21
TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS, DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO E A EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE ARAÚJO, Karina de Toledo 1 - UEM/UEL Grupo de Trabalho – Comunicação e Tecnologia Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo Neste texto descrevemos, a partir de revisões bibliográficas, as transformações no mundo do trabalho e das forças produtivas na sociedade capitalista relacionadas às concepções e perspectivas da educação a partir de tais transformações. Primeiramente apresentamos a ascensão do trabalho manufatureiro, posteriormente, a constituição da industrialização em suas diferentes fases e características até chegarmos ao desenvolvimento das técnicas pautadas nas inovações tecnológicas – micro-informática ou terceira revolução industrial - que transformam significativamente os modos de produção e as forças produtivas. Destacamos a influência dessas transformações na maneira de ser, pensar e existir dos sujeitos sociais, assim como os conceitos e finalidades da educação a partir das transformações ocorridas no mundo do trabalho e os objetivos educacionais frente a formação instrumental. Finalmente instigamos reflexões sobre a necessidade de pensarmos uma educação para além da racionalidade técnica e da formação instrumental, ou seja, uma educação emancipatória por meio da crítica e que tome como sua condição e objetivo a formação humana. A educação para emancipação é preocupada e ocupada em não deixar morrer a crítica, o contraponto. O conteúdo deve ser ensinado com a finalidade maior de pensá-lo nessa sociedade para ir além dela. Para a emancipação. Palavras-chave: Transformações Sociais. Forças Produtivas. Tecnologia. Educação Contemporânea. Introdução A sociedade contemporânea assiste a uma degradação do ser humana nunca experimentada anteriormente na história. Estamos passando por uma degradação ‘de humanidade’. Os níveis de exclusão, de miséria e de todos os tipos violências se mostram de maneira cada vez mais assustadora e, paradoxalmente, naturalizada. A necessidade de que 1 Discente do Curso de Doutoramento em Educação da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicopedagogia, Aprendizagem e Cultura – GEPAC/UEM, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação PPE/UEM. Professora do Depto. de Estudos do Movimento Humano (EMH) do Centro de Educação Física da Universidade Estadual de Londrina – UEL. [email protected]

TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS, DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO E …educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2013/7565_6342.pdf · se dá as relações sociais de produção e suas influências determinantes

  • Upload
    lamkiet

  • View
    220

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS, DESENVOLVIMENTO

TECNOLÓGICO E A EDUCAÇÃO NA CONTEMPORANEIDADE

ARAÚJO, Karina de Toledo1 - UEM/UEL

Grupo de Trabalho – Comunicação e Tecnologia

Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo

Neste texto descrevemos, a partir de revisões bibliográficas, as transformações no mundo do trabalho e das forças produtivas na sociedade capitalista relacionadas às concepções e perspectivas da educação a partir de tais transformações. Primeiramente apresentamos a ascensão do trabalho manufatureiro, posteriormente, a constituição da industrialização em suas diferentes fases e características até chegarmos ao desenvolvimento das técnicas pautadas nas inovações tecnológicas – micro-informática ou terceira revolução industrial - que transformam significativamente os modos de produção e as forças produtivas. Destacamos a influência dessas transformações na maneira de ser, pensar e existir dos sujeitos sociais, assim como os conceitos e finalidades da educação a partir das transformações ocorridas no mundo do trabalho e os objetivos educacionais frente a formação instrumental. Finalmente instigamos reflexões sobre a necessidade de pensarmos uma educação para além da racionalidade técnica e da formação instrumental, ou seja, uma educação emancipatória por meio da crítica e que tome como sua condição e objetivo a formação humana. A educação para emancipação é preocupada e ocupada em não deixar morrer a crítica, o contraponto. O conteúdo deve ser ensinado com a finalidade maior de pensá-lo nessa sociedade para ir além dela. Para a emancipação. Palavras-chave: Transformações Sociais. Forças Produtivas. Tecnologia. Educação Contemporânea.

Introdução

A sociedade contemporânea assiste a uma degradação do ser humana nunca

experimentada anteriormente na história. Estamos passando por uma degradação ‘de

humanidade’. Os níveis de exclusão, de miséria e de todos os tipos violências se mostram de

maneira cada vez mais assustadora e, paradoxalmente, naturalizada. A necessidade de que

1 Discente do Curso de Doutoramento em Educação da Universidade Estadual de Maringá (UEM). Integrante do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicopedagogia, Aprendizagem e Cultura – GEPAC/UEM, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Educação – PPE/UEM. Professora do Depto. de Estudos do Movimento Humano (EMH) do Centro de Educação Física da Universidade Estadual de Londrina – UEL. [email protected]

5165

tudo isso pareça natural nos remete ao pensamento de Kant: "[...] as pessoas aceitam com

maior ou menor resistência aquilo que a existência dominante apresenta à sua vista e ainda

por cima lhes inculca à força, como se aquilo que existe precisasse existir dessa forma"

(ADORNO, 1995, p.178).

Contraditoriamente, é nesta sociedade tão miserável das ‘condições e valores

humanos’, que a técnica, os recursos tecnológicos – a micro-eletroeletrônica, por exemplo – e

a ciência chegam a níveis de desenvolvimento altíssimo. É por esta, entre outras, que a

sociedade capitalista é considerada a sociedade da contradição. Quanto maior o

desenvolvimento e o progresso das técnicas, maior o regresso das condições humanas. Para

Adorno (1995, p. 175), essa é "[...] uma contradição que percorre toda a história burguesa” e,

acreditamos que ela adentre além da sociedade moderna, a sociedade em condições pós-

modernas. É esta na qual vivemos nesta segunda década do século XXI.

Conforme Ghiraldelli Jr (2007), a pós-modernidade não é uma época histórica, mas é

uma CONDIÇÃO. Entretanto, não são todos que reconhecem esta condição social, mas é

assim consideramos neste trabalho: vivemos na contemporaneidade (época) em condições

sociais pós-modernas devido as transformações ocorridas do mundo moderno para o

contemporâneo e sobretudo na própria contemporaneidade.

A educação – juntamente com a saúde, cultura, entre outros – atua como coadjuvante

neste cenário social pós-moderno. Acreditamos que as concepções de educação que temos

visto na atualidade culmina com a desvalorização da educação voltada a formação humana e,

consequentemente, uma ‘descrença’ em seus potenciais formadores para além da razão

instrumental. Ou seja, o que ocorre é a perpetuação do conceito de educação como formação

exclusivamente instrumental.

