado,quersejapor(improvável)cumprimentonorte-americanomedianteeliminaçãodossubsídiosproibidosoupelaremoçãodosefeitosadversosdossubsídiosacionáveis,quersejapelaaplicaçãoderetaliação.
Outrotemadaordemdodia,porassimdizer,refere-seaoprazoparaqueoBrasilcumpraadecisãoaté17dedezembrode2008,norumorosocasodaimportaçãodepneumáticosremoldados.Talcumprimento,entretanto,dependedejulgamentoperanteoSupremoTribunalFederalsobrealegalidadedeliminaresjáconcedidas,permissivasdaimportaçãodepneususados,bemcomodenegociação,emâmbitoregional,deregimecomumparapneusnoMercosul.Casonãocumpra,asCEpoderãosolicitarautorizaçãopararetaliar,ou,deformamaisconciliatória,soli-citarumpainelparaavaliarseBrasilcumpriuounãoadecisãoemcomento.
Noqueconcerneaoutroscasosemandamento,BrasileCanadá,tradicionaiscontendoresnomacroforocomercialgenebrino,atuamdesta feita ladoa lado,contraossubsídiosagrícolasestadunidenses.Trata-sedocasoDS365,nomomentosuspensoeaindanãoretomado.
Há,ainda,outroscasosemqueoBrasilatuacomoterceiraparteequeestãonaperspectivamaisimediatadasatençõesdoMRE,comoocasoacercadaproduçãoeutilizaçãodehormônios(CEvs.EUA,CEvs.Canadá).NoemblemáticocasodasBananas,que incluidiversospaíses latino-americanosdeumladoeasComunidadesEuropéiaseACPs(paísesdaÁfrica,CaribeePacífico)
deoutro,oBrasiltambémfiguracomoterceirointeressado.OmesmoocorrenocasoChina-Autopeças,queenvolvequestõesdeinterpretaçãodosartigosIIeIIIdoGATT,bemcomoquestõesdeclassificaçãoaduaneirademercadorias.TambémenvolvendoaChina,oBrasilparticipouativamentedecontenciosoiniciadopelosEUAsobresupostasviolaçõesderegrasdoAcordodePropriedadeIntelectual(TRIPS),emtemaquepodeserimportantetambémparaopaís.Porderradeiro,masnãocommenorimportância,valereferirocasoquetemcomocontendoresEUAeCEecujoobjetodadisputasãoossubsídiosàindústriaaeronáutica(Boeingvs.Airbus)–aquitambémsomosterceirosinteressados,oquepodeterimplicaçõesdiretastambémnosnegóciosconduzidospelaEmbraer.
Quantoacasosaindavirtuais,oBrasilpreparouestudossobreapossibilidadedequestionamentodasobretarifaestadunidenseàimportaçãodeetanol.Aparentemente,continuamaserfei-tasgestõesnosníveiscomercialepolítico,demodoabuscarumadiminuiçãooueliminaçãodatarifa.EleiçõespresidenciaispróximasnosEUAcontribuemparaocompassodeesperadosinteressados,hesitantesemadotaravialitigiosadesdejáouesperaraatuaçãodopróximoresidentedaCasaBranca.Nessemesmoespectro,medidascomunitário-européiasesuíças,queimpõemcritériosambientaiselaboraisàimportaçãodeetanol,
tambémestãosendoestudadascomcurapelogovernobrasileiro.
Tudoissomostraqueaagendadecontencio-sosdoBrasilestáandandoemritmoregular,semvinculaçãodiretaouproporcional,atéagora,comasdificuldadesenfrentadasnasnegociaçõesdeDoha.Aindaécedoparadizerqueoretardonasnegociaçõesdesencadeiemaispainéis.Porumlado,pode-seesperarmaispressõesdossetoresatingidosparaqueseabrampainéisequecasosqueestavam“nagaveta”,vinculadosaosucessodarumorosaRodada(comoquestõesreferentesàalgodão,bananasezeroingemantidumping)possamserreabertos;poroutro,aexperiênciaacu-muladapeloBrasilnosúltimosanostambémremeteàcautelaeaumcuidadosoestudo
acercadaviabilidadedenovospainéis,emespecialdiantedarecalcitrânciadosEUAemcurvar-seàsdecisõesda instânciamáximadocontenciosocomercialinternacional.Sabe-seque,emboraosistemadesoluçãodecontrovérsiasdaOMCjápossaseestimarindeneacríticasquantoàsuaeficácia,éprecisosempreconsiderarocusto/benefíciodasdemandas,mercêdeseusaltoscustosedeseusresultadosdistendidosnotempo.Deformageral,acautelapresideadecisãoemir-seounãoàOMC,nãoapenasparaoBrasil,masemrelaçãoatodososdemaispartícipes.
