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Material promocional do livro, todos os direitos reservados. Há três links na capa: no título que levará para AMAZON; no corpo levará para a comunidade do SKOOB; e, no autor que levará ao BLOG. P. S. por gentileza, se você gostou: comente, compartilhe, ajudaria bastante. Muito obrigado!
Citation preview
J. S. Rhejviks
Trientérius A última nação da humanidade
Seção I e II
1ª edição atualizada
2015
Copyright © 2015 J. S. Rhejviks
Texto revisado segundo o novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.
Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução, no todo ou em parte, através de quaisquer meios. Os
direitos morais do autor foram assegurados.
Produzido no Brasil.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Rhejviks, J. S. Trientérius [livro eletrônico]: a última nação
da humanidade, seção I e II / J. S. Rhejviks. -- 1. ed. -- Sumaré, SP: Ed. do Autor, 2015. -- (Série Ódem Neutânion) 2 MB; e-PUB
ISBN 978-85-919730-0-2
1. Ficção brasileira 2. Ficção fantástica
I. Título. II. Série.
15-07630 CDD-869.3087 Índices para catálogo sistemático:
1. Ficção fantástica: Literatura brasileira 869.3087
Primeira história no planeta Espectronus.
Em caso de necessidade, não hesite, entre em contato: [email protected]
O e-mail estará a sua disposição, de acordo com as informações na página do Tumblr. Portanto, recomenda-
se que verifique antes de qualquer uso.
Informações da obra, adicionais e do autor: http://jsrhejviks.tumblr.com/
Sumário
PRÓLOGO
O Altíssimo Haiken Vermelho
Três olhos de um rosto, part. 1
Três olhos de um rosto, part. 2
Três olhos de um rosto, part. 3
Depois do fim, dê tempo ao recomeço
Srta. Arylis Sallin, a estilista
O inferno, na verdade, jaz dentro do céu
Nova era em Trientérius, a Estrela do Norte
Corações em chamas, a queda da Estrela
A súplica do anjo, um novo fadário
A Estrela + a contratante = facas e tiros
O céu lança mais um inimigo nos Sallin
Um filme clichê: “A Princesa do Gelo e o caído”
Noite memorável na Casa Branca
Dr. Terâllus Armeny, o especialista
Rotações sob um passado mal passado
A antiga Haiken Carmesim, a noctâmbula?!
Historíolas da Casa Branca, part. 1
Historíolas da Casa Branca, part. 2
O princípio da vingança, a caçada matinal
Duelo entre Haikens, a verdadeira força
Dias precedentes à Copa Basera
Grandes eventos: a Copa Basera, part. 1
Grandes eventos: a Copa Basera, part. 2
Ascensão ao poder, o novo Co-Haiken
Final de encruzilhada, as pegadas díspares
Projeto “Segunda Tropa de Exploração da Humanidade”: em ação
Projeto “Segunda Tropa de Exploração da Humanidade”: o peço da carne
O contra-ataque dos Co-Haikens
Conflagração de corações: inquietos vs. inertes
Vida e morte a Trientérius
Lembranças de sangue, part. 1
GLOSSÁRIO
SEÇÃO 1
A queda da Estrela
“O silêncio é o melhor amigo do autossuficiente, entretanto haverá uma hora em que o
barulho precisará ser manifestado. Deste modo, pergunto-me, há maiores complexos que
se relacionar com outros? Às vezes assim, na ineficácia, germinam certos vazios inex-
plicáveis. Olhe afora do seu quadrado, ninguém sobrevive em flores de imóvel abando-
nado. Ademais, os bem acompanhados sequer precisam de festas a fim de elevar o
espírito. Nós tendemos a ostentar vazios ao proteger a nossa mobília, até nobres causas
procriam nobres danos. Todavia, ocasionalmente alguém desaba em nossa vida, entalha
suas marcas e renova nossa mobília. Independente de quem seja, meus parabéns, o céu
enviou-te uma Estrela. Ilustre ou não, no céu vasto ou na terra curta uma Estrela faiscará
por uma eternidade, desde que seja a sua, tão sonhada: sua. Vivemos em um mundo
repleto de Estrelas e, com certeza, uma delas brilhará unicamente para você. De coração,
que todos encontrem a sua Estrela, uma vida no escuro não é tão melhor do que numa
sepultura”
– J. S. Rhejviks.
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PRÓLOGO
Mundo: palavra pequena e unânime.
Mundo: aglomerações de minúcias exuberantes e alarmantes.
Neste pequeno e grande mundo, único e sem igual mundo, coexistem os homens
e os seus mundos, os animais e os seus mundos, todos peregrinos dentro dum único mun-
do.
Ambos – homem e animal – possuem suas línguas, e em suas palavras o seu amor,
o seu aroma, a sua essência. Neste mundo composto da matéria das palavras, as bem
afeiçoadas retratam a beleza, e as palavras feias a verdade, de toda feiura em se viver sob
meio verdades. Igualdade, união, socialismo e outras: são belíssimas palavras. Desigual-
dade, preconceito, brutalidade e outras: são essas a verdade. Palavras doces compõem o
palpável do mundo, palavras feias jazem nas sombras da verdade. O fato é, o mundo se
divide entre o forte e o fraco, o meio termo é outro fraco também; esta é outra meio
verdade.
A existência humana é também outra meio verdade. O mundo surgiu, e ninguém
saberá o exato de sua verdade. O homem foi privilegiado com o fôlego da vida, ou o
fôlego árduo o autoprivilegia ao conquistar seus amanhãs. Ninguém sabe – ou saberá –
qual é a verdade da verdadeira verdade. Tão-somente o planeta viveu, os seres respiraram,
os animais andaram, o homem ergueu-se. Naquele tempo, o conhecimento jazia na
lembrança, as vogais uniam-se a consoantes, e curvavam-se em palavras, e ungiam-se
frases a diálogos. O primeiro livro da história humana desceu do céu, era uma pena
pairando vagarosa e elegante, com páginas velhas e empoeiradas, capa marrom-escura,
grossa e amassada. Talvez, descia o primeiro velho a ser criado, o primitivo erudito a
partilhar conhecimento com a humanidade.
– Ouçam-me, crianças – toou aquela voz enigmática. – Jubilem nessa terra fértil,
convivam uns com os outros, procriem suas espécies territórios afora. Viver consiste em
fazer as próprias escolhas, não permitam que suas escolhas os façam. Vocês são livres, o
mundo está sujeito a seus pés. Definam o que fazer e como fazer. Sirvam ao deus que
desejarem adorar. Mas saibam, meio decisão não é escolha, e incerteza não é opção. Caso
sirva a uma causa, faça-a integro. Enfim, vocês possuem livre-arbítrio, isso significa
capacidade de decisões e modelagem de destino. Seja macho ou fêmea serão responsáveis
por suas escolhas, gozarão de seus frutos e sofrerão suas amarguras.
Veio ao mundo uma pausa, a primeira registrada na humanidade.
“Indiferente de suas eleições, estão sujeitos a uma única regra. Todos vocês deem
sentido à sua existência, façam seus nomes ante o inalcançável, sejam nesse mundo a boa
ou a má diferença, que eu os presentearei. Assim, seres vivos na terra, eu vos ordeno:
sobrevivam!”
Abruptamente a vida ganhou o mundo, os rugidos matas, os sons pegadas, as dores
corpos, os sopros bocas. Cem seres de cada espécie assim marcharam ao insondado e ao
imprevisível, a sobrevivência não foi digna dos mais fracos. A princípio, os humanos
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eram quebradiços e os animais vigorosos. Eles superavam-nos em velocidade, resistência,
instintos naturais e, maiormente, na sobrevivência. Logo depois, diversos precipitados
elegeram-se predadores a fim de, vindouramente, serem decompostos em carne.
Afugentada, a humanidade desvendou eficácias em uniões, principiaram a criar famílias
e repartiam tarefas e deveres. Inicialmente, os homens eram os responsáveis na guerra
por alimentos e na proteção de seus bandos enquanto as mulheres cuidavam das crianças,
dos afazeres caseiros e, grosso modo, do restante. O começo registrou tempos bestiais em
que a sobrevivência ladrava nas veias e gemia nas perdas, pouco custava qual olho
discernia, desde o princípio esse mundo foi projetado aos mais fortes e os fracos nele
sofriam.
Oposto aos animais selvagens, o homem estudava, inventava, moldava e, em
decorrência, evoluíra mais rápido. Em pouco tempo o fogo brilhou e protegeu, certas
armas pontiagudas integraram arsenais e vestiram mãos, as peles de presas aqueceram e
geraram tendas, e, deste ponto, inúmeras aptidões e sabedorias jazeram enraizadas nas
gerações. Decerto, embora abaixo fisicamente, a humanidade dispôs de seus diferenciais,
mas tão-só um os engenharam especiais, o Livro da Vida1, cujo conhecimento repousava
em suas linhas e atingia qualquer instruído ou estúpido – em suas palavras e ilustrações
vivas, capazes de recriar todas realidades. Definitivamente, entre todos os seres vivos,
parecia que os humanos foram os únicos privilegiados. Dado que os animais nasceram de
físico avantajado e instinto aprimorado, no entanto, os humanos o conhecimento herda-
ram.
O corpo é um utensílio do cérebro, estruturas rígidas e fortificadas são rochas a
serem formadas. O conhecimento é o combustível do cérebro, todo saber proveitoso leva
o homem à evolução e concede o amanhã. Mente sã talvez proporcione um corpo são,
corpo são não essencialmente resulta em mente sã. A mente é a arma da humanidade
enquanto o corpo um meio de engenho, para vencer uma guerra a princípio cria-se uma
estratégia por meio da mente – o artefato de todo o engenho.
A humanidade sempre dispôs da arma mais poderosa.
Pouco depois, o homem tornou o líder da cadeia alimentar. Em tal época era quase
impossível distinguir quem era o verdadeiro animal. O homem caçava, e da caça se
deleitava. A necessidade tornara prazer, e o prazer é outra necessidade. Assim, surgiram
os homens iguais à sua sofrida origem, só que imperantes e sem empatia com a vida
alheia.
Durou quase setenta e sete anos para surgirem os primeiros líderes – oficiais – da
humanidade, batizados de Haiken, o líder da sobrevivência humana. Eles eram os seres
mais sábios da humanidade, poucos destes primeiros líderes expuseram outras qualidades.
1 Livro da Vida é o título do livro que desceu do céu. Tem mais do que oitocentas mil páginas, dividido em
vários capítulos de temas relacionados aos seres vivos – incluso a anatomia, mecânica e etc. –, ambientes,
mapas de regiões, Ódens e flóens, planetas, outras vidas e espécies, céu, estrelas, e dados imprescindíveis
para sobrevivência humana. Um exemplo notável disto: a base para as evoluções tecnológicas foi retirada
dele.
De tão grande e abrangente, nenhum humano conseguiria lê-lo por inteiro ou encontrar rápido o
que anseia.
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Cada geração carece de certas potencialidades – ainda que o conhecimento seja a arma
humana –, os maiores créditos tendem a perseguir a força. Tais Haikens constituíram “a
geração invisível”, os líderes de diálogos, organizações humanas e o todo conhecimento
partilhado.
Logo, de nômade a humanidade construía habitações, cercas e outras proteções
contra animais e certas anomalias, o fogo tornou-se ineficaz, eles adaptaram rápido de-
mais. Em pequenos abrigos, a humanidade seguiu uma nova era. Então, bebidas nasce-
ram, propagações de prazeres carnais viraram febre, festas eram cotidianas. O homem
saboreou a vida digna dos líderes da cadeia alimentar. Alguns anos mais tarde as prazero-
sas caçadas ficaram perigosas, continham muitas perdas e outras diversões atraíam mais.
Ela retornou à necessidade e, objetivando minimizá-la, o homem mexeu na terra farta e
doce.
Os homens progrediram combatendo e alargando o seu território – transcendendo
novecentos anos –, naquele tempo ninguém os aguardava. A humanidade jazia enraizada
em suas delícias, dispersas em diversos pedaços de terras na mesma igualdade, muitas
tribos em congregações e festejos sem qualquer pretexto. Os homens cantavam grave, e
bebiam do melhor vinho, e riam, e toavam asneiras. As mulheres dançavam enquanto
seduziam homens, e cantavam adocicado, e gracejavam juntas de homens cicatrizados.
Fogueiras potentes aglomeravam círculos de orgias, a mesa era sedutora e diversificada
– repleta de frutas, carnes e bebidas aos bocados. Quando eles apareceram os humanos
relembraram da vida sob a lei do predador, e viveram na pele a humilhação de serem
caçados.
Eles não estavam sozinhos, o céu mentira e outras inteligências havia dotado.
Tais surgiam à noite: eram astutas, ágeis, vigorosas e esvoaçavam.
A humanidade tornou-se refém e alimento, deles.
Os legítimos soberanos: apareceram.
ESTE MUNDO É REPLETO DE MEIO VERDADES.
* Prólogo baseado no Livro da Vida, junção de capítulos. Tenha em mente que, qualquer informação à parte ou complementar proveio
do Livro, a não ser determinados casos e outros que estarão sujeitos à perspectiva de ‘alguém’, contudo estará sempre implícito essa
diferença.
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_____ Capítulo I _____
Altíssimo Haiken Vermelho
A grandeza de um homem está em seus feitos.
Eu não fiz parte da história, sou eu quem a estruturei.
Eis uma verdade: os fracos mereciam a morte e os fortes o mundo.
Lougard Dayn
18 de Solifil de 7022.
(Século LXXI2, época final dos Doze Haikens – os maiores líderes da humanidade.)
ALGUMAS HORAS ANTES DO FIM.
Pouquíssimas nações sobreviveram, muitas foram dominadas ou destruídas pelos
opositores à humanidade. Durante os três últimos séculos, a luta contra aquelas criaturas
intensificou e, à essa altura, ambos tiveram perdas incuráveis. As duas últimas nações
jaziam em guerra, e os seus Altíssimos Haikens em fúria. O clímax pairava sobre as três
Casas Imperiais, também muito conhecidas como as últimas Grandes Nações da humani-
dade.
Entre todos territórios humanos ao longo dos milênios, a Nação Vermelha era
sublime. Muitíssimos quilômetros de vegetações rasteiras, árvores em abundância,
privilegiados com um solo fecundo e o clima mais prazeroso durante os dois primeiros
meses do ano. Suas terras perfazem pouco mais da metade das propriedades humanas, um
legítimo tesouro e, possivelmente, prevalecia em poder militar e resistência contra cada
opositor. Bastante provável que seja essa a maior nação do espírito duradouro da
humanidade. A sua capital situa-se próxima ao Necabelisco – onde sucediam as reuniões
das Grandes Nações e considerada terra neutra –, no Castelo Vermelho. Essa nação não
só obteve as maiores terras como seu castelo era o mais forte e colossal entre todos os
castelos já inventados. Por certo, uma autêntica escultura de pedras brancas revestidas de
neterion3.
2 Marcação das datas: os três primeiros meses, que são épocas quentes, contêm 60 dias e foram
denominados de Wilfid, Solifil, Waltil – este último, às vezes, varia o clima – e os meses de 61 dias, épocas
frias, são Lawand e Kallfind. Seus nomes provêm da história da língua desse povo e de seus antepassados.
O ano, portanto, é composto de 302 dias; cada dia contém 51 horas divididas em três períodos – manhã,
tarde e noite – de 17 horas. Elucidações complementares disponíveis no glossário – glosa relógio.
