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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA – UFPB
CENTRO DE EDUCAÇÃO – CE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO – PPGE
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
LADJANE FIDELIS FELINTO BIZERRA
Práticas Pedagógicas: aproximações dos princípios da Educação
do Campo na Escola Vovó Vina, em Santa Rita-PB
JOÃO PESSOA – PB
2020
2
LADJANE FIDELIS FELINTO BIZERRA
Práticas Pedagógicas: aproximações dos princípios da Educação
do Campo na Escola Vovó Vina, em Santa Rita-PB
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em
Educação, Linha de Pesquisa: Educação Popular, do Centro
de Educação da Universidade Federal da Paraíba, como parte
dos requisitos para obtenção do título de Mestre em
Educação.
Orientadora: Profª. Drª. Maria do Socorro Xavier Batista.
JOÃO PESSOA – PB
2020
4
LADJANE FIDELIS FELINTO BIZERRA
Práticas Pedagógicas: aproximações dos princípios da Educação
do Campo na Escola Vovó Vina, em Santa Rita-PB
Aprovado em: 06 / 03 / 2020.
_______________________________________________________________
Profa. Dra. Maria do Socorro Xavier Batista PPGE/CE/UFPB
Orientadora
_______________________________________________________________
Prof. Dr. Severino Bezerra da Silva PPGE/CE/UFPB
Examinador
____________________________________________________________
Prof. Dr. Wallace Gomes Ferreira de Souza UACIS/UFCG
Examinador
JOÃO PESSOA – PB
2020
5
Dedico à meus familiares e amigos, como também aos
companheiros e companheiras que fazem a Escola Municipal Vovó
Vina, em Santa Rita-PB.
6
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, por renovar minhas forças dia após dia.
Aos familiares e amigos, pela paciência, compreensão e conforto dedicados nesse
momento, e em especial, a Mestre Jislayne Fidelis Felinto por sua motivação e
contribuição nesse processo de finalização.
Agradeço a Profa. Dra. Maria do Socorro Xavier Batista por sua parceria, pois é uma
referência na militância do trabalho com a Educação do Campo, o qual desenvolve com
ética e compromisso social.
Agradeço também ao Prof. Dr. Severino Bezerra Silva, por sua sensibilidade e
contribuições nas reflexões teóricas desenvolvidas desde o curso das disciplinas e neste
trabalho.
Agradeço ao Prof. Dr. Wallace Gomes Ferreira de Souza, por realizar uma leitura
comprometida, que foi de fundamental importância para decurso do trabalho, sendo uma
inspiração na militancia no contexto atual.
A gratidão é um sentimento que está fazendo parte desta travessia em minha vida, pelo fato
de reconhecer que pessoas contribuíram beneficamente na construção desta dissertação.
7
“Debulhar o trigo
Recolher cada bago do trigo
Forjar no trigo o milagre do pão
E se fartar de pão
Decepar a cana
Recolher a garapa da cana
Roubar da cana a doçura do mel
Se lambuzar de mel
Afagar a terra
Conhecer os desejos da terra
Cio da terra, a propícia estação
E fecundar o chão”
(Chico Buarque / Milton Nascimento)
8
RESUMO
Esta pesquisa, intitulada Práticas Pedagógicas: aproximações dos princípios da Educação
do Campo na Escola Vovó Vina, em Santa Rita - PB, faz parte do curso de Mestrado em
Educação, na Linha de Pesquisa Educação Popular, vinculada ao Programa de Pós-
Graduação em Educação, da Universidade Federal da Paraíba. O objeto de estudo desta
pesquisa “práticas pedagógicas”, se insere no contexto escolar, no qual foi percebido
contradições vivenciadas pela escola pesquisada, entre projetos diferentes de educação.
Nesse sentido, refletimos sobre o contexto de lutas para a garantia dos direitos legitimados,
na busca de entender como materializar a ação educativa proposta nos documentos oficiais,
a partir da seguinte questão: quais são os princípios que orientam as práticas da escola em
estudo? Para isso, buscamos analisar nas práticas pedagógicas da Escola Municipal Vovó
Vina, as aproximações com os princípios da Educação do Campo. Esta pesquisa perpassará
nos seguintes objetivos específicos: caracterizar as propostas pedagógicas existentes na
escola; identificar as práticas pedagógicas que se aproximam dos princípios da Educação
do Campo; analisar os processos educativos que aproximam a escola aos princípios da
Educação do Campo. A pesquisa tem como opção epistemológica a abordagem
materialista histórico dialética, destacando a categoria teórica contradição e, como
categorias empíricas, trabalho e território. Trata-se de uma pesquisa de campo de natureza
qualitativa. No processo de coleta de dados utilizamos a pesquisa documental, observação
participante e entrevista semiestruturada com 3 (três) professores, 1 (uma) supervisora e 1
(uma) gestora da citada escola. Como técnica de análise de dados utilizamos a Análise de
Conteúdos, em Bardin (2011). Visualiza-se como resultado dessa pesquisa elementos que
apontam para a inserção da Educação do Campo nas práticas pedagógicas da escola em
que a pesquisa foi desenvolvida, tais como: Interdisciplinaridade, Desenvolvimento
sustentável, Diálogo, Formação humana, Prática coletiva, Valorização do trabalho e da
realidade, Autonomia e colaboração. Consideramos que mesmo com a presença desses
princípios pedagógicos nas práticas da escola estudada, existe a ausência de um elemento
fundamental, que é a criticidade nesse processo.
Palavras-chave: Educação do Campo. Práticas Pedagógicas. Escola do Campo.
9
ABSTRACT
This research, entitled Pedagogical Practices: approximations of the principles of Rural
Education at Escola Vovó Vina, in Santa Rita - PB, is part of the Master's course in
Education, in the Popular Education Research Line, linked to the Graduate Program in
Education , from the Federal University of Paraíba. The object of study of this research
“pedagogical practices”, is inserted in the school context, in which it was perceived
contradiction experienced by the researched school, between different education projects.
In this sense, we express our concern through reflection on the context of struggles to
guarantee legitimate rights, we seek to understand how to materialize the educational
action proposed in the official documents, based on the perception of the principles that
guide the practices of the school under study. ? For this, we seek to analyze in the
pedagogical practices of the Municipal School Vovó Vina, the approximations with the
principles of Rural Education. This research will go through the following specific
objectives: to characterize the pedagogical proposals existing in the school; identify
pedagogical practices that are close to the principles of Rural Education; to analyze the
educational processes that bring the school closer to the principles of Rural Education. The
research has as an epistemological option the dialectical materialistic historical approach,
highlighting the theoretical category contradiction and, as empirical categories, work and
territory. This is a qualitative field research. In the data collection process we used
documentary research, participant observation and semi-structured interviews with 3
(three) teachers, 1 (one) supervisor and 1 (one) manager of the school. As a data analysis
technique, we used Content Analysis, in Bardin (2011). As a result of this research,
elements that point to the insertion of Rural Education in the pedagogical practices of the
school in which the research was developed are visualized, such as: Interdisciplinarity,
Sustainable Development, Dialogue, Human Formation, Collective Practice, Valorization
of work and reality, Autonomy and collaboration. We consider that even with the presence
of these pedagogical principles in the practices of the school studied, there is an absence of
a fundamental element, which is the criticality in this process.
Keywords: Rural Education. Pedagogical practices. School Country.
10
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Ilustração 01: Categoria teórica e categorias empíricas.................................................26
Ilustração 02: Os Princípios Pedagógicos da Educação do Campo...............................58
Ilustração 03: Mapa Brasil, Paraíba e Santa Rita/PB.....................................................75
11
LISTA DE QUADROS
Quadro 01: Território do campo: Agronegócio x Agricultura Familiar.............................27
Quadro 02: Contraposição dos projetos educacionais - Educação Popular no Brasil........53
Quadro 03: - Mapeamento das dissertações e teses encontradas no repositório da CAPES,
que abordam as práticas pedagógicas e educativas em escolas do Campo, no período de
2004 a 2018..........................................................................................................................59
Quadro 04: Relação das escolas da zona rural organizadas por polos................................77
Quadro 05: Projetos da Escola Vovó Vina...........................................................................82
Quadro 06: Perfil das professoras, supervisora e gestora da escola Vovó Vina.................82
Quadro 07: Perfil da equipe de apoio da escola Vovó Vina...............................................83
Quadro 08: Sítense dos resultados da pesquisa.................................................................102
12
LISTA DE TABELAS
Tabela 01: Matriculas das escolas da zona rural da rede municipal de Santa Rita-PB.......78
Tabela 02 - Quadro demonstrativo com números de dependências físicas – 2019.............80
Tabela 03: Quadro demonstrativo de estudantes matriculados...........................................81
13
LISTA DE SIGLAS
BNCC - Base Nacional Comum Curricular
CAPES - Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CBAR - Comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações Rurais
CEB‟s - Comunidades Eclesiais de Base
CIEI - Centro Integrado de Educação Infantil
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CNER - Campanha Nacional de Educação Rural
CPC – Centro Popular de Cultura
CPT - Comissão Pastoral da Terra
CUT - Central Única dos Trabalhadores
EC – Educação do Campo
EJA – Educação Jovens e Adultos
ENERA - Encontro Nacional de Educadores e Educadoras da Reforma Agrária
EP – Educação Popular
ETA - Escritório Técnico de Agricultura
EUA – Estados Unidos da América
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDEB - Índice de Desenvolvimento da Educação Básica
IHGP - Instituto Histórico e Geográfico da Paraíba
INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
LDB – Lei de Diretrizes e Bases
LDBEN - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
LEC - Licenciatura em Educação do Campo
MCP - Movimento de Cultura Popular
MEB - Movimento de Educação de Base
MEC - Ministério da Educação
MOBRAL -Movimento Brasileiro de Alfabetização
MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
ONG‟s - Organizações Não Governamentais
PEZP - Programa Escola Zé Peão
PPP – Projeto Político Pedagógico
PT - Partido dos Trabalhadores
SINTRICOM - Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção e do Mobiliário
de João Pessoa
SME - Secretaria Municipal de Educação
TCC - Trabalho Conclusão de Curso
UFPB - Universidade Federal da Paraíba
UNB - Universidade de Brasília
URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
14
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO...............................................................................................................15
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA PESQUISA EM
EDUCAÇÃO DO CAMPO................................................................................................22
2.1 Delineamentos epistemológicos da pesquisa em Educação do Campo.........................22
2.2 Categoria teórica e Categorias empíricas.......................................................................24
2.3 Os Procedimentos da Pesquisa.......................................................................................28
3 A EDUCAÇÃO POPULAR E A EDUCAÇÃO DO CAMPO NO CONTEXTO
HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA..............................................................33
3.1 Da Educação Rural à Educação do Campo....................................................................33
3.2 A Educação Popular e a Educação do Campo...............................................................42
3.3 Pedagogias e Princípios da Educação do Campo...........................................................51
3.4 As práticas pedagógicas em dissertações e teses...........................................................58
3.5 Da práxis revolucionária Marxista a Prática Pedagógica em Freire.............................63
4 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: APROXIMAÇÕES COM A EDUCAÇÃO DO
CAMPO NA ESCOLA VOVÓ VINA, SANTA RITA-PB.............................................72
4.1 Conhecendo o Território de Santa Rita..........................................................................72
4.2 Caracterização da situação educacional do campo no Município de Santa Rita-
PB.........................................................................................................................................77
4.3 O chão da Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Vovó
Vina......................................................................................................................................79
4.4 Aproximações e distanciamentos dos princípios da Educação do Campo nas práticas
pedagógicas..........................................................................................................................85
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................105
REFERÊNCIAS...............................................................................................................109
APÊNDICES
15
1 INTRODUÇÃO
Eu quero uma escola do campo que tenha a ver com a vida, com a gente
querida e organizada e conduzida coletivamente. Eu quero uma escola do
campo que não enxergue apenas equações que tenha como “chave-mestra”
o trabalho e os mutirões. Eu quero uma escola do campo, que não tenha
cercas, que não tenha muros, onde iremos aprender a sermos construtores
do futuro. Eu quero uma escola do campo onde o saber não seja limitado
que a gente possa ver o todo e possa compreender os lados. Eu quero uma
escola do campo onde esteja o ciclo da nossa semeia que seja como a
nossa casa que não seja como a casa alheia (SANTOS, 2012).
A letra da música de Gilvan Santos, Construtores do futuro, expressa a
compreensão que o Movimento Por Uma Educação do Campo tem sobre a Escola do
Campo. O trecho da música “Eu quero uma escola do campo que não tenha cercas, que não
tenha muros, onde iremos aprender a sermos construtores do futuro” aponta a ideia de uma
escola que atende a uma formação humana e retrata o princípio de uma educação que vê
nos educandos pessoas que se fazem sujeitos da história, pessoas que se fazem
transformadores da sociedade, uma educação que contribui para que os sujeitos tenham
projetos de futuro, portanto, sujeitos inconformados com a situação em que vivem e têm
sonhos e esperança de um futuro melhor. No trecho “Eu quero uma escola do campo onde
esteja o ciclo da nossa semeia que seja como a nossa casa que não seja como a casa alheia”
quer dizer que ela deve estar em sintonia com o meio onde ela se encontra, que está atenta
ao trabalho e à produção da agricultura da comunidade onde a escola se situa.
A escola do campo tem sua especificidade e singularidade. Nosso olhar como
educadores nesse espaço consiste em enxergar o modo de vida da comunidade local, seus
costumes e entender que estes fazem parte da proposta pedagógica da escola, a qual deve
ser construída coletivamente, considerando o desenvolvimento sustentável local e suas
relações com o global, refletindo as questões da comunidade e trabalhando ações que
possibilitem alternativas para a valorização dos sujeitos, suas identidades e culturas.
A luta pelo reconhecimento dessa escola do e no campo faz parte de uma das
pautas de reivindicações dos sujeitos do campo, que resistem a um processo histórico de
negação do seu espaço territorial de vida.
[...] A educação brasileira se desenvolveu de forma alheia à realidade rural
e agrícola do Brasil. Assim, a educação do meio rural foi silenciada por
16
mais de quatro séculos e quando aparece no ordenamento jurídico
brasileiro se vincula a uma concepção salvacionista ou compensatória da
educação, voltada aos interesses da elite e não como um instrumento de
emancipação dos camponeses (CAVALCANTE, 2011, p. 01-02).
Compreendendo esse processo histórico, onde o direito à educação favoreceu
apenas uma parte da população, que só tardiamente chegou ao campo brasileiro uma
Educação Rural, que transportou para o meio rural o modelo urbano e só ofertou uma
escola precária que não atende a todos e não garante sequer o Ensino Fundamental
completo como direito dos cidadãos e obrigação do Estado.
Tal situação mobilizou os povos do campo que a partir de 1990 se organizaram na
esfera pública, provocando o agendamento da Educação do Campo como uma questão de
interesse nacional. Esse direito tem respaldo na Constituição Federal Brasileira em seu
artigo 205º, como também mais especificamente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDBEN), nº 9.394 de 1996, (BRASIL, 1996), em seu artigo 28º que expressa a
garantia legal da Educação Básica aos habitantes da zona rural com adaptações que
respeitem as peculiaridades da vida rural e de cada região especialmente no que tange aos
conteúdos curriculares e metodologias, organização escolar própria e adequação à natureza
do trabalho na zona rural.
A legitimidade do direito a uma educação que considere as necessidades dos
sujeitos do campo na prática pedagógica escolar, se constituiu em um processo de luta da
população organizada através dos Movimentos Sociais que promovem uma articulação e
mobilização, destacando-se encontros, seminários e duas Conferências Nacionais de
Educação do Campo que se constituem como um marco para demarcar uma proposta
educacional para a Educação do Campo.
Em 1997 ocorreu o I Encontro Nacional de Educadores e Educadoras da Reforma
Agrária (ENERA), após um ano, em 1998, aconteceu a I Conferência Nacional por uma
Educação Básica do Campo, nesta que estabeleceu o termo Educação do Campo em
contraposição a Educação Rural.
Em 2001, baseado no artigo 28 da LDBEN, foi aprovado o Parecer CNE/CEB nº
36/2001, que gerou a Resolução CNE/CEB nº1/2002, que institui as Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (BRASIL, 2001), a qual
reconhece a diversidade do campo e o modo de vida social das diversas populações que
nele residem. O Campo é um conceito que identifica os espaços da floresta, pecuária, das
17
minas e da agricultura, como também os espaços pesqueiros, caiçaras, ribeirinhos e
extrativistas, este conceito incorpora as possibilidades que dinamizam a ligação dos seres
humanos com a própria produção das condições da existência social e com as realizações
da sociedade humana (BRASIL, 2001).
Nesse sentido, compreendemos o camponês, a partir dos grupos que habitam no
cenário do campo brasileiro, sejam eles: ribeirinhos, agricultores, quilombolas, indígenas,
caiçaras, cujos povos possuem sua própria identidade, que vai depender do espaço
geográfico no qual o sujeito está inserido.
Este território de vida é um campo disputado por projetos de sociedade
antagônicos. De um lado se tem o agronegócio que se situa como projeto do capital
nacional e multinacional que concentra capital, terra e tecnologias para produção de
monoculturas para exportação, explorando os recursos naturais à exaustão e degradando-os
com o desmatamento, os agrotóxicos, usando relações de trabalho de exploração com
aproximações do trabalho escravo. De outro lado, tem-se a agricultura familiar e de base
agroecológica que produz a maior parte dos alimentos produzidos no país, que dispõe de
pouca terra e recursos para produzir alimentos e garantir a vida daqueles trabalhadores e
suas famílias.
Na dimensão política, a Educação do Campo apresenta-se imersa em um território
de disputa de poder, em que assume um posicionamento diante da realidade injusta e
excludente, forjando outra concepção educacional, que seja o oposto do que se pretende
com a educação hegemônica. Em um cenário de profundas desigualdades sociais, a
educação é uma possibilidade de transformação, a partir de ações coletivas, com respeito
ao outro e ao mundo, para garantir a efetivação dos direitos dos sujeitos que se assumem
enquanto ser social no engajamento da luta por libertação (SANTOS e BATISTA, 2017).
A negação do direito à educação aos povos do campo se manifesta na não oferta de
educação, na Escola rural que em sua grande parte tem uma estrutura física precária, com
pouco ou nenhum material didático e alheio à vida do campo, professores que não tem uma
formação voltada para Educação do Campo, currículos descontextualizados e práticas
pedagógicas tradicionais focadas na transmissão de conteúdos científicos fragmentados.
Essa situação de precariedade exposta está presente também nas escolas no campo
dos municípios paraibanos que, além disso, apesar dos dezenove anos de aprovação das
Diretrizes Operacionais (BRASIL, 2001), para as escolas de educação básica no campo
desconsideram a necessidade de adequar os seus projetos pedagógicos aos princípios da
18
Educação do Campo. Não obstante algumas escolas por iniciativa de professores, gestores,
coordenadores pedagógicos, juntamente com a comunidade vem desenvolvendo
experiências que se aproximam dos princípios da Educação do Campo, como é o caso da
Escola Vovó Vina, situada na zona rural do município de Santa Rita-Pb, o que suscitou a
questão que norteará as discussões e reflexões desta pesquisa, que tem como objeto de
estudo a Prática Pedagógica na Escola Vovó Vina, buscando evidenciar aproximações com
os princípios da Educação do Campo.
Identificando a categoria central de nosso objeto de estudo - prática pedagógica,
situando-a no contexto escolar. Nesse sentido, percebemos as contradições vivenciadas
pela escola pesquisada, entre projetos diferentes de educação e refletimos sobre o contexto
de lutas para a garantia dos direitos legitimados, na busca de entender como materializar a
ação educativa proposta nos documentos oficiais, a partir da seguinte questão: quais são os
princípios que orientam as práticas da escola em estudo?
Este questionamento no leva a pensar, na importância de entender como
contribuição da pesquisa, o que está acontecendo nas práticas da escola localizada no
campo, para poder garantir a Educação do Campo não apenas como direito legitimado em
documentos oficiais, mas sua materialidade no município em que está se desenvolvendo a
pesquisa.
Diante da questão problema desta pesquisa define-se como objetivo geral: analisar
nas práticas pedagógicas da Escola Municipal Vovó Vina, as aproximações com os
princípios da Educação do Campo. E como objetivos específicos: caracterizar as propostas
pedagógicas existentes na escola; identificar as práticas pedagógicas que se aproximam dos
princípios da Educação do Campo; analisar os processos educativos que aproximam a
escola aos princípios da Educação do Campo.
Este estudo das práticas pedagógicas na escolas do Campo, emerge da preocupação
pela consolidação da educação do campo enquanto política educacional, efetivada na teoria
e prática. Pensar a Educação do Campo é fazer uma opção ética, é assumir um
compromisso com os sujeitos do campo que tem seus direitos negados, sua dignidade e sua
humanidade desconsiderada em meio à concentração da propriedade da terra, à exploração
e ao desrespeito com os trabalhadores.
A Educação do Campo realiza um diálogo com a Educação Popular, com
realização prática e reflexão teórica, a partir dos princípios da formação humana, da
conscientização, da valorização cultural e da práxis social. “É a concretização da
19
pedagogia do Oprimido, talvez entre seus sujeitos mais legítimos” (CALDART, 2004, p.
28).
A característica das práticas fundamentada em Freire, é o fazer e refazer do
cotidiano, no processo de apropriação de novos saberes, sendo percebida na ação do
processo de construção do conhecimento, pautando-se em uma matriz curricular que
respeita o ser humano e a natureza, nesse sentido: “[...] se impõe a necessidade de um
conhecimento tanto quanto possível cada vez mais crítico do momento histórico em que se
dá a ação [...]” (FREIRE, 1982, p. 102)
A motivação de pesquisar na área da Educação do Campo adveio da minha
experiência e compromisso vivenciado em projetos de extensão e de iniciação científica,
desde 2006, durante a graduação. Neste período pude conhecer a Educação Popular através
do Projeto Escola Zé Peão, e a Educação do Campo em projetos de extensão e de iniciação
científica.
Em 2006 atuei como professora no Programa Escola Zé Peão (PEZP), neste projeto
tive a oportunidade de vivenciar a prática e a teoria de uma proposta pedagógica
fundamentada nos ensinamentos de Paulo Freire, a partir das palavras geradoras, que eram
escolhidas considerando o universo dos alunos que eram trabalhadores da construção civil.
As salas de aulas funcionavam no prédio em que os alunos trabalhavam.
Essa experiência na Educação de Jovens e Adultos, ancorada aos princípios da
Educação Popular, foi rica e significativa no início de minha caminhada acadêmica, pois
possibilitou uma vivência e percepção da educação de qualidade, onde as práticas
pedagógicas são coerentes com uma proposta curricular que considera o contexto, a
identidade, a cultura, as memórias, os valores dos educandos.
O PEZP é um programa de extensão /universitária que teve 27 anos de
existência. Foi criado no ano de 1991, destinado à escolarização,
especificamente alfabetização e pós alfabetização de operários da
construção civil da grande João Pessoa-PB, realizado pela Universidade
Federal da Paraíba (UFPB), em união com o Sindicato dos Trabalhadores
nas Indústrias da Construção e do Mobiliário de João Pessoa
(SINTRICOM). Sua criação deve-se a constatação de que na construção
civil existem elevados índices de analfabetismo, principalmente, porque
seus operários vêm, predominantemente, do interior da Paraíba, sobretudo,
da zona rural, onde o alto índice de analfabetismo é uma realidade
(PROJETO ESCOLA ZÉ PEÃO, 1998).
20
Após essa experiência senti necessidade em aprender sobre currículo, tendo em
vista a necessidade de ampliar a compreensão sobre as questões políticas, que envolvem a
construção do currículo e sua prática, esses foram elementos que durante o curso das
disciplinas no curso de graduação em Pedagogia me instigaram a buscar com mais
profundidade.
Então resolvi trabalhar voluntariamente no projeto de extensão intitulado “As
políticas curriculares e a formação do pedagogo: implicações e repercussões das novas
Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia”, coordenado pela professora
Dr.ª Maria Zuleide da Costa Pereira. Nesta caminhada, em busca de ampliar meus
conhecimentos na área da educação, participei de seleção em projetos de extensão na
pesquisa da Educação do Campo, coordenado pela professora Dr.ª Maria do Socorro
Xavier Batista.
Nesta pesquisa na área da Educação do Campo, reuniu a experiência com a
educação popular e o conhecimento sobre currículo. A extensão universitária me
possibilitou a oportunidade em atuar nas escolas de assentamentos no município de Mari-
PB, participando da elaboração do projeto político pedagógico, e da prática do currículo a
partir de temas geradores, durante um processo de formação continuada, como produções
acadêmicas acerca da pesquisa.
Esse processo construiu em mim, enquanto estudante, uma identidade com a
pesquisa, unindo a teoria, prática e militância nesse processo de reconhecimento do ser
social e histórico pertencente a uma classe social que sofre um processo de negação
educacional político, econômico, social e histórico.
Com essas experiências na UFPB, me envolvi na teoria e na prática com a realidade
do Campo, observando, aprendendo e atuando nas comunidades, nas escolas e na luta dos
movimentos sociais da Paraíba. Os estudos realizados e experiências vivenciadas se
configuraram como referencial para a construção do meu trabalho de conclusão do Curso
de Licenciatura Plena em Pedagogia, com o trabalho intitulado “Questões metodológicas e
curriculares do projeto político pedagógico da escola Tiradentes”, situada no Assentamento
de reforma agrária no município de Mari – Pb, e como precursor de uma vivência que está
tendo continuidade na Pós-Graduação.
Atualmente atuo como supervisora escolar no município de Santa Rita/Pb,
experiência que me motivou para a realização desta pesquisa, município que tem o maior
número de escolas localizadas na zona rural, sendo 23 escolas localizadas na zona rural e
21
21 na zona urbana, despertando-me o interesse em saber como o município realiza o
trabalho educacional com os povos do campo, tendo em vista a garantia legal destes povos
de ter uma educação que atenda às suas especificidades, como consta na LDB e nas
Diretrizes Operacionais para Educação do Campo.
O aporte teórico que destacamos neste estudo, o qual nos ajudou a refletir sobre o
nosso objeto de estudo, foram autores como: Brandão (2006); Freire (1987); Molina(2004);
Batista (2007); Caldart (2004); Arroyo (1999) e Souza (2009).
A metodologia da pesquisa tem uma abordagem qualitativa, onde destacamos como
categoria teórica a contradição, e como categorias empíricas - território e trabalho. No
campo epistemológico, a teoria que vai dar sustentação, enquanto elemento direcionador
do olhar na analise da pesquisa, é o materialismo histórico dialético. Os procedimentos
utilizados no desenvolvimento deste estudo, foi a revisão bibliográfica, análise
documental, observação participante e entrevista semiestruturada.
O capítulo seguinte detalha, esta metodologia, intitulado como: Aspectos
Metodológicos e Epistemológicos da Pesquisa em Educação do Campo, neste espaço
apresentamos os caminhos percorridos para o desenvolvimento da pesquisa, mostrando
como estruturamos o aporte teórico para fundamentar a análise, as categorias que nos
ajudam refletir sobre o lócus da pesquisa a partir do objeto de estudo, e os procedimentos
que dão suporte nesta trajetória.
