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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO KUN YOUNG YU ANÁLISE DA BIOÉTICA NA CORÉIA MESTRADO EM DIREITO São Paulo 2010

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO … · 1. o desenvolvimento da biotecnologia na corÉia do sul 1.1. os ... anÁlise da lei de bioÉtica e biosseguranÇa coreana 4.1. da

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

KUN YOUNG YU

ANÁLISE DA BIOÉTICA NA CORÉIA

MESTRADO EM DIREITO

São Paulo

2010

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

KUN YOUNG YU

ANÁLISE DA BIOÉTICA NA CORÉIA

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à banca Examinadora da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como

exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em

Direito, sob a orientação da Prof. Maria Celeste

Cordeiro Leite dos Santos.

São Paulo

2010

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BANCA EXAMINADORA

_________________________________

Examinador 1

_________________________________

Examinador 2

_________________________________

Examinador 3

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Dedico este trabalho à memória do meu falecido pai.

Dedico também às minhas irmãs e mãe pelo apóio e compreensão.

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Agradeço a Deus pela oportunidade de realizar este

estudo quando não tinha oportunidade nem condição

financeira e de saúde para tal.

Agradeço à Maria Kim, tradutora de língua coreana,

pela ajuda com os textos em língua coreana.

Agradeço à querida Professora Maria Celeste pela

paciência e por acreditar em mim até o fim.

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Resumo A presente pesquisa tem por objetivo analisar a bioética coreana através da análise dos elementos históricos, sociais, culturais e filosóficos do país para entender como tais elementos influíram na constituição da bioética naquele país. Inicia-se o trabalho através do estudo do escândalo protagonizado pelo maior cientista do país na área, o Professor Hwang Woo Suk, e analisando a implicação social e política de tal evento, aprendemos sobre os valores que nortearam a bioética local, que são o pragmatismo e o seu forte apelo social. Veremos como esta ciência foi habilmente manuseada para fins propagandísticos pelo governo local, ao atribuir caráter patriótico ao seu desenvolvimento e a cumplicidade com que toda uma nação abraçou este “projeto nacional” sob o qual depositaram anseios muito além dos benefícios médicos que se propunha alcançar inicialmente. Na análise dos fatores que participaram na formação desta bioética singular analisaremos a vinculação das pesquisas bioéticas aos planos econômicos do governo, a influência de vários elementos sociais e filosóficos como o hedonismo cultural, a filosofia local de cunho pragmática e empírica, o Silhak, a influência econômica das pesquisas pelo capitalismo comunitário praticado no país, e o apelo patriótico atribuído ao mesmo pelos fatores históricos e princípios como o Darwinismo Social. A análise dos elementos mencionados acima ajuda a entender como um país tão avançado nas pesquisas na área de biotecnologia, possui uma bioética tão fraca em conteúdo ético, que em última análise foi a responsável pela eclosão da fraude nas pesquisas de clonagem de células-tronco. Palavras-chave: Bioética, células-tronco, Hwang Woo Sook, Coréia do Sul, Confucionismo, Utilitarismo, Silhak, Darwinismo social, Capitalismo comunitário, Declaração de Helsinke.

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ABSTRACT

The present research aims at analyzing the Korean bioethics through the analysis of the historical, social, cultural and philosophical elements of the country to understand how such elements influenced in the constitution of bioethics in that country.

The work is started through the study of scandal perpetrated by the major scientist of the country in the area, Professor Hwang Woo Suk, and by analyzing the social and political impact of such event we learnt about the values that guided the local bioethics, which are pragmatism and its strong social appeal.

We will see how this science was skillfully handled for propagandistic purposes by the local government, upon attribution of a patriotic character to its development and the complicity with which an entire nation embraced this "national project" under which they placed expectations much beyond the medical benefits initially targeted.

In the analysis of the factors that participated in the formation of this unique bioethics, we will analyze the association of the bioethical researches to the economic plans of the government, the influence of the several social and philosophical elements such as cultural hedonism, the local culture of pragmatic and empiric nature, the Silhak, the economic influence of the research for the community capitalism practiced in the country, and the patriotic appeal attributed thereto by the historical factors and principles such as Social Darwinism.

The analysis of the aforementioned elements helps us to understand how a country so advanced in the researches on the biotechnology area, has a bioethics that is so weak in ethical content, that in last analysis it was responsible for the outbreak of the fraud in the stem cells cloning research.

Keywords: Bioethics, stem cells, Hwang Woo Sook, South Korea, Confucianism, Utilitarism, Silhak, Social Darwinism, Community Capitalism, Declaration of Helsinki.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 11

1. O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA NA CORÉIA DO

SUL

1.1. Os planos econômicos do governo e o progresso científico do país 16

1.2. O investimento em biotecnologia 18

1.3. Da análise do desenvolvimento científico da Coréia 21

2. O ESCÂNDALO HWANG WOO SUK

2.1. O sucesso de Hwang na biotecnologia 23

2.2. O escândalo ético de Hwang nas pesquisas genéticas 27

2.3. A repercussão política e social do escândalo 31

2.4. Sobre a violação da Lei de Bioética e da Declaração de Helsinque 34

3. A ANÁLISE DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA E POLÍTICA DA

BIOÉTICA NA COREIA

3.1. O surgimento dos comitês éticos 42

3.2. A criação da lei de bioética e biossegurança da coréia 47

3.2.1. Cronograma da elaboração das leis de bioética na Coreia 48

4. ANÁLISE DA LEI DE BIOÉTICA E BIOSSEGURANÇA COREANA

4.1. Da visão geral da lei 54

4.2. Do Comitê Nacional de Bioética e das “Institutional Review

Boards”

58

4.3. Das pesquisas embrionárias e das instituições de produção e

pesquisa de embriões

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4.4. Das instituições médicas de produção de embriões 62

4.5. Das instituições médicas de pesquisa de embriões 63

4.6. Das instituições de produção e pesquisa de clones de embriões de

células somáticas

64

4.7. Das pesquisas de DNA 65

4.8. Da proteção e uso das informações genéticas 68

4.9. Das terapias genéticas 71

4.10. Da fiscalização e controle das pesquisas 72

4.11. Normas suplementares 74

4.12. Das cláusulas penais 75

4.13. Disposições gerais 80

5. ANÁLISE CONCEITUAL DA BIOÉTICA COREANA

5.1. Visão geral 82

5.2. Da descontinuidade do pensamento ou “filosofia” coreana 85

5.3. Do hedonismo e da felicidade terrena 87

5.4. A filosofia do Silhak e o pragmatismo coreano 89

5.5. O capitalismo comunitário 96

5.6. O darwinismo social 100

5.7. O cristianismo na Coréia 104

6. A BIOÉTICA NO ORENTE

6.1. Princípios da filosofia Confucionista 107

6.2. Traços gerais da bioética na Ásia 110

6.3. Da visão utilitarista da bioética na Ásia 114

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7. EVOLUÇÃO DA ÉTICA MÉDICA NO LESTE ASIÁTICO

7.1. História ética dos profissionais da saúde 119

7.2. A ética dos profissionais do ocidente 119

7.3. A ética dos profissionais da saúde do leste asiático 121

8. A EVOLUÇÃO DA PROFISSÃO MÉDICA NA COREIA 125

9. CONCLUSÃO 135

10. ANEXO 138

11. BIBLIOGRAFIA 166

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INTRODUÇÃO

Biotecnologia é um termo cunhado no século passado para tratar do avanço da

medicina através da aplicação de grandes descobertas tecnológicas e científicas no tratamento

da saúde do homem.

Diz Guy1 que a biotecnologia, através da aplicação dos avanços da ciência, trouxe

soluções ao homem que melhoraram e prolongaram a sua vida, contudo tais soluções criaram

novos problemas inexistentes até então, nunca antes enfrentados pelo homem. São exemplos

de tais problemas questões como eutanásia, eugenia, manipulação genética, bebês de provetas,

discriminação genética e racial, a experimentação de remédios em humanos, clonagem, entre

outros2.

Assim, com o desenvolvimento da medicina, a sociedade passou a conviver com o

medo da manipulação antiética da biotecnologia, seja na aplicação física no ser humano, seja

na sua utilização econômica e social, mas principalmente na possibilidade de permitir ao ser

humano “brincar de Deus”, fazendo uso dos avanços da genética para usos vis e maléficos,

conforme as várias possibilidades vislumbradas atrás3.

Diz Freud4 que o ser humano nunca aceitou bem a limitação de uma vida mortal,

frustrando-se com a restrição imposta pela sua natureza transitória, vindo a buscar

subterfúgios para burlar a sua limitação de uma forma ou de outra, assim diz que desde cedo

criou deuses imaginários aos quais atribuía capacidades supra-humanas, espelhando neles os

seus sonhos de imortalidade e felicidade.

1 Guy DURAND, Introdução geral à Bioética, p. 28 2 Ibid., p. 28 e seg., p. 40 e seg. 3 Eduardo de Oliveira LEITE, O direito, a ciência e as leis bioéticas. Biodireito Ciência da vida, os novos desafios. Organizadora Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2001. Pg.107 4 Sigmund FREUD, O mal esta da civilização, pg. 25

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Hoje, com os avanços da ciência, o homem se tornou um “Deus de Prótese”5 tendo

conseguido chegar mais perto de seu ideal, seja aumentando a expectativa de sua vida, seja

melhorando a qualidade com que a desfruta, satisfazendo assim em parte os seus anseios de

transcender a sua mortalidade e as limitações a que a transitoriedade o sujeitou.

Para o grande mestre da psicanálise a motivação de todos os atos do homem origina-se

no ato da busca da felicidade, contudo diz que apesar de todos os avanços e conquistas, tal

fato não aumentou o prazer do homem6, pois afirma que a felicidade do homem é subjetiva,

ou seja, variável, não havendo uma definição definitiva a respeito do que em última análise

pode trazer a completa e verdadeira felicidade7.

Uma visão religiosa sobre o assunto também vê o problema da biotecnologia ligada

diretamente com a busca da felicidade e o prazer. Segundo afirma Christian8 com o tempo o

conceito de felicidade mudou, pois antigamente a felicidade estava relacionada com

elementos imateriais ou ainda em elementos pós-vida como a busca do paraíso, mas com a

modernização, a felicidade passou a ter um caráter mais imediato e materialista.

Agora o homem busca a felicidade não no além ou em valores morais e⁄ou religiosos,

mas na própria terra e nesta vida, ou ainda no seu corpo e não mais na próxima vida ou na sua

espiritualidade. O culto ao espírito e à alma mudou para o culto ao corpo e à vaidade.

Para remediar esta crise de valores muito tem sido discutido a respeito de uma ética

universal a este respeito, e a bioética, neste contexto, tem sido provocada de forma incessante,

seja nos meios acadêmicos, seja nos meio políticos e sociais em geral, contudo até a presente

data não foi possível chegar a uma ética verdadeiramente única, que pudesse abordar todas as

particularidades da complexa natureza humana de forma satisfatória.

5 Ibid., pg.44 6 Ibid., pg. 39 7 Ibid., pg.33 8 Christian de Paul de BARCHIFONTAINE e Leo PESSINI. Bioética – Alguns desafios. Edições Loyola.2002. pg. 116 e seg.

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Na busca de um entendimento comum, muitas fórmulas tem sido propostas, mas a

grande diversidade de pensamentos e valores presentes na sociedade tem sido o obstáculo

para o sucesso de tal empreitada.

Frustrado com o fracasso de se determinar uma ética singular para toda a sociedade,

Enghelhardt lembra que o ocidente tem buscado definir uma ética universal através do uso da

razão, contudo o autor faz crítica a tal empreitada, pois diz que este não tem a capacidade de

entender a grande complexidade que o assunto envolve9.

Segundo este autor o ocidente sempre buscou unificar o conhecimento humano ao

longo da história. Inicialmente conseguiu isso com a imposição do pensamento cristão como

base de todo o conhecimento ocidental até a Idade Média, mas com o enfraquecimento do

cristianismo e o seu poder de influência com o advento do racionalismo e empirismo através

do iluminismo, o sonho de unificar o pensamento ocidental através do cristianismo

fracassou10.

Com o iluminismo tentou-se substituir o pensamento cristão pelo pensamento racional,

contudo devido à diversidade do pensamento racional a pretendida unificação do pensamento

ocidental continuou distante11. O que hoje existe é a coexistência de diversos pensamentos

racionais que se conflitam mutuamente, comprometendo o desejo de se alcançar um

entendimento único e definitivo sobre o pensamento humano.

Christian concorda com Enghelardt de que a razão foi incapaz de harmonizar a

diversidade intelectual da humanidade, apontando ainda que alguns pensadores duvidam que

a religião também possa fazer o mesmo, criando uma ordem à ética universal12.

9 Engelhartd Jr, H. Tristram. Fundamentos da Bioética. Edições Loyola. 1998. Pg.34 10 Ibid., Pg.24 11 Ibid., Pg.29 12 Christian de Paul de BARCHIFONTAINE e Leo PESSINI. Bioética – Alguns desafios. Edições Loyola.2002. pg. 93.

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Contudo, enquanto continua a discussão por uma ética universal aceitável por todos, a

medicina continua avançando dia a dia, criando novas realidades que desafiam os arcabouços

legais da sociedade, exigindo das autoridades uma postura rápida e efetiva para adaptar as leis

às novas realidades que a ciência traz às nossas vidas13.

Nestes termos, está correta a observação que afirma que não é a ética que está atrasada

em relação à ciência, mas são os cientistas que tentam praticá-la em um contexto no qual as

leis não foram estabelecidas14, referindo-se indiretamente aos interesses sociais e corporativos

que promovem e sustentam o avanço rápido e sistemático da ciência, para atender interesses

que na maioria das vezes pouco priorizam os interesses sociais.

Assim, estão certos todos aqueles que desde a gênese da biotecnologia, tem apregoado

dos males que ela pode causar, apesar de suas vantagens, e exigido desde então a adoção de

medidas preventivas para possíveis malefícios que esta pode causar ao homem.

A bioética, neste contexto, tem o papel decisivo de fixar os limites legais e morais para

a prática segura e ética da biotecnologia no mundo em que vivemos.

A Coréia do Sul é hoje uma dos países mais avançados do mundo na área de

biotecnologia, tendo alcançado descobertas significativas que a destacaram no cenário

científico internacional neste ramo. Contudo os louros alcançados por anos de esforço e

pesados investimentos foram comprometidos pelo episódio protagonizado por seu maior

cientista na área, o Dr. Hwang Woo Suk.

Como já foi devidamente noticiado pelo mundo, o Dr. Hwang protagonizou uma das

maiores fraudes na história da ciência, ao admitir falsamente perante a comunidade

internacional, que havia conseguido realizar a clonagem de células tronco de 11 pacientes,

13 Eduardo de Oliveira LEITE. O direito, a ciência e as leis bioéticas. Biodireito Ciência da vida, os novos desafios. Organizadora Maria Celeste Cordeiro Leite dos Santos. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais. 2001. Pg.104 14 Maria Celeste Cordeiro dos SANTOS. O equilíbrio do pêndulo. A bioética e a lei. Implicações médico-leais. Ícone Editora. 1998. Pg.26

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vindo posteriormente a ser desmascarado nos feitos, além de ter cometido conduta antiética na

coleta dos óvulos utilizados nas suas pesquisas.

O episódio serviu de alerta para o mundo, pois era a primeira vez que um escândalo

ético de tamanha proporção acontecia, e embora não fosse o pior dos crimes bioéticos em

potencial, era um grande indício de que os temores quanto a condutas antiéticas poderiam se

tornar realidade, se a sociedade não tomasse as medidas preventivas necessárias.

Mesmo após a eclosão do triste evento, o ocidente ainda pouco conhece do

desenvolvimento da biotecnologia coreana, adquirindo o pouco que sabe nas informações

esparsas da mídia. Contudo, afastado dos países do ocidente, a Coréia do Sul vem

desenvolvendo a sua tecnologia na área biotecnológica baseado em princípios próprios,

embebidos de valores e tradições locais, que ao formar uma bioética singular, foi capaz de

permitir uma atmosfera social e política propícia ao surgimento de eventos da natureza do

praticado pelo Dr. Hwang.

Neste contexto, a experiência vivida por este país tem valiosas lições a dar ao mundo,

devendo ser analisada e estudada para servir de subsídio material às intermináveis discussões

bioética que ainda acontecem, até mesmo aqui no Brasil.

Para podermos nos aprofundar no estudo da bioética coreana e com isso cumprir com

o escopo deste estudo, precisamos analisar profundamente o contexto histórico-cultural,

econômico-social, ético-religioso e filosófico do país, que contribuíram para a formação desta

bioética particular.

Assim, iniciemos o estudo da experiência coreana com a abordagem histórica do

desenvolvimento da pesquisa biotecnológica no país, através da análise da política de

desenvolvimento da ciência e biotecnologia do país, e o escândalo protagonizado pelo

cientista Hwan Woo Suk, interpretando-as posteriormente sob o contexto histórico, social, e

principalmente filosófico do país.

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1. O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA NA CORÉIA DO SUL

1.1. Os planos econômicos do governo e o progresso científico do país

O desenvolvimento da biotecnologia na Coréia do Sul deve-se fundamentalmente aos

planos governamentais de desenvolvimento econômico, que tirou o país do estado de miséria

que o acometia desde o fim da guerra da Coréia em 1953.

De fato, até a adoção dos primeiros planos qüinqüenais na década de 60, a Coréia do

Sul havia passado da situação de colônia japonesa, de 1908 a 1945, a um país em guerra até

1953, quando terminou a Guerra da Coréia, o que o colocou no mesmo nível de

desenvolvimento dos países mais pobres do continente africano15.

Como forma de reverter a situação de pobreza, o recém constituído governo ditatorial

do general Park Chung Hee (1961), visionou a criação de diversos planos estratégicos de fim

econômico, que tinham por fim realizar investimentos concentrados em áreas específicas da

economia, para o fim de habilitá-la para o desejado desenvolvimento econômico.

Assim, os primeiros planos qüinqüenais criados pelo governo (assim chamados por

compreenderem períodos de planejamento de 5 anos cada um) dos anos 50 e 60 focaram na

criação de indústrias de manufatura leve e de uso intensivo de mão-de-obra; nos anos 70 e 80

foi investido esforço na criação e fortalecimento da indústria pesada e química, e nos anos 90

em setores da economia de maior conteúdo tecnológico e de alta especialização16.

O investimento governamental nas áreas de tecnologia e pesquisa científica avançada

inicia-se com destaque a partir dos planos econômicos da década de 80, com a criação do

Programa Nacional de P&D, com ênfase no desenvolvimento de tecnologias de chave,

consideradas essenciais para habilitar as empresas coreanas a gerar conhecimento tecnológico

suficiente para se manterem competitivas no novo cenário da economia mundial. Desta forma

15 Byung Nak SONG. The rise of the korean economy, Third edition. Oxford university press. 2003. PG53 16 Renato BAUMANN. Coréia: Uma opção pelo mercado externo. IPRI (Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais). 2000. PG.4

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passa a investir em tecnologia nas áreas de eletroeletrônica, química industrial, construção

naval, informática e biotecnologia, entre outros.

O importante a se notar nos planos econômicos implementados pelo governo coreano

é que os investimentos na área de ciência e tecnologia realizados até hoje, nunca objetivaram

alcançar fins exclusivamente acadêmicos, mas principalmente econômicos, vindo a servir de

meio de avanço e desenvolvimento do parque industrial do país, ou seja, servir de meio para

capacitar as empresas e a mão-de-obra coreana, com conhecimento tecnológico suficiente

para se tornarem competitivas no cenário econômico internacional.

Tal iniciativa procurou substituir a filosofia do “lerning by doing” praticado até então,

através do qual procurava criar o conhecimento científico através da cópia de know-how

industrial importado do exterior, pela nova filosofia do “learning by research” dos anos 80,

através do qual o conhecimento industrial seria alcançado não mais pela mera imitação, mas

pela pesquisa e desenvolvimento de tecnologia própria17.

Assim, entre os vários projetos realizados, os planos quinquenais do país adotaram

medidas estratégicas na área da pesquisa e da ciência como a criação do ministério da ciência

e tecnologia em 1962, a criação de leis promoção da ciência, capacitação e educação de

técnicos e engenheiros do país e criação de institutos de pesquisa financiados pelo governo,

entre outros18.

O esforço de aumentar a qualidade da pesquisa científica no país contou também com

a criação de outros quatro grandes projetos nacionais19:

17 Helio G. BARROS. Política científica na Coréia: evolução da máxima tecnologia contida na educação à máxima ciência contida o conhecimento. IPRI (Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais). 2000. Pg,4. 18 Ruy de Araújo CALDAS. O setor e a política de biotecnologia na Coréia. IPRI (Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais). 2000. pg.2,3 19 Ibid., Pg.14

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a) Projeto HAN (Highly Advanced National Project) – Criado em 1992 promoveu a

listagem das tecnologias chaves a serem desenvolvidas pelo país para a prosperidade do seu

futuro (dentre os quais a Biotecnologia);

b) Projeto CRI (Criative Research Initiative) – Procurou incentivar o avanço da

pesquisa em dois níveis: Ciência fundamental extremamente criativa (Bud-Type Project), e

pesquisa básica no fluxo da fronteira da ciência (Branch-Type Project);

c) Projetos Nacionais Estratégicos de P&D – Criada em 1998, estabeleceu uma lista

de áreas diferenciadas da ciência cuja pesquisa deveria ser priorizada e apoiada de forma

especial para o desenvolvimento da economia coreana;

d) Projetos Nacionais de Laboratórios de Pesquisa – Projeto lançado em 1999 com o

fim de apoiar pequenos centros de pesquisas e laboratórios de empresas e universidades

melhorando assim o nível da infra-estrutura de pesquisa do país.

1.2. O investimento em biotecnologia

O desenvolvimento da biotecnologia na Coréia iniciou-se com a criação do “Programa

Nacional de P&D” em 1982, que ao reconhecer a importância da pesquisa científica como

forma de tornar as empresas coreanas competitivas para a nova era da economia mundial

(baseado no conhecimento tecnológico ⁄ knowledge-based economy), colocou a biotecnologia,

como uma das áreas da ciência responsáveis pelo futuro desenvolvimento econômico do país.

Assim, reconhecida a importância da biotecnologia como parte do futuro da

prosperidade da nação, centros de pesquisa na área começaram a ser criados dentro de

universidades, cabendo-lhes o papel de iniciarem de fato a pesquisa na biotecnologia.

Contudo, por ser este uma medida inicial, a medida mostrou-se limitada, provando ser

insuficiente para cumprir o fim pretendido, exigindo do governo e das lideranças empresariais

o esboço de uma nova política nacional para a área biotecnológica.

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Assim, para atender mais especificamente às necessidades da área da biotecnologia,

lança-se em 1994 o programa “BIOTECH 2000” que previa o investimento de valores na

ordem de US$ 15 bilhões de dólares, entre fundos privados e públicos, na pesquisa científica

em biotecnologia até o ano de 2007. O plano, que compreende período de 14 anos, dividia-se

em 10 planos de ações, 6 programas de P&D e 6 de infra-estrutura de apoio.

Entre os 10 planos de ações propostas pelo governo coreano valem destacar:

a) Criação de cooperação interministerial no desenvolvimento da pesquisa

biotecnológica (Ministérios da Saúde, Ciência e Tecnologia, do Comércio, das Finanças, entre

outros);

b) Criação da “Bio Techno-Belt” criando uma área que concentra empresas

especializadas na pesquisa biotecnológica, como a “Daeduc Science Town”;

c) Estabelecimento de plano de intercâmbio e cooperação internacional onde o MOST

(Ministério da Ciência e Tecnologia) é recomendado a destinar 10% de suas verbas de

pesquisa na área de biotecnologia para projetos de cooperação com países em

desenvolvimento como a China, Malásia, Tailândia, Brasil e a Europa Oriental;

d) Investimento em infra-estrutura e equipamento de pesquisas, assim como a elevação

da quantidade e qualidade dos pesquisadores da área, através de programas como o programa

“Brain Korea 21” que apoiou programas de pós-graduação e pós-doutorado em biotecnologia;

e) Criação do programa “Brain Pool” que patrocinou a repatriação de cientistas e

pesquisadores experientes atuando em centros de pesquisa fora da Coréia do Sul;

f) Definição dos projetos estratégicos em diversas áreas da biotecnologia como:

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1) Biomateriais – Desenvolvimento de novos biomateriais funcionais. Aplicação

industrial das funções biológicas;

2) Saúde – Tecnologia de engenharia biomecânica. Biotecnologia humana.

Análise genômica;

3) Agricultura – Genética molecular e tecnológica de culturas de tecidos.

Tecnologia de alimentos.

4) Ambientes, Biossegurança e Biodiversidade – Biotecnologia ambiental e

Biodiversidade. Biossegurança ambiental;

5) Energia Alternativa – Tecnologias para produção de bioenergia.

Os 6 programas de apoio à infra-estrutura são os seguintes:

a) Programa de Banco de Genes – Programa de coleta, conservação e distribuição

de recursos genéticos, assim como dos dados de sequenciamento de DNA;

b) Programa de Recursos Biológicos – Objetiva ampliar a capacidade do país de

manter “strains” de animais de laboratório e de insetos internacionalmente

registrados. Apóia também os projetos de conservação de animais domésticos,

utilização e distribuição de animais de laboratório e de insetos.

c) Programa de Plantas Piloto – o Programa apóia a internalização de “know

how” na área de facilidade de bioprocessamento, principalmente no

desenvolvimento de bioengenharia.

d) Programa de Informação em Biotecnologia – O programa apóia o

desenvolvimento, gestão e catalogação de base de dados, fontes de informação

e bibliotecas eletrônicas relevantes para o desenvolvimento da biotecnologia.

e) Programa de Avaliação da Biossegurança e Eficácia – As duas missões

centrais do programa são: coordenar ações de análise de segurança e eficácia

de bioprodutos na Coreia e; ampliar a capacidade nacional em testes pré-

clínicos de novos biofármacos. Envolve, para sua realização três institutos

governamentais: o Korean Research Institute of Bioscienceand Biotechnology

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(KRIBB); o Screening and Safety Research Institute of Chemical Technology

(KRICT) e o National Institute of Safety Research (NISR).

f) Programa de Testes Clínicos – O programa desenvolve ações para a formação

de recursos humanos em testes clínicos nas escolas de medicina e hospitais

para ampliar a credibilidade internacional do país. Neste contexto, o programa

vê a criação de redes de cooperação interministerial.

Como seguinte passo ao avanço da pesquisa tecnológica no país, é lançado em 1997 a

“Lei Especial para Inovação Científica e Tecnológica” que visava elevar o padrão da pesquisa

científica coreana para os padrões dos países do G-7. Tal ato focou em medidas pragmáticas

para aumentar a qualidade da pesquisa científica coreana, adotando assim, medidas como o

aumento de número significativo de pesquisadores e engenheiros, fortalecer as escolas de

engenharia local, fortalecer programas de pós-graduação na área científica, ampliar as bolsas

de pós-doutoramento, criação de novos parques tecnológicos, melhorar a infra-estrutura das

universidades 20, entre outros.

Foi nesta ocasião que o governo coreano escolheu no campo da biotecnologia as

tecnologias ligadas à genoma, proteoma, bioinformática, biologia molecular e celular e novos

biomateriais como foco de suas pesquisa na área em questão.

1.3. Da análise do desenvolvimento científico na Coreia

Da análise histórica do desenvolvimento científico e biotecnológico do país, verifica-

se que a ciência na Coréia nunca foi tratada de maneira meramente acadêmica, mas como

instrumento de desenvolvimento social e econômico do país.

Aqui já se vislumbra a principal característica da bioética coreana, que é a sua

marcante preocupação como o progresso do país, servindo este como elemento de política de

desenvolvimento nacional. 20 20 Ruy de Araújo CALDAS. O setor e a política de biotecnologia na Coréia. IPRI (Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais). 2000. Pg.12

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Como se verá mais adiante neste estudo, a partir de um determinado momento na

história coreana, a noção do bem estar da nação passa a se identificar com o desenvolvimento

de sua pesquisa científica, criando a partir de então a noção de unidade entre estes dois

elementos para o resguardo da prosperidade e segurança do país.

Assim, já no início deste estudo começamos a vislumbrar traços de características

utilitaristas na sociedade coreana, que possui forte preocupação com o bem estar (felicidade)

da coletividade, além de pragmatismo na forma de alcançar os seus objetivos.

Contudo a ênfase na busca da felicidade não deriva diretamente do conhecimento da

filosofia utilitarista pelos coreanos, do qual nunca chegaram a ter conhecimento direto antes,

mas pela conjunção direta de determinados fatores históricos e sociais, e principalmente pela

evolução de sua história política, que posteriormente viria a cria a filosofia local de natureza

pragmática, chamado de Silhak.

Embora seja assunto a ser abordado capítulo posterior, adianta-se momentaneamente

que o Silhak é uma filosofia originária da Coréia com forte conteúdo político e social, cujo

fim derradeiro é a busca do bem estar do povo através da prosperidade social e política do

país, e para esta finalidade enfoca basicamente no pragmatismo político e filosófico do país.

Como se verá a seguir, esta visão pragmática foi o grande responsável pelo rumo que a

bioética tomou no país, que em vez de zelar pela prática ética da pesquisa científica no país,

priorizou o aspecto econômico e social da pesquisa.

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23

2. O ESCÂNDALO HANG WOO SUK

2.1. Os sucessos de Hwang na biotecnologia

O cientista Hwang Woo Suk formou-se em veterinária pela Universidade de Seul,

obtendo posteriormente o título de doutorado na mesma área nesta mesma instituição. A

Universidade de Seul é a instituição de ensino superior de maior prestígio do país.

Após a obtenção do título de doutorado, veio a praticar a profissão veterinária por um

breve período de tempo, passando a se dedicar então à pesquisa científica, na área da

clonagem de animais posteriormente. Segundo revelam as entrevistas concedidas durante a

época de seu prestígio, revelou que na época havia optado em se especializar em clonagem

animal, pois tinha o desejo de criar um “Super boi” coreano, através da técnica de

manipulação genética.

Assim, no ano de 1999 realiza o seu primeiro grande trabalho científico na área da

genética, ao anunciar ao mundo que havia conseguido clonar um boi, transformando com isso

a Coréia do Sul no 5° país do mundo a realizar tal façanha.

Posteriormente a este feito o Dr. Hwang continuou a realizar a clonagem de outros

animais com sucesso como porcos, mas tais feitos tiveram os seus méritos postos em dúvida,

pelo simples fato de que este não se preocupava em providenciar provas concretas dos

sucessos que alegava ter conseguido. Até então o cientista Hwang fornecia apenas fotos dos

animais que dizia ter clonado, sem se importar em providenciar prova material dos sucessos

que tanto alardeava.

Um dos grandes trabalhos que Hwang alegava ter realizado nesta época foi o

desenvolvimento de um boi resistente a doenças no ano de 2003, com a colaboração de uma

cientista da Universidade Nacional de Sunchon, a bióloga Ki Young Park, que devido a seus

vínculos com as esferas políticas iria se tornar uma das mais importantes aliadas políticas de

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Hwang no futuro, pois neste mesmo ano passa a ser nomeada assessora presidencial para os

assuntos relacionados com a ciência e tecnologia do governo.

Park21 foi a grande responsável por abrir os caminhos políticos de Hwang junto ao

governo do Presidente Roh Moo Hyun, que escolheu o cientista como um dos símbolos da

nova Coréia que procurava promover junto à sua população e ao mundo, incutindo-lhes a

idéia de que as incertezas do futuro da nação seriam combatidas com o desenvolvimento da

capacidade tecnológica do país, e neste contexto o Dr.Hwang seria uma espécie de “Cristo”

ou salvador desta nova era, garantindo prosperidade e riqueza à nova geração de coreanos

com as suas pesquisas. E as pessoas aceitavam passivamente esta promessa, pois lhes era

agradável.

Em 12⁄03⁄04 ocorre a grande reviravolta de sua carreira científica, ao publicar na

revista “Science” uma matéria afirmando que tinha conseguido criar uma linhagem de células

de tronco embrionárias humanas, através do processo de transferência do núcleo de células

somáticas. O nome do artigo era “Evidence of a Pluripotent Human Embryonic Stem Cell

Line Derived from a Cloned Blastocyst” e era a primeira vez na história humana que alguém

afirmava ter conseguido tal façanha. A bióloga Park foi mencionada como co-autora do

trabalho.

Contudo a publicação deste trabalho teve um efeito paradoxal na carreira do

Dr.Hwang, uma vez que ao mesmo tempo que serviu para alçar o nome de Hwang à altura dos

maiores cientista do mundo na área de biotecnologia, foi também o início de sua sina, uma

vez que questionamentos sobre os procedimentos éticos sobre sua pesquisa começaram a

surgir com intensidade a partir deste momento.

21 Em janeiro de 2006, após a eclosão do escândalo sobre as pesquisas de Hwang, um dos três maiores jornais da

Coréia, o jornal Chosun Ilbo, veio a noticiar nas suas páginas que antes da publicação do primeiro trabalho de

Hwang na revista Science, este havia realizado várias doações a Park, no valor total de US$ 250.000,00, entre os

anos de 2001 a 2004, mostrando com isso a cumplicidade que havia entre os dois no trato das questões

relacionadas com a pesquisa genética.

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Isto não quer dizer que antes desta publicação o Dr. Hwang não tenha sofrido

questionamentos éticos nas suas pesquisas, mas com a extensa exposição que passa a sofrer na

mídia local e internacional a partir de então, novos críticos juntam-se aos que já o criticavam

antes, e com mais intensidade e repercussão social.

De fato, mal publicado o artigo de 2004, surge o primeiro grande questionamento a

respeito da conduta ética de suas pesquisas, quando na época a revista Science vem a indagar

a Hwang sobre aspectos éticos de sua pesquisa, após tomar conhecimento de uma entrevista

concedida pelo mesmo onde teria feito afirmações que pesquisadoras femininas do seu grupo

haviam doado óvulos para sua pesquisa.

Para a revista, Hwang negou que tenha usado óvulos doados por pesquisadoras de sua

equipe, e para evitar maiores questionamentos por parte de seus opositores suspende

voluntariamente as suas pesquisas até o início da vigência da lei de biossegurança e bioética

do país, que entraria em vigor a partir de janeiro de 2005.

Contudo, não satisfeita com tais providências, a KBA 22 vem também questionar

Hwang sobre os procedimentos de obtenção dos óvulos utilizados nas suas pesquisas, assim

como a origem de seus fundos, e recomenda a Comissão Nacional de Direitos Humanos que

realize investigações sobre o caso, mas a comissão desconsidera tais recomendações e deixa

de realizar uma revisão profunda dos projetos de Hwang.

Durante a suspensão temporária imposta a si mesmo, Dr.Hwang vem a colaborar com

o pesquisador de primatas norte-americano, Dr. Gerald Schatten, da Universidade de

Pittsburgh, que fazendo uso da técnica de extrusão do DNA de oócito desenvolvido por

Hwang, realizou a primeira clonagem de embrião de macaco, através do qual obteve células-

tronco, permitindo à equipe de Schatten desenvolver embriões de macaco ao estagio de

blastocistos, contribuindo indiretamente para dar maior credibilidade à técnica desenvolvida

por Hwang.

