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QUARTA REGIÃO

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R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p. 1-431, 2009

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Revista do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. – Vol. 1, n. 1

(jan./mar. 1990). – Porto Alegre: O Tribunal, 1990 – v. – Trimestral.

ISSN 0103-6599

1. Direito – Periódicos. 2. Direito – Jurisprudência. 1. Brasil.Tribunal Regional Federal 4ª Região.

CDU 34(051)34(094.9)

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL4ª Região

Rua Otávio Francisco Caruso da Rocha, 300CEP 90.010-395 - Porto Alegre - RS

PABX: 0 XX 51-3213-3000e-mail: [email protected]: 850 exemplares

Os textos publicados nesta revista são revisados pela Escola da Magistraturado Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Ficha Técnica

Direção:Des. Federal Tadaaqui Hirose

Assessoria:Isabel Cristina Lima Selau

Direção da Divisão de Publicações:Arlete Hartmann

Análise e Indexação:Carla Roberta Leon AbrãoGiovana Torresan VieiraMarta Freitas Heemann

Revisão e Formatação:Camila Thomaz TellesLeonardo Schneider

Tiago Conte Zanotelli

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TADAAQUI HIROSEDes. Federal Diretor da Escola da Magistratura

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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

JURISDIÇÃORio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná

COMPOSIÇÃOEm 04 de setembro de 2009

Des. Federal Vilson Darós – 09.12.1994 – PresidenteDes. Federal Élcio Pinheiro de Castro – 09.12.1994 – Vice-Presidente

Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon – 17.09.1999 – Corregedor RegionalDesa. Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb – 09.12.1994

Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler – 09.12.1994Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria – 09.12.1994

Desa. Federal Maria de Fátima Freitas Labarrère – 05.02.1997Des. Federal Edgard Antonio Lippmann Júnior – 15.06.1998

Des. Federal Valdemar Capeletti – 08.06.1999Des. Federal Tadaaqui Hirose – 08.11.1999 – Diretor da EMAGIS

Des. Federal Dirceu de Almeida Soares – 28.06.2001Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – 28.06.2001

Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado – 28.06.2001 – Vice-Corregedor Regional

Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz – 28.06.2001Des. Federal Néfi Cordeiro – 13.05.2002

Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus – 03.02.2003 – Conselheiro da EMAGISDes. Federal João Batista Pinto Silveira – 06.02.2004 – Conselheiro da EMAGIS

Des. Federal Celso Kipper – 29.03.2004Des. Federal Otávio Roberto Pamplona – 02.07.2004Des. Federal Álvaro Eduardo Junqueira – 02.07.2004

Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle – 27.04.2005Des. Federal Joel Ilan Paciornik – 14.08.2006Des. Federal Rômulo Pizzolatti – 09.10.2006

Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira – 11.12.2006Desa. Federal Luciane Amaral Corrêa Münch – 26.11.2007

Juiz Federal Márcio Antônio Rocha (convocado)Juiz Federal Fernando Quadros da Silva (convocado)

Juiz Federal João Pedro Gebran Neto (convocado)Juíza Federal Vânia Hack de Almeida (convocada)

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Juiz Federal Jorge Antônio Maurique (convocado)Juiz Federal Roger Raupp Rios (convocado)

Juiz Federal Artur César de Souza (convocado)Juíza Federal Maria Isabel Pezzi Klein (convocada)

Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia (convocado)Juiz Federal José Francisco Andreotti Spizzirri (convocado)

Juiz Federal Eduardo Tonetto Picarelli (convocado)Juiz Federal Jairo Gilberto Schäfer (convocado)

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PRIMEIRA SEÇÃODes. Federal Élcio Pinheiro de Castro – Presidente

Desa. Federal Maria de Fátima LabarrèreDes. Federal Otávio Roberto Pamplona Des. Federal Álvaro Eduardo Junqueira

Des. Federal Joel Ilan PaciornikDesa. Federal Luciane Amaral Corrêa Münch

Juíza Federal Vânia Hack de Almeida (convocada)

SEGUNDA SEÇÃODes. Federal Élcio Pinheiro de Castro – Presidente

Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves GoraiebDesa. Federal Marga Inge Barth TesslerDesa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria

Des. Federal Valdemar CapelettiDes. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

Juiz Federal Márcio Antônio Rocha (convocado)

TERCEIRA SEÇÃODes. Federal Élcio Pinheiro de Castro – Presidente

Des. Federal João Batista Pinto SilveiraDes. Federal Celso Kipper

Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo AurvalleDes. Federal Rômulo Pizzolatti

Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle PereiraJuiz Federal Fernando Quadros da Silva (convocado)

QUARTA SEÇÃODes. Federal Élcio Pinheiro de Castro – Presidente

Des. Federal Tadaaqui HiroseDes. Federal Paulo Afonso Brum Vaz

Des. Federal Luiz Fernando Wowk PenteadoDes. Federal Néfi Cordeiro

Des. Federal Victor Luiz dos Santos LausJuiz Federal Roger Raupp Rios (convocado)

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PRIMEIRA TURMADes. Federal Álvaro Eduardo Junqueira – Presidente

Desa. Federal Maria de Fátima Freitas LabarrèreDes. Federal Joel Ilan Paciornik

Juiz Federal Jorge Antônio Maurique (convocado)

SEGUNDA TURMADes. Federal Otávio Roberto Pamplona – Presidente

Desa. Federal Luciane Amaral Corrêa MünchJuíza Federal Vânia Hack de Almeida (convocada)

Juiz Federal Artur César de Souza (convocado)

TERCEIRA TURMADes. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz – Presidente

Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves GoraiebDesa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria

Juiz Federal João Pedro Gebran Neto (convocado)

QUARTA TURMADes. Federal Valdemar Capeletti – Presidente

Desa. Federal Marga Inge Barth TesslerJuiz Federal Márcio Antônio Rocha (convocado)

Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia (convocado)

QUINTA TURMADes. Federal Rômulo Pizzolatti – Presidente

Juiz Federal Fernando Quadros da Silva (convocado)Juíza Federal Maria Isabel Pezzi Klein (convocada)

SEXTA TURMADes. Federal João Batista Pinto Silveira – Presidente

Des. Federal Celso KipperJuiz Federal José Francisco Andreotti Spizzirri (convocado)

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TURMA SUPLEMENTARDes. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira – Presidente

Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo AurvalleJuiz Federal Eduardo Tonetto Picarelli (convocado)

SÉTIMA TURMADes. Federal Tadaaqui Hirose – Presidente

Des. Federal Néfi CordeiroJuiz Federal Roger Raupp Rios (convocado)

OITAVA TURMADes. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado – Presidente

Des. Federal Paulo Afonso Brum VazDes. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

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SUMÁRIO

DOUTRINA .......................................................................................15 OConfisconoDireitoExcepcionaleaConstituiçãode1988 Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz ..................................17

DISCURSOS ......................................................................................25 Vilson Darós ............................................................................27 Silvia Goraieb ..........................................................................37 Marga Inge Barth Tessler ........................................................43 Humberto Jacques de Medeiros ..............................................49 Claudio Pacheco Prates Lamachia .........................................55 Vilson Darós ............................................................................61 Marcelo De Nardi ....................................................................65 Alcides Vettorazzi .....................................................................67 Danilo Pereira Junior ..............................................................71

ACÓRDÃOS.......................................................................................77 Direito Administrativo e Direito Civil .....................................79

Direito Penal e Direito Processual Penal ............................... 115 Direito Previdenciário ............................................................167 Direito Processual Civil .........................................................195 Direito Tributário ................................................................... 311

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ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE ...........................367

SÚMULAS .......................................................................................389

RESUMO ..........................................................................................399

ÍNDICE NUMÉRICO .......................................................................403

ÍNDICE ANALÍTICO ......................................................................407

ÍNDICE LEGISLATIVO ..................................................................425

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DOUTRINA

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O Confisco no Direito Excepcional e aConstituição de 1988

Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz*

Quando integrante do Ministério Público Federal, ao emitir parecer nos autos da Apelação Cível nº 96.04.064841-1, tive a oportunidade de examinar questão constitucional relevante: a possibilidade ou não de exame pelo Poder Judiciário, na vigência da Carta de 1988, dos efeitos doconfiscodebensdecretadocombasenoAtoInstitucional.

Naquela ocasião, ao proferir o parecer como representante do Minis-tério Público Federal, anotei, verbis:

“A pretensão formulada na peça vestibular, com a devida vênia, não pode pros-perar, em face da expressa vedação constante na Constituição de 1967, na redação da Emenda Constitucional nº 1/69, em seu art. 181, I, bem como do art. 3° da Emenda Constitucional n° 11/78.

4. Com efeito, os atos praticados pelo Comando Supremo da Revolução de 1964 foram por decisão do Poder Constituinte Originário aprovados e excluídos de aprecia-ção judicial, pois, nesse particular, o princípio da inafastabilidade do controle judicial sofreu explícita derrogação.

5. Em decorrência do aludido preceito constitucional, são insuscetíveis, igualmente, de apreciação judicial todas as medidas praticadas com fundamento nos Atos Institu-cionais ou Complementares, o que torna os atos revolucionários imunes à apreciação judicial, tanto no que concerne ao seu aspecto material como no formal, consoante

* Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

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reiteradamente deliberou o Egrégio Supremo Tribunal Federal (RTJ 82/744; 87/421; 92/561).

6. Deve-se ter presente que, durante a vigência dos denominados Atos Institucionais, existia, no direito positivo brasileiro, uma ordem jurídica cuja validade não podia ser contestada, uma vez que reconhecida, inclusive pelo Judiciário, que, apesar de sua unidade, se desdobrava em dois planos: um de natureza permanente, representado pela Constituição;outro,excepcionaleprovisório,corporificadonosAtosInstitucionais,resultante do Poder Constituinte Originário, inerente a todas as revoluções, e que, por óbvias razões, se encontra acima da Constituição, tanto que ele manteve a vigência da Constituiçãode1946,comasmodificaçõesqueele,AtoInstitucional,produziu(art.1° do Ato Institucional nº 1/64).

7. E assim, sucessivamente, os demais Atos Institucionais, todos sobranceiros às Constituições de 1946, 1967 e 1969, tanto que as alteraram ou suspenderam a vigência de seus dispositivos, constituindo o que se denomina ‘norma revolucionária’, cuja apreciação judicial, ora pretendida pelo recorrente, sempre foi recusada pela Suprema Corte.

8. Quando do julgamento do Mandado de Segurança n° 14.571-DF, assinalou o eminente Ministro Thompson Flores em seu voto, verbis:

‘(...) A aprovação de atos, como aquele que demitiu o impetrante e o arrebatou de apreciação do Poder Judiciário, é uma decorrência do próprio poder constituinte originário de que se achou investida a Revolução de 1964, que se manteve sobranceira à ordem jurídica existente.

Bem pode ser tenham sido injustos alguns, até mesmo errados outros, não nos cabe julgar de seu merecimento. Um legítimo ato de indenidade, como ocorre no Direito Inglês, cobre cada um deles.

Não é uma originalidade da Carta vigente. A de 1934, em seu art. 18 das Disposições Transitórias, insculpia norma idêntica. E no direito estrangeiro também é encontrada, comosalientamosdoutrinadores.Justificam-secomoatospolíticosdoPoderRevolu-cionário.’ (in RTJ 47/219)

9. A respeito, pertinente o magistério de Hans Kelsen, verbis: ‘On peut juger un ordre juridique injuste du point de vue d’une certeine norme

de justice. Mais le fait que le contenu d’un ordre de contrainte efficace peut être jugé injuste n’est en tout cas pas une raison de refuser de considérer cet ordre de contraint comme un ordre juridique.’

E, mais adiante, acrescenta o notável jurista, verbis: ‘Car la validité des normes juridiques qui ont été reçues sous l’empire de la Cons-

titution nouvelle établie par voie révolutionnaire ne peut plus trouver son fondament immédiat dans l’ancienne Constitution, qui a été abrogée; ce fondement ne peut plus être que la Constitution nouvelle. Sans doute le contenu de ces normes demeure-t-il le même; mais le fondement le leur validité a changé, puisque le foundement de la validité de l’ordre juridique tout entier a changé.’ (Théorie Pure du Droit, traduction française

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par Charles Eisenrnann, Paris: Dalloz, 1962. p. 67 e 279) 10. Com a devida vênia do entendimento esposado pelo douto magistrado a quo,

emsuabemlançadasentença,afls.796/7,mesmosobavigênciadaCartade1988persiste a vedação do exame judicial dos denominados atos revolucionários, por força do disposto nos arts. 181 da Constituição de 1969 e 3º da Emenda Constitucional n° 11/78, nos termos da jurisprudência desta Corte, ao julgar a AC nº 89.04.18754-0-RS, Rel. Juiz Teori Zavascki, julg. em 10.04.1993, in DJU II de 09.06.93.

11.Anulidadedoatodeconfiscodosbensdorecorrente,portanto,encontra-se,assim, excluída de apreciação do Poder Judiciário, quer quanto ao seu aspecto formal, quer quanto ao material, nos termos de tranquilo entendimento da Suprema Corte, verbis:

‘MandadodeSegurançacontraatodeconfiscofundadonoAtoComplementarnº42,ratificadopelosAIsnos 5 e 14.

A indenidade exclui de apreciação os atos praticados com fundamento nos atos institucionais ou complementares, quer sejam eles conformes, quer sejam desconfor-mes a esses mesmos atos, pois, em qualquer das hipóteses, haveria apreciação judicial vedada pela norma constitucional.

MS não conhecido de conformidade com o art. 3° da EC n° 11/78.’ (MS nº 20.194-DF, rel. Min. Cordeiro Guerra, in RTJ92/561)

12. A prevalecer a tese sustentada na inicial, ora reiterada em grau de apelação, permitindo-se a apreciação dos ‘atos revolucionários’, contrariando-se o disposto nos arts. 181, I, da CF de 1969 e 3º da Emenda Constitucional nº 11/78, seria a negação da própria Revolução e do regime por ela instaurado, utilizando a expressão do voto do eminente e saudoso Ministro Amaral Santos, ao votar no Mandado de Segurança nº 18.107-DF, in RTJ 51/353-4, contrariando-se, assim, não somente o texto expresso da Constituição como as regras de hermenêutica.

‘Benignius leges interpretandae sunt, quo voluntas eorum conservetur.’ (Celso, Dig., 1, 3, 18)

Ademais, no caso dos autos, o Supremo Tribunal Federal, em pelo menos duas oportunidades,jásepronunciouacercadalegalidadedoconfiscodosbensdoapelante,ao julgar os Mandados de Segurança nos 19.839-DF e 20.757-DF, publicados, respecti-vamente, nas RTJ 56/475 e 127/105, o que, conforme bem assinalado pelo Juiz a quo, àfl.800,sobreessetópico,configurou-seacoisajulgada,oqueimpedeoseureexamenesta ação, pois, caso contrário, estaria seriamente comprometida a certeza do direito, objetivo maior da coisa julgada.

13.Emconceituadamonografia,lecionaoProfessorMario Vellani, notável pro-cessualista italiano, verbis:

‘Pero la no asegurada inmutabilidad judicial de la declaración de certeza aun respecto de todo nuevo proceso, daria un grave golpe a aquel principio de la certeza del derecho que, como se ha recordado ya, es una exigencia esencial de los ordena-mientos modernos.’ (in Naturaleza de la Cosa Juzgada, traduccíon de Santiago Sentís

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Metendo, Buenos Aires: E.J.E.A., 1963. p. 167, n° 32) 14. Por conseguinte, o ato inquinado de ilegal pelo ora recorrente, por força do

texto constitucional, tem a natureza de bill of indemnity, sendo, portanto, afastada a sua apreciação pelo Judiciário.

15. Em conhecido parecer, publicado em O Confisco no Direito Excepcional, ensina o saudoso publicista Seabra Fagundes, verbis:

‘A nós nos parece que a imunidade, assim outorgada aos efeitos dos atos praticados com invocação de atos institucionais ou atos complementares, é irrestrita. Exclui qualquer possibilidade de controle jurisdicional. Seja considerando-se os tipos de atos (demissão, aposentadoria,reforma,transferênciaparaareserva,penasdisciplinares,confiscodebens,intervenção na ordem econômica, cassação de direitos políticos ou de mandatos eletivos, etc.), seja tendo-se em conta o processamento deles (incompetência, irregularidade formal, etc.), seja ainda ao ângulo da extensão das providências neles contidas (cancelamento de matrícula universitária, ao invés de suspensão; vedação de determinada atividade, ao invés de meras restrições ao seu exercício, etc.).’ (apud RTJ 121/1.129-1.130)

16.Poroutrolado,oaspectodeexaminar-seseosfatosensejadoresdoconfiscoconstituíram ou não um ilícito administrativo, matéria que, com a devida vênia, não pode ser apreciada na via judicial, em razão do disposto nos arts. 181 da CF e 3º da EC nº 11/78.”

Nesse sentido, o parecer do jurista Pontes de Miranda, verbis:“Na Emenda Constitucional n. 11, de 13 de outubro de 1978, art. 3º, diz-se: ‘São

revogados os atos institucionais e complementares, no que contrariarem a Constitui-ção Federal, ressalvados os efeitos dos atos praticados com base neles, os quais estão excluídos de apreciação judicial.’ Não se revogam leis no passado, porque seria ofensa ao princípio da irretroatividade. A revogação só se operou no dia da incidência da Emenda Constitucional n. 11, que entrou em vigor, conforme o art. 4º, a 1º de janeiro de 1979. Portanto, de acordo com os princípios de direito constitucional, todos os atos praticados antes da revogação existiram e foram válidos. Qualquer ato praticado no dia 1º de janeiro de 1979 ou depois, com invocação de algum Ato Institucional ou de algum Ato Complementar, não entrou, sequer, no mundo jurídico. Os atos praticados antes, com base em Ato Institucional ou em Ato Complementar, passaram ao mundo jurídico sem qualquer invalidade, e a Emenda Constitucional n. 11, art. 3º, explicitou que ‘estão excluídos de apreciação judicial’.” (In O Confisco no Direito Excepcional, Caso LUTFALLA, ago. 1979, p. IV-6/IV-7)

Da mesma forma, o entendimento de Seabra Fagundes, no seu já mencionado parecer, verbis:

“1. Regulares ou não, os efeitos dos atos a que se refere a Emenda nº 11 são in-susceptíveis de apreciação jurisdicional. A outorga de imunidade se destina a cobrir, com a impossibilidade de revisão judicial, os atos acaso praticados contra o direito

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escrito vigente, pois os regularmente praticados, ou seja, aqueles conformes a todas as regras a que se deveriam submeter, não necessitariam, para perdurar (em si mesmos, ou nos seus efeitos), de nenhuma declaração de convalescimento. O objetivo dos bills of indemnity é exatamente tornar indiscutíveis, na sua legitimidade, atos que foram praticados em desconformidade com o direito vigente. Eles como que legalizam, a posteriori, medidas originariamente ilegais. Legalizam ilegalidades pretéritas, para usar expressão de E. C. S. Wade e G. Godfrey Phillips, no seu ‘Constitutional Law’ (p. 394-5). Com esse sentido é que aparecem eles no seu país de origem (Inglaterra), como noutros onde eventualmente se têm aplicado.

2. Haja vista o caso dos Estados Unidos, quando necessário apagar desrespeito à competência do Congresso, pelo Presidente Lincoln, por ter suspendido, durante a Guerra de Secessão, a vigência do habeas corpus (Esmein-Nézard, obr. e vol. cits., ps. 94).

3. Se a desconformidade de ato complementar com a legalidade revolucionária, expressa em texto da Carta Política ou no de Ato Institucional, abrisse caminho ao controle do órgão judicante, a imunidade instituída na Emenda nº 11 (art. 3º) seria uma falsa imunidade do ponto de vista político. Pois na verdade o Poder Judiciário é que diria – e não o texto constitucional – até onde estender-se-ia a validez das medidas, cuja intocabilidade se quis assegurar.” (In O Confisco no Direito Excepcional, Caso LUTFALLA, Ago. 1979, p. III-6)

Esse é o entendimento do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, verbis:

“CONFISCO DE BENS. EMENDA CONSTITUCIONAL N. 11, DE 1978. RES-SALVA DOS EFEITOS DOS ATOS PRATICADOS COM BASE EM ATOS INSTITU-CIONAIS E COMPLEMENTARES. IMPOSSIBILIDADE DA DESCONSTITUIÇÃO DO CONFISCO POR DECRETO.

A emenda constitucional n. 11, de 13 de outubro de 1978, em seu artigo 3º, conferiu incolumidade mais ampla aos efeitos dos atos praticados com base nos atos institucio-nais e complementares, pois a ressalva em relação a eles corresponde a sua aprovação, visando forçosamente ao poder executivo, que não pode revê-los. A norma tanto res-salvataisefeitoscomoosexcluidaapreciaçãojudicial,earepetiçãodesignificadosnãoésimplesredundância,masafixaçãodecomandosdistintosemrelaçãoaopoderexecutivo e ao poder judiciário.

Decreto que revoga igual ato, no qual foi declarado insubsistente o decreto de confiscodebens,em1967.Nãosetrataderevogaçãopormotivodeconveniênciaouoportunidade, na qual seriam resguardados direitos adquiridos, mas de anulação do ato praticado em contrariedade a norma constitucional.

Só mediante emenda constitucional pode ser feita a revisão dos atos praticados com base nos atos institucionais e complementares.

Mandado de segurança denegado.” (STF, MS nº 20757/DF, Rel. Min. Carlos Ma-deira, DJ. 17.06.88)

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“CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CON-FISCO DE BENS. PROCEDIMENTO. ATOS FUNDADOS NOS ATOS INSTITU-CIONAIS E COMPLEMENTARES. APRECIAÇÃO PELO JUDICIÁRIO. IMPOS-SIBILIDADE. VIOLAÇÃO À LEI FEDERAL NÃO CONFIGURADA (D.L. 359/68). PREQUESTIONAMENTO AUSENTE. SÚMULAS 282 E 356 STF. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA. RISTJ, ART. 255 E PARÁGRAFOS. LEI 8.038/90.

– Os atos praticados ao abrigo dos atos institucionais ou complementares (atos revolucionários) são intocáveis pelo judiciário; por não terem existência autônoma, a anulação dos mesmos implicaria revisão daqueles, excluídos do controle judiciário, vedado pela norma constitucional.

– Se o Tribunal não apreciou a legislação federal supostamente violada e não foi suscitada a matéria nos embargos de declaração opostos, tem-se por ausente o preques-tionamento indispensável à admissibilidade do recurso especial.

– A simples transcrição de ementas não basta para a comprovação do dissídio pre-toriano alegado, impondo-se a transcrição dos trechos assemelhados ou divergentes entre os paradigmas colacionados e o aresto hostilizado, bem como a juntada das cópias autenticadas dos mesmos.

– Recurso não conhecido.” (STJ, REsp nº 49698/PR, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ 04.10.1999)

Com efeito, essa é a melhor exegese dos artigos constitucionais in-vocados,aquemelhoratendeàsuafinalidadeeaopróprioespíritodaConstituição, o que não deve ser desprezado pelo intérprete. “Scire leges non est verba earum tenere, sed vim ac potestatem” (CELSO, Dig. 1, 3, 7). Nesse sentido, ademais, a distinção no direito constitucional ameri-cano entre a interpretação em sentido estrito e a construction, na lição de Thomas Cooley, verbis:

“Construction, on the other hand, is the drawing of conclusions, respecting subjects that lie beyond the direct expressions of the text, from elements known from and given in the text; conclusions which are in the spirit, though not within the letter of the text.” (in A Treatise on the Constitutional Limitations, 7. ed., p. 70)

Da mesma forma, o ensinamento de William Blackstone, verbis: “(...) the most universal and effectual way of discovering the true meaning of a law, when the words are dubious, is by considering the reason and spirit of it; (...)” (in Commentaries On The Laws Of England, Philadelphia: J. B. Lippincott Company, 1896. v. 1, p. 60, nº 5).

Por conseguinte, mesmo já sob a égide da Constituição Federal de 1988,nãocabeaoPoderJudiciárioreexaminaralegalidadedoconfisco

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decretado com base no Ato Institucional em razão do disposto nos arts. 181 da Constituição Federal/69 e 3º da Emenda Constitucional nº 11/78, consoante os precedentes já citados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça.

Plenamente válido, aqui, o ensinamento de Henry Campbell Black, em obra clássica, verbis:

“10. It is not permissible to disobey, or to construe into nothingness, a provision of the constitution merely because it may appear to work injustice, or to lead to harsh or obnoxious consequences or invidious and unmerited discriminations, and still less weight should be attached to the argument from mere convenience.” (In Handbook of American Constitutional Law, 2. ed., St. Paul: West Publishing Co., 1897.p. 70)

A propósito, convém recordar a velha, mas sempre nova lição de Henri de Page, in De L’interprétation des Lois, éditions Swinnen, Bruxelles, 1978, t. II, p. 22-3, verbis:

“Dans le domaine de l’application de la loi, le juge, peut-être, en tempérera ou en élargira l’exercice. Il usera d’une certaine souplesse suivant les circonstances. Mais son oeuvre, quelque large ou discrète qu’elle soit, devra demeurer compatible avec les pouvoirs limités de juge qui lui donne la division du travail. Il n’est que juge et non pas législateur. Prisonnier de la décision d’espèce, il lui est impossible de s’en évader. Par définition, il est incapable de créer des règles générales, de ‘legiférer’.”

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DISCURSOS

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* Discurso de posse na Presidência do TRF da 4ª Região para o biênio 2009-2011, proferido na sessão solene de 22.06.2009.** Desembargador Federal Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Discurso*

Vilson Darós**

Excelentíssimo Senhor Ministro Teori Albino Zavascki, que neste ato representa o Presidente do Superior Tribunal de Justiça e do Conselho da Justiça Federal, Ministro Cesar Asfor Rocha, em nome de quem saúdo todas as autoridades já nominadas pelo protocolo; meus Colegas De-sembargadores Federais, Magistrados Federais, Estaduais e do Trabalho; Membros do Ministério Público; Procuradores Públicos e do Trabalho; Presidentes das Associações de Magistrados e de Servidores; meus familiares; meus amigos; servidores da Casa e de primeira instância; senhoras e senhores:

Este ato solene, que no Judiciário se repete de dois em dois anos, tem, paramim,significadoespecial.Primeiramente,representaocoroamentode uma carreira de mais de vinte anos dedicada à Justiça Federal. Ao depois, o compromisso de cumprir com humildade, mas com responsa-bilidade, mais uma missão, atribuída pelos meus eminentes Pares, qual seja, a de presidir a alta administração do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sem dúvida honrosa, mas, ao mesmo tempo, espinhosa e de-safiadora.Finalmente,aperspectivadepodercontribuirparaamelhoriada administração da justiça e da prestação jurisdicional, que se requer eficienteeefetiva.

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A sociedade brasileira e mundial vive hoje tempos difíceis. A crise que se abateu sobre o mundo globalizado tem abalado os alicerces do capitalismo e deixado marcas indeléveis em todos os setores produtivos e de serviços. Não se sabe ainda se esta crise é maior ou menor do que a de 1929. A história certamente o dirá. De qualquer sorte, mesmo que Lula tenhaafirmadotratar-sedeumamarolinha,HenriqueMeirellestratou-ade forma diversa ao declarar que “o momento pelo qual passa a econo-miamundialésério,graveedesafiante”.1 Sem pretender desacreditar o Presidente da República, parece-me que os fatos nos levam a concluir que a razão está com o Presidente do Banco Central.

O Judiciário brasileiro não passa ao largo dessa crise; também está sendo afetado. É só ver, e aqui falo da Justiça Federal, o orçamento do anocorrente,quefoisignificativamenteatingidonoquesitoinvestimen-tos, e o anunciado contingenciamento de mais de 37 bilhões de reais, atingindo em vários milhões a Justiça Federal. É ver os projetos de lei de interesse da Justiça Federal, tal como o que prevê a ampliação da sua estrutura com a criação de novas varas e cargos de juízes e de servido-res, somente aprovado na Câmara após ingentes tratativas, sem falar no projeto de atualização do valor do subsídio de Ministro de Supremo Tribunal Federal, com a consequente repercussão na remuneração dos magistrados brasileiros, já no 4º ano sem qualquer revisão.

Isso, no entanto, não me abala; ao contrário, constitui estímulo. A crise nos oportuniza a busca de saídas, de soluções, desperta a criatividade. Não é sem razão que os chineses têm dois sentidos para a palavra crise: risco e oportunidade.2 Crises e problemas sempre tivemos. Desde 1987, quandoassumiamagistraturafederal,fala-seemdificuldadesdetodaordemnojudiciário.Sãoproblemasdeinfraestrutura,dedeficiênciadepessoal, de excessivo número de processos em tramitação, de orçamento deficiente,debaixaremuneraçãoeoutros.

As queixas são múltiplas e das mais diversas ordens. Tenho para mim, contudo, que não é reclamandoque as dificuldades serão superadas.Aprendi com meus pais, pessoas humildes, sem grandes dotes intelectu-ais, mas honestas e trabalhadoras, que somente com trabalho, empenho e criatividade superam-se os problemas. Obstáculos existem, sim, isso

1 JORNAL O SUL de 20 jan. 2009, p. 13.2 CORREIO DO POVO de 27 jan. 2008, p. 8.

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é inegável. A preocupação, no entanto, não se deve dirigir a eles, mas estar direcionada na busca de soluções para resolvê-los ou, ao menos, minimizá-los. Não há falar em crise, mas saber qual é o nosso potencial e o que temos a oferecer à sociedade brasileira.

E é isso que o judiciário tem procurado fazer ao longo de sua história recente. A magistratura brasileira tem dado mostras de competência, dinamismoedisposiçãoparaenfrentarodesafioinerenteàsuaativida-de. Tenho testemunhado e vivenciado tais fatos nestes anos todos e nos diversos cargos que ocupei.

A demanda pelos serviços judiciários tem crescido ano a ano, a com-provar que a população, apesar de todos os percalços, ainda acredita e confianosseusjuízes.Ojudiciáriocontinuasendoodesaguadourodasvicissitudesedosmalesqueafligemasociedadee,aomesmotempo,o canal de valorização da cidadania, tão prestigiada pela Constituição brasileira. Comungo da mesma opinião da Ministra Ellen Gracie Nor-thfleet,expressadaemseudiscursodepossenaPresidênciadoTRF/4ªRegião (20 jun. 1997), quando declarou:

“Pode-seafirmar,ecombaseemdadosconcretos,queaJustiçabrasileiraéservi-çoeficienteedecustoreduzidíssimo,queatendeaumademandaparaaqualnãofoidimensionada e que só tem alcançado tal desempenho por força do devotado empenho de magistrados e servidores, que não medem sacrifícios para cumprir a nobre missão que a sociedade lhes atribuiu.”3

A tarefa do judiciário é enorme. Não é segredo para ninguém e ne-nhuma novidade que os juízos e os tribunais brasileiros se encontram abarrotados de processos. O estudo feito pelo Conselho Nacional de Justiça relativo a 2008 estampa números impressionantes. Durante aquele ano, tramitaram nos Tribunais Regionais Federais (2º grau) quase 1,2 milhão de processos e, no 1º grau, 2,1 milhões. Nas Turmas Recursais, tramitaram 568 mil processos, e nos Juizados Especiais Federais, 2,2 milhões. Esses números indicam a carga de trabalho do judiciário federal em nosso país, que representou 8.660 processos em tramitação para cada magistrado naquele ano.4

Processar e julgar com agilidade, sem perder a qualidade, é tarefa

3 NORTHFLEET, Ellen Gracie. Discurso de Posse na Presidência do TRF/4ª. In: Tribunal Regional Federal da Quarta Região: seus discursos, sua história. Porto Alegre: [s.ed.], 2007. p. 184.4 Justiça em números 2008, www.cnj.jus.br, acesso em: 08 jun. 2009.

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hercúlea; quase sobre-humana. Os magistrados, por mais que se esfor-cem e se dediquem, com o auxílio dos abnegados servidores, não têm conseguido manter a jurisdição no patamar que a sociedade deseja e exige. A demora nos julgamentos, em muitos casos, porém, vai além do admissível, violando, assim, a garantia constitucional da razoável duração do processo.5

O texto constitucional, todavia, não assegura apenas a razoável dura-ção do processo, mas, também, os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. Quer isso dizer que o dispositivo constitucional se dirige a todos. Dos magistrados exige esforço renovado por um processo célere e efetivo. Dos advogados, dos procuradores públicos, das partes e dos demais operadores do Direito, requer o dever de colaboração e lealdade processual. Do legislador, demanda o dever de prover leis para que esses dispositivos constitucionais não se tornem letra morta, mas concretizem e consolidem efetivas mudanças em prol da cidadania, cumprindo a Constituição em sua inteireza, com procedimentos judiciais mais sim-plificadosemaisadequadosaostemposquevivemos.

O que a realidade nos tem mostrado? As partes e seus patronos, de uma formaoudeoutra,tentandoprotelarasoluçãodefinitivadademanda,porque isso é conveniente a um ou a outro. O Legislador, com o apoio do Executivo, embora lhe possamos fazer algumas críticas, tem sido sensível aos reclamos da sociedade e dos próprios magistrados, pondo à disposição do Judiciário instrumentos que objetivam agilizar a prestação jurisdicional.Exemplifico:(i)areformadojudiciário,naqualsedestacaa criação do Conselho Nacional de Justiça como órgão de planejamento estratégico e com a missão maior de modernizar o Judiciário; (ii) a sú-mula vinculante; (iii) a reforma processual civil, merecendo destaque: a) a informatização do processo judicial; b) as novas modalidades de solução alternativa dos litígios (mediação, arbitragem e conciliação); c) a repercussão geral no recurso extraordinário; d) o julgamento dos recursos repetitivos; e (iv) a recente reforma processual penal. Dentre asinovaçõeslegislativas,entretanto,aquesignificoumudançasempre-cedentes, com resultados surpreendentes, foi a instituição dos Juizados Especiais Federais.

5 CF, art. 5º, LXXVIII. A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

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Inegavelmente, os juizados romperam com o processo tradicional, atenderam à expectativa da sociedade brasileira e dão uma resposta po-sitivaaocidadão,prestandojurisdiçãocélere,qualificadaeeficaz.Comeles se atendeu à tão reclamada justiça gratuita, ágil e efetiva, dando-se ao cidadão pleno acesso. Trata-se de um novo modelo de jurisdição, queadotaasimplificaçãoprocedimental.Porele,renovou-seosistemajudiciário, que não mais atendia aos anseios da época em que vivemos.

Os juizados oferecem à sociedade um serviço judiciário direto e próximo do cidadão. Para sua concretização, forçosa a mudança de paradigma, por força dos princípios que regem esse modelo, que deve abranger todos os atores na nova modalidade de jurisdição, aí incluídos juízes, procuradores de entidades públicas, advogados, servidores e agentes públicos. Essa mudança de atitude se faz claramente necessária no âmbito dos juizados federais, já que os réus são entes públicos, nor-malmente avessos à conciliação.

No âmbito da Justiça Federal da 4ª Região, os juizados especiais, embora toda a precariedade na estruturação inicial, foram instalados e estão em plena atividade em todos os municípios-sede, dando uma resposta positiva a quem os procura. A comprovar essa assertiva, foram pagos, somente neste ano de 2009, pelos juizados federais desta 4ª Região R$556.569.391,00,beneficiando67.380pessoas,6 e, no Brasil, desde 2002, mais de 15 bilhões de reais, sendo atendidas cerca de 5 milhões de pessoas.

Temos hoje, contudo, um nó górdio: trata-se das Turmas Recursais, sobrecarregadas de processos. No ano de 2008,7 no âmbito desta 4ª Re-gião, foram distribuídos 115.474 processos novos, que, acrescidos aos remanescentes, totalizaram 181.492. Todos esses feitos estão a cargo de apenas 18 julgadores, o que representa 10.083, em média, para cada um, que têm, para auxiliá-los, uma assessoria reduzidíssima.

Todos sabem que a lei instituidora dos Juizados Especiais Federais8 não lhes proveu qualquer estrutura. O nosso Tribunal, com alguma dificuldade, conseguiu resolver o problemados juizados,mas aindaluta para superar a questão das Turmas Recursais, e não foi por falta de

6 www.trf4.jus.br (Secretaria de Precatórios), acesso em: 09 jun. 2009.7 Justiça em números 2008, www.cnj.jus.br, acesso em: 09 jun. 2009.8 Lei nº 10.259, de 12 jul. 2001.

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empenho das administrações que me antecederam. O problema persiste e urge solucioná-lo, máxime por se tratar da jurisdição que alcança em sua grande maioria pessoas humildes, necessitadas e idosas. A busca de meiosparasuperaressadificuldadeéodesafioqueagestãoqueoraseinicia tem como propósito, especialmente porque tive a honra de ser o 1º Coordenador dos Juizados Especiais Federais e de instalá-los na 4ª Região, tendo-os, assim, por minha “menina dos olhos”.

Senhoras e senhores:Se o Legislativo e o Executivo estão dando sua colaboração para

agilizar a jurisdição, como antes referi, necessário que também nós, julgadores, contribuamos com nossa parcela. Tal contribuição não se pode limitar a oferecer sugestões para eventuais alterações legislativas. É preciso mais. Precisamos suprir as omissões do legislador e buscar a soluçãodosconflitosquenossãosubmetidoscomomáximodepresteza,semesqueceranecessáriaqualidade.ComoafirmouojuizfrancêsOswaldBaudot, em seu discurso “Arenga aos Magistrados que estreiam”:9 “Não espereis o sinal verde de um ministro, ou do legislador ou das reformas sempre em expectativa. Fazei vós mesmos a reforma...”

E ouso acrescentar:“A magistratura costuma atribuir a causas externas a lentidão na prestação juris-

dicional. Contudo, sabe-se, não são elas as únicas causadoras da crise pela qual passa o Judiciário. Mui das vezes, ela decorre da falta de comprometimento do magistrado, da falta de organização da atividade que lhe é afeta e da falta de liderança que deve ter emseulocaldetrabalhoejuntoaseuscolaboradores.Valedizer,deficiênciadegestão.O magistrado não pode ter posição passiva diante da crise do Judiciário. Precisa atuar efetivamente, precisa gerir, coordenar e orientar a atividade que lhe compete e o trabalho de sua equipe. O juiz tem de ser criativo, não ter receio de inovar e ser motivador.”10

Colegas magistrados, é preciso buscar alternativas para superar as deficiênciasedarumarespostaàsociedadeemtemporazoável.Éprecisotomar a dianteira, despregar-se da rotina e partir para novas soluções. É preciso ser criativo na administração da unidade judicial. Não há como seapegaraosvelhoschavões,taiscomo“oorçamentoéinsuficiente”,

9 Citado por Cláudio Antônio de Carvalho Xavier, em “O Juiz e a difícil arte de julgar”. In Revista da ABRAME (Associação Brasileira dos Magistrados Espíritas), n. 9, 2008, p. 5.10 DARÓS, Vilson. Papel facilitador da Corregedoria-Geral para uma justiça célere, eficaz e de qualidade. DissertaçãodoMestradoProfissionalizanteemAdministraçãodoPoderJudiciário.EscoladeDireitodoRiode Janeiro da Fundação Getúlio Vargas, maio de 2008, p. 26.

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“semprefoifeitoassim”,“hádeficiênciadeservidores”,“aqualificaçãoéinadequada”, “a legislação atrapalha” e outros tantos de menor brilho.

NãosenegaqueessasquestõesinfluenciamnasatividadesdoJudi-ciárioenavelocidadedatramitaçãoprocessual,servindo,aofimeaocabo, de desprestígio à instituição judiciária. Os juízes, porém, não podem acomodar-se,nãopodemficarinertes“emberçoesplêndido”,aguardandosoluções do Legislador ou do Executivo. É preciso, sim, sacudir a poei-raetomariniciativasquesimplifiquemosprocedimentosereduzamotempo de tramitação dos processos. Inovações têm de ser buscadas neste momento. O magistrado tem de ser criativo, buscar soluções para superar asdeficiências,racionalizandoostrabalhoscartoráriosesimplificandoasrotinas procedimentais. O magistrado, junto com sua equipe, deve driblar a mesmice e encontrar na sua serventia e nas experiências conhecidas e bemsucedidasocaminhodeumajustiçaágil,eficienteeeficaz.Nãosepode esquecer que, para evoluir, é preciso aceitar as mudanças e não ter receiodeabandonarparadigmasultrapassadoseineficientes.

O juiz moderno não pode se limitar a ser um julgador atento, seguro, competente e célere. É preciso mais, é preciso ser o líder que conduz a equipe e lhe dá segurança, o gestor dos trabalhos que se realizam na serventia, o administrador, o motivador, o idealizador, o catalisador e o condutor das inovações necessárias ao bom desempenho das atividades jurisdicionais.

Essanovafiguradojuizexige,semdúvida,mudançadecultura.Nãosó no âmbito da unidade jurisdicional. A mudança se faz necessária de forma mais ampla, global, ou seja, em toda a instituição. Importa pensar e pôr em prática, na organização, o planejamento estratégico para atender às necessidades do Judiciário, em especial a decorrente do crescimento geométrico no número de processos. Os tempos em que vivemos exigem dos gestores dos tribunais um planejamento não só de curto, mas também de médio e de longo prazos, e, com isso, que sejam os recursos públicos aplicados de modo racional, já que escassos, prestando-se os serviços judiciárioscommaiseficiênciaequalidade.

Não foi sem razão que o 2º Encontro Nacional do Judiciário, realizado sob os auspícios do Conselho Nacional de Justiça, estipulou dez metas para otimizar a justiça, a serem cumpridas pelos tribunais do país, den-tre as quais se destacam a de desenvolver um planejamento estratégico

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próprioeadeseremjulgadosatéofinalde2009todososprocessosdistribuídos até 31.12.2005, em 1ª e 2ª instâncias e nos tribunais supe-riores. Isso é positivo, devendo ser saudado e aplaudido, pois todas as tentativas que visam à melhoria da prestação jurisdicional e dos processos de trabalho devem ser recebidas com entusiasmo e implementadas com ações positivas.

É nessa perspectiva que assumo a Presidência desta Corte. O foco, oobjetivoestratégicodagestãoqueseiniciaéclaro:agilidadeeefici-ênciadaprestaçãojurisdicionalparaalcançaranecessáriaeficáciadasdecisões,medianteaaplicaçãodeumaqualificadagestãodasatividadesdos magistrados e servidores em suas unidades judiciais, tudo aliado ao comprometimento de todos com a instituição para a satisfação de nosso cliente, que é o jurisdicionado. Imbuído desse espírito e dessa determi-nação, ao lado dos Colegas Desembargadores Federais Élcio Pinheiro de Castro e Luiz Carlos de Castro Lugon, respectivamente Vice-Presidente e Corregedor-Geral, com a indispensável colaboração dos eminentes membros deste Tribunal, em tudo apoiados pelos dedicados magistra-dos federais e servidores que compõem a 4ª Região, dos advogados, doMinistérioPúblico,dosProcuradoresPúblicos,enfim,detodososoperadores do Direito e das entidades públicas, tenho certeza, a Justiça Federal da 4ª Região prestará os serviços judiciários que lhe são afetos comeficiência,qualidadeeefetividade,atendendoassimaosreclamosda sociedade e cumprindo com sua missão constitucional.

Senhoras e Senhores:Antes de encerrar estas palavras que já vão se alongando, quero es-

tender um agradecimento especial à Desembargadora Marga Inge Barth Tessler, ao Dr. Humberto Jacques de Medeiros, Procurador-Chefe da Pro-curadoria Regional da República da 4ª Região, e ao Dr. Claudio Pacheco Prates Lamachia, Presidente da OAB/Seccional do RS, pelas bondosas e elogiosas palavras pronunciadas neste ato solene homenageando a nova Administração deste Tribunal. Quero, de igual maneira, prestar minhas homenagens e enaltecer a gestão que se encerrou nesta data, notabi-lizada por seu dinamismo e sua transparência, presidida pela Colega Desembargadora Silvia Maria Gonçalves Goraieb, que teve como seus colaboradores diretos o Desembargador João Surreaux Chagas, na Vice-Presidência, e a Desembargadora Maria de Fátima de Freitas Labarrère,

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na Corregedoria-Geral. Agradecer a honrosa presença das autoridades que prestigiaram este ato solene: Dr. José Fogaça, diligente Prefeito da capital gaúcha; Vereador Sebastião Mello, Presidente da Câmara de Ve-readores de Porto Alegre; e demais autoridades civis já nominadas pelo protocolo. Agradecer a presença dos Ministros do STJ Eliana Calmon Alves,vibrantedefensoradamagistraturafederal,colegalealeeficientena Diretoria da AJUFE no período em que tive a honra de presidir a enti-dade; Teori Albino Zavascki, ex-Presidente desta Casa, jurista de escol, amigo de longa data, cujo sucesso acompanho desde o Banco Central do Brasil e que, neste ato, representa o Ministro Presidente do STJ e do CJF. Agradecer a presença do Presidente do TRF/5ªR., Desembargador Luiz Alberto Gurgel de Faria; do Presidente do TJ/RS, Desembargador Armínio José da Rosa; do Presidente do TRE/RS, Desembargador Sylvio Baptista Neto; do Presidente do TRT/4, Desembargador João Ghisleni Fº; do Presidente do TM/RS, Cel. Sérgio Antônio de Brum. Agradecer a presença do General José Carlos De Nardi, Comandante Militar do Sul, e das demais autoridades militares das três Armas. Agradecer a presença de meus Colegas Desembargadores Federais que compõem este sodalício e os que por aqui já passaram e se encontram usufruindo de merecida aposentadoria; dos Desembargadores Federais vindos de outras regiões e dos Desembargadores Estaduais. Agradecer a presença dos Ministros aposentados do STF Paulo Brossard de Souza Pinto e José Néri da Silveira e do STJ Athos Gusmão Carneiro. Agradecer a presença dos magistrados federais, estaduais e do trabalho; dos membros do ministério público federal e estadual; dos procuradores públicos e dos advogados. Agrade-cer a presença dos Juízes Federais Fernando Mattos, jovem e dinâmico Presidente da AJUFE; Gabriel Weddy, Presidente da AJUFERGS; Érika Reupke, Presidente da AJUFESC; Flávia da Silva Xavier, Presidente da APAJUFE; Desembargador Carlos Cini Marchionatti, Presidente da AJURIS; e dos demais Presidentes de Associações de Magistrados e de servidores. Agradecer a meus pais, na dimensão em que estiverem, pela vida, pelo exemplo e pela educação que me proporcionaram. Agradecer apresençadaCláudia,fielcompanheira,confidentedetodasashorasepermanenteincentivadora,edemeusfamiliares,filhas,neto,irmãos,sogra, cunhados, sobrinhos, primos. Agradecer a presença de todos os amigos, e aqui, dentre tantos, não posso deixar de referir meus colegas

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de graduação na Turma José Dutra/Direito/PUCRS; os vindos da longín-qua Uruguaiana e da vetusta Rio Grande, terras que me acolheram com tanto carinho e das quais guardo as melhores lembranças; os colegas de Mestrado da Fundação Getúlio Vargas; os magistrados e servidores do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul. Agradecer a presença de todos os servidores desta Casa e da primeira instância, especialmente os de meu gabinete e da Secretaria da 1ª Turma que me acompanham há anos com muita lealdade, competência e compromisso com a causa da justiça. Quero, ainda, em nome dos Colegas Élcio e Lugon, agradecer apresençadosseusfamiliareseamigos.Enfim,sougratoatodososque aqui se encontram, que muito me orgulham, me sensibilizam, que honram e engrandecem este ato solene. Por derradeiro, devo agradecer ao Todo Poderoso, Criador e Senhor do Universo, por dar-nos vida e saúde. Muito obrigado a todos e que Deus nos ilumine, inspire, proteja e acompanhe.

Obrigado.

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Discurso*

Silvia Goraieb**

Excelentíssimo Senhor Ministro Teori Albino Zavascki, hoje represen-tando o Presidente do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Na pessoa de Vossa Excelência, saúdo as autoridades constituídas presentes, civis, militares e religiosas, já nominadas; Excelentíssimos Senhores Desem-bargadores e Magistrados Federais, Estaduais, dos Tribunais Regionais do Trabalho e Eleitoral, Membros do Ministério Público, Procuradores da União e Autárquicos, Senhores Advogados, servidores desta Casa, da Justiça Estadual e Eleitoral, Senhoras e Senhores.

Inicialmente, faço a leitura da mensagem enviada pelo Excelentíssimo Ministro Gilmar Mendes, Presidente do Supremo Tribunal Federal, para justificarsuaausêncianestasolenidade:

“A Suas Excelências os Membros do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:Impossibilitado de comparecer à sessão solene de transmissão dos cargos da alta

administração do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, dirijo-me por escrito aos eminentes integrantes dessa Corte, no objetivo de externar agradecimento e congra-tulações aos gestores que ora transmitem suas funções e votos de sucesso aos que iniciam a nobre jornada.

O Poder Judiciário cada vez mais se concebe em um Poder nacional, em que a definiçãodosobjetivoscomuns,aintegração,atrocadeexperiênciaseocompartilha-mento de forças são reconhecidos como peças fundamentais para o aprimoramento da

* Discurso de despedida da Presidência do TRF da 4ª Região, proferido em 22.06.2009.** Desembargadora Federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

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prestação da Justiça.É nesse contexto que, na condição de Presidente do Supremo Tribunal Federal e do

Conselho Nacional de Justiça, venho deixar o meu profundo agradecimento à gestão que ora se encerra e a todo o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, pela sensibilidade e pelo espírito público que marcaram a participação e o engajamento dessa Corte nos diversos programas e ações do STF e do CNJ, especialmente na construção e execução do Plano Estratégico do Judiciário e no incentivo à participação de seus magistrados de primeiro grau e servidores, em funções de auxílio ou de colaboração eventual.

É por indiscutível mérito que esse Tribunal Federal tem recebido, constantemente, o reconhecimento da comunidade jurídica nacional. O comprometimento com a causa da Justiça e o vanguardismo caracterizam a atuação jurisdicional, manifestando-se na efetividade e na consistência dos julgamentos originários da 4ª Região da Justiça Federal. São valores que também marcam a área de Administração da Justiça, verda-deiro laboratório de onde partem programas e normativos hoje replicados em diversos tribunais ou incorporados e estendidos pelo Conselho Nacional de Justiça.

Fica, portanto, o agradecimento à Administração que hoje finda, pela permanente contribuição ao desenvolvimento dos projetos em desenvolvimento no Poder Judici-ário. Desejo muito sucesso aos integrantes da nova gestão, desembargadores Vilson Darós, Élcio Pinheiro de Castro e Luiz Carlos de Castro Lugon, dos quais competência e compromisso com os princípios que norteiam a atividade jurisdicional já são de todos conhecidos. O STF e o CNJ estarão de portas abertas para a manutenção desse trabalho profícuo e integrado.

Em 22 de junho de 2009, Ministro Gilmar Mendes, Presidente.”

É essa a mensagem.Ao dar prosseguimento a esta sessão solene, que se destina à transmis-

são dos cargos da Administração deste Tribunal, não poderia deixar de consignar algumas palavras para marcar a gestão que hoje se encerra.

Há dois anos assumi a Presidência desta Casa, juntamente com o Desembargador Federal João Surreaux Chagas na qualidade de Vice-Presidente e da Desembargadora Federal Maria de Fátima Freitas Labar-rère como Corregedora Regional. Tivemos dois anos de intenso trabalho voltado para o engrandecimento do Poder Judiciário Federal.

O Tribunal não é a sua Administração, é o seu Plenário, é a alma de seus integrantes e de seus servidores, que se manifesta na participação efetivaedecisivaparadignificá-lo,comamorealtruísmo.

Em sessão recentemente realizada, este Plenário teve a oportunidade de receber da atual Administração, bem como do Diretor da Escola da Magistratura Federal, Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, e do Coordenador dos Juizados Especiais Federais e da Conciliação,

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DesembargadorFederalNéfiCordeiro,relatóriodetodasasatividadesdesenvolvidas no biênio, o que dispensa prestação de contas nesta fes-tiva solenidade. Porém, oportuno registrar que nosso Tribunal continua figurandonocenárionacionalcomopioneiroemdiversasáreas,oquefaz parte de sua tradição.

ConfirmamosocompromissoinalienáveldaJustiçaFederalcomaefetivação da cidadania. Acesso à Justiça, enquanto direito fundamen-tal, é muito mais do que aproximar o Poder Judiciário da população brasileira.Éprestarumajurisdiçãoeficiente,confiável,transparenteeprofundamente compromissada com a consolidação do basilar princípio constitucional do Estado Democrático de Direito. Incluir os seres hu-manos nos círculos protetivos dos direitos fundamentais constitui-se no maior legado que o Poder Judiciário deixará para as futuras gerações: a força normativa e transformadora de um Documento Político outrora denominado “mero pedaço de papel”.

E esta Corte sempre soube orientar sua jurisprudência conforme o princípio da máxima efetividade das posições jurídicas fundamentais: direitos indígenas, direito à saúde, direito à boa administração pública, direito à igualdade, são temas que encontraram deslinde inovador a partir dessa perspectiva. Em uma democracia material, as políticas públicas realizadoras dos direitos constitucionais são da responsabilidade solidária de todos os órgãos da soberania, inclusive do Poder Judiciário, a partir de um permanente debate dialético e construtivo.

Por isso, a Administração que ora se encerra, Presidência, Vice-Presidência eCorregedoria,reafirmaquecumpriuojuramentoprestado,voltadaparaaconcretização da Justiça.

No momento em que a troca de dirigentes ocorre, cabe lançar os agradecimentos que devem integrar-se à solenidade, para que esta mani-festação alcance o seu objetivo, no sentido de demonstrar nossa gratidão aos que contribuíram para tanto:

Ministro Gilmar Mendes, Presidente do Supremo Tribunal Federal;Ministro Francisco Cesar Asfor Rocha, Presidente do Superior Tri-

bunal de Justiça;Ministro José Antonio Dias Toffoli, Advogado-Geral da União;Doutor Rogério Favreto, Secretário da Reforma do Judiciário;Delegado de Polícia Federal Ildo Gasparetto, Superintendente Regio-

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nal do Departamento de Polícia Federal no Rio Grande do Sul;Dom Dadeus Grings, Arcebispo Metropolitano;Doutor José Fogaça, Prefeito Municipal de Porto Alegre;Juiz Federal Fernando Cesar Baptista de Mattos, Presidente da AJUFE,

Juízes Federais Gabriel de Jesus Tedesco Wedy, Flávia da Silva Xavier e Henrique Luiz Hartmann, Presidentes das Associações Regionais de Juízes Federais;

Membros do Conselho de Administração e demais Colegas Desem-bargadores Federais; Juízes Federais convocados;

Diretores dos Foros das Seções Judiciárias do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Paraná, Juízes Federais Hermes Siedler da Conceição Júnior, Eliana Paggiarin Marinho e Marcelo Malucelli, e demais juízes federais da 4ª Região.

Consigno, em destaque, o agradecimento especial e com muito afeto aos integrantes do Colégio de Presidentes dos Tribunais Regionais Fe-derais que me acompanharam nesta gestão, Desembargadores Federais Assusete Dumont Reis Magalhães, Jirair Aram Meguerian, Joaquim An-tonio Castro Aguiar, José Baptista de Almeida Filho. À Desembargadora Federal Marli Marques Ferreira presto uma homenagem especial pelo seu elevado espírito de liderança e porque iluminou nossas vidas, com seu carisma, sua alegria e seu desprendimento de alma. Muito devo à queridacolegaeamiga,oqueafirmocomoagradecimento.

Destaco o ingresso do Desembargador Federal Luiz Alberto Gurgel de Faria no Colégio de Presidentes, querido colega que hoje nos honra com sua presença.

Registro ainda minha gratidão incondicional ao Juiz Federal Jairo Gilberto Schäfer, que compartilhou comigo esses dois anos de Presi-dência, não medindo esforços para que pudéssemos concretizar nossos objetivos, deixando a marca de sua incansável atuação. A ele, o meu afeto e o reconhecimento para sempre.

Para encerrar, reverenciando os méritos daqueles que foram incan-sáveis no biênio, tanto na esfera administrativa como na jurisdicional, o agradecimento aos servidores desta Casa, o que faço na pessoa dos Doutores Fádia Maria Ramos Gonzales Zanini, Diretora-Geral, Luís Fernando Gomes Marona, Diretor Administrativo, Eduardo Júlio Ei-delvein, Diretor Judiciário, Roberto Capeleti, Diretor Financeiro, Ivete

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Rossoni, Diretora de Recursos Humanos, e Sérgio Ery Cazella, Diretor de Tecnologia da Informação.

Agradeço, ainda, aos parceiros Caixa Econômica Federal e Banco do Brasilpeloapoiofinanceiroetecnológicoprestadonessesdoisanos.

Saúdo a nova Administração, desejando um biênio de grandes rea-lizações, tendo a certeza de que Vossas Excelências, Desembargadores Federais Vilson Darós, Élcio Pinheiro de Castro e Luiz Carlos de Castro Lugon, conduzirão este Tribunal com as luzes do saber e da justiça, dig-nificandooPoderJudiciárioFederal,emespecialodaQuartaRegião.

Muito obrigada.

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Discurso*

Marga Inge Barth Tessler**

Excelentíssimo Senhor Ministro Teori Albino Zavascki, do Superior Tribunal de Justiça, Excelentíssimo Desembargador Federal Vilson Da-rós, Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nominando-os saúdo todas as autoridades, já citadas, bem como todos os presentes a esta solenidade.

Tenho a honra de falar em nome dos componentes desta Corte por ocasião da posse dos novos dirigentes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região para o biênio 2009/2011, indicada que fui por convite da Desembargadora Silvia Goraieb.

Agradeço a honrosa missão que se anuncia de fácil cumprimento, não pelas qualidades da oradora, mas pelos predicados dos homenageados, ora empossados.

Inicialmente não poderia deixar de destacar a gestão que se encerra e homenagearosmagistradosqueaintegraram,figurashumanassingulares,Desembargadora Silvia Goraieb, Desembargador João Surreaux Chagas e Desembargadora Maria de Fátima Freitas Labarrère, pois souberam persistir na tradição de trabalho e probidade na condução dos destinos do Tribunal. Dedicaram-se intensamente às suas tarefas, superando doenças,

* Discurso de saudação à nova gestão do TRF da 4ª Região (2009-2011), proferido na sessão solene de posse dos novos dirigentes do Tribunal, em 22.06.2009.** Desembargadora Federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

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ausências familiares e incompreensões. Destacaram-se pela gentileza e afabilidade no trato com os colegas e servidores. Foram tolerantes com as divergências, procuraram conciliar, ao invés de fracionar, somar antes de dividir, compreender antes de criticar. Desembargadora Federal Maria deFátima,frágilsónaaparênciafísica,firmeefortecomoocargoexige.Recebamanossagratidãoeadmiraçãopelaserenidadeefirmezacomque se conduziram, conferindo segurança para a prestação da jurisdição, levando-nos do cotidiano trabalho ao brilho do dia intenso de hoje, 22 de junho de 2009, ocasião que nos encontra com ânimo, renovada espe-rança e fé na Justiça. A cerimônia de hoje celebra a gestão democrática e a saudável alternância no exercício dos cargos de direção.

Aos novos dirigentes, que inauguram mais um biênio na vintenária históriadoTribunal,asnossashomenagensnestemomentotãosignifica-tivo na vida dos eminentes Desembargadores e na história institucional do Tribunal. Elevamos à gestão do Tribunal magistrados brilhantes com histórias de vida e origens distintas, que foram, em abençoado momento existencial, conduzidos ao exercício da magistratura.

Requeratradiçãooexamedosregistrosbiográficos,emborasejamde sobejo conhecidas as qualidades e predicados que os acompanham e a história de vida particular que cada um, à sua maneira, construiu durante a longa trajetória.

***Em apertada síntese, o Desembargador Vilson Darós nasceu em Vila

Maria, emancipada de Marau, pertencente à microrregião de Passo Fundo/RS,filhodeSevênioeTherezaDarós,pequenosagricultoresdescendentesde imigrantes da região do Vêneto, Itália. Procurando oferecer-lhe algum estudo, encaminharam-no para a vida religiosa; contudo, antes dos votos perpétuos, preferiu tomar outro rumo. Graduou-se em Ciências Jurídi-cas e Sociais na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), em 1970. Com liderança agregadora, reúne-se com os colegas de turma mensalmente, sendo que diviso muitos na seleta plateia.

Foi professor primário, advogado com militância na Justiça do Tra-balho, Procurador do Município de Porto Alegre e Advogado do Banco Central do Brasil. Constato a presença dos procuradores do Bacen na plateia. Cargos públicos todos alcançados na via do concurso público.

Ingressou na magistratura federal em 1987, no penúltimo concurso

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nacional do Tribunal Federal de Recursos. Participou ativamente e enfrentou o desafiode interiorizar a JustiçaFederal, jurisdicionandoas novas varas interioranas: Rio Grande, Uruguaiana e Santo Ângelo. Foi Juiz Titular da 10ª Vara Federal, sobrecarregada de processos, onde desenvolveu notável trabalho. Foi Diretor do Foro em 1993 e assumiu uma vaga no Tribunal Regional Federal da 4ª Região em dezembro de 1994. Zerou o remanescente de processos que lhe couberam, recebendo o prêmio Destaque Institucional. Foi presidente da Ajufe, conduzindo atividade associativa, ocasião em que conheceu a justiça federal pelo Brasil continente. É fundador da Ajufergs. Foi Coordenador dos Juizados Federais, quando de sua implantação, na gestão do hoje Ministro Teori Zavascki. Exerceu o cargo de Corregedor-Geral na gestão do Desem-bargador Federal Vladimir Passos de Freitas, ocasião em que introduziu inúmeras inovações, como o agendamento prévio das inspeções, a troca de experiências entre Varas Federais da 4ª Região e a implantação do Gedpro no 1º grau; criou um manual para Corregedorias, denominado “Co-Regerparaqualificar”,queconstituiumparadigmaparaascorre-gedorias em geral. Por último, foi presidente da 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com brilhante contribuição na jurispru-dência em matéria tributária. Além de tudo isso, dentro da humildade queoqualifica,voltouaosbancosescolareseconcluiuomestradopro-fissionalizanteemPoderJudiciário,daFundaçãoGetúlioVargas(FGV),incorporando à capacidade empírica de administrador os conhecimentos teóricos que são muito importantes. A sua falta é apontada como uma dasdeficiênciasdoPoderJudiciáriocomoinstituição,eserácadavezmais importante na escassez de recursos.

Verifica-se,assim,peloresumidocurriculum, que o Desembargador Darósqualifica-senãopeloscargosformalmenteocupados,maspelodesempenhoproboeeficiente,pelotrabalhofeito,oquefazdeleumaautoridade legítima na magistratura federal. Não é mero espectador, mas participanteeumgestordainovação.Especialmentegratificanteparamim é ver o contemporâneo de faculdade, colega da Procuradoria do Bacen, construir trajetória tão brilhante. É um gestor da inovação.

***Passo agora ao breve resumo do curriculum do Desembargador

Federal Élcio Pinheiro de Castro,naturaldeSãoPaulo,filhodeAdria-

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no Francisco e Pinheiro de Castro e de Aparecida Castro. Fez estudos fundamentais no Colégio Paulistano, graduou-se em Ciências Jurídicas e Sociais em 1978 pela Universidade de São Paulo (USP) e, desde esta-giário, dedicou-se à advocacia, advogando intensamente com escritório voltado ao Direito de Família e Cível, de 1979 a 1988.

Assumiu a magistratura em janeiro de 1989, aprovado no último concurso nacional do Tribunal Federal de Recursos, como Juiz Federal Substituto na Vara de Rio Grande, e devido à extraordinária produtividade foi promovido para Porto Alegre, por merecimento, em julho de 1994, sendo Titular da 4ª Vara Federal a partir de 24.09.1992, tendo ascendido ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região em 09.12.1994, por mereci-mento, em função da alta produtividade perante a 4ª Vara. Atualmente presidia a 8ª Turma, especializada em matéria criminal. Cuidadoso, detalhista, nada lhe escapa. Incentivador e pioneiro na especialização das turmas criminais, que conferiram real efetividade à jurisdição penal federal na 4ª Região. Proferiu votos paradigmáticos relacionados a cri-mescontraosistemafinanceironacional,infraçõesàordemtributáriaecrimes contra o meio ambiente cometidos por pessoa jurídica, tendo sido o Relator do 1º acórdão no Brasil, legislação que ora lamentavelmente se pretende revogar. Em três gestões integrou o Conselho de Administração do Tribunal Regional Federal da 4ª Região. É frequentemente citado em obras doutrinárias e jurisprudenciais de Tribunais Superiores. Criou o Boletim de Jurisprudência Criminal da Corte, atualmente incorporado ao seu site pessoal na Internet. Extremamente dedicado ao trabalho, tem dificuldadeemdeixarajurisdição,atéparamomentosdelazer.Costu-ma receber os visitantes de pé, frente à deslumbrante paisagem que se descortina de seu gabinete.

Temum lema, profissãode fé, quepode ser assimenunciado: “oêxito só poderá ser alcançado por quem enfrentar o combate de forma obstinada, com dedicação; para tanto, tem que levantar cedo, ler, estu-dar, escrever, meditar, trabalhar muito e falar pouco”. Figura humana adorável, é o nosso Desembargador espartano e certamente desenvolverá profícuo trabalho na Vice-Presidência.

***Porfim,nãomenosricoemexperiênciaprofissional,oDesembargador

Federal Luiz Carlos de Castro Lugon assume como Corregedor Regional.

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NascidoemVilaVelha,EspíritoSanto,depatrilinhagemsuíça,filhodeCarlos José Lugon e Olga Regina Castro Lugon, recentemente falecida aos 94 anos. Cursou etapas fundamentais em colégios no interior do Es-pírito Santo, em Muqui. Graduou-se em Ciências Jurídicas e Sociais, em 1969, na Faculdade de Cachoeiro de Itapemirim/ES. Pós-Graduado em Educação Moral e Cívica, lecionou português no magistério fundamental e, nos cursos superiores jurídicos, diversas disciplinas, em Ourinhos/SP, Jacarezinho/PR, Santo Ângelo/RS, Biguaçu/SC, Florianópolis/SC e Porto Alegre. Foi advogado do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Chavantes/SP.

Aprovado nos concursos públicos para Fiscal do Trabalho e Procura-dor do INSS, com exercício em diversas localidades e diversas funções dechefia.Em1988foiaprovadonoúltimoconcursonacionalparaJuizFederal promovido pelo extinto Tribunal Federal de Recursos, assumindo, em 1989, em Santo Ângelo e, após, em Porto Alegre; promovido a Juiz Federal, foi Vice-Diretor e Diretor do Foro de Santa Catarina. Integrou o pleno do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina. Ascendeu ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região em 16.09.1999, tendo sido Diretor da EMAGIS em 2005/2007, Vice-Corregedor em 2007/2009 e SuplentenoTribunalRegionalEleitoral.Temmonografiaspublicadasepremiadas, a saber: “História da Justiça Federal” (Ajufe, 1997) e “Como tornareficazalegislaçãosobreoMeioAmbiente”(prêmioAMB1999).Realizou cursos na França e nos Estados Unidos e foi integrante da Missão de Observação Eleitoral da ONU para acompanhar as eleições presidenciais no Timor Leste, cujo pleito ocorreu em 14 de abril de 2002, elegendo Xanana Gusmão. Os cursos de aperfeiçoamento somam rela-ção de oito laudas e culminam com a obtenção do título de Mestre em Direito, conferido pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

Evidencia-se, assim, o grande preparo do ilustre Desembargador Lugon, que se caracteriza pela elaboração de votos preciosos, com te-ses cuidadosamente fundamentadas e defendidas; é o Desembargador “ateniense”, que certamente manterá as atividades da Corregedoria no excelente padrão em que a recebe.

Anoto que tão grande preparo e brilhantes trajetórias de vida dos ma-gistrados por certo puderam sedimentar-se pela presença e pelo incentivo

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de suas esposas e companheiras, Cláudia, Iracema e Eliane, a quem, neste momento, também homenageamos, pois partilham momentos de glória, quiçá inalcançáveis se não estivessem presentes.

Renovamos, pois, as nossas esperanças, caro Presidente Vilson Darós. VossaExcelênciaéumgestorqualificado.

Platão, na República, ensinou que o cidadão deve ocupar na pólis a tarefa para a qual está melhor preparado, sendo, na sua lição, os magis-trados os guardiões da República. Hoje encontra-se a Justiça perplexa, incumbida da tarefa de reabilitar a instância política, da qual deveria ser apenas a garante.

A tarefa ora iniciada será árdua, mas Vossa Excelência conta com o apoioeaconfiançadoscolegas,comaadmiraçãodosmagistradosdeprimeiro grau, com os devotados servidores, alguns que o acompanham há mais de uma década.

Poroutrolado,afirma-seafortunadamenteapresençaorientadoradoConselho da Justiça Federal (CJF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estão colocandoumfimà tradiçãoparalisante,morosa edispendiosa do Poder Judiciário, corrigindo rumos e elegendo padrões e estratégias. Como recentemente declarou o eminente Ministro Gilson Dipp, do CNJ: “a população hoje exige que o Judiciário seja transparente, eficaz,ético,justoeprodutivo”.OdesafioagoraestánasmãosdeVossaExcelência, que bem cuidará da administração do nosso Tribunal.

Assim como o homem no seu percurso temporal no mundo, também asinstituiçõessãofilhasdocuidado.Contemconosco,estimadoscolegas,e Deus os ilumine.

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Discurso*

Humberto Jacques de Medeiros**

Excelentíssimo Senhor Presidente, Desembargador Vilson Darós, na pessoa de quem saúdo todos os Magistrados aqui presentes, desta Corte em especial; Excelentíssimo Senhor Procurador da República, Dr. Leiria, decano aqui presente do Ministério Público Federal, na pessoa de quem saúdo todos os Membros do Ministério Público aqui presentes; Doutora Eliana Graeff, Representante do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, na pessoa de quem saúdo todas as autoridades; Doutor Lamachia, Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, na pessoa de quem saúdo toda a cidadania que se faz aqui presente; Senhoras e Senhores:

O princípio republicano impõe a periodicidade dos mandatos e a renovação frequente dos impessoais quadros dirigentes do Estado.

Como Procurador da República, honra-me, pois, acompanhar com proximidade a transição serena e natural da direção da alta administração do Tribunal Regional Federal da 4a Região.

Inaugura-se, hoje, pelo próximo biênio, da mesma forma que se fez em 2007, uma nova Presidência, uma nova Vice-Presidência, uma nova Corregedoria, um novo conselho de administração, uma nova direção à EMAGIS, uma nova coordenação dos juizados especiais, uma nova coordenação dos sistema de conciliação.* Discurso de saudação à nova gestão do TRF da 4ª Região (2009-2011), proferido na sessão solene de 22.06.2009.** Procurador-Chefe da Procuradoria Regional da República da 4ª Região.

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Estão todos os quadros renovados, como há 2 anos.Esta solenidade é uma demonstração ostensiva da prática republicana

desta Corte, da transitoriedade do exercício do poder, da efemeridade dos misteres na vida pública, do quanto todos somos substituíveis e do quanto se engrandecem e se fortalecem as Instituições assim.

Encerra-se hoje uma gestão bem-sucedida; augura-se agora, pelo bem da cidadania, todo o êxito aos novos dirigentes.

A plataforma aonde se chega é a mesma de onde se parte. É a vida. Ensina o poeta:

“E assim chegar e partirSão só dois lados da mesma viagemO trem que chegaÉ o mesmo trem da partidaA hora do encontro é também despedidaA plataforma dessa estaçãoÉ a vida desse meu lugar”

Faço uso da palavra para compartilhar nossas constatações, partindo dos valores que o Ministério Público presenta e do ponto de observação privilegiado de quem é tão próximo da gestão como um integrante da Corte, com tantas expectativas na prestação jurisdicional quanto um advogado e tão crítico quanto os mais exigentes cidadãos em um Estado Democrático de Direito.

Há ciclos bienais na história desta Corte. O encerramento de um ciclo coincide com a abertura de outro. Sempre se volta ao mesmo ponto – este plenário, no dia de hoje –, mas cada vez em um plano mais elevado. Há uma espiral ascendente constante. O momento é sempre de crescimento. Aprende-se com um ciclo e inaugura-se um novo, então.

Viver é optar constantemente. Fazemos escolhas e, quando percebe-mos, nossas escolhas nos fazem também.

Somos o que elegemos. Em 2007, houve a opção da Corte pela Desa. Federal Silvia Goraieb,

pelo Des. Federal João Surreaux e pela Desa. Federal Maria de Fátima Labarrère. Essa opção fez a Corte que temos presentemente.

Esta Corte, então, faz nova opção agora pelo Des. Federal Vilson Darós, pelo Des. Élcio Pinheiro e pelo Des. Lugon.

Recomeça, hoje, então, uma opção fazendo a Corte novamente.

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Cumprimento o Tribunal Regional Federal da 4a Região pela exce-lência de ambas as escolhas.

Passado o tempo, os acertos se explicitam e se evidenciam. Há uma sabedoria coletiva em todas essas opções.

Os cinco Tribunais Regionais Federais ainda emulam soberanamente o Tribunal Federal de Recursos e não se tornaram apêndices ressonantes da cúpula dirigente burocrática central do Judiciário graças à altivez da presidente do Tribunal Regional Federal da 4a Região. Diplomática em todasasnegociações,firmeemtodassuasposições,inflexívelnaimpo-sição de respeito à dignidade da Corte, coube-lhe associar os presiden-tes das Cortes Regionais para serem ouvidos e acatados nas instâncias superiores da Capital Federal.

ApreservaçãodoperfilconstitucionaldosTribunaisRegionaisFe-derais como cortes autônomas em face de novas instâncias de poder ou competências, qual o Conselho Nacional de Justiça e o Conselho da Justiça Federal, foi tarefa da qual todos os magistrados federais são devedores à Dra. Silvia Goraieb e aos demais presidentes dos Tribunais Regionais Federais que a acompanharam. É preciso que se diga como a lealdade da presidente ao Tribunal Regional Federal e aos valores de uma magistratura federal altiva lecionou à cúpula do Poder Judiciário o quanto um juiz pode exercer competências e tarefas políticas sem abrir mão de sua vinculação à lei, à Constituição e a sua consciência, osten-tando uma irretocável impessoalidade.

Quebro, assim, a discrição de sua excelência em nome da justiça desse registro histórico.

O Tribunal Regional Federal da 4a Região ganha, pois, hoje, uma nova Desembargadora para o exercício jurisdicional, ainda mais sensível e sábia para questões administrativas; retorna à jurisdição com suas habili-dades e faculdades expandidas, com todos seus potenciais desenvolvidos a um ponto em que a judicatura ainda não lhe exigira. Depois de tantas lides no planalto, ganhamos todos com seu retorno à planície.

Vejo neste plenário vários futuros presidentes desta Corte. Todos se lembrarão muito de sua excelência, Desa. Silvia, quando conhecerem e viverem os momentos institucionais únicos de um desembargador pre-sidente. Terão seu exemplo vivo na memória para lhes inspirar no mais reto caminho a seguir.

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Mesmo uma presidente em tempo integral não esgota sozinha a pauta da presidência. Sempre que sobre os ombros da presidente se puseram incumbências incompossíveis, lá estava de prontidão o Des. Federal SurreauxChagas.AdisponibilidadeinfinitadoDes.Surreauxfezparecerno último biênio que a presidência do TRF4 seria ubíqua. Não houve jamais descontinuidade, mercê da dedicação do Vice-Presidente. Muito obrigado pela dedicação ímpar ao ininterrupto funcionamento da Corte, em especial pelos muitos plantões em que assisti a sua serena presteza.

Estagestãoquesefindahojefezcomquetantopresidênciaquantocorregedoria fossem, como o são, substantivos e femininos. Dirijo-me à excelentíssima Desembargadora Federal Maria de Fátima Labarrère. Como a corregedoria é sempre responsável pelo futuro da jurisdição, agradeço-lhe todo o investimento feito por V. Exa. nessa causa e espero quelhesejaretribuídopelasuaagoraaindamaiorqualificaçãoparatodosos feitos jurisdicionais responsabilizatórios.

Obrigado, Desa. Maria de Fátima, pela coragem intelectual de exercer a disciplina sobre juízes, algo ao mesmo tempo tão difícil e tão necessário. A imperiosidade do mister e a sua sensata capacidade de guiar fez com que esta Corte fosse aonde nunca fora antes. Cirurgicamente, sempre preservou a saúde de todo o corpo, agindo apenas nos pontos sensíveis, sem traumas, mas com muita precisão. Foi seu elevado senso de dever que lhe fez jamais esmorecer diante das restrições procedimentais de sua tarefa, nem jamais ousar violá-las e muito menos as fazer escusantes para a inércia, pela qual poderia ser, por alguns – nunca pelo Ministério Público –, louvada.

Neste próximo ciclo, o anterior Vice-Corregedor é o novo Corregedor, Dr. Castro Lugon. Sua excelência é um exemplo vivo da descrição de ThomasJeffersonsobreoperfilesperadoparaosjuízesfederaisame-ricanos:

“(...) Os juizes devem ser sempre homens de estudo e experiência em leis, de moral exemplar, muita paciência, calma e atenção; os seus cérebros não devem ser distraídos com interesses discordantes, e não devem ser dependentes de qualquer homem ou organização de homens.”1

1 “The judges... should always be men of learning and experience in the laws, of exemplary morals, great patience, calmness and attention; their minds should not be distracted with jarring interests; they should not be dependent upon any man or body of men.”

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Trago para iluminar a sua continuidade na Corregedoria mais uma lição de Jefferson:

“Nãobastaquehomenshonestossejamnomeadosjuízes.Todossabemosainfluênciados interesses sobre a mente do homem, e como inconscientemente seus julgamentos podemserdesfiguradosporessainfluência.Acrescenteaesseproblemaoespíritodecorpo, para o qual há a máxima peculiar e o credo de que ‘é do ofício de um bom juiz ampliar a sua jurisdição’, bem como a ausência de responsabilidade, e, então, como é que poderemos esperar decisão imparcial entre o Estado, dos quais eles próprios, os juízes, são um eminente lado, e um indivíduo de cuja condição eles não têm nada a esperar ou temer?”2

Ao novo Vice-Presidente, Dr. Élcio Pinheiro de Castro, a fortuna e a virtude lhe reservam a tarefa de administrar o acervo que se formará dos recursos à terceira instância em tempos de inovações legislativas sobre repercussão geral e aguardo em segundo grau por desfechos da instância extraordinária.

A propósito, essas mesmas inovações, somadas às novas dinâmicas, lhe convocam à reforma do Regimento Interno da Corte. Conte com o Ministério Público sempre que necessitar.

Porfim,rogo-lhequeadmitarecursoscomaparcimôniaqueodirei-toaotrânsitojulgadoeaotermodosconflitosrequer,massemnuncaperder de vista que o Tribunal Regional Federal da 4a Região é o menos congestionado tribunal federal e, pois, saem daqui os casos que farão os precedentes para o país.

Ao Dr. Vilson Darós, novo presidente, abre-se, para o biênio, a preciosa oportunidade de V. Exa. expressar todas suas muitas virtudes em prol da grandeza do Tribunal Regional Federal da 4a Região. É chegada a hora de exercitar toda sua experiência acumulada em anos de magistratura para conduzir o Tribunal no caminho da excelência.

Cessa,agora,suabiografiaecomeça,já,umcapítulodahistóriadoTribunal Regional Federal da 4a Região. Ainda melhor, com seu assento no Conselho da Justiça Federal e as competências correicionais, origi-náriaserecursais,poderáinfluirV.Exa.,porcompleto,nosrumosena2 “It is not enough that honest men are appointed judges. All know the influence of interest on the mind of man, and how unconsciously his judgment is warped by that influence. To this bias add that of the esprit de corps, of their peculiar maxim and creed that ‘it is the office of a good judge to enlarge his jurisdiction’, and the absence of responsibility, and how can we expect impartial decision between the General government, of which they are themselves so eminent a part, and an individual state from which they have nothing to hope or fear?”

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qualidade da Justiça Federal a que devotou sua vida. A esperança generalizada é de muito êxito na gestão que ora se inau-

gura. A Sociedade muito espera do Judiciário. A cidadania, mais que o poder, sempre está disposta a uma aliança.

Diga-lhe: sim.Luther King ensina que a medida verdadeira de um homem não é

como ele se porta nos momentos convenientes e confortáveis, mas como elesemantémnosmomentosdecontrovérsiasedesafios.

Seusparesconhecemseuvalor,eporeleofizerampresidentedestaCorte. Que a presidência do Tribunal Regional Federal nunca lhe meça, mas, se a verdadeira medida se impuser, saiba que pode contar com o Ministério Público.

Muito obrigado.

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Discurso*

Claudio Pacheco Prates Lamachia**

Excelentíssimo Senhor Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Desembargador Vilson Darós; Excelentíssimo Ministro Teori Albino Zavascki, representando neste ato o Presidente do Superior Tri-bunal de Justiça; Excelentíssimo Senhor Arminio Abreu Lima da Rosa, Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul; Ex-celentíssima Senhora Advogada Pública, Doutora Procuradora-Geral do Estado, Eliana Graeff Martins, representando neste ato a Governadora do Estado do Rio Grande do Sul, nas pessoas de quem saúdo todas as autoridades já nominadas pelo protocolo.

Saúdo também o senhor Advogado Público, Excelentíssimo Doutor Luis Antônio Alcoba de Freitas, Procurador Regional da Procuradoria Regional da União na 4ª Região, em nome de quem quero saudar todos os advogados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e do Paraná que aqui estão.

Saúdo também e igualmente com a mesma alegria o Excelentíssimo Senhor Procurador-Chefe da República da 4ª Região, Humberto Jacques de Medeiros, na pessoa de quem quero saudar todos os Membros do Ministério Público do Rio Grande do Sul.

Saúdo também a Excelentíssima Senhora Defensora Pública-Geral

* Discurso de saudação à nova gestão do TRF da 4ª Região (2009-2011), proferido na sessão solene de 22.06.2009.** Presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio Grande do Sul (OAB/RS).

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deste Estado, Fátima Záchia Paludo, e, na pessoa da Excelentíssima Se-nhora Defensora Pública-Geral deste Estado, saúdo todos os defensores públicos, advogados, Membros da OAB, dirigentes e Conselheiros da Seccional da OAB do Rio Grande do Sul que aqui estão e que se fazem presentes.

Senhoras e Senhores:Aqui venho, mais uma vez, participar deste que é sem dúvida um

dos mais importantes acontecimentos na vida deste Egrégio Tribunal: a posse de seus novos dirigentes. A posse do seu novo Presidente, o Desembargador Vilson Darós, do Vice-Presidente, o Desembargador Élcio Pinheiro de Castro, e do Corregedor-Geral, o Desembargador Luiz Carlos de Castro Lugon, os quais saúdo respeitosamente, em meu próprio nome e na representação dos advogados e advogadas inscritas na Seccional Gaúcha, em nome do Conselho Federal da OAB, por honrosa delegação do Presidente Cezar Britto, em nome dos eminentes colegas Paulo Roberto de Borba, Presidente da Seccional de Santa Catarina, e Alberto de Paula Machado, Presidente da Seccional do Paraná.

Cumpre-me, inicialmente, agradecer a Vossas Excelências pelo honroso convite que me possibilita, em primeiro lugar, cumprimentar efusivamente a Excelentíssima Senhora Dra. Silvia Maria Gonçalves Goraieb, Digníssima Presidente, o Desembargador João Surreaux Chagas, Vice-Presidente, e a Desembargadora Maria de Fátima Freitas Labarrère, Corregedora-Geral, pela profícua e exemplar gestão.

Mais do que isso, o momento me oportuniza agradecer a suas excelên-cias pela inestimável contribuição à plena realização da Justiça, corpori-ficadaemeficazesmedidasdeatualizaçãoemodernizaçãodaprestaçãojurisdicional, desejada pela cidadania e ambicionada pela advocacia.

Quero ainda, por imposição da consciência e por oportuno, destacar o nosso sincero e profundo reconhecimento pelas atenções permanentes à OABepelosgestosdefidalguiaedistinçãocomquefomosdistinguidosao longo dos dois últimos anos.

Com efeito, tão fortes foram essas atitudes, tão promissoras, leais e respeitosas que, necessariamente, tinham que ser evidenciadas nesta opor-tunidade. Acima de tudo, por um dever de reconhecimento e Justiça.

É que, decorrido um tempo de intenso labor, de estudo aprimorado, cuidadoso, vencidas etapas de planejamento e consequentes preocupa-

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ções, encaminhamento de propostas de melhoria em vários setores de fundamental importância, o TRF4 pode comemorar com a marca da vitória as conquistas de uma fecunda gestão.

Autoridades presentes. Senhoras e Senhores. São por demais conhecidos os sentimentos de admiração e respeito

que me ligam a este Egrégio Tribunal. Na realidade, eles vêm de longa data:primeiramente,doiníciodaminhamilitânciaprofissional,quandopasseiacompreendera importânciaeo imensosignificadosocialdaJustiça Federal quanto aos interesses da cidadania e em relação aos da advocacia brasileira. Posteriormente, quando em virtude dos honrosos cargos, na representação de meus pares, passei a manter com esta Corte uma excelente relação institucional que se fortaleceu no tempo e se se-dimentou no meu espírito.

Foi essa tão cara relação institucional, plenamente revigorada nesses dois últimos anos, precisamente desde que tive a honra e o privilégio de assumir a Presidência da OAB/RS, que me torna para sempre imensa-mente agradecido.

É que a relação institucional, quando transparente, participativa, franca e leal, até mesmo quando eventualmente divergente, é fundamental para que atinjamos os objetivos colimados. Simplesmente porque uma relação assim inspiragestospermanentesdeconfiança,compreensão, solida-riedade e, o que é mais importante, certeza de apoio e reciprocidade. E daí para um momento de gratidão é apenas uma questão de tempo. Pois é o que faço nesta hora. Manifestar a Vossas Excelências a gratidão, o reconhecimento dos advogados e das advogadas gaúchas pelo respeito e pela saudável convivência, que se podem sentir em todas as instâncias e em todos os setores deste Tribunal.

Tenho a exata noção do quanto de profícuo e prazeroso tem sido para mim o fiel cumprimento de meus encargos de Presidente, especialmente quandotivequetratar,comofizinúmerasvezes,comaPresidência,aVice-Presidência e/ou a Corregedoria do TRF da 4ª Região.

Confesso-lhes que não hesitei nunca em aqui trazer para exame, com respeito e franqueza, questões que considerei relevantes para os interesses daadvocaciae/oudacidadania.Aacolhidasemprefidalgaeigualmenterespeitosa enriqueceu sobremodo as nossas relações. Desde então, co-memoramos extraordinários avanços, e a participação dos advogados na

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administração da Justiça tem proporcionado para todos imenso prazer. A integração da Ordem com este Tribunal é notável, exemplar, e a OAB/RS também faz justiça ao proclamar essa fundamental circunstância para toda a nossa comunidade e de um modo especial para todos os presentes nesta ocasião solene.

Cumpro, por isso, o indeclinável dever de agradecer aos desembar-gadores que integraram anteriormente a administração deste Tribunal e aos que o dirigem até a presente data com tanta competência, equilíbrio efidalguia.

Autoridades presentes, senhoras e senhores.Aqui tenho recebido sempre, na representação, que muito me hon-

ra, dos mais de setenta e cinco mil advogados e advogadas, provas inequívocas da preocupação de Magistrados, membros do Ministério Público, da Advocacia Pública, de colegas da Seccional, de esforços integrados, construtivos de uma prestação jurisdicional cada vez mais intensaeparticipativa,comfielobservânciaaosprincípioslegaisinseri-dos na Constituição e na Lei 8.906 – o Estatuto da Advocacia –, para que tudoenfimresultenaaplicaçãocriteriosadamedidaadequada,judiciosa,cristalinamente elevada do senso de equidade e justiça que orna a vida profícua deste Tribunal.

E isso, Senhor Presidente, Senhores Desembargadores, explica os inú-merospedidosdecriaçãodenovasvarasparaaJustiçaFederal.Afirmo-lhes que as súplicas da população tiveram eco na OAB/RS e chegaram ao Congresso Nacional com forte pedido de apoio para a votação do Projeto nº 5829/2005, de iniciativa do Superior Tribunal de Justiça. De todos os quadrantes do Estado, saíram para Brasília, por meio das 104 Subseções da OAB/RS, pedidos de apoio à aprovação do aludido projeto, finalmenteaprovadonodia16docorrente,naCâmaradeDeputados.Foram criadas 230 Varas Federais. A medida cria também 8.500 cargos efetivos e comissionados. O Projeto seguiu para o Senado, ao qual vol-taremos nossas atenções, visando à aprovação imediata. É preciso que se diga que, criadas novas varas na jurisdição do TRF4, ele permanecerá no patamar de grandeza e importância que conquistou, por seu mérito próprio, pela dedicação e pela competência de seus Juízes, Membros do Ministério Público, funcionários e advogados que nele atuam.

A OAB/RS fará a sua parte. Já levou o apelo às 27 Seccionais do País

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para que também concitem seus legisladores no Senado a aprovarem esse importante Projeto.

Porfim,reiterominhascongratulaçõesaoTRF4,emnomedaadvoca-cia gaúcha e brasileira, por delegação do Presidente da OAB, Dr. Cezar Britto, dos colegas Presidentes das Seccionais do Paraná e de Santa Ca-tarina, reconhecendo na plenitude a importância que esta Egrégia Corte tem para que o povo tenha a Justiça que merece e deseja.

Para o homem do povo, o cidadão que clama por Justiça, que acre-ditafirmementenaJustiça,elarepresentaamaisexcelsadasvirtudes.É soberana entre as demais. A Justiça foi, é e continuará sendo sempre a virtude por excelência.

NalinguagemdoJudiciário,Justiçasignificacomumenteaconfor-midade com o direito.

Mas foi na luta diuturna, no exercício damilitância profissio-nal, que aprendi uma importante lição: para o povo, a conceituação de justiça não se atém apenas ao Direito. A Justiça, na concepção popular, está impregnada de moral, de ética, de dignidade, de honra. Daí a constante exigência da sociedade por uma prestação jurisdicional rápida, moderna, baseada nos conceitos fundamentais da dignidade humana e de uma verdadeira ordem social justa, como expressa a nossa Constituição, como quer a nossa gente.

A OAB/RS prosseguirá na luta intransigente em defesa dos interesses da cidadania, combatendo sem trégua o marasmo ou a indiferença de governantes, a corrupção e a impunidade, onde quer que elas estejam, e buscará, em sintonia com esta Corte, o aprimoramento das instituições e o fortalecimento do Estado Democrático de Direito. Temos a inabalável convicção de que este tribunal é um dos portos seguros da cidadania e com ele, com a sua ajuda, haveremos de conquistar dias melhores para a população ordeira e trabalhadora a que servimos.

Ao TRF4, vida longa e profícua; a Vossas Excelências, nossa home-nagem.

Muito obrigado.

Acréscimo:

Vossa Excelência, Desembargador Vilson Darós, juntamente com seus ilustres Vice-Presidente e Corregedor-Geral, traz para este Tribu-

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nal a experiência acumulada do educador emérito, do jurisconsulto de notável saber, do advogado brilhante e combativo, dos Juízes de vida e de atuação exemplares, capacidade comprovada na tarefa de julgar, que sabem quando e como encontrar o caminho da ambicionada Justiça.

De parabéns está esta Corte pela posse de Vossas Excelências.De parabéns estão as comunidades paranaense, catarinense e

gaúcha.

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Discurso*

Vilson Darós**

Saudações às autoridades.Ao encerrar este ato solene, que teve como objetivo dar posse aos

novos administradores desta Seção Judiciária, pouco me resta a dizer. Contudo, não posso me furtar de dirigir algumas palavras aos meus caros magistrados federais e dedicados servidores que atuam neste Estado, tanto os que estão sediados na capital quanto os que se encontram nas Subseções do interior.

A sociedade clama por um Judiciário forte e transparente e exige umaprestaçãojurisdicionaleficienteeemtemporazoável.Tantoissoéverdade que o legislador constitucional o elevou a direito fundamental, inserindo-o no texto da Carta da República: “A todos, no âmbito judi-cial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (CF, art. 5º, LXXXVIII).

Tendo isso presente é que a Administração do Tribunal Regional Federal desta 4ª Região, que tenho a honra de presidir nestes próximos doisanos,fixoucomofocoeobjetivoprincipalaprestaçãojurisdicionaleficiente,ágil,qualificadaeefetiva,tantonoprimeiroquantonosegundo

* Discurso proferido nas solenidades de posse dos novos Diretores de Foro das Seções Judiciárias do Rio Grande do Sul, Juiz Federal Marcelo De Nardi, em 24.06.2009; de Santa Catarina, Juiz Federal Alcides Vettorazzi, em 26.06.2009; e do Paraná, Juiz Federal Danilo Pereira Junior, em 30.06.2009.** Desembargador Federal Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

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graus. Parece que alcançar esse objetivo é um sonho, mas não o é. Bas-ta muita dedicação e empenho, aliados a um planejamento estratégico compatível e a uma gestão efetiva dos recursos humanos e materiais disponíveis.

Estou na magistratura federal há 22 anos. Fui juiz no interior e na capital. Iniciei a interiorização da Justiça Federal na 4ª Região. Fui Di-retor do Foro da Seção Judiciária do RS. Fui o primeiro Coordenador dos Juizados Especiais Federais deste Tribunal. Fui Corregedor-Geral e, por algum tempo, Vice-Presidente do TRF/4ª. Presidi a AJUFE e estou agora na Presidência do Tribunal. Quer dizer, exerci todos os cargos na magistratura federal, o que me fez conhecer a Justiça Federal, conhecer e conviver com os juízes federais, com os servidores do Judiciário Federal dos três Estados do Sul, com os juízes do Brasil. E por conhecer é que possoafirmarcomtodaa tranquilidadequea justiçabrasileiraprestaserviçosdemaneiraeficienteecomreduzidocusto.Digomais,ama-gistratura federal das três Seções Judiciárias que compõem a 4ª Região, secundada pelos dedicados servidores, tem se destacado em seu mister e cumprido a contento a nobre missão que a sociedade lhe atribuiu. As estatísticasestãoaíparaconfirmaressaassertiva.

Embora isso, críticas sobre nosso desempenho são recorrentes. A morosidade é nossa maior chaga. O cidadão brasileiro não pactua mais com a morosidade da prestação jurisdicional e com a reduzida efetividade das decisões judiciais. E a solução a esse problema está em nossas mãos. Não há mais como contemporizar. É preciso conscientizar-se de que a ineficiênciadaprestaçãojurisdicionaléquestãocujoenfrentamentoestáao alcance do Judiciário, por seus integrantes, independentemente da intervenção ou da ação de outros Poderes ou setores da sociedade.

Paralelamente, necessário o engajamento e a coordenação da Admi-nistração, com o estabelecimento do planejamento estratégico e a gestão compartilhada,definindo-seindicadoresemetasdedesempenho,tudoaliado à motivação, à adoção de novas tecnologias e ao treinamento e capacitação de pessoal.

Com essa perspectiva e com essa visão é que, neste ato solene, dei posse aos novos administradores da Seção Judiciária deste Estado, certo de que o novo Diretor do Foro, secundado pelo Vice-Diretor, em comu-nhão de esforços e com a colaboração irrestrita de todos os magistrados

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federais deste Estado, dos servidores, das entidades de magistrados e de servidores,conduziráestaSeçãoJudiciáriacomequilíbrioeeficiência,qualificandoos serviçosprestados e tornando eficazes suas ações.Aessa cruzada conclamo também o MPF, os Procuradores Públicos, os advogados,enfim,todososoperadoresdoDireito,porquanto,aofimeao cabo, a prestação jurisdicional é compromisso de todos.

Meus agradecimentos aos Juízes Federais que deixam a administração desta Seção Judiciária, pela dedicação e pelo brilhantismo com que se houveram, e meus votos de total sucesso aos novos gestores, recém-empossados, aos quais está assegurado total apoio da alta administração do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Obrigado a todos os que prestigiaram este ato e com sua presença o engrandeceram.

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Discurso*

Marcelo De Nardi**

Senhoras e Senhores!Quem sou eu?Que faço aqui?O que é esta instituição?Estas são perguntas existenciais que acredito serem muito pertinentes,

especialmente neste momento de transição de administradores.Respondo que sou um homem comprometido com a dignidade hu-

mana, com a vida em sociedade. Sou alguém que encontra no serviço público e no exercício do poder de Estado a satisfação de contribuir para o bem coletivo.

Sou também um Juiz Federal que já viveu a instituição da Justiça Federal e, por essa história e por características pessoais, mereci a con-fiançadaadministraçãodoTribunalRegionalFederaldaQuartaRegiãopara exercer o cargo de Diretor do Foro.

Assumo-o com a convicção de perseguir permanentemente a res-posta à indagação sobre o que faço aqui. De onde vejo a questão agora, auxiliado pela generosa, admirável e franca recepção que o Diretor do Foro Hermes Siedler da Conceição Júnior e sua equipe me ofereceram, a grande tarefa é gerir recursos escassos, destinando-os da melhor forma possível para atender o dever central de bem prestar jurisdição. Serei, * Discurso de posse na Direção do Foro da Seção Judiciária do Rio Grande do Sul, em 24.06.2009.** Juiz Federal.

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pois, quem diz o não, mas comprometido a me esforçar ao máximo para evitar dizê-lo.

Édeprestarajurisdiçãofederalquesepreencheafinalidadedestainstituição,éoseudevercentral.Embuscadeeficiência,confiabilida-de e presteza no cumprimento desse objetivo é que pretendo exercer a autoridade a mim delegada, conduzindo todos os esforços para prestar o serviço público e exercer o poder de Estado cometido a esta Justiça Federal do Rio Grande do Sul de forma a contribuir para a vida em so-ciedade e valorizar a dignidade humana.

AgradeçoaoDesembargadorFederalVilsonDarósaconfiançade-positada no valoroso colega Altair Antonio Gregório e em mim para administrar a Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.

Agradeço aos colegas Diretores do Foro que me antecederam, pelos conselhos e informações entregues sem reservas e pelas realizações que me fazem receber uma instituição com organização e capacidade notáveis.

Agradeço antecipadamente aos Servidores que aceitaram a missão de administrar pelos próximos dois anos a Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.

Peço a todos – Juízes, Servidores, usuários – que requeiram, sugi-ram, critiquem e elogiem, como forma insubstituível de corrigir nossos caminhos.

O trabalho já começou.Obrigado!

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Discurso*

Alcides Vettorazzi**

Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Vilson Darós, dignís-simo Presidente do E. TRF4, na pessoa de quem saúdo todas as autori-dades civis, militares e eclesiásticas, nominadas e não nominadas pelo cerimonial. Autoridades que, com sua generosa presença, emprestam brilho a esta solenidade de alternância de poder, característica basilar da democracia institucional, cuja razão subjacente não é garantir sucessor melhor que o sucedido, mas evitar que este, ante a perspectiva de poder temporal ilimitado, seja tentado a transformar a coisa pública em quintal de sua residência, no dizer do cientista social cujo nome agora não me vem à memória.

Aos 39 anos de serviço, quase aposentando, já me acenando as mãos do Estatuto do Idoso, eis que acedi, com entusiasmo juvenil, em assu-mir a honrosa função de diretor do foro da SJSC, pelo que agradeço ao PresidenteDaróspelaconfiançadepositada.

Não desconheço já haver passado o tempo em que o exercício de tal função equivalia tão só ao coroamento da carreira. Hoje, o exercício re-quer sintonia com os reclamos da sociedade que ora convive com carga tributáriaelevada,recessãoeconômica,desemprego,déficitorçamentáriogovernamentaleausênciadesinaisderetomadafirmedocrescimento

* Discurso de posse na Direção do Foro da Seção Judiciária de Santa Catarina, em 26.06.2009.** Juiz Federal.

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econômico. Mas o que quer a sociedade no que respeita ao judiciário?Quer mais serviço. É o que demonstra pesquisa nacional (FGV Di-

reito Rio/IPESPE – in Folha de São Paulo, Joaquim Falcão, edição de 08.04.2009), verbis:

“Os brasileiros querem mesmo é que os juízes prestem mais serviço: o serviço público de equacionar conflitos dentro da lei. Querem mais sentenças, rápidas e definitivas.

E querem porque estão satisfeitos com o progresso da Justiça. Um em cada cinco brasileiros foi autor ou réu no ano passado. Cerca de 80% acreditam que vale a pena procurar a Justiça e mais de 50% estão muito satisfeitos ou satisfeitos com o atendi-mento recebido ou com os resultados obtidos.

Cenário inédito.Esses dados revelam uma dissintonia entre a opinião crítica da mídia, de políticos,

intelectuais e elites, de um lado, e, de outro, a opinião positiva, muita vez fundamen-tada em experiência do brasileiro de todas as classes. Há explicação plausível para tal dissintonia. Confia-se mais na Justiça do Trabalho e nos juizados especiais, isto é, na ‘justiça do povo’, que atende a maioria dos brasileiros: trabalhadores e consumidores. QuandoquestionadosseaJustiçanestescincoanosmelhorou,ficouigualoupiorou,a resposta é clara: para 44%, a Justiça está melhor, e somente para 19% piorou. No cômputo geral, 39% avaliam que a Justiça é ótima ou boa.

(...)O que destoa é a lentidão.O brasileiro não se queixa da qualidade das sentenças, mas da quantidade. É pouca.

Cerca de 88% caracterizam a Justiça como lenta, e 78% como cara. Por isso, 48% prefeririam assegurar seus direitos pela conciliação.” (negritos não originais)

A “razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” foram erigidos, pelo constituinte derivado, em direito subjetivo individual (EC 45/2004 acresceu o inc. LXXVIII ao art. 5° da CF). Antes mesmo da EC 45, o Desembargador Darós, na condição de Corregedor-Geral,jáfixavaprazosqueentendiarazoáveis,anteoirrea-lismodaquelesfixadospelosvetustoscódigosdeprocesso.

Enfim,algumtempodeduraçãoétoleráveleissoocorreráatéofinaldos tempos.

Com efeito, o apóstolo João (Apocalipse: 6, 9-10), na sua antevisão do Juízo Final, narra a reclamação das “almas dos que tinham sido imo-lados por causa da palavra de Deus e do testemunho que tinham dado” e, narrando o clamor dessas testemunhas ao Juiz dos Juízes pela rápida

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execução da sentença, o apóstolo ouvia elas verberarem: “até quando, Soberano santo e verdadeiro, tardarás a fazer justiça, vingando nosso sangue contra os habitantes da terra?” (in HAHN, Scott. O Banquete do Cordeiro. 9. ed. São Paulo: Loyola, 2002. p. 97).

Jánãomaisimpressiona,comojustificativaparaoatraso,averdade,um tanto quanto axiomática, de Carnelutti, pela qual “se la giustizia è sicura non è rapida, se è rapida non è sicura”. Para Walter Ceneviva (FSP 06.06.2009), “o judiciário enfrenta o dilema entre melhorar a qualidade e a velocidade de seus serviços ou perder o respeito em sua missão de julgar”.

Essa realidade não passou despercebida aos novos administradores do E. TRF4, tanto que a diretriz estratégica para o biênio 2009/2011 está focadanaagilidadeenaeficiênciadaprestaçãojurisdicionalparaalcançara necessária efetividade das decisões, valendo referir que, no ranking do judiciário federal comum de 2007, a menor taxa de congestionamento é a da 4ª Região (58,9 para a 1ª instância e 46,3 para a 2ª), em confronto com 89,6 (TRF2) e 66,7 (TRF3), respectivamente mais congestionados (in FSP, data não anotada).

Converter, no âmbito das atribuições da direção do foro de SC, em realidade os objetivos priorizados pela novel administração é a tarefa que ora se me impõe. Tarefa essa facilitada pelas condições animadoras com que recebo a direção do foro, inclusive com planejamento estratégico para anos vindouros que, naturalmente, será readequado aos objetivos da nova administração. Em termos orçamentários, a situação recomenda severidade. Agradeço, pois, à eminente Juíza Federal Eliana Paggiarin Marinho, primeira mulher a assumir a direção do foro da SJSC, pela forma fraternal e expedita com que conduziu a transição. Desejo-lhe feliz retorno à atividade judicante.

Para vencer a lentidão, necessário é – além da formulação de táticas e de metas – inovar, abandonando a exclusividade do lugar comum de fazer “mais do mesmo” (mais processos, mais varas, mais servidores). É preciso uso intensivo de tecnologia de ponta em informática, colocan-do, entre o balcão de atendimento e o gabinete do juiz, o computador, extinguindo-sepaulatinamenteafiguradasecretaria(cartório)talcomoa conhecemos hoje. Exemplo simples de inovação: ao assinar a sentença eletrônica (e-proc), poderia o sistema automaticamente intimar as partes,

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evitando milhares de atos repetitivos praticados manualmente pela se-cretaria dos JEFs. Se a forma de desossar aves e suínos ainda estivesse nasmãosdecadafilialdefrigorífico,nãohaveriaaindaoagronegóciona dimensão que vemos hoje naquele segmento. É hora, portanto, de baixar ao “chão da fábrica” e utilizar tempos e movimentos, sem cair, obviamente, na estupidez de achar que a máquina dispensa a atividade humana.Estadeveserredirecionadadaatividade-meioparaatividade-fimdonossonegócio(solucionarconflitosdeformarápidaedefinitiva).

Daí meu convite a todos os juízes e servidores federais catarinenses a se irmanarem nesta empreitada, porque, no dizer do conterrâneo Aldo Colombo,“cada um de nós é um talento único. O que deixarmos de fazer ninguém fará por nós. (...) A vida não é uma competição para ver quem é melhor. A competição é conosco mesmos. Devemos ser o melhor de nós mesmos. Na parábola dos talentos, Cristo fala que eles receberam quantias diferentes. Qualquer resultado era aceito, mas não foi aceita a desculpa daquele que enterrou os seus talentos (Lc 19,2). O objetivo da vida não é brilhar; é (...) ocupar com competência o próprio lugar, seja qual for.”

Que nossos talentos permaneçam desenterrados no biênio que ora se inicia.

Que Deus nos ajude. A mim e ao meu vice, eminente Juiz Federal Ivori Luis da Silva Schaeffer.

Muito obrigado.

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Discurso*

Danilo Pereira Junior**

Dirijo-me à Mesa para saudar os ilustres componentes que nos honram com as suas presenças, o que faço na pessoa do Excelentíssimo Senhor Vilson Darós, Digníssimo Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Dirijo-me, agora, àqueles que nos honram com as suas presenças neste Auditório:

Prezados Membros dos Poderes Executivo, Legislativo Judiciário e do Ministério Público Federal e Estadual.

Autoridades Municipais, Autoridades Civis e Militares.Srs. Advogados, Srs. Defensores Públicos, Srs. Procuradores

Federais.Servidores Públicos municipais, estaduais e federais, com elevada

distinção aos servidores públicos federais e, em especial, àqueles da Justiça Federal do Paraná.

