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Territórios de instituições religiosas: uma análise das territorialidades da Igreja Evangélica
‘Filhos da Promessa’ e da paróquia ‘São Pedro e São Paulo’ em Belém – PA.
2⁰ Simpósio Internacional de História das Religiões
XV Simpósio Nacional de História das Religiões
ABHR 2016
Paulo Afonso Dias de Lima1
Alan Pereira Dias2
Luiz Gustavo Barbosa de Oiveira³
Erick Afonso Santiago Ramos4
1. INTRODUÇÃO
Os estudos envolvendo geografia e religião tem se tornado mais frequente nos
últimos anos. No Brasil, com o aumento de adeptos das religiões protestantes e a
consequente "perda de território" da Igreja Católica que por muito tempo influenciou na
modelagem do espaço, tem criado grande interesse nessa área de estudo, a Geografia da
Religião. (ROSENDAHL, 2005).
Nosso artigo analisará a busca por território das instituições religiosas, tendo por
base a Igreja Filhos da Promessa (Protestante) localizada na Rodovia Mário Covas, bairro do
Coqueiro e a Paróquia São Pedro e São Paulo localizada no Bairro do Guamá, ambas
pertencentes à região metropolitana de Belém, Estado do Pará. Através dessas duas
instituições tentaremos responder algumas questões, como as mesmas mantem e
1 Graduando do Curso de Licenciatura Plena em Geografia pela Universidade do Estado do Pará. 2Graduando do Curso de Licenciatura Plena em Geografia pela Universidade do Estado do Pará. Filiado ao grupo de pesquisa Territórios Urbanos na Amazônia - (TEUA). 3Graduando do Curso de Licenciatura Plena em Geografia pela Universidade do Estado do Pará. 4Graduando do Curso de Licenciatura Plena em Geografia pela Universidade do Estado do Pará.
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aumentam seu território e quem detém o poder sobre esse território? Que práticas elas
utilizam para isso? Qual as semelhanças e diferenças nessas práticas? Para responder essas
problemáticas que se levantam nos utilizaremos de uma bibliografia específica assim como
ida a campo para a realização de entrevistas.
Será feita a discursão dos conceitos utilizados, para que que possamos ter uma forte
fundamentação para o assunto proposto. Serão analisadas as relações de poder e os agentes
desse poder, pois como ressalta Raffestin (1993) "a geografia das religiões, ao mesmo tempo
que forneceu pontos úteis de referências, em geral deixou de lado as relações de poder para
se concentrar, talvez excessivamente, nas expressões espaciais do fenômeno religioso."
(RAFFESTIN, 1993 p. 117)
Buscaremos a definição das territorialidades utilizadas para a manutenção e
aquisição de novos territórios, e para isso analisaremos algumas práticas territoriais
utilizadas por essas duas instituições analisadas e como os símbolos religiosos, que são
produzidos no espaço por essas instituições, também funcionam como estratégias de
controle, portanto, territorialidades, pois os grupos sociais podem muito bem forjar
territórios em que a dimensão simbólica se sobrepõe à dimensão mais concreta.
(HAESBAERT, 2006 apud TONACO, 2008)
Por fim explicar as semelhanças e diferenças da gestão e manutenção desse território
religioso e práticas para atração de fiéis, pois observamos essa luta pelo domínio do
território religioso entre a Igreja Católica e as Igrejas Evangélicas no cotidiano por meio de
suas práticas, como também por meio dos símbolos presentes no espaço. (TONACO, 2008)
2. TERRITÓRIO, TERRITORIALIDADE E RELIGIÃO
Segundo Souza (2001), o território é um espaço definido e delimitado por, e a partir
de relações de poder, e que o poder não se restringe ao Estado e não se confunde com
violência e dominação. Assim, o conceito de território deve abarcar mais que o território do
Estado-Nação. Portanto, pode ser entendido como uma área específica controlada e gerida
por uma pessoa ou por um grupo de pessoas criado como citado acima, por e a partir de
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relações de poder. É importante ressaltar que o território pode ser criado nas mais diversas
escalas temporais e espaciais, da menor a maior, podem levar anos, séculos ou dias para
serem construídos ou desconstruídos e podem ter como área de influência uma rua, um
bairro, um país, um conjunto de países.