3 Neterion: classificado como metal, todavia tem distintas qualidades e adaptações a outros materiais. Em
termos de qualidades naturais dispõe duma grande resistência e leveza, além do mais, é encontrado na cor
de ferrugem. Antigamente achavam-no com extrema facilidade, muito remotamente é claro. E o Livro da
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A datar de sua esplêndida construção, o Castelo Vermelho jamais fora invadido
por humanos. Bem que muitos tentaram, e muitos outros somente tentaram, grande parte
tombou antes mesmo de perceberem. Taticamente a Nação Vermelha preservava variados
animais silvestres, anomalias indóceis e criaturas carnívoras – da floresta – em lugares
específicos, e suas árvores eram enormes – tão antigas quanto a humanidade. Apenas seus
esculturais guerreiros deslocavam-se bem nestas regiões, e os seus postos de observações
eram eficazes a ponto de avistar todas formigas peregrinas em suas terras. Muitíssimos
soldados cumpriam rondas exaustivas em quatro turnos diferentes, e a evidência dessa
nação, arqueiros, sempre se encontravam de prontidão nas muralhas ou dependências do
Castelo.
Ao meditar na história penosa dos humanos – comidos na floresta no decorrer dos
milênios –, se por acaso houve uma região em que pudesse predizê-la de “fortaleza quase
absoluta”, esta, com certeza, situava-se nas terras vermelhas. Que desde o seu parto trajou
menos baixas perante os hostis à humanidade, muito mais investiu em conquistas, contra-
atacou-os e, principalmente, tornou-se a primeira e última nação a voltar-se contra toda
humanidade.
Grande parte da população evacuava quando os sinos de ouro toaram no salão
principal, do Castelo Vermelho – até então nunca usados, eram o grande enfeite de honra
da Nação Vermelha. Seu estrondar despertou a íntegra frouxidão e pavor dos soldados
que, àquela altura, recolhiam-se de funções árduas. Ninguém os toaria por outro desígnio.
Pela primeira vez na história da poderosíssima Nação Vermelha alguém invadiu as suas
terras, passara por todas as criaturas selvagens, armadilhas na floresta e pela defesa nas
muralhas. Poucos soldados continuaram na evacuação da população – flébil, com os pais
segurando filhos e esposa contra o corpo; olhares preocupados, e, o mais torturante: o
silêncio. Sequer demorou muito, e o pandemônio de soldados repercutia como segundo
assombro.
Num segundo momento, alvoroço de ordens e berros, sob diversos enxames de
pelotões, que subiam e desciam escadarias. Certos pelotões percorriam a muralha e todas
áreas do Castelo Vermelho, os arqueiros posicionaram-se nos pontos mais elevados e em
postos de observações achegados ao Castelo. Todos os soldados mais desenvolvidos da
humanidade naufragaram, horas voavam e sem novidades. Ninguém conseguia identificar
os invasores, ou as sombras de suas pegadas. Muitos homens passaram a crer que algum
engraçadinho brincou com os sinos, e queriam capturá-lo para pôr suas mãos embaixo da
terra quando o desespero transpassara seus semblantes atrofiados. Na região noroeste do
Castelo, próximo à segunda torre, o décimo primeiro pelotão finalmente localizou o
principal invasor – o responsável pelo extermínio de onze pelotões inteiros. Caçavam-no
implacavelmente à media que os sinos iam-se e emudeciam, feito uma cigarra em canto
fúnebre.
Demorou menos que três quartos de hora para o vigésimo quinto pelotão chegar
ao Salão Principal, perante os sinos enormes de ouro maciço jaziam os corpos de quinze
soldados – provavelmente responsáveis pelo alarme –, estavam irreconhecíveis e tinham
Vida não o define, tão-só elucida suas qualidades e maneiras de utilização bem como atualiza conforme a
época.
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pequenas aberturas no torso ocasionadas por alguma arma inexistente – pelo menos de
materiais humanos. Os generais silenciaram os rumores, mas, ainda assim, os soldados
souberam de qualquer modo, e o caos espalhava feito praga. Subitamente mais cadáveres
apareciam, grande maioria com as mesmas aberturas doutros corpos e uma minoria
desfigurada. Ao mesmo tempo ocorriam destruições e homicídios comuns em diversas
regiões do castelo, isso resultou em vários homens atrapalhados em suas caçadas e os
temores alargaram. Houve certos soldados que tentaram escapar, tais desvendaram a
passagem secreta ao outro lado da vida, recomendadas por generais ou oficiais de alta
patente.
A regra viva em todas eras, nenhum homem renunciava o campo de batalha. Seja
contra humano ou opositor à humanidade, os desertores eram devidamente absolvidos –
escória sujeita à morte. A Nação Vermelha manteve-se rigorosa nesse princípio, muito
possivelmente a única de verdade imaleável em tal quesito. Naquela época beliscar o
medo era tão natural quanto respirar, muitos Haikens foram tolerantes e sequer deram
punições. Todavia, Lougard Dayn edificara uma terra brutalmente poderosa com outras
ideologias.
Maior parte dos soldados ficaram por conta de sua esperteza. Unicamente a Elite
dos Soldados do Haiken Vermelho recebera instruções, porque, conforme as inaudíveis
doutrinas do Altíssimo, as iscas serviam a um propósito maior. Certos soldados foram
obrigados a abandonar suas famílias e, logo, juntaram-se aos demais barulheiros. Muitas
dessas lâminas haviam evadido aos abrigos ou bem gozavam suas últimas horas de paz
esperando os soberanos4 visitarem-nos – perplexos por sequer terem tão-só o desprazer
dum hóspede indesejado. Em verdade, unanimemente tais escudos nem queriam ser um
escudo; elegiam a alma das cadeiras, sombras ou espectros; porventura criaria uma lista
abrangendo o universo dos insetos, das plantas ou das bactérias; qualquer outro servia,
menos os seus. Poucos, à essa altura, podiam pensar em escudar outra coisa que não fosse
a própria cabeça – nem mesmo os bem casados, nem mesmo as crias do ano, nem mesmo
os samaritanos almejavam outros doces almejos. Ninguém, além do Altíssimo e a mimada
4 Gâsgaro é classificado como uma anomalia onívora que, geralmente, surge à noite – sendo o segundo ou
primeiro maior opositor à humanidade. Embora tenha um corpo capaz de absorver o verde dos legumes e
verduras, igualmente aos humanos, jamais viveria só de mato. A carne é essencial. Uma vez que o homem
abate de preferência o porco, boi e a galinha; os gâsgaros abatem o humano, de preferência, tão-somente o
humano.
Eis um dado interessante à parte desta nota de cabeceira. Divergentemente há duas teorias e, em
certos casos, outras mais. Grande parte dos pesquisadores, que francamente o número total não perfaz um
dígito grande, definem os gâsgaros como animal. Entretanto, claramente o Livro da Vida elucida que são
anomalias onívoras, e não carnívoras de acordo com outros cientistas. Quando em quando surge uma ou
demasiadas divergências dessas, a ciência e sua exatidão são questionáveis. Portanto um amigo neste diá-
logo adverte, atenção ao enunciado. Neste mundo confuso, quantas borboletas não foram ditas de maripo-
sas, não é? A sabedoria do Livro da Vida é, obviamente, mais exata que a ciência humana, contudo cada
criatura tem o direito de criar suas crenças e a discussão desse tópico é infundada. Graças à proposta narra-
tiva poderá, e haverá, uma ou outra definição em enredo – mas, pergunto-me, quando distantes delas, como
podemos realmente saber que uma mariposa que parece borboleta é assim de fato não mariposa em vez de
borboleta.
Nota válida ao livro inteiro e, por certo, outras seções. Quem diria, essa observação fez-me parecer
um preguiçoso!
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Elite, de fato incomodava-se com os invasores. Eles, desesperadamente, só ansiavam ser
escudados pelo abrigo o quanto antes, em vez de presenciarem seus últimos instantes com
um passo e meio à morte. Outro ponteiro doutro, e chegava a hora em que os soberanos
viriam.