No terceiro capítulo, discutimos sobre a Educação Popular e a Educação do Campo
no contexto histórico da educação brasileira, pontuando as pedagogias que fundamentam
os princípios da Educação do/no Campo. Para ajudar na reflexão e respaldar a relevância
do estudo, fizemos um levantamento de teses e dissertações na área da Educação do
Campo que tratavam das práticas pedagógicas. Diante desse levantamento, realizamos um
esforço para fundamentar o conceito do que estamos chamando de prática pedagógica, a
partir do conceito de práxis revolucionária Marxista.
O quarto capítulo, aborda o lócus da pesquisa, situando seu contexto, as práticas
pedagógicas existentes na escola em estudo, analisando através dos registros realizados por
meio de entrevistas, observações e documentos, os elementos de coerência nestes, com os
princípios da Educação do Campo, destacando os desafios e as possibilidades da efetivação
de uma prática pedagógica consciente que fortalece a identidade camponesa, no processo
de luta e ressitência pelo direito a Educação do/no Campo.
22
Concluindo com o quinto capítulo, o qual terá reflexões inerentes acerca do
trabalho desenvolvido.
2 ASPECTOS METODOLÓGICOS E EPISTEMOLÓGICOS DA PESQUISA EM
EDUCAÇÃO DO CAMPO
Neste capítulo trataremos inicialmente da relação da opção epistemológicas da
pesquisa com o objeto de estudo, a qual permeia o enfoque teórico, metodológico e
analítico que se vincula a uma concepção de realidade. Em seguida, apresentaremos os
procedimentos da pesquisa, sua abordagem, o tipo da pesquisa, às técnicas e instrumentos
que fundamentam e definem as estratégias metodológicas que contribuíram para
aproximação com a realidade investigada.
2.1 Delineamentos epistemológicos da pesquisa em Educação do Campo
Tomamos a reflexão do objeto de estudo desta pesquisa na perspectiva do
materialismo histórico-dialético, por entendermos que este referencial contribui para
pensarmos um fenômeno que está imerso nas contradições da luta de classes uma vez que
as práticas e reflexões presentes na raiz da educação do campo, enquanto uma educação da
classe trabalhadora, que tem sua essência na luta dos movimentos sociais por reforma
agrária e pela terra, que busca transformar a realidade sob outras bases, sem a exploração
humana. Nessa perspectiva, o materialismo histórico dialético torna‐se uma importante
ferramenta na reflexão do objeto de estudo nessa busca em que se propõem a desenvolver
os que lutam por terra e demais direitos no campo.
A luz deste método, estruturamos o desenvolvimento da pesquisa, para
compreender a luta dos movimentos dos povos camponeses, tendo a prática pedagógica um
papel central nesta tarefa histórica em construção. Essa opção epistemológica nos leva
considerar a realidade social com toda sua complexidade e que está sempre em movimento,
compreendendo este fato, sua análise é mediada em sua totalidade.
O objeto de estudo posto aqui como “práticas pedagógicas” no contexto de uma
realidade escolar na zona rural do município de Santa Rita-PB, se caracteriza como um
fenômeno social que necessita ser explorado em suas dimensões, considerando vários
23
elementos como os fatores econômicos, políticos, entre outros em que constituem e
influenciam diretamente no desenvolvimento das práticas pedagógicas no ambiente
escolar. Calado (2018, p. 15):
Marx (por vezes, acompanhado por Engels) segue aplicando o mesmo
método, como sucede no Manifesto do Partido Comunista, de 1948, em
que se empenham em partir de fatos históricos concretos, buscando
apreendê-los e interpretá-los dialeticamente, sempre na perspectiva da
transformação social.
Nesta citação o autor apresenta a dialética como instrumento importante para
análise da realidade. Encontramos em Marx a raiz deste entendimento, que se baseia em
uma concepção materialista da realidade, considerando suas contradições, suas dinâmicas.
Nesse sentido, a dialética surge no debate marxista num esforço por superar a
dicotomia entre sujeito e objeto: “É o materialismo histórico, uma das componentes
fundamentais da filosofia marxista-leninista, que elabora a teoria geral e o método de
conhecimento da sociedade humana como sistema, estuda as leis da sua evolução e a sua
utilização pelos homens” (SPIRKINE; YAKHOT, 1975, p. 10). Marx analisa esse modo de
compreender a realidade articulando seu pensamento com as condições materiais vividas e
produzidas pelos homens:
[...] na produção social da sua vida, os homens contraem determinadas
relações necessárias e independentes da sua vontade, relações de produção
que correspondem a uma determinada fase de desenvolvimento das suas
forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção
forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se
levanta a superestrutura jurídica e política e à qual correspondem
determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida
material condiciona o processo da vida social, política e espiritual em
geral. Não é a consciência do homem que determina o seu ser, mas pelo
contrário, o seu ser social é que determina sua consciência (MARX, 1996,
p. 47).
O autor coloca elementos que nos possibilitam refletir sobre as características do
materialismo histórico dialético o qual compreende a história num movimento de luta entre
24
contrários, entre opostos. No entanto, ele não considera a matéria e o pensamento como
princípios isolados, sem interconexões, mas sim dentro de um mesmo todo universal e
indivisível (GADOTTI, 1995).
Justamente por isso a dialética se debruça sobre o entendimento e pesquisa das leis
gerais do universo, comuns em vários e múltiplos aspectos da realidade, englobando tanto
a natureza física quanto o pensamento e a sociedade. Já o materialismo implica numa
concepção científica em que o mundo corresponde à materialidade de uma realidade em
que há a presença do homem que a conhece e a modifica, a transforma por meio de seu
trabalho (material e imaterial).
É relevante afirmar no mesmo sentido do alerta contido em Konder (1998) que
Marx não “inventou” a luta de classes, somente a analisou observando as consequências e
relacionamentos entre as partes que a constituía. Porém o marxismo ao desenvolver o
materialismo histórico e dialético amplia essa visão e se posiciona politicamente como uma
teoria de empoderamento da classe trabalhadora em seu exercício conjunto de desenvolver
a práxis.
É por isso que no método materialista histórico dialético a história ainda deve ser
transformada de modo mais igualitário pelos homens em sua prática como apontado por
Freire (1981), no caminho do “inédito‐viável”.
Concordamos com os autores e em razão desse entendimento analisamos as
contradições entre o modelo de desenvolvimento agrário do agronegócio e da agricultura
camponesa e também da educação para o campo e do campo. Tanto os modelos produtivos
agrícolas quanto às perspectivas educacionais estão, respectivamente, vinculados ao
paradigma do capitalismo agrário e o paradigma da questão agrária.
Essa percepção dos antagonismos e embates permite apreender a história da
educação popular e da educação do campo, sob um prisma de valorização do ato de refletir
sobre as práticas pedagógicas realizadas pelos movimentos sociais e como estes a utilizam
como fortalecimento de coletividades e enraizamento de identidade, pois a dialética
possibilita “pensarmos as contradições da realidade, o modo de compreendermos a
realidade como essencialmente contraditória e em permanente transformação” (KONDER,
1998, p. 05).
25
2.2 Categoria teórica e Categorias empíricas
As categorias empíricas que destacamos neste trabalho, já anunciadas
anteriormente, compreendem o „trabalho e o território‟, no diálogo com a materialidade do
conceito da Educação Do/No Campo, os quais perpassam a discussão da Prática
Pedagógica no contexto escolar. Sobre a Educação Do e No Campo, Caldart (2002),
explica que:
[...] é a luta do povo do campo por políticas públicas que garantam o seu
direito à educação, e a uma educação que seja no e do campo. No: o povo
tem direito a ser educado no lugar onde vive; Do: o povo tem direito a uma
educação pensada desde o seu lugar e com a sua participação, vinculada à
sua cultura e às suas necessidades humanas e sociais. (CALDART, 2002,
p. 26, grifos no original)
Com esta citação, entendemos que as preposições no e do campo, não se resumem a
questão de semântica, mais sim, como preposições históricas que se expressam em termos
de disputas no plano educativo, os embates conceituais entre educação no campo e do
campo que estão historicamente voltados às questões de alienação e ou emancipação.
A Educação Do Campo se vincula a categoria trabalho no sentido da ação humana,
no modo de vida dos sujeitos, nas relações de sociabilidades com o outro e com a natureza.
Nesse sentido, buscamos perceber em que medida essa prática na escola Vovó Vina é feita,
considerando a experiência de vida desses sujeitos?
A Educação No Campo nos remete a pensar no território que a escola se encontra,
que é um território camponês, esse território é um espaço de vida, o lugar aonde os sujeitos
realizam suas ações. A partir dessa categoria realizamos as seguintes reflexões: em que
medida a ação pedagógica desenvolvida neste espaço, pensa a escola dentro desse
território?
Com isso, visualizamos a coerência das categorias e suas implicações
epistemológicas, a partir do campo do materialismo histórico dialético. Nesse sentido,
identificamos como categoria teórica dentro dos princípios da dialética, a contradição. A
categoria destacada (contradição) nos permite compreender o movimento das relações
sociais e suas transformações a partir da luta da sociedade civil organizada, esse
movimento é dinâmico e se opõe a compreensão linear da realidade.
26
Segundo Calado (2018), ao explicar esse princípio, coloca que no desenvolvimento
da pesquisa, na análise do objeto, precisamos registrar acuradamente o que observamos,
classificando os fatos que registramos, decompondo os fatos, e analisando um a um,
situando historicamente, sem perder sua dinâmica, suas contradições, suas mediações e sua
relação com a totalidade. A seguir mostraremos o desenho das categorias que será utilizado
nesta pesquisa.
Ilustração 01: Categoria teórica e categorias empíricas
Fonte: construído pela autora (2019).
Sobre a categoria empírica, trabalho, podemos compreender que, esta, estabelece
uma relação dialética entre o homem e a natureza, permitindo ser transformada por uma
ação criadora e intencional onde o fim é a produção da vida material (HARVEY, 2013).
Então, a escola é Do Campo, porque ela é fruto das relações desses sujeitos com a
natureza, que pensam a escola e consequentemente o currículo.
Nesse sentido, o território ganha corpo nessa discussão, como também, categoria de
análise empírica, porque esta escola situa-se no espaço em que esses sujeitos organizam
suas vidas materiais, permitindo realizar suas necessidades, de comer, beber, vestir, morar,
de construir suas identidades e culturas.
Segundo Fernandes (2009) a ideia de território assume dimensões espaciais,
políticas e culturais, se configurando como material e imaterial, ou seja, é um espaço
27
político por excelência, campo de ação e de poder, onde se realizam determinadas relações
sociais. Fernandes e Molina (2004, p. 36), reafirmam:
Os povos do campo e das florestas têm como base de sua existência o
território onde reproduzem as relações sociais que caracterizam suas
identidades e que possibilitam a permanência na terra. E nestes grupos há
forte centralidade da família na organização não só das relações
produtivas, mas da cultura, do modo de vida.
Quando o currículo escolar reflete o lugar, relacionando com o cotidiano do sujeito
de forma que este estudo signifique a construção de valores, preservação e a valorização de
sua identidade enquanto sujeito do campo, é possível direcionar o sujeito ao pensar critico,
ter suas próprias opiniões e não somente o pensamento imposto por autores hegemônicos.
Ao pensar no território no contexto da Educação do Campo, consideramos a
dicotomia do agronegócio de da agricultura familiar. Fernandes e Molina (2004, p. 42),
colocam que:
Enquanto a agricultura capitalista se realiza a partir da exploração do
trabalho assalariado e do controle político do mercado, a agricultura
camponesa ou familiar é intensamente explorada por meio da renda
capitalizada da terra ficando somente com uma pequena parte da riqueza
que produz, sendo a maior parte apropriada pelas empresas que atuam no
mercado.
No quadro a seguir, realizamos uma síntese dessa dicotomia no território do campo,
a partir da discussão de Fernandes e Molina (2004, p. 34), que identifica o território do
agronegócio, como o mercado e o da Educação do Campo, como a agricultura familiar.
Quadro 01: Território do campo: Agronegócio x Agricultura Familiar
Agronegócio Agricultura Familiar
Produção para exportação (preferencialmente) Produção para o mercado interno e para
exportação
Cultivo e criação onde predomina as espécies
exóticas.
Policultura – uso múltiplo dos recursos
naturais.
Erosão genética Paisagem heterogênea e complexa
Tecnologia de exceção com elevado nível de
insumos externos
Produção para o mercado interno e para
exportação
Competitividade e eliminação de empregos Cultivo e criação onde predomina as espécies
28
nativas e da cultura local.
Concentração de riquezas, aumento da miséria
e da injustiça social
Conservação e enriquecimento da diversidade
biológica.
Êxodo rural e periferias urbanas inchadas Tecnologia apropriada, apoiada no saber
local, com base no uso da produtividade
biológica primária da natureza.
Campo com pouca gente Trabalho familiar e geração de emprego
Campo do trabalho assalariado (em
decréscimo)
Democratização das riquezas –
desenvolvimento local
Paradigma da Educação rural Permanência, resistência na terra e migração
urbano - rural
Perda da diversidade cultural Campo com muita gente, com casa, com
escola...
Campo do trabalho familiar e da reciprocidade
Paradigma da Educação do Campo
Riqueza cultural diversificada – festas,
danças, poesia, música – exemplo: o Mato
Grosso é o maior produtor brasileiro de milho
e não comemora as festas juninas. Já no
Nordeste ...
Fonte: Arquivo da pesquisadora (2020)
Este quadro faz uma síntese das contradições existentes no território do campo,
enquanto espaço de disputa de poder de projetos de sociedade distintos, onde o sentido da
disputa está na essência do território.
O Território é o lugar em que desembocam todas as ações, todas as
paixões, todos os poderes, todas as forças, todas as fraquezas, isto é onde a
história do homem plenamente se realiza a partir das manifestações da sua
existência (SANTOS, 2008).
O território camponês abriga os vetores da globalização e, para se enquadrar ao
modelo econômico, se submete aos usos e apetites do Estado e das empresas
multinacionais. Porém, pode representar-se também como território de resistência que nega
as condições precárias as quais sobrevivem e lutam por uma realidade diferente.
2.3 Os Procedimentos da Pesquisa
O materialismo histórico-dialético nos ajuda a compreender a dinâmica das
relações sociais, nos fazendo entender sua concretude, sua construção histórica, como
29
também nos fazendo superar a maneira de pensar dominante. Diante deste enfoque
metodológico destacamos como categoria, a contradição, a fim de refletir as relações de
poder constituídas nas relações sociais.
Nos estudos e pesquisas na área da Educação do Campo, se destaca o entendimento
da luta por Educação como um reconhecimento de um direito, que se destaca nas
principais pautas de reivindicação dos movimentos sociais do campo, como uma denúncia
da problemática social, de uma realidade educacional vivenciadas pelos sujeitos do campo.
Nesse sentido, a pesquisa adota uma abordagem qualitativa por entendermos que
esta não busca enumerar ou medir os eventos estudados, não aplica instrumental estatístico
na análise dos dados, mas sim, parte de questões de interesses amplos, que vão se
definindo na medida em que o estudo se desenvolve. “Envolve a obtenção de dados
descritivos sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto do
pesquisador com a situação estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a
perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo (GODOY, 1995
p. 58)”.
A abordagem qualitativa de um problema justifica-se, sobretudo, por ser uma forma
adequada para entender a natureza de um fenômeno social. O aspecto qualitativo de uma
investigação pode estar presente até mesmo nas informações colhidas por estudos
essencialmente quantitativos (RICHARDSON, 1999). De acordo com Richardson (1999),
os estudos que empregam uma metodologia qualitativa podem descrever a complexidade
de determinado problema, analisar a interação de certas variáveis, compreender e
classificar processos dinâmicos vividos por grupos sociais.
Dessa forma o objetivo fundamental da pesquisa qualitativa não se baseia na
produção de opiniões representativas e objetivamente mensuráveis de um grupo; consiste
no aprofundamento da compreensão de um fenômeno social por meio de entrevistas em
profundidade e análises qualitativas da consciência articulada dos atores envolvidos no
fenômeno (RICHARDSON,1999) com o objetivo de desenvolver teorias empiricamente
fundamentadas (FLICK, 2009).
As técnicas qualitativas focalizam a experiência das pessoas e seu relativo
significado, em semelhança a eventos, processos e estruturas, implantados em cenários
sociais (SKINNER; TAGG; HOLLOWAY, 2000). São menos estruturadas, porém mais
intensivas do que uma aplicação de questionários fechados, permitindo maior
relacionamento e flexibilidade, atingindo maior detalhe e riqueza dos dados (AAKER;
30
KUMAR; DAY, 2004). Permite que o investigador entre em contato direto e prolongado
com o indivíduo ou grupos humanos, com o ambiente e a situação que está sendo
investigada (MARCONI; LAKATOS, 2011).
O enfoque qualitativo apresenta as seguintes características: o pesquisador é o
instrumento-chave; o ambiente é a fonte direta dos dados; não requer o uso de técnicas e
métodos estatísticos; tem caráter descritivo; o resultado não é o foco da abordagem, mas
sim o processo e seu significado, ou seja, o principal objetivo é a interpretação do
fenômeno ou objeto de estudo (GODOY, 1995; SILVA; MENEZES, 2005).
A definição dos instrumentos e técnicas da pesquisa se deu pela análise do objeto
de estudo e objetivos da pesquisa, no intuito de obter informações necessárias para
promover a viabilidade dos resultados no processo de coleta de dados. Utilizamos a revisão
bibliográfica, análise documental, observação participante e entrevista semiestruturada.
A revisão bibliográfica é imprescindível para “dar significado aos fatos
investigados [...] explica os aspectos da realidade em estudo [...] permite uma
reinterpretação dos fatos investigados.” (Belth apud Triviños, 1987, p. 103). Essa revisão
aconteceu no momento inicial da pesquisa para auxiliar a fundamentação teórica, sendo
uma atividade constante de revisitação dos materiais teóricos durante a pesquisa que nos
ajudam no aprofundamento da investigação. Os materiais teóricos que utilizamos foram
livros, dissertações, teses, artigos e sites eletrônicos. Este momento nos ajudou na
compreensão das questões ainda em aberto que precisam ser estudadas, como também
trouxe elementos importantes para a delimitação do estudo.
A análise documental aconteceu através a consulta aos documentos da escola,
como: projeto político pedagógico, planejamentos de aulas, projetos pedagógicos,
relatórios de atividades, registros fotográficos, como também pareceres, decretos e
resoluções que trata da Educação do Campo. De acordo com Flick (2009, p.284), a
pesquisa documental é uma técnica a qual:
São utilizados artefatos padronizados na medida que ocorrem tipicamente
em determinados formatos como: notas, relatórios de caso, contratos,
rascunhos, certidões de óbito, anotações, diários, estatísticas, certidões,
sentenças, cartas ou pareceres de especialistas.
As observações e a realização das entrevistas se deram a partir do consentimento da
gestão da escola e demais profissionais, como também da aprovação do parecer do comitê de
31
ética, o qual se encontra em anexo neste trabalho. A identificação da escola, também foi com o
consentida da gestão.
Consideramos a observação participante como o procedimento mais adequado para
vivenciar a prática pedagógica, os registros dessa observação do cotidiano escolar foram feitos
no diário de campo, de forma de forma sistemática, usando registros fotográficos, e análise dos
documentos, como os registros dos planejamentos dos professores e projetos coletivos.
Minayo (2010, p.15) entende “a observação participante como um processo pelo qual um
pesquisador se coloca como observador de uma situação social, com a finalidade de
realizar uma investigação científica”
A realização da entrevista semiestruturada com a equipe da Escola Vovó Vina, contou
com a participação de 03 (três) professoras, 01 (uma) supervisora educacional e 01 (uma)
gestora escolar.
As entrevistas semiestruturadas utilizadas em uma pesquisa “abre possibilidade
para os depoentes/entrevistados seguirem seus próprios cursos narrativos e trazerem o
inusitado, a evocação de suas memórias e visões sobre o que é significativo” (MELLO,
2005, p. 53).
O lócus da pesquisa é a Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino
Fundamental Vovó Vina, localizada na Granja São Luiz S/N, Zona Rural do município de
Santa Rita, Estado da Paraíba. A escola oferece a Educação Infantil e o Ensino
Fundamental de 1º ao 5º ano, são três salas de aulas multisseriadas, uma sala funciona a
Educação infantil, outra o ciclo de alfabetização (1º ao 2º anos) e última sala atende aos
alunos que estão nos 4º e 5º anos.
Para o tratamento dos dados utilizamos a Análise de Conteúdo referenciada em
Bardin (2011). De acordo com a autora a Análise de Conteúdo é:
Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter por
procedimentos sistemáticos e objetivos do conteúdo das mensagens
indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de
conhecimentos relativos às condições de reprodução/recepção (variáveis
inferidas) dessas mensagens (BARDIN, 2011, p. 48).
A autora explica que as diferentes fases da análise de conteúdo organizam-se em
três momentos, o primeiro a pré-análise, o segundo exploração do material e a terceira
tratamento dos resultados obtidos da interpretação. No desenvolvimento das fases
trabalhamos com as categorias temáticas para análises dos resultados, sendo estas „Vínculo
32
com a realidade local‟, „Organização pedagógica‟ e „Trabalho pedagógico de acordo com a
realidade local‟.
Este caminho metodológico traçado durante o processo da pesquisa tem o objetivo
de nos ajudar a entender o lócus do objeto de pesquisa que está inserido num espaço de
disputas de poder, e diante disso nos interrogamos como garantir a efetivação do direito à
educação que atenda as especificidades do campo, direito este, legitimado que emergiu de
uma luta dos movimentos sociais que fundamenta sua prática em uma lógica contrária ao
do sistema capitalista? É possível uma prática pedagógica de acordo ou com elementos dos
princípios da Educação do Campo em escolas dirigidas pelos governos locais? Como
construir uma escola contra hegemônica por dentro do estado?
Essa relação com o poder se torna um desafio, e a proposta da Educação do Campo
vem para superar a escola rural, portadora de um currículo urbanocêntrico, de forte
inspiração eurocêntrica, que estabelece os padrões de racionalidade e de sociabilidade
ocidentais como universais para o mundo, impondo um único modo de pensar, agir, sentir,
sonhar e ser como válido para todos, independentemente da diversidade de classe, raça,
etnia, gênero e idade existente na sociedade.
Entendemos como uma ferramenta coerente para análise o materialismo histórico-
dialético, como opção epistemológica que nos ajudará a conhecer o objeto de estudo em
sua totalidade, considerando os vários elementos que estão em volto no processo.
Diante desse embasamento na dialética marxista o movimento da educação do
campo, não é somente um movimento pelo fato de congregar pesquisadores, populações
camponesas, simpatizantes da luta pela terra e demais militantes; mas é também
movimento, pois representa a contradição, elemento que destaco, pois os movimentos
camponeses se tratam das forças dominadas, porém que resistem de diversos modos
(dentre eles revalorizando sua cultura) em contradição explícita com as forças dominantes
(entendidas na atualidade como a expressão do agronegócio e das multinacionais) e, desse
modo, ambas as forças fazendo parte de um todo da questão agrária e o processo de
desenvolvimento capitalista no campo.
33
3 A EDUCAÇÃO POPULAR E A EDUCAÇÃO DO CAMPO NO CONTEXTO
HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Este capítulo apresenta reflexões sobre as temáticas que envolvem o objeto de
estudo desta dissertação, para tanto discorremos sobre a educação brasileira, buscando
situar a Educação Popular e a Educação do Campo no contexto histórico, traçando um
panorama da educação rural à Educação do Campo. Diante das reflexões explanadas,
buscamos situar os princípios da Educação, a partir das pedagógias que os fundamentam.
Nesse percurso, apresentamos o levantamento das discurssões sobre as práticas
pedagógicas em dissertações e teses, optando por analisar as dissertações, fundamentando
no último tópico a relação da práxis revolucionária Marxista a Prática Pedagógica em
Freire.
3.1 Da Educação Rural à Educação do Campo
A história da educação brasileira desde os seus primeiros indícios/ações, no período
da colonização, com os Jesuítas, tem como marca os interesses de um grupo de pessoas
que pertencem à classe que detém o poder econômico, político, que pensa e organiza a
sociedade com o intuito de manter o controle social, a dominação de uma terra, de um
povo, na imposição de uma cultura. As palavras de Marinho (2008, p. 21), nos ajuda a
refletir sobre esse processo, quando o mesmo coloca que:
A alfabetização que os índios recebiam era considerada como processo
educacional alienante/manipulador, pois a alfabetização correspondia aos
interesses imediatos dos colonizadores, isto é, para catequizar os índios era
preciso comunicar-se com eles, não aprendendo a língua deles, mas
ensinando a nossa, já que por meio da língua também passamos uma
cultura.
Marinho (2008), também ressalta que a catequização tinha como objetivo
“amansar” os índios para facilitar a dominação do seu território, no intuito de torná-los
34
mais dóceis à aceitação da fé, língua e cultura europeia portuguesa. Esse momento foi um
processo de fortes conflitos, com alto índice de mortalidade dos nativos. Os jesuítas tinham
a incumbência da formação moral, religiosa e educacional. Ernandes Marinho (2008, p.25)
coloca que:
[...] a história educacional brasileira começa atendendo a interesses
externos ao próprio processo de ensino/aprendizagem, além disso, sem
considerar a educação como um valor para o ser humano, não existe
processo educacional que possa ser considerado como adequado.
Esse contexto nos faz entender a importância da educação, e como historicamente
esta foi utilizada a serviço do poder. Marinho (2008) se respalda em Azevedo (1976) para
falar da dificuldade de um avanço na proposta educacional nesse período histórico em que
os Senhores de Engenho detinham o poder supremo.
Com essa discussão, identificamos práticas educativas violentas no inicio da
colonização, pois existia a finalidade dos diferentes povos abandonarem as suas culturas e
adotarem o modo de vida do colonizador, incorporando os nativos à nova sociedade que se
formava.
Segundo Ribeiro (2012) a sociedade brasileira só começou a pensar na educação
para o meio rural de forma sistematizada a partir de 1920, pontuando o movimento
migratório presente no período da industrialização que começava a atrair trabalhadores
rurais para a cidade. É nesse período que se tem registro do primeiro movimento em defesa
da educação dos camponeses que ficou conhecido como Ruralismo Pedagógico (1930-
1940).
Esse movimento contrapunha à escola literária e urbana, pois defendia uma escola
integrada às condições locais visando promover a fixação do homem do campo “que
preparasse os filhos dos agricultores para se manterem na terra, e que, por isso mesmo,
estivesse associada ao trabalho agrícola e adaptada às demandas das populações rurais”
(RIBEIRO, 2012, p. 296). Assim, estava ligado à modernização do campo e, ainda,
contava com o apoio dos latifundiários (pois estavam preocupados em perder mão de obra
barata), e também a elite urbana (está preocupada com uma migração camponesa para a
cidade).
