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UNISALESIANO Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium
Curso de Direito
RENATO APARECIDO PEREIRA DOS SANTOS
Aplicação da Nova Lei do Divórcio e Seu Impacto na Sociedade
LINS-SP 2016
RENATO APARECIDO PEREIRA DOS SANTOS
Aplicação da Nova Lei do Divórcio e Seu Impacto na Sociedade
Monografia apresentada ao curso de
Direito do UniSALESIANO, Centro
Universitário Católico Salesiano Auxilium,
sob a orientação do(a) Professor(a) Ms.
Thábata Biazzuz Veronese, como um dos
requisitos para obtenção do título de
bacharel em Direito.
LINS-SP 2016
Pereira, Renato Aparecido dos Santos
Aplicação da nova Lei do Divórcio e seu impacto na sociedade / Renato
Aparecido dos Santos Pereira. -- -- Lins, 2016.
65p. 31cm.
Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico Salesiano
Auxilium – UNISALESIANO, Lins-SP, para graduação em Bacharel em
Direito, 2016.
Orientador: Thábata Biazzuz Veronesi
1.Divórcio. 2. Aplicação. 3. Contemporaneidade I Título.
Renato Aparecido Pereira dos Santos
A Aplicação da Nova Lei do Divorcio e seu Impacto na Sociedade
Monografia apresentada ao Curso de Direito
do UniSALESIANO, Centro Universitário
Católico Salesiano Auxilium, como um dos
requisitos para obtenção do título de
Bacharel em Direito.
Lins , 28 de junho de 2016
Professora Mestra Thábata Biazzuz Veronese (Orientador)
Professor Mestre Luiz Alberto Asato
Professor Mestre Pedro Lima Marcheri
AGRADECIMENTOS
Ao meu Deus que é único e soberano e que tem nos aperfeiçoado para conquistar
os desafios que estão por vir. Agradeço especialmente minha orientadora Mestra
Thábata Biazzuz Veronese, pela dedicação e tempo, e aos professores do Curso de
Direito do Unisalesiano de Lins/SP que dedicam suas vidas a ensinar e aperfeiçoar
os futuros operadores do Direito. A minha família por incentivar os meus estudos e
instruir meus caminhos.
RESUMO
A Emenda Constitucional n.º 66/2010, conhecida como a “emenda do amor”, facilitou
a dissolução do casamento, porque permite o divorcio sem a necessidade de prazo
ou causas ensejadoras para seu término. Com efeito, não há mais lugar para a
discussão de culpa no rompimento da sociedade conjugal. Diante dessa nova
formatação normativa, o presente trabalho se propõe a verificar se ocorreu uma
possível banalização do instituto do casamento, a mais antiga e formal estrutura
familiar. Para isso, incumbe recorrer aos novos preceitos constitucionais acerca das
famílias contemporâneas, em contextualização com todos os desafios sociais
superados, para verificar como a liberdade de constituir família e realizar e extinguir
o casamento sobreveio de forma tão inovadora. Percebe-se também a evolução dos
princípios constitucionais que acresceram de forma contundente nesta liberdade em
uma adaptação ao novo contexto social. Os resultados concretos de aplicação da
nova norma jurídica do divórcio têm percentuais de aumento do número de divórcio
nos últimos tempos. Surge como indagação se o aumento dos divórcios se deve
também a essa facilitação da norma jurídica ou se consiste em uma mera
consequência da vida moderna. Entende-se que as normas jurídicas devem
contribuir para que a felicidade plena e individual forme a base necessária para a
conformação contemporânea da família. Neste sentido, cumpre avaliar se a nova
norma sobre o divorcio cumpre este papel.
Palavras Chave: CASAMENTO. PRINCÍPIOS. DIVÓRCIO. AUMENTO. EMENDA
CONSTITUCIONAL N.º 66/2010.
ABSTRACT
The Constitutional Amendment No. 66/2010, known as the "amendment of love,"
facilitated the dissolution of marriage, because it allows divorce without the need for
time or ensejadoras causes for termination. Indeed, there is no room for discussion
of guilt in breaking the conjugal society. Given this new formatting rules, this study
aims to verify if there was a possible trivialization of marriage institute, the oldest and
formal family structure. For this, it is for use of new constitutional provisions about
contemporary families in context with all overcome social challenges, to see how the
freedom to found a family and perform and extinguish the wedding came so
innovative. You can see also the evolution of the constitutional principles that further
compounded forcefully this freedom in adapting to the new social context. The
concrete results of implementation of the new legal standard of divorce have
increased the percentage of divorce number in recent times. Question arises as to
the increase in divorces is also due to this facilitation of the legal rule or consists of a
mere consequence of modern life. It is understood that legal rules should contribute
to the full and individual happiness form the basis for shaping the contemporary
family. In this regard, we must assess whether the new rule on divorce fulfills this
role.
Key words: MARRIAGE . PRINCIPLES. DIVORCE. INCREASE. CONSTITUTIONAL
AMENDMENT No. 66/2010.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 9
2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO CASAMENTO ........................................................................ 12
2.1 Breve evolução histórica do casamento .................................................................... 12
2.2 Natureza jurídica do casamento ................................................................................. 16
2.3 Particularidades do casamento .................................................................................. 18
2.3.1 Habilitação para o casamento .................................................................................. 18
2.3.2 Da invalidade do casamento ................................................................................... 20
2.3.3 Deveres do casamento ............................................................................................. 22
2.3.4 Do regime de bens .................................................................................................... 24
2.4 Princípios constitucionais que regem o casamento ................................................. 25
2.4.1 Princípio da dignidade da pessoa humana ............................................................. 26
2.4.2 Principio da afetividade ............................................................................................ 28
2.4.3 O principio da função social da família ................................................................... 29
2.4.4 Principio da solidariedade familiar .......................................................................... 29
3 DO DIVÓRCIO ...................................................................................................................... 31
3.1 Conceito de divórcio e breve evolução histórica ...................................................... 31
3.2 O divórcio no ordenamento jurídico brasileiro .......................................................... 35
3.2.1 Guarda dos filhos ..................................................................................................... 36
3.2.2 Partilha de bens ........................................................................................................ 39
3.2.3 Uso do nome ............................................................................................................. 41
3.2.4 Pensão alimentícia .................................................................................................... 43
4 DIVÓRCIO EM FACE DA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 66/2010 ............................. 47
4.1 Aplicação da nova regra do divórcio: a Emenda Constitucional n.º66/2010. ......... 47
4.2 Os valores constitucionais contemporâneos e seus desafios de concretização no
âmbito social ...................................................................................................................... 50
4.4 A nova ordem jurídica do divórcio e seu impacto na sociedade.............................. 58
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 61
REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 64
9
1 INTRODUÇÃO
O instituto da família possui suma importância na formação pessoal do
indivíduo na sociedade. O regulamento dos direitos e deveres pelo Direito das
Famílias influencia a maneira como as pessoas agem entre si nas relações
familiares e causam reflexos nos relacionamentos sociais de outras ordens, uma vez
que a personalidade e seu ânimo são moldados em parte de acordo com ambiente
familiar.
Hoje, o Estado demonstra cada vez maior preocupação com a
regulamentação dos direitos familiares, pois reconhece que a formação do indivíduo
tem por base a família e os valores que esta transmite interferem nas relações
sociais em diversas áreas.
O Direito tem por característica insculpir as normas de acordo com os valores
e princípios vigentes na sociedade. Assim, uma vez que o Direito deve acompanhar
a evolução social e, por outro lado, a sociedade deve se adaptar às determinações
do ordenamento jurídico, percebe-se uma interdependência indissociável do instituto
familiar social e jurídico.
A formação da família sofreu diversas modificações com o passar do tempo e
hoje existe uma pluralidade de arranjos familiares. O ordenamento jurídico atento a
estas alterações tem procurado se ajustar ao novo contexto familiar, especialmente
no que tange ao casamento. Por exemplo, nos últimos tempos, reconheceu-se a
união estável e a homoafetiva.
Tão importante quanto o casamento se apresentam as inovações advindas
com últimas alterações normativas em relação às formas de dissolução do instituto,
uma vez que se nota uma facilitação expressiva no ordenamento jurídico em
comparação à legislação anterior.
Durante muito tempo, o casamento recebeu uma consideração mais rígida,
porque a sociedade idealizava projetos e formações fundamentais como parâmetros
familiares fundamentais que possuíam o núcleo familiar como paradigma a ser
seguido para as presentes e futuras gerações, com base em valores mais
conservadores de preservação da família em seu molde inicial, de acordo com um
desenho de uma espécie de família padronizada no País.
Após longas caminhadas legislativas, recentemente a Emenda Constitucional
n.º 66/2010 apresentou uma grande inovação no ordenamento jurídico, extinguindo
10
a separação judicial prévia ou a necessidade de separação de fato por período
mínimo de dois anos, bastando somente à vontade de dissolver o casamento pelo
divórcio. Tal alteração permite aos cônjuges o requerimento de divórcio a qualquer
tempo do término da sociedade conjugal, sem exigir, ainda, a alegação de culpa por
parte de um dos cônjuges. Além disso, o casamento pode ser desfeito de forma
extrajudicial, em algum cartório de registro civil, sem necessidade de um ação
judicial, desde que não haja filhos menores e os cônjuges estejam de acordo com os
termos do divórcio.
Essas mudanças tem diminuído cada vez mais o número de famílias que se
formam ou se mantém como o modelo tradicional de casamento formado por um
homem e uma mulher e seus filhos em comum. Na contemporaneidade, consideram-
se como família diversos tipos de união entre pessoas. Abre-se um leque de tipos
familiares, sobretudo formados por homens e mulheres divorciados que se casaram
novamente e levam consigo cada um os seus filhos frutos do antigo casamento. E,
com isso, reduz-se consideravelmente o núcleo familiar formado por pai, mãe e seus
filhos.
Há de se perceber que, em todos os meios religiosos, a facilitação do divórcio
não foi bem aceita imediatamente. Porém, a pressão social fez com que até mesmo
as igrejas passassem a rever seus posicionamentos, relativizando ou analisando a
hipótese de ser mais flexível com seus fiéis em relação ao término da sociedade
conjugal.
Por outro lado, não se deve olvidar dos inúmeros pedidos de dissolução da
sociedade conjugal mediante separação prévia e que acabavam sendo extintos em
decorrência da reconciliação dos cônjuges no período do chamado “prazo de
reflexão” da separação judicial, a qual, na lei anterior, antecedia o divórcio, e que,
atualmente, não é mais possível. De acordo com a atual ordenação constitucional,
um casal que pretender a reconciliação, com a devida regularidade jurídica, terá que
se submeter a novo casamento, dada a dissolução definitiva promovida pelo
divórcio.
Neste contexto, não se pode estudar o Direito de Família sem conhecer
alguns dos princípios constitucionais que ultrapassam a esfera constitucional e se
aplicam especificamente a este ramo do Direito.
Dentre os diversos princípios constitucionais, destaca-se o principio da
afetividade, o qual decorre intrinsecamente do princípio da dignidade da pessoa
11
humana e da solidariedade entre os membros da entidade familiar, ao garantir que
cada indivíduo deva buscar o arranjo familiar que melhor aprouver e satisfaça suas
necessidades e, sobretudo, a felicidade, independente de raça, sexo, opção sexual,
condição econômica, dentre outros parâmetros. O respeito à existência humana se
apresenta como a garantia constitucional de proteção do Estado.
Como consequência desses princípios e da evolução da sociedade é
necessário a analise da atual entidade familiar, para comparar os conceitos novos e
rever os antigos, em paralelo com a alteração normativa referente ao casamento, e,
especialmente, ao divórcio, após a Emenda Constitucional nº 66/2010. Ao tentar
construir uma sociedade justa e adaptar o ordenamento jurídico aos valores sociais,
deve-se investigar qual a importância e eventuais reflexos que as formas de
casamento e divórcio podem causar na sociedade.
Neste contexto, as pesquisas estatísticas que indicam um aumento do
número de divórcios nos últimos anos, reforça a necessidade de uma análise dos
fatores ensejadores do divórcio, para avaliar até que ponto a Emenda Constitucional
n.º 66/2010, por sua simplificação de procedimentos para obtenção do divórcio, pode
ser considerada responsável por aquele crescimento, ou se se trata apenas de um
reflexo da maior liberdade característica da sociedade contemporânea.
O objetivo geral do trabalho é analisar as alterações do divórcio ocorridas com
a Emenda Constitucional n.º 66/2010 e verificar se o aumento do número de
divórcios nos últimos anos decorreu da facilitação promovida com a referida
inovação normativa ou se apenas reflete uma tendência da evolução social.
O trabalho se dividiu em três capítulos. No Capítulo I, apresenta-se as
principais características do casamento. No Capítulo II, analisa-se o instituto do
divórcio. E, no Capítulo III, aborda as alterações normativas acerca do divórcio
advindas com a Emenda Constitucional n.º 66/2010 e suas consequências. E, por
fim, a conclusão.
Portanto, devem-se valorizar os comportamentos com capacidade de gerar
benefícios à sociedade, para, mormente, com relação à formação do indivíduo,
especificamente em relação aos reflexos do divórcio, assegurar-se, por meio de
normas jurídicas que, ao ter por base a família e seus valores, possa-se acreditar na
construção de um futuro melhor da nação.
12
2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO CASAMENTO
O casamento consiste no ato jurídico pelo qual um homem e uma mulher
criam um vinculo jurídico e pessoal entre si, com base no amor e no companheirismo
existente entre o casal e no propósito de uma vida em comum. O casamento
consiste na base da família, bem como na base de construção e sustentação das
relações familiares e sociais.
O casamento é um contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legitimando por ele suas relações sexuais; estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e 16 de interesses e comprometendo-se a criar e educar a prole que de ambos nascer. (BEVILÁCQUA, 1954, p. 130)
A regulamentação jurídica do instituto passou por diversas modificações na
história até a atual conformação normativa. As normas jurídicas passaram a ser
modificadas pela necessidade de adequação aos valores da sociedade, a qual tem
por natureza a constante mutação e exige do Estado uma construção adequada
dentro do ordenamento jurídico.
2.1 Breve evolução histórica do casamento
O casamento se consolidou na história da civilização, especialmente na
civilização romana, como forma de perpetuação da família. No início, as pessoas
não se casavam pelo afeto ou afinidade, mas por motivos como facilitação de
satisfação de suas necessidades sexuais, atendimento de padrões sociais, vontades
dos pais, o tratamento diferenciado na partilha de bens e a discriminação dos
solteiros na sociedade.
No início, o casamento era realizado exclusivamente como um negócio
jurídico, no qual o interesse consistia apenas na multiplicação do dinheiro da família
e na preservação do seu nome como consequência da procriação.
A família romana, origem da regulamentação civilista da família brasileira,
tinha como característica a incumbência da atribuição da autoridade à figura
paterna, sendo entregue ao pai toda a autoridade, ao qual era atribuída toda a
responsabilidade pela prática religiosa, econômica e de ensinamento moral aos
demais entes familiares. A descendência familiar era fixada pela linha masculina,
sendo que a mulher era subordinada ao seu marido e por sua linhagem. Após a
13
morte de seu cônjuge, a mulher ficava aos cuidados de seus filhos homens, e, na
falta, destes, submetia-se aos parentes mais próximos do cônjuge falecido. Além
disso, a mulher não tinha nenhum direito, uma vez que o pai ou o marido
respondiam por ela ou por toda sua vida. Nem sempre a família era formada pelo
vínculo de sangue, mas também pela identidade de culto, relação esta que poderia
durar por diversas gerações.
Existiam algumas modalidades de casamento na sociedade romana. A
confarreatio consistia em uma cerimônia religiosa. A competio caracterizava-se em
um negócio jurídico formal que se valia de negócios, como a compra e venda como
a venda de uma mulher pelo pátrio poder. E, ainda, a usus, em que a mulher se
submetia ao poder do marido decorrido o prazo de um ano de convivência. Esses
matrimônios funcionavam como uma carta de transferência da família do pai para a
família do marido, e, assim a mulher perdia totalmente a relação de parentesco com
sua família paterna (VENOSA, 2014, p.26).
As origens históricas do casamento se sintetizam em inúmeras características
que o Direito brasileiro recebeu de herança dos romanos.