Restaporderradeirosalientaranaturezasalutardosdiferendoscomerciais.Sópaísesamigospraticamcomércioenãoháconflitoscomerciaissemcomérciooupotencialidadecomercial.Logo,aexpressão“guerracomercial”,tãocaraaosmeiosjornalísticose,pourcause,congressuais,éformaindevidadetratar-seumadisputacomercial,pormaisárduaqueseja. Issooquepodecontaminarocaráteramistosoquedeformaordináriadeveconformarasrelaçõesinternacionais.
*JorgeFontouraédoutoremdireitointernacional,professor-titulardoInstitutoRioBranco,membro-consultordoConselhoFederalda OAB e árbitro em exercício (ICC e Arbitration Institute, Finlândia).
1 Deve-se considerar que a União Européia litiga em bloco, pelasComunidades Européias, representando as vinte e sete soberaniasque a compõe. Considera-se, porém, que superamos todos os Estadoscomunitárioseuropeuscasofossemtomadosemsuasindividualidades.
2 Os números totais de casos dos demais membros ativos no sistema desoluçãodecontrovérsiasdaOMCsão:EUA,190;CE,141;eCanadá,45.
Brasil
…aagendadeconten-ciososdoBrasilestáandandoemritmoregular,semvincu-laçãodiretaoupro-porcional,atéagora,comasdificuldades
enfrentadasnasnego-ciaçõesdeDoha.
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Brasil
O desafio da competitividade para as exportações brasileirasAposiçãodoBrasilcomoumplayerglobaleocrescenteaumentodesuainfluêncianocenáriointernacionaldevem-se,emgrandeparte,àcompetitividadedesuasexportações.Oritmodestaevolução,entretanto,temsidoinferioraoapresentadoporoutraseconomiasemergentes.Algunsdosprincipaisentravesaodesen-volvimentodacompetitividadebrasileiraforamlevantadosemrecentesestudosdirecionadosàiniciativaprivadaeàsestratégiasformuladaspelogovernoparaapromoçãodeexportações.
Asexportações têmpapelcrucialnapolíticaeconômicadoBrasil,emespecialporqueosaldocomercialpositivorepresentaumimportantefatorparaoequilíbriodabalançadepagamen-tos.Esseéumvérticeessencialdaestratégiadeestabilizaçãoempreendidapelosúltimosgovernos,comopropósitodereduziravulnerabilidadeexternadopaís.
Em2007,asexportaçõesbrasileirasalcançaramUS$160,6bilhões,oquerepresenta1,17%dototalmundial.Recentesestudos,contudo,apontamesteresultadocomoinsatisfatório,tendoemvistaotamanhodaeconomiabrasileiraeofatodeocrescimentoterarrefecidonosúltimosanos.Ogoverno,porsuavez,reconheceanecessidadedeampliarestesnúmeroseestabeleceucomometaqueoBrasilalcance1,25%dofluxodecomérciomundialaté2010.
Entreosdiversosfatoresqueinfluemnoprogressodessesíndices,umbrevemapeamentodasexportaçõesdoBrasilapontamparaelementos inerentesàscaracterísticasdapautaexportadora.Nela,ascommoditiesrespondempor65%dovolumeexportado,enquantoosprodutosmanufaturadosrepresentamos35%res-tantes.NaChinaenaÍndia,osmanufaturadoscorrespondema70%e93%dapauta,respectivamente.SegundoJoséAugustodeCastro,Vice-PresidentedaAssociaçãodeExportadoresdoBrasil,obaixovaloragregadodosprodutosbásicostornaodesempenhoexportadormaisvulnerávelàsvariaçõescambiaiseàfixaçãodopreçorealizadapelomercadointernacional.Oelevadopreçodascommoditiesnosúltimosanostêmcontribuídoparaminoraressasensaçãodevulnerabilidade,masarecentetendênciadeinver-sãodessequadro,decorrentedaatualcrisefinanceira,provocaapreensõesquantoaodesempenhonofuturopróximo.