Territórios existem e são construídos (e desconstruídos) nas mais diversas escalas, da mais
acanhada (p. ex., uma rua) á internacional (p. ex. área formada pelo conjunto dos
territórios dos países-membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte - OTAN) [...]
são construídos (e desconstruídos) dentro de escalas temporais as mais diferentes:
séculos, décadas, anos, meses ou dias. [...] (SOUZA, 2001, p.81)
Ainda sobre o território salienta Haesbaert (2007), que: “assim devemos
primeiramente distinguir os territórios de acordo com aqueles que o constroem, sejam ele
indivíduos, grupos sociais/culturais, o Estado, empresas, instituições como a Igreja etc.” Ou
seja cada grupo ou pessoa que possui e controla um território mantendo relações de poder
no mesmo, tem maneiras, ou melhor estratégias, para gerir, manter e formar os territórios,
e isso nós chamamos de territorialidades que segundo Sack citado por Haesbaert
(HAESBAERT 2002 apud HAESBAERT 2007, p. 119) consiste na: “tentativa por uma única
pessoa ou por um grupo de pessoas de atingir, influenciar ou controlar pessoas, fenômenos
e relacionamentos, através da delimitação e afirmação do controle sobre uma área
geográfica.”
Quando falamos de território e territorialidade religiosa devemos levar em
consideração as práticas de instituições religiosas e como estas se organizam no espaço,
produzem seu território e de certa forma o controla, e que quem detém esse poder do
sagrado são seus administradores como diz Raffestin citado por (ROSENDAHL, 2012, p. 86)
“poder dos especialistas do sagrado que fazem e desfazem o território religioso”, portanto, o
poder está na mão dos clérigos, pastores, bispos formadores de opinião e transmissores do
saber sagrado, mas não que só eles possam formar o território religioso, pois esse território
está ligado ao íntimo de cada indivíduo e se forma por experiências sobrenaturais vividas em
dado espaço, por exemplo, “território e identidade religiosa estão intimamente ligados”.
(ROSENDAHL, 2012)
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Estas estratégias, para gerir, manter e formar os territórios na religião estão ligadas
ao controle de pessoas e objetos, e as experiências sobrenaturais no determinado espaço,
tornando um lugar sagrado fortalecendo as territorialidades religiosas.
Para Rosendahl (2005 apud ROSENDAHL, 2012, p. 88):
Territorialidade religiosa significa o conjunto de práticas desenvolvidas por instituições ou
grupos religiosos a fim de controlar pessoas e objetos. É uma ação estratégica para
manter a existência e legitimar a fé e sua reprodução ao longo da história. É fortalecida
pelas experiências religiosas coletivas e individuais que a comunidade religiosa mantém
no lugar sagrado e nos itinerários que constituem seu território.
Dessa forma, buscaremos identificar e analisar essas ações estratégicas
desenvolvidas pelas instituições analisadas, para a manutenção, delimitação de seus
territórios. E como estas refletem em seus fiéis, em conjunto com as práticas religiosas
coletivas e individuais.
3. CARACTERIZAÇÃO DAS IGREJAS ANALISADAS: SÃO PEDRO E SÃO PAULO E FILHOS DA
PROMESSA
Figura 1: Fachada da Paróquia São Pedro e São Paulo no Guamá.
Fonte: Oliveira, 2014.
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Serão analisadas as dinâmicas de duas Igrejas com organizações distintas: uma é
Igreja Católica, no caso a Paróquia São Pedro e São Paulo, localizada na Rua Barão de Igarapé
Mirim, uma das principais vias do bairro do Guamá, uma área periférica de um centro
consolidado, que abarca a maior população entre os bairros de Belém, capital do Estado do
Pará.
