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Pesquisa Sebrae Negros e negras já são 11 milhões dos donos de negócios do País O Brasil é afroempreendedor Projeto Brasil Afroempreendedor Fortalecimento dos negócios e construção de rede de empreendimentos afro- brasileiros é meta principal Afroempreendedorismo, eu apoio essa ideia Brasil vive momento único na história, com políticas de inclusão impulsionando novo ciclo de desenvolvimento Sustentabilidade & Inclusão em Debate B RA SIL sustenta Revista trimestral Ano I - Número 04 Dezembro 2013

Revista Sustenta Brasil - Edição 4

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O Brasil é afroempreendedor. Brasil vive um momento único na história, com políticas de inclusão impulsionando novo ciclo de desenvolvimento. Estas e outras notícias na edição 4 da Revista Sustenta Brasil.

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www.revistasustentabrasil.com.br Pesquisa SebraeNegros e negras já são 11 milhões dos donos de negócios do País

O Brasil é afroempreendedor

Projeto Brasil AfroempreendedorFortalecimento dos negócios e construção de rede de empreendimentos afro-brasileiros é meta principal

Afroempreendedorismo, eu apoio essa ideia

Brasil vive momento único na história, com políticas de inclusão impulsionando novo ciclo de desenvolvimento

S u s t e n t a b i l i d a d e & I n c l u s ã o e m D e b a t eBRASIL

sustenta Revista trimestralAno I - Número 04 Dezembro 2013

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Empreendedorismo afro-brasileiro é estratégico para manter avanços ...................................................................................................4

Entrevista: Luiz Barreto, presidente do Sebrae Nacional ...........................................................................................................................8

Brasil Afroempreendedor é conquista da sociedade ................................................................................................................ 10

Entrevista: Netinho de Paula ........................................................................................................ 18

Afroempreendedores de sucesso ................................................................................................ 20

Entrevista: Deputado Federal Vicente Cândido.......................................................................... 24

Brasil tem 11 milhões de afroempreendedores ........................................................................ 26

Entrevista: Alexandre Reis, diretor FCP ....................................................................................... 30

Entrevista Dom Frederico .............................................................................................................. 32

Cumbre de Gênero ......................................................................................................................... 36

Número 4 – Dezembro de 2013Publicação do Instituto Adolpho BauerConselho Editorial: Adilton de Paula, Osvaldo Rafael Pinto, João Carlos Nogueira, João Bosco Borba, Maria Alice da Silva, Ladislau Dowbor.Presidente IAB: Francisco Rodrigues da Silva SobrinhoVice-presidente IAB: Luiz Antonio de AlmeidaDiretora Administrativo-Financeira IAB: Julia C. MelloCoordenador Geral e Presidente do Conselho Editorial: Adilton de PaulaDiretor Geral da Revista: Adilton de PaulaSuporte: Josemar Chaves Nizer, Iraci Sobral de Oliveira.Apoio Administrativo: Gisele Carvalho Lopes e Analice Rodrigues SantanaTextos e Edição: Amilcar Oliveira (SC 00462 JP)Edição gráfica e ilustração: Laércio CastroJornalista Responsável: Amilcar Oliveira (SC 00462 JP)Fotos: Malu Moura, Arquivo IAB, Instituto Feira Preta, Ascom/FCP e Arquivo PessoalTiragem: 5 mil exemplares impressos, com 1 milhão de exemplares virtuais

Gestores Políticos do ProjetoJoão Carlos Martins – CEABRA-SPLuiz Antonio de Almeida – IABFrancisco Rodrigues da Silva Sobrinho – IABEquipe do Projeto Brasil AfroempreendedorAdilton José de Paula – Coordenador InstitucionalJoão Carlos Nogueira – Consultor TécnicoAmilcar Alexandre Oliveira da Rosa – Consultor NacionalMaria Alice da Silva – Consultora NacionalAparecida Conceição dos Santos – Consultora NacionalGestores do Sebrae NacionalBruno QuickMaria Angela MachadoAntonio Carlos Thobias Jr.O Instituto Adolpho Bauer é uma organização não governamental, sem fins lucrativos, voltado para a promoção do desenvolvimento territorial sustentável, com inclusão social, de raça e de gênero, com sede na cidade de Curitiba (PR) e com perspectiva de atuação em todo o território nacional.

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Índice

S u s t e n t a b i l i d a d e & I n c l u s ã o e m D e b a t eBRASIL

sustenta

Mandela é destas pessoas que a morte não mata, pessoas imortais que vivem e viveram para sempre em nossas mentes, espíritos e corações. Mandela viverá enquanto houver crença de ao menos por parte de uma pessoa que a liberdade existe, que existe e que é possível alcança-la, que a justiça existe e que é possível alcançá-la, que o amor é uma construção e que assim como aprendemos a odiar as pessoas, podemos também aprender a amar as pessoas. Viva Nelson Mandela!Adilton de Paula

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Editorial

Adilton de Paula

Com o seu quarto número BRASIL AFROEMEPREENDEDOR, a Revista Sus-tenta Brasil dá continuidade ao seu traba-lho de discutir grandes temas e grandes questões sócio-economicas do Brasil.

Centrada na ideia de contribuir profun-damente para os debates e diálogos sobre Desenvolvimento Sustentável, com inclu-são de Gênero e Raça, em pouco tempo a Revista se tornou uma referência Nacional junto a Gestores públicos e Privados.

Com uma tiragem de 10 mil exempla-res impressos e com uma rede de distri-buição eletrônica de aproximadamente 1 milhão de pessoas a Revista tornou-se, em seus breve três anos de existência, um importante instrumento e ferramenta de comunicação junto as entidades e movi-mentos sociais.

A Revista sustenta Brasil pertence ao Instituto Adolpho Bauer e a seus parceiros e visa ser um instrumento independente e autônomo dos partidos políticos, dos ór-gãos governamentais e do capital privado, neste sentido se contrapões a alienação da grande mídia e das mídias atreladas a estruturas e concepções discriminatórias e arcaicas.

Ao enfocar temas e questões fora do cotidiano grande midiático a Revista bus-ca trazer a pauta e a baila da sociedade brasileira, elementos fundamentais para o alargamento de nossos processos demo-cráticos e para um olhar amplo e diferen-ciado sobre nossa preconceituosa e racis-ta realidade.

Em seu primeiro número a Revista Sustenta Brasil “apresentou” ao Estado do Paraná, parte da intricada existência e re-alidade de suas Comunidades Quilombo-las, um Estado onde ocorre um profundo ocultamente e escamoteamento de seu pensamento racista e que sempre buscou esconder e ocultar dos outros e de seus próprios olhos a existência tão contraditó-ria desta dura realidade.

Com a cobertura e divulgação da Pri-meira Feira Quilombola do Paraná, des-cortinamos elementos fundamentais do racismo preconceituoso da sociedade Pa-

Afroempreendedorismo

ranaense, que não ve e não reconhecem estas pessoas e suas comunidades, uma pequena amostragem e reflexo do panora-ma nacional, onde todas estas comunida-des, sua força, suas lutas e suas histórias são apagadas e escondidas e escamotea-das dos cenários locais e nacional.

No segundo número da Revista enfo-camos elementos fundamentais sobre a violência e a discriminação que aberta e veladamente ainda hoje sofrem a grande maioria das mulheres na sociedade brasi-leira.

Uma leitura dinâmica e franca sobre grandes questões da temática de gênero junto as nossas empresas e organizações sociais.

Em nosso terceiro numero tratamos da Conferência Rio +20. Grandes debates so-bre o meio ambiente e o Desenvolvimen-to sustentável, com alguns dos maiores estudiosos e especialitas brasileiros da temática. Apontando nitidamente que a responsabilidade de todos nós a Revista foi uma provocação ao Repensar a Ques-tão do Desenvolvimento sustentável, com verdadeira Sustentabilidade.

Neste sentido, neste momento, é com imenso prazer que apresentamos o quar-to número da REVISTA SUSTENTA BRASIL. O BRASIL É AFROEMPREENDEDOR, com esta afirmação apresentamos este traba-lho, e buscamos mostrar e demonstrar a força e a importância do afroempreende-dorismo para o Desenvolvimento Susten-tável, duradouro e democrático da socie-dade Brasileira.

Hoje, segundo pesquisa SEBRAE/IBGE já são mais de 11 milhões de pequenos e micros empresários, cerca de 50% dos micro e pequenos empresários brasileiros. Uma verdadeira potência econômica que precisa ser valorizada, qualificada e expan-dida em todo seu potencial de desenvolvi-mento social e econômico.

Dentro do viés da chamada Economia Criativa, o afroempreendedorismo des-mente e desmascara o mito da “malemo-lência negra” e aponta o perfil de empre-sários e empreendedores deste povo.

Em nosso enfoque buscamos apresen-tar como o avanço e o desenvolvimento deste segmento econômico não afeta e beneficia somente este segmento e esta comunidade, mas todo o povo e toda a so-ciedade brasileira.

AFROEMPREENDEDORISMO EU APOIOESTA IDEIA, este é nosso convite, leia, discuta, debata, converse com seus familiares e amigos e vamos juntos apos-tar na construção de uma Política Nacional de fortalecimento do afroempreendedoris-mo e no desenvolvimento deste segmen-to, desta verdadeira força econômica.

O Brasil só vai ser uma grande nação quando aprender a respeitar e a dar opor-tunidades iguais de desenvolvimento a to-das as pessoas independente de sua cor de pele, ou de sua origem sócio-racial.

Adilton de Paula é coordenador Geral do Instituto Adolpho Bauer e Coordenador Institucional do Projeto Brasil Afroempreendedro

Equipe do Projeto Brasil Afroempreendedor

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Estado, com investimento no campo e na cidade, entre outros avanços. Neste ano, as informações divulgadas no Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil mostram excelentes resultados das po-líticas públicas nos aspectos referentes à renda, educação, saúde, em suma, inclusão. Dos mais de cinco mil municí-pios, 85% eram classificados com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mui-to baixo, em 1991. Em 2010, o número de municípios com IDH muito baixo caiu para 0,6%, apenas 38 municípios.

O Atlas cobre um período que vai de 1991 a 2010. São 20 anos de análise do Índice de Desenvolvimento Humano Mu-nicipal (IDHM), que abarca os 5.565 mu-nicípios brasileiros. Esse índice apresen-ta a evolução combinada de renda per capita, educação e saúde. É um avanço com relação ao critério do Produto Inter-no Bruto (PIB), que mede a quantidade de recursos produzidos e seu uso, não seus resultados. Apenas a título de ilustração,

um desastre ambiental pode elevar o PIB de um país ao gerar gastos com a des-contaminação, gerando uma distorção na análise da melhoria das condições de vida da população desse país.

Várias instituições foram envolvidas na elaboração do Atlas: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Instituto de Pesquisas Econômi-cas Aplicadas (IPEA), vinculado à Secre-taria de Assuntos Estratégicos (SAE) do governo federal, Fundação João Pinhei-ro, de Minas Gerais, além de numerosos consultores externos. Os dados analisa-dos são do Instituto Brasileiro de Geo-grafia e Estatística (IBGE). “Já era tempo que tivéssemos boas cifras sobre como anda o Brasil na sua base territorial. O Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013 apresenta a evolução dos indicadores nos 5.565 municípios do país”, afirma em sua página na internet o professor Ladislau Dowbor, da PUC paulista, consultor de várias agências

Que os números atestam um sal-to nas condições de desenvolvi-mento do País nos últimos anos,

pouca gente ousa duvidar. Que persiste a desigualdade, particularmente quan-do se comparam os índices de brancos e negros, é outra constatação de difícil contestação, apesar dos números posi-tivos. Os dados mais impressionantes remontam à última década da história do Brasil, com a inclusão de 40 milhões de pessoas que saíram da miséria, cria-ção de 18 milhões de empregos formais, aumento de expectativa de vida, popula-ção escolar duas vezes e meia superior à anterior, acesso de mais de um milhão de alunos à universidade via Prouni, pro-gramas sociais que viraram políticas de

Empreendedorismo afro-brasileiro é estratégico para manter avançosPolíticas de inclusão são vitais para aprofundar desenvolvimento brasileiro

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Desigualdade

“O progresso é generalizado e mais intenso nas áreas e territórios mais esquecidos”Ladislau Dowbor, professor da PUC/P

das Nações Unidas e órgãos de governo, e que participou da construção do Atlas.

Ao analisar o momento por que pas-sa o Brasil, o professor Dowbor ressalta os avanços “extremamente fortes” dos últimos anos. “O progresso é generali-zado e mais intenso nas áreas e territó-rios mais esquecidos”, afirma. Segundo ele, a partir de 2003, 149 programas sociais do governo viraram políticas de Estado, atingindo as áreas mais pobres, onde residem muitos negros. Esse fator provocou o salto dos números atuais, que beneficiaram de maneira direta a população negra. Ocorre que, como os números eram muito baixos, alguns da-dos são muito inferiores ao necessário, como os referentes à educação. “O poço é profundo, somos um dos 10 países mais desiguais do planeta. E a desigual-dade é um gigantesco desperdício de potenciais criativos.” O pessimismo com que se prognosticava o desempenho dos pobres, analisado à luz das medidas de inclusão, como cotas e outros ins-trumentos, mostrou-se tão falso como nota de três reais. “Puro preconceito”, diz Dowbor. “As áreas mais pobres são as que têm mais avanço em empregos formais. Os estudantes cotistas têm alto índice de aproveitamento.”

Arquivo Pessoal

Mas persiste a desigualdade, prin-cipalmente quando analisada à luz da questão racial, com números desfavorá-veis à população negra. Principalmente, às mulheres negras. “Aqui o apartheid é econômico e social. Não temos apar-theid e discriminação, como houve na África do Sul, por exemplo. Temos uma situação de fato. Temos mecanismos suficientes de geração de apartheid eco-nômico, para não precisar de apartheid racial ostensivo”, reflete. Para Dowbor, a desigualdade tornou-se um vetor estru-turante do conjunto da sociedade. Que atinge vários campos de ação, como o do empreendedorismo, com alto poten-cial de distribuição de renda e criação de postos de trabalho.

Iniciativas como o projeto Brasil Afroempreendedor buscam justamente superar os limites da falta de educação, de renda, de acesso a crédito, a equi-pamentos e à tecnologia. “A densidade tecnológica dos processos tecnológicos se elevou e o atraso desse público é de-terminante”, diz Dowbor. Mas também há as formas menos convencionais de discriminação, como o que o professor chama de dificuldade de construção da

rede colaborativa informal que assegura a sobrevivência, no contato com os cole-gas e com as instituições que auxiliam na manutenção dos empreendimentos. No caso do projeto, o objetivo é driblar os obstáculos impostos pela falta conti-nuada de oportunidades através do em-penho na construção dos mecanismos colaborativos, como a Rede de Empre-endedores Afro-brasileiros.

O empreendedorismo é um campo privilegiado para se observar a manuten-ção das diferenças com recorte racial, a despeito das mudanças no quadro de in-clusão, conforme mostra a pesquisa do Sebrae, de setembro deste ano, que é objeto de matéria nessa edição da Sus-tenta Brasil. Os dados da pesquisa mos-tram que houve aumento no número de donos de negócios negros e negras, hoje em 49% do total. Mas também mostram que ser empregador é uma realidade ainda muito distante para a população negra: apenas 8% dos empreendedores negros são empregadores. O presidente do Sebrae, Luiz Barreto, acredita que esse quadro tende a mudar (ver entre-vista). “Tanto o número de empreendi-mentos quanto a população negra no país cresceram muito nos últimos anos”, diz. São 11 milhões de empreendedores negros, segundo a pesquisa do Sebrae. Paralelamente a isso, os programas so-ciais do governo, ao tirar das “margens da sociedade pessoas que nunca tive-ram oportunidades”, fizeram com que essas pessoas assumissem posições importantes na estrutura de consumo e no mercado de trabalho. Entre os progra-mas, Barreto destaca a criação da figura do Microempreendedor Individual (MEI), um tipo de empreendedor com grande número de negros e negras. Mesmo o fato de o maior número de negros e ne-gras atuar em atividades mais precárias não desanima o presidente do Sebrae. “Com a maior inserção desse perfil de empreendedores em atividades mais elaboradas e sofisticadas, a tendência é de que eles passem a ser também em-pregadores e que tenham um aumento na renda.”