Em pouco tempo a comunicação ficou conflituosa, muitos brigavam por palavras
mínimas, outros exigiam quando deveriam pedir ou batiam quando deveriam quietar. Os
generais queriam mantê-los sob controle, quando sequer domesticavam a friagem
agoniante que ofegava em seus olhos. Indiferente de pessoa – quer soldado, cidadão ou
general – todos pensavam iguais, ansiavam desvendar quem em sã consciência invadiria
a Nação Vermelha, pelo menos tão próximo dos soberanos sobrevoarem os domínios
humanos.
Já naqueles primitivos tempos o homem ansiava dormir em qualquer período, cada
pequenina alma destroçada cobiçava seus sonhos, o paraíso daqueles cujo o ardente pavor
degustara. A humanidade sonhava bastante, era em sonhos macios e suaves que podiam
viver pesadelos vãos. Isto, por certo, perfazia toda diferença. Um saboroso contraste com
a realidade, em que pesadelos mordiam de verdade. Sempre fora assim, embora o sempre
historicamente não durou – dado que viveram novecentos e poucos anos sem ajoelharem
ante os soberanos –, todavia aquele sempre desde o nascimento à vindoura morte era o
sempre.
Eventualmente, considerando um futuro próspero à humanidade, uma criança se
ergueria da cadeira e daria a voz ante companheiros e livros alados, e perguntaria àquela
pessoa lá na frente: “Mestre, por que ouvir um único nome fazia tantos homens e mulheres
corajosos tremerem?”, e o mestre responderia, “A morte desperta vários medos, ou quem
sabe as hipóteses de morrer acordam seus pesadelos, tudo que vimos e queremos esquecer
vem à tona”. Cada temor ou anseio de amnésia humana ressurgia ao tão-somente ouvir o
nome dos soberanos – gâsgaros. Em tal encurtado período duradouro, até os menos
empáticos ou duros sentiam o destemor e a coragem evaporarem, a cada gota fervida pelo
medo.
Essas anomalias onívoras perfazem os terrores de viver sob a lei do mais forte,
raríssimos os homens que não os temiam, imaginários eram homens sãos e insanos que
sequer os temiam. O medo manteve a humanidade viva, por coexistirem e superarem os
próprios temores surgiram líderes capazes de guiar a humanidade à sobrevivência. Nesse
tempo, muitos ainda criam: “O medo é uma essência humana, que estende as asas do
amanhã”.
Mas outros aprenderam que o medo se manifesta de diversas maneiras, e umas tão
baixas.
– QUE HUMILHAÇÃO – rosnou outra vez, e seus ciclópicos soldados entreolharam-se
desgostados. – JUSTO OS MEUS APOSENTOS. MEUS APOSENTOS! COMO ELE
OUSA CAUSAR-ME TAMANHA DESONRA. ISTO, É IMPERDOÁVEL – sugeriram
à esquerda do corredor escuro, sem pronunciar uma palavra. – PROMETO AO ANJO, O
BRANCO PAGARÁ! FAREI COM QUE SE ARREPENDA – berrou, depois xingou. –
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QUE O CÉU NEGRO SEJA A SUA CASA! – praguejou. E praguejou, e xingou mais, e
mais.
– Altíssimo, por aqui – soou o soldado coagindo um tom agradável. O monarca
da Nação Vermelha o encarou como quem arrancar-lhe-ia a cabeça. Ignorando as ameaças
sorrateiras e com um aceno cortês, o soldado abriu uma porta de madeira quadrada, que
trazia entalhes de um dragão cuspindo fogo. Por dentro, as paredes eram feitas de pedras
reforçadas de neterion, e o péssimo acabamento da pintura branca provia a sensação de
argila graças aos tons de ferrugem à tona. No total haviam quatro tochas mal aclarando o
ambiente contagiado de ares sombrios e empobrecidos – em formato redondo, espaçoso
e despido de mobília. O Altíssimo entrou rápido, tão rápido que sequer deixara o som dos
pés.
– ONDE ELE ESTÁ? – disparou o monarca, e o soldado olhou-o sugestivo. –
DIGA-ME, ONDE ESTÁ MEU RELATÓRIO? – explicou, num mover bruto de mãos. –
TRAGA-O JÁ.
– Imediatamente, Altíssimo. Ordenarei ao General Doll em pessoa – curvou-se,
trucidando qualquer elegância do gesto e, ao partir de lá, incorporou-se à escuridão. Ao
lado da porta quatro homens atentavam às sombras enquanto expectavam novas ordens,
seus rostos enrijecidos relatavam: ‘mil vezes preencher uma papelada a escutar o monarca
novamente’.
Pouco tempo atrás, quando a Elite finalmente chegara, o Altíssimo encontrava-se
encurralado pelas artimanhas do inimigo. Graças à Elite – cinco entre cento e cinquenta
– ele conseguiu fugir da segunda torre – localizada na região noroeste do castelo – para a
quarta torre – na região sudeste –, um local seco de tudo no qual servirá de refúgio à
população durante as invasões noturnas dos gâsgaros – totalmente indigna dum monarca,
conforme as crenças do Altíssimo. Antes de hoje, ele jamais se sentira tão humilhado! No
decorrer da fuga, a Elite lhe escutara reclamar e xingar tanto que ao praguejar soava feito
poesia.
Entretanto, a gigante ineficiência de sua Elite nasceu na longa espera por um mero
relatório.
Muito ranzinza, o Altíssimo andava em círculos ouvindo o relatório do soldado,
que lhe trouxe sua cadeira real; e ao mesmo tempo não permanecia lá. Seus pensamentos
só vagavam no Altíssimo Haiken Branco, no final ele superou quaisquer expectativas. O
Altíssimo precisava evitar um combate direto – encontrava-se sem armadura e arma, em
desvantagem dentro de seus aposentos como qualquer arqueiro estaria –, e quando pegou
uma espada para defender-se quase morreu no primeiro golpe. Era bem penoso para o
Altíssimo reconhecer, mas sua estratégia defensiva foi superada com uma imensa maldita
facilidade. Aliás, abandonar seus aposentos às presas foi um ultraje, ficou tão incrédulo,
tão intimidante que brotava vapores pelos orifícios do nariz, ouvidos e boca – quando
falava.
O Altíssimo culpava a todos: a parede delicada que o mal defendeu, a espada de
péssima qualidade que partiu ao meio, seus soldados imprestáveis que caíram um após o
outro sem causar ferimentos no invasor, aquele seu cachorro infiel que sequer latiu – nem
após ser quase pisoteado pelo Altíssimo Haiken Branco em seu rabo desfiado –, aquela
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planta horrorosa em seu quarto que... por existir era motivo suficiente para culpá-la
também. Quanto mais acusava a tudo e a todos avivava uma voz interna o torturando em
sua ira, e, lá, bem lá no fundo, o Altíssimo reconhecia que subestimara o oponente. Sua
ambição de bem sentir-se superior ao Altíssimo Haiken Branco lhe vendou os olhos, o
coração bem como a cabeça, e graças à sua arrogância quase se decompôs no prêmio do
opositor.
Então o contratempo surgiu ao encarar a própria descrença, a qual não conseguia
evitá-la.
Outra vez, doutras irritantes vezes, o soldado incompetente errou em seu relatório,
provendo tiras de lenha para as chamas zangadas do Altíssimo, mais um balde de álcool
incendiando da garganta ao estômago. Embora jazia em chamas negras, escutou-o a fartas
vezes. Ainda assim, parecia anti-humano mentalizar os seus soldados – tão musculosos
quanto os gorilas, capazes de sobreviverem quatro, cinco ou seis dias afora da Muralha
Imperial5, uma façanha rara até mesmo entre os Haikens – desabando perante um simples
homem.
5 A Muralha Imperial circula as atuais três Grandes Nações – antes reconhecidas como as Doze Casas
Imperiais. Tem cerca de quarenta metros de altura, construída com pedras de neterion puríssimas – um
fornecedor de sombra gigantesco na cor ferrugem. Essa construção resgatou a humanidade dos perigos da
floresta, e preservou toda aquisição de matéria-prima sem cedê-las aos invasores ou aos soberanos. Doze
humanos fizeram seus nomes e ganharam seguidores quando protegiam os voluntários, que a construíram.
