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Tribunal de ConTas FORMAÇÃO noel Gomes

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  • Tribunal de ConTas

    F O R M A O

    noel Gomes

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    Tribunal de Contas

    1. Jurisdio O Tribunal de Contas (TdC) , nos termos do artigo 214. da CRP, o rgo supremo de

    fiscalizao da legalidade das despesas pblicas e de julgamento das contas que a lei mandar submeter-lhe.

    Em concretizao da directriz constitucional, dispe o artigo 1., n. 1, da Lei de

    Organizao e Processo do Tribunal de Contas (LOPTC), que o TdC fiscaliza a legalidade e

    regularidade das receitas e das despesas pblicas, aprecia a boa gesto financeira e efectiva responsabilidades

    por infraces financeiras.

    O TdC um rgo jurisdicional, externo (no sentido de situado fora da administrao

    pblica), dotado de independncia. O facto de o TdC ser um rgo jurisdicional (um tribunal)

    no significa que exera apenas funes jurisdicionais. Na verdade, o TdC, a par de poderes

    jurisdicionais, dispe de poderes no jurisdicionais (fiscalizao). Constituem poderes

    jurisdicionais: o julgamento de contas e a efectivao de responsabilidades financeiras.

    discutido se a fiscalizao prvia constitui o exerccio de um poder deste tipo. Por seu

    turno, constituem poderes no jurisdicionais (ou de fiscalizao): dar parecer sobre a Conta

    Geral do Estado, dar parecer sobre as contas das Regies Autnomas, verificar as contas

    dos organismos, servios ou entidades sujeitos sua prestao; realizao de auditorias s

    entidades do artigo 2, por iniciativa prpria, da Assembleia da Repblica ou Governo e

    fiscalizar s cobrana dos recursos prprios e a aplicao dos recursos financeiros oriundos

    da UE; emitir recomendaes.

    2. mbito subjectivo O mbito subjectivo do TdC, que o mesmo que dizer as entidades que esto

    sujeitas jurisdio e aos poderes de controlo financeiro daquele tribunal, delimitado pelo

    artigo 2. da LOPTC.

    A delimitao do mbito subjectivo do TdC assenta num critrio de natureza

    objectiva: dinheiros e valores pblicos. Desta forma, integram o mbito subjectivo do TdC,

    as entidades do sector pblico, que naturalmente gerem dinheiros pblicos,

    independentemente de se tratar de administrao estadual, indirecta ou autnoma, de ser

    entidade administrativa ou empresarial; e, por outro lado, pelas entidades de qualquer natureza

    que tenham participao de capitais pblicos ou sejam beneficirias, a qualquer ttulo, de dinheiros ou

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    outros valores pblicos, na medida necessria fiscalizao da legalidade, regularidade e correco econmica

    e financeira da aplicao dos mesmos dinheiros e valores pblicos.

    Ao nvel municipal, importar reter a sujeio ao controlo do TdC das seguintes

    entidades:

    i. Autarquias locais, suas associaes ou federaes e seus servios, bem como

    reas metropolitanas (artigo 2., n 1, alnea c));

    ii. Empresas municipais, intermunicipais e regionais (artigo 2., n. 1, alnea c));

    iii. Entidades de qualquer natureza que tenham participao de capitais pblicos

    ou sejam beneficirias, a qualquer ttulo, de dinheiros ou outros valores

    pblicos, na medida necessria fiscalizao da legalidade, regularidade e

    correco econmica e financeira da aplicao dos mesmos dinheiros e valores

    pblicos, quando esteja em causa uma participao de uma autarquia nessa

    entidade (artigo 2., n. 3).

    3. Controlo financeiro A lei confere ao TdC poderes de controlo financeiro, os quais, em funo do

    momento em que se verifica, podem ser agrupados da seguinte forma: (1) fiscalizao

    prvia; (2) fiscalizao concomitante, e (3) fiscalizao sucessiva.

    3.1. Fiscalizao prvia

    3.1.1. Finalidade

    A fiscalizao prvia que se exerce atravs do visto ou da declarao de

    conformidade tem por fim verificar se os actos, contratos ou outros instrumentos geradores de despesa

    ou representativos de responsabilidades financeiras directas ou indirectas esto em conformidade com a lei e

    se os respectivos encargos tm cabimento em verba oramental prpria, sendo que relativamente aos

    instrumentos geradores de dvida pblica a fiscalizao prvia visa verificar a observncia dos

    limites e sublimites de endividamento e as respectivas finalidades, estabelecidas pela Assembleia da

    Repblica (artigo 44., n. 1 e 2, da LOPTC).