Sendo assim, os conceitos sobre educação na sociedade brasileira pós-moderna

continuam fundamentados em uma educação burguesa-moderna senão, ainda jesuítica-

medieval. A partir deste pensamento, podemos dizer que temos uma educação anacrônica e

entendemos ser este um dos determinantes para que as contradições sociais e condições

excludentes se perpetuem e, até mesmo, se alarguem. É urgente a necessidade de

compreendermos e fazermos uma educação em consonância com seu tempo, espaço e,

principalmente, com as necessidades dos atores e atrizes sociais que vivem na sociedade

contemporânea. A educação nos é essencial e pode desempenhar diferentes papéis que

dependem diretamente do objetivo almejado, objetivo este que pode ser a adaptação das

5166

pessoas às situações dadas ou a emancipação humana1. Uma educação que tenha como

objetivo a formação humana e social considerando a diversidade a partir de respeito as

diferenças e na exigência e exercício da igualdade de direitos. Uma educação na qual ensinar

e aprender sejam consideradas, acima de tudo, relações sociais.

A educação com vistas a emancipação deve possibilitar as pessoas a compreensão

das relações sociais de produção da sociedade capitalista, pois segundo Adorno (1995) é

justamente esta relação que impede a emancipação do indivíduo. Conhecer e refletir sobre as

relações de produção emancipa o sujeito social através da constituição da consciência crítica2.

Para tanto, é necessário um método de análise que ofereça possibilidades de se ir além do

senso comum, não qualquer método mas aquele que proporcione um entendimento de como

se dá as relações sociais de produção e suas influências determinantes na vida dos homens.

O materialismo histórico3 possibilita a apreensão e a análise da realidade tal como se

apresenta através da categoria trabalho. Para o materialismo histórico, é na divisão do trabalho

que as relações sociais são estabelecidas e influenciam diretamente no modo de ser das

pessoas, dos sujeitos sociais. É o trabalho que determina a vida social e, as modificações

ocorridas nas relações sociais de produção acarretam em profundas mudanças nas atividades

humanas. O principal fator que contribui para a impotência do pensamento crítico é o modo

como o trabalho se organiza e se efetiva. É este fator que desencadeia e mantém todos os

outros. O objetivo deste artigo é, por meio de uma revisão bibliográfica, apresentar a relação

da constituição da sociedade moderna – burguesa - e da sociedade contemporânea e os

conceitos, fundamentos e perspectivas da educação. O trabalho, a produção de técnicas e as

inovações tecnológicas são orientadores para as discussões que serão apresentadas no decorrer

do texto.

A consituição da sociedade capitalista e a educação: as transformações do trabalho e das forças produtivas

1 Adorno (1995, p. 169-185) entende que a educação para a emancipação deve ter como propósito maior o esclarecimento. Isso significa uma consciência com maior autonomia crítica, capaz de situar o indivíduo consciente das relações produzidas na sociedade em que ele vive. Neste sentido, o método de análise defendido pelo autor deve centrar sua atenção nas relações sociais de produção da sociedade. 2 Entende-se crítica como a crítica da sociedade. 3 Ciência da História.

5167

O fundamento da sociedade burguesa4 é baseado na compra e venda da força de

trabalho. Este fundamento se estende pela modernidade e contemporaneidade pois, enquanto

não for alterado o fundamento da sociedade capitalista, não há uma passagem de sociedade.

A organização do trabalho nos moldes da sociedade capitalista, se dá através da

divisão do trabalho e os objetivos dessa divisão são:1- manutenção do lucro e acúmulo do

capital; 2- retirar o conhecimento de posse do trabalhador (expropriação do saber) e 3-

assumir o controle totalitário da produção e do trabalhador. A divisão provoca um processo de

desqualificação não só do trabalhador, mas da humanidade pois perde-se a capacidade de

aprender o que está nas bases do processo de produção.

A relação da divisão do trabalho com a manufatura se dá a partir de meados do séc.

XVI até a década de 70 do séc. XVIII. A manufatura mostra duas formas de origem: a origem

complexa (cooperação complexa) e a origem simples (cooperação simples). Na primeira,

eram necessários trabalhadores de vários ofícios independentes reunidos na mesma oficina

para formar o mesmo produto final, mas o capitalista detinha os meios de produção

(instrumentos) e comercializava os produtos (relações comerciais). Na manufatura simples,

era necessário reunir vários trabalhadores num único ofício, onde esses produziam as partes

mas vivenciavam a produção por inteiro.

Este período antecede e dá origem ao período manufatureiro, principalmente através

da cooperação simples. Nele, as duas formas de cooperação ainda dependiam da habilidade

do trabalhador, da segurança (domínio) e da aprendizagem. O trabalho é teórico-prático,

necessitava de uma prática reflexiva já que requeria idéias, criatividade, etc. e o objeto

(ferramenta) era subjugado a habilidade. Mas, a partir da especificação das ferramentas

(objetos e instrumentos) foi originada a divisão do trabalho. Toda esta especificação limitava

a habilidade e o conhecimento do trabalhador.

A manufatura se dividiu em heterogênea e orgânica (fazes de produção conexa -

produção em menor espaço e menor tempo de transição e produção), o capitalista tomou para

si o tempo e o espaço transformando-os em lucro (mais valia). A partir da divisão do trabalho,

a produção não foi mais integralizada (o trabalhador produzia só parte do produto), o sujeito

perdeu a capacidade de avaliar aquilo que produzia individualmente e o valor da mercadoria

passou a ser ditado pelo mercado. O trabalhador foi se tornando alienado na relação de

trabalho. Para Marx (1984, p. 403), é da divisão natural do trabalho que se estabelece a 4 O fundamento da sociedade foi alterado quando passou do artesanato (feudal) para o modo capitalista.

5168

divisão social do trabalho e que se estabelece a divisão manufatureira e, a própria divisão

manufatureira incrementa a divisão social do trabalho que produz a divisão do conhecimento.

A divisão do conhecimento é dada pela especialização cada vez maior.

A manufatura aumentou a riqueza social, a capacidade de produção e os modos de

produção, mas ocorreu perda de conhecimentos, habilidades, habilidade de pensamento,

ritmo, etc. Foi iniciado o processo de padronização do sujeito - perda da individualidade e da

identidade. A riqueza social se fez em detrimento da riqueza individual, o sujeito individual se

perdeu por detrás dos produtos e o trabalho submeteu o homem a disciplina exacerbada.

Nas três últimas décadas do séc. XVIII até os anos 70 do séc. XIX. A maquinaria foi

nascendo no interior da manufatura a partir da utilização, junção e especialização de

ferramentas e também da especialização de habilidades físicas e cognitivas dos trabalhadores.