22 Korean Bioethics Association

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Já em 2005, com a entrada em vigor da Lei de Biossegurança do país, Hwang é o

primeiro cientista do país a requerer permissão governamental para realizar pesquisas

genéticas, submetendo os documentos necessários para tal. Contudo o período de graça que se

concedeu a si mesmo foi apenas um momento de calmaria na grande tempestade que Hwang

viria enfrentar a partir da metade do ano de 2005, com a eclosão do escândalo que trouxe à

tona a verdade sobre as suas pesquisas.

De fato, já no começo do ano de 2005, precisamente no mês de janeiro daquele ano,

Hwang vem a apurar que 4 das 7 colônias de células somáticas que dizia ter criado haviam

sido infectadas pelo fungo “fungi” e informa à sua antiga colaboradora, Prof. Park, sobre a

contaminação da células, mas esta, mesmo sendo responsável pela implementação das

medidas preventivas na área de pesquisas, não relatou o caso às autoridades competentes,

mostrando se não conivência, pelo menos uma certa tolerância à fraude de Hwang, em nome

de uma política nacional de pesquisa, manipulada para atingir fins propagandísticos e

políticos.

Contudo, em maio de 2005 Hwang faz um novo anuncio ao mundo, afirmando desta

vez que havia realizado a clonagem de células tronco embrionárias humanas de 11 pessoas

diferentes, fazendo uso de 185 óvulos no experimento. Em 17⁄06⁄05 Hwang publica a segunda

matéria na revista “Science” a respeito deste novo trabalho.

O nome do artigo é “Patient-Specific Embryonic SCs Derived from Human SCNT

Blastocist” e entre os autores estão incluídos os nomes de Gerald Schatten e Sung Il Roh, que

futuramente serão os dois principais pivôs do escândalo que vitimou Hwang no fim do ano em

questão.

Com a publicação dos dois artigos sobre os seus trabalhos na área da clonagem,

Hwang é alçado á posição de maior autoridade mundial na área da clonagem, vindo a ser

escolhido pela revista norte-americana “Times” como “People who mattered 2004”, e

eventualmente sendo cogitado a receber o prêmio Nobel pelos seus trabalhos.

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Na rota de seu prestígio inabalável Dr. Hwang anuncia em 03⁄08⁄05 a clonagem do

primeiro cão do mundo, o cão “Snuppy”, e na mesma época vem a ser nomeado chefe do

recém criado “World Stem Hub” na Coréia do Sul.

Por todos os sucesso científicos que atribuiu-se a si mesmo durante este tempo, Hwang

veio a ser nomeado professor da Universidade Nacional de Seul, e agraciado com generosas

verbas públicas do governo coreano para financiar as suas pesquisas de clonagem (US$ 3

milhões por ano)23 .

2.2. O escândalo ético de Hwang nas pesquisas genéticas

As grandes conquistas científicas alegadas por Hwang Woo Suk até então, passam a

ser desacreditados em virtude de vários acontecimentos que trazem à tona, acusações de

conduta antiética por parte de Hwang e de seus colaboradores na condução de suas pesquisas.

A crise desencadeia-se a partir de novembro de 2005, quando no auge de seu sucesso,

Gerald Schatten, professor da Universidade de Pittsburg associado a Hwang desde o ano de

2003, anuncia inesperadamente que deixa de colaborar com o cientista coreano, devido à

existência de problemas antiéticos, relacionados com a coleta dos óvulos utilizado pela equipe

de pesquisa de Hwang em 2004.

Posteriormente ao anúncio de Schatten, em 21⁄11⁄05, um antigo colaborador de Hwang

e diretor geral do hospital MizMed, Dr. Roh Sung Il, anuncia em entrevista coletiva à

imprensa, que a doação dos óvulos utilizados na pesquisa do Dr. Hwang, haviam sido obtidos

através do pagamento de valor de US$ 4.000,00 para as clinicas de fertilidade24. Na ocasião

Roh afirma perante a imprensa que Hwang não tinha conhecimento de tal fato.

23 David CYRANOSKY, Veredict:Hwnag´s human stem cells were all fakes, Nature, Publicação online de 10/01/2006 24 John Michael MCGUIRE, Revising the Korean Bioethic and Biosafety Act: Should researchers be prohibited from donating oocytes? Division of International Studies, Hanyang University. pg.85

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Roh participou dos dois trabalhos científicos publicados por Hwang na revista

“Science” sendo um dos co-autores dos trabalhos. Foi Roh, através do hospital MizMed, que

providenciou os embriões utilizados na pesquisa e os manteve guardados em seu laboratório.

Para piorar a situação de Hwang, em 22⁄11⁄05, somente 1 dia após a entrevista coletiva

de Roh, um documentário do canal de televisão coreano MBC, a “PD Suchop”, denuncia no

ar a possibilidade de prática de conduta antiética de Hwang, veiculando no programa

testemunho de membro da equipe científica de Hwang (Kim Sung Jong) onde este afirmava

que o cientista conhecia da origem ilícita dos óvulos utilizados nas pesquisas genéticas25.

Contudo, apura-se posteriormente que os produtores do programa haviam conseguido

o testemunho de Kim Sung Jong por meios ilegais, coagindo a pessoa a testemunhar contra

Hwang, e em 4/12/05 a emissora se vê obrigada a reconhecer em público o erro, desculpando-

se em publico por ter veiculado o programa sensacionalista contra Hwang.

A exibição do documentário desfavorável à credibilidade do Dr.Hwang desperta o

apelo patriótico dos coreanos, que em vez de condenar a possibilidade de prática de conduta

antiética o apóiam ainda mais26 . Os patrocinadores do programa “PD Suchop” retiram o

patrocínio ao programa, devido à repercussão negativa do programa junto à população

coreana.

Como conseqüência aos eventos ocorridos até então, Dr.Hwang confessa em entrevista

coletiva realizada em 24⁄11⁄05, que sabia da origem antiética dos óvulos utilizados pela sua

equipe até então, mas que havia mentido sobre o caso para preservar a identidade de suas

verdadeiras doadoras, que haviam sido as colaboradoras de sua equipe de pesquisa. Afirmou

na ocasião que não sabia que tal conduta violava a “Declaração de Helsinque” e que

renunciava a quase todos os seus cargos oficiais que possuía até então.

25 “Ahn disse ontem que dinheiro foi oferecido a Kim para ajudá-lo a se recuperar do choque causado pela primeira entrevista feita à MBC. Ahn alega que ele tentou se matar depois da confissão que fez para o produtor da MBC. Apesar de sua explicação, ainda permanecem dúvidas se a equipe de Hwang teria tentado subornar Kim para que mudasse o seu depoimento feito inicialmente à MBC em uma entrevista posterior a ser feita à YTN. Separata Ohmynews”. “Hwang Scandal Reveals a Fractured Society”. Jean K. Min. 2005 26 Hwang fans hold out despite indictment, The Chosun Ilbo, 5/12/2006

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Contudo, para estourar de vez a crise que atingia as pesquisa do Dr. Hwang, em

15⁄12⁄05, o Dr.Roh que já havia denunciado a prática de conduta antiética de Hwang na coleta

dos óvulos utilizados nas suas pesquisa, vem a público denunciar que o trabalho publicado por

Hwang em 2005 na revista “Science”, onde afirmava ter clonado celular tronco embrionárias

de 11 pessoas, era falsa, e os dados publicados nela eram fabricados.

Segundo afirmou o Dr. Roh na ocasião, das 11 linhas de células tronco clonadas,

apenas 2 eram de fato verdadeiras, e as restantes 9 compartilhavam DNAs idênticos entre si,

dando a entender que estas eram células originárias da mesma pessoa, e não clonadas de

pessoas diferentes.

Como forma de esclarecer definitivamente a série de eventos que veio a comprometer

a credibilidade dos trabalhos realizados pelo Dr. Hwang (assim como a credibilidade da

pesquisa científica coreana perante a comunidade internacional) inicia-se em 17⁄12⁄05 uma

investigação interna da Universidade Nacional de Seul para determinar definitivamente a

extensão dos atos antiéticos praticados por Hwang, e sobre a veracidade de suas pesquisas.

Assim, iniciados os trabalhos de investigação da equipe da Universidade de Seul,

apura-se o seguinte quanto aos trabalhos realizados por Hwang:

Sobre a matéria publicada em 2004 na revista “Science”27, três laboratórios diferentes

realizam a análise dos DNAs das célula dito clonadas e da célula do doador original e

descobre-se que os DNAs não são iguais.

Segundo se apura, o DNA mitocondrial das células clonadas eram idênticas a uma das

células do doador original, mas o DNA proveniente do núcleo da célula apresentava

27 Matéria publicada na revista no dia 12 de março daquele ano.

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discrepâncias em determinados pontos. O comitê conclui que a linhagem originou-se de

partenogênese e não de clonagem, e que os dados apresentados por Hwang eram fabricados28.

Sobre o trabalho apresentado em 2005, apura-se que de fato 9 das 11 linhagens de

célula tronco dito clonadas eram falsas, e que quanto às demais linhagens haviam sérias

dúvidas quanto à sua autenticidade, que em vez de reprodução por clonagem teriam sido na

verdade produzidas por partenogênese através de fertilização in vitro em hospital.

A equipe da Universidade de Seul afirma que Hwang consegui clonar embriões

humanos até o estágio de blastocistos, a partir do qual células tronco podem ser obtidas.

Contudo diz que a taxa de sucesso era de apenas 10% e as células obtidas por tal processo

resultavam em células de condições muito frágeis29.

Descobre-se também que o Dr, Hwang havia mentido sobre o número de óvulos

utilizados nas suas pesquisas, tendo utilizado 2.061 óvulos de 129 mulheres. Hwang reportou

que na pesquisa de 2004 havia utilizado apenas 242 óvulos, e na pesquisa de 2005 apenas 185

óvulos. Parte dos óvulos haviam sido obtidos através de coerção de pesquisadoras de seu

equipe de pesquisa.

Por fim, afirma que a única verdade existente nas pesquisas de Hwang era a clonagem

do cachorro “Snuppy”, que apesar das fraudes cometidas até então, tratava-se de um feito

legítimo e extraordinário.

Assim, em 10/01/06, o time de investigação da Universidade Nacional de Seul declara

que a clonagem de células tronco embrionárias de 11 pessoas anunciadas por Hwang eram

falsas, e que os trabalhos publicados em 2004 e 2005 na Revista Science eram fabricados.

Como corolário a Revista Science retira as matérias de Hwang em 11⁄01⁄06.

28 David CYRANOSKI. Veredict: Hwang´s human stem cells were all fakes. Nature Internatioal weekly journal of Science. 12/01/2006. http://www.nature.com/nature/journal/v439/n7073/full/439122a.html 29 Ibid.,

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Hwang convoca nova entrevista coletiva da imprensa em 12⁄01⁄06 e pede desculpa à

nação pela fabricação das matérias, mas diz que a técnica de clonagem de células tronco

embrionárias é real e que foi vítima de sabotagem por parte de membros de sua equipe de

pesquisa, principalmente o Dr. Roh da Mizmedi, que teria trocado as células clonadas das 11

pessoas diferentes. Por fim pede um prazo de 6 meses, em substituição ao prazo de 10 dias

solicitados antes numa entrevista coletiva realizada em 16⁄12⁄05, para provar que a clonagem

das células tronco embrionárias podia ser realizada.

Posteriormente à revelação da investigação realizada pela SNU, Dr. Hwang passa a ser

investigado pelo ministério público do país por desvio de verbas públicas e em 10⁄07⁄07 é

expulso da SNU, e perde todos os fundos públicos dos governos para financiar a sua pesquisa.

2.3. A repercussão social e política do escândalo

O desenvolvimento da técnica de clonagem embrionária de célula-tronco por Hwnag

não foi somente um grande feito científico e tecnológico para o mundo, mas foi

principalmente uma grande revolução social e histórica para a Coréia do Sul. Tal afirmação se

evidencia quando se analisam a reação social e econômica observada no país após o anúncio

das pretensas “descobertas” de Hwang.

De fato, após o anúncio de tais descobertas, o prof. Hwang passa a ser o centro das

atenções do país, vindo a convergir em si grande parte do interesse do país, que depositam

nele diversos anseios relacionados com futuro da nação.

O assédio experimentado por Hwang veio desde as mais altas cúpulas do governo

coreano, até os níveis mais ordinários da sociedade, que viam nele a figura do “salvador da

pátria”, para os mais diversos problema existentes no país.

A relação de Hwang com o governo coreano deu-se nos primórdios de sua ascensão

social, quando pela primeira vez anunciou que havia realizado com sucesso a clonagem de

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bois e porcos. Deste tal época tem sido favorecido pelo governo, que concedeu-lhe desde

honras ao mérito, como o inédito título de “Cientista Supremo” da nação, a generosas verbas

de pesquisa para a condução de seu trabalho.

O título de cientista supremo foi criado pelo Ministério das Ciências e Tecnologia da

Coréia em 2005, e teve na figura do Prof. Hwang o primeiro agraciado em junho de 2005.

Com tal título Hwang recebeu verba de pesquisa de 15 milhões de dólares. Neste mesmo ano

havia sido nomeado também titular de uma cadeira de ciência na Universidade de POSCO,

uma das mais prestigiosas instituições de ensino e de pesquisa superior do país, recebendo na

ocasião valor para financiamento de pesquisa no valor de 1,5 milhões de dólares.

O Prof. Hwang tinha relações estreitas com os principais dignatários do país, como o

presidente da república, Rho Mu Hyun, e pessoas o primeiro escalão do seu governo, como o

Ministro das Informações e Comunicação “Jin Dae Je”, o Conselheiro Presidencial para

assuntos de Informação, Ciência e Tecnologia “Park Ki Young”30 e o Chefe da Secretaria

Nacional de Política “Kim Byung Joon”. A relação deste grupo de pessoas era notória e muito

estreita vindo a ser chamado pela mídia local como o “Hwang-Kum-Pak-Chui”, criado a

partir da união dos sobrenomes das quatro pessoas e que soava parecido com a frase

“morcego dourado” em coreano.

O Prof.Hwang possuía também um grande número de simpatizantes na política, sendo

que em 6⁄12⁄05, 45 deputados de diversos partidos do país, criaram o grupo de apoio chamado

“Grupo de legisladores de apoio a Hwang Woo Suk” sendo que algumas deputadas deste

grupo chegaram mesmo a aderir aos grupos cíveis de doação de óvulos para as pesquisas de

Hwang, criado após a eclosão do escândalo em novembro de 2005.

O grupo de legisladores apoiadores de Hwang vieram também a pressionar a

Comissão Coreana de Radiodifusão para que este viesse a realizar investigação sobre a

30 International Herald Tribune. Lesson in South Korea: Stem Cells Aren't Cars or Chips. January 11th, 2006 “O escândalo está tendo uma repercussão ampla. Na terça feira Park Ky Young, co-autora de uma dos principais trabalhos do Dr. Hwang, renunciou ao seu cargo de secretária de assuntos científicos do Presidente Roh Môo Hyun, um mês após a substituição do Ministro da Ciência Oh Myung.”.

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possibilidade de existência de má-conduta na equipe de produção do programa de TV “PD

Sucheop”, que em 22⁄11⁄05 veio a expor perante o país a prática de atos antiéticos do

Prof.Hwang na TV. Posteriormente grande parte dos políticos que vieram a manifestar apoio a

Hwang, confessaram que haviam recebido doação de campanha do Prof. Hwang

anteriormente31.

A transmissão do programa “PD Sucheop” teve efeito arrasador na sociedade coreana,

que baseado em sentimentos de idolatria e patriotismo, criou movimentos sociais e políticos

de suporte ao Dr. Hwang, como os mencionados acima32.

De fato, a idolatria ao Prof.Hwang levou à criação de um grupo de doação de óvulos

pela internet, que veio a somar mais de 800 voluntárias, assim como manifestações de apoio a

Hwang, que eram na maioria das vezes carregados de apelo patriótico, onde frases de apoio a

Hwang eram adornadas com a flor “Rosa de Sharon”33 e a execução do hino nacional da

Coréia34.

31 Chosun Ilbo. Hwang's 'Guardian Angel' Owes Us an Explanation. January 18th, 2006. “O conselheiro presidencial para a ciência e tecnologia, Park Ky Young recebeu verbas para pesquisa de $150 milhões de Won e $100 milhões de Won em 2001 e 2003 para realização de estudos do impacto ético e social da bioengenharia, do descreditado cientista de clonagem Hwang Woo Suk. A pesquisa de 2001 tinha como foco o impacto social resultante da criação de bois com resistência à doença da vaca louca, e o trabalho de 2003 sobre normas éticas e o uso comercial dos bio-órgãos”. 32 Chosun Ilbo. Support for Cloning Pioneer Still Growing. Updated Nov.27,2005 “Apóio ao problemático pioneiro da clonagem, o professor Hwang Woo Suk, em virtude de uma reportagem sobre problemas éticos em seus projetos de pesquisas levada ao ar pela MBC, continuaram inalteradas no sábado. A polícia estima que perto de 100 membros de um grupo online de apoio e outros realizaram 2 horas de vigília na frente do escritório do canal em Yeouido, em Seul, à noite. Eles diziam que a MBC havia ferido o interesse nacional com reportagens ‘distorcidas’ sobre a compra de óvulos pela equipe de Hwand em seu programa ‘PD Diary’, exibido em 22 de novembro, e exigiram que a emissora se desculpasse na segunda feira e punissem os produtores.” 33 Flor símbolo do país. 34 Chosun Ilbo. Support for Cloning Pioneer Still Growing. Updated Nov.27,2005. “Um número crescente de pessoas estão se voluntariando para doar óvulos para as pesquisas de Hwang, desde que ele admitiu que havia problemas na forma como os óvulos foram obtidos, devido à falta de doadores. Uma organização dedicada a coletar óvulos para pesquisa científica, disse no domingo que cerca de 900 pessoas haviam se voluntariado através de sites na internet e chamadas telefônicas. Os números cresceram rapidamente para 200 na quinta feira, depois que o Dr. Hwang fez o anúncio, e desde então aumentou 4,5 vezes depois. O comunidade online `Eu amo Hwang Woo Suk` (café.daum.net/ilovehws) aumentou para 33.996 membros no domingo dos meros 19.000 da semana anterior”.

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34

A idolatria a Hwang não se baseava somente no apelo patriótico, mas também no

anseio das pessoas quanto ao sucesso de suas pesquisas que viam neste a única esperança que

possuíam quanto à de males que os afligiam35.

2.4. Sobre a violação da Lei de Biossegurança e da Declaração de Helsinke

Descobertas as fraudes de suas pesquisas, Hwang passa a ser objeto de investigação

por parte do ministério público do país que o acusa de crimes de fraude, apropriação indébita

e violação à Lei de Biossegurança do país.

Contudo, concluídas as investigações e esgotados todos os processos administrativos e

legais, Hwang veio a ser condenado apenas por crimes contra as leis de bioética do país

escapando de condenações mais severas na área penal.

Os críticos de Hwang, e a comunidade científica em geral, criticaram a decisão das

autoridades coreanas quanto à conclusão do caso Hwang, afirmando que além dos crimes já

mencionados, Hwang teria violado também a Declaração de Helsinque, especificamente o

Art.23 desta lei, que determina que o consentimento informado de pessoas objeto de pesquisa,

com alguma forma de vulnerabilidade em relação ao pesquisador (médico), deve ser obtida de

forma cautelosa, através de pesquisador neutro, sem participação direta na pesquisa, e que

tivesse conhecimento pleno da pesquisa em andamento.

Conforme mencionado em capítulo anterior, a condenação por prática de conduta

antiética atribuída ao professor Hwang estava relacionada com a forma como se deu a

obtenção dos óvulos utilizados na sua pesquisa, que foram obtidos de forma onerosa, sem o

35 Chosun Ilbo. Support for Cloning Pioneer Still Growing. Updated Nov.27,2005. “Participantes da vigília noturna incluíam o cantor Kang Won Lae, 36 anos, que é paraplégico desde o acidente de 2000, e sua esposa Kim Song, de 33 anos, que é coreógrafa. Kim já havia realizado extração de óvulo para fins de inseminação e para doação para pesquisas, mas a doação falhou devido a problemas durante o processo. ‘Foram realizadas três extrações de óvulo em mim para fins de inseminação e o processo foi o mesmo para retirada de óvulos para doação para as pesquisas. O hospital me informou a respeito dos potenciais riscos e efeitos colaterais e fui devidamente informada’ disse ela. Kang disse ‘muitos pacientes que sofrem de doenças de difícil cura estão pondo a sua fé na pesquisa de células-tronco. O problema ético é inevitável neste processo. Mas criticar o processo de pesquisa é o mesmo que dizer aos que ainda tem fé de desistirem de suas vidas”.

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35

correto consentimento informado das doadoras, e a possível coação de membros femininos de

sua equipe de pesquisa que teriam sido forçadas a doar óvulos.

A investigação da Universidade de Seul verificou que Dr. Hwang havia mentido sobre

a quantidade total de óvulos utilizados nas suas pesquisas, excedendo bastante o número

oficialmente informado por ele, e que em alguns casos algumas doadoras haviam doado mais

de uma vez, de 2 a até 4 vezes.

Apurou-se posteriormente que 20% das doadoras de óvulos apresentaram

hipersensibilidade na vagina, despertando com isso a ira de grupos de proteção dos direitos

das mulheres do país, que passaram a exigir compensação pelos danos, através de processos

judiciais contra as entidades envolvidas nas pesquisas.

Contudo, observa McGuire 36 que apesar das acusações levantadas pelos seus

opositores, Hwang não teria violado os dispositivos da lei de bioética e biossegurança da

Coréia, pois esta lei não estabelece proibições aos atos praticados pelo mesmo, uma vez que a

lei não estabelece restrições ou condições para as mulheres doarem seus óvulos, nem

mecanismos seguros para coibir a obtenção ilegal dos mesmos, pois não prevê expressamente

a forma como o consentimento informado das doadoras deve ser realizado, nem especifica o

conteúdo das informações que devem ser fornecidas às doadoras no ato da doação, nem

sequer possui mecanismos específicos de proteção contra coação de potenciais doadoras.

De fato, observa o autor que quanto às pesquisadoras da equipe de Hwang, estas

teriam confirmado que a doação dos óvulos foi voluntária, motivadas pela vontade das

mesmas de contribuir com as pesquisas em andamento, e que a formalidade de obtenção do

consentimento informado foi observada na ocasião.

Contudo o que torna tal ato sujeito à crítica ou pelo menos suspeito, é o fato de que o

processo de obtenção do consentimento das pesquisadoras teria sido realizado diretamente

36 John Michael MCGUIRE. Revising the Korean Bioethics and Biosafety Act: Should researchers be prohibited from donating oocytes?. Division of International Studies, Hanyang University. Pg.89

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36

pelo Prof. Hwang, que pelo fato possuir poder de subordinação sobre as pesquisadoras,

poderia ter influenciado de alguma forma na decisão das mesmas de doar os seus óvulos.

Assim, a absolvição de Hwang dos crimes de fraude e apropriação indébita, sendo

condenado apenas nos crimes de natureza ética, despertou o descontentamento de todos os

interessados na questão, seja dos seus opositores, seja dos seus aliados, que receberam com

frustração a decisão anunciada pelos órgãos governamentais.

Para aqueles que eram contrários à pesquisa genética no país, esperavam que a

condenação exemplar de Hwang fosse o início de uma postura mais conservadora na

condução das pesquisas genéticas no país, servindo de ponto de partida de uma nova política

de promoção da pesquisa biotecnológica do país.

Contudo, aqueles que apoiavam as pesquisas genéticas de Hwang eram contrários à

condenação do cientista por violação de conduta ética, pois entendiam que Hwang não teria

violado a lei de bioética do país, nem a Declaração de Helsinque.

De fato, pouco após a eclosão do escândalo protagonizado por Hwang, o deputado

coreano, Sr. Kim Hee Jung, membro do “Comitê da Assembléia Nacional para a Ciência,

Tecnologia, Informação e Telecomunicação”, entidade parlamentar responsável por fiscalizar

a pesquisa biotecnológica no país, afirmou publicamente que a coleta de óvulos de membros

femininos da equipe de Dr. Hwang, mesmo que fosse verdadeira, não teria violado qualquer

norma legal ou ética37.

No mesmo compasso, escritórios de advocacia dos Estados Unidos especializados na

área solicitados a opinar sobre o caso, chegaram à conclusão de que se os óvulos foram

doados voluntariamente pelas pesquisadoras, não teria havido violação de qualquer regra ética

ou legal por parte de Hwang38.

37 TG KIM. In-house donation not unethical. Korea Times, 15 de novembro de 2005 38 Chosun Ilbo. Controversial oocyte donation “no breachof ethics”. 17 de novembro de 2005

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37

Por fim, o Ministério da Saúde da Coréia, entidade conservadora em relação às

pesquisas genéticas no país, corroborou com a mesma tese de que tendo havido

voluntariedade na doação dos óvulos por parte das pesquisadoras, Dr. Hwang não teria

violado qualquer norma legal ou ética39.

McGuire compactua com esta visão favorável a Hwang, esclarecendo que quanto à

acusação de violação da regra do art. 23 da Declaração de Helsinque, o cientista não teria

violado tal dispositivo pelos seguintes motivos:

O primeiro motivo: o autor diz que Hwang não violou a Declaração de Helsinque, pois

afirma que a declaração não proíbe pesquisadores de participarem como objeto de pesquisa, e

neste contexto diz que se o Dr. Hwang cometeu alguma violação à declaração, tal violação

teria sido com relação à forma como a obtenção do consentimento informado das

pesquisadoras femininas foi realizada, pois em vez de ser obtida através de um pesquisador

neutro, sem participação direta nas pesquisas, Hwang teria obtido o consentimento

pessoalmente das pesquisadoras de sua equipe.

Segundo motivo pelo qual Hwang não teria violado a declaração: a declaração diz que

o consentimento informado deveria ser obtido de pessoas que são objeto da pesquisa, mas no

presente caso as pesquisadoras não eram alvos ou objeto da pesquisa de Hwang, assim a regra

determinada no Art.23 da declaração não se aplicaria ao caso.

Terceiro motivo: a regra determinada no artigo 23 da declaração aplica-se

especificamente a atos praticados por médicos, pois na sua redação faz menção específica a

médicos (e não a cientistas) alem do que a declaração foi ratificada pela associação mundial

dos médicos, contudo, não sendo Hwang médico nem membro desta associação, não estaria

sujeito a seguir as normas da Declaração de Helsinque.

Assim, conclui McGuire que pela aplicação literal do dispositivo do Art. 23 da

Declaração de Helsinque aos atos praticados por Hwang, estão corretos aqueles que defendem 39 CW KIM. Hwang´s team in ethical minefield over ova. panel. Korea Times. 2 de fevereiro de 2006

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a inocência de Hwang em relação à Declaração de Helsinque, uma vez que a doação de

óvulos pelas pesquisadoras da equipe de Hwang nunca chegou a violar os atos prescritos nesta

lei.

Contudo, observa o autor que se por um lado o Dr. Hwang é inocente das acusações

atribuídas ao mesmo, de que teria violado normas de conduta ética na condução de suas

pesquisas, por outro lado percebe que tal “zelo” ou “diligência” não resulta do amor que Dr.

Hwang nutre pelas leis da ética, mas por mero capricho do acaso, relacionado com a situação

precária da questão bioética no país.

De fato, para fundamentar a sua observação, McGuire traz à tona dados de pesquisas

realizadas na Coréia anos atrás, onde se apurou que 80% dos pesquisadores coreanos da área

de biotecnologia desconheciam o conteúdo das normas de ética estabelecidas na Declaração

de Helsinque, e que 46% destas pessoas nem mesmo conheciam da existência desta

declaração40.

Os dados da pesquisa revelam o triste fato de que o país tem um desinteresse quase

que institucional pelas normas de bioética (baseado principalmente na visão utilitarista das

pesquisas científicas do país, conforme se verá mais a diante) e o Dr. Hwang, ávido por

reconhecimento e prestígio, aproveitou-se deste cenário de indiferença para realizar as suas

pesquisas, com a conivência das autoridades coreanas.

Para prevenir semelhantes problemas éticos no futuro, qual seja, a exploração e

manipulação de pessoas sujeitas às pesquisas em situação de vulnerabilidade em relação ao

médico ou pesquisador, afirma McGuire que existem discussões a respeito de possível

modificação da lei de biossegurança da Coréia, adotando regras análogas às existentes no

Art.23 da Declaração de Helsinque.

40 John Michael MCGUIRE, Revising the Korean Bioethic and Biosafety Act: Should researchers be prohibited from donating oocytes? Division of International Studies, Hanyang University. pg.92.

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39

Neste caso observa o autor que para que tal iniciativa venha a ser realizada com

sucesso, 2 questões devem ser discutidas:

1) Se a lei de biossegurança da Coréia deveria ser modificada criando-se restrições

para a doação de óvulos pelas pesquisadoras, estabelecendo-se então normas

específicas para a doação ou simplesmente proíbe-se a doação de óvulos das

pesquisadoras; e

2) Se decidir pela proibição de doações, se a proibição seria aplicável a todos os

pesquisadores da equipe, independente do sexo, ou se proíbe apenas a doação

realizada por membros femininos da equipe.

Quanto à primeira questão, a KNBC considera a possibilidade de determinar a

proibição total de doações por parte de todos os membros da equipe de pesquisa, incluindo os

familiares destas pessoas, independente do sexo, seguindo os mesmos moldes em

consideração nos EUA.

Contudo, entende o autor que tais medidas seriam um tanto exageradas, pois entende

que para resolver o problema da vulnerabilidade das pesquisadoras (e dos pesquisadores em

geral) em relação aos seus superiores, a correta aplicação da regra do consentimento

informado estabelecido na declaração seria suficiente para preservar o direito as

pesquisadoras femininas contra possíveis atos de coação de seus superiores.

Entende o autor que a proibição total de doações por parte de pesquisadores seria ato

de excessivo paternalismo, pois tal ato restringiria o livre arbítrio dos pesquisadores

assistentes de decidirem por si só o grau de envolvimento que os mesmos teriam com as

pesquisas em que participam. Neste caso o autor fala da necessidade de distinção do poder de

influência do poder de coação dos pesquisadores superiores sobre os seus pesquisadores

assistentes.

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De fato, realizando uma observação mais fundo a respeito da cultura coreana, o autor

indaga da real possibilidade de proteção das pesquisadoras femininas dentro do contexto da

cultura coreana, uma vez que na cultura oriental o conceito do consentimento informado não

tem a mesma relevância que nos países ocidentais, em virtude da forte hierarquização da

sociedade, e neste caso tal procedimento não impediria pessoas como Hwang de usar do poder

de seu cargo para coagir pesquisadoras a doarem óvulos.

E neste contexto, divaga o autor que talvez a única forma concreta de proteger as

pesquisadoras seria talvez a proibição total das doações, mas ainda assim defende que tal

medida seria radical demais, pois nenhum outro país do mundo chegou a adotar medida tão

extrema, além do que acredita que tal tipo de proibição não teria efetividade na sociedade

coreana, por falta de aceitação, pois observa que a sociedade coreana apóia as pesquisas

genéticas, conforme ficou demonstrado no apoio maciço que Dr. Hwang recebeu da sociedade

mesmo após a eclosão do escândalo.

Ilustra bem esta possibilidade o caso da ineficácia da lei anti-aborto da Coréia, que não

encontra plena aceitação da população, pois conforme se apurou em pesquisa realizada em

1971, em tese 81% da população feminina coreana era a favor da lei aborto, mas na prática

era praticada sem maiores problemas por elas41. Assim critica a adoção de medidas legais que

na prática teriam pouca ou nenhuma aceitação na sociedade.

Outro exemplo deste pragmatismo está no fato ocorrido em 2006, quando o Comitê

Nacional de Bioética da Coréia, motivado pelo escândalo protagonizado por Hwang, reuniu-

se para estabelecer normas apropriadas para doação de óvulos para as pesquisas de células-

tronco no país, contudo para surpresa de muitos, o trabalho pretendido deixou de ser realizado

em virtude da dúvida que os membros do Comitê tinham em relação à necessidade de tais

normais, pois entendiam que não existindo a técnica de clonagem alegada por Hwang, não

havia necessidade de ir adiante com os trabalhos.

41 John Michael MCGUIRE, Revising the Korean Bioethic and Biosafety Act: Should researchers be prohibited from donating oocytes? Division of International Studies, Hanyang University. pg.95

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41

Percebe-se que apesar da repercussão negativa que o escândalo protagonizado por

Hwang trouxe à pesquisa genética do país, o governo não pareceu ter modificado as suas

convicções a respeito da importância da pesquisa genética para o país, a ponto deste vir a

proibir as pesquisas de células-tronco. Tal atitude exemplifica o pensamento da sociedade

coreana de ir atrás de suas ambições na pesquisa genética, mesmo que para isso tenha que

passar por cima de questões “incidentais”, como as questões éticas.

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3. ANÁLISE DA EVOLUÇÃO HISTÓRICA E POLÍTICA DA BIOÉTICA NA

CORÉIA

3.1. O surgimento dos comitês éticos

Até a eclosão do escândalo protagonizado por Hwang, a Coréia do Sul não havia

despertado devidamente para o problema da ética na condução das pesquisas biomédicas, isto

porque até então o interesse econômico permeava todas as decisões na área, e somente com o

interesse e a persistência de pequenos grupos éticos, notadamente grupos civis de proteção

dos direitos humanos e grupos religiosos, mas principalmente cientistas da área que tiveram

acesso a noções de ética através de seus contatos com colegas do ocidente, é que as primeiras

medidas (paliativas) na área de bioética vieram a ser tomadas no país.

De fato, embora o país tenha iniciado suas pesquisas biotecnológica desde 1982, a

promulgação da lei de biossegurança do país só veio a ser promulgada no ano de 2005, após

anos de intensos debates sociais e políticos entre aqueles que defendiam uma visão utilitarista

das pesquisas, advogando a liberdade das pesquisas, e aqueles que defendiam a visão mais

ética e moral, lutando pela proteção da dignidade humana, principalmente as relacionadas

com a clonagem e as pesquisas embrionárias.

É marcante o fato de que este conflito de interesses somente passou a apresentar algum

grau de seriedade muito depois que outras nações, inclusive o Brasil, já realizavam calorosos

debates há muito tempo atrás, e já haviam organizado alguma forma de controle das pesquisas,

de maior ou menor grau, seja através de criação de comissões éticas, seja através de criação

de leis regulamentadoras.

Segundo a professora Pak42, a primeira grande tentativa de estabelecer algum tipo de

controle na pesquisa genética no país veio com o estabelecimento de comitês éticos nos

centros de pesquisas genéticas no país, que deveriam autorizar e supervisionar a condução das

pesquisas médicas. 42 Un Jong PAK, Bioethics, Research Ethics and Regulation. Pg.101

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43

Assim, com a criação da “Korean Good Clinical Practice” (KGCP) em 1995, foi

determinada a obrigação de criação de IRB (Institutional Review Board) dentro de grandes

centros médicos onde pesquisas clínicas eram realizadas.

O sistema de controle ético através das “IRB” surgiu nos países mais desenvolvidos da

Europa a partir da década de 60, para o fim de estabelecer normas e padrões de ética para a

condução das pesquisas biomédicas, contudo, através de esforços da Organização Mundial de

Saúde e de diversos organismos internacionais a criação e administração destes organismos,

veio a ser padronizado internacionalmente a partir dos anos 90.

Seguindo o exemplo vindo do ocidente, a KGCP veio ser reformulada em 2001 para

permitir a implantação efetiva do sistema de IRB no país, e em 2002 foi criada a “Korean

Association of Institutional Review Boards” pela união de médicos, cientista, profissionais da

lei e membros dos principais IRB do país.