A fim de entender a organização catolicista, a obra de Roque Hammes, que trabalha
com a Igreja Católica, Sindicatos e Movimentos Sociais, descreve de forma breve e objetiva
como se dá a dita por ele, hierarquia da Igreja.
Em última instância, é o papa quem nomeia o Bispo para a Diocese e é o Bispo quem
nomeia os padres para as paróquias e as funções diocesanas. Nas paróquias por sua vez,
cabe aos padres, em sintonia com o Bispo e o Papa, legitimar o trabalho das lideranças,
apoiando-as em seu trabalho ou substituindo-as por supostamente "mais fiéis" (...) A
vantagem dessa organização é o senso de estabilidade que cria nas lideranças e no povo.
(HAMMES, 2003, p. 48).
A Arquidiocese de Belém é composta por inúmeras Paróquias, dentro destas, o
Pároco tem a incumbência de gerir as variadas tarefas que surgem, tanto na Paróquia, como
nas Pastorais. No caso específico da Paróquia analisada, essa hierarquia se dá na seguinte
forma, o então, na época, Papa Bento XVI nomeou em 2009 o atual arcebispo de Belém,
Dom Alberto Taveira, e este designou em 2012 ao Pe. Antônio de Pádua Rodrigues da Silva a
responsabilidade de administrar a Paróquia.
Quanto à hierarquia da IEFP, o pastor nos diz que se constitui de Bispo (posto mais
elevado), responsável pela sede e as congregações, então, os pastores responsáveis pelas
filiais e o obreiro responsável por diversas funções auxiliares. Dentro das filiais há
organizações e funções, como disse o pastor: “mesmo sendo um órgão espiritual (igreja), na
parte organizacional tem que funcionar como uma empresa”. Dentro disso, as filiais
possuem presidente (pastor), auxiliares e o secretário financeiro e um contador responsável
pelo patrimônio da igreja.
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Figura 2: Fachada da Igreja Evangélica Filhos da Promessa no Coqueiro. Fonte: Lima, 2014.
A outra análise se dá a partir de uma igreja Protestante para mostrar que há
diferenças na territorialização e estrutura organizacional. A igreja escolhida foi a Filhos da
Promessa, tendo como base a filial no bairro do Coqueiro em Ananindeua (conhecida como
filial da rodovia Mário Covas), por estar localizada, diferentemente da Católica em questão,
em uma zona de expansão da cidade englobando os bairros do Coqueiro, Cabanagem,
Mangueirão, e o distrito de Icoaraci. A matriz da Igreja Evangélica Filhos da Promessa (IEFP),
localiza-se no bairro do Mangueirão em Belém e possui quatro filiais, foi fundada em 2007
pelo Bispo Olivar Castro e um grupo de pastores. A IEFP é uma denominação pertencente à
visão celular, prática que será discutida no decorrer do trabalho. A igreja pentecostal Filhos
da Promessa se hierarquiza com as seguintes instâncias de poder: templo-sede ou igreja-
mãe, igrejas filiais e células conforme a Figura 03:
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Figura 3: (Estrutura Organizacional da IEFP) Adaptado: Machado apud Oliveira (2012, p. 152).
Como podemos observar no esquema acima, fica clara a organização da IEFP, o
templo sede é a base de toda a estrutura organizacional da Igreja, é o local onde se
coordena tanto os templos filiais quanto as células, eles tem a função de dar suporte para os
mesmos, Machado citada por Oliveira (2012), nos descreve uma estrutura semelhante, no
qual podemos nos embasar para analisarmos a IEFP, sendo que o que ela chama de pontos
de pregação na pesquisa foi constatado que possuem algumas das características da célula:
[...] os templos-sede, que são igrejas locais que atuam como sedes do poder local. Em
alguns casos o templo-sede também possui importância regional, uma vez que as cidades
do entorno não são espaços viáveis para receber templos-sede, mas sim, templos filiais. “Os
templos-sede são presididos por pastores locais que estão encarregados, entre outras
coisas, de atender e monitorar os templos filiados, os salões e os grupos de nucleação”
(MACHADO 1997, apud OLIVEIRA, 2012, p. 152).