Oimpactodesseseoutrosentravesàcompetitividadedasexpor-taçõesbrasileirasforamanalisadosemdoisrecentesestudos,umdeiniciativadoCentrodeExcelênciaemLogísticaeCadeiasdeAbastecimento(GVcelog)daFundaçãoGetúlioVargaseoutrodaConfederaçãoNacionaldaIndústria(CNI)1.Ambosestudosidenti-ficamcomoasempresasexportadoraspercebemosgargalosqueprejudicamacompetitividadedeseusprodutos,comaferiçãoderesultadoscoincidentesemdiversospontos.Poroutrolado,oestudodogovernoqueresultounapublicaçãodaEstratégiaBrasileiradeExportação2008-2010temescopomaisamplo.AlémdosproblemasedabuscadesoluçõesjáidentificadospeloGVcelogepelaCNI,odocumentoestabeleceumaestratégiaparacotejaraspolíticaspúblicasdeincentivoàexportaçãocomaPolíticadeDesenvolvimentoProdutivo(PDP),cujoespectromaisamplopropõeumplanejamentodesustentabilidadedocrescimentonolongoprazoeaampliaçãodainserçãointernacionaldopaís.
A visão do setor privadoTaisforambaseadosnacompilaçãodedadosobtidosapartirdequestionáriosenviadosaempresasregistradasnoCatálogodeExportadoresBrasileiros2.Operfildasempresasanalisadasmos-trouumaconcentraçãodeempresasdemédioegrandeporte,principalmentequandorelacionadasaodadodeparticipaçãonasexportações(asgrandesempresasrespondempor71%dovalorexportadonapesquisadaCNI).Noquetocaaosetordeatuação,
oestudodoGVcelogapontaqueamaiorpartedasempresaspertenceàindústriadetransformação,aopassoemqueotra-balhodaCNIdestacaparticipaçãodossegmentosdealimentosebebidas,máquinaseequipamentosecomércioemgeral.
Osprincipaisentravesougargalosàcompetitividaderelacionadospelosexportadorespodemseragrupadosemseisgrandestópicos:(i)macroeconômicos;(ii) infra-estrutura:(iii)burocracia;(iv)custosdelogísticaetransportes;(v)acessoafinanciamentosparaexportação;e(vi)entravestributários.
Osmaisaltoscoeficientesdecrítica , segundooestudodoGVcelog,foramatribuídosaosgargalosrelacionadosàfaltadeincentivosgovernamentais,tributaçãoeinfra-estrutura.Dentreosligadosaincentivos,osgargalosconsideradosmaiscríticosforamataxadejurosea inabilidadedogovernoemvencerbarreirasdeexportação.
ApesquisaelaboradapelaCNI,porsuavez,apontouataxadecâmbiocomooprincipalobstáculoaocrescimentodasexporta-ções,identificadocomoumentravepor82%dasempresas.Emseguidaaparecemoscustosportuárioseaeroportuários,seguidospelaburocraciaalfandegária.
Entreassoluçõessugeridaspelosdoisestudos,destacam-seosinvestimentoseminfra-estrutura,asimplificaçãodosprocedi-mentosaduaneiroseumareformatributáriaquedesonereaproduçãoeaexportação.
Apesardeascríticasseremdirecionadasàesferadeatuaçãogovernamental,osdoisestudosapontamparaobaixoníveldeconhecimento,porpartedosetorempresarial,dasiniciativasestataiscriadasparalidarcomosproblemasapresentados.Muitasempresasnãodemonstraraminteressealgumemfazerusodosprogramasebenefíciosexistentes.Nestecontexto,destaca-seosetoragropecuário,segundooestudodaCNI.
A abordagem do governoAotrataraquestãodacompetitividadedasempresasbrasileiras,ogovernoassumesuaresponsabilidadeemcriarumambientecomcondiçõesfavoráveisparaqueasempresasaquiinstaladasproduzamcomeficiência,oqueserefleteemvantagenscom-parativastantoparaomercadointernoquantoparaoexterno.Combasenessapremissa,asaçõespúblicasvoltadasaoincre-mentodacompetitividadeinserem-senaPDP,quebuscaumviéssistêmicoemultifocadodeorientaçãoparaodesenvolvimentoeconômicosustentável.