Contudo a implantação dos IRB mostraram certas deficiências no cumprimento de sua

funções, principalmente na fiscalização das pesquisas genéticas embrionárias de célula tronco,

notadamente por falta de membros qualificados na área entre os seus membro efetivos, além

de outros problema como a questão da parcialidade ou independência de seus membros, que

participavam das pesquisas que deveriam fiscalizar.

Um importante marco no esforço de melhorar o funcionamento das IRB do país foi a

criação do comitê ético do “Centro de Pesquisa de Célula Tronco” do país, entidade criada em

outubro de 2002 para dar suporte técnico e financeiro a pesquisas embrionárias em quatro

principais áreas que são:

a) Derivação de células humanas embrionárias pluripotentes e operação de banco de

linhas de células;

b) Controle na diferenciação de células embrionárias pluripotentes;

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44

c) Análise da natureza das células tronco adultas e o desenvolvimento tecnológico

para o tratamento de doenças; e

d) O desenvolvimento técnico com base na aplicação de células tronco de animais43.

Sendo este comitê, o comitê regulador do maior centro de promoção da pesquisa

genética do país, os seus regulamentos passaram a servir de parâmetro para os demais comitês

éticos do país, vindo a ser observado pelos institutos de pesquisas do país que recebiam

financiamento deste centro.

As atribuições do comitê ético do “Centro de Pesquisa de Célula Tronco” consistia na

análise e aprovação de projetos nos campos de seu interesse, assim como a criação de normas

e regulamentos para a condução ética das pesquisas embrionárias, e para tal grupos de análise

eram criados para analisar as propostas de pesquisas do centro. O comitê deveria também

criar contra medidas para possíveis problemas éticos porventura existentes assim como

criação de programas de educação e materiais de consulta dirigidos para os pesquisadores.

Na apreciação dos projetos promovidos pelo centro, o comitê analisava 11 quesitos

que eram:

a) O objeto da pesquisa é apropriado?

b) O método de pesquisa proposto é cientificamente adequado?

c) Os pesquisadores envolvidos no projeto tem capacidade acadêmica e ética para

conduzir a pesquisa proposta?

d) A proposta de pesquisa satisfaz todos os requisitos?

e) O processo de escolha das pessoas que serão submetidos à pesquisa foi

apropriado?

f) O consentimento expresso a ser assinado pelas pessoas submetidas à pesquisa

atende às exigências legais?

g) O projeto analisado foi anteriormente aprovado por algum IRB importante?

43 Ibid., Pg.90

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45

h) Os animais envolvidos na pesquisa serão tratados corretamente?

i) Existem medidas de segurança para eventuais casos emergenciais?

j) A pesquisa em análise pode de alguma forma afetar os valores da sociedade?

k) As normas pertinentes à pesquisa em questão estão sendo observadas44?

Analisados os quesitos mencionados acima o comitê emitia o seu parecer podendo:

rejeitar a pesquisa, reprovar a pesquisa, aprovar a pesquisa com ou sem ressalvas, apresentar

exigências para nova análise ou suspensão/cancelamento de projeto anteriormente aprovado.

Posteriormente à análise mencionada acima existiam critérios adicionais a serem

considerados e complementados conforme o tipo de pesquisa realizada pela equipe de

pesquisa:

1 – No caso de pesquisa de derivação de células humanas embrionárias pluripotentes e

operação de banco de linhas de células:

a) Apresentar relatórios sobre o procedimento de obtenção do consentimento

escrito dos doadores de embriões, assim como a guarda destes documentos;

b) Apresentar os documentos analisados e aprovados pelo IRB;

c) Apresentar o “Frame Standar Operating Procedures” (SOP) para

estabelecimento do bancos de células embrionárias e operação de linhas de

células;

d) Adotar medidas para proteção das informações pessoais do doadores de

embriões;

e) Estabelecer plano de contingência para possíveis problemas relacionados com

a utilização das informações resultantes das pesquisas realizadas; e

f) Estabelecimento de normas de conduta ou procedimento para realização de

teste em animais45.

44 Ibid.,. Pg.98 45 Ibid.,. Pg.99

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46

2 – No caso de pesquisa com células embrionárias pluripotentes:

a) Especificar a fonte e o procedimento de distribuição das células embrionárias,

assim como submeter documentos considerados relevantes;

b) Apresentar os documentos submetidos à IRB para análise e aprovação;

c) Estabelecimento de normas de conduta ou procedimento para realização de

teste em animais.

3 – No caso de pesquisa com células embrionárias adultas:

a) Apresentar os instrumentos de consentimento expresso assinado pelo doadores

de células e tecidos;

b) Apresentar os documentos submetidos à IRB para análise e aprovação;

c) Estabelecimento de normas de conduta ou procedimento para realização de

teste em animais.

4 – No caso de pesquisa com células embrionárias de animais:

a) Estabelecimento de normas de conduta ou procedimento para realização de

teste em animais;

b) Submeter-se avaliação ou consulta para tratar de questões relacionados com o

efeito sócio-cultural e segurança ecológica sobre os animais mortos durante as

pesquisas46.

Mas o controle e supervisão da pesquisa biomédica do país não podia depender apenas

da atuação isolada dos comitês éticos dos centros de pesquisa, uma vez que com o grande

desenvolvimento das pesquisas genéticas a sociedade passava a exigir do estado um controle

mais ativo e centralizado; desta forma o governo e as lideranças civis e políticas do país

começaram a se concentrar na elaboração de leis de controle das pesquisas genéticas.

46 Ibid.,. Pg.100

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3.2. A criação da Lei de Bioética e Biossegurança da Coréia

A eclosão do evento protagonizado por Hwang foi uma prova clara de que a Coréia

havia se lançado ao desenvolvimento de suas pesquisas genéticas sem a devida preparação

com as questões éticas de suas pesquisas.

Conforme verificado no estudo do desenvolvimento tecnológico do país, nota-se

claramente que o governo não teve interesse em proteger os valores sociais nas pesquisas no

país, pois o real interesse por trás destas pesquisas foi sempre o interesse econômico, e a

análise da forma como a questão bioética foi tratada a nível legislativo no país, é um bom

exemplo da falta de preocupação política por parte do estado na questão.

De fato, como tentativa de criar um controle legislativo único para a questão, desde

1997 foram realizadas no país 8 tentativas sérias de criação de leis sobre bioética e

biosegurança no país, como o projeto “Lei de Proibição à Clonagem Humana” e a “Lei de

Diretrizes Bioéticas”, sendo que a maioria destes propunham a proibição da clonagem no

país47.

Contudo, devido à dificuldade de se chegar a um consenso sobre a condução das

pesquisas genéticas, o debate sobre a questão sofreu um esfriamento, e a partir do ano de 2000

as decisões na área da biotecnologia passaram a ser realizadas apenas através de

regulamentações administrativas.

Segundo afirma a professora de filosofia de direito da Universidade de Seul, Dra. Pak,

serviram como principais obstáculos para o estabelecimento de uma lei unificada em bioética

o interesse exacerbado do país no desenvolvimento pesquisas para fins comerciais, o

utilitarismo científico dos pesquisadores, a “lógica rígida” dos grupos religiosos e

organizações civis com posições intransigentes sobre a questão, mas principalmente a

incapacidade das autoridades públicas da área, a saber o Ministério das Ciências e Tecnologia

47 Ibid., Pg.180

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48

e o Ministério da Saúde, de chegarem a um ponto em comum nas suas divergências quanto à

questão48.

Contudo, após o anúncio do sucesso da primeira clonagem animal promovido pela

empresa “Clonaid” no país, no fim do ano de 2002, o interesse popular pela pesquisa genética

sofreu um reavivamento, e a população em geral voltou a cobrar do poder público um

posicionamento definitivo sobre a questão, e desde então parecia que um entendimento

uniforme dos ministérios da saúde e ciência estava para ser alcançado em pouco tempo.

Contudo tal expectativa não se concretizou.

3.2.1. Cronograma da elaboração das leis bioéticas da Coréia

Analisando a evolução histórica da legislação do país sobre a bioética, verifica-se que

o primeiro ato decisivo sobre a questão deu-se no ano de 1983, com a promulgação da “Lei de

Suporte à Biotecnologia”, que determinou em seu artigo 15° que o estado deveria criar leis

regulamentando as experiências na área, assim como prever os possíveis efeitos negativos da

mesma, tomando as medidas necessárias para enfrentá-las.

Posteriormente em 1984, promulgou-se uma lei regulamentando a “Lei de Suporte à

Biotecnologia”, somente para acrescentar que o estado deveria criar leis estabelecendo

padrões de segurança em relação a organismos geneticamente modificados49.

Finalmente, em 1997 e 1998 foram apresentados dois projetos de lei para emendar a

Lei de Suporte à Biotecnologia, sendo que destes projetos a proposta apresentada pelo

deputado Lee Sang-Hee, apresentou maior repercussão dentro da sociedade coreana.

O projeto do deputado Lee tinha três pontos principais:

48 Ibid., Pg.181 49 Ibid., pg.183

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49

1) Adoção de medidas legais contra possíveis danos biológicos e contra possíveis

condutas antéticas provocadas pelo ritmo acelerado do desenvolvimento da

biotecnologia no país;

2) Proibição de pesquisas que venham representar ameaça à dignidade humana, assim

como o corte de subsídios e custeios de tais pesquisas; e

3) A criação do “Comitê de Ética e Segurança em Biotecnologia” subordinado ao

Ministério da Ciência e Tecnologia para supervisionar e fiscalizar a pesquisa

genética no país, contudo tal proposta não previa sansões a quaisquer violações da

lei, chegando a ser lacunoso em determinados assuntos.

Seguindo com as tentativas de estabelecer uma legislação definitiva sobre o caso, em

22⁄05⁄2000 o Ministério da Ciência e Tecnologia apresenta o projeto de “Esboço Geral da Lei

de Diretrizes de Bioéticas” e a “Lei de Proibição da Clonagem Humana e Pesquisa de Células

Tronco”, com ênfase à proibição da clonagem humana, contudo, mesmo fazendo referência à

clonagem embrionária através da transferência nuclear de células somáticas e transferência

entre espécies, a lei não chegava a vedá-las em princípio, tentando apoiar as pesquisas

genéticas com células tronco e tratamento de doenças incuráveis50.

Contudo o maior desafio à criação de uma legislação única para a área de

biotecnologia residiu sempre no conflito ideológico existente entre o Ministério da Ciência e

Tecnologia e o Ministério da Saúde e da Previdência, sendo que o primeiro procurava

estabelecer restrições mínimas à pesquisa genética, atendendo aos anseios dos pesquisadores e

das indústrias biotecnológicas, enquanto que o segundo se preocupava em estabelecer limites

à pesquisa genética, preocupado em atender o anseio da opinião pública sobre questões

relacionadas à saúde pública e da dignidade humana.

Segundo entendimento da Professora Un Jong Pak, para a promulgação de uma lei

definitiva, haviam três grandes questões que tinham que ser resolvidos pelo governo coreano,

sendo que destes a primeira questão se referia à forma legislativa como a pesquisa genética

iria ser abordada legalmente, se haveria uma lei que tratasse genericamente de todos os

50 Ibid., pg.193

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50

assuntos relacionados com a bioética, como na “Lei de Diretrizes de Bioética”, proposto pelo

Ministério da Saúde, ou primeiro seria promulgado uma lei em caráter de urgência que trataria

da proibição da clonagem humana primeiro, e depois, após um consenso nacional sobre os

demais assuntos, seriam promulgadas leis específicas sobre cada assunto relacionado com a

biotecnologia, como o uso e administração dos embriões para pesquisas, terapia genética,

proteção dos dados genéticos, etc.

A segunda questão dizia respeito às pesquisas de clonagem embrionárias, sendo que

quanto à clonagem humana através da técnica de transferência de núcleo de célula somática,

os dois ministérios eram unânimes em proibi-la completamente, contudo quanto à pesquisa de

clonagem de embrião humano por transferência de núcleo de celular somática, ou terapia

genética, os dois ministérios divergiam quanto à sua permissibilidade, defendendo o

Ministério da Saúde que deveria ser proibido em princípio e excepcionalmente permitido,

após análise do Comitê Nacional de Bioética, enquanto que o Ministério da Ciência defendia

que a lei não deveria proibir a pesquisa genética, deixando para arbítrio do Comitê que

decidiria cada caso em separado, conforme a necessidade do momento. Entre as duas opções

o governo mostrava maior simpatia pela opção apresentada pelo Ministério das Ciências.

Por fim estava a definição das regras para a criação do “Comitê Nacional de Bioética”,

estabelecendo detalhes a respeito de sua composição, forma de nomeação de membros,

atribuição, e principalmente quanto à sua definição entre órgão meramente consultivo ou com

poderes de fiscalização e regulamentação.

Para resolver tal impasse, foi ordenado pelo presidente da república a mediação do

Ministério da Coordenação Política do conflito, e em 25⁄07⁄2002 determinou-se que:

1) Seria criado uma lei única para a área de biotecnologia, sob a subordinação do

Ministério da Saúde e Previdência, com a cooperação do Ministério da Ciência e

Tecnologia;

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2) Que membros do Ministério da Saúde e Previdência preencheriam os cargos do

Comitê Consultivo Nacional de Bioética com a cooperação do Ministério da

Ciência, assim como a co-administração do Comitê por ambos os ministérios; e

3) Que o Ministério da Ciência e Tecnologia seria o responsável por apresentar

projetos de lei na área da biociência, ficando o Ministério da saúde com as demais

áreas.

Assim, com base no acordo alcançado pela intervenção do Ministério da Coordenação

Política, o Ministério da Saúde e Previdência prepara a “Lei de Bioética e Biosegurança” e em

9 de outubro de 2002 realiza uma audiência pública para discutir a lei.

A lei tratava em geral dos seguintes assuntos:

1) Criação do “Comitê Consultivo Nacional de Biotecnologia” para supervisão de

segurança e ética na biotecnologia, formado pelo mesmo número de membros da

área científica e não-científica;

2) Proibição total da clonagem humana, com pena de prisão de 10 anos para os

infratores;

3) Proibição em princípio da clonagem embrionária através da transferência de

núcleo de célula somática, podendo ser excepcionalmente permitida após análise

do comitê consultivo;

4) Permissão de uso de embriões para pesquisa científica, mas que tenham sido

criados há mais de 5 anos para tratamento de infertilidade, após análise do comitê

consultivo;

5) Proibição em princípio de pesquisa de hibridação entre espécies;

6) Adoção de restrição estrita em teste de genes e tratamento genético;

7) Proibição de criação de embriões humanos fora de propósitos de concepção

humana; e

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8) Proibição de fornecimento de óvulos e esperma para fins comerciais51.

Conforme visto, desde que a discussão a respeito da questão bioética começou a ser

realizada nos fins dos anos 90, discussões sinceras e acaloradas foram realizadas a este

respeito, o que é algo raro no país; contudo devido à oposição levantada pelo Ministério da

Ciência e Tecnologia, junto com Ministério da Indústria e Energia e o Ministério da

Agricultura, diversas objeções foram levantadas, criando as dificuldades observadas na

criação da lei final unificada.

Durante tal período de discussão e negociação, cidadãos insatisfeitos com a

incapacidade do estado em tomar uma atitude definitiva quanto ao caso, uniram-se para criar

uma associação civil chamada “Grupo unido em campanha pela promulgação rápida da Lei de

Diretrizes Bioéticas”, que exigia a proibição total da clonagem embrionária e da hibridização

entre espécies.

Outros grupos civis como o grupo de defesa dos direitos das mulheres, protestaram

contra as regras relacionadas com o uso dos embriões para pesquisa genética; os católicos

protestaram também pela proibição total das pesquisas de clonagem embrionárias e o setor

comercial protestou contra as medidas propostas pelo Ministério da Saúde, por considerá-las

demasiadamente pesadas, impedindo o desenvolvimento das pesquisas, e pediu a liberação

total das pesquisas.

Contudo, apesar do acordo alcançado através da intermediação do Ministério da

Coordenação Política, o impasse entre os ministérios continuou existindo, e o projeto de lei da

“Lei de Bioética e Biosegurança” do Ministério da Saúde foi apresentada em 2002 por um

grupo de 89 deputados para a Comissão da Saúde e Previdência na Assembléia Nacional,

enquanto que o projeto de lei da “Lei de Proibição da Clonagem Humana e Pesquisa de

Célula Tronco” do Ministério das Ciências e Tecnologia foi apresentado para a “Comissão de

Ciência, Tecnologia, Informação e Telecomunicação” da Assembléia Nacional.

51 Ibid., pg.195

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53

Para tentar atender aos interesses de todos os envolvidos na questão, o governo criou

um texto conjunto que permitiria a pesquisa de transferência de núcleo de célula somática,

mesmo entre espécies diferentes, para pesquisa de tratamento de doenças raras e incuráveis,

mas somente com aprovação presidencial.

Por fim, a “Lei de Bioética e Biosegurança” foi aprovada pela Assembléia Nacional

em 29⁄12⁄2003 passando a ter efeito a partir de janeiro de 2005.

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54

4. ANÁLISE DA LEI DE BIOÉTICA E BIOSSEGURANÇA COREANA

4.1. Visão geral da lei

Conforme mencionado anteriormente a “Lei de Bioética e Biossegurança” da Coréia

foi criado a partir de um trabalho árduo e demorado, a partir da unificação de vários projetos

anteriores existentes na área, a saber: “The Bioethics and Biosafety Act” de 13/11/2002,

“Human Cloning Prohibion and Stem Cell Research Act” de 01/01/2003, “Bioethic

framework Act” de 27/03/2003, “Petition on the Legislation of the Bioethic and Biosafety

Act” de 06/11/2002 e “Petition on the Legislation of the Protection of Human Embrio Act” de

21/04/2003.

Diferente do Brasil, o foco da lei coreana é principalmente a pesquisa genética humana

e animal, não prevendo nenhuma norma em específico a respeito das pesquisas de OGM, que

no caso do Brasil é o foco principal da lei de biossegurança do país.

De fato, os 55 artigos da Lei de Bioética e Biossegurança Coreana se dedicam

exclusivamente a regulamentar a realização e supervisão da pesquisa genética embrionária,

enquanto que na Lei de Biossegurança do Brasil apenas o art. 5 e alguns artigos esparsos se

dedicam a tratar exclusivamente da pesquisa embrionária no país.

O motivo de tal discrepância se dá por uma razão muito óbvia: A Coréia do Sul é um

país pequeno, com 70% do seu terreno ocupado por montanhas, existindo pouco espaço arável,

assim a sua indústria agrícola é pequena, obrigando o país a importar a maioria dos alimentos

que consome; desta forma o país concentrou a sua pesquisa biotecnológica em genética

animal e humana, sendo hoje um dos países mais avançados nesta área, enquanto que no

Brasil, devido à sua pujante indústria agropastoril, investiu os seus recursos nas pesquisas

agropecuárias, focando na criação de OGM.

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55

Diferente da lei brasileira, a lei coreana concentra esforços na regulamentação da

pesquisa genética, instituindo normas a respeitos de criação de comitês éticos, definição de

competências, procedimentos clínicos e padrões de conduta ética, além de uma variedade de

proibições e permissões, tudo com o fim de coibir a prática antiética da pesquisa no país. No

Brasil a Lei de Biossegurança concentra grande parte dos esforços em assuntos

administrativos como a criação, constituição e atribuições de comissões e comitês que

segundo algumas críticas locais, reservam demasiado poder nas mãos dos comitês.

Se a lei brasileira concentra-se em erigir a estrutura administrativa para

regulamentação e supervisão da pesquisa bioética no Brasil, na lei coreana tal característica é

falha, limitando-se a determinar que neste aspecto, uma comissão nacional de assuntos

bioéticos “deverá” ser criada num futuro para revisar os assuntos referentes à matéria e alguns

detalhes a respeito de sua constituição e funcionamento. Tal detalhe, expresso no artigo 6° da

lei coreana, demonstra que a batalha de interesses entre o Ministério da Ciência e Tecnologia,

representando a corrente utilitarista do país e o Ministério da Saúde e Previdência,

representando a corrente conservadoras ainda não havia sido totalmente apaziguada.

De fato, determina o Art.7° da lei coreana que o futuro “Comitê Nacional de Bioética”

deverá ser secretariado por dois secretários executivos advindos de cada um dos ministérios

envolvidos, sendo que a chefia da secretaria caberá ao secretário apontado pelo ministério as

Saúde e Previdência.

À primeira vista pode parecer que a posição do Ministério da Saúde saiu-se vencedora

na disputa, em virtude da chefia que obteve da secretaria executiva do “Comitê Nacional de

Bioética” conforme mencionado acima, contudo lendo-se mais adiante na lei, especificamente

no seu artigo 17°, que trata da pesquisa genética de embriões, a lei vem a permitir a pesquisa

com embriões excedentes para tratamento de infertilidade ou doenças raras, incuráveis e

outros, sob a permissão direta do presidente do país.

Neste aspecto verifica-se que embora a lei tenha proibido a pesquisa de clonagem

humana (ponto em que os dois ministérios concordavam), a pesquisa com embriões veio a ser

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permitida com restrições, resultando em última análise na vitória dos interesses do Ministério

da Ciência e Tecnologia que defendia a pesquisa controlada das pesquisas embrionárias.

Até a promulgação desta lei os dois ministérios conflitavam em muitas questões

relacionadas com as pesquisas embrionárias, como na permissão ou não de uso dos embriões

não transplantados e os que não ultrapassaram 14 dias de inseminação, sendo que quanto à

última questão a discussão residia na polêmica de se definir o tempo em que se inicia a

contagem de 14 dias para fins de pesquisa: se a partida da concepção ou quando o núcleo da

célula somática é transferido para o óvulo ou permitir que a pesquisa seja feita mesmo depois

de 14 dias.

A favor da visão permissível das pesquisas com embriões existia o “Guia Ética de

Prática Médica” elaborado pela Associação Médica Coreana, que visava regulamentar a

pesquisa com embriões e proibia determinados tipos de experiências por considerá-los

antiéticos, contudo permitia a pesquisa de embrião com até 14 dias, inclusive para fins de

clonagem, permitindo também a pesquisa de transferência nuclear para fins experimentais e o

uso de embriões usados em experimento para fins de tratamento52.

Contudo, a visão mais humanista das pesquisas estava ganhando força na sociedade e

a tendência existente na época era permitir a pesquisa com excedente de embriões

inseminados para fins de inseminação artificial, constituindo para tal um órgão especial que

fiscalizaria e concederia permissão para uso de embriões para pesquisa, contanto que os

doadores dos espermas e óvulos consentissem com o seu uso em pesquisa. A produção de

embriões para propósitos diversos à inseminação artificial foi proibida e a produção de

embriões humanos pela clonagem de embriões, ou seja, através da transferência de núcleo de

célula somática foi proibida também.

Promulgada a lei, a pesquisa com células-tronco veio a ser permitida, com as

restrições já mencionadas, contudo a lei nada veio a se referir quanto à permissão de uso de

embriões com 14 dias de concepção.

52 Um Jong PAK. Bioethic, research ethic ans regulation. Pg. 159

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Outro aspecto importante desta lei é a consagração expressa dos princípios da

autonomia, descrito como Auto-determinação no Art.5 da lei, que estatui o dever das

entidades de pesquisa de prestar informação àqueles que se submetem às pesquisas, assim

como o direito de consentir ou recusar participar de qualquer atividade de pesquisas após

devidamente informados, e o princípio da Beneficência mencionado no parágrafo 2 do Art.4°

que determina que todo aquele que promove a pesquisa biomédica deverá se empenhar para

proteger a dignidade e os valores humanos, realizando as suas atividades de pesquisa de

acordo com os princípios da bioética e biossegurança.

A adoção de tal dispositivo se dá em virtude da pressão dos grupos de oposição à

pesquisas genéricas do país, que desde a publicação dos trabalhos de Dr Hwang exigiam a

proibição ou o controle total das pesquisas genéticas do país. Uma vez que o desejo do

governo contrariava os interesses destes grupos a permissão condicionada das pesquisas veio

acompanhada da adoção destes princípios éticos.

A adoção incisiva destes princípios pela lei se mostra extremamente necessária na

Coréia (e nos demais países orientais em geral), em virtude das características da cultura local,

que influenciada pela filosofia confucionista, possui uma forte hierarquização social que

coloca o médico numa posição de superioridade em relação aos seus pacientes, fazendo-se

necessário estabelecer alguma forma de proteção à pessoas comuns do poder de influência

que os médicos tem sobre pacientes e subordinados.

De fato, em virtude deste aspecto social, a relação médico-paciente existente na Ásia,

principalmente na Coréia, difere daquilo que se observa muito nos países ocidentais, tornando

impraticáveis muitos dos princípios bioéticos existentes no ocidente.

As características mencionadas acima são os pontos mais importantes desta lei,

contudo existem outros detalhes importantes de relevância como a proibição de clonagem

humana; a permissão de uso de embriões excedentes para pesquisa de doenças incuráveis e

contra a infertilidade (com aprovação do Ministério da Saúde), a criação do Comitê Nacional

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de Bioética e das “Institutioanl Review Boards”, a produção e manutenção das células tronco

para pesquisas, as pesquisas com DNA, a realização de terapias genéticas, entre outros.

Examinemos cada caso em separado.

4.2. Do Comitê Nacional de Bioética e das “Institutional Review Boards”

Previstos nos artigos 6° a 10° da Lei de Biossegurança do país, as duas instituições

tem o papel de zelar pelo cumprimento dos princípios éticos nas pesquisas genéticas do país,

cada um atuando em esferas separadas: O Comitê Nacional de Bioética a nível nacional, junto

ao governo federal e as “Institutional Review Boards” internamente, nos centros de pesquisas

onde são realizadas as pesquisas genéticas.

Quando da discussão do projeto de lei da Lei de Biossegurança, e a definição dos

detalhes referentes à Comissão Nacional de Bioética, vários conflitos relacionados com a

questão como a sua atribuição, subordinação, composição, execução, entre outros haviam

surgido.

A primeira grande dúvida residia na questão de sua atribuição, determinando-se se

devia ser um órgão consultivo, de caráter meramente opinativo, ou deliberativo, exercendo

atividade de regulamentação e de fiscalização.

O governo, através de sua influência junto ao poder legislativo do país, determinou

que o comitê tivesse uma função mais ativa ao mero aconselhamento, assim, em casos de

pesquisas com transferência de núcleo de célula somática, decisões seriam feitas por ordem

presidencial, depois de ouvido o conselho deste comitê, mas quanto às demais questões

relacionadas com a pesquisa genética, atuaria de forma mais decisiva, sendo incumbido de

cuidar de temas como definição de políticas de biossegurança, criação de normas sobre

pesquisas embrionárias, procedimentos éticos em geral, entre outras.

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A segunda dúvida residia quanto à questão de sua subordinação, existindo dúvida

quanto a quem o comitê deveria responder na execução de suas funções, sendo que os que

defendiam a criação de um comitê forte opinavam pela sua vinculação a uma entidade forte

como a Presidência da República ou o gabinete do Primeiro Ministro, enquanto que aqueles

que desejavam um comitê de influência menor defendiam a sua vinculação a uma entidade de

menor poder como o Ministério da Ciência ou da Saúde, ou a sua existência como um comitê

adjunto ao Congresso Nacional53.

Contudo, em virtude da grande importância econômica e estratégica que as pesquisas

tinham para o governo coreano, decidiu-se pela sua vinculação à Presidência da República,

que possuía uma visão utilitarista das pesquisas, reservando, contudo, algumas decisões de

grande importância ao Presidente da República, como a concessão de permissão para

produção de embriões pela clonagem de células-tronco.

Quanto à questão de sua composição, estava em foco a definição de número de

membros do comitê e a forma de nomeação dos mesmos, numa disputa para ver quem

ocupava mais vagas no conselho, o governo ou as entidades civis, sendo que a última desejava

ocupar pelo menos 50% por cento das vagas a serem criadas no conselho em formação.

Contudo, com a promulgação da lei, definiu-se pela criação de 3 grupos distintos de

membros do comitê, sendo que o primeiro grupo, composto de 8 membros, era composto

pelos ministros das seguintes áreas do governo: Ministro da Educação e do Desenvolvimento

dos Recursos Humanos, Ministro da Justiça, Ministro da Ciência e Tecnologia, Ministro do

Comércio, Ministro da Indústria e Tecnologia, Ministro da Saúde e da Previdência, Ministro

da Equidade Sexual e o Ministro da Legislação Governamental.

O segundo grupo de 7 pessoas era composto de pessoas oriundas da área técnica como

cientistas, professores, representantes da área industrial, entre outros com experiência na área

da ciência médica.

53 Um Jong PAK. Bioethic, research ethic ans regulation. Pg. 210

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O terceiro grupo, também composto de 7 pessoas, era composto de membros de

sociedade civil como religiosos, filósofos, advogados, membros de organizações cíveis entre

outros. Todos os membros dos três grupos eram nomeados pelo Presidente da República.

Quanto à forma de execução de suas atividades, decidiu-se pela nomeação de 2

secretários executivos provenientes dos ministérios da Saúde e das Ciências, contudo a chefia

da secretaria foi confiada ao representante do Ministério da Saúde, que sempre teve uma

postura moral e humanista na questão.

Para o controle interno dos laboratórios de pesquisas na área de ciência da vida e

biotecnologia deveriam ser criados os “Intitutional Review Board”, que deveriam zelar pelo

cumprimento das normas de bioética e biossegurança do país.

De acordo com o Art. 9° da Lei de Bioética e Biossegurança da Coréia, as instituições

obrigadas a adotar estes órgãos de controle são: Os institutos de pesquisa embrionária e

bancos de DNA registrados junto ao Ministério da Saúde, Institutos de gene terapia e demais

institutos, que permitidos pelo Ministério da Saúde, venham a realizar algum tipo de pesquisa

relacionado na área de ciência da vida ou biotecnologia e cujo trabalho possa ter algum

impacto moral ou significado social.

Quanto às pesquisas desenvolvidas por estas instituições o escopo do IRB será a

fiscalização dos seguintes requisitos: Se a instituição que realiza a pesquisa está realizando

pesquisa de valor ético aceitável, dentro dos procedimentos éticos determinados em lei, se o

consentimento daqueles que se submetem às pesquisas foi obtido de forma correta, se

procedimentos de segurança e proteção dos dados confidencias daqueles que se submetem à

pesquisa são respeitados e outros assuntos de relevância relacionados com as pesquisas da

ciência da vida e biotecnologia.

A composição do IRB será de 5 a 9 membros, a serem apontados pelo responsável de

cada instituição, devendo, contudo observar que um membro do IRB deverá ser pessoa sem

envolvimento com pesquisas genéticas e mais um membro que não pertença ao quadro da

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instituição. Pessoas cujos trabalhos ou pesquisas sejam sujeitos à fiscalização da IRB, não

poderão ser membros do IRB.

4.3. Das pesquisas embrionárias e das instituições de produção e pesquisa de embriões

Conforme mencionado, a visão utilitarista das pesquisas embrionárias acabou saindo

vencedora na disputa de interesses na lei de biossegurança e bioética do país, permitindo-se,

sob restrições, a realização de pesquisas embrionárias com células-tronco.

Contudo a pressão social por uma bioética controlada e responsável ainda estava sendo

exigido pelos grupos de oposição às pesquisas, que preocupados pelo avanço da pesquisa

genética no país, principalmente com os sucessos aclamados pelo Prof. Hwang, exigiam

controles rígidos para realização das pesquisas na área.

O governo, por sua vez, desejando apoiar o desenvolvimento das pesquisas através de

sua maior estrela na área, o Prof. Hwang, tentou criar a lei de tal forma que permitisse ao

mesmo continuar as suas pesquisas, dando, contudo, algumas concessões às pressões

contrárias, na tentativa de agradar a todos os interesses envolvidos na questão.

Desta forma adotou certos procedimentos padronizados nas pesquisas genéticas em

geral, criando uma série de medidas e procedimentos burocráticos para dificultar o uso

antiético e ilícito das pesquisas nesta área e assim aplacar as vozes contrárias às pesquisas.

Tais medidas vão desde a exigência de concessão de registros governamentais,

necessidade de consentimentos expressos, uso motivado das pesquisas e dos dados obtidos,

documentação de trabalhos e procedimentos, imposição de frequentes consultas ao ministério

e/ou órgãos éticos por diversos motivos e outras que veremos a seguir. Tais procedimentos

demonstram a consagração dos princípios da autonomia e da beneficência da lei.

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Assim, determina o Art. 17 da lei que embriões congelados a mais de 5 anos, criados

para fins de tratamento de reprodução assistida, poderão ser utilizados para pesquisas

embrionárias, desde que seja para pesquisas de tratamento de infertilidade ou contracepção,

tratamento de doenças raras ou incuráveis (sob permissão presidencial), e outras pesquisas

expressamente permitidas pelo Presidente da República.

Pesquisas com transferência de núcleo de célula somática seguem as mesmas

restrições mencionadas no parágrafo anterior, sendo permitidas apenas para pesquisas de

doenças incuráveis e com permissão presidencial, após consulta ao Comitê Nacional de

Bioética (Art.22).

Desta forma, fica proibida implantar, manter ou dar vida a clone de embrião de célula

somática no útero (art.11) e realizar experiências embrionárias entre espécies diferentes. A

produção de embriões somente pode ser permitida para fins de reprodução, contudo a

reprodução não pode ser realizada nas seguintes condições: para escolha do sexo do bebê,

criação de embriões a partir de pessoas mortas ou de pessoas menores. A única exceção para a

última regra é quanto a casais de menores que desejem ter filhos.

Para aumentar o controle das pesquisas embrionárias a lei criou normas específicas

para as instituições médicas produtoras de embriões e aquelas que conduzem experiência com

as mesmas, estabelecendo normas próprias para cada tipo de entidade.

4.4. Das instituições médicas de produção de embriões

As instituições produtoras de embriões são aquelas que coletam óvulos e espermas

para fertilização artificial e devem ser credenciadas diretamente pelo Ministério as Saúde para

tal fim, operando de acordo com as normas estabelecidas pelo ministério.

Assim, estabelece em linhas gerais que o Ministério da Saúde deverá criar norma

regulamentadoras da atividade das entidades médicas produtoras de embriões, e também

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normas sobre o dever de obter o consentimento informado dos doadores e das regras de

conservação e descarte dos embriões.

Sobre o dever de obter o consentimento informado, determina o Art. 15 que no ato da

coleta do óvulo ou do esperma, a instituição médica deverá obter o consentimento escrito dos

doadores, e no caso de atividade de inseminação artificial o consentimento deverá ser obtido

da paciente e do conjugue da paciente. O formulário que documenta o consentimento deverá

constar as seguintes informações:

1. Detalhamento do motivo da produção dos embriões;

2. Definição do período de depósito dos embriões;

3. Descrição do descarte dos embriões excedentes;

4. Da permissão ou não dos doadores de permitir o uso dos embriões excedentes

para outros fins diversos ao da inseminação, e

5. Informações sobre forma de revogação do consentimento, sobre a proteção dos

direitos e das informações dos doadores, e outras informações necessárias

definidas pelo Ministério da Saúde.

Quanto às normas de conservação dos embriões, determinou-se o limite de tempo de 5

anos para a sua conservação, período após o qual os embriões deverão ser descartados pela

instituição médica, com exceção daqueles permitidos para uso em pesquisa. As instituições

médicas devem manter registro sobre a coleta e descarte dos embriões.