Convidados e Convidadas aqui presentes, por dever de ofício, ami-zade ou amor familiar.

Inicio referindo-me às missões temporais que nos são selecionadas, sem combinados, sem prévio querer ou almejar humano, planejadas pelo detentor único da onipresença e da onipotência.

* Discurso de posse na Direção do Foro da Seção Judiciária do Paraná, em 30.06.2009.** Juiz Federal.

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Naocorrênciadessassituações,sentimo-nosaflitosporentenderosdesdobramentos“imprevisíveis”denossasvidasprofissionais.

Amenizei minha ansiedade ao compreender, segundo Eclesiastes, que tudo tem o seu tempo determinado... e que existe tempo e momento para cada coisa entre os Céus e a Terra, planejados pelo Senhor.

Digo isso porque, como membro da magistratura federal que continua-rei sendo, até o dia do manifesto divino ou até que as leis previdenciárias assim permitam, deixo agora de – única e exclusivamente – ministrar – com erros e acertos – a justiça para administrá-la.

Não é uma fácil transição, dizia o Ministro Gueiros Leite, Primeiro Presidente do STJ, em 1987.

Pela identidade dos meus sentimentos e pelos dele que foram expostos naquele momento, ouso parafraseá-lo.

Penseierefletiacercadessatroca,porqueaconvivênciadiuturnacomos autos, com os despachos, com as sentenças, com as audiências, com os estudos, com as partes, em suas manifestações e sentimentos, continua sendo, para mim, vida e paixão.

Mas um novo tempo, para esta pessoa que vos fala e para dileto colega e companheiro, o Vice-Diretor Gerson Rocha, foi planejado.

Noslançamos,agora,paranovoedesafiadormister:administraraSeção Judiciária do Estado do Paraná. Ainda que sob o impacto das novas responsabilidades, nosso estado de espírito momentâneo é acalentado pelo incondicional apoio recebido do Desembargador Vilson Darós, Dig-níssimo Presidente do TRF da 4ª Região, e pelas palavras de estímulo e incentivo recebidas dos meus colegas, em especial, aqueles com quem compartilhei esses anos de Justiça.

Inolvidávelqueoutrosdesafiosseavizinhameadvirão, porque há novas e aceitáveis exigências que complementam os princípios clássicos da Administração Pública.

De tal modo, hoje, se espera dos Administradores Públicos, de todas as esferas de poder:

A consecução de ações voltadas à sinergia entre gestão do conhe-cimento, depessoas e da tecnologia, afimde transformardados em informações, experiências e habilidades em efetividade.

Buscam-se resultados. O cumprimento de metas estrategicamente estabelecidas no plano de

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atuaçãodainstituição,inclusivesoboaspectofinanceiro-orçamentário,que, somado à Lei de Responsabilidade Fiscal e controlado pelos or-ganismosdefiscalizaçãointernaeexterna,tambémfazpartedoroldeobrigações do bom administrador.

Geriratecnologiasignificaatualizarconstantementeasferramentasvirtuaisparaobtermaioragilidade,eficiênciaeeficácia, inclusivenatramitação e na uniformização do trato processual, conforme diretrizes e planos de ação do Tribunal Regional Federal e, agora também, do Conselho Nacional de Justiça.

Buscam o CNJ e todo o Judiciário Federal a efetividade de suas ações.

Pela velocidade e pelo excesso de informações, a Administração Pú-blica em geral não deve prescindir de plena e ágil comunicação interna, como elemento condutor da boa cultura organizacional.

Espera-se também do administrador a tomada de ações voltadas à proteção dos ativos, à redução na formação de passivos, com a adoção de mecanismos internos que permitam aferir a adequação das práticas administrativasdestinadasatalfinalidade.

A formatação de relacionamento interinstitucional,demodoprofis-sionalizado, vinculado às ações contínuas e independentes dos detentores momentâneos de cargos ou funções públicas, com o intuito de solidificar o federalismo cooperativo, é ação que se espera.

Desde já, conclamo à parceria o Ministério Público Federal, a Ordem dos Advogados do Brasil, a Defensoria Pública da União, a Procuradoria da União, a Receita Federal, a Polícia Federal, as Forças Armadas, as autarquiaspúblicaseempresaspúblicas,dentretantosoutros,afimdeformalizar laços de colaboração para fortalecer não somente as institui-ções às quais pertencemos, mas a decantada e incompreendida federação tupiniquim.

Digo isso porque a sociedade, disse Churchill, espera de nós grandes coisas que, paradoxalmente, são simples: liberdade, justiça, honra, dever, piedade e esperança.

A Sociedade também espera que a Administração Pública e o Poder Judiciário ampliem o espectro do princípio da transparência.

Ela, a sociedade, quer que as instituições públicas lhe sejam visíveis.

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Ela anseia melhor compreender o plexo de atribuições do Poder Judiciário para, de fato, transformar-se em uma sociedade democrático-republicana.

Essa é uma de nossas obrigações: formar e informar a nação brasileira.

O pensar e o agir éticos são postura e conduta também esperadas pela Sociedade, por quem me alçou à qualidade de administrador, pelos meus colegas Juízes, pelos servidores deste Poder, pelos licitantes, pelos contratados,enfim,pelo Zé Cidadão.

Esse,emsíntese,éomotequebemrefleteasresponsabilidadesfiscale social, muito embora, com relação a essa última vertente, ainda predo-mine a incipiência de ações públicas voltadas à sustentabilidade.

Para não lhes cansar os ouvidos, administrar a Justiça Federal no Paraná significa, aos olhos deste recém-indicado administrador, bemgerir e conduzir adequadamente esse conjunto de fatores.

Permito-me registrar que a expectativa pública, pela continuidade da boa e correta administração desta Seção da Justiça Federal, tem funda-mento nas ações dos Colegas Juízes que me antecederam, desde 1967, com a nomeação do respeitável Manoel de Oliveira Franco Sobrinho, até 2009, com o amigo, conselheiro, companheiro, exemplar – chega de elogios – Marcelo Malucelli, com quem tive o privilégio de conviver como Juiz Substituto e como Vice-Diretor desta Seção Judiciária.

Não fosse, aliás, essa recente experiência, possibilitada pela então Presidente Dra. Silvia Goraieb, os próximos dois anos seriam, sem dúvida, mais difíceis.

Colegas Magistrados:Registro que buscarei sempre o caminho do diálogo, da conciliação,

que é de minha natureza, e, por compartilhar do mesmo idealismo, lanço a provocação externada pelo Presidente Vilson Darós, em seu discurso de posse, no último dia 22:

“Éprecisobuscaralternativasparasuperarasdeficiênciasedarumarespostaàsociedade em tempo razoável. É preciso tomar a dianteira, despregar-se da rotina e partir para novas soluções. É preciso ser criativo na administração da unidade judicial. Não há como se apegar aos velhos chavões (...).

O magistrado, junto com sua equipe, deve driblar a mesmice e encontrar na sua serventia, nas experiências conhecidas e bem sucedidas, o caminho de uma justiça ágil,eficienteeeficaz.

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Não se pode esquecer que, para evoluir, é preciso aceitar as mudanças e não ter receiodeabandonarparadigmasultrapassadoseineficientes.”

Digo isso porque tenho certeza de que todos nós pertencemos a uma geração que nasceu embalada pelo sonho de construir não só um Poder, mas uma sociedade mais justa, humana, solidária e fraterna.

Nessa esteira lembro que grandes personalidades nos forjaram exem-plos de administração e ideal de justiça.

Em nome de todos aqueles que, particular ou publicamente, temos como referencial, cito o meu apreço, o meu respeito e a minha conside-ração pelo Ministro Milton Luiz Pereira, meu professor de Direito Penal e Juiz, cuja retidão inspirou os meus dias de magistrado, que, neste mo-mento, são passado e futuro... e inspirará os meus dias de administrador, que representam o meu presente.

Aos servidores da Justiça Federal registro que, ao aceitar a missão de administrar, considerei como determinante o fato de contar – esta Seção Judiciária–comprofissionaiscompetentes,dedicados,atualizados,cria-tivos e, acima de tudo, compromissados e comprometidos.

Associo-me, neste momento, a esse verdadeiro patrimônio humano que contribuiu e contribui, positivamente, com a imagem desta Instituição.

Destaco as palavras de Gabriela Mistral, premiada com o Nobel de Literatura em 1945:

“Há a alegria de ser puro e a de ser justo; mas há sobretudo a maravilhosa, a imensa alegria de servir. Que triste seria o mundo se tudo se encontrasse feito.”

Entretanto, serenamente, lembro que, na esteira da nova e necessária cultura organizacional e gerencial da administração pública, o grande privilégio de ser servidor público é, quase que tautologicamente, servir ao público, à sociedade.

Com essas palavras, agradeço a presença e a atenção de todos e no-vamente, citando Eclesiastes, lembro que nesta vida tudo o que a pessoa pode fazer é procurar ser feliz e viver o melhor que puder.

Muito obrigado.

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ACÓRDÃOS

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DIREITO ADMINISTRATIVO E DIREITO CIVIL

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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 1994.71.00.010401-4/RS

Relatora: A Exma. Sra. Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria

Apelantes: Hospital Parque Belém e outrosAdvogado: Dr. Hélio Faraco de Azevedo

Apelante: União FederalProcurador: Dr. Luis Antonio Alcoba de Freitas

Apelante: Carmem Doroti Silva Pinheiro – EspólioAdvogado: Dr. Ilvonaldo Lopes Otesbelgue

Apelados: (Os mesmos)Apelados: Arthur Luiz Veronese e outroAdvogada: Maria Lucia Consul Soares

Remetente: Juízo Substituto da VF Ambiental, Agrária e Residual de Porto Alegre

EMENTA

Responsabilidade civil. Erro médico. Cirurgia de varizes. Anestesia. Alergia à droga utilizada. Estado vegetativo da paciente. União Federal. Legitimidade passiva. Médico do INAMPS. Nexo causal configurado. Dano moral. Valor. Critérios de arbitramento.

1.AUnião está legitimada afigurar nopolopassivodedemandaintentada para obter indenização em razão de lesão sofrida em razão de cirurgia realizada por médico do INAMPS.

2.Sehouvessesidoverificado,antesdacirurgia,seade cujus era ou não alérgica à droga que foi utilizada, os danos poderiam ter sido evitados

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medianteumaavaliaçãomaiscuidadosa,estandoconfiguradoonexocausal entre a conduta do Médico credenciado do INAMPS, conduta pela qual responde a União, e os danos sofridos.

3. A prova pericial comprovou que a autora originária sofreu infecção hospitalar no Hospital Parque Belém, fato esse que contribuiu de modo significativoparaoagravamentodoestadoneurológicodade cujus e evidencia a responsabilidade do nosocômio pelo evento lesivo, do qual responde de forma solidária com a União.

4. O arbitramento do valor da indenização pelo dano moral é ato complexo para o julgador, que deve sopesar, dentre outras variantes, a extensão do dano, a condição socioeconômica dos envolvidos, a razo-abilidade, a proporcionalidade, a repercussão entre terceiros, o caráter pedagógico/punitivo da indenização e a impossibilidade de se constituir em fonte de enriquecimento indevido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações e ao reexame necessário, nostermosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 23 de junho de 2009.Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria, Relatora.

RELATÓRIO

A Exma. Sra. Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria: Trata-se de recursos de apelação e reexame necessário interpostos contra sentença que, nos autos de ação ordinária na qual o Espólio de Carmem Doroti Silva Pinheiro postula o pagamento de indenização por danos morais e materiais decorrentes de erro médico, julgou parcialmente procedente o pedido para:

(a) reconhecer a responsabilidade da União Federal e do Hospital Parque Belém pelos danos causados à autora Carmem Doroti Silva Pinheiro, condenando-os ao pagamento de indenização no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a título de danos morais;

(b) determinar que os valores sejam atualizados monetariamente a

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partir da sentença e acrescidos de juros moratórios desde a data do evento danoso(fls.575-589).

O Hospital Parque Belém apela sustentando que (a) é inaceitável ex-cluir do polo passivo os médicos que causaram os danos e, sem causa, condenar a si e a União ao pagamento de reparação pelo dano moral e que,(b)sehouveerromédico,aresponsabilidadeédosprofissionais(fls.594-615).

A União recorre arguindo, em preliminar, sua ilegitimidade passiva. No mérito, aduz que (a) a responsabilidade é do hospital, que não realizou os exames pré-operatórios indispensáveis, e que (b) a responsabilidade nãoseriadoINAMPS,considerando-seoslimitesdeatribuiçõesfirmadosnoconvênioentreareferidaautarquiaeohospital(fls.623-644).

O autor apela adesivamente requerendo a majoração do valor da indenização pelo dano moral para R$ 300.000,00, considerando-se que a de cujusficouemestadovegetativopormaisdequatorzeanos(fls.652-656).

Comaapresentaçãodecontrarrazões(fls.663-665e671-674),vieramos autos a esta Corte.

A representante do Ministério Público Federal ofertou parecer pelo desprovimentodosrecursos(fls.686-689).

É o relatório.

VOTO

A Exma. Sra. Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria: Insurgem-se os apelantes contra a sentença de parcial procedência prolatada nos autos de ação ordinária na qual se postula o pagamento de indenização por danos morais e materiais decorrentes de erro médico.

Inicialmente, desacolho a preliminar de ilegitimidade passiva susci-tada pela União. Com efeito, o médico responsável pela avaliação da de cujus era credenciado do INAMPS, que, inclusive, emitiu “Autorização de InternaçãoHospitalar” (fl. 263).Em situações fáticas similares àveiculada no processo em tela, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte admite a responsabilização do ente federal por ato de médico credenciado do INAMPS. Vejamos:

“ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. NEGLIGÊNCIA MÉDICA. HOSPITAL CONVENIADO DO INAMPS. LEGITIMI-

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DADE PASSIVA DA UNIÃO COMO SUCESSORA.1. A clínica médica onde ocorreu o atendimento do qual resultou a morte do feto,

por negligência médica comprovada, era conveniada do INAMPS.2. Como a União é sucessora da autarquia federal extinta, nos termos da Lei

8.689/93(art.1º,§único),épartelegítimaparafigurarnopolopassivodeaçãoporresponsabilidade civil.

3. Recurso especial improvido.” (REsp 874.225/RJ, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 07.10.2008, DJU 04.11.2008)

“RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO CREDENCIADO NO INAMPS. LE-GITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO FEDERAL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. 1.AUniãoestálegitimadaafigurarnopolopassivodedemandaintentadaparaobterindenização em razão de lesão sofrida em razão de cirurgia realizada por médico do INAMPS. 2. Comprovados o dano e o nexo de causalidade entre a cirurgia realizada por médico credenciado no INAMPS e a lesão sofrida pela paciente, incide o artigo 37, § 6º, da Constituição ensejando a reparação pretendida. 3. Cabível a condenação em dano moral quando o dano estético é relevante.” (TRF4, AC 2000.04.01.140802-9, Terceira Turma, Relatora Maria de Fátima Freitas Labarrère, DJ 23.04.2003)

Ademais, entendo que está correta e em consonância com a jurispru-dência a exclusão do polo passivo dos Médicos Norton Aerts e Arthur Veronese, considerando-se que a discussão deve prosseguir apenas contra o Hospital Parque Belém e contra a União Federal, pois as modalidades de responsabilidade civil são distintas.

No mérito, mantenho a bem lançada sentença de lavra da MM. Juíza Federal Substituta, Dra. Clarides Rahmeier, que bem deslindou a con-trovérsia, em fundamentação a que adiro:

“(...) QUANTO AO MÉRITO. No mérito, é parcialmente procedente a ação porque a União Federal e o Hospital Parque Belém são responsáveis por parte da indenização requerida pela parte autora.

Em resumo, a autora seria submetida a cirurgia de varizes, que não foi levada a efeito porque a autora apresentou reação alérgica à anestesia, do que restaram seque-las irreversíveis. Antes da cirurgia a autora foi avaliada por médico credenciado no INAMPS, o qual solicitou os exames que entendeu necessários à avaliação da autora. Aparteautoradizqueessaavaliaçãofoideficiente,poisnãodetectouaalergia,equeem razão da aplicação da substância a autora teria sofrido os danos, os quais teriam sido agravados pelo atendimento defeituoso posteriormente prestado no hospital, o que culminou com uma infecção hospitalar.

Da responsabilidade da União Federal – A União responde neste feito pelo extinto INAMPS. No presente caso, antes da cirurgia a autora foi examinada por médico cre-denciado no INAMPS, o qual fez os exames que considerava necessários à avaliação

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da viabilidade da cirurgia, que seria por ele realizada. A autora foi considerada apta à cirurgia, porém, apresentou reação alérgica à anestesia. A alegação da parte autora é no sentidodequeaavaliaçãopréviafoiinsuficiente,tantoqueocorreramascomplicações.Como é comum nessas situações envolvendo serviços de saúde, a problemática está naquestãodaprova.Seessaavaliaçãofoimesmoinsuficiente,háresponsabilidadeda União em razão da avaliação feita pelo médico que era credenciado nessa extinta autarquia.Nãoháprovasnosautosquedemonstremainsuficiênciadessaavaliação.Porém, em se tratando de responsabilidade objetiva da União, basta a comprovação da conduta (não necessariamente culposa), do dano e do nexo causal. Os danos são indiscutíveis,restandoapenasverificarseexistenexocausalentreeleseacondutadomédico que fez a avaliação. Esse nexo deve ser analisado com cautela porque em certa medida se confunde com a comprovação da culpa. Em outras palavras, não se pode exigiracomprovaçãodaculpadomédicoparaqueentãosejaconsideradainsuficienteaavaliação, pois nesse caso a responsabilidade objetiva seria transformada em subjetiva. Neste caso, havendo a alegação da parte autora no sentido de que os danos poderiam ter sido evitados caso a avaliação tivesse sido mais criteriosa (alegação perfeitamente plausível), e não havendo prova em contrário, entendo que está constituído o nexo causal porque, conforme já explicado, exigir prova maior seria o mesmo que exigir prova da culpa, o que não é necessário em se tratando de responsabilidade objetiva. Além disso, mesmoquesejaumavisãoleigadoassunto,parecequenãoverificarseapessoaeraou não alérgica à droga que seria utilizada é uma conduta equivocada. Por essas razões entendoqueestáconfiguradoonexocausalentreacondutadomédicocredenciadono INAMPS (conduta pela qual a União responde) e os danos sofridos pela autora, gerando dever de indenizar por parte da União, uma vez que não há comprovação de fato desconstitutivo do direito alegado pela parte autora.

A jurisprudência vem entendendo que a União é responsável pelos danos decorrentes de condutas de médicos credenciados no INAMPS, na forma do art. 37, § 6º, da CF/88. Nesse sentido o seguinte precedente do TRF4:

(...)Por essas razões, a responsabilidade da União Federal é objetiva, com base no §

6º do art. 37 da CF/88, tendo o dever de indenizar a autora pelos danos causados, de forma solidária com o Hospital Parque Belém, conforme passo a analisar.

Da responsabilidade do Hospital Parque Belém – A cirurgia seria realizada no Hospital Parque Belém, com base no convênio existente entre esse hospital e o extinto INAMPS(fls.270-278),nãotendoocorridoaintervençãoemrazãodascomplicaçõesapresentadas pela autora Carmem Doroti após a aplicação da anestesia. Segundo a parteautora,osexamesrealizadosnohospitalparaverificarqualdrogaanestésicaseriaaplicada ofereceram um diagnóstico prematuro e inverídico, tanto que a aplicação da anestesiacausousériassequelasnaautora,ficandoestaemestadovegetativo.Alémdisso,alegaqueoatendimentoprestadopelohospitalapósessesfatosfoideficiente,vindo a autora a sofrer uma infecção hospitalar que lhe agravou o estado de saúde.

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Porfim,dizqueohospitaldeualtaàautorae,apósisso,nãoprestouqualquerauxílioa esta. Essas são as alegações da parte autora que pesam contra o hospital.

Está devidamente provado nos autos que a autora foi acometida por uma infecção hospitalar,sendoclaroo laudopericial (fls.223-225)nosentidodequea infecçãocontribuiu para o agravamento do estado neurológico da autora. Embora as demais alegações não tenham sido provadas documentalmente, os fatos indicam que houve falha na avaliação quanto à viabilidade da cirurgia ou na aplicação da anestesia ou no próprio serviço prestado pelo hospital. Só assim seria possível que a autora, tendo entrado no hospital em perfeitas condições de saúde, acabasse sofrendo as sequelas descritas nestes autos. Assim, embora não existam provas cabais de que os exames preliminares tenham oferecido um diagnóstico prematuro e inverídico ou de que os serviçosprestadosforamdeficientes,ésimplesmenteinaceitávelqueumapessoasau-dável vá ao hospital para fazer uma cirurgia e antes mesmo da intervenção reste com sequelas irreversíveis. Tendo ocorrido isso, é muito provável que em algum momento houve falha, sendo então da responsabilidade do hospital, juntamente com a União, arcar com a indenização devida, já que não demonstraram a existência de causa exclu-dente da responsabilidade. Neste ponto deve ser aplicado o mesmo raciocínio utilizado com relação à União: não se pode exigir que a parte autora prove onde ocorreu a falha porque esta é uma prova muito difícil, razão pela qual tal exigência poderia inviabili-zar a indenização. Se a parte autora alegou e há plausibilidade nessas alegações, não havendo prova em contrário, deve-se considerar que o atendimento prestado à autora não foi adequado porque, conforme dito acima, se a parte autora ingressou no hospital em perfeitas condições de saúde e, mesmo sem realizar a intervenção cirúrgica, restou com sequelas irreversíveis, é muito provável que alguma falha ocorreu. Além disso, estando evidente o nexo causal entre os danos sofridos pela autora e a sua internação no hospital, já estão presentes os requisitos ensejadores da responsabilidade deste, visto que a sua responsabilidade é objetiva porque estava prestando um serviço público, situação essa que está prevista no § 6º do art. 37 da CF/88 como sendo de responsabilidade objetiva: as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Por essas razões o Hospital Parque Belém tem o dever de indenizar a autora pelos danos causados, de forma solidária com a União Federal.

DOS DANOS: Demonstrado o dever de indenizar por parte da União e do Hospital ParqueBelém,cabeagoraanalisarquaissãoosdanosindenizáveisefixarovalordaindenização. (...)”

Portanto, entendo que são indiscutíveis os fatos narrados na exordial, considerando-sequeaautoraorigináriaficouemestadovegetativodesde07.01.1991 até o seu falecimento, ocorrido em 01.06.2005, ou seja, por maisdequatorzeanos.Sehouvessesidoverificado,antesdacirurgia,se

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a de cujus era ou não alérgica à droga que foi utilizada, os danos pode-riam ter sido evitados mediante uma avaliação mais cuidadosa, estando configuradoonexocausalentreacondutadoMédicocredenciadodoINAMPS, conduta pela qual responde a União, e os danos sofridos.

Ademais, ressalvo que o laudo pericial comprovou que a autora ori-ginária sofreu infecção hospitalar no Hospital Parque Belém, fato esse que contribuiu demodo significativo para o agravamento do estadoneurológicodadecujus(fls.223-225)eevidenciaaresponsabilidadedo nosocômio pelo evento lesivo, pelo qual responde de forma solidária com a União.

Estabelecidas as premissas necessárias para a contextualização da controvérsia posta em julgamento, passo a aferir o valor da indenização pelo dano moral, cujo arbitramento é ato complexo para o julgador, que deve sopesar, dentre outras variantes, a extensão do dano, a condição socioeconômica dos envolvidos, a razoabilidade, a proporcionalidade, a repercussão entre terceiros, o caráter pedagógico/punitivo da indeni-zação e a impossibilidade de se constituir em fonte de enriquecimento indevido.

No que pertine às mencionadas variantes, para o correto deslinde da questão, transcrevo excerto da fundamentação da sentença recorrida, que bem aprecia tais vetores, senão vejamos:

“(...) Da indenização por danos morais – A parte autora requer indenização por danos morais causados à autora Carmem Doroti Silva Pinheiro e a seus familiares, consistente no pagamento de valor com base no piso nacional de salários, incidente desde a data do evento danoso até que a autora atingisse 60 anos de idade.

Com relação ao pedido de indenização pelos danos morais causados aos familiares da autora Carmem Doroti, considerando que esses danos foram causados aos familiares da autora, não cabe a este juízo analisar o mérito desse pedido porque já foi reconhecida preliminarmente a ilegitimidade ativa da parte autora para pleitear indenização por danos causados aos seus familiares, tendo sido extinto o processo com relação a esse pedido, sem resolução do mérito, com base no art. 267, VI, do Código de Processo Civil.

Com relação aos danos morais causados à parte autora, conforme já dito nesta sen-tença, esses danos são evidentes e ensejadores de indenização, tendo em vista as sequelas referidasnolaudopericialdasfls.223-225.Conformejáanalisado,tantooHospitalParqueBelém quanto a União são responsáveis pelos danos causados à autora, restando agora apenasfixaroquantum dessa indenização devida à autora a título de danos morais.

Da fixação da indenização pelos danos morais causados à autora Carmem Doroti Silva Pinheiro – O valor pedido pela parte autora é apenas uma sugestão, visto que

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cabe ao juízo arbitrar o montante da indenização a título de danos morais, considerando principalmente a capacidade econômica das partes, o seu grau de culpa, a repercussão dos danos e a necessidade de justa reparação, sem que isso importe no enriquecimento sem causa da parte lesada.

No presente caso, as sequelas descritas no laudo de fls. 223-225 são muito graves. A autora ingressou no hospital em boas condições de saúde e, por ocasião da aplicação da anestesia (ainda antes de realizar o procedimento cirúrgico), apresentou reação alérgica e permaneceu em estado grave, vindo posteriormente a sofrer uma infecção hospitalar. Também foi realizada cirurgia de traqueotomia. O laudo das fls. 223-225 refere sequelas permanentes de ordem física, neurológica e psíquica. Resumindo, a autora Carmem Doroti permaneceu em estado praticamente vegetativo desde o evento, ocorrido em 17 de janeiro de 1991, até seu falecimento, em 01 de junho de 2005, aos quarenta e cinco anos de idade. Em razão das sequelas, a autora ficou impossibilitada de dar aos filhos a devida atenção, os cuidados e a proteção de que necessitavam, visto que ainda eram crianças, conforme certidões de nascimento das fls. 14-16. Por força das sequelas, não foi possível que a autora acompanhasse seus filhos na fase mais importante das suas vidas.

No presente caso a melhor forma de indenizar, tendo em vista inclusive o óbito daautoraCarmemDoroti,édaralgumaformadesatisfaçãoaosfilhosdesta,jáqueobem-estardosfilhoscertamenteeraoqueaautoramaisqueria,masquenãotevechance de buscar em razão do infortúnio. Na petição inicial foi referido que a autora e seu esposo eram pessoas pobres e de baixa instrução educacional. Para as famílias de origem humilde, um dos principais objetivos na vida é ter moradia própria. Muito se fala que esse é o sonho de todos os brasileiros, mas evidentemente para as famílias humildes é um sonho difícil de realizar. Por isso entendo que no presente caso a forma maisjustadeindenizarédaraosfilhosqueaautoraCarmemDorotideixouaofalecer(RobsoneTiago–fl.438)ovalornecessárioàaquisiçãodeumaresidênciaprópriaporcadafilho,considerandoolocalondemoram(Viamão).OvalordeR$50.000,00ésuficienteparaaaquisiçãodeumamoradiadignaemViamão.Poressasrazões,arbitroa indenização no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Esse é o valor da indenização devida a título de danos morais, na data desta sentença. (...)” (destaquei)

Sendo assim, entendo que o montante de R$ 100.000,00 (cem mil reais),metadeparacadafilhodadecujus,ésuficienteparabemrepararos danos sofridos, de modo que merece ser mantido. Ademais, o valor pretendido pela parte autora, que almeja a majoração do valor da indeni-zação para R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), é excessivo e acarretaria indevido enriquecimento sem causa, vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.Ajurisprudênciaratificaoentendimentoesposado.Vejamos:

“AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENI-

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ZAÇÃO. DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. VEDAÇÃO. SÚMULA Nº 7/STJ.

(...) 2. O valor da indenização sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça,

sendo certo que, na sua fixação, recomendável que o arbitramento seja feito com mo-deração, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores e, ainda, ao porte econômico dos réus, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso e atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso.

3. In casu, o quantumfixadopeloTribunala quo a título de reparação de danos morais mostra-se razoável, limitando-se à compensação do sofrimento advindo do evento danoso.

4. Agravo regimental improvido.” (AgRg no Ag 884.139/SC, Rel. Ministro João Otá-vio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 18.12.2007, DJ 11.02.2008, p. 1) (grifei)

Quanto ao prequestionamento, não há necessidade do julgador mencionar os dispositivos legais e constitucionais em que fundamenta sua decisão, tampouco os citados pelas partes, pois o enfrentamento da matériapormeiodojulgamentofeitopeloTribunaljustificaoconheci-mento de eventual recurso pelos Tribunais Superiores (STJ, EREsp nº 155.621-SP, Corte Especial, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 13.09.99).

Ante o exposto, voto por negar provimento às apelações e ao reexame necessário.

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 2000.71.00.008764-0/RS

Relatora: A Exma. Sra. Desa. Federal Marga Inge Barth TesslerRel. p/ acórdão: O Exmo. Sr. Des. Fed. Edgard Antonio Lippmann Júnior

Apelante: Osorio Caon PiresAdvogados: Drs. Maria Jecira dos Santos Zanata e outros

Apelado: Hospital de Clínicas de Porto AlegreAdvogados: Drs. Cláudia Helena Schmitt Peres e outros

EMENTA

Responsabilidade civil. Requisitos. Infecção hospitalar. Dano moral e estético. Prova. Indenização.

Presente o nexo de causalidade entre os danos estéticos e morais, comprovados pelo autor, e o tratamento médico realizado nas depen-dências do Hospital.

Devido o pagamento de indenização em face dos transtornos físicos e psicológicos vivenciados pelo autor. Respeito ao princípio da razoa-bilidade, que deve coroar as decisões desta natureza.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indi-cadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, dar provimento à apelação, nos termos dorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrante do presente julgado.

Porto Alegre, 1º de abril de 2009.Des. Federal Edgard Antonio Lippmann Júnior, Relator para o

acórdão.

RELATÓRIO

A Exma. Sra. Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler: Trata-se de recurso de apelação proposto por Osório Caon Pires visando reformar sentença que julgou improcedente ação ordinária indenizatória. Pre-tende o ora apelante receber indenização por danos materiais, morais e estéticos em razão de infecção hospitalar adquirida, segundo sus-

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tenta, em cirurgia, que teria causado ao autor paralisia facial do lado esquerdo.

O apelante alega que a sentença vergastada afronta o princípio do con-traditório e da ampla defesa por não ter possibilitado à parte recorrente o envio de quesitos complementares. Ainda, por não ter deferido o pedido de realização de prova testemunhal. Requer a nulidade da sentença por cerceamento de defesa ou, no mérito, a sua reforma com o julgamento pela procedência da ação.

A parte apelada apresentou suas contrarrazões ao recurso de apelação. Baseou sua argumentação na ausência de nexo causal entre o atendimento despendido ao autor e a paralisia facial ocorrida. Também informa que, conforme esclarecimento dos peritos, o quadro do autor é de paresia fa-cial, e não paralisia facial, sendo aquela apenas uma paralisia parcial.

É o relatório.

VOTO

A Exma. Sra. Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler: Não houve cerceamento de defesa, na presente demanda, como alega a parte recor-rente. A própria sentença a quomuitobemconcluiuaoafirmarqueaprova oral não era necessária, estando a matéria fática esclarecida pela perícia. Assim, não haveria necessidade de produzir a requerida prova, uma vez que a perícia já havia prestado os esclarecimentos necessários para a resolução da demanda.

Igual sorte segue a alegação de que ocorreu cerceamento de defesa pelo não deferimento de quesitos suplementares. A perícia esclareceu suficientementequenãohouveinfecçãohospitalar,fundamentodopedidodo autor. Ora, se o autor adentrou o hospital de clínicas com processo infeccioso no ouvido, não há como atribuir tal fato ao réu. Ademais, comobemafirmouoJuizsentenciante,osmesmosforamapresentadosintempestivamente, “já que apresentados após o laudo, quando deveriam ter sido oferecidos antes da entrega do laudo, ainda durante os trabalhos periciais(cf.CPC,art.425;STRJ,REspnº110.784-SP)”(fl.142).

DispositivoAnte o exposto, voto por negar provimento ao apelo.É o voto.

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VOTO-VISTA

O Exmo. Sr. Des. Federal Edgard Antonio Lippmann Júnior: Exa-minando o judicioso voto apresentado, em confronto com os elementos contidos nos autos, inclusive a prova pericial realizada, vou pedir vênia à ilustre Relatora, sem embargo, por óbvio, à sua invejável cultura ju-rídica.

No caso dos autos, incontroverso que a natureza jurídica da Apelada é a de uma empresa pública federal (criada pela Lei nº 5.604, de 02.09.70), vinculada à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (vide art. 15 do seuEstatuto,fls.45-8),tantoqueiniciadooprocessoperantea17ªVaraCível da Justiça Estadual; entretanto, deslocada a competência para a JustiçaFederal(videdespachodefl.54).

Incontroverso nos autos que o Autor/Apelante, na ocasião servidor da Apelada, após se submeter a cirurgia de drenagem do ouvido esquerdo, no serviço de emergência mantido pela Apelada, em 26.03.91, continuou a sofrer da infecção que entendera debelada pelo ato cirúrgico, tanto que submetido a várias outras internações (em 31.03.91, 01.04.91, etc), e, em consequência dessa evolução, veio a desenvolver paralisia facial no lado esquerdo,comdesfiguraçãoestática,emrazãodoquesofreualteraçãofisionômica, inclusive com lacrimejação constante, seja quando fala,seja quando se alimenta, tudo conforme mencionado no laudo pericial defls.125-7.

Para o deslinde da controvérsia, há examinar alguns elementos acerca da responsabilidade objetiva e da teoria do risco administrativo.

Sobre o assunto, pertinente a transcrição da ementa que segue:“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL

DO PODER PÚBLICO. HOSPITAL. CONTAMINAÇÃO E MORTE DE PACIENTE EM RAZÃO DA TRANSFUSÃO DO SANGUE. HIV. ART. 37, § 6º, DA CF/88. 1. Realmente, in casu, restou comprovado o nexo de causalidade para a responsabilidade objetiva dos réus em razão da contaminação e morte do paciente, incidindo, assim, o disposto no art. 37, § 6º, da CF/88. - Na doutrina, colhem-se os seguintes ensinamentos, verbis: ‘No plano da responsabilidade civil do Estado, refere Teresa Ancona Lopez que a responsabilidade pelos danos sofridos em hospitais públicos, bem como naqueles que têm convênio com o INSS, deverá ser informada pela teoria objetiva, pois se trata de responsabilidade de agente do Poder Público, a teor do art. 107 da Constituição de 1969: acórdão pioneiro, publicado na RF 89/178, datado de 16.09.41, estabeleceu a

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responsabilidade do Estado pela cegueira consequente de infecção adquirida por pessoa internada em hospital mantido pelo Estado.’ (YUSSEF SAID CAHALI, in Responsa-bilidade Civil do Estado, 2. ed., Malheiros Editores, 1995, p. 327, n. 60) – (omissis), e AGUIAR DIAS, in Da Responsabilidade Civil, 7. ed., Forense, 1983, v. I, p. 349-350, n. 150. Outro não é o entendimento adotado pela jurisprudência, verbis: ‘Responsabilidade civil de hospital. Ato de enfermagem praticado por empregado seu (enfermeiro) em doente internado no estabelecimento, ocasionando perda parcial de membro superior. Efeitos. II. Na indenização inclui-se o dano moral (mutilação). (...)’ (RE nº 73.788-GB, rel. Min. THOMPSON FLORES, in RTJ 62/255). – ‘Responsabilidade Civil – Infecção hospitalar. A obrigação médica não é evidentemente obrigação de resultado, o mesmo devendo ser dito da instituição hospitalar. Não se exige que assuma o dever de curar, de remediar todos os males, de vir a responder pela própria vida do paciente. Mas é evidente obrigação de meio de não abandonar o paciente, sequer sem assistência doméstica ou ambulatorial.’ (TJSP, 8ª C., 03.03.88, rel. FONSECA TAVARES, verb. 38009, p. 218, in ADCOAS 1988). – ‘ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. OPERAÇÃO CIRÚRGICA. ANESTESIA. ACIDENTE. CASO FORTUITO. NEXO DE CAUSALIDADE. I. É obrigação do Estado indenizar o dano resultante do ato lesivo que foi causador, se a vítima não concorreu para o dano. II. O caso fortuito nem sempre elide a responsabilidade do Estado, se existiu nexo causal entre o comportamento estatal e o dano. III. Responde o Estado pelo acidente ocorrido durante uma anestesia, em seus hospitais, ainda que não tenha o médico agido com negligência, imperícia ou imprudência, desde que tenha ocorrido nexo de causalidade entre o ato lesivo e o dano.’ (TRF da 1ª Região, AC nº 93.01.33571-9/GO, rel. Juiz TOURINHO NETO, in LEX 56/420). – ‘RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTA-DO - CEGUEIRA CONSEQUENTE A INFECÇÃO ADQUIRIDA EM HOSPITAL. O Estado responde pela cegueira consequente a infecção adquirida por pessoa internada em hospital por ele mantido. Fazenda do Estado versus Josina Lopes Ap. nº 13.239 - Relator: DESEMBARGADOR MÁRIO GUIMARÃES Ac. unânime da 2ª Câmara Civil do Trib. de Ap. de São Paulo, em 16 de setembro de 1941.’ (Revista Forense n. 89/178) - Ademais, não há que se falar, pois, nestes autos, em fato fortuito. Aliás, mesmo que se admitisse aqui tal indagação, ver-se-ia, segundo a melhor doutrina, que o fortuito é indiferente para a aferição da responsabilidade objetiva do Estado, quando, como é o caso em exame, se demonstra o mau funcionamento de seus serviços. – (omissis) 2. Apelação adesiva conhecida e parcialmente provida, negando-se provimento aos apelos dos réus e respectivas remessas de ofício.” (AV 2001.04.01.020561-9/SC, TRF 4ª Região, Terceira Turma, rel. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, maioria, dec. 22.04.2003, publ. DJU 07.05.2003, p. 667)

Pelos elementos contidos nos autos, está devidamente comprovado o nexo de causalidade entre o ato da Apelada-HCPA e o dano causado àautora,comreflexosnasuavida–danosmorais–,configurando-sea

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responsabilidade decorrente da teoria do risco administrativo da Ré, ex vi do disposto no art. 37, § 6º, da Carta Magna, devendo a mesma arcar com a indenização pelos danos materiais – a efetuar cirurgia reparadora – e danos morais.

Concluo que falhou o hospital Apelado ao permitir que a infecção tomasse projeção maior quando da primeira internação do Apelante, deixando, também, de efetuar a monitoração contínua do estado clínico domesmoafimdequenãooferecesseaqueledanodiagnosticado.

Além do mais, o caso fortuito se caracteriza pela imprevisibilidade da ocorrência, que não houve no caso, ocorrendo, isto sim, a falha da instituiçãonafaltadeacompanhamentomaiseficazdamoléstiaqueoApelante estava vitimado, razão pela qual deve ser condenada por danos materiais,afimderealizaracirurgiareparadoranomesmo.

Prosseguindo, há de ser analisado o valor dos danos morais. Diante do caráter punitivo e ressarcitório da reparação do dano moral, entendo quefixarumvaloraessetítulonãoétarefanadafácil,umavezquesetrata de danos subjetivos, sentidos e passados pela vítima, competindo aojulgadortransformaressadoremdanosobjetivos,ouseja,fixarumvalor.

Nãotendoaleidefinidoparâmetrosparaaindenizaçãopordanosmo-rais, cabe ao juiz a tarefa árdua de decidir caso a caso, de acordo com o seu “prudente arbítrio”. Como arbítrio não é sinônimo de arbitrariedade, tem-se procurado encontrar no próprio sistema jurídico alguns critérios que tornem essa tarefa menos subjetiva. Invocam-se, antes de tudo, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, de modo a afastar indenizações desmedidas, despropositadas, desproporcionais à ofensa e ao dano a ser reparado. Nessa linha, assim se pronunciou o STJ:

“(...)VI–Aindenizaçãopordanomoraldeveserfixadaemtermosrazoáveis,nãosejustificandoqueareparaçãovenhaaconstituir-seemenriquecimentoindevido,devendoo arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao porte empresarial das partes, às suas atividades comerciais e, ainda, ao valor do negócio. Há de orientar-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida, notadamente à situação econômica atual e às peculiaridades de cada caso.

VII–Afixaçãodovalorindenizatóriopordanomoralpodeserfeitadesdelogo,nestainstância,buscandodarsoluçãodefinitivaaocasoeevitandoinconvenientesere-tardamento da prestação jurisdicional.” (REsp 203755/MG, STJ, 4ª Turma, unânime, rel.

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Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, dec. 27.04.99, publ. DJ de 21.06.1999, p. 167)

Nocasoàliça,entendoquedevaserfixadoovalordeR$20.000,00(vinte mil reais) atualizados monetariamente e com os juros legais a partir dessa data, valor este que me parece adequado considerando-se o casoespecíficoeosprincípiosacimacitados,estandoharmonizadocomohabitualmentefixadoporestaTurma.Fixoaverbahonoráriaem10%sobre o valor da condenação.

Dou por pré-questionados todos os artigos constitucionais e legais tratados na presente decisão.

Pelo exposto, com a vênia da ilustre Relatora, voto por dar provimento à apelação, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2003.70.00.044720-4/PR

Relatora: A Exma. Sra. Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler

Apelante: Herton Luiz Pompeo MadeiraAdvogados: Drs. Araripe Serpa Gomes Pereira e outros

Apelada: Caixa Econômica Federal – CEFAdvogados: Drs. Luis Renato Sinderski e outros

EMENTA

Direito civil e administrativo. Fundos de investimento. Administração. Fiscalização. Prejuízo ao investidor. Responsabilidade civil.

1.Osfundosdeinvestimentopodemserderendafixaouvariável.Em qualquer deles, o fundo é constituído sob a forma de condomínio aberto e representa uma comunhão de recursos destinados à aplicação emcarteiradiversificadade ativosfinanceiros edemaismodalidadesoperacionaisdisponíveisnoâmbitodomercadofinanceiro.

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2.Aadministraçãodo fundo é realizadapor instituiçãofinanceiraque não responde por sua lucratividade, mas apenas pela gestão, pois a rentabilidade é estreitamente relacionada à variação dos títulos que integram a carteira que o compõe.

3. Até o advento das Lei nos 10.303/2001 e 10.411/2002, os fundos de investimento cujas carteiras fossem compostas, preponderantemente, por títulospúblicoseramfiscalizadospeloBACEN.Fundosdeinvestimentoem ativos mobiliários (títulos e valores mobiliários, como as ações), por suavez,eramfiscalizadospelaCVM.Desdeaediçãodasreferidasleis,incumbe apenas à CVM a providência.

4.Àfiscalização incumbe verificar a precificação dos ativos queintegram as carteiras dos fundos, que são dados determinantes do valor do fundo de investimento e de suas cotas. Regulado novo critério de avaliação patrimonial (marcação a mercado), não se pode imputar à Administração do Fundo responsabilidade por eventual prejuízo ex-perimentado pelo investidor, já que não há ilicitude de sua conduta em adequar-se à norma vigente.

5.Fundoscomremuneraçãopós-fixadanãosãoisentosderiscos.Oganho, assim como a perda, é parte integrante da opção pela modalidade de investimento.Ademais, amudançadoscritériosdeprecificaçãoécaracterizada pela inevitabilidade de sua observância pela Administra-dora do Fundo. Tampouco poder-se-ia imputar à CVM ou ao BACEN responsabilidadeporeventualprejuízo,umavezqueórgãosdefiscaliza-ção apenas tomaram as providências cabíveis para evitar prejuízos ainda maiores aos investidores, considerando a realidade macroeconômica.

6. Tendo havido a disponibilização ao investidor de informações quanto aos riscos do investimento, tampouco se pode imputar à CEF violaçãoaodeveranexodeinformar,peloquenãoconfiguradaaobri-gação de indenizar.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencido o Juiz Federal Márcio Rocha, negar provimento à apelação,nostermosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendo parte integrante do presente julgado.

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Porto Alegre, 03 de junho de 2009.Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler, Relatora.

RELATÓRIO

A Exma. Sra. Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler: Trata-se de apelação (fls. 198-281) interposta contra sentença (fls. 269-279) quejulgou improcedente o pedido do autor, formulado para que a ré fosse condenada a ressarci-lo a importância de R$ 2.435,00, acrescida de ren-dimentos, juros e correção monetária, relativa à perda havida em fundo de investimento sob sua administração.

Em suas razões, sustenta o apelante, basicamente, que: a) houve ne-gligência dos administradores do fundo quanto à marcação a mercado; b) o fundo Caixa FIF DI, cujas cotas adquiriu, resultando em perda de suapoupança,eraderendafixa,atreladoàvariaçãodoCertificadodeDepósitoInterfinanceiro–DI,peloquenãoseriaadmissívelperda;c)quemcausaprejuízoaoutremficaobrigadoarepararodano,razãopelaqual, tendo perdido valores no investimento, deve a ré indenizá-lo; d) invoca a boa-fé objetiva e a Teoria da Aparência; e) “se quisesse se aven-turaremumaaventurafinanceira,teriaaplicadoemumfundodeações,enãonumfundoderendafixaDIcomgarantiaderentabilidadedenomínimode95%doCertificadodeDepósitoInterfinanceiro”;f)ovalordas cotas do fundo à época de sua aquisição não corresponderia ao seu valor real, pelo que a ré não deveria ter comercializado as cotas – tema em relação ao qual invoca a Portaria BACEN nº 3.096/2002; g) o fato de ser obrigatória a condição de correntista da ré, bem como fazer uso de débito em conta corrente junto à ré, demonstra sua responsabilidade pelos prejuízos – o que se corrobora pelo pagamento de taxa de administração de 2%; h) caberia à CEF, e não ao autor, a demonstração de que recebidas as informações quanto ao fundo de investimento em questão; i) invoca o Código de Defesa do Consumidor, notadamente quanto à publicidade e à responsabilidade do fornecedor de serviços.

Contra-arrazoado o apelo, subiram os autos.Distribuídos os autos em 13.09.2004 ao Des. Federal Amaury Chaves

de Athayde, foram-me atribuídos por ocasião de sua remoção.É o relatório.

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VOTO

A Exma. Sra. Desa. Federal Marga Inge Barth Tessler:

1 Dos objetivos e riscos do fundo de investimento Caixa FIF DI

O Fundo Caixa FIF-DI, cuja responsabilidade pela desvalorização controverte-se no presente caso, tem seus objetivos descritos no prospecto dafl.102eseguintes.Leia-se:

“Objetivos:O fundo tem como objetivo proporcionar aos condôminos a valorização de

suascotasmedianteaaplicaçãodosrecursosemcarteiradiversificadadeativosemodalidadesoperacionaisdomercadoderendafixa,atendendoaosrequisitosdoart.2ºdacirculardoBACEN,tendocomoparâmetrodeperformanceoCertificadodeDepósitoInterfinanceiro–DI(CETIP),observadososriscosdeflutuaçãodoindicador.

A carteira do fundo é composta por, no mínimo, 80% de títulos de emissão do TesouroNacionale/ouBACENetítulosouvaloresmobiliáriosderendafixa,cujoemissorestejaclassificadonacategoriadebaixoriscodecréditoouequivalente,comcertificaçãoporagênciadeclassificaçãoderiscolocalizadanoBrasil.

Nomínimo,95%desuacarteiradevesercompostaporativosfinanceirose/oumodalidades operacionais de forma acompanhar, direta ou indiretamente, a variação doCertificadodeDepósitoInterfinanceiro–DI.

As operações nos mercados de derivativos e de liquidação futura ou a termo são utilizadascomoobjetivodemanteroperfilderendimentodoindicadordedesempenhoescolhido, não sendo permitida a alavancagem.”

Quanto aos riscos, consta, ainda, do prospecto estar o fundo sujeito a: a) risco proveniente do uso de derivativos; b) risco de liquidez; c) risco de crédito (relativo aos emissores dos títulos ou valores mobiliários que façam parte da carteira do fundo); e d) risco de mercado – “decorrente das oscila-çõesnospreçosdosativosquecompõemofundo,emvirtudedeflutuaçõesnas taxas de juros, índices de preços, taxa de câmbio etc., bem como dos resultados das empresas cujos valores mobiliários compõem a carteira do fundo, podendo inclusive, quando houver queda nos preços dos ativos, o patrimônio líquido variar negativamente. As perdas podem ser temporárias, não existindo, contudo, garantias de que possam ser revertidas ao longo do tempo”.

Isso posto, procedo a breve digressão quanto à natureza do fundo.

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2 Da natureza do Fundo Caixa FIF DI

Sabe-se que os fundos de investimento podem ser de rendafixaou variável. Em qualquer deles, o fundo é constituído sob a forma de condomínio aberto e representa uma comunhão de recursos destinados à aplicação em carteira diversificada de ativosfinanceiros e demaismodalidadesoperacionaisdisponíveisnoâmbitodomercadofinanceiro(Circular BACEN nº 2.616/95).

O investidor adquire uma determinada quantidade de cotas, alcança-da pela divisão do valor investido e o preço da cota no dia da aquisição (Circular BACEN nº 2.616/95). O valor da cota corresponde à valoriza-ção/desvalorização dos títulos que compõe a carteira do próprio fundo, sendo determinado pela divisão do patrimônio do fundo pelo número de cotas emitidas.

Aadministraçãodofundoérealizadaporinstituiçãofinanceiraque,como se sabe, não responde por sua lucratividade, mas apenas pela gestão, pois a rentabilidade é estreitamente relacionada à variação dos títulos que integram a carteira que o compõe.

Nocaso,ofundoéderendafixa.Poroportuno,destacoqueseequi-vocaoautorquantoaosignificadodessadesignação.

EmboraofundoCaixaFIFDIsetratedefundoderendafixa,issonãosignificaquesejaisentoderiscos(absolutamenteseguro).Osfundosderendafixapodemtertaxaderemuneraçãolinear(pré-fixada)ouadmitiroscilação(pós-fixada),estaúltimaéahipótesedaDI,quefazreferênciaàCertificadodeDepósitoInterfinanceiro,quenadamaisédoquetítuloemitidopelasinstituiçõesfinanceirasequerepresentaasoperaçõesdecrédito entre os bancos, admitindo oscilações.

Alémdisso,adesignação“FIF”significaqueofundoderendafixaemquestãoé“fundodeinvestimentofinanceiro”,istoé,suacarteiraécompostaporativosdisponíveisnomercadofinanceiro(títulospúblicosou privados).

Por óbvio, fundos de menor risco são os que investem em papéis de maior garantia e liquidez, como são os títulos públicos, notadamente Letras Financeiras do Tesouro (LFT). Segundo narram os objetivos do Fundo Caixa FIF DI, acima transcritos, 80% da carteira seria composta de títulos de baixo risco de crédito. Ainda, dos objetivos do Caixa FIF

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DI consta que, no mínimo, 95% da carteira deve ser composta por ativos financeirose/oumodalidadesoperacionaisdeformaaacompanhar,diretaouindiretamente,avariaçãodoCertificadodeDepósitoInterfinancei-ro–DI(oquenãogarante,aocontráriodoqueafirmaoautor,95%darentabilidade desses títulos).

Verificados,portanto,osobjetivos,osriscoseanaturezadofundoemquestão,passoaexaminaraquemincumbefiscalizaroinvestimento,afimde determinar se há responsabilidade da CEF ou de terceiro no caso.

3 Da fiscalização do fundo e sua relação com o prejuízo havidopelo autor

Singelamente explicando, até o advento das Lei nos 10.303/2001 e 10.411/2002, os fundos de investimento cujas carteiras fossem com-postas,preponderantemente,portítulospúblicoseramfiscalizadospeloBACEN. Fundos de investimento em ativos mobiliários (títulos e valores mobiliários,comoasações),porsuavez,eramfiscalizadospelaCVM.

Desde a edição das referidas leis, incumbe apenas à CVM a provi-dência.

À época dos fatos, portanto, as instituições atuavam conjuntamente paraafiscalizaçãodosfundos.

Umdosaspectosconsideradospelafiscalizaçãoéa precificação dos ativos que integram as carteiras dos fundos, que, como se viu, são dados determinantes do valor do fundo de investimento e de suas cotas – ao que se atribui o prejuízo sofrido pelo autor.

Desde o início da implementação de fundos de investimento no Brasil, talprecificaçãoeradadapelanegociaçãodostítulosquecompunhamascarteiras nos leilões do BACEN (portanto, mercado primário), mais a rentabilidade original. Essa opção correspondia ao “valor de mercado” dos ativos integrantes das carteiras dos fundos e, consequentemente, era hígido para determinar o valor das cotas dos fundos e seu valor.

Ainda na década de 1990, todavia, o BACEN vinha inclinando-se amodificaressasistemáticaparaadotaramarcaçãoamercado,muitoemborasemdisporprovidênciacogenteedefinitivanessesentido.

Porém, em 15.02.2002, o BACEN editou a Circular nº 3.086/2002, que regulounovo critério de avaliaçãopatrimonial (precificaçãodosativos dos fundos FIF), o qual incluía a ação de informações externas,

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como a planilha de mercado secundário da ANDIMA – Associação Nacional das Instituições de Mercado Aberto. Segundo consta dos esclarecimentos constantes de Focus, datado de 21 de junho de 2002 (original em: http:// www4.bcb.gov.br/pec/ GCI/port/focus/B20020621-precifica%C3%A7%C3%A3o%20das%20Quotas% 20de%20 Fun-dos%20de%20Investimento.pdf), “antes de abril de 2002, avaliar os títulos com base nos preços negociados em mercado praticamente se igualava a avaliá-los com base no seu custo de aquisição adicionado da rentabilidadeoriginaldopapel”.Aexpectativa,contudo,tevereflexosno mercado, com aumento dos resgates.

A circular BACEN nº 3.096/2002 concedia prazo para o ajuste até 30.09.2002. Em 31.05.2002, exatamente a data em que investiu o autor seus recursos no fundo controvertido, todavia, a Instrução da CVM nº 365determinouqueosprocedimentosdeavaliação(precificaçãooumar-cação a mercado) deveriam ser implementados imediatamente. A opção da CVM, evidentemente, objetivava evitar mais resgates de investidores de maior porte e mais bem informados, o que causaria maior prejuízo ainda a investidores de varejo.

A adoção da nova sistemática (marcação a mercado, isto é, de veri-ficaçãodopreçoconformeomercado),demaneiraimediata,provocoudepreciação dos ativos das carteiras dos fundos – muitos de percentual aproximado a 5%, como no caso do fundo no qual investiu o autor, que viu seu investimento diminuído em R$ 2.435,00.

4 Da ausência de ilicitude da conduta da CEF

A questão que se impõe, portanto, é determinar se há ilicitude no procedimento da CEF, do qual resultou perda havida pelo autor.

Como visto, o investimento no fundo Caixa FIF DI não era isento de riscos. O ganho, assim como a perda, era parte integrante da opção pela modalidade de investimento.

Em todo caso, resta demonstrada que a perda em questão não de-correu exclusivamente de oscilações do mercado (risco naturalmente presente no investimento), sendo decorrência, preponderantemente, da modificaçãonasistemáticadeprecificaçãodosativosquecompunhamo fundo (situação excepcional, caracterizada pela inevitabilidade de sua observância pela Administradora do Fundo).

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Logo, são dois aspectos que devem ser examinados: o risco de perda decorrente do próprio investimento e o risco de perda decorrente da modificaçãoderegrasdefiscalização.

Emtempo,destaque-se,poroportuno,queamodificaçãodocritériodeprecificaçãonãoalterouapropriedade do investidor, que manteve o mesmo nº de quotas do condomínio, que teve o seu valor reduzido. Eventual recuperação era, portanto, perfeitamente admissível. A perda severificou,defato,comoresgatedovalorinvestido,oquesedeuporconta e risco do investidor.

Admitindo-se, contudo, que a perda experimentada pelo autor na sua poupançafossedefinitiva(jáqueasinformaçõesconstantesdosautosconduzem à conclusão de que houve o resgate), resta examinar se tal fato(perda,emdecorrênciadasmodificaçõesdoscritériosdeprecifi-cação, bem entendido) constitui fato ilícito a ensejar a condenação em obrigação de indenizar.

Ora, como se viu, a sistemática de precificação vigente à época dos fatos era admitida pelos órgãos fiscalizadores (CVM e BACEN), que determinavam sua alteração (para marcação a mercado) apenas a contar de 30.09.2002.

ACEF, aindaque administradorado fundo (fl. 93), não tinha au-tonomia para agir diferentemente; para ela, a adequação era medida inevitável.Instadaamodificaraformadocálculodovalordosativosem 31.05.2002, cumpriu a determinação dos entes regulamentadores – do contrário, sim, teria sido ilícita a sua conduta. Logo, a rigor, não se constata ilicitude em sua conduta.

Nesse sentido, destaco que o fato tampouco poderia ser imputado à CVMouaoBACEN,umavezqueórgãosdefiscalizaçãoapenastomaramasprovidênciascabíveis,antecipandoamodificaçãodoscritérios,paraevitar prejuízos ainda maiores aos investidores, considerando a realidade macroeconômica da época.

Por outro lado, a “surpresa”, se assim se pode chamar, decorrente daantecipaçãodosnovoscritériosdeprecificaçãoocorreuparatodos(investidores e administradores de fundos). A ré, CEF, não agiu obje-tivando causar prejuízo ao investidor, mas apenas cumpriu norma do órgão regulamentador – e disso não auferiu qualquer benefício, pelo que sequer se pode invocar a teoria do enriquecimento sem causa a ensejar

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restituição.E não se diga que houve negligência da CEF por não implementar

antesosnovoscritériosdeprecificação(marcaçãoamercado)ounãoteradvertidoosinvestidoresdequehaveriamodificaçãodessescritérios,pois, como se viu, a CEF não estava obrigada a tal providência, tendo-se limitado a cumprir as disposições regulamentares atinentes.

5 Da observância do dever de informar no âmbito da relação de consumo

Concluindo, portanto, pela ausência de ato ilícito imputável à CEF quantoàmodificaçãodoscritériosdeprecificaçãodo fundo,passoaexaminar a alegação de que não teria sido o autor devidamente informado e advertido sobre os riscos próprios da sua opção de investimento pelo banco/administradora do fundo – o que, em se tratando de relação de consumo, ensejaria a responsabilização do banco por violação ao dever anexodeinformação(nãoemrelaçãoàperdadecorrentedamodificaçãodoscritériosdeprecificação,que,comoseviu,foifatoimprevisívelenão ilícito, mas em relação à potencialidade de perda que o investimento encerraria pela sua natureza, o que poderia ter lhe sido ocultado).

Quanto ao tópico, contudo, melhor sorte não assiste ao apelante.Por oportuno, esclareço que o caso posto em julgamento distingue-se

faticamente do examinado na AC nº 2003.70.00.080812-2/PR, em cujo julgamento acompanhei o Exmo. Juiz Federal Relator Márcio Antônio Rocha, reconhecendoqueaCEFdeixoudeprestar informaçõessufi-cientes aos investidores.

Nopresentecaso,opróprioautor-apelante,naréplicadasfls.249e seguintes, afirma ter acessadoo site da ré para obter informações quanto ao investimento pelo qual optara. Ateve-se, ao que parece, a in-formações que mais lhe interessavam e que menciona, como “liquidez e rentabilidade diárias”, não tendo buscado analisar os riscos presentes na modalidade de investimento que, todavia, constavam do prospecto e regulamento disponíveis no site acessado pelo autor.

Ademais, há que se observar o senso comum: não há investimento com máxima rentabilidade e segurança. Aliás, como já exposto, “renda fixa”nãoésinônimodesegurançaplena.Esefosseessaaúnicaintençãodo autor, tivesse ele optado por outro investimento (que, claro, não lhe

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ofereceria a mesma “liquidez e rentabilidade diárias” que o atraíram ao FIF DI, mas que poderia ter lhe oferecido a segurança almejada).

Enfim,háriscoeminvestimentodessanaturezaenãohásalvo-condutocontra perdas, nem mesmo para o consumidor, especialmente quando ele não age com a cautela que dele também se esperaria, já que se limitou a examinar questões relativas ao lucro que desejava, e não aos riscos.

Defato,verificando-sequedomaterialdisponibilizadoparaocon-sumidor(cujoacessoelemesmoconfirmaemréplica)constavamrefe-rências aos riscos do investimento, não se pode imputar à CEF violação ao dever anexo de informar.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.É o voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2006.72.04.003887-4/SC

Relator: O Exmo. Sr. Juiz Federal Roger Raupp Rios

Apelante: Loreni Pinto NazarioAdvogado: Dr. Evandro Bitencourt

Apelado: Ministério Público FederalApelada: União Federal

Advogado: Dr. Luis Antonio Alcoba de Freitas

EMENTA

Ação Civil Pública. Direito ambiental. Direito à moradia. Direito internacional dos direitos humanos. Desocupação forçada e demolição de moradia. Área de preservação permanente. Posse antiga e indisputa-da. Aquiescência do poder público. Disponibilidade de alternativa para moradia. Terreno de marinha. Desnecessidade de perícia judicial. Pro-teção à dignidade humana, despejo e demolição forçada para proteção

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ambiental. Prevenção de efeito discriminatório indireto.1. Não há nulidade pela não realização de perícia judicial quanto à

qualificaçãojurídicadaáreaonderesideaautoracomoterrenodema-rinha, à vista dos laudos administrativos e da inexistência de qualquer elementoconcretoainfirmartalconclusão.

2.Aáreaderestinga,fixadoradedunas,empraiamarítima,ébempúblico da União, sujeito a regime de preservação permanente.

3. A concorrência do direito ao ambiente e do direito à moradia requer a compreensão dos respectivos conteúdos jurídicos, segundo a qual a desocupação forçada e a demolição da moradia dependem da disponi-bilidade de alternativa à moradia.

4.Cuidando-sedefamíliapobre,chefiadapormulherpescadora,ha-bitando há largo tempo e com aquiescência do Poder Público a área de preservação ambiental em questão, ausente risco à segurança e de dano maiorouirreparávelaoambiente,ficapatenteodeverdecompatibilizaçãodos direitos fundamentais envolvidos.

5. O princípio de interpretação constitucional da força normativa da Constituiçãoatentaparaainfluênciadoconteúdojurídicodeumoumaisdireitos fundamentais para a compreensão do conteúdo e das exigências normativas de outro direito fundamental, no caso, o direito ao ambiente e o direito à moradia.

6. Incidência do direito internacional dos direitos humanos, cujo conteúdo, segundo o Alto Comissariado para Direitos Humanos da ONU (The Right to adequate housing (art. 11.1): forced evictions: 20.05.97. CESCR General comment 7), implica que, “nos casos em que o despejo forçadoéconsideradojustificável,eledeveserempreendidoemestritaconformidade com as previsões relevantes do direito internacional dos direitos humanos e de acordo com os princípios gerais de razoabilidade e proporcionalidade” (item 14, tradução livre), “não devendo ocasio-nar indivíduos ‘sem-teto’ ou vulneráveis à violação de outros direitos humanos. Quando aqueles afetados são incapazes para prover, por si mesmos, o Estado deve tomar todas as medidas apropriadas, de acordo com o máximo dos recursos disponíveis, para garantir que uma adequa-da alternativa habitacional, reassentamento ou acesso a terra produtiva, conforme o caso, seja disponível”.

8. Proteção da dignidade da pessoa humana, na medida em que o su-

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jeito diretamente afetado seria visto como meio cuja remoção resultaria naconsecuçãodafinalidadedacondutaestatal,sendodesconsideradocomofimemsimesmodetalatividade.

9. Concretização que busca prevenir efeitos discriminatórios indiretos, ainda que desprovidos de intenção, em face de pretensão de despejo e demolição que atinge mulher chefe de família, vivendo em sua residên-ciacomdoisfilhos,exercendo,demodoregular,aatividadepesqueira.A proibição da discriminação indireta atenta para as consequências da vulnerabilidade experimentada por mulheres pobres, sobre quem reca-em de modo desproporcional os ônus da dinâmica gerados das diversas demandas e iniciativas estatais e sociais.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e no-tastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopresentejulgado.

Porto Alegre, 12 de maio de 2009.Juiz Federal Roger Raupp Rios, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Roger Raupp Rios: Trata-se de apelação contra sentença de procedência em ação civil pública que condenou a apelante à demolição de imóvel onde reside, bem como a apresentar e executar plano de recuperação de área degradada, por situar-se em área de preservação permanente e ser bem integrante do patrimônio da União (área de dunas e restinga, no Jardim Ultramar, Município de Balneário Gaivota, SC).

Citada, a apelante apresentou contestação a destempo, sendo decre-tada sua revelia.

As razões recursais sustentam, em síntese: a) ausência de perícia ju-dicial sobre a localização da residência em área de marinha, sendo que nas proximidades há loteamentos regularizados, não bastando a perícia juntada pela Administração; b) localizando-se a residência em zona costeira, deveria receber tratamento adequado, corretivo e preventivo; c) que se trata de residência de família ali situada há mais de 16 anos, não

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podendo a proteção ambiental suplantar o respeito à dignidade humana e o direito à moradia; d) a apelante não degradou a área nem retirou du-nas ou vegetação, descabendo a condenação em obrigação reparatória; e) a área era habitada por outras pessoas antes da apelante; f) a apelante épessoahipossuficiente,semcondiçõesdeapresentareexecutarplanode recuperação ambiental; g) que a concessão de uso especial de bem públicoparafinsdemoradialhefavorece,naformadaMedidaProvi-sória 2.220/2001.

Houve contrarrazões. O Ministério Público Federal opina pelo desprovimento do recurso. É o sucinto relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Roger Raupp Rios: O litígio envolve ques-tões constitucionais e processuais de relevo, uma vez que confrontados direitos fundamentais de grande prestígio, em especial o direito difuso ao ambiente e o direito fundamental à moradia.

Antes de examiná-los, porém, é necessário decidir quanto à validade da sentença, uma vez que a apelante alega ausência de ato instrutório absolutamente necessário, qual seja, a produção de perícia judicial quanto à localização da construção.

Rejeito esse argumento. Há nos autos documentação administrativa demonstrando que a construção efetivamente se encontra sobre área de preservação ambiental (dunas – Lei nº 4.771/65, art. 2º, f) e sobre bem público da União (área de marinha). É o que revelam o mapa elaborado pela Guarnição Especial de Polícia Militar Ambiental e os documentos queoacompanham(fls.25-37).

Ainda que se considerem todas as razões apresentadas na contestação, o fato é que nesta peça a apelante não apresentou qualquer elemento concreto, ou mesmo indício, que aponte para erro fático da perícia. Seu argumento mais forte foi a ausência de participação na realização da perícia pela polícia ambiental.

Neste ponto, todavia, sua argumentação não prospera. Na esteira de precedentes deste Tribunal, a perícia administrativa goza de presunção de legitimidade, não podendo ser afastada sem indicação concreta de equívoco ou incorreção:

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“ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. TAXA DE OCUPAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. – A demonstração de que o imóvel objeto do feito não se caracteriza como terrenodemarinhaimpõeaproduçãodeprovatécnicaquevenhaainfirmarascon-clusões alcançadas pela União por ocasião do procedimento administrativo instaurado para demarcação da linha do preamar-médio de 1831. – Havendo os Autores desistido da perícia requerida para tanto, por considerarem-na demasiadamente onerosa, não se desincumbiram do ônus de provar os fatos constitutivos de seu direito. – Ademais, nãocabecogitardanecessidadedenotificaçãopessoal,namedidaemqueosAutorespassaram a ocupar o imóvel em data posterior à demarcação levada a efeito pela Ad-ministração.–LegalidadedacobrançadestataxadeocupaçãojápacificadanocolendoSuperior Tribunal de Justiça.” (TRF4, AC 95.04.61155-9, Quarta Turma, Relator Edgard Antonio Lippmann Júnior, D.E. 07.04.2008)

No mesmo sentido:“Por outro lado, inexiste qualquer abuso da autoridade apontada como coatora, em

razão de suposta falta de prova do dano ambiental. Aduz a parte impetrante, para tanto, anecessidadedeperíciaambiental,afimdequesedessecumprimentoaosarts.19e72, I, da Lei nº 9.605/98.

Ocorrequetalafirmaçãosimplesmentedesconsideraojácitadoatributodapre-sunção de legitimidade do ato impugnado, tornando-se ainda mais frágil em sede de mandado de segurança, que deve ser instruído pela parte impetrante como prova pré-constituída do direito que pretende ver amparado.

Nessa senda, cabe indagar como pretende a Impetrante, na via estreita do mandamus e sem qualquer dilação probatória, ver aniquilada a presunção de veracidade dos atos administrativos impugnados.

Reforça a presente conclusão a existência de relatório de vistoria técnica do IBAMA, que, relativamente ao local explorado pela parte impetrante, conclui no sentido do corte de vegetação em 150,95 ha de APPs e ocupação irregular por plantio de Pínus, exatamenteacondutaquedeuazoaoregularexercíciodopoderdepolícia(fls.193-197).” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.72.00.007105-9)

Registro que a alegação da existência de outras construções em si-tuação similar, supostamente regulares, sem qualquer prova concreta, não autoriza o afastamento da perícia administrativa.

Superados esses aspectos, adentro no mérito.Constatada a localização da construção em área de preservação perma-

nente, que também é bem público, correta a determinação de reparação ambiental. Em caso similar (mormente quanto à caracterização da área), decidiu este Tribunal:

“CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚ-

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BLICA. BAR CONSTRUÍDO EM PRAIA MARÍTIMA. BEM DA UNIÃO. DUNAS. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. LICENCIAMENTO. AUTORIZAÇÃO. DEMOLIÇÃO. RESPONSABILIDADE. As praias marítimas, elencadas dentre os bens da União, são bens públicos de uso comum, enquanto a área de restinga, fixadora de dunas, é de preservação permanente (Código Florestal, Lei 4.771/65, art. 2º, f). Estando o empreendimento localizado em praia marítima, de propriedade da União, é necessária a autorização da Secretaria de Patrimônio da União – SPU. Reconhecidas a ilegalidade e a irregularidade da construção e da operação de bar/quiosque em área da União, constituída por dunas, em local detentor de formas de vegetação de preservação permanente, sendo correta sua desocupação, demolição e remoção. A Administração Municipal, no que se refere à autorização para construir, tem o dever de observar e cumprir as normas relativas à proteção do meio ambiente. Não pode descuidar de exigir do permissionário ou autorizado o cumprimento das medidas relativas à proteção do meio ambiente e à preservação dos recursos naturais.” (TRF4, AC 2002.71.00.052091-4, Quarta Turma, Relator Márcio Antônio Rocha, D.E. 19.05.2008) (grifei)

As alegações, suscitadas na apelação, de que a apelante não degradou a área e de que a área era anteriormente habitada por outras pessoas não convencem.Aprópriaapelanteafirmounacontestaçãoterelamesma“levantado” sua moradia, conduta que, por si só, implica alteração am-biental na área de dunas, inserta na propriedade da União.

Fica sem sentido, portanto, a afirmaçãode que outrem residia namesma área antes da apelante.

Resta ponderar a colisão entre o respeito à dignidade humana e o direito à moradia em face da proteção ambiental.

Não há dúvida nos autos quanto a duas realidades: (1) a ré é pessoa pobre, vivendo em humilde residência com sua família há vários anos, e (2) o local onde habita é área de preservação permanente, de propriedade daUnião,configurandodanoambiental.

Neste contexto, tenho que a sentença andou bem ao concluir pela necessidade de demolição do imóvel e recuperação da área degradada. Todavia, com a devida vênia, é necessário ir além.

Ao lado do direito ambiental, há que se atentar para a força jurídica do direito fundamental à moradia. A atuação estatal, aí incluídos a ação do Ministério Público Federal e o exercício do poder jurisdicional, não pode olvidar esse dado normativo fundamental, sob pena de enfraque-cimento do texto constitucional, que deve ser interpretado de acordo com os princípios hermenêuticos da força normativa da Constituição e

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daeficáciaintegradora.A preocupação ambiental é, sem sombra de dúvida, necessária e ur-

gente. No entanto, é imperiosa a consideração do direito à moradia, sob pena de emprestar-se solução jurídica incorreta quanto à interpretação sistemática do direito e à força normativa da Constituição. Com efeito, a força normativa da Constituição, como método próprio de interpre-tação constitucional, exige do juiz, ao resolver uma questão de direitos fundamentais,adotarasoluçãoquepropicieamaioreficácia jurídicapossível às normas constitucionais envolvidas, conforme lição de Konrad Hesse (Elementos de Direito Constitucional da República Federal da Alemanha, Porto Alegre: SAF, 1998). É, portanto, diante desse princípio de hermenêutica constitucional que se revela imprescindível a conside-ração do direito à moradia para a concretização do conteúdo jurídico dodireitoaoambiente,afimdequesealcanceumasoluçãojurídicaconstitucionalmente adequada.

O provimento judicial deve fortalecer, simultaneamente, o direito ao ambiente e o direito à moradia. Nesse método de interpretação consti-tucional, vislumbra-se, inclusive, a influência do conteúdo jurídico de um ou mais direitos fundamentais para a compreensão do conteúdo e das exigências normativas de outro direito fundamental, sem vislumbrar contraposição (neste sentido, Edésio Fernandes, Preservação ambiental oumoradia?Umfalsoconflito,inDireito Urbanístico: estudos brasilei-ros e internacionais, org. B. Alfonsin e E. Fernandes, Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 357). No caso concreto é o que se constata pelo in-fluxodoconteúdojurídicododireitoàmoradiaemfacedodireitoaoambiente. Exemplo desse raciocínio é trazido por Raquel Rolnik e João Luiz Portolan Galvão Minnicelli, ao examinar a Resolução nº 369/06, do CONAMA, e o projeto de lei de responsabilidade territorial urbana diante do direito à moradia (“Regularização fundiária e as novas regras dafuturaLeideResponsabilidadeTerritorialUrbana–algunsdesafiosda nova lei”, Fórum de Direito Urbano e Ambiental – FDUA, a. 7, n. 40, p. 36-46, jul./ago. 2008).

Esse procedimento, no âmbito da contemporânea teoria dos direitos fundamentais, pode ser denominado método hermenêutico constitucio-nal contextual, para utilizar a expressão de Juan Carlos Gavara de Cara, pois parte da própria Constituição, da conexão e da inter-relação entre

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as diversas normas de direitos fundamentais. Em suas palavras:“La formación de una interpretación sistemática de los derechos fundamentales

no puede dar lugar a la formación de un sistema que sea axiométrico o lógico deduc-tivo, sine que debe ser el resultado del análisis de las disposiciones de los derechos fundamentales, sus contenidos y las conexiones con otras normas constitucionales.” (Derechos Fundamentales e desarrollo legislativo: la garantía del contenido esencial de los derechos fundamentales en la Ley Fundamental de Bonn. Madrid: Centro de Estúdios Constitucionales, 1994. p. 116)

Aliás, o Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de considerar nadeterminaçãodoconteúdodeumdireitofundamentaloinfluxodeoutranorma de direito fundamental, ao analisar hipótese na qual se discutia o conteúdo do direito de propriedade e sua função social em face do direi-to difuso ao ambiente (MS 22164, Relator Min. CELSO DE MELLO, TRIBUNAL PLENO, julgado em 30.10.1995, DJ 17.11.1995).

Nesse contexto, tenho que a demolição só pode ocorrer, do ponto de vista jurídico fundamental, desde que haja indicação e disponibilização, pelo Poder Público, de área onde a apelante possa construir moradia ade-quada, observados, ademais, os programas habitacionais disponíveis.

Não pode a apelante ver violado seu direito à moradia, com a imposi-çãodedemoliçãodesuahabitação,edificadahámaisdedezanos(esteperíodoafirmadonacontestação;hánosautoscontadeluzdejaneirode 2002), sem sequer a indicação de área alternativa.

De fato, a pura e simples demolição, desacompanhada, no mínimo, de alternativaparaoexercíciododireitoàmoradia,configurariaatoestataldesvinculado da boa-fé objetiva e dos direitos fundamentais da apelante. Ainda mais no caso concreto, em que Poder Público, ciente há muito do local de habitação da apelante, além de nada fazer para compatibilizar a moradia com o ambiente, atuou positivamente ao disponibilizar ali prestação do serviço público de energia elétrica no local.

Essa a conclusão que decorre do regime dos direitos fundamentais vigente, cujo conteúdo se evidencia pelas respectivas previsões consti-tucionais e das normas internacionais de direitos humanos. Tal solução, aliás, na ponderação entre o direito ao ambiente e o direito à moradia, é menos restritiva do direito ao ambiente do que a manutenção da moradia com a consequente regularização, hipótese já prevista em nosso orde-namento jurídico (ver Cintia Maria Scheid, Concessão especial de uso

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parafinsdemoradia:ainterfaceentreodireitoàmoradiaeodireitoaomeio ambiente sustentável em áreas de preservação permanente, Revista de Direito Imobiliário, nº 64, a. 31, jan./jun. 2008, p. 11).

De fato, na Constituição Federal, a moradia, além de direito social expressamente previsto (art. 6º), é considerada necessidade vital básica (art. 7º), diante da qual devem concorrer políticas públicas por parte de todas as esferas da federação (art. 23, IX).

A legislação internacional, assim como entendida nos órgãos de proteção dos direitos humanos formalmente instituídos no direito inter-nacional público, aponta para a ilicitude de desocupação forçada sem a disponibilização de alternativa para moradia. Nas palavras do Alto Comissariado para Direitos Humanos da ONU (The Right to adequate housing (art. 11.1): forced evictions: 20.05.97. CESCR General comment 7, www.unhrchr.ch/tbs/doc.nsf/(symbol)/CESCR+General+Comment+7, em 05.02.2009), “nos casos em que o despejo forçado é considerado justificável,eledeveserempreendidoemestritaconformidadecomasprevisões relevantes do direito internacional dos direitos humanos e de acordo com os princípios gerais de razoabilidade e proporcionalidade” (item 14, tradução livre), “não devendo ocasionar indivíduos ‘sem-teto’ ou vulneráveis à violação de outros direitos humanos. Quando aqueles afetados são incapazes para prover, por si mesmos, o Estado deve tomar todas as medidas apropriadas, de acordo com o máximo dos recursos disponíveis, para garantir que uma adequada alternativa habitacional, reassentamento ou acesso à terra produtiva, conforme o caso, seja dis-ponível” (item 16, tradução livre).

Anote-se que essa diretriz, como não poderia deixar de ser, a par de ser reconhecida na legislação internacional, está presente não só na doutrina (Sylvio Toshiro Mukay, Direito à Moradia e à concessão especial para finsdemoradia,Fórum de Direito Urbano e Ambiental, Belo Horizonte, a. 7, nº 38, p. 79-82, mar./abr. 2008), como na jurisprudência (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Agravo nº 711.429-5/5-00, julgado em 10.12.2207) e no direito interno infraconstitucional (por exemplo, artigo 4º da Medida Provisória nº 2.220/2001).

Medida diversa implicaria violação à proteção fundamental da dignidade humana, na medida em que o sujeito diretamente afetado seria vistocomomeiocujaremoçãoresultarianaconsecuçãodafinalidade

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da conduta estatal, sendo esquecido comofim em simesmo de talatividade.

A proteção jurídica que a norma constitucional protetiva da dignida-de humana proporciona é, dentre outros conteúdos, a garantia de que o sujeitoserárespeitadocomoumfimemsimesmo,aoinvésdesercon-cebidocomoummeioparaarealizaçãodefinsedevaloresquelhesãoexternos, como também quando este é desconsiderado em seus direitos fundamentais.

Esse respeito se torna ainda mais urgente em face de indivíduos e grupos que experimentam discriminação de modo histórico e dissemi-nado socialmente. É o que faz atentar o direito internacional dos direitos humanos quanto à moradia: “Mulheres, crianças, jovens, idosos, indí-genas, minorias étnicas e outras minorias e outros indivíduos e grupos vulneráveis sofrem desproporcionalmente a prática de despejo forçado”, alertou o Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, acima citado, agora no item 10 do referido comentário. Uma ilustração disso é trazida por Betânia de Moraes Alfonsin, no trabalho “Cidade para Todos/Cidade para Todas – Vendo a cidade através do olhar das mulheres” (Direito Urbanístico – Estudos Brasileiros e Internacionais, org. B. Alfonsin e E. Fernandes, Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 253).

A propósito, a extensão e a intensidade da preocupação do direito internacional dos direitos humanos quanto ao fenômeno discriminatório no âmbito do direito à moradiapodeserverificadanotrabalhoDireitoFundamental Social à Moradia: legislação internacional, estrutura consti-tucional e plano infraconstitucional (dissertação de Mestrado apresentada pelo Juiz Federal Francisco Donizete Gomes junto ao PPG-Direito da UFRGS,2005).Alificademonstradaapreocupaçãoquantoàmoradianão somente na Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher como também na Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial e no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais.

Nesse contexto, note-se que, pelo que está presente nos autos, a pre-tensão de despejo e demolição atinge mulher chefe de família, vivendo em sua residência com dois filhos, exercendo, de modo regular, a ativi-dade pesqueira. Longe de se presumir qualquer propósito discrimina-

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tório intencional por parte dos agentes públicos que, preocupados com o ambiente, intentaram a presente ação, o que pode estar ocorrendo é o fenômeno da chamada discriminação indireta (não intencional) ins-titucional: o modo de viver produzido pela ordem social vigente deixa particularmente vulneráveis mulheres pobres, sobre quem recaem de modo desproporcional os ônus da dinâmica gerados das diversas de-mandas e iniciativas estatais e sociais (reporto-me, sobre o fenômeno da discriminação indireta, a Direito da Antidiscriminação: discriminação direta,indiretaeaçõesafirmativas,PortoAlegre:LivrariadoAdvogado,2008, de minha autoria).

Diante desse conteúdo do direito à moradia, em faceta eminentemente defensiva (não ser despejado, ainda que com fundamento jurídico, sem a devidaalternativa),tenhoqueoapelodeveserprovido,afimderejeitara pretensão de promover a desocupação forçada sem a disponibilidade de alternativa de moradia adequada à apelante e à sua família.

A forma a ser eleita, dentre os diversos instrumentos disponíveis ao Poder Público para a concretização do direito à moradia, bem como a co-ordenação entre os entes estatais materialmente competentes, não é objeto deste litígio e, uma vez equacionada pelo Poder Público, abrirá alternativa, na esfera administrativa ou judicial, para nova atuação do Poder Público, visando à proteção do ambiente com respeito e consideração ao direito à moradia, à dignidade da pessoa humana e à proibição de discriminação.

Com efeito, neste litígio, instaurado em ação civil pública ambiental, se requer a desocupação e a demolição de moradia de família pobre, composta de umamãepescadora e seus doisfilhos.A concretizaçãoora proposta, considerando a concorrência dos direitos fundamentais ao ambiente e à moradia, em nada enfraquece um ou outro. Ao contrário, como salientou Nelson Saule Junior (A proteção jurídica da moradia nos assentamentos irregulares, Porto Alegre: SAF, 2004, p. 202):

“...o direito à moradia é um dos direitos que tem a mesma fonte originária do direito ao meio ambiente, que é o direito à vida. Portanto, deve ser considerada a condição das pessoas humanas que vivem em situação precária e que têm boa-fé, mesmo em razão do estado de necessidade social em assentamentos informais, como as favelas em áreas de mananciais.”

Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo, para o fim de julgar improcedente o pedido.

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DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL

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APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2004.70.00.032188-2/PR

Relator:OExmo.Sr.Des.FederalNéfiCordeiro

Apelante: Ministério Público FederalApelado: M.C.G.C.

Advogados: Drs. João Costa Ribeiro Filho e outroDr. Nilton Bussi

EMENTA

Penal. Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional. Gestão teme-rária. Constitucionalidade. Crime de perigo. Risco social da temerária gestão. Elemento subjetivo. Inexistência de figura culposa. Dolo. Falta de demonstração. Inserção de elementos falsos em demonstrativos con-tábeis. Desconhecimento da existência das falsidades.

1. Apresentando o crime de gestão temerária claro sentido de admi-nistraçãofinanceirarealizadacontrariamenteàsnormasousegurançapadronizadadasoperaçõesfinanceiras,comriscosàinstituição,édes-cabido falar na sua inconstitucionalidade por incompreensão, motivada em grave dubiedade, do sentido da proibição pelo cidadão.

2. O tipo do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 é de crime de perigo, pelo risco social causado ante a temerária gestão, embora admissível sua prática com resultados concretizados de dano ou mesmo com dolo de dano inicial.

3.Nãosetemnagestãotemeráriafiguraculposa,poisexigíveljusta-mente o conhecimento do agir desrespeitando os limites de normas ou

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dasegurançafinanceirahabitual.4. Embora admissível a gestão temerária pelo dolo eventual, em face

da consciente assunção dos riscos de gerência arriscada, não se caracteriza acondutatípicapelafiguraculposa.

5. Ausente prova cabal acerca do conhecimento da existência de falsi-dades insertas em demonstrativos contábeis, descabida é a condenação, por infração ao art. 10 da Lei nº 7.492/86, decorrente da homologação dos balanços levada à publicação, pois faltante o elemento subjetivo exigido pela norma penal incriminadora.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso ministerial, nos termosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrante do presente julgado.

Porto Alegre, 05 de maio de 2009.Des. Federal Néfi Cordeiro, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Néfi Cordeiro: O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra M.C.G.C. pela suposta prática, em suma, dos seguintesfatos(fl.03):

“Segundo consta no relatório de inspeção encaminhado pelo Banco Central do Bra-sil, o denunciado M.C.G.C. deferiu, na qualidade de Diretor-Presidente do Banestado, no período de 05 de junho de 1997 a 31 de janeiro de 1999, e de Vice-Presidente do Conselho de Administração do Banco do Estado do Paraná, juntamente com terceiros cuja conduta é apurada em autos distintos, as operações a seguir narradas, caracteriza-das pela ‘celebração de operações de crédito sem observância dos princípios gerais de garantia,seletividade,diversificaçãoderiscoeliquidez;faltadeprovisãoparaperdanas operações de crédito de retorno duvidoso, renovadas ou renegociadas; concessão de desconto sobre o saldo devedor de operação de crédito, sem fundamentação técni-ca; liquidação de operação de crédito por recebimento de bens ou direitos creditórios ilíquidos, sem fundamentação técnica’. Infl.22592(numeraçãodoBancoCentral).

Ainda de acordo com relatório do Banco Central (infls.22571e22592–numeraçãodo Banco Central), o denunciado também atuou irregularmente ao ‘fazer inserir ele-mentos falsos ou omitir elemento exigido pela legislação em demonstrações contábeis

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deinstituiçãofinanceira,caracterizadapelapublicaçãodedemonstraçõesfinanceiraselaboradas em desacordo com as normas consubstanciadas no Plano Contábil das Ins-tituiçõesdoSistemaFinanceiroNacionalpelafaltadesuficienteprovisãoparaperdasem operações de crédito’. (...)”

Descreveu a exordial acusatória 20 operações cuja autorização para a contratação teria sido dada pelo acusado sem observância de diversos princípios regentes da atividade bancária, além da infringência de nor-mas aplicáveis à execução de tais operações, sobretudo no que toca à sua contabilização.

Em razão dos fatos expostos, o órgão acusador atribuiu a M.C.G.C. o cometimento dos delitos previstos no art. 4º, parágrafo único, combinado com o art. 71 do Código Penal, e no art. 10 da Lei nº 7.492/86.

O Ministério Público Federal aditou a peça vestibular, postulando a exclusão de 03 das 20 operações acima referidas, em face da exis-tênciadeinvestigaçãocriminalespecíficareferenteataisfatos(autos2003.70.00.019710-8 e 2004.70.02.008901-8).

A denúncia foi recebida em 31.01.2005, no limite em que postulado pelaacusação(fl.26).

Processado o feito, sobreveio sentença na qual julgada improcedente a denúncia, absolvendo o réu da imputação da prática do delito do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, com fulcro no art. 386, inc. III, do CPP, declarando incidentalmente a inconstitucionalidade do referido tipo incriminador; e da imputação da prática do crime do art. 10 da Lei nº 7.492/86, com base no art. 386, inc. VI, do CPP.

Irresignado, apela o Ministério Público Federal, propugnando pela reforma da sentença. Argumenta não haver qualquer inconstitucionali-dadenotipopenaldagestãotemeráriadeinstituiçãofinanceira,estandoplenamente preservado o princípio da reserva legal. Sustenta tratar-se de tipo penal aberto, cuja complementação do elemento normativo “temerária” deve ocorrer por interpretação e valoração do julgador, não se confundindo com norma penal em branco. Subsidiariamente, pugna pelaaplicaçãodoart.383doCódigoPenal,afimdequeoacusadosejacondenadopelodelitodegestão fraudulentade instituiçãofinanceira(art. 4º, caput, da Lei nº 7.492/86). Assevera estarem demonstradas, em qualquer dos casos, a materialidade e a autoria delitivas, tendo as operações sido realizadas no âmbito da atuação e com a participação

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do recorrido, inexistindo prova, de outro lado, de que não controlasse concretamente a realização das condutas típicas ou mesmo de que estas últimas não estavam sob sua esfera de conhecimento ou decisão. Aduz, também, a responsabilidade penal do acusado por omissão penalmente relevante, porquanto, ocupando a posição de garantidor, devia e podia agir e, apesar disso, não o teria feito. Quanto ao crime do art. 10 da Lei de Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, alega estar devidamen-te demonstrada a sua ocorrência, apontando o réu ser o autor mediato da inserção de elementos fraudulentos nas demonstrações contábeis da instituiçãofinanceiraqueadministrava.

A defesa apresentou contrarrazões.Subidos os autos a esta Corte e dada vista ao Ministério Público Fe-

deral, foi ofertado parecer pelo parcial provimento do apelo, afastada a aplicação da continuidade delitiva.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Néfi Cordeiro: Trata-se de apelação criminal interposta em face da sentença que, julgando improcedente a denúncia oferecida em desfavor de M.C.G.C., absolveu o acusado da imputação da prática do delito do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, com fulcro no art. 386, inc. III, do CPP, declarando incidentalmente a inconstitucionalidade do referido tipo incriminador; e da imputação da prática do crime do art. 10 da Lei nº 7.492/86, com base no art. 386, inc. VI, do CPP.

O órgão ministerial insurge-se contra a absolvição do réu da suposta prática das duas infrações mencionadas.

Procedo ao exame de cada uma das imputações em separado.

1 Do delito de gestão temerária

1.1 Da constitucionalidade do dispositivo legalNo que toca à constitucionalidade do delito do art. 4º, parágrafo úni-

co, da chamada Lei de Crimes de Colarinho-Branco, não vislumbro a pretendida inconstitucionalidade, por imputada afronta ao princípio da legalidade.

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Nenhuma norma penal é de todo indene de complementação valora-tiva pelo intérprete, somente devendo ser excluída de admissão jurídica aquela que torne incompreensível ao cidadão – por grave dubiedade – o sentido da proibição.

Talsituaçãonãoseverificanocrimedegestãotemerária,peloclarosentidodeadministraçãofinanceirarealizadacontrariamenteàsnormasouàsegurançapadronizadadasoperaçõesfinanceiras,comriscosàins-tituição. É o agir conscientemente irresponsável, com riscos anormais ao mercado, às normas e aos costumes da instituição. É a temerária gestão, que possui sim sentido compreensível aos cidadãos.

É de se observar, ademais, a tendência mundial na edição de normas penais com eleição de mais amplas condutas, tendentes a evitar os riscos da sociedade moderna, mas nem por isso descabidas de compreensão e incidência proibitiva.

Nãosetemnagestãotemeráriafiguraculposa,poisexigíveljusta-mente o conhecimento do agir desrespeitando os limites de normas ou dasegurançafinanceirahabitual.

É crime de perigo, pelo risco social causado ante a temerária gestão, embora admissível sua prática com resultados concretizados de dano ou mesmo com dolo de dano inicial.

Desse modo, afastada a inconstitucionalidade da norma do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, examino a materialidade e a autoria da infração.

1.2 Da materialidade Amaterialidadedocrimedegestãotemeráriadeinstituiçãofinanceira

está consubstanciada na farta documentação constante dos autos apensos, examinados com acerto pelo agente ministerial com assento nesta Corte, a ilustre Procuradora Regional da República Maria Hilda Marsiaj Pinto, no parecer ofertado, cujos fundamentos adoto como razões de decidir (fls.481-485v):

“Relativamente à gestão temerária, a materialidade e a autoria podem ser eviden-ciadas através dos seguintes documentos:

(1) relatório confeccionado pelo Banco Central do Brasil (BACEN), dando conta de que o réu foi o responsável pela ‘celebração de operações de crédito sem observância dosprincípiosgeraisdegarantia,seletividade,diversificaçãoderiscoseliquidez;faltade provisão para perdas nas operações de crédito de retorno duvidoso, renovadas ou

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renegociadas; concessão de desconto sobre o saldo devedor de operação de crédito, sem fundamentação técnica; liquidação de operação de crédito por recebimento de bens oudireitos’creditórios‘ilíquidos,semfundamentaçãotécnica’(fls.06-60doVolume1doApensoI,maisespecificamenteemfl.30);

(2) ata da 252ª Reunião Extraordinária do Conselho de Administração do Banestado, realizada em 02.06.1997, em que o apelado foi eleito como Vice-Presidente do referido órgãoecomoDiretor-Presidentedainstituição(fls.155-157doVolume2doApensoI),atoaquemanifestouanuênciaoBancoCentral(fls.158-159doVolume2doApensoI),alémdosrespectivostermosdeposse(fls.160-161doVolume2doApensoI);

(3) documentos pertinentes à auditoria realizada pelo BACEN junto ao Banestado, descrevendo as irregularidades apontadas na exordial, relativamente à Construtora SanchesTripoloniLtda.(fatos04,05,06,07e08–fls.04-08doApensoVI),àXinguConstrutoradeObrasLtda.(fatos09,10,11e12–fls.04-12doApensoIII),aoMata-douroeFrigoríficoContinentalLtda.(operaçõesreferentesaosfatos13,14,15,16,17e18–fls.04-17doApensoII)eàEBECEngenhariaBrasileiradeConstruçõesS.A.,à CR Almeida S.A. Engenharia e Construções e à Henrique do Rego Almeida & Cia. Ltda.(fatos19e20–fls.03-09doVolume1doApensoV);

(4) cópias das escrituras públicas (i) pertinentes à operação n° 1.161.113-3, de (ii) aditamentoàescriturapúblicadeaberturadecréditorotativoede(iii)confissão,com-posiçãoeparcelamentodedívidascomdaçãoempagamentodebens,firmadasasduasúltimasentreoBanestadoeoMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.,eaprimeiracomaConstrutoraSanchesTripoloniLtda.(fls.22-27,34-37e42-45doApensoVI,199-201 e 206-213 do Apenso II);

(5) cópias de atas de reuniões ordinárias da Diretoria do Banestado, em que apro-vadasasoperaçõesnº1.557.456-9(fls.54-58doApensoVI),1.555.879-8,1.644.820-5e1.840.912-2(fls.66-73,83-88e105-114doApensoIII)e1.099.032-6e1.099.033-4(fls.134-160doVolume1doApensoV);

(6) cópias (i) dos contratos de abertura de crédito em conta corrente nº 1.557.456-9 e 1.690.590-9(fls.59-60e71-72doApensoVI),1.555.879-8,1.644.228-9e1.644.820-5(fls.75,79e89-92doApensoIII),(ii)doscontratosdecâmbion°97/1089,97/1083e97/001387(fls.188-192,193-197e283-287doApensoII)e(iii)dosregistrosban-cáriosacercadocontratonº97/001083(fls.186-187doApensoII)edasoperaçõesn°1.161.113-3e1.690.590-9(fls.31-33,39-41e66-70doApensoVI),n°1.557.357-0(fls.202-204doApensoII),n°1.555.879-8,1.644.228-9e1.840.912-2(fls.59-65,98-103 e 136-138 do Apenso III).

Relatórios confeccionados pela testemunha Carlos Alberto Sabino Lopes, analista do Departamento de Combate a Ilícitos Financeiros e Cambiais (DECIF) do BACEN, encartados no Apenso VII, trazem, igualmente, várias informações relevantes acerca de operações efetuadas por ocasião da gestão de M.C.G.C.

Examinando a relação entre o Banestado e a Construtora Sanches Tripoloni Ltda., o técnico apurou a realização de operações de (1) renegociação de dívida vencida (R$

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2.295.421,00),semgarantiassuficientes,comincorporaçãodeencargoseporinter-médio de concessão de rebate no saldo devedor, em face de empresa concordatária, com cadastro incompleto e histórico de inadimplência, não tendo ocorrido a inscrição em ‘crédito em liquidação’, tampouco ajuizamento de ações judiciais para vindicar o quantum impago, com sucessivos aditamentos desacompanhados de estudos acerca da capacidadedoclienteemhonrarasprestaçõesedelaudosdeavaliaçãooufiscalização(n° 1.161.113-3), e de (2) abertura de créditos em conta corrente (R$ 2.000.000,00 e R$ 2.300.000,00) para cliente sem cadastro completo, sem limite de crédito estipulado, com histórico de inadimplência na instituição, em que oferecido como garantia penhor mercantil de equipamentos com laudo de avaliação elaborado por empresa controlada pela construtora em questão (nos1.557.456-9e1.690.590-9).Emobservaçãofinal,oexpert deixou consignado que ‘o relacionamento entre a instituição e a empresa cliente deixoumuitoadesejaremtermosdepráticasbancáriassaudáveis’(fls.1071119doApensoVII–transcriçãodefl.119).

À Xingu Construtora de Obras Ltda. foram deferidas – observou Carlos Alberto – quando dita sociedade ostentava histórico de inadimplência, possuía limite de risco de crédito restrito a R$ 100.000,00 e detinha responsabilidades em face do Banestado que alcançavam quantia substancial, operações de empréstimo em conta corrente de R$ 4.333.000,00, R$ 2.300.000,00 e R$ 17.231.159,00 (nos 1.555.879-8, 1.644.820-5 e1.840.912-2).Oclientetambémnãopossuíafichacadastralcompleta,asgarantiasfidejussóriasapresentadasestavamdesacompanhadasdasfichascadastraisdosgarantes,impossibilitandoaverificaçãodesuarealcapacidadedearcarcomocompromissoassumido, e as garantias reais eram insuficientes.Antes disso, ademais, ‘avaliação[acerca da Xingu] do Serasa de 03.07.97 concluía que o resultado do exercício (96) foi negativo, que o endividamento era elevado e piorou, assim como a rentabilidade. Em 27.11.97, parecer de proposta de limite de crédito do BEP concluía que o desem-penhoeconômicofinanceirodaempresaeraderazoáveladeficitário,revelavaelevadocomprometimentojuntoainstituiçõesfinanceirase,porfim,eracontrárioàfixaçãodelimite de risco de crédito’. A operação de crédito em conta corrente n° 1.644.228-9, en-volvendo R$ 2.135.000,00, apesar de vencida e somente vindo a ser renegociada vários dias após, não foi transferida para ‘créditos em liquidação’, quando deveria ter sido, porsecuidardeoperaçãosemgarantias,omissãoquetambémseverificou,consoanteafirmaoexperto,naoperaçãonº1.644.820-5.Conformesublinhouotécnico,‘oBEPliberou grande soma de recursos [à construtora] ao longo de poucos anos, renegociou 2 vezes [em julho de 1997 e em março de 1998] de forma cada vez melhor para a empresa sem tentar nenhuma medida jurídica, e aí descobre que a 2ª renegociação é deveras desvantajosa, concluindo que o melhor é amargar um prejuízo superior a 50%, que na verdadeestásetornandosuperiora80%’(fls.325-353doApensoVII–transcriçõesdefls.325e352).

AcercadasituaçãodoMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.,oanalistasubli-nhou que ‘relatório da Auditoria Interna de 29.12.1994 informava que a empresa tinha

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falsificadodocumentosrelativosaosembarquesdeprodutosparaoexterior,objetode operações de ACC. Além disso, relatou que, após o conhecimento da fraude e sua certificaçãoporpartedoBEP,foramdeferidasoperaçõesnacarteiradecâmbioenacarteira comercial, e nenhuma providência jurídica foi tomada contra os diretores da empresa no sentido de denunciá-los’. Apesar disso, foram aprovadas adiantamentos sobre contrato de câmbio (nos 97/001083, 97/001089 e 97/001387), nos valores de US$ 236.087,50, US$ 109.000,00 e US$ 6.917.146,75, para cliente com análise de crédito desfavorável e desatualizada, com histórico de inadimplência e sem limite de risco de crédito estipulado – e também, no último caso, com operações objeto de renegociação medianteaconcessãodesignificativorebate.Foicelebrada,nasmesmascondições,escritura pública de aditamento a escritura pública de abertura de crédito, envolvendo US$ 3.600.000,00, e, no mesmo dia, deferida renegociação de ACCs vencidas (operação n° 1.557.357-0), que totalizavam R$ 12.268.076,25, pelo valor de R$ 6.605.923,79 – vale dizer, com rebate de 46,15% –, e mediante garantia hipotecária consistente em área de terras pertencente ao Estado paulista e que seria alagada pelo reservatório da usina de Porto Primavera. Segundo o analista, as responsabilidades do Matadouro, em 22.12.1994, alcançavam somas vultosas, quando, ‘ciente de todos os fatos ocorridos, seria de se esperar por parte da instituição que baixasse todas as responsabilidades do cliente, não deferisse novas operações nem renegociações, haja vista as atitudes ilícitas verificadas,epromovendoasrespectivasexecuções.Entretanto,constatamosquenãofoi isso que ocorreu, ao contrário, vieram renegociações com rebate e dilatação de pra-zos, aumento de limite de crédito na carteira de câmbio, liberações de recursos novos, instituição das mesmas garantias para operações diversas, deferimento de operações com a dispensa de apresentação de certidões negativas, renegociação com exclusão de garantias, recebimento de imóveis em dação em pagamento posteriormente anulada, instituição de garantia não pertencente ao cliente, não apresentação de laudos de ava-liação (...). Além disso, em diversas oportunidades, operações vencidas que deveriam tersidoinscritasemCLnãoasforamtempestivamente,impactandosignificativamentenas demonstrações contábeis da instituição, em face dos valores das responsabilidades daempresa,quenadatabase[31/07/1998]eradeR$25.253.885’(fls.229-253doApensoVII–transcriçõesdefls.230e253).

Saliente-se, ainda, que relatório de inspeção especial, datado de 28.12.1994, concluiu queoMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.‘usoudemá-féparacomoBanestado,falsificandodocumentosemacordocomfuncionáriosdasCompanhiasMarítimas’(fls.21-31doApensoII–transcriçãodefl.31).Este,aliás,vemacompanhadodedeclaraçõesde sociedades dedicadas a serviços de navegação dando conta de que não reconhecem assinaturas creditadas a funcionários seus em Conhecimentos Marítimos nos quais figuravacomoremetentedecargaoFrigoríficoNoroesteLtda.,quefoisucedidopeloContinental(fls.39-47doApensoII).

Percebe-se, dessarte, que anteriormente à realização das operações de adiantamento de contrato de câmbio nos 97/001083, 97/001089 e 97/001387, além da aprovação da

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escritura pública de aditamento à escritura pública de abertura de crédito na modalidade deadiantamentosobrecontratodecâmbioedaconfissão,composiçãoeparcelamentode dívidas com dação em pagamento n° 1.557.357-0, todas celebradas em face do MatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.(fatos13,14,15,16,17e18),oBanestadojá se encontrava ciente de que a referida sociedade lhe apresentara documentação inidônea – o que, entrementes, não obstou que aquela se visse agraciada com novas negociações envolvendo obtenção de créditos bancários.

Também em relação a tal sociedade percebe-se que dívida originária de R$ 12.268.076,25 foi renegociada por R$ 6.605.923,79, montante pouco superior à metade daqueledevido(escriturapúblicadefls.206-213doApensoII),oquemanifestamentesignificouprejuízodeenormesproporções.

(...)ClementeMarinelli,queigualmenteparticipoudasatividadesdefiscalizaçãoda

instituiçãofinanceiraparanaense,comentou,emseutestemunho(fls.106-118),que(fl.107)‘uma situação que aconteceu muito no Banestado e não deveria, ia contra a norma, é incorporar os encargos apropriar os encargos, como renda. Então o Banestado, a regu-lamentação manda apartar, pode incorporar como renda, isso nas operações que já estão baixadas a prejuízo ou em crédito e liquidação, e o Banestado apropriou os encargos comorendasemterrecebidoeissoaírefletiaumlucrofictício.Arenegociaçãotambémpressupõe que ninguém renegocia por renegociar, que existem indicativos que dentro dasnovascondiçõesvaihaverrecebimento.Sóqueasfichascadastrais,aanálisedaoperação, a documentação que era formada no dossiê não dava indicativo nenhum que com aquela nova situação iria acontecer a recuperação do crédito.’

Asseverou ser atípica a liquidação de operações mediante o recebimento de pre-catórios, por serem de baixa liquidez e negociados amiúde por valor bem inferior ao nominal(fl.110).Estes,adespeitodisso,acabaramsendoaceitosparacompordébitosda EBEC e da CR Almeida – ocasião em que, inclusive, restou deferido abatimento significativosobreoquantum (fato 19). (...)”