AchamadaEstratégiaBrasileiradeExportação2008-2010(EBE),documentoproduzidopeloMinistériodoDesenvolvimento,IndústriaeComércioExterior,resumeoplanejamentodogovernodirecionadoàpromoçãodasexportações.Talplanejamentoincluiaampliaçãodacompetitividadeinternacionaldasempresasbrasileirascomoumdosrequisitosessenciaisparaasseguraracontinuidadedocrescimentoeconômico.Nessesentido,apropostacomportaareduçãodoscustosburocráticosedefinanciamentoeoapri-moramentoda infra-estruturadoméstica,gargalosapontadospelosetorprivadocomofortesobstáculosaodesenvolvimentodaatividadeexportadora.
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Pontes
PONTES tem por fim reforçara capacidade dos agentes naárea de comércio internacionale desenvolvimento sustentável,por meio da disponibilização deinformaçõeseanálises relevantespara uma reflexão mais aprofun-dadasobreessestemas.Étambémum instrumento de comunicaçãoe de geração de idéias quepretendeinfluenciartodosaquelesenvolvidos nos processos deformulaçãodepolíticaspúblicasedeestratégiasparaasnegociaçõesinternacionais.
PONTESfoipublicadopeloCentroInternacional para o Comércio eo Desenvolvimento Sustentável(ICTSD) e pela Escola de DireitodeSãoPaulodaFundaçãoGetulioVargas(DireitoGV).
Comitê EditorialMaximilianoChabMichelleRattonSanchez
EditorasMônicaSteffenGuiseRosinaAdrianaVerdier
EquipeManuelaTrindadeVianaDanielaHelenaOliveiraGodoyLeonardoMargonatoRibeiroLima
ICTSDDiretorexecutivo:RicardoMeléndez-Ortiz7,chemindeBalexert1219,Genebra,Suíç[email protected]
DireitoGVDiretorGeral: AryOswaldoMattosFilhoRuaRocha,233-8°andar BelaVista01330-000,SãoPaulo-SP,[email protected]
As opiniões expressadas nosartigos assinados em PONTES sãoexclusivamente dos autores enão refletem necessariamente asopiniões do ICTSD, da DireitoGVou das instituições por elesrepresentadas.
AcadaumdessesdesafioscorrespondeumconjuntodeaçõescomoaEstratégiaNacionaldeSimplificaçãodoComércioExterior(comfocoemprocedimentos)eaConsolidaçãodasNormasdeComércioExterior(cujoescopoéreduziracomplexidadedoambientejurídicoeinstitucionaldocomércioexterior).Entreasaçõesvoltadasàfacilitaçãodaobtençãodecréditoparaaexportação,destaca-seaatuaçãodoBancoNacionaldeDesenvolvimentoEconômicoeSocial(BNDES),pormeiodosprogramasquevisamfacilitaroacessoaocrédito,comooExim-PréEmbarqueeoExim-PósEmbarque,cujosdesembolsossomaramR$4,2bilhõesem2007eR$3,4bilhõesatéagostode2008.
Contudo,alémdosesforçosdirecionadosaoaumentodacompetitividade,aEBEdefineoutrosquatromacro-objetivosqueseinseremnasmetasdaPDP:(i)agregarvaloràsexportações;(ii)aumentarabaseexportadora;(iii)ampliaroacessoamercados;e(iv)incrementarasexportaçõesdeserviços.
AdefiniçãodosobjetivosdaEBEelencaumagamadeaçõesmaisdiversificadadoqueaspropostas,poisapesardeconvergirnoplanejamentorelativoàcompetitividadecommuitasdaspreocupaçõeslevantadaspelosetorprivado,vaialémaoestabeleceroutrasmetas.Emboraalgumasdessasesferasnãosejampercebidaspelosetorprivadocomamesmaintensidade,seuimpactoparaodesempenhodocomércioexteriorbrasileironãopodeserdesmerecido.
O exemplo de outros PEDsHistoricamente,ospaísesemdesenvolvimento(PEDs)possuemcompetitividadeexpor-tadorarelativamenteinferioràdospaísesdesenvolvidos(PDs).ApesardediversosPEDsgozaremdeacessopreferencialamercadosdePDs,garantidoporacordosinternacionais,acrescenteliberalizaçãomultilateral,apontaparamaiorespressõesparaqueosPEDselevemsuacompetitividade.