As relações de trabalho na maquinaria, transformou o trabalhador em 'operador de máquinas'

e a experiência formativa (prática/empeírica), foi sendo corroída na base do trabalho - as

possibilidades formativas foram sendo diferenciadas por conta das transformações nas

relações do trabalho.

A maquinaria tem a finalidade de baratear o produto, aumentar a produção e não

diminuir a labuta (o objetivo é o lucro). Com a introdução das máquinas, acumula-se riqueza

em benefício do capital. Existia uma riqueza social, mas não foi consumida socialmente. A

alteração fundamental foi no instrumental do trabalho, os fundamentos da sociedade

capitalista não foram alterados e continuaram baseados na compra e venda da força de

trabalho.

Com a introdução das máquinas na produção, houve uma perda do contato físico do

trabalhador com o produto e o que restou a ele foi a força motriz, além disso, passa a ter o

papel de vigia e controlador da máquina. Foi o homem que adaptou a máquina por questão de

sobrevivência, perdeu o domínio sobre o objeto, sobre a máquina e como consequência

perdeu o domínio sobre o produto, foi obrigado a produzir o objeto tal como foi estabelecido

o que gera alienação5.

Na produção manufatureira, o trabalho foi dividido em ofício e o ofício em tarefas

onde cada trabalhador fazia uma parte. Na produção industrial, estas partes foram reagrupadas

pelas máquinas mas, os sujeitos são isolados, dessa maneira, o trabalho apesar de simples se

tornou complexo e abstrato. "O conhecimento é produzido para atender as necessidades do

5 Não ocorre mais a experiência formativa.

5169

capital" (Marx, 1984, p. 441), quanto mais o trabalho se industrializou, mais o trabalhador

precisou do conhecimento científico e mais o capital tomou conta da ciência - produção de

conhecimento. A industrialização atingiu principalmente o transporte e a comunicação. Este

período foi o de maior expansão na construção das ferrovias e meios de comunicação mas, ao

mesmo tempo a comunicação e a relação social entre os homens foi se perdendo.

De acordo com Marx (1984, p. 449), entre as consequencias da industrialização estão

a escravização da família (inclusive mulher e crianças), o aumento da degradação humana,

barateamento da força de trabalho (inclusive pela simplificação da produção), o aumento nos

índices de mortalidade infantil, início do distanciamento entre pais e filhos, formação

(instrução) deficiente e com limitações - só se aprende a 'operar', fazer - o trabalhador é

facilmente substituído em seu trabalho o que aumenta o número de excluídos, aumento da

jornada de trabalho e desaparecimento das diferenças individuais dos trabalhadores, estes são

padronizados.

Com a máquina, o grau de percepção, atenção, memória, etc. foi diminuído e

moldado para atender o trabalho, além dessa limitação essas capacidades foram padronizadas

o que gerou a perda da capacidade de reflexão e questionamento. O trabalho se tornou

extremamente estafante. A degradação psíquica e cognitiva dos homens chegou a tal ponto

que eles passaram a destruir o instrumental de trabalho (Marx, 1984, p. 489), e não era

percebido que para mudar essa situação se fazia necessário ir de encontro às relações de

trabalho estabelecidas pela ordem capitalista e não atacar as máquinas.

Um marco para o capital e história do capitalismo, foi a guerra civil americana

(1860) que desencadeou o progresso e o aperfeiçoamento da indústria (Marx, 1984, p. 495).

Foi na década de 60 do séc. XIX, que se iniciou o processo de automação. A guerra civil

americana provocou o processo de imigração principalmente para a América do Sul o que

modificou os hábitos da região que recebeu os imigrantes (como exemplo, o setor de roupa

industrializada e alimentos enlatados), esses hábitos foram repercutidos para outros setores,

num sentido de 'padronização'.

Com o declínio da manufatura e a ascensão da industrualização, a escola pública é

originada na França no final do séc. XIX com o propósito de ser universal, obrigatória,

gratuita, laica. Em 1881 é promulgada a lei que decreta a obrigatoriedade do ensino e em

1882 é decretado a sua gratuidade e laicidade. A Educação Tradicional é, em seus moldes,

'livresca' e 'enciclopédica' centrada no conhecimento dos clássicos, e o professor ocupa um

5170

lugar privilegiado na escola e na sociedade justamente por ter o domínio sobre o

conhecimento a ser mostrado. A ênfase é no ensino e por esta razão era necessário o domínio

dos conteúdos pelos professores.

A democratização da educação no final do séc. XIX foi uma exigência econômica e

política. Econômica porque era necessário investir na força produtiva e política para conter os

movimentos de resistências desta forma, a escola tradicional tentou por em prática e efetivar a

'igualdade' (ideal burguês). A partir daí, o que aconteceu foi uma completa expropriação de

conhecimentos que revelava uma desigualdade cada vez maior. Na realidade a publicização

da escola serviu de 'arma' econômica e política para deter os grandes conflitos que vinham

acontecendo.

As três últimas décadas do séc. XIX e as três primeiras décadas do séc XX, foram

marcadas por novas mudanças tecnológicas que provocaram uma recomposição no sistema

produtivo. As transformações nas técnicas de produção modificaram a organização do

trabalho e consequentemente, no modo de ser do homem - valores, comportamentos,

habilidades, etc. Neste período as atenções do desenvolvimento tecnológico se

deslocaram da Europa para os Estados Unidos (Segunda Revolução Industrial). O

investimento na tecnologia (desenvolvimento técnico) e a mudança nos modos de produção,

tiveram como objetivo a valorização ainda maior do capital e o combate às organizações

operárias (ponto de vista social) - política sindical que exercia a pressão política dos

trabalhadores.

As transformações da técnica e a modificação na organização do trabalho,

potencializou a produção, aumentou o controle sobre o trabalhador, aumentou a expropriação

do saber operário, a padronização dos instrumentos, dos produtos e dos homens, e também

provocou transformações na composição da classe operária. Conforme Coriat (apud

PIMENTEL,1985, p.83), neste período Taylor retomou o estudo de forma metódica e

sistemática sobre a organização do trabalho, tendo em vista o objetivo de quebrar a resistência

operária e de diminuir controle do trabalhador sobre o produto (expropriação do saber

operário). A nova forma de organização proposta por Taylor baseou-se no desmembramento

das grandes máquinas em máquinas menores e mais específicas, dessa forma limitava e

controlava o saber do trabalhador.