Como se vê, está comprovada nos presentes autos a realização de diversas operações de crédito sem observância dos princípios gerais de garantia,seletividade,diversificaçãoderiscoseliquidez;faltadeprovisãopara perdas em negócios bancários de retorno duvidoso, renovados ou renegociados; concessão de desconto sobre saldo devedor de operação de crédito, sem base técnica para tanto; e liquidação de operações de crédito pelo recebimento de bens ou direito creditórios ilíquidos também sem fundamentação técnica. Dentre as inúmeras operações temerárias perpetradas na gestão do Banestado, na esteira da transcrição acima, estão: 1) a de nº 1.161.113-3, em favor da empresa Construtora San-

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ches Tripoloni Ltda., consistente na composição e no parcelamento de dívida no importe de R$ 2.295.421,00 e seus posteriores aditamentos com incorporação de encargos e concessão posterior de rebate, porém sem que estudada a capacidade da cliente honrar o negócio; 2) as de nº 1.557.456-9 e nº 1.690.590-9, por meio das quais foram deferidas aberturas de crédito em conta corrente em favor da Construtora Sanches Tripoloni Ltda. – cliente sem cadastro completo, sem limite de crédito estipulado e com histórico de inadimplência na instituição – nos mon-tantes de R$ 2.000.000,00 e R$ 2.300.000,00, respectivamente; 3) as de nº 1.555.879-8, nº 1.644.820-5 e nº 1.840.912-2, em favor da Xingu Construtora de Obras Ltda. – cliente com conhecido histórico de inadim-plência –, consistentes as duas primeiras na concessão de empréstimos em conta corrente nos valores de R$ 4.333.000,00 e R$ 2.300.000,00, respectivamente, e a última em composição de dívida no importe de R$ 14.219.184,00,semquerealizadasanáliseseconômico-financeirasparaapurar a capacidade de pagamento; 4) os adiantamentos sobre contratos de câmbio nº 97/001083, nº 97/001089 e nº 97/001387, nos valores res-pectivos de US$ 236.087,50, US$ 109.000,00 e US$ 6.917.146,75, em favordoMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.,clientecomanálisede crédito desfavorável e desatualizada e com histórico de inadimplên-cia; 5) a renegociação de ACCs vencidas (operação nº 1.557.357-0), que totalizavam R$ 12.268.076,25, pela quantia de R$ 6.605.923,79, embenefíciodoMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.,clientequefalsificaradocumentosdeembarquedemercadoriasobjetodeopera-ções de ACCs anteriores; 6) concessão de descontos sobre os valores contratualmentepactuadosnas operações de confissão e composiçãode dívida nº 1.099.032-6 (em favor de EBEC Engenharia Brasileira de Construções S.A.) e nº 1.099.033-4 (em favor de C.R. Almeida S.A. Engenharia e Construções Ltda.), além da aceitação de precatórios para liquidação da dívida; e 7) quitação da operação de renegociação de dívida nº 1.099.031-8 (realizada em favor de Henrique do Rego Almeida & Cia. Ltda.) mediante sua inclusão, pelo saldo de R$ 888.163,20, dentre as dívidas das empresas EBEC Engenharia Brasileira de Construções S.A. e C.R. Almeida S.A. Engenharia e Construções Ltda. (no valor de R$ 35.916.883,49), quitadas por meio da cessão de direitos sobre precatórios no valor de R$ 29.392.381,41, representando mero perdão de dívida da

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empresa Henrique do Rego Almeida & Cia. Ltda..Embora tanto na denúncia (décimo primeiro fato) como na descrição

dasirregularidadesfeitapeloBacen(fl.4doApensoIII)constequeaoperação de “Empréstimo em Conta Corrente/Composição de Dívida” aprovada em favor da Xingu Construtora de Obras Ltda. na reunião ordinária da Diretoria realizada em 24.03.1998 seja do valor de R$ 17.231.159,00 (operação nº 1.840.912-2), na ata da referida reunião é apontada a aprovação de negócio no montante de R$ 14.219.184,00. Tal circunstância, todavia, não retira, de plano, o caráter temerário da transa-ção em questão, na medida em que envolvido valor que muito extrapola o limite de crédito estipulado para a tomadora (R$ 500.000,00), a qual inclusive já tinha responsabilidades de R$ 20.625.045,08.

Tenho como comprovada, assim, a materialidade do delito de gestão temeráriadeinstituiçãofinanceira.

1.3 Da autoriaNo que toca à autoria da infração, cumpre averiguar a efetiva contri-

buição do recorrido para a realização das citadas operações, sobretudo pornãosersuficienteàsuaresponsabilizaçãocriminalacircunstânciade,à época dos fatos, ter ocupado os cargos de Diretor-Presidente do Banes-tado e Vice-Presidente do Conselho de Administração de tal instituição financeira,sobpenadeconfiguraçãodeinaceitávelresponsabilizaçãopenal objetiva.

Relativamente às operações realizadas com a Construtora Sanches Tripoloni Ltda., a cópia da ata da reunião ordinária da Diretoria do Ba-nestadodasfls.54-58doApensoVIdácontadeM.C.G.C.tertomadoparte, na qualidade de Diretor-Presidente do banco, da reunião havida em 22.07.1997, na qual aprovada a realização da operação nº 1.557.456-9 (sétimo fato descrito na denúncia), não se localizando, de outro lado, qualquer ingerência, ou mesmo anuência, do réu na aprovação da ope-ração nº 1.161.113-3 e de seus posteriores aditamentos (quinto e sexto fatos descritos na denúncia), nem na de nº 1.690.590-9 (oitavo fato da denúncia). Frise-se, por oportuno, que, quanto a estas duas últimas operações, na “descriçãodas irregularidades” encartada àsfls. 04-08do Apenso VI, é atribuída ao acusado, no âmbito administrativo, tão somente responsabilidade in vigilando. Mesmo a falta de transferência

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da operação nº 1.161.113-3 para “crédito em liquidação” (quarto fato descrito na denúncia) não pode ser atribuída ao denunciado, porquanto ausente qualquer indicativo de que M.C.G.C. tenha, de modo deliberado, se omitido do dever de realizar tal inscrição, fazendo a correspondente provisão. Nesse contexto, tenho como comprovada a participação do réu na reunião em que aprovada a realização da operação nº 1.557.456-9 em 22.07.1997.

No que se refere à aprovação das operações envolvendo a Xingu Construtora de Obras Ltda. narradas na denúncia, a atuação de M.C.G.C. pode ser extraída a partir das cópias das atas das reuniões ordinárias da DiretoriadoBanestadoem30.06.1997(fls.66-73doApensoIII),em07.10.1997(fls.83-88doApensoIII)eem24.03.1998(fls.105-114doApenso III), que trazem à tona a participação do acusado nas reuniões em que aprovadas as operações nº 1.555.879-8, nº 1.644.820-5 e nº 1.840.912-2, respectivamente (nono, décimo e décimo primeiro fatos narradosnadenúncia).Nãoidentifico,todavia,qualquerelementocapazde evidenciar que M.C.G.C. detinha a possibilidade de decidir acerca da aprovação, ou não, da operação nº 1.644.228-9 (décimo segundo fato da denúncia), sobretudo por não constatar no conjunto probatório do feito qualquer documento ou outro elemento indicativo da contribuição – ou mesmo simples prévia conivência – do réu para a prática do ato temerário. Édeseregistrarque,especificamentequantoàoperaçãonº1.644.228-9,afiscalizaçãolevadaàefeitopeloBancoCentralapurouapenasrespon-sabilidade in vigilandodoDiretor-PresidentedoBanestado(fl.12doApenso III), o que corrobora a falta de provas quanto à dolosa prática do ato de gestão temerária consubstanciado na realização da operação nº 1.644.228-9. Comprovada está, portanto, a anuência do réu tão somente à aprovação, em 30.06.1997, 07.10.1997 e 24.03.1998, da realização das operações nº 1.555.879-8, nº 1.644.820-5 e nº 1.840.912-2.

Adescriçãodeirregularidadeselaboradapelaautarquiafiscalizadoratambém se limita a indicar a responsabilidade in vigilando de M.C.G.C. pelastransaçõesenvolvendooMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.narradas na denúncia e sua posterior execução (operações nº 97/1083, nº 97/1089, nº 97/1387, nº 1.557.357-0 e adiantamento sobre contrato de câmbio rotativo no valor de US$ 3.600.000,00 – décimo terceiro a décimo oitavo fatos da denúncia). Compulsando os autos, e em especial

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o seu Apenso II, igualmente não vislumbro qualquer ingerência que o acusado tenha efetivado para a realização dos negócios em questão e sua posterior execução, inclusive no que toca à transferência, em tempo hábil,paraarubricacréditoemliquidação.Especificamentequantoaoaditamento à operação de adiantamento sobre contrato de câmbio no valor deUS$3.600.000,00emfavordoMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda. (décimo quarto fato da denúncia), não foram sequer localizadas pelo Banestado, por ocasião da requisição feita pelo BACEN, a proposta e a autorizaçãorelativasaonegócio(fls.116-117doApensoII).Ademais,aatadareuniãoordináriadaDiretoriarealizadaem09.09.1997(fls.240-244 do Apenso II) dá conta da ausência do acusado no referido ato, no qualaprovada,emfavordoMatadouroeFrigoríficoContinentalLtda.,limite especial para ACC no valor de US$ 500.000,00, operação que é estranha ao caso dos autos.

No que é relativo às operações nº 1.099.032-6 (em favor de EBEC Engenharia Brasileira de Construções S.A.) e nº 1.099.033-4 (em favor de C.R. Almeida S.A. Engenharia e Construções Ltda.), as atas da 231ª e da 232ª reuniões ordinárias do Conselho de Administração da insti-tuiçãofinanceira(ocorridasem26.11.1997eem29.12.1997,respecti-vamente) deixam clara a participação de M.C.G.C. na reunião em que aprovadososnegóciosemexame(fls.127-160doVolume1doApensoV,emespecialasfls.127-134e156-160),nãoobstanteosConselheirosde Administração do Banestado (dentre os quais o acusado) tenham se manifestado no sentido de condicionar a aprovação de tais operações à expressa concordância do Secretário de Estado da Fazenda e Presidente do Conselho de Administração, Giovani Gionédis, com o acatamento dos precatórios.

No tangente à quitação da operação de renegociação de dívida nº 1.099.031-8 (realizada em favor de Henrique do Rego Almeida & Cia. Ltda.) mediante sua inclusão, pelo saldo de R$ 888.163,20, dentre as dívidas das empresas EBEC Engenharia Brasileira de Construções S.A. e C.R. Almeida S.A. Engenharia e Construções Ltda., não pairam dúvidas quantoàautoriadainfração.Osdocumentosdasfls.161-165e168-172do Volume 1 do Apenso V dão conta de que o Banestado foi representado por M.C.G.C. tanto na formalização de cessão de crédito como no aditivo desta, por meio do qual foi considerada compreendida no valor da dívida

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anteriormente reconhecida a importância de R$ 888.163,20, decorrente de saldo devedor da operação nº 1.099.031-8. Evidente, portanto, ter o réu agido no sentido de celebrar aditivo ao negócio, o que acabou culminando com verdadeiro perdão de dívida de expressiva quantia da empresa Henrique do Rego Almeida Ltda.

Estabelecido o quadro acima, o qual é indicativo da anuência do réu para a celebração de ao menos sete das diferentes operações irregulares descritas, cumpre examinar se sua atuação orientou-se impregnada pelo elemento subjetivo exigido pelo tipo incriminador do art. 22, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86.

1.4 Do doloAo crime de gestão temerária é imprescindível o dolo, exigindo-se

demonstraçãodequesaberiaoadministradorautorizaroperaçõesfinan-ceirascontrariamenteàsnormasdesegurançafinanceira,comriscosàinstituição:

“PEDIDO DE EXTENSÃO EM RHC. CORRÉU QUE SE ENCONTRA NA MESMA SITUAÇÃO FÁTICA. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NA-CIONAL. GESTÃO TEMERÁRIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. DOLO. ATIPICIDADE DOS FATOS DESCRITOS NA DENÚNCIA. INÉPCIA.

– Se os fatos narrados na denúncia descrevem negligência, imprudência e imperícia, e o tipo penal da gestão temerária refere-se a crime comissivo doloso, não prevendo a forma culposa, inexiste crime a priori, sendo inepta a exordial acusatória.

–Aexpressãotemeráriasignificaqueagestãocriminalmenterelevantedeveim-plicar necessariamente um liame subjetivo entre a conduta do paciente e o resultado danoso – o que não restou demonstrado in casu.

– Pedido de extensão deferido para determinar-se o trancamento da ação penal por inépcia da denúncia.” (STJ, PERHC 7982, QUINTA TURMA, DJ 09.09.2002, p. 233, Relator FELIX FISCHER, por desempate legal)

Em que pese, conforme acima visto, esteja demonstrado que M.C.G.C. participou de reuniões em que aprovadas diversas operações descritas na denúncia, faz-se necessário perquirir se o réu efetivamente tinha consci-ênciadocarátertemeráriodetaisespecíficosnegócios.

A aprovação da operação nº 1.557.456-9, realizada com a Construtora Sanches Tripoloni Ltda., deu-se escorada em três diferentes pareceres (da agência Avenida Paraná – Maringá, da Superintendência Regional Maringá e da Mesa de Negócios), todos favoráveis à celebração da tran-

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sação(fls.55-56doApensoVI).Nas operações nº 1.555.879-8, nº 1.644.820-5 e nº 1.840.912-2, en-

volvendo a empresa Xingu Construtora de Obras Ltda., também não se evidencia com a clareza necessária a um juízo condenatório que o acu-sado soubesse estar atuando em desconformidade com normas técnicas bancárias. Na primeira operação (nº 1.555.879-8), a autorização para a sua contratação operou-se mediante todas as garantias contidas nos pareceres da Agência Marechal Floriano, SUREG e MESAN, pareceres igualmentefavoráveisaoquefoiajustado(fls.67-71doApensoIII).Quanto à segunda operação (nº 1.644.820-5), apesar do órgão colegiado não ter se pautado pelos pareceres contrários que lhe foram ofertados pelo Centro de Negócios e Poderes Públicos e pela Superintendência Regional, não deixou de observar grande parte da opinião manifestada pela Mesa de Negócios, a qual acenou para a possibilidade de aprovação do negócio, sugerindo, no entanto, a imposição de condições para tanto (fls.85-87doApensoIII).Aterceiraoperação(nº1.840.912-2)tambémacabou sendo outorgada pela diretoria colegiada, de que M.C.G.C. fazia parte, nos termos do favorável parecer do Comitê de Crédito e Operações I, tendo alterado apenas a maneira de amortização de valores recebidos comogarantia(fls.107-112doApensoIII).

Ainda, na renegociação das operações nº 1.099.032-6 (em favor de EBEC Engenharia Brasileira de Construções S.A.) e nº 1.099.033-4 (em favor de C.R. Almeida S.A. Engenharia e Construções Ltda.), mediante a concessão de descontos sobre os valores contratualmente pactuados e a aceitação de precatórios para liquidação da dívida, deve-se atentar que osmembrosdoConselhodeAdministração,dentreosquaisfiguravaoréu, orientaram-se no parecer da Diretoria de Controle, que julgou difícil o recebimento do crédito de outra forma(fls.156-159doApensoV),sendo que, quanto à quitação da operação de renegociação de dívida nº 1.099.031-8 (realizada em favor de Henrique do Rego Almeida & Cia. Ltda.), inexiste prova de que tenha sido realizada ao largo de orientação técnica a lhe dar suporte, ônus probatório que cabia à acusação.

ReferiuatestemunhaCarlosAlbertoSabinoLopes(fls.86-106dospresentesautos),agentedoBancoCentralqueparticipoudafiscalizaçãolevada a efeito no Banestado, que o conjunto da obra seria muito grande para não ter sido observado pelo Conselho de Administração, que era

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integrado pelo acusado.Não obstante, uniforme foi o posicionamento de M.C.G.C. de que,

não sendo especialista na área bancária, seguia ele – assim como usual na Diretoria – os pareceres técnicos da instituição. Não recordou o réu – e tampouco trouxe a acusação mínima prova – que tivesse descumprido ou alterado pareceres técnicos e, menos ainda, que se estivessem nego-ciando operações bancárias em troca de vantagens indevidas, ou mesmo beneficiandoconhecidos.

Aconfirmaraversãoapresentadapelodenunciadoemjuízo,valecitaro testemunho de Gabriel Nunes Pires Neto, integrante da Diretoria de CâmbioeOperaçõesdoBanestadoàépocadosfatos,queafirmouqueo réu somente votava nas deliberações do Conselho de Administração emcasodeempate(fls.195-1999):

“Depoente: É, Londrina. Somos acho que do mesmo ano, temos a mesma idade, 67 anosporaí,eeledepoisachoquefoicontinuarosestudosemSãoPaulo,eeufiqueiem Londrina até um tempo, depois vim para Curitiba, e retornamos a nos encontrar já passada a juventude, já início da fase adulta. E ele, o pai dele foi um homem de sucesso na área de transporte coletivo, tinha uma empresa de ônibus em Londrina, uma agropecuária também de bastante sucesso, e eu sei que o Neco, o Neco [M.C.G.C.] como a gente chamava, trabalhava nas coisas do pai, junto com o pai. Eu, pessoalmente, senhor Procurador, digo isso, a sua excelência, ao senhor, e à Advogada que representa o M.C.G.C., digo aos senhores porque já disse a ele, ele não tinha experiência bancária, ele era um homem do comércio, era um homem da pecuária, era um homem da lavoura. Imagino que os motivos que trouxeram o Neco para cá, que fez com que o Governador na época o trouxesse, foi o prestigiamento que ele desfrutava na cidade como uma pessoa de bem, que era e é, eu considero, e como eu, várias pessoas. E isso, acho que foi o que motivou o Governador, tendo que oferecer a Londrina alguma posição no Governo, eu imagino, ele convidou uma pessoa de Londrina para ser presidente do Banco, embora uma pessoa que não tivesse experiência na área. Como sempre foi, ou como sempre foram, alguns diretores e presidentes do Banco, muito mais de representação, de repre-sentatividade do que operacionais, porque realmente o presidente não era operacional, então supria aquelas necessidades políticas que o Governador vislumbrava.

Ministério Público Federal: Nessas reuniões que o senhor participou com a presença dele, ele se opôs a alguma das operações? Ele pediu explicações referentes a alguma dessas operações?

Depoente: Ele pedia que as operações fossem apresentadas pelas áreas que então tinhamoperações comerciais, operaçõesfinanceiras, tinhamoperações quenãofi-nanceiras mas da área de informática, da área administrativa, ele fazia com que cada responsável pela áreafizesse a apresentação aosdemais diretores e a ele também.

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Agora, eu não me recordo de ele ter feito algum comentário no sentido de aprovar ou nãoaprovar,atéporqueelevotavaemcasodeempate,eeusópossoafirmarcasodeempate, se houve, vendo a ata, porque eu não me recordo.”

Como se vê, o depoimento prestado pela testemunha acima indicada confirmaainexperiênciabancáriadoacusado.Corrobora,ainda,aversãodefensiva quanto ao modo de participação do réu nas deliberações do Conselho de Administração (limitada, ao que tudo leva a crer, ao voto de desempate), situação que põe em dúvida inclusive a efetiva atuação do acusado nas aprovações dos negócios ocorridas nas reuniões em que esteve presente.

Têm-se, pois, aprovações colegiadas de crédito sem demonstrada má-fé ou mesmo descumprimento de pareceres técnicos.

De outro lado, embora até admita como possível a gestão temerária pelo dolo eventual, em face da consciente assunção dos riscos de gerência arriscada,issotampoucoseverificadosautos,nãoseadmitindonessamodalidadetípicaafiguraculposa.

Dessemodo,nãodemonstradodeformasuficienteonecessárioele-mento subjetivo, é de ser mantida a absolvição do acusado M.C.G.C. da imputação da prática do delito do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, porém com fundamento no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal.

2 Do delito de inserção de elementos falsos em demonstrativos contábeis

Acerca da materialidade e da autoria da infração do art. 10 da Lei nº 7.492/86, transcrevo, adotando como razões de decidir, a manifestação daagenteministerialcomassentonesteTribunal(fls.486-488):

“Noquetangeaocrimetipificadonoart.10daLei7.492/86,amaterialidadeeaautoria estão elucidadas nos seguintes documentos:

(1) relatório confeccionado pelo BACEN, dando conta de que o réu foi o responsável por‘irregularidadesemdemonstraçõesfinanceiras,devidoaoperaçõesnãoprovisio-nadas’(fls.06-60doVolume1doApensoI,maisespecificamenteemfl.30);

(2) tabela de ajustes em demonstrações financeiras publicadas, considerandooperações vencidas e não transferidas para ‘crédito em liquidação’ dentro do prazo regulamentar ou renegociadas irregularmente, de forma a evitar a transferência para aludidarubrica(fl.161doVolumeI,doApenso1),oqueredundounapublicaçãoderesultados melhores (ou não tão ruins) que aqueles efetivamente apurados;

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(3)relatóriosdeadministraçãodoBanestado,publicadosnoDiárioOficial,comaapresentação de demonstrações contábeis, nos quais o réu é apontado como Diretor-Presidente do banco e Vice-Presidente do Conselho de Administração e em que se verificam resultados líquidosdos semestres emdesconformidade àqueles apuradospeloBACEN(fls.189-191e193-196doVolume1doApensoI);

(4) ata da 252ª Reunião Extraordinária do Conselho de Administração do Banestado, realizada em 02.06.1997, em que o apelado foi eleito como Vice-Presidente do referido órgãoecomoDiretor-Presidentedobanco(fls.155-157doVolume2doApensoI),atoaquemanifestouanuênciaoBancoCentral(fls.158-159doVolume2doApensoI),alémdosrespectivostermosdeposse(fls.106-161doVolume2doApensoI).

ComoenfatizouClementeMarinelli (fls.106-118), apurou-sequebalançospu-blicados pelo banco no período apresentavam irregularidades, na medida em que as operações renegociadas deveriam ser provisionadas e inscritas na rubrica ‘créditos em liquidação’, o que não ocorreu. Operações tais, não obstante ingressem no ativo da empresa, provocam decréscimo deste, visto que ostentam sinal negativo. Com isso, ‘nós constatamos que houve geração de receita inexistente. Porque quando ela sai do ativo normal e vai pra CL ela provoca um prejuízo, isso não era interesse da instituição fazer, oqueainstituiçãofezfoitrazerdeCLapropriaçãonormalcriandoreceita’(fl.114).

Ouseja,onãolançamentodemontantenegativonoativodainstituiçãofinanceira–comaconsequenterepercussãonopassivo,parafinsdeequilíbriocontábil–redun-douemqueestadivulgassesaúdefinanceiraquenãocondiziacomarealidade,poisartificialmenteinfladooseupatrimônio.Assim,norelatóriodaadministraçãopertinenteao primeiro semestre de 1997, constou que ‘o Banestado apresentou no semestre Lucro LíquidodeR$8.050mil,comrentabilidadesobreoPatrimônioLíquidode1,76%’(fl.189doVolume1doApensoI),dadoconfirmadonademonstraçãoderesultadoem30dejunho(fl.190doVolume1doApensoI),quando,naverdade,levadasemcontaasoperações irregulares, o resultado real foi de R$ 292.516.000,00 (duzentos e noventa edoismilhões,quinhentosedezesseismilreais)negativo(tabeladefl.161doVolume1 do Apenso I); já na demonstração de resultado pertinente à segunda metade de 1997, foi publicado prejuízo líquido de R$ 286.702.000,00 (duzentos e oitenta e seis milhões, setecentosedoismilreais)(fl.194doVolumeIdoApensoI)–masoBACENapuroudéficitefetivodeR$656.255.000,00(seiscentosecinquentaeseismilhões,duzentosecinquentaecincomilreais)(tabeladefl.161doVolume1doApensoI).”

Vê-se, nessa senda, ter constado dos demonstrativos contábeis do Banestado apurados em30.06.1997 (publicado no diário oficial em14.08.1997) e 31.12.1997 (publicado na Gazeta do Povo em 30.12.1998) valoresque,conformeapuradopelafiscalizaçãodoBancoCentral,nãoexpressavamarealsituaçãoeconômico-financeiradainstituição:a)emjunho de 1997, patrimônio líquido de R$ 457.791.000,00 e resultado semestral de R$ 8.050.000,00, quando, em verdade, aquele era de R$

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157.225.000,00, e este, de R$ 292.516.000,00 negativo; b) em dezembro de 1997, patrimônio líquido de R$ 224.57.000,00 e resultado semestral de R$ 286.702.000,00 negativo, quando, em verdade, aquele era de R$ 145.046.000,00 negativo, e este, de R$ 656.255.000,00 negativo.

A autoria da infração, por seu turno, também se mostra cristalina no quetocaaM.C.G.C.,tendoemvistaque,apesardeterafirmadoemseuinterrogatório em juízo que nunca assinou balanços na condição de Presi-dentedainstituiçãofinanceira,naesteiradorelatórioelaboradopeloBan-coCentral(fl.07doVolume1doApensoI),eraatribuiçãodoConselhode Administração do banco, órgão do qual M.C.G.C. era Vice-Presidente à época dos fatos, a aprovação de tais documentos contábeis.

Deve ser averiguado, ainda, se a atuação do réu deu-se com a ciên-cia de que os dados publicados dissociavam-se dos verdadeiramente representativos da realidade, elemento subjetivo indispensável para a responsabilização penal do acusado pela prática de delito do art. 10 da Lei nº 7.492/86. Nesse sentido também se manifestou o magistrado de primeirograu(fls.374-375):

“Caso desconhecesse que a escrituração estava incorreta, por certo não haverá como reconhecer o dolo. Caso o administrador subscreva determinado balanço com afobação, incúria, ou coisa que o valha – mas sem saber que as ditas operações ali registradas são irregulares –, o fato deverá ser tomado como atípico. Friso, por importante, que, em caso de dúvida, deve-se optar pelo reconhecimento de negligência, dado que dolo eventual não pode ser presumido.”

Na espécie, conforme acima já delineado, o acusado ocupava, ao tempo das ocorrências, cargos de alto escalão no Banestado, inclusive noseuConselhodeAdministração.Asdiferençasverificadasentreosvalores publicados e os verdadeiros, por sua vez, são bastante elevadas: foi publicado um resultado ligeiramente positivo atinente ao primeiro semestre de 1997, quando, na realidade, os prejuízos superaram R$ 292.000.000,00; o patrimônio líquido apurado em dezembro de 1997, uma vez ajustado, era de R$ 145.046.000,00 negativo, tendo sido publi-cado, porém, o valor de R$ 224.507.000,00.

Tais circunstâncias são indícios de um possível conhecimento, por parte do réu, das falsidades inseridas nos demonstrativos contábeis cujas publicações, ao que tudo leva a crer, foram chanceladas pelo réu. Entretanto,nãosãosuficientesaevidenciar,semqualquerdúvida,que

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defatoM.C.G.C.,presidentedainstituiçãofinanceira, tivesseciênciada existência de elementos falsos, quando da aprovação dos dados que lhe foram apresentados.

Além da citada inexperiência bancária do réu, não tem este formação em contabilidade, situação que desde logo põe em dúvida a autônoma percepção, pelo acusado, das incorreções em questão, sem que necessi-tasseparatantodeauxíliotécnico.Registre-se,porrelevante,quedifi-cilmente o acusado e os demais membros do Conselho de Administração realizaram, quando das aprovações dos balanços apurados em junho e em dezembro de 1997, uma análise individualizada de cada uma das operações integrantes do período examinado, conforme explanado pela testemunha Clemente Marinelli, servidor aposentado do Banco Central queparticipoudafiscalizaçãolevadaaefeitonoBanestado(fl.117):

“Bom, quem tem que fazer uma suposição se o órgão, o colegiado que tem compe-tência pra homologar o balanço e falar ‘esse balanço tá ok, vamos publicá-lo’, ele deve ter mecanismos de controle interno, deve ter auditoria interna, deve ter talvez um staff dele pra fazer esse serviço, quando chega ele aprovou, eu acredito que nenhum diretor vá procurar dossiê de operação pra ver se aquela operação tá boa ou não. Ele se vale de informações que ele faz chegar até as mãos dele.”

O próprio órgão ministerial admite a possibilidade da homologação tersidocalcadaemparecerestécnicos(fl.486v):

“Marinelli sublinhou que o órgão que tem competência para homologar e mandar publicar o balanço ‘deve ter mecanismos de controle interno, deve ter auditoria interna, devetertalvezumdepartamentodeauditoriaquefiscalize.(...)Elesevaledeinforma-ções que ele faz chegar até as mãos dele’, mormente pareceres elaborados por instâncias técnicasdainstituiçãofinanceira(fl.117).Issoéespecialmentecoerentesesepensarque o réu alega parcas noções – se não insipiência – acerca de assuntos bancários.”

Emjuízo,M.C.G.C.deuaentenderqueconheciaasituaçãofinanceiradesfavorável experimentada pelo banco no ano seguinte ao que se referem osbalançosfalseados(fl.57):

“(...)Inclusiveháumepisódioemqueeu,nofimde1998,obancotevequefazeruma publicação que estava aguardando a entrada de recursos do Tesouro Nacional para poderefetuaroseubalanço,porqueasituaçãodobancoeraextremamentedifícil.Nofimdo ano de 1998, o banco estava indo diariamente na Caixa Econômica buscar 2 bilhões de reais para poder fechar o seu caixa. Isso é uma empresa quebrada. Com capital de trezentos e tantos milhões é uma empresa quebrada, só que nós não podíamos falar,

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apesar do Secretário da Fazenda lamentavelmente ter falado em jornais que o banco já estava quebrado. E era verdade, só que não podia ser dito. A gente tinha que manter as contas dos clientes. A gente estava sofrendo para o banco não ser quebrado. (...)”

Tal depoimento revela que o acusado sabia da delicada situação financeiradoBanestadoaofinaldoanode1998emlinhasgerais,massem tornar patente a sua compreensão a respeito do trato contábil dos negócios bancários.

Nessecontexto,nãosemostrarazoávelafirmardeformacategóricaque o acusado soubesse haver dados discrepantes da realidade insertos nos balanços que lhe teriam sido apresentados para homologação.

Outrossim, nada há que evidencie que o próprio réu tivesse domínio sobre o fato de terem constado dados falsos nos demonstrativos contá-beis que foram levados à publicação. Nem mesmo a eventual desobe-diência a manifestações de auditorias ou de departamentos de controle interno ou dos encarregados pela elaboração material dos documentos é comprovada nos presentes autos. Tais ônus probatórios recaem sobre a acusação, que deles não se desincumbiu. Se, de um lado, é verdade que o denunciado não juntou provas acerca da aprovação dos números divulgados ter operado-se com arrimo em opinião técnica, de outro, cabia ao órgão acusador demonstrar justamente a desobediência a pareceres – ainda que de natureza opinativa – ou a orientações que porventura tenham sido prestadas.

Ainda que se afaste o argumento da sentença voltado para a ocorrência de discordância, pelo Banco Central, dos critérios de renegociação das dívidas e da própria gestão do banco (e não de adulteração da escrita contábil),inexistemprovassuficientesademonstrarquetenhaM.C.G.C.dolosamente realizado a “maquiagem” das publicações.

Portanto, deve ser improvido o recurso ministerial no ponto em exa-me, mantendo-se a absolvição do réu, com fulcro no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal, quanto à imputação da prática do delito do art. 10 da Lei nº 7.492/86.

5 Do dispositivo

Em síntese, tem-se que o recurso ministerial merece ser parcialmente provido,tãosomenteparaofimdeserafastadaainconstitucionalidadeda norma do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, mantida a ab-

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solvição do réu, porém, com fulcro no art. 386, inc. VII, do Código de Processo Penal, no que toca à imputação da prática tanto do citado crime quanto do delito do art. 10 do mesmo diploma legal.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso ministerial, nos termos da fundamentação.

É o voto.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2004.72.01.004756-6/SC

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado

Apelante: Cleunice Conceição Poloniski do PradoAdvogado: Dr. Paulo Henrique Brolini Glinski

Apelado: Ministério Público Federal

EMENTA

Penal e processo penal. Documento adulterado com fim de requerer benefício previdenciário. Falsidade ideológica. Art. 299 do CP. Este-lionato tentado. Art. 171, § 3º, c/c art. 14, II, do CP. Dolo. Elemento subjetivo. Fraude grosseira. Não caracterização. Tabelião. Funcionário público para fins penais.

1. Quando um delito apresentar-se como meio para realização de outro, com aplicação do princípio da consunção, o crime-meio resta absorvido pelocrime-fim.Todavia,nashipótesesemqueocrime-meioestabelecerpenasmaisgravesqueocrime-fim,esterestaráabsorvidoporaquele.

2. O dolo consiste na intenção, de forma livre e consciente, de adulterar oconteúdododocumento,sendoqueoelementosubjetivoconfigura-senofimdeprejudicardireito,criarobrigaçãooualteraraverdadesobrefato juridicamente relevante.

3. Não há como caracterizar como grosseira falsificação que

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envolvareconhecimentodefirmaemtabelionato,sendoestafeitapelotabelião.

4.Onotário,tabeliãoouoficialderegistrossãoprofissionaiscomfépública, atuando em serviço por delegação do Poder Público, conforme regulam o art. 236 da CF/88 e o art. 3º da Lei nº 8.935/94. Assim, exer-cem função pública, estando compreendidos no conceito de funcionário público,parafinspenais,previstonoart.327doCP.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do re-latório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendopartedopresentejulgado.

Porto Alegre, 03 de junho de 2009.Desembargador Federal Luiz Fernando Wowk Penteado, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado: O Mi-nistério Público Federal ofereceu denúncia contra M.L.C.S.P., S.S.P., C.C.P.P. e J.F.K., imputando-lhes a prática do delito previsto no art. 171, § 3º, combinado com o art. 14, inciso II, todos do Código Penal, estando assimdescritososfatosnainicial(fls.02e03):

“Consta nos autos que, no dia 11 de agosto de 2003, a denunciada M.L.C.S.P. requereu salário-maternidade, junto à Agência do INSS em Canoinhas/SC, apresen-tando,paratanto,ContratodeParceriaRuralfalso,firmadocomodenunciadoJ.F.K.e assinado, a rogo, por S.S.P., seu marido.

Os denunciados J.F.K., M.L.C.S.P. e S.S.P. confeccionaram Contrato de Parceria Rural com data retroativa, qual seja, janeiro de 2000. Utilizaram para tanto números de CPFeRGdeM.LC.S.P.emitidos,respectivamente,em05/2001e14.09.2000(fl.08),ou seja, em data posterior à confecção do Contrato de Parceria Rural, demonstrando que a data nele aposta não era verdadeira.

A denunciada C.C.P.P., tabeliã do cartório de Bela Vista do Toldo, reconheceu firmadas assinaturas de J.F.K. e deS.S.P. comdata retroativa (fl. 10), qual seja,31.01.2000.

O benefício foi indeferido pelo INSS, em razão da irregularidade na emissão do contratocomdataanterioràemissãodoCPF(fls.16).

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Àfl.21constaofíciodaSecretariadaSegurançaPúblicaeDefesadoCidadão–22ªDelegacia Regional de Polícia de Canoinhas, informando que a primeira via da Carteira de Identidade da Sra. M.L.C.S.P. foi emitida em 14.09.2000.

Emsedepolicial,M.L.C.S.P.confirmouquetirouoCPFemmaiode2001.Declarou,também, que: ‘foi J.F.K. quem providenciou a documentação e foi o mesmo também quem instruiu referido pedido junto ao INSS (...). Que com referência ao Contrato de ParceriaRural(firmado),dizquefoiamesmaquepediuparaJ.F.K.parafazer(...)queafinalidadedoreferidocontratofoiparadarentradanosalário-maternidade,equeconfirmaquefoiparaobterobenefíciosalário-maternidade(...)’. Informou,ainda,que foi J.F.K. quem levou os papéis até sua casa para que assinasse, tendo, inclusive, a acompanhado até o INSS para dar entrada no benefício, bem como que foi ele e seu maridoquevieramatéocartórioparareconhecerfirmadasassinaturas(fls.43-44).

Àsfls. 45-46, J.F.K. informouque instruiuopedidode salário-maternidadedeM.L.C.S.P, junto ao INSS. Declarou, também, que ‘foi M.L.C.S.P. quem lhe pediu paraquefizesseocontratodeparceriaruraledesseentradanoreferidobenefício(...)’.Afirmou,também,quefoielequempediuàtabeliãquecolocasseocarimboretroati-vonoreconhecimentodefirmadispostonoContratodeParceriaRural,umavezqueprecisavam comprovar tempo de serviço.

Inquirida em sede policial, C.C.P.P., tabeliã do cartório de Bela Vista do Toldo/SC, informouquereconheceuasfirmasdeJ.F.K.edeS.S.P.,bemcomoquefoielaquemcolocouadataretroativanoContratodeParceria(fl.47).(...)”

Apeçaacusatóriafoirecebidaem17.03.2005(fls.73e74).Notermodeaudiênciadafl.107,foihomologadaasuspensãocon-

dicional do processo e do prazo prescricional em relação aos acusados M.L.C.S.P., S.S.P. e J.F.K., nos termos do art. 89 da Lei nº 9.099/95, prosseguindo o feito para a ré C.C.P.P., que não aceitou a proposta.

Nasentença,publicadaemsecretariaem05.05.2008(fl.196),oma-gistrado a quo, com fundamento no art. 383 do CPP, deu nova capitulação jurídica aos fatos e julgou procedente a pretensão punitiva para condenar a acusada C.C.P.P nas sanções do art. 299, parágrafo único, do Código Penal, aplicando a pena de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de reclusão, com regime inicial aberto. Substituiu a privativa de liberdade por uma prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas e por uma prestação pecuniária, consistente em 10 (dez) salários mínimos, vigentes àdatadofato(fls.191-195).

Irresignada, a ré apelou, sustentando sua inocência, tendo em vista que ocarimbodereconhecimentodefirmasdeu-sena2ªlaudadodocumento,tendo sido anexado em momento posterior a 1ª lauda, onde ocorreram

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as inserções incorretas de dados, tanto que nesta última não há qualquer visto, carimbo ou assinatura de sua parte, nem dos contratantes. Referiu nãoestarpresenteodolo,nãopodendoserreconhecidocomoconfissãoseu depoimento prestado na fase policial, uma vez que elaborado de forma confusa. Aduziu, também, que o delito de falso restou absorvido pelo estelionato tentado, aplicando-se a súmula 17 do STJ. Alegou que a fraude não se apresentava de forma idônea a enganar alguém, por isso trata-sedefatoatípicooudecrimeimpossível.Porfim,nocasodenãoser absolvido, postulou o afastamento da majoração da sanção prevista no parágrafo único do art. 299 do CP, pois a função de tabeliã não se enquadranadefiniçãodefuncionáriopúblico,bemcomoquesejaapli-cada a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei nº 9.099/95) e dapena(art.77doCP)(fls.198-219).

Apresentadas as contrarrazões (231-233, verso), vieram os autos a esta Egrégia Corte.

Com vista dos autos, o Ministério Público Federal manifestou-se pelo nãoprovimentodorecurso(fls.241-251).

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado: Preambu-larmente,analisoatipificaçãodofato.

De regra, quando um delito apresentar-se como meio para realização de outro, com aplicação do princípio da consunção, o crime-meio resta absorvido pelo crime-fim.Todavia, não semostra como fator únicopara solucionar a questão, devendo, também, ser considerada a maior censurabilidade presente nas condutas descritas nos tipos penais, sendo queessavaloraçãodolegisladorérefletidanaspenasprevistasemcadaum deles.

Assim, nas hipóteses em que o crime-meio estabelecer penas mais gravesqueocrime-fim,comonopresentecaso,esterestaráabsorvidopor aquele.

Com efeito, a falsidade ideológica, por apresentar-se como ilícito mais grave, deve absorver o estelionato tentado, afastando-se a regra da Súmula 17 do STJ.

Sobre o tema, segue o julgado em caso análogo:

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“PENAL E PROCESSO PENAL. ARTIGO 70 DA LEI Nº 4.117/92. MENOR POTENCIAL OFENSIVO. ARTIGO 183 DA LEI Nº 9.472/97. DATA DA OCOR-RÊNCIA DO FATO. TELECOMUNICAÇÕES. DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. EMENDATIO LIBELLI. ESTELIONATO CONTRA O PARTICULAR E CONTRA A UNIÃO. FAL-SIDADE DE DOCUMENTO PÚBLICO. SÚMULA Nº 17 DO STJ. INAPLICÁVEL. CONSUNÇÃO. ABSORÇÃO DO CRIME MENOS GRAVE (ESTELIONATO) PELO MAIS GRAVE (USO DE DOCUMENTO PÚBLICO FALSO).

(...) O agente que, mediante apresentação de guias DARF falsas, obtém a liberação demercadorianaalfândega,praticaodelitotipificadonoart.293,Ve§1º,doCP.Inaplicável, na hipótese, a Súmula nº 17 do STJ, uma vez que o princípio da consun-çãoexige,parasuaincidência,queapenadocrime-meiosejainferioràdocrime-fim,ficando,assim,oestelionatoabsorvidopelocrimedeusodedocumentopúblicofalso(infração mais grave). Precedente desta Corte.” (TRF-4ª Região, 8ª Turma, ACR 2003.04.01.046574-2/RS, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, publicado em 18.04.2007)

Na espécie, para se compreender a incidência da conduta da agente, transcrevo o preceituado no 299, caput, do CP:

“Art. 299. Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita,comofimdeprejudicardireito,criarobrigaçãooualteraraverdadesobrefatojuridicamente relevante:

Pena – reclusão, de 1 a 5 anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de 1 a 3 anos, e multa, se o documento é particular.”

Portanto,paraaconfiguraçãodafalsidadeideológicaháqueseob-servar a ocorrência de omissão de declaração que deveria constar ou inserção de declaração inverídica ou diversa da que deveria estar presente nodocumento,semprecomumadasfinalidadesdescritasnanormain-criminadora. Ainda, deve estar presente o dolo, consistente na intenção, de forma livre e consciente, de adulterar o conteúdo do documento, bem comooelementosubjetivo,configuradonofimdeprejudicardireito,criarobrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.

Feitas as ponderações, tem-se que a ocorrência do delito está demons-trada pelos seguintes elementos: cópia do RG, com data de expedição de 14.09.2000, e do CPF, com data de emissão em maio/2001, ambos emnomedeM.L.C.S.P.(fl.08);contratodeparceriaruralcomdatadejaneiro/2000ecomreconhecimentodefirmacomdatade31.01.2000

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(fls.09e10);resumodebenefícioemconcessão,comindeferimentoecomDERem11.08.2003(fl.14);comunicaçãodedecisãodoINSS,informandoairregularidade(fl.16);parecerdaprocuradoriadoINSS,constandooreconhecimentodairregularidade(fls.23e24);ofícioda22ª Delegacia Regional de Polícia de Canoinhas/SC, informando que a expediçãoda1ªviadoRGdeM.L.C.S.P.deu-seem14.09.2000(fl.21);ofício da Receita Federal, constando que a inscrição de M.L.C.S.P. no CPFocorreuem15.05.2001(fls.28e29).

Assim, considerando que a data do contrato de parceria rural e seu respectivoreconhecimentodefirmaédejaneiro/2000equeosdocu-mentos referidos de M.L.C.S.P., uma das contratantes, apresenta datas posteriores, ou seja, a expedição de seu RG em 14/09/2000 e sua inscrição no CPF em 15.05.2001, tem-se clara a fraude no documento.

Ainda,verifica-sequeafalsidadedodocumentotevecomofimaob-tenção de benefício em favor de M.L.C.S.P. (salário-maternidade) junto ao INSS, conforme dão conta os documentos que seguem: resumo de benefício em concessão, com indeferimento e com DER em 11.08.2003 (fl.14);comunicaçãodedecisãodoINSS,informandoairregularidade(fl.16);parecerdaprocuradoriadoINSS,constandooreconhecimentoda irregularidade (fls. 23 e 24). Portanto, configurado ofimde criarobrigação ao INSS.

Aliás, os fatos foram reconhecidos pelos depoimentos dos contratan-tes, prestados na fase policial, consoante trechos que transcrevo:

DepoimentodeM.L.C.S.P.(fls.43e44):“(...)queconfirmaquetirouoCPFemdatademaiode2001,conformeconsta

no cartão, confirmando a data constante no referido cartão, 05/2001; (...) diz quefoiamesmaquepediuparaJ.F.K.parafazer,poisdizquenãotinhamnotafiscalaoprodutorruralparacomprovarquetrabalhavamnalavoura,quandoentãofizeramocontratocomJ.F.K.;quedizqueafinalidadedoreferidocontratofoiparadaren-tradanosalário-maternidade,equeconfirmaquefoiparaobterobenefíciosalário-maternidade;(...)”(fl.43).

DepoimentodeJ.F.K.(fl.45):“(...)queocontratodeparceriaruralfoifirmadoporpedidodeM.L.C.S.P.,efoi

feitoparaajudá-la,eafinalidadeeraparaobterobenefíciosalário-maternidade,masque não tinham intenção de fraudar o INSS, dizendo que achava que era direito da Sra. M.L.C.S.P. receber o benefício; que com referência à data retroativa no reconhecimento

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defirmadispostonoContratodeParceriaRural,dizquefoisuapessoaquempediuà tabeliã para que colocasse o carimbo retroativo, isso porque precisavam comprovar tempo de serviço, sendo que a Sra. M.L.C.S.P. havia trabalhado para o mesmo no ano anterior, mas que não haviam feito o contrato, quando então resolveram fazer este com data retroativa; que pediu à tabeliã, esta colocou o carimbo e, como a Sra. M.L.C.S.P. é pessoa bastante pobre, a tabeliã C.C.P.P. nada cobrou de sua pessoa; (...)”.

Aliás, a fraude só foi verificada pela atuação diligente do INSS,que constatou a discordância de datas. Não há como caracterizar como grosseirafalsificaçãoquetenhareconhecimentodefirmaemtabelionato,sendo esta feita pelo tabelião.

Quanto à autoria, resta devidamente comprovada. Não bastasse o re-conhecimentodefirmaterocarimboeaassinaturadaré(fl.10),J.F.K.,quandoouvidonafasepolicial,confirmouaatuaçãodatabeliãC.C.P.P.,esclarecendo, inclusive, que pediu a ela que fosse colocado o carimbo com data retroativa, sendo que, em juízo, corroborou que o contrato foi elaborado no cartório de Bela Vista do Toldo, provavelmente pela ré C.C.P.P., tendo o assinado em cartório.

Em relação ao dolo e ao elemento subjetivo, tenho por demonstra-dos.Nafasepolicial,adenunciadareconheceuterreconhecidofirmanocontrato,masrefereque,seofezcomdataretroativa,foiporengano(fl.47). Já em juízo, apesar de reconhecer sua assinatura no reconhecimento defirma,asseverouque,quandoodocumentofordemaisdeumalauda,tal ato é feito na última folha, e as demais são rubricadas e carimbadas, oquenãoconstanaprimeirafolhadocontrato(fl.109).

Todavia, conforme já referido, J.F.K., quando ouvido na fase policial, confirmouaatuaçãodatabeliãC.C.P.P.,bemcomoquepediuaelaquefosse colocado o carimbo com data retroativa.

Ora, que motivo teria J.F.K. para responsabilizar a denunciada C.C.P.P., pois em nada contribuiria para a descaracterização de seu envolvimento?

Ainda, a defesa levanta uma suspeita de que a primeira folha do documentoteriasidotrocadaapósoreconhecimentodefirma,masnãocomprovataltese,atéporquesepercebequeabeneficiáriaeseumaridosão pessoas humildes.

Portaismotivos,entendoquearéreconheceufirmacomplenaciênciadadataretroativa,bemcomoqueserviriaparaumdosfinsespecíficosdo

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tipo penal (prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante).

Assim, comprovada a ocorrência do delito, a autoria e o dolo, deve ser mantida a condenação da ré nas sanções do art. 299, parágrafo único, do Código Penal.

No tocante à dosimetria, entendo correta a análise dos vetores do art. 59 do CP, todos considerados neutros, por isso mantenho a pena-base no mínimo, ou seja, em 01 (um) ano de reclusão.

Não há agravantes nem atenuantes.Ausente causa de diminuição, presente apenas a causa de aumento do

parágrafo único do art. 299, por isso mantenho a elevação da pena em 1/6(umsexto),tornando-adefinitivaem01(um)anoe02(dois)mesesde reclusão.

Sobreamajorante,onotário,o tabeliãoouooficialde registrossãoprofissionaiscomfépública,atuandoemserviçopordelegaçãodo Poder Público, conforme regulam o art. 236 da CF/88 e o art. 3º da Lei nº 8.935/94. Assim, exerce função pública, estando compreendido noconceitodefuncionáriopúblico,parafinspenais,previstonoart.327 do CP.

Mantenho o regime aberto como inicial para o cumprimento da sanção, nos termos do art. 33, § 2º, alínea c, do Estatuto Repressivo.

Quanto à multa, como não houve condenação na sentença e não hou-ve recurso da acusação a respeito, deixo de aplicar, por observância da proibição da reformatio in pejus.

Preenchidos os requisitos do art. 44 do CP, mantenho a substituição da pena privativa por duas restritivas de direitos, consistentes em uma prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, pelo tempo da condenação, e em uma prestação pecuniária, a qual reduzo para 02 (dois) salários mínimos, vigentes à época do efetivo pagamento, em face daprofissãodaré,atualmenteagricultora(fl.108),demodoa tornarcompatívelseucumprimentocomacapacidadefinanceiradoacusado.

Como fundamento das restritivas adotadas, transcrevo parte de julgado quebemrefleteoentendimentodesta8ªTurma:

“(...) a prestação de serviços à comunidade é a forma de cumprimento da pena mais humana e sem a retirada do condenado do convívio social e familiar, evitando-se o en-carceramento.Alémdisso,épossívela‘flexibilidadenaprestaçãodosserviços,podendo

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serfixadoumcronogramadetrabalhovariável,tudoparanãoprejudicarajornadadelabor do condenado’ (in Nucci, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado, 3. ed. São Paulo: RT, 2003, p. 230), propiciando, inclusive, a possibilidade de antecipação de seu cumprimento (art. 46, § 4º).

Porsuavez,aprestaçãopecuniáriaatingeplenamenteofimaquesedestina,auxi-liando na reparação do dano e prevenindo a reincidência, devendo ser considerado que émotivocomumparaapráticadosdelitosfiscaisaobtençãodelucroemdetrimentoda Fazenda Pública.” (ACR nº 2002.04.01.038718-0, Rel. Des. Paulo Afonso Brum Vaz, julg. em 01.06.2005)

Porfim,nãoseaplicaasuspensãocondicionaldapenaquandoindi-cada ou cabível a substituição por restritivas de direitos, nos termos do art. 77, inciso III, do Código Penal.

Em relação ao sursis processual, previsto no art. 89 da Lei nº 9.099/95, o benefício já foi proposto, mas não foi aceito pela ré, consoante termo deaudiênciadafl.107.Assim,nãoháfalaremsuaaplicação.

Isso posto, voto no sentido de dar parcial provimento ao apelo, tão somente para reduzir a prestação pecuniária para 02 (dois) salários mínimos, vigentes à época do efetivo pagamento.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2005.04.01.023831-0/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro

Apelante: L.A.M.Advogado: Dr. Amarilio Augusto Sturza

Apelante: I.F.P.Advogado: Dr. Olviedo Castanheira Filho

Apelado: Ministério Público Federal

EMENTA

Penal e processual. Instituição financeira ilegal. Art. 16 da Lei

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7.492/86. Cobrança de juros exorbitantes. Art. 8º da lei. Não configura-ção. Suspensão condicional do feito. Condenações anteriores. Reprimen-das extintas. Período superior a cinco anos. Ausência de impedimento ao benefício legal. Precedentes.

1. Tendo a exordial narrado que os agentes, de forma clandestina, captavam recursos de terceiros, mediante remuneração superior à do mercado, repassando os valores a outrem sob a forma de empréstimos, com elevada taxa de juros, é possível falar, em tese, no tipo do art. 16 da Lei dos Crimes do Colarinho Branco.

2. In casu, descabido cogitar da aplicação do art. 8º da mencionada norma. Por um lado, a cobrança de juros irregulares era um dos pilares dacondutade“fazeroperarinstituiçãofinanceira”deformailegal,e,poroutro, não se encontra presente a elementar “exigência”, imprescindível para a caracterização do tipo.

3. Sendo a pena mínima do delito remanescente igual a um ano de reclusão, cabível o benefício contido no art. 89 da Lei dos Juizados Es-peciais Cíveis e Criminais (Súmula nº 337 do E. STJ).

4. Encontrando-se vedada em nosso ordenamento jurídico a atribuição de caráter perpétuo às sanções, não constitui empecilho para a formulação de proposta de sursis processual a condenação anteriormente imposta ao acusado, pois extinta há mais de cinco anos.

5. Retorno dos autos à origem para manifestação do Parquet, sobres-tando-se o exame dos apelos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Oitava Turma do Tribunal Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento aos apelos para afastar o crime do art. 8º da Lei 7.492/86 e, de ofício, determinar a remessa dos autos à Vara de origem para manifestação do Ministério Público Federal acerca docomandoinscritonoart.89daLeinº9.099/95,ficandosobrestadoo julgamento das demais questões suscitadas nas razões recursais, nos termosdorelatório,votoenotastaquigráficasqueintegramopresentejulgado.

Porto Alegre, 06 de agosto de 2008.Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro, Relator.

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RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro: O Ministério Público Federal aviou denúncia em desfavor de L.A.M. e I.F.P., dando-os como incursos nas sanções dos artigos 8º e 16 da Lei nº 7.492/86.

Aexordial(fls.3-4)recebidaem23demaiode2001(fl.902)narrouos fatos, em resumo, nestas letras:

“Duranteosanosde1995,1996e1997osdenunciadosfizeramoperar,semadevidaautorizaçãodoBancoCentral,instituiçãofinanceiraeexigiramjurosecomissões,dentreoutras formas de remuneração, em desacordo com a lei. Por meio da pessoa jurídica Pinheiro e Mosqueira Ltda., promoveram, com habitualidade, atividades privativas deinstituiçãofinanceira,captandorecursosdeterceiros,remunerando-oscomjurossuperioresaosdomercadoeconcedendofinanciamentoscomencargosdeaté30%ao mês. A atividade delituosa está comprovada por depoimentos de clientes e cheques juntados aos autos.”

Regularmenteinstruídoofeito,sobreveiosentença(fls.1336-55)pu-blicada em 20 de maio de 2005, julgando procedente a pretensão punitiva do Estado para condenar os réus da seguinte forma:

L.A.M.: a) pelo art. 8º, caput, da Lei n° 7.492/86, a 1 ano, 4 meses e 10 dias de reclusão (estando aí incluído o acréscimo de 1/6 por conta do art. 71 do CP), bem como 40 dias-multa, no valor de 1/10 do salário mínimo; b) quanto ao crime do art. 16 da referida Lei, a 1 ano e 2 meses de reclusão, além de multa nas mesmas proporções. Somadas, as penas resultaram em 2 (dois) anos, 6 (seis) meses e 10 (dez) dias de reclusão, noregimeaberto,apardamultaespecificada.

I.F.P.: a) pelo crime do art. 8º da Lei nº 7.492/86, a 1 ano e 2 meses de reclusão (já considerado o acréscimo de 1/6 pela continuidade delitiva) e 11 dias-multa, à razão de 1/10 do salário mínimo; b) pelo do art. 16 da mesma Lei, a 1 ano de reclusão, além de 10 dias-multa, em idêntico valor. Ante o concurso material, as reprimendas totalizaram 2 anos e 2 meses de reclusão, no regime aberto, além de 21 dias-multa.

Presentes os requisitos legais, as privativas de liberdade restaram substituídas por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e pecuniária, no valor de 4 salários mínimos para cada um dos agentes.

Irresignados,osréusapelaram(fls.1358e1361).

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Emsuasrazões(fls.1367-91),L.A.M.alega,empreliminar:a) in-competência da Justiça Federal; b) nulidade do decisum ante a ausência de exame de corpo de delito; c) existência de vício processual, pois, por um lado, o interrogatório realizou-se sem a presença de advogado e, por outro, não estava presente o defensor constituído em dois dos atos processuais, mas somente dativo nomeado pelo juízo; d) cerceamento de defesa, porquanto não teria o magistrado, durante o interrogatório, questionado o réu sobre todos os fatos imputados, tampouco oportunizado a manifestação defensiva acerca dos documentos juntados pelo dominus litis na fase do art. 499 do CPP. Na mesma direção, alega que, a despeito de terem sido deferidas, as diligências requeridas pela Defesa não foram implementadas, uma vez que a eminente Juíza a quo teria encerrado prematuramente a referida etapa.

No mérito, sustenta inocência, pois agiu no cumprimento de mandato outorgado pelo corréu, sendo as operações regulares. No que pertine às reprimendas,aduzinexistiremantecedentescriminais.Porfimpleiteia,além da absolvição, a isenção do pagamento da multa e da pecuniária substitutiva, bem como seja reconhecida a prescrição.

I.F.P., a seu turno (fls.1392-6), alémde sustentar aocorrênciadaprescrição,fazremissãoàsalegaçõesfinais,emquesustentouainépciadadenúnciaeainsuficiênciadeprovasparaacondenação.

Apresentadascontrarrazões(fls.1398-1405),subiramosautos.AdoutaProcuradoriaRegionaldaRepública,oficiandonofeito(fls.

1410-21), opinou pelo desprovimento dos recursos.É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro: Antes de entrar nas questões suscitadas nos apelos, cumpre examinar a tipicidade das condutas imputadas aos réus. A propósito, veja-se o texto dos artigos da Lei nº 7.492/86 pelos quais restaram condenados:

“Art. 8º Exigir, em desacordo com a legislação (Vetado), juro, comissão ou qualquer tipo de remuneração sobre operação de crédito ou de seguro, administração de fundo mútuooufiscaloudeconsórcio,serviçodecorretagemoudistribuiçãodetítulosouvalores mobiliários: Pena – Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.”

“Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante

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declaração(Vetado)falsa,instituiçãofinanceira,inclusivededistribuiçãodevaloresmobiliários ou de câmbio: Pena – Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.”

Confira-se,também,oquenarrouaexordialacusatória:“Duranteosanosde1995,1996e1997osdenunciadosfizeramoperar,semadevida

autorizaçãodoBancoCentral,instituiçãofinanceiraeexigiramjurosecomissões,dentreoutras formas de remuneração, em desacordo com a lei. Por meio da pessoa jurídica Pinheiro e Mosqueira Ltda., promoveram, com habitualidade, atividades privativas deinstituiçãofinanceira,captandorecursosdeterceiros,remunerando-oscomjurossuperioresaosdomercadoeconcedendofinanciamentoscomencargosdeaté30%ao mês. A atividade delituosa está comprovada por depoimentos de clientes e cheques juntados aos autos.”

In casu, verifica-sedeplanoqueaimputaçãofoipelacaptaçãoderecursos de terceiros, mediante remuneração, e a posterior concessão de empréstimos a outrem com a cobrança de juros exorbitantes.

Tais condutas, entretanto, não se subsumem ao artigo 8º da Lei dos Crimes do Colarinho-Branco, consoante reiterada jurisprudência.

Com efeito, a concessão de empréstimos por meio de taxas abusivas poderiacaracterizar“agiotagem”ou“usura”,entretantonãoconfiguraoapontadocrimecontraosistemafinanceironacional,namedidaemque praticada à margem da legalidade, mormente considerando ter sido imputada pelo Parquet a conduta prevista no art. 16 (“fazer operar, sem adevidaautorização(...),instituiçãofinanceira”), restando descabida a pretensão de punir-se os réus pela cobrança excessiva de juros.

Nesse sentido, veja-se o Acórdão assim ementado:“PENAL. CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL. ARTS.

8º E 16 DA LEI Nº 7.492/86. OPERAÇÕES DE CAPTAÇÃO E APLICAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIAS DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA ILEGAL. AUTORIA E MATERIALIDADE. DOLO. COBRANÇA DE JUROS EXTORSIVOS. INEXISTÊN-CIA DE OFENSA A BEM JURÍDICO. PRESCRIÇÃO. EXTINÇÃO DA PUNIBILI-DADE.1.Aoperaçãodecaptaçãoeaplicaçãoderecursosfinanceirosporinstituiçãofinanceiraporequiparaçãocaracterizaodelitoinsculpidonoart.16daLeinº7.492/86,sendo irrelevante o fato de o agente ter atuado na intermediação de tal atividade, desde que demonstrado que possuía ciência do funcionamento do esquema delituoso, ao qual, com a sua experiência, dava efetividade. 2. Já a concessão de empréstimos com remuneração excessiva por instituição financeira apenas por ficção e para o fim do artigo 16 da Lei nº 7.492/86, não autorizada a operar no Sistema Financeiro Nacional, atuando com a conivência de expressiva parcela de uma determinada comunidade, no

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mercado marginal e insuflada tanto pela ganância e pelo desapego dos seus gestores às normas reguladoras do mercado formal, como também fomentada pelos interesses obviamente especulativos dos seus ditos ‘investidores ou tomadores’, não agride ao bem jurídico protegido pela norma do artigo 8º da lei que protege o sistema financeiro brasileiro. 3. Prescrição da pretensão punitiva que se reconhece de ofício, ensejando a declaração da extinção da punibilidade do réu, nos termos do que dispõe o art. 107, IV, do CP.” (TRF4, ACR 2004.04.01.044184-5, Oitava Turma, Relator Des. Luiz Fernando Wowk Penteado, D.E. 30.05.2007)

Do voto condutor, permito-me transcrever o seguinte excerto:“No que toca à absolvição da conduta violadora do citado art. 8º da Lei nº 7.492/86,

mantenho a sentença, mas por outros fundamentos, uma vez que a decisão recorrida absolveu o réu nos termos do disposto nos incisos IV e VI do art. 386 do CPP. Com a vênia devida, entendo que não se trata de falta de elementos caracterizadores da autoria do denunciado, mas de ausência de subsunção do fato à norma, uma vez que o artigo 8º, como os demais dispositivos da Lei nº 7.492/86, tem como objetivo mediato a higidez doSistemaFinanceiroNacional,assegurando,emprincípio,aconfiançadosusuários/consumidoreseapoupançadosinvestidores/tomadores,comofimimediatoeespecialde preservar a boa execução da política econômica do Estado.

Nocasopresente,verificoquenãoseobservaaagressãoaobemjurídicoprotegidopela norma do art. 8º da Lei em referência. Tenho que não se pode conceber a ‘con-cessão de empréstimo com remuneração excessiva’ noticiada nos autos como crime, no contexto relatado, uma vez que a prova dos autos é tão só no sentido da existência deumaempresa–instituiçãofinanceiraapenasporficçãoeparaofimdoart.16daLei nº 7.492/86 – não autorizada a operar no Sistema Financeiro Nacional, atuando, com a conivência de expressiva parcela de uma determinada comunidade, no mercado marginal,insufladatantopelaganânciaepelodesapegodosseusgestoresàsnormasreguladoras do mercado formal quanto também fomentada pelos interesses obviamente especulativos dos seus ditos ‘investidores ou tomadores’ .

Não há de ser concebido que a norma em causa proteja um desvalor, como o interesse especulativoeosoutrosinconfessáveisquesustentamomercadofinanceiromarginal.Ela,comoasdemaisdaLeiemreferência,objetivapreservarosistemafinanceirooficial,não o patrimônio ou a credibilidade de quem opera, aplica ou toma recursos no mercado marginal, desautorizado. Ao exemplo, da mesma forma que quem não pode fazer o empréstimovedadopelotipodoartigo17éoadministradordeinstituiçãofinanceiraregularequeoperadevidamenteautorizada,éogestordeinstituiçãofinanceiraregularque está limitado pelo artigo 8º em referência. Igual raciocínio se dá com os artigos 10 e 11, da mesma Lei, que não se destinam ao administrador de instituição marginal, cuja conduta tem especial vedação no artigo 16.

OSistemaoficial,comosesabe,nãoseabalapelaeventualinsolvência,mágestão,fraudes ou abusos ou ainda em caso de qualquer outra das mazelas que possam atingir

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o mercado irregular, marginal, sustentado pela poupança sem origem declarada e que pode se constituir até mesmo de produto de crime.

No caso em concreto, as pessoas que ‘investiram’ na empresa administrada por V.L.S., no intuito de auferir índices percentuais muito superiores aos normalmente ofe-recidos nas tradicionais formas de investimento (rendimentos de 16% ao mês, enquanto a poupança acumulou no ano 16,56%), tinham pleno conhecimento que o faziam de forma ‘paralela’, em instituição não autorizada e notoriamente irregular, circunstância que não os insere no grupo de investidores/aplicadores do Sistema Financeiro Nacional, não podendo, por conseguinte, em razão da apontada patogenia, nem mesmo obter a proteção inerente à norma do artigo 5º. Paralelamente, por óbvio, também os emprés-timos concedidos identicamente à margem da legalidade não atentam contra qualquer Sistema e muito menos ofendem – no âmbito especial da Lei 7.492/86 – a boa-fé ou o patrimônio de investidores ou tomadores, todos com evidente ciência da atuação desautorizada da empresa fornecedora dos recursos obtidos.

Por conseguinte, deve ser mantida a absolvição do réu quanto à suposta infração do art. 8º da Lei nº 7.492/86, mas com base no disposto no inc. III do art. 386 do CPP, ante a atipicidade da conduta narrada na denúncia, restando apenas a condenação pelo ilícito do artigo 16 da Lei nº 7.492/86.”

Outrossim, não se pode olvidar que, além de ter o Ministério Público, jánadenúncia,reconhecidoqueosagentesoperavamempresafinanceiraà margem da lei – impedindo, portanto, a aplicação do art. 8º, já que vol-tadoàtuteladasinstituiçõesoficiais–,nãonarrouaexigência de juros excessivos, sendo esta imprescindível para caracterizar o tipo.

A propósito, Antônio Carlos Rodrigues da Silva (in Crimes do Co-larinho-Branco, Brasília Jurídica, 1999, p. 79 e ss.) trata do tema nas seguintes letras:

“O tipo em questão possui irmão gêmeo descrito no art. 316, § 1º, do Código Penal, que assim se expressam: ‘Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida’ e ‘§ 1º: Se o funcionário exige tributo ou contribuição social que sabe ou deveria saber indevido.’ (...) Tipo objetivo: o núcleo da figura delitiva é exigir, do latim exigere, significando reclamar, demandar, impor, ordenar. Consagrou-se na jurisprudência, para tipos semelhantes, o entendimento de que há, na base da incriminação, o metus publicae potestatis, ou seja, o temor de represálias.”

Diante desse quadro, cumpre afastar, de plano, a incidência do art. 8º da Lei nº 7.492/86, restando somente a imputação pelo art. 16 da referida norma.

Definidaacapitulaçãolegal,exsurgeaquaestio relativa à suspensão

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condicional do processo, uma vez que a sanção mínima cominada para o delito remanescente é de 1 ano de reclusão, adequando-se ao art. 89 da Lei nº 9.099/95, cujo caput prevê:

“Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a 1 (um) ano, abrangidos ou não por esta lei, o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).”

Com efeito, ao julgar o HC 75.894/SP (DJU de 23.08.2002, Relator Ministro Marco Aurélio), o Pretório Excelso manifestou entendimento deque,operadaadesclassificaçãodo fatoparaoutro tipopenal, im-plicando a possibilidade de oferecimento de suspensão condicional do processo, deve o magistrado diligenciar para que o Ministério Público se pronuncie a respeito.

Tal orientação tem sido reiterada pelos Tribunais pátrios, a ponto do Superior Tribunal de Justiça, recentemente, ter editado a Súmula nº 337, dispondo: “É cabível a suspensão condicional do processo na desclassi-ficaçãodocrimeenaprocedênciaparcialdapretensãopunitiva”.

No caso dos autos, insta referir que, consoante já decidiu esta Turma, “o crime do art. 16 da Lei nº 7.492/86 não se coaduna com a forma con-tinuada,poisfazeroperarinstituiçãofinanceiraécrimepermanente,cujaconsumação se prolonga no tempo” (ACR 2003.04.01.018788-2, Relator do Acórdão Des. Luiz Fernando Wowk Penteado, D.E. 11.04.2007). Logo, a reprimenda mínima in abstrato não excede o quantum de 1 ano de reclusão.

Frise-se, ainda, que, malgrado conste dos autos notícia de condena-çõescriminaisanteriormentesofridaspeloréuL.A.M.(fls.1264-65e1270-71), ambas foram extintas há mais de 5 anos.

Com efeito, encontrando-se vedado, em nosso ordenamento jurídico, a atribuição de caráter perpétuo às penas (CF, art. XLVII, b), inexiste óbice à formulação da proposta de sursis processual, na linha do entendimento firmadopeloSupremoTribunalFederal,in verbis:

“HABEAS CORPUS. ABORTO. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO (ART. 89 DA LEI Nº 9.099/95). CONDENAÇÃO ANTERIOR PELO CRIME DE RECEPTAÇÃO. PENA EXTINTA HÁ MAIS DE CINCO ANOS. APLICAÇÃO DO

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INCISO I DO ART. 64 DO CP À LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS. O silêncio da Lei dos Juizados Especiais, no ponto, não afasta o imperativo da interpretação sistêmica das normas de direito penal. Pelo que a exigência do artigo 89 da Lei nº 9.099/95 – de inexistênciadecondenaçãoporoutrocrime,parafinsdeobtençãodasuspensãocondi-cional do feito – é de ser conjugada com a norma do inciso I do art. 64 do CP. Norma que ‘apaga’ a ‘pecha’ de uma anterior condenação criminal, partindo da presunção constitucional da regenerabilidade de todo indivíduo. A melhor interpretação do art. 89 da Lei nº 9.099/95 é aquela que faz associar a esse diploma normativo a regra do inciso I do art. 64 do Código Penal, de modo a viabilizar a concessão da suspensão condicional do processo a todos aqueles acusados que, mesmo já condenados em feito criminal anterior, não podem mais ser havidos como reincidentes, dada a consumação dolapsodecincoanosdocumprimentodarespectivapena.Ordemconcedidaparafinsde anulação do processo-crime desde a data da audiência, determinando-se a remessa do feito ao Ministério Público para que, afastado o óbice do caput do art. 89 da Lei nº 9.099/95, seja analisada a presença dos demais requisitos da concessão do sursis processual.” (STF, HC 88157/SP, Primeira Turma, Relator Min. CARLOS BRITTO, public. DJU 30.03.2007, p. 76)

Por último, cabe referir que, consoante têm decidido o STJ e a Suprema Corte, não é caso de anulação da sentença, mas apenas de sobrestamento da apelação interposta, a qual será analisada na hipótese de não ocorrer a proposta do Parquet ou não ser aceita pelo denunciado.

Frente ao exposto, dou parcial provimento aos apelos para afastar a condenação pelo artigo 8º da Lei nº 7.492/86 e, de ofício, determino a remessa dos autos à Vara de origem para manifestação do MPF acerca do comando inscrito no art. 89 da Lei nº 9.099/95, ficando sobrestado o exame das demais questões arguidas nos recursos.

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NOTÍCIA CRIME Nº 2008.04.00.019096-1/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Tadaaqui Hirose

Notificante: Ministério Público FederalNotificado: M.G.W.

Advogados: Drs. Iberê Athayde Teixeira e outro

EMENTA

Ação penal originária. Notícia crime. Prefeito. Omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil. Artigo 10 da Lei nº 7.347/85. Recebimento da denúncia. Suspensão condicional do processo. Artigo 89 da Lei 9.099/95. Penal.

1.Paraaconfiguraçãodotipoprevistonoartigo10daLei7.347/85,além da indubitável caracterização da recusa, da omissão e/ou do retar-damento em prestar as informações requisitadas pelo Ministério Público, misterquetaisinformaçõesconfigurem,efetivamente,“dadostécnicosindispensáveis à propositura da ação civil”, bem como digam respeito, exclusivamente, a interesses metaindividuais.

2. Hipótese em que o conteúdo dos relatórios requeridos pelo MPF afigura-seindispensávelaofundamentodacausadepedirdaaçãocivilaventada, pois que necessário à demonstração do efetivo cumprimento deespecificaçõestécnicasdeproteçãoaomeioambientepreviamenteacordadas pelo Município em Ajustamento de Conduta perante o IBA-MA.

3. Nessa direção, deve ser recebida a denúncia, pois que minimamente lastreada em elementos probatórios legítimos e idôneos da conduta típi-ca. Mesmo porque, neste momento processual, desnecessária a obtenção de um juízo de certeza acerca da autoria e da materialidade delitivas, indispensável apenas em caso de eventual julgamento do mérito.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda Quarta Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, receber a denúncia, nos termos do relatório, votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopre-sente julgado.

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Porto Alegre, 18 de junho de 2009.Des. Federal Tadaaqui Hirose, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Tadaaqui Hirose: A Procuradoria da República em Uruguaiana/RS, após constatar irregularidades no li-cenciamento ambiental das obras de urbanização do cais do porto do município de São Borja/RS, converteu o Procedimento Administrativo nº1.29.011.000003/2006-44emInquéritoCivilPúblico,comofimdesubsidiar eventual compromisso de ajustamento de conduta entre a Pre-feituraMunicipaleoIBAMA(fls.03-04).

Oficiado,emduasoportunidades,aprestarasinformaçõessolicitadasàfl.04,oprefeitodoMunicípio,M.G.W.,nãosemanifestou(fls.05-07).Assim, instaurado o procedimento investigatório criminal, a Procuradoria Regional da República da 4ª Região ofereceu denúncia em desfavor do Prefeito, pela prática, em tese, da conduta descrita no artigo 10 da Lei nº 7.347/85.

Noprazodoartigo4ºdaLei8.038/90,oNotificadoapresentoures-posta preliminar. Requereu, preliminarmente, a suspensão do processo, na forma do artigo 89 da Lei 9.099/95. No mérito, sustentou, em síntese, a rejeição da denúncia, diante da atipicidade da conduta, bem como por ausênciadejustacausaparaaaçãopenal(fls.70-4).Juntoudocumentosdefls.76-285.

Instado a se manifestar, o órgão ministerial entendeu viável a con-cessão do sursis processual, mediante comparecimento bimestral em Juízo e pagamento de prestação pecuniária de cinco salários mínimos em favor de entidade de proteção ao meio ambiente de São Borja/RS (fls.289-298).

Apósapresentaçãodecontrapropostas(fls.319-321e322v.),oNoti-ficadoaceitouascondiçõesdoMPF,sendopossibilitadooseucompa-recimento bimestral junto ao Juízo Estadual, na Comarca de São Borja/RS(fls.322v.e339).

É o que cumpria relatar.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Tadaaqui Hirose: Cuida-se de notícia

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crime em que oferecida denúncia em desfavor de M.G.W., prefeito do município de São Borja/RS, pela suposta prática da conduta descrita no artigo 10 da Lei 7.347/85.

Nahipótese,oNotificadoteriadeixadodefornecerdadostécnicosindispensáveis à propositura de ação civil pública, os quais foram re-quisitados pelo MPF para instrução de procedimento administrativo, em que apuradas irregularidades no licenciamento ambiental das obras de urbanizaçãodocaisdoportodoMunicípio(fls.47-51).

Posto isso, na forma do artigo 6º da Lei 8.038/90, cumpre analisar sobre o recebimento ou a rejeição da denúncia e, bem assim, quanto à procedência ou não da acusação.

Num primeiro momento, para que ocorra o regular recebimento da denúncia, deve ser averiguada a presença dos requisitos formais do artigo 41 do Código de Processo Penal. Na hipótese, analisando a peça acusatóriadefls.47-51,constata-seadevidaexposiçãodofatocrimino-so,aqualificaçãodoacusadoeaclassificaçãodocrime,estando,pois,perfeitamente preenchidas as exigências constantes no mencionado dispositivo legal.

Adiante, importa aferir as condições de procedibilidade da ação pe-nal. Dessa forma, à luz da nova sistemática processual penal (art. 9º da Lei 8.038/90), cumpre analisar se é caso de incidência de alguma das hipóteses elencadas no art. 395, in verbis:

“Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:I – for manifestamente inepta;II – faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal; ouIII – faltar justa causa para o exercício da ação penal.”

Preenchidos os requisitos dispostos no art. 41 do CPP, não há falar em denúncia inepta, tampouco em ausência dos requisitos necessários para a existência e validade da relação jurídica. Registre-se que o ora Representado é detentor da prerrogativa de foro conferida aos prefeitos emexercício,ajustificaracompetênciaorigináriadestaCorteparapro-cessarejulgarofeito(v.documentodefl.12).

No exame das condições e/ou da justa causa para o exercício da ação penal, cabe perquirir sobre a plausibilidade da pretensão acusatória, a qual, na lição de José Antônio Paganela Boschi (Ação Penal. Rio de

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Janeiro: Aide, 1993, p. 59), “deverá estar minimamente lastreada em elementos probatórios legítimos e idôneos da conduta típica”. Por outro lado, neste momento processual, desnecessária a obtenção de um juízo de certeza acerca da autoria e da materialidade delitivas, indispensável apenas em caso de eventual julgamento do mérito.

Pois bem. A Lei nº 7.347/85, em seu artigo 10, dispõe:“Art. 10. Constitui crime, punido com pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos,

mais multa de 10 (dez) a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional – ORTN, a recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil, quando requisitados pelo Ministério Público.”

Discorrendo sobre referido dispositivo, assim elucidou a Minis-tra Laurita Vaz, quando do julgamento do REsp 633250 (DJU de 26.02.2007):

“[...] Como bem preleciona Mancuso, a lei determinou alguns elementos para a configuraçãodotipo,‘destacando-se os seguintes: a) o bem jurídico protegido há de ser um interesse me-taindividual – difuso, coletivo, individual homogêneo; b) que os dados requisitados se afigurem indispensáveis (e não apenas úteis, auxiliares) à propositura da ação civil pública, porque aquele qualificativo – indispensável – opera como elemento normativo do tipo;c)odescumprimentoàrequisiçãohádeserindevido,ouseja,injustificado,inescusável, tratando-se aí, pois, de elemento normativo do injusto, mormente em se considerando o disposto no art. 8º, § 3º da Lei Complementar Federal 75/93: ‘A falta injustificadaeoretardamentoindevidodocumprimentodasrequisiçõesdoMinistérioPúblico implicarão a responsabilidade de quem lhe der causa’; d) não se concebe a forma tentada, nem tampouco a conduta sob a modalidade culposa, exigindo-se o dolo, genérico, direto ou eventual’ (in Ação Civil Pública: em Defesa do Meio Ambiente, do Patrimônio Cultural e dos Consumidores, RT, 9. ed., 2004, p. 522-523; sem grifo no original)

Exige-se, portanto, que os documentos requisitados sejam indispensáveis à propo-situra da ação, salientando-se que a indispensabilidade deve ser entendida de forma relativa, e não absoluta. Nesse sentido, necessário transcrever as lições do Professor José dos Santos Carvalho Filho, in verbis:

‘Observa o autor que a indispensabilidade do documento pode derivar da circuns-tância de que sem ele não há pretensão deduzida em juízo, eis que seria ele da própria substância do ato, ou dele derivaria a especialidade do procedimento. Exemplo seria o da ação de reivindicação: não poderia ser a ação proposta sem que o autor provasse o domínio pela escritura pública devidamente transcrita no Registro de Imóveis. Nem a ação de separação judicial teria cabimento se não se juntasse, desde logo, a prova do

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matrimônio através da certidão expedida pelo Registro Civil. Não obstante, ao lado desses documentos, haverá outros que não são da substância do ato, mas em relação a este têm mera força probante. Em outras palavras, tais documentos não seriam indis-pensáveis para prova do fundamento fático da demanda.

Tais observações comportam adequação no que toca à inteligência do dispositivo que estamos comentando. Assim como, no direito processual civil, constitui dever do autor instruir a inicial com os documentos indispensáveis à propositura da ação, como está no art. 283 do Código de Processo Civil, em relação ao crime previsto no art.10daLeinº4.347/85,sópodetipificar-seacondutadelituosaseoagenterecusar,retardar ou omitir, diante da requisição do Ministério Público, os dados técnicos que se caracterizem como indispensáveis ao ajuizamento da ação civil. Somente se tais dados, ao contrário, forem absolutamente dispensáveis ao momento da propositura, podendo ser substituídos sem qualquer esforço para instruir a demanda, é que a conduta não se revestirá da ilicitude prevista no dispositivo.

[...]Ora, o Ministério Público, como autor da ação civil, tem o dever processual de

observar os requisitos da petição inicial (art. 282, C.P.C.) e de acostar a esta os do-cumentos indispensáveis à propositura da ação (art. 283). Se algum fato constante da causa de pedir da ação depende de dados técnicos, é claro que o autor deve juntar à inicial a sua prova, já que se trata de fato em que se funda o petitum. Mesmo que tal fato possa vir a ser comprovado no curso da ação, os dados técnicos que o provam devem ser considerados como indispensáveis à propositura da ação. Sem eles, como vimos acima na lição do grande processualista, fica faltante o dever previsto no art. 283 do Código de Processo Civil.

Repetimos, pois, porque nos parece relevante que a lei não quis referir-se à indis-pensabilidade absoluta dos dados técnicos, mas sim à relativa. Mesmo que possam vir a ser obtidos no curso da ação (e os laudos geralmente o podem), mas desde que sejam necessários para provar fato constante da causa de pedir e, em consequência, tenham que ser juntados à inicial da ação civil, tais dados serão qualificados como indispensáveis, de modo que a recusa, o retardamento ou a omissão de fornecê-los, quando requisitados pelo Ministério Público, constituirão o crime previsto no art. 10.’ (in Ação Civil Pública, Comentários por Artigo. Lumen Juris, 5. ed., 2005, p. 315-317; sem grifo no original) [...].”

A par disso, examinando a existência de um suporte probatório razo-ável quanto à materialidade delitiva, tem-se que, em outubro de 2007, a Procuradoria da República em Uruguaiana expediu ofício requisitório ao Prefeito, solicitando a apresentação, em dez dias, do relatório mensal sobre o “cumprimento das condicionantes” acordadas em reunião com oIBAMArealizadaemagostode2007(fl.31).TaiscondicionantessereferemaoTermodeAjustamentodeCondutafirmadoentreoIBAMA

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e o Município de São Borja, em que restou consignado caber à Muni-cipalidade o atendimento integral dos termos da Licença de Instalação para obras no cais do porto e, ainda, a apresentação de “reformulação do projetodeesgotosanitárioecronogramadeatividades”(fl.257).

Passados mais de dois meses, a Procuradoria da República reiterou os termos do ofício anterior, dessa vez, ressalvando quanto às possíveis consequênciaspenais,casomantidaainérciadodestinatário(fl.33).

Em efetivo, consoante se depreende, o conteúdo dos relatórios re-queridospeloMPFafigura-seindispensávelaofundamentodacausadepedirdaaçãocivilaventadaàfl.49,poisquenecessárioàdemonstraçãodoefetivocumprimentodeespecificaçõestécnicasdeproteçãoaomeioambiente, as quais foram previamente acordadas pelo Município em Ajustamento de Conduta perante o IBAMA.

No que pertine aos indícios da autoria delitiva, tornam-se despiciendas maiores divagações neste juízo prévio de admissibilidade, porquanto osdocumentosdefls.32e34demonstramqueosofíciosrequisitóriosforam devidamente recebidos pela Municipalidade, sem que houvesse qualquermanifestaçãoporpartedoNotificado,pelomenosatéabrilde2008(fl.35).

Registre-se que o exame do dolo depende da avaliação da prova e isso só será possível após a instrução do processo. Por ora, sendo aplicável o princípio in dubio pro societatis, não se evidenciando nenhum dos pressupostos para a rejeição da peça inaugural (art. 395 do CPP), é de ser reconhecida a plausibilidade necessária para o seu recebimento.

Ante o exposto, voto pelo recebimento da denúncia.Sendo a presente decisão acatada pela Seção, homologo os termos

acordadosentreaspartesàsfls.298,319-320,322v.e339,parafinsdesuspensão condicional do processo (artigo 89 da Lei 9.099/95), pelo prazo de dois anos, cumprindo a M.G.W. comparecer bimestralmente ao Juízo Estadual de São Borja/RS e efetuar o pagamento de prestação pecuniária, no valor de 05 (cinco) salários mínimos, em favor de entidade de proteção ao meio ambiente localizada no referido Município.

Registre-se que o descumprimento das condições acima descritas ouainstauraçãodeoutraaçãopenalemqueM.G.W.figurecomoRéuensejará a revogação do benefício, com o prosseguimento imediato da presente ação penal em seu ulteriores termos.

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Intime-se pessoalmente o Notificado para fins de início do período de prova, ao final do qual, não havendo revogação, será declarada extinta a punibilidade.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2008.71.00.030825-3/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz

Apelante: R.S.Advogados: Drs. Miguel Vargas da Fonseca e outro

Apelado: Ministério Público Federal

EMENTA

Processo penal. Pedido de restituição de bens. Possível instrumento do crime. Lei nº 9.605/98. Perdimento. Maior amplitude.

1. A restituição de bem apreendido em processo penal condiciona-se à demonstração cabal de sua propriedade por parte do requerente, sem víciosdeidentificaçãooudeindividualização,etambémdeinexistênciade elementos que demonstrem que os bens apreendidos possam interessar ao processo.

2. Tratando-se o bem apreendido de possível instrumento utilizado para o cometimento de crime ambiental, não há falar em sua restituição antes do término da ação penal, independentemente do fato de este apresentar, ou não, características ilícitas. Inteligência do artigo 25 da Lei nº 9.605/98.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, vo-

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tosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopresentejulgado.

Porto Alegre, 15 de julho de 2009.Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz: Cuida-se de pedido de restituição de automóvel (Volkswagen Golf de placas MAO 9595)apreendidopelaPolíciaFederalemoperaçãoqueflagrouore-querente internalizando 20 galões de herbicida de origem estrangeira nointeriordoreferidoveículo.Emsuainicial(fls.02-05),alegouoautor, em síntese, que foi devidamente comprovada a propriedade do bem e que este não apresenta qualquer compartimento oculto destinado ao transporte de material ilícito, consoante constatou a perícia técnica realizada. Assim, refere inexistir possibilidade de perdimento do bem quando da conclusão de eventual ação penal, postulando, assim, a devolução do automóvel constrito ou, alternativamente, seja nomeado depositário do veículo.

Sentenciando(fls.15-17v),oMagistradoa quo julgou improcedente o pedido. Entendeu-se que há a possibilidade de o automóvel ter servido de instrumento para a realização de crime, de forma que sua constrição interessa ao processo em face de possível pena de perdimento. Quanto ao pedido de constituição do autor como depositário do bem, assinalou o Juízo a quo que inexistem provas que indiquem que o veículo seria indispensável ao sustento do postulante.

Irresignado,apelouorequerente(fl.22).Emsuasrazõesrecursais(fls.23-31),ratificaostermosdesuapetiçãoinicial,asseverandoquenecessita do automóvel para as suas atividades profissionais.Refereque, após realizada a perícia, inexistem motivos para que seja mantida a constrição. Alternativamente, reitera o pedido de devolução mediante depósito.

Comcontrarrazões(fls.51-56),vieramosautosaesteTribunal.A Procuradoria Regional da República, em seu parecer acostado às

fls.61-63v,épeloparcialprovimentodaapelação.É o relatório.

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VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz: Consoante entendi-mentofirmadonoâmbitodestaCorte,cumpresalientarquearestituiçãode bens somente “é cabível em favor do seu legítimo proprietário, desde que não interessem ao processo (CPP, art. 118), nem sejam passíveis de perdimento, em caso de eventual sentença condenatória (CPP, art. 119)” (TRF4, ACR 2005.70.02.005525-0, Oitava Turma, Relator Luiz Fernando Wowk Penteado, D.E. 10.01.2007).

Nocasodosautos,R.S.foipresoemflagrantedelitoaotransportar,no automóvel objeto do presente pedido de restituição, 20 galões de 4,8 litros de herbicida de procedência estrangeira (Clomatec 48 CE) não ho-mologado pelas autoridades competentes. Diante do contexto fático que envolve a conduta do agente, não há como desconsiderar que o bem em apreço consiste em possível instrumento do crime ambiental em apura-ção nos autos da Ação Penal nº 2008.71.00.024255-2/RS e, desse modo, evidente que interessa, sim, ao deslinde do processo-crime, encontrando a liberação postulada óbice no artigo 118 do Código de Processo Penal. Senão vejamos.

A teor do art. 25 da Lei nº 9.605/98, “os instrumentos utilizados na prática da infração serão vendidos”. Poder-se-ia asseverar que os ins-trumentos da prática criminosa passíveis da medida prevista no dispo-sitivo em comento seriam apenas aqueles “cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito”, conforme previsão do art. 91, II, a, do Código Penal. Peço vênia, contudo, aos que comungam desse posicionamento, pois não vejo como lhes dar razão. É que, sendo a Lei Ambiental especial, não tendo ela restringido as espécies de instrumentos do crime a serem objeto de pena de perdimento, a sua ratio legis, a toda evidência, foi a de afastar a limitação contida na regra geral. Tal exegese, inclusive, encontra abrigo, sobretudo, diante da norma do artigo 72, IV, da Lei nº 9.605/98, que, no âmbito da autuação administrativa, estabelece como reprimenda a “apreensão dos (...) instrumentos (...) ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração”.

A propósito, vejam-se os ensinamentos de Carlos Ernani Constantino (in Delitos Ecológicos: A Lei Ambiental Comentada Artigo por Artigo. 3. ed. São Paulo: Lemos e Cruz, 2005. p. 123):

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“(...) Instrumentos do crime são meios (petrechos, objetos) através dos quais o delito é perpetrado. São chamados pela doutrina de ‘instrumenta sceleris’. Esse tema é tratado, no Cód. Penal, no art. 91, inc. II, alínea a, a seguir transcrito: (...)

Observe-se, entretanto, que a Lei Ambiental, em seu art. 25, caput, não fez tal res-salva, mas ordenou, pura e simplesmente, a apreensão dos instrumentos da infração (penal ou administrativa), sem deixar consignada a restrição ‘desde que (os instru-mentos) consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito’. Assim, mesmo que os ‘instrumentos’ utilizados na infração (administrativa ou penal) sejam de fabrico, alienação, uso, porte ou detenção permitidos, deverão ser apreendidos e vendidos (...). Isso com base no princípio de que lex specialis derogat generali, isto é, a lei especial (Lei Ambiental) prepondera sobre a lei geral (Cód. Penal) em sua aplicação.” (grifos no original)

Com efeito,“deve a autoridade judicial atentar (...) para o fato de que a Lei nº 9.605/98 contém

regra especial no que tange aos instrumentos usados para a consumação do ilícito. (...) Consoante o artigo 91, II, a, do CP, a perda (e consequente destinação) dos ins-trumentos apreendidos só ocorreriam no caso de coisas ‘cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito’. Contudo, o § 4º do art. 25 não permite esse entendimento, ao se referir genericamente aos ‘instrumentos utilizados na prática da infração’. Reforça essa interpretação o contido no art. 72, IV, da lei em comento, na medida em que institui a pena de apreensão e perdimento dos ‘instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração’.” (COSTA NETO, Nicolao Dino de Castro et ali. Crimes e Infrações Administrativas Ambientais. 2. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2001. p. 125)

Ademais, a intenção do legislador ordinário, com a regra do art. 25 da Lei nº 9.605/98, ao alargar os instrumentos do crime passíveis de perdimento,justifica-seemrazãodaextremarelevânciadobemjurídicotutelado pelo diploma legal em apreço – o conjunto no qual o homem está inserido, dele dependendo para sobreviver biológica, espiritual e socialmente. Busca-se, com tal medida, a toda evidência, obstar que o agente reitere a prática ilícita, atentando, novamente, contra um objeto jurídico de tamanha relevância para a comunidade.

Detalsorte,aindaquenãotenhasidoverificadaapresençadecom-partimento oculto destinado ao transporte de agrotóxicos no interior do automóvel, tal circunstância revela-se irrelevante à luz da legislação penalaplicávelaocaso.Assim,afigura-seincontesteaimportânciadamanutenção de sua constrição para o processo, não merecendo trânsito o pedido de restituição.

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Quanto ao pedido de constituição de depósito em nome do requerente, assinalo que, se estamos diante de um possível instrumento da atividade criminosa, não vejo como dar guarida à pretensão devolutória da res, aindaquemediantetermodefieldepositário.Ademais,noqueserefereà alegada imprescindibilidade do uso do veículo para a realização de atividadesprofissionaisdorequerente,nadafoitrazidoaosautosafimdecomprovartalafirmação.Sobreotema,destacooseguintetrechodasentença recorrida, o qual adoto como fundamento à presente decisão:

“Em outras situações (por exemplo, processo nº 2006.71.00.052226-6), este juízo deferiu o depósito da coisa apreendida em favor do acusado enquanto tramitava o in-quérito e a ação penal. Mas eram circunstâncias especiais, em que existia farta prova de que o bem era necessário para subsistência do acusado e de sua família, ou que era indispensávelparaaatividadeprofissional.Nocasodosautos,essaprovanãoexiste.Seja neste quanto no pedido de restituição anterior (processo 2008.71.00.025311-2), orequerentenãoproduznenhumaprovarelevantedesuacondiçãoquejustificasseodeferimento do depósito da coisa apreendida em seu favor. No outro incidente, juntou apenasprocuração,dadosdoveículoeumcertificadodepropriedadequeestáilegível(simplescópia,ilegível,defls.08dooutroprocesso).Nestepedidoqueoraseexamina,sequer isso foi juntado: não há nenhum documento instruindo a petição do requerente. Ora, sem uma prova conclusiva e evidente do que foi alegado, não é possível presumir que o acusado necessitasse do veículo para sua subsistência e de sua família. Pode ser que tenha outros veículos, pode ser que só utilizasse o veículo para transporte ilícito dosprodutos,podeserquesequerutilizasseoveículoemsuaatividadeprofissional,etc. Sem prova conclusiva, não é possível deferir uma medida excepcional como essa que foi postulada.”

Sendo assim, tenho que não merece qualquer reparo a decisão recor-rida,devendoestaserconfirmada.

Ante o exposto, nos termos da fundamentação, voto por negar pro-vimento à apelação.

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DIREITO PREVIDENCIÁRIO

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 2008.71.00.001228-5/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Apelante: Sidnei Marques dos SantosAdvogado: Dr. Marcelo Lipert

Apelado: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: Dr. Milton Drumond Carvalho

EMENTA

Previdenciário e processual civil. Concessão de benefício distinto e de maior renda mensal no curso da lide cognitiva. Pretensão à execução parcial do julgado. Limitação das prestações vencidas a esse título até o início do amparo outorgado na seara ancilar. Impossibilidade. Artigo 18, § 2º, da Lei 8.213/91. Compreensão majoritária da turma. Entendimento diverso do relator, mas que não altera o resultado do julgamento.

1. Constatado que, no curso da ação cognitiva, a parte-autora obteve a concessão, na seara ancilar, de benefício previdenciário distinto daquele pleiteado em juízo, atualmente em fruição, e que lhe proporciona renda mensal maior, resulta inviável a pretensão de execução parcial do julgado, mediante a limitação das prestações vencidas a esse título até a véspera de início do amparo concedido administrativamente.

2. Na compreensão majoritária da Turma, ou bem o segurado opta por manter, exclusivamente, a renda mensal em manutenção, deixando de promover a execução ou, na hipótese de preferir dar início a esta última, a realiza integralmente, isto é, deduz dos atrasados correspondentes à

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prestação outorgada judicialmente os valores que lhe foram alcançados administrativamente a modo concomitante, mercê da não cumulatividade dos respectivos benefícios e, após o pagamento, renuncia a esse segundo amparo, que será cancelado.

3. Entendimento diverso do Relator, que, no entanto, não altera o re-sultado do julgamento, segundo o qual seria possível a execução parcial do julgado, não houvesse a sobreposição dos salários de contribuição componentes dos períodos básicos de cálculo de cada um dos benefícios, circunstânciahábilarevelaraausênciadesuficientefontedecusteioemface do duplo aproveitamento que decorreria da fruição de mais de um amparo lastreado, no caso, sobre um mesmo suporte contributivo.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relató-rio,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopresente julgado.

Porto Alegre, 11 de fevereiro de 2009.Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus: Trata-se de apelação em face de sentença que, julgando procedentes os embargos de devedor opostos pelo INSS, reconheceu como sendo indevidos os valores computados no cálculo exequendo, extinguindo o feito executório, com estofo no artigo 794, II, do CPC, condenando a parte-embargada ao pa-gamento de honorários advocatícios, arbitrados em R$ 415,00, restando sobrestada a condenação em tal verba, em face da AJG.

Em suas razões recursais tempestivas, a parte-embargada aduz, em síntese, constituir prerrogativa do credor em executar apenas parcialmente o título executivo, da forma que melhor lhe aprouver, fazendo jus ao re-cebimento das parcelas vencidas da aposentadoria por tempo de serviço conferida pela decisão exequenda, a contar de 20.10.1997, até a véspera da concessão da aposentadoria por invalidez, na seara administrativa, em 18.11.2002, sem prejuízo da manutenção dessa última.

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Sem contrarrazões, ascenderam os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus: A controvérsia trazida a exame deste Tribunal cinge-se à viabilidade da execução parcial do título executivo, considerando-se as parcelas vencidas a contar da DIB(20.10.1997)daaposentadoriaconcedidajudicialmente(fls.195-202 do feito principal, em apenso) até a véspera da aposentadoria por invalidezoutorgadanasearaadministrativa,em19.11.2002(fl.212dosautos em apenso), sem a necessidade de a parte-exequente abrir mão da renda mensal dessa, porquanto lhe é mais vantajosa que a RM do amparo concedido em juízo.

Inicialmente, cumpre assinalar que as sentenças de procedência pro-feridas nas ações cognitivas de concessão/restabelecimento de benefícios previdenciários impingem ao INSS uma condenação que, de regra, enseja o cumprimento de duas obrigações: uma relativa à implantação do amparo que foi negado ao segurado na seara administrativa e outra atinente ao pagamento das prestações vencidas a partir do dies a quo da concessão, essegeralmentefixadonadatadorequerimentoadministrativooudoajuizamento da demanda.

Assim, ainda que antevisto certo vínculo entre essas obrigações, mor-mente no que diz respeito à aferição do montante devido relativamente às prestações vencidas, para a qual se parte da renda mensal inicial que deveria ter sido implantada caso deferido o amparo quando do requeri-mento perante o Ente Ancilar, tal grau de interdependência não constitui óbice a que se possa executá-las em tempo e modo diversos, sendo que aboatécnicaprocessualdemandaautilizaçãodemecanismoespecíficopara a primeira (artigo 461 do CPC), consoante já restou delineado pela 3ª Seção deste Tribunal (QOAC 2002.71.00.050349-7/RS, rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper, D.E. 02.10.2007).

Comefeito,aatuaçãojurisdicionalexecutóriatemporfinalidadeasatisfação do direito do credor, por meio do “cumprimento forçado da norma jurídicaconcretacujoconteúdo já seencontra identificadooupor sentença (título executivo judicial) ou por outro ato jurídico (título

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executivo extrajudicial).” (ZAVASCKI, Teori. Comentários ao Código de Processo Civil. 2. ed. rev. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 8, 2003, p. 37)

E isso porque a moderna ciência processual vem entendendo que a existência do processo executório não se resume a um caráter meramente patrimonialista, como ensina abalizada doutrina:

“A execução foi originariamente concebida a partir de valores nitidamente patri-monialistas, com a nítida preocupação de viabilizar a transferência de riquezas de um patrimônio ao outro, considerando, de forma especial, a relação jurídica que se dá entre o credor e o devedor. (...)

A execução, no Estado constitucional, não pode ser reduzida a um ato de transfe-rência de riquezas de um patrimônio a outro, devendo ser vista como a forma ou o ato que, praticado sob a luz da jurisdição, é imprescindível para a realização concreta da tutela jurisdicional do direito, e assim para a própria tutela prometida pela Constituição e pelo direito material.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Execução. 2. ed. rev. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 70)

É, pois, voltada à concretização da tutela de direitos, reconhecidos, in casu, em título executivo judicial, da qual a almejada subtração de bens do patrimônio do executado para a esfera jurídico-econômica do exequente revela-se a realização prática mais evidente, que deve ser con-cebidaafinalidadedoprocessodeexecução,cujasbalizasencontram-sedefinidaspelosprincípiosprocessuaisespecíficosqueregemamatéria,dentre os quais avultam o princípio do interesse prevalente do credor e da disponibilidade da execução, sobre os quais passo a discorrer a seguir, temperados à luz do direito previdenciário.

Em se tratando de demandas que versem a respeito de benefícios previ-denciários, diz-se que os direitos postulados em juízo, em regra, têm natu-reza patrimonial e, portanto, são disponíveis. As consequências jurídicas da adoção desse entendimento já são bem conhecidas na jurisprudência e revelam-se,porexemplo,naviabilidadedadesaposentação,parafinsdeaproveitamento do tempo de serviço em outro benefício – hipótese em que se exige a devolução dos valores recebidos, pois implícito também está a reutilização dos salários de contribuição então considerados para apuração do período básico de cálculo e, consequentemente, da renda mensal inicial do amparo que se visa renunciar, como será visto mais adiante – e na impossibilidade de reconhecimento ex officio da prescri-

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ção quinquenal das prestações vencidas, em se tratando de demandas ajuizadas antecedentemente à Lei 11.280/2006 (que deu nova redação ao artigo 219, § 5º do Código de Processo Civil).

Nessa perspectiva, a natureza patrimonial dos direitos previdenciários autorizaria, portanto, a delimitação das parcelas a serem executadas, ainda que, num primeiro olhar, pareça improvável que o segurado opte por deixar de receber verba de natureza alimentar e, portanto, indispen-sável à sua própria subsistência. Essa circunstância reveste-se de maior plausibilidade nas hipóteses tais como a dos presentes autos, em que a pretensão executiva é norteada pela existência de outro amparo que provê ao segurado-exequente rendimentos mensais superiores àqueles advindos doprovimentojurisdicional,oquenadamaissignificaaintençãodefrui-ção parcial do direito patrimonial disponível que lhe foi conferido pelo título,atémesmoporqueaexecuçãotemporfinalidadeaconcretizaçãodaquele, dentro dos limites da res judicata, no interesse do credor:

“Osegundoprincípioespecíficodaexecuçãoéodequeaexecuçãoserealizanointeresse do credor (CPC, art. 612). Somente tem necessidade de promover a execu-ção quem é sujeito de um título executivo que lhe atribua o direito a exigir de outrem determinada prestação. E toda a atividade executória se dirige no sentido de realizar em concreto a satisfação do crédito do exequente.

Conforme bem observa CARNELUTTI, de qualquer modo a execução já representa um atraso para o credor, em relação ao adimplemento.” (GRECO, Leonardo. O processo de execução. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 305)

Ademais, tem-se que tal pretensão encontraria guarida também no disposto no artigo 569 do CPC, cuja redação assim dispõe: “Art. 569. O credor tem a faculdade de desistir de toda a execução ou de apenas algumas medidas executivas”.

Referido dispositivo legal é apontado pela jurisprudência como a expressão do princípio da disponibilidade, no sentido de que tem o exe-quente “a livre disponibilidade da execução, podendo desistir a qualquer momento em relação a um, a alguns ou a todos os executados, mesmo porque a execução existe em proveito do credor, para a satisfação do seu crédito” (STJ, REsp 7.370, 4ª Turma, rel. Ministro Sálvio de Figueire-do, DJU 04.11.1991). Conquanto exista dissenso a respeito do sentido e alcance desse postulado, mormente no que se refere à possibilidade de o credor abrir mão não apenas das medidas executivas (v.g., arresto,

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penhora,etc.),mastambémdepartedacondenaçãopetrificadanotítulo,tenho que essa conclusão também deve ser prestigiada, à luz do citado princípio do interesse do credor e da natureza patrimonial dos direitos previdenciários.

Ademais, caso vigorasse o entendimento de que a disponibilidade da execução repousa tão somente no que tange aos meios executórios, em se tratando de execução em face da Fazenda Pública, cujo procedimento depara-secomaindisponibilidadedosbenspúblicos,estar-se-iainfir-mandoafinalidadedoprocessoexecutórionotocanteàsatisfaçãoplenado interesse do credor, conferindo ao executado prerrogativa superior àquelas que já lhe são outorgadas.

Mutatis mutandis, a tese da viabilidade de execução parcial do título encontra eco nos seguintes arestos:

“Liquidação de sentença. Não viola o disposto no art. 610 do C. Pr. Civil decisão que,naliquidaçãodasentençaexequenda,seadstringe,aofixarovalordasperdasedanos, ao pedido do exequente no tocante ao limite temporal da atualização do quantum debeatur.” (STF, RE 83.949, 2ª Turma, rel. Ministro Moreira Alves, RTJ 79/987)

“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. EXE-CUÇÃO PARCIAL DE TÍTULO JUDICIAL. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. ART. 468 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. COMPENSAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS À EXECUÇÃO. NÃO OFERECIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO.

1.Seomagistradoverificaquepartedoconteúdodasentençatransitadaemjulgadofoi satisfeita administrativamente, inclusive com valores superiores, pode facultar ao exequente a apresentação de novos cálculos, albergando tão somente os valores rema-nescentes, devidos em decorrência da sentença transitada em julgado. Inexistência de contrariedade ao art. 468 do CPC.

2.Seoexecutadoentendehaverumacausasupervenienteimpeditiva,modificativaou extintiva da obrigação, como a compensação, deve oferecer embargos à execução, com base no art. 741, VI, do CPC, o que, todavia, não ocorreu na presente hipótese.

3. Recurso especial conhecido e improvido.” (STJ, REsp 163733, 5ª Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 09.10.2006)

Ressalte-se que não há de se confundir execução parcial do título, porquanto dirigida a pretensão executória tão somente em relação a parte de uma das condenações nele consubstanciadas (in casu, a de pa-gamento de parte ou da totalidade das parcelas relativas ao amparo desde o requerimento administrativo), com fracionamento ou quebra do valor

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exequendoparafinsdenãosujeiçãodoquantum debeatur à sistemática de pagamentos por meio de precatório, prática que vem sendo amiúde repelida por esta Corte, por representar afronta à Constituição Federal (artigo 100, § 4º).

Admitida a viabilidade de execução parcial do julgado, o cumprimento dos requisitos pertinentes aos dois benefícios, em momentos distintos, ensejaria a opção do segurado por aquele que melhor lhe aproveite, até mesmo porque vedada a cumulação de benefícios, nos termos do artigo 124, II, da Lei 8.213/91.

Outro questionamento que exsurge e que deve ser enfrentado diz res-peito à equivalência da situação posta nos autos à desaposentação, bem assim no que tange às consequências que advêm dessa equiparação, em vista do artigo 18, § 2º, da Lei 8.213/91, cuja redação ora transcrevo:

“§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-famíliaeàreabilitaçãoprofissional,quandoempregado.”

ÉpacíficooentendimentodestaTurmaqueadesaposentaçãoimplicarenúncia da situação de jubilado com efeitos ex tunc, com a devolução dos valores recebidos, caso o aposentado que retorne à atividade labo-rativa pretenda sejam considerados o tempo de serviço, bem assim as contribuições vertidas após a renúncia à primeiraaposentação,parafinsdecômputodarendamensalinicialdonovoamparo,nissonãoseverifi-cando eventual ofensa ao ato jurídico perfeito (vide, a esse respeito, voto de minha relatoria na AC 2007.72.05.003542-4/SC, D.E. 15.09.2008).

Todavia, tenho que a hipótese discutida nos autos, ainda que à primeira vista possa guardar certa semelhança com esse instituto, do que resultaria, em tese, situação anti-isonômica frente àqueles que, uma vez aposenta-dos, retornaram à atividade laborativa e requereram a desaposentação com o intuito de obter benefício com renda mensal mais favorável, não está com esse conectada a ponto de restar inviabilizada a execução das prestações que medeiam as duas DERs.

Seécertoqueadesaposentaçãosignifica“arevogaçãodamanifes-taçãodavontadeantesemitidapelosegurado,afimdesedesconstituiro ato administrativo” (DUARTE, Marina Vasques. Desaposentação e

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revisão do benefício no RGPS. In: ROCHA, Daniel Machado da (org). Temas Atuais de Direito Previdenciário e Assistência Social. Porto Ale-gre: Livraria do Advogado, 2003. p. 90), certo também é que depende de ulterior manifestação, porque, ou se estaria diante de anulação do ato administrativo de concessão, que dependeria da ocorrência de vício de ilegalidade, ou seria o caso de revogação ex officio pela Administração Pública, inviável em se tratando de ato administrativo vinculado (à exce-ção daqueles benefícios tidos por precários, cuja manutenção depende da subsistência do suporte fático que lhes deram origem, v.g., auxílio-doença e aposentadoria por invalidez), não se cogitando, portanto, de renúncia tácita ao amparo concedido administrativamente em face da pretensão em executar, em parte (porque limitada à segunda DER), o título judicial que conferiu a jubilação.

Analisando a questão por ângulo diverso, a provocação posterior da Autarquia pelo segurado, com a concessão de jubilação que lhe é mais benéfica,tampoucoensejariarenúncia(tácitaouexpressa)aoamparoinicialmente postulado e que, a essa altura, se encontrava pendente de provimento jurisdicional. Isso porque o acolhimento em juízo do pleito de aposentação encontrava-se, sob a ótica do segurado, tão somente no plano das probabilidades, não lhe sendo então exigível outra conduta que não a de retornar ou permanecer laborando, quando já teria completado – tão somente nesse momento, segundo a ótica do INSS – os requisitos para a almejada aposentadoria, visto que retirada da sua esfera de expec-tativas legítimas a concessão da verba alimentar, cujo último propósito é a substituição dos rendimentos oriundos do trabalho.

Diversa, no entanto, é a situação daquele em gozo de benefício previ-denciárioquepretendeadesaposentaçãoparafinsdeobtençãodenovaaposentadoria, seja no RGPS (com o aproveitamento do tempo de serviço já computado para o amparo que se visa renunciar, bem assim dos salários de contribuição diversos daqueles originariamente considerados), seja nos regimes próprios de previdência. Nessas situações, a desaposentação resulta da expressão da vontade em desconstituir o ato de concessão do benefício anterior, postulando outro que entende ser-lhe mais vantajoso em face do seu retorno/manutenção nas lides laborais, o que fez não porque não teve escolha, mas tão somente porque assim o desejava.

São situações, portanto, distintas, que ensejam a aplicação de soluções

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diversas,sobpenadeseinfirmaroprincípiodaisonomiaemsuaconcep-ção material, ao se intentar a incidência de solução análoga àquela que vem sendo hodiernamente empregada nas demandas que versam sobre desaposentação, qual seja, devolução das prestações recebidas, o que, in casu, representaria o esvaziamento da pretensão em executar o título judicial. Também por isso não se cogita da aplicação do artigo 18, § 2º, da Lei de Benefícios.

Conquanto a devolução de valores, no caso de desaposentação, tenha sido empregada como suporte a afastar a vedação insculpida nesse dispo-sitivo, tenho que sua aplicação ao caso em tela não encontra fundamento hábil a obstar o pleito executório ora sub judice, em face dos argumentos já lançados, revigorados diante da constatação de que a “permanência do aposentado na atividade”, conforme se extrai do artigo 18, § 2º, da LB, seria frutodemeraficção jurídicaque alcança efeitosex tunc à sentença concessiva da aposentadoria, uma vez transitada em julgado. Essa retroação não retira a circunstância de que, no plano fático, quando deu-se a “permanência” ou o “retorno”, não estava o segurado gozando de aposentadoria de qualquer espécie, bem assim que, quando do segundo requerimento administrativo, a jubilação pela via jurisdicional era mera probabilidade.

Portanto, o recebimento das parcelas entre as duas DERs não represen-taformade“financiamento”dascontribuiçõesvertidasposteriormenteàprimeira provocação administrativa – situação que poderia ser antevista, em tese, no retorno do aposentado à atividade com posterior desaposen-tação sem a devolução das prestações –, porquanto as exações foram vertidas por quem não estava jubilado; logo, não lograria enriquecer-se às custas da autarquia mediante o reembolso/ressarcimento alcançado mercê do cômputo, concomitante, do período básico de cálculo confor-mador do amparo concedido extrajudicialmente.

Todavia, se a possibilidade de desaposentação não encontraria empeço legal, diferente se me apresenta a hipótese de aposentadoria outorgada judicialmente, em que dos atrasados a tal título sobreviesse sobreposição a outra concedida administrativamente após a lei do fator previdenciário.

Équeemtalsituaçãoassumiriarelevoaomenosoóbiceconfiguradopela falta de fonte de custeio, pois estando o PBC do segundo amparo

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constituído de 80% das contribuições vertidas desde julho/94, em haven-do sobreposição decorrente do marco inicial determinado pela outorga judicial, a parte-autora estaria a extrair um duplo proveito de uma mesma base contributiva, olvidando a referida exigência legal e constitucional em relação a cada um dos benefícios.

Nessa hipótese, uma vez conhecido o fato (a concessão de um segundo amparo com sobreposição de PBC) ainda na fase de conhecimento, ca-beria facultar à parte-autora manifestação quanto à extinção do processo com resolução do mérito ante a renúncia do direito sobre o qual se funda a ação ou, eventualmente, a desistência de recurso porventura interposto, ou, então, a opção por um dos dois amparos, se já na fase executiva, isto é, manter somente o benefício concedido administrativamente se maior a RMI e não prosseguir com a execução, ou cobrar, integralmente, o título judicial, ainda que disso possa advir uma menor renda mensal; porém, com mais parcelas (atrasados) a perceber, cancelando-se, neste caso, a aposentadoria remanescente e compensando-se seus valores quando do pagamento.

Entendimento idêntico é de ser aplicado, outrossim, para a circuns-tância emque se verifica a referida sobreposição, aindaqueparcial-mente, inobstante a segunda jubilação tenha sido deferida na via ancilar anteriormente ao advento da Lei 9.876/99 (em vigor, na parte em que interessa a este julgamento, a partir de 29.11.1999) – do que se extrai o emprego, em ambos os amparos, da sistemática de cálculo do salário de benefício consoante redação original do artigo 29 da Lei 8.213/91 –, porquantoigualmenteinfirmadaacorrelaçãoentreabasecontributivaea percepção dos proventos.

In casu, considerando que a DIB do benefício concedido em juízo restoufixadaem20.10.1997equeaqueleoutorgadonasearaancilarteveinício em 19.11.2002, constata-se a existência da aludida concomitân-cia, não merecendo guarida a pretensão aduzida pela parte-embargada, em face da fundamentação retro, mantendo-se na íntegra a sentença objurgada.

Ante o exposto, na forma da fundamentação, voto no sentido de negar provimento à apelação.

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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2008.71.00.004209-5/RS

Relator: O Exmo. Sr. Juiz Federal Eduardo Tonetto Picarelli

Apelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: Procuradoria Regional do INSS

Apelada: Marisa Silveira UllmannAdvogada: Dra. Maria Luiza Pereira de Almeida

Remetente: Juízo Federal da 2ª VF Previdenciária de Porto Alegre

EMENTA

Previdenciário. Prescrição afastada. Pensão por morte. Relação homoafetiva demonstrada. Prova material farta corroborada por prova testemunhal. Consectários.

1. Em se cuidando de benefício previdenciário, cuja prestação é de trato sucessivo e continuado, a prescrição não atinge o fundo de direito, mas somente os créditos relativos às parcelas vencidas há mais de cinco (5) anos da data do ajuizamento da demanda, consoante iterativa juris-prudência dos Tribunais.

2. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a con-cessão de benefício de pensão por morte, quais sejam, a qualidade de seguradodoinstituidoreadependênciadosbeneficiários,que,sepre-enchidos, ensejam o seu deferimento.

3. Demonstrada a qualidade de segurada da de cujus à data do óbito e a condição de companheira da autora, mediante prova documental e tes-temunhal revelando o relacionamento afetivo entre ambas, por anos, com afinalidadedemútuoauxílio,desenvolvimentoeproteção,concede-lheo benefício de pensão por morte, a contar do requerimento administrativo (Lei nº 8.213/91, art. 74, II – redação dada pela Lei nº 9.528/97).

4.AtualizaçãomonetáriadasparcelasvencidasfixadapeloIGP-DI,e juros de mora estabelecidos em 12% ao ano, desde a citação;

5. Honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor das par-celas em atraso, montante calculado até a data da sentença.

6. Isenção de custas (Lei nº 9.289/97, art. 4º, I).7. Preenchidos os requisitos contidos no art. 273 do CPC, mantém-se

atutelaantecipatóriaconcedidaemdecisãointerlocutóriaeconfirmadapela r. sentença.

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8.Apelaçãoeremessaoficialimprovidas.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Suplementar do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial,nostermosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 15 de julho de 2009.Juiz Federal Eduardo Tonetto Picarelli, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Eduardo Tonetto Picarelli: Marisa Silveira Ullmann ajuizou ação ordinária contra o INSS, objetivando ser habili-tadaaosfinsdorecebimentodepensãopormortedesuacompanheira,Francisca Freitas Moreira, falecida em 22.05.2003.

Aantecipaçãodatutelafoideferida(fls.73-75).Sentenciando(fls.167-172),oMM.Juízomonocráticoafastouapres-

crição quinquenal e julgou procedente o pedido, para condenar o INSS a conceder à autora o benefício postulado, com termo inicial (DIB) em 28.04.2006, data do requerimento administrativo. Determinou o paga-mento desde a DIB até a efetiva implantação, autorizado o desconto das parcelas já adimplidas em virtude do deferimento da tutela antecipada. Correção monetária das parcelas em atraso pelo IGP-DI, mais juros de morade1%aomês,acontardacitação.Honoráriosfixadosem10%sobre o montante condenatório, nele compreendidas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença.

A sentença foi submetida a reexame necessário.Irresignado,apelaoINSS(fls.176-179).Alegaquenãosediscuteo

fatodeacompanheirahomossexualserbeneficiáriadepensãopormorte,sendo que na equação dos autos não restou demonstrada a manutenção, à data do óbito da instituidora do benefício, do relacionamento narrado na inicial.

Comcontrarrazões(fls.180-183),vieramosautosaestaCorte.É o relatório.

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VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Eduardo Tonetto Picarelli: Analisando ques-tão preliminar, observo que, em se tratando de benefício previdenciário de prestação continuada, a prescrição não atinge o fundo de direito, mas somente os créditos relativos às parcelas vencidas há mais de cinco (5) anos da data do ajuizamento da demanda, consoante iterativa jurispru-dência dos Tribunais.

In casu, presente a data do requerimento administrativo e até mesmo do óbito (28.04.2006 e 22.05.2003, respectivamente), não há que se falar em parcelasprescritas,tendoofeitosidoajuizadoemagosto/2007(fl.16).

Prossigo.Controverte-se nos autos acerca do direito da autora à percepção de

pensão por morte de sua companheira, diante do reconhecimento de relação homoafetiva duradoura e existente quando do evento morte.

A pensão independe de carência e rege-se pela legislação vigente quando da sua causa legal. No caso, são aplicáveis as disposições da Lei nº 8.213/91 e alterações posteriores, como segue:

“Art.16.SãobeneficiáriosdoRegimeGeraldePrevidênciaSocial,nacondiçãode dependentes do segurado:

I–ocônjuge,acompanheira,ocompanheiroeofilhonãoemancipado,dequal-quer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; (redação dada pela Lei nº 9.032/1995)

II – os pais; III – o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos

ou inválido; (redação dada pela Lei nº 9.032/1995) IV - (revogada pela Lei nº 9.032/1995) § 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito

às prestações os das classes seguintes. §2ºOenteadoeomenortuteladoequiparam-seafilhomediantedeclaraçãodo

segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento. (redação dada pela Lei nº 9.528/1997)

§ 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal.

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações: I – pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família e auxílio-acidente; (redação

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dada pela Lei nº 9.876/1999) II – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qual-

quernaturezaoucausaededoençaprofissionaloudotrabalho,bemcomonoscasosdeseguradoque,apósfiliar-seaoRegimeGeraldePrevidênciaSocial,foracometidodealgumadasdoençaseafecçõesespecificadasemlistaelaboradapelosMinistériosda Saúde e do Trabalho e da Previdência Social a cada três anos, de acordo com os critériosdeestigma,deformação,mutilação,deficiência,ououtrofatorquelheconfiraespecificidadeegravidadequemereçamtratamentoparticularizado;

III – os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados espe-ciais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei;

IV – serviço social; V–reabilitaçãoprofissional;VI – salário-maternidade para as seguradas empregada, trabalhadora avulsa e em-

pregada doméstica. (incluído pela Lei nº 9.876/1999) Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que

falecer, aposentado ou não, a contar da data: (redação dada pela Lei nº 9.528/1997) I – do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste; (incluído pela Lei nº

9.528/1997) II – do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;

(incluído pela Lei nº 9.528/1997) III – da decisão judicial, no caso de morte presumida. (incluído pela Lei nº

9.528/1997)”

De tais dispositivos, extrai-se que dois são os requisitos para a con-cessão do benefício pleiteado, quais sejam, a qualidade de segurado do instituidordapensãoeadependênciadosbeneficiários.

Restou incontroversa nos autos a condição de segurada da de cujus e, poroutrolado,mostra-sedevidamentecomprovadaàfl.23.

Destarte, centra-se o debate no reconhecimento da “união estável” da autora com a segurada falecida e, frise-se, se demonstrada essa situ-ação, não há se perquirir sobre a dependência econômica, uma vez que presumida.

A união estável, assim definida pela Constituição Federal (art. 226, § 3º) e pelo regramento civil substantivo (CC, art. 1723, caput), reclama o enlace entre homem e mulher. Transcrevo os dispositivos mencionados:

“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.

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§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.”

“Art. 1723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem eamulher,configuradanaconvivênciapública,contínuaeduradouraeestabelecidacom o objetivo de constituição de família.”

Emquepeseadefiniçãodeuniãoestávelparaconfigurarconvivênciamore uxorio, o Direito há de se adequar à realidade e, na lacuna da Lei, buscar interpretação integrativa das normas legais que incidirão sobre os fatos.

In casu, sequer pode-se afirmar a existênciade lacunanaLei, namedida em que a legislação previdenciária estabelece o direito de o companheiro perceber pensão por morte. E, uma vez demonstrada a re-lação de companheirismo oriunda de verdadeiro afeto, capaz de ensejar vida em comum que se mantém com o transcorrer dos anos, nada obsta o deferimento do benefício de pensão por morte, certo ademais que a renda de ambos os envolvidos representa fonte de recursos à formação do patrimônio comum, sendo também essencial ao padrão de vida já estabelecido em virtude do enlace amoroso.

No sentido, reproduzo as razões de decidir adotadas pelo i. Julgador singular, que, inclusive, faz remissão à observação por mim já realizada (fl.168v.):

“(...) A matéria, ensejadora de diversos e profundos debates na jurisprudência e na doutrina pátrias, me parece não mais se mostrar provida de tamanha controvérsia, sobretudosereconhecermosque,aofimeaocabo,anegativadetuteladosdireitosdas pessoas envolvidas em tal situação tem por mote a discriminação em função da opçãosexual.Comefeito,emboraoartigo226,§3º,daConstituiçãoFederalserefiraunicamente à união estável entre homem e mulher, apegar-se a autarquia previdenciária apenas a tal previsão parece, realmente, tentar priorizar a forma, e não o conteúdo da relação. Ora, o estabelecimento da união estável e sua equiparação ao núcleo familiar passam, fundamentalmente, como já referido pelo colega Eduardo Tonetto Picarelli, por uma visão na qual ‘a família é vista não como uma instituição formal, mas como a união de pessoas fundada no afeto e no amor, no companheirismo, união estabelecida com o propósito de assegurar aos seus membros o pleno desenvolvimento pessoal e afetivo’ (processo nº 2006.71.00.021019-0). Não parece razoável – e violaria os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade, do direito à liberdade sexual e à proibição de discriminação pela orientação sexual. (...)”

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Compulsando os autos, vê-se que é farta a prova documental demons-trando o relacionamento afetivo da autora com a ex-segurada, por anos, comafinalidadedemútuoauxílio,desenvolvimentoeproteção.Tantoque está consignado na sentença, contrariando o alegado pelo INSS em sua apelação, que não se pode vislumbrar na análise documental feita pela autarquiaàfl.133“outrarazãoparadesconsideraçãodosdocumentosofertados que não, ainda que de modo mascarado ou mesmo inconsciente, a inadmissão da relação homoafetiva como ensejadora de vínculo para finsprevidenciários”.

A prova testemunhal produzida nos autos atesta o relacionamento narrado na peça preambular, união que se manteve até o óbito da Sra. Francisca Freitas Moreira, a quem costumavam se referir como “Dona Chiquinha”(fls.164-166).

Com acerto, a DIB corresponde à data de entrada do requerimento administrativo, formulado depois de 30 dias do evento morte (Lei nº 8.213/91, art. 74, II - redação dada pela Lei nº 9.528/97).

A solução que adoto tem amparo em precedentes deste Tribunal. Exemplifico:

“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CASAL HOMOSSEXUAL. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. TUTELA ESPECÍFICA.

1. Na vigência da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão de be-nefício de pensão por morte, quais sejam, a qualidade de segurado do instituidor e a dependênciadosbeneficiários,que,sepreenchidos,ensejamoseudeferimento.

2. Faz jus à percepção de pensão por morte o companheiro homossexual quando demonstrada a existência de união estável com o ex-segurado até a data do óbito.

3. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obriga-çãodeimplementarobenefício,porsetratardedecisãodeeficáciamandamentalquedeverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).” (TRF-4R, APELREEX 2008.71.00.004210-1, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 22.04.2009)

A atualização monetária das parcelas vencidas, nos termos da sentença, deverá ser feita pelo IGP-DI (MP nº 1.415/96 e Lei nº 9.711/98), desde a data dos vencimentos de cada uma, inclusive daquelas anteriores ao ajuizamento da ação, em consonância com os enunciados nos 43 e 148 da Súmula do STJ.

No que tange aos índices de correção monetária das parcelas venci-

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das, cumpre o registro de que o artigo 10 da Lei nº 9.711/98 continua em vigor.

Não se desconhece que, a partir do advento da Lei nº 10.741, de 01.10.2003 (Estatuto do Idoso), questionou-se sobre eventual alteração na sistemática de apuração da atualização monetária, por força do dis-posto no seu artigo 31.

Ocorre que não pode ser desconsiderado o fato de que o artigo 31 da Lei nº 10.741/2003 determinou a utilização do mesmo índice empregado para o reajustamento dos benefícios previdenciários, sendo certo que, até 2007, os reajustes foram estabelecidos de forma aleatória, por atos doPoderExecutivo,emfacedainexistênciadeíndicedefinidoemlei.Ademais, a correção monetária de valores em atraso deve ser apurada mês a mês, e o índice de reajuste anual dos benefícios previdenciários definido administrativamente somente era conhecidonoprópriomêsdo reajuste.

Sabe-se que a Lei nº 11.430, de 26.12.06, introduziu na Lei nº 8.213/91 oartigo41-A,definindooINPCapuradopeloIBGEcomoíndicedereajuste dos benefícios previdenciários. Decorrentemente, a partir da vi-gência dessa lei já havia índice apurado com periodicidade mensal, o que possibilitaria a aplicação do artigo 31 da referida Lei nº 10.741/2003.

Todavia,oartigo31daLeinº10.741/2003,aodefiniroíndicedecorreção monetária para atualização de débitos previdenciários, tratou apenas das pessoas idosas nela contempladas. Aos demais segurados (não idosospeladefiniçãolegal),nãosecogitariadahipótesedeutilizaçãodo INPC como índice de correção monetária a partir da égide da Lei nº 11.430/2006, visto que para eles ainda aplicável a regra geral contida no artigo 10 da Lei nº 9.711/98.

No que se refere aos idosos, apresenta-se situação inusitada, porquanto a atualização monetária pelo IGP-DI atualmente é mais vantajosa do que a utilização do INPC, de modo que, nessa hipótese, a aplicação do artigo 31 da Lei nº 10.741/2003 acarretaria prejuízo aos segurados idosos.

Com certeza, não foi isso que pretendeu o legislador ao editar lei de natureza protetiva, razão pela qual se deve continuar aplicando a regra geral contida no artigo 10 da Lei nº 9.711/98.

Osjurosmoratórios,conformejulgadono1ºGrau,devemserfixadosà taxa de 1% ao mês, a contar da citação, por tratar-se de verba de caráter

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alimentar, na forma dos Enunciados das Súmulas nos 204 do STJ e 03 do TRF da 4ª Região e precedentes do Superior Tribunal de Justiça (EREsp nº 207992/CE, Relator Ministro Jorge Scartezzini, DJU de 04.02.2002, seção I, p. 287).

Quantoaoshonoráriosadvocatícios,foramacertadamentefixadosem10% sobre o valor da condenação, cálculo que compreenderá as parce-las vencidas até a data da prolação da sentença, excluídas as parcelas vincendas, na forma da Súmula 111 do STJ, conforme entendimento pacificadonaSeçãoPrevidenciáriadesteTribunal(EmbargosInfringen-tes em AC nº 2000.70.08.000414-5, Relatora Desembargadora Federal Virgínia Scheibe, DJU de 17.05.2002, p. 478-498) e no Superior Tribunal de Justiça (EREsp nº 202291/SP, 3ª Seção, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 11.09.2000, Seção I, p. 220).

No Foro Federal, é a Autarquia isenta do pagamento de custas proces-suais, a teor do disposto no art. 4º da Lei nº 9.289, de 04.07.96, sequer adiantadas pela parte autora em razão da concessão do benefício da AJG.

Porfim,mantém-seatutelaantecipatóriaconcedidanadecisãodasfls.73-75emantidapela r. sentença, aqual foi examinadamedianteprévio requerimento da autora, restando igualmente preenchidos os de-mais requisitos contidos no art. 273 do CPC (sendo a demanda julgada procedente,restaconfiguradaaverossimilhança da sua alegação; a seu turno, o fundado receio de dano irreparável exsurge do caráter alimentar do benefício).

Diante do exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação e à remessa oficial.

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REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 2008.71.00.010704-1/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal João Batista Pinto Silveira

Parte autora: Waldemar Ernesto ChristmannAdvogado: Dr. Paulo Cesar Azevedo Silva

Parte ré: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: Dr. Milton Drumond Carvalho

Remetente: Juízo Substituto da 2ª VF Previdenciária de Porto Alegre

EMENTA

Previdenciário. Revisão da RMI. IRSM de fevereiro/94 (39,67%). Tutela antecipada.

1. Os salários de contribuição devem ser reajustados, nos termos da nova legislação previdenciária, pelo INPC até dezembro/92, conforme Lei 8.213/91; pelo IRSM até fevereiro/94 (Lei 8.542/92); pela URV de março a junho/94 (Lei 8.880/94); pelo IPCr de julho/94 até junho/95 (Lei 8.880/94); pelo INPC de julho/95 a abril/96 (MP 1.053/95); a partir de maio/96 pelo IGP-DI (Lei 9.711/98).

2. A tutela de evidência é deferida com base não no perigo de pereci-mento do direito, mas na necessidade de se redistribuir os ônus do tempo do processo, nos casos em que o direito do autor se mostra incontroverso ou provável, e o réu, por sua vez, abusa de seu direito de defesa.

3. Caracterizada a tutela de evidência, em face da presença dos requi-sitos previstos no art. 273, II e § 6º, do CPC.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, confirmar a antecipaçãoda tutela deferida e negarprovimento à remessa oficial, nos termosdo relatório, votos e notastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopresentejulgado.

Porto Alegre, 25 de março de 2009.Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal João Batista Pinto Silveira: Cuida-se de

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remessaoficialdesentençaque,ratificandoosefeitosdatutelaantecipadaconcedidanasfls.14-14v,julgouprocedenteopedidoparacondenaroINSS a:

a) revisar o benefício da parte autora mediante aplicação do IRSM de fevereiro/94 (39,67%) na correção monetária dos salários de contribuição componentes do PBC anteriores a março/94;

b) pagar as diferenças decorrentes da revisão do item anterior, corri-gidasmonetariamentepelosíndicesoficiais(IGP-DIacontardemaio/96até janeiro/04 e pelo INPC a partir de fevereiro/04), acrescidas de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação;

c) arcar com honorários advocatícios em 10% sobre o valor da con-denação.

Demanda isenta de custas processuais.Transcorrido o prazo para interposição de recurso voluntário, subiram

os autos a este Tribunal.É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal João Batista Pinto Silveira: Trata-se de ação revisional de proventos (NB 42/041.455.183-4 – DIB 03.06.94).

Controverte-se nos autos acerca do direito da parte autora ao recálculo da renda inicial do benefício originário de auxílio-doença, considerando oIRSMde39,67%emfevereiro/94,comreflexosnaaposentadoriaporinvalidez de que atualmente usufrui.

O tema em debate não merece maiores digressões, porquanto a Lei 8.880/94 assim determina:

“Art. 21 – Nos benefícios concedidos com base na Lei 8.213, de 1991, com data de início a partir de 1º de março de 1994, o salário de benefício será calculado nos termos do art. 29 da referida Lei, tomando-se os salários de contribuição expressos em URV.

§1º–Parafinsdodispostonesteartigo,ossaláriosdecontribuiçãoreferentesàscompetências anteriores a março de 1994 serão corrigidos, monetariamente, até o mês de fevereiro de 1994, pelos índices previstos no art. 31 da Lei 8.213, de 1991, com as alterações da Lei 8.542, de 1992, e convertidos em URV, pelo valor em cruzeiros reais do equivalente em URV no dia 28 de fevereiro de 1994.”

Arespeitodaquestão,confiram-seasseguintesementasdejulgadosdo Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

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“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITO INFRIN-GENTE. POSSIBILIDADE. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. ATUALIZAÇÃO. IRSM. FEVEREIRO/1994. INCLUSÃO. (...)

–AegrégiaTerceiraSeçãoconsolidou,emdefinitivo,oentendimentodeque,naatualizaçãomonetáriadossaláriosdecontribuiçãoparafinsdecálculodarendainicialdos benefícios concedidos a partir de março de 1994, deve ser incluído o percentual de 39,67%, relativo ao IRSM de fevereiro de 1994, antes de sua conversão em URV, nos termos do artigo 21, parágrafo 1º, da Lei 8.880/94 combinado com o artigo 31 da Lei 8.213/91. (...)” (EEREsp 205752/SP, STJ, Sexta Turma, rel. Min. Vicente Leal, DJU 04.06.2001)

“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO. SALÁRIOS DE CONTRIBUIÇÃO. ATUA-LIZAÇÃO. INCIDÊNCIA DO IRSM DE FEVEREIRO DE 1994 (39,67%).

Na atualização dos salários de contribuição informadores dos salários de benefício que servem de base de cálculo de benefícios concedidos a partir de 1º de março de 1994, deve incidir, antes da conversão em URV, o IRSM de fevereiro de 1994 (39,67%), consoante preconizado pelo art. 21, § 1º, da Lei 8880/94. Precedentes do STJ. Recurso não conhecido.” (REsp 278948/SC, STJ, Quinta Turma, rel. Min. Gilson Dipp, DJU 18.06.2001)

No mesmo sentido, a decisão da Terceira Seção desta Corte, como se vê da ementa a seguir transcrita:

“PREVIDENCIÁRIO. CORREÇÃO DOS SALÁRIOS DE CONTRIBUIÇÃO. IRSM DE 39,67% EM FEVEREIRO/94.

Os salários de contribuição devem ser reajustados, nos termos da nova legislação previdenciária, pelo IRSM até fevereiro/94 (Lei 8.542/92); pela URV de março a junho/94 (Lei 8.880/94); pelo IPCr de julho/94 até junho/95 (Lei 8.880/94); e pelo INPC de julho/95 a janeiro/96 (MP 1.053/95).” (Embargos Infringentes na AC nº 1998.04.01.035665-7, TRF-4ª Região, 3ª Seção, rel. Des. Federal Tadaaqui Hirose, DJU de 14.03.2001)

Logo, convertidos os valores em URV somente em 28 de fevereiro de 1994, consoante determinação do indigitado artigo, não poderia o INSS ter deixado de aplicar a variação do IRSM (39,67%).

Assim, não merece reparos a decisão monocrática, isso porque, na hipótese dos autos, segundo a legislação de regência, os trinta e seis sa-lários de contribuição devem ser corrigidos pelo INPC até dezembro/92, conforme Lei 8.213/91; pelo IRSM até fevereiro/94, conforme o previsto no art. 9º, parágrafo 1º, da Lei 8.542/92; pela URV de março a junho/94; a partir de julho/94 até junho/95 pelo IPCr, com base na Lei 8.880/94; pelo INPC de julho/95 até abril /96, consoante a MP 1.053/95; e a partir de maio/96 pelo IGP-DI, com apoio na Lei 9.711/98.

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Ressalto, ainda, que uma vez determinada a aplicação do índice de correção monetária em questão, referente a fevereiro/1994, no cálculo doPBC,poróbvio,suaaplicaçãotemreflexosobreosmesesanterioresàquele mês e considerados na apuração da RMI.

Do pedido de antecipação de tutela

A doutrina moderna, motivada pela velocidade do nosso tempo e do crescimento das necessidades, vem buscando a efetividade do processo por meio da adoção de tutelas jurídicas diferenciadas pelos sistemas de Direito Positivo.

Consoante Nelson Nery Júnior, tutelas jurídicas diferenciadas “podem ser concebidas com a criação de instrumentos mais efetivos à solução da lide ou com mecanismos da agilização da prestação jurisdicional”.

Podemos trazer como exemplo a ação coletiva para a defesa de direitos individuais homogêneos, espécie de class action for damages (art. 81 do CDC, parágrafo único, II, e 91 et. seq.), os juizados especiais cíveis e criminais (Lei 9.099/95) e a tutela antecipatória, instituída pelo Código de Processo Civil, no seu art. 273, recentemente reestruturado pela reforma com a inclusão dos parágrafos 6º – concessão da tutela quando o pedido ou parte dele se mostrar incontroverso – e 7º, cujo objetivo é a inserção da fungibilidade das medidas de urgência no sistema processual.

Assim, atualmente, no direito brasileiro há duas espécies de antecipa-ção de tutela. Uma concedida contra perigo de perecimento do direito, ou, nos termos da lei, de “dano irreparável ou de difícil reparação” ou de “ineficáciadoprovimentofinal”.Aoutra,denominadadetutelaantecipa-da de evidência ou tutela de evidência, cujos requisitos constam do art. 273, II e § 6º, do CPC, é deferida com base não no perigo de perecimento do direito, mas na necessidade de se redistribuir os ônus do tempo do processo, nos casos em que o direito do autor se mostra incontroverso ou provável, e o réu, por sua vez, abusa de seu direito de defesa.

A certeza de que o pleito preenche os requisitos para concessão da tutela de evidência só é possível após a análise acurada do que seja pe-dido incontroverso.

Sobre esse ponto, cito a doutrina do eminente Ministro do Superior Tribunal de Justiça Teori Albino Zavascki, extraída da obra Antecipa-ção de Tutela, 5ª edição revista e atualizada, ano 2007, Editora Saraiva.

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Vejamos:“3 Conceito de pedido incontroversoAquestãocentralparadefiniroalcancedodispositivoéesta:oquesignifica,para

osfinsprevistoso§6ºdoart.273,‘pedidoincontroverso’?Emseussignificadosliteraiscomuns,incontroversoéadjetivoquedesignaoin-

discutível, o incontestável, o indubitável e também o que não é controverso, o que não despertacontrovérsia,oincontrovertido.Nessesentidopoder-se-iaafirmarquepedidoincontroverso seria aquele a cujo respeito não se estabeleceu controvérsia entre as partes.Emoutraspalavras,paraconfigurarincontrovérsia,bastariaqueodemandadonão se opusesse ao pedido do demandante. Pergunta-se, contudo: a mera ausência de oposiçãosignificará,porsisó,queopedidoéincontroversoparaosfinsdo§6º?Ares-posta, certamente, deve ser negativa. Pode ocorrer, por exemplo, que o demandado não conteste determinado pedido, o qual, contudo, na avaliação do juiz, é manifestamente descabido.Emcasotal,considerandoqueasentençafinalserádeimprocedência,élógico concluir que, embora se trate de pedido a cujo respeito não há controvérsia entre as partes, a sua antecipação será inadmissível. Não se pode esquecer, ademais, que a ausência de contestação pode decorrer de colusão, hipótese em que o processo não poderá prosseguir, cumprindo ao juiz extingui-lo imediatamente sem julgar o mérito (CPC, art. 267, IV) e não antecipar a tutela. Nessa mesma linha de raciocínio, pode-se aventar hipótese de demandas sobre direitos indisponíveis: a ausência de controvérsia formal entre as partes sobre eles impõe que o juiz, mesmo para efeito de antecipação, examineadequadamenteahigidezdopedidodoautor.Oquesequerafirmar,comos exemplos, é que a incontrovérsia ensejadora da medida antecipatória somente se configuracomapresençadeumelementoessencial,aausênciadecontrovérsiadeveconsiderar e envolver a posiçãodo juiz, o terceirofigurante da relaçãoprocessualangularizada. Portanto, além da ausência de controvérsia entre as partes, somente po-derá ser tido como incontroverso o pedido que, na convicção do juiz, for verossímil. ‘Incontroverso’, em suma, não é o ‘indiscutido’, mas sim o ‘indiscutível’.

Por outro lado, a controvérsia que impede a antecipação não é apenas a que diz respeito a questões de mérito. Mesmo em face de pedido que, em sim mesmo, é in-controverso e verossímil, a antecipação pressupõe ausência de empecilhos de ordem processual para o seu atendimento. Assim, se for alegada incompetência, ou litispen-dência, ou coisa julgada, ou falta de qualquer pressuposto processual ou condição daação,enfim,seforalegadaqualquerexceçãooudefesaconcernenteàaçãoouaoprocesso(arts.301e304),estaráconfiguradoumpressupostonegativoparaodeferi-mento da medida antecipatória, ainda que a respeito do pedido em si não tenha havido contestação alguma.

Em contrapartida, considerando o manifesto desiderato legislativo – de criar, com a satisfação antecipada, ainda que provisória, dos pedidos incontroversos, uma ação afirmativaemproldaefetividadedoprocesso–,éindispensávelqueseretiredessavontade da lei as consequências lógicas que dela naturalmente decorrem, entre as

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quais a de não admitir a utilização de subterfúgios à concretização dos objetivos pro-gramados. Sob essa premissa, é apropriado concluir, quando se interpreta o § 6º, que a controvérsia apta à antecipação de tutela há de se revestir de um mínimo de seriedade e razoabilidade. Nesse enfoque, pode-se dar ao conceito de pedido incontroverso um sentido ampliado,mais afinado comuma interpretação teleológicadanorma: seráconsiderado incontroverso o pedido, mesmo contestado, quando os fundamentos da contestação sejam evidentemente descabidos ou improcedentes. Em outras palavras: quando não haja contestação séria.

Essa ausência de seriedade ou razoabilidade, todavia, há de ser medida não apenas a partir da convicção pessoal do juiz, mas à luz de critérios objetivos fornecidos pelo pró-prio sistema de processo. Por exemplo: não se poderá ter como controvertido um pedido cuja contestação esteja fundada exclusivamente na negação de um fato notório (CPC, art. 334, IV); também não se pode ter por controvertido um pedido cuja contestação tenha por fundamento exclusivo alegação (a) contrária a decisões de caráter vinculan-te, como são as proferidas no âmbito do controle concentrado de constitucionalidade (Lei n. 9.968, de 10.11.1999, art. 28, parágrafo único), ou (b) contrária a súmula ou jurisprudênciafirmedoSupremoTribunalFederaloudoSuperiorTribunaldeJustiça,hoje tão prestigiadas em nosso sistema (CPC, arts. 475, § 3º, 518, § 1º, e 558).

Emsuma:pode-seafirmarqueaantecipaçãodatuteladequetratao§6ºdoart.273 do Código de Processo Civil tem como pressuposto pedido (ou a parcela dele) (a) não controvertido seriamente pelas partes, (b) verossímil e c) cujo atendimento não está subordinado a qualquer questão prejudicial.”

Acerca da matéria já se manifestou o egrégio Superior Tribunal de Justiça, consoante excerto que ora transcrevo:

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ENSINO. CURSO SUPERIOR REALIZADO NO EXTERIOR. EXIGÊNCIA DE REVALIDAÇÃO DO DIPLOMA POR UNIVERSIDADE PÚBLICA BRASILEIRA. DIREITO ADQUIRIDO. INO-CORRÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. FALTA DE COTEJO ANALÍTICO. SIMPLES TRANSCRIÇÃO DE EMENTAS. ARTIGO 273 DO CPC. VEDAÇÃO DE ANÁLISE DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7 DO STJ.

1. A tutela antecipada reclama prova inequívoca da verossimilhança da alegação e ‘periclitação do direito’ ou ‘direito evidente’, caracterizado pelo ‘abuso do direito de defesa’ ou ‘manifesto propósito protelatório do réu’ (In Luiz Fux, A Reforma do Processo Civil – Comentários e Análise Crítica da Reforma Infraconstitucional do Poder Judi-ciário e da Reforma do CPC, Editora Impetus, p. 71). 2. O direito adquirido conforme cediçoconfigura-senoordenamentojurídicopátrioquandoincorporadodefinitivamenteao patrimônio do seu titular. 3. Sobrevindo novel legislação, o direito adquirido restará caracterizadoacasoasituaçãojurídicajáestejadefinitivamenteconstituídanavigênciada norma anterior, não podendo ser obstado o exercício do direito pelo seu titular, que poderá, inclusive, recorrer à via judicial. 4. In casu,inocorreuaconstituiçãodefinitiva

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da situação jurídica ensejadora do pretenso direito adquirido do recorrido pelo fato de ter iniciado o curso de medicina no Equador quando a lei brasileira não exigia a revalidação do diploma obtido no exterior, sendo certo que a alteração da legislação ocorreu antes da conclusão, momento em que lhe seria permitido o exercício do direito à automática revalidação. Precedentes: REsp 849437/RO, DJ 23.10.2006; RMS nº 16.268/GO, DJ de 19.06.2006; e RMS nº 13.412/PR, DJ de 12.06.2006. 5. Os direitos nascem instan-taneamente, ou não. No primeiro caso, todo o fato, ou todos os fatos, de que depende a aquisição dos direitos se produz de uma só vez, como em jato, que toma o seu lugar no mundo dos direitos; quer dizer: no sistema jurídico ou ordem jurídica, de que se trata. No segundo caso, há fatos diferentes, ou reiterados, que vêm uns após outros, ou um após outro; de modo que cada um deles, acontecendo, é passo para a aquisição do direito, porém não ainda a aquisição. Há momentos em que muito falta; e momento em que quase nada falta. Estão os futuros titulares em expectativa. Mas erraríamos se tratássemos como sendo no mesmo plano todas as expectativas. Há direitos in fieri a que apenas falta a quem o vai adquirir o exercício de algum direito, ou pretensão; e direitos in fieri, que somente surgirão se algo acontecer, ou outrem praticar algum ato. Naturalmente, todos os direitos ainda não adquiridos, ainda não formados, não existem. Porém há diferença de probabilidade de virem a existir e, a juízo do titular futuro, são bem próximos de existência, de surgimento, aqueles cuja formação só depende de ato seu. Algumas vezes, esse critério, subjetivo, não corresponde aos fatos. Os direitos em formação, portanto as expectativas (os ainda não direitos), podem ser reais ou pessoais, o que permite falar-se de expectativas reais e de expectativas pessoais. Não só. Algumas expectativas são de aquisição originária; outras, de aquisição derivada (Pontes de Mi-randa, in Tratado de Direito Privado, Editora BookSeller, Tomo 5, páginas 326-328). 6. Consectariamente, o requisito da prova inequívoca conducente à verossimilhança do direito evidente não se consumou, retirando a juridicidade da antecipação de tutela. 7. A simples transcrição de ementas, sem o devido confronto analítico nos moldes exigidos pelo art. 255 do RISTJ, impossibilita o conhecimento do Recurso Especial. 8. Recurso Especial provido.” (STJ – REsp 762707, 200501068483/RS, PRIMEIRA TURMA, DJ: 20.09.2007, p. 00225, Relator(a) LUIZ FUX, decisão unânime)

Tenho que a hipótese que ora aprecio é de tutela de evidência, por-quanto estamos diante de direito incontroverso, consoante os argumentos a seguir delineados.

Em primeiro lugar, porque a reivindicação já foi reconhecida em âmbito administrativo, após a publicação da MP nº 201, de 13.07.2004, convertidanaLei10.999-2004eratificadanaINnº120/05INSS/DC(art. 5º).

De outra parte, o pleito de incidência do IRSM de fevereiro/94 na correção dos salários de contribuição integrantes do PBC é matéria que

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já se encontra sumulada por esta Corte (Súmula 77).Por isso, não merece guarida a tese da genérica contestação no sentido

de que a renda mensal inicial foi calculada dentro dos parâmetros legais, já que vai de encontro com o próprio entendimento expressamente mani-festado pelo INSS por meio dos atos administrativos antes mencionados, ainda que, frise-se, lá esteja prevista a exclusão desse direito de revisão àqueles segurados que buscam o recálculo do benefício judicialmente.

Dessarte, como bem apontado na sentença, a situação em tela enqua-dra-senoincisoIIeno§6ºdoart.273doCPC,razãoporquejustificadaestá a concessão da tutela antecipada.

Em face do exposto, voto por confirmar a antecipação da tutela de-ferida e negar provimento à remessa oficial.

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DIREITO PROCESSUAL CIVIL

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EMBARGOS INFRINGENTES EM AC Nº 1998.04.01.083792-1/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Rômulo Pizzolatti

Embargante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogada: Dra. Mariangela Dias BandeiraEmbargada: Margarida Guimarães MoreiraAdvogada: Dra. Jandira Bernardes de Ávila

EMENTA

Benefício previdenciário. Requisitos. Remessa oficial. Efeito trans-lativo.

Aremessaoficialtransfereaotribunaloconhecimentodosrequisitostodos do benefício previdenciário, ainda que a contestação tenha silen-ciado sobre algum deles.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, com voto de desempate do Desembargador Federal João Surreaux Chagas (Presidente), vencidos os Desembargadores Federais João Batista Pinto Silveira e Victor Luiz dos Santos Laus e o Juiz Federal Loraci Flores de Lima, dar provimento aos embargos infringentes, nos termosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrante do presente julgado.

Porto Alegre, 02 de abril de 2009.Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti, Relator.

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RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Rômulo Pizzolatti: Trata-se de embargos infringentes pelos quais busca o embargante INSS prevaleça voto vencido queentendeusercabível,porforçaderemessaoficial,oreexamepelotribunal do requisito da qualidade de segurado para efeito de concessão de aposentadoria por invalidez, embora não alegada a sua falta pela au-tarquianacontestação,edeuprovimentoàremessaoficialparajulgarimprocedente a demanda.

Intimada,aparteembargadanãorespondeu(fls.157).É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Rômulo Pizzolatti: Ao contrário do que entendeuoacórdãoembargado,aremessaoficialtemocondãodele-var ao conhecimento do tribunal todos os pontos e aspectos da causa, inclusive as alegações do segurado que, por falta de impugnação do INSS em contestação, restaram incontroversas (CPC, art. 334, III) e já não poderiam ser apresentadas posteriormente, por força de preclusão (CPC, arts. 300 e 303).

Seassimnãofosse,ficariaesvaziadoomecanismoprotetivodare-messaoficialnoscasosemqueaFazendaPúblicaincorreemrevelia,quando é certo que justamente aí, e em casos semelhantes, a proteção da Fazenda Pública é mais necessária.

Pois bem. O voto vencido reexaminou o ponto atinente à qualidade de segurado da autora e, a meu ver acertadamente, entendeu que não ficoucomprovadaessaqualidade.Confira-se:

“Oportuno registrar que o documento consubstanciado na declaração unilateral, jungidaàfl.76,noticiandoqueaautoralaboroucomodomésticanoperíodode1960a1965,bemcomoasdeclaraçõesdaautoraaoperitooficial,quehátrêsanoscuidadecrianças sem carteira de trabalho assinada, isoladamente são imprestáveis a comprovar aqualidadedesegurada.(fls.139).”

Isso posto, voto por dar provimento aos embargos infringentes.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal João Surreaux Chagas (Presidente

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da 3ª Seção): Cuida-se de ação ordinária de concessão de benefício previdenciário.

Julgada procedente a ação pelo Juízo de 1º grau, determinando o pagamento do benefício de auxílio-doença à autora desde a constatação médica da doença incapacitante e posterior conversão deste benefício em aposentadoria por invalidez a partir do primeiro laudo pericial que concluiupelaincapacidadelaboral(fls.100-102),recorreuoINSS(fls.103-105). A 5ª Turma, por maioria, negou provimento à apelação e à remessaoficial,nostermosdaementa(fl.148),verbis:

“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO. AUXÍLIO-DOENÇA. CONCESSÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.

1. O reexame necessário da sentença não devolve ao Tribunal o conhecimento de matéria não suscitada, discutida e, em decorrência, não julgada em primeiro grau, sob pena de violar o princípio do duplo grau de jurisdição, bem como ocorrida a preclusão temporal.2.Demonstradopelaperíciaoficialemcotejocomorestanteconjuntopro-batório que a autora continua padecendo de moléstia que, atualmente, a incapacita total edefinitivamenteparaoexercíciodequalqueratividadelaborativa,édesermantidasentença que determinou a outorga de auxílio-doença e a conversão em aposentadoria por invalidez.”

Ovotovencido(fls.139-140)deuprovimentoàremessaoficialaofundamento de que, embora não tenha sido suscitado pelo INSS em contestação ou em apelação, a autora não comprovou ser segurada da previdênciaoficial,nãotendo,assim,direitoaobenefício.

O INSS opõe embargos infringentes, pretendendo a prevalência do votovencido(fls.116-120)quedeuprovimentoàremessaoficialparajulgar improcedente a ação.

Cinge-se a controvérsia ao alcance da remessa oficial quandodojulgamento de ações em que se objetiva a concessão de benefício pre-videnciário.

A questão foi intensamente debatida.Os Desembargadores Federais Rômulo Pizzolatti (Relator), Celso

Kipper e Luis Alberto d’Azevedo Aurvalle votam no sentido de dar provimento aos embargos infringentes.

Os Desembargadores Federais João Batista Pinto da Silveira, Victor Luis dos Santos Laus e o Juiz Federal Loraci Flores de Lima, por sua

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vez, votam no sentido de negar provimento aos embargos infringentes.Diante do empate, o julgamento foi suspenso e vieram os autos a mim

conclusos para voto de desempate, na forma do artigo 141, parágrafo único, do Regimento Interno.

Na petição inicial, datada de 08 de janeiro de 1991, a autora assim narra os fatos em que se funda a ação:

“A requerente foi segurada da Previdência Social, tendo trabalhado por quatro anos em um hotel na cidade de Caçapava do Sul, onde contribuiu para o IAPAS.

ARequerentepossuiCarteiraProfissionalassinadanoperíododefinido,Carteiraestadenº62.464,Série582,comaqualseidentificasocialmenteeprofissionalmente,documento anexo.

Após alguns anos de trabalho e mesmo sem carência, conforme lhe permitiu a Lei nº 6179/74, a Requerente postulou, junto à agência de nº 819-300-53, o benefício de Renda Mensal Vitalícia, que levou o nº 30/79702584/7, na data de 21.06.85.

A Requerente, na época, foi atacada por diversos males que a impossibilitaram de trabalhar, males esses que continuam até a data atual castigando a requerente e lhe tirando a possibilidade de trabalhar, pois sofre dos pulmões, coração, sofre falta de ar, dores contínuas na cabeça e pressão alta.

O INSS não concedeu à requerente o benefício que tinha direito a receber, não lhe retribuindo, conforme era de sua obrigação e conforme determina a lei previdenciária.”

Considerando apenas os termos da narrativa apresentada pela autora na inicial, duas conclusões podem ser extraídas relativamente à questão de sua condição de segurada ou não da Previdência. Primeira, que a autoranãoafirmouserseguradadaPrevidênciaSocialquandodoajui-zamento da ação, mas sim ter sido segurada no passado. Segunda, que os fatos narrados – ser a autora portadora de problemas de saúde que a impediram de trabalhar desde 1985 – indicam que a autora efetivamen-te não detinha mais a condição de segurada da Previdência quando do ajuizamento da demanda, em 1991, pois estava aproximadamente há seis anos sem exercer atividade abrangida pela Previdência, não estando em gozo de benefício.

Outrossim, a documentação juntada no curso do processo não aponta em direção diversa, apenas demonstrando que a autora postulou admi-nistrativamente por diversas vezes o benefício de renda mensal vitalícia, justamente porque esse benefício dispensava a condição de segurado contemporaneamenteaopedido.OINSS,porsuavez,nãoafirmano

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curso do processo a condição da autora de segurada da Previdência, emboratambémnãoainfirme.

Assim enfocada a questão, observo que, mesmo que fosse decretada a revelia do INSS e lhe impostos os respectivos efeitos processuais, presumindo-seosfatosafirmadosnainicialcomoverdadeiros,oaten-dimento a um dos requisitos legais indispensáveis para a concessão do benefício – a condição de segurado – não estaria demonstrado.

Ora, o atendimento desse requisito dependeria da comprovação de “fato constitutivo do direito”, hábil a conferir à autora a mencionada con-dição de segurada, podendo consistir na prova do exercício de atividade laboral abrangida pela Previdência Social, ou de estar ela em gozo de benefício, ou de estar no período de graça, ou de recolher contribuições como segurado facultativo, e assim por diante.

O ônus de tal prova incumbia à autora, conforme o art. 333, I, do CPC.

Se a condição de segurada da autora fosse fato incontroverso no processo,ou seja, seafirmadoporela,mesmoquenãocomprovado,mas não contraditado pela autarquia, a solução processual seria mais complexa. Contudo, no caso, não se pode falar em fato incontroverso. NemaautoranemoINSSafirmamqueelasejaseguradadaprevidência.Aliás, como já dito, a exposição dos fatos pela autora demonstra que ela efetivamente não detinha a condição de segurada quando do ajuizamento da demanda.

No caso, a sentença de primeiro grau defere à autora o benefício de auxílio-doença a contar de 04 de outubro de 1989, data em que foi examinada por médico da rede pública de saúde e teve diagnosticados problemascardíacos.Nestemomento,conformesuasprópriasafirma-ções contidas na inicial, a autora não ostentava a condição de segurada da Previdência.

Concluindo, impunha-se a reforma da sentença em sede de reexame necessário, pois o provimento jurisdicional reexaminado defere o bene-fício previdenciário à autora sem que esta tenha implementado um dos requisitos legais indispensáveis para tanto, requisito este que se subsume à ideia de “fato constitutivo do direito”, cujo ônus probatório é do autor, equenãoseconfigura,nocasodosautos,comofatoincontroverso.

Assim, com a devida vênia dos que entendem o contrário, acompanho

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o voto dos Desembargadores Rômulo Pizzolatti (Relator), Celso Kipper e Luis Alberto d’Azevedo Aurvalle.

Ante o exposto, em voto de desempate, dou provimento aos embar-gos infringentes. Lavrará o acórdão o Relator, Desembargador Rômulo Pizzolatti.

VOTO COMPLEMENTAR

O Exmo. Sr. Des. Federal Rômulo Pizzolatti: No caso sub examine, o INSS não questionou, na contestação, a alegada qualidade de segurado da parte autora, limitando-se a impugnar a incapacidade para o trabalho. O juiz, na sentença, tomou implicitamente como existente a qualidade de segurado, sem exigir prova dessa alegação pela parte autora, e, presentes os demais requisitos do benefício, concedeu a aposentadoria. Vindo os autosaoTribunal,porforçadaremessaoficial,bemcomodeapelaçãodo INSS limitada à questão da incapacidade, o entendimento majoritário foi no sentido de que a qualidade de segurado não podia ser agora exa-minada, pois não questionada pelo INSS, nem na contestação nem na apelação, enquanto o voto vencido, examinando esse ponto, entendeu-o não provado e julgou improcedente a demanda.

As questões que se impõe resolver aqui são: (a) se, embora não impugnado o fato da qualidade de segurado pelo INSS, tinha o juiz de tomar esse fato como existente, mesmo sem prova; e (b) se o Tribunal, embora investido na competência de rejulgar a causa em todos os seus aspectos,porforçadaremessaoficialplena,dadoqueobenefíciofoiconcedido, estava, por alguma razão, impedido de reexaminar o ponto da qualidade de segurado.

Pois bem. A ação de concessão de aposentadoria previdenciária por invalidez possui um único fundamento jurídico ou causa de pedir, que é a satisfação dos requisitos legais do benefício (qualidade de segurado, carência e incapacidadedefinitivapara o trabalho).Apetição inicialfundamenta o pedido na alegação de existência desses requisitos. Como o réu aqui é a Fazenda Pública (INSS), os pontos, correspondentes aos requisitos do benefício, não são tidos como incontroversos no processo, ainda que não impugnados na contestação, conforme assentado pela jurisprudênciadominante.Confira-se:

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“Ação contra o Estado de São Paulo. Não importa que a contestação não tenha impugnadoespecificamenteosserviçosdeguerranarradosnapetiçãoinicial,poisapresunção, resultante dessa falta, não se aplica à Fazenda Pública, máxime quando a prova, produzida pelo autor, demonstra a inveracidade dos fatos por ele alegados.” (STF, RE nº 85.635-SP, RTJ 84/613)

“Tributário. Restituição do indébito. Indispensabilidade da prova do pagamento indevido.

I - Constitui ônus do autor da ação de repetição do indébito comprovar a efetivação do pagamento indevido (CPC, art. 333, I). No caso, tal prova não foi feita.

II-OônusdaimpugnaçãoespecificadadosfatosnãoseaplicaàFazendaPública(CPC, art. 302, I).

III - Sentença reformada.” (TFR, AC nº 80.669-RS, RTFR 121/137)“InstitutoNacionaldoSeguroSocial.Contestação.Ônusdeimpugnaçãoespecifi-

cada das alegações do autor. Inaplicabilidade.Ainda que o Instituto Nacional do Seguro Social não tenha impugnado, na contes-

tação, a qualidade de segurada da postulante a benefício previdenciário, cabe ao juiz examinar o ponto, visto que não se aplica à Fazenda Pública o ônus da impugnação es-pecificadadasalegaçõesdapetiçãoinicial.”(TRFda4ªRegião,EIACnº97.04.47036-3/SC, Revista do TRF da 4ª Região 64/227)

Aliás, já Moacyr Amaral Santos lembrava que em algumas situações os fatos não impugnados ou mesmo confessados devem ser provados pela parte a quem favorecem:

“Sempre que os litigantes convêm na verdade de um fato, não é necessário prová-lo, dizia RIBAS. Nada obsta, porém, a que, embora não controvertidos, às vezes deva ser feitaaprovadosfatos.Issoseverificaquandoojuizareclama,paraoefeitodeformarcom mais segurança o seu convencimento, ou quando a lei exige que a prova do ato jurídico se revista de forma especial.” (SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. 5. ed. Atualizada. São Paulo: Saraiva, 1983. v. 1, p. 242-243)

Assim, ainda que não controvertida a qualidade de segurado, deveria ela, como requisito da aposentadoria por invalidez, ser comprovada em juízo, nada importando o fato de que o INSS tenha deixado de contestá-la.

Poroutrolado,concedidoobenefício,aremessaoficialinvestiuoTribunal na cognição de todos os pontos da causa desfavoráveis à Fa-zendaPública,ficandoexcetuados,emtese,somenteaquelesque,sendoobjeto de agravo, tenham sido decididos pelo colegiado, caso em que se operou a chamada preclusão pro judicato (cf. TOSTA, Jorge. Do reexame necessário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 178-179). Nessa linha, assim se pronuncia um estudioso do tema:

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“...o efeito translativo do reexame necessário é informado pelo princípio inquisitório, o que permite ao Tribunal conhecer de todas as matérias que possam representar situa-ção mais favorável à Fazenda Pública, ainda que a sentença não as tenha apreciado”. (TOSTA, Jorge, op. cit., p. 176; destaquei)

Defato,estariafrustradaafinalidadedeproteçãodointeressepúblicopelaremessaoficialsenãohouvesseoreexameintegraldacausa,noslimites da sucumbência da Fazenda Pública. Reduzida que fosse a re-messaoficialaospontosefetivamenteimpugnados,oTribunalacabariaconcedendo, entre outros exemplos teratológicos, aposentadoria por idade a trabalhador urbano homem com 61 anos de idade, a pretexto de que o INSS foi revel ou, tendo contestado, não impugnou o requisito etário do benefício; e também acabaria por conceder pensão “por morte” de segurado ainda vivo, ao argumento de que só foi discutida na causa a qualidade de dependente.

Nocasoexaminado,orelatororiginário,porforçadaremessaoficial,examinou o ponto da qualidade de segurado e, por não provado, entendeu não satisfeito um dos requisitos do benefício, o que o levou a votar pela negativadapretensãodaautora.Confira-se:

“Embora não tenha sido suscitado pelo INSS em contestação ou em apelação, porforçadaremessaoficialéfundamentalqueseapontequenãofoitrazidonenhumdocumentohábilacomprovarquearecorridasejaseguradadaprevidênciaoficial,demodo a obter o reconhecimento do direito de fruir das prestações previdenciárias.

Oportuno registrar que o documento consubstanciado na declaração unilateral, jungidaàfl.76,noticiandoqueaautoralaboroucomodomésticanoperíodode1960a1965,bemcomoasdeclaraçõesdaautoraaoperitooficial,quehátrêsanoscuidadecrianças sem carteira de trabalho assinada, isoladamente, são imprestáveis a comprovar a qualidade de segurada.

A previdência social é um seguro social compulsório, eminentemente contributivo, e entre nós é efetuada mediante o Regime Geral de Previdência Social e dos regimes próprios de previdência social dos servidores públicos e dos militares (art. 6º do Decreto nº 3.048/99).” [fls. 139]

À luz do que vem de ser exposto, tenho que o voto vencido deu a solução adequada ao caso, razão por que se impõe o acolhimento dos embargos infringentes.

Ante o exposto, voto por dar provimento aos embargos infringentes.

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VOTO-VISTA

O Exmo. Sr. Des. Federal João Batista Pinto Silveira: Pedi vista dos autos para melhor análise da controvérsia.

O eminente relator dos embargos infringentes externou posição pela prevalência do voto vencido, o qual, por seu turno, examinou, em sede de reexame necessário, a questão concernente à qualidade de segurada da autora, entendendo que esta não teria restado comprovada. O fundamento dorelatorparaacompanharovotovencidoédeque“aremessaoficialtem o condão de levar ao conhecimento do tribunal todos os pontos (....) assimnãoofosse,ficariaesvaziadoomecanismoprotetivodaremessaoficialnoscasosemqueaFazendaPúblicaérevel”.

Data venia, no caso, tenho que cumpre digressão acerca de como foram estabelecidos os limites da lide, submetendo à Seção a possibili-dade de encaminhamento diverso daquele adotado pelo eminente Rela-tor, para evitar prejuízo maior ao segurado, que se encontra, de forma consabida, em condição de hipossuficiência em relação àAutarquiaPrevidenciária.

Senão vejamos.Na petição inicial da ação ajuizada em janeiro de 1991, a autora

requereu a concessão de aposentadoria por invalidez. Em contestação, o INSS repeliu o pedido veiculado na inicial, sob o fundamento de que a autora foi considerada apta para o trabalho e que a autarquia havia prestado assistência médica até a recuperação total da sua capacidade laborativa.

Foi realizada perícia, na qual restou constatada a incapacidade para o trabalho. Sobreveio, então, sentença de procedência. Apelou o INSS renovando os mesmos argumentos expendidos em contestação relativos à incapacidade da autora.

Subindo os autos a esta Corte, a Quinta Turma, por maioria, votou pelo desprovimento do recurso, tendo assim se pronunciado o voto vencedor do acórdão ora embargado:

“Cumpre esclarecer que à instância superior é devolvido o conhecimento integral da causa, isto é, a matéria discutida e julgada em primeiro grau, bem como as questões não suscitadas no processo não podem ser objeto de apreciação pelo Tribunal, quer em recurso de apelação ou em reexame necessário, sob pena de violar o princípio do duplo

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grau de jurisdição. Ressalto, para aclarar minha posição, que o Reexame necessário da sentençaéatojudicial,impostoporlei,afimdeoEstadomanifestar,porintermédiodomagistrado, seu inconformismo com a sentença prolatada, não sendo possível, entretan-to, ao Tribunal analisar matéria não suscitada ou debatida nos autos, porquanto ocorrida a preclusão temporal, razão por que, não havendo no juízo a quo alegação no que tange à condição de segurada da autora, passo à análise da incapacidade laborativa.

OportunoressaltarquesomenteapósadiligênciadeterminadapeloRelator,àfl.109,foi informado a este Tribunal de que a autora requereu administrativamente o benefí-cio de Amparo Assistencial em 22.02.94, sendo indeferido por não ter carência, o que necessariamentenãosignificaqueademandantenãopossuaacondiçãodeseguradadaPrevidência Social e, em decorrência, lhe seja concedido auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, até porque são benefícios com períodos de carência distintos.”

O voto vencido deu-se em linha totalmente diversa:“Embora não tenha sido suscitado pelo INSS em contestação ou em apelação, por

forçada remessaoficial, é fundamentalqueseapontequenão foi trazidonenhumdocumentohábilacomprovarquearecorridasejaseguradadaprevidênciaoficial,demodo a obter o reconhecimento do direito de fruir das prestações previdenciárias.

(...)Feitas essas considerações, tenho que merece reforma a sentença, visto que a recorri-

da não faz jus a auxílio-doença, bem como ao benefício de aposentadoria por invalidez, porquanto não logrou comprovar a qualidade de segurada, não se podendo, assim, considerá-la titular do direito subjetivo de gozar das prestações previdenciárias.”

Já manifestei em sessão anterior minha preocupação em fazer transitar matéria não apreciada sob este enfoque na fase de instrução, principal-mente quando sequer foi oportunizado ao autor agregar os documentos que a Turma entendeu necessários ao possível sucesso da demanda, sob este novo fundamento/fato jurídico.

Oque impõe reflexão é a circunstância de o INSS, emmomentoalgum, sequer na apelação, ter contestado a qualidade de segurada da autora.Ademais,ainformaçãoprestadanoofíciodefls.118,s.m.j.,emnada esclarece sobre a condição de segurada da autora. Ao contrário, os dados revelam-se confusos e contraditórios, até porque o argumento para o suposto indeferimento da renda mensal vitalícia sequer se sustenta, uma vez que essa forma de amparo sequer requer carência.

Nesses termos, absolutamente temerária a linha seguida pelo voto ven-cido. Ainda que tenha me pronunciado, em julgamento anterior, sobre a possibilidade da indagação acerca da qualidade de segurado ser invocada

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de ofício, naquela oportunidade, o entendimento se deu no sentido de que retornassem os autos ao 1º grau para a instrução adequada, solução diversa da adotada nestes autos. A prevalecer o entendimento do voto vencido, estar-se-á, a meu ver, decidindo acerca de questão sobre a qual a parte não pode se pronunciar, em evidente cerceamento de defesa e supressão do duplo grau de jurisdição.

Ora, se o Julgador de primeirograuficavinculado ao pedido, o Tri-bunal, em sede de apelação, também não pode decidir fora dos limites emquefoi traçadaalide,deveficaradstritoàsquestõessuscitadase discutidas no primeiro grau de jurisdição. As mesmas restrições se im-põemàremessaoficial,excetoàsquestõesdeclináveisdeofício,doquenão se cuida na espécie.

Cumpre transcrever ementa do REsp 658715/RS, Rel: Min. Francisco Falcão, unânime, DJ de 06.12.2004, em que participou o eminente jurista Min. Teori Albino Zavascki, verbis:

“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇAO FISCAL. ICMS. MULTA. APLICAÇÃO DA LEI MAIS BENÉFICA. INOVAÇÃO EM SEDE DE APELAÇÃO. IMPOSSIBI-LIDADE.

I-Éoautorquefixa,napetiçãoinicial,oslimitesdalide,sendoqueojulgadorficaadstrito ao pedido, juntamente com a causa de pedir, sendo-lhe vedado decidir aquém (citra ou infra petita), fora (extra petita) ou além (ultra petita) do que foi pedido, nos termos do art. 460 do CPC.

II - Se o Julgador de primeirograuficaadstrito ao pedido, também é vedado ao Tri-bunal, em sede de apelação, decidir fora dos limites da lide recursal. Embora a apelação seja o recurso de maior âmbito de devolutividade, há limites do mérito do recurso, que ficaadstritoàsquestõessuscitadase discutidas no primeiro grau de jurisdição.

III a V - omissis.”

Nessa linha de entendimento transcrevo, ainda, decisão da relatoria do eminente Min. Teori Albino Zavascki:

“PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ACÓRDÃO QUE JULGOU A CAUSA COM BASE EM FUNDAMENTO JURÍDICO NÃO INVOCADO NEM OBJETO DE CONTRADITÓRIO. NULIDADE.

1. O juiz, que é livre para aplicar o direito, porque do direito ele é que conhece (e isso está cristalizado em brocardos clássicos: jura novit curia e da mihi factum dabo tibi jus), deve, no entanto, decidir a lide ‘nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige iniciativa das partes’ (art. 128 do CPC-73).

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2. Assim, não pode o juiz decidir a causa com base em fundamento jurídico diverso do invocado e debatido nos autos pelos litigantes. A possibilidade de conhecer de ofício certos fatos, prevista no art. 131 do CPC-73, diz respeito apenas aos chamados ‘fatos simples’,enãoaosfatosjurídicos.Estessãoosquecriam,modificamouextinguemdi-reitos: aqueles são, simplesmente, os que servem para demonstrar a existência dos fatos jurídicos.” (AC 93.04.06094-0/RS, DJ de 08.05.96, Min. Teori Albino Zavascki)

Por pertinente, uma vez que o caso em apreço amolda-se perfeita-mente à hipótese aqui examinada, transcrevo excerto do julgado acima ementado:

“O EX. SR. JUIZ TEORI ALBINO ZAVASCKI (relator):Conforme resultou demonstrado nos autos, o autor requereu benefício de aposen-

tadoria especial por trabalhar como motorista. O pedido foi indeferido administrati-vamenteaofundamentodequenãoficoudemonstradoqueaatividadedesenvolvidafosse daquelas que ensejam a concessão do benefício pretendido. Mais precisamente, o indeferimento administrativo se deu ‘em face do mesmo comprovar somente 11 anos, 04 meses e 24 dias de atividade caracterizada como penosa, insalubre ou perigosa, conformecálculoeconversõesrealizadaspeloórgãoconcessorafls.23doprocessodebenefício’.Éoqueselêdoacórdãodefls.40,da2ªJuntadeRecursosdaPrevidênciaSocial. Propôs o autor, então, demanda judicial, procurando demonstrar que fazia jus aobeneficioefocalizando,demodoespecial,otópicoquedeuensejoaoindeferimentoadministrativo,comosevêdapetiçãoinicial(fls.22-37). Em sua contestação, o réu reiterou os fundamentos do indeferimento: falta de prova do exercício de atividade insalubre,penosaouperigosa(fls.43-44). A prova toda foi, assim, direcionada no sentido de elucidar o ponto controvertido. Julgada procedente a demanda por sentença em que o juízo foi formado igualmente sobre a questão controvertida: a natureza da atividade exercida(fls.67)Recorreu o INSS e insistiu na mesma tecla:obeneficioéindevidoporquenãoficoudemonstradoqueaatividadeexercidapeloautorédasquedãoensejoaaposentadoriaespecial(fls.79-80).Assim se apresentou a controvérsia quando foi julgada no Tribunal. Entretanto, conforme se viu do relatório, a Turma en-tendeu de julgar improcedente a demanda, e o fez ao fundamento de que o recolhimento das contribuições não foi regular: embora trabalhando numa empresa, as contribui-ções eram feitas através de outra. Trata-se, como se percebe, de fundamento de fato jamais questionado, nem administrativamente, nem judicialmente. Por não ser fato controvertido, não integrou o contraditório, sobre ele não houve específica instrução probatória, nem apreciação pela sentença. Ou seja, o acórdão julgou a demanda com base em fato jurídico que – ainda que se admitisse procedente – é estranho à causa. Não se tratou, portanto, de julgamento sob ‘ângulo jurídico’ diverso cuja possibilidade não se discute, deve, contudo, preservar sempre os fatos alegados.O juiz, que é livre para aplicar o direito, porque do direito ele é que conhece (e isso inclusive está crista-lizado em brocardos clássicos: jura novit curia e da mihi factum dabo tibi jus), deve,

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no entanto, decidir a lide ‘nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige iniciativa das partes’. É o que dispõe o art. 128 do CPC. Também não procede o argumento de que o acórdão, no caso,agiusegundoopermitidopeloart.131quefacultaaojuizconhecerdeoficiooschamados ‘fatos simples’. O fundamento de fato adotado pelo acórdão é, todo ele, um fundamento novo, completamente diferente e autônomo em relação ao fato da causa. Isso não é fato simples. É, sim, novo fato jurídico, que, certamente, não pode ser adotado de oficio, como ocorreu. A propósito, leia-se o que escreveu Celso Agrícola Barbi, comentando o art. 131: ‘Sabidamente, os fatos, sob o ponto de vista processual, podem ser jurídicos ou simples. Aqueles são os que criam, modificam, conservam ou extinguem direitos. Os simples são os que não têm essas características, mas servem para demonstrar a existência dos fatos jurídicos. Um exemplo elucidativo, lembra LOPES DA COSTA o caso da pessoa que ateia fogo em seus pastos e provoca, com isto, incêndio no imóvel vizinho. Atear fogo é fato jurídico; mas a passagem daquela pessoa, munida de um facho e de uma lata de gasolina, em direção ao local onde teve início o fogo, tudo isso são fatos simples, que não criam o direito do reclamante, mas servem para provar o fato jurídico, que é o ato de o reclamado atear o incêndio.

Aplicadas essas noções ao art. 131, conclui-se que os fatos ali referidos, de que o juiz pode conhecer, ainda que não alegados pelas partes, são os fatos simples, não os jurídicos.

Se o juiz fosse decidir com base em fatos jurídicos não alegados pelas partes, estaria, na verdade, julgando outra demanda, porque o que caracteriza esta são precisamente os fatos da natureza. Quando o autor pede indenização contra o réu, alegando que este matou um cavalo de propriedade do reclamante, o juiz não pode julgar a obrigação pela qual prometera dar o referido cavalo ao autor, mesmo que isso resulte provado nos autos. (Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, 4. ed., v. I, p.535-6)

A propósito da vedação de inovação tomada como fundamento de decidir,confira-se,ainda,decisãodestaCorte:

“DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO CON-CERNENTE A DIREITOS PATRIMONIAIS. IMPOSSIBILIDADE DE DECLARA-ÇÃO EX OFFICIO. REMESSA OFICIAL. LIMITES. DIREITO ADMINISTRATIVO. BENS PÚBLICOS. DISPONIBILIDADE. PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA. CON-CEITUAÇÃO. DISCRICIONARIEDADE EM ALEGAR PRESCRIÇÃO.

1 a 5. omissis6.Aremessaoficialédeficarrestritaàmatériasuscitadanosautos,limitequese

excepciona apenas à matéria declinável ex officio, extrapolar tais limites implica cer-ceamento de defesa, furtando-se à parte autora oportunidade de contrariar a inovação tomada como fundamento.” (EIAC 1999.04.01.039053-0/SC, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, Dj de 11.07.2001)

Concluindo, por força do efeito translativo, o Tribunal está autorizado

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a apreciar as questões suscitadas e discutidas no processo, mesmo que não tenham sido julgadas por inteiro, ainda, as matérias de ordem públi-ca, bem como os fundamentos do pedido e da defesa não acolhidos pelo Juiz de primeiro grau, mas daí a se admitir julgar sobre o que sequer foi tratado nos autos (fato jurídico novo) é, longe de se fazer justiça, avançar no terreno das nulidades.

Ante o exposto, com a vênia do eminente Relator, voto por negar provimento aos embargos infringentes.

VOTO-VISTA

O Exmo. Sr. Des. Federal Celso Kipper:1 – Primeiramente, é de ser observado que, por ocasião da propositura

dapresenteação,em10.01.1991(fl.03),aautoraseencontravacasada– em segundas núpcias – com Alício Francisco Cardoso, passando, em virtude desse casamento, a adotar o nome de Margarida Becker Cardoso, conforme cópia do Termo de Casamento nº 9818 do Ofício do Registro Civil das Pessoas Naturais - 1ª Zona, da Comarca de Novo Hamburgo, juntadoporcópiaàfl.167.Assim,opresentefeitodeveserreautuado,para que conste corretamente o nome da demandante.

2 – Tendo em vista a indisponibilidade dos interesses públicos em jogo, relativos à Fazenda Pública (RE nº 253.885-0/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, D.J. de 21.06.2002; AC nº 402-1/CE, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, decisão monocrática, D.J. de 24.08.2004), a impossibili-dadedeconfissão,porpartedesta,relativamenteaosfatosdacausa,ea presunção de legitimidade dos atos das autoridades administrativas, entendo que não se aplicam à Fazenda Pública os efeitos materiais da revelia e, ao menos em sua integralidade, o ônus da impugnação es-pecificada,comoquenãosepresumemverdadeirososfatosnarradospelo autor.

Nesse sentido, a doutrina e a jurisprudência predominantes, como se vê a seguir:

“A presunção da verdade não ocorrerá quando o fato impugnado for insuscetível de confissão.Osfatosrelativosadireitoindisponívelnãosãosuscetíveisdeconfissão.(...)Seaconfissãoerainobtenívelpelodepoimentopessoal,osilêncionacontestaçãonãopodevalerconfissãoficta.Pode-se,portanto,afirmarinexistiroônusdaimpugnaçãoquando é parte a Fazenda Pública, (...).” (SANTOS, Cézar. O ônus da Impugnação

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EspecíficadoNovoCPC.Revista Brasileira de Direito Processual, Rio de Janeiro, v. 42, p. 16-17, abr./jun. 1984)

“À evidência, a revelia, sendo ré a Fazenda Pública, não produz seu efeito material, de maneira que não haverá presunção de veracidade quanto aos fatos alegados pelo autor na petição inicial. (...)

Aexemplodequalquerpessoaquefigurecomoréu,aFazendaPúblicasujeita-se tanto ao princípio da concentração como ao princípio da eventualidade, devendo concentrar, em sua contestação, toda a matéria de defesa, sob pena de preclusão, não podendo mais alegar novos argumentos, salvo nas exceções do art. 303 do CPC, que incidem em qualquer caso, independentemente de quem seja o réu.

A peculiaridade da Fazenda Pública como ré está na sua não sujeição ao ônus da impugnaçãoespecificadadosfatos.

Cabe ao réu – na dicção do art. 302 do CPC – manifestar-se precisamente sobre os fatos narrados na petição inicial, presumindo-se verdadeiros os fatos não impugnados. Tal presunção não se opera, se não for admissível, a respeito dos fatos não impugna-dos,aconfissão(CPC,art.302,I).Ora,jáseviuqueoDireitodaFazendaPúblicaé indisponível, não sendo admissível, no tocante aos fatos que lhe dizem respeito, a confissão.(...)

Assim,mesmoquenãoimpugnadoespecificamentedeterminadofato,deveoautorcomprová-lo, pois a ausência de impugnação não fará com que se opere a presunção de veracidade prevista no caput do art. 302 do CPC. Na verdade, sendo ré a Fazenda Pública, incide a exceção contida no inciso I do referido art. 302, não estando sujeita aoônusdaimpugnaçãoespecificadadosfatos.”(CUNHA,LeonardoJoséCarneiroda. A Fazenda Pública em Juízo, 5. ed., revista, ampliada e atualizada, São Paulo: Dialética, 2007, p. 85-90)

“Em razão da natureza pública da relação jurídica litigiosa, prevalece a tese de que a Fazenda Pública não está sujeita ao efeito da revelia nem à sanção estabelecida no art. 302 do Código de Processo Civil.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, Volume III, 2. ed., revista e atualizada, São Paulo: Ma-lheiros, 2002, p. 538)

“Entreasexceçõesàexigênciada impugnaçãoespecíficadosfatosnarradosnapetição inicial, ressaltam-se os casos em que a natureza da relação jurídica de direito material, por envolver direito indisponível, impede a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor (arts. 302, I, e 320, II, do CPC). Se o direito material debatido em juízo for indisponível, não será possível a sua admissão pelo réu, tampouco serão considerados verdadeiros os fatos alegados pelo autor. É o que ocorre, por exemplo, nas demandas que envolvem o estado das pessoas, incapazes e a Fazenda Pública.” (TEIXEIRA, Guilherme Freire de Barros. O Princípio da Eventualidade no Processo Civil. Coordenadores Luiz Guilherme Marinoni e Roberto dos Santos Bedaque, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. Coleção Temas Atuais de Direito Processual Civil, v. 10, p. 233-234)

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“A falta de impugnação dos embargos do devedor não produz, em relação à Fazenda Pública, os efeitos da revelia.” (Súmula 256 do extinto TFR)

“TRIBUTÁRIO E PROCESSO CIVIL. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA. MUNICÍPIO DE LONDRINA. APLICAÇÃO DO ART. 557 DO CPC. POSSIBILI-DADE. RESTITUIÇÃO. PROVA DO FATO CONSTITUTIVO (EFETIVAÇÃO DO PAGAMENTO INDEVIDO). INDISPENSABILIDADE.

1. Omissis; 2. Omissis; 3. Em ação de repetição de indébito tributário – em que os fatos da causa não comportam confissão por parte da Fazenda Pública (CPC, art. 351) nem estão sujeitos aos efeitos da revelia (CPC, art. 320, II) –, o juízo de procedência supõe a comprovação, pelo autor (CPC, art. 333, I), do fato constitutivo do direito, qual seja, o do recolhimento dos valores indevidos a serem restituídos. A sentença de procedência que delega à fase de liquidação a prova desse fato constitutivo é sentença condicional e, portanto, nula, pois fundada num pressuposto de fato cuja existência é incerta. Precedentes de ambas as Turmas da 1ª Seção. 4. Recurso especial parcial-mente provido.” (REsp 927.824/PR, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 24.09.2007)

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 544 DO CPC. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 458 E 535 DO CPC. INOCORRÊNCIA. REVELIA. FAZENDA PÚBLICA. NÃO OPERAM EFEITOS. DANO MATERIAL E MORAL. AFERIÇÃO. REEXAME PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 07/STJ. 1. Omissis; 2. Os efeitos da revelia não se operam contra o ente público (CPC, art. 320, II). 3. Omissis. 4. Omissis.” (Ag. nº 720.672/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 19.04.2006) (Destaquei)

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILI-DADE CIVIL EXTRACONTRATUAL. FAZENDA PÚBLICA. REVELIA. ÔNUS DA IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DOS FATOS. DISSÍDIO PRETORIANO NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. ALEGADA VIOLA-ÇÃO DOS ARTS. 300 E 535, II, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. PRECEDENTES. AGRAVO DESPROVIDO.

1. (...)A Fazenda Pública, caso não apresente contestação ou não ofereça embargos no

procedimento monitório, torna-se revel. Isto não significa, porém, sua submissão aos efeitos da revelia. Na verdade, o efeito material da revelia, consistente na presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor, não se opera contra a Fazenda Pública, na medida da indisponibilidade dos direitos por ela defendidos. (...).” (Decisão monocrática no AI Nº 792.181-MS, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de 18.12.2006)

“PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO A RECURSO PENDENTE DE JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. SÚMULAS N.º 634 E 635 DO STF. FUMUS BONI IURIS NÃO CONFIGURADO. MANDADO DE SEGURANÇA QUE DISCUTE CRÉDITO-PRÊMIO DO IPI. JU-RISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA PELA PRIMEIRA SEÇÃO.1. Omissis; 2. Omissis;

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3. Omissis; Ademais, o fumus boni iuris da cautelar revela-se calcado na premissa da possibilidadedeutilizaçãodoincentivofiscaldenominadodecrédito-prêmiodoIPI,instituído pelo Decreto-Lei nº 491/69, matéria que restou sedimentada pela Primeira Seção, na sessão de julgamento de 09 de novembro de 2005, no sentido de sua ine-xistência:

‘PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INO-CORRÊNCIA. IPI. CRÉDITO-PRÊMIO. DECRETOS-LEIS Nos 491/69, 1.724/79, 1.722/79, 1.658/79 E 1.894/81. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. EXTINÇÃO DO BENEFÍCIO.

1.Omissis; 2.Omissis; 3. Omissis;4. Revelia em primeiro grau da Fazenda pública, a qual, não obstante, não operou

integralmente os seus efeitos, posto indisponíveis os interesses em jogo, na forma do art. 320, II, do CPC que assim dispõe:

‘Art. 320 - A revelia não induz, contudo, o efeito mencionado no artigo antecedente:

II - se o litígio versar sobre direitos indisponíveis;’5. A inatividade processual da Fazenda Pública, muito embora não descomprometa

o juiz da investigação dos fatos e do direito, interditando o julgamento por presunção de veracidade, tal como ocorre, em regra, nas causas que gravitam em torno dos direitos patrimoniais disponíveis, na forma do caput do artigo 319 do CPC, também não alforria a entidade pública contumaz a criar no juízo do apelo questões novas, porquanto a instância recursal é de controle, e não de criação, consoante resta claro da doutrina insuperável de Barbosa Moreira, nos seus memoráveis Comentários aos arts. 515, 516 e 517 do CPC, que versam o efeito devolutivo dos recursos, em extensão e profundidade, expresso na máxima tantum devolutum quantum appellatum.

6 a 34. Omissis. (...)” (MC nº 10818, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 21.11.2005) Destaquei.

“PROCESSUAL CIVIL. CITAÇÃO. COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO. INTIMAÇÃO. REVELIA. PREQUESTIONAMENTO. REEXAME DE PROVAS. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. SÚMULAS 7 E 211/STJ, 282 E 356/STF. 1. Omis-sis. 2. Tratando-se de direitos indisponíveis, a revelia não opera os efeitos quanto à presunção de veracidade dos fatos alegados. 3 (...). 8. Omissis.” (REsp 671755/RS, Rel. Castro Meira, 2ª Turma, D.J. de 20.03.2007, p. 259)

“PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA. CONTESTAÇÃO INTEMPESTIVA. DIREITO INDISPONÍVEL. ART. 320, II, DO CPC. EFEITOS DA REVELIA. INAPLICABILIDADE. 1. Sendo o crédito tributá-rio caracterizado como direito indisponível, sobretudo diante do preceito inscrito no art.97eincisodoCTN,afigura-seinviávelaplicaràFazendaPública,emsededeação declaratória de inexistência de débito, os efeitos da revelia. 2. Recurso especial provido.” (REsp 96.691/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 2ª Turma, D.J. de 13.12.2004, p. 269)

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“AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485 DO CPC. DOCUMENTO NOVO. ENQUA-DRAMENTO. EX-COMBATENTE. ART. 53/ADCT. PENSÃO ESPECIAL. 1. In-tempestiva a contestação, não se aplicam ao Instituto Previdenciário os efeitos do art. 319 do CPC, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do interesse público (art. 320, II, do CPC). 2. Omissis. 3. Omissis.” (AR Nº 2001.04.01.029770-8/RS, TRF/4ª Região, Terceira Seção, minha relatoria, D.J.U. de 24.05.2006)

3 – Mesmo que se aplicassem contra a Fazenda Pública os efeitos materiaisdareveliaeoônusdaimpugnaçãoespecificadaemsuaintegrali-dade, isso não implicaria considerar absoluta a presunção da verdade dos fatos narrados pelo autor (a presunção a que aludem os arts. 302 e 319 do CPC é de natureza relativa). A presunção de veracidade dos fatos, por ser relativa, não subsiste frente a um conjunto probatório incompatível com as alegações do autor, porque aquela não vai ao ponto de sobrepor-se à racionalidade do julgamento. Nas palavras de Cândido Dinamarco, “Como toda presunção relativa, também essa não tem o valor tarifado e invariável pró-prio aos sistemas de prova legal. No sistema da livre apreciação da prova segundo os autos (...), o juiz dar-lhe-á o valor que sua inteligência aconselhar, feito o confronto com o conjunto dos elementos de convicção eventualmente existentes nos autos e levando em conta a racional probabilidade de que os fatos hajam ocorrido como disse o autor. (...) A convicção contrária pode resultar da existência de prova nos autos, desmentindo ou pondo em dúvida as alegações do autor; essa prova pode ter sido produzida até por este mesmo (princípio da aquisição da prova)...” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, v. III, 2. ed., revista e atualizada, São Paulo: Malheiros, 2002. p. 535)

Nesse sentido, os seguintes precedentes (relativos a pessoas jurídicas de direito privado):

“REVELIA. CONSEQUÊNCIAS.- A falta de contestação conduz a que se tenham como verdadeiros os fatos alegados

pelo autor. Não, entretanto, a que necessariamente deva ser julgada procedente a ação. Isso pode não ocorrer, seja em virtude de os fatos não conduzirem às consequências jurídicas pretendidas, seja por evidenciar-se existir algum, não cogitado na inicial, a obstarqueaquelasseverifiquem.”(...)(REspnº14.987/CE,Rel.Min.EduardoRibeiro,Terceira Turma, DJ de 17.02.1992)

“PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. SENTENÇA RESCINDENDA FUN-DADA EM REVELIA DA PARTE. FALSIDADE DOCUMENTAL. CABIMENTO.

- A revelia da parte, por si só, não inviabiliza o ajuizamento da ação rescisória.- A revelia e a consequente presunção de veracidade do art. 319 do CPC não im-

plicam, inexoravelmente, a procedência do pedido.

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- O efeito da revelia não dispensa a presença, nos autos, de elementos suficientes para a persuasão do juiz. A presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor é relativa, e não absoluta, podendo ceder frente às provas existentes nos autos, em consonância com o princípio do livre convencimento do juiz.

- (...)” (REsp Nº 723.083/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ de 27.08.2007)

“PROCESSO CIVIL. CONFISSÃO FICTA. A pena de confissão ficta não pode prevalecer sobre o conjunto idôneo das demais provas. Agravo regimental não provido.” (AGRG no AG 475.600/DF, 3ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 01.02.2006, p. 526)

“RECURSO ESPECIAL. FATOS NARRADOS NA INICIAL. FALTA DE ATA-QUE ESPECÍFICO. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. COLISÃO COM A DEFESA CONSIDERADA EM SEU CONJUNTO.

- A presunção de veracidade dos fatos não especificamente impugnados na contesta-ção cede quando incompatível com as provas geradas pela defesa, consideradas em seu conjunto (Art. 302, III, do CPC).” (REsp 772804/SP, Terceira Turma, Rel. Min. CASTRO FILHO, Rel. p/ acórdão Min. Humberto Gomes De Barros, DJ 02.10.2006, p. 271)

“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. REVE-LIA. ART. 897, CPC. ARTS. 234 E 458, CPC. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. RECURSO DESPROVIDO.

I - Não tendo sido apresentada contestação oportunamente, em princípio presumem-se verdadeiros os fatos narrados na inicial.

II - Em alguns casos, todavia, como naqueles em que ausente alguma das condições da ação ou haja evidente falta de direito, o não oferecimento oportuno da contestação não importa procedência do pedido. É da melhor doutrina que ‘não está no espírito da lei obrigar o juiz a abdicar de sua racionalidade e julgar contra evidência, ainda que esta lhe tenha passado desapercebida’.

III-Nãoseconfiguraoprequestionamentoseasquestõesversadasnosartigossupostamente contrariados não foram abordadas pelo aresto recorrido.” (AgRg no Ag nº 123.413/PR, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, D.J.U de 24.03.1997, p. 9037)

“EMENTA: (1) Processual Civil. Possessória. Liminar concedida. Contestação. Prazo. Par. Único, art. 930, CPC.

(2) Processual Civil. Revelia. Efeitos. Art. 319, CPC.(1) Concedida a liminar de que trata o par. Único do art. 930 do CPC, e tendo o

réu procurador nos autos, o prazo para contestar a ação inicia-se no primeiro dia útil seguinte ao que foi intimado daquela decisão.

(2) A pontificação contida no art. 319 do Código de Processo Civil de que, ‘se o réu não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor’ deve ser recebida com temperamento, por isso mesmo é que ‘a presunção de veracidade dos

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fatos alegados pelo autor em face da revelia do réu é relativa, podendo ceder a outras circunstâncias constantes dos autos, de acordo com o princípio do livre convencimento do Juiz’ (REsp nº 2.846/RS, Rel. Min. Barros Monteiro).

Recurso conhecido e parcialmente provido.” (REsp nº 47.107/MT, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, 4ª Turma, DJ 08.09.1997, p. 42504)

“RESPONSABILIDDE CIVIL. DONO DA COISA. PROPRIETÁRIO DO VEÍ-CULO. PREPONENTE. REVELIA.O proprietário do veículo se exonera da responsabilidade pelo dano se provar que tudo fez para impedir a ocorrência do fato.É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do em-pregado ou preposto (Súmula 341/STF).O efeito da revelia não dispensa a presença, nos autos, de elementos suficientes para o convencimento do juiz.Cassação da sentença e reabertura da instrução.

Recurso conhecido e parcialmente provido.” (REsp Nº 261.310/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, D.J. de 27.11.2000, p. 171)

Ressalte-se, ademais, que o magistrado, em primeira ou segunda instâncias, deve pautar a condução do processo e o julgamento da causa pelo princípio da busca da verdade real, como iterativamente têm deci-dido os Tribunais:

“PROCESSO CIVIL. AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. INICIATIVA PRO-BATÓRIA DO JUIZ. PERÍCIA DETERMINADA DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DEMANDA. PRECEDENTES.

- Os juízos de primeiro e segundo graus de jurisdição, sem violação ao princípio da demanda,podemdeterminarasprovasquelhesaprouverem,afimdefirmarseujuízode livre convicção motivado, diante do que expõe o art. 130 do CPC.

- A iniciativa probatória do magistrado, em busca da verdade real, com realização de provas de ofício, é amplíssima, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça.

- Agravo no recurso especial improvido.” (Ag Rg no REsp 738576/DF, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 12.09.2005, p. 330)

“PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE C/C ALIMENTOS - OBSCURIDADE E CONTRADIÇÃO NO JULGADO RECORRIDO - INEXISTÊNCIA - ACÓRDÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURA-DA - ANULAÇÃO DO PROCESSO PARA A REALIZAÇÃO DO EXAME DE DNA - PROVA NECESSÁRIA AO DESLINDE DA QUAESTIO.

1 - Omissis.

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2 - Tendo o Tribunal a quo anulado o processo e, por conseguinte, cassado a sentença de 1ª instância, para possibilitar a produção de prova necessária à instrução de ação de investigação de paternidade c/c alimentos, qual seja, o exame de DNA, meio de prova legalemoralmentelegítimo,suficienteparasolucionaraquaestio posta a desate, foi observado o disposto nos arts. 130 e 332 do CPC. Naquele julgamento, constou, ainda, a advertência de que a recusa relativa à realização da prova pericial pode ser interpretada contra o interesse do recusante. Incidência da Súmula 301 deste Tribunal. Ademais, estaCortedeUniformizaçãopacificouoentendimentodequenemseriaprecisoanularo processo para a prolatação de outra sentença após nova oportunidade de realização do exame de DNA, porque inexiste óbice à transformação do julgamento em diligên-cia, por se encontrar o feito em 2ª instância, pois os magistrados de 1º e 2º graus de jurisdição possuem as mesmas prerrogativas em busca da supracitada verdade real (cf. REsp nos 241.886/GO, 208.582/PR, 218.302/PR).3 - Omissis.

4 - Recurso não conhecido.” (REsp 730566 /MG, Quarta Turma, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 27.06.2005, p. 413) Grifei.

“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDA-DE. LAUDO DE EXAME DE DNA QUE EXCLUI A PATERNIDADE DO RECOR-RENTE. Exame concluído após a interposição do recurso especial. Resultado que deve ser considerado, a despeito de já encerrada a fase probatória. Busca da verdade real.

I. A jurisprudência desta Corte orientou-se no sentido de que o magistrado deve perseguir, especialmente nas ações que tenham por objeto direito indisponível, como nas ações de estado, o estabelecimento da verdade real.

II. Diante disso, deve ser considerado o laudo de exame de DNA que exclui a paternidade do recorrente, a despeito de ter sido produzido apenas após a interposição do recurso especial, quando já encerrada, portanto, a fase probatória.

III. De outro lado, demonstrou-se ter o requerente sido reconhecido pelo pai, o que gerou, inclusive, alteração nos seus registros de nascimento. Não há se falar, assim, em prejuízos para o menor.

IV. Processo julgado extinto (CPC, art. 267, VI), prejudicado o recurso especial.”(REsp 348007/GO, Terceira Turma, Rel. Min. Antônio De Pádua Ribeiro, DJ 01.08.2005, p. 437) Grifei.

“PROCESSO CIVIL. INICIATIVA PROBATÓRIA DO SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO POR PERPLEXIDADE DIANTE DOS FATOS. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DEMANDA. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO QUE NÃO RENOVA PRAZO RECURSAL CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU PROVA PERICIAL CON-TÁBIL. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. PROVIMENTO DO RECURSO PARA QUE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA PROSSIGA NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO.

- Os juízos de primeiro e segundo graus de jurisdição, sem violação ao princípio da demanda, podem determinar as provas que lhes aprouverem, a fim de firmar seu

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juízo de livre convicção motivado, diante do que expõe o art. 130 do CPC.- A iniciativa probatória do magistrado, em busca da verdade real, com realização

de provas de ofício, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça.

- Não é cabível a dilação probatória quando haja outros meios de prova, testemu-nhaledocumental,suficientesparaojulgamentodademanda,devendoainiciativadojuiz se restringir a situações de perplexidade diante de provas contraditórias, confusas ou incompletas.” (REsp 345436/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ 13.05.2002, p. 208)

“DIREITOS CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. INVESTIGAÇÃO DE PATER-NIDADE. PROVA GENÉTICA. DNA. REQUERIMENTO FEITO A DESTEMPO. VALIDADE. NATUREZA DA DEMANDA. AÇÃO DE ESTADO. BUSCA DA VERDADE REAL. PRECLUSÃO. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. INOCORRÊNCIA PARA O JUIZ. PROCESSO CIVIL CONTEMPORÂNEO. CERCEAMENTO DE DEFESA. ART. 130, CPC. CARACTERIZAÇÃO. DISSÍDIO CARACTERIZADO. PRECEDENTE. RECURSO PROVIDO. I - Tem o julgador iniciativa probatória quando presentes razões de ordem pública e igualitária, como, por exemplo, quando está diante de causa que tenha por objeto direito indisponível (ações de estado), ou quando, em face das provas produzidas, se encontra em estado de perplexidade ou, ainda, quando hásignificativadesproporçãoeconômicaousocioculturalentreaspartes.II-Alémdas questões concernentes às condições da ação e aos pressupostos processuais, a cujo respeito há expressa imunização legal (CPC, art. 267, § 3º), a preclusão não alcança o juiz em se cuidando de instrução probatória. III - Diante do cada vez maior sentido publicista que se tem atribuído ao processo contemporâneo, o juiz deixou de ser mero espectador inerte da batalha judicial, passando a assumir uma posição ativa, que lhe permite, dentre outras prerrogativas, determinar a produção de provas, desde que o faça com imparcialidade e resguardando o princípio do contraditório. IV - Na fase atualdaevoluçãodoDireitodeFamília,nãosejustificainacolheraproduçãodeprovagenéticapeloDNA,queaciênciatemproclamadoidôneaeeficaz.”(REsp222.445/PR,4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 29.04.2002, p. 246) Grifei.

4 – A inércia da Fazenda Pública, consubstanciada na revelia ou na ausência de impugnação especificadados fatos, influi positivamenteno convencimento do juiz em benefício do autor, sempre que não seja notória a ausência do direito deste, mas não a penaliza, necessariamente, com a derrota no processo, porque a inércia – conduta contrária ao ônus processual do réu de responder, em contrapartida ao ônus que tem o autor de afirmar–significa,apenas,“ofereceroportunidadesmelhoresao adversário.” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, v. III, 2. ed., revista e atualizada, São Paulo: Malheiros,

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2002, p. 527). É que o ônus não se confunde com obrigação ou dever. Enquanto o descumprimento destes contraria o direito e é sempre passível de ser sancionado, no intuito de forçar o resultado que o cumprimento voluntário teria produzido, aquele caracteriza-se pela faculdade de seu cumprimento, sabendo o onerado que, omitindo-se, terá sua situação agravada no processo (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil, v. II, 2. ed., revista e atualizada, São Paulo: Malheiros, 2002, p. 204).

Emsuma,aausênciadeimpugnaçãoespecificadaporpartedaFazendaPública acarreta-lhe, sim, um ônus, que se limita, no entanto, às conse-quências na formação do convencimento do julgador, dado que este é o resultante de um processo mental racional, em que a não impugnação de determinado fato por parte do réu fortalece a posição do autor. O forta-lecimento da posição do autor cede, entretanto, ao conjunto das provas dos autos, especialmente quando essas demonstram a não ocorrência do fato ou a inexistência do direito do autor, tendo em vista os princípios do livre convencimento motivado do juiz e da busca da verdade real.

5 – Outro aspecto a ser abordado diz com a abrangência da remessa oficial.Nocasodosautos,oapelodoINSS,apardereconheceraincapa-cidade para o trabalho da demandante, silenciou acerca da sua condição de segurada, requisito à concessão do benefício de aposentadoria por invalidezpleiteado.Cumpredefinir,pois,seoTribunalpodeapreciarademanda também nesse aspecto.

A resposta é positiva.Adoutrinapredominanteénosentidodequearemessaoficialdevolve

ao Tribunal o conhecimento amplo, geral e irrestrito da causa.“A assertiva fundamental a ser feita é no sentido de que o duplo grau obrigatório

de jurisdição devolve ao Tribunal o conhecimento de todas as questões decididas contrariamenteàFazendaPública.Afinalidadeéverificarouconfirmaraexatidãoda condenação do Poder Público para eventualmente eliminar erros ou imperfeições prejudiciais à Fazenda Pública. Inexiste, neste aspecto, preclusão. A devolução, ou melhor, o conhecimento é amplo, geral e irrestrito.” (GIANESINI, Rita. A Fazenda Pública e o Reexame Necessário. Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e de Outras Formas de Impugnação às Decisões Judicias, v. 4. Coordenadores Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: RT, 2001, p. 927)

“...cumpre esclarecer que a devolução legal se dá, como já dito anteriormente, tanto pela qualidade da parte quanto pela natureza da lide. Assim, em face da especial atenção

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que o legislador dispensou às demandas enquadradas na moldura legal do dispositivo sob exame, pode-se, de logo, aduzir que tanto a extensão quanto a profundidade da devolução não sofrem limites, sendo, pois, a matéria integralmente devolvida à análise do juízo ad quem, tenha havido ou não apelo voluntário, uma vez coloridas as hipóteses elencadasnodispositivoaquianalisado.Talposiçãosejustifica,exatamente,porqueopropósito da regra é de oferecer às hipóteses consagradas garantia legal de reexame sem qualquer limitação, não sendo lógico que eventual apelo voluntário venha a limitar a ex-tensão do conhecimento na devolução necessária. Não bastasse isso, cumpre esclarecer que,nãosendoadevoluçãonecessáriarecurso,mascondiçãodeeficáciadasentença,não há qualquer motivo plausível que possa fazer com que eventual apelo voluntário gerereflexoslimitativosàremessaoficial,máximefrenteàabsolutadivergênciadepropósitos e natureza jurídica das medidas.” (PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao Código de Processo Civil, v. 6: do processo de conhecimento, arts. 444 a 495, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 239)

No mesmo sentido são os precedentes do STJ:“EMBARGOS DECLARATÓRIOS. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E CONTRA-

DIÇÃO. IMPROCEDÊNCIA. I - Omissis;II - Ao examinar a sentença, em razão do duplo grau obrigatório, pode o Tri-

bunal apreciar amplamente a causa, inclusive se se achavam, ou não, provados os fatos constitutivos da demanda. Há de ter-se em conta, nesse caso, que os direitos da Fazenda Pública são indisponíveis, não se lhe aplicando os efeitos da revelia (CPC, art. 320, II).

III - Omissis;IV - EMBARGOS DECLARATÓRIOS REJEITADOS.” (EDcl no REsp 13851/

SP, Rel. MIN. ANTONIO DE PADUA RIBEIRO, 2ª Turma, DJ 09.05.1994, p. 10856) Grifei.

“PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OBRIGATÓRIA. NATUREZA JURÍDICA. EFEITOS. RECURSO VOLUNTÁRIO. AUSÊNCIA. PRESCINDIBILIDADE. EXI-GÊNCIA DE EXAME IMPOSTA AO TRIBUNAL A QUO SOB PENA DE VIOLA-ÇÃO AO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO.

1.Constituiaremessaobrigatóriacondiçãodeeficáciadasentença.Éumamanifes-tação remanescente do princípio inquisitório pelo qual se protege o interesse público e, em última ratio, o interesse de todos os cidadãos. Por tal razão, ainda que inexistente o recurso voluntário interposto pela Fazenda Estadual, deve o Tribunal revisor proceder à reanálise da sentença, sob pena de violar o duplo grau de jurisdição, princípio maior que transcende o entendimento de que na hipótese o órgão julgador estaria advogando os interesses do Estado na qualidade de parte no processo.

3. Recurso Especial a que se dá provimento.” (REsp nº 52.101/ES, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJU de 11.09.00)

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Veja-se que, relativamente aos honorários advocatícios, por exem-plo, a jurisprudência do STJ, outrora divida, sedimentou-se no sentido dadevolutividadeamplaegeraldaremessaoficial,entendimentoqueculminou na edição da Súmula 325, verbis: “A remessa oficial devolve ao Tribunal o reexame de todas as parcelas da condenação suportadas pela Fazenda Pública, inclusive dos honorários advocatícios”.

Efetivamente, dos precedentes que a originaram, prestigiaram-se aquelesqueapregoavamaabrangênciaampladaremessaoficial,nãosubmetida ao princípio tantum devolutum quantum appelattum, como se pode ver dos a seguir transcritos:

“PROCESSO CIVIL. FAZENDA PÚBLICA. SUCUMBÊNCIA. REMESSA OFI-CIAL. AMPLA DEVOLUTIVIDADE.

1. Malgrado a Fazenda pública tenha interposto apelação voluntária, onde omitiu-se acerca de ponto específico relacionado com sua sucumbência em honorários, cabe ao Tribunal o reexame da questão, tendo em vista o efeito devolutivo amplo inerente ao instituto da remessa obrigatória.

2. Recurso especial conhecido e provido. Decisão unânime.” (REsp 143909/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 12.04.1999)

“PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA PROFERIDA CONTRA FAZENDA PÚ-BLICA. REEXAME NECESSÁRIO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ART. 557 DO CPC. POSSIBILIDDE. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.

1. No vocábulo recurso contido no art. 557 do CPC está compreendida a remessa oficialprevistanoart.475domesmodiplomalegal.

2.Orelatorpode,monocraticamente,negarseguimentoàremessaoficialsemviolaro princípio do duplo grau de jurisdição.

3. ‘A remessa ex officio devolve ao Tribunal o conhecimento da causa na sua inte-gralidade, impondo o reexame de todas as parcelas da condenação a serem suportadas pela Fazenda pública, aí incluída a verba honorária’ (REsp nº 117.020/RS, Relator o Ministro ARI PARGENDLER, DJU de 08.09.97).” (REsp 212504/MG, 2ª Turma, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJ 09.10.2000)

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. EXECUÇÃO FISCAL. REEXAME NECESSÁRIO. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA.

1. No reexame necessário, pode o Tribunal diminuir a condenação da Fazenda Pública em honorários de sucumbência. Precedentes.

2. Excepciona-se o princípio tantum devolutum quantum appelattum, ante o peculiar efeito devolutivo em benefício do ente público, característico da remessa ex officio.

3. O fato de a sentença não haver se pronunciado sobre as alegações relativas ao montante da verba honorária de sucumbência, não impede a Corte de Apelação de decidir a respeito do assunto no reexame necessário, pois, na instância ordinária, o

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prequestionamento não é requisito para acesso ao segundo grau de jurisdição.4. Recurso especial provido.” (REsp nº 437.715/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Castro

Meira, DJ de 16.11.2004)

Ressalto, dentre esses precedentes, excerto de voto da lavra do Min. Ari Pargendler, por ocasião do julgamento do RE 100.596/BA, em que traz à colação ensinamento de Alfredo Buzaid (Da Apelação Ex Officio no Sistema do Código do Processo Civil, São Paulo: Saraiva, 2. ed., 1951, p. 48-49):

“(...) a apelação necessária não é um recurso, nem mera providência, ditada por motivodeordempública.Oselementosqueadefinemsão:a)aordemdedevoluçãoà instância superior. (...) b) a instância superior conhece da causa integralmente. Re-almente, devolve-se a ela o conhecimento integral de todas as questões, suscitadas e discutidas no processo (Cód. do Proc., art. 824), de forma que o Tribunal pode manter ou reformar a decisão. Nem as partes arrazoam, nem o juiz formula pedido de nova decisão. Porém, o Tribunal reexamina a causa em sua integridade. Se faltar a declara-ção de devolução na sentença, o Tribunal avoca os autos. Não está sujeita a ordem de devolução quanto a prazo de remessa. E a sentença não será exequível enquanto não forconfirmadapeloTribunal.Decorredaí,portanto,queocaracterísticodaapelaçãode ofício é a ordem de devolução, imposta pela lei, que transfere à instância superior o conhecimento integral da causa.”

O referido acórdão restou assim ementado:“PROCESSO CIVIL. 1. REMESSA OFICIAL. ABRANGÊNCIA. A remessa ex

officio devolve ao tribunal o conhecimento da causa na sua integralidade, impondo o reexame de todas as parcelas da condenação suportada pela Fazenda Pública, aí incluída a verba honorária. 2. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. MULTA PREVISTA NO ARTIGO 538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Se o acórdão proferido no julgamento da remessa ex officio deixa de se manifestar a propósito daverbahonorária,justificadaestáaoposiçãodeembargosdedeclaração,quenãopodeser punida com a aplicação da multa prevista no artigo 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil. Recurso especial conhecido em parte, e parcialmente provido.” (REsp nº 100.596/BA, 2ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, D.J. de 24.11.1997)

Mais recentemente, por ocasião do julgamento do AgRg nos EREsp 628806/DF, embora tenha restado vencido na matéria de fundo (pos-sibilidade de conhecimento de embargos de divergência), ao proferir voto-vista, o Ministro Herman Benjamin teceu considerações acerca da extensão e profundidade do reexame necessário que, por sua adequação ao caso dos autos, peço licença para transcrever parcialmente:

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“O instituto do reexame necessário visa a evitar dano irreparável ou de incerta reparação, submetendo à Superior Instância, em determinadas hipóteses legalmente previstas, a sentença proferida contra o Poder Público, para que haja inafastavelmente um novo julgamento da causa. A razão da tutela especial se impõe diante dos direitos e interesses indisponíveis confiados à Administração, como agente fiduciário primário e implementador do interesse público. É produto do sistema de pesos e contrapesos, que informa o ordenamento jurídico moderno. Pressupõe, além disso, que várias instâncias decidem melhor que uma única, e que vários juízes decidem melhor que um juiz solitário. A‘pluralidadedejulgadores’,dizPontesdeMiranda,temo‘fimpolíticodeassegurardiversos exames ao mesmo tempo, além do duplo ou múltiplo exame’, porque ‘essa prioridade do exame múltiplo ao mesmo tempo, em relação ao exame de um só, se transforma em superioridade sempre que desejamos maior certeza’ (in Comentários ao Código de Processo Civil, v. V, Rio de Janeiro: Revista Forense, 1949, p. 13).