Ainda sobre a organização da IEFP, os templos filiais seriam espaços em vários bairros
da cidade, e são importantes pois indicam o crescimento de uma determinada denominação
religiosa, que são geridos pelo templo sede, sobre os templos filiais Oliveira (2012) expõe
que:
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Os templos filiais são comumente chamados de congregações e se instalam, na maioria
das vezes, em cômodos alugados em vários bairros de uma cidade. Apesar das
congregações serem importantes para o crescimento de uma denominação religiosa, os
salões e os pontos de pregação (grupos de nucleação ou germinação) desempenham
papel mais significativo, pois segundo Machado (1994) esses são a base da hierarquia
pentecostal. (OLIVEIRA 2012, p. 153).
Partindo agora para as células que é a estratégia de crescimento e na manutenção de
fieis mais importante da IEFP, elas são importantes, pois é uma estratégia de
descentralização, para que não ocorra a estagnação e o enfraquecimento do templo-sede
sobre essa dinâmica Machado citada por Oliveira (2012) nos dá informações de que:
A nucleação é uma prática informal, através da qual um crente ou um pastor reúne em
sua própria casa, ou mesmo em qualquer lugar, um pequeno grupo de não-crentes
curiosos em conhecer a Bíblia. Foi e continua sendo uma estratégia proselitista (estratégia
de conversão) bem-sucedida que abarca de forma bem clara a dimensão territorial. [...]
Não obstante os pontos de pregação estarem submetidos às instâncias superiores de
poder (templo-sede, templo filial), eles alimentam o ciclo de reprodução pentecostal e
desempenham um importante papel na conquista de novos territórios. (MACHADO 1994,
apud OLIVEIRA 2012, p.153).
O que Machado chama de “nucleação”, nós pelas pesquisas feitas preferimos utilizar
o termo “célula”, é uma prática de manutenção e também de manutenção do território
religioso o que vai ser abordado melhor no decorrer deste artigo.
4. DINÂMICAS TERRITORIAIS DA IGREJA SÃO PEDRO E SÃO PAULO E A IGREJA FILHOS DA PROMESSA
A partir das entrevistas realizadas com o Padre responsável pela Paróquia,
denominado de Pároco, que vai discorrer sobre a estrutura organizacional da Paróquia e
com o Pastor que administra a filial trabalhada, são de fundamental importância para se
entender cada uma das dinâmicas e organizações propostas pelos seguimentos religiosos.
A Paróquia é formada por comunidades, a partir de um processo intenso de
evangelização e manifestações religiosas variadas se cria a necessidade de uma nova
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Paróquia, esta criação é apoiada por comunidades no entorno ou por uma Paróquia
propriamente dita. A participação dos devotos é fundamental para a criação de uma
paróquia, o que é destacado por Rosendahl (2003):
O pároco exerce as funções associadas ao sagrado e os fiéis podem participar de forma
plena dos sacramentos. Sendo assim, a criação e a consequente ampliação do número de
paróquias, e mesmo a reestruturação de igrejas antigas, podem renascer porque "o
devoto reconhece a igreja como lugar e de sua permanência. (Rosendahl, 2003, p.196).
Além dessa análise da estrutura da paroquia através das entrevistas foi possível
definir uma área de abrangência da paroquia estudada. A Paróquia de São Pedro e São Paulo
o seu território abrange e se constitui em torno do bairro do Guamá, indo a campo,
obtivemos essa informação em entrevistas com o Pároco responsável, Antônio de Pádua
Rodrigues da Silva, e com outros fieis que nos indicaram que o território da paróquia seria:
Figura 4(Área de Abrangência da Paróquia) Fonte: Site da Paróquia São Pedro e São Paulo
Ele descreve que o território da Igreja se desenvolve ao longo das vias principais do
bairro, como a Bernardo Sayão, Augusto Corrêa, e a própria Barão de Igarapé Mirim, e que a
crescente evangelização da comunidade próxima ao Tucunduba (importante área que
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envolve o bairro do Guamá e da Terra Firme) criou mais uma entidade religiosa (Santo
Antônio de Tucunduba) para auxiliar nesse controle sobre a expansão e manutenção de fiéis.