Eles não “levantaram uma pedra”, porém afastavam quaisquer inimigos – seres hostis, anomalias e animais
selvagens –, que vinham alimentar-se. Sem esses doze, naquele tempo, a Muralha Imperial jamais teria sido
erguida.
Sua construção principiou no mês de Waltil de 6989, nenhum registro do dia específico, e findou
no dia 21 de Lawand de 7018 – em torno de 29 anos. Os primeiros Haikens a integrarem os planejadores e
a os protegê-los foram Jed Lamparzi, o Haiken Azul, e Ugo Jonker, o Haiken Cinza, que tinham uma “boa”
relação. Já os outros chegaram sem fama ou seguidores, ninguém esperava que daqueles pequenos frutos
elevar-se-ia sólidos Haikens – grande parte desses jaziam numa faixa etária de treze a quinze anos quando
iniciaram a auxiliá-los e, aproximadamente, entre seus 15-17 anos tinham seguidores e renasceram Haikens.
Esses dez, novatos, surgiram na época em que as anomalias estiveram mais ativas e atacavam a qualquer
momento.
Havia, entre os Doze Haikens, três homens – e uma mulher – que sobressaíram. Foram os únicos
a retomarem as caçadas abandonadas pela humanidade há anos, podiam sobreviver por meses na floresta e
tinham a melhor performance em combate. Não havia um território humano que desconhecia seus nomes:
Ardyus Loanders, o Haiken Branco; Lougard Dayn, o Haiken Vermelho; Ugo Jonker, o Haiken Cinza; e, a
única mulher desse bando, Lunara Garil, a Haiken Carmesim. Apesar de que Lunara sofreu terríveis con-
denações, referente às suas capacidades, dispunha dum histórico quase sem igual. Desde criança morou
sozinha na floresta, caçava com maestria e, à exceção de dois Haikens, jamais perdeu em algum combate
corporal, mas o seu manuseio de espada era questionável. De todo modo, além disso, num período no qual
nenhum outro pôde, Lunara acompanhou os três futuros Altíssimos – Ardyus, Ugo e Lougard – sempre que
requerida.
* Apesar de não ser na prática “três” Grandes Nações, dado que só existe duas delas atualmente, entretanto
referido assim por a) história; b) ainda não foi oficializado qualquer junção de posses de terras, ao menos
documentada – e isso nos faz voltar à história, também é graças a tais documentos que povos sancionam as
certezas –; c) territorialmente as divisões entre as nações prevaleceram, e Lougard não intentara mudá-las,
portanto o entendimento de tais propriedades humanas fixa melhor dessa maneira, que alegar dois pedaços
de três.
16
O Altíssimo sentiu-se temeroso, pouco a pouco, passou a perceber seus enganos.
Avaliar a Nação Branca como medíocre, foi um entre vários deles. Deveria, ao menos,
ter poupado a Nação Cinza – aniquilada duas semanas atrás –, ou ter posto a Nação Branca
em seu lugar. Entre equívocos, a morte daquela mulher era a causa desse aborrecimento,
movido a ódio. Enraivecera o Altíssimo Branco, o protetor dos fracassados. Se ao menos
a tivesse poupado em vez de curvar-se aos seus prazeres de torturá-la lentamente, ouvi-la
prantear e, especialmente, fazê-la sofrer. Por certo, um erro fatal, embora deleitável. O
Altíssimo venerava pedaços humanos estilhaçados, cada criatura emanava um certo grau
de prazer que aflorava, naturalmente, no decorrer de qualquer tortura. Aquela mulher
nunca fora mais bela com menos orifícios, torturá-la perfizera o néctar de mil orgasmos.
Contudo, no final, um erro, nada além disso. Infelizmente, quem diria, ela tinha mais
serventia viva do que num caixão raso, esburacada e diminuída em minúsculos belíssimos
pedaços.
Esquecido pela tranquilidade, o Altíssimo sentou-se novamente em sua Cadeira
Real, que era idêntica a outras cadeiras rangentes no salão de refeição. Sequer tinha algum
diferencial além da pessoa sentada nela, ou a própria a nomeá-la, como a vida dum nobre
herdeiro cortejado no berço de ouro do seu sobrenome, mas de madeira e sem direito à
coroa.
– Certo, profira calmo desta vez. Já estou farto de sua ignorância, não darei outra
chance. Tome, portanto, cuidado – ordenou ao solado ajoelhado à esquerda da porta de
madeira; a sua cabeça estava inclinada e carregava consigo um pergaminho grosso meio
aberto.
– Obrigado, Altíssimo – retribuiu o soldado, Yan, um tanto abatido.
– WOW, QUE MALDIÇÃO! QUE PUTA MALDIÇÃO!! ESTOU CERCADO
DE INÚTEIS – disparou rubro de raiva. – QUE O ANJO NEGRO PROCRIE NAS DOZE
CASAS IMPERIAIS! – praguejou muito irritadíssimo. – Ouça-me, papagaio. Quando eu
te ordenar, apenas trate de responder objetivamente.
– Sim, Altíssimo – chocou a mão esquerda no peito, emitindo um som intenso.
– O quê?!
– Que seja honrada a sua vontade! – disparou rápido em tom fluente, mas percebia
sua inquietação. – Peço vossa benevolência, Altíssimo. Eu prometo que não ocorrerá
novamente.
– Que seja – riu, e abanou a mão direita num gesto desdenhoso. – Sou um homem
atarefado, soldado. Quero o relatório de hoje para hoje, de preferência quando chegou,
mas é meu equívoco querer eficácia de parasitas. Ande, faça certo um simples relatório...
ou quer desvendar as sequelas de errar outra vez – suspirou grosso. – Vamos!! O que está
esperando? Agilidade, soldado. Eu disse que era para hoje, para há décimos de hora, seu
incompetente.
E, veja, o coração da Nação Cinza, embora conquistada, pertencia a outro, mas nem todos eram
românticos.
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– Hã... Segundo relatório de “18 de Lawand de 7022”, relatado por Sua
Excelência, o General Igan Doll, segundo comandante da patente...
– Melhor! Resuma-o, e já – ordenou, sorrindo sarcástico. Yan, inteiramente alar-
mado, abaixou o pergaminho mostrando seu rosto esquelético. – Você leu sete vezes um
simples relatório, soldado. Meu cachorro, o Sr. Fruber, precisa repetir duas ou três vezes
a mesma ação para decorá-la. Por mais que pareça, você não é um animal. É um ser
humano, e humanos pensam melhor do que animais. Almeja demonstrar-me o contrário,
soldado. – Quando Yan ia respondê-lo, o Altíssimo o interrompeu. – Então, resuma-o e
objetivamente.
Um olhar abalado e inquieto dominou seu semblante ossudo, Yan evitava encarar
os olhos de falcão do Altíssimo, como um peixe à beira da praia visualizando aquele fim
iminente, tão contaminado que o rosto pareceu mais chupado que o habitual. Quem via
Yan pressentia uma crucificação mental planando atrás de seus olhos, uma companheira
infernal.
– Às ordens, Altíssimo – disse, e seus olhos estilhaçaram breves no pergaminho.
– Fracassamos, o inimigo nos pegou desprevenidos e, despercebidos, entraram na Nação
Vermelha. Os sinos tocaram no tempo em que, preventivamente, acontecia a evacuação
antecedendo os gâsgaros. E ao que tudo indica, Altíssimo, eles não seguem o plano do
informante, que talvez nos traiu guiando-os por rotas desconhecidas e roubando as nossas
armadilhas...
– Onde desapareceu o maior número de armadilhas?!
– Suponho que...