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    3.1.2. mbito subjectivo

    O permetro da fiscalizao prvia abrange as seguintes entidades: (i) entidades

    previstas no artigo 2., n. 1, da LOPTC, nas quais se enquadram as autarquias locais; (ii)

    entidades previstas no artigo 2., n. 2, alneas a), b) e c), da LOPTC, das quais se destacam

    as empresas locais; (iii) as entidades, de qualquer natureza, criadas pelo Estado ou por quaisquer

    entidades pblicas para desempenhar funes administrativas originariamente a cargo da Administrao

    Pblica, com encargos suportados por financiamento directo ou indirecto, incluindo a constituio de

    garantias, da entidade que as criou

    3.1.3. mbito objectivo

    Dispe o artigo 5., n. 1, alnea c), da LOPTC, que compete ao TdC fiscalizar

    previamente a legalidade e o cabimento oramental dos actos e contratos de qualquer natureza que sejam

    geradores de despesa ou representativos de quaisquer encargos e responsabilidades.

    Todavia, nem todos os actos e contratos referidos na norma citada esto sujeitos a

    fiscalizao prvia. Na verdade, a norma citada tem de ser conjugada com o disposto no

    artigo 46. da LOPTC, o qual delimita positivamente o mbito da fiscalizao prvia. De

    acordo com este artigo, esto sujeitos a fiscalizao prvia do TdC:

    a) Todos os actos de que resulte o aumento da dvida pblica fundada dos servios e fundos do

    Estado e das Regies Autnomas com autonomia administrativa e financeira e das demais

    entidades referidas nas alneas c) a e) do n. 1 do artigo 2., bem como os actos que

    modifiquem as condies gerais de emprstimos visados;

    b) Os contratos de obras pblicas, aquisio de bens e servios, bem como outras aquisies

    patrimoniais que impliquem despesa nos termos do artigo 48, quando reduzidos a escrito por

    fora de lei;

    c) As minutas dos contratos de valor igual ou superior ao fixado nas leis do Oramento nos

    termos do artigo 48., cujos encargos, ou parte deles, tenham de ser satisfeitos no acto da sua

    celebrao.

    d) Os actos ou contratos que formalizem condies objectivas a contratos visados e que impliquem

    um agravamento dos respectivos encargos financeiros ou responsabilidades financeiras;

    e) Os actos ou contratos que formalizem modificaes objectivas a contratos no visados que

    impliquem um agravamento dos respectivos encargos financeiros ou responsabilidades

    financeiras em valor superior ao previsto no artigo 48.;

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    A amplitude desta modalidade de controlo financeiro ainda mais restrita, na

    medida em que nem todos os actos e contratos indicados no artigo 46. tm de ser

    submetidos a fiscalizao prvia do TdC. Na verdade, a lei, relativamente s situaes

    previstas no referido artigo 46., estabelece e diferencia situaes de iseno (artigo 46.) e

    de dispensa (artigo 47.).

    3.1.4. Recusa do visto

    O visto recusado com fundamento em desconformidade dos actos, contratos e demais

    instrumentos referidos com as leis em vigor que implique: a) nulidade; b) encargos sem cabimento em verba

    oramental prpria ou violao directa de normas financeiras; c) ilegalidade que altere ou possa alterar o

    respectivo resultado financeiro (artigo 44., n. 3, da LOPTC)

    A recusa do visto implica a ineficcia jurdica dos actos, contratos e demais instrumentos aps

    a data da notificao da deciso aos respectivos servios ou organismos interessados (artigo 45., n. 2,

    da LOPTC).

    De referir que os trabalhos realizados ou os bens ou servios adquiridos aps a celebrao do

    contrato e at data da notificao da recusa do visto podero ser pagos aps esta notificao, desde que o

    respectivo valor no ultrapasse a programao contratualmente estabelecida para o mesmo perodo (artigo

    45., n. 3, da LOPTC).

    3.1.5. Efeitos do visto

    Os actos, contratos e demais instrumentos sujeitos fiscalizao prvia do TdC

    podem produzir todos os seus efeitos antes do visto ou da declarao de conformidade,

    excepto quanto aos pagamentos a que derem causa. (artigo 45., n. 1, da LOPTC).