4.5. Das instituições médicas de pesquisa de embriões

As instituições de pesquisa que desejem realizar pesquisas embrionárias devem ser

cadastradas junto ao Ministério da Saúde como instituição de pesquisa embrionária,

cumprindo com todas as exigências estabelecidas pelo Ministério da Saúde para tais tipos de

estabelecimentos.

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Feito o registro, a pesquisa de embriões deve ser autorizada pelo Ministro da Saúde,

mediante a submissão de um protocolo de pesquisa elaborado pela instituição interessada, que

deverá apresentada junto com o protocolo um parecer da diretoria do estabelecimento de

pesquisa sobre a pesquisa a ser conduzida. Se a pesquisa for patrocinada por fundos

provenientes de uma entidade do governo, o Ministro da Saúde deverá discutir o conteúdo da

pesquisa com o responsável desta entidade antes de autorizar a pesquisa (art.19).

Quando a instituição médica que produz embriões transferir os embriões excedentes à

instituição de pesquisa, poderá requerer compensação financeira pelos custos de preservação e

transferência dos embriões. A compensação deverá ser autorizada pelo Ministério da Saúde,

que irá decidir sobre o valor de compensação a ser pago pela instituição de pesquisa, assim

como outros detalhes como o procedimento de transferência dos embriões.

Caso a instituição de pesquisa deixe de utilizar alguns dos embriões recebidos, deverá

descartar os mesmos de acordo com a norma estabelecida no art.16, criando e mantendo

registro, de acordo com as normas a serem estabelecidas pelo Ministério da Saúde.

Tanto a instituição de produção quanto a de pesquisa tem obrigações de cumprir com

os critérios definidos no consentimento informado assinado pelos doadores, cuidando e

descartando os óvulos com cuidado e em caso de haver potenciais perigos de biossegurança

ou bioética deverão suspender as suas atividades e tomar as medidas de segurança aplicáveis.

4.6. Das instituições de produção e pesquisa de clones de embriões de células

somáticas

As entidades que desejem empreender atividades de criação e pesquisa de clones de

embriões de células somáticas deverão obter registro junto ao Ministério da Saúde, provando

que cumpriram com todas as exigências estabelecidas na lei para tal atividade, principalmente

os dispostos no art. 19 a 21 desta lei.

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4.7. Das pesquisas de DNA

Quanto às pesquisas de DNA, a questão de maior importância para a lei de

biossegurança foi garantir a proteção dos direitos daqueles submetidos às pesquisas,

procurando estabelecer meios para a proteção de sua integridade física e de sua dignidade.

Para tal fim, estabeleceu normas que obriga a instituição de pesquisa a obter o

consentimento informado daqueles submetidos à pesquisa, e de obter permissão por escrito

para a divulgação dos dados obtidos pelas pesquisas.

As normas gerais para as pesquisas de DNA são os seguintes:

Inicialmente, cabe mencionar as restrições às pesquisas de DNA estabelecida na lei

(art.25) que são:

1. Pesquisas de DNA sobre características físicas ou traços de personalidade sem

fundamento científico que possam causar danos às pessoas submetidas a teste, ou

proibidas pelo Presidente da República, após consulta ao Comitê Nacional de

Bioética;

2. Testes de DNA em embriões ou fetos, que somente serão permitidos para

diagnóstico de doença de distrofia muscular ou outras doenças relacionadas com

DNA, conforme aprovadas pelo Presidente da República;

3. Entidades de teste de DNA não poderão realizar testes de DNA para detecção de

doença senão quando for também entidade médica ou vier a ser solicitada por uma.

Para os casos permitidos na lei, o dever de obter o consentimento informado das

pessoas sujeitas à pesquisa impõe-se como a maior de todas as obrigações impostas à

pesquisa; assim determina o Art.26 da lei que antes de realizar a pesquisa a entidade deverá

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obter o consentimento informado da pessoa, informando aos mesmos as seguintes

informações:

1. O objetivo do teste e⁄ou da pesquisa de DNA;

2. Informação se o resultado da pesquisa será utilizado para outros fins que os

determinados de acordo com o item anterior;

3. Informação se os dados da pessoa objeto da pesquisa será revelado junto com os

dados coletados durante a pesquisa, de acordo com o item anterior;

4. Informação sobre a manutenção e prazo de conservação do material obtido durante

a pesquisa; e

5. Informação sobre os procedimentos necessários para revogar o consentimento

dado pela pessoa sujeita ao teste, assim como os seus direitos e outras informações

determinadas pelo Ministério da Saúde.

A obrigação do consentimento informado, nos termos supra mencionado, repete-se no

caso dos incapazes ou quase-incapazes, que além do consentimento normal devem ser

autorizados também pelos guardiões ou tutores destas pessoas. Esta regra somente será

descartada no caso do incapaz estiver impossibilitado de dar o seu consentimento e houver a

necessidade de submeter esta pessoa a diagnósticos ou tratamentos.

Outros casos previstos na lei para descartar o consentimento informado são os casos

de necessidade urgente de identificar pessoas falecidas ou inconscientes e outros casos

permitidos por lei. As formalidades para a obtenção do consentimento assim como demais

detalhes pertinentes ao caso serão definidas pelo Ministério da Saúde (art.26).

Os dados coletados pela instituição de teste de DNA poderão ser repassados para

instituições de pesquisa de DNA ou instituições autorizadas a funcionar como bancos de DNA,

conforme regras determinadas no Art.32 da lei de Bioética, que trata da proteção e uso das

informações genéticas pelas entidades de pesquisa, contudo as informações pessoais das

pessoas sujeitas a teste poderão ser fornecidas em caso de consentimento dos mesmos.

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Os dados coletados com as pesquisas de DNA deverão ser conservados por 5 anos,

quando então deverão ser imediatamente descartados. O consentimento daqueles submetidos a

teste ou de seus guardiões ou tutores tem importância vital neste quesito, uma vez que podem

dispor dos dados livremente junto à instituição de pesquisa, solicitando que sejam descartados

antes do prazo de 5 anos estabelecido em lei ou ainda que os mesmos sejam conservados por

tempo maior se assim desejarem.

Caso a instituição venha a encerrar ou suspender as suas atividades e ficar impedido

de continuar conservando os materiais de pesquisa, deverá providenciar a sua transferência a

outra instituição ou cuidar dos materiais da forma estabelecida pelo Ministério da Saúde

(art.28).

As instituições de teste de DNA deverão manter os seguintes documentos:

1. O consentimento informado, conforme determinado no art.26 desta lei;

2. O resultado dos testes de DNA; e

3. Registro de fornecimento dos dados de pesquisa a outras instituições, conforme

mencionado no Art.27 desta lei.

As pessoas sujeitas à pesquisa de DNA terão o direito de verificar os resultados de

seus testes, podendo inclusive obter cópia dos mesmos. As instituições de pesquisa deverão

atender os pedidos de acesso aos dados das pesquisas.

Por fim, as instituições de pesquisa de DNA não poderão emitir declarações falsas ou

exagerar sobre as pesquisas de DNA nos meios de comunicação, e deverão cumprir com as

seguintes exigências:

1. Cumprir as regras do consentimento informado determinado no artigo 26 desta lei;

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2. Proteger as informações relacionadas com as pesquisas de DNA;

3. Outras exigências que o Ministério da Saúde porventura venha a fazer em relação

aos requisitos supra mencionados;

4.8. Da proteção e uso das informações genéticas

Com o desenvolvimento das pesquisas genéticas, como o projeto do genoma humano,

e o consequente aumento e uso das informações para diversos fins, discutiu-se no país a

possibilidade de fazer uso destas informações para fins sociais, como identificação de

paternidade, uso forense para fins penais como identificação de criminosos, busca de pessoas

e crianças perdidas, ente outros.

Os opositores da idéia alegavam não só a questão da violação da privacidade, mas

também o temor de uso antiético de tais dados como o desenvolvimento de chips de DNA.

Contudo, um exemplo positivo e prático do uso destas informações seria o projeto

governamental de criar um banco de dados genéticos de 17.000 crianças perdidas em abrigos

no país e disponibilizá-las à sociedade para fins de reunião familiar. O projeto previa que a

iniciativa contaria com a participação do poder público e de entidades privadas para gerir o

projeto. Contudo, apesar do grande valor social do projeto, o mesmo contava com a oposição

de pessoas preocupadas com o uso ilegal de tais dados54.

Um outro problema que vislumbravam os opositores do uso indiscriminado de

informações genéticas era a possibilidade de mães em gestação vir a abortar fetos com

probabilidade de disfunção, uma vez que a “Lei de Bem Estar das Mães e Crianças da Coréia”

existente no país permitia a realização de aborto em caso se detecção de doenças ou disfunção

no feto.

54 Um Jong PAK. Bioethic, research ethic and regulation. Pg. 163

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Existem no país diversas leis esparsas que tratam indiretamente da questão, como leis

penais, constitucionais, trabalhistas, cíveis, mas nenhum específico para as informações

genéticas, assim para evitar o uso indevido destas informações sentia-se a necessidade de criar

leis específicas que viessem a proteger as informações genéticas dos fetos e das pessoas em

geral.

Contudo, para criar uma lei específica para a proteção das informações genéticas

precisam definir algumas questões importantes como:

1. Se as informações genéticas podiam ser objeto de proteção legal;

2. Se as informações genéticas deviam ser tratadas separadamente das demais

informações médicas, e em caso positivo se as leis esparsas sobre o tema deveriam

ser adaptadas a esta questão; e

3. Se os dados genéticos de um indivíduo são objeto de deliberação pessoal ou

membros da família também podem/devem participar desta decisão (partindo do

pressuposto que tais informações pertencem à família e não individualmente à

pessoa)55.

A discussão sobre o assunto parece que chegou a alcançar alguns consensos como a

necessidade de uma determinação explícita afirmando que as informações genéticas não são

de propriedade privada ou estatal, mas herança de toda a humanidade; da proibição de

distinção entre pessoas baseado em características genéticas; da necessidade de consentimento

do indivíduo para se obter os dados genéticos da pessoa, entre outros.

Com base nestas considerações a Lei de Bioética e Biossegurança do país veio a tratar

deste assunto, criando uma série de medidas e procedimentos burocráticos para dificultar o

uso indevido das informações.

55 Ibid., Pg. 165

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Assim, a primeira das grandes restrições foi determinada na forma de proibições no

uso das informações, proibindo a distinção ou segregação de pessoas em ambientes de

trabalho e educacional ou na contratação de serviços de seguros em geral. Também se proíbe

coagir pessoas a realizar os testes genéticos fora dos casos permitidos em lei.

Uma segunda restrição se refere à qualidade daqueles que podem pesquisar, possuir e

utilizar as informações genéticas das pessoas e neste contexto o governo restringiu o uso e

pesquisa para as instituições registradas junto a ela como bancos de DNA ou instituições de

pesquisa.

Além das entidades normais mencionadas até o momento, entidades de pesquisa não

governamentais também poderão funcionar como bancos de DNA, com a aprovação do

Ministério da Saúde. Contudo, se tais entidades estiverem sendo financiadas por alguma

entidade governamental, o responsável pela entidade financiadora deverá ser consultado pelo

Ministro da Saúde antes de ser concedida a licença.

A lei determina também que os bancos de DNA deverão ser construídos, equipados e

adotar procedimentos padrões estabelecidos pelo Ministério da Saúde e em caso de mudança

de local do estabelecimento, realizar alterações estipuladas na lei ou cessando as suas

atividades temporariamente ou permanentemente a entidade deverá reportar ao Ministério da

Saúde também.

Quanto aos procedimentos para fornecimento de informações genéticas a instituições

interessadas, o responsável pelo banco de dados exigirá dos interessados relatório sobre a

forma de uso das informações desejadas, e as submeterá à apreciação do “IRB” do banco

antes de tomar a sua decisão. O parecer da “IRB” deverá ser informado ao Ministério da

Saúde posteriormente (art.33). Normas gerais a respeito deste assunto serão determinados

pelo Ministério da Saúde.

A proteção dos dados genéticos das pessoas pesquisadas fica obrigada também pela

adoção das seguintes medidas:

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1. Não havendo motivo justificado, o banco de dados genéticos, assim como os seus

funcionários, não poderão repassar dados pessoais das pessoas pesquisadas quando

vierem a repassar informações genéticas às instituições de pesquisa, nem fazer uso

inapropriado dos mesmos;

2. A proibição permanece no caso de fornecimento de dados genéticos de pacientes

para hospitais, sendo descartado apenas quando fornecido para diagnóstico do

paciente e forem tomadas medidas necessárias para proteger os dados pessoais do

mesmo (art.35).

Por fim, os bancos de dados genéticos não podem cobrar valores quando fornecem

informações às entidades de pesquisa, mas podem requerer compensação pelo custo da

pesquisa e guarda das informações obtidas, de acordo com as normas do Ministério da Saúde

para o caso.

4.9. Das terapias genéticas

As terapias genéticas são tratadas também por esta lei que impõe restrições e controles

como nas demais pesquisas genéticas, assim além dos usuais registros e autorizações perante

o Ministério da Saúde estabeleceu algumas proibições e restrições que são:

1. Os tratamentos são permitidos apenas para cura de desordens genéticas, câncer,

AIDS, e outras doenças que representem sério perigo à vida;

2. Permitidos apenas para doenças sem cura ou aqueles em que o tratamento com

terapia genética apresenta resultados mais efetivos que os tratamentos tradicionais;

3. Permitido para doenças especificamente permitidas pelo Ministério da Saúde, após

consulta à Comissão Nacional de Bioética.

4. Totalmente proibido o tratamento em espermas, óvulos, embriões ou fetos.

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Outro importante meio de controle destas terapias é a obrigação de obter o

consentimento informado dos pacientes através de formulário escrito, que deverá conter as

seguintes informações:

1. O propósito da terapia;

2. O resultado esperado da terapia e os efeitos colaterais; e

3. Outras informações a serem determinadas pelo Ministério da Saúde.

4.10. Da fiscalização e controle das pesquisas

As restrições e proibições impostas na lei não teriam eficácia se não houvesse um

trabalho de fiscalização e repressão, assim, com vista a intimidar e suprimir os abusos que

porventura possam vir a existir, a Lei de Biossegurança do país estabeleceu normas de

fiscalização de todas as entidades de pesquisas e de saúdes relacionadas na lei, nos seguintes

termos:

1. O Ministro da Saúde pode exigir das instituições de pesquisa e de saúde, assim

como de seus funcionários, que apresentem relatório demonstrando que os

mecanismos de segurança estabelecidos na da lei estão sendo respeitados em

relação a pesquisas consideradas de risco;

2. O Ministro da Saúde poderá também exigir que o estabelecimento de pesquisa ou

de saúde suspendam os trabalhos, ou que tomem medidas complementares de

segurança havendo riscos à bioética ou biossegurança;

3. Existindo receio de que as normas de segurança estipulados na lei estejam sendo

descumpridas por qualquer instituição de pesquisa ou de saúde, o Ministro da

Saúde poderá enviar oficiais do governo à entidade para fiscalização e exame do

local, assim como coletar informações e materiais necessárias para inspeção,

podendo inclusive interrogar pessoas do local. Neste caso, o oficial deverá se

identificar dando prova de sua autoridade ao responsável da instituição sob

fiscalização.

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4. As instituições sob fiscalização e seus funcionários deverão obedecer às ordens,

pedidos de inspeção e inquirições provenientes do Ministro, conforme estatuídos

nos Arts.38 ① e ②, a menos que haja motivo legítimo para se opor.

O Ministério da Saúde poderá exigir também das instituições de pesquisa a exibição

dos embriões e clones de embriões de células somáticas que tenham criado, guardado ou

fornecido em desrespeito às regras estipuladas nos Arts. 13, 14,15-①, 16-②, 17 a 19, 20-①,

20-④ e , 22-① e 23, assim como os materiais de testes colhidos, guardados e fornecidos em

desrespeito às regras estipuladas nos Arts. 24-①, 25, 26-① a 26-③, 27-①, 27-②, 27-④, 28-

②, 28-③, 32-① e 32-②. Os procedimentos de apresentação deverão obedecer às regras

estipuladas nos Arts. 16-④ e 28-⑥.

Caso a instituição de pesquisa ou de saúde onde se realizam as pesquisas não cumpra

rigorosamente com os padrões estabelecidos nos Arts. 14-②, 18, 23 e 32-⑤ e seja

considerado potencial perigo para a bioética e biossegurança do país, o Ministro da Saúde

poderá exigir que o estabelecimento melhore as suas instalações ou poderá mandar fechá-la

totalmente ou parcialmente, em ambos os casos.

O Ministro da Saúde poderá ainda revogar autorizações, registros ou licenças das

instituições previstas na lei de biossegurança, podendo ainda fechá-las totalmente ou

parcialmente, caso venham a infligir algumas das seguintes disposições:

1. No desrespeito dos seguintes artigos: 9-①, 9-③, 10-①, 10-③, 11, 14, 15-①, 15-

③, 16-②, 16-③, 17, 19-①, 20, 22, 24-②, 24-④, 25, 26-①, 26-③, 26-⑤, 27, 28-

②, 28-⑤, 29-①, 29-②, 32-③, 32-④, 33-②, 35, 36, 37-① ou 37-②;

2. Não cumprir com o determinado nos Arts. 21, 30 ou 34;

3. Não realizar as ordens dos Arts. 38-①, 39 ou 40, ou

4. Não cumprir com a ordem de fiscalização, de questionamento e de coleta

determinados no Art. 38-②.

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Contudo, a ordem de revogação de autorização, registro ou licença estipulado nos

casos previstos acima será precedido por uma audiência à instituição em questão.

Havendo o descumprimento das seguintes exigências, o Ministro da Saúde poderá

ordenar o fechamento das Instituições Médicas de Produção de Embriões ou as Instituições de

terapia genética, contudo caso o Ministro entenda que tal decisão possa provocar prejuízos

aos seus pacientes ou ao público em geral, poderá comutar esta pena por multa pecuniária de

no máximo 200 milhões de Won56:

1. No descumprimento dos Arts. 14, 15-①, 15-③, 16-②, 16-③ ou 36;

2. No descumprimento do Art.21;

3. No descumprimento das ordens previstas nos Arts.38-①, 39 ou 40; ou

4. Não cumprir com a ordem de fiscalização, de questionamento e de coleta

determinados no Art. 38-②

Por fim, todo aquele que deseja obter autorizações, registros, licenças ou aprovações

ou submeter relatórios ao Ministério da Saúde, ou ainda emendar documentos registrado junto

ao mesmo deverá recolher taxas cujos valores serão estipulados pelo Ministério.

4.11. Normas suplementares

As normas suplementares tratam do poder de delegação dos poderes do Ministro da

Saúde para entidades diversas e dos financiamentos das pesquisas biotecnológicas pelo

governo local e federal.

56 Moeda coreana.

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Sobre o financiamento das pesquisas genéticas pelo governo, determina o Art.45 da lei

de biossegurança que o financiamento poderá ser concedido a pesquisas de células tronco-

adultas ou pesquisas e programas de educação relacionadas com a bioética e a biossegurança,

de forma total ou parcial.

O financiamento poderá ser concedido a instituições, organizações ou profissionais da

área, conforme normas a serem determinadas pelo Presidente da República.

O Art. 47 determina que o Ministro da Saúde poderá delegar parte dos poderes que

esta lei lhe atribui para chefes de entidades de pesquisa ou organizações de relevância, de

acordo os normas a serem estipuladas pelo Presidente da República.

Os poderes delegáveis são:

1. Administração das instituições de produção de embriões mencionados no Art.14;

2. Administração das instituições de pesquisa de embriões mencionados no Art.18;

3. Administração das instituições de teste de DNA mencionados no Art.24;

4. Administração dos bancos de DNA mencionados no Art.32, e

5. Administração das instituições de terapia genética mencionados no Art.37.

As entidades que agirem sob delegação dos poderes do Ministro da Saúde, conforme

mencionados no Art. 47, poderão ser compensados financeiramente pelos serviços prestados.

4.12. Das cláusulas penais

A efetividade das leis vem de sua capacidade de vincular as pessoas seja através de

sanções morais ou físicas. A lei de bioética não pode fugir a esta regra sob pena de tornar-se

ineficaz ao fim pretendido.

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A Lei de Biossegurança da Coréia estabelece diversos tipos de sanções para os

diversos tipos de delitos elencados na lei, que vão desde sanções pecuniárias de diversos

valores a até prisões com penas superiores de 3 a 10 anos, conforme a gravidade do crime que

se comete.

As punições mais severas da lei são reservadas aos crimes relacionados com a

violação à proibição da clonagem humana, conforme mencionado no Art. 11 da lei,

reservando a pena de prisão superior a 10 anos para aquele que implanta ou mantém clone de

embrião de célula somática dentro do útero, ou ainda realiza o parto de clones. A tentativa

deste tipo penal é punível de acordo com a gravidade da tentativa do crime cometido.

A violação ao Art. 12 da lei, que proíbe as experiências genéticas ente espécies

diferentes, reserva a pena de prisão superior a 5 anos a aquele que afrontam as disposições

deste artigo, implantando embrião humano em útero animal ou embrião animal em útero

humano, ou ainda as diversas modalidades de pesquisas genéticas entre espécies diferentes

mencionados no mesmo artigo.

A pena de prisão superior a três anos é reservada aos seguintes delitos relacionados

com as pesquisa genéticas:

1. Aqueles que induzem ou assistem outros a cometer os atos descritos no Art. 11

desta lei, relacionados com a proibição de clonagem humana;

2. Aqueles que praticam os atos descritos no Art. 12-② da lei, referente à

transferência de embriões entre espécies diferentes;

3. Aqueles que produzem embriões para fins diversos à reprodução, conforme

determinado no Art. 13-① da lei;

4. Aqueles que violam o disposto no Art. 13-② produzindo embrião com

material genético originário de pessoa falecida, criam embriões para seleção do

sexo do bebê ou criam embriões de progenitores menores;

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5. Aquele que viola o disposto no Art. 13-③ assistindo ou induzindo pessoas a

doarem ou fazerem uso de materiais genéticos para o fim de obter vantagem

pecuniária ou outros benefícios indevidos;

6. Aquele que viola o disposto no Art. 22-① da lei realizando a transferência de

núcleo de célula somática para fins diversos à pesquisa de doenças raras ou

incuráveis; e

7. Aquele que viola disposto do Art. 48 da lei revelando ou se apropriando

indevidamente de informações secretas a que tem acesso em virtude de suas

funções.

Havendo a violação do disposto no Art. 17, através do uso de embriões para pesquisa

fora dos prazos determinados na lei, o infrator receberá pena de prisão superior a 3 anos ou

multa pecuniária superior a 50 milhões de won.

Diferente dos delitos mencionados anteriormente os seguintes delitos são apenados

com pena de prisão superior a três anos ou multa pecuniária superior a 30 milhões de won:

1. Aquele que viola o disposto no Art. 13-③ assistindo ou induzindo pessoas a

doarem ou fazerem uso de materiais genéticos para o fim de obter vantagem

pecuniária ou outros benefícios para si mesmo;

2. Aquele que viola o disposto no Art.15-① e obtém óvulos ou espermas sem

obter dos doadores o consentimento escrito para a produção de embriões;

3. Aquele que viola o disposto no Art. 25 realizando testes de DNA causando

danos aos que se submetem à pesquisa;

4. Aquele que viola o disposto no Art. 26-① a ③ colhendo materiais para teste

de DNA, sem obter o consentimento escrito das pessoas testadas ou solicita o

teste de DNA sem o acompanhamento do consentimento escrito das pessoas;

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5. Aquele que viola o disposto no Art. 31-① ou 31-② discriminando as pessoas

com base em informações genéticas ou obriga alguém a realizar ou se

submeter ao teste de DNA;

6. Aquele que viola o disposto no Art.34 fornecendo dados pessoais de pessoas

pesquisadas quando fornece informações genéticas a outros;

7. Aquele que viola o disposto no Art. 35-① fornecendo a terceiros informações

genéticas sem motivo legítimo ou a utiliza para fins ilegítimos;

8. Aquele que viola o disposto no Art. 36-① ou Art.36-② realizando terapia

genética; e

9. Aquele que viola o disposto no Art. 39, deixando de cumprir com as normas de

descarte dos materiais de pesquisa genética.

Pena de prisão superior a 1 ano ou cobrança de multa pecuniária superior a 20 milhões

de won será aplicado para a prática dos seguintes delitos:

1. Aquele que viola o disposto no Art. 14 da lei, armazenando ou coletando óvulo

e esperma humano, assim como cria embriões em lugares não licenciados

como Instituições médicas de produção de embriões;

2. Aquele que viola o disposto no Art. 16-② ou 16-③ (inclusive Art. 20-④) não

descartando os embriões conforme regulamentação determinada pelo

Ministério da Saúde, ou não realiza nem mantém em guarda dos embriões

descartados;

3. Aquele que viola o disposto no Art. 18 realizando pesquisa em embriões

guardados a mais de 5 anos sem ser registrado como instituição de pesquisa de

embriões;

4. Aquele que viola o disposto no Art.19-① (inclusive o Art.23-②) realizando

pesquisa com embriões sem a aprovação expressa do Ministério da Saúde para

tal;

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5. Aquele que viola o disposto no Art. 20-① ou 20-②, fornecendo embriões com

prazo superior a 5 anos por vantagem pecuniária ou deixa de fornecer relatório

sobre armazenamento e fornecimento dos embriões excedentes ao Ministério

da Saúde;

6. Aquele que viola o disposto no Art.23-①, criando clone de embrião de célula

somática ou realiza pesquisa sobre tal clone, sem o devido registro junto ao

Ministério da Saúde;

7. Aquele que viola o disposto o Art. 30-① ou violando o Art. 30-② faz

afirmações falsas ou comete excessos na publicidade sobre os testes de DNA;

8. Aquele que viola o disposto no Art. 32-① estabelecendo um banco de DNA

sem o devido registro perante o Ministério da Saúde; e

9. Aquele que deixa de cumprir a ordem de melhoria do estabelecimento

mencionado no Art.40 desta lei.

As penas mencionadas nesta lei poderão ser aplicadas duplamente para o responsável,

funcionários em geral ou representante (entre outros) da instituição e à própria instituição que

viole as disposições estabelecidas nos artigos 49 a 53 desta lei (art.54 da lei).

Por fim, multa pecuniária superior a 5 milhões de won será aplicada sobre aqueles

que praticarem as seguintes ilegalidades:

1. Aquele que deixar de realizar o relatório contendo as informações

mencionadas nos Art.24-①-②-③, ou seja, às instituições de teste de DNA que

deixarem de reportar dados como localização, nome do responsável pela

instituição, os tipos de testes a serem realizados, entre outros;

2. Aquele que viola o disposto no Artigo 28-② a 28-⑤, ou seja, às instituições de

teste de DNA que não venham a realizar o descarte dos materiais de pesquisa

de acordo com os procedimentos e prazos estabelecido no artigo, ente outros;

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3. Aquele que deixa de manter os documentos mencionados no Art.29-① ou

impede acesso ou realizar cópias dos documentos mencionados no Art.29-②;

4. Ao banco de DNA que deixar de reportar mudança de endereço ou realizar

alterações na sua estrutura nos termos do disposto no Art.32-③, ou deixa de

reportar suspensão temporária ou definitiva de suas atividades;

5. Aquele que viola o disposto no Art.35-② fornecendo arquivos e informações

genéticas de um paciente a terceiro; e

6. Aquele que viola o disposto no Art.37-① realizando terapia genética sem estar

devidamente cadastrado junto ao Ministério da Saúde.

A multa pecuniária de 5 milhões estabelecida acima será aplicada pelo Ministério da

Saúde, de acordo com o decreto presidencial que complementa a lei de biossegurança,

contudo, a lei reconhece o direito de objeção da entidade multada, concedendo a esta o prazo

de 30 dias, a contar da data do recebimento multa, para apresentar recurso perante o

Ministério da Saúde.

Recebida o recurso, será instaurado processo na justiça comum, que seguirá

procedimento não litigioso, e sendo condenado o recorrente, a multa lhe será cobrado através

de execução atinente aos débitos tributários do país.

4.13. Disposições gerais

A parte final da lei de biossegurança traz algumas disposições transitórias a respeito de

algumas questões abordadas pela lei que são:

Sobre a pesquisa de embriões excedentes, determina que até que a linha primitiva do

embrião surja, embriões excedentes poderão ser utilizados para pesquisa de embriões nas

seguintes condições:

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1. Se os embriões excedentes são produzidos antes do vigor da presente lei;

2. Se o prazo de 5 anos transcorreu a partir da criação dos embriões; ou

3. Se houve consentimento escrito por parte dos doadores, mas o paradeiro dos

mesmos for desconhecido.

Sobre a pesquisa de célula tronco embrionária, diz a lei que aquele que ao tempo em que a

presente lei passa a vigorar já estava realizando as pesquisas poderá continuar com a pesquisa,

desde que tenha a aprovação do Ministério da Saúde, e obedeça as seguintes condições:

1. Se o pesquisador já realizava pesquisa por pelo menos há mais de 3 anos; e

2. Se o pesquisador tiver publicado pelo menos um artigo sobre pesquisa de

célula-tronco embrionária em jornal da área.

Quanto a esta última disposição, parece ter sido criada especialmente para favorecer o

Dr.Hwang e suas pesquisas, pois estando este sob ataque de grupos de proteção aos direitos

humanos, e sendo do interesse do governo proteger as suas pesquisas, criaram tal artifício

para eximir as suas pesquisas de um controle rigoroso que pudesse vir a penalizá-lo

posteriormente.

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5. ANÁLISE CONCEITUAL DA BIOÉTICA COREANA

5.1. Visão geral

Conforme analisada até o momento a bioética coreana caracteriza-se por ser bastante

acometido em conteúdo moral e ético, pois o motivo principal por trás de seu

desenvolvimento está o interesse financeiro e social do país, através da adoção de ações

pragmáticas na elaboração e execução das diretrizes de sua pesquisa biotecnológica.

Neste contexto, indaga-se quais são as peculiaridades que levaram o país a criar uma

bioética local com tais feições? Quais são os acontecimentos históricos, sociais e culturais que

propiciaram o surgimento de uma biotecnologia vibrante e avançada em termos técnicos, mas

fraco em conteúdo moral e principalmente ético? E quais são as tendências futuras desta

ciência no país, após o incidente ético provocado pelo Dr. Hwang? O país aprendeu alguma

lição com este evento?

Fazendo uma breve introdução a respeito da bioética na Coréia, observa a professora

Pak, que a Coréia, assim como a maioria dos países asiáticos, aceita com mais naturalidade os

avanços da biotecnologia que os países do ocidente, pois é carente de recursos naturais e vê na

biotecnologia um instrumento de prosperidade ainda a ser explorado, assim diz que a Ásia

aceitou com mais facilidade os avanços da biotecnologia, como os alimentos transgênicos e as

pesquisas genéticas, e coloca a ciência num pedestal de divindade, atribuindo à ciência um

valor muito superior que ao atribuído pelo ocidente57.

Lembra que a filosofia coreana herdou do pensamento budista a visão holística do

universo, onde natureza, pessoas e animais integram o universo e são vistos como partes

dependentes entre si; assim as ações humanas devem ser consideradas em relação aos demais

elementos da natureza e em relação às demais pessoas, buscando sempre a harmonia na

interação entre os elementos.

57 Un Jong PAK, Bioethics, Research Ethics and Regulation . Pg.03

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Parte desta premissa os princípios do Feng-Shui, muito em voga no ocidente hoje58,

que tem como cerne a busca do bem-estar das pessoas através da harmonização entre o

homem e o ambiente que o cerca.

Contudo, observa esta professora que a capacidade que a ciência trouxe ao homem de

alterar radicalmente o mundo em que vive, destruindo, manipulando ou alterando os

elementos, assim como modificando os organismos através da pesquisa genética, modificou

esta consciência holística do homem com o mundo que habita; se antes tinha uma consciência

integrada aos elementos da natureza, chegando mesmo a acreditar que pedras tinham almas,

agora está mais centrado em si mesmo, afastando-se da natureza e adotando novos valores

materialistas.

Agora a sociedade coreana transformou-se em um ambiente povoado por máquinas e

produtos tecnológicos, o que acabou alterando a perspectiva tradicional sobre a vida e

consequentemente os valores tradicionais do país. Quais foram motivos que levaram a esta

mudança de perspectiva no povo coreano?

Com a intervenção do interesse econômico sobre as pesquisas genéticas a partir da

década de 90, a ciência passou a ser vista de bem cultural para um bem comercial, uma vez

que hoje as pesquisas são orientadas para originar produtos, buscando resultados a curto e

médio prazo, conforme visto na análise da evolução do desenvolvimento científico no país.

Os interesses empresariais passaram a ditar o rumo da pesquisa científica, com o apóio

declarado do estado.

Em vista desta visão “progressista” ou “mercantilista” do desenvolvimento científico

coreano, reconhece a autora que dentro da Coréia existe também e a briga entre os que

defendem o princípio da “qualidade de vida” (partidários das pesquisas biotecnologia),

contrários à visão mercadológica da ciência, e os que defendem a “dignidade da vida” (não

partidários das pesquisas) a favor da ciência como é praticada no país hoje; e neste contexto

58 Ibid., Pg.08

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reconhece a existência de conflito entre a corrente deontológica (conservadora/tem medo da

ciência) e a corrente utilitarista (liberal/deseja a pesquisa) dentro do país também.

A observação da professora Santos, parece aplicar-se perfeitamente à situação

existente na Coréia, pois ao analisar o rápido desenvolvimento da ciência e da demora da ética

em acompanhar as mudanças, diz que não é a ética que está atrasada em relação à ciência,

mas são os cientistas que tentam praticá-la em um contexto no qual as leis não foram

estabelecidas 59 , referindo-se indiretamente aos interesses sociais e corporativos que

promovem e sustentam o avanço rápido e sistemático da ciência, para atender interesses que

na maioria das vezes pouco priorizam os interesses sociais.

Feita a análise histórica do surgimento da biotecnologia coreana e o seu

desenvolvimento até a eclosão do escândalo das pesquisas de células tronco do Dr. Hwang,

nos primeiros capítulos deste estudo, precisamos agora entender as bases ideológicas por trás

de tais episódios para poder estabelecer a verdadeira feição da bioética coreana, assim, uma

vez feita a análise histórica e social do desenvolvimento da biotecnologia coreana, precisamos

agora analisar os elementos adicionais para podermos concluir o propósito deste estudo.

Assim, procederemos agora à análise dos elementos culturais, filosóficos, sociais,

econômicos e religiosos da Coréia que contribuíram para a formação e da bioética coreana.

O elemento cultural tratará do estudo da origem do caráter materialista e imediatista

do povo coreano através do estudo do elemento hedonista na sua cultura.

O elemento filosófico local a ser estudado é o Silhak, a filosofia local de natureza

pragmática e de preocupação social, que hoje é apontado pela maioria dos pensadores

coreanos e estrangeiros como a base ideológica por trás do sucesso econômico alcançado pelo

país depois das diversas guerras experimentadas pela Coréia.

59 Maria Celeste Cordeiro Dos SANTOS, O equilíbrio do pêndulo. A bioética e a lei. Implicações médico-leais. Ícone Editora. 1998. Pg.26

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O elemento social na formação da bioética coreana é o excessivo patriotismo existente

ainda hoje na sociedade daquele país, que transformou a pesquisa genética em elemento de

orgulho e de afirmação nacional perante o mundo.

O elemento econômico é o capitalismo comunitária na Coréia, que diferente do

praticado no ocidente tem características sociais fortes, criando uma união simbiótica entre

estado, empresas e sociedade, onde o sucesso econômico de um se reverte no benefício de

todos.

