Praticoria e Juizos de Valor

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    O EXERCCIO DA PRATICORIA APRESENTADO NOS JUZOS DE VALOR DELICENCIANDOS SOBRE SUAS FORMAES EM ESTGIO

    Andrea [email protected]

    Faculdade de Educao da UFRJGT5: O papel dos Colgios de Aplicao na Formao do Professor de ArtePalavras-chave:currculo, formao de professores, ensino de arte, Teoria da Argumentao.RESUMO:Vimos pensando, na Faculdade de Educao da UFRJ, prticas de formao quepossibilitem aos estagirios de artes visuais o entendimento de que a formao doprofessor d-se de modo continuado, no se restringindo formao inicial ou acursos pontuais, mas incorporando a aprendizagem que ocorre no prprioexerccio da docncia, como coloca Tardif (2000).Entre os embates com que temos nos deparado nas teses sobre essas formaes,ressalta-se a tradio de se pensar em termos de formao terica e formaoprtica, considerando os meios de promover uma melhor articulao entre taisdimenses formativas.Entretanto, nossas investidas no estudo da filosofia da argumentao e dosconhecimentos retricos (PERELMAN & OLBRECHTS-TYTECA, 2002) levam-nos

    impossibilidade de conceber teoria e prtica como noes distintas, o que nosimpe repensar os meios de formao.Nesse artigo propomos, assim, argumentar a favor da associao das noesteoria/prtica, para pensarmos uma nova noo no dissociada e, tendo-adefinido, buscar meios formativos que atendam a essa concepo. A COISA TEORIA E A COISA PRTICAPara propor a formao pedaggica inicial do professor de artes visuais, gostariade reforar que a formao do professor para o ensino bsico, na Faculdade de

    Educao da UFRJ (FE/UFRJ), tem sido repensada constantemente, nas diversaslicenciaturas que oferece. Isso acontece no sentido de aprimorar, cada vez mais, oentendimento da aprendizagem como ato que envolve indissociavelmente duasinstncias concebidas, a princpio, como autnomas, podendo articular-se comoplos ao relacionar-se, mas no concebidas como unidade: a teoria e a prtica.Em sentido diverso a esta concepo, tenho buscado romper, junto com meusalunos, o paradigma que: a) compreende a prtica e a teoria como instncias

    http://mail.uol.com.br/[email protected]://mail.uol.com.br/[email protected]://mail.uol.com.br/[email protected]://mail.uol.com.br/[email protected]://mail.uol.com.br/[email protected]://mail.uol.com.br/[email protected]://mail.uol.com.br/[email protected]://mail.uol.com.br/[email protected]
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    autnomas; b) admitindo a autonomia dessas instncias, as percebe compossibilidades intercambiveis que podem ser articuladas; c) defende que ointercmbio entre essas instncias deve buscar superar a hierarquizao quecompreende o primeiro polo desta relao como norteador do segundo, j queisso resulta em teorias prescritivas que desvalorizam as formas de saber

    estabelecidas pela reflexo na prtica.

    No esforo de superar o entendimento dicotmico que nos impe a perspectivainerte da teoria (j que teorizar no revela uma ao, no sendo, portanto, umaprtica) e a perspectiva irracional da ao - pois lhe nega uma dimenso terica ereflexiva, admitindo que as prticas se dem em um "no pensar" -, tenhorecorrido Teoria da Nova Retrica, de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2002).Para esses autores "a argumentao uma aoque tende sempre a modificarum estado de coisas preexistentes" (Ibid., p 61. Grifo nosso); por outro lado, oestudo da argumentao que visa sustentar ou defender uma tese ope-se squestes que so respondidas pela lgica formal, uma vez que, para aquilo que demonstrativo, no h necessidade de defesa. Assim, s questes formais cabeapenas a elaborao axiomtica das normas e regras que as gerenciam. Destemodo, os conhecimentos construdos dentro de um sistema lgico-formal soprescritos neste conjunto que regula o prprio sistema em que esto inseridos, eneste sentido, os conhecimentos oriundos da lgica formal procedem aplicaode seu corpo terico. S possvel apreender a construo da geometriaeuclidiana a partir da aplicao das regras que a compem, uma vez que o prpriolugar geomtrico uma abstrao espacial resultante destas regras e no de suaexistncia prtica em algum contexto natural scio-histrico.Porm, ao admitirmos que as verdades absolutas no so possveis fora dosconhecimentos demonstrativos e formais, no precisamos ser necessariamenteimpelidos presuno de que sobre os demais campos do saber no hajaverdades possveis. Segundo Perelman (2005, p 334), " inegvel que, em grandenmero de reas, quando se trata de conhecimento, o ideal de verdade devaprevalecer sobre qualquer outra questo". Mas, como estabelecer o "ideal deverdade"? Ou melhor: como definir entre as verdades possveis, aquela que nos "ideal"? Este autor vai propor que o ideal ser considerado a partir de umaideologia que se apresenta no exerccio da razo prtica associado vontade dossujeitos:

    Creio que h um papel na razo prtica, mas puramentenegativo: permite-nos descartar solues desarrazoadas. Masnada nos garante, em questo prtica, a existncia de uma nicasoluo razovel: nesse caso, se no h em questo prticasoluo nica, (...) a escolha da soluo depende, no mais darazo, mas da vontade (Ib. ibidem)

    Deste modo, estabelece-se uma relao entre a razo prtica das questesprticas, descartando as solues que no se ancoram em nenhuma razo, e a

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    vontade que elege, entre as razes possveis, aquela que representa apossibilidade de se atingir "o ideal de homem" desejado; ou seja: uma ideologianorteia a razo e estabelece, a partir das necessidades prticas, uma novaprtica.

    Assim, os demais conhecimentos que no so demonstrativos, ou que no advmde um sistema lgico-formal, so construdos em contextos sociais e histricosconcretos, a partir da argumentao mais ou menos persuasiva de diferentesoradores (sujeitos e teses) que buscam as verdades provisrias mais cabveisquela concretude social qual se referem, usando a razo prtica e a vontade.Portanto, a argumentao ao racional acontecimento de uso da razo e damente que resulta na construo terica pertinente a determinada prtica socialsobre a qual, por falta de soluo definitiva (as prticas sociais no sodemonstrativas, tampouco acontecem dentro de um sistema formal), necessrioteorizar incessantemente pela busca de solues que sero, sempre,circunstanciais (da que a teorizao uma prtica e exige ser sempre retomada)e voluntrias (da que as prticas so um uso da razo que exige escolha, nopodendo ser arbitrrias e/ou automatizadas).Toda prtica, portanto, a ao que aplica uma argumentao visandodeterminar, para um contexto especfico, a melhor prtica possvel. E todaargumentao ao que confere a racionalidade e a ideologia ligadas sprticas, libertando-as de serem compreendidas a partir de um mecanismoarbitrrio, regulado por alguma espcie de ente abstrato que desconhecemos. preciso colocar que se toda prtica ao de argumentao, como vemos noTratado da Argumentao (2002), consideramos que o argumento , em si, umdiscurso parcial e circunstancial assumindo diferentes formas (pode ser escrito,pode ser falado, pode ser pensado), aplicadas em diferentes mbitos. H aqueleque parte de um orador a um auditrio, mas tambm h a argumentao de forontimo, na qual o sujeito da argumentao seu orador e auditriosimultaneamente.Essas reflexes levam-me proposio de que a clssica ruptura nacompreenso da construo dos conhecimentos, que nos leva a pensar em umadimenso dos saberes prtica e outra terica, pode ter sido estabelecida a partirde uma verdade possvel, cuja ideologia firmou-se de modo modelar em nossacultura: a verdade ideolgica de que os conhecimentos verdadeiros so oudemonstrativos ou lgico-formais e absolutos, e os conhecimentos falsos, etambm os do senso comum - que no comungam da cientificidade, so aquelesconstrudos na prtica.Ora, se o conhecimento que se estabelece dentro de um sistema lgico-formal resultante da aplicao do conjunto de normas estabelecidas pelo prprio sistemaa que se refere, claro admitir que neste tipo de construo que, devemoslembrar, abstrata e no emprica a teoria, ou o conjunto de suas razes lgico-formais, norteiem os resultados. Vale dizer que os princpios reguladores dosistema formal orientam as verdades possveis de serem nele admitidas. Assim