    Esta regra tambm no vale relativamente aos actos, contratos e demais instrumentos

    de valor superior a 950.000, os quais, por regra, no produzem quaisquer efeitos antes do visto

    ou da declarao de conformidade (artigo 45., n. 4 e 5, da LOPTC).

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    3.2. Fiscalizao concomitante

    A lei no limita a fiscalizao do TdC fase prvia da execuo dos actos e contratos.

    Para alm desse tipo de fiscalizao, a lei confere ao TdC poderes para realizar a

    fiscalizao concomitante, isto , um tipo de fiscalizao (simultnea) que se traduz no

    acompanhamento da execuo dos actos, contratos, e da actividade financeira, em geral,

    sob a sua jurisdio.

    Essa actividade exercida atravs de auditorias (realizadas atravs da 1. e 2.

    seces), as quais podem incidir sobre: (a) os procedimentos e actos administrativos que

    impliquem despesas de pessoal e aos contratos que no devam ser remetidos para

    fiscalizao prvia, bem como execuo de contratos visados; (b) actividade financeira

    exercida antes do encerramento da respectiva gerncia.

    A fiscalizao concomitante articula-se com as restantes modalidades de fiscalizao

    e com os poderes outorgados ao TdC em matria de efectivao de responsabilidades

    financeiras.

    3.2. Fiscalizao sucessiva

    O TdC, para alm de uma fiscalizao prvia e concomitante, pode ainda

    desenvolver uma fiscalizao sucessiva. Isto , uma fiscalizao que feita a posteriori,

    exercida em momento posterior ao do desenvolvimento da actividade financeira. Ocorre,

    portanto, depois do fim do exerccio ou gerncia e de serem elaboradas as contas anuais.

    De acordo com o artigo 50., o TdC, no mbito da fiscalizao sucessiva: (a) verifica

    as contas das entidades previstas no artigo 2., designadamente das autarquias locais; (b)

    Avalia os respectivos sistemas de controlo interno; (c) Aprecia a legalidade, economia,

    eficincia e eficcia da sua gesto financeira; (d) Assegura a fiscalizao da comparticipao

    nacional nos recursos prprios comunitrios e da aplicao dos recursos financeiros

    oriundos da UE.

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    O artigo 51. enuncia as entidades que esto sujeitas elaborao e prestao de

    contas. O artigo 52., por seu turno, estabelece algumas regras a observar em matria de

    prestao de contas, a saber: (a) devem ser prestadas por anos econmicos (n. 1); (b)

    elaboradas pelos responsveis da respectiva gerncia, ou no caso de cessao de funes

    aqueles que lhes sucederam (n. 2 e 3); (c) Devem ser remetidas ao TdC at 30 de Abril do

    ano seguinte quele a que respeitam (n. 4);

    A prestao de contas reveste-se de fundamental importncia, na medida em que

    constitui o suporte para os actos de verificao interna (anlise e conferencia da conta para

    demonstrao numrica das operaes realizadas que integram o dbito e crdito da gerncia com evidncia

    dos saldos de abertura e encerramento artigo 53.) e para os actos de verificao externa (onde

    se procura apreciar a legalidade e regularidade das operaes, a fiabilidade dos sistemas de

    controlo, se as contas das entidades sujeitas prestao reflectem as receitas e despesas, e

    se so elaboradas segundo as regras contabilsticas fixadas, sendo elaborado o respectivo

    relatrio artigo 54.).

    4. Responsabilidades financeiras As competncias do TdC no se limitam a apreciar a gesto financeira das entidades

    sujeitas sua jurisdio. O TdC tem tambm competncias (jurisdicionais) para tornar

    efectivas responsabilidades financeiras emergentes de factos evidenciados em relatrios das

    suas prprias aces de controlo ou em relatrios dos rgos de controlo interno.

    A efectivao de responsabilidades financeiras pode passar pela condenao (1) na

    reposio de determinadas quantias nos cofres do errio pblico (responsabilidade

    reintegratria) e/ou (2) na aplicao de multas aos responsveis (responsabilidade

    sancionatria).

    Em qualquer dos casos a responsabilidade financeira (pela reposio e/ou pagamento

    das multas) recai sobre o agente ou agentes da aco e no sobre a instituio onde aqueles

    exercem as suas funes (artigo 61.). Quer isto dizer que a responsabilidade financeira

    implica uma responsabilidade pessoal e no institucional.