A decomposição do trabalho aliada a especialização dos instrumentos levou a menor

fração do trabalho. O operário trabalhava com a especificidade da máquina e só tinha o

5171

conhecimento desta fração, desta forma ocorreu neste período o aprofundamento da divisão

entre a concepção e a execução do trabalho, não havia mais aprendizado mas, treinamento e a

produção foi padronizada - produção rígida, automação rígida.

O regresso das condições humanas aumentaram assim como aumentaram o progresso

das técnicas, a partir dessa relação a técnica não é neutra. Ocorre neste período uma tensão

entre o aspecto positivo e o negativo da transformação das técnicas de produção: o positivo é

que os instrumentos produzidos pelo homem poderia libertá-lo do trabalho, mas a técnica não

é explorada visando as necessidades humanas e sim às necessidades do mercado, do capital.

Com a automação rígida o capital aumentou o controle sobre o processo produtivo e

sobre o operário, aumentou significativamente a obtenção do lucro e acarretou em uma

diminuição dos acidentes de trabalho (consequentemente, diminuição com indenizações).

Das últimas décadas do séc. XIX até a metade do séc. XX, mais precisamente até o

final da déc. de 50, ocoreu um período de grande expansão do capital como resposta ao

período de crise que antecedeu a produção homogênea (produção em série), e culminou com

as duas grandes guerras que também proporcionaram a expansão e a colonização do capital

através do domínio e conquista de novos mercados e patentização de novos eventos de grande

impacto, como aço, energia elétrica, motor de explosão, o petróleo , o telégrafo elétrico que

causou surpreendente expansão nos sistemas de comunicação e consequentemente uma

expansão na rede de comércio e no modo de produção capitalista.

De acordo com Harvey (1992), Ford acreditava na construção de um novo tipo de

sociedade através da aplicação adequada do poder cooperativo de regulamentação da

economia a partir da racionalização do processo de trabalho. Na racionalização do trabalho,

foi aumentado o valor da hora de trabalho e diminuída a jornada (5 dólares e 8 horas de

trabalho) essas mudanças tiveram o objetivo de estimular o consumo pois, a produção em

massa teve que eqüivaler o consumo em massa. "As alterações da produtividade em massa

provocaram alterações do conceito de estética física (ambiente) - adaptação do homem ao

novo ambiente físico - funcionalidade estética" (HARVEY, 1992, p.131). Outro objetivo foi o

de tentar diminuir a resistência sindical. Os sindicatos na América eram menos combatidos

por causa dos imigrantes, que se submetiam com maior facilidade ao capitalismo.

Os aspectos que caracterizaram a forma de organização do trabalho baseada no

fordismo foram: o estímulo ao consumo de massa e a introdução da linha de montagem

(esteira rolante), mas essa organização enfrentou duas dificuldades para sua disseminação,

5172

sendo a resistência dos trabalhadores ao novo sistema e os modos e mecanismos da

intervenção estatal (HARVEY, 1992, p. 123 e 124). Novas concepções administrativas

científicas e poderes estatais foram dados a pertir do "Estado do Bem Estar Social" através de

conquistas conseguidas pelos sindicatos na Inglaterra e nos Estados Unidos. (p.125).

As duas grandes guerras contribuíram para a expansão da industrialização através da

indústria bélica e também de outros de produtos como: medicamentos, alimentação, estuário,

calçados entre outros ramos da industrialização. A expansão foi consequencia principalmente

da 1ª guerra e a flexibilização nos processos de produção foi levada pela II Guerra Mundial.

Nas primeiras décadas do séc. XX, a educação rompe com os ideais da revolução

burguesa e tem o compromisso de 'educar' para o trabalho, onde o 'pensar' caberia a poucos.

Com a divisão do trabalho e a consequente expropriação dos conhecimentos, a escola deveria

garantir a formação do sujeito burguês. Neste cenário, os fundamentes da escola nova e,

posteriormente a educação tecnicista passam a orientar a educação formalizada. A escola nova

tinha como características a liberdade, a igualdade e a atividade. Na escola nova o ensino era

centrado no aluno e garantia condições para que se desenvolvessem suas potencialidades

individuais de acordo com seu ritmo. O professor era organizador, somente dando condições

para que as atividades acontecessem (espaço e tempo).

A educação tecnicista que se fundamenta no trabalho no interior das indústrias. Nesta

educação, a escola é organizada por princípios administrativos e de organização do trabalho

(supervisão, coordenação, professores, currículos, etc.) importados das empresas, e os

conteúdos (disciplinas) de cunho humanista foram retirados. A Educação Tecnicista é

centrada nos instrumentos, meios e recursos que, se bem selecionados, dispostos e manejados

por si só promovem o aprendizado.

Um dos principais autores que fundamentou a educação tecnicista foi o americano B.

F. SKINNER, influenciado pelos fundamentos da filosofia positivista de COMTE. Apesar

dele buscar uma 'mudança' na nova ordem, contribuiu para a manutenção da ordem vigente

(mercado). A teoria de Skinner procura controlar as leis que regulam o comportamento do

sujeito. Na escola, o aprendizado é garantido através do reforço e o afeto é desvinculado do

comportamento no trabalho.

Assim, como acontece a divisão do trabalho, deve acontecer a divisão dos conteúdos

– discipinas - e, como o controle dos instrumentos, meios e recursos era o suficiente para a

eficácia na escola, o planejamento era tido como principal recurso e instrumento para

5173

promover o aprendizado. Em resumo, na educação tecnicista, a ênfase era no planejamento, os

conteúdos fragmentados e naturalizados (desprovidos do movimento da história, sem

significado social) e o reforço era importante para a aprendizagem. Um dos recursos

utilizados é a tecnologia aplicada a educação (máquina de ensinar). Esse período foi

caracterizado por grande abundância em termos de produtos, no entanto foi um período em

que a expropriação do conhecimento foi intensificada, pois com a produção em massa veio a

alienação em massa, que impedia o homem de pensar diferente dos termos de produção

capitalista.

O realinhamento produtivo ocorreu a partir dos anos 60 do século XX, mais

precisamente nas décadas de 70 e 80 e o que leva esta transfomação no mundo do trabalho

(chamada de 3ª revolução industrial) é a reconversão produtiva ocorrida nos Estados Unidos e

alguns países da Europa como Inglaterra e França. A reconversão produtiva foi provocada

pela decadência da forma de organização do trabalho taylorista-fordista, que procurava

atender somente as necessidades sociais postas pelo mercado de trabalho.