Quanto à igreja IEFP, o pastor relata que para a abertura de uma nova Congregação
ou filial (como ele fala na entrevista), é necessário inicialmente que ele receba um
“chamado”, uma sensação a partir do espiritual. Após isso, se vê o contexto da área (se é um
local carente) necessitando desse trabalho espiritual e social. Segundo ele, a igreja não
possui concorrente, entende-se então que a presença de outras instituições religiosas no
local, não interfere em sua instalação.
Já o território da filial da IEFP, o pastor nos diz que a área de abrangência vai da Av.
Independência até passagem Santa Maria, englobando o Jardim América, o Jardim Itália e o
Jardim Europa. Já um membro entrevistado nos indica onde são realizadas as células, sendo
realizada uma na Rua São Paulo, outra na Passagem Santa Paz, uma na própria sede do
Coqueiro e uma próxima a filial.
Figura 5 (Área de Abrangência da Congregação) Fonte: Imagens Google Earth, 2015. Elaboração: Dias, 2015.
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Com as informações do próprio pastor e de fieis foi possível se aproximar de um
esboço desse território da IEFP. Partimos então para o estudo de que práticas as duas
instituições religiosas analisadas se utilizam para gerir estes territórios, para expandi-lo e
defini-los.
4.1. As formas de definir as territorialidades
Para definir as territorialidades utilizadas para a manutenção e aquisição de novos
territórios, nós analisaremos algumas práticas territoriais utilizadas por essas duas
instituições analisadas, começando pela paroquia, sobre o território da Igreja Católica e
sobre a função da Paróquia Rosendahl (2003) explana:
A igreja Católica reconhece tais territórios religiosos e os controla. Eles são de dois tipos: o
primeiro refere-se aos lugares sagrados e edifícios da igreja; o segundo inclui a sua própria
estrutura administrativa. Assim, a concepção de território religioso católico pode ser
concebida pela igreja-matriz e sua área de abrangência. [...] O território religioso se
modifica para melhor corresponder a afirmação do poder ele responde a duas funções
principais, uma de ordem religiosa e outra de ordem política. A paróquia, em sua
dimensão espacial, muda, morre ou renasce segundo a concentração e a dispersão dos
paroquianos. A vida paroquial está diretamente ligada à dinâmica da ocupação humana.
(ROSENDAHL 2003, p. 194)
As Pastorais são estratégias que a Igreja encontra para manter laços de afetividade,
sem desviar o foco que é a religiosidade, as pastorais são ações de cunho social que trazem a
comunidade um bem estar e um apoio a diversas causas, a pastoral da juventude, por
exemplo, que possibilita ao jovem uma formação profissional, além do foco principal que é a
evangelização. O Pároco forma o conselho de pastorais para administrar as ações
evangelizadoras/sociais, e justamente o ato de evangelizar é praticado pelos discípulos que
se engajam para desenvolver tal evangelização.
A prática das pastorais se tornam muito úteis pra a manutenção dos fiéis, como
explica Rosendahl e Corrêa (2005), já que ela está no cotidiano da comunidade, presente na
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escala da convivência humana, onde os se dá o controle do cotidiano, por parte dos
profissionais do sagrado.
A prática mais eficiente que a IEFP utiliza para a manutenção e aquisição de
territórios, é a dinâmica das células, que são pequenos grupos nos lares, inspiradas em
práticas do início do cristianismo, já que não havia templo físico, as congregações eram
realizadas nos lares. Estas são utilizadas como uma extensão da igreja, criando uma maior
interação entre os fiéis. Nas palavras do pastor entrevistado, “as células servem para cuidar
melhor das ovelhas (fiéis)”. As células dependem apenas de um lar podendo se encontrar
em qualquer parte da cidade desde que tenham fiéis dispostos a criá-la. Por ocorrerem nos
lares às células não criam grandes custos para igreja. Apesar de ocorrer nos lares, às células
possuem uma organização sendo ela: líder, vice-líder, o secretário (anota cada visitante, e
recebe a oferta) e uma pessoa responsável por convidar outras a ingressarem na mesma. A
oferta recebida é destinada para manutenção da célula.