O elemento religioso é o cristianismo coreano que influenciou a cultura local

ajudando-a a assimilar melhor os princípios capitalistas adotado pelo país depois da Guerra da

Coréia.

Estes são os elementos internos do país que contribuíram conjuntamente para a

formação da bioética coreana de hoje conforme veremos a seguir. Analisemos cada um a

seguir.

5.2. Da descontinuidade do pensamento ou da “filosofia” coreana

Porém, antes de iniciarmos o estudo do pensamento ou da filosofia coreana, se faz

necessário fazer uma pequena introdução àquilo que hoje em dia é conhecido como a

“filosofia” coreana.

É que existe um grande problema quando se pretende estudar o pensamento, ou mais

propriamente dito, a filosofia coreana hoje em dia.

O problema reside no fato de que mesmo dentro da Coréia existe confusão a este

respeito, uma vez que não existe uniformidade quanto ao que de fato se entende como

filosofia coreana, ou ainda, se de fato existe mesmo uma.

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Obviamente, é um exagero dizer que não existe uma filosofia coreana, uma vez que ao

longo de sua história (5 mil anos) muitos trabalhos filosóficos têm sido produzidos dentro do

país.

O problema reside naquilo que os pensadores chamam de “descontinuidade” da

moderna filosofia coreana, referindo-se aos vários eventos que ao longo da história recente do

país causaram a interrupção de seu desenvolvimento intelectual.

Quanto ao tema, Lee Seung Hwan 60, em seu trabalho “Continuity and discontinuity of

traditional and modern philosophy in Korea” atribui esta descontinuidade a fatores históricos

que assolaram o país desde o fim do século 19, como a colonização do país pelo Japão até o

fim da Segunda Guerra Mundial, a distorção de valores locais promovido pelo regime militar

nas décadas de 80 e 90, e por fim os esforços de políticos neo-liberais que posteriormente

tentaram reformular a estrutura de ensino e pesquisa no país.

Em linhas gerais o autor aponta três grandes descontinuidades na história moderna do

país, sendo que a primeira grande descontinuidade se deu com a tentativa japonesa de

aniquilar a cultura e o pensamento coreano, com o fim de promover o esforço imperialista do

país antes e durante a Segunda Guerra Mundial, subjugando não somente fisicamente o país,

mas também ideologicamente. Dentre as várias medidas adotadas pelo governo japonês

durante a ocupação japonesa, os coreanos foram impedidos de falar a sua língua natal, tiveram

de substituir os seus nomes por nomes japoneses, adotar sistema educacional revisado e

impostos pelo Japão, tiveram saqueados ou destruídos os seus tesouros e bens culturais, e

muitas outras formas de subjugação cultural imposta pelo Japão.

A segunda descontinuidade se deu durante a época da ditadura militar do Presidente

Park Jung Hee, que num grande esforço de modernizar o país e manter o controle ideológico

sobre a sociedade, tentou substituir a filosofia coreana pelo pensamento ocidental, relegando a

filosofia coreana a mero elemento de superstição ou pensamento retrógrado. Oportuno

60 Lee Seung Hwan. Korean Philosiphy: Its tradition and moder transformation. Pg. 3

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lembrar que o presidente Park foi aluno da academia militar japonesa da Manchúria, tendo

recebido grande influência da ideologia japonesa que denegriu a filosofia coreana para o fim

de enaltecer a “superioridade” do povo japonês sobre os demais povos asiáticos.

Por fim, a última descontinuidade teria acontecido durante as décadas de 80 e 90,

quando os presidentes civis da época pós-ditadura tentaram impor à sociedade valores e

conceitos em consonância com as ideologias políticas que adotavam, assim os trabalhos

intelectuais da época focavam sobre o patriotismo exacerbado e o estudo voltado para fins

econômicos, contribuindo com o esforço desenvolvista do país.

Ainda hoje o pensamento coreano é relegado por muitos como primitivo dentro do

próprio país, que por causa das diversas descontinuidades mencionadas perdeu a

independência ideológica e se limita a importar e interpretar a filosofia ocidental, assim como

o exemplo de grandes potências da filosofia do passado como a Grécia e do Oriente Médio61.

5.3. Do hedonismo e da felicidade terrena

O caráter excessivamente materialista e imediatista vista no desenvolvimento da

ciência coreana em geral, talvez possa ser atribuída em parte à natureza hedonista da cultura

do povo coreano.

Na cultura coreana a preocupação hedonista, ou mais apropriadamente a preocupação

com os elementos prazer e felicidade existe também, mas não na sua forma clássica como o

hedonismo grego ou o defendido no utilitarismo de Bentham, onde o prazer chegava a ser

mesmo quantificável, mas num hedonismo diferente, onde a felicidade não reside em valores

individuais mas em valores coletivos, focado em valores sociais e o bem estar da sociedade

em vez do bem estar pessoal.

61 Lee Seung Hwan. Korean Philosiphy: Its tradition and moder transformation. Pg.6, 7

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De fato, os traços hedonistas da cultura coreana são bastante evidentes no folclore, que

aborda a questão da felicidade e dos prazeres humanos de forma própria, identificando a

felicidade com a vida terrena, em vez de focada no além ou num mundo diferente.

A primeira grande evidência desta peculiaridade verifica-se na lenda do surgimento do

povo coreano através do deus Hwanung que há muito tempo atrás desceu dos céus à terra, e

achando a terra um lugar aprazível e de grande beleza, transformou uma ursa em mulher e

gerou através dela a “Dangun”, que segundo as lendas teria sido o antepassado de todos os

coreanos, e que posteriormente veio a fundar na nação coreana62.

Assim, se em algumas culturas a terra era vista de forma negativa, vindo até a ser

considerada como lugar de exílio de deuses, no folclore coreano a terra é vista de forma

positiva, considerado lugar de beleza para onde os deuses se dirigiam para compartilhar com

os humanos dos prazeres aqui existentes; para o folclore coreano a terra é na maioria das

vezes mencionado com um lugar de encanto e abençoado, desejado por deuses e seres

celestiais que para cá vinham para desfrutar de sua beleza63.

A identidade da felicidade com a terra que habitam talvez tenha surgido da admiração

que o próprio coreano tem da sua própria terra, que desde a antiguidade era exaltado por

outros povos pela sua beleza; assim dos vários nomes através do qual era conhecido no

passado, havia aqueles que faziam referência direta à sua beleza chamando-a de “a terra da

manhã calma” ou ainda, “uma terra tão bela quanto o bordado de um tapete”.

Esta visão paradisíaca da terra na cultura coreana evidencia-se ainda mais quando se

comparam as lendas de criação do povo coreano e do povo japonês, que diferente da visão

coreana, relega a terra a lugar desolado servindo de exílio dos deuses, como no caso dos

deuses Izanagi (deus masculino) e Izanami (deusa feminina) que teriam criados as ilhas do

Japão enquanto estavam aprisionados aqui, e também no caso do deus Suzanowo (deus do

62 A Handbok of Korea. Published by Korean Overseas Information Service. Ministry of Culture and Infromation. Seul. 1982. Pg.171 63 Ibid, pg.172. Fala da história de um anjo feminina chamada “Sonnyo” que desceu do céu á terra para se casar com um pobre lenhador. Diz a lenda que ela casou com o lenhador e constituiu uma família com ele, gerando filhos, e depois do falecimento de todos voltou aos céus.

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mar), que foi proibido de subir ao céu e ficou exilado na terra pela deusa Amaterasu (deusa do

sol), até que viesse a ser perdoado pelos demais deuses das maldades que teria praticado

contra a sua irmã.

Este “hedonismo terreno” criou na mentalidade coreana a identidade da felicidade nas

coisas concretas e plausíveis e não em elementos imaginários ou do além. Assim, a noção

coreana de felicidade é pragmática, imediatista e material desde os primórdios64.

Se no utilitarismo ocidental a noção de felicidade associa-se com elementos sensoriais,

de virtudes e⁄ou metafísicos, na filosofia coreana a felicidade tem um cunho coletivista,

dissociado do bem estar individual, pois entende que o bem estar pessoal subordina-se ao bem

estar geral de todos, assumindo um caráter coletivista; assim o interesse de todos é assegurar a

própria felicidade garantindo o bem estar de todos os elementos da sociedade, ou pelo menos

do maior numero possível de pessoas. Tal fato se comprova nos princípios basilares do Silhak

que foca no progresso social e econômico da nação para promover o bem estar das pessoas.

Este traço cultural da sociedade coreana para ser um dos elementos responsáveis pela

forma como a sociedade coreana se comportou perante as questões bioéticas, deixando de

lado a preocupação com os direitos individuais das pessoas para assegurar o benefício da

sociedade com um todo.

5.4. A filosofia do Silhak e o pragmatismo social coreano

“A noção da busca do bem estar e da felicidade resulta do instinto natural das pessoas,

independente de sua filiação a qualquer forma de pensamento ou filosofia existente, contudo a

busca do prazer com base no mero impulso só é capaz de trazer ao homem a felicidade banal,

imprópria para um ser instruído e sábio.”

64 A Handbok of Korea. Published by Korean Overseas Information Service. Ministry of Culture and Infromation. Seul. 1982. Pg.171

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Tal assertiva vem dos pensamentos de Aristóteles, que em sua obra “Ética a

Nicômacos”65, descreve a felicidade como o bem supremo a ser perseguido pelo homem, mas

não na sua forma primitiva ou crua, desprovido de valor moral e ético, mas revestido de

refinamento, aquela que se identifica com alguma forma de excelência, como a contemplativa.

Conforme mencionado acima, a filosofia coreana possui os mesmos fundamentos

hedonísticos e sociais que o utilitarismo ocidental, mas se neste pensamento o interesse social

na busca da felicidade resulta da influência aristotélica da busca da excelência, na filosofia

coreana o cunho social origina-se da influência da filosofia local chamada “Silhak”, que ao

despertar a preocupação política no pensamento coreano, imprimiu feição pragmática e

empírica que até hoje existe no pensamento coreana.

Conforme se demonstrará a seguir, o grande enfoque desta filosofia não era o

desenvolvimento dos valores morais e sociais da nação, mas o bem estar do povo e a

prosperidade do país, através da adoção de reformas sociais e políticas pragmáticas, e o

desenvolvimento da ciência, através da adoção dos conhecimentos ocidentais aos quais

pensadores coreanos vieram a tomar conhecimento através de sua principal fonte de

conhecimento na época, a China.

O Silhak surgiu na Coréia no começou no século 17, e foi criado para substituir o

pensamento dominante na época, o neo-confusionismo, vindo a tornar-se a corrente

dominante no país no século 18.

O termo vem da junção de duas palavras: Sil, que significa “real, prático” e Hak que

significa conhecimento, ou seja: “Conhecimento pela prática”, e surgiu como oposição ao

neo-confucionismo, que era a ideologia dominante até então66.

65 Aristóteles, Ética a Nicômacos, Tradução do grego de Mário da Gama Kury. Brasília. Editora UNB, 4ª edição. Pg. 25 66 Michael C. KALTON, An introduction to Silhak, Korean Philosophy: Its Tradition and Modern Transformation. Pg.294

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O Confucionismo (que posteriormente veio a ser reformulado, vindo a se tornar o

Neo-Confucionismo) havia sido introduzido na Coréia durante a dinastia Goryeo para

substituir o budismo. A sua introdução deu-se por iniciativa política, para o fim de substituir o

budismo como forma de pensamento dominante na sociedade e assim consolidar o poder do

rei, através de profundas reformas sociais que vieram a impor à sociedade alto grau de

ritualização dos relacionamentos humanos, estabelecendo em todos os níveis da sociedade

condutas e procedimentos pré-determinados, com o fim maior de disciplinar a sociedade.

Segundo esta filosofia a disciplina da sociedade levava à sua moralização, elevando

com isso a virtude da sociedade, o que assegurava estabilidade social. Contudo tal

estabilidade social era apenas um instrumento de dominação e controle que o estado havia

imposto à sociedade para subjugá-la à sua vontade.

Um bom exemplo desta política de controle social foi a criação do código de conduta

comunal chamado “código da vila”, criado especificamente para promover a interação

harmoniosa entre os indivíduos dentro de uma vila e entre as vilas também. Esta harmonia

visava padronizar a conduta dos elementos da vila através do controle da moralidade e da

política local67.

Contudo, com a deturpação dos princípios confucionistas, a dinastia Goryo

transformou-se num estado falido, onde de um lado existiam os grandes aristocratas, que

possuíam grandes extensões de terra e concentravam grande parte da riqueza do país, e do

outro lado uma classe média composta de pequenos e médios fazendeiros que suportavam

pesada carga tributária para sustentar o estado em ruínas.

A preocupação maior destes aristocratas estava com a manutenção de seus privilégios

e riquezas, razão pelo qual frequentemente se associavam com invasores estrangeiros, como

chineses e japoneses, toda vez que o país era invadido por estes vizinhos.

67 Martina DEUCHER, Neo-Confusianism in the Early Joseon Dynasty: Some Reflections on the Role of Ye. Korean Philosophy: Its Tradition and Modern Transformation. Pg.52

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Em resposta a esta situação uma nova dinastia se sucedeu, fruto da união da classe

média intelectualizada e os militares, dando assim início à dinastia Joson, que foi fundada

pelo general Yi Seong Gye, que tinha como braço direito Jeong Do Jeon, um dos primeiros e

principais pensadores do Silhak.

O cerne do pensamento de Jeong era dirigido ao bem estar do povo, defendendo a

idéia de que todas as atividades do estado deveriam ser empreendidas para o fim de atender a

necessidade da nação, colocando assim o estado em situação secundária, e defendendo a idéia

de que o rei existia em função do povo e que todos os membros do estado eram seus servos.

Tal pensamente era revolucionário para a época, até mesmo pra os padrões ocidentais, uma

vez que a monarquia foi sempre a forma de governo adotado pelo país.

Contribui decisivamente para o desenvolvimento do Silhak a grande influência que

esta filosofia recebeu dos conhecimentos ocidentais, aos quais pensadores coreanos tiveram

acesso através de suas viagens de intercâmbio com a China. Baseado neste intercâmbio de

cultura o Silhak se opunha ao isolacionismo existente até então, defendendo o comércio com

outros povos68.

Ora, cientes do evidente benefício que a aplicação dos conhecimentos ocidentais

causou na China, principalmente na indústria, agricultura e comércio, os defensores do Silhak

queriam aplicar a ciência ocidental na Coréia também, contudo não através de um simples

processo de cópia do modelo chinês, mas através de adaptação do mesmo às particularidades

coreanas69.

68 Michael C. KALTON, An introduction to Silhak, Korean Philosophy: Its Tradition and Modern Transformation. Pg.296 69 Helio G. BARROS, Política científica na Coréia: Evolução da máxima tecnologia contida na educação à máxima ciência contida no conhecimento. Pg.2. “O “Country Review”, realizada pela OECD em 1996, sobre a política nacional de C&T menciona aspectos históricos culturais – com origem no período neolítico – e iniciativa ocorridas nos séculos XVII e XVII. Nesses séculos, ocorreram importantes movimentos intelectuais de valorização da aprendizagem prática (o chamado silhak) e a absorção de conhecimentos ocidentais que fomentaram reformas científicas na sociedade coreana. O conteúdo tecnológico inserido na sua antiga metalurgia, astronomia, pintura, tecelagem e artesanato do início dos séculos, que floresceu em um território que era entroncamento de muitas rotas do leste asiático, encontrou-se com a tradição ocidental, no século XIX, quando a Coréia esteve exposta à tecnologia e aos produtos europeus. A herança contida nessa tradição de habilidades práticas e conhecimento empírico – a que o relatório atribui características de originalidade e imitação – difundiu-se sem muita consideração pelas explicações teóricas ou experimentação sistemática. Mas produziu inventos e descobertas relevantes e recebeu forte influência da cultura tecnológica chinesa, outra importante fonte da evolução local. Apesar do alto valor que a ética confucionista

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O período de 1750 a 1850 foi a época em que o Silhak teve a sua maior influência na

sociedade coreana. Nesta época houve ampla produção intelectual em grande variedade de

campos do conhecimento como a literatura, ciências naturais, geografia, história e o período

foi marcado pelo patrocínio cultural e científico promovido pelo estado.

Foi nesta época também que ouve a introdução e o crescimento da religião cristã no

país, da industrialização e do desenvolvimento mercantil. Foi a época em que o empirismo foi

utilizado com grande ênfase na ciência coreana.

Contudo, como apontado anteriormente, o enfoque desta filosofia não era promover o

desenvolvimento intelectual ou moral do país, mas promover o bem estar do povo e a

prosperidade da nação, através da adoção de reformas sociais pragmáticas e do

desenvolvimento de suas instituições. Neste termo, o desenvolvimento da ciência servia ao

propósito de alcançar a prosperidade social e econômica dos cidadãos do país, e não apenas o

desenvolvimento científico puro e simples.

Assim, a característica principal do Silhak pode ser dividida em 3 grupos: 1) Espírito

de crtica, que visa criticar a situação política da época, exigindo reformas administrativas e

políticas, assim como crítica quanto à rigidez intelectual que tornava a ciência da época

especulativa e fora do contexto da realidade, 2) O espírito de procura das evidências para

estabelecer a verdade e os fatos, para o fim de introduzir princípios empíricos na condução de

estudos científicos no país, e 3) o espírito da praticidade, com relação às questões sociais,

econômicas e administrativas do país70.

O Silhak substituiu o pensamento metafísico do neo-confusionismo pelo pensamento

pragmático. No neo-confusionismo conhecimentos em áreas como medicina, direito,

geografia, astronomia etc eram consideradas como conhecimento de menor importância ou atribuía à literatura e à filosofia, a cultura coreana produziu conquistas tecnológicas, cuja lista inclui “sofisticados instrumentos meteorológicos e astrológicos, a invenção da tipografia muito antes de Gutemberg, a criação de caracteres fonéticos únicos (denominados Hangul) e construções originais de prédios e navios” 70 Michael C. KALTON, An introduction to Silhak, Korean Philosophy: Its Tradition and Modern Transformation. Pg.300

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até mesmo como meras habilidades pessoais. Contudo, através do contato com conhecimento

vindo do ocidente, por intermédio da China, adquirindo dela conhecimento superior nestas

áreas, e principalmente através de adoção de novas metodologias de ensino (pragmatismo e

empirismo), estas áreas sofreram grande desenvolvimento, vindo a receber a importância que

mereciam.

Aristóteles afirmava que a política era a ciência por excelência numa sociedade, pois

era esta que determinava como as demais ciências deveriam ser aplicadas. O utilitarismo

influenciou-se de Aristóteles para estabelecer a preocupação com o bem estar social como um

dos requisitos para a busca da felicidade.

Tal feição social existe também no Silhak, como se viu até o momento, contudo o

pensamento coreano subverteu a ordem estabelecida no pensamento ocidental, colocando a

preocupação social acima da preocupação pessoal, estabelecendo a idéia de que a felicidade

pessoal está ligada à busca do bem estar de todos. Nestes termos, a Silhak negligencia a

preocupação com os valores morais ou éticos na sociedade, ou mais precisamente com os

valores relacionados com os direitos individuais, limitando-se a atrelar o bem estar individual

da pessoa ao bem estar coletivo.

Enfim, os defensores do Silhak adotavam esta postura de forma radical, negando todo

tipo de pensamento não racional, chegando ao extremo de negligenciar o estudo de ciências

sem fundamento empírico.

Exemplifica esta postura de orientação empírica o fato de que antes do

desenvolvimento do Silhak a elite do país se dedicava ao estudo de matérias filosóficas

baseados em princípios confucionistas tidos como metafísicos pelos pensadores do Silhak,

contudo com o advento da nova escola crítica ou pragmática estudos das ciências da natureza,

geografia, literatura, história, entre outros passaram a ser priorizados sobre os estudos de

natureza filosófica.

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Nestes termos, nas poucas referências que estes pensadores faziam sobre o estudo da

natureza humana e as suas virtudes, defendiam todos a mesma idéia de que o destino da vida

humana era definida por elementos que as pessoas experimentavam após o evento de seus

nascimentos, como a autodisciplina ou a bagagem de experiências que um indivíduo adquiria

ao longo de sua vida, negando assim a existência de influências de cunho determinista ou a

pré-determinação do destino das pessoas por considerá-las elementos metafísicos.

O pensador Jeong Yak Yong, que em suas obras literárias adotava o pseudônimo de

Dasan, via a natureza humana de forma neutra, nem boa nem má, mas que se tornava

propenso a pender para um lado ou outro conforme o estilo de vida que escolhia, assim dizia

que uma pessoa poderia ser correta e moralmente justa se treinasse para se tornar tal tipo de

pessoa71.

Choe Han Gi, que adotava o pseudônimo de Hyegang, assumia posição ideológica

similar a Dasan quanto à descrição da natureza humana, negando todo tipo de pensamento

apriorístico e defendendo a idéia de que a vida de uma pessoa era definida pelas experiências

que este acumulava ao longo de sua vida, reconhecendo assim que a vida pode ser moldada

por fatores racionais72.

Depreende-se da análise do pensamento dos dois pensadores acima mencionados que a

objetividade do Silhak aplica-se também ao estudo da natureza humana, que era analisado por

padrões empíricos, razão pelo qual dava pouca importância às questões morais ou éticas,

focando apenas no binômio bem estar social e progresso.

Esta filosofia marcou de forma profunda o pensamento coreano a partir de então,

sendo hoje apontado pela grande maioria dos pensadores que estudam o desenvolvimento

social e econômico do país, como um dos grandes responsáveis pelo desenvolvimento do país,

71 Han, Yeong U, Korean Philosophy: Its Tradition and Moderrn Transformation. Jeong Yak Yong: He man and his Though. Hollym. 2004. Pg.364. 72 Ibid., Pg.376

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uma vez que foi a base ideológica que permitiu ao país se modernizar, adotando os avanços

tecnológicos e filosóficos do ocidente73.

Assim, o Silhak exerceu forte influência na consciência social coreana, sendo

responsável pela postura pragmática e materialista adotado pelo país no desenvolvimento da

biotecnologia no país, que apostou no desenvolvimento científico para se recuperar

economicamente dos prejuízos sofridos por sucessivas guerras, quando as pesquisas

biotecnológicas iniciaram no país nas décadas de 80 e 90.

5.5. O capitalismo comunitário

A feição social que tomou conta da bioética coreana não resulta apenas da influência

direta do Silhak, mas também da característica peculiar que o sistema de produção econômica

coreana assumiu, vindo a assumir uma feição distinta do existente no ocidente, favorecendo a

forma como a bioética se desenvolveu no país.

Tal feição, como veremos adiante, reforça a similaridade da bioética coreana com as

feições do utilitarismo, justificando com isso as falhas cometidas em nome do bem estar da

comunidade.

73 Gilson SCHWARTZ, Notas sobre a experiência de gestão de conhecimento. Pg.12. Sobre o papel do Silhak no desenvolvimento da pesquisa científica na Coréia o autor diz: “Sobre esse pano de fundo histórico, é possível compreender melhor, por exemplo, o fato de que a busca de aperfeiçoamento tecnológico, parte de uma estratégia nacional, ganha expressão prática também ao nível das empresas. A ênfase tradicional nessa visão de aprendizado prático é também uma bastante provável fonte de inspiração para o sucesso das redes de instituições voltadas para a pesquisa aplicada, diferenciadas setorialmente, que constitui uma das características centrais do sistema de inovação da Coréia do Sul. (...) Os indicadores de pesquisa e desenvolvimento coreanos confirmam a extrema intensidade do esforço empresarial privado de produção de conhecimento aplicado. Até que ponto essa é uma decorrência de políticas governamentais de estímulo, até que ponto se trata de um desdobramento de uma tradição cultural voltada à valorização do “conhecimento prático”? Mais até, em que medida as próprias medidas oficiais já não refletem a mesma herança cultural? E em que medida essa orientação atravessa o sistema educacional? Ou seja, do ponto de vista da “razão comunicativa”, em especial no que se refere à promoção da inserção da Coréia do Sul na sociedade do conhecimento, o silhak é uma interessante via de acesso ao “espírito do capitalismo coreano”.

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Como alardeado incessantemente pelos conservadores a respeito dos perigos da falta

de controle das pesquisas científicas biotecnológicas no mundo, e principalmente da

intervenção do interesse econômico nas pesquisas, a bioética coreana sofreu de grande

influência dos valores econômicos em seu desenvolvimento, sendo este parcialmente

responsável pela forma que ela assumiu hoje.

Já foi claramente demonstrado em capítulos anteriores, quando estudada a história do

desenvolvimento científico do país e da evolução histórica do processo legislativo para a

promulgação da lei de biossegurança do país, que a pesquisa biotecnológica da Coréia foi

criada especificamente para atender interesses econômicos, servindo esta como mais um

“produto” a ser agregado à sua lista de bens exportáveis para outros países.

Contudo, a participação do interesse econômico na biotecnologia coreana não se

resume apenas a uma visão mercantilista, mas também social, em virtude da visão

comunitarista que o capitalismo coreano tem, que a distingue do capitalismo praticado no

ocidente.

O sistema capitalista foi introduzido na Coréia do Sul após a Segunda Guerra Mundial,

com a divisão da península coreana em duas zonas de influências distintas, ocupada ao norte

pela extinta União Soviética, onde implantou o comunismo, e no sul pelos Estados Unidos,

onde implantou o sistema de produção capitalista.

Com a adoção do capitalismo a Coréia do Sul reconstruiu o país depois da seqüência

de guerras e tragédias que a vitimou desde o fim do século 19 como a anexação japonesa do

país, a Segunda Guerra Mundial e por fim a Guerra da Coréia, que terminou em 1953.

O capitalismo encontrou terreno fértil na Coréia do Sul, conseguindo tirar o país da

situação de miséria que a penalizava, transformando-a hoje numa das economias mais

avançadas do mundo. A julgar pela forma como a sociedade coreana se adaptou facilmente ao

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capitalismo, defendem os especialistas que os valores e tradições culturais do país tiveram

papel decisivo na assimilação deste novo sistema pelo povo coreano74.

Contudo, o capitalismo praticado no país sofreu modificações em relação ao modelo

recebido do seu principal aliado no ocidente, os Estados Unidos, vindo a sofrer influências da

cultura local, criando um tipo diferente de capitalismo chamado de “capitalismo

comunitário”75.

Diferente do sistema ocidental que tem características individualistas, no capitalismo

comunitário todos os elementos da sociedade, desde o governo, os empresários e os

trabalhadores cooperam para o bem geral do país, cada um contribuindo à sua maneira para

que o interesse da coletividade prevaleça sobre o interesse individual. Nestes termos, a

história do capitalismo na Coréia caracterizou-se pela sinergia entre as ações do governo e as

entidades privadas, no qual o estado assumia o papel central de órgão planejador e as

empresas de executores dos planos esboçados pelo estado com rapidez e eficiência.

Um bom exemplo da sinergia em questão era o papel do estado em identificar e

promover pesquisas de tecnologia de ponta para depois transferi-la à iniciativa privada, para

que fossem comercializadas dentro e fora do país. Neste ponto em questão o estado cobria a

incapacidade das empresas coreanas de promoverem pesquisa de ponta, para o fim de agregar

valor aos seus produtos, comprometendo a competitividade das empresas do país em relação

às empresas de países mais desenvolvidos76.

74 Byung Nak SONG, The rise of the korean economy. Oxford University Press, terceira edição, 2003. Pg. 53. “Samuel P. Huntington enfatiza o fato de que no começo dos anos 60 a Coréia do Sul era em muitos aspectos similar a Gana em termos de renda per capita, ajuda econômica, a relativa importância da agricultura e assim por diante. Mas hoje, a renda per capita da Coréia do Sul é cerca de 25 vezes superior ao de Gana. Esta extraordinária diferença de desenvolvimento entre os dois países é, segundo ele, devido à diferença na cultura. Ele afirma que ‘A alta poupança sul coreana, investimento, trabalho duro, educação, organização e disciplina. Os Ganenses tem diferentes valores. Resumindo, Cultura faz a diferença”. Song, Byung Nak, The rise of the korean economy. Oxford University Press, terceira edição, 2003. Pg. 53. 75 Ibid., Pg. 55. “Neste capítulo nós argumentamos que as cinco características da cultura coreana identificadas acima, junto com o confucionismo e cristianismo, criaram o singular jeito coreano de produzir riqueza, e ao qual eu cunho o termo de capitalismo comunitário. Isto é diferente do capitalismo que se vê nos Estados Unidos e outros países ocidentais” 76 International Herald Tribune. Lesson in South Korea: Stem Cells Aren't Cars or Chips.. January 11th, 2006 “Numa estratégia invejada por outros países em desenvolvimento, a Coréia do Sul tornou-se a 11ª potência econômica do mundo focando investimento nacional em setores industriais definidos e produzindo resultados rápidos. Trata-se de uma receita que permitiu ao país desafiar a dominação japonesa na área de semicondutores e

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Serve de exemplo desta parceria o caso das indústrias de semi-condutores do país que

surgiram por impulso estatal, onde o estado promoveu a pesquisa inicial da tecnologia dos

semi-condutores em seus laboratórios, e depois de desenvolvido a transferiu às empresas

particulares para que fossem comercializadas. Hoje a Coréia do Sul domina este mercado no

mundo77.

Assim, a intromissão do interesse econômico na bioética coreana não teve a

repercussão negativa que teria ocidente, uma vez que diferente de lá, se considera que o lucro

ou o benefício auferido pelas empresas são auferidos indiretamente por toda a sociedade, uma

vez que a economia do país está estruturado de tal forma que o destino de um (empresas) está

sempre atrelado ao dos outros (estado e cidadãos).

Logo, uma outra particularidade da bioética coreana é a constante participação do

interesse econômico na bioética coreana, que com exceção dos casos extremos, é considerada

normal e até estimulada para atender às necessidades econômicas da nação.

Foi baseado nesta sinergia que o estado apoiou as pesquisas do Dr. Hwang,

promovendo as suas pesquisas a assunto de interesse nacional, reconhecendo a biotecnologia

como a nova fronteira comercial do país. Assim, a sociedade apoiou o governo nesta

iniciativa, numa clara prova de cumplicidade e cooperação estrita existente entre a sociedade

e o estado na Coréia.

Embora tenha havido oposição e críticas a esta visão “empresarial”, a população em

geral aceitava esta realidade e apoiava as pesquisas científicas vendo-as como elemento de

prosperidade nacional.

de construção naval. Até três anos atrás, com o ascensão do Dr,Hwang, a Coréia do Sul tentou usar o mesmo truque com a biotecnologia”. http://biopoliticaltimes.org/article.php?id=1783 77 Nature Biotechnology. “South Korean biotechnology—a rising industrial and scientific powerhouse”, volume 22, Supplement December 2004. “O setor de saúde de biotecnologia da Coréia do Sul é competitivo em relação a muito países desenvolvidos. O governo tem alocado fundos para pesquisa nas áreas básica e aplicada. De forma significativa, recentemente começou a financiar mecanismos de transferência de tecnologia das excelentes instituições acadêmicas para o setor privado.”

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5.6. O darwinismo social

Feita a análise da supremacia do interesse coletivo nas pesquisa biotecnológicas na

Coréia através da influência do Silhak, faz-se necessário agora realizar o estudo da influência

que o sentimento patriótico tomou conta da bioética coreana, principalmente no triste episódio

de fraudes protagonizado pelo Dr. Hwang.

Se a supremacia do interesse coletivo na bioética coreana está claramente justificada

pela influência do Silhak na sociedade coreana, tal fator não explica por completo a adesão

cega e apaixonada que os coreanos demonstraram pela pesquisa biotecnológica do país.

Conforme se verificou no episódio protagonizado pelo Dr.Hwang, o envolvimento da

massa no desenrolar deste evento apresentou traços de fanatismo, em resposta ao apelo

patriótico que as autoridades e o próprio Dr.Hwang imprimiram a estas pesquisas. Tal

estratagema colocou a pesquisa bioética no centro do interesse do país, tornando-a num

elemento de interesse nacional como jamais visto em outro país, ou seja, de mero elemento

médico-científico a biotecnologia passou a ser tratada como elemento de segurança e

estratégia nacional, conforme se verifica a seguir.

A teoria do darwinismo social deriva do trabalho científico de Charles Darwin, que no

seu livro “A origem das espécies” fala da teoria da evolução das espécies através da

sobrevivência do mais forte e do mais apto. Tal teoria inspirou pensadores da época como

Herber Spencer e Thomas Huxley, que aplicaram estes princípios na análise do

desenvolvimento da sociedade humana78.

Tal teoria aplica a idéia de competição das espécies na espécie humana, defendendo a

idéia de que os homens e nações competem entre si para alcançar o sucesso ou a

78 Sang Ik LEE, On the concepto of “New Korea” envisioned by enlightment reforrmers, Korean Philosophy: Its Tradition and Moderrn Transformation, pg.469.

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sobrevivência como os animais, ou seja, para sobreviver e progredir os estados precisavam

competir entre si, superando os limites impostos pela natureza.

O Darwinismo Social chegou à Coréia nos idos de 1900 através da vários caminhos

como a tradução de livros de autores chineses e japoneses, que naquela época já eram

familiarizados com a teoria, além de estudiosos coreanos que tiveram a chance de estudar no

ocidente, como os Estados Unidos, onde o pensamento Darwinista era amplamente difundido.

Assim, tal movimento surgiu través da classe mais esclarecida do pais, que logo tentou

difundi-la na sociedade menos culta.

A introdução deste princípio não poderia ter sido mais oportuna, pois no fim do século

19, a última dinastia coreana, a dinastia Joson, estava em perigo de desaparecer, anexada à

força pelo Japão, e haviam grandes movimentos patrióticos que tentavam resistir a esta

tragédia nacional79.

Naquela época, a Coréia e o mundo estavam testemunhando o surgimento do império

japonês, que se modernizou rapidamente ao abrir o seu mercado para o ocidente, e adquiriu

tecnologia e armamento superior, superando com isso a Coréia, que se enfraqueceu por

infindáveis crises internas e pela adoção de política isolacionista, que a levou em direção

contrária à modernização experimentada pelo Japão80.

Diante da ameaça iminente, popularizaram-se na sociedade os princípios advogados

pelo Darwinismo Social, levando os mais esclarecidos a defender o fortalecimento do país

através da criação de instituições fortes, da educação e da industrialização. Com isto

79 Ibid., Pg.471 80 Amaury Porto de OLIVEIRA. A Política Coreana na Ásia: aspectos políticos e militares. Pg.2. “Pesquisas recentes sobre essa desmontagem do sistema tributário chinês vêm trazendo nova luz para a compreensão dos primeiros movimentos de tipo imperial do Japão, atacando a supremacia chinesa de dentro mesmo da área tributária. O ataque central do Japão veio a liquidar a ascendência da China sobre a Coréia, numa série de edificantes manobras bem descritas por Bruce Cumings. Destaca-se no episódio a figura de Li Hing-Chang, que muitos apontam como o maior estadista chinês da segunda metade do século XIX. Lutou ele me vão por arquitetar tratados bilaterais que prolongassem a independência da Coréia, mesmo se em termos muito formais, a fim de manter um resto de participação da China no jogo político do Nordeste Asiático. O Japão levou a melhor, e em 1910reduziu a Coréia à sua colônia. Assim arrancada à força da influência da China, a península coreana iria ser, durante trinta e cinco anos, peça-chave do sistema imperial eu o Japão começara a montar no Leste Asiático”.

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tornaram-se populares frases como “Luta pela existência” e “sobrevivência do mais adaptado”

na sociedade coreana.

