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RILKIM TAVARES RODRIGUES
ABORTAMENTO DO ANENCÉFALO: UMA QUESTÃO DE BOM SENSO
Belém
Pará
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RILKIM TAVARES RODRIGUES
ABORTAMENTO DO ANENCÉFALO: UMA QUESTÃO DE BOM SENSO
Monografia apresentada como
Requisito para obtenção do Grau
de Bacharel em Direito da Disciplina
TCC – II, Ministrada pelo MS.
José Miranda.
Belém
Pará
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RILKIM TAVARES RODRIGUES
ABORTAMENTO DO ANENCÉFALO: UMA QUESTÃO DE BOM SENSO
BANCA EXAMINADORA
______________________________
ORIENTADOR: MS. Paulo Rogério
________________________________
MEMBRO
________________________________
MEMBRO
DATA DA DEFESA: ___/___/___
CONCEITO: ________________
Belém
Pará
4
A minha incomparável mãe, presente em todos os minutos da minha vida. Por sua fé, seu
carinho, suas palavras amigas, Obrigado!
5
Agradeço a todos aqueles que acreditaram em mim, e, Passaram-me sabedoria e forças
e que de forma direta ou indireta contribuíram para realização deste trabalho monográfico,
e em especial ao Profº. MS. José Miranda que muito me apoiou, para conclusão do
mesmo.
6
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO......................................................................................................... 8
2. HISTÓRICO DO ABORTO ..................................................................................... 9
2.1DEFINIÇÕES .......................................................... .......................................... 11
2.2PREVISÂO LEGAL ............................................................................................... 12
2.3SUJEITO ATIVO ................................................................................................... 12
2.4SUJEITO PASSIVO ............................................................................................. 12
2.5 BEM JURÍDICO TUTELADO ............................................................................... 13
2.5OBJETO MATERIAL ........................................................................................... 13
2.7 CAUSAS DE AUMENTO DA PENA ................................................................... 14
2.8 EXCLUDENTES DE ILICITUDE ........................................................................... 14
2.8.1.Aborto Necessário ......................................................................................... 15
2.8.2 Aborto Humanitário ....................................................................................... 16
3. A ANENCEFALIA ...................................................................................................18
3.1 MEDICINA X DIREITO ...........................................................................................20
3.2 A VISÃO RELIGIOSA ........................................................................................... 21
3.3 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ................................................................. 23
4. O HISTÓRICO NORMATIVO DO TEMA ............................................................. 26
4.1. A INSUFICIÊNCIA DO DIREITO LEGISLATIVO ............................................ 27
7
4.2. ABORTO DO ANANCÉFALO SOB O PRISMA CONSTITUCIONAL ............. 29
4.3. A SOLUÇÃO PENAL .......................................................................................31
CONCLUSÃO....................................................................................................... 36
REFERENCIAS ................................................................................................... 37
8
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho BUSCA TENTAR esclarecer alguns pontos, com
destaque Para a posição do nosso atual Código Penal diante do aborto, e de que
forma prossegue sua reformulação, além de mostrar que muitas vezes a lei nos
parece obscura, confusa, sendo necessária a função de analisá-la com cautela.
Que a solução dos problemas sociais nem sempre estará nas normas de direito,
pois o fato gera a norma, e quem cria a norma é a sociedade, que por fim, é a
causadora do fato. E o mais importante, que é tentar fazer com que o leitor crie
questionamentos sobre tal tema que por muito tempo irá gerar polêmica.
No capitulo I, será feita uma abordagem geral sobre o aborto, desde as
visões primeiras sobre a problemática, até as definições legislativas do atual código
Penal. O capitulo II traz o núcleo deste trabalho, já que trata da Anencefalia
propriamente dita, onde é feita um apanhado geral sobre a questão, tratando
inclusive da posição religiosa em relação ao assunto. Por fim, no terceiro capitulo é
feita uma abordagem legislativa ampla acerca da Anencefalia, demonstrando até
mesmo a visão Constitucional do assunto e, posteriormente, a dada solução à
questão pelo direito Penal propriamente dito.
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2. HISTÓRICO DO ABORTO
O aborto é e foi muito perigoso, pelo que era raro além do que , quando se
realizava, ou falhava ou matava mãe filho. O resultado de tudo isso é que em
épocas passadas o infanticídio acabou por ser relacionado ao aborto. A Igreja
Católica condenava veementemente o aborto, mas os seus teólogos e moralistas
discutiam diferentes graus de gravidade. Geral, na Europa e na America as leis
civis seguiam a lei canônica.
Por volta de 1750 encontrou – se uma técnica de aborto que, embora continuasse
a matar muitas mães constituiu-se num “progresso”.
Na seqüencia da descoberta que permitia abortos com uma segurança um pouco
maior, a rejeição do aborto abrandou e este chegou ate mesmo a ser legalizado em
muitos estados. Vale destacar que, legal ou não, o aborto acabou se tornando uma
prática muito vulgar no século XIX. Contudo, a legalização teve por base os
conhecimentos científicos da época.
Pensava-se que cada espermatozóide é um homem que se limita a crescer dentro
do útero. Porém, em 1827 Karl Emst Von Boar descreveu pela primeira vez o processo de
concepção e em meados do século XIX os médicos estavam já completamente
convencidos da existência desse processo, iniciando-se ali uma campanha para proibir o
aborto realizada por vários médicos. A frase que todos pensam ter sido inventada pelo
vaticano “a vida humana começa no momento da concepção”, na realidade, data dessa
campanha iniciada pelos cientistas no século XIX. Outro slogan dessa campanha era
precisamente “adoção em vez de aborto”.
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O Código Criminal do Império de 1830 não criminalizava o aborto quando praticado
pela própria gestante, apenas aqueles realizados por terceiros, independentemente do
consentimento, ou não, da gestante. Na verdade, tal código criminalizava o aborto sentido
e o aborto sofrido, mas não o aborto provocado, ou seja, auto-aborto. O que ocorria era
que a punição era imposta somente a terceiros os quais interviessem no abortamento,
mas não a gestante, em hipótese alguma. Punia-se também o fornecimento dos meios
abortivos, mesmo que o mesmo não viesse a ser praticado, com uma criminalização dos
preparatórios, situação esta agravada se o sujeito ativo fosse médico, cirurgião ou similar.