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Economia solidáriaHá também um outro tipo de empre-endedor, que atua no campo, e que sente os reflexos das políticas de inclusão do go-verno. Ações voltadas para esse público estão previstas no projeto Brasil Afroem-preendedor. Representantes de 12 comu-nidades de remanescentes de quilombos definidas pela Fundação Cultural Palma-res participarão do projeto, com ações de qualificação e capacitação para o empre-endedorismo (ver entrevista). O diretor da Fundação Cultural Palmares, Alexandre Reis, destaca vários programas nas co-munidades quilombolas desenvolvidos pelo governo. “Temos avançado para im-plementar políticas públicas em comuni-dades quilombolas a partir da certificação de autodefinição. É o caso dos Programas Minha Casa Minha, Minha Vida, Brasil Sem Miséria, Assistência Técnica e Ex-tensão Rural Quilombola, Programa de Aquisição de Alimentos, emissão de De-claração de Aptidão ao Pronaf, Bolsa de Assistência Estudantil para estudantes universitários quilombolas, matriculados em universidades públicas federais, apo-sentadoria especial para quilombolas; Pontos de Cultura, assistência jurídica, entre outras ações do governo federal.” A partir do investimento nas comunida-des, também são praticadas ações de estímulo ao empreendedorismo. Neste caso, com a inserção dos quilombolas na cadeia da produção cultural. No Plano Na-cional da Economia Criativa, há previsão do desenvolvimento da produção, circula-ção e promoção de bens e serviços des-sas comunidades.

A Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), vinculada ao Mi-nistério do Trabalho e Emprego (MTE), também atua junto às comunidades quilombolas. “Esta área de atuação é conhecida como etnodesenvolvimento. A estratégia lança mão de agentes de desenvolvimento, cada um pertencente a uma comunidade quilombola. Em ge-ral, são indicados pelas comunidades e gozam da confiança delas. O papel dos agentes é fazer a ligação entre os esfor-ços da comunidade para conquistar seu desenvolvimento e as ações de apoio que a SENAES desenvolve diretamente ou por meio de ONGs conveniadas. Os agentes trabalham em rede e utilizam seu pertencimento à SENAES para mobi-lizar recursos públicos em ajuda de suas comunidades”, explica o titular da secre-taria, Paul Singer.

Segundo ele, nem sempre o universo

empreendedor é resistente a modelos que pressuponham associação e auto-gestão. “Quando a conjuntura econômi-ca é favorável às micro e pequenas em-presas, é mais provável que elas sejam pouco propensas a se associarem. Mas, quando a conjuntura torna-se desfavorá-vel a elas, as pequenas e micro empre-sas tratam de se associar porque nesta condição elas se fortalecem ponderavel-mente e são capazes de superar as difi-culdades”, afirma. A economia solidária pode ter o que ensinar ao empreendedo-rismo de negócios. Medidas concretas como formação em economia solidária e em gestão fiscal, comercial e finan-ceira de empreendimentos, assistência técnica e, sobretudo, apoio e orientação para a formação de redes de empreen-dimentos, tendo em vista maximizar o apoio mútuo e fortalecer o espírito co-munitário, podem ser aproveitadas pelos micro e pequenos empresários negros e negras. “Neste quadro, uma das políti-cas da SENAES consiste em apoiar a for-mação e o funcionamento de entidades de finanças solidárias tais como fundos rotativos solidários, cooperativas de cré-dito e bancos comunitários de desenvol-vimento”, diz Singer. O secretário afirma que, para superar o quadro que informa o baixo número de empregadores entre os empreendedores negros, “a alterna-tiva que a economia solidária oferece é a associação, para que possam juntar forças e, mediante ajuda recíproca, me-lhorar os resultados de suas atividades”.

“A alternativa que a economia solidária oferece é a associação, para que possam juntar forças e, mediante ajuda recíproca, melhorar os resultados de suas atividades.”Paul Singer, SENAES/MTE

“Tanto o número de empreendimentos quanto a população negra no país cresceram muito nos últimos anos”Luiz Barreto, presidente do Sebrae

Arquivo pessoal

Rodrigo de Oliveira/Sebrae

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Educação

O Sebrae tradicionalmente investe no fortalecimento de micro e pequenos empreendimentos. Nos últimos anos, porém, propostas de inclusão, particularmente as com recorte racial, têm sido encampadas pela instituição com maior ênfase. A que se deve essa nova postura?

Nesses 41 anos de existência, o Sebrae sempre procurou apoiar os pe-quenos negócios de forma a atender to-dos os públicos e continuamos fazendo isso, mas sempre andamos alinhados com as políticas de inclusão social e econômica previstas pelo Governo. Uma boa prova é o tratamento que damos aos microempreendedores individuais (MEI) – aqueles que ganham até R$ 60 mil por ano – e que pode ser visto como o maior programa de formalização do mundo. Temos cursos específicos e gra-tuitos para essa categoria. Em relação à raça, os negros já são quase a maio-ria dos donos de pequenos negócios no país e é mais do que importante que olhemos com bastante atenção para esse público.

Entrevista: Luiz Barreto, presidente do Sebrae Nacional

O presidente do Sebrae Nacional, Luiz Barreto, acredita que, apesar da desigualdade ainda existente entre negros e brancos no universo do empreendedorismo, há sinais claros de mudança na situação dos primeiros.

Bons sinais à frente

Há diferenças de rendimento, de escolaridade, de tipo de negócios, mas com avanços significativos,

se comparados há 10 anos. Pesquisa do Sebrae divulgada em setembro mostrou algumas modificações em um cenário que sempre foi problemático para os ne-gros e negras empreendedores. “Com a maior inserção desse perfil de empreen-dedores em atividades mais elaboradas e sofisticadas, a tendência é de que eles passem a ser também empregadores e que tenham um aumento na renda”, afirma. Na entrevista a seguir, Barreto apresenta algumas razões que, segundo ele, justificam o otimismo com relação à melhoria das condições dos empreendi-mentos de negros e negras no País.

A pesquisa elaborada pelo Sebrae so-bre os donos de negócios a partir da raça/cor traz muitas informações va-liosas. Uma das principais é que negros e negras são donos de quase 50% dos empreendimentos do País. Uma das hi-póteses do estudo é de que isso ocorre porque mais pessoas se declaram ne-gros e negras. Há também o crescimen-to da formalização como possibilidade explicativa. O que se pode dizer sobre esses números?

Tanto o número de empreendimentos quanto a população negra no país cres-ceram muito nos últimos anos. A ascen-são da nova classe média também está ajudando nesse processo, já que mais negros estão ascendendo às classes B e C, e com isso assumindo posições im-portantes na estrutura de consumo e no mercado de trabalho. Além disso, o go-verno vem desenvolvendo diversas políti-cas de inclusão social que estão tirando das margens da sociedade pessoas que nunca tiveram oportunidades. Entre eles, o Bolsa Família, programas de cotas e a criação da figura do Microempreendedor

Rodrigo de Oliveira/Sebrae

Presidente defende investimentos em políticas diferenciadas para públicos diferenciados

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Individual (MEI). O aumento da escolari-dade da população e do fortalecimento do mercado interno consumidor também devem ser levados em consideração.

Apesar do crescimento do números de donos de negócios negros e negras, há uma questão que preocupa: apenas 8% dos negros e negras são empregadores, sendo 92% empreendedores por conta própria. Como aproximar esses percentuais, de maneira a que os empreendedores negros e negras passem a usufruir de negócios mais rentáveis e menos precários?

Historicamente os negros tiveram mui-tas dificuldades na inserção do mercado de trabalho mais qualificado, mas essa re-alidade já está mudando. É fato que entre os negros ainda há uma proporção maior de indivíduos que atuam em atividades mais simples, de menor valor agregado ou maior precariedade. São exemplos a pro-dução de milho, a pesca, o comércio de ambulantes, o reaproveitamento de suca-tas e resíduos, a construção civil, o ramo de bares e lanchonetes, ou até mesmo o chamado “faz tudo”. Com a maior inser-ção desse perfil de empreendedores em atividades mais elaboradas e sofistica-das, a tendência é de que eles passem a ser também empregadores e que tenham um aumento na renda.

Outro resultado preocupante da pesquisa é o relativo aos anos de estudo. A diferença de anos de estudo entre brancos e negros empreendedores ainda é muito grande. Quase 60% dos negros e negras não completaram o Ensino Fundamental, com reflexos nas diferenças de ocupação e de rendimentos (donos de negócios negros e negras ganham metade do que os donos de negócios brancos, em média). De que políticas o Sebrae dispõe para reverter esse quadro?

Indivíduos com menor escolaridade tendem, em média, a receber menores rendimentos. Essa é uma regra geral e

IAB

que também vale para os empreende-dores. Mas os dados estão mostrando que vem caindo a diferença de escola-ridade, quando comparado aos brancos. E isso também contribui para a redução da diferença de rendimentos que esta-mos observando. Além disso, a ativida-de empreendedora deixou de ser um caminho emergencial para quem não tinha alternativa de renda e cada vez mais é buscada devido à identificação de uma oportunidade no mercado, o que também está ocorrendo no grupo dos empreendedores negros. E o Sebrae tem um papel fundamental nisso. Nós buscamos oferecer cursos variados, na maioria gratuitos, com linguagem e didá-tica segmentadas para cada tipo de em-preendimento: microempreendedores individuais, microempresas e pequenas empresas. Contamos com uma rede de mais de 700 pontos de atendimento fí-sico, um Call Center (0800 570 0800) e com o site www.sebrae.com.br.

Muitos empreendedores negros e negras começaram a trabalhar em seus negócios com até 17 anos (85%), contra 78% dos donos de negócios brancos, por exemplo. Os empreendedores negros e negras ingressam mais cedo no mercado de trabalho, em um círculo vicioso: trabalham mais cedo, não estudam, por não estudarem, ganham menos. Como superar essa contradição: ingresso cedo no mercado de trabalho, como donos de negócios, sem poder estudar, e necessidade de escolaridade para manter seus negócios?

Ainda é grande a defasagem do fa-turamento médio dos donos de negócio

negros e brancos, mas em uma década o rendimento dos empreendimentos co-mandados por afrodescendentes cres-ceu 70%, ante 37% dos demais. Entre 2001 e 2011, o rendimento médio real desses negócios passou de R$ 612,00 para R$ 1.039,00 por mês, enquanto no grupo dos empresários da raça bran-ca a expansão foi de R$ 1.477,00 para R$ 2.019,00 mensais. A desigualdade ainda existe, mas a melhora da escolari-dade e do rendimento aponta para uma situação mais favorável no futuro para os negros que estão no empreendedo-rismo. Apesar de ainda possuírem me-nos tempo de estudo do que os brancos, o nível escolar desse público teve um crescimento de 41% nos dez anos ana-lisados, enquanto que entre os brancos o aumento foi de 17%. Entre a totalidade dos empreendedores afrodescendentes - 71% representados pelo público mas-culino -, a escolaridade passou de 4,4 anos de estudo para 6,2 anos na última década analisada.

“Historicamente os negros tiveram muitas dificuldades na inserção do mercado de trabalho mais qualificado, mas essa realidade já está

mudando.”

“A desigualdade ainda existe, mas a melhora da escolaridade e do

rendimento aponta para uma situação mais favorável no futuro para os negros no

empreendedorismo.”

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Desde o lançamento do projeto Bra-sil Afroempreendedor, no dia 5 de agos-to, na Câmara Municipal de São Paulo, essa iniciativa ousada de inclusão racial a partir do empreendedorismo tem me-xido com as expectativas do mundo dos micro e pequenos empreendedores afro--brasileiros. E o universo não é pequeno. Segundo pesquisa do Sebrae Nacional divulgada em setembro deste ano (ver matéria), são mais de 11 milhões de em-

preendedores negros e negras no País. Mas pode vir a ser maior, se considerado o gigantismo dos números da inclusão da última década: 40 milhões de pesso-as, dos quais 80% são negros. Produto de demandas antigas da sociedade civil, o projeto também contou com o estímulo e o apoio de órgãos do governo, desde as primeiras reuniões para discutir sua implementação. Assim, é uma iniciativa que surge para se somar aos esforços

de inclusão que ganharam força no País a partir do momento em que Luís Inácio Lula da Silva assumiu a Presidência da República, em 2003.

Naquele momento, o Brasil se viu diante de uma encruzilhada: ou o poder público começava efetivamente a enca-minhar soluções concretas para a dívida social histórica com milhões de negros e negras, ou correríamos o risco de ver passar mais uma oportunidade de pelo

Brasil Afroempreendedor é conquista da sociedadeProjeto terá duração de dois anos, em 12 estados, e envolverá 1200 empreendedores afro-brasileiros

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menos começar a resgatar os potenciais beneficiários das políticas públicas de uma situação de precarização das condi-ções de vida. Não foi por acaso que uma das primeiras medidas do governo consis-tiu em criar a Secretaria Especial de Po-líticas de Promoção da Igualdade Racial, vinculada à Presidência da República, atualmente Secretaria de Políticas de Pro-moção da Igualdade Racial (SEPPIR/PR), com status de ministério. Negros e negras do Brasil, durante décadas à frente de exi-gências de políticas públicas que contem-plassem seus interesses, tinham final-mente um órgão para pensar as políticas públicas de inclusão com recorte racial tão necessárias ao País. Na sequência, vieram a lei 10.639/2003, que instituiu

“Temos 16 anos de trabalho no CEA-BRA e este é um grande momento, de muita importância com a assinatura do convênio do projeto Brasil Afro-empreendedor. Somos mais de 100 milhões de negros no país, muitos vivendo na miséria. Com o governo Lula, começamos a mudar. Com este projeto, damos mais um passo, um passo importante para garantir aos negros e as negras desse país o aces-so às políticas públicas e ao desen-volvimento.”

João Carlos Martins, presidente do CEABRA/SP

“O Instituto Adolpho Bauer (IAB) é uma organização não governamental sem fins lucrativos e voltado para o desenvolvimento sustentável com inclusão so-cial de gênero e de raça. Viemos do movimento sindical. Com o sindicalismo cidadão, temos a visão de que os sindicatos têm de ter outras iniciativas rela-cionadas com as lutas gerais da sociedade. Quando criamos o IAB, pensamos justamente em ampliar nossa atuação social. Em 2010, realizamos a I Feira Quilombola do Paraná, em parceria com a Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP) e com o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República (CDES). Foi neste sentido que encampamos e formu-lamos o Projeto Brasil Afroempreendedor. No movimento sindical, a discrimi-nação dos afrodescendentes é muito grande. A sociedade brasileira tem uma dívida histórica com negros e negras no País. Por isso, estamos à frente desse projeto, junto com o CEABRA e o SEBRAE Nacional, para contribuir na constru-ção de uma política pública para o afroempreendedorismo no país.”

Francisco Rodrigues da Silva Sobrinho, presidente do Instituto Adolpho Bauer

na educação as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana; a Polí-tica Nacional Quilombola, para atender às milhares de comunidades remanescen-tes de quilombos; as políticas de Ações Afirmativas, com destaque para as políti-cas de cotas nas universidades públicas e privadas, via Prouni.

Foram precisos, no entanto, mais sete anos até que finalmente a SEPPIR tivesse uma base legal que orientasse suas ações de forma ampla e coordena-da. E esta veio na forma da Lei 12.228, de 20 de julho de 2010 (Estatuto da Igualdade Racial), um documento que, entre outras coisas, dispõe sobre o es-tímulo à promoção de empresários ne-gros, através do financiamento para a constituição e ampliação de pequenas e

médias empresas e de programas de ge-ração de renda. No Título III, que trata do Sistema Nacional de Promoção da Igual-dade Racial (Sinapir), o Estatuto buscou, como objetivo principal, promover a igualdade racial e combater as desigual-dades sociais resultantes do racismo. A lei orienta, no Capítulo V, o financiamento das políticas de promoção da igualdade racial, destacando no inciso IV o “incen-tivo à criação e à manutenção de micro-empresas administradas por pessoas autodeclaradas negras”. Estava aberto o caminho para o desenvolvimento de es-tratégias para ampliar a existência das microempresas e microempreendimen-tos individuais negros e negras, a partir de novos conhecimentos e ferramentas disponibilizadas pelos órgãos de gover-nos, Sebrae, universidades e entidades da sociedade civil.

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Não é de hoje que há a compreensão de que, além das políticas de promoção da igualdade racial nos campos da edu-cação e do trabalho, deve haver um forte estímulo ao empreendedorismo negro. Por esse prisma, negros e negras donos de negócios, com empresas sólidas e ge-radoras de emprego e renda, aproveitan-do os conhecimentos acumulados em funções variadas, desde a culinária, a estética, via moda e produtos de beleza, a indústria, o comércio, etc., foram con-siderados os elementos-chave para a distribuição da riqueza e a eliminação da desigualdade. Com o tempo, e a criação de várias entidades que reuniram em-presários negros, como incubadoras de empresas, feiras, cooperativas e asso-ciações no campo e na cidade, os Cole-tivos de Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros (CEABRAs) em vários es-tados, a Associação Nacional dos Coleti-vos de Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros (Anceabra), o caminho foi deixando de ser apenas um sonho para se constituir em uma alternativa vi-ável de transformação da realidade dos empreendedores negros e negras.