Com o Darwinismo Social as pessoas passaram a entender que para a sobrevivência da

nação precisavam fortalecer a economia e a educação do país, e assim tentaram ensaiar uma

rápida tentativa de industrialização e desenvolvimento do sistema educacional no país,

contudo tais tentativas fracassaram devido à situação fragilizada do país81.

Como conseqüência a esta nova conscientização política, difundiu-se na sociedade a

idéia de fortalecimento do país através daquilo que passaram a chamar de “povo novo”, que

seria a recriação ou a refundação da nação, através de pessoas novas que imbuídas de novos

valores, permitiria ao povo coreano evoluir e desenvolver como os países do ocidente.

Tal postura teve conseqüências muito negativas para a cultura local, que passou a ser

marginalizada e considerada retrógrada, em detrimento da adoção dos valores ocidentais que

estavam em voga na época.

Embora seja uma tendência que surgiu a mais de um século, a influência do

darwinismo social permanece ainda muito forte na sociedade coreana, isto porque a situação

que existia naquela época pouco mudou com o tempo, uma vez que o clima de guerra

experimentado na época ainda permanece inalterado na mente dos coreanos, pela ameaça

constante de guerra com a metade comunista do país, a Coréia do Norte, que de tempos em

tempos dá sinais de beligerância ameaçando ou provocando a parte sul do país.

Permanece também a sensação de fraqueza e dominação da Coréia por parte das

grandes potências do mundo, uma vez que com o tempo a relação de desigualdade com os

seus vizinhos (Japão, China e Rússia) não sofreu qualquer modificação, vindo a agravar-se, e

pelos resquícios nefastos da Guerra Fria que ainda permanece na vida dos coreanos, que

81 Ennio CANDOTTI, Educação e Movimentos Sociais na Coréia do Sul. Pg.16. “Por outro lado a ocupação japonesa da Coréia foi uma tragédia nacional que despertou uma intensa revolta e promoveu movimentos de recuperação da língua, da cultura e dignidade e contribuiu para cimentar as relações humanas na reconstrução do país e dar-lhe agressividade na política de comércio exterior.”

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colocou o país na zona de influência da grande potência Norte-Americana, que em troca da

proteção militar oferecida ao país exerce poder de ingerência na política interna e externa do

país.

Assim, diante de tais sinais de fraqueza e necessidade, a Coréia, apesar de hoje ser

uma das grandes economias do mundo, está ainda numa corrida incessante pelo

fortalecimento, numa tentativa em vão de superar os seus “inimigos”, que graças à

superioridade de seus recursos naturais e humanos, estarão sempre em situação de

superioridade, independente de quanto esforço venha a ser empreendido pela Coréia82.

O desenvolvimento da biotecnologia na Coréia entra nesta questão como mais um dos

vários fatores que o país dispunha na sua luta pela superação, usando os louros da

biotecnologia como forma de fortalecer-se contra os seus adversários.

Obviamente os sucessos provenientes dos avanços da medicina não podem ser

utilizados como instrumento de confrontação e intimidação na política internacional, mas na

Coréia foram indevidamente utilizados como instrumento de afirmação nacional, através do

apelo patriótico dado às pesquisas, e como instrumento de promessa de prosperidade, criando-

se expectativa quanto à possibilidade e ganhos financeiros com a exploração comercial das

descobertas científicas.

Neste aspecto, o esforço de criação do “novo povo” não parece ter desvanecido com o

tempo, mas continua latente no peito dos coreanos, que continuam investindo esforço no

82 Pete SHANKS. The Hwang Saga Continues. Civil society warnings about the dangers of genetic technology were ignored. OhmyNews. Published 2006-05-17. “Os fãs estão em grande anarquia. Eles se comunicam por sites da web e salas de bate-papo, e se apóiam mutuamente nas vigílias e outros esforços. No mês de abril, Jang Yong Jin, iniciou uma greve de fome em frente da KBS como protesto pela recusa da emissora de colocar no ar programas com opiniões favoráveis a Hwang. Jang aceita o fato de que Hwang tenha cometido erros (“70 por cento bom, 30 por cento ruim”), mas acredita que deveria ser permitido a Hwang manter a sua equipe e repetir os resultados de suas pesquisas para permitir que a Coréia do Sul tome a liderança na clonagem, antes que o Japão ou a China ocupe esse nicho. Ele estava no nono dia da greve de fome, se alimentando apenas de líquidos quando falei com ele, e percebi que ele poderia manter a greve por mais de 1 mês.”©2006 http://english.ohmynews.com/articleview/article_view.asp?article_class=2&no=292505&rel_no=1

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fortalecimento do país através do fortalecimento de suas instituições, de sua educação e do

desenvolvimento tecnológico para alcançar e superar os países do ocidente e os seus vizinhos.

5.7. O cristianismo na coréia

No ocidente os grupos religiosos têm participado ativamente da discussão ética a

respeito do desenvolvimento das pesquisas na área de biotecnologia, sendo, dentre as várias

forças atuantes, um dos mais importantes e poderosos participantes nesta discussão.

Tradicionalmente, o papel dos grupos religiosos tem sido de assumir uma postura

conservadora em relação ao desenvolvimento da biotecnologia, sob o argumento da proteção

da sacralidade da vida humana e do respeito à criação divina do homem. Neste aspecto o

cristianismo tem sido o grupo religioso mais combativo quanto ao desenvolvimento das

pesquisas biotecnológicas.

Contudo, como vários dos elementos sociais que tem atuado na determinação da

bioética coreana, a religião cristã no país tem assumido uma posição bastante passiva em

relação aos avanços da bioética coreana quando comparada a países ocidentais.

Não que esta seja a favor ou que não tenha interesse nas pesquisas, mas embebido da

cultura local, tem apresentado uma postura própria que se explica melhor a seguir.

O cristianismo começou a ser introduzido na Coréia através dos viajantes coreanos que

visitavam frequentemente a China entre o fim da dinastia Ming e o início da dinastia Qing.

Estes viajantes tiveram contato com as traduções chinesas de diversos livros escritos pelos

jesuítas, que levaram à China o conhecimento científico e religioso do ocidente.

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Estas traduções foram levaram à Coréia para a difusão do cristianismo na Coréia,

iniciando assim surgimento da fé cristã no país83. Hoje o cristianismo é uma das religiões

dominantes do país, sendo a Coréia o maior país cristão da Ásia.

Segundo Gilmar Masiero, a questão da influência do cristianismo na cultura oriental

foi estudada pelo professor chinês Tu Wei Ming84, que ao analisar a questão chamou esta

intervenção de a “nova ética Confucionista”, a mudança promovida pelos princípios cristãos

na filosofia confucionista dos países asiáticos.

Para Tu, o cristianismo modificou o confucionismo oriental transformando os traços

de uma sociedade coletivista e formalista em individualista e pragmática, alterando ainda os

valores que a sociedade conhecia há gerações. Serve de exemplo a tal assertiva a forma como

o cristianismo modificou a visão que a sociedade coreana tinha a respeito do comércio, que de

atividade vil e de pouco valor passou a ser considerado a atividade de valor, assim como fez a

Cristianismo Protestante na Europa, com isso as atividades comerciantes e industriais

passaram a ser reconhecidos na sociedade coreana, que até então os relegava às posições

menos honrosas na sociedade85.

Obviamente, a religião cristã não foi a única responsável por esta transformação de

valores no país, mas com os seus princípios de benção e prosperidade exemplificado

soberbamente nas histórias do Velho Testamento86, colaborou grandemente para a assimilação

dos princípios capitalistas pelos coreanos.

Com a “cristianização” do confucionismo, os valores excessivamente coletivistas da

sociedade oriental passaram a sofrer certa flexibilização, adequando-se oportunamente aos

princípios capitalistas de individualidade e pragmatismos, permitindo assim, que os países

83 O peculiar quanto à esta questão é que diferente de resto dos demais países cristãos do mundo, a Coréia foi o único país do mundo onde a fé cristã se desenvolveu de forma independente, sem a intervenção direta da Santa Sé, que até o primeiro contato promovido pelos cristãos coreanos, desconhecia até mesmo da existência do país. Desta forma o cristianismo na Coréia veio a ser conhecido pelo Vaticano somente após o primeiro contato promovido pelo próprio povo coreano, solicitando à Santa Sé o envio de missionários para o país. 84 Gilmar MASIERO. A economia coreana: Características estruturais. Pg.4 85 Gilmar MASIERO. A economia coreana: Características estruturais. Pg.4 86 Jô, Patriarcas, Rei Salomão,

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orientais, e a Coréia do Sul, abraçassem o capitalismo sem culpa ou conflito com as suas

crenças e valores87.

O peculiar quanto à esta questão é ver que com a “nova ética confucionista”

promovida pelo cristianismo, coloca em destaque o papel auxiliar que a fé cristã teve no

desenvolvimento social e financeiro dos países asiáticos, que até então estavam familiarizados

com um sistema de produção cuja forma de geração de rendas girava em torno da posse da

terra.

87 Gene Ethique. The human cloning scandal in South Korea : toward a post-cloning era? Cloning: a sensational declaration. December 2005. “O posicionamento da igreja da Coreia do Sul, que há tempos tem condenado as pesquisas com células embrionárias e a clonagem, sai fortalecido. Ela anunciou, antes da eclosão do escândalo, que o Comitê pela vida, uma organização criada pela diocese de Seul, proveria fundos de 8 milhões de Euros (US$ 9.6 milhões) para pesquisa de células tronco adultas”.

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6. A BIOÉTICA NO ORIENTE

Feita a análise das características que influenciaram a formação do que se pode chamar

de bioética coreana, faremos agora uma comparação desta bioética particular com os traços

gerais da bioética praticada nos demais países asiáticos, fazendo uma breve introdução à

filosofia confucionista, e posteriormente uma breve comparação com os traços gerais que

caracterizam a bioética praticada no ocidente.

Assim, iniciaremos esta parte do nosso estudo realizando uma introdução à filosofia

confucionista que moldou a forma como a filosofia local veio a se formar, contribuindo

decisivamente para a formação da bioética na Ásia como a conhecemos hoje.

6.1. Princípios da filosofia Confucionista

A característica principal do pensamento do confucionismo é o sem dúvida seu forte

caráter coletivista que submete a análise das questões sociais e políticas à adequação do

interesse pessoal ao interesse da coletividade.

Para esta escola de pensamento o humano está em conexão harmônica com o universo,

divergindo da visão antropológica predominante no pensamento ocidental. Explica que a

origem do homem resulta da vontade do céu e da terra, sendo o céu o pai a terra a mãe e o

homem o produto da vontade dos dois, compondo com estes os três principais elementos do

universo. Desta forma os seus atos devem ser praticados em harmonia com o desígnio da

natureza.

Afirma que o homem é imperfeito, mas é superior a todas as coisas do universo, assim

tem potencial ilimitado para fazer o que deseja, contudo, embora o homem seja naturalmente

bom, pode fazer mal uso de sua potencialidade ao ser seduzido pelos desejos carnais ou

terrenos, assim deve se esforçar para permanecer bom, mesmo que venha a ceder ao mal.

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Quanto à questão vida e morte, o confucionismo vê a morte como um processo natural

da vida, sem vinculá-la a qualquer sentido religioso ou divino. A morte resulta na separação

entre o corpo e a alma, retornando esta ao universo, ou à paz, e acreditam que esta separação

se completa em 4 gerações, desta forma praticam a reverência à memória dos que morrem até

quatro gerações seguintes. Apesar de entender que o homem é superior às demais criaturas do

universo diz que este sujeita-se à regra da vida e morte como os demais seres vivos,

assemelhando-se a eles pelo menos neste aspecto.

Quanto à questão do valor ou o sentido da vida atrelam este quesito a dois elementos

essenciais que são a família e a uma vontade superior, que na falta de existência de um ser

superior como um deus, resolveram designar genericamente como o céu.

No pensamento confucionista o homem insere-se na complexa estrutura familiar,

como membro de uma linhagem a quem deve atrelar o seu destino, colocando como

finalidade maior ser fiel à família, como forma de mostrar gratidão aos pais por terem gerado

e ao céu por ter permitido a sua existência. Tal posicionamento leva à crença de que a vida de

uma pessoa não pertence a ela, mas à sua família e o seu corpo aos seus pais que o geraram.

Com isso faz parte de suas obrigações garantir a continuidade do nome da família gerando

filhos para perpetuarem a linhagem da família.

Quanto à vida em sociedade existem duas realidades que o homem deve saber: o

mundo da natureza e o mundo das pessoas. No mundo das pessoas, o homem deve ser

regulado por uma postura moral elevada baseada nos valores bondade, benevolência e afeição

no trato das pessoas.

Para garantir a harmonia nas relações humanas o confucionismo reconhece 5 tipos de

relações humanas que são as bases da moralidade social: 1) ternura entre pai e filho, 2)

lealdade do povo ao rei, 3) distinção entre marido e mulher, 4) hierarquia entre o velho e o

novo e 5) confiança entre os amigos. Tais relacionamentos servem para regular os

relacionamentos sociais e devem ser praticados junto com as 5 virtudes celestiais que são a

benevolência, a retidão, as boas maneiras, o conhecimento e a sinceridade. Junto aos 5 tipos

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de relações humanas existem 3 princípios que governam os relacionamentos familiares e são a

piedade filial, fraternidade e afeição parental.

O confucionismo vê a vida social como uma extensão da vida em família ou como

entidades relacionadas, que compartilham dos mesmos princípios morais para se

desenvolverem em harmonia conforme a vontade dos céus, assim a conduta moral familiar

deve ser estendida também à vida social seja horizontalmente, seja verticalmente, pois

entendem que a moralidade praticada na família é extensível à sociedade de forma que a

harmonia que se alcança na família passa a existir na sociedade também, em outras palavras a

consciência familiar torna-se a base da consciência social.

Por fim, afirma que se o homem segue os ordenamentos do céu e alcança a perfeição

na relação humana então diz-se que a ordem social é alcançada. Para alcançar o destino da

perfeição dos relacionamentos humanos o confucionismo prevê dois caminhos que são a

repressão dos desejos humanos e a realização de uma experiência divina para entender a

vontade do céu na vida de cada indivíduo.

Quanto ao primeiro caminho, entendem que o segredo para a perfeição está na

repressão dos desejos e assim viver uma vida ética, substituindo-a por um código de conduta

regrado, e assim conduzindo a vida através de parâmetros morais, criando relacionamento

estável com a família e o país.

Quanto ao segundo caminho entendem que o homem deve buscar uma experiência

divina direta para o fim de entender o propósito do céu, e para tanto a pessoa deve cultivar a

sua personalidade reexaminando o seu coração e cultivar a sua natureza básica que é bom.

Deve também refletir nos seus pensamentos e ações como forma de demonstrar respeito

perante a o céu, sendo este a forma de conhecer a essência do céu a partir do seu interior, e

não do seu exterior. Uma vez conhecendo a vontade do céu deve mostrar respeito ao mesmo

obedecendo-o como forma de desenvolver o seu caráter.

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A cultivação dos valores morais é a cerne desta filosofia sendo que respeito e

sinceridade são valores básicos para aqueles que querem alcançar a harmonia com o céu,

contudo a comunhão com o céu torna-se impossível se não se alcançar a perfeição nos

relacionamentos humanos, sendo assim prega que o homem deve focar nos homens tanto

quanto foca no céu.

6.2. Traços gerais da bioética contemporânea na Ásia

Feita a introdução ao pensamento confucionista analisaremos agora as nuances da

bioética local que se desenvolveu a partir de suas fundações na filosofia confucionista,

adquirindo dela as bases ideológicas que a formaram.

Em traços gerais a bioética local segue os princípios básicos do confucionismo

mencionado no capítulo anterior, criando aqui uma bioética focada no coletivismo, onde a

individualidade da pessoa é em geral colocada em segundo plano em detrimento das decisões

familiares, com base na noção de que o destino ou a sorte de uma pessoa está atrelada ao

desígnio familiar, uma vez que a ela aquele pertence.

Segundo Englheardt88, o conceito de família existente no confucionismo vê a família

com baseia em vínculos de natureza metafísica, onde a família e os seus membros são vistos

sob uma perspectiva cósmica, sendo esta parte de uma realidade necessária para o

amadurecimento da sociedade humana. Esta visão altamente simbólica do homem e do

universo diverge profundamente da visão materialista e racional que predomina no ocidente,

os chamados pós-tradicionalistas pelo autor, pois estes não seguem o mesmo ponto de vista

metafísica do homem e do universo, não vinculando a sua existência a nenhuma finalidade

supra-humana, valorizando apenas valores como a autonomia, o individualismo, a liberdade

de escolha em detrimento da família, o que torna as pessoas estranhas moral e

metafisicamente uns dos outros.

88 Shui Chen LEE e Justin HO. The family, medical decision making and biotechnology – Critical reflection os Asian moral perspectives. Capítulo 1 – Medicine and the biomedical Technologies in the contexto of asian perspectives. 2007. pg.3

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Para o autor, os pós-tradicionalistas vêem a família como um obstáculo à realização

dos interesses pessoais.

Contudo, a vinculação da individualidade da pessoa ao desígnio da família não pode

ser visto de forma simplória, como uma fatalidade onde a individualidade é sacrificada em

nome do grupo familiar, isto porque pelo ensinamento confucionista a identidade da pessoa é

formada dentro da família, onde ele se desenvolve e floresce nutrido dos valores e

experiências que a família lhe propicia para o seu amadurecimento e aprimoramento, ou seja,

a família assume uma posição central na constituição da identidade e personalidade do

indivíduo, criando com isso um vínculo muito forte com os demais membros da familiar onde

todos dependem entre si e se ajudam mutuamente para o benefício de todos

Nestes termos, a decisão familiar nas questões individuais não é vista como um ato de

ingerência ou privação, mas o processo pelo qual a família age em conjunto pelo benefício do

seu ente querido, protegendo-o e cuidando do mesmo para que o mesmo atinja a plenitude de

sua existência.

Pelos ditames confucionistas, a autoridade da família sobre o indivíduo chega ao ponto

de poder decidir se o médico poderá omitir informações do paciente que julgue ser necessário

para o bem estar do mesmo, assim como decidir junto com o médico qual tipo de tratamento

poderá ser aplicado ao paciente, sempre tendo como prioridade o bem estar do membro da

família. Como se vê na Ásia a família participa decisivamente do tratamento do paciente do

mesmo jeito que participa de sua educação, carreira, casamento e outros eventos de

importância na vida de uma pessoa.

Contudo, entende Ruiping Fan89 que com a modernização dos costumes e a adoção

crescente de valores ocidentais, os valores confucionistas têm sofrido constantes ataques

daqueles que adotam o pensamento individualista, que chamam de retrocesso o modelo de

decisão familiar adotado nos países asiáticos, sob a falácia dos avanços sociais e proteção dos

direitos individuais ou a hegemonização absoluta do princípio da auto-determinação sobre a 89 Ruiping FAN. P The family, medical decision making and biotechnology – Critical reflection os Asian moral perspectives. Capítulo 1 – Confucian familism and its bioethics implications. 2007. pg. 20

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tradição local, tentando com isso estabelecer o pensamento liberal individualista praticado no

ocidente como predominante nas decisões na área da saúde.

Estas pessoas não só julgam as sociedades confucionistas atrasadas em relação às

sociedades ocidentais, mas com base em estudos de casos desfavoráveis à bioética asiática

defendem que estas sociedades seguem um conjunto de regras e valores falsos e retrógrados.

Segundo Erickson 90 , a globalização seria o responsável pelo que ele chama de

“Americanização” da sociedade oriental transformando as sociedades orientais em sociedades

de consumo, focadas na produção e na geração de riquezas, ávida em consumir sempre mais,

criando com isso uma sociedade que busca o imediatismo e cultua o individualismo como

forma de atingir este modelo de sociedade.

Nestes termos, o liberalismo secular tem persistido na promessa de uma sociedade

focada no desenvolvimento material e aproveitou o desenvolvimento das pesquisas

biotecnológica para transformá-la num novo produto, industrializado para ser explorado de

acordo com as leis de mercado.

Conclui o autor que com a ocidentalização dos valores asiáticos, as famílias orientais

irão cada vez mais abandonar a visão familiar adquirida do confucionismo e engajará num

estilo de vida que privilegia a produtividade sobre a empatia entre os membros familiares,

condenando com isso o estilo de vida que até hoje tem caracterizado a sociedade asiática.

Quanta às pesquisas genéticas embrionárias, contudo, os papéis observados pelas duas

sociedades mudam radicalmente, assumindo cada uma a posição oposta que a outra assumia

quando analisamos a feição geral da bioética na Ásia.

90 Stephen A. ERICKSON. The family, medical decision making and biotechnology – Critical reflection os Asian moral perspectives. Capítulo 4 – Family life, bioethics and confucianism. 2007. pg.52

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Isto acontece por que enquanto que no ocidente as pesquisas embrionárias são

envolvidas numa áurea de religiosidade e tabu que inibe o seu desenvolvimento, na Ásia as

pesquisas são vistas de forma objetiva e direta, sem qualquer deturpação ideológica ou

religiosa que perturbe o seu desenvolvimento.

Quanto a este particularidade esclarecem Lee e Ho91 que a sociedade confucionista

não tem problemas em aceitar o uso dos embriões excedentes de tratamento de fertilidade em

pesquisas genéticas, pois foram criados para fins de reprodução e seriam descartados de

qualquer forma, e se a sua destruição é vista de forma lamentável pelo menos o seu uso nas

pesquisas poderá beneficiar as pessoas necessitadas.

Afirma Lee que mesmo que seja errado produzir embriões por clonagem terapêutica

para se obter células-tronco, e estas células pudessem ser adquiridas de outra forma,

respeitando-se assim aqueles que consideram os embriões com o mesmo status moral das

pessoas normais, ainda assim acredita que a clonagem terapêutica seria justificada para curar

e aliviar o sofrimento de pessoas doentes.

Ainda no caso das culturas islâmicas, acreditam que uma pessoa completa se forma da

união do corpo e da alma, mas como entendem que esta união só ocorreria a partir de 40 ou

50 dias após a sua concepção, consideram apenas lamentável a destruição do embrião antes da

união, mas proibido destruir um embrião depois daquela data.

Tal crença tem uma implicação muito grande na realização de pesquisas embrionárias

nessas culturas, pois podem usar feto abortado espontaneamente ou embriões excedentes de

tratamentos de fertilidade para as suas pesquisas, uma vez que não atribuem ainda o status de

pessoa completa ao embrião, contudo devido à sacralidade da vida que o islã prega não

podem criar um embrião propositalmente para fins terapêuticos, assim como forçar o aborto,

pois seria errado criar vida (embriões) para o fim exclusivo de beneficiar outras vidas.

91 Shui Chen LEE e Justin HO. The family, medical decision making and biotechnology – Critical reflection os Asian moral perspectives. Capítulo 1 – Medicine and the biomedical Technologies in the contexto of asian perspectives. 2007. pg.10

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6.3. Da visão utilitarista da bioética na Ásia

Diz Dall’Agnol92 que a Ética Kantiana e o Utilitarismo foram as duas principais

teorias éticas a servir de subsídio para a formulação da bioética principialista, proposta

inicialmente por Beauchamp e Childress no “Relatório Belmont”.

Afirma este autor que as teorias éticas se dividem em dois grupos principais: as teorias

teleológicas e as teorias deontológicas, sendo o utilitarismo exemplo da primeira e a ética

kantiana a segunda. Para a teoria teleológica o certo ou errado será definido conforme o fim

que se imprime a um determinado ato, sendo que para a teoria deontológica a observância ou

não de um “dever” ou uma obrigação será o elemento determinante na validade ou não de um

ato93.

Analisando a forma como se desenrolou o episódio em estudo, qual seja, o

desenvolvimento da biotecnologia coreana e a eclosão do escândalo protagonizado por

Hwang, tem se a clara impressão de que a bioética coreana apresenta um forte conteúdo

utilitarista, visto o seu forte caráter finalista, desenvolvido com foco nos interesses

econômicos e estratégicos do país.

De fato, desde a sua concepção não houve por parte das autoridades coreanas a

preocupação efetiva de estabelecer princípios ou limites morais e éticos na condução das

pesquisas genéticas, mas apenas a adoção de diretrizes de natureza mercadológicas, haja vista

a sua direta vinculação à política industrial e econômica, definida não pelo ministério a cargo

da educação ou ciência, mas pelo ministério a cargo dos negócios e da condução da política

industrial do país.

Tal assertiva se confirma pela falta de preocupação do governo coreano em estabelecer

normas ou procedimentos que garantam respeito aos valores morais, através de determinação

92 Dall’Agnol, Darlei. Bioética: princípios morais e aplicações. Rio de Janeiro, DP&A Editora. 2004. Pg.15 93 Ibid., Pg. 22, 23

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de “máximas” ou “imperativos mínimos”, conforme observado na bioética de países

influenciados pela ética kantiana.

Assim parece oportuno fazermos uma crítica à bioética coreana com base nas críticas

que experimentam as bioéticas fundadas no utilitarismo no ocidente, e disso extrairmos lições

preciosas sobre possíveis soluções aplicáveis aos problemas que afligem a bioética coreana.

Importante iniciar as críticas abordando o Silhak, que conforme visto até o momento

tem sido uma das principais fonte de influência não somente da bioética, mas de todo o

pensamento coreano contemporâneo.

A similaridade entre o utilitarismo e o Silhak reside no fato de que este pensamento

tem caráter basicamente social, focado no estudo dos assuntos do estado, sem interesse em

aprofundar em questões de moralidade ou virtudes, determinando a definição das ações em

boas ou más apenas na capacidade que estas têm de aumentar o diminuir a felicidade das

pessoas, assim com o bem estar da nação, através de medidas pragmáticas na área da

administração pública, ciência e economia.

O remédio para solucionar o excessivo materialismo ou objetividade do Silhak parece

estar na inclusão de uma conscientização valorativa nos seus princípios, preocupada com

valores morais fundadas em virtudes como no utilitarismo proposto por Mills ou Moore,94 ou

ainda, para uma nova versão do utilitarismo proposto por Brink em 1989, que Dall’Agnol

identifica como o “utilitarismo objetivo”, que tem por base a preocupação com a qualidade de

vida de todos das indivíduos da sociedade95.

O elemento capitalismo comunitário mencionado anteriormente vem agravar o

problema causado pelo Silhak, uma vez que coloca o interesse corporativo pelo lucro como

uma necessidade social, vinculando a sorte dos cidadãos à sorte de suas empresas.

94 Ibid., Pg.67 95 Ibid., Pg.84

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Não se pode negar que as pesquisas na biotecnologia possam vir a atender interesses

comerciais, uma vez que no sistema econômico em que vivemos atualmente as pesquisas

necessitam ter algum valor econômico para que possam se desenvolver, contudo devido aos

valores humanos que estas pesquisas carregam não parecer ser aconselhável que o interesse

econômico seja o valor preponderante.

A particularidade social que experimenta a Coréia justifica em parte a grande

vinculação da pesquisa genética aos interesses econômicos do país, mas se o capitalismo

comunitário praticado por lá torna a relação empresa-governo-cidadãos simbiótica, a

promoção do interesse econômico nestas pesquisas deve avançar até um ponto em que tal

atitude não venha a representar risco aos cidadãos, uma vez que a dependência é mútua e a

empresa não pode sobreviver sem o cidadão.

Aqui novamente nos referimos ao utilitarismo adotado por Mills e Moore e Brink que

justifica a felicidade não apenas no elemento prazer, mas também na vinculação deste ao

respeito de valores sociais e da preocupação finalista dos atos, levando em consideração a

qualidade de vida dos cidadãos do país.

Outra crítica inerente ao utilitarismo que pode ser aplicado à bioética coreana está na

crítica que alguns eticistas fazem à vinculação da filosofia utilitarista ao naturalismo ou à

teoria da seleção natural de Darwin, reduzindo os valores humanos a meros princípios

biológicos.

O problema da adoção de tais princípios é o perigo de se validar os atos humanos sob

o enfoque evolucionista, aceitando como correto a prática e atos como a eugenia, sob o

pretexto de se respeitar o princípio da seleção natural na sociedade humana também.

Tal disposição vai contra o principio da busca do bem geral do utilitarismo, que se

opõe ao estabelecimento de normas ou princípios de exclusão ou segregação de uma parcela

da sociedade, em nome de uma supremacia ou evolução humana com base em princípios tão

restritos e limitados.

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Os valores que cultivamos na sociedade humana não podem ser substituídos por

aqueles que regulam a vida de seres tidos como inferiores, que devido à sua natureza não tem

capacidade de entender a vida com a mesma complexidade como nós, que podemos

compreender conceitos e valores superiores a meros instintos carnais96.

Assim, a grande queixa dos eticistas está no argumento de que a vida humana deve ser

analisada de forma mais racional, com a devida importância, e não apenas com base em meras

leis da natureza. Nestes termos, condenam também o Darwinismo Social criado por

pensadores como Spencer e Huxley, os principais criadores do Darwinismo Social.

É aqui que a crítica ao utilitarismo se aplica à bioética coreana novamente, uma vez

que, como mencionado atrás, motivou o desenvolvimento de sua bioética com base em

princípios naturalistas como a seleção e evolução natural, e não em princípios mais

condizentes com a dignidade da natureza humana.

A motivação da bioética coreana veio do desejo do país de competir e superar outros

países, através de sua pesquisa, resultando posteriormente no escândalo que abalou a pesquisa

científica do país97.

Neste caso não há necessidade de se prolongar muito em explicações, pois os fatos

falam por si, pois o interesse de promover a felicidade e o bem estar de todos mostrou-se

baseada em princípios inadequados à condição humana, que pela sua natureza transcende a

mera necessidade de competir com os outros, exigindo que para a promoção da verdadeira

96 Ibid, Pg.73 97 Nature Biotechnology. South Korean biotechnology—a rising industrial and scientific powerhouse. volume 22, Supplement December 2004: “Despite all of the positive indicators surrounding their biotechnology sector’s prospects, South Koreans are waiting for that one major technological and commercial breakthrough that will place South Korean biotechnology in the same league as that of the United States or the United Kingdom. The reality is that the public does not realize that development of a mature biotechnology industry base is a slow process, fraught with many more failures than successes. This impatience may have important consequences for future biotechnology investments. The government’s decision to pour in hundreds of millions of dollars each year is increasingly challenged, and its commitment is beginning to wane, particularly in its financing of exploratory, long-term R&D endeavors. Investors are also increasingly skeptical, especially after the venture minibubble of the late 1990s burst.”

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felicidade de todos, vivamos numa sociedade que respeita valores humanos como a dignidade

e a justiça.

A bioética coreana errou ao exagerar na excessiva preocupação com o bem estar geral

de todos, ficando míope ao bem estar individual, permitindo que dor e sofrimento fossem

infligidos a certos elementos da sociedade, como as pesquisadoras que foram forçadas a doar

óvulos para as pesquisas genéticas ou as que ao se disporem a vendê-las, sem terem sido

devidamente informadas a respeito dos riscos de tais atos, passaram a sofrer de dores no corpo

e agora estão processando os responsáveis por tais atos98.

O exemplo do exagerado apelo patriótico atribuído à pesquisa genética do país é uma prova

clara dos perigos que a pesquisa genética pode causar a uma sociedade quando associada

indevidamente com valores nocivos. Foi este excesso que deturpou a capacidade de discernir

das pessoas no país, levando-as a apoiar as pesquisas, mesmo sabendo serem antiéticas.

98 AsiaNew. “Ova donors demand compensation from government”. February 7th,, 2006. “A coalition of 35 women’s groups filed a suit for compensation against the South Korean government on behalf of women suffering from side-effects after making uninformed ova donations to Prof Hwang Woo-suk for his research on stem cell embryos”.

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7. EVOLUÇÃO DA ÉTICA MÉDICA NO LESTE ASIÁTICO

7.1. História ética dos profissionais da saúde.

Nunca na história da humanidade, os médicos apresentassem tanta homogeneidade em

seu status social ou seu nível educacional como na atualidade.

De fato, antigamente no oriente existiram diversos categorias de profissionais da saúde

que eram classificados conforme o seu nível de conhecimento e nível social, a começar pelos

verdadeiros profissionais médicos, detentores da prática médica que se dedicavam

meticulosamente aos estudos e às ideologias confucionistas; existiam também aqueles pseudo

médicos, detentores de técnicas razoáveis de medicina, indo até os curandeiros que atraíam os

fregueses na rua, agitando os seus sininhos.

O ocidente também tinha a sua diversidade de especialistas na medicina, indo desde

aqueles que além de receber a educação formal em escolas de medicina também tinham

grandes conhecimentos em outros ramos de conhecimento como a da teologia e filosofia;

tinha também os cirurgiões que tratavam de doenças de menor complexidade, assim como os

médicos-barbeiros que prestavam serviços de saúde sem conhecimento técnico, baseado

apenas em suas experiências no trato das pessoas, e por fim os boticários que faziam

prescrições básicas e distribuíam remédios à população.

7.2. A ética dos profissionais do ocidente

Podemos dizer que a ética médica fora criada no meio desta desordenada estrutura de

profissões, com o intuito de elevar a auto-estima dos profissionais da saúde, de proteger os

interesses de grupos específico e ao mesmo tempo, para proteger os direitos e interesses dos

pacientes. Isto é, podemos dizer que fora criada com o intuito de harmonizar os interesses das

diversas classes. Quando lemos as entrelinhas do Juramento de Hipócrates, considerado como

o criador da ética médica, podemos descobrir esta preocupação social. Isto é, saem do método

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tradicional, onde a profissão era transmitida de pai para o filho, para o método didático

através de escolas de medicinas, que ensinam para todos os que desejam aprender; assim,

surge a necessidade de adoção de critérios na relação mestre-discípulo que correspondam ao

existente na relação pai-filho no método tradicional99.

Podemos dizer que o Juramento de Hipócrates organizou os critérios necessários à

mudança do sistema tradicional/familiar para uma relação contratual ou profissional.

Juntamente a isso, podemos perceber que havia o interesse de consolidar a posição (status) da

medicina tradicional distinguindo-a da medicina praticada com base em misticismo ou tida

como divina, que consideravam as doenças como um fenômeno sobrenatural e se apoiavam

na força divina para poder superá-lo.

Quando constatamos que havia ainda a busca de pacientes por praticantes de

procedimentos cirúrgicos para o aborto e outros tipos de cirurgias, mesmo quando se proibia

essas práticas, podemos perceber que existiam outros profissionais da saúde na época além

daqueles da escola de Hipócrates, e neste contexto o juramento tenha a intenção de garantir a

legitimidades dos médicos desta escola, diferenciando-se de outros servidores da saúde. Dessa

forma, a medicina do antigo ocidente, sai da relação contratual religiosa de um deus com o

homem, direcionando-se para a relação contratual “moralista” firmada entre o médico e o

paciente.

A ética médica da antiguidade que tinha como preceito a prática da virtude, muda de

foco na Idade Média passando a praticar a medicina em nome do amor cristão ensinado nas

igrejas. Assim, as igrejas fundam as formas primitivas dos atuais hospitais, capazes de

acomodar mendigos e doentes e forneciam além de cama e comida também os serviços

médicos.