AlgunsPEDsjásedestacamnocomércioexteriorpelaaltacompetitividadedesuasexpor-tações,oquedespertaposturasprotecionistas,principalmenteporpartedePDs.Doisexemplossãointeressantesparaocasobrasileiro:ChinaeÍndia.AChina,paísíconedaseconomiasemergentes,optouporumaestratégiaqueincluioaumentosignificativodeinvestimentosemcapitalfixo,quepassaramde31,6%doProdutoInternoBruto(PIB)em1997para40,8%em2006.TambémoinvestimentoemPesquisaeDesenvolvimento(P&D)saltoude0,64%para1,42%doseuPIBnomesmoperíodo.Aparceladeexportaçõesdealtatecnologianasuapautadeexportaçõessubiude12,7%para30,3%3.AÍndia,porsuavez,mostra-seumbomexemplonoavançodaexportaçãodeserviços.Osuperávitnabalançadeserviçostecnológicosdessepaísrepresentou3,1%doseuPIBem2006.
ApesardeChinaeÍndiaaindanãoseclassificarementreomaiscompetitivosdomundo,osdoispaíses,quepossuemrendasimilaràdoBrasil,encontram-seentreosquemaisganharamcompetitividadeentre1997e2006.IssopõeemevidênciaadefasagemdoritmodeganhodecompetitividadedoBrasil,mesmoemrelaçãoaessaseconomiasemergentes.ChinaeÍndiajáavançaramemmetasestabelecidaspeloBrasil,comooaumentodovaloragregadodasexportaçõeseadiversificaçãodapautaexportadora,bemcomooincrementodaexportaçãodeserviços.
Odesempenhoexportadorbrasileiroaindaseencontrafortementeatreladoàscommodities,cujabalançacontinuacrescendoemrelaçãoaosdemaispaíses.Contudo,abalançademanufaturasapresentamelhorabemmaistímida,muitoaquémdospaísesderendasimilar,cujamédiasubiude1,1%doPIBpara5,4%nosúltimosnoveanos–noBrasilacategoriarespondeuapenaspor0,2%doPIBem2006.
OBrasilpodeextrairimportantesliçõesdomodeloimplementadoporChinaeÍndiaparapromoverasexportaçõeseampliarsuainserçãoeinfluênciainternacionais.Aobservaçãodeseudesempenhotambémserveparamostrarque,paraqueumpaíscresçaemcompe-titividadeexportadora,umdesempenhopositivopontualnãoésuficiente.Ospaísesquemaiscresceramnosúltimosanossãoosquetêmservidocomoreferencialdemodelodedesenvolvimentocompetitivo.
Aspectosmacroeconômicos,infra-estruturadeficiente,excessodeburocracia,desproporcio-nalidadedacargatributária,ausênciadeincentivos,dificuldadesdeacessoacrédito,entreoutros,sãoproblemasqueoBrasilprecisaenfrentarcomurgênciacasodesejetornar-sedefatomaiscompetitivo.Osgargalosidentificadospelosetorprivadonãosão,entretanto,osúnicosdesafiosaseremenfrentadosparaqueopaísretomeoritmodemelhoradesuacompetitividade.OsdemaisobjetivostraçadoscomopartedaPDP,jámaisavançadosporoutrospaísesderendasimilar,mostram-seigualmenteprementes,senãomais.
1 CNI - “Os problemas da empresa exportadora brasileira”; GVcelog – “Competitividade Brasileira nasExportações”.Ambososestudosforampublicadosnosegundosemestrede2008.
2 O CatálogoNacional de Exportadores, contém registro de 10.245 empresas, que responderampor 90%das exportações brasileiras entre 2004 e 2005.As amostras dos estudos, porém, forammenores: 258questionáriosanalisadospelaGVceloge855pelaCNI.
3 Dados do Índice FIESP de Competitividade das Nações divulgado em outubro de 2008. No estudo, asvariáveisdeterminantesdacompetitividadedospaísessãoagrupadasemoitofatores:EconomiaDoméstica,Abertura,Governo,Capital,Infra-estrutura,Tecnologia,GestãoEmpresarialeCapitalHumano.
