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1 Clínica Escola Vida Intervenção em Adolescentes com Problemas Internalizantes Maria Augusta C.S.B. de Moraes Selmita Marques de Paiva Introdução O período de mudança que uma criança passa para atingir sua adolescência traz consigo questões físicas, sociais e psicológicas. Por esse motivo, nesta fase, o adolescente passa por um momento de forte instabilidade emocional e, portanto sente uma grande necessidade de buscar uma identidade, autoafirmação e independência individual. É comum que nesta fase, o adolescente se distancie da sua família de origem e se aproxime dos seus “iguais”, ou seja, pessoas que pensem de forma semelhante a sua. É uma fase mais propícia para o desenvolvimento de problemas emocionais e comportamentais. (Hess & Falcke, 2013). Existem várias definições acerca dos problemas emocionais e de comportamento (PEC) que ocorrem durante a infância e adolescência. Estes são caracterizados por padrões sintomáticos, sendo estes divididos em dois tipos, os externalizantes e os internalizantes. Os transtornos externalizantes, como o próprio nome já diz, são aqueles relacionados a outras pessoas.

Projeto de Intervenção

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Projeto de intervenção em adolescentes com problemas internalizantes

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Clínica Escola VidaIntervenção em Adolescentes com Problemas Internalizantes

Maria Augusta C.S.B. de MoraesSelmita Marques de Paiva

Introdução

O período de mudança que uma criança passa para atingir sua adolescência traz consigo

questões físicas, sociais e psicológicas. Por esse motivo, nesta fase, o adolescente passa por um

momento de forte instabilidade emocional e, portanto sente uma grande necessidade de buscar

uma identidade, autoafirmação e independência individual. É comum que nesta fase, o

adolescente se distancie da sua família de origem e se aproxime dos seus “iguais”, ou seja,

pessoas que pensem de forma semelhante a sua. É uma fase mais propícia para o

desenvolvimento de problemas emocionais e comportamentais. (Hess & Falcke, 2013).

Existem várias definições acerca dos problemas emocionais e de comportamento (PEC)

que ocorrem durante a infância e adolescência. Estes são caracterizados por padrões

sintomáticos, sendo estes divididos em dois tipos, os externalizantes e os internalizantes. Os

transtornos externalizantes, como o próprio nome já diz, são aqueles relacionados a outras

pessoas. Caracterizam-se por comportamentos como a dificuldade em controlar os impulsos, a

hiperatividade, agressividade e a presença de raiva e delinquência. Estão ligados aos transtornos

de conduta e ao desafiador opositivo. Os transtornos internalizantes são os que se expressam em

relação ao próprio indivíduo. Caracterizam-se pela tristeza, retraimento, queixas somáticas e

medo. Geralmente estão relacionados aos transtornos de humor (depressão) e ansiedade. Este

retraimento social na infância, pode se apresentar como sendo bastante desafiador para a clínica e

para a pesquisa de desenvolvimento infantil, por trazer consequências para o bem estar

psicológico e a adaptação psicossocial da criança. (Hess & Falcke, 2013).

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Por terem a tarefa de socializar os filhos, os pais criam a expectativa de que estes

consigam ser assertivos e habilidosos, sendo aceitos por todos a sua volta. Crianças que possuem

habilidades sociais e empatia são aceitas com mais facilidade, sendo consideradas mais sociáveis.

Já as crianças que não possuem amigos, perdem importantes oportunidades de socialização,

muitas vezes causando efeitos negativos de afastamento dos seus grupos sociais podendo gerar

consequências irreversíveis. (Nunes, Faraco & Vieira, 2012).

Olhando de uma maneira geral, as crianças que possuem retraimento social, apresentam

com uma maior facilidade e de forma recorrente, dificuldades nas interações e nas relações

sociais com os seus pares, fazendo com que se sintam mais infelizes e solitárias. Dessa forma,

estão mais susceptíveis a enfrentar problemas escolares, tendo um baixo desempenho, e a

desenvolverem transtornos mentais na infância e adolescência, tais como, a depressão, ansiedade,

baixa autoestima e queixas somáticas, estes são considerados problemas internalizantes, tendo

em comum o excessivo controle de seus comportamentos, emoções e cognições. (Nunes, Faraco

& Vieira, 2012).

Além das características individuais dos adolescentes, a estrutura familiar, os aspectos

relacionais e as características dos pais podem estar vinculados ao surgimento de problemas

emocionais e de comportamento. A partir disso, uma família que possa estar em situação de crise

pode ser considerada um fator de risco para o surgimento de PEC em seus filhos. (Hess &

Falcke, 2013).