Em 1931, a IV Conferência Nacional de Educação discutiu as diretrizes da
educação no Brasil. Em 1933, deu-se início à campanha de alfabetização na zona rural. Já,
35
em 1935, ocorreu o I Congresso Nacional do Ensino Regional que contribuiu para a
fundação da Sociedade Brasileira de Educação Rural no ano de 1937. Em 1947, foi criada
a Comissão Brasileiro-Americana de Educação das Populações Rurais (CBAR), órgão
integrante do Ministério da Agricultura. Em 1953, foram firmados novos tratados de
cooperação técnica entre Brasil e EUA, que resultaram na Campanha Nacional de
Educação Rural (CNER) e no Escritório Técnico de Agricultura Brasil – Estados Unidos
(ETA). Neste mesmo período, a efervescência das lutas camponesas no Brasil, cuja maior
expressão era o Movimento das Ligas Camponesas, coincidiu com o movimento de
Educação Popular, tendo no Movimento de Educação de Base (MEB) e nas ideias de Paulo
Freire.
Para contrapor a esses movimentos de educação popular já no período da Ditadura
Militar, o governo implantou o Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL). Esse
programa chegou ao campo de forma ainda mais precária que na cidade e uma inversão no
objetivo da educação ofertada ao meio rural. A perspectiva de fixação das populações
camponesas no campo foi substituída pelo projeto de expulsão destes indivíduos das terras
para dar lugar ao processo de modernização da agricultura em benefício do grande capital.
Com a suposição de que o campesinato estaria fadado ao desaparecimento, a educação
voltada a estas populações também estaria (Santos, 2013).
Nesse contexto da ditadura militar e das fortes crises econômicas, em meados de
1975, destacamos a importante atuação da Comissão Pastoral da Terra – CPT, neste
cenário. A CPT atuava com o objetivo de apoiar os trabalhadores rurais em relação à
retirada de terra e a exploração exacerbada das forças de trabalho. O surgimento da CPT
estava ligado com a igreja católica, precisamente nos encontros dos Bispos, convocado
pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - CNBB (CPT, 2010).
Diante do desfavorecimento da classe trabalhadora, tal organização (CPT) foi
impulsionada a construir ideias com influências marxistas incorporadas pela teologia da
libertação (SILVA, 2003). A teologia da libertação é uma experiência de vida e fé
libertadora. E está intimamente articulada com a afirmação dos movimentos sociais e
populares de libertação.
A ação da CPT se estendeu pelo Brasil, se destacando pela defesa do direito dos
trabalhadores à terra. A comissão esteve envolvida com os interesses dos trabalhadores,
famílias pobres, posseiros, sem-terra etc. que iam de desencontro aos projetos capitalistas.
36
Este trabalho de base da CPT, de manter na práxis libertadora um diálogo fraterno
com os oprimidos da terra, foi de fundamental importância para a organização da
sociedade civil.
A derrota da Ditadura, a crise econômica e política interna e a reorganização dos
movimentos de massa nos anos de 1980 trouxeram desdobramentos decisivos nas lutas
pela terra e pela educação dos trabalhadores do campo, no plano das lutas sociais que se
abriam no Brasil.
Com isso, ocorreu a criação de organizações de massa no campo e na cidade, como:
o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a organização dos povos
indígenas, o novo movimento operário, a criação da Central Única dos Trabalhadores
(CUT) e do Partido dos Trabalhadores (PT).
Em termos de organização social coletiva no campo brasileiro, destaca-se o
protagonismo do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), uma vez que
assumiu um caráter pioneiro quanto à discussão de uma proposta educativa com
características específicas para o campo brasileiro.
Este foi criado no ano de 1984, constituindo-se como um dos principais
movimentos que se mobilizou em defesa da Educação do Campo, uma vez que, no
conjunto das lutas por Reforma Agrária, considerou a educação como instrumento
fundamental no processo estratégico de fortalecimento do projeto de sociedade, tendo a
Reforma Agrária como base.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra retomou a discussão
relacionada à propriedade da terra anunciada nas lutas dos posseiros, defendendo a reforma
agrária antes empreendida pelo Partido Comunista Brasileiro e por organizações ligadas ao
campo, no século XX (SOUZA, 2006).
É, pois, inegável o protagonismo desse movimento na luta por justiça social,
respeito, dignidade e melhor qualidade de vida para os agricultores, especialmente aqueles
que servem de mão-de-obra para o enriquecimento dos proprietários de terra, sem
nenhuma perspectiva de liberdade. Nesse contexto, a educação assume um papel
preponderante como um meio de desocultar os ideais hegemônicos de classes que têm na
força de trabalho do camponês um instrumento de acúmulo de capital (COSTA, 2010).
37
Esse processo histórico e político pela educação do meio rural ampliou-se, em
1997, com o Encontro Nacional dos Educadores da Reforma Agrária do MST, onde foram
discutidos problemas da educação dos trabalhadores do campo.
A partir desse evento, nasceu a Articulação por uma Educação Básica do Campo e
depois o Movimento por uma Educação do Campo. Em 1998, na I Conferência Nacional
por uma Educação Básica do Campo, realizada em Goiás, os participantes debateram
vários temas durante os cinco dias, onde foi elaborado um texto reunindo várias posições
em relação aos objetivos, ações e políticas públicas para a Educação do Campo como um
vetor de um novo projeto de desenvolvimento para o Brasil.
Em 2004, na II Conferência Nacional por uma Educação do Campo, explicitou-se a
proposta da construção de uma Licenciatura em Educação do Campo (LEC), que se
configurou com base na gestão dos processos educativos e na docência por áreas de
conhecimento, como: as linguagens, ciências da natureza e matemática, ciências agrárias e
ciências humanas e sociais. Para Caldart (2012, p. 262): “A Educação do Campo não
nasceu como teoria educacional, suas primeiras questões foram práticas, seus desafios
atuais continuam sendo práticos, não se resolvendo no plano apenas da disputa teórica”.
Contudo, exatamente porque trata de práticas e de lutas contra hegemônicas, ela
exige teoria, e exige cada vez maior rigor de análise da realidade concreta, na perspectiva
de práxis. Nos combates que lhe têm constituído, a Educação do Campo reafirma e
revigora uma concepção de educação de perspectiva emancipatória, vinculada a um projeto
histórico, às lutas e à construção social e humana de longo prazo.
Faz isso ao se mover pelas necessidades formativas de uma classe portadora de
futuro. Às especificidades da Educação do Campo tem-se mostrado por meio de suas
práticas, vinculadas a um projeto histórico, emancipatório, de lutas contra hegemônicas à
construção social e humana. Nesse sentido, torna-se imprescindível considerar a cultura, as
características, as necessidades e os sonhos dos que vivem no meio rural, na busca de
assegurar garantias a esses povos por meio de políticas públicas voltadas a essas
realidades.
Mesmo com a origem agrária do nosso país, os povos que vivem e sobrevivem do
campo brasileiro tiveram, historicamente, seus direitos educacionais negados,
notadamente, aqueles que se referem à educação formal ministrada nesse espaço
geográfico, como destacamos inicialmente.
38
Estudos como os realizados por Leite (2002), Arroyo (2007) e Munarim (2006),
mostram que o campo sempre foi visto como lugar de atraso, uma realidade a ser superada
e, por esse motivo, as políticas sociais e educacionais não foram vistas como prioritárias
para esses povos.
Quando passaram a lhes ofertar a educação escolar, ela esteve centrada no modelo
da Educação Rural “adequada aos modelos políticos de desenvolvimento econômico
efetivados no campo, cujas bases se fundamentam nos interesses das classes dominantes”
(AZEVEDO, 2007, p. 145), de certo modo, responsável por preocupantes consequências
ao longo dos séculos na escolarização desses povos.
Como já pontuamos, desde os anos de 1990, foram criados vários grupos de
reflexão sobre educação do campo no Brasil com o objetivo de pensar novas alternativas
que viessem suprir as necessidades de educação formal, não -formal e informal por parte
dos povos do campo.
Foram criados Encontros de Educadores do Campo, Conferências Nacionais de
Educação do Campo, Simpósios em algumas Universidades, aos poucos, nesse cenário de
lutas sociais e redes solidárias, os movimentos sociais do campo, começaram a serem
incluídos nas agendas políticas, nesse movimento iniciou-se a construção de políticas
públicas e uma ampla discussão sobre a Educação do Campo.
A Educação do Campo (re) conhece os camponeses como transformadores de suas
vidas. Assume a perspectiva de “educar as pessoas que trabalham e vivem no campo, para
que se encontrem, se organizem e assumam a condição de sujeitos da direção de seu
destino” (CALDART, 2004, p. 28).
A exclusão de direitos como educação, saúde, moradia, trabalho, terra, dentre
outros, ao longo da história brasileira, motivou o protagonismo de movimentos sociais do
campo em processos reivindicatórios para o reconhecimento de sua condição de sujeitos de
direitos, gerando a organização de forças coletivas em favor de um projeto de campo mais
humano que favoreça aos sujeitos do campo condições de vida digna em que todos e todas
tenham acesso aos direitos historicamente negados.
Em meio aos avanços das pesquisas acadêmicas acerca da desconstrução da visão
da cultura do campo como atrasada e inferior a do meio urbano, ainda encontramos neste
caminhar várias formas de discriminação, como a disseminação da visão alienante acerca
da concentração da terra em mãos dos latifundiários, das empresas transnacionais, em uma
perspectiva de progresso.
39
Ao estudar a Educação do Campo não há como negar essas análises, pois a
população camponesa faz parte dessa exclusão deliberada pela ideologia da classe
dominante. A Educação do Campo em seu arcabouço teórico e prático traz uma discussão
que valoriza as identidades das pessoas que vivem no campo, desvinculando a ideia de um
modelo de campo estigmatizado por estereótipos e preconceitos.
Neste contexto a presença dos movimentos sociais é forte e significativa, pois os
avanços que vêm ocorrendo nas políticas se dão com a pressão dos movimentos sociais
organizados frente aos governantes, sendo essa relação com o poder um dos seus mais
importantes desafios.
Na perspectiva dos movimentos não bastam ocuparem o poder, mas reinventá-lo.
Pois, o campo defendido pelos movimentos sociais não é apenas um espaço geográfico, é
espaço de lutas e disputas, que exige a realização da Reforma Agrária e das políticas
públicas sociais e econômicas em sua totalidade.
Como diz Freire (1997): “Então o camponês descobre que, tendo sido capaz de
transformar a terra, ele é capaz também de transformar a cultura, renasce não mais como
objeto dela, mas também como sujeito da história”. Nesse universo de relações, a
concentração da propriedade privada, a exploração da mão-de-obra, a relação patrão
empregado/escravo, refletem um Estado clientelista, patrimonialista e de políticas
populistas. Repercutem também a dependência em relação ao capital externo e suas
relações econômicas financeiras internacionais, apontados por Souza (2006), como fatores
determinantes na história dos movimentos sociais do campo.
A principal bandeira de luta dos movimentos sociais do campo ao longo da história
brasileira tem sido pela Reforma Agrária, entendida como uma das bases para a construção
de um novo projeto de sociedade que questiona o latifúndio brasileiro e busca melhores
condições de vida para os camponeses. A distribuição desigual da terra tem gerado
contextos de exploração, escravidão e a expulsão do homem do campo de suas terras em
direção às grandes cidades, de modo a serem condenados a “sobreviver” em favelas, nas
periferias dos grandes centros urbanos, conforme afirma (BATISTA, 2007).
Acerca do protagonismo dos movimentos sociais do campo na luta a favor do
camponês, Batista (2007) destaca que, estes se articularam em torno de reivindicações,
visando propor uma educação de qualidade, específica para a realidade dos camponeses, no
sentido de que contribua na constituição e afirmação da identidade camponesa e da
valorização da vida no campo.
40
Na medida em que se acirram as discussões sobre a Reforma Agrária, como um
possível projeto de desenvolvimento para o campo brasileiro, outras demandas sociais
assumiram centralidade, dentre estas, a Educação do Campo, passando a ser considerada
como um componente necessário à formação dos sujeitos do campo e ao projeto de
desenvolvimento que defendem e que está fundado na igualdade, na solidariedade, na
agricultura camponesa e agroecológica.
A esse respeito, Correa (2016), assinala que os movimentos sociais passaram a
compreender que a educação poderia contribuir para a ampliação do acesso à totalidade
dos direitos e, consequentemente à melhoria das condições de vida no campo. Molina e
Jesus (2011, p. 29) afirmam que:
É em resposta à hegemonia do modelo de organização da agricultura
nacional, que movimentos sociais e sindicais se organizam e lutam para
construir estratégias coletivas de resistência, que lhes possibilitem
continuar garantindo sua reprodução social, a partir do trabalho na terra.
A presença dos movimentos sociais do Campo tem assumido relevante papel nas
políticas para o setor, uma vez que pressionando os governos, nas três esferas, vêm
fortalecendo o cumprimento das determinações apresentadas nas Diretrizes Operacionais
para a Educação Básica nas Escolas do Campo (Resolução CNE/CEB 1/2002). O
paradigma de educação que os movimentos sociais do campo estão construindo considera a
cultura, as características, as necessidades e os sonhos dos que vivem no e do campo.
Arroyo (1999), afirma que “[...] é impossível pensar na educação do campo sem
referi-la aos sujeitos concretos, históricos, à infância, à adolescência, à juventude, aos
adultos que vivem e constituem humanos”. A educação pensada a partir dessa lógica
reconhece o homem, a mulher, a criança camponesa como seres humanos que têm o direito
à educação de qualidade e que possa servir de fato como meio de emancipação da condição
de subordinação à lógica do capital.
A luta dos movimentos sociais do campo, na construção do paradigma da Educação
do Campo, dar-se em oposição ao paradigma da educação rural, uma vez que esse não
contribui com projeto de desenvolvimento sustentável para o campo brasileiro que está em
construção. Ao contrário, reforça a lógica do agronegócio, de que o campo deve ser
inabitável para tornar-se unicamente fonte de acumulação de riqueza.
41
Esse paradigma de educação é respaldado em uma cultura hegemônica que trata os
valores, as crenças, os saberes do campo ou de maneira romântica ou depreciativa, como
valores ultrapassados, como saberes tradicionais, pré-científicos, pré-modernos.
A educação rural teve sua origem na ideologia ruralista, com fins de subordinação
dos povos do campo, constituindo-se como um espaço de controle social dos setores
populares. Ao contrário, a Educação do Campo tem sua origem no pensamento, no desejo
e nos interesses dos sujeitos do campo, que nas últimas décadas intensificaram suas lutas,
formando territórios concretos e imateriais, construindo ideologias baseadas em uma
concepção crítica de mundo que o cerca e dele faz parte (FERNANDES, 2006).
O termo Educação do Campo indica a concepção de educação pautada no debate
empreendido pelos movimentos sociais de trabalhadores. O uso do “do campo” está
relacionado ao protagonismo dos movimentos sociais de trabalhadores, pois não é uma
educação “para” nem “com”: é dos trabalhadores. A esse respeito, Caldart (2010, p. 108)
assinala que,
[...] um „do‟ que não é dado, mas que precisa ser construído pelo processo
de formação dos sujeitos coletivos, que lutam para tomar parte da
dinâmica social, para se constituir como sujeitos políticos, capazes de
influir na agenda política da sociedade; que representam, nos limites
impostos pelo quadro em que se inserem a emergência efetiva de novos
educadores, interrogadores da educação, da sociedade, construtores
(pela/pressão) de políticas, pensadores da pedagogia, sujeitos de práticas.
A Educação do Campo contribui com o projeto de sociedade e de campo brasileiro
o qual, de acordo com Batista (2007, p. 169), deve-se “[...] constituir economicamente
sustentável e socialmente solidário, constitutivo de novas territorialidades e sociabilidades
para a implementação de uma política de educação que se fundamenta no respeito aos
saberes dos povos do campo”, de modo que valorize a terra como instrumento de vida, de
cultura, de produção, que deve se constituir na identidade de escola do campo a partir dos
sujeitos sociais a quem se destina, a saber: agricultores/as familiares, assalariados/as,
assentados/as, ribeirinhos, caiçaras, extrativistas, pescadores, indígenas, remanescentes de
quilombos, enfim, todos os povos do campo brasileiro.
De acordo com Ribeiro (2013, p. 23), a educação do campo, defendida pelo
Movimento Camponês traz implícitos: a) o vínculo entre a educação e a garantia da terra
42
de trabalho; b) a superação da escola rural portadora de currículo, conteúdo e metodologia
voltados à valorização do trabalho e da cultura urbanos; c) a identificação com o campo
enquanto espaço político de disputas históricas dos agricultores familiares pela conquista
da terra de trabalho e permanência nela; d) a relação entre o trabalho desenvolvido na
agricultura, na pesca e na pecuária, associado ao currículo, ao conteúdo e ao método
adotados pela escola do campo; e) o reconhecimento dos agricultores familiares como
sujeitos de educação e produtores de alimentos, saberes, conhecimentos e culturas.
3.2 A Educação Popular e a Educação do Campo
Considerando o contexto histórico da Educação do Campo, refletimos nesse espaço,
os fundamentos da Educação do Campo, respaldados na Educação Popular. Entendemos
que a Educação Popular e a Educação do Campo, traz em sua essência práticas
pedagógicas para a transformação social.
É nesse sentindo que buscamos ir além do discurso sobre a importância da
educação. Temos necessidade de pensar, qual educação queremos e de que forma
implementa-la? Aí está a raiz das diferenças de projetos político partidários, projetos
sociais e políticas públicas, na qual a educação é parte integrante. Como não falar de
práticas educativas populares numa sociedade de tanta desigualdade social? Não há uma
educação única para sujeitos marcados pela diferença.
Falar da EP é tratar de ato educativo comprometido com as camadas sociais
desfavorecidas. O que caracteriza a educação popular é esta sua relação estreita com os
setores marginalizados da sociedade na medida em que reconhece a legitimidade do saber
que aí se produz e fora ignorado pelo academicismo clássico.
Podemos citar aqui alguns intelectuais que vivenciaram profundamente este modo
de praticar educação, entre os quais lembramos Carlos Rodrigues Brandão (1994, 2001 e
2002); Paulo Freire & Adriano Nogueira (1993); Marisa Vorraber Costa (1998); Jaime
José Zitkoski (2000); Conceição Paludo (2001); Luiz Eduardo W. Wanderley (1984 e
1994); Vanilda Paiva (1987); Moacir Gadotti (1994); Rosa Maria Torres (1987); João
Francisco de Souza (1998); Severina Ilza do Nascimento (1998); Alder Júlio Ferreira
Calado (1998); Celso de Rui Beisiegel (1992).
Destacamos momentos de intensa movimentação das classes populares no contexto
sócio-político-histórico brasileiro e latino-americano que influenciaram as teorias e
43
práticas de um modo de fazer política e educação, pois o tema da Educação Popular poderá
ser melhor compreendido, enquanto prática pedagógica inovadora na relação com o
contexto histórico-político em que emerge, isto é, a partir das raízes.
O capitalismo alcançou sua expansão e consolidação no mundo a partir da segunda
metade do século XVIII, com o desenvolvimento da Revolução Industrial. Os efeitos dessa
revolução que iniciou na Inglaterra, atingiram as populações de outras nações na medida
das etapas de desenvolvimento do próprio processo.
Assim, a América Latina experimenta as consequências desse modelo de produção
a partir das primeiras décadas do século XX. No Brasil, a política industrialista recebeu a
primeira formatação mais explícita no governo de Getúlio Vargas (1930-1954). É um
desenvolvimento industrial de caráter nacionalista que preocupou-se inicialmente em
implantar a necessária estrutura do parque industrial nos limites territoriais em cada país.
Esta fase termina com o golpe militar em 1964.
Após a II Guerra Mundial, sob a liderança dos EUA, o capitalismo passa da fase
concorrencial para a monopolista. Nesta etapa os países hegemônicos do processo impõe
uma política internacionalista que se caracteriza pela abertura dos mercados através das
empresas multinacionais. Para concretizar esta nova fase do capitalismo internacional era
fundamental contar com governos afinados com tal política de desenvolvimento. Isto
explica os sucessivos golpes militares impostos à população de toda América Latina nas
décadas de 1960 e 1970.
Sob um regime de força, implanta-se um modelo de desenvolvimento baseado na
produção para exportação, restringindo as possibilidades de um processo de
desenvolvimento voltado para a realidade local. Trata-se de um modelo intervencionista na
medida que influencia as ações do Estado colocando-o à serviço do grande capital, seja de
caráter nacional ou internacional.
A prática do modelo desenvolvimentista, centrado na indústria, acelera o processo
de acumulação de capitais que são transferidos para as matrizes das empresas situadas nos
países desenvolvidos. Esta transferência aumenta ainda mais as desigualdades sociais entre
países ricos e pobres, como também os desequilíbrios regionais dentro de um mesmo país.
Esta situação de desapropriação sistemática das populações dos países pobres é
facilitada com políticas sociais que exercem a função de ocultar as verdadeiras razões da
pobreza. A deseducação das classes trabalhadoras é legitimada por políticas educacionais
que atendem os interesses do capital monopolista. Assim, a educação escolar reproduz um
44
projeto de desenvolvimento que não se interessa pela qualidade de vida das classes
trabalhadoras, mantendo-as disciplinadas para o trabalho e com mínimas informações.
Porém, este projeto encontra resistências em diversas organizações, instituições e
grupos sociais que sofrem os efeitos produzidos por esse modelo de produção excludente.
A partir destas resistências emergem concepções de política e de educação que
contemplam os interesses das classes populares. É neste contexto que emerge um tipo de
educação que reconhece o saber das classes populares - a Educação Popular.
Após a década de 1960, quando a Educação Popular já alcançou o reconhecimento
como saber teórico-prático dos interesses das classes populares. No Brasil, Brandão (1986,
1994, 2002) entende que a Educação Popular surgiu na década de 1960. “No pequeno
domínio de teorias e trabalhos que pensamos haver inventado entre 60 e 64 e a que mais
tarde demos o nome de educação popular, surgiu e por algum tempo floresceu um tipo
relativamente inovador de prática pedagógica” (p.15). O mesmo ponto de vista é destacado
em Wanderley (1984) quando avalia as ações do MEB (Movimento de Educação de Base).
O MEB “desenvolveu uma original pedagogia popular, engendrando subsídios concretos
para uma efetiva integração da teoria com a prática, para a investigação militante, para a
educação libertadora” (p.16).
A mesma tese é reafirmada por Paludo (2001): “é nos anos 1960, com Paulo Freire,
que no Brasil se tem, pela primeira vez, de forma consistente, uma pedagogia anunciada
das classes populares” (p.90). Conforme a autora, estava emergindo aí uma teoria da
educação brasileira que parte da realidade local e busca a transformação da sociedade, na
qual as classes populares são atores centrais.
Este acontecimento trata-se de uma reação ativa ao modelo de desenvolvimento
capitalista, cujos efeitos são mais sentidos pelas classes populares. Assim, a EP nasce no
meio dos desassistidos do Estado burguês, que, assessorados por intelectuais
comprometidos com as causas populares, desenvolvem um trabalho de educação básica
formal ou informal de caráter político-pedagógico.
Esta prática é acolhida em diferentes categorias de sujeitos sociais expandindo-se
para outras regiões e países. No bojo deste trabalho está um projeto alternativo de
sociedade. Apostar nas possibilidades emancipadoras da prática de Educação Popular
significa assumir que nem todos os projetos sociais potencializam a transformação. É
colocar-se a serviço das classes populares.
45
Entendemos que não há educação popular desvinculada do cotidiano das camadas
sociais populares. E mais, sem a participação efetiva dos sujeitos destas camadas a “ação
reflexão” da educação popular perde o seu potencial transformador, que é a sua vocação
desde as origens. No sentido freireano dir-se-á que não poderá acontecer o processo de
“libertação” sem esta busca intencional de um projeto político-pedagógico emancipatório.
Na medida que a intervenção educativa é histórica, política e cultural, Paludo
(2001) acredita que toda experiência teórico-prática realizada com as camadas populares
sempre será única pelo fato de partir de uma “leitura séria e crítica da realidade e que
indica os percursos pedagógicos a serem construídos, a partir da opção política e ética”
(p.96). Se o ponto de partida e de chegada da ação e reflexão da Educação Popular é a
análise da realidade social, esta orienta e fecunda a nossa ação teórico-prática. Referindo-
se à escola, Brandão (2002, p. 106) lembra que “nossos alunos não querem só ouvir,
querem falar, querem ser ouvidos”. Estes querem sair da insignificância e contribuir na
construção de um projeto político-pedagógico transformador pela participação. Esta é a
razão fundamental de um projeto educativo que propõe-se como objetivo a formação de
sujeitos emancipados, atores de sua história.
No final da década de 1950 e início de 1960, a Educação Popular, a partir da
inserção de intelectuais e universitários, da valorização da cultura popular e de sua
vinculação com os interesses da classe trabalhadora, na disputa entre Escola Nova e Escola
Tradicional, distingue-se destas vinculando-se ao movimento de transformação da
sociedade, conquistando espaço.
Neste período, o governo paradoxal de Jânio e Jango traz a possibilidade de
acirramento entre os vários setores vinculados às distintas classes sociais: trabalhadores e
burguesia. No interior da igreja, institui-se um grande embate entre uma ala
ultraconservadora, a Tradição, Família e Propriedade; e outra progressista, a Teologia da
Libertação. A imprensa, através dos meios de comunicação de massas, posiciona-se
claramente em favor da concepção internacionalista/imperialista, questão latente neste
momento devido à guerra fria, intensificando ao máximo a implementação de uma
ideologia de submissão ao império estadunidense. Enquanto nas comunidades populares,
há um grande movimento cultural que desemboca em um amplo processo de
conscientização da classe trabalhadora. Isto é verificado nos vários movimentos de
Educação Popular que surgiram (MCP – Movimento de Cultura Popular; Campanha de pé
46
no chão também se aprende a ler; MEB – Movimento de Educação de Base; Sistema Paulo
Freire; CPC – Centro Popular de Cultura).
Conforme Saviani (2008, p. 317), a mobilização que toma vulto na primeira metade
dos anos de 1960 assume outra significação. Em seu centro emerge a preocupação com a
participação política das massas a partir da tomada de consciência da realidade brasileira. E
a educação passa a ser vista como instrumento de conscientização. A expressão “educação
popular” assume, então, o sentido de uma educação do povo, pelo povo e para o povo,
pretendendo-se superar o sentido anterior, criticado como sendo uma educação das elites,
dos grupos dirigentes e dominantes, para o povo, visando controlá-lo, manipulá-lo, ajustá-
lo à ordem existente.
Com isso, o movimento que se constitui a partir da ampla efervescência popular
tem como característica a promoção e o incentivo à educação de crianças e adultos, no
âmbito não formal, elevando o nível cultural, entendendo o processo histórico, com relação
ao mundo.