A união em sacramento foi introduzida na sociedade brasileira através do
Direito Canônico em 1531, quando Portugal passou a colonizar o Brasil e trouxe
consigo as ordenações e demais normas legais portuguesas. O sacramento era
caracterizado pelo envolvimento espiritual entre as partes perante Jesus Cristo
representado pela Igreja Católica. Uma vez realizado, jamais deveria ser desfeito,
pois se tratava de uma união santa e indissolúvel. (CUNHA, 2013, p.30).
Em 1824, mesmo após a independência brasileira promovida por meio da
Constituição Federal brasileira, as normas originadas de Portugal prevaleceram, não
alterando em nada em matéria do casamento que permanecia sobre a influência da
Igreja Católica. (CUNHA, 2013, p.31). Esta Constituição não tratava da família como
integrante da sociedade de direitos, deveres e proteção, pois o caráter não
intervencionista do Estado liberal da época se harmonizava com o pensamento
individualista existente. A única proteção conferida naquela Carta referia-se à família
imperial, para garantir a transmissão hereditária do poder, de acordo com o
interesse do Estado (ALBINANTE, 2012).
A Constituição Federal de 1891, apesar de possuir cunho republicano,
manteve a família marcada pelo individualismo, conforme o mesmo conteúdo liberal
anterior.
14
Em 1916, na promulgação do Código Civil brasileiro, promulgado com grande
influência do Direito Romano, trouxe um conteúdo jurídico ao Direito de Família e
relativizou a sobreposição das normas portuguesas até então prevalentes. A família
do Código Civil de 1916 era hierarquizada, patriarcal e transpessoal. Hierarquizada
visto que a mulher era considerada como relativamente incapaz pelo pátrio poder, e
estava sujeita a obrigações e deveres que o homem ordenava. Patriarcal refere-se
ao fato de o pai ser considerado a figura principal da família, como o chefe ao qual a
mulher e a filha estavam sujeitas à sua direção. E, transpessoal, porque as pessoas
deveriam seguir um modelo formado pelo Estado, não havendo possibilidade de
escolha como ocorre com a atual sociedade. (CUNHA, 2013, p.32)
A Constituição de 1934, ao trazer alguns direitos sociais, ainda que, sem
conceituar substancialmente a família, determinou a indissolubilidade do casamento,
representou a transição do liberalismo clássico capitalista para o intervencionismo
Estatal, mas ainda não propriamente se dispunha o Estado a promover o bem-estar
social. A Constituição de 1937, oriunda de golpe de estado, tratou do tema família
sem nenhuma alteração em relação ao já estabelecido anteriormente. A Constituição
de 1946, trouxe os princípios básicos de certas instituições sociais, como a família e
a propriedade, mas sem alterações em relação à família em si (ALBINANTE, 2012).
Na Constituição de 1967, manteve-se a formação da família pelo casamento
indissolúvel, mas também não definia a família. Apesar das diversas Emendas
Constitucionais que se seguiram, somente com a Emenda Constitucional nº 09/77,
por meio da Lei nº 6.515/77, ocorreu à legalização do divórcio (ALBINANTE, 2012)
Com o fim da ditadura e a nova ordem constitucional, instituída a democracia
por meio da Constituição Federal de 1988, finalmente procurou-se atender aos
interesses sociais mais do que aos interesses estatais.
Assim, o art. 226 da Constituição Federal de 1988 considerou a família como
a base da sociedade civil com especial proteção do Estado. O conceito original de
família formado por um homem e uma mulher foi ampliado para considerar-se
formada a família por qualquer dos pais e seus descendentes, conforme o § 4º.
Maria Berenice Dias conceitua a família como envolvimento emocional
retirando o aspecto de direito obrigacional, e o reposicionando no direito de família
que tem como base o afeto, o sentimento do amor que funde das almas e enleia os
patrimônios, gera responsabilidades e comprometimentos recíprocos (DIAS, 2011,
p.43).
15
Portanto, somente em 1988, com a promulgação da atual Constituição
Federal, pode-se considerar que surgiu alguma mudança significativa de acordo com
os valores relacionados aos direitos fundamentais, pois trouxe, entre outros direitos,
a igualdade entre homens e mulheres bem como em relação ao poder familiar
quanto à manutenção, sustento dos filhos e sua educação.
O Código Civil de 2002 trouxe outras modificações importantes, com
destaque para a independência dos cônjuges ante suas responsabilidades
Caracteriza-se pela liberdade de pensamento, com reconhecimento de casamento
entre pessoas do mesmo sexo e os novos tipos de família, como as famílias
formadas só pelo pai e filhos, só pela mãe e filhos, ou por pais e mães com filhos de
relacionamentos anteriores e mais filhos em comum, entre outras conjunções
familiares.
Na contemporaneidade, as definições de casamento permitem contemplar
valiosas definições, dentre as quais se destaca:
O casamento é o centro do direito de família. Dele irradiam suas normas fundamentais. Sua importância, como negócio jurídico formal, vai desde as formalidades que antecedem sua celebração passando pelo ato material de conclusão até os efeitos do negócio que deságuam nas relações entre cônjuges os deveres recíprocos, a criação e a assistência material e espiritual da prole etc. (VENOSA, 2014, p.27)
Hoje, o casamento, após atravessar séculos de história e sofrer diversas
modificações sociais e jurídicas, traz consigo a família como principal objetivo, não
financeiro ou de procriação, mas o afeto como principal característica para sua
formação, onde se tem, de fato, a realização do ser humano e a importância da
felicidade e realização individual, não só a dos cônjuges, mas a dos filhos frutos
dessa relação.
A configuração de família contemporânea consiste em qualquer relação de
afeto, amor, solidariedade e companheirismo entre os integrantes de uma relação
entre pessoas que vivem sob o mesmo teto e com objetivos de uma vida em comum.
A família hoje pode assumir diversas formas, sem necessidade de formação pelo
casamento, ante o reconhecimento da união estável no § 3º do art. 226 da
Constituição Federal, ou por pessoas de sexos diferentes, uma vez que o Supremo
Tribunal Federal reconheceu a união entre pessoas do mesmo sexo. (STF, ADI
ADPF 132/RJ, 2011).
16
2.2 Natureza jurídica do casamento
O casamento possui várias formas de interpretação doutrinária e diversas
definições. Especificamente com relação à natureza jurídica do instituto, duas
correntes se destacam.
A primeira defende a teoria contratual, dependendo apenas da livre
manifestação de vontade entre as partes, para realiza-lo, porém ao concretizá-lo
deverá seguir as normas que estão previstas na legislação tanto na vigência deste
contrato quanto em seu fim, trazendo uma série de relações jurídicas envolvidas.
Orlando Gomes refere-se ao casamento como um “contrato de feição
especial” ao qual a regulamentação legal “não elimina a base voluntarista do
casamento” (1999, p. 59-60). No mesmo sentido, BITTAR defende que o casamento
é uma “espécie de contrato de características peculiares” e que “instituição é, na
verdade, a família que dele se origina.” (1993, p. 1041).
Em contrapartida a esta definição contratualista, outra corrente da doutrina
defende o casamento como instituição, onde o mesmo é regido por normas de
ordem pública, que definem de forma detalhada seus efeitos jurídicos, impondo
direitos e deveres para os cônjuges, não podendo ser mitigados pela livre vontade
das partes.
Neste sentido, o casamento constitui “uma grande instituição social, que, de
fato, nasce da vontade dos contraentes, mas que, da imutável autoridade da lei,
recebe sua forma, suas normas e seus efeitos.” O ponto marcante desta teoria em
oposição à anterior consiste em dizer que a vontade das partes externada no
casamento não pode ser contrária à lei. “A vontade individual é livre para fazer surgir
à relação, mas não pode alterar a disciplina estatuída pela lei.” (MONTEIRO, 2004,
p. 13)
Em uma demonstração clara à teoria contratualista, defende-se que o
casamento “atenta à sua natureza íntima, não é um contrato, antes difere dele
profundamente, em sua constituição, no seu modo de ser, na sua duração e alcance
de seus efeitos.” (LAFFAYETE, apud GONÇALVES, 2012, p. 34).
Uma terceira corrente que descreve o casamento como um ato complexo de
natureza mista, onde se reconhece a coexistência das duas características que se
dividem. Sendo assim a autonomia de escolha entre as partes se resume apenas a
escolha de seu parceiro, o regime de bens e a conservação ou não da relação
17
familiar. Assim, efeitos pessoais como alteração do estado civil, surgimento dos
vínculos de parentesco, alteração do nome, deveres da fidelidade e coabitação,
entre outros, retiram do casamento sua essência contratualista, já que efeitos
pessoais não podem ser regulados por contrato. Dessa forma a natureza jurídica do
casamento passa a ser contratual e individual, possuindo características de ambas
as partes.
Para uma defesa da complexidade, Wald conceitua “o casamento como um
ato jurídico complexo e solene que não tem natureza contratual.” (2000, p. 52).
É um contrato todo especial, que muito se distingue dos demais contratos
meramente patrimoniais. Porque enquanto estes só giram em torno de interesses
econômicos, o casamento se prende a elevados interesses morais e pessoais e de
tal forma que, uma vez ultimado o contrato, produz ele efeitos desde logo, que não
mais podem desaparecer, subsistindo sempre e sempre como que para mais lhe
realçar o valor. (SANTOS, p. 10-11).
Há também quem defina desnecessário atribuir personalidade a família:
Não há interesse em atribuir personalidade á família, tendo em vista que suas atividades jurídicas, de natureza patrimonial ou não, podem ser realizadas sem esse domicílio e da residência atual dos contraentes e de seus pais, se forem conhecidos; atributo (VENOSA, 2014, p.10).
Respaldado a opiniões doutrinárias pode se afirmar que o casamento ato é
um negócio jurídico e o casamento estado pode ser considerado uma instituição.
(VENOSA, 2014, p.28).
O casamento tem a natureza de um negócio jurídico, atendidos os requisitos
previstos no art. 104, incisos I, II e III do Código Civil. Neste liame, reforça o artigo
1.514 que “O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher
manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz
os declara casados”.
Assim, ante a pluralidade de correntes e posições doutrinárias, a teoria
contratualista se apresenta como a mais adequada ao atual sistema jurídico, pois
entende o casamento como um contrato formado pelo acordo das vontades das
partes.
18
2.3 Particularidades do casamento
Para a consumação do casamento, a legislação traz requisitos para o seu
reconhecimento jurídico e a proteção da lei. A necessidade da organização jurídica
para este instituto decorre da variação dos tipos de famílias que podem ser
formados, regulamentando suas características, direitos e deveres instituídos ao
poder familiar de forma objetiva.
2.3.1 Habilitação para o casamento
O casamento desperta o interesse do Estado e exige regulamentação diante
do reconhecimento do instituto como a base da sociedade. Por esse motivo, a lei
disciplina a formalização do casamento, instituindo requisitos que devem ser
observados para a proteção legal. Assim, a habilitação para o casamento reveste-se
de formalidades a serem cumpridas a fim de se verificar se os nubentes estão aptos
para o casamento e sem nenhum impedimento legal.
O processo de habilitação para o casamento está previsto nos artigos 1525 a
1532 do Código Civil e na Lei n°6.015 de 31 de dezembro de 1975, a Lei de
Registros Públicos.
A regulamentação legal descreve os documentos necessários os requisitos e
o processo administrativo para a realização do casamento.
Artigo 1525. O requerimento de habilitação para o casamento será firmado
por ambos os nubentes, de próprio punho, ou, a seu pedido, por procurador,
e deve ser instruído com os seguintes documentos:
I - certidão de nascimento ou documento equivalente;
II - autorização por escrito das pessoas sob cuja dependência legal
estiverem, ou ato judicial que a supra;
III - declaração de duas testemunhas maiores, parentes ou não, que
atestem conhecê-los e afirmem não existir impedimento que os iniba de
casar;
IV- declaração do estado civil, do dom;
V - certidão de óbito do cônjuge falecido, de sentença declaratória de
nulidade ou de anulação de casamento, transitada em julgado, ou do
registro da sentença de divórcio.
Apresentados corretamente os documentos exigidos no artigo 1525 do
Código Civil, será publicado um edital de proclamas proferido pelo Cartório de
19
Registro Civil em que tramita a habilitação, sendo o referido edital fixado durante
quinze dias nas circunscrições do Registro Civil dos nubentes, bem como deverá ser
divulgado na imprensa local da cidade, tendo em vista que o casamento consiste em
um ato solene e público.
Pode ocorrer dispensa do edital de Proclamas previsto no artigo 1527 do
Código Civil, se houver urgência na celebração do casamento podendo essa ser
requerida em petição dirigida ao juiz quando houver urgência, já indicadas ás
devidas provas. Neste caso, faz-se necessária a ciência do Ministério Público, o qual
poderá se manifestar em até 24 horas. Nos casos previstos em lei, os contraentes,
em petição dirigida ao Juiz, deduzirão os motivos de urgência do casamento,
provando-a, desde logo, com documentos ou indicando outras provas para
demonstração do alegado, nos termos do art. 69 da Lei n.º 6.015/73.
Segundo Barros, a urgência poderá advir de vários fatores, entre esses por
viagem demorada e imprevista ou por ausência forçada por motivo de serviços
públicos e tratando de pressa pra celebração da felicidade do bem comum isso é
mais que justo (2010, p.97).
Renumerado o art. 70, pela Lei nº 6.216, de 1975, quando o pedido se fundar
em crime contra os costumes, a dispensa de proclamas será precedida da audiência
dos contraentes, separadamente e em segredo de justiça ou se produzidas às
provas dentro de cinco dias, com a ciência do órgão do Ministério Público, que
poderá manifestar-se, a seguir, em vinte e quatro horas, o juiz decidirá, em igual
prazo, sem recurso, remetendo os autos para serem anexados ao processo de
habilitação matrimonial.
Atendidos todos os requisitos necessários para o casamento e não havendo
nenhum impedimento, a certidão de habilitação será proferida no prazo de noventa
dias, para então poder ser celebrado o casamento, como um ato solene, no qual a
livre vontade das partes é externada e permite a declaração da união dos nubentes
pelo laço matrimonial. O casamento civil recebe o registro em uma Certidão de
Casamento, a qual constitui prova de sua celebração e goza de presunção jurídica
de veracidade.
20
2.3.2 Da invalidade do casamento
A invalidade do casamento está prevista do artigo 1548 a 1564 do Código
Civil, onde se encontram elencados os pressupostos para a invalidação do instituto
por nulidade ou anulabilidade. Por se tratar de um negócio jurídico e em
conformidade com Tartuce (2014, p.76) existem regras especiais que serão
utilizadas e até mesmo consideradas diante de alguma situação prevista na
legislação onde os efeitos da invalidade se aplicaram de forma contundente.
O casamento será nulo quando realizado com alguma infringência à
legislação, como, por exemplo, no caso de pessoas com enfermidade mental que
não possui discernimento para os atos da vida civil, e também por infringência de
impedimentos esses que estão previstos no artigo 1.521 do Código Civil. De acordo
com os incisos I a VII do referido artigo, são esses, os ascendentes com os
descendentes, seja por parentesco civil ou natural, parentes afins em linha reta, o
adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem foi cônjuge do
adotante, os colaterais até o terceiro grau, inclusive, o adotado com o filho do
adotante, as pessoas casadas, o cônjuge sobrevivente com o condenado por
homicídio ou tentativa de homicídio contra seu consorte.
Tartuce (2014, p.87) descreve que mesmo após a declaração de sentença
pela nulidade do casamento seus efeitos serão ex tunc, e retroagirão não podendo
prejudicar a aquisição de direitos á titulo oneroso por terceiros de boa fé e nem
resultando de sentença transitada em julgado, protegendo o instituto da boa fé
objetiva e da coisa julgada.
Ao ser declarado nulo, o casamento possui efeito ex tunc, pois é considerado
inválido desde o dia em que fora celebrado e não produz os efeitos civis do
matrimônio perante os contraentes. As ações de nulidade de casamento são
imprescritíveis, em razão de que o casamento nulo não se convalida.
O casamento anulável é aquele que impede a união por falta de idade mínima
para a sua realização, como aquele que resulta de gravidez, vício da vontade, por
incompetência da autoridade celebrante todos esses descritos no Código Civil:
Art.1.550. É anulável o casamento: I - de quem não completou a idade mínima para casar; II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal; III - por vício da vontade, nos termos dos artigos. 1.556 a 1.558;
21
IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento; V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges; VI - por incompetência da autoridade celebrante. Parágrafo único. Equipara-se à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada.