A organização taylorista-fordista nunca foi tranquila pois sempre enfrentou a

resistências dos sindicatos e necessitava de trabalhadores. Esta forma de trabalho não se

organizava sem os trabalhadores e estes, sabendo disso, provocavam resistências. Estes

embates proporcionaram ganhos sociais ('bem estar social') e as indústrias eram obrigadas a

adotar rodízios pelos postos de trabalho e reagrupar tarefas, já que a divisão e a 'mecanização'

dos gestos foi acentuada até o limite humano suportável. Todas essas dificuldades obrigou o

capital a pensar em mudanças na organização do trabalho e, entre essas mudanças foi

instaurado o reagrupamento de tarefas (uma das características da 3ª revolução industrial). O

reagrupamento não devolveu ao homem a dignidade de ter o conhecimento como um todo

(autonomia), pois não havia condições de 'devolver' o conhecimento tirado, este continua

corroído. Este ponto foi um dos que proporcionou a decadência da organização taylorista-

fordista que chegou ao ponto de 'dividir o indivisível'.

Após as duas grandes guerras, as indústrias foram obrigadas a contratar pessoas não

capacitadas para produzir mais em menos tempo e , além disso, o mesmo trabalhador era

obrigado a realizar mais que uma tarefa e também a realizar tarefas que nunca haviam

realizados. Alguns pontos contribuíram para a transformação da organização nos modos de

produção: reagrupamento de tarefas; diminuição de operários especializados; grande

5174

deslocamento do setor de produção para o setor de manutenção (controle) e sofisticação

tecnológica do sistema produtivo (ponto alto da produção flexível).

A diminuição do consumo levou a indústria a criar estratégias, e uma dessas

estratégias foi produzir para uma 'pequena' classe dominante, onde os produtos atenderiam às

características individuais dos consumidores. Isto interessaria ao mercado e ao consumo e, os

meios de comunicação de massa vieram a atender este interesse.

Essas estratégias necessitavam de uma reorganização nos modos de produção e um

reajustamento das máquinas já que a produção devia ser menor, mais rápida e atender os

consumidores de forma personalizada (atender à pedidos, sistema de encomendas).

As transformações ocorridas durante as décadas de 70 e 80 foram marcadas por um

período de reestruturação econômica e política, dessa forma social. A produção flexível é

baseada na computadorização dos sistemas produtivos com base na microeletrônica

(HARVEY, 1992, p.140).

A acumulação flexível alterou as máquinas, essas foram reacopladas e

informatizadas, o sistema de controle é disfarçado e acontece via computador, o produto

assume formas diferentes, a 'alimentação' das linhas de montagem é realizado pelos

computadores e a circulação da mercadoria é em tempo mínimo.

As consequencias da flexibilização da produção (HARVEY, 1992, p.141-143) foram

dadas através da diminuição drástica do trabalho vivo, aumento brutal do desemprego, rápida

destruição de habilidades, reconstrução de 'novas' habilidades, retrocesso no poder dos

sindicatos, trabalho em domicílio, exploração do trabalho da mulher e deforma a idáia de

família. A aceleração da produção deveria estar preenchendo a aceleração do consumo (idéia

de que tudo que é novo é melhor) e o supérfulo tomado como necessidade fundamental.

Conforme Harvey (1992, p.150-155), a informação se tornou uma mercadoria muito

valorizada e o mercado foi marcado tanto por transações financeiras como por transações de

produtos. Estas transformações fizeram com que a capital financeira do mundo se transferisse

rapidamente de um lugar para o outro. Incidiu também sobre o setor político (desmonte do

'bem estar social'), o Estado se omitia de responsabilidades sociais e passava para as empresas

essas funções através dos 'patrocínios'.

A produção rígida ainda se mostra presente, mas tendia a ser substituída pela

produção flexível através da força da concorrência. Nos países não desenvolvidos, ainda hoje,

há formas de trabalhos que não são derivados nem da automação flexível e nem da automação

5175

rígida, e com o desemprego um novo setor de trabalho é explorado, é o chamado trabalho

informal. Apesar da capacidade de produzir mais, não significa que a sociedade

A mais recente reorganização do processo produtivo deve-se a automação flexível e

a informatização na produção. Novos conceitos e novas organizações do trabalho e da

produção são resultantes da utilização das novas tecnologias: eletrônica e informática. O

computador controla a produção e, consequentemente o trabalhador.

A integração do processo produtivo a partir da reintegração das tarefas (das partes) e

a flexibilização - que tem sua base na informatização aplicada a produção e também nas

pesquisas encomendadas e financiadas pelo capital - são dois aspectos presentes na

reorganização do trabalho.

O início do processo de reorganização da produção se deu a partir das 'ilhas de

montagem' (CORIAT, 1988. p.16). Nesse sistema as linhas de montagem são organizadas em

grupos de trabalhadores o que faz com que ocorra a diminuição dos postos de trabalho e o

aumento das tarefas do grupo. Os grupos tem no máximo quatro trabalhadores e deixa

transparecer uma ('falsa') maior autonomia, pois o trabalho se torna menos enfadonho. O

discurso do capital atualmente se dá no sentido de que a automação flexível consegue

humanizar o trabalho, mas este argumento não se sustenta já que o trabalhador não reúne

concepção e execução durante a produção desta forma, não vincula uma relação com o objeto

de acordo com sua vontade.

A reorganização do processo de produção necessita da informatização para atender o

novo tipo consumo e a concorrência, torna-se necessário as linhas flexíveis de produção que

gerem produtos adaptáveis e diferenciados e assim correspondam à nova demanda. Couriat

(1988, p. 20) explica que as linhas são flexíveis "porque são capazes de fabricar, sem exigir

uma reorganização maior, diferentes produtos, a partir da mesma organização básica de

equipamentos e com um intervalo reduzido de adaptação."

As produções com base nas inovações de equipamentos (automação programável)

são, a partir da natureza das funções assumidas, agrupadas em: a) meios de operação:

acoplamento de ferramentas nas máquinas e manipuladores; b) alimentação das linhas de

montagem: abastecimento da linha de montagem através de trolleys comandados por

computador; c) controle de equipamentos de produção: via computador, aumento de controle

de produção e do trabalho humano; d) auxílio a projetos (COURIAT, 1988, p. 22 e 23).

5176

A nova engenharia produtiva assume tendências e, entre elas está a Integração

(integração das seqüências temporais da produção) e a flexibilidade determinada pelas novas

características da demanda (voláteis, instáveis e diferenciadas) e como conseqüência da

concorrência entre empresas. A flexibilização no plano econômico permite ao capital explorar

o máximo possível a utilização das diferentes capacidades (recursos) de uma mesma máquina.