NOVEMBRO10 CEPAL–SeminárioInfra-estrutura2020:Avanços,Déficits
eDesafios,Santiago,Chile
11-13 ReuniãoMercosul–Turquia,Ancara,Turquia
CVCCM–ReuniãoOrdináriadaComissãodeComérciodoMercosul,Montevidéu,Uruguai
12 Lançamentodapublicação“WorldEnergyOutlook”,elaboradoporOCDEeAgênciaInternacionaldeEnergia,Londres,ReinoUnido
CEPAL–ReuniãodaComissãodasNaçõesUnidassobreCiênciaeTecnologiaparaoDesenvolvimento,Santiago,Chile
IVReuniãodoComitêConsultivodoProjetodeCooperaçãoMercosul-UniãoEuropéia,Brasília,Brasil
13 UNCTAD – XLV Reunião da Direção de Comércio eDesenvolvimento,Genebra,Suíça
13-14 Mercosul–GrupodeAltoNívelparaReformaInstitucional(GANRI),Brasília,Brasil
17 OMC–ReuniãodoÓrgãodeSoluçãodeControvérsias
17-19 XVIIReuniãodoGrupoAdHocdeEspecialistasdoFOCEM,Montevidéu,Uruguai
18-19 Inovaçãoedesenvolvimentosustentávelnomundogloba-lizado,conferênciaconjuntadeOCDEeBancoMundial,Paris,França
24-25 LVReuniãoOrdináriadoForodeConsultaeConcertaçãoPolítica(FCCP),Brasília,Brasil
24-26 Fórum intergovernamental sobremineração,metaisedesenvolvimentosustentável,Genebra,Suíça
26-28 LXXIVGMC -ReuniãoOrdináriadoGrupodoMercadoComum,Brasília,Brasil
DEZEMBRO1 OMC – Reunião do Comitê sobre comércio de serviços
financeiros,Genebra,Suíça
1-12 ConferênciadasNaçõesUnidassobreaMudançaClimática(COP14),Poznan,Polônia
2-3 Mesa redonda latino-americana sobre governançacorporativa,CidadedoMéxico,México
IV Reunião Ordinária do Grupo de MonitoramentoMacroeconômico do Mercosul (GMM), Rio de Janeiro,Brasil
4 OMC – Reunião do Comitê sobre Agricultura, Genebra,Suíça
5-8 OMC–ReuniãodoConselhosobreComérciodeServiços,Genebra,Suíça
6-16 CúpuladoMercosul,Salvador,Brasil
13 Mercosul-IVReuniãodosCoordenadoresNacionaisdoForoConsultivodeMunicípios,EstadosFederados,ProvínciaseDepartamentos(FCCR),Salvador,Brasil
15 XXXVIReuniãodoConselhodoMercadoComum,Salvador,Brasil
22 OMC–ReuniãodoÓrgãodeSoluçãodeControvérsias
EVENTOS PUBLICAÇÕES
The Political Economy of Hemispheric Integration: Responding to Globalization in the Americas. Ancochea, Diego Sánchez &Shadlen,KennethC.PalgraveMacmillan,2008.
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Emprego, Desenvolvimento Humano e Trabalho Decente: A Experiência Brasileira Recente. CEPAL, OIT, PNUD. Set.2008. Disponível em: <http://www.eclac.cl/brasil/noticias/noticias/3/34013/EmpregoDesenvHumanoTrabDecente.pdf>.
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The crisis of a century. UNCTAD. 22 set. 2008. Disponível em:<http://www.unctad.org/en/docs/presspb20083_en.pdf>.
The effects of anti-competitive business practices on developing countries and their development prospects. UNCTAD.7out.2008.Disponível em: <http://www.unctad.org/en/docs/ditcclp20082_en.pdf>.
O regionalismo pós-liberal na América do Sul: origens, iniciativas e dilemas. VEIGA, Pedro da Motta & Rios, Sandra P.BrevesCINDESNo. 10 (Ago. 2008).Disponível em: <http://www.cindesbrasil.org/index.php?option=com_docman&task=cat_view&gid=57&Itemid=47&lang=8>.
Implications for Brazil of the July 2008 Draft Agricultural Modalities. Nassar,A, Cabral da Costa, C, and Chiodi, L (2008).International Centre for Trade and Sustainable Development,Geneva,Switzerland.
www.ictsd.org/news/pontes/ewww.direitogv.com.br20
PontesENTRE O COMÉRCIO E O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL