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TRABALHO, FORMAÇÃO E CONDIÇÃO DOCENTE NA EDUCAÇÃO BÁSICA E SUPERIOR: ANALISANDO PESQUISAS E EXPERIÊNCIAS Este painel tem como eixo o trabalho docente buscando reunir diferentes contextos e perspectivas de análise do trabalho, da formação e das condições objetivas do exercício profissional da docência com foco na realidade do Distrito Federal. Desta forma, apresenta dois trabalhos que discutem a docência na Educação Profissional Técnica e Tecnológica (EPT) como modalidade da educação básica e superior e um terceiro que analisa o contexto da educação básica regular, mas, especificamente, a condição do professor que ingressa na carreira docente. As pesquisas partem, então, do pressuposto de que a formação e o trabalho constituem uma unidade e que a sua análise precisa considerar as múltiplas determinações imbricadas na educação como prática social. Assim, o primeiro estudo levanta elementos em teses e dissertações buscando identificar sobre quais perspectivas da produção acadêmica a respeito da docência e a constituição de seu trabalho e profissionalidade podem ser apontadas para o trabalho e a formação docente na EPT no contexto de expansão da Educação Profissional após a lei que institui Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT) a partir do ano de 2008. Desse mesmo cenário o segundo trabalho analisa a particularidade do trabalho docente na verticalização a integração da educação básica ao nível superior com o mesmo corpo docente a partir de uma otimização de recursos no Instituto Federal de Brasília. Por fim, o terceiro trabalho tem como objeto o professor iniciante na Secretaria de Educação do Distrito Federal destacando as mediações e contradições para a resistência e desistência da carreira docente problematizando a realidade objetiva de se iniciar a carreira sob determinadas condições concretas de trabalho. Palavras-chave: Trabalho Docente. Formação De Professores. Educação Básica e Superior. XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 9081 ISSN 2177-336X

TRABALHO, FORMAÇÃO E CONDIÇÃO DOCENTE … que a formação e o trabalho constituem uma unidade e que a sua análise precisa considerar as múltiplas determinações imbricadas

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TRABALHO, FORMAÇÃO E CONDIÇÃO DOCENTE NA EDUCAÇÃO

BÁSICA E SUPERIOR: ANALISANDO PESQUISAS E EXPERIÊNCIAS

Este painel tem como eixo o trabalho docente buscando reunir diferentes contextos e

perspectivas de análise do trabalho, da formação e das condições objetivas do exercício

profissional da docência com foco na realidade do Distrito Federal. Desta forma,

apresenta dois trabalhos que discutem a docência na Educação Profissional Técnica e

Tecnológica (EPT) como modalidade da educação básica e superior e um terceiro que

analisa o contexto da educação básica regular, mas, especificamente, a condição do

professor que ingressa na carreira docente. As pesquisas partem, então, do pressuposto

de que a formação e o trabalho constituem uma unidade e que a sua análise precisa

considerar as múltiplas determinações imbricadas na educação como prática social.

Assim, o primeiro estudo levanta elementos em teses e dissertações buscando identificar

sobre quais perspectivas da produção acadêmica a respeito da docência e a constituição

de seu trabalho e profissionalidade podem ser apontadas para o trabalho e a formação

docente na EPT no contexto de expansão da Educação Profissional após a lei que

institui Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT) a

partir do ano de 2008. Desse mesmo cenário o segundo trabalho analisa a

particularidade do trabalho docente na verticalização – a integração da educação básica

ao nível superior com o mesmo corpo docente a partir de uma otimização de recursos –

no Instituto Federal de Brasília. Por fim, o terceiro trabalho tem como objeto o

professor iniciante na Secretaria de Educação do Distrito Federal destacando as

mediações e contradições para a resistência e desistência da carreira docente

problematizando a realidade objetiva de se iniciar a carreira sob determinadas condições

concretas de trabalho.

Palavras-chave: Trabalho Docente. Formação De Professores. Educação Básica e

Superior.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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TRABALHO DOCENTE NA VERTICALIZAÇÃO DO INSTITUTO FEDERAL

DE BRASÍLIA

Blenda Cavalcante de Oliveira

Professora do Instituto Federal de Brasília - IFB

[email protected]

Resumo: Este trabalho analisa a particularidade do trabalho docente na verticalização

dos Institutos Federais (IFs) a partir das determinações específicas da educação

profissional e tecnológica (EPT), na totalidade de uma política pública educacional

brasileira, que se insere no sistema do capital com suas contradições e mediações. Na

busca pela compreensão da realidade, que se entende como contraditória e em

permanente transformação, realizamos análise documental a partir da legislação

educacional voltada para a EPT e de documentos oficiais emitidos pelo Ministério da

Educação (MEC) e Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (SETEC) e pelo

próprio Instituto Federal de Brasília (IFB), que subsidiaram os achados sobre o trabalho

docente no IFB. Nossas descobertas indicam que a expansão acelerada da Rede Federal

de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT) enquanto política

pública, ao mesmo tempo em que levou o ensino técnico de nível médio e superior para

regiões menos favorecidas do país, o fez sem as devidas condições, pois a infraestrutura

dos IFs tem se mostrado insuficiente para cumprir as exigências que são propostas às

instituições. A característica de verticalização dos IFs – que significa a integração da

educação básica ao nível superior com o mesmo corpo docente a partir de uma

otimização de recursos – tem impelido à flexibilização e polivalência docente. O perfil

do professor polivalente, que dá conta de todas as demandas da instituição, está

submetido a um excessivo número de aulas, leva à intensificação do trabalho,

dificultando a realização da tríade ensino, pesquisa e extensão, revelando dados

indicativos alarmantes sobre a condição de trabalho docente nos IFs.

Palavras-chave: Verticalização. Trabalho Docente. Instituto Federal de Brasília.

INTRODUÇÃO

A partir de 2008, observa-se uma alteração e expansão da Educação

Profissional e Tecnológica (EPT) em todo o país apoiada na transformação das antigas

Escolas Técnicas Federais. Essas escolas, a exemplo dos Centros Federais de Educação

Tecnológica (CEFET), escolas agrotécnicas e escolas vinculadas a universidades, em

sua maioria deixaram de existir para se transformarem em Institutos Federais de

Educação, Ciência e Tecnologia, também conhecidos somente como Institutos Federais

(IFs). Essa transformação significou a expansão acelerada da educação profissional,

uma vez que em pouco tempo as escolas técnicas federais, muitas delas centenárias,

tiveram a sua estrutura administrativa reorganizada, transformadas em IFs e novas

unidades descentralizadas, chamadas de campus, foram criadas em todos os estados

brasileiros, contemplando regiões onde antes não havia educação profissional pública

federal. Todas essas mudanças foram resultado de um processo político, histórico e

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social, culminado na Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008, que institui a Rede

Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT), conhecida como

Rede Federal, e cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia.

Conforme a referida lei de criação dos IFs, na Seção II que trata das finalidades e

características dos Institutos Federais, em seu Artigo 6º, destacamos o inciso “III -

promover a integração e a verticalização da educação básica à educação profissional e

educação superior, otimizando a infraestrutura física, os quadros de pessoal e os

recursos de gestão” (BRASIL, 2008). Assim, verticalização é uma característica dos IFs

que possibilitaria a otimização dos seus recursos, inclusive humanos. O conceito de

otimização pode ser encontrado no dicionário da língua portuguesa, significando tornar

ótimo. “Ótimo” é o adjetivo superlativo absoluto sintético de “bom”, ou seja, o melhor

possível. Na biologia significa o ponto onde se obtém melhor resposta a um estímulo ou

conjunto de condições de meio que sejam as mais favoráveis à realização de diversas

funções, ou seja, obter o melhor desempenho possível de um sistema, segundo critérios

de funcionamento previamente definidos. No caso dos IFs, o conceito de otimização foi

aplicado à educação, no qual os critérios de desempenho são a realização dos seus

múltiplos objetivos, finalidades e características, em conformidade com a sua lei de

criação.

Por essa característica de verticalização, os professores dos Institutos Federais

defrontam-se em seu trabalho com as distintas especificidades que envolvem o ensino

na educação básica, na educação superior e tecnológica, além do desenvolvimento de

atividades de pesquisa e extensão. Essas são características da verticalização, que por

um lado oferece aos estudantes dos IFs a possibilidade de traçar um itinerário formativo

que vai da educação básica ao nível superior e por outro leva o corpo docente a realizar

ensino, pesquisa e extensão em diferentes níveis e modalidades de ensino

simultaneamente. Compreender o trabalho do professor no contexto dessa nova

institucionalidade é apreender as totalidades que envolvem as características próprias do

trabalho docente, a historicidade e a política de expansão da educação profissional que

resultou na reorganização de antigas escolas federais, na criação dessas recentes

instituições educacionais e os encadeamentos resultantes da verticalização no trabalho

dos professores e professoras que atuam no ensino profissional.

Com essa intenção, esta pesquisa teve como objetivo analisar o trabalho

docente no contexto da verticalização do ensino no Instituto Federal de Brasília (IFB).

Realizamos análise documental a partir da legislação educacional voltada para a EPT e

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de documentos oficiais emitidos pelo Ministério da Educação (MEC) e Secretaria de

Educação Profissional e Tecnológica (SETEC) e pelo próprio Instituto Federal de

Brasília (IFB) que subsidiaram os achados sobre o trabalho docente no IFB.

O TRABALHO

Na produção da vida material, o trabalho é categoria fundante do ser social. O

homem, ao nascer, carrega consigo o patrimônio genético da espécie, mas é por meio do

trabalho que se humaniza. A categoria do trabalho, para Marx é o que diferencia o ser

humano do reino animal, pois distinto do animal, que apenas adapta-se à natureza, o ser

humano por meio da sua ação consciente, transforma o meio natural em seu benefício.

O trabalho tem, “portanto, [...] uma intenção ontologicamente voltada para o processo

de humanização do homem em seu sentido amplo” (ANTUNES, 1999, p. 142). O

trabalho é então, componente fundante da sociabilidade humana.

O trabalho, enquanto gênese do ser social existe para responder a situações

concretas das necessidades do ser humano e, de acordo com o momento social, o

trabalho tem diferentes significados e, sendo determinado, “assume formas históricas

específicas nos diferentes modos de produção da existência humana” (FRIGOTTO,

2009). No sistema de produção capitalista, no qual os homens se dividem em detentores

e não detentores dos meios de produção, o trabalho se assume como mercadoria, uma

vez que aqueles que não detêm os meios de produção nada mais possuem além da sua

própria força de trabalho. Dessa forma, o capital acumula-se em poucas mãos, e os

trabalhadores vendem a única coisa que possuem. Os produtos desse trabalho sob a

condição da expropriação não pertencem ao trabalhador, mas ao capitalista. Esse tipo de

trabalho, no sentido econômico (KOSIK, 2002) não mais se configura como

humanização do homem, mas como alienação. Nesse sentido, trabalho é diferente de

emprego. O trabalho enquanto princípio ontológico de humanização do homem é

distinto do trabalho realizado sob o modo de produção capitalista, na forma de emprego

ou trabalho assalariado.

Ao tratar sobre trabalho assalariado, a classe trabalhadora é um conceito

presente na obra de Marx e que foi ampliado por Antunes (1999) como classe-que-vive-

do-trabalho, ou seja, todo aquele que vende sua força de trabalho, e que engloba o

trabalho assalariado. Essa classe que vive do trabalho incorpora tanto os trabalhadores

produtivos – aqueles que produzem mais-valia e valorizam diretamente o capital –

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quanto os trabalhadores improdutivos – aqueles cujo trabalho é consumido como

serviço –, seja para uso público ou para o capitalista.

O trabalhador improdutivo está em franca expansão no capitalismo

contemporâneo e envolve uma massa de assalariados do setor de serviços, tais como

bancos, comércio e serviços públicos. No modo de produção capitalista, as alterações no

mundo do trabalho, referentes às concepções de trabalho como princípio ontológico,

acometem o sistema econômico, político e influenciam a organização de toda uma

sociedade, inclusive a organização do sistema educacional como um todo e,

particularmente, do trabalho escolar, enquanto parte integrante do setor de serviços.

Nessas circunstâncias, a gestão educacional se aproxima de uma administração

gerencial, ignorando as especificidades das instituições de ensino, bem como a natureza

do trabalho pedagógico. O trabalho docente, como parte constituinte da totalidade do

trabalho no capitalismo, está sujeito também a sua lógica de exploração e contradições.

Na produção da sua existência, o homem busca antes de tudo a sua

sobrevivência material, assim a produção de bens materiais se torna cada vez mais

elaborada. Essa produção, na qual o homem planejou antecipadamente representando

mentalmente os objetivos reais da sua atividade é considerada trabalho material. A

“representação inclui o aspecto de conhecimento das propriedades do mundo real

(ciência), de valorização (ética) e de simbolização (arte).” (SAVIANI, 1984, p. 1). A

produção de conhecimentos, ideias, conceitos, valores, símbolos, atitudes, habilidades

são consideradas trabalho não material. Mas o trabalho não material se divide em duas

modalidades. Quando o produto se separa do produtor, no caso de um objeto artístico ou

livro existe um intervalo entre produção e consumo. Na segunda modalidade o produto

não se separa do ato de produção, não existe o intervalho entre o ato de consumir e

produzir, pois eles estão imbricados, como é o caso da educação.

A educação, enquanto prestação de um serviço está assim localizada na forma da

produção não material, não separando o produto do seu processo de sua produção, como

acontece, por exemplo, em uma sala de aula. Essa é uma característica própria do

trabalho docente. Os professores de instituições públicas – objeto deste estudo – são

trabalhadores assalariados, vendem sua força de trabalho para uma instituição

educacional pública – são, portanto, classe que vive do trabalho - prestadores de um

serviço, que é a educação pública, dessa forma, realizam trabalho improdutivo e não

material. O fato de o trabalho docente ser não material significa que há mais espaço para

a resistência e autonomia do trabalhador. O trabalho docente vive uma contradição entre

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as condições de sua realização e o prazer e o compromisso com um quadro de políticas

públicas onde há redução de investimentos em educação e aumento das exigências sobre

o papel da escola. Em todo tipo de trabalho há o dispêndio de “[...] energias físicas,

intelectuais e afetivas” (DAL ROSSO, 2014, p. 80), e sendo trabalhadores não materiais

existe uma carga extra de sofrimento psíquico ao qual estão submetidos.

As condições de trabalho entendidas como meios para ocorrer o trabalho de

maneira satisfatória. Podemos considerar “[...] meios de trabalho em sentido lato todas

as condições materiais seja como for necessárias à realização do processo de trabalho.

Elas não participam diretamente do processo, mas este fica sem elas total ou

parcialmente impossibilitado de concretizar-se” (MARX, 1989, p. 205). Assim,

pesquisas indicam que nem todos os campi dos IFs oferecem aos professores condições

materiais de trabalho para cumprir com todas as determinações que lhes são exigidas

(RAMOS, 2011; FERRETTI, 2011; GONÇALVES, 2014). Considerando as condições

de trabalho dos professores no Instituto Federal, a verticalização, que poderia unir o

melhor de dois mundos – da Educação Básica e Superior -, ao mesmo tempo impõe

excesso de funções e tarefas aos seus docentes que trabalham em uma estrutura

otimizada de IF, levando a uma intensificação desse trabalho (GONÇALVES, 2014;

MENEZES, 2015).

A intensificação do trabalho “representa uma das formas tangíveis pelas quais os

privilégios de trabalho dos trabalhadores educacionais são degradados.” (KUENZER;

CALDAS, 2009, p. 35) e as implicações para o trabalho docente são várias com cada

vez mais sobrecarga de atividades para cumprir. A condição de intensificação do

trabalho se traduz em mais esforço físico, intelectual e emocional com a finalidade de

produzir mais resultados, consideradas constantes a jornada, a força de trabalho e as

condições técnicas. O trabalho é intensificado por meio do alongamento das jornadas;

ritmo e velocidade; acúmulo de atividades; polivalência, versatilidade e flexibilidade; e,

gestão por resultados (DAL ROSSO, 2008). A carga mental do trabalho (CODO, 1999)

é a ampliação do tempo de trabalho e a diversificação de tarefas, além da fragmentação

do trabalho, preponderante em profissionais que trabalham em mais de um nível de

ensino, como é o caso dos IFs verticalizados e otimizados, o que pressupõe maior

esforço de adaptação entre ambientes diferentes e preparação de atividades distintas,

podendo gerar exaustão.

Nos IFs, é possível perceber características da intensificação do trabalho docente

por meio dos cinco meios elencados por Dal Rosso, por exemplo: o alongamento das

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jornadas de trabalho pode ser percebido nas atividades que os professores levam para

casa, atitude bastante comum no meio docente como planejamento de aulas,

preenchimento de diários e correção de provas. O acúmulo de atividades pode ser

percebido no desenvolvimento do ensino, da pesquisa e da extensão no nível básico e

superior, além daqueles docentes que assumem cargos de gestão em seus campi. A

polivalência pode ser verificada no que denominamos como polivalência por nível de

ensino, ou seja, professores que assumem o ensino na verticalização dos Institutos

Federais, atendendo a uma diversidade de níveis e modalidades que vão do Ensino

Médio Integrado ao Ensino Médio Concomitante, cursos FIC, cursos de nível superior

tanto na licenciatura, bacharelado quanto tecnólogo, cursos de educação a distância,

cursos de pós-graduação, programas como Proeja, entre outras atividades voltadas para

o ensino. A versatilidade e a flexibilidade podem ser observadas na atuação em nos

diferentes cursos e áreas de atuação de um IF, independente da formação ou experiência

profissional daqueles docentes. A gestão por resultados vem das cobranças de

resultados padronizados para todos os IFs por meio da sua lei de criação, que estabelece

os percentuais mínimos que devem ser cumpridos para atingir os objetivos, além das

demandas de cada Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) da instituição

dependendo do estágio de implantação em que se encontra.

O discurso oficial, feito por aqueles que pensam a política (no caso dos IFs, a

Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC), enxerga o professor que

irá trabalhar no contexto da verticalização da seguinte forma:

Ora, é evidente que esse modelo curricular exige mudanças no perfil do

profissional docente inserido na Rede, pois lidar com o conhecimento de

forma integrada e verticalizada exige a superação do “modelo hegemônico

disciplinar” e a construção do perfil de um profissional docente capaz de

“desenvolver um trabalho reflexivo e criativo e promover transposições

didáticas contextualizadas que permitam a construção da autonomia dos

educandos” (BRASIL, 2008b, p. 28) (PACHECO; PEREIRA; SOBRINHO,

2010, p. 81).

Parafraseando Cruz e Neto (2012), a retórica eloquente do discurso oficial

descreve os predicados da verticalização e responsabiliza o professor dos IFs para que

ele seja criativo o suficiente para dar conta de múltiplos currículos desde a educação

básica ao ensino superior em uma instituição que se equipara, em alguns aspectos, a

uma universidade e, em outros, a uma escola de educação básica, técnica e tecnológica.

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Mas quais as condições concretas de trabalho nas quais se realizam essa verticalização e

essa docência polivalente? Qual a distância entre a verticalização ideal e a real?

Diante da política de expansão da RFEPCT, analisamos a realidade concreta de

implantação de um IF e, para tanto, tomamos o Instituto Federal de Brasília como lócus

de análise. É a partir desse contexto e de alguns dos movimentos de construção do

trabalho docente que analisaremos a seguir.

O INSTITUTO FEDERAL DE BRASÍLIA

O Instituto Federal de Brasília faz parte dos IFs criados a partir de Escolas

Agrotécnicas, mais especificamente, mediante transformação da Escola Técnica Federal

de Brasília. O IFB foi criado em 2008, sendo composto por dez campi. O Plano de

Desenvolvimento Institucional (PDI) do IFB afirma que a instituição “é mais que uma

IES. Aqui se oferta a formação profissional desde a sua iniciação até a pós-graduação”

(IFB, 2014, p. 18). O PDI trata-se de um documento obrigatório para as Instituições de

Educação Superior, mas no caso de um IF, por sua característica de verticalização do

ensino, ele termina por abordar todos os segmentos que o compõem.

O Instituto Federal de Brasília por ter natureza jurídica de autarquia é detentor

de autonomia administrativa, patrimonial, financeira, didático-pedagógica e disciplinar.

Dessa forma, o IFB tem dispositivos internos para organizar o seu funcionamento. Este

é o caso da Portaria RIFB nº24 de 2009 que estabelece a distribuição da carga horária

didática semanal dos docentes do IFB por tipo de atividade. Essa portaria passou por um

processo de atualização no ano de 2015 e para essa tarefa foi instituída uma comissão

formada por servidores do IFB que, entre outras atividades, realizou consulta pública

para que os professores pudessem sugerir alterações no documento. O documento esteve

em consulta pública no site do Instituto Federal de Brasília e, por meio de formulário

próprio, foi possível fazer contribuições ao documento. A comissão sistematizou essas

contribuições e ofereceu uma avaliação para cada sugestão apresentada. Os documentos

produzidos pela comissão foram disponibilizados no mesmo site do IFB, no qual foi

possível acessá-los para destacar alguns pontos importantes sobre a opinião dos

docentes a repeito de um documento que interessa diretamente a eles, pois organiza seu

trabalho dentro da instituição.

Os professores de diversos campi sugeriram que a carga horária em sala de aula

fosse delimitada em um mínimo de 8 horas e um máximo de 12 horas. A justificativa

para essa alteração foi que “O envolvimento com pesquisa viabilizará melhores

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estruturas para o desenvolvimento das atividades de ensino, teórica e, principalmente,

práticas no IFB” (IFB, 2015, p. 24). Os professores assinalam que estão

sobrecarregados com atividades de ensino, dificultando a realização de outras atividades

inerentes às suas funções no IFB. Também houve a sugestão de que o número de

componentes curriculares diferentes ministrados por docente não excedesse o limite de

quatro. A justificativa para isso vem daqueles professores que vivem a verticalização

nos campi, por exemplo, há aqueles que ministram aulas no nível superior no curso de

Tecnologia em Agroecologia e Técnico em Agropecuária (subsequente e integrado), e

acreditam que “seja pedagogicamente inviável a docência de mais de quatro

componentes curriculares diferentes por professor” (IFB, 2015, p. 31). Os professores

seguem afirmando que o número acima de quatro componentes curriculares por docente

prejudica a qualidade da aula e o processo de ensino aprendizagem; devido à limitação

do tempo necessário para preparação didática de cada componente curricular. Afirmam

também que “a complexidade dos conteúdos ministrados no ensino superior também

requer um tempo maior de preparação didática” (IFB, 2015, p. 31).

Os professores que lecionam nos cursos superiores argumentaram mais de uma

vez sobre o grau de dificuldade que esse nível tem representado para eles no sentido do

planejamento das atividades. São docentes que estão vivenciando a polivalência por

nível de ensino, uma vez que lecionam em dois níveis e sentem as complicações

causadas pela sobrecarga de múltiplos componentes curriculares distintos. Com uma

estrutura enxuta e otimizada, os professores do IFB não têm opção a não ser assumir

uma variedade de componentes curriculares e em cursos diferentes.

Na lei de criação dos IFs, Art. 2o § 1º, para efeito da incidência das disposições

que regem a regulação, avaliação e supervisão das instituições e dos cursos de educação

superior, os Institutos Federais são equiparados às universidades federais. Considerando

que os IFs, conforme o Decreto nº 5.773 de 2006, no que se referem à regulação,

supervisão e avaliação serão tratados como instituições de educação superior,

depreende-se que, para serem avaliados de maneira equivalente, os professores

deveriam ter as mesmas condições de trabalho de seus pares nas universidades federais.

O que existe atualmente é um sistema de avaliação único para os cursos superiores, o

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) tratando como iguais

instituições que funcionam em situações diversas. O documento de Análise das

Contribuições da Comunidade pela comissão do IFB segue com vários outros

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comentários sobre a sobrecarga de trabalho docente e propostas para minimizá-la. Todas

devidamente declinadas pela comissão.

Tanto a proposta de alteração quanto a atual Resolução RIFB nº. 24/2009, que

regula a carga horária docente no IFB refuta de toda maneira a possibilidade de que os

professores tenham mais do que 8 horas semanais para o planejamento das aulas e todas

as outras atividades que resultam do ensino (elaboração e correção de atividades de

avaliação, preenchimento de diários, planejamento das aulas, leituras para as aulas,

entre outros). O resultado disso é o indicativo de intensificação do trabalho para dar

conta de todas essas atividades imprescindíveis ao ensino ou a utilização do tempo que

deveria ser de pesquisa e extensão para esse propósito. A fala dos professores dá a

dimensão da sobrecarga

Alguns professores com 18 horas/aula estão esgotados. A qualidade das aulas

fica comprometida. Um professor que tem 4 componentes diferentes continua

com a mesma quantidade de horas para atender alunos e preparar suas aulas.

Isso é simplesmente improdutivo (IFB, 2015, p. 40).

O parecer jurídico da Procuradoria Geral da União junto ao IFB sobre a minuta

de resolução proposta pela comissão sugere que “a prioridade de distribuição de carga

horária docente deve ser dada às atividades de ensino” (AGU, 2015, p. 3), o que é

prontamente acatado pela comissão, que deixa claro que as aulas são priorizadas em

relação às outras atividades de pesquisa e extensão. Fica evidente que a função

primordial do professor do IFB é estar em sala de aula. A contradição se revela na

quantidade de atribuições e exigências que se faz desse profissional para além da

docência propriamente dita. O que parece resultar com essas determinações é um

professor que leciona no nível superior, mas que não realiza pesquisa, pois não há

tempo, um professor que desenvolve programas de extensão e pesquisa aplicada, mas

não tem as condições para o que propõe a lei que cria os IFs.

Além da intensificação do trabalho docente, a consequência dessa sobrecarga é a

baixa produtividade de pesquisa, conforme indicou o estudo da Fundação Joaquim

Nabuco que deixa claro que uma das principais causas para essa situação é o

requerimento no tempo dos professores em atividades de ensino, assim

Os IFs não fazem, na maioria dos seus campi, pesquisa tecnológica, nem

transferem tecnologia, por falta de incentivo específico e pela grande

demanda para atividades de ensino, agravada por ser simultaneamente em

diferentes níveis (básico, superior e profissional), que exigem diferentes

formas de comunicação e técnica pedagógica e em alguns casos por exceder a

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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competência de ensino adquirida pelos novos professores em seus cursos de

graduação e pós-graduação que não preveem o exercício do ensino

fundamental. (TÁVORA et al., 2015, p.11, grifo nosso).

O estudo ressalta ainda as condições de trabalho como a “deficiência na

estrutura de apoio, como laboratórios” e a “drenagem de tempo e energia” que impede o

cumprimento das determinações da Lei que criou os IFs. Os pesquisadores recomendam

a alocação de um tempo máximo de carga horária no ensino que seja compatível com o

desafio da tarefa que se propõe, além do que, os Institutos são avaliados da mesma

forma que as Universidades, tratando como iguais situações bastante diferentes.

A análise documental denota a intensificação do trabalho docente como um

impeditivo para que os IFs alcancem suas metas estabelecidas em lei. Assim, a criação

dos Institutos Federais aparenta ser uma inovação no campo educacional, porém, até

aqui os IFs estão se desvelando como a junção de antigos modelos educacionais, tanto

em nível médio quanto em nível superior, sem apresentar modificação enquanto

processo educativo, apesar do discurso inovador. A novidade está na criação de uma

única instituição pluricurricular, com estrutura otimizada e sobrecarga dos seus

professores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A expansão da Rede Federal e consequentemente a criação dos Institutos

Federais trouxeram implicações para o trabalho docente. Sendo os professores aqueles

que materializam a política pública de expansão da educação profissional, técnica e

tecnológica, pouco participaram na elaboração e nos processos decisórios de

reorganização da educação profissional (FERRETTI, 2011). Os novos professores que

chegam aos IFs não têm clareza dos objetivos e características da nova instituição que

tem uma institucionalidade multifuncional, ou seja, não há uma identidade própria, mas

sim um hibridismo entre escola técnica e universidade (MANCEBO; SILVA JUNIOR,

2015). O trabalho dos professores nos IFs se caracteriza pela sua diversificação, ao

mesmo tempo em que o professor do IF tem as atribuições e responsabilidades de um

professor de Ensino Médio e de Nível Superior, ele também deve se dedicar no seu

cotidiano à realização de pesquisa científica e ações de extensão, visando, conforme a

legislação, o desenvolvimento dos arranjos produtivos locais.

As condições concretas de trabalho em cada Instituto Federal são desiguais,

podem ser baseadas em seu histórico e experiência na educação profissional, portanto

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importa se foi criado a partir de um CEFET ou colégio agrícola, interessa se trata de um

campus centenário ou recém-criado, se funciona de maneira adequada ou improvisada,

quais as condições dos professores realizarem o ensino, a extensão, a pesquisa ou

mesmo seus estudos de pós-graduação, tão necessários ao desenvolvimento profissional.

Podemos perceber uma diversidade das condições de exercício da profissão com

Institutos Federais e campi com condições materiais mais ou menos compatíveis às

exigências que são gerais para todos.

Destacamos a importância do olhar sobre o impacto da verticalização no

trabalho dos professores e a pertinência ao abordar questões, como por exemplo: as

condições materiais de trabalho, as exigências sobre as atividades que devem ser

desenvolvidas, as inquietações e os desafios trazidos pelas várias ocupações, as

experiências dos professores e a organização pedagógica como um todo. Os professores

são chamados a desempenhar funções e responder a exigências que muitas vezes estão

além da sua formação. É preciso se posicionar na defesa por condições de trabalho para

uma prática que favoreça o desempenho, saberes e competência docente. Esses são

aspectos que denotam a materialidade do trabalho que expressam também os nexos

entre este trabalho e as demandas oficiais das políticas que lhes são impostas afetando a

sua autonomia e promovendo intensificação.

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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9093ISSN 2177-336X

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A PRODUÇÃO ACADÊMICA SOBRE O TRABALHO E FORMAÇÃO

DOCENTE PARA A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

Shirleide Pereira da Silva Cruz

Professora Doutora da Universidade de Brasília

[email protected]

Resumo: Este trabalho analisa quais perspectivas da produção acadêmica sobre a

docência e a constituição de seu trabalho e profissionalidade no contexto da educação

profissional (EPT) podem ser apontadas para o trabalho e a formação docente na EPT.

Para tanto, realizou-se um estudo de teses e dissertações defendidas no período de 2008

a 2014, ou seja, a partir da lei que institui a Rede Federal de Educação tecnológica uma

vez que esta trouxe a demanda de expansão dos institutos federais e ampliação do seu

correspondente quadro docente. Utilizou as palavras-chave: profissionalidade docente,

professor da educação profissional, bacharel docente e trabalho docente,

encontrando, num total de 81 trabalhos apenas, 9 (nove) que trataram da análise da

docência na EPT no contexto da Rede Federal de Educação Profissional (RFEPT),

distribuídos entre os anos de 2010 a 2014, o que demonstra o período recente da nova

profissionalidade dos IFs e um interesse relevante sobre essa realidade. Percebeu-se

que pela existência na maioria dos estudos o olhar se direcionou muito mais pela

formação na perspectiva do sujeito, o par dialético trabalho-formação foi pouco

explorado o que pode reproduzir, muitas vezes, lógica pragmática e de

responsabilização do professor. Contudo, identificou-se conteúdos formativos que

podem abrir perspectivas mais coletivas de construção da docência na EPT, tais como:

o conhecimento e a pesquisa sobre a educação; a constituição de uma unidade entre os

conhecimentos didáticos dos conteúdos e os conhecimentos das profissões de origem;

unidade teoria-prática; formação política e social; relação educação e trabalho e

sujeitos da educação profissional.

Palavras-chave: Educação Profissional. Trabalho Docente. Formação Docente.

INTRODUÇÃO

Com a aprovação da lei 11.892/2008, o governo federal instituiu a Rede

Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (RFEPCT) no país e criou

os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, extinguindo assim as Escolas

Agrotécnicas Federais, Escolas Técnicas Federais e a maioria dos Centros Federais de

Educação Tecnológica.

Nesse sentido, vivencia-se uma expansão dos Institutos Federais, resultantes de

políticas que buscam ampliar a oferta da educação profissional e tecnológica e

consequentemente, uma ampliação dos quadros docentes para atuarem nessa instituição.

Contudo, a essa ampliação não se percebe uma relação direta de uma política de

formação de professores específica para os profissionais que atuam nesta modalidade.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9094ISSN 2177-336X

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Observa-se a existência de certo “silêncio” sobre o contexto da docência exercida por

profissionais tanto licenciados como não licenciados na área da EPT.

Já no âmbito da produção acadêmica temos exemplos de pesquisadores que

tem pensado de forma sistemática sobre a formação de professores para essa

modalidade de ensino. Moura (2008), por exemplo, descreve três perfis de professores

que exigiriam diferentes formatos de ações para a formação docente naquele contexto

que poderiam contribuir com a consolidação de um trabalho docente que, determinado

pelas relações entre os projetos de educação e o papel da educação profissional numa

sociedade capitalista, pode assumir. São eles:

os profissionais não graduados que já atuam na EPT. [...] os graduados que já

atuam como docentes da EPT, mas não têm formação específica nessa esfera

educacional; e os futuros profissionais que já estão em formação superior

inicial. (p. 31) [...] delineiam-se duas possibilidades concretas para essa

formação de professores: cursos de licenciatura voltados para a educação

profissional e pós-graduação lato e stricto sensu. (p.32)

Machado (2008) também tem discutido uma proposta de licenciatura para a

educação profissional em contraposição à lógica de propostas de cursos aligeiradas e

emergenciais que tem marcado historicamente a formação de professores para a EPT.

Defendendo que um curso de licenciatura apresenta

a possibilidade ao professor da educação profissional para o desenvolvimento

de pedagogias apropriadas às especificidades da educação profissional, o

intercâmbio de experiências no campo da educação profissional, o

desenvolvimento da reflexão pedagógica sobre a prática docente nesta área, o

fortalecimento do elo entre ensino-pesquisa-extensão, pensar a profissão, as

relações de trabalho e de poder nas instituições escolares, a responsabilidade

dos professores etc ( p. 15 )

Esse debate, então, pode ser problematizado focalizando-se a produção

acadêmica sobre a docência na EPT. Será que esta tem sido analisada como um trabalho

inteiro do docente? Ou tem sido vista de forma fragmentada? Quais bases

epistemológicas têm norteado estes estudos? Quais perspectivas pode-se vislumbrar

com as análises produzidas? Daí o presente texto parte da seguinte questão central:

Quais perspectivas da produção acadêmica sobre a docência e a constituição de seu

trabalho e profissionalidade podem ser apontadas para o trabalho e a formação docente

na EPT?

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9095ISSN 2177-336X

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Partimos da compreensão de que trabalho e formação constituem um par

dialético. Ou seja, a formação tem sua gênese no trabalho (LIMONTA; CURADO

SILVA, 2013, p. 174). O trabalho como ontologia do ser social, como expressão

humana de transformar a natureza e de se transformar como ser social por meio de uma

prática laboral específica, desvela que existem condições objetivas históricas e sociais

que interferem na sua constituição. No caso do professor, o trabalho está marcado por

especificidades, dentre elas a função docente de fazer alguém aprender algo (ROLDÃO,

2005) e está inserido numa lógica de produção que marca tanto a sua formação como

seu exercício profissional. Assim, cursos de formação baseados em modelos formativos

marcados por projetos societários em disputas de hegemonia e contra hegemonia sobre

o capital, constituem e são constituídos pela realidade objetiva do trabalho. No caso

deste texto, o trabalho docente na educação profissional está permeado dessas relações.

Consideramos ainda que o trabalho docente, na educação profissional, desvela uma

profissionalidade que expressa as formas subjetivas de ser e estar na profissão mediadas pelos

elementos sociais internos e externos, instituídos e instituintes da profissionalização. Denota,

portanto, uma relação entre a objetividade do trabalho e a subjetividade marcada por modelos

sociais do ser professor e a caracterização da atividade profissional exercida pelos sujeitos.

Estes modelos, por sua vez, são configurados em propostas formativas que podem, por vezes,

fragmentar e precarizar o trabalho docente. A lógica de certificação que tem sido uma constante

nos cursos de formação para a EPT seria um exemplo dessa questão.

Desta feita, realizamos um estudo de teses e dissertações defendidas no período

de 2008 a 2014, ou seja, a partir da lei que institui a Rede Federal de Educação

tecnológica uma vez que esta trouxe a demanda de expansão dos institutos federais e

ampliação do seu correspondente quadro docente. A partir das palavras-chave:

profissionalidade docente, professor da educação profissional e bacharel docente e

trabalho docente, identificamos um universo de 81 trabalhos referentes ao período em

estudo. Contudo, aqueles que focalizaram instituições pertencentes à RFEPT foram

apenas 9 (nove). Os demais ou versavam sobre as etapas da educação básica em geral ou

sobre a docência no contexto universitário ou, por fim, analisavam a docência na EPT

na rede estadual de diferentes unidades da federação.

O TRABALHO E A PROFISSIONALIDADE DOCENTE NA EDUCAÇÃO

PROFISSIONAL: O QUE DIZEM OS ESTUDOS

O trabalho de Moreira (2012) analisou os processos de formação e atuação de

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9096ISSN 2177-336X

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onze bacharéis do Instituto Superior de Santa Catarina identificando que estes buscam

soluções individuais para as questões de ensino aprendizagem calcadas em suas

experiências de vida, sendo os conhecimentos didático-pedagógicos minimizados e até

mesmo desvalorizados pela maioria dos bacharéis docentes. Seu trabalho deu destaque

para a história da formação de professores para a EPT. Baseou-se ainda em estudos sobre

os saberes docentes e a partir destes, principalmente os estudos de Tardif (2002) analisou as

dificuldades enfrentadas pelos professores e as ações de superação para o exercício

profissional.

Discorreu, ainda que de forma não central, sobre aspectos das condições de

trabalho, sem, contudo, apresentar de forma explícita sobre qual perspectiva de trabalho se

norteia. Desta feita, a análise das condições de trabalho foi apresentada de forma descritiva

apontando que a escolha tardia pela profissão de professor tem fragilizado a condição de ser

docente na EPT, como também que a estabilidade de ser servidor público dá certa

motivação para o trabalho. Contudo, a política de remuneração, de cargas e a instituição de

cargos e salários pode ainda ser aperfeiçoada, uma vez que reflete a desvalorização da

profissão docente de forma geral.

As dificuldades apontaram ainda para uma certa fragmentação do trabalho

docente uma vez que tendeu a indicar que os saberes experienciais e a relação teoria e

prática foram destacadas de forma dissociadas. Para os professores saber o conteúdo da

área de formação profissional parece ser mais relevante do que construir uma unidade

teoria-prática. Essa compreensão também está norteada pelas mudanças no mundo do

trabalho no que se refere às exigências de formação profissional para atender à

reestruturação produtiva e, nesse contexto, o papel das tecnologias da informação.

Tecnologias, essas, centrais nos cursos técnicos em que atuam.

Como elementos de superação destacamos que embora exista certa desvalorização

dos conhecimentos específicos da docência, contraditoriamente, os professores da pesquisa

defenderam uma formação contínua para análise desta, inclusive por meio de um trabalho

coletivo entre os pares, a gestão e equipe multidisciplinar (psicólogos, pedagogos e etc.).

Deram ainda destaque sobre as lacunas que sentiram por não terem tido uma formação

pedagógica inicial. Refletiram ainda sobre as condições de trabalho referentes à distribuição

de carga horária, carreira e regime de trabalho. Entretanto, a superação pareceu ainda

refletir uma ação isolada ou pessoal com pouca integração do professor na instituição

conforme indicado anteriormente.

Já o estudo de Helmer (2012) ao compreender o processo de constituição

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9097ISSN 2177-336X

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da profissionalidade de professores do Instituto federal de São Paulo, norteou-se por

uma abordagem quali-quantitativa sob a qual descreveu o perfil dos docentes e, por

meio de entrevista narrativa, buscou analisar diferentes dimensões do exercício

profissional na EPT tais como: “escolha da carreira, os conhecimentos necessários para

ser professor, os desafios do magistério, a organização da aula, a relação com os alunos

e as vivencias na profissão docente”. Para a pesquisadora o desenvolvimento

profissional e a construção de sua profissionalidade estão relacionados às dimensões

pessoal e político social do professor, daí a importância de se realizar um estudo sobre o

percurso formativo deles. A autora analisa o contexto dos institutos federais

inserindo-os no cenário de mudanças no ensino superior no Brasil e no mundo e

percebe que os anseios e dificuldades enfrentados por professores do ensino técnico,

tanto no nível básico como no nível superior, muito se assemelham aos que são

vivenciados por professores universitários, considerando-se ainda que a função social

desta instituição tem sofrido mudanças estruturais e estruturantes atendendo muito

mais a uma lógica de mercado, tal como nos avisou Chauí (1999).

O estudo de Urbanetz (2011) problematizou como formar professores para a

educação profissional destacando as características dessa modalidade de ensino e o

compromisso com a classe trabalhadora. Baseou-se no materialismo histórico

realizando um estudo de caso em duas instituições, uma Universidade Corporativa e

uma universidade tecnológica. Escolheu a formação técnica em engenharia por esta ter

um papel central na constituição do capitalismo industrial, dando assim origem às

iniciativas públicas e privadas de formação profissional, portanto, de educação

profissional. A pesquisadora toma Marx para conceituar o trabalho e Kuenzer,

Machado, Saviani, Lombardi, Sanfelice e Duarte, dentre outros para analisar o trabalho

docente e as perspectivas de formação docente para a EPT.

Os principais resultados apontaram que o interesse inicial pela docência

mesmo realizando a formação em engenharia foi relevante para a constituição da

docência. Contudo, a experiência de trabalho na engenharia ainda é um fator de maior

constituição do fazer docente desses professores. Em relação às condições de trabalho

em uma Universidade tecnológica e uma universidade corporativa interfere no tempo

de dedicação exclusiva para a docência constituindo-se, portanto, não diferencial para

a docência que realizam. Nesse mesmo sentido, a docência estaria diretamente

relacionada às diferentes naturezas da função social de cada uma destas instituições.

Para a autora urge a necessidade de vinculação da ação docente ao mundo do trabalho e

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9098ISSN 2177-336X

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não somente ao mundo do emprego tal qual se encontra na atualidade articulando-se o

domínio didático ao entendimento do mundo do trabalho.

Os estudos que se referiram à educação básica (técnico integrado e PROEJA)

foram os de Auarek (2012) e Fernandes (2012). O primeiro estudo, a partir de uma

abordagem ergológica e ergonômica da atividade de trabalho do docente da educação

profissional buscou analisar as relações de cooperação entre professor e aluno em um

laboratório de ensino e quais são influências dessa relação para a atividade de trabalho

docente de um professor do segundo módulo do Curso Técnico de Eletrotécnica de

Nível Médio de um CEFET não identificado. Teve como referencial teórico os estudos

Freire, Vigostysk, o referencial da didática profissional formulada por Pastré, Mayen e

Vergnaud norteada por Laplet.

Para tanto, realizou filmagem e registro de áudio de uma aula entrevistas

abertas, em profundidade e em autoconfrontação, após a realização da atividade, além

de análise documental. A pesquisadora identificou que na atividade de laboratório

analisada percebeu-se a circulação de saberes, valores e normas pautadas ora pela

horizontalidade ora pela verticalidade. Nesse contexto, observou-se a “forte a presença

da incerteza e do reconhecimento da necessidade de se tomar decisão em conjunto”

(p.208), e esta foi pautada por muito diálogo e pela valorização, por parte do professor,

do que o aluno sabia e não sabia no momento da atividade de laboratório, bem como do

aluno ao reconhecer o saber do professor, inclusive explorando-se os imprevistos. A

autora, então destaca que a análise da atividade do “ensino do trabalho” pode remeter

ao aprofundamento a “relação teoria e prática, os recursos de ensino, o número de

alunos assistidos por docente, dentre outras possibilidades relativas ao trabalho

docente” (p.211).

O segundo trabalho, o de Fernandes (2012) baseado em Paulo Freire destacou

que tal vivencia aponta para valores e saberes estudados em suas dimensões

epistemológica e ética com vistas à construção da autonomia. Analisou assim os

processos identitários docentes de professores que lecionam no PROEJA, do IFCE,

campus Fortaleza, evidenciando, entre os professores, percursos dinâmicos de encontros

com a docência, ora por ato de pertencimento ou identificação, ora por atribuição. Teve

como aporte teórico os estudos sobre identidade de Dubar, Hall, Woodward, e Lopes,

sobre experiência a partir de Larrosa, Dubet e Dewey, Josso, Tompson e Reale. E sobre

formação de professor, saberes e prática docente baseou-se em Nóvoa, Tardif Schon,

Lawn, Machado, Peterosi, e outros. Realizou observações em sala de aula e entrevistas

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9099ISSN 2177-336X

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narrativas com seis professores.

Observou ainda a existência de processos inconclusos e alguns momentos

contraditórios, permeados por uma refletividade sobre o ato de ensinar a pessoas jovens

e adultas, caracterizado por um jogo de identificação entre as identidades para outro,

atribuídas pelos sistemas peritos - ser professor de EJA - e a identidade para si - ser

professor da educação profissional. (p. 8-9).

O último trabalho dessa palavra-chave professor da educação profissional foi

o de Valezi (2014) que investigou o agir do professor de língua portuguesa de um curso

de Sistemas de Internet no Instituo Federal do Mato Grosso. Analisando textos sobre o

trabalho e no trabalho a pesquisadora baseou-se no interacionismo sociodiscursivo

tendo como principal expoente Bronckart (1999, 2006, 2008, apud VALEZI, 2014)

destacou a relação entre trabalho e linguagem pautando-se em Marx, Frigoto,

Habermas, Ricouer e Leontiev, este último para explorar o conceito de atividade, além

de trabalhar com estudos sobre a transposição didática, semiologia, psicologia do

trabalho e a clínica da atividade Teve como principais instrumentos entrevistas,

pesquisa-ação com a implementação da sequência didática do gênero relatório técnico,

observação participante e encontro de confrontação com o professores que vivenciaram

a atividade. Como um dos seus principais resultados Valezi destaca que o agir

profissional não tem prescrições claras, é constantemente reconfigurado pelas

transformações institucionais em níveis nacional e local, pelas coerções do mundo do

trabalho e da modernidade tardia decorrente das novas tecnologias.

Em relação à palavra-chave trabalho docente o estudo de Pinto (2014) analisou o

trabalho docente para compreender como os professores do IFMT se constituem docentes

a partir da elaboração do seu fazer pedagógico e das condições de trabalho nas quais estão

inseridos e as perspectivas de formação continuada. A pesquisadora desenvolveu uma

abordagem qualitativa de estudo a partir da perspectiva do materialismo histórico dialético

e do trabalho como princípio educativo, baseando-se em Gramsci, Ribeiro e Manacorda.

Em relação ao conceito de educação a autora baseia-se em Paulo Freire, Frigotto, Saviani e

Libâneo. Sobre a formação de professores e a identidade docente norteia-se pelos estudos

de Tardif, Brezenzisk, Nóvoa, Imbernón,, Cunha e Arroyo. Do campo da educação

profissional dialoga com os estudos de Machado, Kuenzer, Franco e Kunze. Já o conceito

de profissionalidade é norteado por Sácristán, Nóvoa e Perrenoud.

Pinto (2014) utilizou entrevistas semiestruturadas e análise documental para

problematizar que o trabalho docente necessita ser analisado desde a formação histórica da

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9100ISSN 2177-336X

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educação profissional sob e nas formulações das políticas para a EPT, os concursos

públicos e demais formas de ingresso na carreira docente que definem um perfil de

docência para essa modalidade. Partiu, então, do questionamento de como os professores

elaboram seu fazer pedagógico diante das condições concretas de trabalho e dos processos

de formação continuada que foram e têm sido submetidos. Ao articular esses contextos ao

trabalho do professor e a questão central levantada a pesquisadora aponta que aqueles

contextos articulados a como os sujeitos constroem seu trabalho produzem saberes do

trabalho constituindo uma práxis. Tal práxis contribuirá para a concepção de trabalho

docente como um princípio educativo rompendo assim com o caráter funcionalista da EPT

e caminhando para tendências pedagógicas progressistas.

Heckler (2012) debruçou-se sobre a análise das especificidades a docência no

Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na

Modalidade de Educação de Jovens e Adultos PROEJA no Instituto Federal do Sul-Rio

grandense – Campus Sapucaia do Sul-RS. Norteada por uma abordagem qualitativa a

autora utilizou-se de diferentes técnicas e instrumentos, tais como a análise documental da

legislação referente ao tema, o método documentário de interpretação, o referencial de

Josso (2004) na perspectiva da pesquisa-formação e dos grupos de discussão. Teve

como referencial teórico para o trabalho docente os estudos de Tardif &Lessard (2005),

Nóvoa (1992, 1995a, 1995b) e Cunha (1989) e para o contexto da formação de

professores para EJA baseou-se em Machado (2000) e Soares (2008).

As principais especificidades apontadas pela pesquisa foram: a maior interação

dos alunos entre eles e com os professores; percepção de uma maior afetividade dos

alunos demonstrando reconhecimento e admiração pelos professores. Lidar com atrasos e

saídas antecipadas para fazer a gestão do conteúdo. No geral, não houve por parte dos

professores o reconhecimento do aluno como trabalhador que traz saberes do trabalho para

a sala de aula. Apontou-se ainda que as razões para os professores aderirem ao programa se

relaciona diretamente com sua trajetória profissional e seus posicionamentos político-

pedagógicos, além de contextualizar as dificuldades para a implementação do programa por

meio de uma formação continuada que pareceu ter tido pouco efeito para a prática dos

professores e a precarização evidenciada por uma grande quantidade de professores

temporários contratados para o referido programa.

Por fim, a pesquisa de Ramos (2011) analisou as representações de professores

do Instituto Federal Goiano, Campus Rio Verde, instituição de origem agrícola das

antigas escolas agrotécnicas, problematizando a mudança de institucionalidade advinda

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9101ISSN 2177-336X

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pela implementação da rede federal de educação profissional desde 20087. O estudo foi

de abordagem qualitativa por meio de um estudo de caso, tendo como principais

procedimentos de pesquisa a análise de documentos gerados por fontes escritas e orais.

Baseou-se para o conceito de representações em Lefevbre (2006), situando-as no

contexto das reformas educativas dos anos 1990 com destaque para a educação

profissional e a configuração do papel do Estado. Essas representações foram então

captadas partir do trinômio de memória (memória da história cultural-familiar, memória

da formação pedagógica e memória da história de vida e escolar) produzindo oito eixos

dinâmicos de saberes, sendo, por exemplo, alguns destes: 1)Visão de movimento da história

da ciência, tecnologia, cultura e filosofia; 2) Visão de movimento da história da

ciência/disciplina que ensina; 3)Visão de movimento das interfaces das ciências correlatas; [...]

(p. 115-116). Como conclusão o pesquisador identificou ainda que a relação entre a

centralização e a descentralização no processo de administração do ensino influencia no

trabalho docente e nos modos de avaliá-lo. Viu ainda que a autonomia revestida de

formas burocráticas de captação de recursos para a pesquisa, por exemplo, pode produzir

um afastamento do docente dos processos pedagógicos.

SÍNTESES E CONSIDERAÇÕES

Diante do exposto destaca-se que boa parte dos estudos não tratam do par

dialético trabalho e formação, dando-se mais ênfase para o estudo da formação (trajetórias

formativas, representações sobre a formação, vivencia de formação continuada) e tendo-se

um olhar para essa formação focada na perspectiva do sujeito. Isso é referendado pela

predominância de pesquisas que se valeram de entrevistas narrativas, histórias de vida e a

metodologia de pesquisa-formação (cinco trabalhos) e pouca utilização de observação

(dois trabalhos). Outro elemento a se destacar nessa mesma direção diz respeito à

predominância de estudo de abordagem qualitativa, abordagem essa que privilegia a

análise das percepções e dos significados que os sujeitos atribuem aos fenômenos

educacionais e tende a não relacionar as multideterminações que constituem o trabalho

concreto dos professores nessa modalidade.

O referencial teórico é predominantemente baseados nas elaborações de Tardif &

Lessard (2002) como também em Freire (1996). Percebeu-se pouca clareza em alguns

estudos sobre o conceito de trabalho e trabalho docente. Em outros a referência se pautou

nos estudos e Marx e em pesquisadores brasileiros que têm estudado as especificidades da

relação trabalho e educação no campo da formação de professores para a educação

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9102ISSN 2177-336X

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profissional, tais como Machado, Kuenzer, Moura, Frigotto, Ciavatta e outros. Houve

ainda a constituição de abordagens cognitivista (um deles). Sobre a relação entre o

conceito de trabalho e o de profissionalidade, o referencial mais utilizado foi o de

Sacristán e em apenas um trabalho comentou-se que nas diferentes dimensões

constitutivas da profissionalidade inserem-se as condições concretas de trabalho como

multideterminação.

As análises encontradas referendaram ainda que o trabalho e a formação para / da

docência na educação profissional apresenta uma forte marca empírica para sua

constituição, expressadas pela necessidade de levantar trajetórias formativas, com

destaques à ausência da formação inicial para docência e a busca por mapear elementos

que podem sustentar o fazer pedagógico. Atribuímos como consequências das políticas de

formação vivenciadas, que legitimam a promoção de cursos aligeirados ou que pouco

contribuiu com o conhecimento profissional para a docência.