O duplo grau obrigatório é um privilégio que não viola o princípio geral da isonomia formal das partes – de resto profundamente mitigado no processo civil –, haja vista queointeressepúblico(esuasupremaciaemfacedosinteressesparticulares)justificaa diferenciação de tratamento. Como alerta BARBOSA MOREIRA, ‘a Fazenda não pode ser equivalente a um litigante qualquer, dada a natureza dos interesses que repre-senta’ (José Carlos Barbosa Moreira, Em defesa da revisão obrigatória das sentenças contrárias à Fazenda Pública, in Revista Síntese de Direito Civil e Processual, v. 6, nº 32, Porto Alegre: Síntese, nov./dez. 2004, p. 9).

Aliás, seria nomínimo contraditório que tal supremacia justificasse, no planomaterial, a intervenção na ordem econômica e, no âmbito do processo, vigorasse o repúdio à sua admissibilidade. Por isso mesmo, o instituto funciona como condição para o trânsito em julgado da sentença proferida contra a Fazenda Pública (Súmula 423/STF: “Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que se considera interposto ex lege).

Para alguns, o reexame necessário seria uma espécie de ‘recurso’ e, para outros, uma condição de eficácia (ou condição para o trânsito em julgado) da sentença proferi-da em Primeiro Grau. Qualquer que seja a posição que se adote, o resultado prático é sempre um só: o decisum deve ser objeto de reanálise pelo Tribunal em tudo aquilo que se considere prejudicial às entidades de Direito Público, impondo-se a revisão ampla e profunda de todas as matérias que, em tal perspectiva, foram apreciadas diretamente, ou serviram de base à apreciação direta, pela Primeira Instância.

Frequentemente a remessa obrigatória coincide com recurso(s) voluntário(s) da(s) parte(s),seafigurandoadequadaaincidênciadedispositivosconcernentesàTeoriaGeraldos Recursos. Amiúde, mas nem sempre. Assim, por exemplo, a cognição do Tribunal, por força da remessa necessária, não atrai o princípio tantum devolutum quantum appellatum, pois no novo julgamento a cognição é plena e exauriente, vale insistir. Numa palavra, a remessa necessária devolve o conhecimento ao Tribunal não só o que foi objeto do recurso voluntário, mas também a ele submete toda a matéria da causa.

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Ora, se o objeto litigioso, no reexame necessário, é o próprio processo de conhe-cimento em sua inteireza, a análise pelo Tribunal, quanto à extensão e à amplitude do reexame, deve ser plena, não cabendo falar-se em limitação no que conhecer. Já quanto à forma de tratar o que conhecido, o Tribunal deve agir de forma exauriente, completa, acima dissemos. Numa palavra, o Colegiado age (ou deveria agir) sobre a integralidade do processo e da forma mais completa possível. Recusar-se o Tribu-nal a apreciar qualquer ponto que tenha tido, ou que poderia ter tido, influência no julgamento de Primeira Instância é negar, pela via indireta, validade e eficácia ao reexame necessário. Nesse sentido, cumprir parcialmente com o dever de reexame é descumpri-lo por inteiro, pois, em tal esfera, o inadimplemento judicial parcial equivale a inadimplemento total, sobretudo porque não se trata de obrigação que conviva com adimplemento seletivo, em tiras ou fragmentos.

Para o cumprimento deste dever de reexaminar foi assegurada ao Tribunal a uti-lização de todos os meios necessários ou úteis para tanto. O Colegiado ad quem tem a responsabilidade de agir de modo pleno e exauriente sobre o objeto do processo, abrangendo a totalidade das questões. A cognição é integral, implicando, por óbvio, a possibilidade (prudentemente aferida e devidamente motivada) de, por exemplo, determinar a realização de novas provas.

Com efeito, não me parece lógico falar em rejulgamento da causa sem que se pro-cedaaoantecedenteinarredável:oreexamedosfatos,provasedireito,oquesignificaconsiderar, investigar, analisar tudo novamente. Se não se reexaminar integralmente, o que seria rejulgado? E mais: qual a utilidade do reexame se ao Tribunal se restringir ou mesmo proibir adentrar nos fundamentos do decidido?

Não custa repetir que o instituto não foi criado para ser cumprido de forma per-functória ou de modo cosmético. A interpretação sistemática e teleológica dos dispo-sitivos processuais aplicáveis ao caso e do próprio instituto do reexame obrigatório conduz-me, induvidosamente, à conclusão de que a mesma causa (submetida ao crivo do Tribunal) deve ser reexaminada em sua inteireza pelo Colegiado ad quem; numa palavra e singelamente: deve ser rejulgada.

Vale dizer, com o reexame necessário dá-se a transmissão para o Tribunal de todas as questões que ao Judiciário compete examinar (e no caso parece muito evidente que ele tem o dever de reexaminar a questão integralmente, nos termos do art. 475 do CPC). Atente-se que o caput do comando legal prevê que a sentença ‘está sujeita ao duplo grau de jurisdição’. Não é uma expressão de somenos importância.

Como procurei evidenciar, a cognição a ser exercida pela Instância Superior é plena, sendo perfeitamente válido o reexame de tudo quanto decidido nos autos, com a possibili-dadedemodificação,anulação,correção,refazimento,nãohavendosefalarempreclusão(art. 473 do CPC). Nesse sentido, importa lembrar que a previsão legal afasta a preclusão quando está em jogo o reexame necessário: o inciso II do art. 471 do CPC ressalva a possibilidade de o julgador decidir novamente questão já decidida, na medida em que põe a salvo os ‘demais casos prescritos em lei’, e o art. 475 do CPC é um desses casos.

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Nada impede, portanto, que o Julgador Colegiado determine a realização de novas provas, caso assim resulte convencido exponte propria, por requerimento de alguma das partes, ou por algum outro elemento indicativo, que evidencie a indispensabilidade de assim proceder, com a necessária fundamentação.

Assim, não me parece razoável que o Tribunal a quo possa, de ofício, reapreciar qualquer canto ou recanto do conjunto probatório, inclusive a perícia e seus critérios, masfiqueimpedidodefazê-loapartirdoinstanteemqueumadasparteschamaasuaatenção,seofizerforadomomentoprocessualcabível.Aperplexidadeprobatóriaes-pontânea obrigaria o Magistrado a agir; já a mesma perplexidade, só que estimulada por um dos sujeitos da relação processual, o condenaria a fechar os olhos e a permanecer inerte, mesmo que o direito em discussão fosse do interesse de toda Nação, seja pela sua textura de bem indisponível, seja por ofender princípios fundamentais da República, como a probidade administrativa, seja ainda pelo valor absolutamente gigantesco do quantum debeatur que se cobra dos cofres públicos!”

No presente caso, estando no polo passivo pessoa jurídica de direito público (INSS) e não se aplicando a ela o ônus, em sua integralidade, da impugnaçãoespecificadaeosefeitosmateriaisdarevelia–comoseviuacima –, todos os pontos alegados pelo autor tornam-se automaticamente questões, devendo, portanto, ser reanalisadas pelo Tribunal. É de Cândido Dinamarco a lição sobre o tema, in “Ônus de Contestar e o Efeito da Revelia”, Revista de Processo, nº 41, janeiro/março 86, p. 189-190):

“Todo direito se faz a partir de fatos. Daí então o ônus que tem o autor, toda vez que demandar, de indicar em sua petição inicial os fundamentos de fato, ou seja, a sua causa de pedir. (...) Cada alegação, cada fundamento que alguém coloca para suas conclusõeséumponto.(...)TodosselembramdasdefiniçõesqueCarneluttideuparaquestão. É ‘uma dúvida em torno de um ponto de fato ou de direito.’ (...) As alegações de fato que faz o autor na sua petição inicial são pontos de fato. As conclusões que tira em torno da interpretação da lei são pontos de direito. A doutrina fala de ponto e diz que o ponto se pode transformar em questão. Como isso ocorre? Mediante a controvérsia, emprimeirolugar.Querdizer,quandoumadaspartesafirmaalgoeaoutranegaoquefoiafirmado,aquelepontodeixoudeserpacífico.Surgiuparaojuiz,quedeveafinalsepronunciararespeito,umadúvida.Essadúvidaéaquestão.Carneluttidefiniuquestãoem várias passagens de sua obra, por ângulos diferentes, mas dizendo sempre a mesma coisa: as dúvidas, dizia ele, são o ponto controvertido de fato ou de direito. É o ponto com essa conotação de que é controvertido. Outras vezes, uma dúvida – a questão é a própria dúvida em torno de algum ponto.

O ponto pode ser posto em dúvida ou pela parte contrária ou, se se tratar de uma ação que versa sobre direitos indisponíveis, é dever do juiz considerar-se num estado de dúvida quanto a todos os fatos alegados, exigindo do autor que os comprove, sob

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pena de considerar que os mesmos não ocorreram.” (Grifei)

A conclusão inarredável para o caso dos autos, pois, é que a “quali-dade de segurada da autora” é questão a ser analisada pelo Tribunal, até porque não se trata de matéria nova, uma vez que, na petição inicial, a autoraafirmahavertrabalhado“porquatroanosemumhotelnacidadedeCaçapavadoSul”(fl.03),oque,noentanto,nãorestoucomprovado.

6 – No caso concreto, não se trata apenas de não comprovação da qualidade de segurada; mais que isso, há prova nos autos da ausência de tal condição à época dos requerimentos administrativos indeferidos (NB 30.80.980.454.9 - Renda Mensal Vitalícia a Inválidos, formulado em 31.03.1986; NB 40/041.192.895.3 - Renda Mensal Vitalícia a Maiores de 70 anos, protocolado em 22.02.1994), porquanto os documentos que comprovariamaatividadedaautoraresumem-seàdeclaraçãodafl.76,de que teria trabalhado como doméstica no período de 1960 a 1965, e àdeclaraçãodafl.165,firmadaporMariaMachado,nosentidodequea autora trabalhou em sua residência como doméstica no período de 01.02.62 a 30.11.69.

7 – Considerando, pois, que as únicas provas da atividade laboral (declarações extemporâneas de supostos empregadores) demonstram, no máximo, que a autora exerceu atividade de doméstica somente até o longínquo ano de 1969 e que, portanto, não era segurada da Previdência Social à época dos requerimentos administrativos, tampouco por oca-sião do início da invalidez, notória a inexistência de direito ao benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez, com o que, mesmo sem impugnação daquele fato por parte do INSS, não pode a ação ser julgada procedente, sob pena de afronta à prova dos autos, à própria racionalidade do julgamento e ao princípio da busca da verdade real.

8–Édeserdito,porfim,queaautoranãoseencontradesamparada,porquanto, conforme extratos do CNIS, cuja juntada aos autos determino, de 30.11.1994 a 31.03.2002 percebeu o benefício (NB 0599895683) de Renda Mensal Vitalícia a Maiores de 70 anos e, a partir de então, em face do falecimento de seu esposo, passou a perceber o benefício (NB 1242916102) de Pensão por Morte, estando, ainda, ativo.

Em face do exposto, com ressalva e acréscimo de fundamentação, acompanho o e. Relator e voto por dar provimento aos embargos in-

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fringentes, não sem antes pedir vênia aos que manifestaram diverso entendimento.

VOTO-VISTA

O Exmo. Sr. Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle: Pedi vista dos autos, para melhor exame, devido a dupla razão: a relevância da matériatratada(alcancedadevoluçãonaremessaoficial)eadensidadedos votos que me precederam, com conteúdos antagônicos.

A matéria fática é incontroversa: trata-se de pedido de aposentadoria por invalidez, pela conversão do benefício de Renda Mensal Vitalícia aInválidos;redargueoInstitutoPrevidenciário,afirmandoterprestadoauxílio-doença até a recuperação da capacidade laborativa.

Realizada perícia médica, foi constatada cardiopatia isquêmica e hipertensiva, além de discopatia degenerativa, com total e permanente incapacitação ao labor.

Seguiu-se sentença de parcial procedência, com a condenação ao “pa-gamentodobenefícioauxílio-doençadesdeolaudomédicofirmadopelomédico do INAMPS (...) em 04.10.89 (...) até a data da perícia médica realizada por ordem do Juízo Estadual, ou seja, em 10.09.91, quando deverá ser convertido em aposentadoria por invalidez”.

Em apelação, o INSS requereu fosse a data do laudo produzido em juízo tomada como dies a quo para o cálculo da condenação.

Subindo os autos ao Tribunal, foi baixado em diligência para que o INSS esclarecesse a situação da Embargada, que resultou na informa-ção de que a mesma “requereu benefício de Amparo Assistencial, em 22.02.94, tendo sido indeferido, em 05.09.94, por não ter carência”.

Posto o feito em julgamento, o eminente Relator deu provimento à remessaoficial, julgandoprejudicadoo apelodo INSS,paranegar àEmbargante a condição de segurada, verbis:

“Embora não tenha sido suscitado pelo INSS em contestação ou em apelação, porforçaderemessaoficialéfundamentalqueseapontequenãofoitrazidonenhumdocumentohábil,acomprovarquearecorridasejaseguradadaprevidênciaoficial,demodo a obter o reconhecimento do direito de usufruir das prestações previdenciárias.

Oportuno registrar que o documento consubstanciado na declaração unilateral, jungidaàfl.76,noticiandoqueaautoralaboroucomodomésticanoperíodode1960a1965,bemcomoasdeclaraçõesdaautoraaoperitooficial,quehátrêsanoscuidade

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crianças sem carteira de trabalho assinada, isoladamente, são imprestáveis a comprovar aqualidadedesegurada.”(fl.139)

Entretanto, sagrou-se vencedora a tese revisora, sob a alegação de que “questões não suscitadas no processo não poderão ser objeto de apreciação pelo Tribunal, quer em recurso de apelação, quer em reexame necessário, sob pena de violar o princípio do duplo grau de jurisdição”(fl.141),razãopelaqualasentençadeparcialprocedênciafoiconfirmada.

Pretende o Embargante a prevalência do voto vencido, o qual clamou pela possibilidade de ser examinada, em segunda instância, a condição de segurada da autora, matéria essa não discutida na primeira instância.

Iniciado o julgamento na Seção, contrapuseram-se, até então, teses diametralmente opostas.

Pelo provimento dos embargos, manifestaram-se os eminentes De-sembargadores Federais Rômulo Pizzolatti, Relator, e Celso Kipper, com espeque nas razões de decidir resumidamente referidas abaixo:

–aremessaoficialtemocondãodelevaraoconhecimentodoTribunaltodos os pontos e aspectos da causa, sob pena de restar tal mecanismo protetivo esvaziado;

– ainda que não impugnados na contestação, os requisitos legais do benefício não são tidos por incontroversos, pois sua satisfação constitui a causa de pedir;

–aremessaoficialinvestiuoTribunalnacogniçãodetodosospontosda causa desfavoráveis à Fazenda Pública;

– tendo em vista a indisponibilidade dos interesses públicos e a im-possibilidadedeconfissãoporpartedaFazendaPública,nãoseaplicamaelaosefeitosmateriaisdareveliaeoônusdaimpugnaçãoespecificada,com o que não se presumem verdadeiros os fatos narrados pelo autor;

– a busca da verdade real deve pautar a condução do processo;– “ao examinar a sentença, em razão do duplo grau obrigatório, pode

o Tribunal apreciar amplamente a causa, inclusive se se acham, ou não, provados os fatos constitutivos da demanda” (EDcl no REsp 13851/SP, Min. Pádua Ribeiro, 2ª T., DJ 09.05.94);

– a qualidade de segurada da autora não constitui matéria nova, uma vezquenainicialafirmou,semtê-locomprovado,havertrabalhadopor

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quatro anos em um hotel.Em sentido oposto, votaram o eminente Des. Federal João Batista

Pinto Silveira e o Juiz Federal Loraci Flores de Lima, tendo por baldrame as seguintes razões:

– a prevalecer o entendimento do voto vencido, estar-se-á decidindo acerca de questão sobre a qual a parte não pôde se pronunciar, em evidente cerceamento de defesa e supressão do duplo grau de jurisdição;

–seojulgadordeprimeirograuficavinculadoaopedido,oTribunal,emsededeapelaçãoederemessaoficial(excetoquestõesdeclináveisdeofício),deveficaradstritoàsquestõessuscitadasediscutidasnoprimeirograu de jurisdição;

– novo fato jurídico não pode ser adotado de ofício;– a Fazenda Pública não restou vencida quanto à discussão da quali-

dade de segurada da autora, pois tal discussão inexistiu.Posta assim a questão, passo a opinar.Prefacialmente, cumpre seja examinada a natureza jurídica da remessa

oficial.Delogo,afastoaquerelafradescasobresabersearemessaoficialconstituirecursoatípicooumeracondiçãodeeficáciadasentençades-favorável à Fazenda Pública. Seja um, seja outro, o fato é que a remessa oficialencontra-sehigidamenteassentadanoarcabouçoprocessualpá-trio, desde longa data, mais precisamente desde a Constituição Federal de 1934.

Desde seu longevo nascimento até os dias de hoje, sua ratio perma-nece inalterada: a proteção do interesse público. Nisso, há unanimidade na melhor doutrina, de ontem e de hoje:

“A apelação necessária ou ex officio não é propriamente um recurso. Não tem o característico do recurso. Trata-se, antes, de uma providência imposta (o grifo é nosso) por lei, em casos excepcionais, dada a natureza do objeto da causa, para que a decisão do juiz de primeira instância seja revista obrigatoriamente, por motivo de interesses de ordem pública” (CARVALHO SANTOS, apud ALCIDES DE MEN-DONÇA LIMA. Sistema de normas gerais dos recursos cíveis. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, , 1963, p. 171).

“Devemosnotar,porém,queasdefiniçõesapontadasconsideram,sempre,comoobje-tivodorecursoareformadasentença,fatorqueexcluidoâmbitodasmesmasdefiniçõeso recurso ex officio,quenãovisaàmodificaçãodadecisãorecorrida,masaoreexamedacausa por motivos de ordem pública.” (JOÃO CLAUDINO DE OLIVEIRA E CRUZ. Dos recursos no código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense, , 1954, p. 16).

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“Visando ao resguardo de certos interesses de ordem pública, nesses casos a sentença dependerá, necessariamente, para transitar em julgado e produzir coisa julgada, de ser reexaminada a causa e novamente julgada por tribunal de segundo grau competente. Será esse segundo julgamento que produzirá coisa julgada” (MOACYR AMARAL SANTOS. Comentários ao CPC. Forense, Rio, 1976, p. 499).“A razão do reexame necessário de sentenças se encontra exatamente no interesse público relevante de determinadas causas, seja pela ma-téria decidida, seja pela qualidade da parte contra a qual é proferida a decisão. Há quem entenda ser inconstitucional o reexame previsto nos n. II e III do art. 475, por ferir o princípio da isonomia, dispensando, no processo, tratamento diverso às partes litigantes. Tal, porém, não ocorre, pois a sucumbência da parte contrária não impede sua mani-festação recursal. Neste caso, não há, portanto, nenhuma disparidade de tratamento, pois uma coisa é a lei desinteressar-se pela aceitação do julgado pelo particular e outra é exigir o reexame necessário da sentença, em razão do interesse público relevante em jogo.” (ERNA-NI FIDÉLIS DOS SANTOS. Comentários ao CPC. Rio de Janeiro: Forense, , 1980, p. 344)

Cremosqueoúltimoautorfoialémdorazoável,aoafirmainexistirdisparidade de tratamento das partes litigantes, no que concerne ao reexame necessário. A disparidade é inegável, masjustificávelemfaceda proteção do interesse público. Não há falar em quebra de isonomia, pois a lei trata desigualmente partes desiguais. Tampouco há falar em paridade de armas, em se tratando de lide gravosa ao patrimônio públi-co.Trata-se,sim,deprivilégioprocessual,plenamentejustificadopelointeresse público, assim como o são os prazos ampliados para contestar ou recorrer, cuja constitucionalidade nunca foi questionada.

A conveniência do reexame necessário é reconhecida inclusive por autores que, em tese, são contrários aos privilégios estatais, tais como SEABRA FAGUNDES:

“O recurso necessário, nos casos de sentenças proferidas contra a União, (...) tem suaorigemhistóricanostemposdoabsolutismofiscaldoEstado,emqueapareciamindistintos os interesses do Rei e do Fisco. Mas, não obstante as restrições que a evo-lução do direito impôs, de então até hoje, aos privilégios estatais, perdura o instituto do recurso ex officio com o mesmo feitio amplo, que o caracterizava no velho direito. Cumpre reconhecer, todavia, que, dentre todos os privilégios jurídicos outorgados ao Estado, nas suas relações com o indivíduo, esse é o menos odioso, sendo mesmo expli-

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cável, por motivos de ordem prática: a necessidade de subtrair o patrimônio público à possível desídia, e, até mesmo, aos pontos de vista pessoais dos funcionários, a quem se confia a sua defesa.” (Dos recursos ordinários em matéria civil. Rio de Janeiro: Forense, 1946, p. 137 - grifos nossos)

Nessemesmodiapasão,apósreconhecer,altoebomsom,que“afina-lidade principal do instituto, portanto, foi, em nosso meio, a de conceder privilégioaofisco,quandovencido” (p. 165), o ilustre processualista gaúcho ALCIDES DE MENDONÇA LIMA, em passagem seguinte, endossou a conveniência do mesmo: “o recurso ex officio, nos casos estritos e reduzidos da legislação brasileira, ainda é uma providência louvável, em face dos altos interesses sociais que pretende resguardar” (Recursos cíveis. op. cit. p. 173).

Contudo, se é verdade que o princípio do duplo grau de jurisdição obrigatória, em caso de reexame necessário, está a recomendar o pro-vimento dos presentes embargos infringentes, menos verdadeiro não é que o reconhecimento tout court da improcedência da ação acarretaria inaceitável desprezo ao princípio do contraditório e da ampla defesa, conforme bem assinalado por votos que me antecederam. Com efeito, não foi dada à parte, em momento algum do processo, a oportunidade de discutir sua condição ou não de segurada, pois tal matéria não foi debatida nos autos, a não ser em grau de apelação.

A maioria dos códigos, atualmente, contém previsão expressa, miti-gando a aplicação do jura novit curia, estabelecendo que o Tribunal não pode surpreender as partes, por meio das chamadas “decisões-suspresa”. Segundo preleciona o Prof. Danilo Knijnik em obra que se encontra no prelo, pendente de publicação,

“Os ordenamentos e tribunais, cada vez mais, têm atentado para as assim chamadas decisões-surpresa (SÁNCHEZ, Guillermo Ormazabal. Jura novit curia: la vinculación deljuezalacalificaciónjurídicadelademanda.MarcialPons,Barcelona,2007,p.60).Segundo esse mesmo autor, já são vários os precedentes dos tribunais espanhóis, no sentido de que ‘se o julgador altera os termos jurídicos do debate, ditando resolução com base em fundamentos jurídicos não aduzidos pelas partes e, por consequência, não debatidos durante o processo, incorre em vício de incongruência extra petitum, que vulnera o art. 24, I, da CE, ao causar cerceamento de defesa, por privar a uma parte a oportunidade de exercitar seu direito a rebater os fundamentos jurídicos empregados por seuadversárioprocessual’.Emsíntese,‘seseproduzumacompletamodificaçãodostermos do debate processual, pode dar-se uma vulneração do princípio do contraditório

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e por consequência do fundamental direito à defesa, pois a sentença deve ser ditada mediante a existência de um debate e de um contraditório, e somente nesses termos dialéticos é justo o processo e justa a decisão em que ele redunda’.”

Assim, a meu ver, caberia, em tese, a baixa dos autos à origem para propiciar à parte autora a produção de prova da sua condição de segu-rada, em homenagem aos princípios do contraditório e da efetividade do processo.

Entretanto,verificodosdocumentosacostadosaosautos,emespecialosdefls.76e122,queosmesmosdemonstramcontradiçãonaprovajáproduzida pela autora no intuito de provar a qualidade de segurada.

Senão,vejamos.Nodocumentodafl.76,aSenhoraDoloresSoaresdeclara perante o INSS que a autora trabalhou como doméstica em sua residência, em Novo Hamburgo (na Rua Minas Gerais, 635, Bairro Ron-dônia),de1960a1965.Jánodocumentodafl.122,aautoradeclara,em março de 1994, ter exercido atividade de trabalhadora em regime de economia familiar de 1958 a 1983, período que engloba aquele alegada-mente de exercício de trabalho doméstico, fazendo com que a declaração dafl.76devaserdesconsiderada.

Diante desse fato, mesmo que se considerasse a efetividade do trabalho rural alegado, não teria a autora direito ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço, porquanto não cumprida a carência necessária, razão pela qual se torna inócua a baixa dos autos à origem.

Ante o exposto, voto por dar provimento aos embargos infringentes.

VOTO-VISTA

O Exmo Sr. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus: Pedi vista dos autos para melhor examiná-los em face da relevância do tema em deba-te, decorrente não só dos diversos aspectos jurídicos que o circundam, mas, e principalmente, das consequências de ordem prática que advirão de uma eventual alteração da jurisprudência até então em vigor no dia a diadasTurmasqueintegramestaSeção,qualseja,adequeadefiniçãodoâmbitodedevolutividadedaremessaoficialestájungidaàsquestõesque foram suscitadas e discutidas no curso do processo, é dizer, à ma-téria impugnada, e não no sentido proposto pelo relator, e dos demais votos que o acompanharam, para quem àquela é indiferente o âmbito de

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litigiosidade sobre o qual se estabilizou a lide, isto é, ainda que à parte a quem o instituto aproveite não tenha alegado, no momento próprio, fato impeditivo,modificativoouextintivododireitodaparte-autora,estáojuiz obrigado, de ofício, a analisar a pretensão deduzida em toda a sua plenitude, isto é, se estão presentes todos os requisitos que a conformam, tanto factuais como normativos, em face da natureza indisponível dos direitos de que é titular a Fazenda Pública, a quem não se aplicam o ônus deimpugnaçãoespecificadadosfatoseoprincípiodaeventualidade.

Inicialmente,difiroaformulaçãodequestãodeordemnoquetangeao não conhecimento do presente inconformismo, porquanto a razão de ser desse óbice está intimamente entrosada com o mérito desta narrativa, de modo que a prejudicial será retomada mais adiante, fazendo parte da fundamentação que dará ensejo ao dispositivo do voto.

Ospresentesembargosensejamreverteracórdão(fl.148)que,negandoprovimentoàapelaçãodoINSSeàremessaoficial,mantevesentençadeprocedênciaparaofimdeconcederauxílio-doençadesdeadatadolaudomédico-administrativo (04.10.1989) e convertê-lo em aposentadoria por invalidez a partir da data do primeiro exame pericial, que concluiu pela incapacidade laboral (10.09.1991).

Em suas razões, a autarquia, mesmo não tendo deduzido tal pretensão quando da contestação e, consequentemente, do seu recurso voluntário, pede ao Tribunal a prevalência do voto minoritário na Turma, que, pro-vendoaremessaoficial,julgavaimprocedenteademanda,àmínguadacomprovação da qualidade de segurado da parte-autora.

De minha parte, em que pese a grande discussão acerca da natureza jurídicada remessaoficial, tantonadoutrinacomona jurisprudênciabrasileiras, adoto a tese que preconiza não ser aquela um instituto de ín-doleestritamenterecursal,antesumacondiçãodeeficáciadassentençasproferidas em desfavor da Fazenda Pública, muito embora dos recursos possa tomar de empréstimo, v.g.,asregrasdedefiniçãodoâmbitodedevolutividade e os efeitos suspensivo e devolutivo (impróprio) pleno, vale dizer, translativo. Nessa última hipótese, incluem-se os casos que merecem ser conhecidos em qualquer tempo e grau de jurisdição, ainda que sem expressa manifestação das partes, a exemplo do rol constante do artigo 301 do CPC (exceto seu inciso IX), ou seja, as questões de ordem pública.

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No ponto, merece destaque o ensinamento dos doutrinadores abaixo relacionados:

“O reexame necessário não é recurso. Faltam-lhe as características e condições de admissibilidade das espécies recursais, tais como: tipicidade, voluntariedade, legitimi-dade, tempestividade, preparo, interesse recursal e dialeticidade. Quanto à tipicidade, embora trate a doutrina dos chamados ‘recursos atípicos’, prepondera o entendimento de que ‘o conceito de recurso não é supralegal: depende exclusivamente do direito positivo (...)’. O principal requisito que falta ao reexame necessário, para que se possa nominá-lo de recurso, segundo pensamos, é a ‘voluntariedade’. Recurso, enquanto pedido de reforma da sentença, é ato voluntário da parte.

O fato de se lhe aplicarem alguns dos princípios próprios dos recursos, como é o caso da vedação da reformatio in pejus (matéria, de rigor, controvertida, como já se disse), não o transforma em recurso. Da mesma forma, a exigência de que a questão seja previamente suscitada e discutida (exceto as de ordem pública), a exemplo do que exige o art. 515 do CPC, para autorizar o exame em sede de apelação, não é motivo para considerar-se o reexame necessário recurso.” (VAZ, Paulo Afonso Brum. O Re-exame Necessário no Novo Processo Civil, in Revista de Direito Processual Civil nº 34, Curitiba: Genesis, out./dez. de 2004, p. 779)

“Trata-sedecondiçãodeeficáciadasentença,emboraexistenteeválida,somenteproduziráefeitosdepoisdeconfirmadapelotribunal.(...)Enquantonãoreexaminadaa sentença pelo tribunal, não haverá trânsito em julgado e, consequentemente, será ela ineficaz.Ainterpretaçãoteleológicaquesetemdedarànormadeproteçãosobanáli-se,aliadaàsuanaturezajurídicadecondiçãodeeficáciadasentença,indicasomentea sentença de mérito como o objeto da referida proteção. O controvertido instituto, não poucas vezes (e não sem razão, pela aplicação que se lhe tem dado) acoimado de inconstitucionalidade, vem sofrendo, por isso mesmo, mitigação legislativa (v.g. L. 10352/2001, LJEFed 13), deixando de incidir em numerosos casos, razão bastante para orientar o intérprete a restringir sua aplicação, quando isso mostrar-se razoável.” (NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante em Vigor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 622)

Nesse sentido:“RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DUPLO GRAU DE JURIS-

DIÇÃO OBRIGATÓRIO. REEXAME DAS QUESTÕES DECIDIDAS E DAS DE ORDEM PÚBLICA. MATÉRIA NÃO DECIDIDA PELA CORTE ESTADUAL. SÚMULAS Nos 282 E 356/STF. DIVERGÊNCIA NOTÓRIA. HONORÁRIOS AD-VOCATÍCIOS. SÚMULA Nº 111/STJ.

1. O duplo grau de jurisdição obrigatório, como na boa doutrina, não é recurso, tem estatuto processual próprio e em nada se relaciona com o recurso voluntário, daí

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por que não se lhe aplicam as normas referentes à apelação, limitando-se a transferir a reapreciação da matéria suscitada, discutida e decidida na sentença, ressalvadas as questões de ordem pública, de conhecimento e julgamento obrigatórios, mesmo que não tenham sido suscitadas, em virtude, é verdade, da remessa necessária, mas por não lhe ser estranho o efeito translativo, não comportando tais questões a preclusão.

2.Asnormasdereexamenecessário,poróbvio,pelasuaafinidadecomoautori-tarismo, são de direito estrito e devem ser interpretadas restritivamente, em obséquio dos direitos fundamentais, constitucionalmente assegurados, até porque, ao menor desaviso, submeter-se-á o processo a tempos sociais prescritivos ou, o que não é menos grave, a aprofundamentos intoleráveis de privilégios, denegatórios do direito à tutela jurisdicional.

3 a 7. Omissis.” (REsp 556.759, 6ª Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 02.08.2004)

“PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. ÂMBITO DE DEVOLUTI-VIDADE. PRESCRIÇÃO. CPC, ART. 219, § 5º. ADMINISTRATIVO. TÍTULOS DA DÍVIDA AGRÁRIA (TDAs). CORREÇÃO MONETÁRIA. EXPURGOS INFLACIO-NÁRIOS. INCIDÊNCIA. PRECEDENTES REITERADOS.

1. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem, embora su-cintamente,pronuncia-sedeformaclaraesuficientesobreaquestãopostanosautos.Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pelaparte,desdequeosfundamentosutilizadostenhamsidosuficientesparaembasara decisão.

2. A remessa necessária devolve à instância ad quem apenas as questões discutidas e decididas no primeiro grau de jurisdição, bem como as questões conhecíveis ex officio.

3. A prescrição, não obstante conhecível em qualquer tempo e grau de jurisdição, deve ser alegada (CPC, art. 219, § 5º), máxime tratando-se de direitos patrimoniais.

4. É devida a correção monetária dos Títulos da Dívida Agrária – TDAs, inclusive quantoaoschamados‘expurgosinflacionários’,postoqueraciocínioinversoimplicariadesvirtuamento da cláusula constitucional que garante a justa indenização.

5. Recurso especial desprovido.” (STJ, REsp 597.552, 1ª Turma, Rel. Ministro Luiz Fux, DJU 25.10.2004)

Poroutrolado,aapropriaçãodoefeitotranslativopelaremessaofi-cial, édizer,o seuconfinamentoàsquestõesefetivamentesuscitadase discutidas até a fase de saneamento, salvo aquelas de ordem pública examináveisdeofício,temcomojustificativaadicionaloprincípiodaeventualidade:

“Por este princípio, o réu deve alegar, na contestação, todas as defesas que tiver contra o pedido do autor, ainda que sejam incompatíveis entre si, pois na eventualidade

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de o juiz não acolher uma delas passa a examinar a outra. Caso o réu não alegue, na contestação, tudo o que poderia, terá havido preclusão consumativa, estando impedido de deduzir qualquer outra matéria de defesa depois da contestação, salvo o disposto no CPC 303. A oportunidade, o evento processual para que ele possa defender-se, é a contestação.” (NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante em Vigor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 493)

“(...) Como visto no princípio da concentração, o réu é obrigado a produzir todas as suas razões de uma só vez, simultânea e cumulativamente na contestação (e não sucessivamente nas peças que seguem no procedimento). O princípio da eventualidade, contudo, é mais abrangente. Com efeito, este princípio, também chamado de cumu-lação eventual, abrange não só as alegações de defesa, como também as de ataque, os requerimentos e as produções de provas. Ademais, a eventualidade incide tanto no processo de conhecimento como na execução e pertine não só às partes, mas também aos juízes de todos os graus. (...)

O princípio viabiliza, desse modo, que a parte se previna legitimamente para a even-tualidade de que, mais tarde, na hipótese de não serem acolhidas pelo julgador algumas dasrazões,passeojuizaconsiderar,examinarevaler-sedeoutras.Enfim,algumasrazõesqueaprincípiopodemparecersemimportância,aofinal,poderãoserúteis.

A ideia básica do princípio da eventualidade é concentrar nas manifestações das partes todas as alegações próprias para a fase processual em que elas se dão. Desimporta que tais alegações sejam incompatíveis entre si. O interesse maior não é a compatibi-lidade dos argumentos, mas a garantia de conhecimento de todas as alegações, tanto pela outra parte como pelo juiz. (...)

O objetivo do princípio é a concentração, delimitação e disciplina ordenada das alegações e das provas. Visa a um processo mais seguro, mais leal e ao equilíbrio de interesses entre as partes. Busca evitar malabarismos e manobras dilatórias das partes. Funda-se no princípio lógico e no da economia processual. Regulando a ati-vidade das partes, projeta a dialeticidade do processo e assegura a igualdade. Enfim, proporciona celeridade e atende à finalidade do processo que é marcha à frente sem volta atrás. (...)

A existência de um sistema dividido em estágios, fases e compartimentos estanques enseja a necessidade de preclusões e obriga a existência do princípio da eventualidade. Como se sabe, nosso sistema obedece a cinco fases: postulatória, saneadora, instrutória, sentencial e recursal. Assim, não se quer que, iniciada a fase da instrução probatória, as partes ainda postulem. A preclusão é pena para quem desrespeita o princípio da even-tualidade. Aliás, a relação entre eventualidade e preclusão é tão íntima que Theodoro Jr. (1981, p. 187) as apresenta como sinônimos. Porém, o instituto da preclusão é mais abrangente que a eventualidade. A tendência é o alargamento da preclusão que vai abar-car tanto o princípio da concentração como o da consubstanciação do pedido. (...)

Não se encontra expressa no código a possibilidade de as partes trazerem razões

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contraditórias e/ou incompatíveis. No nosso CPC a expressão legal do princípio está nos arts. 282 e 283, que obrigam o autor a articular fatos, fundamentos jurídicos e requerer provas já na petição inicial. É lícito formular mais de um pedido em ordem sucessiva (art. 289). Quanto ao réu, encontram-se nos arts. 300 e 301, que determinam aobrigatoriedadedetodasasmatériasdedefesa,inclusiveasformais.Porfim,oart.517 só viabiliza apreciação de novas questões de fato na hipótese de não terem sido propostas no primeiro grau por motivo de força maior.” (PORTANOVA, Rui. Princípios do Processo Civil. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, p. 130-132 – grifei)

A propósito, e ressalvando a não aplicação dos efeitos materiais da revelia à Fazenda Pública, já assentou o STJ:

“RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. MATÉRIA NÃO IMPUGNADA PELA FAZENDA PÚBLICA. PROVAS. PRODUÇÃO. DESNECESSIDADE. RE-EXAME NECESSÁRIO. ABRANGÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1.Arevisãodomontantefixadoparaoshonoráriosadvocatíciosnãopodeseraco-lhida, porquanto para tal tarefa seria necessário o reexame dos fatos. Súmula 7/STJ.

2. A Fazenda Pública municipal deixou de impugnar a alegação dos contribuintes de que não havia sido prestado o serviço de coleta de lixo e que essa seria feita por eles próprios.

3. O juiz de primeiro grau, diante da falta de impugnação da entidade pública quanto à não prestação do serviço e das razões apresentadas pelos autores, considerou que o lixo tinha sua destinação dada pelos contribuintes da taxa de coleta, conforme alegado na exordial da ação.

4. O Tribunal a quo, ao julgar a apelação, manteve a sentença, considerando inde-vida a taxa de coleta de lixo, já que quem realizava o suposto serviço eram os próprios contribuintes.

5. O recorrente entende que assim não poderia ter ocorrido, uma vez que se estaria a aplicar os efeitos da revelia à Fazenda Pública e que o Tribunal, em sede de reexame necessário, deveria ter declarado a nulidade da sentença por não ter sido determinada a produção de provas.

6. A não aplicação dos efeitos da revelia à Fazenda Pública não pode servir como um escudo para que os entes públicos deixem de impugnar os argumentos da parte contrária, não produzam as provas necessárias na fase de instrução do feito e, apesar disso, busquem reverter as decisões em sede recursal. Precedentes: REsp 541.239/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJ 05.06.2006; REsp 624.922/SC, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJU de 07.11.05.

7. Ainda que pretendesse fazer a prova desconstitutiva do fato alegado pelos autores em momento posterior, o município recorrente, quando da apresentação da contestação, em face do princípio da eventualidade, deveria ter realizado todas as impugnações que entendesse devidas, de modo especificado, nos termos do art. 302 do CPC.

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8. Apenas quando da interposição da apelação, a municipalidade se insurgiu quanto a esse ponto, aduzindo que os serviços existiriam e seriam prestados. Se não se incumbiu de demonstrar o alegado na instrução do feito, não poderia pretender que o Tribunal acolhesse tal pedido em sede de apelação.

9. A contrariedade ao art. 320, II, do CPC nem mesmo foi suscitada pelo município na apelação, sendo aventada apenas nos embargos de declaração opostos contra o acórdão recorrido, quando, então, veio o dispositivo a ser analisado pelo Tribunal a quo.

10. Não é de se conceder tamanha largueza ao instituto do reexame necessário, a ponto de se ter de reconhecer nulidade – se esta existisse – decorrente da não produção de provas não requeridas pela Fazenda Pública, já que esta não se insurgiu quanto ao ponto. Não se reconhece a nulidade na decisão que deixou de determinar a produção de provas sobre matéria que não foi impugnada pela entidade pública. Ademais, as instâncias ordinárias, para chegarem à conclusão de que não houve a prestação do ser-viço e de que eram os próprios contribuintes que o realizavam, valeram-se não apenas da falta de impugnação por parte do Município, mas também das razões apresentadas pelos contribuintes, de forma que o juízo alcançado não decorreu exclusivamente da inércia da Fazenda.

11. Recurso especial conhecido em parte e não provido. (REsp 635.996, 2ª Turma, Rel. Ministro Castro Meira, DJU 17.12.2007, grifei)

Essa, formei convicção, é a interpretação mais afeiçoada aos novos rumos trazidos com a Constituição de 1988.

Com efeito, aproximando esta ideia do princípio da estabilidade obje-tiva da demanda, que possui estreita relação com o da eventualidade por estabelecer o momento pelo qual autor e réu podem, respectivamente, postular e defender-se utilizando-se de novos argumentos, é, ainda, a lição de Rui Portanova:

“Até 1993, intentada a ação, só por ação distinta o autor poderia formular o pedido que houvesse omitido. Hoje o art. 294 tem nova reação. O autor poderá aditar o pedi-doantesdacitação.Masnãosóopedido.Oautortambémpodemodificaracausadepedir durante esse tempo. Assim, somente depois de ‘feita a citação é defeso ao autor modificaropedidoouacausadepedir’(art.264).Assim,atéquesecompletemtodasas citações, a liberdade do autor vige a pleno.

Quanto ao réu, o princípio geral do acesso à justiça (também chamado disponi-bilidade) informa a ampla defesa. Na contestação, o réu pode alegar o que entender conveniente para defender-se. Depois disso, os termos da lide se estabilizam.

Em verdade, depois da citação as partes mantêm plena disponibilidade, mas devem estardeacordo.Assim,vê-senasequênciadoart.264queoautorpoderámodificaropedido e a causa de pedir com o consentimento do réu.

Essa liberdade vai até o saneamento do processo. Depois desse ato, incide interesse

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público na estabilidade objetiva e material da demanda. Logo, em nenhuma hipótese serão permitidas alterações.

(...) Apesar dos termos candentes do parágrafo único do art. 264 impedindo alte-ração do pedido ou da causa de pedir após o saneamento do processo, não se há de desconsiderar os termos do art. 462. Esse artigo está inserido na seção do Código que trata dos requisitos e diz que, ‘se, depois da propositura da ação’ (e mesmo depois do saneamento,dizemos),‘algumfatoconstitutivo,modificativoouextintivododireitoinfluirnojulgamentodalide,caberáaojuiztomá-loemconsideração,deofícioouarequerimento da parte, no momento de proferir a sentença’.

O réu, além de se favorecer dos termos do art. 462, também vê abrandada a es-tabilidade da demanda pelo art. 303. Assim, depois da contestação, só é lícito ao réu deduzir novas razões quando:

I – relativas a direito superveniente;II – competir ao juiz conhecer delas de ofício;III – por expressa autorização legal, puderem ser formuladas em qualquer tempo e

juízo, como a prescrição.” (op. cit. , p. 134 e 136, grifei)

Ora, diante do dever de colaboração que deve haver entre as partes, impõe-seoônusdaimpugnaçãoespecificada,ouseja,cabeaoréuim-pugnar um a um os fatos elencados pelo autor na petição inicial. Se não responder a um fato, será considerado revel em relação a ele, incidindo os efeitos da revelia previstos no artigo 319 do CPC (presunção de ve-racidade).

Todavia, se tal silogismo é verdadeiro em relação ao particular, haja vistaqueaconfissãofictaéinoponívelàFazendaPública,configuraalgobem distinto sustentar que a essa não é aplicável o ônus de impugnação especificadadosfatos.

Di-lo, com todas as letras, o parágrafo único do artigo 302 do CPC: “Estaregra,quantoaoônusdaimpugnaçãoespecificadadosfatos,nãose aplica ao advogado dativo, ao curador especial e ao órgão do Minis-tério Público.”

Qual o porquê dessa previsão?A resposta está na ontológica diferença entre interesse primário (pú-

blico) e secundário (da Administração):“A Advocacia de Estado, antes de mais nada, distingue-se da Advocacia comum,

seja no aspecto consultivo, seja no seu aspecto contencioso. Essa distinção radica basicamente na diferença do interesse aconselhado ou patrocinado, que é o interesse público, o qual, a par de sua publicidade, e em razão mesmo dessa sua natureza, é um interesse administrado, assim tomado no sentido técnico do termo. (...)

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Quando se fala de que o objeto da Advocacia de Estado é a tutela do interesse pú-blico, está-se a referir, naturalmente e em primeiro lugar, o interesse do Estado, que, numa estrutura federativa ou descentralizada, vem a corresponder ao interesse das chamadas ‘pessoas administrativas necessárias’.” (SESTA, Mário Bernardo. Advocacia de Estado: Posição Institucional, in Revista de Informação Legislativa, nº 117, jan./mar. 1993, p. 191-192)

Dessa maneira, a defesa, em juízo, do interesse público está reserva-da ao Ministério Público (CPC, artigo 82, III), a quem, na sua origem, tambémincumbiaopatrocíniodecausasemquefigurava,emumdospolos da demanda, os entes estatais. Precedente do Egrégio Superior Tribunal de Justiça muito bem explicitou as transformações das atribui-ções daquele órgão:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATO DE IMPROBIDADE. CAPACIDADE POSTULATÓRIA. ARTIGO 25, IV, B, DA LEI 8.625/93. LEGITIMATIO AD CAUSAM DO PARQUET. ARTS. 127 E 129 DA CF/88. PATRIMÔNIO PÚBLICO. DEVER DE PROTEÇÃO.

1. A Constituição Federal de 1988 conferiu ao Ministério Público o status de instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (artigo 129, caput).

2. Deveras, o Ministério Público está legitimado a defender os interesses públicos patrimoniais e sociais, ostentando, a um só tempo, legitimatio ad processum e capa-cidade postulatória que pressupõe aptidão para praticar atos processuais. É que essa capacidade equivale a do advogado que atua em causa própria.

Revelar-se-ia contraditio in terminis que o Ministério Público legitimado para a causa e exercente de função essencial à jurisdição pela sua aptidão técnica fosse instado a contratar advogado na sua atuação pro populo de custos legis.

3. A ratio essendi da capacidade postulatória vem expressa no art. 36 do CPC, verbis: ‘A parte será representada em juízo por advogado legalmente habilitado. Ser-lhe-á lícito, no entanto, postular em causa própria, quando tiver habilitação legal ou, não a tendo, no caso de falta de advogado no lugar ou recusa ou impedimento dos que houver’.

4. É que a Carta de 1988, ao evidenciar a importância da cidadania no controle dos atos da administração, com a eleição dos valores imateriais do art. 37 da CF/1988 como tuteláveis judicialmente, coadjuvados por uma série de instrumentos processuais de defesa dos interesses transindividuais, criou um microssistema de tutela de interesses difusos referentes à probidade da administração pública, nele encartando-se a Ação Popular, a Ação Civil Pública e o Mandado de Segurança Coletivo, como instrumentos concorrentes na defesa desses direitos eclipsados por cláusulas pétreas.

5. Destarte, é mister ressaltar que a nova ordem constitucional erigiu um autêntico ‘concurso de ações’ entre os instrumentos de tutela dos interesses transindividuais e, a

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fortiori, legitimou o Ministério Público para o manejo dos mesmos.6. Legitimatio ad causamdoMinistérioPúblicoàluzdadicçãofinaldodisposto

no art. 127 da CF, que o habilita a demandar em prol de interesses indisponíveis, na forma da recentíssima súmula nº 329, aprovada pela Corte Especial em 02.08.2006, cujo verbete assim sintetiza a tese: ‘O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa do patrimônio público’.

7. Sob esse enfoque, adota-se a fundamentação ideológica e analógica com o que se concluiu no RE n.º 163231/SP, para externar que a Constituição Federal confere ao Ministério Público capacidade postulatória para a propositura da ação de improbida-de, nos seguintes termos: ‘RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMO-GÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO. 1. A Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127). 2. Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade postulatória não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III). 3. Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. 3.1. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos, e a determinidade, a daqueles interesses que envolvem os coletivos. 4. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitoscoletivos.4.1.Querseafirmeinteressescoletivosouparticularmenteinteresseshomogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes depessoas,que,conquantodigamrespeitoàspessoasisoladamente,nãoseclassificamcomodireitosindividuaisparaofimdeservedadaasuadefesaemaçãocivilpública,porquesuaconcepçãofinalísticadestina-seàproteçãodessesgrupos,categoriasouclasse de pessoas. 5. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois, ainda que sejam interesses homogêneos de origem comum, são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. 5.1. Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam, quando o bem que se busca resguardar se insere

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na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda-se o abrigo estatal. Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação.’

8. Consequentemente, a Carta Federal outorgou ao Ministério Público a incumbên-cia de promover a defesa do interesse patrimonial público e social, em função do bem comum maior a proteger, derivado da própria força impositiva dos preceitos de ordem pública, podendo, para tanto, exercer outras atribuições previstas em lei, desde que compatíveiscomsuafinalidadeinstitucional(CF/1988,arts.127e129).

9. Outrossim, impõe-se, ressaltar que o artigo 25, IV, b, da Lei 8.625/93 permite ao Ministério Público ingressar em juízo, por meio da propositura da ação civil pública para ‘a anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa do Estado ou de Município, de suas administrações indiretas ou fundacionais ou de entidades privadas de que participem’.

10. Deveras, o Ministério Público, ao propor ação civil pública por ato de improbi-dade, visa à realização do interesse público primário, protegendo o patrimônio público, com a cobrança do devido ressarcimento dos prejuízos causados ao erário municipal, oqueconfigurafunçãoinstitucionaltípicadoenteministerial,adespeitodetratar-sede legitimação extraordinária.

11. É cediço na doutrina pátria que ‘o bacharel em direito regularmente inscrito no quadro de advogados da OAB tem capacidade postulatória (EOAB 8º, 1º e ss). Tam-bém a possui o membro do MP, tanto no processo penal quanto no processo civil, para ajuizar a ação penal e a ACP (CF 129, III; CPC 81; LACP 5º; CDC 82, I; ECA 210 I)’ (Nelson Nery Júnior In Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante em Vigor, 5. ed., Editora Revista dos Tribunais, p. 429).

12. Recurso especial desprovido.” (REsp 749988, 1ª Turma, Rel. Ministro Luiz Fux, DJU 18.09.2006)

Já à Fazenda Pública, por seus procuradores, cabe a tutela do interesse da Administração, razão por que o Código quanto a ela não transige comoônusdeimpugnarespecificadamenteosfatos,franquiaoutorgadaapenas àquele encarregado da zeladoria dos interesses maiores da coletividade.

Aliás, no campo processual, a Fazenda Pública possui ao seu alcance uma gama de benefícios legais, tais como desnecessidade de apresen-tação de procuração judicial para os seus causídicos concursados; não incidência dos efeitos da revelia; prazos em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer; reexame necessário; a intimação pessoal dos seus patronos; dispensa de preparo nos recursos por ela interpostos; ausência

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de depósito prévio de 5% sobre o valor da causa nas rescisórias; entre outros tantos exemplos. Essas prerrogativas, de sua vez, devem ser so-pesadas com o princípio da isonomia processual e da proporcionalidade e, sobretudo, com a celeridade e a efetividade processuais:

“Em nosso entender, constitui prerrogativa, e não privilégio. Privilégio enseja a ideia de ilegalidade ou inconstitucionalidade, o que não ocorre com a prerrogativa, que tem previsão legal e fundamento de validade na própria Constituição, sob pena de ser ilegítima. (...)

Não obstante a resistência de cunho doutrinário, a jurisprudência é remansosa no sentidodeadmitirqueasprerrogativasatribuídasàFazendaPúblicanãoconflitamcomos princípios constitucionais sobre processo, especialmente com o princípio da isonomia. A tutela especial que merecem os interesses públicos curados pela Administração e a supremaciadointeressepúblicoemrelaçãoaoprivadojustificamcertasprerrogativasdeferidas as entes que a compõem. (...)

O princípio da igualdade, enfocado sob o ponto de vista formal, assegura aos litigan-tesaisonomiadetratamentodiantedalei.Cuida-sedevisãosuperadaeinsuficienteparaos ideais de justiça que norteiam o Estado de Direito, porquanto olvida e não considera desigualdades materiais entre os jurisdicionados. Segundo a ótica da isonomia material, deve a atividade jurisdicional – e o processo – atuar como instrumento de igualização, assegurandoeficáciaaosistema jurídico. Justifica-se,dessarte,quea leiestabeleçatratamento processual diferenciado em favor do Poder Público, desde que afete a to-dosigualmente,sejaexecutadocomfidelidadeaoscritérioslegalmenteestabelecidos,estejaperfeitamentejustificadooelementodiscriminadoreguardeconsonânciacomos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.” (VAZ, Paulo Afonso Brum. O Reexame Necessário no Novo Processo Civil, in Revista de Direito Processual Civil nº 34, Curitiba: Genesis, out./dez. 2004, p. 777)

De fato, a jurisprudência pátria tem aplicado o princípio da isonomia nas relações processuais como forma de impedir a acentuação do já existente desequilíbrio entre as partes,emobséquioaumaadequadaponderaçãodosinteressesemconflito,conformese observa:

“AÇÃO RESCISÓRIA: ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DE MEDIDAS PROVISÓRIAS (MPR 1.703/98 A MPR 1798-3/99) EDITADAS E REEDITADAS PARA A) ALTERAR O ART. 188, I, CPC, A FIM DE DUPLICAR O PRAZO PARA AJUIZAR AÇÃO RESCISÓRIA, QUANDO PROPOSTA PELA UNIÃO, PELOS ESTADOS, PELO DF, PELOS MUNICÍPIOS OU PELO MI-NISTÉRIO PÚBLICO; B) ACRESCENTAR O INCISO X NO ART. 485 CPC, DE MODO A TORNAR RESCINDÍVEL A SENTENÇA, QUANDO ‘A INDENIZAÇÃO FIXADA EM AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO DIRETA OU INDIRETA FOR FLA-GRANTEMENTE SUPERIOR OU MANIFESTAMENTE INFERIOR AO PREÇO DE MERCADO OBJETO DA AÇÃO JUDICIAL’: PRECEITOS QUE ADOÇAM A

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PÍLULA DO EDITO ANTERIOR SEM LHE EXTRAIR, CONTUDO, O VENENO DA ESSÊNCIA: MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. 1. Medida provisória: excepcio-nalidade da censura jurisdicional da ausência dos pressupostos de relevância e urgência àsuaedição:raia,noentanto,pelairrisãoaafirmaçãodeurgênciaparaasalteraçõesquestionadas à disciplina legal da ação rescisória, quando, segundo a doutrina e a ju-risprudência, sua aplicação à rescisão de sentenças já transitadas em julgado, quanto a umadelas–acriaçãodenovocasoderescindibilidade–épacificamenteinadmissívele quanto à outra – a ampliação do prazo de decadência – é pelo menos duvidosa: ra-zões da medida cautelar na ADIn 1753, que persistem na presente. 2. Plausibilidade, ademais, da impugnação da utilização de medidas provisórias para alterar a disciplina legaldoprocesso,àvistadadefinitividadedosatosnelepraticados,emparticular,desentença coberta pela coisa julgada. 3. A igualdade das partes é imanente ao procedural due process of law; quando uma das partes é o Estado, a jurisprudência tem transigido com alguns favores legais que, além da vetustez, têm sido reputados não arbitrários porvisaremacompensardificuldadesdadefesaemjuízodasentidadespúblicas;se,aocontrário,desafiamamedidadarazoabilidadeoudaproporcionalidade,caracterizamprivilégios inconstitucionais: parece ser esse o caso na parte em que a nova medida provisória insiste, quanto ao prazo de decadência da ação rescisória, no favorecimento unilateral das entidades estatais, aparentemente não explicável por diferenças reais entre as partes e que, somadas a outras vantagens processuais da Fazenda Pública, agravam a consequência perversa de retardar sem limites a satisfação do direito do particular já reconhecido em juízo. 4. No caminho da efetivação do due process of law – que tem particular relevo na construção sempre inacabada do Estado de direito democrático –, a tendência há de ser a da gradativa superação dos privilégios processuais do Estado, à custa da melhoria de suas instituições de defesa em juízo, e nunca a da ampliação deles ou a da criação de outros, como – é preciso dizê-lo – se tem observado neste decênio no Brasil.” (STF, ADI 1910-1, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, DJU 27.02-.2004)

Essa, insisto, é a tendência.Fazendo-se um breve contraponto, relembre-se as origens do instituto

daremessaoficial:“Esse instituto do reexame necessário tem origens nas leis criminais de Portugal

doséculoXIV,normasdeinspiraçãoinquisitorialqueinfluenciaramasOrdenaçõesManuelinas (em 1521) e depois as Ordenações Filipinas (em 1603). De instituto do direito processual criminal português foi incorporado às leis brasileiras, com objetivo de defesa diante das ameaças de ‘descalabros contra o erário’.

Essesentidoprotetivodosbenspúblicosfoierigidosobainfluênciadeumatíbiaatuação do Estado, em sua defesa. Enquanto o Estado fosse frágil na defesa de seu patrimônio e na defesa de seus interesses, deveria e deve ser mantido um sistema (auxiliar)quecontribuísseàpreservaçãodosbenspúblicos.Porissoéquesejustifica,ainda, a imprescritibilidade de imóveis públicos, por exemplo.” (GUEDES, Jeferson

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Carús. Duplo Grau ou Duplo Exame e a Atenuação do Reexame Necessário nas Leis Brasileiras, in Aspectos polêmicos e atuais dos recursos e de outros meios de impug-nação às decisões judiciais. Coord. Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier. São Paulo: RT, 2002, p. 313)

No entanto, forçoso é de se convir que, atualmente, a defensoria dos interesses estatais conta com uma melhor estruturação do que no passado. É dividida em Procuradorias Regionais da União e da Fazenda Nacional, Procuradorias da União e da Fazenda Nacional nos Estados e no Distrito Federal e Procuradorias Seccionais destas, compostas por advogados con-cursados, com atuação nas capitais e no interior, servidores e estagiários capacitados. Também possuem equipamentos em maior número e de boa qualidade, sistema de banco de dados informatizado e com comunicação com outros órgãos públicos viabilizada por meio da Internet.

Esse enfoque foi muito bem analisado no artigo e na página suso-transcritos:

“Tal proposição (do reexame necessário) vem declinando em importância, perante, principalmente, a efetiva atuação do Estado e a expansão da advocacia pública, que permite o acompanhamento dos feitos de interesse da Fazenda Pública em todas as suas esferas (municipal, estadual e federal), por todos os meios administrativos e judiciais, em todas as instâncias recursais.

Por isso se pode afirmar a vantagem do recurso, voluntariamente interposto,enquanto manifestação imediata da Administração, além de declaração expressa de inconformismo contra a decisão recorrida. Em contrapartida, o reexame necessário opera por força de lei, sem manifestação de vontade imediata, sem a cogitação de eventuais desvantagens.”

Portanto, encaminho uma primeira conclusão provisória. Denota-se, a meu ver, que, ante o caráter excepcional de que se reveste, a exclusão do ônusdeimpugnaçãoespecíficadasalegaçõesfáticasdoautor,previstano parágrafo único do artigo 302 do CPC, é norma à qual há que ser dada interpretação estrita.

Por isso, malgrado os precedentes jurisprudenciais estendendo essa prerrogativa à Fazenda Pública, é de ser ressaltado que essa exceção não se aplica nos casos em que está representando em juízo o interesse da pessoa administrativa, e não o interesse público (bem comum). Sob esse aspecto, bem salientou Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, em sua obra Código de Processo Civil Comentado Artigo por Artigo, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 314, in verbis:

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“São exemplos de direitos indisponíveis os direitos referentes ao estado da pessoa, os direitos de personalidade (art. 11 do CC) e os direitos da Fazenda Pública que têm por base o interesse público primário. Observe-se: nem todo direito titularizado pela Fazenda Pública é indisponível. Só há indisponibilidade se há interesse público primá-rio à base. O interesse público pode ser dividido em interesse público primário (bem comum) e interesse público secundário (interesse da pessoa administrativa). O direito da Fazenda Pública fundado em interesse público secundário é disponível.”

E,emconclusão,tenhoquearemessaoficialnãodeveserentendidacomo um super-recurso posto a serviço da Fazenda Pública, apto a pre-encher lacunas de sua defesa ou obviar a preclusão lógica ou consuma-tiva, tendo em vista o aparato humano, material e tecnológico que está atualmente à disposição da advocacia dos entes estatais. No caso dos autos, a atuação do procurador público limita-se a tutelar os direitos do INSS – e não o interesse público (bem comum) –, este foco da atenção do Ministério Público, tendo, dessa forma, o ônus de ter impugnado especificamenteasalegaçõesfáticascontidasnainicial,oquenãofezno momento oportuno.

Como visto, há uma tendência do processo civil contemporâneo em interpretar restritivamente as prerrogativas processuais da Fazenda Pú-blica, e não em ampliá-las. Aliado a isso, os princípios da estabilidade objetiva da demanda e o da eventualidade apresentam-se como meios capazes de concentrar todas as alegações próprias dos litigantes para a fase processual em que elas se dão, proporcionando a garantia de conhecimento de toda a matéria debatida, tanto pela parte adversária, como pelo juiz, evitando-se, dessa maneira, o elemento surpresa. Refe-rido corolário visa a um processo mais seguro, mais leal e ao equilíbrio de interesses entre os demandantes, tendo como mote elidir eventuais manobras procrastinatórias das partes, de forma a atender à economia processual e à igualdade, bem como proporcionar a celeridade e a efe-tividade da marcha processual.

Nessa perspectiva, e delineando, também, os parâmetros para o que chamei, inicialmente, de questão de ordem quanto ao não conhecimento dos presentes embargos, tem-se recentíssima decisão do STJ:

“(...) Pessoalmente, tenho defendido que na ótica da moderna processualística, em que se busca dar efetividade à garantia constitucional do acesso à justiça, positivada no art. 5°, XXXV, da Constituição Federal, é necessário que se restrinjam os privilégios

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da Fazenda Pública, mediante a harmonização dos institutos processuais criados em seu benefício, de que é exemplo o reexame necessário, com os demais valores consti-tucionalmente protegidos no âmbito do Direito Processual Civil, especialmente diante do avanço tecnológico e da consequente estrutura material, colocada à sua disposição nos dias atuais, contrariamente a que existia há alguns anos atrás.

Segundo Alfredo Buzaid, citado por Jorge Tosta, o reexame necessário teve origem em Portugal, em meados do Século XIV, tendo sido introduzido no Processo Penal, sob ainfluênciadoDireitoCanônico,pormeiododenominadoprocessoinquisitório,noqual o próprio magistrado iniciava o processo toda vez que, por insinuação ou sem ela, lhe chegava ao conhecimento a existência de algum crime (in Do Reexame Necessário, São Paulo: RT, 2005, p. 104). Ainda segundo o mencionado autor, em l2 de março de 1355, D. Afonso IV criou, por meio das Ordenações Afonsinas, a obrigatoriedade de o juiz apelar polla Justiça.

Ajustificativahistóricadoaparecimentodoreexamenecessário,comonarraNelsonNery Júnior (in Teoria Geral dos Recursos, 6. ed. São Paulo: RT, 2004, p. 76), foi a necessidade de se impor um sistema de freios aos amplos poderes que tinha o magistrado no direito intermédio, quando da vigência do processo inquisitório.

No direito brasileiro, ainda segundo Nelson Nery Júnior, a origem do reexame necessário remonta a 1831, com objetivo semelhante ao que o instituto apresenta em nossos dias, vale dizer, o de dar às sentenças proferidas contra a fazenda pública jul-gamentocommaiorsegurança,afimdeevitardanosaoerário.

Em que pese a nobreza da intenção com que foi concebido, com o passar do tempo, o reexame necessário tem se revelado extremamente perverso com aqueles que litigam contra a fazenda pública, especialmente as pessoas físicas e jurídicas de menor poder aquisitivo,quemuitasvezestêmsidoobrigadasaesperarváriosanosatévercertificadoo seu direito, pela sentença, acrescidos de muitos outros até que efetivamente recebam o bem da vida perseguido.

Confrontado por essa triste e cruel realidade, o legislador do século XXI tem se mostrado sensível ao problema, promovendo sucessivas alterações no ordenamento jurídico,afimdetomarefetivaagarantiadoacessoàjustiçaprometidapeloEstadoBrasileiro.

Assim é que, por intermédio da Lei 10.259/2001, excluiu expressamente a necessi-dade de reexame necessário das sentenças proferidas pelos Juizados Especiais Federais, consoante se observa do art. 13 do referido diploma legal:

‘Art. 13. Nas causas de que trata esta lei, não haverá reexame necessário.’Posteriormente, em sintonia com esse movimento de resgate da efetividade da tu-

telajurisdicional,foieditadaaLei10.352/2001,modificandooart.475doCPCparaestender às demais ações que menciona a regra que dispensa o reexame necessário. Confira-se:

‘Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito, senão depoisdeconfirmadapelotribunal,asentença:

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I – proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respec-tivas autarquias e fundações de direito público;

II – que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).

§ 1º Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.

§ 2º Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.

§ 3° Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fun-dada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.’

Apesar dos significativos avanços representados pelas Leis 10.259/2001 e 10.352/2001, o reexame necessário permanece em nosso sistema processual, mantendo o privilégio e a abrangência nas demais causas não atingidas pelas alterações imple-mentadas pelas referidas leis.

Tem-se, assim, uma fonte propulsora de recursos desnecessários, ao possibilitar-se sempre e sempre recorrer a Fazenda Pública para este sodalício, alegando apenas que o Tribunal não examinou tal ou qual aspecto que estava obrigado a examinar, por força do reexame necessário, ou, o que é mais grave, ressuscitando as questões decididas pela sentença, em relação às quais já manifestara aceitação tácita, ao deixar de interpor recursovoluntário,comoocorrenocasodospresentesautos,apesardecientedoreflexoe alcance em sua esfera jurídica.

À luz do entendimento consolidado na Súmula 45/STJ [No reexame necessário, é defeso, ao Tribunal, agravar a condenação imposta à Fazenda Pública], chega a ser incoerente e até mesmo de constitucionalidade duvidosa, por violar o princípio da igualdade das partes no processo, permitir que a Fazenda Pública, sabedora de que os reflexosjurídicosdasentençaemsuaesferajurídicanãopoderiamseragravados,ecom eles já tendo concordado tacitamente, possa reabrir a discussão em sede de recurso especial, muitas vezes apenas para retardar a entrega da prestação jurisdicional, que envolve maior interesse público e não se confunde com o interesse puramente patrimo-nial da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas respectivas autarquias e fundações. Isso sem perder de vista a prerrogativa de prazo em dobro para recorrerdequedesfrutam;queindiscutivelmentelhesproporcionatemposuficienteparaavaliaremtodososreflexosdasentença.

Daí porque, em nome da efetividade do acesso à justiça, entendo que há que se privilegiar na hipótese a preclusão lógica, instituto processual que, segundo Fredie Didier Júnior e Leonardo José Carneiro da Cunha (in Curso de Processo Civil, vol. 3, 5. ed. Salvador: Podivm, 2008, p. 52), consiste na perda de um direito ou faculdade processual por quem tenha realizado atividade incompatível com o respectivo exercício,

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e que constitui regra que diz respeito ao princípio da confiança, que orienta a lealdade processual (proibição do venire contra factum proprium).

Sobre a importância desse instituto para a efetividade da entrega da prestação juris-dicional, merecem transcrição as palavras de José Manoel de Arruda Alvim (in Manual de Direito Processual Civil, v. 1, 10. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 468):

‘A preclusão pode ser considerada um verdadeiro princípio da teoria dos prazos porque ela interfere em toda a dinâmica do andamento processual. Ela é a espinha dorsal do processo, no que respeita ao seu andamento, pois é o instituto através do qual, no processo, se superam os estágios procedimentais, e não deixa de ser também um instituto propulsionador da dinâmica processual, na medida em que for acatada pela legislação positiva.

[...]A preclusão, para ser corretamente entendida, pressupõe o entendimento do con-

ceito de ônus. A ideia de ônus consiste em que a parte deve, no processo, praticar determinados

atosemseuprópriobenefício:consequentemente,seficarinerte,possivelmenteessecomportamento acarretará consequência danosa para ela. A figura do ônus; aliada à da preclusão, faz com que a parte saia de sua inércia e atue utilmente no processo, resultando disso, se for o caso, uma colaboração forçada da parte com a própria autoridade judiciária.

[...]Diz-se lógica a preclusão quando um ato não mais pode ser praticado, pelo fato de

seterpraticadooutroatoque,pelalei,édefinidocomoincompatívelcomojárealizado,ouqueestacircunstânciadefluainequivocamentedosistema.A aceitação da sentença envolve uma preclusão lógica de não recorrer.’

A ilação de que fraudes e conluios contra a Fazenda Pública ocorrem principalmente no primeiro grau de jurisdição, levando à não impugnação da sentença no momento processual oportuno pelos procuradores em suas diversas esferas do Poder Executivo, por si só, não tem o condão de afastar a indispensável busca pela efetividade da tutela jurisdicional, que envolve maior interesse público e não se confunde com o interesse puramente patrimonial da União, dos Estados, do Distrito Federal e de suas respectivas autarquias e fundações, como mencionado anteriormente. Ademais, o ordenamento ju-rídicopossuiinstrumentospróprios,inclusivenasearapenal,eficazesparaarepressãode tais desvios de conduta dos funcionários públicos.

Diante das razões expostas neste voto, sob a ótica do juízo de admissibilidade do recurso especial, com a devida vênia dos que pensam em sentido contrário, entendo que a não interposição de recurso voluntário pelo ente público constitui fato extintivo do poder de recorrer contra o acórdão proferido em sede de reexame necessário, requi-sitointrínsecodeadmissibilidade,consoanteaconhecidaclassificaçãodeJoséCarlosBarbosa Moreira (in Comentários ao Código de Processo Civil, v. V: arts. 476 a 565. 12. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 263).

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Exatamente essa a hipótese dos presentes autos, onde, embora a ação tenha sido julgadaintegralmenteprocedente(fls.128-134),aFazendaNacionalnãoseinsurgiucontra a sentença, limitando-se a requerer a subida dos autos ao Tribunal a quo, em facedoduplograudejurisdição(fl.143).

Porfim,registroqueofatodeoart.105,III,daConstituiçãoFederalnãofazerdis-tinção entre a origem da causa decidida, se proveniente de reexame necessário ou não, é irrelevante, tendo em vista que o recurso especial, como de regra os demais recursos de nosso sistema, deve preencher, também, os requisitos genéricos de admissibilidade. Tanto é assim que a Constituição Federal não menciona que deve haver preparo recursal ou que o recurso deve ser tempestivo. E, apesar disso, é indiscutível a necessidade do preenchimento de tais exigências para que o recurso seja conhecido.

Emsuma,nãomodificadaasentençaemprejuízodarecorrente,peloTribunaldeorigem, não conheço do recurso especial.

É o voto.” (REsp 904885/SP, 1ª Seção, Rel. Ministra Eliana Calmon, julgamento em 12.11.2008, o destaque não é do original)

Ora, se ao apelar o INSS não suscitou a falta de qualidade de segurado – o que, como é curial, nem sequer poderia fazer, sob pena de inovação recursal – de qualquer modo, não poderia, também, usar dos presentes embargos para ressuscitar ponto quanto ao qual se consumou a preclusão, quer lógica, quer consumativa.

Logo, com a uniformização da jurisprudência perante o colendo tri-bunal encarregado de dar a última palavra na interpretação do Direito Federal,ficaafastadaapossibilidadederecursoscontraacórdãosdesteTribunal, que, acaso desprovidos os presente embargos, se mantiverem fiéisàsuacompreensãodequeacontestaçãoparaaparte-ré,talqualainicial para a parte-autora, é o momento para estabilizar a lide, mediante adefiniçãodoâmbitodesualitigiosidade,salvoasexceçõesexpressa-mente previstas no artigo 303 do CPC.

Duasobservaçõesfinais:(a)asúmula325doSTJnãoéaplicávelàcausa, pois seu objeto é estranho à presente controvérsia, na medida em que os acórdãos que lhe deram origem consagraram a tese de que, se colocando a remessa a serviço dos interesses da Fazenda Pública, havendo parcelas da condenação, ou seja, sobre as quais houve pronunciamento, que não sejam devidas, a questão mostra-se devolvida ao Tribunal, a teor, também e coerentemente, da súmula 45 da mesma Corte nacional (a contrario sensu); e, (b) caso prevaleça a devolutividade da remessa oficialdeformaampla,corre-seoriscodeseviolaroprincípiododuplo

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grau de jurisdição, na forma de supressão de instância, porque o tema remetido não foi decidido pelo juiz nem foi atraído pelo efeito translativo (inexistente, na espécie, questão de ordem pública).

Ademais, relembre-se que, nos julgamentos de ações rescisórias, esta Corte tem considerado inadequada a via processual eleita quando a violação ao artigo 475 olvida não ter havido debate da matéria na demanda originária.

No ponto, ilustro com o seguinte julgado:“AÇÃO RESCISÓRIA. CABIMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. REAJUSTE DE

28,86%. COMPENSAÇÃO. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. Cabível a ação rescisória ajuizada com fundamento no art. 485, V, do CPC, uma

vez que, tratando-se de matéria constitucional, não tem incidência a Súmula 343 do STF. Precedentes da Seção.

Não incorre em violação aos arts. 4, 5º, 6º e 7º da Lei nº 8.622/93; 1°, 2°, 3° e 4º da Lei nº 8.627/93; 5º, caput, e 37, X, da Constituição o acórdão que deixou de determi-nar a compensação do reajuste de 28,86% conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no ROMS 22.307.

Para ensejar a rescisão com fundamento no art. 485, V, do CPC, é necessário que tenha havido violação literal a dispositivo de lei, inadmitindo-se que esta tenha sido deformaveladaoureflexa.

Inexistente também violação dos arts. 10 da Lei nº 9.469/97; 475, II; 458, I, II e III, e 515 do CPC; 5º, XXXV e LV, 93, IX, da CF/88: houve recurso voluntário da autora, em face do qual a sentença sujeitou-se ao duplo grau de jurisdição, apreciados todos os fundamentos da apelação.

O reexame necessário não obriga o Tribunal a cogitar de questões jamais ventiladas no curso do processo ou no recurso do ente de direito público para extrair possíveis consequências que possam causar prejuízos ao último.

Diversa seria a situação em que o ponto impugnado dissesse respeito a questão de ordem pública, passível de ser examinada de ofício; todavia, esta não é a natureza da compensação do reajuste de 28,86%.

Prequestionamento quanto à legislação invocada estabelecido pelas razões de decidir. Ação rescisória improcedente.” (AR 2001.04.01.074048-3, 2ª Seção, Rel. Juiz Federal Fernando Quadros da Silva, DJU 29.11.2006 – grifei)

Nessas condições, com a devida vênia do Relator, voto no sentido de negar provimento aos embargos infringentes.

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EMBARGOS À EXECUÇÃO Nº 2006.04.00.034452-9/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Rômulo PizzolattiRel. p/ acórdão: O Exmo. Sr. Des. Fed. Ricardo Teixeira do Valle Pereira

Embargante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: Dr. Milton Drumond Carvalho

Embargada: Selma SchneiderAdvogadas: Dras. Maria Kunigunde Pozza e Carla Katia Antoni Pozza

EMENTA

Processual civil. Previdenciário. Embargos à execução. Honorários advocatícios. Incidência de juros. Índice de correção monetária.

1. Em se tratando de honorários advocatícios de sucumbência arbi-trados em percentual do valor que toca à parte autora (condenação), de regra a alíquota da referida verba recai sobre o montante já atualizado e acrescidode juros.A cobrançadenovos juros, assim, configurariaanatocismo, de modo que indevida.

2.Quandooshonoráriosadvocatíciossãoarbitradosemvalorfixo,ou em percentual sobre o valor da causa (como no caso dos autos), to-davia, a situação é diversa, pois não representam repercussão de valor principal já contemplado com juros; constituem débito autônomo. Assim, osjurossãodevidosdesdeotrânsitoemjulgadodadecisãoquefixouaverba, nos termos dos artigos 394 e 397 do Código Civil e da Súmula 254 do STF.

3. Consoante precedente do STF, os honorários advocatícios ostentam natureza alimentar (RE 146318/SP), de modo que os juros de mora, no caso, devem ser apurados à taxa de 1% ao mês, tendo em vista a inci-dência analógica do DL 2.322/87 (REsp 847587/SP).

4. As Turmas integrantes da 3ª Seção desta Corte têm aplicado o IGP-DI na atualização de créditos previdenciários. Assim, em se tratando de honorários advocatícios referentes a causa previdenciária, deve ser utilizado o mesmo indexador para a atualização do valor.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região,

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por maioria, julgar procedentes os embargos à execução, porém em ex-tensão menor do que a proposta pelo Relator originário, nos termos do relatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedo presente julgado.

Porto Alegre, 02 de abril de 2009.Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Relator para o

acórdão.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Rômulo Pizzolatti: Trata-se de embargos à execuçãodehonoráriosadvocatícios,opostospeloINSS(fls.04-06),apretexto de excesso de execução, considerando que: a) o valor atualizado da causa até junho de 2006 é de R$ 18.515,54, e não R$ 25.079,00, como apontado pela embargada em sua memória de cálculo; b) não é devida a incidência dos juros de mora sobre o valor corrigido da causa, haja vista que o Superior Tribunal de Justiça apenas determinou a inversão da sucumbência, qual seja, a condenação em honorários advocatícios fixadosem10%dovaloratualizadodacausa;ec)oíndicedecorreçãomonetária, para a competência de julho de 1997, seria 1,851554, e não 2,5079876. Dessarte, o valor a ser executado deveria ser de R$ 1.851,55, e não de R$ 5.166,20.

Aembargada,emimpugnaçãoaosembargos(fls.10-11),defendequeo índice de atualização a ser aplicado é o IGP-M e que a condenação a juros de mora prescinde de explicitação, nos termos da Súmula 254 do Supremo Tribunal Federal.

ApósaexpediçãodeRPVdovalorincontroverso,R$1.851,55(fls.29), foram os autos encaminhados à Contadoria Judicial, a qual apurou, valendo-se dos indexadores UFIR e IPCA-E, que o valor da causa atua-lizado até junho de 2006 é de R$ 19.002,74 e que o valor dos honorários advocatícios, sem a aplicação dos juros moratórios, é de R$ 1.900,27 (fls.32-33).

Foi determinada a expedição de RPV do remanescente incontroverso, R$48,72(fls.39),correspondenteaovalorencontradopelaContadoriasubtraído o montante de R$ 1.851,55, já pago. A embargada, em petição defls.44-45,diznãoterinteressenovalordeR$48,72,porquantobasea-do em cálculo que não incluiu os juros moratórios, e requer o julgamento

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dos embargos, haja vista que ainda não houve decisão sobre o índice de correção monetária aplicável.

É o relatório. Dispensada revisão, por ser a controvérsia predominan-temente de direito.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Rômulo Pizzolatti: Conforme apontou a ContadoriaJudicial,emseuparecertécnico(fls.32-33),osíndicesdeatualização monetária a serem utilizados são a UFIR e o IPCA-E do IBGE, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 242, de 2001, do Conselho da Justiça Federal (CJF), uma vez que se trata de condenação em honorários advocatícios. Infundada, pois, a pretensão do INSS, de que o índice seja o INPC, e da embargada, de que seja o IGP-M, porque tais índices se aplicariam somente no caso de condenação ao pagamento de benefício previdenciário, do que aqui não se cogita.

Por outro lado, é descabida a pretensão da embargada de que sobre a condenação em honorários advocatícios incidam juros de mora. Ora, os juros moratórios incidem apenas quando houver obrigação líquida, não satisfeita em seu vencimento, o que inexiste. De fato, embora normal-mente se considere líquida a condenação em honorários sobre o valor da causa, a partir do trânsito em julgado da decisão, entendo que há ne-cessidadededistinguir.Aqui,otítuloexecutivojudicialnãoespecificoua correção monetária da base de cálculo, e, mais que isso, houve efetiva controvérsia sobre o índice aplicável, só agora resolvida.

Impõe-se, pois, com base no parecer técnico da Contadoria Judicial (fls.32-33),acolheremparteosembargosàexecução,fixadoovalordoshonorários em R$ 1.900,27, em junho de 2006, condenando-se a parte embargada ao pagamento de honorários advocatícios de R$ 380,00, ob-servadoodispostonoart.12daLeinº1.060,de1950,porserbeneficiáriada gratuidade de justiça (Regimento Interno, art. 87, § 2º).

Ante o exposto, voto por acolher em parte os embargos à execução.

VOTO-VISTA

O Exmo. Sr. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira: Peço vênia para divergir do eminente Relator.

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Quando do início do julgamento deste processo, esbocei divergência no que toca aos juros de mora. O Des. Federal Celso Kipper, todavia, comosepercebedaleituradasnotastaquigráficasjuntadasaosautos,chamou a atenção para o índice de correção monetária, o qual igualmen-te é motivo de dissensão entre as partes. Assim, pedi vista para melhor apreciação.

Trata-se de execução de honorários de sucumbência referentes a ação, rescisória,osquaisforamfixadosem10%sobreovalordacausa.

Trato inicialmente do índice de correção monetária.SegundoinformaçãodaContadoria(fl.32),oautoralegaterusado

como índice de correção monetária o IGP-M, conquanto tenha aplicado fator equivocado. O INSS, nos embargos, defendeu a utilização do INPC. Ocálculodefls.32/33daContadoriavaleu-sedoIPCA-E,nostermosdo Manual aprovado pelo CJF. Todavia, como bem observado pelo Des. Federal Celso Kipper na seção antecedente, em matéria previdenciária, de maneira geral, as Turmas integrantes da 3ª Seção têm aplicado o IGP-DI. Parece razoável, assim, que, em se tratando de honorários referentes a matéria previdenciária, seja utilizado igualmente o IGP-DI. Nesse sentido o seguinte precedente da 6ª Turma desta Corte:

“PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. PRES-CRIÇÃO DA AÇÃO EXECUTIVA VERSUS PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO ACOLHIMENTO. SÚMULA 02 DESTA CORTE. INOBSERVÂNCIA. SA-LÁRIO MÍNIMO DE JUNHO DE 1989. NCZ$ 120,00. ABONOS ANUAIS INTE-GRAIS EM 1988 E 1989. LIMITE DA PRETENSÃO COGNITIVA E DA DECISÃO EXEQUENDA. SILÊNCIO DO TÍTULO QUANTO À TAXA DE JUROS DE MORA SOBRE AS PARCELAS VENCIDAS. VERBA HONORÁRIA NA INCIDENTAL. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA. OMISSÕES SUPRIDAS.

1. (...)7. Silenciando a decisão objurgada a respeito da incidência de juros de mora e

correção monetária sobre os honorários advocatícios na embargatória, mantidos em valorfixo,cumpresuprir,deofício,areferidaomissão,determinando-seaaplicaçãodaqueles à taxa de 1% ao mês, a contar do trânsito em julgado, e, quanto à última, do IGP-DI (ou outro índice que venha a substituí-lo) como indexador, a partir da prolação da sentença.” (AC 2002.72.09.002702-7/SC. 6ª Turma do TRF4. Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus. Julgado em 12.11.2008)

Registro que afastada a possibilidade de prejuízo para o embargante com a adoção do referido indexador, como cogitado na sessão antece-

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dente. Com efeito, segundo informações que me foram prestadas pela Contadoria, no período em discussão, que vai de 07/1997 a 06/2006, o INPC apresentou índice acumulado de 85,0345%, o IGP-DI, de 137,3901%, e o IGP-M, de 139,0951%. Como o exequente-embargado defende a aplicação do IGP-M, cuja variação foi maior no período, não há problema algum na aplicação do IGP-DI, o índice considerado cor-reto. O INPC, índice defendido pelo INSS, foi ainda mais baixo; não é, contudo, aplicável à atualização do principal, como já esclarecido.

DefinidaacorreçãomonetáriapeloIGP-DI,restadeliberarsobreosjuros.

Em se tratando de discussão sobre a incidência de juros sobre ho-norários advocatícios, há que se fazer uma distinção entre as diferentes hipóteses possíveis.

Em se tratando de honorários advocatícios de sucumbência arbitrados em percentual do valor que toca à parte autora (condenação), de regra a alíquota da referida verba recai sobre o montante já atualizado e acrescido dejuros.Acobrançadenovosjuros,assim,configurariaanatocismo,demodo que realmente indevida.

Quandooshonoráriosadvocatíciossãoarbitradosemvalorfixo,ouem percentual sobre o valor da causa, todavia, a situação é diversa, pois não representam repercussão de valor principal já contemplado com juros; constituem débito autônomo. Assim, os juros são devidos desde o trânsito em julgado, quando caracterizada a mora, nos termos dos artigos 394 e 397 do Código Civil:

“Art. 394. Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.

(...)Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui

de pleno direito em mora o devedor.Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação

judicial ou extrajudicial.”

Consigne-sequenãosepodeafirmarausenteliquideznaobrigaçãopelo fato de ser necessária a apuração de correção monetária. A correção monetária apenas mantém, ou procura manter, o valor real do crédito. Nada acrescenta, pois se trata de mero acessório. A necessidade de atu-

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alização de um valor certo não afeta sua liquidez, até porque, assim não fosse, nenhum crédito poderia ser considerado líquido, salvo se cobrado no mesmo mês em que constituído, pois, mesmo quando incontroverso o índice de correção monetária a ser aplicado, pode surgir, por exemplo, discussãoacercadostermosinicialefinaldeincidência.

Tenho, pois, que no caso dos autos são devidos juros de mora, até porquesuaincidênciaindependedepedidooudecisãoespecíficos,nalinha do que estabelece a Súmula 254 do Supremo Tribunal Federal:

“SÚMULA Nº 254 - INCLUEM-SE OS JUROS MORATÓRIOS NA LIQUIDA-ÇÃO, EMBORA OMISSO O PEDIDO INICIAL OU A CONDENAÇÃO.”

Seguem, em apoio ao que foi exposto, precedentes desta Corte:“ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. JUROS SOBRE HONO-

RÁRIOS ADVOCATÍCIOS.Cabível a aplicação de juros sobre os honorários advocatícios, uma vez que a

mora em que constituído o réu (art. 219, caput, do CPC) abrange também os con-sectários legais.” (EMBARGOS À EXECUÇÃO EM AÇÃO RESCISÓRIA Nº 2006.04.00.000894-3/PR. Rel,. p. acórdão Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon. 2ª Seção. Julgado em 10.08.06)

“EXECUÇÃO DE SENTENÇA. EMBARGOS. VERBA HONORÁRIA. JUROS DE MORA.

A 1ª. Seção desta Corte já decidiu a respeito do marco inicial da incidência de juros moratórios sobre a verba honorária, asseverando que incidem juros moratórios sobre o cálculo dos honorários advocatícios, ainda que não previstos na decisão exequen-da (Súmula 254 do E. STF), a partir do trânsito em julgado da decisão judicial que condenou a parte vencida ao pagamento da verba honorária.” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 2005.71.01.001431-9/RS. Rel. Juiz Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ. Segunda Turma. Julgado em 07.02.06)

“EXECUÇÃO DE SENTENÇA. EMBARGOS. VERBA HONORÁRIA. JUROS DE MORA.

A 1ª Seção desta Corte já decidiu a respeito do marco inicial da incidência de juros moratórios sobre a verba honorária, asseverando que incidem juros moratórios sobre o cálculo dos honorários advocatícios, ainda que não previstos na decisão exequenda (Súmula 254 do E. STF), a partir do trânsito em julgado da decisão judicial que con-denou a parte vencida ao pagamento da verba honorária.” (APELAÇÃO CÍVEL Nº 2006.70.12.000314-8/PR. Rel. Des. Federal Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle. Turma Suplementar. Julgado em 02.05.07)

Registro, contudo, que os juros de mora não podem incidir desde a

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data do ajuizamento da primeira rescisória, como pretendido pelo em-bargado. Somente com o trânsito em julgado foi o INSS constituído em mora. Assim, os juros devem ser computados a partir da data do trânsito em julgado da decisão do Superior Tribunal de Justiça que acolheu o pedido formulado nesta rescisória invertendo os ônus da sucumbência naprimeira,oqueocorreuem29.06.2005,comosepercebeàfl.254dos autos da execução.

Assim, a correção monetária incidente sobre os honorários advocatí-cios deve ser apurada pelo IGP-DI desde a data do ajuizamento, incidindo ainda juros de mora a partir da data do trânsito em julgado da rescisória julgada pelo Superior Tribunal de Justiça. A propósito, com base nesses critérios,eafimdesolucionaraquestão,determineiaremessadosautosàContadoria,aqualapresentounovocálculo(fls.59/60).Ocorrequenoreferido trabalho os juros foram calculados à taxa de 6% ao ano.

OSupremoTribunalFederaljáafirmouqueoshonoráriosadvocatíciosostentam natureza alimentar:

“EMENTA: CONSTITUCIONAL. PRECATÓRIO. PAGAMENTO NA FORMA DO ART. 33, ADCT. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E PERICIAIS: CARÁTER ALIMENTAR. ADCT, ART. 33.

I - Os honorários advocatícios e periciais têm natureza alimentar. Por isso, excluem-se da forma de pagamento preconizada no art. 33, ADCT.

II - R.E. não conhecido.” (RE 146318/SP. 2ª Turma do STF. Rel. Min. Carlos Velloso. Julgado em 13.12.1996)

Em se tratando de créditos de natureza alimentar, como sabido, há muito o Superior Tribunal de Justiça reputou que os juros de mora devem incidir à taxa de 12% ao ano, tendo em vista a incidência analógica do DL 2.322/87. Nesse sentido:

“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. DEFERIDO BENEFÍCIO AS-SISTENCIAL EM VEZ DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. DECISÃO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. JUROS DE MORA. RECURSO PROVIDO.

1. Cuidando-se de matéria previdenciária, o pleito contido na peça inaugural deve ser analisado comcertaflexibilidade. In casu, postulada na inicial a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, incensurável a decisão judicial que reconhece o preenchimento dos requisitos e concede ao autor o benefício assistencial de prestação continuada.

2.Osjurosmoratórios,emsetratandodebenefícioprevidenciário,devemserfi-

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xados à razão de 1% (um por cento) ao mês em face de sua natureza alimentar, a partir da citação, conforme o disposto no art. 3º do Decreto-Lei 2.322/87.

3. Recurso especial provido.” (REsp 847587/SP. 5ª Turma do STJ. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. Julgado em 07.10.2008)

No caso em apreço, portanto, os juros não só devem incidir sobre os honorários, como devem ser apurados à taxa de 1% ao mês. Nesse sentido, a propósito, o precedente da 6ª Turma deste Tribunal já referido e transcrito anteriormente neste voto (AC 2002.72.09.002702-7/SC. 6ª Turma do TRF4. Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus. Julgado em 12.11.2008).

Dessaforma,aproveitoocálculodefls.59/60apenasemrelaçãoaomontante corrigido dos honorários advocatícios (R$ 2.357,49), de modo que, acrescendo os juros de 1% ao mês, o valor devido em junho de 2006 era de R$ 2.640,38 (dois mil seiscentos e quarenta reais e trinta e oito centavos), inferior ao pretendido pelo INSS e superior ao defendido pelo embargado, impondo-se o acolhimento parcial dos embargos.

Oshonoráriosadvocatíciosdospresentesautosficamcompensados.Semcustas,poisoINSSéisentoeoembargado,beneficiáriodaJustiçaGratuita.

Ante o exposto, voto por julgar procedentes os embargos à execução, porém em extensão menor do que a proposta pelo eminente Relator.

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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 2007.04.00.023866-7/RS

Relator: O Exmo. Sr. Juiz Federal Alcides Vettorazzi

Autora: Paulina Ernestina GomesAdvogada: Dra. Alvacir Adriane da Silva BempchRéu: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Advogado: Dr. Milton Drumond Carvalho

EMENTA

Ação rescisória. Previdenciário. Pensão por morte. Violação literal a dispositivo de lei (art. 485, V, CPC). Ocorrência.

1. Viola o disposto no art. 130 do CPC o acórdão que julga improce-dente a ação por entender indemonstrada a alegada união estável, mas sinaliza no sentido de que outra solução poderia ser tomada se tivesse sido juntada cópia da sentença em Ação Declaratória de União Estável proferida na Justiça Estadual e outros documentos, porquanto a Turma julgadora deveria requisitá-los de ofício, ou determinar que a parte autora os produzisse.

2. “O direito à prova é componente inafastável do princípio do con-traditório e do direito de defesa. O problema não pode ser tratado apenas pelo ângulo do ônus (CPC, art. 333). Necessário examiná-lo do ponto de vista da garantia constitucional ao instrumento adequado à solução das controvérsias,dotadodeefetividadesuficienteparaasseguraraotitularde um interesse juridicamente protegido em sede material a tutela juris-dicional.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes instrutórios do juiz. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2001. p. 21)

3. Ação rescisória julgada procedente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, julgar procedente a ação rescisória, nos termos do relatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedo presente julgado.

Porto Alegre, 04 de junho de 2009.Juiz Federal Alcides Vettorazzi, Relator.

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RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Alcides Vettorazzi: Trata-se de ação rescisó-ria ajuizada pelo INSS objetivando, com fulcro no art. 485, V, do CPC, a rescisão de acórdão da Sexta Turma deste Tribunal, em composição anterior,quedeuprovimentoàapelaçãodoINSSeàremessaoficialparajulgar improcedente ação previdenciária visando à concessão de pensão por morte de companheiro.

Sustenta que a decisão incidiu em violação às disposições dos arts. 1º da Lei nº 9.278/96 e 332 do CPC, ao desconsiderar a certidão passada pela Segunda Vara da Comarca de Capão da Canoa/RS, que atesta a prolação de sentença de procedência da ação declaratória de união estável havida entre a demandante e Octávio Rodrigues da Silva no período de março/77 a maio/97, a qual transitou em julgado em 28.12.2000.

Pede a antecipação dos efeitos da tutela, alegando a existência de verossimilhança, bem como o perigo da demora, por ser portadora de enfermidade grave (CID B 24).

Atribuiu à causa o valor de R$ 27.845,68.DeferidaaAJGeindeferidaaantecipaçãodosefeitosdatutela(fl.29

e verso), o INSS contestou a ação alegando (a) irregularidade de repre-sentação da parte autora, (b) falta de interesse processual – à causa de não comprovada a dependência econômica em relação ao de cujus – e (c) ocaráterrecursalconferidoàrescisória.Porfim,postulou,casojulgadaprocedenteaaçãorescisória,afixaçãodosjurosem0,5%aomês.

Saneadoofeito(fls.46e59),oportunizou-sevistadosautosaoMinis-térioPúblicoFederal,queexarouparecer(fls.65-66)pelaimprocedênciada ação rescisória.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Alcides Vettorazzi: O feito originário tran-sitouemjulgadoem28.03.2007(certidãodafl.11),sendotempestivo,portanto, o ajuizamento da ação rescisória em 26.07.2007 (fl. 02).Ademais, impugnando acórdão que resolveu o mérito da causa e, ainda, estando formalmente fundada em hipótese do artigo 485 do Código de Processo Civil, deve a presente ação rescisória ser conhecida.

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A preliminar de irregularidade de representação processual restou supridapelajuntadadeprocuraçãoporinstrumentopúblico(fl.56),emcumprimentoàdecisãodafl.46.

A preliminar de falta de interesse processual – levantada sob o argumento de que a parte autora não comprovou a dependência econômica em relação ao de cujus – diz com o mérito da ação e com ele será analisado.

Os dispositivos legais tidos por violados são os seguintes:“É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua,

de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família.” (Art. 1º da Lei nº 9.278/96)

“Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não espe-cificadosnesteCódigo,sãohábeisparaprovaraverdadedosfatos,emquesefundaaação ou a defesa.” (art. 332 do CPC)

O acórdão, no ponto em que interessa à solução da presente ação rescisóriamanifestou-senosseguintestermos(fls.13-14):

“O exame dos autos revela que a Autora é funcionária pública no município de Xangri-Lá(fl.13),ondeofalecido,OctávioRodriguesdaSilva,trabalhava,epretende,alegando vida em comum, receber pensão por sua morte.

Ocorre que não há prova nos autos que demonstrem a referida união estável. Com efeito,eladelenãoeradependente(fl.89)ecomelenãopartilhavadecoisasemcomum,como conta bancária, plano de saúde, pagamento de conta de luz e outras atividades próprias de um casal.

O único documento existente é uma certidão de uma ação declaratória, que men-cionaoperíododevidaemcomum,qualseja,marçode1977amaiode1997(fl.13).A autora nem sequer trouxe cópia da sentença para que os fatos pudessem ser melhor avaliados. E, além disso, o INSS não foi parte da ação e não pode ser atingido por seus efeitos.Outrasprovasnãoforamproduzidasnemrequeridas(fl.91).

Emfacedoexposto,merecereformaar.sentença,afimdequeaaçãosejajulgadaimprocedente, invertendo-se o ônus da sucumbência. A Autora arcará com o pagamento dos honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 300,00. A execução, contudo, resta suspensa em razão da concessão da assistência judiciária gratuita.

Pelas razões expostas, voto no sentido de dar provimento à apelação do INSS e à remessaoficialenegarprovimentoàapelaçãodaparteautora,nostermosdafunda-mentação retro.”

OcumprimentodorequisitoespecíficodoincisoVdoart.485pres-supõe que “a interpretação conferida ao texto legal represente violação

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de sua literalidade” (AR 953/AL, Rel. Min. Edson Vidigal, DJU de 13.08.2001), violando “seu sentido, seu propósito” (AR nº 2810/SP, STJ, Terceira Seção, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ de 12.12.2007, p. 01). “Por não setratardesucedâneoderecurso(...),sótemlugaremcasosdeflagrantetransgressão à lei” (REsp 489.073/SC, Rel. Humberto Martins, 2ª Turma, DJ de 20.03.2007). “...se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos” (RSTJ 93/416, RT 634/93). Portan-to, “...a violação de dispositivo de lei deve ser literal, frontal, evidente, dispensando o reexame dos fatos da causa”, sendo “Inviável, assim, a rescisória quando intenta a parte, unicamente, rediscutir a justiça da decisão, traduzindo-se em mera insatisfação com o deslinde da questão, objetivando transformar a ação rescisória em mero meio recursal, com prazo dilatado de 02 (dois) anos.” (AR 2280/PR, Relator p/ o acórdão Ministro GILSON DIPP, Terceira Seção, DJ 10.09.2007, p. 183)

No caso dos autos, o voto condutor do acórdão, ao passo que enten-deu não demonstrada a referida união estável, sinalizou no sentido de que outra solução poderia ser tomada a partir da juntada, para análise, de cópia da sentença da Ação Declaratória de União Estável nº 25.111, proferida pelo juízo da Comarca de Capão da Canoa/RS, e de outras provas que não foram requeridas e produzidas.

A Autora, por sua vez, não requereu outras provas possivelmente porque entendeusuficienteacertidãodafl.17,passadapeloEscrivãodaVaradaJustiçaEstadualdaComarcadeCapãodaCanoa/RS,certificandoque,na Ação Declaratória de União Estável nº 25.111, fora proferida senten-ça, em 08.11.2000, declarando a união estável entre Paulina Ernestina Gomes e Octávio Rodrigues da Silva no período de março de 1977 a 14 de maio de 1997. É razoável que assim entendesse a Autora, em face da existência de entendimento de que a união estável declarada por sentença naJustiçaEstadualconstituiprovasuficientenaesferafederalparafinsprevidenciários (TRF 4ª Região, AC nº 2005.04.01.053143-7/RS, 5ª Turma, maioria, Rel. Juiz Federal Luiz Antonio Bonat, D.E. de 19.08.2008; AC nº 2002.04.01.021262-8/RS, 5ª Turma, maioria, Rel. Juiz Federal Luiz Antonio Bonat, D.E. de 19.08.2008; AC nº 2001.71.00.018306-1-/RS, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJ de 26.07.2006), sendo da competência da

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Justiça Estadual o processamento de ação tendente ao reconhecimento de união estável para posterior utilização perante órgão federal (STJ: RMS nº 24.005/DF, julgado em 26.02.2008; CC 51.173/PA, DJ de 08.03.2007; CC 86.553/DF, DJ de 19.07.2007; CC 45.703/RJ, DJ de 11.04.2005; CC n° 36210, DJ 22.08.2005, CC 35.061/DF, DJ de 22.03.2004).

Assim postas as circunstâncias, se – como no caso – a Turma julgadora entendia necessárias novas provas, deveria requisitá-las de ofício, ou determinar que a parte autora as produzisse, porquanto assim determina o art. 130 do CPC.

Maurício Giannico (A preclusão no direito processual civil brasilei-ro. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 178/179) lembra o escólio de Barbosa Moreira:

“Para José Carlos Barbosa Moreira, é resultado de um enorme equívoco a asser-tiva de que se deve deixar apenas às partes o trabalho de trazer ou não aos autos as provasquedesejareme,seelasassimnãoofizerem,éporqueestariamabrindomão– dispondo, pois – de um direito seu. Na acertada ótica do processualista carioca, tal assertiva é falha porque não leva em consideração um fator essencial: ainda que as partes possam dispor de seus direitos, nenhum poder de disposição têm sobre o poder do juiz de averiguar os fatos.”

Outra não é a opinião de José Roberto dos Santos Bedaque (Poderes instrutórios do juiz. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2001. p. 21 e 71-72, respectivamente), para quem a justiça do resultado da prestação jurisdicional é de interesse primário de toda a sociedade, constituindo dever a ser incessantemente perseguido pelo Estado:

“O direito à prova é componente inafastável do princípio do contraditório e do direito de defesa. O problema não pode ser tratado apenas pelo ângulo do ônus (CPC, art. 333). Necessário examiná-lo do ponto de vista da garantia constitucional ao ins-trumentoadequadoàsoluçãodascontrovérsias,dotadodeefetividadesuficienteparaassegurar ao titular de um interesse juridicamente protegido em sede material a tutela jurisdicional. Em última análise, o amplo acesso aos meios de prova constitui corolário natural dos direitos de ação e de defesa.

Para que o processo possibilite real acesso à ordem jurídica justa, necessária a garan-tia da produção da prova, cujo titular é, em princípio, a parte, mas não exclusivamente ela, pois ao juiz, como sujeito interessado no contraditório efetivo e equilibrado e na justiça das decisões, também assiste o poder de determinar as provas necessárias à formação de seu convencimento. A iniciativa probatória do juiz é elemento indissociável da efetividade do processo.” (destaque ausente no original)

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“OEstadoteminteressenaintegridadedoordenamentojurídicoenapacificaçãosocial.Porisso,instituiumafunçãovoltadaespecificamenteparaessefim(JURISDI-ÇÃO). Para fazer com que os órgãos jurisdicionais atuem e alcancem o seu objetivo de aplicação do direito, os destinatários da norma de direito material devem manifestar-se (AÇÃO E DEFESA). Da dialética desenvolvida pelas partes e coordenada pelo juiz, surge o instrumento que possibilitará a formulação e atuação da regra jurídica para o caso concreto (PROCESSO).

Esse fenômeno, analisado por um ângulo publicista, está voltado para um só obje-tivo: a atuação do direito, com o que estará garantida a paz social.

Se assim é, não só às partes devem ser concedidos poderes instrutórios. Conclusão contrária resulta de uma concepção privatista dos institutos processuais, principalmente da ação e da defesa.

Não só elas têm interesse no resultado do processo. Tal resultado interessa muito mais ao Estado que, para tornar possível a convivência das pessoas em sociedade, tem que manter a integridade do ordenamento jurídico por ele criado. (...) Tudo aconselha, portanto, que também o juiz se comporte ativamente, buscando esclarecer por completo a situação de direito material. Muitas vezes, e por razões várias, apenas a iniciativa dasparteséinsuficienteparatanto.

(...).Justifica-se,portanto,ainiciativaprobatóriaoficial.Quantomelhorosfatosesti-

verem representados nos autos, maior a possibilidade de um provimento justo, que expresse perfeitamente a regra jurídica do caso concreto. E somente um resultado como esse possibilitaria a verdadeira paz social. Aquele que não vê reconhecido seu direito, em decorrência de um provimento injusto, passa a não crer mais na função jurisdicional. Na medida em que essas frustrações se repetem, aumenta a tensão social, o que, evidentemente, não interessa ao Estado.

Afinalidadede atuaçãoda lei e, portanto, de alcancedaverdadeira paz socialsobrepõe-se aos possíveis interesses egoístas das partes.

Como estas defendem suas pretensões mediante ação e defesa, compete ao juiz manter o equilíbrio necessário ao bom funcionamento do mecanismo processual. Se ele verifica que, por qualquer motivo, provas importantes, necessárias aos esclareci-mento dos fatos, não foram apresentadas, deve, exofficio, determinar sua produção. Comissonãoestarábeneficiandoqualquerdaspartes,masproporcionandoumrealequilíbrio entre elas.

Somente assim o instrumento utilizado pela autoridade jurisdicional, em colaboração comaspartes–oprocesso–,torna-serealmenteaptoaatingirsuafinalidade:aatuaçãodo ordenamento jurídico e, em consequência, a perfeita harmonia social.

Essa conclusão é decorrência lógica de uma concepção publicista dos institutos fundamentais do direito processual.” (negrito ausente no original)

o mesmo sentido são os precedentes do STJ:

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“RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. INICIATIVA PROBATÓRIA DO JUIZ. DETERMINAÇÃO EX OFFICIO. POSSIBILIDADE. ART. 130 DO CPC. RECURSO NÃO CONHECIDO.

1. No caso dos autos, determinou o Tribunal a quo o retorno dos autos à primeira instância, cassando, por conseguinte, a sentença de improcedência prolatada, na medida em que, tendo admitido expressamente o magistrado singular que as provas colaciona-dasaosautosnãoseriamsuficientesparaverificaçãodaalegadaviolaçãodecláusulascontratuais, deveria ter determinado, ex officio, sua realização.

2. ‘A experiência mostra que a imparcialidade não resulta comprometida quando, com serenidade e consciência da necessidade de instruir-se para melhor julgar, o juizsuprecominiciativasprópriasasdeficiênciasprobatóriasdaspartes.Osmalesde possíveis e excepcionais comportamentos passionais de algum juiz não devem impressionar o sentido de fechar a todos os juízes, de modo absoluto, as portas de um sadio ativismo.’ (in Instituições de Direito Processual Civil, v. III, 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 52-54)

3. Recurso especial não conhecido.” (REsp 629312/DF, Rel.Min. HÉLIO QUAGLIA BARBOSA,T4,DJ de 23.04.2007, p. 271)

“PROCESSUAL CIVIL. PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. DETERMINA-ÇÃO DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO ART. 130 DO CPC. PRE-CLUSÃO QUE NÃO SE APLICA, NA HIPÓTESE. ART. 183 DO CPC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. RECURSO ESPECIAL. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 211/STJ E ADEMAIS, DA SÚMULA Nº 83/STJ.