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    podemos tambm ressaltar que os resultados verdadeiros admitidos em talsistema tambm so abstraes que apontam para verdades absolutas, pormsomente e apenas somente se admitidas dentro do prprio sistema. Como osistema formal e suas verdades so uma abstrao, podemos compreend-loscomo racionalidade abstrata que no necessita de uma concretude vinculada s

    prticas sociais, considerando, mesmo assim, que a prpria prtica de suaconstruo configura uma prtica.Por outro lado, essa mesma ideologia, ao admitir que os conhecimentos quepartem de prticas, ou no so verdadeiros, ou no permitem soluesverdadeiras, vai propor que o conhecimento prtico se estabelece por tentativa eerro, atravs de uma prtica automatizada incapaz de pensar e prever, na aomental, solues razoveis (que venham da razo). So assim construdos emuma espcie de vazio racional, em uma no racionalidade.O desenrolar histrico e temporal destas duas maneiras de entender oconhecimento e a verdade nos permitir admitir que: a) o conhecimento racionalacontece a partir da abstrao dos termos a um estado absoluto e , portanto,abstrato; b) o conhecimento racional forma um corpo terico (conjunto de regrasque levam verdade) que o prprio sistema no qual opera; b) o conhecimentoracional aquilo que est na teoria e, por reduo, o conhecimento teoria; c)teoria aquilo que norteia as aes para se chegar a um resultado verdadeiro eabsoluto; d) a prtica no se d na abstrao do pensamento, portanto no racional; c) se a prtica no racional, gera apenas outras prticas e no gerateoria; d) se a prtica no nem racional, nem terica, no gera conhecimentoverdadeiro e absoluto; e) a prtica, para gerar conhecimento verdadeiro eabsoluto, necessita, para inserir-se na racionalidade abstrata que a liberta do erro,de uma teoria que a norteie; f) como no h construo de teoria na prtica, necessrio que a prtica se apie em um corpo terico tomado por emprstimo deoutro sistema, que no o sistema das prticas sociais no qual se originou.Efetivamente, vimos operando desta maneira por um razovel perodo histrico:retira-se uma questo prtica de seu contexto e prescreve-se um procedimentoque parte de um corpo terico retirado de outro contexto, ou, mais ainda, de umsistema abstrato, na expectativa de chegar-se a uma soluo para a questoinicial. Se a questo prtica no for atendida com o procedimento, entender-se-que a teoria no foi bem aplicada.Com a quebra das metanarrativas no sculo XX, admitindo-se que as teorias sonarrativas que devem ser entendidas dentro de seu prprio sistema, passa-se areconhecer que h uma multiplicidade de teorias possveis de serem aplicadas auma questo prtica. Agora, se a questo no foi atendida pelo procedimentoprescrito, cabe buscar outras teorias que se adqem o melhor possvel questo.Essa perspectiva desencadeia nova questo prtica: como orientar a escolha damelhor teoria questo prtica colocada? Surge uma srie de propostas

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    metodolgicas para tentar dar conta de adequar teoria e prtica. Entre essaspropostas, pensando nas questes prticas que pululam no interior das escolas navirada do sculo XX para o sculo XXI, ganham especial difuso aquelas em quea ideologia v o professor como profissional cuja formao d-se em campo,atravs da prtica reflexiva e da pesquisa que envolve a investigao e a

    sistematizao das prticas de sala de aula, nas formulaes de vriospesquisadores como Schn, Shulman, Stenhouse, Tardif, e, no Brasil, MengaLdke, Corinta Geraldi, Marli Andr, Ivana Ibiapina, entre outros.A COISA QUE NO NEM TEORIA, NEM PRTICA: A PRATICORIA