Tinha como metodologia o diagnóstico da realidade, buscando através da reflexão,
elaborar e desenvolver práticas para transformar. Todo esse movimento trazia de maneira
objetiva sua intencionalidade política de transformação social. A inserção de intelectuais
nos movimentos populares faz com que estes sintetizam vários elementos que contribuem
para a construção de um projeto de nação, sob a ótica da classe trabalhadora.
O movimento de Educação Popular, neste período, já demonstrava sua resistência
em compreender a escola pública como espaço, também, de veicular as transformações
sociais. Este derradeiro entendimento se materializa com a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Brasileira de 1961 que conforme Xavier (1990, p. 135) se configurou no
[...] fato de o texto final aprovado e transformado em lei ter-se revelado o
fruto da conciliação entre as propostas em confronto, confirmou a
presença, ainda predominante, das preocupações político-partidárias, a
fragilidade das oposições ideológicas entre as elites dirigentes e a
importância secundária realmente atribuída por elas ao sistema
educacional em si, para a solução dos problemas que as afligiam.
O movimento em prol da educação, por parte da classe trabalhadora, ocorrido no
início da década de 1960, já traz consigo certa descrença na escola pública. O desfecho da
Lei de Diretrizes e Bases Nacional pode ser citado como um dos fatores que impulsionou
47
essa incredulidade em relação à educação pública formal como espaço importante para os
processos de mudanças sociais. Sendo assim, nos anos de 1960, o educador Paulo Freire,
sistematiza, de forma consciente e atrelada à luta das classes populares, uma pedagogia
anunciada e pertencente a essas classes.
Conforme Paludo (2000, p. 91), “pela primeira vez, começa-se a conceber uma
pedagogia na educação brasileira (e latino americana) que leva em consideração a
realidade brasileira com vistas à sua transformação, em que as classes populares assumem
papel central.” Por outro lado, junto com a disputa de projeto de desenvolvimento, a forte
mobilização popular e a organização de movimentos reacionários conservadores, no
quadro político brasileiro, e sua relação na política internacional do contexto da Guerra
Fria, constituem-se como o estopim de um longo período de silenciamento das vozes
populares: a Ditadura Militar.
Segundo Konder (2003), com a tomada do poder pelos militares, através do golpe
militar, institui-se no Brasil um período de autoritarismo, perseguição política a
intelectuais, artistas, lideranças populares, prisões, torturas, exílio, desaparecimentos... o
que, se considerado o contexto internacional, refletia as consequências da guerra fria, da
divisão entre o mundo capitalista, liderado pelo imperialismo estadunidense e o mundo
socialista articulado em torno da URSS. A política econômica deste período se baseava no
arrocho salarial e no incentivo para a modernização do capitalismo, abrindo caminho para
o estabelecimento do capital especulativo, com o aumento acelerado da dívida externa, a
concentração da renda em poucas mãos e o alastramento da pobreza e da miséria entre as
classes populares.
O êxodo rural alcançou números exacerbados, o que significou o aumento
desgovernado das favelas nos grandes centros urbanos. Após a instituição da Ditadura
Militar há o recrudescimento da ação de desmantelamento das forças populares, o que
obriga as forças progressistas da época a ampliarem os trabalhos de base, feitos na surdina,
nos quais a Igreja Católica passa a ter papel fundamental, como a organização das
Comunidades Eclesiais de Base – CEB‟s.
Mesmo considerando o movimento internacional da classe trabalhadora e a
intervenção externa advinda das disputas entre capitalismo e socialismo, no contexto da
guerra fria, no Brasil durante a Ditadura Militar, a Educação Popular manteve suas
práticas, agora com uma vinculação muito próxima à Teologia da Libertação. Já no final da
década de 1970, há o re-ascenso das forças populares, com a organização do novo
48
sindicalismo, não mais atrelado ao Estado e o surgimento de Movimentos Sociais
Populares comprometidos com a transformação social.
Sob a égide da virulência opressora e interventora, inclusive nas escolas, (re)
emerge o movimento de educação do popular, a partir do ano de 1970, tendo como espaço
central os locais de moradia e trabalho das classes subalternas. Mais uma vez, é a
conjuntura que reforça a ideia de que a educação pública servia mesmo para reprodução da
ordem. Endossada principalmente pelas Teorias Reprodutivistas, que consideram a escola
como aparelho reprodutor das ideologias do Estado, esta visão ganha força e é alentada
pelo ciclo de ditaduras e o uso parcial da educação escolar pelas elites, sob a égide da
ideologia da segurança nacional, em todo o continente latino-americano.
É nesse momento que a Educação Popular ganha a posição de concepção que
associa os processos educativos à ação política e social das classes subalternas com vista à
transformação social, apesar e para além da multiplicidade de correntes que a conformam,
esta constitui-se a centralidade que lhe confere sentido (PALUDO, 2001, p. 96).
A Educação Popular, neste contexto, encontra campo fecundo para constituir-se
como teoria pedagógica, tendo o educador Paulo Freire papel fundamental na
sistematização de tal concepção, que conforme Saviani (2008, p. 319), constituiu-se como
“A expressão mais acabada da orientação seguida por esses movimentos e que maior
repercussão teve no país e no exterior [...].” Apontado a indissociabilidade entre o político
e o pedagógico; a não neutralidade; a não ingenuidade; a sua característica histórica; a sua
vinculação com um projeto de desenvolvimento nacional e popular; apostando na
organização popular como campo de atuação.
Em meados da década de 1980, a Educação Popular alcança seu auge como
concepção pedagógica, assume o método de Paulo Freire como método de trabalho, com o
qual as pastorais progressistas da Igreja, Organizações Não Governamentais – ONG‟s,
Sindicatos, Partidos de Esquerda e Movimentos Sociais Populares comprometidos com a
transformação, buscam na efetivação prática, a partir da reflexão, contribuir para a solução
dos problemas sociais.
O momento histórico de luta pela redemocratização também impulsionou a
ampliação da Educação Popular. Em 1989, com as eleições presidenciais diretas, na qual a
classe trabalhadora, identificando aqui, todas as forças populares que desde a Proclamação
da República vinham trabalhando na perspectiva de um projeto nacional popular de
49
desenvolvimento, unifica-se sob a égide da estrela do Partido dos Trabalhadores para a
concretização de tal projeto.
Como em tantos momentos da história da humanidade, o desafio que se coloca
mais uma vez para a Educação Popular no contexto atual é continuar explicitando e
desvendando a intencionalidade dos projetos políticos neoliberais. Ao mesmo tempo trata-
se de reforçar o vínculo entre educação e política, relação desafiadora para o campo
popular.
Ao resgatar o contexto de constituição da Educação Popular como concepção
político-pedagógica, busca-se identificar uma possível vinculação desta com a luta por uma
Educação do Campo, o que permitirá compreender os princípios da Educação Popular
como determinantes da luta e constituição da Educação do Campo, pois ao assumirem tal
demanda, os povos do campo, através dos Movimentos Sociais Populares do Campo,
firmam-se em suas diversas experiências formativas no sentido de se contraporem à
Educação Rural, ao tempo em que afirmam o direito à educação e a necessidade definir o
projeto de educação atenda aos camponeses e aos diferentes sujeitos do campo. Sendo
assim, está posto um importante marco para compreender a constituição da luta por uma
Educação do Campo no Brasil.
Esse marco gira em torno da questão: qual educação está sendo pleiteada pelos
povos do campo? Sendo que as diferentes experiências que, no final da década de 1990,
dão fôlego para que os Movimentos Sociais Populares do Campo se articulem e pautem a
Educação do Campo na agenda educacional brasileira, como identificado, vêm se
construindo historicamente, com uma vinculação intrínseca à concepção de Educação
Popular.
A gênese da Educação Popular está nos movimentos operários do início do
século XX; nas mobilizações e nos movimentos de massas quando da possibilidade de
reformas estruturais de base; sob os ditames dos governos militares, durante a articulação
de resistência e confronto ao regime ditatorial; no movimento de redemocratização, que
possibilita a retomada do sindicalismo combativo e o surgimento dos Movimentos Sociais
Populares comprometidos com a transformação, que intensificam sua atuação também no
campo da educação, a partir da formação e escolarização de seus quadros e de suas bases.
Sendo que essa atuação está intimamente ligada aos processos desenvolvidos no âmbito da
Educação Popular.
50
Pode-se afirmar a possibilidade da Educação do Campo, na perspectiva da
Educação Popular, ser considerada no sentido de uma educação do povo, pelo povo e para
o povo (SAVIANI, 2008). Essa afirmação leva-nos a compreender a Educação do Campo
como uma concepção e uma prática educativa que se propõe a ser diferenciada, isto é,
compromissada com os interesses e a emancipação das classes subalternas (PALUDO,
2001), neste caso, a classe trabalhadora que vive no campo, e tem sofrido na pele as
marcas da opressão, discriminação e exploração impostas pelo capital, também e inclusive,
no que se refere ao seu não acesso à educação.
Aqui ressalta-se o entendimento que orienta essa análise, o qual permite utilizar
a expressão “povos do campo” para referir-se aos sujeitos pertencentes à classe
trabalhadora que vivem no campo. Tal entendimento, está amparado na leitura de que sob a
forma histórica do capitalismo no Brasil, os povos do campo, como extrato da classe
trabalhadora, subalterna ao domínio dos detentores dos meios de produção, produzem sua
existência material na relação direta com a natureza, e em consequência desta, dão corpo a
uma diversidade de formas sociais que se sustentam a partir da organização do trabalho
familiar, tendo a terra, e a luta por esta, como principais meios para garantia de sua
existência.
Sendo assim, pode-se fixar como marco, o vínculo intrínseco entre a Educação
do Campo e a Educação Popular. Pois a Educação do Campo se constitui como projeto
educativo que surge da classe trabalhadora do campo que afirma uma educação
emancipadora que luta para ocupar espaços na educação comunitária, nos movimentos
sociais e educação institucional como forma de garantir o direito à educação dos povos do
campo que reflita sobre seus modos de vida, suas culturas e formas de produção da vida,
tendo por base a concepção e o fazer educativo da Educação Popular, avançando e
tencionando a esfera pública, tanto no aspecto político, assim como, no didático-
pedagógico, e através dele, garantindo sua incidência de forma direta em processos
educativos formais.
Diante deste fundamento, no próximo item apontamos as Pedagogias que compõem
a proposta da Educação do Campo, destacando os princípios pedagógicos que norteam a
prática pedagógica.
51
3.3 Pedagogias e Princípios da Educação do Campo
As Pedagogias da Educação do Campo, anunciadas por Caldart (2004), nos ajudam
fundamentar a prática pedagógica da Educação do Campo. A autora apresenta três
referências como principais – Pedagogia Socialista, Pedagogia do Oprimido e a Pedagogia
do Movimento, destacando em um primeiro momento a Pedagogia Socialista, a qual seu
veio teórico dialoga com a tradição pedagógica crítica. Caldart (2004, p. 4) diz que este
pensamento pedagógico socialista:
“[...] pode nos ajudar a pensar a relação entre educação e produção desde a
realidade particular dos sujeitos do campo; também nos traz a dimensão
pedagógica do trabalho e da organização coletiva, e a reflexão sobre a
dimensão da cultura no processo histórico [...]”.
Nessa perspectiva, Saviani (2008), traz sua contribuição para a compreensão dessa
pedagogia mencionada por Caldart (2004). Para esta, consideramos a reflexão do contexto
de diversos movimentos sociais do campo, que lutam pelo fim da propriedade privada da
terra e dos demais meios de produção, e da exploração do trabalho a partir da construção
de outro projeto histórico. Nesse processo identifica-se em sua educação a influência da
pedagogia socialista. Sobre a pedagogia socialista, Saviani (2008, p. 201-202) afirma:
As ideias socialistas vicejaram no movimento operário europeu ao longo do século
XIX. Também chamadas de “socialismo utópico”, essas ideias propunham a
transformação da ordem capitalista burguesa pela via da educação. De acordo com
essa concepção, a sociedade poderia ser organizada de forma justa, sem crimes
nem pobreza, com todos participando da produção e fruição dos bens segundo
suas capacidades e necessidades. Para tanto, era mister erradicar a ignorância, o
grande obstáculo para a construção da sociedade. A educação desempenharia,
pois, um papel decisivo nesse processo. Seguindo essa orientação, no Brasil os
vários partidos operários, partidos socialistas, centros socialistas assumiram a
defesa do ensino público, criticavam a inoperância governamental no que se refere
à instrução popular e fomentaram o surgimento de escolas operárias e de
bibliotecas populares. Mas não chegaram a explicitar mais claramente a
concepção pedagógica que deveria orientar os procedimentos de ensino. Deve-se
observar que, no contexto do “socialismo científico”, a expressão “pedagogia
socialista” é assimilada e por vezes identificada com “pedagogia comunista”.
52
A categoria “trabalho” é evidente no conceito da pedagogia socialista. A partir do
que nos explica Pistrak (2000, p. 8): a pedagogia social é “uma pedagogia centrada na ideia
do coletivo e vinculada ao movimento mais amplo de transformação social”.
Para esta pedagogia é fundamental a relação entre teoria e prática, o trabalho social
e útil na escola, uma organização do ensino em forma de complexos que possibilite a
compreensão da história da natureza e da história dos homens para uma apropriação da
realidade atual e, através da auto-organização dos estudantes, construir as condições
materiais necessárias para a superação dos problemas científicos identificados a partir da
prática social.
Nesse sentido, o currículo escolar não é mais somente o local de repasse de
conteúdo, mas é um lugar de produção social e o trabalho está articulado aos objetivos
gerais da educação – a produção da humanidade em cada indivíduo de forma que ele possa
ser um novo homem. Para a construção dessa pedagogia faz-se necessário à crítica radical
à escola atual e à construção de propostas educativas que cumpram especialmente duas
funções sociais: a primeira, de internalizar valores e atitudes contrários aos do regime
social do capital, e a segunda, de desenvolvimento dos instrumentos de pensamento para a
apreensão do conhecimento do mundo objetivo.
Em relação à primeira, de internalização de valores e atitudes, é preciso identificar
que os valores mais em voga hoje são o individualismo, o egoísmo, a competição
exacerbada, o consumismo fútil, entre outros. Então a pedagogia socialista, está pautada
em valores humanistas como a coletividade, o trabalho coletivo, a socialização da riqueza
produzida, a solidariedade de classe e o desenvolvimento máximo das potencialidades de
cada indivíduo.
A segunda função de uma pedagogia socialista, do desenvolvimento dos
instrumentos de pensamento para a apreensão do conhecimento do mundo objetivo, requer
um processo especial para a apreensão de um conjunto de conhecimentos historicamente
construídos que permitam tal processo, ou seja, o conhecimento científico a partir do
materialismo histórico dialético.
Caldart (2004), após tratar da pedagogia socialista, como uma das pedagogias que
fazem parte da Educação do Campo, menciona a Pedagogia do Oprimido:
53
A segunda referência para esta interlocução é a Pedagogia do Oprimido e
toda a tradição pedagógica decorrente das experiências da Educação
Popular, que incluem o diálogo com as matrizes pedagógicas da opressão
(a dimensão educativa da própria condição de oprimido) e da cultura (a
cultura como formadora do ser humano), especialmente em Paulo Freire.
A Educação do Campo talvez possa ser considerada uma das realizações
práticas da pedagogia do oprimido, à medida que afirma os pobres do
campo como sujeitos legítimos de um projeto emancipatório, e por isso
mesmo, educativo. (CALDART, 2004, p. 4).
Freire (2011), nos seus escritos nos remete a perspectiva da ação dialógica, no
respeito a dignidade humana. A Pedagogia do Oprimido, nos leva a refletir na relação
opressão e oprimido, considerando a sociedade de classes sociais, e também na relação
pedagógica entre professor e aluno. O olhar para essas relações é na perspectiva
humanizada, para superar a desumanização de uma educação que ele chamou de
“bancária‟.
O quadro a seguir, explana a denúncia da Educação Bancária, em paralelo a
Educação libertadora defendida por Freire (1987):
Quadro 02: Contraposição dos projetos educacionais - Educação Popular no Brasil
Educação Bancária Educação Libertadora
Autolibertação Libertação coletiva
Assistencial Crítica
Doméstica Transformadora
Inibi a criatividade Funda-se na criatividade
Oculta a realidade Desvela a realidade
Decora Problematiza
Desconhece o homem como ser histórico Reconhece a história do homem
Mantém a imersão da consciência Busca a emersão da consciência
Privilegia a cultura elitista Valoriza a cultura popular
Dominação dos homens Libertação dos homens
Depósito Diálogo
Fonte: Quadro construído pela autora tendo no conteúdo a seguinte referencia: Freire (1987)
Em Pedagogia do Oprimido, Freire (2011) fala da teoria da ação antidialógica e da
ação dialógica, mostra como essa dominação do opressor contra o oprimido acontece, por
meio da tentativa de conquista permanente de um pelo outro, da divisão para manter a
opressão, dividir para enfraquecer, da manipulação através dos meios de comunicação de
massa, dessa invasão cultural permanente que é uma forma de penetrar na cultura do outro
54
impondo sua lógica, sua visão de mundo, quase cancelando a visão do oprimido e sua
própria cultura.
Freire (1987) designa os dois principais projetos educativos em luta como
pedagogia do opressor e pedagogia do oprimido. O opressor, membro ou representante dos
interesses dominantes tem consciência que para manutenção da estrutura desigual
capitalista, a qual se beneficia, se dá a partir do funcionamento dos mecanismos de
reprodução da sociedade, dentre eles o estado e suas instituições, nas dimensões política,
cultural, educacional, religiosa, ideológica etc.
A pedagogia do opressor tem êxito quando consegue fazer com que os oprimidos
pensem e ajam em conformidade com os interesses dominantes, quando permitem que o
opressor se “hospede” na sua consciência. Na Pedagogia do Oprimido, o autor direciona a
sua opção político-pedagógica aos esfarrapados do mundo, e aos que neles se descobrem e,
assim descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam. Reconhece como
compromisso político a busca pela emersão das consciências das classes populares e sua
inserção crítica na realidade.
Freire centra sua atenção sobre aqueles que ele chamava de oprimidos do
capitalismo periférico, isto é, sobre aqueles a quem a palavra havia sido negada. Frente à
opressão, a pedagogia dos oprimidos se instala e se expressa em dois momentos distintos:
“O primeiro, em que os oprimidos vão desvelando o mundo da opressão e vão
comprometendo-se, na práxis com a sua transformação; o segundo, em que, transformada a
realidade opressora, esta pedagogia dos homens em processo de permanente libertação”
(FREIRE, 1987, p. 41).
O diálogo com essas pedagogias está vinculado a objetivos políticos de
emancipação e de luta por justiça e igualdade social. A terceira pedagogia referenciada por
Caldart (2004) para a Educação do Campo, intitulada de Pedagogia do Movimento, a
autora afirma que esta:
[...] também dialoga com as tradições anteriores, mas se produz desde as
experiências educativas dos próprios Movimentos Sociais, e em especial
dos Movimentos Sociais do Campo. Trata-se de uma matriz pedagógica
cuja constituição teórica se dá no mesmo tempo histórico da Educação do
Campo. Podemos dizer então que se trata de um diálogo que ao mesmo
tempo será formulação de suas concepções e de seus desdobramentos
práticos. Esta é, pois, uma reflexão pedagógica que a Educação do Campo
está ajudando a construir, na perspectiva talvez de chegarmos a produzir
uma tradição pedagógica que tenha como referências o campo e as lutas
sociais. (CALDART, 2004, p. 4)
55
Esta pedagogia é gerada a partir das experiências do MST. Para o MST a forma de
pensar no processo educativo é chamada Pedagogia do Movimento, com a intencionalidade
de transformar a educação, e formar os sujeitos sociais do campo. Pedagogia significa a
forma de como dirigir a formação de uma pessoa, e suas práticas são a educação, num
processo de humanização das pessoas.
Esse tipo de Pedagogia é essencialmente de cunho social, na qual leva consigo o
sentimento de luta, de batalhas, conquistas e vitórias da luta de um povo com identidade
que esta sempre em busca de novas mudanças. Carregando com cada educando as
experiências de suas famílias, para que seja conteúdo de estudo aos mesmos, que aprendam
tudo aquilo que os foi vivido e aprendido na luta. Acima de tudo sejam transformados em
sua essência, com o sentimento de valorização de sua identidade, contestação social,
inconformismo diante de injustiças, e esperança de acreditar que os mesmos podem mudar
sua realidade. (ARROYO et. al. 2008).
No MST a pedagogia tem como ideal a cooperação dos assentamentos e
acampamentos, partindo dos ideais da Reforma Agrária um dos objetivos da luta,
cooperação para o desenvolvimento do campo, pregando uma cultura em conjunto
acabando com o pensamento individualista e egocêntrico presentes nas relações de
trabalho. E o papel da escola é problematizar para o aluno, construir e desconstruir valores,
ajudado a enraizar a identidade do Sem Terra com o objetivo de suprir a necessidade de
todos e não uma pessoa unicamente.
As práticas que vemos que o MST utiliza para fortalecer o processo de
enraizamento dos sujeitos são a memória que trabalha com os alunos os relatos das antigas
lutas dos familiares, as vivencias, carregando consigo todo um sentimento de superação de
batalhas de um passado sofrido, trabalhando a memória coletiva buscando conhecer a
história da humanidade.
A Pedagogia do Movimento contribui para as concepções da educação do campo,
levando para a escola os desafios de uma mudança social a ser feita, uma transformação
que esta nas mãos de cada sujeito capazes de assumir as lutas por sua identidade.
Tendo como respaldo as Pedagogias da Educação do Campo, anunciamos os
Princípios Pedagógicos da Educação do Campo que identificamos, a partir das
discussões deste trabalho, as quais são coerentes com os princípios pedagógicos
mencionados no documento - “Referências Nacionais para uma Educação do Campo”
56
(BRASIL/ MEC, 2004) que fundamentam a identidade da escola do campo, como também
no Caderno de Educação nº 08 do MST.
Os princípios pedagógicos referem-se ao jeito de fazer e pensar a educação. As
propostas destes princípios apontam que a Educação do Campo deve ser compreendida
como uma ação de afirmação da realidade educacional dos camponeses que pressupõe o
trabalho e a pesquisa como principio educativo, pois os conhecimentos são construídos de
forma coletiva a partir do trabalho na terra, da problematização sistemática da relação dos
camponeses com a natureza.
Inicialmente destacamos o princípio da Formação Humana, para Arroyo, Caldart e
Molina (2004, p. 121), a escola do campo sustenta-se através das relações sociais que se
tornam a base desse ambiente educativo, explicando que “[...] se a escola é lugar de
formação humana, significa que ela não é apenas lugar de conhecimentos formais e de
natureza intelectual. A escola é lugar de tratar das diversas dimensões do ser humano de
modo processual e combinado”.
O segundo princípio pedagógico é a Valorização dos Diferentes Saberes no
Processo Educativo, Freire (2006) enfatiza a necessidade da apreensão dos saberes dos
educandos pela escola para que possa “captar uma realidade, fazendo-a objeto de seus
conhecimentos” (p. 30). Expressa que esses saberes devem ser respeitados, pois são
construídos socialmente na prática comunitária, e devem ser discutidos em relação ao
ensino dos conteúdos.
A Resolução CNE/CEB 1/2002 que institui as Diretrizes Operacionais para a
Educação Básica nas Escolas do Campo, em seus artigos 5º e 7º, demonstra preocupação
com a organização do trabalho pedagógico, organização curricular e tempo pedagógico, de
forma a garantir o princípio pedagógico dos Espaços e dos Tempos de Formação dos
Sujeitos de Aprendizagem e o de atender as especificidades do campo. Um currículo e um
calendário que atendam as especificidades do campo fazem parte de muitos dos problemas
e negações já visualizados na educação do campo, tanto nas Diretrizes Operacionais, já
mencionada, como na LDB, em seu art. 28.
Destacamos no artigo 6º das Diretrizes Operacionais, o princípio do Lugar da
Escola vinculado à Realidade dos Sujeitos, como discute Caldart (2004), a escola
vinculada à realidade fortalece a reflexão sobre a exclusão e a discriminação sofrida pela
população do campo, e a buscarmos compreender vários porquês, ou seja, o porquê das
políticas públicas não atenderem a necessidade da população rural, o porquê da
57
subordinação do povo campesino a uma cultura urbana e o porquê da desvalorização da
cultural local. O quinto princípio trata da Educação como Estratégia do Desenvolvimento
Sustentável. O documento “Referências para uma Política Nacional de Educação para o
campo” (BRASIL/MEC, 2004) afirma que a educação em relação ao desenvolvimento
sustentável deve ser pensada a partir da ideia de que o local pode ser reinventado através
de suas potencialidades.
O último princípio pedagógico seria o da Autonomia e colaboração entre os sujeitos
do campo e o sistema nacional de ensino, este princípio reflete sobre a heterogeneidade do
campo e para duas implicações ligadas a essa heterogeneidade: a primeira, que não se pode
construir uma política pública de educação idêntica para todos os povos do campo; e a
segunda, a política de educação, por ser heterogênea, deve ser articulada às políticas
nacionais e essas às demandas e às especificidades de cada região ou de cada espaço ou
território (MEC, 2004).
Destacamos também, os princípios da Educação do Campo que foram definidos no Art.
2º do Decreto 7.352/2010 (BRASIL, 2010), em que prevê:
I - respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais,
culturais, ambientais, políticos, econômicos, de gênero, geracional
e de raça e etnia;
II - incentivo à formulação de projetos político-pedagógicos
específicos para as escolas do campo, estimulando o
desenvolvimento das unidades escolares como espaços públicos de
investigação e articulação de experiências e estudos direcionados
para o desenvolvimento social, economicamente justo e
ambientalmente sustentável, em articulação com o mundo do
trabalho;
III - desenvolvimento de políticas de formação de profissionais da
educação para o atendimento da especificidade das escolas do
campo, considerando-se as condições concretas da produção e
reprodução social da vida no campo;
IV - valorização da identidade da escola do campo por meio de
projetos pedagógicos com conteúdos curriculares e metodologias
adequadas às reais necessidades dos alunos do campo, bem como flexibilidade na organização escolar, incluindo adequação do
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições
climáticas; e
V - controle social da qualidade da educação escolar, mediante a
efetiva participação da comunidade e dos movimentos sociais do
campo.
58
Nesse sentido, a escola do campo é provocada a repensar seu Projeto Político
Pedagógico considerando esses princípios. O quadro a seguir apresenta a síntese dos
princípios pedagógicos identificados no estudo realizado.
Ilustração 02: Os Princípios Pedagógicos da Educação do Campo
Fonte: Arquivo da pesquisadora (2020)
Estes princípios políticos e pedagógicos se enraízam num projeto de sociedade, ao
qual, seus sujeitos lutam para construir, na perspectiva de buscar superar as relações de
opressão, dominação e desigualdades que são intrínsecas à sociabilidade capitalista.