O projeto Brasil Afroempreendedor é tributário dessas ações, com origem mais definida na grande feira de negó-cios realizada em Goiânia (GO), m 2005. Neste mesmo ano, o governo federal, por intermédio da SEPPIR/PR, realizou o Se-minário Desenvolvimento com Inclusão Social e Econômica da População Negra. Vários ministérios participaram do even-to, que contou com a parceria da Orga-nização Internacional do Trabalho (OIT). Somou-se a isso a retomada da agenda com o Sebrae Nacional, agora favoreci-da pelo momento econômico brasileiro, com a inclusão de milhões de pessoas no ciclo produtivo.

Para a formulação do projeto, foi realizada Oficina Técnica Nacional, em Brasília (DF), em 2011, cujo objetivo principal foi construir as grandes metas nacionais para a elaboração do projeto

Luta histórica

Brasil Afroempreendedor. Após, ofici-nas técnicas foram realizadas nos 12 estados que serão contemplados pelo projeto (ver quadro adiante), reunindo empreendedores negros e negras para buscar sugestões de demandas que deveriam ser absorvidas pela iniciativa. Participaram em torno de 400 empreen-dedores (microempresários e microem-preendedores individuais) e convidados, representando os mais diversos setores das atividades produtivas, formando as-sim os núcleos de redes que, articula-dos, sustentaram inicialmente o projeto. Várias sugestões foram incorporadas, até que se estabelecessem as metas e ações que serão implementadas duran-

te os dois anos de duração do projeto.O Sebrae Nacional abraçou a inicia-

tiva já no início, possibilitando a realiza-ção das oficinas estaduais e, juntamente com o Instituto Adolpho Bauer, patroci-nando o I Seminário Desenvolvimento e Empreendedorismo Afro-brasileiro (I SENEAB), realizado em Brasília, em de-zembro de 2012. Durante o seminário, realizado pelo CEABRA/SP, a primeira versão do projeto Brasil Afroempreende-dor foi apresentada aos participantes. Várias conclusões dos seminários foram incorporadas ao projeto durante os pri-meiros meses de 2013, até a assinatura o convênio entre Sebrae Nacional, IAB e CEABRA/SP, em maio de 2013.

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Durante o lançamento do projeto Bra-sil Afroempreendedor em São Paulo, os 465 empreendedores e empreendedo-ras negras presentes foram testemunhas de um momento histórico. O projeto é, afinal, uma possibilidade real de tirar do papel e das cabeças a tão esperada Rede de Empreendedores Afro-brasileiros e, a partir dela, estabelecer a pauta para a construção das políticas públicas que ala-vanquem de vez os negócios de negros e negras no País. A presença de lideranças expressivas negras e de autoridades dos poderes Executivo e Legislativo no lança-mento em São Paulo deu a dimensão da ambição do projeto. Estavam presentes o ministro da Secretaria das Micro e Peque-nas Empresas, Guilherme Afif Domingos, o diretor-presidente do Sebrae Nacional, entidade financiadora do projeto, Luiz Bar-reto, o deputado federal Vicente Cândido (PT/SP), a deputada estadual Leci Bran-dão (PC do B/SP) e a secretária adjunta da Secretaria de Políticas de Promoção Racial de São Paulo e ex-ministra da SE-PPIR/PR, Matilde Ribeiro, os vereadores José Américo e Alfredo Alves Cavalcante, o Alfredinho (PT/SP), os presidentes do

IAB, Francisco Rodrigues da Silva Sobri-nho, e do CEABRA/SP, João Carlos Borges Martins, entidades executoras do projeto Brasil Afroempreendedor, e o presidente da Associação Nacional dos Coletivos de Empreendedores do Brasil (Anceabra) João Bosco Borba.

O ministro das Micro e Pequenas Em-presas, Guilherme Afif Domingos, lembrou que é o movimento da sociedade que permite as mudanças. “Os movimentos sociais têm muita força, o Movimento Ne-gro tem muita força. Por isso, temos de trazê-los para divulgar conceitos e ganhar massa e volume nas votações de interes-se no Congresso Nacional”, afirmou. Con-firmando as palavras do ministro, durante a solenidade de lançamento, um primeiro resultado do projeto já foi anunciado. O vereador Alfredinho comunicou o envio de projeto de lei de sua autoria para aprecia-ção dos vereadores da cidade de São Pau-lo. É o primeiro projeto com esse perfil no país. Durante o anúncio, o vereador desta-cou que o Brasil tem uma “dívida imensa com os afrodescendentes”. Após, lem-brou a resistência histórica dos negros no Brasil, e a necessidade de políticas com-

Lançamento em São Paulo mobilizou mais de 450 empreendedores

pensatórias, como as cotas, para superar nossas desigualdades raciais. “Temos de mirar os bons exemplos, dentro e fora do Brasil, para avançarmos”, destacou.

O deputado federal Vicente Cândido (PT/SP), apoiador de primeira hora do projeto, elogiou a participação das auto-ridades no lançamento do Brasil Afroem-preendedor. “Quero elogiar o ministro e vice-governador Guilherme Afif e o presi-dente do Sebrae Nacional, Luiz Barreto, que entenderam a importância do projeto Brasil Afroempreendedor.” O deputado fez um breve apanhado de sua experiên-cia com o tema: “Talvez esse seja um dos eventos mais importantes de que participo para discutir um tema não muito comum para nós. Começamos discutindo cotas e chegamos agora a uma agenda positiva de valorização da cidadania, para estabe-lecer como o negro vai se posicionar num Brasil cada vez mais rico e próspero. O apoio do Sebrae Nacional e a participação de um ministério neste lançamento dão a dimensão da importância estratégica des-te projeto. Vamos estimular a articulação de emendas parlamentares para a execu-ção deste e de mais projetos como este. Dessa forma, serão viabilizados os recur-sos necessários para sua execução. Esse evento é para despertar isso, não apenas para quem executa os empreendimentos, mas para quem elabora as políticas públi-cas e para quem luta pela promoção da igualdade racial”.

O presidente do Sebrae Nacional, Luiz Barreto, lembrou a importância do empre-endedorismo para o País: “São 99% das empresas, 25% do PIB, as pequenas e mi-cro empresas são responsáveis por 70% do emprego da mão de obra de nosso país”. Mas, como transformar esses nú-meros em uma possibilidade de inclusão? “Com políticas específicas, pensando o recorte racial e de gênero, já que hoje o maior crescimento entre os empreende-dores brasileiros é dos negros e das ne-gras. Temos que aproveitar este imenso potencial criador e empreendedor deste povo. Temos de ter muitas informações e muita capacitação, de forma a superar as barreiras e os marcos legais e culturais.”

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“Hoje é um dia de celebração. Matilde, primeira mulher negra ministra no Bra-sil, começo por você. E também por você, Teodosina, a primeira mulher negra a entrar na Assembleia Legislativa de São Paulo. Olho para essa plateia, e vejo a diversidade de nosso País. A diversidade está comemorando. E olha como as coisas mudam. Nesse projeto apresentado pelo vereador Alfredinho temos o fortalecimento e o desenvolvimento de comunidades quilombolas, de ter-reiros e de comunidades tradicionais. Essas comunidades podem nem saber pronunciar a palavra empreendedor, mas tem de saber aproveitar os frutos desta política. Esse projeto vai ser uma vitória arrasadora, com recursos públi-cos ajudando as pessoas a construir uma nação em que se priorize o acesso da população negra a uma vida melhor.”

Leci Brandão, deputada estadual (PC do B/SP)

ParceriasOutras iniciativas semelhantes à do

vereador Alfredinho começam a pipocar nos estados, além dos avanços oriundos do poder público. Em novembro, durante a III Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (III Conapir), a SEPPIR/PR e o Sebrae Nacional firmaram Proto-colo de Intenções que tem como objetivo geral o “fomento ao empreendedorismo negro, de pessoas e organizações da co-munidade negra, junto a potenciais em-presários, microempreendedores indivi-duais, micro e pequenas empresas, com vistas à formalização e desenvolvimento de pequenos negócios e consequente geração de emprego e renda, no contexto das ações de prevenção e enfrentamento do racismo institucional e fortalecimento de políticas de promoção da igualdade racial”. Entre os objetivos específicos, o termo prevê a priorização de medidas voltadas para as mulheres e a juventude negra, formação e capacitação e compar-tilhamento das boas práticas nacionais e internacionais.

O Banco Nacional de Desenvolvimen-to Econômico e Social (BNDES) também começa a estabelecer instrumentos de fo-mento voltados para os empreendedores negros e negras. Em novembro, durante o evento Rodadas de Negócios e Finan-ciamento para Empreendedor@s Afro--brasileir@s, iniciativa do Festival da Mu-lher Afro Latino Americana e Caribenha, Latinidades e da Anceabra, com apoio da Fundação Cultural Palmares (FCP), al-gumas medidas passaram a integrar as ações visando ao público afroempreende-dor. Entre elas, o financiamento dos inves-timentos dos micro e pequenos empre-endedores e dos microempreendedores individuais afro-brasileiros, o público alvo do projeto Brasil Afroempreendedor.

Desde o lançamento do projeto, ar-ticulações têm sido feitas nas várias es-feras do Executivo e do Legislativo para construir a rede de parceiros que permi-tirá a disseminação do programa no País. Comitês estaduais de promoção da igual-

dade racial, secretarias municipais, Se-braes estaduais, parceiros em entidades públicas e privadas estão sendo contata-dos para garantir a execução do projeto nos estados. A primeira parte, em fase de finalização, prevê acúmulo de informação sobre empreendedorismo e população afro-brasileira nos 12 estados escolhidos para a execução do projeto.

Neste momento, já se passa à sele-ção de consultores que acompanharão o desenvolvimento das atividades nos esta-dos. Serão 12 consultores estaduais, com experiência no tema do afroempreende-dorismo e conhecimento dos movimentos sociais, que estarão próximos aos empre-endedores escolhidos para participar dos seminários estaduais e que terão seus negócios alavancados a partir das consul-

torias de técnicos do Sebrae e dos consul-tores do projeto, com qualificação de seus planos de negócios, análises de gestão, sugestões de acesso a crédito, entre ou-tras medidas que visam ao fortalecimento de seus negócios.

A partir de 2014, quando começarem os seminários estaduais, as informa-ções coletadas neste primeiro semestre de atividades se somarão às relações institucionais para a construção das políticas de fortalecimento dos empre-endimentos selecionados, que terão acompanhamento específico. Pesquisa com os participantes dos seminários fará um levantamento do perfil desses empreendedores, servindo de base para estabelecer diagnósticos e ações para o desenvolvimento de seus negócios.

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“Estamos construindo na Prefeitura Municipal de São Paulo um termo de cooperação que auxiliará nos próximos passos desse programa em nossa cidade. Temos de lembrar o fato histórico de que demoramos mais de 100 anos para o desenvol-vimento de políticas de igualdade racial em nosso País, após a cha-mada abolição de 1888. Nos anos 1980, começou o desenvolvimento das políticas de igualdade racial no Brasil. São Paulo foi pioneira, com a criação do Conselho de Desenvol-vimento da Comunidade Negra. Foi um longo caminho até chegarmos ao ministério, em 2003. Isso tudo porque a população negra assumiu a luta. Temos um legado de lutas e conquistas, e é com eles que o SE-BRAE e o Ministério das Micro e Pe-quenas Empresas trabalharão.”

Matilde Ribeiro, secretária de Igualdade Racial de São Paulo, ex-ministra da SEPPIR/PR

Comitê Gestor é instaladoOutra atividade prevista para esta pri-

meira etapa do projeto foi a instalação do Comitê Gestor, uma instância consultiva que reúne representantes de entidades públicas e privadas. A reunião de instala-ção aconteceu no dia 22 de outubro, na sede do Sebrae Nacional, em Brasília. Par-ticiparam da reunião de instalação Adria-na Barbosa, do Instituto Feira Preta, Sér-gio Melo, reverendo da Igreja Azusa, João Maria, do Instituto Maria Comunicação, Cristiane Sobral, da Fundação Cultural Pal-mares, e Graça Santos, da Associação Na-cional da Moda Afro-brasileira (Anamab), além dos representantes do IAB, CEABRA/SP e SEBRAE Nacional. Os representantes do Ministério do Desenvolvimento, Indús-tria e Comércio (MDIC) e da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (SEPPIR/PR), justificaram a ausência. A Casa Civil da Presidência da República e a Coordena-ção Nacional das Comunidades Quilombo-las (Conaq) ainda não definiram os nomes que integrarão o comitê.

O Comitê Gestor do projeto Brasil Afro-empreendedor conta com a participação de entidades governamentais e da socie-dade civil historicamente comprometidas com a questão da inclusão racial. O Co-mitê é presidido pelos representantes do Instituto Adolfo Bauer (IAB) e do Coletivo de Empresários e Empreendedores Afro-

-brasileiros de São Paulo (CEABRA/SP), com a coordenação do consultor técnico nacional do projeto, João Carlos Nogueira, ex-secretário executivo da SEPPIR/PR. A participação efetiva dos integrantes do Comitê será fundamental para a realiza-ção dos objetivos do projeto e se pautará pelos seguintes objetivos: compartilha-mento e aperfeiçoamento da gestão do projeto; ampliação e fortalecimento da Rede Nacional de Empreendedores Ne-gros e Negras; criação do Prêmio “Brasil Afroempreendedor”, previsto no proje-to; participação nos Grupos de Trabalho (GTs); contribuição para a realização dos seminários estaduais.

Como principais encaminhamentos, foram criados grupos de trabalho para a execução do projeto e definiu-se que serão elaborados instrumentos virtuais para a comunicação entre os participantes, para o seu funcionamento e o dos grupos de trabalho, a partir da constituição de redes on-line. Ficou definida a criação dos GTs Rede Brasil Afroempreendedor, Metodo-logias do Afroempreendedorismo, Fundo Brasil Afroempreendedor, Economia Cria-tiva e Comunicação Social. As reuniões do Comitê são trimestrais, e acontecem em Curitiba, São Paulo e em Brasília. A próxi-ma será na segunda quinzena de janeiro de 2014. O local será definido em breve e comunicado aos participantes.

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O que é o Projeto Brasil Afroempreendedor O projeto Brasil Afroempreendedor é uma iniciativa da sociedade civil demandada ao Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae Nacional), de Brasília (DF), com coordenação do Instituto Adolpho Bauer (IAB), de Curitiba (PR), e Coletivo de Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros de São Paulo (CEABRA/SP).

Objetivosn Realizar 12 seminários estaduais (PR, SC, RS, SP, RJ, MG, PE, BA, MA, PB, GO e AP), com a presença de aproximadamente 1.200 empreendedores afro-brasileiros (100 por atividade), e participação de instituições, especialistas e parceiros.

n Subsidiar a formação e capacitação sobre empreendedorismo, em 12 comunidades negras remanescentes de quilombo, identificadas pela Fundação Cultural Palmares (FCP/MINC).

n Criar a Rede Nacional de Micro e Pequenos Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros, focada na troca de experiências, intercâmbios, desenvolvimento de negócios solidários para o fortalecimento econômico deste segmento.

n Estruturar propostas de Programas de Apoio aos Empreendedores Afro-brasileiros (PROAEABs).

n Divulgar dados sobre micro e pequenos empreendedores afro-brasileiros.

n Publicar livro com textos de especialistas sobre empreendedorismo afro-brasileiro e os desafios no desenvolvimento nacional.

Público alvoMicro e pequenas empresas e micro empreendedores individuais afro-brasileiros.

Duração e abrangênciaO projeto terá duração de 24 meses, com desenvolvimento em 12 estados da Federação (RJ, SP, MG, PR, SC, RS, GO, BA, PE, PB, MA, AP). A escolha desses estados seguiu os critérios de organização dos(das) empreendedores(as) afro-brasileiros(as), seja por intermédio das organizações específicas no tema, como os Coletivos de Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros (CEABRAs), a Incubadora Afro-brasileira ou entidades locais voltadas diretamente ao atendimento a este segmento. Do mesmo modo, foram consideradas as iniciativas do poder público a partir das políticas de promoção da igualdade racial. A partir do projeto, será criada uma Rede Nacional de Afroempreendedores, que funcionará como um espaço permanente de socialização, intercâmbio (formativo e informativo), qualificação empreendedora e de desenvolvimento de oportunidades de negócios.

Estratégias para os afroempreendimentosAlém dos objetivos gerais, o projeto Brasil Afroempreendedor pretende ser o ponto de partida para estabelecer estratégias inovadoras de formação e qualificação dos empreendedores afro-brasileiros. Desta forma, esse segmento estará apto para dar continuidade aos seus negócios e participar de redes que fortalecerão seus empreendimentos. Veja outros resultados pretendidos pelo projeto.

n Elevar e dar consistência ao processo de formalização dos empreendimentos de micro e pequenas empresas afro-brasileiros e MEIs através da realização dos cursos de formação e qualificação.

n Ampliar os conhecimentos do universo das micro e

“Este é um encontro que busca engrossar ainda mais as fileiras do empreen-dedorismo no Brasil. Tenho uma vida de mais de 30 anos voltados ao apoio ao empreendedorismo. Estive na Constituinte de 1988 com o então deputado federal Luiz Inácio Lula da Silva. Agora, a presidente Dilma me convidou para a secretaria (Ministério da Pequena e Micro Empresa). E é com esse espírito, de ajudar a formar consensos, que presenciamos e parabenizamos o nascimento deste grande Projeto. É o movimento das ruas que vai nos ajudar a ultrapassar os obstáculos. E temos de estimular não apenas o empreendedor afro-brasilei-ro, mas também o “apreendedor” afro-brasileiro (o jovem negro aprendiz), com cursos no SENAI, no SENAC e outros. Com empreendedores e “apreendedores”, o Brasil vai pra frente!”

Guilherme Afif Domingos, Ministro das Micro e Pequenas Empresas e vice-governador de São Paulo

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pequenas empresas e MEIs.

n Consolidar as redes de pequenas e microempresas e de microempreendedores individuais afro-brasileiros, a partir de iniciativas da economia solidária, economia criativa e cooperativas, para fortalecer o associativismo.

n Articular parcerias com iniciativas nacionais, locais e regionais, como feiras de negócios e outras iniciativas.

n Fortalecer o atendimento do Sebrae às micro e pequenas empresas afrobrasileiras.

n Fomentar a cultura empreendedora, a partir da interlocução das experiências das organizações da sociedade civil, em particular do Sistema Sebrae, CEABRA e IAB, através dos cursos de capacitação e qualificação.

n Lançar o “Prêmio Brasil Afroempreendedor”.

Etapa 1Organização e publicação de dados, seleção e capacitação de equipe do projetoEssa etapa tem duração de um ano e prevê a publicação do livro “Desenvolvimento e Empreendedorismo Afro-brasileiro”, criação de banco de dados digital e seleção e capacitação de 12 consultores estaduais para o início dos trabalhos de implantação da Rede Nacional de Afroempreendedores. O objetivo da ação dos consultores estaduais é fortalecer a articulação entre os empreendedores afro-brasileiros e os setores públicos e privados, relativamente aos aspectos gerenciais, creditícios, mercadológicos, entre outros, de seus empreendimentos. Os dados constantes do livro e do banco de dados digital proporcionarão uma maior compreensão da realidade dos empreendedores afro-brasileiros. O banco de dados digital será permanentemente atualizado com as informações sobre os empreendedores afro-brasileiros que forem sendo levantadas ao longo do projeto. Nesta etapa, estão sendo realizados os primeiros estudos para a construção dos instrumentos de pesquisa e de aferição dos resultados do projeto, bem como, será definida a metodologia para a realização dos seminários estaduais.

Etapa 2Formação de Redes de Apoio e Realização de Seminários EstaduaisEssa etapa prevê a realização dos seminários estaduais para alinhar as propostas de parcerias para a construção de políticas públicas e a construção de instrumentos para a aferição dos resultados do projeto, que já começaram a ser elaborados na primeira fase. Com a definição da metodologia para formação de redes, e com a realização da capacitação dos consultores que atuarão como articuladores nos estados, serão realizados seminários estaduais visando reunir 1200 empreendedores afro-brasileiros, instituições públicas e privadas, com a participação de representantes das comunidades quilombolas definidos pela Fundação Cultural Palmares. Nos seminários, serão apresentadas as informações sistematizadas na Etapa 1, levantamento de demandas e necessidades dos empreendedores afro-brasileiros presentes, apresentadas propostas de políticas públicas para o atendimento dessas demandas, bem como, serão apresentados programas, produtos e serviços dos parceiros a serem integrados ao projeto, como Sebraes, instituições de crédito, apoio e fomento, secretarias de estado e

outras entidades, na busca de apoio para realização de treinamentos, capacitações, palestras, orientações para acesso ao crédito, apoio à formalização dos negócios, entre outros. Nesta etapa, os empreendimentos terão acompanhamento específico para a elaboração de planos de negócios envolvendo mercado, processos produtivos, finanças, atendimento, que servirão como base para acompanhamento desenvolvimento desses negócios.

Etapa 3Formação de Redes de Apoio, Realização de Seminários Estaduais, Monitoramento e Disseminação do ProgramaAqui, o foco é o acompanhamento e o monitoramento dos empreendimentos selecionados para participar do projeto, bem como, a elaboração de relatórios de divulgação. Em um primeiro momento, serão elaborados instrumentos para a aferição de resultados do projeto: Indicadores de Processo, Indicadores de Resultados e Indicadores de Impacto. O objetivo fundamental desta Etapa 2 e da Etapa 3 é a continuidade do processo de desenvolvimento e fortalecimento dos micro e pequenos empreendedores afro-brasileiros, com a realização das ações de monitoramento.

Ações do projetoAs propostas do projeto Brasil Afroempreendedor estão divididas em três etapas, com sete ações executadas durante 24 meses.

IAB – Instituto Adolpho Bauer Rua Conselheiro Laurindo, 809/305Centro - Curitiba/PR - 80.060-100Coordenador: Adilton de PaulaE-mail: [email protected].: (41) 3029-0215

CEABRA – Coletivo de Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros de São PauloPresidente: João Carlos Borges MartinsE-mail: [email protected] [email protected] - Tel.: (11) 3333-1066

Contatos

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Arquivo

das desigualdades raciais históricas entre brancos e negros no Brasil persiste como sendo um dos grandes desafios para o desenvolvimento do País. Negros (pretos e pardos) têm sofrido diversas formas de discriminação nas diversas áreas e, sobretudo, no mundo do trabalho. Para além dos processos mais dificultosos de acesso ao mundo do trabalho, recebem menores remunerações que brancos e raramente são promovidos. Desta forma, observa-se que o mercado informal mais incidente entre os negros traduz os impac-tos das dificuldades encontradas de sua inserção no mundo de trabalho formal. Por isso, acreditamos que o investimento público no empreendedorismo afro seja uma das estratégias importantes no em-poderamento de empreendedores negros nesta conjuntura em que, cada vez mais o Brasil, do ponto de vista social e econô-mico, se desenvolve. O que se espera é que este desenvolvimento seja inclusivo, especialmente quando se observa o histó-

Apesar da diminuição da pobreza e da miséria, persiste a desigualdade no Brasil. Até que ponto o empreendedorismo é uma solução para superá-la, levando-se em consideração que, segundo pesquisa do Sebrae divulgada recentemente, os negros e negras representam 49% do total de donos de negócios do País, mas apenas 8% dos empregadores?

Os dados refletem a característica das relações raciais fincadas no Brasil ao lon-go do tempo. O fenômeno do racismo e

Entrevista: Netinho de Paula, Secretário de Promoção da Igualdade Racial de São Paulo (SMPIR/SP)

Superar a barreira do racismo institucional é o grande desafioO titular da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial de São Paulo (SMPIR/SP), Netinho de Paula, considera-se um empreendedor.

“O fenômeno do racismo e das desigualdades raciais históricas entre brancos e negros no Brasil persiste

como sendo um dos grandes desafios para o

desenvolvimento do País.”

Começou vendendo balas nos trens de São Paulo, virou cantor da ban-da de pagode Negritude Junior,

alçou voo em carreira solo, fundou a TV da Gente, para discutir as questões ra-ciais e dar espaço para talentos negros. Foi vereador e o terceiro candidato mais votado ao Senado Federal por São Paulo nas últimas eleições. Nesta entrevista à revista Sustenta Brasil, Netinho fala sobre a condição dos empreendedores negros e negras no Brasil, suas dificuldades para driblar o racismo institucional e a necessi-dade de o Estado brasileiro assumir cada vez mais o papel de indutor de políticas públicas de inclusão. “É necessário um in-vestimento maior em programas de ações afirmativas focalizadas na população ne-gra nos diversos espaços, para além da educação”, afirma. Confira a entrevista.

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rico de injustiças sociais que a população negra sofreu e ainda sofre, relacionadas ao trabalho na escravização, no pós- abo-lição e na realidade contemporânea.

A pesquisa também mostra que empreendedores negros e negras entram mais cedo no mercado de trabalho, o que reflete em seus anos de estudo. Com menos anos de estudo, terão mais dificuldade de consolidar seus negócios. Como sair dessa armadilha?

Bom, de fato, as dificuldades para um empreendedor negro ou para uma empreendedora negra são muitas e, além da educação, uma grande barrei-ra para o sucesso desse empreendedor ainda é o racismo. Racismo, que o im-possibilita de ter acesso a crédito ou mi-crocrédito para financiar ou desenvolver o seu negócio, por exemplo. Então, sair dessa armadilha ou mesmo do ciclo da desigualdade consiste na construção de políticas públicas específicas para o for-talecimento e desenvolvimento do em-preendedorismo negro, ou seja, políticas de promoção da igualdade racial que se-jam capazes de enxergar as dificuldades e desafios dos nossos empreendedores e a partir dessa perspectiva promover a mudança e quebrar essa armadilha. É também importante garantir mais opor-tunidade para que empreendedores ne-gros e negras possam participar de ace-leradoras ou incubadoras de negócios

O racismo é um fato, e tem reflexos terríveis no nosso processo de desenvolvimento. O Brasil pode se desenvolver sem superar essa chaga deixada pela escravização?

O racismo, como uma ideologia de dominação, tem construído, ao longo do tempo, processos de hierarquização das diferenças entre brancos e negros nos diversos espaços e, especialmente, na forma de construção e consolidação das políticas públicas na área da educação, no trabalho, na saúde, na segurança, etc. A população negra (pretos e pardos) tem so-

frido de desigualdade de resultados, quan-do comparada à população branca neste formato de construção das políticas públi-cas. Por exemplo, as políticas sociais de cunho universalistas são de extrema im-portância para o combate as desigualda-des, porém, mesmo com os avanços des-sas políticas, as desigualdades diminuem para todos, mas não aproximam brancos e negros. Brancos, em geral, segundo os indicadores (IPEA, IBGE, DIEESE), têm tido impactos sociais mais positivos. Por isso, é necessário um investimento maior em programas de ações afirmativas focaliza-das na população negra nos diversos es-paços, para além da educação. O desen-volvimento social e econômico do Brasil só se dará de forma efetiva com a inclusão da população negra nos diversos espaços sociais com equidade. Para tanto, um dos grandes desafios para o enfrentamento ao racismo e a promoção da igualdade racial é o racismo institucional. O Brasil institu-cionalizou a escravização de africanos e seus descendentes por séculos, os negros construíram as bases econômicas, sociais e culturais do país na condição de escravi-zados. Existe uma chaga da escravização que perdurou por vários séculos. Contudo, a principal desafio para um perfil de desen-volvimento inclusivo para negros no Brasil passa, sobretudo, pelo enfrentamento do racismo de forma comprometida pelo Es-tado Brasileiro na suas várias instâncias.

O senhor tem sido um grande apoiador do projeto Brasil Afroempreendedor. O que acha da iniciativa?

Considero uma iniciativa fantástica e inovadora, pois esse projeto vem justa-

mente para suprir uma lacuna que existiu durante anos, que é promover o desen-volvimento econômico tendo um olhar específico para os nossos empreendedo-res negros e empreendedoras negras do Brasil, sobretudo na cidade de São Paulo. Nós já sabemos como é a correria no co-tidiano de um empreendedor negro ou de uma empreendedora negra, inclusive já vivi diversas situações, seja quando ven-dia bala nos trens de São Paulo ou quan-do criei a TV da Gente. Mas, a partir do momento que você tem um projeto que visa compreender e fortalecer o empre-endedorismo afro-brasileiro, com certeza algumas dificuldades serão amenizadas para o empreendedor negro. Digo ameni-zadas, porque esse projeto tem que ser in-corporado pelo Estado e virar uma política pública séria e efetiva para toda a popula-ção negra que deseja ou sonha em ser um empreendedor de sucesso.

Secretário, conte um pouco de sua trajetória como empreendedor. Que dificuldades o senhor enfrentou e como fez para superá-las?

Eu me considero um empreendedor. Como é sabido, comecei vendendo ba-las nos trens de São Paulo. Em 1986, comecei minha carreira na banda de pagode Negritude Junior. Eu era o voca-lista desse grupo que foi criado no con-junto habitacional onde eu morava. Me afastei da banda em 2001 e parti para uma carreira solo. Foi aí então que sur-giu a oportunidade de apresentar um programa de televisão e posteriormen-te criar a TV da Gente – uma TV volta-da para a valorização da diversidade étnico-racial brasileira. As dificuldades foram muitas, e a principal delas tem relação com o racismo e os estigmas construídos sobre a população negra. Negros têm potencial e talento para de-senvolver atividades em todas as áre-as deste país, ou seja, das tecnologias mais avançadas às menos avançadas. O Brasil precisa entender isso e investir nisso. Não há lugares ou papéis desti-nados aos negros naturalmente.

“Considero [o Projeto Brasil Afroempreendedor] uma iniciativa fantástica e

inovadora, pois esse projeto vem justamente para suprir

uma lacuna que existiu durante anos”

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e roupas em um brechó. Se a situação já não estava boa, piorou quando foram furtadas em um arrastão em uma dessas oportunidades. Decididas, resolveram fundar a própria feira, que hoje é talvez o maior encontro de cultura negra da Amé-rica Latina, unindo cultura e comércio de produtos afro-étnicos.

A Feira Preta é realizada anualmente. A edição de 2013, entre os dias 9 e 15

de dezembro, marcou o retorno do evento ao Palácio das Convenções do Anhembi, em São Paulo. “O objetivo é difundir cos-tumes e tradições da cultura negra e fo-mentar negócios de empreendedores da comunidade negra”, diz Adriana. Pelos números do evento, a Feira Preta já reu-niu 500 artistas, 600 expositores, mais de R$ 3,5 milhões de circulação monetária e 100 mil visitantes. Nada mal, para quem

Do brechó à feira

São pessoas que viram na falta de emprego, no ta-lento artístico ou nas novas tecnologias uma brecha para explorar um campo restrito: o empreendedoris-

mo. Tocar o próprio negócio exige dedicação, perseverança e, acima de tudo, acreditar em si próprio, mesmo quando

nada parece dar certo. Quando as práticas vêm associadas à afirmação da identidade e à busca de desenvolvimento de soluções criativas fundadas no reconhecimento do valor da cultura e do pertencimento, esse se torna um caminho sem volta, pela força de sua motivação.

Aqui você acompanhará histórias de empreendedores afro-brasileiros de diferentes áreas, com diferentes talentos.

Afroempreendedores de sucesso

O desemprego foi o dínamo que fez duas mulheres negras, Adriana Barbosa e Deise Moyses, investirem na Feira Preta, iniciativa que reúne em um mesmo es-paço o comércio e a cultura. Precisando se sustentar, as duas começaram a par-ticipar de feiras de rua, vendendo pastel

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há pouco mais de uma década não sabia que rumo tomar. Era possível imaginar isso, Adriana? “Não imaginava, até por-que era uma iniciativa de duas mulheres que precisavam sobreviver. E hoje abarca toda a população brasileira. Só fomos nos dando conta da grandiosidade anos depois, ao perceber o volume de pessoas que mobilizávamos em todo o Brasil e o crescente número de público visitante que resolveu empreender a partir da Feira Preta.” Na área de empreendedorismo, segundo Adriana, a feira conta com expo-sitores divididos entre grandes empresas e microempreendedores de diversos seg-mentos: alimentação, artesanato, moda, decoração, acessórios e calçados. “A co-mercialização de produtos étnicos possi-bilitou a circulação monetária, estimulan-do a produtividade da comunidade negra e impulsionando o interesse crescente em investimentos nesse mercado.”

A partir dos levantamentos que mos-tram o aumento do número de pessoas autodeclaradas pretas e pardas, até che-gar aos 51% do Censo de 2010, as duas empreendedoras viram um mercado promissor do ponto de vista econômico, mas pouco aproveitado em seu potencial. “Assim, em 2005 criamos a Produtora Pretamultimidia Produções, Promoções e Organizações de Eventos Culturais, com o objetivo de oferecer serviços de qualida-de e soluções criativas e inovadoras em entretenimento e projetos culturais, com foco em eventos pautados na cultura negra”, lembra. Segundo Adriana, a Pre-tamultimidia é hoje uma das principais referências na produção cultural negra do Brasil e América Latina.

Em 2009, foi criado o instituto Feira Preta. A intenção foi servir como uma Pla-taforma Preta Cultural que promove espa-ço de celebração, reflexão do movimento cultural de coletivos que se dedicam à te-mática negra. A plataforma funciona como um banco de dados, reunindo informação variada sobre artistas de diferentes lingua-gens, funcionando também para a divul-gação dos eventos, iniciativas, exposições e performances nas áreas de fotografia, cinema, artes plásticas, música, literatura,

artesanato, moda, design, hip hop, teatro, dança, educação, economia criativa e soli-dária. Nesse local, são reunidos inúmeros representantes da cultura afro-brasileira e empreendedores de diversas regiões do Brasil. Atualmente, a Feira Preta é gerida pelo Instituto Feira Preta e pela produtora de eventos Pretamultimidia.

