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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA Instituto de Letras Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução Área de Japonês VERYANNE COUTO TELES UM ALUNO DEFICIENTE VISUAL COM LAPSOS NA MEMÓRIA RECENTE NO CURSO SUPERIOR DE LETRAS-JAPONÊS: ESTUDO DE CASO Brasília 2010

UM ALUNO DEFICIENTE VISUAL COM LAPSOS NA MEMÓRIA … · Aos amigos do Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais (PPNE/UnB), que me fizeram conhecer, aprender e gostar

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

Instituto de Letras

Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução

Área de Japonês

VERYANNE COUTO TELES

UM ALUNO DEFICIENTE VISUAL COM LAPSOS NA

MEMÓRIA RECENTE NO CURSO SUPERIOR DE

LETRAS-JAPONÊS:

ESTUDO DE CASO

Brasília

2010

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

Instituto de Letras

Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução

Área de Japonês

VERYANNE COUTO TELES

UM ALUNO DEFICIENTE VISUAL COM LAPSOS NA

MEMÓRIA RECENTE NO CURSO SUPERIOR DE

LETRAS-JAPONÊS:

ESTUDO DE CASO

Projeto final de curso apresentado ao Departamento de Línguas

Estrangeiras e Tradução – LET/UnB, como requisito parcial

para a obtenção do grau em Licenciatura em Língua e Literatura

Japonesa

Orientador: Prof. Dr. Yûki Mukai

Brasília

2010

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Veryanne Couto Teles

Folha de Aprovação

Aprovada em: Brasília, 20 de agosto de 2010

Banca Examinadora

_____________________________________

Orientador: Prof. Dr. Yûki Mukai

_____________________________________

Examinadora: Profa. Msc. Alice Tamie Joko

_____________________________________

Examinador: Prof. Marcus Vinícius de Lira Ferreira

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus, pois sem Ele não teria tudo que tenho e nem tampouco

conseguiria alcançar todas as minhas vitórias, e à Maria Santíssima que me protegeu nesta

caminhada.

Aos meus pais, pelo amor incondicional, pelo apoio irrestrito, pela força imensurável,

por sempre serem meu ‘porto seguro’, por me incentivarem desde o início, por

compreenderem a importância dos estudos em minha vida, e principalmente por estimular

meu amor pelas letras e pela educação.

À minha irmã. Obrigada Nana, por sempre escutar minhas queixas, sempre me apoiar,

ser minha amiga e ter orgulho de mim.

Aos meus colegas que fizeram da minha graduação uma fase de grande crescimento,

mas agradeço de modo especial aos amigos André Willian, Adriana Harumi, Jorge Henrique e

Júlia Yoko, que estiveram sempre do meu lado, que me ajudavam tanto nos problemas

acadêmicos quanto nas minhas dificuldades aqui em Brasília. Companheiros, amigos-irmãos

que estavam sempre dispostos a me acolher, cuidar e escutar. Que riram e choraram comigo, e

que juntos formamos o “Quinteto Fantástico”.

Ao Rafael Teza, pessoa importante e querida que apareceu na minha vida e que na fase

final do curso teve uma paciência e um amor inexplicável, apoio moral e emocional que me

ajudou a seguir em frente, além de sugerir, ler e revisar este trabalho.

Aos amigos do Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais

(PPNE/UnB), que me fizeram conhecer, aprender e gostar da educação especial e a respeitar

as diferenças. Além de darem a oportunidade de saber mais sobre a deficiência visual e o

Sistema Braille.

Ao Prof. Dr. Yûki Mukai, meu orientador, que de forma profissional e dedicada me

orientou, me apresentou novos horizontes, sempre de maneira humilde e paciente, e trazendo

valiosas sugestões quanto à referência bibliográfica e lingüística aplicada.

Aos deficientes visuais que a cada dia me dão uma nova lição de superação, e que

colaboraram como sujeitos da pesquisa.

A todas as pessoas que, direta ou indiretamente, contribuíram para a minha formação e

na realização deste trabalho.

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“Não importa se as informações e o conhecimento penetram em nós pelos olhos ou pelos

dedos, o essencial é que neles existam o coração e a mente.”

Paulo Zurita

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RESUMO

Este trabalho apresenta uma reflexão sobre o processo de ensino-aprendizagem da

Língua Japonesa e como este acontece com os alunos deficientes visuais. A pesquisa destaca a

aquisição de língua estrangeira enraizado no meio social, segundo teorias psicológicas. Além

disso, por se tratar de educação especial, observa os procedimentos acerca do ensino de

línguas e as formas de ter a inclusão de alunos cegos em instituições convencionais de ensino.

Explica sobre o sistema Braille, fazendo um paralelo entre o alfabeto português e japonês. Por

fim, analisa através de estudo de caso, as principais dificuldades enfrentadas pelos deficientes

visuais, identificando métodos mais eficazes para o aprendizado de língua japonesa e

interpreta os instrumentos de coleta de dados.

PALAVRAS - CHAVE: Deficientes visuais, Língua japonesa, inclusão, sistema Braille.

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ABSTRACT

This paper presents a reflexion on the learning-teaching of Japanese language process and

how it happens to student that are visually impaired. The research highlights the acquisition of

a second language rooted in the social milieu, according to psychological theories. Besides, as

it deals with special education, it observes the procedures involved in the teaching of foreign

languages and the ways of including blind students in conventional educational institutions. It

explains the Braille system, making a comparison between Portuguese and Japanese

alphabets. It also analyses, through a case study, the main difficulties faced by students who

are visually impaired, identifying more efficient methods for the learning of Japanese

language, and interprets the instruments to the recollection of data.

KEYWORDS: visual deficiency, Japanese Language, Braille system, inclusion

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NOTA PRELIMINAR

a) Todos os nomes mencionados na pesquisa são fictícios para preservar a identidade dos

informantes.

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1 –

DEFINIÇÃO DA CID 10 SOBRE PERDA DE VISÃO............................ 03

QUADRO 2 –

ÍNDICES DE PERDA DE VISÃO.............................................................

05

QUADRO 3 –

MÉTODOS PARA ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA.................. 37

QUADRO 4 - CATEGORIZAÇÃO DOS DADOS........................................................... 38

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LISTA DE SIGLAS

DV - Deficiente Visual

OMS - Organização Mundial de Saúde

CID - Classificação Internacional de Doenças

CIDID - Classificação das Deficiências, Incapacidades e Desvantagens.

CIF - Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde.

LA - Lingüística Aplicada.

LJ - Língua Japonesa.

LE - Língua Estrangeira.

LDB - Lei de Diretrizes e Bases.

PPNE - Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais

LDV - Laboratório de apoio aos Deficientes Visuais

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................... 01

2. DEFICIÊNCIA VISUAL .................................................................................... 03

3. EDUCAÇÃO INCLUSIVA ................................................................................. 05

4. SISTEMA BRAILLE .......................................................................................... 10

5. SOFTWARES LEITORES DE TELA .............................................................. 12

5.1. Dosvox ...................................................................................................... 12

5.2 Linvox ........................................................................................................ 12

5.3 Jaws ............................................................................................................ 13

5.4 Virtual Vision ............................................................................................. 13

5.5 NVDA ........................................................................................................ 13

5.6 Orca ............................................................................................................ 14

5.7 Window-Eyes ............................................................................................. 14

6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ...................................................................... 15

6.1. Visão da Lingüística Aplicada .................................................................. 15

6.2. Vygotsky e a Educação Especial............................................................... 19

7. METODOLOGIA ................................................................................................ 25

7.1. Tipo de Pesquisa ....................................................................................... 25

7.2. Contextualização da Pesquisa ................................................................... 25

7.3. Informantes ............................................................................................... 26

7.4. Procedimentos ........................................................................................... 27

7.5. Instrumentos de Coleta de Dados .............................................................. 28

7.5.1. Observação das aulas ............................................................................. 28

7.5.2. Questionário Socioeconômico ............................................................... 28

7.5.3. Questionário Aberto e Escrito ................................................................ 28

7.5.4. Entrevista................................................................................................ 29

7.5.5 Notas de Campo do Pesquisador ............................................................. 29

7.5.6 Procedimentos de Análise de Dados ....................................................... 29

7.6. Contribuição do Estudo ............................................................................. 29

8. ANÁLISE DO ENSINO DE JAPONÊS PARA DEFICIENTES VISUAIS

ATRAVÉS DO PRESENTE ESTUDO DE CASO ........................................... 31

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................. 44

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................. 48

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1. INTRODUÇÃO

A problemática do presente projeto surgiu depois que observei a falta de

informação quanto à deficiência visual e principalmente a escassez de profissionais

qualificados para o ensino de línguas estrangeiras para deficientes visuais.

A sociedade infelizmente não está preparada para receber deficientes, pois não

sabe lidar com a demanda trazida por cada deficiência, apesar da legislação brasileira

"garantir" o atendimento e a acessibilidade aos alunos com necessidades especiais.

Assim, se torna mais conveniente optar pela visão do improdutivo, inútil, incapaz.

A questão da deficiência sempre encontrou muitas barreiras no que diz respeito

ao enfrentamento na sociedade de modo geral, o que ainda é comum, já que há uma

"tendência natural" do homem de se rejeitar o que e aquele que não faz parte dos

"padrões normais". Por causa desta rejeição, as pessoas com necessidades especiais

passam a ser excluídas e marginalizadas. E isso é refletido em vários aspectos na vida

social, como no processo de aprendizagem e no mercado de trabalho.

As instituições de ensino por muitas vezes não compreendem as particularidades

de cada aluno, segregando assim os alunos considerados fora do “padrão”. Os

conteúdos escolares privilegiam a visualização em todas as áreas de conhecimento, de

um universo permeado de símbolos gráficos, imagens, letras e números. Assim,

necessidades decorrentes de limitações visuais não devem ser ignoradas, negligenciadas

ou confundidas com concessões ou necessidades fictícias, ao contrário, deveria rever os

conceitos, atitudes, postura e preconceitos e aceitar as diferenças como desafios

positivos e expressão natural das potencialidades humanas.

Mesmo que a pessoa tenha uma limitação, que é a deficiência visual, seja ela a

baixa visão ou a cegueira total, isso não impede que aprendam novos idiomas,

conheçam novas culturas, mesmo porque, é importante destacar a relevância e a

necessidade de propiciar o desenvolvimento dos indivíduos e principalmente no meio

das suas capacidades comunicativas e educacionais, o que auxilia também nas suas

capacidades de desenvolvimento pessoal e social. Diante disso, meu objetivo é mostrar

a importância do ensino de línguas estrangeiras, assim como, verificar como se dá o

processo de ensino-aprendizagem. Levando em consideração que é essencial contribuir

um pensamento educacional, mesmo sabendo que o acesso à educação seja ela básica,

de nível médio ou superior é bastante difícil para o deficiente visual, por ser um campo

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extenso e complexo, com falta de informação específica e de infra-estrutura. Buscando

novas diretrizes para o ensino de língua estrangeira (japonês) para deficientes visuais.

O processo de elaboração deste projeto começou, num primeiro estágio com o

levantamento e pesquisa de teorias que fundamentassem a aquisição de língua

estrangeira e posteriormente, o desenvolvimento cognitivo (e de linguagem) dos

deficientes. Focalizei para isto, nas teorias da Lingüística Aplicada que privilegiam nos

processos do uso da linguagem nas relações sociais, e na teoria sócio-interacionista de

Lev Semionovich Vygotsky que enfatiza a importância do meio social para o

aprendizado das pessoas deficientes. Logo após, analisei a questão da educação especial

e inclusiva no Brasil, para entender como se dá o ensino de alunos “especiais”, como é o

serviço educacional prestado pela educação especial para atender as necessidades

educacionais específicas dos educandos, pormenorizando o aprendizado de uma língua

estrangeira pelos deficientes visuais. Num terceiro momento, focalizei o projeto no

estudo de caso feito com um aluno deficiente visual (DV), com lapsos de memória

recente que cursa Língua e Literatura Japonesa na Universidade de Brasília.

Durante a realização do trabalho, várias dificuldades apareceram e muitas

dúvidas surgiram a respeito do melhor método para a alfabetização da língua japonesa

para um DV, se seria possível a aplicação do sistema Braille no ensino da nova língua,

qual enfoque que seria dado, a formação dos professores com relação à educação

inclusiva, além do empenho do aluno em enfrentar esse novo desafio.