3.4 As Práticas Pedagógicas em Dissertações
Nesse tópico, optamos por realizar o levantamento no repositório de teses e
dissertações da Capes, onde foi utilizado como filtro de busca o termo: práticas na
Educação do Campo, que resultou em aproximadamente 22 trabalhos, sendo que 16 eram
59
dissertações de mestrado e 6 teses de doutorado. Entre os trabalhos mapeados, realizamos
uma busca em que analisamos apenas as dissertações que possuíam em seus títulos os
termos: práticas pedagógicas e educativas, considerando o contexto das escolas do Campo,
com intuito de buscar o conceito e justificar a relevância desta pesquisa.
Nesse sentido, questionamos: o que os pesquisadores estão chamando de práticas
pedagógicas e práticas educativas? Quais os teóricos que estão sendo usados para
fundamentar esse conceito? Com objetivo de analisar as dissertações e teses que empregam
no título as práticas pedagógicas e educativas das escolas do Campo, buscamos destacar
através do quadro abaixo os anos das dissertações, título, autor, nível e instituição.
Quadro 03 - Mapeamento das dissertações e teses encontradas no repositório da CAPES, que
abordam as práticas pedagógicas e educativas em escolas do Campo, no período de 2004 a
2018.
Ano Título Autor Área/nível Instituição
2004 Ocupação da escola e gestão democrática:
limites e possibilidades a partir da prática
educacional realizada em acampamentos e
assentamentos do MST.
Fernando José
Martins.
Mestrado em
Educação
Universidade Federal
do Paraná, Curitiba.
2008 Caminhos da educação pela transamazônica:
ressignificando o saber cotidiano e as práticas
educativas de educadores(as) do campo'
Rosemeri
Scalabrin.
Mestrado em
Educação
Universidade Federal
do Rio Grande do
Norte
2009 Juventudes do campo e práticas educativas: o
caso do assentamento marrecas em São João do
Piauí
Marli
Clementino
Gonçalves.
Mestrado em
Educação
Fundação
Universidade Federal
do Piauí
2012 Escolas rurais de teresópolis: um estudo sobre
o fenômeno da urbanização do campo e as
práticas pedagógicas'
Cesar Marques
de Medeiros.
Mestrado em
Educação,
Cultura e
Comunicação
Universidade do
Estado do Rio de
Janeiro
2013 A prática educativa e as contribuições do
processo formativo da organicidade da
licenciatura em Educação do Campo da UNB -
um estudo de caso no território kalunga/goiás
Elisangela
Nunes Pereira.
Mestrado em
educação
Universidade de
Brasília
2014 Práticas pedagógicas em alternância:
contribuição ao estudo do trabalho docente na
escola família agrícola de São João do Garrafão
Andressa Paula
Fadini.
Mestrado em
educação
Universidade Federal
de Viçosa
2015 A prática pedagógica com o uso de livros
didáticos em escolas localizadas no campo
Francisco de
Assis teles
Maria.
Mestrado em
educação
Universidade Tuiuti
do Paraná
2018 Limites e possibilidades das práticas
pedagógicas nas escolas multisseriadas no
campo: um estudo em Dom Macedo Costa-
Bahia.
Roque Lessa
Bispo.
Mestrado
profissional
em educação
do campo
Universidade Federal
do Recôncavo da
Bahia
Fonte: Repositório de dados da CAPES (2019).
A discussão das práticas pedagógicas e educativas na Educação do Campo se
dá a partir de autores como Paulo Freire, Mônica Molina, Miguel Arroyo, sendo Freire o
mais referenciado nas discussões das análises das práticas. Nos trabalhos analisados, os
60
termos prática educativa e pedagógica são usados como sinônimos que refletem em uma
ação consciente em espaços escolares e não escolares, como destaca Gonçalves (2009). A
autora, ao debruçar no processo de construção das identidades através das práticas
educativas, entendeu que essa prática é uma ação que ganha amplitude em variados
espaços, como escolares e também no núcleo familiar.
Nessa perspectiva, na dissertação de Martins (2004), que utilizou como
categoria de análise, prática educativa, entendeu que esta prática é uma ação consciente
com base no diálogo, na conscientização política dos sujeitos envolvidos, na participação
dos educadores e educandos frente às problemáticas da comunidade etc.
Outras dissertações, como Pereira (2013) que buscou compreender como processo
educativo pode contribuir com a prática de educadores do campo, considerando
organicidade da licenciatura em Educação do Campo na instituição. A autora identificou
que a ação consciente da organicidade das turmas e das disciplinas, geraram nos alunos a
auto-organização, como também a compressão que o trabalho se caracteriza como um
princípio fundamental para que o educador do campo possa transformar sua prática
educativa. Portanto, a prática educativa enquanto ação consciente fortaleceu a organização
social dos jovens, destacado pela referida autora na citação abaixo.
As práticas dos estudantes Kalungas no seu território fortalece sua
organização social enquanto povo Kalunga, uma vez que eles são jovens
e que todos estão tendo acesso a universidade pública. Esses estudantes
estão engajados e conscientes de algumas das dificuldades que sua luta
por educação de qualidade no território pode enfrentar ou já enfrenta.
(PEREIRA, 2013, p. 84)
Diante dos trabalhos analisados, compreendemos os conceitos de prática
pedagógica e educativa, no sentido de uma ação consciente e transformadora, por gerar no
estudante um pensar crítico e engajamento político frente a suas condições sociais.
Na dissertação de Sousa (2014), a prática pedagógica é entendida como uma prática
social politicamente comprometida com as mudanças sociais.
Enquanto prática social, a prática pedagógica aborda a complexidade
onde as diversidades se entrecruzam. Promover um diálogo autêntico
nessa pluralidade é compreender quem são os sujeitos envolvidos no
processo educativo, como pensam, agem, sentem e se desenvolvem
possibilitando outros arranjos na reorientação de práticas pedagógicas
61
para além da sistematização e da intencionalidade como algo dado ou
previsto. A prática pedagógica em alternância implicaria numa prática
social politicamente comprometida com a mudança na medida em que
exige consciência de interação e comunicação e orienta-se para a
constituição de sujeitos conscientes e atuantes na sociedade. (SOUSA,
2014, p. 19)
A discussão destacada na pesquisa de Bispo (2018), que buscou tratar sobre os
limites e possibilidades quanto ao desenvolvimento das práticas pedagógicas nas escolas
multisseriadas, corrobora com as demais pesquisas analisadas, colocando que a prática
pedagógica, precisa está alicerçada em uma ação coletiva, que seja refletida a partir da
organização curricular entre os sujeitos envolvidos.
Entende-se que para vencer os desafios e estabelecer uma nova forma de
organização das práticas pedagógicas nas escolas do campo, destaca-se
algumas questões relacionadas a organização no interior da escola, como
o Projeto Político Pedagógico, o trabalho coletivo, o conhecimento a as
competências pedagógicas, evidenciando que se requer que as escolas e o
Sistema Municipal de Ensino, revejam sua organização e se organizem de
um modo novo construído a partir do já existente, sendo necessário para
isso, que a escola traduza para si, especifique e detalhe os avanços e os
problemas da civilização atual. Inclui-se aqui, para nossas escolas
multisseriadas, os avanços e os problemas da Educação do Campo.
(BISPO, 2018)
As reflexões abordadas apresentam elementos concomitantes que envolvem a
estrutura e organização do currículo, o aprendizado, vivência do cotidiano, práticas
calcadas na pedagogia das perguntas, essas práticas considera os sujeitos, o território, a
cultura e a organização do trabalho. Também são entendidas na interação professor-aluno;
em movimento constante, num processo de desconstrução e reconstrução, descobertas,
reflexão. Os elementos identificados nessas práticas cotidianas, são o diálogo,
metodologia, participação, construção coletiva, sendo que dentre esses o diálogo ganha
destaque no processo, sendo mencionado em todos os trabalhos pesquisados.
Na busca do entendimento do conceito da prática pedagógica tratada neste trabalho,
usamos como referencia Souza (2009), que faz uma discussão sobre a compreensão do
conceito, o qual, em um primeiro momento dos seus estudos, limitava a compreensão deste
conceito a prática docente.
62
A prática docente é apenas uma das dimensões da prática pedagógica
interconectada com a prática gestora, a prática discente e a prática
gnosiológica e/ou epistemológica. A prática pedagógica inclui a prática
docente, mas a ela não se reduz. (SOUZA, 2009, p. 5)
O referente autor aborda o conceito de prática pedagógica como uma práxis, e esta
comporta algumas dimensões envolvidas no processo de construção e reflexão desta
prática, são elas: a prática docente, discente, gestora, epistemológica e/ou gnosiológica que
estão relacionadas e que se desenvolve “com intencionalidades explicitas, assumidas
coletivamente, permeadas por afetos (amores e ódios)”. (SOUZA, 2009, p. 11)
Dialogamos também sobre a concepção da prática pedagógica, com os autores
Adolfo Sánchez Vasquez (2007) e Paulo Freire (1987, 2009). Nesse sentido o objeto de
estudo da pesquisa será desenvolvido, considerando as dimensões anunciadas por Souza
(2009), compreendendo a prática escolar em sentido mais amplo, envolvendo a prática
docente, discente, gestora e epistêmicas.
A práticas pedagógicas conceituada por Vasquez (2007) como práxis, envolve a
base epistêmica do materialismo histórico dialético, entendendo a prática como uma “ação
material, objetiva, transformadora, que corresponde a interesses sociais e que, considerada
do ponto de vista histórico‐social, não é apenas produção de uma realidade material, mas
sim a criação e o desenvolvimento incessantes da realidade humana” (VÁZQUEZ, 2007, p.
213).
Coadunando com Vasquez, Freire apresenta em suas obras Educação como prática
da liberdade (2009) e Pedagogia do oprimido (1987) que o ponto de partida de toda prática
educativa é a situação concreta, a realidade, o meio existencial. A experiência vivida torna-
se a referência do momento reflexivo da práxis, na transformação das relações econômicas,
políticas e sociais.
A práxis educativa freiriana é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para
transformá-lo. O embate dialético entre ação-reflexão presente neste método favorece a
uma mudança da consciência humana da estrutura social e a uma aproximação crítica,
reflexiva da realidade estudada. A práxis é a pedagogia dos homens empenhados na luta
por liberdade, uma pedagogia humanista e libertadora.
A práxis se constitui a razão nova da consciência oprimida e que a
revolução, que inaugura o momento histórico desta razão, não pode
63
encontrar viabilidade fora dos níveis de consciência oprimida (FREIRE,
1987, p.53).
A práxis é o elemento fundamental na conscientização do ser humano sobre sua
situação no mundo e para a transformação da situação de opressão em que vivem,
especialmente as populações do campo.
A práxis, porém, é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para
transformá-lo, Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-
oprimidos. Desta forma, esta superação exige a inserção crítica dos
oprimidos na realidade opressora, com que, objetivando-a,
simultaneamente atuam sobre ela (FREIRE, 2009, p. 40).
Ao denunciar a opressão, desumanização de uma sociedade de classes e convocar
os oprimidos e explorados a desvendar o mundo para transformá-lo, Paulo Freire estreita a
conexão com o pensamento marxista, notadamente com Marx e com o teórico mexicano
Adolfo Sánchez Vázquez, estudioso da práxis. A pedagogia do oprimido, a educação
libertadora, a educação problematizadora – todas concebidas por Freire são princípios da
Educação Popular que fundamentam a Educação do Campo e orientam as propostas
pedagógicas que imbricadas à práxis se constituem em instrumentos de luta de libertação
do ser humano, no campo educacional.
O caráter dialógico do processo educativo libertador, portanto, revolucionário,
apresentado por Freire resgata a humanização do oprimido restituindo-lhe a condição de
sujeito de direitos, na ação-reflexão do direito de ser mais. A ação dialógica é ação-
reflexão, portanto, práxis libertadora. Sem diálogo com os oprimidos e explorados não há
prática revolucionária.
3.5 Da práxis revolucionária Marxista a Prática Pedagógica em Freire
O conceito de práxis em Freire é bastante fecundo à prática pedagógica, pois se
concretiza na relação teoria e prática. Nos estudos contidos em “Educação como prática da
liberdade” e “Pedagogia do Oprimido”, destacamos o diálogo, a reflexão e a ação
transformadora da realidade, que objetivam a construção coletiva da consciência crítica da
humanidade a partir de uma práxis libertadora, revolucionária.
64
Este conceito de práxis em Freire têm influências da tradição marxista, reflete o
modo de produção capitalista, e orienta a educação para a emancipação humana. Discutir
esse conceito é oportuno no contexto atual, pois nos permite ampliar o sentindo da
educação e da ação transformadora.
Entendemos o termo práxis para designar a atividade que produz historicamente a
unidade entre o homem e o mundo, entre a matéria e o espírito, entre a teoria e a prática,
entre o sujeito e o objeto. Trata-se de atividade humana e social que se manifesta e se
realiza na e a partir da realidade. Segundo Vázquez (1977) é a “atividade material do
homem que transforma o mundo natural e social para fazer dele um mundo humano” (op.
cit., p. 3).
A práxis, sendo histórica e social, apresenta-se em formas específicas, a saber: o
trabalho, a arte, a política, a educação e etc., além de suas manifestações individuais e
coletivas concretizadas nas relações sociais e em produtos diversos. Historicamente, os
sujeitos sociais elevam sua consciência sobre seu mundo imediato, transitando de uma
consciência ingênua (Freire, 1987), a possibilidade da crítica e da transcendência.
No estudo da sociedade capitalista Marx cria um sistema de entendimento da vida e
prática humanas e das relações dos seres humanos entre si e com a natureza, ao qual
denomina de materialismo histórico e dialético.
O materialismo histórico e dialético surge como resposta e oposição às perspectivas
idealistas e materialistas da primeira metade do século XIX: “Os filósofos têm apenas
interpretado o mundo de maneiras diferentes; a questão, porém, é transformá-lo” (MARX,
2013). A partir da identificação das contradições de classes essa nova “visão de mundo”
procura se constituir em instrumento de compreensão coletiva da realidade e da luta pela
transformação social. Na perspectiva marxiana, a práxis é concebida como “a categoria
central da filosofia que se concebe ela mesma não só como interpretação do mundo, mas
também como guia de sua transformação” (VÁZQUEZ, 1977, p. 5).
A partir da categoria da práxis, podemos entender o desenvolvimento de outras
categorias que serão apresentadas neste trabalho, que compreende as atividades humanas.
É na práxis e pela práxis que o homem enquanto ser social transforma seu meio e se
autotransforma, se recria, ou seja, na luta pela sobrevivência o homem transforma suas
condições sociais da vida que é, ao mesmo tempo, autocriação e criação coletiva de si
mesmo. Dessa forma a “práxis é, por excelência, o elemento fundante, e sustentador de
65
toda a humanidade” (SOARES, 2012, op. cit., p. 18). Sobre o princípio educativo da práxis
em relação ao trabalho é mister observar que
O trabalho, ainda que alienado, não perde o princípio educativo, o qual se
revela, acima de tudo, pelo seu caráter contraditório. Porém, o trabalho,
nessas condições históricas não pode ser o momento exclusivo da formação
dos trabalhadores, poder-se-ia dizer mesmo que sequer seria central nesse
processo (SOUSA JUNIOR, 2010, p. 67).
Conforme Sousa Junior (2010) a práxis é o princípio pedagógico fundamental que
orienta a perspectiva marxiana de mundo, tanto como práxis revolucionária na sociedade
capitalista, sob a égide da burguesia, quanto na práxis da liberdade numa sociedade sem
classes, já emancipada. A educação humana se dá nas atividades de trabalho e de não
trabalho e atravessa todos os estágios vivenciados pela humanidade. Vásquez (1977) alerta
que a “atividade própria do homem não pode reduzir-se a sua mera expressão exterior, e
que ela faz parte essencialmente da atividade da consciência” (op. cit., p. 191).
Essa atividade se desenvolve de acordo com finalidades que conscientemente
idealizam o produto final e manifestam-se também em forma de conceitos, hipóteses,
teorias ou leis mediante os quais o homem conhece a realidade. A “atividade prática que se
manifesta no trabalho humano, na criação artística ou na práxis revolucionária, é uma
atividade adequada a objetivos, cujo cumprimento exige – como já dissemos – certa
atividade cognoscitiva” (VÁZQUEZ, 1977, loc. cit.).
Vázquez defende uma atividade da consciência que seja inseparável de qualquer
atividade humana, portanto, que se apresente como teoria que se materializa, que seja
elaborada com finalidades e produza conhecimentos em íntima unidade com a atividade
prática, que transforme o ideal e penetre no próprio fato real, ou seja, que pressuponha uma
ação efetiva sobre o mundo, com a perspectiva de sua transformação.
Nesse sentido, o termo práxis designa a atividade que produz historicamente a
unidade entre o homem e o mundo, entre a matéria e o espírito, entre a teoria e a prática,
entre o sujeito e o objeto, entre a essência e aparência. Trata-se de atividade humana e
social que se manifesta e se realiza na e pela realidade. E enquanto forma específica do ser
humano, a práxis torna-se uma atividade transformadora, criadora, autocriadora, uma
atividade que produz, forma e transforma o homem social, seu meio, sua consciência e
suas ações no mundo real. Não ações isoladas de pessoas ou grupos, mas intervenções
66
entre indivíduos singulares e o gênero humano, pois a práxis articulada em sua dialética
fornece os meios necessários para se estabelecer e compreender as relações entre o
indivíduo e a totalidade.
A categoria práxis materializa-se no pensamento pedagógico emancipatório. E o
educador brasileiro, o pernambucano Paulo Freire através de suas descobertas do mundo
será um dos teóricos da educação que entenderá o lugar da práxis na construção de uma
pedagogia dos oprimidos e de uma pedagogia libertadora.
Os princípios da Pedagogia Libertadora de Paulo Freire, inicialmente voltada para
alfabetização de adultos e posteriormente ampliada para a educação popular em geral têm
como principais categorias: humanização, dialogicidade, problematização, conscientização
e emancipação.
Na sociedade de classes, as práticas formadoras e deformadoras, humanizadoras e
desumanizadoras, se dão na materialidade das contradições que ao longo da história
disputam projetos educativos (formativos) opostos, expostos nos conflitos entre
exploradores e explorados, opressores e oprimidos. “No contexto de luta de classes, a
educação é, portanto, inerente aos processos formativos das classes, que constroem seus
distintos projetos históricos nas lutas sociais” (CARVALHO e MENDES, 2014).
A concepção freiriana de educação se propõe a uma historicidade humana concreta
e tem como essência a libertação dos seres humanos das amarras que os oprimem.
Liberdade é concebida como fonte que alimenta e atribui sentido a uma prática educativa
que só pode alcançar validade, eficiência, utilidade e eficácia na medida da participação
livre e crítica dos educandos. Justifica-se, portanto, o empenho de Paulo Freire em fazer de
suas intenções de libertação do homem e da mulher o sentido essencial de sua práxis
pedagógica, pois segundo ele, a libertação dos oprimidos é obra deles próprios, jamais dos
opressores.
A práxis educativa freiriana é reflexão e ação dos homens sobre o mundo para
transformá-lo. O embate dialético entre ação-reflexão presente neste método favorece a
uma mudança da consciência humana da estrutura social e a uma aproximação crítica,
reflexiva da realidade estudada. A práxis é a pedagogia dos homens empenhados na luta
por liberdade, uma pedagogia humanista e libertadora. “A práxis se constitui a razão nova
da consciência oprimida e que a revolução, que inaugura o momento histórico desta razão,
não pode encontrar viabilidade fora dos níveis de consciência oprimida” (FREIRE, 187,
p.53).
67
A formação de cidadãos progressistas num primeiro momento, e revolucionários
posteriormente, transformadores da ordem social, econômica e politicamente injusta é
possibilitada, pela conscientização das massas populares por meio de um método
pedagógico baseado no diálogo. Na concepção tradicional de educação escolar,
protagonizada pelas classes opressoras/exploradoras, a qual Paulo Freire denomina de
bancária, os educandos oriundos das classes oprimidas são desrespeitados na sua condição
humana, desumanizados em seus saberes e experiências: “a educação se torna um ato de
depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante” (FREIRE,
1987, 58).
Frente a essa situação de violência contra os educandos, Freire propõe a educação
problematizadora, que considerando a essência humana dos educandos os impulsionam a
problematizarem e compreenderem a realidade, na perspectiva de uma sociabilidade
fundada na práxis libertadora, pois segundo o autor a “educação se re-faz constantemente
na práxis. Para ser tem que estar sendo” (p.73).
O método de educação freireano é dialógico. O diálogo é uma exigência existencial
nutrida de amor, humildade, esperança, fé e confiança. Nesta relação dialógico libertadora,
parte-se sempre dos educandos, dos conhecimentos e das experiências deles, para construir
a partir daí um conhecimento novo, uma cultura vinculada aos seus interesses e não à
cultura das elites. A metodologia dos temas geradores apresentada por Freire trata-se de
uma forma de investigar “o pensamento dos homens referido à realidade, é investigar seu
atuar sobre a realidade, que é a sua práxis” (FREIRE, 1987, 98).
Encontramos a síntese dessa reflexão que compreende o contexto e o lugar que a
pesquisa se desenvolve em João Francisco de Souza (2009). Nessa perspectiva
epistemológica, o referente autor situa a discussão da categoria da práxis para trazer o
conceito da prática pedagógica. Dessa forma, compreendemos a prática pedagógica como
uma forma específica de práxis que não pode ser confundida com prática docente, pois a
prática docente é apenas uma das dimensões da prática pedagógica, significando
a condensação/síntese da realização interconectada da prática docente,
discente, prática gestora, permeadas por relações de afeto (amores, ódios,
raivas...) entre seus sujeitos, na condução de uma prática epistemológica ou
gnosiológica que garantiria a construção de conhecimentos ou de
conteúdos pedagógicos (educativos, instrumentais e operacionais), de
acordo com opções axiológicas de determinados grupos culturais.
(SOUZA, 2009, p. 37).
68
Dependendo da porosidade existente nas relações entre a equipe gestora, a
supervisão, e os/as professores(as), alunos/as da comunidade local, uma forma de conceber
a formação dos sujeitos humanos será construída. Com isto é importante afirmar que uma
prática pedagógica que possibilite a superação da alienação e da relação de subalternidade
cultural, política e social, exige a inserção crítica dos sujeitos.
Precisamos salientar que as reflexões presentes na Educação do Campo, tem
matrizes na Educação Popular, e por isso pode se afirmar que é uma relação consolidada,
tanto na prática como na teoria. Esta prática em espaços escolares se torna uma ação de
resistência, por estar situada em um campo de disputa. A relação entre ambas é marcada,
sobretudo pela luta dos movimentos populares que buscam transformar a realidade social
por meio da educação. Segundo Ribeiro (2013, p.43):
Do mesmo modo que a expressão campo remete às lutas históricas do
campesinato, educação popular carrega o sentido das organizações
populares do campo e da cidade que, na sua caminhada histórica,
participam, realizam e sistematizam experiência de educação popular.
A educação almejada por esses movimentos é aquela que respeita as diferenças
sociais, econômicas e culturais, sejam elas no campo, na cidade, nas comunidades
quilombolas, ribeirinhas, dentre outras. É uma educação construída com os sujeitos e não
uma imposição e nessa ótica, temos o que Freire (2016, p.68) denomina de “educação
libertadora, problematizadora”, na qual o conhecimento não advém de um ato de doação
que o educador faz ao educando, mas da interação, numa construção coletiva baseada na
relação dialógica e reflexiva entre ambos.
A educação libertadora, problematizada por Freire nos leva a compreender a
importância da participação coletiva no processo educativo, indo ao encontro daquilo que
os movimentos sociais anseiam para a escola do campo e reafirmando o “do” e não o
“para” o campo. De tal forma, podemos vincular a educação do campo à educação popular,
no sentido de que “a educação popular não é uma atividade pedagógica, mas um trabalho
coletivo em si mesmo, ou seja, é o momento em que a vivência do saber compartido cria a
experiência do poder compartilhado” (BRANDÃO, 2012, p.98).
Nesse sentido, a educação do campo é construída com o povo, considerando as
especificidades desse lugar e, os sujeitos por fazerem parte da construção do conhecimento
69
não são objetos do processo, mas participantes ativos, críticos, autônomos, conscientes. A
participação ativa dos sujeitos é possível porque os mesmos são seres de práxis.
Se os homens [e mulheres] são seres do quefazer é exatamente porque
seu fazer é ação e reflexão. É práxis. É transformação do mundo. E na
razão mesma, em que o quefazer é práxis, todo fazer do quefazer tem de
ter uma teoria que necessariamente o ilumine. O quefazer é teoria e
prática. É reflexão e ação (FREIRE, 2016, p.145).
A partir desse entendimento, a transformação não se efetiva apenas na prática, mas
se funda em um processo dialético onde ação e reflexão se complementam continuamente.
A dinâmica da transformação pauta-se em matrizes que sustentam tanto a teoria
como a prática e, analisando as matrizes da educação do campo é possível perceber
elementos da educação popular, fortalecendo ainda mais a relação entre ambas. Entre tais
elementos destacamos aqui os discutidos por Ramos; Moreira e Santos (2004) que são: o
papel da escola enquanto formadora de sujeitos articulada a um projeto de emancipação
humana; a valorização dos diferentes saberes no processo educativo; valorização dos
espaços e tempos de formação dos sujeitos da aprendizagem; a escola vinculada à
realidade dos sujeitos.
Pensar a escola enquanto formadora de sujeitos, articulada a um projeto de
emancipação humana é situá-la numa proposta de libertação, de conquista de direitos e
acima de tudo de respeito à história, às origens de cada sujeito e por assim ser não é
possível aceitar uma educação planejada na cidade e executada no campo, sem nenhum
vínculo com este espaço e com as pessoas que moram nele. Nesse sentido, Arroyo (2004,
p.80) ressalta que:
Quando situamos a educação como um processo de transformação
humana, de emancipação humana, percebemos quanto os valores do
campo fazem parte da história da emancipação humana. Então como a
escola vai trabalhá-los? Será que a escola vai ignorá-los? Será suficiente
pegar o livro da cidade e apenas adaptá-lo? A questão é mais fundamental,
é ir às raízes do campo e trabalhá-las, incorporá-las como uma herança
coletiva que mobiliza e inspira lutas pela terra, pelos direitos, por um
projeto democrático e que também pede educação.
E em um projeto de educação democrático, as pessoas precisam ter o direito à voz
garantido, pois, “ninguém vive plenamente a democracia nem tampouco a ajuda crescer,
70
primeiro, se é interditado no seu direito de falar, de ter voz, de fazer o seu discurso crítico;
segundo, se não se engaja, de uma ou de outra forma, na briga em defesa desse direito, que,
no fundo, é o direito de atuar (FREIRE, 1993, p.88).
O engajamento na luta pelos direitos é um princípio básico tanto na educação do
campo, como na educação popular, isso porque engajar-se é uma necessidade primordial
para todo aquele que busca construir um projeto emancipador.
Outro elemento indicado é a valorização dos diferentes saberes no processo
educativo e refere-se à diversidade de conhecimento, de experiências e dos saberes. Para
tanto, é necessário conceber o educando como aquele que aprende e que também ensina,
numa relação dialógica com o educador. Essa relação é possível na medida em que o
educador se coloca também na condição de aprendiz e concebe os educandos como:
[...] sujeitos de saberes historicamente construídos, não necessariamente
científicos, mas portadores de conteúdo socialmente útil e válido porque
construído na interação entre seres humanos e entre ser humano e
natureza, na busca de soluções para seus próprios problemas e desafios. A
educação do campo deve considerá-la como instrumento de alto valor
educativo, especialmente pela natureza rica e diversa de conhecimentos
identificados no campo (Ramos; Moreira; Santos, 2004, p.38).
Quando a escola tem um projeto de valorização dos diferentes saberes, educadores
e educandos participam ativamente do processo ensino e aprendizagem e ambos expõem
aquilo que sabem e reformulam esse saber. Deste modo, a escola se transforma, transforma
as pessoas e “supera a tradicional visão segundo a qual alguns sabem e outros aprendem. O
importante é participar criativamente em atos de conhecimento. Não se compreende, então,
Educação como um banco de dados, mas sim como uma série de envolvimentos”
(FREIRE, 2014, 87).
Se há a valorização de saberes, há também valorização dos espaços e tempos de
formação dos sujeitos da aprendizagem, sobretudo porque é difícil imaginar que o processo
educativo acontece apenas em um único espaço, ele ficaria restrito a espaços formais, salas
fechadas, mas concebê-lo assim é desrespeitá-lo em sua totalidade, é não compreendê-lo
enquanto processo constituído por diferentes pessoas, momentos e espaços, além de ser
uma concepção fragmentada, haja vista que a educação está envolvida nas diversas
dimensões da sociedade.
71
Na educação do campo e nas propostas de educação popular, os saberes são
construídos em “formas livres, familiares, vicinais, comunitárias de trocas de
conhecimentos imersas em outras práticas sociais, como as que vão do trabalho na lavoura
aos ofícios de ferro do catolicismo popular” (BRANDÃO, 2012, p.60).
Não se pretende com isso negar a importância da escola e sim reforçar que ela é
apenas um dos espaços onde a educação se efetiva e, é nesse sentido que Ramos, Moreira e
Santos (2004) ressaltam que a escola é o espaço de organização e síntese das
aprendizagens e de produção de novas formas de conhecimentos a partir dos
conhecimentos que os educandos já possuem.
As práticas da educação do campo e da educação popular buscam sustentação
também no princípio de vínculo da escola à realidade dos sujeitos, estritamente necessário
para que a educação não seja feita aos moldes de um lugar e executada em outro, como por
muito tempo acontecia no espaço rural. Freire enfatiza que trazer a realidade dos
educandos para à escola é respeitar o que os alunos vivenciam cotidianamente e diante
disso questiona: “Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva
associar a disciplina cujo conteúdo se ensina?” (FREIRE, 2016, p.32).
Com esse vínculo, possibilita-se aos educandos uma reflexão sobre o lugar onde
vivem e consequentemente a transformação desse lugar, isso é possível na medida em que
a realidade é tomada como referência e segundo Ramos, Moreira e Santos (2004, p.38) “a
realidade não se limita ao espaço geográfico, mas que se refere, principalmente, aos
elementos socioculturais que desenham os modos de vida desses”.
72
4 PRÁTICAS PEDAGÓGICAS: APROXIMAÇÕES COM A EDUCAÇÃO DO
CAMPO NA ESCOLA VOVÓ VINA, SANTA RITA-PB
Este capítulo consiste na análise dos dados empíricos da pesquisa. Trataremos no
primeiro momento em conhecer o território em que a pesquisa foi desenvolvida, no
contexto macro. Em um segundo momento, apresentaremos de forma detalhada o lócus da
pesquisa, concluindo com a análise das práticas pedagógicas desenvolvidas na Escola
Vovó Vina.
4.1 Conhecendo o Território de Santa Rita
O município de Santa Rita, localizado no estado da Paraíba, no cerne de sua história,
tem origem exclusivamente rural/agrária, se confundindo, nesse sentido, com o inicio da
história do Brasil.
A origem da ocupação pela força deste espaço, da hoje chamada cidade de Santa
Rita, aconteceu em meados de 1588, logo após a fundação da cidade de João Pessoa, em
1585, pelo português Frutuoso Barbosa (1585-1591). Nesta terra, viviam indígenas das
tribos tabajaras e potiguaras, que resistiram à invasão dos portugueses do seu espaço,
sendo este, um momento de grandes conflitos.
Nesta época foi erguido o primeiro Forte da região, o Mirante do Atalaia, o Forte
Velho, que servia como ponto de observação dos Portugueses para identificarem possíveis
piratas franceses em busca do pau brasil.
Foto 01: Pedra do Atalaia – Santa Rita-PB
Fonte: http://trilhasdospotiguaras.pb.gov.br/pt-br/historia/atalaia-do-forte-velho, 2020.
73
Para a caracterização da história do território „santaritense‟, senti dificuldades em
encontrar registros sobre o inicio dessa história, a partir de um olhar para organização do
modo de vida das comunidades nativas, pois a história nos deixa com essa lacuna ao contar
os fatos a partir do colonizador.
O primeiro núcleo não nativo se instalou no século XVI, décadas antes da fundação
de Filipéia, conhecido como feitoria do Forte Velho (um dos primeiros entrepostos
comerciais - junto a Baía da Traição - na América Portuguesa de normandos e bretões).
Segundo Elias Herckmans (1886), o forte velho foi totalmente destruído pelos espanhóis e
portugueses, aliados aos tabajaras para evitar uma nova investida contra os assentamentos
ibéricos, na margem oriental da reentrância flúvio-marítimas, pouco a norte da costa.
Paralelo a esta edificação, os portugueses construíram o Engenho Real Tibiry, nas
proximidades onde hoje fica os bairros de Várzea Nova e Tibiry Fábrica. Tratava-se de um
engenho de alta tecnologia para a época, movido à água. O nome Tibiry deriva de uma
tribo indígena que habitava essa região.
O município de Santa Rita originou-se de acampamento de nativos, colonos,
exploradores, comerciantes, criadores e até tropas militares. Foi construído no local então
conhecido como Tibiry, o Forte de São Sebastião (1771) e próximo a ele foi edificada a
capela que, juntamente com o primeiro engenho de açúcar, se tornaram o marco para a
formação do povoado.
Segundo Aguiar (1985), o distrito de Santa Rita foi criado pela Lei provincial nº 2,
de 20 de Fevereiro de 1839. O município foi declarado como tal pelo Decreto Estadual nº
10, de 19 de março de 1890 e Antônio Gomes Cordeiro de Melo foi nomeado Presidente
do Conselho de Intendência Municipal, cargo equivalente ao de Prefeito Constitucional.
Suprimido este, posteriormente a Lei Estadual nº 79 de 24 de Setembro de 1897 o
restaurou, firmando Santa Rita como território desmembrado da cidade de Paraíba. A sede
municipal recebeu foros de cidade pela Lei Estadual nº 613, de 3 de Dezembro de 1924,
que novamente extinta foi restaurada pelo Decreto Estadual nº 352, de 28 de dezembro de
1932.
[...]Instalada esta intendência resta-me congratular-me com todos os nossos
concidadãos por tão feliz acontecimento, motivando a segurança de que
todos sem distinção concorrerão na razão de suas forças para o progresso e
engrandecimento deste rico município. Está instalada a intendência
municipal da vila de Santa Rita. Viva a República dos Estados Unidos do
74
Brasil. Viva o generalíssimo chefe do Poder Executivo, viva o Governador
deste Estado, Viva a Vila, o município de Santa Rita e seus habitantes.
Antônio Gomes Cordeiro de Melo (Santa Rita/PB,29/03/1980)
De acordo com Aguiar, (1985), é de suma importância lembrar que o Jornal “A
Gazeta da Parahyba” de 22 de março de 1890, página 2, arquivado ao acervo do Instituto
Histórico e Geográfico da Paraíba (IHGP), informou a notícia da emancipação política de
Santa Rita, em 19 de março de 1890, através do Decreto nº 10, publicado igualmente
naquele diário e bem assim registrou também na edição de 01 de abril de 1890 que o
referido município foi instalado no dia 29 de março de 1890.
Cidade histórica localizada junto à capital do estado, Santa Rita foi palco da
implantação dos primeiros engenhos de cana-de-açúcar na Paraíba. A prosperidade
canavieira possibilitou que muitas casas, igrejas, capelas e outros monumentos em estilo
arquitetônico barroco fossem erguidos, os quais ainda hoje remontam a essa época. Os
registros dessa história nos mostram a exploração da terra como objeto de riqueza e
crescimento econômico dos colonizadores.
A população de Santa Rita fora dos engenhos deu-se início dentro de um
acampamento de tropas, ou ponto de partida, ou estacionamento de comboios de
almocreves de matutos, tendo sido a atual cidade, primeiramente, um local de "pouso" das
pessoas que viajavam da capital da Província para o interior, e vice-versa, onde,
geralmente, pernoitavam. Naquele tempo, efetivamente, para se ir à capital da Província,
fazia-se um grande rodeio, contornando o vasto alagadiço existente entre Santa Rita e
Tibiri, para então alcançar a Estrada de Manênma que ligava o Engenho Tibiri à Paraíba. A
pousada aí, portanto, era uma necessidade. Foi, justamente, nesse "pouso", que surgiram as
primeiras habitações.
O distrito foi criado com a denominação de Santa Rita através da Lei provincial nº
2, de 20 de fevereiro de 1839. Já o município foi declarado como tal pelo Decreto estadual
nº 10, de 19 de março de 1890, no qual Antônio Cordeiro Gomes de Melo foi nomeado
Presidente do Conselho de Intendência Municipal, cargo equivalente ao de Prefeito
Constitucional.
Suprimido este, posteriormente a Lei estadual nº 79 de 24 de setembro de 1897 o
restaurou, firmando Santa Rita como território desmembrado da cidade de Paraíba. A sede
municipal recebeu foros de cidade pela Lei Estadual nº 613, de 3 de dezembro de 1924,
75
que novamente extinta foi restaurada pelo Decreto Estadual nº 352, de 28 de dezembro de
1932.
Com isso a cidade teve seu total crescimento fora dos engenhos no centro, perto da
Basílica de Santa Rita. Praças foram construídas, prefeitura, biblioteca até um cinema, a
cidade ganhou e por falta de investimento do governo, Santa Rita poderia ser uma cidade
padrão Campina Grande. Inicialmente apenas com a sede, sofreu diversas reformulações
administrativas chegando em 1959 a contar com os distritos de Livramento, Lucena e
Bayeux.
Desse ano em diante perdeu os distritos de Bayeux (1959) e Lucena (1961). A
padroeira do município é Santa Rita de Cássia, divindade do catolicismo e tem como
Prefeito atual, (Junho de 2015), o advogado Reginaldo Pereira da Costa.
Ilustração 03 – Mapa Brasil, Paraíba e Santa Rita/PB.
Fonte: DANTAS (2017, p. 58)
O referente município fica situado, na Região Metropolitana de João Pessoa e/ou
Macrorregião da grande João Pessoa. Geograficamente pertence à Mesorregião da Mata
Paraibana, faz divisa ao norte com os municípios de Capim (28km), Rio Tinto (36km), e
Lucena (27km); ao sul com Pedras de Fogo (34km), Alhandra (45km) e Conde (18km); ao
leste João Pessoa (11km), Bayeux (7km) e Cabedelo (23km); ao Oeste Sapé (27km) e
Cruz do Espírito Santo (12km).
De acordo com o IBGE, Censo Demográfico de 2019, sua população estimada em
136.586 habitantes, distribuídos em 727,847 km² de área, representando 1,29% (um
vírgula vinte e nove por cento) da superfície do Estado e com uma densidade demográfica
de 165,52 (hab/km²).
76
Santa Rita é também conhecida como a cidade dos canaviais, pela grande produção
de cana de açúcar. O município é identificado no Banco de Informações do IBGE através
do código 2513703, reconhece sua população naturalizada com o Gentílico “Santaritense”.
É o terceiro município do Estado em população e em número de eleitores, o segundo em
extensão territorial e o segundo maior produtor de abacaxi da Paraíba.
Em virtude de seu distrito industrial, atualmente o município é detentor da quarta
maior economia do estado, com um PIB per capita de 16.239,26 mil reais, no ano de 2017,
segundo o IBGE, após a capital, Campina Grande e Cabedelo. O município apresenta o
maior número de fontes de águas minerais do estado da Paraíba, por isso também é
conhecida como "cidade das águas minerais".
A sede do município fica a uma altitude aproximada de 16 metros do nível do mar.
O município tem belas colinas verdejantes, cavernas, vales profundos similares a cânions
rasgando os tabuleiros fluviais do sertão, denominados por alguns como falésias "mortas"
revestidas por densa vegetação de baixa latitude, gerando um microclima divergente do
encontrado em zonas menos verdes.
A vegetação é predominantemente do tipo floresta tropical do tipo atlântica,
Vegetação Pioneira, Campos e Mata de Restingas, Manguezais e Mata Úmida, com partes
de floresta e cerrado. De modo geral, os solos são profundos e de baixa fertilidade natural.
Santa Rita encontra-se inserido nos domínios das bacias hidrográficas dos rios Paraíba
(região da Várzea Paraibana), Miriri e Gramame. Todos os cursos d‟água têm regime de
escoamento perene e o padrão de drenagem é o dendrítico. Os principais corpos de
acumulação d'água são os açudes e lagoas.
O município tem saída para o mar através do estuário do Rio Paraíba. Nessa região
situam-se várias ilhas, entre elas se destacam duas pertencentes ao município: Ilha Stuart e
Ilha Tiriri. Os corpos d'água do município são: Rios: Cabocó, Camaço, Engenho Novo,
Estiva, Gargaú, Gramame, Jaburu, Mamuaba, Mangereba, Miriri, Mumbaba, Paraíba,
Paroeira, Pau-Brasil, Preto, Soé, Tapira, Tibiri, Una.
Seus principais açudes são: Gargaú, Miriri, dos Reis, Tibiri. É notável a presença de
lagoas como: Barriga Cheia, (do) Paturi, Seca de Baixo, Seca de Cima, Tibiri e Zumbi, e
os riachos : Água Branca, Bambu, Bibira, riacho do Boi, riacho do Cesto, Dois Rios,
riacho da Estiva, Jacaraúna, Jacuípe, Japungu, Laminha, Mangabeira, Miriri, Obim,
Palmeira, Pau-Brasil, riacho das Pedras e Pilão.
77
O clima do município de Santa Rita é do tipo tropical chuvoso, com verão seco. O
período chuvoso tem início em janeiro e término em setembro, concentrando-se entre abril
e julho.
4.2 Caracterização da situação educacional do campo no Município de Santa Rita-PB
Este espaço expressa elementos de variáveis econômicas, políticas, culturais e
sociais que constituem o ambiente de vida da classe trabalhadora. O espaço agrário
abordando esses elementos se configuram como espaço de exploração considerando seu
processo histórico do ponto de vista do trabalhador. A vida no campo apresenta diferentes
momentos do processo de acumulação do capital na agricultura.
O município de Santa Rita-Pb possui grande extensão territorial rural, tendo
atualmente nesta área 23 escolas de Ensino Fundamental, destas 15 são seriadas e 08
multisseriadas, contando ainda com 06 CIEI‟s (Centro Integrado de Educação Infantil) que
atendem crianças de 1 ano e 06 meses a 5 anos, contabilizando cerca de 5.000 crianças e
jovens residentes nas comunidades rurais atendidos pelo município. (dados coletados na
SME, 2019)
No quadro a seguir identificamos as escolas localizadas na zona rural e sua divisão
por pólos, esses polos são organizados pelas proximidades geograficas das escolas.
Quadro 04: Relação das escolas da zona rural organizadas por polos
Nº POLO I LOCALIZAÇÃO
1. EMEF ARNALDO BONIFÁCIO Odilândia
2. EMEF TARCISIO DE M. BURITY Odilândia
3. EMEF DEP. FLAVIANO R. FILHO Cicerolândia
4. EMEF VOVÓ VINA Taquarituba
5. EMEF PROF. JOAQUIM TORRES Fazenda Águas Turvas
6. EMEF RITA DE CÁSSIA A. MESQUITA Cidade Verde
7. EMEF FAZENDA SOCORRO Usina São João
8. CIEI JOÃO MOREIRA Odilandia 9. CIEI MARIA ANUNCIADA Cicerolandia Nº POLO II LOCALIZAÇÃO
1. EMEF AMBRÓSIO F. BRANDÃO Pirpiri
2. EMEF GIBSON MAUL Bebelândia
3. EMEF ATERRO Aterro
4. EMEF PRESIDENTE JOÃO SUASSUNA Sítio Utinga
5. EMEF AMARO G. COUTINHO Livramento
78
6. EMEF PADRE PIRES FERREIRA Livramento
7. EMEF ZULMIRA MAUL Ribeira de Baixo
8. EMEF EULINA XAVIER Forte Velho
9. CIEI JOSÉ CÂNDIDO Livramento 10. CIEI PROFESSOR NERY Bebelandia 11. CIEI DONA RITA Forte Velho Nº POLO III LOCALIZAÇÃO
1. EMEF ARNÓBIO MAROJA Fazenda Engenho do Meio
2. EMEF PROFESSORA CÂNDIDA DE SÁ Fazenda Pitombeira
3. EMEF FLAVIANO RIBEIRO COUTINHO Usina Agroval
4. EMEF PAULO JORGE R. LIMA Lerolândia
5. EMEF EMÍLIA C. DE MORAIS NETA Lerolândia
6. EMEF ZILDA VELOSO FALCÃO Fazenda Tapira
7. EMEF JAPUNGU Japungu 8. EMEF SANTA EMÍLIA Destilaria Miriri
9. CIEI RAQUEL PEDROSA Lerolandia
Fonte: Secretaria de Educação do município de Santa Rita-PB, 2019.
Estas comunidades que compõem essas diferentes áreas, trabalham com a cana de
açúcar, abacaxi, psicultura, e pequenos agricultores familiares, formando um campo
diversos em suas diferentes áreas.
De acordo com dados disponíveis no site qeduc, as escolas mencionadas,
localizadas no Campo da rede municipal de Santa Rita-PB, atendem a diferentes demandas
do quantitativo de matriculas, distribuídos nas seguintes etapas de ensino e modalidades:
creches, pré-escolas, ensino fundamental anos inicias e finais, Educação de Jovens e
Adultos e a Educação Especial.
Tabela 01: Matriculas das escolas da zona rural da rede municipal de Santa Rita-PB
MATRICULAS
Matriculas em creches 255 estudantes
Matriculas em pré-escolas 649 estudantes
Matriculas anos iniciais 2.093 estudantes
Matriculas anos finais 966 estudantes
Matrículas EJA 422 estudantes
Matriculas educação especial 214 estudantes
Total 4.599 estudantes
Fonte: Censo Escolar/INEP 2018/ QEdu.org.br
Visualizamos um quantitativo significativo de matriculas nos anos iniciais do
ensino fundamental e sua descrecencia nos anos finais. Um dos fatores para esta situação,
seria um quantitavo reduzido de escolas que oferecem o ensino fundamental anos finais,
79
pois das 23 (vinte e três) escolas localizadas no Campo, apenas 07 (sete) oferecem o ensino
fumdamental anos finais.
Os alunos assistidos na rede municipal de ensino de Santa Rita, são avaliados pelo
Indice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, que faz uma analise e sinaliza os
indicadores de qualidade por escola de cada municipio.
Segundo o Indice de desenvolvimento da Educação Básica de 2017, nos anos
iniciais da rede municipal cresceu, mas não atingiu a meta e não alcançou 6,0, sendo sua
nota igual a 3,8, tem o desafio de garantir mais alunos aprendendo e com um fluxo escolar
adequado. Já nos anos finais não atingiu a meta, teve queda e não alcançou 6,0. Precisa
melhorar a sua situação para garantir mais alunos aprendendo e com um fluxo escolar
adequado, sua nota foi 3,0.
O panorama geral do minicípio na área da Educação em uma visão dos
indicadores do INEP, mostram que se faz necessário melhorias no âmbito acadêmico dos
alunos, porém compreendemos que este não é o único indicador de qualidade das escolas,
pois existem variáveis que vão além das questões pedagógicas, e essas precisam ser
refletidas nesse processo.
4.3 O chão da Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Vovó Vina
Foto 02: Escola Vovó Vina – Santa Rita/PB
Fonte: Arquivo da pesquisadora, 2019
A escolha por esta escola se deu a partir de visitas às escolas localizadas na zona
rural do município de Santa Rita, junto com a equipe pedagógica da secretaria de educação
80
do município citado. Durante as visitas percebi que na Vovó Vina, em suas práticas
pedagógicas observadas através de registros fotográficos, relatórios de atividades,
planejamentos e projetos da equipe pedagógica, indícios de elementos que se aproximavam
da proposta da Educação do Campo. Outro fator importante, foi a aceitação da equipe
escolar em participar da pesquisa através das entrevistas, observação das atividades da
escola, acesso aos documentos da instituição. Também identifiquei que existiam
profissionais que buscaram por conta própria formação específica sobre a Educação do
Campo.
A fotografia 01 foi um registro feito durante a primeira visita a Escola Municipal de
Educação Infantil e Ensino Fundamental Vovó Vina.
Foto 03- Caminho da Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino
Fundamental Vovó Vina em Santa Rita-PB, 2018.
Fonte: Arquivo da pesquisadora, 2018.
A Escola Vovó Vina fica localizada no campo do campo do município de Santa
Rita, mais precisamente na Granja São Luiz S/N, na comunidade de Taquarituba, Zona
Rural do município de Santa Rita , Estado da Paraíba, foi fundada em 30/05/1994 através
do decreto nº 10/94, Resolução 086/2004, parecer 077/2004. Integrada ao Sistema
Municipal de Educação do Município de Santa Rita/PB.
A Escola Municipal Vovó Vina, tem como entidade mantenedora a prefeitura
municipal de Santa Rita, localizada a R. Juarez Távora, 93 - Centro, Santa Rita - PB,
58300-410 , inscrita sob CNPJ nº 09159666/0001-61 . A instituição possui um prédio
81
cedido. A escola funciona numa capela pertencente à uma granja de propriedade do casal,
Artur Bernardes e Maria José Soares (Dra. Lila) e em outras salas que foram construídas
para abrigar as salas de aula.
A região em que fica localizada a escola, faz divisa com os Municípios do Conde e
Alhandra. O Território da comunidade é loteado por granjas (propriedade rural destinada
ao lazer aos fins de semana por seus proprietários e familiares), alguns lotes deste território
são destinados ao plantio de abacaxi e coco, havendo ainda três propriedades que possuem
pequenas empresas: criação de aves (frango) para o abate, criação de codornas para
produção de ovos e abate, além de envase de água de coco.
A escola Vovó Vina, atende as crianças filhas(os) dos moradores destas granjas e
de ex-alunos residentes na comunidade vizinha, chamada de Cicerolândia.
Atualmente a estrutura física da escola possui 03 (três) salas de aulas, espaços que
foram adaptadas para funcionar como salas de aulas, 02 (dois) banheiros, um pequeno
espaço destinado ao armazenamento de livros, uma cozinha e dispensa, além de uma área
coberta onde as crianças fazem as refeições.
Tabela 02 - Quadro demonstrativo com números de dependências físicas – 2019
AMBIENTES FUNCIONA NÃO FUNCIONA
SALA DE AULA 03 -----
SALA MULTIFUNCIONAL ---- 01
REFEITÓRIO 01 -----
BANHEIROS DE MENINAS 01 ----
BANHEIROS DE MENINOS 01 ----
COZINHA 01 ----
PÁTIO 01 ----
DEPÓSITOS 01 ----
Fonte: Arquivo da pesquisadora, 2019
A escola atende um público de 68 estudantes matriculados nas etapas da Educação
Infantil ao 5º ano do Ensino Fundamental no turno da manhã. O modelo de organização
das turmas são multisseriadas. As classes multisseriadas são uma forma de organização de
ensino na qual o professor trabalha, na mesma sala de aula, com várias séries/anos
simultaneamente, tendo de atender a estudantes com idades e níveis de conhecimento
diferentes. No quadro a seguir, informamos a distribuição das turmas e a quantidade de
estudantes:
82
Tabela 03: Quadro demonstrativo de estudantes matriculados.
Anos Nº de Estudantes matriculados por ano Nº de estudantes
Infantil IV e V IV – 5 / V – 15 20 estudantes
1º, 2º e 3º anos 1º - 7 / 2º - 7 / 3º - 10 24 estudantes
4º e 5º anos 4º - 14/ 5º - 10 24 estudantes
Total 68 estudantes
Fonte: Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Vovó Vina, 2019.
O quandro mostra que na sala de aula da Educação Infantil, atende a
estudantesreferentes ao Infantil IV e V, sendo 5 estudantes matriculados no Infantil IV e 15
estudantes matriculados no Infantil V, compondo um total de 20 estudantes matriculados.
A outra sala de aula corresponde a composição de uma turma que atende a estudantes do
1º, 2º e 3º anos, sendo 7 estudantes matriculados no 1º ano, 7 estudantes matriculados no 2º
ano e 10 no 3º ano, com o quantitivo total de 24 estudantes matriculados. A terceira sala de
aula, atende aos alunos do 4º e 5º anos, sendo 14 estudantes matriculados no 4º ano e 10
estudantes matriculados no 5º ano, compondo uma turma com 24 estudantes matriculados.
Configurando um número total de 68 estudantes matriculados.
O trabalho pedagógico é realizado através do trabalho seriado, trabalhando
conteúdos de acordo com o ano que o estudantes foi matriculado, e em paralelo a este
trabalho exite o trabalho com projetos temáticos com seus períodos determinados.
Identificamos nas falas das participantes da entrevista e nos registros do planejamentos os
seguintes projetos que são desenvolvidos na escola:
Quadro 05: Projetos da Escola Vovó Vina
TEMÁTICAS PERÍODO
Água Bimestral
Identidade Bimestral
Alimentação Bimestral
Higiene e saúde Bimestral
Projeto de leitura Anual
Meio Ambiente Anual
Horta Anual
Fonte: Arquivo da pesquisadora (2019)
A Educação Infantil trabalha os direitos de aprendizagens, a oralidade, a
criatividade através da ludicidade e construção, atendendo as competências mencionadas
83
na BNCC (Base Nacional Comum Curricular). No Ciclo de Alfabetização, assim como nos
4º e 5º anos as professoras organizam as salas por grupos, duplas ou enfileirados no dia a
dia, e a utilização dos espaços fora da sala de aula dependerá da atividade realizada,
havendo ainda alguns projetos executados no decorrer do ano. Todas as profissionais
relatam sentir dificuldade em trabalhar com as turmas Multisseriadas.
Pelo território da comunidade está dividida em granjas, a escola acolhe crianças,
advindas de vários municípios paraibanos e até mesmo de outros estados, são famílias de
agricultores que fogem da fome e da seca buscando emprego assalariado, havendo um
fluxo constante de crianças que chegam e saem da comunidade, pois estes dependem da
adaptação de suas famílias ao novo modo de vida. Os educandos utilizam transporte para
chegar à instituição de ensino, hoje realizado pelo ônibus escolar do Programa Federal
caminhos da Escola.
Seu quadro Funcional é composto por três professores, uma supervisora, uma
gestora, duas auxiliares de serviço e vigilante. Destes servidores apenas uma professora é
contratada os demais são concursados. Para apresentar o perfil destes profissionais
construímos o quadro abaixo de acordo com a categoria.
Quadro 06: Perfil das professoras, supervisora e gestora da escola Vovó Vina
Modalidade
de Ensino que
atua
Tempo
de
atuação
Formação Pós-Graduação Formação
complementar
Local de
Moradia
Infantil 05 anos Pedagogia *** SME-
Departamento de
Educ. Infantil
Taquarituba
Ciclo de
alfabetização
20 anos Pedagogia Supervisão
Escolar
Educar pra valer João Pessoa
4º e 5º ano 08 anos Pedagogia Supervisão
Escolar
Extensão em Educ.
campo
João Pessoa
Gestora 17 anos Pedagogia Supervisão e
Psicopedagogia
Extensão em Educ.
campo
João Pessoa
Supervisora
Escolar
20 anos Pedagogia Supervisão e
Orientação
Escolar
João Pessoa
Fonte: Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Vovó Vina, 2019.
Quadro 07: Perfil da equipe de apoio da escola Vovó Vina
Função Tempo de
atuação
Formação Local de Moradia
Auxiliar de Serviços 24 anos Ensino Médio Águas Turvas
84
Fonte: Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental Vovó Vina, 2019.
A Escola possui Projeto Político Pedagógico, o exemplar disponibilizado é
referente ao ano de 2017, também nos foi informado que o mesmo está em processo de
reestruturação. O documento busca um diálogo dentro do que rege a proposta educacional
nacional vigente, porém não cita a Educação do Campo. Observamos que no mesmo é
exposta a preocupação de articular a vivência dos alunos, inserindo-os aos conteúdos
programáticos das aulas, respeitando e valorizando os saberes adquiridos culturalmente por
estes educandos.
Segundo relatos da gestora e registro no Projeto Político Pedagógico da escola, a
Escola Vovó Vina surgiu a partir da iniciativa de um casal, chamados de Artur Bernardes e
Maria José Soares (Dra. Lila), essa iniciativa partiu da sugestão do pároco que celebrava
missas, aos proprietários da fazenda em transformar o espaço da capela numa escola
durante a semana, devido às dificuldades das crianças em frequentarem a escola.
A capela foi construída nos finais de semana quando o casal trazia um pedreiro de
João Pessoa e seus filhos Artur e Rodrigo eram os ajudantes. A gestora em sua fala disse
que: “os meses passavam e a construção ia sendo finalizada, ao mesmo tempo o casal
Artur e Lila, iam percebendo a carência escolar das crianças da comunidade que não
estudavam ou tinham que andar muitos quilômetros até as Mumbabas para chegarem a
escola, resolvendo assim disponibilizar o espaço da capela para funcionar como escola
durante a semana”.
Assim no dia 08 de Dezembro de 1995, nasce a Escola Vovó Vina, que recebeu
este nome em homenagem à senhora Ambrosina (Vovó Vina) mãe de Dr. Artur, conforme
relato da Gestora (2019), esta assim define:
mulher guerreira como tantas outras que sempre incentivou seus filhos a
estudarem, sabendo que é através da Educação que nos tornamos senhores
do nosso destino. A Ideia da escola foi abraçada por toda comunidade, que
colaboraram com algumas cadeiras, livros como também a senhora Maria
das Dores (Dona Dorinha), uma das granjeiras, professora aposentada, se
dispôs a dá aula a 40 crianças inscritas, por se tratar de uma senhora de
idade o casal Artur e Lila disponibilizou um trator que iria buscá-la e
deixá-la todos os dias, eles também ofereciam o lanche para as crianças
Auxiliar de Serviços 21 anos Pedagogia Águas Turvas
Vigia 18 anos Pedagogia Águas Turvas
85
que era uma sopa deliciosa feita em fogo de lenha, surgindo assim a
tradição a sopa de Dona Deusa.
No PPP é colocado que a escola iniciou seu funcionamento de “forma social e
improvisada”, até que em 1996 foi realizada uma parceria com a Prefeitura Municipal de
Santa Rita, na pessoa do Prefeito Oildo Soares que entraria com uma pequena contribuição
financeira aos funcionários, material pedagógico, cadernetas, fichas de matrícula,
possibilitando assim os primeiros registros documentais da instituição. Seguem-se os anos
a escola é registrada no MEC tornando-se EMEIEF Vovó Vina.
4.4 Aproximações e distanciamentos dos princípios da Educação do Campo nas práticas
pedagógicas
Para a análise do material da pesquisa de campo e a definição das categorias
temáticas, busquei respaldo nas reflexões do referencial teórico desta pesquisa,
identificando os princípios pedagógicos da Educação do Campo nas práticas pedagógicas
da escola em estudo, onde estes princípios permeará e direcionará o tratamento dos dados,
considerando o contexto das discussões sobre trabalho e território.
Lembrando que estes princípios se fundamentam na Educação Popular, pois
compreendemos que “A educação popular surge como uma alternativa político-pedagógico
para confrontar-se com os projetos educativos estatais que não representavam ou até
afetavam os interesses populares.” (PALUDO, 2007, p.8).
As práticas pedagógicas das escolas do campo devem se orientar em princípios
norteadores pautados nos fundamentos da Educação Popular, que dão sustentação à
materialização do conceito de Educação do Campo. Conceito este já garantido legalmente
na Resoluão CNE-CEB 1/2002 e no Decreto 7.352 de 4/11/2010 que dispõe sobre a
política de educação do campo e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária -
PRONERA. Nesse sentido buscamos identificar no material coletado das práticas
pedagógicas desenvolvidas na Escola Vovó Vina, elementos de aproximação com os
princípios identificados.
86
A escola combina o trabalho pedagógico com aulas tradicionais centradas na
transmissão de conhecimentos, tendo o livro didático como principal material didático e
trabalha com projetos didáticos envolvendo determinados temas, com todas as turmas.
Nesses projetos as práticas pedagógicas são mais diversificadas com várias atividades
envolvendo a participação das professoras, equipe pedagógica e estudantes com um papel
mais ativo.
Foto 04: Atividade com alunos na área externa da escola.
Fonte: Arquivo da pesquisadora, 2018.
Na análise das entrevistas, organizamos as falas das colaboradoras que foram
entrevistadas, chamando-as de participantes e enumerando-as. Os relatos sobre suas
práticas pedagógicas foram organizados de acordo com os seguinte tópicos temáticos, o
primeiro corresponde ao vínculo com a realidade local, no qual buscamos perceber a
dimensão da identidade dos profissionais com o território em que a escola está inserida. O
segundo tópico, corresponde a organização pedagógica, neste buscamos identificar as
práticas existentes na escola lócus da pesquisa, e o terceiro tópico temático, corresponde ao
trabalho pedagógico de acordo com a realidade local, neste buscamos identificar as
aproximações das práticas da escola com os princípios da Educação do Campo.
Vínculo com a realidade local
Uma das primeiras questões da entrevista foi com relação ao vínculo com a
realidade local das professoras participantes da entrevista, sua relação com o trabalho e
com a comunidade onde está situada a escola. Nesse sentido, analisaremos nas falas das
87
profissionais, sua relação com as atividades vivenciadas no território que está situada a
escola, percebendo este vínculo com o território do campo, através do relato de suas
memórias, no sentido de se reconhecerem enquanto sujeitos pertencentes a este espaço, e
das suas práticas compromissadas com o projeto da Educação do Campo.
Diante disso, percebemos nas falas da maioria das participantes da entrevista, a
relação de seu vínculo com a comunidade escolar, por meio das suas próprias histórias de
vida. Como relata a participante 03:
A minha relação com a escola é bem antiga. Há 24 anos atrás minha mãe
trabalhava aqui, e ela não tinha com quem me deixar. [...] Então, eu criei,
me criei dentro da escola, no âmbito escolar Vovó Vina. Minha relação
com a escola, realmente, é desde novinha. (Participante 03, 2019)
Assim como a participante 03, as participantes 02 e 05, expressam em suas falas a
ligação com o Campo, resgatando em sua memórias, vivências de suas infâncias na zona
rural:
Eu sou de sítio, morei em João Pessoa desde de muito pequena, mas a
minha infância foi em sitio, então quando eu cheguei aqui me senti em
casa. Minha primeira experiência de trabalho em escola foi em sitio, na
escola que estudei eu trabalhei. (Participante 02, 2019)
Eu nasci na zona rural, trabalhar aqui me faz lembrar da minha vida
durante minha infância, é como um resgate afetivo. (Participante 05, 2019)
A participante 04, expressa em seu relato o sentido de pertencimento à comunidade
onde está situada a escola e o vínculo da família com a escola.
[...] A nossa história se mistura. A história familiar com a história da escola
é uma mistura. (Participante 04, 2019)
Este vínculo dos profissionais da instituição escolar Vovó Vina com a realidade
local, contribui na construção da identidade territorial e do pertencimento ao lugar de
vivência, para o desenvolvimento da proposta pedagógica considerando a identidade com a
comunidade local, se faz necessário identificar nos sujeitos esse processo de construção da
identidade territorial.
88
Como diz Medeiros (2009, p. 217) o “território é um espaço de identidade ou de
identificação. O sentimento é sua base”. Nesse sentido, há necessidade de analisar a escola
do campo integrada à comunidade na qual está inserida.
Neste espaço, percebemos que essa identificação não acontece de forma unânime
com todos os profissionais da escola, pois a fala da Participante 01 (2019), diz o seguinte:
“eu não conheço a vivência da escola [...]. A gente reclama, e ao mesmo tempo, a gente
é… quando se faz com… faz o que você gosta, todas as dificuldades conseguem ser
superadas.”. A P1 afirma que não tem ligação com a comunidade, porém gosta do trabalho
que faz, ou seja, nas falas das interlocutoras participantes da pesquisa existem situações
diferenciadas no que se refere ao vínculo com o trabalho e a vivencia com a escola e a
comunidade, desde a P1 que não tem ligação com a comunidade e a escolha pelo local de
trabalho se deu mais por conveniência em relação à proximidade com seu local de moradia
a com a escola, mas gosta do trabalho que faz. Noutra situação temos a participante 3 que
tem um vínculo antigo e familiar com a escola.
Considerando que a maior parte das participantes da entrevista se identificam com
o território no qual está localizada a escola, nos inquietamos para identificar se essa relação
de pertencimento com a comunidade escolar tem relação com o projeto de Educação do
Campo. Nesse sentido, buscamos entender como acontecem as práticas pedagógicas da
escola Vovó Vina através da sua organização pedagógica.
Organização pedagógica
Optamos por entender a prática pedagógica desenvolvida na escola por meio da
organização pedagógica, pois a concepção de prática pedagógica adotada neste trabalho
está baseada no conceito construído por Souza (2009) que envolve não só a sala de aula,
mas a participação de todas e todos que estão inseridos no contexto escolar. Portanto, a
práxis pedagógica segundo Souza (2009, p. 27) é entendida
como realização de um currículo por meio das relações e ações que se
dão entre os sujeitos em suas práticas. Sujeito educador (prática
docente). Sujeito educando (prática discente). Sujeito gestor (Prática
gestora). Esses sujeitos, em suas ações e relações, serão sempre
89
mediados pela construção dos conteúdos pedagógicos ou de
conhecimentos (prática gnosiológica e/ou epistemológica).
A partir da identificação das práticas pedagógicas da escola em estudo, buscamos
compreender sua organização através das falas das participantes da pesquisa,
complementando e dialogando com os dados da observação que foram registrados no
caderno de campo, no sentido de captar as relações que estas práticas estabecem com os
princípios da Educação do Campo, já elencados neste texto.
O documento intitulado “Referências para uma Politíca Educacional de Educação
do Campo” (MEC, 2003) ao situar os princípios da Educação do Campo, entende que os
princípios pedagógicos não são apenas construídos em sala de aula, mas também da
realidade dos sujeitos, “não são apenas os saberes construídos na sala de aula, mas também
aqueles construídos na produção, na família, na convivência social, na cultura, no lazer e
nos movimentos sociais.” (MEC, 2003, p. 38). Ou seja, na estrutura estabelecida na
comunidade, sobretudo, com olhar crítico, para assim construir consciência política.
Uma das participantes da entrevista relata sua rotina de trabalho colocando que:
Eu divido as atividades do primeiro ano, faço atividade do primeiro ano.
Do segundo e terceiro que estão iniciando na alfabetização é atividades
para alfabetizar, e os outros que conseguem ler as famílias simples, estou
trabalhando com as famílias complexas para avançar. Aí, é bem difícil.
Quando uma pessoa fica na sala fica perdida, porque você tem que saber
onde cada aluno está. Eu não vou poder dar a mesma atividade para todo
mundo. (Participante 01, 2019)
A fala da participante 01, retrata uma sala multisseriada, composta de alunos do 1º
ao 3º ano. Como vimos, esta desenvolve seu trabalho de forma seriada, onde tenta trabalhar
com conteúdos de acordo com o ano que o aluno se encontra, ressaltando sua dificuldade
em desenvolver esse trabalho, de acordo com a dinâmica metodológica adotada. Esta ainda
coloca que no seu trabalho em sala de aula, as áreas de conhecimento abordadas ficam
mais limitadas ao ensino da Linguagem e Matemática.
.
Com relação ao conteúdo, nesse momento agora você trabalha de acordo
com os níveis deles, você não segue. Assim, é história, geografia, ciências.
Eu trabalho, uma vez na semana, mas cada um com seu conteúdo. O
terceiro ano estuda o conteúdo do terceiro, segundo do segundo, o
primeiro do primeiro, de história, Geografia e ciências, aí, português,
90
matemática, eu vou de acordo do nível deles, porque não adianta colocar
um conteúdo do terceiro ano, se os meninos não conhecem os numerais até
20, entendes? (Participante 01, 2019)
Nessa fala acima observa-se que a professora relata uma defasagem de
aprendizagem dos estudantes em Português e Matemática, fazendo com que a professora
tenha que trabalhar conteúdos do ano anterior considerando que eles não acompanham o
conteúdo da ano que está cursando.
No processo do desenvolvimento de sua prática pedagógica, a participante 01
expressa o não uso do livro didático enquanto recurso, justificando que o nível de
aprendizagem dos estudantes se encontra em uma fase elementar, sendo os livros
inadequados ao nível dos estudantes.
[...] é tanto que o livro de Português e Matemática, eu quase não estou
usando, porque tem que esperar eles aprenderem alguma coisa para
fazer, porque os meninos do primeiro ano, eles só conhecem as letras de
forma. Todos têm livros, todos os livros, aí, o problema dos livros é esta
questão, porque eles não acompanham o livro. (Participante 01, 2019)
A gente... deixa eu ver como eu digo, nós chegamos, organizamos a
turminha, por exemplo, a minha turma eu separo 1º ano nesse espaço, 3º
ano nesse espaço, então, cada um sabe qual é sua série e qual é seu espaço,
aí, a gente ora, faz uma oração, faz uma acolhida, faz uma música, uma
brincadeira para receber e para socializar também, né, dar um abraço, eee...
faz uma leitura deleite. A contação, geralmente eu conto porque eles não
leem e depois faz o desenvolvimento das atividades, normal. (Participante
01, 2019)
Percebemos a angústia da participante 01 com relação a aprendizagem dos
estudantes, no contexto da turma multisseriada, centrada na transmissão de conteúdos das
disciplinas, sem relacionar com o contexto de vida dos estudantes, conforme indica Costa
(2019, p. 42):
As práticas pedagógicas em escolas do campo multisseriadas devem aliar-
se às estratégias de ensino com outros espaços de aprendizagem que fazem
parte da vida dos atores sociais envolvidos em um exercício continuo de
pesquisa, de reflexão e de construção de conhecimentos.
91
Destacamos nesta citação a importância de dois elementos, pesquisa e reflexão. A
participante 01 em sua fala sobre as áreas de conhecimentos abordadas em sala de aula,
apresenta a forma do trabalho disciplinar, na divisão seriada dos conteúdos das diferentes
áreas de conhecimento. A mesma coloca que trabalha os conteúdos de história, geografia e
ciências, uma vez por semana, de acordo com o ano que o grupo de alunos estão inseridos
e a ênfase no ensino de Portugêse Matemática.
O relato desta professora sobre a compreensão da organização do trabalho
pedagógico que denota uma forma cartesiana do conhecimento, fragmentada por
disciplinas compartimentadas. No seu discurso percebemos os elementos da educação
tradicional, chamada por Freire (1987) de Educação Báncaria. Em que os estudantes de
formaa passiva têm que assimilar os conhecimentos transmitidos pela professora.
Entretanto, a fala não se refere a outras práticas pedagógicas que percebi nas
observações realizadas das atividades das desenvolvidas na escola, em que vivenciei o
desenvolvimento de projetos com diferentes temáticas, como: “Nossas raízes indígenas” ,
“Cultura Africana”, “Horta: Semeando saúde, plantando saberes e colhendo vínculos-
sociais”, dentre outros. Neste desenvolvimento destes projetos, visualizei um conjunto de
práticas envolvendo a interdiciplinaridade nas ações, embora que a interdisciplinaridade
não fosse percebida, ou seja, e explicitada no planejamento. Nessas experiências os
estudantes realizam pesquisas, participavam ativamente.
Fotografia 05: Projeto raízes indígenas Fotografia 06: Projeto raízes indígenas
Fonte: autoral (2019) Fonte: autoral (2019)
As imagens usadas, ilustram momentos do projeto que tratava da cultura indígena,
onde os alunos vivem diversas experiências que abordaremos no próximo tópico temático.
92
No relato da participante 02, percebemos uma dinâmica diferenciada na
organização do trabalho pedagógico desenvolvido em sala de aula, a mesma pontua na
metodologia do trabalho, ações integradas dos conteúdos na sala multisseriada, explorando
outros ambientes do espaço escolar, apesar de em alguns momentos o trabalho ser
desenvolvido na divisão dos estudantes por ano.
Geralmente começa com uma colhida, oração uma música, uma
brincadeira, depois a gente faz uma correção daquela tarefa que passou
para casa, depois a gente começa o conteúdo do planejamento que a gente
tem anual. Nesse inicio, vou rever os conteúdos anual do ano passado.....
Geralmente trabalho os projetos nas datas comemorativas, tipo meio
ambiente, na sala multisseriada eu trabalho tudo junto, geralmente eu
trabalho um conteúdo que dê para todos. (Participante 02, 2019)
No momento assim, eu gosto de procurar conteúdos que dê pra trabalhar
todos juntos. Procuro pegar conteúdos do 4º e 5º ano que dê para juntar.
Mas como vem o livro deles, ai eu tenho que separar. Ai na hora do
livro tem conteúdo só do 5º e só do 4º. Mas geralmente a sala é uma só, é
só quando precisa trabalhar em grupo, ai separo o 5º ano no grupo e 4º ano
no outro. A sala é pequena, um pouco apertada, mas a gente se ajusta. São
23 alunos. Se for para trabalhar com circulo, essas coisas, ai geralmente eu
vou pra outro espaço. Se eu precisar fazer um trabalho que precise de
espaço, tem esse espaço fora, ai eu saio. (Participante 02, 2019)
A participante 03, descreve sua rotina, e como desenvolve o trabalho pedagógico
com os estudantes. Destacamos nesta fala a identificação da profissional com o
compromisso do seu trabalho.
No ano de 2017 e 2018, eu tentei me reinventar, me mudar em algumas
determinadas coisas em sala, né, como pedagogicamente, e agora, esse ano
2019, estou trabalhando sistematizando, tô fazendo um álbum com eles.
A estratégia do algum mencionado é um portifólio onde fica registrada as
atividades dos estudantes, atividades selecionadas de acordo com as sequências didáticas
planejadas que vão sinalizar o desenvolvimento dos estudantes no que corresponde as
etapas dos níveis da escrita que estes vão adquirindo a partir do processo de alfabetização.
A participante segue, relatando sua rotina:
93
Comecei com álbum que se chama eu e o mundo. Começou com “eu” eu
menina e eu menino. Aí, trabalhei uma semana dentro dessa, desse tema.
Trabalhei o corpo humano. Também trabalhei as letrinhas iniciais, as
vogais. Aí na segunda semana comecei a trabalhar as vogais. Aí comecei
com a letrinha “A” passei uma semana em cima dessa letrinha A, com
crepon, giz de cera, tinta guache pra elas fazerem a letrinha A com a mão,
com areia, para eles fazerem a letrinha A. E essa semana, eu tô trabalhando
com a certidão de nascimento. Mostrei a certidão de nascimento, aí
mostrei, perguntei o nome da sua mãe, qual nome do pai. Alguns sabiam,
outros sabiam por apelido, acostumado em casa, ou eles diziam, mamãe,
papai, e eu dizia o nome. Aí, trabalhei a certidão, e, no outro dia, comecei
a trabalhar o mês de aniversário. Cada um tem seu mês, aí, mostrei o mês,
qual é o mês que eles fazem aniversário deles, e hoje, ontem fiz pintura das
velinhas com material de palito de picolé cortado no meio. (Participante
03, 2019)
Neste trabalho sobre o eixo Identidade que a participante 03 relata, é desenvolvido
em uma perspectiva da identificação da palavra (nome), com foco no processo de
alfabetização através da decodificação dos símbolo gráficos. A sequência didática não
avança no sentido da reflexão do lugar, no reconhecer-se a partir do território que a escola
está situada.
Os registros realizados a partir das falas, nesta temática nos remetem a pensar no
princípio da Educação do Campo que reflete sobre os espaços e tempos de formação dos
sujeitos da aprendizagem. Este princípio sugere que na educação escolar devem ser
discutidos não apenas os saberes construídos, mas também aqueles construídos pela
experiência na produção, na família, na convivência social, na cultura, no lazer e nos
movimentos sociais. Portanto, a sala de aula é um espaço de sistematização, análise e de
síntese das aprendizagens se constituindo assim, num local de encontro das diferenças, pois
é nelas que se produzem novas formas de ver, estar e se relacionar com o mundo. (MEC,
2003, p. 40)
Nas falas a seguir, visualizamos como acontece esse pensar na escola lócus da
pesquisa.
A questão da rotina, a gente os acolhem, geralmente, a gente dar um
biscoitinho, quando é época de fruta a gente dar, biscoito com banana, dar
uma melancia com biscoito, a gente procura acolhe-los no início da aula
com lanchinho porque a gente sabe que crianças veem sem se alimentar ou
por não ter, ou porque vem no ônibus, nós fazemos isso. Sempre tem o
momento da leitura, tem acolhida com as musiquinhas e passa para as
atividades, tem o lanche, não dá pra dar intervalo muito tempo, é só o
94
período da alimentação mesmo, por que, nós temos um tempo, nós
dependemos do ônibus, então, o ônibus já chega atrasado na escola, eles
chegam entre 07h:40min e tem dias que chegam de quase 8h, então não da
pra a gente dar esse intervalo e de 11h em ponto ele tem que partir. Então
as crianças só comem e voltam para sala. Nós temos momentos de oração
e agradecimento pela manhã, depende da professora, tem dias que ela
canta, tem dias que ela faz a oração, fica livre para elas. (Participante 05,
2019)
A participante 04, também menciona a questão da alimentação e relata a
intencionalidade do trabalho coletivo, mostra que existe uma autonomia dos professores no
desenvolvimento de suas práticas, cada uma desenvolve suas atividades pedagógicas de
acordo com a experiência que adquiriu em suas formações, a Proposta Pedagógica da
escola não é referenciada nas falas como respaldo para o desenvolvimento das práticas
realizadas. A forma de trabalho é desenvolvida a partir das ações e pensadas coletivamente
a partir dos planejamentos e registradas nos cadernos de planejamentos individuais de cada
profissional, como relata a fala da participante 4.
A questão da alimentação as meninas fazem com todo amor do mundo, a
gente tenta manter a equipe mais unida possível pra favorecer. Tem dias
que a metodologia, eu não me meto muito, procuro as vezes encaixar
coisas que eu acho que seja importante, então, chego: olha vamos fazer
isso, vamos fazer a semana disso, vamos fazer o jardim, vamos pensar em
trazer isso. Mando sugestões pelo grupo de atividades, mas não me meto
diretamente, dentro do plano de aula delas. Tem dias elas vão fazer
atividade de receita, então, uma das professoras fica a frente e todos os
alunos participam, faz de forma interativa com todas as turmas. Mas,
assim, deixa eu ver, é, no máximo, é dessa forma, como posso dizer.
(Participante 04, 2019)
Outro elemento que percebemos na rotina de sala de aula relatada pelas
participantes, como também durante as observações é a oração. Estas práticas religiosas
estão presentes cotidianamente em vários momentos durante uma jornada de aula, que seja
antes das refeições, quando chega na escola, no momento da saída ao entrar no ônibus,
sempre são rezas/orações da religião católica.
Através das falas dos que compõem o espaço escolar cotidianamente, entendo que
o elemento da fé da religião católica é presente nas ações como um meio de fortalecer a
superação das dificuldades, é um elemento de esperança em condições melhores de vida e
metodologicamente no dia a dia para ajudar manter a disciplina.
95
Essa prática, no entanto, não está conformidade com o ensino religioso previsto na
Lei de Diretrizes e Bases 9.394/1996, mas representa uma imposição da religião católica.
Art. 33. O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina
dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo
oferecido, sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as
preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em
caráter:
I - confessional, de acordo com a opção religiosa do aluno ou do seu
responsável, ministrado por professores
ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas
igrejas ou entidades religiosas; ou
II - interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades
religiosas, que responsabilizar-se-ão pela elaboração do respectivo
programa.
Essas práticas religiosas estão presentes desde o inicio da escola, também se
materializa no prédio onde funciona e nas praticas cotidianas com as orações que
realizadas e nos eventos festivos que envolvem a escola e toda a comunidade que o
novenário realizado no mês de maio e o aniversário da escola que é comemorado com um
“culto ecumênico”, que na verdade só consta a presença de um padre amigo da família dos
donos da granja onde se localiza a escola.
Outro aspecto que observamos durante a pesquisa é que a escola para os
profissionais e as famílias não é vista como um direito, mas sim, como uma dádiva,
pela doação dos donos da Terra, em cederem o prédio da capela para o funcionamento
da escola, nesse sentido não há uma reflexão crítica sobre o direito que os estudantes
têm do acesso à educação e do direito a ter uma escola que realmente seja adequada.