Couriat (1988, p. 33-53) descreve cinco novas formas de automação na ordem

cronológica em que elas foram elaboradas e postas em prática. A primeira é a linha integrada

de fabricação (FIF): ilhas de montagem, a segunda é a linha assincrônica de montagem

(LAM): início da aplicação da informática sobre a produção - o objetivo da primeira aplicação

da informática na produção é o controle sobre os trabalhadores e também sobre a vida dos

homens; posteriormente, apresenta-se a linha integrada flexível (robotgate): considerada a

mais avançada do ponto de vista tecnológico ('indústria de ponta') pois, além de integrada ela

é altamente flexível. A quarta é denominada Kan-ban (5 zeros: estoque zero, defeitos zero,

pane zero, demora zero papel zero): não demanda novas tecnologias e consiste na

reorganização do trabalho e, a última é a MRP (planejamento do material requerido):

produção com base nas previsões de consumo vinculada diretamente com a informação de

consumo.

As mudanças na organização do trabalho provocam modificações sociais, entre as

quais a necessidade de equacionar as reivindicações dos trabalhadores e adaptar o mercado

produtivo às demandas. Potencializa a exploração do trabalho morto.

As novas formas de organização da produção influenciaram e continuam a

influenciarem diretamente o modo de ser do sujeito social. Todo arsenal técnico que deveria

dominar a natureza e livrar o trabalhador da labuta, domina também o homem. O controle é

simultâneo sobre a liberdade social e a individual. O capital coopta para si a força física e

também as capacidades intelectivas e psíquicas de uma só vez na sociedade e em cada

indivíduo. Essas capacidades têm uma formação unidimensional, são formadas como convém

para a ordem capitalista às medidas de suas necessidades.

As relações sociais de produção deixam o sujeito sem reação, o ser humano encontra

dificuldades em resistir ao 'conforto tecnológico', pois a alta tecnologia permite 'popularizar' o

consumo, os produtos.

O sentido de liberdade não é mais o mesmo, os homens passam a lutar por uma

liberdade individual ao invés de lutarem por uma liberdade social. O conhecimento é a

5177

racionalidade unidirecional (a razão atende ao capital) e o individualismo nasce das relações

deste trabalho. Isto ajuda a garantir a falta de resistência ao controle estabelecido e, desta

maneira, a oposição ao sistema é corroído pelo processo de trabalho e as necessidades

supérfluas passam a ser essenciais (COURIAT, 1988, p. 24).

A sociedade industrial se mantêm estimulando o consumo e o desperdício, é através

do consumo que o mercado controla o indivíduo, o sujeito se trona submisso ao objeto, o

controle da liberdade nunca foi tão grande pois a sociedade que forma padrões de

comportamento e de pensamento (id p. 32 e 33). A sociedade capitalista usa a comunicação de

massa para manter a alienação.

Para Marcuse (1973, p. 35), na contemporaneidade vivemos em regresso e não

progresso. Regresso nas condições humanas. As implicações sociais da tecnologia moderna

possui os seguintes aspectos: processo de uniformização da individualidade e o impacto das

novas forças produtivas sobre a deformação da individualidade. É difícil para o homem

entender este controle, pois ele é conduzido de maneira sutil, imperceptível. O capital coopta

para si o conhecimento, as formas de pensamento e determina a formação.

A tecnologia não se restringe a técnica, significa no contexto da história muito mais

que mudança da técnica, é todo um conjunto de conhecimento a serviço da produção e do

consumo da técnica tal como o consumo e a produção da técnica se realizam na nossa

sociedade. A técnica se pudesse ser tomada em si, seria um processo neutro, mas como serve

a determinados propósitos não pode ser pensada desta forma, pois prioriza as necessidades do

capital, do mercado e não as necessidades humanas (MARCUSE, 1941, p. 113).

Na sociedade capitalista, é priorizada a racionalidade dominante e a padronização da

individualidade. As características individuais vão sendo minadas e a indústria cultural

impregna no sujeito necessidades individuais produzidas pelo mercado. O controle da

produção vai se concentra no capital e o trabalho se torna, cada vez mais, um meio de

obtenção de lucro e deixa de ser um lugar de realização pessoal.

Para Marcuse (1941, p.123), convivemos com duas verdades: a consciência crítica,

emancipatória e a consciência instrumental, técnica. A racionalidade é instrumental (serve

para a manutenção da ordem vigente), mas anterior a esta se encontra a racionalidade

emancipatória, é a razão iluminista - consciência crítica, capaz de perceber a potencialidade -

onde o sujeito se liberta e deixa de ser subjugado (id. p.115). Quando a razão passa a dominar

a fé, parecia ter chegado os tempo de emancipação, de libertação, tudo pode ser observado,

5178

mas a ciência conduz os homens ao experimentalismo, controlado pelos próprios homens e os

instrumentos que ele próprio criou.

A manutenção da impotência da razão crítica ou do pensamento crítico para Marcuse

(1941, p.124-135) segue determinados fatores: o modo como o trabalho se organiza e se

efetua (fator que desencadeia e mantém todos os outros); o crescimento do aparato

tecnológico a serviço tanto da produção como da comunicação; a incorporação ao sistema

vigente de camadas ou setores da sociedade que eram de oposição, de protesto; o isolamento

do indivíduo na multidão (razão instrumental corrói a individualidade); a criação de uma base

comum de experiência para diferentes profissões (sensação de igualdade através do domínio

das técnicas, do conhecimento e de 'novas' habilidades) e o aumento da burocracia, tanto

estatal como privada (aumento do controle).

Após a descrição das transformações no mundo do trabalho e das relações das forças

produtivas, as perguntas que fazemos é: quais são as consequências das inovações

tecnológicas e a transformações no processo de trabalho na qualificação do trabalhador? E a

educação? Quais as interferências das características e mudanças no mundo do trabalho na

educação e na escola?

As transformações ocorridas nas formas de produção e na organização do trabalho

trouxeram problemas educacionais de ordem objetiva e subjetiva. A educação se mostra

descontextualizada e o ensino de conteúdos desprovidos da vertente histórica que os origina.

Pinto (1991, p. 52) argumenta que as formas mais integradas6 e flexíveis de

organização do trabalho, possibilitam a transformação do trabalho fragmentado, padronizado

e repetitivo pelo trabalho flexível e integrado, o que possibilita a criação de novas

perspectivas para a educação. Essa integração do trabalho sugere uma intelectualização da

produção e consequentemente uma intelectualização do trabalhador e dos homens

(convergência nos interesses do capita e do ensino).