    A partir das questes at aqui colocadas, venho tentando redimensionar apercepo dos conhecimentos estabelecidos pelas prticas sociais, entre estes,especialmente as prticas que envolvem o conhecimento nas escolas. Minha primeira dificuldade quase clssica e saussureana: no encontro palavra

    que represente aquilo ao que pretendo reportar-me, uma vez que nossa cultura jadmite prtica e teoria como duas coisas distintas, ainda que possam relacionar-se. Quero pensar isso como coisa nica a qual, por brincadeira demasiadamentebvia, chamarei de praticoria.O termo, notoriamente, reporta-se coisa que promove um conhecimento,admitindo que todo conhecimento uma ao, j que advm do atode conhecer.O ato de conhecer, por sua vez, caracteriza-se: a) pelas teses que soconstrudas na busca de solues quando uma questo prtica apresenta-se, b)pela argumentao que as apresenta e defende (ainda que em foro ntimo), c)pelo momento de escolha que envolve o julgamento das teses construdas. O

    julgamento, pela carncia demonstrativa das teses, pautar-se- na vontade queelege a ideologia que mais persuade o conhecedor, reforando no apenas aconcepo de que impossvel imaginar, no vasto campo das questes prticas,prtica e teoria como duas coisas que acontecem distintamente e se podemarticular, assim como a noo da impossibilidade de supormos um conhecimentoverdade/verdadeiro absoluto - para as questes prticas.Chego, ento, perspectiva de que no h como pensar a "articulao entreteoria e prtica", j que no sendo termos referentes a duas coisas separadas,no haveria como articul-los. Conseqentemente, torna-se impossvel pensaruma proposta para uma "prtica reflexiva", pela incoerncia do prprio termo.Retomando nosso tema inicial, qual seja, a formao pedaggica do professor deartes visuais que se d na Prtica de Ensino, essa concluso coloca-me nodesconfortvel lugar de vivncia de uma questo prtica: se no quero formarmeus licenciandos a partir da adoo de uma teoria abstrata que norteie suasfuturas prticas, e se no quero form-los pelas metodologias que favorecem anoo da "prtica reflexiva", como posso sistematizar com eles conhecimentosvlidos para suas carreiras?

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    No bojo de tal questo, chamo a ateno para a prpria tese, adjacente pergunta que levanto: o conhecimento que posso oferecer a meus alunos tem algoa ver com a noo de uma "sistematizao do conhecimento" ?Se o conhecimento uma construo que se d pela argumentao de teses

    visando o prprio conhecimento como um meio de soluo para as questesprticas, considero que tais teses podem ser construdas mais ou menosintuitivamente, mais ou menos contraditoriamente, com maior ou menorlegitimidade.Como, ento, atuar na construo de teses e no processo de argumentao queas defende, de modo a favorecer a superao de um conhecimento inicial, ouseja, de modo a construir conhecimento novo e vlido? Em primeiro lugar cabe lembrar que uma tese sobre uma questo prtica parte deopinies que temos sobre essa questo e visa ampli-la, melhor-la, torn-la mais

    assertiva. Como construir uma opinio que nos permita caminhar legitimamente apartir das opinies iniciais?Bernardo (2000, p. 31) salienta que ter uma opinio" muito mais difcil do que sesupe, opinies so raras, logo, precisam ser construdas com muito cuidado ecom muito trabalho. claro que nos referimos, aqui, opinio que construda apartir de uma racionalidade e criticidade que nos permite julgar, inclusive, aquelasteses que so desarrazoadas. Todos temos opinies sobre as questes prticas;meus alunos tm opinies a respeito da educao, do ensino, da aprendizagem eda disciplina de artes visuais. Ento o que tenho a ensinar? A argumentao nosensina a superar nossas prprias teses e acordos iniciais com vistas melhoria davida pblica, social e comum, que se d pela constante resoluo de questesprticas que vo se apresentando para ns.

    Assim, a argumentao tambm um campo metodolgico que nos permite sairdo lugar em que nos encontramos com nossas opinies, e formar novas opiniesque atendam melhor s necessidades sociais. essa construo de novas tesese opinies que Bernardo nos lembra no ser to simples atingir. E, se refiro-me a uma metodologia, penso em um sistema, em sistematizao. Noincio de nosso texto arrisquei a hiptese de que uma das chaves para acompreenso da ruptura teoria/prtica era pensarmos a partir de um paradigmaque prope a adoo de um corpo terico construdo dentro de um sistemaracional alheio ao ambiente prtico no qual as questes prticas originaram-se. ATeoria da Nova Retrica vai propor um caminho pelo qual possamos pensarnossas opinies (acordos iniciais) a partir e dentro de um sistema racionalestabelecido nas prprias prticas cotidianas que buscam solues para suasquestes. Isso porque toda argumentao parte das opinies comumente aceitaspelos sujeitos envolvidos, e visa o encurtamento da distncia que h entre asteses defendidas por essas pessoas, estabelecendo novos acordos que nadamais so do que o consenso gerado a partir do embate inicial.