A cultura é um dos eixos centrais da Feira Preta, atesta Adriana. “Ela mobiliza o público a prestigiar a Feira e, a partir das manifestações culturais, o público enxer-ga os empreendedores, que de alguma forma tentam atender uma demanda de consumo. É um ciclo virtuoso.” O vínculo com a cultura, para a empreendedora, também pode ser uma estratégia para a educação, ao acessar espaços e públicos que não conseguem alcançar esse pri-vilégio. “Por exemplo, a lei 10.639, que cria obrigatoriedade do ensino da cultu-ra negra e indígena na rede de ensino. Muitas das metodologias utilizadas pelos professores em sala de aula são ativida-des culturais que conseguem transmitir a riqueza que esses povos construíram na identidade do Brasil. A criança que conse-

gue aprender o conceito mais amplo da diversidade com certeza terá um olhar di-ferenciado após adulto: a criança branca, por aceitar que existem as diferenças; e a criança negra, com o empoderamento de sua autoestima.”

Para superar as dificuldades e limites que ainda existem para os afro-brasilei-ros, particularmente no mundo do em-preendedorismo, Adriana aponta alguns caminhos: acessar a informação e as fer-ramentas que poderão fazer o empreendi-mento prosperar e investimento. “Para o primeiro, acho que o Sebrae e outras ins-tituições poderão contribuir, com cursos e capacitações de ponta, mas que levem em consideração a particularidade desse empreendedor. E é muito difícil prosperar sem recursos. Precisamos de investimen-tos e capital de giro para empregar, preci-samos de recursos para investir em mão de obra, em recursos tecnológicos e ma-téria prima, entre outros. Sem esses dois ingredientes, ficaremos apenas no MEI e no micro. Precisamos avançar e vislum-brar também em nos tornarmos médias e grandes empresas.”

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“Não tinha conhecimento de negócio. Ainda por cima, havia a dificuldade do dinheiro. Construí esse negócio do nada, apenas com a vontade e muita imagina-ção”, afirma. Atualmente, a Tânagra aten-

de a 30 distribuidoras de abrangência na-cional e exporta para os Estados Unidos, Ásia e Oriente Médio. Só neste ano, já mandou quatro contêineres de produtos para o Oriente Médio, e isso que é para

A química do Dr. FaustoFoi quando fazia doutorado em Quí-

mica Orgânica na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em São Paulo, que Fausto Silva Junior vislumbrou a oportunidade de dar uma guinada em sua vida. Um simples detalhe, a preocu-pação da filha pequena com os cabelos, fez o hoje PhD enveredar pelo mundo dos cosméticos. “Isso foi há 20 anos. Na época, queria seguir carreira acadêmi-ca”, lembra. Conhecedor do mundo da manipulação das substâncias químicas, começou a desenvolver produtos para o cabelo das filhas e das amigas. Quando percebeu que dava para fazer dinheiro, foi atrás do Sebrae de São Paulo. As in-formações começaram a chegar. Um dia soube que havia uma indústria de cos-méticos à venda, fechada há quase 10 anos. Corria o ano de 1993. Foi à luta, buscou empréstimos. A garantia era a bolsa da pós-graduação. Hoje, são 20 anos de atuação e um faturamento de R$ 9 milhões ao ano da Tânagra Cos-méticos, especializada em produtos de beleza voltados para o público brasileiro.

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O mundo virtual também é espaço para as práticas dos empreendedores negros. A Rede Afrokut foi fundada em 2008 com a finalidade de combater o preconceito e a discriminação através de grupos de discussão virtuais. “A ideia da construção da Rede Afrokut, inicialmente, foi para suprir a falta de debate e infor-mação sobre a questão racial dentro do seguimento protestante. Hoje, a rede se consolidou, diversificando o seu conteúdo e abrangendo temas variados, como: ne-gritude, branquitude, religiosidade negra, cristianismo negro, estilo negro, oportuni-dades, saúde, beleza, qualidade de vida, e outros conceitos”, diz o empreendedor social Hernani Francisco da Silva, funda-dor e moderador da rede.

Nascido em Campina Grande, na Pa-raíba, Hernani vive em São Paulo, onde atua no movimento negro. Além da Rede Afrokut, desenvolve trabalhos junto a co-munidades quilombolas do Vale da Ribei-ra, em São Paulo. Segundo ele, grande parte dos participantes da rede são pro-

fessores e professoras, pastores e pas-toras e militantes das questões sociais e raciais. Atualmente, são cerca de sete mil inscritos na rede, que tem um tráfego de 30 mil visitas por mês. “Em breve, alcança-remos um milhão de visitantes”, anima-se.

A sustentação inicial da rede aconte-ceu através de recursos próprios, segun-do Hernani. Após, alguns projetos foram fechados com financiadores. Atualmente, a venda de produtos e o voluntariado sus-tentam a rede. Para se diferenciar de ou-tras organizações que executam trabalho assemelhado, Hernani aposta na criação de conteúdos diferenciados, mas, prin-cipalmente, na aproximação do público alvo, negros e negras cristãos, através da discussão da questão racial. “Pretende-mos obter informações de qualidade que venham a ajudar na caminhada na ques-tão racial e nas discussões sobre a negri-tude. Não queremos ser uma rede social entre muitas outras. Queremos ser ‘a rede social’ que, se não existisse, faria falta nessa imensa ‘nuvem’ que é a internet.”

onde vende menos. Nos Estados Unidos, depara-se com as idiossincrasias do país. “Se dissermos que queremos vender ape-nas para a comunidade latina, vamos ven-der só para eles. Para vender para todos, temos de focar no povo americano.”

No site da empresa, o diferencial apontado é “o pioneirismo na criação de cosméticos capilares desenvolvidos espe-cialmente para o consumidor brasileiro”. O proprietário da empresa lembra que o Brasil é um país rico em miscigenação e com clima tropical, por isso não se pode aplicar os mesmos produtos vendidos aos europeus, por fatores fisiológicos e climá-ticos. Para elaborar produtos adequados ao tipo de cabelo do povo e do clima brasi-leiros, a Tânagra investe em tecnologia de ponta, aliada ao uso de produtos naturais. “Sou da área da sínteses dos produtos naturais, sei do que estou falando”, diz. Com tanto investimento, tem de investir em um público que queira qualidade. “O preço ainda é fundamental na tomada de decisão. As pessoas acabam comprando produtos mais baratos, com muito formol, substância altamente cancerígena. Quem paga o pato são os cabeleireiros, que ma-nipulam esses produtos.”

A Tânagra já teve 110 funcionários. Após a crise de 2008, Fausto deu início ao processo de reestruturação da em-presa, diminuindo o quadro. “A realidade do mundo é uma realidade de crise. As vendas para a Europa e para os Estados Unidos diminuíram. E mudou também o perfil do consumidor brasileiro.” Para pio-rar, as multinacionais entram com tudo no mercado, cercando pontos de venda, não deixando a concorrência se estabelecer. A saída, segundo Fausto, é investir em tecnologia, atuar junto a um público escla-recido, que sabe o que usa e o que quer. “Aí, a empresa consegue se posicionar. O público que teve poder de compra repri-mido durante anos quer experimentar, comprar o que nunca teve.” Além disso, o empresário tem outra receita para ser bem sucedido em seu empreendimento: “Tem de sonhar grande. O tempo que gas-ta para sonhar pequeno é o mesmo que gasta para sonhar grande”.

Na rede contra o preconceito e a discriminação

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Educação

Os donos de negócios negros e negras têm menos anos de estudo do que os brancos e amarelos, o que acaba por refletir na remuneração de seus empreendimentos. Como o senhor acha que se pode superar essa situação?

Estudo do Sebrae com base em pes-quisa do IBGE mostrou que 31% dos do-nos de negócios de cor branca têm en-sino médio; 4% não concluem o ensino superior e 16% tem nível superior com-pleto. Por sua vez, 26% dos empreende-dores negros têm ensino médio; 2% têm superior incompleto e 4% têm ensino superior completo. O rendimento men-sal do primeiro grupo é de R$ 2.019,00, enquanto o rendimento mensal dos do-nos de negócios pretos e pardos é de R$ 1.039,00. Ou seja, o estudo mostra correlação direta entre nível de escola-ridade e rendimentos. Por outro lado, uma pesquisa do DIEESE mostra que um empregado negro que trabalhe nas principais regiões metropolitanas do país recebe em média 36,1% menos do que empregado não negro, mesmo quando seu nível de escolaridade tenha evoluído

Entrevista: Deutado Federal Vicente Cândido (PT/SP)

O deputado federal Vicente Cândido (PT/SP) é um apoiador de primeira hora do projeto Brasil Afroempreendedor.

Mão na massa

Nesta entrevista, o parlamentar elenca vários dados que reno-vam sua convicção no apoio às

políticas afirmativas em várias áreas. Muitos desses dados vieram a público na pesquisa do Sebrae que analisou o empreendedorismo no Brasil a partir do recorte da raça/cor (veja matéria nas páginas seguintes). Vicente Cândi-do acredita que os dados embasam as iniciativas que visam a incluir negros e negras em posições mais destacadas no Brasil que empreende. “Acredito que, para superarmos as enormes diferenças de remuneração e de educação formal entre negros e não negros precisamos cada vez mais eliminar as barreiras da segregação e do racismo institucional”, diz. E cita o próprio Congresso Nacional como exemplo de exclusão. “O exemplo mais expressivo da assimetria é quando analisamos a presença de apenas 9,8% de deputados e senadores negros no Congresso Nacional.” Leia a entrevista.

e se equiparado ao do trabalhador não negro. Assim como os cargos ocupados pelos negros são os de menor prestígio hierárquico e de salários inferiores. Che-gamos então à conclusão de que a discri-minação racial no mercado de trabalho é real e independe do nível de escolari-dade! O acesso dos negros a postos de direção no aparelho de estado em todos os poderes, Executivo, Legislativo e Judi-ciário, tem que ser viabilizado com ações afirmativas. O exemplo mais expressivo da assimetria é quando analisamos a presença de apenas 9,8% de deputados e senadores negros no Congresso Nacio-nal. Acredito que, para superarmos as enormes diferenças de remuneração e de educação formal entre negros e não negros precisamos cada vez mais elimi-nar as barreiras da segregação e do ra-cismo institucional. Precisamos de mais políticas públicas destinadas ao acesso em educação, cultura, esporte, saúde.

Deputado defende políticas afirmativas nas áreas da educação, cultura, esporte e saúde

Malu Moura/CEABRA

“Discriminação racial no mercado de trabalho é real

e independe do nível de escolaridade.”

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Precisamos apoiar os homens negros e as mulheres negras a exigirem mais igualdade de oportunidades.

Ainda são insuficientes os mecanismos que propulsionam o desenvolvimento sem exclusão racial e preconceito?

Somos um dos países cuja desigual-dade é uma das maiores do mundo e que resiste tanto a períodos de expansão quanto de recessão econômica. Poucos foram os períodos de nossa história em que conseguimos associar desenvolvi-mento econômico com ampliação de direitos sociais. Pensava-se que era su-ficiente o crescimento econômico para que o bem-estar da população estivesse garantido. Durante o governo de Fernan-do Henrique Cardoso houve arrocho dos salários do setor público para conter gas-tos e os salários do setor privado ficaram estagnados para justificar a inserção do Brasil na globalização. O resultado foi brutal para a renda do trabalhador: na década de 1959/60 o trabalho agrega-va 56,6% à renda nacional, enquanto que no período de 1999/2000 foi de 40%. Associar conquistas econômicas a conquistas sociais e políticas é o que queremos para termos um país justo e igual. Mas, para isso, é preciso que con-tinuemos a valorizar a remuneração do trabalho e a crescer com distribuição de renda. De 2000 a 2011 o salário mínimo teve um crescimento de 100% em pari-dade de poder de compra e a taxa de de-semprego vem se mantendo abaixo dos 10%. Tenho certeza de que estamos no caminho certo. Ele é longo e pontilhado de diversidades, mas estamos com uma oportunidade única na história do país: governos e sociedade imbuídos da con-vicção de que é preciso partilhar mais justamente os resultados do crescimento da riqueza nacional.

Por que no Brasil os dados e as análises sobre o empreendedorismo negro são poucos e insuficientes?

Só muito recentemente o recorte

racial passou a ser incorporado a pes-quisas e análises realizadas por institu-tos, universidades e empresas. E esses estudos vêm subsidiando políticas go-vernamentais e ações de entidades da sociedade civil de combate ao racismo e pela igualdade racial. A escassez de informações é reflexo do lugar que os negros ocupam em nossa sociedade: de exclusão e preconceito. Não poderia ser diferente com relação a estudos sobre a participação dos negros no mundo dos negócios. O Sebrae, ao ter a iniciativa de lançar o estudo “Os donos de negócios no Brasil: análise por raça e cor”, basea-do no PNAD/IBGE de 2011, e ao apoiar o projeto Brasil Afroempreendedor, rompe essa trajetória de denegação do quesito raça na produção intelectual brasileira.

O que chamou a sua atenção nos dados que cruzam informações sobre a variável cor no empreendedorismo?

Em primeiro lugar, o impacto de um aspecto aparentemente simples: o da autodeclaração da cor (aumento acu-mulado de 29% entre 2001/2011). Há

menos de duas décadas se começou no Brasil uma ampla campanha para que negros e pardos assumissem a sua iden-tidade de cor. Hoje temos números que nos permitem saber, por exemplo, qual o percentual de negros em instituições de ensino, no mercado de trabalho e mais recentemente nos negócios. Há dados muito interessantes, que vão permitir ações para equilibrar ou mesmo eliminar as distorções encontradas no afroem-preendedorismo: 1) há poucas mulheres negras empreendedoras, 29%, enquanto a média nacional é de 31%; 2) são 92% de negros que trabalham por conta pró-pria, enquanto a média nacional é 86%; 3) há mais jovens, em média, 42 anos; 4) seus rendimentos mensais são a metade dos recebidos pelos donos de negócios brancos; 5) começam a trabalhar mais cedo e têm menos anos de estudos; 6) têm menos acesso a telefones e com-putadores; 7) concentram-se na região Nordeste e são proporcionalmente em menor número na área de serviços; 8) são proporcionalmente em maior núme-ro na construção civil. Minha expectativa, como apoiador entusiasmado do projeto Brasil Afroempreendedor, é que se colo-que “a mão na massa”, com atividades de capacitação, de inclusão digital, de estímulo às mulheres, de incentivo à educação continuada, são alguns pou-cos exemplos do que instituições como o Sebrae podem fazer.

“Precisamos apoiar os homens negros e as mulheres

negras a exigirem mais igualdade de oportunidades.”

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a partir do incremento das políticas públi-cas distributivas em curso no Brasil. Nas conclusões finais da pesquisa, o Sebrae alerta: “Os perfis diferenciados identifi-cados entre os donos de negócios de di-ferentes raças/cores deixam claro que o desenvolvimento de produtos e serviços para donos de negócios, no Brasil, pode e deve levar em conta esses diferenciais. A eficácia das estratégias voltadas para estes grupos específicos tende a ser mais bem-sucedida quanto mais forem consi-derados os diferenciais citados”.

Entre 2001 e 2011, o número de do-nos de negócios que autodeclaram ne-gros cresceu 29%, mais do que o cresci-mento médio dos donos de negócios no mesmo período, que foi de 13%. No total, 49% dos empreendedores brasileiros são negros. Paralelamente, o número de pes-

Crescimento de donos de negócios que se autodeclaram negros foi de 29%, chegando ao total de 49% em 2011

Brasil tem 11 milhões de empreendedores afro-brasileiros

Pesquisa inédita do Sebrae Nacio-nal divulgada em setembro deste ano aponta: já somos 11 milhões

de afroempreendedores no País, com maior presença no Nordeste (41%), prin-cipalmente na Bahia, com 12% do total. O comércio (23%), o setor agrícola (23%), o setor de serviços (21%) e a construção (19%), concentram as atividades princi-pais dos empreendedores negros e ne-gras. O levantamento, intitulado Os donos de negócios no Brasil: análise por raça/cor, abrangeu os anos de 2001 a 2011, e foi realizado tomando como base as

informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2011, a última produzida pelo Instituto Brasilei-ro de Geografia e Estatística (IBGE) até o momento em que o estudo foi elaborado.