– Você supõe? Seu desgraçado, deveria cortar sua língua! – levantou-se rápido da
cadeira e, em um movimento súbito, chutou-a para longe. Xingou. Praguejou. Gritava e
ofendia o soldado. Lá fora os outros soldados zombaram bem-humorados. Yan ficou sem
palavras, e suas mãos tremiam cada instante mais. – LEIA E RESUMA ESSE MALDITO
RELATÓRIO, SEU IMPRESTÁVEL! – disse entre os dentes, ainda conseguindo um tom
elevadíssimo.
– Boa parte delas foram próximas do portão principal, Altíssimo – respondeu após
lê-lo. – Há registros, que relatam, outras armadilhas desaparecidas em regiões próximas
ao castelo, estão perto das torres de observação entre a primeira e a décima, mas em menor
número. No castelo encontraram nove armadilhas: duas desarmadas, sete que os soldados
caíram...
– Meus parabéns, soldado, você é um ótimo leitor – disse, observando-o histérico.
Um dos quatro soldados de sua elite brotou preciso na claridade acima da linha que dividia
a porta e fora dela, seu rosto era rígido que nem rochedos e a alegria evadia de seus olhos,
aos quais conseguiam cultivar escuridões mesmo de cor verde-clara. – Algum problema,
Loandf?
Yan notou-o de soslaio, mas, por méritos de sorte, ninguém percebeu.
– Licença para dirigir-lhe à palavra, Altíssimo – pediu, ao ajoelhar-se e pôr uma
mão cerrada nas pedras brancas. Ele, desdenhoso, consentiu. – Peço, humildemente, que
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me permita resolver esse problema. O inimigo está confiante, este é o momento certo para
agirmos.
Alguns soldados, afora, fuxicavam que Loandf tão-somente queria os créditos por
salvar o dia, e tentavam controlar as suas gozações ásperas. Mas um dos soldados, o mais
afastado, imitou Loandf na escassa claridade do corredor sem tochas, e todos os compa-
nheiros entraram na zombaria, até o mais alto sorriu – revelando dentes brancos e espaços
vazios.
– Pois bem, Loandf, conto com você – o Altíssimo radiava e a voz saiu fervorosa.
– Vocês, na porta, entrem sem cerimônias. Por aqui, agora. – Eles, portanto, passaram por
Yan e Loandf; ajoelharam-se silenciosos.
A Elite, no geral, usava uma armadura dourada brilhosa; qualquer um podia perce-
ber, por de trás delas, os músculos rígidos proeminentes de cada soldado como se fossem
manequins naturais. – Expliquem ao papagaio o que Loandf fará – ordenou o Altíssimo,
notando a expressão confusa de Yan, e por querer analisar a performance de outros mem-
bros da sua elite. Os três aquiesceram, no entanto, Loandf agiu mais rápido e tomou a
dianteira.
– Altíssimo – articulou vigoroso –, permita-me esse humilde prazer de educar um
indigno. – A palavra “educar”, neste caso, toou como “domesticar”, que foi o termo tácito
de Loandf.
Um dos soldados da ponta, com descerimoniosa postura, encarou Loandf, e assim
pronunciou-se:
– Educá-lo? – ironia a sua voz esbanjava, e ambos trocaram olhares perversos. –
Loandf, a pretensão e a antipatia andam juntas. Você não acha que rouba demais as nossas
distrações? Já irá divertir-se lá fora e também quer nos tirar isso? Tão egoísta que você é,
amigo.
– É o melhor que pode justificar-se, Hollin? Todos sabemos que você disse isso
porque as moças me amam. E, ao explicar, poupar-nos-ei energia e tempo. Deveriam ser
gratos.
A Elite via Yan, e desprezava-o em cada partícula. O Altíssimo fixou o olhar neles
durante um extenso fio de momento, ao perceberem cessaram comentários e aguardaram
o monarca. Depois, a gravidade no ar quebrou-se com um riso cortante, e o Altíssimo
dirigiu-lhe à palavra. – Muito bem, Loandf, prossiga – sentia-se faíscas curiosas em seu
tom.
– Soldado – disse, arrogante –, conseguiu entender a nossa conversa? Hein? Por
acaso você é mudo? Responda-me, agora! – seu tom saiu sem pausas e alarmante. “Não”
respondeu Yan depois, sentindo-se humilhado e impotente. Os cinco entreolharam-se, e
zombaram bastante. O Altíssimo deu os ombros com um jeito acolhedor, como indicasse
“arrependa-se do seu pedido, Loandf”, que o retribuíra compartilhando um sorriso mal-
intencionado. – Soldado – ecoou feito piada –, o que você percebeu lá fora? Responda.
Desculpe, eu entendi. Você é tão desatento quanto estúpido – Loandf caia nas graças do
Altíssimo.
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“Muito antes de elaborar uma armadilha, não somente usamos como preferimos
os materiais com maior peso, porque os gâsgaros são astutos e tendem a encontrá-las, e
usá-las contra nós. Pois bem, considere agora as armadilhas leves. São fáceis de serem
transportadas e têm baixo custo, todas as criaturas espalhadas fora do Castelo Vermelho
também nos atacam, logo temos de locomover-nos rápido para instalá-las sem maiores
perdas. Construímos, portanto, ambas. Só que damos preferência às armadilhas de menor
peso espalhadas longe do Castelo, e as mais pesadas próximas. As armadilhas leves ser-
vem a outro propósito, isto é, contra humanos. Então as produzimos em menor número
esperando que eles as peguem e usem-nas contra nós... Em caso de não caírem nelas, é
claro.”
Loandf e o Altíssimo trocavam olhares alegres. “Os invasores não usariam as ar-
madilhas pesadas contra nós, somente se estivessem em um grande número e se fossem
estúpidos. Partimos, deste modo, da suposição de que pegaram as armadilhas mais leves,
descobriram as emboscadas na passagem que planejaram, alteraram a rota para outra fra-
queza, nunca haverá uma proteção perfeita. Essa conclusão também nos faz supor que o
espião continua integro a nós, e, caso seja astuto, estará até o desfecho. Enfim, para ter-
minar eles instalaram as armadilhas pelo Castelo. Presumo, as armadilhas serviram a dois
propósitos. Primeiro, para o significado de sua construção: capturar otários. Segundo, as
outras encontradas não foram de fato encontradas, eles permitiram que as encontrásse-
mos...”
– Ei, que suposição... – proferia, um tanto confuso, o soldado do meio; mas quando
percebeu o olhar mortal do Altíssimo a um momento de desprezá-lo, engoliu uma saliva
seca, incerta e dura. – Eu quis dizer que deveria explicar mais claro a ele. Olhem-no, está
perdido.
O rapaz nem contra-argumentou, e o Altíssimo relaxou em sua Cadeira Real, que
rangeu, mas nenhum soldado olhou-o nesse momento, não almejavam visitar as portas do
outro mundo mais cedo. – É, eu estava chegando lá, Kron, caso fique calado e deixe-me
terminar.
– Tudo bem. Então continue, Loandf – respondeu orgulhoso e aliviado.
“Assim que localizaram as armadilhas, o que aconteceu? Pânico. Nossos soldados
ficaram temerosos, mais do que já estavam. Os pelotões, depois, brigaram internamente
e outros eram mortos até que, por fim, aqueles inúteis baixaram as defesas nos aposentos
do Altíssimo e permitiram a entrada do inimigo – pronunciava e gesticulava seguro. – Faz
quatro horas desde que principiou aquele ataque, há tempos que ninguém encontra outra
armadilha. E, de acordo com o relatório, o grupo é pequeno. Logo, suponho que haja mais
líderes a subalternos, por isso, não teriam como transportar tantas armadilhas num grupo
pequeno, dado que os líderes sequer fariam esse trabalho braçal, é besteira gastar energia
nisso.”
“Entenda, soldado. Há certas situações em que o medo significa prudência, que
em si poderá voltar-se contra o proprietário. Afinal, ter prudência não é só bom quanto é
indispensável, assim evitamos diversas más consequências. Já a prudência exagerada é
causada também por medo descontrolado, que, por sua vez, é uma forma de acorrentar o
homem ao solo e privar sua sabedoria. Veja, soldado, seus companheiros vagam receosos
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e olham cada passo que executam, uma extrema cautela pelo medo de armadilhas e dos
gâsgaros que estão chegando – Loandf estufou o peito. – Consegue, agora, concluir o que
farei?”