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    A base de uma Argumentao fugindo ao bate-boca e s falcias vai exigir queestabeleamos regras para o jogo argumentativo, uma vez que toda a prticasocial exige regulamentao. Perelman e Olbrechts-Tyteca vo propor para acontemporaneidade que as premissas para o debate sejam razoveis (a razoprtica descarta as solues e teses desarrazoadas) e possam ser defendidas por

    meio de argumentos consistentes (que no sejam facilmente contra-argumentados), e ainda considerando-as ponto de partida entre as partes queargumentam ser o objetivo do debate chegar a uma soluo possvel, sem quenenhum dos envolvidos busque enganar os demais. A argumentao passa poruma questo tica, onde os sujeitos buscam a verdade mais razovel para o temacolocado e servindo sociedade e no a interesses egotistas. Como comum aocampo dos conhecimentos prticos e sociais, nota-se que a argumentao, comometodologia, no encerra um procedimento rigoroso (lgico-abstrato), que seriaresultado de um corpo terico estruturalista, mas pauta-se desde o incio naprpria argumentao como meio de fundar as regras necessrias suacontinuidade. Uma vez que as regras no esto previamente estruturadas, elasso formuladas a partir da concretude social que originou a questo prtica. Dapodermos propor que este seria um sistema adequado para tentarmos resolver asquestes prticas.A PRATICORIA E A PESQUISA PRATICRICA NA FORMAO DOPROFESSOR

    A partir das teses que apresentei, e que nortearam ideologicamente minhasescolhas para a formao de docentes, em um longo processo argumentativo deforo ntimo, cheguei proposta que esse trabalho de sistematizao deconhecimentos se desse no modelo de pesquisa do campo das humanidades. Isso implica que meus alunos ocupem o espao do estgio como espao deaprendizagem que se constitui pelo exerccio da pesquisa compreendendo-a,resumidamente, em quatro etapas principais, no necessariamente sucessivas: a)insero em campo para, atravs da observao registrada pela escrita, realizarlevantamento das questes prticas que se apresentem ao observador, de modo ainvestig-las mais cuidadosamente; b) escolha de uma questo prtica principalpara ser investigada, uma vez que a construo de teses para a argumentaosolicitar o enfoque, um a um, das noes trabalhadas, correspondendo quiloque tradicionalmente, nas pesquisas, nomeamos por delimitao do objeto deestudo; c) estudos das teses comuns j defendidas a respeito da questo prticainvestigada, ou que sustentam tal questo (acordos iniciais e premissas departida) para a problematizao que permita a construo de novas tesesbuscando solues para o(s) problema(s) prtico(s) abordado(s); d)sistematizao do resultado das investigaes que implica a construo de umanova tese buscando solues para o problema prtico, a partir da argumentaorealizada com as teses e/ou acordos iniciais, e sua apresentao argumentativaatravs da redao de artigos cientficos.

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    A investigao das didticas e prticas cotidianas do ensinamento de arte naescola, a reflexo a partir da compreenso das teses que sustentam essasprticas, a defesa ou ataque s teses iniciais propondo novas teses, ou reforandoo valor daquelas que vigoram, tem sido o modo como venho tentando orientar einstrumentar meus alunos. A direo para um tipo de abordagem das questes

    prticas do fazer docente, que considere a docncia como uma praticoria que seconstitui e se restabelece continuamente a partir de uma pesquisa praticrica. Gostaria de apresentar, brevemente, ao final desta argumentao, a construode alguns conhecimentos desenvolvida por alunos que estagiaram no Colgio de