A célula é a estratégia de crescimento e manutenção do território mais eficaz das
Igrejas pentecostais como a IEFP, pois é uma forma de territorialidade mais dinâmica, pois
como visto acima a questão da informalidade, dá célula acontecer nos lares de fieis ou
pessoas que não são da religião, facilita a difusão dessa crença no espaço, assim também
considera Machado citado no texto de Oliveira (2012):
A territorialidade pentecostal é marcada pela descentralização de decisões e por uma
informalidade que facilita de maneira considerável a difusão dessa crença no espaço. Tais
características permitem ao pentecostalismo, não apenas o acompanhamento, mas,
sobretudo, a adaptação às causalidades e às transformações inerentes e imanentes à
sociedade moderna. (MACHADO 1997 apud OLIVEIRA 2012, p. 153).
Ainda sobre essa estratégia territorial que é a célula, podemos dizer que ela é
dinâmica momentânea, pois ela tem um dia e uma determinada temporariedade, podemos
considera-la como um território instável em relação ao da igreja católica, porém mais flexível
dinâmico e rápido no que se diz respeito a conquista de novos territórios, para explicar a
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minha fala sobre territórios dinâmicos, Souza (2008), exemplifica bem o que estamos
tentando expor:
Territórios, que são no fundo antes relações sociais projetadas no espaço que espaços
concretos (os quais são apenas substratos materiais da territorialidades – voltar-se-á a isso
mais adiante), podem, conforme já se indicara na introdução, formar-se e dissolver-se,
constituir-se e dissipar-se de modo relativamente rápido (ao invés de uma escala temporal
de séculos ou décadas, podem ser simplesmente anos ou mesmo meses, semanas ou
dias), ser antes instáveis que estáveis ou, mesmo, ter existência regular mas apenas
periódica, ou seja, em alguns momentos – e isto apesar de que o substrato espacial
permanece ou pode permanecer o mesmo.
As grandes metrópoles modernas, do “Primeiro” como do “Terceiro Mundo”, com toda a
sua complexidade, parecem conter os exemplos mais interessantes e variados de tais
“territorialidades flexíveis”. (SOUZA 2008, p.87)
O território das células e das igrejas pentecostais tem de ser definido
momentaneamente, e não de maneira fechada, pois a sua lógica está baseada em sua
mobilidade e no aspecto transitório dos seus territórios, pois novos territórios são formados
ou concretizados a cada momento, podendo até mesmo haver vários territórios de uma
mesma igreja em um espaço relativamente pequeno.
4.2. Características espaciais das igrejas analisadas (símbolos e representações)
As religiões praticam territorialidades. Assim, produzem símbolos e representações
que indicam que tal espaço os pertence. Esses símbolos podem ser de forma material (como
estátuas de santos) ou imaterial (festas e práticas religiosas), que demarcam o local como
sagrado e/ou pertencente à determinada crença. Segundo Rosendahl (2003), “O conceito de
sagrado e sua representação simbólica remete-nos, inevitavelmente, à perspectiva do poder
mantido e reproduzido pela comunidade em suas territorialidades religiosas ou quase-
sagradas”.
Esses símbolos são perceptíveis, principalmente na Paróquia São Pedro São Paulo
(católica), já que logo na sua fachada há estátuas dos santos que dão nome à entidade.