Por sua vez, o Código Penal de 1890 já criminalizava o aborto praticado pela
própria gestante, porém a pena sofria um considerável atenuado nos casos em que era
praticado com a finalidade de ocultar a desonra própria. Ele distinguia o crime de aborto
havendo ou não a expulsão do feto, fato esse agravado quando ocorresse a morte da
gestante. Tal Código permitia também a pratica do aborto nos casos em que o mesmo
fosse necessário para salvar a vida da parturiente, punindo-se nesses casos, apenas
eventuais imperícias do médico ou da parteira que causassem a morte da gestante,
mesmo que culposamente.
O código Penal de 1940 trouxe três tipificações de aborto: aborto provocado (art.
124), quando a própria mulher se responsabiliza pelo abortamento; aborto sofrido (art.
125), quando o aborto ocorre sem o seu consentimento, em função da interrupção do
ciclo natural da gravidez por vias alheias ao seu consentimento; aborto consentido (art.
126), aquele em que a gestante consente que terceiro realize o abortamento. A legislação
penal desse período foi baseada na cultura, hábito e costumes vigentes na década de30.
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Após sessenta anos os avanços científicos e tecnológicos revolucionaram a ciência
médica, chegando ao ponto de poder definir com absoluta precisão possíveis anomalias
do feto e, conseqüentemente, a inviabilidade da vida extra-uterina. Deste modo, é
perfeitamente compreensível a orientação do Anteprojeto de Reforma da Parte Especial
do Código Penal, o qual autoriza à realização do aborto quando o nascituro apresenta
graves e irreversíveis anomalias físicas e mentais, incluindo-se, assim, o aborto eugênico
ou piedoso.
2.1 DEFINIÇÕES
A palavra aborto tem sua origem etimológica no latim abortus, derivado de aboriri
(“perecer”), composto de ab “(“distanciamento”, a parti de”) e oriri (“nascer”).
O aborto trata-se da destruição da vida antes do inicio do parto, ou então, é o período
que compreende desde a concepção até o inicio do parto, que é o fim da vida ultra-
uterina. Logo pode se dizer que o aborto acontece quando por algum motivo a vida ultra
uterina é interrompida, e que a causa desta interrupção não seja o nascimento da criança.
O aborto pode se dar espontaneamente, em função de problemas da saúde da
gestante acidentalmente, devido a acidentes no dia-a-dia, ou provocado, o chamado
aborto criminoso. As causas desta pratica são inúmeras, mas as que merecem destaque
são os de natureza moral, nos casos em que a mulher não tem condições para sustentar
o filho, moral, devido gestação havido extra-matrimonio, ou individual, havido por mera
vaidade, egoísmo, horror a responsabilidade.
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2.2 PREVISÃO LEGAL
O atual Código Penal prevê os crimes de auto aborto e consentimento do aborto (art.
124); aborto sem consentimento da gestante (art. 125); e aquele que há o devido
consentimento da gestante (art. 126).
Tais artigos visam tutelar a vida humana em formação, conhecida como vida intra-uterina,
pois desde a fecundação do óvulo existe um ser em germe, que cresce, aperfeiçoa-se,
assimila substancias, tem metabolismo orgânico e se movimenta revelando atividade
cardíaca, pelo menos nos últimos meses da gravidez, executando atividades típicas de
vida. Tutela-se também a vida e a integridade corporal da mulher gestante do aborto
provocado por terceiro sem seu consentimento.
2.3SUJEITO ATIVO
No caso do art. 124, o sujeito ativo é a própria gestante, tratando-se assim de crime
especial ou próprio. Já nos demais dispositivos, qualquer pessoa pode ser o autor do
delito.
2.4 SUJEITO PASSIVO
De acordo com a doutrina, o sujeito passivo é o feto, ou seja, o produto da concepção,
recordando-se que a lei civil resguarda os direitos do nascituro (art. 2 do Direito Civil).
Logo, não é o feto titular do bem jurídico ofendido, mesmo tendo seus direitos de natureza
Civil resguardados. Sendo assim, o sujeito passivo trata-se do próprio estado ou a
comunidade nacional. Vitima também a mulher nos casos em que o aborto é praticado
sem seu consentimento.
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2.5 BEM JURIDICO TUTELADO
O delito de aborto esta previsto no capitulo I do titulo I do Código Penal,
correspondente aos crimes contra a vida. Então, claramente em função de sua
localização topográfica, o bem jurídico a ser protegido de forma precípua, por meio dos
três tipos penais incriminadores, só poderia ser a vida humana em desenvolvimento.
2.6 OBJETO MATERIAL
Objeto material do crime em questão pode ser o óvulo fecundado, o embrião ou o feto,
razão pela qual pode ser considerado ovular, quando cometido ate os dois primeiros
meses de gravidez embrionário, havido no terceiro ou quarto mês da gravidez e por fim,
fetal, quando o produto da gestação já atingiu os cincos meses de vida intra-uterina, e daí
em diante.
Os crimes de auto-aborto, aborto provocado por terceiro sem o consentimento da
gestante somente podem ser praticado quando a gestante dirige finalisticamente sua
conduta no sentido de causar a morte do ovulo, embrião ou feto, ou não realizando um
comportamento diretamente a este fim, atuando não se importando com a ocorrência
do resultado, ou seja, age a titulo de dolo direto ou eventual, respectivamente.
Por ser um crime material, o delito se consuma com a afetiva morte do produto da
fecundação, não havendo a necessidade de que o óvulo fecundado, embrião ou feto
seja expulso, podendo, inclusive, ocorre sua petrificação no útero materno. Porém, é
fundamental a prova de que o feto estava vivo no momento da ação ou omissão do
agente, dirigida no sentido de causar-lhe a morte, porque caso contrario, nos
deparemos com um crime dito impossível, em função da absoluta impropriedade do
objeto. Vale ressaltar também que a doutrina não exige, para fins de caracterização do
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aborto, que o feto possua capacidade de desenvolvimento que o conduza a
maturação.
2.7 CAUSAS DE AUMENTO DE PENA
Notamos que a dita forma qualificada do crime do aborto, Prevista no art. 127 do
Código Penal, na verdade não existem qualificadoras, e assim causas especiais de
aumento de pena, ou majorantes, de acordo com a sua própria redação, que diz
Art. 127. As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um
terço, se, em conseqüência do aborto ou dos Meios empregados para provocá-lo, a
gestante sofre lesão corporal de natureza grave e são duplicadas, se, por qualquer
dessas causas lhe sobrevém a morte.
Logo apenas no terceiro momento critério trifásico de aplicação da pena é que o
julgador faz incidir o aumento de um terço, ou então duplica a pena, após comprovada as
lesões corporais.
Vale ressaltar ainda que na redação do referido artigo, a majorante somente é
aplicada nas hipóteses de aborto provocado por terceiro com ou sem consentimento da
gestante, pois a autolesao não é punível. Então, não é aplicada a causa de aumento de
pena a gestante que realizar o auto-aborto, vindo a causar lesão corporal de natureza
grave em si mesma.
2.8 EXCLUDENTES DE ILICITUDE
O art. 128 do CP afirma que
Não se pune o aborto praticado por medico
1- se não há outro meio de salvar a vida da gestante
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2- se a gravidez resulta de estupro e o aborto e precedido de consentimento da
gestante ou, ou quando incapaz, de seu representante legal.
Percebe-se que o próprio Código atribui os nomes júris de aborto necessário, ao
primeiro, e aborto humanitário nos casos em que a gravidez resulte de estupro. Foi
a maneira especial que o legislador encontrou para excluir a ilicitude de uma
infração penal sem dizer que não ouve crime, como assim o faz o art. 23 do
mesmo diploma legal.
2.8.1 ABORTO NECESSARIO
Também conhecido como necessário, constitui um legitimo estado de necessidade,
justificado quando não ouve outro meio de salvar a vida da gestante
Tal modalidade exige dois requisitos essenciais e simultâneos a) perigo de morte
para a gestante b) Não existência de outro meio para salva-la. Porem, o requisito
fundamental, na verdade, é o iminente perigo a vida da gestante, sendo insuficiente o
perigo a saúde, mesmo que muito grave. Então, o aborto deve ser o único meio capaz
de salva a vida da gestante, se não o medico respondera pelo crime. Logo, tal
necessidade não se faz presente quando o ato é praticado para preserva a saúde da
gestante ou para evitar desonra pessoal ou familiar.
Ressalta-se que o aborto necessário pode ser praticado sem o consentimento da
gestante, pois a intervenção medico-cirurgica está autorizada pelo disposto nos art.
128, 1 (aborto necessário), art. 24 (estado de necessidade) e art. 146, § 3º
(intervenção medico-cirurgica justificada por iminente perigo de vida). Por fim tomando
os devidos cuidados, agira no estrito cumprimento do dever legal (art. 23, III, 1ª parte),
já que, não pode deixar parecer a vida da gestante.
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2.8.2 ABORTO HUMANITARIO
O inciso II do art. 128 do Código Penal traz um confronto de dois bens, a vida do
feto de um lado, tutelada pelo nosso ordenamento jurídico desde a concepção, e a
honra da mulher vitima de estupro do outro, ou a dor pela recordação dos terríveis
momentos pelos as quais passou pelas Mãos do estuprador.
Também denominado ético ou sentimental, e aquele autorizado quando a gravidez
ocorre fruto do crime de estupro, alem de necessitar do consentimento prévio da
gestante para sua realização.
São requisitos essenciais para autorização do aborto humanitário; a) gravidez
resultante de estupro; b) prévio consentimento da gestante ou, sendo incapaz, de seu
representante legal.
Como garantia do próprio medico, o consentimento da gestante ou de seu
representante legal, quando for o caso, devera ser obtido por escrito ou na presença
de testemunhas idôneas.
Atualmente, doutrina e jurisprudência admitem o aborto sentimental quando a
gravidez resulta de atentado violento ao pudor, por analogia, o qual é tão indigno e
repugnante quanto o próprio crime de estupro.
Não e necessário autorização judicial, sentença condenatória muito menos processo
criminal contra o autor do crime sexual. O medico deve busca certifica-se da
autenticidade da paciente através da existência de inquérito policial, ocorrência policial
ou processo judicial, ou por quaisquer outros meios ou diligenciais pessoais os quais
possa e deva realizar para certifica-se da veracidade da ocorrência de estupro.
Respaldado sobre a veracidade da alegação, apenas a gestante responde
criminalmente (art. 124, 2 figura) quando comprovada a falsidade da afirmação.
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Conclui-se que a boa-fé do medico caracteriza erro do tipo, incluindo o dolo, e,
conseqüentemente, afasta a tipicidade.
A excludente em exame estende-se ao crime praticado com violência ficta (art. 224). A
permissão legal limita-se a referi-se ao crime de estupro, sem o adjetivar. Porém, em
função do desconhecimento por parte do legislador da existência das duas formas de
violência , elementares desse crime – real e ficta -, ao não limitar a excludente a
presença de qualquer delas, não pode o intérprete restringir onde a lei não faz
qualquer restrição, especialmente para criminalizar a conduta do medico. Por
conseguinte, interpretação restritiva implica criminalizar uma conduta autorizada, uma
espécie de interpretação extensiva contra legem, ou seja, “in malam partem”.
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3. A ANENCEFALIA
Anencefalia e um defeito do tubo neural (uma desordem envolvendo incompleto
desenvolvimento do cérebro, espinha dorsal e sua cobertura de proteção). O tubo
neural e de envoltura estreita que dobra e fecha entre a terceira e quarta semana da
gravidez para formação do cérebro e a espinha dorsal do embrião. Anencefalia ocorre
quando o fim cefálico ou de cabeça do tubo não fecha, enquanto resultando na
ausência de uma porção principal do cérebro, crânio e couro cabeludo. Crianças com
essa desordem nascem sem ambos (a parte dianteira do cérebro), e um cérebro (o
pensamento coordenações da área do cérebro). O tecido do cérebro restante esta
freqüentemente exposta não coberto através de osso e pele. A criança é normalmente
surda, inconsciente e incapaz de sentir dor. Embora alguns indivíduos com anencefalia
podem nascer com um talo de cérebro rudimentar, mas a falta de um cérebro
funcionando permanentemente, regras que refogem a possibilidade de já ganhar
consciência. Ação reflexiva como respiração (respirando) e resposta para soar ou
toque pode acontecer. A causa de anencefalia e desconhecida. Embora é crido que a
dieta da mãe, a falta de vitaminas pode ter um papel importante, os cientistas
acreditam que muitos outros fatores também são envolvidos.
Aborda-se agora a impossibilidade de aborto em casos de feto anencefálico na
legislação brasileira. A lei é bem clara quando exclui a possibilidade de aborto
eugenésico, ou seja, feto com deformidade ou enfermidade incurável. É fato que tal
discussão gera controvérsia em diversos aspectos tanto éticos, como religiosos, jurídicos
etc. Porem, não cabe neste momento analisar outros aspectos senão o jurídico. E com
clareza coloca o jurista Cesar Roberto Bitencurt, quando afirma que “modernamente não
se distingue mais entre vida biológica e vida autônoma ou extra-uterina. É indiferente a
capacidade de vida autônoma, sendo suficiente a presença da vida biológica“. Sendo
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assim, se tal afirmação for considerada verdadeira, como conseqüência, o abortamento
de feto anencefálico enquadra-se como crime contra a vida. Ora, o feto possui batimento
cardíaco, circulação sanguínea, e isto, já caracterizaria vida biológica.
Porém cabe lembrar que o produto dessa gestação só possui “vida” devido ao
metabolismo da mãe, que a criança ao nascer, conseguiria “sobreviver” apenas alguns
instantes e viria a óbito logo em seguida. Assim, a ausência de cérebro não daria a este
ser nenhuma expectativa de vida. E mesmo com a afirmação acima de que a capacidade
de vida autônoma torna-se irrelevante à questão do aborto, torna-se indispensável expor
aqui desnecessidade de uma mãe carregar de seu ventre um filho que não tenha
possibilidade de ter uma vida extra-uterina, e que ela, alem da dor física que terá durante
nove meses de gravidez, que neste caso tornar-se-ia a menor das dores, sofrerá de forma
que só uma mãe pode sofrer ao imaginar seu filho “nascendo” e “ morrendo” em seguida.
Interessante e analisar a legislação brasileira, que, senão redundante, muitas
vezes torna se “curiosa”. Nota-se na lei 9.434 de 04 de fevereiro de 1997, que é a lei de
transplante de órgãos, em seu art. 3º, que prevê a retirada post mortem de tecidos,
órgãos ou parte do corpo humano destinada a transplante, somente se e quando for
diagnosticada a morte encefálica do paciente, constada e registrada, por dois médicos
não participantes das equipes de remoção de transplantes. Ora, neste caso a lei e bem
clara, que quando constada a morte encefálica e permitido a remoção de órgãos, e
conseqüentemente, devido a isto, se obteria a morte biológica do paciente.
Então, o que vale o legislador a aceitar a morte encefálica do paciente como
prioridade para o transplante, e a não consenti-la no caso do feto anencefálico?
Note que propositadamente a redundância na pergunta, visto que, não é possível,
que um organismo venha sofrer disfunção em um órgão que não possua.
20
Outro motivo que leva a crer que a proibição do aborto eugênico é ultrapassada.
Cabe ressaltar que, o Código Penal de 40 foi publicado com costumes de décadas
anteriores, e conseqüentemente não podemos esperar que tais hábitos permaneçam
pétreos. Na atual conjuntura não só na cultura como também na ciência houve uma
grande evolução, permitindo dessa forma, a indiscutível necessidade de um Anteprojeto
de Reforma no Código Penal, quando em 1992 foi criada uma Comissão para
Reformulação do Código Penal, sendo que a parte especifica dos crimes contra a vida foi
orientada por uma subcomissão, presidida pelo desembargador Dr. Alberto Franco. E
ressalta-se que, dentre outras formas, autorizaria o aborto nos casos em que o nascituro
apresentasse graves e irreversíveis anomalias físicas ou mentais. E a redação proposta
pela comissão é a seguinte:
“não constitui crime o aborto praticado por medico: se comprova, através de
diagnóstico pré-natal, que o nascituro venha a nascer com graves e irreversíveis
malformações físicas ou psíquicas, desde que a interrupção da gravidez ocorra até a
vigésima semana e seja precedida de parecer de dois médicos, diversos daqueles que,
ou sob sua direção, o oborto é realizado.”
3.1 MEDICINA E DIREITO
A questão da interrupção da gravidez quando o produto da concepção tem
declarada a inviabilidade da sua vida extra uterina em razão da anencefalia, ultrapassa a
seara da Direito Penal, edentrando profundamente em premissas de ordem ética, jurídica,
política, moral, religiosa e filosófica.
A Medicina é uma das mais sublimes atividades profissionais desenvolvidas pelo
homem em todos os tempos, onde a valorização da vida e da saúde humanas atinge o
seu ápice, a qual deve ser exercida com responsabilidade, sinceridade de propósitos e
21
respeito ao ser humano. Por isso antes de tudo é preciso ter nascido para isso. Quem
tiver vocação para super-homem vira médico.
Ao Direito cumpre o papel de gerir todas as relações que se desenvolvem e que
tem reflexo na vida do homem. O Direito e a Ciência devem caminhar juntos, uma vez que
são indispensáveis à aventura humana mantendo sempre o equilíbrio que se fizer
necessário, cada qual respeitando o papel que lhe fora incumbido, desempenhando
irrefutavelmente a manutenção da vida em todas as suas dimensões.
A questão desta integração ou até mesmo de sua (dês) integração, ora posta em
debate, diz respeito a possibilidade do médico realizar a extirpação do feto Anencefálico,
sem torna-se co-autor do crime de aborto, bem como de excluir a culpabilidade da mãe
que tenha tomado tal decisão.
Sendo assim, nesta breve inclusão na ciência hipocrática, vemos de logo, cientificamente
a impossibilidade da vida extra-uterina do feto anencéfalo, razão pela qual podemos de
logo estabelecer uma premissa, não existe possibilidade da perpetuação da existência do
neonato que for portador de anencefalia.
3.2 A VISAO RELIGIOSA
Levando-se em conta a avaliação do assunto sobre o prisma da globalização,
impede registrar que praticamente todos os países desenvolvidos já autorizam o aborto
por anencefalia, como: Itália, Espanha, França, Suíça, Bélgica, Austrália entre outros.
Com tudo na contra-mão, deste posicionamento encontramos as nações em
desenvolvimento como Brasil, peru, Paraguai, Venezuela, argentina, Chile e Equador.
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Outro viés que ganha importância na discussão do tema é a ótica dos religiosos, os
quais exercem uma pressão muito grande juntos aos políticos e até mesmo perante os
julgadores para impedirem a discriminação de tal conduta.
Abordagem interessante do tema faz Sergio Nogueira Reis, que sintetiza as
opiniões dos católicos, budistas das religiões afro-brasileiras e por fim o espiritismo afirma
que entre esses grupos não existem opiniões favoráveis a liberação do aborto eugênico.
Reafirma sua opinião lançada na obra Justiça Divina X Justiça dos Homens, no sentido de
apoiar o anteprojeto que autoriza o aborto no caso de anomalia congênita do feto
impossibilitado de sobrevida; “pois numa sociedade democrática a mulher tem garantido o
“livre-arbítrio”, devendo escolher seus atos e arca com as conseqüências cármicas dos
mesmos.” (Revista Consulex, ano VIII, Nº 174)
Anote-se que vivemos num Estado Laico e que as questões religiosas, inobstante a
liberdade de culto assegurado pela Carta constitucional (art5º, VI), não podem e não
devem interferir nas decisões do Poder Judiciário, carecendo assim de legitimidade
quaisquer espécies de Lobbies que possam ser entabulados com o escopo de interferir na
discussão do tema.
Para esclarecer o tema, nunca é demais recorrer à opinião do ministro Celso de Melo: “O
dogmatismo religioso revela-se tão opressivo a liberdade das pessoas quanto a
intolerância do Estado, pois ambos estabelecem meio de autoritária restrição à esfera de
livre arbítrio e de autodeterminação das pessoas, que hão de ser essencialmente livres na
avaliação de questões pertinentes ao âmbito de foro intimo, notadamente em temas do
direito que assiste a mulher seja ao controle de sua própria sexualidade, e ai surge temas
do direito reprodutivos, seja sobre a matéria que confere o controle sobre sua própria
23
fecundidade.”noticias do STF, disponível em http//WWW.sff.gov.br, consultado em
21.11.2008).
Assinala com propriedade a Doutora em Direito das Relações Sociais, Tereza Rodrigues
de Vieira que: “Nossos julgadores não podem basear suas decisões em conceitos
superados ou suas crenças. Não podem os juízes reeditar o direito Consuetudinário. Esta
matéria é de competência da área da saúde e os médicos já haviam atestado a certeza
da incompatibilidade da vida extra-uterina. Com a interrupção da gravidez por anomalia
fetal as mulheres não estão renunciando a sua fé em Deus. Estão reafirmando sua crença
na autonomia e capacidade para escolher o rumo de suas vidas, sem limitações ao
exercício de seus direitos e liberdade. O judiciário deveria ser solidário a elas.” (Revista
jurídica Consulex. Ano VIII. Nº 174)
3.3 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O direito é completo e oxiológico. Não se restringe a redação das normas, também é
inegável que o caso em comento, normas de conteúdo ético, religiosos e culturais,
estarão sempre sendo questionados, contudo o mais importante é saber adequar estes
padrões pré-estabelecidos com o principio da dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III, da
Constituição Federal).
Também é cedido que a dignidade humana foi alçada aos centros do sistema
jurídicos contemporâneos, podendo-se afirma que a Carta Política de 1988 se integra ao
movimento político pós-positivista que busca a reaproximação entre o direito e a ética,
afastando-o por conseqüência da religião (secularização), afinal Direito é Direito, Religião
e Religião, dogma é Dogma.
24
A propósito a abalizada opinião de Luiz Roberto Barroso: “Obrigar uma mulher a
conversa no ventre, por longos meses, o filho que não poderá ter impõe a ela sofrimento
inútil e cruel. Adiar o parto, que não será uma aceleração da vida, mas um ritual de morte,
viola a integridade física e psicológica da gestante, em situação análoga e da tortura.“
Correio Braziliense. Brasília, segunda-feira, 2 de agosto de 2004.)
Também sobre o tema vale o pensamento de Luiz Vicente Carnicchiario:
“Não nós parece razoável aguarda-se o final da gestão para ser consentida, na hipótese
mencionada, a interrupção da gravidez. O ser humano também se caracteriza por sua
constituição física. A gestação somente se justifica para reproduzir o homem. A ausência
de cérebro (anencefalia), (para a hipótese, não se confunde como anomalias físicas –
outro grande debate) afeta profundamente as características físicas do próprio homem,
ou, explica a ciência, a sobrevivência e de curto espaço de tempo, não ultrapassando em
regra, cinco dias.” (Revista Consulex, ano VIII, nº 174).
Nesses casos, não há duvida, de que a previsão legal deveria ser favorável ao
abortamento, pois não seria justo submeter a gestante ao intenso sofrimento de carregar
consigo sem a menor perspectiva de vida futura. Assim, uma vez constatada a hipótese
de que a vida seria inviável por grave anomalia acometida ao feto, poderia a lei autorizar o
abortamento, ou seja, a interrupção daquele processo de gravidez, já que nada conduziria
prosseguir com ela.
Como verbete Luiz Flavio Gomes “Os que sustentam (ainda que com muita boa-fé)
o respeito á vida do feto devem atentar para o seguinte: em jogo esta a vida ou a
qualidade de vida de todas as pessoas envolvidas com o feto mal formado. E até em caso
de estupro, em que o feto esta bem formada, nosso Direito autoriza o aborto, nada
justifica que idêntica regra não seja estendida para o aborto anencefálico. lógico que a
25
gestante, por suas convicções religiosas, pode não querer o aborto. Mais isso constitui
uma decisão eminentemente pessoal (que deve ser respeitada). De qualquer maneira,
não se pode impedir o exercício do direito ao abortamento para aquelas que não querem
padecer tanto sofrimento”. (Revista Síntese de direito Penal e Processual Penal. Ano V.
Nº28- Out-Nov 2004. Págs 35 e 36).
A justiça não pode distanciar dos avanços científicos, devendo sempre
acompanhar as mudanças éticas e culturais da sociedade. Afinal a gravidez não modifica
apenas o corpo da mulher, mês também seu estado psíquico, não sendo por tanto
biológico.
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4.0 O HISTORICO NORMATIVO DO TEMA
Uma terceira abordagem diz respeito a umas das regras da Escola Histórica do Direito,
surgida no século XIX, fundada no pensamento de Friedrich Karl Von Savigny (1778-
1861), na Alemanha, ao observa que a lei, antes de ser uma criação arbitraria do
legislador, produto de sua razão, deve espelhar o desenvolvimento histórico de cada
povo, pois na medida em que as condições da vida social vão se alterando, deve a lei
adaptar as novas situações.
Sabemos que nosso Código Penal data de 1940, ainda que reformado em 1984, na
sua parte geral, mantendo-se em sua quase totalidade a redação da época ditatorial do
Estado Novo com conceitos envelhecidos equivocados., olvidando-se de se atualizar na
nova textualização dos avanços da ciência e da tecnologia.
Inegavelmente, a situações que antes não podiam ser previstas, hoje, cada vez
mais cedo podem ser diagnosticada, assinando-se que não se pretende levantar uma
bandeira de legalização geral do aborto, mas de logo, é imperiosa uma manifestação
sobre uma vexada questão que vem ganhando relevo nas discussões do meio médico e
jurídico.
Questiona-se; É Legal a interrupção da gravidez pós demonstrada a
impossibilidade da vida extra-uterina?
27
4.1. A INSUFISIENCIA DO DIREITO LEGISLADO
É de sabença geral que o legislador não tem o dom da onisciência, onipresença e
onipotência o que lhe garantiria a possibilidade de prever todas as situações possíveis e
imagináveis de acontecerem no factual da vida dos indivíduos, isto porque, as sociedades
modernas e principalmente nas pós modernas em razão de sua complexidade, tendem a
inviabilizar o controle do futuro dos acontecimentos em razão da evolução cientifica e
tecnológicas, crescentes em proporção jamais assistidas.
Prevendo isto a LICC estabeleceu no seu art. 4º que “Quando a lei for omissa, o
juiz agira de acordo com a analogia, princípios gerais do direito.” e no artigo subseqüente:
“Na aplicação da lei, o juiz entendera aos fins sociais a que ela se dirige e as exigências
do bem comum”.
Nosso ordenamento político positivou esses dois princípios não só na LICC como também
no próprio CPC e, neste caso, serve a hetero-integração da norma para aplicá-la também
ao processo criminal. Estipula o art. 126 do CPC: ”O juiz não se exime de sentenciar ou
despachar alegando lacuna ou obscuridade na lei. No julgamento da lide caber-lhe-á
aplicar as normais legais; não as havendo, recorrera à analogia, aos costumes e aos
princípios gerais de direito.”
Então, na qualidade de fonte subsidiaria do direito, os princípios serviram como
elemento integrador ou forma de contemplação de lacunas do ordenamento jurídico, na
hipótese de ausência da lei aplicável a espécie típica.
Por tanto, caso o juiz não encontre disposições legais capazes de suprir a plena
eficácia da norma definidora de direito, deve buscar outros meios de fazer com que a
norma atinja sua máxima efetividade, através da analogia, dos costumes e por fim, dos
princípios gerais de direito.
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A base da analogia “aponta Maria Helena Diniz:” encontra-se na igualdade jurídica
já que o processo analógico constitui um raciocínio baseado em razões relevantes de
similitude, fundando se de razão que é o elemento justificador da aplicabilidade da norma
a casos não previstos, mas substancialmente semelhantes sem, contudo ter por objetivo
perscrutar o exato significado da norma, partindo, tão-só, do pressuposto de que a
questão sub judice, apesar de não se enquadrar no dispositivo legal, deve cair sob sua
égide por semelhança da razão”. (Maria Helena Diniz. Compêndio de introdução a Ciência
do Direito. São Pulo: saraiva, 1995, p. 411/412).
No Direito Penal somente se admite a analogia in bonam partem. Segundo Clovis
Beviláqua, com os princípios gerais do direito “o jurista penetra em um campo mais
dilatado, procura apanhar as correntes diretoras do pensamento jurídico e canalizá-la
para onde a necessidade social mostra a insuficiência do Direito Positivo”. (Clóvis
Beviláqua. Teoria geral do direito. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1980. P.44).
Observação interessante faz Maria Berenice Dias, Desembargadora do TJRS:
“Como a plenitude do sistema estadual, não convivem com vazios, para a concreção do
direito, o juiz precisar ter olhos voltados para a realidade social. ”(Revista Consulex, ano
VIII, nº 168). “Psicologia autorizaria a inclusão deste dispositivo da perspectiva inexorável
da “morte psicológica” da mãe, literalmente forçada, pelas injunções do sistema, a
conviver com a gravidez que carrega em si mesma a idéia do aborto.” (Revista Consulex,
ano VIII, nº174)
29
4.2. ABORTO DO ANENCÉFALO SOB O PRISMA CONSTITUCIONAL
É certo que a proteção a vida é amparada pela lei de uma forma geral. Esta
proteção é, com certeza, o maior objetivo do Estado no intuito de manter a paz social
entre os povos.
A constituição Federal Brasileira, em seu exaustivo rol de garantias fundamentais,
consigna expressamente o direito á vida. Com efeito, esta proteção não abrange tão
somente, a vida extra-uterina, pois se ao contrario fosse lei não seria plena e coerente,
uma vez que, aparte da concepção, já existe vida.
Nesta defesa a vida, o Estado, acertadamente, põe a salvo os direitos do nascituro, sendo
proibida a pratica abortiva. O aborto assunto de farta discussões sociais e morais, é sob
conceito jurídico é a interrupção da gravidez, tendo por conseqüência a morte do feto. A
lei brasileira, entretanto, prevê duas hipóteses em que haverá punição para quem praticar
o aborto. A primeira esta descrita no art. 128, do código Penal e diz respeito à
possibilidade de não haver ouro meio de salvar a vida da genitora. Já a segunda hipótese
é esculpida no inicio seguinte do mesmo artigo e se refere ao caso de a gravidez ter sido
conseqüência de um estupro e que aja o consentimento da gestante, ou se esta for
incapaz, de seu representante legal. Observe-se que num caso a lei preocupa-se
estritamente com o direito a vida da gestante, enquanto noutro caso as leis atem-se
especificamente ao aspecto de ordem moral.
Temos ainda outro tipo de aborto, o qual legislação brasileira é silente a respeito. Trata-se
do aborto eugenesico ou eugênico. Esta espécie de aborto ocorre quando há grave
perigo para o feto, em virtude de grave predisposição hereditária, seja por doenças
maternas ou por qualquer outro fator externo que resulte para o nascituro enfermidades
de ordem psíquicas ou corporais gravíssimas.
30
A baila dessas abordagens vem á decisão proferida pelo ministério do Supremo
Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio de Melo que concedeu liminar autorizando o aborto
em casos de fetos com anencefalia, ou seja, um defeito de formação do sistema nervoso
fetal que ocorre entre 23º e o 26º dia de gestação. Os nascituros portadores dessa
anomalia nascem cem a maior parte do cérebro, ou sem ele. É por este motivo que a
criança geralmente nasce com graves defeitos fisiológicos e sem consciência,
sobrevivendo no Maximo algumas horas sendo certo que não há possibilidade de vida.
De acordo com o ministério, mulheres grávidas de fetos anencefálicos podem fazer
a operação sem serem condenadas pelo crime de aborto, bastando para tanto apresentar
um laudo medico que comprove a ausência de cérebro do feto.
A justificativa do eminente pretor se funda no fato de que a gestante com feto
anencefálico “convive diuturnamente com a triste realidade e a lembrança ininterrupta do
feto, dentro de si, que nunca poderá se torna um ser vivo”. O Ministro não considera a
cirurgia um aborto, pois não há chance de vida após o nascimento. Por isso ele
considerou um direito da gestante “submetesse a operação terapêutica de partos de fetos
anencefálicos, aparte de laudo médico atestando a deformidade”.
Entendemos plausível a cabida tal posição, pois o Direito Constitucional vislumbra
a proteção da vida humana e, no caso da ausência de cérebro sendo esta aferida por
uma rigorosa pericia médica, não há que se fala em afronta a este direito, uma vez que
não existe vida a ser tutelada. Ainda, devemos levar em consideração o grande transtorno
e sofrimento da família do nascituro e principalmente da genitora que terá que suporta
meses com um feto que não tem possibilidade alguma de alcançar a vida.
Ademais, os mais críticos acerca do assunto, que normalmente são os que
arvoram em princípios religiosos, deveriam entender que não se trataria de uma
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obrigação imposta pela lei, mas sim, de uma faculdade que o Estado concederia àquelas
gestantes com fetos anencefálicos. Assim, só seria realizado esse aborto se a genitora
assim equiescesse e também se esta grave anomalia fosse detectada indubitavelmente
pela pericia medica.
Diante de tudo, o aborto devera ser penalizado quando estiver violando o direito
constitucional a vida, devendo, no entanto, ser despenalizado nos casos em que a lei
penal menciona e, ainda, no caso de que o feto não ter nenhuma possibilidade de
sobrevivência.
4.3 A SOLUCAO PENAL
Após todas essas reflexões sobre o tema parece-me que a melhor solução a ser
apontada para defender o posicionamento, qual seja a adoção da tese Inexigibilidade de
Conduta Diversa como causa da exclusão da culpabilidade nas hipóteses de aborto
anencefálico.
A culpabilidade é a reprovação da ordem jurídica, na conduta humana. Afirmava
Heleno Claudio Fragoso “é a responsabilidade de conduta ilícita (típica e antijurídica) de
quem tem capacidade genérica de entender e querer (imputabilidade) e podia nas
circunstâncias em que o fato ocorreu conhecer a sua ilicitude, sendo exigível
comportamento que se ajuste ao Direito”. (A nova parte geral, II. ª Ed., São Paulo: Ed.
Forense, 1980)
Um comportamento humano, ainda que seja típico e antijurídico, somente será
considerado crime se o autor desse comportamento for culpável, ou seja, se ele tiver
capacidade penal. Segundo opinião de Francisco Muñoz Conde, tendo por centro de
32
cogitação a culpabilidade de alguém, é mister analisar o que ele denomina de elementos
específicos da culpabilidade: imputabilidade, conhecimento da antijuricidade do fato
praticado e exigibilidade de um comportamento distinto. (Francisco Muñoz Conde, Teoria
Geral do Delito, Tradução de Juarez Tavares e Luiz Regis Prado, Porto Alegre: Sérgio
Antonio Fabris, Editor, 1988, p. 132) Assim, só haverá culpabilidade “quando, devendo e
podendo o sujeito agir de maneira conforme o ordenamento jurídico, realiza conduta
diferente, que constitui o delito” (Damásio de Jesus, Direito Penal, Ed. Saraiva 16.ª
edição, 1.º volume, p. 420).