O casamento que é declarado anulável tem efeito ex nunc, ou seja, mesmo
anulado produz efeitos até a data da declaração da anulação e é passível de
ratificação. Ao contrário da ação de nulidade, a qual é imprescritível, a ação de
anulação de casamento tem prazos para propositura, sendo que o artigo 1.560 do
Código Civil dispõe sobre os prazos para ingressar com referida ação.
Art. 1.560. O prazo para ser intentada a ação de anulação do casamento, a contar da data da celebração, é de: I-cento e oitenta dias, no caso do inciso IV do art. 1.550; II-dois anos, se incompetente a autoridade celebrante; III-três anos, nos casos dos incisos I a IV do art. 1.557; IV-quatro anos, se houver coação. § 1º Extingue-se, em cento e oitenta dias, o direito de anular o casamento dos menores de dezesseis anos, contado o prazo para o menor do dia em que perfez essa idade; e da data do casamento, para seus representantes legais ou ascendentes. § 2º Na hipótese do inciso V do art. 1.550, o prazo para anulação do casamento é de cento e oitenta dias, a partir da data em que o mandante tiver conhecimento da celebração.
Gonçalves (2011, p.140) descreve que embora não elencado no Código Civil,
a doutrina instituiu a teoria do casamento inexistente, pelo qual o casamento não
possua todos os requisitos necessários para sua realização. Neste caso, mesmo
havendo de fato uma união, essa é considerada inexistente.
É inexistente o casamento no qual inexiste o consentimento, a autoridade
celebrante ou quando há identidade de sexos. No ramo no Direito de Família só
poderá ser considerado nulo ou anulável o que estiver expressamente declarado em
lei, como o casamento sem consentimento, em que este deverá ser espontâneo, e
para que seja declarado nulo o matrimônio é necessário que haja omissão na
manifestação de vontade e não uma simples declaração defeituosa.
O ato inexistente é considerado um nada para o direito, pois não gera efeitos no âmbito jurídico. Em casos tais, o negócio jurídico não apresenta os seus mínimos pressupostos de existência, quais sejam: partes, vontade, objeto e forma. (TARTUCE, 2014, p. 78).
22
Na ausência de autoridade celebrante, o casamento quando realizado por
pessoa não competente para a celebração é considerado nulo. Como exemplo,
pode-se citar um falso juiz de paz que realize o casamento, passando-se por
autoridade investida, sem que haja o conhecimento dos nubentes ao contrário
ocorre quando o juiz de paz não tem competência naquela jurisdição. Neste caso, o
casamento não será nulo e sim anulável, será considerada como competência:
“ratione loci”.
Com relação à identidade de sexos, as uniões homoafetivas recentemente
foram reconhecidas como casamento. A união estável deve ser realizada em
cartório, como o processo de habilitação para o casamento. Gagliano (2013, p.486)
apresenta que o casamento homoafetivo foi, de certa forma, aceito por força dos
tribunais, pois não possui uma previsão legal específica. Neste ponto, cumpre
destacar que a Corte máxima brasileira, o Supremo Tribunal Federal, já se
posicionou a respeito e reconheceu a união entre pessoas do mesmo sexo (FTS,
ADI ADPF 132/RJ, 2011).
2.3.3 Deveres do casamento
Para que haja eficácia no casamento, a legislação atribui alguns deveres que
são essenciais para o bom convívio entre os nubentes. Tratam-se da fidelidade
reciproca, vida em comum no domicilio, mútua assistência, sustento, guarda e
educação dos filhos e respeito e consideração mutua entre o casal.
Venosa (2014, p.148) descreve que pela fidelidade recíproca, cada cônjuge
tem a obrigação de fidelidade para com o outro mantendo, os vínculos afetivos
previstos na constituição para o bom relacionamento da família. Contudo, embora
atue em todas essas esferas, perfaz também norma jurídica, porque sua
transgressão admite punição na esfera civil com o divórcio.
A vida em comum no domicílio conjugal deve ser contemplada de acordo
com a realidade social. É possível que os cônjuges sejam casados, mas vivam em
casas separadas, sem que haja o rompimento do casamento e do afeto. O dever de
vida em comum não é violado com essas separações transitórias devendo obedecer
à fidelidade reciproca de acordo com a vontade do casal.
Para Gagliano (2013, p.298) o legislador a respeito da vida em comum,
preservou a necessária comunhão de vida, onde exclui, de certa forma, que um
23
cônjuge abandone a esfera de convivência como parceiro e passe a residir em outro
domicilio sem motivo justificado ou contra a vontade da outra parte.
A mútua assistência consiste em ajuda e cuidados em aspectos morais,
espirituais, materiais e econômicos. Tais deveres existem em diversas fases da vida
conjugal como quando um dos cônjuges estiver doente, por exemplo. Também
ocorre quando um dos cônjuges esteja em dificuldades financeiras, com problemas
pessoais, entre outros. Caso o cônjuge que não esteja com problemas abandonar o
outro, é causa para o divórcio e a doutrina defende que:
A mutua assistência ultrapassa a simples noção de amparo recíproco de cunho material, para integrar-se à ideia maior de apoio mútuo moral e espiritual. Certamente, um dos móveis psicológicos da união conjugal é a busca de um parceiro de vida que, para além da simples perspectiva carnal traduza um suporte emocional seguro para compartilhamento das vicissitude da vida, de maneira a permitir que, dividindo, cada um dos consortes cresça com o individuo, como ser humano, em toda a sua potencialidade. (GAGLIANO, 2013, p.301).
Sustento guarda e educação dos filhos não está qualificada apenas quando
há filhos provindos dessa união, mas também de outros relacionamentos e se faz
necessário que ambos os cônjuges estejam dispostos a criá-los e educá-los.
Devendo os pais exercer de forma absoluta a responsabilidade sobre seus filhos
com os deveres educacionais, saúde alimentação e principalmente o afeto e
respeito.
Gagliano (2013, p.303) descreve que, a obrigação de sustentar, guardar e
educar os filhos, impõe sempre a todo pai e toda mãe pois esse dever é derivado do
poder de família.
A obrigação de respeito e consideração mútuos refere-se ao antigo poder do
marido sobre a esposa. Antigamente, o marido era a “cabeça” da família, ou seja,
tinha que ser respeitado pela esposa e seus filhos. A sua vontade tinha força de lei,
e lhe dava poder de controlar a esposa da maneira como quisesse, além de ter o
respeito da sociedade por isso. Na contemporaneidade, a Constituição Federal de
1988, em seu artigo 5º, descreve que todos são iguais perante a lei sem distinção de
qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade.
24
Em contrapartida aos preceitos passados o artigo também alterou o
casamento, pois, em consonância com o princípio da igualdade, deu à esposa o
poder de controlar a família juntamente com o marido, além do direito de ser
respeitada em sua individualidade, sem violência e ser tratada em todos os sentidos
conforme o princípio da dignidade da pessoa humana.
2.3.4 Do regime de bens
O casamento pode ter efeitos jurídicos diferentes, dependendo de algumas
particularidades no ato de sua realização. Neste aspecto, no pacto antinupcial, deve-
se escolher o regime de bens dentre aqueles previstos no Código Civil, em seus
artigos 1658 a 1688.
São quatro os regimes de bens: comunhão universal de bens; comunhão
parcial de bens; separação de bens e regime de participação final nos aquestos
Gonçalves define o regime de bens da seguinte forma:
É o conjunto de regras que disciplina as relações econômicas dos cônjuges, quer entre si, quer no tocante a terceiros, durante o casamento. Regula especialmente o domínio e a administração de ambos ou de cada um sobre os bens anteriores e os adquiridos na constância da união conjugal. (GONÇALVES 2011.p.437).
Cada regime de bens existente do ordenamento jurídico brasileiro tem
algumas especificidades. Na comunhão universal de bens, todos os bens adquiridos
antes e após o casamento se tornam comum entre os cônjuges, sendo excluídos
apenas os bens doados e herdados com clausula de incomunicabilidade, os bens
gravados de fideicomisso, as dividas anteriores ao casamento, salvo se provierem
de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; e as doações
antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com clausula de
incomunicabilidade.
No regime de comunhão parcial dos bens, serão incomunicáveis todos os
bens que cada um dos cônjuges possuía antes do matrimônio, mas se comunicam
seus frutos bem como os adquiridos (os chamados aquestos) na constância do
casamento a título oneroso. Quando não houver oposição por outro, o regime de
bens entre os cônjuges, ao celebrar o contrato antinupcial, o casamento será
25
considerado como do regime de comunhão parcial de bens, motivo pelo qual este se
apresenta como regime legal.
No regime de separação de bens, existe incomunicabilidade dos bens
presentes e futuros do casal, permanecendo separado quanto à propriedade dos
bens, sua administração e gozo e as dívidas passivas. Nesta modalidade, o regime
de separação é completamente individualista, já que não se divide nenhum bem,
nem os adquiridos antes do casamento e muito menos que seriam conquistados no
futuro.
O regime de participação final nos aquestos contém princípios aplicáveis à
comunhão parcial e à separação de bens, baseando-se em bens próprios, durante
toda a constância do casamento e, ao final da sociedade conjugal, na apuração dos
aquestos a serem excluídos desses bens próprios, dando aos cônjuges mais
liberdade e autonomia na administração desses bens, inclusive individualmente
quanto à responsabilidade pelas obrigações contraídas durante o casamento.
No regime de separação obrigatória ou separação legal de bens, em caso de
divórcio, deve ser observada a regra pacificada pela Sumula 377 do Supremo
Tribunal Federal, que descreve que comunicam se os bens adquiridos na constância
do casamento, no caso de falecimento de um dos cônjuges. Se houver
descendentes, o cônjuge sobrevivente não será considerado herdeiro, porém se
houver ascendentes, o cônjuge sobrevivente terá direito a herança, na mesma
proporção que esses.
2.4 Princípios constitucionais que regem o casamento
A Constituição Federal de 1988 trouxe em seu contexto alguns princípios
pelos quais se abre espaço direto à formação da família, sem a intervenção do
Estado e com a liberdade das pessoas a buscarem a sua realização pessoal. A atual
formação da família não apresenta contornos tradicionais como os do século XX,
mas desenha novos formatos nos quais a felicidade e a realização pessoal são os
únicos protagonistas para a atual sociedade.
Nesta atual conformação da Constituição Federal, de acordo com os valores e
princípios recentes na sociedade contemporânea, o texto constitucional absorve
alguns desses princípios, os quais ainda precisam ser interpretados para serem
apreciados de acordo com o fim maior de realização pessoal.
26
2.4.1 Princípio da dignidade da pessoa humana
A dignidade da pessoa humana caracteriza-se por ser um valor moral e
espiritual inerente à pessoa, pois todo ser humano é dotado desse preceito, onde
não existe um valor material sobre essa dignidade, a qual não pode ser substituível
por qualquer outro tipo de forma, matéria e valor financeiro.
“A noção de dignidade da pessoa humana atinge o núcleo existencial de cada
ser humano como integrante ao gênero humano, o que impõe um dever geral de
respeito, de proteção e de intocabilidade, não sendo admitida a despersonificação
da pessoa humana” (LOBO apud ALBINANTE, 2012).
O valor intrínseco que faz do homem um ser superior às coisas (que podem receber preço) é a dignidade; e considerar o homem um ser que não pode ser tratado ou avaliado como coisa implica conceber uma denominação específica ao próprio homem: pessoa. Assim, o homem, em Kant, é decididamente um ser superior na ordem da natureza e das coisas. (PEREIRA, 2004, p.96).
A Carta Magna de 1988 instituiu varias mudanças como resposta aos anseios
da contemporaneidade dos direitos e deveres que estão sempre em
desenvolvimento. A principal base da Constituição para que se construísse uma
sociedade completamente realizada porque a realização alcançasse a todos os seus
indivíduos, reside no princípio da dignidade humana.
A dignidade da pessoa humana proporciona uma virtude legislativa por não
permitir que o ser humano seja desvalorizado de forma alguma, devendo seus
direitos ser preservados e adquiridos com a contribuição do Estado para o devido
crescimento, sendo irrenunciável e inalienável, não cabendo a ninguém a denegrir
essa dignidade:
[...] a dignidade intrínseca da pessoa humana, é irrenunciável e inalienável, constituindo elemento que qualifica o ser humano como tal e dele não pode ser destacado, de sorte que não pode cogitar nem a possibilidade de determinada pessoa ser titular de um pretensão a que lhe seja concedida a dignidade. (SARLET, 2006,p.41).
27
Tartuce (2014, p.6) apresenta a dignidade da pessoa humana como forma
máxima de definição do Estado Democrático de Direito, é o princípio máximo, ou
superprincípio ou macroprincípio ou princípios dos princípios.
O princípio da dignidade da pessoa humana representa o epicentro axiológico da ordem constitucional, irradiando efeitos sobre todo o ordenamento jurídico, não apenas no que tange aos atos e às situações envolvendo a esfera pública dos atos estatais, mas também todo o conjunto das relações privadas que se verificam no âmbito da sociedade (SARMENTO apud ALBINANTE, 2012).
O artigo 1°, inciso III da Constituição Federal trouxe uma inovação ao tempo
de sua promulgação, ao elevar o princípio da dignidade da pessoa humana como
responsável pelo nascimento de todos os outros. O principio da dignidade da pessoa
humana se pressupõe em proteger a família como instituição, unidade de produção
e reprodução dos valores culturais, éticos, religiosos e econômicos.
A família através desse principio se fundamentou em objeto social de
nascimento da civilização moderna onde as normas jurídicas se renderam a reger o
instituto da família através de leis defendendo a realização pessoal dos cidadãos.
O direito de família é o direito mais humano de todos os ramos do direito, e também pelo sentido ideológico e histórico de exclusões. A evolução do conhecimento científico, os movimentos políticos e sociais do século XX e o fenômeno da globalização provocaram mudanças profundas na estrutura da família e nos ordenamentos jurídicos de todo o mundo. O principio á dignidade da pessoa humana constitui assim base da comunidade familiar, garantindo o pleno desenvolvimento e a realização de todos os seus membros principalmente da criança e do adolescente. (GONÇALVES, 2011, p22).
Com a evolução da sociedade, a atual Constituição Federal ao instituir a
dignidade da pessoa humana como principio, oferece a todos a liberdade de escolha
para o melhor meio de vida que desejar. Assim, a opção por e pela forma de
constituir a família depende da vontade de realização pessoal, cabendo ao Estado
assegurar suporte necessário para que se haja a dignidade da pessoa humana, não
só em relação aos direitos a educação, saúde e moradia, entre outras necessidades
vitais básicas, mas também a direitos e garantias das pessoas envolvidas por um
relacionamento amoroso que gere o casamento.
28
2.4.2 Principio da afetividade
O afeto trata-se de princípio basilar constitucional ligado intrinsecamente à
dignidade da pessoa humana e à solidariedade familiar, que versam que a entidade
familiar e seus membros, independente de raça, sexo, opção sexual, condição
econômica, entre outros parâmetros, tem o direito ao respeito à existência humana,
segundo as suas possibilidades e expectativas afetivas e patrimoniais, buscando
sempre, em primeiro lugar, satisfazer sua realização pessoal plena e sua felicidade.
O afeto consiste na base do núcleo familiar, porque une os seus integrantes.
Deriva da convivência familiar mais do que do vínculo sanguíneo. O laço entre os
membros da família adquire contornos específicos com o passar do tempo e motiva
o estreitamento ou o distanciamento das pessoas conforme os sentimentos
propiciem a busca pela felicidade de cada indivíduo.
A mudança das formas de constituição familiar fez com que vários
doutrinadores contextualizassem de uma forma diferente essa mudança. Destaca-
se:
Deveras, a família estar passando por profundas modificações, mas como organismo natural ela não se acaba e como organismo jurídico esta sofrendo uma nova organização; logo não há desagregação ou crise. Nenhuma dessas mudanças legislativas abalará a estrutura essencial da família e do matrimonio, que é sua pedra angular. (DINIZ, 2010, p.25)
Tartuce (2014,p.24) descreve que o afeto equivale á interação entre as
pessoas, e não necessariamente ao amor, o qual pode ser considerado apenas uma
de suas facetas. O princípio da afetividade não se trata apenas do vínculo entre o
parentesco civil ou consanguíneo, mas com o afeto adquirido entre as pessoas. Um
exemplo bem comum está no caso de um marido que reconhece como seu o filho de
sua mulher. O principio da afetividade caracteriza se como uma conquista para o
Direito de Família não só pela liberdade da formação adequada da família, bem
como para a realização pessoal.
A afetividade apresenta várias facetas e aspectos, uma força elementar,
propulsora de todas as nossas relações de vida, e sua presença no ramo do direito,
se faz, sobretudo, forte nas relações de direito (GAGLIANO, 2013, p.89).
Certamente, a família contemporânea valoriza os sentimentos que nutre os
relacionamentos entre seus membros, ao priorizar a amizade, o companheirismo, os
29
desejos, as igualdades e os carinhos, em satisfação a sentimentos outros como o
amor e a paixão. Com a nova regulamentação jurídica e a atual conformação social,
o afeto passa a ser um direito fundamental reinante inclusive constitucionalmente, a
fim de se garantir a busca pela felicidade e, assim, uma sociedade mais fraterna.
2.4.3 O principio da função social da família
O principio da função social da família se caracteriza pela importância de
construir a dignidade de seus integrantes sendo um instrumento de realização
existencial de seus membros para que seja possível a convivência na sociedade.
Através deste princípio é perceptível que mesmo após tantas mudanças na
formação da família a valorização do mesmo prevalece intacto.
Numa perspectiva constitucional a funcionalização social da família significa o respeito ao seu caráter eudemonista, enquanto ambiência para a realização do projeto de vida e de felicidade de seus membros, respeitando-se com isso a dimensão existencial de cada um. De fato, a principal função da família é a sua característica de meio para a realização de nossos anseios e pretensões. Não é mais a família um fim em si mesmo, mas, sim, o meio social para a busca de nossa felicidade na relação com o outro (GLAGLIANO,2013,p.99).
A família é a realização do bem coletivo, ético, moral e social. O Código Civil,
ao destacar o poder familiar caracteriza a importância do convívio social entre seus
entes, apresentando, em ultima hipótese a separação familiar entre filhos e pais. A
instituição familiar, que durante os últimos anos, sofreu grandes mudanças, liga-se
diretamente ao principio da afetividade como se apresenta na contemporaneidade,
como a base de qualquer espécie de família, já que através da mesma dá-se o início
da busca pela felicidade coletiva.
2.4.4 Principio da solidariedade familiar
A solidariedade social tem o apanágio de um dos objetivos fundamentais da
República Federativa do Brasil, conforme dispõe o artigo 3º, I da Constituição
Federal, no sentido de construir uma sociedade livre, justa e solidária, o que,
certamente, inclui a solidariedade familiar.
O princípio da solidariedade familiar se caracteriza pelo companheirismo entre
os membros familiares, pelo qual se impõe a cada um deveres de cooperação,
30
assistência, amparo, ajuda e cuidado entre si. A solidariedade cresce em
importância na medida em que permite a tomada de consciência da
interdependência social, onde a afetividade pode ser considerada o pilar essencial
para o desenvolvimento e realização pessoal de todos os membros do instituto.
A solidariedade significa envolvimento com o outro ente familiar por respeito e
consideração recíproca. Os valores envolvem além do aspecto patrimonial, os
âmbitos afetivos e psicológicos, para traduzir em sentimentos e comportamentos de
mútua assistência entre os membros familiares.
A solidariedade culmina por determinar o amparo, a assistência material e moral recíproca, entre todos os familiares, em respeito ao princípio maior da dignidade da pessoa humana. É ela, por exemplo, que justifica a obrigação alimentar entre parentes, cônjuges ou companheiros, ou na mesma linha, que serve de base ao poder familiar exercido em face dos filhos menores. Uma observação, porém, se faz necessária. Embora a ideia de solidariedade remonte aos mais puros e nobres sentimentos humanos, a repercussão patrimonial, no sistema normativo brasileiro, parece evidente. (GLAGLIANO, 2013, p.95).
Esse princípio serve de base para que o pai ao divorciar da mãe possua
solidariedade de prestar alimentos aos filhos, bem como também ao filho o dever de
cuidar dos pais já idosos, ou prestar alimentos ao verificando um retorno à
solidariedade já prestada ao mesmo no período em que foi incapaz de exercer seus
direitos e deveres.
Tartuce (2014, p.13) justifica que a solidariedade familiar é princípio
extremamente essencial em virtude do reconhecimento de objetivo fundamental que
este princípio possui.
A conjugação do princípio da solidariedade familiar com o princípio da
dignidade da pessoa humana implica na valorização do indivíduo dentro da família.
A família se forma para a realização pessoal de seus membros, e não para a
realização individual destes em prol da família, de acordo com o princípio da
dignidade da pessoa humana. A família hoje, em oposição à forma originária da
sociedade romana, compreende a democracia participativa de todos os seus
membros em igualdade de direitos e deveres e respeito mútuo, tudo em
conformidade com a solidariedade familiar.
31
3 DO DIVÓRCIO
Hoje, as pessoas tem liberdade de planejamento familiar e de escolher com
quem querem se casar. Os valores sociais e os princípios constitucionais
relacionados à instituição familiar permitem essa busca ao bem estar e à realização
pessoal, em respeito, sobretudo, à dignidade da pessoa humana. Neste liame, os
cônjuges, na mesma busca pela felicidade, podem pretender se divorciar.
O divórcio nem sempre foi admitido na história da sociedade e do Direito. E
mesmo após a sua aceitação e regulamentação jurídica, o instituto do divórcio teve
crescente evolução até se chegar aos atuais costumes.
3.1 Conceito de divórcio e breve evolução histórica
O divórcio caracteriza-se pela dissolução do casamento que tenha sido
realizado em conformidade com a lei, com a possibilidade de se constituir novas
núpcias. Assim para que haja a consumação de fato do divórcio, o casamento deve
ter se realizado de forma válida seguindo as normas previstas no Código Civil
brasileiro.
Caso não tenha preenchido todos os requisitos mínimos para sua realização,
o divórcio não se apresenta possível como forma de dissolução do casamento, uma
vez que este se perfaz invalido.
A doutrina trata o divórcio como:
[...] medida dissolutória do vínculo matrimonial válido, importando, por consequência, a extinção de deveres conjugais. Trata-se, no vigente ordenamento jurídico brasileiro, de uma forma voluntária de extinção da relação conjugal, sem causa específica, decorrente de simples manifestação de vontade de um ou ambos os cônjuges, apta e permitir, por consequência, a constituição de novos vínculos matrimonias (GAGLIANO, 2013, p.523).
Nem sempre o meio de se quebrar o vínculo jurídico entre as partes fora
realizado de forma simples. Para se chegar à atual concepção de liberdade e ao
atual molde de desfazimento do vínculo matrimonial, com fulcro nos princípios
constitucionais, o divórcio percorreu longa caminhada. Até ser aceito pelo
ordenamento jurídico brasileiro teve como um de seus principais obstáculos à
resistência pelas instituições religiosas.
32
Desde a primeira Constituição Federal, em 1891, o casamento foi separado
definitivamente da Igreja, porém, por muita resistência da influencia religiosa, foi
disciplinada apenas a separação de corpos, sendo indicadas as causas aceitáveis,
como adultério; sevícia grave ou injuria grave; abandono voluntário do domicilio
conjugal por dois anos contínuos e mútuo consentimento dos cônjuges, se fossem
casados há mais de dois anos.
Em 1893, apresentou-se ao parlamento a primeira proposição divorcista, onde
ficou apenas a apresentação e nada mais se falou. Apenas em 1900, o deputado
Érico Marinho apresenta ao Senado a proposta de divórcio vincular, onde os
contraentes do matrimonio, se vinculariam juridicamente a si mesmos e a seus
patrimônios, visando à constituição de uma família, e dissolveria esse vínculo por
vontade apenas de um dos cônjuges, mesmo que afetassem os direitos de terceiros,
por exemplo, dos filhos. A proposta foi repelida. (CUNHA, 2013, p.31).
No ano de 1901, o jurista Clóvis Bevilaqua, após seis meses de trabalho em
seu projeto de Código Civil, foi duramente criticado pelo então senador Rui Barbosa
e por vários juristas. O projeto sofreu varias alterações até sua aprovação em 1916.
Em seu dispositivo, o divórcio era permitido apenas por via do desquite, amigável ou
litigioso. A sentença do desquite apenas colocava termo ao regime de bens, porque
permanecia o vínculo matrimonial. Em 1934, surge a segunda Constituição da
República, onde a indissolubilidade do casamento tornou se preceito constitucional.
No ano de 1937, é promulgada a terceira Constituição da República, a qual manteve
o mesmo regramento. O preceito se repetiu nas Constituições de 1946 e 1967
(CUNHA, 2013, p 30).
Na Carta Magna de 1969, outorgada pelos chefes militares, por meio da
Emenda Constitucional n.º 1/69, qualquer projeto de divórcio somente seria possível
com a aprovação de Emenda Constitucional por dois terços dos senadores (44) e
dos deputados (207). Em 12 de março de 1975, foi apresentada a Emenda
Constitucional n.º 5 à Constituição de 1969, para permitir a dissolução do vínculo
matrimonial após cinco anos de desquite ou sete de separação de fato. Em sessão
de 08 de maio de 1975, a Emenda obteve maioria de votos (222 contra 149), porém
insuficientes para atingir o quórum exigido de dois terços. (CUNHA, 2013, p.32).
Apenas em 1977, o divórcio finalmente foi oficialmente introduzido por meio
da Emenda Constitucional nº 09, de 28 de junho de 1977, regulamentada pela Lei
33
6.015, de 26 de dezembro do mesmo ano. Porém, houve ainda muitas restrições
acerca de aceitamento:
Para que fosse aprovada a Lei n.º 6.515, em 26.12.1977, foi necessário fazer algumas concessões, e o divórcio foi dificultado ao máximo; só era possível se divorciar uma única vez, era necessário o prazo de cinco anos de separação de fato para o divórcio direto e três anos para o indireto (ou por conversão). O desquite, embora tivesse mudado o nome para separação judicial, continuaria existindo, afinal, os católicos não deveriam se divorciar. E assim foi mantido o esdrúxulo e inútil instituto da separação judicial (CUNHA, 2013.p.29).
Esta transcrição permite perceber a resistência que a sociedade da época
prescindia a respeito do divórcio, tido como um tabu dentre os religiosos, que, por
suas crenças, e até mesmo por influência direta da Igreja à legislação, não ocorrera
mudanças anteriores da normatização brasileira. Anterior ao advento da Lei n.º
6.515/77, por intransigência constitucional, inspirada em objeções religiosas, o
vínculo matrimonial não podia ser rompido, só se admitindo a dissolução da
sociedade conjugal, que então fazia-se pelo desquite, apresentado como solução,
pelo fato de que o mesmo colocava fim apenas aos deveres recíprocos dos
cônjuges, mas não importava a dissolução completa do vínculo matrimonial, uma
vez que os desquitados não podiam contrair novas núpcias.
Nos termos em que foi concebido pela Lei n.º 6.515/77, o divórcio poderia ser
requerido após o decurso de um prazo de três anos, contados a partir da data em
que se operasse a separação judicial do casal. A separação judicial apresentava-se,
portanto, como um degrau necessário a ser percorrido antes do requerimento de
divórcio, exceto em casos excepcionais, contemplados na Emenda Constitucional.
Havia assim dois tipos de separação, a consensual e a de fato. A separação
consensual era firmada mediante acordo entre o casal, nas modalidades judicial ou
extrajudicial. Já a de fato caracterizava pelo fim do vínculo conjugal, não recorrendo
aos meios legais. Para que houvesse a separação de fato, o casal deveria estar por
mais de dois anos separados, para a extinção do vínculo matrimonial, sendo ainda
possível a alegação de culpa por parte de um dos cônjuges.
Em 1989, a Lei n.º 7.841/89, revogou o artigo 38 da Lei do Divórcio,
eliminando a restrição à possibilidade de divórcios sucessivos.
O Novo Código Civil, instituído por meio da Lei n.º 10.406 de 10 de janeiro de
2002, para vigência para um ano após sua publicação, tratou do Direito de Família
34
em seus artigos 1.511 a 1.783, e tentou incorporar em seu texto as modificações
introduzidas na Constituição Federal de 1988 e nas leis infraconstitucionais esparsas
referentes aos temas familiares, inclusive quanto à possibilidade de dissolução da
sociedade conjugal. Consequentemente, revogou a Lei n.º 6.515/77 em relação à
separação judicial e ao divórcio, em relação às causas, espécies e requisitos para
sua obtenção, embora permanecessem as normas processuais, especialmente
aquelas relativas à conversão da separação judicial em divórcio (artigos 35 a 37) e
ao divórcio consensual (artigo 40, § 2º). De acordo com o Novo Código civilista, o fim
da sociedade conjugal pode se dar por invalidade do casamento, separação judicial
e divórcio. Inovou, ainda, por acrescer como causa a presunção de ausência de um
dos cônjuges, apenas para fins de sucessão provisória, e depois definitiva (artigo 10,
c.c. com 481 e 482).
A Lei n.º 11.441 de 04 de janeiro de 2007, estabeleceu que o divórcio e a
separação consensuais pudessem ser requeridos por via administrativa, bastando
que o casal comparecesse a um cartório de notas assistidos por um advogado,
desde que não possuíssem filhos menores de idade ou incapazes.
Promulgada em 13.07.2010, a Emenda Constitucional n 66, sugerida pelo
IBFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família) permitiu que o casamento civil
passasse a ser dissolvido pelo divórcio sendo suprimido o requisito de prévia
separação judicial ou de fato. O divórcio passou a ser realizado de forma menos
burocrática, de modo que o Estado retira, em partes, de suas mãos a
responsabilidade sobre a forma de constituir família do individuo que busca a sua
realização pessoal por meio da formação da família que melhor entender adequada.
Antes da Emenda Constitucional n.º 66/2010, batizada como a “PEC do
amor”, havia a necessidade da realização da separação judicial em primeiro lugar,
como dissolução da sociedade conjugal, preservando, entretanto, o vínculo
matrimonial, sendo que o divórcio era somente concedido após o prazo de reflexão
estabelecido na lei. No entanto, assim como no divórcio, a separação judicial
importava no fim dos deveres conjugais de fidelidade e coabitação, provocaria o
término do regime de bens vigente no casamento, a separação de corpos e a
partilha dos bens do casal. Sendo assim, verifica-se que a diferença entre divórcio e
separação judicial resumia-se à possibilidade de contração de novas núpcias.
O dever de assistência à família permanece intacto, mesmo que o divorciado
venha a contrair novas núpcias. O requerimento de divórcio não encontrou no texto
35
constitucional qualquer limitação quanto ao número de vezes em que pode ser
formulado. Assim, faz-se perfeitamente possível que uma mesma pessoa se divorcie
sucessivas vezes.
O pedido só pode ser levado a juízo pelos consortes. Excepcionalmente, em
caso de incapacidade do cônjuge, admite-se seja a pretensão deduzida por curador,
ascendente ou irmão. Pouco importa saber se a separação precedente, judicial ou
de fato, ocorreu por culpa de um ou de ambos os cônjuges. O cancelamento desse
vínculo matrimonial se dá através de meio judicial ou extrajudicial.
O divórcio judicial se realiza por meio de sentença transitada em julgado, com
o consentimento das partes que desejam uma sentença para definir a divisão dos
bens, pensão alimentícia e guarda dos filhos, em acordo firmado e homologado
perante juiz, especialmente se os ex-cônjuges possuam filhos menores e incapazes.
O divorcio judicial litigioso acontece sempre que a decisão ou iniciativa são
unilaterais provindas apenas de uma parte ou quando não há acordo para guarda
dos filhos, pensão alimentícia e divisão dos bens inserindo o judiciário diretamente
para a resolução do conflito juntamente com as partes envolvidas.
O divórcio extrajudicial simplesmente se realiza mediante contrato realizado
entre as partes firmado em cartório público, desde que o casal esteja em acordo,
inclusive quanto à divisão de bens e não haja filhos menores ou incapazes.
3.2 O divórcio no ordenamento jurídico brasileiro
A Emenda Constitucional n.º 66/2010 inovou alterando gradualmente a Lei do
Divórcio quando retirou o prazo de reflexão para que o mesmo ocorresse. Com isso,
apresentou celeridade ao processo de divórcio e facilitou o procedimento para sua
conclusão.
