Quem das flores, trai?

“Que beijo teu de lágrimas terei para esquecer o que vivi lembrando”, li assim em voz alta, o pequeno pedaço da poesia de Vinicius de Moraes, sozinha no vazio imenso do meu quarto. Cada verso cortava-me as entranhas, fatigava-me cruelmente. A cama era vazia, o quarto escuro, as paredes sujas de desespero entregavam toda aflição que se dispunha ali naquele cômodo. Os relógios falantes alertavam que o tempo ungia aflito. Só a poesia era capaz de entrar profundamente em todos os orifícios daquela casa, daquele corpo, a poesia estuprava toda a pele, rasgava toda garganta e refaziam todos os nós.

A traição parecia mais um bicho torto criando formas nas sombras da parede da sala, gritavam assombrosamente e espancavam-me a cara. Gozemo-nos da esperança que judia, que estraçalha toda vontade voltada para o futuro, forcemo-nos a dar mais um sorriso para toda gente, que graça indizível restará para a minha’lma, pobre alma que não tem sossego? “Vai-te para longe ser perverso, desalmado e vadio, postula tua conduta ínfima, oh escravo do teu gozo” E amanhecia mais um dia e o homem vadio cobriu-lhe a fronte de flores e beijos fartos. E o perdão se fez presente por toda a casa, mais uma vez....