Yan, preferindo não arriscar, disse “não”.
– Esse inútil não tem futuro... – comentou Hollin, rindo seco.
Vieram comentários de sua astúcia inferior a um macaco, com mais comparações
e ironias grosseiras. Yan olhava para o chão, sua respiração estava levemente alterada e
oscilava mais a cada comentário humilhante. A Nação Vermelha, grosso modo, poderia
ser resumida em duas hierarquias sociais6: aqueles que gozam da vida; e, os que trabalham
enquanto vivos. Yan, por certo, pertence ao último grupo, e deveria sentir-se privilegiado
por conseguir ler, grande parte de seus semelhantes perfaziam os índices de analfabetismo
e trabalhavam braçalmente além de servir ao exército. Soldados iguais à Elite do Haiken
Vermelho, ou os quinze últimos pelotões, integravam a classe poderosa e ociosa longe de
guerras.
Yan nasceu desfavorecido no nada, com os pais veio ao tudo, e aqui ainda eram o
nada.
– Hollin, temos de encontrar o General Doll em breve, não creio que um soldado
desses graduou em nosso exército. – O Altíssimo, para surpresa de todos, riu tão forte que
uma hiena ficaria envergonha. Eles riram cordialmente, mas Yan olhou o chão ansiando
entrar nele. Depois de tal euforia coagida, desta vez Loandf desdenhou-lhe inteiramente
superior – a ponto de extinguir o pouco escrúpulo que usava contra um Yan abatido e
diminuído.
– Simplificarei, muitas das armadilhas que sumiram estariam próximas ao castelo,
em vista que não usaram tantas quanto roubaram. Estão escondidas em algum lugar, ao
qual encontrarei e provarei que o medo dos homens é infundado. Isso erguerá suas morais
enfraquecidas e afastarei seus pensamentos, ainda que pouco, dos gâsgaros. E, após um
discurso motivador usando seus temores como combustível, eu conduzirei o restante das
operações e capturaremos os invasores. Claro, como a insuficiência deve ser punida, terei
o prazer de aplicar as devidas penitências mais tarde – pausou Loandf. – Compreendeu,
soldado?
– Entendi – disse para dentro.
– Errado, soldado. Você deveria entender muito antes, seu incompetente. –
Quando o Altíssimo foi pegar sua Cadeira Real um dos três soldados retornava e serviu-
a para que se sentasse, ele foi depois ao último lugar com outros. – Soldado, perceba a
diferença entre – apontou para seus quatro homens – a Elite e – indicou-o com a mão –
os resíduos.
6 Há nove classes sociais na Nação Vermelha, embora facilmente diferenciadas. Interessante que, no caso
de Yan, o exército era a única possibilidade de um futuro melhor – caso sobreviva ao teste de nova patente,
tendo que passar dois, três ou mais dias afora da Muralha Imperial. Obs.: A Nação Vermelha é a única que
apresenta divisão por hierarquia social e, portanto, maior índice de discriminação – um relacionado ao
outro.
21
Reprimindo-se, Yan cerrou um punho calado atrás do corpo. Loandf, já satisfeito,
fez menção ao Altíssimo e entrou na escuridão. Ouvia-se, no corredor, seus risos vivos à
flor da pele.
– Você desonra meu exército, soldado – disse amargurado. – Se você fosse alguém
importante saberia da angustia que é enxergar um ser de sua espécie. Pessoas iguais a
você deveriam viver nas sombras da Nação Vermelha, e comer as sobras de nossos ani-
mais. Para sua ilimitada sorte, soldado, sou um Altíssimo Haiken caridoso. Permito que
fracos como você rastejem por nossas ruas, desonrem nossas comidas, contaminem nos-
sos vinhos, profanem nossas mulheres... Mas você é um fraco que sobrevive graças à
nossa força. Lamentar por nascer é o seu dever. Servir-nos é a sua obrigação – suspirou
meio irritadíssimo, meio cansado. O Altíssimo não suportava esse povo vagando em sua
nação como se pertencesse a ela, seu rosto endureceu e seus olhos negros ficavam mais
pretos.
– Entendi – respondeu Yan contra o seu orgulho.
– Altíssimo – proferiu um soldado da Elite, que esperou a permissão do monarca
bastante quieto e respeitoso, tudo elevado ao mais puro extremo dessas palavras. – Seria
uma honra fazer-te o relatório. Contudo, é claro, as circunstâncias são desfavoráveis para
honrar-me.
O rosto do Altíssimo arrebentou de tanto orgulho, olhando-o como quisesse dizer:
“São soldados assim, como você, que salvam esta nação”. – Agradeço-lhe, Hollin, mas já
estou entediado – respondeu pondo um fim naquilo. O Altíssimo os encarou mudo, por
tempos e tempos prolongados, e muito perturbadores; sua expressão rígida era o pergami-
nho informando para ninguém abrir a boca. Ele, desdenhosamente, falou quando Yan lhe
acarou:
– Faz quatro horas que a Nação Branca, guiada pelo próprio Altíssimo Haiken
Branco, invadiu o Castelo. São, no total, sete inimigos; setecentas e noventa e sete mortes,
todos soldados, e os civis foram ignorados três vezes. Depois de invadir meus aposentos,
o Haiken Branco desapareceu e os seus cinco generais pereceram acobertando o negro do
Coração de Tigre, que também está desaparecido. Faltam, portanto, dois invasores. Justo
os mais perigosos, ambos possuem dois anéis celestiais como eu – discursou bem alto e
confiante.
Yan nem soube o que dizer e fazer, ou reagir, ou pensar.
– Também posso resumir um relatório, após escutá-lo tantas vezes – redisse o
Altíssimo particularmente a ninguém. Já Hollin não se sentiu ultrajado, pelo contrário,
junto aos outros, amou o deboche. – Eu cansei. Obrigado, mas a diversão acabou. Lem-
bre-me de promovê-lo a bobo da corte, tenho fé em sucesso – Yan estava perdido. – Sol-
dado, um homem sábio presta atenção no que fala e como fala. Dou-te, desta vez, a minha
misericórdia.
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Embora confuso, a palavra misericórdia era boa. – Obrigado – falou sem emoção,
e ficou largado pelas palavras. Nem mesmo quando lhe caçoavam7, por ser filho de uma
prostituta, chegaram a rebaixá-lo nesse nível. – Eu não sou digno de vossa benevolência,
Altíssimo. – E bateu a mão contra o peito, num sinal respeitoso e perdendo o seu amor-
próprio.
– Eu sei.
Sua falta de controle havia sido breve, mas breve o bastante para ser notada. Yan
olhou o Altíssimo com declarado ódio, e desviou os olhos para o chão. Ao perceber a
audácia do soldado, após sua vasta clemência, o Altíssimo pensou em liquidá-lo. Sem se
precipitar, porque gostava de agoniá-lo, rodou um anel verde em seu dedo – uma ameaça
silenciosa.
Ele concluíra que Yan, igual a todos desta nação, sabia daquilo, ou acompanhava
os rumores. Estava claro que Yan não queria provar sua morte daquela forma, seu corpo
era uma bandeira num mastro aos ventos. Os outros soldados estavam questionando-se –
entre olhares aterrorizados – se fizeram alguma coisa errada para presenciar aquilo. Mas,
devido a Yan, o Altíssimo estava de bom humor, e reconsiderou – utilizar seu anel naquela
imundície gastaria a sua energia espiritual, melhor consagrada contra o Altíssimo Haiken
Branco.
– Convoque a Elite dos centos e cinquenta – ordenou ríspido a Yan, que ainda se
ajoelhava reprimido. – Temos novas prioridades, não esqueça de trazer aquela garota do
Haiken Branco, veremos sua utilidade para a Nação Vermelha.