Outro ponto que simboliza os fiéis desta religião é o fato dos mesmos fazerem uma prática
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da Igreja, o “sinal da cruz”, ao passarem pela frente. Dentro da paróquia, são inúmeros os
objetos sagrados, como cruzes e imagens de santos. Os símbolos são importantes laços
religiosos do catolicismo apostólico romano, assim como as festividades, como evidenciado
em Rosendahl (2003, p.189-90):
No catolicismo popular brasileiro há um conjunto de bens simbólicos - imagens, velas, ex-
votos, terços, medalhas, santinhos e outros objetos (...). A produção desses artigos
religiosos é fortemente suscetível de variação intra-anual e interanual, a partir de
especificidades da demanda vinculada ao sagrado, como as diversas festas e cerimônias
definidoras de tempos sagrados específicos, e também eventos externos ao sagrado.
Para Rosendahl (2003), os objetos sagrados nos podem dizer muito mais do que
aparentam, (...) “existe mais simbolismos nos objetos e nas coisas do que a aparência indica
sugere reconhecer tanto o valor mercantil como o valor cultural de um bem simbólico, isto
é, a mercadoria e o símbolo”, podemos observar isto na fala de uma fiel católica quando se
refere à imagens de santos e objetos sagrados que nos diz: “representa que elas são uma
manifestação concreta em forma de objeto de santos ou mártires que são modelos de
santidade. E as tenho em casa por esses motivos.”. Outro fiel relata sobre os símbolos: “a
imagem dos padroeiros de nossa paróquia, São Pedro e São Paulo, mostra a identidade que
a paróquia possui. As imagens são instrumentos de fé dedicadas a elas fazemos nossas
orações diárias, as imagens dos santos são fundamentais na vida de um católico.”
Já na Igreja Evangélica Filhos da Promessa (IEFP) tais símbolos não são expressivos.
Na fachada da sede (congregação), não há demarcações explícitas do espaço. Importante
ressaltar que a IEFP, apresenta uma interpretação diferente dos mandamentos bíblicos. Para
eles, diferente da Igreja Católica Apostólica Romana, fazer imagens é considerado pecado.
Por isso não há imagens no templo. No entanto, eles apresentam o simbolismo em suas
práticas, presente em suas festividades como a “Festa dos Tabernáculos ou da Cabana”, que
remete aos tempos do Profeta Moisés, em que os israelitas vagavam pelo deserto e
moravam em tendas (cabanas). Em uma entrevista com uma fiel da Igreja IEFP, visualizamos
como este símbolo imaterial age para garantir o território: “eu celebro não só em memória à
esse cuidado e provisão de Deus pelo seu povo no passado, mas ao cuidado que Ele tem
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conosco até hoje”, ela acrescenta ainda que esta festividade pode atrair novos fiéis. “Sim,
[...] acredito que pessoas de outras religiões são atraídas por estes momentos [...], por
questões diversas, seja prestigiar algo histórico ou por acreditar que vai encontrar cura,
respostas, ter suas necessidades pessoais supridas por Deus”.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Partindo do entendimento que os territórios são construídos a partir de relações de
poder, em que um ou mais indivíduos controlam dada porção do espaço (SOUZA, 2001). E
que as instituições religiosas não fogem disso, já que (...) “os fatos religiosos não escapam da
problemática relacional nem, muito menos, do poder, por consequência.” Torna-se evidente
que as mesmas produzem territórios e praticam territorialidades.
Dessa forma as dinâmicas territoriais religiosas expressam uma relação de poder com
seus fiéis, já que essa se faz com a sua manutenção e atração. Para Raffestin (1993), existem
três tipos de trunfos de poder: “[...] população, o recurso e o território”. Nessa discussão o
trunfo população é essencial, pois “[...] é concebida como um recurso, um trunfo, portanto,
mas também como um elemento atuante.” (Raffestin, 1993, p.58), ele nos diz que a
população é a origem de todo o poder existente, ressaltando que nelas residem as
capacidades de transformação e colocando a população como o sujeito que executa as ações
em determinado espaço atuante.