O principal dispositivo que foi alterado para que ocorresse essa mudança foi
no artigo 226, § 6º da Constituição Federal, o qual retirou a separação de fato e a
separação judicial do dispositivo, prevalecendo apenas o divórcio como forma de
dissolução do vínculo conjugal.
No Código Civil, as alterações vão além da exclusão da separação, tendo em
vista que o divorcio afeta todas as modalidades previstas na legislação após a
conclusão desse instituto.
36
Observa-se que os reflexos das mudanças ultrapassam a dissolução do
vínculo matrimonial em si e abarcam efeitos referentes à pensão alimentícia, guarda
dos filhos, partilha de bens e uso do nome, o que denota a importância de se
investigar a facilitação concedida pelo ordenamento jurídico brasileiro para o fim da
sociedade conjugal.
3.2.1 Guarda dos filhos
As mudanças que ocorrerem com relação ao vínculo conjugal dos pais não
podem afetar o convívio afetivo com os filhos entre ambas as partes. Para isso, o
artigo 1579 do Código Civil descreve que o divórcio não modifica os direitos e
deveres dos pais, sendo que a responsabilidade quanto alimentos, moradia e
principalmente o da afetividade entre a família, mesmo após a dissolução do vínculo
judicial, perdurará.
A legislação apresenta três tipos de guarda, a compartilhada, a unilateral e
aquela que pode ser deferida a terceiros. Porém, além dessas, a doutrina e o direito
comparado mencionam também mais dois tipos de guarda, a alternada e a nidal.
A guarda conjunta ou compartilhada conduz os pais a uma unificação a
educação de seus filhos, fazendo com que estes estejam mais presentes
integralmente no desenvolvimento dos filhos, levando a pluralização das
responsabilidades e realizando uma verdadeira eclosão em todos os sentidos,
mesmo após o divórcio, onde os pais não estarão ausentes em momento algum.
Nesta modalidade de guarda pode se definir uma residência única ou duas, sendo
que os direitos e responsabilidade sobre o menor prevalecerão iguais para ambos os
pais.
“Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser
dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as
condições fáticas e os interesses dos filhos” (art. 1.583, § 3º, Código Civil).
Para Maria Berenice Dias, a guarda compartilhada consiste em uma garantia
para a criança ter maior presença dos pais do que na guarda unilateral, marcada
esta pelo distanciamento daquele que não fica com a guarda, in verbis:
Compartilhar a guarda de um filho se refere muito mais à garantia de que ele terá pais igualmente engajados no atendimento aos deveres inerentes ao poder familiar, bem como aos direitos que tal poder lhes confere.
37
Segundo Maria Antonieta Pisano Motta, a guarda compartilhada deve ser tomada, antes de tudo, como uma postura, como o reflexo de uma mentalidade, segundo a qual pai e mãe são igualmente importantes para os filhos de qualquer idade e, portanto, essas relações dever ser preservadas para a garantia de que o adequado desenvolvimento fisiopsíquico das crianças ou adolescentes venha a o ocorrer (DIAS, 2009, p. 403).
Na guarda compartilhada, há uma ideologia de uma cooperação mútua entre
os ex-cônjuges para encontrarem juntos uma melhor solução para a criação de seus
filhos. Ocorrem mais comumente entre pais que residem próximos uns dos outros,
para permitir uma alternância mais facilitada de uma casa para outra, já que a ideia
consiste em divisão igual de tempo entre as casas, tanto em período escolar como
nas férias. Naturalmente, esse modelo de guarda não pode ser imposto e nem pode
ser aceito em todos os casos, mas apenas quando os pais estiverem de comum
acordo e realmente for conveniente para os pais e os filhos (GONÇALVES, 2012, p.
295).
Segundo o art. 1583, § 1º, do Código Civil:
Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
A guarda unilateral é aquela exclusiva a um dos genitores, seja por consenso
dos pais ou decisão judicial, sendo essa atribuída se não for viável a guarda
compartilhada, sobretudo em razão do relacionamento entre os pais. Neste caso, a
guarda unilateral é atribuída à parte que melhor reunir condições para exercê-la.
A obtenção da guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a
supervisionar os interesses dos filhos (art. 1583, § 3º, Código Civil). Mas “qualquer
dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação
de contas” (art.1.583, § 5º, Código Civil).
A guarda unilateral tem sido a modalidade mais comum. Um dos cônjuges fica
com a guarda e o outro com o direito de visitas. O problema reside no inconveniente
de um dos pais não participar da convivência diária e contínua do filho
(GONÇALVES, 2012, p. 293).
Na guarda deferida a terceiros, os pais não reúnem condições necessárias
para defenderem o melhor interesse dos filhos. Há necessidade de deferir a guarda
38
do menor a um terceiro que será o responsável pela criança e deverá defender seus
interesses.
O Estatuto da Criança e do Adolescente regulamenta, complementando o
Código Civil, a posse da criança ou adolescente em situação irregular, para
promover o processo de tutela e adoção, sempre de acordo com o melhor interesse
do menor.
Neste sentido, a jurisprudência:
CIVIL E FAMÍLIA. APELAÇÃO CÍVEL. MODIFICAÇÃO DA GUARDA PARA TERCEIROS. MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. 1. A concessão da guarda deve ser precedida de avaliação criteriosa do contexto sócio-econômico em que inserido a menor, devendo permanecer na companhia de quem lhe protege e assegura a efetividade do princípio do melhor interesse. 2. Verificado, após estudo psicossocial, que a criança possui o amparo e condições sadias de desenvolvimento físico e psicológico, possível a concessão da guarda aos padrinhos, sobretudo quando evidenciado que a genitora se mudou para outro estado da Federação e se desobrigou de criar a infante. 3. Recurso desprovido. (TJ-DF - Apelação Cível APC 20130610056165, DF 0005510-53.2013.8.07.0006, TJ-DF, Data da publicação: 24/03/2015).
A guarda alternada, apesar de ter características com a guarda
compartilhada, é completamente desigual, pois nessa modalidade a criança se
alterna sobre o poder de responsabilidade dos pais. Por exemplo, um período de um
mês, sob a responsabilidade de um genitor e outro mês sobre a responsabilidade do
outro, divide-se o tempo da criança de forma igualitária entre os pais.
“Não há compartilhamento porque embora os pais consintam em que a
guarda não seja exclusiva de nenhum deles por tempo indeterminado também
sabem que não é de ambos a um só tempo. Criam-se regras, espaços próprios,
tempos próprios e o filho participará dessa alternância sistematizada de
convivência.” (BELLO).
Neste sentido, cita-se como exemplo:
FAMÍLIA. AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA. SITUAÇÃO DE ALTERNÂNCIA QUE, EMBORA NÃO ACONSELHÁVEL PELA DOUTRINA E JURISPRUDÊNCIA, SE CONSOLIDOU NO TEMPO. MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA. ESTUDOS PSICOSSOCIAIS. PROVA SEGURA. CRIANÇA ADAPTADA E FELIZ. SENTENÇA MANTIDA. - A guarda alternada de filho entre pais não é providência que se recomenda quando a autoridade judiciária irá, pela primeira vez, definir quem conservará a prole consigo. - No entanto, se a guarda alternada consolidou-se por mais de três anos e os estudos sociais realizados indicam que o filho encontra-se saudável, feliz e com desenvolvimento emocional normal, não é
39
razoável modificá-la para estabelecer a guarda unilateral. (TJ/MG, Processo nº 07271641020088130153).
A guarda nidal, representa o inverso da guarda alternada, pois quem se
alterna na residência são os pais, os filhos continuam na residência original onde
moravam com os pais, e a cada período um dos genitores ficara junto com os filhos
nessa residência original. Essa modalidade de guarda é aplicada no ordenamento
jurídico alemão. No ordenamento jurídico brasileiro não há nenhuma proibição dessa
modalidade, porém ela é pouco acolhida pelos ex-cônjuges (CUNHA, 2013, p.101).
Seja qual for a modalidade de guarda escolhida, além das regras e princípios
do Código Civil, do Estatuto do Adolescente, da Constituição Federal e da Lei de
Guarda n.º 11.698/08, deve-se sempre buscar a melhor solução para o menor, para
sua adaptação, segurança e felicidade, de acordo com o melhor interesse do menor.
Cada caso exige uma análise individual com muita cautela.
3.2.2 Partilha de bens
A partilha de bens no divórcio caracteriza-se pela divisão dos bens adquiridos
ou entregues uns aos outros na constância do casamento. Alguns desses bens são
adquiridos antes ou depois do matrimônio, podendo comunicar-se ou não,
dependendo do regime em que constituíram pro meio do vinculo conjugal, sendo
que cada um possui uma característica própria para a partilha dos bens dentro da
legislação.
A partilha no divórcio depende do acordo firmado entre as partes e deverá ser
homologado pelo juiz. Os bens deverão ser todos descritos no pedido de partilha e,
se não houver acordo entre os ex-cônjuges, o juiz homologará sentença de acordo
com o regime de bens adotado na constância do casamento (VENOSA, 2014, p.219)
O regime de comunhão parcial de bens, os bens adquiridos pelo casal
durante o casamento ou união estável, juntos ou individualmente, pertencem aos
dois. Com o divórcio ou a dissolução da união, os bens devem ser somados e
divididos por dois, ficando metade para cada um. Essa metade se chama meação, e
à totalidade dos bens submetidos à partilha dá-se o nome de aquestos, nos moldes
dos artigos 1658 a 1666 do Código Civil.
No caso de regime de comunhão universal de bens, além dos bens
adquiridos durante o casamento ou união estável, somam-se os bens que o cada
40
cônjuge ou convivente já havia antes de casar ou juntar. Com o divórcio ou a
dissolução da união, os bens devem ser somados e divididos por dois, ficando
metade para cada. Essa metade se chama meação, e à totalidade dos bens
submetidos à partilha dá-se o nome de aquestos, conforme artigos 1667 a 1671 do
Código Civil.
No regime de separação de bens, imposto pela lei quando um dos noivos tem
mais de setenta anos de idade, cada parte sai do casamento ou união estável, com
aquilo adquiriu individualmente, antes ou depois do vínculo. Neste regime há plena
liberdade para negociar os bens sem a concordância do outro cônjuge, pois os bens
adquiridos durante a relação pertencem a cada um, exclusivamente, nos termos dos
artigos 1687 a 1688 do Código Civil.
No regime de comunhão participação final nos aquestos, o casal tem ampla
liberdade de negociar seus bens durante o casamento ou união, independente de
autorização do outro. A peculiaridade deste regime é que, no fim da relação, os
bens adquiridos e administrados individualmente durante a relação devem ser
somados e divididos proporcionalmente para cada um, salvo acordo em contrário,
nos termos dos artigos 1672 a 1686 do Código Civil.
Quando o divórcio for consensual e os cônjuges não possuírem filhos
menores, o acordo para divisão dos bens poderá ser realizado em cartório de
registro público, podendo os cônjuges ajustar da forma que desejarem a divisão e
bens. Quando não houver acordo entre as partes quanto à divisão dos bens ou
ainda houver filhos menores, deverá obrigatoriamente ser aplicado de o regime de
bens escolhido na celebração do casamento, sendo a decisão a ser imposta pelo
juiz de direito.
Se no contrato do casamento houver a clausula de incomunicabilidade de
bens e esta estiver registrada em cartório público constando a incomunicabilidade de
devido bem, esse independerá do regime adotado na constância do casamento e
não se comunicará com os demais.
Caso haja escolha do regime de bens em eventual pacto antenupcial, serão
obedecidas as regras específicas daquele regime. Se não houver feito escolha do
regime de bens, adota-se o regime da comunhão parcial de bens. Neste caso,
aplicam-se as regras deste regime no ato do divórcio.
Independentemente do regime de bens, o ideal seria que os cônjuges
conseguissem realizar um acordo para um divórcio amigável, mesmo quando o
41
divórcio exija um processo judicial porque existem menores envolvidos. No entanto,
caso o acordo não seja possível, o juiz se utilizará das regras específicas de cada
regime de bens e dos princípios constitucionais e civis específicos, com suporte,
sobretudo, nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, para encontrar a
solução mais justa.
3.2.3 Uso do nome
No momento da celebração do casamento, os cônjuges podem adotar o
sobrenome um do outro, tanto o homem como a mulher. O Código Civil em seu
artigo 1565, § 2° descreve que qualquer dos nubentes, se quiser pode acrescer ao
seu nome o sobrenome do outro. Através do casamento a adoção do sobrenome é
facultada a vontade dos nubentes, e se caso venha ocorrer o divórcio também fica
facultativa a retirada do sobrenome podendo o ex-cônjuge continuar a usar o
sobrenome do outro.
Antes, não havia essa permissão, salvo nos casos do art. 1.578, I a III,
quando houver prejuízo evidente para identificação do cônjuge, ou manifesta
distinção entre seu nome de família e os dos filhos havidos da união dissolvida, ou,
ainda, dano grave reconhecido de decisão judicial. Hoje, não há mais proibição, e o
cônjuge pode manter livremente o nome de casado.
O sobrenome que causar prejuízo em sua perda será defeso por sentença
caso o ex-cônjuge deseje que a parte retire o sobrenome. De qualquer forma se a lei
atribui aspectos para resolução desses casos os cônjuges terão amparo para melhor
resolver essas situações.
Venosa descreve que:
Não perderá o sobrenome o cônjuge que se houver evidente prejuízo para a sua identificação. Imagina-se, nesse caso, por exemplo, a situação de um ator ou escritor que tenha granjeado fama como sobrenome do outro cônjuge. Essa perda do sobrenome também poderia inserir se no dano econômico grave. (VENOSA, 2014, p.171).
Com a Emenda Constitucional n.º 66/2010, não haverá repercussão de
eventual culpa na manutenção ou perda do direito de usar o sobrenome de casado
após o divórcio. Assim, considera-se revogado o art. 1.578 do Código Civil.
42
A preservação do direito do homem ou da mulher de "usar o nome do outro", diz respeito exclusivamente ao cônjuge vencido na ação de separação judicial, embora as exceções enumeradas no art. 1.578, I, II e III, consubstanciam simples reprodução do parágrafo único do art. 25 da Lei n.
6.515/77 (CAHALI, 2002, p. 726).
O nome incorpora-se à personalidade da pessoa e por esse motivo inclui-se
no rol dos direitos da personalidade, conforme artigos 16 a 19 do Código Civil e art.
5º X da Constituição Federal que garante o direito à privacidade. Por isso, o uso do
nome de casado após o divórcio incumbe apenas ao cônjuge, culpado ou não,
como sua faculdade exclusiva, pois está incorporado à sua personalidade, de acordo
com o princípio da dignidade da pessoa humana, assegurado no art. 1º, inciso III da
Lei Maior (GONÇALVES, 2012, p. 290).
No entanto, pode haver decisão jurisprudencial em sentido contrário, como
esta:
O ESFORÇO COMUM. USO DO NOME DE CASADA. DIREITO DA PERSONALIDADE. PERDA. REQUISITOS (CC, ART. 1.578). ATENDIMENTO. GUARDA. PROVA TÉCNICA. ESTUDO PSICOSSOCIAL. RELEVÂNCIA. PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. OBSERVÂNCIA. DISSENSO ENTRE OS GENITORES. COMPARTILHAMENTO. NÃO CABIMENTO. 1. No regime de separação de bens, os patrimônios de cada cônjuge são distintos e incomunicáveis, detendo cada cônjuge a livre administração e disposição dos bens (CC, artigo 1.687). 2. Visando evitar o enriquecimento sem causa, nada obsta que, havendo esforço comum dos cônjuges na aquisição do patrimônio, este seja dividido, desde que se faça prova neste sentido. 3. O nome é a identificação da pessoa e, por consequência, um direito da personalidade, superada de há muito a ideia de que seria um direito de propriedade. 4. A manutenção do nome de casado após o divórcio é faculdade assegurada pelo § 2º do artigo 1.571 do Código Civil. 5. Existe uma única hipótese de perda do sobrenome de casado contra a vontade do titular, hipótese em que requer a combinação de quatro requisitos, a saber: 1º) Pedido expresso do cônjuge inocente (o juiz não pode atuar de ofício); 2º) Culpa grave reconhecida na decisão judicial; 3º) Não causar prejuízo à identificação da prole; 4º) Não causar prejuízo à identificação do próprio cônjuge. 6. Em ações que se discutem a atribuição ou modificação de guarda e responsabilidade, não deve ser considerado somente e de modo determinante o sentimento que envolve a relação paterno-filial, mas um conjunto de fatores inerentes às condições de proteção e cuidado, capazes de contribuir para o desenvolvimento psíquico e fisicamente saudável dos infantes. 7. O estudo psicossocial configura uma importante prova técnica apta, em regra, a fundamentar o convencimento do julgador a respeito da lide posta em debate. 8. Demonstrado, por meio de laudo técnico (estudo psicossocial), que os menores estão adaptados à convivência materna e atendidos em suas necessidades, não há motivos para estabelecer a guarda unilateral ao genitor.