    Aplicao da UFRJ em 2010 (CAp/UFRJ) e que se referem especificamente questo desta construo. Dos vinte e dois artigos escritos, quero apresentarcinco trabalhos cujo tema de sistematizao referiu-se praticoria da construode conhecimentos sobre a docncia realizada via pesquisa na disciplina de Prticade Ensino. Esses artigos permitiram uma viso avaliativa do processo deformao pelo qual os licenciandos passaram, no se restringindo anlise deacontecimentos durante o estgio no CAp/UFRJ, mas apresentando anlisescrticas e importantes sobre o prprio modelo de aprendizagem sugerido peladisciplina.Outrossim, cabe dizer que o recurso citao desses artigos no se pretendemodelar, no sentido de fundar teses vlidas ou de estabelecer esse formato depesquisa praticrica como formato verdadeiro para a formao inicial e contnuado docente, mas pretende ilustrar os argumentos at aqui levantados com o intuitode melhorar a tese que aqui se apresenta a julgamento. Dos artigos apresentados, quatro analisam positivamente a experincia deestagiar como experincia de pesquisa que se prope a ser uma metodologia deformao docente inicial e contnua. Esses artigos discutem o valor decompreender a ao didtica como ao que se constitui pela praticoria da sala deaula, ainda que fundamentada em uma tradio anterior, mas que no se constituicomo modelo terico orientador e prescritivo da docncia. Um deles, ainda queconsidere a pesquisa como mtodo vlido para a elaborao constante dadocncia, faz crticas maneira como o paradigma que sustenta a proposio depesquisa foi conduzido nesta turma, o que me levou a reformular minhas tesessobre qual pesquisa contributiva para a formao docente.No artigo O Ingresso da Criana no Primeiro Ano do Ensino Fundamental, asalunas Beatriz SantAnna, Marcelle Soares, Mariana Vital da Silva e MoniqueChaves investigam e teorizam a favor das teses que sustentam que a prticadocente constitui-se da revisibilidade necessria ao reconhecimento doacontecimento em sala de aula. As autoras do nfase ao movimento dosprofessores regentes de uma turma de 1 ano do Ensino Fundamental dereformular suas prticas a partir das necessidades das crianas percebidas,durante as aulas, no sentido de acolh-las nesta nova etapa da vida, aescolarizao:

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    Podemos perceber junto ao professor, que cada criana tem umtempo diferente, sendo necessrio muitas vezes rever osprocedimentosajustando-as s particularidades de cada um esempre buscando compreender, na medida do possvel, os fatoresrelacionados tanto histria do aluno, suas caractersticasindividuais, assim como de seu ambiente familiar. (Grifo nosso)

    E na concluso colocam queAo vivenciar a adaptao de crianas no 1 ano do EnsinoFundamental durante a Prtica de Ensino, percebemos o quanto necessrio pensarmos na escola e nas relaes que a permeiam,estando atentos quanto a questes como o espao e o tempo.Estes esto constantemente sofrendo modificaes, cada perodotraz consigo diferentes vises, valores e especificidades. (Grifonosso)

    Duas alunas de desenho geomtrico ao sistematizarem suas experincias deestgio, pelo artigo Aprendendo a Ensinar e Ensinando a Aprender: uma anlisedo campo de estgio, do nfase tanto questo de compreendermosprtica/teoria como uma s coisa, quanto importncia da criatividade noexerccio docente, uma vez que no possvel imaginar uma didtica prescritiva,como se pode observar nos dois trechos selecionados: "nenhuma teoria prevalecesem prtica, assim como, nem toda prtica sustenta-se sem um fundamentoterico por trs" e "o professor precisa estar disposto e bem preparado para criar,planejar, pesquisar e tornar possvel a troca de conhecimento".