Contraditoriamente, infere-se que o conhecimento e a pesquisa sobre educação

se revelaram como um elemento significativo para a relação trabalho e formação, assim

como a assumência das instituições do processo de formação continuada e em serviço de

modo a atenuar os individualismos e, por vezes, a solidão sob quais muito professores

da EPT tem construído seu trabalho. Fator que impacta, inclusive nas possibilidades de

se erigir o trabalho coletivo como um aspecto positivo nessa modalidade.

Da mesma forma, outra relação problematizada foi a relação entre o

reconhecimento da profissão de origem como um elemento imprescindível para a

constituição do seu fazer docente e a formação pedagógica para se constituir professor.

Sobre essa relação, a maioria das pesquisas refletem que os conhecimentos da profissão

de origem são ressiginificados pela relação que se estabelece com o conhecimento

didático do conteúdo, denotando assim que é necessária a construção da unidade na

práxis da docência para a EPT.

Tal aspecto nos aponta para a relevância de se aprofundar, para a consolidação do

par dialético trabalho e formação, em análises que deem visibilidade à relação educação e

trabalho. Os trabalhos de Urbanetez; Valezi e Pinto; e Ramos se aproximam dessa

perspectiva. Para compreender o trabalho e a formação docente para a educação

profissional é necessário apontar as contradições e mediações constituintes da formação e

do exercício profissional da docência, que desvelam uma luta por hegemonias marcadas

por multideterminações da sociedade capitalista.

Em suma, identificam-se alguns conteúdos para a formação desses docentes que

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poderiam ser elencados: unidade teoria-prática; formação política e social; relação

educação e trabalho, sujeitos da educação profissional. Conteúdos esses já vislumbrados

nas propostas de Machado e Moura indicadas de forma breve neste texto. Estes

referendam ainda que a formação e o trabalho docente é uma prática social atuante na

constituição da existência humana. “Essa prática social é munida de forma e conteúdo,

expressando dentro das suas possibilidades objetivas as determinações políticas e

ideológicas dominantes em uma sociedade” (FREITAS, 2002).

Daí depreende-se que podem ser vivenciadas ações pautadas formas coletivas de

abstração da realidade tais como grupo de discussão, observação participante, pesquisa-

ação, por exemplo, nas quais a realidade concreta pode ser analisada desvelando-se

pseudoconcreticidades da docência na EPT. Contudo, estas ações não podem configura-se

em processos isolados ou apenas sob a responsabilidade do professor, mas, sim, precisam

estar articuladas ao movimento de constituição de melhores condições de trabalho tais

como aperfeiçoamento de estrutura física (laboratórios, bibliotecas, salas de aula

adequados); tempo remunerado para planejamento, pesquisa e estabelecimento de

parcerias de extensão e a possibilidade de formação inicial e continuada institucionalizadas

também no âmbito das políticas de carreira elaboradas também de forma coletiva.

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XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9105ISSN 2177-336X

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CONDIÇÕES DE TRABALHO DE PROFESSORES INICIANTES:

MEDIAÇÕES PARA A RESISTÊNCIA E DESISTÊNCIA DA CARREIRA

Deise Ramos da Rocha

Doutoranda em Educação – UFPel

[email protected]

Resumo: O presente trabalho origina-se de preocupações voltadas para as condições de

trabalho de professores que iniciam na docência e dos desafios e dilemas mais

frequentes que esses professores enfrentam, na fase de inserção à carreira. Esta pesquisa

tem por objeto de estudo o professor iniciante na Secretaria de Educação do Distrito

Federal, discorrendo sobre a importância de olhar para o docente nesta fase. Os

resultados são obtidos a partir da aplicação de questionários e entrevistas, que nos

permitem trazer um debate sobre a direção do olhar das pesquisas levantadas sobre as

iniciativas para a formação continuada do professor iniciante, e que permitem

compreender empiricamente o que estudiosos da área tem levantado acerca da temática:

um quantitativo relevante de desistentes na carreira, compreendido em um terço dos

professores que são aprovados em concurso público, desiste da carreira, anunciando

questões objetivas ligadas as condições de trabalho, e a necessidade de políticas de

formação pensadas a partir da realidade do trabalho docente. Entretanto, o que nos

alarma não é falta de um programa oficial que pense no professor em início de carreira,

mas sim, a omissão diante do caso: agravar a situação do professor na fase das

descobertas e choques de realidade, ao iniciar no magistério, dificulta ainda mais as

condições com que o professor perpassa nesta etapa da carreira. Todas essas são ideias

que, a partir dos dados obtidos, se espera que possamos produzir conhecimentos na área

de formação de professores no que se refere aos dilemas vividos pelo professor

iniciante, visando contribuir para a fundamentação de propostas sobre acompanhamento

profissional dos docentes iniciantes na carreira no magistério público, na educação

básica.

Palavras-chave: Trabalho Docente. Professor Iniciante. Condições de Trabalho.

INTRODUÇÃO

A motivação para a pesquisa origina-se das inquietações da trajetória

profissional e de investigações na formação de professores que surgem sobre os

docentes no início de carreira. Essa etapa da profissão é identificada como o período

mais difícil, por ser a fase de transição de aluno a professor, no qual é comum o

sentimento de insegurança, medo e de despreparado profissional. O período de iniciação

é a etapa em que o professor busca conhecer a sua própria situação e definir os

comportamentos que serão adotados no exercício da atividade profissional.

Huberman (2000) ressalta que este momento do início da docência é

caracterizado pelos estágios de sobrevivência e descoberta. Este momento de

sobrevivência está relacionado com o choque do real, no qual entre tantas experiências,

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9106ISSN 2177-336X

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o professor passa por um tatear constante, percebe distância entre os seus ideais e as

realidades cotidianas da sala de aula. Segundo o autor, o professor só consegue

enfrentar este primeiro aspecto por acontecer paralelamente à descoberta, que é o

entusiasmo do professor por estar em uma situação de responsabilidade. Em outras

instâncias que provocam sofrimento e dificuldades, pode levar o professor a desistência

da carreira docente.

A presente pesquisa propõe estudar a condição de trabalho do professor no início

da carreira, no intuito de contribuir com a análise da realidade da atividade docente, a

fim de trazer elementos que possam subsidiar propostas de acompanhamento e

fortalecimento da ação aos iniciantes na carreira, apoiando o professor e possibilitando a

formação de um profissional com maior segurança, desenvoltura e habilidade para lidar

com o cotidiano do trabalho pedagógico.

Para a realização desta pesquisa, utilizamos das respostas obtidas em 283

questionários de respostas fechadas e abertas, aplicados aos professores que ingressaram

na carreira do magistério público no Distrito Federal, pelos editais de 2010 e 2013. O

público-alvo para a aplicação dos questionários é justificada na base teórica em Tardiff

(2002), compreendo o período de cinco anos como fase iniciante na carreira. A partir

dos questionários, foi possível entrar em contato com 10 professores com até dois anos

de carreira, que concordaram em nos ceder entrevistas, tratando sobre as condições de

trabalho do iniciante na profissão. O roteiro da entrevista constou 10 perguntas abertas

que permitissem compreender o perfil profissional e as condições de trabalho.

MEDIAÇÕES E CONTRADIÇÕES NO TRABALHO DOCENTE

As contradições postas pelo movimento dialético entre o sujeito e o processo

histórico-social é que vai gerar as contradições indivíduo-sociedade. As contradições se

tornam importantes para as concepções críticas do mundo real, e das relações de

trabalho na qual, como classe trabalhadora, estamos diariamente expostos. A realidade

social se torna o espaço da luta de classes. É dentro da escola que essas contradições

provocadas pelo movimento dialético produzido pelo conhecimento, como parte do

compromisso com um projeto de escola podem acontecer. Entendendo a totalidade

apreendida no papel social do professor, que se manifesta na luta por qualidade nas

condições de trabalho, a análise posta e que se faz essencial, são percebidas como as

contradições existentes na relação das produções se manifestam no cotidiano escolar, e

resultante à classe que na instituição trabalha e é atendida.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9107ISSN 2177-336X

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Kosik (1976) chama a atenção para o aspecto fenomênico que a situação revela

aparentemente, provocada pela práxis utilitária, que se manifesta no cotidiano e de

forma fragmentada. A totalidade não é revelada e passa a não ter importância útil. Em

nosso entendimento, podemos perceber uma lógica cruel e enganadora do sistema

capitalista, em roubar dos sujeitos o direito em entender a realidade. O sufocamento do

cotidiano do trabalhador o faz com que caia na arbitrariedade do senso comum, fruto

dessa práxis utilitária.

Os professores convocados nos editais de 2010 e 2013 para professor da SEDF

nos revela uma incidência de 923 candidatos que não chegam a assumir a vaga/cargo,

representando 16% pelo edital de 2010 e 10% pelo edital de 2013. Observando na

“Tabela 1: Professores convocados por área de atuação – Editais de 2010 e 2013”, pelo

edital de 2013 percebemos que há um número menor de convocados, representando

uma porcentagem de desistência consideravelmente maior, em proporção aos

quantitativos obtidos pelo edital de 2010.

Nas disciplinas como física e química, o quantitativo de nomeações sem efeito

atinge uma proporção grande e equivalente ao total de convocados. Observando que a

porcentagem de desistentes atinge 18% e 28% respectivamente, no edital de 2010, e

100% de desistentes pelo edital de 2013. Ao observarmos a área de atividades,

correspondente aos graduados em pedagogia, obtemos um percentual de 12% pelo edital

de 2010 e 13% pelo edital de 2013. O número de desistentes empossados também

assusta. Ao solicitar para a SEDF o quantitativo de professores em exercício, e as sua

locações, nos deparamos com um total de 2680 professores em atuação, dentre os 3274

que tomara posse pela convocação do edital de 2010, e 1983 em exercício, entre os

2477 que assumiram a vaga pelo edital de 2013. Ao colocar esses dados em

porcentagem, teremos um quantitativo de 18% e 19%, respectivamente, de desistentes.

Do universo de total de professores convocados pelo edital de 2010, 34%

desistiram da carreira, e pelo edital de 2013, esse número representa em 29%. Ou seja,

basicamente um terço dos professores desistiu da carreira, logo em seu início. Esse

número expressivo de desistentes pode estar diretamente ligado às condições de

trabalho e condições de valorização profissionais objetivas ao trabalho docente. Esse

dado se mostra alarmante, considerando que atualmente, o Distrito Federal tenha um

dos melhores saláriosi entre os professores da educação básica, na esfera nacional, entre

outros fatores como o choque de realidade e as dificuldades da docência.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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Tabela 1: Professores convocados, desistentes e atuantes – Editais de 2010 e 2013

Edital de 2010 Edital de 2013 Total

Total de nomeados 3905 2769 6674

Total de nomeação sem efeito 631 292 923

Total de empossados 3274 2477 5751

Total de desistentes 594 494 1088

Total de atuantes 2680 1983 4663

Fonte: DODF.