A intelectualização do trabalho e dos homens é fundamentada no pressuposto de que,

as necessidades de adaptação do sujeito às novas tecnologias estão ligadas a "inteligência e ao

conhecimento" já que o nível de mobilidade e plasticidade do trabalhador é elevado e a

informação é entendida como 'conhecimento' (PINTO, 1991, p.53). As novas de produção

pressupõem as necessidades de novas formas de capacidades e habilidades como, por

exemplo, lidar com símbolos verbais e numéricos. 6 A autora parte do pressuposto que a junção de partes é igual ao todo e, se esquece que a junção deveria ser entre concepção e execução.

5179

A automação flexível determina o trabalho e consequentemente os conteúdos de

ensino e a ação escolar que deve objetivar a adaptação dos sujeitos às novas formas de

produção, já que essas requerem novas competências e novas habilidades. Nessa perspectiva

(PINTO, 1991), define que a qualidade do ensino é definida pelas demandas tecnológicas. (o

que se ensina, como se ensina e para que se ensina é determinado pelas demandas imediatas

do capital). Entretanto, as novas capacidades intelectivas7 são pré-determinadas pela

tecnologia (determinismo tecnológico) e por essa razão, não é permitido ao homem maior

controle sobre o processo de trabalho.

A educação não pode tomar a demanda tecnológica como objetivo final pois, desta

forma será uma educação para a adaptação (sem ruptura) e sim deve tomar a demanda do

capital como ponto de partida e buscar a transformação. Em contrapartida, nessa sociedade a

verdade é ditada pela lógica formal (razão instrumental), o conteúdo educacional é

fragmentado e as partes se explicam por si. Sendo assim, existe a necessidade de considerar

os valores externos à escola que estão postos na sociedade. Silva T. (1992) procura atender

essa necessidade através da análise da relação entre a divisão social do trabalho, o processo de

(des) qualificação e as divisões educacionais.

Perspectivas da educação: a formação instrumental e a formação humana

A divisão do trabalho traz consigo o processo de desqualificação não só do

trabalhador, mas da humanidade e atinge seu ponto máximo na divisão entre concepção

(quem pensa) e execução (quem faz). Perde-se a capacidade de apreender o que está nas bases

do processo de produção, desta forma, ocorre uma deformação ao invés de uma formação do

sujeito pois este se forma através da cultura mercantil e dos meios de comunicação de massa.

A educação não produz divisão (concepção e execução) - ela ocorre o âmbito do trabalho -

mas, a educação forma indivíduos para atender essa divisão. A escola deve dar condições de

permanência do sujeito, caso contrário ela favorecerá a exclusão e consequentemente, essa

exclusão.

O sistema educacional se divide em níveis e em especialidades e perde a noção da

totalidade. As áreas de conhecimento específicas que não mantém um único método de

análise, proporciona um aumento na divisão do ensino. O processo de desqualificação não se 7 POLICOGNIÇÃO: raciocínio demarcado, baseado na informação e não permite compreender os problemas sociais e o processo de humanização)

5180

dá somente no setor técnico profissionalizante, se reflete também na formação básica. A

educação têm que saber seus objetivos. Que tipo de formação se pretende?.

O processo de desqualificação (produção flexível, automação flexível) se reflete no

interior da escola através da educação virtual. Os que fazem o trabalho intelectual não

escapam dessa degradação na formação (deformação). Acredita-se que atualmente há uma

formação mais ampla e geral através da requalificação do trabalho, do trabalhador e da

educação escolar. A automação flexível junta a concepção da execução , mas não resolve o

problema, pois quem concebe, se restringe a um só sistema. Se tornou mais abstrato e a

divisão permanece. Ocorre então a formação de novas capacidades, mas dentro da lógica

capitalista e não uma requalificação no sentido da formação geral.

O problema da desqualificação passa pela questão do conteúdo em sala de aula

(como e, em que perspectivas é trabalhado) e, é preciso ter clareza em relação ao saber a ser

ensinado. Percebe-se um descompromisso do educador, sob a crença de que o aluno aprende

por si, isso provoca um certo descompromisso com relação aos conteúdos. A

interdisciplinaridade requer pressupostos teóricos e norteadores únicos e não diversificados

(critério teórico e metodológico). Caso não queira romper com o método da ciência e da

história, só se pode pensar com uma única base. O diálogo não pode ser de opiniões (com

base no senso comum e na percepção imediata). Só estão preocupados com um único

referencial teórico aqueles que trabalham em uma perspectiva histórico-cultural. Se o método

de análise não permite analisar as contradições e os embates, corre-se o risco de ficar exposto

à razão instrumental.

Como afirma Silva (1992, p. 65-67), a desqualificação no interior da escola, é

simultâneo à redução do tempo dedicado à reflexão, ao estudo e ao ensino propriamente dito.

Reflexões estas, que levem a análise e articulação do conhecimento para além do que está

posto. A reflexão tem que ser guiada por um método e pelo professor.

Considerações Finais

A educação por si só não pode transformar o quadro anteriormente relatado, mas

pode tirar do centro do debate a questão da qualificação e desqualificação e, mostrar que o

núcleo maior é a divisão do trabalho (SILVA, 1992 p.172).

5181

Boaventura de Sousa Santos (apud SILVA, 1996, p.15-33), propõe os fundamentos

de um projeto educativo com vistas a emancipação humana (educação para a emancipação).

De acordo com as idéias do autor, vive-se em um tempo paradoxal, de um lado o

desenvolvimento tecnológico extraordinário intitulado de globalização (capaz de suprir as

necessidades da sociedade em todos os níveis) e, de outro lado vive-se a repetição do passado

através da regressão das condições humanas (expropriação, miséria, violência, etc.) e de

estagnação da consciência de transformação social é essa repetição eterna do presente - nas

bases da produção social do trabalho: como está organizado e como se realiza, racionalidade

instrumental no pensamento e no modo de ser dos homens, e a filosofia burguesa que faz com

que o sujeito enxergue a ordem posta como a ordem de 'progresso' - que consuma a vitória do

capitalismo burguês.

Contra esse estado de estagnação, é necessário uma educação com vistas a

emancipação, que tem no conflito8 seu eixo principal para a formação dos sujeitos sociais, dos

seres humanos. Inseridos nesse "projeto educativo emancipatório" (SANTOS apud SILVA,

1996, p. 17) estão três conflitos de conhecimento descritos a seguir (id, p.18 -32).