O objetivo do trabalho era identificar as ‘barreiras’ enfrentadas no processo de

ensino-aprendizagem da Língua japonesa, os métodos mais eficazes para o ensino de

japonês para deficientes visuais no Brasil e as expectativas e progressos dos

participantes da pesquisa em relação à Língua Japonesa.

Pretendeu-se entender, a partir de uma pesquisa etnográfica de cunho

interpretativista, como ocorre o ensino-aprendizado de língua japonesa em nível inicial

(básico) e como é possível expandir uma educação inclusiva no ensino desta língua para

deficientes visuais.

Tendo como motivador as seguintes questões: 1) Como se dá o aprendizado

deste aluno na Língua Japonesa? 2) Qual melhor método de ensino de japonês para

deficientes visuais? 3) Quais são as principais dificuldades enfrentadas para o ensino e a

aprendizagem do nível básico de Língua Japonesa pelo aluno pesquisado?

Logo, é possível dizer que o presente projeto priorizou a análise da alfabetização

e dos procedimentos que proporcionaram o aprendizado de japonês para DV.

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2. DEFICIÊNCIA VISUAL

O termo deficiência visual abrange conceitos que incluem desde a cegueira total,

onde não há percepção de luz, até a baixa visão.

A Organização Mundial da Saúde __ OMS disponibiliza classificações

internacionais visando à codificação das informações sobre saúde, que busca uma

uniformização na definição de termos ligados às deficiências, incluindo a deficiência

visual.

Em 1893, surgiu a primeira classificação chamada de: Classificação de Bertillon

ou Lista Internacional de Causas de Morte. Esta classificação passou por um processo

de revisão realizado a cada dez anos. Durante o processo para a 6a revisão, em 1948,

adotou-se a denominação Classificação Internacional de Doenças __ CID. Na décima

revisão, a baixa visão ou visão subnormal foi catalogada com o código H54.2 pela CID

e compreende os graus de comprometimento apresentados em 1 e 2, já a cegueira total e

congênita com o código da categoria H54.0, e compreende os graus 3, 4 e 5 de

comprometimento apresentados na quadro 1:

QUADRO 1: DEFINIÇÃO DA CID 10 SOBRE PERDA DE VISÃO.

Graus de comprometimento

visual

Acuidade visual com a melhor correção possível

Máxima menor que: Mínima igual ou maior

que:

1 6/18

3/10 (0,3)

20/70

6/60

1/10 (0,1)

20/200

2

6/60

1/10 (0,1)

20/200

3/60

1/20 (0,05)

20/400

1/60 (capacidade de contar

dedos a 1m)

3 3/60

1/20 (0,05)

20/400

1/50 (0,02)

5/300 (20/1200)

4 1/60 (capacidade de contar

dedos a 1m)

1/50 (0,02)

5/300

Percepção da Luz

5 Ausência de Percepção de

Luz

9 Indeterminada ou não

identificada

(Adaptado pela autora baseado em MASINI et al. [2006])

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Na década de 70, foi aprovada, em caráter experimental, a Classificação das

Deficiências, Incapacidades e Desvantagens — CIDID.

A CIDID, além de complementar-se à CID (Classificação Internacional de

Doenças), contribuiu promovendo a uniformização de conceitos e terminologias em

caráter geral e apresentando definições para deficiência. Depois de uma revisão deste

documento, originou-se a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e

Saúde – CIF.

Porém só em 20 de abril de 2002, em Sidney na Austrália, a partir da resolução

adotada pelo Conselho Internacional de Oftalmologia, que passou a utilizar termos e

definições acerca de deficiência visual, tais como:

• Cegueira: somente em caso de perda total de visão e para condições nas quais

os indivíduos precisam contar predominantemente com habilidades de

substituição da visão.

• Baixa Visão: também denominada de visão subnormal, para graus menores de

perda de visão, nos quais os indivíduos podem receber auxílio significativo por

meio de aparelhos e dispositivos de reforço da visão

• Visão Diminuída: quando as condições de perda de visão são caracterizadas por

perda de funções visuais (como acuidade visual ou campo visual). Muitas

dessas funções podem ser medidas quantitativamente.

• Visão Funcional: descreve a capacidade de uso da visão pelas pessoas para as

Atividades Diárias da Vida (ADV), sendo que, muitas dessas atividades podem

ser descritas apenas qualitativamente.

• Perda de Visão: termo geral que compreende perda total ou parcial da visão,

caracterizada por visão diminuída ou perda de visão funcional.

Esta mesma resolução, o Conselho também definiu os índices de perda da visão:

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QUADRO 2 – ÍNDICES DE PERDA DE VISÃO

(Adaptado pela autora baseado em MASINI et al. [2006])

3. EDUCAÇÃO INCLUSIVA

A palavra Inclusão, do verbo incluir (do latim includere), assim como no

japonês 包括する, etimologicamente, significa abranger, inserir, envolver, fazer parte

de. O princípio da inclusão pauta-se na valorização e compreensão da diversidade

humana.

A inclusão há tempo tem sido alvo de várias pesquisas no meio científico e

acadêmico para um movimento em prol da pessoa com deficiência. Esta questão

começou a ser debatida, de fato, a partir dos anos 60, quando diferentes países passaram

a se mobilizar a respeito da integração educacional.

A Declaração de Salamanca foi um documento internacional de suma

importância para a educação. Elaborado a partir da Conferência Mundial sobre

Necessidades Educacionais Especiais, realizada na Espanha, em junho de 1994, que

reuniu oitenta países os quais debateram sobre necessidades educacionais especiais.

Neste mesmo evento, foi reafirmado o direito à educação de cada indivíduo, conforme a

Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, e as demandas resultantes da

Conferência Mundial de Educação para Todos, de 1990. O texto da Declaração afirma

que todas as crianças e jovens com necessidades educacionais especiais devem ser

incluídas em instituições de ensino regulares, postulando serem as escolas inclusivas a

maneira mais eficiente de luta contra a segregação dos deficientes. O principal desafio

dessas instituições consiste em desenvolver uma pedagogia centrada no processo de

ensinar e aprender, capaz de atingir a todos, independentemente da dificuldade e da

necessidade.

·Visão normal: 0,8 ≥

·Perde leve de visão: < 0,8 e ≥0,3

·Perda moderada de visão: < 0,3 e ≥0,125

·Perda grave da visão: < 0,125 e ≥ 0,05

·Perda profunda de visão: < 0,05 e ≥ 0,02

·Perda quase total de visão (próxima à cegueira): < 0,02 e = SPL (Sem Percepção da Luz)

· Perda total de visão (cegueira): Sem Percepção da Luz

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Todos os locais de ensino deveriam acomodar todas as pessoas que querem

aprender indiferentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais,

lingüísticas ou outras.

Partindo desse princípio, a educação especial inclusiva deixa de ser um

subsistema paralelo que se encarrega de terminados alunos considerados especiais,

passando a ser um conjunto de recursos especiais a serviço da educação geral, em

beneficio de todos os alunos. Não menosprezando as escolas especiais que prestaram e

prestam uma assistência incomparável as pessoas com deficiência.

No Brasil, o movimento a favor da escola inclusiva representa uma mudança

radical na educação, tendo em vista que favoreceu a igualdade de oportunidades a todas

as pessoas, sendo uma educação personalizada que respeita a singularidade e diferenças

de cada aluno e não enfatizando a deficiência.

O movimento de inclusão no Brasil apresenta duas correntes: uma que defende a

inclusão como forma de oposição à exclusão das pessoas com deficiência no ensino

comum; e outra, que discorda da inclusão indiscriminada, em que não se consideram as

necessidades requeridas para o atendimento das pessoas com deficiência, sejam esses

recursos humanos ou materiais.

Segundo Senna (2008), atualmente conta-se com um vasto aparato de

expedientes legais e humanitários que visam a assegurar plenos direitos civis às

minorias sociais, de forma que as práticas de exclusão tradicionalmente empregadas

para interditar os ditos sujeitos marginais e mantê-los na condição de alienados da

esfera pública colidem diretamente com os direitos que lhe são assegurados. Entretanto,

ainda que potencialmente incluídos na sociedade, os marginalizados continuam a não

ser tolerados e têm sua condição perpetuada na atitude social que os toma como sujeitos

meramente tutelados, cuja emancipação se compreende como impossível à luz da

condição de alienado estrutural, ou seja, formalmente incapaz de ter comando sobre si

próprio. Desse modo, às condutas de exclusão, somam-se as condutas de banimento,

estas sutilmente organizadas para atestar e reintegrar a natureza alienada dos sujeitos

historicamente marginais.

Para sobrepujar a exclusão escolar é demandado muito mais do que mero direito

a vaga e/ou a permanência do aluno “especial”; demanda também uma superação dos

valores que segregam e banem este indivíduo do cotidiano de uma experiência em que

jamais conseguem superar os limites do intolerável, pois para uma sociedade

desacostumada com o “anormal”, uma pessoa considerada fora dos padrões, sempre

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estará eminente ao fracasso; e esta mentalidade acontece principalmente na área de

educação.

A educação passa, então a ser vista como um processo social

sistemático de construção da humanidade. O aluno jamais poderá ser

visto como alguém que não aprende. Nesta abordagem o professor

torna-se figura fundamental; o colega de classe, um parceiro

importante; o planejamento das atividades torna-se tarefa essencial e a

escola, o lugar de construção. (VALDÉS, 2002).

A realidade social sempre foi marcada pelas desigualdades e isto,

conseqüentemente tem reflexos na educação e o que nos leva a pensar e debater acerca

da educação que queremos, considerando que não é possível abordar a inclusão

ignorando todo o histórico e processo da exclusão. A partir da idéia de que a educação

inclusiva é uma nova forma de pensar em educação, a inclusão provoca um exercício

crítico, que estimula a formação de professores, dispondo o desafio de repensar na

escola e planejá-la para que se torne efetivamente aberta às diferenças. Pois como

propõe Senna (2008), é justamente na normatividade e sua condição de normalidade é

que se situa o estado de estagnação da educação para a inclusão social.

A educação inclusiva é tema atual no contexto da política educacional do nosso

país, inúmeras leis e diretrizes inspiradas na concepção de direitos humanos suscitam

mudanças no sistema educacional em todos os níveis e orientam para a garantia da

eqüidade no processo educacional, fazendo avançar a responsabilidade do sistema

educacional com a promoção da cidadania. Porém bem antes disso, Vygotsky já

afirmava que as pessoas com deficiência deveriam ser estimuladas e interagir

amplamente ao invés de serem educadas apenas com contatos com pessoas da mesma

situação.

No processo de desenvolvimento histórico, o homem social modifica

os meios e os procedimentos de seu comportamento, transformando as

atitudes e funções naturais e constrói novos níveis no sistema de

comportamento do homem. (VYGOTSKY, 1989, p.93).

Logo, sendo o meio social e cultural tão importantes para o desenvolvimento

humano e a sua construção enquanto sujeito histórico e cidadão, o ambiente em que

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vive este sujeito e principalmente a educação que recebe, devem ser permeados por uma

mediação que estimule o seu crescimento e desenvolvimento.

A nossa sociedade não está habituada a ver as pessoas com deficiência inseridas

nela, de modo efetivo e produtivo, possui uma visão padronizada do homem e exclui

tudo e todos que fogem desse padrão. Atitudes preconcebidas, estereótipos e

sentimentos que transmitem inferioridade e compaixão são observados comumente,

esses estigmas e posturas preconceituosas, criam barreiras sociais e físicas que

dificultam ainda mais o processo de inclusão. Dentre as rejeições, a maior barreira

consiste na tendência de não se acreditar no potencial de desenvolvimento e

aprendizagem do aluno com deficiência. Escolhemos um parâmetro de normalidade e

nos esquecemos que a sociedade se compõe de pessoas diferentes, que ela se constitui

na diferença. Assim como indica Valdés (2002), a educação especial, diz, deve ser

subordinada ao social; coordenada com o social e inclusive deve estar fundida

organicamente com o social e penetrar no social.