Quando se trabalha com adolescentes, uma das técnicas mais utilizadas é o jogo

dramático. Através do jogo é possível criar um clima lúdico que irá possibilitar a colocação de

temas que poderiam demorar para serem trazidos pelos adolescentes, pois estes teriam que ser

amadurecidos, para que possíveis conflitos pudessem ser traduzidos em palavras afim de serem

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explicados.O jogo dramático é uma maneira criativa de se lidar com os conflitos, já que a sua

proposta é a de abordar os temas de uma forma relaxada. (Motta, 1995).

Os jogos dramáticos contam com três etapas, são elas: o aquecimento, o jogo

propriamente dito e o compartilhamento. O aquecimento, que é a primeira etapa do jogo

dramático. Consiste em alguma atividade que permita que o grupo se prepare para a nova

situação, podendo alcançar assim um ponto ótimo de tensão, mas não tão alta que possa

desestruturar o grupo, e nem tão baixa ao ponto de que as pessoas não se comprometam com a

proposta. O aquecimento é a parte fundamental do jogo, pois é nele que os participantes poderão

liberar sua espontaneidade. (Motta, 1995).

A segunda etapa é o jogo dramático, ou seja, após o aquecimento, será feito o jogo de

acordo com a proposta do grupo, atendendo as necessidades do conflito grupal, suas demandas,

que no caso do grupo em questão está relacionado aos problemas internalizantes. É necessário

que todos tenham em mente o porquê de estarem juntos, o clima (como todos estão, o aqui e

agora), o conflito a ser resolvido (o que estará por trás das aparências) e o aquecimento do diretor

(como este está para trabalhar com o grupo, como se sente). (Motta, 1995).

O jogo dramático ainda pode ser dividido em três momentos: o eu comigo, onde ocorre o

voltar-se para si mesmo, tudo que possa lidar com os aspectos emocionais do adolescente,

buscando então uma auto percepção. O eu com o outro, ou seja, o adolescente se voltará para o

outro, para fora de si. E por fim o eu com todos, nesse momento os adolescentes se voltam para o

grupo, observando sua própria integração com o grupo, estando como elemento participante. Os

três momentos devem estar presentes no jogo dramático, apesar de que cada jogo poderá dar

ênfase a um de forma específica. (Motta, 1995).

Por último ocorre a etapa final, denominada compartilhamento. Nela ocorre a integração

grupal através da palavra, os participantes irão colocar em questão a vivência obtida através dos

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encontros, podendo aparecer então as dificuldades e os prazeres experimentados. Com

adolescentes mais novos, o compartilhamento poderá ser resumido ficando então empobrecido,

pois para estes o falar é mais difícil. A tarefa de relacionar o que foi vivenciado no jogo com o

que se vive no contexto grupal deverá ser do diretor. (Motta, 1995).

O trabalho em grupo com adolescentes é visto como sendo bastante enriquecedor, já que

escutar algo novo sobre si ou sobre o outro vindo de um companheiro, de uma pessoa que está no

mesmo nível que você, pode ser mais marcante que escutar de um adulto. Para trabalhar com

adolescentes, é necessário ter em mente que este é um indivíduo que vive em busca de seus

objetivos, sonhando, querendo. Os jogos dramáticos podem funcionar como catalisador deste

movimento existencial, trazendo à tona todas as vivências do mesmo, podendo auxiliar em sua

construção (tanto social quanto afetiva), buscando então sua plenitude. (Motta, 1995).

Objetivo

O presente projeto de intervenção tem como objetivo auxiliar, através do jogo dramático,

adolescentes com questões envolvendo problemas internalizantes.

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Método

Participantes

Para a elaboração do Projeto de Intervenção na Clínica Escola Vida, as acadêmicas de

Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás analisaram as fichas contendo os nomes

e as demandas dos pacientes para definir o público-alvo da presente intervenção.

Foram escolhidas duas adolescentes com idades entre 12 e 13 anos, ambas do sexo

feminino. As queixas apresentadas nas fichas mantinham certo padrão, todas traziam demandas

com as seguintes características: baixo desempenho escolar, retração/timidez, isolamento social,

embotamento afetivo, ansiedade, distração, dificuldades nos relacionamentos interpessoais, ou

seja, problemas internalizantes.