43
9. O compartilhamento da guarda pressupõe a existência de cooperação e comunicação entre os genitores, com vistas a promover o melhor interesse da criança e do adolescente. Desse modo, constatada a dificuldade de se estabelecer um canal de comunicação entre os pais, não se mostra recomendável o exercício da guarda compartilhada. 10. Apelação da autora conhecida e não provida. Apelação do réu conhecida e parcialmente provida. (TJDFT, 20120610124630APC, APC, Apelação Cível, 1ª Turma Cível, Relatora: Simone Lucindo, Data do julgamento: 23/09/2015, Publicado no DJE: 06/10/2015).
O uso do nome, embora o nome seja inerente à personalidade da pessoa,
pode haver um questionamento do outro cônjuge como uma espécie de invasão ou
tomada de parte da personalidade da sua família que não pertence mais ao outro.
Conclui-se que, neste aspecto, caberá muito a análise individual de cada caso e da
interpretação jurisdicional no caso concreto.
3.2.4 Pensão alimentícia
A pensão alimentícia consiste na fonte de renda necessária para o custeio
das despesas de quem não tem meios próprios de subsistência. Nader (2013, p 453)
descreve que são direitos subjetivos, mas invocados em juízo, consistindo na
prestação periódica decorrente do vínculo familiar. Tem direito de receber o filho, ex-
cônjuge, ex-companheiro de união estável e os pais, desde que comprovada à
necessidade de quem solicita. Neste tópico, caracterizam-se como despesas, gastos
com alimentação, saúde, locomoção, lazer e educação.
Obrigação alimentar, em Direito de Família, que é decorrente de parentesco, ou da formação de uma família (matrimonial ou união estável, ou qualquer outra modalidades de famílias, como união homoafetiva), também é possível afirmar a reciprocidade nos alimentos pois todo aquele que potencialmente, tem direito a recebê-los da mesma forma pode vir a juízo exigi-los para si, se incidir em situação de necessidade. Note se que na mesma linha de parentesco, entre ascendentes e descendentes, não há limites de grau para a fixação de tal obrigação, podendo ser estendidos a avós, bisavós e outros, indefinidamente enquanto houver atendimento aos pressupostos de necessidade/possibilidade, á luz de um critério de razoabilidade. (GAGLIANO, 2013, p.685).
Os alimentos, juridicamente, não significam apenas o alimento em si, mas
também a condição social que vivia o cônjuge antes do divórcio, em conjugação com
a aplicação do binômio necessidade-possibilidade.
44
Assim, o art. 1.694 do Código Civil dispõe que “podem os parentes, os
cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem
para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às
necessidades de sua educação.”
Com relação à educação, se comprovada à necessidade, não só tem direito à
pensão a criança, como também o cônjuge, em casos que comprove que ele deixou
de estudar para cuidar do filho. Se o cônjuge já tem graduação, perde o direito, de
acordo com o artigo 1694 do Código Civil.
Para entrar com pedido de pensão alimentícia, a mãe ou o pai precisam de
documentos que provem a condição de filho como, certidão de nascimento,
documentos do pai e da mãe e provas de bens materiais do pai ou da mãe. O valor
será estabelecido conforme os rendimento líquidos do prestador, que pode ser o pai,
mãe, ou responsável.
Enquanto os filhos se encontram sobre o poder familiar, aos pais cumprem
conjuntamente o dever de elementar de prover o seu sustento.
Além dos direitos alimentares estarem amparados no Código Civil, também
existe a Lei nº 5.478 de 25 de julho de 1968, que regulamenta o direitos a pensão
alimentícia.
Neste liame, se, após o divórcio, um dos cônjuges não tiver como se
sustentar ou tiver grandes prejuízos decorrentes da separação, cabem alimentos.
Estes, por sua vez, podem ser pleiteados pelo homem ou pela mulher, de acordo
com o princípio da igualdade, assegurado no art. 5º, I da Constituição Federal.
No entanto, algumas observações se fazem necessárias. Em caso de o
cônjuge demandante poder se sustentar, não tem direito a alimentos. Da mesma
maneira, se houver modo de se recolocar no mercado de trabalho, pode ter uma
pensão alimentícia estabelecida temporariamente. Se o cônjuge tiver idade
avançada e não tiver possibilidade de se colocar no mercado de trabalho, a pensão
pode ser definida para o resto de sua vida. Mas, se o cônjuge contrair novo
matrimônio, perde o direito. Entretanto, o novo casamento do cônjuge devedor não
exclui sua obrigação. Em muitos pontos, há divergência doutrinária a ser sanada em
cada caso concreto.
O pressuposto da necessidade do alimentando somente se descaracteriza se referidos bens de que é titular se mostram hábeis para ministrar-lhe rendimento suficiente a sua mantença; ou não se mostra razoável exigir-lhe
45
a conversão de tais bens em valores monetários capazes de atender aos reclamos vitais do possuidor. Mas a matéria é controvertida, impondo-se temperamentos com vistas a uma solução de equidade, ínsita, aliás, na natureza do instituto. Para Laurent, aquele que possui imóveis não se encontra em estado de necessidade, se ele pode procurar os meios para viver, vendendo-os. Diana Amati e Tamburrino dizem que o fato de possuir o alimentando bens não exclui a necessidade, quando a alienação destes, bastando para satisfazer apenas temporariamente às suas necessidades, resolve-se em inútil dilapidação de seu patrimônio. Divergindo deste entendimento, Tedeschi aproxima-se da opinião de Laurent. Tratando-se de questão de fato, nenhum princípio pode ser enunciado. Daí a observação de Cunha Gonçalves: 'Não se pode dizer que é necessitado quem possui importantes valores improdutivos, cuja alienação lhe pode produzir um capital suficiente para subsistir por largo tempo, consumindo-o regradamente, pois necessitado é somente quem não possui recursos alguns para satisfazer às necessidades ou que só os tem os suficientes para parte delas.' [...] Donde se ter decidido que 'poderá reclamar alimentos de seus parentes aquele que, embora possuindo bens, não aufira rendas, por serem os mesmos improdutivos e lhe faltarem possibilidades para explorá-los, para aquela finalidade. (CAHALI, 2013, p. 500/501).
Ressalte-se que a legislação brasileira permite apenas alimentos presentes e
futuros, não sendo possível o pedido de alimentos pretéritos. Se sobreviveu sem os
alimentos, não há motivo para sua concessão.
Outro ponto importante reside na possibilidade de prisão civil pelo não
pagamento de pensão alimentícia. A mesma regra aplicável à pensão alimentícia
devida aos filhos cabe em relação aos ex-cônjuges. Neste sentido, a Súmula n.º 309
do STJ estabeleceu que “O débito alimentar que autoriza a prisão civil do
alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da
execução e as que se vencerem no curso do processo”.
Nada impede que o cônjuge renuncie ao seu direito de alimentos. A
irrenunciabilidade só tem sentido enquanto vigente o casamento ou a união estável,
nos termos do art. 1.707 do Código Civil.
A Emenda Constitucional n.º 66/2010 extinguiu a culpa também em relação
aos alimentos:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DIVÓRCIO - SENTENÇA PROLATADA APÓS A EC Nº 66/2010 - EXTINÇÃO DO VÍNCULO CONJUGAL E REALIZAÇÃO DA PARTILHA DE BENS - PLEITO DE ALIMENTOS INDEFERIDO POR ALEGADA INCOMPATIBILIDADE DE PROCEDIMENTO - INSURGÊNCIA DO VARÃO, QUE AFIRMA TER DEPENDIDO ECONOMICAMENTE DA EX-ESPOSA NO PERÍODO DE 40 (QUARENTA) ANOS EM QUE PERMANECERAM CASADOS, NÃO POSSUINDO CONDIÇÕES DE ATUALMENTE PROVER O SUSTENTO PRÓPRIO - CASAL SEPARADO DE FATO POR LAPSO SUPERIOR A 4 (QUATRO) ANOS - POSSIBILIDADE DE A VERBA ALIMENTÍCIA SER FIXADA NA AÇÃO DE DIVÓRCIO - PRECARIEDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO APRESENTADO NA ESPÉCIE - AUSÊNCIA DE
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DEMONSTRAÇÃO DO BINÔMIO NECESSIDADE-POSSIBILIDADE - INEXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA ACERCA DE QUE O RECORRENTE ERA QUEM FAZIA AS TAREFAS DOMÉSTICAS E CUIDAVA DA PROLE, ENQUANTO A CÔNJUGE VIRAGO EXERCIA ATIVIDADE REMUNERADA - ALEGAÇÃO DA RECORRIDA NO SENTIDO DE QUE O EX-CONSORTE TRABALHAVA NO COMÉRCIO INFORMAL DE COISAS E ANIMAIS, AUFERINDO, AINDA, COM EXCLUSIVIDADE, O FRUTO DA LOCAÇÃO DOS BENS AMEALHADOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO - DÚVIDA QUANTO AO MEIO DE SUBSISTÊNCIA DO APELANTE NO PERÍODO DA SEPARAÇÃO DE FATO - PRETENSÃO QUE DEVE SER RENOVADA EM PROCEDIMENTO AUTÔNOMO, ACOMPANHADA DA RESPECTIVA PROVA - SENTENÇA REFORMADA ANTE A VIABILIDADE DA CUMULAÇÃO DO PEDIDO DE DIVÓRCIO E ALIMENTOS - PLEITO EXAMINADO EM GRAU RECURSAL, MAS, CONTUDO, JULGADO IMPROCEDENTE - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Após a alteração promovida pela Emenda Constitucional 66/2010, o divórcio passou a constituir rompimento do vínculo da sociedade conjugal independente da discussão de culpa pelo fim do relacionamento afetivo, dispensando-se o prévio afastamento dos consortes e, inclusive, anterior declaração judicial acerca da respectiva dissolução, de modo que não há impedimento para que, juntamente com a partilha de bens e definição da guarda dos filhos, seja fixada obrigação alimentar em benefício do cônjuge que fizer prova do seu estado de necessidade, desde que igualmente demonstrado que aquele contra quem se formula o pedido pode responder pelo encargo sem prejuízo do seu sustento próprio ou de seus familiares. (TJ/SC, 696740 SC 2011.069674-0, Relator: Luiz Fernando Boller, Data de Julgamento: 24/02/2012, Quarta Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Apelação Cível nº , da Capital / Estreito).
Na atual conformação normativa do divórcio, sobretudo com a extinção da
culpa, há mais liberdade de estabelecimento de acordo em relação ao uso do nome,
aos alimentos e outros itens da separação. Percebe-se um distanciamento do
Estado nas relações familiares, para um respeito maior à intimidade e à privacidade,
para a construção da felicidade.
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4 DIVÓRCIO EM FACE DA EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 66/2010
Após analisar as características pertinentes ao divórcio verifica-se a
necessidade de aprofundamento de pesquisa sobre a Emenda Constitucional n.
66/2010, em que o divórcio passa a ser regido de forma livre pelo principio da
dissolubilidade do vínculo matrimonial, segundo o qual, se não houver mais vontade
ou interesse em manter a vida a dois, não pode o casal ser obrigado a viver
matrimonialmente, podendo, a qualquer tempo, extinguir a vida conjugal.
A Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, deu nova redação ao
§ 6º do art. 226 da Constituição Federal, o qual sintetiza que “o casamento civil pode
ser dissolvido pelo divórcio”. Entende-se que a separação conjugal não foi
recepcionada pelo texto constitucional. Estabeleceu-se o divórcio direto como único
meio de extinção do casamento.
A intenção da Emenda ficou clara no sentido de permitir aos casais a
possibilidade de se divorciarem a qualquer momento, sem necessidade de nenhum
requisito prévio, como, por exemplo, a culpa, ou da espera de um prazo para se
provar que vida em comum se tornou insuportável. Não mais se obriga os casais,
que não se amam mais, aguardar um ano após a separação para o divórcio indireto
ou dois anos de separação de fato para o divorcio direto.
A mudança foi reconhecida como reflexo dos anseios sociais e da evolução
da sociedade, de acordo com a nova interpretação e novos princípios e valores que
já vinham sido reconhecidos pela jurisprudência. O Direito, como fruto das relações
sociais, teve que se adaptar.
4.1 Aplicação da nova regra do divórcio: a Emenda Constitucional n.º66/2010.
Em 13 de julho de 2010, a Emenda Constitucional n. 66 provocou uma
verdadeira revolução no Direito de Família, ao trazer o divórcio ao centro de todas
as atenções midiáticas, sociais e religiosas daquele ano. Houve a descaracterização
da separação no nosso ordenamento jurídico, restando apenas o divórcio como
forma de dissolução do casamento por iniciativa das partes.
O texto da Emenda não foi redigido no Congresso Nacional, mas surgiu como
iniciativa do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM, que após deliberação
em plenário no IV Congresso Brasileiro de Direito de Família, apresentou o projeto
48
que sugeria a posterior Emenda Constitucional, com o objetivo de unificar no
divórcio todas as hipóteses de cessação da vida conjugal.
A proposta foi apresentada ao Congresso pelo deputado Antônio Carlos
Biscaia, como PEC 413/05 e, posteriormente pelo deputado Sérgio Barradas
Carneiro, que deu nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal,
resumindo se em dispor que “o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio”.
Assim,
[...] a Constituição joga por terra aquilo que a melhor doutrina e a mais consistência jurisprudência vinham afirmando há muitos anos , a discussão da culpa pelo do fim casamento, aliás um grande sinal de atraso no ordenamento jurídico brasileiro (CUNHA,2013, p.50).
Com essa modificação, o novo divórcio passou a ter validade imediata, não
necessitando de prévio requisito para que o mesmo ocorra. Para que essa
independência adviesse de forma legitima, houve antes um verdadeiro embate de
princípios religiosos em oposição ao Legislativo. Um dos argumentos utilizados para
aprovar a Emenda Constitucional n. 66/2010 foi que a desburocratização do divórcio
apenas refletiria a um anseio da sociedade brasileira, pois muitas pessoas
separadas judicialmente viviam em situação de união estável, embaraçando ainda
mais as relações familiares antigas e as sucessórias. Levou-se em conta também o
fato de que, no Brasil, o número de reconciliações de casais separados de fato ou
judicialmente era muito pequeno e a maioria dos processos de separação judicial
começava ou terminava de forma consensual.
Cumpre relatar que, em razão da segurança jurídica, pessoas já separadas
ao tempo da promulgação da Emenda não podiam ser consideradas
automaticamente divorciadas. Exigia-se o necessário pedido de decretação do
divórcio, porém, não há mais a necessidade de cômputo de qualquer prazo
(CUNHA, 2013, p.48).
Observa-se, ainda que, nos casos de divórcios e separações consensuais
administrativos, disciplinados pela Lei nº. 11.441/2007, os tabeliães não deverão
mais lavrar escrituras públicas de separação, mantendo-se aquelas já formalizadas,
possibilitando, também, lavrarem atos de conversão de separação em divórcio, nos
termos do art. 52 da Resolução n.º 35 do Conselho Nacional de Justiça. Todavia, se
o tabelião lavrar escritura de separação, após a vigência da EC nº 66/2010, esta não
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terá validade jurídica, sendo nula absolutamente, de acordo com o art. 166, II, do
Código Civil.
Assim, no âmbito judicial, não há mais ao que se discutir em torno dessa nova
regra, já que a Constituição Federal extirpou totalmente de seu corpo normativo a
única referência que se fazia a separação judicial. Suprimiu, então, de todos os
outros artigos que em seu dispositivo discorria algo sobre separação judicial,
permanecendo em vigor apenas o divórcio. O divórcio passou ser o exercício de um
direito potestativo, podendo ser exercido por qualquer dos cônjuges que não queira
permanecer unido ao outro, independentemente do tempo de casados, se um ano,
um mês, uma semana ou um dia (GAGLIANO, 2013).