Conforme ensina o penalista pernambucano Aníbal Bruno, consiste a exigibilidade
de obediência ao direito na “possibilidade da motivação moral da vontade do agente em
conseqüência da normalidade das circunstâncias concomitantes do fato”. Este terceiro
elemento esta relacionado com o juizo de reprovabilidade da conduta, posto que, ao
valorar a consciência aprecia-se sobre de que forma poderia comporta o agente, sendo
exigida sua atitude que não esteja acima dos parâmetros normais de exigibilidade
comportamental. (Direito Penal, Forense, 1º edição, 1956 pág. 24)
Ainda sobre o assunto Muñoz Conde, no respeitante exigibilidade de um
comportamento distinto, afirma “Normalmente, o direito exige comportamentos mais ou
menos incômodos ou difíceis, mais não impossíveis, o direito não pode, contudo, exigir
comportamentos heróicos: toda norma jurídica tem um âmbito de exigência, fora do qual
não se pode exigir responsabilidade alguma. Essa exigibilidade, ainda que seja exigida
por padrões objetivos, é em ultima instancia um problema individual: é o autor concreto,
no caso concreto, quem tem de se comporta de um modo ou de outro. Quando a
obediência da norma coloca o sujeito fora dos limites da exigibilidade, faltará esse
elemento e, com ele, a culpabilidade”. (Francisco Muñoz Conde, porto Alegre, Sérgio
Antonio Fabris, Editor, 1988, p. 132)
33
A idéia de inexigibilidade de outra conduta não é privativa da culpabilidade, mas
uns principiam regular e informador de todo o ordenamento jurídico. Na culpabilidade,
exige ela comprovação, antes de se formular o juízo completo de culpabilidade, se um
autor, com capacidade de culpabilidade e conhecimento da ilicitude de sua ação, realizou
um fato típico e antijurídico, mas encontrava-se numa situação tão extrema que não seria
aconselhável, do ponto de vista dos fins de PE, importa-lhe uma seção penal, nesta
hipótese inegavelmente encontra-se a mãe que carrega no seu ventre o feto anencéfalo.
Considere-se por oportuno, neste conjunto de reflexões que o homem vive em
sociedade e que essa sociedade fixa normas comportamentais para o grupo social e, que
este mesmo grupo fixa condutas aceitáveis para os seus integrantes. Assim, observado
no fato concreto, que o agente agiu em conformidade com o estipulado nos limites do
parâmetro do juízo de reprovação do grupo social, impõe-se o reconhecimento por parte
de este mesmo grupo que a atitude do agente guarda amparo nos mecanismo de controle
social, excluindo desta forma a culpabilidade. Neste mesmo sentido, se a conduta do
agente ofende aos critérios de convivência do grupo, sujeitar-se-á aos rigorosos legais por
ausências de elementos que Possa excluir a culpabilidade.
Dito isto, pode-se afirma que um dos elementos, mais importantes da
reprovabilidade é a possibilidade que possui o sujeito de determinar-se “intra legem”. Do
sujeito imputável, é exigida geralmente, a atuação conforme o ordenamento jurídico.
Entretanto existe situações que não é exigida uma conduta adequada ao Direito, mesmo
que se trate de sujeito imputável e que o mesmo realize essa conduta com a consciência
da antijuridicidade. Daí decorre a inexigibilidade de outra conduta, o que fará afasta o
terceiro elemento da culpabilidade, ferindo-a de morte.
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A referencia utilizada como não exigibilidade de outro comportamento é medida
tomando como referencia o homo medius (homem médio) significando que o juízo da
culpabilidade implica numa reprovação pessoal do autor do fato punível. Há causas de
motivação que é julgada de forma individualizada, considerando-se o conjunto factual de
circunstancias vivida pelo autor na execução do injusto, que será objeto da avaliação do
juiz penal, consoante a lição de Álvaro Mayrink da costa (Álvaro Mayrink da costa,
Criminologia, vol. I t. II, Rio de Janeiro: Ed. Rio, 1980, p. 186).
Consoante a lição de João Campos Mendes, “a pessoa pode ver-se compelida a
praticar determinada conduta, embora ciente que seja ela contraria á lei, não ficando, não
observando, sujeito a punição, por que qualquer ser humano, normal nas mesmas
condições, teria igual comportamento, não sendo este, assim, censurável”. (João Mendes
Campos. A inexigibilidade de outra conduta no júri: Doutrina e Jurisprudência Belo
Horizonte: Del Rei, 1998, p.21)
Parte da Doutrina entende-se que todas as causas de exclusão da culpabilidade
se assenta num principio maior, qual seja a inexigibilidade da outra Conduta.
A doutrina das justificativas supra-legais funda-se na afirmação de que o direito do
Estado, por ser estático, não esgota a totalidade das
Parte da Doutrina entende-se que todas as causas de exclusão da culpabilidade se
assenta num principio maior, qual seja a inexigibilidade da outra Conduta.
A doutrina das justificativas supra-legais funda-se na afirmação de que o direito do
Estado, por ser estático, não esgota a totalidade das
possibilidades de previsão legal, sendo impossível esgotar todas as causas de
justificação da conduta humana no plano da vida social. Partindo-se dessa premissa
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pode ser afirma antijuricidade nada mais é de que a lesão de determinado interesse vital
aferido perante as normais de cultura reconhecidas pela sociedade, sendo assim, afirma-
se que não se deve apreciar o antijuricidade apenas diante do direito legislativo, mas
também das normas de cultura. Alem de que o legislado não é onisciente, não lhe dado o
dom de prever todas as hipóteses e casos que a vida social possa apresentar nos
domínios do direito Penal.
36
CONCLUSAO
Sendo assim podemos afirma que a razão se encontrar com a parte da doutrina
que admite a exclusão da culpabilidade nesta hipótese, pois nesses casos, não há duvida,
de que a previsão legal deveria ser favorável ao abortamento, pois que não seria justo
submeter a gestante ao intenso sofrimento de carregar com sigo feto sem a menor
perspectiva de vida futura.
Assim, uma vez constada a hipótese de que a vida seria inviável por grave anomalia
acometida ao feto, poderia a lei autorizar o abortamento, ou seja, a interrupção daquele
processo de gravidez, já que a nada conduziria prosseguir com ela, porem se o legislador
assim não se posicionou, e, portanto tal situação não esta ainda arrolada na lei, não por
isso pode deixar de ser admitida.
Estamos convencidos de que, não apenas a apresentação do tema, mas também a
continuidade de sua discussão é de fundamental importância para estudo da exclusão de
culpabilidade na ação da gestante e do médico que interrompem a gravidez quando
diagnosticada a anencefalia, esperando despontar nos leitores interesse em razão da
importância do tema, para que através de sucessivos, debate tenha contribuído com o
prolongamento do dialogo frutuoso que temos mantido com a Comunidade Jurídica Penal
Brasileira.
Tratando-se de questões humanas na sua complexidade e vista à luz de tantas
interpretações teóricas, é prudente que os profissionais do direito ao tomarem o concreto
empírico, munam-se de todo um referencial para chegarem ao concreto pensado e correr
risco de errar.
37
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