Em 2013, o Sebrae ampliou sua linha de estudos sobre empreendedores de pe-quenos negócios. A novidade são os estu-dos segmentados, utilizando as variáveis sexo, faixa etária, raça/cor, entre outros. A análise por raça/cor deve-se à necessi-dade detectada pelo Sebrae de esmiuçar as características deste que é um dos segmentos que mais tem se destacado,

Malu Moura

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soas que se declaram brancos foi de 1%, representando 50% do total dos donos de negócios. A categoria Outros, em que pre-dominam os amarelos, que se mantém no patamar de 1% de donos de negócios, registrou expansão de 42% em números absolutos. A explicação do aumento ex-pressivo do número de donos de negócios negros deve-se, segundo o estudo do Se-brae, ao fato de mais pessoas se declara-rem negras em relação às pesquisas ante-riores do IBGE, além do registro histórico do Censo de 2010, segundo o qual pela primeira vez a população negra é o seg-mento em maior número na população total brasileira.

“Esses dados significam um merca-do extremamente promissor do ponto de vista econômico, mas ainda pouco aproveitado em seu potencial”, afirma Adriana Barbosa, da Feira Preta, evento que reúne comércio e cultura desenvol-vido anualmente em São Paulo, e que atualmente está na décima segunda edição. A empreendedora acredita que ainda falta muito para que negros e negras ocupem um espaço condizente com a representatividade da população negra no Brasil. E aponta soluções para uma dificuldade detectada na pesquisa: do total de empreendedores negros e negras, apenas são 8% são empregado-res. Os outros 92% são empreendedo-res por conta própria. Segundo o IBGE, este é um segmento em que a pessoa trabalha explorando seu próprio empre-endimento, sozinha ou com sócio, sem ter empregado e contando, ou não, com a ajuda de trabalhador não remunerado, normalmente alguém da própria família.

Os donos de negócios por conta pró-pria normalmente se ocupam de ativida-des mais simples, com menor remunera-ção e situação mais precarizada. Adriana vê duas saídas para superar essa condi-ção: informação e investimento. Para o primeiro, defende as parcerias com o Se-brae como forma de acessar as ferramen-tas que farão o empreendimento prospe-rar. Para o segundo, que complementa o primeiro, é necessário buscar os recursos que farão o negócio se diferenciar.

Mas a pesquisa do Sebrae não iden-tificou apenas o problema de haver pou-cos empregadores negros e negras. Há também as questões envolvendo os anos de estudo, rendimentos médios mensais, quantidade de horas trabalhadas, aces-so a recursos de telefonia e informática, e vários outros fatores que demonstram que, apesar do crescimento em números absolutos, persiste a desigualdade entre donos de negócios negros e negras, bran-cos e amarelos, sempre em desfavor dos negros e negras (veja quadros).

A pesquisa vem ao encontro das ações do projeto Brasil Afroempreende-dor e servirá como subsídio para os tra-balhos de capacitação e qualificação dos empreendedores negros e negras abran-gidos pela iniciativa. É mais um elemento a identificar a necessidade de um projeto com essa característica, e que se soma a várias iniciativas em curso no País. “É fato que entre os negros ainda há uma

proporção maior de indivíduos que atuam em atividades mais simples, de menor va-lor agregado ou maior precariedade. São exemplos a produção de milho, a pesca, o comércio de ambulantes, o reaproveita-mento de sucatas e resíduos, a constru-ção civil, o ramo de bares e lanchonetes, ou até mesmo o chamado ‘faz tudo’”, diz o presidente do Sebrae, Luiz Barreto. Mas ele acredita que, com iniciativas direcio-nadas para a capacitação dos negócios, essa realidade tende a mudar. “Com a maior inserção desse perfil de empreen-dedores em atividades mais elaboradas e sofisticadas, a tendência é de que eles passem a ser também empregadores e que tenham um aumento na renda”, aposta.

Uma mudança importante do perfil dos empreendedores, e do próprio em-preendedorismo no Brasil, é destacada por Barreto. Segundo ele, a identificação de oportunidades no mercado está subs-

Variáveis negativas

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tituindo o empreendedorismo como cami-nho emergencial. Com este argumento, ele está na verdade chamando a atenção para a relação entre o empreendedorismo por necessidade e o empreendedorismo por oportunidade, que deve caracterizar uma economia sadia, em que os empre-endedores enxergam as oportunidades de negócio. Para ele, o Sebrae tem um papel fundamental no oferecimento de cursos, muitos deles gratuitos, redes de atendimento físico, call center e site.

Não são poucos os instrumentos co-locados à disposição do público empre-endedor afro-brasileiro. Além do projeto Brasil Afroempreendedor, há vários me-canismos sendo criados em municípios e estados, e na própria estrutura do go-verno federal. A criação da Secretaria das Micro e Pequenas Empresas é um avanço nesse sentido, incorporando a estrutura da secretaria existente no Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Iniciativas no âmbito da Secretaria de Po-líticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR/PR) e da Fundação Cultural Pal-mares e iniciativas de projetos de lei nos legislativos das várias esferas pretendem

dar conta de uma realidade que, apesar das mudanças, mantém heranças do pas-sado prejudiciais ao desenvolvimento bra-sileiro. Afinal, se mais da metade da po-pulação é composta por negros e negras e se, desses, pelo menos 11 milhões são empreendedores, nada mais razoável do que incrementar as políticas de fortaleci-mento das atividades desse público. Não se trata de privilégios, mas de uma conta que ao final trará resultados vantajosos para o próprio País, na forma de criação de empregos e de fornecimento de servi-ços e insumos para o mercado interno.

É o professor Ladislau Dowbor, da PUC de São Paulo, quem argumenta: “Ainda há uma imensa massa no setor informal, em torno de 40% da População Economica-mente Ativa (PEA). Ali, todo mundo se vira. Nessa massa, há um conjunto de busca de mecanismos de inclusão produtiva que gerarão o MEI, por parte do Sebrae. São mudanças que facilitam a inclusão produ-tiva. Mas é um processo que precisa ser muito amplo. Toda essa massa de gente, em particular com seu conteúdo racial, de gênero ou regional, não são um problema, são um potencial”.

Donos de negóciosDe acordo com o IBGE, entre 2001 e 2011, o número de donos de negócios no País cresceu 13%, passando de 20,2 milhões para 22,8 milhões de pessoas. Nesse mesmo período, o número dos que se declaravam pretos e pardos cresceu 29%, passando de 8,6 milhões para 11,1 milhões de pessoas (Gráfico 1), o número dos que se declaravam brancos aumentou 1% (passando de 11,4 milhões para 11,5 milhões de pessoas) e a categoria outros apresentou expansão de 42% (passando de 185 mil para 262 mil).

11,4 milhões

Brancos Negros/pardos

8,6 milhões

57%Fundamentalincompleto

11,1 milhões

11,5 milhões

Donos de negócios pretos e pardos85% começaram a trabalhar com até 17 anos de idade, 14% começaram a trabalhar entre 18 e 24 anos1% a partir dos 25 anos de idade.Donos de negócios brancos78% começaram a trabalhar com até 17 anos de idade, 20% começaram a trabalhar entre 18 e 24 anos2% a partir dos 25 anos de idade.Outros 79% começaram a trabalhar com até 17 anos de idade, 17% começaram a trabalhar entre 18 e 24 anos4% a partir dos 25 anos de idade.

Escolaridade

Brancos

NegrosPardos

11%Fundamental

completo

11%Fundamental

completo

31%Ensino médio

(completoincompleto)

26%Ensino médio

(completoincompleto)

4%Superior

incompleto

4%Superior completoou mais

2%Superior

incompleto

40%Fundamentalincompleto

Outros

11%Fundamental

completo

28%Ensino médio

(completoincompleto)

18%Superior completoou mais

3%Superior

incompleto

16%Superior completoou mais

38%Fundamentalincompleto

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Setor de atividade

Donos de negócios pretos e pardos

23% estão no comércio

23% no setor agrícola

21% no setor de serviços

19% na construção

10% na indústria

4% em outras atividades e/ou atividades mal definidas.

Donos de negócios brancos

26% estão no comércio

24% no setor de serviços

18% no setor agrícola

12% na construção

10% na indústria

10% em outras atividades e/ou atividades mal definidas.

Outros

28% estão no comércio

26% no setor agrícola

22% no setor de serviços

7% na construção

10% na indústria

8% em outras atividades e/ou atividades mal definidas.

Número médio de anos de estudo, 2001 e 2011 (em anos de estudo)

Preta/parda Branca Outras TOTAL

2001 4,4 7,2 9,0 6,0

2011 6,2 8,5 8,4 7,3

Taxa de expansão 41% 17% -7% 22%Fonte: Sebrae, a partir de processamento dos dados do IBGE (PNAD 2011)

Rendimento médio mensal, em 2001 e 2011 (em R$)

Preta/parda Branca Outras TOTAL

2001 R$ 612 R$ 1.477 R$ 3.296 R$ 1.126

2011 R$ 1.039 R$ 2.019 R$ 1.976 R$ 1.541

Taxa de expansão 70% 37% -40% 37%Fonte: Sebrae, a partir de processamento dos dados do IBGE (PNAD)Nota: dados já deflacionados

Número de donos(as) de negócio por posição na ocupação no mercado de trabalho (Por raça/cor, em 2011)

Preta/parda Branca Outras TOTAL

Conta Própria 10.170.687 92% 9.283.954 81% 210.246 80% 19.664.887 86%

Empregador 913.340 8% 2.210.659 19% 51.758 20% 3.175.757 14%

TOTAL 11.084.027 100% 11.494.613 100% 262.004 100% 22.840.644 100%Fonte: Sebrae, a partir de processamento dos dados do IBGE (PNAD 2011)

1211

108

76 6

5 43 3 3

2 2 2 2 2 2 21 1 1 1 1 1 1 1 0,4

BA SP MG PA RJ CE MA PE CE GO PI AM PB MT ES RN SE MS RO DF TO SC AC AP RRRSALPR

Distribuição por regiões do País (2011)

Distribuição dos donos de negócios (Pretos e pardos por UF -2011)

1520

5

41

17 19

8 7 8

30

4639

6

25

14

Norte Nordeste Centro-Oeste Sudeste Sul

Fonte: Sebrae, a partir de processamento dos dados do IBGE (PNAD 2011)

PretoBrancaOutros

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“Identificar, qualificar e formar empreendimentos e

empreendedores quilombolas são medidas que podem inserir os quilombolas na

cadeia da produção cultural.”

publicação definitiva do título. O Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) é órgão federal responsável pela regula-rização fundiária das terras quilombolas. Mesmo nesse cenário, o governo federal, em ação coordenada pela Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Ra-cial (SEPPIR), tem avançado para imple-mentar políticas públicas em comunida-des quilombolas a partir da certificação de autodefinição. É o caso dos Programas Minha Casa, Minha Vida; Brasil Sem Misé-ria; Assistência Técnica e Extensão Rural Quilombola; Programa de Aquisição de Ali-mentos (PAA), emissão de Declaração de Aptidão ao Pronaf; Bolsa de Assistência Estudantil para estudantes universitários quilombolas, matriculados em universida-des públicas federais, aposentadoria es-pecial para quilombolas; Pontos de Cultu-ra, assistência jurídica, entre outras ações do Governo Federal.

Os processos de titulação dos territórios das comunidades de remanescentes de quilombos sofreram um influxo a partir de 2011, com menor número de títulos emitidos. De que forma isso reflete na formulação de políticas de inclusão dessas comunidades?

A titulação de território quilombola é um processo difícil, tendo em vista a complexidade técnica, jurídica e admi-nistrativa que tem início na certificação da Fundação Cultural Palmares (FCP/Minc), produção do Relatório Técnico de Identificação e Demarcação (RTID) até a

Entrevista: Alexandre Reis - Diretor da Fundação Cultural Palmares/MinC

Empreendedorismo quilombolaAs comunidades de remanescentes de quilombos também são abrangidas pelo projeto Brasil Afroempreendedor.

Doze serão escolhidas pela Funda-ção Cultural Palmares para partici-parem das ações do projeto. Nesta

entrevista, o diretor do Departamento de Proteção ao Patrimônio Afro-brasileiro da Fundação Cultural Palmares, do Minis-tério da Cultura (FCP/MinC), Alexandre Reis, discorre sobre as políticas públicas implementadas nesses comunidades pelo governo federal. Alexandre aponta iniciativas, inclusive na área do empreen-dedorismo, que estão auxiliando os rema-nescentes de quilombos a garantirem o desenvolvimento de suas comunidades. Veja na entrevista a seguir.

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“Concomitante ao acesso a terra, é preciso ampliar e aprofundar as ações de melhoria da qualidade de

vida dos quilombolas”

Que medidas podem ser estimuladas para a inclusão de comunidades remanescentes de quilombos a partir do empreendedorismo?

O Edital NUFAC, o projeto Mapeamen-to do Patrimônio Cultural Quilombola e os editais, em parceria com a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), os programas Imagens da Memória e Ideias Criativas também são ações da FCP/Minc para apoiar o desenvolvimento do empre-endedorismo quilombola. A Assistência Técnica e Extensão Rural Quilombola, do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), é outra ação do governo federal que estimula o empreendedorismo.

A questão da propriedade da terra é decisiva para a sobrevivência das comunidades de remanescentes de quilombos e para o desenvolvimento de políticas públicas. Mas sabe-se que este é um problema secular no Brasil, que enfrenta muitos obstáculos. Como fazer dessas comunidades participantes efetivos do processo de desenvolvimento nacional, superando o obstáculo da concentração da terra?

A FCP/Minc atua para a preservação do patrimônio quilombola como herança para a cultura negra de matriz africana, e nesse sentido reconhece a necessidade de avanços nas questões relacionadas à regularização fundiária dos territórios, tendo em vista a garantia de um direito fundamental consagrado na Constitui-ção Federal. Concomitante ao acesso a terra, é preciso ampliar e aprofundar as

ações de melhoria da qualidade de vida dos quilombolas no sentido de superar o analfabetismo, garantir oportunidades no mercado de trabalho, promover a saúde integral dessas populações, como ações básicas para o acesso e difusão da cul-tura negra.

As iniciativas no campo da economia criativa são frequentemente apontadas como alternativas para comunidades com forte identificação com o campo da cultura, em seu sentido amplo. Mas o Brasil ainda é um dos países com menor índice de desenvolvimento de iniciativas nesse campo da economia. Este pode ser um caminho para o desenvolvimento das práticas econômicas das comunidades de remanescentes de quilombos? De que forma?

Sim. Identificar, qualificar e formar empreendimentos e empreendedores quilombolas são medidas que podem inserir os quilombolas na cadeia da pro-dução cultural. A parceria da FCP/MinC com a UERJ, inclusive, tem esse objetivo. Destacamos que no Plano Nacional de Economia Criativa existe a previsão do atendimento às comunidades quilombo-las, a fim de implementar ações de de-

senvolvimento da produção, circulação e promoção de bens e serviços dessas co-munidades.

Um dos princípios apontados pelos estudiosos da economia criativa é a tolerância, que parte do pressuposto da inclusão de minorias étnicas e religiosas. A discriminação e o preconceito são cada vez mais reconhecidos como entraves para o desenvolvimento global dos países, mas quase sempre do ponto de vista dos direitos humanos. Claro que reduzir tudo à economia é sempre um problema, mas seria possível também mensurar prejuízos econômicos a partir dessas práticas condenáveis, e essa não seria uma forma inovadora (embora dúbia) de lidar com essa questão?

A intolerância, o ódio religioso, o racismo são crimes previstos no orde-namento jurídico brasileiro, e assim de-vem ser tratados. Evidente que práticas objetivas, e principalmente subjetivas, de preconceito e de discriminação ra-cial dificultam as oportunidades econô-micas e sociais da população negra. As discrepâncias salariais entre brancos e negros no mercado de trabalho são provas dessa realidade. A promoção da igualdade racial pressupõe exata-mente o estabelecimento de ações no campo do direito econômico, com vis-tas à superação das desigualdades, e nesse quadro insere-se a experiência envolvendo a economia criativa, empre-endedorismo, cotas no ensino superior, apoio às manifestações culturais das comunidades negras.

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O que é a UIM?

Unidos por uma língua comum e um desejo de trabalhar no tema do fortalecimento da democracia e da

descentralização de assuntos territoriais locais, a União Iberoamericana de Muni-cipalistas (UIM) é hoje uma associação internacional de pessoas que, de forma pluralista, com personalidade jurídica própria e com plena capacidade de exe-cução, trabalham para a construção de cidades amigáveis e inclusivas. Somos pessoas que trabalham com pessoas para as pessoas e que, como programa anexo à Secretaria Geral Iberoamericana

(SEGIB), trabalha junto a uma rede de municípios espanhois e da Iberoaméri-ca para melhorar o trabalho municipal, transformando-os nos líderes do espaço local na América e na Península Ibérica.

Há quanto tempo ela existe e porque nasceu?

A UIM nasceu em 1991 por iniciati-va de líderes políticos e técnicos muni-cipais da Espanha e da Iberoamérica.

Quais são seus principais objetivos?