Instrumentos

Para a realização da intervenção foi agendado um consultório da Clínica Escola Vida,

endereçada na Rua Colônia, Quadra 240-C, Lotes 26 a 28, Jardim Novo Mundo. O consultório

reservado para os atendimentos foi o 6. Os atendimentos ocorreram todas as terças-feiras, das

10hrs00 às 11hs00, sendo estes realizados de forma grupal com as adolescentes.

O consultório possui uma mesa, cadeiras, um colchonete, almofadas e um ventilador. No

local não há interferências de sons externos.

Foram utilizados objetos que representavam animais, colchonete do consultório,

almofadas e balões.

Procedimento

O primeiro contato ocorreu no dia 14/04/2015, neste dia foi realizado um rapport com os

responsáveis pelos adolescentes para saber se estes ainda tinham interesse no atendimento, já que

o preenchimento da ficha ocorreu há algum tempo, também havia sido explicado que os

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atendimentos seriam feitos de forma coletiva, com outros adolescentes com demandas

semelhantes. Foi possível agendar os encontros com dois dos adolescentes. Não se obteve

sucesso ao contatar um deles.

Tem-se como principal foco neste trabalho de intervenção, que será constituído em cinco

encontros, sendo estes semanais, e operacionalizado por meio de um grupo com duas

participantes, proporcionar a partir de nosso instrumental descrito no método, perfazer um

caminho que as leve a uma melhoria de seus quadros emocionais ou conflitivos.

A escolha da abordagem psicodramática contribuirá no sentido de que as participantes

poderão entrar em conjunto na proposta apresentada. Em cada um dos encontros será observado e

registrado o quadro de ambos e a efetividade do trabalho terapêutico.

No primeiro encontro, que ocorreu dia 05/05/2015, foi realizado um contato com a

realidade de ambas e os pontos focais mais tensionais. O jogo trabalhado é denominado como

passeio pela floresta. Após o aquecimento, entramos em uma floresta onde há vários animais que

são usados também como instrumento de apresentação do seu átomo social, ou seja, as pessoas

com as quais convive (presentes ou ausentes, conforme apresentação das participantes). Aqui são

marcadas as demandas que elas se permitirem ser reveladas.

No segundo encontro, do dia 12/05/2015, foi feito após o aquecimento, o passeio pelo

jardim. Esta foi uma etapa bem mais profunda, pois começou o encontro do Eu-comigo. O

objetivo da técnica é colocar o participante em contato com sua realidade e permitir-lhe dar um

rumo diferente. A apresentação de outras possibilidades e levá-los a crer que não são seres

isolados, mas têm sempre um ponto de apoio, alguém em quem confiar. Maximizar suas próprias

energias.

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O terceiro encontro, 19/05/2015, foi feito por meio de um objeto intermediário. Foram

utilizadas bexigas que serão cheias conforme a expressão dos afetos que possuem maior

dificuldade em lidar. Captar aqui o fenômeno que se revela em cada uma delas e fazer a junção de

ambas para que escolham posteriormente uma bexiga com um colorido diferente. Trabalhar a

dramaturgia. O jogo da espontaneidade e a criatividade. Aqui, provavelmente, a espontaneidade

da equipe de terapia é que levará a um bom fechamento do encontro.

No quarto e último encontro, que ocorreu no dia 26/05/2015, realizou-se a inversão de

papéis. A motivação esperada é a de que ambas consigam entrar em contato com a realidade da

compreensão de si e do outro em relação ao meio social. A intervenção fecha-se para a equipe

que trabalha com o objetivo de mostrar ao outro uma infinitude de possibilidades que muitas

vezes o outro o cerceia, não permitindo que as visualize.

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Resultados

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Referências Bibliográficas

Motta, J. (1995). O Jogo no Psicodrama. São Paulo: Ágora Ltda.

Nunes, S.A.N., Franco, A.M., Vieira, M.L. (2012). Correlatos e Consequências do

Retraimento Social na Infância. Arquivos Brasileiros de Psicologia, 64, 122-138.

Hess, A.R.B., Falcke, D. (2013). Sintomas Internalizantes na Adolescência e as Relações

Familiares: Uma Revisão Sistemática da Literatura. Psico-USF,18, 263-276.

Gonçalves, C.O., Peres, V.L.A. (2012). O Psicodrama na universidade: contribuições

morenianas à psicoterapia em uma clínica-escola. Revista Brasileira de Psicodrama, 20, 71-92.