I - A matéria inserta no dispositivo infraconstitucional suscitado (art. 183 do CPC) não foi objeto do julgamento a quo, sequer implicitamente, carecendo o recurso especial dopressupostoespecíficodoprequestionamento(IncidênciadaSúmulanº211/STJ).

II-Demaisdisso,estaCortetementendimentopacíficonosentidodequealivreiniciativa do magistrado, na busca pela verdade real, torna-o imune aos efeitos da pre-clusão, sendo lícita a determinação de produção de prova pericial, que indevidamente não foi deferida em primeira instância, mesmo de ofício (art. 130 do CPC).

III - Noutras palavras, ainda que tenha havido o anterior indeferimento da produção de prova pericial, pelo juízo de primeiro grau, ainda assim pode o Tribunal de apelação, de ofício, determinar tal produção, se entender pela sua indispensabilidade.

IV - Precedentes citados: AgRg no REsp nº 738.576/DF, Rel. Min. NANCY ANDRI-GHI, DJ de 12.09.2005; EDcl no Ag nº 646.486/MT, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, DJ de 29.08.2005; AgRg no AG nº 655.888/MG, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES DE LIMA, DJ de 22.08.2005; REsp nº 406.862/MG, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ de 07.04.2003.

V - Aplicação, de qualquer modo, da Súmula nº 83/STJ.VI - Recurso especial não conhecido. Manutenção do acórdão que determinou a

realização de nova perícia judicial.” (REsp 896072/DF, Min. FRANCISCO FALCÃO, T1, DJ de 05.05.2008)

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“RECURSO ESPECIAL - PREQUESTIONAMENTO AUSÊNCIA - CONVERSÃO DE APELAÇÃO EM DILIGÊNCIA - PRODUÇÃO DE PROVA - JULGAMENTO ULTRA OU EXTRA PETITA - NÃO OCORRÊNCIA - ART. 130 DO CPC - COISA JULGADA - TRÍPLICE IDENTIDADE - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO CONFIGURADA.

- Falta prequestionamento quando o dispositivo legal supostamente violado não é discutido na formação do acórdão recorrido.

- A conversão de apelação em diligência para produção de provas não implica jul-gamento ultra ou extra petita, pois o Art. 130 do CPC também possibilita aos Tribunais a prerrogativa de determinarem a produção de provas que consideram necessárias.

- A coisa julgada decorrente de execução extinta por iliquidez do título não impede o ajuizamento de ação de cobrança, pois, ainda que idênticas as partes e a causa de pedir, não há identidade de pedidos, sendo um executivo e outro condenatório.

- Para demonstrar divergência jurisprudencial é necessário confronto analítico e semelhança entre os casos. Não bastam simples transcrições de ementas e tre-chos.” (REsp 985077/ SC, Rel. Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, T3, DJ 06.11.2007, p. 170)

“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. INICIATIVA PROBATÓRIA DO MAGISTRADO. POSSIBILIDADE.

1. Embora tenha o julgado deixado de fazer menção expressa ao art. 333, I, do CPC, não há que se falar em omissão, já que a questão jurídica de que trata o citado dispositivo foi devidamente analisada, tendo o Magistrado a quo emitido juízo de valor acerca da controvérsia.

2. Em que pese o art. 333, I, do CPC determinar que compete ao autor o ônus da prova, quanto ao fato constitutivo do seu direito, o art. 130 do CPC possibilita também ao Juiz a iniciativa probatória, mesmo quando a parte tenha tido a oportunidade de requerer a produção da prova e, no entanto, quedou-se inerte.

3. De acordo com a prestigiada doutrina processualística contemporânea, admite-se umaatuaçãoprotagonistadoJulgador,que,aoinvésdemerofiscaldaaplicaçãodasleis, passa a agir intensivamente para a maior efetividade do processo, especialmente quando se tratar de relação processual desproporcional, a exemplo das demandas previdenciárias.

4. Recurso Especial do INSS improvido.” (REsp 964649/RS, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, T5,DJ de 10.09.2007, p. 308)

“PROCESSO CIVIL. AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL. INICIATIVA PRO-BATÓRIA DO JUIZ. PERÍCIA DETERMINADA DE OFÍCIO. POSSIBILIDADE MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DEMANDA. PRECEDENTES.

- Os juízos de primeiro e segundo graus de jurisdição, sem violação ao princípio da demanda,podemdeterminarasprovasquelhesaprouverem,afimdefirmarseujuízode livre convicção motivado, diante do que expõe o art. 130 do CPC.

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- A iniciativa probatória do magistrado, em busca da verdade real, com realização de provas de ofício, é amplíssima, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça.

- Agravo no recurso especial improvido.” (AgRg no REsp 738576/DF, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 12.09.2005, p. 330)

“DIREITOS CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. (...) BUSCA DA VERDADE REAL. PRECLUSÃO. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. INOCORRÊNCIA PARA O JUIZ. PROCESSO CIVIL CONTEMPORÂNEO. ART. 130, CPC.

I - Tem o julgador iniciativa probatória quando presentes razões de ordem pública e igualitária, como, por exemplo, quando se esteja diante de causa que tenha por objeto direito indisponível (ações de estado) ou quando, em face das provas produzidas, se encontreemestadodeperplexidadeou,ainda,quandohajasignificativadesproporçãoeconômica ou sociocultural entre as partes.

II - Além das questões concernentes às condições da ação e aos pressupostos pro-cessuais, a cujo respeito há expressa imunização legal (CPC, art. 267, § 3º), a preclusão não alcança o juiz em se cuidando de instrução probatória.

III - Pelo nosso sistema jurídico, é perfeitamente possível a produção de prova em instância recursal ordinária.

IV - No campo probatório, a grande evolução jurídica em nosso século continua sendo, em termos processuais, a busca da verdade real.

V - Diante do cada vez maior sentido publicista que se tem atribuído ao processo contemporâneo, o juiz deixou de ser mero espectador inerte da batalha judicial, passan-do a assumir posição ativa, que lhe permite, dentre outras prerrogativas, determinar a produção de provas, desde que o faça com imparcialidade e resguardando o princípio do contraditório.

VI - Omissis.” (STJ, REsp 192.681, 4ª Turma, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJU 24.03.2003)

“PROCESSO CIVIL. INICIATIVA PROBATÓRIA DO SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO POR PERPLEXIDADE DIANTE DOS FATOS. MITIGAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DEMANDA. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO QUE NÃO RENOVA PRAZO RECURSAL CONTRA DECISÃO QUE INDEFERIU PROVA PERICIAL CON-TÁBIL. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. PROVIMENTO DO RECURSO PARA QUE O TRIBUNAL DE JUSTIÇA PROSSIGA NO JULGAMENTO DA APELAÇÃO.

- Os juízos de primeiro e segundo graus de jurisdição, sem violação ao princípio da demanda,podemdeterminarasprovasquelhesaprouverem,afimdefirmarseujuízode livre convicção motivado, diante do que expõe o art. 130 do CPC.

- A iniciativa probatória do magistrado, em busca da verdade real, com realização de provas de ofício, não se sujeita à preclusão temporal, porque é feita no interesse público de efetividade da Justiça.

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- Não é cabível a dilação probatória quando haja outros meios de prova, testemu-nhaledocumental,suficientesparaojulgamentodademanda,devendoainiciativadojuiz se restringir a situações de perplexidade diante de provas contraditórias, confusas ou incompletas.” (REsp 345436/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ 13.05.2002, p. 208)

Reafirmandooentendimentoesposadoalhurespeloe.Des.FederalCel-so Kipper, sufragado por esta 3ª Seção (AR nº 2002.04.01.027418-0/RS), tenho que o acórdão rescindendo violou o art. 130 do CPC, na parte em que determina que “Caberá ao juiz, de ofício (...) determinar as provas ne-cessárias à instrução do processo, (...)”, devendo, pois, ser rescindido.

Observo que, considerando os brocardos jurídicos “jura novit curia” e “da mihi factum, dabo tibi jus”, é cabível a rescisão por ferimento à norma diversa daquela apontada na inicial, conforme jurisprudência que trago à colação:

“Processual Civil. Ação Rescisória. Erro no enquadramento legal dos fatos que servem de fundamento ao pedido. Pretendida afronta ao art. 485, V, do CPC e ao art. 1º do Decreto nº 20.910/32.

Ausência de incompatibilidade entre a ação rescisória e o princípio jura novit curia.

Caso em que a própria narração dos fatos aponta, de modo iniludível, o dispositivo legal violado.

Prescrição que não poderia ser decretada, em face do caráter declaratório da pre-tensão, no ponto enfocado, não havendo incidência da norma do art. 1º do Decreto nº 20.910/32.

Recurso não conhecido.” (REsp nº 7/154-SP, STJ, 2ª Turma, Rel Min. Ilmar Galvão, DJ 03.06.1991)

“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. TRIBUTÁRIO. RETENÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA INCIDENTE SOBRE OS BENEFÍCIOS DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSEN-TADORIA RECEBIDOS DE ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. BITRIBUTAÇÃO. LEI Nº 7.713/88 E 9.250/95.

1. O art. 485, V, do CPC, que autoriza a rescisão de julgado por ofensa à literal disposiçãodelei,éaplicávelsomentequandoainterpretaçãodadasejaflagrantementedestoante da literalidade do dispositivo legal.

2. Ao tempo da prolação da sentença rescindenda, a jurisprudência a respeito da questãocontrovertidaestavapacificada,tantonestaCortequantonoSTJ,nãoseapli-cando ao caso vertente a restrição estabelecida na Súmula nº 343 do STF.

3. Sendo plenamente válidos os brocardos jurídicos jura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus à ação rescisória, a sentença deve ser rescindida, também, pela violação ao art.

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460 do CPC, visto que o provimento jurisdicional incorreu em julgamento ultra petita. (...) 7. Ação rescisória julgada procedente, para desconstituir a sentença proferida na

Ação Declaratória nº 2003.71.00.030588-6/RS e, em juízo rescisório, julgar procedente o pedido.” (AR nº 2004.04.01.036321-4-RS, TRF/4ª Região, Primeira Seção, Rel. Des. Federal WELLINGTON MENDES DE ALMEIDA, DJU 29.06.2005)

Nesse passo, nos termos da fundamentação supra, tenho que o acórdão rescindendo incidiu, em verdade, em afronta direta ao disposto no art. 130 do CPC, devendo, portanto, ser rescindido.

Em juízo rescisório, voto pela baixa dos autos em diligência, para que seja possibilitada à parte autora a juntada de cópia da sentença proferida na Ação Declaratória de União Estável nº 25.111 – declarando a união estável entre Paulina Ernestina Gomes e Octávio Rodrigues da Silva no período de março de 1977 a 14 de maio de 1997 – e de quais-quer outros documentos que entender aptos à comprovação do direito alegado, bem como possibilitando à demandante a produção de prova oral. Quanto a esse ponto, observo que, recentemente, em 02.10.2008, esta Terceira Seção, por unanimidade, adotou solução similar ao solver Questão de Ordem nos Embargos Infringentes nº 2003.71.11.007542-5/RS, de relatoria do e. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus.

Arbitro honorários advocatícios em favor da parte autora em 10% sobre o valor atribuído à causa (R$ 27.845,68), atualizado.

Ante o exposto, voto por julgar procedente a ação rescisória, nos termos da fundamentação.

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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 2007.04.00.026653-5/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle

Autor: Orácio Pereira da SilvaAdvogado: Dr. Cláudio Pisconti Machado

Réu: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSAdvogado: Dr. Milton Drumond Carvalho

EMENTA

Ação rescisória. Aposentadoria por idade urbana. Revisão de bene-fício. Majoração da RMI. Limites da lide. Violação a literal disposição de lei. Inocorrência. Reexame da causa. Inviabilidade.

1. A ação rescisória não se presta para a correção da injustiça da sentença rescindenda, nem para o reexame da prova produzida no feito originário.

2. Os limites da lide são impostos pelo autor quando formula os seus pedidos na exordial. Revisão de benefício é um pedido certo e determi-nado que não se confunde com pedido de conversão de uma espécie de benefício para outra espécie.

3. Ação rescisória julgada improcedente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedo presente julgado.

Porto Alegre, 04 de dezembro de 2008.Desembargador Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle: Trata-se de ação rescisória ajuizada por Orácio Pereira da Silva, com fulcro no art.485,V,doCPC,objetivandorescindirasentençadasfls.171-177,prolatada nos autos da ação ordinária nº 2003.70.00.034199-2, que de-cidiu nos seguintes termos:

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“(1) reconheço o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, pelo suplicante, entre 16.10.40 e 31.12.75; (2) não reconheço o exercício de atividade especial no período de 12.11.81 a 01.10.92; e (3) rejeito o pedido de condenação do INSS na obrigação de revisar o benefício em manutenção”.

Sustentou o autor, em síntese, que teria sido violado o art. 55 da Lei 8.213/91,porquantotantonoSTJquantonosdemaistribunaisépacíficoo entendimento de que “é direito do Segurado a averbação do tempo rural e, se anterior à Lei 8213/91, a revisão do benefício sem o recolhimento dacontribuição”(fl.03),tendoadecisãoatacadareconhecidoodireito,mas deixado de impor ao INSS a revisão do benefício do autor. Alegou que a sentença, apesar de reconhecer o tempo de serviço rural, se tornou confusa, contraditória e ilegal, pois não condenou o INSS a fazer a revisão do benefício do autor, com mais de 35 anos de tempo rural. Aduziu que, em 1992, foi concedido ao autor o benefício de aposentadoria por idade (NB: 87.175.663-23), proporcional, com renda de 86%, não que ele tenha requerido esse benefício, mas foi esse que o INSS concedeu, computando apenas o tempo de serviço urbano, sem considerar o tempo de serviço rural e o tempo de serviço especial. Sustentou que tem 58 anos e 07 meses de tempo de serviço, devendo ser revisado o benefício concedido, com o cômputo do tempo de serviço rural e do tempo de serviço especial. Requereu, pois, a rescisão da sentença, “condenando o instituto requerido a revisar a aposentadoria por idade, majorando de 86% para 100%, com o pagamento de todas as diferenças com juros e correção, na forma usual destaCorte,desdeoRequerimentoAdministrativo”(fl.16).Requereu,também, a rescisão da sentença quanto ao reconhecimento do tempo laborado em condições especiais que a sentença deixou de reconhecer, de1975a1992.Porfim,“Requeraindasejasucessivamenterescindidaa r. decisão dos autos nº 2003.70.00.034199-2 da Vara Previdenciária de Curitiba, transformando a aposentadoria em idade por tempo de serviço, pois este era o interesse e o direito do autor, e reformada a contagem de tempo,comaconcessãoe100%daRMIdobenefício”(fl.16).

Àfl.186foideferidoaoautorobenefíciodaassistênciajudiciáriagratuita.

Oréuapresentoucontestaçãoàsfls.192-198,tendosobreelasema-nifestadoodemandanteàsfls.203-212.

Intimadas as partes acerca do interesse na produção de provas, o autor

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manifestou-se negativamente e o INSS restou silente.Inexistindo provas a serem produzidas, na esteira do entendimento

firmadopeloSuperiorTribunaldeJustiçanojulgamentodosEmbargosde Declaração em Ação Rescisória nº 729/PB, proferido pela Primeira Seção,em22.11.2000,publicadonoDJde12.11.2001,ficoudispensadaaapresentaçãodasrazõesfinais.

OMinistérioPúblicoFederal,noparecerdasfls.224-228,opinoupela improcedência da ação.

É o relatório.Dispensada a revisão (parágrafo único do art. 38 do RITRF-4ªR).

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle: A ação originária foi ajuizada objetivando a revisão do benefício do autor, ipsis litteris:

“3 – Requer, ainda, que seja declarada e decretada na forma do artigo 4º e seguintes a relação jurídica material, com a condenação do INSTITUTO REQUERIDO nos termos dos artigos retrocitados e pertinentes aos pedidos, bem como o preceito constitucional, disposto no artigo 202, §§ 1º e 2º, e demais aplicáveis e pertinentes da Constituição Federal, impondo-lhe a obrigação de averbar o período rural e converter tempo comum em especial, anotando em registro próprio; e conceder-lhe a revisão da aposentadoria, concedendo nova RMI com 100% da média dos últimos 36 salários, com pagamento de todas as diferenças desde a concessão do benefício com os respectivos reajustes, com alcance no limite período do prescricional, aplicando o princípio da ISONOMIA; ou seja, se o INSTITUTO tem direito a receber em 10 anos seus haveres, deve ser o mesmo, se o INSTITUTO tem direito a receber somente 05 anos, deve ser aplicado o mesmoprincípio;(...).”(cópiadainicialàfl.33destarescisória)

Na presente ação, o autor alega que o julgado foi confuso, contraditório e ilegal, porque reconheceu o direito à averbação do tempo rural pleiteado, mas não julgou procedente o pedido de revisão do benefício, bem como pelo fato de não ter reconhecido a especialidade do período trabalhado junto à Industrial Papeleira Santa Mônica S.A. Sustenta que não há que se falar em falta de carência, pois o trabalho rural se deu antes da Lei nº 8.213/91, tendo a decisão violado o art. 55, § 2º, da Lei 8.213/91.

Sem razão o demandante.A ação rescisória é uma ação autônoma que visa desconstituir decisão

transitada em julgado. As hipóteses que ensejam a rescisão da sentença

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estão arroladas taxativamente no artigo 485 do CPC, não admitindo ampliação por interpretação analógica ou extensiva.

No caso em tela, o que o autor pretende é a rediscussão do julgado, uma vez que a questão foi plenamente analisada no processo originário, tanto no acórdão que anulou a 1ª sentença, quanto na 2ª sentença que quer ele ver rescindida. O fato de não ter sido reconhecido o direito de revisão do benefício titulado pelo autor não pode ensejar a rescisão do julgado, porquanto não houve nenhuma violação à lei, pois, como bem analisado na sentença atacada, “Em que pese o reconhecimento do tempo de serviço rural ocorrido acima, não há como revisar o benefício do autor (...)”, porquanto, “Ainda que tenha trabalhado na lavoura em regime de economiafamiliar,otempodeserviçoemtaiscondiçõesnadarefletenocoeficientedecálculodaaposentadoriaporidade”.

Os limites da lide são impostos pelo autor quando formula os seus pedidos na exordial. Revisão de benefício é um pedido certo e determi-nado que não se confunde com pedido de conversão de uma espécie de benefício para outra espécie. Pedir para revisar a renda mensal inicial de uma aposentadoria por idade urbana é completamente diferente de pedir o reconhecimento de tempo de serviço rural e de tempo de serviço prestado emcondiçõesespeciaiscomconversãoparatempocomumparafinsdeaposentadoria por tempo de serviço/contribuição com RMI de 100%.

O eminente Des. Victor Laus, ao proferir o voto condutor do acórdão da c. 6ª Turma, quando do julgamento da apelação da parte autora, em que se anulou a primeira sentença, por citra petita, uma vez que deixara de examinar o pedido de reconhecimento e averbação do tempo de serviço rural e especial, já assinalara, com muita propriedade, que:

“...não merece prosperar a alegação do demandante de que postulou a transforma-ção de sua aposentadoria por idade em tempo de serviço com RMI majorada, uma vez queopedidodainicialéclaroaorequerer(fl.12):‘(...)arevisãodaaposentadoriaconcedendo nova RMI com 100% da média dos últimos 36 salários, com pagamento de todas as diferenças desde a concessão do benefício com os respectivos reajustes (...)’. Se o autor deseja a revisão do amparo, isso somente é possível em benefício já concedido, in casu,oamparoporvelhice.”(fl.161destarescisória)

Ademais, como bem asseverou a nobre Procuradora Regional da República,Dra.AnaLuísaChiodellivonMengden,noparecerdasfls.224-228, “Desse modo, sequer é aplicável ao presente caso o dispositivo

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legal supostamente violado, pois o benefício que o autor percebe é o de aposentadoria por idade, e o artigo 55, § 2º, da Lei nº 8.213/1991 refere-seàaposentadoriaportempodeserviço”(fl.225).

A via da rescisória não se presta para a correção da injustiça da sen-tença nem para o reexame da prova, como é o caso do recurso. Enquanto ademandarescisóriatemafinalidadedealterarumestadojurídicojáexistente, o recurso objetiva fazer com que seja evitado esse estado ju-rídico, retardando a ocorrência da coisa julgada material.

O direito anterior (CPC de 1939) era explícito no sentido de não admi-tir a ação rescisória proposta sob a alegação de injustiça ou má apreciação da prova, como se extrai do CPC Comentado de Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, 7ª edição, 2003, p. 829.

Assim, limitando-se a insurgência da parte à injustiça do julgamento, e não à nulidade da decisão judicial, que não houve, não há como pros-perar a presente ação. Nesse sentido, colaciono precedentes desta Corte e do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE FATO. INEXISTÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. - Mostra-se cabível a propositura de ação rescisória com fundamento na ocorrência de erro de fato quando a sentença rescindenda considera fato inexistente ou tem por inexistente fato efetivamente ocorrido, desde que sobre esse fato não tenha havido controvérsia nem pronunciamento judicial.Noentanto,nenhumadascondiçõesseverificanasituaçãoemanálise.-Aaçãorescisória não tem cabimento quando visa à reparação de hipotética injustiça existente na sentença rescindenda em razão da má apreciação da prova ou como instrumento para seprocederàrevisãodessadecisão,emsubstituiçãoarecursoespecíficoquedeveriater sido interposto no momento oportuno. Precedentes.” (STJ, REsp 515.279, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJU de 20.10.2003)

“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. DOCUMENTO NOVO (CPC, ART.485,VII).REEXAMEDECAUSA.1.Paraaconfiguraçãododocumentonovoensejadordaaçãorescisória,mistersefazqueomesmosejasuficienteaosfinsdeas-segurar, por si só, pronunciamento favorável, no caso, a prova cabal do acidente que a parte alega. 2. Não se admite ação rescisória quando a parte promovente intenta mero reexame da causa, limitando-se a insurgência à injustiça do julgado e não à nulidade da decisão judicial.” (TRF da 4ª Região, AR nº 2000.04.01125771-4/RS, Segunda Seção, Rel. Des. Amaury Chaves de Athayde, DJU de 02.07.2003)

“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. FATO. ART. 485, IX, DO CPC. 1.Emnossodireitonãoéaaçãorescisóriarecurso,ajustificaroreexameeanovadecisãocomafinalidadedecorrigirsupostainjustiçanasuaapreciação.(...)”(TRFda

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R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p.77-366, 2009276

4ª Região, AR nº 2001.04.01.086875-0/RS, Segunda Seção, Rel. Des. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, DJU de 28.08.2002)

Por esses motivos, improcede a rescisória.Condenooautoraopagamentodehonoráriosadvocatícios,fixados

em 10% sobre o valor da causa, restando suspensa a sua exigibilidade em face da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita.

Ante o exposto, voto por julgar improcedente a ação rescisória.

AGRAVO NA SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO DE LIMINARNº 2007.04.00.040066-5/SC

Relatora: A Exma. Sra. Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb

Agravante: Cesar Augusto Bleyer BresolaAdvogado: Dr. Marcelo Ramos Peregrino Ferreira

Agravado: Estado de Santa CatarinaProcurador: Dr. Adriano Zanotto

Interessados: Ordem dos Advogados do Brasil – Secção de Santa Catarina

José Carlos DamoOscar Juvêncio Borges Neto

Edézio Henrique Waltrick CaonOswaldo José Pedreira HornSebastião Cesar Evangelista

Humberto PradiValmir Pamplona Pinheiro

João Henrique BlasiPaulo Roney Avila Fagundez

Abelardo Cardoso DuarteAntonio Mario Koschinski

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Claudio Gastão da Rosa FilhoDomingos Afonso Kriger Filho

Luiz Fernando MolleriMarcus Antonio Luiz da Silva

Osmar Elias de Oliveira

EMENTA

Agravo em suspensão de liminar. Restabelecimento de eficácia de nomeação e posse de Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Atos suspensos pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Florianópolis. Liminares concedidas em ação popular. Presença dos requisitos do art. 4º da Lei 8.437/92.

. O artigo 4º da Lei nº 8.437/92 prevê a possibilidade de suspensão das decisões concessivas de liminares em ações movidas contra o poder público, se vislumbrada a hipótese de que a execução do ato judicial implicará ameaça de lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.

. Hipótese em que é postulada a suspensão de liminares obstando procedimento de escolha da vaga de Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e entrada em exercício no cargo referido, pelo descumprimento, por parte do advogado indicado pela OAB/SC, do requisito“exercíciodaprofissão”.

. Havendo pretensão de desconstituir ato administrativo de nomeação e posse de desembargador, a antecipação dos efeitos da sentença exige demonstração cabal da absoluta necessidade da medida, sopesadas sua adequação, necessidade e ponderação, em face de seu caráter de provi-soriedade.

. Inexistência do perigo da demora, consistente na irreversibilidade fática, tendo em vista a possibilidade de aplicar a técnica da modula-ção temporal dos efeitos, preservando os atos judiciais praticados pelo Desembargador cujas nomeação e posse estão sendo discutidas na ação popular originária.

. Presença dos requisitos do art. 4º da Lei nº 8.437/92, consubstan-ciados na grave lesão à ordem pública estadual, considerada em termos de ordem jurídico-constitucional (STF, SS-AgR/SP, Relatora Ministra Ellen Gracie, 11.10.2007, Tribunal Pleno), e à segurança jurídica, porque

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interfere na estrutura orgânica de um dos Poderes do Estado de Santa Catarina.

. Questão que envolve intrincados aspectos de partição das compe-tências constitucionais entre os órgão da federação, o que refoge dos pressupostos a serem examinados em sede de suspensão de execução de liminar.

. Agravo improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Re-gião, por maioria, vencida a Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, conhecer da suspensão e, no mérito, por unanimidade, negar provimentoaoagravo,nostermosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopresentejulgado.

Porto Alegre, 19 de dezembro de 2007.Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb, Relatora.

RELATÓRIO

A Exma. Sra. Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb: Cesar Augusto Bleyer Bresola, autor da Ação Popular nº 2007.72.00.013830-8, objetivandoarestituiçãodaeficáciadasliminaresquelheforamconce-didas no referido processo, interpôs o presente agravo contra a decisão defls.326-328,proferidanosseguintestermos:

“Cuida-se de pedido de suspensão de liminar proposto pelo Estado de Santa Catarina contra decisões proferidas por Juiz Federal nos Autos da Ação Popular nº 2007.72.00.013830/SC, consistentes em: a) suspensão do procedimento de escolha davagadeDesembargadordoTribunaldeJustiçadeSantaCatarina(fls.307-308);b)suspensão da entrada em exercício no cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça deSantaCatarina(fl.313).Fundamentam-seasdecisõesnodescumprimento,porpartedoadvogadoindicadopelaOAB/SC,dorequisito‘exercíciodaprofissão’.

Argumenta o requerente ocorrência de grave lesão à ordem administrativa estadual e à segurança jurídica, uma vez que a decisão suspende a posse no cargo de Desem-bargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

A cláusula do devido processo legal (due process of law), cuja essência reside na necessidade de proteger os direitos e as liberdades das pessoas contra qualquer modalidade interventiva do Poder Público que se revele opressiva ou destituída do

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necessáriocoeficientederazoabilidade(STF,ADI1063MC-QO,RelatorMin.CELSODE MELLO. Julgamento: 18.05.1994. Tribunal Pleno. Publicação: DJ 27.04.2001, p. 00057), encontra concretização nas normas infraconstitucionais, as quais delimitam e densificamesseimportanteprincípioconstitucional(STF,Pet2066AgR/SP,RelatorMin. MARCO AURÉLIO. Julgamento: 19.10.2000. Tribunal Pleno. Publicação: DJ 28.02.2003, p. 00007).

A medida cautelar, para seu deferimento, pede a ponderação de dois elementos que lhesãoessenciais–aplausibilidadedodireitodorequerenteeoriscodeineficácia(dano)dafuturatutela.Aponderação,enquantotécnicaadequadadesuperaçãodeconflitosentre normas jurídicas, deve presidir a aplicação das normas constitucionais, tendo-se por objetivo a obtenção de uma concordância prática entre os vários bens e direitos protegidos jurídico-constitucionalmente, independentemente de serem veiculados por meio de princípios ou de regras. Controvertem-se, no caso concreto, dois princípios constitucionais: ampla defesa e efetividade processual, na ótica da efetivação do direito material.Asoluçãoquesedeveatribuiraoconflitodeprincípios,queseestabelecenadimensão do peso, é no caso concreto: quando dois princípios constitucionais entram em colisão irreversível, um deles obrigatoriamente tem que ceder diante do outro, o que,porém,nãosignificaquehajaanecessidadedeserdeclaradaainvalidadedeumdos princípios, senão que, sob determinadas condições, um princípio tem mais peso ou importância do que outro e, em outras circunstâncias, poderá suceder o inverso.

Nesse passo, tenho que a antecipação dos efeitos da sentença somente poderá ser efetuada quando demonstrada a absoluta necessidade, a partir da aplicação do princípio da proporcionalidade (adequação, necessidade e ponderação), da medida, tendo-se em vista a irreversibilidade de futuro provimento concessivo da pretensão inicial.

Atesejurídicasustentadanainicialdaaçãopopular(prazodeexercíciodaprofissão)exige profundo exercício de interpretação do Texto Constitucional, o que é razoável seja efetuado quando da sentença de mérito da demanda, e não em provimento liminar, cuja característica é a provisoriedade.

De outro lado, embora não se mostre aplicável a teoria do fato consumado, não resta configuradooperigonademora,consistentenairreversibilidadefática,umavezquepoderá a sentença, em eventual procedência, aplicar a técnica da modulação temporal dos efeitos, preservando os atos judiciais praticados pelo Desembargador João Henrique Blasi, decorrendo a inexistência de prejuízo no privilegiamento do contraditório.

Assim, tenho que se encontram presentes os requisitos do artigo 4º da Lei nº 8.437/92, uma vez ser indiscutível a grave lesão à ordem pública estadual, considera-da em termos de ordem jurídico-constitucional (STF, SS-AgR/SP, Relatora Ministra Ellen Gracie, 11.10.2007, Tribunal Pleno), e à segurança jurídica, no momento em que interfere a decisão judicial diretamente na estrutura orgânica de um dos Poderes do Estado de Santa Catarina, ao suspender a posse no cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, envolvendo intrincadas questões de partição das competências constitucionais entre os órgãos da federação, sendo certo que na

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suspensão de segurança não se aprecia, em princípio, o ‘mérito do processo principal, mas tão somente a ocorrência dos aspectos relacionados à potencialidade lesiva do ato decisório em face dos interesses públicos relevantes consagrados em lei, quais sejam, a ordem, a saúde, a segurança e a economia públicas’ (STF, SS-AgR 3232/TO, Relatora Ministra Ellen Gracie, 11.10.2007, Tribunal Pleno).

Emfacedoexposto,defiroopedidoparasuspenderosefeitosdasliminaresprofe-ridas nos Autos da Ação Popular nº 2007.72.00.013830-8/SC.”

Invocando razões pertinentes à ação popular originária, o agravante reiterou que houve investidura no cargo de desembargador sem o cumpri-mento dos requisitos constitucionais necessários, em detrimento do inte-resse público, razão por que é um equívoco que as liminares concedidas pelo juízo monocrático continuem suspensas pela decisão transcrita.

Além disso, ponderou que a suspensão questionada provoca maior danoàordemadministrativa,umavezquecriaafigurade“desembar-gador provisório, com a possível discussão incidental em cada processo queatuadascondiçõesdesuainvestidura”(fl.350).

Requereu a reconsideração monocrática da decisão ou que esta fosse examinada pela Corte Especial.

Mantive a decisão agravada e, em atenção a pedido de vista anterior-mente formulado, determinei a remessa dos autos ao Ministério Público Federal, o qual opinou pela improcedência do agravo.

É o relatório.

VOTO

A Exma. Sra. Desa. Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb: Con-forme já manifestado no relatório, a suspensão em tela foi deferida porque vislumbrada a presença dos pressupostos do artigo 4º da Lei nº 8.437/92.

Efetivamente, suspender posse em cargo de Desembargador com base em provimento liminar suscetível de reforma pela própria decisão de mérito, de fato representa grave lesão à ordem jurídica e administrativa, considerada a presunção de legalidade que reveste os atos de órgãos da envergadura do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, OAB/SC e Governo do Estado de Santa Catarina.

No caso em exame, devo reiterar que eventual procedência da ação popular não implicará a invalidação dos atos jurisdicionais praticados

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pelo Desembargador João Henrique Blasi, uma vez que aplicável a téc-nica da modulação temporal dos efeitos, que preserva a integridade da atuação judicial, mesmo que posteriormente venha a ser proclamada a nulidade da nomeação e da posse.

Tal entendimento, inclusive, serviu de fundamento para que, em 12.12.2007, o eminente Ministro Celso de Mello deferisse liminar no Mandado de Segurança nº 27033 impetrado perante o Supremo Tribu-nal Federal, suspendendo decisão do Conselho Nacional de Justiça que anulara a nomeação de desembargador para vaga do Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul.

Nesse passo, e agregando a este as razões já transcritas para conceder o pedido de suspensão das liminares questionadas, nego provimento ao agravo.

É o voto.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz: Sra. Presidente:

Acompanho o voto proferido por Vossa Excelência, uma vez que, nesse sentido, há precedente do Eg. STF.

Com efeito, em sua obra Constituição Federal Anotada, 2ª edição ampliada, Saraiva, 1986, anotou o eminente Ministro José Celso de Mello Filho, p. 390-1, verbis:

“A Carta Federal, ao dispor sobre a composição do TST, reservou 2 (duas) vagas à classe dos advogados. Estipulou, contudo, que elas fossem providas por ‘advogados no efetivoexercíciodaprofissão’.Essacláusulaconstitucionalimpõe,comopressupostonecessário à investidura no cargo de Ministro togado do TST, o requisito da militância na advocacia. Essa exigência constitucional supõe (1) que o bacharel em direito esteja inscrito na OAB e (2) que exerça, atualmente, a advocacia, cujo sentido legal abrange a representação judicial, o procuratório extrajudicial, os serviços jurídicos de consultoria e assessoria e as funções de diretoria jurídica. Pode ocorrer, no entanto, que o advogado incidaemsituaçãocaracterizadoradeincompatibilidade(conflitototal)oudeimpedi-mento(conflitoparcial),queoinibadeexercerasuaatividadedeprofissional.Nessecaso, conforme já decidiu o STF, ‘se o bacharel em direito, inscrito na OAB, esteve no efetivo exercício da advocacia e por circunstância eventual não se encontra militando na advocacia forense, em razão de incompatibilidade ou impedimento transitório, aí nada impede sua nomeação para a vaga reservada a advogado. Em tal hipótese não se

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pode negar a experiência haurida no exercício efetivo da advocacia’ (RTJ, 112:589). Note-se que a situação de temporária incompatibilidade não produz o cancelamento da inscriçãodoprofissionalnosquadrosdaOAB.Nessecaso,oadvogadoserálicenciadodo exercício da advocacia (v. Lei n. 4.215/63, art. 60, I). Contudo, será cancelada a inscriçãoreferidaseoadvogado‘passaraexercer,emcaráterdefinitivo,cargo,fun-ção ou atividade incompatíveis com a advocacia’ (Lei cit., art. 61, II). Apenas nesta segundahipótese–situaçãodedefinitivaincompatibilidade–équeficarádescaracte-rizada a qualidade de advogado do inscrito na OAB, falecendo-lhe, em consequência, legitimidade para ser investido no cargo judicial reservado, constitucionalmente, aos advogados. Cf., ainda, decisão do STF (RDA, 159:149) e estudo de CAIO TÁCITO, Nomeação de advogado para Tribunal Judiciário, RDA, 159:165-7.”

Nesse sentido, o precedente do STF, em caso idêntico ao dos autos, publicado na RTJ, 112/589, verbis:

“Mandado de Segurança nº 20.454 - RJTribunal PlenoRelator: o Sr. Ministro Djaci FalcãoImpetrante: Ordem dos Advogados do Brasil – Seção do Estado do Rio de Janeiro

– Autoridade Coatora: Presidente da República – Litisconsorte Passivo: Luiz Carlos de Brito

Mandado de segurança impetrado pela OAB, Seção do Estado do Rio de Janeiro. Legitimação ativa (artigo 1º, parágrafo único, da Lei nº 4.215, de 27.04.63).

O legislador constituinte, quando estabelece a participação de membros do Ministé-rio Público e de advogados no corpo dos Tribunais, visa, sem dúvida, obter importante contribuição,frutodaexperiênciaconquistadanoexercíciodasatribuiçõesespecíficasdessascategoriasprofissionais.Ter-se-á,então,asomadaexperiênciavividaemsitua-ções distintas – a de juiz de carreira, de membro do Ministério Público e de advogado militante,cadaumcomasuaformaçãoprofissional,emproldarealizaçãodaJustiça.Esseéosentidofinalísticodonossosistemaconstitucional(verartigos121,131,incisoII, 141, § 1º, letra a e § 5º, e 144, inciso IV).

Se o bacharel em direito, inscrito na OAB, esteve no efetivo exercício da advocacia e por circunstância eventual não se encontra militando na advocacia forense, em razão de incompatibilidade ou impedimento transitório, aí nada impede sua nomeação para vaga reservada a advogado. Em tal hipótese não se pode negar a experiência haurida no exercício efetivo da advocacia. Precedentes do Supremo Tribunal Federal.

In casu, o litisconsorte passivo nomeado juiz togado do TRT da 1ª Região achava-se inscrito na OAB, tendo praticado a advocacia por largos anos. A circunstância de se achar licenciado, em razão de incompatibilidade temporária para o seu exercício, não afasta o requisito da militância na advocacia. Denegação do writ.”

Realmente,aofixaroalcancedoart.94daCF,nãocabeaointérprete

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distinguir onde a lei não o faz (Carlos Maximiliano, in Hermenêutica e Aplicação do Direito, 6. ed., Freitas Bastos, 1957, p. 306, n. 300), notadamente quando se trata, como é o caso dos autos, de interpretação constitucional.

A respeito, pertinente o magistério sempre autorizado de Pontes de Miranda, verbis:

“Na interpretação das regras jurídicas gerais da Constituição, deve-se procurar, de antemão,saberqualointeressequeotextotemporfitoproteger.Éopontomaisrijo,mais sólido; é o conceito central, em que se há de apoiar a investigação exegética. Com isso não se proscreve a exploração lógica. Só se tem de adotar critério de interpretação restritiva quando haja, na própria regra jurídica ou noutra, outro interesse que passe à frente. Por isso, é erro dizer-se que as regras jurídicas constitucionais se interpretam sempre com restrição. De regra, o procedimento do intérprete obedece a outras sugestões, e é acertado que se formule do seguinte modo: se há mais de uma interpretação da mesma regrajurídicainsertanaConstituição,temdepreferir-seaquelaquelheinsufleamaisampla extensão jurídica; e o mesmo vale dizer-se quando há mais de uma interpretação de que sejam suscetíveis duas ou mais regras jurídicas consideradas em conjunto, ou de que seja suscetível proposição extraída, segundo os princípios, de duas ou mais regras. A restrição, portanto, é excepcional.” (In Comentários à Constituição de 1967 com Emenda nº 1 de 1969, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1987, t. I, p. 302, n. 14)

Outra não é a lição de um dos mais conceituados constitucionalistas norte-americanos, Henry Campbell Black, em obra clássica, verbis:

“Where the meaning shown on the face of the words is definite and intelligible, the courts are not at liberty to look for another meaning, even though it would seem more probable or natural, but they must assume that the constitution means just what it says.” (In Handbook of American Constitutional Law, 2. ed., St. Paul: West Publishing Co., 1897, p. 68)

Ademais, recorde-se a lição do saudoso Ministro Hannemann Gui-marães ao julgar o RE nº 9.189, verbis:

“Não se deve, entretanto, na interpretação da lei, observar estritamente a sua letra. A melhor interpretação, a melhor forma de interpretar a lei não é, sem dúvida, a gramatical. A lei deve ser interpretada pelo seu fim,pelasuafinalidade.Amelhorinterpretaçãodaleié,certamente,aquetememmiraofimdalei,éainterpretaçãoteleológica.”(InRevista Forense, v. 127/397).

Por esses motivos, nego provimento ao agravo.É o meu voto.

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AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2008.04.00.010520-9/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona

Agravante: João Luiz Oliveira PachecoAdvogados: Drs. Frederico Eduardo Sobbe e outro

Agravada: União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: Dr. José Diogo Cyrillo da Silva

Interessada: Metalúrgica Natalino Tomasi Ltda.Advogados: Drs. Antonio Machado e outro

EMENTA

Processo civil. Agravo de instrumento. Negativa de jurisdição. Ine-xistência. Agravo improvido.

Se a petição endereçada ao juízo do feito principal objetivava aclarar situação de fato e de direito já esclarecidas e resolvidas no processo, não há negativa de jurisdição pela instância originária ao indeferir tal pretensão, pois realmente o Judiciário não é órgão consultivo. Agravo de instrumento improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relató-rio,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopresente julgado.

Porto Alegre, 07 de abril de 2009.Desembargador Federal Otávio Roberto Pamplona, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona: Cuida-se de agravo de instrumento, interposto em causa própria por JOÃO LUIZ OLIVEIRA PACHECO, em face de decisão que não conheceu dos pe-didosformulados,pornãoteroJudiciáriofunçãoconsultiva(fl.53).

O agravante sustenta, em suas razões, que não fez consulta ao Ju-diciário, mas, sim, exerceu o seu “direito fundamental de garantia in-dividualpostonoart.5º,LIIIeLIV,daConstituiçãoFederal.Afinal,o

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erro, se existente, há de ser declarado pelo juízo recorrido – coisa que ojuízorecorridoaindanãofez”(fl.08).Prossegue,assinalandoqueo“pedido do Agravante, portanto, é para que o Juízo recorrido cumpra o seudeverdeofícioedigaseháounãoerromaterialnasentençadefl.272 (doc. 4). Se há o erro, que o declare e desconstitua a sentença que homologou o cálculo de liquidação; se não há erro, que declare isto”. Aduz, outrossim, que, em razão de um suposto erro material ainda não declarado, teve contra si instaurada ação penal, com condenação (ainda não transitada em julgado) e graves danos pessoais e morais, por, supos-tamente, ter levantado quantia indevida no processo. Requer, assim, o provimento do presente recurso para que se determine ao Juízo natural queenfrenteospleitosformulados(fls.51-52),decidindosehouveounão o alegado erro.

Intimada, aUnião apresentou resposta e juntoudocumentos (fls.60-128).

OJuízodeorigem,àfl.130,informaqueaparteagravantecumpriuo disposto no art. 526 do CPC.

Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal, em seu parecer (fls.133-6),opinapeloprovimentodorecurso.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona: Inicialmente, registro que o agravante apenas juntou partes do processo original, e não a sua íntegra, deixando, também, de referir alguns fatos relevantes para o deslinde da controvérsia e a compreensão do caso. No entanto, a parte agravada juntou outros documentos pertinentes ao caso, que bem retratam a situação posta em julgamento.

Dito isso, entendo que, para a correta compreensão da lide, impõe-se um breve escorço histórico do feito originário e das medidas tomadas con-tra o autor da ação e os seus procuradores, entre eles o ora agravante.

Em razão do pagamento do empréstimo compulsório incidente sobre a aquisição de veículo automotor (Ford/Escort 1987), o autor promoveu ação de repetição do indébito tributário, restando vitorioso. A ação foi proposta em novembro de 1987. Em janeiro de 1996, logrou levantar a quantia de R$ 2.517.869,93 (dois milhões, quinhentos e dezessete mil,

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oitocentos e sessenta e nove reais e noventa e três centavos), mediante dois alvarás judiciais, um referente ao valor dos honorários, na ordem de R$ 227.219,89 (duzentos e vinte e sete mil, duzentos e dezenove reais e oitenta e nove centavos), em favor do agravante, e o outro, com o valor relativo à diferença, em favor do autor da ação. O agravante, então procurador do autor, ao retirar os alvarás, que permitiram o levan-tamentodosvalores,pegouosautosemcargaecomelesficoupormaisde seis meses, só se obtendo a devolução após a expedição de mandado de busca e apreensão. Substabeleceu o mandato, sem reserva, a outros dois advogados que requereram a atualização da conta para a expedição de precatório complementar. Com vista dos autos, o Ministério Público Federaldetectouainviabilidadenãosódaatualizaçãodaconta,fixadana casa de R$ 989.867,02 (novecentos e oitenta e nove mil, oitocentos e sessenta e sete reais e dois centavos), mas também de que o que já fora pago extrapolara, em valores estratosféricos, aquilo que seria de direito. Constatou, inclusive, na sua manifestação, a existência de indícios do crimedeestelionato.Seguiram-seinvestigaçõesefoideflagradaaçãopenal contra o ora agravante e o autor da ação por estelionato consumado, contra os advogados substabelecidos pelo crime de estelionato tentado e contra o servidor desta Corte responsável pela atualização dos precató-rios, este último por peculato culposo. Houve condenação do agravante e do autor da ação pela prática do crime de estelionato consumado, tendo ocorrido a absolvição dos demais denunciados, inclusive do servidor desta Corte, acusado pelo crime de peculato culposo. As condenações e as absolvições restaram mantidas em acórdão desta Corte. O Recurso Especial interposto não foi admitido, e o agravo manejado contra essa inadmissão não foi conhecido. Já o Recurso Extraordinário não foi, ain-da, apreciado. Paralelamente, a União Federal busca, em procedimento próprio, o ressarcimento das quantias indevidamente levantadas.

Após essa sucessão de fatos processuais, com desdobramentos nas áreas penal e cível, o agravante volta ao juízo do processo em que se operou o levantamento do precatório e apresenta, em junho de 2006, a petiçãodefls.363/364,assinalandoepostulandooseguinte:

“(...) 6. Ocorre que até hoje referida SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA não foi alterada,permaneceíntegra,válidaeeficaz,nostermosemquefoiprolatada.

Dessa forma, não sabe o REQUERENTE se o Juízo Natural têm ou não entendi-

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mento de que dita SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA padece ou não de erro material, pois que nenhuma alteração foi promovida na mesma.

Ante o exposto, requer se digne Vª Exª.:– reconheceroerromaterialnaSENTENÇAHOMOLOGATÓRIAdefls.304,

corrigindo-a;– abster-se de praticar qualquer ato de correção na SENTENÇA HOMOLOGATÓ-

RIAdefls.304,acasoentendaqueamesmajáfezcoisajulgada;–dadecisão,determineaintimaçãodoREQUERENTE.”(fl.364)

Não há dúvida, diante do que se observa de tudo o que consta dos autos, mormente após a juntada dos documentos pela parte agravada, que o agravante está, em verdade, procurando revolver questão que, de todos, e principalmente dele, já é de conhecimento. Ele sabe, e muito bem, que a sentença não contém erro e que o erro decorre da não transformação da moeda em que elaborada a conta e expedido o precatório para os devidos padrões monetários, por ocasião da atualização do precatório, expedido no padrão monetário cruzeiro. A contadoria da Corte, ao promover a atu-alização, não observou que a conta homologada e o precatório estavam no padrão monetário cruzeiro (Cr$), e não em cruzeiros reais (CR$).

Com efeito, a conta, que restou homologada, elaborada em 05.08.1993, foi confeccionada no padrão monetário cruzeiro (Cr$), conforme consta dainformaçãoapostaacimadarubricaTOTAL(Cr$)(fl.11),emquepesejá em vigor o cruzeiro real (CR$), por força da Medida Provisória 336, de 28 de julho de 1993, convertida na Lei nº 8.697, de 27 de agosto de 1993. A sentença, ao homologar a referida conta, homologou-a nos termos em que lançada, portanto, em Cruzeiros (Cr$). Tanto que o precatório foi expedido, em março de 1994, em cruzeiros, e não em cruzeiros reais. Assim, ao se efetuar a atualização da conta, em 01 de julho de 1994, dever-se-ia não só observar o novo padrão monetário então vigente – o Real, por força da MP 482, de 1994, convertida na Lei n. 8.880, de 27 de maio de 1994 –, mas também promover a prévia conversão do cruzeiro para cruzeiro real. Desse modo, o erro não está na conta e na sentença, mas sim em ato posterior, devidamente esclarecido no processo.

De tudo tinha ciência o agravante, tanto que, por ocasião do pedido de expedição do precatório, o próprio autor da ação, representado pelo agravante,postulouaexpediçãodevaloresemcruzeirosreais(fl.20),fazendo ele mesmo a devida conversão.

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Nãohádúvida,eissoopróprioagravantereconheceeconfessaaofinaldas razões deste seu agravo, que a sua intenção é revolver fatos, para tentar, com base em elementos supostamente novos, reverter a condenação que lhe foi imposta, assim como se escudar da responsabilização civil decorrente da sua conduta, pois, segundo os seus dizeres, o erro, até agora, seria mera ficção,que,apesardeficção,rendeu-lheinjustacondenação(aindanãotransitada em julgado), entre outras ofensas. Os fatos, no entanto, estão bemretratadosenãoestãonomundodaficção.Olevantamentodaquantiaestratosférica ocorreu, e as razões para tanto estão, ao contrário do susten-tado pelo recorrente, devidamente esclarecidas nos autos principais, cuja cópia integral, propositadamente, não foi juntada aos autos deste agravo de instrumento, como já ressaltado no início desta fundamentação.

Portanto, a pretensão veiculada no primeiro grau de jurisdição tinha, em verdade, cunho eminentemente consultivo, pois tudo estava bem esclarecido nos autos.

Não houve, pois, negativa de jurisdição, de modo a autorizar o pro-vimento do agravo.

Em face do exposto, voto pelo improvimento do recurso.

CORREIÇÃO PARCIAL Nº 2008.04.00.032667-6/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

Requerente: União FederalAdvogado: Dr. Luis Antonio Alcoba de Freitas

Requerido: Juízo Federal da 3ª VF de Santa MariaInteressada: Maria Therezinha Schoferneker da Silva

Advogado: Defensoria Pública da UniãoInteressados: Estado do Rio Grande do Sul

Município de Santa Maria/RS

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EMENTA

Constitucional e Administrativo. Bloqueio de verba pública. Correição parcial. Transferência de recursos depositados pelo Fundo Nacional de Saúde em processo judicial a fim de dar efetividade à antecipação de tutela deferida em outra demanda judicial. Impossibilidade.

1. É manifesta a ilegalidade da decisão impugnada, em face do disposto no art. 100, caput e § 2º, da CF, bem como no art. 730 do CPC, já que os bens públicos são impenhoráveis e, consequentemente, insuscetíveis de apreensão, neles incluídos os bens das autarquias (in RT 568/107).

Nesse sentido, ainda, deliberou o Pretório Excelso que os bens do então INPS, hoje INSS, são impenhoráveis (RE nº 69.010-PE, rel. Min. Cunha Peixoto, in RTJ 87/866).

Ademais,pacificou-seajurisprudêncianosentidodequeinclusiveoscréditos alimentícios estão sujeitos ao precatório, em razão do disposto no art. 100 da CF (in Revista Forense, 311/122; 314/94).

Plenamente válido o ensinamento de Henry Campbell Black, em obra clássica, verbis:

“10. It is not permissible to disobey, or to construe into nothingness, a provision of the constitution merely because it may appear to work injustice, or to lead to harsh or obnoxious consequences or invidious and unmerited discriminations, and still less weight should be attached to the argument from mere convenience.” (In Handbook of American Consti-tutional Law, 2. ed., St. Paul, Minn.: West Publishing, 1897, p. 70)

É importante referir que, por ocasião do julgamento do Mandado de Segurança nº 319, julgado em 02 de outubro de 1936, sendo relator o saudoso Ministro Carlos Maximiliano, a Suprema Corte concedeu man-dado de segurança contra ato de Juiz Federal que determinara a penhora das rendas do Estado de Minas Gerais (in Revista Forense, 70/481).

Mais recentemente, quando do julgamento do Pedido de Avocação nº 12-MA, em que foi relator o eminente Ministro Sidney Sanches, deliberou o Supremo Tribunal Federal, verbis:

“Avocação de causa. Deferimento pelo STF, diante do perigo de gravelesãoàsfinançaspúblicas,emfacededecisãodeJuizdepri-meirograu,que,emprocessodedesapropriaçãoindireta,fixouprazode 30 dias para o depósito prévio de vultosa indenização, sob pena de

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bloqueio de valores. Suspensão dos efeitos de tal decisão para que o STF resolva essa

questão incidente (artigos 119, I, o, da CF, 252 e 258 do RISTF).” (in RTJ 125/1 – destacamos).

Na mesma esteira da corrente dominante, precedente deste Tribunal, verbis:

“Previdência Social. Execução de sentença. Sequestro de valores da Autarquia junto à rede bancária.

1. Precedentes da Corte no sentido da inadmissibilidade de sequestro de valores da autarquia previdenciária para satisfazer débitos judiciais, ante a ausência de permissivo legal para tanto.

2. O sequestro de rendas públicas (art. 731 do CPC-73) é medida cabível somente em caso de preterição na ordem de pagamento dos pre-catórios. Impossibilidade de aplicação analógica de tal preceito.

3.Decisãodenegatóriaconfirmada.”(AInº94.04.57990-4/SC,Turmade Férias, rel. Juíza Virgínia Scheibe, publicada na RTRF 4ª/21/323)

Realmente, não tem cabimento o bloqueio de renda pública deter-minado pela autoridade judicial porque se trata de medida frontalmente contrária ao art. 100, § 2º, da CF de 1988, já que o sequestro de renda aí permitido somente tem lugar na hipótese de o credor ser preterido no seu direito de precedência e, ainda, por ordem do Presidente do Tribunal competente.

Esta, de resto, a lição de Pontes de Miranda, verbis:“Só o presidente que proferiu a decisão exequenda é constitucional-

mente autorizado a expedir ordens de pagamento, dentro das forças do depósito, e responsável pela execução dessa parte, importantíssima, do art. 117 e do § 2º. Nenhuma atribuição de ordenar pagamento possuem, em se tratando de sentenças judiciárias, o Presidente da República, os Ministros de Estado, o Tribunal de Contas, ou qualquer autoridade ad-ministrativa. O § 2º previu a preterição da procedência, autorizando o presidente que proferiu a sentença exequenda a medida inédita no direito constitucional: o sequestro da quantia no cofre dos depósitos públicos.” (In Comentários à Constituição de 1967 c. a Emenda nº 1/69, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1987, t. III, p. 647, n. 3 – destacamos).

Por conseguinte, a única modalidade de sequestro de renda pública admitida pela Constituição da República é aquela prevista no art. 100,

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§ 2º, que não é o caso dos autos, e cuja autoridade para determiná-la é o Presidente da Corte competente.

2. Precedentes do STF e do STJ.3. Procedência da correição parcial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, julgar procedente a correição parcial, nos termos do relatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedo presente julgado.

Porto Alegre, 11 de novembro de 2008.Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz: O parecerdoMPF,afls.94/6,expõecomprecisãoacontrovérsia,verbis:

“Cuida-se de Correição Parcial ajuizada pela União Federal em face de decisão que determinou a transferência de valores oriundos de depósito voluntário pelo Fundo Nacional de Saúde para outro processo, o de n° 2008.71.02.002749-0, visando dar cum-primento à antecipação de tutela deferida para garantir a aquisição dos medicamentos necessários ao tratamento de Linfoma.

Maria Therezinha Schoferneker da Silva ajuizou ação ordinária com pedido de ante-cipação de tutela visando ao fornecimento de medicamentos. Houve decisão deferindo a antecipação da tutela para garantir 4 caixas do medicamento Bab-thera 500mg e 4 caixas do medicamento Mab-thera 100mg. Fixou-se prazo de 30 dias para a entrega da medicação ou depósito do valor correspondente de R$ 35.847,24.

Foi interposto agravo de instrumento visando à suspensão da decisão. No agravo foi deferido efeito suspensivo pelo MM. Des. Federal Relator para obstar qualquer bloqueio de verba pública.

Entretanto, nos autos do proc. 2007.71.02.007952-6, houve o deferimento de antecipação de tutela para o fornecimento da mesma medicação. Nesses autos foi determinado fornecimento do fármaco ou o valor necessário à sua aquisição (R$ 26.087,70). A decisão restou cumprida, porém, paralelamente, o Fundo Nacional de Saúde promoveu depósito voluntário de R$ 26.087,70 em cumprimento à antecipação dos efeitos da tutela.

Em nova decisão, a MM. Juíza a quo determinou a transferência de parte do valordepositadopeloFNSparaoprocessooraemanálisecomofimdeatenderà

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tutela antecipada. Contra tal fato é que se insurge a União Federal por meio da presente correição

parcial. O fundamento da irresignação diz respeito à suposta ofensa à decisão proferida nos autos de agravo de instrumento, o qual reconheceu a impossibilidade de bloqueio de verbas públicas. Sustenta a requerente que se trata de uma forma transversa de burlar a decisão judicial proferida em sede de agravo de instrumento.

Houveodeferimentodemedidaliminarnapresentecorreiçãoparcialparaofimde suspender a transferência de verbas do processo n° 2007.71.02.007952-6 para o processo n° 2008.71.02.0030318-4, com a consequente restituição do montante de R$ 17.049,15 ao Fundo Nacional de Saúde.

É o breve relato.”

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz: Afiguram-se-meirrefutáveisasconsideraçõesdesenvolvidasnoparecerdocultoagentedoMPF,Dr.JoãoHeliofardeJesusVillar,afls.96-7,verbis:

“2. Discute-se na presente correição parcial o limite do magistrado no que se refere à aplicaçãodoprincípiodaeconomiaprocessualeàpráticadeatoscomofimdegarantira mais célere prestação jurisdicional.

De um lado está a magistrada com nítido interesse em fornecer o mais brevemente possível a medicação imprescindível para o tratamento da autora. Para tanto, entendeu por bem transferir valores depositados voluntariamente pelo Fundo Nacional de Saúde em outro feito, visando garantir o fornecimento de medicação igual à solicitada pela autora.

Entretanto, sob a ótica da União Federal, tal procedimento fere decisão proferida pelo E. TRF/4, a qual vedou qualquer bloqueio de valores da Fazenda Pública.

Emborarefiraamagistradanãosetratardeofensaàdecisãojudicial,entendoqueseconfigurasimdescumprimentodomandamentoquedeterminaseremosbenspúblicosinsuscetíveis de apreensão ou penhora. Não parece razoável que a magistrada saque valores vinculados a um determinado processo para satisfazer obrigação pleiteada em outro feito, especialmente se não existe qualquer relação de identidade de partes ou de causa de pedir nesses feitos.

É verdade que os valores já estavam disponíveis e até mesmo poderiam vir a ser devolvidos aos cofres da União. Entretanto, a decisão acerca da conveniência do re-passe cabe à União Federal, pois ela é a titular daquela importância. Tais valores não estavamàdisposiçãodojuízoparaquefossemadministradospelamagistradaafimdedar efetividade ao provimento jurisdicional de fornecimento de medicação em processo

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que não possui qualquer relação com aquele ao qual o depósito está vinculado. Dessa forma, não há que se admitir a transferência de valores de um processo para

outro sem que haja a oitiva da parte interessada, no caso a União Federal. 3. Conclusão Diante do exposto, opina o Ministério Público Federal pelo provimento da presente

correição parcial.”

Correto o parecer.É manifesta a ilegalidade da decisão impugnada, em face do disposto

no art. 100, caput e § 2º, da CF, bem como no art. 730 do CPC, já que os bens públicos são impenhoráveis e, consequentemente, insuscetíveis de apreensão, neles incluídos os bens das autarquias (in RT 568/107).

Nesse sentido, ainda, deliberou o Pretório Excelso que os bens do então INPS, hoje INSS, são impenhoráveis (RE nº 69.010-PE, rel. Min. Cunha Peixoto, in RTJ 87/866).

Ademais,pacificou-seajurisprudêncianosentidodequeinclusiveoscréditos alimentícios estão sujeitos ao precatório, em razão do disposto no art. 100 da CF (in Revista Forense, 311/122; 314/94).

Plenamente válido o ensinamento de Henry Campbell Black, em obra clássica, verbis:

“10. It is not permissible to disobey, or to construe into nothingness, a provision of the constitution merely because it may appear to work injustice, or to lead to harsh or obnoxious consequences or invidious and unmerited discriminations, and still less weight should be attached to the argument from mere convenience.” (In Handbook of American Constitutional Law, 2. ed., St. Paul, Minn.: West Publishing, 1897, p. 70)

É importante referir que, por ocasião do julgamento do Mandado de Segurança nº 319, julgado em 02 de outubro de 1936, sendo relator o saudoso Ministro Carlos Maximiliano, a Suprema Corte concedeu man-dado de segurança contra ato de Juiz Federal que determinara a penhora das rendas do Estado de Minas Gerais (in Revista Forense, 70/481).

Mais recentemente, quando do julgamento do Pedido de Avocação nº 12-MA, em que foi relator o eminente Ministro Sidney Sanches, deliberou o Supremo Tribunal Federal, verbis:

“Avocação de causa. Deferimento pelo STF, diante do perigo de grave lesão às finançaspúblicas,emfacededecisãodeJuizdeprimeirograu,que,emprocessodedesapropriaçãoindireta,fixouprazode30diasparaodepósitopréviodevultosain-denização, sob pena de bloqueio de valores.

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Suspensão dos efeitos de tal decisão para que o STF resolva essa questão incidente (artigos 119, I, o, da CF, 252 e 258 do RISTF).” (in RTJ 125/1 – destacamos)

Na mesma esteira da corrente dominante, precedente deste Tribunal, verbis:

“Previdência Social. Execução de sentença. Sequestro de valores da Autarquia junto à rede bancária.

1. Precedentes da Corte no sentido da inadmissibilidade de sequestro de valores da autarquia previdenciária para satisfazer débitos judiciais, ante a ausência de permissivo legal para tanto.

2. O sequestro de rendas públicas (art. 731 do CPC-73) é medida cabível somente em caso de preterição na ordem de pagamento dos precatórios. Impossibilidade de aplicação analógica de tal preceito.

3.Decisãodenegatóriaconfirmada.”(AInº94.04.57990-4/SC,TurmadeFérias,rel. Juíza Virgínia Scheibe, publicada na RTRF 4ª/21/323)

Realmente, não tem cabimento o bloqueio de renda pública deter-minado pela autoridade judicial porque se trata de medida frontalmente contrária ao art. 100, § 2º, da CF de 1988, já que o sequestro de renda aí permitido somente tem lugar na hipótese de o credor ser preterido no seu direito de precedência e, ainda, por ordem do Presidente do Tribunal competente.

Esta, de resto, a lição de Pontes de Miranda, verbis:“Só o presidente que proferiu a decisão exequenda é constitucionalmente autorizado

a expedir ordens de pagamento, dentro das forças do depósito, e responsável pela execu-ção dessa parte, importantíssima, do art. 117 e do § 2º. Nenhuma atribuição de ordenar pagamento possuem, em se tratando de sentenças judiciárias, o Presidente da República, os Ministros de Estado, o Tribunal de Contas, ou qualquer autoridade administrativa. O § 2º previu a preterição da procedência, autorizando o presidente que proferiu a sentença exequenda a medida inédita no direito constitucional: o sequestro da quantia no cofre dos depósitos públicos.” (In Comentários à Constituição de 1967 c. a Emenda nº 1/69, 3. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1987, t. III, p. 647, n. 3 – destacamos)

Por conseguinte, a única modalidade de sequestro de renda pública admitida pela Constituição da República é aquela prevista no art. 100, § 2º, que não é o caso dos autos, e cuja autoridade para determiná-la é o Presidente da Corte competente.

Nesse sentido, ainda, precedentes do STF e STJ, verbis:“Ademais, não bastasse estar sujeito a esse quadro de múltiplas obrigações legais

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e constitucionais perante outras entidades federativas e perante a própria sociedade itapevense, constata-se que, em razão da ordem judicial de sequestro, o Município de Itapeva encontra-se em estado de calamidade pública. Diante de tais circunstâncias, cumpre indagar se a medida extrema do sequestro atende, no caso, aos requisitos do princípioconstitucionaldaproporcionalidade.Se,porumlado,pode-seafirmarqueamedidadosequestroéadequada(atendeaosfinspretendidos),poroutro,emexamepreliminar,afigura-seduvidosoqueaquelamedidatenhasidonecessária(sobopressu-postodequenãohaviaoutromeiomenosgravosoeigualmenteeficaz)eproporcionalem sentido estrito (existência de proporção entre o objetivo perseguido e o ônus imposto ao atingido, que, no caso, não é apenas o Município, mas também a própria sociedade itapevense). Nesse ponto, cabe registrar a Lição de Pieroth e Schlink, no sentido de que a prova da necessidade tem maior relevância do que o teste da adequação. Positivo o teste da necessidade, não há de ser negativo o teste da adequação. Por outro lado, se o teste quanto à necessidade revelar-se negativo, o resultado positivo do teste de adequação nãomaispoderáafetaroresultadodefinitivooufinal(cf.HermenêuticaConstitucionale Direitos Fundamentais, Gilmar Mendes, Inocêncio M. Coelho e Paulo G. Branco, Brasília,IDP/BrasíliaJurídica,2002,p.250).Porfim,consideradasaspeculiaridadesdocaso em exame, e observada a presente fase processual, diante dos princípios constitu-cionaisquesupostamenteencontram-seemconflito,afigura-serecomendávelaadoçãodaquiloqueadoutrinadefinecomouma‘relaçãodeprecedênciacondicionada’entreos princípios concorrentes. Nesse sentido, ensina Inocêncio Mártires Coelho:

‘Por isso é que, diante das antinomias de princípios, quando em tese mais de uma pauta lhe parecer aplicável à mesma situação de fato, ao invés de se sentir obrigado a escolher este ou aquele princípio, com exclusão de outros que, prima facie, repute igualmente utilizáveis como norma de decisão, o intérprete fará uma ponderação entre os standards concorrentes (obviamente se todos forem princípios válidos, pois só assim podementraremrotadecolisão),optando,afinal,poraqueleque,nascircunstâncias,lhe pareça mais adequado em termos de otimização de justiça. Em outras palavras de Alexy,resolve-seesseconflitoestabelecendo,entreosprincípiosconcorrentes,umarelação de precedência condicionada, na qual se diz, sempre diante das peculiaridades do caso, em que condições um princípio prevalece sobre o outro, sendo certo que, nou-tras circunstâncias, a questão da precedência poderá resolver-se de maneira inversa.’ (COELHO, Inocêncio Mártires. Racionalidade Hermenêutica: Acertos e Equívocos. In: MARTINS, Ives Gandra S. (coord.). As Vertentes do Direito Constitucional Con-temporâneo: Estudos em Homenagem a Manoel Gonçalves Ferreira Filho. São Paulo: América Jurídica, 2002. p. 363)

Estão claros, no caso, os princípios constitucionais em situação de confronto. De um lado, a posição subjetiva de um particular calcada no direito de precedência contido no art. 100, § 2°, da Constituição. De outro, a posição do Município e dos munícipes de Itapeva, no sentido de não ser prejudicada a continuidade da prestação de serviços públicos elementares como educação e saúde. Assim, sem prejuízo de melhor exame

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quando do julgamento do mérito, considerando-se: (1) que a previsão constitucional desequestrodeveserinterpretadarestritivamente,nostermosdoprecedentefirmadona ADI 1.662; (2) que há controvérsia quanto à ocorrência ou não de preterição; (3) que o Município agiu tendo em vista o enquadramento em disciplina de Lei federal relativa a parcelamento de débitos; (4) que o referido enquadramento teve em mira o cumprimento de uma série de obrigações, inclusive de matriz constitucional, perante outras unidades da federação (União e Estados) e perante a própria sociedade de Itapeva; (5) o comprometimento da execução do orçamento municipal; (6) os múltiplos bens jurídicosemconflito,comênfasenopapeldoMunicípionooferecimentodeserviçospúblicos essenciais; (7) e, ainda, o fato de que a execução da medida impugnada já representapatentesituaçãodecolapsofinanceirodeItapeva,cominevitáveis,eemalguma medida irreparáveis, consequências para a prestação de serviços públicos; (8) a possível ausência de proporcionalidade da ordem de sequestro; CONCEDO A CAUTELAR para determinar a suspensão do sequestro e a imediata devolução aos cofrespúblicosmunicipaisdosvaloresdeleobjeto,atédecisãofinalsobreamatéria.Comunique-se mediante ‘telex’ e ofício. Requisitem-se informações. Brasília, 12 de agosto de 2002.” (Ministro Gilmar Mendes, Relator – decisão publicada no DJU de 19.08.2002. RCL 2126 – Informativo 288 do Supremo Tribunal Federal)

“EMENTA: RECLAMAÇÃO. GOVERNADOR DO ESTADO: LEGITIMIDA-DE. PRECATÓRIO. NÃO INCLUSÃO DO DÉBITO NO ORÇAMENTO DO ENTE PÚBLICO DEVEDOR. SEQUESTRO: IMPOSSIBILIDADE. 1. Reclamação. Legi-timidade ativa do Governador do Estado para defender interesses de órgãos estatais da Administração pública direta e indireta. 2. Não inclusão do débito judicial no orçamento do ente devedor. Hipótese que não se equipara à preterição de ordem, sendo ilegítima a determinação de sequestro em tais casos. A presunção de existência de recursos financeirosnão elide a ausênciadeprevisãoorçamentária, não consistindomotivosuficienteparaadecretaçãodebloqueiodeverbaspúblicas.Reclamaçãoprocedente.”(RECLAMAÇÃO; Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA; Julgamento: Tribunal Pleno; RECLTE.: GOVERNADOR DO ESTADO DO PARÁ; RECLDO.: TRIBU-NAL REGIONAL DO TRABALHO DA 8ª REGIÃO; INTDO.: ITAJAÍ OLIVEIRA DE ALBUQUERQUE; ADVDOS.: SILVIA MARINA RIBEIRO DE MIRANDA MOURÃO E OUTROS)

“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. DE-TERMINAÇÃO DE SEQUESTRO DA CONTA DO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DO ESTADO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO, NOS TERMOS PREVISTOS NOS AR-TIGOS 730 E 731 DO CPC. PAGAMENTOS DEVIDOS PELA FAZENDA PÚBLI-CA, DECORRENTES DE SENTENÇA JUDICIAL. ORDEM CRONOLÓGICA DE APRESENTAÇÃO DOS PRECATÓRIOS. SEQUESTRO SOMENTE AUTORIZADO QUANDO HÁ PRETERIMENTO DO DIREITO DE PRECEDÊNCIA.

I – (...) II – Os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, decorrentes

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de sentença judiciária, deverão ser feitos na ordem cronológica de apresentação dos preca-tórios. O sequestro de quantia necessária para satisfazer o débito somente será determinado pelo presidente do Tribunal se houver preterimento do direito de precedência.

III – Não tendo sido desrespeitada a ordem cronológica voluntariamente pelo Es-tado, e se já foram incluídos no orçamento valores correspondentes ao débito objeto daexecução,nãosejustificaamedidaextremaerigorosadosequestro,sóadmissívelem casos excepcionais.

IV– Recurso provido.” (REsp. n° 275893/PI – Primeira Turma STJ – Rel. Min. Garcia Vieira, julgado em 13.03.2001)

“PROCESSO CIVIL. SEQUESTRO DE RENDAS PÚBLICAS. INVIABILIDADE. O SEQUESTRO DE RENDAS PÚBLICAS NÃO É AUTORIZADO PELO NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.” (Data da Decisão: 07.10.1996. Órgão Julgador: T2 – SEGUNDA TURMA. Decisão Acórdão ROMS 7234/RJ; RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 1996/0034622-4. Fonte: DJ DATA: 29.10.1996 p. 41624. LEXSTJ VOL.: 00091 p. 00106. Relator: Min. ARI PARGENDLER)

Por esses motivos, voto por julgar procedente a correição parcial.É o meu voto.

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2009.04.00.015301-4/RS

Relatora: A Exma. Sra. Juíza Federal Vânia Hack de AlmeidaRelator p/ acórdão: O Exmo. Sr. Juiz Federal Artur César de Souza

Agravante: Santa Casa de Caridade de JaguarãoAdvogados: Drs. Antonio Carlos Wexel Becker e outro

Agravada: União Federal (Fazenda Nacional)Procurador: Procuradoria Regional da Fazenda Nacional

EMENTA

Tributário. Agravo de instrumento. Execução fiscal. Penhora sobre o faturamento. Hospital. Possibilidade.

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Viável a constrição de percentual sobre o faturamento do hospital como medida hábil a assegurar o manejo da prestação dos serviços de saúde à população local e, concomitantemente, satisfazer a pretensão da União em ter satisfeito o crédito tributário.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, dar parcial provimento ao agravo, nos termos do relatório, votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopre-sente julgado.

Porto Alegre/RS, 14 de julho de 2009.Juiz Federal Artur César de Souza, Relator para o acórdão.

RELATÓRIO

A Exma. Sra. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida: Trata-se de agra-vo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto contra decisão proferida em exceção de pré-executividade que determinou o prosseguimento da execução com hasta pública do imóvel que é sede do Hospital da Santa Casa de Caridade de Jaguarão.

Sustenta a agravante não ser válida penhora de prédio que abriga a Santa Casa, seja porque a matrícula do imóvel contém cláusulas restriti-vas de inalienabilidade, seja em função do disposto nos artigos 649, V e IX, do CPC. Informa a parte agravante que a Santa Casa de Caridade de Jaguarão é o único hospital com Pronto Socorro da região, suportando toda a demanda do município, além da dos municípios vizinhos. Diz que mantém o atendimento com recursos provenientes do SUS, sendo que aproximadamente 84% do total de serviços prestados são destinados ao Sistema Único de Saúde. Defende que, se os instrumentos e equipa-mentos hospitalares, bem como os recursos aplicados na manutenção da saúde, estão a salvo da constrição judicial, nada mais razoável que essa proteção se estenda à estrutura física que abriga a instituição, pois, do contrário, não há razão de ser na proteção conferida pela lei. Requer efeito suspensivopara que, até o julgamentodefinitivodo agravo, oprédionãoseja levadoàhastapública.Aofinal, requerareformadadecisão agravada no tocante à validade da penhora que abriga o Hospital

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e Pronto Socorro da Santa Casa de Caridade de Jaguarão, liberando a constrição do referido imóvel.

Foi deferido o pedido de efeito suspensivo.Apresentou a União (Fazenda Nacional) contrarrazões ao agravo.É o relatório.

VOTO

A Exma. Sra. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida: Sustenta a agravante não ser válida penhora de prédio que abriga a Santa Casa, seja porque a matrícula do imóvel contém cláusulas restritivas de inalienabi-lidade, seja em função do disposto nos artigos 649, V e IX, do CPC.

Quanto à existência de cláusula de impenhorabilidade inscrita no registro imobiliário, prevalece o disposto no artigo 184 do CTN, que dispõe:

“Art. 184. Sem prejuízo dos privilégios especiais sobre determinados bens, que sejam previstos em lei, responde pelo pagamento do crédito tributário a totalidade dos bens e das rendas, de qualquer origem ou natureza, do sujeito passivo, seu espólio ou sua massa falida, inclusive os gravados por ônus real ou cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade, seja qual for a data da constituição do ônus ou da cláusula, exce-tuados unicamente os bens e rendas que a lei declare absolutamente impenhoráveis.”

Assim, possível a penhora do imóvel, ainda que gravado com cláusula de impenhorabilidade.

Quanto ao argumento de que a penhora de prédio que abriga a Santa Casa não é válida em função do disposto nos artigos 649, V e IX, do CPC, também improcede.

Dispõe o art. 649 do CPC:“Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:(...)V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros

bensmóveisnecessáriosouúteisaoexercíciodequalquerprofissão;(...)IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação com-

pulsória em educação, saúde ou assistência social;”

Em princípio, a regra do artigo 649, V, do CPC aplica-se somente em relação às pessoas físicas. Considerando a jurisprudência, em relação às pessoas jurídicas, há a incidência do dispositivo retromencionado apenas

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na hipótese de bens imprescindíveis à sobrevivência da própria empresa. Precedentes do STJ (REsp nº 686581/RS, Rel. Ministro Franciulli Netto, DJU 14.12.2004; AG no REsp nº 652489/RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, DJU 22.11.2004).

Imprescindíveis para o funcionamento da embargante (hospital) são osequipamentoshospitalares,poisvinculadosàatividade-fimdames-ma, o que ensejaria a desconstituição da penhora. No entanto, estando constrito imóvel sede da executada, bem de natureza diversa daqueles referidos no inciso V do CPC, não vejo óbice à manutenção da penhora sobre o mesmo.

Nesse sentido já posicionou-se a jurisprudência:“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PENHORABILIDADE DE IMÓVEL

SEDE DE HOSPITAL. REAVALIAÇÃO DO BEM.- A jurisprudência vem admitindo a aplicabilidade da regra do artigo 649, VI, do

CPC, que trata da impenhorabilidade, aos bens imprescindíveis à sobrevivência da empresa.

- Tem-se considerado como imprescindíveis, no caso de hospitais, os equipamentos hospitalaresvinculadosàatividade-fimdaempresa.Contudo,oimóvel,sededohos-pital, não se enquadra nas hipóteses constantes no inciso VI do CPC, razão pela qual a penhora deve ser mantida.

- Em que pese se reconheça a necessidade de ser promovida a execução do modo menos oneroso para o devedor (artigo 620 do CPC), há de ser observado, da mesma forma,oprincípiodadisponibilidadedoprocessodeexecução,segundooqualafina-lidade do feito executivo é a satisfação do crédito exequendo.

-Areavaliaçãodobem,comofimdedemonstrarexcessodeexecução,deveserfeita no processo de execução.” (AC Nº 200371060031547, TRF 4ª REGIÃO, Fonte DJ 03.05.2006 Relator VILSON DARÓS)

“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. PENHORA DE PLANTA HOSPITALAR. ENTIDADE FILANTRÓPICA PRESTADORA DE SERVIÇO DE SAÚDE. ARTIGO 649, VI, DO CPC.

1. Em princípio, a regra do artigo 649, VI, do CPC aplica-se somente em relação às pessoas físicas, considerando a jurisprudência, em relação às pessoas jurídicas, a incidência do dispositivo mencionado apenas na hipótese de bens imprescindíveis à sobrevivência da própria empresa. Imprescindíveis para o funcionamento da embar-gante(hospital)sãoosequipamentoshospitalares,poisvinculadosàatividade-fimdamesma, o que ensejaria a desconstituição da penhora. No entanto, estando constrito imóvel sede da embargante, bem de natureza diversa daqueles referidos no inciso VI do CPC, é de ser mantida a penhora sobre o mesmo.

2. Embora se reconheça a necessidade de ser promovida a execução do modo menos

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oneroso para o devedor (artigo 620 do CPC), há de ser observado, da mesma forma, o princípiodadisponibilidadedoprocessodeexecução,segundooqualafinalidadedofeito executivo é a satisfação do crédito exequendo.

3. Apelação improvida.” (AC nº 200371060031535, TRF 4ª Região, DJ 19.10.2005, Relator ÁLVARO EDUARDO JUNQUEIRA)

Alega o agravante que os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social são impenhoráveis. Todavia, no presente caso, o que foi penhorado é o imóvel sede do hospital, e não os recursos públicos recebidos, motivo pelo qual improcede tal colocação.

Informa a parte agravante que a Santa Casa de Caridade de Jagua-rão é o único hospital com Pronto Socorro da região, suportando toda a demanda do município, além da dos municípios vizinhos. Diz que mantém o atendimento com recursos provenientes do SUS, sendo que aproximadamente 84% do total de serviços prestados são destinados ao Sistema Único de Saúde. Defende que não pode ser realizada a alienação judicial do imóvel penhorado.

Contudo, a constrição somente recaiu sobre o imóvel que comporta a sede da executada, porque ela mesma ofertou à penhora, conforme cópiasdosdocumentosdefls.16a22desteagravo.Obemfoiofertadopela executada e aceito pela exequente. Estando garantida a execução, foraminterpostosembargosàexecução,que,porém,findaramrejeitadospor intempestivos. Logo, prosseguiu-se a execução.

Não pode a executada, três anos após a penhora, invocar a impenho-rabilidade de bem que ela mesma ofertou.

Saliente-se que, embora se reconheça a necessidade de ser promovida a execução do modo menos oneroso para o devedor (artigo 620 do CPC), há de ser observado, da mesma forma, o princípio da disponibilidade do processodeexecução,segundooqualafinalidadedofeitoexecutivoéa satisfação do crédito exequendo.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo de instrumento.

VOTO DIVERGENTE

O Exmo. Sr. Juiz Federal Artur César de Souza: Dois pontos do re-latório chamaram-me a atenção para, com a devida vênia da Eminente

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Relatora, apresentar voto divergente.O primeiro ponto diz que a Santa Casa de Caridade de Jaguarão seria o

único hospital com Pronto Socorro da região, suportando toda a demanda do município, além da dos municípios vizinhos.

Osegundopontoafirmaque84%dototaldosserviçosprestadospelohospital são destinados ao Sistema Único de Saúde - SUS.

Parto da pressuposição de que esses dois pontos são verdadeiros, uma vez que não há no relatório qualquer indicação de insurgência por parte da União Federal, exequente.

Evidentemente que essas duas circunstâncias devem ser levadas em consideração para o efeito de autorizar a penhora sobre o prédio em que está instalado o hospital, pois, se por um lado há a regra jurídica tributária do artigo 184 do CTN que permite a penhora de imóvel, ainda que gravado com cláusula de impenhorabilidade, há, por outro lado, o princípio constitucional previsto no artigo 196 da Constituição Federal que estabelece: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

Assim, está-se diante de uma regra jurídica tributária e processual que determina a penhora de bem imóvel para satisfação do crédito tributário e de um princípio constitucional que garante a todos o direito à saúde.

Preliminarmente, e como parte introdutória deste campo de análise, seria oportuno traçar um marco divisório entre princípio e regra.

Abandona-se, a priori, a teoria metodológica tradicional que coloca em campos opostos normas e princípios.

Como ponto de partida, sugere-se que regras e princípios são duas espécies de normas.

Contudo, a distinção entre regras e princípios não é uma tarefa fácil.

José J. G. Canotilho, sobre o tema, apresenta a seguinte sugestão como critério diferenciador:

“a) Grau de abstracção: os princípios são normas com um grau de abstracção rela-tivamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abstracção relativamente reduzida.

b) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto; os princípios, por

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serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras (do legislador, do juiz), enquanto as regras são susceptíveis de aplicação directa.

c) Caráter de fundamentalidade no sistema das fontes de direito: os princípios são normas de natureza estruturante ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes (ex.: princípios constitucionais) ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico (ex.: princípio do Estado de Direito).

d) ‘Proximidade’ da ideia de direito: os princípios são standards juridicamente vincu-lantes radicados nas exigências de ‘justiça’ (Dworkin) ou na ‘ideia de direito’ (Larenz); as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo meramente funcional.

e) Natureza normogenética: os princípios são fundamento de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.” (CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7. ed. Coimbra: Almedida, 2003. p. 1160-1161)

Segundo Ronald Dworkin, a diferença entre princípios e regras jurídi-cas é de natureza lógica, ou seja, os dois conjuntos de padrões apontam para decisões particulares acerca da obrigação jurídica em circunstâncias específicas,contudo,distinguem-sequantoànaturezadeorientaçãoqueoferecem. As regras aplicam-se à maneira de tudo ou nada. Uma vez realizados os fatos que uma regra estipula, então ou a regra é válida, e nessa hipótese o resultado que ela fornece deve ser aceito, ou não é vá-lida, e nessa hipótese nada se contribui para a decisão. Já os princípios são aplicados segundo uma dimensão que as regras não têm, ou seja, a dimensão do peso ou importância (DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 39).

Aconvivênciadosprincípioséconflitual,aconvivênciaderegrasé antinômica: os princípios, ao constituírem exigência de otimização, permitem o balanceamento de valores e interesses, sendo que as regras não deixam espaço para qualquer outra solução, uma vez que, se uma regra tem validade, deve ser observada exatamente nos seus termos, nem mais nem menos. Os princípios suscitam problemas de validade e peso (importância, ponderação, valia), já as regras estabelecem apenas questãodevalidade(seelasnãosãocorretasdevemsermodificadas).(ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997. p. 88-89)

Segundo Robert Alexy, o ponto decisivo para a distinção entre regras

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e princípios é que os princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades jurídicas e reais existentes. Assim, os princípios são “mandados de otimização”, ou seja, podem ser cumpridos de diferentes graus, e a medida de seu cumprimento depende das condições reais e jurídicas. Ao contrário, as regras são normas que somente podem ser cumpridas ou não. Se uma regra é válida, deve-se fazer exatamente o que ela determina, nem mais nemmenos.Issosignificaqueadiferençaentreambosnãoédegrau,mas qualitativa (ALEXY, Robert, idem, ibidem, p. 87).

Os princípios, portanto, constituem critérios objetivos de interpre-tação e aplicação do Direito que impõem ao julgador o dever de sua observância, evitando, dessa maneira, que ele lance mão de eventuais concepções meramente subjetivas (FARIAS, Edilsom Pereira. Colisão de direito: a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. Porto Alegre: Sergio Antonio Fa-bris, 1996. p. 26).

Evidentemente que a forma de padrão nem sempre deixa claro se se trata de uma regra ou de um princípio. Para se ter uma ideia, a primeira emenda à Constituição dos Estados Unidos apresenta uma disposição em que o Congresso não pode cercear a liberdade de expressão. A dúvida é pertinente: será essa uma regra que impede que o Congresso edite uma leicerceandoaliberdadedeexpressão,sobpenadeserconfiguradacomoinconstitucional? Para aqueles que entendem que essa forma de padrão é “absoluta”, sustenta-se que se está diante de uma regra. Contudo, se ela meramente enuncia um princípio, de maneira que, se um cerceamento de liberdade de expressão for descoberto será inconstitucional, a não ser que seu contexto revele a existência de uma outra política ou princípio queapresenteforçasuficienteparaautorizaroaludidocerceamento,seráconsiderada um princípio (DWORKIN, R., op. cit., p. 44).

Seja como for, apenas as regras ditam resultados. Quando se obtém um resultado contrário, a regra é abandonada ou mudada. Os princípios atuam de outra maneira; eles conduzem a decisão em uma direção, em que pese de maneira não conclusiva. Além do mais, sobrevivem intactos quando não prevalecem.

Emfacedocasoconcreto,poder-se-iaafirmarqueseestádiantedeumconflitoentreumaregratributáriaprocessual(penhoradebemimóvel

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para satisfação de um crédito tributário) e um princípio constitucional (direito fundamental à saúde de todos).

Contudo, a própria regra prevista no artigo 184 do CTN, bem como as previstas no âmbito da hasta pública do Código Processual Civil de 1973, são, na verdade, regras de condensação de um outro importante princípio Constitucional, ou seja, princípio da efetividade da tutela ju-risdicional em favor do credor.

Assim, na verdade, está-se diante de um conflito entre dois princípios constitucionais; de um lado, o princípio que garante a efetividade da tute-la jurisdicional, do outro, o princípio que garante a saúde para todos.

Diantedesseconflito, torna-se legítimaaaplicaçãodamáxima da razoabilidade ou da proporcionalidade para a solução dessa questão conflitual.

Com a penhora e a alienação do imóvel em que se encontra o Hospi-tal Santa Casa de Caridade de Jaguarão, evidentemente que o princípio previsto no artigo 196 da Constituição Federal deixará de ter inteira aplicação, pois, não obstante os equipamentos hospitalares permaneçam além da penhora, a falta do prédio tornará imprestável a existência dos equipamentosaludidosparaosfinsaquesepropõeohospital.

Na verdade, se em prédio próprio (sem pagamento de aluguel ou outro encargo) o Hospital não consegue honrar seus compromissos tributários, édetodaevidênciaquenãoconseguiráprosseguircomsuafinalidadebásica que é a prestação de atendimento à saúde da população do Mu-nicípio de Jaguarão e da redondeza, quando lhe for exigido que alugue outroprédio(seéqueexiste)paraoprosseguimentodesuafinalidadeessencial.

Por outro lado, não permitindo a alienação em hasta pública do prédio penhorado, também haverá mácula ao artigo 184 do CTN, assim como ao princípio da efetiva tutela jurisdicional a ser prestada ao credor.

Portanto, penso que compete ao Poder Judiciário, nos casos especiais como o deste julgamento, encontrar uma solução que não afete demasia-damente o princípio da efetiva tutela jurisdicional, muito menos coloque emriscoasaúdedaquelesquesãohipossuficientesequenecessitamdoSistema Único de Saúde para sua sobrevivência. Na realidade, quando se fala que 84% dos atendimentos é pelo Sistema Único de Saúde, o que se desejaafirmaréqueapopulaçãocarenteedebaixarendaéquesevaledo

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atendimento do aludido hospital, pois as pessoas que detêm certo poder econômico podem procurar a rede hospitalar de outra região, muitas vezes das cidades maiores, para fazer valer seu direito fundamental à saúde.

Assim, ao Poder Judiciário incumbe concretizar a norma jurisdicional, tendo em mente que essa norma irá, sem dúvida, ultrapassar a barreira do próprio processo, para atingir também outras relações sociais extraproces-suais. Diante dessa força extraprocessual das decisões judiciais, inclusive com a possibilidade de causar danos irreversíveis ao direito fundamental àsaúdedaspessoasmaispobresehipossuficientes,équeaanálisedoprocesso nos dias atuais deve ter por base a sua humanização.

As questões prioritárias (nucleares) que capturam a atenção dos estu-diosos neste momento, e que possivelmente dominarão todo o horizonte processual constitucional do Século XXI, circulam por uma ampla faixa geral e comum a todos os países e se desdobram em um elenco integrado por:

“– privilegiar su rol instrumental [de serviço] en el núcleo de la persona (principal referencia del Derecho), con base en la pauta guía de la solidaridad y dimensión so-cial; la meta del debido proceso adjetivo, el desemboque real, es un fallo justo que en verdad solucione o disuelva los conflictos, que brinde una tutela efectiva, facilitando la realización del derecho material;

– dar prioridad a los valores; en la cumbre, la dignidad de la persona, pero también enlassociedadesdemasasyenlaescaladelosconflictoscoexistenciales,preservarla paz jurídica;

– reconocer que el hallazgo inteligente de las respuestas será la conclusión de un método interdisciplinario; en donde cada especialización arrime su verdad, su técnica, sumándose al esfuerzo común.

– El juez debe saber sumar a su función normal - la de dar con sus sentencias soluciones jurídicas - la creativa del derecho aplicable al caso, la de un activismo protagónico y una presencia y dirección inteligentes.” (MORELLO, Augusto. El proceso justo. Buenos Aires: Abeledo - Perrot, 1994. p. 625-626)

A incansável luta para se derrubarem e ultrapassarem os obstáculos e as barreiras, tanto as do interior do processo em si (em particular a idealizaçãoabstratadoprocessocomorealizaçãosuficienteecabaldodireitodedefesaemjuízoeademoraeineficáciadesuasdecisões)comoas exógenas demonstradas por tantas circunstâncias sociológicas debili-tadoras (pobreza, linguagem, desinformação, discriminações), conduz a uma nova perspectiva: “(...) el del proceso justo, como resultante de los

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ajustes interiores y del paulatino e intenso derrocamiento de las vallas que, desde afuera de los tribunales, impiden el acesso a jurisdicción”. Essa perspectiva de um “processo justo” também é representada pela dimensão social de um processo, caracterizado por um aspecto mais hu-mano e solidário, bem como pelo trânsito de uma justiça ortodoxamente “liberal” para aquela que incorpora em suas vivencias “(...) las exigencias del estado social de derecho, en el pivote de una clara relevancia del solidarismo (la justicia con un rostro más humano)” (MORELLO, A. idem, ibidem, p. 234).

São mudanças importantes e adequadas para um perfeito funciona-mento do processo atual, ou seja:

“(...) de la garantización de una aparente igualdad de armas a la destrucción de las barreras que impiden – en los hechos – asegurar la igualación real, consagrando la desprotección del débil, carenciado o sin capacidad económica de similar nivel, para equipararlos a la del dominante, lo que en la praxis equivale a verdadera privación de justicia; al mismo tiempo, un retorno a la personalización, a la debida conside-ración central de la persona, también, como sujeto del proceso o de sus alternativas integradoras (...); la constante y preferente atención en el hombre que está envuelto en el conflicto que dio origen a la controversia, y que aguarda la solución de ésos, sus problemas, que son los referentes del derecho y, también, del proceso; el franco reconocimiento de que el proceso es una institución social; los intereses que en él se hallan en juego trascienden los de las partes; humanizar el proceso es personalizarlo; al cabo socializarlo con los aires no egoístas de la solidariedad.” (MORELLO, A. idem, ibidem, p. 306)

Na verdade, a injustiça percorre todo o organismo social e solta suas raízes onde encontra um terreno propício. A fonte de injustiça está num sistema que reproduz em todos os níveis o abuso sem distinção de classe. Deve-se cada vez mais sustentar e com rigor a aspiração ética e intelectual que, por detrás de qualquer investigação teórica, conserva intacta sua razão de ser: “(...) la necesidad de eliminar la explotación económica y los abusos y discriminaciones sociales” (MORELLO, A., idem, ibidem, p. 346).

Éporissoqueseexigeparaasoluçãodosconflitosurgentesmudançasfundamentais, que vão mais além do que atualmente se vem oferecendo, afimdequeajurisdiçãosejaumaatividadeefetivamenteigualitária,solidária e humana.

E para que a jurisdição seja mais igualitária e humana, ela deve levar

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em consideração essa ponderação de princípios, no sentido de que, ao mesmo tempo, garanta a efetividade da tutela jurisdicional e o direito à saúde de uma população mais pobre e carente.

Desta feita, penso que não é o momento de se autorizar a alienação em hasta pública do prédio em que se encontra instalado o Hospital Santa Casa de Misericórdia de Jaguarão, pois sua alienação, nos dias atuais, em que a precariedade da saúde do povo brasileiro é pública e notória, com parcos investimentos do Poder Público nessa necessidade social, somente irá agravar o problema da região.

Além do mais, essa alienação visa ao pagamento de tributos, os quais, de alguma maneira, deverão retornar para a melhoria da saúde pública e privada,afimdequeaspessoascarentestenhammelhoracessoaodireitofundamental previsto no artigo 196 da Constituição Federal.

Por outro lado, também não se pode deixar de dar aplicação ao prin-cípio da efetividade da tutela jurisdicional, pois o pagamento do tributo tambémtemporfinalidadeamelhoriasocialdopaís.

Assim, antes de se determinar a alienação do bem penhorado, outras alternativas devem ser buscadas para a prevalência dos dois princípios em questão, como, por exemplo:

– penhora sobre o faturamento, no caso um percentual sobre a receita proveniente dos valores repassados pelo Sistema Único de Saúde;

–usufrutosobreobemimóvel,mantendo-seafinalidadehospitalar,mediante nomeação conjunta entre a União, o Município e o Poder Judiciário de um administrador para o efeito do pagamento do crédito tributário;

– redirecionamento da execução em relação aos administradores ou sócios-gerentesdohospital,casofiquedemonstradoqueopagamentodotributo deu-se por infração à lei ou ao contrato social, pois a impossibi-lidade de se prosseguir na execução pela impenhorabilidade dos bens da pessoa jurídica, seja por determinação legal, seja judicial, representa o mesmo que a dissolução irregular da sociedade. Portanto, deve-se analisar se a atual situação do hospital não decorre de eventual má administração com enriquecimento ilícito por parte de seus administradores.

Dentretaispossibilidades,afigura-se-meapenhorasobreparceladofaturamento do nosocômio aquela que tem o condão de imprimir maior eficáciaaosprincípiosacimareferidos.Essasoluçãoasseguraaprestação

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dos serviços de saúde à população local e, concomitantemente, satisfaz a pretensão da União em ver ressarcidos os valores que lhe são devidos em virtude do crédito tributário já constituído.

Por conseguinte, há de ser dado parcial provimento ao inconformis-mo, determinando-se que o juízo de origem estipule, antes da alienação dobemquegaranteaexecuçãofiscal,opercentualdofaturamentodohospital que deverá ser objeto de constrição, considerando-se, para tanto, os montantes que lhe são repassados pelo SUS mensalmente.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo de instru-mento, nos termos da fundamentação.

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DIREITO TRIBUTÁRIO

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 97.04.54757-9/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Joel Ilan Paciornik

Apelante: Varig S/A Viação Aérea Rio-GrandenseAdvogados: Drs. Waldir Luiz Braga, Plinio José Marafon,

Renato Bing Reis e outrosApelada: União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: Dr. José Diogo Cyrillo da Silva

EMENTA

Processual civil. Tributário. Ação anulatória e execução fiscal. Cone-xão. Contribuição social sobre o lucro. Base de cálculo. Lucros obtidos no exterior. Aplicação do art. 268 do RIR/1980. Lei nº 9.249/1995. MP nº 1.858-6/1999.

1. A jurisprudência do STJ e desta Corte reconhece a conexão entre a açãoanulatóriadodébitoeaexecuçãofiscal,umavezquesevislumbraa mesma natureza de ação de embargos do devedor na anulatória, bem como admite a competência do juízo da Vara de Execuções Fiscais, por se tratar de competência funcional e, portanto, absoluta.

2.Quandoosprocessosquejustificariamoprocessamentonomesmojuízodasexecuçõesfiscaisjáforamsentenciados,nãohámaisrazãoparaa reunião dos processos, nos termos da Súmula nº 235 do STJ: “A conexão não determina reunião dos processos, se um deles já foi julgado”.

3. Há evidente paralelismo entre a contribuição social sobre o lucro e o imposto de renda calculado com base no lucro real, porque ambos os

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tributos originam-se do lucro contábil do exercício, resultante do cômputo do lucro operacional, dos resultados não operacionais e das participações noslucros,apuradosconformeasdemonstraçõesfinanceiras.Olucrolíquido, após as adições, exclusões e compensações autorizadas pela legislação da CSLL e do IRPJ, formará a base de cálculo da contribuição e do imposto. O lucro líquido, portanto, é o elemento básico para compor a base de cálculo tanto da CSLL quanto do IRPJ; o que diferencia esses tributos são as adições, exclusões e compensações determinadas pela lei tributária. Por isso, a base de cálculo da CSLL é o resultado ajustado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda, ao passo que a do IRPJ é o lucro real.

4. O art. 63 da Lei nº 4.506/1964, regulamentado pelo art. 268 do Decreto nº 85.450/1980, não trata de hipótese de isenção, mas de não incidência. A isenção exclui o crédito tributário, ou seja, o fato previsto na norma legal constitui obrigação tributária, porém a lei dispensa o seucumprimento.Nãoincidênciasignificaqueofatonãoseamoldaàhipótese abstratamente prevista na obrigação tributária. No caso presen-te, a legislação não prevê o surgimento de obrigação tributária sobre o lucro operacional resultante de atividades exercidas no exterior; é caso clássico de não subsunção fática, pois o fato não está abrangido pela norma de tributação.

5. A omissão na legislação da CSLL, no que concerne aos lucros auferidos no exterior, não decorre propriamente da má redação do texto legal. O legislador considerou ser desnecessário referir todas as hipóte-sesquepoderiaminfluirnolucrolíquido,járeguladaspelalegislaçãodo imposto de renda. A incidência do art. 268 do RIR/1980 somente serevelariaimpossívelcasohouvessenítidoconflitocomasadições,exclusões e compensações ao resultado do exercício, expressamente mencionadas na Lei nº 7.689/1988. A questão resolve-se, portanto, pela pesquisa do verdadeiro alcance da lei, em consonância com o princípio da legalidade, posto no art. 150, inciso I, da Constituição.

6. Embora os elementos que compõem o resultado do exercício sejam estabelecidos pela lei comercial (art. 187 da Lei nº 6.404/1976), a ine-xistênciadedefiniçãonoregramentodaCSLLnãotornaincompatívelaaplicaçãodasnormasespecíficasdoimpostoderenda.Ora,sealeitributária determina que o lucro proveniente de atividades exercidas

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no exterior não integra o resultado do exercício, não é possível erigir o art. 187 da Lei das Sociedades Anônimas para afastar a aplicação dessa norma em relação à CSLL, mas considerá-la válida quanto ao IRPJ. Por conseguinte, a mesma regra de apuração do IRPJ, no tocante ao lucro proveniente de atividades exercidas fora do País, incide para efeito de apuração da base de cálculo da CSLL.

7. Não obstante o inciso I do § 2º do art. 153 da CF/1988 estabeleça a universalidade como critério informativo do imposto de renda, o IRPJ, até a edição da Lei nº 9.249/1995, adotava o princípio da territorialidade, ou seja, somente era passível de tributação a renda originada de situa-ções jurídicas ocorridas dentro do território nacional. No que concerne à CSLL, a tributação em bases universais foi normatizada somente pela Medida Provisória nº 1.858-6, de 29.06.1999.

8. O art. 15 da Instrução Normativa SRF nº 38/1996, concernente à Lei nº 9.249/1995, exclui os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior da base de cálculo da CSLL. Somente a contar de 01.10.1999 há base legal para a tributação dos lucros provindos do exterior, conforme o Ato Declaratório SRF nº 75/1999, relativo à MP nº 1.858-6/1999.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação,nostermosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 15 de julho de 2009.Des. Federal Joel Ilan Paciornik, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Joel Ilan Paciornik: Varig S/A ajuizou ação objetivando a anulação do débito exigido no processo administrativo nº 11080.004887/93-51, oriundo de auto de infração e relativo à apuração de valor da contribuição social sobre o lucro líquido – CSLL – no ano base 1989, decorrente da parcela de lucro obtida no exterior e não adicionada àbasedecálculodotributonoexercíciofinanceirode1990.

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Regularmente processada a demanda, sobreveio sentença de impro-cedênciadaação(fls.119-130).

A autora opôs recurso de apelação, arguindo, preliminarmente, a nuli-dade da sentença, em razão da necessidade de reunião da ação anulatória comaexecuçãofiscal,diantedaconexãoentreelas.Nomérito,sustentaque as contribuições sociais podem se revestir da natureza jurídica de imposto, taxa ou contribuição de melhoria (art. 145 da CF), conforme as hipóteses de incidência, a base de cálculo e a destinação que tiverem, uma vezqueoart.149daConstituiçãoFederalapenasapontouasfinalidadesdas contribuições. Alega que a CSLL consiste em um imposto, pois possui base de cálculo referente a uma particularidade do sujeito passivo (lucro) e não está vinculada a qualquer atuação estatal. Propugna a reforma da sentença, ainda, em virtude da recusa de aplicação analógica do art. 268 do Decreto nº 85.450/1980 (Regulamento do Imposto de Renda de 1980), pois isenção ou exclusão não se confunde com não incidência, hipótese da qual trata esse dispositivo. Traçando o paralelo entre a hipótese de incidência e a base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, entende que há autorização legal de interpretação integrativa mediante analogia, nos termos do art. 108, I, do CTN, mormente porque a Lei nº 7.689/1988 não prevê a incidência do tributo sobre o resultado apurado no exterior ou no território nacional. Frisa que o pressuposto da analogia é justamente a inexistência da lei. Defende que os mesmos motivos que nortearam o legislador e o aplicador da norma do imposto de renda são aplicáveis comojustificativaparaanãoincidênciadaCSLLsobreolucroapuradono exterior. Aponta violação ao princípio da estrita legalidade tributária (art. 150, I, da CF/88), porquanto não existe lei dispondo expressamente acerca da exigência de CSLL sobre o lucro obtido no exterior. Preconiza a aplicação do princípio da territorialidade, com fulcro em interpretação a contrario sensu dos arts. 101 e 102 do CTN, no sentido de que a legis-lação não poderá incidir fora dos limites do território, ante a inexistência deleioutratadosdispondosobreoassunto(fls.145-161).

Orecursofoiimprovido(fls.190-198),publicando-seaementanestestermos:

“TRIBUTÁRIO. CSSL. LUCROS OBTIDOS NO EXTERIOR. TERRITORIA-LIDADE E LEGALIDADE. ASPECTOS MATERIAL E ESPACIAL DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA.

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1. É de se ter que os lucros obtidos no exterior, compondo o resultado do exercí-cio, não podem deixar de incluir-se na base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, nos termos do esquema jurídico-contábil consagrado pelos arts. 2º da Lei nº 7.689/88e187daLeinº6.404/76.Dessemodo,nãocabefalarqueaexigênciafiscalora impugnada fere o princípio da legalidade.

2. Inaplicável à espécie o art. 268 do RIR/80, já, somente após obtido o lucro líquido do exercício, iniciam-se as adições, exclusões e compensações prescritas ou autorizadas, como os lucros auferidos no exterior, que determinam o lucro real tributável.

3. Diferindo o aspecto espacial das normas tributárias do campo de validade da lei, não se vislumbram óbices, no que concerne ao ponto, à incidência da contribuição insti-tuída pela Lei nº 7.689/88 sobre o lucro obtido no exterior.” (TRF4, AC 97.04.54757-9, Primeira Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, DJ 24.01.2001)

Então, a autora opôs embargos de declaração, esgrimindo que o acórdão não se manifestou expressamente sobre a ofensa aos arts. 103, 105 e 106 do CPC e do Provimento nº 11, de 26.08.1993, deste Tribu-nal; aos arts. 145 e 150, I, da CF/88; e ao art. 108 do CTN. Obtempera que o princípio da territorialidade foi adotado por nosso ordenamento jurídico até o advento da Lei nº 9.249/1995, quando o Brasil passou a adotaroprincípiodauniversalidade,paraofimdetributaçãodarendainternacional das pessoas jurídicas. Argumenta que a Instrução Norma-tiva SRF nº 38/1996 determina expressamente que os lucros auferidos no exterior não integram a base de cálculo da CSLL, explicando que a tributação dos lucros provindos do exterior ocorreu somente a partir da edição da Medida Provisória nº 1.858/1999, regulamentada pelo Ato Declaratório nº 75/1999. Alega que as questões atinentes ao princípio da territorialidade, ao teor da IN SRF nº 38/1996 e da MP nº 1.858/99, embora analisados por ocasião do julgamento do recurso, não constaram noacórdão(fls.200-206).

Nojulgamentodosembargosdedeclaração,aTurmaafirmouque“nãohá omissão por não ter a decisão enfrentado todas as questões suscitadas ou analisado todos os dispositivos mencionados pelo recorrente. Deve o magistrado apenas apreciar todo o objeto do recurso, demonstrando os motivos de seu convencimento, concatenando os argumentos de forma lógica”(fls.208-212).

A autora interpôs recurso especial, arguindo a ofensa ao art. 535 do CPC e de outros dispositivos da legislação federal – arts. 97, 101 e 108 do CTN, arts. 2º e 6º da Lei nº 7.689/1988, art. 63 da Lei nº 4.506/1964, art.