Em geral, as pesquisas que abordam a inclusão de alunos deficientes no sistema

regular de ensino, são focalizadas na estrutura educacional no Ensino Fundamental e

Médio. Já no Ensino Superior, Delpino (2004) foi a primeira a investigar o tema. E

analisando suas pesquisas pode-se perceber que o maior problema da educação

inclusiva está na formação dos profissionais, (principalmente os docentes) que não estão

preparados para receber os alunos “especiais”. A imensa maioria dos professores que

atum em contexto de educação inclusiva não tem a formação apropriada.

E na área do ensino de línguas estrangeiras, ainda tem o mito que os alunos

deficientes sejam incapazes de aprender, quando a questão é apenas a falta de preparo e

de disponibilização para mudar, se adaptar ao novo.

Sob a ótica da mudança, as ações da educação especial também devem

ser ressignificadas como um conjunto de serviços e de recursos de

apoio, orientados para a educação regular, em benefício de todos os

aprendizes. (TONINI, 2005).

Investigar a educação especial inclusiva leva à conclusão que é um processo

ainda complexo, pois não se sabe como fazer essa inclusão, seja no que diz respeito aos

recursos humanos e materiais, o objetivo da inclusão e as condições oferecidas para que

esta ocorra.

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Destacarei mais a seguir, a importância da teoria sócio-interacionista para o

processo de inclusão escolar de pessoas com deficiência, devido a esta teoria destacar as

especificidades dos indivíduos e as superações destes diante de um ambiente que

estabeleça relações de mediação junto a um indivíduo interativo.

Outro aspecto relevante a se concluir é que não são necessários novos

professores, com novas formações, mas que os professores que já atuam hoje entendam

o novo contexto de inclusão e que possam refletir como vão usufruir de suas

concepções, conhecimentos, valores e crença adquiridos durante sua vida para

posicionar-se em uma classe inclusiva.

A humanidade, sempre há sonhado como um milagre religioso: que os

cegos vejam e os mudos falem. É provável, que a humanidade triunfe

sobre a cegueira, a surdez e a deficiência mental. Porém a vencerá no

plano social e pedagógico muito antes que no plano biológico e

medicinal. É possível que não esteja longe o tempo que a pedagogia se

envergonhe do próprio conceito de “criança com defeito”. O surdo

falante e o trabalhador cego participantes da vida geral em toda sua

plenitude, não sentirão sua deficiência e não darão motivo para que

outros se sintam. Está “em nossas mãos” o desaparecimento das

condições sociais de existência destes defeitos, ainda que o cego

continue sendo cego e o surdo continue sendo suro. (VYGOTSKY,

1989, p.61).

A educação para ser realmente inclusiva, deve levar em conta os desejos dos

alunos e não os rótulos deles; suas potencialidades, qualidades e capacidades e não

somente suas dificuldades. Sendo que dessa forma, não beneficia só o aluno incluído,

mas todos que com ele estabelecerem interações. Precisamos mais do que de uma

‘escola’ inclusiva, precisamos de um mundo inclusivo.

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4. SISTEMA BRAILLE

O Sistema Braille é utilizado na leitura e na escrita por pessoas cegas de todo o

mundo. Foi inventado pelo jovem cego Louis Braille (1809 – 1852), na França,

reconhecendo-se o ano de 1825 como o marco da mais importante conquista dos

deficientes visuais no âmbito da educação e a integração na sociedade.

Antes do reconhecimento desse invento, registram-se várias tentativas em

diversos países, para que encontrassem formas que proporcionassem às pessoas cegas

condições de ler e escrever. Dentre essas tentativas, destaca-se o processo de

representação dos caracteres comuns em alto relevo, adaptado pelo francês Valentin

Hauy, fundador da primeira escola para cegos no mundo, em 1784, na cidade de Paris,

denominada Instituto Real dos Jovens Cegos. Foi nesta escola, que os estudantes cegos

tinham acesso apenas à leitura, pois ainda não existia recursos que permitissem que

pessoas cegas comunicassem através da escrita individual.

Louis Braille teve o conhecimento da sonografia ou código militar, desenvolvida

pelo oficial do exército francês Charles Barbier. O invento tinha como objetivo

possibilitar a comunicação noturna entre oficiais na guerra. Era baseado em pontos

salientes e linhas, compreendendo ao todo doze sinais que representavam sílabas da

língua francesa. O invento não obteve êxito. Sendo assim, Barbier apresentou seu

“sistema” ao Instituto Real dos Jovens Cegos para que pudessem experimentá-lo. E foi

esta invenção que teve como base para criação do Sistema Braille, o que facilitou a vida

dos deficientes visuais, podendo ser aplicável tanto para leitura quanto para escrita.

O Sistema Braille, é constituído por 63 sinais obtidos pela combinação metódica

de seis pontos que se agrupam em duas colunas justapostas e verticais de três pontos

cada. São empregados em diversos idiomas em textos literários, adaptados para o

devido alfabeto, bem como nas simbologias matemáticas e científicas, como também na

música e na informática.

A partir da invenção do Sistema Braille, em 1825, seu autor desenvolveu estudos

que resultaram, em 1837, na proposta que definiu a estrutura básica do sistema, ainda

hoje utilizada mundialmente. Comprovadamente, o Sistema Braille teve plena aceitação

por parte das pessoas cegas.

O Brasil conhece o sistema desde 1854, data da inauguração do Instituto

Benjamin Constant, no Rio de Janeiro, chamado, na época, Imperial Instituto dos

Meninos Cegos. Fundado por D. Pedro II, o instituto já tinha como missão a educação e

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profissionalização das pessoas com deficiência visual. Porém, apenas em 1945

estabeleceu o Sistema Braille oficial no Brasil. O Brasil infelizmente, ainda não possui

uma política desenvolvida na formação de educadores e materiais adaptados para os

deficientes visuais, e tampouco a sociedade está acostumada e consciente da diversidade

e das características da acessibilidade. Até o presente, temos uma formação cultural que

exclui os “diferentes”, ao invés de incluí-los de forma legítima e correta. Mas com

passos lentos esta realidade esta mudando, e no auxílio da formação e informação das

pessoas cegas e de baixa visão destaca-se o trabalho conjunto da Fundação Dorina

Nowill para Cegos e do Instituto Benjamin Constant, através de seus especialistas e seus

trabalhos de adaptação, construção e publicações de diversos materiais.

No Japão a oficialização do sistema chamado de 点字 (Tenji) ocorreu no ano de

1887, quando o professor Nobuhachi Konishi da Escola de Cegos entendeu a

importância do Sistema Braille e encorajou seu aluno M. Kuraji Ishikawa à estudar o

Braille. Ishikawa, depois de ter estudado com grandes detalhes a possibilidade de

adaptar o Sistema Braille à Língua Japonesa, criou com êxito seu próprio sistema que

atualmente ainda é usado quase que exclusivamente no ensino do Japão. As diferentes

espécies de caracteres em relevo utilizado inicialmente para educação dos cegos foi uma

revolução nos métodos de escrita e leitura.

O código elaborado por M. Ishikawa para escrita japonesa é uma hábil e concisa

forma do Braille, pois o silabário Kana, que são fonogramas, é constituído de quarenta e

seis sílabas, compostos de sete consoantes e cinco vogais, além dos símbolos de

nasalização, chamados de dakuon e handakuon e diacríticos, e consegue-se representar

todas as sílabas e nasalizações com apenas seis pontos. Sendo que, cada vogal é

representada pela combinação dos pontos 1, 2 e 4, e cada consoante é formada pelos

pontos 3, 5 e 6 combinados adequadamente. A característica interessante é que essas

combinações consoantes-vogais são feitas no interior de uma mesma célula, em que

cada sílaba exprime um caractere único.

Esta construção sintética dos caracteres silábicos facilitou sem dúvida tanto a

vida dos professores quantos dos alunos cegos no Japão, que mesmo com a

peculiaridade da escrita nipônica criaram uma situação particular e adaptaram o Sistema

Braille de acordo com suas necessidades e esta simbologia está em vigor até os dias

atuais, com trabalhos muito mais desenvolvidos do que no Brasil e com uma sociedade

culturalmente mais acessível.

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5. SOFTWARES LEITORES DE TELA

Um leitor de tela é um programa que, juntamente com o Sistema Operacional do

Computador, captura todas as informações apresentadas na forma de texto e a

transforma em uma resposta falada utilizando um sintetizador de voz. Deste modo, o

usuário pode ouvir o que está sendo mostrado, conforme utiliza os comandos do

programa. Existem diversos leitores de telas, sejam eles livres e gratuitos, ou pagos para

o sistema Windows ou Linux. Os principais leitores de tela são:

5.1 Dosvox

O Projeto DOSVOX surgiu a partir das dificuldades enfrentadas por Marcelo

Pimentel, aluno cego do Curso de Informática da UFRJ. Foi criado em 1993,

coordenado pelo Professor José Antonio Borges e elaborado por uma equipe do Núcleo

de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (NCE/UFRJ). O

Dosvox é um sistema operacional microcomputadores PC, compatível com o sistema

operacional Windows, que realiza a comunicação entre o computador e o usuário por

meio de um sintetizador de voz (humana) em português, mas por ser uma síntese de

textos pode ser configurada para outros idiomas, que proporciona a independência nos

estudos, no trabalho e na vida cotidiana dos deficientes visuais.

Composto por 80 programas como: editor de textos (Edivox), navegador textual

de internet (Webvox), calculadora (calcuvox), agenda de telefones (televox),

gerenciador de tarefas (clockvox), ampliador de telas para pessoas com baixa visão,

controlador de apresentações com feedback sonoro (pptvox), jogos,

impressor/formatador para Braille, entre outros.

5.2 Linvox.

Projeto de utilização do sistema Dosvox para o sistema operacional Linux

(baseado na distribuição Kurumin).

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5.3 Jaws - Job Access With Speech

É considerado pelos usuários um dos melhores softwares leitores de tela pagos

atualmente. Foi desenvolvido pela empresa norte-americana Freedom Scientific.

A primeira versão foi criada em 1989 para o sistema operacional MS-DOS e a

cada ano é lançado uma nova versão, sendo que, desde 1995 utiliza o sistema

operacional Windows.

É muito popular entre as pessoas deficientes visuais por conta da facilidade no

uso e da acessibilidade aos aplicativos do computador. Além da leitura da tela ser

completa e por possuir tradução para mais de trinta idiomas, inclusive o português do

Brasil.

5.4 Virtual Vision.

É um programa leitor de telas brasileiro, produzido pela Micropower em 1998 e

utilizado em computadores com sistema operacional Windows. O Virtual Vision possui

um sintetizador de voz em português e é o único software desenvolvido no Brasil que

permite aos usuários utilizarem aplicativos Office e navegar pela internet (reconhece

Word, Excel, Internet Explorer, Outlook, MSN, Skype, entre outros). E se destaca pela

alta qualidade devido ao modelo gráfico que possui.

5.5 NVDA - No-Visual Desktop Acess.

O NVDA é um software leitor de telas de código-fonte aberto e gratuito para

sistema operacional Microsoft Windows XP, Vista e 7. Criado em 2007 pelo australiano

Michael Curran, em conjunto com Organização NV Acess e Mozilla Fundation. Este

tem a vantagem que além da versão para instalação no computador, possui a mesma

versão pronta para ser executada diretamente através de dispositivos externos (pendrive).

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5.6 Orca.

Projeto elaborado pelo Programa de Acessibilidade da Sun Microsystems Inc.

Utiliza o sistema operacional Linux com a plataforma gráfica Gnome. Orca combina o

Sistema Braille, narração e ampliador de tela, formando um leitor de tela eficiente.

5.7 Window-Eyes.

Software leitor de tela lançado em 1995 pela empresa norte-americana GW

Micro, e utiliza sistema operacional Windows e seus aplicativos. Atualmente encontra-

se em sua versão 6.1.

Existem ainda outros leitores de tela, porém menos divulgados. Como: Window

Bridge, Nitrous Voice Flux, IBM Via Voice, Yeosoft Text, Pocket Voice, Home Page

Reader (HPR), Yondekoko, que é um ledor de telas japonês.