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    4.1. Responsabilidade financeira reintegratria

    4.1.1. Noo

    A responsabilidade financeira reintegratria tem por objectivo, perante a perda de

    certas quantias em resultado de infraco praticada por determinado agente, que este

    restitua ao errio pblico os valores perdidos em virtude da sua actuao.

    4.1.2. Infraces (artigos 59. e seguintes)

    O TdC pode condenar o responsvel a repor as importncias abrangidas pela

    infraco, nos casos seguintes casos:

    1) Alcance de dinheiros ou valores pblicos;

    2) Desvio de dinheiros ou valores pblicos;

    3) Pagamentos indevidos;

    4) Obrigao de indemnizar por parte de entidades pbicas decorrentes da

    violao de normas financeiras, incluindo no domnio da contratao pblica;

    5) No arrecadao de receitas decorrente da: (a) prtica, autorizao ou

    sancionamento; (b) com dolo ou culpa grave; (c) Implique a no liquidao,

    cobrana ou entrega de receitas; (d) em violao de normas legais aplicveis.

    4.2. Responsabilidade financeira sancionatria

    4.2.1. Noo

    A responsabilidade financeira sancionatria no tem como objectivo a recuperao

    dos valores em prejuzo para o errio pblico, mas antes a aplicao de multas decorrentes

    da prtica de determinadas infraces financeiras.

    4.2.2. Infraces

    As situaes em que o TdC pode aplicar multas constam de duas listas previstas nos

    artigos 65. e 66. da LOPTC, aos quais correspondem regimes diferenciados.

    A primeira lista consta do artigo 65., n. 1, da LOPTC, e abrange as seguintes

    infraces:

    a) No liquidao, cobrana ou entrega nos cofres do Estado das receitas devidas;

    b) Violao das normas sobre a elaborao e execuo dos oramentos, bem como

    da assuno, autorizao ou pagamento de despesas pblicas ou compromissos;

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    c) Falta de efectivao ou reteno indevida dos descontos legalmente

    obrigatrios a efectuar ao pessoal;

    d) Violao de normas legais ou regulamentares relativas gesto e controlo

    oramental, de tesouraria e de patrimnio;

    e) Adiantamentos por conta de pagamentos nos casos no expressamente

    previstos na lei;

    f) Utilizao de emprstimos pblicos em finalidade diversa da legalmente

    prevista, bem como pela ultrapassagem dos limites legais da capacidade de

    endividamento;

    g) Utilizao indevida de fundos movimentados por operaes de tesouraria para

    financiar despesas pblicas;

    h) Execuo de contratos a que tenha sido recusado o visto ou de contratos que

    no tenham sido submetidos fiscalizao prvia quando a isso estavam

    legalmente sujeitos;

    i) Utilizao de dinheiros ou outros valores pblicos em finalidade diversa da

    legalmente prevista;

    j) No acatamento reiterado e injustificado das injunes e das recomendaes do

    Tribunal;

    k) Violao de normas legais ou regulamentares relativas contratao pblica,

    bem como admisso de pessoal;

    l) No accionamento dos mecanismos legais relativos ao exerccio do direito de

    regresso, a efectivao de penalizaes ou a restituies devidas ao errio

    pblico;

    As multas tm como limite mnimo o montante correspondente a 25 UC1 e como

    limite mximo o correspondente a 180 UC (artigo 65., n. 2).

    A segunda lista, que consta do artigo 66., n. 1, da LOPTC, abrange as seguintes

    infraces:

    a) Falta injustificada de remessa de contas ao Tribunal, pela falta injustificada da

    sua remessa tempestiva ou pela sua apresentao com deficincias tais que

    impossibilitem ou gravemente dificultem a sua verificao;

    1 O valor da UC de 102,00.

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    b) Falta injustificada de prestao tempestiva de documentos que a lei obrigue a

    remeter;

    c) Falta injustificada de prestao de informaes pedidas, de remessa de

    documentos solicitados ou pela comparncia para a prestao de declaraes;

    d) Falta injustificada da colaborao devida ao Tribunal;

    e) Inobservncia dos prazos legais de remessa ao Tribunal dos processos relativos

    a actos ou contratos que produzam efeitos antes do visto;

    f) Introduo nos processos que possam induzir o Tribunal em erro nas suas

    decises ou relatrios.

    Nestes casos, as multas tm como limite mnimo o montante correspondente a 5 UC

    e como limite mximo o correspondente a 40 UC (artigo 66., n. 2).