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25daLeinº9.249/1995eart.19daMPnº1.858/1999(fls.261-303).O Ministro Francisco Falcão proveu o recurso especial, uma vez que

“a matéria dos artigos apontados como violados não foi objeto de debate no v. acórdão hostilizado e, embora opostos embargos de declaração para suprir a omissão e ventilar a questão federal, restaram eles rejeitados”. Determinou o retorno dos autos a esta Corte, para que se manifeste sobre amatériaarticuladanosembargosdedeclaração(fls.402-403).

A União opôs agravo regimental, asseverando que o Tribunal ma-nifestou-se sobre todos os pontos feridos pela apelação da Varig S/A. Aduz que a recorrente trouxe questões nos embargos declaratórios e no recurso especial que não foram abordadas ao longo do processo, tal como a Lei nº 9.249/1995, a IN SRF nº 38/96, a MP nº 1.858/99, o Ato Declaratório nº 75/99, assim como questões constitucionais não invo-cadas anteriormente.

A Primeira Turma do STJ negou provimento ao agravo regimental nestes termos:

“PROCESSUAL CIVIL. CSSL. LUCROS OBTIDOS NO EXTERIOR. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO REGIMENTAL. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC. OMISSÃO VERIFICADA. RETORNO AO TRIBUNAL A QUO PARA EXAME DAS QUESTÕES NÃO ESCLARECIDAS.

I - O Tribunal a quo, no acórdão principal, não se desincumbiu de apreciar as ques-tões alavancadas. Nos embargos de declaração que se seguiram, apesar do Sodalício ter observado que inexistiriam as pechas invocadas, relativas à não incidência da CSSL para o período anterior à MP nº 1.858/99, não realizou o necessário desate jurídico apto à formação do convencimento e obrigatório para viabilizar a interposição posterior de eventuais recursos.

II - O fato do Tribunal a quo haver lastreado o decisum, em grande parte, com esteio em regra constitucional não implica a vedação da análise de pretenso malferimento ao artigo 535 do CPC quando tal omissão busca o exame de regra infraconstitucional.

III - Agravo regimental improvido.” (AgRg no REsp 379917/RS, Rel. Minis-tro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16.06.2005, DJ 05.09.2005, p. 205)

Transitado em julgado o acórdão, vieram os autos a esta Corte.É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Joel Ilan Paciornik: De início, impende

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esclarecer a matéria submetida à apreciação desta Corte. O STJ reco-nheceu a relevância e a necessidade de debate das questões suscitadas nos embargos de declaração, na decisão singular proferida pelo Ministro FranciscoFalcão.Reafirmouesseentendimentoaojulgaroagravoregi-mental, salientando que “O Tribunal a quo, no acórdão principal, não se desincumbiu de apreciar as questões alavancadas. (...) não realizou o ne-cessário desate jurídico apto à formação do convencimento e obrigatório paraviabilizarainterposiçãoposteriordeeventuaisrecursos”(fl.415).

Outrossim, o STJ não acolheu a alegação da Fazenda Nacional que apontava inovação da causa, em sede de embargos de declaração, quan-to à ausência de manifestação sobre a Lei nº 9.249/1995, a IN SRF nº 38/1996, a MP nº 1.858/99 e o Ato Declaratório nº 75/99. Não obstante esses dispositivos legais, editados posteriormente à propositura da demanda, não integrassem a fundamentação expendida na inicial, este Tribunal não pode desconhecê-los, porque isso implicaria desconsiderar a decisão da Corte Superior.

Para que as omissões apontadas pela embargante sejam supridas, ou seja, haja o esgotamento da prestação jurisdicional, segundo a determina-ção do STJ, é imperioso o reexame da causa posta nestes autos. As razões que formaram a convicção da relatora do acórdão que apreciou o recurso de apelação não são exatamente as mesmas deste julgador, de modo que seria paradoxal analisar as questões postas nos embargos, não apreciadas anteriormente, a partir da fundamentação utilizada no julgamento do ape-lo. Assim, embora o STJ não tenha anulado o acórdão principal, entendo que este Tribunal está autorizado a se valer de fundamentos diversos dos que embasaram o acórdão embargado. Esse procedimento equivale à atribuiçãodeefeitosmodificativosaosembargosdeclaratórios,admitidaquando, para sanar a omissão, é preciso alterar o julgado.

Passo, então, a analisar a matéria controvertida.A autora invoca a conexão entre esta ação anulatória, ajuizada em

26.01.1995,eaexecuçãofiscalnº95.0001712-1,ajuizadaem01.02.1995,com base no art. 3º do Provimento nº 11, de 26.08.1993, deste Tribunal e nos arts. 103, 105 e 106 do CPC. Conquanto a jurisprudência do STJ e desta Corte reconheça a conexão entre a ação anulatória do débito e a execuçãofiscal,umavezquesevislumbraamesmanaturezadeaçãodeembargos do devedor na anulatória, bem como admita a competência do

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juízo da Vara de Execuções Fiscais, por se tratar de competência funcional e, portanto, absoluta, a anulação da sentença constitui medida desprovida deutilidade,deacordocomapresenteconfiguraçãoprocessual.

É certo que, em 19.04.1996, quando a autora alegou a conexão, ainda não fora sentenciada a ação anulatória, o que veio a ocorrer em 09.12.1996.Apetiçãodefl.131,informandoqueoJuízoondetramitavaaexecuçãofiscalhaviasedeclaradocompetenteparaprocessarejulgaraação anulatória, foi protocolada em 26.11.1996, porém, equivocadamente, juntada após a sentença. Por sua vez, a 2ª Vara das Execuções Fiscais solicitou a redistribuição da ação anulatória apenas em 07.02.1997, mo-mento em que a declaração de competência já havia se tornado inócua.

OfatoéqueacomunicaçãooficialdoJuízodasExecuçõesFiscaisaconteceu após a prolação da sentença na ação anulatória. Quando os processosquejustificariamoprocessamentonomesmojuízodasexe-cuçõesfiscaisjáforamsentenciados,nãohámaisrazãoparaareuniãodos processos, nos termos da Súmula nº 235 do STJ: “A conexão não determina reunião dos processos, se um deles já foi julgado”. Impende salientar que não houve qualquer prejuízo concreto à autora, porque, embora as ações não tenham sido julgadas conjuntamente, receberam decisão idêntica; quanto aos recursos nelas interpostos, estão distribuídos a este relator, incluídos na mesma pauta, de molde que não há possibi-lidadedejulgamentosconflitantes.Assim,verifica-seainexistênciadeafronta aos arts. 103, 105 e 106 do CPC e ao art. 3º do Provimento nº 11, de 26.08.1993.

A questão de fundo diz respeito à base de cálculo da contribuição social sobre o lucro no ano de 1989.

Ofiscoautuouaempresa,alicerçadonoentendimentodequeaCSLLincide sobre o lucro auferido fora do território nacional por pessoas jurídicasdomiciliadasnoPaísquepossuamfiliaisouestabelecimentossituados no exterior. Asseverou que não incide a norma contida no art. 268 do RIR/80, pois a lei tributária veda a utilização da analogia para estender a um tributo ou contribuição a isenção concedida a determinado fatoporoutrotributo.Afirmouqueseaplicaaanalogiasomentequandoa situação fática não é objeto de regulamentação legal.

As alegações da autora fundam-se em três linhas argumentativas básicas: a) possibilidade de aplicação analógica do art. 268 do Decreto

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nº 85.450/1980 (Regulamento do Imposto de Renda de 1980), com base no art. 108, inciso I, do CTN, uma vez que a CSLL, na tipologia pre-vista no art. 145 da Constituição Federal, enquadra-se na categoria de imposto; b) violação ao art. 150, inciso I, da CF/88, pois não existe lei tributária determinando de forma expressa a incidência de CSLL sobre o lucro auferido no exterior; c) aplicação do princípio da territorialidade, porquantooprincípiodauniversalidade,parafinsdetributaçãodarendainternacional das pessoas jurídicas, passou a vigorar após a edição da Lei nº 9.249/1995 e da Medida Provisória nº 1.858-6/1999 (atualmente tramitando sob nº 2.158-35/2001), consoante estabelecem a Instrução Normativa nº 38/1996 e o Ato Declaratório nº 75/1999, da Secretaria da Receita Federal.

De acordo com a evolução da doutrina e da jurisprudência sobre o sistema tributário instituído pela Constituição de 1988, não há dúvida no sentido de que a contribuição social sobre o lucro é tributo. Segundo oentendimentofirmadopeloSTF,noREnº146.733/SP(RelatorMin.Moreira Alves, DJ 06.11.1992, p. 20110), há cinco espécies de tributos: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais. Em relação aos três primeiros, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios possuem competência legis-lativa; por isso, estão agrupados no art. 145. Em relação aos dois últimos, somente a União é competente para instituí-los, havendo normatização exclusiva nos arts. 148 (empréstimo compulsório) e 149 (contribuições especiais). As contribuições especiais, por sua vez, subdividem-se em sociais (gerais e de seguridade social), de intervenção no domínio econô-micoedeinteressenascategoriasprofissionaisoueconômicas.ACSLL,portanto, não se enquadra na categoria de imposto; todavia, submete-se ao regime jurídico tributário, diante da determinação constitucional de observância das normas gerais de direito tributário e dos princípios da legalidade estrita, da irretroatividade e da anterioridade nonagesimal.

A Constituição Federal não veda a instituição de contribuições espe-ciais com o mesmo fato gerador e a mesma base de cálculo de imposto, porqueorequisitoqueascaracterizaméafinalidadeconstitucionalqueautoriza a sua criação. As contribuições de seguridade social, entre as quais se enquadra a CSLL, possuem fato gerador e base de cálculo ex-pressamente previstos no art. 195, inciso I, da CF/88.

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Há evidente paralelismo entre a contribuição social sobre o lucro e o imposto de renda calculado com base no lucro real, porque ambos os tributos originam-se do lucro contábil do exercício, resultante do cômputo do lucro operacional, dos resultados não operacionais e das participações noslucros,apuradosconformeasdemonstraçõesfinanceiras.Olucrolíquido, após as adições, exclusões e compensações autorizadas pela legislação da CSLL e do IRPJ, formará a base de cálculo da contribuição e do imposto. O lucro líquido, portanto, é o elemento básico para compor a base de cálculo tanto da CSLL quanto do IRPJ; o que diferencia esses tributos são as adições, exclusões e compensações determinadas pela lei tributária. Por isso, a base de cálculo da CSLL é o resultado ajustado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda, ao passo que a do IRPJ é o lucro real.

Feita essa explanação, impõe-se a apreciação do disposto no art. 63 da Lei nº 4.506/1964, regulamentado pelo art. 268 do Decreto nº 85.450/1980, in verbis:

“Art. 63. No caso de empresas cujos resultados provenham de atividades exercidas parte no País e parte no exterior, somente integrarão o lucro operacional os resultados produzidos no País.

§ 1º Consideram-se atividades exercidas parte no País e parte no exterior as que provierem:

a) das operações de comércio e outras atividades lucrativas iniciadas no Brasil e ultimadas no exterior, ou vice-versa;

b)daexploraçãodamatéria-primanoterritórionacionalparaserbeneficiada,ven-dida ou utilizada no estrangeiro, ou vice-versa;

c) dos transportes e meios de comunicação com os países estrangeiros.”“Art. 268. O lucro proveniente de atividades exercidas parte no País e parte no exte-

rior somente será tributado na parte produzida no País (Lei nº 4.506/1964, art. 63).”

Esses dispositivos, evidentemente, não tratam de hipótese de isenção, mas de não incidência. A isenção exclui o crédito tributário, ou seja, o fato previsto na norma legal constitui obrigação tributária, porém a lei dispensaoseucumprimento.Nãoincidênciasignificaqueofatonãoseamolda à hipótese abstratamente prevista na obrigação tributária. No caso presente, a legislação não prevê o surgimento de obrigação tributária sobre o lucro operacional resultante de atividades exercidas no exterior; é caso clássico de não subsunção fática, pois o fato não está abrangido

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pela norma de tributação. A propósito, colaciono precedente do STF esclarecedor da distinção entre não incidência e isenção:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 268, DE 2 DE ABRIL DE 1990, DO ESTADO DE RONDÔNIA, QUE ACRESCENTOU INCISO AO AR-TIGO 4º DA LEI 223/89. INICIATIVA PARLAMENTAR. NÃO INCIDÊNCIA DO ICMS INSTITUÍDA COMO ISENÇÃO. VÍCIO FORMAL DE INICIATIVA: INE-XISTÊNCIA. EXIGÊNCIA DE CONVÊNIO ENTRE OS ESTADOS E O DISTRITO FEDERAL.

(...)2. A não incidência do tributo equivale a todas as situações de fato não contempladas

pela regra jurídica da tributação e decorre da abrangência ditada pela própria norma.3. A isenção é a dispensa do pagamento de um tributo devido em face da ocorrência

de seu fato gerador. Constitui exceção instituída por lei à regra jurídica da tributação.4. A norma legal impugnada concede verdadeira isenção do ICMS, sob o disfarce

de não incidência. (...)” (ADI 286, Relator Min. MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 22.05.2002, DJ 30.08.2002 PP-00060 EMENT VOL-02080-01 PP-00001)

Uma vez que o art. 268 do RIR/1980 trata de hipótese de não incidên-cia, é impertinente invocar o art. 97, inciso VI, do CTN, que exige lei específicaparaexcluircréditotributário.Pelomesmomotivo,odispostono art. 111, inciso II, do CTN, que determina a interpretação literal da lei concessiva de isenção, não tem relevância.

É deveras tormentoso apontar se o caso rende ensejo à integração analógica ou à interpretação extensiva. A clássica distinção teórica, que enfatiza a analogia como forma de integração da legislação, mediante aplicação da lei à situação de fato nela não prevista, cuja semelhança com a hipótese legal é o elemento determinante de ambas, e a interpretação extensiva como modo de determinar com exatidão o verdadeiro sentido da lei, estendendo a sua aplicação de acordo com os limites da sua inci-dência,nãofornececritériodefinitivoparaocasopresente.Naprática,a distinção não é simples, como pondera Luciano Amaro:

“Teoricamente, a integração analógica não se confunde com a interpretação exten-siva, de que se avizinha. Na prática, distingui-las não é tarefa simples. Como se viu, a integração visa a preencher a lacuna legislativa; já a interpretação extensiva teria por objetivoidentificaro‘verdadeiro’conteúdoealcancedalei,insuficientementeexpressono texto normativo (dixit minus quam voluit). A diferença estaria em que, na analogia, a lei não teria levado em consideração a hipótese, mas, se o tivesse feito, supõe-se que lhe teria dado idêntica disciplina; já na interpretação extensiva, a lei teria querido

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abranger a hipótese, mas, em razão da má formulação do texto, deixou a situação fora do alcance expresso da norma, tornando com isso necessário que o aplicador da lei reconstitua o seu alcance.” (Direito Tributário Brasileiro, 7. ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p. 206)

A omissão na legislação da CSLL, no que concerne aos lucros au-feridos no exterior, não decorre propriamente da má redação do texto legal. Como já foi explicitado acima, o resultado do exercício (lucro contábil) forma a base de cálculo da CSLL e do IRPJ (apurado pelo lucro real). A meu ver, o legislador considerou ser desnecessário referir todasashipótesesquepoderiaminfluirnolucrolíquido,járeguladaspela legislação do imposto de renda. Prova disso é a concisão da Lei nº 7.689/1988 (oito artigos relativos à CSLL, nos quais estabelece somente a base de cálculo, alíquota, contribuintes, forma de pagamento e órgão fiscalizador).Percebe-sequealeicingiu-seaoessencialdotributo,mor-mente os ajustes a serem feitos ao resultado do exercício, cuja apuração deve observar a legislação comercial. Assim, a incidência do art. 268 do RIR/1980somenteserevelariaimpossívelcasohouvessenítidoconflitocom as adições, exclusões e compensações ao resultado do exercício, expressamente mencionadas na Lei nº 7.689/1988. A questão resolve-se, portanto, pela pesquisa do verdadeiro alcance da lei, em consonância com o princípio da legalidade, posto no art. 150, inciso I, da Constituição. Areservadelei,emmatériatributária,nãosignificaaadoçãodetiposfechados, mas a determinabilidade do conteúdo da relação obrigacional a partir da lei, o que permite a utilização dos métodos de interpretação e deintegração,afimdeconcretizaraabstraçãodocomandolegal.

Outro ponto a ser elucidado diz respeito ao que consiste o resultado do exercício. Embora os elementos que compõem o resultado do exercício sejam estabelecidos pela lei comercial (art. 187 da Lei nº 6.404/1976), ainexistênciadedefiniçãonoregramentodaCSLLnãotornaincompa-tívelaaplicaçãodasnormasespecíficasdoimpostoderenda.Ora,sealei tributária determina que o lucro proveniente de atividades exercidas no exterior não integra o resultado do exercício, não é possível erigir o art. 187 da Lei das Sociedades Anônimas para afastar a aplicação dessa norma em relação à CSLL, mas considerá-la válida quanto ao IRPJ. Por conseguinte, a mesma regra de apuração do IRPJ, no tocante ao lucro proveniente de atividades exercidas fora do País, incide para efeito de

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apuração da base de cálculo da CSLL.Porfim,devemserlançadasluzessobreoaspectoespacialdabase

de cálculo do imposto de renda, por ser pertinente ao conteúdo da nor-ma investigada. Não obstante o inciso I do § 2º do art. 153 da CF/1988 estabeleça a universalidade como critério informativo do imposto de renda, o IRPJ, até a edição da Lei nº 9.249/1995, adotava o princípio da territorialidade, ou seja, somente era passível de tributação a renda originada de situações jurídicas ocorridas dentro do território nacional. Nesse sentido, dispõe o art. 337 do Decreto nº 1.041/1994 (Regulamento do Imposto de Renda), in verbis:

“Art. 337. O lucro proveniente de atividades exercidas parte no País e parte no exterior somente será tributado na parte produzida no País (Lei nº 4.506/64, art. 63, e Decreto-Lei nº 2.429/88, art. 11).

§ 1º Considera-se lucro de atividades exercidas parte no País e parte no exterior o proveniente (Lei nº 4.506/64, art. 63, § 1º):

a) das operações de comércio e outras atividades lucrativas iniciadas no Brasil e ultimadas no exterior, ou vice-versa;

b)daexploraçãodematéria-primanoterritórionacionalparaserbeneficiada,ven-dida ou utilizada no exterior, ou vice-versa;

c) dos transportes e meios de comunicação com os países estrangeiros.§ 2º Para os efeitos da alínea c do parágrafo anterior, serão considerados:a) resultados produzidos no País aqueles derivados de fontes nacionais, provenientes

de fretes, passagens ou outros, recebidos ou a receber de fontes sediadas, domiciliadas ou estabelecidas no País, irrelevante o local em que tal pagamento se efetue;

b) resultados produzidos no exterior aqueles derivados de fontes estrangeiras, relati-vos a fretes, passagens ou outros, recebidos ou a receber de fontes domiciliadas, sediadas ou estabelecidas no exterior, irrelevante o local em que tal pagamento se efetue.”

A base de cálculo do IRPJ passou a alcançar a renda auferida no País e no exterior por pessoas jurídicas aqui domiciliadas, concretizando o princípio da universalidade, por determinação dos arts. 25 e 26 da Lei nº 9.249/1995:

“Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano.”

“Art. 26. A pessoa jurídica poderá compensar o imposto de renda incidente, no exterior, sobre os lucros, rendimentos e ganhos de capital computados no lucro real, até o limite do imposto de renda incidente, no Brasil, sobre os referidos lucros, rendi-mentos ou ganhos de capital.”

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No que concerne à CSLL, contudo, a tributação em bases universais foi normatizada somente pela Medida Provisória nº 1.858-6, de 29.06.1999 (incorporada à MP nº 2.158-35/2001), nos termos do art. 19:

“Art. 19. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior sujeitam-se à incidência da CSLL, observadas as normas de tributação universal de que tratam os arts. 25 a 27 da Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995, os arts. 15 a 17 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, e o art. 1º da Lei nº 9.532, de 1997.

Parágrafo único. O saldo do imposto de renda pago no exterior, que exceder o valor compensável com o imposto de renda devido no Brasil, poderá ser compensado com a CSLL devida em virtude da adição, à sua base de cálculo, dos lucros oriundos do exterior, até o limite acrescido em decorrência dessa adição.”

A argumentação expendida neste voto é corroborada por atos norma-tivos da Secretaria da Receita Federal, que reconhecem a legalidade da tributação dos lucros provindos do exterior, para apuração da base de cálculo da CSLL, somente a contar da MP nº 1.858-6/1999. Veja-se o teor do art. 15 da Instrução Normativa nº 38/1996, concernente à Lei nº 9.249/1995, e do artigo único do Ato Declaratório nº 75/1999, relativo à MP nº 1.858-6:

“Art. 15. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital, auferidos no exterior, não integram a base de cálculo da contribuição social sobre o lucro, instituída pela Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988.”

“Artigo único. A incidência da CSLL, segundo as normas de tributação em bases universais, dar-se-á em relação aos lucros, rendimentos e ganhos de capital, auferidos no exterior, disponibilizados, nos termos do art. 1° da Lei n° 9.532, de 1997, a partir de 1° de outubro de 1999, e serão computados na base de cálculo dessa contribuição em 31 de dezembro do ano-calendário da disponibilização, observadas as demais normas estabelecidas para o imposto de renda.”

As razões expostas pela autora, tanto no recurso de apelação quanto nos embargos declaratórios, merecem acolhida, devendo ser desconsti-tuído o lançamento tributário que originou o processo administrativo nº 11080.004887/93-51.

Considerando o elevado valor da causa (R$ 11.000.000,00, em ja-neiro de 1995), impõe-se considerar a equidadenafixaçãoda verbahonorária.

O art. 20, § 4º, do CPC permite que se arbitre os honorários com base na equidade, valendo-se dos critérios elencados nas alíneas a, b e c do

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§ 3º desse artigo. A equidade serve como valioso recurso destinado a suprir as lacunas legais e auxiliar a aclarar o sentido e o alcance das leis, atenuando o rigorismo dessas, de molde a compatibilizá-las às circuns-tâncias sociais, inspirada pelo espírito de justiça.

Assim,aopassoquesedeveteremcontaograudezelodoprofissio-nal, o lugar de prestação do serviço e a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para seu serviço, também deve-se remunerar dignamente o causídico, impedindo-se o avilta-mentodaprofissão.Aremissãoaoparágrafo3ºnãosignifica,todavia,queoshonoráriosdevamnecessariamenteserfixadosempercentualsobreovalor da causa, principalmente quando o montante da verba corresponderia à vultosa importância, que oneraria demasiadamente ambas as partes.

No caso presente, o percentual de 10% sobre o valor da causa repre-senta ônus exacerbado à Fazenda Nacional. Por esse motivo, arbitro os honorários advocatícios em R$ 100.000,00, atualizados pelo IPCA-E, com fulcro no art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC.

Ante o exposto, voto no sentido de rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento à apelação.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2006.71.00.009374-4/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Vilson Darós

Apelante: Copesul Cia. Petroquímica do SulAdvogado: Dr. George Lippert Neto

Apelada: União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: Dr. José Diogo Cyrillo da Silva

EMENTA

PIS. COFINS. Importação. Não cumulatividade. Crédito. Alíquota

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zero. Aquisição de nafta petroquímica no mercado externo. Creditamen-to. Impossibilidade. § 12 do art. 195 da CF/88. § 1º do art. 15 da Lei nº 10.865/2004. Hierarquia de tratados internacionais no ordenamento pátrio. Lei ordinária.

Os tratados internacionais ingressam no sistema jurídico pátrio com status de lei ordinária, não havendo a superioridade hierárquica sustentada pela autora. Portanto, é perfeitamente revogável (critério cronológico) ou afastável (critério da especialidade) norma proveniente de tratado ou convenção internacional mediante lei ordinária.

A Lei 10.865/2004, normativo que instituiu o PIS/COFINS-impor-tação, vedou a apropriação de créditos quando essas exações não forem efetivamente cobradas e também trouxe a vedação de utilização de créditos do PIS/COFINS-faturamento quando não houver o pagamento efetivo dessas contribuições. Ocorre que, ante a permissão anterior de creditamento, essa última vedação apenas surtiu efeitos após o prazo de noventa dias, em respeito à anterioridade inscrita no § 6º do art. 195 da CF/88. Portanto, a leitura correta a ser feita da questão é de que a permissão ao direito de creditar o PIS/COFINS-faturamento, referente às aquisições de nafta no mercado interno, no período de 01.04.2004 a 31.07.2004, decorre apenas da observância à anterioridade nonagesimal que submete as contribuições previdenciárias ao Princípio da Não Sur-presa. Trata-se de uma garantia conferida aos contribuintes, e o fato de causarodiferimentodaeficáciadedispositivolegalqueveiculavedaçãodo direito a crédito não pode ser utilizado como pretexto para afastar a incidência de dispositivo de lei diverso e que disciplina tributo também distinto (vedação de creditamento do PIS/COFINS-importação).

A não cumulatividade prevista constitucionalmente para as contri-buiçõesdistingue-sedaprevisãodoIPIedoICMS,poisadefiniçãodeextensão do seu conteúdo foi relegada ao legislador infraconstitucional. E mais, o § 12 do art. 195 da CF/88 não impõe o direito irrestrito a crédito de todos os bens ou serviços consumidos pela empresa na sua atividade produtiva.Referidodispositivo,alémdeincumbiràleiadefiniçãodossetores e atividades que poderão utilizar a forma não cumulativa das contribuições,tambémàleiincumbedefiniromontantedocréditoeaforma como se dará o seu cálculo. Nessa medida, não se denota qualquer incompatibilidade com o § 1º do art. 15 da Lei nº 10.865/2004.

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ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo da impetrante, nos termos do relatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedo presente julgado.

Porto Alegre, 06 de maio de 2009.Desembargador Federal Vilson Darós, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Vilson Darós: COPESUL – Companhia Petroquímica do Sul impetrou o presente mandado de segurança para ver reconhecido direito ao creditamento referente à aquisição de nafta petroquímica de países signatários do GATT/OMC e do MERCOSUL, no período de 01.05.04 a 31.07.04, a despeito de não haver a efetiva co-brança das exações nesse intervalo. Sustenta que a limitação do § 1º do art. 15 da Lei nº 10.865/2004 é ilegítima e deve ser afastada por ofensa à isonomia, já que a nafta adquirida no mercado interno, no mesmo período, e que era tributada à alíquota zero, conferia direito a crédito.

Indeferidaaliminar(fl.335).Notificado, o Delegado da Receita Federal prestou informações

(fls. 390-405).Sobreveiosentença(fls.414-19)julgandoimprocedenteopedido.A impetrante interpôs embargos declaratórios, os quais foram acolhi-

dospelasentençadefls.425-8.Inconformada,apelouaimpetrante(fls.440-80),pugnandopelare-

forma da sentença.Com contrarrazões, subiram os autos.O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso

(fls.498-501).É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Vilson Darós: Trata-se de apelo da im-petrante pretendendo a reforma de sentença que denegou a segurança

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buscada no sentido de que seja reconhecido o direito a crédito do PIS/COFINS-importação,parafinsdeutilizaçãonasistemáticanãocumu-lativa das contribuições.

Inicialmente, a impetrante sustenta em seu apelo que a vedação aos créditos do PIS/COFINS-importação, no período de 01.05.04 a 31.07.04, implica ofensa a tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, especificamente em relação aoGATT (AcordoGeral sobreTarifas eComércio) e ao Mercosul. Alega-se que, nesse período, há tratamento desigual em relação às operações de aquisição de nafta petroquímica no mercado interno, pois havia a permissão de creditamento a despeito da incidência das contribuições (PIS/COFINS-faturamento) serem tributadas à alíquota zero.

A discussão acerca da hierarquia conferida aos tratados internacionais em matéria tributária não é nova nos tribunais. No âmbito desta Corte, esta Primeira Turma tem precedente repercutindo o entendimento dos Tribunais Superiores, que, por sua vez, têm por descabida a tese de supe-rioridade hierárquica dos tratados internacionais sustentada pela autora, com supedâneo no art. 98 do CTN: “Art. 98. Os tratados e as convenções internacionaisrevogamoumodificamalegislaçãotributáriainterna,eserão observados pela que lhes sobrevenha”.

Efetivamente, a jurisprudência pátria estabilizou-se no sentido de que o Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT) tem caráter normativo,podendo,assim,sermodificadoporleisuperveniente.Veja-se,a respeito, os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

“TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DO AFRMM EM RELAÇÃO A MERCADORIAS IMPORTADAS SOB A ÉGIDE DO GATT. IMPOSSIBILIDADE.

O mandamento contido no artigo 98 do CTN não atribui ascendência às normas de direito internacional em detrimento do direito positivo interno, mas, ao revés, posiciona-as em nível idêntico, conferindo-lhes efeitos semelhantes.

O artigo 98 do CTN, ao preceituar que tratado ou convenção não são revogados por leitributáriainterna,refere-seaosacordosfirmadospeloBrasilapropósitodeassuntosespecíficosesóéaplicávelaostratadosdenaturezacontratual.

Se o ato internacional não estabelecer, de forma expressa, a desobrigação de con-tribuições para a intervenção no domínio econômico, inexiste isenção pertinente ao AFRMM.

Recurso provido. Decisão unânime.” (STJ, REsp 196.560/RJ, Rel. Ministro DEMÓCRI-TO REINALDO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18.03.1999, DJ 10.05.1999, p. 118)

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“PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO. POSSIBI-LIDADE. ADICIONAL AO FRETE PARA RENOVAÇÃO DA MARINHA MERCANTE-AFRMM. ISENÇÃO. PRODUTO IMPORTADO DE PAÍS SIGNATÁRIO DO GATT.

1. O artigo 463 do Código de Processo Civil autoriza o magistrado a corrigir, de ofício ou a requerimento da parte, erro material ou erro de cálculo.

2. Na hipótese dos autos, é patente a ocorrência de erro material, porquanto a lide tratava de isenção do AFRMM e esta Turma julgou o feito como se fosse restituição de empréstimo compulsório sobre combustíveis.

3. Esta Corte admite a isenção do AFRMM desde que a importação seja proveniente depaísquetenhafirmadoacordocontratualcomoBrasil,nãobastandosersignatá-riodoGATTcomojustificativaàisençãopretendida,porserumacordomeramentenormativo.

4. Recurso especial provido.” (STJ, REsp 97.162/SP, Rel. Ministro CASTRO MEI-RA, SEGUNDA TURMA, julgado em 16.09.2004, DJ 13.12.2004, p. 269)

Ademais, o precedente trazido no apelo da impetrante (REsp nº 480.563,fl.460-1)ratificaesseentendimentoaoreferirque“ostratadosinternacionais têm força de lei federal”.

Quanto a essa questão em particular, valho-me, ainda, de deci-são proferida pelo Des. Wellington Mendes de Almeida no AI nº 2004.04.01.022215-1/RS:

“Em que pese a interpretação literal do dispositivo (art. 98 do CTN), a questão da revogabilidade de Tratados/Convenções por lei interna já foi objeto de acórdão prolatado no RE nº 80.004, pelo Supremo Tribunal Federal, tendo essa Corte decidido pela inexistência de supremacia das normas da Convenção de Genebra sobre Decreto-Lei posterior (DL nº 427/69). Neste julgamento, o relator, Ministro Cunha Peixoto, observou em seu voto que o tratado pode ser normativo ou contratual, e que o referido dispositivo (artigo 98 do CTN) só tem aplicação no caso de ostentar o tratado caráter contratual, que deve ser respeitado pelas partes por ser título de direito subjetivo, não sendo princípio, portanto, de ordem geral.

Por outro lado, o E. Superior Tribunal de Justiça, sufragando tese esposada pela Su-prema Corte, veio a disparar, em feito relatoriado pelo e. Ministro Demócrito Reinaldo, que da dicção do artigo 98 do CTN ‘não é lícito supor a irrevogabilidade de convenções e tratados, recepcionados pelo direito interno, ante a superveniência de legislação que regule a matéria de modo diverso. Tal interpretação conduziria à inconstitucionalidade danorma,porquantosignificasse iníquarestriçãoàcompetênciaprimeiradoPoderLegislativo’ (REsp nº 196.560/RJ).

Nesse andar, nota-se que se traveste o Tratado de Assunção pelo manto da normati-vidade, porquanto apenas remeteram o tratamento tributário que entendiam ideal, sem, no entanto, adentrar em minúcias. Assim, perfeitamente possível a superveniência de atolegislativointernomodificandooquadrodedireitoatéentãoresenhado.”

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Ainda sobre o status no sistema jurídico pátrio e a revogabilidade das normas originadas de tratados internacionais, transcrevo, por escla-recedor, fragmento de ementa do Supremo Tribunal Federal (ADI-MC nº 1480 - Medida Cautelar na Ação Direita de Inconstitucionalidade, Relator: Min. Celso de Mello):

“(...) PARIDADE NORMATIVA ENTRE ATOS INTERNACIONAIS E NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS DE DIREITO INTERNO. - Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no sistemajurídicobrasileiro,nosmesmosplanosdevalidade,deeficáciaedeautoridadeem que se posicionam as leis ordinárias, havendo, em consequência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa. Precedentes. No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre as normas de direito interno. A eventual precedência dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras infraconstitucionais de direito interno somente se jus-tificaráquandoasituaçãodeantinomiacomoordenamentodomésticoimpuser,paraa soluçãodoconflito,aaplicaçãoalternativadocritériocronológico (lex posterior derogat priori) ou, quando cabível, do critério da especialidade. (...)”

Portanto, é perfeitamente revogável (critério cronológico) ou afastável (critério da especialidade) norma proveniente de tratado ou convenção internacional mediante lei ordinária.

Por sua vez, não denoto, outrossim, ofensa à isonomia, à razoabilidade eaonãoconfisco.ALei10.865/2004,normativoqueinstituiuoPIS/CO-FINS-importação, vedou a apropriação de créditos quando essas exações não forem efetivamente cobradas, também vedou de utilização de créditos do PIS/COFINS-faturamento quando não houver o pagamento efetivo des-sas contribuições. Ocorre que, ante a permissão anterior de creditamento, essa última vedação apenas surtiu efeitos após o prazo de noventa dias, em respeito à anterioridade inscrita no § 6º do art. 195 da CF/88.

Portanto, a leitura correta a ser feita da questão é de que a permissão ao direito de creditar o PIS/COFINS-faturamento, referente às aquisições de nafta no mercado interno, no período de 01.04.2004 a 31.07.2004, decorre apenas da observância à anterioridade nonagesimal que submete as contribuições previdenciárias ao Princípio da Não Surpresa. Trata-se de uma garantia conferida aos contribuintes, e o fato de causar o dife-rimentodaeficáciadedispositivolegalqueveiculavedaçãododireitoa crédito não pode ser utilizado como pretexto para afastar a incidência de dispositivo de lei diverso e que disciplina tributo também distinto

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(vedação de creditamento do PIS/COFINS-importação).Emais,deve-seterpresente,ainda,que,havendoconflitoentreprin-

cípios, utiliza-se a regra da preponderância sem operar a negativa de vigência ou lesão à isonomia. Dessa forma, no presente caso, confere-se eficáciaplenaànormacontidano§6ºdoart.195(PrincípiodaAnterio-ridade Nonagesimal), no período de noventa dias, até o momento em que o regime de creditamento passa a ser idêntico entre as exações incidentes no mercado interno e externo.

Ademais,afirma-senainicialqueaempresaadquireanaftapetro-químicatantonomercadointernoquantonoexterno(fl.03),fatoque,por si só, pelo menos quanto à própria impetrante, esvazia o argumento de tratamento desigual entre os adquirentes do produto nacional e do produto importado.

Porfim,nãoháfalartambémemofensaao§12doart.195daCF/88diante da impossibilidade de creditamento de mercadoria adquirida com alíquotazero:“§12.Aleidefiniráossetoresdeatividadeeconômicapara os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b, e IV do caput serão não cumulativas”.

A não cumulatividade prevista constitucionalmente para as contri-buiçõesdistingue-sedaprevisãodoIPIedoICMS,poisadefiniçãodeextensão do seu conteúdo foi relegada ao legislador infraconstitucional. E mais, diverso do sustentado pela autora, o § 12 do art. 195 da CF/88 não impõe o direito irrestrito a crédito de todos os bens ou serviços con-sumidos pela empresa na sua atividade produtiva. Referido dispositivo, alémdeincumbiràleiadefiniçãodossetoreseatividadesquepoderãoutilizar a forma não cumulativa das contribuições, também à lei incum-bedefiniromontantedocréditoeaformacomosedaráoseucálculo.Nessa medida, não se denota qualquer incompatibilidade com o § 1º do art. 15 da Lei nº 10.865/2004.

Comafinalidadeespecíficadeevitarnãosejamconhecidoseventuaisrecursos a serem manejados nas instâncias superiores, consideram-se prequestionados o Princípio da Não Discriminação constante nos tratados internacionais em matéria tributária, o § 2º do art. 5º, incisos II e IV do art. 150, § 1º do art. 145, § 12 do art. 195 da CF/88 e o art. 98 do CTN.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo da impetrante.É o voto.

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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2007.71.00.015243-1/RS

Relator: O Exmo. Sr. Des. Federal Álvaro Eduardo Junqueira

Apelantes: União Federal (Fazenda Nacional) e outroAdvogado: Dr. José Diogo Cyrillo da Silva

Apelada:PetroflexInd.eCom.S/AAdvogada: Dra. Jaqueline Oliveira dos Santos

Remetente: Juízo Substituto da 1ª VF Tributária de Porto Alegre

EMENTA

Tributário. Agravo retido. Apelação em mandado de segurança. Sus-pensão da exigibilidade dos débitos fiscais. Multa de mora. Exclusão do CADIN. CPD-EN. Compensação. Liminar cassada. Pagamento do débito atualizado em trinta dias. Art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96.

1. A pretensão esposada no agravo retido se confunde com o mérito e com ele é examinada conjuntamente.

2. Reconhecidos em liminar e sentença proferida em ação ordinária o direito ao aproveitamento dos créditos escriturais do IPI para compensa-ção dentro da cadeia do IPI e o direito à compensação do IPI recolhido indevidamente com outros tributos ou contribuições.

3. Efetuado o pagamento integral do débito, atualizado pela Taxa SELIC, dentro de trinta dias contados da publicação do acórdão que deu provimento ao apelo da União e cassou a liminar, em razão da não homologação das compensações.

4.Afastadaamulta,porquantonãoconfiguradaamorade tributopago após o vencimento com amparo em liminar, nos termos do art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/2006, o qual estabelece: “A interposição da ação judicial favorecida com a medida liminar interrompe a incidência da multa de mora, desde a concessão da medida judicial, até 30 dias após a data da publicação da decisão judicial que considerar devido o tributo ou contribuição.”

5. Em relação à multa de mora, foi suprido o vácuo legislativo pelo art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96, cuja aplicação não pode ser afastada em razão da Súmula Vinculante nº 10 do STF, mantendo-se a aplicação da Súmula 405 do STF em relação a quaisquer outros efeitos jurídicos produzidos no período amparado por liminar posteriormente cassada.

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6. Determinada a exclusão do CADIN dos débitos a título de multa.7.Agravoretido,apelaçãoeremessaoficialimprovidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo retido, à apelação e à remessaoficial,nostermosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopresentejulgado.

Porto Alegre, 10 de junho de 2009.Desembargador Federal Álvaro Eduardo Junqueira, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Álvaro Eduardo Junqueira: Trata-se de mandado de segurança objetivando a suspensão da exigibilidade dos débitosfiscaisrelacionadosemoitoprocessosadministrativos,devidosatítulodemultademora,aexclusãodoCADINe,porfim,aemissãode Certidão Positiva com Efeito de negativa (CPD-EN), em razão do recolhimento de todos os valores que pretendia compensar, dentro de trinta dias, contados da publicação do acórdão que cassou a sentença e a liminar concedida em ação ordinária. Fundamenta seu pedido no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96.

Aliminarfoiconcedida(fls.297-299).Oagravodeinstrumentodessadecisão,interpostopelaUnião(fls.304-317),foiconvertidoemretido(fls.341-346).

A Autoridade impetrada prestou informações, alegando ilegitimida-de passiva e, entendendo exigíveis os débitos constantes no âmbito da Receita Federal do Brasil e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, concluiu que a impetrante não atendia, naquela data, às condições reque-ridas para emissão de Certidão Conjunta Negativa ou mesmo Positiva com Efeitos de Negativa.

Após parecer ministerial, sobreveio sentença de parcial procedência destemandadodesegurança,confirmandooprovimentoliminar,comretificaçãododispositivoemsededeembargosdeclaratórios,restandoassim redigido:

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“ACOLHO OS PRESENTES EMBARGOS DE DECLARAÇÃO para que o dis-positivo da sentença passe a ter a seguinte redação:

‘JULGOPARCIALMENTEPROCEDENTEAAÇÃOpara,confirmandooprovi-mento liminar, determinar às autoridades coatoras que consolidem os débitos objetos dos processos administrativos acima apontados, bem como relativamente ao IPI pago em 17.11.2005, referente aos períodos de apuração de julho/01 e fevereiro/02, sem a inclusão de multa moratória ou de ofício, e subtraindo os pagamentos efetuados pelo impetrante, dentro do prazo estipulado no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96, dirigidos aos mencionados débitos, posto que cabível o lançamento de multas tão somente sobre eventuais diferenças ainda existentes, devendo as autoridade coatoras, enquanto não fizeremtaiscorreções,suspenderaexigibilidadedocréditotributáriodebatido,excluirou deixar de incluir a impetrante o CADIN, expedindo certidão positiva com efeitos de negativa, se não existirem outros débitos em aberto que não os aqui debatidos.’”

Apelou a União, requerendo, preliminarmente, a apreciação do agravo retido. Postulou a denegação da segurança, seja por inadequação da via eleita, seja pela improcedência da argumentação esposada.

Com contrarrazões vieram os autos a esta Corte.O Ministério Público Federal opinou por julgar prejudicado o agravo

retidoepeloimprovimentodaapelaçãoedaremessaoficial.AimpetranteformuloupedidoderetificaçãodabasededadosdaRe-

ceita Federal para fazer constar que o crédito encontra-se suspenso em razão de liminar concedida em mandado de segurança e expedição de CPD-EN.Opedidofoideferidopeladecisãodasfls.395-397,exaradaem 04.05.2009.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Álvaro Eduardo Junqueira:

Do agravo retido

A União interpôs agravo de instrumento, transformado em retido, postulando, em síntese, a suspensão da liminar ou a antecipação de tutela para cassar a liminar que suspendeu a exigibilidade dos créditos tributários,comreflexonaexpediçãodaCertidãoPositivadeDébitoscom Efeito de Negativa (CPD-EN), em razão da compensação errônea praticada pela impetrante, diante da ausência de prova pré-constituída de que o crédito se compõe exclusivamente de multa moratória.

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A pretensão constante no agravo retido se confunde com o mérito e com ele será examinada conjuntamente.

Da apelação

Pretende a impetrante o reconhecimento do direito líquido e certo denãosercompelidaaopagamentodedébitosfiscaisexclusivamentea título de multa de mora, relativamente aos tributos por ela pagos tem-pestivamente em 17.11.2005, conforme planilha acostada na inicial. Relaciona 08 (oito) Processos Administrativos de compensação que estão na iminência de serem inscritos em dívida ativa, os quais receberam a seguinte numeração: 13007.000170/20001-65, 13007.000180/2001-09, 13007.000199/2001-47, 13007.000208/2001-08, 13007.000225/2001-37, 13007.000238/2001-14, 13007.000245/2001-16 e 13007.000255/2002-24, bem como relativamente aos tributos pagos em 17.11.2005, nos valores de R$ 1.619,59 (IPI – Período de apuração julho de 2001) e R$ 671,89 (IPI – Período de apuração fevereiro de 2002). Pede a exclusão definitivadetaisdébitosdoCADINeordemjudicialparaqueaautori-dadecoatoranãoincluanovosdébitosfiscaissobomesmofundamento,relativamente aos tributos pagos em 17.11.2005.

A impetrante informa que ajuizou a Ação Ordinária nº 99.0017611-1, distribuída à 30ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, objetivando o reconhecimento do seu direito ao aproveitamento dos créditos escriturais do IPI nas aquisições de insumos à alíquota zero, imunes, isentos ou não tributados, para a implementação das compen-sações dentro da cadeia do IPI, bem como lhe fosse assegurado o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente de IPI em anos anteriores com exações devidas a título de outros tributos ou contribui-ções administrados pela Secretaria da Receita Federal.

Com sustentáculo naquela liminar, passou a efetuar as compensações. No entanto, o TRF da 2ª Região deu provimento à apelação da União, revogando a sentença proferida em seu favor, cujo acórdão foi publicado em 18.10.2005.

Diante da revogação da decisão/sentença que autorizava as referidas compensações, a Impetrante, em 17.11.2005, efetuou o recolhimento de todos os valores dos tributos objeto de compensação, acrescidos da taxa SELIC devida, a qual engloba juros e correção monetária, desde a

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ocorrência dos fatos geradores até o efetivo pagamento, ou seja, dentro do prazo de 30 dias contados da publicação do acórdão que revogou a sentença que lhe amparava. No entanto, menciona que a autoridade coatora pretende exigir parcelas supostamente devidas a título de mora sobre os valores principais dos tributos recolhidos tempestivamente, o que entende ser manifestamente ilegal, a teor do disposto no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96.

As autoridades impetradas informam que a cobrança decorre de com-pensações não homologadas, porque efetivadas com base em decisão não transitada em julgado. Alegam a inexistência de prova de que os débitos serefiramamultademora.

Aimpetrante,porsuavez,afirmaqueacobrançadesconsiderouofatodeque,quandofizeraascompensações,tinharespaldojudicialparatale que pagou, sem acréscimos moratórios, tão logo reformada a decisão judicial que lhe respaldava. Entende que a consolidação do débito sem considerar tais fatos implica, certamente, em indevida cobrança de multa de mora incidente sobre os tributos que foram pagos fora do vencimento, porque albergados pela suspensão decorrente de decisão judicial.

De fato, a leitura do parecer administrativo revela que não foi tomado conhecimento dos pedidos de compensação e não foram homologadas as compensações, porque não amparadas por decisão judicial transitada em julgado.

Nesse caso, desconsiderou o Fisco a liminar da 30ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, que autorizara a compensação na época em que efetivada. Somente após a insubsistência da liminar, deixoudeexistiróbiceàexigênciadodébitofiscal,oqual,todavia,foidevidamente pago dentro de trinta dias a contar do acórdão que revogou a liminar e a sentença concessiva da segurança.

Entende a impetrante que não são devidos os acréscimos moratórios no prazo de vigência da liminar suspensiva, porque o pagamento da dívida se deu dentro de 30 dias depois da intimação do acórdão que reformou a sentença e revogou a medida liminar, pois a exigibilidade estava sus-pensa, na forma do art. 151, IV, do CTN, consoante o disposto no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96, a seguir transcrito:

“Art. 63. Não caberá lançamento de multa de ofício na constituição do crédito tributário destinada a prevenir a decadência, relativo a tributos e contribuições de

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competência da União, cuja exigibilidade houver sido suspensa na forma do inciso IV do art. 151 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. (Vide Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001)

(...)§ 2º A interposição da ação judicial favorecida com a medida liminar interrompe

a incidência da multa de mora, desde a concessão da medida judicial até 30 dias após a data da publicação da decisão judicial que considerar devido o tributo ou contribuição.” (grifo nosso)

Como visto, a leitura desse dispositivo legal é clara e afasta a exi-gibilidade de multa de mora se o principal for pago em até trinta dias, contados da publicação da decisão judicial que considerar devido o tributo ou contribuição.

Assim,nãoháfalaremmora,parafinsdeaplicaçãodemulta,seotributo não foi pago no vencimento, porque respaldado por medida limi-nar em ação judicial que objetivava, justamente, obter a quitação desses tributos mediante compensação, situação expressamente prevista pelo legislador, que editou norma legal protetiva, plasmada no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96.

No caso em lide, o acórdão que revogou a sentença de procedência do pedido de compensação de créditos do IPI e, em consequência, a liminar outrora concedida na Ação Ordinária nº 99.0017611-1 foi pu-blicado em 18.10.2005. A impetrante efetuou o pagamento dos tributos em 17.11.2005 (principal acrescido da taxa SELIC), tão logo reformada a decisão que lhe autorizava a compensação, ou seja, dentro do prazo de 30 dias após a publicação do acórdão que considerou devido o tributo, na forma da lei.

Assim, tenho que merece ser prestigiado o disposto no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96, que ampara a pretensão da impetrante. Afasto, pois, a multa de mora, incidente sobre o débito já quitado, no período amparado pela liminar concedida na ação ordinária.

Nesse sentido, o acórdão da Primeira Turma deste TRF, recentemente publicado, a saber:

“EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. DEPÓSITOS JUDICIAIS. ART. 63, § 2º, DA LEI Nº 9.430/96. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

1. Consoante exposto no art. 106, II, c, do CTN, a Lei aplica-se a ato ou fato pre-térito,tratando-sedeatonãodefinitivamentejulgado,quandolhecominepenalidademenos severa que a prevista na Lei vigente ao tempo da sua prática.

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2. O art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96 estabelece que ‘a interposição da ação judicial favorecida com a medida liminar interrompe a incidência da multa de mora, desde a concessão da medida judicial até 30 dias após a data da publicação da decisão judicial que considerar devido o tributo ou contribuição.’

3. Mantidas a condenação das partes ao pagamento das custas processuais e dos honoráriosadvocatíciosnostermosfixadospeloMM.Juízoa quo, uma vez que em con-formidade com o art. 20, § 4º, do CPC.” (TRF4, REOAC nº 2006.71.99.002398-4/RS, Rel. Des. Federal Joel Ilan Paciornik, Primeira Turma, j. em 18.03.2009, D.E. de 25.03.2009)

Não desconheço, todavia, o teor da Súmula nº 405 do Supremo Tribu-nal Federal, que vem sendo aplicada por aquele areópago superior e pelo Superior Tribunal de Justiça, cujo enunciado é o seguinte: “Denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto,ficasemefeitoaliminarconcedida,retroagindoosefeitosda decisão contrária”.

Considero válido o mandamento sumular em relação a quaisquer ou-tros efeitos jurídicos produzidos no período amparado por liminar, poste-riormente cassada, mas, em relação à multa, prestigio a clara manifestação de vontade do legislador de dispensar o contribuinte do pagamento de multa pelo atraso no pagamento de tributo, quando amparado por me-dida liminar até trinta dias após a publicação da decisão revogadora da proteção judicial, enunciada no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96.

Não se trata de desrespeito a orientação superior, mas de aplicação das novas orientações, emanadas justamente do Supremo Tribunal Federal, mais condizente com a realidade social e jurídica contemporânea, por meio da Súmula Vinculante nº 10, com o seguinte enunciado:

“Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.”

Como visto, nova ordem advém do Supremo Tribunal Federal e não mais se pode simplesmente desprestigiar a atividade legislativa e a edição denormalegal,quebuscaregulamentarepacificarconflitosadministra-tivos e jurídicos, surgidos, justamente, do confronto entre a aplicação de disposição sumular e a legislação de regência.

Trata-se, pois, de confrontar duas súmulas do STF, a Súmula nº 405, de 06.07.1964, e a Súmula Vinculante nº 10, de 27.06.2008.

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A Súmula nº 405 foi aprovada na Sessão Plenária de 01.06.1964, DJU de 06.07.1964, p. 2181, tendo por referência legislativa o art. 7º, II, e o art. 12 da Lei do Mandado de Segurança nº 1533/1951. Tais dispositivos legais têm a seguinte redação:

“Art. 7º - Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:I - Omissis;II - que se suspenda o ato que deu motivo ao pedido quando for relevante o funda-

mentoedoatoimpugnadopuderresultaraineficáciadamedida,casosejadeferida.”“Art. 12 - Da sentença, negando ou concedendo o mandado, cabe apelação.Parágrafoúnico.Asentençaqueconcederomandadoficasujeitaaoduplograude

jurisdição, podendo, entretanto, ser executada provisoriamente.”

Comovisto,nãoháconflitoentreosarts.7º,II,e12daLeinº1.533/51e o art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96, mas entre esse último dispositivo legal e a Súmula 405 do STF, que orientava situação não prevista na Lei nº 1533/51, qual seja, o adequado tratamento a ser dado aos efeitos jurí-dicos produzidos durante a concessão de medida liminar, posteriormente cassada. Todavia, em relação à multa de mora, o vácuo legislativo foi suprido pelo art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96 e deve ser prestigiado, sob pena de transformar o juiz em legislador positivo.

Deve ser levado em conta que a Súmula 405 do STF foi editada numa ambientação político-social dos anos 60, ainda sob a égide da Consti-tuição Federal de 1946.

Já a Súmula Vinculante nº 10, publicada no DJE nº 117/2008, p. 1, em 27.06.2008, foi editada sob os auspícios do novo norte constitucio-nal emanado do Supremo Tribunal Federal, na tentativa de debelar a enxurrada de processos repetitivos que adentram aquela Corte Superior, oriundos de todo o território nacional, com decisões muitas vezes con-flitantescomaorientaçãosuperior.

E da Súmula Vinculante nº 10 extrai-se a vedação expressa de afastar a aplicação da lei, por órgão fracionário de tribunal, sem que seja declarada a inconstitucionalidade pelo Plenário ou Corte Especial. Todavia, nestes autos não foi aventada a inconstitucionalidade do disposto no § 2º do art. 63 da Lei nº 9.430/96 pela União Federal, pois trata-se de benefício protetivo em favor do contribuinte. Nesse caso, tenho que o correto é afastar a aplicação da Súmula 405 do STF, em relação à multa de mora, prestigiando a Súmula Vinculante nº 10 e a nova regulamentação legis-

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lativa atinente à matéria.De conseguinte, a regra do § 2º não está em dissonância com o disposto

no caput do art. 63 da Lei nº 9.430/96, o qual alude à possibilidade de lançamento, relativo a crédito tributário cuja exigibilidade esteja suspensa pordecisãojudicial,afimdeevitaraocorrênciadadecadência.Ouseja,aleipermitequeaautoridadefiscalpromovaolançamento,aindaquesuspensa a exigibilidade do crédito por decisão judicial, porém veda a inclusãodamultadeofícionesseatofiscal,mesmoapósconcluídooprocesso judicial, se o contribuinte quita o débito dentro de trinta dias da publicação da decisão em que cassada a liminar.

Quanto à alegação da União, nas suas razões de apelação, de inade-quação da via eleita, não merece maiores considerações, pois a pretensão da impetrante diz respeito, unicamente, à exclusão da multa de mora, em razão do pagamento integral dos tributos devidos, corrigidos pela SELIC, dentro de trinta dias, a contar da publicação do acórdão que cassou a liminar concedida em ação ordinária, na forma do art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96.

Oimpetranteafirmouqueoslançamentossetratavamexclusivamentede multa de mora e cabia à Fazenda Nacional evidenciar que a exigên-ciafiscalabrangiaoutrasrubricas,enãosimplesmentealegar,poiseradela o ônus da prova, e não do impetrante, nos termos do art. 333, II, do CPC.

Anoto que, ao contrário do asseverado na petição da União, acostada às fls.404/407,dandocontadequeaapelaçãodaautora,naAçãoOrdinárianº 99.0017611-1, foi recebida no duplo efeito e, portanto, não poderia ela proceder à compensação, trata-se também de fato desconstitutivo do direito da autora e deveria ter sido apresentado pela Autoridade Coatora juntamente com as informações prestadas, e não agora, na véspera da sessão de julgamento do seu apelo, em sede mandamental que não admite dilação probatória.

De todo modo, a informação a respeito do recebimento da apelação no efeito suspensivo, obstativa da compensação efetuada, além de ter vindo aos autos de forma inoportuna e fora do prazo que lhe competia, é inócua, porquanto o acórdão prolatado naquela ação ordinária afastou o direito à compensação, decisão que obrigou a autora a pagar o valor integral do débito que havia compensado indevidamente, porém sem a

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multa de mora, com sustentáculo no art. 63, § 2º, da Lei nº 9.430/96. E a exigência do pagamento da multa por parte da União deu causa ao ajuizamento deste mandamus.

Somente em relação a esta alegação da Fazenda Nacional, de que nos processos administrativos não se cuida apenas de multa moratória e que isso não está comprovado nos autos, a MM. Juíza a quo, considerando que o instrumento processual eleito não se presta à dilação probatória, pelo princípio da eventualidade, entendeu que não é possível excluir definitivamenteosdébitosemsuaintegralidade,razãodaparcialpro-cedência da ação.

Neste contexto, mantenho a sentença de parcial procedência e o provi-mentoliminarconcedidoàsfls.297-299,naausênciaderecursodaparteimpetrante, devendo ser excluída a multa moratória dos oito processos administrativos nos 13007.000170/20001-65, 13007.000180/2001-09, 13007.000199/2001-47, 13007.000208/2001-08, 13007.000225/2001-37, 13007.000238/2001-14, 13007.000245/2001-16 e 13007.000255/2002-24, bem como relativamente aos tributos pagos em 17.11.2005, nos valores de R$ 1.619,59 (IPI - Período de apuração julho de 2001) e R$ 671,89 (IPI – Período de apuração fevereiro de 2002).

Determino,também,aexclusãodefinitivadetaisdébitosdoCADIN,se compostos exclusivamente de multa moratória, bem como a não in-clusãodenovosdébitosfiscaissobomesmofundamento,relativamenteaos tributos pagos em 17.11.2005.

Ante o exposto, voto por negar provimento ao agravo retido, à ape-laçãoeàremessaoficial.

É o voto.

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APELAÇÃO CÍVEL Nº 2008.72.08.004169-8/SC

Relatora: A Exma. Sra. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida

Apelante: Orientador Alfandegário Com. Imp. e Exp. Ltda.Advogados: Drs. Maria Cecilia Paifer de Carvalho e Kelmer Pozzebom

Apelada: União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: Dr. José Diogo Cyrillo da Silva

EMENTA

Tributário. Mandado de segurança. Importação de mercadorias. Pro-cedimento especial de fiscalização. IN 206/02. Retenção de mercadorias. Sigilo de dados fiscais. Importação por conta e ordem de terceiro ou por encomenda. Necessidade de prévia habilitação. Ocultação do verdadeiro importador. Pena de perdimento.

1. A Lei n.º 10.637/2002, ao dar nova redação ao art. 23 do Decreto-Lei n.º 1455/76, criou outra hipótese à aplicação da pena de perdimento da mercadoria, que diz respeito às pessoas e empresas envolvidas em ocultação do verdadeiro responsável pela importação.

2. Conforme entendimento manifestado pela Corte Especial deste TRF quando do julgamento do incidente de arguição de inconstitucionalidade na AMS n.º 2005.72.01.000181-9, Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona, D.E. publicado em 17.12.2007, não há vício de inconstitu-cionalidade nos §§ 2º e 3º do art. 11 da Lei 9.311/96, nos arts. 5º e 6º da Lei Complementar n.º 105/2001 e no art. 1º da Lei 10.174/2001, na parte que deu nova redação ao § 3º do art. 11 da Lei 9.311/96. Até o advento da Lei 9.311/96, as informações obtidas mediante a “quebra” do sigilo bancáriodiretamentepelaautoridadefiscalnãopoderiamoriginarlança-mento tributário. Na sua vigência, era possível o lançamento tributário concernente apenas à CPMF. Após a Lei 10.174/01, facultou-se ao Fisco a utilização das informações bancárias concernentes à CPMF para ins-taurarprocedimentoadministrativoobjetivandoverificaraexistênciadecrédito tributário relativo a outras contribuições e impostos, bem como para o respectivo lançamento.

3. Não há confundir a base física em que dispostos os dados com a pro-teção constitucional à comunicação dos mesmos. Precedentes do e. STF.

4. Consoante o artigo 2º da IN/SRF n.º 225/2002, é necessária a habili-

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tação prévia do importador em operação por conta e ordem do adquirente ou por encomenda, mediante a apresentação do contrato, dentre outros documentos, à Receita Federal.

5. Mercadoria importada pode ser retida pela autoridade alfandegária para que se apure a ocorrência de irregularidade punível com a pena de perdimento, desde que estejam demonstrados veementes indícios de sua existência (art. 68 da Medida Provisória n.º 2158/2001).

6. A Instrução Normativa n.º 228/2002 dispõe sobre o procedimento especialdeverificaçãodaorigemdosrecursosaplicadosemoperaçõesde comércio exterior e combate à interposição fraudulenta de pessoas.

7.Nocasodosautos,háprovassuficientesdeindíciosque,consoanteas máximas de experiências, legitimam a presunção de existência de ocultação dolosa do real importador.

8. A importação por conta e ordem de terceiro e/ou por encomenda não observou a prévia habilitação.

9. A superveniência da Lei 11.281/2006 não alterou a situação dos autos. A novel legislação (ao considerar que a importação promovida por pessoa jurídica importadora que adquire mercadorias no exterior para revenda a encomendante predeterminado não mais caracterizaria importação por conta e ordem de terceiros) manteve a necessidade de habilitação prévia da importadora.

10. A pena de perdimento deve ser imposta aos casos em que a in-terposição fraudulenta é presumida com fundamento em operação co-mercial na qual a interposta empresa não possui capacidade econômica demonstrada, ou seja, os recursos são, na verdade, da real importadora. Análise da legislação aduaneira.

11. Sentença mantida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedopre-sente julgado.

Porto Alegre, 09 de junho de 2009.Juíza Federal Vânia Hack de Almeida, Relatora.

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RELATÓRIO

A Exma. Sra. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida: Orientador Alfan-degário Comércio e Importação impetrou ação mandamental contra ato do Delegado da Receita do Brasil em Itajaí/SC objetivando a liberação de mercadorias apreendidas sob a acusação de que a importação se deu para ocultação do sujeito passivo. Alegou, em síntese, ilegalidade da medida, ausência de fraude e dano ao erário e nulidade das diligências que culminaram com o perdimento (violação ao sigilo de correspondência einviolabilidadedodomicílioprofissionaleausênciadeperícia).

Aliminarfoiindeferida(fl.232).Notificada,aautoridadeimpetradadefendeuoato,alegandoque:[1] o exame dos documentos mantidos em arquivos magnéticos

relacionados ao procedimentofiscal é autorizado pela legislação deregência;

[2] as diligências e investigações promovidas comprovaram a ocul-tação do verdadeiro comprador das mercadorias, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros; e

[3] o dano ao erário não se restringe ao caráter pecuniário das exações.

Na sentença, a segurança foi denegada.A parte autora apelou, repisando as alegações da exordial.Com as contrarrazões e parecer do Ministério Público Federal

pelo desprovimento do recurso, vieram os autos para julgamento. É o relatório.

VOTO

A Exma. Sra. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida:

I – Do procedimento fiscal-aduaneiro

As mercadorias importadas podem ser retidas pela autoridade al-fandegária para que se apure a ocorrência de irregularidades puníveis com a pena de perdimento, consoante o art. 68 da Medida Provisória n.º 2.158/01, verbis:

“Art. 68. Quando houver indícios de infração punível com a pena de perdimento, a mercadoria importada será retida pela Secretaria da Receita Federal até que seja

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concluídoocorrespondenteprocedimentodefiscalização.Par. único. O disposto neste artigo aplicar-se-á na forma a ser disciplinada pela

Secretaria da Receita Federal, que disporá sobre o prazo máximo de retenção, bem assim às situações em que as mercadorias poderão ser entregues ao importador, antes da conclusão doprocedimento defiscalização,mediante a adoçãodas necessáriasmedidasdecautelafiscal.”

Afimderegularosprocedimentosdeinvestigaçãodasinfraçõessu-jeitas à pena de perdimento, foram editadas pela Secretaria da Receita Federal as Instruções Normativas nos 206 e 228/2002. Veja-se o que dispõem os arts. 65 e 66 da IN/SRF 206/2002:

“Art. 65. A mercadoria introduzida no País sob fundada suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento ou que impeça seu consumo ou comercialização no País será submetida aos procedimentos especiais de controle aduaneiro estabelecidos neste título.

Parágrafo único. A mercadoria submetida aos procedimentos especiais a que se refereesteartigoficaráretidaatéaconclusãodocorrespondenteprocedimentodefis-calização, independentemente de encontrar-se em despacho aduaneiro de importação ou desembaraçada.

Art. 66. As situações de irregularidade mencionadas no artigo anterior compreendem, entre outras hipóteses, os casos de suspeita quanto:

(...)V - à ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável

pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiro; ou

VI - à existência de fato do estabelecimento importador ou de qualquer pessoa envolvida na transação comercial.

(...)§ 3º Nos casos dos incisos V e VI do caput deste artigo, a autoridade aduaneira

poderá considerar, entre outros, os seguintes fatos:I - importação de mercadorias em volumes ou valores incompatíveis com as insta-

lações físicas ou com o patrimônio do importador;II - ausência de histórico de importações da empresa na unidade de despacho;III - opção questionável por determinada unidade de despacho, em detrimento de

outras que, teoricamente, apresentariam maiores vantagens ao importador, tendo em vistaalocalizaçãodoseudomicíliofiscal,otrajetoeomeiodetransporteutilizadosou a logística da operação;

IV - existência de endosso no conhecimento de carga, ressalvada a hipótese de endosso bancário;

V - conhecimento de carga consignado ao portador;VI - ausência de fatura comercial ou sua apresentação sem a devida assinatura,

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identificaçãodosignatárioeendereçocompletodovendedor;VII - aquisição de mercadoria de fornecedor não fabricante:a)sediadoempaísconsideradoparaísofiscalouzonafrancainternacional;b) cujo endereço exclusivo seja do tipo caixa postal; ouc) que apresente qualquer evidência de tratar-se de empresa de fachada.”

Nos termos do art. 69 da Instrução Normativa n.º 206, “as mercado-riasficarãoretidaspelafiscalizaçãopeloprazomáximodenoventadias,prorrogávelporigualperíodo,emsituaçõesdevidamentejustificadas”.

Já a Instrução Normativa n.º 228/02 dispõe sobre “o procedimento especialdeverificaçãoaorigemdosrecursosaplicadosemoperaçõesdecomércio exterior e combate à interposição fraudulenta de pessoas”.

Uma vez apreendida a mercadoria, cabe esclarecer que sua liberação pode ser condicionada ao oferecimento de garantia, consoante art. 80, II, da Medida Provisória n.º 2.158/2001, verbis:

“Art. 80. A Secretaria da Receita Federal poderá:(...)II - exigir prestação de garantia como condição para a entrega de mercadorias,

quando o valor das importações for incompatível com o capital social ou o patrimônio líquido do importador ou do adquirente.”

Também é importante ressaltar que não se pretende, com o procedi-mentoespecialdefiscalização,opagamentodetributos,sendoinoportunaa invocação das Súmulas 323 e 547 do STF. É que se trata de investigação específicasobreorigemderecursosempregadosnaimportaçãoesobrepossível pessoa fraudulentamente interposta.

Esta Turma já entendeu que, além de ser lícito o procedimento de fiscalização especial com retenção demercadoria, a falta de regularprocesso administrativo não implicaria violação ao princípio do devido processo legal e à ampla defesa. Nesse sentido, os seguintes acórdãos de minha relatoria: AI 2004.04.01.007217-7/PR, DJU 23.06.2004, e AI 2004.04.01.0089372, DJU 23.06.2004, bem como a decisão no AI n.º 2003.04.01.003644-2, j. 29.04.2003, cuja relatoria é do eminente Des. Federal João Surreaux Chagas, o qual, na ocasião, bem salientou:

“(...) Trata-se, pois, de procedimento investigatório, em que a autoridade coleta provas,equivalenteaoiníciodaaçãofiscal.Oprocedimentoemquestãosomentepodeser admitido como preparatório de eventual e futuro processo administrativo previsto no art. 27 e seguintes do Decreto-Lei 1.455, de 07.04.76 (arts. 544 e ss. do Regulamento

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Aduaneiro) para a aplicação da pena de perdimento da mercadoria. Aliás, a existência deaçãofiscalqueantecedeequeépreparatóriadeeventualprocessoadministrativo,anterior à formalização do auto de infração e da abertura de prazo para defesa, é habitual noprocessoadministrativofiscal,nãorepresentandonenhumanovidade.

A peculiaridade do caso é que, enquanto as investigações preliminares se desenvol-vem,asmercadoriasficamretidas,mashábaselegalparatanto(...).”

De outra banda, saliento que a prova da existência de interposta pessoa em importação não é condicionante do próprio ato cautelar de apreensão de mercadorias.

De fato, trata-se de procedimento preparatório do devido e posterior (sejustificado)procedimentoadministrativodeperdimento.

Portanto, o Fisco, diante de iniciais e “fundados” indícios de interposta pessoa em importação, pode (e deve) reter mercadorias para acautelar os interesses alfandegários, até que consequente investigação constitua o suporte do eventual ato efetivamente punitivo (no caso, perdimento).

Nesse sentido, vem decidindo esta Turma, em casos análogos ao destes autos, como, por exemplo, no AI n.º 2003.04.01.024882-2, Rel. Des. Federal Dirceu de Almeida Soares, julgado na sessão de 20.08.2003, unânime, ou no AI n.º 2004.04.01.010962-0, Relator Des. Federal Antô-nio Albino Ramos de Oliveira, sessão de 22.06.2004, unânime.

E quanto aos indícios, na espécie, basta a leitura das informações da autoridade impetrada, bem como do próprio reconhecimento da impe-trante, o que se verá adiante na análise do mérito.

Adiante,passoaanalisaroacessoaosdadosfiscais.Entendo que o exame dos documentos mantidos em arquivos magnéti-

cos,concernentesaoprocedimentofiscalemapuração,encontraamparono art. 34 da Lei 9.430/96, que preceitua: “Art. 34. São também passí-veis de exame os documentos do sujeito passivo, mantidos em arquivos magnéticosouassemelhados,encontradosnolocaldaverificação,quetenham relação direta ou indireta com a atividade por ele exercida”.

Defato,acolendaCorteEspecialdesteTRFjáafirmouqueasinfor-maçõesfiscaispodemserdiretamenteacessadaspeloFiscosempréviaordem judicial, conforme o seguinte julgado:

“INCIDENTE DE ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. PARÁGRA-FOS 2º e 3º DO ART. 11 DA LEI 9.311/96, ARTS. 5º e 6º DA LEI COMPLEMENTAR N.º 105/2001 E ART. 1º DA LEI 10.174/2001, NA PARTE QUE DEU NOVA REDA-

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ÇÃO AO PARÁGRAFO 3º DO ART. 11 DA LEI 9.311/96. SIGILO BANCÁRIO. QUEBRA PARA FINS DE INSTRUÇÃO DE PROCEDIMENTO FISCAL. PRINCÍPIO DA RESERVA DE JURISDIÇÃO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO CONSTITU-CIONAL. REJEIÇÃO DO INCIDENTE.

1. Os arts. 11, §§ 2° e 3°, da Lei n° 9.311/96 e 5° e 6° da Lei Complementar n° 105/2001,aoregularemaquebradosigilobancárioparafinstributários,nãolesarama tutela do direito à privacidade conferida pela Constituição de 1988.

2. As normas que versam sobre sigilo bancário devem ser interpretadas levando em conta o conjunto principiológico da Constituição, e dessa diretriz sobressaem duas premissas básicas que devem nortear o intérprete: é obrigação precípua do Poder Público combaterasonegação,demodoapropiciarocusteiodasnecessidadesfinanceirasdoEstado,eosistemafinanceirodeveservirdeelementoestruturantedapromoçãododesenvolvimento do País e dos interesses da coletividade. Lições na doutrina.

3. O legislador preservou a privacidade do cidadão, instituindo mecanismo cercado de garantias, que apenas transfere a obrigação de sigilo da instituição bancária para a autoridadefiscal.Nãoérazoávelque,semprequehouveranecessidadedeacessoàvidafinanceiradaspessoasfísicasoujurídicasporpartedafiscalizaçãotributária,sejaa Administração instada a provocar o Judiciário para tanto. Sentindo-se o contribuinte prejudicado com a quebra de seu sigilo, por se apresentar a ação da autoridade arbitrária, pode, então, provocar a tutela jurisdicional. É de se presumir a legitimidade da ação das autoridades constituídas, devendo o contrário ser provado.

4. Não há vício de inconstitucionalidade nos §§ 2º e 3º do art. 11 da Lei 9.311/96, nos arts. 5º e 6º da Lei Complementar n.º 105/2001 e no art. 1º da Lei 10.174/2001, na parte que deu nova redação ao § 3º do art. 11 da Lei 9.311/96.” (Incidente de arguição de inconstitucionalidade na AMS n.º 2005.72.01.000181-9, Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona, D.E. publicado em 17.12.2007)

De outro norte, não há confundir a base física em que dispostos os dados com a proteção constitucional à comunicação dos mesmos, como bem expressou o eminente Ministro Sepúlveda Pertence (relator) em conhecido julgado do e. STF, cuja ementa colaciono:

“(...) II. Quebra de sigilo bancário: prejudicadas as alegações referentes ao decreto que a determinou, dado que a sentença e o acórdão não se referiram a qualquer prova resultante da quebra do sigilo bancário, tanto mais que, dado o deferimento parcial de mandado de segurança, houve a devolução da documentação respectiva.

III. Decreto de busca e apreensão: validade.1.Decretoespecíficoquesomentepermitiuqueasautoridadesencarregadasda

diligênciaselecionassemobjetosdentreaquelesespecificadosnadecisãoenasededas duas empresas nela indicadas e que fossem ‘interessantes à investigação’, que, no caso, tinha pertinência com a prática do crime pelo qual foi efetivamente condenado o recorrente.

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2. Ademais, não se demonstrou que as instâncias de mérito tenham invocado prova não contida no objeto da medida judicial nem tenham valorado qualquer dado resul-tante da extensão dos efeitos da decisão determinante da busca e apreensão, para que a Receita Federal e a ‘Fiscalização do INSS’ também tivessem acesso aos documentos apreendidos,parafinsdeinvestigaçãoecooperaçãonapersecuçãocriminal,‘observadoo sigilo imposto ao feito’.

IV - Proteção constitucional ao sigilo das comunicações de dados – art. 5º, XVII, da CF: ausência de violação, no caso.

1. Impertinência à hipótese da invocação da AP 307 (Pleno, 13.12.94, Galvão, DJU 13.10.95), em que a tese da inviolabilidade absoluta de dados de computador não pode ser tomada como consagrada pelo Colegiado, dada a interferência, naquele caso, de outra razãosuficienteparaaexclusãodaprovaquestionada–otersidoomicrocomputadorapreendido sem ordem judicial e a consequente ofensa da garantia da inviolabilidade do domicílio da empresa – este segundo fundamento, sim, bastante aceito por votação unânime, à luz do art. 5º, XI, da Lei Fundamental.

2. Na espécie, ao contrário, não se questiona que a apreensão dos computadores da empresa do recorrente se fez regularmente, na conformidade e em cumprimento de mandado judicial.

3. Não há violação do art. 5º, XII, da Constituição, que, conforme se acentuou na sentença, não se aplica ao caso, pois não houve ‘quebra de sigilo das comunicações de dados (interceptação das comunicações), mas sim apreensão de base física na qual se encontravam os dados, mediante prévia e fundamentada decisão judicial’.

4. A proteção a que se refere o art. 5º, XII, da Constituição é a da comunicação ‘de dados’, e não a dos ‘dados em si mesmos’, ainda quando armazenados em computador (cf. voto no MS 21.729, Pleno, 05.10.95, rel. Néri da Silveira - RTJ 179/225, 270). (...)” (RE 418416/SC, julgamento 10.05.2006, Tribunal Pleno)

Ademais,sealeipermitequeosagentesdafiscalizaçãofazendáriatenham acesso a todos os documentos atinentes ao exercício das ativi-dades empresariais da pessoa jurídica, não faz sentido que os mesmos documentos, por se materializarem em meio eletrônico, estejam imunes àaçãofiscalizatória.

Nesse sentido, veja-se a jurisprudência deste Regional:“PENAL. SONEGAÇÃO FISCAL E CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEI-

RO. CONTINUIDADE DELITIVA. LEI POSTERIOR MAIS SEVERA. SÚMULA 711 DO STF. PRESCRIÇÃO. CONCURSO FORMAL IMPERFEITO. DECISÃO ADMINISTRATIVA DO BACEN. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. SEPARAÇÃO DAS ESFERAS. CONCURSO APARENTE DE NORMAS. PRINCÍPIO DA CON-SUNÇÃO ENTRE OS ARTIGOS 1º DA LEI 8.137/90 E 21, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 7.492/86. MATERIALIDADE. DOCUMENTOS EM IDIOMA ESTRANGEIRO. PROVAS OBTIDAS MEDIANTE ATUAÇÃO DA RECEITA FEDERAL. QUEBRA

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DE SIGILO BANCÁRIO. AUTORIA. EXCLUSÃO DA CULPABILIDADE. INE-XIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA. DOSIMETRIA. CULPABILIDADE. SUBSTITUIÇÃO DA PENA.

(...)9. Não se depreendendo dos autos o mínimo indício de que a conduta dos Auditores

Fiscais do Tesouro Nacional extrapolou os limites da legalidade, não há se falar em vício naapreensãodoslivroscontábeisenotasfiscaisdapessoajurídica(documentoscomcaráterpúblico)duranteafiscalização,umavezque,emnomedointeressecoletivo,taisagentes atuam sob a tutela do poder de polícia. (...)” (TRF4, ACR 2002.04.01.002257-8, Oitava Turma, Relator Luiz Fernando Wowk Penteado, DJ 22.03.2006)

De outra banda, destaco que a impetrante não produziu prova do-cumental prévia sobre a existência de violação de correspondências pessoais (comunicação constitucionalmente protegida). Apenas valeu-se decitaçõesvagasderelatosdosagentesfiscais.

E saliento que tal produção e análise de prova não seria possível na via estreita do mandamus.

Porfimeomaisimportante,há informação nos autos de que os re-presentantes da impetrante consentiram com o acesso da fiscalização aos dados.

Portanto, mantenho a sentença no ponto.

II – Do mérito – interposta pessoa em importação

Compulsandoosautos,constatoexistirprovadeindíciossuficientesque, consoante as máximas de experiência, legitimam a presunção de ser a impetrante interposta pessoa em importação.

Vejam-se, para evitar tautologia, as informações lançadas na sentença:

“(...) No caso dos autos, consoante a cópia integral do Auto de Infração e informações apresentadas, conclui-se que, muito embora a impetrante seja empresa que atue no ramo de importação, ela serviu de intermediária para a importação destinada à empresa Aco-plamento Comércio Ltda, sem, contudo, cumprir as obrigações acessórias necessárias paraaidentificação.Emoutraspalavras,acomprafoirealizadapelaAcoplamento,masa internalização da mercadoria foi feita pela impetrante. É evidente que não se proíbe que a impetrante adquira as mercadorias e, posteriormente, as comercialize com quem quer que seja. Veda-se, sim, que ela sirva de mera intermediária da compra realizada para ocultar a real destinatária, especialmente omitindo-se a declarar o fato.

Colhodoautodeinfração(fls.278/279):‘A caracterização da ocultação da ACOPLAMENTO como real compradora das

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mercadorias por meio da interposição fraudulenta da ORIENTADOR pode ser resumida da seguinte forma:

1) A ACOPLAMENTO negocia diretamente com o exportador e representante de venda no exterior a compra de motores de embarcação da marca Caterpillar (vide fls.124,128e129).OSr.CLOVISdetémconhecimentoarespeitodeimportaçãodemotores de embarcações, uma vez que ele próprio cota os preços dos exportadores por meiodeumsistemadecotaçõesemtemporeal(fl.140);

2) O Sr. CLOVIS é quem gerencia toda a transação e operação de importação dosmotoresamparadospeloconhecimentodecargaOE6006-078-A(fls.128,129,132 e 138);

3) O Sr. CLOVIS procura a GOLDEN TRADE para que esta realize a operação de importação dos motores por conta própria, em dissonância ao que reza a IN SRF nº 225 de 2002;

4) A GOLDEN TRADE peticiona junto à Receita Federal em Itajaí a intenção de nacionalizar os motores apresentando conhecimento de carga consignado a ela e faturas comerciaisfigurandocomoadquirente(fls.34e35);

5)Porcontadetersidosubmetidaaprocedimentoespecialdefiscalizaçãodeope-rações de comércio exterior à época, a GOLDEN TRADE comunica ao Sr. CLOVIS a intençãoderegularizarodespachodenacionalizaçãodosmotores(fls.130e131);

6) O Sr. CLOVIS não aceita a proposta da GOLDEN TRADE e procura o Sr. LUIZ RAMOS(BASKA)pararealizaraoperaçãoporcontaprópriadaORIENTADOR(fls.128 e 130);

7) O Sr. CLOVIS demonstra intenção de devolver os motores para o exterior e reaver os valores adiantados para a nacionalização, uma vez que a ORIENTADOR estava com o CNPJ em situação inapta à época, o que foi revertido posteriormente (fls.134e135);

8) A ORIENTADOR registra a DI dos motores como importação por conta própria (fls.69a72);

9) A Sra. ELIANE (ORIENTADOR) solicita adiantamento de cerca de R$ 70 mil paraoSr.CLOVIScomvistasapagaraarmazenagemdosmotores(fls.142e143);

10) O Sr. CLOVIS transfere os valores solicitados pela preposta da ORIENTADOR (fls.150e151);

11) A ORIENTADOR, por meio da BASKA (comissária/assessora em comércio exterior), paga o Porto de Itajaí com os recursos advindos da ACOPLAMENTO/Sr. CLOVIS(fls.155e156);

Desta forma, restou caracterizado que o Sr. CLOVIS, proprietário da ACOPLA-MENTO, transacionou com o exportador encomendando os motores, gerenciou o embarque, buscou e contratou uma trading disposta a registrar a operação por conta própria, recusou regularizar o processo de importação por conta e ordem de terceiros como sugerido pela GOLDEN TRADE, adiantou recursos para pagamento de despesas atinentes ao processo de importação e gerenciou todas as etapas da nacionalização,

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inclusivecogitandoadevoluçãodosmesmosaoexteriorporcontadedificuldadescoma trading contratada (ORIENTADOR).’”

Outrossim, a própria impetrante admite ser terceira pessoa em impor-tação. Todavia, alega que a operação teria sido uma regular importação por conta e ordem de terceiro ou por encomenda, o que afastaria a pena de perdimento.

A Lei nº 10.637/2002, ao alterar a redação do art. 23 do Decreto-Lei nº 1.455/76, criou nova hipótese à aplicação da pena de perdimento, que diz respeito às pessoas e empresas envolvidas em interposição fraudu-lenta de terceiros:

“Art. 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:(...)V - estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocul-

tação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros.

§ 1º. O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será punido com a pena de perdimento das mercadorias.

§ 2º. Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.”

No que se refere à operação por conta e ordem de terceiro ou a por encomenda, considero impossível admiti-las no caso dos autos.

De fato, ao efetuar o registro da Declaração de Importação, a empresa inseriu informação falsa, pois declarou ser o adquirente o próprio im-portador, o que não condiz com a realidade. Conforme o art. 2º da IN/SRF nº 225/2002, é necessária a habilitação prévia do importador por conta e ordem do adquirente ou indicação do encomendante, no caso de importação por encomenda, tudo mediante a apresentação do contrato, dentre outros documentos. E tal providência é fundamental à lisura da operação.

A empresa impetrante, portanto, não agiu com boa-fé, pois não foi transparente desde o início do procedimento (início do despacho adua-neiro sem qualquer informação sobre o real adquirente da mercadoria). Somente apresentou a documentação exigida e admitiu a operação por conta e ordem de terceiro ou porencomenda,porquefoialvodafisca-lização direta.

Énecessário,portanto,diferenciaraboa-fédaconfissão.

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Friso que o importador não pode, por sua livre e espontânea vontade, criar o seu tipo de procedimento administrativo, tudo sob a alegação de que procede de boa-fé. O controle prévio, formal e rígido é inato e constituigarantiadacorretafiscalizaçãoaduaneira.

De outra banda, não procede a alegação de que a Lei 11.281/06, ao mudar o regime da importação por conta e ordem de terceiros ou por encomenda,beneficiaaimpetrante.

A novel legislação, ao considerar que a importação promovida por pessoa jurídica importadora que adquire mercadorias no exterior para revenda a encomendante predeterminado não mais caracterizaria im-portação por conta e ordem de terceiros, manteve a necessidade de ha-bilitação prévia da importadora. Portanto, a situação da apelante resta inalterada.

Dessarte, há dano ao erário, seja pelo controle político (soberania das fronteiras – violação do procedimento e do controle prévio), seja pelo controle tributário (diferença na cobrança do IPI, como bem explicou o Fisco).

Justificada, portanto, a apreensão inicial dasmercadorias, passo aanalisar a pena a ser imposta.

Alega a impetrante que o caso reclamaria a aplicação da multa, e não da pena de perdimento.

É necessária uma análise detalhada da legislação aduaneira. Vejamos a redação do art. 33 da Lei 11.488/2007:“Art. 33. A pessoa jurídica que ceder seu nome, inclusive mediante a disponibili-

zação de documentos próprios, para a realização de operações de comércio exterior de terceiroscomvistasaoacobertamentodeseusreaisintervenientesoubeneficiáriosficasujeita a multa de 10% (dez por cento) do valor da operação acobertada, não podendo ser inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Parágrafo único. À hipótese prevista no caput deste artigo não se aplica o disposto no art. 81 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996.” (grifo meu)

Por sua vez, o artigo 81 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, tem a seguinte redação:

“Art. 81. Poderá ser declarada inapta, nos termos e condições definidos pelaSecretaria da Receita Federal do Brasil, a inscrição no CNPJ da pessoa jurídica que, estando obrigada, deixar de apresentar declarações e demonstrativos em dois exercícios consecutivos. (Alterada pela MEDIDA PROVISÓRIA Nº 449, DE 3 DE DEZEMBRO

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DE 2008 – DOU DE 04.12.2008)*** Redação anterior do caputArt.81.Poderá,ainda,serdeclaradainapta,nostermosecondiçõesdefinidosematodo

Ministro da Fazenda, a inscrição da pessoa jurídica que deixar de apresentar a declaração anual de imposto de renda em um ou mais exercícios e não for localizada no endereço informado à Secretaria da Receita Federal, bem como daquela que não exista de fato.

§ 1º Será também declarada inapta a inscrição da pessoa jurídica que não comprove a origem, a disponibilidade e a efetiva transferência, se for o caso, dos recursos em-pregados em operações de comércio exterior. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)

§2ºParafinsdodispostono§1º,acomprovaçãodaorigemderecursosprove-nientes do exterior dar-se-á mediante, cumulativamente: (Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)

I–provadoregularfechamentodaoperaçãodecâmbio,inclusivecomaidentifi-caçãodainstituiçãofinanceiranoexteriorencarregadadaremessadosrecursosparaoPaís; (Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)

II–identificaçãodoremetentedosrecursos,assimentendidocomoapessoafísicaou jurídica titular dos recursos remetidos. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)

§ 3º No caso de o remetente referido no inciso II do § 2º ser pessoa jurídica, deverão sertambémidentificadososintegrantesdeseusquadrossocietárioegerencial.(Incluídopela Lei nº 10.637, de 2002)

§ 4º O disposto nos §§ 2º e 3º aplica-se, também, na hipótese de que trata o § 2º do art. 23 do Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 2002)

§ 5º Poderá também ser declarada inapta a inscrição no CNPJ da pessoa jurídica que nãoforlocalizadanoendereçoinformadoaoCNPJ,nostermosecondiçõesdefinidospela Secretaria da Receita Federal do Brasil. (Incluído pela MEDIDA PROVISÓRIA Nº 449, DE 3 DE DEZEMBRO DE 2008 - DOU DE 04.12.2008)” (grifos meus)

O artigo 23 do Decreto-Lei 1.455/76 prevê o seguinte:“Art. 23. Consideram-se dano ao Erário as infrações relativas às mercadorias:I – importadas, ao desamparo de guia de importação ou documento de efeito

equivalente, quando a sua emissão estiver vedada ou suspensa na forma da legislação específicaemvigor;

II – importadas e que forem consideradas abandonadas pelo decurso do prazo de permanência em recintos alfandegados nas seguintes condições:

a) 90 (noventa) dias após a descarga, sem que tenha sido iniciado o seu despa-cho; ou

b) 60 (sessenta) dias da data da interrupção do despacho por ação ou omissão do importador ou seu representante; ou

c)60(sessenta)diasdadatadanotificaçãoaqueserefereoartigo56doDecreto-Leinúmero 37, de 18 de novembro de 1966, nos casos previstos no artigo 55 do mesmo

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Decreto-Lei; oud)45(quarentaecinco)diasapósesgotar-seoprazofixadoparapermanênciaem

entreposto aduaneiro ou recinto alfandegado situado na zona secundária.III – trazidas do exterior como bagagem, acompanhada ou desacompanhada e que

permanecerem nos recintos alfandegados por prazo superior a 45 (quarenta e cinco) dias, sem que o passageiro inicie a promoção do seu desembaraço;

IV – enquadradas nas hipóteses previstas nas alíneas a e b do parágrafo único do artigo 104 e nos incisos I a XIX do artigo 105 do Decreto-Lei número 37, de 18 de novembro de 1966.

V – estrangeiras ou nacionais, na importação ou na exportação, na hipótese de ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiros. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

VI – (Vide Medida Provisória nº 320, 2006)§ 1º O dano ao erário decorrente das infrações previstas no caput deste artigo será

punido com a pena de perdimento das mercadorias. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 2º Presume-se interposição fraudulenta na operação de comércio exterior a não comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 3º A pena prevista no § 1º converte-se em multa equivalente ao valor aduaneiro da mercadoria que não seja localizada ou que tenha sido consumida.(Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)

§ 4º O disposto no § 3º não impede a apreensão da mercadoria nos casos previstos no inciso I ou quando for proibida sua importação, consumo ou circulação no território nacional. (Incluído pela Lei nº 10.637, de 30.12.2002)”

Da análise da legislação, concluo que a pena de perdimento deve ser imposta aos casos em que a interposição fraudulenta é presumida com fundamento em operação comercial em que a interposta empresa não possui capacidade econômica demonstrada, ou seja, os recursos são, na verdade, da real importadora.

E essa realidade é a que restou demonstrada documentalmente nos autos, por meio da investigação e conclusão da autoridade aduaneira (autodeinfração),conformefl.279:

“(...) 7) O Sr. CLOVIS demonstra intenção de devolver os motores para o exterior e rea-ver os valores adiantados para a nacionalização, uma vez que a ORIENTADOR estava com oCNPJemsituaçãoinaptaàépoca,oquefoirevertidoposteriormente(fls.134e135);

8) A ORIENTADOR registra a DI dos motores como importação por conta pró-pria(fls.69a72);

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9) A Sra. ELIANE (ORIENTADOR) solicita adiantamento de cerca de R$ 70 mil para o Sr. CLOVIScomvistasapagaraarmazenagemdosmotores(fls.142e143);

10) O Sr. CLOVIS transfere os valores solicitados pela preposta da ORIENTADOR (fls.150e151);

11) A ORIENTADOR, por meio da BASKA (comissária/assessora em comércio exterior), paga o Porto de Itajaí com os recursos advindos da ACOPLAMENTO/Sr. CLOVIS(fls.155e156);

Dessa forma, restou caracterizado que o Sr. CLOVIS, proprietário da ACOPLA-MENTO, transacionou com o exportador encomendando os motores, gerenciou o embarque, buscou e contratou uma trading disposta a registrar a operação por conta própria, recusou regularizar o processo de importação por conta e ordem de terceiros como sugerido pela GOLDEN TRADE, adiantou recursos para pagamento de despesas atinentes ao processo de importação e gerenciou todas as etapas da nacionalização, inclusive cogitando a devolução dos mesmos ao exterior por conta de dificuldades com a trading contratada (ORIENTADOR).”

Aimpetrantenãojuntouprovadocumentalpré-constituídasuficientea elidir a presunção de veracidade da investigação e dos atos da autori-dade aduaneira. E não há falar da possibilidade de prova pericial na via estreita do mandamus.

Dessarte, a pena de perdimento é a que se impõe na espécie.A sentença deve ser integralmente mantida.Pelo exposto, voto por negar provimento ao apelo.

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 2009.04.00.007500-3/RS

Relator: O Exmo. Sr. Juiz Federal Marcelo De Nardi

Agravante: Guillermo Federico Campbell GargiuloAdvogados: Drs. Alberto Fett e outro

Agravada: União Federal (Fazenda Nacional)Procurador: Dr. José Diogo Cyrillo da Silva

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EMENTA

Aduaneiro. Cidadão argentino com visto temporário de perma-nência no Brasil. Ingresso dos bens pessoais no país sob regime de admissão temporária. Prazo. Arts. 157, parágrafo único e inc. I, do Dec. 4.543/2002 e 158, parágrafo único e inc. I, do Dec. 6.759/2009. Interpretação. Mercosul, Tratado de Assunção e acordo existente entre Brasil e Argentina acerca de residência para pessoas provenientes dos estados partes.

1. Os bens pessoais do cidadão argentino com visto temporário de permanência no Brasil ingressam no território nacional sujeitos ao Re-gime Aduaneiro Especial de Admissão Temporária, nos termos dos arts. 307 do Dec. 4.543/2002 e 353 do Dec. 6.759/2009, até que ele obtenha visto permanente. Esses bens se enquadram no conceito de bagagem desacompanhada, a teor dos arts. 153, III, do Dec. 4.543/2002 e 155, III, do Dec. 6.759/2009.

2. A bagagem desacompanhada deve ingressar no País até seis meses posteriores à chegada do viajante, conforme estabelecem os arts. 157, parágrafo único e inc. I, do Dec. 4.543/2002 e 158, parágrafo único e inc. I, do Dec. 6.759/2009.

3. Na interpretação desses dispositivos é imprescindível levar em conta os objetivos estabelecidos no Tratado de Assunção, de 1991, que fundou o Mercado Comum do Sul - Mercosul, e o acordo existente entre Brasil e Argentina acerca de residência para pessoas provenientes des-ses dois Estados Partes. Tal acordo encontra-se em pleno vigor à vista da Portaria Interministerial dos Ministros das Relações Exteriores e da Justiça, publicada no DOU de 29 de agosto de 2006.

4. A interpretação mais consentânea dos arts. 157, parágrafo único e inc. I, do Dec. 4.543/2002 e 158, parágrafo único e inc. I, do Dec. 6.759/2009 com os interesses e diretrizes estabelecidos no acordo ce-lebrado entre Brasil e Argentina e o esforço levado a efeito no sentido de facilitar o trânsito dos cidadãos de ambos os países é aquela que considera a expressão chegada do viajante como sendo a data em que o estrangeirofixa sua residência, comânimodefinitivo, no territórionacional.Porconsequência,nessadatasefixaotermoinicialdoprazode seis meses para a admissão dos bens integrantes da bagagem de es-

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trangeiro portador de visto temporário pelo regime aduaneiro especial de admissão temporária.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendoparteintegrantedo presente julgado.

Porto Alegre, 29 de abril de 2009.Juiz Federal Marcelo De Nardi, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Marcelo De Nardi: Trata-se de agravo de instrumento interposto sobre mandado de segurança impetrado por Guil-lermo Federico Campbell Gargiulo, cidadão argentino, detentor de visto de permanência temporária no Brasil e aqui residente. A magistrada de origem assim sintetizou os fatos e fundamentos jurídicos expostos pelo autor e pela autoridade impetrada:

“GUILLERMO FEDERICO CAMPBELL GARGIULO impetrou mandado de se-gurança em face do Delegado da Receita Federal do Brasil em Uruguaiana com vistas à obtenção de provimento jurisdicional que, em sede de liminar, determine a imediata execução de todos os procedimentos aduaneiros necessários à admissão temporária dos bens que compõem sua mudança pessoal e atualmente encontram-se na EADI deUruguaiana,sobcontroledaAutoridadeCoatoraeidentificadospelaDeclaraçãoSimplificadadeImportaçãonº09/0002725-7.

Narrou que, conquanto possua visto temporário de permanência no Brasil des-de 11.08.2007, reside efetivamente no país desde 16.08.2008. Asseverou que, em 29.01.2009, registrou DSI para internalização de seus bens pessoais no território na-cional, o que foi indeferido sob argumento de intempestividade do pedido, que deveria ter sido feito dentro de, no máximo, 06 meses a contar do ‘desembarque’ no país.

Argumentou que, sob o pálio do art. 5º, XV, da CF e do Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul, de 06.12.2002, as Instruções Norma-tivas da SRF nº 117/98 e 285/03, aplicáveis ao estrangeiro com residência temporária admitida,nãofixamoprazo invocadopelaReceitaFederal, sendoquea InstruçãoNormativaSRFnº117/98,quandofixaoprazode06mesesapósodesembarque,éaplicável apenas ao estrangeiro com visto permanente.

Afirmou,ademais,que,sealgumprazoincide,devesercomputadoapartirdadata

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de ‘desembarque’ no país, adotando-se como tal a data de 16.08.2008, quando passou a residir efetivamente, e não a data de registro de visto temporário, 11.08.2007.

Aautoridadeimpetradaprestouinformaçõesàsfls.705-710.Quanto à legislação aplicável ao caso em tela, notadamente o prazo de internalização

dos bens, ponderou que (a) a admissão temporária de bens no país com a suspensão de tributos é tratada pelos arts. 307 e seguintes do Regulamento Aduaneiro revogado (Decreto nº 4.543/2002), (b) que os bens de uso do imigrante, enquanto não obtido o visto permanente ou de uso do viajante não residente, desde que integrantes de sua bagagem, são passíveis de admissão temporária, conforme art. 4º, XVII e XVIII, da IN SRF nº 285/2003, (c) que tais bens admitidos temporariamente estão inseridos no conceito de ‘bagagem desacompanhada’, tratada nos arts. 153 e 157 do Regulamento Aduaneirorevogado(Decretonº4.543/2002),sendofixadooprazodeinternalizaçãode03 meses antes do desembarque ou 06 meses após o desembarque, (d) que a IN SRF nº 117/98, notadamente seu art. 18, que trata dos prazos de internalização nos moldes do Regulamento Aduaneiro, aplica-se à bagagem desacompanhada, inclusive a imigrantes com visto temporário, razões pelas quais há sim prazo de internalização dos bens de uso pessoal do autor pelo procedimento de admissão temporária.

Quanto ao termo inicial da contagem do prazo de 06 meses a partir do ‘desembar-que’doviajante,sinalouquedeveseradotadaadatacertificadapelaPolíciaFederalcomoadatadeentradanoterritórionacionalparafinsdevistotemporário,qualseja,11.08.2007, já que não é lícito à Administração Pública negar fé a documentos públicos, como a Cédula de Identidade de Estrangeiro.

Em vista disso, asseverou extrapolado o prazo para a admissão temporária da ba-gagem desacompanhada do impetrante.”

A medida liminar foi indeferida na origem, sob o fundamento de que o impetrante extrapolou o prazo de seis meses para a admissão tempo-rária dos bens integrantes da bagagem de estrangeiro que migrar para o País com visto temporário. Referido prazo foi contado da data em que concedido o visto de permanência temporária.

O impetrante interpôs agravo de instrumento, repisando os argumentos da inicial. Foi deferida antecipação da tutela recursal para “determinar a imediata realização de todos os procedimentos necessários para que os bens do agravante ingressem no país sob o regime aduaneiro especial de admissão temporária, considerando adimplido o requisito do prazo para ingresso dos referidos bens”.

A agravada apresentou resposta.

VOTO

O Exmo. Sr. Juiz Federal Marcelo De Nardi: O agravante é argentino

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e possui visto temporário de permanência no Brasil desde 11.08.2007. PassouaresidircomânimodefinitivonoPaís,noMunicípiodeLajeado,Rio Grande do Sul, desde 16.08.2008. Em 29.01.2009 registrou Declara-çãoSimplificadadeImportaçãoparainternalizaçãodeseusbenspessoaisno território nacional com regime de admissão temporária, pedido que restou indeferido ao fundamento de ser intempestivo. Segundo a auto-ridade impetrada, o pedido deveria ter sido formulado dentro do prazo máximo de seis meses a contar do desembarque no território brasileiro, em 11.08.2007.

Regime aduaneiro a que estão submetidos os bens do agravante

Os bens que o agravante pretende internalizar no País estão sujeitos ao Regime Aduaneiro Especial de Admissão Temporária, nos termos dos arts. 307 do Dec. 4.543/2002 e 353 do Dec. 6.759/2009, até que ele obtenha visto permanente. Esses bens enquadram-se no conceito de bagagem desacompanhada, a teor dos arts. 153, III, do Dec. 4.543/2002 e 155, III, do Dec. 6.759/2009.

A bagagem desacompanhada deve ingressar no País até seis meses posteriores à “chegada do viajante”, conforme estabelecem os arts. 157, parágrafo único e inc. I, do Dec. 4.543/2002 e 158, parágrafo único e inc. I, do Dec. 6.759/2009.

O regime de admissão temporária para os bens integrantes da bagagem de estrangeiro que migrar para o País com visto temporário perdurará pelo tempo necessário à obtenção do visto permanente, nos termos do art. 25 da Instrução Normativa da SRF 117/1998.

Interpretação das regras que regem a espécie

A controvérsia reside na determinação do termo inicial do prazo de 6 meses para a admissão temporária dos bens integrantes da bagagem de estrangeiro que migrar para o País com visto temporário, mais preci-samentenosignificadoealcancedaexpressãochegada do viajante, de que tratam os arts. 157, parágrafo único e inc. I, do Dec. 4.543/2002 e 158, parágrafo único e inc. I, do Dec. 6.759/2009.

A hipótese dos autos apresenta especial peculiaridade e para o correto desate da contenda é necessário ir além do exame dos dispositivos da legislação aduaneira que regulam o regime de admissão temporária para

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os bens de imigrantes no País. Cumpre levar em conta, na interpretação desses dispositivos, os objetivos estabelecidos no Tratado de Assunção, de 1991, que fundou o bloco denominado Mercado Comum do Sul – Mer-cosul, e o acordo existente entre Brasil e Argentina acerca de residência para pessoas provenientes desses dois Estados Partes.

O Mercosul, como se sabe, é um amplo projeto de integração conce-bido por Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, com dimensões econô-micas, políticas e sociais. Seus objetivos e princípios estão estabelecidos no art. 1º do Tratado de Assunção.

A união de esforços com vistas à defesa de interesses comuns ligados ao Mercosul impulsionou a assinatura de acordos, dentre eles, o Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul, de 6 de dezembro de 2002, aprovado pelo Congresso Nacional (Decreto-Legislativo 210, de 20 de maio de 2004), que concede o direito à resi-dência e ao trabalho para os cidadãos de todos os Estados Partes, sem outro requisito que não a nacionalidade.

No atual momento, esse acordo encontra-se em pleno vigor entre Brasil e Argentina, haja vista a edição da Portaria Interministerial dos Ministros das Relações Exteriores e da Justiça, publicada no DOU de 29 de agosto de 2006. Essa Portaria é decorrência de acordo celebrado entre os dois Países, por troca de notas, em Porto Iguaçu, República Argentina, em 30 de novembro de 2005, para implementação entre si do Acordo sobre Residência para Nacionais dos Estados Partes do Mercosul.

No acordo, estão previstas as seguintes situações:a) a do brasileiro que está no Brasil e quer se estabelecer na Argen-

tina ou a do argentino que está na Argentina e quer se estabelecer no Brasil;

b) a do brasileiro que já se encontra na Argentina e deseja se estabele-cer naquele País ou a do argentino que já se encontra no Brasil e deseja aqui se estabelecer.

Merecem destaque algumas peculiaridades. Pouco importa a categoria migratória pela qual o brasileiro ingressou no território argentino ou o argentino ingressou no território brasileiro (turista, a negócios ou para trabalho) e o tempo em que essas situações ocorrem: não se aplicam multas ou outras sanções mais graves.

O acordo somente não ampara quem entrou nos países de forma clan-

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destina, sem se submeter ao controle migratório. Nessa hipótese, a pessoa deve sair do país e apresentar solicitação nos respectivos Consulados.

Os Ministros das Relações Exteriores da República Federativa do Brasil e das Relações Exteriores, Comércio Internacional e Culto da República Argentina destacaram que a implementação do acordo tem o propósito de solucionar a situação migratória dos nacionais argentinos e brasileiros que se encontrem em situação irregular nos territórios do Brasil e da Argentina, sendo que, para estabelecer regras comuns para a tramitação da autorização de residências aos nacionais dos dois países, essencial implementar uma política de livre circulação de pessoas na região.

Em linhas gerais, o acordo tem o objetivo de fortalecer o processo de integração com a adoção de medidas concretas para a facilitação do trânsito dos cidadãos de ambos países, cabendo realçar o disposto no art. 11:

“Artigo 11Os nacionais das Partes e suas famílias que obtiveram residência nos termos do

presente Acordo gozarão dos mesmos direitos e liberdades civis, sociais, culturais e econômicas concedidos aos nacionais do país de recepção, em particular o direito ao trabalho e à livre iniciativa; o direito de petição; o direito de entrar, permanecer, tran-sitar e sair do território das Partes; o direito de associação e à liberdade de culto. Tais direitos serão exercidos conforme a legislação interna do País de recepção.

A concessão da residência prevista no Artigo 6º não será submetida a nenhuma prova desuficiênciaeconômicaouaqualquerautorizaçãopréviadenaturezatrabalhistaenão será denegada por critérios de proporcionalidade em matéria de nacionalidade ou de paridade de salários.”

Com os olhos postos nessas diretrizes devem ser interpretadas as regras aduaneiras sobre o regime de admissão temporária para os bens do cidadão argentino que ingressa regularmente no país, com o intuito deaquifixarresidência.

As ideias e aspirações básicas postas no acordo entre Brasil e Argen-tina emergem da vida social, possuindo feição essencialmente humana, motivo pelo qual facilmente se propagam.

Por essa razão, é com senso de realidade que se deve interpretar e aplicar as regras atinentes à situação migratória dos argentinos, com relação ao Brasil. Mudar de país não é tarefa tão fácil. Isso envolve,

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inclusive, mudança de hábitos, o que não é uma questão só de força de vontade, mas de paciência e estratégia. Tarefas devem ser cumpridas para se iniciar uma nova vida social, em outro país. Está comprovado, por exemplo, que o agravante frequentava semanalmente aulas no Instituto de Direito Comparado da Academia Nacional de Direito de Córdoba até agosto de 2008. Não é razoável exigir que deixasse todos os seus compromissos no país de origem para se transferir para cá o mais breve possível,comtodososseusbens.Arealidadenemsempreseidentificacom o conteúdo da regra legal.

Dentro dessa ordem de ideias e por esse modo de ver, é perfeitamente compreensível que o agravante, em que pese ter obtido o visto tempo-rário de permanência no Brasil em 11.08.2007, somente em agosto de 2008efetivamente tenhafixado residência, comânimodefinitivo,noterritório nacional.