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6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Para estabelecer uma análise consistente a respeito do ensino de língua

estrangeira para deficientes visuais procurei, antes de mais nada, buscar apoio nos

conhecimentos da Literatura Científica Formal. Foram levantadas informações sobre o

ensino de língua estrangeira além dos conceitos relacionados as deficiências e suas

implicações propriamente ditas.

Após esse exame inicial optou-se por explorar aprofundadamente os

princípios e considerações da Lingüística Aplicada, de forma a esclarecer as relações de

uso corrente de idiomas estrangeiros, abrangendo nesse caso a LJ, especificamente.

Além disso, a teoria sócio-interacionista de Vygotsky também foi

amplamente requisitada para entender o processo de desenvolvimento cognitivo dos

indivíduos e assim argumentar a favor do ponto de vista de que a inclusão é a forma

mais racional e humana de ensino para qualquer pessoa, mas sobretudo para os

deficientes.

6.1 Visão da Lingüística Aplicada do Tema

A Lingüística Aplicada (LA) até alcançar o renome que tem hoje, passou por

caminhos “complicados”. Em sua origem, a LA está relacionada ao enfoque dado ao

ensino de línguas, pois foi nos Estados Unidos e na Europa durante e após a Segunda

Guerra Mundial que começou o interesse e a preocupação científica para com a

pedagogia e o ensino de línguas; surgindo a partir de então o debate sobre as questões

do uso da linguagem, sendo então possível a teorização e a conseqüente melhoria da

prática concernente aos estudos lingüísticos.

A pesquisa em LA privilegia as relações entre a ação humana e os processos de

uso de linguagem, ou seja, a interação de atores sociais (usuários da linguagem: falantes,

ouvintes, leitores, escritores e tradutores) em um determinado contexto e os problemas

da prática de uso da linguagem com que se defrontam.

Atualmente, entende-se LA como uma área de investigação

interdisciplinar que se centra na resolução de problemas da prática de

uso da linguagem dentro e fora da sala de aula (cf. AILA 15, 1992:

Cavalcanti, 1986; Moita Lopes, 1991) ou seja, uma visão que traz

implícita a preocupação com problemas de uso da linguagem situados

e contextos da práxis humana. (MOITA LOPES, 1996).

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A lingüística aplicada desenvolve um importante papel no processo citado, já

que, tem uma participação direta no ensino de língua estrangeira e conseqüentemente

inserido em um meio social e real, o que contribui para a elaboração dessa pesquisa e

formalização da mesma. O lingüista aplicado procura solucionar problemas reais e

práticos relacionados ao uso da linguagem e à interação social da linguagem.

Segundo Celani (2000), a contribuição da LA na área de ensino/aprendizagem

de línguas é vasta e direta. Para a autora, assim como para outros estudiosos da área, a

Lingüística Aplicada não aplica apenas as teorias da Lingüística que descreve e analisa

a língua como código, mas sim na utilização da linguagem, a importância da interação

social e também teorizando os resultados destas relações. Como numa subdivisão, a LA

apresenta um grande apoio ao ensino de língua estrangeira, sendo esta uma subárea

predominantemente forte, priorizando a investigação inter e multidisciplinar dos

contextos comunicativos e também sócio-educacionais.

Por outro lado, é também particularmente relevante a contribuição

das pesquisas no que se refere à função social da aprendizagem de

uma língua estrangeira e à importância de se manter uma posição

crítica em relação à hegemonia de determinados momentos históricos.

(CELANI, 2000).

Por estarem diretamente empenhados na solução de problemas

humanos que derivam dos vários usos da linguagem, os lingüistas

aplicados estão envolvidos em trabalho que tem uma dimensão

essencialmente dinâmica. Os lingüistas, por sua parte, no empenho de

resolver problemas lingüísticos, relacionados com algum dos

subsistemas da linguagem, que podem ser tornados estáticos, podem

encontrar-se isolados das variáveis complexas que afetam o

comportamento humano. (idem, ibid.).

Pode-se aceitar que as línguas estão relacionadas a processos de contextos reais

do uso lingüístico. Isto evidencia a relevância das relações sociais, inseridas em um

contexto cultural, que levam em consideração as experiências vivenciadas pelos seres

humanos.

Moita Lopes (1996) faz um levantamento de diversas naturezas de LA,

entre elas, uma como a interdisciplinar e mediadora da LA, e afirma: a

LA tem como uma das suas tarefas no percurso de uma investigação

mediar entre o conhecimento teórico advindo de várias disciplinas

(por exemplo, psicologia, educação, lingüística etc.). Resumindo a

característica interdisciplinar é “empréstimo” de duas ou mais

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disciplinas, principalmente, da lingüística, psicologia e educação.

(MUKAI, 2007, p.167).

A lingüística aplicada apresenta uma importante participação no ensino de

línguas estrangeiras e mais que isso, no seu uso prático, a sua abordagem e o

envolvimento da linguagem com a cultura e os meios sociais que cercam seus falantes e

aprendizes.

A proposta de ensino de língua estrangeira, para deficientes visuais

promove tanto a inclusão social como a lingüística, visto que estamos

inseridos em um mundo globalizado, em que é necessário o domínio

desta língua para lidarmos com as situações cotidianas.

Desta forma, os alunos cegos e com baixa visão não devem ser

privados do aprendizado de um novo idioma, dado que a sua

deficiência não afeta de maneira alguma o proceder do aprendizado.

Sendo a língua um fenômeno oral e a escrita decorrência da fala, um

deficiente visual não apresenta limitações num curso que enfatize a

“Comunicação Oral”. (NOGUEIRA, 2008).

Diante da conceitualização do papel da LA, a pesquisa se fundamentaliza em

alguns autores que mostram a importância do estudo de Lingüística Aplicada e no

ensino de Língua Japonesa (LJ), mediante a realidade social dos envolvidos.

Meu interesse por esse tema de pesquisa se deve também ao fato de observar que

a pessoa com alguma deficiência muitas vezes é discriminada e excluída por precisarem

de algumas adaptações para o acesso pleno na sociedade, mas é uma pessoa como

qualquer outra, com suas aptidões, habilidades, dificuldades, interesses, capacidades…

necessitando apenas da oportunidade para desenvolver suas potencialidades

A Lei de Diretrizes e Bases (LDB 9394/96) reservou o capítulo V à

Educação Especial, incluindo também alguns artigos no decorrer da

lei, onde é assegurada a inclusão aos alunos com necessidades

especiais de forma justa, gratuita, com apoio especializado, viável, e

exigindo que a sociedade se envolva e que o governo adote uma

política educacional específica, voltada às minorias, para que estas

possam ter suas diferenças respeitadas e reconhecidas. Assim, é

necessário implementar diversas ações e políticas, simultâneas, pelos

órgãos administrativos, pelas escolas e pela comunidade; sendo

necessária, uma mudança radical na estruturação dos cursos

universitários, fazendo valer no currículo dos cursos afins, o

conhecimento do sujeito, pois esse sujeito também constrói, produz e

transforma a sociedade. (GALVÃO, 2007).

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Mesmo a legislação brasileira e a LDB citarem sobre a educação especial, ela de

fato não anda acontecendo como deveria, e é nosso dever como professores,

pesquisadores e mediadores da educação compreender o processo e facilitá-lo, e auxiliar

os deficientes visuais na aquisição da Língua Estrangeira, mantendo uma posição crítica

a respeito desse campo de ensino.

Por meio desta pesquisa, busco apresentar possíveis formas para que o DV tenha

acessibilidade ao ensino da língua japonesa e o que poderia ser feito para facilitar uma

plena realização do seu curso de graduação. Infelizmente não existem muitas

pesquisas relacionadas ao ensino de LE para deficientes visuais, poucos estudos foram

feitos sobre o assunto, apesar da sua importância; e não ter encontrado nenhum

trabalho direcionado ao ensino de Língua Japonesa para DV, o projeto partiria mais

para a prática, para a observação e os instrumentos de coleta de dados. Os estudo da

Língua Japonesa precisa se consolidar mais, tornar-se mais crítica e investigativa, pois

mesmo no Brasil os estudos sobre LJ terem começado na mesma época que os em LA,

pouco foi desenvolvido na área em termos pedagógicos e políticos.

Como lembra Mukai (2007), dentro desse contexto, é indispensável a realização

de um treinamento de professores não apenas para formandos, mas também para

aqueles que já atuam no ensino de LJ. Precisa-se, também, da pesquisa metodológico-

acadêmica voltada para este tema, pois os docentes ainda estão resistentes as

mudanças.

Sendo assim, são necessárias, e com urgência, estudos e pesquisas que buscam

uma solução para a classe inclusiva de alunos deficientes em ensino de japonês,

buscando como base a abordagem metodológica, científico-acadêmico e social,

baseando em estudos da lingüística aplicada e da pedagogia sócio-interacionista.

Pois como lembra Vygotsky:

É lamentável, todavia, que ‘o pensamento científico’ ainda não abriu

uma brecha no muro existente entre a teoria da educação da criança

normal e da anormal. (VYGOTSKY, 1989, p.67).

6.2 Vygotsky e a Educação Especial

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O eixo norteador deste projeto baseia-se nos estudos sobre a teoria sócio-

interacionista de Vygotsky, a partir da fundamentação do princípio da inclusão enquanto

fio condutor do processo educacional de pessoas com deficiência.

Estamos vivendo em uma época onde buscamos nas teorias de alguns autores

argumentos e respostas fundamentalizados em estudos científicos que explicam os

nossos questionamentos e que possam acontecer mudanças em algumas áreas do

conhecimento. A educação de deficientes é um desses questionamentos e que encontra

na psicopedagogia, e mais especificamente em Vygotsky um suporte para a mudança.

As idéias de Vygotsky, mesmo 70 anos após seus estudos e escritos serem

concluídos, ainda são atuais e fornecem base para uma abordagem relevante para que se

compreenda questões atuais relativas à prática da educação especial e inclusiva, visto

que o autor focalizou o desenvolvimento do deficientes a partir dos mesmo pressupostos

gerais que orientavam a concepção do desenvolvimento de pessoas consideradas

normais; destacando os diversos aspectos qualitativos desses indivíduos, em virtude,

não apenas de suas diferenças orgânicas, mas das peculiaridades de suas relações sociais

– fatores estes que fazem com que a pessoa com deficiência seja, não simplesmente

menos desenvolvido em determinados aspectos que seus companheiros, mas um sujeito

que se desenvolve de uma outra maneira.

Quanto à sua importância no processo de ensino-aprendizagem

Vygotsky, afirmou que as investigações psicológicas relacionadas

com o problema do ensino se limitaram comumente a estabelecer o

nível de desenvolvimento. (VALDÉS, 2002).

De acordo com que Vygotsky pregava as pessoas com deficiência podem se

beneficiar do processo de aprendizagem assim como as demais. No entanto, precisam

ser estimuladas de maneira correta, desde cedo, onde o ambiente educacional deve ser

receptivo, utilizando-se de recursos educacionais adequados para que ela possa

assimilar os conhecimentos.

Lev Vygotsky, em sua teoria relacionada à educação, abriu novas perspectivas,

redefinindo o papel da escola e do trabalho pedagógico com as pessoas deficientes.

Afirmava que a aprendizagem é essencialmente social e as funções psicológicas (e

educacionais) do ser humano são constituídas nas apropriações de habilidades e

conhecimentos socialmente disponíveis.

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No livro Fundamentos de Defectologia (1989) o autor apontou as dificuldades,

peculiaridades e características do desenvolvimento e como as situações sócio-

educacionais, auxiliam as pessoas chamadas por ele de “anormais” ou com defeito.

Vygotsky, como se pode notar, não mascarava a dificuldade das pessoas com

deficiência através de analogias, inclusive se for considerado a época que a obra foi

escrita, os deficientes ainda passavam por um processo de rotulação e viviam

segregados na sociedade, porém em seus textos se faz presente a responsabilidade com

o desenvolvimento real de todos os indivíduos, independentes da sua condição.

Nesse livro mostra que os métodos para avaliar um deficiente são

completamente quantitativos, uma vez que se avalia e analisa o “defeito” da pessoa e

não suas potencialidades e sua personalidade. No entanto, deveria avaliar o

desenvolvimento dessas pessoas através de uma ótica de desenvolvimento especial,

onde são desenvolvidas de modo diferente, e não que são menos desenvolvidas. O autor

considera a defectologia como um problema social.