Quanto às igrejas analisadas, percebemos que estas possuem diferenças em suas
territorialidades. Isso se deve as suas próprias diferenças organizacionais, que é fruto de
suas diferenças temporais e espaciais enquanto instituição universal. Rosendahl (2003) nos
diz que a Igreja Católica Romana mantém dois mil anos de história com uma unidade
político-espacial, e encontra-se presente em diversos países (ROSENDAHL, 2003). Já a IEFP
possui 8 anos de existência e localiza-se em alguns pontos do Brasil. No entanto, sendo
instituições religiosas e possuindo a mesma função, “um instrumento de comunicação do
sagrado” (RAFFESTIN, 1993, p. 119), claramente, de formas diferentes.
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Apesar de não ser admitido pelos seus representantes (Pároco e o Pastor). Os
programas desenvolvidos pelas instituições sejam com os grupos de cunho apenas religioso,
ou como as Células e as Pastorais, que tomam uma função social, são estratégias de
manutenção de fiéis, ou seja, territorialidades. Afinal (Raffestin, 1993, p.58) traz em sua
obra, "frequentemente o objetivo declarado mascara os verdadeiros trunfos". Assim,
mesmo que os representantes não enxerguem dessa forma, esses programas são estratégias
territoriais, criando novas e ampliando as relações de poder, pois garantem a manutenção e
a obtenção de novos fiéis (trunfo população).
Quanto às ações analisadas no trabalho: pastorais e células, sendo a primeira
relacionada a Igreja Católica, ou seja, realizadas pela Paróquia São Pedro e São Paulo, já a
última é realizada pela IEFP. Percebemos que as Pastorais são uma importante estratégia,
pois criam vínculos mais resistentes com os fiéis, e acabam por conquistar novos, já que
possuem práticas sociais, como ajuda aos mais necessitados entre outras atividades na
comunidade. No entanto ela não possui um caráter de expansão, e sim mais de delimitação
territorial, já que as reuniões ocorrem no espaço da paróquia, no caso o ponto fixo.
Já as células, pertencentes à IEFP, acabam por se tornar estratégia única, já que a
mesma possui grupos de reuniões fora do espaço-território da Igreja, que pode vir a crescer
e se tornar uma nova filial da IEFP. Possuindo além do caráter de definição e manutenção, o
caráter de expansão do território da Igreja. Outra característica é a diferenciação nas
relações de poder entre o especialista do sagrado e os fiéis, pois são os leigos que realizam
as atividades nas células, podendo ser realizado por um pastor, mas não sendo regra.
Quanto aos símbolos fruto dessas dinâmicas territoriais das igrejas analisadas,
contatamos através das entrevistas e da ida a campo, que estes são importantes na
manutenção dos territórios, podendo ser tanto imateriais quanto materiais. Na Paróquia São
Pedro e São Paulo os símbolos materiais são expressivos, nas figuras dos santos, e servem
como uma identidade, gera uma relação de pertencimento entre o fiel e o espaço sagrado.
Na Congregação da IEFP esses símbolos se encontram no campo do imaterial. Não há
imagens no interior do templo, no entanto percebe-se esses símbolos em suas práticas,
17
como as festas que simbolizam momentos históricos de sua crença. E percebemos que
mesmo imateriais geram uma relação de pertencimento entre o fiel e o espaço sagrado.
Dessa forma as células se mostram como uma estratégia muito dinâmica, já que
estas podem ampliar as áreas de atuação da instituição, seus territórios, identificando
possíveis pontos onde possa se instalar um novo templo, em diversas partes da cidade, sem
depender de grandes custos por parte da Igreja, diferente das pastorais que se mantem no
território da paróquia. Mas vale ressaltar que esses territórios cíclicos, as células, também
são frágeis, pois não se dão no espaço sagrado. Quanto aos símbolos tanto materiais quanto
imateriais são formas de definição desse território, pois criam uma relação de
pertencimento entre os fiéis e o espaço sagrado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HAESBAERT, Rogério. Território e multiterritorialidade: um debate. GEOgrafia, v. 17, 2007.
HAMMES, R. Atual organização da Igreja Católica na região. In: _________.Igreja Católica,
Sindicatos e Movimentos Sociais: Quarenta anos de história projetando luzes para a defesa e
promoção da vida na região. Edunisc, Santa Cruz do Sul, 2003. p. 48-49.
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