Promover as relações de coopera-

ção e intercâmbio entre municípios, pessoal dos governos locais e estudio-sos e pesquisadores de autonomia e desenvolvimento local; fomentar ativi-dades que favoreçam o desenvolvimen-to das autonomias locais; estimular a participação cidadã na gestão dos in-teresses que representam; defender os interesses municipais e sua atividade em organizações nacionais e interna-cionais; capacitar e aperfeiçoar os res-ponsáveis pela gestão local.

De que forma a UIM está organizada?

A UIM está organizada da seguinte

Nesta entrevista, o Secretário-Geral da União Iberoa-mericana de Municipalistas (UIM), D. Federico Cas-tillo, fala sobre a importância da organização na pro-

moção da igualdade racial e de gênero, além das atividades de auxílio à gestão das administrações públicas locais, sua

função principal. Dedicada a promover o desenvolvimento de políticas públicas junto às várias instâncias da Administração Pública na América Ibérica, a UIM está presente em vários pa-íses da América Latina, além de Espanha, local de sua sede, e em Portugal. No Brasil, a UIM é representada pelo Instituto

UIM quer ampliar parcerias na América Latina

II Cúpula Iberoamericana de Gênero celebrada este ano em Aguascalientes (México), com a participação de mais de 600 pessoas

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maneira: Assembleia Geral, Conselho de Direção, Presidência, Vice-Presidên-cia, Secretaria Executiva Geral, Gabine-te Técnico da Secretaria Geral, Tesoura-ria, Escola Superior do Governo Local, Instituto de Investigação Urbana e Terri-torial e Agência de Cooperação Técnica.

Em que países a UIM está presente?

A UIM está presente em todos os pa-íses da América Latina e na Península Ibérica e é representada por meio de seus quase 4000 membros associados. Ela também tem representação, atra-vés do seu Conselho Consultivo, na Ar-gentina, Chile, México, Equador, Bolívia, Nicarágua, Cuba e Espanha. Há tam-bém os Territórios UIM, que são nossas sedes territoriais nos seguintes países: Argentina (Fundação Cidadãos 365); México (Instituto para o Fortalecimento do Municipalismo e Desenvolvimento Integral de Governos Locais – INTEGRA-MUN); México (Locallis, Especialistas em Desenvolvimento Local); Honduras, El Salvador e Nicarágua (NORTE SUL Cooperação - COONS); Colômbia (Fun-dação Iberoamericana para a Democra-cia e o Desenvolvimento Local – FUNI-DEL); Brasil (Instituto Adolpho Bauer); Chile (Instituto Latinoamericano de Ca-

pacitação em Gestão Pública – IGEP); Equador (ECUAGOVERMENT); Venezue-la (Fundação Iberoamericana de Estu-dos Avançados Profissionais – FIAEP); e República Dominicana (Centro Integral de Desenvolvimento Local – CIDEL)

Quais são suas principais atividades?

A UIM tem vários instrumentos de cooperação com os governos locais da América Latina e da Península Ibérica: atividades acadêmicas e formativas, através de cursos, certificações, espe-cializações, programas de mestrado, doutorado e pós-doutorado. Trabalha-mos nas modalidades virtual, semipre-sencial e presencial. Desenvolvemos assistências técnicas internacionais, eventos internacionais e participamos de licitações com organismos multila-terais como o BID, PNUD, EuropeAID, ONUMulheres, entre outros. Também incentivamos a pesquisa e a transferên-cia de conhecimento por meio de bol-sas de estudo e de pesquisa, publica-ções especializadas (El Edil, Sinteses, Monografias, VoxLocallis, entre outras), o Centro de Documentação Virtual, a biblioteca especializada e a rede de universidades de que participamos. De-senvolvemos trabalho em rede, através

de nossa Rede de Investigadores, as Redes de Conhecimento desenvolvidas em sete áreas temáticas, parcerias pú-blico-privadas e as redes de instituições (RIIDEL, RUDICEL e EMCODEL); essas iniciativas pretendem promover a boa governança, a democracia, igualdade e cooperação.

Quais são os cursos ofertados pela UIM e como podemos acessá-los?

Os programas oferecidos pela UIM podem ser vistos no site da organiza-ção (www.uimunicipalistas.org) e tam-bém no nosso catálogo de cursos on--line: http://www.pga.uimunicipalistas.org/catalogo. Os programas que atual-mente estão sendo oferecidos são os seguintes: Perito em Direção e Gestão Pública Local (http://www.pga.uimuni-cipalistas.org/catalogo/99), com Mes-trado em Direção e Gestão Pública Lo-cal (http://www.pga.uimunicipalistas.org/catalogo/101), Especialização em Gestão e Desenvolvimento Local (http//www.pga.uimunicipalistas.org/catalo-go/84), Especialização em Gerência e Marketing Político (http://www.pga.uimunicipalistas.org/catalogo/86), Ofi-cina da Dissertação de Mestrado UIM (http://www.pga.uimunicipalistas.org/

Grupo de alunos graduados no Mestrado em Direção e Gestão Pública da UIM

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catalogo/103) e Diploma Internacional em Comunicação Pública (http://www.pga.uimpgranada.es/catalogo/102).

O que são os Territórios UIM e como funcionam?

Os Territórios UIM constituem um ponto de encontro para os alunos e parceiros que em diferentes países da América Latina buscam preparar-se para melhorar as gestões das institui-ções em que se desenvolvem. Essas sedes territoriais compartilham progra-mas com o respaldo, validação e valida-de do nosso organismo, permitindo que os alunos que assistem as suas ativida-des possam, posteriormente, continuar a sua formação na sede ou campus virtual da UIM, com o objetivo - entre muitos outros – de completar o mestra-do em Direção e Gestão Pública Local UIM. Os territórios permitem uma maior proximidade com os governos locais em cada país, tornar-se um ponto de refe-rência para o desenvolvimento das ati-vidades da UIM e centralizar o esforço e trabalho institucional. Os Territórios são a UIM no seu país. Para saber mais sobre os territorios UIM, visite nossa pa-gina em www.territoriosuim.org.

A UIM tambem está presente no Brasil? Quais são as atividades da UIM no Brasil?

A UIM funciona no Brasil há mais de 10 anos com programas de ação e acordos com a Associação Brasileira de Municípios - ABM. No Brasil, há dois anos a UIM é representada pelo Insti-tuto Adolpho Bauer, que está envolvido nas atividades de promoção de ações UIM , como o Programa de Mestrado em Liderança e Gestão Local, a II Cúpula das Agendas Locais de Gênero realiza-da em 2013, entre outros. Além disso, o IAB desenvolve a linha de trabalho afrodescendente na área de Gestão da Diversidade.

Como a UIM se sustenta financeiramente? Como ela é mantida?

A UIM é financiada através de di-ferentes maneiras: a contribuição de seus quatro mil membros, as contribui-ções de redes de instituições (RIIDEL, RUDICEL e EMCODEL), projetos e lici-tações públicas de que participa, as contribuições da Fundação CIGOB e do cofinanciamento de entidades como a AECID, o SEGIB, entre outras.

A UIM também realiza consultorias para administrações públicas. Como funciona?

A UIM exerce funções de assistência técnica para governos iberoamericanos. Com mais de 20 anos de experiência, nossa rede de peritos atua em várias áreas do conhecimento. Além disso, a UIM tem trabalhado com governos locais em toda a América Ibérica, com agências internacionais como o PNUD, no Chile, a AECID, na Bolívia, Equador e Peru, com EuropeAid/AECID no Brasil, Chile, Argentina, Uruguai e Paraguai. Podem visitar nosso site http://www.uimunicipalistas.org/act ou entrar em contato com a Agência Iberoamericana de Cooperação Técnica: [email protected].

Em que a UIM pode contribuir para a melhoria da gestão pública em nosso país?

A UIM pode apoiar o seu trabalho através de conhecimentos e da trans-ferência de experiências de sucesso e replicáveis de outras nações da Amé-rica Latina e da Península Ibérica que acreditam e têm trabalhado com nosso organismo, e também através da forma-ção de quadros que trabalham na admi-nistração pública no Brasil. A UIM conta com experiência nas seguintes áreas: Gestão Pública e Modernização das Ad-ministrações Públicas, Gestão de Cida-des Sustentáveis (receitas fiscais, o es-paço urbano e sustentabilidade), Gestão de Políticas de Gênero, Gestão do De-senvolvimento Local, Gestão da Coope-ração Externa e Internacionalização das Cidades, Mudanças Climáticas, Gestão de Riscos e Desenvolvimento Sustentá-vel, Governança e Participação Cidadã, Relações Público-Privadas e Direitos Hu-manos e Gestão da Diversidade.

Como se organiza o trabalho de gênero da UIM?

Através da Unidade Técnica de Gê-nero da instituição que trabalha dia a

Reitor da Universidade Internacional Menéndez Pelayo (UIMP), D. César Nombela, e o Secretário Geral da UIM, D. Federico Castillo (esquerda)

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dia com a ONUMulheres e de outros organismos vinculados à temática, que preparam cursos, seminários e reuni-ões de caráter internacional em que se debate, se trabalha e constroi. A UIM também coordena a Rede Iberoameri-cana dos Municípios pela Igualdade de Gênero e trabalha junto da Agência Es-panhola de Cooperação em Desenvolvi-mento (AECID) no programa de constru-ção de agendas locais com enfoque de gênero GENÉRALO.

Este ano a UIM realizou no México uma cúpula. Como foi e que avaliação vocês fazem deste evento?

No mês de setembro foi realizada a II Cúpula Iberoamericana de Gênero de Aguascalientes (de 23 a 27 de setembro), que foi a continuação do trabalho feito há dois anos em Córdoba (Argentina). Este

evento foi assistido por mais de 600 pes-soas. Entre os resultados, destacou-se a constituição da Rede Mexicana de Mu-lheres, da Rede Iberoamericana de Mu-nicípios para o Gênero e a Declaração de Aguascalientes “Repensando as cidades desde a perspectiva de gênero”

Como a UIM vê hoje a ação das administrações públicas no combate ao racismo e na promoção de igualdade racial?

Acreditamos que ainda há muito que fazer desde a perspectiva das ad-ministrações publica na promoção da igualdade racial. Esforços no Brasil e na Colômbia ainda são insuficientes. Desde a UIM, através do Instituto Adol-pho Bauer, acreditamos que podemos potencializar este tipo de ação: sensibi-lizar os governos locais da América La-

Como contatar a UIM?Os dados de contato da UIM são: União Iberoamericana de Municipalistas, Plaza Mariana Pineda 9, 18009 Granada, Espanha, Telefone: +34958215047, Fax: +34958229767,Email - [email protected] Site - www.uimunicipalistas.org. Você pode ser um membro da UIM. Acesse - www.uimunicipalistas.org/#/enredate Redes sociais - www.facebook.com/uimunicipalistas | twitter: @uimunicipalista |linkedIn: es.linkedin.com/em/uimunicipalistas | google+: plus.google. com/+UIMGRANADAskype: uimunicipalistas

tina e da Península Ibérica, desenvolver uma rede de conhecimento sobre a ma-téria e promover políticas públicas que busquem a igualdade racial.

Quais as expectativas e perspectivas da UIM para o Brasil?

A UIM pretende fortalecer seu tra-balho no Brasil com o IAB. No ano de 2014 pretendemos contar com a ofer-ta de formação em português, através dos programas de formação contínua da UIM. Estamos estudando ações para realizar o XI Congresso Internacional da UIM no Brasil. Esperamos contribuir para o fortalecimento dos governos lo-cais no Brasil, com novas experiências e modelos de gestão; aprender com a grande experiência que têm os gover-nos locais brasileiros para replicar em outros governos da América Ibérica e ajudar a fortalecer a cooperação SUL--SUL no espaço local iberoamericano.

Que conhecimento vocês têm do Instituto Adolpho Bauer e qual avaliação vocês fazem dele?

Há vários anos a UIM trabalha com o Instituto Adolpho Bauer e, como Terri-tório UIM, desde o ano de 2012. Esta-mos convencidos de que o projeto que realiza o IAB é de alta qualidade e agre-ga valor ao trabalho da UIM no Brasil.

Grupo de alunos da Especialização sobre Planificação Estratégica Territorial que a UIM desenvolveu junto à CEPAL em Tandil (Argentina)

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Territórios locais de direitos das mulheres

As mulheres e homens municipalis-tas, no marco da II Cúpula Ibero-ameri-cana de Agendas Locais e Gênero: Re-pensando nas cidades desde os direitos, dos dias 23 a 27 de setembro de 2013.

Considerando:

1Que, em virtude da diferença das funções atribuídas a homens e mulheres que tenham sido cons-

truídas a partir de tradições, culturas e práticas históricas, podemos afirmar que as cidades são vividas de maneiras distintas pelos homens e as mulheres. Diferenças também construídas com base no gênero, existem múltiplas identi-dades e situações que estão na área ur-bana. Não é igual ser mulher ou homem, como tampouco é igual ser mulher rica e mulher pobre, mulheres mais velhas, as mulheres urbanas, camponesas ou indígenas; é uma infinidade de outros fatores e dimensões, são para integrar o atributo de ser mulher ou homem, cor-roendo os direitos dos cidadãos de dife-rentes sujeitos sociais, particularmente as mulheres.

2A planificação urbana e as políti-cas públicas relativas para o me-lhoramento de qualidade de vida

nas cidades dificilmente integram as mu-lheres para si mesmas, apesar de ser--lhes, por seu papel, especialmente as de “cuidadoras”, as principais usuárias dos serviços e espaços urbanos, particu-larmente sob os cuidados de outras pes-soas: crianças, pessoas doentes, com deficiência, senhores. O preconceito dis-criminatório no planejamento físico não considera tais aspectos, dificultando o acesso e usufruto de direitos, recursos e participação ativa na democratização da esfera pública em uma cidade que ofereça cenários inclusivos, condições e oportunidades iguais para seus habitan-tes permanentes ou temporários.

3Que as desigualdades de gêne-ro continuam sendo percebidas como uma questão de “mulheres”

e, portanto, ações para capacitar as mulheres, para atender às suas neces-sidades específicas ou exigências são geralmente marginais ao bem-estar, ig-norando ou desprezando não só o ime-diato, mas também a necessidade de contribuir de forma estratégica para as mudanças que podem levar à remoção

das causas estruturais da desigualdade.

4Que, apesar de todo o progres-so na legitimação das mulheres como sujeitos sociais por si só, há

uma predominância de mulheres entre a população abaixo da linha de pobreza, o que é reconhecido como a “feminiza-ção da pobreza”. Isso provoca menos oportunidades para as mulheres, es-pecialmente aquelas que desenvolvem exclusivamente o seu papel doméstico, principalmente no âmbito privado, em contextos de pobreza, como a falta de acesso a recursos, aprofunda situações de desigualdade, pobreza e risco de violência como uma das características mais relevantes de gênero nas socieda-des locais da região latino-americana, dando esses números o impacto da eco-nomia urbana na vida das mulheres.

5A divisão sexual do trabalho segue sendo o desafio para avançar na igualdade de direitos. São as mu-

lheres a maioria no cuidado da reprodu-ção e das responsabilidades no âmbito privado, o que limita e define também suas possibilidades de desenvolvimento pleno e sua efetiva integração no espaço público, a medição da pobreza do tempo associada a este e a discriminação labo-

Repensando as cidades desde a perspectiva de gêneroEntre os dias 23 a 27 de setembro,

a União Ibero-americana de Munici-palistas realizou a II Cúpula Ibero-

-americana de Gênero de Aguascalientes, no México. A primeira cúpula foi realiza-da há dois anos em Córdoba (Argentina). Mais de 600 pessoas participaram do evento do México. Entre os resultados,

destacou-se a constituição da Rede Me-xicana de Mulheres, da Rede Ibero-ame-ricana de Municípios para o Gênero e a Declaração de Aguascalientes “Repen-sando as cidades desde a perspectiva de gênero”. A cúpula é concebida como um espaço a partir do qual se busca pro-mover a construção de novos modelos de

cidade, a partir da visão de justiça e de igualdade de gênero como premissa para o desenvolvimento local. A construção de novos modelos de gestão é indissociável da incorporação de enfoques de gênero nas agendas públicas locais. A seguir, apresentamos a íntegra da Declaração de Aguascalientes.

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ral e salarial contra as mulheres, entre outras, condicionando o desfrute das cidades, o acesso, uso e controle sobre seus recursos e oportunidades, incluin-do o acesso ao trabalho remunerado, para consolidar a sua autonomia e direi-tos econômicos.

6Que o trabalho reprodutivo e do-méstico que realiza a maioria das mulheres se vincula ao trabalho

voluntário, no qual são a maioria absolu-ta no mundo inteiro. Todos os que contri-buem para “naturalizar” a contribuição das mulheres e portanto, invisível para a contribuição econômica fazendo a so-ciedade aprofundar na desvalorização de seus esforços e custos pessoais na melhoria da qualidade de vida urbana. Esta contribuição em geral envolve tra-balho produtivo, reprodutiva e trabalho comunitário (Moser), sendo para mulhe-res o tempo sempre escasso.