A procura de um método torna-se um dos problemas mais importantes

de todo o empreendimento para a compreensão das formas

caracteristicamente humanas de atividade psicológica. Neste caso, o

método é, ao mesmo tempo, pré-requisito e produto, o instrumento e o

resultado. (VYGOTSKY, 1991).

A criação de novos métodos, adequados às novas maneiras de se

colocar os problemas, requer muito mais do que uma simples

modificação do método previamente aceito. (idem, ibid.).

Como Beyer (2005) lembra, para Vygotsky, o ser humano deveria antes ser

reconhecido como detentor de uma identidade única, que anularia as relações binárias

do tipo normal/anormal, mais inteligente/menos inteligente, melhor/pior, etc.

A deficiência é considerada um desvio do tipo humano biológico já pré-

estabelecido e dito normal. Segundo Vygotsky, a deficiência cria barreiras diferentes

para o desenvolvimento orgânico e para o desenvolvimento cultural. Para tanto, são

criados métodos especiais para que ocorra o desenvolvimento cultural da pessoa com

deficiência, exemplo disso são os cegos que têm um alfabeto e símbolos que são

utilizados através do tato. Estas adaptações especiais são feitas para o alcanço de

superações.

Vygotsky defendia que a educação para a pessoa surda, assim como para o cego

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e o deficiente mental, deve ser a mesma utilizada para a criança sem deficiência, porém

ressaltava que as mudanças devem ocorrer inicialmente na família e serem ampliadas

para o contexto escolar e social. Essa criança deve ter o mesmo tratamento como se não

fora deficiente, sem piedade e sem privações de experiências. Considerando que é

importante uma educação especial para as pessoas com deficiência, mas não é

necessário que se exclua a pessoa em uma escola especial. Já que, de acordo com ele,

esses locais vivem em função do “defeito” e das adaptações dos indivíduos e fazem uma

ruptura com a realidade, sendo assim não devemos nos conformar apenas com as

instituições de ensino especiais, mas sim com as inclusivas. A educação especial não

potencializa a criança com deficiência, porque é uma educação voltada para as

diferenças, que não visa uma inclusão e nem visa vencer a dificuldade, e sim, adaptar-se

a ela.

Vygotsky sempre procurou uma abordagem que abrangesse e que possibilitasse

a descrição e a explicação das funções psicológicas superiores, em termos aceitáveis

para as ciências naturais, sendo um dos precursores das transformações na educação

especial por formular idéias relacionadas com a normalização, integração e a Pedagogia

Especial como parte da educação regular. Por conseguinte, passou a ver o homem e a

deficiência de uma nova forma, enfocando no processo de desenvolvimento sendo a

esfera social imprescindível para a constituição da pessoa.

Vygotsky sempre combateu uma proposta de formação de grupos com

igualdade nos perfis, isto é, grupos com tendência a se

homogeneizarem a partir particularmente dos critérios de condição

intelectual e de desempenho acadêmico. Para ele, seria através dos

variados contornos individuais de cada criança que as trocas

psicossociais se tornariam enriquecedoras e contribuiriam para o

crescimento de cada um no grupo. (BEYER, 2005).

Além de olhar criticamente para o ‘problema’, Vygotsky aborda as formas como

essa educação inclusiva deveria se comportar. Destacando na maneira própria e peculiar

com que o deficiente se desenvolve, não a desmerecendo; concentrando nas habilidades

das pessoas deficientes, estimulando o aluno e não focalizando nas suas limitações e

carências; dando importância as interações sociais.

Através da inserção na cultura e da participação no processo de

construção histórica, a criança portadora de deficiência assimila as

formas sociais de atuação, as internaliza e interage como sujeito

histórico. (VYGOTSKY, 1989).

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A premissa básica da qual Vygotsky parte e na qual se apóia encontra-se no

cerne da sua teoria sócio-interacionista, sendo assim, não apoiou uma educação de

segregação, onde os diferentes devem ficar isolados, já que, em uma visão geral, a

tendência é acreditar que estes teriam as mesmas dificuldades e por isso se adaptariam

mais facilmente a um ambiente de iguais. Se opondo a essa crença, Vygotsky afirmava

que as crianças “anormais” devem interagir com crianças “normais”; pois a

sociabilidade é um jeito de não se adaptar à deficiência, mas sim, de desenvolver

habilidades diferentes. A escola deve prezar a inserção social e continuar buscando

formas de não alienar os deficientes. Para ele, a criança cujo desenvolvimento se há

complicado por um defeito, não é simplesmente menos desenvolvida que seus

coetâneos normais, é uma criança desenvolvida de outra forma e os mecanismos de

desenvolvimento são dependentes dos processos de aprendizagem. (VYGOTSKY,

1989)

Ainda se propõe a ensinar a simbologia própria mantendo a unidade

absoluta dos conteúdos da instrução, cria a separação sistemática do

meio social, isola o cego e o situa num mundo estreito e fechado, onde

tudo está adaptado ao defeito, onde tudo está calculado para ele, onde

tudo recorda o defeito. Este meio artificial não tem nada em comum

com o mundo normal em que viver o cego. (VALDÉS, 2002).

Alguns dos principais conceitos vygotskyanos, com implicação para o projeto de

educação inclusiva como sugere Duarte (2001) e Beyer (2005) são:

1. Primeiramente, o conceito de “deficiência” em Vygotsky. Ele não propunha

uma definição que partisse de critérios comparativos ou normativos. Rompia com um

conceito que significasse definir alguém pelo que teria a mais ou a menos em relação a

um parâmetro normativo médio da população. Com isto se acabaria por praticar

exclusões, pois os que se afastassem da média estariam automaticamente sendo

definidos como sub-cidadãos (ou super-cidadãos). Para Vygotsky, o ser humano deveria

antes ser reconhecido como detentor de uma identidade única, que anularia as relações

binárias do tipo normal/anormal, mais inteligente/menos inteligente, melhor/pior, etc.

2. O conceito da compensação ou supercompensação foi considerado por

Vygotsky a partir do conceito adleriano (Alfred Adler, psiquiatra austríaco e aluno de

Freud) de compensação. É importante afirmar que Vygotsky extrapolou teoricamente

este conceito, não se atendo às categorias psicanalíticas ou neopsicanalíticas, porém

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considerando-o a partir das categorias sócio-históricas. Em relação à postura de Adler,

Vygotsky criticou sua interpretação subjetivista (ou, como denominou, metafísica) do

conceito de compensação, e destacou as relações sociais do conceito, em que compensar

significaria o confronto do sujeito com a realidade social e sua inserção e realização

social (ou não). Ele entendia que a pessoa teria condições de superação das limitações

decorrentes da deficiência não por meio da compensação orgânica, porém através da

inclusão social. Afirmava que o problema da deficiência se definiria através da sua

solução (ou capitulação) social, por meio de processos de inserção e superação social

(inclusão na escola, no trabalho, na família, etc.). Esta inclusão teria conseqüências

diretas na auto-estima da pessoa com necessidades especiais. Podemos concluir que

neste conceito encontra-se uma definição de compensação psicossocial e não

estritamente orgânica ou psíquica da deficiência.

3. Outro aspecto de considerável importância no pensamento de Vygotsky,

constituem suas elaborações a respeito da avaliação das condições de desempenho

intelectual da criança.

4. Outro importante conceito, central no arcabouço teórico vygotskyano,

constituía-se na necessidade da mediação semiótica (ou instrumental, no sentido do uso

dos recursos culturais – do qual a linguagem seria o principal – do grupo social) no

desenvolvimento infantil. Vygotsky sempre entendeu que o desenvolvimento humano

seria um vetor resultante de duas principais linhas genéticas, a biológica, por um lado, e

a social, por outro.

Para Vygotsky (1991), na interação social, as relações do sujeito versus outros

(pais, irmãos, colegas, professores) são essenciais para o seu aprendizado e

desenvolvimento. Isto é, tudo o que a criança aprende em suas relações sociais será

elaborado e incorporado por ela, transformando seu modo de agir e pensar

Qualquer defeito, seja a cegueira, a surdez, ou a deficiência mental

inata... influem, sobretudo, nas relações com as pessoas. Também na

família, a criança cega, surda é, antes de tudo, uma criança peculiar e

se lhe oferece um trato exclusivo, inabitual. Distinto ao que se lhe dá

aos outros, e isto não só ocorre nas famílias na quais essa criança é

considerada uma carga pesada e um castigo como também quando é

rodeada de um amor duplicado ou uma atenção superprotetora que a

separa dos demais. Isto evidencia, diz, tanto as confissões reflexivas

dos próprios cegos e surdos, como a observação cotidiana, muito

simples, da vida das crianças com defeito e os dados de análise

científica e psicológica. (VYGOTSKY, 1989, p.53).

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Pode-se concluir que Lev Semiónovich Vygotsky foi um dos precursores, que

por volta da década de 20 do século passado, já propunha explicações

fundamentalizadas e soluções para os problemas relativos à deficiência e a educação

especial inclusiva, que estão presentes até hoje, e servem como verdadeiras descobertas

que podem servir de valiosos argumentos para a retórica da mudança tanto do sistema

formal de educação.

Sempre preocupado com os aspectos que envolvem a constituição do sujeito a

partir de suas experiências adquiridas através da interação com o outro. Fazia reflexões

acerca da aprendizagem das pessoas com deficiência. É por conta disso que baseio e

acredito que melhor forma de ensinar pessoas com deficiência é incluindo, não

importando sua necessidade especial, assim como propõe Vygotsky.

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7. METODOLOGIA

A orientação metodológica dessa pesquisa descreve o contexto, os informantes,

os instrumentos de coletas de dados, e os procedimentos para análise, partindo do tipo

adotado de pesquisa.

O tipo de pesquisa utilizada busca descrever e interpretar o comportamento

humano, em um meio social, com padrões culturais, sendo apropriada para esse trabalho.

(WOLCOTT, 1987)

Segundo Nunan (1992) apresenta algumas características da pesquisa

etnográfica, as quais se aplicam nesse estudo: a) a pesquisa será conduzida no contexto

em que os informantes trabalham, b) o pesquisador evitará manipular o fenômeno

investigado, c) o pesquisador, o professor e o aluno estarão envolvidos em colaboração

no processo, 3) uma análise interpretativa será conduzida por parte do pesquisador, e

por fim, f) buscar-se-á uma interação entre as questões levadas na pesquisa, as hipóteses,

a coleta e interação dos dados obtidos a partir da coleta (apud CONCEIÇÃO, 2004)

7.1 Tipo de pesquisa

A pesquisa de cunho interpretativista segundo Moita Lopes (1996), será

etnográfica com estudo de caso; que tem como objetivo focalizar a percepção do

participante e a interação social.

Conforme citações de Martins (2002), estudo de caso é uma categoria de

pesquisa cujo objeto é uma unidade que se analisa profundamente. Pode ser

caracterizado como um estudo de uma entidade bem definida, como um programa, uma

instituição, um sistema educativo, uma pessoa ou uma unidade social. Visa conhecer o

seu “como” e os seus “porquês”, evidenciando a sua unidade e identidade próprias. É

uma investigação que se assume como particularística, debruçando-se sobre uma

situação específica, procurando descobrir o que há nela de mais essencial e

característico.

7.2 Contextualização da pesquisa

Como estudante de Língua e Literatura estrangeira (Japonês), e futura professora,

observei a falta de interesse e informação quanto ao ensino de línguas estrangeiras para

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deficientes visuais. Após alguns anos convivendo com deficientes por meio do

Programa de Apoio à Pessoas com Necessidades Especiais da Universidade de Brasília

(PPNE - UnB), me deparei por várias vezes a dificuldade do acesso à línguas

estrangeiras dos deficientes, e por conta disso me interessei a fazer uma pesquisa a

respeito desse "problema". Diante deste fato, realizei a pesquisa na Universidade de

Brasília – UnB, no primeiro semestre do curso de Língua e Literatura Japonesa com um

aluno deficiente visual. Pela primeira vez, o curso recebe um aluno com cegueira, e por

conta disso, muitas dificuldades foram apresentadas aos professores e ao aluno foi a

respeito destas dificuldades e como elas foram enfrentadas que focalizei o meu projeto.