    As licenciandas Adriana Campos da Silva, Isabella Navarro Fernandes, MaryanneSeabra Teixeira da Cunha e Tassia Nunes Vieira percebem oportunamente que,por mais que seja possvel perceber o carter organizado e artificial da inserodos formandos no campo de estgio, a presena e atuao dos estagiriosreconfigura, por si s, a praticoria em sala de aula, uma vez que o acontecimentodocente formador de prtica docente:

    Com o intuito de investigar colaborativamente, ns licenciandas,nos colocamos no papel de pesquisadoras, levantando eproblematizando questes prticas de sala de aula, sendoorientadas e direcionadas pela professora regente. Este modelocolaborativo de pesquisa permitiu uma dimenso crtica da Prticade Ensino, desencadeando na problematizao de alguns

    aspectos relativos sua prpria estrutura. Como j foi dito, aPrtica de Ensino subdividida em trs etapas: observao,encarada como um processo sistemtico e constante (FERRAZ eFUSARI, 2009, p. 119), onde temos uma iniciao sala de aula esuas dinmicas, assim como a possibilidade de conhecer osalunos e fazer um diagnstico de turma; co-participao, onde, apartir das observaes, passamos a intervir junto professoraregente,auxiliando e orientando os alunos em suas atividades eem toda a dinmica da sala de aula; e por fim a regncia, onde

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    cada licencianda ter a oportunidade de ministrar duas aulassendo orientada e avaliada pela professora de prtica de ensino epela professora regente. Chegamos ento ao foco da nossapesquisa: as regncias e os efeitos que estas causam na dinmicade ensino-aprendizagem de Artes Visuais.

    As alunas Jane Herkenhoff Carij, Samara Carneiro e Silva, Maria do SocorroFerreira de Melo, Viviane Silva Bulco, Suellen Santos Balthazar da Silveira ePaloma de Oliveira Garcia Goulart, em seu artigo, observam como a investigaode um caso particular pode constituir a base de uma tese provisria para a prticadocente em um acontecimento para o qual no h prescries apriorsticas:

    O artigo relata nossas pesquisas diante de um caso particularrelativo a um dos alunos que encontramos no estgiosupervisionado no Colgio de Aplicao da UFRJ. Tal pesquisa seestende para uma maior compreenso do caso e para osdiferentes casos que encontraremos, em nossas vidas, como

    professoras de Artes Visuais.

    Por fim, quero apresentar um trecho do artigo da aluna Renata Figueiredo Bragaque, apesar de no se opor sugesto de pensar-se o locusdo estgio e aprpria prtica docente como campo de pesquisa, denuncia o direcionamentorgido que essa proposta pode ter tido no ano de 2010, uma vez que sugeri aoslicenciandos a formulao de teses e problematizao das questes prticascomuns a todos. A aluna vai observar em seu artigo a arbitrariedade desta escolhae as limitaes que impe, o que me levou reviso dos modos de conduzir essescampos de argumentao com os licenciandos do ano de 2011:

    A partir de certa liberdade individual seria possvel um trabalhocoletivo de re-significao constante de todos os projetos depesquisa propostos pelos licenciandos. Desta forma a pesquisano seria um fim, mas um meio de conhecimento e renovao daprtica educativa consistindo no s numa concluso terica arespeito de um nico e exclusivo tema, mas numa forma deatualizao de conceitos e uma reinsero dos temas naatualidade do cotidiano educativo.

    Os diversos artigos que recebi, e em especial aqueles que apresentei aqui,ajudam-me a compreender a construo do conhecimento cada vez mais comocoisa praticrica, pela qual j no possvel continuar agindo sob o paradigma

    que aceita a proposio de teoria e prtica como mbitos de uma experincia eno como unidade ainda que se imagine ser possvel o intercmbio entre aspartes.Em relao ao conhecimento que se estabelece nas prticas sociais, apesar deminha brincadeira relativa nomenclatura, precisamos criar uma nova noo quenos permita um novo meio de estar racional e voluntariamente a favor de suaconstruo.

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    BIBLIOGRAFIA:BERNARDO, Gustavo. Educao pelo Argumento. Rio de Janeiro: Rocco, 2000. PERELMAN, Cham & OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da Argumentao:

    A Nova Retrica. So Paulo: Martins Fontes, 2002.

    PERELMAN, Cham. tica e Direito. So Paulo: Martins Fontes, 2005.MINICURRCULO:Andrea Penteado:Doutora em Educao pela Faculdade de Educao da UFRJ e professora deDidtica das Artes Visuais na mesma Instituio, tem conduzido pesquisas nocampo de currculo que visam investigar o argumento de alunos sobre as artes

    visuais, a partir da Teoria da Argumentao de Cham Perelman e Olbrechts-Tyteca.