A ética cristã, em vez de se fundar em noções racionais ou cartesianos, assume a

forma de uma atividade devocional centrado na obediência incondicional à ordem divida,

como na obediência aos dez mandamentos de Moisés, assim a prática da atividade médica 99 KANG Shin Ik, Professional medical ethics in the cultural contexts of Korea, Korean Journal of Medical Ethics Education 7(2), Dezembro de 2004, pg.157

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foca-se na obediência ao mandamento religioso de amar o outro. Contudo, esta ética baseada

no mandamento religioso, ao atravessar a época do esclarecimento (ou o iluminismo), vai se

tornando mais mundano, organizando-se num sistema muito mais elaborada

filosoficamente100.

7.3. A ética dos profissionais da saúde do sudeste asiático.

Se os profissionais da saúde do ocidente geralmente se dividiram sob a categoria de

médicos e cirurgiões, no leste asiático podemos classificá-los em profissionais da saúde

propriamente reconhecidos, chamados de “seon-bi” (homens da nobreza), que eram versados

na ideologia dominante do Confucionismo, e do outro lado os pseudo-médicos que

exercitavam a medicina no meio do povo, com base no pouco conhecimento que detinham,

proveniente principalmente da experiência que acumulavam, mas que não eram reconhecidos

como médicos de verdade.

Esta classificação se repete ao longo da história dos países do leste asiático por causa

da influência do confucionismo em suas culturas, assim, não é difícil inferir que a medicina e

a ética médica local tenham recebido influências da mesma fonte, qual seja o confucionismo,

razão pelo qual se costumava dizer na época que a medicina e a ética andavam juntos pela

mesma via. Contudo, se na parte ética a medicina local se alimenta do confucionismo, por

outro lado, notamos que o conteúdo e a estrutura técnica da medicina é basicamente taoísta,

razão pelo qual dizem que a medicina e a moralidade local surgiram de uma mesma raiz.

Assim podemos dizer que embora a medicina do leste asiático tenha nascido da doutrina

naturalista taoista, desenvolveu suas características éticas tendo por base a perspectiva

humana do confucionismo101.

De fato, quando do trato dos elementos da natureza, ou seja, da interação entre os seres

vivos e o universo, a medicina local seguia o princípio taoista de preservação do corpo e da

alma, mas quando tratava do ser humano em si, seguiam os princípios confucionistas de

100 KANG Shin Ik, Professional medical ethics in the cultural contexts of Korea, Korean Journal of Medical Ethics Education 7(2), Dezembro de 2004, pg.158 101 Ibid., Pg.160

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preocupação com o bem estar das pessoas, da prática da virtude e da busca de uma vida

próspera.

Diferentemente do Ocidente que desde cedo tinha estruturado um juramento que

enfatizava o dever do médico, na história médica do leste asiático o documento que mais se

aproximaria deste juramento parece ter sido o “Cheon-guim-bang (Direção do céu dorado)” e

o “Rondae-eujungsung (Diretriz para um grande médico)” escritos por “Sun Sumiao” no

século 7. Contudo uma comparação direta entre os dois tipos de textos parece ser complicada,

devido às diferenças culturais e de valores que existia entre as duas sociedades, tornando

improvável uma comparação precisa e justa.

Contudo, pesquisando os antigos livros médicos verificamos que os livros daquela

época chegaram a abordar questões relacionadas com a ética médica, mas de forma sutil,

tratando esporadicamente de comportamentos permissíveis ou não do médico, pois na maioria

das vezes o foco principal eram as discussões a respeito da classificação dos médicos e do

valor de sua tradição e de seu ofício. Verifica-se que em vez de focar objetivamente nas ações

que levam à prática da virtude médica, ou seja, realizar a arte da benevolência através da arte

da medicina, despediam tempo divagando e ideologizando o conceito da benevolência, sem se

preocupar em transformar esse conceito em prática102.

Contudo a tradição da ética médica do leste asiático não enfatizou somente o princípio

da “arte da cura” uma vez que o Legalista “Han Bija”, num momento de lucidez e

pragmatismo chegou a observar que “o médico chupa a ferida do paciente não por causa de

sua afinidade com o corpo e o sangue, mas sim porque lhe garante um ganho maior”,

apresentando assim uma visão mais racional da ética médica. Para o especialista na medicina

chinesa Unschuld, a história da ética médica chinesa era vista como uma sucessão de luta de

grupos em torno do poder e da divisão de recursos103.

Mas os exemplos mencionados aqui são mais a exceção do que obviamente a regra, e

infelizmente, não é por causa destas exceções que se pode dizer que seja possível realizarmos 102 Ibid., Pg.161 103 Ibid., Pg 161

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uma análise racional e lógica de toda a ética médica do leste asiático, isso porque a ética se

forma dentro do contexto histórico, social e cultural característico de cada povo, o que às

vezes o torna difícil de ser interpretado quando contraposto a uma ética oriunda de valores

diferentes104.

Mas a discussão ética que vinha sendo mantido até então passa a sofrer um imenso

abalo com a introdução das ideologias ocidentais no oriente, que diferente das ideologias

locais eram baseadas em princípios pouco em voga como a liberdade e a igualdade. Esta

introdução afetou de maneira muito profunda o pensamento local não só pelo seu ineditismo,

mas principalmente pela forma como foi realizada, uma vez que foi introduzida à força pela

ocidentalização da região imposta pelo processo de colonização do oriente.

Através desta nova realidade o tradicional sistema de saúde local passa a sofrer uma

reforma geral, e passa a ser regulamentado pelo estado que vem a impor nova estruturação

dos profissionais de saúde estabelecendo novas classificações e hierarquização entre os

médicos.

Assim a partir desta reforma o governo colonialista japonês determina que somente os

médicos graduados nas escolas de medicina ocidental poderiam carregar o título de “doutor”,

gozando de todos os direitos e deveres que tal título acarretava. Aos médicos formados na

medicina tradicional, seguindo a tradição confucionista, não lhes permitiu carregar o mesmo

título, impondo-lhes apenas a humilhante denominação de “herborista” ou profissionais que

lidariam apenas com plantas medicinais. Dessa forma, os médicos especializados na medicina

ocidental conseguiram alcançar posições sócio-economicos elevadas, alçando-os a condição

104 Paul U. UNSCHULD. Medicine in China: A history of ideas. London. 1985, pg.4. “A situação fica diferente quando analisamos sociedades complexas como a Chinesa. Aqui nós encontramos, a mais de dois mil anos, uma enorme variedade de diferentes sistemas conceptualizados de terapia, parte se cobrindo, parte se antagonizando, e todos eles representando a cultura chinesa. Esta diversidade intra-cultural não pode ser explicado pela perspectiva da “medicina como sistema cultural”, desde que “sistema cultural” permaneça um conceito vago, correlato, por exemplo, com “cultura chinesa” ou “cultura indiana”. Obviamente, a forma como eram realizadas os tratamentos de saúde e as idéia que a influenciaram são parte da “cultura”, mas nós precisamos identificar variáveis responsáveis pelo aparecimento e aceitação dos diferentes sistemas conceptualizados de terapias de vários grupos, mesmo dentro daqueles chamados esfera cultural.

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de membros da elite da sociedade graças ao título agraciado pelo governo colonialista

japonês105.

A ascensão social imediata dos “novos” médicos coreanos não contrastava com a

realidade dos médicos do ocidente, que precisaram conquistar o seu prestígio e fortuna pelo

merecimento de seu trabalho, competindo com outros médicos e outros profissionais da saúde,

sempre respeitando os parâmetros da ética médica. Nestes termos podemos observar que

enquanto os médicos da medicina ocidental precisavam lidar com a ciência e ética para

prosperar, os médicos coreanos precisavam apenas garantir o conhecimento científico, sem se

preocupar com a questão ética, pois tal elemento não era exigido para exercer a sua profissão.

Contudo, apesar de sua formação considerada elitista e considerar a medicina

ocidental superior à medicina tradicional, os médicos formados pela medicina ocidental não

conseguiam se desvincular totalmente da influência e do moralismo da medicina tradicional,

haja vista ser este o mesmo sistema moral dominante na sociedade em que exercia a sua

profissão. Tal situação comprometia o exercício da medicina por parte do médico que se via

numa situação de conflito entre os dois diferentes sistemas, um defendendo uma visão mais

humana da medicina resumida no princípio da “medicina como uma arte da benevolência”, e

do outro lado a visão lógica e mercantilista da medicina, que resumia o seu exercício a uma

mera atividade de prestação de serviços.

105 KANG Shin Ik, Professional medical ethics in the cultural contexts of Korea, Korean Journal of Medical Ethics Education 7(2), Dezembro de 2004, pg.161

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8. A EVOLUÇÃO DA PROFISSÃO MÉDICA NA COREIA

Com a introdução da medicina ocidental na Coréia pelos japoneses e estrangeiros

como os missionários, assim como a criação de sistema de licenças para a prática e exercício

da medicina imposta no país pelo governo colonial japonês, os médicos de medicina

tradicional coreana passaram a sofrer uma crise na sua autoridade de médicos na sociedade.

Naquela época três classes de médicos se destacavam na sociedade coreana, sendo

estes os médicos de medicina ocidental, os médicos tradicionalistas e os médicos japoneses

que residiam na Coréia. Cada um destes grupos contribuiu para o desenvolvimento da

medicina coreana na época, sendo que a medicina ocidental passou a influenciar os dois

outros grupos que passaram a adotar os seus métodos nas suas respectivas áreas.

Esta diferenciação serviu de oportunidade tanto para instaurar a crise entre as classes

assim como criar novas oportunidades para que as profissões estabelecessem a sua autoridade

perante a sociedade. No caso da medicina ocidental, com o franco favoritismo dado pelo

governo colonialista, esta se deparou com um dilema em relação às demais classes de médicos

com os quais dividia o exercício da profissão médica no país, afinal sendo ela a classe

predominante, se indagava se deveria unificar os demais conhecimentos médicos em torno

dela, e se tal fosse afirmativo, como deveria lidar com as particularidades médicas regionais

existentes no país, reconhecendo-as e estudando-as ou simplesmente ignorá-las, e como então

deveria se comunicar com a comunidade local que ainda estava embebida da influência da

medicina local, ou dita tradicional. Tais indagações afloravam como consequência natural à

ambição da medicina ocidental de se impor como o conhecimento predominante na campo da

medicina.

Curioso notar que a tentativa de modernização da medicina foi tentada pelo Japão

também na China e em Taiwan, sendo que a reforma no sistema médico coreano teve

resultados mais positivos do que os obtidos na China, mas não tão bons quanto aos obtidos

em Taiwan. Na Coréia o total absoluto que exerciam no país permitiu ao governo Japonês

realizar um planejamento centralizado que regulou de forma uniforme e concisa a atividade

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médica na Coréia, contudo a reforma não foi tão exitosa quanto em Taiwan, pois a sociedade

coreana não era tão aberta à nova medicina, continuando a fazer uso da medicina tradicional

no seu dia a dia106.

Assim, para forçar o predomínio da medicina ocidental sobre a tradicional, o governo

japonês determinou que os praticantes da medicina tradicional fossem chamados de

“estudantes de medicina” para inferiorizá-los em relação aos praticantes da medicina

ocidental.

Com a criação de diferentes classes de médicos, os médicos tradicionalistas foram os

que mais sentiram a necessidade de justificar a autoridade de sua medicina perante a nova

sociedade coreana, e para tal adotaram diversas medidas que trataremos a seguir neste

capítulo.

Embora a introdução da medicina ocidental na Coréia tenha ocorrido em meados de

1876, foi somente no começo do século 20 que os médicos tradicionalistas coreanos

começaram a se preocupar com esta “invasão”, começando a mostrar sinais de perturbação e

necessidade de mudança para re-justificar a sua autoridade de médicos perante a sociedade.

Tal perturbação começa a ser evidente nos escritos do célebre mestre da medicina

tradicional Hwang To Yon, que ao longo de suas publicações aborda a questão da reforma da

medicina tradicional com base num afastamento de sua origem, os ensinos confucionistas,

como forma de mostrá-la como algo independente, como uma ciência pura.

Tal afastamento se origina do fato de que na antiguidade o estudo da medicina era

realizado por estudiosos da filosofia confucionista, como complemento ao estudo dos textos

clássicos, com a finalidade de preservar a própria saúde e forma de praticar a benevolência

com os próximos107.

106 Soyoung SUH, Korean medicine between the local and the universal: 1600 – 1945, Pg.02 do Cap.03 107 Ibid,, Pg.07 do Cap.03

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Contudo a ruptura defendida por Hwang não é radical, demonstrando certo temor ou

respeito aos antigos mestres do confucionismo, e argumenta que a medicina muda com o

tempo e o lugar, logo a validade da medicina não depende apenas dos escritos do passado,

nem dos títulos de nobreza que carregavam os que a praticavam, mas deveria ser adaptado ao

tempo e lugar, devendo o médico estar ciente dos problemas de sua época.

Assim, o médico defende a importância da medicina clássica, pois a saúde e doenças

estão condicionadas a fatores regionais e temporais e o conhecimento da medicina clássica

serve de subsídio material para conhecer e tratar as doenças. Hwang entendia que a medicina

coreana não podia viver apenas dos ensinamentos do passado, mas também não deveria

depender somente na medicina moderna também.

Hwang reconhecia que a separação entre o passado e presente na medicina (tradição e

modernidade) não era um trabalho fácil, pois embora desejava livrar-se do apego exclusivo ao

passado desejava também se guiar pelo mesmo. Hwang reconhecia que existia um grande

abismo entre a tradição e a modernidade, mas entendia que a verdadeira autoridade da

medicina residia na capacidade do médico de se situar no tempo e espaço, embasado nos

ensinamentos tradicionais.

Contudo as idéias de Hwang começavam a se tornar obsoletas a medida que os

praticantes da medicina tradicional procuravam se desvencilhar dos ensinamentos clássicos,

fugindo do ideal médico confucionista. A medicina tradicional perdia sua autoridade em

virtude do crescente desapego da sociedade aos ensinamentos confucionistas, em detrimento

dos valores modernos que começavam a ganhar força na sociedade daquela época108.

Esta perda de autoridade era concomitante com a introdução do sistema de licenças

médicas, inicialmente criada pelo governo coreano em 1898 (Grande Império Han) e

posteriormente pelo governo colonial japonês em 1913. No sistema criado pelo governo

coreano a definição de doutor abrangia tantos os médicos de medicina tradicional como os da

108 Ibid,, Pg.09 do Cap.03

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medicina ocidental, contudo dava ênfase aos últimos, revelando assim o seu desejo de

modernizar e adaptar a medicina tradicional aos moldes ocidentais.

Contudo, a crise na medicina tradicional coreana veio definitivamente com a reforma

proposta pelo governo colonial japonês, quando em 1913 reservou o título de médico somente

para aqueles formados pela medicina ocidental e aprovado pelo exame controlado pelo estado.

Assim, com esta reforma os praticantes da medicina tradicional passaram a ser determinados

apenas como “estudantes de medicina” o que veio a agravar ainda mais a crise de no seio da

classe109.

Instaurada a crise com a adoção do sistema de licença, praticantes da medicina

tradicional começaram a buscar formas de preservar a identidade e a autoridade de sua

profissão, agora que a sua arte era relegada a conhecimento de segunda categoria pelo

governo colonial japonês. Assim decidem aprofundar a ruptura com a tradição confucionista

do qual se originaram, para ser vista agora não mais como um ramo do conhecimento

filosófico, mas algo que resulta da experimentação e da investigação objetiva, similar ao que

se pratica na medicina ocidental.

Assim, em 1905 Yi In Jae publicou um livro de medicina popular chamado “Guia de

bolso de prescrições eficazes” que circulou na Coréia mesmo depois do fim da dinastia Joson.

Não se tratava de uma obra prima da literatura médica, pois era um apanhado de obras

clássicas, apresentando prescrições e diagnósticos que o autor publicara como sendo seus.

No livro de Yi In Jae, Park Chol Ju declarou que as pessoas deviam se dedicar ao

estudo dos textos clássicos confucionistas e aos ensinamentos de medicina, pois o primeiro

desenvolvia a mente enquanto que segundo a saúde. Contudo, dizia que o estudo da saúde

deveria ser priorizado sobre os textos clássicos, talvez baseado no entendimento de que para

ter uma mente saudável era imprescindível um corpo saudável também, sugerindo assim a

superioridade do conhecimento da medicina sobre os textos confucionistas clássicos.

109 Ibid,, Pg.10 do Cap.03

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Para aumentar a noção de ruptura a nova estratégia adotada pelos médicos

tradicionalistas era enfatizar o valor da experiência do médico sobre os textos clássicos.

Nestes termos Yi Sok Mo criticava os médicos que aprendiam a profissão com base apenas no

estudo dos textos clássicos, pois afirmava que somente o livro não formava o médico e fazia

distinção entre este tipo de médico e aquele que fazia uso da experiência para desenvolver o

seu conhecimento110.

Contudo a estratégia de se afastar do confucionismo clássico criou um dilema para o

movimento de renovação da medicina tradicional, uma vez que ao colocar em dúvida a

autoridade da medicina oriunda da filosofia confucionista colocava em dúvida a sua própria

autoridade, afinal foi dela que a medicina tradicional veio a surgir.

Para lidar com este conflito buscaram solução junto à medicina ocidental, da seguinte

forma: procuraram criar a noção de complementação entre as duas medicinas, focando na

diferença existente entre ambas, principalmente daquela resultante da diferença regional, e

desta discrepância defendiam a idéia de que uma complementaria a outra, criando com isso

uma nova medicina, em vez da aniquilação da outra.

Contudo a tentativa de criar a visão unificada das diferentes classes de medicinas não

se mostrava fácil de se impor, uma vez que médicos praticantes da medicina ocidental

defendiam a idéia de universalismo na medicina, afirmando que tudo deveria ser centralizado

ao redor da medicina ocidental, desta forma criticavam a proposta dos médicos

tradicionalistas de complementação, pois viam a medicina tradicional como uma forma de

conhecimento inferior e acusavam estes médicos de promover os interesses particulares da

classe.

Outra alternativa para superar o problema de crise na sua autoridade foi a adoção de

métodos e linguagem oriundas da medicina ocidental para sustentar a eficácia da medicina

tradicional. Assim, realizavam analogias entre técnicas ocidentais e tradicionais, fazendo uso

da linguagem técnica da medicina ocidental para dar uma idéia mais científica à suas técnicas.

110 Ibid,, Pg.13 do Cap.03

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Com isso os médicos tradicionalistas passaram a adquirir conhecimentos oriundos da

medicina ocidental que os ajudou entre outras coisas, a lidar com as Críticas da medicina

ocidental.

Contudo a universalidade da medicina ocidental defendida por seus praticantes não se

sustentava na realidade, pois estes mesmos chegavam à conclusão que a supremacia da

medicina ocidental perante a tradicional era parcial, sendo suplantado por esta em certas áreas.

Nestes termos, Kang Pil Mo, médico formado na escola ocidental, chegou a afirmar

em jornal da época a sua simpatia com a medicina tradicional, pois afirmava que

determinadas doenças para os quais a medicina ocidental não tinha tratamento ou cura a

medicina tradicional tinha, reconhecendo assim o limite da medicina que praticava. Contudo

tal ponto de vista não parecia ser a dominante nesta classe de médicos111.

Do exame da situação ora apresentada depreende-se duas situações: os médicos da

medicina tradicional conseguiram sobreviver à invasão da medicina ocidental através de

mudança e reformulação de seus conceitos, concedendo espaço à medicina ocidental em seus

conhecimentos, contudo a medicina ocidental dentro da Coréia não aceitava esta pluralidade

de conhecimentos na seara médica, relegando a medicina tradicional a espécie de

conhecimento inferior e firmando-se como a elite da ciência médica na sociedade, posição

esta que até hoje procuram manter irredutivelmente.

A constatação desta última situação demonstra a forma como a relação

paciente/médico na Coréia foi formada no tempo, criando-se um desequilíbrio de poder em

favor do médico que já existia mesmo com a prática da medicina tradicional e agravou-se com

a elitização da medicina ocidental através das medidas adotadas pelo governo colonial

japonês.

De fato, a elitização da profissão médica na Coreia do Sul permanece até os dias de

hoje, e a medicina ocidental, hoje chamada mais apropriadamente de medicina moderna, 111 Ibid,, Pg.28 do Cap.03

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procura sustentar a todo custo a sua supremacia, numa clara demonstração de que seu ímpeto

pela dominação permanece inalterado apesar do tempo.

A constatação deste fato confirma mais uma vez o que foi observado por Paul

Unschuld em seu estudo sobre a ética médica chinesa, quando afirmou que a história da

medicina daquele país era caracterizada por sucessão de lutas de grupos por recursos e poder,

em vez de focar em questões mais importantes como o tratamento das doenças e o bem estar

dos pacientes. Tal observação se aplica perfeitamente à medicina coreana que tem

apresentado as mesmas características observadas na medicina chinesa por Unschuld.

Como corolário, o sistema de saúde coreano esteve no meio de grandes conflitos nas

últimas décadas sendo que tais conflitos foram de tamanha magnitude e importância que

impactou de maneira profunda a sociedade coreana, principalmente os centros de pesquisa

que se dedicavam às pesquisas médicas de ponta.

Tais fatos se referem especificamente a dois episódios bastante ilustrativos, quando

médicos da medicina ocidental protagonizaram um dos episódios mais inusitados e polêmicos

na história da medicina coreana, comprovando que ainda hoje se preocupam com a defesa dos

interesses corporativos da classe e continuam demonstrando a peculiar falta de interesse com

as questões éticas que tem caracterizado a medicina coreana há tempos. Vejamos a seguir os

exemplos:

O primeiro estopim para o início deste conflito foi o julgamento de um processo

judicial, em que um hospital foi condenado pela morte de um paciente que veio a falecer em

casa, depois que o mesmo veio a abandonar o hospital em que recebia tratamento, pois não

podia arcar com as despesas médicas por problemas financeiros, e o hospital nada fez para

impedir a saída do paciente. Tal episódio iniciou uma crise de identidade no sistema de saúde

coreano, e pela primeira vez na sua história moderna iniciou um movimento de auto reflexão

que o levou a analisar os vários elementos relacionados com a prática da medicina, como a lei,

os procedimentos médicos e a ética na prática da medicina. Tal episódio serviu também para

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dar início a um movimento que veio a defender a criação de vários centros de pesquisas éticas

na medicina pelo país.

Corolário a este evento, em 1997 o Conselho Coreano de Medicina, publicou os

“Princípios Gerais da Ética Médica” e em 2001 as “Diretrizes Éticas do Médico”, vindo a

estabelecer procedimentos mais específicos que complementaram os “Princípios Gerais da

Ética Médica” publicada anteriormente. Nestes termos, o artigo 30, parágrafo 2° desta

diretriz determinava que “quando a família ou o seu representante vier a solicitar a

interrupção e/ou a saída do paciente do hospital, o médico poderá aceitá-lo”.

Contudo, tal disposição contrariava jurisprudência dominante no país que determinava

a ilicitude de tal procedimento, tornando ilícita a determinação das Diretrizes Éticas do

Conselho de Médicos, uma vez que a decisão havia emanado da Suprema Corte do país e esta

era irrevogável. Tal conflito inflamou ainda mais as discussões éticas na medicina no país.

Enquanto ocorria o debate jurídico entediante sobre o caso em questão, eclodiu mais

um episódio que veio a chocar novamente a sociedade coreana. Tal episódio se refere à greve

nacional realizada pelos médicos em 2000, que se opunham ao projeto governamental de

“Divisão de Trabalhos do Sistema de Saúde” do país, que dividia as funções médicas entre

farmacêuticos e médicos, principalmente o poder de receitar remédios que os médicos

entendiam ser atribuição exclusiva de sua categoria.

Neste episódio, milhares de médicos saíram às ruas para protestar contra a divisão

proposta pelo governo, e com exceção dos tratamentos de urgência, suspenderam por uma

semana todos os atendimentos e tratamentos médicos como forma de pressionar o governo a

decidir a seu favor. O que estava em jogo neste evento era a divisão de receitas provenientes

das indústrias farmacêuticas do país que remuneravam os médicos quando estes receitavam os

seus produtos ao seus pacientes, e os médicos não queriam dividir esta fonte de receita com os

médicos da medicina tradicional112.

112 Wang Jung LEE, What drove Korean doctors into the street? Americam medical Assosiation, 2004.

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Embora este caso tenha resultado da divergência de opiniões sobre o papel do governo

e entre as diferentes entidades profissionais acerca da implementação da nova política, estas

diferenças culminaram numa radicalização do corporativismo na área de saúde, revelando

uma faceta inédita a cerca dos médicos coreanos que até então eram tidos como grupo

tradicionalista e conservadora, ou seja, avessa a radicalismos.

Diante do caso, as organizações de sociedade civil passaram a criticar as atitudes dos

médicos, acusando-os de egoístas e preocupados apenas em garantir os interesses

corporativistas da classe. Tal episódio serviu para abalar a relação existente entre os

profissionais de saúde e a população, que tradicionalmente se baseia na relação de confiança

entre os envolvidos. Uma avaliação sobre os inúmeros debates e discussões ocorridos durante

a greve, demonstrou que a preocupação dos grupos médicos envolvidos no evento era apenas

de fazer público as suas opiniões, sem conseguir apresentar alternativas construtivas para a

solução do conflito em que se envolveram.

Interessante notar que sobre este problema foram realizadas diversas pesquisas e

estudos por profissionais de diversas áreas como da ciência médica, sociais, jurídicas,

sanitárias, do jornalismo, entre outros, mas tais estudos limitaram-se a abordaram apenas o

fenômeno da greve e sua possível solução, não conseguindo chegar a uma análise mais

profunda com base em questões humanitárias, como a questão dos direitos humanos e o

benefício dos pacientes, discutindo a medicina sobre o ponto de vista mais ético.

Foram realizados também estudos com enfoque nas relações sociais e econômicos

com base no princípio econômico da oferta e da procura, relegando a prestação dos serviços

médicos apenas como um serviço comercial, falhando em realizar estudos com base em

valores sociais ou morais.

No meio das discussões em curso, prosseguiram-se as pesquisas sobre os tratamentos

médicos de ponta. Assim, em 2000 foi anunciada a conclusão do trabalho de decodificação da

seqüência de base de DNA do ser humano, que atingem 3 bilhões de pares, e em 2004 se

reportado o sucesso do cientista coreano Hwang Woo Suk, que consegue realizar a clonagem

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da célula tronco do embrião humano. Tais notícias apareceram em momento especialmente

sensível para a bioética coreana, pois vieram à tona no momento em que a Lei de Bioética

nacional, que proibia por princípio a aplicação da técnica de manipulação da vida, incluindo a

reprodução de embrião, fora aprovada pelo Congresso e estava aguardando apenas a sua

publicação.

Mas a imprensa, a comunidade científica e os políticos davam importância apenas ao

significado científico e principalmente o valor econômico dessas pesquisas, ignorando outras

questões tão importantes quanto essas como o risco de desastres éticos que esta técnica

poderia causar ou discutir os benefícios que traria aos pacientes esta descoberta, e nem sequer

se davam ao trabalho de avaliar a real possibilidade da concretização desta técnica.

Diversas organizações civis, tais como a Sociedade de Ética da Vida levantou a

problemática de forma enfática, junto com diversas imprensas estrangeiras que também

manifestaram suas preocupações, contudo, para o país tais vozes soavam apenas como

criticismo de “perdedores” ressentidos com o sucesso que o país estava vivendo no momento.

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9. CONCLUSÃO

A pesquisa biotecnológica na Coréia do Sul surgiu de uma necessidade estratégica

num país em busca de desenvolvimento econômico e afirmação nacional.

O seu desenvolvimento se deu de forma sistemática, dentro de um planejamento

macroeconômico de sucesso que tirou o país da situação de miséria que vivia depois das

seguidas guerras pelos quais passou.

Contudo, o sucesso das pesquisas na biotecnologia não foi devidamente acompanhado

pelo desenvolvimento de uma bioética local, vindo a permitir o surgimento de eventos como o

protagonizado pelo cientista Hwang Woo Suk nas pesquisas com clonagem de células tronco.

Tal evento mostrou as verdadeiras forças por detrás do desenvolvimento da

biotecnologia do país, que abrangiam desde interesses econômicos aos mais intensos

sentimentos nacionalistas, colocando as pesquisas bioéticas como instrumento de afirmação

nacional.

Os fatores culturais e filosóficos do país tiveram papel relevante na forma como a

bioética do país se formou, sendo dentro deles o Silhak e nacionalismo os fatores

preponderantes.

O estudo realizado mostra como na Ásia a bioética deixa de receber a mesma

relevância que recebe no ocidente devido às particularidades da cultura local, e que os países

orientais estão dispostos a levar adiante as suas pesquisas em nome das aspirações de

prosperidade que depositam nas pesquisas.

No caso particular da Coréia do Sul, a bioética local parece estar ainda fortemente

comprometido com os valores que tem adotado até o momento, e apesar da fraude nas

pesquisas embrionárias, o país não parece ter mudado de ânimo a respeito das pesquisas.

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Confirma esta observação a notícia veiculada nos jornais do país no ano em curso,

informando que a Suprema Corte do país decidiu por não reconhecer o status de pessoas aos

embriões humanos, abrindo com isso precedente legal para permitir que as pesquisas com

embriões se desenvolvam sem empecilhos legais e a notícia sobre os preparativos realizados

pelo professor Hwang Woo Suk para retornar às suas pesquisas embrionárias, apesar do

evento protagonizado no passado.

O evento estudado é uma prova clara de que os temores a respeito dos problemas

éticos nas pesquisas genéticas são um perigo em potencial latente, que não podem ser

ignorados sob perigo de se materializarem, apesar dos vários avisos que ecoam na sociedade

há tempos.

As pesquisas embrionárias abrem uma nova página na história da humanidade, em sua

luta incansável para superar os seus próprios limites e se assemelhar cada vez mais de Deus,

alienando-se com isso cada vez mais dos ditames realidade. Tal alienação parece ter

acontecido na Coréia do Sul não apenas por causa das aspirações humanas já mencionadas,

mas principalmente pelos traços culturais locais, como o Confucionismo e o Silhak, que criam

uma realidade própria onde eventos observados eram plenamente possíveis e justificáveis.

É então correto dizer que a bioética na Coréia é inexistente ou que é inexpressivo? Se

positivo qual é a solução para tal debilidade?

Não é uma tarefa fácil para a cultura ocidental tentar entender o sucedido na Coréia do

Sul tendo apenas por base os valores morais e éticos deste lado do mundo, assim não parece

ser correto afirmar se a bioética de lá seja correta ou errada com base em paradigmas

ocidentais, pois as necessidades e valores são diferentes.

O que se pode fazer talvez, seja entender o contexto geral através do qual o evento

estudado aconteceu e através de seu estudo tentar tirar lições que possam complementar a

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bioética ocidental, evitando com isso que eventos ocorridos lá possam se repetir aqui também.

A experiência vivida pela Coréia do Sul não pode ser desperdiçada devendo ser analisada para

o aprimoramento da bioética de outros países.

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10. ANEXO

South Korea’s Bioethics and Biosafety Act, effective on January 1, 2005

This is an unofficial English translation version 1.0 (November 11, 2004), prepared by

Professor Young-Mo KOO ([email protected]) and edited by Professor John McGuire

([email protected]). Please contact them for inquires.

Bioethics and Biosafety Act

Chapter 1

General Provisions

Article 1 - Purpose

This act aims to enhance the health of human beings and the quality of human life by creating

conditions that allow for the development of life sciences and biotechnologies that can be

used to prevent or cure human diseases. Additionally, this act aims to protect human dignity

and to prevent harm to human beings by ensuring that these life sciences and biotechnologies

are developed safely and in accordance with the principles of bioethics.

Article 2 – Definitions

The following definitions apply in this Act:

1. “Life Sciences and Biotechnologies” refers to the sciences and technologies that study and

utilize human embryos, cells, and DNA.

2. “Embryo” refers to a fertilized egg (or segmented cell) from the moment of fertilization to

the point of time at which all organs of the given organism have developed

embryologically.

3. “Remaining Embryo” refers to an embryo that is created through in vitro fertilization

procedures but is not implanted in the womb of any woman.

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139

4. “Somatic Cell Nucleus Transfer” refers to the transfer of a human somatic cell nucleus to

a human or animal oocyte from which the nucleus has been removed.

5. “Somatic Cell Embryo Clone” refers to an embryo formed by the act of somatic cell

nucleus transfer.

6. “DNA Test” refers to the act of analyzing chromosomes and DNA derived from the blood,

hair, saliva, or any other bodily part or a person for the purpose of identifying that

individual or examining his or her heath status or predisposition to acquire certain diseases.

7. “Genetic Information” refers to the information obtained through DNA tests.

8. “DNA Bank” refers to an institution which either directly uses or provides others with

preserved samples of genes or personal genetic information.

9. “Gene Therapy” refers to procedures involving genetic mutation that are intended to

prevent or treat certain diseases.

Article 3 – Extent of Application

Unless there are other provisions from other laws concerning bioethics and the safety of life

sciences and biotechnologies, this act will be relied upon solely.

Article 4 – Obligations

1. National or regional governments shall arrange all necessary measures to deal effectively

with problems concerning bioethics and biosafety that may arise during the process of

developing and utilizing life sciences and biotechnologies.

2. Anyone who intends to study, develop, or utilize life sciences and biotechnologies shall

endeavor to safeguard human dignity and the value of human life and to carry out their

work in accordance with the principles of bioethics and biosafety.

Article 5 – Right to Self-Determination

Anyone who becomes a subject of research or experimentation in the area of life sciences and

biotechnologies shall have the right to be fully informed of his or her involvement in the

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research and shall also have the right to consent, or refuse consent, after being fully informed

of his or her involvement in the research.

Chapter 2

National Bioethics Committee and Institutional Review Boards

Article 6 – The Establishment and Functions of the National Bioethics Committee

1) There shall exist a National Bioethics Committee (hereafter called the ‘Committee’),

responsible to the President, whose function it is to review the following items concerning

bioethics and biosafety in the life sciences and biotechnologies:

1. Policies concerning national bioethics and biosafety;

2. The type, subject, and extent of research involving remaining embryos under Article 17-3;

3. The type, subject, and extent of research involving somatic cell nucleus transfer under

Article 22-2);

4. The types of DNA tests that are prohibited under Article 25-1);

5. The types of diseases for which gene therapy can be performed under Article 36-1)-3; and

6. Other issues of social or moral significance concerning the research, development, and

utilization of life sciences and biotechnologies that the Chairperson of the Committee

formally submits to the Committee for its deliberation.

2) The Chairperson of the Committee shall submit to the Committee for its deliberation any

issue related to items 1)-1 through 1)-5 that has been proposed by at least one third of the

members of the Committee.

Article 7 – Composition of the Committee

1) The Committee will be composed of between 16 and 21 persons, including one

Chairperson and one Vice-Chairperson.

2) The President shall appoint the Chairperson of the Committee; the Vice-Chairperson of

the Committee shall be elected by a majority vote of the Committee members.

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3) Membership in the Committee shall be as follows.

1. The following ministers will all be members of the Committee: the Minister of

Education and Human Resources Development, the Minister of Justice, the Minister of

Science and Technology, the Minister of Commerce, the Minister of Industry and

Energy, the Minister of Health and Welfare, the Minister of Gender Equality, and the

Minister of Government Legislation.

2. The president will appoint not more than seven representatives of the academic,

scientific, and industrial spheres, each of whom have professional knowledge and

experience in the fields of life science or medical science.

3. The president will appoint not more than seven representatives of the fields of religion,

philosophy, ethics, social science, law, NGO groups (nonprofit civil organizations

under Article 2 of the Nonprofit Civil Organization Support Act), or gender equality.

4) Members appointed under clause 3)-2 and 3)-3 shall serve on the Committee for a

term 3 years and may be reappointed for additional terms.