7.3 Informantes

O informante do estudo foi um aluno do curso de Língua e Literatura Japonesa

da Universidade de Brasília com deficiência visual (cegueira total), além de dois

professores do mesmo, e seus tutores. Com a intenção de compreender como são o

processo ensino-aprendizagem, suas crenças, e suas principais dificuldades.

Disponibilizaram-se a participar voluntariamente da pesquisa.

BACKGROUND

ALUNO: Igor é o aluno pesquisado neste trabalho monográfico. Tem 30 anos e está no

1º semestre do curso de Língua e Literatura Japonesa. Ficou cego há aproximadamente

dez anos devido a complicações derivadas de um tumor no cérebro, e por causa desse

tumor também tem alguns lapsos na memória recente o que em parte atrapalha a sua

memorização do conteúdo dado, apesar de já ter estudado japonês antes de perder a

visão. Ingressou na Universidade através do vestibular. E cursa as disciplinas de

Japonês 1 e Prática de Japonês Oral e Escrito 1 e tem como objetivo ser tradutor.

PROFESSORES:

Aline: A professora Aline tem 61 anos e 34 de profissão. Com o apoio de outros

professores ajudou a criar o curso de Língua e Literatura Japonesa da Universidade de

Brasília, mas apesar da experiência nunca havia dado aula para um aluno deficiente

visual (total) tampouco tido formação adequada para lidar com alunos cegos. Ministra

as aulas de Japonês 1.

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Paulo: O professor Paulo tem 30 anos, destes 6 de profissão. Formado pela UnB

conhece o material didático aplicado e a realidade do curso. Nunca havia trabalhado

com deficientes visuais.

TUTORES:

Ricardo: Aluno também do 1º semestre, é tutor na disciplina de Prática de Japonês Oral

e Escrito 1. Apesar de estar no começo do curso, já tem uma boa bagagem com relação

ao japonês, pois já estuda há alguns anos, e até mesmo dá aulas particulares. Muito

dedicado se interessou pela tutoria devido ao aprendizado além da bolsa que é oferecida.

Ajuda o aluno nos seus exercícios dentro e fora de sala de aula.

Carlos: Aluno do 2º semestre, é tutor da disciplina de Japonês 1. Soube da tutoria

através da professora e acreditou que seria uma oportunidade de conhecer sobre as

deficiências e aprender como lidar com elas. Teve um bom empenho na matéria que é

tutor por isso está sempre atento às instruções da professora e auxilia o aluno nas suas

atividades dentro e fora de sala de aula.

7.4 Procedimentos

1o Passo: Levantamento de material bibliográfico: foram realizadas leituras

relacionadas à deficiência visual; inclusão escolar (com enfoque no ensino superior);

pesquisas de Lingüística Aplicada sobre o ensino de Línguas Estrangeiras, além de

textos que dizem respeito à teoria sócio-interacionista de Vygotsky, em busca de dados

relevantes para pesquisa.

2o Passo: Contato com os sujeitos da pesquisa, fazendo uma breve exposição do

tema a ser abordado e verificar a disponibilidade destes para participarem desta

investigação.

3o Passo: Coleta de Dados: para coletar os dados foram enviados via e-mail para os

informantes os questionários, mas sempre foi mantido contato com os mesmo, e

também foi realizada uma entrevista, agendados dia e horário, de acordo com a

disponibilidade dos sujeitos.

4o Passo: Análise dos dados: foi realizada em três etapas:

a) Levantamento dos significados em cada questionário.

b) Observações de aulas e entrevista.

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c) Reflexões sobre os significados e convergências a partir do referencial teórico.

7.5 Instrumentos de coleta de dados

Para obter uma maior confiabilidade na pesquisa, apresentarei uma triangulação

de dados por meio de diferentes meios de coleta de dados, utilizando, pois, como

instrumentos de coleta de dados: a observação em sala de aula, questionário sócio-

econômico, questionário aberto e escrito, entrevista e notas de campo do pesquisador.

7.5.1 Observação das aulas

O objetivo da observação das aulas foi compreender as formas e os materiais

utilizados em sala para facilitar o aprendizado do aluno deficiente visual, buscando

analisar a influência e contribuição desses materiais, além da abordagem do professor

com o aluno no ensino da língua japonesa. Identificar se o método e a didática adotados

pelo professor são eficazes e proporcionam de forma satisfatória o aprendizado.

7.5.2 Questionário Socioeconômico

O questionário foi aplicado com o intuito de conhecer a realidade e os problemas

sociais enfrentados pelo aluno com deficiência visual e as principais dificuldades

colocadas pelos e aos professores. Além também de levantar dados pessoais para traçar

um perfil do aluno. (cf. apêndices 1 e 2).

7.5.3 Questionário Aberto e Escrito

O questionário escrito teve como objetivo buscar as informações de formação

dos professores, tais como suas adaptações para ensinar o aluno com necessidade

especial, onde explicitarão suas crenças, suas idéias, seus objetivos e suas dificuldades

no ensino-aprendizagem do ensino de japonês, mas de forma aberta para que o

pesquisador não possa influenciar em nenhum aspecto os informantes.

Outro questionário também foi aplicado para o aluno para que explique sua

motivação para fazer Letras- Japonês e suas expectativas para com o curso. (cf.

apêndices 3,4 e 5).

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7.5.4 Entrevista

Este instrumento foi utilizado de forma em que os participantes informaram

sobre suas experiências, as relações entre eles, a metodologia aplicada, o

direcionamento do estudo, e também sobre o material didático (livros adaptados, vídeos,

músicas, conversação). (cf. apêndices 6-13).

7.5.5 Notas de Campo do Pesquisador

As notas de campo me permitiram como pesquisadora, registrar minhas

impressões e reflexões descrevendo os pontos relevantes de acordo com a observação

em sala de aula e dos objetivos da pesquisa, anotando e comentando de forma a analisar

os eventos ocorridos no decorrer da pesquisa. (cf. apêndice 14.).

7.5.6 Procedimentos de Análise de Dados

O primeiro procedimento feito foi o de organização dos dados, posteriormente o

de classificação e codificação. Isto é, formalizar o objetivo da pesquisa, organizar os

dados obtidos por meio dos instrumentos de coleta de dados, depois interpretá-los,

analisá-los e para ter uma maior confiabilidade na pesquisa, voltar uma segunda vez nos

dados para comparar os resultados ou excluir qualquer dúvida ou falha que possa ter

passada na primeira análise, e também a participação efetiva com a minha permanência

como pesquisadora no cenário da pesquisa.

7.6 Contribuição do Estudo

Devido à carência de aprimoramento no corpo docente e no sistema de ensino de

Língua Estrangeira procuro com esse estudo contribuir para uma investigação das

crenças dos professores e alunos especiais, tais como, suas necessidades, suas

expectativas, os principais problemas enfrentados pelos alunos com deficiência visual e

aos seus professores, problematizando a questão do ensino de língua japonesa, buscando

entender e contribuir na realidade do processo de aquisição de língua estrangeira dos

deficientes visuais, pois infelizmente poucos pesquisadores se interessam por esse tema

o que ainda torna insignificativo a inclusão das pessoas com necessidade especiais na

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sociedade principalmente em um âmbito educacional regular. Apontando também como

está sendo observado o papel do aluno deficiente na sociedade.

O presente estudo, contribui ainda, para a conscientização dos profissionais da

educação, especialmente os de ensino de Japonês da importância da implementação de

meios mais acessíveis de ensino, atendendo a todos que se interessam por este idioma e

explorar várias formas de atingir o seu "público alvo", explorando um ambiente

acadêmico-social embasado na teoria sócio-interacionista, ampliando a rede de

informações, para facilitar o acesso à educação de todos. Deve ser tratado de forma

natural, aceitando as limitações dos alunos cegos e adaptando o meio e os materiais.

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8. ANÁLISE DO ENSINO DE JAPONÊS PARA DEFICIENTES VISUAIS

ATRAVÉS DO PRESENTE ESTUDO DE CASO

Considerando os resultados obtidos na apreciação qualitativa dos dados

coletados, fiz uma análise relativa aos objetivos da pesquisa, tecendo algumas

considerações sobre o ensino de japonês para deficientes visuais.

8.1 Análise das dificuldades enfrentadas no processo de ensino/aprendizagem da

língua japonesa

Sendo o primeiro objetivo identificar as dificuldades enfrentadas no processo de

ensino/aprendizagem da Língua Japonesa, pude perceber por meio das observações de

aulas, questionários e entrevistas com os informantes que falta uma formação adequada

aos professores para lidar e para ensinar um aluno cego é o principal problema.

O professor Paulo, por exemplo, quando perguntado o propósito de alguma

instrução a respeito do aluno DV, ou sobre como estavam acontecendo as aulas disse

que:

“só depois que o semestre estava transcorrendo a reunião que teve com o pessoal do

PPNE, deram as instruções básicas, explicaram sobre o funcionamento do PPNE, um

pouco sobre alguns cuidados que tem que ter, em preparar a aula voltando um pouco

pra ele, incluindo ele, foi uma reunião rápida, a gente tava tratando de várias coisas

que estavam acumuladas mas não teve tempo de dá essa orientação. Aí depois disso foi

definido os tutores dele, aí deu uma facilitada, porque no começo foi meio na base da

adivinhação”.

Ou a professora Aline quando questionado sobre as principais dificuldades que

encontrou para ensinar japonês, admitiu que foi :

“Falta de conhecimento sobre como lidar com essa deficiência e traçar objetivo

diferenciado dos demais, sem deixar de promover a inclusão com a turma.”.

Partindo da fala dos professores pode se elucidar que infelizmente o curso ainda

não está preparado para receber alunos deficientes visuais. Tanto que até o presente

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momento não havia feito nenhuma avaliação com o aluno pesquisado na disciplina de

Japonês 1, e os materiais das duas disciplinas só passaram a ser entreguem com

antecedência para que ele pudesse estudar, depois que foram selecionados os tutores;

que acompanham e auxiliam o Igor nas atividades propostas.

Outra dificuldade que analisei foi a insuficiente interação entre a turma e o Igor,

no entanto não pude concluir se este fato ocorre devido a falta de informação e

conhecimento dos alunos para lidar com uma pessoa cega ou se é por causa da

personalidade do aluno estudado e a diferença de idade entre eles.

Não obstante em entrevista feita com o professor Paulo, quando perguntei como

ele via a relação do Igor com o restante da turma, observei que assim como eu, os

professores também sentem essa falta de intercâmbio dele com os colegas. Disse o

professor Paulo:

“eu vejo mais com o tutor que acompanha ele, ele tem mais contato, mas limitado as

coisas de aula, mas não saberia te dizer como é com o restante da turma, [...] mas eu

sinto um pouco ainda que é um pouco distante, falta um pouco mais de proximidade.

Não sei se o pessoal tem alguma dificuldade de se aproximar por conta dele ser cego

ou também porque ele tem um senso de humor que é um muito peculiar...”.

Os tutores também notam essa dificuldade:

“a gente conversa, eu sempre fico do lado dele nas aulas que sou tutor dele, tem que

ponderar de uma maneira diferente devido a sua personalidade, o jeito é entrar no

universo dele, mas ficar sempre nisso a impressão que dá é que ele não vai produzir,

que ele vai ficar na brincadeira, que vai ficar só no Japonês que ele sabe, que ele vai

ficar lá estagnado”.

E o Igor mesmo comenta essa relação elecolegasprofessores em entrevista:

“ eu sempre me dei super bem com meus professores mesmo porquê não deixava surgir

algum probleminha como me considero muito cara de pau, qualquer coisinha que

surgia assim que considerava problema eu dava um jeito de burlar isso com alguma

brincadeirinha minha que nem sempre era bem interpretada. Mas era melhor do que

deixar da forma que tava, aí eu por causa dessas brincadeirinhas, os problemas eram

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deixado de lado. Apesar de já estarmos em julho minha relação com os professores

ainda foi muito pouca não posso dizer que foi suficiente pra dizer, ter alguma opinião

se foi boa ou ruim, mas até agora ta tudo bem... estou sobrevivendo!”