Daí porque a interpretação mais consentânea dos arts. 157, parágrafo único e inc. I, do Dec. 4.543/2002 e 158, parágrafo único e inc. I, do Dec. 6.759/2009 com os interesses e diretrizes estabelecidos no acordo cele-brado entre Brasil e Argentina e o esforço levado a efeito no sentido de facilitar o trânsito dos cidadãos de ambos os países é aquela que considera a expressão chegada do viajante como sendo a data em que o estrangeiro fixasuaresidência,comânimodefinitivo,noterritórionacionale,porconsequência, o termo inicial do prazo de 6 meses para a adoção do regi-me aduaneiro de admissão temporária dos bens integrantes da bagagem de estrangeiro que migrar para o país com visto temporário.

Ressalte-se que a Administração Pública deve pautar-se pelos princí-pios da razoabilidade e da proporcionalidade, não podendo impor restri-ções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público.

De resto, ao se permitir que o agravante permaneça regularmente no país, sem os seus bens pessoais, não se confere a plenitude dos direitos assegurados no art. 11 acima referido. De fato, os bens não são coisas separadas do mundo, posto que materialmente se apresentem como unidades desligadas. No caso dos bens pessoais, herdados ou adquiridos como fruto do trabalho, a essência da realidade não se encontra unica-mente na matéria, mas também no aspecto imaterial das coisas. Sejam de valor puramente afetivo, sejam indispensáveis à normal sobrevivência da

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família, constitui privação da propriedade impedir que o estrangeiro os traga consigo se ele não cometeu nenhuma espécie de ilícito prejudicial aos interesses do país.

Assim,consideradaadataemqueoagravantefixouresidência,comânimodefinitivo,emLajeadocomotermoinicialdoprazodequetratamos arts. 157, parágrafo único e inc. I, do Dec. 4.543/2002 e 158, pará-grafo único e inc. I, do Dec. 6.759/2009, entre 16.08.2008 e 29.01.2009 não transcorreram 6 meses, de modo que o registro da Declaração Sim-plificadadeImportaçãovisandoàinternalizaçãodosbenspessoaisdoagravante no território nacional com regime de admissão temporária foi realizado dentro do prazo legal.

Hárelevâncianafundamentaçãoaoagravodeinstrumentoajustificarintervenção.

Os prejuízos advindos da impossibilidade de ingresso dos bens pes-soais do agravante no território nacional são evidentes.

Pelo exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para deter-minar a imediata realização de todos os procedimentos necessários para que os bens do agravante ingressem no país sob o regime aduaneiro especial de admissão temporária, considerando adimplido o requisito do prazo para ingresso dos referidos bens.

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ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE

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ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE NO AGNº 2008.04.00.002897-5/PR

Relator: O Exmo. Sr. Des. Fed. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

Agravante: Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do ParanáAdvogados: Drs. Mario Jorge Sobrinho e outrosAgravados: Caminhos do Paraná S/A e outros

Advogados: Drs. Cesar Augusto Guimarães Pereira e outrosInteressada: União Federal

Advogado: Dr. Luis Antonio Alcoba de FreitasInteressado: Departamento Nacional de Infraestrutura de

Transportes – DNITInteressada: Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT

Procuradora: Dra. Solange Dias Campos PreusslerInteressado: Estado do Paraná

EMENTA

Constitucional e administrativo. Contrato administrativo. Concessão. Lei estadual que estabelece isenção ou redução de tarifa de pedágio sem compensação. Inconstitucionalidade. Precedentes do STF.

1. A lei do Estado do Paraná, a qual cria isenção de tarifa para as moto-cicletas e similares, altera a perspectiva de lucro já delineada por ocasião da celebração do contrato de concessão, não só pela inexistência de tal isenção quando da contratação, mas também pela ausência de previsão de mecanismos de compensação das perdas decorrentes dessa dispensa

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de pagamento. Isso altera de forma substancial as condições iniciais da proposta e o possível lucro que levou a concessionária a contratar com o Poder Público.

Sob esse enfoque, a norma em questão viola diretamente o disposto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, na medida em que não são mantidas as condições efetivas da proposta.

2. Precedentes do STF.3. Inconstitucionalidade do art. 1º da Lei nº 15.722 do Estado do

Paraná.4. Incidente de inconstitucionalidade acolhido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Corte Especial do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, acolher o presente incidente de inconstitucio-nalidade,nostermosdorelatório,votosenotastaquigráficasqueficamfazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 28 de maio de 2009.Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Relator.

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz: Oparecer doMPF, afls. 381-3, expõe comprecisão a controvérsia,verbis:

“Noanode1996,aUniãofirmoucomoEstadodoParanáconvêniosobjetivandoa delegação da administração e exploração das rodovias federais naquele Estado, pelo períodode25anos.Nacondiçãodedelegatário,oEstadofirmoucomasempresasprivadas Caminhos do Paraná S/A, Concessionária Ecovia Caminho do Mar S/A, Econorte – Empresa Concessionária de Rodovias do Norte S/A, Rodovia das Cataratas S/A e Viapar – Rodovias Integradas do Paraná S/A contrato de concessão de rodovia, retribuído mediante a cobrança de pedágio pelos usuários, dentro do Programa ‘Anel de Integração do Estado do Paraná’.

Em dezembro de 2007, o Estado do Paraná publicou a Lei 15.722, que estabeleceu a isenção do pagamento da tarifa de pedágio, cobrada pelas concessionárias dos usuários da rodovia, para motocicletas e similares.

Em razão dessa Lei, as concessionárias ajuizaram a ação ordinária nº 2008.70.00.000253-8, contra União, Departamento Nacional de Infraestrutura de

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Transportes – DNIT, Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, Estado do Paraná e Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Paraná – DER/PR, objetivando, inclusive em sede de antecipação de tutela, autorização para a cobrança do pedágio nos termos estabelecidos no contrato de concessão e seus aditivos, inclu-sivedaquelesusuáriosbeneficiadoscomaisençãoestabelecidapelaLei15.722/2007(motocicletas e similares), sem que essa conduta implicasse qualquer espécie de sanção pelo poder concedente.

Nostermosdainicial(fls.14-62),aLeiEstadualqueestabeleceaisençãoparamo-tocicletas e similares afronta a Constituição Federal, porque: a – viola a intangibilidade da equação contratual; b – ofende as leis federais que dispõe sobre as normas gerais dos contratos e concessões; c – contraria os termos da delegação federal que condiciona as alterações da equação contratual a prévio processo administrativo com participação de cada concessionária e dos entes federais delegantes; d – viola o princípio da isonomia ao dar privilégio a determinados usuários, os quais utilizam os serviços da concessão sem arcar com os custos correspondentes.

Opedidodeantecipaçãodetutelafoideferido(fls.72-73v),easconcessionáriasforam autorizadas a continuar a cobrança da tarifa de pedágio de todos os usuários, inclusiveaquelesbeneficiadoscomaisençãooutorgadapelaLeiEstadual15.722/2007(motos e similares).

Contra essa decisão, o Departamento de Estradas de Rodagem do Estado do Paraná – DER/PR interpôs o presente agravo, com pedido de atribuição de efeito suspensivo formuladopeloagravante,quefoiinicialmenteindeferido(fls.93-106).Aoapreciaromérito do agravo, porém, a Turma suspendeu os efeitos da decisão de primeiro grau e de-terminou a instauração de incidente de inconstitucionalidade, nos seguintes termos:

‘ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. CONSTITUCIONALIDADE. INCIDENTE. Ten-do em vista que a tutela foi deferida em virtude de alegação de inconstitucionalidade, a sua manutenção implicaria o reconhecimento desta, que, contudo, em segundo grau, somente se pode dar com observância do princípio da reserva de Plenário. Hipótese, pois, de suspensão da liminar de primeiro grau e sobrestamento do processo, para apreciação do incidente de inconstitucionalidade.’

Diante desse quadro, as concessionárias postularam no Supremo Tribunal Federal a suspensão dos efeitos do acórdão proferido pela E. Terceira Turma do TRF4, o que foiconcedido,conformesevêdoteordadecisãodasfls.371-378.

Resta a análise do incidente de inconstitucionalidade que se faz a seguir.”

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz: Afiguram-se-me irrefutáveis as considerações desenvolvidas pelo culto Procurador Regional da República, Dr. João Heliofar de Jesus

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Villar, a fls. 383-8, verbis:“FUNDAMENTAÇÃO Dispõe a Lei 15.722/2007 do Estado do Paraná: ‘Art. 1º. Ficam isentas de pagamento de pedágio, nas estradas e rodovias localizadas

no âmbito territorial do Estado do Paraná, as motocicletas e similares. Art. 2º. Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.’ A matéria discutida não me parece que encontra solução na questão relativa à

competência legislativa do Estado para a edição da lei outorgando isenção, nem na iniciativa legislativa do Executivo ou do Legislativo para tal ato normativo. A rigor, tendo o Estado recebido delegação da União para exploração das rodovias federais, dele é a competência para estabelecer normas acerca da questão, desde que obedecidos os limites da delegação e da lei estabelecendo normas gerais publicada pela União.

Na verdade, a questão deve ser resolvida sob a ótica das normas que regem os contratos de concessão, cujos contornos se encontram no texto constitucional, haja vista que a lei objeto do presente incidente produz efeitos concretos sobre o contrato celebrado entre o Poder Executivo estadual e as concessionárias.

Pois bem. Dispõe o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal: ‘XXI–ressalvadososcasosespecificadosnalegislação,asobras,serviços,compras

e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igual-dade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somentepermitiráasexigênciasdequalificaçãotécnicaeeconômicaindispensáveisàgarantia do cumprimento das obrigações.’

Sobre o tema preleciona Celso Antônio Bandeira de Mello: ‘A concessão é uma relação jurídica complexa, composta por um ato regulamentar

doEstadoquefixaunilateralmentecondiçõesdefuncionamento,organizaçãoemodode prestação do serviço, isto é, as condições em que será oferecido aos usuários; de um ato condição, por meio do qual o concessionário voluntariamente se insere debaixo da situação jurídica objetiva estabelecida pelo Poder Público, e de contrato, por cuja viagaranteaequaçãoeconômico-financeira,resguardandooslegítimosobjetivosdelucro do concessionário. (...) Para o concessionário, a prestação do serviço é um meio atravésdoqualobtémofimquealmeja:olucro.Reversamente,paraoEstado,olucroquepropiciaaoconcessionárioémeioporcujaviabuscaafinalidade,queéaboaprestação do serviço. (...)

Ao Estado assistem todas as garantias necessárias à obtenção de seu desiderato. Por essa razão, pode dispor livremente sobre as condições de prestação do serviço e modificá-lassemprequeointeressepúblicooreclamar,bemcomoretomá-losemquecaiba oposição do concessionário. A este, por seu turno, caberão todas as garantias atinentes àmantençado equilíbrio econômico-financeiro avençadopor ocasiãodaconcessão,poisfoioqueatravésdelabuscou.Daíque,emboraoestadopossamodifi-

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car unilateralmente as condições do serviço, deverá preservar o equilíbrio econômico quando as alterações que introduzir agravarem a situação do concessionário.’

Mais adiante preleciona o citado autor: ‘Háumanecessáriarelaçãoentreosencargosfixadosnoatoconcessivoeolucro

tão ensejado ao concessionário. Uns e outro, segundo os termos compostos na época, comopesosdistribuídosentredoispratosdabalança,fixamumaigualdadedeequilí-brio. É esse equilíbrio que o Estado não só não pode romper unilateralmente mas deve, ainda, procurar preservar. Os termos da igualdade alteram-se necessariamente toda a vezqueopoderpúblicoagravarosencargos.Issoporque,afimdemanteramesmaproporcionalidade, correspondente à igualdade da equação, o Estado terá que recompor economicamenteoconcessionárioquandomodificaragrandezadoseuônus.Aexpres-sãoquantitativapodesemodificarporatodaautoridadepública,unilateralmente,ecomo exercício normal de um direito seu, mas precisa ser compensada correlatamente no outro extremo da relação.’

Partindo dessa perspectiva, é inegável que a lei do Estado do Paraná, a qual cria isenção de tarifa para as motocicletas e similares, altera a perspectiva de lucro já deli-neada por ocasião da celebração do contrato de concessão, não só pela inexistência de tal isenção quando da contratação, mas também pela ausência de previsão de mecanis-mos de compensação das perdas decorrentes dessa dispensa de pagamento. Isso altera de forma substancial as condições iniciais da proposta e o possível lucro que levou a concessionária a contratar com o Poder Público.

Sob esse enfoque, a norma em questão viola diretamente o disposto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, na medida em que não são mantidas as condições efetivas da proposta.

O Supremo Tribunal Federal já se posicionou sobre a inconstitucionalidade material de lei estadual que estabeleceu isenção ou redução de tarifa de pedágio, conforme se vê pelo excerto do voto condutor do acórdão da ADI 2733/ES:

‘Ao conceder descontos e isenções sem prever qualquer forma de compensação, a lei estadual afetaoequilíbrioeconômico-financeirodocontratodeconcessãodeobra pública, celebrado pela administração capixaba com a empresa concessionária, Rodovia do Sol S/A. Essa situação de desequilíbrio econômico deve ser corrigida pelo poder concedente, o Estado do Espírito Santo. É o que decorre da cláusula ‘mantidas as condições efetivas da proposta’ constante no inciso XXI do art. 37 da Constituição doBrasil.Otemadamanutençãodaequaçãoeconômico-financeirafoiabordadopelacorte no julgamento de outra ação direta, na qual se discutiu a constitucionalidade de lei estadual que concedeu isenções de pagamento de consumo de energia elétrica e água a trabalhadores desempregados, no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul. O Ministro Moreira Alves, relator, destacou então que: com efeito, em exame compatível com a natureza da liminar requerida, Lei estadual, máxime quando diz respeito à concessão de serviço público estadual e municipal, como ocorre no caso, não pode alterar as con-dições da relação contratual entre o poder concedente e os concessionários sem causar

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descompasso entre a tarifa e a obrigação de manter o serviço adequado em favor dos usuários, infringindo, assim, não só a política tarifária estabelecida contratualmente e sob o controle do poder concedente e o concessionário, mas também introduzindo elemento novo na relação contratual entre o poder concedente e o concessionário, alterando, dessa forma, as condições contratuais previstas na licitação exigida pelo caput do art. 175 da Carta Magna, que, assim, é violado (ADI/MC N 2.299, Relator Ministro Moreira Alves. DJ de 29.08.2003).’

III – CONCLUSÃO Em razão do que foi exposto, manifesta-se o Ministério Público Federal pela decla-

ração de inconstitucionalidade material da Lei 15.722/2007 do Estado do Paraná.”

Correto o parecer.Nesse sentido, a decisão proferida pelo eminente Ministro Gilmar

Mendes, Presidente do STF, ao suspender os efeitos do acórdão da 3ª Turmanesteprocesso,afls.375-8,verbis:

“No presente caso, as requerentes objetivam resguardar a garantia do equilíbrio econômico-financeirodos contratosde concessão celebrados comaAdministraçãoPúblicaestadual,comafinalidadedemanteraadequadaprestaçãodoserviçopúblico.Especificamente,acontrovérsiadizrespeitoàsupostainconstitucionalidadedeleiedi-tada pelo Estado do Paraná que isentou as motocicletas e similares do pagamento de pedágio, sem, no entanto, prever a fonte de custeio ou meio de compensação da perda de receita decorrente da norma desonerativa.

Verifico,naespécie,estardevidamentedemonstradoofundamentodeaplicabili-dade do instituto da suspensão. O acórdão impugnado, ao permitir a manutenção da isenção de pagamento de pedágio concedida a determinada categoria de usuários, não asseguranecessariamenteautilidadedoprovimentodaaçãooriginária(fimalmejado)e representa grave lesão à ordem e à economia públicas.

Defato,apossibilidadedequebradeequilíbrioeconômico-financeirodoscontra-tos de concessão, por decisão judicial, impõe elevado ônus não só às concessionárias e ao poder concedente, mas também aos usuários, pois coloca em risco a adequada prestação do serviço público.

Aguardar, portanto, toda a discussão de mérito acerca da constitucionalidade da lei estadual impede, na prática, a adequada remuneração do serviço público.

Não se pode olvidar que a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal tem adotado,parafixaroquesedeveentenderporordempúblicanopedidodesuspensão,entendimento formado ainda no âmbito do Tribunal Federal de Recursos a partir do julgamento da SS 4.405, Rel. Néri da Silveira. Segundo esse entendimento, estaria in-serto no conceito de ordem pública o de ordem administrativa em geral, concebida esta como a normal execução dos serviços públicos, o regular andamento das obras públicas, o devido exercício das funções da Administração pelas autoridades constituídas.

Assim, representa violação à ordem pública provimento judicial que obstaculiza ou

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dificulta,semcausalegítima,oadequadoexercíciodosserviçospelaAdministraçãoPública ou pelos seus delegados.

Ademais, é preciso enfatizar, em juízo mínimo acerca do mérito, que esta Corte, nos autos da ADI 2.733-6, Rel. Eros Grau, DJ 03.02.2006, ao analisar lei de idêntico teor ao da impugnada no processo de origem, declarou, por unanimidade, a sua inconstituciona-lidade, por entender que ela teria violado o princípio da separação dos poderes (art. 2º da CF/88)eagarantiadamanutençãodoequilíbrioeconômico-financeiro,previstanosarts.37, XXI, e 175 da Constituição da República. Eis o teor da ementa do julgado:

‘AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 7.304/2002 DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. EXCLUSÃO DAS MOTOCICLETAS DA RELA-ÇÃO DE VEÍCULOS SUJEITOS AO PAGAMENTO DE PEDÁGIO. CONCESSÃO DE DESCONTO, AOS ESTUDANTES, DE CINQUENTA POR CENTO SOBRE O VALOR DO PEDÁGIO. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS CONTRATROS CELEBRADOS PELA ADMI-NISTRAÇÃO. VIOLAÇÃO. PRINCÍPIO DA HARMONIA ENTRE OS PODERES. AFRONTA.1.Aleiestadualafetaoequilíbrioeconômico-financeirodocontratodeconcessão de obra pública, celebrado pela Administração capixaba, ao conceder des-contos e isenções sem qualquer forma de compensação. 2. Afronta evidente ao princípio da harmonia entre os poderes, harmonia e não separação, na medida em que o Poder Legislativo pretende substituir o Executivo na gestão dos contratos administrativos celebrados. 3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.’

Dovotocondutordoacórdão,extrai-seaseguinteafirmação:‘Note-se bem que, como observei em outra ocasião, essa preservação não se impõe

por razões de equidade, mas por imposição de interesse público; em razão dele é que sefaznecessáriaamanutençãodoequilíbrioeconômico-financeirodoscontratoscele-brados com a Administração, considerada a relação aceita pelas partes no momento da contratação [=permanência da correspondência entre as prestações no tempo]. Há, no caso, alteração dessa relação, do que decorre descompasso entre a tarifa e a obrigação de manter o serviço adequado em favor dos usuários; a lei avançou sobre a política tarifária estabelecida contratualmente e sob controle do poder concedente, introduzindo elemento novo na relação contratual entre o poder concedente e o concessionário; daí, qual reconhecido por esta Corte na ADI/MC nº 2.299, o artigo 175 da Constituição resulta violado.’

Anteoexposto,defiroopedidoparasuspenderosefeitosdoacórdãoproferido,pela3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, nos autos do Agravo de Instru-mentonº2008.04.00.002897-5,demodoarevigoraraeficáciadadecisãoantecipatóriaproferida pelo Juiz Federal Plantonista, Fabiano Bley Franco, da Seção Judiciária do Paraná, na Ação Ordinária nº 2008.70.00.000253-8.”

Realmente, em caso idêntico ao dos autos, deliberou o Eg. STF, verbis:

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“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 7.304/2002 DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. EXCLUSÃO DAS MOTOCICLETAS DA RELA-ÇÃO DE VEÍCULOS SUJEITOS AO PAGAMENTO DE PEDÁGIO. CONCESSÃO DE DESCONTO, AOS ESTUDANTES, DE CINQUENTA POR CENTO SOBRE O VALOR DO PEDÁGIO. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO DOS CONTRATROS CELEBRADOS PELA ADMI-NISTRAÇÃO. VIOLAÇÃO. PRINCÍPIO DA HARMONIA ENTRE OS PODERES. AFRONTA.

1.Aleiestadualafetaoequilíbrioeconômico-financeirodocontratodeconcessãode obra pública, celebrado pela Administração capixaba, ao conceder descontos e isenções sem qualquer forma de compensação.

2. Afronta evidente ao princípio da harmonia entre os poderes, harmonia e não separação, na medida em que o Poder Legislativo pretende substituir o Executivo na gestão dos contratos administrativos celebrados.

3. Pedido de declaração de inconstitucionalidade julgado procedente.” (ADI 2.733-6, v.u., Rel. Min. EROS GRAU, j. 26.10.2005)

Em seu voto, disse o ilustre Relator, verbis:“O SENHOR MINISTRO Eros Grau (Relator): Trata-se de ação direta na qual

se objetiva a declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 7.304/2002, do Estado do Espírito Santo, que, no âmbito daquela unidade federativa, exclui as motocicletas da relação de veículos sujeitos ao pagamento do pedágio e concede aos estudantes desconto de 50% (cinquenta por cento) também sobre o valor do pedágio.

2. Afasto, desde logo, a alegada inconstitucionalidade formal por vício de iniciati-va, já que, ao contrário do sustentado pelo requerente, não é verdadeiro que qualquer projetodeleiqueproduzareflexosnoorçamentosópossaserpropostopeloChefedoExecutivo estadual.

3. Os casos de limitação da iniciativa parlamentar estão previstos, em numerus clausus, no § 1° do artigo 61 da Constituição do Brasil, dizendo respeito às matérias relativas ao funcionamento da Administração, notadamente no que se refere a servi-dores e órgãos do Poder Executivo. Não se pode ampliar esse rol, para abranger toda e qualquer situação que crie despesas para o Estado-membro. A esse respeito, assim se pronunciaram os Ministros OCTÁVIO GALLOTTI e MOREIRA ALVES, quando do julgamento da ADI nº 2072/MC.

4.Éinsustentávelaafirmaçãodeque,nocaso,aconsequentereduçãodearrecadaçãonos pedágios – o que pode ensejar a adoção de medidas tendentes a restabelecer o equilí-brioeconômico-financeirodocontratodeconcessãocelebradoentreoEstado-membroeoparticular–justifiqueareservadeiniciativa.Nãosepode,poranalogia,restringir,alémdos casos previstos na Constituição, o exercício da atividade tipicamente parlamentar.

5. Mas a lei em questão produz efeitos diretos no contrato de concessão celebrado entre o Poder Executivo estadual e pessoa jurídica de direito privado.

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6. O texto normativo atacado, ao conceder isenções e descontos nos pedágios esta-duais, altera substancialmente o contrato celebrado entre poder concedente – o Estado do Espírito Santo, por intermédio do Departamento de Estradas e Rodagens, autarquia vinculada à Secretaria de Estado dos Transportes e Obras Públicas – e concessionário de serviço público. Importa, destarte, indevida ingerência do Poder Legislativo em campo próprio da atividade administrativa.

7. A isenção e os descontos contemplados pelo texto normativo frustram as expecta-tivas da contratada, já que reduzem suas receitas sem que seja prevista qualquer forma de compensação por essa redução, o que acarreta desequilíbrio na relação contratual, uma vez que os custos permanecem os mesmos.

8. O Plenário desta Corte, embora analisando matéria diversa da contida nestes autos, assentou que o Estado de Santa Catarina não dispunha de competência para modificaroualterarascondiçõesque,previstasnalicitação,achavam-seformalmenteestipuladas no contrato de concessão celebrado entre o poder concedente [União e Municípios] e as empresas concessionárias. No referido julgamento [ADI/MC nº 2.337, RelatoroMinistroCelsodeMello]afirmou-sequeaingerênciadoEstado-membro,aodeterminar a suspensão temporária do pagamento das tarifas devidas pela prestação dos serviços concedidos – serviços de energia elétrica, sob regime de concessão federal, e serviços de esgoto e abastecimento de água, sob regime de concessão municipal –, afetariaoequilíbriofinanceiroresultantedessarelaçãojurídico-contratualdedireitoadministrativo.

9. Ademais, estabeleceu-se também que no plano estadual, sob a ordem constitu-cionalvigente,‘dispositivossimilaresquesubmetemàautorizaçãoouratificaçãodaAssembleia Legislativa convênios celebrados pelo Governador têm sido liminarmente suspensos pela Corte’ [ADI nº 770, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 25.09.1992]. É inadmissível a ingerência indevida do Poder Legislativo na esfera própria das atividades da Administração Pública.

10. Ao conceder descontos e isenções sem prever qualquer forma de compensação, a lei estadual afetaoequilíbrioeconômico-financeirodocontratodeconcessãodeobra pública, celebrado pela Administração capixaba com a empresa concessionária, Rodovia do Sol S/A. Essa situação de desequilíbrio econômico deve ser corrigida pelo poder concedente, o Estado do Espírito Santo. É o que decorre da cláusula ‘mantidas as condições efetivas da proposta’ constante do inciso XXI do artigo 37 da Constituição do Brasil.

11.O temadamanutençãodaequaçãoeconômico-financeira foiabordadopelaCorte no julgamento de outra ação direta, na qual se discutiu a constitucionalidade de lei estadual que concedeu isenções de pagamento de consumo de energia elétrica e água a trabalhadores desempregados, no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul. O Ministro Moreira Alves, Relator, destacou então que:

‘Com efeito, em exame compatível com a natureza da liminar requerida, Lei esta-dual, máxime quando diz respeito à concessão de serviço público estadual e municipal,

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como ocorre no caso, não pode alterar as condições da relação contratual entre o poder concedente e os concessionários sem causar descompasso entre a tarifa e a obrigação de manter serviço adequado em favor dos usuários, infringindo, assim, não só a polí-tica tarifaria estabelecida contratualmente e sob o controle do poder concedente, mas também introduzindo elemento novo na relação contratual entre o poder concedente e o concessionário, alterando, dessa forma, as condições contratuais previstas na licitação exigida pelo caput do artigo 175 da Carta Magna, que, assim, é violado.’ [ADI/MC nº 2.299, Relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 29.08.2003]

12. Note-se bem que, como observei em outra ocasião, essa preservação não se impõe por razões de equidade, mas por imposição do interesse público; em razão deleéque se faznecessária amanutençãodoequilíbrioeconômico-financeirodoscontratos celebrados com a Administração, considerada a relação aceita pelas partes no momento da contratação [= permanência da correspondência entre as prestações no tempo]. Há, no caso, alteração dessa relação, do que decorre descompasso entre a tarifa e a obrigação de manter serviço adequado em favor dos usuários; a lei avançou sobre a política tarifária estabelecida contratualmente e sob o controle do poder con-cedente, introduzindo elemento novo na relação contratual entre o poder concedente e o concessionário; daí, qual reconhecido por esta Corte na ADI/MC nº 2.299, o artigo 175 da Constituição resulta violado.

13. A afronta ao princípio da harmonia entre os poderes é evidente na medida em que o Poder Legislativo pretende substituir o Executivo na gestão dos contratos por este celebrados, introduzindo alterações unilaterais em contratos administrativos. Permito-me sublinhar a circunstância de aqui aludir não a uma improvável e inconsistente ‘separação’ – que a doutrina atualizada sepultou há várias décadas –, mas à harmonia entreospoderes,nalinhadoqueafirmeiemmeuvotonaADInº3.367.

14. Vislumbro, dessarte, inconstitucionalidade material no artigo 1º da lei atacada, e por consequência também nos demais preceitos, por afronta ao artigo 2º, ao artigo 37, XXI, e ao artigo 175 da Constituição do Brasil.

Julgo procedente o pedido formulado nesta ação direta e declaro inconstitucional a Lei nº 7.304/2002 do Estado do Espírito Santo.”

A doutrina é uniforme no admitir que o poder de alteração e rescisão unilateral do contrato administrativo é inerente à Administração Pública, podendo ser exercido ainda que nenhuma cláusula expressa o consigne, porém, a alteração somente pode atingir as denominadas cláusulas re-gulamentares, isto é, aquelas que dispõem sobre o objeto do contrato e o modo de sua execução.

Contudo, no que concerne às cláusulas econômicas, ou seja, aquelas que estabelecem a remuneração e os direitos do contratado perante a Administraçãoedispõemacercadaequaçãoeconômico-financeirado

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contrato administrativo, estas são inalteráveis, unilateralmente, pelo Poder Público sem que se proceda à devida compensação econômica docontratado,visandorestabeleceroequilíbriofinanceiroinicialmenteajustado entre as partes.

Esse o magistério do saudoso jurista Hely Lopes Meirelles, in Lici-tação e Contrato Administrativo, 9. ed., Revista dos Tribunais, 1990, p. 181-2.

É o que se encontra previsto nos arts. 37, XXI, e 175, III, da CF/88, bem como no art. 9º, § 4º, da Lei nº 8.987/95.

Por outro lado, a concessionária, a teor do disposto no art. 6º, § 1º, da Lei nº 8.987/95, tem o dever de satisfazer as condições de regularidade, continuidade,eficiência, segurança,atualidade,generalidade,cortesiana sua prestação e modicidade das tarifas.

Ora, o não atendimento desses encargos importa a aplicação de pena-lidades que podem originar, inclusive, a extinção da concessão.

Ademais, o não deferimento da liminar poderá comprometer a remu-neração do serviço por meio da tarifa e, via de consequência, a garantia doequilíbrioeconômico-financeirodocontratodeconcessão.

A respeito, leciona Celso Antônio Bandeira de Mello, em sua obra Prestação de Serviços Públicos e Administração Indireta, 2. ed. – 3ª tiragem, RT, 1987, p. 47-8, verbis:

“No Brasil, a álea ordinária, ou seja, o único risco que o concessionário deve suportar sozinho cinge-se aos casos em que o concessionário haja atuado canhestramente, proce-dendocomineficiênciaouimperícia.Issoporqueoart.167daCartaConstitucionaldopaís estatui que a lei disporá sobre o regime das concessionárias de serviços públicos federais, estaduais e municipais, assegurando, entre outros, ‘tarifas que permitam a justa remuneração do capital, o melhoramento e a expansão dos serviços e assegurem oequilíbrioeconômicoefinanceirodocontratoefiscalizaçãopermanenteerevisãoperiódica das tarifas, ainda que estipuladas em contrato anterior’.

Ora, desde que o texto constitucional exige a adoção de tarifas que assegurem a justaremuneraçãodocapital,impõeagarantiadoequilíbrioeconômicoefinanceiroerequer a revisão periódica das tarifas, está visto que sempre que ocorrer desequilíbrio na equação patrimonial – mesmo que derivado de oscilações de preços no mercado, insuficiênciadonúmerodeusuários,oudeprovidênciasgovernamentaisdesempenhadasem nome de sua supremacia geral e sem relação com a posição jurídica de contratante que haja assumido – o Poder concedente deverá restabelecer o equilíbrio através da revisão de tarifas, de modo não só a restaurar-lhe os termos de igualdade, mas ainda comfitodeassegurarajustaretribuiçãodocapital.EmoutraspalavrasaLeiMagna

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impõe indiretamente a adoção, nas concessões, do regime de serviço pelo custo, dando agarantiadeu’amargemfixadelucro.”

Tais princípios restaramdefinitivamente incorporados noDireitoAdministrativo, sobretudo após a publicação do famoso aresto do Con-selho de Estado da França, no caso da Companhia de Gás de Bordeaux, proferido em 1916, em que se destacou a notável contribuição de Char-denet, verbis:

“Mais tout service public doit être organisé dans des conditions qui permettent de compter sur son fonctionnement d’une manière régulière, sans interruption, même momentanée, sans à-coups, passez-nous l’expression, et qui, en même temps, seront de nature à donner pleine satisfaction à ceux ayant à faire appel au service public, qui a étécréé pour eux, fonctionne régulièrement à leur égard. Voyez Syndicat des Propriétaires et Contribuables du quartier de la Croix-de-Seguey-Tivoli, à Bordeaux, 21 décembre 1906. Il faut également, et cela dans l’intérêt général, que le service public soit à l’abri d’incessantes ou de trop fréquentes modifications qui, le plus souvent, apporteraient des troubles dans le fonctionnement ou la marche du service. Par suite, le service public doit être organisé pour un certain nombre d’années, réserve faite, bien entendu, des perfectio-nnements qui pourraient y être apportés. Mais, au cours d’une période de temps un peu longue, bien des événements peuvent se produire, notamment la situation économique peut changer ou tout au moins se modifier. D’autre part, pour la bonne organisation et l’heureux fonctionnement d’un service public important, des dépenses élevées doivent être engagées, de gros capitaux doivent être immobilisés pour longtemps. Si nous prenons l’exemple du service d’éclairage, au début on aura à construire des usines, à établir des canalisations, etc. Plus tard, on aura à faire face à des frais d’entretien, de reconstruc-tion, etc., à procéder à des renouvellements de matériel, souvent rendus nécessaires par quelque découverte scientifique ou par des perfectionnements des moyens de fabrication, dont les bénéficiaires du service public doivent profiter. Au cours de l’execution du ser-vice, il faudra passer, presque toujours longtemps à l’avance, des marchés importants pour s’assurer les matières premières nécessaires à la fabrication du gaz. Les dépenses que l’on aura ainsi engagées seront amorties peu à peu et elles ne le seront que sur une période de temps assez longue. Pour éviter d’exposer la personne publique à tous les risques auxquels nous venons de faire allusion, – pour lui éviter d’engager ses ressources propres dans des opérations commerciales ou industrielles qu’impose le fonctionnement du service public, – pour lui éviter d’être obligée de recourir parfois à des emprunts plus ou moins onéreus, – on a songé à s’adresser à des tiers, particuliers ou sociétés, pour assurer le service public; on a songé à se décharger sur eux du soin d’assurer ce service. On est ainsi arrivé au contrat de concession.” (In Revue du Droit Public et de la Science Politique, M. Giard & E. Brière Editeurs, Paris, 1916, t. 33, p. 220-1)

É o magistério autorizado de Georges Péquignot, verbis:

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“Le cocontractant a droit à la rémunération inscrite dans son contrat. C’est le principe de la fixité du prix du contrat. Il n’a consenti son concours que dans l’espoir d’un certain bénéfice. Il a accepté de prendre à sa charge des travaux et des aléas qui, s’il n’avait pas voulu contracter, auraient été supportés par l’Administration: il est normal qu’il en soi rémunéré.

Il serait, par ailleurs, contraire à la règle de bonne foi, contraire aussi à toute sécurité des affaires et, de ce fait, dangereux pour l’état social et économique, que l’Administration puisse modifier, spécialment réduire, cette rémunération.”

E, mais adiante, conclui o mesmo autor, verbis:“...l’Administration, lorsqu’elle modifie le contrat sur un point qui intéresse le ser-

vice public, doit cependant maintenir son équation financière, c’està-dire, le bénéfice que le cocontractant espérait tirer de l’opération. A fortiori, toute autre modification étant mise à part, cette équation financière doit-elle être maintenue par l’impossibilité de réduire ou de supprimer directement la rémunération en vue de laquelle le cocon-tractant s’est engagé.

Ce principe est fondamental. Il doit être entendu très rigoureusement, car, applica-tion particulière de l’idée d’équation financière, il est la source de la sécurité juridique du cocontractant de l’Administration.” (In Théorie Générale du Contrat Administratif, Paris: Éditions A. Pédone, 1945, p. 434-5)

Confira-se,arespeito,recentesdecisõesdoEg.STJ,verbis:“AGRAVO REGIMENTAL NA SUSPENSÃO DE LIMINAR Nº 74 – PR

(2004/0031293-3)Relator: Ministro Edson VidigalAgravante: Empresa Concessionária de Rodovias do Norte S/A – EconorteAdvogados: Romeu Felipe Bacellar Filho e outrosAgravado: Estado do ParanáProcuradores: Sérgio Botto de Lacerda e outrosRequerido: Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoEMENTASuspensão de liminar. Tutela antecipada deferida para assegurar o reajuste de tarifas

de pedágio pela empresa concessionária.1. Não há como se concluir por ofensa à ordem ou à economia públicas em deci-

são concessiva de tutela antecipada que apenas assegurou o cumprimento de cláusula contratuallivrementefirmadaentreaspartesenãoquestionadaadministrativamenteou em juízo.

2. Perigo de dano inverso. O simples descumprimento de cláusulas contratuais por parte do governo local viola o princípio da segurança jurídica e inspira riscos nos contratos com a Administração.

3. Agravo regimental provido.

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ACÓRDÃOVistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Corte Especial,

doSuperiorTribunaldeJustiça,naconformidadedosvotosedasnotastaquigráficasa seguir, por unanimidade, conhecer do agravo regimental e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Barros Monteiro, Francisco Peçanha Martins, Humberto Gomes de Barros, Cesar Asfor Rocha, Ari Pargendler, José Arnaldo da Fonseca, Fernando Gonçalves, Carlos Alberto Menezes Direito, Felix Fischer, Hamilton Carvalhido, Eliana Calmon, Paulo Gallotti, Franciulli Netto e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro-Relator. Não participou do julgamento o Sr. Ministro AntôniodePáduaRibeiro.Ausentes, justificadamente,osSrs.MinistrosSálviodeFigueiredo Teixeira, José Delgado, Gilson Dipp e Francisco Falcão, sendo os três últi-mos substituídos, respectivamente, pelos Srs. Ministros Teori Albino Zavascki, Hélio Quaglia Barbosa e Castro Meira.

Brasília (DF), 1º de julho de 2004 (data do julgamento).Ministro Nilson Naves, PresidenteMinistro Edson Vidigal, Relator” (Publicado no DJ de 23.08.2004 – In RSTJ,

180/21)

Nessa mesma orientação, os julgados publicados na RSTJ, 181/31 e 182/49.

Preciso o magistério de Hely Lopes Meirelles, in Estudos e Pareceres de Direito Público, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1991, v. 11, p. 120-1, verbis:

“Oequilíbrioeconômico-financeiroéarelaçãoqueaspartesestabeleceminicial-mente no contrato administrativo, entre os encargos do particular e a retribuição devida pela entidade ou órgão contratante, para a justa remuneração do seu objeto (cf. nosso Licitação e Contrato Administrativo, ob. cit., p. 184)

Essa correlação encargo-remuneração deve ser conservada durante toda a execu-çãodocontrato,mesmoquealteradasascláusulasdeserviço,modificadosprojetoseprogramas, liberados trabalhos em quantidades inferiores às previstas, ou superados os prazoscontratuaispormoradaAdministração,afimdequesemantenhaoequilíbrioeconômico-financeiro,oqual,comobemobservaWaline,é‘direitofundamentaldequem contrata com a Administração’ (Marcel Waline. Droit Administratif, Paris, 1959, p. 574). Para De Soto, citado por Laubadère, ‘a manutenção desse equilíbrio constitui norma fundamental da teoria dos contratos administrativos. As obrigações das partes sãotidascomocalculadasdetalmaneiraqueseequilibramdopontodevistafinanceiroe o responsável pelo contrato deverá esforçar-se para manter, a qualquer custo, esse equilíbrio’ (André De Laubadère, Contrats Administratifs, Paris, 1956, II/35, nota 6).

5.Oreconhecimentododireitoaoequilíbriofinanceiro–oprimeirodireitoori-ginal do cocontratante com o Poder Público, segundo Péquignot (Théorie Générale du Contrat Administratif, Paris, 1945, p. 430) – surgiu como contrapartida ao poder-

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dever de alteração unilateral do contrato administrativo, mas vale também para os casos em que, impedido de invocar a exceção de contrato não cumprido, o particular contratado se vê obrigado a suportar o cumprimento irregular do ajuste ou a mora da Administração contratante.

Com efeito, o contrato administrativo, por parte da Administração, destina-se ao atendimento das necessidades públicas, mas, por parte do contratado, objetiva um lu-cro,atravésdaremuneraçãoconsubstanciadanascláusulaseconômicasefinanceiras.Esse lucro há que ser assegurado nos termos iniciais do ajuste porque, se de um lado aAdministraçãotemopoderdemodificarascondiçõesdeexecuçãodocontratoedeexigir a prestação da outra parte, ainda que ela mesma não tenha cumprido a sua, de outro lado, o particular contratado tem o direito de ver mantida a correlação encargo-remuneração estabelecida originariamente, uma vez que o seu objetivo ao participar da relação negocial foi – e continua sendo – o ganho pecuniário. Objetivo altamente lícito e respeitável, diga-se de passagem, que a Administração contratante não pode, validamente, restringir, exigindo que, a partir de um dado momento, a execução do contrato prossiga em condições menos lucrativas e até mesmo prejudiciais ao contra-tado, sem qualquer culpa deste.

6. Para a cabal satisfação desse direito, é forçoso se operem os necessários ajustes econômicos sempre que, por ato ou fato da Administração, for rompido o equilíbrio econômico-financeiro,emdetrimentodoparticularcontratado,independentementedeprevisão contratual, como nos ensina Laubadère, nestes precisos termos: ‘Cette règle d’equilibre est quelque fois considerée comme résultant de la commune intention des parties; elle s’applique, en tous cas, même lorsqu’elle ne figure pas expressément dans le contrat’ (André de Laubadère, Traité Élémentaire de Droit Administratif, Pa-ris, 1957, p. 431. No mesmo sentido: Caio Tácito, Direito Administrativo, São Paulo, 1975, p. 293).

7.Poroutrolado,seorespeitoaoequilíbrioeconômico-financeiroinicial,nahi-pótese de alteração unilateral do ajuste, constitui dever da Administração contratante, com muito mais razão é direito daquele e dever desta, nos casos em que o órgão ou entidade contratante abusa de sua posição privilegiada para descumprir ou cumprir irregularmente suas prestações, ou ainda suspender os prazos contratuais, obrigando o particular a suportar encargos excessivos, os quais, por não terem sido cogitados quando da elaboração da proposta ou da celebração do contrato, representam insupor-táveis prejuízos, mormente numa conjuntura em que o custo do dinheiro é altíssimo e ainflaçãoaviltaamoedaacadadia.”

Da mesma forma, a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, in Revista Trimestral de Direito Público, v. 38/143-4, verbis:

“6. A legislação brasileira, a começar da Constituição, proclama a intangibilidade doequilíbrioeconômico-financeirooriginaldocontrato.Deverasoart.37,XXI,daLei Magna dispõe que ‘(...) obras, serviços, compras e alienações serão contratados,

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mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento mantidas as condições efetivas da proposta (...)’.

O versículo em apreço, como consta de sua dicção, estabeleceu uma correspondência entre as obrigações de pagamento e as condições efetivas da proposta. Dado que as partes se obrigarão em face daquelas condições efetivas, os pagamentos devidos ao contratado haverão de correlacionar-se às bases do negócio, uma vez que presidiram a oferta e se substanciaram em sua real compostura. Assim, tais pagamentos, para atenderemàprevisãoconstitucional,necessitamresguardaracorrelaçãoestratificadasobre as condições efetivas em vista das quais se assentaram as partes, o que equivale a dizer que terão que ser reequilibrados se houver supervenientes desconcertos.

É, dessarte, no próprio texto constitucional que se assenta o resguardo daquilo que, emdireitoadministrativo,édenominado‘equilíbrioeconômico-financeirodocontratoadministrativo’, com os decorrentes reajustes e revisões.

7.Emnível infraconstitucional, o equilíbrio econômico-financeiro também seencontra enfatizado pelo direito positivo. Desde logo, a Lei 8.666, de 21.6.1993, que veicula regras gerais sobre licitação e contratos, consagra sua incolumidade em nu-merosas passagens. Basta referir as disposições que se estampam no art. 5º, § 1º; no art. 7º, § 7º; no art. 40, XI e XIV, c; no art. 57, § 1º; no art. 58, §§ 1º e 2º; e 65, II, d, assim como em seu § 5º.

É certo, além disto, que a Lei de Concessões, Lei 8.987, de 13.2.1995, também encareceaproteçãoàequaçãoeconômico-financeiraeexige-lheapersistênciaaolongoda relação instaurada. Com efeito, seu art. 9º estatui que a tarifa do serviço concedido ‘será preservada pelas regras de revisão’.

O mesmo intuito de preservação do equilíbrio estipulado de início reaparece es-tampadamente nos §§ 2º, 3º e 4º do mesmo artigo, ao estabelecerem, respectivamente, que:‘Oscontratospoderãoestabelecermecanismosderevisãodastarifas,afimdemanter-seoequilíbrioeconômicoefinanceiro’;que:‘Ressalvadososimpostossobrea renda, a criação, alteração ou extinção de quaisquer tributos ou encargos legais, após a apresentação da proposta, quando comprovado seu impacto, implicará a revisão da tarifa para mais ou para menos, conforme o caso’; e que: ‘Em havendo alteração unilateraldocontratoqueafeteoseuinicialequilíbrioeconômico-financeiro,opoderconcedente deverá restabelecê-lo, concomitantemente à alteração’.

O art. 18 da mesma lei dispõe que: ‘O edital de licitação será elaborado pelo poder concedente, observados, no que couber, os critérios e as normas gerais da legislação própria sobre licitações e contratos e conterá, especialmente: (...) VIII – os critérios de reajuste e revisão das tarifas’.

O art. 23, entre as cláusulas categorizadas como essenciais ao contrato de concessão, em seu inciso IV, inclui as relativas ‘ao preço do serviço e aos critérios e procedimentos para o reajuste e a revisão das tarifas’.

É inquestionável, pois, que a legislação de concessão de serviços públicos, tanto

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como a de contratos administrativos em geral – e os princípios gerais destes se apli-cam às licitações para concessão de serviços públicos, como o declara seu art. 18 –, consagraminsistentementeagarantiadoequilíbrioeconômico-financeiro,tantopeloinstituto da revisão, quanto dos reajustes.

Tudo isto está a revelar, inobjetavelmente, a decidida orientação legislativa de asseguraroequilíbrioeconômico-financeirodocontratoadministrativo.”

No que concerne às limitações que sofre a Administração Pública para promover alterações unilaterais no contrato administrativo, notadamente o contrato de concessão do serviço público, averba André de Laubadè-re, em seu já clássico Traité des Contrats Administratifs, 2. ed., Paris: L.G.D.J., Paris, 1984, t. 2º, p. 406, n. 1.177, verbis:

“D’une part, l’administration et son cocontractant ont conclu un certain contrat, ayant un certain objet: l’administration ne peut prétendre imposer une modification qui aboutirait à dénaturer le contrat, à lui donner en fait un objet nouveau, différent de celui qui a été envisagé dans la commune intention des parties; d’autre part, le cocontractant a conclu le contrat en considération de certaines conditions, notamment de ses possibilités techniques et financières. L’administration ne peut prétendre imposer des modifications qui aboutiraient par leur importance à un bouleversement du contrat et de son économie générale.”

Nesse sentido, ainda, os seguintes autores: Jean de Soto, in Droit Administratif – Theorie Generale du Service Public, Paris: Éditions Montchrestien, 1981, p. 339; Marcel Waline, in Traité Élémentaire de Droit Administratif, 6. ed., Paris: Libr. du Recueil Sirey, 1952, 392-3, § 3º; Jean Rivero, in Droit Administratif, 8. ed., Paris: Dalloz, 1977, p. 454-5, nº 481; Jacqueline Morand-Deviller, in Cours de Droit Adminis-tratif, 3. ed., Paris: Montchrestien, p. 362, c; Georges Dupuis, Marie J. Guédon, Patrice Chrétien, in Droit Administratif, 7. ed., Paris: Armand Colin, p. 403, b; Laurent Richer, in Droit des Contrats Administratifs, Paris: L.G.D.J., 1995, p. 198; Gaston Jèze, in Les Principes Généraux du Droit Administratif – Théorie Générale des Contrats de L’Administration, Troisième Partie, Paris: L.G.D.J., 1936, 1.142.

A respeito, a lição precisa de Laubadère, em artigo intitulado “Du pouvoir de l’administration d’imposer unilatéralement des changements aux dispositions des contrats administratifs”, publicado na Revue du Droit Public, 1954, p. 40-1, verbis:

“Le pouvoir de modification unilatérale est considéré comme d’ordre public;

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l’administration ne peut renoncer à l’avance à l’exercer (Jèze, op. cit., p. 225; Bon-nard, op. cit., p. 620).

Le pouvoir de modification existant en dehors des stipulations du contrat, lorsque celui-ci le prévoit il ne le crée pas mais ne fait que régler ses conditions d’exercice, en particulier ses limites et ses conséquences pécuniaires (Jèze, loc. cit.).

Par ailleurs un tel pouvoir a des limites et des contreparties; à cet égard la juris-prudence relative aux limites et contreparties des modifications prévues par le contrat lui-même est utilisable d’une manière générale et elle est très développée.

Les limites du pouvoir de modification sont de deux ordres: D’une part les modifications unilatérales ne peuvent concerner que les clauses du

contrat qui intéressent le service public et ses besoins (c’est-à-dire les prestations du cocontractant et leurs modalités d’exécution) à l’exclusion des clauses qui règlent les rapports d’intérêts entre les parties (notamment les clauses financières).

D’autre part l’administration ne peut pas utiliser son pouvoir de modification pour imposer au cocontractant des changements excessifs, dépassant une mesure raisonna-ble, c’est-à-dire ayant pour effet de transformer l’objet même du contrat (par exemple de transformer une concession de service public en une régie déguisée: C. E., 18 juillet 1930, Compagnie P.L.M. et autres, R.D.P., 1931, p. 142, concl. Josse) ou d’excéder les possibilités techniques ou économiques du cocontractant; ce dernier critère est très largement éclairé, par exemple, par l’abondante jurisprudence relative, en matière de marchés de travaux publics, aux notions d’‘ouvrage nouveau’ et de ‘bouleversement de l’économie générale du projet’ (C. E., 23 juin 1920, Briançon, p. 626).

Quant à la contrepartie du pouvoir de modification elle se trouve dans le principe générale selon lequel toute modification imposée au cocontractant et lui causant un préjudice oblige l’administration à l’indemniser de manière à rétablir l’équilibre contractuel initialement envisagé dans la commune intention des parties.”

Em palavras lapidares, a propósito do alcance da garantia do equilíbrio econômico-financeirodocontratoadministrativo,anotamNicolaAssinie Lucio Marotta, in La Concessione di Opere Pubbliche, CEDAM-PADOVA, 1981, p. 73-4, verbis:

“È un principio pacifico che la gestione sia svolta dal concessionario a suo rischio e periculo. Ma è altrettanto evidente che rischi e pericoli sono a carico del concessio-nario solo in condizioni di normale svolgimento del rapporto economico regolato fra le parti dalla convenzione accessiva all’atto di concessione.

Fra le obbligazioni de concedente e quelle des concessionario si stabilisce all’inizio un certo rapporto ed è questo rapporto che deve essere mantenuto nel tempo, anche se ciò dovesse richiedere un mutamento delle obbligazioni assunte originariamente dalle parti.

Interessato particolarmente al mantenimento di questo rapporto è naturalmente il concessionario, che eviterà cosí di doversi accollare i rischi di gestione dipendenti

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da avvenimenti eccezionali ed imprevedibili. Ma anche il concedente ha interesse che il concessionario non venga mai a trovarsi in crisi in dipendenza di fatti che non gli siano addebitabili, poiché altrimenti verrebbe pregiudicato il perseguimento del fine pubblico che l’atto di concessione si riprometteva.

È nella logica della concessione che gli interessi delle parti non debbano risentire di quella contrapposizione o antiteticità che normalmente si verifica in qualsiasi altro rapporto obbligatorio scaturente da contratto. Concedente e concessionario sono in effetti legati da un rapporto del tutto peculiare, per cui essi vengono a trovarsi, secondo una plastica espressione, nella stessa barca.”

Essa interpretação resulta do texto da Lei Maior, nos arts. 37, XXI, e 175, III, da CF/88, que garante ao concessionário do serviço público a justaremuneraçãopelaprestaçãodoserviço,oqueseverificapormeioda tarifa.

Ora, permitir que o Poder Público, por ato unilateral, alterasse o valor da tarifa, reduzindo-o, seria infringir o intento constitucional, compro-metendooequilíbrioeconômico-financeirodocontratodeconcessão,com repercussões negativas na prestação do serviço público e no próprio desdobramento do contrato, pondo em risco a continuidade e a regulari-dade da prestação do serviço.

Impõe-se, aqui, recordar as palavras de Sutherland, a propósito da interpretação das cláusulas constitucionais, verbis:

“No Court is authorized to so construe a clause of the constitution as to defeat its obvious ends, when another construction, equally accordant with the words and sense, will enforce and protect those ends. (...) a Court has no right to insert anything in the constitution which is not expressed and cannot fairly be implied, and when the text of a constitutional provision is not ambiguous, the courts are not at liberty to search for its meaning beyond the instrument itself.” (William A. Sutherland, in Notes on the Constitution of the United States, San Francisco: Bancroft-Whitney Company, 1904, p. 28-9)

Benignius leges interpretandae sunt, quo voluntas eorum conservetur (Celso, Dig. 1, 3, 18).

Ademais, como sabido, os atos e contratos praticados pelo Poder Pú-blico,suavalidade,extensãoeeficácia,somentepoderãoserapreciadosàluz das regras de direito público, notadamente o princípio da legalidade, hoje insculpido no art. 37 da CF/88.

A respeito, bem lembrou Hartmut Maurer, verbis:“Le problème principal du contrat administratif, du point de vue juridique, est le

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principe de la soumission de l’administration à la loi et au droit (Gesetzmässigkeit der Verwaltung). Alors que le droit civil est marqué par le principe d’autonomie des rela-tions entre personnes privées (Privatautonomie) et que, par suite, il est axé précisément sur le contrat, considéré comme moyen d’aménagement des rapports entre individus (Gestaltungsmittel), le droit administratif est dominé par le principe de légalité. Les règles juridiques s’imposant à l’administration régissent de plus en plus étroitement les rapports qu’elle a avec le citoyen, comme le montre l’extension du domaine réservé à la loi, la soumission croissante du pouvoir discrétionnaire à des règles de droit, la reconnaissance de droits subjectifs et le développment de la protection juridictionel-le.” (In Droit Administratif Allemand, traduit par M. Fromont, Paris: L.G.D.J., 1994, p. 378-9, n. 25, c ).

O art. 1º da Lei Estadual nº 15.722 do Estado do Paraná é do seguinte teor, verbis:

“Art. 1º. Ficam isentas de pagamento de pedágio, nas estradas e rodovias localizadas no âmbito territorial do Estado do Paraná, as motocicletas e similares.”

É, pois, clara a violação do mencionado dispositivo legal aos arts. 37, XXI, e 175, III, da CF/88.

Por esses motivos, voto por acolher o presente incidente de incons-titucionalidade.

É o meu voto.

VOTO-VISTA

A Exma. Sra. Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria: Pedi vista para melhor examinar os autos, por não me sentir habilitada a votar na sessão em que foi iniciado o presente julgamento.

Verificoque,efetivamente,houveviolaçãoaosartigos37,XXI,e175,III, da Constituição Federal de 1988.

Ante o exposto, voto por acompanhar o Eminente Relator, acolhendo o presente incidente de inconstitucionalidade.

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SÚMULAS

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SÚMULA Nº 1“É inconstitucional a exigência do empréstimo compulsório instituído pelo artigo

10 do Decreto-Lei 2.288, de 1986, na aquisição de veículos de passeio e utilitários.” (DJ 02.10.91, p. 24.184)

SÚMULA Nº 2“Para o cálculo da aposentadoria por idade ou por tempo de serviço, no regime

precedente à Lei n° 8.213, de 24 de julho de 1991, corrigem-se os salários-de-contri-buição, anteriores aos doze últimos meses, pela variação nominal da ORTN/OTN.” (DJ 13.01.92, p. 241)

SÚMULA Nº 3“Os juros de mora, impostos a partir da citação, incidem também sobre a soma das

prestações previdenciárias vencidas.” (DJ 24.02.92, p. 3.665)

SÚMULA Nº 4“É constitucional a isenção prevista no art. 6° do Decreto-Lei n° 2.434, de 19.05.88.”

(DJ 22.04.92, p. 989)

SÚMULA Nº 5“A correção monetária incidente até a data do ajuizamento deve integrar o valor da

causa na ação de repetição de indébito.” (DJ 01.05.92, p. 12.081)

SÚMULA Nº 6“A autoridade administrativa não pode, com base na Instrução Normativa n° 54/81

- SRF, exigir a comprovação do recolhimento do ICMS por ocasião do desembaraço aduaneiro.” (DJ 20.05.92, p. 13.384)

SÚMULA Nº 7“É inconstitucional o art. 8° da Lei n° 7.689 de 15 de dezembro de 1988.” (DJ

20.05.92, p. 13.384)

SÚMULA Nº 8“Subsiste no novo texto constitucional a opção do segurado para ajuizar ações

contra a Previdência Social no foro estadual do seu domicílio ou no do Juízo Federal.” (DJ 20.05.92, p. 13.385)

SÚMULA Nº 9“Incide correção monetária sobre os valores pagos com atraso, na via administrativa,

a título de vencimento, remuneração, provento, soldo, pensão ou benefício previden-ciário, face à sua natureza alimentar.” (DJ 06.11.92, p. 35.897)

SÚMULA Nº 10“A impenhorabilidade da Lei n° 8.009/90 alcança o bem que, anteriormente ao seu

advento, tenha sido objeto de constrição judicial.” (DJ 20.05.93, p. 18.986)

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SÚMULA Nº 11“O desapropriante está desobrigado de garantir compensação pelo deságio que os

títulos da dívida agrária venham a sofrer, se levados ao mercado antecipadamente.” (DJ 20.05.93, p.18986) (Rep. DJ 14.06.93, p. 22.907)

SÚMULA Nº 12“Na execução fiscal, quando a ciência da penhora for pessoal, o prazo para a

oposição dos embargos de devedor inicia no dia seguinte ao da intimação deste.” (DJ 20.05.93, p. 18.986)

SÚMULA Nº 13“É inconstitucional o empréstimo compulsório incidente sobre a compra de gaso-

lina e álcool, instituído pelo artigo 10 do Decreto-Lei 2.288, de 1986.” (DJ 20.05.93, p. 18.987)

SÚMULA Nº 14 (*)“É constitucional o inciso I do artigo 3° da Lei 7.787, de 1989.” (DJ 20.05.93,

p. 18.987) (DJ 31.08.94, p. 47.563 (*)CANCELADA)

SÚMULA Nº 15“O reajuste dos benefícios de natureza previdenciária, na vigência do Decreto-Lei

n° 2.351, de 7 de agosto de 1987, vinculava-se ao salário mínimo de referência e não ao piso nacional de salários.” (DJ 14.10.93, p. 43.516)

SÚMULA Nº 16“A apelação genérica, pela improcedência da ação, não devolve ao Tribunal o exame

da fixação dos honorários advocatícios, se esta deixou de ser atacada no recurso.” (DJ 29.10.93, p. 46.086)

SÚMULA Nº 17 (*)“No cálculo de liquidação de débito judicial, inclui-se o índice de 70,28%

relativo à correção monetária de janeiro de 1989.” (DJ 02.12.93, p. 52.558) (DJ 19.06.95, p. 38.484 (*)REVISADA)

SÚMULA Nº 18“O depósito judicial destinado a suspender a exigibilidade do crédito tributário

somente poderá ser levantado, ou convertido em renda, após o trânsito em julgado da sentença.” (DJ 02.12.93, p. 52.558)

SÚMULA Nº 19“É legítima a restrição imposta pela Portaria DECEX n° 8, de 13.05.91, no que

respeita à importação de bens usados, dentre os quais pneus e veículos.” (DJ 15.12.93, p. 55.316)

SÚMULA Nº 20“O art. 8°, parágrafo 1°, da Lei 8.620/93 não isenta o INSS das custas judiciais,

quando demandado na Justiça Estadual.” (DJ 15.12.93, p. 55.316)

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SÚMULA Nº 21“É constitucional a Contribuição Social criada pelo art. 1° da Lei Complementar

n° 70, de 1991.” (DJ 15.12.93, p. 55.316)

SÚMULA Nº 22“É inconstitucional a cobrança da taxa ou do emolumento para licenciamento de

importação, de que trata o art. 10 da Lei 2.145/53, com a redação da Lei 7.690/88 e da Lei 8.387/91.” (DJ 05.05.94, p. 20.933)

SÚMULA Nº 23“É legítima a cobrança do empréstimo compulsório incidente sobre o consumo de

energia elétrica, instituído pela Lei 4.156/62, inclusive na vigência da Constituição Federal de 1988.” (DJ 05.05.94, p. 20.933)

SÚMULA Nº 24“São autoaplicáveis os parágrafos 5° e 6° do art. 201 da Constituição Federal de

1988.” (DJ 05.05.94, p. 20.934)

SÚMULA Nº 25“É cabível apelação da sentença que julga liquidação por cálculo, e agravo de

instrumento da decisão que, no curso da execução, aprecia atualização da conta.” (DJ 05.05.94, p. 20.934)

SÚMULA Nº 26“O valor dos benefícios previdenciários devidos no mês de junho de 1989 tem

por base o salário mínimo de NCz$120,00 (art. 1° da Lei 7.789/89).” (DJ 05.05.94, p. 20.934)

SÚMULA Nº 27“A prescrição não pode ser acolhida no curso do processo de execução, salvo se super-

veniente à sentença proferida no processo de conhecimento.” (DJ 05.05.94, p. 20.934)

SÚMULA Nº 28“São inconstitucionais as alterações introduzidas no Programa de Integração Social

(PIS) pelos Decretos-Leis 2.445/88 e 2.449/88.” (DJ 05.05.94, p. 20.934)

SÚMULA Nº 29“Não cabe a exigência de estágio profissionalizante para efeito de matrícula em

curso superior.” (DJ 05.05.94, p. 20.934)

SÚMULA Nº 30“A conversão do regime jurídico trabalhista para o estatutário não autoriza ao ser-

vidor o saque dos depósitos do FGTS.” (DJ 09.06.94, p. 30.113)

SÚMULA Nº 31“Na ação de repetição do indébito tributário, os juros de mora incidem a partir do

trânsito da sentença em julgado.” (DJ 29.05.95, p. 32.675)

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SÚMULA Nº 32 (*)“No cálculo de liquidação de débito judicial, inclui-se o índice de 42,72% relativo

à correção monetária de janeiro de 1989.” (DJ 19.06.95, p. 38.484 (*)REVISÃO DA SÚMULA 17)

SÚMULA Nº 33“A devolução do empréstimo compulsório sobre combustíveis (art. 10 do De-

creto-Lein°2.288/86)independedaapresentaçãodasnotasfiscais.”(DJ08.09.95,p. 58.814)

SÚMULA Nº 34“Os municípios são imunes ao pagamento de IOF sobre suas aplicações financeiras.”

(DJ 22.12.95, p. 89.171)

SÚMULA Nº 35“Inexiste direito adquirido a reajuste de vencimentos de servidores públicos federais

com base na variação do IPC – Índice de Preços ao Consumidor – de março e abril de 1990.” (DJ 15.01.96, p. 744)

SÚMULA Nº 36“Inexiste direito adquirido a reajuste de benefícios previdenciários com base na

variação do IPC – Índice de Preços ao Consumidor – de março e abril de 1990.” (DJ 15.01.96, p. 744)

SÚMULA Nº 37“Na liquidação de débito resultante de decisão judicial, incluem-se os índices

relativos ao IPC de março, abril e maio de 1990 e fevereiro de 1991.” (DJ 14.03.96, p. 15.388)

SÚMULA Nº 38“São devidos os ônus sucumbenciais na ocorrência de perda do objeto por causa

superveniente ao ajuizamento da ação.” (DJ 15.07.96, p. 48.558)

SÚMULA Nº 39“Aplica-se o índice de variação do salário da categoria profissional do mutuário

para o cálculo do reajuste dos contratos de mútuo habitacional com cláusula PES, vinculados ao SFH.” (DJ 28.10.96, p. 81.959)

SÚMULA Nº 40“Por falta de previsão legal, é incabível a equivalência entre o salário-de-contribuição

e o salário-de-benefício para o cálculo da renda mensal dos benefícios previdenciários.” (DJ 28.10.96, p. 81.959)

SÚMULA Nº 41“É incabível o sequestro de valores ou bloqueio das contas bancárias do INSS para

garantir a satisfação de débitos judiciais.” (DJ 28.10.96, p. 81.959)

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R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p.389-398, 2009 395

SÚMULA Nº 42 (*)“A União e suas autarquias estão sujeitas ao adiantamento das despesas do oficial de

justiça necessárias ao cumprimento de diligências por elas requeridas.” (DJ 16.04.97, p. 24.642-43) (DJ 19.05.97, p. 34.755 (*)REVISÃO)

SÚMULA Nº 43“As contribuições para o FGTS não têm natureza tributária, sujeitando-se ao prazo

prescricional de trinta anos.” (DJ 14.01.98, p. 329)

SÚMULA Nº 44“É inconstitucional a contribuição previdenciária sobre o pro labore dos admi-

nistradores, autônomos e avulsos, prevista nas Leis nos 7.787/89 e 8.212/91.” (DJ 14.01.98, p. 329)

SÚMULA Nº 45“Descabe a concessão de liminar ou de antecipação de tutela para a compensação

de tributos.” (DJ 14.01.98, p. 329)

SÚMULA Nº 46“É incabível a extinção do processo de execução fiscal pela falta de localização do

devedor ou inexistência de bens penhoráveis (art. 40 da Lei n° 6.830/80).” (DJ 14.01.98, p.330) (Rep. DJ 11.02.98, p. 725)

SÚMULA Nº 47“Na correção monetária dos salários-de-contribuição integrantes do cálculo da renda

mensal inicial dos benefícios previdenciários, em relação ao período de março a agosto de 1991, não se aplica o índice de 230,40%.” (DJ 07.04.98, p. 381)

SÚMULA Nº 48“O abono previsto no artigo 9°, § 6°, letra b, da Lei n° 8178/91 está incluído no

índice de 147,06%, referente ao reajuste dos benefícios previdenciários em 1° de se-tembro de 1991.” (DJ 07.04.98, p. 381)

SÚMULA Nº 49“O critério de cálculo da aposentadoria proporcional estabelecido no artigo 53 da

Lei 8.213/91 não ofende o texto constitucional.” (DJ 07.04.98, p. 381)

SÚMULA Nº 50“Não há direito adquirido à contribuição previdenciária sobre o teto máximo de 20

salários mínimos após a entrada em vigor da Lei n° 7.787/89.” (DJ 07.04.98, p. 381)

SÚMULA Nº 51“Não se aplicam os critérios da Súmula n° 260 do extinto Tribunal Federal de

Recursos aos benefícios previdenciários concedidos após a Constituição Federal de 1988.” (DJ 07.04.98, p. 381)

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SÚMULA Nº 52 (*)“São devidos juros de mora na atualização da conta objeto de precatório comple-

mentar.” (DJ 07.04.98, p. 382) (DJ 07.10.2003, p. 202 (*) CANCELADA)

SÚMULA Nº 53“A sentença que, independentemente de pedido, determina a correção monetária

do débito judicial não é ultra ou extra petita.” (DJ 07.04.98, p. 382)

SÚMULA Nº 54“Os valores recebidos a título de incentivo à demissão voluntária não se sujeitam

à incidência do imposto de renda.” (DJ 22.04.98, p. 386)

SÚMULA Nº 55“É constitucional a exigência de depósito prévio da multa para a interposição de recurso

administrativo, nas hipóteses previstas pelo art. 93 da Lei n° 8.212/91 – com a redação dada pela Lei n° 8.870/94 - e pelo art. 636, § 1°, da CLT.” (DJ 15.06.98, p. 584)

SÚMULA Nº 56“Somente a Caixa Econômica Federal tem legitimidade passiva nas ações que ob-

jetivam a correção monetária das contas vinculadas do FGTS.” (DJ 03.11.98, p. 298)

SÚMULA Nº 57“As ações de cobrança de correção monetária das contas vinculadas do FGTS

sujeitam-se ao prazo prescricional de trinta anos.” (DJ 03.11.98, p. 298)

SÚMULA Nº 58“A execução fiscal contra a Fazenda Pública rege-se pelo procedimento previsto

no art. 730 do Código de Processo Civil.” (DJ 18.11.98, p. 518)

SÚMULA Nº 59“A UFIR, como índice de correção monetária de débitos e créditos tributários,

passou a viger a partir de janeiro de 1992.” (DJ 18.11.98, p. 519)

SÚMULA Nº 60“Da decisão que não recebe ou que rejeita a denúncia cabe recurso em sentido

estrito.” (DJ 29.04.99, p. 339)

SÚMULA Nº 61 (*)“A União e o INSS são litisconsortes passivos necessários nas ações em que seja

postulado o benefício assistencial previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, não sendo caso de delegação de jurisdição federal.” (DJ 27.05.99, p. 290) (DJ 07.07.2004, p. 240 (*) CANCELADA)

SÚMULA Nº 62 (*)“Nas demandas que julgam procedente o pedido de diferença de correção monetária

sobre depósitos do FGTS, não são devidos juros de mora relativamente às contas não movimentadas.” (DJ 23.02.2000, p. 578) (DJ 08.10.2004, p. 586 (*) CANCELADA)

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SÚMULA Nº 63“Não é aplicável a Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal nas ações rescisórias

versando matéria constitucional.” (DJ 09.05.2000, p. 657)

SÚMULA Nº 64“É dispensável o reconhecimento de firma nas procurações ad judicia, mesmo

para o exercício em juízo dos poderes especiais previstos no art. 38 do CPC.” (DJ 07.03.2001, p. 619)

SÚMULA Nº 65“A pena decorrente do crime de omissão no recolhimento de contribuições previ-

denciárias não constitui prisão por dívida.” (DJ 03.10.2002, p. 499)

SÚMULA Nº 66“A anistia prevista no art. 11 da Lei nº 9.639/98 é aplicável aos agentes políticos, não

aproveitando aos administradores de empresas privadas.” (DJ 03.10.2002, p. 499)

SÚMULA Nº 67“A prova da materialidade nos crimes de omissão no recolhimento de contribui-

ções previdenciárias pode ser feita pela autuação e notificação da fiscalização, sendo desnecessária a realização de perícia.” (DJ 03.10.2002, p. 499)

SÚMULA Nº 68“A prova de dificuldades financeiras, e consequente inexigibilidade de outra

conduta, nos crimes de omissão no recolhimento de contribuições previdenciárias, pode ser feita através de documentos, sendo desnecessária a realização de perícia.” (DJ 03.10.2002, p. 499)

SÚMULA Nº 69“A nova redação do art. 168-A do Código Penal não importa em descriminalização

da conduta prevista no art. 95, d, da Lei nº 8.212/91.” (DJ 03.10.2002, p. 499)

SÚMULA Nº 70“São devidos honorários advocatícios em execução de título judicial, oriundo de

ação civil pública.” (DJ 06.10.2003, p. 459)

SÚMULA Nº 71“Os juros moratórios são devidos pelo gestor do FGTS e incidem a partir da citação

nas ações em que se reclamam diferenças de correção monetária, tenha havido ou não levantamento do saldo, parcial ou integralmente.” (DJ 08.10.2004, p. 586)

SÚMULA Nº 72“É possível cumular aposentadoria urbana e pensão rural.” (DJ 02.02.2006, p. 524)

SÚMULA Nº 73“Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade

rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.” (DJ 02.02.2006, p. 524)

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SÚMULA Nº 74“Extingue-se o direito à pensão previdenciária por morte do dependente que atinge

21 anos, ainda que estudante de curso superior.” (DJ 02.02.2006, p. 524)

SÚMULA Nº 75“Os juros moratórios, nas ações previdenciárias, devem ser fixados em 12% ao ano,

a contar da citação.” (DJ 02.02.2006, p. 524)

SÚMULA Nº 76“Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente

sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência.” (DJ 02.02.2006, p. 524)

SÚMULA Nº 77“O cálculo da renda mensal inicial de benefício previdenciário concedido a partir

de março de 1994 inclui a variação integral do IRSM de fevereiro de 1994 (39,67%).” (DJ 08.02.2006, p. 290)

SÚMULA Nº 78“A constituição definitiva do crédito tributário é pressuposto da persecução penal

concernente a crime contra a ordem tributária previsto no art. 1º da Lei nº 8.137/90.” (DJ 22.03.2006, p. 434)

SÚMULA Nº 79“Cabível a denunciação da lide à Caixa Econômica Federal nas ações em que os

ex-procuradores do Banco Meridional buscam o pagamento de verba honorária rela-tivamente aos serviços prestados para a recuperação dos créditos cedidos no processo de privatização da instituição.” (DE 26.05.2009)

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RESUMO

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ResumoTrata-se de publicação oficial do Tribunal Regional Federal da 4ª

Região, com periodicidade trimestral e distribuição nacional. A Revista contém inteiros teores de acórdãos recentes selecionados pelos Excelen-tíssimos Desembargadores, abordando as matérias de sua competência. Traz, ainda, discursos oficiais, arguições de inconstitucionalidade e as súmulas editadas pelo Tribunal, além de artigos doutrinários nacionais e internacionais de renomados juristas e, principalmente, da lavra dos Desembargadores Federais integrantes desta Corte.

SummaryThis is about an official trimestrial publication of Tribunal Regional

Federal da 4ª Região (Federal Regional Court of Appeals of the 4th Cir-cuit) in Brazil, distributed nationally. The periodical contains the entire up-to-date judgments selected by the federal judges, concerning to the matters of the federal competence. It also brings the official speeches, the arguings unconstitutionality and the law summarized cases edited by the Court, as well as the national and the international doctrinal articles, written by renowned jurists and mainly those written by the Judges of this Court.

ResumenEsta es una publicación oficial del Tribunal Regional de la 4ª Región,

con periodicidad trimestral y distribución nacional. La Revista contiene la íntegra de recientes decisiones, seleccionadas por Magistrados com-

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ponentes de esta Casa, abordando materias de su competencia, también discursos oficiales, cuestiones sobre control de constitucionalidad, sú-mulas editadas por el propio Tribunal, artículos de doctrina nacional y internacional escritos por renombrados jurisconsultos y, principalmente, aquellos proferidos por Jueces que pertenecen a esta Corte.

SintesiSi tratta di pubblicazione ufficiale del Tribunale Regionale Federale

della Quarta Regione, con periodicità trimestrale e distribuizione na-zionale. La Rivista riproducce l’integra di sentenze recenti selezionate dai egregi Consiglieri della Corte d’Appello Federale, relazionate alle materie della sua competenza. Riproducce, ancora, pronunciamenti ufficiali, ricorsi di incostituzionalità, la giurisprudenza consolidata publicata dal Tribunale e testi dottrinali scritti dai Consiglieri di questa Corte d’Appello e da rinomati giuristi nazionali ed internazionali.

RésuméIl s’agit d’une publication officielle du Tribunal Regional Federal

da 4ª Região (Tribunal Régional Fédéral de la 4ème Région), dont la périodicité est trimestrielle et la distribution nationale. Cette Revue publie les textes complets des arrêts les plus récents, sélectionnés par les Juges Conseillers de la Cour d’Appel, concernant des matières de leur compétence. En plus ce périodique apporte aussi bien des discours officiels, des argumentations d’inconstitutionnalité, des arrêts édités par le Tribunal, des articles doctrinaires, y compris des textes redigés par les Juges Conseillers de cette Cour de Justice et par des juristes nacionaux et internationaux renommés.

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ÍNDICE NUMÉRICO

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DIREITO ADMINISTRATIVO E DIREITO CIVIL1994.71.00.010401-4/RS (APELREEX) Rel. Desa. Federal Maria Lúcia Luz Leiria ...............................812000.71.00.008764-0/RS (AC) Rel. Des. Federal Edgard Antonio Lippmann Júnior ................902003.70.00.044720-4/PR (AC) Rel. Desa. Federal Marga Barth Tessler ....................................952006.72.04.003887-4/SC (AC) Rel. Juiz Federal Roger Raupp Rios........................................104

DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL2004.70.00.032188-2/PR(ACR) Rel.Des.FederalNéfiCordeiro ..............................................1172004.72.01.004756-6/SC (ACR) Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado ..................1382005.04.01.023831-0/RS (ACR) Rel. Des. Federal Élcio Pinheiro de Castro .............................1462008.04.00.019096-1/RS (NOTCRI) Rel. Des. Federal Tadaaqui Hirose ..........................................1552008.71.00.030825-3/RS (ACR) Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz ..............................161

DIREITO PREVIDENCIÁRIO2008.71.00.001228-5/RS (AC) Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus .......................1692008.71.00.004209-5/RS (APELREEX) Rel. Juiz Federal Eduardo Tonetto Picarelli ............................1792008.71.00.010704-1/RS (REOAC) Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira ..........................187

DIREITO PROCESSUAL CIVIL1998.04.01.083792-1/RS (EIAC) Rel. Des. Federal Rômulo Pizzolatti .......................................1972006.04.00.034452-9/RS (EEAR) Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira ...............2522007.04.00.023866-7/RS (AR) Rel. Juiz Federal Alcides Vettorazzi ........................................2602007.04.00.026653-5/RS (AR) Rel. Des. Federal Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle ...............2712007.04.00.040066-5/SC (AGVSEL) Rel. Desa. Federal Silvia Goraieb ...........................................2762008.04.00.010520-9/RS (AG) Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona...........................2842008.04.00.032667-6/RS (COR) Rel. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz .....2882009.04.00.015301-4/RS (AG) Rel. Juiz Federal Artur César de Souza ...................................297

DIREITO TRIBUTÁRIO97.04.54757-9/RS (AC) Rel. Des. Federal Joel Ilan Paciornik ......................................3132006.71.00.009374-4/RS (AC) Rel. Des. Federal Vilson Darós ...............................................3272007.71.00.015243-1/RS (APELREEX) Rel. Des. Federal Álvaro Eduardo Junqueira ..........................3342008.72.08.004169-8/SC (AC) Rel. Juíza Federal Vânia Hack de Almeida .............................3442009.04.00.007500-3/RS (AG) Rel. Juiz Federal Marcelo De Nardi ........................................358

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE2008.04.00.002897-5/PR (INAG) Rel. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz .....369

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ÍNDICE ANALÍTICO

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A

ABSORÇÃO DE CRIMEEstelionato – Vide FALSIDADE IDEOLÓGICA

AÇÃO PENALEncerramento – Vide REGIME ADUANEIRO

AÇÃO RESCISÓRIAIndeferimento. Sentença judicial. Análise. Pedido. Revisão de benefício. Aposentado-ria por idade. Descabimento. Pretensão. Segurado. Reconhecimento. Tempo de servi-ço. Atividade rural. Tempo de serviço especial. Objetivo. Conversão. Aposentadoria por tempo de serviço. Inexistência. Violação. Dispositivo legal. Reexame. Prova. Descabimento. ..........271

Procedência. Violação. Dispositivo legal. Código de Processo Civil. Ação previden-ciária. Possibilidade. Juntada. Cópia. Sentença judicial. Ação declaratória. União estável. Justiça Estadual. Objetivo. Requerimento. Pensão por morte. Companheiro. Legitimidade. Meio de prova.Juiz.Consideração.Insuficiênciadeprovas.Comprovação.Uniãoestável.Cabimen-to. Requerimento. Ex officio. Complementação. Produção de prova. ......................260

ADMISSÃO TEMPORÁRIABagagem desacompanhada – Vide REGIME ADUANEIRO

Prazo – Vide REGIME ADUANEIRO

ADVOGADOSucumbência – Vide HONORÁRIOS

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AGRAVAMENTO DE DOENÇAInfecção hospitalar – Vide DANO MORAL

AGRAVO DE INSTRUMENTOIndeferimento. Poder Judiciário. Não caracterização. Órgão consultivo.Petição. Objetivo. Esclarecimento. Situação fática. Situação jurídica. Ação principal. Descabimento. Inexistência. Obscuridade.Negação. Jurisdição. Inexistência. ..........................................................................284

Suspensão. Provimento. Liminar. Determinação. Não ocorrência. Posse. Cargo. De-sembargador.Decorrência.Não.Cumprimento.Requisito.Prazo.Exercícioprofissio-nal. Advocacia.Caracterização. Grave lesão. Ordem pública. Violação. Princípio da segurança jurí-dica.Necessidade. Interpretação. Conteúdo. Constituição Federal. Descabimento. Aprecia-ção. Provimento. Liminar.Hipótese. Procedência. Ação popular. Não caracterização. Invalidação. Ato judicial. Desembargador. Cabimento. Preservação. Atuação. Decisão judicial. Anulação. Pos-terior. Nomeação. Posse. Irrelevância.Ponderação. Princípio da ampla defesa. Princípio da efetividade. .........................276

APLICAÇÃO FINANCEIRAPrejuízo – Vide FUNDO DE INVESTIMENTO

APOSENTADORIA POR INVALIDEZVide REMESSA EX OFFICIO

ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTEDemolição. Imóvel residencial. Despejo. Condição. Poder Público. Oferecimento. Al-ternativa.Área.Construção.Habitação.Morador.Dificuldade.Condiçãoeconômica.Chefe de família. Mulher. Pescador. Direito ambiental. Ponderação. Direito à mora-dia.Posse antiga. Localização. Terreno de Marinha. Com. Aceitação. Poder Público. Ob-servância. Direitos humanos. Princípio da dignidade da pessoa humana. Princípio da razoabilidade. Princípio da proporcionalidade. Desnecessidade. Prova pericial. ...104

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADELei estadual – Vide PEDÁGIO

AUXÍLIO-DOENÇARMI – Vide REVISÃO DE BENEFÍCIO

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B

BACENVide FUNDO DE INVESTIMENTO

BEM PÚBLICOImpenhorabilidade – Vide CORREIÇÃO PARCIAL

BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIOMais. Vantagem. Segurado. Concessão. Via administrativa. Antes. Decisão judicial. Ação previdenciária. Deferimento. Diversidade. Benefício.Execução. Parte. Título executivo judicial. Limite. Prestação vencida. Aposentadoria por tempo de serviço. Até. Dia. Anterior. Concessão. Via administrativa. Aposentado-ria por invalidez. Impossibilidade.Concomitância. Utilização. Cálculo. Mesmo. Salário de contribuição. Descabimento. Proibição. Recebimento. Mais de um. Benefício previdenciário. Necessidade. Opção. .....................................................................................................................169

C

CADINVide MULTA MORATÓRIA

CAPTAÇÃO DE RECURSOSOperaçãodeinstituiçãofinanceirasemautorização–VideCRIMECONTRAOSIS-TEMA FINANCEIRO

CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DA PENAServidor público – Vide FALSIDADE IDEOLÓGICA

CEFAdministrador – Vide FUNDO DE INVESTIMENTO

CIRURGIAErro médico – Vide DANO MORAL

Infecção hospitalar – Vide DANO MORAL

CLÁUSULA DE IMPENHORABILIDADEHospital – Vide PENHORA

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CÓDIGO DE PROCESSO CIVILViolação – Vide AÇÃO RESCISÓRIA

COMPANHEIRAUnião estável – Vide PENSÃO POR MORTE

COMPENSAÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIOIPI – Vide MULTA MORATÓRIA

COMPETÊNCIA ORIGINÁRIATRF – Vide NOTÍCIA CRIME

COMPETÊNCIA POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃOCompetência originária – Vide NOTÍCIA CRIME

CONSTITUCIONALIDADEGestão temerária – Vide CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

CONSTITUIÇÃO FEDERALInterpretação – Vide AGRAVO DE INSTRUMENTO

CONTRATOEquilíbrioeconômico-financeiro–VidePEDÁGIO

Parceria rural – Vide FALSIDADE IDEOLÓGICA

CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRONão incidência. Lucro operacional. Decorrência. Atividade. País estrangeiro.Observância. Princípio da legalidade tributária. Princípio da irretroatividade da lei. Princípio da anterioridade mitigada.Lançamento tributário. Desconstituição.Açãoanulatória.Execuçãofiscal.Conexão.Momentodaação.Posterior.Prolaçãodasentença. Descabimento. Identidade. Sentença judicial. Prejuízo. Não ocorrência. ...313

CORREÇÃO MONETÁRIAIGP-DI – Vide HONORÁRIOS

IGP-DI – Vide PENSÃO POR MORTE

Salário de contribuição – Vide REVISÃO DE BENEFÍCIO

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CORREIÇÃO PARCIALContra. Decisão judicial. Autos. Agravo de instrumento. Reconhecimento. Impenho-rabilidade. Bem público.Juízo a quo. Determinação. Bloqueio. Verba pública. Vinculação. Outro. Processo judicial. Descabimento. Transferência. Valor. Origem. Depósito voluntário. Fundo Nacional de Saúde. Objetivo. Efetividade. Tutela antecipada. Garantia. Aquisição. Medicamento. Doente. Com. Neoplasia maligna. Não ocorrência. Oitiva. Parte contrária. União Federal. .........................................288

CRÉDITOImportação – Vide PIS

Faturamento – Vide PIS

CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTEInstrumento do crime – Vide REGIME ADUANEIRO

CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO Gestão temerária. Instituiçãofinanceira.Constitucionalidade.Autordo crime.Pos-sibilidade. Conhecimento. Ilicitude. Conduta. Irregularidade. Realização. Operação financeira.Dolo.Não.Comprovação.Absolvição.Inclusão. Informação falsa. Documento contábil. Absolvição. Dolo. Não. Comprova-ção. Autor do crime. Desconhecimento. Contabilidade. . ........................................117

Operaçãodeinstituiçãofinanceirasemautorização.Captaçãoderecursos.Terceiro.Com.Remuneração.Superior.Mercadofinanceiro.Comprovação.Atipicidade.Co-brança. Juros usurários. Decorrência. Empréstimo. Remessa. Autos. Necessidade. Manifestação. Ministério Público Federal. Possibilida-de. Proposta. Concessão. Suspensão condicional do processo. Irrelevância. Existên-cia. Condenação anterior. Extinção da punibilidade. Período. Superior. Cinco anos. ..

CVMVide FUNDO DE INVESTIMENTO

D

DANO ESTÉTICONexo de causalidade – Vide DANO MORAL

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DANO MORALDano estético. Comprovação. Nexo de causalidade. Infecção hospitalar. Decorrência. Cirurgia. Emergência. Hospital público. Vinculação. Universidade federal. Responsabilidade objetiva do Estado. Aplicação. Teoria do risco. Indenização. Obser-vância. Princípio da razoabilidade. Princípio da proporcionalidade. Necessidade. Realização. Nova. Cirurgia. ................................................................90

Indenização. Filho. Decorrência. Erro médico. Atendimento. Avaliação. Mãe. Cirur-gia.Negligência. Médico. Credenciamento. INAMPS. Comprovação. Nexo de causalida-de. Morte. Paciente.Agravamento de doença. Decorrência. Infecção hospitalar. Irreversibilidade. Estado. Saúde. Duração. Mais. Dez anos. Antes. Morte.Responsabilidade objetiva do Estado. Legitimidade passiva. União Federal. Responsabilidade solidária. Hospital. Convênio. INAMPS. ....................................81

DÉBITO TRIBUTÁRIOSuspensão da exigibilidade do crédito tributário – Vide MULTA MORATÓRIA

DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃOInformação falsa – Vide PERDIMENTO DE BENS

DENÚNCIAPrefeito – Vide NOTÍCIA CRIME

DESEMBARGADORPosse – Vide AGRAVO DE INSTRUMENTO

DIREITO À MORADIAPonderação – Vide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

DIREITO À SAÚDEPonderação – Vide PENHORA

DIREITO AMBIENTALPonderação – Vide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

DIREITOS HUMANOSVide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

DOCUMENTO CONTÁBILInformação falsa – Vide CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

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DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃORevelia – Vide REMESSA EX OFFICIO

E

EFEITO RETROATIVOReconhecimentodefirma–VideFALSIDADEIDEOLÓGICA

EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIROContrato – Vide PEDÁGIO

ERRO MÉDICOCirurgia – Vide DANO MORAL

ESTELIONATOAbsorção do crime – Vide FALSIDADE IDEOLÓGICA

ESTRANGEIRO RESIDENTE NO BRASILVisto permanente – Vide REGIME ADUANEIRO

EXECUÇÃOTítulo executivo judicial – Vide BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO

EXECUÇÃO MENOS GRAVOSAHospital – Vide PENHORA

F

FALSIDADE IDEOLÓGICADocumento falso. Contrato. Parceria rural. Criação. Data. Anterior. Expedição. Car-teira de identidade. Inscrição. CPF. Autor do crime. Utilização. Objetivo. Obtenção. Salário-maternidade. Falsificaçãogrosseira.Descaracterização.Réu.Tabelião.Equiparação.Servidorpú-blico.Reconhecimentodefirma.Data.Efeitoretroativo.Tentativa. Estelionato. Contra. INSS. Não ocorrência. Observância. Absorção de crime. Regime de cumprimento da pena. Regime aberto. Pena de multa. Inaplicabilidade. Observância. Proibição. Reformatio in pejus. Sursis. Descabimento. Possibilidade. Substituição da pena. Pena privativa de liberda-de. Pena restritiva de direitos. Prestação de serviços à comunidade. Prestação pecu-niária. Redução. Causa especial de aumento da pena. Aplicação. Decorrência. Autor do crime. Condi-ção. Servidor público. Suspensão condicional do processo. Não. Aceitação. Réu. ....................................138

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FATO INCONTROVERSODescaracterização – Vide REMESSA EX OFFICIO

FATURAMENTOHospital – Vide PENHORA

FAZENDA PÚBLICARevelia – Vide REMESSA EX OFFICIO

FRAUDEInterposta pessoa – Vide PERDIMENTO DE BENS

FUNDO DE INVESTIMENTOAplicaçãofinanceira.Rendafixa.Desvalorização.Indenização.Prejuízo.Investidor.Descabimento.Administrador. CEF. Alteração. Critério. Avaliação. Patrimônio. Adequação. Nova. Norma. Vigência. Não. Violação. Dever. Informação. Investidor. Risco. Investimento financeiro.CVM. Bacen. Inexistência. Responsabilidade. Prejuízo. Investidor. ........................95

G

GESTÃO TEMERÁRIAConstitucionalidade – Vide CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

H

HONORÁRIOSAdvogado. Sucumbência. Incidência. Crédito previdenciário. Correção monetária. Aplicação. IGP-DI. A partir. Data. Ajuizamento. Juros de mora. Taxa. 1%. Mês. Incidência. Crédito de natureza alimentícia. A partir. Data. Trânsito em julgado. Decisão judicial. STJ. Acolhimento. Pedido. Ação rescisória. Ajuizamento. Posterior. Inversão. Ônus da sucumbência. Ação rescisória. Anterior. ..................................................................................................................252

HOSPITALFaturamento – Vide PENHORA

HOSPITAL PÚBLICOUniversidade federal – Vide DANO MORAL

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I

IGP-DICorreção monetária – Vide HONORÁRIOS

IMÓVEL RESIDENCIALDemolição – Vide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

INAMPS Médico – Vide DANO MORAL

INFORMAÇÃO FALSA Declaração de importação – Vide PERDIMENTO DE BENS

Documento contábil – Vide CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

INFRAÇÃO FISCALMercadoria importada – Vide PERDIMENTO DE BENS

INSTRUMENTO DO CRIMEVeículo automotor – Vide REGIME ADUANEIRO

INTERPOSTA PESSOA Fraude – Vide PERDIMENTO DE BENS

IPI Compensação de crédito tributário – Vide MULTA MORATÓRIA

J

JUROS DE MORACrédito de natureza alimentícia – Vide HONORÁRIOS

L

LANÇAMENTO TRIBUTÁRIODesconstituição – Vide CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO

LEI ESTADUALArguição de inconstitucionalidade – Vide PEDÁGIO

LUCRO OPERACIONALPaís estrangeiro – Vide CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO

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M

MÉDICOINAMPS – Vide DANO MORAL

MEIO AMBIENTEProteção – Vide NOTÍCIA CRIME

MERCADORIA IMPORTADAInfraçãofiscal–VidePERDIMENTODEBENS

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALInstrução processual – Vide NOTÍCIA CRIME

MULTA MORATÓRIADescabimento. Hipótese. Débito tributário. Com. Suspensão da exigibilidade do cré-dito tributário. Possibilidade. Lançamento tributário.Tempestividade. Recolhimento. Tributo. Pagamento. Até. Trinta dias. Após. Revoga-ção. Liminar. Ação judicial. Deferimento. Compensação de crédito tributário. Crédito escritural. IPI. Aquisição. Insumo. Alíquota zero. Imunidade tributária. Isenção tribu-tária. Não. Tributação. Aplicação. Súmula vinculante.Cadin. Exclusão. Mesmo. Débito. ..........................................................................334

N

NÃO INCIDÊNCIALucro operacional – Vide CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO

NOTÍCIA CRIMERecebimento. Denúncia. Prefeito. Omissão. Dados. Técnico. Referência. Termo de Ajustamento de Conduta. Entre. Ibama. Município. Documento indispensável. Apu-ração. Irregularidade. Licenciamento. Meio ambiente. Obra. Urbanização. Porto. Ministério Público Federal. Requisição. Documento. Objetivo. Instrução processual. Procedimento administrativo. Intenção. Posterior. Ajuizamento. Ação civil pública. Competência por prerrogativa de função. Competência originária. TRF. Suspensão condicional do processo. Prazo. Dois anos. Pagamento. Prestação pecuniária. Entidade. Proteção. Meio ambiente. Município. ..................................155

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O

OPERAÇÃO DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SEM AUTORIZAÇÃOCaptação de recursos – Vide CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

P

PEDÁGIORodovia. Localização. Âmbito. Território. Estado. Motocicleta. Necessidade. Paga-mento. Tarifa.Poder Público. Ato unilateral. Alteração. Cláusula. Natureza econômica. Inexistência. Garantia. Compensação. Perda. Arrecadação. Receita. Quebra. Equilíbrio econômico-financeiro.Contrato.Concessão.Arguição de inconstitucionalidade. Lei estadual. Procedência. ..............................369

PENHORAIncidência. Percentual. Faturamento. Hospital. Possibilidade. Observância. Valor. Re-passe. Mês. Origem. SUS. Princípio da razoabilidade. Princípio da proporcionalidade. Aplicação. Descabimento. Alienação. Prédio. Hospital. Único. Atendimento. Emergência. Loca-lidade. Necessidade. Observância. Execução menos gravosa. Irrelevância. Imóvel. Com. Gravame. Cláusula de impenhorabilidade. Ponderação. Princípio constitucional. Direito à saúde. Princípio da efetividade. Privi-légio do crédito tributário. .......................................................................................297

PENSÃO POR MORTEBeneficiário.Companheira.Homossexual.Comprovação.Uniãoestável.Decorrên-cia. Prova documental. Prova testemunhal. Verificação. Qualidade. Segurado. De cujus. Data. Morte. Prescrição. Não ocorrência. Termo inicial. Data. Requerimento. Via administrativa.Tutela antecipada. Deferimento.Correção monetária. Fixação. IGP-DI. Juros de mora.Isenção de custas. ....................................................................................................179

PERDIMENTO DE BENSMercadoria importada. Regularidade. Procedimento. Autoridade aduaneira. Reten-ção.Objetivo.Apuração.Infraçãofiscal.Registro. Declaração de importação. Informação falsa. Inobservância. Habilitação preliminar. Importador. Ou. Indicação. Pessoa jurídica. Realização. Encomenda. Ne-cessidade. Apresentação. Contrato.Presunção. Fraude. Interposta pessoa. Inexistência. Comprovação. Capacidade eco-nômica. Importação.Observância. Princípio. Devido processo legal. Ampla defesa. .............................344

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PISCofins.Importação.Inexistência.Crédito.Hipótese.Nãoocorrência.Cobrança.Possibilidade.Utilização.Crédito.PIS.Cofins.Faturamento.Período.Ano.2004.Ob-servância. Princípio da anterioridade mitigada. IPI. ICMS. Diversidade. Previsão legal. Não cumulatividade. Contribuição. Não. Vio-lação. Princípio da igualdade tributária. Tratado internacional. Inaplicabilidade. Inexistência. Superior. Hierarquia. Natureza jurídica. Lei ordinária. .............................................................................................327

POSSEDesembargador – Vide AGRAVO DE INSTRUMENTO

POSSE ANTIGATerreno de Marinha – Vide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

PREFEITOVide NOTÍCIA CRIME

PREVIDÊNCIA SOCIALFiliação – Vide REMESSA EX OFFICIO

PRINCÍPIO CONSTITUCIONALDireito à saúde – Vide PENHORA

PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESAPonderação – Vide AGRAVO DE INSTRUMENTO

PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE MITIGADACofins–VidePIS

Lucro operacional – Vide CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO

PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANAPescador – Vide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

PRINCÍPIO DA EFETIVIDADEPonderação – Vide AGRAVO DE INSTRUMENTO

Ponderação – Vide PENHORA

PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA LEIVide CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO

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PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA Vide CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO

PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADEFaturamento – Vide PENHORA

Vide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

Vide DANO MORAL

PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADEVide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

Vide DANO MORAL

Vide PENHORA

PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICAVide AGRAVO DE INSTRUMENTO

PRODUÇÃO DE PROVAUnião estável – Vide AÇÃO RESCISÓRIA

PROVA DOCUMENTALVide PENSÃO POR MORTE

PROVA TESTEMUNHALVide PENSÃO POR MORTE

R

RECEITAPerda – Vide PEDÁGIO

RECONHECIMENTO DE FIRMAEfeito retroativo – Vide FALSIDADE IDEOLÓGICA

REEXAMECabimento – Vide REMESSA EX OFFICIO

REFORMATIO IN PEJUSVide FALSIDADE IDEOLÓGICA

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REGIME ADUANEIROAdmissão temporária. Bem. Propriedade. Cidadão. Origem. País estrangeiro. Até. Obtenção. Visto permanente. Caracterização. Bagagem desacompanhada.Prazo. Ingresso. Até. Seis meses. Após. Data. Fixação. Proprietário. Estrangeiro resi-dentenoBrasil.Territórionacional.Com.Caráterdefinitivo.Residênciafixa.Aplica-ção. Decreto. Tratado de Assunção. ........................................................................358

REMESSA EX OFFICIOCabimento. Reexame. Requisito. Qualidade. Segurado. Objetivo. Concessão. Apo-sentadoria por invalidez. Irrelevância. INSS. Inexistência. Alegação. Não. Preenchi-mento. Requisito. Contestação. Inaplicabilidade. Resultado. Revelia. Contra. Fazenda Pública. Observância. Princípio. Duplo grau de jurisdição.Ação originária. Autor. Não. Comprovação. Filiação. Previdência Social. Fato incon-troverso. Descaracterização. ...................................................................................197

RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADOTeoria do risco – Vide DANO MORAL

União Federal – Vide DANO MORAL

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIAHospital – Vide DANO MORAL

RESTITUIÇÃO DE COISA APREENDIDAVeículo automotor. Descabimento. Necessidade. Encerramento. Ação penal.Apreensão. Processo penal. Indício. Bem. Instrumento do crime. Crime contra o meio ambiente. .................................................................................................................161

REVELIAFazenda Pública – Vide REMESSA EX OFFICIO

REVISÃO DE BENEFÍCIORMI. Auxílio-doença. Índice de Reajuste do Salário Mínimo. Percentual. Fevereiro. 1994. Incidência. Correção monetária. Salário de contribuição. Integração. Período Básico de Cálculo. Anterior. Março. 1994.Pagamento. Diferença. Com. Correção monetária. Mais. Juros de mora.Tutela antecipada. Deferimento. Inexistência. Controvérsia. Direito. ....................187

RMIAuxílio-doença – Vide REVISÃO DE BENEFÍCIO

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S

SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃOCorreção monetária – Vide REVISÃO DE BENEFÍCIO

SALÁRIO-MATERNIDADEVide FALSIDADE IDEOLÓGICA

SERVIDOR PÚBLICOEquiparação – Vide FALSIDADE IDEOLÓGICA

SUCUMBÊNCIAAdvogado – Vide HONORÁRIOS

Crédito previdenciário – Vide HONORÁRIOS

SÚMULA VINCULANTE Vide MULTA MORATÓRIA

SUSRepasse – Vide PENHORA

SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSOPrazo – Vide NOTÍCIA CRIME

Vide CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIODébito tributário – Vide MULTA MORATÓRIA

T

TABELIÃOVide FALSIDADE IDEOLÓGICA

TARIFAMotocicleta – Vide PEDÁGIO

TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTADocumento indispensável – Vide NOTÍCIA CRIME

TERRENO DE MARINHAPosse antiga – Vide ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE

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TÍTULO EXECUTIVO JUDICIALExecução – Vide BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO

TRATADO DE ASSUNÇÃOVide REGIME ADUANEIRO

TRATADO INTERNACIONALInaplicabilidade – Vide PIS

TUTELA ANTECIPADA Vide PENSÃO POR MORTE

Vide REVISÃO DE BENEFÍCIO

U

UNIÃO ESTÁVELCompanheira – Vide PENSÃO POR MORTE

Produção de prova – Vide AÇÃO RESCISÓRIA

UNIÃO FEDERALResponsabilidade objetiva – Vide DANO MORAL

V

VEÍCULO AUTOMOTORInstrumento do crime – Vide REGIME ADUANEIRO

VERBA PÚBLICABloqueio – Vide CORREIÇÃO PARCIAL

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ÍNDICE LEGISLATIVO

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R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p. 425-431, 2009 427

Ato Declaratório 75/99 ..........................................................................................313

Código CivilArtigo 394 ................................................................................................................252Artigo 397 ................................................................................................................252Artigo 1723 ..............................................................................................................179

Código PenalArtigo 14 ..................................................................................................................138Artigo 33 ..................................................................................................................138Artigo 44 ..................................................................................................................138Artigo 77 ..................................................................................................................138Artigo 91 ..................................................................................................................161Artigo 171 ................................................................................................................138Artigo 299 ................................................................................................................138Artigo 327 ................................................................................................................138

Código de Processo CivilArtigo 41 ..................................................................................................................155Artigo 103 ................................................................................................................313Artigo 105 ................................................................................................................313Artigo 130 ................................................................................................................260Artigo 273 ................................................................................................................179Artigo 332 ................................................................................................................260Artigo 333 ................................................................................................................369Artigo 395 ................................................................................................................155Artigo 485 ........................................................................................................ 260/271Artigo 569 ................................................................................................................169Artigo 730 ................................................................................................................288

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R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p. 425-431, 2009428

Código de Processo PenalArtigo 118 ................................................................................................................161Artigo 386 .........................................................................................................117/146

Código Tributário NacionalArtigo 151 ................................................................................................................334Artigo 184 ................................................................................................................297Artigo 198 ................................................................................................................327

Constituição Federal/1988 Artigo 6º ...................................................................................................................104Artigo 7º ...................................................................................................................104Artigo 23 ..................................................................................................................104Artigo 37 ....................................................................................................... 81/90/369Artigo 100 ........................................................................................................ 169/288Artigo 175 ................................................................................................................369Artigo 195 ........................................................................................................ 187/313Artigo 196 ................................................................................................................297Artigo 226 ................................................................................................................179Artigo 236 ................................................................................................................138

Decreto nº 85.450/80Artigo 268 ................................................................................................................313

Decreto nº 1.041/94Artigo 337 ................................................................................................................313

Decreto nº 4.543/2002Artigo 153 ................................................................................................................358Artigo 157 ................................................................................................................358Artigo 307 ................................................................................................................358

Decreto nº 6.759/2009Artigo 155 ................................................................................................................358Artigo 158 ................................................................................................................358Artigo 353 ................................................................................................................358

Decreto-Lei nº 1.455/76Artigo 23 ..................................................................................................................344

Decreto-Lei nº 2.322/87Artigo 3º ...................................................................................................................252

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R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p. 425-431, 2009 429

Decreto-Legislativo nº 210/2004Artigo 11 ..................................................................................................................358

Instrução Normativa nº 38/96Artigo 15 ..................................................................................................................313

Instrução Normativa da SRF nº 206/2002Artigo 65 ..................................................................................................................344Artigo 66 ..................................................................................................................344Artigo 69 ..................................................................................................................344

Instrução Normativa da SRF nº 225/2002 Artigo 2º ...................................................................................................................344

Instrução Normativa da SRF nº 228/2002 ..........................................................344

Instrução Normativa do INSS/DC nº 120/2005Artigo 5º ...................................................................................................................187

Lei nº 1.533/51Artigo 7º ...................................................................................................................334Artigo 12 ..................................................................................................................334

Lei nº 4.506/64Artigo 63 ..................................................................................................................313

Lei nº 7.347/85Artigo 10 ..................................................................................................................155

Lei nº 7.492/86Artigo 4º ...................................................................................................................117Artigo 8º ...................................................................................................................146Artigo 10 ..................................................................................................................117Artigo 16 ..................................................................................................................146

Lei nº 8.038/90Artigo 6º ...................................................................................................................155Artigo 9º ...................................................................................................................155

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R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p. 425-431, 2009430

Lei nº 8.213/91Artigo 16 ..................................................................................................................179Artigo 26 ..................................................................................................................179Artigo 29 ..................................................................................................................169 Artigo 74 ..................................................................................................................179Artigo 124 ................................................................................................................169

Lei nº 8.437/92Artigo 4º ...................................................................................................................276

Lei nº 8.880/94Artigo 21 ..................................................................................................................187

Lei nº 8.935/94Artigo 3º ...................................................................................................................138

Lei nº 8.987/95Artigo 6º ...................................................................................................................369

Lei nº 9.099/95Artigo 89 ................................................................................................... 138/146/155

Lei nº 9.278/96Artigo 1º ...................................................................................................................260

Lei nº 9.289/96Artigo 4º ...................................................................................................................179

Lei nº 9.294/96Artigo 25 ..................................................................................................................313Artigo 26 ..................................................................................................................313

Lei nº 9.430/96Artigo 33 ..................................................................................................................344Artigo 34 ..................................................................................................................344Artigo 63 ..................................................................................................................334

Lei nº 9.605/98Artigo 25 ..................................................................................................................161Artigo 72 ..................................................................................................................161

Lei nº 9.711/98Artigo 10 ..................................................................................................................179

Page 431: QUARTA REGIÃO - trf4.jus.br · Federal Dirceu de Almeida Soares – 28.06.2001 Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz – 28.06.2001 ... “A pretensão formulada na peça vestibular,

R. Trib. Reg. Fed. 4ª Reg. Porto Alegre, a. 20, n. 73, p. 425-431, 2009 431

Lei nº 10.865/2004 ..................................................................................................327

Lei nº 10.999/2004 ..................................................................................................187

Lei nº 11.488/2007Artigo 33 ..................................................................................................................344

Lei nº 15.722/2007 do Estado do Paraná ..............................................................369

Medida Provisória nº 1.858-6/99Artigo 19 ..................................................................................................................313

Medida Provisória nº 2.158/2001Artigo 68 ..................................................................................................................344Artigo 80 ..................................................................................................................344

Provimento do TRF da 4ª Região nº 11/93Artigo 3º ...................................................................................................................313

Súmula do Superior Tribunal de JustiçaNº 43 ........................................................................................................................179Nº 148 ......................................................................................................................179Nº 204 ......................................................................................................................179Nº 235 ......................................................................................................................313Nº 337 ......................................................................................................................146

Súmula do Supremo Tribunal FederalNº 254 .....................................................................................................................252Nº 405 ......................................................................................................................334

Súmula do Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoNº 3 ..........................................................................................................................179Nº 77 ........................................................................................................................187

Súmula VinculanteNº 10 ........................................................................................................................334