Aplicação técnica e aplicação edificante da ciência: A técnica (conhecimento

científico) não é produzida e consumida a medida das necessidades humanas fundamentais,

mas sim de acordo com as necessidades do mercado. Há uma fusão entre a ciência e produção

capitalista, o que provoca a aplicação técnica em detrimento da razão. Os meios são tomados

como fins últimos e a ética perde de vista a preocupação com o sujeito. Para que esta

aplicação seja alterada, é proposto um modelo alternativo denominado de aplicação edificante

da ciência que tem como objetivo contrapor o estabelecido.

Na aplicação edificante, a ética não pode ser tomada como a ética do mercado, os

meios não podem ser tidos como fim e a ciência deve lutar para enriquecer culturas locais. O

conflito é o eixo, no contexto ensino-aprendizagem, entre o modelo de aplicação técnica e o

edificante e sinaliza para a necessidade de se pensar em formas alternativas da produção e

aplicação da ciência. No modelo proposto professores e estudantes terão que utilizar as

pedagogias das ausências. Esta é a base da pedagogia do conflito, onde a imaginação da

experiência passada e presente deve ser posta e pensada com o objetivo de supor diferentes

consequencias da aplicação da ciência se outras opções tivessem sido tomadas. Só a

8 O conflito serve para vulerabilizar e desestabilizar os modelos epistemológicos dominantes e para olhar o passado através do sofrimento humano que, por via deles e da iniciativa humana a eles referida, foi indesculpavelmente causado (SANTOS apud SILVA,1996,p. 33).

5182

imaginação das consequências do que nunca existiu poderá desenvolver o espanto e a

indignação perante as consequências do que existe.

O conhecimento como regulação e conhecimento como emancipação: Este conflito

se estende ao próprio conhecimento a ser aplicado e parte da idéia da transição

paradigmática9.

O conhecimento-como-regulação consiste numa tragetória entre um ponto de ignorância designado por caos e um ponto de conhecimento, designado por ordem. O conhecimento-como-emancipação consiste numa tragetória entre um ponto de ignorância chamado colonialismo e um ponto de conhecimento chamado solidariedade (SANTOS apud SILVA, 1996, p. 24).

A regulação posta é baseada na razão instrumental ( o sistema capitalista tem que

desenvolver diariamente novos 'artifícios de encantamento' para manter a dominação, que pela

contradição que gerada encontra dificuldades para se manter) que está ligado a forma de

como se dá o trabalho. O conhecimento como regulação tem de sersubstituído pelo

conhecimento como emancipação através da capacidade de análise dos diferentes conteúdos

de ensino, com o objetivo de alcançar a educação como formação do sujeito.

O conflito entre o Imperialismo cultural e multiculturalismo, parte da análise sobre o

domínio crescente da cultura imperialista ocidental auxiliado pela globalização que tende a

devorar as pequenas culturas milenares. A educação emancipatória deve lutar pela discussão

consciente entre culturas diferentes, livre de preconceitos postos pela cultura dominante. Deve

ser procurado nas culturas o que elas tem de humano, para que seja copiado e transportado

para a nossa sociedade e não colocar a cultura burguesa como a melhor, a mais avançada e

mais completa.

O conflito cultural deve estar no centro do currículo do projeto educativo

emancipatório. "Um relacionamento mais igualitário, mais justo que nos faça aprender o

mundo de modo edificante, emancipatório e multicultural. Será este o critério último da boa e

da má aprendizagem." (SANTOS apud SILVA, 1996, p.33).

A educação tem que considerar a adaptação, mas ir além dela e, através de uma

educação crítica, explicitar a sociedade capitalista e perceber a positividade excludente e

miserável no sentido humano que se instala. Esta educação deve tomar as necessidades

humanas em todas as suas dimensões como ponto de chegada. Desta forma, Adorno (1995,

9 A partir da reconstituição desse conflito matriarcal, se aprofunde a crise da confiaça epistemológica da ciência moderna e se criem energias para a emergência de novos conflitos epistemológicos (SANTOS, B., 1996, p. 24).

5183

p.180) chama a atenção para a necessidade do fortalecimento do 'eu' como subsídio para a

consciência crítica.

A emancipação só tem chance de se regular numa sociedade que não seja a

capitalista. “[...] a única concretização efetiva da emancipação consiste em que aquelas

poucas pessoas interessadas nesta direção orientem toda a sua energia para que a educação

seja uma educação para a contradição e para a resistência" (ADORNO, 1995, p. 183). A

educação para emancipação é preocupada e ocupada em não deixar morrer a crítica, o

contraponto. O conteúdo deve ser ensinado com a finalidade maior de pensá-lo nessa

sociedade para ir além dela.

REFERENCIAS

ADORNO, T. W. Educação e emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. CORIAT, B. Automação Programável: Novas Formas e Conceitos de Organização da Produção. In: SCHMTZ, H.; CARVALHO, R.Q. (orgs.). Automação, Competitividade e Trabalho: A Experiência Internacional. São Paulo: Hucitec, 1988. ________________. O Taylorismo e a Expropriação do Saber Operário. In: PIMENTEL, Duarte et alii. (orgs). Sociologia do trabalho: organização do trabalho industrial. Lisboa: A Regra do Jogo, 1985. GHIRALDELLI, Jr. P. O corpo: filosofia e educação. São Paulo: Ática, 2007. HARVEY, D. Condição Pós-Moderna. São Paulo: Loyola, 1992. Parte II, capt. 8 MARCUSE, H. A ideologia da sociedade industrial. Rio de Janeiro: Zahar, 1973. ________________. Algumas Implicações Sociais da Tecnologia Moderna. In: Praga - Revista de Estudos Marxistas. São Paulo: Boitempo, 1997, nº 1. MARX, K. H. O capital. São Paulo: Difel, 1984. PINTO, A. M. R. O Advento da Automação Flexível e a Formação do Trabalhador: Fim da Atividade Fragmentária? Emergência da Multiabilitação Profissional? O horizonte entreaberto na década de 80. In: Revista Tempo Brasileiro - Sistema educacional e Novas Tecnologias. Rio de Janeiro: Folha Carioca Editora, 1991, nº 105. SANTOS, B. de S. Para uma Pedagogia do Conflito. In: SILVA, L. H. et al (orgs.). Novos mapas culturais novas perspectivas educacionais. Porto Alegre: Sulinas, 1997.

5184

SILVA, T. T. da. O que se produz e o que se reproduz em educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. SKINNER, B.F. Tecnologia do ensino. São Paulo: Herder, 1972.