E quanto aos colegas:

“Parece que eu me dou com eles. Até hoje não vi, não percebi nenhuma reclamação,

nada de ruim referente a mim. Nunca ouvi falarem mal de mim. A interação, acho que

sim, mas não é muita interação não, eu sou um cara meio a parte também, sou um tanto

aéreo. Isso é uma característica minha que eu tenho desde que sou garotinho, sou um

tanto aéreo. E inclusive por causa disso, desde o começo desse semestre eu gravo o

áudio das aulas também pra estudar em casa também.”

Sendo assim, notei que a insensibilidade tanto dos professores quanto dos alunos

é a principal “barreira” enfrentada para que o processo de ensino/aprendizagem seja

cumprido com êxito. Nesse cenário, deve-se elucidar sobre a função real do professor e

dos demais alunos, como agentes que colaboram para a formação acadêmica e social de

cada indivíduo.

Outro fator que dificulta o ensino e a aprendizagem são os lapsos de memória do

Igor. Esse “problema” afeta o armazenamento das informações que lhe são passadas.

Ainda não se sabe até que ponto isso afeta no seu aprendizado, pois o nível conteúdo

que está sendo abordado no 1º semestre do curso de Letras-Japonês é inferior ao que o

aluno já tinha aprendido antes de perder a visão.

Essa dúvida também intriga os professores e os tutores, porque, quando

perguntados se esses lapsos influenciavam no ensino ou na aprendizagem do Igor, tanto

os professores quantos tutores têm opiniões análogas. O tutor Ricardo, por exemplo,

disse que:

“a dependência do Igor, você tem que ficar por conta, e a questão de não sentir

progresso, você tá, ajudando tá ajudando e pode ser só impressão, eu nunca cheguei a

perguntar se ele estuda muito em casa, que às vezes é questão da deficiência da

memória dele ele pode até estudar, mas a impressão que dá é que ele não se empenha

tanto que ele fica mais no que sabe. Acho que influência porque na aula de lingüística e

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ele sempre repete a mesma história... não sei se é falta da memória ou falta de estudo,

nunca perguntei se ele estuda muito”.

O tutor Carlos lembra que:

“dentro de sala não tem muita dificuldade, porque ele já estudou japonês antes e fora

de sala é só a questão da memória mesmo porque como eu não tenho contato diário

com ele, às vezes ele esquece, e eu tenho que relembrá-lo e ele esquece de novo”.

E o professor Paulo também tem dúvida sobre até que ponto os lapsos na

memória recente do Igor influenciam o processo de ensino/aprendizagem de LJ, no

entanto ele se questiona a respeito:

“eu acho que um pouco, não sei se na forma de ensinar, mas na forma de relacionar.

Por exemplo: ele manda o mesmo e-mail várias vezes. Mas eu ofereci uma abertura

maior pra ele pra caso tiver alguma dúvida por perguntar fora de aula, mandar e-mail,

esse espaço tá sempre aberto pra ele. Eu acho que pode ser um fator de dificuldade

para ele, não dá pra dizer o conteúdo que ele tem agora é acima do nível que a gente

tem estudado, e não necessitado da memória recente dele ser tão trabalhada pelo

menos na questão de conteúdo. Mas algumas vezes em aula ele se distrai um pouco, eu

acho, ou já teve caso também de ele não lembrar que tinha sido dito que ia fazer

alguma atividade na aula seguinte, mas mesmo não se lembrando o que iria ser feito na

aula seguinte, ele conseguiu fazer a atividade sem problema.”

Porém todas as dúvidas cessam a respeito do assunto quando o próprio Igor

afirma:

“atrasou um pouquinho a memorizar algumas coisas, mas esses lapsos tão se reduzindo

cada vez mais e atualmente eu acho, tenho impressão que nem os tenho mais é muito

raro.”

E quando fala da sua relação com os tutores, relembra seus lapsos de memória:

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“me dou bem com todos eles. Melhorou bastante, inclusive com relação aos lapsos

qualquer coisa eu posso perguntar a eles, qualquer lapso qualquer coisa que eu

esqueço eu posso perguntar a eles que eles me ajudam a lembrar de tudo mais rápido”.

Desta forma, pode-se considerar como outro ponto de dificuldade enfrentado

pelos informantes no processo de ensino/aprendizagem, os lapsos na memória recente

do Igor.

8.2 Análise das expectativas e dos progressos dos participantes da pesquisa

O segundo objetivo era identificar as expectativas e os progressos dos

participantes da pesquisa em relação à Língua Japonesa, e de acordo com o previsto, as

expectativas e os progressos nesse 1º período ainda foram poucos. O aluno pesquisado

foi muito sincero em relação a essas expectativas, dizendo que:

“nem sei se entrei com alguma expectativa, eu só entrei querendo aprender japonês

mesmo, ah sim com relação a que tipo de..., com que trabalharei quando terminar esse

curso né , isso ainda tá uma certa incógnita. Com relação ao curso, não não, tá tudo

como eu tinha imaginado mesmo... que seria.”

Já o professor Paulo tem boas expectativas quanto ao futuro deste aluno no

curso:

“Acho que vai ser difícil, mas creio que não seja impossível. A questão é ele tem que

traçar objetivos, saber que ele pretende, do que ele quer fazer. Ele disse que quer ser

tradutor, então ele tem que ir atrás das ferramentas que ele precisa para fazer isso,

softwares de leitura, ele teria que ter ferramentas técnicas para desenvolver esse

trabalho. E com base nisso, nos próximos semestres, os próximos professores teriam

que fazer um trabalho de adaptação para poder orientar os estudos dele nessa direção.

Mas eu creio que o conteúdo básico que ele vai está estudando aqui é completamente

possível ser estudado, a não ser é claro que esse problema com a memória recente se

mostre um obstáculo maior do que a gente tenha percebido até agora.”

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Percebe-se então que as expectativas não são muito grandiosas, mas existe;

mesmo conscientes de todos os problemas e dificuldades que todos envolvidos no

processo terão. E todos acreditam que foi uma experiência que valeu muito a pena, que

o enriqueceram pessoalmente e profissionalmente.

E quanto aos progressos, esses foram poucos, e continuam a passos lentos. O

progresso mais significativo foi a adaptação, mesmo que tardia do material. E isso só

pode acontecer após a escolha dos tutores, sendo que esta foi feita depois da metade do

semestre; o que atrapalhou muito, tanto o ensino quanto o aprendizado da língua

japonesa.

Entretanto acredito que as coisas ainda podem mudar, porém para que isso

aconteça os professores devem-se preparar previamente. Preparar o material, ter um

treinamento para saber sobre as deficiências e a educação inclusiva, preparar exposições

diferentes do que estavam acostumados, dando mais enfoque para dinâmica oral e aulas

mais inclusivas.

8.3 Análise de métodos mais eficazes para o ensino de japonês para DV

O terceiro e último objetivo proposto na pesquisa era identificar métodos mais

eficazes para o ensino de japonês para DV no Brasil. Diante deste objetivo não se pode

afirmar com certeza quais métodos seriam mais eficazes, visto que o caso tem algumas

particularidades importantes, como os lapsos na memória recente do aluno, a sua

dependência e sua personalidade já que é importante não só conhecer a deficiência, mas

também o lugar que ocupa no sistema da personalidade e como a pessoa domina sua

deficiência. Todavia, acredito que os métodos que pregam uma didática mais oral como

o: Audiolingual, Aprendizado Comunitário e a Abordagem Comunicativa teriam efeitos

mais positivos, pois abordam o uso da língua alvo, a interação entre os alunos e

professores pela conversação, pois Vygotsky (1991, p. 44) afirmava que o

desenvolvimento do pensamento é determinado pela linguagem, isto é, pelos

instrumentos lingüísticos do pensamento e pela experiência sócio-cultural e por fim

apresenta a gramática gradativamente; porque a língua precisa ser vivenciada.

Os professores sentiram a necessidade de mudar sua metodologia de ensino para

se adaptar ao Igor, apesar de não suprir todas as carências de ensino, foram melhorando

ao longo do semestre de acordo com a precisão da turma e para ter a inclusão do aluno

DV.

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A professora Aline cita:

“Todo material escrito em japonês está sendo digitalizado em rômaji para o aluno

poder assimilar o conteúdo. Deixei de usar projetor na aula e dar mais aulas

expositivas. Usei menos os exercícios em grupo com fotos e ilustrações e passei a

usar mais exercícios escritos.”

Abaixo serão apresentados alguns conceitos básicos de cada método para ficar

mais explícito o porquê da escolha, e o porquê que acredito que são os melhores

métodos para serem aplicados em salas de aulas inclusivas e interativas, onde os alunos

falem mais na língua-alvo e que se privilegia a oralidade e o uso prático da língua.

QUADRO 3 – MÉTODOS PARA ENSINO DE LÍNGUA ESTRANGEIRA.

MÉTODO GRAMÁTICA OBJETIVOS AMBIENTE

Audiolingual Ensino da

gramática é

secundário

Baseado em

repetição

(behaviorismo)

Conversas

preferencialmente na

língua alvo

Uso da

linguagem

falada e

compreensão

auditiva

Aprendizado

Comunitário

Ensino da

gramática é

gradual

Interação

entre os

estudantes

Inicialmente não há

correções

Conversas

gravadas

como

feedback para

os alunos

Abordagem

Comunicativa

Gramática

secundária

Uso da língua

em situações

práticas.

Conversas na língua

alvo, intensificação

das experiências

pessoais do aluno

como elemento

importante na

contribuição para

Uso da

oralidade e

interação

entre

estudantes

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aprendizagem em

sala de aula

Sugestopedia Gramática

gradual

Memorização

do

vocabulário

Conteúdo é passado

em etapas, de acordo

com

o interesse

Ambiente

lúdico e

musical

Esses foram os resultados finais diante os objetivos propostos. Sabendo que

ainda não se tem um nível satisfatório de mudanças como se previa, no entanto espero

que isso mude para a melhoria do curso de Língua e Literatura Japonesa da

Universidade de Brasília que deveria ter também um papel na construção intelectual e

humanitária dos seus alunos.

A seguir, encontra-se a sistematização da análise de dados obtidos nos

questionários e nas entrevistas:

QUADRO 4 - CATEGORIZAÇÃO DOS DADOS

PROFESSOR PAULO

Pergunta Resposta Situação que

ilustra a

resposta

Quais as principais

dificuldades que encontrou

para ensinar japonês para um

aluno deficiente visual?

Falta de materiais

Uso de materiais visuais

Inexperiência em trabalhar com este

público-alvo

Dependência dos colegas

“Falta de material

para ensino de

japonês a

deficientes

visuais e minha

própria

inexperiência em

trabalhar com

este público-alvo.

Também

dificultou um

pouco a

indefinição de

tutores enfrentada

inicialmente.

Qual metodologia que utiliza?

Aulas Expositivas “Em geral

expositiva,

entretanto

buscando

incentivar

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interação maior

dos alunos entre

si.”

Quais suas expectativas de dar

aula para um aluno cego?

Boas

Aprendizado do conteúdo

“Tenho

expectativas de

que o aluno

consiga absorver

os conhecimentos

da estrutura da

língua e

expressões

idiomáticas, tanto

na forma oral

quanto escrita...”

Suas aulas sofreram alguma

modificação? Sim

Modificação na apresentação do

conteúdo

“Muitas das

atividades que

eram

desenvolvidas

utilizando

recursos visuais

tiveram que ser

adaptadas [...]

Atividades com

vídeos, por

exemplo, foram

substituídas a

princípio por

outras

atividades”.

Os lapsos da memória recente

do aluno influenciaram no

ensino da Língua Japonesa?

Um pouco

Influenciou também na forma de se

relacionar

“Não sei se na

forma de ensinar,

mas na forma de

relacionar, por

exemplo: ele

manda o mesmo

e-mail várias

vezes. Mas eu

ofereci uma

abertura maior

pra ele caso tiver

alguma dúvida

pode perguntar

fora de aula,

mandar e-mail.”

Como avalia essa

experiência?

Boa experiência

Surpreendente

“Foi uma boa

experiência, [...]

deficiente visual

querendo

aprender japonês

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foi uma novidade

surpresa pra

mim”

PROFESSORA ALINE

Pergunta Resposta Situação que

ilustra a

resposta

Quais as principais

dificuldades que encontrou

para ensinar japonês para um

aluno deficiente visual?