A SEDF é dividida em 15 regionais de ensino, aglutinando as escolas pela

região geográfica. Nessa repartição, há as regionais de ingresso e as regionais de

transferência – destinadas aos professores com um tempo considerável de carreira, e

regulado na Portaria nº 29 de 29 de janeiro de 2013, que dispõe sobre os critérios para

Distribuição de Carga Horária, os procedimentos para a escolha de turmas e para o

desenvolvimento das atividades de coordenação pedagógica e, ainda, os quantitativos de

Coordenadores Pedagógicos Locais, para os servidores da Carreira do Magistério

Público do Distrito Federal em exercício nas unidades escolares da rede pública de

ensino do DF – Distrito Federal. Um fator interessante a ser observado é que o professor

em período de estágio probatório, e, portanto, no início da carreira não possui lotação

efetiva, mas provisória em uma escola. A sua lotação está como efetiva na regional de

ensino.

Essa mesma divisão recai sobre as chamadas escolas modelo – que são as

escolas com melhores condições estruturais de desenvolvimento do trabalho educativo,

por diversos fatores, como o envolvimento com a comunidade, o nível de formação do

corpo docente, a disposição de recursos materiais e de estrutura física, entre outros

fatores – que aparentam ter sempre melhores condições de trabalho, e para a qual,

professores efetivos e com maior tempo de docência tem preferência para atuar.

A escolha de turma é realizada uma única vez no início do ano letivo (ou

semestre letivo, de acordo com a formação disposta pela unidade escolar), conforme dia

e horário disposto pela SEDF, em que são observados os componentes curriculares e o

cargo concursado ou habilitações para as quais o professor está em disposição para

trabalhar. A própria Portaria nº 29/2013 prioriza os professores que tem mais tempo de

serviço na SEDF, Regional de Ensino e/ou na unidade de ensino (escola).

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9109ISSN 2177-336X

30

Há, ainda, gratificações oferecidas para atuações com o ciclo da alfabetização,

educação especial e sala inclusiva e para unidades localizadas em zonas rurais. Essas

gratificações são reguladas também na Portaria nº 29/2013, dando direito de recebê-las

o professor que atuar na série/ano ou instituição escolar que entram nas especificidades

normalizadas legalmente. Em nosso entendimento, turmas multisseriadas ou que

concentram alunos retidos na série/ciclo, ou mesmo escolas localizadas em zonas

periféricas deveriam ter a oferta de uma gratificação extra, por compreendermos que são

os professores experientes que deveriam lecionar nessas turmas e escolas, para

contribuir com a oferta de uma educação de qualidade ao público atendido nesses

critérios.

Esse pensamento coaduna com a mesma lógica da oferta de gratificações para

as que já constam na lei, atendendo ao raciocínio de que as especificidades do público

da zona rural e turmas de alunos em alfabetização, inclusiva ou especial exigem a

presença de professores experientes. A realidade revela um massivo ingresso de

professores iniciantes para lidar com as complexidades apresentadas em zonas

periféricas e em turmas multisseriadas e de alunos retidos na série/ciclo, o que agrava as

condições de professores iniciantes, na fase da aprendizagem da docência (VAILLANT

e MARCELO, 2012).

Partindo do recorte temporal considerado por Tardif (2002) de cinco anos de

carreira o professor ainda se encontra na fase do início de carreira, por ainda estar

consolidando a identidade docente, obtivemos que 57% de nossos respondentes tem até

cinco anos de carreira, e que 42% já tem mais tempo de experiência de docência, no

entanto, estão na fase de ingresso na carreira na SEDF. Entre os professores iniciantes

com até cinco anos de experiência docente, obtivemos um número representativo pelos

respondentes ao questionário em que 30% se encontra no primeiro ano de carreira, 18%

no segundo ano, 14% no terceiro ano, 11% no quarto ano e 25% no quinto ano da

docência. Este percentual pode ser visualizado no “Gráfico 11: Até 5 anos de carreira”.

Numa ação de acompanhar, monitorar e avaliar o professor ingressante, a Lei

nº 5.105, de 03 de maio de 2013 reestrutura a carreira do magistério público, que em

síntese, dispõe sobre quem pode ocupar os cargos públicos e reafirma as formas de

ingresso, das habilitações e da lotação do cargo. No capítulo III, a seção I trata da

qualificação profissional, especificando nos artigos 11, 12 e 13 implementações que a

SEDF deve realizar um curso de integração a carreiro Magistério Público e programas

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9110ISSN 2177-336X

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de acompanhamento e avaliação, para os servidores em estágio probatório, e ainda

incentiva a produção técnico-científico dos professores:

Entre as variantes que levam à escolha profissional pelo curso de licenciatura,

47% revela que o fator incentivador foi a identificação com a área de conhecimento. Do

universo total entre os professores respondentes, 41% por interesse pela profissão. As

outras variantes caem em quase metade, revelando que 26% escolheu a profissão pela

acessibilidade ao curso, 23% por vocação, 19% por um objetivo de realização pessoal,

14% pelas possibilidades de oferta de emprego. Com um representativo pequeno em

relação as outras respostas, 8% revela que fez a escolha profissional pelo interesse em

trabalhar e por gostar de crianças, 6% por influência de familiares, 4% por falta de

opções, e 3% por influência de amigos ou por questões financeiras quanto aos custos

com o curso de ensino superior. Para responder a esta pergunta, cada respondente

poderia marcar mais de uma opção.

Ao indagarmos sobre possíveis interesses por cursar outra graduação, 49%

afirmaram ter interesse em fazer outro curso superior, enquanto que quase a metade

disse não possuir vontade. Outros 26% disseram não saber ainda se quer se formar em

outra especialidade profissional. Comparado com o questionamento se desejam fazer

outro concurso para sair da SEDF, 43% disseram que sim, justificando o desinteresse na

profissão ligado às questões de desvalorização profissional, condições de trabalho e

desgaste físico e emocional. Enquanto que 34% afirmaram querer permanecer na SEDF.

Outros 23% não souberam responder.

Esses dados nos revelam ser preocupantes, ao nos atentarmos que, conforme já

expusemos aqui nesta pesquisa, cerca de 30% desistiram da profissão, o que

corresponde a um terço dos professores convocados para o magistério público nos

últimos cinco anos. Pelas respostas obtidas, outros 30% revelaram desânimo e

desinteresse pela atuação profissional na escola. Essa perca de interesse nos leva a

indagarmos se a desistência ou o pensar em outros espaços de atuação seja pela perda

do sentido de ser professor, ou por não haver um sentido de um projeto de escola

conciso que oriente na luta pela profissão.

Entendemos que as análises sobre as condições de trabalho devem ser situadas

na conjuntura histórica, política e econômica que as engendram (ANTUNES, 2007). A

condição do trabalho docente na atualidade, implica em considerar que as mesmas são

resultados de uma ordem social objetiva, que infere na relação subjetiva do professor

com a atividade. O que afirmamos é que as condições de trabalho do professor são

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9111ISSN 2177-336X

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constituídas das determinações da organização do trabalho no capitalismo. Constrói-se

uma estrutura de condição de trabalho, que intensifica a atividade docente, mantendo o

controle sobre a categoria que ensina, e do conhecimento historicamente acumulado

pelo homem. O que afirmamos é que as posições são políticas, tomadas em instâncias

hierárquicas.

Entretanto, outras demandas das condições de trabalho são enfrentadas pelos

profissionais da educação, quando é possível nos debruçarmos sobre a qualidade com

que professores exercem sua função na rede pública de ensino considerada como uma

das que melhor paga o salário inicial ao docente. Com o olhar sobre o professor no

início da carreira, é possível perceber que a profissão ainda se intensifica com outras

demandas que são postas para esse ciclo da carreira e uma grande preocupação que nos

aparece como dado: a naturalização do sofrimento ao ofício da profissão. “Dificuldade”,

“tentativa de acerto”, “sofrimento” são palavras que aparecem constantemente, com

uma entonação de naturalidade, na fala de nossos professores colaboradores, mesmo

para aqueles que apresentam resistência ao modelo de escola que está posto, e assumem

fazer disputa por um outro projeto de escola.

Condição de trabalho aparece para nós como uma forma determinante para a

existência do objeto da pesquisa, que nos permite entender os procedimentos

reproduzidos teórica e historicamente na fala dos professores. Além, claro, de ser uma

base pilar pelo materialismo histórico dialético, em entender a aprendizagem da

profissão e a constituição do projeto de escola, a partir das relações de trabalho.

Diante disso, condição de trabalho se torna uma categoria estruturante para esta

pesquisa. É interessante destacar sobre como esses mesmos fatores vão se mostrando

como fenômenos compreendidos nas estruturas diacrônicas e sincrônicas, reveladas

ainda nas categorias mediação, contradição, formação profissional. Um está imanente

ao outro, e não se pode compreender o objeto sem a totalidade desses intérpretes da

realidade.

Partindo de Vaillant e Marcelo (2012), desenvolvimento profissional é

também aprendizagem da docência, e por isto, a necessidade e a luta pela valorização de

uma formação continuada. Ter um acompanhamento para o início da carreira se mostra

importante tanto para as questões pedagógicas, quanto para outros elementos como o

acompanhamento à saúde do professor e para o tramite de questões burocráticas e

administrativas como parte do ofício do trabalho, e que nos aparecem, e que, no entanto,

não são enfatizadas pelas pesquisas apontadas no levantamento bibliográfico realizado.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9112ISSN 2177-336X

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Na fala dos professores entrevistados nos aparecem depoimentos os quais

daremos ênfase, por enxergar que elas são necessárias: não pode ser naturalizado

professores relatarem do desgaste físico e emocional, principalmente em se tratando de

profissionais no início da carreira, ou mesmo que muito lhes parece que entram na

escola, como docentes, “na marra”, pois os fatores do cotidiano são intensificados

quanto aos enfrentamentos das dificuldades. Os questionários revelam em número que

84% dos professores apresentam como aspecto negativo da profissão o desgaste

emocional, contra 61% apontam também ser o desgaste físico.

Os professores ingressantes da SEDF que estão entre os cinco primeiros anos

da carreira estão cansados e desgastados. Esse dado revela como fenômeno importante

pare entender as condições de trabalho, e o impacto que isso causa na qualidade de um

ensino-aprendizagem.

Olhando para o que os questionários nos trazem como dados relevantes para

esta pesquisa, 53% dos professores que ingressaram como professores efetivos pelos

editais de 2010 e 2013 assumiram a sala de aula logo no primeiro dia de aula, sem

qualquer suporte de acompanhamento e contextualização desse professor. Esse fator é

ainda interessante ao ser comparado à outra questão que aparece no questionário.