– Altíssimo, podemos confiar naquela mulher?
– Afinal, qual é o seu nome, soldado?
E assim o pesar lhe atingira. – Yan... Yan Pokein… F-filho dos artesões Arkine e
Wudy Pokein, de...
– Yan Pokein... Quem é Yan Pokein?
Ele sentira-se pressionado com a áurea do Altíssimo, era como se o peso de seu
nome, de seus títulos de honra, de sua força sobre humana lhe esmagassem. Abaixou a
cabeça, tremendo novamente enquanto escutava os risos abafados dos soldados, que mur-
muravam: “Ah, a Wudy. Que língua maravilhosa, talvez eu passe lá em nome dos velhos
tempos” – somente para Yan escutar.
– Você não existe. Seus pais não existem. Sua vida é a prova da minha misericór-
dia. Você não pensa, porque não existe. Você executa, e morrerá quando eu ordenar. Es-
tamos entendidos?
– Sim, Altíssimo! Desculpe... por meu... atrevimento... isso...
– Você ainda está aqui, papagaio?
7 A Sra. Pokein nasceu na Nação Vermelha, e teve o seu filho fora da Muralha Imperial, mas retornou para
casar-se com o pai de Yan.
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Yan pôs a mão no peito, entregou o relatório ao Altíssimo e fez uma menção atra-
palhada, por inquietação. Quando saía quase pisou num dos soldados, que o encarou feio,
no entanto, ignorou. Os corredores eram escuros, como caminhar numa noite ausente de
lua, mas Yan os virava naturalmente, participou, com os pais, desta construção inacabada.
O silêncio era derrotado por seus pés enfurecidos, algumas vezes ele conversava sozinho,
ou socava a parede, e quase não sentia dor, era como se a fúria não desse espaço a outras
dores.
Tão igual, estava raivoso com o Altíssimo e sua Elite. Toda paciência, disse-lhe
certa vez a sua mãe, choca-se com seus limites. Hoje, Yan descobria os seus. Ambos – o
Sr. e a Sra. Pokein – investiram de tal maneia expressiva em seus estudos e carreira,
desejaram as oportunidades que nunca tiveram ao filho. Já Yan (?), sempre via os seus
esforços árduos naqueles trabalhos até de madrugada enquanto os gâsgaros voavam e
soltavam sons medonhos. Contudo seus pais engoliam medos, continuavam trabalhando,
centrados no futuro de seu único filho e herdeiro. O Sr. Arkine Pokein, seu pai, era muito
bondoso. Yan jamais esperou que durasse o suficiente para assistir alguém a casar-se com
uma prostituta e reconhecer o seu filho, aliás, seu pai era bastante afetuoso e amável com
ambos.
Ele ansiava honrá-los, mas na Nação Vermelha parecia impraticável. Seus pais o
estimulavam e frisavam suas competências admiráveis, porém, mesmo assim; Yan Pokein
sabia que a sua única opção, para retribuir seus amáveis pais, era viver dois dias além da
Muralha Imperial, e jamais conseguiria. Nos testes de aptidões sempre foi o pior de todos;
e suas expectativas com a leitura foram dolorosas, conseguia identificar as letras e ainda
assim não as entendia muito bem. Yan avaliava-se como outro dos muitos arruinados na
poderosa Nação Vermelha, que tão-só os fortes tinham direitos e os fracos carroças de
deveres.
Desde que, quando criança, enxergou as diferenças sociais das pessoas, teve uma
sensação ruim: igual a nascer em um lugar e perecer nele sem alterar nada, uma inaptidão
eterna, um sentimento a martelar o peito. Mas, além duma promoção na Nação Vermelha,
tinha outras opções, e não tão boas. Viver numa nação menor não compensava, todos
estavam sujeitos a guerras internas por pedaços de terra e comida, e os inimigos da hu-
manidade alimentavam-se de cada ser humano afora da Muralha8. A Nação Cinza foi
8 Um fato: dentro das muralhas há conflitos humanos, apesar de não envolver os civis. Após as duas nações
sobreviverem ao ataque da Vermelha, houve uma guerra política. Nela a paz fora um tiro perdido, uma bela
tentativa do impossível. Igualmente, resolver essa briga em um duelo entre três governantes – o exército e
a população negaram –, bem como outra amenização de conflito. Acordaram em poupar os civis, alocando-
os noutras áreas longínquas de seus exércitos, à exceção da hora em que os soberanos viriam. Certamente,
na guerra “vale tudo” e, assim, poderia ter um ou outro inocente atingido. Todavia, nesta, o destino de toda
humanidade encontrava-se em xeque; nem tudo, portanto, valia. Se alguém infringisse esse acordo político,
deveria erradicar duas nações ou seria atacado por elas*, e, ainda por cima, um Haiken – seja justo ou injusto
– deveria honrar sua promessa de prezar pela vida humana, qualquer tentativa de erradicá-la levaria a uma
falência.
Nem os piores seres desvirginariam tal precisão, por certo haveria perda de seguidores e nasceriam
desertores.
* Simultaneamente estava no acordo a proibição de alianças, devidamente historiada, requerida e aprovada
pela população e exército das três nações. Desse modo os Altíssimos e Haikens deveriam honrar esse acordo
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destruída insanamente, o Altíssimo Lougard Dayn9 trucidou as gestantes, as crianças, os
doentes... percorreram relatos de que sequer os animais de estimação dos Haikens foram
poupados.
Sua única e melhor opção era imediatamente recorrer ao refúgio da Nação Branca,
trair suas terras. Yan escutava muitos relatos agradáveis a respeito do Altíssimo Haiken
Branco e a sua clemência com os mais fracos. Alguns alegavam que a Nação Branca tinha
uma elite de dois mil homens perfeitamente treinados; o restante era considerado parte da
população, consolidavam proteções internas, apoiavam os cardeais soldados e raramente
iam às guerras externas. Dois mil homens, contra os atuais quase dez mil homens da nação
vizinha, era pouca coisa. Entretanto, caso a cabeça do monarca caísse os números sequer
importariam. O seu específico, e maior, receio era de perder os poucos privilégios que a
Nação Vermelha ofertava ao exército, mesmo que, no caso de Yan, seu único privilégio10
saciava com prostitutas e grandemente inferiores à alta patente ou à Elite. Ele seguiu os
corredores em dilemas, quando avistou a claridade no último corredor tivera tomado sua
decisão.
Eles chegarão, logo que a tarde cair, eles chegarão. Enxurros de soberanos sobrevoarão a
Muralha Imperial, colocarão o destino versus os humanos e a esperança ante a realidade;
homens e mulheres terão um fio em torno do pescoço e os vestígios de sua humanidade
despetalada. Já no desabrochar de toda existência este mundo afundou na origem do caos,
tanto que o amanhã significou angústia e a morte uma libertação. No entanto, naquele
momento, o mundo adentrava, mais do que em outrora, no fluxo do desespero; e transporá
quaisquer calamidades com o Altíssimo Haiken Vermelho a meio passo de domar toda a
humanidade.
político, este acordo durou impecável, mas como agora restava somente duas nações, o destino soltava suas
risadas.
9 Lougard Dayn nasceu numa das tribos menores – sem nome –, no dia 11 de Kallfind de 6997. Fundou o
Reino Vermelho em 19 de Lawand, 7014. No dia 60 de Waltil, 7019, realizou a união do Reino Vermelho
com o Reino Rosa da Haiken Rosa, Dallina Forkbs; o Reino Lilás do Haiken Lilás, Flakoales Astill; e o
Reino Laranja da Haiken Laranja, Byena Arudys; originalizando o Altíssimo Haiken Vermelho Lougard
Dayn e a Nação Vermelha; liderada por cada Haiken citado em segundo plano.
10 Todos, desde que fossem aceitos, podiam optar por qual Haiken seguir. A Nação Vermelha é a única
entre as três Grandes Nações a privilegiar homens e mulheres com prazeres carnais, motivo ao qual possuía
maior população.