Falta de instrução

Falta de preparo ou experiência para

trabalhar com alunos deficientes visuais

“Falta de

conhecimento

sobre como lidar

com essa

deficiência e

traçar objetivo

diferenciado dos

demais, sem

deixar de

promover a

inclusão com a

turma”.

Qual metodologia que utiliza?

Comunicativo (funcionalismo),

Metodologia Direta,

Metodologia Audiolingual,

Metodologia Audiovisual

“Comunicativo

(funcionalismo),

Metodologia

Direta,

Metodologia

Audio-lingual,

Metodologia

Audio-Visual”

Quais suas expectativas de dar

aula para um aluno cego?

Boas

mas tem dúvidas

“Ainda é uma

incógnita. Não sei

até onde ele

aprendeu no

curso.”

Suas aulas sofreram alguma

modificação? Sim

Metodologia audiovisual menos

utilizada

“Uso menos

metodologia

audiovisual e

mais metodologia

comunicativa.”

Os lapsos da memória recente

do aluno influenciaram no

ensino da Língua Japonesa?

ainda não sabe

“Ainda vou

corrigir as provas

dele”

Como avalia essa experiência? Receber orientação sobre como

trabalhar com esses alunos

“Válida no

sentido de lições

aprendidas, mas,

pela indefinição

do resultado,

apreensiva em

relação ao futuro

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do aluno [...]

creio termos

desenvolvido

relações de

confiança e

respeito mútuo.”

ALUNO PRESQUISADO - IGOR

Pergunta Resposta Situação que

ilustra a

resposta

Quais principais dificuldades?

Deficiência visual

Lapsos na memória recente

Condições financeiras

“É a ausência da visão, somada ao pouco dinheiro disponível [...] e os lapsos na memória atrasou

um pouquinho a

memorizar”

Quais suas expectativas? não tem muitas expectativas

ser tradutor

“Nem sei se

entrei com

alguma

expectativa, eu só

entrei querendo

aprender japonês

mesmo [...]

Pretendo formar-me em Letras Língua Japonesa e trabalhar como

tradutor.”

Depois da escolha dos tutores,

algo mudou no seu

aprendizado?

Sim

Auxílio nas atividades

Digitalização dos materiais

“Melhorou

bastante,

inclusive com

relação aos lapsos

qualquer coisa eu

posso perguntar a

eles ...”

TUTOR RICARDO

Perguntas Resposta Situação que

ilustra a

resposta

Qual motivo o levou a se

candidatar à tutoria

(especialmente para ajudar o

aluno deficiente)?

Experiência nova

Bolsa

Créditos

“pretendo dar

aula de japonês

e trabalhar com

deficiente visual

ia ser uma

experiência

nova e acredito

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que essa

experiência iria

abrir minha

capacidade de

ensino, além

também da

remuneração.”

Como auxilia este aluno?

Tanto em sala de aula quanto

fora da sala de aula.

Dúvidas

Preparação do material

“quando ele tem

dúvida nos

exercício eu

explico o que é

e como é, e fora

de sala, passo

os materiais

com

antecedência

para ele. ”

Quais as principais

dificuldades? Tanto em sala de

aula quanto fora da sala de

aula.

Dependência do aluno

Falta de empenho do Igor

“A dependência

dele. Você tem

que ficar por

conta, e a

questão de não

sentir

progresso, e às

vezes a questão

da deficiência

da memória

dele.”

Quais suas expectativas para

com a tutoria especial e com o

aluno?

Boas

Vale a pena

“Não foi em

vão, eu gostei,

vale muito a

pena mesmo.”

TUTOR CARLOS

Perguntas Resposta Situação que

ilustra a

resposta

Qual motivo o levou a se

candidatar à tutoria

(especialmente para ajudar o

aluno deficiente)?

Busca de conhecimento sobre DV

Bolsa

Créditos

“lidar com

diferentes tipos

de pessoas e

achei

interessante e

tem o lado

financeiro

também e tem

os créditos

também.”

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Como auxilia este aluno?

Tanto em sala de aula quanto

fora da sala de aula.

Dando suporte em sala

Digita os exercícios

“Assisto às

aulas com ele,

mas no mais

dou um suporte

fora: digito os

exercícios.”

Quais as principais

dificuldades? Tanto em sala de

aula quanto fora da sala de

aula.

Lapsos na memória

“Dentro de sala

não tem muita

dificuldade,

como ele fez

japonês antes já

tem muita coisa

que ele já sabe.

E fora de sala

só tem a

questão da

memória”

Quais suas expectativas para

com a tutoria especial e com o

aluno?

Vale a pena

Boas expectativas

“Vale a pena

sim, [...] no

curso agora tá

tranqüilo depois

eu acho que

complica, não

pela visão, mas

pela questão da

memória, é

muita

informação de

uma vez não sei

se ele vai

conseguir

assimilar e tem

muita coisa

visual.

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9. Considerações Finais

Como se dá o aprendizado deste aluno na Língua Japonesa?

Qual o melhor método para ensino de japonês para deficientes visuais?

Quais são as principais dificuldades enfrentadas para o ensino e a aprendizagem do

nível básico de LJ pelo aluno pesquisado?

Para responder as questões inicias desta pesquisa que foram retomadas acima,

baseei-me na análise dos dados que foram coletados ao longo da pesquisa e nas teorias

estudadas e discutidas.

Ainda não se pode avaliar de fato, como ocorre o aprendizado de LJ pelo aluno

estudado, já que o conteúdo abordado no 1º semestre do curso já era do seu

conhecimento por ter estudado japonês antes de perder a visão. Mas vejo que foi um

nível satisfatório apesar das dificuldades enfrentadas pela falta de material e os lapsos

da memória recente do aluno em questão.

Quanto ao melhor método a ser aplicado para o ensino de japonês para DVs não

se pode afirmar com certeza qual seria o mais eficaz, porém, acredito que um conjunto

de aplicações que se baseiam nos métodos: audiolingual, aprendizado comunitário,

abordagem comunicativa, abordagem nocional-funcional e algumas didáticas abordadas

pela sugestopedia, já que esses métodos privilegiam uma maneira no ensino de línguas

que prima pela interação entre os falantes (alunos e professores), pelo uso da língua-

alvo e focaliza no sentido, nas funções e intenções lingüísticas do aprendiz. Em que a

gramática é apresentada gradualmente e de forma espontânea e o professor age como

coordenador e facilitador da aprendizagem, preparando materiais e circunstâncias que

os alunos possam trocar informações mutuamente e pensando no idioma ensinado e

transmitindo suas idéias com atividades colaborativas.

Para finalizar e responder a terceira questão da pesquisa me apoiei nas teorias

relativas à educação inclusiva na perspectiva de Vygotsky, além das análises feitas dos

instrumentos de coleta de dados. Visto que foram várias as dificuldades para o ensino e

a aprendizagem do nível básico de LJ pelo aluno, começando pelo fato do aluno ainda

demonstrar uma dependência grande de outras pessoas, seja para se locomover na

universidade seja para explicar as atividades e matérias sempre para ele. Além da sua

desorganização com os materiais, talvez em parte por conta dos lapsos na memória

recente que tem. Sendo este último fator um ponto que desencadeia outras questões,

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pois não foi possível avaliar até que grau esse comprometimento na memória influencia

o ensino, por parte dos professores, e o aprendizado, por parte do aluno pesquisado.

Outro fator de complicação poderia ser a falta de proximidade do aluno com

seus colegas, já que, na educação inclusiva privilegia-se a interação entre os estudantes,

como Vygotsky mesmo cita na sua teoria sócio-interacionista. Isso, na verdade não

ocorre no âmbito pesquisado. Contudo, não se pode afirmar qual seria a razão para tal

acontecimento; se seria a falta de “tato” e informação dos alunos para lidar com um DV,

se seria pela diferença de idade entre eles, ou mais que tudo isso, se seria pela própria

personalidade singular e por vezes peculiar de Igor. O fato é que não acontece um

intercâmbio de informação, e ao contrário as pessoas se sentem incomodadas e

impacientes com a presença de um aluno cego em sala de aula.

Outro determinante nas dificuldades para o ensino de japonês seria a falta de

estrutura do curso e de material apropriado para um aluno deficiente visual. A princípio

ainda não seria possível o uso do Braille, pois tanto o aluno quanto os professores não

estão habilitados para trabalhar com o Sistema Braille Japonês embora seja muito

importante o conhecimento deste alfabeto para as aplicações de atividades e a

independência do aluno. Mas seria possível a digitalização do material completo do

curso para que possa ser acessível e utilizado através de um software leitor de tela.

Mas acredito que a maior das dificuldades enfrentadas seria mesmo a falta de

instrução, formação e conhecimento dos professores a respeito da deficiência visual.

Infelizmente não se tem pesquisado em torno deste tema na área de Língua Japonesa no

Brasil.

Investir na formação do professor é importante. Nessa formação, precisam ser

incluídas questões que auxiliem o professor a modificar as suas concepções acerca do

desenvolvimento e aprendizagem dos alunos. Além do conhecimento e treino no uso de

técnicas e recursos, é necessário o professor conhecer todo o mecanismo de relações

interpessoais e sociais presentes em situação de ensino-aprendizagem e as influências

que estas podem sofrer. Mas se eles não quiserem mudar as suas práticas

estigmatizadoras, não mudarão.

Podemos como tantos outros, sonhar, defender uma utopia, estabelecer metas que

signifiquem a gradativa transformação de educadores, escolas, famílias e alunos em

sujeitos ativos, participantes, criativos no processo de inclusão de alunos com

deficiência no sistema regular de ensino.

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Esse assunto faz refletir ainda sobre a atual situação em que se encontra o aluno

com deficiência visual no Ensino Superior, os relatos dos docentes ouvidos anunciam e

denunciam dificuldades, frustrações, temores, e as barreiras que esses alunos enfrentam

ao serem “incluídos” no meio universitário. Porém também a esperança de que, através

dos vários intercâmbios a serem estabelecidos entre professores, alunos, e outros

sujeitos do espaço acadêmico, avanços e mudanças possam ser produzidos, tornando

realmente possível a inclusão de deficientes visuais nos cursos superiores em uma

sociedade que inda segrega os considerados ‘anormais’.

A meu ver, para que os professores universitários possam trabalhar com os

alunos deficientes visuais, de forma a oferecer condições para sua inclusão, faz-se

necessário um conhecimento maior sobre o que é a deficiência visual e suas

especificidades.

Sugiro até a proposta de incluir nos currículos dos Cursos de Letras, disciplinas

que contemplem essas situações, ou seja, disciplinas em que o professor ensine o aluno

a dar aula em salas inclusivistas, porquanto as matérias abordadas no curso de

licenciatura que são da área de educação (pedagogia) pouco ou quase nada comentam

ou explicam sobre as deficiências, escolas inclusivas e maneiras de lidar e ensinar

deficientes, sejam eles visuais, auditivos, físicos, mentais ou de qualquer outra natureza.

Encerro minhas considerações não conclusivas, ciente de que o tema ainda é

polêmico no mundo acadêmico e que tem a necessidade de realização de mais pesquisas

a respeito e de uma investigação sobre aprendizagem (principalmente por parte de DVs),

à luz da educação especial em uma dimensão socioafetiva. No entanto não foi possível

terminar tal tarefa ficando essa investigação postergada para estudos futuros. Pois como

lembra Senna (2008, p. 216-17), é indispensável trazer à tona tal assunto e começar a

discernir entre o preconceito contra o saber meramente técnico e aquilo que é específico,

necessário e imperativo para que a educação formal possa, de fato, cumprir–se numa

perspectiva inclusiva. Caso contrário, estaremos tão somente contribuindo para a

perpetuação da história social do fracasso escolar e deliberadamente contribuindo para a

manutenção da condição de tutelados e interditados, desde sempre imputados aos

sujeitos marginais em nossa sociedade.

Espero que este projeto de curso tenha trazido à área de japonês da Universidade

de Brasília algumas contribuições para a compreensão da educação especial e inclusiva,

ou ao menos despertado interesse ao assunto. Conscientizando da importância da

educação e do papel pedagógico do professor como facilitador da informação,

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conscientizador e autor ativo na formação de seus alunos.

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