O divórcio passa ser a única forma de dissolução de casamento. Pode ser
consensual, com sentença homologada pelo juiz para divisão de bens, guarda dos
filhos e pensão alimentícia com as partes estando em devido acordo. Ou litigioso,
quando há falta de acordo entre as partes quanto a divisão de bens, guarda, pensão
alimentícia, ou resistência unilateral para conceder o divórcio consensualmente.
Ainda há o divórcio extrajudicial, realizado em cartório de registro publico quando as
partes possuem acordo sobre divisão de bens, salvo quando há filhos menores
incapazes. Cabe observar que com a impossibilidade de separação judicial, o
mesmo se aplica à extrajudicial, deixando de existir também a exigência de
observância dos prazos ou de separação prévia para o divórcio via escritura pública.
Subentende-se revogados todos os artigos do Código Civil que tratam da
separação judicial e não podem ser aproveitados para a realização do divórcio.
Frise-se que, alguns autores entendem que a separação judicial permanece válida
ante a não revogação expressa dos artigos do Código Civil, sobretudo o art. 1.577
do Código Civil, o qual enuncia que “seja qual for a causa da separação judicial e o
modo como esta se faça, é lícito aos cônjuges restabelecer, a todo tempo, a
sociedade conjugal, por ato regular em juízo.” Existem, inclusive, decisões
jurisprudenciais nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. DIVÓRCIO DIRETO CONSENSUAL. SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO. SUPRESSÃO DA AUDIÊNCIA DE TENTATIVA DE RECONCILIAÇÃO OU RATIFICAÇÃO. IRREGULARIDADE. POSTERIOR RECONCILIAÇÃO DOS CÔNJUGES. DECRETO DE DIVÓRCIO TORNADO SEM EFEITO. PRECEDENTE. Manifestada em juízo livremente pelas partes a vontade de dissolução da sociedade e do vínculo conjugal, não há cogitar nulidade do processo diante da supressão da audiência de tentativa de reconciliação ou ratificação,
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justificando-se a medida apenas em face de indícios de prejuízo. Todavia, sobrevindo aos autos manifestação de reconciliação dos cônjuges, ainda que depois de prolatada sentença homologatória, é possível torná-la sem efeito, por aplicação da norma disposta no caput do art. 1.577 do Código Civil, não havendo trânsito em julgado. Processo julgado extinto. APELO PROVIDO. (TJ/RS, Apelação Cível Nº 70065432122, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sandra Brisolara Medeiros, Julgado em 24/02/2016).
No entanto, com todo o respeito, não se pode admitir esse posicionamento,
uma vez que não subsiste sentido ou utilidade prática para a manutenção da
separação judicial, ainda que de forma facultativa. Além disso, seriam mais
processos pendentes de decisões judiciais tumultuando o já bastante
sobrecarregado Judiciário.
4.2 Os valores constitucionais contemporâneos e seus desafios de
concretização no âmbito social
Os princípios constitucionais formam a base para a valorização do Direito de
Família no atual ordenamento jurídico, marcado pelo movimento feminista na
década de 1960, quando houve a grande mudança no Direito de Família.
A grande mudança do Direito de Família no Brasil, como em todos os ordenamentos jurídicos ocidentais, não pode ser entendida fora de seu contexto histórico. Essas mudanças estão associadas ao declínio do patriarcalismo, que, por sua vez, tem suas raízes históricas a Revolução Francesa e a Revolução Industrial, que marcaram um novo ciclo histórico: a Idade Contemporânea. A partir daí, o declínio do patriarcalismo começa a se acentuar e surge o movimento feminista a grande revolução do século XX. (CUNHA, 2013, p.35).
Com o movimento feminista ganhando força no mundo e, consequentemente,
no Brasil, a revolução começa a dar sinais na legislação sobre a família e as
mulheres passam a ter direitos equiparados com os dos homens mesmo assim
existiam restrições pela diferença de sexo. O ponto de partida para os princípios
constitucionais nasce após essa revolução na qual as mulheres já não são mais
tratadas como mais frágeis, mas possuidoras de direito e deveres característicos
como ser humano independente do sexo.
Como consequência da evolução social, a Constituição Federal de 1988
assegura formas contundentes de direitos e deveres que devem ser seguidos por
todo cidadão brasileiro e entre esses direitos à liberdade de constituir família e a de
dissolução do vínculo conjugal.
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O artigo 5º da Constituição Federal descreve em seu caput que todos são
iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes. E, mais
precisamente, no inciso I, assegura que homens e mulheres são iguais em direitos e
obrigações.
As pessoas tem a liberdade de constituir família da melhor forma que lhe
convier. O principio da afetividade se apresenta como um dos principais
fundamentos desta construção.
Porém, observa-se que, diante de grande liberdade de escolha conjugal,
houve a banalização do instituto do casamento, que anteriormente era defendido por
interesses familiares e valores mais sólidos de construção e manutenção do núcleo
familiar, os quais foram bastante relativizados de acordo com interesses individuais
em sobreposição ao interesse de manutenção de uma família e, sobretudo, de um
conjunto familiar e um lar em seus moldes tradicionais para os filhos. De acordo com
o princípio da afetividade, o afeto se coloca acima de tudo para uma busca da
felicidade individual de cada membro da família enquanto ser humano com direito à
busca por sua felicidade. Com este argumento de afeto e felicidade, permite-se o
desfazimento do laço matrimonial sem nenhum requisito ou tempo, mas apenas com
base na liberdade de escolha e decisão dos cônjuges.
Essa inovação trouxe à contemporaneidade grandes desafios acerca da
preservação da família. Aparentemente, a liberdade e o sistema jurídico, por suas
regras e princípios, sempre estarão à frente de qualquer menção conservadora que
exista no país. Contudo, a garantia ao cumprimento de deveres e direitos após a
dissolução do casamento, principalmente quando se possui filhos menores ou
discordância acerca da divisão dos bens em que o Judiciário é acionado para
resolver essas questões, demonstra a imaturidade da sociedade frente a direitos
defendidos pelo ordenamento jurídico. A falta de acordo entre as partes gera um
enorme embate judicial, trazendo um desgaste entre os familiares e, principalmente,
não conseguindo, muitas vezes, fazer valer o propósito dos princípios constitucionais
em sua aplicabilidade a esses conflitos.
A Constituição Federal, ao defender a dissolução do casamento, não
contradiz seus princípios referentes à família, mas defende a felicidade e realização
pessoal de cada indivíduo. Outrossim, as obrigações que devem ser necessárias a
52
sua responsabilidade quando se trata de filhos menores e assegura o poder familiar
sobre os responsáveis pelo menor.
O poder familiar que está previsto no Código Civil consiste em um valor
contemporâneo que deve ser apreciado de forma minuciosa, pelos pais ou
responsáveis, pois caracteriza o valor que uma família mesmo dissolvida possui,
quanto à responsabilidade dos alimentos, a guarda dos filhos, a educação e a
formação do indivíduo.
A família pode ser entendida em uma definição lato sensu, como “uma
reunião de pessoas descendentes de um tronco ancestral comum, incluídas aí
também as pessoas ligadas pelo casamento ou pela união estável, juntamente com
seus parentes sucessíveis, ainda que não descendentes”, como também em
modo stricto sensu como sendo a “família é uma reunião de pai, mãe e filhos, ou
apenas um dos pais com seus filhos” (FIUZA, 2008, p. 939).
A história relata a formatação da família matriarcal, surgida pelo vínculo
sanguíneo, biológico da mãe, como autoridade do lar, substituída pela família
patriarcal, marcada pela autoridade inquestionável do pai, que, na antiguidade,
destacou-se pela sua habilidade para a caça, a pesca e a defesa do lar. A história
mostra, ainda, a evolução do modelo de família de acordo com valores sociais de
cada época.
A atual conformação familiar do art. 226 do Carta Magna reconhece diversas
modalidades de família. Além da forma tradicional formada pelo casamento entre um
homem e uma mulher e seus filhos, determina que a lei deve facilitar a conversão
em casamento, reconhecendo a união estável, bem como a família monoparental,
formada por qualquer dos pais e seus descendentes.
Nota-se como “as relações de família são, portanto, amplamente afetadas
pelas transformações da globalização, que abre espaço para as manifestações
plurais de comportamento” (SOARES apud MOTA, 2016).
Neste sentido,
O mundo contemporâneo requer a adequação do fenômeno de internacionalização de Direitos Humanos às normas de direito interno. Assim, novos temas como a igualdade de gênero, a democratização de uniões livres, a reconstrução do parâmetro parental, a socioafetividade, a inseminação artificial ou as uniões homoafetivas incrementam o debate que descamba, necessariamente, na concepção tradicional dos modelos familiares, passando a ser necessário que se repense os critérios de
53
igualdade e de cidadania aplicáveis a estes e inúmeros outros casos. (SOARES apud MOTA, 2016).
Assim, as novas famílias recebem os mesmos direitos e deveres antes
garantidos apenas ao modelo tradicional de família. Hoje, refere-se à família natural
como aquela decorrente dos laços sanguíneos, constituída por pai, mãe e filhos,
pelo casamento ou união estável, ambas com proteção constitucional e no 1.723 do
Código Civil. A família monoparental pode decorrer de produção independente,
separação dos cônjuges, morte, abandono ou adoção, formada por um dos pais e
seus descendentes, reconhecida no § 4º do art. 226 da Lei Maior. A modernidade
forçou o reconhecimento jurisprudencial da família socioafetiva ou homoafetiva,
proporcionando o reconhecimento da união amorosa entre pessoas do mesmo sexo,
com a possibilidade inclusive de adoção ou inseminação artificial para uma nova
conformação familiar.
De forma destemida e corajosa, a Justiça precisa ver que os
relacionamentos homoafetivos não merecem tratamento diverso do que se
outorga aos demais vínculos afetivos. Configuram uma família e, por isso,
devem estar ao abrigo das leis que regulam o casamento e a união estável.
Não se trata de uma sociedade de fato relegada ao Direito Obrigacional. É
uma sociedade de afeto, a ser enlaçada pelo Direito de Família para gerar
direitos e deveres entre os parceiros, tais como obrigação alimentar, direito
sucessório, pensão previdenciária, etc. (DIAS, p. 01).
Neste sentido, a jurisprudência:
APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. UNIÃO HOMOAFETIVA. PARTILHA. SENTENÇA MANTIDA. Aplica-se, no caso, o regime de comunhão parcial de bens, devendo ser partilhados, na proporção de 50%, os bens adquiridos durante a união, porquanto se presume tenham sido adquiridos com o esforço comum, nos termos do art. 1.725 do Código Civil . RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70059100727, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 16/04/2014).
Ademais, a família pluriparental se forma pela conjugação de diferentes graus
de parentesco, como fruto da conjunção de outras famílias monoparentais, onde o
afeto deve ser fundamental para o respeito e consideração familiar e aceitação
jurídica. “As famílias que recebem esse novo membro muitas vezes não estão
preparadas para recebê-lo, de modo que, somente o convívio diário pode fazer com
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que o afeto surja, e aí sim, o motivo para o reconhecimento jurídico” (CONCIANI,
RODRIGUES, 2016).
Em qualquer modalidade de família e sua dissolução, prioriza-se sempre o
afeto, a busca pela realização pessoal e pela felicidade, em detrimento de condições
formais engessadoras de formatos não mais condizentes com a realidade social
contemporânea, que prima por valores outros de tempos atrás. Nesta busca pela
realização individual, apresenta-se um tortuoso caminho e um complexo de trabalho
de verificação de direitos e deveres em geral no âmbito familiar, para adequação da
legislação às mudanças sociais, para que se possa respeitar os princípios da
igualdade e da dignidade da pessoa humana.
4.3 Aspectos polêmicos sobre o divórcio frente aos valores religiosos
Antes de nascida a Carta Constitucional de 1891, a Igreja Católica detinha
com exclusividade o privilégio de celebrar casamentos, e somente estes cerimoniais
eram considerados válidos pelo Estado no Brasil. A Constituição de 1891
reconheceu a legalidade do casamento civil, encerrando, assim, o monopólio da
Igreja Católica.
A primeira Constituição da República, em 1891, foi um marco importante para a laicização de um Estado Republicano, ao estabelecer que não haveria, mais uma religião oficial, que á época era a católica. Embora a igreja tinha oficialmente se separado do Estado a influência católica e a moral judaico cristã permaneceram ainda fortes por muitos anos, especialmente sobre as formas e o vínculo da constituição de família. Basta lembrar que casamento civil e casamento religioso eram um só (CUNHA, 2013, p.45).
Embora religião tenha sido separada da legislação brasileira, em 1891 com a
promulgação da primeira Constituição da República, ainda havia forte influência da
Igreja ante a formação de opinião da sociedade contemporânea acerca de temas
familiares, como casamento e divórcio. Não se percebe nitidamente a desvinculação
do aspecto religioso para a formação de diversos setores sociais, dentre esses
setores a formação da família tradicional, assim descrita pelos religiosos (CUNHA,
2013, p.31).
A principal característica que foi adotada severamente entre todas as
entidades religiosas foi a condenação do divórcio. Para fins religiosos o divórcio não
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era aceito, acreditava-se na condenação espiritual por um ser superior. Porém,
ressalta-se que após a Emenda Constitucional 66/2010, os preceitos religiosos que
detinham força para assegurar que normas legislativas fossem completamente
controladas evitando que acontecesse quebra de tradições religiosas, que passaram
a perder força, pautando-se apenas em assuntos legislativos que trouxessem
benefícios a população religiosa do país.
Toda essa mudança de conceito para aqueles que se divorciavam fez com
que algumas instituições religiosas das mais tradicionais do país adotassem
medidas completamente diferenciadas de suas tradicionais doutrinas, pautando-se
aqui no divórcio como estopim para que houvesse uma modernização da igreja e a
adaptação de seus estatutos internos a legislação atual.
Ao agregar os valores religiosos a princípios jurídicos verifica-se que a
religião sempre contribuiu de forma extensa com a formação do Estado de Direito,
sendo que a negação do divórcio, durante séculos, se dava em favor dos seus
costumes bem como pela interlocução de aceitamento dessa ruptura nos preceitos
familiares com a perspectiva de que o número de divorcio iria aumentar
gradativamente.
A Constituição Federal de 1988 descreve em seu artigo 19 que o Estado é
laico e que o poder público não pode estabelecer cultos religiosos e igrejas vedando
qualquer relação institucional com esses estabelecimentos. E defende em seu artigo
5º, inciso VI, a liberdade de religião garantindo o direito de culto. No entanto, a
laicidade do país é colocada em confronto com tantas comemorações religiosas que
existem no calendário.
Os motivos ocasionadores do divórcio geralmente não são previsíveis, pois no
início do casamento os cônjuges não se conhecem por completo, salvo aqueles que
já coabitaram antes de convolarem núpcias. Somente com a convivência, aquelas
características antes ocultas durante o período de namoro serão reveladas no dia a
dia, e, então, a situação se torna propícia para os confrontos entre o casal,
culminando na grande maioria em um futuro processo de divórcio.
Os efeitos de ordem emocional, caracterizado por ser psicológico e, é nesse
estágio, que geralmente acontece a separação do casal. Os efeitos advindos desse
processo acarretam o divórcio e a obrigatoriedade de comportamentos dos
cônjuges, como por exemplo, o homem terá que manter uma boa relação com a ex-
cônjuge para exercer plenamente o direito de visita aos filhos. A concessão do
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débito alimentar se mostra impositivo pela norma jurídica e, principalmente, a
convivência com o atual companheiro dos divorciados são alguns dos diversos
desafios impostos a eles.
O divórcio traz a liberdade de construção e de realização do individuo
contrapondo que as pessoas têm muitas adversidades a enfrentar para superar a
crise pós-divórcio para não afetar mais ainda o desempenho da prole diante dessa
circunstância. Aos filhos devem ser esclarecidas todas as nuances legais, como, por
exemplo, quem ficará responsável pela a guarda, sendo difundida atualmente àquela
exercida plenamente pelos dois progenitores a guarda compartilhada, competindo a
cada um deles desempenharem as mesmas obrigações e garantindo a presença
constante nas atividades que compõem suas vidas, auxiliando-os financeiro, moral e
emocionalmente.