Ao indagarmos quais são as informações repassadas ao professor, em sua

chegada a escola, nós temos um dado de que 69% dos ingressantes obtiveram acesso a

informações sobre a estrutura física da escola, se tratanto sobre os ambientes, material

pedagógico, materiais didáticos de apoio, entre outros fatores que pudessem aparecer;

35% tiveram informações sobre a estrutura pedagógica, correspondendo ao

planejamento curricular ou da escola, as formas de avaliação que a escola adere, o

Projeto Político Pedagógico, sobre os encontros pedagógicos, documentos, currículo,

etc.; 27% foram informados sobre serviços de apoio ao professor e ao aluno; 67% foram

informados sobre regras funcionais como horário, regimento, procedimentos

administrativos, pedagógicos, disciplinares, etc; a 56% desses professores foram

repassadas informações sobre a rotina; 33% foram informados sobre o perfil da turma.

Mesmo que corresponda a uma porcentagem que represente menos da metade

do total de respostas obtidas, queremos chamar a atenção, alarmando para o fato de que

31% dos professores não foram informados sobre a estrutura física, 33% informados

sobre as regras funcionais, 44% não foram informados sobre a rotina da escola.

Agravando a situação, 67% de nossos respondentes não foram informados sobre o perfil

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9113ISSN 2177-336X

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da turma que iria assumir, 73% não foram informados sobre os serviços de apoio ao

professor e ao aluno; 65% não obteve informações sobre a estrutura pedagógica.

E um percentual pequeno, entretanto, bastante representativo de 4% que não

teve acesso a nenhuma das informações listadas. Supondo que esses 4% correspondem

aos 53% que assumiram a turma no primeiro dia de aula, há de se imaginar sobre quais

condições esse professor teve que trabalhar, e as possíveis dificuldades com o ensino

dos conteúdos e a relação com a turma, tão veemente apontados nas pesquisas

levantadas, como um fator sério a ser considerado no acompanhamento pedagógico. O

que nos parece é que a fala de uma de nossas professoras “parece que a gente entra na

escola na marra” são demonstrados em número, sobre como o choque de realidade é

um fator objetivo e inerente a um projeto de escola que peneira os professores que se

mantém na carreira, e os professores que fazem parte do um terço que desiste da

carreira, ou mesmo correspondem 43% que querem fazer outro concurso público para

sair da SEDF.

Ainda fazendo relação com entre o que os professores respondem nos

questionários e o que respondem nas entrevistas, adentramos na relação entre os pares e

a equipe gestora. No questionário, ao indagarmos sobre o nível de receptividade dos

pares ao se apresentar à escola, entre as variantes péssima, ruim, regular, boa ou ótima,

obtivemos um percentual relativamente positivo, ao avaliarem a coordenação, a equipe

gestora (diretor e vice-diretor), professores e alunos (sendo estes responsáveis pela

porcentagem mais alta), com porcentagens acima de 30% em cada uma das variantes

(boa ou ótima). Para a variante regular, o percentual se demonstra relativamente

mediano, em relação aos demonstrados positivamente, com um representativo acima de

20%. E para as variantes péssimo ou ruim, nenhuma atingiu uma porcentagem acima de

10.

Entretanto, apenas duas de nossas entrevistadas não relataram nenhum tipo de

conflito com os pares, dois professores (do sexo masculino) relataram ter uma relação

relativamente boa ou harmoniosa, e os outros seis professores relataram ter conflitos

com os pares, que variam entre as divergências de técnicas, saberes e competências

pedagógicas, valores morais e éticos, ao passo que entendemos serem fatores ligados ao

projeto de escola ou ao fazer pedagógico, por termos professoras relatando a resistência

com a técnica nova de ensinar e relatando a possibilidade de haver acomodação por

parte dos pares mais velhos. Outro fator alarmante, é que duas professoras chegam a

evidenciar em suas falas o assédio por parte dos pares, por conta do tempo de carreira

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

9114ISSN 2177-336X

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na educação pública, podendo ser ligadas a distância entre idade e ao fato de serem

novas na escola. Uma das professoras relata até mesmo a ocorrência de uma professora

mais experiente adentrar em sua sala de aula e interferir na relação professor e aluno,

por duas vezes.

Os relatos de conflitos entre iniciantes e professores já experientes se pautam

com bastante frequência no confronto de ideias, de cunho ligadas a questões morais e de

valores, ou mesmo porque os professores novos trazem novas ideias e maneiras de

ensinar, o que viria a “desestabilizar” o modo de ensinar construído há tantos anos.

Ocorre-nos que para além do conflito inerente ao modo de como articula a prática

pedagógica, e com isso, a maneira de lidar com o conhecimento, esses professores mais

antigos na carreira, pela fala das professoras, demonstram também já ter desistido da

carreira, quando se escutam falas como “quando eu entrei eu também queria fazer

diferente” ou “você ainda está nova, pode mudar de carreira”.

Os questionários também vai nos trazer que entre uma escala de 1 a 7, os

professores e os coordenadores são pares que auxiliam na aprendizagem da docência,

com uma nota de grau cinco. Entretanto, 47% dos respondentes avaliam em grau 7 a

importância do auxilio dos professores para o inicio da profissão, e 39% também em

grau 7 para os coordenadores. Esses dados revelam que o tempo inteiro, a relação entre

os pares demonstram contradições que ocorre nas relações entre o aprender a profissão,

a sensação de isolamento ou contentamento com o trabalho coletivo da escola, nas

divergências e convergências com um projeto de educação, e são relações que vão

formando o projeto coletivo de escola, ou que mesmo propiciam para que o contrário

aconteça: a não existência de um trabalho coletivo porque não há um trabalho coletivo.

Entre o total dos professores respondentes aos questionários, 77% dos

professores dão valor atributivo de muito importante para o trabalho coletivo, na

aprendizagem da docência. Isso também nos leva a entender que tanto o valor positivo

quanto o valor negativo das relações contribuem para uma aprendizagem. O fato é que,

o trabalho coletivo, no modo como ele funciona também propiciará a forma como os

professores se relacionam. A entrevista cedida pela professora FPED-30 revela a força e

contentamento com o trabalho coletivo na escola em que ela está, porque há um projeto

coletivo construído pela escola. Ter um projeto de escola se torna importante porque o

projeto é quem orienta nas relações entre os pares, e na prática pedagógica dos

professores. Essa afirmação nos leva a perceber que também gera impacto nas

condições de trabalho.

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Na fala entre os professores entrevistados, há o reconhecimento de que a gestão

é uma liderança na forma de funcionar o trabalho docente na unidade escolar é

importante e influente. Quando o professor MPED-33 nos relata que “eu percebi que

por mais que estivesse solto na escola que eu tivesse esse sentimento a escola em

momento nenhum foi impedimento foi entrave que me impedia tocar algum tipo de

projeto muito pelo contrário teve muito espaço” é possível perceber que a ausência

dessa liderança também é provocativa, e pode culminar em ações positivas de um

professor encabeçar e tornar-se líder no processo do trabalho coletivo, que aos poucos

vai envolvendo outros profissionais e alunos, ou pode reforçar a sensação de isolamento

relatado por FBIO-23 e FPED-27, que tocam suas ações pedagógicas sozinhas.

A professora FPED-23 vai nos relatar que a gestão ainda pode reforçar as

relações hierárquicas de tempo de profissão, ao fazer observações sobre como a gestão

em relação a professores mais antigos na unidade escolar. Mais de um professor ainda

relata que a postura da gestão conduz para uma boa ou má estrutura de trabalho e de

desenvolvimento de atividades pedagógicas. E ainda a ausência de liderança de uma

gestão que faça atividades receptivas, que informe e acompanhe esse professor

iniciante, com o cuidado sobre a aprendizagem da docência como a qualidade do

ensino-aprendizagem dos alunos são impactos multideterminantes para a constituição de

um projeto de escola.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do quadro exposto sobre as condições com que os professores iniciantes

se deparam nessa etapa da carreira, e o quantitativo revelado de desistentes, nossa

proposta culmina na defesa de uma política de formação continuada, que embase um

programa de recepção, acompanhamento, formação e avaliação do professor iniciante

na carreira, a partir da realidade do trabalho docente. Entretanto, o que nos alarma não é

falta de um programa oficial que pense no professor em início de carreira, mas sim, a

omissão diante do caso: agravar a situação do professor na fase das descobertas e

choques de realidade, ao iniciar no magistério, dificulta ainda mais as condições com

que o professor perpassa nesta etapa da carreira.

Defendemos o espaço escolar como a instituição social responsável pelo

desenvolvimento intelectual científico do sujeito. Essa é a função da escola. A escola,

enquanto instituição isolada não consegue desenvolver esse papel por se sobrecarregar

com as múltiplas diversidades e situações vivenciadas cotidianamente. Tão pouco o

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professor que tem sua formação realizada apenas em um único espaço como a faculdade

em que cursou seu ensino superior, poderá ter sua formação condicionada a limitações

teóricas e práticas.

Todas essas são ideias que, a partir dos dados obtidos, se espera que possamos

produzir conhecimentos na área de formação de professores no que se refere aos

dilemas vividos pelo professor iniciante, visando contribuir para a fundamentação de

propostas sobre acompanhamento profissional dos docentes iniciantes na carreira no

magistério público, na educação básica. E apresentar critérios e princípios relativos aos

maiores desafios vivenciados pelo professor iniciante e as possibilidades de

acompanhamentos como base para pensar e propor programas de formação contínua dos

professores da educação básica, visando qualidade na condição de trabalho.

REFERÊNCIAS

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T.; DRUCK, G. (Org.). A perda da razão social do trabalho: terceirização e

precarização. São Paulo: Boitempo, 2007. p. 13-22.

CURADO SILVA, Kátia A. P. C. Professores com Formação Strictu Sensu e o

Desenvolvimento da Pesquisa na Educação Básica da Rede Pública de Goiânia:

Realidade, entraves e possibilidades. 2008. 292f. Tese (Doutorado em Educação) –

Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2008.

CURY, Carlos Roberto Jamil. Educação e Contradição: elementos metodológicos

para uma teoria crítica do fenômeno educativo. São Paulo: Cortez, 2000.

HUBERMAN, Michael. O Ciclo de Vida Profissional dos Professores. In: NÓVOA,

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KOSIK, Karel. Dialética do Concreto. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.

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Vozes, 2002.

VAILLANT, Denise; MARCELO, Carlos. Ensinando a ensinar: as quatro etapas de

uma aprendizagem. Curitiba: Ed. UTFPR, 2012.

NOTA DE FIM i Vencimento básico inicial estimado em R$3.929,70. Fonte: Edital nº 01, de 04 de

setembro de 2013, publicado no DODF nº. 185, em 05/09/2013, pág. 76.

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