Trabalho pedagógico de acordo com a realidade local
Nesse tópico, buscaremos relatar sobre as práticas pedagógicas, buscando
visualizar elementos que se aproximem das princípios pedagógicos da Política Nacional de
Educação do Campo. Especialmente o que prevê o artigo 2º do Decreto 7.352 de
4/11/2010, quando explicita os princípios da Educação do Campo:
I - respeito à diversidade do campo em seus aspectos sociais, culturais,
ambientais, políticos, econômicos, de gênero, geracional e de raça e etnia;
II - incentivo à formulação de projetos político-pedagógicos específicos
para as escolas do campo, estimulando o desenvolvimento das unidades
96
escolares como espaços públicos de investigação e articulação de
experiências e estudos direcionados para o desenvolvimento social,
economicamente justo e ambientalmente sustentável, em articulação com
o mundo do trabalho;
IV - valorização da identidade da escola do campo por meio de projetos
pedagógicos com conteúdos curriculares e metodologias adequadas às
reais necessidades dos alunos do campo, bem como flexibilidade na
organização escolar, incluindo adequação do calendário escolar às fases
do ciclo agrícola e às condições climáticas (BRASIL, 2010, p.1).
As falas das participantes revelam algumas experiências de práticas pedagógicas
trabalhadas baseadas na pedagogia de projetos envolvendo um trabalho coletivo com todas
as turmas da escola:
Os projetos, nós sempre trabalhamos juntos, por exemplo, nós tivemos
agora, [...] projeto da água, e aí, fizemos atividades. Assistimos vídeos,
porque aí a gente faz… Trabalha todas as turmas, E aí, de acordo com o
nível, A gente vai fazendo atividades que seja do nível de cada um, mas aí
assiste… a gente fez uma gincana na sexta-feira, com as turmas do
primeiro ao quinto, e foi uma gincana de conhecimento, com recreação,
aí, a gente fez o encerramento do projeto da água, e os projetos geralmente
trabalha assim. (Participante 01, 2019)
Assim, a gente faz atividades que relacione português, matemática, mas
que seja dentro do tema. (Participante 01, 2019)
Esta fala da participante 01, indica que as atividades que são realizadas com temas
geradores ou com projetos, acontecem de forma interdisciplinar, com a participação
coletiva de forma dinâmica e criativa.
Geralmente no 1° bimestre nós trabalhamos identidade, que é o 1°
bimestre. Trabalhamos, acho, que é alimentação, higiene saúde, 2°
bimestre, deixa ver se me lembro do 3° e 4°. (Participante 01, 2019)
É um projeto à parte, que é, aaa, supervisora quem coordena, ela passa pra
gente. Agora, a gente, decidimos trabalhar com projeto de leitura,
assim, vamos trabalhar os gêneros textuais, é, durante todo ano, então, a
gente decide.(Participante 01, 2019)
Identificamos os projetos trabalhados, através das falas e registros no caderno do
plano de aula das professoras, o PPP da instituição não deixa claro esta informação, e pelo
fato, da dinâmica escolar em sua organização do espaço e tempo, não permitir a
97
atualização deste documento, esse momento de sistematizar as decisões e reflexões
realizadas durante as reuniões de planejamentos que ocorrem uma vez por mês, acaba não
acontecendo.
Percebemos nas falas e durante as observações que a escola tem uma certa
autonomia para pensar sua própria prática pedagógica. Pontuamos também o principio da
cooperação nas ações do coletivo escolar. No cotidiano escolar, observamos este princípio
nas relações dos profissionais e dos alunos, como também na participação da comunidade
em algumas atividades desenvolvidas pela escola.
Então, as professoras que individualmente organizam os registros nos cadernos de
planejamentos que são feitos e orientados pela supervisora quinzenalmente ou
semanalmente. Como se explicita na fala seguinte, a participante 01, diz que as datas de
planejamentos já são estabelecidas no calendário anual.
Eu, a gente, na escola nós temos um planejamento que foi, que estava no
calendário, ele vem esse ano, até a gente, teve isso, graças a Deus, pra data
pra gente parar. (Participante 01, 2019)
A gente tem o planejamento pedagógico que é o dia que a gente senta para
pensar as ações vai ser desenvolvidas dentro do bimestre, aí nesse
momento, a gente pensa e traça as metas, mas, aí, vamos fazer um projeto
de leitura voltado pra isso, e durante o tempo a semana a gente vai
pegando sugestões e enviando. (Participante 04, 2019).
Ao serem questionadas sobre a a existência e/ou participação em formação
continuada para educadores direcionada para o trabalho específico da Educação do Campo,
a participante 01, coloca o seguinte:
Pra falar a verdade, durante esse tempo que estou aqui, eu nunca tive
nenhuma formação direcionada pra Educação do Campo, mas não
lembro de diferença alguma. Do que é essa proposta, nós tínhamos um
livro que era direcionado para Educação de Campo, do campo, que é, que
era, que trabalhava realmente a questão do trabalho do campo e tudo, mas
aí, os livros ficaram iguais aos outros. (Participante 01, 2019)
Acho que era o girassol, aí ele vinha direcionado, mas agora os livros estão
igual ao que todo mundo, então, não tem mais diferença. Temas
relacionado à educação do campo: Olha, a gente, éee... uma questão que
poderia ser conversado mais, entendesse? Porque a gente, não tem muito
98
isso, relacionado ao campo. A gente trabalha mais no geral, igual as outras
escolas. (Participante 01, 2019)
Entendo que esta fala justifica a necessidade da oferta de uma formação continuada
específica para o desenvolvimento da prática pedagógica que contemple os princípios da
Educação do Campo, e dessa forma materializar o que já está legitimado através das
Diretrizes Operacionais da Educação do Campo e demais resoluções. A falta de
conhecimento da proposta da Educação do Campo, a falta do PPP vivo na escola, de forma
que oriente a prática pedagógica, constituindo uma identidade para a escola, faz com que
os elementos que o próprio campo fornece para o trabalho que comunge com os princípios
da Educação do Campo, não sejam identificados pelos profissionais que estão inseridos
neste contexto.
A participante 2, relata em sua fala que a escola trabalha com temas que faz relação
com o trabalho da agricultura local, mencionado projetos que são desenvolvidos pela
escola nessa dimensão, colocando:
A gente já fez trabalho aqui com eles, no caso do 4º e 5º ano, que era pra
falar sobre a cana, o que traz de bom, e o prejuízo que traz para o meio
ambiente, por causa da química, então a gente já trabalhou. (Participante
02, 2019)
Geralmente nos planejamentos, fazemos a escolha dos temas. Pensamos no
que trabalhar por bimestre. O trabalho da horta é fixo. Meio ambiente
também. (Participante 02, 2019)
Nas falas das participantes referentes ao trabalho da agricultura local aparecem o
trabalho sobre a cana que deve se referir a cana de açúcar, cultura muito comum no
município, voltada para a produção de açúcar e álcool, que faz parte do agronegócio e que
não é tão presente na realidade dos estudantes e suas famílias pois o território onde se
localiza a escola é constituído por pequenas granjas que servem como local de uso para
fins de semana e para o plantio de culturas voltadas para alimentação como inhame,
macaxeira e o cultivo de abacaxi. O outro tema se refere ao trabalho com a horta que se
refere a uma horta existente na escola onde se cultivam hortaliças que são consumidas na
merenda escolar.
99
A participante 02 em seus estudos acadêmicos, já participou de uma formação
continuada direcionada para a Educação do Campo, em sua fala ela faz menção às práticas
que aproximam aos elementos dos princípios da Educação do Campo. O projeto horta
mencionado é um trabalho significativo para a escola e comunidade.
Este projeto intitulado „Horta: Semeando saúde, plantando saberes e colhendo
vínculos-sociais‟, foi desenvolvido numa área de 80 m2, doado pelo dono da terra na qual
a escola está situada, cultivando, sem uso de agrotóxico, hortaliças, além de algumas frutas
que foram plantadas com mudas doadas pelos pais, tais como: mamão, uva e morango.
Participaram das atividades cerca de 40 crianças com idade de 06 a 12 anos de idade e
vinte famílias de duas comunidades rurais, Taquarituba e Cicerolândia, ambas localizadas
nas proximidades da escola, no município de Santa Rita- PB.
Através de imagens, apresentaremos o caminho trilhado nesse trabalho:
Foto 07: Reunião com os pais/responsáveis Foto 08: Corte da terra
Fonte: Escola Vovó Vina (2018) Fonte: Escola Vovó Vina (2018)
Foto 09: Inicio do plantio Foto 10: Cuidados com a horta
Fonte: Escola Vovó Vina (2018) Fonte: Escola Vovó Vina (2018)
100
Foto 11: Preparando os alimentos Foto 12: Famílias cultivando em casa
Fonte: Escola Vovó Vina (2018) Fonte: Escola Vovó Vina (2018)
Diante da vivencia nesta prática pedagógica, destacamos alguns princípios da
Educação do Campo que identificamos, como a interdisciplinaridade, através das
atividades desenvolvidas com os estudantes; desenvolvimento sustentável, por meio do
cultivo da terra refletindo aquele chão como vida, pois ele é essencial para produzir o
alimento, respeitando o cultivo na perspectiva da agricultura familiar e da agroecologia,
pois é um cultivo sem agrotóxico; o diálogo e prática coletiva, por meio da participação
efetiva dos estudantes e familiares em todo processo. Entendemos nesse espaço a
valorização do trabalho nesse território, construindo um trabalho com autonomia e
colaboração de todos e todas.
Refletindo sobre este projeto os participantes da pesquisa entendem que esse
projeto tem sido um importante espaço de socialização, de trocas culturais e de estímulo
para a melhoria da qualidade de vida das crianças bem como dos seus familiares.
Nesse sentido, constitui-se no ambiente escola um lugar para que as comunidades
possam expressar a cultura através do cultivo de hortaliças, estreitar laços familiares,
possibilitar ganhos na qualidade alimentar e nutricional, além de ampliar a sociabilidade
com os demais moradores locais.
Com relação a este trabalho com a horta a participante 02, 03 e 04 colocam que:
Ai pra começar adaptar eles, saber o que é alimentação saudável, ai a gente
fez a horta. No dia da horta foi maravilhoso, do plantio até a colheita, foi
muito bom. (Participante 02, 2019)
A gente pensa, a gente trabalha com a realidade deles. Vamos supor, as
frutas, vamos trabalhar as fruta, vamos trabalhar a fruta na nossa região?
101
Qual é a fruta da nossa região? Há tia, é o abacaxi, é a cana-de-açúcar,
então a gente trabalha sistematizado o que a região dar. A gente tem horta,
projeto horta. Todo ano a gente faz projeto horta na escola. (Participante
03, 2019).
Cada um (família) tem sua horta em casa. Eles têm o cultivo de macaxeira.
Alguns plantam alface, tomate, essas coisas, verdura e frutas também,
porque todas as granjas tem um plantio de macaxeira, inhame e tudo mais.
(Participante 03, 2019)
[...] valorizar a ter o trabalho com a terra, os recursos naturais, é, a
produção do alimento sem agrotóxico, sabendo que resulta no alimento
saudável. (Participante 04, 2019).
A participação da comunidade na prática pedagógica no âmbito escolar, como
vimos neste trabalho com a horta, nos faz refletir sobre o desenvolvimento do trabalho
coletivo, considerando um diálogo crítico/reflexiva. Na contemporaneidade, a política
nacional de educação do campo, exige uma nova roupagem em relação à escola no campo,
no sentido de efetivar a participação da comunidade no processo educativo escolar (MEC,
2003).
As participantes da pesquisa refletindo sobre sua prática pedagógica, pontua
algumas dificuldades.
A educação no geral, ela tem, ela, a gente sabe que é muito sofrimento,
porque é difícil em tudo, em relação a material, você tem que tirar do seu
bolso, né. Essa semana, eu fui fazer um trabalho com pincel, eu tive que
gastar 35 reais com pincéis, então, né, é difícil, porque já não tem um
salário legal, você tem que bancar. (Participante 01, 2019)
Até que o ano passado a gente só teve um problema de 15 dias sem ônibus,
mas já teve tempo de passar meses. A gente vem, vem de moto, de todo
jeito, mas é com pouca quantidade de alunos, mas isso prejudica os
outros. (Participante 02, 2019)
O que me angústia é a desvalorização, o desrespeito com a educação, que é
muito difícil o sistema que a gente tem político educacional, todo sistema
superior, a gente, ele destrói a alma do pedagogo, tira possibilidade de
você tá vendo crianças futuro, ele destrói essa parte da nação. (Participante
04, 2019)
102
A realização é mais pessoal mesmo, quando você ver uma criança
começando a ler, a fazer cartinhas, a você ver a transformação, porque a
educação transforma, você ver a criança mudar o pensar, passar a creditar
em sonhos, saber que ela é capaz, porque foi isso que eu vivi. Eu não
tinha a dimensão que a educação me trouxe hoje. Então, eu acho que eu
puder favorecer para outra criança, é minha maior realização, mais que a
financeira. (Participante 04, 2019)
Minha frustração maior é a desvalorização com a educação. Tudo que você
vai fazer, se é pra área de saúde, um médico, tem um respeito, um juiz, eu
duvido um profissional de outra área exercer sua função no ambiente que
não ache adequado que não tenha condições de... um professor se
descabela numa sala quente, com seu salário defasado com desrepeito da
família, com desrespeito do aluno, tira do bolso o pouco que tem, mas não
tem valor nenhum nesse país. (Participante 05, 2019)
As dificuldades anunciadas, são angústias e reflexões que as participantes da
pesquisa vivenciam enquanto trabalhadoras na área da educação, que podem sinalizar
elementos para os limites do trabalho desenvolvido na escola em estudo.
Na busca de sintetizar as falas e responder a pergunta levantada, elaboramos um
quadro que mostra os princípios pedagógicos da educação da educação do campo e como
estes eram executados na escola Vovó Vina.
Quadro 08: Sítense dos resultados da pesquisa
Princípio pedagógico da Educação do
campo
Princípios da Educação do Campo na
escola Vovó Vina
Educação problematizadora A ausência de provocações que gere reflexões
sobre problemáticas da comunidade.
Interdisciplinaridade Nos momentos que eram desenvolvidos
projetos, ou seja, ações pontuais.
Desenvolvimento sustentável Desenvolvido a partir de um projeto pontual
denominado como Horta que suscita a prática
e a reflexão do modo de vida sustentável,
percebendo terra enquanto um espaço de vida.
Cultivo de identidades A valorização da cultura e do território na
prática de pedagógica é esporádica.
Reflexão e a ação Não é uma prática diária que se incorpora
organicamente nas práticas pedagógicas.
Diálogo Presente na participação coletiva com a
103
equipe que integra com a escola e com os
estudantes no projetos.
Visão de mundo crítica e histórica Não existe uma reflexão crítica do direito à
educação, e sim, como uma dádiva, um
sentimento de gratidão pelos donos que
cederam a terra e o prédio da capela onde
funciona a escola, e que se faz presente até
hoje, opinando nos trabalhos pedagógicos da
escola.
Formação humana Materializa-se enquanto valores éticos, morais
e religiosos para o convício social/coletivo.
Prática coletiva Faz-se presente no cotidiano, com toda
comunidade escolar se envolve nas ações e as
vezes com as famílias.
Valorização do trabalho e da realidade É presente de forma eventual porque traz
elementos do cultivo do território local, apesar
de não refletir sobre tal prática.
Autonomia e colaboração A prática pedagógica é desenvolvida em uma
perspectiva colaborativa e as tomadas de
decisões no processo de elaboração das ações
são realizadas envolvendo a comunidade
escolar.
Pesquisa
A prática pedagógica tem como princípio a
pesquisa, e no caso da escola Vovó Vina, as
professoras relataram não ter dificuldades
porque a internet facilitava, mas não
considerando a perspectiva da pesquisa
enquanto princípio educativo incorporado em
uma prática problematizadora, que estimula a
curiosidade e a reflexão.
Fonte: autoral (2020)
O elemento da criticidade nas práticas pedagógicas desenvolvidas na escola Vovó
Vina não aparece nas falas, como também não aparece durante as observações realizadas
na escola. Esse elemento é fundamental para uma prática pedagógica segundo o conceito
de Souza (2009, p.9), definida como práxis pedagógica que compreende:
uma ação coletiva institucional, portanto ação de todos os seus
sujeitos (discentes, docentes e gestores), permeada pela afetividade, na
construção de conhecimentos ou de conteúdos pedagógicos
(educacionais, instrumentais e operativos) que garanta condições
104
subjetivas e algumas objetivas do crescimento humano de todos os
seus sujeitos.
Neste trabalho entendemos que visando o trabalho na perspectiva da Proposta de
Educação do e no Campo de acordo com o conceito tratado neste trabalho, para que ocorra
a transformação, se faz necessário a tomada de consciência , a reflexão crítica é peça
chave nesse processo educativo.
As falas e as práticas observadas indicam que a organização do currículo por temas
geradores, estaria mais adequada ao desenvolvimento do trabalho pedagógico nas salas
multisseriadas. Visualizamos isso nos trabalhos pontuais de projetos que ocorreram
durante o ano letivo de 2019.
Na análise das falas, pontuamos o trabalho com o livro didático, colocado pelas
participantes como fator que direciona o trabalho disciplinar, fazendo com que os
conteúdos e as práticas com os temas geradores sejam tratados de forma paralela, ou como
exeção e não como parte orgânica da organização do trabalho pedagógico da escola.
Entendemos que um fator que pode estar dificultando este trabalho interdisciplinar seja
pelo fato de não existir a clareza de uma proposta pedagógica pensada coletivamente, que
nortei o trabalho realizado.
Para isto, percebemos a necessidade da realização do trabalho através de uma
formação continuada específica para as escolas no Campo, pois possibilitaria o
desenvolvimento do trabalho de forma consciente.
105
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa se insere no contexto das discussões em que permeiam as escolas do
campo como um espaço que valoriza o modo de vida da comunidade local, seus costumes,
e de uma proposta pedagógica pautada em uma construção coletiva, considerando o
desenvolvimento sustentável local e suas relações com o global, refletindo de forma crítica
as questões da comunidade e uma prática pedagógica, com ações que possibilitem
alternativas para a valorização dos sujeitos, suas identidades e culturas. A luta pelo
reconhecimento dessa escola do e no campo faz parte de uma das pautas de reivindicações
dos sujeitos do campo, que resistem a um processo histórico de negação do seu espaço
territorial de vida.
Estas discussões envolvem problemáticas, onde o direito à educação favoreceu
apenas uma parte da população, que tardiamente chegou ao campo brasileiro através de
uma Educação Rural, onde foi ofertada, um tipo de escola em contexto precário que não
atendia a todos, como direito dos cidadãos e obrigação do Estado.
Tal situação mobilizou os povos do campo na esfera pública, provocando o
agendamento da Educação do Campo como uma questão de interesse nacional. Esse direito
tem respaldo na Constituição Federal Brasileira em seu artigo 205º, e na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDBEN), nº 9.394 de 1996, (BRASIL, 1996), em seu artigo
28º.
Em conformidade com artigo 28 da LDBEN, no ano de 2001, foi aprovado o
Parecer CNE/CEB nº 36/2001, que gerou a Resolução CNE/CEB nº1/2002, que institui as
Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (BRASIL, 2001), a
qual elaborou um projeto do campo, reconhecendo a diversidade e o modo de vida social
das diversas populações que nele residem.
Compreende-se que a Educação do Campo se insere na dimensão política, porque
se apresenta imersa em um território de disputa de poder, que assume um posicionamento
diante da realidade injusta e excludente e de profundas desigualdades sociais. Nesse
sentido, a educação torna-se uma possibilidade de transformação.
Essa situação de precariedade exposta está presente também nas escolas no campo
dos municípios paraibanos que, além disso, apesar de uns dezenove anos de aprovação das
Diretrizes Operacionais (BRASIL, 2001), para as escolas de Educação Básica no campo
desconsideram a necessidade de adequar os seus projetos pedagógicos aos princípios da
106
Educação do Campo. Não obstante algumas escolas por iniciativa de professores, gestores,
coordenadores pedagógicos, juntamente com a comunidade vem desenvolvendo
experiências que se aproximam dos princípios da Educação do Campo, como é o caso da
Escola Vovó Vina lócus dessa pesquisa, o que suscitou a questão que norteou as discussões
e reflexões desta investigação, que teve como objeto de estudo a Prática Pedagógica na
Escola Vovó Vina, buscando evidenciar aproximações com os princípios da Educação do
Campo.
Para tanto, questionamos como materializar a ação educativa proposta nos
documentos oficiais, a partir da percepção de quais são os princípios que orientam as
práticas da escola em estudo? Para buscar responder a esse questionamento analisamos nas
práticas pedagógicas da Escola Municipal Vovó Vina, as aproximações com os princípios
da Educação do Campo. E como objetivos específicos definimos caracterizar as propostas
pedagógicas existentes na escola; identificar as práticas pedagógicas que se aproximam dos
princípios da Educação do Campo; analisar os processos educativos que aproximam a
escola aos princípios da Educação do Campo.
O estudo apontou que o elemento da criticidade nas práticas pedagógicas
desenvolvidas na escola Vovó Vina, não aparece nas falas, como também não aparece nas
práticas que observamos durante a pesquisa de campo realizada na escola. Esse elemento é
fundamental para o conceito adotado neste estudo de prática pedagógica.
Nessa direção, entendemos que visando o trabalho na perspectiva da proposta de
Educação do e no Campo e de acordo com o conceito de prática pedagógica adotado nesta
pesquisa, para que ocorra a transformação se faz necessária a tomada de consciência e a
reflexão crítica. Para tanto, destacamos os elementos que se aproximam de uma prática
pedagógica que dialoga com alguns princípios da proposta de Educação do Campo, tais
como:
Interdisciplinaridade: identificamos que o princípio da interdisciplinaridade ocorre
em momentos em que são desenvolvidos projetos pedagógicos, ou seja, em ações pontuais.
Desenvolvimento sustentável: desenvolvido a partir de um projeto pontual
denominado como Horta que suscita a prática e a reflexão do modo de vida sustentável,
percebendo a terra enquanto um espaço de vida.
Diálogo: presente na participação coletiva com a equipe que integra a escola e com
a comunidade de pais e mães em situações pontuais.
107
Formação humana: materializa-se nas práticas pedagógicas enquanto valores éticos
e morais para o convício social/coletivo.
Prática coletiva: faz-se presente no cotidiano, com toda comunidade escolar, que se
envolve com as ações.
Valorização do trabalho e da realidade: presente de forma pontual nas práticas
pedagógicas envolvidas nos projetos trazendo elementos do cultivo do território local,
apesar de não refletir sobre tal prática.
Autonomia e colaboração: A prática pedagógica é desenvolvida em uma
perspectiva colaborativa, e as tomadas de decisões no processo de elaboração das ações são
realizadas pela própria comunidade escolar.
O princípio que se distancia, reforça a questão de que o elemento reflexivo e crítico
não estão presentes na prática pedagógica da escola Vovó Vina, nesse sentido, podemos
destacar:
Cultivo de identidades: existe a ausência da valorização da cultura e do
território na prática de pedagógica.
Reflexão e a ação: não é uma prática diária que se incorpora organicamente
nas práticas pedagógicas.
Visão de mundo crítica e histórica: não existe uma reflexão crítica do direito
à educação, e sim a educação como uma dádiva, um sentimento de gratidão pelos
donos que cederam a terra e o prédio onde funciona a escola, e que se faz presente
até hoje, opinando nos trabalhos pedagógicos da escola.
Pesquisa: considerando a perspectiva da pesquisa enquanto princípio
educativo incorporado em uma prática problematizadora, que estimula a
curiosidade e a reflexão, não está presente na prática pedagógica.
Compreendendo os elementos que se aproximam de uma proposta de Educação do
Campo e os que se distanciam, propomos nesta pesquisa uma organização do currículo por
temas geradores, pois essa proposta estaria mais adequada ao desenvolvimento do trabalho
pedagógico nas salas multisseriadas. Pois visualizamos que as práticas pedagógicas com
temas geradores eram eram desenvolvidos de forma pontual, como a elaboração de
projetos que ocorreram durante o ano letivo de 2019.
108
Na análise das falas, pontuamos o trabalho com o livro didático, colocado pelas
participantes como fator que direciona o as práticas pedagogicas disciplinar, fazendo com
que os conteúdos e o trabalho com os temas geradores sejam tratados de forma paralela e
eventual. Entendemos que um fator que pode estar dificultando este trabalho
interdisciplinar seja pelo fato de não existir a clareza de uma proposta pedagógica pensada
coletivamente, que norteia o trabalho realizado.
Para isto, percebemos a necessidade da realização do trabalho através de uma
formação continuada específica para as escolas no Campo, pois possibilitaria o
desenvolvimento do trabalho de forma consciente. Concluímos que esta pesquisa trata-se
de um ponto de partida para elaborar estratégias que possa efetivar uma proposta
pedagógica voltada para Educação do campo.
109
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115
APÊNDICE 1 - ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
Título da Pesquisa - Práticas Pedagógicas: aproximações dos princípios da Educação
do Campo na Escola Vovó Vina, em Santa Rita-PB
Objetivo geral: analisar nas práticas pedagógicas da Escola Municipal Vovó Vina, as
aproximações com os princípios da Educação do Campo.
Pesquisadora Responsável: Ladjane Fidelis Felinto Bizerra
Orientadora: Profª. Dra. Maria do Socorro Xavier Batista
I – IDENFITICAÇÃO/PERFIL
Formação:
Idade:
Sexo: ( ) feminino ( ) masculino ( ) outros
Tempo de atuação na área da educação:
Tempo de atuação na Escola:
Tempo de atuação em escola do campo:
Composição da turma que você leciona (ano/série):
1. Mora no local? O tempo em que trabalha na escola?
2. Como você iniciou seu trabalho na zona rural? (foi uma opção?)
3. Seu trabalho te deixa satisfeito profissionalmente? (existe angustias? Quais?)
4. Os alunos fazem relatos sobre o lugar onde eles vivem? Suas atividades fora da
escola, a atividades de seus familiares?
5. Já foi desenvolvida na escola alguma atividade sobre a comunidade local? Sua
história? Abordagem de atividades culturais da comunidade?
6. Os alunos expressão interesse em estudar nesta escola?
116
7. Como é a rotina da escola? Da sala de aula?
8. Como são organizados os conteúdos? Como são trabalhados?
9. Se existe projetos, quais são e como são trabalhados? (como são definidos os temas,
considera as necessidades que os alunos expressão?)
10. Quais as dificuldades que você enfrenta para desenvolver a aula que planejou?
11. Existe tempo para planejar? Você planeja, na escola, em casa? Quais os recursos
que você tem acesso?
12. Como se planeja o ensino na escola? Quais são as pessoas que participam do
planejamento? É levado em consideração as dificuldades de aprendizagem dos
alunos? Com que frequência acontece?
13. Como o contexto e/ou realidade dos alunos da Escola têm sido considerados no seu
planejamento a nas atividades pedagógicas? Que estratégias você utiliza para
adequar os conteúdos a realidade local?
14. Você participou da Elaboração do Projeto Político Pedagógico da Escola? Como
aconteceu sua discussão e elaboração? Quem foi às pessoas que participaram desse
processo? Como foi a participação dos pais/comunidade nesse processo? Quem o
organizou? Já houve reunião para avaliá-lo? Quem participou dela?
15. Como o Projeto Político Pedagógico orienta o planejamento e a prática pedagógica
na Escola?