Os progenitores não devem impedir o contanto direto da criança com o outro
genitor, bem como não devem manipular os filhos com o intuito de criar obstáculos
emocionais na relação pais-filhos, pois, assim, estaria configurada a alienação
parental, Mesmo com as consequências traumáticas, o divórcio ainda continua
sendo a maneira mais eficiente para pôr fim aos conflitos existentes entre os casais,
onde os maiores prejudicados serão os filhos.
A Emenda Constitucional nº 66/q2010 prevalece frente às necessidades
impostas pela sociedade em constante pressa para resolução de seus problemas.
No caso do divórcio, porém, ao confrontar a lei e a religião, o embate de paciência
passa a ter um diálogo extremamente crucial entre as partes, como descreve Maria
Berenice Dias (2010):
A alteração é significativa e para lá de salutar, pois atende ao princípio da liberdade e respeita a autonomia da vontade. Nada, absolutamente nada justifica impor a alguém a obrigação de manter se casado. Nem as obrigações decorrentes do poder familiar exigem que os pais vivam sob o mesmo teto, muitas vezes em um clima de tanta beligerância muito mais nocivo aos filhos. Também não se pode dizer que a salutar novidade venha a banalizar os “sagrados” laços do matrimônio. Não, ao contrário. Em face da enorme dificuldade de pôr um fio ao casamento a opção passou a ser a união estável, pois não há a necessidade da intervenção estatal nem prazos ou identificação de culpas para se dissolver. Os processos de separação, muitas vezes, se arrastavam por anos, com enormes prejuízos aos parentes e principalmente aos filhos. Previsíveis os danos emocionais e afetivos ao tomarem conhecimento que um dos seus genitores foi declarado culpado. Claro que o sabor de vitória do “vencedor” leva-o a desconstruir a imagem do outro, perante a família e a própria sociedade. (DIAS, 2010).
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A plena liberdade de escolha na legislação posta são as mesmas para as
religiões, porém observa se que há uma tolerância mais acentuada aos religiosos
em face da resolução de conflitos em seus relacionamentos onde há o ensinamento
eclesiástico aos seus adeptos.
Não existe banalização do instituto do casamento no direito formal, pois,
dentro do positivismo, a aplicabilidade dos interesses individuais passa a ser
completamente favorável a realização da pessoa humana. A respeito da
integralidade do positivismo sobre o divórcio, Maria Berenice Dias argumenta que
ninguém se dá conta que todos perdiam quanto essa inserção religiosa sobre a
legislação ainda que a alteração passe a vigorar desde já, é preciso lembrar que o
divórcio não passou a ser instantâneo, dando margem ao tão propalado período de
reflexão. Afinal, mesmo que haja consenso, não existam filhos menores e seja eleita
a via extrajudicial, é preciso constituir advogado. (DIAS, 2010).
Contudo, dentro do direito material religioso existe a extirpação do instituto do
casamento, pois não está em declínio apenas a realização da pessoa humana, que
deseja realização pessoal, mas também a tradição de construir uma família pautada
em princípios religiosos e sociais de forma tradicional, a vulnerabilidade na criação
de filhos em regimes de guarda onde os pais praticam a alienação parental e estão
em conflitos constantes e o desgaste da relação familiar de ambas as partes que
estão envolvias diretamente nesta rescisão contratual.
Ainda que exista uma pluralidade de crenças e liturgias no Brasil, diante da
laicidade do Estado assegurada na Constituição Federal, e cada Igreja tenha seu
regramento interno, ainda, pela tradição histórica, há um chamamento maior da
Igreja Católica, até mesmo por sua própria história e conservadorismo. O Direito
Canônico, como conjunto de normas estabelecidas pela Igreja Católica que
disciplinam sua organização e a atividade de pessoas a ela ligadas, perfaz um
Direito não estatal. Contudo, apresenta ainda grande influência nos direitos dos
povos.
Não se nega a influência da Igreja na conjugação da elaboração das leis e
sua aplicação na jurisprudência, mas percebe-se um aumento da inter-relação entre
o Direito Positivo, a jurisprudência e as manifestações da Igreja, todos em uma
busca incessante de atender aos anseios sociais de acordo com os valores e
princípios da modernidade, sem deixar de lado a segurança jurídica e, ao mesmo
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tempo, o amparo da doutrina religiosa para aqueles que possuem uma crença. Em
uma coisa todos concordam, não é uma tarefa fácil.
4.4 A nova ordem jurídica do divórcio e seu impacto na sociedade
Após a discussão acerca do divórcio, faz-se necessária a averiguação de
resultados de sua aplicação prática que facilitou a vida dos que querem se divorciar.
Retirada a separação do ordenamento jurídico, o divórcio passa a ser a única forma
de dissolução conjugal e traz resultados de aplicação que exigem uma análise de
sua eficácia ou ineficácia sobre a vontade das partes.
Percebe-se um aumento anualmente de casos de divórcio em pesquisas
realizadas, que apresenta um breve relatório sobre as estatísticas do divórcio em
relação à nova Emenda, duração do tempo de casamento e tipo de guarda mais
aplicada.
A Lei do Divórcio instituída em 1977 possibilitou juridicamente a dissolução da
vida conjugal, e, pouco tempo depois, em 1984, foram contabilizados 30,8 mil
divórcios. O Brasil registrou 341,1 mil divórcios em 2014, ante 130,5 mil registros em
2004, o que representa um salto de 161,4% em dez anos. Mais especificamente, em
1994, foram registrados 94,1 mil casos, o que representou um acréscimo de 205,1%
em comparação a 1984. E, em, 2004, com 130,5 mil casos, o aumento foi de 38,7%.
Em suma, a comparação entre 1984 e 2014 demonstra um crescimento de 1.007%
(PORTAL BRASIL GOV, 2015).
Na avaliação do IBGE, a elevação sucessiva, ao longo dos anos, do número de divórcios concedidos revela “uma gradual mudança de comportamento da sociedade brasileira, que passou a aceitá-lo com maior naturalidade e a acessar os serviços de Justiça de modo a formalizar as dissoluções dos casamentos”. (PORTAL BRASIL NET, 2015).
Também foi apresentada recente pesquisa sobre a duração dos casamentos,
não atribuindo tão somente essa desvalorização matrimonial apenas a nova lei do
divórcio, mas a independência feminina que cresceu nas últimas décadas, onde o
homem passou de fato a ter menor poder sobre a família e, como consequência,
equiparou-se à mulher em todos os aspectos sociais. (PORTAL BRASIL NET, 2015).
Outros dados interessantes foram levantados pelo IBGE. Por exemplo, a
idade média do homem ao se divorciar passou de 44 para 43 anos, entre 1984 e
59
2014, enquanto a das mulheres manteve-se de 40, nos dois casos. Quanto à
duração dos casamentos, no período entre 1984 e 2014, constatou-se redução na
duração dos casamentos, de 19 para 15 anos. (PORTAL BRASIL NET 2015).
A equiparação e a liberdade de direitos às mulheres durante as últimas
décadas também trouxeram mudanças no âmbito da guarda dos filhos que, em sua
predominância, permaneceram com as mães, as quais obtiveram êxito na
responsabilidade de seus filhos menores incapazes. Com a inserção no final de
2014 da guarda compartilhada, em caso de litígio judicial, o divórcio ganhou uma
atenuante a favor do bom relacionamento entre as partes. Independentemente das
divergências pessoais, o bem comum dessas relações deverá ser em favor da
criação de seus filhos.
A mulher sempre predominou as estatísticas de responsabilidade pela guarda
dos filhos menores de idade após o divórcio. O número aumentou de 78,9% dos
casos em 1984 para 85,1% em 2014. No entanto, o número já havia sido maior nas
duas décadas anteriores, as quais indicaram 89,7% em 2004 e 88,0% em 1994.
(PORTAL BRASIL GOV, 2015).
Esse cenário de crescente dissolução conjugal demonstra, de certa forma,
uma evolução nas relações interdependentes de partes que foram durante séculos
oprimidas, como as mulheres que vem adquirindo direitos e igualdades em âmbito
geral frente aos homens, mas também traz uma discussão acentuada sobre como o
afeto é diretamente subtraído dessas relações que são quebradas.
A Constituição trata os princípios constitucionais como forma de garantia de
direitos e deveres. Da mesma forma que se fere o direito de liberdade, fere-se
também o direito ao afeto, ao direito de constituir família, este que está se perdendo
entre formas desorientadas, onde algumas entidades se autodenominam famílias
contemporâneas, mas abusam da liberdade constitucional que lhe dá respaldo e
deixa em aberto, nesses casos, a função social da família no Estado Democrático de
Direito.
De fato, toda a liberdade aplicada a qualquer pessoa, quando passa a ser
realizada de forma imprudente, como em alguns casamentos, possui séria relação
de desorganização social que atrapalha no desenvolvimento em geral. O divórcio
não se apresenta como sinônimo de destruição familiar quando analisado através do
positivismo, porém é certo que o mesmo causado de forma conturbada fica a cargo
60
de o Judiciário interferir no conflito direto, o que reduz, de certa forma, a liberdade
deste direito.
Toda norma jurídica existente deve contribuir para o bem comum das
pessoas, e no caso da Emenda Constitucional n.º 66/2010, não foi diferente, pois
aperfeiçoa o princípio do livre planejamento familiar e da dignidade da pessoa
humana.
O divórcio permite a liberdade para buscar novamente a felicidade, o que se
apresenta extremante válido, mas o problema não reside apenas na felicidade entre
os cônjuges colocada em contradição quando os cônjuges não mais se amam ou
não mais se suportam, mas a dos filhos e familiares envolvidos. Mesmo após a
homologação da sentença em juízo, existe a indisponibilidade dos ex-cônjuges
cumprirem suas obrigações, como visita de seus filhos e pagamento de pensão
alimentícia e, com isso, deixam de exercer afetivamente muita das vezes os deveres
previstos no poder familiar.
Portanto, em que pese o aumento do número de divórcios se dê anualmente,
não se pode concluir satisfatoriamente que o crescimento se deve exclusivamente à
maior liberdade e facilitação do processo nos termos da Emenda Constitucional n.
66/2010. As estatísticas e os relatos sociais demonstram que a legislação apenas
acompanhou um novo anseio social de busca pela felicidade em sua individualidade.
A questão de se colocar o indivíduo acima da família em seus moldes
tradicionais tem respostas variadas de acordo com os valores e a pluralidade de
interpretações natural do ser humano e do Direito. Como o Direito caminha pari
passu com a evolução social, conclui-se que, neste caso, à legislação e à
Constituição Federal não restava alternativa a não ser se adaptar à nova realidade
social, o que já vinha sido reconhecido pela jurisprudência dos tribunais do País. O
aumento da estatística de divórcios após a Emenda Constitucional apenas corrobora
esta afirmação.
61
CONCLUSÃO
Durante muito tempo, o casamento recebeu uma consideração mais rígida,
porque a sociedade idealizava projetos e formações fundamentais como parâmetros
familiares essenciais, que possuíam o núcleo familiar como paradigma a ser seguido
para as presentes e futuras gerações, com base em valores mais conservadores de
preservação da prole em seu molde inicial, de acordo com um desenho de uma
espécie de família padronizada no País.
Ao longo dos anos a formação da família sofreu diversas modificações e hoje
existe uma pluralidade de arranjos familiares. O ordenamento jurídico atento a estas
alterações tem procurado se ajustar ao novo contexto familiar, especialmente no que
tange ao casamento. Por exemplo, nos últimos tempos, reconheceu-se a união
estável e a homoafetiva.
Tão importante quanto o casamento, se apresentam as inovações advindas
com últimas alterações normativas em relação às formas de dissolução do instituto,
uma vez que se nota uma facilitação expressiva no ordenamento jurídico em
comparação à legislação anterior. Neste aspecto, o instituto do divórcio também
sofreu suas modificações no ordenamento jurídico.
No passado, a Igreja como forte influência política no País, não autorizava o
divórcio e por isso, os projetos que tramitavam nas casas legislativas eram
completamente esquecidos ou obtinham modificações pequenas sempre dificultando
o meio mais simples de realizar o divórcio, implicando em prazos de reflexão e
dificultando a dissolução do vinculo conjugal.
O estudo teve como objetivo identificar os elementos estruturais do
casamento, do divórcio, as obrigações após o rompimento do vínculo matrimonial e
a nova Emenda Constitucional nº 66/2010, em busca de conceitos basilares,
vantagens e benefícios no divórcio.
Percebe-se a evolução do divórcio como solução dos conflitos conjugais,
como resultado das mudanças no comportamento da sociedade ao longo dos anos,
principalmente durante as últimas décadas do século XX, quando as mulheres
alcançaram a sua autoafirmação em oposição à antiga sociedade machista, e, em
contrapartida, os homens adquiriram uma maior sensibilidade frente a tais conflitos.
Após um longo caminho evolutivo na sociedade e no ordenamento jurídico, a
nova Emenda Constitucional n° 66/2010 apresentou um rompimento contratual
62
definitivo entre as partes. Agora, não há mais necessidade de espera pelo prazo de
reflexão anteriormente exigido pela antiga legislação. Desta forma, sem o
pressuposto temporal, os cônjuges podem decidir de comum acordo não mais
permanecerem juntos e procurarem o desfazimento da união por um procedimento
mais simples.
Especialmente, para decidir sobre a partilha de bens, pensão, permanência
ou não do nome do cônjuge e, desde que não possuam filhos menores ou
incapazes, têm a possibilidade de escolher o divórcio extrajudicial, por tratar-se de
um procedimento simples, rápido e facilitado.
Os novos valores e princípios que regem a sociedade e o atual sistema
jurídico brasileiro não mais aceitam a interferência da Igreja como antigamente,
especialmente em relação ao tema do divórcio. A modernização da sociedade exige
uma revisão da Igreja em seus conceitos e posturas mais tradicionais. Não se
condena mais as pessoas que decidem se divorciar. O objetivo principal da vida
passa a ser identificado com a felicidade, bem estar e realização pessoal do
indivíduo, em consonância com os princípios democráticos reconhecidos
constitucionalmente, dentre os quais se destaca o princípio da dignidade da pessoa
humana.
As estatísticas comprovam o aumento do número de divórcio nas últimas
décadas, o que pode ser associado à facilitação promovida pela Emenda
Constitucional n.º 66/2010. A observância da nova norma demonstra sua eficiência e
eficácia. Também se denota de sua demanda a paridade com os anseios sociais. Os
números apenas refletem a realidade da sociedade contemporânea. A diferença é
que antes os índices ocultavam esta realidade, porque a lei dificultava o divórcio e
as pessoas viviam separadas de fato e casadas no papel. Havia um descompasso
entre o formalismo jurídico e a realidade social.
Porem adverte-se que a sociedade não está completamente pronta para
resolver suas dificuldades particulares. Tanto é verdade que as ações judiciais
sempre se apresentam em números grandes. Seja em relação a casos que
poderiam ser resolvidos por meio de um simples diálogo, mas não o são, ou seja em
relação a causas mais complexas que exigem uma solução judicial, a criação e a
modificação de leis se fazem necessárias para tentar solucionar os conflitos sociais.
A sociedade evolui, mas permanece imatura para lidar com seus direitos e deveres,
sem o amparo da lei e do Estado, inclusive em assuntos familiares.
63
Conclui-se que o Direito de Família não se ocupa em satisfazer a vontade
individual do cidadão, mas, acima disso, a protege-los, acompanhando a
modernização da sociedade, as mudanças nas relações interpessoais entre homens
e mulheres, a velocidade com que os relacionamentos começam e terminam, a
flexibilização de valores os quais outrora eram tidos como imutáveis, a rapidez das
informações e interação das pessoas do mundo todo, o acesso à justiça e a
celeridade.
Portanto, o divórcio não deve ser visto como uma forma de desestruturação
da família e das relações afetivas existentes entre os envolvidos, como já foi
considerado antigamente. Pelo contrário, pode ser a saída mais sadia para pessoas
ligadas entre si por um vínculo meramente formal, quando não há mais sentimento
amoroso e de companheirismo, nem expectativas de uma possível reconciliação. Se
o Estado se propõe a promover o bem comum, este envolve o bem de cada um, e,
para isso, a realização pessoal e a felicidade devem ter um caminho facilitado pelo
Estado. A Emenda Constitucional n.º 66/2010 apenas formalizou um anseio social e
permitiu um avanço da legislação. É o Direito em sua dinamicidade, acompanhando
a evolução social.
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REFERÊNCIAS
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