7O princípio da igualdade e não dis-criminação inclui obrigações dos Estados, como a defesa, proteção

e divulgação do direito de garantia das mulheres políticas a participar nos as-suntos públicos. E a assimetria de gêne-ro persiste no número de prefeitas, que mal chega a 10% nos governos locais da América Latina e do Caribe, e os cargos de eleição edilícios e dentro da adminis-tração pública dos municípios perpetu-am a visão androcêntrica na construção de agendas públicas com base em uma suposta “neutralidade de gênero”, que envolve a omissão ou marginalização das políticas públicas com enfoque de gênero e atenção para os interesses es-pecíficos das mulheres. Reconhecendo assim mesmo que a presença da uma mulher no comando do governo local, e mulheres nos espaços que tomam deci-sões, não garante uma agenda de polí-ticas públicas de igualdade de gênero e promoção dos direitos das mulheres.

8Que a globalização colocou a cida-de no centro do debate em muitos aspectos que contribuem para o

desenvolvimento e as competições da mesma enquanto uma fragmentação crescente do território urbano é eviden-ciada, segregando grupos homogêneos (Borja, Sassen, Burgess Castells, ou-tros). Essa segregação territorial e social agrava as condições de pobreza e de subordinação em que a maioria são mu-lheres. As condições do território urbano variam de acordo com o setor econômi-co e social, por um lado, todos os servi-ços e o desenvolvimento urbano de nível superior e de outra extensão de territó-rios carentes de direitos (Falu). Nas áre-as de pobreza que encontramos o maior número de casas de famílias chefiadas por mulheres solteiras responsáveis por elas e são essas casas (CEPAL 2012) que têm o maior número de crianças.

9 Que os espaços públicos urbanos são geralmente projetados a partir de uma visão masculina. O qual é

necessário acrescentar que pelo menos em certos horários e dias da semana esses espaços de socialização e trocas são transformados em cenários hostis. O medo, seja este por real criminalida-de ou a percepção dela mesmo, de que ela cria um círculo vicioso de medo e esvaziamento dos espaços públicos que alimentam os medos e perda de qualida-des urbanas. Violência e insegurança da cidadania parecem afetar mais as mu-lheres. América Latina e no Caribe rela-tam mais da metade dos 25 países com maior incidência de feminicídio (Informe 2012 Small Arms Survey).

10 O tráfico de seres huma-nos atingiu proporções alarmantes: entre 2007 e

2010, a maioria das vítimas de tráfico de seres humanos que foram detectados em todo o mundo são mulheres. As cida-des não estão imunes aos crimes globa-lizados, como tráfico de seres humanos e, especificamente, das mulheres víti-mas de tráfico para exploração sexual. Essa âncora espacial de delito interna-cional são as cidades, que muitas vezes, com naturalidade, são protagonistas de

uma forma de violência que se reproduz dia a dia, facilitada por um contexto so-cial, legal e político que não toma como prioridade o combate ao tráfico.

11 Que nas cidades são encenadas complexas mudanças estruturais

localizadas, entre muitas outras conse-quências, em conflitos armados, o de-semprego, a migração e o feminicídio, com experiência do entrelaçamento das opressões de situações de raça, gênero e classe. O racismo e a mercantilização patriarcal do corpo das mulheres está ameaçando seu cotidiano.

12 Os estilos de desenvolvi-mento global (baseado em interesses macroeco-

nômicos) afetam o desenvolvimento lo-cal pelos efeitos e impactos em seus sis-temas e recursos naturais, como na vida humana, onde novamente os mais afe-tados são os grupos vulneráveis, como as mulheres, meninos e meninas, pelo impacto de sua saúde, a economia fami-liar, o acesso à água segura, ambientes saudáveis e até mesmo a migração for-çada na condição de deslocados.

13 A declaração de Córdoba “Construindo modelos para a igualdade” (2011)

definiu um eixo específico em relação à prioridade de políticas e estratégias que potencializem a inclusão social nas cida-des, proporcionando princípios e ações orientados a garantir o direito das cida-des às mulheres, o direito de circular, trabalhar e desfrutar da mesma. Esta demanda incorpora a planificação da perspectiva de gênero das cidades.

14 E, recuperando a Carta Internacional pelos direi-tos das mulheres na ci-

dade, e as contribuições realizadas por quem participou do foro virtual sobre “O que as cidades fazem para avançar a igualdade entre os gêneros?”:

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A II Cúpula Ibero-americana de Agendas Locais de Gênero, Cidades dos Direitos das Mulheres resolve:

Adotar a presente declaração, resultado de reflexões multidisciplinares, multiculturais e os sentimentos de mulheres e homens mu-nicipalistas participantes nesta II Cúpula.

Convidar os governos locais da América Latina, associações nacionais, regionais e internacionais de municípios, associações e redes de mulheres eleitas às autoridades locais, os mecanismos nacionais para as mulheres, as organizações da sociedade ci-vil, e as diversas instâncias, e os homens e mulheres comprometidos com a igualdade de gêneros, a aderir à presente declaração e promover políticas públicas, que teve como objetivo efetivar os princípios, valores e pres-suposto contidos na mesma ação.

Primeiro - Repensar nas cidades e nos direitos das mulheres

A organização, modelo e arquitetura das cidades, seus espaços e tempos deve aten-der as considerações de gênero, geração e intercultural, sobretudo as necessidades es-pecíficas que surgem desde o âmbito privado. Uma cidade inclusa nas perspectivas de gê-nero é aquela que, em primeiro lugar, mostra uma clara vontade política em seus distintos atores sociais e políticos de priorizar na agen-da pública temáticas e problemáticas de gê-nero, repensar as ações e políticas públicas que promovam a igualdade de gênero. Uma cidade compatível para homens e mulheres é aquela que flexibiliza, acolhe, garanta e am-plia os serviços públicos, trazendo escolas de qualidade, e assim como pontos de assis-tências sanitárias em zonas habitacionais, ampliando as estações e horários de trans-portes públicos, melhorando a infraestrutura e a acessibilidade dos espaços urbanos e ru-rais, e criando redes de apoio social e acesso ao conhecimento para a conciliação da vida público-privada, entre outras.

Segundo - Identificar os impactos diferenciados da planificação territorial

A incorporação da perspectiva de gênero no planejamento das cidades demanda pri-meiramente a análise das lacunas de gênero cruzadas com outras variáveis como classes, idade, etnia, raça, deficientes, privação de

liberdade, habitante de territórios no âmbi-to rural/urbano, com diversidade em sua identidade e orientação sexual, condição de imigrantes, refugiados, deslocados, situação socioeconômica desfavorável, afetados por guerras, conflitos armados e, neste sentido, é imprescindível que os governos locais e, so-bretudo, as instâncias nacionais e regionais, promovam a geração de estatísticas desagre-gadas, de modo a poder realizar uma aborda-gem holística e ajustada às necessidades de seus cidadãos e cidadãs.

Terceiro - Incorporar a perspectiva de gênero nas políticas de acesso ao solo, habitação e habitat

O projeto habitacional e urbano deve re-conhecer as necessidades e interesses das pessoas e das famílias, a fim de assegurar que eles fornecem as utilizações e papéis que determinam a função de mobilidade do gênero e o próprio desenvolvimento das pessoas. Junto a ele, é necessário que as políticas habitacionais flexibilizem o acesso e controle sobre as habitações por parte das mulheres, através de créditos, subsídios e assistência para a autoconstrução, propor-cionar proteção e garantia de permanência suficiente em habitação ou abrigo em casos de violência doméstica, viuvez ou em casos de mulheres chefes de família desemprega-das, e outras situações específicas.

Quarto - Proporcionar a convivência social, a mobilidade segura e cidadania de mulheres ativas

A fragmentação das cidades aprofunda expressões de desigualdade, como a própria violência urbana, que aumenta a percepção de insegurança, restringindo gozo e apropria-ção dos espaços urbanos, especialmente por mulheres urbanas e a presença, participação e utilização de serviços públicos com quali-dade, comodidade e calor para as mulheres rurais. Neste sentido, é necessário que:

A) O planejamento físico de territórios, espaços de design, iluminação e mobiliá-rio urbano respondendo às necessidades e usos de moradores e moradoras; conside-rando as rotas e tempos de uso e trânsito que demandarão os demais serviços de mobilidade e transporte de maneira que, em seu conjunto, inspirem e assegurem ambientes mais seguros e livres da violên-cia.

B) Perspectiva de gênero no problema da (in)segurança é projetada para incorpo-rar a coleção, produção, dados de registro, acompanhamento e sistematização de da-

dos e informação sobre a violência contra as mulheres; como permanentes insumos para o desenvolvimento, implementação e gestão de políticas públicas visando à pre-venção e à erradicação da violência contra as mulheres (Ex.: observatórios de violên-cias contra as mulheres).

C) Os governos municipais desenvol-vem políticas de prevenção e atenção à violência de gênero, tanto dos que ocorrem na esfera privada e na esfera pública, in-cluindo equipe especializada para polícias, sensibilizando e com perspectivas de gê-nero e modelos de desenvolvimento eco-nômico, especialmente para mulheres que sofrem violência.

Quinto - Considerar o enfoque de gênero na gestão ambiental dos territórios locais

Os governos locais não estão isentos dos problemas ambientais e de seus efeitos e im-pactos diferenciados em razão de gênero, por isso devem:

A) Exigir em seus estados ou governos nacionais fortes políticas de mitigação ambiental, efetivos sistemas de contro-le ambiental e responsabilidade social, como verdadeiras ações que melhorem a qualidade de vida da população em geral e dos grupos vulneráveis em específico.

B) Os governos locais devem iden-tificar o efeito e impacto dos tipos de contaminação ambiental na população e de maneira direcionada nas popula-ções vulneráveis (mulheres e crianças) e programar políticas locais que envolvem os atores responsáveis no contexto de responsabilidade social para garantir o acesso à água potável, sistemas de saú-de abordando os problemas identificados pela poluição ambiental, ambientes sau-dáveis e acesso sustentável aos seus re-cursos naturais.

Sexto - Promover a integração econômica das mulheres

É fundamental reconhecer, medir e valo-rizar a contribuição para o desenvolvimento da maioria das mulheres através do trabalho reprodutivo não remunerado e os serviços na comunidade, visibilizando seus custos na diminuição de oportunidades para o de-senvolvimento pessoal das mulheres e como fonte permanente de discriminação. Assim mesmo, é necessário medir e valorizar a participação de mulheres nos serviços que prestam na comunidade como um conjunto de atividades que elevam a qualidade de vida da população. Com isso, deve-se promover o

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empoderamento econômico das mulheres e o desenvolvimento local através de política de igualdade e luta contra a pobreza, sem estereótipos ou atribuição dos papéis de gê-nero, de modo que permitam sua inserção no mercado laboral com programas produtivos e atividades de capacitação que suprimam e eliminam a segregação no local de trabalho e as diferenças salariais que discriminam as mulheres. Também é preciso integrar políti-cas públicas e programas que fortaleçam a capacidade das mulheres rurais e indígenas para melhorar suas habilidades de empreen-dimento econômico e um mercado justo para seus produtos.

Sétimo - Avançar no sentido de responsabilidade social para a economia do cuidado

A divisão sexual do trabalho restringe e limita a igualdade de oportunidades para as mulheres, por isso, é inevitável um maior en-volvimento dos homens no trabalho domésti-co e cuidado como parte da vida familiar e a geração de uma nova cultura social. Enquan-to isso, os governos locais devem garantir a acessibilidade às instalações e serviços de proximidade, o cuidado das crianças e de-pendentes, refeitórios, centros de ensino, es-colas e serviços de saúde, entre outros, rela-cionados com rotas de transportes públicos.

Oitavo - Conciliar políticas de igualdade a partir da diversidade

A inclusão e a justiça social não só repre-sentam a igualdade de gênero a partir das diferenças entre homens e mulheres, mas também a necessidade de conciliar as po-líticas que incluem a diversidade de gênero na função social da idade, estado civil, etnia, raça, religião, a orientação sexual, a cultura e as diferenças socioeconômicas, envolvendo trajetórias, dinâmicas e necessidades espe-cíficas de diferentes perspectivas, promover a irmandade e complementaridade entre as mulheres urbanas e rurais. As cidades devem ser, portanto, construídas socialmente sobre o respeito à diversidade e às diferenças asse-gurar a igualdade de direitos e de oportunida-des como o pilar de convivência democrática, pacífica, saudável e solidária.

Nono - Garantir os direitos sexuais e reprodutivos

Independentemente de em alguns paí-ses a saúde reprodutiva e sexual, em certas áreas de intervenção social, não serem com-petência direta dos governos locais, a admi-nistração municipal que incentivar as suas

políticas sócias nos centros médicos, e as vá-rias unidades de bem-estar social, incentivar a mulher a decidir livre e responsavelmente, sem estar sujeita à coerção, discriminação ou violência, em questões como a escolha do casal, a decisão de ser sexualmente ativo ou não, receber educação sexual, decidir se quer ter filhos ou não, e quando, e vendo a maternidade como uma opção e não como uma obrigação, entre outras.

Décimo - Garantir a construção coletiva e inclusiva da cidade

O espaço local constitui o cenário idôneo para abrir espaços e reforçar processos par-ticipativos e de inclusão através de diálogo entre governo e sociedade civil, de concer-tação, construção e gestão democrática da cidade. Os governos locais são, por excelên-cia, os instrumentos para promover o plane-jamento e gestão participativa das cidades e a cidadania e para promover e potencializar a coesão social. Neste sentido, é imprescin-dível facilitar a participação das mulheres, proporcionando que os envolvidos contribu-am substantivamente como sujeitos sociais e políticos na tomada de decisões. Ao mesmo tempo, programar atividades que promovam a conscientização do poder individual e co-letivo, por meio do investimento de recursos em treinamento e formação do público e, as-sim, a geração de liderança participativa e inclusiva, que permitam que as mulheres pro-movam propostas para melhorar sua autoria e que recuperem sua dignidade e façam valer os seus direitos como pessoas e cidadãos.

Décimo primeiro - Fortalecer os mecanismos municipais de gênero

Agenda pública sensível ao gênero se consolida quando o foco de igualdade ocupa um lugar transversal e articulador de políti-cas públicas; para isso é necessário fortale-cer as instituições e liderança e capacidade de execução e aplicação de mecanismos municipais, através de sua hierarquização e a alocação de recursos suficientes para de-sempenhar as suas funções e objetivos. Qua-dro institucional que será reforçada na medi-da em que as instituições democráticas que atendem as vozes das mulheres, em especial as mulheres organizadas em nível da comu-nidade, as ONGs e especialistas que possam contribuir para a melhoria das condições de vida em igualdade de oportunidades para mulheres e homens. Os orçamentos sensí-veis ao gênero e os orçamentos participativos com enfoque de gênero são ferramentas im-prescindíveis para implementar, sustentar e

renovar as agendas públicas locais de gênero e, assim, também é necessário implementar mecanismos de responsabilização que pro-movem a visibilidade de indicadores locais ou regionais e orçamentos sensíveis ao gênero, necessários para fazer efetivas políticas com inclusão, equidade e justiça social.

Décimo segundo - Fortalecer a democracia e as ações afirmativas de proteção e garantia dos direitos políticos

A democracia se fortalece com a presen-ça equilibrada de mulheres e homens parti-cipando dos assuntos públicos, e para con-seguir isso exige um enquadramento jurídico que inclui ações afirmativas que garantem a igualdade de tratamento e por conta do gê-nero, tanto na nomeação de candidatos para preencher os cargos de eleição popular, ou posições dentro da administração pública local. Os governos locais deverão formular e promover as reformas necessárias de harmo-nização legislativa que garantem o principio de igualdade substantiva e efetiva que consti-tui um mandato, e acompanhar a sua aplica-ção integral através da máquina institucional, redes e agentes sociais.

Declaração finalConforme acima, solicitamos:

- aos estados, a cumprir com seus com-promissos na matéria de direitos humanos das mulheres para uma vida livre de violên-cias por condições de gênero; e para garantir que as políticas públicas que permitam que às mulheres participem do desenvolvimento das localidades não se eliminem nos processos de alternância de governos, ao contrário, adicio-nam as ações e políticas que permitem menos tempo para alcançar a igualdade substantiva.

- a todas as pessoas, a responsabilidade na participação política, promovendo o uso inclusivo das cidades como espaço público e equitativo;

- os órgãos competentes, que adotem ações concordantes com a declaração assi-nada.

- e os governos locais, instituições públi-cas distinguidas como territorialidades capa-zes de projetar, programar e renovar planos abrangentes e participativos, políticas e orça-mentos, a partir de uma perspectiva de gêne-ro, articulando a cidade e o território como um espaço compartilhado, de conciliação e cons-trução democrática melhor e mais justa com qualidade de vida para todas e todos.

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