5) The Committee shall have two executive secretaries: the Minister of Science and

Technology and the Minister of Health and Welfare. The Chief Executive Secretary

shall be the Minister of Health and Welfare.

Article 8 – Operation of the Committee

1. In order to ensure the effective operation of the Committee, specialized subcommittees

may be formed.

2. The Chief Executive Secretary shall oversee all affairs of the Committee.

3. The conferences and activities of the Committee shall be open to the public.

4. Other matters concerning the composition and administration of the Committee and

subcommittees that are not stated in this Act shall be decided by the President.

Article 9 – The Establishment of Institutional Review Boards

1) In order to ensure bioethics and bioethical safety in the life sciences and biotechnologies,

each of the following institutions shall set up its own Institutional Review Board

(hereafter called a “Board”):

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1. Embryo research institutions registered with the Ministry of Health and Welfare

according to Article 18;

2. DNA banks approved by the Minister of Health and Welfare under Article 32-1);

3. Gene therapy institutions, under Article 37-2); and

4. Other research institutions appointed by the Minister of Health and Welfare that

research, develop, or utilize life sciences and biotechnologies that may have

significant moral or social consequences.

2) The Board of each institution mentioned in article 9-1) shall review the following matters

related to the research, development, and utilization of life sciences and biotechnologies

carried out by its institution:

1. The ethical and scientific validity of its research and whether or not the research

conforms to protocols in the life sciences and biotechnologies;

2. Whether or not consent was obtained, with appropriate measures, from all patients and

donors of sperm, eggs, and test samples;

3. The safety measures undertaken for patients, subjects of genetic information, and

donors of sperm, eggs, or test samples. Where sperm, eggs, or test samples are

provided to others, information such as the donors’ name and identification number

(hereafter called ‘personal information’), which can be used to identify individuals,

must be protected.

4. Other matters concerning the research, development, or utilization of life sciences and

biotechnologies carried out by the institutions listed in Article 9-1).

3) Where there is a serious threat or a potential threat to bioethics and biosafety due to the

research, development, or utilization of the life sciences and biotechnologies at any of the

institutions listed in Article 9-1), the head of that institution must summon its Board

immediately to review the relevant details of the threat or potential threat and must also

report the results of the Board’s meeting to the Minister of Health and Welfare.

4) Among the institutions mentioned in Article 9-1), when an institution is below the

standard set by the Ministry of Health and Welfare, in size or number of researchers, and

when that institution has agreed to cooperate in the review of items listed in Articles 9-2)

and 9-3) with a similar institution that does have a Board, then such an institution will be

regarded as having a Board.

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Article 10 – Organization and Administration of Boards

1. Each Board shall consist of between 5 and 9 persons, including one chairperson. Each

Board should also include one person not engaged in the fields of life science or medical

science, as well as one person external to the institution.

2. The head of each institution listed in Article 9-1) shall appoint the members of that

institution’s Board, and the chairperson shall be elected by a majority vote of the members

of that Board.

3. Members involved in research, development, or utilization of life sciences and

biotechnologies that needs to be reviewed by the Board shall not participate in the review

process.

4. Other matters related to the Board’s composition and operation not covered by this Act

shall be decided by the President.

Chapter 3

Embryo Production and Research

Paragraph 1 – Prohibitions on Human Cloning

Article 11 – Prohibition on Human Cloning

1) No one shall implant a somatic cell embryo clone into a uterus, maintain a cloned embryo

within a uterus, or give birth when the pregnancy results from the act of implanting a

somatic cell embryo clone into a uterus.

2) No one shall induce or assist in the activities defined in Article 11-1).

Article 12 – Prohibition on the Transfer of Embryos between Two Different Species

1) No one shall implant a human embryo in the uterus of an animal; nor shall anyone implant

an animal embryo into a human uterus.

2) No one shall perform any of the following acts:

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144

1. The act of fertilizing a human oocyte with an animal sperm, or vice versa, for any

purpose other than that of testing human sperm cells;

2. The act of implanting an animal’s somatic cell nucleus into a human oocyte whose

nucleus has been removed;

3. The act of fusing a human embryo with an animal embryo; or

4. The act of fusing a human embryo with another embryo of non-identical genetic

information.

1) No one shall transfer the products of any of the acts described in Article 12-2) into the

uterus of a human being or animal.

Paragraph 2 – Embryos Produced through

Artificial Insemination

Article 13 – Producing Embryos

1) No one shall produce embryos other than for the purpose of pregnancy.

2) In producing embryos for the purpose of pregnancy, no one shall perform any of the

following acts:

1. Fertilizing an oocyte, when the oocyte and/or sperm have been specially selected for

the purpose of producing offspring of a particular gender;

2. Fertilizing an oocyte, when the oocyte and/or sperm are those of a nonliving human;

or

3. Fertilizing an oocyte, when the oocyte and/or sperm are those of an underaged human.

However, this shall be allowed when married under-aged parents wish to conceive a

child.

3) No one shall induce or assist in providing or utilizing sperm or oocytes for the purpose of

receiving financial reward, property, or any other personal benefits.

Article 14 – Embryo Producing Medical Institutions

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1) Any medical institution that wishes to collect and preserve sperm or oocytes for artificial

fertilization or to generate embryos through fertilization should be authorized to do by the

Minister of Health and Welfare and designated as an Embryo Producing Medical

Institution.

2) Any medical institution that wishes to be designated as an Embryo Producing Medical

Institution should meet the facility and manpower requirements set by the Ministry of

Health and Welfare.

3) The Ministry of Health and Welfare is to decide on the criteria, process, documents, and

any other requirements of institutions seeking designation as Embryo Producing Medical

Institutions.

Article 15 – Consent to the Production of Embryos

1) When a medical institution, designated as an Embryo Producing Medical Institution by

Article 14, collects sperm or oocytes in order to produce an embryo, they shall obtain

written consent from both the sperm and oocyte donors as well as the artificial

insemination patient and her spouse (hereafter called the ‘Consenters’).

2) In the written consent described in Article 15-1), the following shall be included:

1. The details of the purpose of producing an embryo;

2. The details of the period of depositing embryos;

3. The details of the disposal of all embryos;

4. Indication of whether or not consent is given to utilize the remaining embryos for

purposes other than pregnancy; and

5. Information on the procedures for the withdrawal of consent, the protection of

consenters’ rights and information, and other necessary information set by the

Ministry of Health and Welfare.

3) Embryo Producing Medical Institutions shall explain in detail the contents of Article 15-2)

before obtaining a written consent under the provisions of Article 15-1).

4) Any other details or procedures required for the written consent outlined in Article 15-1),

such as the consent form and record keeping, will be decided by the Ministry of Health

and Welfare.

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Article 16 – Storage and Disposal of Embryos

1) The storage period of embryos shall be 5 years; shorter storage periods are possible when

the Consenters agree to it.

2) Embryo Producing Medical Institutions shall dispose of all embryos approaching the end

of their period of storage, except for those that are to be utilized for the purpose of

research outlined in Article 17.

3) Embryo Producing Medical Institutions shall keep records and preserve details concerning

the disposal of all embryos.

4) The correct processes and procedures of embryo disposal and the necessary details

concerning record keeping will be further outlined by the Ministry of Health and Welfare.

Article 17 – Research on Remaining Embryos

Remaining Embryos that have passed the storage period outlined in Article 16 may be utilized

for the following purposes, but only until the embryological primitive streaks appear in their

developmental process:

1. To conduct research aimed at developing contraception and infertility treatments;

2. To conduct research aimed at curing rare or incurable diseases, as decreed by the

President.

3. To conduct other research approved by the President after being reviewed by the

Committee.

However, in order to utilize a remaining embryo that has been stored for less than 5 years, a

new consent, for this new purpose, is required from the Consenters.

Article 18 – Embryo Research Institutions

Any one who wishes to do research on remaining embryos under the provisions of Article 17

should meet the facility and manpower requirements set by the Ministry of Health and

Welfare and be registered with the Ministry as an Embryo Research Institution.

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Article 19 – Approval of Embryo Research Protocol

1) When an embryo research institution, registered with the Ministry of Health and Welfare

under Article 18, wishes to do research on embryos under the provisions of Article 17, it

shall submit an Embryo Research Protocol for the approval of the Minister of Health and

Welfare. The same requirement applies even in the event of significant changes to the

Presidential orders that support this Act.

2) The Embryo Research Protocol mentioned in Article 19-� should include documents

showing the review results of that Embryo Research Institution’s Board.

3) When an Embryo Research Institution submits a research protocol that is funded by a

central government agency, the Minister of Health and Welfare should discuss the matter

with the head of that agency before granting approval.

4) The approval criteria, processes, documents, and any other relevant details shall be

decided by the Ministry of Health and Welfare.

Article 20 – Supplying and Maintaining Remaining Embryos

1) When an Embryo Producing Institution supplies a remaining embryo to an Embryo

Research Institution for research approved under Article 19-1), it shall be supplied for free.

However, the Embryo Producing Institution may, with the approval of the Ministry of

Health and Welfare, request that the Embryo Research Institution provide reimbursement

for the expenses of storing and providing the remaining embryo.

2) The supply procedures, the calculation of expenses, and any other details concerning the

remaining embryos mentioned in Article 20-1) shall be decided by the Ministry of Health

and Welfare.

3) The Embryo Producing Institution and Embryo Research Institution shall report all details

concerning the storage and supply of remaining embryos to the Minister of Health and

Welfare in accordance with the regulations of the Ministry of Health and Welfare.

4) The provisions of Article 16-2) through 16-4) shall apply to the disposal of remaining

embryos that are received by an Embryo Research Institution in accordance with Article

20-1) but are not utilized for research. In such cases, the Embryo Producing Medical

institution will be regarded as the Embryo Research Institution.

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Article 21 – Compliance of Embryo Producing Medical Institutions and Embryo

Research Institutions

Embryo Producing Medical Institutions and Embryo Research Institutions shall do the

following:

1. Deal with embryos in accordance with what is written in the relevant consent forms, as

outlined in Article 15;

2. Exercise care in storing, handling, and disposing of remaining embryos;

3. Cease all relevant research or take appropriate measures when the research poses a

significant or potential threat to bioethics or biosafety; and

4. Follow other regulations or guidelines set by the Ministry of Health and Welfare in order

to ensure bioethics and biosafety.

Paragraph 3 – Somatic Cell Embryo Clones

Article 22 – The Act of Somatic Cell Nucleus Transfer

1) No one shall conduct somatic cell nucleus transfer other than for the purpose of

conducting research aimed at curing rare or currently incurable diseases, as described in

Article 17-2).

2) The type, subject, and extent of allowed research on somatic cell nucleus transfer guided

by the purpose stated in Article 22-1) shall be decided by the President after it has been

reviewed by the Committee.

Article 23 – Production and Research of Somatic Cell Embryo Clones

1) Any one wishing to produce or research somatic cell embryo clones shall register with the

Ministry of Health and Welfare only after satisfying the Ministry’s requirements

concerning facilities and personnel.

2) Articles 19 through 21 shall apply also to research on somatic cell embryo clones.

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Chapter 4

DNA Testing

Article 24 – DNA Testing Institutions

1) Anyone who wishes to conduct DNA tests or do research on material directly obtained

from DNA tests should report the following details to the Minister of Health and Welfare:

the location of the institution in which the tests or research are carried out, the name of the

head of the institution, the type of DNA tests or research topics carried out, and other

details required by the Ministry of Health and Welfare. Government agencies that conduct

DNA tests or engage in DNA research are not required to report these details to the

Minister.

2) The provisions of Article 24-1) will apply even in the event of changes being made to the

Presidential orders that support this Act.

3) The Minister of Health and Welfare may require any institution wishing to conduct DNA

tests in accordance with Article 24-1) (hereafter called a DNA Testing Institution) to be

evaluated for the accuracy of its DNA tests and make the results of this evaluation public.

4) If a DNA Testing Institution ceases operations, either permanently or temporarily, it

should report to the Minister of Health and Welfare, in accordance with the regulations of

the Ministry of Health Welfare.

Article 25 – Restrictions on DNA Tests

1) DNA Testing Institutions shall not conduct DNA tests concerning physical characteristics

or personality traits that may mislead subjects due to a lack of scientific evidence; nor

shall they conduct tests that have been prohibited by the President after being reviewed by

the Committee.

2) DNA Testing Institutions shall not conduct DNA tests on embryos or fetuses for purposes

other than that of diagnosing muscular dystrophy or other DNA-related diseases as

stipulated by the President.

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3) No DNA Testing Institution shall conduct DNA tests for the diagnosis of disease, unless it

either is a medical institution or is requested by a medical institution to conduct such tests.

Article 26 – Consenting to DNA Tests

1) Before a DNA Testing Institution or anyone conducting DNA research obtains, either

directly or indirectly, test materials or materials to be utilized in the research, a written

consent, which includes the following details, should be obtained from the test subject:

1. The purpose of the DNA test or DNA research;

2. Indication of whether or not consent is given for the use of test materials other than for

purposes mentioned in 26-1)-1;

3. Indication of whether or not personal information will be revealed when test materials

are provided to others, in accordance with Article 26-1)-2;

4. Information on the maintenance and storage period of test materials; and

5. Information on the right and manner of withdrawing consent, the rights and protection

of test subjects, and any other details stipulated by the Ministry of Health and Welfare.

2) When anyone other than a DNA Testing Institution requests a DNA test, a written consent,

as outlined in Article 26-1), should be obtained from the test subject and attached to the

request. In this case, all necessary steps must be taken to protect personal information, as

guided by the Ministry of Health and Welfare.

3) If the test subject is a minor, a quasi-incompetent, or an incompetent, the consent outlined

in Article 26-1), as well as an additional consent by his or her legal guardian, should be

obtained. However, in the case of conducting DNA tests for the purpose of diagnosing or

treating a disease, if consent cannot be obtained from the test subject due to his or her

quasi-incompetence or incompetence, consent from the test subject may be waived.

4) Articles 26-1) and 26-3) notwithstanding, a DNA test may be conducted without written

consent in either of the following cases:

1. When there is an urgent or a special reason to identify an individual who is either

deceased or unconscious; or

2. When special provisions exist under other Acts.

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5) Anyone wishing to obtain a written consent, as outlined in Article 26-1) through 3) shall

thoroughly explain the purpose and procedures of the DNA test as well as the meanings of

its possible results to the test subject or his or her legal guardian beforehand.

6) The consent procedures, the format of the consent documents, and any other necessary

details related to Articles 26-1) through 3) shall be stipulated in the regulations of the

Ministry of Health and Welfare.

Article 27 – Providing Test Materials

1) When a DNA Testing Institutions obtains a written consent from a test subject concerning

the use of test materials for research purpose as guided by Article 26, it may provide the

test materials to either a person conducting research on DNA or an institution licensed to

open a DNA bank under Article 32.

2) DNA Testing Institutions shall not include personal information in the test materials

mentioned in Article 27-1). However, personal information may be included when the test

subject or his or her legal guardian has agreed to it in a written consent and a copy of the

written consent is attached.

3) When a DNA Testing Institution, any institution conducting DNA research, or any

institution licensed to open a DNA bank (hereafter called DNA Test Institutions) provide,

or are provided with, test materials as guided by Article 27-1), a record of the process

shall be kept, as stipulated in the regulations of Ministry of Health and Welfare.

4) Articles 27-1) through 27-3) shall apply when an institution that has received test

materials wishes to provide them to other researchers or DNA banks.

Article 28 – Disposal of Test Materials

1) The storage period of test materials shall be five years, unless the test subject or his or her

legal guardian states otherwise in the written consent outlined in Article 26-1).

2) DNA Testing Institutions shall dispose of test materials immediately after the storage

period expires, unless the test subject or his or her legal guardian submits a written request

not to dispose of the test materials.

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3) If the test subject or his or her legal guardian requests the disposal of his or her test

material at any point during the storage period, the DNA Testing Institutions shall comply

with the request.

4) DNA Testing Institutions shall keep records and file documentation concerning the

disposal of all test materials.

5) If a DNA Testing Institution closes, temporarily or permanently, for unavoidable reasons

and cannot store test materials, they shall handle or transfer the test materials in

accordance with the guidelines of the Ministry of Health and Welfare.

6) Other necessary details concerning the disposal procedures and methods, the keeping and

filing of records, and the handling and transferring of the test materials described in

Article 28-5) shall be stipulated in the regulations of the Ministry of Health and Welfare.

Article 29 – Filing and Reading Records

1) DNA Testing Institutions shall file the following documents in accordance with

the guidelines of the Ministry of Health and Welfare:

1. A signed consent form, as outlined in Article 26;

2. The results of the DNA tests; and

3. The records of providing test materials in accordance with Article 27-3).

2) DNA Testing Institutions shall comply with all requests made by the test subject or his or

her legal guardian to read the records described in Article 29-1) or to obtain copies of

them.

3) Other necessary details concerning the request procedures and forms and the issuing of

copies of records shall be stipulated in the regulations of the Ministry of Health and

Welfare.

Article 30 – Obligations of DNA Testing Institutions

1) DNA Testing Institutions shall observe the following:

1. The details of informed consent outlined in Article 26;

2. The protection of DNA information;

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3. Other details related to Articles 30-1)-1 and 30-1)-2 that the Ministry of Health and

Welfare stipulates to ensure bioethics and biosafety.

2) DNA Testing Institutions shall not make false statements or exaggerated advertisements

about DNA tests.

3) Other relevant details concerning Article 30-2) shall be stipulated in the regulations of the

Ministry of Health and Welfare.

Chapter 5

Protection and Use of Genetic Information

Article 31 – Prohibitions on Discrimination Based on Genetic Information

1) No one shall be discriminated against in educational opportunities, in employment or

promotion, or in eligibility for insurance coverage on the basis of his or her genetic

information.

2) Unless specifically stated otherwise in a different law, no one shall force others to take

DNA tests or to submit DNA test results.

Article 32 – DNA Bank Licensing and Registration

1) Any non-government institution wishing to open a DNA bank must receive the approval

of the Minister of Health and Welfare, as stipulated in the Presidential orders that support

this Act.

2) Anyone wishing to open a DNA bank with a research grant from some other central

government agency must receive licensing from the Minister of Health and Welfare. In

this case, however, the head of the central government agency shall consult with the

Minister of Health and Welfare before licensing is granted.

3) Before moving the location of a DNA bank, under Article 32-1), or making other

important changes stipulated in Presidential orders, the head of the DNA bank should

report to the Minister of Health and Welfare as stipulated in the regulations of Ministry of

Health and Welfare.

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4) If a DNA bank is closed, temporarily or permanently, the head of the DNA bank should

report to the Minister of Health and Welfare, in accordance with the regulations of the

Ministry of Health and Welfare.

5) Facilities and equipment standards, licensing procedures, and other necessary details

concerning DNA banks, under Article 32-1), shall be stipulated in the Presidential orders

that support this Act.

Article 33 – Providing Genetic Information

1) Any one wishing to use genetic information from a DNA Bank shall submit a plan on how

the genetic information is to be used to the head of the DNA Bank.

2) The head of the DNA Bank shall decide whether or not to release genetic information only

after that institution’s Board, under Article 9, reviews the plan on how the information

will be used. Furthermore, the head of the DNA bank must report the results of the

Board’s review to the Minister of Health and Welfare.

3) Details of the items to be included in the plan, submission procedures, and guidelines for

providing and maintaining genetic information will be stipulated in the regulations of the

Ministry of Health and Welfare.

Article 34 – Obligations of Heads of DNA Banks

1) The head of a DNA Bank shall not include personal information when providing others

with the genetic information mentioned in Article 33.

2) When the head of DNA Bank provides others with genetic information, it shall be

provided free of charge. However, the head of DNA Bank may request compensation for

the cost of maintaining and providing genetic information, as stipulated in the regulations

of the Ministry of Health and Welfare.

Article 35 – Protection of Genetic Information

1) In the absence of legitimate reasons for doing so, neither the head of a DNA Bank nor its

employees shall provide others with genetic information obtained through their work; nor

shall they use such genetic information for inappropriate purposes.

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2) In accordance with the provisions of Article 20-� of the Medical Act, Medical institutions

shall not include genetic information when disclosing patient information to persons other

than the patient. However, disclosure of a patient’s genetic information is allowed when it

is requested by another medical institution seeking to cure and diagnose the patient’s

disease and when appropriate measures are taken to protect the patient’s personal

information.

Chapter 6

Gene Therapy

Article 36 – Gene Therapy

1) Gene therapy is allowed only in the following cases:

1. To treat or cure genetic disorders, cancer, Acquired Immune Deficiency Syndrome, and

other life threatening or seriously damaging diseases;

2. To treat diseases for which there currently is no cure or when the expected results of gene

therapy outweigh those of other therapies; or

3. To prevent or cure diseases that the Minister of Health and Welfare, after a review by the

Board, targets for treatment by means of gene therapy.

2) Notwithstanding Article 36-1), gene therapy on sperm, oocytes, embryos, or fetuses is

prohibited.

Article 37 – Gene Therapy Institutions

1) Any medical institutions wishing to conduct gene therapy should register with the

Ministry of Health and Welfare. This condition will apply even in the event of significant

changes to the Presidential orders that support this Act.

2) Any medical institution (hereafter called a ‘Gene Therapy Institution’) that has registered

with the Ministry of Health and Welfare according to the provisions of Article 37-1) shall

obtain a written consent from patients wishing to undergo gene therapy only after it

provides them sufficient information, including the following:

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1. The purpose of the therapy;

2. The predicted results and side effects of the therapy; and

3. Other details stipulated in the regulations of the Ministry of Health and Welfare.

3) The reporting procedures that each Gene Therapy Institution shall follow, the written

consent forms that they are to use, and other relevant details shall be stipulated in the

regulations of the Ministry of Health and Welfare.

Chapter 7

Supervision

Article 38 – Report and Inspection

1) The Minister of Health and Welfare may order Embryo Producing Medical Institutions,

Embryo Research Institutions, DNA Testing Institutions, Gene Therapy Institutions

(hereafter called the ‘institutions subject to inspection’) and their employees to report or

submit any details concerning the enforcement of this Act when it is deemed necessary to

ensure bioethics and biosafety. The Minister may also order any research or development

or use of biotechnology to stop or may take any other precautionary measures when there

is either a serious or a potential threat to bioethics or biosafety.

2) Whenever the Minister of Health and Welfare believes there is a need to confirm that the

provisions of this Act are being followed, the Minister may send a government official to

any of the institutions subject to inspection or their offices in order to inspect facilities and

documents, to ask questions of the institution’s employees, and to collect minimum

amounts of test material needed for inspection. In this case, the government official shall

carry proof of his or her authority and show it to the relevant representatives of the

institution under inspection.

3) Institutions subject to inspection and their employees shall comply with all orders,

inspection requests, and questions from the Minister, under Articles 38-1) and 38-2),

unless there is a legitimate reason not to do so.

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157

Article 39 – Disposal Orders

The Minister of Health and Welfare may order institutions subject to inspection and their

employees to dispose of embryo and somatic cell embryo clones that have been created,

stored, or provided in breach of Articles 13, 14, 15-1), 16-2), 17 through 19, 20-1), 20-4), 22-

1) and 23 as well as test materials that have been collected, stored, and provided in breach of

Articles 24-1), 25, 26-1) through 26-3), 27-1), 27-2), 27-4), 28-2), 28-3), 32-1), 32-2). The

procedures and methods of disposal shall comply with provisions of Article 16-4) or 28-6).

Article 40 – Improvement Orders

When the Minister of Health and Welfare concludes that the research being carried out at an

institution subject to inspection, or its collection, storage, or creation procedures for embryos,

poses a serious threat to bioethics or biosafety, in virtue of the fact that the facility fails to

meet the standards set in Articles 14-2), 18, 23, 32-5), the Minister may either order the

institution to improve its facilities or close the facility, either partially or fully.

Article 41 – License Revocation and Facility Closure

1) If any one of the following conditions apply to an Embryo Producing Medical Institution,

an Embryo Research Institutions, a DNA Test Institution, a DNA Bank, or a Gene

Therapy Institution, the Minister of Health and Welfare may revoke the authorization,

registration, or license of that institution or order it to close its facilities, partially or fully,

for a maximum of one year:

1. It is in breach of Articles 9-1), 9-3), 10-1), 10-3), 11, 14, 15-1), 15-3), 16-2), 16-3), 17,

19-1), 20, 22, 24-2), 24-4), 25, 26-1), 26-3), 26-5), 27, 28-2), 28-5), 29-1), 29-2), 32-

3), 32-4), 33-2), 35, 36, 37-1) or 37-2);

2. It does not comply with Articles 21, 30, or 34;

3. It fails to carry out the orders of Articles 38-1) , 39, or 40; or

4. It does not comply with inspections, questions, and collection requirements stated in

Article 38-2).

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2) Details on the administrative action under Article 41-1) shall be stipulated in the

regulations of the Ministry of Health and Welfare, which will take into consideration the

type and degree of the violation.

Article 42 – Hearing

Whenever the Minister of Health and Welfare wishes to revoke the authorization, registration,

or license of an institution under Article 41-1), a hearing shall be held.

Article 43 – Issuing of Fines

1) If, for one of the following reasons, an order by the Minister of Health and Welfare to shut

down an Embryo Producing Medical Institution or a Genetic Therapy Institution either

causes serious inconveniences to the users of the facility or poses threats to the public

interest, the Minister of Health and Welfare may instead fine the institution a maximum

amount of 200 million Korean won as stipulated in the Presidential orders that support this

Act.

1. It is in breach of Articles 14, 15-1), 15-3), 16-2), 16-3)or 36;

2. It is in breach of Article 21;

3. It fails to carry out the orders stated in Articles 38-1), 39, or 40; or

4. It fails to comply with the inspection, questioning, or collection requirement

mentioned in Article 38-2).

2) The amount of the fines levied, which will depend on the type and degree of the violations

under Article 43-1) and other necessary details will be stipulated in the regulations of

Ministry of Health and Welfare.

3) When a person who is charged with a fine does not pay it on time, the Minister of Health

and Welfare may collect the full amount of the fine under the disposition of national taxes

in arrears.

Article 44 – Commission Fee

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Under the provisions of this Act, anyone who wishes to be authorized, registered, licensed or

approved, or who wishes to file a report with the Ministry of Health and Welfare, as well as

anyone who wishes to make changes to documents filed with the Ministry, may be subject to

a commission fee, as guided by the Ministry of Health and Welfare.

Chapter 8

Supplementary Rules

Article 45 – Support for Adult Stem Cell Research

The national and regional governments may both provide financial support for adult stem cell

research.

Article 46 – National Fund Support

To promote and support research and education concerning bioethics and biosafety in the life

sciences and biotechnologies, the Minister of Health and Welfare may offer either partial or

full financial support to organizations, research institutions, and life science professionals, as

stipulated in the Presidential orders that support this Act.

Article 47 – Delegating Responsibilities

1) The Minister of Health and Welfare may delegate part of his authority in this Act to the

head of other institutions, as stipulated in the Presidential orders that support this Act.

2) The Minister of Health and Welfare may entrust the following duties to the relevant

institutions or organizations, as stipulated in the Presidential orders that support this Act:

1. Managing the Embryo Producing Medical Institutions mentioned in Article 14;

2. Managing the Embryo Research Institutions mentioned in Article 18;

3. Managing the DNA Testing Institutions mentioned in Article 24;

4. Managing the DNA Banks mentioned in Article 32; and

5. Managing the Gene Therapy Institutions mentioned in Article 37.

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3) When the Minister of Health and Welfare entrusts institutions and organizations with any

of the duties described in Article 47-2) he may reward those institutions or organizations

with financial compensation for such work.

Article 48 – Prohibition on Disclosure of Secret Information

Neither the institutions that are subject to inspection nor their employees shall disclose or

misappropriate secret information that they come across ex officio.

Chapter 9

Penal Clause

Article 49 – Penal Clause

1) Anyone who, in violation of Article 11-1) implants a somatic cell embryo clone into a

uterus, maintains a cloned embryo within a uterus, or gives birth when the pregnancy

results from the act of implanting a somatic cell embryo clone into a uterus shall be

sentenced to up to 10 years of imprisonment.

2) Anyone who attempts any of the actions described in Article 49-1) shall be punished

accordingly.

Article 50 – Penal Clause

Anyone who, in violation of Article 12-1) implants a human embryo into an animal’s uterus

or an animal embryo into a human’s uterus and any one who, in violation of Article 12-3)

implants the products of the acts described in Article 12-2) into the uterus of an animal or a

human shall be sentenced to up to 5 years of imprisonment.

Article 51 – Penal Clause

1) Sentences of up to 3 years of imprisonment shall be given to the following:

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1. Anyone who, in violation of Article 11-2), either induces, or assists in, the act of

implanting a somatic cell embryo clone into a uterus, maintaining a cloned embryo

within a uterus, or giving birth when the pregnancy results from the act of implanting

a somatic cell embryo clone into a uterus;

2. Anyone who performs one of the actions described in Article 12-2);

3. Anyone who, in violation of Article 13-1), produces an embryo for a purpose other

than pregnancy;

4. Anyone who performs one of the actions described in Article 13-2);

5. Anyone who, in violation of Article 13-3), either induces or assists in providing or

utilizing sperm or eggs for monetary reward, capital gain, or other personal benefits;

6. Anyone who, in violation of Article 22-1), conducts somatic cell nuclear transfer for a

purpose other than that of engaging in research aimed at curing rare or incurable

diseases; and

7. Anyone who, in violation of Article 48, discloses or misappropriates secret

information that they come across ex officio.

2) Anyone who, in violation of Article 17, utilizes remaining embryos shall either be

sentenced to up to 3 years of imprisonment or pay a fine of up to 50 million Korean won.

3) Anyone who attempts any of the actions described in Article 51-1)-1 shall be punished

accordingly.

Article 52 – Penal Clause

Sentences of up to 3 years of imprisonment or fines of up to 30 million Korean won shall be

given to the following:

a. Anyone who, in violation of Article 13-3), induces or assists in providing or utilizing

sperm or eggs for monetary reward, capital gain, or other personal benefits;

b. Anyone who, in violation of Article 15-1), harvests sperm and oocytes without

obtaining a written consent concerning embryo creation;

c. Anyone who, in violation of Article 25, conducts a DNA Test;

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d. Anyone who, in violation of Article 26-1) through Article 26-3), collects test materials

without a written consent for a DNA Test or requests a DNA Test without attaching a

written consent;

e. Anyone who, in violation of Article 31-1) or Article 31-2), discriminates against other

people by using genetic information or forces others to either take a DNA Test or

submit the results of a DNA Test;

f. Anyone who, in violation of Article 34, includes personal information when providing

others with genetic information;

g. Anyone who, in violation of Article 35-1), provides others with genetic information

without a legitimate reason for doing so or who uses such information for an

illegitimate purposes;

h. Anyone who, in violation of Article 36-1 or Article 36-2), performs gene therapy; and

i. Anyone who fails to comply with the Disposal Orders mentioned in Article 39.

Article 53 – Penal Clause

Sentences of up to 1 year of imprisonment or fines of up to 20 million Korean won shall be

given to the following:

1. Anyone who, in violation of Article 14, harvests and stores human sperm or oocytes or

creates embryos in places not licensed as Embryo Producing Medical Institutions;

2. Anyone who, in violation of Article 16-2) or 16-3) (including the application of

Article 20- 4)), does not dispose of embryos in accordance with the regulations of the

Ministry of Health and Welfare or does not record or store information about the

embryo disposal;

3. Anyone who, in violation of Article 18, conducts research on remaining embryos

without being registered as an Embryo Research Institution;

4. Anyone who, in violation of Article 19-1) (including the application of Article 23-2)),

conducts research on embryos without the expressed approval of the Minister of

Health and Welfare;

5. Anyone who, in violation of Article 20-1) or 202) , provides remaining embryos for

monetary compensation or does not report the details of the storage and provision of

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remaining embryos to the Minister of Health and Welfare, as stipulated in the

regulations of Ministry of Health and Welfare;

6. Anyone who, in violation of Article 23-1), creates a somatic cell embryo clone or

conducts research on such a clone, without being registered with the Ministry of

Health and Welfare;

7. Anyone who violates Article 30-1) or who, in violation of Article 30-2) makes false

statements or exaggerated advertisements about DNA Tests;

8. Anyone who, in violation of Article 32-1), opens a DNA Bank without being licensed

by the Minister of Health and Welfare; and

9. Anyone who violates the Improvement Orders described in Article 40.

Article 54 – Provision of Dual Punishment

When the head of a corporation, a representative of a corporation, or an individual, an

employer, or an employee of a corporation violates any of the Articles 49 through 53, a

fine shall be imposed upon the agent who commits the act as well as on the corporation or

the individual for whom the agent works.

Article 55 – Fines of Negligence

1) Fines of up to 5 million Korean won shall be given to the following:

1. Anyone who fails to report details mentioned in Articles 24-1), 24-2) or 24-4)

2. Anyone who violates any of the Articles 28-2) through 28-5);

3. Anyone who, in violation of Article 29-1), fails to store documents or who, in

violation of Article 29-2), denies access to, or the copying of, records;

4. Anyone who fails to report the details mentioned in Articles 32-3) or 32-4);

5. Anyone who, in violation of Article 35-2), provides records including a patient’s

genetic information to someone other than the patient; and

6. Anyone who, in violation of Article 37-1), conducts Gene Therapy without being

registered with the Ministry of Health and Welfare.

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2) The negligence fine under Article 55- shall be levied and imposed by the Minister of

Health and Welfare, as stipulated in the Presidential orders that support this Act.

3) Anyone who objects to the negligence fine imposed upon him or her under Article 55-2)

may submit a demurrer to the Minister of Health and Welfare within 30 days of receiving

notice of the fine.

4) When a person, imposed with a negligence fine under Article 55-2), submits a demurrer

under Article 55-_ , the Minister of Health and Welfare should report the matter

immediately to a competent court, and the court shall open a trial following non-litigation

case procedures.

5) When no demurrer is submitted within the time period stated in Article 55-3), and when

the fine remains unpaid, it will be collected under the regulations of the National Tax

Collection Law.

Additional Provisions

1) (Date of Effect) This Act shall take effect on 1 January 2005. However, Articles 11, 12,

49, 50, 51-1)-1, and 51-2)-2 shall become effective on the day of promulgation.

2) (Interim Measures on Remaining Embryo Research) Until the embryological primitive

streaks emerge, remaining embryos may be utilized for the purposes mentioned in Article

17 on any of the following conditions:

1. If the remaining embryos are produced before this Act takes effect;

2. If a period of 5 years has passed since the remaining embryos were created; or

3. A written consent was obtained from the consenters, but the consenter’s whereabouts

is unknown.

3) (Interim Measures on Embryonic Stem Cell Research) Anyone who is engaged in

embryonic stem cell research for the purposes mentioned in Article 17-2) at the time this

Act takes effect may continue his or her research, with the approval of the Minister of

Health and Welfare, on either the following conditions:

1. The researcher has been engaged in embryonic stem cell research for at least 3 years;

or

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2. The researcher has published at least one research paper on embryonic stem cell

research in a related academic periodical.

4) (Revision of Other Acts) The Organ Transplantation Act is revised as follows. The term

“Bioethics Committee” in the title of Chapter 2 is revised as “Organ Transplantation

Ethics Committee”. The title of Article 7, “Bioethics Committee” is revised as “Organ

Transplantation Ethics Committee,” and the term “Bioethics Committee” in Article 7-1) is

revised as “Organ Transplantation Ethics Committee.”

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